Download PDF
ads:
Infraestrutura verde:
uma estratégia de conexão entre pessoas e lugares
Por um planejamento urbano ecológico para Goiânia
FAUUSP
2010
Maria Eliana Jubé Ribeiro
ads:
Livros Grátis
http://www.livrosgratis.com.br
Milhares de livros grátis para download.
Maria Eliana Jubé Ribeiro
Infraestrutura verde: uma estratégia de conexão entre pessoas e lugares
Por um planejamento urbano ecológico para Goiânia
Tese de Doutorado
Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação da FAUUSP, área de concentração em Paisagem e Ambiente, como exigência parcial para
obtenção do título de Doutor em Arquitetura e Urbanismo
Universidade de São Paulo
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo
Área de Concentração: Paisagem e Ambiente
Orientador: Prof. Drº Paulo Renato Mesquita Pellegrino
São Paulo
2010
ads:
Autorizo a reprodução e a divulgação total ou parcial deste trabalho, por qualquer meio
convencional ou eletrônico, para ns de estudo e pesquisa, desde que citada a fonte.
R484i
Ribeiro, Maria Eliana Jubé
Infraestrutura verde, uma estratégia de conexão entre pessoas e lugares: por um planejamento
urbano ecológico para Goiânia / Maria Eliana Jubé Ribeiro. – Goiânia, 2010.
2v, 374 p.: il.
Conteúdo: v.1,178 p. – Texto; v.2, 196 p. – Anexos.
Tese (Doutorado) – Universidade de São Paulo, Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, 2010.
“Orientador: Prof. Drº Paulo Renato Mesquita Pellegrino”
1. Planejamento urbano – ecologia - Goiânia. 2. Paisagem ecológica - Goiânia. 3. Paisagem
natural – Goiânia – infraestrutura. I. Título.
CDU 71:502.15(817.3)(043)
os meus pais, José e Lacy, pelo amor e apoio incondicional em todos os momentos. Sem eles este trabalho não teria sido
concluído.
Ao professor Paulo Pellegrino, meu orientador, pela competência técnica, dedicação e incentivo.
Aos professores Yuri Tavares Rocha e Vladimir Bartalini, pelo incentivo dado no momento da qualicação. Foram críticos
na medida certa e incentivaram o crescimento e o avanço da pesquisa, o que se mostrou fundamental para que este trabalho fosse
concluído.
À Elizete M. Bakes, da Terracorp Consultoria e Serviços de Mineração, que disponibilizou os serviços de geoprocessamento
da empresa, possibilitando-me gerar os mapas do lugar e as imagens de aplicação da estrutura proposta nesta pesquisa.
Aos meus colaboradores diretos, Lorena Santos, Thiago de Lima Teles, Matheus Garcia Ferreira, Rodrigo Ferreira e
Alexandre dos Santos, que produziram na linguagem gráca computacional os mapas e imagens apresentados.
Ao amigo el, Rui Melo, do Instituto de Pesquisa Observatório, pela competência e paciência no desenvolvimento, aplicação
e interpretação dos dados da pesquisa sociocultural.
Aos pesquisadores Rafael Neves Flores Belmonte e Aidhan Ricardo Gagliardi, pela preparação da equipe e pela nalização
das tabelas e grácos da pesquisa quantitativa sociocultural, que deram origem às alises de identidade e expectativas das pessoas
do lugar. Também à equipe de campo: Jaqueline Pereira, Juliana Nogueira Santos, Marcelo Soldan, Marina Lemes, Marcilene Martins,
Neville Vilas Boas, pela seriedade e entusiasmo com que realizaram a aplicação dos questionários.
Aos colegas e amigos queridos, Albertina Vicentini e Laerte Araújo, pela amizade. Albertina, mais que uma mera revisora
ortográca, foi uma leitora atenta e competente que reordenou a minha escrita, e Laerte, pelo excelente projeto gráco que conferiu
delidade e abrilhantou a pesquisa.
Agradecimentos
A
4
Aos colegas e amigos éis da Secretaria Municipal de Planejamento SEPLAM, Agência Municipal do Meio Ambiente
AMMA, da Agência Municipal de Obras – AMOB, pelo material cedido e debates que permitiram avançar as pesquisas.
Aos professores e colegas do Departamento de Artes e Arquitetura da Escola Edgar Albuquerque Graeff da Pontifícia
Universidade Católica de Goiás, que contribuíram na distribuição da carga horária do curso, otimizando-me o tempo dentro e fora
da instituição para tornar possível essa árdua jornada que não recebeu o apoio logístico devido.
Enm, à minha irmã e aos meus irmãos, cunhado e cunhadas, sobrinhas e sobrinho, e a todos os amigos tão queridos que
participam da minha vida com gratuidade de alma, mostrando-se sempre presentes e perdoando-me pelas ausências.
Fig. 1 Mapa das Bacias Hidrográcas Brasileiras. Fonte: http://www.portalbrasil.net/brasil_hidrograa.htm dia 30/11/2009 as
17:30. 48
Fig. 2 Mapa das Bacias Hidrográcas de Goiânia. Fonte: Governo do Estado de Goiás / 2003. Diagnóstico Hidrogeológico da
Região de Goiânia. 49
Fig. 3 Mapa Geológico de Goiânia. Fonte: Governo do Estado de Goiás / 2003. Diagnóstico Hidrogeológico da Região de
Goiânia. 50
Fig. 4 – Mapa Geomorfológico de Goiânia. Fonte: Governo do Estado de Goiás / 2003. Diagnóstico Hidrogeológico da Região de
Goiânia. 52
Fig. 5 – Mapa de classicação dos solos de Goiânia. Fonte: Governo do Estado de Goiás / 2003. Diagnóstico Hidrogeológico da
Região de Goiânia. 53
Fig. 6 Mapa demarcando as áreas de abrangência das Bacias Hidrográcas de Goiânia. Fontes: Governo do Estado de
Goiás / 2003. Diagstico Hidrogeológico da Rego de Goiânia e Secretaria Municipal de Planejamento. (Adaptação
nossa). 54
Fig. 7 – Mapa de localização do Plano Original. Fonte: RIBEIRO, Maria Eliana Jubé, 2004. 59
Fig. 8 – Plano Original de Goiânia de Attílio Corrêa Lima. Fonte: IBGE, 1942. 60
Fig. 9 – Centro de Letchworth de Ebenezer Howard. Fonte: GRAEFF, 1983. 61
Fig. 10 – Centro de Goiânia de Attílio C. Lima. Fonte: IBGE, 1942. 62
Fig. 11 – Plano de urbanização de Goiânia de Armando Augusto de Godói. Fonte – IBGE, 1942. 63
Fig. 12 – Projeto do Setor Sul de Armando Augusto de Godói. Fonte – IBGE, 1942. 64
Fig. 13 – Evolução dos loteamentos aprovados em Goiânia. De 1933 a 1939; até 1951; e até 1959. Fonte: RIBEIRO, Maria Eliana
Jubé, 2004. 65
Lista de Figuras
6
Fig. 13a Evolução dos loteamentos aprovados em Goiânia. De 1933 a 1939; até 1951; e até 1959. Fonte: RIBEIRO, Maria Eliana
Jubé, 2004. 66
Fig. 13b Evolução dos loteamentos aprovados em Goiânia. De 1933 a 1939; até 1951; e até 1959. Fonte: RIBEIRO, Maria Eliana
Jubé, 2004. 67
Fig. 14 – Proposta de compartimentação de Luis Saia. Fonte: RIBEIRO, Maria Eliana Jubé, 2004. 69
Fig. 15 – Pontos focais de Luis Saia. Fonte: RIBEIRO, Maria Eliana Jubé, 2004. 70
Fig. 16 – Plano de áreas verdes de Wilheim. Fonte: IPLAM/SEPLAM, 1969. 71
Fig. 17 – Plano de Desenvolvimento Integrado de Goiânia. Fonte: SEPLAM, 1992. 73
Fig. 18 – Mapa de Áreas verdes cadastradas em Goiânia até 2000. Fonte: RIBEIRO, Maria Eliana Jubé, 2004. 74
Fig. 19 Modelo Espacial. Fonte: Prefeitura Municipal de Goiânia / Secretaria Municipal de Planejamento. Plano Diretor de
2007. 76
Fig. 20 – Mapa de Localização da APA do Morro do Mendanha. 89
Fig. 21 – Mapa Ipsométrico da APA do Morro do Mendanha. 91
Fig. 22 – Mapa de Declividade da APA do Morro do Mendanha. 92
Fig. 23 – Mapa de Risco de Erosão da APA do Morro do Mendanha. 93
Fig. 24 – Mapa das Águas da APA do Morro do Mendanha. 94
Fig. 25 – Mapa da Análise Temporal da Vegetação da APA do Morro do Mendanha. 95
Fig. 26 – Foto de um trecho da área do Residencial Parque Mendanha com parcelamentos populares ao fundo. Foto: Maria Eliana
Jubé Ribeiro /2009. 102
Fig. 27 – Vazios Urbanos. Fonte: Prefeitura Municipal de Goiânia / Secretaria Municipal de Planejamento. Plano Diretor 2007. 103
Fig. 28 – Lotes Vagos. Fonte: Prefeitura Municipal de Goiânia / Secretaria Municipal de Planejamento. Plano Diretor 2007. 103
Fig. 29 Fotos das ocupações irregulares das Igrejas Pentecostais que ocorrem no topo do Morro. Fotos: Maria Eliana Jubé
Ribeiro /2008. 104
Fig. 29a Fotos das ocupações irregulares das Igrejas Pentecostais que ocorrem no topo do Morro. Fotos: Maria Eliana Jubé
Ribeiro /2008. 105
Fig. 29b Fotos das ocupações irregulares das Igrejas Pentecostais que ocorrem no topo do Morro. Fotos: Maria Eliana Jubé
Ribeiro /2008. 106
Fig. 30 – Fotos de um trecho do loteamento irregular – Residencial Serra Azul. Fotos: Maria Eliana Jubé Ribeiro / 2008. 107
Fig. 30a – Fotos de um trecho do loteamento irregular – Residencial Serra Azul. Fotos: Maria Eliana Jubé Ribeiro / 2008. 108
7
Fig. 31 – Vista geral do morro do Mendanha. Foto: Maria Eliana Jubé Ribeiro / 2009. 111
Fig. 32– Mapa de Ocupação da APA do Mendanha. 112
Fig. 33 – Módulos rurais situados na APA do Mendanha praticamente desativados. Fotos: Maria Eliana Jubé Ribeiro / 2008. 113
Fig. 33a – Módulos rurais situados na APA do Mendanha praticamente desativados. Fotos: Maria Eliana Jubé Ribeiro / 2008. 114
Fig. 34 – Fotos de uma erosão do córrego do Café e cortes da área. Fotos: Maria Eliana Jubé Ribeiro / 2009. 115
Fig. 34a – Fotos de uma erosão do córrego do Café e cortes da área. Fotos: Maria Eliana Jubé Ribeiro / 2009. 116
Fig. 35 – Fotos de escoamento e captação de água no Jardim Pampulha Fotos: Maria Eliana Jubé Ribeiro / 2009. 117
Fig. 35a – Fotos de escoamento e captação de água no Jardim Pampulha Fotos: Maria Eliana Jubé Ribeiro / 2009. 118
Fig. 36 – Fotos de áreas livres alagadas no Jardim Pampulha. Fotos: Maria Eliana Jubé Ribeiro / 2009. 119
Fig. 36a – Fotos de áreas livres alagadas no Jardim Pampulha. Fotos: Maria Eliana Jubé Ribeiro / 2009. 120
Fig. 37 Fotos do modelo dominante que ocorre nas vias locais dos parcelamentos abertos recentes. Fotos: Maria Eliana Jubé
Ribeiro / 2009. 121
Fig. 37a Fotos do modelo dominante que ocorre nas vias locais dos parcelamentos abertos recentes. Fotos: Maria Eliana Jubé
Ribeiro / 2009. 122
Fig. 38 Unidades de serviço e lazer propostas no Programa de Recuperação Ambiental do córrego Macambira e ribeirão Anicuns
classicadas como espaços básicos, médios e completos. Fonte: Prefeitura Municipal de Goiânia/2003. 123
Fig. 38a, 38b Unidades de serviço e lazer propostas no Programa de Recuperação Ambiental do córrego Macambira e ribeirão
Anicuns classicadas como espaços básicos, médios e completos. Fonte: Prefeitura Municipal de Goiânia/2003. 124
Fig. 39 Parque da Pedreira, Unidade de Conservação Ambiental 2 do Programa de Recuperação Ambiental do córrego Macambira
e ribeirão Anicuns. Fonte: Prefeitura Municipal de Goiânia/2003. 125
Fig. 40 – Mapa síntese da APA do Mendanha. 130
Fig. 41 Planta e cortes: longitudinal e transversal, esquemáticos, de canteiros pluviais. Fonte: painel da disciplina AUT 221 -
Arquitetura, Ambiente e Desenvolvimento Sustentável / Universidade de São Paulo. 138
Fig. 41a Planta e cortes: longitudinal e transversal, esquemáticos, de canteiros pluviais. Fonte: painel da disciplina AUT 221 -
Arquitetura, Ambiente e Desenvolvimento Sustentável / Universidade de São Paulo. 139
Fig. 42 Corte esquetico de biovaleta. Fonte: painel da disciplina AUT 221 - Arquitetura, Ambiente e Desenvolvimento
Sustentável / Universidade de São Paulo. 140
Fig. 43 – Lagoa Pluvial. Fonte: painel da disciplina AUT 221 - Arquitetura, Ambiente e Desenvolvimento Sustentável / Universidade
de São Paulo. 142
8
Fig. 44 Alagados com plantas utuantes. Fonte: SALATI, Eneas. Controle de qualidade de água através de sistemas de
wetlands construídos. 145
Fig. 45 – Alagados com solos ltrantes com uxo descendente. Fonte: SALATI, Eneas. Controle de qualidade de água através de
sistemas de wetlands construídos. 145
Fig. 46 Alagados com solos ltrantes com uxo ascendente. Fonte: SALATI, Eneas. Controle de qualidade de água através de
sistemas de wetlands construídos. 145
Fig. 47 – Mapa proposto de recuperação ambiental da APA do Mendanha. 153
Fig. 48 – Áreas de alagamento natural selecionadas para a construção dos ‘Alagados Construídos’. 154
Fig. 49 Intervenções Pontuais Exemplares: Alagados de Tratamento das Águas Pluviais e Servidas e Intervenção de Infraestrutura
Verde no Jardim Pampulha. 155
Fig. 50 – Detalhe dos Alagados de Tratamento das Águas Pluviais e Servidas
. 156
Fig. 51 – Detalhamento da Intervenção no Jardim Pampulha. 157
Fig. 51a – Detalhamento da Intervenção no Jardim Pampulha. 158
Fig. 52 – Mapa delimitando o núcleo e a zona de transição e cooperação que integralizam a APA, com as vias a serem suprimidas
e o anel viário proposto. 159
Fig. 53 – Planta esquemática das vias expressas com jardins de chuva e biovaletas. 160
Fig. 54 – Corte esquemático das vias expressas com jardins de chuva e biovaletas. 160
Fig. 55 – Imagem esquemática das vias que estabelecem o novo limite da APA. 161
Fig. 56 – Planta esquemática da Alameda Parque com jardins de chuva e biovaletas. 162
Fig. 57 – Corte esquemático da Alameda Parque com jardins de chuva e biovaletas. 163
Fig. 58 – Imagem esquemática da Alameda Parque. 163
Fig. 59 – Planta esquemática das calçadas de 3 m de largura com jardins de chuva. 164
Fig. 60 – Corte esquemático das calçadas de 3 m de largura com jardins de chuva. 164
Fig. 61 – Planta esquemática das calçadas de 5 m de largura com biovaletas. 165
Fig. 62 – Corte esquemático das calçadas de 5 m de largura com biovaletas. 165
Fig. 63 – Perl esquemático A das vias verdes nas áreas urbanas de baixa densidade do interior da APA. 166
Fig. 64 – Perl esquemático B das vias verdes nas áreas urbanas de baixa densidade do interior da APA. 167
Fig. 65 – Perspectiva 3D da APA do Mendanha. 168
ABNT Associação Brasileira de Normas Técnicas
AMMA Agência Municipal do Meio Ambiente.
APA – Área de Preservação Ambiental.
APP – Área de Preservação Permanente.
AUT – Tecnologia da Arquitetura.
CR – Carta de Risco.
CAIS – Centros Integrados de Apoio a Saúde.
CMEIS – Centros Municipais de Educação Infantil.
DHRG – Diagnóstico Hidrogeológico da Região de Goiânia.
ETE – Estação de Tratamento de Esgoto.
ESALQ – Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz
IBGE – Instituto Brasileiro de Geograa e Estatística.
IPLAM – Instituto de Planejamento Municipal.
LF – Lei Federal.
LM – Lei Municipal.
PDIG – Plano de Desenvolvimento Integrado de Goiânia.
PDG – Plano Diretor.
PDDUG – Plano Diretor de Drenagem Urbana de Goiânia.
RPPN – Reservas Particulares do Patrimônio Natural.
Lista de Siglas
10
SEPLAM – Secretaria Municipal de Planejamento.
SNUC – Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza.
TAC – Termo de Ajustamento de Conduta.
UC – Unidade de Conservação.
UCA – Unidade de Conservação Ambiental.
UNESP – Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho
UNICAMP – Universidade Estadual de Campinas.
USP – Universidade de São Paulo.
ZA – Zoneamento Ambiental.
ZEE – Zoneamento Ecológico e Econômico.
ZPA – Zona de Proteção Ambiental.
Resumo
IBEIRO, M. E. Jubé. Infraestrutura verde, uma estratégia de conexão entre pessoas e lugares: por um planejamento urbano
ecológico para Goiânia. Tese de Doutorado. Universidade de São Paulo. São Paulo, 2010.
Esta tese debate a produção do espaço urbano a partir de duas vertentes, as condições biofísicas do território e a
sociedade, com a nalidade de buscar alternativas para um desenvolvimento que compatibilize meio ambiente e cultura. Assim,
dene os princípios e conceitos em que se fundamenta o planejamento urbano ecológico a partir de (MCHARG, Ian L., 2000),
(HOUGH, Michael, 1998), (SPIRN, Anne Whiston, 1995), (SANTOS, Milton, 1996 e 1997), (PALOMO, Pedro J. Salvador, 2003),
(PELLEGRINO, Paulo R. M., 1995), e (BENEDDICT, Mark A., MCMAHON, Edward T., 2006); delineia enfrentamentos distintos dos
que vêm sendo propostos e que têm materializado sérios problemas ambientais, sociais e de espaços e relações humanas de
segregação nas cidades; focaliza em Goiânia, uma cidade planejada, a leitura de como o meio ambiente, os projetos e as pessoas
em sua vivência ordinária vão compondo uma nova paisagem; e analisa um ambiente especíco, a unidade de conservação Morro
do Mendanha, que permite a interpretação dos conitos e oportunidades que podem determinar valores alternativos capazes de
assegurar o equilíbrio entre desenvolvimento urbano e conservação ambiental, porque permite processos de ocupação antrópicos
com preservação de características ambientais relevantes, conectando pessoas e lugares. Por m, apresenta um projeto
de Infraestrutura verde aplicado à APA do Morro do Mendanha como uma estratégia capaz de estabelecer a retomada de um
desenvolvimento social autóctone e em equilíbrio com as características biofísicas do lugar.
Palavras chaves: Natureza; Cidade; Sociedade; Cultura; Sustentabilidade; Paisagem natural; Paisagem urbana.
R
Abstract
IBEIRO, M. E. Jubé. Green infrastructure: a strategy of linking people and places for an ecological urban planning for Goiânia.
Doctorate Thesis. São Paulo University, São Paulo, 2010.
This thesis discusses the production of urban space from two aspects, the territory biophysical conditions and the community,
with the purpose of searching for alternatives of development which promotes compatibility between the environment and culture.
Thus, it denes the principles and concepts on which the ecological urban planning is fundamented, based on MCHARG, Ian L.
(2000), HOUGH, Michael (1998), SPIRN, Anne Whiston (1995), SANTOS, Milton (1996 e 1997), PALOMO, Pedro J. Salvador
(2003), PELLEGRINO, Paulo R. M. (1995), BENEDICT, Mark A., MCMAHON, Edward T. (2006); it outlines efforts that are distinct
from those which have been proposed and that have caused serious environmental and social problems, as well as segregation
in the human relations in the cities; it focuses on Goiânia, a planned city, the reading of how the environment, the projects and the
people, in their ordinary life, go on composing a new landscape; and it analyzes a determined environment, a unit of conservation
called Mendanha Hill, allowing the interpretation of the conicts and opportunities that may determine alternative values capable
of assuring the balance between the urban development and the environmental conservation, because it allows processes of
anthropic occupation with the preservation of relevant environmental characteristics, connecting people and places. Eventually,
it presents a green infrastructure project applied to the APA of Mendanha Hill as a strategy capable of establishing the retaking of
an autochtonous social development and in balance with the biophysical characteristics of the place.
Key words: Nature; City; Society; Culture; Sustainability; Natural landscape; Urban landscape.
R
Lista de Figuras 5
Lista de Siglas 9
Resumo 11
Abstract 13
Introdução 17
1 Infraestrutura verde: uma estratégia para o projeto urbano 25
1.1 A evolução dos princípios do planejamento ecológico no projeto urbano 27
1.2 Conceitos do planejamento urbano ecológico 32
1.3 Uma alternativa de projeto para espaços abertos urbanos 37
2 Goiânia: meio ambiente e projeto urbano 47
2.1 A constituição biofísica 47
2.2 Os planos e a cidade 58
2.3 A base legislativa 79
2.3.1 As leis federais 80
2.3.2 As legislações municipais 82
3. A APA do Morro do Mendanha: o lugar 87
3.1 O lugar 87
3.1.1 Uma aproximação biofísica 88
Sumário
16
3.1.2 A base legislativa 96
3.1.3 Identidade social: conhecimento e expectativas 98
3.1.3.1 Os agentes da transformação 99
3.1.3.2 Os moradores do lugar 101
3.2 Interpretação dos conitos e oportunidades 110
3.2.1 Os problemas 126
3.2.2 As potencialidades 127
4 Infraestrutura verde: conexão entre pessoas e lugares 131
4.1 A ecácia do novo enfoque proposto para assegurar a conservação da APA
integrando-a ao desenvolvimento urbano 131
4.2 O projeto urbano: modelos alternativos 133
4.2.1 Alagados e oresta urbana: infraestrutura verde de equilíbrio 133
4.2.1.1 Drenagem natural 136
4.2.1.2 Alagados construídos 140
4.2.1.3 Floresta urbana 146
4.2.1.4 Mobilidades e circulações 149
4.3 Uma infraestrutura verde para a APA e sua borda 151
Considerações Finais 169
Referências Bibliográcas 173
Aproximação Teórica
rojetar com a natureza é uma combinação singular de ideias em que a paisagem se apresenta como um ecossistema
dinâmico onde se processam fatores biofísicos e humanos que fundamentam decisões de planejamento e de projeto,
ambos denominados, segundo McHarg (2000), planejamento ecológico humano”. Esse planejamento é entendido, a partir
da interão entre os sistemas naturais e culturais, como dinâmicas dos ecossistemas vivos que podem influenciar o
comportamento, a saúde e o bem-estar.
Hough (1998, p.5) arma que:
A dependência existente entre os sistemas vivos, que interconectam o desenvolvimento dos processos físicos e vitais da
terra, o clima, a água, as plantas, os animais, a contínua transformação, a reciclagem dos materiais vivos e não vivos, são
os elementos que propiciam a autossuciência da biosfera, que permitem a vida na terra e que dão lugar à paisagem física.
Constituem os elementos determinantes que dão forma a todas as atividades humanas sobre a terra.
1
Essa forma de interpretar a cidade e sobre ela atuar, conectando meio ambiente e sociedade com suas características e
interações, e que se denomina planejamento urbano ecológico, propõe que seja investigado o meio biofísico assumido como suporte
intrínseco das atividades humanas, para desvendar formas de adaptá-lo e adequá-lo a melhores respostas aos assentamentos
com o mínimo esforço e perda possível do sistema.
1 La dependencia de un sistema de vida con otro, el desarrollo interconectado de los procesos físicos y vitales de la tierra, el clima, el agua, las plantas y los animales, la continua transformación
y reciclado de los materiales vivos y no vivos, son los elementos de la autosuciente biosfera que permiten la vida en la tierra y que dan lugar al paisaje físico. Constituyen los elementos determi-
nantes que dan forma a todas actividades humanas sobre la tierra.
Introdução
P
18
Nesse sentido, pode-se aferir que o desenvolvimento apropriado conserva as características intrínsecas do ambiente e
propõe intervenções mais sustentáveis, que devem atender às necessidades de convivência humana, determinando uma adaptação
antrópica em que convivam, no novo ambiente, a evolução social e a saúde das espécies e do ecossistema.
Ao proceder a uma interveão no ambiente urbano, não se deve dar ênfase em separado nem ao projeto nem à natureza,
mas à inter-relação entre o homem e os elementos biogicos. O projeto não é estabelecido de forma arbitria, mas a partir da
exploração criativa do potencial máximo que a natureza oferece, reconhecendo, contudo, as restrições necessárias que ela impõe.
A premissa em que se apoia esse princípio é a das relações de reciprocidade entre o ambiente construído e o meio
biofísico, pois parte do argumento de que a natureza é a base de nossas intervenções e fornece informações que nos permitem
modicar sua forma e controlar sua evolução. Ela é um dos componentes imprescindíveis das decisões técnicas, econômicas,
políticas e de projeto que dão forma à cidade.
Segundo Pellegrino (2000, p.162 e 163), um planejamento ecológico da paisagem “pode fornecer as ferramentas para
se alcançar uma integração plena entre sociedade e natureza, de forma que ambas prosperem a longo prazo”. No entanto, “o
projeto de paisagismo situa-se sempre no limiar dos conitos”, devendo ser utilizado como instrumento fundamental para denir
inter-relações que podem revelar tanto a dialética entre processos naturais e sociais como bloquear e destruir conexões entre
comunidades e sítios.
É a partir desse entendimento da ecologia no planejamento da paisagem, traduzido na cotidianidade pela implantação de
um sistema que participe da vida ordinária do cidadão, que identicamos uma estratégia capaz de propiciar a conexão entre planos
e cidade, entre natureza e vivência ordinária.
Para Benedict e McMahon (2006), a infraestrutura verde cumpre esse papel e adotá-la como estratégia pode revelar,
identicar e proteger espos de conexão, redes para conservação da terra e outros espaços abertos. Ao lançar o dos
instrumentos de conservação, restauração e manuteão de um sistema de funções naturais, não se visa, simplesmente,
à proteção de áreas patrimoniais e de grande valor, mas também prover distintos espaços de sociabilidade, de lazer e de
benefícios econômicos para as pessoas.
A presente pesquisa busca identicar como um núcleo urbano planejado que adotou valores ecológicos veio sendo
degradado em virtude da adoção de posturas inadequadas. Goiânia, cidade verde e com boa qualidade de vida, pode realmente
traduzir essa imagem. Contudo, como possui suporte e aparato consistente, o que lhe falta é a explicitação, nos planos e projetos,
de um planejamento ecológico que, ao incorporar estratégias de pensar e atuar na cidade, a exemplo da infraestrutura verde,
conjugue e preserve o homem e o lugar.
19
O objeto da Pesquisa
A pesquisa referencia Goiânia, cidade planejada na década de 1930, implantada para abrigar a transferência da capital do
Estado da cidade de Goiás, antiga Vila Boa, para o Planalto Central.
Os critérios denidos para a escolha do lugar foram: abundância de água, bom clima, topograa adequada, facilidade de
acesso e transporte e localização estratégica central tanto em relação ao Estado como ao país.
A localização especíca cou na proximidade ao eixo da estrada que lhe dava acesso, sendo implantada às margens
do córrego Botafogo, área de relevo quase plano e banhada por vários cursos d’água. Seu projeto inicial foi elaborado por Attílio
Corrêa Lima, que tomou como referência as ideias e os princípios de vanguarda oriundos da Europa e dos Estados Unidos.
Lima tomou como exemplos projetuais as cidades-jardins de Ebenezer Howard, pois o centro de Gonia assemelha-se muito
ao centro que Unwin traçou para Letchworth, protótipo desse modelo, além das seguintes fontes confessas: Versalhes, Karlsruhe e
Washington. Nos dois primeiros casos, destacam-se as inncias dos projetos paisagísticos, não os dos eixos monumentais, mas os
dos park-ways, que, para Graeff (1983), conferem à cidade a sua alma de “cidade-parque”; e, no último caso, o respeito à topograa.
Por situar-se Goiânia em local bastante quente e sujeito a chuvas torrenciais, o relevo e o clima foram preponderantes
nas denições do projeto inicial. O sistema de distribuição de uxo feito por rotatórias, pequenas e grandes praças, avenidas
arborizadas, quadras públicas com áreas internas, park-ways ao longo dos rios, parques públicos nas áreas de mata exuberante,
além do cinturão verde em todo o perímetro do entorno e, portanto, com generosidade de áreas verdes urbanas em uma cidade
modesta, com edicações bastante simples, foi uma proposta que fazia parte de um plano único que demonstrava profundo respeito
à cultura, ao meio ambiente e à paisagem. Tal respeito por muitas vezes se repetiu nos projetos posteriores, que, no entanto, em
virtude de ambições econômicas e políticas, deram lugar a mais uma cidade marcada por problemas ambientais e sociais.
Os planos urbanos posteriores de Armando Augusto de Godói, de 1937; Luís Saia, de 1962; Jorge Wilheim, de 1971;
Engevix Engenharia, de 1992 – tentaram imprimir novos desenhos à cidade, sustentados, em muitos casos, em novas ideologias,
em outros, articulados ao inicial e, em outros mais, apenas colados neste, o que desvirtuou o projeto original em menor ou maior
grau e promoveu o desaparecimento das motivações iniciais da memória urbana.
O plano atual, aprovado em 2007, tentou resgatar os princípios ecológicos do projeto original, ao adotar as bacias
hidrográcas como o elemento estrutural do ambiente urbano em que a topograa, a hidrograa e a biodiversidade são tomadas
como parâmetros de planejamento. Deixou, entretanto, a lacuna de como traduzir essas informações no projeto do lugar.
Charles Jordan e Lawrence Selzer, ao apresentarem Benedict e McMahon (2006, p. xiii), mostram-nos como estabelecer
essa relação entre planos urbanos e projetos de cidade. Para eles,
20
Para proteger a paisagem e os caminhos das águas que nos sustentam como nação e nos denem como um povo, precisamos
de um novo caminho para olhar para nós mesmos e para a terra que nos cerca. Áreas naturais não são simplesmente terras
que ainda têm de ser desenvolvidas. Parques não são simplesmente lugares bonitos. Paisagens com atividades produtivas
não são meramente lugares para produzir alimentos. Esses espaços abertos formam a tapeçaria natural que nos conecta à
nossa herança ambiental, uns aos outros, e às comunidades em que vivemos.
2
A partir desse entendimento, a pesquisa investigou uma área denida de preservação ambiental (APA), inserida a oeste
do núcleo central de Goiânia: a APA do Morro do Mendanha, composta de áreas públicas e privadas, que ocupa o terço médio da
encosta esquerda do Ribeirão Anicuns. Com área de 747,6035 ha, demarcada por parâmetros geométricos e de ocupação, possui
topograa acidentada e encostas muito íngremes. É um ambiente frágil, porém único no perímetro urbanizado, contendo pequenos
cursos d’água, nascentes, lagos, alagados e uma mata nativa dispersa, mas com possibilidades de transformar-se em um corredor
ecológico ao somar-se ao fundo de vale do rio.
O Ribeirão Anicuns é tributário do rio Meia Ponte e ambos esculturam uma zona urbana densamente construída. No
momento, essa zona urbana apresenta distintos graus e formas de ocupação, que abrangem condomínios fechados de alto
padrão, loteamentos de baixo padrão, torres de telecomunicação, entre outros, o que a qualica como objeto de leitura e aplicação
desta pesquisa.
As hipóteses
Esta tese adotou como hipóteses: que o projeto original da cidade, elaborado por Attílio Corrêa Lima, desenvolvido de
1933 a 1935, teve o seu modelo assentado, mesmo sem os evocar, nos princípios ecológicos da paisagem, apresentando um
desenho urbano inovador enquanto destinado a uma cultura agropecuarista do interior do país. O plano inicial foi seguido por outros
quatro planos urbanos com certas incompatibilidades que não o descaracterizaram devido à forte identidade que ele criou na
população. O plano diretor atual, aprovado em maio de 2007, buscou resgatar esse projeto inicial ao adotar as bacias hidrográcas
como parâmetro de planejamento. Em seu suporte, ainda foram elaborados, em 2008, o Zoneamento Ecológico-Econômico e a
revisão da Carta de Risco, documentos que apontam que a estrutura existente pode caminhar para a sustentabilidade. Entretanto,
para atingir essa meta, é necessária uma nova postura de enfrentamento, distinta da que vem sendo adotada até o momento.
Devem-se incentivar novas pesquisas de caminhos que levem ao desenvolvimento sustentável e que, ao respeitar a topograa, as
2 To protect the landscape and waterways that sustain us as a nation and dene us as a people, we need a new way of looking at ourselves and the land around us. Natural areas are not simply
lands that have yet to be developed. Parks are not simple beautiful places. Working landscapes are not merely sites for producing food and ber. These open spaces from a natural tapestry that
connects us to our outdoor heritage, to one another, and the communities in which we live.
21
áreas de matas, os fundos de vale, as áreas frágeis e de relevância biofísica e cultural, o façam de forma a contribuir efetivamente
para adaptar o homem ao lugar, reduzir as entropias da ocupação antrópica e promover meios de autorrecuperação ambiental.
A infraestrutura verde apresenta-se como uma base estratégica para a conguração de projetos e intervenções criativas para cada
ambiente, conectando as pessoas aos lugares e resgatando a identidade ambiental e cultural.
O problema
Dado que a paisagem é um quadro do processo histórico, do qual participam ativamente as interações do meio ambiente
biofísico e as relações socioculturais, tem-se a dimensão do problema a ser enfrentado.
Compreender as interações biofísicas do meio ambiente demanda estudos e prossionais de diversas ciências relacionais,
e sua síntese é sempre relativa a um ambiente especíco em um período de tempo determinado. A sociedade e seus hábitos de
convívio socioculturais são uma equação que resulta de fatores do meio biofísico, da economia e do acesso a informações, bens
e serviços das infraestruturas, que também se alteram no tempo.
Confrontar ou tratar esses dois universos demanda uma nova aproximação: signica, sobretudo, buscar caminhos que
unam o uso racional do solo às necessidades das pessoas, denir uma visão comum e propor soluções para seus entraves,
propiciando a qualicação do ambiente biofísico e o conforto de seus usuários, de forma a contribuir no desenvolvimento de uma
percepção do planejamento da cidade e dos instrumentos de proteção dos espaços livres.
O Morro do Mendanha, referência e objeto de valorização da paisagem de Goiânia tanto por suas características físicas
e dimensões como por sua presença visual, veio sendo ocupado em processo acelerado a partir do nal da década de 1990, com
sérios problemas que podem ameaçar a sua integridade. As ocupações, feitas, na maioria dos casos, em observância a legislações
anteriores e dentro do modelo tradicional de infraestrutura urbana utilizado nas cidades no último século, não tomaram o ambiente
natural como parâmetro, mas tão somente como suporte. Reproduzindo os mesmos padrões da cidade como um todo, carente de
espaços públicos, de áreas de preservação da vegetação e de infraestrutura de saneamento, vêm resultando em graves problemas
urbanísticos, paisagísticos e ambientais.
Os problemas se agravam com a diculdade de acesso, que compromete o transporte, a coleta de lixo, a disposição
de esgotos, a saúde, a educação e o abastecimento e, no aspecto biofísico, com o dado adicional dos cortes e desmatamentos
indiscriminados: sua topograa acentuada faz com que a velocidade das águas lave o solo, exponha a rocha, represe indevidamente
a linha de drenagem, causando seu rompimento. As resultantes são o alagamento das áreas planas, as erosões, os escorregamentos
de massas pela execução de obras e a interrupção do ciclo vital da ora e da fauna.
22
O método
Diante desse quadro, e para seu enfrentamento, este trabalho se estrutura em quatro capítulos, que orientam a pesquisa
e fazem compreender o método traçado.
O primeiro capítulo investiga as bases da ecologia para a remodelação das cidades e revisita a história para entender
como esse pensamento veio sendo construído. Busca, nas inquietações e em algumas intervenções em áreas urbanas, referências
de projetos de paisagem que marcaram esse processo evolutivo e que continuam a nos mostrar que os caminhos podem e
devem ser menos depredatórios, fornecendo-nos parâmetros comparativos fundamentais para a construção de um novo modelo
de enfrentamento de que se obtenham paisagens urbanas mais sustentáveis.
Trata dos conceitos e métodos que fundamentam e estruturam a pesquisa como sustentabilidade urbana e planejamento
urbano ecológico e de como eles se materializam na forma das cidades. Ao tomar como referência os conceitos trabalhados,
delineia uma base estratégica alternativa de desenho e construção da paisagem.
O segundo capítulo descreve a base biofísica do território de Goiânia; analisa os planos urbanos e seus projetos diante
dos conceitos vigentes e à luz da história e de suas relações com os dados encontrados no momento das intervenções; e aponta
como os planos e projetos vão compondo a paisagem. Ainda alinha os principais instrumentos legais que sustentam a proposta
de planejamento na atualidade, para compreender até que ponto eles são e serão efetivos e como torná-los mais presentes na
paisagem que vemos.
Mostra como os parâmetros ambientais adotados no projeto original, em que pesem as intervenções dos planos e projetos
que o seguem, à mercê de um crescimento por vezes descontrolado, conseguem manter, mesmo que descaracterizados e
desgurados, seus principais paradigmas ambientais e, ao fazê-lo, propiciam suporte para o atual plano urbanístico. Plano que,
apesar de sustentado por instrumentos técnicos bastante atuais, como o Zoneamento Ecológico-Econômico e a Carta de Risco,
e também de ter adotado como referencial de planejamento as bacias hidrográcas, prescinde de uma estruturação e de um
planejamento ecológicos.
O terceiro capítulo é a leitura do objeto da tese, a APA do Morro do Mendanha, e pretende, na paisagem do lugar e
balizado pelos conceitos e métodos estudados, perceber quais fatores biofísicos ou culturais vêm determinando sua ocupação
e desenvolvimento.
Espacializa os recursos da paisagem local à luz da bacia hidrográfica que lhe suporte e identifica, por meio de
documentos cartogficos, visuais e perceptivos, com visitas ao local, aplicação de questionários e entrevistas, as heranças
do lugar, a formação cultural e os desejos de urbanidade. O conjunto de paisagens selecionado para a aplicão das
23
entrevistas com moradores ou usuários foi escolhido a partir de estudos e pesquisas de comportamento. Os instrumentos
utilizados foram elaborados especificamente para a investigação e contaram com a experiência e a dedicação de profissionais
qualificados: psicólogo, sociólogo e publicitário. Os resultados podem representar exemplos significativos da percepção
ambiental. O procedimento se justificou por acreditar que a imersão na realidade do objeto de estudo representa uma
importante contribuição de dados primários para as interpretações e possibilidades delineadas no capítulo final.
O quarto e último capítulo é o exercício de aplicação da tese e procura testar os conceitos teóricos com estratégias
selecionadas na área especíca do objeto de estudo tomado como modelo, demonstrando uma entre as diversas possibilidades
que, centradas nas capacidades físicas do meio, nas heranças e nos desejos socialmente construídos, podem atingir patamares
de sustentabilidade ambiental e social.
Pela aplicação da estratégia da infraestrutura verde, o capítulo procura evidenciar a importância dos espaços abertos
como partes de um sistema interconectado de proteção e manejo que provê benefícios ecológicos à cidade e à sociedade. A
infraestrutura verde é tomada como referência para as comunidades que, a partir dela, passam a identicar e a priorizar as suas
oportunidades dentro de um plano de desenvolvimento e de caminhos que otimizam o uso da terra.
Portanto, a tese, no geral, procurou investigar um modelo de observação e atuação para um plano estratégico sensível
que alie homem e natureza. O desejo foi o de contribuir para que a cidade ou cada ambiente se junte às intervenções da ‘arte e
ciência’, com a nalidade de realçar o meio ambiente físico e proporcionar lugares civilizados e enriquecedores para as pessoas
que os habitam, compreendendo que as bases atuais do projeto urbano devem ser reexaminadas. Enm, buscou entender o que
Hough (1998, p.6) quis dizer quando assinalou ser “necessário redescobrir, através das ciências naturais, a essência dos lugares
familiares em que vivemos.”
3
3 Es necesario redescubrir, a través de las ciencias naturales, la esencia de los lugares familiares en los que vivimos.
ecessitamos da natureza tanto na cidade como no campo. Essa afirmativa nos leva a refletir sobre os valores que
construímos como seres capazes de perceber, expressar e adaptar o ambiente natural às nossas necessidades e desejos.
Cada vez mais, entendemos que a observância e o respeito às características do nosso ambiente são um caminho seguro
e necessário. Essa consciência é fruto da compreensão de que a natureza é em si um conjunto de interações submetidas
às suas próprias leis, que apresenta valores e oportunidades a serem desfrutados pelo homem, mas que impõe limites
como contrapartida.
Para McHarg (2000), a problemática relação entre homem e natureza não se resolve ao utilizá-la apenas para o prazer
estético. Tampouco resolve enxergá-la como minimizadora dos aspectos desoladores que a urbanização das cidades tem
promovido. É necessário adotar uma postura em que ela gure como base estratégica. Sobretudo, é preciso investigar e descobrir
suas particularidades e sutilezas como fonte e signicado.
McHarg (2000, p.23 e 25) lembra-nos de “que o crescimento é inevitável, porém o desenvolvimento não implica destruição.”
41
O economicismo que determinou muitas decisões nos planejamentos urbanos é em grande parte responsável pelo estado de
entropia que nos atinge e “o determinismo econômico como uma forma de evolução imperfeita do mundo biofísico é uma das
consequências do nosso legado.”
52
Segundo ele, o reequibrio é possível, mas é produto da unidade. É o resultado de sociedades “que acreditam que o
homem e a natureza são indivisíveis e que a sobrevivência e a sde dependem da sua compreensão do ambiente natural e
de seus processos”
63
(McHarg, 2000, p.26). Essas sociedades são muito diferentes da nossa e produzem também diferentes
cidades e paisagens.
