Download PDF
ads:
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
Vandro Pisaneschi
Contribuições do aconselhamento psicológico para a prática da direção
espiritual
MESTRADO EM PSICOLOGIA CLÍNICA
SÃO PAULO
2009
ads:
Livros Grátis
http://www.livrosgratis.com.br
Milhares de livros grátis para download.
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
Vandro Pisaneschi
Contribuições do aconselhamento psicológico para a prática da direção
espiritual
Dissertação apresentada à Banca Examinadora do
Programa de Pós Graduação em Psicologia Clínica
da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo,
como exigência parcial para obtenção do título de
Mestre em Psicologia Clínica, sob a orientação da
Professora Doutora Marília Ancona Lopez.
SÃO PAULO
2009
ads:
Banca Examinadora
________________________________
________________________________
________________________________
“Sobretudo, agradeço a Deus, que não me desamparou
nos momentos difíceis em que a Ele recorri durante a
execução desta tarefa, e a Quem, em última instância,
‘toda honra e toda glória’ são devidas. Queira Ele
continuar me guiando, inspirando, defendendo e
abençoando em todos os passos e momentos de minha
vida, e possa eu, de maneira cada vez mais plena,
verdadeira e consciente colocar-me a Seu serviço e
entregar-me a Seu amor”.
Elias Boainain Jr.
Dedico esta dissertação a Deus e a todos
àqueles a quem esta pesquisa puder ser útil.
AGRADECIMENTOS
Em primeiríssimo lugar, agradeço a Deus, meu maior amigo e a quem eu entreguei
toda a minha vida.
À querida Igreja Católica, especialmente à Arquidiocese de São Paulo, na pessoa do
seu Arcebispo Cardeal Dom Odilo Pedro Scherer.
Agradeço, também, a Dom Manuel Parrado Carral e a Dom Tarcísio Scaramussa,
pastores e amigos na fé.
A caríssima Professora Marília Ancona Lopez, por acreditar em mim desde o início.
Sem o seu apoio nada disto teria acontecido, minha admiração e gratidão filial.
As professoras Maria Elisabeth Montagna e Silvia Ancona Lopez, pelos valiosos
comentários no exame de qualificação.
À querida PUC/SP, ao programa de Pós-graduação em Psicologia Clínica,
especialmente a Professora Marlise Aparecida Bassani e a professora Edna Peters Kahhale; à
Pastoral Universitária e a todos os meus amigos e irmãos, colegas de mestrado e doutorado
que sempre me acolheram e incentivaram.
Aos padres Vando Valentini e Edélcio Serafim Ottaviani pelo carinho fraterno de
sempre.
À minha amada família paroquial Nossa Senhora Aparecida dos Ferroviários por
toda a paciência e compreensão durante todo o tempo de estudo.
Agradeço também à querida professora Alzira Mesquita, ao Professor José Ribeiro
Filho e a toda comunidade do Colégio São Judas Tadeu.
À toda minha família: minha “vó”, minha mãe, meu pai e meu irmão, por estarem
comigo em todos os momentos.
À Cristiane Fairbanks, à Maria Beatriz Ferreira Leite e à Família Veloso por todo o
apoio sincero.
À Fundação São Paulo por me possibilitar a realização desta pesquisa.
E a todas as pessoas que direta ou indiretamente participaram deste momento muito
importante da minha vida, meus sinceros agradecimentos.
A todos minha eterna gratidão, contem sempre comigo e com as minhas orações.
SUMÁRIO
RESUMO X
ABSTRACT IX
INTRODUÇÃO 12
CAPÍTULO I - ACONSELHAMENTO PSICOLÓGICO 18
1.1. Relação de ajuda 18
1.2. Aconselhamento psicológico 19
1.2.1. As atitudes facilitadoras 21
1.2.1.1. Aceitação positiva 22
1.2.1.2. Congruência 24
1.2.1.3. Empatia 26
1.2.1.4. Escuta 28
1.2.1.5. Envolvimento existencial e distanciamento reflexivo 29
1.2.2. A pessoa do conselheiro 30
1.2.2.1. Maturidade psicoafetiva 30
1.2.2.2. Formação teórica 31
1.2.2.3. Prática Profissional 31
1.3. Aconselhamento psicológico: rumo à vida autônoma e responsável 32
CAPÍTULO II - DIREÇÃO ESPIRITUAL 33
2.1. Direção espiritual 34
2.1.1. Fé: elemento fundamental na relação de direção espiritual 37
2.2. O diretor espiritual 38
2.2.1. Acompanhamento e supervisão 39
2.3. Objetivos da direção espiritual 40
2.3.1. Teografia e Mistagogia 40
2.3.2. Educação da consciência 41
2.3.3. Nova vida em Cristo 43
2.4. O processo de direção espiritual 44
2.4.1. Elementos essenciais na direção espiritual 46
2.4.2. Movimentos da direção espiritual 47
2.4.2.1. Percepção de Deus na vida cotidiana 48
2.4.2.2. Apropriação das manifestações de Deus 48
2.4.2.3 Compromisso com Deus 49
2.4.2.4. Acompanhamento permanente 49
2.4.3. Transferência e contratransferência 49
2.5. Frutos da direção espiritual 50
CAPÍTULO III - DIÁLOGO ENTRE O ACONSELHAMENTO PSICOLÓGICO E A DIREÇÃO
ESPIRITUAL 52
3.1. Visão de homem para a abordagem centrada na pessoa 52
3.2. Visão de homem para a Igreja Católica 53
3.3. Dimensão espiritual e psicológica 56
3.4. Tendência ao desenvolvimento 61
3.4.1. Vida em plenitude 63
3.5. Síntese 65
CAPÍTULO IV – APROPRIAÇÃO DE CONHECIMENTOS DO ACONSELHAMENTO
PSICOLÓGICO PARA A PRÁTICA DA DIREÇÃO ESPIRITUAL 69
4.1. Motivação da pesquisa 70
4.2. Escolha da abordagem teórica 70
4.3. Apropriação de alguns conceitos da abordagem centrada na pessoa 72
4.4. Ambiente favorável e atitudes facilitadoras 75
4.4.1. Aceitação positiva 75
4.4.2. Congruência ou autenticidade 79
4.4.3. Empatia 80
4.4.4. Escuta 83
4.4.5. Envolvimento existencial e distanciamento reflexivo 85
AFIRMAÇÕES FINAIS 86
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 88
PISANESCHI, Vandro. Contribuições do aconselhamento psicológico para a prática da
direção espiritual. Dissertação (Mestrado) – Programa de Pós Graduação em Psicologia
Clínica, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. São Paulo, 2009, 92 p.
RESUMO
Esta dissertação tem por objetivo pesquisar possíveis contribuições do aconselhamento
psicológico na abordagem centrada na pessoa para a prática da direção espiritual, na
perspectiva da religião Católica, à luz do diálogo interdisciplinar. Para concretizar este
objetivo, em primeiro lugar, apresenta-se o aconselhamento psicológico como uma relação de
ajuda, na qual o conselheiro busca auxiliar o aconselhado a encontrar seu próprio caminho
rumo a uma vida plena. No segundo momento, apresenta-se a direção espiritual como uma
relação de ajuda espiritual, à luz da fé em Jesus Cristo, entre diretor espiritual e orientando, na
qual o primeiro auxilia o segundo a perscrutar, nas suas experiências de vida, os sinais de
Deus, para melhorar o seu relacionamento consigo mesmo, com os outros e com Deus. Após
apresentar as duas relações de ajuda, constrói-se um diálogo entre as mesmas, apontando suas
semelhanças, diferenças e implicações para a prática da direção espiritual. Para concluir,
apresentam-se apropriações de conceitos e atitudes do aconselhamento psicológico na prática
da direção espiritual.
Palavras chave: 1. Aconselhamento psicológico; 2. Abordagem centrada na pessoa;
3. Direção Espiritual. 4. Religião Católica; 5. Diálogo interdisciplinar.
PISANESCHI, Vandro. Contributions of psychological counseling to the practice of spiritual
direction. Master’s Dissertation – Program of Graduate Studies in Clinical Psychology of the
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. São Paulo, SP, Brazil, 2009, 92 p.
ABSTRACT
The objective of this dissertation is to research possible contributions of psychological
counseling under Person-Centered Approach to the practice of spiritual direction, according to
the Catholic religion perspective, in the light of interdisciplinary dialogue. In order to achieve
this objective, introduce yourself at first psychological counseling as a help relationship
through which the counselor tries to help the advised person to find his own way and lead a
good full life. Secondly, present spiritual direction as a spiritual help relationship in the light
of the faith in Jesus Christ, between spiritual director and directee in which the first helps the
second to observe God´s signs through his own life experiences in order to improve his
relationship with himself, with others and with God himself. After presenting two help
relationships, established a dialogue between both, showing their similarities, differences and
implications for the practice of spiritual direction. To conclude, present appropriations of
concepts and attitudes of the psychological counseling in the practice of spiritual direction.
Key Words: 1. Psychological counseling; 2. Person-Centered approach. 3. Spiritual direction.
4. Catholic Religion; 5. Interdisciplinary dialogue.
INTRODUÇÃO
O interesse nesta pesquisa nasceu da minha experiência como padre e diretor
espiritual. Ao longo dos encontros de direção espiritual, percebia que a complexidade dos
problemas apresentados, muitas vezes, exigia outras compreensões além daquelas abordadas
na esfera espiritual.
Sentia que faltavam alguns elementos para compreender e ajudar melhor a pessoa
que eu estava orientando, sendo necessários alguns conhecimentos complementares aos da
teologia que me ajudassem a realizar um trabalho mais abrangente.
Muitas vivências narradas pelas pessoas que me procuravam não eram abarcadas
somente pela dimensão espiritual e, em alguns casos, percebia aspectos psicológicos que eu
não dominava, já que a minha graduação foi em direito e em teologia.
Afirmo que tais aspectos eram de origem psicológica, porque eu reconhecia que
muitas das coisas narradas eram originárias da psique do indivíduo, da sua estrutura interna de
referência, ou seja, de seus sentimentos, medos, hábitos, carências, traumas e de sua história
pessoal.
Ante este quadro, sentia-me desprovido de conhecimentos mais amplos que me
permitissem entender melhor o orientando, e ajudá-lo a lidar com os seus problemas. Senti,
então, uma grande necessidade de buscar, no campo da psicologia, conhecimentos que me
auxiliassem na direção espiritual.
A partir desta inquietação e desejo, procurei o programa de pós-graduação em
Psicologia Clínica da PUC/SP, porque me interessava pesquisar, nesta área, possíveis
contribuições que pudessem auxiliar na minha prática. Como a literatura sobre psicologia e
direção espiritual ainda é muito escassa, penso que esta dissertação, resultado da pesquisa,
pode inclusive ajudar outros sacerdotes e seminaristas que necessitam destes conhecimentos
para o exercício do seu ministério pastoral.
13
Para perceber a relevância desta pesquisa, faz-se necessário um olhar atento sobre o
homem.
O homem é constituído de diversas dimensões, dentre elas, a espiritual e a
psicológica.
1
Toda esta unidade precisa ser entendida e respeitada durante o processo de
direção espiritual, pois sempre que o ser humano se relaciona com o Sagrado, todo seu ser é
envolvido e, se uma destas dimensões não é cuidada, toda a experiência humana está
comprometida.
Enxergar o homem somente pelo viés da dimensão espiritual significa ignorar muitos
aspectos da experiência humana. Embora a dimensão espiritual tenha efeitos suficientes no
modo da pessoa viver, em seus valores e referências, muitas vezes ela não é suficiente para
resolver todos os problemas humanos.
Dada a sua complexidade, para uma correta compreensão da vida humana e de seus
problemas, é necessário o diálogo entre diversas áreas do conhecimento que investigam o ser
humano. O enquadre de apenas uma disciplina não consegue abarcar toda a riqueza e a
diversidade da experiência humana.
Mendonça afirma que
os problemas contemporâneos não se situam no interior de apenas uma
disciplina e suas soluções exigem um encaminhamento interdisciplinar e
uma franca colaboração entre especialistas de disciplinas diferentes. Tais
problemas impõem perspectivas e encaminhamentos mais globais, os quais
ultrapassam o enquadre de apenas uma disciplina.
(...)
Os problemas humanos e sociais são de tal complexidade que colocam em
interação aspectos muito distintos do conhecimento e de sua descoberta.
2
Sendo assim, para entender a complexidade dos problemas do ser humano e ajudá-lo
a fazer uma experiência religiosa é fundamental conhecê-lo e, para isto, o auxílio de outras
ciências humanas pode ser útil.
Do ponto de vista acadêmico, a pesquisa que envolve duas disciplinas distintas, que
investigam o mesmo problema, é caracterizada e desenvolvida no campo da
interdisciplinaridade.
1
Cf. Saturnino GAMARRA, Teologia Espiritual, p.258 e Mário ALETTI, “Processi psicologici e
accompagnamento spirituale: specificità e interazioni” in F. G. BRAMBILLA, M. ALETTI, M. I. ANGELINI,
A. MONTANARI, Accompagnamento spirituale e Intervento Psicologico: interpretazioni, pp.11-48.
2
Maria Emília MENDONÇA, A psicomotricidade e a educação somática à luz da psicanálise winnicottiana,
p.143.
14
A colaboração dos pesquisadores, o encontro, e, por vezes, a integração das
disciplinas, dos métodos de trabalho e de pesquisa exigem que especialistas
de domínios diferentes possam se interrogar, dialogar e se compreender. Esta
necessidade favorece o nascimento de terrenos comuns, de zonas de
interface entre disciplinas e contribui para a construção da
interdisciplinaridade. O progresso das ciências humanas contribuiu para o
desenvolvimento da interdisciplinaridade, pelo fato de pegar emprestado de
determinadas disciplinas teorias e instrumentos de trabalho, além da
complexidade de seu objeto de pesquisa exige que se recorra
simultaneamente a diversas disciplinas.
3
O estudo interdisciplinar é transformador. Quando representantes de duas disciplinas
se encontram e se deixam afetar um pelo outro, vivem uma experiência única. Cada um
transmite ao outro características que lhe são inerentes, partilham algo de si, incorporam algo
do outro e sofrem alguma mutação, de tal maneira, que saem do encontro transformados.
Para participar de um estudo interdisciplinar
os especialistas de diversas disciplinas devem estar animados de uma
vontade comum e de uma boa vontade. Cada qual aceita esforçar-se fora do
seu domínio e da sua própria linguagem técnica para aventurar-se num
domínio de que não é proprietário exclusivo.
4
Este encontro é positivo, quando respeitadas as especificidades de ambos. Deste
modo, cada parte apreende algo da outra que a complementa, sem perder a sua própria
identidade e, ao final do encontro, saem enriquecidas e melhoradas.
Acredito que o encontro entre a psicologia e a religião pode proporcionar este
enriquecimento recíproco. Mantendo suas identidades, ambas podem aprender entre si muitas
coisas e partilhar conhecimentos que as tornem ainda mais eficazes para responder aos
problemas humanos que lhes são apresentados.
Sobre o encontro entre a psicologia e a religião, Giovanetti afirma que
o tema da espiritualidade tem sido objeto de muitos estudos, extrapolando a
fronteira da teologia e exigindo outras perspectivas para melhor
compreensão desse fenômeno humano. Como não poderia deixar de ser, a
psicologia também se vê as voltas com esta realidade. Assim, o psicólogo,
principalmente o psicólogo clínico, esbarra com esta faceta da vida humana
no seu trabalho. Daí a necessidade de se buscar uma compreensão do que
seja a espiritualidade, a fim de poder compreender melhor o ser humano na
busca de sua ajuda profissional.
5
3
Maria Emília MENDONÇA, A psicomotricidade e a educação somática à luz da psicanálise winnicottiana,
p.142.
4
Georges GUSDORF, “Reflexions sur l’interdisciplinarité Bulletin de Psychologie”, XLIII, p. 397 apud Maria
Emília MENDONÇA, A psicomotricidade e a educação somática à luz da psicanálise winnicottiana,p. 145.
5
João Paulo GIOVANETTI, Psicologia e existencial e espiritualidade, in Mauro Martins AMATUZZI,
Psicologia e Espiritualidade, p.129.
15
Neste sentido, a relação entre psicologia e religião pode ser de complementaridade,
na qual, cada uma em sua respectiva área do saber, contribui com a outra para uma melhor
compreensão da complexidade do ser humano.
Conforme este entendimento, penso que é possível uma relação harmoniosa entre a
psicologia e a religião, entre a fé e a razão “onde ambas se ajudem mutuamente, exercendo,
uma em prol da outra, a função tanto de discernimento crítico e purificador como de estímulo
para progredir na investigação e no aprofundamento”.
6
Do ponto de vista da direção espiritual, o conhecimento em psicologia não deve
substituir a experiência religiosa, mas pode ajudar a compreendê-la e vivenciá-la melhor:
Diante da natureza específica da vida espiritual, a psicologia não dispõe de meios
adequados para substituir a direção espiritual; isto não quer dizer que não possa contribuir
para ela, pois deve haver colaboração entre ambas”.
7
O diretor espiritual cuida de seres humanos cuja dinâmica psicológica interfere
diretamente no seu modo de viver a religiosidade. Todos estes fatores precisam ser
entendidos, durante a direção espiritual, para melhor compreender a pessoa do orientando e a
sua experiência religiosa. Portanto, os conhecimentos em psicologia podem auxiliar o diretor
espiritual a compreender estas questões, preparando e facilitando sua intervenção na vida
espiritual.
Certos problemas apresentados durante a direção espiritual têm raízes no psiquismo
da pessoa e, alguns problemas que poderiam constituir questões sérias do ponto de vista
espiritual, não se mostram tão graves quando é levada em conta a estrutura psíquica de cada
individuo.
O Catecismo da Igreja Católica aponta nesta direção:
para formar um justo juízo sobre a responsabilidade moral dos sujeitos e
orientar a ação pastoral, dever-se-á levar em conta a imaturidade afetiva, a
força dos hábitos contraídos, o estado de angústia ou outros fatores psíquicos
ou sociais que minoram ou deixam mesmo extremamente atenuada a
culpabilidade moral.
8
6
JOÃO PAULO II, Carta Encíclica Fé e Razão, nº 100, p. 75.
7
Danilo MONDONI, Teologia da Espiritualidade Cristã, p.156
8
CATECISMO da Igreja Católica, nº 2352, p.609.
16
Neste sentido, vários autores católicos
9
consideram que uma direção espiritual bem
conduzida, além de uma adequada preparação em teologia e espiritualidade, requer
conhecimentos teóricos e práticos que as ciências humanas, especialmente a psicologia,
podem oferecer.
Houdek afirma que “o diretor deve estar familiarizado com algumas teorias
psicológicas da personalidade e do desenvolvimento humano e conscientes dos sinais comuns
de responsabilidade e maturidade humanas”.
10
Szentmártoni entende que a psicologia contribui com a direção espiritual nos
seguintes planos: “No plano teórico, ela ajuda a conhecer mais e melhor o orientando e
proporciona condições de sucesso em sua orientação. No plano prático, pode fornecer ao
diretor espiritual a aplicação pessoal de certos princípios e de certas técnicas
psicoterapêuticas”.
11
Muitas direções espirituais incluem incursões no campo psicológico. Por exemplo,
quando os diretores espirituais, aconselham e estimulam o diálogo, pois percebem que há
dificuldades no relacionamento familiar. Nestes casos, e em outros, o diretor espiritual
reconhece elementos psicológicos e vale-se desse reconhecimento para a compreensão do
fenômeno e para oferecer orientação.
As pessoas que procuram a direção espiritual, comumente, não fazem distinção entre
a dimensão espiritual e a psicológica, enxergando o diretor espiritual como alguém capacitado
para resolver todos os seus problemas. O diretor espiritual precisa estar preparado para fazer
essa distinção, resolver o que lhe compete e encaminhar a pessoa para um atendimento
psicológico, se considerar necessário.
12
Ante todo o exposto, acredito que o conhecimento em psicologia pode auxiliar o
diretor espiritual a desempenhar sua tarefa com mais eficácia.
Por esta razão, o objetivo desta dissertação é pesquisar na psicologia,
especificamente no aconselhamento psicológico, elementos psicológicos que contribuam para
a prática da direção espiritual.
9
Cf. Frei Patrício SCIADINI, A pedagogia da Direção Espiritual, p.96; Mihály SZENTMÁRTONI, Caminhar
juntos: Psicologia pastoral, pp.81-82; Frank J. HOUDEK, Guiados pelo Espírito: Direção espiritual em
perspectiva inaciana, p.131; William BARRY e William CONNOLLY, A prática da direção espiritual, pp.139-
141; Bruno GIORDANI, Encuentro de Ayuda Espiritual, p.75
10
Frank J. HOUDEK, Guiados pelo Espírito: Direção espiritual em perspectiva inaciana. p.132.
11
Mihály SZENTMÁRTONI, Caminhar juntos: Psicologia pastoral, p.86.
12
Cf. CONGREGAÇÃO para Educação Católica, n.14; Bruno GIORDANI, Encuentro de Ayuda Espiritual,
p.60.
17
Para realizar esta pesquisa, no campo da psicologia, optei pela área do
aconselhamento psicológico, especificamente da abordagem centrada na pessoa, porque se
apresenta como a mais propícia para este estudo, já que possui uma visão positiva do homem,
e enfatiza a tendência humana ao desenvolvimento, buscando auxiliar a pessoa a se conhecer
melhor e fazer suas próprias escolhas de maneira autônoma. Optei também por esta
abordagem porque ela respeita a dimensão espiritual do homem.
Esta abordagem apresenta, ainda, salvaguardada suas devidas diferenças com a
direção espiritual, algumas atitudes que podem ser vivenciadas pelo diretor espiritual, como
por exemplo: a empatia, a aceitação positiva e a congruência.
Para iniciar esta dissertação, apresentarei o aconselhamento psicológico, na
perspectiva da abordagem centrada na pessoa, caracterizando-o como uma relação de ajuda
que auxilia o ser humano a conhecer melhor a si mesmo e a desenvolver-se em busca de uma
vida plena.
No segundo momento, pretendo estudar a direção espiritual em uma perspectiva
católica, mostrando suas principais características e particularidades, entendida como uma
relação de ajuda espiritual.
Em seguida, construirei um diálogo entre o aconselhamento psicológico e a direção
espiritual que possibilitará refletir sobre ambos, compreendendo suas aproximações,
distanciamentos e irredutibilidades.
Após este diálogo, será possível discriminar quais elementos do aconselhamento
psicológico poderão auxiliar o diretor espiritual em sua tarefa.
Ao final, espero que esta pesquisa possa contribuir para fortalecer a relação
harmoniosa entre a psicologia e a religião, possibilitando um avanço nos trabalhos de direção
espiritual, tornando-os mais completos e aptos a responder aos anseios do coração humano.
18
CAPÍTULO I - ACONSELHAMENTO PSICOLÓGICO
“Precisamos do outro, sem o que não seremos” .
Amatuzzi
Na literatura psicológica há uma grande diversidade de nomenclaturas empregadas
para se referir às duas pessoas envolvidas no aconselhamento psicológico. Encontram-se,
entre outras: cliente, paciente e aconselhado; terapeuta, psicólogo e conselheiro. Nesta
dissertação, adotei conselheiro e aconselhado porque acredito que expressam melhor esta
relação de ajuda e facilitam a aproximação com a direção espiritual.
1.1. Relação de ajuda
Para Rudio,
13
o ser humano se desenvolve plenamente na medida em que se
relaciona com seus semelhantes e partilha suas experiências de vida. Na solidão e no
isolamento, o ser humano definha e não se desenvolve. Há sempre a necessidade do encontro
e da partilha com outra pessoa para que isto ocorra.
Neste sentido, Thorne e Mears afirmam que
somos esencialmente relacionales y esto, aparentemente, es una verdad que
ilumina la forma de entender la humanidad y la terapia centrada en la
persona. Nos necesitamos unos a otros para estar completos. Los seres
relacionales necesitan relaciones para su curación. Mas aun, cuando se
establece una relación en profundidad, de tal forma que, citando a Rogers “el
espíritu interior sale y alcanza el espíritu interior del otro, entonces la
relación entra a formar parte de algo mayor. (Rogers, 1980:129)
14
A relação de ajuda, neste contexto, é compreendida como um encontro interpessoal
que visa à facilitação para que o outro seja ele mesmo, e se torne ativo e responsável em suas
decisões pessoais.
