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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
INSTITUTO DE PESQUISAS HIDRÁULICAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM RECURSOS HÍDRICOS E SANEAMENTO
AMBIENTAL
COBRANÇA POR VOLUME EM SISTEMAS COLETIVOS DE IRRIGAÇÃO
COMO INSTRUMENTO DE GESTÃO DA ÁGUA
FERNANDO SETEMBRINO CRUZ MEIRELLES
TESE DE DOUTORADO
Porto Alegre, julho de 2009.
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
INSTITUTO DE PESQUISAS HIDRÁULICAS
COBRANÇA POR VOLUME EM SISTEMAS COLETIVOS DE IRRIGAÇÃO
COMO INSTRUMENTO DE GESTÃO DA ÁGUA
FERNANDO SETEMBRINO CRUZ MEIRELLES
Tese realizada sob a orientação do
Prof. Dr.Joel Avruch Goldenfum
apresentada ao Programa de Pós-Graduação em
Recursos Hídricos e Saneamento Ambiental da
Universidade Federal do Rio Grande do Sul,
em preenchimento parcial dos requisitos para a
obtenção do título de Doutor em Recursos Hídricos e
Saneamento Ambiental.
PORTO ALEGRE
2009
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i
À minha pequena família,
Célia, Pedro e Lúcia,
meu norte, meu leste e meu oeste,
meu alfa e meu ômega.
ii
AGRADECIMENTOS
muitos agradecimentos a serem feitos, pois muitos viabilizaram ou
contribuíram para a realização deste trabalho, de forma direta ou indireta.
Devo, inicialmente, agradecer à CAPES, que possibilitou o estágio na
Universidade de Évora, por meio do PDEE.
Em Évora, o apoio e a amizade do Prof. Dr. Manuel Rijo foram fundamentais,
mais do que a séria e competente orientação técnica. Sem ele, não teria contatado os
gestores dos perímetros irrigados, que nos receberam e aceitaram ser entrevistados,
fornecendo detalhes de gestão e de rentabilidade, nem sempre fáceis de serem obtidos. Na
pessoa do Prof. Rijo, agradeço a todo o Departamento de Engenharia Rural.
Outro apoio fundamental foi o do Sr. Condessas, dedicado técnico do laboratório
de hidráulica da Universidade de Évora, que participou de todas as experiências no canal
de vidro. Também contei com o apoio do Sr. Valério, das oficinas, que confeccionou as
hastes e os tubos utilizados, além de consertar o canal do NHUCC. Nas pessoas deles,
agradeço o apoio dos técnicos da Universidade de Évora.
Em terras gaúchas, pessoas ligadas ou não ao IPH. Destas, destaco o
Engenheiro Agrônomo Joaquim Carriconde Filho, gestor do distrito de irrigação do
Chasqueiro, e o Prof. Alvaro Franz, da Universidade Federal de Pelotas, que apoiaram a
realização dos ensaios de campo em Arroio Grande. Sem estes, não haveria possibilidade
de conclusão do trabalho.
Outras duas pessoas fundamentais foram os alunos de mestrado do Programa de
Pós-Graduação em Economia da UFRGS, Marianne Stampe e Magnus Nehme, que
aceitaram o meu desfio de trabalhar com água e receber a minha orientação na execução
das pesquisas realizadas nas bacias dos rios Gravataí e Quaraí, que permitiram validar
metodologias de valoração da água.
Dentro do IPH, devo, inicialmente, agradecer o apoio do Departamento de
Hidromecânica e Hidrologia, que permitiu que eu dedicasse o tempo necessário à
conclusão do doutorado, mesmo com uma interrupção dos três anos em que assumi a Pró-
Reitoria de Extensão da UFRGS.
À coordenação do PPGRHSA, nas pessoas do Prof. Andre Silveira e de Nadir
Bueno, que compreenderam as peculiaridades de um aluno não bolsista e com atividades
administrativas conjuntas com o período do doutorado.
iii
Dentre os docentes do IPH, quero agradecer à primeira acolhida de Paulo Kroeff e
Luiz Augusto Endres e à orientação final de Joel Avruch Goldenfum, parceiro de tempos
remotos, e de José Antônio Saldanha Louzada, colega do Setor de Água e Solo, com quem
discuti as últimas versões finais trabalho.
Aos colegas Marcelo Marques, Luiz Endres, Nara Rosauro, Edith Beatriz
Schettini, Ana Luiza Borges, Rogério Maestri e Alexandre Beluco, agradeço o apoio nas
questões hidráulicas e pelo tempo de utilização dos laboratórios.
Aos colegas Edith Beatriz Schettini e Walter Collischonn, pela confiança
depositada na execução do tema econômico do projeto TwinLatin, que possibilitou a
obtenção de informações e ensaio de metodologias na bacia do rio Quaraí.
Ao Antônio Eduardo Lanna, pelas discussões econômicas e empréstimo de
bibliografia sobre o tema de análise de projetos.
Aos amigos Lawson Beltrame e Alfonso Risso, pelo apoio, conversas e parcerias
ao longo deste período.
Ainda dentro do IPH, um agradecimento especial aos técnicos em hidrologia que
participaram do estudo, em suas diferentes etapas. Joelma Murliki e Fabiana da Cunha
Lagoas apoiaram os ensaios em laboratório; Israel Diego Pinho Martins e Lucas Dalsotto,
os experimentos em campo, tanto em Viamão como em Arroio Grande. Mas certamente
este estudo não teria sido realizado se não fosse pela inteligência e perspicácia do geógrafo
e técnico em hidrologia Agustin Miguel Sanchez y Vacas, responsável pela instalação dos
vertedores a campo e pela coleta de dados das estruturas de controle, a quem agradeço de
forma especial.
Ao Marinho e à Fernanda, agradeço o empréstimo da vista do mar da Joatinga e da
calma de Búzios, onde grande parte desta tese foi escrita.
Finalmente, agradeço à minha esposa Célia, pelo apoio carinhoso, pela
compreensão, pelas fotografias dos experimentos e pela construção do dispositivo de
tranquilização do canal em Portugal e pela paciência ao longo deste estudo.
iv
SUMÁRIO
Página
Lista de Figuras
vi
Lista de Tabelas
x
Resumo
xiii
Abstract
xiv
Apresentação
xv
1. Introdução
1
2. Objetivos
4
3. Justificativa
6
4. Revisão bibliográfica
10
4.1. O princípio usuário-pagador
12
4.2. O valor da água para irrigação
50
4.3. Projetos coletivos de irrigação
64
4.4. Sistemas de distribuição por canais não revestidos
100
4.5. Eficiência da irrigação
111
4.6. Eficiência em sistemas de irrigação
119
4.7. A lavoura de arroz irrigado no Rio Grande do Sul
132
4.8. Sistemas coletivos de irrigação no Rio Grande do Sul
144
4.9. Sistemas de coletivos de irrigação em Portugal
150
4.10. Estudos sobre vertedores e orifícios como medidores de vazão
em canais de irrigação
159
v
4.10.1. Importância da medição de vazão
159
4.10.2. Medidores de vazão
162
4.10.3. Limitantes dos medidores de vazão em canais não revestidos
173
4.10.4. Escoamento em orifícios
175
4.10.5. Estudo sobre vertedores
183
4.10.6. Vertedores de paredes curtas
195
4.10.7. Combinação de vertedor e orifício
199
5. Metodologia
203
5.1. Princípio usuário-pagador
204
5.2. Medidores de vazão em canais de irrigação
209
5.2.1 Ensaios realizados no IPH e no Sistema de Irrigação do Arroio
Chasqueiro
210
5.2.2. Ensaios realizados na Universidade de Évora
216
6. Resultados e discussão
224
6.1. Sobre a aplicação do Princípio Usuário-Pagador
224
6.2. Sobre a medição de vazão
231
6.3. Sobre o medidor IPH
239
7. Conclusão
253
8. Recomendações
261
9. Referências bibliográficas
264
vi
LISTA DE FIGURAS
Figura nº
Título
Página
1.
Componentes do custo total da água
26
2.
Componentes do valor de uso da água
27
3.
Evolução da área irrigada e do volume consumido em função
do valor da taxa de uso da água
47
4.
Redução do consumo de água em função do preço
56
5.
Módulo milanês
84
6.
Módulo de Ribeira
84
7.
Estrutura automática de controle de vazão em canais de
irrigação: regulador com orifícios
85
8.
Módulo de prancha
87
9.
Comando por montante e comando por jusante
89
10.
Possibilidades de combinação entre regulação e comando
90
11.
Seleção do processo de operação de canal de irrigação
97
12.
Variação da profundidade em canais para as situações de
vazão máxima e vazão nula, de acordo com a lógica de
controle
104
13.
Variação de nível em canal de acordo com manobras das
estruturas transversais
104
14.
Esquema de balanço hídrico
117
15.
Balanço hídrico concebido para o projeto da bacia do
Mekong
118
vii
Figura nº
Título
Página
16.
Evolução da área plantada e produtividade da lavoura de
arroz no Rio Grande do Sul 1921-2008
135
17.
Fluxograma para a determinação de demanda
140
18.
Distribuição temporal do volume de irrigação da lavoura de
arroz na bacia do rio Quaraí, RS.
141
19.
Vertedor triangular parede espessa em canal de irrigação
166
20.
Configuração básica de uma calha Parshall
169
21.
Condições hidráulicas de funcionamento de bueiros
171
22.
Orifício afogado em canal
177
23.
Escoamento livre sob uma comporta
179
24.
Escoamento afogado sob uma comporta
180
25.
Escoamento sobre vertedores de parede espessa
184
26.
Desenvolvimento do jato de um vertedor livre
187
27.
Detritos acumulados junto à estrutura de controle em canal
190
28.
Alteração no coeficiente de vazão de acordo com o
afogamento do vertedor
197
29.
Alteração do coeficiente de vazão de acordo com Fawer
200
30.
Vertedor construído com tubos de concreto em canal do
sistema de irrigação do arroio Chasqueiro
212
31.
Colocação de réguas de medição na seção de jusante de uma
estrutura de controle
213
viii
Figura nº
Título
Página
32.
Estrutura de controle do sistema de irrigação do arroio
Chasqueiro, mostrando o volante e o parafuso sem fim. A
comporta da esquerda mostra um vertedor tulipa acoplado,
responsável pela segurança do canal.
214
33.
Ficha de coleta de informações sobre a operação de cada
estrutura do Sistema de Irrigação do Arroio Chasqueiro
215
34.
Canal do Laboratório de Hidráulica da Universidade de Évora
217
35.
Sistema de amortecimento de ondas na entrada do canal
218
36.
Estrutura de ensaio com tubo de diâmetro de 75 mm e haste
de elevação ensaio com uso de solução de permanganato de
potássio
219
37.
Vista geral do canal do NUHCC Canal superior, canal
inferior, comportas planas, tomadas de água e caixa de
sensores de nível.
220
38.
Tubo e escalas de medição colocados no canal trapezoidal
inferior do NUHCC
222
39.
Tubo e escala colocados no canal trapezoidal superior do
NUHCC
223
40.
Amortecimento das ondas provocadas pela over shot gate
223
41.
Valores de vazão específica e nível a montante da estrutura
de controle 2 do Canal C 2.1
232
42.
Valores de vazão específica e nível a montante da estrutura
de controle 4 do Canal C 2.1
232
ix
Figura nº
Título
Página
43.
Comparação entre a vazão específica (l/s.ha) dos controles 2
e 4, Canal C 2.1
233
44.
Valores normalizados de vazão específica e nível de
montante para o canal C2.1, controle 4
234
45.
Valores normalizados de vazão específica e nível de
montante para o canal C2.1, controle 2
235
46.
Vazão específica e nível de montante no bueiro 6 do canal
C1.
237
47.
Valores normalizados para vazão específica e nível a
montante no bueiro 6 do canal C1
238
48.
Limite de utilização da tubulação apoiada no fundo do canal
como um vertedor livre, segundo Bonafé.
242
49.
Relação entre alturas de montante da tubulação estimada e
medida
242
50.
Medição de velocidade com a sonda de Prandtl
245
51.
Relação entre vazão estimada e vazão medida no conjunto
orifício e vertedor com a aplicação da proposta de Akerman e
Martin
246
52.
Relação entre valores de vazão (m³/s) medidos e estimados
com o uso da equação de Ferro
248
53.
Comportamento do erro de estimativa em relação à vazão de
ensaio
252
x
LISTA DE TABELAS
Tabela nº
Título
1.
Instrumentos de gestão de recursos hídricos, abordagem,
critérios, formas de negociação e interlocutores
2.
Governança da água na agricultura, em diferentes níveis
institucionais
3.
Arrecadação por setor usuário de água entre os anos de 2003 e
2005 na bacia do rio Paraíba do Sul, em Reais (R$)
4.
Aplicação do PUP sobre a Região Hidrográfica do Guaíba, RS, e
seu efeito na arrecadação dos recursos necessários à execução do
Plano de Bacia
5.
Classificação de bens quanto à elasticidade-renda
6.
Classificação da demanda quanto à elasticidade-preço
7.
Valores propostos para a cobrança da água de irrigação e a
elasticidade-preço para as bacias hidrográficas do estado da Bahia
8.
Valores referenciais para a água bruta no Ceará
9.
Simulação da aplicação dos valores propostos para a bacia dos
rios Pardo e Pardinho
10.
Variação da renda, da arrecadação estatal, da demanda de mão de
obra e do uso de fertilizantes em função do preço da água
11.
Relação entre a área irrigada anual e a área dominada em
perímetros irrigados
12.
Métodos de distribuição e modos de controle e sua influência nas
variáveis de operação do sistema de canais
13.
Perdas de água em canais não revestidos
xi
Tabela nº
Título
14.
Eficiência de irrigação e consumo de energia de diferentes
métodos de irrigação
15.
Taxas de eficiência global baseada em pesquisas da ICID
16.
Consumo de água, rendimento de grãos, eficiência do uso da
água, início e período de irrigação de diferentes sistemas de
cultivo do arroz irrigado, em dois anos agrícolas
17.
Valores aproximados do consumo de água em lavouras de arroz
18.
Aproveitamentos Hidro-agrícolas em exploração ou em
execução, por região administrativa
19.
Necessidades hídricas anuais do arroz em diferentes regiões
produtoras de Portugal
20.
Arrecadação de recursos no Vale do Sorraia por volume
consumido e por hectare
21.
Valores da taxa de exploração e conservação aplicadas no
perímetro de rega equipado ou áreas próximas do Baixo
Mondego
22.
Valores por unidade de área nos Campos de Pranto (€/aguilhada)
23.
Valores cobrados por área no Vale do Arunca (€/aguilhada)
24.
Variação do valor do coeficiente de descarga C para vertedores
em canais de seção trapezoidal, de acordo com a carga e com a
inclinação dos taludes
25.
Estimativa de perda de água em pontos distintos do Sistema de
Irrigação do Arroio Chasqueiro (l/s.m)
xii
Tabela nº
Título
26.
27.
Resultados obtidos com o uso do medidor IPH no trecho superior
do canal do NUHCC de acordo com a equação de Negm
28.
Ajuste do fator de F da equação de Negm para o canal inferior do
NUHCC
xiii
RESUMO
Um dos instrumentos de gestão que podem elevar a eficiência do uso de recursos hídricos
é a cobrança a partir da aplicação do princípio usuário-pagador. Esta definição aparece nas
propostas dos planos de bacia com diferentes critérios de cobrança, tanto em termos de
valores como de unidade de cobrança. A irrigação é o uso mais importante de água no
mundo, sendo que o atendimento a esta demanda pode ser realizado por um ordenamento
do uso ou da oferta. No Rio Grande do Sul, a irrigação do arroz atinge uma superfície de
cerca de um milhão de hectares e representa praticamente a totalidade do uso da água
anual de algumas bacias, concentrada em poucos meses. Sendo a distribuição da água para
irrigação realizada principalmente por canais em terra não revestidos e de pequena
declividade, a determinação da quantidade de água derivada apresenta limitantes ao uso de
algumas opções correntes, sendo usual a substituição da vazão pela área irrigada como
medida proposta para a cobrança pela água.
O estudo analisa o comportamento de irrigantes frente à implantação da cobrança pelo uso
da água, determinando o valor referencial para a irrigação do arroz em duas bacias
hidrográficas do Rio Grande do Sul e avaliando a aceitação do valor proposto pelo
Instituto Nacional da Água em Portugal. Avalia, também, o efeito da cobrança com a
aplicação de valores superiores aos aceitáveis por parte dos irrigantes.
A partir da experiência portuguesa e de casos citados na bibliografia, verifica-se o
comportamento do irrigante frente à cobrança por área ou por volume, apontando para a
inadequação do parâmetro de superfície irrigada como base da cobrança em termos de
eficiência do uso da água no arroz irrigado.
Sobre sistemas coletivos de irrigação, adotados como campo de pesquisa, testa a
viabilidade de determinação da vazão a partir de estruturas existentes, definindo-se o
comportamento do sistema de distribuição ao longo da safra, a eficiência do operador, a
lógica de controle adotada e a vazão específica em diferentes trechos de um sistema
público de irrigação no Rio Grande do Sul. Confrontando os resultados obtidos, conclui-se
que a estrutura implantada não permite uma gestão eficiente da água.
Como alternativa de determinação de vazão, o estudo apresenta solução simples e
acessível para canais não revestidos, de baixo custo, fácil construção, pequena perda de
carga e nenhuma interferência no transporte de material sólido pela água de irrigação, cuja
precisão é equivalente a obtida com outras estruturas.
xiv
ABSTRACT
One of the management tools that helps to increase the efficiency in the use of
hydrological resources is the charge based in the user/payer principle. This definition can
be found in proposals of basin plans with different charge criteria, both in terms of amount
and charge units. Irrigation is the most important of all water uses in the world, and the
satisfaction of this demand can be obtained through the planning of use or supply. In Rio
Grande do Sul, rice irrigation covers about one million hectares and represents practically
the whole water use of certain basins, concentrated over a few months. With the
distribution of water for irrigation done mainly through underground uncovered channels
with low declivity, the options for determining the amount of derived water are limited,
being common the substitution of water flow for irrigated area as a proposed measure for
the water charge.
This study analyses the irrigant’s behavior face to the implementation of the water
charge, determining the referential value for rice irrigation in two hydrographical basins of
Rio Grande do Sul and evaluating the acceptance of the value proposed by the National
Water Institute of Portugal. Moreover, this study evaluates the effect of the charge with
superior values as the ones accepted by the irrigants. From the Portuguese experience and
the cases referred to in the bibliography, the behavior of the irrigant face to the charge per
area or volume act can be verified, which points out that the parameters of irrigated
surfaces are inadequate in terms of efficiency of water used for the irrigated rice.
As for the collective irrigation systems adopted as a research field, it examines the
viability the determination of flow from the existing structures, defining the performance
of the distribution system throughout the crop, the efficiency of the operator, the logic of
control adopted and the specific flows in different passages of a public irrigation system in
Rio Grande do Sul. By confronting the obtained results, it is possible to conclude that the
applied structure does not allow an efficient management of water.
As an alternative for the calculation of the flow, the study presents a simple and
accessible solution for uncovered channels, with low-cost, easy building, little charge loss
and which would not interfere in the transportation of solid material through the irrigation
water, whose precision is equivalent to the one obtained with other structures.
xv
APRESENTAÇÃO
Este trabalho é fruto de dois projetos de extensão universitária desenvolvidos pelo
Instituto de Pesquisas Hidráulicas IPH - junto a sistemas coletivos de irrigação. A partir
destes projetos, foi desenvolvida a pesquisa no âmbito do Programa de Pós-Graduação em
Recursos Hídricos e Saneamento Ambiental do IPH da Universidades Federal do Rio
Grande do Sul, sob orientação do Prof. Dr.Joel Avruch Goldenfum.
A constatação das dificuldades encontradas para a implantação de uma gestão
eficiente e uma maior economia de água por parte dos irrigantes levou à formulação dos
questionamentos básicos do trabalho e à busca das soluções possíveis, considerando a
série de limitantes reais existentes, que envolvem aspectos estruturais, culturais,
hidráulicos, econômicos e financeiros.
Por outro lado, a alteração relativamente recente da filosofia de gestão de recursos
hídricos no Brasil gerou, por parte de alguns setores, expectativa de solução dos conflitos
existentes em algumas bacias hidrográficas, principalmente pela aplicação dos
instrumentos previstos na Lei. Esses princípios vêm embasados fortemente em teorias
econômicas de maximização do benefício do uso do recurso hídrico e na sólida
participação representativa da sociedade organizada, em um sistema descentralizado de
gestão e de tomada de decisões. O IPH, por participar ativamente da implantação do
sistema integrado de gestão de recursos hídricos e desenvolver uma série de pesquisas
sobre o tema, tem um papel estratégico na discussão destes instrumentos e de sua
aplicabilidade.
No caso da agricultura irrigada, sobram dificuldades em adotar tais instrumentos,
seja por falta de estrutura, de pessoal, recursos financeiros ou equipamentos por parte do
Estado, incluindo os Comitês de Gerenciamento de Bacias Hidrográficas e as ainda
inexistentes Agências de Região Hidrográfica, seja pelo tamanho e dispersão da área
irrigada. As soluções atualmente adotadas nas raras bacias que adotam tais instrumentos
não são capazes de gerar os efeitos pretendidos, o que, por sua vez, trará mais dificuldades
na implantação do sistema como um todo, afetando a sua credibilidade frente à sociedade.
Entender este processo e analisar as soluções possíveis, com graus de precisão e
custos adequados à realidade encontrada, foi o desafio levado para a pesquisa, dentro da
visão indissociável que esta tem com a extensão universitária. O resultado disto será, por
sua vez, levado ao ensino técnico, de graduação e de pós-graduação, encerrando a primeira
xvi
volta desta espiral, que espera-se seja percorrida muitas outras vezes, em aproximação
crescente com a produção de um conhecimento cada vez mais sólido e de fronteira.
A pesquisa realizada dividiu-se em ensaios a campo e em laboratório, além de
entrevistas com pessoas-chave na gestão dos perímetros utilizados na avaliação. Com o
apoio da CAPES e da Universidade de Évora, foi realizado um estágio de doutoramento
com a duração de cerca de quatro meses, período no qual foram utilizadas as instalações
daquela Universidade e, especificamente, do Núcleo de Hidráulica e Controlo de Canais, o
que foi fundamental para a evolução da proposta de solução aqui apresentada. No retorno
de Portugal, as pesquisas avançaram nas instalações do IPH e do Distrito de Irrigação do
Chasqueiro, de responsabilidade da Universidade Federal de Pelotas.
Buscar as raízes da situação encontrada na realidade constituiu uma etapa muito
rica deste processo. A opção adotada na revisão bibliográfica foi a de buscar informações
existentes à época de implantação dos projetos analisados, de forma a avaliar se foi a falta
ou carência de informações técnicas que gerou as concepções de projeto e de gestão da
irrigação adotadas. Isso levou à aquisição de muitos materiais em sebos (ou, na linguagem
lisboeta, alfarrabistas) e pesquisa de obras antigas em acervos digitalizados de
universidades americanas, complementados com a tradicional varredura em revistas
científicas atualizadas. Com isso foi possível estabelecer alguns contrapontos importantes
entre diferentes formas de entender a gestão da irrigação, notadamente entre uma escola
européia mediterrânea e outra do oeste americano e entre estas e a realidade da lavoura de
arroz do Rio Grande do Sul.
Por outro lado, na avaliação econômica do problema proposto, as mesmas escolas
apresentam propostas distintas, que influenciam diferentes proposições atuais de gestão de
recursos hídricos.
Por fim, realizou-se uma proposta de solução para a falta das informações
necessárias para a gestão pretendida, mas com um foco regional, que considera as
dificuldades e limitações impostas pela lavoura de arroz, à qual foi dado o nome do IPH.
O trabalho é dividido conforme apresentado no sumário. O capítulo 1 apresenta o
tema da pesquisa, que é a análise da aplicação do instrumento econômico de cobrança pelo
uso da água na irrigação com base na determinação de vazão e seus condicionantes. O
capítulo seguinte traz os objetivos da pesquisa e a formulação da hipótese básica
analisada, a partir da qual foram formuladas as questões que deveriam ser respondidas ao
final da análise. A importância do estudo é discutida no capítulo 3, que também coloca a
xvii
situação atual e as dificuldades encontradas para a aplicação do princípio econômico
estudado.
