Assim, de acordo com Marcuschi (1991: 52), compreender
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um texto não significa
memorizá-lo, muito menos, apreender os seus significados literais. Na verdade, para
compreender um texto, o leitor precisa fazer uma série de inferências, que são comandadas
por um conjunto de fatores que fazem com que um texto seja um texto, e não apenas uma
sequência de frases. Compreender é, ao mesmo tempo, buscar novos significados,
enriquecer-se e apreender as várias possibilidades sociais indicadas no texto. Barthes
(1980: 11-3) apud Dell’Isola (2001: 38) pressupõe que
Interpretar um texto não é dar-lhe um sentido (mais ou menos
fundamentado, mais ou menos livre), é, pelo contrário, apreciar o plural de que
ele é feito. Suponhamos a imagem de um plural triunfante, que não
empobreceria nenhuma obrigatoriedade de representação (de imitação). Nesse
texto ideal, as redes são múltiplas e jogam entre si sem que nenhuma delas
possa encobrir as outras; esse texto é uma galáxia de significantes e não uma
estrutura de significados; não há um começo: ele é reversível; acedemos ao
texto por várias entradas sem que nenhuma delas seja considerada principal; os
códigos que ele mobiliza perfilam-se “a perder de vista”, são indecidíveis (o
sentido nunca é aí submetido a um princípio de decisão, a não ser por uma
jogada de sorte); os sistemas de sentido podem apoderar-se desse texto
inteiramente plural, mas o seu número nunca é fechado, tendo por medida o
infinito da linguagem.
Nessa perspectiva, interpretar um texto não é apenas dar um sentido a ele, mas
perceber a sua plurissignificação. E, para chegar ao núcleo, ou seja, a um dos possíveis
sentidos indicados pelo texto, o ouvinte/leitor deverá utilizar vários sistemas de
conhecimento e ativar processos e estratégias cognitivas e interacionais.
Portanto, como afirma Kerbrat-Orecchioni (1986: 299)
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, para interpretar um texto é
preciso combinar as informações extraídas do enunciado (competência linguística) e certas
informações que fazem parte do repertório cultural do sujeito interpretante (competência
enciclopédica), de tal modo que a interpretação esteja de acordo com as leis do discurso
(competência retórico-pragmática) e com os princípios da lógica natural (competência
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Nesse parágrafo, compreender está sendo utilizado como sinônimo de interpretar. Mantivemos o termo
compreender, respeitando as ideias do autor. Neste trabalho, entendemos que é no nível da interpretação que
o leitor busca novos significados.
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Original em francês: “D’une manière générale, le travail interprétatif consiste, en combinant les
informations extraites de l’énoncé (compétence linguistique) et certaines informations dont on dispose
‘préalablement’ (compétence encyclopédique), et de telle sorte que le résultat se conforme aux lois de
discours (compétence rhétorico-pragmatique) et aux príncipes de la logique naturelle (compétence logique),
à construire de l’énoncé une représentation sémantico-pragmatique cohérente et vraisemblable: (...)”. (p.
298).