13
Cf. Franz Victor RUDIO, Orientação não-diretiva na educação, no aconselhamento e na psicoterapia, pp.83-
89
14
Brian THORNE e Dave MEARS, La terapia centrada en la persona hoy: Nuevos avances en la teoria y en la
prática, pp.113-114.
19
Morato afirma que a “ajuda não significa dar tudo que o outro precisa ou está
buscando, mas favorecer ao outro as condições necessárias para o seu desenvolvimento”.
15
Benjamim afirma que a relação de ajuda é um ato de capacitação, caracterizado pela
confiança mútua e mudança criativa e, sobretudo um relacionamento em que o conselheiro
ajuda o aconselhado a “reconhecer, sentir, saber, decidir e escolher se deve mudar”.
16
Para Rogers
relações de ajuda são as relações em que pelo menos uma das partes procura
promover na outra o crescimento, o desenvolvimento, a maturidade, um
melhor funcionamento e uma maior capacidade de enfrentar a vida.
(...)
A relação é uma situação na qual um dos participantes procura promover
numa ou outra parte, ou em ambas, uma maior apreciação, uma maior
expressão e uma utilização mais funcional dos recursos latentes do
individuo.
17
A relação de ajuda, neste enfoque, tem por objetivo “dar ao indivíduo oportunidade
para se conhecer como realmente é, aceitando o seu próprio processo de vida e nele se
inserindo, a fim de utilizar os recursos pessoais, que as experiências lhe oferecem, para a
transformação construtiva de atitudes e comportamentos”.
18
Ante o exposto, pode-se afirmar que uma relação de ajuda precisa propiciar
crescimento e desenvolvimento para seus participantes. Uma relação que não ajuda o
aconselhado a encontrar sua autonomia psicológica e não proporciona o seu desenvolvimento,
não é relação de ajuda, mas de dependência.
1.2. Aconselhamento psicológico
O aconselhamento psicológico é uma forma específica de relação de ajuda e, é
compreendido neste trabalho, na perspectiva da psicologia humanista, especificamente na
abordagem centrada na pessoa, desenvolvida por Carl Rogers e seus seguidores.
15
Henriette Tognetti Penha MORATO, “Abordagem centrada na pessoa: teoria ou atitude na relação de ajuda?
in Rachel Lea ROSENBERG (Org.), Aconselhamento psicológico centrado na pessoa, p.25.
16
Alfred BENJAMIM, A entrevista de Ajuda, p.14.
17
Carl R. ROGERS, Tornar-se Pessoa, p.43.
18
Franz Victor RUDIO, Orientação não-diretiva na educação, no aconselhamento e na psicoterapia, p.18
20
Nesta perspectiva, Giordani define o aconselhamento psicológico como “uma
relação interpessoal na qual o conselheiro ajuda a alguém a entender e resolver problemas
existenciais”.
19
Forghieri concebe o aconselhamento psicológico como
a relação entre duas ou mais pessoas, por meio de uma conversação, na qual
a presença de um aconselhador torna-se existencialmente terapêutica para
uma ou várias pessoas, que são os aconselhados. Constitui-se, portanto, de
uma relação interpessoal que requer a presença genuína do aconselhador,
manifestada por ele mediante diferentes atuações, tais como o fornecimento
de informações ou esclarecimentos sobre assuntos que preocupam o
aconselhando, o exame e a reflexão a respeito de situações conflitantes
vivenciadas por ele e das várias perspectivas sob as quais elas podem ser
consideradas; o reconhecimento e a exploração de recursos e capacidades
pessoais do aconselhando no sentido de desenvolver sua própria liberdade
para se confrontar com suas dificuldades do momento e procurar resolvê-las
ou ultrapassá-las, ajudado inicialmente pela presença do aconselhador.
20
Nas definições apresentadas acima, percebe-se a centralidade do aconselhado na
relação; ele é responsável em perceber as mudanças a serem feitas em sua vida, para
posteriormente, executá-las.
Nesta pesquisa, entende-se o aconselhamento psicológico como uma relação de
ajuda, na qual o conselheiro busca auxiliar o aconselhado a encontrar seu próprio caminho
rumo a uma vida plena.
Durante o aconselhamento, o conselheiro é um auxiliar no processo, ele percebe os
elementos da vida apresentados pelo aconselhado, e os devolve, para que ele possa refletir
sobre os mesmos e, por sua vez, fazer o que considerar necessário.
“O outro não adere porque eu tenha produzido nele essa adesão, mas porque ele
mesmo, a partir de suas forças de atualização, que têm seus próprios caminhos, pôde se abrir
para algo que fala por si, e o faz a ele”.
21
O conselheiro age no sentido de ajudar o aconselhado a “tornar-se cada vez mais
consciente de si mesmo, de seu espaço vital, de sua própria estrutura de referência”.
22
19
Bruno GIORDANI, La relación de ayuda: de Rogers a Carkhuff, p. 21.
20
Yolanda Cintrão FORGHIERI, Aconselhamento Terapêutico: Origens, Fundamentos e prática, p.1.
21
Mauro Martins AMATUZZI, O resgate da Fala Autêntica: Filosofia da Psicoterapia e da Educação, p.52.
22
Alfred BENJAMIM, A entrevista de Ajuda, p.57.
21
No aconselhamento psicológico, considera-se que a própria relação é curativa.
Quanto mais o aconselhamento se configura como uma relação livre de pressões e aberta ao
diálogo, na qual o aconselhado pode expressar-se autenticamente, mais são facilitadas
mudanças positivas na sua vida, a fim de que ele se torne autêntico e autônomo.
Este processo não é individualista, porque provoca no aconselhado uma série de
transformações com características muito altruístas, como um interesse maior pelos outros e a
aceitação do seu semelhante.
Muitos autores
23
acreditam que este tipo de relação de ajuda pode acontecer em
apenas um único encontro ou estender-se por mais encontros, desde que combinados entre
conselheiro e aconselhado.
No caso de ocorrer em único encontro, muitas vezes, em regime de plantão, Mahfoud
afirma que “o trabalho do conselheiro-psicólogo é no sentido de facilitar ao cliente uma
visão mais clara de si mesmo e de sua perspectiva ante a problemática que vive”.
24
O encontro único, muitas vezes assume características de uma triagem e resulta em
encaminhamento para um acompanhamento mais específico, de acordo com a demanda
apresentada pela aconselhado. Pode indicar, também, a necessidade de um aconselhamento
psicológico contínuo ou um acompanhamento psiquiátrico.
25
Se a demanda apresentada for de
ordem religiosa pode o conselheiro encaminhar a um diretor espiritual.
1.2.1. As atitudes facilitadoras
Para que o aconselhado se desenvolva, faz-se necessária a criação de um ambiente
facilitador. Para tanto, algumas atitudes do conselheiro são importantes, como a aceitação
positiva, a congruência, a empatia, a escuta, o envolvimento existencial e o distanciamento
reflexivo.
23
Cf. Maria Luisa Sandoval SCHMIDT, “Aconselhamento psicológico: questões introdutórias” in Rachel Lea
ROSENBERG (Org.), Aconselhamento psicológico centrado na pessoa, p.14; Yolanda Cintrão FORGHIERI,
Aconselhamento Terapêutico: Origens, Fundamentos e prática, p. 127; RUDIO, Orientação não-diretiva na
educação, no aconselhamento e na psicoterapia, p.15; Miguel MAHFOUD, “A vivência de um desafio: plantão
psicológico” in: Rachel Lea ROSENBERG (Org.). Aconselhamento psicológico centrado na pessoa, p.75
24
Ibid., p. 76.
25
Cf. MAHFOUD. Ibid., p.87
22
1.2.1.1. Aceitação positiva
Entende-se por aceitação positiva, o fato da pessoa ser acolhida com todas as suas
dores e sofrimentos, sem julgamento ou condenação.
Em primeiro lugar, o conselheiro coloca-se em uma atitude de aceitação da pessoa e
da sua história de vida. Ele precisa acreditar no ser humano e em suas potencialidades para o
desenvolvimento, para ajudá-lo a construir um caminho eficaz e duradouro.
Aceitação positiva significa acolher incondicionalmente a pessoa que o procura,
mostrando real interesse e confiança na sua vida. O conselheiro precisa acolher a história de
vida da pessoa, mostrando-se um companheiro que está disposto a percorrer com ela um
caminho novo. Ele precisa ajudar o aconselhado a não ficar preso aos erros do passado, mas a
ter coragem de assumir as decisões do presente para construir o futuro de um jeito novo.
O conselheiro não precisa concordar ou discordar com o que o aconselhado diz, mas
colocar-se ao lado dele, acolhendo e respeitando as experiências vividas, através de uma
escuta dedicada, com respeito e interesse.
26
Para Amatuzzi durante o processo de aconselhamento pode haver discordância de
posicionamentos. Segundo o autor, as diferenças devem surgir, sob pena de perda da
autenticidade:“mesmo que eu tenha de me contrapor ponto por ponto ao que o outro fala, e
devo fazê-lo se quiser estar inteiramente presente e se essa presença me levar a isso. Pode
haver conversação genuína entre pessoas que a respeito de algo sejam adversárias”.
27
Para Amatuzzi, o aconselhamento precisa “constituir o outro como parceiro de
encontro, legitimá-lo como interlocutor de mesmo nível e não necessariamente concordar
com ele”.
28
O conselheiro é convidado a compreender os motivos que levaram o aconselhado a
chegar até aquele momento e ajudá-lo a perceber que sempre é possível construir um novo
caminho. O aconselhado precisa perceber-se acolhido, para encontrar maneiras de vencer suas
dificuldades.
26
Cf. Ruth SCHEEFER, Aconselhamento Psicológico: teoria e prática, p.60.
27
Mauro Martins AMATUZZI, O resgate da Fala Autêntica: Filosofia da Psicoterapia e da Educação, p.52.
28
Mauro Martins AMATUZZI, O resgate da Fala Autêntica: Filosofia da Psicoterapia e da Educação, p.53.
23
“O papel do aconselhador, não é passivo, pois o relacionamento é implementado
ativamente pelo calor humano, sensibilidade e aceitação genuína por ele expressa”.
29
A relação de aceitação cria possibilidades de mudanças autênticas e duradouras.
O paciente modifica-se e reorganiza a concepção que faz de si mesmo;
desvia-se de uma idéia que o torna inaceitável aos seus próprios olhos,
indigno de consideração, obrigado a viver segundo as normas dos outros.
Conquista progressivamente uma concepção de si mesmo como uma pessoa
de valor e autônoma.
30
As pessoas necessitam, antes de tudo, de acolhimento, respeito e amor, para poder
acreditar na possibilidade de viver de um jeito novo. Para tanto, não querem seguir uma lei
imposta que não lhes faça sentido, nem ouvir uma sentença de condenação, mas buscam
encontrar um amigo que lhes mostre que ainda vale a pena enfrentar a vida, e continuar
buscando a felicidade.
O conselheiro que acredita no ser humano confia que o homem é essencialmente
positivo e apto para se desenvolver.
Desta aceitação resulta,
uma consideração positiva para consigo, o individuo se torna para si pessoa
significativa. O centro de avaliação está em si e não no outro. Deste modo,
ele confia no seu organismo, tornando-se critério para si mesmo. E, assim,a
tendência ao desenvolvimento pode efetivar-se, de fato, no sentido da auto-
realização, autonomia e maturidade.
31
Considerar positivamente o outro implica acreditar que cada um tem ou está
em busca de sua própria rota e que esta é a sua preferência. Não há uma
melhor rota para ele, senão essa, pois essa é sua e apenas sua, e como tal, é
única. Há que se reencontrar o “amor deslumbrado”, força motriz do seu
caminho e direção.
32
Muitos autores
33
entendem que a aceitação baseia-se no amor que deve ser
dispensado a cada pessoa, condição que todo ser humano precisa para se desenvolver
plenamente.
29
Ruth SCHEEFER, Teorias de Aconselhamento, pp.56-57
30
Carl R. ROGERS, Tornar-se Pessoa, p. 67.
31
Franz Victor RUDIO, Orientação não-diretiva na educação, no aconselhamento e na psicoterapia, p.20.
32
Marina Pacheco JORDÃO, “Reflexões de um terapeuta sobre as atitudes básicas na relação terapeuta-cliente
in Rachel Lea ROSENBERG (Org.), Aconselhamento psicológico centrado na pessoa, p.52.
33
Cf. Carl R. ROGERS e Barry STEVENS, De pessoa para pessoa: O problema de Ser Humano - uma nova
tendência na psicologia, p.107; Franz Victor RUDIO, Orientação não-diretiva na educação, no aconselhamento
e na psicoterapia, p.24-25 e Brian THORNE e Dave MEARS, La terapia centrada en la persona hoy: Nuevos
avances en la teoria y en la prática, p.118-121; Bruno GIORDANI, La relación de ayuda: de Rogers a
Carkhuff, p.89-90
24
Este amor é muito mais que um sentimento momentâneo, mas fruto de uma escolha
por acreditar no outro, querer seu bem e criar condições facilitadoras para que ele possa viver
em plenitude.
O amor é um gesto de acolhida, fruto de uma atitude interior do conselheiro que
escolhe amar o aconselhado, porque vê nele um indivíduo em igual dignidade, e merecedor de
confiança. O amor provoca transformações, pois reacende no outro a valorização de si mesmo
e a força para acreditar na possibilidade de mudança.
Giordani afirma que a aceitação ajuda o aconselhado a “descobrir o que há de
positivo nele e a reconstruir a confiança em si mesmo. Vale aqui o princípio de que uma
pessoa só pode estimar e amar a si mesma, se encontra alguém que a aprecie e a aceite com
amor”.
34
1.2.1.2. Congruência
Congruência é a escuta dos sentimentos do conselheiro e a comunicação destes ao
aconselhado, se for o caso, de maneira clara e sincera. A congruência permite ao conselheiro
ser autêntico e transparente com o aconselhado. Esta atitude facilita o diálogo e cria um clima
de confiança na relação.
Com a palavra congruência queremos dizer que os sentimentos que o
conselheiro está vivenciando são acessíveis à sua consciência, que é capaz
de viver estes sentimentos, senti-los na relação e capaz de comunicá-los, se
isso for adequado. Significa que entra num encontro pessoal direto com o
cliente, encontrando-o de pessoa para pessoa. Significa que é ele que não se
nega. Quanto mais o terapeuta é capaz de ouvir e aceitar o que ocorre em seu
íntimo, e quanto mais é capaz de, sem medo, ser a complexidade de seus
sentimentos, maior é o grau de sua congruência.
35
O conselheiro é afetado pela experiência do outro e ao viver e expressar seus
sentimentos e impressões torna-se mais autêntico na relação e comunica algo mais profundo
ao aconselhado.
Os dois estabelecem uma boa relação quando estão inteiros nela. A congruência é
facilitadora e elemento indispensável na relação de ajuda.
34
Bruno GIORDANI, La relación de ayuda: de Rogers a Carkhuff, p.92
35
Carl R. ROGERS e Barry STEVENS, De pessoa para pessoa: O problema de Ser Humano - uma nova
tendência na psicologia., p.105.
25
O conselheiro procura ser corajoso e abandonar a tentativa de querer agradar o
aconselhado, sendo congruente com suas impressões e sentimentos. Do contrário, estaria
criando uma relação inautêntica, dificultando o desenvolvimento do processo.
Isto não significa que o conselheiro deva dizer tudo o que pensa ao aconselhado, mas
cabe a ele discernir o que precisa ser dito para o benefício do outro. O conselheiro busca dizer
sempre aquilo que pensa, mas nem tudo o que ele pensa necessita ser dito.
O conselheiro possibilita ao aconselhado vislumbrar uma real possibilidade de
mudança em sua vida quando ele “é aquilo que é, quando as suas relações com o paciente
são autênticas, exprimindo abertamente os sentimentos e as atitudes que nesse momento nele
ocorrem”.
36
Quando o aconselhado percebe que está diante de um conselheiro autenticamente
presente na relação, estabelece-se um clima de confiança que possibilita o surgimento de algo
novo para sua vida. Ele percebe que pode ser autêntico também, que não precisa ter medo de
expressar o que realmente vive e está sentindo.
Quanto mais o paciente captar o terapeuta como uma pessoa verdadeira ou
autêntica, capaz de empatia, tendo em relação a si um respeito incondicional,
tanto mais ele se afastará de um modo de funcionamento estático, fixo,
insensível e impessoal, e se encaminhará no sentido de um funcionamento
marcado por uma experiência fluida, em mudança e plenamente receptiva.
37
Por outro lado, a ausência de congruência dificulta ou rompe o clima de confiança e,
dificilmente, o aconselhado conseguirá prosseguir na relação. Havendo uma
incompatibilidade muito grande entre conselheiro e aconselhado, o indicado é que a relação
não prossiga, porque será prejudicial para ambos.
A atitude congruente do conselheiro provoca no aconselhado uma atitude de
aceitação de si mesmo e, na medida em que o aconselhado passa a ouvir e respeitar seus
sentimentos, a mudança se torna possível.
Finalmente, ao ouvir com amor atenção os sentimentos interiores, com
menos espírito de avaliação e mais aceitação de si mesmo, encaminha-se
também para uma maior congruência. Descobre que é possível abandonar a
fachada atrás da qual se escondia, que é possível pôr de lado os
comportamentos de defesa e ser de uma maneira mais aberta o que na
verdade é. À medida que estas transformações vão se operando, torna-se
mais consciente de si, se aceita melhor, adota uma atitude menos defensiva e
36
Carl R. ROGERS, Tornar-se Pessoa, p.63.
37
Ibid., p.68
26
mais aberta, descobre que afinal é livre para se modificar e para crescer nas
direções naturais do organismo humano.
38
1.2.1.3. Empatia
A empatia é a possibilidade de compreender o outro a partir dele mesmo: “o
aconselhador continuamente procura compreender as experiências e as vivências do
aconselhando, tentando perceber o mundo fenomenológico do aconselhando como ele o
percebe, e expressa a sua compreensão de maneira empática”.
39
Rogers define empatia como “a capacidade de perceber o quadro de referência
interno do outro com precisão e com os componentes e significados emocionais que a ele
pertencem, como se aquele que percebe fosse a outra pessoa, mas sem jamais perder a
condição do ‘como se’”.
40
Rogers frisa “o como se fosse”, porque o conselheiro não toma sobre si a vida do
outro. Ele sente com o aconselhado, mas não se identifica com este sentimento, pois seria
muito prejudicial para ele e para o processo de aconselhamento.
Há uma metodologia fenomenológica neste tipo de aconselhamento, pois o
conselheiro é convidado a colocar entre parênteses seus julgamentos
pessoais e entender o cliente a partir da sua própria experiência e vivenciar
com ele a problemática trazida durante o aconselhamento, ou seja, a
necessidade de um despojamento e suspensão de julgamento para entrar em
contato com o outro, captando-o, reconhecendo-o e comunicando-se.
41
O modo de relacionar-se é fundamental durante o processo de aconselhamento, pois
quando há a compreensão empática abrem-se as portas para um real processo de mudança.
O conselheiro coloca entre parênteses seu quadro interno de referências para deixar-
se afetar pelo que o outro lhe apresenta. A partir daí, ouve e compreende o que esta
experiência quer dizer e quais os seus significados, ajudando o aconselhado a aumentar o grau
de percepção sobre sua vida, de modo a fazer suas opções e escolhas rumo ao
desenvolvimento.
38
Carl R. ROGERS, Tornar-se Pessoa, p.66.
39
Ruth SCHEEFER, Teorias de Aconselhamento, p.57
40
Carl R. ROGERS e Barry STEVENS, De pessoa para pessoa: O problema de Ser Humano - uma nova
tendência na psicologia, p.107.
41
Henriette Tognetti Penha MORATO, “Abordagem centrada na pessoa: teoria ou atitude na relação de ajuda?
in Rachel Lea ROSENBERG (Org.), Aconselhamento psicológico centrado na pessoa, p.36.
27
“Se alguém compreende como isto me faz sentir e parecer eu, sem procurar
analisar-me ou julgar-me, então eu posso abrir-me e desenvolver-me neste clima
acolhedor”.
42
Empatia significa enxergar com os olhos do outro, auxiliando-o a entender e
assumir sua própria história.
A atitude empática não é fácil de ser vivenciada na relação de ajuda, mas precisa ser
desenvolvida. Muitas vezes, o conselheiro ao buscar se colocar em condições de compreender
empaticamente o seu aconselhado, precisa estar atento aos rótulos ou preconceitos que
possam surgir ao longo do diálogo, para poder deixá-los de lado.
A compreensão empática, ensina Benjamim, é
a mais significativa, embora simultaneamente a mais difícil. Trata-se de
compreender com a outra pessoa. É necessário deixar tudo de lado, menos
nosso senso comum de humanidade, e somente com ele tentar compreender
com a outra pessoa como ela pensa, sente e vê o mundo ao seu redor.
Significa nos livrarmos de nossa estrutura interna de referência, e adotar a do
outro. A questão é não é discordar ou concordar com ele, mas compreender o
que é ser com ele.
43
No mesmo sentido Forghieri:
O cliente necessita da presença viva do terapeuta, e esta acontece quando o
profissional consegue deixar entre parênteses ou fora de ação todos os
conhecimentos que adquiriu nos compêndios científicos. Estes ficam como o
fundo da figura concreta, primordial, que é a sua humanidade. De forma
direta, ou subliminarmente, o cliente deixa transparecer um pedido sob a
forma de indignação, não como um curioso que pede uma resposta e sim
como um ser humano, esperando ser olhado e ouvido por outro ser humano,
semelhante a ele. O terapeuta é chamado para o vinculo de comunhão.
44
Quando o conselheiro consegue agir assim e compreende os significados da
experiência para o aconselhado a mudança começa a acontecer porque é a própria vida do
aconselhado e suas experiências que vão indicando o melhor caminho para prosseguir.
O desafio imediato é ouvir a vida tal como ela se manifesta ali em sua frente
e para ele. Além de ouvir, o que ele pode fazer e deve fazer é responder
autenticamente e nos limites que a situação lhe impõe, ou seja, os de uma
relação cujo foco é o outro que lhe procura, seja ele um individuo ou um
grupo.Tudo o mais já não lhe pertence. Mas, se entendemos o que significa
ouvir e responder, isso é muito. E, se pensamos na relação sem adjetivos,
isso é tudo.
45
42
Carl R. ROGERS, Tornar-se Pessoa, p. 65
43
Alfred BENJAMIM, A entrevista de Ajuda, p.67.
44
Yolanda Cintrão FORGHIERI, Aconselhamento Terapêutico: Origens, Fundamentos e prática, p.117.
45
Mauro Martins AMATUZZI, O resgate da Fala Autêntica: Filosofia da Psicoterapia e da Educação, p.184.
28
Para Amatuzzi “a compreensão é terapêutica e não a explicação”,
46
ou seja, quanto
mais o aconselhamento se configura como uma relação autêntica, em que as duas partes agem
de modo livre e transparente, na qual o conselheiro consegue compreender empaticamente o
aconselhado, segundo o quadro interno de referências deste último, o processo de mudança
está em curso e produz frutos.
1.2.1.4. Escuta
Saber ouvir é condição indispensável para o estabelecimento de uma compreensão
empática. Para entender o mundo do aconselhado e seu quadro interno de referências, o
conselheiro precisa estar disposto a uma escuta sincera e interessada.
A escuta valoriza o aconselhado e o ajuda a falar e a expressar-se livremente. Saber
ouvir significa perceber toda a comunicação expressa pelo aconselhado, não só através das
palavras proferidas, mas também através das nuances da fala, do tom de voz e de suas
mudanças, do silêncio e de todas as formas de comunicação manifestadas através da postura e
dos gestos corporais.
Escutar o aconselhado significa estar presente na relação, inteirando-se da vida do
aconselhado para poder ser um com ele e, ajudá-lo em sua busca de desenvolvimento.
Neste aspecto, Benjamim
47
afirma que, durante o aconselhamento, é interessante
evitar interrupções da fala do aconselhado, pois isto pode parecer falta de interesse na relação.
