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senhor, para tantos mortais que vivem na floresta; se os livrardes do abismo profundo, vireis a
ser monarca de outro mundo.
(6) Príncipe do Brasil, futuro dono que governa a Pátria-mãe, ponde,
excelso Senhor, aos pés do trono as desgraças do povo miserável. A recompensa para tanta
esperança é o vosso título e nome que, ao ser invocado, se chamará dom José, salvador de um
mundo novo, como o Egito chamou ao outro [José do Egito]. Nem podereis temer que não
haja heróis no povo luso que desejem dedicar-se ao santo intento e apresento-vos o antigo
Portugal renascido no Brasil, como novo. Vereis do domador da região indiana alta renovação
nas guerras do Brasil e que os seguem [aos heróis] nas bélicas idéias os Vieiras, os Barretos e
os Correias
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. Portanto, senhor dom José, dai-me potente ímpeto para que eu possa entoar
sonoro verso sobre o invicto pulso da gente brasileira que aumenta o império do vosso reino.
E enquanto eu canto em nova lira e novo plectro o povo convulso
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do Brasil, fazei que vosso
Trono fidelíssimo se veja em propagar a Igreja [católica].
(9) O vasto espaço da nova Lusitânia Diogo ia povoar, a quem bisonho
chama o Brasil, temendo o forte braço horrível do trovão medonho. Essa Fúria saiu do abismo
a cortar-lhe o passo, como suponho, da qual o Paganismo, aluno do Inferno, fez Netuno
dando-lhe o império das águas
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. Este cravou seu grande Tridente, com o qual agita o mar, na
horrível montanha dos Órgãos
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, e na escura caverna onde Jove (outro espírito) espalha a luz
tremenda, faz mil relâmpagos e chove coriscos. Bate-se o vento em horrível contenda, arde o
céu, zune o ar, treme a montanha e o mar se ergue em frente igual a outra montanha. O Filho
do Trovão seguia em um navio, passando por tormentas, ruinoso; vê que na travessia o alto
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O autor remete a João Fernandes Vieira e ao general Francisco Barretos de Meneses, que se distinguiram na
expulsão dos holandeses de Pernambuco, em 1654; e Manuel Alves Correia que tomou parte na defesa da
Colônia do Sacramento contra os sitiantes espanhóis, segundo Hernâni Cidade (1961)
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Referência bíblica às profecias de Isaías: convulso, conforme esclarece o próprio Durão no manuscrito, é o
epíteto que ele dá aos povos pecadores (primeiro capítulo do livro de Isaías), no caso, os americanos.
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Diz a mitologia: foi o Paganismo, doutrinado pelo Inferno, que atribuiu o império dos mares a Netuno; seu
símbolo era um grande tridente com o qual agitava as águas. A ele se alude na estrofe seguinte. A Júpiter ou Jove
foi concedido o domínio dos ares, onde ele troveja.
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O autor esclarece no manuscrito que esta montanha é um ramo da célebre cordilheira que percorre o Brasil,
saindo de suas cavernas névoas tempestuosas.