4 El crecimiento es inevitable, pero el desarrollo no implica el expolio.
5 El determinismo econômico como uma forma de evaluación imperfecta del mundo biofísico es solo uma de las consecuencias de nuestro legado.
6 Alií donde encontremos un pueblo que crea que el hombre y la natureza son indivisibles y que la supervivencia e la salud dependen del entendimiento de la naturaleza y de sus procesos.
N
1 Infraestrutura verde: uma estratégia para o projeto urbano
26
É inegável que os nossos planos urbanos não têm dado a devida atenção à base biofísica que os recebe e mantém,
e nossas cidades, como seus produtos, têm nos mostrado claramente essa dicotomia. Assim, é necessário reconhecer que a
retomada da unidade entre o homem e a natureza repousa em ações impregnadas da realidade física e social do lugar.
Lugares projetados devem dar atenção especial à geologia, às declividades, às condições do solo de suscetibilidade a
erosão, à pavimentação e drenagem como a base biofísica que interage com os processos naturais e sociais, dentre estes os
valores paisagísticos, históricos, hídricos, orestais, faunísticos, residenciais, institucionais e recreativos.
Os lugares, por meio de seus componentes vivos - terra, água, ar, animais -, estabelece trocas. Assim, pode o meio
ambiente fazer essa troca de maneira intencionalmente direcionada, tornando-se mais adequado ao homem e a todos os seres
vivos que o formam?
A resposta pode ser sim, mas seu êxito dependerá do esforço apreendido de conhecer o meio biofísico, seus componentes
e suas interações como requisito prévio do planejamento e das opções.
O lugar da natureza na cidade não pode se limitar ao abastecimento, ao lazer e ao ócio. Para além desses ambientes,
devem-se somar todos os lugares onde os processos naturais frágeis, de proteção e notáveis manifestam-se, respeitando-os.
É preciso identicar zonas de inundação, solos alagadiços, encostas íngremes, áreas de proteção dos rios, córregos e lagos, para
evitar assoreamentos e contaminações e garantir a capacidade hídrica supercial e a do lençol freático mais profundo.
As áreas úmidas, lugares onde se acumulam as águas das chuvas, possuem uma função biológica complexa no sistema,
responsável pela recarga e puricação do lençol freático. São também o lugar de reprodução de comunidades bióticas, a exemplo
dos pássaros, fundamentais à manutenção do equilíbrio ambiental e fontes de ar puricado.
Para que haja uma urbanização sustentável, é necessário identicar, no lugar, as funções de proteção ao homem, além das
hostis e a dos ambientes raros, valiosos e vulneráveis. Dos lugares que beneciam o homem, podem-se destacar a acumulação
e puricação da água, a dispersão da contaminação atmosférica, a melhoria climática, o controle da erosão, os solos férteis e a
riqueza da ora e da fauna. Das hostilidades, citam-se as inundações, as secas, os desmoronamentos de encostas, a deserticação
do solo, a elevação da temperatura, a poluição, a extinção de recursos e a exposição aos raios ultravioletas. Os lugares relativos
às zonas de interesse ecológico por sua raridade, valor e vulnerabilidade têm as matas virgens, cumeeiras, talvegues, alagados,
solos frágeis e áreas que apresentam monumentos naturais.
Os contextos põem à prova a sustentabilidade urbana como fruto de uma relação direta entre espaço natural e social,
centrada na conservação das condições ecológicas, porém adequando-as às comunidades. Existem na atualidade inúmeros
estudos que ilustram que as soluções naturais de investigação, conhecimento, respeito e manutenção da vegetação natural e
27
dos cursos d’água como forma de conter os solos e obter uma drenagem eciente são mais econômicas e adequadas que as
intervenções da engenharia e suas obras de arte.
Assim, ocupar lugares de forma mais apropriada exige um planejamento rigoroso da paisagem, que reconheça, respeite e mantenha
sua estrutura morfológica, identicando saliências e reentrâncias, encostas, divisores, topos, talvegues, vales, linhas de drenagens,
aoramentos rochosos, vegetação nativa, matas e reservas biológicas, cujas características devem ser condicionantes do projeto. O que
permite dizer que, para manter a integridade do meio, devem-se reconhecer suas restrições e potencialidades, determinando, a partir das
aspirações sociais, os melhores usos e ocupação de cada lugar, propiciando respostas sociais, estéticas, culturais e ambientais.
1.1 A evolução dos princípios do planejamento ecológico no projeto urbano
A conservação da natureza como rede ecológica urbana inicia-se como reação à Revolução Industrial do século XIX,
quando toma forma a preocupação com a conservação da terra e a preservação dos recursos naturais. As reexões e intervenções
sobre o papel da natureza na cidade devido a problemas resultantes das ações humanas, propondo um desenho que compense
ou minimize os seus efeitos negativos, estão marcadas na história do urbanismo por alguns grandes desenhadores de cidades,
dentre eles Frederick Law Olmsted e Ebenezer Howard.
Os ideais do arquiteto paisagista Frederick Law Olmsted, que defendia os efeitos restaurativos dos espaços livres orestados
na mente humana, encontram terreno fértil entre os reformadores sociais. Olmsted adquire notoriedade pela dimensão e abranncia
de suas obras, dentre elas o Central Park de Nova York, na ilha de Manhattan, de 1866; o Plano de Riverside, em Illinois, de 1868; e
um complexo de parques e parkways em Boston, o Emerald Necklace, que se inicia em 1887. Destaque importante de sua obra são
os seus argumentos de recuperão da natureza que determina a suaão, pois esta, mesmo quando centrada no meio urbano, ao
incorporar condições de ocupação e lazer centra-se no retorno do ambiente às condições físicas que lhe são próprias.
É de Olmsted o primeiro sistema metropolitano de parques planejado a partir dos aspectos hidrológicos e ecológicos, o
Emerald Necklace, formado por uma rede de parques conectados por alamedas verdes, que buscam atender a um programa de
recreação, preservação da paisagem e gestão da qualidade da água, conferindo-lhes unidade. Já no seu tempo, trabalhou com um
processo rudimentar de sobreposição de mapas. O Emerald Necklace é sua primeira experiência de sistema urbano de espaços
abertos e uma das mais antigas experiências planejadas e executadas dentro desse princípio estrutural, que interliga grandes
parques por meio de parques lineares.
Assim, ao iniciar o complexo do Emerald Necklace pelo projeto do Back Bay Fens, uma área insalubre e alagada de
um bairro pobre de Boston, o paisagista trabalhou vislumbrando a construção de um sistema, que se tornou possível por ter
28
encontrado uma sociedade progressista e nanceiramente estável. A rede incluía o Boston Public Garden, o Boston Common, a
Commonwealth Avenue, o Back Bay Fens, o Riverway, o Olmsted Park, o Jamaica Park, o Arnold Arboretum e o Franklin Park,
unidos por uma série de caminhos verdes.
O grande valor desse projeto, que naquele momento ainda não possuía o aparato e as exigências ecológicas atuais,
foi o de ser inaugural do conceito de sistema urbano de áreas verdes, valorizando a água, os alagados e os cenários naturais,
protegendo-os e ampliando suas possibilidades naturais e de interação com a população do entorno, ainda que mais focado na
natureza que na sociedade.
A partir dos projetos do Central Park e do Emerald Necklace, Olmsted deu início a outra forma de convívio entre natureza
e cidade e fez repercutirem suas idéias e seu trabalho. A base de seu pensamento localiza-se no paradigma de que cada nação,
território ou localidade possui características singulares estéticas e físicas que devem ser protegidas e estudadas, reconhecendo
o meio e reconhecendo-se no meio, desfrutando-o, porém preservando-o. Foi com o parque da ilha de Manhattan e o sistema
de parques de Boston que ele instalou a losoa americana de parques nacionais urbanos de preservação e lazer, inspirando
paisagistas no mundo todo até a atualidade.
Assim, em que pesem os registros da existência de parques urbanos e nacionais desde a Antiguidade, foi essa experiência
americana do século XIX e seus princípios que atravessaram o oceano e inauguraram esse novo paradigma de natureza na cidade:
não mais apenas uma natureza estética ou de deleite, mas como condição de sobrevivência do meio.
Outro reformador social de destaque, Ebenezer Howard, projetou seus ideais nas cidades-jardins em 1898, modelo que
ganhou seguidores em diversos lugares do mundo devido aos seus princípios higienistas e estéticos contrapostos à industrialização.
O urbanista adotou a importância de balancear o desenvolvimento com as necessidades da natureza. De seu protótipo, destacam-se
alamedas radiais, ajardinadas, no entorno da cidade, os vários espaços vegetados e o famoso cinturão verde do entorno, que, além
de impor limite a crescimentos desordenados, demarcava com clareza as áreas edicadas e as áreas rurais e de abastecimento.
Apesar de sua origem nas cidades-jardins, os cintues verdes de Howard foram revisitados e tomaram força nos projetos da
década de 30 do culo passado. Seu novo desenho incla, além das preconizadas zonas tampão “buffer zones” e de agricultura,
uma vasta zona ativa e complementar à cidade, incorporando indústrias, escolas, estradas, grandes áreas de lazer e espaços
governamentais, modicando com essa nova infraestrutura construída a proposta do cinturão verde inicial. Deve-se ressalvar que o
direito de edicar nessas áreas, introduzido por sua proposta, defendia que a estrutura construída fosse permeada por extensas áreas
verdes. Remodelados a partir dos anos de 1990, tais cinturões passaram a incluir infraestrutura urbana, como trilhas de caminhada,
corredores verdes, orestas-tamo no entorno urbano, alagados naturais e construídos, e diversos pequenos cinturões verdes nas
divisas das áreas de vizinhança, oferecendo um contato mais direto e fácil da comunidade com a natureza.
29
Outro plano contemporâneo ao sistema de parques de Boston, menos famoso, mas o menos importante, foi o sistema de
parques de Minneapolis e St. Paul, recentemente reformulado pela Universidade de Minnesota e denominado Grand Rounds. Elaborado
inicialmente pelo arquiteto paisagista Horace W. S. Cleveland, o projeto data de 1890 e tratava de uma rede de vias cênicas, parques e
alamedas nas encostas do rio. O projeto original tinha o objetivo de preservar os diversos alagados existentes no entorno da cidade e as
áreas naturais ao longo do Rio Mississippi. Contemplava, simultaneamente, um sistema de parques de mais de 2.589,99 ha de área e 58
milhas de alamedas do lado de Minneapolis e 1.702,51 ha de área e 46 milhas de alamedas parques do lado de St. Paul.
No Brasil, o exemplo mais curioso é o da Floresta da Tijuca
7
,
4
inteiramente inserido na área urbana e reconhecido como
parque nacional em 1961. Sua história é, no mínimo, instigante, pois essa oresta não foi sempre assim. Tendo sido inteiramente
desmatada para a cultura do café, encontrava-se degradada e abandonada em meados de 1850. Para salvá-la, em 1856 o Governo
Imperial desapropriou os terrenos localizados ao redor das nascentes e, em seguida, pelo Decreto 577 de 11 de novembro de 1861,
iniciou o replantio das espécies nativas e a sua conservação. Essa experiência botânica foi introduzida na realidade nacional pela
família imperial brasileira, que trouxe, em 1817, a Missão Austríaca integrada por Carl Friedrich Von Martius (1794 – 1868).
O trabalho de reorestamento do lugar iniciou-se em 1862, sob o comando do Major da Guarda Nacional Manuel Gomes
Acher. Este, com a ajuda de seus escravos, buscava mudas a 60 km, em Guaratiba. A idéia era reconstituir a oresta nativa e,
como essa havia sido completamente dizimada, buscavam-se exemplares remanescentes nas proximidades que possuíssem
latitudes e altitudes geográcas similares. O replantio foi continuado até 1888 pelo Barão Gastão D’Escragnole, com a colaboração
do paisagista botânico francês Auguste François Marie Glaziou. Nos primeiros anos do século XX, a oresta caiu no abandono,
período em que os trabalhos foram sucessivamente retomados e abandonados, até que, em 1973, foi integrada ao Parque Nacional
da Tijuca, antigo Parque Nacional do Rio de Janeiro, instituído em 1961. Em 1990, foi declarada integrante da Reserva da Mata
Atlântica e Patrimônio Natural da Humanidade pela UNESCO.
Apesar das fortes pressões pela urbanização que sofreu ao longo do século XIX, esse trabalho transformou-se na primeira
e mais bem sucedida experiência ecológica de reorestamento do mundo tropical, dando uma lição de conservação da natureza
para o mundo e servindo de norte para uma política ambientalista interna em se tratando de encostas.
Quanto à construção do pensamento ecológico, a história evolutiva tem seu marco em 1932, quando surge a Carta de Atenas,
resultado dos trabalhos do Congresso Mundial de Arquitetura, que estabeleceu os princípios do funcionalismo na arquitetura e no
planejamento urbano modernista. A divisão funcional em moradia, trabalho, deslocamento e lazer, que apregoa a Carta de Atenas,
está muito próxima do que vinha sendo debatido pelo higienismo dos princípios do século. A nova versão conduziu ao zoneamento
urbano, que teve como conseqüência a domesticação e a redução notável de espaços verdes, concepção hoje superada.
7 AFONSO, Sônia. p. 380 a 381
30
Palomo (2003, p.14) faz uma reexão a respeito da cidade modernista:
Este modelo de cidade funcional tem demonstrado suas limitações e sua falta de elasticidade para adaptar-se a situações de
baixo nível econômico ou atividades próximas à marginalidade e ao desemprego, e uma incapacidade total de integrar os valores
alheios ao sistema de oferta e demanda. A grande maioria dos países em vias de desenvolvimento ca fora desse modelo, que
tem conduzido em todos os casos a uma inevitável densicação urbana e ao congestionamento do tráfego privado.
85
Entretanto, apesar de essa trajetória levar as pessoas a reetir e entender como a sua inserção nos lugares afeta o ambiente
natural, esse enfoque ainda se mostrava frágil ante os projetos urbanos até os anos de 1960, quando Ian McHarg o articulou em
seus estudos publicados no livro Design with nature, de 1969. Foi McHarg quem desenvolveu o método de superposição de mapas
temáticos transparentes que, interpretados como sistema de valores, revelavam áreas apropriadas a diferentes usos humanos.
Com esse procedimento, ele inaugurou uma leitura da paisagem em que se tornam visíveis as dimensões ambientais de proteção
e as passíveis de ocupação.
O método foi acolhido mundialmente e veio se aperfeiçoando, especialmente porque apresentava lacunas nas interações
entre sociedade e paisagem, dado que os elementos biofísicos apresentam realidades distintas, mas, em todos os casos,
interdependentes dos usos sociais do território.
O avanço da tecnologia computacional nos anos de 1970 de imediato proveu recursos para entender e avaliar as
paisagens e ampliou concomitantemente um espectro de alternativas de adequação da ação humana sobre os processos naturais,
proporcionando aos planejadores das cidades armazenar e cruzar informações do meio biofísico e cultural de forma rápida e
precisa, abrindo possibilidades e opções inteligentes de ocupação e desenvolvimento das atividades humanas no território.
No nal dos anos 70, com a mentalidade de proteção ambiental já consolidada, surgem as pesquisas sobre como aplicar
os princípios ecológicos do planejamento à paisagem urbana, que tomam corpo nos estudos de Michel Hough, Anne Spirn, John
Lyle. A partir de então, na tentativa de traduzir os princípios ecológicos para a escala prática dos planejadores e arquitetos e ao
interpretar o pensamento dos ecologistas de outras áreas do conhecimento, elaboraram-se contribuições para que a informação
ecológica seja organizada de forma útil à intervenção. Surge a ecologia da paisagem. A cidade passa a ser reconhecida como parte
integrante da natureza e deve reconhecer a analisar os processos de interação que ocorrem na zona rural.
8 El modelo de ciudad funcional há demostrado sus limitaciones y su falta de elasticidad para adaptarse a situaciones de bajo nivel económico o actividades próximas a la marginalidade y al de-
sempleo, y uma incapacidad total para integrar los valores ajenos de la oferta y la demanda. La grand mayoría de los países en vías de desarrollo queda fuera de este modelo, que ha conducido
en todos los casos a una inevitable densicación urbana y a la congestión del tráco privado.
31
A década dos anos 80 é muito profícua, nela surgem movimentos e documentos, na Europa e na América, com
recomendões sobre a atuação política formal no ambiente urbano. Entre esses es o Relatório da Comiso de Bruntland,
elaborado entre 1983 a 1987, com o enfoque planerio que denunciou com rigor os problemas ambientais e demonstrou
suas preocupações e recomendações para o futuro. No parecer, emerge pela primeira vez o conceito de desenvolvimento
sustentável, além do desao obrigario de compatibilizar políticas ambientais e desenvolvimento das cidades. Em 1986, a
Organização Mundial de Sde e em marcha seu programa de cidades saudáveis, recuperando algumas iias higienistas
da cidade-jardim de Howard.
O Relatório deu transparência à enorme entropia instalada no mundo e tornou urgente propor um novo modelo de
desenvolvimento. Assim, Richard T. T. Forman e Michel Godron, na obra Landscape ecology, de 1986, fundem os conhecimentos
de geógrafos, ecologistas, arquitetos-paisagistas, planejadores e historiadores como instrumento de leitura e compreensão da
estrutura, função e mudanças das paisagens, criando um quadro de referência para arquitetos planejadores e um modelo para
explorar como a paisagem do território evolui em conjunto com os processos ecológicos.
A abordagem centraliza-se na paisagem urbana como ecossistema, ou seja, uma coleção de organismos vivos
interagindo entre si e com os ambientes naturais e construídos. Parte do princípio de que entender os mecanismos subjacentes
aos ecossistemas urbanos constitui a base para projetos sustentáveis. A paisagem passa, então, a ser uma resultante das
interações dos fatores sicos, biológicos e culturais, conectados por um uxo de energia, matéria e espécies cujo equilíbrio
produz a estabilidade dos ecossistemas. A cidade é, nessa perspectiva, um ecossistema em que convivem comunidades
bióticas e abióticas entreladas pela cultura e onde a estrutura ecogica de sustentação assume um signicado decisivo tanto
na forma perceptiva como na de conformação do ambiente.
Em 1992, acontece no Rio de Janeiro, Brasil, a I Conferência Mundial das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e
Desenvolvimento – Eco 92, com o objetivo de avançar nos trabalhos anteriores ao constatar os níveis alarmantes de degradação
ambiental e a conseqüente miséria dos povos. Como forma de enfrentar esse quadro, suas deliberações propuseram a adoção de
uma agenda que norteasse uma política mundial de respeito e cooperação, denominada Agenda 21, que deveria ter desdobramentos
em todos os países até atingir as cidades. Assim, cada cidade deveria ter uma agenda própria de ação com base nos princípios de
desenvolvimento humano, preservando o meio ambiente e a cultura.
Na prática, entretanto, pela análise de Dean (1996, p.378), essa Conferência legou para o futuro uma das mais utilitaristas
e mesquinhas concepções do mundo natural dos tempos modernos. A diversidade da vida é rotulada de ‘recursos genéticos’, as
orestas, de ‘recurso renovável’ e a preservação passa a se chamar ‘uso sustentável’, jogando o paradigma da sustentabilidade
32
na vala comum. A idéia traz, de forma dissimulada, para a prática, o sentido de extrair a máxima sustentação possível a partir dos
substratos vivos. Posta em prática, a proposição isentou muitas biotas de proteção.
Em 2002, em Johanesburgo, aconteceu a II Conferência Mundial das Nações Unidas para o Meio Ambiente, onde, am de se
constatar o agravamento do quadro de pobreza e degradação ambiental, expuseram-se as diculdades, em distintos veis, de atingir
índices de solidariedade e cooperação entre pobres e ricos, no âmbito local ou global. Os temas centrais debatidos e, portanto, as
grandes questões que continuaram e continuam na pauta do dia são: erradicação da pobreza; pades insustentáveis de consumo e
produção; manejo sustentável de recursos naturais; compatibilização da globalização e do desenvolvimento sustentável.
Em nossa realidade latino-americana, constatamos que, na maioria de nossas cidades, desequilíbrio entre concentração
humana e capacidade de oferecer serviços mínimos, o que gera a ‘invasão’ indiscriminada e sem planejamento adequado das
periferias urbanas, resultando em perda de terras, de recursos naturais e de paisagem. Diante da incapacidade que temos
demonstrado de resolver esse quadro, os problemas ambientais têm-se agravado.
Dado o tamanho e a diversidade ambiental, social e econômica de nossas cidades, grandes planos abrangentes não
são mais capazes de atender a toda a demanda ambiental e social. Faz-se então necessário descer às especicidades, ou seja,
elaborar planos complementares que subsidiem por denição o plano de ação.
A estratégia que vem sendo desenvolvida nos anos 2000, denominada infraestrutura verde, caracteriza-se por uma nova
postura de projeto para o meio urbano, por cuidar de cada ambiente com atenção às suas condições biofísicas e sociais e manter
o foco nas redes regionais de espaços abertos.
Tal postura vem ganhando notabilidade e sendo adotada no desenvolvimento e execução de projetos. Mesmo quando
altera o funcionamento de ecossistemas naturais, tem produzido uma compensação capaz de reequilibrar o sistema ao propiciar a
sustentabilidade urbana. O objetivo de tal estratégia é buscar o equilíbrio entre o ambiente biofísico e a sociedade, adotando ações
de conservação próprias do lugar para promover o desenvolvimento necessário.
1.2 Conceitos do planejamento urbano ecológico
Comecemos por uma breve revisão dos conceitos de paisagem, sustentabilidade e percepção.
A paisagem é aqui entendida pelo conjunto de memórias, imagens, concepções, atitudes e valores que se desenvolvem na
mente de todos aqueles que a vêem, usam e conhecem, podendo ser diferente da realidade física. O imaterial marca o material e
dene a forma como ela é percebida bem como a forma de o homem atuar sobre ela. O desao do projeto reside então em unir o
imaterial e o material, ou seja, materializar na realidade física os anseios das comunidades.
33
Contudo, para se atingir a perenidade dos elementos físicos que conguram e estruturam a paisagem, é necessária uma
ação planejada. A manutenção da natureza na cidade, resultado da determinação social e política, exige ajustes de magnitude,
necessidades, distribuição, combinação e acessibilidade.
Planejar a paisagem é, portanto, uma ação integradora de disciplinas e enfoques diversos. É reconhecer restrições e valores e
impor limites. É responder previamente que desenvolvimento se pretende atingir. Para am de objetivos econômicos e de mais-valia,
devem-se eleger as compensações que deverão incorporar o novo sistema e que, ao darem respostas aos anseios sociais, permitam
a adaptação do meio ambiente, restringindo a entropia. Envolve ainda conceitos de equidade e respeito, uma atitude ética.
Lima (1996) diz que a arquitetura paisagística surge como um campo privilegiado de materialização da natureza na cidade
e consolida-se como atividade projetual no século XX ao rearmar uma avaliação das relações entre processos sociais e naturais.
Nessa mesma linha, Palomo (2003, p.283) assegura que
O coerente é propor um planejamento que integre as políticas econômicas, sociais e de qualidade espacial, sejam paisagísticas,
ambientais, ecológicas, tudo em harmonia com a capacidade física do território, de modo que o integre e contribua para tornar
realidade o desenvolvimento sustentável.
96
Essa é uma forma de desenvolvimento que combate o utilitarismo e a estética imposta por padrões que pouco ou nada têm
a ver com as características e a cultura do local. Utilitarismo e padrões estéticos que têm prevalecido nas cidades e que não são
compatíveis com o bem-estar coletivo nem com a estabilidade do ambiente natural.
É forma que se arma como habilidade em manejar ecologia e economia, que, não sendo antagônicas, embora inseridas
na sociedade de consumo, apresentam difícil compatibilização com vistas a equilíbrios e compensações. Para Pellegrino (2006, p.
161), a “sustentabilidade das cidades somente torna-se possível quando esta é vista como parte indivisível de uma constelação de
paisagens conectadas, que devem ser planejadas e protegidas em seu conjunto”.
Conceito maior que o de proteção ambiental, a sustentabilidade envolve o equilíbrio entre sociedade, ecologia e economia.
Pode ser denida como um conjunto de posturas e técnicas de ocupação e apropriação do espaço geográco que investiga
alternativas de minimizar os impactos negativos na cidade, resultantes de seus processos de evolução urbana.
A noção de desenvolvimento sustentável implica em eciência ambiental e bem-estar social. Para se atingir a sustentabilidade
urbana, é necessário um planejamento comunitário e político, ocial, e uma responsabilidade compartilhada. Devem-se primar as
9 Lo coherente es abordar una planicación integrada, en la que las políticas que se adopten incorporen aspectos económicos, sociales, de la calidad espacial (paisajísticos, ambientales, ecoló-
gicos), y todo ello en armonía con la capacidad de carga del territorio, de modo que tal integración contribuya a hacer realidad el desarrollo sostenible.
34
decisões tomadas em conjunto, cidadãos e poder público, nas quais prioritário é o que proporciona maior retorno com menor
consumo e perda de energia. A visão ecológica, nesse sentido, é cientíca, mas também especulativa e integradora, busca equalizar
os ecossistemas existentes e os construídos na cidade.
O desenvolvimento sustentável diz respeito a prover qualidade de vida à comunidade a partir de uma estrutura
socioeconômica, contudo minimizando os impactos no ambiente local ou global. As dimensões da sustentabilidade nas cidades
são: ecológica, social e econômica.
Por mais brilhantes que possam ser as soluções urbanísticas, a sustentabilidade se torna viável se criar entre as pessoas
maior consciência sobre os impactos negativos de determinados modos de vida. Todos são parte do problema e as soluções, a
despeito de surgirem da equalização dos problemas, devem ser discutidas, originadas e aprovadas pelas pessoas que terão de
efetivá-las e com elas conviver. Assim, segundo Lyle (1994), “tornar visíveis os processos ecológicos que suportam a vida será uma
importante parte dessa paisagem emergente.”
107
Sustentabilidade é, portanto, também um processo de visibilidade.
A visibilidade exige a percepção da paisagem, que se pela experiência cotidiana. Ela é uma ação experienciada e formada
pelas condições biofísicas do ambiente em interação com as ações humanas e acontece de acordo com registros previamente
armazenados. Pellegrino (1995, p.12) explicita bem essa forma de o homem captar o meio:
O uso e o hábito organizam uma imagem perceptiva da paisagem que, apesar de calcada em sua imagem física, se sobrepõe
a esta, passando a ser o elemento de manifestação concreta do espaço, transcendendo a própria realidade material, com a
criação de uma co-realidade.
O cidadão ordinário percebe e vive a cidade em fragmentos de espaços que vão sendo apropriados em suas relações
cotidianas. É então pela vivência que confere signicado aos lugares. Dessa forma, a apropriação social da paisagem constitui um
instrumento que poderá garantir o uso e a permanência das ideias e dos símbolos.
Para que os ambientes da cidade permitam uma percepção adequada, os projetos devem partir do conhecimento
especíco, rigoroso e profundo do local, evitando formulões genéricas. Situar o problema a ser enfrentado no tempo e no
espaço, diagnosticar sua complexidade e singularidade signicam dizer que o projeto deve tomar como medida as condições
biosicas do lugar e balizá-las pelas interações sociais, com vistas a propiciar uma inserção precisa dos cidadãos no meio pela
compreensão de suas estruturas funcionais e relacionais em um ambiente saudável.
10 Apud MENEGUETTI, 2007, p.43
35
A intervenção deve, portanto, reetir com clareza o meio e a cultura, facilitando a percepção dos cidadãos de sua cidade,
levando-os à ação esclarecida. Segundo M. R. Levin, “os planejadores carregam a tarefa de ampliar a gama de escolha informada
e inteligente. Em um sentido direto, somos, como outros prossionais, educadores públicos.”
118
Nessa perspectiva, o planejamento urbano ecogico se arma como o paradigma que torna possível explorar uma base
estratégica de projeto que pode aliar a melhoria da qualidade de vida urbana à recuperação dos ecossistemas locais, dada pela percepção
e compreensão do espaço habitado e sua capacidade de recuperar-se, levando-o a compensações que produzam sustentabilidade.
É um método no qual os planos urbanos são denidos a partir do meio natural e das relações ecológicas estabelecidas
entre si e com a cultura de cada povo. Forma de planejamento em que o ambiente natural é assumido como um componente
essencial de suporte que acomoda a cidade, embora não se constitua em fator determinista do ato de projetar.
Essa ação permite avaliar as potencialidades e a capacidade de adaptação às intervenções dos diversos sítios urbanos,
adequando-os para incorporar e consolidar processos de urbanização e, ao mesmo tempo, de autorrecuperação.
O planejamento urbano ecológico é o paradigma adotado nesta tese por entendermos que ele realiza uma nova maneira
de focalizar o urbanismo para o século XXI, ao vincular os valores e recursos naturais, ecológicos e ambientais aos sociais e
paisagísticos da cidade. Um instrumento de planejamento altamente especializado, com equipes multidisciplinares e vocação
integradora das distintas áreas do conhecimento. É um modelo de pensar e construir cidades como parte da natureza, que pretende
superar as visões dualísticas de homem e natureza. Para Pellegrino (2000), é a criação de uma solução espacial capaz de manejar
as mudanças dos elementos da paisagem de modo que as intervenções humanas sejam compatibilizadas à capacidade dos
ecossistemas de absorver impactos e manter a integridade dos processos e ciclos vitais.
Caracteriza-se como um conjunto de alternativas futuras de inserção humana nos processos naturais. O planejamento
urbano ecológico é a denição criteriosa da acomodação das atividades humanas sobre uma base biofísica de suporte. É a
mediação entre as ações do homem e seu território. Expressa um processo e um domínio da prática prossional e da pesquisa
dentro da arquitetura da paisagem e do planejamento urbano sustentável. Assim, por mais adequados que sejam os projetos, eles
só se qualicam pela apropriação social. A materialidade do projeto se dá no lugar da vivência cotidiana.
O planejamento urbano ecológico é também um modo de focalizar o projeto como uma ferramenta capaz de desempenhar
papel preponderante na recuperação dos abusos e na reconciliação do uso humano da paisagem urbana, ao partir do princípio de
que a paisagem ou um ecossistema é resultante da somatória de organismos vivos que interagem entre si, sendo o homem apenas
parte desses organismos vivos.
11 Apud PALOMO: 2003, p.20 ( ... ) los planicadores cargan con la tarea de ampliar la gama de una eleción informada e inteligente. En un sentido directo, somos, como otros profesionales,
educadores públicos.
36
A postura de pensar e agir sobre a cidade demanda um plano complementar que subsidie o plano urbano ocial. Ao
reconhecer que a cidade necessita ser compensada diante dos inúmeros problemas biofísicos e sociais evidentes, apresenta
propostas fundamentadas passíveis de serem implementadas a curto prazo, sem desdobramentos nocivos a longo prazo, e que
provêem recursos ao desenvolvimento sociocultural e do meio ambiente. Trata-se de um planejamento que adota uma postura
ética com relação à natureza e à sociedade.
Como outra maneira de atuar nas cidades, revisa os princípios e práticas do planejamento urbano tradicional e introduz uma
nova forma de ver o solo urbano. Sendo assim, apresenta restrições ambientais, ecológicas e paisagísticas de uso e ocupação,
mas com ganhos estéticos e econômicos consideráveis na qualidade de vida. O escopo é reequilibrar o tecido urbano, freando as
expansões meramente mercantis e industriais que geram concentração e vazios urbanísticos, e contribuir para preservar espaços
abertos e zonas naturais.
Os avanços do planejamento urbano ecológico em relação ao planejamento tradicional ou estudos tradicionais se dão
em duas dimensões: a da escala e a dos fatores humanos. Congura-se como uma ciência que pesquisa a fragmentação e a
conectividade realizadas pelo homem e determina os padrões de cada lugar sobre os ecossistemas naturais.
Segundo Pellegrino (2006), a fragmentação é dada pela ruptura dos ecossistemas naturais, resultado direto da
construção de cidades, o que de imediato produz dois efeitos: o rompimento da conectividade e a redução da área. Essa
redução pode ter como consequência a esterilização do meio e a extinção das espécies vegetais e animais, ameaçando a
biodiversidade.
A conectividade representa o esforço feito no sentido contrário, determinado por espaços físicos bem delimitados, como
os corredores verdes, e é denida como a capacidade da paisagem de gerar uxos entre seus elementos bióticos. É um conceito
que integra a capacidade dos processos bióticos, dada por mecanismos internos capazes de absorver e resistir às mudanças,
garantindo-lhes exibilidade e perenidade. Funda-se nos princípios ecológicos próprios dos ecossistemas naturais, quais sejam:
mínima intervenção nos espaços da estrutura ecológica de sustentação; equilíbrio entre população e recursos; preservação da
diversidade; manutenção sistêmica.
O que signica dizer que um planejamento urbano ecológico não se concebe a partir de fórmulas xas capazes de dar
respostas aos problemas da cidade de maneira generalizada, mas a partir de princípios ecológicos que incorporam modelos e
métodos de forma dinâmica. O homem, como parte do contexto, integra o meio ambiente, porém o altera e, se esse processo se
dá em uma relação de troca em que o homem reconhece e se adapta às regras da natureza, transformando-a de acordo com as
suas próprias regras, a sustentabilidade torna-se viável.
37
O que caracteriza essa forma de planejamento é a união os aspectos biofísicos, sociais e econômicos ao projeto e à
imagem do lugar que, ao se revelar, seduz o homem. Ela não segue uma fórmula, contudo forma processos e dene uma postura
de observação e permuta em que o projeto é parte integrante da gestão ambiental, ajustado às normas do meio ambiente e com
coerência no tempo e no espaço.
A ecologia da paisagem oferece, portanto, um conjunto de princípios a serem aplicados no planejamento e desenho da paisagem
urbana e regional, uma ferramenta importante para os planejadores e arquitetos-paisagistas manusearem na coleta de informações, análise
e interpretação de dados e realizarem propostas de intervenção. Caracterizada pela espacialização do início ao m do processo permite a
criação de uma ou mais propostas de desenho, facilita a comunicação entre as diversas disciplinas e os tomadores de decisões.
Ao visar a criação de ambientes sustentáveis nas cidades, a estratégia básica é procurar, no mosaico de paisagens, as
congurações biofísicas de suporte e adequá-las para que atendam aos princípios de ocupação e conservação.
Resultado dos aspectos naturais e culturais, a paisagem revela-se nos elementos visíveis, como rios, matas, lagos,
campos e cidades. A forma como esses elementos são utilizados reete a cultura de seus habitantes bem como suas atividades
de planejamento.
O uso sustentável ou sem degradação residual da paisagem pressupõe que, ao se radicar em um lugar, o homem deve
adotar, concomitantemente, medidas de implantação de uma estrutura de morar e medidas de conservação dos recursos naturais e
culturais, de forma que, ao atender aos anseios sociais do presente, garanta a perpetuação dos recursos renováveis, possibilitando
a perenidade ambiental e usos futuros.
É uma sustentabilidade que exige reconhecer a paisagem como um fato histórico em permanente estado de construção e
mutação e admitindo que ela se transforma por suas interações naturais ou pela ação humana num processo de construção que
pode garantir a estabilidade dos ecossistemas.
O planejamento ecológico da paisagem manifesta-se então na forma de agenciar espacialmente as mudanças da paisagem,
para acomodar as ações humanas, compatibilizando maior capacidade de absorção e recuperação do meio, mantendo os ciclos
vitais do lugar.
1.3 Uma alternativa de projeto para espaços abertos urbanos
As montanhas, colinas, vales, rios, córregos, riachos, lagos, bosques, pradarias determinam os aspectos climáticos e,
em certa medida, os ambientes das cidades. A qualidade do projeto depende do equilíbrio que a intervenção estabelece entre a
comunidade e os elementos previamente existentes.
38
princípios ou parâmetros que podem e devem nortear as intervenções, atuando como marcos de referência a partir
dos quais, dentro de um quadro de individualidade e singularidades, pode-se explorar, em variadas combinações, o que, em um
determinado período da história e em um determinado lugar, será capaz de responder às necessidades ecológicas do meio físico
e cultural da sociedade do lugar.
A vegetação e a água têm inuência determinante na manutenção de microclimas agradáveis dentro das cidades: eliminam
a poluição, transformam e puricam os gases tóxicos e agentes químicos, proporcionam condições favoráveis ao desenvolvimento
da vida animal. Quando combinadas em proporções adequadas, equilibram os ciclos hidrológicos, poupam energia, evitam gastos
desnecessários e catástrofes, além de construir uma nova dimensão estética do lugar.
As grandes superfícies cobertas bem como as vias pavimentadas são problemas urbanos com desdobramentos
desagradáveis e destrutivos, como o aquecimento resultante da superexposição à radiação solar; as enchentes e os
assoreamentos pós-chuvas intensas. A implantação da infraestrutura verde nos espaços propicia consideráveis ganhos de
saúde ambiental, sejam eles físicos, sociais, econômicos ou estéticos. São inegáveis os ganhos climáticos e ambientais quando
se adotam soluções verdes nas cidades.
A estratégia de ação que se denomina infraestrutura verde, para Benedict e McMahon (2006), pode ser denida como
uma rede que interconecta espaços naturais e outros espaços abertos para conservar valores e funções de ecossistemas naturais,
sustentando a água e o ar limpos ao incorporar benefícios para as pessoas e a vida selvagem. Infraestrutura verde é, então,
uma estrutura ecológica para o desenvolvimento social e econômico saudável, que permite à percepção popular saber como foi
elaborado o planejamento e quais são os instrumentos de proteção dos espaços verdes.
O conceito enfatiza a importância dos espaços verdes abertos como partes de um sistema interconectado de proteção e
manejo que provê benefícios ecogicos. Ajuda, portanto, as comunidades a identicar e a priorizar as oportunidades dentro de um
plano de desenvolvimento e de caminhos que otimizam um uso da terra que concilia as necessidades das pessoas e da natureza.
Ainda Benedict e McMahon (2006, p.xvii) dizem que a infraestrutura verde propicia a racionalidade cientíca ao habilitar a
comunidade a colocar os objetivos políticos a serviço da qualidade de vida:
Ela encoraja as pessoas a focar nos benefícios do planejamento holístico do uso da terra e enfatiza a congruência dos
objetivos ambientais e econômicos. Pela elevação da importância de nanciar a longo prazo a gestão e a conservação de
espaços abertos, a infraestrutura verde pode garantir que os nossos planos sejam realistas e factíveis.
129
12 It encourages people to focus on the benets of holistic land-use planning and emphasizes the congruence of environmental and economic goals. By elevation the importance of long-term
funding of open space conservation and management, green infrastructure can guarantee that our plans are realistic and realizable.
39
A infraestrutura verde é, portanto, uma base estratégica, uma alternativa que assume diferentes signicados, da vegetação
ao manejo das águas pluviais. Sua denição como um sistema de conexão de áreas naturais e espaços abertos construídos,
destinados à conservação das características ecossistêmicas da água, do solo, do ar, das comunidades bióticas animais e vegetais,
provê benefícios para as pessoas. É o sistema planejado e construído que toma como suporte a natureza no ambiente da cidade.
Essa abordagem focaliza a natureza na cidade não apenas como um conjunto ou malha de fragmentos e reservas naturais
interconectados, mas também as estruturas próprias da urbanizão, como ruas, calçadas, galerias de esgoto pluvial, jardins privados,
entre outros. Parte da premissa de que as cidades o o lugar onde as pessoas trabalham, circulam, compram, satisfazem necessidades
estéticas e sociais e, nesse cotidiano, devem conviver, reconhecer, apreciar e se identicar com os processos naturais.
O modelo, no entanto, não é único, tendo sido defendido por outros autores com distintas representações, a exemplo
do modelo da Universidade de Minnesota elaborado na década de 1990, que reestrutura o projeto de Horace W. S. Cleveland,
de 1883, denominado por Willian Watts Folwell, em 1891, de sistema de parques Grand Rounds. O projeto original se constituía
apenas de um programa de cenário urbano de preservação de espaços públicos e parques conectados por grandes alamedas,
abrangendo rios, lagos, encostas e fundos de vale.
O trabalho atual, datado de 1994 e 1995, elaborado pelo Colégio de Arquitetura e Arquitetura da Paisagem do Centro
de Desenho da Paisagem Urbana Americana, denominado um estudo de caso, integra desenho urbano e ecologia, e adota
como princípio a redenão do rio Mississippi como um rio comunirio ao longo do qual se desenvolveu a estrutura das duas
metpoles por ele divididas: Minneapolis e St. Paul. Nesse novo desenho, corredores, redes e bacias hidrográcas são os
elementos estruturais de coneo entre o rio e as duas cidades. Esse trabalho, que vem sendo desenvolvido em parceria com
a sociedade civil, atua nas mais distintas realidades. Em 1998, foi reconhecido comoCaminho Cênico Nacional” pelo governo
americano. Atualmente, o projeto se dedica a desenvolver estudos de casos de lugares especícos, integrados ao projeto maior
e de aplicação a curto prazo.
É importante ressaltar que esse é um estudo exemplar, em que pesem as diferenças físicas, sociais e econômicas que
guarda em relação às nossas cidades brasileiras. Deve ser conhecido e entendido pelo seu formato de malha articulada que engloba
características ambientais, culturais e nanceiras semelhantes, e em que os diversos ambientes de natureza estão contidos de
alguma forma, interligados e em permanente troca, retroalimentando-se, condição essencial para a manutenção do equilíbrio.
Portanto, a infraestrutura verde são os processos sistêmicos de promoção de estratégias de aproximação para a conservação
do solo em escala local, regional, estadual e nacional, reestruturando o planejamento e as práticas de uso do solo com bons
resultados para a natureza e as pessoas. Ela é um instrumental a ser usado para guiar o futuro crescimento e o desenvolvimento
40
do solo ao mesmo tempo que sua conservação, ao tomar decisões que acomodam o crescimento populacional com medidas de
proteção e preservação de valores comunitários e de recursos naturais.
Essa estrutura abrange uma extensa variedade de recursos naturais na recuperação de características da paisagem e
ecossistemas nativos, incluindo a conservação natural de áreas: alagados;orestas; caminhos dágua e habitats de vida selvagem; áreas
de conservação públicas e privadas, como: parques nacionais; parques estaduais; de preservação natural; corredores de vida selvagem;
fazendas; sítios; chácaras; solos agricultáveis, entre outros espaços abertos de proteção, como vistas panorâmicas e caminhos verdes.