O capítulo 4 apresenta informações sobre os processos de gestão, a instrumentos de
gestão de recursos hídricos, a estruturas hidráulicas e à lavoura de arroz irrigado. As
pesquisas realizadas, sua metodologia, resultados encontrados e discussão são
apresentados nos capítulos 5 e 6.
Os capítulos 7 e 8 trazem a conclusão e as recomendações de aplicação e sequência
do estudo. Finalmente, o nono capítulo apresenta as referências citadas ao longo do texto.
Por sugestão da banca examinadora, o tulo original Medição de vazão em canais
não revestidos e o princípio usuário-pagador como instrumentos de gestão da água em
sistemas coletivos de irrigação, foi substituído por um mais curto, adotando-se na versão
final Cobrança por volume em sistemas coletivos de irrigação como instrumento de
gestão da água.
1
1. INTRODUÇÃO
Starvation is the characteristic of some people
not having enough food to eat.
It is not characteristic of there being
not enough food to eat.
Amartya Sen (UNESCO, 2006)
Os problemas referentes à gestão dos recursos hídricos em diversas partes do
mundo são bem conhecidos, mas com tendência geral de agravamento. Na apresentação
do dia mundial da água de 2009, coloca-se que ocorreram 37 guerras pela água nos
últimos 60 anos. (UNITED, 2009).
Dentre os usos da água, a irrigação representa 70% das derivações de água
(UNESCO, 2006), sendo que no Brasil este percentual é de 60% (Lima et alli, 1999). No
oeste dos Estados Unidos, esse uso atinge 85% do uso da água (Sammis e Mott, 1994).
Em bacias específicas, este valor é ainda mais alto, como na bacia do rio Quaraí, onde a
irrigação é responsável por 98% do consumo anual ( UNIVERSIDADE FEDERAL DO
RIO GRANDE DO SUL, 2008), sendo que no período de verão a demanda de água é
cerca de 2.200% superior ao valor da vazão com 95% de permanência (Q
95%
).
Os dados das UNESCO (2006) sobre a fome no mundo relembram a profecia de
Malthus: para satisfazer a necessidade de alimentos entre 2000 e 2030, a produção
agrícola deveria aumentar 67% nos países em desenvolvimento; mantida a atual taxa de
crescimento, esse acréscimo será de apenas 14%.
Portanto, em uma competição pelo uso da água com outros setores econômicos, a
irrigação necessita ser cuidadosamente analisada no momento da sociedade decidir qual
uso da água trará mais benefícios. A eficiência do uso da água na agricultura irrigada, no
entanto, apresenta valores abaixo do tecnicamente possível, revelando que parte
importante do que é retirado dos cursos d’água superficiais ou dos aquíferos não é
utilizado pelas culturas e não gera, na maior parte dos casos, qualquer benefício
econômico e em detrimento de outros usos concorrentes.
No documento Water, a shared responsibility, a UNESCO (2006) apresenta as
preocupações mundiais sobre a água. Para a irrigação, o estudo cita:
As instituições vinculadas à irrigação devem responder às necessidades dos
produtores, com fornecimento adequado de água, ampliando a transparência na gestão e
equilibrando eficiência de uso e equidade no acesso à água. Isso requer mudanças de
2
atitudes e investimentos em modernização da infra-estrutura, reestruturação institucional e
melhoria da capacidade técnica de agricultores e gestores;
O setor agrícola deve passar por uma complexa mudança: produzir mais
alimentos de melhor qualidade com menor uso de água por unidade produzida;
proporcionar melhores condições de vida para a população rural; aplicar tecnologias
limpas e sustentáveis; contribuir de forma produtiva para a economia local e nacional;
São necessárias ações imediatas para adaptar as políticas agrícolas e de
desenvolvimento rural, acelerar as mudanças na gestão da irrigação, e, por meio de leis
sobre a gestão de recursos hídricos e arranjos institucionais adequados, apoiar a gestão
integrada das necessidades sociais, econômicas e ambientais das populações rurais.
O aumento da eficiência do uso da água na irrigação pode representar uma maior
disponibilidade de água para os outros usos em uma bacia hidrográfica e uma maior
rentabilidade econômica pelo seu uso, com resultados positivos para os produtores rurais e
para a sociedade.
Uma possibilidade indicada na maior parte dos estudos e prevista na legislação é a
aplicação do princípio usuário-pagador como elemento indutor ao uso eficiente da água. A
sua adoção na agricultura irrigada deve ser baseada no consumo e no valor da água,
determinados por metodologias que possibilitem o alcance dos objetivos pretendidos. A
partir disto, é lógico que se verifiquem a forma de medição dos volumes utilizados nas
lavouras e o efeito que essa cobrança trará no consumo de água e no comportamento dos
irrigantes e seu reflexo na economia regional.
No Rio Grande do Sul, a irrigação concentra-se na cultura de arroz e no método de
irrigação por inundação. Os sistemas de distribuição de água são formados basicamente
por canais em terra não revestidos e praticamente inexistem estruturas de medição de
vazão. Além disto, as estruturas parcelares de tomada de água são rústicas, sem um padrão
definido. Estes fatos, aliados às oscilações do nível da água nos canais de distribuição,
remetem a uma dificuldade da determinação ao menos aproximada do consumo de água, o
que leva à simplificação da cobrança, que passa a ser realizada por área cultivada.
O presente estudo discute a cobrança pela água de irrigação e sua capacidade de
influenciar no consumo de água de irrigação em projetos atendidos por sistemas de canais
não revestidos. Além disto, avalia uma possibilidade de mensuração do consumo de água
de baixo custo para estes canais.
3
Como campos de estudo, foram analisados projetos públicos de irrigação de
Portugal e do Brasil nos quais o arroz é uma cultura importante em termos de área
cultivada.
Verificou-se que (i) externalidades econômicas interferem na disposição a pagar
pela água consumida, alterando o comportamento dos irrigantes e o poder do instrumento
de cobrança pela água de induzir um uso mais eficiente; (ii) a cobrança simples por área
irrigada não altera o consumo de água; (iii) uma taxa mais elevada pelo uso da água
retirará do mercado produtor os agricultores de menor porte, aqueles que não recebem
subsídios e os que têm um excedente do produtor muito pequeno; e (iv) o dispositivo
proposto é capaz de estimar a vazão com uma precisão adequada ao propósito.
Esta pesquisa contou com o apoio da CAPES/MEC, por meio do Programa de
Estágio no Exterior em Doutoramento PDEE.
4
2. OBJETIVOS
O presente estudo tem por objetivo principal avaliar a alteração na gestão da água
em canais de irrigação não revestidos a partir da aplicação do princípio usuário pagador,
com base no volume consumido.
Os objetivos específicos são:
Comparar a gestão de perímetros irrigados localizados no Brasil - Rio
Grande do Sul - e em Portugal, nos quais o arroz tem papel de destaque entre as culturas
exploradas;
Propor uma estrutura de medição de vazão em canais não revestidos;
Analisar valores referenciais de taxa de cobrança pelo uso da água na
irrigação da lavoura de arroz.
A hipótese básica formulada é a de que o princípio usuário-pagador é um
instrumento poderoso para aumentar a eficiência do uso da água na irrigação pela
participação efetiva do irrigante, desde que a cobrança seja implantada por volume
efetivamente consumido. Com isto, aplica-se a lógica da economia na gestão da água,
base do princípio adotado, e insere-se um agente interessado na redução do volume
recebido do sistema de irrigação, que é o irrigante.
A partir desta hipótese, devem ser respondidas as seguintes questões:
Quanto cobrar?
Como determinar a unidade de cobrança?
Qual o efeito dessa cobrança na economia regional?
Qual é o efeito da cobrança no comportamento do irrigante?
Embora pareça ser óbvia a validação da hipótese formulada, isso não corresponde à
realidade brasileira e da maioria das áreas irrigadas que utilizam sistemas de distribuição
por canais e irrigação superficial. Primeiro, porque a cobrança por volume não é aplicada
na maior parte dos casos por falta de instrumentos confiáveis, aplicáveis em canais de
irrigação e de valores acessíveis ao irrigante ou à instituição responsável pela cobrança.
Segundo, porque o princípio usuário-pagador pode levar a valores de cobrança
insustentáveis para a agricultura irrigada. Em casos onde isto ocorreu, a redução do
consumo de água é resultante do abandono de áreas irrigadas ou da alteração da cultura
explorada, e não pelo aumento da eficiência do uso da água. Abandonos de área irrigada,
por sua vez, podem trazer efeitos econômicos importantes e indesejáveis para a bacia
5
hidrográfica. Por outro lado, se o valor cobrado for muito pequeno, não haverá alteração
significativa no consumo das lavouras. Dentre estes limites está o campo de validação ou
não da hipótese: a determinação de uma faixa referencial de valores que podem ser
adotados para cobrar a água de irrigação utilizada na lavoura de arroz capazes de levar à
economia da água por aumento de eficiência, desde que acompanhada ou baseada na
medição de vazão ou no volume consumido. As dificuldades encontradas para realizar
essa determinação de vazão ou volume são inerentes às características hidráulicas dos
canais e as dimensões dos sistemas. Mesmo quando as demandas são conhecidas, a
eficiência da alteração das variáveis de controle da irrigação depende do tempo necessário
para a obtenção de uma nova condição estável e do tempo necessário para que o volume
adicional de água chegue até aos pontos de controle considerados. Além disto, a medição
da vazão em canais abertos e não revestidos apresenta dificuldades, como custo e
fragilidade dos equipamentos eletrônicos, a falta de precisão em instalações mais rústicas
ou a interferência excessiva no comportamento hidráulico do canal. O tempo de resposta
normalmente elevado entre a alteração de vazão na estrutura de comando e a sua
percepção no ponto de controle, limita a utilização de soluções adotadas para outras
formas de condução de água. No entanto, Bautista et alli (2003) demonstram que
estratégias de manejo da água podem ser implementadas com sucesso em canais abertos e
na gestão on farm, com a adoção de um controle programado e com antecipação de
manobras, considerando o tempo necessário para a observação da alteração da vazão no
ponto de controle.
A hipótese negativa é a de não cobrar pelo volume consumido, uma vez que a
cobrança em si é definida por leis federais e estaduais e não pode ser desconsiderada. A
possibilidade restante é a manutenção da cobrança por área irrigada, mantendo o irrigante
em uma posição passiva quanto à gestão da água.
Para realizar a avaliação dessas hipóteses, foram realizados ensaios, levantamentos
e entrevistas nos dois países, junto a produtores de arroz e gestores de sistemas coletivos
de irrigação.
6
3. JUSTIFICATIVA
A demanda por água em todo o mundo vem se ampliando, mesmo que a
disponibilidade hídrica seja limitada. A geração de conflitos pelo uso da água coloca em
oposição principalmente usuários urbanos e outros usuários, dentre estes os irrigantes. A
agricultura irrigada utiliza a maior parte da água doce do mundo, sendo o uso mais
importante em muitos países. Nos Estados Unidos, a utilização da água para agricultura
irrigada representou 65% do volume de água doce derivado no ano de 2000, excluindo do
total analisado a utilização de água na geração termoelétrica. No oeste americano, a
irrigação teve que elevar a sua eficiência para reduzir os conflitos com os usos urbanos,
como o abastecimento humano e industrial.
Essa elevada participação no consumo hídrico observado em diversas bacias leva a
considerar que a implantação de estruturas e a execução de políticas de economia de água
na irrigação terão um efeito importante na disponibilidade hídrica para outras atividades
econômicas e para a conservação ambiental. No entanto, pela sua importância estratégica,
uma redução no fornecimento de água não pode significar redução na produção de
alimentos ou de matéria prima para a indústria.
Segundo Clemmens (2002), poucos estudos são realizados para a conservação de
água utilizada na agricultura. situações em que, certamente, a melhoria da distribuição
da água para irrigação reduzirá a utilização de água ou a degradação da qualidade da água.
Clemmens e Dedrick (1992) afirmam que a medição do volume de água
consumido é um dos fatores que levam o irrigante a consumir menos água em uma safra e
que esta informação também é utilizada em tomadas de decisão posteriores.
Em relação à capacitação técnica para a irrigação, principalmente em relação a
projetos coletivos de irrigação, observam-se lacunas na formação dos profissionais que
atuam na área. Relembrando a implantação do Programa Nacional de Irrigação PRONI,
entre 1986 e 1989, verifica-se que a formação de mão de obra especializada no País é
realizada principalmente por demanda, não persistindo uma estrutura específica de estudo
e ensino de irrigação. Naquela época, dezenas de engenheiros foram treinados em
irrigação e drenagem, mas de forma isolada e não continuada. No caso do Rio Grande do
Sul, esta carência é ainda mais evidente, com a exceção da atuação do IRGA, mas que tem
foco mais no produtor isolado.
A discussão sobre formas de comando e controle da irrigação em canais de
irrigação é básica para a concepção do sistema de canais, mas não aparece em nenhum
7
livro brasileiro sobre irrigação consultado. O Manual de Irrigação, tradução do material do
Bureau of Reclamation, realizada no âmbito do PRONI, é uma exceção, mas, por
assumir uma filosofia básica de operação e distribuição, não detalha estes conceitos da
mesma forma que a bibliografia européia.
No Rio Grande do Sul, existem muitos sistemas coletivos de distribuição de água
para a lavoura de arroz, que são operados por particulares e alimentados a partir de
reservatórios ou por instalações de recalque. Pode-se, preliminarmente, definir que a
lógica desses sistemas coletivos de irrigação é o comando por montante, tendo em vista
que o manejo da tomada de água da barragem ou da estação de recalque é a principal
forma de alteração da vazão. A partir da alteração da vazão, as operações necessárias vão
sendo executadas de montante para jusante. O controle pode ser definido como de jusante,
realizado pela manutenção de um nível constante a jusante das tomadas, supostamente
relacionado com uma vazão necessária, a partir da operação das estruturas de controle
(comportas transversais ou trancas). Considerando este nível, são abertas as tomadas de
água. Os irrigantes, na maior parte dos casos privados, podem exercer o controle local,
alterando a abertura das bocas nas taipas. Também poderia ser considerado que o controle
é de montante, se o gestor busca manter um nível constante à montante das estruturas
transversais, independente do nível do canal junto às tomadas dos irrigantes.
A distribuição poderia ser considerada como sendo de vazão fixa, com frequência
anual. Observa-se, na realidade, que a vazão inicial é mais elevada, reduzindo-se na
medida em que as perdas por infiltração estabilizam. A lógica de aumento ou redução da
vazão depende do manejo da lavoura, que pode ser alterada repentinamente na ocorrência
de pragas ou pela definição da necessidade de adubação de cobertura, entre outros tratos
culturais, bem como acidentes por ocorrência de chuvas intensas, que podem exigir a
interrupção da irrigação por um curto período ou a exigência de um volume maior de água
para retomar a condição de inundação.
O controle da água na parcela é realizado pela abertura ou fechamento de bocas no
lado oposto ao da entrada da água, retirando a água para os canais de drenagem ou
esgotos da lavoura. Em muitas situações, o canal de drenagem de uma lavoura será o canal
de irrigação de outra parcela, sendo que não são raros os casos de bombeamento da água
da água drenada para alimentar canais de irrigação mais elevados ou outras parcelas de
forma direta. A complexidade deste sistema, aliada a simplicidade das estruturas, indica
uma natural baixa eficiência no uso da água.
8
Após a consolidação do conceito de que a água detém valor econômico e é um
elemento finito, as estratégias de planejamento passaram a considerar, de forma mais
efetiva, a eficiência de seu uso. O princípio usuário - pagador reflete essa condição, pelo
qual os consumidores de água de uma bacia devem pagar em função do volume retirado
das fontes naturais ou dos reservatórios.
Na composição desse volume, a influência de diversos fatores: a
evapotranspiração, a porosidade do solo, a drenagem interna do solo, a altura da lâmina
mantida sobre o solo e o manejo da irrigação. Em relação à porosidade e à drenagem
interna, poucas são as possibilidades práticas de alteração. A mudança da época de plantio
e a variedade cultivada são exemplos de mudanças que podem ser implementadas pelos
agricultores quanto à redução da evapotranspiração, e, por consequência, do volume
consumido. No entanto, a definição da época do plantio não é uma decisão que dependa
apenas da vontade do agricultor, sendo limitada pelo conteúdo de água do solo,
disponibilidade de crédito, ocorrência de chuva ou baixas temperaturas, entre outros
fatores. Dessa forma, não pode ser considerado como uma prática que possa resultar em
reduções significativas do consumo de água para a totalidade das bacias.
A altura da lâmina e o manejo da irrigação são os componentes do consumo que
podem ser gerenciados pelo irrigante, desde que este disponha de informações suficientes
e precisas. Os diferentes métodos de plantio e de manejo da irrigação existentes dispõem
de informações de pesquisa sobre consumo, mas que não estão de acordo com as práticas
correntes de grande parte dos orizicultores. Assim, a redução do consumo por adoção
dessas práticas inicia pelo cálculo do consumo, em condições reais, para cada conjunto de
práticas de irrigação e métodos de plantio adotados.
O interesse dos agricultores na busca pela economia de água não está vinculado,
em um primeiro momento, aos aspectos ambientais ou ao valor econômico da água, mas à
necessidade financeira de reduzir os custos de produção do arroz, que os preços pagos
ao produtor têm-se apresentado em patamares muito aquém dos valores médios históricos.
Como uma grande parte da irrigação do arroz no Rio Grande do Sul depende de recalque
mecânico, com o uso de motores a diesel ou elétricos, a redução do volume implica em
uma diminuição direta dos desembolsos do agricultor. O mesmo não ocorre, no entanto, se
o produtor recebe água de um sistema coletivo por meio de canais cuja alimentação não
esteja a seu cargo.
9
A aplicação do princípio usuário-pagador não é realizada apenas para arrecadação
de recursos, mas para orientar o uso da água de forma que atenda mais interesses sociais
do que individuais. O seu resultado, no entanto, depende da sua capacidade de alteração
do comportamento dos irrigantes.
Atualmente, as propostas de cobrança para o setor de irrigação são,
predominantemente, por área irrigada. A utilização da área irrigada como unidade de
consumo deve-se à dificuldade de realizar o controle do volume de água consumido nas
lavouras, seja pela extensão territorial que ocupam, seja pela irregularidade e falta de
padronização das estruturas de controle e gestão existentes. Não havendo uma vinculação
clara entre o uso e a unidade de cobrança, não há porque esperar uma redução de
consumo, que pode, inclusive, ser elevado por indução de um pagamento pelo uso sem
controle de vazão.
A junção de uma unidade de cobrança incapaz de levar ao uso eficiente da água,
das dificuldades impostas, nos sistemas coletivos de irrigação, por um sistema comandado
por montante e regulado por jusante e da falta de opções adequadas à situação da lavoura
de arroz para medir a vazão ou o volume consumido leva a um quadro de uso de água
excessivo, com elevados índices médios de perda, e a conflitos pelo uso da água na época
de irrigação.
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4. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
A revisão bibliográfica que é apresentada a seguir traz a discussão sobre os
diversos temas envolvidos na gestão de sistemas de irrigação, como condução da água em
canais, hidráulica de estruturas de medição e a própria gestão em si, com suas diferentes
formas de execução. Para subsidiar a compreensão da aplicação do princípio usuário-
pagador (PUP), além do princípio em si, são discutidas questões sobre eficiência da
irrigação, formação de preço da água, reflexos no comportamento dos irrigantes, entre
outros. Por fim, sendo o estudo focado na lavoura de arroz irrigado, é necessário
apresentar os elementos básicos sobre esta atividade agrícola. Este conjunto de temas é
necessário para a compreensão do conjunto final pretendido, que permite a validação ou
não da hipótese estabelecida. Por ser uma parte extensa do trabalho, decidiu-se pela
elaboração de um esquema base de relações entre os itens, de forma a facilitar a leitura.
O item 4.1 apresenta o princípio usuário-pagador - PUP, seu embasamento legal e
algumas experiências referentes a sua aplicação, tanto nacionais como internacionais.
Desta análise, são retirados os referenciais para a aplicação de questionários junto a
irrigantes e gestores, que geram as condições de validação da hipótese, bem como
permitem entender a complexidade de sua aplicação na situação atual dos sistemas de
irrigação em canais não revestidos. Um destaque é dado sobre a unidade de cobrança a ser
adotada.
O valor da água para irrigação é discutido no item 4.2, onde são apresentados
estudos realizados principalmente no Rio Grande do Sul e na Europa. A definição destes
valores fundamenta a aplicação da metodologia de valoração da água junto aos gestores
dos projetos coletivos analisados.
Os projetos coletivos de irrigação são apresentados no item 4.3, apresentando os
conceitos básicos existentes por trás da concepção das redes de distribuição e das
estruturas de controle. A importância desta análise é a posterior relação que se faz com os
mecanismos de entrega de água e a possibilidade de aplicação do PUP nos sistemas
coletivos, uma vez que nestes casos um responsável pelo volume entregue a cada
irrigante e sua atuação passa a ser fundamental em um possível processo de implantação
da cobrança pela água.
Introduzindo a questão hidráulica na análise pretendida, o item 4.4 apresenta o
comportamento dos sistemas de distribuição por canais e dos canais não revestidos,
11
indicando os processos de alteração das variáveis hidráulicas envolvidas no processo de
distribuição de água.
Já o item 4.5 trata da eficiência da irrigação, detalhando seus componentes e
valores referenciais. Na sequência, no item 4.6, discute-se especificamente a eficiência em
sistemas de irrigação coletivos, considerando-se as estruturas de reservação e distribuição.
O item 4.7 apresenta a lavoura de arroz, que é a situação detalhada no estudo, dada a sua
importância para gestão das águas no Rio Grande do Sul. Nessa parte, são tratadas as
peculiaridades de sua condução e apresentados os dados sobre o consumo de água dessa
lavoura. Os itens 4.8 e 4.9 trazem, respectivamente, a caracterização dos sistemas
coletivos de irrigação no Rio Grande do Sul e em Portugal, referindo-se mais
detalhadamente aos que foram visitados durante esse trabalho. Por fim, o item 4.10 retoma
a questão hidráulica, focando desta vez os medidores de vazão. Inicialmente, estes são
descritos de forma ampla, passando à situação específica dos canais em terra não
revestidos e suas peculiaridades.
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4.1. O princípio usuário pagador
A alteração na legislação sobre gestão de recursos hídricos no Brasil, iniciada com
a Constituição Federal de 1988, introduziu novos instrumentos, novas instituições, criando
todo um novo sistema de abrangência nacional.
Sousa Júnior (2004) cita que o Sistema Nacional de Recursos Hídricos baseia-se,
além da outorga, prevista no Código de Águas de 1934, e da cobrança, objeto de
interesse mais próximo deste estudo, em três outros instrumentos:
um sistema de informações em recursos hídricos;
os planos de recursos hídricos;
o enquadramento das águas.
A sequência lógica de implantação dos instrumentos proposta pelo autor é:
a. Sistema de informações sobre recursos hídricos, com dados hidrológicos,
econômicos, sociais e ambientais sistêmicos, incluindo também o cadastro de usuários;
b. Enquadramento das águas, definido pelo Comitê de Gerenciamento da
Bacia Hidrográfica;
c. Plano de Recursos Hídricos, consistindo de um planejamento estratégico
que resume os objetivos, as metas e os métodos a serem adotados para diversos
indicadores de situação da bacia;
d. Outorga, que deve ser baseada em informações técnicas relevantes; e
e. Cobrança pelo uso da água, última etapa do ciclo inicial, que deve
assegurar os recursos necessários ao funcionamento do sistema.
Dos instrumentos aplicáveis, a cobrança aprece como o que suscita maior interesse
e gera mais polêmicas (Sousa Júnior, 2004). Além da confusão com as tarifas pagas por
serviços de abastecimento e distribuição de água, a falta de informação de parte da
população e de usuários sobre a cobrança em si, sobre o sistema de gerenciamento de
recursos hídricos e sobre a existência e função dos Comitês de Bacia.
