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UNIVERSIDADE SÃO PAULO
Programa de Pós-Graduação Interunidades em Estética e História da Arte
Identidade e a Arte de Maria Martins
M.Silvia Eisele Farina
São Paulo
2008
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UNIVERSIDADE SÃO PAULO
Programa de Pós-Graduação Interunidades em Estética e História da Arte
Identidade e a Arte de Maria Martins
M.Silvia Eisele Farina
Dissertação apresentada ao Programa de
Pós-Graduação Interunidades em Estética e
História da Arte, na Linha de Pesquisa
Teoria e Crítica da Arte para obtenção do
título de mestre em Estética e História da
Arte, sob a orientação Profa. Dra. Kátia
Canton.
São Paulo
2008
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Aos meus pais
Aos meus filhos Thomas Ludi e Daniel
Ao meu amigo David Azoubel Neto, que acreditou em mim.
E à Profa. Dra. Elide Monzeglio, por me mostrar o que é ser uma grande mestra,
in memorian.
AGRADECIMENTOS
Ao querido amigo e artista Nelson Screnci pela luz
A minha orientadora Kátia Canton pelas sugestões precisas
A Érika Knoblauch pelas primeiras imagens escaneadas
Izabel Rocha por me fazer acreditar que era possível
Joel Coelho de Souza, coordenador da Coleção Roberto Marinho.do Rio de Janeiro pelo
primeiro start e muitas informações imprescindíveis para iniciar e dar andamento à
minha pesquisa
À minha terapeuta Maria Cecília Schmidt de Oliveira que me incentivou a ir em frente e
descobrir meu caminho
Jean Boghici por muitas informações e ser o “dono” de Maria
Ao Chester do Itaú Cultural
Ao meu amigo Manoel Ratto pelo suporte técnico
Wellington do MAM pelas autorizações das fotos
À minha amiga Flavia Rudge Ramos
À querida amiga Neusa Brandão pela paciência
Ao amigo Paulo Marquezini
Ao meu querido filho Ludi pela impecável e paciente formatação do texto
Em especial
À minha querida amiga Ines Novoa Jezler pela revisão da compreensão do texto precisa
ao estimulo e sua dedicação.
e
À Alecsandra Matias pela paciência, organização e carinho.
E com muito carinho à prof. Dra. Elza Alzenberg pela idealização do curso
E principalmente e acima de tudo a DEUS.
RESUMO
A produção artística de Maria Martins é cercada de efemérides desconhecidas
do grande público, por exemplo, poucos têm conhecimento de que a escultura
monumento O Rito do Ritmo foi criada para a inauguração de Brasília, em 1961. O que
teria de mistério ou preconceito em torno de Maria Martins? Por que a história da arte
brasileira marginaliza uma artista que intercedeu diretamente na criação da Bienal
Internacional de São Paulo? Quem era essa mulher irreverente, ousada e sensível?
Na trajetória de Maria Martins, muitas datas e nomes de obras divergem ou são
imprecisos. Foi uma das organizadoras Bienal Internacional de São Paulo. O contato
que tinha com os artistas fora do país, facilitou a participação de grandes nomes na
exposição internacional.
Nas cadas de 1940 e 1950 seu trabalho artístico desenvolveu-se de forma
progressiva e significativa, no exterior. A presente pesquisa se propõe a validar as obras
de Maria Martins, dentro de um levantamento fotográfico das obras in loco, além de
utilizar registros em livros e catálogos, especificamente, suas esculturas.O objetivo
principal é buscar uma linha condutora artística. Seu papel na arte brasileira não se
restringe à poética visual, mas também, estende-se à promoção da produção artística
nacional.
A pesquisa dirigiu-se no âmbito da perspectiva de apreciação estética formal de
sua obra, bem como, pautou-se no realce e elenco de suas esculturas. Deve-se atentar
que, esse exercício é implementado, muito embora, a própria Maria Martins não tivesse
em sua poética uma continuidade cronológica lógica cercada de idéias e linhas. O
estudo sobre a obra de uma grande artista é, simultaneamente, desafio e proposta de
trabalho apaixonante. A artista procurou ver para além obra matéria
Palavras chave: Maria Martins; Surrealismo; poética visual; Arte Brasileira; escultura
surrealista; mulher na arte.
ABSTRACT
Maria Martin’s production is surrounded by unknown ephemeredes to the
public. Few people know that her monument sculpture “Rite of the Rhythm” was
idealized for the foundation of Brazil’s capital, Brasília in 1961. What is it about the
artist’s story: mystery or prejudice? Many names and dates in her artistic production are
imprecise. Why is it that the history of Brazilian art does not value Maria Martins as
expected having been an artist whose significance does not restrict itself exclusively to
the plastic production but also to the promotion of the Brazilian Art as a whole. Maria
Martins interceded directly in the creation of the International Biennial of São Paulo?
Because of her acquaintances many important international artists participated in the
Biennial.
Who was this irreverent, bold and sensitive artist? During the 1940’s through
the 1950’s the works of Maria Martins had a significant and progressive development in
Europe. Through an extensive in loco photographic and bibliographical research of her
works this paper intends to validate her importance in the artistic scenario as well as to
situate her production in the artistic context of her time. Apart from enlisting and
organizing her creative work, this paper also emphasizes the relevance of her sculptures,
eventually including an esthetic appreciation. Although there is a concern in the
chronological and aesthetical organization of her production, one must keep in mind
that the artist herself did not follow any intentional development or sequence of her
works.
The study and appreciation of her production was simultaneously a challenge
and a passionate enterprise, once you consider that Maria Martins could see beyond the
materia.
Key Words: Maria Martins; Surrealism Visual; Brazilian Art; Art Surrealistic
Sculpture; Woman in Art
“Quando no limiar comovente da humanidade o homem, pela primeira vez, tomou
conhecimento de sua vida espiritual e a consciência de sua vida mental, nesse dia
nasceu a Arte”. A verdadeira obra de arte guarda em si muito mais que a imagem
representa, guarda a magia de uma dupla vida a que lhe deu o artista, na grande
aventura da criação e a que cada qual lhe empresta, quando da emoção de
contemplá-la”. Maria Martins
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO ............................................................................................ 1
2. PRIMITIVO E SURREALISMO ................................................................ 6
2.1. A Expressão da Arte Primitiva.............................................................. 6
2.2. O Novo Mundo do Surrealismo........................................................... 11
2.3. 1920, o Surrealismo no Brasil .............................................................. 25
3. AS DIVERSAS FACES DE MARIA MARTINS ...................................... 31
3.1. Dados Biográficos................................................................................. 31
3.2. Trajetória Estética................................................................................ 36
3.3. Sem a Sombra de Duchamp................................................................. 42
4. A POÉTICA VISUAL DE MARIA MARTINS ........................................ 48
4.1. Um Percurso ......................................................................................... 48
4.2. Amazônia, Mito, Lendas e Maria ........................................................ 49
4.3. Um Olhar Sobre... A Soma de Nossos Dias ......................................... 54
4.4. Olhares sobre Maria ............................................................................ 58
5. LEVANTAMENTO DAS OBRAS............................................................. 65
5.1. Obras..................................................................................................... 66
5.2. Obras Sem Imagens.............................................................................. 69
5.3. Fotos das Esculturas In Loco............................................................... 70
5.4. Exposições............................................................................................. 72
5.4.1. Exposições Individuais................................................................... 72
5.4.2. Exposições Póstumas ..................................................................... 74
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS ..................................................................... 78
7. FOTOS DAS OBRAS ................................................................................. 83
8. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..................................................... 103
1
1. INTRODUÇÃO
A arte não reproduz o visível; mais do que reproduzir, ela
torna visível (...) Meu objetivo é sempre encontrar a magia
da realidade e transferir essa realidade para a pintura -
tornar o invisível visível através da realidade. Pode soar
paradoxal, mas é de fato a realidade que produz o mistério
da nossa existência
1
.
Paul Klee
A visão do artista, repleta de símbolos e imagens, pode tornar a realidade do
mundo externo, mais plena de sentido, retomando a concepção de Paul Klee, de que a
arte torna visível o invisível. Se no início do século Paul Klee declarou que cabia a arte
tornar visível o invisível”, esse estudo faz uma inversão correspondente. Tornar visível
o lugar secreto, onde as coleções são guardadas, significa apresentar ao público uma
história da vida subterrânea dos museus.
Quando escolhi Maria Martins para ser meu objeto de pesquisa, nem de longe
poderia imaginar a afinidade que essa artista tinha comigo e meu trabalho em arte. O
enlevo e o encantamento provocados em mim pela percepção crescente da sensibilidade
de Maria foi me tornando, cada vez mais próxima mais identificada com o seu trabalho,
e o que vi refletido em meus tridimensionais (esculturas) que precederam ao meu
conhecimento da artista. Percebi que seria impossível pesquisar a obra de uma grande
artista sem penetrar, de uma forma mais subjetiva, no estudo de sua historia de vida.
Porém, para essa missão seria necessária uma ação observadora repleta de sensibilidade.
A obra de Maria Martins configura-se em energia, ousadia e sutileza erótica.
Durante a pesquisa ocorreu um despertar da sensibilidade, surpreendendo-me
com a eclosão de tantas formas inquietantes, carregadas de uma sensualidade que
ultrapassou o erotismo, exalando o transe de uma sexualidade perene e a liberdade de
suas expressões. É possível referir-se a um barroco surrealista”, em face das linhas e
curvas que movimentam o olhar de modo inquieto.
O não reconhecimento da artista no panorama da arte brasileira também me
inquietou. Como uma artista de tamanha expressão de alma e de sentimentos,
1
KLEE, Paul. Sobre a Arte Moderna e Outros Ensaios/ Paul Klee. (Prefácio e notas), Günther Regel. Rio
de Janeiro: Zahar, 2001.
2
depositada em suas obras, poderia passar sem o merecido prestigio, no contexto artístico
nacional, em uma época em que artistas mulheres começaram a se destacar, tais como
Anita Malfatti e Tarsila do Amaral?
A produção artística de Maria Martins é cercada de efemérides desconhecidas
do grande público, por exemplo, poucos têm conhecimento de que a escultura
monumento O Rito do Ritmo foi criada para a inauguração de Brasília, em 1961
2
: o que
teria de mistério ou preconceito em torno de Maria Martins? Por que a História da Arte
marginaliza uma artista que intercedeu diretamente na criação da Bienal Internacional
de São Paulo? Com relação às suas obras: divergências nos títulos e publicações
diferentes que mostram a mesma obra? Quem era essa mulher irreverente, ousada e
sensível?
Na trajetória de Maria Martins, muitas datas e nomes divergem ou são
imprecisos. Seu papel na arte brasileira não se restringe à poética visual, mas também,
estende-se à promoção da produção artística nacional. Maria Martins foi uma das
organizadoras da Bienal Internacional de São Paulo. O contato que tinha com os artistas
fora do país, facilitou a participação de grandes nomes na exposição internacional. Nas
décadas de 1940 e 1950 seu trabalho artístico desenvolveu-se de forma progressiva e
significativa, no exterior.
Em uma busca repleta de paixão e prazer, procurei esgotar as fontes possíveis.
Sorvi as formas elaboradas por Maria Martins na tentativa de encontrar o ser humano e
a artista. Foi difícil, por intermédio de suas obras ou por meio de livros, encontrar uma
unidade, um denominador comum que pudesse caracterizar o seu trabalho. Descobri
algo melhor que unidade (identidade). Descobri a força de uma naturalidade, de uma
espontaneidade ligada ao inconsciente. Algo correspondente ao estilo, à marca
registrada e reconhecida à distância como uma qualidade artística.
2
O Rito do Ritmo, de sua autoria, escultura/monumento situada em Brasília, mede aproximadamente 7m
de altura e foi replicada em miniaturas, distribuída como lembrança por ocasião da inauguração da nova
capital do Brasil, em 1961, neste pequeno objeto está a seguinte inscrição do trecho do discurso do
presidente Juscelino Kubitschek no lançamento da pedra fundamental de Brasília em 2 de dezembro de
1956: “Deste Planalto Central, desta solidão que em breve se transformará em cérebro das altas
decisões nacionais, lanço os olhos mais uma vez sobre o amanhã do meu país e antevejo esta alvorada
com fé inquebrantável e uma confiança sem limites no seu grande destino”.
3
A unidade (estilo) de Maria Martins provinha direta ou indiretamente do seu
inconsciente e poderia ser captada pelo inconsciente daqueles mais sensíveis, levando-
se em consideração o conceito de inconsciente coletivo de Carl Gustav Jung. Para esse
cientista, o inconsciente coletivo seria a camada mais profunda do psiquismo
inconsciente humano, no qual se encontram os arquétipos, ou seja, as estruturas
responsáveis pela formação das imagens arquetípicas imagens comuns à Humanidade
e que surgem nos mitos, nas obras de arte e também em sonhos e devaneios.
A característica expressiva da artista consistia em surpreender o público com
inovação que não se sustentava pela seqüência lógica formal, mas por uma seqüência de
um automatismo psíquico: a mesma proposta do Movimento Surrealista. As linhas,
traços e escritos adotados por Maria Martins carregam um erotismo sutil e sensualidade
discreta, envoltos em uma agressividade da liberdade da expressão. Por essas
características em sua poética, Maria Martins à sua época era incômoda.
A fase figurativa, especialmente na linguagem escultórica finalizou-se em
1942, transformando-se, rapidamente, em seres imaginários, oníricos e folclóricos
pertencentes às lendas brasileiras. Sua poética incorporou formas bridas entre gente,
plantas e bichos. A artista integrou os reinos animal, vegetal e mineral formas de difícil
compreensão lógica e consciente do espectador. Muitas vezes, essa é a magia de Maria
Martins: sua obra observada com atenção remete a uma história ou a uma viagem...
É possível afirmar que o meu trabalho artístico particularmente, se divide em
duas partes essenciais: antes e depois de conhecer as obras de Maria Martins. Esse
contato forneceu-me sensibilidade maior e questionamento mais intenso sobre a minha
identidade dentro do meu processo de criação artística. Talvez, tenha ocorrido, no meu
íntimo, algum tipo estranho e bastante subjetivo de diálogo. Senti, diante de Maria
Martins, uma profunda afinidade, uma identidade que converge em relacionamento
expressivo e profundo envolvimento como artista.
Desse modo, a presente pesquisa se propõe a validar as obras de Maria
Martins, dentro de um levantamento fotográfico in loco, além de utilizar registros em
livros e catálogos. O objetivo principal é buscar uma linha condutora artística, embasada
na poética de Maria Martins. A pesquisa dirigiu-se no âmbito da perspectiva de
apreciação estética formal de sua obra, bem como, pautou-se no realce e elenco de suas
4
esculturas. Deve-se atentar que, esse exercício é implementado, muito embora, a própria
Maria Martins não tivesse em sua poética uma continuidade cronológica lógica cercada
de idéias e linhas. A artista procurou ver para além obra matéria.
Outro detalhe significativo na obra de Maria Martins: a artista parece não ter
receio de explorar a intuição, mergulhando às vezes nas profundezas do inconsciente. É
assim que transferiu o seu imaginário para as suas obras, dando um caráter de ousadia,
coragem e criatividade ilimitada. Como artista plástica, esforço-me para examinar seus
estudos como uma apurada forma de expressão do seu imaginário. O subjetivo de suas
imagens parece colocar o indivíduo em contato com a alma.
O estudo sobre a obra de uma grande artista é, simultaneamente, desafio e
proposta de trabalho apaixonante. Essa dissertação se propõe a fazer um levantamento
da história e da obra de Maria Martins, especificamente, suas esculturas, e traz mais
informações sobre sua vida, uma vez que não há uma bibliografia mais detalhada.
O estudo Identidade e a Arte de Maria Martins está estruturado em três partes
principais:
1) Primitivo e Surrealismo:
Abre as discussões acerca dos novos caminhos adotados pelas vanguardas, no início
do Século XX e que serão, também, os pilares da poética visual de Maria Martins.
Ressalta-se a vertente surrealista que representa uma forma inovadora de
compreensão estética da realidade e o impacto dessa orientação no contexto
brasileiro durante a década de 1920.
2) Diversas faces de Maria Martins:
Destaca os dados biográficos da artista e, principalmente, desvenda sua trajetória
estética (da formação aos eventos mais relevantes que contribuíram para a
constituição de seu repertório). Merece destaque sua convivência com Marcel
Duchamp. Pode-se ver através de obras que dialogam entre si as de Duchamp e de
Martins, a influencia daquele sobre a artista. Uma influencia não explícita, mas nas
principais entrelinhas das obras de Maria.
5
3) Poética Visual de Maria Martins:
Lança olhares para a produção da artista, que descrevem a singularidade de Maria na
Arte Brasileira. Os temas principais, as técnicas inéditas de uso de materiais como o
sermolite, são examinadas às condicionantes estéticas que formam o contexto da
artista. Ao final do estudo e pesquisa apurada, realiza-se um levantamento
fotográfico geral das obras de Maria Martins uma tentativa de documentação, e
catalogação e preservação da memória de tão relevante artista.
Destaca os dados biográficos da artista e, principalmente, desvenda sua trajetória
estética (da formação aos eventos mais importantes que contribuíram para a
constituição de seu repertório). Merece destaque sua convivência com Marcel
Duchamp. Pode-se ver através de obras que dialogam entre si as de Duchamp e de
Martins, a influencia daquele sobre a artista. Uma influencia não explícita, mas nas
principais entrelinhas das obras de Maria.
4) Poética Visual de Maria Martins
Lança olhares para a produção da artista, que descrevem a singularidade de Maria na
Arte Brasileira. Os temas principais, as técnicas inéditas de uso de materiais como o
sermolite, são examinadas às condicionantes estéticas que formam o contexto da
artista. Ao final do estudo e pesquisa apurada, realiza-se um levantamento geral das
obras de Maria Martins uma tentativa de documentação, e catalogação e
preservação da memória de tão relevante artista.
6
2. PRIMITIVO E SURREALISMO
2.1. A Expressão da Arte Primitiva
A arte existe desde que o Homem existe. Antes de conhecer a escrita, o
Homem produzia obras de arte. Nas cavernas, procurou registrar, metaforicamente,
através de imagens, a sua realidade às vezes esse registro parecia irreal, mas nada
mais era do que a tentativa de reproduzir a realidade. Ao fazer figuras, que
representaram os animais e pessoas, com cenas de caças e ritos religiosos esses homens
estavam registrando seu cotidiano. Faziam também esculturas em madeira, ossos e
pedras; esses objetos e pinturas são estudados para se conseguir saber como viviam
aqueles povos antigos.
A arte se faz presente, na Pré-História, no esculpir a pedra para fazer um
instrumento de caça ou corte e na marca individual da presença do Homem, através da
impressão de suas mãos nas paredes das cavernas. No instante em que deixou as
impressões de suas mãos nas cavernas, surgiu o registro do presente. Nesse contexto, a
arte tem a função de registrar o momento de uma época e somente ao Homem foi dado
o atributo da arte.
Além da arte dos povos pré-históricos, considera-se, também, como arte
primitiva aquela produzida pelos índios e outros povos que viviam na América, antes da
vinda de Colombo. Os maias, os astecas e os incas representaram a arte pré-colombiana:
são pinturas, esculturas e templos, feitos de pedras ou materiais preciosos, que contam a
história desses povos. Na atualidade também arte primitiva, tais como: os negros
africanos, que produzem máscaras para rituais, esculturas e pinturas; os nativos da
Oceania (Polinésia, Melanésia, etc.) também têm arte primitiva com estilo próprio; os
índios americanos produzem objetos de arte primitiva.
Em algumas regiões do mundo, inúmeros fatores contribuíram para que os
povos que nelas viviam não atingissem o estado da civilização, permanecendo num
estágio de desenvolvimento próximo às culturas neolíticas. A produção artística desses
povos, baseada em lógicas diferentes das que se observam no mundo, costuma ser
chamada de arte primitiva, etnográfica ou nativa. Geralmente, essa arte tem função
definida dentro da sociedade original, sendo freqüente sua ligação aos aspectos
7
religiosos. A reprodução de imagens, freqüente entre os povos primitivos, por exemplo,
parece ser uma exigência comum da espécie humana, talvez guiada por aspectos do
inconsciente que proporciona imagens aleatórias de uma forma automática sem censura.
Ídolos, figuras fetichistas, máscaras e pinturas pelo corpo são bons exemplos de
expressão da arte primitiva.
Os principais objetos trabalhados são matérias-primas naturais, como a madeira
e a pedra, através de técnicas semelhantes a dos homens da Idade do Bronze. Além
disso, é notável o senso de desenho que essa arte costuma apresentar. As crenças, rituais
e tradições dos povos fornecem ampla temática para as suas mais variadas
manifestações. A influência, na arte Ocidental do século XX, da escultura tradicional da
África e da Oceania e dos outros povos em desenvolvimento demonstra a vitalidade que
resulta a interação cultural. Isto também indica que a cultura moderna muito tem de
influência destes povos.
Durante alguns séculos a proporção da altura para a largura do corpo e a
proporção da cabeça para a altura da figura humana variavam somente dentro de limites
pré-estabelecidos. O extremo desses limites foi notório no Maneirismo, com El Greco,
considerado único, por alguns historiadores. As angulações e distorções de suas figuras
influenciaram Picasso. No final de 1906 a mudança radical em favor das razões
extremas da proporção é antecipada no estilo ibérico de Picasso como: As Duas
Mulheres, (1906). Mas, em 1907, em Les Demoiselles d’Avignon e em O Luxo de
Matisse, eclodiu a liberdade. Essa nova configuração do corpo humano foi logo
absorvida pelos artistas alemães a partir da prática da “desproporção expressiva”.
No princípio do culo XX, o olhar do período foi insensível à beleza, força e
sutileza das artes tribais. Mas se o termo “primitivo”, fora, a então, usado quase
sempre com um sentido pejorativo, a partir dos artistas modernos essa configuração se
modifica, tornando a palavra positiva e vital. Quando Picasso declara: ... que a
escultura primitiva nunca foi superada...”, isso mostra que a admiração pela arte tribal
proporcionou à arte moderna um enriquecimento imensurável.
Muitos artistas modernos e contemporâneos empregaram como referências
para suas produções a arte primitiva: o contato com esse tipo de arte foi de extrema
importância para a definição dos rumos tomados pela arte do século XX. Isso é fato
notório na poética de artistas, tais como: Gauguin, Matisse, Picasso, Miró, Braque,
Modigliani, Leger, Klee, Giacometti, Brancusi, Henri Moore, Calder, Wifredo Lam e
Arman, entre outros.
8
diversos exemplos de arte primitiva inspiradores de obras modernas. Um
dos exemplos seria a Cabeça de Amorgos, um dos ídolos mais extraordinários da
chamada cultura das ilhas gregas Cíclades.