Por conseguinte, é um sistema que pode contribuir com importantes valores ecológicos e sociais, como proteger habitats
de vida selvagem e ou promover uma base natural para espaços de recreação e relaxamento. Proteger o sistema natural e
a biodiversidade é um importante objetivo da infraestrutura verde, mas ela pode incluir, também, uma extensa diversidade de
elementos que não estão diretamente relacionados com os seus objetivos. Criar uma rede de infraestrutura verde pressupõe
pesquisar onde estão as oportunidades existentes.
Segundo Benedict e McMahon (2006), a infraestrutura verde tem origem em duas iniciativas fundamentais:
interligar e proteger parques e outros espaços verdes para beneficiar pessoas com recreação, saúde, estética e conforto 1.
urbano;
preservar as áreas de conexão naturais em benefício da biodiversidade, opondo-se à fragmentação e promovendo a proteção 2.
de habitats de plantas nativas, animais, processos naturais e ecossistemas. O movimento de infraestrutura verde ajuda as
pessoas a compreender quais princípios estão por trás do projeto e sua implantação, por apoiar-se em uma rede de diversos
trabalhos comprometidos com o conjunto e apontar a direção da ampliação das estratégias de conservação.
Dessa forma, centra-se em três princípios que a norteiam e a diferem de outras formas de pensar o meio ambiente urbano:
enfatiza a ecologia, em que a recreação pode assumir caráter complementar;1.
demarca as áreas ecológicas estruturais como chaves do sistema de conexão de paisagens;2.
dene e qualica a forma urbana, que passa a ser o elemento de partida de sua estrutura de crescimento, ao identicar, 3.
previamente, quais são as áreas ecológicas signicativas e que devem ser preservadas; oportuniza as áreas apropriadas a
receber a estrutura urbana construída e, portanto, o desenvolvimento adequado para o lugar.
A manutenção de um sistema dessa envergadura, estabelecido entre vegetação, água e vida animal, necessita de
conectores. Assim, ao planejar a cidade, o desenho dos espaços livres e verdes devem assumir essa função, estabelecendo uma
rede urbana de lugares que cumprem seu papel biológico, além de oportunidades e experiências recreacionais e educacionais.
41
Nesses ambientes, a pesquisa e a aplicação de espécies nativas ou adaptadas são uma questão de inteligência e economia,
pois permitem à vegetação e ao ambiente respostas otimizadas com baixo esforço e custo de manutenção. Hough (1998) arma
que a manutenção da paisagem pode converter-se em processo de gestão integrada, baseada em parâmetros ecológicos, ao
mesmo tempo em que nos ferramentas práticas para manter paisagens produtivas e autossustentáveis. As espécies vegetais
apropriadas devem estar relacionadas à estrutura de suporte, à fauna, à adaptabilidade dos solos, ao clima, aos ventos, à drenagem,
entre tantos outros elementos de interação sociocultural.
Esse esforço deve ainda ser complementado ao redenir, nas áreas urbanizadas, quais espaços devem ser renaturalizados,
como, por exemplo, o reorestamento de áreas degradadas, a introdução de novas áreas vegetadas e a construção de alagados ou o
favorecimento de seu surgimento com condições hidrológicas apropriadas a recuperar o sistema natural. Quando essas medidas são
tomadas a partir de um zoneamento ecológico em que se detectam áreas frágeis e que exigem um nível de conservão mais rigoroso,
os benefícios ambientais, sociais e estéticos saltam aos olhos, além da economia de energia, de material e de mão de obra.
A recomposição da ora urbana tem um potencial signicativo para se tornar um meio ambiente rico e produtivo. Ela pode
converter, de forma crescente, o uso funcional da terra urbana e reverter quadros de desemprego e pobreza. Em distintas escalas,
a pequena produção agrícola pode realizar-se como pública ou privada, como parques urbanos produtores de alimentos e diversão.
Os processos de produção de alimentos, como jardins bem cuidados e gestão adequada dos solos, reverte a invisibilidade a que
esses ambientes têm sido connados, enriquecem a experiência urbana e proporcionam novas bases estéticas de sustentabilidade
que têm sua origem no lugar.
A aplicação desses princípios no projeto e na gestão urbana deixa transparecer a necessidade da apropriação de um
novo conceito de paisagem urbana, que passa por medidas radicais de conservação ambiental como forma de assegurar a
viabilidade social. de se adotar uma losoa de projeto que integre ideais do urbanismo com a natureza. Apropriar-nos dos
sistemas biológicos e dos valores da terra e, portanto, nos desalienar são as ferramentas práticas de que lançaremos mão para
nos autossustentarmos no momento presente e no futuro.
O entorno urbano, as áreas que margeiam a zona densamente ocupada, em geral são muito maiores e possuem mais recursos
dispoveis para a manuteão da vida em seu interior. Entretanto, os núcleos centrais têm recebido toda a atenção dos poderes
políticos e econômicos constituídos, como se fossem em si a cidade. As áreas periricas são negligenciadas e ocupadas de maneira
pouco cuidada, via de regra por uma populão que não teve oportunidades, marginalizada e marginalizando os espaços. Os espos
não ocupados são, ainda, os que correm mais riscos, pois o vistos como ociosos e à espera de possíveis expansões e ocupões.
Dessa forma, uma concepção urbastica que parta do planejamento urbano ecogico e siga em dirão à sustentabilidade deve ser
sistêmica, buscando conhecer cada parte do todo em sua especicidade e compreendendo qual é a sua função no todo.
42
A demarcação da estrutura verde é um passo fundamental na malha urbana. Porém, parte dessa estrutura, por exigência
dos processos de ocupação, passa a ser uma natureza domesticada, e nada impede isso se respeitadas suas características
de origem. O reconhecimento da forma e do formato da área e do modo de ocupação deve levar a preservá-la e conservá-la,
o que a tornará mais perene, informativa e formativa de seus processos biológicos de ora e fauna, economicamente viáveis e
esteticamente singulares.
O clima é o elemento da natureza que possui a maior capacidade de permear e transcender as fronteiras naturais e humanas.
Ele inuencia os ciclos das águas, das plantas, da fauna e conforma os lugares. Por outro lado, as ações humanas têm atuado e
modicado microclimas, adaptando-os às suas necessidades e modos de vida. Todavia, o conforto humano e a sobrevivência desses
novos lugares dependem do equilíbrio e da habilidade em adaptar o clima ao meio ambiente socialmente construído.
Os bosques e as áreas vegetadas, pântanos e águas são os habitats de vida animal. A diversidade, a estrutura e a contínua
evolução da ora, sua interação com o meio, solo e clima propiciam estabilidade e diversidade da população faunística.
A urbanização altera de forma radical esses habitats naturais e, portanto, as comunidades da fauna. Apesar disso,
o número de espécies animais que habita o ambiente urbano é significativo, principalmente o de pássaros e roedores, pois
a cidade possui inúmeros ambientes propícios, como fundos de vale, alagados tanto naturais como artificiais, parques,
bosques, encostas, entre outros. A manutenção da quantidade e diversidade da fauna é parte do ciclo ambiental, pois fauna
e florao interdependentes. A perpetuação da vida animal depende da estrutura da vegetação e de sua área de ocupação.
Dessa forma, estabelecer conees entre esses ambientes naturais no meio urbano é condão para a manutenção da flora
e da fauna, enfim, da vida.
Mesmo assim, nossa escala de valores e mesmo a saúde pública nos levam a discriminar as espécies, tornando algumas
bem vistas e outras extremamente combatidas. A questão é como e em que ambientes devem-se propiciar esses núcleos
biogeográcos e suas necessárias interlocuções e migrações. O projeto urbano feito a partir de um planejamento urbano ecológico
preserva áreas de orestas e matas, alagados e corredores verdes, basicamente formados por rios, riachos, córregos e nascentes
que, quando bem conservados, mantêm saudável toda a estrutura do entorno.
Essa constatação não desobriga, contudo, as gestões públicas da implantação e manutenção de outras estruturas verdes
urbanas, tais como ruas, paredes e tetos verdes. Ela apenas o tom da hierarquia que se estabelece entre esses ambientes.
Os espaços livres vegetados não podem ser restritos aos parques, bosques, jardins e praças. As vias e as áreas remanescentes,
públicas e privadas guram entre as diversas possibilidades que uma cidade oferece ao planejador e paisagista atentos, como
instrumento de mudança efetiva na forma de projetar e produzir uma nova cultura ambiental.
43
O planejamento urbano ecológico como objeto de pesquisa busca descortinar essas formas que podem ser exploradas
pela imaginação e pelo projeto urbano de reintroduzir a ora e, consequentemente, a fauna nas cidades. O que é necessário
aprender é que o valor dessas comunidades tem a ver com o equilíbrio da natureza, e que a vida humana é apenas parte desse
equilíbrio. Assim, o estudo de alternativas deve avançar na exploração de sistemas urbanos naturais e humanos, que invertam o
ciclo de entropia que tem avançado em nossas cidades, e que as torne mais belas e sustentáveis.
As ruas assumem nas cidades um caráter que lhes é peculiar, sem paralelo com outros espaços públicos. Ela talvez seja,
no cotidiano, o espaço mais comunitário que temos. Isso se comprova por sua utilização para jogos infantis e adultos, entre tantas
outras informalidades. Paradoxalmente, ao seu caráter eminente de circulação, pois em nossa cultura ela é vista diretamente
relacionada ao uxo de veículos, soma-se o desconhecimento de suas regras pelas pessoas que nela circulam e demarcam os
espaços de acordo com suas necessidades e conveniências, porque a rua, como disse Hough (1998), é um lugar melhor do que
os parques ou outros espaços públicos para se fazer muitas coisas.
Como armou Jacobs (2000) nos anos 60, a tendência de usar as ruas como espaços sociais é espontânea e natural.
Elas são usadas por diferentes pessoas e distintas atividades. Na sua diversidade de usos e usuários, elas vão denindo sua
vocação social, o que extrapola seu desenho de apenas unir lugares, de ser elo de ligação. Não é sem razão que os woonerf,
empregados nas cidades holandesas, zeram e fazem tanto sucesso, pois eles reconhecem e fomentam a multifuncionalidade da
rua, a diversidade das atividades sociais, rearmando esse espaço como lugar de convívio e troca de experiências, de que o carro
não está excluído, mas não é visto como o elemento que dita as regras à urbanização.
Claro que não são todas as ruas que podem assumir esse papel de lugar de encontro e permanência para
atividades de lazer e contemplação. Mas a grande maioria das ruas pode assumir outro enfoque que não o simplesmente
de ligação. Podem ser projetadas e constituírem elos verdes que interligam ambientes e funções, impondo-se como
lugares agradáveis, saudáveis e educativos no meio urbano. Devem estar inclusas também, nessa perspectiva, todas as
áreas abandonadas e de servidão pública, como trilhos, encostas de vias públicas de alta velocidade, áreas de torres de
alta tensão, entre outras.
Assim, pode-se concluir que as águas e as plantas são partes indivisíveis dos processos naturais das cidades e devem
ser tratados nesse contexto. Está claro que as plantas são fundamentais ao cenário urbano, para manutenção da água e da vida
selvagem e a saúde ecológica e humana.
Benedict e McMahon (2006) alinham dez princípios de infraestrutura verde e os denem como estratégias de aproximação
entre a estrutura de conservação e o uso sustentável da terra, beneciando pessoas e natureza. São eles:
44
conectividade como estratégia de desenho urbano, cujo foco é manter interligados o sistema natural de preservação e outros 1.
espaços abertos, pessoas e programas de desenvolvimento. Essa estratégia une parques, áreas de conservação, áreas
ripárias, alagados e áreas livres. Mesmo se incorporar novos valores, preserva a essência do sistema de vida natural da ora
e da fauna de forma a manter a saúde e a diversidade das distintas comunidades;
identicação da essência do conjunto, em que se reconhecem e se valorizam as individualidades de cada parte do sistema e 2.
como se dá sua relação e inuências no contexto. O resultado das interações é o que interessa e, por isso, toda intervenção
deve ter visão do parcial no global;
adoção da forma hostica de planejar e projetar a paisagem, unindo vários campos do conhecimento, dentre eles a biologia, 3.
a ecologia da paisagem, o planejamento regional e urbano, a arquitetura da paisagem, a geograa e a engenharia civil. Essas
ciências devem ter como foco comum o sucesso do sistema, ao unicar teoria e prática nos planos e desenho de uso da terra;
estabelecimento de uma estrutura de conservação e desenvolvimento que ajude a comunidade a priorizar as necessidades de 4.
conservação e a determinar qual desenvolvimento e crescimento desejam. As funções ecológicas essenciais são compreendidas
tanto pelo planejamento feito em conjunto como pela vivência cotidiana, partilhando da infraestrutura verde em seus espaços
livres, que fornecem, também, ferramentas que auxiliam a desenvolver instrumentos para seleção de alternativas para um
crescimento adequado, compacto e com redução de perda de energia;
instauração inicial de um plano de proteção para propiciar o desenvolvimento, com entendimento de que a restauração é 5.
um processo oneroso e desgastante, mas que a proteção que a infraestrutura verde possibilita, principalmente se for feita
preventivamente, garantirá suporte ao desenvolvimento mais equilibrado;
instauração de um processo de crítica propositiva, que leva a otimizar os investimentos públicos além de apontar alternativas 6.
mais naturais para o problema local, com atenção a todas as suas relações de conjunto, conjugando natureza e sociedade;
incorporação de benecios à natureza e às pessoas, ao interconectar natureza e sociedade: uma estratégia de uso da terra e de 7.
proteção da estrutura verde e/ou das áreas frágeis, com redução das necessidades de infraestrutura convencional e seus conseqüentes
distúrbios, ao identicar as áreas de risco e reduzir a vulnerabilidade dos assentamentos humanos a desastres naturais;
respeito às necessidades e aos desejos dos cidadãos envolvidos com a cidade. Assim, a infraestrutura verde não é um projeto 8.
somente para espaços públicos, mas envolve todos pelo princípio básico de redes. Seu sucesso requer o compromisso do
público e privado, de grandes e pequenas estruturas, incorporando cidadania ao projeto;
estabelecimento de conexões com e para a comunidade. Os projetos de infraestrutura verde devem estar centralizados em 9.
iniciativas de conservação do ambiente, com envolvimento direto da sociedade. Investigam oportunidades de construir uma
rede de espaços verdes ecossistêmicos de forma a atender, formar e responder [a]os anseios sociais;
45
comprometimento a longo prazo dos projetos, considerando as necessidades perdicas vitais de modificações e 10.
adaptões sociais e regionais para abarcar o crescimento desevel. Assim, é uma estrutura que se assume em
permanente estado de construção.
Proativa, a infraestrutura verde aproxima a conservação da terra e o desenvolvimento, porque provê, de imediato, um
número signicativo de benefícios ambientais, físicos e sociais. A implantação de suas redes incorpora uma inserção crítica de
produção do espaço de morar do homem, conectada com os paradigmas atuais de protão, conservão e biodiversidade.
Trabalha no sentido de manter o equilíbrio dos recursos hídricos e orestais, os usos da terra e outros sistemas naturais,
que, ao se articularem em rede, economizam os investimentos públicos direcionados ao sistema de saneamento tradicional,
aos alagamentos, desmoronamentos, assoreamentos, puricão da água, e incorporam um grande número de resultados e
soluções econômicas, de saúde, estéticos e de conforto humano.
A metodologia para a elaborão de propostas de infraestrutura verde para áreas de proteção ambiental urbanas
caracterizadas pela existência de grandes declividades, cursos d’água primários e secunrios e ocupação humana intensiva
segue duas linhas técnicas de ação bem definidas: uma dada pelo conhecimento das características estruturais próprias do
lugar como subsídio para explorar suas melhores habilidades, criada por McHarg; outra baseada na ecologia da paisagem.
O método de McHarg propõe o conhecimento da variedade intrínseca da terra e deve ser apropriado como critério de
aptidão dos solos e não pela simples sobreposição de mapas. Dele resultam zonas de uso. Esse planejamento avança em
relão aos zoneamentos tradicionais à medida que o ambiente natural e suas condões biofísicas o o primeiro parâmetro
de denição de manchas de ocupação, as quais se o posteriormente dentro de um quadro ecológico e cultural.
Assim, esse método foi adaptado aos conhecimentos cientícos atuais e à tecnologia digital, que permitiram maior
aproximação e precisão no cruzamento de informações, de maneira a obter como resultado um mapa-síntese.
Sustentada pelo planejamento urbano ecológico, a proposta adota corredores verdes e alagados construídos, para, com
eles, estabelecer uma infraestrutura que se baseia em:
relocação da população situada em áreas de risco de inundação;1.
relocação da população situada em localidades de alta declividade e sem rede de abastecimento de água e captação de esgoto;2.
criação de ambientes de transição entre as áreas orestadas e o ambiente urbano;3.
demarcação das áreas de adensamento populacional;4.
implantação de pequenos, médios e grandes alagados com múltiplas funções;5.
conexão das manchas de vegetação por intermédio de corredores verdes.6.
46
Um novo projeto elaborado com base no planejamento urbano ecológico e com a aplicação das estratégias de infraestrutura
verde deve conter:
redes, interligando corredores, manchas de vegetação e fragmentos orestais;1.
corredores formados por ruas, rios e áreas de servidão;2.
ruas verdes compostas por linhas de drenagem, localização das manchas de vegetação, áreas de retenção e inltração das 3.
águas pluviais de forma a proceder ao controle da poluição difusa, evitar assoreamentos, combater enchentes, manter as
temperaturas agradáveis e a boa qualidade atmosférica.
Dado que, como explicitado, a infraestrutura verde benecia diretamente as pessoas, muitas das estruturas provenientes
de trilhas, caminhos d’água e outros sítios naturais, utilizadas como áreas externas recreativas, são a base de uma nova forma de
ver e entender a natureza. Florestas, bosques, pradarias, corredores de rios não só propiciam a ltragem das águas das chuvas,
mas ampliam o senso estético comunitário.
O que nos permite concluir que, ao dar visibilidade à infraestrutura verde, estabelece-se o domínio sobre os anseios sociais,
eleva-se a auto-estima e a qualidade de vida. As redes de infraestrutura verde propiciam essa leitura e aproximam as comunidades
dos valores da terra, suas necessidades de proteção e potenciais a serem explorados, que devem nortear o desenvolvimento, as
novas leituras e escolhas, rearmando o sentido da história como uma construção feita a partir da compreensão da paisagem.
2.1. A constituição biofísica
oiânia localiza-se no centro do Brasil, em uma região de extensas planícies, com cotas em geral entre 700 e 900 m na porção
sudeste da Faixa de Dobramentos Brasília, formada por um amplo evento deformacional de natureza compressiva que evoluiu
entre 900 e 600 milhões de anos.
É modelada pelo vale do Rio Meia Ponte, que a atravessa no sentido noroeste-sudeste e determina o nível de erosão das
calhas de seus principais contribuintes. Pela margem direita, o Ribeirão Anicuns, onde se concentra a maior parte da população,
é um quadrante marcado por uma topograa de relevo suave e drenado por uma vasta rede hídrica. Entretanto, devido à intensa
ocupação, quase não dispõe de cobertura vegetal, de que resulta a contaminação dos cursos d’água e em que se registram as
principais ocorrências de degradação do solo e fundos de vale. na margem esquerda, seu grande contribuinte é o Ribeirão João
Leite, que abastece a cidade. É uma localidade com declividades mais acentuadas, ecossistemas frágeis e solos de maior aptidão
agrícola e onde se concentram os principais remanescentes de vegetação original.
Segundo dados do IBGE do Censo de 2000, a populão de Gonia somava a essa época 1.085.806 pessoas na zona
urbana, o que representava 99,3% do contingente total, com apenas 7.201 habitantes na zona rural. A taxa de crescimento registrada
entre 1991 e 2000 foi de 1,95% ao ano, o que leva a estimar para acada em curso uma taxa de crescimento de 1,85%. Assim, em
2010, estima-se que haverá, em Goiânia, uma população de 1.313.703 habitantes e, em 2020, de 1.515.815. (Fig. 1 e 2)
G
2 Goiânia: meio ambiente e projeto urbano
48
Fig. 1 – Fonte: http://www.portalbrasil.net/brasil_hidrograa.htm dia 30/11/2009 as 17:30.
A geologia
Em Goiânia, as rochas não possuem elevado potencial para acumulação e transmissão de águas em subsuperfície, por
não apresentarem espaços intergranulares. Acusam a presença de folissilicatos micas, e sua concentração resulta em um
comportamento mais plástico, afetando o grau de intersecção e manutenção da abertura das estruturas planares, entendidas como
juntas, fraturas, zonas de catáclase, dentre outras. também concentração de quartzo em determinadas porções dessas rochas,
de que resulta um comportamento inverso aos das micas, ou seja, a rocha torna-se mais quebradiça.
Na região, ocorrem ainda rochas correlacionadas ao Complexo Granulítico Anápolis-Itauçu e ao Grupo Araxá. As do
Complexo Granulítico Anápolis-Itauçu representam um conjunto modicado e de natureza, origem e idades diversas; as do Grupo
Araxá representam uma associação de rochas de idades similares e formadas em um ambiente comum.
49
Fig. 2 – Fonte: Governo do Estado de Goiás / 2003. Diagnóstico Hidrogeológico da Região de Goiânia.
A geologia do território goiano caracteriza- se pela predominância de elevações topográcas pouco acentuadas e extensas
áreas aplainadas, o que diculta o transporte de material de cobertura durante os períodos chuvosos, mas facilita o desenvolvimento
de solos espessos, fazendo desaparecer gradualmente o número de aoramentos. (Fig. 3)
A geomorfologia
Geomorfologicamente, de acordo com os estudos de formação clássicos, o território goiano divide-se em quatro
compartimentos: o Planalto Central Goiano; o Planalto Rebaixado de Goiânia; as Depressões e Morrarias do Rio dos Bois; e as
Planícies Aluviais.
50
É composto por relevos de topos tabulares e/ou planos rampeados de topo convexo, colinas de topo aguçado, morrarias,
com altitudes que variam de 720 a 1100 m. Essa área é coberta por latossolos muito profundos, de textura argilosa, característica
que pode ser também encontrada nas áreas mais planas do Complexo Granulítico Anápolis-Itauçu, cuja vegetação natural é de
cerrado, distinguível pelos remanescentes das formações de cerradão, cerrado stricto sensu e de campo de cerrado.
Há, contudo, outra compartimentação proposta pelo Diagnóstico Hidrogeológico da Região de Goiânia, denominada
de geomorfologia local, na qual identicam-se quatro compartimentos denominados de Depressão do Meia Ponte, Planalto
Dissecado, Planalto Rebaixado e Residuais de Aplainamento. Essa proposta de compartimentação, apesar de fragmentada em
relação à anteriormente descrita, justica-se pelo foco dado à morfologia da paisagem do território goiano.
A Depressão do Meia Ponte ou Terraços e Planícies da Bacia do Meia Ponte localiza-se ao longo do Rio Meia Ponte e
seus principais tributários os ribeirões: João Leite e Anicuns. Com altitudes variáveis entre 690 e 750 m e relevo ondulado, são
localidades onde predominam os processos de erosão e acumulação. Suas encostas são do tipo côncavo e a amplitude de relevo
não supera 70 m. Constitui-se bom aquífero, por possuir boas condições de recarga, apesar da baixa transmissividade em virtude
da restrita espessura dos depósitos uviais. Apresenta grandes riscos de contaminação das planícies e das águas subterrâneas
rasas e profundas, devido às constantes enchentes.
Fig. 3 – Fonte: Governo do Estado de Goiás / 2003. Diagnóstico Hidrogeológico da Região de Goiânia.
Geologia
Qa -aluvião
Pck-char nockitos
Pgaip-gnaissehiperaluminos o
Pg1-granito gama 1
Pg3-granito gama 3
Pgaio-granulitoanfibolito
Pgaip-granulitos bandados
Pgaip-granulitos paraderivados
Pmt-meta tufos básicos
Pmgb -metagabros
Pmp-metapiroxenitos
Pmqa -quartzito mi ceo
Pmp-xisto
Anápolis-Itauçu
Araxá
51
O Planalto Dissecado possui relevo ondulado e fortemente ondulado com cotas variáveis entre 760 a 1000 m e
predominância de processos erosivos. Com solos rasos e relevo ondulado, possui um bom escoamento supercial, mas com
redução da inltração, não sendo, portanto, um bom aquífero. Entretanto, suas águas subterrâneas estão pouco expostas à
contaminação. Divide-se em dois subsistemas: as Encostas Aguçadas e os Interúvios Planos. As Encostas Aguçadas possuem
declividade entre 20 e 40%, com escoamento rápido. Quando desprovidas de vegetação, geram uxos concentrados, originando
ravinas. os Interúvios Planos, situados na continuidade das encostas, possuem baixa declividade de 0 a 10%, com formas
planas e suavemente convexas, locais onde o uxo pluvial se concentra e onde aparecem ravinas.
O Planalto Rebaixado ou Chapadas de Goiânia situa-se à SO do município, com relevo entre plano e suavemente ondulado,
com declividades em média inferiores a 5%, cotas de altitude entre 760 e 1000 m, em que predominam processos intempéricos.
É compartimento em que se encontram todos os estratos da tosionomia dos cerrados, de campos limpos até cerrado stricto
sensu e mata mesofítica. Contudo, em sua maior extensão, a área se apresenta metamorfoseada, com a implantação de
atividades urbanas e agropecuárias.
É também espaço geomorfológico com melhores condições físicas para formação de bons aquíferos, pois possui latossolos
profundos. Subdivide-se em rampas coluvionadas e formas aplanadas, cujas rampas coluvionadas são as áreas que ligam os topos
dos relevos aos fundos de vales. Apresenta declividades de 5 a 10%, erosão laminar generalizada e ravinamentos. Com baixa
ocupação, acha-se bastante desmatada e antropizada. Já as formas aplanadas possuem solos estáveis com declividades de 0 a
5% e caracterizam-se como uma importante área de recarga natural do aquífero.
Os Residuais de Aplainamento, área especica deste estudo, caracteriza-se como um compartimento geomorfológico
de solos rasos, relevo ondulado, declividades por vezes superiores a 45% e cotas acima de 800 m, o que desfavorece a inltração
e recarga, não sendo um bom aquífero. Nesse sistema, predominam processos de erosão e transporte, com vertentes côncavas,
elevada densidade de drenagem e forte incisão de vales em “V”, bastante encaixados. Apresenta grande amplitude, em média de
100 m entre as cumeeiras e os talvegues mais rebaixados, formando um anel elipsoidal no entorno dos morrotes e morros isolados
em meio aos planaltos. Área de formação rochosa, apresenta pedregosidade elevada. A vegetação, em sua maior parte, registra
pers de campos limpos e sujos e extensas orestas ao longo das principais drenagens. Na borda dos morros, ocorrem áreas de
cerrado rupestre típico. (Fig. 4)
52
Os solos
Quanto aos solos, uma caractestica do município goiano é a homogeneidade, predominando os latossolos, que
recobrem mais de 90% do território e cujos substratos rochosos são pouco evidentes. A ocupação humana é intensiva.
Considerando essa formão, adotou-se neste trabalho o agrupamento proposto pelo Diagnóstico Hidrogeológico da Região
de Goiânia, que dividiu os solos em ts grupos: o grupo 1, que reúne os Latossolo Vermelho, Latossolo Vermelho-Amarelo
e Nitossolo Vermelho; o grupo 2, que registra os Cambissolo, Neossolo Litótico e Plintossolo; e o grupo 3, que ficou com os
Neossolo Fvico e Gleissolo.
Os solos do grupo 1 apresentam estrutura em avançado estágio de intemperismo, muito evoluídos em função das grandes
transformações sofridas pelo material de origem. A espessura total do solum pode superar 20 m. Em termos de capacidade de
inltração, esses solos variam de fortemente a bem drenados, embora ocorram variedades de cores pálidas, com drenagem
moderada ou imperfeita. Em sua fase natural, o recobrimento principal é o cerrado. Em clímax hídrico, encontram-se também
eventuais manchas de cerradão ou de matas mesofíticas.
Fig. 4 – Fonte: Governo do Estado de Goiás / 2003. Diagnóstico Hidrogeológico da Região de Goiânia.
Rio
Ribe irão
Ribeirão
Ponte
Meia
Jo
Anicuns
Ponte
Rio
Le ite
Meia
BR 1 53
GO 060
GO07 0
GO 462
GO 080
GO 040
BR 060
BR 457/GO 01 0
Macambir a
Córrego
670000
670000
680000
680000
690000
690000
700000
700000
8140000
8140000
8150000
8150000
8160000
8160000
8170000
8170000
Planalto Dissecado
Planalto Rebaixado
ResiduaisdeAplainamento
DepressãodoMeiaPonte
53
Os solos do grupo 2, ao contrário dos anteriores, apresentam pers rasos a muito rasos, geralmente associados a relevos
de padrão ondulado a fortemente ondulado, com cobertura vegetal do tipo campo limpo e sujo. Caracterizam-se por possuírem
escoamento supercial e evapotranspiração favorecidos, o que os leva a uma recarga efetiva baixa.
Os solos do grupo 3, os Neossolos Flúvicos e Gleissolos, caracterizam-se por níveis rasos d’água, permanecendo totalmente
saturados em alguns períodos do ano. Assim, são aquíferos pouco ecientes e com elevado risco de contaminação por euentes
lançados na superfície. Encontram-se distribuídos ao longo das planícies uviais do município, com destaque para as planícies dos
rios Meia Ponte, João Leite, Capivara e Anicuns.
A vegetação dominante apresenta duas fases distintas: quando saturada, possui gramíneas e arbustos especicamente
adaptados; quando o processo de hidromorsmo atenua-se, é recoberta por vegetação arbustiva de matas ciliares. Em função
do hidromorsmo, do elevado risco de inundação e da alta plasticidade desses solos, suas faixas de ocorrência não deveriam ser
ocupadas para qualquer nalidade construtiva, sendo a sua melhor alternativa de uso tornarem-se áreas de proteção ambiental
permanente. São áreas estratégicas, mas que convivem no momento com uma poluição elevadíssima dos solos e dos cursos
d’água que as acompanham. (Fig. 5)
Fig. 5 - Fonte: Governo do Estado de Goiás / 2003. Diagnóstico Hidrogeológico da Região de Goiânia.
Rio
Ribe irão
Ribeirão
Ponte
Meia
Jo
Anicuns
Ponte
Rio
Le ite
Meia
BR 1 53
GO 060
GO070
GO 462
GO 080
GO 040
BR 060
BR 457/GO 01 0
Macambi ra
rrego
670000
670000
680000
680000
690000
690000
700000
700000
8140000
8140000
8150000
8150000
8160000
8160000
8170000
8170000
Cambissolo plico
ChernossoloHáplico
Latossolo Vermelho
Latossolo Vermelho-Amarelo
Neos solo FlúvicoeGleissolo
Neos solo Lilico
NitossoloVermelho
PlintossoloPétrico
54
A hidrograa
Banhada pela rede hidrográca pertencente à Bacia do Paraná, seus principais recursos hídricos são o rio Meia Ponte e
seus tributários: os ribeirões João Leite e Anicuns, responsáveis pela esculturação recente do lugar. Esse quadro geral completa-se
com mais um ribeirão e outros dezesseis córregos, num total de vinte calhas ou talvegues, além de diversos pequenos riachos e
alagados, muitos ainda não identicados e mapeados.
O ribeirão Anicuns, auente da margem direita, está inserido nas áreas urbanizadas, com longos trechos retineos, encaixados
e adaptados à estrutura do substrato. Esse possui, também, em sua margem direita, auentes de cursos extensos da ordem de 10 km,
com declives suaves. Os auentes da margem esquerda são de pequena extensão, em média 2 km, e com maior declividade.
O auente da margem esquerda, o ribeirão João Leite, destaca-se não pela extensão e expressão da bacia, mas
também pela presença de extensas planícies uviais ao longo de seu curso. (Fig. 6)
Fig. 6 - Fontes: Governo do Estado de Goiás / 2003. Diagstico Hidrogeológico da Região de Goiânia e Secretaria Municipal de Planejamento.
(Adaptação nossa).
RioMeiaPonte
rrego Botafogo
rrego Capim Puba
rrego Cascavel
rrego Macambira
rrego Pedreira
rrego Pipa
rrego Salinas
rrego Taquaral
rrego Vaca Brava
rregoBarreiro
rregoLageado
rregoPalmito
rregoSão Jo
rregodaGameleira
rregoda Ladeira
rregguaBranca
Ribeirão Caveirinha
Ribeirão Anicuns
Ribeirão João Leite
Rio
Ribe io
Ribeio
Ponte
Meia
João
Anicuns
Pon te
Rio
Leite
Mei a
BR 153
GO060
GO070
GO 462
GO 080
GO 040
BR060
BR 457/GO 010
Macambi ra
rrego
660000
660000
670000
670000
680000
680000
690000
690000
700000
700000
710000
710000
8140000
8140000
8150000
8150000
8160000
8160000
8170000
8170000
55
O clima
Outros elementos naturais importantes na formação da paisagem são os relativos ao clima: precipitações, temperatura,
insolação, umidade relativa do ar, evaporação e ventos, que funcionam interligados, sendo, portanto, determinantes das condições
biofísicas do lugar. Os dados aqui apresentados estão consolidados no Diagnóstico Hidrogeológico.
No que se refere às precipitações, Goiânia apresenta médias que estão na casa dos 1576 mm anuais. Entretanto, há uma
sazonalidade acentuada, com períodos muito chuvosos e períodos de seca, que se divide em cinco meses de chuvas intensas,
acima de 200 mm mensais, de novembro a março, chegando a ultrapassar os 250 mm mensais em dezembro e janeiro; e cinco
meses bastante secos, com precipitações abaixo de 50 mm mensais, de maio a setembro, chegando a quase zero em julho. Os
meses de transição, abril e outubro, apresentam respectivamente uma média um pouco superior a 100 mm em abril e um pouco
superior a 150 mm em outubro.
A temperatura foi obtida pela dia das máximas, que cam em torno de 29,8°C, e das mínimas, na ordem de 17,9°C. O gráco
das médias mensais é similar ao das chuvas, apresentando temperaturas médias na casa dos 23º C, entre novembro e abril, em torno de
22º C de maio a agosto, e na média de 20º C em junho e julho, atingindo os menores valores absolutos no mês de julho. Apesar de a média
de junho ser um pouco menor, os valoresximoso atingidos nos meses de setembro e outubro, próximos a 24º C. Esse panorama
mostra que a média de temperaturas é pouco signicativa, pois não possui grandes variações. O que deve ser levado em conta, contudo,
é que, entre os meses de agosto e dezembro, e, ainda, de março e abril, as médias máximas estão acima de 30º C.
Quanto à insolação, o estudo identicou que a maior incidência de radiação solar ocorre nos meses de junho, julho e
agosto, apesar de coincidir com os períodos mais frios e os dias mais curtos.
A umidade relativa do ar, como está intimamente relacionada ao período de precipitação, encontra sua fase crítica nos meses
de junho a setembro. Isso se deve ainda às temperaturas elevadas do período, o que provoca um acréscimo na evapotranspiração.
A umidade atinge médias signicativas nos meses de novembro a março, cando na casa dos 75%, em curva decrescente a partir
de março, com valores mínimos na média de 47% em agosto, quando volta a crescer até atingir seus valores de pico no período
chuvoso, ou seja, a partir de novembro.
A evaporação apresenta-se inversamente proporcional à precipitação e à umidade relativa do ar e diretamente proporcional
à insolação. Esse fator é o que garante, apesar do período seco entre maio e setembro, compensado pela alta incidência de
radiação solar nos meses de junho, julho e agosto, uma umidade relativamente suportável no período.
Finalmente, quanto aos ventos inseridos em um cone nordeste-sudeste, sua ocorrência é moderada no período de janeiro
a abril, com velocidade média de 0,75m/s, e ligeiro acréscimo no período de maio a dezembro, atingindo uma média de 1,2m/s.
56
O que se afere desses dados climatológicos é que Goiânia possui um clima quente e úmido em uma considerável parte do
ano, com moderado décit hídrico nos períodos de baixa precipitação, ventilação moderada, porém constante. Não possui o que
se denomina inverno.
A vegetação
Para melhor analisar o quadro da ora local, é preciso primeiro compreender um pouco do ambiente em que está inserida.
Assim, o Domínio dos Cerrados, em geral, é coberto por um estrato gramíneo que sustenta uma fauna de herbívoros durante uma
boa parte do ano. No período das chuvas, tão logo cessam, aparecem as ores que substituem, como alimento, as pastagens.
O m da orada, que coincide novamente com o início da estação chuvosa, faz renascer os pastos secos e com eles a maturação
de diversas espécies frutíferas.
Nesse momento, os herbívoros retornam de seus refúgios estabelecidos nas matas orestadas, constituídas pelas matas
ciliares que ocorrem nas cabeceiras e nas margens dos pequenos córregos e rios, bem como em manchas diversicadas e
espalhadas de solos de boa fertilidade natural, trazendo outros recursos vegetais e animais, com novos hábitos e restabelecendo
essa intrincada cadeia.
A posição geográca do cerrado e seu caráter bastante diversicado, orístico, faunístico e geomorfológico fazem com
que o seu subsistema constitua ponto de equilíbrio dos diversos domínios ou sistemas biogeográcos brasileiros, uma vez que
se conecta com a maior parte deles, além de outros domínios continentais, por meio de corredores hidrográcos que atuam ainda
como corredores faunísticos.
A partir dessa perspectiva de sistema biogeográco, os cerrados podem ser subdivididos em seis subsistemas especícos,
caracterizados pela sionomia e composição vegetal e animal, além de outros fatores
13
:
0
1- subsistema de Campos; 2- subsistema
do Cerrado; 3- subsistema do Cerradão; 4- subsistema de Matas; 5- subsistema de Matas Ciliares; 6- subsistema das Veredas
e Ambientes Alagadiços. A biodiversidade é o fator principal da variedade vegetal, pois é comum encontrar espécies da ora
adaptadas a áreas ensolaradas e abertas, bem como a áreas sombreadas e de matas bastante fechadas. A variedade animal,
não menos importante, registra a presença de espécimes adaptados aos dois ambientes, ou seja, em localidades mais áridas bem
como nas muito úmidas.
O subsistema dos Campos ocupa as áreas mais elevadas do sistema, apresenta morfologia plana, grandes planícies
abertas intensamente vegetadas, com ocorrência predominante de gramíneas. Encontra-se também vegetação arbustiva esparsa,
13 Instituto do Trópico Subúmido. Sistema Biogeográco do Cerrado. 2ª versão. Goiânia. Volume 3. p. 11.
57
que, regionalmente, recebe a denominação de chapadões ou capinas. Apresenta forte ventilação durante quase todo o ano, o que
garante, em geral, uma temperatura mais amena que nos outros subsistemas. Sua rede de drenagem é insignicante, ocorrendo
de forma dispersa e bastante rala pequenas lagoas, algumas perenes.
O subsistema do Cerrado, paisagem dominante do sistema, diferencia-se do subsistema dos Campos pela ocorrência
bastante comum de árvores de pequeno porte e aspecto tortuoso, explicável pela teoria do escleromorsmo oligotróco. Outra
característica que o distingue é sua rede de drenagem, que é boa. Porém os solos são de baixa fertilidade natural e não são
uniformes. Esse subsistema pode aparecer tanto em latossolos vermelhos como em solos arenosos.
Entre esses dois subsistemas descritos, aparece uma paisagem intermediária, designada popularmente de campo sujo.
Essa formação não pode ser considerada um subsistema à parte, pois sua abrangência geográca é pequena, com ocorrência em
pequenas faixas de transição, nas quais, ecologicamente, é possível vericar as mesmas características dos dois subsistemas que
divide, tendendo ora para um, ora para o outro.
O subsistema do Cerradão, sionomicamente mais vigoroso que o subsistema do Cerrado, não apresenta um estrato
gramíneo forte, sendo formado por árvores de médio e grande porte, que atingem de 10 a 15 metros de altura. Seus solos
apresentam maior fertilidade natural e sua rede de drenagem é bastante signicativa.
O subsistema das Matas ocorre em manchas de solo de boa fertilidade natural. Por vezes assume a conguração de ilhas
no meio da paisagem dominante do cerrado. Por isso se tornou, popularmente, conhecido como capões e pode se apresentar em
áreas extensas, compactas e homogêneas.
O subsistema das Matas Ciliares ocorre nas cabeceiras dos córregos e rios e, em geral, em estreitas faixas ao longo das margens, com
dimenes varveis e distintas, sem uniformidade. Por vezes, alarga-se em forma de bosque e, em outros trechos, praticamente desaparece.
A vegetação também se apresenta de forma descontínua e diversicada, não caracterizando nenhum subsistema especíco.
O subsistema das Veredas e Ambientes Alagadiços ocorre com frequência nas cabeceiras dos córregos e rios, caracteriza-se por
sua composição formada por áreas em constante processo de alagamento, decorrentes do aoramento do lençol d’água ou mesmo da
característica dos solos impermeáveis. Essas paisagens, nas quais predominam os coqueiros buriti e buritirana, por vezes alongam-se e
acompanham parte bastante signicativa dos rios, formando uma paisagem muito bonita. Seus solos são recobertos por gramíneas, que
se mostram verdes durante todo o ano. Registra-se, nesse subsistema, lençol freático aorado de forma perene, formando lagoas.
Nessa descrição dos cerrados, contudo, outros dois elementos da ecologia que, em particular, devem ser bem
entendidos: o seu caráter xeromorfo e o agente fogo. O xeromorsmo é fundamental, tendo em vista a climatologia. Assim, segundo
Rawitscher
14
,
2
e posteriormente Ferri e Rachid, é possível observar que muitas plantas do cerrado não apresentam sinais de
14 Instituto do Trópico Subúmido. Sistema Biogeográco do Cerrado. 2ª versão. Goiânia. Volume 3. p. 24.
58
murchamento, mesmo no auge da seca, com oração e brotação abundantes antes das chuvas, o que permite armar não ser a
água um fator limitante. A grande maioria das plantas permanentes dos cerrados transpira livremente e com altos valores, mesmo
em períodos de seca mais severos, e apenas poucas apresentam pequena restrição ao consumo hídrico nessa época.
Quanto ao fogo, ele registra-se como um elemento comum e associado à paisagem do cerrado. Apesar de sua importância
nesse sistema biogeográco, sua real condição é pouco estudada e, portanto, muitas vezes mal interpretada. Para além de posições
apressadas e sem consistência cientíca, é possível armar que vários elementos da fauna e da microfauna dependem desse
processo para sua sobrevivência. Também a vegetação sobrevive e rebrota a partir dessa ação, que possivelmente está ligada a
condições naturais. Arens
153
arma ser o fogo um fator que acentua o oligotrosmo, além de inuir na conservação e propagação
dos cerrados. Coutinho
16
,
4
por sua vez, diz ser a ação do fogo o elemento que aumenta o vigor da vegetação herbáceo-subarbustiva
no cerrado, porém com a redução arbórea, o que signica dizer, de acordo com o autor, que um aumento progressivo das áreas
de campo com a consequente redução das áreas de cerrado e cerradão.