Carrera-Fernandez e Garrido, citados por Bernardi (2003), colocam que a cobrança
pelo uso da água é um dos instrumentos mais importantes na gestão dos recursos hídricos,
pois concorre para que ocorra o equilíbrio entre oferta e demanda na bacia ou na região
hidrográfica. Além disto, atua como mecanismo eficiente para a redistribuição dos custos
sociais de forma mais equitativa; para disciplinar a localização dos usuários; para
13
promover o desenvolvimento regional integrado nas suas dimensões social e ambiental; e
para incentivar a melhora dos níveis de qualidade dos efluentes lançados nos mananciais.
A falta do respaldo da opinião pública, a possibilidade de não consideração de
especificidades de setores e uma simplificação excessiva dos modelos de simulação ou dos
processos de valoração da água podem gerar, além de reações contrárias, uma baixa
credibilidade da aplicação do instrumento, inviabilizando a sua implantação e a existência
do próprio sistema como proposto.
No Brasil, a cobrança pelo uso dos recursos hídricos está definida nos seguintes
artigos da Lei Federal 9.433/1997:
DA COBRANÇA DO USO DE RECURSOS HÍDRICOS
Art. 19. A cobrança pelo uso de recursos hídricos objetiva:
I - reconhecer a água como bem econômico e dar ao usuário uma indicação de seu
real valor;
II - incentivar a racionalização do uso da água;
III - obter recursos financeiros para o financiamento dos programas e
intervenções contemplados nos planos de recursos hídricos.
Art. 20. Serão cobrados os usos de recursos hídricos sujeitos a outorga, nos
termos do art. 12 desta Lei.
Art. 21. Na fixação dos valores a serem cobrados pelo uso dos recursos hídricos
devem ser observados, dentre outros:
I - nas derivações, captações e extrações de água, o volume retirado e seu regime
de variação;
II - nos lançamentos de esgotos e demais resíduos líquidos ou gasosos, o volume
lançado e seu regime de variação e as características físico-químicas, biológicas e de
toxidade do afluente.
Art. 22. Os valores arrecadados com a cobrança pelo uso de recursos hídricos
serão aplicados prioritariamente na bacia hidrográfica em que foram gerados e serão
utilizados:
I - no financiamento de estudos, programas, projetos e obras incluídos nos Planos
de Recursos Hídricos;
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II - no pagamento de despesas de implantação e custeio administrativo dos órgãos
e entidades integrantes do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos.
§ 1º A aplicação nas despesas previstas no inciso II deste artigo é limitada a sete e
meio por cento do total arrecadado.
§ Os valores previstos no caput deste artigo poderão ser aplicados a fundo
perdido em projetos e obras que alterem, de modo considerado benéfico à coletividade, a
qualidade, a quantidade e o regime de vazão de um corpo de água.
Para cumprir o disposto no artigo 19, é necessário estimar o valor da água para a
sociedade. O principio usuário-pagador (PUP) é uma das três bases da análise custo-
benefício do ponto de vista social (Lanna, 1996), acompanhado dos princípios poluidor-
pagador (PPP) e beneficiáriopagador (PBP). O PPP é o mais conhecido destes princípios,
definido como um instrumento da política ambiental pela Organização para a Cooperação
e Desenvolvimento Econômico - OCDE em 1972. Por ele, o poluidor tem duas situações
extremas possíveis (Lanna, 1996): pagar por toda a poluição gerada, sem investir nada no
tratamento do efluente ou tratar todo o efluente e não pagar nada ao sistema de gestão de
recursos hídricos, pois não estará mais poluindo.
O PUP é mais recente que o PPP. Por este princípio, os usuários da água estarão
sujeitos à aplicação de instrumentos econômicos para que o uso e o aproveitamento desses
recursos se processem em benefício da coletividade. O PUP abre a possibilidade da
cobrança por todas as formas de uso e aproveitamento da água, sem questionar se essa
cobrança é necessária ou desejável (Santos, 2003, apud Silva et alli, 2007). Para definição
de valores, são utilizados indiretamente critérios de preços públicos para financiamento de
gastos definidos pela sociedade representada no Comitê de Gerenciamento da Bacia
Hidrográfica. Por fim, o PBP onera a sociedade beneficiada com uma ação adotada por um
usuário ou um poluidor, sendo que os recursos arrecadados por este princípio podem ser
utilizados para subsidiar justamente estas intervenções (Lanna, 1996).
O princípio usuário-pagador é considerado como um mecanismo eficiente para
uma melhor alocação de recursos hídricos, a partir da adoção de escalas de taxas que
reflitam o custo econômico real da água. Segundo Alvim e Carraro (2006), um bem
econômico define tudo que tem utilidade e potencial de suprir uma carência ou uma
necessidade. De outra maneira, pelo princípio da escassez, o bem econômico tem uma
demanda que excede a oferta, quando o seu preço tende a zero. Isso facom que um
esforço humano e intencional seja realizado para atender esta demanda excedente gerada.
15
De acordo com os autores, a característica diferencial entre bens públicos e privados está
na impossibilidade de exclusão de determinados indivíduos ou de parte da população ao
seu acesso. Por outro lado, a água não pode ser enquadrada como bem público, pois, para
isto, deveria ser respeitado o princípio da não-rivalidade, ou seja, o fato de um usuário
consumir uma certa quantidade de água não impediria a utilização desta mesma água por
outro. Assim, a água pode ser considerada um bem privado, o que possibilita a utilização
de mecanismos de mercado para definição de seu valor.
De acordo com Machado (2002), o primeiro país a adotar a cobrança da água com
o uso do princípio do usuário/poluidor-pagador foi a França, no ano de 1964. No Brasil,
destacam-se as experiências do Projeto Rio Doce em Minas Gerais, pioneiro no estudo de
critérios de cobrança nos anos 90, utilizando o princípio do poluidor/usuário-pagador, e a
do rio Paraíba do Sul (Serrichio et alli, 2005). BRASIL (2001) cita que a cobrança pelo
principio usuário-pagador na França iniciou em 1969 recaindo apenas sobre dois setores:
serviços municipais de água e esgoto e indústrias e atividades econômicas similares. A
inclusão dos irrigantes é observada apenas em 1986, por interesse deste grupo em
participar de políticas de financiamento por parte das agências de bacia. Salienta-se que a
categoria dos agricultores foi a única que recebeu mais contribuições da agência do que
recolhimento de taxas, no período 1992 a 1996. Das seis agências de água existentes na
França, cinco cobravam a água dos irrigantes em 1994.
De acordo com BRASIL (2001), as categorias que pagam pela água na França são:
Consumidores domésticos dos municípios com mais de 400 habitantes,
considerando os aglomerados permanentes e os de ocupação sazonal, como praias e
cidades turísticas, esses de forma ponderada pelo tempo de uso;
Indústrias e atividades econômicas similares, produzindo uma poluição
remanescente igual ou maior a 200 equivalentes-habitante;
Criadores bovino, suíno e avícola, produzindo uma poluição remanescente
igual ou maior a 200 equivalentes-habitante;
Irrigantes
Setor hidroelétrico
Centrais térmicas; e
Centrais nucleares.
16
De acordo com Alvim e Carraro (2006), a gestão dos recursos hídricos no Brasil
teve início na cada de 70, a partir de um modelo centralizado nos órgãos públicos
federais e com visão estritamente setorial, com os objetivos de controlar episódios de
escassez e descontinuidade da oferta de água. Na mesma década, foi implantado o
primeiro projeto de irrigação na região semi-árida brasileira (World Bank, 2004)
O exemplo francês foi forte inspirador da legislação gaúcha (Cánepa e Grassi,
2000). O modelo de gestão francês, descentralizado e participativo, apresenta o seguinte
esquema geral de cobrança pela água:
a. parte-se de um conjunto de objetivos de longo prazo a atingir, definindo os
padrões de qualidade e os usos pretendidos pela sociedade;
b. o Comitê de Bacia, considerando os usos e padrões definidos, com base em
estudos realizados pela agência da bacia (ou da região) decide as metas e as intervenções a
serem realizadas, cotejando com as taxas necessárias para a indução de comportamentos
desejados e dos recursos financeiros da comunidade, seu nível de desenvolvimento, sua
preocupação ambiental, as correlações entre as forças políticas, entre outros fatores;
c. a taxa definida para o lançamento de despejos deve ser necessária e
suficiente para, de acordo com a curva do custo marginal de controle, induzir as metas de
qualidade da água do enquadramento. O total arrecadado é direcionado para um fundo e
são repassados para custear as ações necessárias, desde a forma de financiamento a fundo
perdido (ou subsídio) até a forma de empréstimo, respeitando o decidido no Comitê de
Bacia;
d. a taxa definida para a captação de água é calculada para custear as
intervenções projetadas e a economia no consumo da água pretendida pelos usuários;
e. o Estado, em nome da sociedade, deve monitorar as condições dos recursos
hídricos, analisando a aproximação da realidade com os objetivos de longo prazo
definidos.
A fixação de preço para a utilização da água passa a ser adotada como meio de
distribuição dos custos de administração entre os usuários, para proporcionar incentivos ao
uso eficiente e como restrição ao mau uso, aos despejos e à contaminação dos recursos
hídricos. (Machado, 2002)
Como instrumento econômico, a cobrança deve sinalizar corretamente para a
sociedade o uso dos recursos hídricos de forma racional e que atende aos princípios de
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desenvolvimento sustentável. De forma ideal, a cobrança deve apresentar efetividade e
eficiência econômica e financeira, ter impacto ambiental e ser, ainda, um instrumento
prático e com bom nível de aceitação pela sociedade. (Santos, 2002)
Os critérios utilizados pela autora para avaliar a aplicabilidade ou a desempenho de
instrumentos econômicos adotado na gestão são os estabelecidos pela OCDE:
Efetividade financeira é função da capacidade do sistema de gestão de
gerar receitas para financiamento das atividades necessárias ao alcance dos objetivos para
os quais o sistema foi montado, ou seja, depende da capacidade de gerar recursos para o
financiamento dos sistemas de fiscalização, monitoramento, licenciamento, recuperação e
preservação ambiental;
Eficiência financeira: relacionada com os custos de transação decorrentes
dos encargos gerados para as autoridades responsáveis e para os usuários, isto é, a
importância dos custos administrativos e operacionais do sistema frente ao montante de
recursos arrecadados;
Eficiência econômica: para garantir a alocação eficiente do recurso, o
preço deve refletir o custo marginal de provisão da água; no caso dos diferentes usos da
água, a cobrança deve ter a capacidade de incorporar os custos sociais ou externalidades
decorrentes do uso.
Impacto ambiental: capacidade do instrumento de influenciar o
comportamento dos poluidores e consumidores de forma a melhora a qualidade ambiental
Praticabilidade: caracteriza o quão direto é o instrumento para atingir os
seus objetivos. Neste critério, clareza e simplicidade são considerados fatores cruciais que
afetam a eficiência administrativa da política.
Aceitabilidade: como o instrumento é aceito e recebido pelos que são
impactados por ele. Idealmente, a implementação deve ser progressiva para permitir o
planejamento de longo prazo e evitar grandes aumentos de custos de produção e tornar-se
um limitante à competitividade.
Além disto, a autora cita que os instrumentos econômicos devem considerar as
seguintes questões:
Integração com outras políticas públicas
Consequências econômicas e distributivas
18
Conformidade com os princípios gerais das políticas fiscais, comerciais e
de meio ambiente, nacionais e internacionais.
De acordo com Santos (2002) os instrumentos econômicos têm grande
aceitabilidade na Europa, embora na década passada ainda não tivessem sido plenamente
implantados. O setor agrícola é considerado como o mais resistente à implantação da
cobrança pelo uso da água, o que é coerente com o seu papel de grande usuário de água e
gerador de poluição difusa. Por outro lado, na Europa, é um setor fortemente subsidiado.
Em todas as experiências de aplicação de instrumentos econômicos analisados pela autora,
o setor agrícola ou não participa ou tem sido o último a ser incorporado.
Silva e Pruski (2000) apresentam contestação sobre o sistema de cobranças de
tarifas na Espanha, na qual os juristas Navarro e Sanagustín afirmam que os baixos valores
cobrados e a elevada renda de consumidores de água levavam ao desperdício, sendo
necessário adotar a lei de mercado para certos bens públicos e fixação de preços que
reflitam os custos de gestão e transformação.
De Buffon (1861) apresenta diversos exemplos de cobrança por água para irrigação
em canais de irrigação e abastecimento humano no norte da Itália, mas estes custos são
relacionados com o serviço de distribuição da água. Por outro lado, os valores também
refletem uma consideração de fatores de mercado, pois o valor da água no Grande Canal,
próximo à Milão, em 1787, sofreu um reajuste de 450 para 700 livres milanises por onça
de água, devido ao aumento de demanda.
Flynn (1892) também apresenta exemplos de cobrança pela distribuição de água no
oeste norte-americano, onde a água era cobrada por uma vazão constante cedida por 24
horas, apenas durante o dia, apenas durante a noite ou por acre ao longo de toda a safra.
Entre os valores, destaca-se o menor valor cobrado pela irrigação noturna e no período de
inverno e as diferenças entre frutíferas e culturas de grão.
A questão do subsídio à agricultura na União Européia assume uma importância
destacada a partir da implantação da Política Agrícola Comunitária PAC. Segundo
López (2000), a dependência da produção agrícola da Espanha em relação ao subsídio, nos
anos de 95 a 97, era evidente, sendo que apenas a lavoura de arroz recebia subsídios que
somavam 44% da renda gerada pela lavoura. O autor conclui que a modificação nos
subsídios teria efeitos maiores na economia de água do que incrementos do seu custo para
os irrigantes. Albiac et alli (2000) verificaram que a existência da PAC influencia a
tomada de decisão dos agricultores, pois com a eliminação das ajudas diretas a
19
rentabilidade da atividade agrária cai cerca de 45% e a superfície não utilizada de terras
triplica. A eliminação das ajudas leva a um aumento da exploração de sequeiro,
penalizando, sobretudo, os cultivos irrigados. Por outro lado, a demanda de água tende a
permanecer no mesmo valor, devido à redistribuição dos cultivos de acordo com os tipos
de solo. Neste cenário, as áreas irrigadas de girassol e alfafa são substituídas por áreas de
arroz, que têm um maior consumo unitário de água.
Arrojo (2000) considera que a política indiscriminada de subsídios observada na
Espanha no final da década passada gerou a retomada do cultivo de terrenos salinizados ou
de baixa qualidade, passando-se a cultivar literalmente subvenções irrigadas. Coloca,
ainda, que a aplicação sistemática e generalizada de amplas subvenções públicas a
política de irrigação baseada em águas superficiais perverteu o sentido original de
interesse publico ou interesse geral, desembocando em um modelo ineficiente ou
insustentável.
Segundo a Directiva (2000), na maioria dos países em desenvolvimento, o
crescimento econômico rural é uma condição prévia fundamental para o crescimento
econômico geral. A integração da gestão do solo e dos recursos hídricos é essencial para
a segurança alimentar e do abastecimento de água, sobretudo em zonas em que
rivalidades em torno dos recursos hídricos, exigindo uma maior eficiência na utilização
da água para a agricultura, o setor que mais água doce consome, a fim de reduzir a
pressão sobre os recursos.
Segundo Santos (2002), a gestão de recursos hídricos tem um forte componente
executivo (expresso nos planos), enquanto que a gestão ambiental é basicamente
regulatória. Por outro lado, a gestão de recursos hídricos incorpora parcialmente a gestão
ambiental, por definir a outorga em função de licenciamento ambiental ou padrões de
qualidade de água e por definir os valores dos instrumentos ambientais de acordo com
cenários de qualidade da água a serem atingidos em prazos definidos.
A Tabela 1 a seguir apresenta a visão da autora sobre a gestão dos recursos
hídricos e seus instrumentos.
Por vezes, a preocupação com a gestão das bacias é focada principalmente nos
usos mais fáceis de controle. Setti et alli (2001), colocam textualmente que quando
baixa densidade demográfica, ocupação rarefeita do solo e pouco desenvolvimento
industrial, o uso da água não exige maiores cuidados quanto ao controle. À medida que o
uso torna-se mais intensivo, é necessário atenção para a proteção dos recursos hídricos,
20
visando o seu aproveitamento racional. Bacias com uso pouco intensivo do solo, baixa
densidade demográfica e incipiente atividade industrial são maioria entre as bacias
hidrográficas do sul do Rio Grande do Sul (Santa Maria, Quaraí, Ibicuí, Piratini, Jaguarão,
Lagoa Mirim, entre outras). Em algumas destas mesmas bacias, o uso de água só é
intensivo em parte do ano, mas o conflito existe, revelando que tal afirmativa não pode ser
generalizada.
Tabela 1 Instrumentos de gestão de recursos hídricos, abordagem, critérios,
formas de negociação e interlocutores
Instrumentos de
gestão
Abordagem/Critérios
Negociação/Interlocutores
Comando
Outorga baseada em objetivos de
qualidade de água (WQO). Análises
necessárias:
Disponibilidade hídrica x uso solicitado
Eficiência do uso
Uso solicitado x licenciamento
Negociação entre usuários,
poder outorgante e sociedade
civil para fixação dos
objetivos de qualidade de
água; negociação entre
outorgante e outorgado caso a
solicitação seja para uso com
baixa eficiência ou restrição
no licenciamento
Controle
Automonitoramento das fontes
Monitoramento do meio (medições,
denúncias)
Fiscalização com base na outorga
Multas com base na outorga
Negociação entre usuário e
licenciador para definição de
Termo de Ajuste de Conduta
no caso de não atendimento
das exigências
Econômicos
Cobrança pelo uso da água, baseada em:
Análises custo-efetividade para atingir os
objetivos de qualidade ambiental
Rateio de custos de investimentos
Restrições derivadas de políticas, do
impacto sobre atividades econômicas e
outras.
Compensação pela redução do uso
quantitativo
Baseada em disposição a pagar (DAP) do
usuário
Restrições de ordem social e política
Royalties e compensações financeiras pelo
uso da água ou áreas inundadas
Negociação entre usuários,
poder outorgante e sociedade
civil para fixação de valores
de cobrança e critérios de
racionamento
Executivos
Planos de investimentos
Objetivos ambientais e
econômico-financeiros
fixados em negociação entre
usuários, poder outorgante e
sociedade civil
Adaptado de Santos, 2002.
De acordo com Rogers et alli (2001), existem diversos princípios envolvidos na
avaliação do valor econômico da água, desde os custos diretos e indiretos de sua provisão
21
à garantia de seu fornecimento com a qualidade necessária. Estes podem ser determinados
de forma individual para cada setor ou para o sistema como um todo. A estes custos
devem ser somados os custos de oportunidade e o valor de usos alternativos. Na existência
de um mercado da água, este deve estabelecer um equilíbrio entre a oferta e a demanda,
desde que existam políticas apropriadas capazes de eliminar o efeito das externalidades.
Se estes mercados não existirem, a distribuição eficiente da água pode ser solucionada
com a aplicação de modelos de analises de sistemas multi-períodos e multi-geográficos.
Se estes modelos não podem ser aplicados, devem ser estimados os custos de
oportunidade da água para os diferentes setores econômicos. Para a irrigação pode-se
prever dificuldades em realizar esta estimativa, já que este setor consome cerca de 70% da
água utilizada no mundo.
Em relação ao uso da água, a Comunidade Econômica Européia expressa
preocupações em escala mundial, em especial a situação dos países em desenvolvimento.
Neste grupo de nações, muitas estão em uma fase de transição de um cenário de gestão
baseada na oferta para um cenário de gestão baseada na demanda (Comunidade, 2002) o
que é descrito como uma escada de gestão das águas: quando a procura e a concorrência
são baixas, isto é, quando o acesso é relativamente fácil, o custo é baixo e o sistema
técnico e institucional pode ser relativamente simples. Uma maior demanda pela água
levará inicialmente a necessidade de ajustes técnicos para aumentar a oferta, isto é, ainda
mantendo uma fase de gestão orientada para a oferta. Novos aumentos de demanda
deverao conduzir a uma concorrência intersetorial e aumento das preocupações
ambientais. Estes desafios de gestão não podem ser resolvidos apenas por intervenções
orientadas para a oferta, sendo necessário aplicar estratégias de gestão da demanda.
Gradualmente, torna-se inevitável fazer a "melhor utilização possível" da água, o que
exige a concepção de modalidades institucionais adequadas.
A gestão dos recursos hídricos com vistas a controlar a oferta pode levar a uma
situação de inversão dos objetivos pretendidos inicialmente. Arranjo (2000) acrescenta
que a irrigação com águas superficiais na Espanha seguiu uma estratégia de oferta
subvencionada pelo Estado, que gerou uma espiral de demandas, seguindo uma
expectativa de custos quase nulos para os irrigantes.
No Brasil, a adoção de um modelo de aumento de oferta, com investimentos
públicos, foi acompanhada, a partir da década de 80, de medidas de caráter regulatório,
especialmente em relação à preservação ambiental. No entanto, o arranjo institucional
implantado demontrou-se ineficaz no sentido de fazer cumprir essa legislação. A efetiva
22
mudança da gestão de recursos hídricos foi efetivada no final da década de 90, com a
criação do Sistema Nacional de Recursos Hídricos e da Agência Nacional de Águas.
Numa situação de demanda crescente, o desafio consiste em reduzir esta demanda
e aumentar, simultaneamente, a produção por unidade de água consumida. A adoção de
um valor para a água para todas as suas utilizações e de uma correspondente taxação pelo
seu uso, bem como para a aplicação de multas ou taxas pela degradação da água, é a
tendência atual em termos de gestao.
UNESCO (2006) apresenta um quadro referencial sobre a gestão de água na
irrigação, conforme a Tabela 2.
Verifica-se que o complexo arranjo apresentado inclui os instrumentos previstos
na legislação brasileira, como outorga, licenciamento, cobrança, sistemas de informações e
planos de bacia. No nível da gestão dos sistemas de irrigação, verifica-se uma tomada de
posição sobre a flexibilidade do fornecimento da água, o que terá, conforme discutido
adiante, que considerar a lógica de concepção do próprio projeto de irrigação. Além disto,
apresenta a cobrança de tarifas no nível federal e também a possibilidade de subsídios
agrícolas.
As decisões relativas aos preços da água, de acordo com Comissão (2002) não
devem ser restritas à recuperação dos custos dos serviços, mas sim incorporar os
necessários custos da proteção do ambiente contra os resíduos e a poluição, o "princípio
do poluidor-pagador". Contudo, também é importante satisfazer as necessidades básicas
dos grupos pobres e vulneráveis concebendo as estruturas tarifárias e os sistemas de
cobrança de forma apropriada. Dada a sensibilidade das questões relativas aos preços,
que desenvolver os mecanismos de fixação dos preços de forma transparente, com a
participação dos utilizadores, incorporar incentivos adequados e introduzir os novos
regimes de preços de forma faseada.
23
Tabela 2 - Governança da água na agricultura, em diferentes níveis institucionais
Água
Terra
Infraestrutura
Serviços prestados pelo
mercado
Produtor
Acesso à água, direito à água,
mercados de água
Acesso à terra, posse da
terra, tamanho da
propriedade
Acesso à tecnologia, incluindo
irrigação
Acesso a insumos e aos
mercados consumidores
Associação de
produtores
Direito à água, distribuição da
água, equidade, contabilidade
Perímetros irrigados
Cooperativas de produtores,
associações, previsão
meteorológica
Gestor do sistema de
irrigação
Pontualidade, equidade e
flexibilidade da distribuição da
água
Métodos produtivos e
licenciamento
Gestão do sistema de distibuição e sua
manutenção; recuperação de custos;
transparência, contabilidade
Estradas e outras estruturas
do perímetro
Governo local
Outorga e licenciamento,
resolução de conflitos
Planejamento do uso da terra
Descentralização, desenvolvimento de
novas estruturas
Infra-estrutra de
comercialização e transporte;
acesso a financiamentos,
informações de mercado
Autoridade da bacia
Alocação setorial da água;
monitoramento da qualidade de
água; preservação da qualidade
da água
Conservação do solo,
proteção contra erosão
Planejamento das infra-estruturas
principais; desdnvolvimento e gestão
Governo nacional
Política de água e legislação;
arranjo institucional
Política de uso da terra e
legislação; cadastro;
planejamento do uso da terra
Política e legislação de
descenntralização; desenvolvimento
de infra-estrutura; recuperação de
investimentos; mecanismos de
financiamento de infraestrutura;acesso
a recursos para agentes locais
Políticas e legislação sobre
segurança alimentar,
desenvolvimento rural,
fomento - tarifas e subsídios;
autosuficiância alimentar;
financiamento rural
Nível regional
Bacias transfronteiriças,
segurança de abastecimento
Infra-estrutura de compartilhamento
da água transfronteiriça
Acordos regionais de
fomento
Global
Segurança internacional e
solidariedade
Subsídios agrícolas e tarifas
UNESCO (2006), página 246.