3
Esta cabeça de mármore, polida como um
seixo, possivelmente pertenceu ao corpo de uma mulher A esquematização das linhas
corresponde a um desejo de simplificação, mais do que a uma técnica primitiva. Essa
síntese da figura humana, na qual poucos elementos definem um rosto aproxima-se do
trabalho de Brancusi, Danaide (1918), bronze sobre uma pedra polida. A Tue Tête, de
Maria Martins (1950) também utiliza o mesmo recurso. Outro exemplo: Cabeça de
Modigliani (1915) e uma máscara de Mali, madeira, na qual a simplicidade e limpeza de
linhas ditam a forma de cabeça humana ao mesmo tempo em que um alongamento
do rosto, diferindo dos padrões estéticos convencionais.
Provavelmente, Alberto Giacometti teve contato com a alongada Figura
Nyamwezi (Tanzânia), que como uma nova maneira de retratar o homem possa ter
influenciado sua série de trabalhos com figuras altas e alongadas representadas aqui por
Tall Figure (1949). É notório o diálogo deste artista/escultura com a obra A Mulher
Que Perdeu Sua Sombra (1946) de Maria Martins.
Uma outra obra, Princess X (1916) de Brancusi, em comparação com um
pilão de Papua (Nova Guiné), sugere uma mulher com cabeça e pescoço encurvados
sobre dois seios insinuados. Princess X é apresentada com uma cabeça reclinada e uma
mão repousada sobre um único seio. É perceptível a semelhança entre essas duas obras
e Sombras (1952) de Maria Martins.
Os surrealistas preferiram a Arte da Oceania em detrimento à Arte Africana.
Talvez, essa escolha tivesse sido sustentada pelo fato da Arte da Oceania estar próxima
da natureza, por conter um grau maior de variação ou, ainda, pelo aleatório dos
materiais naturais.
É dito que a Arte africana é Clássica e a Arte da Oceania é Romântica,
entretanto tais generalizações podem dificultar mais do que clarear os conceitos, mas
uma afirmação poderia estar correta, a que a Arte Melanésia é mais romântica do que a
da africana, no sentido de que se caracteriza com a identificação com o mundo da
natureza. Enquanto existem homens e animais híbridos entre as máscaras africanas e as
figuras representadas nas suas esculturas, essas peças tendem conceitualmente a serem
3
Complexo de 56 ilhas, entre as quais estão: Amorgos, Anafi, Andros, Antiparos, Delos, Ios, Kea,
Kimolos, Kythnos, Milos, Mykonos, Naxos, Paros, Santorini, Serifos, Sikinos, Sifnos, Syros, Tinos,
Folegandros.
9
removidas e ficarem mais abstratos do natural do que os monstros ubíquos dos povos da
Melanésia.
Comparativamente às várias artes da Oceania, as esculturas africanas poderiam
ser caracterizadas em termos da predominância do antropomorfismo e antropocentrismo
ambas as qualidades do Clássico
4
. Os artistas da Nova Guiné, por outro lado, tendem
a achar seus monstros mais próximos dos ready-made nos recursos da essência da
matéria natural. Em nenhum momento da arte africana, por exemplo, se acha alguma
coisa comparável com aos bridos e malévolos Imunus
5
da região do Golfo da
Papuásia (Nova Guiné), feitos na sua totalidade de galhos ou raízes das árvores. O
resultado dessa “seleção natural” é uma acomodação acidental aleatória, do objeto
linear, mais próximo de algo sem forma cujos contornos diferem dos modelos estéticos
africanos.
Calder esteve perto do Surrealismo durante os anos de 1930 e se interessou
pela arte tribal, formando uma razoável coleção da arte primitiva. Como se pode
observar na figura Imunu (Nova Guiné) e Apple Monster (1938) de Calder, onde elabora
galhos de macieira pintados e arame um trabalho totalmente incomum em sua obra,
respondendo, diretamente, à fascinação do artista à expressão dos Imunu da Nova
Guiné. Esse tridimensional consiste num tipo de objets trouvés
6
. Tanto Calder quanto os
artistas da Nova Guiné buscaram “adivinhar” o teor mágico dentro desses materiais, em
seu estado bruto natural.
Pode-se perceber a aproximação do trabalho de Giacometti com a arte
primitiva em duas figuras de madeira do Zaire e da África do Sul e Man (1929), de
Giacometti.Nessas peças poucas linhas se encontram e de forma simples e vazada,
sintetizando a figura humana. A obra O Rito do Ritmo (1960), de Maria Martins, que
está em Brasília e foi encomendado para a inauguração da capital brasileira também
aproveita a mesma solução estética.
similaridade das formas entre Um Apito Mossi, de Upper Volta, e O Rei
Jogando com a Rainha (1944) de Max Ernst. Existem semelhanças entre uma figura de
4
Antropomorfismo é a forma de pensamento que atribui características e/ou aspectos humanos a Deus,
deuses, elementos da natureza e constituintes da realidade em geral. (Nesse sentido, toda a mitologia
grega, por exemplo, é antropomórfica), e o antropocentrismo, é uma concepção que considera, que a
humanidade deve permanecer no centro do entendimento dos humanos, tudo no universo deve ser
avaliado de acordo com a sua relação com o homem.
5
Imunu é uma figura original que representa a força espiritual obtida da raiz da árvore Mangrove. Essa
figura é esculpida e transformada nas condições formais apresentadas pela natureza, procurando manter a
forma original da raiz.
6
Agrupamento de objetos achados, submetidos à alteração mínima, após a sua seleção e agrupamento.
10
animal do Reino de Karagwe (Tanzânia), e Prometeu (1949) de Maria Martins. Ou,
ainda, uma releitura do primitivo nas duas obras de Maria Martins Simple History
(1951) e Sem Título, (Homem Dançando), bronze, (32 x 25 x 9 cm) e com uma tanga
(vestimenta) em casca de arvore pintada, Nova Guiné (Foto 8). Mais uma comparação
de semelhanças de uma figura de animal, ferro, 20cm, Reino de Karagwe, Tanzânia, e
Prometeu, 1949, bronze (57,5x51,5x 36cm) de Maria Martins.
Pode-se dizer que arte não provém de uma mesma fonte, que ela seria a alma
do homem, a alma do artista captando e transformando de acordo com sua percepção e
sensibilidade criando uma nova forma no mundo. Ela é exposta ao mundo pelo filtro da
alma do seu criador e que primitivo/surrealismo são dois vieses em um mesmo
caminho.
Primitivo/ surrealismo/ alma do artista se fundem, se mesclam e se recriam a
cada momento que uma obra de arte surge no mundo, dentro de um contexto livre e de
extrema sensibilidade. Este questionamento esbarra na mesmo relação existente entre o
primitivo e a alma humana. O que acontece é que o primitivo pode ser tomado como um
ponto de referência que é, ao mesmo tempo, um ponto de partida. O primitivo, como o
próprio nome indica, está na base, na raiz de todo o sentir. O primitivo é o que vem
antes, é o que já estava, é o próprio vir a ser que significa a projeção do homem e do seu
pensamento no tempo do futuro.
11
2.2. O Novo Mundo do Surrealismo
“... por estética se entende o simplesmente a teoria da
Beleza, mas a teoria das qualidades do sentir”.
Freud
O Surrealismo surgiu em 1924. A criação do termo “surrealismo” é atribuída ai
Appollinaire, em 1917, na ocasião da apresentação da peça Parade. Mas André Breton
escritor, artista e psicanalista francês, é quem consagra o movimento com as
Manifestações do Surrealismo. Esse movimento, no início, limitou-se à literatura
campo no qual escritores e poetas que, como os dadaístas, procuravam um novo meio
de confrontar o ambiente artístico e social que lhes era repugnante e sufocante. Era a
tentativa de aproximar-se com a vida e com uma nova forma de ver o mundo, colocando
à prova e provocando uma reviravolta dentro de uma tradição bem estabelecida posta a
prêmio para a mudança
7
.
Os surrealistas pretendiam desenvolver uma ampla filosofia de vida, que a
princípio era tão somente literária, mas logo foram envolvidos num íntimo contato com
as tendências contemporâneas nas artes verbais e visuais, bem como, com as novas
teorias da Psicologia, Antropologia, Filosofia e Política. Dentro do Surrealismo podem-
se considerar três aspectos básicos:
1) a convicção de que o sonho é uma parte válida e integral na experiência da
vida;
2) a crença da força criativa do inconsciente;
3) e a aceitação de uma necessidade universal do mito, que nasce de um fator
comum à mentalidade humana e une os povos de todas as civilizações.
Desde o início os surrealistas estudaram as idéias e criações dos artistas e
pensadores do passado em busca de um suporte histórico e de inspiração na formulação
7
André Breton nasceu em Tinchebray, Orne (Baixa Normandia França), em 1896. É considerado pai e
fundador do movimento surrealista. Estudou medicina e, durante a Primeira Guerra Mundial, prestou
serviço nos centros de psiquiatria do exército, o que o levou a estudar as obras de Freud e a interessar-se
pelo mundo do inconsciente.
12
e na justificativa de sua própria filosofia. Na procura por precedentes, os surrealistas
foram atraídos não por objetos primitivos, mas, pelo modo de ver desse homem
primitivo, um assunto que foi estudado durante o percorrer do século XIX e início do
século XX, por etnógrafos, antropólogos, psiquiatras e filósofos. Tão logo, os
surrealistas integraram a mentalidade do primitivo às suas obras e também a integram
em suas próprias vidas.
Nesse ponto, toma-se o exame dessa exploração intelectual européia sobre o
primitivo. É importante mencionar que essa exploração formou o background da
teoria e do interesse surrealista, através do trabalho de três autores: James George
Frazer, (1854-1941); Lucien Lévy-Bruhl (1857-1939) e, Sigmund Freud (1856-1939)
O Golden Bough de James George Frazer, em 1890, causou impacto na
literatura européia contemporânea. Foi considerada uma fonte de discussão entre os
surrealistas, e apresentava uma ampla consulta cultural, na qual temas básicos do
pensamento humano são ilustrados, tomando como exemplos mitos e lendas do povo
antigo, do Oriente, do folclore europeu, das culturas primitivas da África, da Oceania e
das Américas. Uma das grandes contribuições de Frazer no estudo da mente primitiva
foi sua investigação da função do sonho. Para o homem primitivo os sonhos eram uma
parte integral e essencial da sua vida cotidiana e essas experiências da mente e espírito
eram um agente influenciador no comportamento, ações e pensamentos ativados dentro
das horas de vigília. Em um dos seus exemplos de uma tribo (Gran Chaco), o autor
relata que os índios eram absolutamente convictos da veracidade das maravilhosas
experiências que seus sonhos ofereciam. Os índios não as distinguiam das experiências
reais.
Nas culturas dos povos primitivos, um universo no qual flora, fauna e força
da natureza, motivados por uma alma ou espírito, possuíam um valor similar para a
própria existência, uma força espiritual capaz de uma mesma ação como a que forneceu
a energia para a vida. Este aspecto é salientado na serie Amazônia de Maria Martins
Assim uma pessoa bem-sucedida para os conceitos da cultura primitiva, é aquela que
mantém uma harmoniosa e interativa relação com as forças da natureza, ao contrário
da cultura ocidental moderna que tende a ver o homem como superior à natureza e,
conseqüentemente, distanciando o físico do psicológico.
13
Lucien Lévy-Bruhl
8
, nas suas mais importantes publicações Les Fonctions
Mentales Dans Les Societé Inférieures” (1920) e La Mentalité Primitive” (1922), se
preocupou em definir as diferenças básicas entre os caminhos das culturas primitivas e
das culturas ocidentais contemporâneas. Para o autor, era importante observar como os
diversos indivíduos ditos primitivos e civilizados viram o mundo e estruturaram seus
relacionamentos com ele. O autor valoriza o sonho como o encontro mais significativo
da realidade física com as entidades espirituais do consciente com o inconsciente. Para
ele, a principal característica dos primitivos reside na profunda interação entre material,
realidade temporal e o espiritual. Suas teorias incitaram os surrealistas a usar o sonho e
o inconsciente como um meio de iluminar a experiência consciente como motriz para o
processo criativo. Sua principal tese era a de que o homem primitivo organizou o
mundo a partir de um princípio dualístico, o qual deu grande valor às forças espirituais
místicas que forneciam vida ou animavam todas as coisas e lhes davam ímpeto a
motivação da vida.
Em A Interpretação dos Sonhos, publicado no ano de 1900, Freud trouxe,
através dos seus estudos clínicos, uma contribuição diferenciada dos outros dois autores
citados até aqui:
1) Para o estudo dos sonhos, Freud sugeriu metodologia nova e original
baseada na associação livre de idéias e no estudo das relações simbólicas das
imagens, cenas e configurações dos sonhos;
2) Acentuou a sua teoria, sustentada no princípio de que todo sonho é e contém
uma tentativa de realização de um desejo;
3) Freud assinalou uma relação de aproximação entre o sonho e as lendas, os
contos de fadas, os mitos, entre outras narrativas, como formas primitivas de
pensamento.
Em Totem e Tabu (1913), Freud ainda despertou nos surrealistas o interesse e
compreensão pelo estudo do primitivo. Nesse estudo, o autor tentou fazer uma ponte
entre a antropologia social, o folclore e a psicologia, com a intenção de inferir o original
significado do totemismo. A reprodução de imagens, freqüente entre os povos
primitivos, por exemplo, parece ser uma exigência comum da espécie humana, talvez
8
Lucien Lévy-Bruhl (1857 1939). Filósofo e sociólogo francês nascido em Paris, cuja teoria se opôs à
validez universal da moralidade teórica e à unidade da natureza humana, e defendia uma sociologia
relativista e pluralista
14
guiada por aspectos da mente pré-consciente. Trabalhar com as imagens aleatórias
vindas do inconsciente de uma forma automática é uma proposta do Surrealismo.
Acrescente-se que os surrealistas se nutrem dessas formas inspiradoras da arte
primitiva, dentro da simplicidade e experiência, para o contato com os sonhos e
automatismo psíquico. A arte primitiva pode ser comparada aos desenhos de crianças.
Os desenhos de crianças são apenas lúdicos ao passo que o trabalho dos artistas é um
objetivo de vida, uma expressão da sua própria vida. Sendo assim em arte, nada é
definitivo e completo. O fato é que as crianças somente se divertem, ao passo que o
artista, procura expressar uma idéia.
Desde o estudo sobre os sonhos (em 1900), Freud percebeu que precisava de
uma concepção teórica, um esboço para explicar a formação do Aparelho Psíquico. A
questão era, ao mesmo tempo, aparentemente simples e muito complicada. Ele havia
concebido um Inconsciente (Ics) que era a abstração de um espaço no qual se alojariam
todos os estímulos vindos do interior do corpo. Essa concepção era uma espécie de
bloco fechado no qual os estímulos iam sendo armazenados, transformados em energia
psíquica, descarregados como excesso de bagagem. Isto quer dizer que - os estímulos
Inconscientes eram sem especificações e não sofriam diferenças . Eles eram apenas,
uma energia (estímulo), não tinham forma nem cor, nem cheiro nem aparência de nada.
Mas, na medida em que a concepção desse aparelho psíquico rudimentar foi avançando,
o processo evolutivo sentiu a necessidade de criar a estação intermediária (Instância) a
que Freud chamou de Pré-Consciente. Assim definido, o Pré-Consciente era um local de
encontros. Um local, onde restos de impressões sensoriais (pedaços mesmo: cores,
fragmentos de uma idéia e muito mais que poderia se confrontar, se confundir e resultar
daí em qualquer coisa). que algumas vezes (muito raramente), essa coisa adquiria
forma ou então, por circunstâncias especiais, adquiria algum sentido (conceito). Então
estava formada uma noção. No entanto, a maioria desses objetos assim formados (ou
deformados) nem sempre e, para falar a verdade, na maioria, na grande maioria das
vezes, o encontrava aprovação da Consciência através de suas instâncias reguladoras.
Então voltava para a semi-escuridão do pré-consciente, permanecendo para sempre
ou, talvez, quem sabe, aguardando uma oportunidade de passar por perto algo que lhe
desse mais sentido do que já tinha. Nesse sentido, o Pré-consciente também funcionava
como uma espécie de Inconsciente, o Inconsciente do reprimido.
15
Nesse âmbito, o inconsciente entra como a instância psíquica mais primitiva e
mais antiga do homem, sendo ligação entre o animal e o homem. Seria o que restou
dessa passagem em direção ao humano. O inconsciente ainda não é, propriamente, um
estado psíquico é uma condição pré-psíquica e o material existente nesse inconsciente
primitivo é um resíduo (o que restou) dos estímulos sensoriais externos e internos, aos
quais se chamaram de “processos primários”.
O pré-consciente é uma estação (instância) intermediária, a abstração de um
lugar onde esses processos primários são transformados em processos secundários
(processos oníricos e psíquicos em geral). O pré-consciente tornou-se, portanto, numa
aquisição evolutiva mais tardia e correspondeu a um estágio evolutivo mais adiantado.
O sistema consciente contém a consciência, uma instância sempre em desenvolvimento.
A consciência se amplia na medida em que o desenvolvimento evolutivo avançou. A
consciência não é um conhecimento propriamente, mas é um estado de ser que se
amplia cada vez mais – um universo em expansão
9
.
É relevante observar as manifestações do Surrealismo que para seus
principais idealizadores sempre esteve presente no processo criativo do homem. Para
esses, o Surrealismo sempre existiu uma vez que se originou de uma mente criativa e
livre de dogmas. Na Renascença, Bosch (1450-1516), manifestava suas visões oníricas.
El Greco (1608-1614), por sua vez, ensaiava, nos seus personagens um corpo mais
alongado, um prenúncio de uma distorção das formas reais, num olhar mais subjetivo.
Goya (1746-1828) prenunciou o Surrealismo com sua crítica perversa e subjetiva da
sociedade burguesa, quando em seu trabalho surgiram seres oníricos e cenários surreais.
Na tensão das cores e linhas, Vang Gogh (1823-1890) deixou escapar seu olhar puro de
ver a arte independente de uma beleza padronizada. Munch (1863 -1944) colocou seu
olhar de forma emocional e intensa. Carregou sentimentos despertados por um grito de
sua alma. Quando Salvador Dali (1904-1989) entrou em cena seria como se fosse a
primeira vez que alguém interferia na realidade de uma forma automática sem censura.
Na poética desses artistas citados é possível identificar uma unidade e uma síntese. A
síntese do que o homem tem e carrega dentro de si, num momento em que a sua verdade
e essência se manifestam e se integram sem passar por um filtro da consciência.
O artista não espreocupado em como deve ser a sua obra”, dentro de uma
rigidez estética e de estilo em determinada época da História da Arte. Está preocupado
9
A partir de comentários do psicanalista Professor Dr. David Azoubel Neto, agosto 2007.
16
na maior parte das vezes com um determinado momento pertencente à sua história de
vida, movido por sua alma, emoções e sentimentos. Com certeza esses vanguardista
levaram anos para ter seu trabalho e expressão artística compreendidos, mas a sua
preocupação não era a de serem entendidos e sim, de externar algo que lhes inquietava e
que pedia passagem através da arte para se manifestar. Será que o Surrealismo é um
movimento estanque dos anos de 1920 ou ficou demarcado desde aquele primeiro
momento dos homens das cavernas até hoje?
Nas duas primeiras décadas do século XX, os estudos psicanalíticos de Freud e
as incertezas políticas favoreceram o desenvolvimento de uma arte que criticou a cultura
européia e a frágil condição humana diante de um mundo cada vez mais complexo.
Surgem movimentos estéticos que interferem de maneira fantasiosa na realidade. Um
primeiro momento se deu com o Dadaísmo, seguindo o movimento surrealista, como
forma de continuidade de tal mudança tão almejada e defendida pelos seus adeptos. O
Surrealismo foi por excelência a corrente artística moderna da representação do
irracional e do subconsciente.
Antonin Artaurd (1896-1948) define: “O surrealismo não é um estilo. É o grito
da mente que volta para si mesma.”
10
. Essa frase pronunciada em 1924 marca a
afirmação que o Surrealismo existiu e sempre existirá. Que é atestada por André Breton:
O Surrealismo existia antes de mim e tenho esperança de que me sobreviva”. Maurice
Nadeau descreve que, o cerne do Surrealismo era o redescobrir a vida, sob as finas
carapaças de séculos e cultura: a vida pura, a vida nua e crua. Este entusiasmo pelo
desvelar do inconsciente foi visto com muita proximidade com os achados da
psiquiatria
11
. Sendo assim, define-se:
O surrealismo é concebido por seus fundadores não como
uma nova escola artística, mas como um meio de
conhecimento, em particular de continentes que até então
não tinham sido sistematicamente explorados: o
inconsciente, o maravilhoso, o sonho, a loucura, os estados
10
Antonin Artaud nasceu na França em 1896. Ele foi poeta, pintor, escritor, ator e dramaturgo. Seu
percurso marcou de modo decisivo áreas tão abrangentes como a literatura o teatro, a pintura, a filosofia,
a medicina e a antropologia.
11
Maurice Nadeau, francês, viveu a maior parte do século XX e participou da vida intelectual por dentro
dos acontecimentos, tanto como crítico literário quanto como editor. Amigo de Breton, escreveu uma
“História do Surrealismo” que é uma importante referência no assunto. NADEAU, Maurice. The History
of Surrealism, New York: Macmillan Co., 1965, p. 43.
17
alucinatórios, em resumo, o avesso do que se apresenta
como cenário lógico
12
.
O surrealismo (...) está profundamente incrustado no
período do entre-guerras. Afirmar, como fazem muitos, de
que o que acontecia na arte era apenas manifestação do
período seria um materialismo muito simplificado: o
surrealismo também é herdeiro e difusor de movimentos
artísticos que o precederam e sem os quais ele não teria
existido
13
.
Ainda nas palavras de Nadeau:
A razão, a todo-poderosa razão, é denunciada. A realidade
está, por vezes, por trás do que nós vemos, ouvimos, tocamos,
cheiramos, experimentamos. Existem forças desconhecidas
que nos controlam, mas sobre as quais nós queremos atuar.
Nós só precisamos descobrir o que elas são
14
.
Em 1916, Breton um jovem dico iniciou seu trabalho na Psicologia, sob a
orientação de Jean Martin Charcot (1825-1893) um dos fundadores da neurologia
moderna. Freud foi um de seus alunos e foi com Charcot que aprendeu o uso da
hipnose. Charcot estudou a hipnose e descreveu a histeria e as neuroses. Foi um
influente neuropsiquiatra que analisou e fotografou assuntos femininos, em 1870, na
tentativa de mostrar sintomas da histeria.