Em relação às queimadas, é possível armar que a ação do homem ao longo da história desse biosistema não se constituiu
em elemento de desequilíbrio. Assim, o agente fogo deve ser buscado em causas naturais: no calor, nas variações da radiação solar
sempre muito intensa, provocando movimentos acentuados convectivos na atmosfera, onde a concentração da umidade e o forte
gradiente atmosférico levam à formação de tempestades magnéticas, caracterizadas pela intensidade dos trovões, relâmpagos e
raios. Deve-se, contudo, registrar que, na atualidade, há uma ação humana de desequilíbrio nesse sentido.
Uma pequena ressalva quando se estuda a diversidade vegetal dos cerrados é a de que sua riqueza tem apresentado
certas diculdades para os pesquisadores determinarem o tipo de sionomia que corresponde à sua vegetação original que reetiria
as suas condições ambientais sem uma provável interferência humana.
2.2 Os planos e a cidade
Goiânia, cidade planejada da década de 1930, teve como elemento fundante sediar a capital do Estado de Goiás, intermediando
conitos ecomicos e poticos tanto no interior do Estado como nacionais, a exemplo da depreso econômica que resultou no golpe de 30,
cuja saída foi a interiorização do país com o sloganMarcha para o Oeste’. Entretanto, para entender melhor esse território e sua ocupão,
faz-se necesrio alinhavar alguns dados de sua concepção e evolão em distintos períodos da hisria, momentos que foram denindo sua
paisagem cujas condições físicas, políticas, econômicas e culturais interpenetraram-se para oferecer-nos como legado a cidade atual.
15 Instituto do Trópico Subúmido. Sistema Biogeográco do Cerrado. 2ª versão. Goiânia. Volume 3. p. 27.
16 Idem. p. 27.
59
Attílio Corrêa Lima, arquiteto escolhido para elaboração do projeto de implantação da cidade, lançou mão de sua formação
urbanística formal da Escola Francesa e implantou a cidade tirando o melhor proveito de sua topograa, atendendo à necessidade
de tráfego e adequando-a ao relevo natural da região. Seguiu o seu menor declive no traçado das ruas, postura que se mostrou
fundamental para evitar a velocidade das águas e enxurradas numa localidade sujeita a chuvas periódicas e abundantes.
Margeada por um cinturão verde composto pelos fundos de vale dos córregos Botafogo e Capim Puba - que formam os
dois extensos parques lineares que a circulam e se abrem em suas planíces de inundação - ambos conguraram dois dos seus três
generosos parques: os parques Botafogo e Buritis. O terceiro parque, o das Paineiras, congurou-se no interior da cidade, ao sul.
O sistema, nesse primeiro projeto, se completava com cinco grandes avenidas, articuladas e arborizadas em um desenho,
segundo Graeff (1983, p.18), de “pé de ganso”. E assumiam as seguintes funções: os eixos Anhanguera e Paranaíba, dispostos
no sentido leste/oeste, destinavam-se ao comércio formal e informal, respectivamente. As três avenidas que os cortavam no
sentido sul/norte partiam da Praça Cívica: a central, Avenida Goiás, era o grande bulevar da cidade, com duas pistas divididas por
um amplo canteiro, unindo o centro de poder à estação ferroviária, principal meio de transporte à época. Quanto às outras duas,
avenidas Tocantins e Araguaia, a primeira se destinava ao comércio e à prestação de serviços diferenciados, e a segunda dava
acesso a um imponente parque da cidade, o Parque Botafogo. (Fig. 7 e 8)
Fig. 7 – Mapa de localização do Plano Original. Fonte: RIBEIRO, Maria Eliana Jubé, 2004.
60
Fig. 8 – Plano Original de Goiânia de Attílio Corrêa Lima. Fonte: IBGE, 1942.
Cabe destacar, contudo, que Goiânia, apesar de suas inúmeras contradições, é realmente, dentre as capitais do país, uma
das que apresentam melhores condições físicas e urbanas para uma boa qualidade de vida, e essa condição resultou do trabalho
de base feito pelo plano e projeto elaborados por Attílio Corrêa Lima. Este, ao conceber a cidade, tomou como referência as
idéias e os princípios de vanguarda vigentes à época. Adotou como um dos seus moldes projetuais as cidades-jardins de Howard,
adequando-os às condições físicas do local, com destaque para a topograa e o clima. Essa postura, além de tecnicamente
correta, resultou em uma cidade singular, bem aceita e com um desenho projetual que se propagou na cultura de morar do povo
goiano. (Fig. 9 e 10).
O plano inicial de Attílio Corrêa Lima, elaborado entre 1933-1935, foi complementado pelos trabalhos do engenheiro
Armando Augusto de Godói, entre 1935-1937, ocializado pelo Decreto-lei 90-A, de 31 de julho de 1938. (Fig. 11). Godói, encantado
61
Fig. 9 – Centro de Letchworth de Ebenezer Howard. Fonte: GRAEFF, 1983.
que era com os fundamentos das cidades-jardins, manteve o desenho original, mas propôs uma redução das áreas abertas ao
longo dos eixos formados pelas avenidas Anhanguera e Goiás, o que provocou adensamento principalmente com a entrada do
carro na cidade. Redesenhou, também, o Setor Sul, apenas esboçado no projeto original, que passou a assumir o traçado dos
conceitos de cidade-jardim (Fig. 12), com os quais Godói almejava imprimir uma nova losoa de morar. A tentativa não se adequou
aos costumes locais e tornou o bairro desarticulado do projeto inicial, além de reorientar o crescimento da cidade de norte para
sul. Desvirtuado desde sua ocupação primeira, só ocorrida de fato a partir dos anos de 1950, foi objeto de reavaliação de todos os
planos posteriores e, efetivamente, até a atualidade. Mesmo tendo presente seu valor histórico e patrimonial, não houve proposta
capaz de reverter o processo instaurado de descaracterização e degradação.
62
Fig. 10 – Centro de Goiânia de Attílio C. Lima. Fonte: IBGE, 1942.
63
Em que pesem essas considerações, os planos iniciais tiveram sua aplicação e viabilidade respeitadas e foram o instrumento
norteador da ocupação e crescimento da cidade até a década de 1950, com a administração pública exercendo sua capacidade
de conter os especuladores pelo controle do uso e ocupação do solo. A única exceção deu-se ao leste, formado pelos bairros Vila
Nova, Botafogo e Nova Vila às margens direita do córrego Botafogo, onde foram instalados, provisoriamente, os operários que
construíram a cidade, mas que se tornaram bairros denitivos regularizados entre 1947 e 1954.
Fig. 11 – Plano de urbanização de Goiânia de Armando Augusto de Godói. Fonte - IBGE. 1942.
64
Fig. 12 – Projeto do Setor Sul. Fonte - IBGE. 1942.
65
Entretanto, as pressões de particulares para a liberação de parcelamentos vieram e, no início dos anos de 1950, o
governo cedeu a essas forças e, pela Lei Municipal 176 e Decreto-lei Municipal n° 16, liberou e regulamentou empreendimentos
imobiliários que exigiam apenas a locação e a abertura de vias. Assim, no m da década de 50, a cidade encontrava-se completamente
desgurada no seu projeto original. Os particulares detiveram todas as áreas centrais, e os loteamentos proliferaram em proporção
descontrolada, o que expulsou a população desprovida e, de certa forma, induziu-a a ocupar áreas públicas, muito particularmente
as áreas verdes, os parques e os fundos de vale.
Entre 1950 e 1964, foram aprovados 183 loteamentos que não obedeciam a nenhum critério técnico. Com deciência de
áreas verdes, essas foram resumidas a pequenas praças centrais que não observavam sequer as faixas de proteção dos córregos.
Os lotes muitas vezes tinham seu limite no talvegue, situação agravada pela falta de articulação entre loteamentos, gerando uma
ocupação rarefeita com grandes vazios urbanos e infraestrutura em descontinuidade, construções feitas de forma desordenada e
sem restrições de uso, fosse ele industrial, comercial ou residencial.
(Fig. 13, 13a, 13b)
Fig. 13 – Evolução dos loteamentos aprovados em Goiânia. De 1933 a 1939; até 1951; e até 1959. Fonte: RIBEIRO, Maria Eliana Jubé, 2004.
66
Fig. 13a – Evolução dos loteamentos aprovados em Goiânia. De 1933 a 1939; até 1951; e até 1959. Fonte: RIBEIRO, Maria Eliana Jubé, 2004.
Esse contexto expulsou a população carente para a periferia distante, locais sem equipamentos ou serviços públicos,
sem ocupação de emprego e de renda, obrigando-a a movimentos pendulares de longas distâncias em busca de oportunidades
de trabalho nas áreas centrais, em viagens que evidenciaram os grandes espaços existentes e que a levaram a pressionar pela
ocupação dos espaços vazios remanescentes. Esse movimento, a despeito de gerar uma imagem de progresso e crescimento,
resultou em desestruturação da organização socioeconômica.
Em decorrência, surgiram, ao longo da década de 50, as primeiras invasões, dentre as quais destaca-se uma, diferenciada
das demais por não ter o mesmo caráter socioeconômico: a invasão do Setor Sul em um trecho da Rua 115, à esquerda do córrego
Botafogo, em seu fundo de vale, área de preservação de manancial, feita por cidadãos de alto poder aquisitivo. Constituiu uma
ocupação privilegiada, exceção ao quadro geral, e, de certa forma, ocializou esse modelo de ocupação.
67
Fig. 13b – Evolução dos loteamentos aprovados em Goiânia. De 1933 a 1939; até 1951; e até 1959. Fonte: RIBEIRO, Maria Eliana Jubé, 2004.
Essa combinação de loteamentos, que dispõe do suporte físico sem nenhuma consideração de sua capacidade biofísica,
somada a processos de ocupação irregular, resultou no extermínio de várias áreas públicas e, nesse particular, das áreas verdes
das praças, parques e fundos de vale, alterando consideravelmente o perl físico e ambiental da cidade. No término do milênio,
passados 50 anos do início desse modelo de urbanização, dados da Secretaria Municipal de Planejamento indicavam que 35% da
população haviam migrado para as regiões periféricas da cidade, habitando o enorme cinturão de bairros que se formou ao redor
do núcleo original composto pelos setores Central, Sul, Oeste, Universitário e Bueno.
Dessas ocupações, a mais grave e perniciosa iniciou-se na década de 1980, na região noroeste da cidade, junto ao
leito do rio Meia Ponte, na cabeceira da captação de água para o abastecimento de Goiânia, à época zona rural. Promovida
pelo Governo do Estado de forma ilegal e sem nenhuma infraestrutura, foi composta inicialmente pelas vilas Finsocial e Mutio,
68
Jardim Curitiba e Bairro da Vitória. Conta hoje, porém, com mais 33 loteamentos quase todos irregulares. Sua ocupação é
superior a 150.000 habitantes, com expressiva maioria em situação de miséria econômica, social e ambiental, sem um quadro
alentador quanto à sua regularização.
Essa urbanização teve inúmeros desdobramentos quanto à segregação populacional e a sua consequente marginalização,
além de ter consolidado o processo de deterioração ambiental das áreas de fundo de vale, que foram planejadas como alternativa
de lazer da população no projeto inicial da cidade.
Quanto à formação cultural, Goiânia apresenta-se bastante miscigenada. Formada por pessoas em grande parte do
interior do Estado de Goiás e do entorno do Distrito Federal, contingentes que ainda hoje migram de forma expressiva, é também
composta de mineiros, paulistas, baianos, maranhenses, paranaenses, matogrossenses, tocantinenses, muitos deles em busca de
oportunidades. Como resultado, tem-se uma cultura bastante heterogênea, plural e fragmentada, embora solidária.
O plano posterior de Luís Saia, de 1960 a 1962, encerrou um ciclo de projetos elaborados no formato diagnóstico,
planejamento comunitário e desenho urbano. Contudo, esse plano se perdeu, não chegando sequer a ser aprovado, devido ao
momento político nacional que o rotulou de comunista, inviabilizando-o.
Em seu trabalho, o arquiteto paulista identicou uma cidade com crescimento desordenado, permeada por grandes vazios
urbanos, sem infraestrutura suciente e com ruas e praças assumindo apenas a função de deslocamento. As áreas de matas
estavam destituídas e os fundos de vale, loteados como chácaras.
Sua proposta baseou-se na compartimentação, projeto que dividia a cidade em seis partes: Central, Campinas, Dergo,
Macambira, Leste Universitário e Meia Ponte. Esse seu recurso era fundamental, porque agrupava áreas ans para facilitar
levantamentos e diagnósticos, além de as linhas divisórias dos compartimentos coincidirem, basicamente, com os fundos de vale
dos leitos dos córregos e rios que cortavam Goiânia urbanizada, de forma a recuperar as áreas verdes existentes e implantar
novas, incluindo os parques urbanos. (Fig. 14 e 15)
Indicou a abertura de alamedas ao longo de todos os fundos de vale, após a área de proteção, pretendendo solucionar o
problema viário, o de escoamento e o da preservação e conservação dos leitos, além de garantir sua apropriação e utilização pela
população. Isso recuperava, em parte, a proposta original dos parks-ways de Attílio Corrêa Lima, cujas passagens seriam feitas
por viadutos a cada 500 ou 1000 m. Propôs o saneamento dos córregos urbanos e a regularização dos cursos d’água, prevenindo
enchentes com a instalação adequada e isolada de emissários d’águas pluviais e esgotos sanitários. Todavia, esse plano se perdeu
quase na íntegra. Dele se aproveitou a retirada dos campi universitários, Universidades Federal e Católica, transferindo-os do
centro para as periferias ermas, ações que atendiam aos anseios políticos do momento.
69
No quadro de recessão política e econômica dos anos 60, implantados pelo regime militar, um novo plano surgiu entre 1969
e 1971, com Jorge Wilheim, porém inserido em uma nova losoa, denida por Luiz César de Queiroz Ribeiro e Adauto Lúcio
Cardoso (RIBEIRO, 1996, p.68) como tecno-burocrático desenvolvimentista:
Caracterizava-se por um padrão que se constrói por uma importação de idéias, aqui não mais os princípios organicistas e
funcionalistas, mas as propostas de racionalização administrativas desenvolvidas principalmente pelo “planning” americano,
e as idéias desenvolvidas no âmbito da geograa humana, principalmente em sua vertente francesa. Esse padrão se
caracterizou por assumir o urbano como um problema de desenvolvimento econômico, objeto de tratamento racionalizador
e administrativo. Trata-se de não mais criar a cidade ideal, mas de gerir com eciência a cidade existente, eliminando-se os
focos de distorção, oriundos das disfuncionalidades do crescimento econômico.
Fig. 14 – Proposta de compartimentação de Luis Saia. Fonte: RIBEIRO, Maria Eliana Jubé, 2004.
70
Fig. 15 – Pontos focais de Luis Saia. Fonte: RIBEIRO, Maria Eliana Jubé, 2004.
Foram essas as ideias que permearam, com maior ou menor grau de inuência, os planos posteriores.
A política adotada por Wilheim, bem como pelos autores dos projetos complementares, Jaime Lerner e Lubomir Ficinsky,
estava sintonizada com esses paradigmas econômicos. Tanto que seu lema foi “gerir com eciência a cidade existente”. Dentro
dessa concepção, as áreas verdes resumiram-se a quatro itens: os verdes lineares equipados; os parques municipais e regionais,
incluindo as áreas de morro; as áreas livres urbanas; e o cinturão verde produtivo com mini-hortas, sem nenhuma preocupação de
articulação dessas áreas entre si, que não seriam restritas à preservação, mas deveriam sempre assumir funções, principalmente,
as de utilidade pública. Dessa maneira, as áreas verdes urbanas foram reduzidas de forma drástica.
A reticação, a dragagem e a canalização dos leitos urbanos, a produção rentável dos fundos de vale com a implantação
de equipamentos de natureza social, fossem eles culturais, de saúde, de segurança pública etc., eram, por assim dizer, a linha
71
dorsal do projeto que, por sorte, por falta de recursos econômicos ou por inecácia, ou ainda pela combinação desses fatores, não
foi implantado na íntegra. Todavia, a descaracterização do projeto sistêmico de áreas verdes teve nesse período sua maior ecácia,
ao passar da ilegalidade das invasões para as ocupações e os índices permitidos.
(Fig. 16)
O plano seguinte teve início no começo dos anos de 1990, sob o comando da prefeitura municipal de Goiânia. Originou o
Plano Diretor Integrado de Gonia - PDIG, Lei 015/92, em decorrência do qual elaborou-se a lei complementar que “Dise [ôs] sobre
o uso e a ocupão do solo nas zonas urbanas e de expano urbana do munipio de Gonia”, Lei Complementar nº. 031/94.
Foi um desses tantos projetos elaborados por grandes rmas de planejamento e consultoria, feitos por pacotes, altamente
técnicos, que primavam por apresentar um estudo detalhado da realidade local, levantando os objetivos e traçando as metas para
a correção dos problemas já existentes e planejando as ações futuras. O PDIG/92 foi entregue à Engevix Engenharia S.A.
Na questão ambiental, o plano diagnosticou, com base na carta de Risco do Município de Goiânia de 1991, que os
maiores problemas referiam-se: à presea reduzida de cobertura vegetal, notadamente em relação à vegetação original;
Fig. 16 – Plano de áreas verdes de Wilheim. Fonte: IPLAM/SEPLAM, 1969
72
intensa contaminação e poluição dos cursos d’água, sobretudo daqueles localizados nas áreas urbanas; degradão dos
solos, principalmente em decorrência de parcelamentos mal projetados e da remoção indiscriminada da cobertura vegetal,
que resultara na instalação de intensos processos erosivos; alterações climáticas, com formação de ilhas de calor nas
regiões centrais, com diferença de até 6º C decorrentes da desproporção entre o adensamento populacional e as áreas
contínuas; e poluição atmosférica.
Como forma de solucionar essa situação propôs:
evitar a ocupação de áreas de fundo de vale, promovendo a recuperação das já degradadas e preservando as não ocupadas, 1.
instituídas por lei como de “preservação permanente e reservas ecológicas”, propiciando ambiente adequado para reassumirem
sua função de drenagem da declividade acentuada e das erosões;
vetar a ocupação das áreas localizadas a noroeste e sudoeste do município, que apresentassem declividade entre 20% e 40%, 2.
por serem solos imaturos e instáveis, propícios ao aparecimento de processos erosivos;
recuperar e preservar áreas de vegetação nativa, situadas de forma dispersa no município, com maior freqüência ao norte e 3.
muito raramente nas áreas urbanizadas;
recuperar e preservar áreas de depressões circulares, que correspondiam às antigas veredas, solos hidromórcos, com 4.
aoramento do lençol freático, localizadas, principalmente, a montante dos córregos e açudes, como Macambira, Capim Puba,
Anicuns e Dourados, além dos olhos d’água e lagoas de esgoto.
Para as unidades de conservação e similares, a proposta foi propiciar proteção aos mananciais de abastecimento d’água
e preservar ecossistemas, monumentos naturais e locais de beleza cênica especial e de importância histórico-cultural, criando
parques municipais, além do tombamento de unidades siográcas especiais. As unidades de conservação propostas foram:
a APA do João Leite, ao longo de toda a bacia de drenagem e captação que estivesse dentro do município, com o objetivo de 1.
preservar esse manancial de abastecimento de água de Goiânia;
a APA do Meia Ponte, por sua importância vital no sistema hídrico da cidade, principal leito da rede, além de ser também um leito 2.
de abastecimento de água, devendo ter suas planícies e bacia de captação preservadas para a recuperação do manancial;
a APA do Morro do Medanha, área de declividade acentuada, com intensa incidência de nascentes e veios d’água, com objetivo de 3.
preservar as qualidades ambientais além de conservar sua beleza nica, mantendo-o como referência na paisagem urbana;
Parque Municipal Jardim Botânico do Cerrado, situado entre a fazenda Gameleira e a BR-153, envolvendo a nascente do 4.
córrego Botafogo, onde foi implantado, na década de 1990, o Paço Municipal;
as APAs dos Morros do Além e Serrinha, em função de sua alta declividade, importância histórica, cultural e cênica. 5.
(Fig. 17 e 18)
73
A partir desse plano, as Áreas de Proteção Ambiental – APA e as Unidades de Conservação – UC passaram a integrar as
Zonas de Proteção Ambiental ZPA e foram regulamentadas pela Lei Complementar 031/94, que, já no título das suas disposições
fundamentais, capítulo dos conceitos e denições, artigo 17, dizia serem essas
Fig. 17 - Plano de Desenvolvimento Integrado de Goiânia. Fonte: SEPLAM, 1992.
74
Áreas urbanas sujeitas a restrições de uso e ocupação do solo, estabelecidas com a nalidade de preservar e restaurar os
processos ecológicos essenciais e combater a degradação ambiental em todas as suas formas, caracterizando-se pela garantia
de condições ecológicas e pelo desenvolvimento de atividades recreativas, técnico-cientícas e culturais compatíveis.
Também dispôs sobre as zonas especiais no artigo 84, discriminando-as em ambiental e aeroportuária e assegurando
que “As Zonas de Proteção Ambiental compreende[sse]m as Áreas de Preservação Permanente, as Unidades de Conservação
e faixas contíguas às Áreas de Preservação Permanente e às Unidades de Conservação”. Subdividiu essas zonas em quatro,
compreendendo as Áreas de Proteção Permanente, as ZPA-I, e as Unidades de Conservação, as ZPA-II, e discriminou o que se
congura como Áreas de Preservação Permanente. No artigo 87, armava:
Fig. 18 – Mapa de Áreas verdes cadastradas até 2000. Fonte: RIBEIRO, Maria Eliana Jubé, 2004
75
São coletivamente considerados Unidades de Conservação os sítios ecológicos de relevante importância cultural, criados
pelo poder público, como: parques municipais; estações e reservas ecológicas; reservas biológicas; Jardim Botânico; Área de
Proteção Ambiental – APA; reserva particular de patrimônio natural; bosques e matas denidas nos projetos de parcelamento
do solo urbano; orestas municipais; Jardim Zoológico; horto orestal.
O plano foi um exemplo do que Lamas (1992) denominou de “Urbanismo Burocrático e Operacional”, ou seja, um urbanismo
que considera a realidade levantada, traça diretrizes e metas, simula situações, e esse seu aparato técnico-metodológico determina
a “Estrutura Urbana”, os instrumentos para implementá-la, os programas de apoio ou de base, as estratégias de implementação e,
por m, a forma jurídico-legal de executá-la.
Esse tipo de planejamento possui um discurso bem articulado, mas não o reete no projeto da cidade, pois suprime do
contexto o projeto urbano. Em Goiânia, ele cou alinhado aos conceitos atuais de controle e preservação do meio ambiente,
avançando na retomada da idéia de um sistema de áreas verdes. Contudo, como é do seu caráter burocrático, não estabeleceu o
elo entre a teoria e a prática e, mais uma vez, a população cou excluída dos processos de decisão e a cidade à mercê das forças
político-ideológicas de uma minoria econômica.
Em 29 de maio de 2007, foi aprovado, depois de um período de quase seis anos de desenvolvimento, o atual Plano Diretor
de Goiânia. Sua elaboração repetiu a fórmula, diagnóstico e proposta do anterior, mas avançou ao tomar como referência de
planejamento as bacias hidrográcas e ao propor desenvolver e editar o Zoneamento Ecológico e Econômico ZEE e a atualização
da Carta de Risco. Ficou a dever na medida em que não instituiu um planejamento urbano ecológico e os projetos pilotos de
sua materialização no ambiente urbano. O risco hoje é de, mais uma vez, apesar de ser técnica e legalmente correto, haver um
distanciamento entre plano e cidade. (Fig. 19)
O relatório técnico do Plano Diretor (2007, p. 114 e 115) justica com propriedade o modelo de planejamento adotado com
base nas sub-bacias hidrográcas:
Tem-se considerado a água e a biodiversidade como fontes de fundamental importância. A cada dia, a gestão dos recursos
hídricos é um desao maior, principalmente quando se mostra com clareza sua interface com: as atividades próprias do
desenvolvimento regional e urbano; gestão do uso do solo; gestão da drenagem urbana; gestão da agricultura irrigada e
da agroindústria; gestão das hidrelétricas; gestão do saneamento e do esgotamento sanitário; gestão dos resíduos sólidos;
gestão da exploração mineral; gestão das áreas verdes.
Se o princípio é correto, deve haver, contudo, outro modo de executá-lo, que se aproprie dos dados produzidos, aproxime-se
da cultura local e atue com base nas suas especicidades, respeitando e buscando o equilíbrio entre o meio ambiente e a sociedade.
76
A leitura da zona urbana construída de Goiânia neste momento, mesmo em se tratando de uma cidade com tradição em
planejamento, assemelha-se à das demais cidades brasileiras do mesmo porte e permite constatar que os problemas ambientais
são relativos: aos desmatamentos e à ocupação dos fundos de vale, com aumento do desconforto térmico e da qualidade do
ar, além de alagamentos, carreamentos, assoreamentos, ravinas e voçorocas, com constantes prejuízos ambientais e sociais;
à ausência de uma política global e eciente de transporte, que inclua distintos aparatos públicos, como a pedestralização, que
se encontra pressionada pelo enorme tráfego de veículos coletivos e individuais, constantes engarrafamentos, altos índices de
poluição atmosférica; e, até em razão do atendimento a essa demanda, à impermeabilização generalizada, que não permite a
recarga natural responsável pela manutenção e pelo equilíbrio dinâmico dos aquíferos.
Fig. 19 – Modelo Espacial. Fonte: Prefeitura Municipal de Goiânia / Secretaria Municipal de Planejamento. Plano Diretor de 2007.
77
E o panorama da paisagem da cidade se completa se somarmos a esses os graves problemas da rede de drenagem
pluvial, que sujeitam a cidade a constantes inundações nos períodos de chuvas intensas, entre novembro e março. Tal quadro
não se reverterá caso se continue a investir na atual política urbana de desenvolvimento. Se a cidade tem mais de 100 unidades
de conservação legalmente reconhecidas, elas deveriam estar protegidas e não sofrendo processos contínuos de degradação
ambiental, com algumas unidades totalmente invadidas.
As principais diculdades em administrar o patrimônio natural de forma integrada, além das políticas de atendimento à elite
econômica dominante e da ausência de planos de gestão, relacionam-se à falta de integração entre os governos: parte das áreas
está sob jurisdição do governo estadual e parte, do poder público municipal. A divisão territorial existente até o m de 2007, dado
que a zona rural não é administrada pelo município, mas pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária INCRA, incluía
a administração desse órgão federal. No espaço rural está localizada a grande maioria das áreas não ocupadas que necessitam
de urgentes mapeamento, zoneamento ambiental e de proteção.
De outro lado, há também a falta de integração interna entre os órgãos do poder blico municipal de planejamento e
meio ambiente. Até 2004, a aprovação dos parcelamentos era uma atividade exclusiva do óro de planejamento. A Secretaria
do Meio Ambiente se restringia apenas a apontar as áreas que o deveriam receber ocupação antrópica, de que resultavam,
de imediato, dois problemas: primeiro, apesar de grande parte dessas áreas estar destinada a parques, elas cavam restritas
aos acordos do empreendedor com o óro de planejamento, sem o devido reconhecimento e implementação pelo órgão
ambiental; segundo, porque muitas dessas áreas o se enquadravam nas dimensões adequadas para se constitrem como
unidades de conservação.
Hoje, a rarefeita cobertura vegetal natural, resultado da retirada da mata ciliar das drenagens, potencializa processos
erosivos do tipo “em sulcos”, que podem evoluir para ravinas e voçorocas e assoreamentos, o que contribui para o desmoronamento
dos barrancos dos fundos de vale, com alagamento das margens, redução da umidade e aumento do desconforto da população.
Estando essas áreas, de maneira expressiva, ocupadas pela população de baixa renda, conguram-se como áreas de risco, focos
de poluição ambiental e proliferação de doenças. As valas que se abrem são, também, locais de despejo de lixo de toda natureza,
com grande contributo da construção civil.
as galerias de esgoto pluvial que, mal dimensionadas, não suportam a sobrecarga de chuvas intensas em áreas
altamente impermeabilizadas. Essa condição se agrava, quando, além das chuvas, os alagamentos e assoreamento dos leitos,
que transbordam o esgoto e o lixo clandestino, com galerias entupidas e/ou também assoreadas, associadas às zonas de enchentes
dos cursos d’água – um problema cíclico de alagamento e processos erosivos no sistema da macrodrenagem.
78
A esse panorama acresce-se o saneamento básico. Grande parte da população ocupante das áreas lindeiras, ou mesmo
das áreas dos fundos de vale, usa as águas para o abastecimento e para a descarga das águas servidas e do lixo. Dessa forma,
a Estação de Tratamento de Esgoto – ETE Goiânia, localizada ao norte, próxima ao local onde o ribeirão João Leite deságua no rio
Meia Ponte, é uma solução parcial na vida urbana, pois recebe cerca de 70% dos dejetos gerados na capital, todos provenientes
da margem direita do rio Meia Ponte. Trata-os apenas em sua fase primária, na remoção dos sólidos grosseiros, areia e outros
sedimentos. Ao fazê-lo, retorna essas águas ao rio, que deve fazer a decantação nal.
As populações que ocupam a margem esquerda do Meia Ponte não são atendidas pela estação e fazem sua contribuição
in natura, ou perfuram poços artesianos e fossas, em sua maioria sem as condições mínimas de funcionamento, portanto, sem
licença ambiental, o que polui não só o leito mas também o lençol subterrâneo.
Segundo os dados apresentados no relatório técnico do Plano Diretor PD/2007, os principais problemas socioambientais
do município de Goiânia hoje são provenientes de:
desmatamento descontrolado da cobertura vegetal na zona urbana, devido a parcelamentos mal planejados - os remanescentes 1.
de vegetação nativa e a grande maioria das áreas protegidas não possuem um sistema ecaz de gestão;
poluição signicativa dos corpos d’água, que drenam o território pela descarga do esgoto 2. in natura; falta de atendimento de
serviços de saneamento; descarga de esgotos clandestinos nas galerias de esgoto pluvial; e descarga de lixos sólidos nas suas
margens, em grande parte provenientes da construção civil;
ocupação desordenada do solo urbano, geradora de grandes vazios urbanos, espaços segregados e sem atendimento de 3.
serviços básicos de saneamento, galerias de esgoto pluvial e coleta de lixo;
proliferação das ocupações irregulares mais próximas às zonas urbanizadas, agravando as ocupações de risco, os processos 4.
erosivos e os assoreamentos;
alagamento das vias públicas nas áreas urbanas consolidadas, principalmente nos meses de janeiro, fevereiro e março, devido 5.
ao excesso de impermeabilização e ao subdimensionamento das galerias de esgoto pluvial;
alterações climáticas, com formação de ilhas de calor nas regiões densamente ocupadas, com variações de temperatura 6.
atingindo até C, o que ciclicamente contribui para a incidência de chuvas torrenciais e consequentes novos alagamentos e
assoreamentos;
poluição atmosférica, resultante das inversões térmicas e da excessiva descarga de poluentes na atmosfera, cujo maior vilão 7.
é o monóxido de carbono proveniente da grande frota de veículos - em Goiânia, a frota de veículos particulares estabelece a
relação de 1 automóvel para cada 1,7 habitantes;
79
mobilidade e acessibilidade reduzidas, com muitos pontos críticos de engarrafamento, visto que o único meio de transporte 8.
utilizado é o de veículos automotores, públicos ou particulares, não havendo nenhuma solução alternativa.
De maneira que, dessa política socioambiental adotada pelos governos e planos, constata-se que:
apesar de diagnósticos muito bem elaborados, o planejamento, a partir do m da década de 1960, desconsidera o meio ambiente 1.
como parâmetro básico para o desenvolvimento de projetos, implantação e gestão de políticas de desenvolvimento, e a questão
ambiental passa a ser tratada isoladamente, não permeando a vida das populações;
falta articulação tanto dos órgãos públicos municipais de planejamento e meio ambiente, como entre as esferas municipal, 2.
estadual e federal;
há incapacidade de promover capacitação técnica e operacional continuada e bem dimensionada;3.
precariedade de scalização ambiental, falta de instrumentos legais que obriguem os agentes promotores dos danos a 4.
reverter os processos de degradação instalados;
inexistem pesquisas na área de planejamento que desvendem outras tipologias mais eficazes e economicamente 5.
viáveis, ficando a cidade e o cidadão à mercê da mesmice e das fórmulas insuficientes, ineficazes, mal dimensionadas,
equivocadas e, acima de tudo, danosas e onerosas. Cabe ressaltar que, mesmo quando essas pesquisaso realizadas,
sua divulgação é precária;
há diculdade de acesso aos planos e projetos de governo na área ambiental, elaborados desarticuladamente, na maioria das 6.
vezes à revelia das condições biofísicas e culturais das comunidades, o que não forma sistema e de que não resulta uma cidade
que, por si mesma, seja o elemento de visibilidade e educação ambiental.
2.3 A base legislativa
Todo plano ou projeto necessita de aparato legal, que se pelas normativas federais, estaduais e municipais. Em Goiânia,
talvez por sua tradição em planejamento, as leis complementares do município bem como os documentos técnicos que lhe dão
suporte compõem um conjunto bastante signicativo, que, apoiado no aparato federal, permite a ação inclusiva no planejamento
das condicionantes biofísicas e culturais.
Com vistas a dar sustentão aos debates e questões levantados, algumas dessas leis, seus artigos e normativas
exigem uma explicitação, para resguardar a validade do que se propõe, além de demonstrar com clareza que o teor de uma
abordagem feita com base nos preceitos de planejamento urbano ecológico e nas estratégias de infraestrutura verde o tem
como marca um ecologismo exacerbado, mas busca compatibilizar natureza e sociedade no meio antrópico.
80
2.3.1 As leis federais
A lei federal LF. 6766/1979, que dispõe sobre o Parcelamento do Solo Urbano, delibera que somente será
admitido o parcelamento do solo para fins urbanos em zonas de expansão urbana ou de urbanização específica, definidas
pelo plano diretor ou aprovadas por lei municipal. Em parágrafo único prevê que não será permitido o parcelamento em
áreas de preservação ecológica, naquelas onde a poluição impeça condições sanitárias suportáveis, até a sua correção,
ou em terreno com declividade igual ou superior a 30% (trinta por cento), salvo se atendidas exigências específicas das
autoridades competentes.
Outro destaque é a lei federal LF. 9985/2000, que institui o “Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza”
SNUC e explicita os conceitos que norteiam e disciplinam as condutas e ações na área, dene as unidades de conservação
como o espaço territorial e seus recursos ambientais, incluindo as águas jurisdicionais, com objetivos de conservação, por possuir
características naturais relevantes, com limites claros e sob regime especial de administração, ao qual se aplicam garantias
adequadas de proteção.
Segundo essa lei, proteção implica conservação da natureza pelo manejo do homem, compreende a preservação, a
manutenção, a utilização sustentável, a restauração e a recuperação do ambiente natural, para que ele possa produzir maior
benefício, em bases sustentáveis, para as atuais gerações; manter potencial de satisfação das necessidades e aspirações das
gerações futuras; e garantir a sobrevivência dos seres vivos em geral.
Uso sustentável é denido como a exploração do ambiente de maneira a garantir a perenidade dos recursos ambientais
renováveis e dos processos ecológicos, mantidos a biodiversidade e os demais atributos ecológicos de forma socialmente justa
e economicamente viável. A recuperação deve ser buscada na restituição de um ecossistema ou de uma população silvestre
degradados a uma condição não degradada, o que pode ser diferente de sua condição original; e a restauração é a restituição de
um ecossistema ou de uma população silvestre degradada ao mais próximo possível da sua condição original.
Ao tomar esses parâmetros, o zoneamento no interior das unidades de conservão passa a ser balizado pela repartição
de setores ou zonas em uma unidade de conservação, com objetivos de manejo e normas especícas para proporcionar
os meios e as condições para que todos os objetivos da unidade possam ser alcançados de forma harmônica e ecaz.
O Plano de Manejo é, pela lei, um documento técnico elaborado a partir das motivações que originam a instituição das
unidades de conservação explicitadas em seus objetivos gerais, a partir dos quais se estabelecem o seu zoneamento e as normas
que devem presidir o uso da área e o manejo dos recursos naturais, inclusive a implantação das estruturas físicas necessárias à
gestão da unidade.
81
Prevê ainda que o plano que estabelece a abrangência das áreas de preservação deve também xar sua zona de
amortecimento, abrangendo o entorno de seu núcleo focal, em que as atividades humanas estão sujeitas a normas e restrições
especícas, com o propósito de minimizar os impactos negativos sobre a unidade.
No capítulo dos conceitos, dene os corredores ecológicos como porções de ecossistemas naturais ou seminaturais que
ligam unidades de conservação e possibilitam entre elas o uxo de genes e o movimento da biota, a dispersão de espécies e a
recolonização de áreas degradadas bem como a manutenção de populações que demandam, para sua sobrevivência, áreas com
extensão maior do que aquelas das unidades individuais.
Dene também os objetivos a serem alcançados, dentre os quais são mais relevantes:
promover o desenvolvimento sustentável a partir dos recursos naturais;1.
promover a utilização dos princípios e práticas de conservação da natureza no processo de desenvolvimento;2.
proteger paisagens naturais e pouco alteradas de notável beleza cênica;3.
proteger as características relevantes de natureza geológica, geomorfológica, espeleológica, arqueológica, paleontológica e cultural;4.
proteger e recuperar recursos hídricos e edácos;5.
valorizar, econômica e socialmente, a diversidade biológica;6.
favorecer condições e promover a educação e a interpretação ambientais, a recreação em contato com a natureza, e o 7.
turismo ecológico.
Determina que se deve assegurar a participação efetiva das populações locais na criação, implantação e gestão das unidades
de conservação bem como buscar proteger grandes áreas próximas ou contíguas por meio de um conjunto integrado de unidades de
conservação de diferentes categorias e suas respectivas zonas de amortecimento e corredores ecológicos, para integrar diferentes
atividades de preservação da natureza, uso sustentável dos recursos naturais e restauração e recuperação dos ecossistemas.
Por m, preconiza que o Plano de Manejo deve abranger a área da unidade de conservação, sua zona de amortecimento e
os corredores ecológicos, incluindo medidas com o m de promover sua integração à vida econômica e social das comunidades
vizinhas. E, para dar efetividade a essa determinação, estabelece que, até que seja elaborado o plano, todas as atividades e obras
desenvolvidas nas unidades de conservação de proteção integral devem limitar-se àquelas destinadas a garantir a integridade dos
recursos que a unidade objetiva proteger, assegurando às populações tradicionais porventura residentes na área as condições de
permanência e os meios necessários para a satisfação de suas necessidades materiais, sociais e culturais. Nos casos em que sua
permanência se inviabilize, deverão ser indenizadas ou compensadas pelas benfeitorias existentes e devidamente realocadas pelo
Poder Público em localidades e condições acordadas entre as partes.
82
2.3.2 As legislações municipais
As leis federais são determinações gerais, mais abrangentes, que não têm como contemplar as especicidades de cada
município. Assim, são regulamentadas por leis especícas municipais, que se igualam a ou restringem as primeiras. A lei municipal
LM. 171/2007 do ‘Plano Diretor’, quando aproximada à legislação federal, apresenta descompassos e torna evidentes seu grau de
compreensão e aplicabilidade e os necessários processos de adaptação para que novas estruturas sustentáveis possam aparecer.
Essa lei municipal instituiu a área de preservação ambiental do morro do Mendanha, a APA do Morro do Mendanha, apesar
de essa área ter sido prevista no Plano Diretor anterior a 1992. A lei determina que essa APA deve ter uma ocupação de baixa
densidade e admite parcelamentos habitacionais e mistos em unidades autônomas, com unidade imobiliária igual ou maior que
450m² (quatrocentos e cinqüenta metros quadrados), com duas economias: nas áreas com declividade igual ou menor que 30%
(trinta por cento) com unidade imobiliária igual ou superior a 1.250m² (um mil duzentos e cinquenta metros quadrados); e, nas
áreas com declividade superior a 30% (trinta por cento), com uma economia por unidade e infraestrutura e acessos às expensas
do empreendedor, excluídas as áreas de preservação permanente – APPs.
O primeiro conito gerado entre a lei municipal e a lei de urbanização federal está na declividade. Por ser a área em foco um
ecossistema frágil e de preservação ecológica, não deveria haver ocupações em áreas iguais ou acima de 30% (trinta por cento)
de declividade, pois o problema não se restringe, como deixa transparecer o texto, à infraestrutura especíca e aos acessos a tais
unidades, mas ao ecossistema territorial, que se caracteriza por uma paisagem natural frágil, com alterações ainda recuperáveis,
de notável beleza cênica, com características biofísicas e culturais relevantes.
A lei municipal prevê a implementação de programas, subprogramas, projetos e ações, dos quais destaca-se o Subprograma
de Recursos Hídricos, que deverá implantar e implementar a Área de Proteção Ambiental da Bacia do Alto Anicuns, a APA do Alto
Anicuns, situada na região oeste/sudoeste de Goiânia, para proteger as nascentes do ribeirão Anicuns e a região do morro do
Mendanha, conforme previsão do PDIG 2000 e recomendação do Plano Diretor de Drenagem do município de Goiânia.
Para proteger os cursos d’água, determina que os novos parcelamentos deverão prever e implantar toda a infraestrutura
necessária, composta de bacias de retenção de águas pluviais e caixas de recarga do lençol freático, segundo a necessidade de
drenagem para cada subbacia hidrográca, em consonância com as recomendações do Plano Diretor de Drenagem Urbana
de Goiânia, aplicadas a cada ambiente de forma individualizada.
No parágrafo que trata dos parâmetros ambientais, esclarece que as ‘unidades de conservação’ dividem-se em ‘unidades
de proteção integral’, que têm caráter de proteção total, constituídas pelas Áreas de Preservação Permanente – APP e Unidades
de Uso Sustentável, que têm caráter de utilização controlada, representadas pela rede hídrica estrutural e áreas verdes.
83
Posteriormente, esclarece que, no município de Goiânia, as ‘Unidades de Proteção Integral’ têm o objetivo de preservar a
natureza, sendo admitido apenas o uso indireto dos seus recursos naturais, excetuando, entretanto, todas as ‘Áreas de Preservação
Permanentes – APP’ existentes no território.