24
A água, no entanto, apresenta características que dificultam a fixação deste preço
(Alvim e Carraro, 2006). A água tem várias utilidades, podendo ser utilizada para
abastecimento humano, industrial, dessedentação animal, irrigação, diluição de esgotos,
preservação de ambientes, navegação, entre outros. A oferta natural da água neste
“mercado” é normalmente instável, pois sofre significativas variações quali-quantitativas
no espaço e no tempo.
Segundo o Consórcio Catamayo-Chira (2005), a tarifa da água na agricultura
irrigada cumpre três funções básicas: econômica, financeira e social.
A função econômica busca o uso eficiente da água; a expressão deste valor é o
preço marginal, que por sua vez é igual ao “custo marginal” da água (“valor marginal social
líquido” do recurso água, tomando em conta os efeitos secundários positivos e negativos.
Se a tarifa é maior do que o custo marginal se utilizará menos água; por outro lado, se a
tarifa é menor que o custo marginal se utilizará mais água e haverá o desperdício do
recurso.
Na função econômica, o valor da água tende a ser elevado e é definido pelas
condições intrínsecas da água, que é indispensável para a produção agrícola irrigada, a
geração de energia elétrica, o abastecimento de água potável, e ao mesmo tempo, por ser
um elemento muito escasso em algumas situações, seja no espaço, seja no tempo.
A função financeira da tarifa é a recuperação de custos de investimentos, de
administração, de operação e manutenção dos sistemas de irrigação e das obras acessórias
construídas por causa destes sistemas. Por fim, a função social é geralmente atribuída à
agricultura e tem por objetivo garantir a distribuição equitativa do recurso disponível entre
os agricultores. A definição desta parcela é realizada considerando a capacidade de
pagamento e/ou o benefício adicional recebido pelos agricultores devido ao uso da água na
produção agrícola irrigada.
O custo total da água deve ser avaliado em unidades monetárias por m³, desde que
se disponha de estruturas de medição e controle da água entregue a cada usuário. No caso
contrário, a cobrança na agricultura pode ser, opcionalmente, por área irrigada, a partir da
adoção de um valor médio de consumo de água por hectare. A parcela social, ao considerar
a capacidade de pagamento, pode influenciar a tarifa para cima ou para baixo, de forma a
25
não inviabilizar a produção dos agricultores mais pobres ou com menor rentabilidade na
exploração agrícola.
Segundo Rogers et alli (2001), os custos totais são representados por:
Custo de oferta total inclui os custos associados ao abastecimento de água,
sem considerar as externalidades nem os custos alternativos da água. Este custo aproxima-
se do custo marginal de longo prazo da água e é composto por dois itens distintos:
o Custo de operação e manutenção considera os gastos com energia
elétrica, o trabalho envolvido, os materiais e isnumos necessarios para o manejo e operão
das plantas de tratamento de água, distribuição e armazenamento;
o Custos de capital referem-se aos custos de depreciação e de juros
referentes ao capital utilizado na implantação das estruturas necessarias para efetuar o
abastecimento de água.
Custo econômico total é obtido pela soma do custo de oferta total com o
custo de oportunidade associado ao custo alternativo do mesmo recurso (água) e as
exteralidades econômicas impostas.
o Custo de oportunidade este custo existe pelo fato de que se um
setor consome o recurso água, está impedindo o seu uso por um outro setor. Se este último
valora mais a água, existe um custo que a sociedade arca, gerado por esta distribuição de
água por um menor valor. Este custo será nulo se não houver escassez de água. A não
inclusão dos custos de oportunidade leva a uma sub-estimação do valor da água e leva à
distribuição do recurso. Para a irrigação, este valor pode ser de difícil mensuração, pela
importância do volume consumido, entre 60 e 80% do volume total utilizado em algumas
bacias.
o Externalidades econômicas as externalidades possíveis no caso da
água são muitas, desde as positivas, como a recarga dos aquiferos pela percolação profunda
da água de irrigação, às negativas, como a contaminação por despejos de uma cidade a
montante ou pela contaminação da água subterrânea com sais, observada nas áreas
irrigadas.
26
Custo total do consumo de água é obtido pela soma do custo econômico
total com as externallidades do meio ambiente, que considera os impactos causados pelo
uso da água ou dos custos de tratamento adicionais capazes de devolver o recurso à sua
condição inicical, desde que esta informação esteja disponível. O Custo Total do Consumo
de Água deve ser igual ao Valor de Uso, para que haja um equilíbrio econômico
A figura 1 apresenta os principios gerais para estimar o custo da água.
Figura 1 Componentes do custo total da água (Fonte: Rogers et alli, 2001)
Quanto ao valor de uso da água, Rogers et alli (2001) apresentam a seguinte
composição, ilustrada na figura 2.
Valor para os usuários da água refere-se ao valor obtido por análises, por
exemplo, do valor marginal da água de uso agrícola ou da disposição a pagar.
Benefícios dos fluxos de retorno avalia o efeito dos volumes “perdidos”
por infiltração, por exemplo, sobre a recarga dos aquíferos ou para os ambientes a jusante
de áreas agrícolas irrigadas
27
Benefícios do uso indireto usos complementares da água armazenada e
distribuída para um determinado uso para outras finalidades, como o abastecimento
humano e a dessedentação animal com o uso da água transportada em sistemas de canais
para irrigação
Ajustes por objetivos sociais avalia o resultado do uso da água para
objetvos sociais, como redução da pobreza, o emprego e a segurança alimentar
Valor intrínseco variável de difícil mensuração, visa identificar o valor
referente à existência da água. Pode ser associado ao valor dado à visão hídrica associada a
obras de irrigação, por exemplo.
Figura 2 Componentes do valor de uso da água (Fonte: Rogers et alli, 2001)
A aplicação destes princípios em uma área irrigada na região árida da Índia (Rogers
et alli (2001)) possibilitou a definição do custo e do valor da água para a agricultura
irrigada. O valor da água foi determinado pela diferença entre as margens brutas da
produção com e sem irrigação, dividida pelo volume de água desviado para a irrigação, isto
é, incluindo as perdas por transporte, condução e distribuição. O valor do produto agrícola
obtido foi de US$ 0,019/de água. O ajuste por objetivos sociais considerou a geração de
28
empregos por conta da produção agrícola, elevando-se o valor inicial em 50%, obtendo-se
US$ 0,028/m³. Os beneficios do uso da água sem ser para a irrigação foram estimados em
US$ 0,01/m³, considerando-se as facilidades obtidas para o abastecimento doméstico e o
gado. Por fim, os benefícios do fluxo de retorno foram estimados em US$ 0,005/m³, a partir
do efeito positivo sobre a disponibilidade das águas subterrâneas na região da irrigação. O
valor final resultou em US$ 0,062/m³.
Quanto aos custos, foram considerados US$ 0,002/m³ para a operação e manutenção
dos sistemas; US$ 0,038/m³ para os custos de capital; US$ 0,015/m³ para as despesas com
o bombeamento da água; e US$ 0,03/m³ como o custo de oportunidade para as famílias
urbanas. Estes valores, mais o custo do bombeamento (US$ 0,037/m³) somam US$
0,087/m³, o que representa o Custo Econômico Total do abastecimento hídrico para a
irrigação. Como os dois valores diferem entre si (US$ 0,062/m³ e US$ 0,087/m³), os
autores concluem que este uso não é sustentável.
Rogers et alli (2001) colocam que quando os usuários enfrentam uma composição
de custos econômicos totais, que incluem os custos de oferta, de capital e os custos de
oportunidade, o valor da água será o do seu melhor uso alternativo possível. No caso da
irrigação, o custo de oportunidade dependerá da existência destas outras oportunidades de
uso e dos custos de transferir a água entre estes possíveis usuários, o que inclui outros
agricultores, cidades e indústrias. O custo de oportunidade para a irrigação tende a diminuir
rapidamente, logo que todas as possibilidades de transferências custo-eficientes tenham se
esgotado. O valor deste custo tende a zero ou próximo de zero, depois de atendidas as
necessidades dos outros setores usuários.
A cobrança pelo uso dos recursos hídricos está vinculada, filosoficamente e
legalmente, a execução de planos de bacia, nos quais estão previstas intervenções
estruturais e não-estruturais, que são financiadas pelos recursos arrecadados pelos
instrumentos econômicos. Estes podem incorporar os princípios destacados por Rogers
(2001), de forma total ou parcial, de acordo com a decisão dos Comitês de Gerenciamento.
Pela legislação brasileira, cabe ao Comi de Gerenciamento definir tanto os
critérios de outorga como o enquadramento da água em classes de qualidade e o valor da
29
água para os diferentes usos. Nesta situação teórica, a irrigação poderia ser preterida em
relação aos demais usos na bacia, desde que a sociedade aceitasse arcar com os custos
referentes à transferência da água entre os setores.
Arrojo (2000) considera que uma nova politica de preços para a água de irrigação na
Espanha não deveria contemplar apenas os aspectos quantitativos, mas também os
qualitativos, sendo esta também a posição estabelecida na Diretiva Quadro da Água. Barth,
citado por Silva e Pruski (2000), coloca que irrigação tem alto uso consuntivo, de 90%, e
altera a qualidade da água com carreamento de agrotóxicos e fertilizantes.
Santos (2002) relata que a estimativa de receita do Plano Estadual de Recursos
Hídricos do estado de São Paulo para o período 2000-2003 dificilmente será atingida. Isto
porque cerca de 30% deveria vir do setor agrícola, que tende a ser isento ou pagar valores
muito reduzidos, diante do forte lobby do setor contra a aprovação da cobrança na
Assembléia Legislativa. BRASIL (2001) cita a exclusão do setor agrícola da cobrança no
estado de São Paulo, e de um projeto de lei estadual isentando esta cobrança até 2004.
Neste plano, o setor agrícola não pagaria a taxa referente à captação, apenas a referente ao
consumo, mesmo com uma expectativa de captação do setor agrícola de 180 m³/s, ou 45%
de um total de 400 m³/s utilizados.
No caso do Ceará, Santos (2002) apresenta valores a serem cobrados ao setor
agrícola que variam de um mínimo de R$ 0,0011/m³, passando por valores intermediários
de R$ 0,02/m³ e R$ 0,028/m³ e até R$ 0,30/m³, que é o caso da Adutora de Quixadá. No
entanto, a autora relata que os irrigantes são muito resistentes a pagar pela água, seja pela
baixa capacidade de pagamento, seja por uma cultura arraigada, onde o agricultor
acostumou a “ter” ou “não ter” água, como uma benesse ou uma incompetência. Por fim,
coloca que apenas os irrigantes localizados no Vale do Acarape (R$ 0,004/m³) e do
Jaguaribe (R$ 0,01/m³) estariam pagando pela água utilizada.
Na bacia do rio Paraíba do Sul, a cobrança pela água foi definida em 06 de
dezembro de 2001, sendo o valor calculado pela expressão:
PPUKKKKKQCobrança
cap
.11
32110
4.1
sendo:
30
Q
cap
: corresponde ao volume captado durante um mês (m³/mês)
K
0
: multiplicador do preço unitário para a captação, definido pelo Comitê de Bacia
(CEIVAP)
K
1
: coeficiente de consumo de água para atividade, que relaciona a quantidade
retirada do manancial e a que retorna a ele;
K
2
: percentual do volume de efluentes tratados em relação ao volume total de
efluentes
K
3
: eficiência de redução de DBO
PPU: preço público unitário correspondente à cobrança pela captação, consumo e
diluição de efluentes, definido pelo CEIVAP em 2001 como R$ 0,02/m³.
Segundo SANTOS (2002), a cobrança pela captação das indústrias e do
saneamento, com a aplicação do sistema de descontos vigente à época, seria de R$
0,008/m³, enquanto que a cobrança pelo consumo seria de R$ 0,02/m³. A soma dos dois
valores, portanto, significaria um valor total de R$ 0,028/m³ captado e consumido, e um
valor médio entre R$ 0,02 e R$ 0,028/m³, dependendo do grau de consumo. Serrichio et alli
(2005) confirmam os valores apresentados acima e apresentam uma variação entre R$ 0,00
a R$ 0,02/m³ para uma redução entre 100% e 0% da DBO do efluente lançado,
respectivamente. Para a agricultura, o valor do PPU é reduzido para R$ 0,0005/m³, com um
fator de consumo K
0
=0,4, mas o valor final deve ser limitado a 0,5% do custo de produção.
A Tabela 3 a seguir apresenta os valores arrecadados na bacia pela Agência
Nacional de Águas (ANA), entre os anos de 2003 e 2005. A ANA realizou um estudo sobre
aplicação do principio usuário pagador na região do Guaíba, no Rio Grande do Sul,
adotando os valores atualizados (2007) do CEIVAP e outras propostas de taxa, num total de
quatro cenários. Também definiu o tempo necessário para arrecadar os recursos necessários
para custear a implantação do Plano de Bacia. Estes valores são apresentados na Tabela 4 a
seguir. O estudo demonstra a dificuldade de realizar o balanço hídrico das lavouras
irrigadas, pela inexistência de lançamentos pontuais da drenagem. O retorno da água ao
sistema hídrico ocorre também por infiltração e de forma difusa, sendo de difícil
31
mensuração. Foram estabelecidos coeficientes de consumo para as lavouras, sendo que para
a lavoura de arroz considerou-se um consumo médio de 40% da água bruta captada.
Tabela 3 Arrecadação por setor usuário de água entre os anos de 2003 e 2005 na
bacia do rio Paraíba do Sul, em Reais (R$)
Setor
2003
2004
2005
Indústria
2.767.648,70
2.182.688,19
1.472.521,12
Irrigação
3.842,55
2.098,23
3.673,43
Dessedentação animal
-
243,94
133,06
Mineração
-
368,21
976,96
Outros usos
2.758,02
17.139,83
21.016,01
Saneamento
3.129.788,88
4.113.782,99
4.432.118,70
Total
5.904.038,15
6.316.321,39
5.930.439,28
Fonte: Serrichio (2005)
Tabela 4 Aplicação do PUP sobre a Região Hidrográfica do Guaíba, RS, e seu
efeito na arrecadação dos recursos necessários à execução do Plano de Bacia
Tipo de uso
PPU
Unida
de
Valor (R$/unidade)
Cenário
1
2
3
4
Captação de água bruta
PPU
cap
0,01
0,02
0,03
0,10
Consumo de água bruta
PPU
cons
0,02
0,04
0,06
0,20
Lançamento de carga orgânica (DBO
5,20
)
PPU
DBO
Kg
0,07
0,14
0,21
0,70
Tempo de arrecadação (anos)
51
25
17
5
Obs.: o Cenário 1 corresponde aos valores propostos pelo CEIVAP, Deliberação 65
(28/09/2006). Fonte: ANA, 2007.
32
O valor do consumo de água na lavoura de arroz tem recebido críticas por parte de
técnicos que atuam no setor orizícola. Pugatch (2007) coloca que
Quem utiliza a água a toma emprestado da natureza, a utiliza por um determinado
período, e a devolve com um volume idêntico ao que retirou. A população em geral tem a
idéia, incorreta, de que a água que chega, por exemplo, em uma lavoura de arroz, ali
acaba sumindo! Ou acaba se transformando em arroz, através de um processo químico!
Não, isso não acontece, absolutamente! O ciclo hidrológico vigente no planeta é fechado, e
a substância água é imutável em volume e quantidade no decorrer do tempo.(...) Na
lavoura de arroz a água que chega através da irrigação toma os seguintes destinos:
infiltra-se no solo, retornando ao meio ambiente, ou escorre para o curso d’água mais
próximo, ou evapora-se para a atmosfera. Uma pequena parte encerra-se na biomassa
verde das plantas, incorporando-se, portanto de novo à natureza. Apenas uma pequena
parcela, aquela que acompanha o produto nas prateleiras do supermercado e que se
constitui de aproximadamente doze por cento do peso, é que sai das fronteiras do processo
produtivo do arroz. Porém, esta água, ao ser consumido o produto, em qualquer parte do
globo, voltará ao ciclo hidrológico através do metabolismo dos seres humanos que a
utilizaram.
Tal afirmativa está completamente desvinculada de dimensões espaço-temporais
aplicáveis para o gerenciamento de uma bacia hidrográfica, no qual os tempos necessários
para a infiltração e fluxo da água pelo solo, decomposição da massa verde, precipitação
pluviométrica da água evaporada e metabolização do arroz consumido pelos seres
humanos, são incompatíveis com as necessidades imediatas e concomitantes de captação de
água para o abastecimento humano, manutenção de ecossistemas e outros usos da água.
Porém, a sua simples colocação como uma possibilidade válida para discutir o ciclo
hidrológico de uma bacia hidrográfica na qual a agricultura irrigada esteja presente, leva a
uma contestação do setor da irrigação da real necessidade de pagar por um volume de água
que, pelo raciocínio apresentado, não foi consumido.
Villasante (2005) realiza uma análise hidrológica sobre este tema. Coloca que o
conceito de eficiência pelo uso da água na irrigação leva às pessoas a terem uma idéia de
que toda a água não consumida é perdida, utilizando o mesmo raciocínio válido para a
33
engenharia ou para a indústria, por exemplo. No caso da agricultura irrigada, a fração de
água que se infiltra na rede de distribuição ou na lavoura pode retornar ao fluxo superficial
diretamente pelo sistema de drenagem e, se tiverem qualidade suficiente, podem ser
reutilizadas, o mesmo acontecendo com o excesso de água superficial ou com a drenagem
dos quadros. Portanto, sua condição de ser perdida depende do (i) âmbito espacial,
considerando a área da bacia hidrográfica e as estruturas disponíveis para captar e reutilizar
essa água; e (ii) do âmbito temporal, que os fluxos que se incorporam aos rios ou aos
aquíferos geram uma disponibilidade com defasagens de tempo variadas.
Se uma quantidade de água pode ser recuperada dentro do próprio sistema de
irrigação, faz-se uma economia interna de água. Se a água recuperada pode ser utilizada em
outro sistema externo ao projeto de irrigação, mas dentro da mesma bacia hidrográfica,
verifica-se que o volume perdido passa a ter outra avaliação.
O autor defende o uso de expressões como fração consumida e fração reutilizável
para avaliar com maior propriedade as possíveis economias de água em processos de
modernização de sistemas irrigados. Definidas as frações, é necessário definir-se também o
âmbito geográfico de análise, que pode ser o canteiro irrigado, a quadra de irrigação, a zona
irrigável ou a bacia hidrográfica. Considerando que os retornos de água nos níveis mais
simples são potencialmente mais fáceis de serem recuperados nos níveis mais complexos
analisados, a utilidade da água pode ser maior na bacia do que a soma das utilidades da
água nas zonas irrigáveis ou a soma da utilidade da água nos canteiros pode ser menor do
que a utilidade da água na quadra que os contém. Assim, o valor aceitável para a fração
consumida em um canteiro pode ser menor do que o valor aceitável para a quadra, que pode
ser menor do que a zona irrigável, que por sua vez pode ser menor do que a da bacia.
Mesmo assim, os fluxos retornados à rede de drenagem a partir de uma zona
irrigável são perdidos para esta zona, já que não beneficiam a produção irrigada. Os
irrigantes que investiram recursos para armazenamento, transporte e distribuição desta água
terão que também pagar pelo volume utilizado, porém não consumido.
Voltando à proposta da ANA, especificamente para o caso da irrigação, o valor a ser
arrecadado foi definido pela seguinte expressão:
34
consconscapcons
KPPUQValor
4.2
sendo K
cons
igual a 0,4.
Neste estudo destaca-se a tendência de minorar as taxas para a irrigação, pois,
embora este setor consuma 72,7% do total da região hidrográfica, a sua arrecadação atinge
apenas 9% do montante projetado. Por não terem sido considerados os efeitos da cobrança
sobre as atividades econômicas, estas participações são constantes para todos os cenários, já
que as taxas propostas são elevadas na mesma proporção.
O trabalho de Forgiarini et alli (2007) analisa a situação da bacia do rio Santa
Maria, no Rio Grande do Sul, que apresenta uma economia predominantemente agrícola,
basicamente orizicultura. Em pesquisa junto aos membros do Comitê de Gerenciamento da
bacia, a totalidade dos entrevistados apontou que o setor agrícola é o responsável pelos
problemas de ordem quantitativa na bacia.
Os autores, citando Pearce e Turner, colocam que a aplicação de instrumentos
econômicos na política de gerenciamento dos recursos hídricos tem por princípio o
incentivo à mudança dos padrões de consumo dos usuários. Os mesmos autores, citando
pesquisas de opinião pública do WWF, realizadas no Brasil em 2005 e 2007 pelo IBOPE,
apontam que 63% e 60% da população acreditam que a cobrança pelo uso da água mudará
os hábitos dos usuários. Também concluem que a maior parte dos representantes do Comitê
entende que a cobrança deve arrecadar os recursos necessários para a implantação do plano
de bacia; no entanto, os autores apontam que estes são superiores aos que se pode arrecadar
com a cobrança pelo uso da água, dado o perfil das atividades econômicas da bacia. Neste
trabalho, cerca de 30% dos usuários rurais apontam que o valor a ser cobrado deve ser de
0,5% do custo de produção, sendo este o valor modal das respostas. O mesmo valor
referencial aparece no caso da bacia do rio Paraíba do Sul (Serrichio et alli, 2005).
De acordo com IRGA, o custo de produção do arroz irrigado apresenta um valor
médio referencial de US$ 1.952,15/hectare para as últimas safras ( INSTITUTO, 2008).
Assim, o valor a ser cobrado por esta proposição seria igual a US$ 9,76/hectare ou 0,65
sacos/hectare. Silva et alli (2007) colocam que para definição da taxação podem ser
utilizados os conceitos econômicos de elasticidade-renda e elasticidade-preço. Ribeiro et
35
alli (1999), citando Andrade (1995) colocam que os objetivos de se conhecer uma curva de
demanda por água são:
a) conhecer as variáveis que determinam a quantidade demandada;
b) estimar as elasticidades-preço e renda da demanda;
c) estudar o efeito que diferentes estruturas de taxa possam ter sobre a receita e
sobre a quantidade consumida de água;
d) fazer a projeção da quantidade demandada de água a fim de dimensionar as
necessidades
Os autores seguem classificando a água como um bem normal, ou seja, aquele cujo
consumo aumenta se a renda do consumidor aumenta.
O valor da elasticidade-renda é determinado pela expressão:
RRQQE
R
///
4.3
onde E
R
é a elasticidade-renda da demanda; Q é a quantidade demandada e R é a
renda do usuário.
Por sua vez, a elasticidade-preço é dada pela expressão:
PPQQE
P
///
4.4
onde E
P
é a elasticidade-preço da demanda; Q é a quantidade demandada e P é o
preço do bem.
A Tabela 5 a seguir apresenta a classificação dos bens de acordo com a
elasticidade-renda.
A Tabela 6 a seguir apresenta a classificação da demanda por bens de acordo com a
elasticidade-preço.
Sobre a elasticidade-preço para os consumidores agrícolas, os autores colocam que
existem poucos estudos sobre o assunto. Estudo realizado na Califórnia na década de 70,
encontrou valores de elasticidade de 1,5, para culturas com preço de mercado mais baixo, e
de 0,46, para culturas de maior valor. Para este último grupo, a demanda é portanto
36
praticamente inelástica, ou seja, o consumo de água diminuirá menos que
proporcionalmente à elevação do preço cobrado.