Em 1917, Breton e Aragon se conhecem, ao servirem como médicos auxiliares
na ala psiquiátrica de um hospital militar voltado ao atendimento de indivíduos
traumatizados pela guerra. Foi através dos delírios e mórbidas visões repetitivas que
Breton intuiu as primeiras idéias que formariam o pensamento surrealista.
Simultaneamente, Breton e Freud estavam desenvolvendo a noção de repetição
compulsiva, que suscitariam as teorias do desconhecido e da “death drive”, que constam
12
Idem, p. 48.
13
Idem.
14
Idem.
18
de seu ensaio Das Unheimlich
15
que somente seria publicado, na França, mais tarde.
Esse ensaio não foi traduzido para o francês até 1933. Tem-se conhecimento que não foi
possível para Breton ler as primeiras traduções de Freud, pois essas ficaram disponíveis
para leitura e vertidas para o francês, somente em 1922.”
16
.
Breton nutria a expectativa de encontrar Freud para compartilhar suas
experiências dos sonhos no Surrealismo e suas interpretações, uma vez que A
Interpretação dos Sonhos (1900) seria uma das mais importantes publicações de Freud.
No entanto, teve um grande desapontamento ao encontrar o médico vienense, em 1921,
e receber indiferença e frieza de Freud com se tocou nas questões do Surrealismo.
Contudo, Breton não se abalou e deu continuidade às fascinantes descobertas
sobre o inconsciente. Em Vasos Comunicantes (1932), Breton versou sobre a
interpretação de sonhos. O título originou-se de uma frase que usou para comparar a
relação dos sonhos com a realidade numa metáfora com os gases que circulam de um
tubo para o outro num experimento científico, carregando uma energia circulante. O
sonho é considerado como o ximo da experiência da mente no inconsciente e o
recurso para a análise consciente desta experiência. A abertura do campo para infinitas
possibilidades no fenômeno do sonho era a parte mais excitante para o grupo, quer
sendo interpretada coletiva ou individualmente.
Desse modo, o Surrealismo repousou sobre a crença na realidade superior de
certas formas de associações desprezadas antes dele, na onipotência do sonho, no
desempenho desinteressado do pensamento. O movimento demoliu definitivamente
todos os outros mecanismos psíquicos, e a se substituir a eles na resolução dos
principais problemas da vida.
Como marcos históricos do movimento têm-se o ano de 1919, em Paris,
quando André Breton fundou com Louis Aragon (1897- 1982) e Philippe Soupault
15
Em O estranho (Unheimlich), Freud (1919/1976) faz um fascinante estudo da palavra unheimlich,
buscando verificar as possibilidades de sua tradução em outras bem num texto esplêndido sobre a
«estranheza inquietante” (Unheimlich). das Unheimlich é o não conhecido, que provoca uma sensação
difusa de medo e de horror. Freud retoma esta questão no texto “O Estranho”, (1919). Nele, a Estética não
está resumida ao belo, ao grandioso, ao atrativo, o que o Freud chama de “sentimentos de natureza
positiva”, que norteiam as principais análises desta área, mas uma estética voltada às qualidades do sentir,
a uma percepção através do afeto, de uma realidade psíquica inconsciente e não material. Neste sentido
Freud nos diz que: “ele [o psicanalista] trabalha em outras camadas da vida psíquica e pouco tem a ver
com as moções emocionais inibidas em seus objetivos, amortecidas, demasiado dependentes de
constelações acompanhantes que, em geral, são matérias da Estética”. Freud complementa seu
pensamento expondo que “por estética se entende não simplesmente a teoria da Beleza, mas a teoria das
qualidades do sentir”. Ainda neste estudo Freud analisa a palavra “estranho” (Unheimlich), e nos mostra
que a mesma relaciona-se diretamente com o seu sentido contrário, ou seja, o “familiar”. FREUD,
Sigmund, Edição Standard Brasileira das Obras Completas – (ESB). Rio de Janeiro: Imago, 1980.
19
(1897-1990) a revista Littérature – principal publicação surrealista. A própria conotação
da palavra Littérature, cuja grafia trazia um tom de ironia e de deboche: Lis tes ratures
(lendo seus restos) ou Lits et ratures (camas e rabiscos). Colocar-se num estado que
favoreça alucinações lúcidas, foi à conduta de Breton e de Soupault ao escreverem seus
trabalhos. Ainda em 1919, esses autores publicaram Os Campos Magnéticos, obra na
qual pela primeira vez é realizada uma coletânea de textos automáticos. A escrita
automática também estava presente em Eu é um outro de Arthur Rimbaud (1854-1891)
outra das fontes do Surrealismo. Em Os Campos Magnéticos os capítulos terminavam
de acordo com o tema e estrutura impostos. Cada capítulo possuía seu término no final
do dia no qual foi iniciado. A primeira parte de Os Campos Magnéticos foi O Espelho
sem Aço”, que tratava sobre um vidro de espelho sem o metal refletor que seria uma
porta ou uma janela – o limiar de um mundo novo.
Cinco anos depois, em 1924, o Surrealismo foi proclamado movimento, através
de várias iniciativas tomadas por um grupo de jovens poetas franceses, entre eles: André
Breton, Louis Aragon, Baron, Jacques-André Boiffard, Jean Carrive, René Crevel,
Delteil, Robert Desnos Eluard, Gerard, Georges Limbour, Malkine, Max Morise,
Naville, Noll, Péret, Picon, Philippe Soupault, Roger Vitrac. Esses foram as principais
testemunhas do Surrealismo. Antes de ser uma concepção de beleza que se propagou em
todas as artes, o movimento consistiu em uma revolta contra a estética, em nome da
liberdade e da inspiração de pintores, de fotógrafos e de outros artistas e intelectuais, de
diversas nacionalidades (Max Ernst era alemão, Man Ray americano, Picasso espanhol,
entre outros que se agruparam neste movimento). Em outubro de 1924, Breton publicou
La Révolution Surrealiste, onde constava:
com muita fé poderiam nos contestar o direito de
empregar a palavra SURREALISMO no sentido muito
particular em que o entendemos, pois está claro que antes de
nós esta palavra não obteve êxito. Defino-a, pois uma vez
por todas.
SURREALISMO, s.m. Automatismo psíquico puro pelo
qual se propõe exprimir, seja verbalmente, seja por escrito,
seja de qualquer outra maneira, o funcionamento real do
pensamento. Ditado do pensamento, na ausência de todo
16
Idem.
20
controle exercido pela razão, fora de toda preocupação
estética ou moral
17
.
Neste mesmo mês inicia-se também o Bureau de Recherches Surréalisties, um
“escritório de pesquisas surrealistas” que consistia em um lugar de encontro. Além dos
cafés, dos participantes do movimento em Paris, eram distribuídos folhetos e
publicações de aforismos surrealistas. Em dezembro, de 1924, a revista Littérature era
substituída pela La Révolution Surréaliste. Nesse periódico, as artes plásticas eram
evidenciadas com uma publicação maior de quadros, fotografias e pinturas alusivas ao
movimento. A adesão de novos participantes do movimento era festejada com a
divulgação de suas obras nesta revista. Nessas novas adesões, destacam-se as mulheres
artistas surrealistas: Eilien Agar (1899-1991); Meret Opppenheim, alemã, (1913-1985);
Dorothea Tanning, americana, (1910); Toyen de Praga (1902-1980); Leonor Fini,
argentina, (1907-1996); Ithell Colquhoun (1906-1988); Valentine Hugo, francesa,
(1887-1968); Remedios Varo espanhola, (1908-1963);, Frida Kahlo, mexicana, (1907-
1954); Leonora Carrington (1917); Lee Miller (1907-1976); Maria Martins(1894-1973).
Essas artistas utilizaram a pintura, assemblages, colagens e fotografia como linguagens
artísticas. Maria buscou sua expressão maior nas peças tridimensionais.
Em geral, os surrealistas estudaram as idéias e criações dos artistas pensadores
do passado para terem suporte histórico de inspiração na formulação e justificação de
sua própria filosofia. A sexualidade, o desejo, o amor são tônicas desse movimento. O
erotismo e a sensualidade permitem as mais variadas expressões e imagens liberadas do
inconsciente sem censura. Um dos focos principais era a culto à mulher e ao amor. O
desejo ocupou um destaque, no qual a mulher era o símbolo desse desejo. Dali enfatizou
a necessidade dos elementos aleatórios: "Deve-se criar confusão sistematicamente,
deste modo coloca-se em movimento o processo criativo. Tudo o que gera contradição
é sinônimo de vida"
18
.
Outra questão integrante do Surrealismo era a manifestação de humor
desconcertante e com caráter libertário, nos quais elementos macabros, absurdos ou
violentos se associam ao cósmico. O conceito de humor negro foi introduzido pelo
surrealista André Breton na primeira edição da sua Anthologie de l’humour noir (1940),
17
BRETON, André. Revista periódica La Révolution Surrealiste, 1924.
18
Idem.
21
em que se encontram reunidos textos de autores que vão de Swift a Sade, Kafka, Hans
Arp, Salvador Dali e Benjamin Péret. No prefácio, Breton, influenciado pelas
concepções de humor formuladas por Hegel e Freud, imprimia a perspectiva do humor
negro como uma revolta superior do espírito. Era Breton que explicitava os segredos
da arte mágica surrealista:
Faça com que lhe tragam com o que escrever depois de ter
encontrado um local, tão favorável quanto possível, para a
concentração de seu espírito nele mesmo. Coloque-se no
estado mais passivo ou receptivo que puder. Abstraia sua
genialidade, talento e também o dos outros. Diga que a
literatura é um dos mais tristes caminhos que leva a
qualquer lugar. Escreva rapidamente, sem tema
preconcebido (...) continue pelo tempo que quiser. Fie-se no
caráter inesgotável do murmúrio
19
.
O Surrealismo buscou a comunicação com o irracional e o ilógico
deliberadamente, desorientando e reorientando. Buscou a consciência por meio do
inconsciente. Longe de negar a realidade o Surrealismo é a superação de uma realidade
mutiladora que dilacera o homem de si mesmo e que o leva a perder a unidade do ser.
Além disso, esse movimento tenta resolver as antinomias das quais os homens sofrem e
que os leva a ser subjugado às forças repressivas, antinomias entre sonho e realidade,
loucura e razão entre a arte e a vida.
O automatismo psíquico o é aleatório é uma verdade interna que se
manifesta uma expressão livre com um conteúdo profundo e intrigante, é o inicio da arte
não retiniana de Duchamp. A liberdade da forma estava presa a um conteúdo mais
profundo. E que por mais universal que pareça tem um significado único e particular de
uma mente que pensa e sente. Por mais aleatório que parecesse ser, era senão um estudo
minucioso e ousado da mente humana. Os sonhos proporcionam essas manutenções que
manipulam os comportamentos. Não era um ato aleatório, mas sim carregado de
emoção sentimento reprimidos, um silêncio imposto, mas acima de tudo um relato
interno da mente individualizada.
19
Idem.
22
A liberdade que esse automatismo permite faz com que o artista fique mais
próximo de si mesmo, da sua vida e decodificação de seus signos e sinais. Sem censura
estética ou política de bons costumes é permitido ao homem retomar a sua própria
essência e viver pleno de suas necessidades e desejos satisfeitos. É o ato pelo ato,
pensamento livre despojado e fiel a uma individualidade precisa. O Surrealismo
procurou atender a algo que quer ser expresso livremente sem preconceitos, regras e
artifícios.
O simbolismo favorece a expressão da riqueza do mundo interior da
imaginação. Para Freud os objetos do dia se transformam em sonho, em importantes
signos que enfatizam desejos e inquietações. A pintura surrealista tendeu a fixar-se nos
objetos concretos. A fim de desacreditar e desestabilizar a normalidade da percepção, os
artistas surrealistas manipulavam os objetos reconhecíveis, confundindo a fronteira
entre o real e o imaginário. Magritte (1898–1967) fez esse jogo com maestria quando
registrou um cachimbo e escreveu embaixo do desenho que: “Isto não é um cachimbo”,
que pode até ser verdade, pois é a figura de um cachimbo, e não um cachimbo...
O sonho abriga tudo o que se quer ser. Ele é cúmplice da história pessoal
através de códigos e significado/significante. Símbolos e signos se apresentam numa
investigação camuflada. Nesse sentido, acredita-se que a arte constitui-se na forma do
ser humano contatar o invisível, o que existe e sempre existiu por detrás de todas as
coisas. De certo modo, é uma forma de tocar à espiritualidade.
Max Ernst (1891-1976) fez a aplicação da alucinação provocada em suas
colagens e suas frotages, e enunciou até mesmo sua teoria. Não são caprichos da
fantasia que produzem as imagens surrealistas, mas os relâmpagos da intuição
desvelando o que sob as aparências. Suas criações são sonhos dirigidos, quer dizer,
sonhos que comportam uma parte de especulação intelectual. Sobretudo, o artista
pratica o conhecimento pela alucinação provocada. Eis, aliás, o que é tipicamente
surrealista.
O segundo Manifesto (1929) demonstra mais precisamente a pretensão do
surrealismo:
Tudo leva a crer que existe certo ponto do espírito onde a
vida e a morte, o real e o imaginário, o passado e o futuro, o
23
comunicável e o incomunicável, o alto e o baixo, deixam de
ser percebidos contraditoriamente. Ora, em vão procurar-
se-ia na atividade surrealista um fim outro que a esperança
de determinar este ponto
20
.
Em 1932, sem falso pudor, André Breton se entregou, em "Os Vasos
Comunicantes", a uma análise de um de seus sonhos e mostrou como este sonho,
emancipação de pulsões profundas, lhe indicou uma solução que ele não pode encontrar
com ajuda da atividade consciente.
Os surrealistas seguiram dois caminhos; o do estudo do sonho, uma vez que é
nele que se experimentam as mais diferentes fantasias e situações, e são revelados os
instintos; e o do caminho através da referida escrita automática, que consiste em
escrever sem qualquer racionalidade, conforme as imagens se apresentam em nossa
mente, instintivamente. Dizia Breton: "A imaginação está a ponto de recuperar seus
direitos"
21
. Nesse sentido, estabelece-se certa ligação com o movimento romântico,
apesar de o Romantismo ter sido a expressão da arte burguesa por excelência.
O Surrealismo teve caminhos direcionados pelos estudos psicanalíticos de
Freud e na filosofia de rgson
22
. Os dois estudiosos levantaram a importância do
mundo interior do homem e o seu estado do subconsciente, passando, portanto, para
segundo plano, o mundo puramente racional dos positivistas e naturalistas.
André Breton, em “Arcano 17” (1944) proclamou:
É vital que o homem se passe, de armas e bagagens, para
o lado do homem. Insurgir-se contra as regras
estabelecidas não significa - ao contrário! - agredir ou
trazer qualquer forma de violência contra o humano. É
antes contra tudo o que tolhe o humano que se insurge o
20
Idem.
21
Idem.
22
Henri-Louis Bergson (Paris, 1859 - 1941), um dos mais famosos e influentes filósofos franceses do
início do século XX. Prêmio Nobel da Literatura em 1927.
24
surrealismo. Será preciso começar por retirar da guerra
todos os seus títulos de nobreza!
23
Durante muito tempo Dalí, Max Ernst e René Magritte, expoentes do
movimento surrealista na França, foram vistos como corajosos artistas dispostos a
revelar seu inconsciente por meio de livres associações e visões oníricas. Um sonho não
interpretado era como uma carta não aberta proclamava o psicanalista, estimulando a
produção de telas como A Persistência da Memória (1931) de Dalí, que passou à
história com uma espécie de monumento simbólico do Surrealismo. Nessa obra,
relógios derretidos representariam a hora intermediária entre a vigília e o sono. Dalí
criava, enfim, uma obra segundo seu método paranóica crítico”, em que congelava
sonhos para interpretá-los.
Do outro lado estava Picasso, que rejeitou o Surrealismo por entender que a
arte não precisava de interpretação, e sim de certa ingenuidade infantil. concordava
com os surrealistas numa questão freudiana fundamental: o conflito entre Eros e
Thanatos, (onde Freud procura explicar o conflito humano como sendo, essencialmente,
o conflito de Eros x Thanatos. Eros é a pulsão que conduz a vida e Thanatos é a pulsão
que conduz a morte, sendo necessário haver equilíbrio entre as duas pulsões
24
.
Surrealistas, a exemplo de Freud, sempre foram obcecados pelo sexo e pela morte. Isso
explica, de certo modo, sua diluição na vida cotidiana. São temas dos quais ninguém
escapa. Surrealista ou não.
Breton via o surrealismo como uma questão máxima em todo o percurso dos
esforços intelectuais e artísticos. A influência dos surrealistas foi tão grande que chegou
aos artistas da Semana de Arte de 1922 (Tarsila do Amaral, em particular), marcando
profundamente a carreira de outros brasileiros como Ismael Nery e Farnese de Andrade.
Freud, claro, representou um peso na alma desses pintores.
23
BRETON, André, op. cit, p. 88.
24
FREUD, E. “Além do Princípio do Prazer”. In: FREUD. Edição Standard Brasileira das Obras
Psicológicas completas de Sigmund Freud, vol. XVIII, Imago Editora, Rio de Janeiro, 1976.
25
2.3. 1920, o Surrealismo no Brasil
A Semana de 1922, no Brasil confirmava o Surrealismo, mesmo sendo
conceituada à Arte Moderna. Representou uma verdadeira renovação da linguagem, na
busca de experimentação, na liberdade criadora e na ruptura com o passado. O evento
marcou época ao apresentar novas idéias e conceitos artísticos. A nova poesia através da
declamação. A nova música por meio de concertos. A nova arte plástica exibida em
telas, esculturas e maquetes de arquitetura. O adjetivo "novo", marcando todas estas
manifestações, propunha algo a ser recebido com curiosidade ou interesse.
Participaram da Semana nomes consagrados do Modernismo brasileiro, como
Mário e Oswald de Andrade, Víctor Brecheret, Anita Malfatti, Menotti Del Pichia. Do
mesmo modo que o Surrealismo na Europa, a Semana de Arte Moderna iniciou-se com
manifestações na literatura e crítica nacional, através da atividade crítica e literária de
Oswald de Andrade, Menotti del Picchia, Mário de Andrade e alguns outros artistas que
iriam se conscientizando do tempo em que viviam. Oswald de Andrade, em 1912,
baseava-se no Manifesto Futurista, de Marinetti, que propunha o compromisso da
literatura com a nova civilização técnica”.
Embora as influências européias fossem presentes Oswald de Andrade alertou
para uma nacionalização da expressão em que as raízes da Terra Brasilis fossem
acentuadas e incitou à valorização das linhagens brasileiras, fundando um dos
movimentos modernistas, o Pau Brasil, no qual os artistas se unem para expor uma idéia
nova de expressão e configurar uma nova proposta estética.
Antes dos anos de 1920, aconteceram em São Paulo duas exposições de pintura
que colocaram a arte moderna de um modo concreto para os brasileiros: a de Lasar
Segall (1913) e a de Anita Malfatti (1917). A exposição de Anita Malfatti provocou
uma grande polêmica com os adeptos da arte acadêmica. Dessa polêmica, o artigo de
Monteiro Lobato para o jornal O Estado de S. Paulo, intitulado: “A propósito da
Exposição Malfatti”, publicado na seção “Artes e Artistas” da edição de 20 de dezembro
de 1917, foi a reação mais contundente dos espíritos presos a princípios estéticos
conservadores.
26
Dessa polêmica, o artigo de Monteiro Lobato para o jornal O Estado de S.
Paulo, intitulado: “A propósito da Exposição Malfatti”, publicado na seção “Artes e
Artistas” da edição de 20 de dezembro de 1917, foi a reação mais contundente dos
espíritos conservadores:
(...) todas as artes são regidas por princípios imutáveis, leis
fundamentais que não dependem do tempo nem da latitude
(...) quando as sensações do mundo externo transformaram-
se em impressões cerebrais, nós ‘sentimos’; para que
sintamos de maneira diversa, cúbica ou futurista, é forçoso
ou que a harmonia do universo sofra completa alteração, ou
que o nosso cérebro esteja em ‘pane’ por virtude de alguma
grave lesão. Enquanto a percepção sensorial se fizer
normalmente no homem, através da porta comum dos cinco
sentidos, um artista diante de um gato não poderá ‘sentir’
senão um gato, e é falsa a ‘interpretação que do bichano
fizer um totó, um escaravelho ou um amontoado de cubos
transparentes.
Em posição totalmente contrária à de Monteiro Lobato estaria, anos mais tarde,
Mário de Andrade. Suas idéias estéticas foram expostas, basicamente, no Prefácio
Interessantíssimo de sua obra Paulicéia Desvairada, publicada em 1922. Nesse texto, O
Prefácio Interessantíssimo da Paulicéia Desvairada de Mário de Andrade O Prefácio
Interessantíssimo vale como verdadeiro manifesto-programa do Modernismo brasileiro,
uma plataforma teórica, que será retomada e aprofundada pelo próprio Mário de
Andrade em A escrava que Não é Isaura (1924). É onde expõe suas idéias a respeito de
poesia e declara ter fundado o desvairismo.
Mário de Andrade afirmou que:
(...) Belo da arte: arbitrário, convencional, transitório -
questão de moda. Belo da natureza: imutável, o objetivo,
natural - tem a eternidade que a natureza tiver. Arte não
consegue reproduzir natureza, nem este é seu fim. Todos os
grandes artistas, ora consciente (Rafael das Madonas, Rodin
do Balzac, Beetjoven da Pastoral Machado de Assis do Brás
Cubas), ora inconscientemente (a grande maioria), foram
27
deformadores da natureza. Donde infiro que o belo artístico
será tanto mais artístico, tanto mais subjetivo quanto mais
se afastar do belo natural. Outros infiram o que quiserem.
Pouco me importa (...)
Tudo indica que, no Brasil, no primeiro semestre de 1925 ou, quem sabe, até
antes, o Surrealismo tenha encontrado ressonância entre a dupla de editores da revista
Estética. Esses editores liam a Nouvelle Revue Française, a revista Commerce (que
publicara o ensaio Uma Vaga de Sonhos, de Aragon) e tudo mais que podiam encontrar.
Esses leitores interessados pelas leituras surrealistas eram Sérgio Buarque de Holanda e
Prudente de Moraes. Esses intelectuais estavam ansiosos para conhecer, discutir,
experimentar novas propostas poéticas e literárias. De acordo com o testemunho de
Sérgio Buarque de Holanda, ambos iniciaram a redação de cartas surrealistas, conforme
a receita de Breton: através do automatismo psíquico.
Quais eram exatamente esses textos automáticos? Não se tem conhecimento.