Dessa forma, xa que integram as Áreas de Preservação Permanentes – APP as Unidades de Conservação com caráter
de proteção total e os sítios ecológicos de relevante importância ambiental. Na sequência, determina que as Áreas de Preservação
Permanente APP são bens de interesse nacional e espaços territoriais especialmente protegidos, cobertos ou não por vegetação,
com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica, a biodiversidade, a fauna e ora,
proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas. No município de Goiânia, enquadram-se nessa categoria:
as faixas bilaterais contíguas aos cursos d’água temporários e permanentes, com largura mínima de 50m (cinqüenta metros), a 1.
partir das margens ou cota de inundação para todos os córregos, e de 100m (cem metros) para o rio Meia Ponte e os ribeirões
Anicuns e João Leite, desde que tais dimensões propiciem a preservação de suas planícies de inundação ou várzeas;
as áreas circundantes das nascentes permanentes e temporárias, de córrego, ribeirão e rio, com um raio de no mínimo 100 m (cem 2.
metros), podendo o órgão municipal competente ampliar esses limites, visando proteger a faixa de aoramento do lençol freático;
os topos e encostas dos morros do Mendanha, Serrinha, Santo Antonio e do Além, assim como os topos e encostas daqueles 3.
morros situados entre a BR – 153 e o ribeirão João Leite;
as faixas de 50m (cinqüenta metros) circundantes aos lagos, lagoas e reservatórios d’água naturais medidas horizontalmente 4.
desde o seu nível mais alto;
as encostas com vegetação ou partes destas com declividade superior a 40% (quarenta por cento);5.
todas as áreas recobertas por orestas nativas, cerrado ou savana, identicáveis e delimitáveis dentro do perímetro do território 6.
do município; aquelas pertencentes à zona urbana construída, identicadas no levantamento aerofotogramétrico de julho de
1988, bem como as identicadas na nova Carta de Risco de Goiânia, ressalvando-se as áreas de matas secas, que estão
sujeitas a análise técnica especíca.
Ainda prevê como Áreas de Preservação Permanente - APP as orestas e demais formas de vegetação, quando declaradas
e devidamente desapropriadas por ato do Poder Público, destinadas a proteger o bem-estar geral e a:
conter processos erosivos;1.
formar faixa de proteção ao longo de rodovias e ferrovias;2.
proteger sítios de excepcional beleza, valor cientíco ou histórico.3.
84
Remete para análise especíca os trechos de cursos temporários e grotas secas, os quais poderão ser admitidos no
percentual de áreas verdes desde que se enquadrem na lei de parcelamento do solo.
Nesse ponto, é preciso dizer que esse texto da lei praticamente repete, com poucas variações, a Lei Complementar de
1994, notadamente no item 6, quando se refere a qual carta aerofotogramétrica os projetos devem remeter, ou quando suplementa
as possíveis informações dúbias que ela possa gerar com a edição da Carta de Risco atualizada. A novidade ca na previsão de
proteção para as grotas secas e cursos temporários, ambientes comuns em Goiânia em virtude dos tipos de solos e dos períodos
de secas severas, que passam a integrar as áreas verdes.
A legislão atual avança quando elenca as ‘Unidades de Conservação com cater de proteção total e os sítios
ecogicos de relevante imporncia cultural, como os parques naturais municipais; as estações ecológicas; as reservas
biogicas; os monumentos naturais; as orestas, matas, bosques e reservas legais localizadas no território municipal; e os
refúgios de vida silvestre.
Esclarece que integram as Áreas de Conservação e Recuperação aquelas integrantes das Áreas de Patrimônio Natural
impróprias à ocupação urbana do ponto de vista geotécnico e das restrições de ocupação da Carta de Risco de Goiânia, bem como
as áreas onde houver ocupação urbana de forma ambientalmente inadequada, sujeita a tratamento especíco.
Determina ainda que, no município de Goiânia, as Unidades de Uso Sustentável têm como objetivo compatibilizar a
conservação da natureza com o uso sustentável do solo nas: Áreas de Proteção Ambiental APA, em especial a APA da Bacia
Hidrográca do ribeirão São Domingos, a APA da Bacia Hidrográca do ribeirão João Leite, e a APA das nascentes do ribeirão
Anicuns; Reservas Particulares do Patrimônio Natural RPPN; faixas de transição representadas pelas zonas de amortecimento
contíguo às Unidades de Proteção Integral; áreas verdes do município de Goiânia representadas por praças, espaços abertos,
parques infantis, parques esportivos, parques urbanos, parques temáticos, jardins públicos, rótulas do sistema viário e plantas
ornamentais de logradouros.
Sobre a Lei Municipal LM. 8617/2008, que dispõe sobre a regulamentação do controle das atividades não residenciais e
dos parâmetros urbanísticos estabelecidos para a Zona Urbana Construída, esta determina, no capítulo que trata dos parâmetros
ambientais, que, nas faixas de Unidades de Proteção Integral, conforme previsto no Plano Diretor de Goiânia, as ocupações
previamente consolidadas à vigência da lei e resguardados os casos excepcionais deverão ser ressalvadas, desde que demonstrado
seu caráter de utilidade pública, de interesse social e de baixo impacto ambiental, casos que remetem à ‘Resolução do Conselho
Nacional do Meio Ambiente’. Também, nas faixas de Unidades de Proteção Integral, serão admitidos usos e atividades voltados à
pesquisa, ao ecoturismo, ao lazer, à educação ambiental e ao reorestamento.
85
São esses os destaques das legislações que alimentam os questionamentos de desequilíbrio ambiental frente aos
processos de urbanização expressos nos planos, projetos e cidade. Com pequenas correções, mostram-se, contudo, eciente
suporte de apoio institucional à alternativas de planejamento que possam ser apresentadas.
Destarte, como forma de estabelecer uma abordagem distinta, esta tese propõe uma outra forma de pensar e atuar na
cidade. A partir de um estudo de caso inserido nos moldes de um planejamento urbano ecológico, pretende gerar um zoneamento
ecológico da paisagem com propostas de aplicação de estratégias de intervenção fundamentadas na infraestrutura verde,
acreditando ser essa uma ferramenta capaz de promover um desenvolvimento mais apropriado das populações nas escalas da
bacia hidrográca, com resultados pontuais e comunitários que aproximam o homem do seu ambiente natural.
O objetivo é reduzir os desequilíbrios entre o ambiente natural e o construído e restaurar a estabilidade dos processos
naturais hidrológicos, para o que se fundamenta e adota como parâmetro os instrumentos cartográcos, o aparato legal e a
evolução da paisagem enquanto interação natureza e sociedade.
3.1 O lugar
egundo Milton Santos (1997, p. 258), a localidade “se opõe à globalidade, mas também se confunde com ela. (...) Entretanto, se, pela
sua essência, pode esconder-se, não pode fazê-lo pela sua existência, que se dá nos lugares.”
Diz ainda que, no lugar, o eixo das coexistências se superpõe dialeticamente. Tudo se funde: desejo e realidade, natureza
e sociedade. Para ele, o lugar
é o quadro de uma referência pragmática ao mundo, do qual vêm solicitações e ordens precisas de ações condicionadas,
mas é também o teatro insubstituível das paixões humanas, responsáveis, através da ação comunicativa, pelas mais
diversas manifestações da espontaneidade e da criatividade.
O lugar tem origem na vida ordinária, suas imagens são a da realidade circundante, do ambiente biofísico e cultural. As
pessoas xam do meio ambiente os aspectos que inspiram perigo ou prometem sustento, em outras palavras, respeito e satisfação.
A paisagem do lugar muda à medida que as pessoas mudam, deslocando seus interesses. Mas eles continuam sendo provenientes
do meio ambiente como entidade biofísica e cultural.
Um lugar não é necessariamente uma construção sólida: é muito mais amplo e se traduz em localidade, onde se desenvolvem
valores sociais. Aventurar-se a planejar a paisagem signica interpretar e materializar os valores de uma sociedade em um ponto
especíco do território.
O conhecimento do ambiente entendido como a fusão do meio biofísico e das relações humanas é um diferencial na
construção dos espaços do homem. Portanto, o planejamento da paisagem será adequado quando aliar as condições físicas do
território à maneira de viver dos povos, que, reconhecendo os limites e potencialidades espaciais do meio, valorizem a forma como
cada sociedade pretende construir seu lugar.
3.A APA do Morro do Mendanha: o lugar
S
88
Existe, portanto, uma diferença entre lugares criados coletivamente e lugares criados para a coletividade. A manutenção
da integridade das pessoas e territórios é feita por ritos próprios, advindos do conhecimento, que pode ser adquirido pela
visibilidade real resultante da vivência, do ato de experienciar.
ainda diferea entre o lugar para os planejadores e para o homem ordinário, aquele que permanece na localidade.
O planejador, apesar de muitas vezes não habitar a área, conhece-a profundamente em suas características biofísicas e
socioeconômicas, sabe com precio sua espacialidade e limites. No entanto, muitas vezes também não é capaz de ler as relações
íntimas que se estabelecem entre as pessoas do lugar. De seu lado, também o morador muitas vezes o consegue ter uma visão
espacial clara de seu lugar, tem-na de forma difusa,o conhece as leis da física. Mas conhece o lugar e é capaz de identicar tanto
os femenos físicos da natureza como o resultado de suas ações no meio e na sociedade. Enm, os lugares só se tornam visíveis
pela humanização. É pela vivência que recordamos as localidades e essa é a única forma de criar a identidade de um lugar.
Isso signica que pensar e planejar a paisagem são conquistas do espaço quando esse ato é exercido sobre ou capta as
habilidades espaciais preexistentes, produzindo familiaridade, ou seja, uma atmosfera que faz com que as pessoas se sintam à
vontade nos lugares onde estão.
3.1.1 Uma aproximação biofísica
A APA do Mendanha é uma unidade de conservação inserida na paisagem da cidade, situada a oeste, no interior da área
urbanizada. É a única grande gleba de alta declividade dentro da zona densamente ocupada. As demais são pontuais e, devido à
sua importância, dá nome a uma das doze unidades territoriais de planejamento: a Região Mendanha.
Encosta signicativa, está inteiramente dentro do perimetro urbano ocupado. Possui uma cota variável entre 700 m a 915
m de altitude, e concentra alguns dos fragmentos mais importantes de vegetação natural remanescente relativamente preservada,
assim como diversas nascentes, meandros e alagados, pequenos veios d’água sem nomes ociais ou nominados pela população
do local de maneira bem especíca. Apesar dessas tipologias, encontra-se em processo depredatório de urbanização acelerado
nos últimos dez anos, que a vem ocupando desde sua base até as partes mais altas. Já se encontra bastante seccionada por vias
pavimentadas ou não. As áreas mais planas e as faixas de matas ciliares dos cursos d’água encontram-se bastante antropizadas.
Abrange uma área presumida de 7.476.035,00 m², dos quais, de acordo com o Cadastro Imobiliário da Prefeitura Municipal
de Goiânia de agosto de 2009, 243.560,00 m² pertencem ao município. Em virtude de ser uma paisagem única e bastante distinta
em um território marcado por extensas planícies, e por sua importância ecológica e cultural, visibilidade e valor econômico, foi
delimitada geometricamente a partir dos parcelamentos anteriormente aprovados pela Secretaria Municipal de Planejamento
89
SEPLAM. No perímetro demarcado, há muitas áreas pertencentes a particulares, e boa percentagem dessas se caracteriza como
áreas de proteção permanente por seu caráter de áreas de mata nativa, nascentes, encostas íngremes, veios d’água, fundos de
vale e outros.
Estabelecida ao longo de cerca de 10 km da encosta do ribeirão Anicuns, é delimitada por seu fundo de vale e cumeeira
e o contorno da linha litrofe dos parcelamentos existentes do entorno. Dessa forma, toma como referência, ao leste, o fundo
de vale do rrego do Ca, tributário do Anicuns e, a oeste, o Morro dos Macacos. O perímetro demarcado em respeito à
ocupação existenteca denido a partir do talvegue do ribeirão e assume o desenho dos limites estabelecidos pelos bairros
aprovados: na encosta leste, o Jardim Pampulha e o Residencial Cidade Verde; na cumeeira, os loteamentos Jardim Petrópolis
I e II, Residencial Petrópolis e Chácaras Maringá; a oeste, o Residencial Junqueira e o Conjunto Vera Cruz, que, novamente,
atinge o rio. (Fig.20)
Fig.20 – Mapa de Localização da APA do Morro do Mendanha.
90
São exatamente suas características de declividades acentuadas em um território bastante plano, suas belas matas e seus
cursos d’água que têm atraído um índice crescente de urbanização tanto para o interior da Área de Preservação Ambiental – APA
como para o seu entorno imediato, trazendo os problemas de degradação: desmatamentos indiscriminados, cortes e aberturas de
ruas com desrespeito à topograa, ocupações de áreas alagadas e não atendidas pela rede convencional de esgoto, assoreamentos,
desmoronamentos, ravinas, voçorocas, alagamentos, contaminação por esgoto doméstico e lixo.
Destarte, a APA do Mendanha é uma unidade de conservação existente dentro da cidade, criada legalmente, prevista no
Plano Diretor, porém não devidamente delimitada. Não apresenta diretrizes especícas ou legislações complementares, não possui
planejamento urbano ecológico que propicie um plano de manejo adequado, e não é alvo de projeto especíco que contemple
estratégias de ocupação adequada. Até por isso, muitas vezes é objeto de ocupações inadequadas.
A geologia
Geologicamente, a gleba encontra-se inserida no Complexo Granulítico Anápolis Itauçu e caracteriza-se como um conjunto
de rochas modicadas, composto de granulitos bandados: granito, mica e quartzo, com intensa milotização (trituração estrutural),
dispostos em uma faixa descontínua que segue a orientação geral NNE-SSW.
A geomorfologia
A geomorfologia local é marcada por um compartimento especíco em território goiano, denominado Residuais de
Aplainamento. Apresenta solos rasos, relevo ondulado, declividades acentuadas, vertentes côncavas, vales encaixados em ‘V’,
amplitude variável, atingindo valores signicativos entre cumeeiras e talvegues. (Fig. 21)
Os declives
Suas encostas apresentam declividades maiores que 10%, atingindo até 45% em pontos especícos próximos dos fundos
de vale das drenagens principais. O que se avalia com base na Lei do Plano Diretor 171/2007 em vigor, art. 106, alínea e, é que são
áreas de Preservação Permanente – APP somente as declividades superiores a 40%, o que signica que praticamente toda a APA
pode sofrer ocupação antrópica. Há, porém, pontos críticos potenciais que podem ser identicados em trechos com declividades
acima de 20%, onde existe a possibilidade de erosões ou escorregamentos de massa pela execução de obras que impliquem a
construção de cortes e aterros, riscos potenciais que se ampliam em função do desmatamento. (Fig. 22 e 23)
91
Fig. 21 – Mapa Ipsométrico da APA do Morro do Mendanha.
Os solos
Os solos, marcados pela formação de coluviões nas superfícies íngremes e aluviões nas superfícies aplainadas, apresentam
depósitos coluvionares com horizontes não consolidados, às vezes profundos, submetidos a contínuos processos de pedogenização
em que predominam Latossolos Vermelho Escuro, Distrócos. Tais ambientes são muito importantes, pois determinam a presença
e a qualidade do lençol freático, propiciam as condições para a produção do espaço urbanizado, estancam processos erosivos
diversos e permitem a xação das plantas e as condições indispensáveis à permanência do homem no território.
Nas encostas mais íngremes, a APA ainda apresenta os Neossolos Litóticos pouco espessos, com estrutura pedogenética
não diagnosticável, textura pobre e estrutura em início de formação e incipiente, a que se soma o relevo ondulado a fortemente
ondulado, tornando os solos acentuadamente drenados e extremamente susceptíveis a processos erosivos. O campo limpo é a
vegetação típica. Contudo, por ainda não ter sido atingido por um processo de urbanização intenso, encontra-se, em muitos pontos,
encoberto com manchas signicativas de matas.
92
Fig. 22 – Mapa de Declividade da APA do Morro do Mendanha.
As águas
O ribeirão Anicuns, bacia hidrográca em que se localiza a APA, nasce na divisa dos municípios de Goiânia e Trindade,
com altitude de 800 m, e deságua no Rio Meia Ponte pela margem direita, após percorrer 20,5 km. Inteiramente inserido dentro
da zona urbana ocupada, exerce grande inuência antrópica sobre a vegetação contígua aos mananciais, que se encontra em
situação crítica, porque é ambiente em que ocorreu a simplicação da biota, às vezes com alterações muito drásticas e substituição
da cobertura vegetal nativa por culturas temporárias ou por cobertura vegetal exótica, invasora e/ou oportunista.
No perímetro demarcado, apresenta vários pequenos contribuintes, nascentes e olhos d’água em geral, com processos de
desmatamento acentuados, desmoronamento de margens e assoreamento de leitos mesmo estando no interior da área.
O baixo grau de preservação se dá tanto pela falta de gerenciamento do poder público quanto de iniciativas dos
empreendedores de parcelamentos do solo que, no ato da implantação dos setores, não promovem a demarcação correta das
93
Fig. 23 – Mapa de Risco de Erosão da APA do Morro do Mendanha.
Áreas de Preservação Permanente – APP, deixando-as expostas à extração de material biológico, deposição irregular de entulho,
ocupações irregulares, lavagem, dentre outros problemas que afetam o meio biótico.
A contaminação dos aquíferos, outro grave problema, ocorre, via de regra, em função do lançamento dos esgotos pluvial
e doméstico na rede de drenagem que, nas zonas de falha, são abastecedoras dos aquíferos ssurais semiconnados existentes.
Hoje, o quadro geral é negativo, com toda a rede de drenagem apresentando poluição por lançamentos de esgotos. (Fig. 24)
A vegetação
O interior da área ainda guarda características ambientais até certo ponto preservadas, embora coberta por conjuntos
de matas nativas mesmo as internas ameaçadas pelas ocupões do entorno imediato, devido à auncia de um planejamento
94
Fig. 24 – Mapa das Águas da APA do Morro do Mendanha.
ambiental específico que as delimite e possibilite a edição de Lei Complementar própria, instituindo e classificando a APA e
seus usos, além de um plano correto de manejo frente à sua fragilidade ambiental.
Na área, pode-se observar a predominância dos campos limpos, ao lado dos seguintes conjuntos bióticos: quatro fragmentos
maiores de orestas; alguns fragmentos menores de bosques e matas; e, nas dependências da área pertencente ao Condomínio
do Lago, em sua porção noroeste, um fragmento menor de vegetação de cerrado sensu-stricto que, no conjunto do loteamento, foi
aprovado como Parque Municipal Bosque do Lago.
A vegetação ao longo dos fundos de vale do ribeirão Anicuns e dos pequenos córregos e nascentes encontra-se alterada
em função da retirada da mata ciliar, dos assoreamentos e das erosões, além de bastante contaminada por esgotos, principalmente
os domésticos, e pelos euentes das pequenas indústrias e a deposição do lixo.
95
Várias nascentes já se apresentam com processo de antropização evoluído. Inclusive, os fragmentos de oresta mesóla
registrados no interior da APA são exemplares de formações bióticas da região do cerrado bastante desmatadas e quase
exterminadas em território goiano, e de que restam apenas fragmentos esparsos nas áreas que ocupavam originalmente.
O campo limpo é marcado pela presença de gramíneas estacionais. Ao longo do período de estiagem, cam sob o risco
constante de queimadas que, quando provocadas por fatores externos ao ciclo natural, tornam-se prejudiciais ao ecossistema: diminuem
ainda mais o baixo teor natural de matéria orgânica dos solos e causam danos óbvios aos componentes da fauna e da ora.
Estudos de pesquisadores do Departamento de Botânica da Universidade Federal de Goiás, citados em Goiânia por
Mendonça (1998, p. 69 e 70), apontam na região uma ora bastante rica: ipê amarelo; canela; jacarandá; e pequizeiro. Registram
ainda muitas espécies invasoras, principalmente nas faixas ciliares. Nas faixas antropizadas, encontram pequenos grupos de
espécies arbóreas e arbustivas, tanto de mata original quanto de introduzidas, a exemplo da barriguda e do amboyant. (Fig. 25)
Fig. 25 – Mapa da Análise Temporal da Vegetação da APA do Morro do Mendanha.
96
A fauna
A fauna, parte constitutiva fundamental desses sistemas, em sua maioria possui hábitos de locomoção e migração ativos.
Os mesmos estudos da Universidade Federal de Goiás copilados em Mendonça (1998, p. 71 e 72) apontam a ocorrência de
espécies, como: tamanduá bandeira; tatu peludo; raposa; macaco prego; e, segundo moradores do local, jaguatirica e capivara.
Em relação à ictiofauna, não estudos detalhados sobre as espécies. Entretanto, pela pequena dimensão do ribeirão e por seu
grau de poluição, pode-se supor uma baixa diversidade.
A avifauna apresenta-se muito rica e dela destacam-se: o papagaio; o beija-or; a coruja; o periquito; a garça branca; o
urubu; o pica-pau do campo; a rolinha; o João-de-barro; a codorna; o bem-te-vi; a perdiz; e o sabiá. (MENDONÇA, 1998, p.72)
Ante essa riqueza da fauna e ora locais, é possível concluir que, apesar da urbanização acelerada, os fragmentos de
matas, os pequenos cursos d’água e nascentes e a declividade acentuada que caracterizam o lugar são os fatores que têm
assegurado as condições ecológicas mínimas para o desenvolvimento dos processos naturais. Entretanto, dado o processo de
antropização, todo esse patrimônio encontra-se altamente ameaçado de extinção.
3.1.2 A base legislativa
Apesar de os planos urbanos de Goiânia, desde o elaborado por Attílio Corrêa Lima até o atual, determinarem uma reserva
de preservação de cada lado das margens de seus rios, foi a partir do Plano Diretor PD de 1992 e da Lei Complementar de 1994,
reforçados no PD em vigor aprovado em 2007, na seção VI, Dos parâmetros ambientais, Art. 106, parágrafo 1º, itens a e b, que
se especicaram ser as áreas de fundo de vale e topos de morros como áreas de preservação permanente – APP, devendo ser
demarcadas para propiciar a preservação das planícies de inundação ou várzeas.
A lei atual determina protão integral às matas recobertas por florestas nativas e do cerrado ou savana, identificadas
a partir do levantamento aerofotogramétrico de julho de 1988, bem como a todas aquelas inseridas no perímetro urbano
identificadas na Carta de Risco, elaborada pelo Munipio de Goiânia e editada em conjunto com o Ministério das Cidades
em 2008. (Fig. 25)
Entretanto, a realidade é muito distinta da que preconizam os textos da lei: proliferam os usos irregulares dessas áreas,
entre outros a construção de moradias e templos religiosos e a ocupação por cultivos temporários, com a retirada dos recursos
naturais originais.
No que se refere às declividades acentuadas, foi no PD de 1994 que, pela primeira vez, se reconheceram e xaram as
cumeeiras do Mendanha, Serrinha, Santo Antônio e do Além como Áreas de Preservação Ambiental – APA. Contudo, nada tem
97
sido feito a partir de então. Somente o PD 2007, em seu artigo 123, institui o Morro do Mendanha como APA com caráter de baixa
densidade, como ambiente em que se admitem parcelamentos habitacionais e mistos.
Em que pese isso, até o presente momento não se envidaram esforços para a elaboração de um texto legislativo especíco
obrigatório, como determina a Lei do Sistema Nacional de Unidade de Conservação SNUC/2000, no capítulo que trata da criação,
implantação e gestão das unidades de conservação. Essa condição ca agravada pelo fato de não haver planejamento ambiental
próprio que suporte ao Plano de Manejo obrigatório, que ca à mercê das possibilidades ou impossibilidades do ambiente
biofísico, da sociedade e da sua ocupação. A ocupação é efetuada por populações carentes, que, na falta de oportunidades,
obrigam a abertura de espaços sociais visíveis em uma sociedade excludente. Entretanto, há também apropriações indevidas da
comunidade de alto poder aquisitivo, que seleciona os melhores lugares, de maior beleza cênica, para se xar.
É importante ressaltar que APA é uma gura jurídica regulamentada pela Lei 9985/2000 SNUC como parte das “Unidades
de Conservação” e assume compatibilizar as atividades antrópicas com a preservação do meio ambiente. O objetivo fundamental
de proteção dos recursos ambientais e de melhoria da qualidade de vida da população signica dizer que pode haver ocupação do
espaço, desde que sejam mantidas suas principais características e estruturas, de forma a proteger a qualidade do meio ambiente,
assegurar o bem-estar das populações humanas e promover a recuperação e conservação das condições ecológicas locais.
O objetivo, portanto, de um planejamento urbano ecológico da área não é proibir as atividades humanas, mas encontrar
formas adequadas de ocupação. É desse entendimento que pode resultar outra forma de relação entre sociedade e áreas de
proteção, pois essas não precisam ser obrigatoriamente públicas, porque não exigem desapropriação para sua implantação, mas
tão somente a adequação do uso humano às predisposições naturais do lugar.
Assim, deve-se estar atento às suas características de origem, dado que a APA é instituída por alguma razão de fragilidade
ambiental, com exigências de cuidados especiais e proteção do patrimônio histórico, cultural e paisagístico, exigências que devem
gerar um conjunto de legislações e regulamentações próprias e, se necessário, restritivas. A APA do Mendanha assume esse
caráter de resgatar um cenário único no território urbano densamente ocupado de Goiânia, em geral bastante plano e com solos
profundos e bem drenados, porém exposto a uma ação antrópica de grandes proporções. A APA é uma ilha no contexto, depositária
de alguns dos mais importantes fragmentos de mata nativa em uma área ambientalmente frágil, constituída por morros e morrotes
e solos suscetíveis a processos erosivos.
Os topos de morro e as áreas de mata nativa ou reconstituídas, as encostas íngremes e os fundos de vale integram o
conjunto. Sendo Áreas de Preservação Permanente e que não podem ser ocupadas, são os espaços no interior da APA que devem
ser demarcados como sustentáculo da gleba como um todo, tendo em vista que os principais problemas atuais do meio físico local
de certa forma repetem o quadro geral da cidade. São os processos erosivos, os assoreamentos e a poluição dos corpos d’água.
98
3.1.3 Identidade social: conhecimento e expectativas
Tomando como referência a paisagem descrita e considerando que as transformações não são advindas de
ações isoladas ou eventos específicos, ao contrário são resultado da estrutura sociocultural e sua interação com o meio,
tornam-se necessários, para um planejamento da paisagem que tem como foco reduzir os problemas do lugar, estudos
mais aprofundados das realidades sociais e seus hábitos cotidianos. Tais estudos e pesquisas devem revelar a lógica do
mercado imobiliário, a natureza idealizada e a realidade produzida, a inércia diante da perda das capacidades ambientais
e a incapacidade ou falta de interesse do poder público, em todas as esferas, de por em prática as políticas territoriais e
ambientais.
Para tanto, necessitam ouvir os segmentos de pessoas que adaptam e transformam o espaço, o que Hannah Arendt (1997,
p. 15 a 20) dene como vita activa, ou seja, as atividades humanas fundamentais que se reúnem em três categorias: o “labor”,
que é a própria vida e corresponde aos processos biológicos, às necessidades vitais; o “trabalho”, responsável pelo articialismo
da existência humana, nitidamente diferente do ambiente natural e que se destina a prover a sobrevivência; e a “ação”, que
corresponde à condição humana da pluralidade, se dá entre os homens sem mediação das coisas ou da matéria, e é a condição
de toda a vida política.
Nessa perspectiva, e para conhecer o universo de produção do espaço habitado, o presente trabalho optou então por
realizar uma pesquisa quantitativa com a população local entendida como os agentes que construíram e constroem, habitam e
transformam o lugar; e uma pesquisa qualitativa com grupos de prossionais que atuaram e atuam nesse espaço pela formulação
de normativas e leis que regulamentam e disciplinam a ocupação social do território urbano; e com os segmentos que produziram
e ainda produzem os projetos e os constroem.
Tais grupos, por suas distintas formações, interesses, formas de inserção e ação exigiram, por sua vez, ões
diferenciadas para coletar os dados previamente solicitados. Em outras palavras, a pesquisa teve como sujeitos principais
distintos segmentos compostos de moradores do lugar, empreendedores e poder público, intermediados ou não por
profissionais habilitados. Seu objetivo principal era entender como esses sujeitos percebiam a paisagem, agiam sobre ela e
qual resultado esperavam obter de suas ações.
Os requisitos iniciais obedeceram a quatro grandes indagações: imagem prévia do lugar que as pessoas tinham para
ocupar o local; a expectativa ao chegar; a interação com o lugar; e as perspectivas de futuro.
99
3.1.3.1 Os agentes da transformação
Os homens, como as demais espécies dos seres vivos que compartilham a biosfera, são agentes movidos por necessidades
vitais de abrigo, proteção e sustento. Entretanto, de modo distinto, orienta suas ações também por dados culturais, estéticos e
econômicos. Possui a capacidade de pensar e agir sobre o meio físico, transformando-o de forma naturalizada e de acordo com
seus conceitos culturais.
Os grandes agentes da transformação do ambiente natural são, dessa forma, a espécie humana, que se agrupa conforme
sua formação social e econômica, por vezes em oposição de interesses com as condicionantes biofísicas originais e sociais,
mesmo quando estes são alimentados por um discurso comum, como o da construção da habitabilidade humana do território.
No ambiente da pesquisa da APA do Mendanha, os principais grupos percebidos como transformadores da paisagem natural
foram os moradores do lugar (grupo 1), mediados pelas ações políticas e econômicas que se valem de técnicos e empreendedores
(grupo 2) para materializar um discurso e uma prática de cidade e de lugares. Assim, por se tratarem de grupos de agentes
diferenciados, os requisitos iniciais elencados foram respeitados, mas a forma se deu de duas maneiras distintas.
Para o primeiro grupo, foi elaborado e aplicado um questionário estruturado, quantitativo, que contou com a assessoria do
Instituto de Pesquisa de Comportamento Observatório, radicado em Goiânia, à Rua 94-C, 120, Setor Sul, instituto que mantém uma
sólida estrutura e experiência em pesquisa de comportamento. A pesquisa foi aplicada nos dias 18 e 19 de abril de 2009 por estudantes
de ciências sociais da Universidade Federal de Goiás UFG
17
em um contingente de 391 pessoas, número denido a partir dos
autores Babbie (1999) e Tagliacarne (1978). Este quantitativo, neste tipo de pesquisa, é estipulado, conforme explicitam os autores,
por referências estatísticas a partir do número de pessoas que habitam o lugar, e corresponde a um índice de altíssima delidade: 5%
de margem de erro. O questionário compôs-se com 31 questões (anexo1), além de quatro outras sobre o perl do entrevistado. Desse
material resultaram as tabelas que se encontram em volume separado e anexado a esta tese, disponível para consulta. (anexo 1)
A pesquisa com o grupo 2, técnicos do poder público e empreendedores
18
,
2
deu-se na modalidade qualitativa por entrevistas
em profundidade e seguiu um roteiro previamente estabelecido que tomou como referência as quatro grandes indagações a serem
17 A equipe de campo foi composta por Jaqueline Pereira, Juliana Nogueira Santos, Marcelo Soldan, Marina Lemes, Marcilene Martins, Neville Vilas Boas, equipe previamente treinada e prepa-
rada pelo sociólogo e doutorando da Universidade de Brasília – UnB Rafael Neves Flores Belmonte e o publicitário Aidhan Ricardo Gagliardi, ambos do Instituto de Pesquisa de Comportamento
Observatório.
18 Grupos focais realizados pela pesquisadora e acompanhados pelo psicólogo Rui Melo do Instituto de Pesquisa de Comportamento Observatório. Compuseram o grupo realizado na Agência
do Meio Ambiente Municipal – AMMA: Geógrafo Antônio Soares e Engenheiro Florestal Antônio Esteves; o grupo da Secretaria Municipal do Planejamento – SEPLAM: Geólogo Sílvio Matos e Ar-
quiteta Iolane Marques Prudente; e o grupo da Tropical Imóveis os prossionais: Empresária, Acionista, Empreendedora e Arquiteta Maria Luci Costa, Engenheiro e Diretor Operacional Raphael
Melo de Moraes Gualberto e Arquiteta Andréia Acioli.
100
investigadas. Aplicadas a grupos formados de duas a três pessoas, as entrevistas expressaram suas percepções, conhecimentos
e expectativas.
Nos três segmentos, os membros foram identicados com nome, formação prossional, local de trabalho, cargo e
tempo de serviço na área. A aplicação dos questionários e as entrevistas tiveram duração de aproximadamente uma hora. As
entrevistas foram gravadas e transcritas. Foram ouvidos em 02/04/2009, dois prossionais da Agência Municipal do Meio Ambiente
AMMA; em 16/04/2009, dois prossionais da Secretaria Municipal de Planejamento – SEPLAM; e, em 14/05/2009, um grupo de
empreendedores e prossionais que elaborou o projeto do condomínio fechado Residencial Parque Mendanha, que vem sendo
implantado no interior da APA. Os roteiros e transcrições integram o volume à parte a que já nos reportamos.
Para a aplicação dos questionários a população, houve uma conversa prévia com e com o presidente da Associação
de Moradores do Jardim Pampulha e Residencial Cidade Verde, Edivaldo Assis Braz, realizada em 02/04/2009, que foi gravada
e também transcrita, e que teve como objetivo a aproximação entre as partes e o reconhecimento inicial do lugar. Embora não
prevista, foi incorporada às análises por ter apontado pontos importantes na percepção do ambiente.
O objetivo, como dissemos, foi detectar o grau de percepção que os usuários tinham e têm da paisagem, o que dela pensam,
desejam e rejeitam, e que motivações os fazem escolher e permanecer em um determinado lugar do território. A premissa foi que
conhecer determinados hábitos de convivência, grau de consciência socioambiental, compromisso social e vontade que transformam
desejo em realidade tornam possível determinar de que instrumentos cada grupo dispõe e se utiliza para provocar transformações
que dêem conta do ambiente físico e dos anseios sociais, de forma a compatibilizar esses dois universos indissociáveis.
O problema geral da pesquisa ao tomar como parâmetro um lugar especíco era buscar subsídios para entender como a
população percebe e interage com a paisagem, seja nos espaços construídos e habitados, seja nos espaços em fase de construção
ou naqueles que ainda não foram transformados, estando todos, porém, visual e funcionalmente no mesmo ambiente.
Essa base cotidiana de ação e transformação do solo, que por vezes distancia expectativas e ação, em geral não é tomada
como referência em planejamentos urbanos. No entanto, é fundamental nas transformações processadas no território e principalmente
como subsídio de um planejamento futuro. A partir desses requisitos, criaram-se as bases para a leitura e a interpretação dos dados.
Aplicou-se o questionário em alguns bairros do entorno, do lado leste e cumeeira da APA: Jardim Pampulha, Residencial
Cidade Verde, Jardim Petrópolis, Jardim Leblon e Bairro São Francisco. Localidade mais íngreme, com muitos problemas no
escoamento das águas servidas e de chuvas, encontra-se separada de um condomínio fechado para classe média alta, localizado
no ambiente da APA, o Residencial Parque Mendanha, apenas pelo fundo de vale do córrego do Café e sua topograa, e por
barreiras físicas construídas, como cercas. Embora separados, esses dois universos compartilham a mesma paisagem. No
101
entanto, como o condomínio Residencial Parque Mendanha ainda estava em fase nal de implantação no momento da pesquisa,
não julgamos oportuno ouvir os futuros moradores, que só trariam suas expectativas, mas não a sua cotidianidade.
Os segmentos do grupo 2, empreendedores, prossionais e técnicos municipais, corresponderam à categoria que idealiza
e atua na cidade, atendendo aos fatores econômicos, ecológicos, políticos, ideológicos e sociais, porque propõem normas e
aplicam a legislação vigente, que de toda forma vai criando subterfúgios para garantir a maior ocupação ou preservação do lugar.
3.1.3.2 Os moradores do lugar
A interpretação que se segue a respeito dos moradores do lugar foi feita pela pesquisadora com a assessoria do psicólogo
Rui Melo e teve como base os dados do questionário estruturado aplicado à população, dispostos em tabelas elaboradas pelos:
sociólogo e doutorando da Universidade de Brasília UnB Rafael Neves Flores Belmonte e o publicitário Aidhan Ricardo Gagliardi,
prossionais ligados ao Instituto de Pesquisa de Comportamento Observatório. Geraram os seguintes resultados: frequência
simples; cruzamento por tempo de moradia; cruzamento por bairro; cruzamento por sexo; cruzamento por idade; cruzamento por
classe econômica; e cruzamentos especícos e grácos. (anexo1)
A população do entorno da APA do Mendanha é composta por maioria de pessoas jovens, que se radicaram no local nos
últimos dez anos e não se encontram ali de passagem. Criaram ou estão criando raízes e suas expectativas giram em torno de
investimentos do poder público em distintas frentes para que o lugar se torne melhor.
O seu grau de instrução formal é o ensino fundamental e médio e a renda mensal está na faixa de 3 a 5 salários mínimos.
Esse perl vem se alterando nos últimos cinco anos, devido ao surgimento das invasões, dos loteamentos irregulares e dos
condomínios fechados. Até esse período, havia homogeneidade no perl populacional. A partir do investimento da iniciativa privada,
que implantou residenciais diferenciados para uma classe econômica de maior poder aquisitivo e com maiores exigências de
oportunidades e acessibilidade, o segmento que vive à borda, sobrevivendo de subempregos, também migrou para a localidade
em busca de oportunidades de sobrevivência e visibilidade. (Fig. 26).
Mais da metade da população foi para o local nos últimos dez anos, mas pode-se armar que esse quadro de ocupação
tende, num curto prazo, a se expandir, atingindo patamares preocupantes em virtude das fragilidades ambientais geradas pelos
investimentos que têm sido feitos na região. Isso porque, mesmo estando os loteamentos do entorno em sua maioria já aprovados
e em grande parte comercializados, registram-se ainda inúmeros imóveis não construídos ou vazios. (Fig. 27 e 28)
Um fator positivo é que o crescimento ou adensamento tem ocorrido, até o momento, de forma nuclear, em um quadro de
interesses comuns, especialmente pela indicação e inuência de pessoas amigas e familiares. Mais da metade dos moradores
102
Fig. 26 – Residencial Parque Mendanha com parcelamentos populares ao fundo. Foto: Maria Eliana Jubé Ribeiro / 2009.
do entorno chegou até o local motivada por relações sociais, familiares ou de amizade, o que indica um crescimento das
horizontalidades
19
,
3
ou seja, das relações de proximidade de interesses sociais.
, entretanto, um fator de adensamento que merece distinção: a ocupão por invasão do topo do morro, feita por
entidades religiosas pentecostais. Ainda que represente índice baixo em relação ao total, é significativo diante do ambiente
19 Para Milton Santos (1997, p. 227 229), as horizontalidades são tanto o lugar da nalidade imposta de fora, de longe e de cima, quanto o da contranalidade, localmente gerada. Elas
são o teatro de um cotidiano conforme, mas não obrigatoriamente conformista e, simultaneamente, o lugar da cegueira e da descoberta, da complacência e da revolta”. Segundo o autor, a
sociedade e o território são determinados por forças opostas, centrípetas e centrífugas, em que as forças centrípetas o as forças de agregação, o fatores de convergência, fatores de
aglomeração, fatores de coesão e, como tais, conduzem a um processo de homogenização. E acrescenta: “A solidariedade interna ao subespaço, providenciada pelas forças centrípetas, está
permanentemente perturbada pelas forças centrífugas e deve permanentemente ser refeita”. Diz também que os lugares podem se “[...] refortalecer horizontalmente, reconstruindo, a partir
das ões localmente construídas, uma base de vida que amplie a coesão da sociedade civil, a serviço do interesse coletivo”, e isso se torna viável na busca incansável e na construção
de “[...] um sistema de reivindicações mais abrangente, adaptado às contingências da existência comum, no espaço da horizontalidade”.
103
Fig. 27 – Vazios Urbanos. Fonte: Prefeitura Municipal de Goiânia / Secretaria Municipal de Planejamento. Plano Diretor 2007.
Fig. 28 – Lotes Vagos. Fonte: Prefeitura Municipal de Goiânia / Secretaria Municipal de Planejamento. Plano Diretor 2007.
104
Fig. 29 – Ocupações irregulares das Igrejas Pentecostais. Fotos: Maria Eliana Jubé Ribeiro / 2008.
da APA e das populações do entorno: a baixa oferta de moradias para as classes econômicas menos favorecidas e sua
consequente exclusão motivam sua adesão à religião como instrumento de visibilidade e atendimento, pelo culto e pela
oração, de suas necessidades primárias de moradia. Disso resulta um quadro de ocupação e degradação ambiental e social.
(Fig. 29, 29a, 29b)
Outro dado expressivo é determinado por fatores econômicos, de centralidade e acessibilidade. Em relação à centralidade,
indicam um panorama ainda incipiente da carência de imóveis com preços acessíveis em áreas mais centrais. Quanto aos
parâmetros econômicos e a facilidade de acesso, o local está inserido nas proximidades do eixo do transporte coletivo leste/
oeste, o mais eciente da cidade. Mesmo não cortando a região diretamente, essa linha margeia-a. Se considerarmos que o
105
transporte público em Goiânia é decitário, esse dado torna-se bastante signicativo para a população que depende desse meio
de locomão para suas atividades cotidianas.
O processo de construção dominante é o da autoconstrão, modo bastante característico e comum nas populões
de baixo poder aquisitivo, que o edificando suas moradas de acordo com suas necessidades e em consonância com sua
disponibilidade financeira. O significativo desse quadro é que grande parteo ocupa toda a área disponível e nem pretende
fazê-lo, expressando uma relão entre espaços livres e espaços construídos que a população cultiva, além da contribuição
de cada um ao percentual de áreas permeáveis do lugar. (Fig. 30, 30a)
O processo de urbanização recente aponta, entre as transformações positivas, o aumento populacional e a implantação
de novas infraestruturas, entre as quais se destaca o acesso: a pavimentação asfáltica e o transporte o os itens que mais
contribuíram para os bons índices de qualidade.
Fig. 29a – Ocupações irregulares das Igrejas Pentecostais. Fotos: Maria Eliana Jubé Ribeiro / 2008.
106
As praças assumem relevância nas áreasblicas livres, mas esses índices de satisfaçãoo podem ser analisados
como um item isolado, mas como parte do conjunto, pois o sistema viário de Gonia, desde sua concepção inicial, adotou
um desenho de distribuição de fluxo por rotatórias, de forma que estas vão assumindo o papel de pequenos recantos de
repouso e lazer e de composição estética.