É preciso deixá-lo falar a seu modo e a seu ritmo e o conselheiro precisa estar interessado e
atento ao que é comunicado.
O que se pode fazer por uma pessoa que está tentando se comunicar, mesmo
que no momento não sinta sucesso de seu empreendimento, é basicamente
ouvi-la. Receber suas formulações, por mais tentativas que sejam, sem
parcializar ou introduzir esquemas de escuta, é o que permite o fluxo
expressivo e, com ele, o aprofundamento (pelo próprio cliente) em direção a
maior expressividade.
48
46
Mauro Martins AMATUZZI, O resgate da Fala Autêntica: Filosofia da Psicoterapia e da Educação, p.33
47
Cf. Alfred BENJAMIM, A entrevista de Ajuda, p. 68 -70
48
Mauro Martins AMATUZZI, O resgate da Fala Autêntica: Filosofia da Psicoterapia e da Educação, p.171.
29
1.2.1.5. Envolvimento existencial e distanciamento reflexivo
A congruência, a atitude empática e a escuta atenta convidam o conselheiro a dois
movimentos, que muitas vezes se sobrepõem, durante o aconselhamento: o envolvimento
existencial e o distanciamento reflexivo.
No envolvimento existencial, o conselheiro se aproxima da vida do outro, de maneira
sincera e empática, acolhendo sua história de vida e levando em conta tudo que é relatado.
Este movimento é fundamental no aconselhamento psicológico, pois permite entender o outro
a partir dele mesmo, e faz com que o conselheiro, ao entender a experiência do outro, possa
ajudá-lo melhor.
Assim define Forghieri:
No envolvimento existencial o terapeuta procura colocar ‘entre parênteses’,
ou fora de ação, as teorias, os conhecimentos, conceitos e preconceitos que
tiver a respeito do ser humano, para tentar perceber o cliente tal qual se
revela para ele... Consiste em um exercício de amar as pessoas.
49
O cuidado a ser tomado é o de não se identificar com o problema do outro. É
preciso, no entanto, saber ganhar distância para não se identificar com a pessoa e seus
problemas.“No distanciamento reflexivo o terapeuta procura, de certo modo, diminuir o seu
envolvimento com o cliente, para captar os significados e conhecimentos que são
revelados”.
50
O distanciamento reflexivo permite perceber o outro, refletir e utilizar recursos
para ajudá-lo.
Este processo visa aumentar no aconselhado seu grau de percepção a respeito de sua
própria vida. Alargando seu quadro interno de referências, ele entra em contato com quem
realmente é, e pode se tornar mais integrado e responsável.
Ao longo do processo de aconselhamento, o conselheiro pode se utilizar de algumas
interpretações existenciais para alargar este campo perceptivo do aconselhado, “que
consistem em procurar mostrar ao cliente outras perspectivas e significados sob os quais
determinadas vivências dele podem ser consideradas”.
51
Se existir rejeição por parte do
aconselhado, estas hipóteses devem ser retiradas em definitivo ou apresentadas em outro
momento, sempre respeitando a vontade do aconselhado.
49
Yolanda Cintrão FORGHIERI, Aconselhamento Terapêutico: Origens, Fundamentos e prática, p.116.
50
Ibid.
51
Ibid., p.118.
30
1.2.2. A pessoa do conselheiro
Juntamente com estas atitudes, alguns autores apontam características dos
conselheiros que são importantes para o processo de aconselhamento.
1.2.2.1. Maturidade psicoafetiva
A vida e a presença do conselheiro influenciam a vida do aconselhado. Se há um
equilíbrio em sua vida, isto repercutirá na relação de ajuda.
A relação de ajuda ótima é o tipo de relação criada por uma pessoa
psicologicamente madura. Por outras palavras, a minha capacidade de criar
relações que facilitem o crescimento do outro, como uma pessoa
independente, mede-se pelo desenvolvimento que eu próprio atingi.
52
Afirma Giordani,
Solo si el terapeuta tiene una suficiente madurez psico afectiva llegará a
promover y acompañar el proceso de transformación que el cliente va
efectuando en si mismo. El terapeuta que no goce de esta madurez es
fácilmente empujado por su inseguridad hacia lo nuevo y lo desconocido y a
imponer una línea de cambio modelada sobre su propia experiencia.
53
É importante que o conselheiro procure desenvolver o seu equilíbrio interior,
buscando maturidade psicológica, para evitar identificações com o problema do aconselhado e
até mesmo suprir carências pessoais durante a relação de ajuda.
Afirma Camargo: “Se não tiver um bom conhecimento de si, de suas incoerências,
de seus medos e inseguranças, não poderá estar disponível para perceber seu mundo e o do
seu cliente”.
54
É a maturidade afetiva do conselheiro que permitirá o desenvolvimento das atitudes
necessárias para o bom desempenho de seu trabalho: a congruência, a empatia, a aceitação
positiva, a escuta, o envolvimento afetivo e o necessário distanciamento reflexivo.
52
Carl R. ROGERS, Tornar-se Pessoa, p.59
53
Bruno GIORDANI, La relación de ayuda: de Rogers a Carkhuff, p.97.
54
Ismênia de CAMARGO,A formação do conselheiro” in Rachel Lea ROSENBERG (Org.), Aconselhamento
psicológico centrado na pessoa, p.58.
31
1.2.2.2. Formação teórica
Além de uma maturidade psicoafetiva, o conselheiro necessita de bons
conhecimentos sobre o psiquismo humano, adquiridos através de formação e estudos
permanentes. Ele precisa se basear em conceitos e formulações teóricas para ajudar com
competência a pessoa que o procura.
Ensina Benjamim:“essencialmente, trazemos nosso conhecimento, experiência,
habilidade profissional, as informações que possuímos e os recursos a nossa disposição.
Além disso, trazemos a nós mesmos , nosso desejo de sermos úteis”.
55
A falta de preparo nesta área pode causar vários danos. “De fato, entrar no campo de
profundidade da reorganização da personalidade, sem que para isso se tenha preparo, é
colocar em risco o cliente e levar o aconselhador a situações difíceis e embaraçosas”.
56
A formação teórica é
fundamental para que o conselheiro possa se localizar dentro de um sistema
de referenciais e refletir constantemente o que pretende fazer. O conselheiro
precisa, pois, de uma teoria. Mesmo não sendo formal ou axiomática, ela
representaria a estrutura básica de seu relacionamento com o mundo e de
suas conseqüentes atitudes.Portanto, a teoria não pode referir-se apenas ao
nível intelectual.Tem que se internalizada, fazendo parte do mundo interior
do conselheiro.
57
1.2.2.3. Prática Profissional
O terceiro elemento é a competência na prática profissional. A experiência vai
lapidando o conselheiro e a prática fornece elementos que respondem melhor às exigências do
aconselhamento, e ensinam a lidar com as mais diferentes situações que surgem durante o
aconselhamento psicológico.
O conselheiro poderá se enriquecer com todas as estratégias e conhecimentos, “mas
é através da prática que ele se conhecerá e possibilitará ao outro se conhecer”.
58
Para Camargo, a formação do conselheiro “baseia-se no tripé: teoria; prática (sem a
qual se correria o risco de falar sobre relação de ajuda sem vivenciá-la);crescimento
pessoal(que proporciona sempre um melhor conhecimento de si)”.
59
55
Alfred BENJAMIM, A entrevista de Ajuda, p.60
56
Franz Vitor RUDIO, Orientação não-diretiva na educação, no aconselhamento e na psicoterapia, p.16.
57
Ismênia de CAMARGO,A formação do conselheiro” in Rachel Lea ROSENBERG (Org.), Aconselhamento
psicológico centrado na pessoa, p.53-54
58
Ibid., p.54
32
1.3. Aconselhamento psicológico: rumo à vida autônoma e responsável
Todo o processo de aconselhamento psicológico tem por objetivo permitir que o
aconselhado possa atingir um grau de autonomia psicológica que lhe permita fazer suas
próprias escolhas, sentindo-se livre para vivenciar com responsabilidade todas as experiências
que a vida lhe proporcionar.
Para tanto, faz-se necessário que o aconselhamento psicológico possibilite um
ambiente facilitador para que as potencialidades inatas ao desenvolvimento, presentes no ser
humano, possam se desenvolver sem impedimentos.
Tal processo, fluido e livre, é denominado por Rogers de “vida plena”.
60
Neste
processo o homem aprende a ouvir a si mesmo e percebe, com mais clareza, seus sentimentos
interiores que o impulsionam a tomar as decisões que considera melhores para si.
A autonomia psicológica implica em algumas dificuldades e riscos, mas possibilita
ao próprio aconselhado tornar-se protagonista da sua história, construindo e caminhando pela
própria estrada. A este movimento de autonomia psicológica Rogers chama de “direção de
si”.
61
Para Amatuzzi, o aconselhamento psicológico auxilia na busca da autenticidade,
definida pelo autor como “um estado de integração da pessoa, no qual, somente, seu
potencial se encontra mais plenamente liberado para atuar”.
62
Deste modo, o ser humano tem a possibilidade de viver plenamente, para ser tudo
que pode ser e para desenvolver e atualizar suas capacidades inatas e positivas. Deste
processo, nasce no ser humano a alegria da liberdade interior e a confiança em si mesmo, na
própria experiência e na vida.
Este processo implica a expansão e a maturação de todas as potencialidades
de uma pessoa. Implica a coragem de ser. Significa que se mergulha em
cheio na corrente da vida. E, no entanto, o que há de mais profundamente
apaixonante em relação aos seres humanos é que, quando o indivíduo se
torna livre interiormente, escolhe esta vida plena como processo de
transformação.
63
59
Ismênia de CAMARGO,A formação do conselheiro” in Rachel Lea ROSENBERG (Org.), Aconselhamento
psicológico centrado na pessoa, p.54.
60
Carl R. ROGERS, Tornar-se Pessoa, p.163.
61
Ibid., p.150.
62
Mauro Martins AMATUZZI, O resgate da Fala Autêntica: Filosofia da Psicoterapia e da Educação, p.96.
63
Carl R. ROGERS, Tornar-se Pessoa, p.174.
33
CAPÍTULO II - DIREÇÃO ESPIRITUAL
“Ninguém se salva sozinho”.
Bento XVI
Ao longo da revisão bibliográfica feita sobre a direção espiritual na religião
Católica, nota-se que não há um manual ou uma única forma de se fazer direção espiritual,
pois cada autor a apresenta a partir da sua experiência e da sua prática.
Este capítulo é fruto de pesquisa e elaboração pessoal acerca do tema e, não tem a
intenção de apresentar a direção espiritual como algo pronto e acabado, mesmo porque toda
relação de ajuda é única e precisa ser construída a partir dos anseios e necessidades
vivenciadas no momento concreto em que a relação está acontecendo.
Neste sentido, este capítulo é uma compilação de conhecimentos sobre direção
espiritual, com o objetivo de facilitar a compreensão deste tipo de relação de ajuda espiritual.
Na Igreja Católica existem três tipos de relação de ajuda espiritual: direção espiritual,
aconselhamento pastoral e confissão.
A direção espiritual é uma relação de ajuda estabelecida entre diretor e orientando,
que visa construir um caminho de crescimento espiritual duradouro, sem um término
determinado.
O aconselhamento pastoral também é uma relação de ajuda, mas não possui um
caráter contínuo e duradouro e, visa auxiliar na resolução de algumas demandas específicas,
trazidas pelo aconselhado. Solucionado o interesse do aconselhado, encerra-se o
aconselhamento. Este tipo de relação de ajuda pode ocorrer em um único encontro ou mais,
não ultrapassando dez.
64
A direção espiritual e o aconselhamento pastoral podem ser exercidos por pessoas
idôneas e preparadas pela comunidade, não havendo necessidade de ser um sacerdote
ordenado pela Igreja Católica.
65
64
Cf. Mihály SZENTMÁRTONI, Caminhar juntos: Psicologia pastoral, p.76.
65
Cf. CATECISMO da Igreja Católica, n.2690, p.690; Rebeca J. LAIRD, Como encontrar um diretor espiritual,
pp. 200-202; William BARRY e William CONNOLY, A prática da direção espiritual, p.129.
34
Por sua vez, a confissão possui um caráter sacramental e só pode ser realizada por
um sacerdote, devidamente ordenado pela Igreja Católica. Ocorre em um único encontro, no
qual o penitente conta seus pecados ao sacerdote e recebe ao final, o perdão de Deus.
66
A prática da direção espiritual é muito antiga na Igreja Católica. O aconselhamento é
uma prática pastoral mais recente que surgiu a partir das necessidades dos fiéis, que não
buscavam a confissão, nem uma direção espiritual contínua, mas uma ajuda momentânea para
alguma demanda específica.
A direção espiritual e o aconselhamento pastoral não envolvem diretamente o
sacramento da confissão. No entanto, quando realizados por um sacerdote, o sacramento
pode ser celebrado.
A confissão obriga o sacerdote ao sigilo, sob pena de excomunhão.
67
O sacerdote
que celebra o sacramento da confissão não pode fazer alusão ao pecado, sequer, com o
próprio penitente.
A direção espiritual e o aconselhamento pastoral não exigem o dever de sigilo como
na confissão, mas pedem um sigilo ético. Para Szentmártoni
não se trata do segredo de confissão, como algumas vezes os clientes pedem
ao sacerdote. A diferença está no fato de que o segredo da confissão vincula
o sacerdote também no futuro em relação ao próprio penitente, enquanto o
consultor pastoral deve fazer referencia aos diálogos anteriores
periodicamente.
68
2.1. Direção espiritual
Antes de tudo, vale dizer que embora o termo “direção” indique um tipo de relação
que implica na definição de uma única orientação a ser seguida, com um caráter muitas vezes
coercitivo, isto não corresponde à realidade desta relação de ajuda espiritual.
Em primeiro lugar, o termo “direção” é utilizado em função da sua historicidade e
tradição, haja vista que este tipo de relação de ajuda existe na Igreja Católica, com a mesma
nomenclatura, há muitos séculos.
66
Cf. CATECISMO da Igreja Católica, nº 1422-1498, pp.391-411.
67
Cf. CÓDIGO de Direito Canônico, c.1388.
68
Mihály SZENTMÁRTONI, Caminhar juntos: Psicologia pastoral, p. 71
35
Esta relação de ajuda não assume um papel coercitivo, porque nada é imposto ao
orientando. O diretor espiritual apresenta a mensagem cristã e suas implicações, mas é o
próprio orientando que assume as suas decisões, sempre num clima de amizade e respeito.
Barry e Connolly definem a direção espiritual como: “a ajuda dada por um cristão a
outro, que capacita este outro a prestar atenção à comunicação pessoal de Deus com ele, a
aumentar sua intimidade com Deus e a viver as consequências desse relacionamento”.
69
Outra definição é apresentada por Sciadini: “Ajudar os outros a encontrar-se
consigo mesmo, com os outros e com Deus para ter uma vida humana e espiritual de
qualidade”.
70
Existem outras formas de compreender a direção espiritual. Nesta dissertação
compreende-se a direção espiritual como uma relação de ajuda espiritual, à luz da fé em Jesus
Cristo, entre diretor espiritual e orientando, na qual o primeiro auxilia o segundo a perscrutar,
nas suas experiências de vida, os sinais de Deus, para melhorar o seu relacionamento consigo
mesmo, com os outros e com Deus.
O texto bíblico extraído de Samuel 3,3-10.19 ilustra este tipo de relação de ajuda
espiritual e elucida muitas particularidades da direção espiritual.
Naqueles dias, Samuel estava dormindo no templo do Senhor, onde se
encontrava a arca de Deus. Então o Senhor chamou: Samuel, Samuel! Ele
respondeu: Estou aqui. E correu para junto de Eli e disse: Tu me chamaste,
aqui estou. Eli respondeu: eu não te chamei. Volta a dormir! E ele foi deitar-
se. O Senhor chamou de novo: Samuel, Samuel. E Samuel levantou-se e foi
ter com Eli: Tu me chamaste, aqui estou. Eli respondeu: Não te chamei meu
filho. Volta a dormir!
Samuel ainda não conhecia o Senhor, pois, até então, a palavra do Senhor
não se lhe tinha manifestado.
O Senhor chamou pela terceira vez: Samuel, Samuel. Ele levantou-se, foi
para junto de Eli e disse: Tu me chamaste, aqui estou. Eli compreendeu que
era o Senhor que estava chamando o menino. Então disse a Samuel: Volta a
deitar-te e, se alguém te chamar, responderás: Senhor, fala que teu servo
escuta. E Samuel voltou ao seu lugar para dormir. O Senhor veio, pôs-se
junto dele e chamou-o como das outras vezes; Samuel, Samuel. E ele
respondeu: Fala, que teu servo escuta. Samuel crescia e o Senhor estava com
ele. E não deixava cair por terra nenhuma de suas palavras.
Para o catolicismo, Deus vem ao encontro do ser humano, a todo instante,
manifestando-se nas suas experiências concretas e cotidianas, para estabelecer com ele uma
relação de comunhão.
69
William BARRY e William CONNOLY, A prática da direção espiritual, p.22.
70
Frei Patrício SCIADINI, A pedagogia da Direção Espiritual, p.14.
36
“Cada pessoa, homem ou mulher, encontra Deus em sua própria experiência, quer
essa experiência ocorra comunitariamente num culto litúrgico, quer na companhia de uma ou
duas outras pessoas, ou a sós.”
71
Observando com atenção as experiências cotidianas é possível encontrar os sinais da
transcendência e perceber a ação de Deus na vida do homem. Deus fala através das
experiências de vida, como falou através da vida de Samuel.
Na medida em que a pessoa entra em contato com suas experiências, olhando-as a
partir da fé, percebe a presença de Deus e sente-se motivada a viver de um jeito novo.
Todavia, esta fé não nasce por conta própria, precisa ser apresentada, ensinada e
partilhada.
A fé é um ato pessoal: a resposta livre do homem à iniciativa de Deus que se
revela. Ela não é, porém, um ato isolado. Ninguém pode crer sozinho, assim
como ninguém pode viver sozinho. Ninguém deu a fé a si mesmo, assim
como ninguém deu a vida a si mesmo. O crente recebeu a fé de outros.
72
Ninguém consegue se salvar sozinho
73
, e é muito difícil perscrutar os sinais de Deus
de maneira solitária. Na passagem bíblica de Samuel isto fica claro. Deus fala, mas Samuel
não consegue discernir o autor da voz. Precisou recorrer a alguém, com mais experiência no
caminho espiritual, para auxiliá-lo. Foi necessário que alguém lhe apresentasse o Senhor e o
orientasse a responder ao seu chamado.
Eli desempenhou o papel de diretor espiritual na vida de Samuel. Auxiliou-o a
discernir a voz de Deus em seu coração e encorajou-o a responder positivamente ao convite
feito por Deus.
Deus faz convites todos os dias e fala constantemente em muitos momentos da vida.
É preciso mergulhar nas próprias experiências para perceber sua voz. Faz-se necessária a
humildade de Samuel, que reconheceu que não podia tudo sozinho e aceitou a orientação de
um amigo na fé. O diretor espiritual busca auxiliar nesta caminhada com Deus.
71
William BARRY e William CONNOLY, A prática da direção espiritual, p 31
72
CATECISMO da Igreja Católica, n. 166, p.55.
73
Cf. BENTO XVI, Carta Encíclica sobre a esperança cristã, nº 48.
37
2.1.1. Fé: elemento fundamental na relação de direção espiritual
A fé é um elemento fundamental na experiência de direção espiritual. As coisas que
são ditas e as experiências que são narradas, durante os encontros de direção espiritual, são
compreendidas à luz de Cristo e da Tradição da Igreja Católica e, vivenciadas interiormente e
críveis pela fé.
A própria definição de fé que a Bíblia apresenta afirma: “fé é o fundamento da
esperança, é uma certeza a respeito do que não se vê.” (Hb,11 -1). “É um testemunho
interior das coisas invisíveis”
.
74
A fé determina a chave de leitura para compreender os fenômenos narrados durante
todo o processo de direção espiritual. Quando diretor e orientando interpretam fatos
cotidianos como sinais divinos, estão atribuindo valores pessoais e subjetivos e evocando sua
experiência de fé para explicá-los. Se não há fé, não há experiência espiritual e,
consequentemente, não há como se falar em direção espiritual.
Tanto o diretor espiritual quanto o orientando partem da fé, ou seja, de um universo
comum de crenças e valores que ampara toda a relação de ajuda espiritual. Na direção
espiritual, há momentos em que diretor e orientando convergem para aquilo que crêem pela
fé, mesmo sem ter uma prova empírica disto.
Para a Igreja Católica, a fé possui um caráter subjetivo e só pode ser assumida
livremente, nunca por coação ou imposição. “Por conseguinte, ninguém deve ser forçado
contra sua vontade a abraçar a fé. Pois o ato de fé é por sua natureza voluntário. Cristo
convidou à fé e à conversão, mas de modo algum coagiu”.
75
Todavia, quem escolhe livremente a fé precisa conhecê-la, saber suas implicações e
praticá-la, pois “a fé sem obras é morta”(Tg2,26). O catolicismo acredita que a fé cristã
possui um conteúdo específico e comunitário, que foi revelado por Jesus Cristo e confiado à
Igreja Católica.
76
Sendo assim, na direção espiritual católica, os parâmetros para compreensão
dos fenômenos religiosos são encontrados na Sagrada Escritura e na Tradição da Igreja.
74
Comentário da BÍBLIA SAGRADA, p.1535
75
CATECISMO da Igreja Católica, nº 160, p.53.
76
Cf. CONSTITUIÇÃO DOGMÁTICA DEI VERBUM, nº 7-12, pp.125-131.
38
2.2. O diretor espiritual
Na Igreja Católica não existe um ministério instituído de diretor espiritual.
Usualmente, a direção espiritual é praticada por sacerdotes em função de sua preparação
pastoral e teológica, mas para exercê-la não é necessário ser sacerdote. Homens e mulheres,
leigos ou religiosos, devidamente preparados e confirmados pela comunidade, podem exercer
esta missão junto aos seus irmãos. A história da Igreja Católica está repleta de exemplos de
diretores espirituais: São Francisco de Assis, Santa Catarina de Sena e Santa Teresa D’ Ávila.
Para perceber Deus na vida dos outros, primeiramente, é necessário que Ele faça
parte da vida do diretor espiritual. Uma das condições mais importantes para o exercício dessa
função é ser uma pessoa de fé. O diretor espiritual precisa ter familiaridade e intimidade com
Deus para poder reconhecê-lo na vida do outro.
O diretor espiritual comunica aquilo que possui e só mostra Deus ao outro, se já o
conhece na sua vida diária. Só um homem, enamorado por Deus, é capaz de conduzir outros
corações para o amor Dele.
77
A comunicação de Deus, na relação de direção espiritual, ocorre por
“transbordamento interior”, isto é, a experiência pessoal do diretor espiritual com o amor de
Deus precisa ser tão intensa e verdadeira que ultrapasse seu ser, até chegar à vida do outro
como doação, pode-se dizer, como um verdadeiro transbordamento de amor. Barry e Conolly
chamam esta experiência de “excedente de calor”.
78
Madre Teresa de Calcutá aconselhava assim: “continue dando Jesus ao seu povo não
pelas palavras, mas pelo seu exemplo – por estar enamorado de Jesus – por irradiar a
santidade Dele e espalhar Sua fragrância de amor onde quer que o senhor vá”.
79
Todavia, para exercer esta tarefa de direção espiritual, não basta o estado de
enamoramento por Deus, é necessário possuir um dom divino. Não basta simplesmente
enriquecer-se com técnicas ou estudos, é necessário, primeiramente, ser chamado e capacitado
por Deus para reconhecer sua ação na vida dos outros.
80
77
CF. Renato CORTI, Moioli GIOVANNI e Luigi SERENTHÁ, A direção espiritual hoje: Discernimento
cristão e comunicação interpessoal, p.85; Frank J. HOUDEK, Guiados pelo Espírito: Direção espiritual em
perspectiva inaciana, pp. 134-135
78
William BARRY e William CONNOLY, A prática da direção espiritual, p.134.
