santa-fezense (...) quase no mesmo nível dos estancieiros (...) o juiz de comarca, o
juiz distrital, o promotor público, os oficiais da guarnição federal, alguns altos
funcionários e a maioria dos médicos e advogados” (R1, p. 130), até chegar às
camadas mais finas da sociedade que freqüentava o clube, “o leite propriamente dito
(...) funcionários públicos, sempre muito mal pagos, uma série de pessoas de
profissão incerta, e principalmente uma legião de empregados do comércio” (R1, p.
130).
Esse esmiuçamento da sociedade serve de base ao grande encontro que
acontece no baile de réveillon dessa noite, onde, imersos na música tocada pela
banda, as relações de classe transparecem, clara ou veladamente:
E agora, naquele 31 de dezembro de 1909, ao entrar nos salões iluminados
do Comercial, Rodrigo ainda não via claro no colorido conglomerado
humano. Tinha, porém, a intuição de que havia ali várias camadas que não
se misturavam (R1, p. 135).
A conclusão de Rodrigo adianta o terceiro volume da trilogia, num ambiente
onde a dança e a música dão indícios das divisões existentes na sociedade, e
também dos códigos de conduta e os preconceitos que acompanham esses códigos:
Aquelas pessoas não se encontravam num continente: eram, antes,
moradores dum arquipélago. Lá estava a importante ilha dos estancieiros,
comerciantes e “pessoas gradas” da localidade. Havia as pequenas ilhas,
de escassa população, dos descendentes de imigrantes e finalmente a
grande, populosa, pululante ilha dos funcionários públicos e empregadinhos
do comércio. Certo, os habitantes duma ilha às vezes se aventuravam em
excursões pelas outras ilhas vizinhas, mas mesmo essas viagens
ocasionais obedeciam a certas regras. As filhas dos estancieiros e dos
comerciantes dançavam geralmente com os filhos dos estancieiros e dos
comerciantes: moços, porém, como o promotor público e o Dr. Amintas, que
eram solteiros, bem como os oficiais da guarnição federal também
dançavam com as Fagundes, as Prates as Teixeiras, as Macedos, e as
Amarais. Um dia, entretanto, o Lelé Pontes, caixeiro da Casa Sol, teve a
ousadia de convidar para dançar a filha mais moça de Cacique Fagundes;
ora a rapariga, que era bem educada, não recusou, mas fechou a cara, não
trocou uma palavra com o rapaz e mal parou a música, foi sentar-se na sua
cadeira e passou emburrada o resto da noite. Os caixeiros, porém,
encontravam seus pares e escolhiam eventualmente suas namoradas e
esposas entre as moças pobres, filhas de pequenos comerciantes ou
funcionários (R1, p. 135-36).