Em relação à infraestrutura de esgoto de águas servidas, construída pelo sistema público, parte da população possui o
serviço, o que em geral coincide com as urbanizações mais antigas. Sobre a parcela da população que não o possui, a quase
totalidade possui fossa séptica. Apenas uma pequena parte escoa suas águas servidas diretamente na mata ou rio.
Fig. 29b – Ocupações irregulares das Igrejas Pentecostais. Fotos: Maria Eliana Jubé Ribeiro / 2008.
107
Os serviços de abastecimento de água, rede de energia elétrica e coleta de lixo atingem a quase totalidade dos lotes: a
população conta com água tratada, rede de energia no lote e coleta regular de lixo feita por caminhões. Ainda assim, as matas
e as áreas não ocupadas muitas vezes encontram-se cheias de lixos e entulhos provenientes da construção civil, esses últimos
repetindo um quadro dominante em Goiânia.
Um dado preocupante é a percepção da rede de coleta e escoamento das águas pluviais, pois um mero signicativo de pessoas
aponta contar com esse serviço. Pela encosta de declividades acentuadas, além da proximidade da mata e do rio, a compreensão não
se restringe apenas à amplitude de possuir ou o rede, mas, para além da cobertura, também da qualidade e eciência dessa rede
Fig. 30 – Loteamento irregular – Residencial Serra Azul. Foto: Maria Eliana Jubé Ribeiro / 2008.
108
em captar e escoar de forma segura as águas das chuvas, não provocando ou agravando processos de assoreamentos, deslizamentos
e desmoronamentos, com aberturas de ravinas, voçorocas e alagamentos, levando a um quadro complexo de destruão ambiental e
retirando da população os potenciais naturais de compreensão do meio biofísico e da qualidade de vida.
Quanto aos temas referentes às expectativas de melhoria do transporte e coleta de lixo, os índices foram relevantes,
principalmente se considerarmos que esses serviços foram avaliados positivamente em seu formato atual. Isso demonstra que,
mesmo usufruindo de algo que está acima da média da cidade, os moradores não perdem as referências de qualidade na prestação
de serviços públicos e não se deixam ofuscar, minimizando suas exigências ou o patamar que desejam atingir no futuro.
Entre as mudanças negativas apontadas, relativas ao meio biofísico, estão o desmatamento e a invasão do morro, com uma
incidência quase unânime dos elementos que os desagradam na violência e na prostituição. Os dados apresentados demonstram
carência de segurança e serviços nas áreas públicas institucionais e livres, em virtude da iluminação decitária e dos vazios
urbanos, que facilitam os refúgios e se armam como atrativos para as transgressões socioculturais.
Fig. 30a – Loteamento irregular – Residencial Serra Azul. Foto: Maria Eliana Jubé Ribeiro / 2008.
109
No entanto, os moradores do lugar se mostraram satisfeitos em viver no ambiente do morro, resultado de alguns fatores
dentre os quais, como elementos de atração: a localização e o fácil acesso; o preço do imóvel; o meio ambiente; e a tranqüilidade,
nessa ordem. Ao se xarem ao lugar, dois desses fatores se mantêm, mas invertem a ordem, vindo em primeiro lugar a tranquilidade
e, após, a localização. Neste, outro componente toma força, o da sociabilidade, resultado da proximidade e das relações de
fraternidade que os unem.
Assim, mesmo diante de ações que os desagradam, encontram ambiente favorável nos grandes espaços abertos vegetados.
Ao focalizar o meio-ambiente, boa parte da população o aponta como de preservação da natureza, esta entendida pela presença
de cobertura vegetal, de rios e lagos, mas deseja vê-los transformados em parques, o que leva a aferir que as pessoas do lugar
têm uma percepção bastante sensível do ambiente natural.
Sobre o ribeirão Anicuns, a percepção é distinta entre os que estão próximos ao seu leito e os que se encontram mais
distanciados: a grande maioria dos que moram mais próximos acha que ele deveria ser despoluído e recuperado; os que se
manifestaram indiferentes à sua presença são os que se encontram mais afastados. Entretanto, mesmo nestes, a atitude é de não
possuir opinião formada sobre o tema. Poucos se manifestaram favoráveis a intervenções radicais, a exemplo da canalização.
Sobre a percepção das matas do local, a maioria da população gosta delas, embora aponte a necessidade de cuidados
que efetivamente levem à recuperação e à preservação da natureza. Um desejo comum entre eles é o da implantação de uma
infraestrutura mínima que lhes garanta, além da beleza e dos benefícios diretos da qualidade ambiental, a utilização das matas
como áreas de lazer, com ocupação apropriada, resultando em segurança e evitando atos ilícitos propícios a se desenvolverem
em lugares degradados e ermos.
Deve-se, contudo, ressaltar que todos negam com veemência um desenvolvimento que se apóie na supressão da oresta
ou da fauna entendida como parte integrante da paisagem local e não como incômodo à ocupação humana. O que reivindicam
são cuidados na manutenção das matas, mantendo a fauna em seu interior, e a implantação de áreas de lazer passivo e ativo,
unindo preservação e ocupação humana com ambientes passíveis de apropriação. Acima de tudo, não relegam a um plano menor
a manutenção das características bem denidas da paisagem local.
O desejo de manutenção do ambiente natural é uma manifestação interna da comunidade, resultado de vivências anteriores
e não de processos educacionais ou legais, pois é signicativo o contingente de moradores locais que desconhecem o fato de a
encosta não ocupada do morro ser declarada em lei como área de preservação ambiental. Entretanto, entre os que disso sabem,
constatou-se um elevado nível de conhecimento sobre o tema, pois foram elencadas as funções primordiais de uma área de proteção
e preservação da natureza: a manutenção da qualidade do ar e a promoção da qualidade de vida dos animais e do homem.
110
As expectativas de futuro apontam as melhorias necessárias para que o lugar venha a ser ideal para viver: primeiramente,
recuperar o rio; em seguida, as matas. Essas duas melhorias atingiram valores quase absolutos no desejo da população. Contudo,
sobressaem nesse contexto os que aliam a essa ação a implantação de um grande parque. Assume ainda relevância acabar com
os lotes vazios.
As aspirações quanto à qualidade de vida centram-se em dois focos de distintas solicitações, que agrupamos em áreas de
interesse: acabar com a violência e a prostituição é a maior esperança que propiciaa qualicão do ambiente; melhorar a infraestrutura
que se encontra diluída, desde a ampliação do comércio local até a implantão de áreas de lazer, escolas e creches. De forma menos
expressiva, houve demandas quanto à infraestrutura das vias públicas, repartidas em: melhoria de acesso e iluminação pública.
Todos demonstraram acreditar que, no futuro, o lugar estará melhor que na atualidade, com melhor qualidade de vida.
Sobre quais seriam as ações necessárias para atingir essa qualidade desejada, apontaram o desenvolvimento determinado pela
presença efetiva do poder público ao promover crescimento ordenado, regular e scalizar e, portanto, reduzir a criminalidade.
Elevar a consciência individual é importante, mas não determinante e não se associa à ação coletiva.
Dessa forma, os dados possibilitam dizer que a inércia da população no que se refere à ação direta é muito forte, mesmo
considerando seu bom nível de consciência do ambiente natural e um pequeno movimento individualizado, porém incipiente,
de inserção ambiental. O que se destaca, todavia, é que, mesmo manifestando um desejo claro de desenvolvimento, este não
implica em redução dos índices de matas e rios. Ao contrário, a pretensão é que se implantem infraestruturas mais ecientes para
recuperá-los, transformando-os em um grande parque para eles e para a cidade. (Fig.31)
3.2 Interpretação dos conitos e oportunidades
O fenômeno de ocupação da área do morro do Mendanha não é recente, mas foi intensicado na última década. Apesar de
haver registro de loteamentos aprovados em seu perímetro urbano desde 1930, como o Conjunto Padre Pelágio, foi nas décadas
de 1950 e 1960 que sua ocupação deu um salto, com a aprovação dos parcelamentos das Chácaras Maringá e dos bairros São
Francisco e Parque Industrial João Braz (década de 50), Jardim Petrópolis e Jardim Leblon (década de 60) e Conjunto Vera
Cruz (década de 70), época em que as legislações ambientais não eram muito rigorosas. Os parcelamentos foram paralisados a
partir de então até o nal dos anos 90, quando, novamente, sofreram forte pressão. Na última década, no entorno do perímetro
demarcado da APA, foram aprovados, na margem esquerda do rio, o Residencial Junqueira, o Jardim Pampulha, o Residencial
Cidade Verde, Jardim Novo Petrópolis e o Residencial Petrópolis; na sua margem direita, o Parque Industrial João Braz 2; e, em
seu interior, o Condomínio do Lago e o Residencial Parque Mendanha. Houve ainda, em sua margem direita, os parcelamentos
111
Fig. 31 – Vista geral do morro do Mendanha. Foto: Maria Eliana Jubé Ribeiro / 2009.
irregulares Residencial Serra Azul I e II, e o loteamento Estrela Nova. Cabe ressaltar que, à exceção desses dois últimos, os demais
parcelamentos passaram por processos de aprovação formal.
Os dois condomínios fechados situados nas encostas íngremes foram locados nas extremidades leste e oeste. Do lado
leste, na divisa com o córrego do Café, encontra-se o Residencial Parque Mendanha, com área de 319.144,70 m², em fase de
implantação; no lado oeste, na divisa com o Morro dos Macacos, o Condomínio do Lago, com 389.036,00 de área em processo
de ocupação acelerada. Nesses loteamentos, registram-se áreas de mata nativa, alagados e pequenos veios d’água, contribuintes
do ribeirão Anicuns. Foram delimitados em atendimento à lei municipal de preservação dos fundos de vale, em que pese estarem
em locais de declividades bastante acentuadas e com alto risco de erosão. (Fig. 32)
Na cumeeira, encontram-se diversas torres de telecomunicações, uma grande estrutura eclética de concreto abandonada,
construída na década de 80 para sediar um clube sírio-libanês, e proliferam, de forma progressiva e descontrolada, invasões, na
maioria ligadas às igrejas pentecostais que, para a ocupação, realizam desmatamentos e cortes indiscriminados, colocando-se em
risco bem com a toda a comunidade local, com prejuízos ambientais para toda a cidade.
112
Fig. 32 – Mapa de Ocupação da APA do Mendanha.
Inserida em uma das doze Unidades Regionais de Planejamento, a Região Mendanha contava, segundo o senso ocial do IBGE
em 2000, com 53.593 habitantes. A taxa de crescimento entre 1991 a 2000 foi de 2,03%, acima da média registrada para a cidade. Se
considerarmos que grande parte dos parcelamentos regulares, irregulares ou invasões aconteceram após 2000, e se, numa perspectiva
otimista, mantivermos essa taxa de crescimento, sua progressão aponta uma população local por volta de 80.000 habitantes em 2020.
Os primeiros loteamentos do local destinavam-se às classes trabalhadoras com renda acima de cinco salários mínimos, a
exemplo do Jardim Petrópolis e Conjunto Vera Cruz. Mas houve também parcelamentos populares para a população com renda
acima de três salários mínimos, como o Parque Industrial João Braz. Outra forma de parcelamento da região, bastante usual
à época, foram as chácaras de recreio, com módulos de 5.000 a 10.000 m² ou um pouco maiores, de características rurais, cuja
atividade principal era a criação de gado leiteiro e algumas pequenas lavouras. Essas áreas, entretanto, estão hoje praticamente
desativadas e expostas a todo o tipo de especulação econômica e imobiliária. (Fig. 33,33a)
113
Na última década, a situação assume nova características: na barra da APA, continuam surgindo novos loteamentos para
as classes populares. São, porém, limítrofes a parcelamentos locados em suas encostas íngremes e voltados a um público que
está acima de vinte salários mínimos. Assim, a separação entre os distintos segmentos sociais se por barreiras físicas, como
topograa, matas e córregos, além, evidentemente, das cercas e muros.
Outra ocupação que vem imprimindo novo perl ao local devido ao seu caráter se não exclusivo, porém bastante peculiar está
caracterizada nos condomínios fechados nas encostas frágeis, residenciais populares abertos na zona do entorno. Representam
um quadro de crescimento que, de certa forma, tende a consolidar-se, pois conta com a aceitação e a conivência dos órgãos
públicos municipais. Exige, contudo, uma reavaliação cuidadosa, uma vez que a única possibilidade de continuidade e manutenção
Fig. 33 – Módulos rurais praticamente desativados. Fotos: Maria Eliana Jubé Ribeiro / 2008.
114
do uxo gênico dentro da zona urbana construída é a recuperação das unidades de conservação. Essa são o suporte essencial
para a implantação de corredores ecológicos nesses ambientes. Muitos exemplares remanescentes da fauna silvestre dependem
da recuperação da vegetação para se restabelecerem como populações.
Em diversas áreas, a exemplo da área da cumeeira do morro do Mendanha, onde estão locadas as torres de
telecomunicações e as igrejas pentecostais, além do loteamento Jd. Petrópolis, dos domínios do Conjunto Vera Cruz, a
oeste, e dos arredores dos loteamentos Cidade Verde e Jd. Pampulha, a leste, o conjunto vem sofrendo notável processo de
voçorocamento, devido ao uso inadequado do solo urbano quando da abertura das vias, feitas com cortes impprios. Sua
posterior pavimentação provoca o aumento do escoamento concentrado. Ao somarmos a essa paisagem uma canalizão
de esgoto pluvial nem sempre suciente e/ou eciente, o resultado es, dentro de um quadro presuvel, no aparecimento e
crescimento de imensas voçorocas, com decréscimo signicativo da qualidade ambiental, expondo a população gradativamente
a riscos. (Fig. 34, 34a)
Fig. 33a – Módulos rurais praticamente desativados. Fotos: Maria Eliana Jubé Ribeiro / 2008.
115
A implantação dos parcelamentos nas áreas planas ou mesmo íngremes do entorno da encosta deu-se dentro de uma lógica
de planejamento na qual o traçado ortogonal aos fundos de vale era o desenho dominante, o que provocou a intensicação dos
processos erosivos com o consequente assoreamento das drenagens. Os condomínios fechados apresentaram preocupação em
adequar seu traçado à topograa e aos cursos d’água, não só em resposta à nova legislação, mas também para evitar problemas
internos de lavagem, alagamentos e desmoronamentos. Além de atender a uma demanda crescente da população, mesmo que,
por vezes, tomando padrões equivocados de como fazê-lo, por exemplo o de basear-se no economicamente mais atrativo.
A infraestrutura existente para os parcelamentos abertos do entorno é decitária. Possui apenas: rede de água tratada para quase
a totalidade dos imóveis; as ruas, quando abertas, são pavimentadas com asfalto de baixa qualidade; as calçadas são praticamente
Fig. 34 – Erosão do córrego do Café e cortes da área. Foto: Maria Eliana Jubé Ribeiro / 2009.
116
inexistentes; as galerias de esgoto pluvial o insucientes e inecientes; a coleta de lixo é precária, visto que tanto as ruas como as
matas e os lotes baldios possuem despejo de reduos. Assim, mesmo que haja rede de esgoto pluvial e coleta regular de lixo, dada a
precariedade desses serviços sua abrangência será limitada, não atingindo com eciência todos os lugares. (Fig. 35, 35a)
A limpeza urbana se através de prestação de servo público de varrão das ruas, roçagem, capina e poda de árvores. Em
virtude da deciência do serviço prestado, a população não atendida joga seu lixo domiciliar em terrenos baldios, nos corpos d’água
e nos buracos das eroes, contribuindo para o agravamento das condões ambientais e sanirias. Dentre essas, a mais relevante
é a contaminão dos cursos d’água, com a proliferão da produção de vetores e disseminação de doeas, agravada pelo fato de
muitos moradores possuírem, também, sistema de poços para sua retirada d’água.
Contudo, a questão mais preocupante é que vários desses parcelamentos não contam com rede de esgoto doméstico,
como o Jardim Pampulha e o Residencial Cidade Verde, que fazem seu escoamento em fossa séptica. Situação de escoamento
Fig. 34a – Erosão do córrego do Café e cortes da área. Foto: Maria Eliana Jubé Ribeiro / 2009.
117
de águas servidas que se repete mesmo nos condomínios horizontais fechados, o que de certa forma apenas mascara o problema
ou, até por isso, o perpetua, agravando a situação de degradação ambiental, dada a proximidade do lençol freático. Essa solução
é bastante decitária, com grandes prejuízos para os recursos hídricos.
O quadro de escoamento de águas servidas em fossas pticas realiza apenas a decantação priria dos lidos. Posteriormente,
escoa suas águas no solo, diretamente para o leito do ribeirão Anicuns, contaminando as águas superciais e o leol frtico raso.
Assim, algumas soluções de planejamento da paisagem se tornam emergenciais na resolução das questões ambientais em relação ao
rio e suas encostas e ainda em atendimento à população que demanda por serviços, equipamentos e qualidade de vida.
Cabe lembrar que, nesses lugares, as possibilidades de implantação de infraestrutura de saneamento básico de esgoto
sanitário dentro dos parâmetros tradicionais da engenharia, com obras de arte de captação e tratamento, é bastante improvável. As
atuais unidades de tratamento não estão dimensionadas para receber essa carga, pois já se encontram saturadas e não há quadro
de expansão previsto. (Fig. 36,36a)
Fig. 35 – Escoamento e captação de água no Jardim Pampulha Foto: Maria Eliana Jubé Ribeiro / 2009.
118
Fig. 35a – Escoamento e captação de água no Jardim Pampulha Foto: Maria Eliana Jubé Ribeiro / 2009.
As áreas públicas institucionais são bastante restritas, do que resulta a pequena infraestrutura atual e mesmo
futura de serviços de educação, saúde e segurança, obrigando a população a buscar atendimentos em outros locais,
ficando o lazer praticamente ausente dessa somatória. Esses equipamentos, quando existentes, se restringem em geral a
campos de futebol improvisados em áreas ainda não ocupadas, além de bares e lanchonetes que se espalham por todos
os lugares.
As vias de acesso, as internas e principalmente as externas, já se encontram abertas e com frequência
pavimentadas, apesar de se apresentarem regularmente interrompidas, com pouca ou sem arborização e com sérios
problemas de articulação interna com os parcelamentos e externa com a cidade.
119
Fig. 36 – Áreas livres alagadas no Jardim Pampulha. Fotos: Maria Eliana Jubé Ribeiro / 2009.
Esse panorama torna bastante complexa a implantação de áreas públicas livres e institucionais de lazer. Além da escassez
ou inexistência de áreas para tais ns, em muitos casos essas áreas, quando previstas, situam-se em locais de implantação
improvável porque projetadas para ambientes de matas e ou alagados.
A iluminação pública dos parcelamentos abertos é precária. Acontece geralmente apenas nas vias principais, com
posteamentos de ação aérea e lâmpadas de vapor de mercúrio. Entretanto, a quase totalidade dos imóveis recebe a distribuição
da rede de energia elétrica. O serviço telefônico, como é particular e próximo às torres de telefonia, é serviço regular, tanto de
telefones públicos como de linhas particulares. (Fig. 37,37a).
Há ainda no contexto, ou de certa forma englobando-o, um grande projeto que deve ser analisado e reavaliado, assinado
em setembro de 2009. De nanciamento internacional, a liberação da primeira parcela dos recursos se destina, exatamente, à
licitação e ao desenvolvimento de projetos executivos. Trata-se do “Programa de Recuperação Ambiental do córrego Macambira e
120
Fig. 36a – Áreas livres alagadas no Jardim Pampulha. Fotos: Maria Eliana Jubé Ribeiro / 2009.
ribeirão Anicuns”, aprovado no nal de 2003, no valor de 94,5 milhões de dólares, nanciado em 60% pelo Banco Interamericano
de Desenvolvimento – BID e em 40% pelo tesouro municipal.
Esse plano conceitual desenvolvido pela Prefeitura Municipal de Goiânia abrange 26,5 km dos dois leitos que lhe dão o nome.
É um projeto de recuperação da capacidade do meio ambiente em meio antpico, pela implantação de um grande parque linear com
60 m de áreas verdes de cada lado, ao longo dos fundos de vale, com várias unidades de serviço e lazer em seu percurso, classicadas
como espaços recreativos básicos, médios e completos, que devem contar com equipamentos de desporto e lazer. (Fig. 38, 38a, 38b).
Prevê ainda três grandes parques denominados genericamente de Unidades de Conservação Ambiental – UCA 1, 2, 3. )
O traçado desse parque tem início nas nascentes do córrego Macambira, na parte sul da cidade, e segue o percurso desse
leito até o seu encontro com o ribeirão Anicuns, a oeste; continua a partir desse ponto até o encontro das águas com o rio Meia
Ponte, a noroeste. O encontro do córrego Macambira com o ribeirão Anicuns acontece, exatamente, no limite posterior da APA do
121
Fig. 37 – Vias locais. Foto: Maria Eliana Jubé Ribeiro / 2009.
Mendanha. Apesar de um pequeno trecho dessa unidade estar contido no plano maior como um dos três parques temáticos, ele
focaliza apenas uma intervenção pontual próxima à cumeeira e a melhoria em alguns bairros do entorno no encontro das águas, não
tendo sido desenvolvido um planejamento mais abrangente que envolvesse o leito e suas nascentes. Também o projeto não exige
a elaboração de um plano de manejo, no caso uma prerrogativa legal imprescindível à manutenção da integridade ambiental.
Unidades de conservação ambiental, temáticas, as UCA contarão com estruturas de lazer e educação ambiental,
apresentando propostas e programas complexos, a despeito de um planejamento urbano ecológico mais fundamentado. A UCA1
subdivide-se em duas partes: a primeira se localiza nas nascentes do córrego Macambira, nas proximidades do Setor Faiçalville,
e se denomina Parque Macambira; e a segunda, no entorno de um condomínio horizontal fechado, o Jardins Florença, e recebe o
nome de Parque Buriti.
122
Fig. 37a – Vias locais. Foto: Maria Eliana Jubé Ribeiro / 2009.
A UCA2, o Parque da Pedreira concebido pelo arquiteto Luis Fernando Cruvinel Teixeira, encontra-se na cumeeira da
APA e deverá contar com um extenso programa de equipamentos de esportes radicais, temáticos do esporte de aventura, e ainda
viveiros e centros de lazer e educação, com cursos especiais sobre clima e ventos. A UCA3 ocorrerá no encontro do ribeirão
Anicuns com o rio Meia Ponte, ambiente de veredas alagadiças, motivo pelo qual recebeu o nome de Parque das Águas. É unidade
que merece um estudo mais rigoroso e detalhado por sua própria natureza, pois se trata de uma reserva biológica de contribuição
imprescindível na redução das frequentes enchentes a jusante do rio Meia Ponte. (Fig. 39)
No projeto, há ainda um programa de melhoria dos bairros, totalizando 114 áreas de intervenção, cuja proposta
é a qualicação das áreas urbanizadas lindeiras ao parque como forma de garantir sua integridade. A infraestrutura engloba
a implantação de ‘Centros Municipais de Educação Infantil’ CMEIS, ‘Centros Integrados de Apoio a Saúde’ CAIS, praças,
123
quadras poliesportivas, escolas-padrão, centros comunitários, casas de cultura, asfalto, galerias de águas pluviais e pontes. Prevê
também realocações das populações que se encontram em áreas de risco. Entretanto, essa estrutura deverá ser construída dentro
dos padrões tradicionais das engenharias, já bastante experimentados em nossas cidades e muito decientes.
O Programa Macambira Anicuns, como é chamado, para além de sua importância indiscutível, deve ser objeto de
reavaliação, por conter diversos componentes equivocados no processo de concepção do projeto. Entre eles:
Fig. 38 – Unidades de serviço e lazer propostas classicadas como espaços básicos, médios e
completos. Fonte: Prefeitura Municipal de Goiânia/2003.
124
Fig. 38a,38b – Unidades de serviço e lazer propostas classicadas como espaços básicos, médios e completos. Fonte: Prefeitura Municipal de Goiânia/2003.
125
1
0
5
1
0 2 5
50 (m)
DAS ÁGUAS
PONTE SUSPENSA
TORRE SUL
OLHO D´ÁGUA
CAMINHO
ESTAR 5
PRAÇA DE ACESSO 2
PÓRTICO 2
TORRE NORTE
PLAYGROUND
- SANITÁRIOS
- PORTARIA
TORRE
ESTAÇÃO
METEOROLÓGICA
OESTE
ADENSAMENTO DE
ESPÉCIES NATIVAS
MATA EXISTENTE COM
BOSQUE
RECEPÇÃO 2
ACESSO 2
MIRANTE - PASSARELA
(QUADRA - A)
JARDIM PETRÓPOLIS
PRAÇA DOS BACURIS
VIVEIRO COBERTO
OCA 2
OCA 1
ESTAR 3
ESTAR 2
- SALAS DE AULA
- AUDITÓRIO
- RECEPÇÃO
- SANITÁRIO
- DEPÓSITO
- SANITÁRIOS
PLATAFORMA EXISTENTE
PASSARELA ATIRANTADA SOBRE
PLATAFORMA EXISTENTE
PASSARELA ATIRANTADA SOBRE
PASSARELA ATIRANTADA
- CANTEIROS
AUDITÓRIO PEQUENO
PRAÇA CENTRAL
ESTAR 4
AUDITÓRIO GRANDE
- ESPELHO D´ÁGUA
- ARQUIBANCADA
- PALCO
DECK
- PALCO
- SANITÁRIOS
- BAR
EVENTOS
- TERRAÇO
PLAYGROUND
- PRACINHA
- PERGOLADO
- TERRAÇO
EDUCAÇÃO
AMBIENTAL
PRAÇA DE ACESSO 1
TORRE LESTE
PÓRTICO 1
- SANITÁRIOS
- AMBULATÓRIO
- NÚCLEO DE SERVIÇOS
- ADMINISTRAÇÃO
CORTE 2
CORTE 1
- LOJA
ESTAR 01
4545
4646
AVENTURAS
CIRCUITO DE
PRAÇA DA AVENTURA
OCA 3
CIRCUITO 2
- ALUGUEL DE EQUIPAMENTOS
- SANITÁRIOS
- PERCURSO ADULTO
- CURSOS DE ESPORTE NA NATUREZA
- ACESSOS AOS CIRCUITOS
CIRCUITO 1
- PERCURSO INFANTIL
- TREINAMENTO INICIANTES
4747
ACESSO 1
RECEPÇÃO 1
UCA 2 - Proposta PARQUE DA PEDREIRA
Fig. 39 – Parque da Pedreira. Fonte: Prefeitura Municipal de Goiânia/2003.
126
1. não foi precedido de um estudo detalhado das condições biofísicas de cada trecho, o que possibilitaria um planejamento da
paisagem a partir de um zoneamento urbano ecológico que atendese às necessidades do ambiente natural e humano;
2. a infraestrutura prevista utiliza-se de técnicas e tecnologias tradicionais, as obras de arte. Não há inovação, apenas amplia um
pouco mais o quadro de atendimento, solução que, em geral, aponta graves problemas em curtos espaços de tempo;
3. apesar de tratar-se de um projeto de recuperão dos leitos do córrego Macambira e ribeio Anicuns, não inclui as nascentes do
ribeirão, e não apresenta um estudo aprofundado da unidade de conservação, a APA do Mendanha. Mesmo sendo um projeto de
reabilitação e saneamento das referidas bacias, é carente de soluções efetivas de saneamento das águas pluviais que extrapolem as
tradicionais galerias,o havendo nenhuma discuso ou novas propostas de enfrentamento do problema do esgoto doméstico.
Ao tomar esse panorama dos quadros de implantação e desenvolvimento da cidade de Goiânia e em particular da APA do
Mendanha e ainda as questões apontadas nas entrevistas com os prossionais do planejamento urbano e ambiental, públicos e
privados, empreendedores, e o presidente da associação dos moradores do Jardim Pampulha e Cidade Verde, é possível apontar
um quadro bem claro dos problemas e potencialidades a serem enfrentados.
3.2.1 Os problemas
1. Os parcelamentos aprovados nas décadas de 50 / 60 / 70 e 80 não tinham grandes exigências ambientais. A legislação especica
só iniciou a ser formatada na segunda metade da década de 80, quando, efetivamente, começaram a acontecer as cobranças.
2. Por um longo período de tempo, as aprovações de parcelamentos foram exclusividade da Secretaria Municipal de Planejamento.
3. O órgão ambiental cava excluso desse processo.
3. Os parcelamentos aprovados nas décadas de 50 e 60, mesmo não tendo sido totalmente ocupados, a exemplo do Jardim
Petrópolis na cumeeira do morro do Mendanha, com trechos de altas declividades e matas nativas, na atualidade são focos de
grandes polêmicas, envolvendo o direito de propriedade e as leis ambientais.
4. A ocupação recente feita por condomínios fechados com suas cercas e muros tem tirado da população o patrimônio ambiental e
a possibilidade de implantação de parques de acesso livre.
5. No Plano Diretor, Lei 171/2007, uma polêmica com relação ao artigo 123, que institui a APA. Também com relação às leis
federais de parcelamento, a 6766, ao Código Florestal, e à lei que institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação
SNUC. Nas leis federais e mesmo no artigo supracitado da lei municipal, são Áreas de Preservação Permanente – APP todos
os ambientes com declividade maior que 30%; já no texto da lei municipal, o capítulo que trata das questões ambientais prevê
que se podem ocupar áreas com até 40% de inclinação.
127
6.Tem havido redução progressiva das áreas de preservação permanente.
7. Existe a pressão da população em geral para ocupação do passivo ambiental.
8. Desmatamentos ocorrem.
9. Tem ocorrido abertura de vias em áreas declivosas, acelerando processos erosivos.
10. A encosta desprotegida, com sistema ineciente de esgoto pluvial, tem gerado assoreamentos, deslizamentos, desmoronamentos,
ravinas e voçorocas.
11. A coleta de lixo é precária, do que resulta o lançamento nas erosões.
12. Já existe e se agrava uma voçoroca no córrego do Café, em virtude do esgoto pluvial.
13. Há precariedade e, em muitos casos, ausência de sistema de esgoto de águas servidas.
14. Não existem levantamentos com dimensões precisas de Goiânia em geral e, mais especicamente, das Unidades de
Conservação.
15. Também é insuciente a infraestrutura de material, de pessoal, de técnicas e tecnologias no órgão ambiental.
16. O projeto de recuperação ambiental aprovado, e que conta com recursos internacionais de implantação, exclui as nascentes
do ribeirão Anicuns, além de não avançar em planejamento urbano ecológico com zoneamento ambiental próprio. Também
restringe-se a soluções convencionais de engenharia, que vêm se mostrando inecientes e incapazes de dar respostas locais
satisfatórias ou com desdobramentos a contento para a bacia hidrográca como um todo, com resultados palpáveis de elevação
da qualidade de vida das populações lindeiras.
17. A população local que ocupa os parcelamentos populares é vítima do momento de transição entre o público e o privado: o poder
público não tem agilidade para resolver as demandas, e os proprietários privados, que atendem a esse público, perderam o
interesse em investimentos no lugar, dada a defasagem que passou a existir entre as exigências feitas e o valor comercial desse
tipo de empreendimento.
3.2.2 As potencialidades
1. Os parcelamentos da região da APA do Mendanha iniciaram-se na década de 50 e eram, até os anos 70, muito mais voltados
aos extratos rurais, a exemplo das Chácaras Maringá, o que garantiu uma baixa densidade até a atualidade
2. Na década de 90, os condomínios fechados trouxeram em seu conceito um forte apelo de paisagismo ambiental, em que a
topograa acentuada, talvegues, cursos d’ água e matas nativas passaram a ser grandes atrativos.
128
3. O apelo ambiental passou a incorporar o dia-a-dia do cidadão e se tornou uma excelente mídia para o empreendedor, que a
captou e vem aplicando alguns de seus conceitos, mesmo que de forma mercadológica, nos parcelamentos destinados às
classes sociais mais abastadas, incorporando aos empreendimentos valores ecológicos e econômicos.
4. Há exigência de implantação de vias verdes separando as APP dos loteamentos.
5. A aprovação dos parcelamentos, nos últimos quatro anos, tem sido feita pelos órgãos responsáveis em conjunto: a Secretaria
Municipal de Planejamento – a SEPLAM aprova o plano urbanístico e a Agência Municipal do Meio Ambiente AMMA, o plano
ambiental.
6. Tem havido parcial recuperação natural das matas nos últimos 20 anos, devido à resistência dos técnicos dos órgãos de
planejamento e ambiental na aprovação de parcelamentos.
7. Dadas as características biofísicas do lugar, a infraestrutura existente e as limitações impostas pela SEPLAM e AMMA, e
ainda por não haver via perimétrica e nem sistema viário ampliado, os parcelamentos de baixa densidade com alto controle de
ocupação são uma exigência para que haja a recuperação dos corredores de ora e fauna.
8. Qualquer aprovação de parcelamentos para a área delimitada da APA, a partir de 2007, é feita com base na Lei 171, artigo 123,
balizada pelos recursos hídricos, topograa, vegetação e fauna, nessa ordem de prioridades.
9. Existe a obrigatoriedade, de acordo com a Lei 171 e as determinações do Plano Diretor de Drenagem Urbana, de implantação
de lagoas de detenção e/ou retenção de águas pluviais.
10. A proposta atual de planejamento para a APA é a de recuperação dos corredores verdes com a implantação dos parques
lineares nas áreas de matas ciliares, retomando, em tese, a proposta inicial de Attílio Corrêa Lima.
11. Os traçados das vias dos condomínios residenciais que se localizam no núcleo da APA tiraram proveito da topograa: seguiram
ao máximo as curvas de nível e adotaram bacia de detenção e/ou retenção de águas pluviais.
12. Com a implantação do condomínio fechado Parque Mendanha, houve melhorias, como a limpeza de um lago do córrego do
Café, recuperando sua vazão, e um projeto de recomposição orística de compensação ambiental, com revegetação de 43.000
mudas da ora nativa, a cargo do empreendedor.
13. As grandes áreas alagadas ao longo do fundo de vale em locais de baixa declividade e próximas ao rio vêm inibindo ocupações,
a exemplo de uma área verde no Jardim Pampulha, prevista no parcelamento como área institucional e para a qual a
reivindicação de implantação de um parque.
14. Implantou-se recentemente a pavimentação asfáltica.
15. A instituição do Termo de Ajustamento de Conduta TAC na Lei 171/2007 gerou receita especíca de destino previamente
129
estabelecido, com aplicação preferencial em locais onde ocorreram danos. Quando o local já se encontra atendido, pode haver
deslocamento do recurso que, entretanto, deve estar sempre vinculado às questões de preservação e/ou recuperação do
ambiente natural.
16. Hoje há autonomia política e nanceira da Agência Municipal do Meio Ambiente – AMMA.
17. Existe um projeto aprovado, o ‘Programa Macambira / Anicuns’, com recursos nanceiros disponibilizados, que, se reavaliado
e redimensionado, pode tornar-se apropriado para o ambiente, a bacia hidrográca e Goiânia. (Fig. 40)
Fig.40 – Mapas síntese da APA do Mendanha.
130
4.1 A ecácia do novo enfoque proposto para assegurar a conservação da APA, integrando-a ao
desenvolvimento urbano.
s pesquisas para a utilização dos conceitos do planejamento urbano ecológico são emergentes, tendo em vista o tamanho e a
densidade de ocupação de nossas cidades. Visam as alamedas, bulevares e parques, mas também um sistema que os inclua e se
amplie para um outro abrangente de águas urbanas, manutenção de fragmentos de vegetação aliados à ocupação humana.
Desse modo, o princípio de criação de uma estrutura ecológica ou de infraestrutura verde que agregue corredores verdes
urbanos aliado à otimizada prática de manejo das águas, reorestamento de encostas, ruas verdes, captação, armazenamento,
reuso e inltração das águas de chuva no lençol freático, entre outras intervenções de baixo impacto e custo, poderá fornecer
importantes contribuições para um projeto de cidade ecologicamente mais equilibrado, em que os espaços livres vegetados
assumam o papel crucial de manutenção da sustentabilidade urbana.
O Planejamento Ecológico das Cidades a partir dos princípios da Infraestrutura Verde adota quatro preceitos de denição
de projeto:
reconhecer e delimitar a Estrutura Ecológica da Paisagem Urbana dada pelas condições biofísicas e de biodiversidade do 1.
território, compostas por: Parques Lineares ou Corredores Verdes ao longo dos cursos d’água e seus fundos de vale; alagados;
matas nativas; áreas íngremes ou muito frágeis; cumeeiras ou topos de morros; e áreas de solos férteis;
adotar um sistema complementar de Drenagem Urbana com os princípios naturais de escoamento, puricação e armazenagem 2.
das águas pluviais, projetados na malha urbana como forma de minimizar os efeitos devastadores das corredeiras, lavagens,
assoreamentos, ravinas e voçorocas que vêm afetando nossas cidades, diminuindo de forma signicativa os custos da estrutura
4 Infraestrutura verde: conexão entre pessoas e lugares
A
132
tradicional das obras de arte, com resultados ecológicos, econômicos, estéticos e educacionais de grande importância na
construção da sustentabilidade urbana;
planejar a mobilidade como elemento intrínseco da acessibilidade urbana de maneira que, ao denir as vias públicas que dão 3.
caráter ao desenho da malha urbana, o faça com atenção às distintas formas de locomoção;
planejar, implantar e manter a Floresta Urbana em rede formada pelo conjunto das áreas vegetadas livres urbanas, públicas e 4.
privadas, naturais ou construídas.
Esse sistema, que tem como base a estrutura ecológica no ambiente da cidade, repensa o planejamento urbano em outra
lógica que a dos espaços verdes livres como lugares de circulação, acessibilidade ou permanência, contemplação ou recreação.
O sistema proposto é o de repensar cada espaço ou ambiente da cidade na perspectiva de que assumam múltiplas funções:
conectar fragmentos de vegetação; conduzir águas com segurança; oferecer melhorias microclimáticas; preservar as águas
subterrâneas concomitante aos novos usos urbanos de habitação, trabalho, educação, lazer e suas demandas de transporte e
abastecimento; além de atender, é claro, às tradicionais demandas de melhorias ambientais e de recreação e estética.
Dessa forma, a denição da estrutura ecológica urbana ou da infraestrutura verde para as cidades e, em particular, para
a APA do Mendanha, exige um conjunto de espaços abertos preferencialmente vegetados, que incluam as áreas urbanizadas de
sua borda, formando uma rede articulada com as áreas construídas, conectadas às grandes áreas de preservação, espaços não
edicados em virtude de suas características biofísicas, e que assumam as seguintes funções:
manter, criar e enriquecer os hábitats e proteger a diversidade das espécies;1.
proteger os recursos hídricos e ajudar no manejo das águas pluviais com a consequente redução da exposição dos moradores 2.
às áreas de risco e inundação;
contribuir com a melhoria do microclima local, bem como, pelo efeito acumulativo, inuir no conjunto do espaço urbano 3.
metropolitano;
reduzir os problemas de saúde pública pelo controle do uso do solo e tratamento das águas contaminadas, promover atividades 4.
físicas e reduzir o estresse ao oferecer espaços para contemplação, interação social e expressão cultural;
valorizar o território ao longo do tempo, possibilitando retorno nanceiro de longo alcance em termos de valor das propriedades, 5.
investimentos urbanos e ampliação da base scal municipal;
oferecer alternativa mais eciente e menos onerosa que a infraestrutura urbana tradicional, além de agregar valores éticos e estéticos.6.
133
O enfoque representa um avanço nas redes verdes e sistemas de espaços livres existentes por apropriar-se dos recursos
básicos da natureza para sua sustentação e principalmente lançar mão desses recursos nas zonas urbanas do entorno como
infraestruturas de serviços e saneamento. O diferencial é que as áreas livres passam a ser consideradas importantes não por
seus valores estéticos, condição intrínseca de sua existência, mas como parte de uma estrutura de sustentação urbana, que, ao
articular-se à rede viária e às edicações, assume no conjunto as funções de preservação e manutenção do sítio urbanizado.
É enm apropriar-se das qualidades biofísicas do lugar e combiná-las com outras redes de sustentação urbana, articulando-
as no projeto da paisagem em diferentes situações socioambientais como estratégias capazes de conferir ao ambiente da cidade
características de aconchego e beleza e inspirar cuidados e desejo de perenidade.
4.2 O projeto urbano: modelos alternativos
4.2.1 Alagados e oresta urbana: infraestrutura verde de equilíbrio
A rede de infraestrutura verde formada de orestas, alagados e outros espaços abertos provê vários benefícios ecológicos,
como hábitat para animais e plantas e puricação do ar, ao remover as partículas em suspensão de dióxido de nitrogênio, dióxido
de sulfato, de monóxido de carbono e ozônio emitidas por sua vegetação.
As águas pluviais urbanas concentram um grau considerável de contaminação atmosférica, como resíduos de óleos,
hidrocarbonetos e materiais em suspensão, que são conduzidos pelos microssistemas de drenagem urbana para os rios, quando
não são jogados diretamente nesses canais, provocando o extermínio da ictiofauna e a redução do caudal.
Destacamos nos alagados as funções de armazenagem de águas, proteção e estabilização das chuvas torrenciais,
retenção e sedimentação de nutrientes, mitigação das mudanças climáticas e puricação das águas. Muitas plantas desenvolvidas
nesses ambientes têm a capacidade de remover substâncias tóxicas provenientes de pesticidas, descargas industriais, entre
outras atividades danosas. São ambientes que preservam as bacias com sua vegetação natural e ampliam a quantidade e a
qualidade das águas para o consumo humano.
Até poucos anos não valorizados, os alagados naturais são ricas associações que reduzem a contaminação das águas
subterrâneas, evitam as enchentes e são valiosas reservas naturais. Com seu entorno vegetado, são microambientes em total
equilíbrio, cujas águas são ricas em nutrientes, provendo sustento a diversas comunidades de plantas, pássaros e invertebrados.
Assim, inseridos na cidade, devem ser revisitados nos ambientes das grandes estações de abastecimento e tratamento de
águas aos construídos para o lazer que, em outros momentos da história urbana, assumiram funções distintas, ora cnicas
134
e funcionais ou apenas estéticas, em detrimento das sociais e ambientais. Recuperar os ambientes dos alagados e das matas é
recuperar as águas superciais e profundas, a ora e a fauna da cidade.
Os alagados e pântanos, entre outros ambientes do gênero, são talvez os mais importantes locais de vida animal, ltros
de primeira qualidade das águas, além de bacias naturais de coleta das águas das chuvas. São esponjas que absorvem as
precipitações e o escoamento das águas e retardam sua descarga nos rios.