79
Madre TERESA DE CALCUTÁ,Carta de madre Teresa para o padre Don Kribs”, in Brian
KOLODIEJCHUK, Madre Teresa venha, seja minha luz, p.281.
80
Cf. William BARRY, A direção espiritual e o encontro com Deus: Uma indagação teológica, pp.114-115;
Szentmártoni,2006 p100
39
Houdek afirma que a direção espiritual é um “dom espiritual, verdadeiro carisma,
concedido pelo Espírito de Deus para o crescimento e o progresso do Reino de Deus. Sem
dúvida, habilidades, técnicas e destrezas aprendidas facilitam esse dom, mas não o
substituem.”
81
O Catecismo da Igreja Católica afirma: “O Espírito Santo dá a certos fiéis dons de
sabedoria, de fé e de discernimento em vista do bem comum que é a oração (direção
espiritual). Aqueles e aquelas que têm esses dons são verdadeiros servidores da tradição viva
da oração”.
82
Para reconhecer este dom, em primeiro lugar, é necessária a percepção do próprio
escolhido acerca deste chamado e sua aceitação e, posteriormente, a confirmação da
comunidade de fé da qual participa.
O dom para a direção espiritual precisa estar acompanhado de algumas
características importantes:
experiência de vida; conhecimento de um Deus Salvador, mas que desafia a
pessoa a mudar; hábito de leitura da Bíblia como fonte de oração;
conhecimento do verdadeiro Deus e da Fé da Igreja; sólido conhecimento de
teologia; estudo da história da espiritualidade; familiaridade com a
psicologia.
83
2.2.1. Acompanhamento e supervisão
O diretor espiritual, ele mesmo, necessita de direção espiritual constante, para manter
viva sua experiência com Deus e continuar evoluindo no caminho da santidade. Quanto mais
evolui, mais se torna preparado para auxiliar outras pessoas a fazer suas experiências de fé.
“Pode um cego guiar outro cego? Não cairão ambos na cova?” (Lc. 6,39). Se o
diretor não conhece o caminho do Senhor e não está devidamente preparado, não poderá
auxiliar outra pessoa a percorrer este caminho.
Outra necessidade apresentada por vários autores é a supervisão.
A supervisão não se destina a ser apenas um exercício intelectual sem
nenhuma relação com o verdadeiro ministério. Antes, envolve um estudo
intensivo sobre a direção que se está fazendo. Leva ao exame de atitudes,
projeções, ansiedades e medos experimentados no relacionamento de direção
espiritual.
84
81
Frank J. HOUDEK, Guiados pelo Espírito: Direção espiritual em perspectiva inaciana, p.129.
82
CATECISMO da Igreja Católica,nº 2690, p.690.
83
Mihály SZENTMÁRTONI, Caminhar juntos: Psicologia pastoral, p.100.
84
Frank J. HOUDEK, Guiados pelo Espírito: Direção espiritual em perspectiva inaciana, p.135.
40
Isto pode ocorrer individualmente ou em grupo, para diretores iniciantes e
experientes.
85
2.3. Objetivos da direção espiritual
Toda ação evangelizadora da Igreja Católica tem como prioridade “tornar presente
Deus neste mundo e abrir aos homens o acesso a Deus”.
86
Portanto, o encontro de direção espiritual é visto como um meio de anunciar o
Evangelho de Cristo e tem como objetivo maior facilitar ao orientando um encontro mais
profundo com Deus.
Com este escopo primeiro, o processo de direção espiritual possui quatro objetivos
específicos: teografia, mistagogia, educação da consciência e nova vida em Cristo.
2.3.1. Teografia e Mistagogia
A teografia é uma espécie de ajuda que uma pessoa presta a outra para entender a
escrita de Deus feita ao longo de sua vida, percebendo a ação do amor de Deus na sua história
pessoal. A mistagogia é a capacidade que uma pessoa possui para ensinar outra a fazer uma
experiência pessoal com o mistério de Deus.
De fato, Deus escreve em cada coração uma história de amor: “Não há dúvida de
que vós sois uma carta de Cristo, redigida por nosso ministério e escrita, não com tinta, mas
com o Espírito de Deus vivo, não em tabuas de pedra, mas em tabuas de carne, isto é, em
vossos corações” (II Cor. 3,3.)
O diretor espiritual precisa tornar-se um teógrafo para perceber a história de amor
que Deus escreve em cada coração e, um mistagogo para ensinar o orientando a mergulhar,
através das suas experiências, no mistério de Deus.
87
85
Cf. William BARRY, A direção espiritual e o encontro com Deus: Uma indagação teológica, p 118
86
BENTO XVI, Carta do Papa sobre a remissão da excomunhão aos bispos ordenados por Dom Lefebvre.
87
Cf. Ulpiano Vasquez MORO, A orientação espiritual: mistagogia e teografia, pp.10-11.
41
Como teógrafo e mistagogo, o diretor espiritual ajuda quem o procura a
perceber e localizar em sua vida os sinais da presença de Deus, a descobrir e
tornar mais consciente na história da experiência espiritual de cada pessoa a
maneira pela qual é encaminhada por Deus, ou a maneira segundo a qual
Deus, que pelo Espírito Santo revelou seu mistério na história de Jesus
Cristo, se manifesta na história do dirigido. A atenção do diretor deve estar
voltada para essas duas histórias e para a progressiva fusão de seus dois
horizontes.
88
O resultado da leitura espiritual da própria experiência e de seu confronto
com a palavra de Deus acabara conduzindo a pessoa a se perguntar sobre o
sentido que deverá dar a própria experiência, isto é, em termos do que tem
feito, do que faz e do que deve fazer da própria vida e da própria liberdade.
89
Ser teógrafo e mistagogo implica reconhecer que o verdadeiro diretor espiritual é o
Espírito Santo, é ele quem sonda e conhece o coração humano mais profundamente. “Mas o
Paráclito, o Espírito Santo, que o Pai enviará em meu nome, ensinar-vos-á todas as coisas”
(Jo 14,26). É preciso permitir que o Espírito de Deus tenha livre acesso ao coração do
orientando, para levar a termo seu plano de amor e salvação.
A direção espiritual é obra do Espírito de Deus que guia o espírito humano
em direção para Deus. O papel do diretor espiritual é o de colaborador. O
diretor colabora com o orientando e com o Espírito de Deus para descobrir
avaliar e incentivar a direção iniciada pelo amoroso e sempre presente
Espírito de Deus.
90
Neste sentido, a direção ocorre a três pessoas, o orientando, o diretor e o Espírito
Santo. “A direção espiritual é o caminho e a comunicação onde tomam parte a pessoa que se
empenha pela santidade, a pessoa que o ajuda a progredir, e o Espírito Santo, que dirige
efetivamente”.
91
2.3.2. Educação da consciência
A concepção de consciência para o catolicismo assume particularidades específicas
que se diferenciam das concepções psicológicas. Uma distinção clara desta diferença é o fato
da Igreja Católica defini-la como “consciência moral”.
92
88
Danilo MONDONI, Teologia da Espiritualidade Cristã, pp.163-164
89
Ibid., p.163.
90
Frank J. HOUDEK, Guiados pelo Espírito: Direção espiritual em perspectiva inaciana, p18.
91
Danilo MONDONI, Teologia da Espiritualidade Cristã, p.157.
92
JOÃO PAULO II, Carta Encíclica O Esplendor da Verdade, p.89
42
Para o catolicismo, a consciência moral possui um papel fundamental na vida
humana. É através dela que o homem percebe a vontade de Deus e se torna capaz de segui-lo.
Na intimidade da consciência, o homem descobre uma lei. Ele não dá a si
mesmo. Mas a ela deve obedecer. Chamando-o sempre a amar e fazer o bem
e a evitar o mal, no momento oportuno a voz desta lei lhe soa no coração:
faze isto e evita aquilo. De fato o homem tem uma lei escrita por Deus em
seu coração. Obedecer a ela é a própria dignidade do homem. A consciência
é o núcleo secretíssimo e o sacrário do homem onde ele está sozinho com
Deus e onde ressoa sua voz. Pela consciência se descobre, de modo
admirável, aquela lei que se cumpre no amor de Deus e do próximo.
93
Mas nem sempre a percepção desta “voz interior” é clara.
Os preceitos da lei natural não são percebidos por todos de maneira clara e
inconfundível. Na atual situação, a graça e a revelação nos são necessárias,
como pecadores que somos, para que as verdades religiosas e morais possam
ser conhecidas por todos e sem dificuldade, com firmeza e sem mistura de
erro.
94
Muitas vezes, algumas pessoas atribuem a Deus vontades próprias e objetivos
pessoais que supõem perceber através da voz interior. Neste sentido, afirmam Barry e
Connoly:
A tradição cristã suspeita também da autenticidade da oração mística,
quando o místico se recusa a ouvir qualquer outra voz que não seja a própria
voz interior. Experiências religiosas autênticas voltam-se para uma unidade
entre indivíduos e comunidades e levam à abertura a outras vozes,
especialmente à voz da autoridade legítima da Igreja.
95
Tudo que é percebido através da voz interior precisa estar em consonância com a
sagrada Escritura e a Tradição, fontes da revelação divina, para que se possa reconhecer como
correspondido efetivamente à voz de Deus. “A sagrada Tradição e a Sagrada Escritura
constituem um só sagrado depósito da palavra de Deus confiado à Igreja”.
96
Neste sentido, uma tarefa fundamental dentro da direção espiritual católica é a
“educação da consciência”, que significa mostrar ao orientando a Palavra de Deus e suas
implicações, levando ao seu conhecimento a Tradição cristã católica e seus principais
ensinamentos, mas sempre respeitando a maturidade do orientando, suas experiências de fé e
toda a sua história de vida.
93
CONSTITUIÇÃO PASTORAL GAUDIUM ET SPES, nº 16, p.157.
94
CATECISMO da Igreja Católica, nº 1960, p.518.
95
William BARRY e William CONNOLY, A prática da direção espiritual, p.123.
96
CONSTITUIÇÃO DOGMÁTICA DEI VERBUM, n º 10, p.127.
43
Giordani chama este processo de “orientar para a verdade”
.
97
O orientando tem o
direito de ser instruído sobre os conteúdos da mensagem cristã e todas as implicações para sua
vida.
Giordani afirma que existem dois modos de dirigir: informante e estruturante.
Quando o diretor vale-se do modo informante, ele apresenta ao orientando possibilidades e
“exerce um influxo em despertar e potencializar determinados valores”,
98
permitindo que o
orientando possa fazer suas próprias escolhas e tomar as atitudes que considerar necessárias.
Na segunda maneira, estruturante, o diretor “atua como especialista, ou seja,
propondo explicitamente e insistindo em determinados valores, ou seja, colocando frente a
frente o ponto de vista do indivíduo com seu próprio, exercendo uma pressão moral direta.
99
Na presente dissertação, a direção espiritual é entendida no seu modo informante, no
qual, o diretor informa e partilha suas convicções, sem impô-las, deixando à livre escolha do
orientando a assimilação e a aceitação do que é proposto.
A educação da consciência é uma tarefa de toda a vida. Uma educação
prudente ensina a virtude, preserva ou cura do medo, do egoísmo e do
orgulho, dos sentimentos de culpabilidade e dos movimentos de
complacência, nascidos da fraqueza e das faltas humanas”. Este processo
“garante a liberdade e gera a paz no coração.
100
2.3.3. Nova vida em Cristo
A direção espiritual visa favorecer um encontro pessoal com Jesus Cristo. Quanto
maior for o grau de amizade e intimidade com o Senhor, mais frutuosa será a direção
espiritual. A comunhão com Cristo não significa uma adesão a uma idéia, mas um
relacionamento afetivo de profunda amizade: “Se não o tinham compreendido ainda, por que
o seguiam? Porque Cristo tinha se tornado seu centro afetivo”.
101
A comunhão com Cristo, mais do que uma simples sintonia intelectual ou
afetiva comum à idéia, uma causa, uma utopia, é a experiência do fato de
uma associação e participação pessoais, afetivas e efetivas, no mistério de
sua pessoa e do seu destino; sua fé, sua esperança e seu amor na entrega de
sua vida ao Pai e aos seres humanos se tornam nossa fé, nossa esperança e
nosso amor.
102
97
Bruno GIORDANI, Encuentro de Ayuda Espiritual, p.107-108
98
Ibid., p.104
99
Ibid.
100
CATECISMO da Igreja Católica,1993,n.1784, p.482
101
Luigi GIUSSANI, O caminho para verdade é uma experiência, p.103.
102
Danilo MONDONI, Teologia da Espiritualidade, p.160.
44
Para o catolicismo, quanto mais próximo do Coração de Deus o ser humano estiver,
por meio de uma amizade livre e sincera com Cristo, mais ele perceberá o amor de Deus por
ele, tornando-se mais disposto a amar o seu semelhante.
O diretor espiritual parte do princípio de que a experiência com Cristo dá um novo
sentido à vida do cristão, de tal maneira, que ele não se contenta com uma vida medíocre e
mesquinha, mas passa a querer viver de um jeito novo, porque toda a sua vida vai sendo
influenciada por este amor de Deus.
A busca por esta novidade de vida em Cristo é entendida pela Igreja Católica como a
vocação universal à santidade. “Todos os fiéis cristãos, de qualquer estado ou ordem, são
chamados a plenitude da vida cristã e a perfeição da caridade”.
103
O diretor espiritual sabe que buscar a santidade como meta da vida espiritual não
significa que o orientando se tornará perfeito, mas que ele poderá escolher o amor como
caminho de vida, buscando a cada dia melhorar o seu relacionamento com Deus, consigo
mesmo e com outros.
Para o diretor espiritual, o encontro com Cristo é um ato de capacitação que permite
ao orientando encontrar uma nova força para assumir sua vida e vivê-la de um jeito novo.
“Todo aquele que está em Cristo é uma nova criatura. Passou o que era velho; eis que tudo
se fez novo” (II Cor, 5,17).
2.4. O processo de direção espiritual
Os encontros de direção espiritual não assumem uma forma padronizada, pois cada
pessoa é única, com necessidades e anseios singulares. Esta singularidade é levada em conta
durante o processo de direção espiritual, o que leva o diretor espiritual a lidar diferentemente
com cada orientando, considerando o seu grau de intimidade com Deus e a sua maturidade
psicológica.
Santo Inácio de Loyola oferece um pouco de sabedoria prática: “não há erro
maior nem maior mal que orientar os outros tal como se orientasse a si
mesmo”. Ele quis deixar claro que não há dois indivíduos que se beneficiem
do mesmo tipo de orientação, porque Deus lida com cada um de maneira
singular, específica e apropriada. Assim, para o diretor, reconhecer a
realidade subjetiva, pessoal e única do individuo é sempre mais importante
que identificar tipos reconhecíveis ou processos previsíveis de crescimento
espiritual. O diretor deve estar aberto às diferenças existentes entre os
103
CONSTITUIÇÃO DOGMÁTICA LUMEN GENTIUM, nº 40, p.87.
45
orientandos, mas ser livre o bastante para se arriscar a entrar na
singularidade pessoal de outrem.
104
O processo de direção espiritual é eficaz na medida em que o orientando escolhe
Deus livremente, sentindo-se confiante para percorrer sua própria estrada. A direção espiritual
precisa ocorrer através de um diálogo livre e aberto, em “clima não-hierárquico”,
105
para
possibilitar frutos de conversão eficazes e duradouros na vida do orientando.
Esta posição se baseia nos relacionamentos que Jesus estabeleceu ao longo de sua
vida. Ele não impunha, nem obrigava, apenas convidava e apresentava sua mensagem e
deixava a cargo do interlocutor a aceitação. A aceitação livre gera compromisso de vida,
enquanto que a imposição gera incerteza e insegurança.
“Acompanhar não significa impor um itinerário a uma pessoa, nem conhecer a
direção que ela vai tomar, mas caminhar ao seu lado. Todo trabalho consiste em ajudar a
pessoa a descobrir seu caminho no Espírito”.
106
A direção espiritual é um processo contínuo. Usualmente, o orientando toma a
iniciativa de procurar o diretor espiritual para iniciar a relação de ajuda espiritual. Não há um
prazo estipulado para o término, embora cada parte seja livre para terminar a relação no
momento que achar conveniente.
107
Os primeiros encontros são muito importantes para estabelecer o que Barry e
Conolly chamam de aliança de trabalho
108
, ou seja, acordar as condições que serão
observadas ao longo do processo, como a periodicidade dos encontros, o local, horário e tudo
que considerarem necessário estabelecer para o bom andamento da direção espiritual.
Antes de estabelecer a aliança de trabalho, diretor e orientando são convidados a
refletir sobre a viabilidade para iniciar o processo de direção espiritual. Por motivações
pessoais e não havendo possibilidades, não convém estabelecer a aliança de trabalho.
Nos primeiros encontros, é conveniente fazer uma triagem para definir se é possível
um trabalho em direção espiritual, ou se é necessário um encaminhamento para algum outro
tipo de auxílio, como o psicológico ou psiquiátrico, ou mesmo realizar um trabalho
104
Frank J. HOUDEK, Guiados pelo Espírito: Direção espiritual em perspectiva inaciana, p.23.
105
William BARRY e William CONNOLY, A prática da direção espiritual, p.130.
106
Danilo MONDONI, Teologia da Espiritualidade, p.162.
107
Frank J. HOUDEK, Guiados pelo Espírito: Direção espiritual em perspectiva inaciana, p.25.
108
William BARRY e William CONNOLY, A prática da direção espiritual, p.147.
46
simultâneo entre um atendimento psicológico e a direção espiritual, cada qual com seu
profissional competente.
109
Os primeiros encontros podem ocorrer semanalmente. Depois de estabelecida a
aliança de trabalho, o mais indicado é que eles se tornem quinzenais ou no máximo
mensais,
110
e que não passem de uma hora, salvo em casos excepcionais.
2.4.1. Elementos essenciais na direção espiritual
Alguns elementos são fundamentais, para que exista uma maior eficácia durante o
processo de direção espiritual.
Acolhida. O diretor espiritual precisa criar um ambiente acolhedor e favorável para
que o orientando sinta-se livre para ser autentico, sem restrições e nem medos. Sem um bom
acolhimento inicial toda a direção espiritual fica comprometida.
Escuta. Muitas vezes o encontro se resume em um monólogo, no qual o orientando
fala e o diretor escuta. Ao falar da própria experiência, o orientando encontra alento e
consolo, pois “exprimir é sempre esclarecer a si mesmo”.
111
Ao mesmo tempo, sabe que está
sendo ouvido por alguém que presta atenção à sua vida.
A escuta permite que o outro se estruture: é falando que alguém se apropria
de sua existência; para que o apelo de Deus possa crescer e produzir frutos.
A função de ajuda começa pela atenção às palavras do dirigido, pela escuta;
esta atitude atenta e respeitosa é uma atitude de fé na ação de Deus que se
revela através das palavras do dirigido.
112
Confiança. É importante que haja confiança entre as pessoas envolvidas nesta
relação que vai sendo adquirida ao longo do tempo.
O diretor espiritual inspira confiança quando respeita a vontade do orientando, é
autêntico e mostra uma coerência entre sua fala e a sua prática de vida. Por outro lado, o
orientando desperta a confiança do diretor quando demonstra interesse sincero pela direção
espiritual e, na medida em que é autêntico.
109
Cf. Frank J. HOUDEK, Guiados pelo Espírito: Direção espiritual em perspectiva inaciana, pp. 25-26.
110
Cf. Frei Patrício SCIADINI, O que é, como se faz direção espiritual, p.82 ; Rebeca J. LAIRD, Como
encontrar um diretor espiritual, p.202.
111
Mihály SZENTMÁRTONI, Caminhar juntos: Psicologia pastoral, p.60
112
Danilo MONDONI, Teologia da Espiritualidade, pp.160-161.
47
O testemunho de vida estabelece um sentimento de confiança na relação, quanto
mais coerente for a relação entre as palavras e a vida, maior será a autoridade do discurso e
consequentemente, maior será a confiança durante a relação de direção espiritual.
Liberdade. É importante que tanto o diretor espiritual quanto o orientando tenham
liberdade para dizer o que pensam e para se mostrar autenticamente. O diretor espiritual
precisa expressar sua opinião, apontar os limites necessários, mas nunca impor ou esperar
uma adesão cega por parte do orientando, que, por sua vez, tem que ser livre para ouvir e
aceitar as orientações que parecerem úteis a sua vida.
Solitude. Solitude é o processo de estar a sós com Deus. Não significa estar
solitário, mas estar a sós na presença de Deus, para ouvi-lo e manter com Ele uma relação de
profunda intimidade.
Para praticar a solitude, devemos reservar um tempo regular para nos
aquietar física e espiritualmente. Este é um momento de oração sem
palavras, através de leituras sagradas, seguidas por um espaço aberto para
ouvir a voz de Deus ou sentir a presença de Deus ou um chamado para
esperar.
113
Caridade. O amor é condição fundamental em qualquer relação cristã e é virtude
indispensável na direção espiritual. O diretor espiritual se dispõe a auxiliar o orientando com
uma atitude de amor. O diretor precisa amá-lo, querer seu bem, sua felicidade, de maneira
sincera e gratuita e olhar para o orientando como um irmão que, naquele momento concreto,
procura sua ajuda.
2.4.2. Movimentos da direção espiritual
Houdek apresenta alguns movimentos que ocorrem durante o processo de direção
espiritual.
114
Não se tratam de passos obrigatórios a serem seguidos em toda a prática de
direção espiritual, pois o diretor é convidado a percorrer com seu orientando a trajetória que
melhor convier a cada situação concreta.
113
Henri NOUWEN, Direção espiritual: Sabedoria para o caminho da fé, p.146.
114
Cf. Frank J. HOUDEK, Guiados pelo Espírito: Direção espiritual em perspectiva inaciana, pp.43-48.
48
2.4.2.1. Percepção de Deus na vida cotidiana
Durante os encontros, os orientandos narram suas vidas, suas experiências
cotidianas, sonhos e esperanças, os fatos que são vividos naquele momento e suas
experiências atuais.
Através do diálogo, com o auxílio do diretor espiritual, começam a perceber a ação
de Deus ao longo desta história, como Deus fala através daquelas experiências e, assim,
percebem a presença amorosa de Deus ao seu lado. Com o tempo, uma nova experiência vai
surgindo, conforme a pessoa percebe a presença do amor de Deus em sua vida, as mudanças
começam a ocorrer.
Novas percepções surgem de encontros, de leituras, da beleza da natureza,
de uma celebração que toque fundo a pessoa, de ocasiões de conflito ou crise
pessoal. A verdade ou presença da realidade misteriosa é clara e exigente.
Fé, Espírito, mistério ou amor tocam profundamente e movem a pessoa. O
orientando percebe que Deus pode ser levado a sério. A pergunta agora é : o
que eu faço com tudo isso?
115
2.4.2.2. Apropriação das manifestações de Deus
Este movimento sugere a contemplação e a aceitação por parte do orientando das
novas percepções de Deus em sua vida. Ele aceita que a vida transcorreu este percurso e
apropria-se de tudo aquilo que percebeu sobre a ação de Deus em sua vida.
Apropriar-se dos acontecimentos que causaram a percepção da dimensão
misteriosa da vida. Esclarecer e procurar o sentido interior da experiência
torna-a parte da história e da personalidade do orientando, que reflete sobre
os fatos, examina as inferências, descobre padrões de sentidos, aprecia afetos
profundos e evoca coragem para assumir o compromisso. Aqui a pessoa
encontra o Espírito de Deus com reverência e seriedade reflexiva.
116
Surge a pergunta: o que Deus quer para minha vida? A partir deste momento, a
história pode ser reescrita de um jeito novo.
115
Frank J. HOUDEK, Guiados pelo Espírito: Direção espiritual em perspectiva inaciana, p.45.
116
Ibid., p.46.
49
2.4.2.3 Compromisso com Deus
Em outro momento, o diretor é convidado a discernir juntamente com o orientando a
voz de Deus na vida dele e auxiliá-lo a escolher os passos concretos que quer dar para
progredir no caminho de amor com o Senhor.
O verdadeiro desafio é ajustar a vida a esse novo compromisso. Valores,
necessidades, relações e trabalho têm de ser ajustados radicalmente para se
harmonizarem com a qualidade de experiência de conversão. A reflexão
critica, necessária em todas as dimensões da vida, substitui a espontaneidade
impensada.