Mas não chegaram às páginas da Estética, que, no entanto, publicou, no segundo
número (datado de janeiro-março de 1925), um artigo em que Prudente de Moraes
comentou as considerações do crítico francês Benjamin Crémieux sobre o Surrealismo,
veiculadas pela Nouvelle Revue Française, e, no terceiro número (datado de abril-junho
de 1925), um ensaio em que Buarque de Holanda afirmou que "só à noite enxergamos
claro", e reivindica "uma declaração dos direitos do sonho".
A atitude de Sérgio Buarque de Holanda é curiosa e merece atenção: ao falar
numa declaração dos direitos do sonho, o autor jogou com o prefácio e com o lema da
capa do primeiro número de La Révolution Surréaliste, fazendo uma colagem de ambos,
mas sem dizê-lo e sem formular uma única vez a palavra surrealista (ou supra-realista,
como se usava então). Por que essa postura? Seria cautela? Estariam os dois diretores da
revista sondando o terreno dos meios literários brasileiros? Caso a intenção fosse
compreender a possibilidade de absorção, no ambiente brasileiro, das propostas
surrealistas, receberam várias reações pouco favoráveis, entre as quais as de Mário de
Andrade (assaz reticente para com o Surrealismo), Graça Aranha, Ronald de Carvalho e
Tristão de Athayde (francamente contrários). Apesar disso, Prudente de Moraes não se
acanhou e enviou um texto de escritura automática ao jornal A Noite (publicado em 28
28
de dezembro de 1925) e outro à revista Verde (publicado em novembro de 1927). Como
é possível perceber, a dupla Prudente de Moraes e Buarque de Holanda, considerada a
árvore modernista brasileira, produziu um ramo franca e explicitamente surrealista. Mas
este não vingou. Seria interessante pesquisar o porquê. Salvo engano, esse estudo está
ainda por ser feito.
Nos anos seguintes, cabe, entre outros dados, assinalar que, em 1927, durante
uma viagem à Europa, Ismael Nery, nascido em Pernambuco (1900-1934) teve breve
contato com Breton e fez amizade com Marc Chagall (que o pertencia ao grupo
surrealista e tampouco se considerava surrealista). No Brasil, em 1928, ao fazer a crítica
da exposição apresentada por Cícero Dias no salão da Policlínica Geral, no Rio de
Janeiro, Graça Aranha caracterizou como "pintura surrealista" a obra do artista
pernambucano, que, pouco informado sobre esse movimento, estaria, portanto, fazendo
espontânea e ingenuamente telas surrealistas.
Em 1928, deve ser relembrado, sobretudo, o lançamento da Antropofagia,
através de revista e manifesto do mesmo nome. No manifesto, Oswald de Andrade o
esqueceu de situar a Antropofagia em relação ao Surrealismo: " tínhamos o
comunismo. tínhamos a língua surrealista”. Tanto André Breton como e Oswald de
Andrade recusaram a definição de escola literária para seus projetos. Uma vez que seus
objetivos, em comum, quais sejam eram basicamente o de provocar transgressão, de
subverter as leis existentes para mudar as formas do viver Era evidente que o
Surrealismo havia de alguma forma integrado o cabedal antropofágico. O que o
transformou automaticamente os antropófagos em surrealistas. E isso se deve a várias
razões, mas, sobretudo, porque os demais membros do grupo não concordavam,
necessariamente, com Oswald de Andrade e porque a prática deste não era,
forçosamente, conseqüente com suas palavras. Independentemente da dose de retórica
ou de firme propósito, o fato é que no país existia “a língua surrealista”. Resultam
dessa vertente, várias telas de Tarsila do Amaral que flertaram com o Surrealismo. Há,
ainda, o episódio da chegada ao Brasil, em fevereiro de 1929, do poeta surrealista
francês Benjamin Péret com esposa brasileira (a cantora lírica Elsie Houston), o qual foi
imediatamente saudado pela Revista de Antropofagia com artigo específico, assinado
por Cunhambebinho (ou seja, o próprio Oswald). O poeta francês foi aceito como "um
antropófago que merece cauins de cacique" e (...) "precisa ficar entre nós".
29
Por que precisaria Péret ficar entre os antropófagos? Para que pudesse aprender
e crescer com eles? Certamente, mas, sem dúvida, para que os antropófagos pudessem
igual e reciprocamente, conhecer melhor o Surrealismo, aprender e crescer com Péret e
com esse movimento (elogiado pelo Cunhambebinho porque vinha oferecendo "um dos
mais empolgantes espetáculos para qualquer coração de antropófago"). Aliás, a
Revista acrescentou taxativamente: "Depois do Surrealismo, só a Antropofagia". O
movimento brasileiro possuía a capacidade de ingurgitar, mastigar e digerir,
assimilando-convertendo-superando as teses e propostas européias. O Surrealismo era
tido como um projeto dotado de um grau de definição muito mais alto e preciso que o
movimento brasileiro (o que os antropófagos não ignoravam). A pequena frase, acima,
era também um programa e tanto!
De fato, tivesse Cunhambebinho consciência disso ou não, constituía um
verdadeiro desafio, chamando à superação da Antropofagia, para que, em relação ao
Surrealismo, aquela deixasse de ser uma “prima distante” ou enigmática (porque
cultuava certa indefinição e heterogeneidade), e se transformasse em uma interlocutora
privilegiada, um alter ego. O que, obviamente, poderia ocorrer por meio de uma
complexa alquimia em que a Antropofagia se transformaria, avançaria, mantendo o
Surrealismo original, preservando o canibalismo impiedoso, integrando as conquistas do
Surrealismo moderno (1919-1929, e depois) e superando (Aufhebung) todos esses
componentes elencados para alcançar uma nova e superior ntese que poderia ou o
assumir uma denominação diferente. Sabe-se que isto não ocorreu. Uma das razões foi
que Péret não era bem acolhido por todos os antropófagos. Carlos Drummond de
Andrade, com uma possível pitada de provocação teria rompido com a Revista de
Antropofagia, pois, entre outros motivos havia na figura de Péret, elemento inaceitável
no grupo brasileiro "por ser supra-realista e francês".
Aos olhos de certos antropófagos, pesavam contra os surrealistas tanto a
qualidade de seu engajamento político-revolucionário (declaravam-se marxistas e
simpatizantes do comunismo) quanto o fato de sua revolta, sua contestação se
estenderem a todos os domínios da vida e do pensamento, incluindo a religião e a
própria instituição artístico-literária e seus valores. A Antropofagia se desagregou,
vítima de sua própria heterogeneidade e da impossibilidade de conciliar suas
contradições, sendo o último número da Revista o de nº. 15, de de agosto de 1929.
30
Enfim, porque Oswald de Andrade, em vez de procurar avançar, partindo das conquistas
da Antropofagia, resolveu dar as costas a ela, renegá-la e buscar caminho e luz na
política cultural da Internacional Comunista, já estalinizada! Ou seja, é como se o
desaparecimento da Revista de Antropofagia tivesse tido por conseqüência o
esgotamento, por alguns decênios, da possibilidade de efetivo funcionamento de um
grupo surrealista - antropofagicamente surrealista no Brasil!
A partir das premissas apresentadas até o momento nessa pesquisa, é possível
afirmar que arte não se origina de uma única fonte: ela se engendra da alma do homem,
da alma do artista, captando e transformando segundo a percepção e sensibilidade
destes, materializando-se como uma nova forma no mundo. A arte é exposta ao mundo
pelo filtro da alma do seu criador
Surrealismo e Antropofagia, enfim, termos diferentes para tendências e
pensamentos parecidos, inspiradas num mesmo momento em que o homem precisava
expressar livremente o que de mais forte a sua essência precisava transmitir. Tanto no
Brasil como no exterior, havia uma tendência a uma ruptura, com dogmas e
paradigmas estéticos, preestabelecidos e saturados dentro da expressão artística que era
até então uma forma de expressão sem um verdadeiro e puro sentimento. Maria Martins
inserida no movimento fora do seu país, quando volta ao Brasil já traz em suas obras
uma linguagem estritamente surrealista. Embora rejeitada por alguns artistas e críticos
brasileiros sua bagagem e conhecimento de uma estética apurada, pelo convívio com os
mestres e patronos do movimento surrealista, bem como sua inquietação própria e
liberdade criativa, confere-lhe o status de uma das mais importantes artistas brasileiras
engajada no surrealismo e mais ainda, praticamente a única escultora mulher brasileira
surrealista, uma vez que a pintura dominava as artes na época, e a escultura era uma arte
para homens.
31
3. AS DIVERSAS FACES DE MARIA MARTINS
3.1. Dados Biográficos
Maria de Lourdes Faria Alves nasceu em 7 de agosto de 1894, em Campanha,
Minas Gerais. Seu pai, João Luiz Alves, era um notório advogado e promotor público e
um respeitável político. Escreveu importantes livros sobre Direito, que foram
instrumentos para a revisão das leis brasileiras. Tornou-se juiz, senador, ministro da
Suprema Corte Federal e ministro da justiça. Foi membro da Academia Brasileira de
Letras e incentivou Maria a apreciar a literatura clássica, principalmente a obra de
Dante.
Maria Martins estudou no Colégio Sion, em Petrópolis, Rio de Janeiro. As
aulas eram ministradas em francês e isso lhe permitiu a fluência e o domínio dessa
língua. Em 1912, nasce sua filha, Maisa. Em 1915, casou-se pela primeira vez com
Otavio Tarquínio de Souza (1889-1958), reconhecido intelectual que entre outros livros
escreveu a História do Brasil Império e três volumes sobre a vida de Dom Pedro no
Brasil. Em 1916, nasceu sua filha Lucia Maria. No ano de 1925, Maria Martins separou-
se de Otavio Tarquínio de Souza e, morre de meningite, sua filha Maísa.
Em 1926, morre seu pai de tuberculose, em Paris, e ela se casa com, Carlos
Martins Pereira e Souza, diplomata brasileiro, nomeado ministro no Equador. Nesse ano
nasceu Theresa, a terceira filha de Maria, que morreu ao nascer. Em 1927, o casal
transferiu-se para Paris e, em 1928, ocorreu o nascimento da sua quarta filha, Nora
Yolanda Henriqueta Maria. Em 1930, nasce Anna Maria Pia, a quinta filha. Nesse
mesmo ano conheceu Amedée Ozenfant, André Breton e Rufino Tamayo, que integram
o círculo dos artistas que se refugiaram em Nova York, durante os anos da guerra. A
maioria deles se reuniu no apartamento de Peggy Guggenheim. Estavam também:
André Masson (1896-1987), Yves Tanguy (1900-1955), Matta (1911-2002), Ossip
Zadkine (1890-1967), Max Ernst, Marcel Duchamp, Marc Chagall e Piet Mondrian.
Ressalta-se que Maria Martins tornou-se grande amiga de Fernand Leger que a visitou
em Washington, fazendo desenhos de suas esculturas.
32
Em 1931, Getúlio Vargas nomeou Carlos Martins ministro da delegação
brasileira em Copenhagen. Em 1934, Carlos Martins era nomeado embaixador
brasileiro no Japão. A família mudou-se para Tókio. Maria encantou-se com a cerâmica
japonesa e se interessou pelo Zen Budismo. Dois anos mais tarde, Carlos Martins era
nomeado embaixador na Bélgica. Maria estudou escultura com o escultor belga Oscar
Jespers (1887 – 1970) e desenvolveu trabalhos em terracota. A artista também fez vários
retratos. Em 1939, Carlos Martins era nomeado embaixador dos Estados Unidos e a
família mudou-se para Washington.
Nesse período, Maria decidiu se dedicar à escultura, e transformou o andar
superior do prédio da embaixada num estúdio. Maria começou a esculpir, em jacarandá,
várias esculturas em grandes dimensões. Esse tipo de madeira, tipicamente, brasileira
estava numa feira internacional em Nova York, no pavilhão brasileiro, em 1939. A
artista também desenvolveu trabalhos em cerâmica, instalando um forno no porão da
embaixada. No mesmo ano suas esculturas foram incluídas numa exposição de um
grupo de arte latino-americana no Riverside Musem em Nova York.
De 14 de outubro a 3 de novembro de 1941, aconteceu sua primeira exposição
individual, sob o título de Maria”, na galeria Cocoran, em Washington. Nesse
momento, as críticas eram favoráveis. Nelson Rockefeller comprou Cristo para o Museu
de Arte Moderna de Nova York a primeira obra da artista que entra para o acervo de
um museu americano. Enquanto estava em Nova York conheceu Jacques Lipchitz, com
quem Maria aprendeu o processo de fundição em bronze.
Em 1942, ainda em Nova York, conheceu Mary Callery que lhe apresentou os
arquitetos Mies van der Rohe e Philip Johnson. De 22 de março a 10 de abril de 1942,
ocorreu a exposição, Maria: Novas Esculturas e Mondrian: Novas pinturas, na galeria
Valentine, em Nova York. Nessa mostra Maria, apresentou 6 esculturas da rie
Amazônia e foi lançado um livro também intitulado Amazônia escrito por Maria. Nessa
exposição Maria adquiriu uma obra de Mondrian, Broadway Boogie Woogie, por $800
dólares e que após a exposição passou para o acervo do Museu de Arte Moderna de
Nova York (MoMA).
De 8 a 27 de maio de 1944, realizou-se a mostra Maria: Esculturas e Jóias
Artísticas, na galeria Valentine, em Nova York. O crítico Clement Greenberg fez uma
crítica, considerando-a uma artista de talento ímpar. Em 1946, Maria Martins aprendeu
33
a técnica da gravura. Nesse momento, incia um intenso relacionamento com Marcel
Duchamp, que começou construção de sua célebre e última obra Etant Donnés ou O
grande Vidro (1947), e tem Maria como modelo.
Em abril, aconselhada por Duchamp, Maria Martins comprou a pintura Le
Modèle Rouge (1935), de René Magritte, numa exposição na Hugo Gallery, em Nova
York. Mais tarde, Duchamp indicou para ser reproduzido na capa do livro de Breton: O
Surrealismo e a Pintura (a pintura está hoje no Museu de Arte Moderna em Paris). De
julho a agosto, duas de suas esculturas participaram da Exposição Internacional do
Surrealismo, na galeria Maeght, em Paris. A edição luxo do catálogo, intitulado O
Surrealismo em 1947, mostra na sua capa um seio de material macio de borracha,
inspirado num molde em gesso que Duchamp fez dos seios de Maria, no início daquele
ano.
De 25 de novembro a 2 de janeiro de 1947, aconteceu a exposição Maria na
galeria Julien Levi, em Nova York. O catálogo apresentou um ensaio de André Breton
sobre as esculturas de Maria. Em dezembro, Maria serviu como modelo para: Etant
donnés: Maria, Ia chute d'eau et le gaz d'éclairage [Given: Maria, the waterfall and the
illuminating gas].
Em 1948, Carlos Martins era nomeado embaixador da França e a família
mudou para Paris. Maria alugou um estúdio na Vila d’Alesia, onde, em frente, se
localizava o estúdio de Brancusi. Os dois escultores se tornam grandes amigos e juntos
realizam refeições no seu estúdio. Depois de alguns meses, Maria mudou-se para um
estúdio que pertencia à galeria René Drouin na rue l'Université. De outubro a novembro,
ocorreu primeira exposição individual, em Paris, na Galerie René Drouin.
Simultaneamente, era editado um catálogo Les Statues Magiques de Maria, o primeiro
mais importante livro sobre o trabalho da artista até aquela data. Nesse catálogo estavam
os ensaios de Breton (o mesmo que foi apresentado na Julien Levy Gallery, em 1947) e
de Michel Tapié (1909-1987).
Em 1949, Carlos Martins e a família retornaram ao Brasil e Maria se preparou
para sua maior exposição no país. Em 1950, a exposição Maria Esculturas é inaugurada
no Museu de Arte Moderna de São Paulo. Eram 36 esculturas que de acordo com o
catálogo range in date de 1934 a 1950. O catálogo apresentou ensaios de Duchamp,
Henry Mcbride, Breton, Tapié, Ozenfant, Christian Zervos e Santa Rosa. No mesmo
34
ano, Maria tornou-se co-fundadora da Fundação do Museu de Arte Moderna do Rio de
Janeiro.
No ano de 1951, Maria Martins auxiliou, intensamente, a organização da
primeira Bienal Internacional de São Paulo. em 1953, com a intenção de formar uma
exposição com artistas de peso internacional, Maria viajou para os Estados Unidos,
Canadá, Cuba, México e Guatemala. Nessa Bienal, recebeu o segundo lugar como
melhor escultura da mostra. Em 1955, recebeu o prêmio de melhor artista brasileira na
III Bienal de São Paulo.
Em 1956, ocorreu uma retrospectiva de suas obras no Museu de Arte Moderna
do Rio de Janeiro. O catálogo da mostra apresentou 42 esculturas, datadas de 1937 a
1956. Foram apresentadas, também, litogravuras, desenhos e gravuras. Em outubro do
mesmo ano, Maria viajou para a Europa, Egito, Israel, Japão e China por dois meses.
Em 1958, Maria publicou Ásia Maior: O Planeta China. Como poetisa confirma sua
forma de expressão na mesma proporção de sensibilidade impetuosa que usa nas
concepções artísticas:
Mesmo depois da minha morte
Muito depois da sua morte
Eu quero te torturar
Eu quero o pensamento de mim encaracolado em volta do seu corpo
Como uma serpente de fogo sem queimá-lo
Eu quero te ver perdido, asfixiado, perambulando
Na nevoa sombria
Entrelaçado por meus desejos
Para você quero longas noites de insônias
Preenchidas pelos troares dos sons da tempestades
Bem distante, invisível, desconhecido
Eu quero que a saudade da minha presença
Então te paralise
25
25
Poema que fez na década de 40 supostamente relacionado com suas intensas paixões, entre elas com
Marcel Duchamp.
35
Num livro sobre escultura moderna, Michel Seuphor, renomado crítico francês,
descreveu a escultura de Maria, como poesia tropical, e se refere à artista como “a
grande escultora do surrealismo”. Por volta do ano de 1959, Maria Martins terminou o
monumento O Rito do Ritmo, colocado em frente ao Palácio da Alvorada, por ocasião
da inauguração de Brasília, em 1960.
Durante 1960, escreveu numa coluna a Poeiras da Vida, no jornal Correio da
Manhã, veículo de comunicação carioca, na qual entrevistava pessoas importantes. De
28 de novembro a 14 de janeiro 1960, ocorreu a Exposição Surrealista Internacional, na
D’Arcy Galleries, em Nova York, com a obra Impossível Lent pelo Museu de Arte
Moderna de Nova York. Também escreveu textos sobre Rimbaud e Verlaine que nunca
foram publicados.
Em 1961, Maria publicou Brama, Gandi e Nehru. em 1964, Carlos Martins
faleceu e, no ano posterior, Maria publicou Deuses Malditos 1: Nietzsche. Em 1968, a
artista terminou mais duas esculturas para Brasília: O Canto da Noite e uma segunda
versão de The Road, The Shadow, Toam Narrow, Too Long obras que foram
colocadas nos Jardins do Palácio do Itamaraty (Ministério de Relações Exteriores).
Em 1970, Oscar Niemeyer solicitou a Maria Martins uma escultura para a
catedral de Brasília. Arquiteto e a artista criaram vários desenhos de uma enorme cruz,
onde eram agregados vários instrumentos de tortura (uma alusão aos estudantes que
foram perseguidos pelo governo). Contudo, a artista não finalizou a escultura, sentia que
não teria mais tempo de continuar o trabalho. Por fim, em 1973, Maria Martins morreu
aos 78 anos de idade, vitimada por uma parada cardíaca, em 27 de março, na sua casa
no Rio de Janeiro.
36
3.2. Trajetória Estética
Contudo, considerei o viés do surrealismo, para analisar a obra de Maria, Suas
obras não o estáticas nem visualmente nem conceitual mente. Desde o início sempre
suas figuras tridimensionais com um movimento significativamente expressivo e por
intermédio de seu inconsciente e mundo imaginário.
Enquanto Maria estava em Washington, o grupo do Breton estava em Nova
York e isso lhe proporcionou um contato maior com o surrealismo. Ela tentou
estabelecer um pertencimento à questão brasileira para ser aceita no met americano,
com a apresentação da serie Amazônia. Esta série, primeiro mergulho no Surrealismo,
mostra uma identidade brasileira na escolha dos temas folclóricos da região Amazônica.
Breton a nomeia surrealista quando entra em contato com suas obras em 1942
A partir daí, seu trabalho vai se identificando com o surrealismo e com sua
feminilidade, sempre por meio de formas não-explícitas e de um erotismo sutil. Nada é
totalmente exposta, incitando um pensar, um sentir, uma sensibilidade que mobiliza
também o racional.
A beleza estética convencional não é encontrada na maioria de suas obras
exceto em algumas de sua primeira fase, que eram figurativas, e que impressionavam na
maioria das vezes, também por suas grandes dimensões (esculturas do tamanho natural
ou de até 2,50m esculpidas em madeira). Ela era dona das suas formas, e suas formas
lhe pertenciam. Um mergulho no inconsciente de maneira consciente”. Obediente aos
preceitos do movimento surrealista vigente na época, lhe é facilitada a originalidade na
concepção das formas. Na conjugação de suas fases existe um fio condutor poético:
LIBERDADE. As linhas entrelaçam-se, mas não se prendem e nem se perdem, os
espaços vazados proporcionam uma não contenção. Algumas obras como Súr Dout ou
Chanson em Suspens, por exemplo, sugerem acolhimento, mas nunca prisão.
Sedução e prazer, mas nunca dor. A escultura difere da pintura devido a uma cinética
espacial e isso pode ser visto na obra da artista que acentua a uma mobilização
inquietante ao olhar do espectador
A contribuição de Maria é relevante no uso de novos materiais, como o
sermolite, cimento sorel. Estas experimentações com materiais incitam a uma busca de
37
soluções mais aprimoradas na concepção estética de obras pela grandiosidade física que
apresentaram ou por ter estrutura frágil de manuseio como filetes vazados ou pontas.
(como em A Soma de Nossos Dias). A singularidade da Maria Martins como brasileira
está em jogo quando apresenta a serie Amazônia onde um hibridismo constante entre
animal, vegetal e humano são a tônica desta fase.
O surrealismo, recriado por Maria Martins, introduziu a identidade brasileira
no surrealismo internacional: os símbolos elaborados foram desenvolvidos por ela a
partir dos temas do folclore e lendas da região amazônica, num acúmulo de textura da
natureza brasileira. Obras posteriores a esta série, já numa linha mais abstrata se
apresentam com uma textura, como se fossem pinceladas de uma massa pastosa, densa,
textura esta que se usa na pintura, e em painéis escultóricos, de baixo e alto relevo.