Com o avanço dos estudos da ecologia, constatou-se serem eles lugares onde o lençol freático encontra-se muito próximo
da superfície, o que, aliado às condições topográcas de pequenas depressões ou bacia, cria uma camada rasa de água sobre o
solo, o suciente para mantê-lo saturado por quase todo o ano, inclusive nos períodos de seca, com vegetação perene. Assim, uma
característica típica dessas áreas é o alto teor de matéria orgânica acumulada nos solos. Dada a sua produtividade, torna esses
ambientes uma fonte importantíssima de alimentos para vários animais.
Ainda outra característica é a capacidade que esses ambientes possuem de absorver nitrogênio, fósforo, metais pesados,
bactérias e outros materiais contaminantes, tornando-se depuradores naturais e reguladores da qualidade do ar e do uxo das
águas, amortecedores de enchentes e controladores de processos de erosão e assoreamento dos rios.
Essas são qualidades desejáveis de reproduzirem-se ao se construírem alagados. A diferença é que, nos ambientes
construídos, a água, a vegetação e o substrato são controlados de forma a garantir objetivos previamente denidos. Contudo, o
objetivo principal deve centrar-se na melhoria da qualidade da água pela remoção de poluentes e o controle de enchentes; pela
qualicação atmosférica com inuência direta na qualidade do ar e do microclima; e como áreas de recomposição de fragmentos
de vegetação. As funções complementares de educação e lazer são fundamentais pelo convívio que resulta na compreensão e
conhecimento dos processos da natureza. Assim, a sua preservação é muito importante.
A remoção dos poluentes dá-se por três mecanismos: os físicos, pela sedimentação, ltração, absorção e retenção; os
químicos, que advêm das interações e reações com outros componentes; os biológicos, realizados pelos vegetais. Sua eciência é,
contudo, variável, porque depende dos projetos referentes à hidrologia, solo, clima, nutrientes, com destaque para a manutenção.
Até por isso, uma condição de sua capacidade é a garantia do uxo contínuo de água, de que resulta, em geral, a remoção de
matéria orgânica de grau moderado a alto, metais e bactérias, e que contribui, mesmo que de forma menos efetiva, para a remoção
de fósforo e nitrogênio.
Os alagados construídos, quando adequados ao meio biofísico, reproduzindo suas condições naturais, são sistemas de
baixo custo de implantação e manutenção; quando associados a sistemas convencionais de esgoto pluvial, tornam-se um excelente
mecanismo de tratamento da poluição difusa carreada pelas águas das chuvas bem como servem para ampliar a eciência dos
135
sistemas alternativos de tratamento de esgoto. Seu tamanho e forma são variáveis e dependem da área disponível, podendo
congurar-se como grandes lagoas ou pequenas cascatas e bacias.
Mesmo as pequenas intervenções são bastante interessantes, seja pela eciência, evitando redes de transporte até as
estações de tratamento convencionais, seja pela sua função estética, que com poucos recursos se obtém. Sua tecnologia de
construção e manutenção é relativamente simples e de baixo custo, porque todo o processo de tratamento da água baseia-se em
energias renováveis, como a energia solar e a energia cinética, em que a vegetação e os microorganismos são os responsáveis
pelo procedimento.
Com esse entendimento, pode-se dizer que os alagados são especialmente importantes no sistema, como auxiliares ou
preventivos dos alagamentos das bacias hidrográcas, pois absorvem grande parte das águas durante chuvas intensas, retardam
o escoamento supercial para o interior dos rios e reduzem as enchentes nas cheias, além de serem excelentes ambientes de
limpeza e puricação das águas.
As enchentes, um dos grandes problemas das bacias hidrográcas, podem ser em grande parte minimizadas pelos alagados,
embora somente esses ambientes não sejam capazes de conter grandes volumes de águas provenientes de intempéries intermitentes.
Assim, as orestas de proteção dos leitos, corredores verdes de vida selvagem, também constituem elementos fundamentais desse
sistema de prevenção.
As orestas e os alagados prestam um serviço incomparável na mitigação das enchentes. Reorestar áreas auxilia a
redução do impacto das corredeiras das águas das chuvas e reduz o impacto das tempestades no solo, evitando erosões. Árvores
tornam os solos mais absorventes e transformam-nos em competentes ltros que reduzem a lavagem e a sedimentação dos rios.
A destruição das orestas amplia os sedimentos nos canais dos rios, abre suas calhas e, consequentemente, provoca os
alagamentos, impactando a ecologia desses ambientes com a redução dos peixes e outras espécies animais. Essa destruição
amplia as bacias rasas, destroi estradas, plantações, enm, comunidades inteiras.
O objetivo de apresentar uma proposta que contemple um sistema de alagados construídos e preservação de matas não tem
o caráter de substituir os sistemas tradicionais em uso, mas complementá-los, notadamente onde esses não conseguem alcançar
eciência, seja porque já estão funcionando com sua capacidade máxima, seja pelo alto custo de implantação e manutenção dos
sistemas químicos de tratamento. O que se pretende é discutir procedimentos alternativos para lugares onde as situações habituais
são caras e/ou impossíveis de serem adaptadas.
A grande vantagem do tratamento das águas usando sistemas de autodepuração é o convívio da população com seus
resíduos pela implantação de parques urbanos mantenedores do sistema em equilíbrio, como um caminho de garantir acesso
136
à água de qualidade e à saúde pública. O processo transforma esses espaços em polos turístico-ecológicos de preservação do
ambiente natural e cultural urbano, reconhecidos tanto pelos moradores locais como por toda a sociedade.
Tais atitudes podem também, por seu efeito em cadeia, estimular a captação das águas das chuvas para limpezas, evitando
lavagens e contaminações. A puricação das águas pluviais e residuais de forma direta e visível eleva a consciência das pessoas
sobre os ciclos de consumo e as recorda do papel vital da água e da responsabilidade de cada indivíduo no projeto coletivo.
A função ecológica desse sistema é altamente eciente, atraindo, como nos sistemas naturais, grande quantidade de
animais, que se alimentam e revegetam a área com os resíduos de sementes disseminados pelas fezes, que se acasalam e
transformam o ambiente em hábitat.
A função social é indiscutível, pois ambientes naturalizados esteticamente construídos têm potencial para atuar como
centros educacionais e recreativos, quando incorporam soluções alternativas e infraestruturas como trilhas, plataformas, painéis e
outras. E podem tornar-se parques com áreas verdes, lagos, cascatas, mirantes e demais mobiliários de serviço e lazer.
Os ganhos, além dos considerados e dos nanceiros, fundamentais em qualquer economia forte ou carente, são, portanto, os
de preservação do meio ambiente e a formão cultural: a população conscientiza-se das gicas do ambiente natural, principalmente
das relativas à queso das águas, ao tomar contato e participar da depurão de seus resíduos; aperfeoa o consumo; e reduz
a produção de lixo, ou da entropia. Mais que a inevel preocupão ambiental, esse procedimento tem um cater pedagógico
fundamental, por demonstrar que uma iniciativa ecológica pode tornar-se signo da identidade de um lugar, um bairro ou uma cidade.
4.2.1.1 Drenagem natural
Entendida como o conjunto de instalações destinadas a escoar o excesso das águas na malha urbana não deve se restringir
aos aspectos puramente técnicos impostos pelos limites restritos da engenharia. Compreende todas as medidas adotadas com
vistas à atenuação dos riscos e dos prejuízos das inundações a que a população está exposta.
Em nossas cidades, com a implantação da malha urbana, o percurso das enxurradas provenientes das águas das chuvas passa a
ser determinado pelo traçado das ruas. Essas torrentes, captadas pelas sarjetas, desembocam nos bueiros, somam-se às águas coletadas
pela rede pública por coletores localizados nos pátios e nos topos das edicações, e escoam por tubulações que alimentam condutos
secundários, a partir dos quais atingem o fundo de vale mesmo não havendo um curso dágua perene. Esse sistema é denominado
macrodrenagem. O sistema que capta, reduz a velocidade, ltra e armazena as águas pluviais diretamente das ruas, pátios e telhados e
as conduz à macrodrenagem denomina-se microdrenagem e é nesse sistema que se propõem soluções alternativas de amplo alcance
ecológico, social e econômico.
137
Essa técnica destina-se, como no sistema de sarjetas, bocas de lobo e condutos subterrâneos, a prover os distintos
espaços urbanos com critérios mais éticos e econômicos para o destino das águas pluviais, porque adota a bacia hidrográca como
parâmetro de planejamento das medidas locais e estabelece uma política de ocupação das várzeas inundáveis que não entra em
conito com a política de drenagem adotada, mas atua na redução do percurso das águas entre origem e destino e na retomada
do escoamento gradativo e por gravidade.
Os estudos de drenagem urbana aplicados às grandes e pequenas vias e a intervenção pontual no Jardim Pampulha
apresentada neste trabalho, usando tipologias de infraestrutura verde, constituem exemplos dessa estratégia de abordagem
ecológica de manejo das águas pluviais e de aproximação da natureza e da sociedade na cidade. Esses instrumentos assumem o
papel de interligar espaços livres no meio urbano, integrando-os à paisagem que lhes deu suporte.
O estudo da paisagem da APA como um todo, composta de parques, corredores verdes, espaços naturais preservados,
áreas urbanizadas e áreas passíveis de serem urbanizadas, tem suas raízes nos princípios da ecologia da paisagem e adota como
suporte o planejamento da bacia, base de aplicação desse modelo. As áreas livres passam então a fazer parte da estrutura de
suporte da cidade para além dos interesses estéticos de lazer e contemplação. Elas são parte efetiva do desempenho das vias
públicas e ainda o elemento de aproximação do homem ao meio biofísico.
Com isso procura-se defender um planejamento urbano ecológico mais responsável, que incorpore a construção de outros
componentes de captação e permeabilização das águas, a exemplo dos jardins de chuva, biovaletas, lagoas pluviais e pavimentação
drenante implantados em distintas áreas públicas, pequenos parques e vias, com ganhos estéticos, hidrológicos, climatológicos,
sociais, culturais e econômicos. São ferramentas de um conjunto que integra um projeto de infraestrutura verde e assume-se como
estratégia de manejo das águas pluviais em busca da sustentabilidade, ao reduzir o impacto ambiental em uma relação favorável
de custo x benefício e ao usar sistemas naturais para captar, limpar e reduzir o impacto pluvial nas plantas e no solo.
Os jardins de chuva ou canteiros pluviais de biorretenção são áreas em depressão, no nível do solo, que recebem e tratam
as águas pluviais no local. Quando a eles são adicionados solo composto e plantas, o primeiro os faz funcionar como uma esponja,
sugando a água, que, em seu interior, devido à ação de bactérias e microorganismos, é puricada com a remoção de poluentes; as
plantas intensicam a evapotranspiração, potencializando ainda mais a remoção dos poluentes.
Podem ser usados em distintos espaços abertos, pras, estacionamentos e áreas residenciais, e assumir tamanhos variáveis,
pequenos ou grandes, dependendo do espo disponível. Mesmo os pequenos são muito ecientes no processo de ltragem da água.
Por possuírem uma camada impermeabilizante, para que o solo e o lençol frtico não sejam contaminados, seu uso tamm é
recomendado em áreas potencialmente poluidoras. Os canteiros pluviais são os jardins de chuva compactados em pequenos espaços
138
urbanos e compõem qualquer ambiente, desde pequenas áreas internas connadas até remanescentes de áreas em meio urbano mais
denso. Podem ainda suprimir a inltração, assumindo apenas as funções de evaporação, evapotranspiração e transbordamento.
São áreas que exigem manutenção para que sua eciência permaneça com taxas de despoluição consideráveis. Seu custo é
variável e depende do tipo de solo, do tamanho da área e do grau e do tipo de poluição produzida, condições que determinam o tratamento
e a impermeabilização que devem ser utilizados. (Fig. 41, 41a)
Outro elemento que compõe essa rede as biovaletas (também conhecidas como valetas de biorretenção vegetadas)
são as depressões lineares com vegetação para captar, inltrar e limpar as águas das chuvas, evitando corredeiras e lavagens.
Fig.41 – Planta e cortes: longitudinal e transversal, esquemáticos, de canteiros pluviais.
201
20 Figura do painel da disciplina AUT 221 - Arquitetura, Ambiente e Desenvolvimento Sustentável - Universidade de São Paulo.
139
Fig.41a – Planta e cortes: longitudinal e transversal, esquemáticos, de canteiros pluviais
Geralmente dispostas nas ruas, ao longo dos passeios públicos, partem do mesmo princípio dos jardins de chuva. A diferença são
suas dimensões e disposição, além da função, visto que, ao invés de simplesmente conduzir as águas coletadas para seu destino
nal, como fazem as valetas tradicionais, elas funcionam no sistema integrado de infraestrutura verde para otimizar os resultados
de sustentabilidade do ambiente construído.
Seu uso deve observar alguns pontos importantes para o seu desempenho: pela sua característica de sistema em células,
em que a água vai transbordando de uma célula para outra, elas são estruturas de unidades de vizinhança, exigem manutenção e
devem ser adotadas e cuidadas pelos proprietários do lugar. Em grandes vias e de urbanização intensa, com a presença de postos
de combustível entre outras estruturas muito poluentes, recomenda-se que as vias verdes adotem canteiros pluviais, visto que o
escoamento de águas poluídas é maior e mais intenso, o que exige áreas maiores de absorção e processos mais elaborados para
140
Fig. 42 – Corte esquemático de biovaleta.
21
21 Figura do painel da disciplina AUT 221 – Arquitetura, Ambiente e Desenvolvimento Sustentável - Universidade de São Paulo.
ltragem das águas superciais. O que caracteriza as biovaletas é sua estrutura reduzida, de pequena inclinação, plantadas com
vegetação rasteira e de áreas alagadas, ltrando as águas superciais diretamente para as águas subterrâneas.
Seu custo varia de acordo com a maneira como é construída, mas deve ser considerado. Entretanto, se associadas às
estruturas tradicionais de escoamento, além das outras infraestruturas verdes, torna-se menor e se justica, pois os ganhos para
a cidade são enormes quando evitam alagamentos e assoreamentos, repõem o lençol freático e removem os poluentes das águas
das chuvas. Apresentam, assim, resultados visíveis de qualidade ambiental, além de evitar transtornos sociais e gastos futuros na
correção de danos urbanos. (Fig. 42)
Outra ferramenta que compõe o sistema de infraestrutura verde de drenagem urbana são as lagoas pluviais, também
conhecidas como bacias de retenção. Caracterizam-se como grandes depressões naturais ou construídas no nível do solo, capazes
de receber as enchentes carreadas pelas drenagens, neste caso apenas para as águas pluviais. Sua capacidade de armazenagem
é calculada pelo nível permanente de água e o nível de transbordamento.
141
As lagoas pluviais têm a capacidade de armazenar bastante água, abrigar brejos, que são importantes habitats de vida
animal, e manter a qualidade das águas. Podem ser construídas em locais mais íngremes, com declividades de até 15%.
Como essas lagoas estão sujeitas a receber águas contaminadas e em virtude de seu possível contato com as águas
subterrâneas, elas devem receber uma boa impermeabilização. Por necessitarem de generosas áreas de implantação e de
manutenção, devido à vegetação que surge em seu entorno, seu custo deve ser considerado.
ainda que evitar a criação e a proliferação de insetos. Para tanto, predadores naturais devem ser incentivados em
lâminas permanentes que possuam cotas de 1,5 a 2m de profundidade. Quando não há essa possibilidade, devem ser esvaziadas
em até 72 horas ou ter sua superfície movimentada por spray, onda ou uxo. (Fig. 43)
O último elemento desse conjunto, o piso drenante, valioso auxiliar na drenagem urbana, caracteriza-se por permear as
águas de chuva, fato que ocorre por não possuir agregados miúdos em sua composição.
Sua aplicação é recomendada em zonas residenciais de tráfego moderado edio, grandes pátios, como estacionamentos,
evitando alagamentos. Em áreas íngremes, é mais um elemento que contribui para evitar lavagens e assoreamentos. Como ele permite
a inltração da água no solo, seu uso deve ser controlado em áreas contaminadas. Nesses casos, deve-se observar uma distância
mínima de 0,6 a 1,5 m do ponto mais alto do lençol freático e aproximadamente 30 m de distância de canais de água potável.
Seu bom desempenho exige cuidados de instalação e de manuteão. É mais caro que o asfalto tradicional, porém seu
uso se justica em curto prazo pelas vantagens ambientais provenientes de sua capacidade de drenar e distribuir as águas pluviais
no solo como um todo. Irrigando as distintas áreas verdes pequenas ou grandes, jardins e matas, é uma estragia de manutenção
da qualidade das águas dos leitos pluviais, porque promove uma drenagem mais lenta e gradual e evita situações de alagamentos,
assoreamentos e desmoronamento. Em perspectiva mais ampla, contribui na qualidade de vida social e na otimização de recursos.
4.2.1.2 Alagados construídos
A capacidade autodepuradora da natureza no que se refere à água tem sido largamente pesquisada na atualidade. Não
exige grandes áreas, os cuidados são poucos e resulta em estratégias econômicas, principalmente se comparada aos sistemas
químicos e de elevatórias tradicionais, além de, em geral, não produzir odores. A autodepuração para o reuso tem elevados
índices na melhoria da saúde pública, com destaque para países em que as desigualdades sociais e econômicas são grandes e a
população ribeirinha é menos privilegiada.
As águas servidas, em particular as de uso doméstico, possuem matérias orgânicas, principalmente de carbono, que se
transformam em moléculas novamente estáveis pela ação de bactérias. Entretanto, para que esse processo ocorra são necessárias
142
Fig. 43 – Lagoa Pluvial.
22
1
22 Figura do painel da disciplina AUT 221 - Arquitetura, Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Universidade de São Paulo.
143
grandes quantidades de oxigênio, que, quando vertidas sem tratamento nos rios ou lagos, roubam-lhes esse elemento em detrimento
da fauna aquática. Esse fenômeno ocorre devido à liberação de nitrogênio e fósforo. Este segundo elemento é responsável pelo
desenvolvimento das algas das águas doces, que nutrem as bactérias. Assim, apropriar-se desse ciclo tornando-o favorável à
presença humana ao conduzir as águas servidas por canais vegetados reduz em até 75% a contaminação dos cursos d’água.
Pesquisas recentes têm buscado reproduzir as caractesticas dos alagados naturais em ambientes construídos para tratamento
das águas residuais, construção complexa que requer conhecimentos mais aprofundados das engenharias do solo, química e hidráulica
e que tem provado o ser mais dispendioso que o utilizado no sistema convencional de tratamento de esgotos.
Os alagados construídos são a assimilação e a simulação das características dos ecossistemas naturais em novos
ambientes construídos, utilizando os princípios básicos de depuração e puricação para manutenção da qualidade das águas.
Suas características estão diretamente relacionadas às condições geológicas, geomorfológicas, de solos e climáticas, elementos
constitutivos do ambiente e dele indissociáveis.
A literatura especíca do tema aponta diversas experiências em distintos lugares do planeta, com diferentes resultados,
dependendo do tamanho, clima e objetivos denidos. As respostas, porém, têm sido muito promissoras à saúde pública e à
ecologia, principalmente quanto à recuperação e despoluição de bacias hidrográcas.
Têm-se multiplicado os exemplos com bons resultados de tratamento de águas servidas com plantas aquáticas. Citando
apenas experiências brasileiras, o primeiro projeto foi desenvolvido por Salati et al. (1984), na Escola Superior de Agricultura Luiz
de Queiroz – ESALQ, nas proximidades do córrego Piracicamirim, em Piracicaba-SP. A partir de então, surgiram novas pesquisas
para aumentar a eciência do sistema e reduzir os investimentos. Dentre esses esforços, cabe destacar os de: Roquete Pinto et
al. (1998), do Instituto Nacional de Tecnologia; Valentin & Roston (1998), da UNICAMP; Giovannini & Moatta Marques (1998), da
Universidade Federal do Rio Grande do Sul; Philippi et al. (1998), da Universidade Federal de Santa Catarina; e Oliveira e Talamoni
et al. (2000), da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho – UNESP.
O tratamento das águas servidas comporta diversas etapas. O tratamento primário rem as matérias lidas em
suspensão na água, o que se consegue com muita eciência por decantação em fossas sépticas. O tratamento secundário
elimina a contaminação do carbono dissolvido na água pela ação das bacrias, que consomem todo o oxinio produzido pelas
plantas aquáticas. Finda essa etapa, a água está tecnicamente puricada dos nitratos, metais pesados e germes patógenos,
mas deciente em fosfato. O retorno desse elemento às águas tratadas ocorre pelo tratamento tercrio ou complementar, se
vertidas pós-tratamento secundário em substratos de solo para irrigação.
Segundo Izembart e Boudec (2003: p.25-27), quando os alagados são utilizados para o tratamento primário,
necessidade de área de extensão considerável: 10m² por habitante. Entretanto, quando esse sistema é compartilhado, cabendo
144
a cada unidade a primeira etapa do processo de implantação e manutenção das fossas sépticas, as águas, ao serem conduzidas
às plantas depuradoras, reduzem bastante as áreas exigidas, que passam para 2m² a 5m² por habitante. No caso de esgotos
predominantemente domésticos, essa eciência é atingida com, no máximo, 2m² por pessoa.
Outra grande vantagem é que essas águas não aparecem na superfície e não produzem maus odores, insetos ou lodo, o
que torna sua manutenção simplicada, reduzida à retirada do excesso de plantas aquáticas, além de possibilitar a implantação de
moradias em seu entorno.
As plantas aquáticas merecem algumas considerações: os Eichornia crassipes, largamente utilizados em climas tropicais
com excelentes resultados, e popularmente conhecidos por aguapés, se reproduzem como praga. Em Izembart e Boudec (2003:
p.113), uma mensuração nesse sentido: em climas favoráveis, em seis meses, dez exemplares podem se converter em mais de
seiscentas mil unidades e cobrir meio hectare.
Essa proliferação, quando não contida, além de em número excessivo é agravada por sua robustez, o que oculta a superfície
das águas e anula a ação dos ventos que as oxigena. Em que pese isso, seu uso é altamente recomendado, pois possuem elevada
capacidade de transformar a demanda bioquímica de oxigênio em demanda química, substrato para os micróbios, suportam
e realizam digestões importantes de matérias em suspensão, possuem uma taxa de absorção de metais pesados otimizada
pela absorção e precipitação química do Nitrogênio em NH4 e a decomposição das bactérias, e são capazes de transformar
rapidamente os oligoelementos. Sua retirada e processamento são ainda excelente biomassa que se pode converter em energia
como, por exemplo, alimento para o gado e/ou biofertilizantes.
Existem quatro tipos de alagados construídos e classicados como: de plantas utuantes; de plantas emergentes; de
macrótas xas submersa; e de solos ltrantes. entre eles a possibilidade de associação, do que resulta um sistema combinado.
Nesta tese, dadas as características biofísicas locais, optou-se por um sistema combinado de plantas utuantes e solos ltrantes,
a exemplo da estação do Rio Piracicaba, que usou o sistema apresentando resultados satisfatórios.
Os alagados com plantas utuantes, já bastante desenvolvidos para utilização em regiões tropicais e subtropicais,
caracterizam-se pela construção de canais longos, estreitos e relativamente rasos, com aproximadamente 0,70m de profundidade,
e vegetados com uma espécie de planta ou uma combinação delas, sendo a mais utilizada o aguapé.
(Fig. 44)
O outro componente desse conjunto, os alagados com solos ltrantes, é composto de camadas superpostas de brita,
pedriscos e solo cultivado com arroz. As dimensões e espessura dos solos variam de acordo com o euente e a eciência que se
deseja atingir. A depuração se dá através de sua ação como ltro mecânico, físico-químico e biológico. Esse sistema funciona tanto
com uxo descendente, como ascendente e geralmente é utilizado no tratamento secundário e terciário do esgoto urbano. Suas
vantagens são: diminuir os custos do tratamento primário convencional, ao associar a essa tecnologia as fossas sépticas; evitar o
contato direto com o euente a ser tratado, eliminando maus odores e proliferação de insetos. (Fig. 45 e 46)
145
Fig. 44 – Alagados com plantas utuantes.
23
Fig. 45 – Alagados com solos ltrantes com uxo descendente.
241
23 SALATI, Eneas. Controle de qualidade de água através de sistemas de wetlands construídos
24 Idem.
25 Ibidem
Fig. 46 – Alagados com solos ltrantes com uxo ascendente.
25
146
4.2.1.3 Floresta urbana
Florestas urbanas são conjuntos de parques e espaços verdes que permeiam e percorrem ambientes, melhoram a qualidade
do ar e reduzem as temperaturas. Não se constituem somente das grandes áreas vegetadas que resultam em benefícios ecológicos,
mas também das pequenas áreas arborizadas distribuídas na malha urbana. São desejáveis e prestam um serviço muito ecaz.
A oresta urbana é a maior aliada do combate ao aquecimento da terra e da contaminação atmosférica. Sua capacidade de
absorver como esponja o monóxido de carbono e de comportar-se como ltro para o ozônio e o dióxido sulfúrico em níveis signicativos
mitiga a contaminação, principalmente a do ozônio, e reduz as altas temperaturas provenientes do monóxido de carbono.
Está comprovado que as árvores são auxiliares no controle das temperaturas urbanas. Áreas com boa vegetação e bem
distribuídas podem apresentar temperaturas menores e mais confortáveis, reduzindo-as, quando em projetos bem solucionados,
na casa de 10°C. Além de, evidentemente, as árvores constituírem importante habitat para os pássaros, pequenos roedores e
outros animais grandes revegetadores do entorno urbano.
Um elemento de vital importância na manutenção e saúde do sistema proposto são os corredores de vida selvagem,
entendidos como caminhos alongados de terras que conectam outros fragmentos desconectados de vida animal. Para os ecologistas,
eles são uma técnica fundamental de combater o risco de extinção das espécies animais, porque ampliam os habitats e as espécies
ao conectar os diversos fragmentos resultantes das ações humanas de devastação. Entre os seus benefícios, podemos destacar:
a garantia da biodiversidade; a ampliação do número de espécies; a ampliação de recursos para alimentação; ampliação, a longo
prazo, da viabilidade genética; e a promoção de habitat para procriação.
os corredores verdes urbanos têm papel claro nos conceitos de ecologia da paisagem como elementos lineares que
conectam fragmentos verdes, manchas de matas e integram equipamentos. Entretanto, se abordados no interior das cidades, eles
devem ampliar suas relações socioeconômicas de forma que suas funções sejam:
1. manutenção da biodiversidade, com o objetivo de permitir a movimentação das espécies animais e vegetais, garantindo sua
sobrevivência, permanência e continuidade;
2. proteção dos cursos d’água, com o objetivo de recuperar e preservar a qualidade das águas bem como as áreas contíguas de
drenagem, principalmente os fundos de vale e várzeas;
3. incentivo à implantação de espaços de recreação e cultura, que deve incluir transportes alternativos não poluentes em seu
programa de necessidades, possibilitando uma compreensão imediata, pela vivência, do sistema de conexões dado pelo
percurso cultural e recreativo.
147
Os corredores se conguram por meio dos seguintes espaços:
1. ruas arborizadas, que interligam áreas verdes, são marcos referenciais urbanos de distribuição, lazer e estética e proporcionam
o percurso entre si;
2. parques lineares destinados à preservação e limpeza das águas, ao lazer e à prática de esportes, com equipamentos como
quadras, praças de brinquedos, ciclovias e outros;
3. espaços com tratamento paisagístico adequado e visualmente agradável dos elementos lineares preexistentes na cidade, e que
não podem sofrer ocupações humanas, como faixas lindeiras às linhas de transmissão de alta tensão, ferrovias e rodovias;
4.grandes vias vegetadas ao longo do fundo de vale, como um elemento de proteção e de borda, dicultando ocupações indevidas,
amortecendo os impactos negativos e conectando as ruas arborizadas.
As vantagens de um corredor verde que integre funções ecológicas e urbanas são:
1. fatores climáticos e de qualidade do ar, com a vegetação urbana responsável pela melhoria microclimática e de conforto térmico,
pelo sombreamento, aumento da umidade, proteção dos ventos e redução da temperatura; pela interceptação das partículas e
absorção de gases poluentes, feita por suas folhas, quando a qualidade do ar é signicativamente melhorada; pela redução da
poluição sonora e a indiscutível qualidade estética;
2. fatores biológicos, porque a implantação de um sistema de corredores verdes forma uma malha continua articulada que possibilita
a movimentação de animais e vegetais interáreas, permite a disseminação das espécies e diculta sua extinção, reduz as
perdas das bordas e a esterilização do solo ao facilitar e ampliar a recuperação ambiental dos lugares e, portanto, da cidade
como um todo;
3. fatores hidrológicos: os rios, entendidos em seu conjunto de calhas hidrográcas e encostas, são compostos por um outro
conjunto indissociável de solos e águas que expressam sua dinâmica natural. Quando sofre intervenções, essa dinâmica é
alterada, tornando os rios frágeis e incapazes de se recompor e cumprir as funções de abastecimento, esgotamento, condução
de matéria e geração de energia.
4. A devastação de suas margens, com ocupação antrópica ou não, ou sua canalização interrompem o ciclo das cheias, provocando
enchentes à jusante, além de impedir a formação de corredores biológicos com o consequente desaparecimento de inúmeras
espécies de plantas e animais, notadamente de pássaros e pequenos roedores.
5. Os barrancos, outro ambiente marginalizado na estética convencional devido à sua degradação, são altamente suscetíveis
a erosões. Quando não ocupados, vão recuperando sua vegetação com plantas diversas. São lugares signicativos para a
148
recreação passiva, as trilhas e a educação ambiental. Sua integridade é a garantia de segurança da população e dos solos dos
vales, que podem ser ocupados sem ameaça de soterramento;
6. fatores culturais de educação e lazer: a criação de um sistema de espaços livres interligados permite a implantação de diversos
pontos de recreação e lazer de acesso facilitado, gerando alternativas de locomoção menos poluentes ao incorporar ciclovias
e circuitos sombreados e agradáveis para pedestres.
7. Outra possibilidade é a de estabelecer roteiros culturais e de educação ambiental, demarcar espaços de interesse ecológico,
educacionais e trilhas interpretativas em locais especícos da mata. Esse projeto é facilmente desenvolvido com instituições de
ensino públicas ou privadas, de nível fundamental ou superior.
A manutenção desses corredores verdes permite a reintegração do rio à paisagem, a recuperação e a limpeza das águas
superciais e subterrâneas, a preservação de áreas de reserva biológica fundamentais para a manutenção do ecossistema, além
de proporcionar a viabilidade, em diversos trechos de suas margens, de equipamentos públicos de uso da população, alternando
áreas de recreação e serviços com áreas de preservação. A qualidade da água inui diretamente na qualidade do solo e vice-versa,
qualicando também a oresta urbana em efeito de cadeia indissociável e auto-regulador.
No interior desses corredores que interligam as manchas, por vezes surgem pequenos espaços diferenciados de
colonização, de remansos, pequenas ilhas, fragmentos de vegetação, que favorecem a proliferação das espécies. Se não houver
uma ação efetiva de recomposição da paisagem com vegetação nativa, formando um parque linear, eliminando a urbanização
indevida ou marginal e promovendo a recuperação das matas ciliares, a tendência é de extinção.
Para se obter sucesso na revegetação de ambientes urbanos, dadas suas condições adversas, deve-se optar por uma
escolha e plantio das espécies com objetivos bem claros, que evitem gastos energéticos e econômicos desnecessários. Um dos
métodos bastante ecientes é o que se denomina sucessional. Trata-se, como o nome sugere, de uma plantação inicial de espécies
pioneiras e de rápido crescimento, que demandam pouca luz, proporcionam rápida cobertura vegetal, melhoram a drenagem
do solo, xam o nitrogênio, estimulam os microorganismos e criam condições favoráveis de serem substituídas por espécies de
crescimento lento, tolerantes à sombra e de vida longa. Outra característica dessa técnica é que ela se aplica tanto a bosques e
parques como a praças e ruas.
A oresta urbana deve internalizar ainda o conceito de produtividade, que exigirá do projeto urbano ações mais arejadas
ao adotar práticas com base em paradigmas ecológicos e sociais que atendam ao meio e às aspirações humanas. Vegetações
nativas, como capins, plantas frutíferas, de absorção e limpeza das águas, entre outras, são a condição primeira para a
149
manutenção de habitats da ora, da fauna e dos hidrológicos em equilíbrio e devem ser pesquisadas e utilizadas nos projetos
de reabilitação. Da variedade e riqueza de cenários resultarão novas estéticas e culturas que propiciem o aparecimento de uma
base alternativa desejada.
Ao incorporar esses paradigmas de planejamento urbano ecológico no projeto da APA do Mendanha, os benefícios a serem
alcançados são:
1. reter as águas das chuvas no local onde elas caem, minimizando o efeito de lavagens de poluição, assoreamentos e enchentes
no sistema de saneamento pluvial e nos rios;
2. propiciar um ar respirável, limpo e saudável;
3. mitigar os impactos urbanos provocados pelas ilhas de calor;
4. incentivar o entendimento do real valor dos bens e energias renováveis;
5. reduzir a criminalidade;
6. promover a saúde pública com a redução de internações em hospitais e uso de medicamentos;
7. reduzir a exposição à radiação solar;
8. reduzir o estresse e restaurar a saúde mental;
9. tornar as casas e os edifícios mais frescos com o uso de energia mais eciente e barata;
10. atrair novos investimentos nanceiros, imobiliários e turísticos;
11. atrair mais comércio, de forma a produzir mais recursos nanceiros em benefício do local;
12. proporcionar estacionamentos mais frescos, bem como sombra para os carros;
13. propiciar aos moradores ambientes para o desenvolvimento de atividades culturais e de lazer, ativos e passivos;
14. possibilitar à comunidade o desenvolvimento do senso de lugar, em que a vegetação passe a ser vista como o grande desao
de manejo em função da manutenção da biodiversidade, e não simplesmente como áreas desocupadas, potencialmente
inservíveis e que se justicam como reserva de futuras ocupações ou apenas para o lazer humano.
4.2.1.4 Mobilidades e circulações
O sistema viário deve garantir as diversas formas de deslocamento e a acessibilidade de todos aos diversos espaços,
priorizando a pedestralização e os deslocamentos seguros feitos por bicicletas em ciclovias inseridas ao cotidiano dos deslocamentos
motores, individuais e coletivos, privados e públicos.
150
As vias públicas, em virtude das especicidades e constituição do nosso modelo de cidades, consomem cerca de 1/3
das áreas urbanizadas, sendo seus elementos tanto estruturadores como geradores de graves problemas, como poluição difusa,
correntezas, carreamento de lixo, aumento das temperaturas, entre outros. Assim, na medida das possibilidades, devem-se adotar
as cotas de nível em seu traçado, evitando grandes declives e produzindo uma malha mais orgânica, capaz de conter e receber
estruturas verdes complementares, de maneira a deter os processos de lavagem e assoreamentos além de adotar e promover
parâmetros mais democráticos de locomoção nas cidades.
Em que pese a política urbana até o presente momento ter priorizado os deslocamentos motores em Goiânia, o Plano
Diretor – PD Lei 171/2007, em seu capítulo III, que dispõe sobre a mobilidade e a acessibilidade, em seu artigo 15, preconiza que
se devem promover ações de forma a garantir o direito de locomoção com medidas efetivas que resultem na inclusão social.
A mobilidade urbana é denida como um atributo associado à cidade e corresponde à facilidade de deslocamento de pessoas
e bens na área urbana, através de veículos, vias, serviços de transporte e infraestrutura urbana associada. Expressa a capacidade
de atendimento às necessidades das pessoas e aos bens de forma socialmente responsável e com segurança, incorporando os
preceitos da sustentabilidade econômica, social e ambiental como condição de garantia da qualidade de vida atual e futura.
A acessibilidade é conceituada como a facilidade em distância, custo e tempo, de se alcançar sicamente, a partir de um
ponto especíco, os destinos desejados, os espaços, os mobiliários e equipamentos urbanos, edicações, serviços de transporte
e dispositivos, instalações e equipamentos esportivos, sistemas e meios de comunicação e informação, com as pessoas tendo
ou não limitações de mobilidade ou percepção sensorial, possibilitando comunicação, compreensão e integração dos cidadãos à
cidade com autonomia e segurança.
De acordo com o Comitê Brasileiro de Acessibilidade, da Associação Brasileira de Normas Técnicas ABNT, a acessibilidade
é conferida pelo direito de a pessoa movimentar-se e locomover-se de acordo com as suas capacidades individuais, livre de
obstáculos que a limitem, condição para sua participação social e econômica em igualdade de oportunidades. É direito básico que
garante a não discriminação do cidadão em função de sua idade ou de suas necessidades especiais.
A adequação da rede viária é o primeiro programa para a implementação dessa política em Goiânia, prevista no artigo 19
de seu Plano Diretor, que dene a hierarquia de vias existentes e projetadas, classicadas em: Vias Expressas; Vias Arteriais; Vias
Coletoras; Vias Locais; Vias de Pedestre; e Ciclovias.
As vias expressas priorizam o uxo intenso de veículos com interseções de nível e em nível, propicia maiores velocidades
e cumprem, como principal função, as ligações entre as regiões do município e a articulação metropolitana ou regional.
As vias arteriais são as estruturadoras do tráfego urbano, atendendo à circulação geral, com pista dupla e canteiro central,
ou pista única, ambas de sentido duplo e que recebem a maior parte do tráfego de passagem.
151
As vias coletoras são as que recebem o tráfego das vias locais e o direcionam para as de categoria superior.
As vias locais devem promover a distribuição do tráfego no lugar e proporcionar o acesso imediato aos lotes, identicadas
como vias verdes aquelas com a nalidade de separar as Unidades de Proteção Integral das áreas parceladas e ocupadas.
Por m, as vias de pedestre devem ser exclusivas à circulação e ao deslocamento sem utilização de veículo motorizado ou
mecânico. As Ciclovias destinam-se somente à circulação de bicicletas.
Adotar no desenho urbano essas denições normativas dispostas na lei, aplicando nas vias públicas a hierarquia proposta
com a utilização das estratégias de infraestrutura verde, é a prerrogativa adotada nesta tese para garantir a mobilidade e o acesso
como forma de sustentabilidade ambiental, econômica e social.
4.3. Uma infraestrutura verde para a APA e sua borda
A UNESCO dene paisagem cultural como lugares ou ambientes que ajudam a manter uma interação profunda entre as
pessoas e o meio ambiente. O Parque da Cidade Morro do Mendanha buscou, no planejamento urbano ecológico, a denição
dessa paisagem cultural pela estratégia de incorporar em sua forma os ambientes de sua composição biofísica, identicados e
mapeados para serem preservados: matas nativas, veios d’água, nascentes, encostas íngremes, áreas suscetíveis à erosão e áreas
de recarga do lençol freático. Permitiu nas demais áreas, as intersticiais, a implantação de urbanização de baixa densidade de
moradia, lazer e serviços intercalados por caminhos lentos de veículos, bicicletas e pedestres, absorvendo, dessa forma, o desejo
da população de desenvolvimento que preserva a natureza do lugar.
A setorização tomou como base a estrutura ecológica urbana, de forma a conter a ocupação humana existente, estabelecer
parâmetros biofísicos e sociais mais seguros para as ocupações futuras, e demarcar as áreas de risco para realocações, com o
intuito de atender às seguintes diretrizes:
1. preservar espaços abertos, de beleza cênica e áreas ambientalmente relevantes;
2. propiciar variedade de oportunidades mais sustentáveis de ocupação;
3. integrar diferentes formas de uso e ocupação do solo;
4. propiciar caminhos mais lentos e amigáveis;
5. promover o uso da ciclovia como alternativa de transporte e lazer;
6. fomentar a implantação de espaços diversos, atraentes e com forte signicado de lugar, para estimular e solidicar o sentimento
de pertencimento;
152
7. incentivar e fortalecer a ocupação e o crescimento das áreas já construídas e edicadas;
8. prever zonas de transição entre as áreas já ocupadas, a ocupar, as áreas orestais e as áreas protegidas.
É importante ter claro que o mapa de usos elaborado dentro dos preceitos do planejamento urbano ecológico adotado
apresenta-se bastante semelhante aos mapas de uso do solo tradicionais produzidos em planos de urbanização. A distinção é dada
por dois fatores fundamentais: primeiro, o reconhecimento e a demarcação precisa das estruturas físicas ambientais frágeis e/ou
de sustentação de equilíbrio do meio ambiente; segundo, o reconhecimento e a adequação das necessidades sociais especícas
do lugar, de que resultou um planejamento da paisagem que, para além da simples preservação utópica em meios urbanos, ou da
ocupação mercadológica de áreas ambientais frágeis e de sustentação, estabelece o real/desejável.
A proposta de recuperação ambiental demarca a faixa de proteção das matas de galeria com 100 m para o ribeirão Anicuns
e 50 m para os demais leitos, as áreas de matas existentes, as áreas a serem recuperadas, as encostas com declividades acima
de 30% e as áreas de alto risco de erosão, como determina o Plano Diretor PD, Lei Municipal 171/2007. Essa demarcação se
justica por serem essas dimensões muito importantes para reduzir a velocidade das águas das chuvas, mitigar a contaminação
das águas uviais, evitar as freqüentes enchentes e restituir o valor ecológico e a diversidade biológica no corredor do rio.
O zoneamento indicou as áreas pasveis de ocupação, com recomendação de seus usos: os parques existentes e os
propostos, a supressão de algumas vias e a implantão de um anel viário, do qual participam várias avenidas já existentes, adaptadas
às condões ecológicas em pauta e complementadas por uma grande alameda-parque. Ainda indicou os parcelamentos existentes,
suas áreas de conito e as realocações necesrias. O planejamento tomou como parâmetro fundamental, além das características
biosicas, as necessidades e os anseios de desenvolvimento social e ecomico da população, aliados à preservação da identidade do
lugar, transformando-o em um grande parque urbano. Essa foi a primeira estratégia para a restauração do corredor uvial.
(Fig. 47)
A segunda estratégia de restauração ecológica foi o controle da qualidade das águas do rio: demarcar as áreas de alagamento
e sobre elas adotar a constrão de alagados para tratamento das águas pluviais e servidas como parte integrante do parque. No caso
dos alagados de tratamento das águas servidas, optou-se por um sistema combinado em duas etapas, que ajudao a limpar as águas
do Anicuns. A primeira etapa coms alagados com plantas utuantes, os aguapés, grandes canais alongados, de pouca profundidade,
que recebem as águas provenientes das fossas sépticas, o que torna o ambiente eciente no controle biogico e de contaminantes, na
limpeza e manutenção da qualidade das águas, além reduzir sua velocidade e conter as inundações locais e a jusante.