117
2.4.2.4. Acompanhamento permanente
O diretor espiritual precisa estar à disposição para que o orientando o procure sempre
que precisar. O diretor é convidado a caminhar ao lado do orientando, para auxiliá-lo a
continuar percebendo a ação amorosa de Deus em sua vida.
2.4.3. Transferência e contratransferência
Para alguns autores,
118
os fenômenos da transferência e contratransferência precisam
ser evitados durante o processo de direção espiritual, pois podem prejudicar toda a relação de
ajuda espiritual.
Para Houdek ocorre a transferência quando “o orientando liga ou transfere ao
diretor imagens, sentimentos, lembranças e experiências que pouco ou nada tem a ver com
ele”.
119
Por sua vez, contratransferência ocorre quando estas imagens são transferidas ao
orientando por parte do diretor.
Estes fenômenos atrapalham o processo de direção porque deslocam do centro da
relação, o encontro do orientando com Deus. Nestes casos, o diretor ou até mesmo o
117
Frank J. HOUDEK, Guiados pelo Espírito: Direção espiritual em perspectiva inaciana, p.47.
118
Cf.Mihály SZENTMÁRTONI, Caminhar juntos: Psicologia pastoral, pp.95-98; Frank J. HOUDEK,
Guiados pelo Espírito: Direção espiritual em perspectiva inaciana, p.146-152; William BARRY e William
CONNOLY, A prática da direção espiritual, p.162-180.
119
Frank J. HOUDEK, Guiados pelo Espírito: Direção espiritual em perspectiva inaciana, p.147.
50
orientando podem se tornar o objetivo do encontro, desvirtuando o caráter transcendental da
direção espiritual.
Szentmártoni aponta algumas maneiras para lidar com este problema: reduzir a
frequência dos encontros e tornar o fenômeno explícito, fazendo com o orientando uma
abordagem direta sobre o problema.
120
2.5. Frutos da direção espiritual
Pode-se dizer que uma relação de direção espiritual é frutuosa, não quando se fala
sobre Deus, mas quando Ele fala aos corações.
A avaliação da direção espiritual se dá através da vida do orientando, quando ele está
mais feliz, mais próximo dos outros, de Deus e de si mesmo são sinais de que a direção
espiritual está no caminho certo.
O crescimento das virtudes, na vida do orientando, tamm é sinal claro da ação de
Deus. O aumento das virtudes teologais da fé, esperança e caridade, que são dons de Deus,
àqueles que buscam viver segundo o seu Espírito, são fortes indícios de que a direção
espiritual está gerando bons frutos.
Conforme a caminhada espiritual é construída, o orientando percebe o aumento da
sua fé e passa a confiar mais em Deus e no seu amor, tornando-se mais otimista, confiando
num futuro melhor e na possibilidade de viver de um jeito novo, pois Deus é Pai e está à
frente de tudo. Ele passa a acreditar mais na vida e em tudo o que a Divina Providência vai
lhe proporcionar, pois sabe que a esperança não decepciona.
O orientando percebe-se mais amado por Deus e sente a necessidade de comunicar
isto aos outros, tornando-se mais altruísta e preocupado com as necessidades das outras
pessoas.
O altruísmo é, sem dúvida, sinal de crescimento no orientando. Acarreta
percepção nova ou aprofundada dos outros, sensibilidade às realidades dos
outros seres humanos e concentração nessa realidade. Assinala a mudança do
egocentrismo para a percepção dos outros e consideração positiva por
121
eles.
120
Cf. Mihály SZENTMÁRTONI, Caminhar juntos: Psicologia pastoral, pp.98-99.
121
Frank J. HOUDEK, Guiados pelo Espírito: Direção espiritual em perspectiva inaciana, p.146.
51
A carta de São Paulo aos Gálatas aponta os frutos do Espírito que acompanham todo
aquele que cresce na vida espiritual: “caridade, alegria, paz, paciência, afabilidade, bondade,
fidelidade, brandura e temperança” (Gl 5,22 ).
Enfim, “a direção espiritual deve fazer crescer uma pessoa que assume Jesus Cristo,
a Igreja e a vida concreta de cada dia, que tem uma identidade cristã e social no ambiente
em que vive, tornando-se assim fermento de transformação
122
”.
122
Frei Patrício SCIADINI, O que é, como se faz direção espiritual, p.119.
52
CAPÍTULO III - DIÁLOGO ENTRE O ACONSELHAMENTO
PSICOLÓGICO E A DIREÇÃO ESPIRITUAL
“A
f
orça mais poderosa do universo é o amor”.
Rogers
“Quem não ama, não conhece a Deus, porque Deus é amor”.
(I Jo 4,8)
A primeira tarefa que se mostra necessária ao relacionar o aconselhamento
psicológico e a direção espiritual é esclarecer a visão de homem em que cada uma delas se
baseia. Através do conhecimento da visão de homem, contida em cada uma dessas relações de
ajuda, será possível compreender melhor no que elas se aproximam e no que se distanciam.
Portanto, o objeto deste capítulo será a comparação entre as visões de homem
contidas no aconselhamento psicológico e na direção espiritual católica, apontando suas
semelhanças, diferenças, irredutibilidades e suas principais implicações para a prática da
direção espiritual.
A visão de homem subjacente à direção espiritual na religião católica e aquela
presente na abordagem centrada na pessoa não são absolutamente distintas, mas possuem
diferenças consideráveis e, em muitos aspectos, se aproximam.
3.1. Visão de homem para a abordagem centrada na pessoa
A proposta rogeriana baseia-se em uma visão de homem específica. Para Rogers o
ser humano é essencialmente positivo e apto para atingir, com suas próprias forças, o seu
desenvolvimento.
123
Um dos conceitos mais revolucionários que se destacam da nossa
experiência clínica foi o reconhecimento progressivo de que o centro mais
íntimo da natureza humana, as camadas mais profundas da sua
personalidade, a base da sua natureza animal, tudo isso é naturalmente
positivo, fundamentalmente sociabilizado, dirigido para diante, racional e
realista.
124
123
Cf. Carl R. ROGERS, Tornar-se Pessoa, pp.165-174.
124
Ibid., p.91
53
A abordagem centrada na pessoa acredita que o homem possui uma tendência inata
ao desenvolvimento.
Rogers expressa sua crença no homem como um organismo vivo, global,
com capacidade de crescimento e desenvolvimento de suas potencialidades
próprias. Tal processo é inato e admitido como tendência atualizadora, ou
seja, direcionado para o crescimento. Acredito que para Rogers essa
tendência atualizadora seja o próprio sentido de vida, de existência e de
caráter evolutivo.
125
Todas as forças que o homem precisa, para atingir a plenitude de seu
desenvolvimento, se encontram nele. Faz-se necessário, então, que o aconselhamento
psicológico crie condições para que o aconselhado possa tomar consciência delas e passe a
usá-las em beneficio próprio.
Num ambiente facilitador, o homem encontra as condições necessárias para que suas
potencialidades ao desenvolvimento se atualizem, possibilitando que a sua vida possa seguir
seu caminho natural rumo à plenitude, haja vista que a natureza humana é entendida como
“algo fluido: uma tendência para crescer, um movimento de sair de si, um projetar-se, um
devir, um incessante tornar-se, um contínuo processo de vir a ser”.
126
Em suma, o homem é bom e apto a atingir, atualizando suas próprias
potencialidades, o desenvolvimento e a vida plena que almeja.
3.2. Visão de homem para a Igreja Católica
Para a religião católica, Deus criou o ser humano à sua imagem e semelhança.
127
No
momento da criação, o ser humano gozava da santidade original, possuía uma comunhão
plena com o Criador e não estava sujeito à morte e aos sofrimentos do mundo.
128
O homem
tinha o pleno domínio de si mesmo e “estava intacto e ordenado em todo seu ser”.
129
125
Henriette Tognetti Penha MORATO, “Abordagem centrada na pessoa: teoria ou atitude na relação de ajuda?”
in Rachel Lea ROSENBERG (Org.), Aconselhamento psicológico centrado na pessoa, p.37.
126
Elias BOAINAIN JR., Tornar-se transpessoal: transcendência e espiritualidade na obra de Carl Rogers,
p.34
127
Cf. Gn,1, 26-31
128
Cf.CATECISMO da Igreja Católica, nº 376, p.108.
129
Ibid., nº 377, p.108
54
O pecado original rompeu esta comunhão inicial e afetou a natureza humana.
Embora o homem continuasse a ser imagem e semelhança do criador, possuindo o desejo e a
capacidade de Deus, sua natureza ficou marcada com uma inclinação ao pecado, chamada de
concupiscência.
130
A vinda de Jesus Cristo restabeleceu a comunhão com o Deus. Sua morte e
ressurreição apagaram o pecado original, mas não retiraram do homem as conseqüências deste
pecado.
O Batismo, ao conferir a vida da graça de Cristo, apaga o pecado original e
torna a voltar o homem para Deus, porem as consequências de tal pecado
original sobre a natureza, enfraquecida e inclinada ao mal, permanecem no
homem e o incitam ao combate espiritual.
131
Portanto, todo cristão é convidado a agir corretamente e praticar o bem.
132
O homem
é novamente capaz de atingir a felicidade almejada, mas só alcançará isto com muito esforço
aliado à graça de Deus.
Uma luta árdua contra o poder das trevas perpassa a história universal da
humanidade. Iniciada desde a origem do mundo, vai durar até o último dia,
segundo as palavras do Senhor. Inserido nesta batalha, o homem deve lutar
sempre para aderir ao bem; mas não consegue alcançar a unidade interior
senão com grandes labutas e o auxílio da graça de Deus.
133
Mais ainda, o homem possui o desejo de Deus e, não pode ser feliz enquanto não
saciá-lo. Nas palavras de Santo Agostinho: “Fizeste-nos para ti, e inquieto está o nosso
coração, enquanto não repousa em ti”.
134
Para Bittencourt, a visão de homem presente no catolicismo é otimista, porque
não receia dizer que houve uma queda original e que carregamos as
consequências desta queda; mas ela afirma a existência de uma Providência
Divina, que, respeitando o livre jogo da vontade humana e suas
consequências, não permite as quedas senão a fim de fazê-las servir a
maiores bens. Todo homem que toma consciência disto, concebe a grande
preocupação de ser incondicionalmente fiel a Deus; só Ele pode fazer da
ignomínia glória, e da morte vida.
135
130
Cf. CATECISMO da Igreja Católica, nº 405, p.115
131
Ibid.
132
Ibid. nº 1709, p.468
133
CONSTITUIÇÃO PASTORAL GAUDIUM ET SPES, nº 37, p.180.
134
SANTO AGOSTINHO, Confissões , p.15.
135
Pe. Estevão Tavares BETTENCOURT, Curso por correspondência: Curso de Antropologia Teológica
(criação e pecado), p.200.
55
Comparando estas duas visões, percebem-se algumas semelhanças, mas também
diferenças consideráveis.
Assemelham-se quando compreendem a natureza humana de maneira positiva. Para
as duas compreensões o homem é intrinsecamente bom. No aconselhamento esta bondade está
ligada à essência do ser humano, a sua natureza. Para o catolicismo esta bondade é originária
da criação. O homem é bom porque foi criado por Deus que é o Sumo Bem.
Todavia, a visão católica apresenta uma diferença considerável em relação à visão da
abordagem centrada na pessoa, a inclinação ao pecado.
Para o catolicismo, mesmo mantendo sua essência positiva e seu livre arbítrio, o
homem tem sua natureza marcada por uma desordem interior que o incita ao pecado.
136
As
próprias palavras de São Paulo atestam isto: “Não faço o bem que quero, mas o mal que não
quero”.( Rm 7,19).
Por esta razão, toda a vida humana, individual e coletiva, apresenta-se como
uma luta dramática entre o bem e o mal, entre a luz e as trevas. Bem, mais
ainda. O homem se encontra incapaz, por si mesmo, de debelar eficazmente
os ataques do mal.
137
Para a abordagem centrada na pessoa, o homem busca o bem e alcança-o por conta
própria, na medida em que vive em um ambiente propício a este desenvolvimento.
Todavia, esta tendência ao desenvolvimento não acontece da mesma maneira em
todos os indivíduos, varia de acordo com cada pessoa e com a interação com o meio.
138
Uma coisa é a capacidade que ele realmente possui e, outra, é o exercício
desta capacidade. Para que se efetive a capacidade de compreender e
resolver problemas, o homem necessita como condição imprescindível, de
um clima permissivo, onde tenha liberdade experiencial para as elaborações
interiores convenientes.
139
Para o catolicismo, nem sempre é o ambiente que facilita ou prejudica o
desenvolvimento humano. Muitas vezes, ele é alcançado através de um esforço do homem em
saber lidar com todos seus desejos e inclinações que nem sempre o conduzem para o caminho
do bem.
136
CF. Johan AUER e Joseph RATZINGER, Curso de Teologia Dogmática: Tomo III El mundo creación de
Dios, pp. 602-641.
137
CONSTITUIÇÃO PASTORAL GAUDIUM ET SPES, nº 13, p.155.
138
Cf. Henriette Tognetti Penha MORATO, “Abordagem centrada na pessoa: teoria ou atitude na relação de
ajuda?” in Rachel Lea ROSENBERG (Org.), Aconselhamento psicológico centrado na pessoa,, p. 38
139
Carl R. Rogers, Tornar-se Pessoa, p.77.
56
Para o catolicismo, o homem, sem o auxílio de Deus, não vive plenamente. Ele quer
o bem, mas nem sempre consegue buscá-lo e, sem Deus é quase impossível alcançá-lo.
Para a abordagem centrada na pessoa, a vida humana é um fluxo contínuo para o
bem e para o desenvolvimento. Para o catolicismo, a vida humana se apresenta como uma
luta, indubitavelmente vitoriosa em Cristo, conquistada através do esforço e do auxílio da
graça de Deus.
3.3. Dimensão espiritual e psicológica
Um aspecto que se destaca ao refletir sobre o diálogo entre a direção espiritual e o
aconselhamento psicológico é o modo de considerar a dimensão espiritual do ser humano.
Para o Catolicismo, o homem possui uma realidade ontológica de cunho espiritual,
marcada por Deus, que transcende a dimensão psicológica.
O homem excede a universalidade das coisas. Ele penetra nesta intimidade
profunda quando se volta ao seu coração, onde o espera Deus, que perscruta
os corações. Deste modo, reconhecendo em si mesmo a alma espiritual e
imortal, o homem, atinge a própria profundeza da realidade.
140
Pelo batismo, o católico torna-se templo vivo do Espírito Santo, possuindo uma
marca espiritual indelével em seu coração. O homem não caminha sozinho, Deus está nele e o
acompanha em todos os momentos da sua vida. Esta presença de Deus, em seu coração,
norteia toda a sua vida.
141
No aconselhamento psicológico, a dimensão espiritual do ser humano não é
considerada como objeto da psicologia. Não há uma oposição em relação a ela, mas a
dimensão espiritual do homem não é trabalhada pelo aconselhamento psicológico, que volta
sua atenção para a dimensão psicológica.
140
CONSTITUIÇÃO PASTORAL GAUDIUM ET SPES, nº 14, p.156.
141
João Paulo II ao explicar o significado do termo coração para o catolicismo afirma que “a categoria do
‘coração’ é, em certo sentido, o equivalente à subjetividade pessoal”. Homem e mulher o criou : catequeses
sobre o amor humano, p.227.
57
Farris afirma que “o aconselhamento psicológico não começa com a pressuposição
da existência de um universo moral, ou de um Deus. Considerando que Deus não é um
fenômeno observável, a convicção em Deus não pode ser parte das pressuposições
fundamentais da disciplina”.
142
Sendo assim, o psicólogo não concentra sua atenção em afirmar ou negar a existência
de Deus, mas em considerar os significados da experiência religiosa para a vida do homem.
Neste sentido, Aletti afirma que
a psicologia, por sua vez, pode reconhecer na mente de quem acredita,
somente, a “marca” invisível de Deus, não da realidade daquele que deixa a
marca no homem, ou seja, Deus. Cabe a psicologia acessar os significados e
valores psicológicos dos símbolos, crenças e ritos religiosos. Entretanto, o
objetivo da pesquisa em psicologia não é verificar a existência da graça de
Deus, nem reconhecê-la na obra do homem, nem ao contrário, ver na
conduta humana a ação do demônio. Isso que transcende a observação
empírica não pode ser para a psicologia nem objeto de indagação, nem
critério de explicação do comportamento humano. Mas, o psicólogo não
pode prescindir da condição subjetiva daquele que acredita: e isto é, do fato,
relevante, de que Deus opera nele e que esta convicção orienta também sua
relação com Deus, e seu modo de ser religioso.
143
Também é importante frisar que Rogers não descartou a existência da dimensão
espiritual no ser humano, até valorizou-a, mas deixou claro que pertencia “ao terreno do
místico”. “Tenho a certeza de que nossas experiências terapêuticas e grupais lidam com o
transcendente, o indescritível, o espiritual”
144
e prossegue: “Estas experiências
transcendentes, indescritíveis, inesperadas e transformadoras são concomitantes à
abordagem centrada na pessoa”.
145
Para Thorne e Mears,
146
a abordagem centrada na pessoa não exclui a possibilidade
de uma dimensão espiritual na vida do ser humano, mas não a abarca porque não pertence a
sua área de atuação, fazendo parte de outro campo da experiência, o mistério, que ultrapassa o
limite do psicológico.
142
James Reaves FARRIS, Aconselhamento psicólogo e espiritualidade, in Mauro Martins AMATUZZI (Org.),
Psicologia e Espiritualidade, p.163.
143
Mário ALETTI, “Processi psicologici e accompagnamento spirituale: specificità e interazioni” in F. G.
BRAMBILLA, M. ALETTI, M. I. ANGELINI, A. MONTANARI, Accompagnamento spirituale e Intervento
Psicologico: interpretazioni, p.19 (tradução do autor).
144
Carl R. ROGERS, Um jeito de ser, p.48.
145
Ibid., p. 49
146
Cf. BrianTHORNE e Dave MEARS, La terapia centrada en la persona hoy: Nuevos avances en la teoria y
en la prática, pp. 112-122
58
Farris afirma que
a questão fundamental não é o conteúdo, mas o significado da
espiritualidade, ou dos valores e símbolos. Porém, isso requer sensibilidade,
criatividade e flexibilidade por parte do psicólogo, porque pode ser muito
difícil ir além dos limites de nossos próprios universos simbólicos e entrar
no mundo do cliente.
147
Por outro lado, muitos autores católicos,
148
que tratam da espiritualidade,
reconhecem a importância da dimensão psicológica presente no ser humano, afirmando que é
necessário reconhecê-la e cuidá-la para ter uma experiência de fé amadurecida.
A Constituição Pastoral Gaudium et Spes afirma:
na pastoral sejam suficientemente conhecidos e usados não somente os
princípios teológicos, mas também as descobertas das ciências profanas,
sobretudo da psicologia e da sociologia, de tal modo que também os fieis
sejam encaminhados a uma vida de fé mais pura e amadurecida.
149
Gamarra afirma que
dentro da cultura atual não se pode esquecer que o homem tende ao
aperfeiçoamento na totalidade de seus componentes; e entre todos eles, se
destacam os psicológicos”. O processo de vida cristã “conta hoje com um
interesse especial por seu momento bio-psíquico. E a espiritualidade cristã
não é estranha ao tema da psicologia.
150
Giordani afirma que “o homem busca a Deus a partir da situação existencial em que
está imerso”,
151
sendo necessário não só reconhecer a dimensão psicológica na vida humana,
mas cuidá-la, porque ela exerce influências na própria experiência religiosa.
Nesta perspectiva, sobre o exercício da direção espiritual católica, Giordani afirma
que “uma direção espiritual bem conduzida, além de uma adequada preparação em teologia
e espiritualidade, requer, atualmente, conhecimentos teóricos e práticos que só as ciências
humanas podem oferecer”.
152
147
James Reaves FARRIS, Aconselhamento psicólogo e espiritualidade, in Mauro Martins AMATUZZI (Org.),
Psicologia e Espiritualidade, p.171
148
Cf. André Charles BERNARD, Introdução à Teologia Espiritual, p.77-88, Saturnino GAMARRA, Teología
Espiritual, p.258; Bruno GIORDANI, Encuentro de Ayuda Espiritual, p.52-62, Frei Patrício SCIADINI, A
pedagogia da Direção Espiritual, p.362.
149
CONSTITUIÇÃO PASTORAL GAUDIUM ET SPES, nº 62, p.214.
150
Saturnino GAMARRA, Teología Espiritual, p.258
151
Bruno GIORDANI, Encuentro de Ayuda Espiritual, p.52
152
Ibid., p.62.
59
Ante o exposto, é importante dizer que as duas dimensões, espiritual e psicológica,
não se opõem, porque abarcam áreas distintas da experiência humana, mas se inter-
relacionam. Portanto, é descabido entender que uma dimensão exclui a outra. Pelo contrário,
respeitadas as diferenças, pode se configurar uma relação de complementaridade entre elas, na
qual, cada uma em sua respectiva área de atuação, pode auxiliar o ser humano a cuidar da sua
vida de um modo mais abrangente.
Todavia, deve-se tomar o cuidado para evitar a confusão entre as duas dimensões, ou
seja, os reducionismos.
Em primeiro lugar, é preciso evitar o “psicologismo” que é a tentativa de explicar
todos os fenômenos humanos, inclusive as experiências religiosas, através de conceitos
psicológicos.
Farris afirma que é necessário
reconsiderar a redução da “religião”, ou da “espiritualidade”, a uma neurose,
um mecanismo de defesa, ou um comportamento de adaptação socialmente
aprendido. A religião pode funcionar de maneira neurótica. Mas também
pode expressar um processo maduro e bem integrado da busca, ou
construção de significado.
153
Em documento recente, a Congregação para a educação católica apontou o perigo da
ocorrência do psicologismo na direção espiritual, afirmando que
a direção espiritual não pode, de modo algum, ser confundida com formas de
análise ou de auxílio psicológico, nem ser por elas substituída, e que a vida
espiritual favorece por si mesma o crescimento das virtudes humanas, caso
não haja bloqueios de natureza psicológica.
154
Por outro lado, é preciso evitar a redução de todos os fenômenos humanos ao campo
da experiência religiosa.
155
Certos problemas narrados durante a direção espiritual são de
natureza psicológica e precisam ser tratados por um profissional habilitado nesta área.
153
James Reaves FARRIS, Aconselhamento psicólogo e espiritualidade, in Mauro Martins AMATUZZI (Org.),
Psicologia e Espiritualidade, p.171.
154
CONGREGAÇÃO PARA A EDUCAÇÃO CATÓLICA, nº 14.
155
Cf. Bruno GIORDANI, Encuentro de Ayuda Espiritual, p.52; Saturnino GAMARRA, Teología Espiritual,
p.260.
60
A Igreja Católica aponta nesta direção: “o diretor espiritual, a fim de esclarecer
dúvidas difíceis de serem resolvidas de outra maneira, pode ver-se na contingência de
sugerir, sem nunca impor, uma consulta psicológica para proceder com maior segurança no
discernimento e no acompanhamento espiritual”.
156
Estes dois movimentos reducionistas enxergam o homem de maneira parcial, não
correspondendo à visão global e unificada que tanto a psicologia humanista quanto a religião
católica buscam.
Ante todo o exposto, é valido afirmar que o ser humano é dotado de algumas
dimensões, dentre elas a psicológica e a espiritual que não se contrapõem, porque atuam em
áreas distintas do ser humano. De tal maneira, que a relação entre ambas pode ser de
complementaridade, desde que uma respeite as especificidades e o campo de atuação da outra.
O ser humano precisa lidar harmoniosamente com todas as suas dimensões para ter
uma vida saudável.
Neste sentido, o psicólogo precisa respeitar e valorizar a experiência religiosa, pois é
uma dimensão importante da experiência humana. Ancona-Lopez afirma:
Por mais que conheçamos a psicologia do homem e investiguemos seu
comportamento, por mais que penetremos em sua intimidade e
esquadrinhemos sua subjetividade, sempre sobra uma pergunta não
respondida. É assim que a aura do mistério envolve todo o trabalho do
psicólogo clínico.