Nesta série, apresenta hibridismo formal entre vegetais, animais e seres reinventados da
floresta amazônica. A textura é evidenciada pelo chapiscado de massas. É uma vibração
muito forte que dá movimento ao todo da forma:
É como se fosse uma pintora que realizasse em ts dimensões
o significado da vibração das formas dando uma
personalidade marcante
26
.
À medida que ela se coloca como artista e vai hibridizando isso como uma
questão autobiográfica abandona a temática brasileira. Marca uma época, conseguindo
se impor com uma personalidade/identidade. Por ora isto é mostrado em sua obra Não
Se EsqueçaNunca Que Eu Venho dos Trópicos”. Embora a concepção formal esteja
mais para um figurativo abstrato o título incita a lembrança de onde veio Maria, de uma
terra dos trópicos.
Para se buscar a identidade de Maria é importante, buscar as variáveis que
singularizam sua obra. Maria Martins respondeu muito bem aos quesitos do movimento
surrealista ao ponto de Breton, reconhecê-la como uma escultora surrealista. Ela se
serve do automatismo psíquico de maneira que suas obras sejam de acordo com sua
expressão livre e sem censura, com carga expressiva, original e instigante. É impossível
parar diante da maioria das obras de Maria, sem repetir o olhar e refletir, e muitas vezes
sobre a relação do titulo e obra, que Maria talvez pela convivência com Duchamp,
26
Depoimento: Profª.dra. Elide Monzeglio, quando da minha banca de qualificação, em 25 de novembro
de 2005 no auditório do MAC USP (Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo).
38
desenvolveu uma forma de pensar a arte de maneira profunda e de extrema inteligência
e sensibilidade.
Maria vai polindo” e limpando” as irregularidades propositais, caminhando
pala um alisamento das superfícies de suas obras, mas nunca sem deixar a obra mole,
sem esqueleto. Mesmo nas obras que passaram pelo processo de fundição em bronze e
polimento, Maria, dava o toque final deixando a obra “com vida própria”, com a
sensação de que o artista passou por ali.
Quanto aos títulos de suas obras, observamos que raramente referem-se de
modo óbvio à forma; sempre incitam a uma reflexão poética. Muitas delas, aparecem
sem título, não se sabe se porque a informação foi perdida ou se Maria o achou um
título à altura da sua obra.
Uma das três obras que pertencem ao MAC, Museu de Arte Contemporânea da
USP (São Paulo), adois anos atrás era considerada sem título. A presente pesquisa
levantou o nome desta obra, encontrado com imagem e título, num catálogo de
exposição, da qual Maria participou na Suíça. Constatou-se assim, que se chamava
Calendrier de L’Eternité. Tal informação foi passada para Cristina Cabral,
documentalista do museu, que nomeou a obra a partir de então de Calendário da
Eternidade.
Um catálogo que na capa tem um desenho, a bico de pena, do perfil de uma
mulher, assinado por Candido Portinari, registrou a abertura, na tarde do dia 14 de
outubro de 1941, da primeira exposição individual de Maria Martins, na galeria de arte
Cocoran em Washington DC. Até então, Maria somente havia apresentado suas obras
em duas vezes, uma na Filadélfia, em 1940, e logo em seguida em uma exposição com
um grupo de artistas latino-americano, em Nova York.
Foram expostas 18 obras, figurativas, de material diversificado: gesso,
terracota, bronze, e três tipos exóticos de madeira tropical, jacarandá, imbuia e peroba.
A maioria das peças destacou-se, por apresentar grandes dimensões.. Alguns temas
inspirados na origem brasileira de Maria: Samba (duas versões), Noite no Salgueiro e
Yara. Outros com referência à sua vida pessoal como Nora (uma de suas filhas) bronze:
com 30 cm de altura, em bronze, num estilo mais realista, um retrato, com acabamento
rugoso, Refugiados (referente aos primeiros anos da guerra) e com temas bíblicos, tais
como Salomé, Eva, São Francisco e Cristo.
39
Salomé foi concebida em quatro versões no ano de 1940: Salomé, bronze ,97
cm de altura; Salomé, 1,80cm de altura, tamanho natural, figura nua, pernas afastadas
dobradas para traz como num movimento de dança que expõe a região pubiana, com um
pano sobre uma das pernas e cabelos curtos expondo a nuca; assentada na base que traz
a seguinte inscrição em Francês, "Je veux Ia tête de Jokanaan” - Salomé : figura nua,
semelhante à anterior, em escala menor, 40 cm de altura, aproximadamente, com a
mesma postura da anterior, mas com os cabelos compridos. Salomé , figura ajoelhada,de
26 cm de altura, com a cabeça de João Batista nas mãos próximo ao rosto, um trabalho
mais clássico, onde as proporções acadêmicas anatômicas são consideradas, exibindo a
fisionomia estilizada, com olhos de orientais, oblíquos. Traz na base uma inscrição em
francês: “L'amour a une acre”.
A primeira versão de Yara (a deusa do rio) 1941 bronze é uma figura feminina
de fonte, com 2,20m de altura, sustentada por seres aquáticos peixes, ou golfinhos, meio
disformes, que emergem da água e elevam a figura acredito que, ai inicia, na sua
criação, a tendência de agregar o mundo animal , a natureza às suas obras , o que se
repete em outras obras ainda dentro de um estilo figurativo ; as mãos de Yara se juntam
na altura dos seios como numa prece; acabamento da superfície ligeiramente áspero
com linhas escorridas pelo corpo como se fossem a água, deslizando pelo corpo após
emergir do rio.
A singularidade da obra Cristo não se destacou somente pelo entalhe em
madeira exótica jacarandá em tom de rosa forte e seu acabamento rústico,
texturizado, deixando ver a marca da goiva, mas também, pelo tamanho expressivo da
obra: 2,50 m de altura. Os braços da figura estão amarrados, apoiados sobre a cabeça e
as mãos cerradas, maiores que o natural. Na base da obra, uma inscrição esculpida em
latim, retirada do Evangelho de São Mateus VAE VOBIS, SCRIBAE ET PHARISAEI
HYPOCRITAE! Cristo foi comprada por Nelson Rockefeller que, posteriormente, a
doou ao Metropolitan Museum of Art de Nova York; Yara foi adquirida pelo Museu de
Arte da Filadélfia, o mesmo museu que abriga duas obras principais de Duchamp A
Noiva Despida Pelos Seus Celibatários, mesmo. (ou O Grande Vidro) e Ettant Donné.
O Museu do Brooklyn adquiriu Awakening, uma pequena figura de nu feminino em
terracota.
A exposição na Cocoran Gallery obteve grande repercussão, e teve uma
matéria publicada na revista Life, em que Maria foi citada como a melhor escultora do
40
Brasil. Durante o inverno de 1941-42, a artista alugou um estúdio em Nova York,
localizado no mesmo quarteirão da Valentine Gallery. Nessa época, conheceu o artista
Jacques Lipchitz (1891 – 1973) que ensinou à Maria a técnica da fundição em bronze. A
durabilidade do material fascinou-a e na década seguinte, a maioria de suas esculturas
foi confeccionada em argila passando em gesso ou para ser fundida em bronze.
Em maio de 1942, a Valentine Gallery exibiu 21 esculturas, sendo que a maior
parte havia sido exposta na Cocoran. Nessa oportunidade, as esculturas como a
monumental deusa do rio, Yara, eram fundidas em bronze. Alguns críticos achavam que
seu trabalho era pagão e violento, mas Maria não se preocupava com essas opiniões.
O ano de grande mudança no trabalho de Maria foi 1942. Depois de sua
primeira exposição na Valentine, a artista abandonou os temas convencionais e fontes
de estilo que inspiraram suas primeiras esculturas, indo à direção de assuntos mais
introspectivos, derivados da sua experiência de vida. Um dos seus primeiros trabalhos,
nesse novo momento, foi provocativamente intitulado de Não te Esqueças Eu Venho
dos Trópicos, que sugere uma mulher, de forma estilizada, deitada de costas, seus
braços estendidos para o alto, tendo suas mãos transformadas em garras. A cabeça está
inclinada para trás fora do ângulo de visão, e protuberâncias, que lembram seios,
indicam um ser do gênero feminino. Na área lvica cinco chamas” saem em direção
ao alto que, segundo a visão de alguns críticos, representariam as suas cinco filhas.
Até 1942, seus trabalhos eram figurativos, a partir de Não te esqueças... e a
série Amazônia inicia-se uma concepção voltada para o Surrealismo, na qual figuras
inventadas do seu imaginário transcenderam o real. Maria Martins participou de
exposições internacionais ligadas ao movimento do Surrealismo, entre elas, a grande
mostra Le Surréalisme na Galerie Maeght (1947), em Paris, organizado por André
Breton. O próprio Breton a reconheceu como uma artista surrealista e passou a assinar
textos de catálogos das exposições dela.
A arte de Maria Martins partiu de uma sensibilidade extremamente feminina.
Suas formas desafiam os limites entre figurativo e abstrato. Por não fazer questão de
pertencer ao movimento artístico nos anos de 1950, no Brasil, foi muito criticada. Em
1956, por ocasião de sua exposição no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro,
prevendo a severidade de uma crítica modernista em relação a seu trabalho. Maria
Martins escreve em seu catálogo:
41
Pouco importa essa ou aquela forma de expressão desde que
o artista transmita a mensagem que é a sua e em seu idioma
próprio, e não use essa espécie de modismo muitas vezes
responsável pela grande pobreza de artistas de real valor.
Para melhor me explicar diria que (...) quando em uma
pintura ou escultura ressalta à primeira vista a escola ou o
movimento a que se pretende filiar o seu autor, sem que tal
escultura ou tal pintura desperte maior interesse de
admiração ou mesmo de repulsa, essa obra não passa de
‘modismo e morrerá, ainda que conheça sucesso
momentâneo (...) Poderá tal obra apresentar técnica
perfeita, artesanato maravilhoso. Nem uma nem outra coisa,
porém, realizaram ou realizarão jamais obra de arte
duradoura. Em qualquer linguagem, o artista criador
deixará ecoar pelos tempos
27
.
Alternava a arte com o glamour das recepções da embaixada. Dedicava-se
durante o dia à escultura e à noite às recepções como embaixatriz. Muitas de suas obras
eram “sem títulos”, ou sem ficha técnica, bem como, somente existem citadas em textos
e catálogos, sem localização das peças. Essas divergências com relação à suas imagens
são comuns, tal como a Simple History, 1951,bronze,(142x65x45cm) na qual,em uma
foto encontrada , surge um golfinho no seu topo e em outra imagem está ausente
aparentemente, seria a mesma obra.
Essa pesquisa realizou também um levantamento fotográfico in loco,
abordando os diversos ângulos de suas esculturas, com a intenção de conhecer
profundamente a produção da artista e estabelecer uma aproximação com a poética de
sua obra. Quando a obra Cobra Grande foi fotografada in loco no Rio de Janeiro, na
Galeria Jean Boghici foi possível observar a miríade de detalhes que Maria criou para
apresentá-la. Esses detalhes minuciosos de certo modo dificultaram o processo da
fundição em bronze e isso se repete em todas suas obras da série Amazônia. Folhas,
figuras, flores, pássaros, musgos e múltiplos filetes se multiplicaram e se entrelaçaram,
compondo um emaranhado de formas, que também podem ser observados nas obras:
Les Deux Sacres , Macumba, e as oito obras da série Amazônia
27
MARIA Martins, São Paulo:[s.n.]1997.95p.Catálogo. Exposição de 21 de novembro a 21 de dezembro
de 1997, Fundação Maria Luisa e Oscar Americano, São Paulo
42
Alguns críticos têm idéias muito originais sobre a obra de Maria Martins.
André Breton, por exemplo, analisou a obra da artista:
As esculturas que Maria expõe atualmente em Nova York
acusam ainda mais a preocupação de despojamento e não
deixam de situá-la nos antípodas de uma arte que ao lado
de Brancusi, Arp e Giacometti não cessou nestes trinta
anos de ressecar o intelectualismo. Em Hasard Hagard, Sur
Doute, a despedida dada ao anedótico é tal que o se
poderia de modo algum interpretar como uma mudança de
orientação sua. E sim que (o importante é que) a démarche
de Maria a trouxe do macrocosmo ao microcosmo, em vez
de fazê-la percorrer o caminho inverso, o qual sabe-se,
possui emboscadas e engodos. E nunca se repetirá o
suficiente, o universo que deve ser interrogado em primeiro
lugar e a partir do homem e não o homem a partir do
universo. O que prenuncia os grandes acordes acrobáticos
de Maria, o tour de force dessa maleabilidade total no rígido,
não é a 'cera perdida', são as seivas
28
.
3.3. Sem a Sombra de Duchamp
“Um artista exprime-se com a alma e é com a alma que a
obra de arte deve ser assimilada.”
Marcel Duchamp
Por muito tempo, a referência a Maria Martins estaria à sombra de Marcel
Duchamp, em especial quando era citada como amante do artista francês. André Breton
abriu os catálogos de exposições da artista e foi um dos que reconheceu a obra de Maria
Martins como surrealista. De fato, é possível perceber na sua obra, um diálogo com
outros artistas surrealistas com quem conviveu, como Alberto Giacometti, Max Ernst,
Marcel Duchamp, Miró e Jean Arp. Um exemplo disso reside na obra A Mulher que
Perdeu sua Sombra. Essa peça mostra semelhanças com as obras de Giacometti A
Mulher Andando (Walking Woman) e O Homem Apontando (Man Pointing), ambas de
43
formas alongadas. Tanto as dimensões das obras são semelhantes quanto a aparência
extra terrestre das figuras.
O que não se sabe é da arte de Maria como uma forma audaciosa avançada e
provocante, e acima de tudo com um erotismo inerente. Feminino e masculino se
insinuam, se unem ou se repelem de forma sutil e, ao mesmo tempo, com intensidade
erótica. Seus tridimensionais vêm carregados de códigos secretos, de uma sensualidade
barroca e inquieta. Assinava simplesmente, Maria.
Analisar a obra de Maria é entrar num mundo de linhas e formas imprevisíveis
aos contornos e desenhos. Se por um lado, no Surrealismo, o feminino era a fonte de
inspiração, o erótico ilimitado da mente humana era posto à vista: a mulher era objeto
de desejo, assim como a mulher Maria fala sobre o desejo e sobre o erotismo sem se
preocupar com as conseqüências.
Duchamp não é tão somente um relacionamento amoroso na vida de Maria,
mas representa um diálogo entre as obras de ambos, um caso formal e simbólico entre
suas obras. Essa convivência é percebida, sutilmente, no Grande Vidro um relato
sobre o amor impossível da noiva e seus celibatários. A mesma narrativa que acontece
na obra Impossível de Maria, na qual tentáculos eretos e pontiagudos afastam ou
protegem um homem de uma mulher numa relação mais íntima.
É possível observar nas concepções da obra Salomé de Maria, um
figurativo/realista até a realização da figura do Oitavo Véu quando entra
numaconcepção surrealista onde uma figura feminina sentada sobre os joelhos com
suas pernas dobradas e abertas numa superfície plana,suas mãos e pés estão com os
dedos unidos à semelhança de garras que parecem mais ser de um animal. A cabeça é
um pouco maior em relação à proporção do corpo. Esta obra nos remete à Étant
Donneé, onde se vê a figura de uma mulher nua deitada com as pernas abertas, onde seu
sexo é visível. É dito que Maria foi o modelo desta obra para Marcel.
O trabalho de Maria não apresenta um erotismo explícito e sim pontuações de
uma sutileza erótica e liberdade de expressar sem censura o que sente, tanto em suas
obras quanto em suas poesias:
28
BRETON, André. Maria Martins. A Phala - Revista do Movimento Surrealismo. v. 1, p. 112-113.
44
I
Eu sei que minhas Deusas e sei que
meus Monstros sempre se parecerão
sensuais e bárbaros. Eu sei que
você gostaria ver reinar em minhas
mãos a medida imutável dos elos
eternos« Eu sei que minhas Deusas
e sei que meus Monstros sempre te
parecerão sensuais e bárbaros.
Eu sei que você gostaria ver reinar
em minhas mãos a medida imutável
dos elos eternos.
Você esquece
que eu sou dos trópicos, e de mais
longe vinda,
você esquece tudo isso, que de mais
longe vindo
se mistura ainda nas minhas veias,
ao sangue queimado do Astro
equatorial,
o orgulho bravio do Espanhol
vencido
raptando sua vitória ao Mouro
perdido de êxtase;
- a aventura portuguesa temerário
destino,
abdicando do ouro e do poder no
braço de Moema
- a arrogância holandesa, a
inquietude irlandesa,
uma e outra submissas
ao imperioso amor, que dispõe dos
homens
II
45
Eu sou o meio dia pleno da noite
tropical.
Tudo é calma e esplendor
nenhuma folha se move
Nenhuma falha rompe a eternidade
do dia,
Um mesmo torpor, angustiante e
mudo,
das cores do pássaro ao odor da
flor
tece o mesmo sonho.
E o jaguar todo lânguido de doçura,
cede à embriaguez do sono.
Só o transe efêmero de uma cigarra
corta a morna espessura do silêncio
macio.
III
De repente o espaço é de chumbo.
Palpitante e bravio desperta a
floresta
num arrepio de espera e uma onda
de felicidade
e de repente sobe um sopro de
loucura,
e eis o vento correndo em altiva
frenesia,
o vento que canta e uiva.
a grande canção de força e de
desejo,
o vento que ruge e ralha,
transbordante
e desesperado grita
seu monstruoso amor num tumulto
ofegante.
46
E durante longas horas as folhas
e as árvores se entregam
se afastam e se entregam, se
afastam e se entregam,
até o bom cansaço da união vivida...
Então, tudo volta à tranquilidade
primeira reengendrada
dolorosamente
na conquista da plenitude
E a vida, inocente saciada,
a terra fresca descansa,
a terra novamente Virgem e
misteriosa e fechada
como aquela que a Vida não
ousaria atormentar
29
.
Suas obras sugerem novos seres, algo que brota de uma unidade primeira: a
essência humana. Seu trabalho anunciou um mundo de seres que poderiam existir. O
vegetal, animal e mineral se mesclam e se transformam. Ora essas formas se fundem,
ora se repelem, num estado de não toque, não aproximação como as obras Impossível. É
um nascer e transformar, um brotar que é sugado por tentáculos, que brotam, proliferam
e se encolhem. Desejo, amor e sensualidadeo sugeridos sutilmente.
Na concepção Impossivel, duas figuras (uma feminina outra masculina), se
deparam de frente, mas com tentáculos eretos e protetores que caminham para uma
estilização do não encontro, na obra A Soma de Nossos Dias o feminino e masculino
não se unem novamente. A escultura se torna o totem de um ritual misterioso sobre o
tempo e a feminilidade. Uma espinha dorsal/adaga que se projeta no espaço, marcando
o tempo, o espaço e a memória. A obra apresenta um enorme esqueleto que desemboca,
em seu topo, numa pequenina "cabeça", com uma forma que lembra um botão de flor ou
uma vulva. No contraste entre a solidez implacável do esqueleto abaixo e a delicadeza
da forma acima, estruturada em camadas de contornos, Maria tece, visualmente, um
poético comentário sobre a sexualidade feminina, a criação da vida e o tempo que passa.
29
Poema Explicação de Maria gravado em quatro águas-fortes a 60 exemplares cada para o catálogo da
exposição na Valentine Gallery, em Nova York, 1946
47
A concepção de Impossível repete uma semelhança de formas ou se inspira no Secador
de Garrafas, de Duchamp.
É da autoria da artista este trecho poético feito supostamente para Duchamp, na
década de 40 (sem, ainda, uma data precisa), quando de seu possível relacionamento
amoroso com ela. Neste poema observa-se um tom de sarcasmo e uma paixão ardente e
perversa. O que, não é sugerido nos tridimensionais explicitamente, é sugerido aqui em
relação ao amor entre um homem e uma mulher:
Mesmo depois da minha morte
Muito depois da sua morte
Eu quero te torturar
Eu quero o pensamento de mim encaracolado em volta do seu
corpo
Como uma serpente de fogo sem queimá-lo
Eu quero te ver perdido, asfixiado, perambulando.
Na nevoa sombria
Entrelaçado por meus desejos
Para você quero longas noites de insônias
Preenchidas pelos troares dos sons da tempestade
Bem distante, invisível, desconhecido.
Eu quero que a saudade da minha presença
Então te paralise
30
30
Tradução livre do poema (sem titulo) no catálogo MARIA The surrealist Sculpture of Maria Martins 19
de março a 18 de abril de 1998 Catálogo André Emmerich Gallery, New York p.22
48
4. A POÉTICA VISUAL DE MARIA MARTINS
4.1. Um Percurso
Sua assinatura nas obras era apenas MARIA, sem o Martins, pois Maria Martins
era seu nome como embaixatriz. Maria fazia extrema questão desta diferença. Sua
primeira fase, na escultura foi figurativa, e em 1941 acontece sua primeira exposição
individual sob o título de MARIA na Cocoran Gallery, em Washington. Configuradas
em blocos maciços, sem vazados, a partir de diversos materiais como gesso, terracota,
bronze e de três exóticas madeiras: jacarandá, embúia e peroba (amostras que foram
deixadas no stand do Pavilhão do Brasil, em 1939, na Feira Internacional, em Nova
York).
A maioria das peças destacou-se, por suas grandes dimensões. Alguns temas
foram inspirados na origem brasileira de Maria: Samba, a primeira versão de Yara (a
deusa do rio); outros faziam referência à sua vida pessoal como, Nora (uma de suas
filhas), Refugiados (referente aos primeiros anos da guerra); ou ainda, com temas
bíblicos, tais como Salomé, Eva, São Francisco e Cristo.
Ao entrar na sua fase surrealista que acontece a partir de 1942, a escultura de
Maria se caracteriza pela soma de elementos interdependentes e encadeados. Devido à
diversidade de elementos da natureza - vegetais, animais, figuras humanas em conexão -
um movimento de massa e um resultado inesperado é criado, surpreendendo o
espectador. Nesta fase, as obras apresentam uma textura irregular, áspera e opaca e são
fundidas em bronze, sendo a sua série Amazônia o exemplo marcante desta fase.
Em 1943, na exposição Maria Novas esculturasMondrian: Novas pinturas, na
galeria Valentine, em Nova York, Maria apresentou 8 esculturas da série Amazônia. Na
mesma ocasião, foi lançado um livro de sua autoria, também intitulado Amazônia, que
trazia um texto quase que poético para cada obra.
Num segundo momento, quando mais integrada ao Surrealismo, suas esculturas
exibem superfícies mais lisas, o que as torna mais luminosas e confere maior força
plástica aos volumes, como na obra O Implacável, 1944, (acervo do MAC/USP). Outro
49
recurso que se observa, é o uso de filetes que se entrelaçam e delineiam espaços vazados
contidos, como em O Canto da Noite, O Canto do Mar, O Rito do Ritmo. Maria se
utiliza de diversas técnicas de pátinas para dar acabamento à suas esculturas fundidas
em bronze. Segundo sua filha, Nora, Maria fazia questão de interferir no acabamento
para que a escultura não ficasse sem a sua participação direta.