Tabela 5 Classificação de bens quanto à elasticidade-renda (E
R
)
Se
O bem é
Se
A quantidade
demandada
0<E
R
<1
Normal
R
R↓
Q↑
Q
E
R
<0
Inferior
R↑
R↓
Q↓
Q
Fonte: Ribeiro et alli, 1999.
Tabela 6 Classificação da demanda (Q) quanto à elasticidade-preço (E
P
)
Se
A demanda é
Se
A quantidade demandada
Receitas totais
(P,Q)
E
P
<1
Preço-
inelástica
P↑
P↓
Q↓ menos que
proporcionalmente
Q↑ menos que
proporcionalmente
Aumentam
Diminuem
E
P
=1
Elástica-
unitária
P↑
P↓
Q↓ proporcionalmente
Q↑ proporcionalmente
Constantes
Constantes
E
P
>1
Preço-elástica
P↑
P↓
Q↓ mais que proporcionalmente
Q↑ mais que proporcionalmente
Diminuem
Aumentam
Fonte: Ribeiro et alli, 1999.
37
Kunimitsu (s.d. ), em estudo realizado no Japão, concluiu que:
no caso do arroz, a demanda é inelástica em relação ao preço da água;
o preço sugerido pela aplicação do Método de Valoração Contingente não é
suficiente para cobrir os reais custos da água de irrigação;
o valor sugerido para o preço da água é afetado pelo preço do arroz e pela
produtividade da lavoura.
Carrera-Fernandez e Garrido (2002) apresentam valores de elasticidade-preço para a
irrigação em diferentes bacias da Bahia, conforme Tabela a seguir. A Tabela também
apresenta os preços de reserva (ou custo de oportunidade) e os preços ótimos a serem
cobrados dos irrigantes. O preço ótimo é definido de forma a garantir sustentabilidade ao
sistema de gestão de recursos hídricos na respectiva bacia hidrográfica, sendo obtido pelo
seguinte sistema de equações:
j
jj
jjj
Cxp
jCMgp
0
,/
*
**
4.5 e 4.6
onde p
j
*
é o preço ótimo da água no uso j; x
j
é a respectiva quantidade de água
demandada após terem sido realizados os investimentos programados (no plano de
investimentos da bacia), CMg
*
é o custo marginal de gerenciamento da água, ε é a
elasticidade-preço do uso j, em valor absoluto; C é o custo total do sistema de gestão da
bacia e α é uma constante de proporcionalidade que reflete a diferença entre benefícios e
custos marginais, a ser determinado.
A primeira equação pode ser facilmente rearranjada, de forma a demonstrar que o
diferencial no preço da água em cada um dos usos j previstos em relação ao custo marginal,
em termos percentuais, é inversamente proporcional a sua elasticidade-preço da demanda:
jpCMgp
jjj
,//
**
4.7
Na decisão pelo valor a ser adotado no pagamento pela água, os autores colocam
que se os preços ótimos forem maiores do que o preço de reserva, este deve ser o valor
adotado, pois representa a capacidade de pagamento dos irrigantes. No caso oposto, com
38
preço ótimo inferior ao preço de reserva, o primeiro valor é que deve ser adotado e não é
esperada resistência na sua implantação, uma vez que está dentro da capacidade de
pagamento.
Por outro lado, assumindo-se que o custo de gerenciamento da bacia deve ser
plenamente coberto pela arrecadação dos diferentes setores, é necessário que o déficit
originado no setor de irrigação seja coberto por uma elevação do preço ótimo de outros
setores, sendo que, nas bacias apresentadas, a situação mais evidente deste desvio é a bacia
do Verde-Jacaré, no qual a irrigação deve alocar cerca de 840 avos do valor ótimo definido.
Os valores de elasticidade-preço mostram um comportamento essencialmente
inelástico, mas com variações entre si. bacias em que o comportamento dos irrigantes é
próximo da elasticidade-unitária, ao lado de outras, onde a demanda apresenta-se como
totalmente inelástica, com valores próximos a zero. Esta variação trará efeitos diversos para
a implantação da cobrança pelo uso da água, sendo que este comportamento deve estar
vinculado ao padrão de uso da água na agricultura irrigada.
Tabela 7 Valores propostos para a cobrança da água de irrigação e a elasticidade-
preço para as bacias hidrográficas do estado da Bahia
Bacia
Preço de
reserva
(US$.m-³)
Preço ótimo
Sem restrição
(US$.m-³)
Elasticidade-
preço
Verde Jacaré
1,64x10
-3
1,38
0,17
Alto Grande
2,60 x10
-3
7,42x10
-4
0,02
Corrente
2,63 x10
-3
1,32x10
-3
0,19
Contas
2,40 x10
-3
5,69x10
-2
0,14
Salitre
2,21 x10
-3
7,16x10
-2
0,74
Médio e Baixo Grande e margem esquerda
do Lago
2,11 x10
-3
6,78x10
-4
0,88
Margem direita do Sub-Médio São
Francisco
3,35 x10
-3
6,73x10
-4
0,93
Paramirim
2,46 x10
-2
6,61x10
-2
0,02
Médio e Baixo Paraguaçu
1,71 x10
-3
9,04x10
-4
0,57
Recôncavo Norte e Inhambupe
7,08 x10
-3
7,32x10
-4
0,77
Recôncavo Sul
2,15 x10
-3
1,13x10
-3
0,43
Alto Paraguaçu
9,89 x10
-3
8,00x10
-4
0,39
Itapicuru
2,17 x10
-3
9,91x10
-3
0,58
Fonte: Carrera-Fernandez e Garrido (2002)
39
Sousa Júnior (2004) coloca que a maior parte dos estudos de situações de demanda
no Brasil caracteriza a água como um bem de demanda inelástica. Como na modelagem
econômica das propostas de cobrança pela água usualmente se assume um comportamento
uniforme para a elasticidade-preço, para facilitar a análise, a água tende a sempre ser
tratada como de demanda inelástica. Citando Serôa da Mota, o autor conclui que a
determinação clássica de preços públicos privilegia usuários com maior elasticidade-preço
de demanda em detrimento daqueles que possuem perfis inelásticos.
A Diretiva 2000/60/CE do Parlamento Europeu e do Conselho da Comunidade
Econômica Européia, de 23 de Outubro de 2000, define o quadro de ação comunitária no
domínio da política da água. Por este instrumento, os países-membro têm até 2010 (art. 9º)
para que as políticas de estabelecimento de preços da água dêem incentivos adequados
para que os consumidores utilizem eficazmente a água, e assim contribuam para os
objetivos ambientais propostos pela Diretiva. Além disso, deve ser estabelecida uma
contribuição adequada dos diversos setores econômicos, separados pelo menos em setor
industrial, setor doméstico e setor agrícola, para a recuperação dos custos dos serviços de
abastecimento de água, baseado em uma análise econômica e que tenha em conta o
princípio do poluidor-pagador.
Neste contexto, os Estados-Membros podem atender às consequências sociais,
ambientais e econômicas da amortização, bem como às condições geográficas e
climatéricas da região ou regiões afetadas. (Directiva, 2000)
A atual orientação sobre a avaliação do valor da água da Comunidade Européia,
expressa na Diretiva Quadro da Água, estabelece a necessidade de uma análise econômica,
que deve conter informações pormenorizadas suficientes (tendo em conta os custos
associados à obtenção dos dados pertinentes) para:
realização dos cálculos pertinentes necessários para ter em conta, nos termos
do artigo 9º da Diretiva, o princípio da amortização dos custos dos serviços hídricos,
tomando em consideração as previsões de longo prazo relativas à oferta e à procura de água
na região hidrográfica e, quando necessário:
o estimativas dos volumes, preços e custos associados à prestação dos
serviços hídricos, e
40
o estimativas dos investimentos pertinentes, incluindo previsões desses
investimentos;
determinação, com base em estimativas dos seus custos potenciais, da
combinação de medidas com melhor relação custo/eficácia no que se refere às utilizações
da água que serão incluídas no programa de medidas das bacias hidrográficas.
Ribeiro et alli (1999) seguem sua análise em estudos realizados sobre a demanda e a
aplicação da Diretiva Quadro da Água da União Européia, mostrando que as curvas de
demanda são mais elásticas onde é possível uma ampla variação de cultivos.
Nas situações de monocultivo, a curva de demanda é totalmente inelástica. Ainda
segundo Ribeiro et alli (1999), culturas tradicionais, com baixo valor agregado, irrigados
com técnicas pouco eficientes quanto ao consumo de água, têm comportamento inelástico.
Colocam, textualmente, que o arroz irrigado no Rio Grande do Sul pode entrar nesta
classe em face do grande consumo de água. Isto significa que mesmo baixos valores de
cobrança pelo uso da água poderão significar a inviabilização da atividade.
Comparando-se duas situações de monocultivo, observa-se que as regiões com
menor dotação de água e sistema de irrigação mais moderno têm curvas de demanda mais
inelásticas (maior resistência a reduzir o consumo frente ao aumento de preço) do que
regiões com sistemas mais antigos, com maior dotação de água e sistemas de distribuição
menos eficientes.
Em situações de uso industrial e uso agrícola menos inelásticos, com a demanda
mais afetada pelo aumento de preço, o aumento de preço faria com que diminuíssem as
quantidades demandadas mais do que proporcionalmente, reduzindo o montante arrecadado
pela cobrança.
O nível de elasticidade é influenciado pela existência de bens que possam substituir
o bem considerado. No caso da água de irrigação para o arroz, as possibilidades teóricas
são escassas (como a exploração de água subterrânea ou reuso de águas servidas).
Especificamente no caso do arroz irrigado em várzeas com drenagem deficiente, a opção de
troca de cultivos por um conjunto que seja menos exigente em água é limitada por fatores
edafoclimáticos, tecnológicos, culturais e de mercado, entre outros.
41
A outra possibilidade está na utilização de tecnologias que permitam utilizar menos
água, aumentando a eficiência do seu uso. A adoção de novas tecnologias, no entanto,
exigirá novos investimentos, cuja viabilidade financeira para o irrigante deve ser avaliada.
Segundo López (2000) experiências de encarecer a água para irrigação ou para
abastecimento urbano não apresentaram uma resposta adequada no consumo, existindo
práticas mais eficazes, como tarifas diferenciadas que bonifiquem ou penalizem os usuários
de acordo com seu nível de utilização. Unicamente com elevações significativas do custo
da água é que se poderia alterar a expansão da irrigação.
Ribeiro et alli (1999), buscando maximizar a arrecadação pela cobrança, sugerem
que usuários com demandas mais elásticas pagariam mais do que usuários com demandas
menos elásticas; ou seja, para situações onde a agricultura é de monocultura e menos
eficiente, o valor da água seria menor do que para regiões com maior opção de cultivos.
Albuquerque (2001) apresenta uma análise sobre a irrigação e economia no
Arizona, no qual é proposta de alteração da estrutura econômica no estado a partir da
inviabilização de projetos vinculados à expansão da irrigação com base na gestão da oferta.
A proposta, desenvolvida pela Universidade do Arizona, mostra a vantagem de substituição
de produtos agrícolas por outros, em relação ao consumo da água e ao custo de produção
desta água. Por esta gica, a agricultura irrigada não seria excluída da matriz produtiva,
mas deveriam ser priorizados os produtos de maior valor de mercado, como frutas, verduras
e grãos.
Gómez-Limón e Berbel (2000) analisam a formação do preço público da água, de
acordo com a Teoria Econômica, como instrumento de melhorar a sua gestão e promover a
sua distribuição eficiente. Do ponto de vista social, colocam que um maior preço da água,
além de um menor consumo e a otimização do uso deste recurso, trará inevitavelmente uma
mudança nas culturas e nas técnicas utilizadas, gerando menor renda agrícola e redução de
empregos, uma vez que cultivos de sequeiro são mais extensivos e menos rentáveis do que
os irrigados.
Carrera-Fernandez e Garrido (2002) dizem que, em um sistema de interação ideal
entre os usuários de água, os irrigantes determinam o seu custo ótimo de produção agrícola
igualando o preço ao custo marginal social, que, além de custos privados, inclui o custo
42
social que cada irrigante impõe aos demais usuários do sistema hídrico ao fazer a captação
do volume necessário para atender as suas demandas. Os autores também definem que o
preço de reserva ou custo de oportunidade da água utilizada para a irrigação é o máximo
valor que os irrigantes estariam dispostos a pagar por de água, sendo indiferente irrigar
ou não a partir deste valor. Este valor é igual ao ganho adicional que eles teriam se
irrigassem as lavouras, utilizando as águas desta bacia. Os valores calculados para as bacias
do estado da Bahia foram apresentados na Tabela 7.
Alvim e Carraro (2006), em formulação de proposta de cobrança pela água na bacia
dos rios Pardo e Pardinho, no Rio Grande do Sul, colocam a sua expectativa de que a
definição de taxas leve a uma redução do consumo de água, que será tanto maior quanto
mais inelástica for a demanda, pois haveria o abandono da irrigação de algumas culturas. A
água não consumida se tornaria viável para outros usos, como a preservação ambiental.
Observa-se que essas afirmativas somente serão válidas e o instrumento será
eficiente se houver a contabilização correta da quantidade de água utilizada.
É importante aqui ressaltar que a cobrança pela água estabelecida pela legislação e
discutida pelo principio usuáriopagador não pode ser confundida com a taxação de
estruturas coletivas de irrigação, conforme destacado por BRASIL (2001), nem com o
“mercado de água formado pelo arrendamento de áreas aptas ao cultivo de arroz ou de
fornecimento de água por estruturas de canais e estações de bombeamento. BRASIL
(2001), analisando o caso da gestão de recursos hídricos no Ceará, apresenta um quadro
referencial de cobrança pelo uso da água bruta, apresentado a seguir.
Pelos valores apresentados para a irrigação, evidencia-se que para a adutora
Quixadá foram incluídos, claramente, custos de operação e gestão das estruturas, sendo que
o próprio órgão gestor estadual justifica a cobrança como forma de diminuir o desperdício,
aumentar a eficiência no uso da água e como fonte arrecadadora de fundos para cobrir as
despesas com a gestão, a operação e a manutenção das obras hídricas.
43
Tabela 8 Valores referenciais para a água bruta no Ceará
Uso de água bruta
Valor (R$ por 1000 m³)
Industrial
670,00
Abastecimento de água Região Metropolitana de Fortaleza
28,00
Abastecimento de água interior do Estado
12,10
Irrigação Canal do Trabalhador
20,00
Irrigação Vale do Acarape do Meio
4,00
Irrigação Adutora Quixadá
300,00
Fonte: BRASIL (2001).
No Rio Grande do Sul, a iniciativa mais avançada de implantação da cobrança
encontra-se na bacia do rio Santa Maria, que tem uma proposta de cobrança apresentada
pelo grupo de pesquisa denominado GerHi Grupo de Pesquisa de Gestão de Recursos
Hídricos, da Universidade Federal de Santa Maria. Este modelo parte de uma das
possibilidades de definição do valor da água, que é o princípio de que os valores
arrecadados devem ser suficientes para a aplicação do Plano da Bacia Hidrográfica, como
preconiza a legislação. Por outro lado, não verifica a possibilidade dos custos serem
absorvidos pelos sistemas produtivos locais. (UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA
MARIA, 2007)
Outra proposta levou a definição de um modelo de gestão (STÁgua), com o objetivo
de modelar a cobrança pelo uso da água em bacias hidrográficas por meio dos princípios
“usuário-pagador” e “poluidor-pagador”. Assim, os custos das ações são distribuídos entre
os usuários, de forma proporcional aos seus consumos e eventuais efeitos produzidos nas
águas da bacia, sob a forma de quotas.
Os usuários são classificados pela definição da distância de sua situação em relação
a uma situação ideal (quota zero), por meio das variáveis ponderadas. As quotas têm
44
correspondência ao desvio de cada usuário da solução ideal. Estes desvios são
normalizados entre zero e um, sendo que quanto mais distante da solução ideal, maior será
a quota de participação do usuário. Estas quotas são revisadas periodicamente,
possibilitando a criação de um ambiente competitivo entre os usuários, que buscarão uma
melhor posição na distribuição dos custos referentes ao Plano de Bacia. As variáveis
incluídas no modelo podem estar representadas pela quantidade de água consumida ou por
qualquer outra medida que sirva como referência para o rateio dos custos dos investimentos
e de manutenção do sistema de gestão, desde que sejam mensuráveis e aceitas pelo Comitê
da Bacia Hidrográfica. Essas variáveis são grandezas quantitativas passíveis de medição e
controle, utilizadas para avaliação e classificação dos usuários e estabelecidas e ponderadas
pelo Comitê da Bacia e condicionadas às peculiaridades da bacia.
Ao adotar outra medida qualquer em substituição à quantidade de água consumida
como referência para as cotas, o modelo busca uma saída para a falta de medição e controle
das vazões derivadas, dentro do que se pode considerar peculiaridades da bacia extensas
áreas irrigadas com arroz por inundação, alta probabilidade da existência mais de uma
captação ou fonte de água por lavoura, estruturas de recalque por vezes rudimentares e sem
registros técnicos atualizados, entre outros. A área irrigada, por exemplo, atenderia a esse
propósito, pois permite estimar a quantidade de água e é passível de uma medição fácil e
barata, como a realizada a partir da análise de imagens de satélite.
De acordo com BRASIL (2001), a cobrança de água pela irrigação na França é
baseada em um volume de captação, que por sua vez é geralmente estimado em função da
área irrigada. Os critérios variam de uma agência a outra, ou mesmo dentro de uma mesma
agência, quando considerados fatores como métodos distintos de irrigação. A agência Rhin-
Meuse, onde a irrigação não é uma atividade importante, considera um coeficiente
genérico, de 1.500 por hectare por ano. O fator de consumo é de 0,6 (40% de retorno de
água), o maior aplicado entre os usos indicados, com exceção da água engarrafada e da
reversão para fora dos limites da bacia.
A adoção da área irrigada no lugar do volume consumido leva uma situação
incoerente da aplicação da elasticidade-preço para a definição de valores econômicos da
45
água. Substituindo-se a variável volume consumido por área irrigada, a expressão seria
transformada para:
PPAAE
P
///
4.8
sendo E
P
é a elasticidade-preço pela área irrigada; A é a área irrigada e P é o preço
do bem e ∆ a variação.
Mas uma vez que não se conhece especificamente o volume consumido ou a
eficiência de cada irrigante, não seria defensável variar o preço da água de acordo com o
aumento ou a redução da área irrigada. Não havendo variação de preço, o denominador da
expressão da elasticidade-preço com base na área será igual a zero. Assim, uma taxa de
água igual por hectare irrigado para as mesmas condições de plantio o estimularia a
economia de água. Ou seja, a utilização da área irrigada não tem o mesmo potencial de
garantir uma situação eficiência econômica, pois, não estando diretamente vinculado ao
consumo, fará com que dois usuários que irriguem a mesma área, mas com eficiências
distintas, paguem o mesmo valor por volumes diferentes.
Risler e Wery (1916) colocam que nos canais antigos época) a venda da água se
fazia por área, com um preço médio de 30 francos por hectare irrigado, mas que este
procedimento era muito deficiente, encorajando o consumo excessivo da água e as fraudes,
pois o volume de água fornecido era muito mal definido. A cobrança por vazão fornecida é
a forma incontestavelmente melhor de venda da água, o que estava sendo implantado nos
projetos modernos de irrigação (à época).
Arrojo (2000) cita que nos projetos de irrigação com águas superficiais a cobrança
tende a ser relacionada com a área irrigada e não com o volume utilizado, sendo esta uma
iniciativa que não incentiva qualquer proposta de melhoria da eficiência do uso, em
conjunto com os baixos preços cobrados. Na formulação de uma nova política de preços
para a água de irrigação, o autor afirma que deveria ser necessário reformular a cobrança
por hectare irrigado para utilizado, bem como aplicar taxas por faixas de consumo com
preço crescente ou introduzir a aplicação de bonificação pela economia de água.
Rosa et alli (2000) afirmam que em perímetros irrigados nos quais existe um
esquema pré-fixado de distribuição de água na parcela, os irrigantes tendem a utilizar toda a
46
água distribuída, independente da necessidade de irrigação, uma vez que a cobrança pela
água será pela área irrigada e não pelo volume utilizado. A eficiência da irrigação nestes
casos situa-se entre 30 e 50%, quando poderia estar em patamares superiores a 85-90%.
Fagundes (1997), ao descrever o Perímetro de Irrigação da Barragem do Capané,
afirma textualmente que em nível de produtor irrigante, não existe nenhuma estrutura de
medição de consumo, sendo determinado isto por estimativa, levando-se em conta a
dotação preconizada no projeto (o dado informado anteriormente no texto original era
17.000 m
-
³.ha.safra). Porém no global conhecemos o diagrama volumétrico da bacia de
acumulação e a partir deste instalou-se uma régua que permite verificar diariamente a
altura d’água acumulada e com isto controlar o consumo diário para todo o sistema.
O conhecimento do comportamento do irrigante cobrado por hectare havia sido
apresentado por Mayer (1945) que afirma:
Se a água for paga por um tanto por hectare, independentemente da quantidade
utilizada, o regante, sobretudo nos primeiros tempos, é naturalmente levado a empregá-la
em excesso. Se o custo for função da quantidade fornecida, o regante terá mais cuidado de
a fazer render o máximo possível. Este fato, ligado com o critério e experiência do regante,
pode ser de importância primacial, segundo se conclui do que tem sido observado nas
regiões de regadio dos Estados Unidos.
A série de dados da Associação de Regantes e Beneficiários do Vale do Sorraia
(2008), permite observar o comportamento dos irrigantes de arroz em função do valor da
taxa cobrada pelo fornecimento de água às lavouras. Adotando-se o período entre 1996 e
2007, verifica-se, no gráfico a seguir, que o volume consumido tende a diminuir de acordo
com a taxa da água, embora a correlação entre o acréscimo da taxa e a redução do volume
seja baixa (R²=0,31). Assim, para um mesmo valor de taxa, são verificados diferentes
volumes consumidos, bem como são anotados volumes similares para valores distintos da
taxa. A declividade da reta estimada, no entanto, é negativa e coerente com a elasticidade-
preço.
Para a área irrigada, no entanto, observa-se o oposto, sendo a tendência da área ser
aumentada de acordo com o valor da taxa cobrada, contrariando o princípio da elasticidade-
preço. Ou seja, verifica-se que não é o valor da taxa cobrada que define a área a ser
47
cultivada, embora esse mesmo valor apresente uma tendência de influenciar o volume de
água consumido. Segundo o relatório da Associação (2008), o crescimento da área
cultivada (em 2007) deve-se também à subida no preço base por quilo na ordem de 12%.
Esse comportamento é mostrado na figura 3.
Figura 3 Evolução da área irrigada e do volume de água consumido em função do
valor da taxa de uso da água - Fonte dos dados primários: Associação dos Regantes e
Beneficiários do Vale do Sorraia (2008)
Para voltar a utilizar a expressão anterior, a quantidade demandada teria que ser
estimada por uma função de consumo de acordo com técnicas de cultivo (pré-germinado,
plantio direto ou plantio convencional), tipo de solo, época de plantio ou região de
produção, por exemplo.
Especificamente para a irrigação, essa é uma situação problemática. Primeiro, por
que a irrigação é o setor que mais consome água em todo o mundo, sendo esta situação
levada ao extremo em algumas bacias hidrográficas gaúchas. Segundo, porque a irrigação
tende a ser um uso extremamente ineficiente em muitos casos e mesmo em regiões áridas.
UNITED (2006) afirma que menos de 50% da água captada é utilizada produtivamente em
sistemas irrigados (particularmente com arroz) na bacia do rio Senegal e muitos produtores
não reconhecem o custo econômico desta perda de água. O Programa Nacional para o Uso
48
Eficiente da Água em Portugal (PORTUGAL, 2001), estima que a agricultura irrigada seja
responsável por 88% das perdas totais de água no país. Na bacia do rio Amarelo, na China
(Xu et alli, 2005), a concorrência da irrigação com outros usos resultou na necessidade
urgente de aumento da eficiência de irrigação, com redução das perdas por condução,
evaporação e sobre-exploração dos recursos hídricos. A agricultura consome mais de 50%
da disponibilidade hídrica da bacia, possuindo um grande potencial de solução dos
problemas de escassez. Para 2010, a expectativa é de que a irrigação represente 68,4% do
total consumido.