157
Por sua vez, o diretor espiritual precisa saber que a experiência religiosa afeta todo o
ser humano, pois a relação com o sagrado não envolve só a dimensão espiritual, mas toda a
pessoa. Neste sentido, é impossível separar a dimensão espiritual do restante do ser humano,
sendo um erro acreditar que cuidar somente desta dimensão resolveria todos os problemas
humanos.
Se uma das dimensões padece, toda a pessoa sente. Do mesmo modo que a
experiência religiosa afeta todo o homem, também a dimensão psicológica exerce influencia
na totalidade da pessoa e, consequentemente, na experiência religiosa. Em função disto, se a
pessoa apresenta alguma deficiência psicológica e não a trata, a experiência religiosa resultará
prejudicada.
156
CONGREGAÇÃO PARA EDUCAÇÃO CATÓLICA, nº 14.
157
Marília ANCONA-LOPEZ, “Religião e psicologia clínica: quatro atitudes básicas” in Marina MASSIMI e
Miguel MAHFOUD (org.), Diante do mistério, p.86.
61
Portanto, para realizar um bom trabalho em direção espiritual, faz-se necessário que
o diretor espiritual possua conhecimentos de psicologia, especificamente do aconselhamento
psicológico, para realizar uma abordagem condizente com a situação de cada orientando,
percebendo as influências das dinâmicas psíquicas na experiência religiosa e, com mais
cuidado, poder discernir entre aquilo que pertence à esfera religiosa e a psicológica.
Neste contexto é possível um trabalho simultâneo, entre direção espiritual e
aconselhamento psicológico, cada um, com seu respectivo profissional, para ajudar a mesma
pessoa a cuidar de aspectos distintos da sua vida, abrangendo de uma maneira mais ampla
toda sua história.
3.4. Tendência ao desenvolvimento
Do ponto de vista da abordagem centrada na pessoa, o homem possui uma tendência
ao desenvolvimento, que o faz buscar sua realização pessoal e atingi-la com suas próprias
forças, desde que lhe seja proporcionado um ambiente favorável.
158
Tal tendência é inata e presente em todo organismo vivo, especialmente no ser
humano.
159
Esta tendência é “positiva, construtiva, tendente à atualização da pessoa,
progredindo para a maturidade e para a socialização”.
160
Existindo um ambiente favorável,
esta tendência atualiza-se, como um processo fluido e inerente ao ser humano.
Para o catolicismo, o homem também possui uma tendência inata a buscar a
felicidade, pois Deus mesmo a colocou no coração do homem.
161
Todavia, ele não consegue
alcançá-la somente com suas forças, porque está marcado em sua natureza com as
consequências do pecado original e possui, além do desejo de felicidade, uma inclinação ao
pecado, que só pode ser superada, com esforço e a graça de Deus
162
.
158
Cf. Franz Victor RUDIO, Orientação não-diretiva na educação, no aconselhamento e na psicoterapia,
pp.75-78
159
Cf. Henriette Tognetti Penha MORATO, “Abordagem centrada na pessoa: teoria ou atitude na relação de
ajuda?” in Rachel Lea ROSENBERG (Org.), Aconselhamento psicológico centrado na pessoa, pp.37-38.
160
Rogers, 1970, p.38
161
Cf. CATECISMO da Igreja Católica,1993, n.1718,p469
162
Cf. CONSTITUIÇÃO PASTORAL GAUDIUM ET SPES, 1965 n.13,p155
62
Não se pode subestimar, todavia, o fato de que a maturidade cristã e
vocacional alcançável graças ao auxílio das competências psicológicas,
embora iluminadas e integradas pelos dados da antropologia da vocação
cristã e, portanto, da graça, nunca estará isenta de dificuldades e tensões que
exigem disciplina interior, espírito de sacrifício, aceitação das fadigas e da
cruz, e confiança no auxilio insubstituível da graça.
163
Para a abordagem centrada na pessoa, a criação de um ambiente favorável propicia a
atualização da tendência ao desenvolvimento. Neste ambiente, o homem se torna capaz de
perceber melhor seus sentimentos interiores e passa a ter mais confiança na própria
experiência, para vivenciá-la sem medo.
Para Rogers, quando o homem pauta suas escolhas segundo o ditame de seus
sentimentos interiores e naquilo que acredita ser bom, dificilmente se engana. “Quando sinto
que uma atividade é boa e que vale a pena prossegui-la, devo prossegui-la”.
164
Para o catolicismo, em função da concupiscência, a existência de um ambiente
favorável na direção espiritual é importante, mas não é suficiente para que o homem atinja seu
pleno desenvolvimento. Além deste ambiente, é necessária uma abertura ao Espírito de Deus,
que habita no seu coração, para que se realize o plano de Deus em sua vida.
O homem possui não só uma tendência que o impulsiona a buscar a felicidade, mas
possui, também, uma consciência interior, na qual Deus fala e mostra sua vontade para sua
vida, todo aquele que a segue caminha com Deus rumo à felicidade.
Para realizar-se, não basta só desenvolver-se, o homem precisa seguir a voz da
consciência e atender ao convite do Criador para uma vida de comunhão com Deus, consigo
mesmo e com os outros.
Ante o exposto, é possível perceber que tanto a abordagem centrada na pessoa
quanto o catolicismo consideram que o homem tende ao desenvolvimento, mas, possuem
formas diferentes de compreender este desenvolvimento.
Estas diferenças refletem diretamente no papel do diretor espiritual e do conselheiro
psicológico.
O conselheiro tem por função criar um ambiente favorável que permita ao
aconselhado ser ele mesmo, ouvindo seus sentimentos interiores e fazendo o que considera
melhor para si, deixando fluir a tendência ao desenvolvimento que possui.
163
CONGREGAÇÃO PARA A EDUCAÇÃO CATÓLICA, 2008, n.9
164
Carl R. ROGERS, Tornar-se Pessoa, p.33
63
Na direção espiritual, a criação deste ambiente é necessária, mas não é o bastante. O
diretor espiritual precisa auxiliar o orientando a escutar da voz de Deus e, além disso, ser um
educador da sua consciência, auxiliando-o a viver à luz do Evangelho e da Sagrada Tradição.
Para o catolicismo, o homem possui uma missão atribuída por Deus, uma vocação. O
diretor espiritual possui, também, o papel de auxiliar o orientando a perscrutar os sinais de
Deus em sua vida, para perceber sua vocação e segui-la.
É preciso levar em conta a singularidade de cada indivíduo, conhecendo sua história
e suas experiências de vida para realizar um aconselhamento psicológico de qualidade. Em
função disto, toda experiência de aconselhamento é única, pois leva em conta a experiência de
vida de cada pessoa.
Para o Catolicismo, o homem é único e singular, desde sua concepção. O homem
possui uma singularidade que precisa ser observada para que seja respeitada sua dignidade de
filho de Deus. Portanto, todo o processo de direção espiritual, semelhantemente ao
aconselhamento psicológico, precisa respeitar a situação e as particularidades de cada
orientando, tornando cada relação de direção espiritual uma experiência única.
3.4.1. Vida em plenitude
Morato acredita que, na abordagem centrada na pessoa, a tendência ao
desenvolvimento é o próprio sentido da vida do homem e o sentido da existência. Quanto
mais o homem deixa fluir livremente esta tendência, mais ele amadurece, encontra seu
desenvolvimento e possui uma vida em plenitude.
165
Rogers acredita que todo homem vive em busca de uma vida plena, que ocorre na
medida em que deixar fluir a tendência que possui para o desenvolvimento.
166
Esta vida plena
não é um estado acabado e definitivo, mas um processo que vai ocorrendo ao longo de toda a
vida. “A vida plena é um processo, não um estado de ser. É uma direção, não um destino”.
167
Na medida em que o homem consegue fazer suas próprias escolhas, tornando-se
responsável por elas, passa a viver de um modo novo e a encontrar um novo sentido para sua
vida.
165
Cf. Henriette Tognetti Penha MORATO, “Abordagem centrada na pessoa: teoria ou atitude na relação de
ajuda?” in Rachel Lea ROSENBERG (Org.), Aconselhamento psicológico centrado na pessoa, p.37
166
Cf. Carl R. ROGERS, Tornar-se Pessoa, p.38-39
167
Ibid., p.165.
64
Rogers define este sentido pleno da existência assim:
o indivíduo é mais capaz de experimentar todos os seus sentimentos e tem
menos medo deles; mergulha completamente no processo de ser e de se
tornar o que é. O indivíduo torna-se um organismo que funciona mais
plenamente e, devido à consciência de si mesmo que corre livremente na e
através da sua experiência, torna-se uma pessoa que funciona de um modo
mais pleno.
168
Para o catolicismo, a vida em plenitude é uma conquista individual e comunitária.
Pode-se dizer que o homem é pleno quando consegue satisfazer suas necessidades pessoais e
ajudar o seu semelhante a satisfazê-los também. O mandamento cristão “Ama o próximo
como a ti mesmo” confirma esta idéia. O cristão que cuida somente dos seus interesses
particulares não pode ser considerado um cristão autêntico e está longe de viver em plenitude.
Para o catolicismo, embora exista uma tendência à felicidade, ela não é um fim em si
mesma, mas um meio para se chegar a Deus que é o fim último e o sentido supremo de toda
vida humana. Só Deus é capaz de responder a todos os anseios do coração humano.
No catolicismo, para viver em plenitude, o homem precisa também respeitar e
valorizar sua dimensão espiritual e, para tanto, necessita de um encontro pessoal com Cristo.
“Todo aquele que segue Cristo, o Homem perfeito, torna-se ele também mais homem”.
169
O homem precisa deixar fluir a força do amor presente em seu coração e, viver
segundo a mensagem de Cristo, para alcançar a felicidade que almeja. O cristão encontra a
plenitude da sua existência na medida em que vive o amor de Deus, amando a si mesmo e aos
outros.
Na abordagem centrada da pessoa, pode-se dizer que o homem é o seu próprio
princípio moral, pois pauta sua conduta pelo que sente e acredita ser o melhor para si,
conduzindo seu desenvolvimento segundo seus próprios juízos de valor e interesses pessoais.
Browning e Cooper
170
fazem uma crítica a este aspecto da abordagem centrada na
pessoa, afirmando que este tipo de compreensão, da auto-atualização como imperativo moral,
pode conduzir o homem a um egoísmo ético, que supervaloriza os interesses particulares em
detrimento dos interesses coletivos.
168
Ibid., p.170.
169
CONSTITUIÇÃO PASTORAL GAUDIUM ET SPES, nº 41, p. 186.
170
Cf. D.S.BROWNING e T.D. COPPER, Self-Actualization and Harmony in Humanistic Psychology. Religious
Thought and the Modern Psychologies, pp.63-68.
65
Para o cristianismo, o Evangelho de Jesus Cristo e a Tradição da Igreja são os
princípios norteadores da moral cristã. O homem não pode pautar sua conduta somente por
seus valores e interesses pessoais, mas precisa vivê-los à luz do Evangelho, colaborando para
a construção de um mundo mais justo e solidário.
As diferenças relativas ao conceito de vida em plenitude encontradas na abordagem
centrada na pessoa e no catolicismo implicam diretamente no papel do diretor espiritual e do
conselheiro.
Enquanto que o conselheiro tem por objetivo fazer com que o aconselhado possa ser
ele mesmo, atingindo suas metas pessoais de desenvolvimento, baseado nos seus interesses e
valores pessoais, o diretor espiritual visa aproximar o orientando do coração de Deus, para
que ele melhore o seu relacionamento com Deus, consigo mesmo e com os outros, sempre
baseado nos valores evangélicos. Para tanto, o diretor necessita apresentar os valores do
Evangelho e os ensinamentos da Igreja, indicando, quando necessário, os desvios.
Pode-se dizer que para o aconselhamento psicológico a vida em plenitude é uma
conquista individual que beneficia a própria pessoa e, para a direção espiritual, esta conquista
é fruto de uma luta pessoal, auxiliada pela graça de Deus, que visa beneficiar não só o
orientando, mas também o seu próximo.
3.5. Síntese
É muito importante que o diretor espiritual tenha consciência das diferenças e
semelhanças entre a abordagem centrada na pessoa e o catolicismo, no que diz respeito à
visão de homem, caso pretenda valer-se, adequadamente, dos conceitos do aconselhamento
psicológico para a prática da direção espiritual.
Em primeiro lugar, é possível a utilização de alguns conhecimentos do
aconselhamento psicológico na prática da direção espiritual uma vez que as duas concepções
de homem se apóiam em raízes semelhantes: a consideração positiva do homem e sua
tendência ao desenvolvimento.
Outra semelhança que os aproxima e corrobora esta utilização é a crença de que o
homem é um ser constituído por varias dimensões, entre elas: a espiritual e a psicológica.
66
Para as duas concepções, o ser humano é único e singular, merecedor de respeito e
dignidade, sendo capaz de fazer escolhas e tornando-se responsável por elas. Na medida em
que vai se desenvolvendo, o homem consegue fazer escolhas que o auxiliam a atingir seus
objetivos.
Para as duas relações de ajuda é necessária uma postura de confiança em relação ao
ser humano, pois consideram que o homem é capaz de melhorar e buscar a felicidade e que
ele está em constante aperfeiçoamento em prol de uma vida em plenitude.
Diante destas proposições em comum, é valido afirmar que o diretor espiritual
precisa encorajar o orientando a acreditar na vida e enfrentar seus problemas para superá-los
no momento oportuno.
O diretor espiritual, levando em conta a singularidade do orientando, precisa se
debruçar sobre a vida dele, através de uma boa acolhida e uma escuta interessada, deixando de
lado seus preconceitos e decisões pré-estabelecidas. Ele precisa ter uma postura confiante em
relação ao orientando, mostrando que acredita na sua capacidade de concretizar o seu desejo
de felicidade. É necessário apresentar ao orientando a mensagem do Evangelho e os
ensinamentos da Igreja, mas deixá-lo livre para fazer suas próprias escolhas.
Apresentadas estas semelhanças e suas possíveis implicações para a prática da
direção espiritual católica, algumas diferenças precisam ficar claras para que não haja
confusões entre as áreas.
Em síntese, no que diz respeito à visão de homem, a grande diferença entre a
abordagem centrada na pessoa e o catolicismo é a ênfase católica na importância da dimensão
espiritual no ser humano.
Para o catolicismo, admitir a dimensão espiritual é elemento fundamental para uma
compreensão completa da vida humana. Para o aconselhamento psicológico essa dimensão
não é primordial, embora o conselheiro possa se debruçar sobre os significados das
experiências religiosas de seus aconselhados.
Para a abordagem centrada na pessoa, o homem é bom e apto a atingir seu
desenvolvimento com suas próprias forças, na medida em que suas potencialidades se
atualizam facilitadas por um ambiente favorável.
Para o catolicismo, a tendência ao desenvolvimento também está presente no
homem, mas não é suficiente para que o homem atinja sua realização, pois a natureza humana
traz em si uma inclinação ao pecado que só pode ser superada com a graça de Deus.
67
Quanto ao sentido da existência, na abordagem centrada na pessoa entende-se que a
própria tendência ao desenvolvimento é o sentido da vida. No catolicismo, porém, entende-se
que Deus é o sentido último da existência humana.
Esta diferença tem uma implicação direta nos valores morais adotados pelas duas
concepções.
Para a abordagem centrada na pessoa, o homem é seu próprio principio moral, pois
vai descobrindo ao longo da vida, segundo o ditame de seus sentimentos interiores, os valores
que precisa observar para atingir seus objetivos.
Para o catolicismo, os valores morais são revelados por Deus e podem ser percebidos
pelos homens segundo a lei natural impressa em seu coração. A inclinação ao pecado, porém,
pode dificultar essa percepção e cabe, então, ao diretor espiritual, auxiliar o orientando a
reconhecer a voz de Deus em sua consciência.
Enquanto que para a abordagem centrada na pessoa a vida plena decorre da
atualização e do desenvolvimento das potencialidades que o homem possui, para o
catolicismo, a vida plena anunciada por Jesus Cristo, é fruto de um encontro com o amor de
Deus que modifica o relacionamento consigo mesmo e com os outros. O homem precisa de
Deus para se desenvolver plenamente, tanto para vencer a inclinação ao pecado, quanto para
preencher a sua dimensão espiritual e amar de um modo mais pleno.
As diferenças apresentadas acima implicam diretamente no papel do conselheiro e do
diretor espiritual.
Enquanto o conselheiro psicológico visa propiciar um ambiente favorável que
possibilite ao aconselhado desenvolver os seus potenciais, o diretor espiritual ajuda o
orientando a encontrar, na sua experiência diária, a presença de Deus que o fortalece e o
capacita a enfrentar mais corajosamente seus problemas.
O diretor espiritual precisa ter clareza de que embora conheça e se utilize de
conceitos e recursos desenvolvidos na área do aconselhamento psicológico, ele mesmo não
realiza um aconselhamento psicológico. Os conhecimentos em psicologia podem ser
importantes para o seu trabalho, mas não são suficientes para cuidar da dimensão espiritual do
ser humano.
68
Embora o conselheiro considere o significado da dimensão espiritual na vida
humana, ele mesmo não a afirma ou nega. O diretor espiritual, por sua vez, afirma pela fé a
existência de Deus e auxilia o orientando a perceber a ação Dele em sua vida. Ele tem a fé
como pressuposto fundamental para toda a sua conduta, o que o diferencia significativamente
do conselheiro psicólogo.
No aconselhamento psicológico, o conselheiro configura-se como um facilitador para
que a própria pessoa possa desenvolver suas potencialidades inatas à realização. O diretor
espiritual também atua como facilitador em alguns momentos, mas, em outros, assume o
papel de um educador, com a missão de anunciar, com clareza, ao orientando a mensagem
cristã.
Tanto o conselheiro psicológico quanto o diretor espiritual tem por objetivo auxiliar
a pessoa a viver em plenitude. Todavia, o conceito de vida em plenitude é distinto para as
duas relações de ajuda, o que influencia diretamente no papel do conselheiro e do diretor
espiritual.
O conselheiro entende que para viver em plenitude é suficiente que o aconselhado se
torne capaz de escolhas autônomas, desenvolvendo suas potencialidades. O diretor espiritual
acredita que a vida em plenitude ocorre na medida em que o orientando encontra-se com
Cristo e suas escolhas correspondem à mensagem cristã, propiciando o bem a si mesmo e ao
próximo.
Em suma, percebe-se a possibilidade da utilização de alguns conhecimentos do
aconselhamento psicológico para a prática da direção espiritual, em função das semelhanças
existentes entre a abordagem centrada na pessoa e o catolicismo, desde que observadas e
respeitadas às devidas diferenças entre eles.
Sendo assim, para produzir bons frutos, a utilização dos conceitos e recursos
psicológicos precisa ser adequada à direção espiritual, levando em conta suas particularidades
e especificidades e, por sua vez, o diretor espiritual precisa estar bem consciente disto, para
evitar confusões e ser preciso na sua tarefa.
69
CAPÍTULO IV – APROPRIAÇÃO DE CONHECIMENTOS DO
ACONSELHAMENTO PSICOLÓGICO PARA A PRÁTICA DA
DIREÇÃO ESPIRITUAL
Não existe nada que abale tanto o homem, abale a ponto de provocar
o sentimento de entrega total, quanto ser descoberto e compreendido”.
Luigi Giussani
Neste momento da dissertação, faz-se necessário escrever um relato da minha
experiência de pesquisa para mostrar quais as apropriações que fiz de conhecimentos da
psicologia, especificamente do aconselhamento psicológico, para a minha prática da direção
espiritual.
Durante o processo de pesquisa fui me apropriando de conhecimentos do
aconselhamento psicológico, na medida em que eles faziam sentido à minha prática da
direção espiritual e podiam contribuir com ela. Estas apropriações, me fizeram compreender a
minha experiência como diretor espiritual de uma forma nova e, consequentemente, mudaram
a minha prática.
Provavelmente, o uso de alguns conceitos pode não corresponder exatamente ao
rigor teórico com que é utilizado na abordagem psicológica, haja vista que a aplicabilidade de
conceitos de uma área do conhecimento em outra, não se dá sem que eles sofram
transformações ao serem inseridos em outro contexto.
De tal maneira, que as apropriações feitas ao longo da pesquisa, em certo sentido,
dão novas nuances aos conceitos, e ao mesmo tempo, as apropriações destes conceitos
também mudam o modo de entender e fazer a direção espiritual.
Para tanto, nesse trajeto de pesquisa, não me preocupei tanto com o uso rigoroso
destes conhecimentos, mas sim como ressoaram em mim, produzindo novas possibilidades e
modos de aplicá-los na prática da direção espiritual. Certamente, este é um dos efeitos da
reflexão interdisciplinar.
70
4.1. Motivação da pesquisa
Como afirmei na introdução, busquei o programa de psicologia clínica para realizar
uma dissertação de mestrado, porque percebia que faltavam conhecimentos nesta área para
minha prática de direção espiritual. Sentia a necessidade de adquirir outros elementos
complementares aos da teologia, que pudessem tornar meu trabalho mais abrangente.
Ao encontrar no Programa de Pós Graduação em Psicologia Clínica da PUC/SP um
eixo que pesquisava temas ligados à psicologia e à religião, acreditei na possibilidade de
atingir meu objetivo.
Fiquei com dúvidas sobre a possibilidade de realizar esta pesquisa, pelo fato de não
ser graduado em psicologia. Questionava-me se eu conseguiria realizar uma dissertação de
mestrado fora da minha área de atuação.
Antes mesmo de ingressar no mestrado, fui orientado a ler sobre
interdisciplinaridade, para refletir sobre a possibilidade de desenvolver uma dissertação nas
duas áreas. De fato, isto me ajudou bastante e, me encorajou a percorrer um campo que eu não
dominava, a psicologia.
Hoje, posso dizer que o enquadre de apenas uma disciplina não responde a todos os
problemas humanos. Quanto mais nos enriquecemos com conhecimentos das diferentes
ciências, mais nos tornamos aptos a prestar um serviço ao ser humano que pede a nossa ajuda.
Na medida em que aumentamos nosso cabedal de conhecimentos, ficamos mais preparados
para compreender o homem e ajudá-lo.
4.2. Escolha da abordagem teórica
Ante a possibilidade de uma pesquisa em uma área do saber diversa da minha
formação acadêmica, surgiu outra questão: no campo da psicologia, que possui tantas linhas
teóricas distintas, de qual me valer para fazer a pesquisa?
No início, a diversidade de abordagens me assustou. Questionava-me como
poderiam existir, dentro de uma mesma ciência, conceitos tão divergentes sobre uma mesma
questão; sobre um mesmo fenômeno se apresentava uma gama enorme de explicações que,
muitas vezes, eram absolutamente distintas.
71
Diante desta diversidade de abordagens, comecei a descartar aquelas que eram mais
incompatíveis com meus valores pessoais e a minha maneira de entender o homem e o mundo
e, também, aquelas que entendiam a experiência religiosa como patologia.
Achei melhor não me debruçar sobre a psicanálise freudiana, pois eu não aceitava as
afirmações sobre a experiência religiosa daquela linha teórica. Não conseguiria ser coerente
comigo mesmo naquela abordagem.
Outra linha teórica que não me interessou foi a apresentada pela psicologia
comportamental. Descartei-a baseado na minha experiência como diretor espiritual. Nas
direções espirituais percebia que não se podia reduzir à experiência humana apenas aos seus
comportamentos observáveis. Uma direção espiritual com cunho comportamental, não olharia
o “coração” do homem, mas analisaria e avaliaria as suas práticas e comportamentos.
Posso dizer que minha visão de homem me indicava um caminho diferente destas
duas abordagens.
O único contato com a psicologia que eu possuía, até então, era com as obras de
Viktor Frankl, as quais eu gostava muito, pois estavam de acordo com aquilo que eu
acreditava.
Acredito na unicidade do homem e na sua capacidade de fazer escolhas, tornando-se
responsável por elas e, também, na sua liberdade para construir sua história, segundo suas
crenças e valores.