A artista cria uma ordem nova para a escultura uma escultura da expressão
humana – temas de paixões, de sensualidade e dores da natureza feminina. Acredito que
a liberdade seja anunciada nos espaços vazados e nas pontas em riste (que protegem das
“invasões”) em Impossível, A Soma de Nossos Dias, A Mulher Que Perdeu Sua Sombra,
However, Pourquois Toujours?, Saudade, O oitavo véu, e Sem Dúvida, onde obra e
título interagem e incitam a uma reflexão poética. A obra de Maria não segue os padrões
estéticos previsíveis, sendo carregada de linhas que não descansam o olhar e nem a
mente do espectador. Linhas que se entrelaçam se escondem e tentam mostrar que não
há começo nem fim, mas um eterno e sutil movimento da vida.
4.2. Amazônia, Mito, Lendas e Maria
Nas culturas dos povos primitivos, o universo da flora, da fauna e das forças da
Natureza, motivados por uma alma ou espírito, possuí um valor similar ao da própria
existência. Uma força espiritual capaz de uma mesma ação como a que forneceu a
energia para que se desse a Vida. Assim, uma pessoa bem-sucedida para a cultura
primitiva, seria aquela que mantém uma harmoniosa e interativa relação com as forças
da Natureza, ao contrário do que ocorre na cultura ocidental moderna, que tende a ver o
homem como superior à Natureza e, conseqüentemente, distanciando o físico do
psicológico.
As crendices populares, nascidas do imaginário simbólico da Água,
enriquecem o nosso folclore com vultos de nuances extravagantes. O rio elemento
onipresente na vida dos habitantes das florestas inspira um sem número de estórias. É
certo que as sereias da mitologia grega, que tanto atormentaram Ulisses, entram com
sua contribuição na tessitura da lenda da Mãe D’Água, do Boto, e da Yara. Contudo, o
indígena também é responsável pela criação de muitos mitos, à semelhança dos
europeus e de outras culturas. Não prevalência de uma cultura sobre a outra, mas um
50
sincretismo. Sempre que existe uma mistura de povos, a tendência predominante em
relação à assimilação das lendas de um lugar específico, de uma tribo ou grupo étnico é
para a fusão das contribuições culturais divergentes, o que origem a uma versão
regional da lenda.
Estórias amazônicas de duendes, ninfas e gênios, possuem um hibridismo que
as torna mais encantadoras. A Yara, por exemplo, presente em qualquer parte da região,
é uma lenda indígena que corresponde às iemanjás, ou àquelas sereias que obrigaram
Ulisses, perto da ilha de Capri, a tapar os ouvidos com cera, e a se amarrar no mastro do
navio, para fugir de seus irresistíveis encantos.
Sob os conceitos ideológicos e estéticos apresentados pelo Surrealismo que
estavam a todo vapor naquele momento, Maria Martins entra para o elenco dos artistas
surrealistas, pela supremacia formal e expressão máxima de sua sensibilidade audaciosa
e livre. Aspectos míticos, crenças e lendas da Amazônia, incluindo os ritos, as
manifestações do inconsciente e do automatismo expressivo estão resumidas na sua
série Amazônia quer nas formas, quer nos textos de sua autoria referentes a cada obra
concebida.
A arte de Maria Martins parte de uma sensualidade e erotismo sutil, captados
pelo olhar feminino. Suas formas e linhas desafiam os limites entre figurativo e
abstrato. Até 1942, as formas de seus tridimensionais se apresentavam como figurativas
realistas. A série Amazônia constitui o divisor de águas no trabalho de Maria:
momento de transição, quando passa do figurativo para um
figurativo/abstrato/fantasioso/surreal, com as marcas do seu imaginário espontâneo.
André Breton viu a exposição, reconhecendo neste momento, em Maria uma
escultora surrealista, e diz com muita admiração sobre Amazônia:
(...) Maria apresentou de formar espetacular não somente a
angustia, sedução e paixão, a fonte do primitivo desses
temas, bem como o por do sol, alegria e calma e amesmo
ocasionalmente um puro prazer
31
.
Existem várias versões das histórias desses deuses do folclore amazônico e
Maria por sua vez cria as formas e histórias em especial sob sua poética pessoal e
31
Tradução livre do catálogo, em inglês, Amazônia by Maria Valentine Gallery, New York Março 1943.
51
instigante. São oito figuras: nas quais animais, vegetação e figuras se assemelham às
humanas e se mesclam num pesadelo rococó. Para cada uma delas Maria escreveu um
texto, como se fosse uma lenda de um folclore particular, relatando os mistérios que
intuiu a partir dos mitos amazônicos, em que o imaginário e o real se confundem.
Amazônia é uma criação, a partir do inesgotável imaginário de Maria. As
figuras dessa série apresentam-se numa miríade de formas abstratas e figurativas, dentro
de um emaranhado de linhas espirais e contínuas. Flora e seres monstruosos coexistem
dentro de um espírito de sensualidade, erotismo, paixão e amor fatal tônicas
integrantes de uma temática expressiva, ao longo de sua obra artística. Seguem trechos
dos textos que Maria fez para cada obra dessa exposição.
A obra Cobra Grande prefigura a deusa de todas as divindades da Amazônia:
Ela mora no fundo do rio num palácio adornado com
pedras preciosas e adornado por flores raras. De ela
governa a floresta e dita as regras para os outros deuses. Ela
é a deusa que manda a noite para o mundo de modo que a
luz do dia não machuque seus olhos quando visitar seu
reinado, o imenso e desconhecido mundo da Amazônia. Ela
tem a crueldade de um monstro e a doçura de uma fruta
selvagem. Os deuses tremem ante ela e os mortais lhe
fazem-lhe reverências. E ela continua viver tranqüila no
fundo do seu amado rio
32
.
A obra Boto aborda a temática do sedutor. Para Maria Martins:
Como qualquer Don Juan, o Boto, não é inteligente, forte ou
até mesmo bonito. Mas ele sabe como falar com cada
mulher em especial. Ele diz a ela o que ela quer ouvir, ele
traz os sonhos que ela quer sonhar. Ele faz para ela
promessas que ela quer que lhe sejam feitas. Don Juan é a
quinta essência do homem dissimulado ardiloso e traiçoeiro
pérfido homem e doce. Ele a persuade de forma que ele seja
o fim da solidão que a tortura, ele é forte o suficiente para
ser seu escravo e senhor, que para ela é o começo e o fim.
Cada vez que uma bonita cunha(Mulher jovem em tupi
32
Idem.
52
guarani) uma volta às margens do Amazonas aparece o
Boto o terror das mulheres no meu país. Ele vem na sua
mágica jangada. E surge ele cantando sua canção de amor.
Para cada mulher Boto se transforma na forma que ela
sonhou para o homem da sua vida. Como ela pode resistir às
sedutoras canções? Enquanto o crepúsculo lentamente
começa a acontecer e uma luz que pode aparecer apenas no
Nordeste do Brasil, ele se vai. Pobre cunhatã como Don
Juan Boto perde o interesse. Com um riso vulgar ele volta a
ser como era antes um peixe sem cor e desaparece no Rio.
Onde está a jangada mágica, onde estão as flores, e as
promessas? Onde está o Amor? Cunhatã, Cunhatã! Tome
cuidado
33
.
Para a obra Yara, segue o texto:
(...)Yara é apaixonada pelo amor
Ela é a sereia do Rio Amazonas
Entretanto tão longe o amor possa estar, Yara canta sua
canção da sedução Embora esteja perdida de amor por um
mortal que ele é. E o amante ouve o canto de Yara
Desgraça para ele será ouvir duas vezes (...)
34
Já a Yemanjá:
(...) Ela comanda os oceanos, todos os mares lhe pertencem.
Ela poderia viver no Mediterrâneo, no Oceano Indico, onde
ela quisesse, mas Yemanjá escolheu o Brasil.
Lá ela circula da Bahia para o Amazonas.
Em noites claras ela emerge das águas para inspecionar seu
reinado, porque ela ama a Lua e por ser mulher, ela sabe
que seu cabelo brilhante, suavidade de algas de todos os
oceanos é ainda mais bonito sob a sob o feitiço da lua,
33
Idem.
34
Idem.
53
transformando as ondas em prata e seduzindo o mais forte
dos homens (...)
35
O texto da obra Aiokã, diz que:
Aiokã Rainha da selva, que mora bem abaixo do azul do
horizonte.
Aiokã é a própria floresta. Uma virgem não deflorada pelo
homem
Condenado está o viajante que tentar penetrar no seu
mistério. Ela o atrai, intoxica-o e o mata para criar novas
vidas.
Pobre inocente que vai a procura de Aiokã. Ela veio para o
Brasil de uma ilha distante e foi admitida pelo país onde ela
fez de suas terras, a Amazônia.
ela vive e reina e espera o mortal que deseje estar com
ela e então ela cuidará de destino dele.
Os outros deuses também mandam, para Aiokã, as almas
daqueles que pereceram nas ações de seus valores.
Ela os protege com carinho, e cada dia aparece num
diferente disfarce de forma que nunca mostra a saudade de
outros paises ajuda-os a em embarcar numa nova vida, de
novo.
Aiokã: filha do casamento de Macumba e o Índio selvagem.
Insaciável deusa, generosa e boa eu lhe rogo proteger meu
pais para mim
36
.
A partir da série Amazônia, Maria faz um mergulho infinito no seu imaginário
criando formas inusitadas, intrigantes, inquietantes, questionáveis e, por vezes
chocantes na sua originalidade formal característica particular e inédita que imprime
até a última de suas obras. Seu percurso na criação das formas culmina na obra A Soma
de Nossos Dias.
35
Idem.
36
Idem.
54
4.3. Um Olhar Sobre... A Soma de Nossos Dias
A primeira obra que conheci de Maria, foi A Soma de Nossos Dias (1954/55),
quando fiquei extasiada por ver uma obra tão instigante e simbólica. O que teria por
detrás dessas linhas e formas? Linhas se unem de uma maneira vazada contida e, filetes
que tem suas pontas direcionadas para fora e para o alto, numa quase rigidez fálica,
numa altura de 3m. Após conhecer mais sobre suas obras e vida, pude constatar que A
Soma de Nossos Dias é uma obra, das mais significativas, da poética visual de Maria,
pois ela sintetiza uma marca registrada da artista: orifícios vazados, linhas e filetes
pontiagudos. Um eterno crescer, acrescentar...
A Soma de Nossos Dias é a soma de suas obras. É como que se ela fosse a
somatória de suas obras empilhadas num totem, o totem de sua história, a soma de sua
vida e a soma de nossas marcas que vão sendo fincadas no nosso ser de uma forma
silenciosa, implacável, e como tatuagem, ficam para sempre. Existe um diálogo sutil
formal entre esta obra e O Secador de Garrafas de Marcel Duchamp: linhas
pontiagudas com suas pontas para cima e círculos que se repetem. Sua obra não tem
uma beleza convencional. Ela tem beleza original, sensível, reflexiva e sutil.
A obra A Soma de Nossos Dias (1954/1955), 330,9 x 190, 7x 64,9 cm sobre
uma base de madeira de 18,0 x 144,0 x 64,0cm - em sermolite e estanho, recebeu o
prêmio regulamentar na III Bienal de São Paulo, em 1955. A artista doou este trabalho,
neste mesmo ano ao Museu de Arte Moderna de São Paulo. Em 1963, essa obra
juntamente com o acervo do Museu de Arte Moderna de São transfere-se para a coleção
do Museu de Arte do Museu de Arte Contemporânea da USP.
É uma figura que se parece com um esqueleto: a parte central é formada por
círculos vazados que se prolongam para as laterais, em forma de hastes de
aproximadamente 2,5 cm de espessura num total de 22 hastes, onze de cada lado e com
uma distância de 15 cm entre cada uma. O material de revestimento apresenta uma
coloração cinza semelhante a uma massa de cimento que reveste uma estrutura de metal.
Maria, para catalogação, determinou como materiais sermolite e estanho, utilizados para
a confecção da obra. Segundo a pesquisa feita por Magali Sehn, em sua tese de
mestrado: Arte Contemporânea: Da Preservação Aos Métodos de Intervenção, esse
termo “sermolite” não foi encontrado na literatura e dentro de sua pesquisa o objetivo
55
foi mandar analisar as amostras extraídas de rachaduras da obra, provocadas por
umidade nos ambientes, onde esteve exposta.
Aparentemente a peça foi moldada em torno de uma armação de ferro e a
superfície da escultura não foi impermeabilizada. Através das análises de amostras do
material chegou-se à conclusão de que foi utilizado cimento sorel, que é um tipo de
cimento utilizado até mais recentemente na construção civil. É um cimento que tem
uma grande sensibilidade à umidade atmosférica, decompondo-se através da reação com
a água. A proposta do estudo de Magali é a de proporcionar a restauração e preservação
da obra, procurando depois de restaurada conservá-la em ambiente climatizado
adequado. Por ter um tamanho incomum e com hastes pontiagudas, seu transporte
requer cuidados especiais.
Em A Soma de Nossos Dias, o erótico, o sensual, o feminino e o masculino
dialogam de forma ordenada e estilizada numa só obra. A escultura se torna o totem de
um ritual misterioso sobre o tempo e a feminilidade. Uma espinha dorsal/adaga, que se
projeta no espaço/marcando o tempo, o espaço, a memória. A obra apresenta um
enorme esqueleto que desemboca, em seu topo, numa pequenina "cabeça", com uma
forma que lembra um botão de flor ou uma vulva. Aqui, no contraste entre a solidez
implacável do esqueleto abaixo e a delicadeza da forma acima, estruturada em camadas
de contornos, Maria tece um poético comentário sobre a sexualidade feminina, a criação
da vida e o tempo que passa.
Kátia Canton expressa, sobre esta obra, em ensaio no livro de sua autoria:
Maria Martins Mistérios da Forma:
Finalmente a flor se solta no campo,
Campo magnético,
campo verde,
campo grande,
campo belo,
campo de batalha,
campo da vida.
Tão amplo que faz tudo diminuir,
Flutuar, virar pó.
Partículas arredondadas, cheias de historia de vida.
E quando percebe isso,
a gente abre as asas e fica em paz.
Ganha uma pequena coroa que desponta.
56
De cima, observa o tempo,
que passa imponente e generoso.
Na somatória dos dias que passam
a vida vai se ampliando,
dizendo a que veio,
contando histórias de viagens e de pessoas (...)
37
Na Soma..., o feminino se repete em formas circulares, empilhadas no “totem
costela”. Da costela de Adão foi realizada a mulher, porém com independência e
autonomia. As formas circulares femininas e vazadas, não são continentes, e permitem
ao olhar, transpassá-las. Essas formas são prolongadas pelos “espinhos-falos”, sugeridos
pelas laterais pontiagudas e demarcadoras de território, como “protetores das suas
fêmeas”. Esta proteção não sugere fragilidade do feminino e sim a valorização do poder
da mulher, que era um aspecto da personalidade da artista, que se colocava de forma
inquieta, com uma fragilidade voltada para a sedução e não para a perda de identidade e
submissão.
A Soma de Nossos Dias parece ter asas, mas não precisa voar, apenas necessita
de uma certeza: a do vôo possível. Um botão se coloca no topo, pronto para uma mesma
nova forma acontecer. Os dias se somam igualmente diferentes. A altura da obra (3m)
sugere uma apropriação de espaço de forma poderosa, mas não amedronta. A cada dia a
história se repete. A forma é igual, mas não o conteúdo.
Posso dizer que até este momento da pesquisa, considero a Soma de Nossos
Dias como uma síntese da obra de Maria. Os mesmos filetes/linhas, apresentados em
Chanson en Suspens, Canto do Mar, O Galo, por exemplo, aparecem nos filetes
pontiagudos da Soma, e nos remetem à Prometeu, e à Impossível, em que aparecem de
forma ereta. Os orifícios vazados, marca característica de Maria, se repetem agora de
uma forma simétrica e comportada na Soma de Nossos Dias ...
Apresentando a obra para diversas pessoas, pude ver que cada uma fazia sua
leitura subjetiva, por vezes com sensibilidade poética, por vezes com uma obviedade
extrema: parece uma espinha de peixe, parece um pássaro, parece um totem”. Mas
também sugeriu dois times de futebol num campo. Com onze jogadores de cada lado.
Isso é a Arte – uma mistura de concepções e sentimentos despertados a partir da historia
37
CANTON, tia e M. Tereza Louro, Maria Martins: Mistérios das Formas, o Paulo:
Paulinas/USP/MAC, 1997.
57
de cada um que a contempla. Idéias com formas óbvias ou formas sugeridas, o realizar
concreto de um movimento interno do artista que com sua alma busca se expressar no
mundo externo. A Arte desperta sentimento na pessoa de quem a contempla e faz sua
alma se manifestar de alguma forma, aceitando ou não, gostando ou não, mas
mobilizando de alguma forma o seu espectador.
Registro abaixo, a minha reflexão particular, a partir da obra:
A cada dia uma forma se repete
O dia nasce e morre numa mesma rotina.
Dia e noite,
a forma é igual,
mas estou diferente.
Os círculos se somam,
e cresço,
aparentemente igual,
internamente acrescentada,
acumulada de histórias e experiências.
Mantenho a aparência,
igual e silenciosa.
Um grito parado no ar...
o silêncio o abriga.
Somam-se as formas, os dias também.
O olhar permanece calmo, a alma inquieta.
Dia e noite, luz e treva, vida e morte.
Vários ciclos,
vários círculos.
A soma de nossos dias.
Apenas uma passagem.
Uma chegada,
cheia de partidas..
...a soma,
...o silêncio,
...a forma,
...os dias.
58
4.4. Olhares sobre Maria
Breton encantado pelas formas e poéticas, e da identidade brasileira de Maria
escreve:
(...) O pensamento analógico, oficialmente abandonado
desde o Renascimento, procura retomar seus direitos. É
normal que o impulso nesse sentido lhe venha dos lugares
onde a natureza está em plena exuberância. Neste astro que
sobe, se inscreve entre todos, o nome de Maria.
Maria, e atrás dela - ou melhor nela -, o Brasil maravilhoso
onde, sobre os mais vastos espaços,(...) A porta imensa,
apenas entreaberta sobre as regiões virgens onde as forças
do futuro ainda intactas, todas novas, estão recolhidas. O
Brasil que, nos olhos dourados e na visão própria de Maria,
alcança o sonho de amanhã de todos seus enigmas, da folha
sobre a qual ela coloca a noite da Vitória Régia ao fio das
águas (...)
Assim, a escultura de Maria tem começado a
carregar em seus ombros toda uma lenda e, desnudada
como a própria água pelas lianas do seu país, não era nada
menos que o Amazonas que cantava nas suas obras que tive
a felicídade de tanto admirar, em Nova lorque, em 1943.
Cantava com todas suas vozes imemoriais a paixão do
homem, do nascimento até a morte, tal como souberam
condensá-Ia em mbolos mais envolventes que todos os
outros as tribos indígenas que se sucederam ao longo dessas
margens traiçoeiras. As angústias, as tentações, as febres,
mas também o nascer do sol, as venturas, as puras delícias,
eis o que nos seus bronzes laci, Boiuna, Iemanjá, Maria
como ninguém soube captar na fonte primitiva, de onde ela
emana, asas e flores, sem nada dever à escultura do passado
ou do presente - demasiado segura do ritmo original que faz
cada vez mais falta àquela escultura e pródiga do que lhe
deu a Amazônia: o luxo imediato da vida.
59
Esses mesmos dons deveriam, pouco depois, levá-la
a se debruçar sobre tais reações da alma coletiva que, na
vizinhança das florestas da América tropical, persistem,
para se exprimir, em ativar os poderes propícios ao
sacrifício e à dança. O mesmo ritmo, de fato - pude constatá-
lo no Haiti - leva certas horas os seres humanos a
participarem da força dessas espessas florações. A Possessão
pela alma da natureza é o termo extático desse ímpeto
passional. Estamos nas raízes do Sagrado. Cabe a Maria
se aventurar, com um passo que ela podia ousar, nessa
estrada, participando Por Dentro do cerimonial, fazer
irradiar o sentido eterno comumente velado, ainda bem que
culmina no amor humano. E foi a soberba veia das obras
reunidas em volta de Macumba, hino ao próprio deus do
espasmo, onde a carne, abrindo-se como um botão de flor, se
ramifica de todas as singularidades de estrutura do metal
Nativo.
Mas Cobra Grande, a deusa, à qual estão submissas
todas as divindades do Amazonas, que tem "a crueldade de
um monstro e a doçura de um fruto selvagem", faz
afirmar, através dessas obras, seu domínio, não mais
exclusivamente sobre a floresta, mas ainda sobre o ser
humano que ela fascina e espanta, impondo por lei suprema
ao mundo o fluxo e refluxo do seu ondeamento. Ela é, sem
dúvida, em última análise, o Desejo elevado ao poder pânico
- e é o desejo mestre do mundo - pela primeira vez na arte
conseguindo se liberar - quem prosseguirá infundindo, à
maneira de um veneno, sua virtude única, sublimando -
confundindo, as obras de inspiração estritamente interior
(ao encontro das obras precedentes), tais como o Impossível
e O Caminho, A Sombra, Longos Demais, Estreitos Demais,
apresentadas em julho último na Exposição Internacional
do Surrealismo em Paris.
A preocupação de extremo despojamento, que
revelam ainda mais as esculturas que Maria expõe
atualmente em Nova Iorque, não impede de situá-la nos
antípodas de uma arte que - salvo Brancusi, Arp e
60
Giacometti - não parou há trinta anos de se ressecar de
intelectualismo(...). O importante é que a trajetória de
Maria a tenha levado do macrocosmo ao microcosmo, em
vez de lhe fazer percorrer o caminho no sentido contrário,
semeado somente de armadilhas e de enganos. É, nunca se
repetirá bastante, o universo que deve ser em primeiro lugar
interrogado sobre o homem e não o homem sobre o
universo. O que prenuncia os grandes acordos acrobáticos
de Maria, a proeza desta total flexibilidade no rígido, não é
a "cera perdida", São as Seivas.
ANDRÉ BRETON Paris, 28 de outubro 1947
38
.