Segundo Lima et alli (1999), mais de 60% das derivações dos cursos d’água
brasileiros são para fins de irrigação, sendo o setor o principal concorrente pelo uso da
água. Os autores citam dados da CEMIG que demonstram a ocorrência de um desperdício
médio de 20% da água desviada de seus cursos normais para a irrigação. Com base nas
estimativas apresentadas, concluem que o manejo adequado da irrigação traria um
excedente ao país da ordem de 6.755.459.400 m
3
/ano de água e cerca de 2.300 GWh/ano de
energia elétrica, o que reduziria substancialmente as tensões sobre esses dois recursos (água
e energia elétrica) de fundamental importância para o país.
De acordo com PORTUGAL (2001), a água para a agricultura é relativamente
barata, tendo pouco peso na composição final dos custos de produção. Por isso, o agricultor
pode ser levado a utilizá-la em excesso. Em alguns perímetros de irrigação, a água é
cobrada por área/cultura e não em função do volume efetivamente consumido, não havendo
assim estimulo a utilização correta deste recurso. No âmbito do Programa para o Uso
Eficiente de Água, a taxação por volume permitirá evitar o desperdício e poderá incentivar
a adoção de métodos e procedimentos de irrigação mais eficientes. Outra medida prevista é
a taxação escalonada, tendo por base os volumes considerados adequados para as culturas
em função do clima, sendo que consumos excedentes e improdutivos penalizados com
taxas mais elevadas. O Programa indica que esta deva ser o mecanismo mais dissuador de
usos indiscriminados.
Arranjo (2000) coloca ainda que projetos públicos irrigados na Espanha receberam
modernizações por iniciativas dos próprios irrigantes, não pelo aumento do preço da água,
mas pela escassez de água na bacia. Estas iniciativas dos irrigantes levaram a consolidação
49
de uma nova posição, antes meramente reivindicatória, para uma nova posição
empreendedora. Com isto, foram implantadas estruturas complementares de reservação ao
longo do sistema existente e, principalmente, a substituição da forma de distribuição de
água, que passou a ser realizada por pressão e com faturação por volume distribuído, em
substituição da área atendida.
50
4.2. O valor da água para a irrigação
A definição de um valor para a água a ser pago pelos usuários para a sociedade pode
ser realizada de modos distintos. Stampe (2007), na bacia do rio Gravataí/RS, adotou o
Método Econométrico Tradicional de estimação da demanda por água, aplicando-se a
elasticidade-preço da demanda para chegar ao valor econômico da água para irrigação de
arroz, e o Método de Valoração Contingente, que utiliza a Disposição a Pagar (DAP), como
alternativa para calcular este mesmo valor. Para a aplicação destes instrumentos, foi
utilizado como referencial um consumo de 14.000 de água por hectare irrigado por ano,
sendo este valor definido como a média dos volumes obtidos pela multiplicação da menor
vazão específica e do menor período de irrigação e da maior vazão e do maior período,
conforme sugerido pela SOSBAI (CONGRESSO, 2005).
Alvim e Carraro (2006) e Carrera-Fernandez e Garrido (2002) criticam a utilização
do método de valoração contingente nos estudos do valor da água em bacias hidrográficas,
apresentando três grandes desvantagens de sua aplicação:
a expectativa de que os usuários não revelem os verdadeiros preços que estão
dispostos a pagar pela água, gerando valores subestimados;
alto custo da pesquisa de campo, o que dificulta a sua aplicação;
o vinculação do preço ao plano de investimentos na bacia, o que não assegura
a arrecadação necessária para a implantação das intervenções definidas pelo Comitê de
Gerenciamento.
Stampe (2007) conclui que a aplicação da elasticidade-preço resulta em um valor da
água para irrigação no intervalo entre 1,76 a 2,52 sacos/hectare por ano, com uma tendência
predominante para o limite superior do intervalo. A unidade sacos/hectare corresponde ao
valor de comercialização de 50 kg de arroz tipo 1, seco e limpo, sendo esta a unidade
corrente entre os irrigantes para a contratação de serviços vinculados à lavoura orizícola.
Pelo Método de Valoração Contingente com Disposição a Pagar (DAP), investigada por
três diferentes metodologias, a autora encontrou um valor médio da DAP de 2,56
sacos/hectare, sendo este um valor considerado possível pela maior parte dos irrigantes
entrevistados.
51
Observa-se que o valor é muito superior ao valor limite proposto pelo CEIVAP e
pelos entrevistados na bacia do rio Santa Maria (0,65 sacos/hectare), contrariando a
primeira das afirmativas de Alvim e Carraro (2006) apresentadas acima.
O trabalho de Nehme (2008), ainda em desenvolvimento na bacia do rio Quarai,
apresenta valores semelhantes de DAP. Após a definição de um valor referencial de 2,7
sacos/hectare, o mesmo foi apresentado aos representantes dos irrigantes nos pontos
centrais da bacia e aceito como ponto de partida para discussão no recém criado Comitê de
Gerenciamento. Esta validação do preço referencial é concordante com o proposto por
Alvim e Carraro (2006), que colocam que a aplicação de um sistema de preços deve ser
precedida da avaliação do impacto que o mesmo possa ter sobre os usuários.
Nas duas bacias, existem características comuns que podem explicar a similitude
dos valores encontrados: irrigação apenas da cultura de arroz; demanda de água muito
acima da oferta hídrica natural; aptidão agrícola das terras muito limitada, mas propícia à
cultura do arroz; conflito entre a irrigação e os demais usos da água, especialmente
abastecimento humano e saneamento.
Também foi observado, nas pesquisas de campo realizadas nas duas bacias, que
irrigantes proprietários de estruturas de armazenamento de água oferecem maior resistência
a pagar por ela, sendo que alguns entendem que deveriam receber alguma compensação
financeira, que contribuem para o aumento de oferta de água no período da irrigação.
Este raciocínio remete ao principio beneficiário pagador.
Alvim e Carraro (2006) propõem a seguinte estrutura tarifária para a bacia dos rios
Pardo e Pardinho:
abastecimento urbano
AUAU
PX 05,044,0
4.9
abastecimento industrial
AIAI
PX 01,009,0
4.10
irrigação
II
PX 95,54749,15
4.11
diluição de efluentes industriais
EIEI
PX 26,310493,4284
4.12
diluição de esgotamento sanitário
ESES
PX 51,754134,11356
4.13
52
A partir da função apresentada para a irrigação foram estimados os valores para
consumo, taxa por hectare, elasticidade-preço, área irrigada e variação da área por cenário.
O valor do saco de arroz adotado foi o mesmo citado por Stampe (2007), igual a R$ 20,00.
A base de comparação para a variação de área é o cenário 1, que apresenta o menor valor
de taxa.
Tabela 9: Simulação da aplicação dos valores propostos para a bacia dos rios Pardo
e Pardinho
Cenário
Taxa
R$.m-³
Consumo
m-³.ha
R$/ha
Sacos/ha
Elasticidade-
preço
Área irrigada
(ha)
Área
irrigada
em
relação
ao
cenário 1
1
0,00005
15.464
0,73
0,04
34.190
100%
2
0,00009
15.438
1,46
0,07
0,003
34.134
100%
3
0,00019
15.387
2,90
0,15
0,007
34.756
102%
4
0,00038
15.283
5,77
0,29
0,014
34.522
101%
5
0,00076
15.076
11,38
0,57
0,027
34.053
100%
6
0,00151
14.663
22,14
1,11
0,056
33.033
97%
7
0,00302
13.835
41,78
2,09
0,120
31.169
91%
8
0,00604
12.180
73,57
3,68
0,272
27.440
80%
9
0,01208
8.871
107,16
5,36
0,746
19.982
58%
10
0,02416
2.252
54,40
2,72
5,880
5.067
15%
Fonte: Alvim e Carraro, 2006.
Observa-se a pequena variação da área irrigada entre os cenários de 1 a 6,
compatível com o índice de elasticidade-preço, indicando que os irrigantes não tendem a
variar o seu consumo para essa faixa de variação da taxa. Por outro lado, a partir do cenário
8, a redução da área irrigada e a redução teórica do consumo são significativas. Os autores
concluem que os cenários mais vantajosos para a bacia são os de numero 5, 6 e 7. Para o
cenário 7, o consumo previsto é similar ao considerado por Stampe (2007), enquanto que a
taxa prevista é próxima e inferior à definida para a bacia do Gravataí, onde há uma situação
de conflito quantitativo pelo uso da água.
Deve ser considerado ainda que o valor calculado para o consumo de água no
cenário 10 é muito inferior ao tecnicamente possível para a irrigação por inundação. O
53
valor do cenário 9 somente é possível com eficiências elevadas de distribuição e irrigação,
o que não é o usual.
Wichelns (2004) ainda apresenta uma situação hipotética mais radical, em que os
irrigantes poderiam transacionar a água com os responsáveis pelo abastecimento humano
ou com a indústria, movimentando a água entre os setores econômicos de acordo com as
diferenças nos valores incrementais. Para isso, seria necessária a utilização de preços
econômicos (shadow prices) para a definição dos valores da água.
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL (2008) utilizou o
Método dos Efeitos, de acordo com a proposição de Chervell e Le Gall (1989) e de Cabral e
Abecassis (2000), demonstrando o efeito multiplicador da atividade agrícola irrigada na
bacia do rio Quarai e o resultado econômico da substituição do uso da água de irrigação
para a diluição de esgotos para três classes de qualidade de água junto às cidades de Quarai
e Artigas.
Para uma disposição a pagar de 2,7 sacos de arroz por hectare para a irrigação, o
valor a ser arrecadado pela irrigação do arroz seria de R$ 0,0039/m³. No entanto, a solução
do problema dos esgotos das cidades de Quaraí e Artigas é uma reivindicação histórica das
duas cidades. Para atingir a classe 3 do CONAMA pela simples diluição do esgoto, seria
necessário aumentar a vazão mínima em 1.54 m³/s, que é igual ao consumo previsto de
1.025 hectares de arroz com irrigação contínua. A supressão desta área para a economia
regional significaria a perda de US$ 4.8 milhões/ano e 112 empregos. O tratamento do
efluente do esgoto até a classe 3 teria um custo de US$ 3.27/m³, representando um
montante de US$ 214.000 nos dois meses mais críticos (janeiro e fevereiro), que coincidem
com a temporada de irrigação. Com estes valores, a diluição de esgotos poderia assumir um
custo pela água de até US$ 0,027/m³, que é o valor do tratamento do efluente, e é cerca de
14 vezes mais do que o valor que os irrigantes estariam dispostos a pagar.
Por este enfoque, verifica-se que apenas a utilização de valores de preço da água
para decisão de conflitos pode gerar situações negativas para a economia da bacia.
Arranjo (2000) coloca que, aumentando o preço da água, a primeira reação do
agricultor não será a modernização da exploração, mas a troca por culturas menos
54
demandantes em água, passando para culturas de sequeiro ou até abandonar a atividade
agrícola.
O mesmo autor cita que no Vale do Guadalquivir, no sul da Espanha, foram obtidas
curvas com uma notável elasticidade para tarifas baixas, entre 0 e 10 pesetas/m³ (0 a
0,00006 €.m-³), enquanto que no Guadiana haveria uma baixa elasticidade para estes
valores, mas uma elasticidade importante para valores entre 10 e 25 pesetas/m³ (0,00006 a
0,00015€.m-³).
Gómez-Limón e Berbel criticam a utilização do axioma da maximização do
benefício do uso da água. Consideram que os empresários levam em conta, na hora de
tomar decisões de produção, uma série de fatores relacionados com seu entorno econômico,
social, cultural e ambiental, como a aversão ao risco, a minimização do capital circulante na
produção, a minimização da complexidade da gestão da produção, a minimização da
utilização da mão de obra alheia, entre outros.
Estas questões foram abordadas pelos entrevistados por Stampe (2007), que citaram
a tradição de cultivo e as condições de solo como os fatores principais que decidem o
plantio de arroz, acima do valor do produto no mercado, por exemplo. Da mesma forma,
alguns agricultores aceitariam pagar valores elevados pela água e manteriam o cultivo de
arroz por não saberem cultivar outro produto, por possuírem o maquinário necessário ou
por não dependerem de mão de obra externa ou assistência técnica para manter esta
exploração.
Os dados do INSTITUTO (2007) para a safra 2007/2008 mostram que o item
irrigação responde por 9,46% do custo de produção médio ponderado (inclui a irrigação
“natural” e por recalque, com motores elétricos e a diesel), ou 14,65 sacos/hectare, sendo o
segundo custo médio mais importante, atrás apenas do valor de terra para o plantio (16,75
sacos/hectare).
O custo de produção do saco de arroz com base nos dados de novembro de 2007 era
de R$ 26,28/saco contra um valor de venda de R$ 22,32/saco (INSTITUTO, 2007). Assim,
verifica-se que o excedente do produtor é negativo para a situação média, o que
inviabilizaria a cobrança pela água ou, de outra forma, a cobrança pela água estimada com
55
base apenas em um percentual do custo médio de produção levaria a inviabilizar o plantio
de arroz de uma parcela de produtores.
Ainda segundo Gómez-Limón e Berbel (2000), a política de tarifação em geral
indica uma redução na renda dos agricultores por dois motivos: a despesa com a água e o
abandono dos cultivos que geram mais benefícios e são exigentes em água, como o caso
espanhol do milho, beterraba e alfafa, gerando uma ineficiência econômica induzida pela
tarifação.
O estudo realizado sobre irrigação na Espanha mostra os efeitos de uma elevação do
valor da água para irrigação sobre o consumo de água, a renda dos agricultores, a
arrecadação estatal, a redução do emprego e a redução do uso de fertilizantes.
Os autores dividem a série de preços em duas partes, sendo a primeira para valores
de até 8 pesetas/m³ (0,000048 €.m-³) e a outra acima deste valor. A figura 4 a seguir
apresenta a distribuição dos preços e a redução do consumo de água como auxílio à
interpretação dos valores.
Os autores observam que até o valor de 8 pesetas/m³ (0,000048 €.m-³) a variação de
preço resulta em uma pequena alteração do consumo de água, sendo que nestas
circunstâncias esta política de preços não teria muito sentido, se o objetivo principal fosse
reduzir o consumo. Nesta faixa de valores, esperavam que os agricultores apenas mudassem
os seus planos de cultivo.
A partir do valor de 8 pesetas/m³ (0,000048 €.m-³), alterações importantes no
comportamento do produtor, que passa a buscar alternativas que tenham uma menor
necessidade de água. Quanto à arrecadação estatal, esta tem seu valor máximo no preço de
8 pesetas/m³, sendo afetada pela decisão de alteração profunda do consumo de água. A
partir deste valor, observa-se que a arrecadação tende, em geral, a diminuir. A elevação no
preço da água acima de 8 pesetas/m³, no entanto, traz uma redução no número de empregos
e na utilização de fertilizantes, indicando a opção por cultivos de sequeiro, mais extensivos
e de menor demanda de insumos. Esta redução de fertilizantes gera um benefício ambiental
indireto por uma menor contaminação do solo e do lençol freático, que poderia ser
considerado como um ganho para a sociedade, desde que fosse corretamente mensurado.
56
Tabela 10 Variação da renda, da arrecadação estatal, da demanda de mão de obra
e do uso de fertilizantes em função do preço da água
Preço da
água
(pesetas/m³)
Redução
do
consumo
da água
(%)
Redução da margem bruta
Arrecadação
estatal
(pesetas/ha)
Redução
do
emprego
(%)
Redução
da
adubação
(%)
Pesetas/ha
% margem
bruta inicial
0
0%
-
0%
-
0%
0%
1
1%
5,227
4%
4,700
0%
1%
2
2%
10,351
7%
9,296
0%
3%
3
3%
15,371
10%
13,789
0%
4%
4
4%
20,289
14%
18,179
1%
5%
5
5%
25,103
17%
22,466
1%
6%
6
7%
29,813
20%
26,650
1%
8%
7
8%
34,421
23%
30,730
1%
9%
8
9%
38,926
26%
34,707
1%
10%
9
34%
43,610
30%
28,385
2%
15%
10
37%
47,062
32%
30,011
3%
16%
12
49%
52,918
36%
28,900
9%
22%
14
57%
57,725
39%
28,465
13%
26%
16
63%
61,510
42%
27,870
14%
32%
18
69%
64,130
43%
26,110
16%
38%
20
76%
65,585
44%
23,186
17%
44%
30
82%
72,714
49%
25,830
18%
50%
40
82%
81,941
55%
33,586
18%
50%
50
89%
93,839
63%
25,766
39%
58%
60
100%
99,546
67%
-
71%
71%
Fonte: Gómez-Limón e Berbel (2000) (1 peseta = 6,01X10
-6
€)
Figura 4 Redução do consumo de água em função do preço. Fonte dos dados:
Gómez-Limón e Berbel (2000)
57
Os valores obtidos levam à conclusão de que uma redução significativa do consumo
começaria a ser obtida com redução na margem do produtor da ordem de 25%.
França (2001) cita que na Espanha foi adotado um cálculo de produção, expresso
em pesetas por de água consumida por hectare, que indica a produção por utilizado.
Sobre esta base, são realizadas comparações entre produtividade hídrica e
hidroeconomicidade, sendo que o primeiro reflete apenas a relação entre produção agrícola
e consumo de água, enquanto o segundo utiliza o valor de transação dos produtos nos
mercados agrícolas. A partir disto, são definidas as melhores combinações de cultivos mais
eficientes do ponto de vista econômico e de redução do consumo de água.
Os agricultores, segundo English (2002), citado por Wichelns (2004), podem ser
divididos de duas formas quando é analisada a maximização do lucro da atividade agrícola:
Quando a água é o recurso limitante e a terra é relativamente abundante; ou
Quando a terra é o recurso limitante e a água é relativamente abundante:
neste caso, ao agricultores tenderão a buscar o maior rendimento possível por m², utilizando
a água necessária, mesmo que esta seja escassa nas regiões a jusante ou em outras áreas do
país.
Wichelns (2004) apresenta equações de maximização de lucro para as situações
onde a água é o recurso limitante e onde a terra é o limitante para a produção agrícola.
No caso da água não ser limitante, a renda bruta do agricultor será definida pelo
valor obtido pela venda da produção menos os custos de produção, que incluem o custo de
obtenção e aplicação da água e os outros custos. A renda por hectare é determinada por:
4.14
sendo i(w) a renda obtida ($.ha-¹); p
y
o preço do produto agrícola ($.kg-¹); y a
quantidade produzida (k.ha-¹); p
w
o preço da água ($.m-³); w o consumo da água (m-³.ha);
cw o custo de aplicação da água, que inclui os custos de bombeamento e os da retirada da
água do canal terciário e cn os custos dos outros insumos e serviços e outros custos
(excluindo a água) que influenciam a decisão do irrigante. As letras x e z representam
vetores dos insumos variáveis e fixos, respectivamente. O vetor x inclui variáveis como
trabalho, fertilizante e energia, enquanto que o vetor z inclui os custos fixos dos
58
equipamentos de irrigação e os de outros equipamentos necessários. A barra vertical
separando as letras w, x e z na função cw é para destacar que a análise considera
principalmente a variação do custo em função da água consumida.
A condição de maximização da função apresentada é obtida pela primeira derivada
com respeito ao consumo de água:
4.15
4.16
Os irrigantes irão buscar a maximização do lucro, irrigando com a quantidade w que
satisfaça a equação acima, ou seja, o valor do incremento da produção em função da
irrigação é igual ao custo da água somado com os custos necessários para obter e aplicar a
água na lavoura.
O autor cita que muitas observações podem ser originadas deste critério:
a maximização potencial da produção só ocorrerá se tanto o custo da água como
o custo envolvido na sua obtenção e distribuição forem nulos;
se o preço da água para irrigação for zero, os custos necessários para sua
obtenção e distribuição limitarão a maximização da produção;
políticas que reduzam o custo da irrigação ou da obtenção e aplicação da água
no nível dos irrigantes motivarão a um uso maior da água ou no mínimo igual;
políticas que mantenham o preço dos produtos agrícolas acima dos valores de
mercado motivarão a um uso maior (ou no mínimo igual) da água para irrigação;
políticas de redução do preço de insumos, como fertilizantes e pesticidas,
poderão elevar o consumo de água pelo aumento da produtividade deste insumo.
No caso da água ser o fator limitante, o ganho do produtor é expresso não mais por
hectare, mas em termos globais, a partir da inclusão da variável área:
4.17
A variável área (A) pode ser substituída pela razão entre o total de água aplicado
(W, m³/ano) pelo consumo unitário (m-³.ha). A função de maximização é expressa por:
59
4.18
O lado esquerdo da equação mostra o incremento bruto por hectare com o aumento
da água utilizada na irrigação. O lado direito é a média do ingresso de receita por unidade
de água utilizada na irrigação. A maximização da margem do produtor ocorrerá quando o
incremento bruto for igual à média do lucro.
Assim, quando a água é um recurso limitante, os lucros serão maiores quando a
produtividade média da água é maximizada, ou o retorno incremental por unidade
incremental de água é igual ao retorno médio por unidade de água.
4.19
Quando a água é o fator limitante, o volume disponível determina a dimensão da
área ótima a ser irrigada. No caso de uma seca ou redução do volume disponível por uma
decisão externa à propriedade, o agricultor não irrigará algumas áreas e reduzirá o consumo
nas áreas mantidas em produção.
Esmaeili e Vazirzadeh (2009), estudando a distribuição de água no sul do Irã,
analisaram as culturas irrigadas, volumes consumidos e margem de produção (excedente do
produtor) de oito culturas. Embora a abóbora apresente a melhor produtividade hídrica, a
cebola é a que apresenta a maior área cultivada. A cultura da romã apresenta uma
produtividade hídrica cerca de 65 vezes menor do que a lima ou 200 vezes menor do que a
abóbora, mas continua sendo cultivada. Este comportamento dos agricultores deve-se ao
elevado subsídio da água para irrigação, que resulta em um entendimento por parte dos
irrigantes de que o custo de oportunidade da água para irrigação é próximo de zero. No
caso de um aumento do custo da água, a tendência dos agricultores será substituir a romã
pela lima, que tem um ato valor de exportação, ou pela abóbora, que tem a maior
produtividade hídrica. Estes autores também citam estudo desenvolvido na China (Han e
Zhao, 2007), que observaram uma redução de área cultivada com arroz em virtude do
aumento do preço da água.
França (2001) apresenta as tarifas da água em Israel para irrigação, que não seguem
apenas critérios de custos marginais, mas também observam as políticas de imigração, de
desenvolvimento e dos padrões dos assentamentos. O preço da água é escalonado de acordo
60
com o volume estipulado para cada cultura. Os primeiros 50% são cobrados pelo valor mais
baixo do tipo de água (as águas podem ser de baixo custo superficiais , de médio custo
profundas ou superficiais que exijam altos investimentos de bombeamento e distribuição
e de alto custo grande elevações ou água dessalinizada), enquanto que os restantes 50%
são cobrados por um valor mais elevado. Havendo necessidade de complementação, os
primeiros 10% extras custam o dobro do valor médio estipulado, sendo que este valor é
dobrado para demandas que superem este volume adicional.
Wichelns (2004) indica que políticas que não refletem o caráter de escassez do
recurso hídrico, que supõem que os agricultores terão em conta o custo de oportunidade na
sua tomada de decisões ou que considerem o impacto de suas atividades fora de suas
propriedades contribuem muito para a gestão ineficiente observada em regiões com
irrigação. Em muitas áreas, os preços baixos e os direitos de propriedade mal definidos
levam ao agricultor a utilizar mais água do que o volume socialmente ótimo e os
desestimulam a investir em práticas conservacionistas de água.
A política agrícola do governo influencia o comportamento dos agricultores.