Quando comecei a conhecer a psicologia humanista, percebi que suas afirmações
eram condizentes com a minha maneira de ver o mundo e o homem. Neste momento, passei a
vislumbrar possibilidades concretas de realizar meu trabalho de pesquisa.
Passei a procurar, na psicologia humanista, autores que me auxiliassem a construir
um diálogo entre a psicologia e a religião e, que me ajudassem a perceber possíveis
contribuições que a psicologia poderia oferecer para a prática da direção espiritual.
No meu levantamento bibliográfico sobre direção espiritual, constatei que alguns
autores da espiritualidade se referiam à utilização de alguns elementos da psicologia na
prática da direção espiritual e, quando o faziam, usualmente, citavam Rogers.
Lendo este autor, pude perceber que, de fato, suas colocações pareciam compatíveis
com o tipo de pesquisa que eu queria desenvolver. Optei por um estudo mais detalhado do
aconselhamento psicológico na abordagem centrada na pessoa, acreditando que poderia me
72
possibilitar a apropriação de alguns conceitos e atitudes para a prática da direção espiritual
que eu realizava.
Algo que me marcou muito, desde o início da pesquisa, diz respeito à dimensão
espiritual do homem. Muitos autores, da abordagem centrada na pessoa, não afirmam e nem
negam a existência do Transcendente, mas mantêm uma posição de respeito para com a
pessoa que faz a experiência religiosa.
A abertura à possibilidade da experiência religiosa e o respeito, sem oposições
teóricas, “ao terreno do mistério”, me permitiram a continuidade da pesquisa dentro desta
abordagem. Notei que seria possível estudá-la e, ao mesmo tempo, continuar acreditando em
Deus.
Adotar uma linha teórica da psicologia que fosse totalmente contrária à experiência
religiosa e aos valores do cristianismo inviabilizaria minha pesquisa.
4.3. Apropriação de alguns conceitos da abordagem centrada na pessoa
Ao longo da pesquisa, pude perceber que alguns conceitos da abordagem centrada na
pessoa eram compatíveis com conceitos católicos, tornando possível um diálogo harmonioso
entre eles.
Esta pesquisa me ajudou a adquirir alguns conhecimentos psicológicos e tamm
serviu para fortalecer alguns conhecimentos teológicos que eu já possuía, dada a proximidade
entre eles.
O primeiro conceito da abordagem centrada na pessoa que despertou meu interesse
foi a visão positiva do homem, também afirmada pelo cristianismo.
A visão positiva do homem, presente na psicologia humanista, fortalecia meu
discurso religioso e, consequentemente, minha prática da direção espiritual, pois não era mais
só uma questão de fé, mas, também, a afirmação de uma ciência humana.
Acreditar na necessidade da confiança no ser humano e nas suas possibilidades de
mudança afetou minha postura na direção espiritual. Notei que, muitas vezes, na prática da
direção espiritual, eu tinha uma postura de desconfiança em relação ao orientando e em suas
reais condições para crescer na fé e discernir sobre o seu próprio caminho.
73
Outro conceito da abordagem centrada na pessoa que foi muito importante para a
minha pesquisa foi a afirmação da tendência humana ao desenvolvimento.
Observadas as devidas diferenças com a direção espiritual, relativas à concupiscência
e a necessidade da graça de Deus, este conceito também me ajudou a acreditar mais no
orientando e a entender que, também na vida espiritual, ele pode caminhar por conta própria.
Neste sentido, na relação de ajuda espiritual, o diretor exerce a missão de facilitador
e não de protagonista. O próprio orientando é capaz de construir seu caminho e sua história,
quanto mais o diretor confia nele de uma maneira clara e sincera, mais seu desenvolvimento é
favorecido.
Muitos autores afirmam que estes conceitos não devem ser entendidos como
conhecimentos meramente teóricos, mas vivenciados e internalizados pelo conselheiro, a fim
de que façam parte integrante de seus valores e crenças pessoais. O conselheiro precisa
acreditar no aconselhado de fato, para encorajá-lo a fazer mudanças concretas.
Na direção espiritual, isto também precisa ocorrer. O diretor espiritual não consegue
expressar uma postura de confiança, se não for uma pessoa confiante, porque a maneira de ser
do diretor espiritual influencia a sua prática.
Se ele acredita no ser humano, então sua postura e sua prática corresponderão a essa
confiança e a revelarão. Portanto, tanto o conselheiro psicológico quanto o diretor espiritual
precisam internalizar e acreditar nestes conceitos para poder vivenciá-los de forma autêntica
na relação de ajuda.
Estudar o conceito de relação de ajuda me fez entender que a direção espiritual
também é uma relação de ajuda voltada à dimensão espiritual.
Em primeiro lugar, semelhantemente ao aconselhamento psicológico, a direção
espiritual também se configura como uma experiência de encontro e partilha, haja vista que o
ser humano não se desenvolve sozinho e necessita do encontro com o outro para ser pleno, o
simples fato de encontrar-se, possibilita transformações.
A afirmação de que o homem é um ser relacional é muito compatível com o
Cristianismo que propõe fundamentalmente uma experiência de encontro com Cristo, que
veio ao mundo para se relacionar fraternalmente com o ser humano. Sob este enfoque, a
direção espiritual assume um caráter de relação de ajuda espiritual que favorece o
desenvolvimento pleno do ser humano.
74
Portanto, na direção espiritual, em primeiro lugar, o diretor precisa ter consciência de
que o encontro com o orientando, por si só, pode ser curativo e, que sua presença sincera e
disposta a ajudar é o início de um processo de transformação.
É importante que o diretor espiritual esteja interessado no desenvolvimento do
orientando para poder ajudá-lo melhor. O diretor precisa estar inteiro na relação, debruçado
sobre a vida do orientando e, por menor que seja o tempo do encontro, ele precisa ser pleno.
O diretor espiritual precisa possibilitar ao orientando viver de maneira independente,
cuidando para não gerar no orientando uma relação de dependência aos seus conselhos e
orientações. Sendo assim, a direção espiritual se configura como uma relação de ajuda que
gera liberdade de escolha e responsabilidade.
Muitas vezes, o orientando fragilizado enxerga, no diretor espiritual, um homem
capaz de resolver todos os seus problemas e responder a todos os seus questionamentos,
fazendo das orientações do diretor, regras para sua vida. Em muitos casos, o diretor espiritual
corre o risco de aceitar este papel, identificando-se com a vida do orientando e querendo
resolver os seus problemas.
A direção espiritual, no entanto, precisa propiciar crescimento e desenvolvimento e
não uma relação de dependência. O diretor espiritual acompanha a vida de muitas pessoas,
mas não deve se identificar e nem decidir por elas, cabe-lhe permitir que cada orientando
aprenda a fazer suas próprias escolhas e se torne responsável por elas.
O diretor espiritual não desempenha um papel coercitivo, mas sim de facilitador para
que o orientando encontre a Deus e a si mesmo e, faça suas próprias escolhas segundo sua
consciência.
Na minha prática, eu estava acostumado a tomar decisões pelos orientandos e a dar
conselhos que excluíam seu poder de decisão. Certa vez, conversando com um psicólogo, ele
me disse que acerca de um problema pessoal, eu podia ouvir muitos conselhos e levá-los em
conta, mas ao final, eu é que deveria tomar e assumir a decisão.
Passei a vivenciar esta idéia na direção espiritual, encontrando apoio para ela ao
estudar o aconselhamento psicológico. A partir deste momento, quando o orientando contava
seu problema e me pedia uma decisão sobre o que fazer, eu deixava a cargo dele a decisão a
ser tomada.
75
Eu mostrava algumas passagens bíblicas, atitudes de Jesus e os ensinamentos da
Igreja que pudessem lhe servir de auxílio, mas ao final ele mesmo devia decidir, pois era ele
quem continuaria a lidar com a situação concreta e, ninguém a conhecia melhor do que ele
mesmo.
Os resultados foram bons. Eu percebia no orientando o crescimento de uma fé
madura e livre. O orientando escolhia livremente a Cristo, porque Ele fazia sentido à sua vida
e, não porque era obrigado. Algumas pessoas ficavam tristes por não receber uma resposta
pronta, mas eu sabia que isto, posteriormente, proporcionaria um bem maior. Elas precisavam
aprender a assumir e administrar suas vidas e a enfrentar seus problemas.
Não cabe ao diretor espiritual tomar decisões no lugar dos orientandos, mas ajudá-los
a fazê-lo. A relação de ajuda espiritual tem como principal objetivo favorecer uma
aproximação maior com Deus e, não com o diretor espiritual e seus conselhos.
4.4. Ambiente favorável e atitudes facilitadoras
Na abordagem centrada na pessoa afirma-se a necessidade da criação de um
ambiente que facilite a atualização da tendência ao desenvolvimento presente no ser humano.
Para tanto, apresenta algumas atitudes a serem vivenciadas no processo da relação de ajuda.
Percebi que seria muito útil à direção espiritual levar em conta a necessidade da
criação de um ambiente propício ao desenvolvimento espiritual do orientando, através das
vivências de algumas atitudes facilitadoras que, observadas às devidas particularidades,
poderiam ser aplicadas à direção espiritual.
4.4.1. Aceitação positiva
A aceitação positiva no aconselhamento psicológico significa que o conselheiro não
impõe condições para aceitar e acolher o aconselhado. Souza afirma que o conselheiro sequer
“faz julgamentos de valor, mas, ao contrário aceita o seu cliente plenamente como ele é”.
171
171
Lizete Quelha de SOUZA, A Abordagem centrada na pessoa e a experiência religiosa: uma discussão da
relação Eu-Tu como fator de transcendência na psicoterapia, p.27.
76
Na esfera da direção espiritual, entendo por aceitação positiva da pessoa o fato de
acolhê-lho, com todas as suas dores e sofrimentos, sem julgamento ou condenação, de um
modo amoroso, mostrando que sempre há a possibilidade de mudança. O diretor espiritual
precisa aceitar o orientando e sua história de vida, para ajudá-lo a construir um caminho
eficaz e duradouro.
É importante que o orientando perceba que não está à margem da sociedade ou da
comunidade religiosa, mas é um ser humano capaz de rever sua história de vida e mudar,
possuindo totais condições de alcançar a felicidade que anseia.
Esta aceitação vivida dentro da direção espiritual tem um limite, pois não pode
concordar com o erro. Isto seria contrário à missão do diretor espiritual, que tem o dever
moral e ético de apresentar os valores do Evangelho.
172
Passagem bíblica que apresenta esta atitude de aceitação na vida de Jesus é a da
samaritana.
173
Em primeiro lugar, Jesus se aproxima e acolhe a pessoa, mesmo conhecendo a
situação de pecado em que a mulher estava envolvida.
Ele primeiro se coloca ao lado da mulher e faz com que ela o conheça. Depois de
estabelecida uma relação de confiança, ela mesma passa a querer a mensagem de amor que é
oferecida por ele.
Jesus se apresenta e oferece a oportunidade de um encontro, de uma relação de amor
e de ajuda. O encontro com Cristo é tão transformador que a mulher percebe que sua própria
história pode ser vivida de um jeito novo e sente a necessidade de reescrevê-la de maneira
diferente.
Uma relação de aceitação cria a possibilidade de mudanças autenticas e duradouras.
Mesmo que o diretor espiritual se ausente de sua convivência diária, a nova postura já foi
assumida pelo orientando e não foi imposta, mas foi aceita por ele mesmo, atitude que fará
parte de toda a sua vida.
172
Ez 3,17-21: “Filho do homem, estabeleço-te como sentinela na casa de Israel. Logo que escutares um
oráculo saindo de minha boca, tu lho transmitirás de minha parte. Se digo ao malévolo que ele vai morrer, e tu
não prevines e não lhe falas para pô-lo de sobreaviso, devido ao seu péssimo proceder, de modo que ele possa
viver ele há de perecer por causa do seu delito, mas é a ti que pedirei conta do seu sangue. Contudo, se depois
de advertido por ti, não se corrigir da malícia e perversidade, ele perecerá por causa de seu pecado, enquanto
tu hás de salvar a tua vida. Ao contrário, se advertires ao justo que se abstenha do pecado, e ele não pecar,
então ele viverá, graças à tua advertência, e tu, assim, terás salvado a tua vida”.
173
Cf. Jo 4, 1-42
77
Muitas vezes, as pessoas não têm plena consciência da situação que estão vivendo ou
não conseguem viver de outra maneira. O papel do diretor espiritual é transmitir ao orientando
a mensagem evangélica, para possibilitar que ele mesmo perceba a sua situação e
posteriormente, decida sobre suas atitudes.
Semelhante atitude é encontrada na situação da mulher adúltera que iria ser
apedrejada. Jesus a acolhe, reprova o julgamento dos homens e depois aconselha: “vá e não
peques mais.”
174
Jesus acolhe, mostra a situação de pecado e permite que a mulher escolha
seu próprio caminho.
As pessoas querem os parâmetros cristãos, por isto buscam o diretor espiritual, mas
necessitam, antes de tudo, de acolhimento, respeito e amor, para poder acreditar na
possibilidade de uma nova vida. Não querem seguir uma lei imposta e sem sentido, nem
querem ouvir uma sentença de condenação, mas buscam encontrar no diretor espiritual um
irmão que lhes mostre que ainda vale a pena enfrentar a vida e continuar buscando a
felicidade.
As pessoas precisam entender a mensagem de amor e todas as suas implicações, para
poder vivê-la conscientemente. Tudo que é imposto e não é assimilado pela pessoa não
produz fruto.
O diretor espiritual precisa acreditar no ser humano. Ele precisa confiar que o
coração do homem é essencialmente bom, criado a imagem e semelhança do Criador e que o
orientando possui uma força propulsora para o bem, o divino Espírito Santo.
A aceitação positiva é entendida por muitos autores, do aconselhamento psicológico,
como uma atitude amorosa em relação ao aconselhado. Para o Catolicismo, o homem se
realiza na medida em que ama e é amado, pois o amor é a sua essência. O homem nasceu do
amor e só se realiza quando se aproxima deste amor e o partilha, amando a Deus, a si mesmo
e os outros.
É importante frisar que o diretor espiritual não deve ser excessivamente permissivo,
afirmando que tudo pode e tudo está certo.
No aconselhamento psicológico também existem limites para a aceitação. Souza
afirma que “a aceitação incondicional do cliente por parte do terapeuta não significa que
174
Jo 8,11
78
‘tudo é aceitável’. Na realidade, tal fato quer dizer que, embora o terapeuta se proponha a
aceitar incondicionalmente o cliente, isso só é possível dentro de certos limites”.
175
A diferença significativa entre a aceitação no aconselhamento psicológico e na
direção espiritual está exatamente nos limites da aceitação. Enquanto para o conselheiro os
limites da aceitação estão discriminados no código de ética do psicólogo e em valores
consensuais, assim como em convenções éticas sociais. Para o diretor espiritual estes limites
estão contidos no Evangelho e na Tradição da Igreja.
As diferenças dos limites de aceitação no aconselhamento psicológico e na direção
espiritual, em parte, são decorrentes das diferenças entre a visão de homem no catolicismo e
na abordagem centrada na pessoa.
Para o aconselhamento, a crença na plena capacidade do homem em alcançar o seu
desenvolvimento, faz com que o aconselhado seja aceito de um modo quase que ilimitado. O
catolicismo, por sua vez, por acreditar na inclinação ao pecado e na necessidade da educação
da consciência, acredita que o diretor espiritual precisa orientar o homem para os valores
evangélicos e, se necessário, mostrar os desvios.
Para a direção espiritual, existe uma diferença significativa entre o acolhimento da
pessoa e a concordância com aquilo que a afasta de Deus. Acolher a pessoa não significa
concordar com seus erros e pecados, porque isto implica em prejuízo para o próprio
orientando.
Todavia, mesmo que o orientando apresente algo que está em desacordo com a
mensagem cristã e precise ser orientado quanto a isto pelo diretor, este deve fazê-lo sempre de
forma acolhedora e amorosa. A discordância, por parte do diretor espiritual, com aspectos da
vida do orientando, não significa rejeição do orientando.
Na direção espiritual, somente o erro não é aceito, mas não a pessoa. Na prática, as
pessoas esperam que o diretor espiritual apresente a mensagem cristã com todas as suas
implicações e também aponte os limites, mas que o faça de uma maneira caridosa e fraterna.
A questão fundamental é saber como falar e apresentar os valores evangélicos, pois
quando são apresentados com caridade, os resultados são surpreendentes e as pessoas ficam
agradecidas.
175
Lizete Quelha de SOUZA, A Abordagem centrada na pessoa e a experiência religiosa: uma discussão da
relação Eu-Tu como fator de transcendência na psicoterapia, p.28
79
4.4.2. Congruência ou autenticidade
“A congruência ou autenticidade decorre de um modo de ser genuíno, verdadeiro. Ou seja, é
a correspondência que deve existir entre o que o conselheiro sente, pensa e expressa”.
176
A ênfase na atitude de congruência proposta pela abordagem centrada na pessoa foi
um auxílio de grande valia para a minha prática de direção espiritual. Antes desta pesquisa, eu
acreditava que a atuação do diretor espiritual devia ser a mais imparcial possível e que ele não
podia manifestar seus sentimentos e impressões, sob pena de atrapalhar o processo de direção
espiritual.
Portanto, eu acreditava que não precisava manifestar meus sentimentos, bastava
apontar o caminho de Deus e que eu estava na relação para falar de Jesus e do Evangelho e
não de mim mesmo.
Quando passei a estudar esta atitude, fiquei muito curioso sobre a viabilidade de sua
vivência dentro da direção espiritual, mas resolvi fazer uma experiência. Ao longo do tempo,
fui me sentindo mais livre para ser eu mesmo, percebia que isto também fazia bem às pessoas,
porque a relação ficava mais transparente e verdadeira.
Durantes as direções, eu, constantemente, dizia aquilo que estava sentindo no
momento, considerando a situação e a condição do orientando e, percebia que dava certo.
Ouvi inúmeras vezes as pessoas agradecerem esta minha postura, dizendo que gostavam de
uma relação verdadeira, transparente e sem máscaras. A relação de ajuda começou a fluir com
mais sinceridade.
Percebi que era necessário estar inteiro na relação e, por mais que eu tivesse outros
compromissos, era melhor dedicar menos tempo com maior atenção, a dedicar mais tempo
com pressa para terminar. Era necessário dizer ao orientando que precisava terminar ou que
tinha ocorrido algo inesperado que exigia minha presença. Nestes casos, o orientando percebe
que o diretor está sendo verdadeiro e, isto o ajuda a acreditar no diretor espiritual e confiar no
processo de relação de ajuda.
Vale dizer, que o diretor espiritual precisa ser congruente com caridade, ou seja, não
é falar tudo que lhe vem à mente, de qualquer modo, mas dizer o que convém para o bem da
relação e do orientando, sempre de uma forma amorosa e cordial.
176
Lilia Ransan GOUVÊA, Aconselhamento Religioso à luz da teoria de Kierkegaard sobre as estações na
estrada da vida, p.24
80
Se o diretor espiritual não é congruente, o orientando percebe e a relação fica
prejudicada, pois ele percebe que aquilo que está sendo dito não é verdadeiro, uma vez que a
postura do diretor revela esta incongruência.
Do ponto de vista do catolicismo, posso dizer que quanto mais próximo de Jesus o
diretor espiritual estiver, quanto mais a sua vida cotidiana corresponder ao Evangelho, mais a
sua conduta comunicará isto e, esta comunicação se fará por um “transbordamento de amor”.
Vivendo assim, o diretor não precisará ensaiar ou temer suas atitudes, porque toda a sua vida
corresponderá ao amor de Deus.
A congruência é uma atitude constante nas relações de Jesus. Ele sempre se mostrou
autêntico, não escondendo seus sentimentos e apresentando seus pensamentos com
transparência.
Jesus não forjava assertivas para agradar aos outros, nem para evitar futuros
problemas, mas sempre assumiu sua vida e sua missão, com todas as implicações decorrentes.
Jesus viveu assim porque acreditava que a autenticidade levava a uma conversão
sincera e a falsidade a uma vida mentirosa. Esta atitude autêntica cria um clima de confiança e
verdade na relação.
Na direção espiritual, ser congruente significa comunicar ao orientando o que o
diretor é de fato. Portanto, o empenho maior do diretor espiritual não deve estar voltado para a
forma da comunicação, mas para a melhor maneira de ser, pois quando ele é um homem da
caridade, que escolhe a congruência como atitude fundamental, ele anuncia o amor de Deus
com sua própria vida.
4.4.3. Empatia
A atitude empática, proposta pelo aconselhamento psicológico aponta a importância
do conselheiro em não apenas conhecer os problemas da pessoa que pede sua ajuda,
mas sim que os compartilhe com ela, que entenda como ela reagiu e sentiu o
que passou, as atitudes que tomou e o que resultou disso tudo para ela. Não
basta observar o que acontece, é preciso se colocar no lugar do cliente para
perceber seu mundo, senti-lo como se fosse seu, porem, sem perder o próprio
referencial. Procurar sentir o mesmo que o cliente sentiu, ódio, amor, raiva,
como se fossem seus próprios sentimentos, porém sem confundi-los com seu
próprio ódio, amor e raiva.
177
177
Melissa Guerrera LARRABURE, Semelhanças e diferenças entre o atendimento psicológico e o atendimento
religioso: “os últimos passos de um homem”, p.17
81
A empatia foi uma das atitudes que mais contribuiu para a minha pratica de direção
espiritual, mas também a mais difícil de ser aceita e vivenciada.
Colocar-se no lugar do outro para entender a partir dele, no início, soava-me como
algo estranho. Eu acreditava que na direção espiritual, o diretor tinha que entender o que se
passava com o outro, com base na sua própria experiência e no Evangelho.
Em função disto, na minha prática, quase não ouvia, ficava tentando interpretar o
caso e aguardando a minha vez de falar para apresentar alguma solução. Esta obrigação de ter
que encontrar sempre uma resposta para toda problemática apresentada, me deixava tenso e,
nem sempre trazia resultados para a vida do orientando.
Com muita luta interior, comecei a tentar compreender empaticamente cada
orientando, tentando me colocar no lugar dele, para entender o que ele sentia naquela
determinada situação, levando em conta suas impressões e sentimentos.
Fui notando que quanto mais forte era a minha atitude empática, quanto mais eu saia
de mim e de meus referenciais, deixando-os de lado momentaneamente, para me colocar no
lugar do outro e entendê-lo, a partir de seu contexto e de seus referenciais, mais eu conseguia
entender a vida do orientando que, por sua vez, sentia-se mais acolhido e valorizado.
Entender os significados que o próprio orientando atribui às suas experiências, torna
o diretor espiritual mais apto para ajudá-lo, pois possibilita uma melhor compreensão da vida
do orientando, de seus problemas e anseios.
O conceito cristão de compaixão aproxima-se desse contexto, pois compaixão
significa “sofrer com” o outro e, para isto, é necessário colocar-se no lugar daquele que sofre
para entender seu sofrimento e ajudá-lo.
Na vida cristã, compreender empaticamente auxilia na superação do egoísmo, pois
possibilita sair do seu próprio mundo interior, para tentar conhecer o mundo do outro,
percebendo seus sofrimentos e necessidades. Significa reconhecer a singularidade do
orientando e valorizar sua história de vida, colocando-se no lugar dele, de modo que, seus
sentimentos ressoem no diretor espiritual.
A compreensão empática permite uma liberdade maior à experiência do orientando,
pois quando ela é valorizada, ele percebe que aquilo que está narrando é importante e pode
continuar a ser experenciado.
82
A partir da busca de me colocar em uma atitude empática, passei a observar no
Evangelho a maneira como Jesus se relacionava com as pessoas e reconheci, por diversas
vezes, a sua atitude empática.
Colocando-se no lugar das pessoas, ouvindo seus anseios e compartilhando os
sentidos das experiências com aqueles que o procuravam, Jesus, em muitos momentos, sentiu
compaixão, chegando a chorar diante do sofrimento alheio. Ele não era indiferente ao
sofrimento humano, mas se colocava no lugar de cada pessoa, entendendo a partir do outro,
para depois poder ajudá-lo.
A empatia é uma atitude de humildade, pois necessita reconhecer que o diretor
espiritual não é o centro das atenções e que, o orientando é importante e o sujeito na relação.