Amedée Ozenfant sintetiza, neste texto, a forma singular, de Maria lidar com sua
poética artística considerando sua busca mágica pelo significado de liberdade:
(...) O catálogo da exposição atual de Maria começa por um
longo prefácio, lindamente lírico, do papa do Surrealismo
André Breton, e o prefácio assim começa - "O espírito,
durante estes últimos anos não parou de soprar das terras
quentes". - Porque Maria é Brasileira. Sem dúvida é uma
sorte ter nascido no Brasil quando o destino a designou para
esculpir a alma dos trópicos... lá, a natureza é excessiva e
todas as forças, da terra e das vastas águas, das vidas
vegetais e animais, a eletricidade das tempestades e dos
fluidos telúricos, as nuvens e os ventos... lá, as forças sopram
sem freio. Mais do que em outro lugar, nos Trópicos, a vida
e a morte mostram que elas só ficam bem juntas. Nos nossos
países industrializados, podemos esquecer que a vida vive da
morte, pois os vegetais mortos e os bichos abatidos que
nutrem nossa vida são vendidos em pequenos embrulhos
bem amarrados, com celofane, ou em caixas prateadas e
bem etiquetadas. Mas nas florestas, nos pântanos e nos
38
Apresentação de Breton no catalogo da exposição de Maria na Julien Lévy Gallery em Nova
York,1947
61
imensos rios amazonenses, a luta pela vida mostra-se em
toda a sua realidade bravia (...)
(...) sua atual exposição me parece menos tropical. Ela canta
menos o drama natural exterior que o drama interior do
homem e talvez essencialmente da Mulher. É talvez
essencialmente a liberdade que ela canta: a inacessível e
total liberdade... Maria, um dos espíritos mais livres e
apaixonados pela liberdade que eu conheço, compreende
como ninguém que a liberdade só existe na condição de
conhecer seus limites, ela sabe que a liberdade é
infinitamente condicional sempre ameaçada pelas forças que
nos dominam e também ameaçada pela nossa sede de
liberdade total que leva à anarquia. Na obra intitulada O
Caminho, a sombra, longos demais, estreitos demais, uma
figura dourada progride serena: vejo nela a liberdade ideal,
a liberdade sem correntes, e sem freio, sem obrigações, a
liberdade no papel, a liberdade toda nua que vai em frente,
a liberdade de ser nu na água sem filme sem fundo ou no
céu sem limites, a liberdade abstrata, a liberdade 100%, a
liberdade teórica... mas por traz da calma figura, rastejam
bolas sombrias e ameaçantes , formas lavadas das pesadas
serpentes : obrigações e fatalidades que ameaçam a bela
liberdade toda nua tão bem polida e tão bem dourada .
Seria proibido a uma obra de arte fazer sentir e pensar
profundamente?
39
Mario Pedrosa critica a obra de Maria Martins:
Os volumes na sua escultura, em bronze, metal polido ou
madeira, não têm consistência, articulação ou hierarquia de
planos. Tendem a igualarem-se uns aos outros, tratados
39
Trechos do Catalogo da exposição de Maria no Museu de Arte Moderna de o Paulo, 1950; in
MARIA Martins, São Paulo: [s.n.]1997. 95p. Catálogo. Exposição de 21 de novembro a 21 de
dezembro de 1997, Fundação Maria Luisa e Oscar Americano, São Paulo.
62
como se fossem apenas uma superfície escorrida ou uma
superfície porosa. (...) Em fases posteriores, os volumes
maciços esvaziam-se, abrem-se brechas neles e o espaço
circundante tende a penetrá-los. É quando a escultora
melhor se realiza. Dá-nos, então, uma trama feita de galhos,
de lianas, de troncos em que a sensualidade do material
escolhido, poroso, verdoengo, numa consistência de pau
podre, exprime, com menos derrames sentimentais e mais
plasticamente, seu espírito torturado.
40
Os críticos brasileiros, contemporâneos, Sônia Salzstein e Ivo Mesquita,
reafirmam a importância do trabalho da artista:
As expansões e contrações orgânicas da escultura de Maria
Martins - ela, de fato, a única a ter tido ligação com o
movimento surrealista - apontam para outra área de
interesse do fantástico. Importa, antes de tudo, reconhecer
a obstinação dessa obra marcada pelo excesso, pela
profusão incontrolável de uma figuração discursiva num
contexto - o do Brasil dos anos 50 - que se esforça por
impor uma visualidade regida por princípios abstratos,
racionais e generalizantes, que devem dar conta da
desordem originária da realidade brasileira.
A obra de Maria faz o trabalho inverso: expressa
ingenuamente essa desordem em dois tipos de figuração.
A primeira, apresentando-se como inconsciente mítico da
própria alma brasileira, surgida do esforço tortuoso de
materialização de uma natureza generosa e exuberante,
mas ao mesmo tempo inculta e indomável. É significativo
observar aqui a série de obras que a artista dedicou à
Amazônia. A segunda, irrompendo como o
desrepresamento do inconsciente psicológico, entregue
despudoradamente à transcrição quase retórica de suas
40
PEDROSA. Mário. Maria a escultora. In: BIENAL BRASIL SÉCULO XX. Catálogo. São Paulo:
Fundação Bienal de São Paulo, 1994. p. 145-146.
63
imagens. Em ambas, a crença de poder materializar
imediatamente o inconsciente transbordante, uma natureza
primordial que se vai instalar como viscosidade insondável
num mundo ordenado e controlado. Por essa falta de
comedimento, essa quase deselegância, Mário Pedrosa
apontou a ausência de monumentalidade em sua escultura.
Aspira a algo grande, majestoso, mas se dilacera na
impossibilidade da própria grandeza de seu discurso. Por
isso, vive nesse limiar, sempre a um passo além ou aquém
da escultura: vive nessa dúvida, desejando
incessantemente ostentar uma potência que a ultrapasse até
o infinito.
41
A obra de Maria instiga a uma reflexão aberta, o que permite a cada crítico ter
um parecer/sentir, um perceber bem subjetivo sem que se perca a essência da intenção
da obra de Maria: o toque no cerne humano de forma única.
Michel Tapié
42
, no seu comentário crítico em catálogo de uma das exposições
de Maria, capta a intenção codificada em formas, característica da artista, e cria
reflexões sobre algumas de suas obras:
Olhem e toquem, descubram vocês mesmos as linhas de força criadas pela
vossa confrontação, por elas e por vocês, tentem vossa sorte ENTRE VOCÊS, para o
melhor como para o pior. Acabou a intervenção de Maria o jogo de aventura se passa
entre a Obra e o espectador, contra ele contra todos entrem na dança.
Cobra Grande: A Grande Deusa do Amazonas, a víbora magnífica, o nobre dos
animais.
41
SALZSTEIN, Sônia; MESQUITA, Ivo. Imaginários singulares. In: IMAGINÁRIOS singulares. São
Paulo: Fundação Bienal de São Paulo, 1987. p. 18.
42
Michel Tapié (1909 - 1987) Crítico e artista francês O termo art informel foi adoptado na Europa pelo
crítico francês Michel Tapié, que ficou sendo o criador do termo. A Arte Informal é uma tendência da arte
abstracta que se desenvolveu nos anos 50 na Europa, paralelamente ao Expressionismo Abstracto que
marcou a cultura artística. É uma pintura abstrata gestual. O termo informal (sem forma) pretende
exprimir a tendência para o abandono de qualquer forma previamente conhecida, eliminando-se
gradualmente os objetos da pintura. Os artistas informais acreditavam que era possível a comunicação
estética através de imagens e de linguagens totalmente novas e inventadas sem referência a memórias ou
vivências comuns.
64
Oitavo Véu: Nenhuma explicação, mas uma moralidade: “não se deve tirar o oitavo
véu”.
A Mulher que Perdeu Sua Sombra: “ela se liberou tanto que aperdeu sua sombra, ela
não temais nada: é o grande perigo da liberação, torna-se novamente escravo da
liberdade”.
However: Busca da liberação, espero que ela nunca se libertará, seria triste demais.
Le Couple: Só podemos realmente nos compreender através de um grande sofrimento.
Sûr Doute : A única coisa certa no mundo e que nos faz agir, é a dúvida
Sans Écho (Sem Eco):um grito no deserto.
Le chemin, l’ombre, trop longs, trop étroits: Somos perseguidos por todos os
preconceitos, por tudo que temos desejado e que não fizemos: é o que nos
impede ser verdadeiramente livre.
Saudade: Ela brinca com seus cabelos, para se lembrar com doce amargura das coisas
vividas.
Apuseiro :Matam você sempre o matarão, qualquer coisa que você faça, seja por amor
seja por ódio.
Hasard Hagard: O que tivemos por acaso nunca teríamos conseguido de outra
maneira.
43
43
MARIA Martins, São Paulo: [s.n.]1997.95p.Catálogo. Exposição de 21 de novembro a 21 de dezembro
de 1997, Fundação Maria Luisa e Oscar Americano, São Paulo
65
5. LEVANTAMENTO DAS OBRAS
Após o levantamento das obras tridimensionais de Maria, mais precisamente as
esculturas surrealistas, constato que Maria ainda não tem no Brasil um reconhecimento
de seu trabalho artístico, nem de sua importante participação na história da arte do
Brasil. Um número mínimo de autores cita Maria Martins em seus livros que se referem
à arte brasileira. Esta não era a preocupação da artista, no entanto, e sim, o
reconhecimento público e a exploração máxima da criação de suas figuras imaginárias
formas essas, inéditas e de extrema ousadia formal, que ela soube aproveitar numa
época em que a arte passava por uma transição radical de conceitos estéticos. A
feminilidade da artista flui livremente marcando significativamente seu trabalho.
É comum um artista renomear sua obra de uma exposição para outra,
principalmente quando o tema incita a várias interpretações. Muitas obras são
classificadas como “sem título”, o que acredito, possa se tratar de falha de
documentação. Quem sabe, num futuro próximo proporei um ressone das obras de
Maria juntando novos documentos e entrevistas.
A maioria dos títulos é em francês, uma vez que Maria falava fluentemente a
língua. Todavia, as obras Saudade (três variantes) o tiveram versão do título para
outras línguas por ser esta uma palavra existente na língua portuguesa. Da mesma
forma, mantiveram seu título em português: Yemanjá, Yara, Apuseiro, Uirapuru, Cobra
Grande, Macumba, O Boto e Aiokã.
Segundo entrevista com Joel Coelho, que cuida da Coleção Roberto Marinho,
obtive a informação de que o Dr. Roberto teria adquirido a escultura "Saudade" em
torno de 1994, da ex-mulher de Moreira Salles (proprietário do Unibanco), na partilha
de separação, e teria sido instalada em Angra dos Reis (Rio de Janeiro), na residência do
dr. Roberto. Após o falecimento deste, João Salles, filho do Moreira Salles, e atual
presidente do Unibanco, entrou em contato com os filhos de Roberto Marinho, e fez um
apelo se poderiam fazer permuta da obra, pois ele e seus irmãos tinham um
relacionamento afetivo com a escultura, uma vez que foram criados vendo Saudade e
gostariam de tê-la de volta. Há cerca de quatro anos, após a venda da casa de Angra, a
escultura foi devolvida e se encontra hoje numa fazenda de propriedade dos Moreira
66
Salles, no interior de São Paulo. A escultura fica sobre uma base com engrenagem que a
mantém girando para ser apreciada por todos os ângulos.
Segue, a seguir, uma relação de imagens das obras coletadas. Algumas obtidas
através de catálogos de exposições, e fotos feitas por mim em exposições e acervos de
museus e galerias de arte. A lista dos nomes e datas e dimensões são a partir de uma
ordem cronológica.
5.1. Obras
1. Samba 1
2. Samba 2
3. Nora
4. Salomé pequena, gesso
5. Salomé tamanho natural, gesso
6. Salomé pequena ajoelhada com a cabeça de João Batista, gesso
7. Eva
8. São Francisco (maior)
9. São Francisco (menor)
10. Cristo
11. Salgueiro, painel de gesso
12. Saudade, 1940, bronze, (para o projeto da maior sem as medidas ainda)
13. A Procura Da Luz bronze, 1940 2,10m de altura *
14. Yara, 1941, bronze (primeira versão) - Museu de Arte da Filadélfia
15. However, 1941
16. Simple History, com peixe
17. Yara,1941, bronze (ainda sem as medidas)
18. Les Deux Sacres (Two rites), bronze, 1942 - Museu de Arte de Baltimore (EUA)
19. Macumba, 1942, bronze - Museu de Arte de São Francisco (EUA)
20. Amazônia, bronze 1942 (s/medidas)
21. Yara , bronze 1942 (s/medidas)
22. Boiúna ,bronze 1942 (s/medidas)
23. Cobra Grande, 1942, bronze, (40,5 x 52 x 31 cm)
67
24. Aiokã, bronze 1942 (s/medidas)
25. Boto, bronze 1942 (s/medidas)
26. Iacy, bronze 1942 (s/medidas)
27. Yemanjá, bronze 1942 (s/medidas)
28. Sem Título, (MAM Rio de Janeiro), década de 1940, bronze, (52 x 38 x 28 cm)
29. Sem Título, década de 1940, bronze, (17 x 15 x 7,5 cm)
30. Sem Título (aranha com casa), década de 1940, (52 x 38 x 28 cm)
31. S em Título, década de 1940, bronze (braços abertos), (17 x 15 x 7,5 cm)
32. Não Te Esqueças Nunca Que Eu Venho dos Trópicos, 1942, bronze, (95 x 120 x
70 cm).
33. Sem Eco, 1943, bronze, (64 x 53 x 33 cm).
34. Apuseiro, 1943, bronze, (65 x 25 x 27,5 cm)
35. Le Couple,1943, bronze, (58,5 x 39 x 40,5 cm)
36. However,1944,
37. Saudade, 1944, bronze (51x 38 x 28 cm)
38. Glebe –Ailes (Earthly Wings), 1944, bronze, (117 x 41 x 117 cm)
39. Saudade, (maior), 1944, bronze (2,50 x 3,00 m)
40. However, (braços abaixo c/ cobra envolvendo), 1944, bronze, (130 x 24 x 32,5
cm)
41. O Implacável CRM, 1944, bronze (132 x 234 x 34 cm)
42. Glebe Ailes, CRM, 1944, bronze, (126,5 x 115,5 x 13,5 cm)
43. Impossível (com braços), 1944, bronze, (79 x 80 x 47cm)
44. Impossível, 1945, gesso, (182 x 175 x 90 cm)
45. Chanson en Suspens, (Galo tocando), 1945, (47 x 38,5 x 30 cm)
46. Uirapuru, 1945, (114,5 x 45 x 35 cm)
47. TambaTajá, bronze, (verde 67), 1945, (85,7 x 69,8 x 24,8 cm)
48. Je Crus Avoir Longement Revé Que J’etaits Libre (I Believed That I Long
Dreamed I Was Free), 1946, bronze e bronze polido.
49. The Road The Shadow; too long, too narrow, bronze,1946,(144x180x 60cm)
50. La Femme A Perdu Son Ombre, 1946, bronze, (128cm)
51. Pourquois Toujours, 1946, bronze, (64 x 14 x 10 cm)
52. Aranha, 1946, bronze, (6,5 x 17 x 13 cm)
53. Painel bidmensional em bronze 1946
54. Impossível, bronze, (com toco de braço), verde, 1946, (80 x 82,5 x 53,3 cm)
68
55. Implacável bronze, 1947 (74x117,6x19,5 cm)
56. Hasard Hagard, bronze, 1947
57. O Implacável, MAC USP, 1947, bronze, (74 x 117,6 x 19,5 cm)
58. Sem Título, (Homem Dançando), verde, p.78, 1947, bronze, (32 x 25 x 9 cm)
59. Sur Doute (Certain doubt),1947, (37 x 41 x 5 cm)
60. O guerreiro, Chapa de bronze recortado 1948, (80 cm de altura)
61. Fatalité-Femme, 1948, (49 x 28 x 9 cm)
62. A Sombra, 1948
63. Ritmo, 1948
64. However!!, 1948, bronze polido, (2,10m de altura)
65. Prometheus, (cheio de fiapos), 1948 (104,5 x 57 x 39 cm)
66. Por toi Seul, 1949
67. Prometheus, 1949, bronze (57,5 x 51,5 x 36 cm)
68. Boto Da Amazônia, 1949, argamassa, (975 x 90 x 24 cm).
69. Titulo Desconhecido, 1949, bronze (17 x 15 x 7,5 cm), (Mulher de braços
abertos, p.83)
70. Oitavo Véu, 1949, bronze polido, (104 x 114,5 x 94 cm)
71. Três Avide,1949, bronze polido, (24 x 29 x 22 cm)
72. Brouillard Noir (Black Fog),1949, bronze, (88,3 x 76 x 36,8 cm)
73. Sem Título CRM, 1949, chumbo e sermolite, (91 x 78 x 52 cm)
74. A Tue Tête, 1950, bronze, (78 x 31 x 33 cm)
75. Sem titulo, 1950, bronze, (54 x 27,3 x 21,6 cm), p.88
76. Simple History, 1951, bronze, (142 x 65 x 45 cm)
77. Sombras, 1952, gesso, (166 x 120 x 50 cm)
78. O Canto do Mar, bronze, 1952, (68 x 72,9 x 18 cm)
79. Orpheus, 1953, bronze, (101 x 60 x 80 cm)
80. Calendário da Eternidade, bronze, 1953, (42,2x44,6x12,9cm)
44
81. A Soma dos Nossos dias, sermolite estanho1954/55 (330,9x190,7x64,9cm)
82. O Galo, 1955, bronze, (84,5 x 63 x 19cm)
44
A obra que pertence ao acervo do MAC sem titulo até a presente pesquisa, aparece com título:
Calendrier de L’ Eternité (1953).citada com foto no catálogo da exposição Arts Primitifs e Modernes
Bresilienes publicado pelo Musée d’Ethnographie de Neuchâtel,Suiça já foi catalogada por Cristina
Cabral do Museu Arte Contemporânea da Universidade São Paulo USP .
69
83. O Rito do Ritmo, 1960, bronze, (7m de altura)
84. O Canto da Noite, 1968, bronze polido, (sem medidas)
85. Impossível, sem data, bronze, (182 x 175 x 90 cm) copia da Impossível em gesso
de 1945 feita após a morte de Maria
Jóias em Ouro, 1944 peças únicas.
86. Une Autre Étoile
87. .Ma Chanson
88. Yemanjá
Gravuras, 1946 (Tiragem de 60 imagens de cada uma)
89. Impossível 17,5x14cm
90. Comme une Liane s/ medidas
91. Place à L’Implacable 12,5x21,5 cm
92. .Iacy s/ medidas
5.2. Obras Sem Imagens
Citadas em catálogos e textos que podem ser a princípio, uma mesma obra com
títulos diferentes, ou obras desaparecidas:
1. Awakening, 1941, uma pequena figura de nu feminino, em terracota
2. Bendita Sejas tu, terra profunda, bronze, 1950
3. Cheia de Graça, 1953, gesso
4. Fatalidade, bronze polido, (0,58 cm de altura)
5. Canto perdido, bronze polido, (0,78cm altura)
6. Yemanjá, 1953, estanho (a que tenho referência é em bronze)
70
5.3. Fotos das Esculturas In Loco
2004 - São Paulo SP - O Preço da Sedução: do espartilho ao silicone, no Itaú Cultural.
1. Impossível, 1990, bronze, (182 x 175 x 90 cm) copia da Impossível em gesso de
1945
2005 - Feira de Antiguidades e Arte no Clube A Hebraica em São Paulo
Stand da Galeria Jean Boghici Rio De Janeiro
2. Prometheus, bronze, 1948 (104,5 x 57 x 39 cm)
Feira de Galerias e Artes Bienal São Paulo
3. O Boto da Amazônia, 1949, argamassa, (975 x 90 x 24 cm).
Prêmios Bienais no Acervo MAC USP. São Paulo. 2005
Acervo Museu de Arte Contemporânea da USP (MAC USP):
4. A Soma dos Nossos dias, sermolite estanho1954/55 (330,9x190,7x64,9cm)
5. Implacável bronze ,1947 (74x117,6x19,5 cm)
6. Calendário da Eternidade ,bronze,1953,(42,2x44,6x12,9cm)
O Século de um Brasileiro: Coleção Roberto Marinho, no MAM/SP. 2005.
7. Implacável (versão maior) 1944, bronze (132 x 234 x 34 cm)
8. Glebe Ailes, CRM, 1944, bronze, (126,5 x 115,5 x 13,5 cm)
9. Sem Título CRM,1949, chumbo e sermolite, (91 x 78 x 52 cm)
Acervo Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro (em 2006):
10. Sem Título, (MAM Rio de Janeiro), 1940, bronze, (52 x 38 x 28 cm)
Acervo Galeria Jean Boghici (Rio de Janeiro- 2006):
11. Oitavo Véu, 1949, bronze polido, (104 x 114,5 x 94 cm)
12. Cobra Grande, 1942, bronze, (40,5 x 52 x 31 cm)
71
O Corpo na Arte Contemporânea Brasileira, no Itaú Cultural l2005:
13. Impossível (com braços), 1944, bronze, (79 x 80 x 47cm) *
Jardim da Pinacoteca de São Paulo
14. 1.A procura da luz, 1940, bronze 2,20 m de altura
Fotos na casa de Nora, filha de Maria Martins em São Paulo
15. Painel bidimensional em bronze 1946
16. O guerreiro, Chapa de bronze recortado 1948, (80 cm de altura)
17. However!!, 1948, bronze polido, (2,10m de altura)
18. .Miniatura dão monumento O Rito do ritmo 15cm de altura (lembrança vendida
como souvenir de Brasília DF)
Dados para serem checados:
No catálogo da II Bienal Internacional de São Paulo, em 1953; obras de Maria
Martins citadas na relação, mas sem fotos:
1. Bendita Sejas tu, terra profunda, bronze, 1950, (desconheço até a presente data)
2. Cheia de Graça, 1953, gesso, (desconheço até a presente data)
3.Yemanjá, 1953, estanho (a que tenho referência é em bronze)
No catálogo de Arte Moderna do Brasil em 1957, na Argentina, sem imagem:
1. Canto del Mar, bronze polido, (0,65 x 0,60 cm)
2. Fatalidad, bronze polido, (0,58 cm de altura)
3. Canto Perdido, bronze polido, (0,78 cm altura)
Observação: O Banco It tem uma reprodução em bronze da escultura de uma das
versões da Impossível que fica nos jardins do complexo de seus prédios em São Paulo
que foi feita após da morte de Maria.