Política cambial, taxas e impostos sobre importação ou exportação e taxas ou subsídios
sobre fertilizantes, pesticidas, e eletricidade também podem gerar comportamentos que não
reflitam a situação de escassez da água para irrigação.
Na Califórnia (França, 2001), espera-se que 153 mil hectares de um universo de
3,65 milhões de hectares não serão mais irrigados no futuro devido ao custo da água, que
deverá recuperar integralmente os desembolsos relativos ao transporte, à operação, à
manutenção e à energia relativos à entrega da água ao irrigante.
Por outro lado, a elevação das taxas pelo uso da água ou a inexistência de linhas
acessíveis de crédito para investimento em equipamentos de irrigação levam o irrigante a
utilizar menos água do que o tecnicamente recomendado para a cultura. Do ponto de vista
público, no entanto, este uso continuará sendo excessivo, por que o custo pago pelos
irrigantes não reflete o custo de oportunidade da água, assim como as consequências do uso
da água na agricultura, como salinização do solo ou contaminação dos aquíferos, não terem
sido considerados na definição do custo da água.
61
Uma política de subsídios também levará a um consumo excessivo de água se não
refletir corretamente os benefícios sociais provenientes da agricultura irrigada.
Carrera-Fernandez e Garrido (2002) propõem a cobrança da água para irrigação por
meio de associações de irrigantes, pois esta solução:
facilitaria a outorga de direito ao uso da água, que pode ser realizada de forma
agregada
reduziria os custos sociais de transação, medição e cobrança pelo uso da água;
minimizaria a probabilidade de inadimplência por parte dos irrigantes
individuais;
adoção de um preço único, que deveria ser o preço ótimo pelo uso da água na
irrigação, reduzindo a possibilidade de rejeição do pagamento por parte dos irrigantes.
Os autores indicam que pode haver tratamento distinto entre diferentes associações
de irrigantes de uma mesma bacia hidrográfica. A partir disto, pode-se definir valores de
cobrança de cada associação pela da expressão:
jijiij
RxpV
*
4.20
sendo V
ij
o valor a ser cobrado da associação de irrigantes j pelo uso da água nessa
modalidade de uso i; p
i
*
o preço ótimo nesse uso, x
ij
o volume de água demandado pela
associação de irrigantes j; e R
j
o coeficiente de ponderação relativo à associação j.
Os autores colocam que cada associação pode decidir internamente por um sistema
de cobrança diferenciada, como forma de beneficiar alguns irrigantes com renda menor.
Sugerem, ainda que, para evitar as dificuldades de medição do consumo em zonas rurais,
que a medição volumétrica necessariamente impõe, formas alternativas podem ser
adotadas, tais como:
medição direta com o uso de hidrômetros
medição indireta por estimativa de área plantada, com base em coeficientes de
consumo por cultura, região e tecnologia de irrigação adotada
62
medição indireta com o uso do consumo de energia elétrica da estação de
bombeamento.
Para prevenir que uma associação faça um requerimento superior às necessidades
dos seus irrigantes (para fins de outorga), os autores sugerem a criação de uma parcela fixa
de cobrança, independente do consumo final, e de uma parcela variável, relacionada com
este consumo:
)(
0*0
ijjijiijij
fxIxpfxV
4.21
sendo x
0
ij
a quantidade de água requerida no processo de outorga pela associação de
irrigantes j; f o custo fixo médio e I
j
o consumo efetivo da associação.
Wichelns (2004) afirma que no caso de muitos irrigantes estarem vinculados a uma
mesma fonte de água, os volumes de água podem ser distribuídos de forma (i) a alocar para
todos os irrigantes o volume ótimo, (ii) modificar o preço da água para o irrigante, para que
ele escolha o volume necessário de acordo com o benefício para a sociedade ou (iii) os
irrigantes transacionem entre si, em um mercado de água, os volumes excedentes ou
necessários de acordo com seu planejamento de produção.
Carrera-Fernandez e Garrido (2002) defendem que a cobrança em duas parcelas,
conforme apresentado acima, induziria ao consumo mais racional da água, possibilitando
que um irrigante que não utilizar total ou parcialmente a água prevista possa transferir
esta quantidade para outros usuários do sistema.
Esta situação foi verificada no Vale do Sado, em Portugal, no qual a gerência
técnica da associação vai realizando balanços periódicos entre os consumos efetivos e os
projetados por cada agricultor, remanejando os excedentes entre os que gastaram menos do
que o previsto e os que necessitam de mais água para completar o ciclo cultural. Essa
situação é favorecida pela existência de irrigantes fora do sistema de canais, que estão
dispostos a receber quantias de água variáveis ao longo dos anos e durante o período de
safra, assim como irrigantes que tiveram problemas na condução da irrigação da lavoura.
Segundo França (2001) a maioria dos países que realizou reformas na cobrança da
água da irrigação, adotou tarifas volumétricas, medição controlada do uso da água,
abandono do sistema de tarifas uniformes e fixas ou tarifas de valores mínimos,
63
introduzindo uma lógica de incentivos dirigidos especificamente para o uso mais eficiente
da água.
64
4.3. Projetos coletivos de irrigação
Um projeto coletivo de irrigação pode ser entendido a partir das seguintes
definições básicas (Tiercelin et alli, 1998):
perímetro de irrigação toda a superfície irrigada ou não, que pode receber
água de irrigação. Esta superfície é superior à área do perímetro dominada pela distribuição
de água por gravidade
perímetro irrigado zona de cultivo efetivamente irrigada pelos canais
rede de irrigação conjunto de obras e equipamentos que asseguram o
transporte e a distribuição de água até o início (ou a cabeça) da parcele cultivada
rede de irrigação por gravidade ou rede de canais rede de irrigação na qual
a água escorre a superfície livre, desde um ponto mais alto até um ponto mais baixo. A
energia em jogo então é a força peso e o canal apresenta uma pendente longitudinal mais ou
menos importante e não tolera declividades adversas.
cantoneiros um perímetro irrigado por gravidade é servido por uma rede de
irrigação, uma rede de drenagem e uma rede de circulação. O gerenciamento destas três
redes em um espaço limitado é responsabilidade dos cantoneiros. Um cantoneiro orienta o
trabalho dos canaleiros, responsáveis pela abertura e fechamento das tomadas de água
parcelares;
módulo de rega ou Main d’eau vazão que pode ser manipulada pelo
irrigante ou pelo aguador. Em geral, a tomada de água depende da capacidade técnica do
irrigante mais do que o modo de irrigação ou das culturas a irrigar. Este termo tem origem
nos sistemas de irrigação superficial, notadamente por sulcos, nos quais os irrigantes
tinham que conduzir a água ao longo das parcelas, com a utilização de enxadas. Este valor
de vazão, então, referia-se à quantidade de água que o irrigante conseguiria levar até o final
do quadro irrigado, sem permitir a formação de poças. Segundo Poirre e Ollier, são
diversos fatores que determinam o valor do módulo. O primeiro é o método de irrigação,
sendo que quanto mais aperfeiçoado for este, menor será o valor do módulo. Em segundo,
as condições do terreno, sendo que terrenos nivelados necessitam de menos água. O
terceiro, a permeabilidade do solo, no entanto, é o fator limitante mais importante. O
65
módulo não deve ter valores elevados, pois necessitaria de mais de um homem para
conduzi-lo, exigiria canais terciários ou quaternários com seções maiores e tomadas
parcelares também maiores, gerando custos maiores e afetando a viabilidade de sua
implantação. Se for muito pequeno, por outro lado, não será suficiente para atender uma
superfície de maior expressão ou exigirá um tempo de manejo muito grande, elevando o
custo da mão de obra. Os módulos variam entre 20 e 100 l/s, sendo o valor de 40 l/s o mais
corrente (Tiercelin, 1998; Heras, 1981).
Poirre e Ollier (1965) afirmam que uma rede de distribuição de água dificilmente é
uma obra privada, mas sim de interesse de um grande número de irrigantes.
Os grandes projetos coletivos de agricultura irrigada utilizam, habitualmente,
sistemas de canais para o transporte e distribuição de água, por razões técnicas e
econômicas (Rijo et alli, 2007). Atualmente, os sistemas coletivos clássicos com
distribuição da água por um sistema de canais vêm sendo substituídos por redes coletivas
pressurizadas em muitos países, por permitirem uma maior economia de água e grande
facilidade e flexibilidade de assumir uma distribuição à demanda. (Gomes, 1999)
No entanto, para regiões onde a irrigação superficial é a mais aconselhada, ou onde
o valor da produção agrícola por unidade de área é baixa, tal substituição não teria
justificativa ou viabilidade.
Segundo Rijo (1993), o problema do transporte e distribuição de água, comum a
todas as redes de alimentação, é particularmente difícil de resolver no caso das redes de
canais, pelas razões seguintes:
o controle dinâmico dos escoamentos em superfície livre é mais complexo do
que o dos escoamentos sob pressão;
em regime de exploração, os regimes de escoamento raramente são
permanentes;
as distâncias e, consequentemente, os tempos de transporte podem ser elevados;
a rede de canais pode ser muito ramificada e comportar diversas singularidades,
aumentando, assim, a complexidade do sistema.
66
Entende-se por rede de irrigação o conjunto de órgãos, obras e dispositivos que
asseguram o transporte, repartição e distribuição, a cada parcela irrigada, das águas
destinadas às culturas, bem como os dispositivos que permitem evacuar a vazão excedente.
(Heras, 1981)
O esquema mais comum de alimentação de uma rede de irrigação por gravidade, a
partir de montante, é (Heras, 1981):
Uma obra de captação de águas, situada nas proximidades de um rio, lago,
poço, barragem, etc.;
Um canal de derivação, que parte da obra de captação e leva a água até as
imediações da zona irrigável;
Barramentos compensadores, que permitem regular a vazão para atender o
canal de derivação;
Rede primária, em geral representada por um canal com alguns ramais,
sendo, de certo modo, uma continuação do canal de derivação;
Rede secundária, constituída de uma rede de canais que partem do canal
principal e dominam diferentes superfícies da zona irrigável, terminando, geralmente, nos
ramais correspondentes à rede de drenagem;
Rede terciária, composta por um conjunto de canais originados na rede
secundária e distribuem a água por toda a superfície irrigada;
Rede de drenagem, que permite evacuar os excessos de água da zona
irrigada.
Ainda segundo Tiercelin et alli. (1998), a rede de canais propriamente dita apresenta
uma hierarquia com no máximo quatro níveis:
Um ou mais canais primários ou principais que dominam a zona de irrigação
Os canais secundários, que abastecem os setores de irrigação
Os canais terciários, que são alimentados pelos secundários e transportam
uma a três main d’eau para abastecer os sub-setores de irrigação
67
Os canais quaternários ou regadeiras (arroseurs) ou canaletas (filioles) que
distribuem um main d’eau para abastecer as quadras hidráulicas.
Segundo Rijo (1993), os constituintes das redes de rega em superfície livre são
assim definidos:
Rede de rega ou sistema de rega sistema que liga a fonte ou fontes de
abastecimento, habitualmente barragens de acumulação (albufeiras), aos diferentes pontos
de distribuição de água às parcelas;
Rede de transporte ou rede primária parte do sistema de rega que liga a
fonte de abastecimento à rede de distribuição. A sua função principal é o transporte das
vazões necessárias, apesar de, às vezes, também realizar distribuição aos irrigantes
localizados junto a ela;
Rede de distribuição ou rede secundária e terciária parte do sistema que
liga a rede primária às tomadas de água dos irrigantes. É, habitualmente, constituída da rede
secundária, que liga a rede primária à terciária, com função preponderante de transporte, e
pela rede terciária, que é a parte do sistema diretamente responsável pela distribuição de
água aos irrigantes;
Tomada d’água órgão ou dispositivo hidráulico que regula diretamente a
vazão a distribuir à parcela irrigada;
Reservatórios intercalares de regulação reservatórios situados no interior
das redes de canais ou paralelos a esta, com a função de acumular os excessos de água em
trânsito, quando as redes de distribuição não apresentarem capacidade para isto. Também
podem ser utilizados quando é insuficiente o tempo de resposta de um sistema onde a
demanda é livre por parte dos irrigantes, como forma de aumentar o grau de liberdade dado
a estes;
Regulador transversal ou regulador toda a estrutura ou dispositivo
mecânico que, numa determinada seção transversal, regula as cotas da superfície livre, na
maior parte dos casos, podendo ainda regular as vazões aduzidas para jusante. Por norma,
ocupa toda a largura da seção transversal e pode ser constituído por vertedores ou por uma
ou várias comportas associadas em baterias.
68
Trecho de canal regulado ou trecho parte de um canal compreendido entre
dois reguladores.
De acordo com Poirre e Ollier (1963), em um perímetro irrigado a irrigação não
ocorre em toda a área dominada, sendo que há uma variação ao longo dos anos. Citando um
estudo norte-americano, os autores apresentam a seguinte evolução da relação entre a área
irrigada e a área dominada:
Tabela 11 Relação entre a área irrigada anual e a área dominada em perímetros
irrigados
Anos após o término das obras
Relação entre as áreas
5
0,36
10
0,38
15
0,68
0
0,76
30
0,82
40
0,85
50
0,86
Fonte: Poirre e Ollier (1963)
De modo geral, na maioria dos países da América Latina os resultados dos projetos
de irrigação coletiva, públicos ou privados, não têm atingido as metas esperadas (Effertz et
alli, 1993). A falta de êxito na execução de projetos e/ou programas no setor agropecuário
tradicional resulta de algumas situações, entre as quais podem ser consideradas:
desvinculação entre a etapa de elaboração de projeto e sua execução;
desvinculação entre projetista e executores do projeto com os usuários ou
beneficiários do mesmo;
desvinculação entre o que se quer fazer e a maneira de fazê-lo.
69
Mesmo para projetos que tenham sido bem concebidos e bem implantados em
termos físicos, o funcionamento depende de pessoas e formas de atuação, estando sujeitos a
deficiências no cumprimento dos propósitos iniciais, as quais podem levar ao não
atendimento das metas fixadas e até prejudicar o sistema e os beneficiários do projeto,
como no caso de falta de água para as lavouras devido ao excesso de perdas, isto é, pela
baixa eficiência global da prática de irrigação.
A concepção de uma rede deve assegurar uma repartição de água equitativa entre os
irrigantes, motivo pelo qual sua concepção é um trabalho delicado, não sendo um problema
comum de hidráulica. Sem organização e sem disciplina, os irrigantes situados no início da
rede captariam, para seu proveito, toda a vazão disponível (Poirre e Ollier, 1965).
A vazão de cálculo dos canais depende da disponibilidade de água (Poirre e Ollier,
1965), sendo que no caso da existência de água em abundância, a vazão de cálculo deve ser
a suficiente para atender à necessidade máxima das plantas, acrescendo-se 20% a 30%
deste valor para compensar as perdas de distribuição. No caso de restrição hídrica, a vazão
de referência depende do plano de cultivo previsto, selecionando-se a maior demanda
mensal prevista.
Definida a vazão, estabelece-se o método de distribuição que será adotado. Essa
decisão é fundamental e deve ser tomada no início da concepção do projeto da rede de
canais de forma a responder à pergunta: qual será a forma de atendimento da demanda? A
programação do fornecimento de água pelo sistema de distribuição é feita para minimizar
as perdas operacionais e influencia todas as outras decisões sobre o sistema de canais.
O fornecimento de água aos irrigantes (Mayer, 1945) pode ser contínuo; em rotação
ou contra-pedido. Heras (1981) resume os métodos a duas possibilidades, por turnos (ou
rotação) ou por demanda (contra-pedido)
De acordo com Rijo (1993) os principais tipos de sistema de distribuição de água
em sistemas de irrigação são:
pela demanda: o agricultor dispõe de água em qualquer momento e em
qualquer quantidade
70
semi-demanda: o agricultor dispõe de água após ter solicitado. O volume por
hectare é limitado;
rotação de canais com demanda livre: os canais secundários recebem água
por turnos, e, quando a água chega a um setor, os agricultores podem usar a quantidade que
quiserem;
por turnos: os canais secundários recebem água por turnos e os irrigantes,
dentro de uma determinada zona servida por este canal, recebem água em horas e
quantidades fixadas previamente;
vazão contínua: em toda a temporada de irrigação, o agricultor recebe uma
pequena mas contínua vazão, que compensa a evapotranspiração diária das culturas.
O método de distribuição contínuo implica no direito do irrigante de utilizar esta
vazão em qualquer ocasião. Segundo Mayer (1945), é o único processo aplicável na cultura
do arroz. Esse processo é o preferido pelos irrigantes com pouca experiência, talvez por ser
o mais semelhante ao escoamento dos cursos de água naturais e podem programar a
irrigação de suas parcelas de acordo com sua conveniência. Por outro lado, para a
implantação do perímetro, a adoção deste método pode significar custos menores, pois os
canais terão uma seção mínima, que a vazão se constante. Isso é particularmente
interessante no caso de redes que utilizam tubulações, pois os diâmetros serão pequenos. Os
inconvenientes na sua adoção são:
Como a água se fornecida continuamente, a vazão parcelar se
demasiadamente pequena, resultando em grande dificuldade em manejá-la (o que não se
aplica para a lavoura de arroz irrigada por inundação, em que o manejo da água não é como
na irrigação por sulcos, por exemplo, na qual o irrigante deve conduzir a água ao longo da
parcela);
Se o agricultor sempre tem água à sua disposição, é frequentemente levado a
usá-la em excesso e, por vezes, até em épocas impróprias;
É um método que favorece o desperdício, o encharcamento do terreno junto
dos canais de distribuição e a elevação do nível do lençol subterrâneo.
Neste método podem ser observadas três situações distintas (Poirre e Ollier, 1965):
71
A vazão é superior ao módulo: o irrigante pode realizar uma rotação dentro
da sua parcela, dividindo-a em 2 ou 3 partes, se a vazão for igual a 2 ou 3 módulos;
A vazão é pouco inferior ao módulo: o irrigante dirige esta quantidade de
água para parcelas menores da área irrigável. Isto traz como inconveniente a necessidade de
implantar-se redes internas de distribuição, o que pode ser muito custoso;
A vazão é muito inferior ao módulo: neste caso, o irrigante terá que
acumular a água em um reservatório ou irrigar áreas muito pequenas.
Ferreira (1986) indica que a vazão em um canal terciário para vazões contínuas
pode ser obtida pela expressão:
TEEE
N
AQ
dca
i
tt
1157,0
4.22
sendo Q
t
a vazão do canal terciário, em l/s; A
t
a área atendida pelo canal terciário,
em hectares; N
i
a necessidade de irrigação média ponderada da área A
t
, em mm/mês;
0,1157 o fator de conversão de mm/dia para l/s; E
a
a eficiência de aplicação média
das parcelas inseridas na área A
t
;
E
c
a eficiência de condução; E
d
a eficiência de
distribuição; T o número de dias do mês considerado.
Heras (1981) afirma que o cálculo da vazão de projeto para definição das estruturas
de distribuição é obtido por:
MHQ .
0
4.23
sendo
M
S
S
H
4.24
sendo Q
0
a vazão na cabeceira do canal terciário, em m³/s; H o número de módulos;
M o módulo eleito (m³/s); S a superfície total dominada pelo canal terciário (em hectares); e
S
M
a área máxima atendida pelo módulo M, irrigando continuamente durante a jornada de
rega.
A vazão irá diminuindo ao longo do canal conforme ocorra a derivação pelos
módulos sucessivos, sendo que se verificará a seguinte situação hipotética:
MiHQ
i
).(
4.25
72
sendo Q
i
a vazão de projeto para o trecho correspondente entre a tomada de água de
ordem i e a de ordem (i+1), quando as tomadas são numeradas de montante para jusante.
No caso em que o serviço das tomadas de água não seja contínuo, isto é, quando os
módulos são programados para abrirem durante tempos fixos, a intervalos previamente
determinados pelo plano de irrigação, a vazão de projeto na cabeceira do canal terciário
será a mesma definida pela expressão anterior, mas a diminuição da vazão de projeto
somente se realizará agora quando coincidir que os tempos de serviço das tomadas de água
sejam iguais. Se a jornada de irrigação não cobre todo o dia, é conveniente que os canais
terciários permaneçam cheios, devendo-se fechar as tomadas de água de jusante para
montante, ainda que se possa perder uma quantidade de água nesta operação. Por outro
lado, se os canais serão esvaziados, as tomadas serão fechadas de montante para jusante,
mas isso exigirá que o plano de irrigação considere que é necessário um tempo extra na
jornada de irrigação para encher os canais antes de iniciar a irrigação. (Heras, 1981)
O método de rotação ou por turnos consiste em fornecer a água por turnos a
diferentes setores do sistema de irrigação. O princípio deste método é o seguinte (Poirre e
Ollier, 1965): a água chega aos proprietários apenas em intervalos determinados, porém
com uma vazão igual ao módulo, ou seja, geralmente muito mais importante que a vazão
contínua necessária. O tempo durante o qual uma propriedade recebe esta vazão é
reduzido na mesma proporção, de modo a que receba apenas o volume definido e não
mais.
Com isto, as vazões conduzidas pelos canais são maiores, bem como às que são
entregues às parcelas de irrigação. Isso torna mais eficaz o trabalho do irrigante, facilitando
a distribuição da água na parcela, evitando desperdícios e o excesso de umidade nos
terrenos junto aos canais. Porém, necessita de certa disciplina e submissão a um plano de
distribuição previamente estabelecido, o que afeta a independência do irrigante.
Raposo (1996) acrescenta que a distribuição pode ser realizada por volume
constante (cada agricultor recebe o volume fixado, independente da disponibilidade
hídrica) ou por volume proporcional (cada irrigante recebe uma parte do disponível naquele
instante), sendo esta situação mais encontrada em projetos antigos no norte da África para
repartição da água de cursos superficiais intermitentes.
73
Ainda segundo Raposo, a rotação é o método mais utilizado em todo o mundo,
inclusive em Portugal, e é o método mais adaptado para a irrigação superficial. Em sistemas
onde foi adotado (Mayer, 1945) observou-se que os irrigantes inicialmente mostram
relutância em aceitá-lo, porém logo se convencem da sua utilidade. Para os gestores do
sistema, o método da rotação tem mais dificuldades operacionais do que o de fornecimento
contínuo, que exige um estudo criterioso dos horários de rega e programação dos canais
que serão atendidos. O método permite que se substitua o controle de vazão por um
controle de tempo de distribuição, muito mais fácil de medir e controlar, partindo-se da
hipótese de que é possível manter constante a vazão calculada.
A rotação é observada principalmente nos canais de menor hierarquia, com menos
frequência nos canais secundários e excepcionalmente nos canais primários. Ainda que
considerar-se que os canais sofrem um processo de enchimento e esvaziamento constante, o
que provoca uma maior perda por infiltração em comparação com o método anterior, no
qual as valas sempre estariam com água. No entanto, Poirre e Ollier (1965) citam a
irrigação no Egito como exemplo de rotação no canal principal, colocando como
desvantagens importantes a perda de tempo para a operação, os atrasos da chegada da água
nos trechos anteriormente em descanso, a manutenção mais delicada das obras, a
manutenção de intervalos fixos que não respeitam as diferentes necessidades das plantas ao
longo do ciclo vegetativo e não considerar a ocorrência de chuvas ou ventos que
prejudicam a aplicação da água. Como justificativa para adotar tal sistema, os autores citam
a necessidade de evitar-se as perdas nos canais secundários para os cultivos irrigados por
outros canais mais abaixo, quando a rede é muito extensa para limitar as quantidades de
água, inclusive quando esta não escasseia, para evitar o encharcamento do solo ou a
dificuldade de drenagem; para controlar a ascensão de sais à superfície do solo pela
facilitação da drenagem pela imposição de um menor nível de água nos canais; a
necessidade de retirada do limo dos canais ou promover a limpeza destes; para atender
adequadamente as necessidades de múltiplos cultivos na época correta e observando
intervalos de tempo mínimos entre regas; e por variações importantes na fonte de água que
alimenta os canais durante o ano.
74
O resultado, no entanto, pode ser uma rega pouco racional, muito distante da
necessidade dos cultivos, havendo desperdício de água algumas vezes e escassez em outras,
com encharcamento ou ressecamento do solo.