No Evangelho, em algumas passagens da vida de Jesus, sua atitude empática fica
clara. Após a sua morte, muitos discípulos estavam tristes e desconsolados porque
acreditavam que toda a missão de Cristo tinha terminado na cruz. Após sua ressurreição, Jesus
se encontra no caminho de Emaús, com dois discípulos que voltavam para casa,
tremendamente tristes com o ocorrido.
178
Jesus “põe-se com eles a caminho”.
179
Estar junto é a primeira necessidade para
uma compreensão empática na esfera da direção espiritual. Jesus torna-se um com eles,
colocando-se em situação de igualdade, como um amigo interessado no problema do outro.
Na sequência, pergunta aos discípulos sobre o que estavam falando e dá a
oportunidade para que eles relatem suas experiências segundo as suas próprias impressões.
Jesus já conhecia todos os fatos, pois ele mesmo os tinha vivido, mas colocou tudo isto de
lado, entre parênteses, para deixar emergir da experiência dos discípulos seus sentimentos e
significados.
Interessante frisar que Jesus pergunta por duas vezes sobre o ocorrido, para que eles
pudessem falar tudo o que quisessem, sem interrupções. Só depois que os ouviu e os
compreendeu empaticamente, Jesus passou a explicar as Escrituras e em seguida desapareceu,
para que os discípulos pudessem tirar suas próprias conclusões e entender o que tinha sido
explicado.
178
Cf.Lc 24,13-35
179
Lc 24,15
83
O diretor espiritual é convidado, no primeiro momento, a ouvir o que está sendo
relatado, deixando em suspenso momentaneamente seu ponto de vista, colocando-se no lugar
do outro para efetivamente deixar emergir seus significados, reconhecendo-os e
compartilhando-os com o orientando.
O diretor espiritual precisa colocar–se no lugar do outro para tentar entender e sentir
como se fosse o orientando, mas sem identificar-se com os sentimentos e problemas do
orientando e sem tomá-los para si.
Percebi que este tipo de compreensão habilita o diretor para entender melhor cada
orientando e permite que cada relação de ajuda seja única e eficaz, segundo os sentimentos e
as necessidades de cada orientando.
A compreensão empática desperta no orientando um sentimento de valorização
pessoal e de agradecimento ao diretor que o compreende e o valoriza.
“Não existe nada que abale tanto o homem, abale a ponto de provocar o sentimento
de entrega total, quanto ser descoberto e compreendido”.
180
4.4.4. Escuta
Elemento fundamental para a relação de ajuda é a escuta sincera e interessada.
Entender a escuta como um elemento curativo na relação de ajuda foi um dado transformador
na minha prática de direção espiritual, pois eu entendia que direção espiritual era
essencialmente a fala do diretor e que, no máximo, a escuta servia para avaliar o problema do
orientando. Constatei que, em muitos casos, o diretor espiritual não escuta o orientando,
simplesmente aguarda sua vez de falar.
Escutar significa confiar e acreditar na experiência do outro. O diretor espiritual só
conhece e entende a experiência do orientando se o escuta. Para mim, admitir que a própria
escuta é curativa foi algo muito difícil. Em muitos momentos, me sentia como se eu não
quisesse ou não soubesse aconselhar. Afinal, eu acreditava que o diretor espiritual exercia seu
papel quando falava e não quando ficava escutando.
180
Luigi GIUSSANI, O caminho para verdade é uma experiência, p.119
84
Ao longo da prática, fui percebendo que a escuta me ajudava a entender melhor a
vida do orientando e, em muitos casos, o que o orientando mais precisava era falar da sua vida
e sentir-se ouvido e valorizado.
Muitas vezes, a minha escuta permitia que os próprios orientandos, ao verbalizarem
as suas necessidades e anseios, encontrassem à melhor resposta para a situação em que
estavam vivendo. Mais do que isto, permitia que eu conseguisse perceber a voz de Deus que
falava ao seu coração.
Com o tempo, fui percebendo que aquilo que em um primeiro momento, eu
considerava falta de preparo da minha parte, se configurava como um grande instrumento de
valorização do outro e de sua experiência de vida.
Constatei que na medida em que o orientando percebe que está sendo ouvido, ele
sente-se mais amado e isto provoca mudanças em sua vida.
Hoje posso dizer, que sem escuta não há relação de ajuda, pois só podemos ajudar a
quem conhecemos e, é só através de uma escuta sincera e interessada que entendemos a
pessoa e podemos ajudá-la.
Escutar com interesse faz com que a pessoa sinta-se protagonista na relação. Através
da escuta, percebi que não há soluções iguais para pessoas diferentes e, que para cada pessoa
há uma maneira de lidar específica. Escutar de maneira interessada significa reconhecer a
singularidade e a dignidade de cada pessoa humana.
Em alguns casos, as pessoas me relatavam situações que não possuíam características
ligadas à dimensão espiritual, como por exemplo, problemas de relacionamento, traumas e
medos, enfim, problemas psicológicos que eu não tinha preparo para lidar.
Antes desta pesquisa, tinha dificuldades para lidar com esta situação, eu a entendia e
tratava como sendo uma forma de desabafo, mas sentia que em alguns casos, as pessoas
esperavam algo a mais de mim.
A partir das leituras e discussões sobre o aconselhamento psicológico, fui
percebendo, nestes casos, a necessidade de perguntar ao orientando porque ele procurava um
padre para este tipo de demanda e no que eu poderia ajudá-lo.
85
Pode-se dizer que esta atitude do conselheiro “propicia ao cliente configurar com
mais clareza seu pedido de ajuda – ainda que isso não mude sua perspectiva. Trata-se de
facilitação à clarificação de sua demanda; o que equivale a dizer, clarificação de seu eu que
está em um certo movimento de busca”.
181
Passei a agir deste modo e, as respostas foram as mais variadas possíveis. Alguns
chegavam, por conta própria, à conclusão de que precisavam buscar outro tipo de ajuda, pois
eu não estava habilitado a ajudá-lo em uma demanda especificamente psicológica. Outros
tomavam consciência das próprias necessidades, me pedindo uma benção ou uma orientação
sobre a vontade de Deus para aquela determinada situação.
Em todos os casos, esta pratica me ajudou a realizar a direção espiritual de um modo
mais condizente com a necessidade de cada orientando.
4.4.5. Envolvimento existencial e distanciamento reflexivo
Constatei que os dois movimentos propostos pela psicologia, de envolvimento
existencial e distanciamento reflexivo auxiliam na direção espiritual.
Em um primeiro momento, o diretor escuta com atenção e compaixão, sendo sempre
afetado pelas experiências narradas, e precisa mostrar isto ao orientando. Após este
envolvimento, o diretor pode realizar o distanciamento reflexivo para explicar, o que
considerar necessário, à luz das Sagradas Escrituras e da Tradição da Igreja, e deixar que o
orientando tire suas próprias conclusões.
Todavia, não pode assumir o problema e tentar resolvê-lo no lugar do orientando,
precisa se distanciar para refletir sobre o que foi dito, entender e buscar a melhor forma para
ajudar.
181
Miguel MAHFOUD, A vivência de um desafio: plantão psicológico, in Rachel Lea ROSENBERG (Org.),
Aconselhamento psicológico centrado na pessoa, p.83.
86
AFIRMAÇÕES FINAIS
Para concluir, posso dizer que as reflexões que desenvolvi a partir das leituras e
discussões foram sendo aplicadas e apropriadas à minha prática de direção espiritual e, eu fui
percebendo mudanças concretas no processo e nos resultados alcançados. Percebi, também,
que a minha maneira de compreender e de fazer direção espiritual foi mudando influenciada
por esta pesquisa.
Constatei que o diretor espiritual é um instrumento que precisa confiar no orientando
a fim de deixar emergir suas capacidades, para que ele possa, com o auxílio da graça de Deus,
chegar às suas conclusões e tomar suas próprias decisões.
O diretor espiritual precisa preparar o orientando para a sua ausência, para que o
próprio orientando possa seguir seu caminho.
Ao longo da pesquisa, pude notar que o processo de direção espiritual foi se tornado
mais livre, menos truncado de interrupções da minha parte. Fiquei mais tranquilo, porque me
sentia desobrigado de conhecer sempre uma solução para tudo, permitindo que toda relação
de ajuda fosse única.
A possibilidade de vivenciar cada relação de maneira inesperada passou a me
fascinar, pois eu não sabia o que eu iria encontrar, então eu não precisava ter respostas
prontas. O processo acontecia naturalmente e com uma dinâmica própria e o orientando por
sua vez, sentia-se livre, confiante e valorizado por alguém que lhe dava atenção.
Consequentemente mudava a visão que algumas pessoas tinham de Deus, pois as
pessoas identificam a imagem de Deus que não vêem ao diretor que vêem. Um diretor
acolhedor e empático faz com que as pessoas também vejam Deus deste modo.
Mudava também a visão de algumas pessoas sobre a religião católica, que para
alguns era uma religião de preceitos e julgamentos, passava a ser um local de encontro,
partilha e amor, espaço fraterno de comunhão consigo mesmo, com Deus e com os outros.
No início desta pesquisa, eu acreditava que o importante na relação de ajuda
espiritual era que o diretor espiritual fosse um perito em espiritualidade e isto bastava. Hoje,
acredito que além da necessidade da perícia, as pessoas necessitam de um amigo de fé e um
companheiro de caminhada na vida espiritual.
87
Verifiquei, na prática, que a psicologia exerce um papel importante na vida do
homem, mas não substitui a experiência espiritual, porque o aconselhamento psicológico e a
direção espiritual transitam por dois campos distintos de atuação que podem conviver
harmoniosamente numa relação de complementaridade.
Atendi pessoas em direção espiritual que já faziam ou que, por indicação minha,
passaram a fazer aconselhamento psicológico, realizando um trabalho simultâneo entre a
direção espiritual e o aconselhamento psicológico e os resultados foram muito significativos.
Neste momento, a vontade que tenho é de continuar estudando psicologia e
incentivar que outros o façam, talvez na área da psicopatologia, pois os conhecimentos em
psicologia são muito mais amplos que os abarcados somente pelo aconselhamento psicológico
na abordagem centrada na pessoa e, a continuidade deste estudo pode propiciar um maior
enriquecimento para a prática da direção espiritual.
Posso dizer que este trabalho de pesquisa me ajudou a conhecer melhor o ser humano
e acreditar ainda mais no catolicismo, pois percebi que a psicologia e a religião podem
assumir um papel de complementaridade, no qual uma não exclui a outra e cada uma delas é
convidada a percorrer o seu próprio campo de atuação, auxiliando o ser humano naquilo que
lhe cabe.
Enfim, sou grato por esta dissertação que me possibilitou aventurar-me fora da minha
área de atuação, conhecer a beleza do diálogo interdisciplinar e perceber que toda ciência
humana existe para estar a serviço do homem.
88
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AGOSTINHO, Santo. Confissões. Trad. Maria Luiza Jardim Amarante. 16 ed. São Paulo:
Paulus, 2003.
ALETTI, Mario. “Processi psicologici e accompagnamento spirituale: specificità e
interazioni”. In: BRAMBILLA, F.G; ALETTI, M; ANGELINI, M.I; MONTANARI,A.
Accompagnamento spirituale e Intervento Psicologico: interpretazioni. Milano: Glossa, 2008,
pp. 11-48.
AMATUZZI, Mauro Martins. O resgate da Fala Autêntica: Filosofia da Psicoterapia e da
Educação. Campinas: Editora Papirus, 1989.
ANCONA LOPEZ, Marília. “A espiritualidade e os psicólogos”. In: AMATUZZI, Mauro
Martins (Org.). Psicologia e Espiritualidade. São Paulo: Paulus, 2005, pp.147-159
_________. “Religião e psicologia clínica: quatro atitudes básicas”. In: MASSIMI, Marina;
MAHFOUD, Miguel (org.). Diante do mistério. São Paulo: Loyola, 1999, pp.71-86.
AUER, Johann; RATZINGER, Joseph. Curso de Teologia Dogmática: Tomo III El mundo
creación de Dios. 2 ed. Barcelona: Herder,1985.
BARRY, William A. A direção espiritual e o encontro com Deus: Uma indagação teológica.
Trad. Barbara Theoto Lambert. São Paulo: Edições Loyola, 2005.
BARRY,William A.;CONNOLLY,William J. A prática da direção espiritual. Trad.Gulnara
Lobato de Morais Pereira. 3 ed. São Paulo: Loyola,1999.
BENJAMIN, Alfred. A entrevista de Ajuda Trad. Urias Corrêa Arantes. 1.ed. brasileira:
1978. São Paulo: Livraria Martins Fontes Editora Ltda.
BENTO XVI. Carta Encíclica Deus é amor. São Paulo: Loyola, 2006.
_________. Carta Encíclica sobre a esperança cristã. São Paulo: Loyola, 2008.
_________. Carta do Papa sobre a remissão da excomunhão aos bispos ordenados por Dom
Lefebvre. 12/03/2009. Disponível em: <www zenit.org/article-21042?I = portuguese.
BERNARD, André Charles. Introdução à Teologia Espiritual. Trad. Pier Luigi Cabra. São
Paulo: Loyola, 1999.
BETTENCOURT, Pe. Estêvão Tavares. Curso por correspondência: Curso de Antropologia
Teológica (criação e pecado). Rio de Janeiro: Escola Mater Ecclesiae,1997.
89
BÍBLIA SAGRADA. 173 ed. São Paulo: Editora Ave Maria, 2006.
BOAINAIN JR, Elias. Tornar-se transpessoal: transcendência e espiritualidade na obra de
Carl Rogers. São Paulo: Summus, 1999.
BROWNING,D.S & COOPER, T.D. Self-Actualization and Harmony in Humanistic
Psychology. Religious Thought and the Modern Psychologies. 2.ed. Minneapolis: s. ed, 2004.
CAMARGO, Ismênia de. “A formação do conselheiro”. In: ROSENBERG, Rachel Lea
(Org.). Aconselhamento psicológico centrado na pessoa. São Paulo: EPU, 1987. pp. 53-59
CATECISMO DA IGREJA CATÓLICA. São Paulo: Vozes, 1993. nº 2352
CÓDIGO DE DIREITO CANÔNICO. Tradução CNBB. 2. ed. São Paulo: Loyola, 2002.
CONGREGAÇÃO PARA A EDUCAÇÃO CATÓLICA. Orientação da Santa Sé sobre
psicologia e seminaristas - 2008. Disponível em: <www zenit.org/article-20134?I
=portuguese>. Acesso em: 23.11.2008.
CONSTITUIÇÃO DOGMÁTICA DEI VERBUM, 1965 In: Compêndio Vaticano II. 29
ed. Petrópolis: Vozes, 2000, pp. 121-139
CONSTITUIÇÃO DOGMÁTICA LUMEN GENTIUM, 1964 In: Compêndio Vaticano II.
29 ed. Petrópolis: Vozes, 2000, pp. 39-113
CONSTITUIÇÃO PASTORAL GAUDIUM ET SPES, 1965. In: Compêndio Vaticano II.
29 ed. Petrópolis: Vozes, 2000, pp.143-256
CORTI, Renato; Moioli, GIOVANNI ; SERENTHÁ, Luigi. A direção espiritual hoje:
Discernimento cristão e comunicação interpessoal. Trad. Alda da Anunciação Machado. São
Paulo: Paulinas, 1990.
FARRIS, James Reaves. “Aconselhamento psicólogo e espiritualidade”. In: AMATUZZI,
Mauro Martins (Org.). Psicologia e Espiritualidade. São Paulo: Paulus, 2005, pp. 161-172
FORGHIERI, Yolanda Cintrão. Aconselhamento Terapêutico: Origens, Fundamentos e
prática. São Paulo: Editora Thomson, 2007.
GAMARRA, Saturnino. Teología Espiritual. 2. ed. Madrid: Biblioteca de autores Cristianos,
2006.
GIORDANI, Bruno. Encuentro de Ayuda Espiritual. Trad. Jesús Morera. Madrid: Sociedad
de Educacion Atenas, 1985.
90
_________. La relación de ayuda: de Rogers a Carkhuff. Trad. Carlota Boyer Bergese.
Bilbao: Desclée de Brouwer, 1997.
GIOVANETTI, João Paulo. “Psicologia e existencial e espiritualidade”. In: AMATUZZI,
Mauro Martin (Org.). Psicologia e Espiritualidade. São Paulo: Paulus, 2005, pp.129-145
GIUSSANI, Luigi. O caminho para verdade é uma experiência. Trad. Neófita Oliveira e
Giovanni Vecchio. São Paulo: Companhia Ilimitada, 2006.
GOUVÊA, Lilia Ransan. Aconselhamento Religioso à luz da teoria de Kierkegaard sobre as
estações na estrada da vida. São Paulo, 2003, 100 p. Dissertação (Mestrado em Psicologia
Clínica) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.
GRUMMON, Donald L. “Teoria centrada no cliente”. In: STEFFLRE, Buford; GRANT,
Harold W.(org) Teorias de aconselhamento .Trad. Erothildes M. Barros da Rocha. Recife.
Editora Mcgraw-hill do Brasil, 1976, pp. 65-124
GUSDORF, Georges, “Reflexions sur l’interdisciplinarité Bulletin de Psychologie”, XLIII,
397, In: MENDOÇA, Maria Emilia. A psicomotricidade e a educação somática à luz da
psicanálise winnicottiana. São Paulo, 2007, 256 p. Tese (Doutorado em Psicologia Clínica) –
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.
HOUDEK, Frank J. Guiados pelo Espírito: Direção espiritual em perspectiva inaciana.
Trad. Barbara Theoto Lambert. São Paulo: Loyola, 2000.
JOÃO PAULO II. Carta Encíclica Fé e Razão. 2 ed. São Paulo: Loyola, 1998.
_________. Carta Encíclica O Esplendor da Verdade, São Paulo: Paulinas, 1993.
_________. Homem e mulher o criou: catequeses sobre o amor humano. PETRINI, João
Carlos; SILVA, Josafá Menezes da (Orgs). Bauru: Edusc, 2005.
JORDÃO, Marina Pacheco. “Reflexões de um terapeuta sobre as atitudes básicas na relação
terapeuta-cliente”. In: ROSENBERG, Rachel Lea (Org). Aconselhamento psicológico
centrado na pessoa. São Paulo: EPU, 1987, pp.45-52
LAIRD, Rebecca J. “Como encontrar um diretor espiritual”. In: Direção espiritual:
Sabedoria para o caminho da fé. Trad. Daniela Barbosa Henriques. Petrópolis:Vozes, 2007,
pp.197-203.
LARRABURE, Melissa Guerrera. Semelhanças e diferenças entre o atendimento psicológico
e o atendimento religioso: “os últimos passos de um homem”. São Paulo, 2003, 53 p.
91
Dissertação (Mestrado em Psicologia Clínica) – Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo.
MAHFOUD. Miguel. “A vivência de um desafio: plantão psicológico”. In: ROSENBERG,
Rachel Lea (Org). Aconselhamento psicológico centrado na pessoa. São Paulo: EPU, 1987,
pp.75-83
MENDONÇA, Maria Emilia. A psicomotricidade e a educação somática à luz da psicanálise
winnicottiana. São Paulo, 2007, 256 f. Tese (Doutorado em Psicologia Clínica) - Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo.
MONDONI, Danilo. Teologia da Espiritualidade Cristã. 2ed. São Paulo: Edições Loyola,
2002.
MORATO, Henriette Tognetti Penha. “Abordagem centrada na pessoa: teoria ou atitude na
relação de ajuda?” in: ROSENBERG, Rachel Lea (Org.). Aconselhamento psicológico
centrado na pessoa. São Paulo: EPU, 1987, pp.24-44
MORO, Ulpiano Vasquez. A orientação espiritual: mistagogia e teografia. São Paulo:
Edições Loyola, 2001.
NOUWEN, Henri. Direção espiritual: Sabedoria para o caminho da fé. Trad. Daniela
Barbosa Henriques. Petrópolis:Vozes, 2007.
ROGERS, Carl R. Tornar-se Pessoa. Trad. Manuel José do Carmo Ferreira. Lisboa: Moraes
editores, 1970.
__________. Um jeito de ser. Trad.Maria Cristina Machado Kupfer, Heloísa Lebrão e Yone
Souza Patto. São Paulo: EPU, 1983.
__________, Kinget, G. Marian. Psicoterapia e Relações Humanas: Teoria e Prática da
Terapia Não-Diretiva. Trad. Maria Luisa Bizotto. Belo Horizonte: Interlivros,1975.
ROGERS ,Carl R.; STEVENS, Barry. De pessoa para pessoa: O problema de Ser Humano
- uma nova tendência na psicologia. 2ed. São Paulo: Livraria Pioneira Editora, 1978. Trad.
Miriam L. Moreira Leite e Dante Moreira Leite.
RUDIO, Franz Victor. Orientação não-diretiva na educação, no aconselhamento e na
psicoterapia. 14 ed. Petrópolis: Editora Vozes, 2003.
SCHEEFFER, Ruth. Aconselhamento Psicológico: teoria e prática. 6. ed. São Paulo: Atlas,
1976
__________.Teorias de Aconselhamento. São Paulo: Atlas, 1976
92
SCHMIDT, Maria Luisa Sandoval. “Aconselhamento psicológico: questões introdutórias”.
In: ROSENBERG, Rachel Lea (Org). Aconselhamento psicológico centrado na pessoa. São
Paulo: EPU, 1987, pp.14-23
SCIADINI, Frei Patrício. A pedagogia da Direção Espiritual. São Paulo: Edições Loyola,
2006.
__________.O que é, como se faz direção espiritual. São Paulo: Edições Loyola, 2008.
SOUZA, Lizete Quelha De. A Abordagem centrada na pessoa e a experiência religiosa: uma
discussão da relação Eu-Tu como fator de transcendência na psicoterapia. São Paulo, 2002,
96p. Dissertação (Mestrado em Psicologia Clínica) – Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo.
SZENTMÁRTONI, Mihály. Caminhar juntos: Psicologia pastoral. Trad. Anna Maria
Pareschi Capovilla. São Paulo: Loyola, 2006.
TERESA DE CALCUTÁ, Madre. “Carta de Madre Teresa para o padre Don Kribs – 1974”.
In: KOLODIEJCHUK, Brian. Madre Teresa venha, seja minha luz. Trad. Maria José
Figueiredo. Rio de Janeiro: Thomas Nelson Brasil, 2008.
THORNE, Brian; MEARNS, Dave. La terapia centrada en la persona hoy: Nuevos avances
en la teoria y en la prática. Trad. Susana Gorbeña Etxebarría e Manuel Marroquín Pérez.
Bilbao: Desclée de Brouwer, 2003.
Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download:
Baixar livros de Administração
Baixar livros de Agronomia
Baixar livros de Arquitetura
Baixar livros de Artes
Baixar livros de Astronomia
Baixar livros de Biologia Geral
Baixar livros de Ciência da Computação
Baixar livros de Ciência da Informação
Baixar livros de Ciência Política
Baixar livros de Ciências da Saúde
Baixar livros de Comunicação
Baixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNE
Baixar livros de Defesa civil
Baixar livros de Direito
Baixar livros de Direitos humanos
Baixar livros de Economia
Baixar livros de Economia Doméstica
Baixar livros de Educação
Baixar livros de Educação - Trânsito
Baixar livros de Educação Física
Baixar livros de Engenharia Aeroespacial
Baixar livros de Farmácia
Baixar livros de Filosofia
Baixar livros de Física
Baixar livros de Geociências
Baixar livros de Geografia
Baixar livros de História
Baixar livros de Línguas
Baixar livros de Literatura
Baixar livros de Literatura de Cordel
Baixar livros de Literatura Infantil
Baixar livros de Matemática
Baixar livros de Medicina
Baixar livros de Medicina Veterinária
Baixar livros de Meio Ambiente
Baixar livros de Meteorologia
Baixar Monografias e TCC
Baixar livros Multidisciplinar
Baixar livros de Música
Baixar livros de Psicologia
Baixar livros de Química
Baixar livros de Saúde Coletiva
Baixar livros de Serviço Social
Baixar livros de Sociologia
Baixar livros de Teologia
Baixar livros de Trabalho
Baixar livros de Turismo