72
5.4. Exposições
5.4.1. Exposições Individuais
1941 - Washington (Estados Unidos) - Individual, na Corcoram Art Gallery
1942 - Nova York (Estados Unidos) - Individual, na Valentine Gallery
1943 - Nova York (Estados Unidos) - Individual, na Valentine Gallery
1944 - Nova York (Estados Unidos) - Individual, na Valentine Gallery
1946 - Nova York (Estados Unidos) - Individual, na Valentine Gallery
1947 - Nova York (Estados Unidos) - Individual, na Julien Lery Gallery
1947 - Nova York (Estados Unidos) - Maria: recent sculptures, na Julien Lery Gallery
1949 - Paris (França) - Individual, na Galerie René Drouin
1950 - Rio de Janeiro RJ - Individual, na ABI/RJ
1950 - São Paulo SP - Individual, no MAM/SP
1956 - Rio de Janeiro RJ - Maria, no MAM/RJExposições Coletivas
1940 - Filadélfia (Estados Unidos) - Coletiva, na International Philadelphia
1941 - Nova York (Estados Unidos) - 3ª Latin America Exhibition of Fine Arts
1942 - Nova York (Estados Unidos) - Hommage Fait à Rodin, na Buchhlz Gallery
1942 - Nova York (Estados Unidos) - Maria Martins, na Valentine Gallery
1943 - Nova York (Estados Unidos) - Maria Martins, na Valentine Gallery
1944 - Ohio (Estados Unidos) - Religious Art of Today, na Dayton Ohio
1946 - Saint Louis (Estados Unidos) - Origins of Modern Sculpture, na City Art of St.
Louis
73
1947 - Paris (França) - Exposition International e Surréaliste, na Galerie Maeght
1949 - Paris (França) - De Rodin à Nos Jours, na Maison de la Culture Française
1949 - Salzburgo (Áustria) - A Música e as Artes Plásticas
1951 - São Paulo SP - 1ª Bienal Internacional de São Paulo, no Pavilhão do Trianon -
artista convidada
1953 - São Paulo SP - 2ª Bienal Internacional de São Paulo, no MAM/SP - 2º prêmio
escultura
1954 - São Paulo SP - Arte Contemporânea: exposição do acervo do Museu de Arte
Moderna de São Paulo, no MAM/SP
1955 - São Paulo SP - 3ª Bienal Internacional de São Paulo, no MAM/SP - prêmio
melhor escultor nacional
1959 - Leverkusen (Alemanha) - Primeira Exposição Coletiva de Artistas Brasileiros na
Europa
1959 - Munique (Alemanha) - Primeira Exposição Coletiva de Artistas Brasileiros na
Europa, no Kunsthaus
1959 - Viena (Áustria) - Primeira Exposição Coletiva de Artistas Brasileiros na Europa
1960 - Hamburgo (Alemanha) - Primeira Exposição Coletiva de Artistas Brasileiros na
Europa
1960 - Lisboa (Portugal) - Primeira Exposição Coletiva de Artistas Brasileiros na
Europa
1960 - Madri (Espanha) - Primeira Exposição Coletiva de Artistas Brasileiros na Europa
1960 - Paris (França) - Primeira Exposição Coletiva de Artistas Brasileiros na Europa
1960 - Utrecht (Holanda) - Primeira Exposição Coletiva de Artistas Brasileiros na
Europa
74
5.4.2. Exposições Póstumas
1973 - São Paulo SP - 12ª Bienal Internacional de São Paulo, na Fundação Bienal
1978 - Rio de Janeiro RJ - Escultura Brasileira no Espaço Urbano: 50 anos
1979 - São Paulo SP - 15ª Bienal Internacional de São Paulo, na Fundação Bienal
1982 - São Paulo SP - Um Século de Escultura no Brasil, no Masp
1984 - Petrópolis RJ - Individual, no Palácio de Cristal
1984 - São Paulo SP - Tradição e Ruptura: síntese de arte e cultura brasileiras, na
Fundação Bienal
1985 - Belo Horizonte MG - Rio: vertente construtiva, no MAP
1985 - Rio de Janeiro RJ - Rio: vertente surrealista, na Galeria de Arte Banerj
1985 - São Paulo SP - A Arte do Imaginário, na Galeria Encontro das Artes
1985 - São Paulo SP - Rio: vertente construtiva, no MAC/USP
1987 - São Paulo SP - 19ª Bienal Internacional de São Paulo - Sala Imaginários
Singulares, na Fundação Bienal
1987 - São Paulo SP - As Bienais no Acervo do MAC: 1951 a 1985, no MAC/USP
1987- Paris (França) - Modernidade: arte brasileira do século XX, no Musée d'Art
Moderne de la Ville de Paris
1988 - Nova York (Estados Unidos) - The Latin American Spirit: art and artists in the
United States: 1920-1970, no The Bronx Museum of the Arts
1988 - São Paulo SP - MAC 25 anos: destaques da coleção inicial, no MAC/USP
1988 - São Paulo SP - Modernidade: arte brasileira do século XX, no MAM/SP
1989 - El Paso (Estados Unidos) - The Latin American Spirit: art and artists in the
United States: 1920-1970, no El Paso Museum of Art
75
1989 - San Diego (Estados Unidos) - The Latin American Spirit: art and artists in the
United States: 1920-1970, no San Diego Museum of Art
1989 - San Juan (Porto Rico) - The Latin American Spirit: art and artists in the United
States: 1920-1970, no Instituto de Cultura Puertorriqueña
1990 - Miami (Estados Unidos) - The Latin American Spirit: art and artists in the
United States: 1920-1970, no Center for the Fine Arts Miami Art Museum of Date
1992 - Poços de Caldas MG - Arte Moderna Brasileira: acervo do Museu de Arte
Contemporânea da Universidade de São Paulo, na Casa da Cultura de Poços de Caldas
1992 - São Paulo SP - A Sedução dos Volumes: os tridimensionais do MAC, no
MAC/USP
1992 - Zurique (Suíça) - Brasilien: entdeckung und selbstentdeckung, no Kunsthaus
1993 - Rio de Janeiro RJ - Brasil 100 Anos de Arte Moderna, no MNBA
1994 - São Paulo SP - Arte Moderna Brasileira: uma seleção da Coleção Roberto
Marinho, no Masp
1994 - São Paulo SP - Bienal Brasil Século XX, na Fundação Bienal
1996 - São Paulo SP - Arte Brasileira: 50 anos de história no acervo MAC/USP: 1920-
1970, no MAC/USP
1996 - São Paulo SP - Mulheres Artistas no Acervo do MAC, no MAC/USP
1997 - Florianópolis SC - 5º Salão Nacional Victor Meirelles, no Masc
1997 - Rio de Janeiro RJ - Maria Martins: retrospectiva, na Galeria Jean Boghici
1997 - São Paulo SP - Escultura Brasileira: perfil de uma identidade, no Espaço Cultural
Safra
1997 - São Paulo SP - Maria Martins, na Fundação Maria Luisa e Oscar Americano
1997 - São Paulo SP - O Mistério das Formas, no MAC/USP
1997 - São Paulo SP - Tridimensionalidade na Arte Brasileira do Século XX, no Itaú
Cultural
76
1997 - Washington D. C. (Estados Unidos) - Escultura Brasileira: perfil de uma
identidade, no Centro Cultural do BID
1998 - Nova York (Estados Unidos) - The Surrealist Sculpture of Maria Martins, na
André Emmerich Gallery
1998 - Rio de Janeiro RJ - A Coleção Constantini no Museu de Arte Moderna do Rio de
Janeiro, no MAM/RJ
1998 - São Paulo SP - 24ª Bienal Internacional de São Paulo, na Fundação Bienal
1998 - São Paulo SP - A Coleção Constantini no Museu de Arte Moderna de São Paulo,
no MAM/SP
1999 - Lima (Peru) - Mostra Brasil 500 Anos, no Museu Pedro de Osma
1999 - Rio de Janeiro RJ - Maria Martins: Les sculptures surréalistes des annés 40, na
Galeria Jean Boghici
2000 - Brasília DF - Exposição Brasil Europa: encontros no século XX, no Conjunto
Cultural da Caixa
2000 - Lisboa (Portugal) - Século 20: arte do Brasil, no Centro de Arte Moderna José de
Azeredo Perdigão
2000 - São Paulo SP - Brasil + 500 Mostra do Redescobrimento. Arte Moderna, na
Fundação Bienal
2000 - São Paulo SP - Escultura Brasileira: da pinacoteca ao Jardim da Luz, na
Pinacoteca do Estado
2001 - Nova York (Estados Unidos) - Brazil: body and soul, no Guggenheim Museum
2001 - Nova York (Estados Unidos) - Brazil: body and soul, no Solomon R.
Guggenheim Museum
2001 - Rio de Janeiro RJ - Surrealismo, no CCBB
2002 - Rio de Janeiro RJ - Arte Brasileira na Coleção Fadel: da inquietação do moderno
à autonomia da linguagem, no CCBB
77
2002 - São Paulo SP - Arte Brasileira na Coleção Fadel: da inquietação do moderno à
autonomia da linguagem, no CCBB
2003 - Brasília DF - Arte Brasileira na Coleção Fadel: da inquietação do moderno à
autonomia da linguagem, no CCBB
2004 - Rio de Janeiro RJ - O Século de um Brasileiro: Coleção Roberto Marinho, no
Paço Imperial
2004- Prêmios Bienais no Acervo MAC USP. São Paulo:, 2004.
2004 - São Paulo SP - O Preço da Sedução: do espartilho ao silicone, no Itaú Cultural
2005 - São Paulo SP - O Corpo na Arte Contemporânea Brasileira, no Itaú Cultural
2005 - São Paulo SP - O Século de um Brasileiro: Coleção Roberto Marinho, no
MAM/SP
78
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Para um primeiro estudo sobre a obra de uma artista ainda pouco conhecida,
acredito ter obtido importantes informações iniciais. Muitos dados e fontes
contraditórias prejudicaram uma pesquisa mais precisa e minuciosa para a qual me
sinto motivada e pretendo empreender num segundo momento de meu trabalho sobre a
artista.
Apesar do limitado conhecimento de Maria Martins no Brasil, suas obras hoje
são aquisições de destaque em grandes museus: a figura de Cristo foi comprada por
Nelson Rockefeller que, posteriormente, a doou ao Metropolitan Museum of Art; Yara
foi adquirida pelo Museu de Arte da Filadélfia e, o Museu do Brooklyn adquiriu
Awakening, uma pequena figura de nu feminino em terracota. Ter suas obras
pertencentes a locais públicos de passagem obrigatória para pessoas que circulam nos
meios da arte, enaltece o nome de Maria Martins, cujo reconhecimento deve-se, em
grande parte a isso. ainda muito a ser explorado e divulgado sobre o todo de sua
obra, quer no conteúdo de suas esculturas, títulos, textos, gravuras e jóias.
À medida que fui conhecendo as imagens de suas obras fui observando o fio
condutor que unia seus trabalhos de forma sutilmente concebida, culminando na obra A
Soma De Nossos Dias que agrega, como em um totem, a síntese de sua gênese e
percurso artísticos. No início, por volta de 1938/40, suas esculturas eram mais
figurativas como Cristo, as versões de São Francisco, e as versões de Salomé. Nesta
fase, Maria se utilizava de uma poética reflexiva em suas obras. Por vezes, esculpia
inscrições na base de suas esculturas, com frases que instigavam a uma reflexão ou
mensagem , como na obra Cristo, em que se lê em latim: “Vae Vobis, Scribae et
Pharisaei, Hypocritae!” - Ai de vós, infelizes escribas e fariseus hipócritas! Uma de suas
figuras, Samba (40 cm) de 1939/40, em jacarandá com superfície lisa, representa uma
figura feminina com seios a mostra, com um pano amarrado à cintura que cobre as
pernas e as nádegas deixando expostas a parte da frente da perna e a barriga, e traz na
base de madeira, a inscrição: “Tem cheiro de mato” reforçando a sensualidade, como
nas obras Salomé.
79
Na série Amazônia, marco da sua entrada no Surrealismo, além da criação de
figuras das lendas dos personagens da selva amazônica, existe uma compulsão pelo
excesso de linhas e filetes, configurando um emaranhado de fauna e flora. Vegetação e
seres imaginários se fundem e não se consegue perceber o começo nem o fim, apenas
um movimento inquieto e borbulhante de signos e formas inusitadas. Nesta série, Maria
redige um texto poético para apresentar cada uma de suas 8 obras dessa exposição.
À medida que a artista satura esse “borbulhar” de linhas e texturas, parte para
uma limpeza formal, unificando e sintetizando o feitio de suas obras concebidas. Muitas
vezes, mescla o acabamento de bronze com bronze polido, numa mesma obra, como em
The Road The Shadow; Too Long, Too Narrow, de 1946, onde o contraste de
acabamento realça o conteúdo reflexivo do tema sugerido.
Seu diálogo com as obras de Duchamp fica cada vez mais claro à medida que
se conhece sua obra. E, compreende-se que sua intensa identificação com ele foi muito
além de um relacionamento amoroso apenas. À semelhança dele, Maria buscou
expressar-se de forma livre e sem censura, num automatismo psíquico, que foi a tônica
do movimento surrealista. Seu trabalho transmite uma alma alma essa, primitiva, de
um ser inquietante e questionador, sem medo de assumir plenamente esse Ser. Um
“automatismo psíquico” da sensualidade e erotismo. Seu trabalho transmite uma alma
aberta, como de um ser inquietante e questionador, de forma instintual, mostrando bem
a transformação ou sublimação de boa parte de seus impulsos instintivos em obras de
arte. Se expressa também, através das palavras, com maestria:
“(...)As mais remotas épocas nos legaram, pintadas,
esculpidas ou gravadas, imagens que nos transmitem, até
hoje, a magia de suas religiões, de seus mito, de suas lendas,
de seus ódios e se seus amores. Aqueles homens incipientes,
em contínua luta com a natureza, cercados de perigos
sempre novos, sedentos de beleza, semearam nas cavernas
escuras, onde viviam, as primeiras obras de arte.
(...) E desde essas eras, que se perdem nas noites dos tempos,
a verdadeira obra de arte guarda em si muito mais que a
imagem representa, guarda a magia de uma dupla vida a
que lhe deu o artista, na grande aventura da criação e a que
cada qual lhe empresta, quando da emoção de contemplá-la.
80
Nas grutas de Altamira e de Lascaux as pinturas e gravuras
existentes despertam em quem as contempla, emoções nunca
esquecidas, e os séculos que passaram e passarão. Existe
Arte e nada mais. Ao artista, ao criador, só importa
percorrer o caminho em profundidade que o levará a um
“estado de graça” até o momento primordial da criação.
Guarda sempre, o pudor, a reserva de seu segredo, que
transparece apenas na mensagem oferecida, sem nenhuma
exploração do mistério que o tortura e sem quebrar o
silencio, regra de toda iniciação. assim sua obra irá
exercer seu poder de emoção na solidão íntima de cada um,
despertando sensibilidades adormecidas e descobrindo
facetas de sua personalidade até então desconhecidas”. M
Martins
45
A primeira obra que conheci de Maria, foi A Soma De Nossos Dias, e posso
dizer que fiquei perplexa diante de obra tão enigmática, com sua forma inusitada que
remete aos totens primitivos. Certa magia ficou no ar e um enigma também. Inspiração
ou identificação, não sei, sei que antes e depois de conhecer a obra de Maria, se
coloca uma vontade imensa de ir além do que já está pronto, visto e aceito. O Belo é
Belo quando o que se vê pode ser sentido, e não apenas visto. A Beleza é sugerida como
forma de comunicação e não como forma estética para ser aceita. Mostrar a alma sem
censura é se despir sem pudor aos olhos do outro, esperando a rejeição ou aprovação,
arriscando sempre arriscando com ousadia e dignidade consigo mesmo, porém
respeitando-se o universo interior como a mais preciosa das pedras. Maria Martins
soube se colocar sem medo de não ser compreendida; ela entendia e isso lhe bastava.
A partir desta pesquisa, concluo, ao meu olhar, que A Soma De Nossos Dias é
um totem da história pessoal de Maria, bem como uma fusão da maioria de seus
trabalhos. Os filetes, os buracos vazados, as linhas sinuosas, um código a ser decifrado.
Essa obra datada de 1954/55 traz consigo a síntese e uma poética sutil e clamadora. Não
se pode dizer que ela se resume apenas ao que é captado visualmente, mas que ela incita
a uma profunda reflexão, metafórica, de um sentimento profundo de uma vida somada
45
MARIA Martins, São Paulo: [s.n.] 1997. 95p. Catálogo. Exposição de 21 de novembro a 21 de
dezembro de 1997, Fundação Maria Luisa e Oscar Americano, São Paulo.
81
de tantos mesmos fatos, contidos num silêncio repetido como o nascer e o pôr-do-sol,
que sem ruídos passam pelos nossos dias. O círculo do sol e seus raios em pontas se
expandindo aos olhos de cada pessoa, todos os dias num silêncio de um ritual que
sinaliza a Vida.
Esta pesquisa atingiu o seu objetivo inicial de buscar o maior número possível
de obras com imagens, da artista, contribuindo para a valorização e reconhecimento de
tão notável artista brasileira, incluindo-a com mais destaque no elenco dos artistas
plásticos do Brasil.
Um segundo aspecto a ser enfatizado, dentro da sua história, refere-se à
importância de sua atuação na arte do Brasil, sendo que se não fosse o seu
relacionamento com os artistas europeus o teria havido a Bienal Internacional, nem a
participação de Picasso com sua Guernica em 1953, na Bienal Internacional de São
Paulo.
Maria fez releituras de suas obras como a Yara, O Boto e Salomé sendo que
esta é representada numa versão surrealismo com Oitavo Véu.
Minha obra artística, por sua vez, tem muito a ver com a obra de Maria, ou a
ver com a mesma fonte em que todos os artistas se inspiram, ou seja, nada mais do que
o contato interno mais profundo com a nossa essência. Sinto uma afinidade muito
marcante do meu trabalho com o dela, e vejo que a partir do erotismo sutil que Maria
sugeria nas suas obras, pude conceber a minha série Mulheres Fálicas e as Vênus
Contemporâneas. Ao analisar e observar o fio condutor das obras de Maria pude ter
facilitada a compreensão do meu próprio estilo e perceber melhor a síntese do meu
trabalho.
Após esse trabalho de reconhecimento da artista Maria Martins, pude situar
minha obra, que caminha em semelhante percurso, e ao traçar um paralelo entre
algumas formas que se identificam em suas obras e nas minhas. O lado sensual e
feminino de Maria despertou a minha série das Vênus Contemporâneas ou Mulheres
Fálicas, onde o feminino e masculino se insinuam, se entrelaçam e não se pertencem:
apenas sugerem algo que o acontece, mas está explícito nas formas. Os cabelos
esvoaçantes das minhas Vênus Contemporâneas remetem às obras de Maria: Impossível
82
e Prometeu; os vazados remetem às obras: Apuseiro; Canto do Mar Canto da Noite, e A
Soma Dos Nossos Dias, para citar alguns exemplos.
Maria Martins, pela audácia e coragem em ser uma artista plástica na escultura
modalidade, que na época era opção masculina demonstrou atender exatamente o
que sentia, e não ao que seria adequado à uma mulher artista, seguindo um “...ismo”
qualquer da moda. Ela se coloca com sua alma transformada em arte.
Para finalizar, uma inspiração que representa para mim, Maria:
Não precisa aplaudi-la.
Ela já saiu do palco
Não tente esquecer
ela já mora dentro de você
Não tente escapar ela já lhe prendeu
Não a procure,
Ela quem vai lhe achar
Você pertence a ela,
sem ela lhe pertencer.
M.Silvia “Martins
83
7. FOTOS DAS OBRAS
84
OBRAS Figurativas 1939\40
Noite no Salgueiro, Painel em gesso
Cristo Samba São Francisco
85
SÉRIE AMAZÔNIA – bronze, 1942
86
87
Cobra Grande, 1942, bronze, (40,5 x 52 x 31 cm)
Galeria Jean Boghici – RJ
88
SALOMÉS (quatro versões de 1939\40)
1939\40, bronze, 97 cm de altura 1940, gesso, 40 cm de altura
1939|40 gesso, 1,80m de altura 1939\40, gesso, 26 cm de altura
89
Oitavo Véu, 1949, bronze polido, (104 x 114,5 x 94 cm)
Galeria Jean Boghici - RJ
90
Impossível
1944, bronze, (79 x 80 x 47cm)
Impossível
1945, gesso, (182 x 175 x 90 cm)
91
Calendário da Eternidade
bronze, 1953, (42,2x44,6x12,9) Acervo MAC/USP
A obra que pertence ao acervo do MAC sem titulo até a presente pesquisa,
aparece com título: Calendrier de L’ Eternité (1953). Citada com foto no catálogo da
exposição Arts Primitifs e Modernes Bresilienes publicado pelo Musée d’Ethnographie
de Neuchâtel,Suiça já foi catalogada por Cristina Cabral do Museu Arte Contemporânea
da Universidade São Paulo USP.
92
Gravuras (1946)
Place à L’Implacable - 12,5x21,5 cm
Impossível - 17,5x14cm
Comme une Liane , s/ medidas
93
O Rito do Ritmo, 1960,
Bronze, (7m de altura) Brasilia
94
O Rito do Ritmo
1960 bronze, 7 m de altura
Maria Martins e amigos
Miniatura da O rito do Ritmo
95
BOTO (duas versões)
Boto, bronze 1942 (s/medidas)
Boto Da Amazônia, 1949, argamassa, (975 x 90 x 24 cm).
Feira de Galerias e Artes Bienal São Paulo 2005
96
YARA (duas versões)
Yara 1941, bronze 2,10m altura Yara, bronze 1942 (s/medidas)
97
Sombras
1948 gesso (sem medidas)
Maria (de chapéu) ao lado de sua obra, em 1950.
98
A Soma dos Nossos dias
Sermolite estanho1954/55 (330,9x190, 7x64, 9 cm) MAC/USP
99
Sem Titulo 1945, bronze 52x38x28cm MAM RJ
100
The Road the Shadow; too long, too narrow
bronze, 1946, (144x180x 60cm)
Itamaraty
O Canto da Noite
1968, bronze polido, (sem medidas) Palácio Itamaraty
101
O Canto do Mar
bronze, 1952, (68 x 72,9 x 18 cm)
Painel bidmensional
bronze 1946 (90 x 180 cm)
102
AFINIDADES
Marcel Duchamp Maria Martins
O Secador de Garrafas A Soma de Nossos Dias
Sil Farina
A Soma dos Meus Dias
103
8. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Verbo/EDUSP, 1973.
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São Paulo: Companhia das Letras, 1992.
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Naify, 2000. (Movimentos da arte moderna).
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1998. 570 p. il. color. p.288-294
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Internet:
Os seguintes sites foram visitados no período de Janeiro de 2004 à Janeiro de 2008.
http:// www.bbc.co.uk/works/s3/duchamp/nora/shtml
http:// www.mac.usp.br
http:// www.itaucultural.org.br
Filme:
The Secret of Marcel Duchamp. Direção Chris Granlund, BBC Televisionn Post
Production Resources, Londres, 1997.
Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download:
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