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em 1815, com a queda de Napoleão, a diplomacia França-Portugal voltou a apresentar
cordialidade. Lebreton, através de Alexandre von Humboldt, seu colega no Instituto de
França, fora indicado ao Marquês de Marialva – embaixador de Portugal em Paris – para
organizar um grupo de artistas que quisessem emigrar à América Portugesa. Como afirma
Bandeira (2008, p.27), Marialva, seguindo instruções do “Conde da Barca, Ministro da
Marinha e do Ultramar, partidário do trono português na América (...) buscava imigrantes
qualificados para a capital americana do recém criado Reino Unido de Portugal e Brasil”.
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Assim, no dia 20 de março de 1816 aporta no Brasil a Missão Artística Francesa,
tendo a bordo Jean Baptiste Debret. Fora contratado como "pintor de história"
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. Daria forma
e substância à construção de uma nova monarquia, participando ativamente − em um primeiro
momento − da gênese do Império Luso-Brasileiro e, com a independência, da gênese do
próprio Brasil. Investindo nos cerimoniais e nas representações simbólicas do poder
monárquico, criaria insígnias e símbolos para o nascente Império, sendo ainda membro
fundador e professor de pintura histórica da Academia Imperial de Belas-Artes (que só viria a
funcionar efetivamente em 1826).
Durante os anos que antecederam à inauguração oficial da Academia, Debret alternou
suas atividades de professor em seu ateliê com viagens para várias cidades do país, quando
retrata tipos humanos, costumes e paisagens locais, não esquecendo de destacar a forte
presença dos escravos, seus trajes, instrumentos e costumes, com explicações detalhadas de
cada imagem. Queria oferecer aos estrangeiros um panorama que extrapolasse a visão de um
país exótico e interessante apenas do ponto de vista da história natural. Acreditava que o Brasil
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A historiografia não é unânime quanto ao convite para organizar a expedição ter partido de D.João VI, através
de seu ministro, o marquês de Marialva. Elaine Dias (2006), considera que, a partir das correspondências
trocadas entre Le Breton e os representantes da corte portuguesa em Paris, é possível afirmar que a idéia da
missão partiu dos franceses. Em trechos das cartas, Le Breton sugerira a criação de um projeto que
promovesse a indústria e as artes no Brasil, formado por artistas franceses emigrados, obtendo a seguinte
resposta do ministro português: “Não entro por nada na expedição projetada por Mr. Lebreton, bem que esteja
certo de suas boas intenções e escolha acertada. Fico esperando as Reais Ordens para me saber regular acerca
de semelhantes pretensões”. Para a autora, o marquês de Aguiar e o cavaleiro de Brito deixam bem claro que
esperam as ordens reais para tomar qualquer iniciativa quanto ao andamento do projeto de Le Breton, o que
corrobora a idéia de, apesar da monarquia portuguesa ser favorável ao projeto, este não é de sua autoria.
Valéria Lima (2003) destaca ainda que muitos dos artistas que aqui chegaram na Missão Francesa eram
movidos por uma situação política não muito favorável e a partida da Europa não era propriamente uma livre
escolha. O retorno da monarquia bourbônica ao poder riscava de cena toda e qualquer lembrança napoleônica.
Assim, se por um lado a viagem ao Brasil era uma saída aos artistas da época, não significava necessariamente
uma solução a situação política em que se encontravam.
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Para um conceito de "pintura de história" e sua relação com a idéia de nação e nacionalismo ver: VEJO,
Tomás P. "La pintura de historia y la invención de las naciones". In: Locus Revista de História - nº8. Juiz de
Fora: Ed. UFJF, 1999. Segundo o autor, a pintura de história, como produto de uma visão educada para
celebrar as convenções de poder e divulgar sua glória, privilegia mais o conteúdo do que a forma e, por isso
mesmo, pode ser vista como representação do saber e do poder oriundos da razão de Estado.