
Casa, doce lar: o habitar doméstico percebido e vivenciado
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Porque, antes, morava uma amiga minha nesse apartamento, e quando eu vinha de Tatuí pra cá,
pra trabalhar na escola, eu já ficava ali, eu já dormia com ela de quarta pra quinta. Mas, já na
época da minha amiga, que eu cheguei no ap, eu olhei e eu gostei. Era uma sala grande,
retangular, o quartão, cozinha legal, tal. E aí – ela era americana –, o pai dela faleceu e ela voltou.
E, já naquele impasse de eu vir pra cá, eu acabei ficando ali. Então, é super‐bacana porque, na
verdade, eu achei que ele veio pra mim!
E agora, a minha casa, ela é assim: a minha mãe é costureira, então, muitas coisas que tem em
casa,
é
ela que fez. Então, assim: eu moro longe dos meus pais fazem cinco anos, vai fazer seis.
Então, eu gosto dessa coisa que a minha mãe tem, de fazer as coisas pra mim, porque, pra mim,
eles tão ali. Então, assim, tem o violão – o violão é o meu pai, porque o meu pai toca. E, mesmo
essa coisa da organização, que eu falei que eu sou bem noiada com limpeza: eu gosto de tudo
organizado e tudo limpo, mas também não gosto daquela casa que parece casa de boneca, que
não mora gente. Então, eu acho que a movimentação das coisas é importante, a troca de lugar.
Ou mesmo, se eu li um livro, deixar esse livro lá, porque ele tá tendo um dinamismo ali.
E as coisas de casa... é assim: os meus móveis é tudo cada um de uma cor, cada um de uma coisa
–porque desde que eu saí de casa, eu saí pras
vizinhança lá, da minha mãe: “olha, quem tem
fogão pra dar, quem tem mesa pra dar, me dá aí, porque eu vou morar fora e não tamo com
grana pra comprar nada, agora”. Então, a primeira mesa que eu tive era mesa bem antiga, mas
bem fortona, assim; que a mesa já veio de um bazar, que já tinha sido de não sei quem. Beleza, a
mesa. As cadeiras, meu pai sempre mexeu, também, um pouco com madeira, então era assim,
uma cadeira era uma mais alta, outra era mais baixa, em tons diferentes. E eu penso muito nisso,
assim, cada coisa que eu adquiro, às vezes, eu penso de benzer. Porque já veio de uma outra
história e vai começar uma nova história. Eles tiveram em outras casas, com outras vivências.
Mesmo essa cama que eu comprei agora
c
– pô, ela é de 1940! Quanta coisa não rolou, quanta
gente, de repente, já chorou em cima dela, já sorriu, né, fez milhões de filhos, teve uma noite boa
ou ruim de sono... de repente é válido benzer... ou passar um bom pano com lutra‐móvel [risos],
jogar umas pétalas de rosa... Porque eu acredito mesmo nisso, que cada coisa tem seu histórico;
como a minha casa – ela é composta por coisas que foram de outras pessoas, elas tão vibrando
ali, também.
O sofá – o sofá, eu arrumei um sofá há uns dois anos, que era de um amigo meu. O pai dele fez
esse sofá – que eles moravam na Inglaterra –, então, é um sofá com a estrutura de madeira, mais
ou menos num tom claro assim, e as almofadas, eram seis almofadas que, simplesmente, jogava
os assentos e jogava o encosto. Aí, ele era todo molenga, as almofadas tavam lá, era aquele
tecido até hoje, depois de vinte anos, e tal, o sofá já era de uma república... aí eu falei “meu Deus,
c
Analu contou‐me, antes da entrevista, que havia comprado uma cama em um antiquário.