Na segunda etapa, as águas passam pelo processo terciário, os alagados de solos ltrantes, as áreas pantanosas ao longo
do rio, que procedem à depuração nal com a cultura de arroz. Além de propiciar o retorno dos níveis de fósforo e oxigênio às águas
tratadas, a estratégia habilita sua descarga puricada e em condições de uso no curso do rio.
153
Fig.47 – Mapas proposto de recuperação ambiental da APA do Mendanha.
154
O desenho da orla da borda e a forma dos alagados assumiram a estrutura biofísica preexistente, apenas adequando seu traçado
ao desenho natural com linhas e curvas, para tor-lo mais harnico. A despeito de tratar-se de um sistema de proteção ambiental,
garantiu-se uma franja de mata ciliar de no mínimo 30 m entre o rio e o sistema de tratamento, para permitir a ação de proteção do rio pela
contenção e tratamento das águas, e as nalidades, educativa e recreacional, pelo tratamento paisagístico adequado, trilhas para ciclistas
e pedestres ao longo dos alagados, demonstrando ao público tecnologias para depuração biológica e bioltração. (Fig. 48)
A proposta incorpora, ainda, múltiplas estratégias ecológicas para depuração das águas das chuvas, dentre elas a de um sistema
interligado de drenagem urbana, denominado infraestrutura verde, para captação, inltração e puricação das águas pluviais.
O sistema se dá pela percolação das águas no local onde ocorre a precipitação e adota os jardins de chuva e as biovaletas, que
propiciam a drenagem direta em distintos pontos do solo e evitam lavagem. A preservação e otimização dos alagados naturais
ocorre com a implantação das lagoas de chuva que, no seu conjunto, assumem o caráter vital de restauração dos ecossistemas
ribeirinhos. (Fig. 49 e 50)
Fig. 48 – Áreas de Alagamento Natural Selecionadas para a Construção dos Alagados Construídos.
155
Fig. 49 – Intervenções Pontuais Exemplares: Alagados de Tratamento das Águas Pluviais e Servidas e Intervenção de Infraestrutura Verde no Jardim Pampulha.
Como forma de comprovar sua aplicabilidade em diversos espaços pequenos ou grandes, foi elaborado um exemplo de
redesenho do bairro popular existente, o Jardim Pampulha, localidade que concentra os problemas e as demandas de urbanização
elencados no capítulo anterior deste trabalho, incorporando em suas áreas livres as infraestruturas verdes de proteção, drenagem
urbana, recreação e lazer, em consonância com o meio biofísico e em atendimento às demandas da população, demonstrando ser
essa uma estratégia que promove a educação e a democratização dos espaços livres urbanos. (Fig. 51, 51a)
Complementa a proposta um novo limite para a APA do Mendanha, denindo-lhe uma zona de transição e cooperação com
base nas peculiaridades locais de caracterização biofísica, ocupação do território e anseios sociais, no traçado exposto a seguir:
a partir do fundo de vale, do lado direito, o limite sobrepõe o corredor viário proposto no Plano Diretor. Esse trecho percorre quatro
vias a Avenida Noel Rosa, a Rua La Paz, a Avenida Francisco de Oliveira e a Rua Felix de Bulhões e segue até atingir a Via
da Estrada de Ferro. Ao cruzar com a Avenida Castelo Branco, a leste, sobe em direção à via expressa de segunda categoria, a
Avenida dos Bandeirantes, GO 060, tomando-a no sentido oeste. Ao encontrar a Avenida Gercina Borges Teixeira no Conjunto
Vera Cruz, desce, fechando o perímetro, para novamente encontrar a Avenida Noel Rosa.
Lagoa pluvial
Parque municipal Estrela Nova
Área para relocação
Alagados de plantas utuantes
Lagoa pluvial
Àrea administrativa e de controle
Saída para o rio
Área de desocupação
Alagados de solos ltrantes
156
Fig. 50 – Detalhe dos Alagados de Tratamento das Águas Pluviais e Servidas.
A proposta é que esse anel seja tratado como um grande corredor verde urbano, com canteiros vegetados, pistas de
pedestre e ciclistas e tratamento vegetal das bordas. A pavimentação assumirá um tom avermelhado, executado com solo ltrante,
que, além de remeter ao solo mais característico do lugar, o Latossolo Vermelho, ainda demarcará claramente os limites da APA.
O trecho tomou como parâmetro as nascentes, cumeeiras, matas, áreas alagadiças, fundos de vale, bem como a urbanização
157
Fig.51 – Detalhamento da Intervenção no Jardim Pampulha.
lindeira existente e as grandes vias do entorno de alto impacto para o ambiente natural, com as nalidades de compor, com
a encosta ainda não ocupada da Unidade de Conservação, um grande território de moradia, lazer e proteção, e de minimizar
os impactos negativos sobre suas áreas frágeis. O novo ambiente da APA, composto de núcleo central e zona urbanizada de
cooperação, ainda foi alvo de aplicação das estratégias da infraestrutura verde, adotando, a exemplo da proposta apresentada para
o parcelamento Jardim Pampulha, os canteiros pluviais, as biovaletas, os jardins de chuva e os pisos drenantes.
158
Fig.51a – Detalhamento da Intervenção no Jardim Pampulha.
Para conferir viabilidade à proposta, foi feita uma reavaliação do projeto apresentado no Plano Diretor. Para a macrorrede
viária, ocorreu a supressão e o desvio, do interior da Unidade de Conservação, das vias ainda a serem implantadas: anel rodoviário
metropolitano e três corredores viários nos trechos entre a Avenida Noel Rosa, Avenida Francisco de Oliveira e a Rua Felix de
Bulhões, ambas do lado direito do rio, até atingirem a Avenida Bandeirantes (GO 060), não mais interceptando-a diretamente,
mas passando a assumir o novo anel do limite da APA. (Fig.52, 53, 54 e 55)
Praça da chuva
Estrutura tensionada
Lagoa pluvial
Platos no solo para minimizar a descida d’agua e mirante
159
Fig. 52 – Mapa delimitando o núcleo e a zona de transição e cooperação que integralizam a APA, com as vias a serem suprimidas e o anel viário proposto.
Ao longo da margem direita do rio, área bastante plana e com vários trechos de alagamento, propõe-se a implantação
de uma Alameda Parque que incorpore as técnicas explicitadas de contenção, bioltração e puricação ao mesmo tempo que
disponha para os moradores uma rede de lazer e serviços. Assim, a nova paisagem, valorizando os aspectos biofísicos e sociais,
observada do vale para o morro, tornará visível a importância da preservação dessa encosta. (Figura 56, 57 e 58)
A proposta se justica dado o alto impacto no interior da Unidade de Conservação UC causado pelas vias de grande
uxo, de que resultam prejuízos para as matas e a fauna, além de serem desnecessárias ao desenvolvimento local, em virtude de
sua especicidade de conservação, lazer e baixa densidade. O sistema viário a ser implantado deverá ser apenas de acesso local,
incorporando ao seu desenho as vias verdes compostas de jardins de chuva, biovaletas e piso drenante, sem uxo de passagem.
Toda a pavimentação futura deverá ser feita em tons avermelhados, para concorrer na formação e solidicação da identidade do
lugar. (Fig. 59, 60, 61, 62, 63 e 64)
160
Fig. 53 – Planta esquemática das vias expressas com jardins de chuva e biovaletas.
Fig. 54 – Corte esquemático das vias expressas com jardins de chuva e biovaletas.
Calçada (5m)
Canteiro central (1m)
Via motorizada (9m)
Ciclovia (3m)
Jardim de chuva (1,5m)
Biovaleta (2,5m)
Calçada (4m)
161
Fig. 55 – Imagem esquemática das vias que estabelecem o novo limite da APA.
No ambiente da APA, os passeios de pedestres e mirantes possibilitarão vistas do parque e da cidade, uma importante
ferramenta para o trabalho que se desenvolverá sobre a restauração ecológica das matas e das águas do Anicuns. Os caminhos
de pedestres e ciclistas conectam todas as áreas do parque. Ao longo dessas rotas, se desenvolverão áreas de lazer, restaurantes,
cafés, lojas e pequenos remansos de contemplação, reexão e oração, atividades de grande apelo social do lugar.
Um centro ambiental estrategicamente locado promoverá programas educativos especiais e caminhadas guiadas,
incluindo nessas o Parque da Pedreira proposto no Programa Macambira e Anicuns. O sistema de alagados proposto será
complementado por mais dois outros projetos pontuais: o Parque das Torres, com exposições na temática da comunicação, e um
grande espaço ecumênico para manifestações religiosas coletivas diversas. (Fig. 63)
Essa proposta de planejamento urbano ecológico para Goiânia confronta os conitos potenciais de desenvolvimento e
proteção da paisagem, uma vez que admite a ocupação humana de baixa densidade. Aliada a estratégias de proteção de valores
biofísicos e culturais importantes promove o desenvolvimento, mas preservando e recuperando valores ecológicos da região.
O estudo realizado por esta tese pretende, ao apresentar uma alternativa de planejamento urbano ecológico, criar um
quadro de referência para o projeto urbano que busque aliar sistemas naturais, de caráter único na paisagem local, às condições
culturais de ocupação do território, para estabelecer um contínuo de espaços vegetados de usos diversicados, habilitados a
desempenhar múltiplas funções, a saber:
1. controlar a densidade de ocupação e a edicação nas áreas das encostas, protegendo o meio natural e a população dos
assoreamentos e desabamentos ao mantê-las vegetadas nos ambientes de proteção e/ou frágeis, de forma a contribuir com a
melhoria do conforto ambiental e da qualidade do ar;
162
Fig. 56 – Planta esquemática da Alameda Parque com jardins de chuva e biovaletas
163
Figura 58 – Imagem esquemática da Alameda Parque.
Fig. 57 – Corte esquemático da Alameda Parque com jardins de chuva e biovaletas.
APP (100m)
Fundo de vale
Pista de atletismo (3m)
Calçada (6m)
Ciclovia (3m)
Biovaleta (2,5m)
Canteiro c/ vegetação rasteira, árvore
de pequeno porte e iluminação
Área pública livre para estacionamento,
estação de recreio e mobiliário urbano (8m)
Via motorizada (9m)
Conteiro de proteção com vegetação
rasteira e árvore de grande porte (1m)
Calçada (5m)
Jardim de chuva (1,5)
Canteiro de proteção c/ vegetação
rasteira e iluminação (1m)
164
Fig. 59 – Planta esquemática das calçadas de 3 m de largura com jardins de chuva.
Fig. 60 – Corte esquemático das calçadas de 3m de largura com jardins de chuva.
Vista esquemática de calçada de 3m com jardim de chuva esc.: 1:100
Calçada (2m)
Jardim de chuva (0.60m)
Guia de prodeção (0.40m)
165
Fig. 61 – Planta esquemática das calçadas de 5 m de largura com biovaletas.
Fig. 62 – Corte esquemático das calçadas de 5m de largura com biovaletas.
Vista esquemática de calçada de 50m com Biovaleta esc.: 1:100
Calçada (3m)
Biovaleta (1,5m)
Guia de prodeção (0.50m)
166
Fig. 63 – Perl esquemático A das vias verdes nas áreas urbanas de baixa densidade do interior da APA.
2. promover a qualidade das águas urbanas de superfície e profundas, via sistema de drenagem natural, com a utilização de plantas
que propiciam maior retenção, ltragem e sedimentação dos resíduos difusos que vêm sendo lançados diretamente no canal;
conservar e incentivar espaços culturais e de serviços;
3. propiciar a implantação de ambientes de recreação e lazer, que contribuam com a educação ambiental pela apreensão e
compreensão do meio como resultado da percepção dos processos naturais em interação com os processos culturais;
4. proteger e conservar os fragmentos de matas ciliares, as encostas, as vegetações, as várzeas e as veredas remanescentes na
malha urbana que, além de contribuir com os objetivos já delimitados, colocam-se como barreiras à ocupação indevida.
Tais medidas, se aplicadas ao ambiente da APA do Mendanha, visam assegurar a preservação e a sobrevivência do principal
recurso hídrico dessa área densamente urbanizada de Goiânia, de forma a promover a qualicação atmosférica, a diversidade
biológica dos ecossistemas e a aproximação e a apreensão da sociedade dos processos naturais, pela preservação e manutenção
da paisagem biofísica e cultural, conferindo-lhe valores estéticos e éticos, qualidade de vida e sustentabilidade.
167
Fig. 64 – Perl esquemático B das vias verdes nas áreas urbanas de baixa densidade do interior da APA.
168
Fig. 65 – Perspectiva 3D da APA do Mendanha.
ribeirão Anicuns é um exemplo claro de como a demanda excessiva de recursos e a contaminação são resultados das trocas
adversas ocorridas no entorno, transformando-o e desqualicando-o. O objetivo desse trabalho foi o de retomar essa bacia
como entidade hidrológica, biológica e social. A atenção especial dada aos 10 km da trama central do rio foi determinada por
alguns condicionantes essenciais, como: a forte pressão urbana de ocupação, em detrimento de ser dotada de encosta íngreme,
declividades acentuadas e solos com riscos potenciais de erosão; abrigar remanescentes signicativos da ora e fauna local, além
de diversos pequenos veios, distinguindo-a como uma paisagem única no território goianiense.
Dessa forma, a aplicação dos conceitos selecionados da infraestrutura verde nessa base especíca permite concluir que:
os processos de urbanização sobre o quadro das águas podem estabelecer uma outra relação com o meio ambiente 1.
quando utilizam os espaços abertos para amortecer, reter e tratar tanto as águas pluviais como as águas servidas e criar
novos ambientes que garantam: segurança e saúde pública, ao minimizar enchentes, desmoronamentos e assoreamentos;
perenizar os recursos hídricos superciais e profundos, essenciais a todos os ciclos vitais; irrigar e consequentemente
manter a oresta urbana, o que retoma o ciclo de limpeza e integridade do meio biofísico e cultural. Possibilitam ainda
distintos e bons projetos;
a drenagem urbana, que naturalmente passa a ser assumida nos espaços pela adoção de pisos drenantes, jardins de chuva, 2.
biovaletas e alagados pluviais e de tratamento das águas servidas, ao apropriar-se dos ciclos naturais do ambiente permite-lhes:
beleza, uso e conhecimento pela vivência cotidiana agradável; comprometimento social no consumo, produção de resíduos e
manutenção do sistema. Mesmo que, tecnicamente, esse possa parecer um sistema que, ao multiplicar-se, tornará as cidades
iguais e repetitivas, dada a diversidade do meio biofísico com seus solos, geomorfologia, clima, ora e fauna, cada paisagem
assumirá suas características intrínsecas, garantindo identidade, surpresa e sustentabilidade;
Considerações Finais
O
170
a recreação e o lazer passivo e ativo que passam a incorporar esses ambientes, equipamentos e mobiliários, como pistas 3.
exclusivas para pedestres e ciclistas com vegetação e iluminação adequadas, bancos, lixeiras e remansos com estacionamentos
e quiosques de alimentação e leitura, tornam a paisagem cotidiana informativa e formativa, ao associá-la a atividades ao mesmo
tempo de passagem e permanência, em que cada ambiente assume caráter especíco de acordo com seu entorno e conexões,
assegurando integridade ambiental, social e cultural;
a mobilidade em suas diversas formas, ao promover no ambiente urbano espaços exclusivos para as distintas maneiras de 4.
deslocamento com pistas paralelas, simultâneas e individualizadas para pedestres, ciclistas e veículos motores, garantem a
acessibilidade e a democratização do espaço público.
Considerando, portanto, essas contribuições na transformação das paisagens urbanas, adequando as capacidades
e limitações biofísicas à cultura local, o objetivo desta tese não tem o caráter de transformar essas estratégias em propostas
exclusivas, que substituam a prática urbana até então disponível, mas tão somente comprovar que existem outras formas de
pensar e gerir a cidade. Mas o planejamento urbano ecológico, ao fazer uma aproximação em microescala de cada ambiente em
suas interfaces e ao utilizar as estratégias de infraestrutura verde aqui demonstradas, pode evitar possíveis transtornos futuros,
sendo uma investigação e contribuição que abrem o leque de possibilidades do auto-regulável e, portanto, sustentável.
A relevância de um estudo dessa natureza é a de elucidar que existem propostas alternativas que podem contribuir com a
construção de cidades sustentáveis. Mesmo impulsionadas pelas demandas de mercado, as cidades podem ser moderadas pelas
condições ambientais, históricas e culturais, ao aproximar os homens do seu meio biofísico, das necessidades de sua comunidade
e das possibilidades que o levem a alcançar o que anseiam.
A tentativa foi reestabelecer a hidrologia natural da bacia, mitigar e restaurar a paisagem natural, lançar mão de técnicas
e tecnologias mais econômicas, tomar como modelo os processos de equilíbrio da própria natureza, viabilizando o escoamento
supercial das áreas construídas, auxiliando no tratamento das águas residuais e criando possibilidades para o ressurgimento de
importantes habitats da ora e da fauna local, para reconduzir a paisagem ao seu equilíbrio e reconhecer e permitir distintas formas
de uso e ocupação em consonância com as condições naturais, fomentando a compreensão de todos os ciclos ecológicos e as
interações humanas sobre o meio.
Contemplar o planejamento urbano com estratégias de conectividade, como corredores verdes, pisos drenantes, jardins
de chuva, biovaletas e os alagados de tratamento das águas pluviais e servidas, propicia percursos mais lentos, mas viabiliza o
contato direto da população com o meio ambiente e as distintas apreensões e percepções dos lugares. Gerido por ato racional
e tecnicamente fundamentado, intermediado pela estética e pela cultura, permite criar paisagens versáteis e de proteção aos
171
ambientes de alta importância ecológica além de valorizar os recursos visuais da bacia, pela estruturação de uma rede de limpeza
com base em estratégias que, no conjunto, denem uma rede de infraestrutura verde.
Essa forma de planejar e projetar a cidade demonstra a importância da adão de estratégias que tenham origem na
formação interna de cada lugar, para alcançar os objetivos ecogicos e de lazer estabelecidos. Um Anicuns limpo tem o potencial
de converter-se em um recurso educativo e recreacional de grande importância para a comunidade local e goianiense.
A encosta que, a partir da aplicação desses conceitos e técnicas no desenho urbano, passa a ser marcada por um sistema
de parques de serviço, lazer e proteção e ocupações urbanas de baixa densidade, interligadas por circulação de baixa velocidade,
passa também a dispor de um sistema de caminhos para pedestres e bicicletas, permitindo melhorar a sua acessibilidade e
oferecendo aos habitantes do lugar, da cidade e aos turistas uma experiência de reconhecimento, valorização e variedade de
paisagens com transparência da função e da forma.
As estratégias necessárias para a sustentabilidade urbana são possíveis quando integram os espaços construídos aos
recursos naturais, ou seja, às necessidades biofísicas e sociais, adaptando funções e formas. Prescott-Allen, em Dematova
(2007: p 3), diz que “uma sociedade está mais próxima de ser sustentável se sua condição de bem-estar é alta, e o estresse
sobre o sistema ecológico é baixo”. Assim, os projetos que incorporam as estratégias de infraestrutura verde obtêm a regulação
microclimática, a redução de ruídos, a drenagem das águas pluviais, o tratamento de esgotos, além da promoção de valores
culturais e recreativos.
Como buscamos demonstrar, a paisagem deve ser parte integrante de qualquer planejamento e projeto urbano em
qualquer escala. Sendo assim, o estudo propôs um planejamento urbano ecológico que recebe a ocupação antrópica com base
nos elementos inerentes à sua própria constituição biofísica e social, buscando em sua formação interna os elementos que,
potencializados, levem à proteção e ao desenvolvimento dos seus recursos paisagísticos. Essa é uma condição de sobrevivência,
principalmente quando estão em pauta ambientes frágeis, como é o caso das encostas do ribeirão Anicuns, muito importantes para
o futuro e o bem-estar da população local e da cidade de Goiânia.
O trabalho levantou e cruzou dados primários biofísicos e socioculturais do lugar para possibilitar a reexão sobre o projeto
apresentado, que poderão servir como contribuição nas deliberações de futuros planos e legislações para a APA do Mendanha.
O projeto buscou dar transparência aos valores biofísicos e culturais locais para permitir ao cidadão ordinário a leitura e a
apreensão dos ciclos do ambiente natural e estabelecer uma relação de forma e função que não se reveste, em momento algum,
de um predeterminismo técnico, ou seja, de que a função determina a forma, Ao contrário, quis signicar que a forma pode e deve
ser criativa além de adequada para garantir visibilidade aos processos naturais, mas respeitando seus limites. Nesse sentido, o
172
projeto está diretamente relacionado à noção de permuta, ou seja, as oportunidades construtivas devem ser avaliadas em relação
aos ganhos e perdas inerentes a todo processo de mudança.
A premissa adotada foi a de contemplar os processos naturais e sociais, permitindo que o meio biofísico cumpra seus ciclos,
propiciando o desenvolvimento humano sobre o território, com baixo dispêndio de energia e custos e com a diversidade inerente
aos distintos ambientes podendo ser experimentada, conhecida e respeitada, promovendo a sobrevivência da singularidade e da
pluralidade. O que leva a concluir que repensar as cidades exige entendê-las em seu potencial natural, social e cultural, e que um
cruzamento de potencialidades deve ser feito para então se estabelecerem permutas em que cada parte do sistema se acomode
ao novo desenho do ambiente e o resultado nal seja instrumento de aprendizado, de educação ambiental.
O princípio da reabilitação do meio ambiente construído ou natural pretendeu propiciar que a urbanização assuma o que é
intrínseco às suas características biofísicas adaptadas à diversidade de aspirações e formas de ocupação humana, para recuperar
a integridade ecossistêmica. Em suma, restabelecer a sociobiodiversidade entendida como a somatória das condicionantes
biofísicas e da história cultural de xação do homem no lugar.
AB’ SÁBER, Aziz Nacib. Os domínios de natureza no Brasil: potencialidades paisagísticas. São Paulo: Ateliê Editorial, 2003.
AB’ SÁBER, Aziz Nacib. Geomorfologia do Sítio Urbano de São Paulo. Edição Fac Similar 50 anos. São Paulo: Ateliê
Editorial, 2007.
AFONSO, Sônia. Urbanização de encostas crises e possibilidades: o morro da Cruz como um referencial de projeto de arquitetura
da paisagem. Tese de Doutorado. São Paulo: Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo, 1999.
ARENDT, Hannah. A condição humana. 8ª ed. Rio de Janeiro; Forense Universitária, 1997.
BABBIE, Earl. Métodos de pesquisas de Survey. Tradução: Guilherme Cezarino. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 1999.
BENEDDICT, Mark A., MCMAHON, Edward T. Green infrastructure: Linking landscapes and communites. Washington, DC:
ISLAND PRESS, 2006.
BARRETO, Cláudio Menna e CHIESA, Paulo. Sistema de espaços livres em Curitiba: tradições posturas e práticas locais. In
KAHTOUNI, Saide; MAGNOLI, Miranda Martelli e TOMINAGA, Yosuko (Orgs.). Discutindo a paisagem. Coleção paisagem aberta
– Volume 1. São Carlos – SP: Rima Editora, 2006.
BESSE, Jean-Marc. Ver a terra : seis ensaios sobre a paisagem e a geograa. Tradução de Vladimir Bartalini. São Paulo:
Prespectiva, 2006.
CHAUL, Nars Fayad. A construção de Goiânia e a transferência da capital. Dissertação (Mestrado) Goiânia; Universidade
Federal de Goiás, 1984.
CHIESA, Paulo. II Colóquio. Os sistemas de espaços livres e a constituição da esfera pública contemporânea. Curitiba
Metropolitana. Curitiba: Núcleo CAUUFPR, 2007.
CONSTANTINO, Norma Regina Truppel. A construção da paisagem dos fundos de vale: o caso de Bauru. Tese de Doutorado.
São Paulo: Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo, 2005.
Referências Bibliográcas
174
COSTA, Lucia Maria Sá Antunes. (org.). Rios e paisagens urbanas em cidades brasileiras. Rio de Janeiro: Viana & Mosley; Ed.
PROURB, 2006.
DEAN, Warren. A ferro e fogo: a história e a devastação da Mata Atlântica brasileira. São Paulo: Companhia das Letras, 1996.
DRAMSTAD, Wenche E.; OLSON, James D. and FORMAN, Richard T. T. Landscape ecology principles in landscape architecture
and land-use planning. Island Press. Washington – DC, 2009.
FRANCE, Robert L. Wetland design: principles and practices for landscape architects and land-use planners. Ist ed. New York:
Norton, 2003.
FRANCO, Maria de Assunção Ribeiro. Planejamento ambiental para a cidade sustentável. São Paulo: Annablume;
FAPESP, 2001.
GOUVEA, Luiz Alberto. Biocidade: conceitos e críticas para um desenho ambiental urbano, em localidades de clima tropical de
planalto. São Paulo: Nobel, 2002.
GOUVEA, Luiz Alberto de C. Desenhando a cidade com a natureza. Tese de Doutorado. São Paulo: Faculdade de Arquitetura e
Urbanismo da Universidade de São Paulo, 1996.
GRAEFF, Edgar Albuquerque. Goiânia: 50 anos. Goiânia: Gráca da UCG, 1983.
HOUGH, Michael. Natureza e cidade. Barcelona: Editorial Gustavo Gili S. A.,1998.
IZEMBART, Hélène; BOUDEC, Bertrand Le. Land&ScapeSeries: Waterscapes el tratamiento de aguas residuales mediante sistemas
vegetales / using plant systems to treat wastewater. Barcelona: Editorial Gustavo Gili S. A., 2003.
JACOBS, Jane. Morte e vida das grandes cidades. São Paulo: Martins Fontes, 2000.
JELLICOE, Geoffrey y Suzan. El paisaje del hombre: la conformación del entorno desde la prehistoria hasta nuestros días.
Barcelona; Editorial Gustavo Gili, S. A., 1995.
LAMAS, José M. Ressano Garcia. Morfologia urbana e desenho da cidade. Tese de Doutorado. Lisboa: Fundação Calouste
Gulberklan; Junta Nacional de Investigação Cientíca e Tecnologia, 1992.
KERLINGER, Fred Nichols. Metodologia da pesquisa em ciências sociais: um tratamento conceitual. 9ª ed. São Paulo: Editora
Pedagógica e Universitária, 2003.
LIMA, Catharina Cordeiro dos Santos. A natureza na cidade / A natureza da cidade. Tese de Doutorado. São Paulo: Faculdade
de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo, 1997.
LEFEBVRE, Henri. La Production de L’Espace. 4ª ed. Paris : Anthropos, 2000.
MCHARG, Ian L. Proyectar com la naturaleza. México: Gustavo Gili S.A., 2000.
MACHADO, Marília Novais da Mata. Entrevista de pesquisa: a interação pesquisador/entrevistado. Belo Horizonte: C/Arte, 2002.
175
MENEGUETTI, Karin Schwabe. De cidade-jardim a cidade sustentável: potencialidades para uma estrutura ecológica urbana em
Maringá-PR. Tese de Doutorado. São Paulo: Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo, 2007.
MOTA, Luciana Costa. Planejamento urbano e conservação ambiental. Dissertação de Mestrado. Estudo de caso: Goiânia-Go.
São Carlos: Universidade Federal de São Carlos, 2003.
ODUM, Eugene P. Ecologia. Rio de Janeiro: Editora Guanabara, 1983.
PALOMO, Pedro J. Salvador. La Planicación verde em las ciudades. Barcelona: Gustavo Gili S.A., 2003.
PELLEGRINO, Paulo R. M. Paisagens temáticas: ambiente virtual. Tese de Doutorado. São Paulo: Faculdade de Arquitetura e
Urbanismo da Universidade de São Paulo, 1995.
PELLEGRINO, Paulo R. M. Pode-se planejar a paisagem? In Paisagem e Ambiente: ensaios São Paulo: Faculdade de
Arquitetura e Urbanismo, nº 13, dez de 2000. p. 159-180.
PELLEGRINO, Paulo R. M. GUEDES, Paula P. PIRILLO, Fernanda C. e FERNANDES, Sávio A. A paisagem da borda: uma
estratégia para condução das águas, da biodiversidade e das pessoas. In: COSTA, Lúcia M. S. A. (org.) Rios e paisagens
urbanas em cidades brasileiras. Rio de Janeiro: Viana & Mosley; Editora PROURB, 2006. p. 57-76.
RIBEIRO, Luis César de Queiroz; PECHMAN, Robert (Org.). Cidade povo e nação: gênese do urbanismo moderno. Rio de
Janeiro: Civilização Brasileira, 1996.
RIBEIRO, Maria Eliana Jubé. Goiânia: os planos a cidade e o sistema de áreas verdes. Goiânia: Editora da UCG, 2004.
RICHADSON, Roberto Jarry. Pesquisa social: métodos e técnicas. 3ª ed. São Paulo: Atlas, 1999.
RUANO, Miguel. Eco urbanismo. Entornos humanos sostenibles: 60 proyetos. Barcelona: Editorial Gustavo Gili S. A., 1998.
SANTOS, Carlos Nelson F. dos. A cidade como um jogo de cartas. São Paulo: EDUFF e Projetos Editoriais associados LTDA, 1993.
SANTOS, Milton. A construção do espaço. São Paulo: Nobel, 1986.
SANTOS, Milton. A natureza do espaço: Técnica e tempo / Razão e emoção. 2ª ed. São Paulo: Hucitec, 1997.
SANTOS, Milton. Pensando o espaço homem. 4ª ed. São Paulo: Hucitec, 1997.
SCHAMA, Simon. Paisagem e memória. São Paulo: Companhia das Letras, 1996.
SPIRN, Anne Whiston. O jardim de granito: a natureza no desenho da cidade. São Paulo: Edusp, 1995.
STEINITZ, Carl; WERTHMANN, Christian. Um futuro alternativo para el paisaje de Castilla-La Mancha. Massachusetts:
Harvard College, 2007.
STEINITZ, Carl; WERTHMANN, Christian. El renacer del río Tajo. Toledo: Fundación + SUMA, 2008.
176
TAGLIACARNE, Guglielmo. Pesquisa de mercado: técnica e prática. Tradução: Maria de Lourdes Rosa da Silva. São Paulo:
Atlas, 1978.
THOMAS, Keitch. O homem e o mundo natural: mudanças de atitudes em relação às plantas e aos animais (1500-1800). São
Paulo: Companhia das Letras, 1988.
TUAN, Yi-Fu. Topolía: um estudo de percepção, atitudes e valores do meio ambiente. São Paulo / Rio de Janeiro: Diefel /
Difusão Editorial S. A., 1980.
TUAN, Yi-Fu. Espaço e lugar: a perspectiva da experiência. São Paulo: DIEFEL, 1983.
VASCONCELOS, Eduardo Mourão. Complexidade e pesquisa interdisciplinar: epistemologia e metodologia operativa.
Petrópolis, RJ: Vozes, 2002.
VILLAÇA, Flávio. Espaço intra-urbano no Brasil. 2ª ed. São Paulo: Studio Nobel; FAPESP; Lincoln Institute, 2001.
Documentos
AUSTRICH, Ricardo. Frederick Law Olmsted y el “Emerald Necklace” de Boston. URBANO, Septiembre, año 6, número 8.
Concepción: Universidad del Bio Bio, 2003. p. 93-99. Disponível em:
<http://redalyc.uaemex.mx/redalyc/pdf/198/19800816.pdf> Acesso em: 13/12/2007.
BRASIL. Lei Federal nº 4.771, de 15 de Setembro de 1965. Institui o novo Código Florestal.
BRASIL. Lei Federal nº 6.766, de 19 de Dezembro de1979. Dispõe sobre o Parcelamento do Solo Urbano e dá outras Providências.
BRASIL. Lei Federal nº 6.938, de 31 de Agosto de 1981. Dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus ns e
mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências.
BRASIL. Lei Federal nº 9985, de 18 de Julho de 2000. Regulamenta o art. 225, § 1o, incisos I, II, III e VII da Constituição Federal,
institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza e dá outras providências.
BRASIL. Lei Federal 10257, de 10 de julho de 2001. Regulamenta os arts. 182 e 183 da Constituição Federal, estabelece
diretrizes gerais da política urbana e dá outras providências.
CARDOSO NETO, Antonio. Sistemas urbanos de drenagem. Florianópolis: Laboratório de Drenagem do Departamento de
Engenharia Sanitária da Universidade Federal de Santa Catarina, 1998. p. 19. Documento interno. Disponível em:
<http://www.ana.gov.br/AcoesAdministrativas/CDOC/ProducaoAcademica/Antonio%20Cardoso%20Neto/Introducao_a_
drenagem_urbana.pdf> Acesso em 10/07/2009.
CORMIER, Nate. Grenn infrastructure: high performance landscapes for health cities. Asla, Leed AP. SvR Design Company.
Palestra 01. Disponível em: <www.sabesp.com.br/sabesp/lesmng.nsf/.../$File/palestra01.pdf> Acesso em: 06/10/2009.
Palestra 02. Disponível em: <www.sabesp.com.br/sabesp/lesmng.nsf/.../$File/palestra02.pdf> Acesso em: 11/10/2009.
DEMANTOVA, Graziella Cristina; RUTKOWAKI, Emília Wanda. A sustentabilidade urbana. Simbiose necessária entre a
sustentabilidade ambiental e a sustentabilidade social. Texto Especial 437. São Paulo: arquitextos o88, 2007. Disponível em:
<http://www.vitruvius.com.br/arquitextos/arq000/esp437.asp> Acesso em: 13/06/2009.
177
CENTRO DE ESTUDOS DE ARQUITETURA PAISAGÍSTICA PROFESSOR CALDEIRA CABRAL. Plano Verde do Conselho de
Sintra. Lisboa: Instituto Superior de Agronomia da Universidade Técnica de Lisboa, 2005.
GOIÂNIA. Lei complementar nº 31, de 29 de dezembro de 1994. Dispõe sobre o uso e a ocupação do solo nas Zonas Urbana e
de Expansão Urbana do Município de Goiânia e estabelece outras providências urbanísticas.
GOIÂNIA. Lei complementar nº 171, de 29 de Maio de 2007. Dispõe sobre o Plano Diretor e o processo de planejamento urbano
do Município de Goiânia e dá outras providências.
GOIÂNIA. Plano Diretor: relatório técnico e modelo espacial. Goiânia: Secretaria Municipal de Planejamento, 2006.
GOIÂNIA. Instituto de Desenvolvimento Tecnológico do Centro Oeste. Revisão e detalhamento da carta de risco e planejamento
do meio físico do município de Goiânia: relatório técnico: volumes I e II e modelo espacial. Goiânia: Prefeitura Municipal de
Goiânia, 2008.
GOIÂNIA. Instituto de Desenvolvimento Tecnológico do Centro Oeste. ZEE - Zoneamento Ecológico-Econômico do Município de
Goiânia: relatório técnico e modelo espacial. Goiânia: Prefeitura Municipal de Goiânia, 2008.
GOIÂNIA. Instituto de Planejamento Municipal e Companhia de Prestação de Serviços de Geoprocessamento e Dados. Mapa
Urbano Básico Digital – MUBDG, V20.
GOIÁS, Governo do Estado; Secretaria de Indústria e Comércio e Superintendência de Geologia e Mineração. Diagnóstico
hidrogeológico da região de Goiânia. Goiânia: Governo do Estado de Goiás, 2003.
GUZZO, Daniel de Salles Guerra; SOBRINHO, Francisco C. Magalhães; RIBEIRO Salvador Corrêa. Uso do geoprocessamento
na denição de um modelo do potencial de erodibilidade do solo na zona de expansão urbana de Goiânia. Monograa
apresentada para obtenção do título de especialista em geoprocessamento. Goiânia: Centro Federal de Educação Tecnológica /
Instituto Tecnológico do Centro Oeste, 2006.
HNTB-Hoisington Koegler Group Inc. Minneapolis Park and recreation board. Hess Roise, 2007. Disponível em :
<http://www.minneapolisparks.org/documents/design/missing/study_plan.pdf> Acesso em: 13/12/2007.
LUYMES, Don; PROFT, Joanne. (Org.) Mananciais sustentáveis: desenho da paisagem urbana para assentamentos de baixa
renda. Charrette do para a vizinhança do Pintassilgo. Santo André. Brasil. Christine Evans, University of British Columbia.
Canadá, 2001. Disponível em:
<http://www.semasa.sp.gov.br/Documentos/Manancial/Mananciais.pdf> Acesso em: 13/06/2009
MATTOS, Assessoria Ltda. Recursos naturais, meio ambiente, planejamento urbano e desenvolvimento social. Zoneamento da
área de proteção ambiental vertente do ribeirão Anicuns – APRAN, município de Goiânia. Goiânia, 1998.
UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO. Infraestrutura verde em bairro existente. Aut 221 – arquitetura ambiente e desenvolvimento
sustentável. São Paulo: Faculdade de Arquitetura e Urbanismo. Disponível em:
<http://www.usp.br/fau/cursos/graduacao/arq_urbanismo/disciplinas/aut0221/Trabalhos_Finais_2007/Infraestrutura_Verde.pdf>
Acesso em: 10/07/2009.
UNIVERSITY OF MINNESOTA. A case study integrating urban and ecology: redening the river corridor as a river community /
using the Mississippi River as a development for twin cities metropolitan communities. Minneapolis: College of Architecture and
178
Landscape Architecture, Design Center for American Urban Landscape, volume2, number1, 1994. Disponível em:
<http://www.designcenter.umn.edu/reference_ctr/publications/pdfs/missv2n1.pdf> acesso em: 13/12/2007.
UNIVERSITY OF MINNESOTA. A case study integrating urban and ecology: corridors, networks and watersheds / neighborhood
connections to the Mississippi River in the twin cities region. Minneapolis: College of Architecture and Landscape Architecture,
Design Center for American Urban Landscape, volume2, number2, 1994. Disponível em:
<http://www.designcenter.umn.edu/reference_ctr/publications/pdfs/missv2n2.pdf> acesso em: 13/12/2007.
UNIVERSITY OF MINNESOTA. A case study integrating urban and ecology: the sand plain and terrace reach: extending and
protecting systems / an urban design framework connecting metropolitan communities the Mississippi River. Minneapolis: College
of Architecture and Landscape Architecture, Design Center for American Urban Landscape, volume2, number3, 1995. Disponível
em: <http://www.designcenter.umn.edu/reference_ctr/publications/pdfs/missv2n3.pdf> acesso em: 13/12/2007.
UNIVERSITY OF MINNESOTA. A case study integrating urban and ecology: the falls and canyon reach / reinvesting and
connecting / an urban design framework connecting metropolitan communities the Mississippi River. Minneapolis: College of
Architecture and Landscape Architecture, Design Center for American Urban Landscape, volume2, number4, 1995. Disponível
em:
<http://www.designcenter.umn.edu/reference_ctr/publications/pdfs/missv2n4.pdf> acesso em: 13/12/2007.
UNIVERSITY OF MINNESOTA. A case study integrating urban and ecology: the valley and prairie plain reach / preserving and
enhancing assets / an urban design framework connecting metropolitan communities the Mississippi River. Minneapolis: College
of Architecture and Landscape Architecture, Design Center for American Urban Landscape, volume2, number5, 1995. Disponível
em: <http://www.designcenter.umn.edu/reference_ctr/publications/pdfs/missv2n5.pdf> acesso em: 13/12/2007.
UNIVERSITY OF MINNESOTA. A case study integrating urban and ecology: building a Mississippi River community / a summary
of principles, process and recommendations. Minneapolis: College of Architecture and Landscape Architecture, Design Center for
American Urban Landscape, volume2, number6, 1995. Disponível em:
<http://www.designcenter.umn.edu/reference_ctr/publications/pdfs/missv2n6.pdf> acesso em: 13/12/2007.
SALATI, Eneas. Controle de qualidade de água através de sistemas de wetlands construídos. FBDS – Fundação Brasileira para
o Desenvolvimento Sustentável, Rio de Janeiro, RJ. Disponível em: <www.fbds.org.br/article.php3?id_article=308> Acesso em:
10/07/2009.
SALATTI, Eneida. Utilização de sistemas de wetlands construídas para tratamento de águas. Piracicaba: Koltec Consultores
Associados, 2003. Disponível em: <http://www.biologico.sp.gov.br/docs/bio/v65_1_2/salatti.pdf> Acesso em: 10/07/2009.
ZAITZEVSKY, Cynthia. Frederick Law Olmsted and the Boston park system. Cambridge: the Belknap press of Harvard University,
1982. Disponível em: <http://memory.loc.gov/ammem/collections/landscape/olmsted.html> Acesso em: 13/12/2007.
Periódicos
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE GOIÁS; Instituto do Trópico Subúmido. Bioma cerrado: Volume 1. Contribuições. 2006. 2ª
edição. Goiânia: Editora da UCG, 2006.
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE GOIÁS; Instituto do Trópico Subúmido. Sistema biogeográco do cerrado. 2ª versão. Volume
3. 2ª edição. Goiânia: Editora da UCG, 2006.
Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download:
Baixar livros de Administração
Baixar livros de Agronomia
Baixar livros de Arquitetura
Baixar livros de Artes
Baixar livros de Astronomia
Baixar livros de Biologia Geral
Baixar livros de Ciência da Computação
Baixar livros de Ciência da Informação
Baixar livros de Ciência Política
Baixar livros de Ciências da Saúde
Baixar livros de Comunicação
Baixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNE
Baixar livros de Defesa civil
Baixar livros de Direito
Baixar livros de Direitos humanos
Baixar livros de Economia
Baixar livros de Economia Doméstica
Baixar livros de Educação
Baixar livros de Educação - Trânsito
Baixar livros de Educação Física
Baixar livros de Engenharia Aeroespacial
Baixar livros de Farmácia
Baixar livros de Filosofia
Baixar livros de Física
Baixar livros de Geociências
Baixar livros de Geografia
Baixar livros de História
Baixar livros de Línguas
Baixar livros de Literatura
Baixar livros de Literatura de Cordel
Baixar livros de Literatura Infantil
Baixar livros de Matemática
Baixar livros de Medicina
Baixar livros de Medicina Veterinária
Baixar livros de Meio Ambiente
Baixar livros de Meteorologia
Baixar Monografias e TCC
Baixar livros Multidisciplinar
Baixar livros de Música
Baixar livros de Psicologia
Baixar livros de Química
Baixar livros de Saúde Coletiva
Baixar livros de Serviço Social
Baixar livros de Sociologia
Baixar livros de Teologia
Baixar livros de Trabalho
Baixar livros de Turismo