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As conclusões a que o jesuíta chegou, neste sermão, sobre a figura pregada
por São João no apocalipse foram duas:
A primeira, que este filho varão, nascido para imperador universal, havia de
ser príncipe cristão, e filho da Igreja Católica. [...]. A segunda coisa que
significava a mesma figura, é a circunstância do tempo, em que havia de
nascer à Igreja aquele filho varão e dominador do mundo. Esta questão já a
excitei, e resolvi no último discurso do sermão passado, onde mostrei com o
profeta Daniel, que a exaltação do império universal há de concorrer no
mesmo tempo com a ruína do império do turco, porque, quando este cair,
então aquele se há de levantar (VIEIRA, 1958, p. 21, v. XXII).
A lua sob os pés da mulher na figura apocalíptica seria, para o Padre Vieira,
“a lua que os maometanos adoram e trazem em suas bandeiras” (VIEIRA, 1958, p. 22, v.
XXII). Logo, quando o império turco estivesse subjugado aos pés da mulher nasceria o V
Império. Esta mulher seria a Igreja Católica, pois aquela estaria “vestida do sol, que é cristo”
(VIEIRA, 1958, p. 21, v. XXII), e “coroada de doze estrelas, que significam os doze
apóstolos: [...] porque a mesma Igreja não só é e se intitula católica, senão também
apostólica” (VIEIRA, 1958, p. 21, v. XXII). Era necessário, portanto, que o império turco
fosse vencido
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. Após este fato, teria início as mudanças que desembocariam no V Império.
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São inúmeras as alusões, nas cartas, à questão da conjuntura pela qual os turcos passavam. Como na escrita a
D. Rodrigo de Meneses (15 de fevereiro de 1670) onde argumentou que “o Turco fica fazendo em
Constantinopla e Cândia os maiores aparatos de a guerra [...]” (VIEIRA, In: AZEVEDO, 1926, p. 293). Ao
mesmo D. Rodrigo argumentou o jesuíta, em nova carta (15 de março de 1670) que “os hereges de Hungria estão
levantados e se presume que tem inteligências com o Turco” (VIEIRA, In: AZEVEDO, 1926, p. 297). Ainda
nesta época escreveu novamente àquele (10 de maio de 1670) que “o Turco continua nos aprestos de uma
poderosa armada, sutil e de alto bordo, não se descuidando de Alemanha pela Croácia e Hungria” (VIEIRA, In:
AZEVEDO, 1926, p. 303).Em 14 de fevereiro de 1671, ao Marquês de Gouveia, escreveu que um príncipe de
Polônia havia jurado fidelidade aos turcos. Os relatos das movimentações do exército turco – e os perigos que
disto resultariam - pela Europa foram uma constante neste período. Além das já mencionadas, foi possível
encontrar outras cartas onde o assunto foi tratado: a D. Rodrigo de Meneses (29 de setembro e 06 de outubro de
1664, 11 de maio de 1671), ao Marquês de Gouveia (23 de maio e 26 de setembro de 1671, bem como em 4 e 18
de junho de 1672, 08 de outubro de 1672; 11 de março e 03 de junho de 1673) e a Duarte Ribeiro de Macedo (16
de abril, 28 de junho, 25 de outubro e 18 de dezembro de 1672; 12 de setembro de 1673), cf. Vieira (In:
AZEVEDO, 1926, p. 91, 92, 345-347, 370, 439, 455, 457, 460, 510, 517, 539, 578, 605, 653). Em época
posterior também foi mencionada a questão, nas cartas enviadas a Duarte Ribeiro de Macedo -12 de junho de
1677 e 11 de outubro de 1678 – (VIEIRA, In: AZEVEDO, 1928, p. 233 e 316-317), quando ainda se encontrava
em Portugal o jesuíta. No último período, após 1681, referiu-se novamente na questão do império turco otomano
em carta a Diogo Marchão Temudo (02 de maio de 1686), escreveu “anglia convertetur, Imperium Otomanum
ruet”. Como havia falecido o monarca Carlos II da Inglaterra, estaria próximo a sujeição dos turcos (VIEIRA,
In: AZEVEDO, 1928, p. 527). Era necessário, pelas crenças do Padre Vieira que os turcos vencessem a
Alemanha, pois esta seria uma continuação do império romano. Depois desta vitória dos turcos, se iniciaria o
processo de transformações para o V Império, razão da sempre atenção do jesuíta voltada a questão das
movimentações de guerras – ou indícios de - que os turcos otomanos estavam realizando. Cf. Vieira (In:
AZEVEDO, 1926 e 1928).