Lamaddalena et alli (1994), comparando a gestão de dois projetos de irrigação
similares, concluíram que a rotação não induz a economia de água, resultando em
consumos unitários mais elevados do que o do sistema por demanda. No entanto, este
sistema, quando aplicado em um projeto concebido por rotação, pode levar a situações de
inviabilidade de atendimento da vazão necessária, por esta ser superior à capacidade de
transporte do canal principal.
O método de fornecimento de água a contra-pedido é aplicável quando a
capacidade dos canais e a vazão disponível é bastante superior à superfície irrigável. Sendo
possível atender ao irrigante quando ele desejar e fornecendo a quantidade de água
solicitada no tempo estabelecido, torna o processo inteiramente satisfatório ao irrigante,
mais do que o fornecimento contínuo. Poirre e Ollier (1965) colocam que este é o método
tecnicamente melhor e mais racional, ainda que não seja o mais econômico na implantação
da rede. No entanto, é um processo muito difícil de ser colocado em prática, porque o mais
provável é que os pedidos de muitos irrigantes se concentrem em determinadas épocas,
determinadas pela natureza dos cultivos ou pelas condições climatológicas, de mercado ou
disponibilidade de maquinário, entre outras causas, e não haja água ou capacidade de
transporte do sistema de canais suficiente para atender a todas as solicitações. Ainda deve-
se considerar a possibilidade das parcelas que serão irrigadas estarem muito dispersas,
gerando a necessidade de transportar a água por grandes distâncias para atender estas
demandas, o que pode tornar as perdas de água e de tempo de operações importantes,
afetando a viabilidade financeira do gestor do sistema para executar estas operações. Esse
método também considera que o irrigante tenha conhecimento correto das necessidades de
água dos cultivos, sendo necessária a vulgarização de conhecimentos técnicos para que isso
ocorra.
Assim, segundo Mayer, esta distribuição é observada durante os primeiros anos
de funcionamento de uma rede de distribuição ou durante as épocas do ano em que as
exigências de água são diminutas. Considerando o crescimento da relação entre a área
75
irrigada e a área dominada, verifica-se que a distribuição contra-pedido pode ser realizada
ao longo dos primeiros anos sem muitas limitações, pois os canais de distribuição são
dimensionados para valores entre 95% e 100% de irrigação da área dominada e, com isto,
terão dimensões suficientes para permitir este método de distribuição para uma área
consideravelmente menor. Poirre e Ollier (1965) colocam textualmente que
Ademais, para que os irrigantes não tenham a intenção de abusar, a água deve ser
vendida e eles por volume realmente consumido.
Raposo prefere denominar este método de outra forma, com expressões como à
vontade, ao livre arbítrio ou rega livre, de forma a mostrar que a lógica deste sistema é
liberdade de uso da água pelos irrigantes, no quando e no quanto irrigar, sendo o único
limite a capacidade de transporte do sistema de distribuição ou das tomadas de água. Este é
o método mais adequado para a irrigação pressurizada, que deve ser complementada pela
medição dos volumes utilizados. Pela provável variação da distribuição ao longo dos
setores do perímetro, esta modalidade é mais recomendada para redes em tubulações
enterradas.
Se a distribuição contra-pedido for adotada em canais, além dos problemas de
dimensionamento e de estabilidade de taludes, uma maior dificuldade em combater a
infestação de ervas invasoras e processos de eutrofização das águas.
Os sistemas de irrigação públicos no Brasil (excluindo os da região Sul, projetados
para vazão contínua) são, usualmente, projetados ou operados para fornecer água quando
necessário (demand system), porém, quando a demanda ultrapassa a capacidade de
fornecimento do sistema, é necessário controle e programação da distribuição. Se não
uma programação e controle, alguns irrigantes ao longo do sistema não mais receberão a
quantidade necessitada. Isto pode acontecer, especialmente, nos meses de demanda máxima
e em horários de demanda máxima durante o dia. Na maioria das vezes, os beneficiários
dos projetos de irrigação implantados pelo setor público são pessoas acostumadas a
gerenciar o lote isoladamente e com pouca experiência de irrigação. Este é outro fator de
aumento de perdas. (Effertz et al, 1993).
Heras (1981) pondera, ainda, que se o sistema de distribuição é livre, a capacidade
de vazão de cada tomada deve ser superior à vazão fictícia contínua, sendo este um valor
76
definido por um plano de cultivo estimativo, definido ainda na fase de projeto, pois o
irrigante pode solicitar a quantidade necessária para atender a demanda diária das plantas
em um tempo inferior a 24 horas. Evidentemente, a adoção de vazões elevadas que serão
utilizadas somente algumas horas por dia resulta em um custo muito elevado da rede de
distribuição e este custo será tanto mais elevado quanto maior for o grau de liberdade dado
aos irrigantes. Assim, o problema é o custo da liberdade.
Segundo Raposo (1996), esta lógica de distribuição é muito atrativa para os
irrigantes, sendo que perímetros implantados com a possibilidade de fornecimento de água
contra-pedido apresentam uma maior área efetiva em menor tempo após a implantação. O
maior inconveniente é o elevado custo inicial, pois as redes têm que ser concebidas com as
folgas necessárias para garantir o livre acesso à água.
Uma forma de reduzir este custo é limitar o uso possível dentro do mesmo setor de
irrigação, considerando que apenas parte dos agricultores poderá irrigar ao mesmo tempo,
com o que se pode atingir até 15% de redução dos custos.
Correspondente à vazão fictícia, há um tempo de irrigação máximo, T. No entanto, a
utilização da rede de irrigação tende a ser menor, correspondendo a um tempo T’. A relação
entre estes tempos é dada por
1
'
T
T
r
, 4.26
sendo r denominado de rendimento de utilização da rede.
A definição de T’ vem da compreensão de que durante o tempo T-T’ a vazão é nula,
ou seja, a probabilidade do funcionamento das tomadas de água neste intervalo é nula. No
entanto, é mais provável que a demanda seja sempre variável e, consequentemente, a
probabilidade de haver uma vazão em alguma tomada também é variável. A introdução do
parâmetro r significa a aplicação de um coeficiente 1/r da probabilidade de cada tomada,
calculada sobre a totalidade do período de ponta T, para ter em conta a sua variação em
relação à média.
Para jornadas de irrigação diárias de 16 e 18 horas (limitadas por turnos de trabalho
dos canaleiros), o valor de r é, respectivamente, 0,66 e 0,75. No entanto, Clement (Heras,
77
1981) na análise desta situação, considera que o valor de r deve ser muito próximo à
unidade, considerando a irrigação por aspersão, pois os agricultores têm a tendência de
irrigar ao longo de toda a jornada. Valores baixos de r significam um sobre-
dimensionamento da rede para que não haja problema de distribuição.
Os estudos de Clement (Heras, 1981) baseiam-se na distribuição de Bernoulli,
considerando que a probabilidade das tomadas estarem abertas ou fechadas são
complementares à unidade, isto é
pq 1
4.27
em que q é a probabilidade da tomada estar fechada e p é a probabilidade de estar
aberta.
A partir do valor de r, pode-se estimar a vazão fictícia para o tempo T’, isto é,f’:
r
f
f
'
4.28
Assim
r
Rf
r
D
DfR
.
.
''
4.29
sendo R o número total de tomadas de água na rede considerada; D a vazão fictícia
contínua na cabeça da rede, para um tempo de utilização T; D’ a vazão fictícia contínua na
cabeça da rede, para um tempo de utilização T’
O grau de liberdade dado aos irrigantes é definido por:
'
'
f
d
g
4.30
em que d é a vazão máxima em cada tomada de água, considerando-se que as
tomadas sejam iguais.
A probabilidade p para que i tomadas das R tomadas da rede estejam funcionando
obedece a distribuição binomial ou de Bernoulli (Heras, 1981), resultando:
78
iRi
iR
i
i
qp
i
R
pp
i
R
P
1
4.31
Considerando-se que as probabilidades de que o número de comportas em
funcionamento é um fenômeno independente, pode-se assumir que
iRi
Ni
i
N
qp
i
R
P
1
4.32
O valor de P
N
é denominado de qualidade de funcionamento e uma vez fixado pode-
se calcular o valor de N que determina o número de tomadas em funcionamento simultâneo
correspondente a este grau de qualidade. Clements (Heras, 1981) sugere que este valor
varie entre 95% e 99%.
Os estudos de Clement (Heras, 1981) resultaram em processos mais práticos de
determinação dos valores necessários para a manutenção da qualidade da rede, com a
determinação de duas fórmulas generalizadas.
Para qualquer situação, o roteiro para a determinação dos valores necessários é:
a. Fixar o coeficiente r de utilização da rede;
b. Determinar os diferentes subconjuntos de tomadas homogêneas em relação à
vazão;
c. Calcular a probabilidade p de funcionamento das tomadas
d. Fixar a qualidade de funcionamento P
N
da rede ou de cada trecho da rede, se
esta não for uniforme
e. Aplicar, em cada trecho, as fórmulas de Clement e determinar o número de
tomadas que devem ser consideradas abertas em cada um deles
f. Determinar as vazões correspondentes a cada trecho ou canal terciário,
realizando o mesmo processo com relação aos canais secundários e destes em relação ao
canal principal. A vazão do canal principal poderá ser diferente do somatório da vazão dos
canais secundários, uma vez que os critérios de distribuição de probabilidades também
serão aplicados nesta relação.
79
É importante salientar que a definição das vazões de projeto e do número de
tomadas atendidas por cada canal terciário se na fase de projeto e que esta definição
determina (ou é determinada, conforme o caso) a qualidade de funcionamento, sendo que
esta definição é diretamente ligada ao sistema de distribuição estabelecido. Por outro lado,
a implantação ou supressão de tomadas de água ao longo de um canal existente interfere
nesta qualidade.
Pode-se, ainda, recorrer a sistemas mistos de distribuição, como o fornecimento
contínuo aos canais distribuidores e uma rotação entre canais secundários ou terciários, ou
utilizar o sistema de contra-pedido na estação climática de menor demanda, alterando-se o
método quando houver uma maior exigência de água.
O manejo da água dentro do sistema de canais, para qualquer método de
distribuição selecionado, pode seguir um dos três processos possíveis:
Uma distribuição proporcional entre os irrigantes
Uma distribuição por volume fixo de água durante a temporada de irrigação,
cobrando-se um determinado valor por hectare irrigado;
Uma distribuição que entrega a cada consumidor um volume que é medido,
sendo a cobrança realizada pelo volume efetivamente recebido
A seleção do processo de manejo indicará o tipo de mecanismo de manejo de
distribuição de água, que podem ser:
Partidores: construções que tem a finalidade de dividir a água que é
conduzida por um canal em partes proporcionais, entregando alíquotas da vazão a cada
canal secundário ou terciário, conservando-se constante a razão entre os volumes parciais
entregues a cada canal e o volume total distribuído. O princípio de funcionamento de um
partidor pode ser entendido a partir do estudo da vazão em um canal retangular. Para uma
altura constante do tirante, a vazão é uma função da largura e da velocidade média,
VbhfQ ,,
Para dividir-se a vazão em 2, 3 ou 4 partes iguais, basta dividir teoricamente a
largura do canal em 2, 3 ou 4 partes iguais. Os resultados são aproximados, que a
velocidade não é a mesma em toda a largura do canal e os partidores provocam contrações
80
laterais na veia líquida. Heras (1981) afirma que os partidores, quando fixos, têm o
inconveniente de distribuir água a parcelas que não necessitam. A colocação de elementos
móveis permite fazer estes reajustes. No entanto, os partidores devem ser implantados de
tal forma que o regime do escoamento seja rápido, para garantir a qualidade da repartição
de vazão, pois o regime fluvial é sensível a obstáculos a jusante do partidor.
Módulos e reguladores de nível: é o conjunto de estruturas adequadas para
quando se opta por distribuir um volume determinado para cada hectare irrigado durante o
período total de irrigação, sendo correspondente a uma taxa de acordo com as condições do
terreno. Observa-se, por exemplo, no Perímetro do Vale do Sado, em que os solos salinos
sob irrigação recebem 18.000 m-³.ha em cada temporada de irrigação, enquanto que os
outros tipos de solo recebem menos de 14.000 m-³.ha (Associação de Regantes, 2008).
Os reguladores de nível mantêm o nível da água no canal quase constante,
independente das vazões circulantes. Podem ser representados, fundamentalmente, por
comportas ou por vertedores. As comportas podem ser planas ou curvas; manuais,
automáticas de acionamento hidromecânico ou de acionamento elétrico; regular o nível a
montante ou a jusante.
Em projetos de redes de distribuição de água em locais onde o suprimento de
energia elétrica e os serviços de manutenção são pouco confiáveis, ou onde carência de
mão de obra especializada, a preferência é dada aos sistemas de controle que contam com
comportas hidromecânicas automáticas. Estas comportas são controladas por flutuadores e
exigem poucos cuidados de manutenção, dada a sua simplicidade de concepção e
funcionamento. Resumidamente, é uma chapa metálica, com uma seção correspondente a
do canal ou de um orifício que abastece um canal, ligada a um flutuador por meio de uma
armação metálica. Essas comportas causam uma pequena perda de carga, menor que a
observada em um vertedor (Poirre e Ollier , 1963). O sistema acha-se equilibrado de tal
modo que o momento do seu peso é igual e de sentido contrário ao momento da impulsão
que a água exerce sobre o flutuador quando o nível da água encontra-se à cota que se
pretende manter, sendo esta cota igual à cota do eixo de giro da estrutura.
As comportas que controlam o nível da água a jusante, são normalmente referidas
por seus nomes comerciais AVIS e AVIO, sendo estas mais utilizadas no Brasil. As
81
comportas que regulam o nível da água por montante são chamadas pelo nome comercial
de AMIL, sendo muito encontradas em Portugal. Estas comportas permitem facilmente a
implantação de instrumentos de controle de seu funcionamento, possibilitando a obtenção
dos volumes derivados ao longo do tempo. Como desvantagem principal, está o seu custo
relativamente elevado. Também a simulação numérica do comportamento destas estruturas
foi estudada, possibilitando a sua manutenção em projetos de modernização e
monitoramento por sensores eletrônicos. (Collischonn et alli, 2001 a,b; Rijo e Betâmio de
Almeida, 1994)
Redes controladas por estes sistemas permitem manter níveis aproximadamente
constantes imediatamente a montante ou imediatamente a jusante das comportas, e
permitem grande independência aos irrigantes ou aos canaleiros que, ao abrir ou fechar as
tomadas de água, determinam a vazão no sistema. Comportas deste tipo têm sido usadas
desde os anos 50 na Europa e norte da África, e hoje podem ser encontradas em
praticamente qualquer país em que se utiliza a agricultura irrigada.
Atualmente, equipamentos controlados por sensores ligados a processadores de
dados e acionados por motores têm aumentado a sua importância, principalmente nos
países mais desenvolvidos. Comportas planas ou comportas de setor acionadas por motores
elétricos e controladas por sensores de nível também podem ser utilizadas. Os limitantes
encontrados para a instalação destes equipamentos de controle são a necessidade de revestir
os canais, que devem manter uma geometria constante, os custos de instalação e a
necessidade de mão de obra especializada para manutenção e operação. No entanto, o
aumento da eficiência de painéis solares, a expansão da telefonia celular e a redução dos
custos de equipamentos de informática têm revertido esta situação, como no caso do Vale
do Sado, onde controladores serão colocados inclusive no final das redes de distribuição e
controlados totalmente de forma remota e autônoma.
Outras estruturas simples, como vertedores de grande desenvolvimento, também
conhecidos como bico de pato, são utilizados para manter a variação dos níveis da água nos
canais dentro de intervalos aceitáveis, de tal forma que a alteração da vazão que escoa pelas
tomadas d’água parcelares não seja significativa, pois a altura de carga também não irá
variar significativamente. Estes vertedores provocam elevação do nível da água a montante
82
e uma queda da água a jusante, sendo, necessariamente, implantados em trechos revestidos
do canal.
Como medidores de vazão, estas estruturas apresentam, como inconveniente,
justamente a pequena variação de altura a montante para alterações no valor da vazão, o
que compromete a sua precisão, considerando a margem significativa de erro na leitura
visuais de réguas instaladas em canais. Também facilitam a deposição de sedimentos a
montante, pela redução da velocidade de escoamento, mas isso pode ser evitado quando se
une o bico de pato a uma comporta.
Os módulos, por sua vez, garantem uma vazão quase constante quando colocados
nos trechos dos canais onde o remanso causado pelos reguladores de nível, de forma a
estabelecer-se uma relação entre nível e vazão que passa por cada módulo para atendimento
de uma parcela. A denominação módulo tem origem italiana, sendo que o módulo milanês
data de 1572. Poirre e Ollier colocam que um módulo, na verdade, compreende três
elementos distintos: a tomada de água propriamente dita, o órgão regulador e o módulo.
Para ser satisfatório, um módulo deve apresentar as seguintes condições (Mayer, 1945):
Fornecer, em tempos iguais, volumes iguais de água, em quaisquer
condições de altura de água e velocidade da corrente no canal de onde é realizada a
derivação;
Ser simples e pouco sujeito a avarias;
Ser automático;
Determinar uma pequena perde de carga;
Não poder ser desregulado pelos irrigantes;
Ocupar pouco espaço; e
Fornecer constante e rigorosamente a quantidade de água para a qual
está graduado.
Carpenter (apud Wilson, 1911, p. 85) enumera as qualidades mais importantes para
um módulo ou equipamento de medição de vazão:
83
a vazão deve ser transformável em uma unidade comum de medida, como
m³/s;
o mesmo módulo deve permitir a mesma vazão em qualquer lugar;
deve ser utilizável em canais de todos os tamanhos e permitir a passagem de
qualquer fração de sua capacidade para permitir a divisão pro rata;
a alteração da vazão deve ser facilmente reconhecida;
deve ser simples o suficiente para ser operado por um homem de
inteligência comum (opinião do autor, reforçando a necessidade de um instrumento fácil
de ser operado ou controlado), ou os cálculos não devem exigir que se regule a vazão de
diferentes módulos ou determinar o montante de água distribuído.
deve ocupar o mínimo espaço possível;
a vazão não deve ser afetada por variações no nível de água a montante.
Wilson (1911) afirma que os módulos são muito utilizados na Itália e outras partes
do sudeste da Europa, sendo que modificações destes módulos eram encontrados na Índia e
Estados Unidos.
O módulo italiano (Poirre e Ollier, 1963) consiste em criar uma câmara com uma
superfície significativa pela qual passa a água, após transpor uma comporta, que sairá da
câmara por uma abertura submersa ou por um vertedor de parede delgada. A câmara
consiste no órgão regulador e será operada manualmente mantendo-se o nível interno
constante mesmo que o nível no canal varie, para que a vazão escoada pela abertura ou pelo
vertedor possam ser determinadas. A figura 5 apresenta o módulo milanês.
84
Figura 5 Módulo milanês (Poirre e Ollier, 1963)
O módulo espanhol é diferente e introduz a regulagem automática. A água passa do
canal alimentador por meio de orifícios a uma pequena câmara. Nesta, um flutuador
cônico, que obstrui parcialmente um outro orifício que comunica a primeira câmara com
outra, situada abaixo desta. Se o nível da água se eleva no canal, o flutuador diminui a
abertura do orifício, mas esta diminuição é compensada pela elevação da pressão, visando a
manutenção da vazão.
Figura 6 Módulo de Ribera (Conti, 1912)
Uma adaptação deste dispositivo foi apresentada recentemente por Amaral e Righes
(2005) que apresentam uma proposta de estruturas automáticas de controle de água em
canais de irrigação de arroz. As duas alternativas estudadas foram uma comporta-segmento
associada a um vertedor e um regulador de vazão com controle via orifício, que foram
85
comparados em relação à sensibilidade de controle de vazão, em função da variação da
altura de lâmina de água no canal principal, com duas comportas fixas: uma comporta-
gaveta de aço e uma comporta-vertedor de tábuas, ambas de regulagem manual com grande
aplicação nas lavouras de arroz da região do estudo. A variação do nível do canal principal
ao longo da irrigação é de 0,15 m em relação a um valor máximo de 0,9 m, ou seja, uma
variação de 16,7%. Para esta variação, o regulador de vazão com orifícios mostrou uma
variação na vazão entregue ao canal de apenas 5,6%, As estruturas são mostradas na figura
7 a seguir.
Figura 7: Estrutura automática de controle de vazão em canais de irrigação:
regulador com orifícios (Amaral e Righes, 2005)
Em relação ao sistema de pranchas, descrito a seguir, esta concepção tem a
vantagem de não precisar da manutenção do nível no canal principal. O módulo de prancha
é o mais utilizado em canais europeus. Consiste de um vertedor de crista horizontal, uma
prancha metálica inclinada, fixada a uma altura bem determinada acima da crista e uma
comporta móvel que fecha ou abre completamente o orifício formado entre a prancha e o
umbral do vertedor. O funcionamento deste dulo obedece a dois princípios distintos.
Para níveis da água no canal abaixo do bordo superior do orifício, a vazão é dada pelo
vertedor. Quando a água ultrapassa aquele nível, o escoamento se pelo orifício. As
curvas de vazão dos dois dispositivos são distintas, sendo que para o vertedor a vazão é
86
uma função da altura de carga elevada a 3/2 (
ghbmQ .2...
2
3
), enquanto que no orifício
esta função é uma raiz quadrada da carga (
hgSbmQ ..2...
). A figura 8 a seguir ilustra o
princípio de funcionamento destes módulos, na qual se observa que uma faixa onde a
vazão tem uma variação de ± 5%, mas a variação da altura de carga é muito maior do que
este valor. Assim, os módulos de prancha garantem um valor aproximadamente constante
de vazão, mesmo para flutuações significativas do nível da água no canal. Observa-se que
os valores de vazão dos módulos comerciais respeitam os valores dos módulos de rega, isto
é, os módulos comerciais apresentam valores múltiplos de 5 l/s, sendo os menores
dispositivos apresentados como baterias com capacidade para 20 l/s. Poirre e Ollier
observam que a noção de módulo, tão rígida nas redes antigas, onde o método de
distribuição por rotação dava ao módulo uma importância fundamental e impunha-lhe
uma constância absoluta no interior da rede, desaparece nas redes modernas com
distribuição à vontade do irrigante. As vazões administradas podem variar em uma mesma
rede, segundo as tomadas de água. Esta observação é feita no contexto da adoção da
irrigação por aspersão em substituição aos métodos de irrigação por superfície, mas
reforçam a idéia da vinculação dos módulos com a filosofia da distribuição por rotação.
Outras possibilidades de tomadas de água para a parcela são vertedores controlados
por comportas, vertedores Bazin de altura ajustável ou não e orifícios controlados por
comportas. Rijo e Arranja (2006) avaliaram o funcionamento destas tomadas, encontrando
o pior desempenho para os orifícios controlados por comportas, sendo este o caso das
tomadas de água do sistema do Arroio Duro..
Conhecida ou não a vazão, pela aplicação de um dos métodos possíveis, é
necessário realizar a sua gestão ao longo do sistema, de forma a atender as demandas das
culturas. A “arte” de gerenciar as vazões afluentes ao sistema, as vazões efluentes e as
reservas de água nos canais denomina-se regulação de canais de irrigação (Rijo, 1997). A
regulação tem como objetivos a economia de água, a diminuição do investimento global, a
diminuição dos custos de exploração, a simplificação da operação e a diminuição do custo
da água útil.
87
Figura 8 Módulo de prancha (Fonte: Bauzil, 1952)
O termo regulação refere-se a uma ação do controlador, e objetiva a manutenção de
um nível de água ou de uma vazão em determinado valor. A regulação pode ser realizada
manualmente, por um operador humano (cantoneiro ou canaleiro), pela força da água em
uma comporta hidromecânica, por um flutuador com um controlador gico programável e
uma comporta eletromecânica, etc. Além disto, regulação pode ser realizada por um
regulador passivo, como um vertedor de grande desenvolvimento de crista, como um bico-
de-pato.
Existem basicamente duas lógicas de regulação que se pode adotar em um sistema
de canais (Rijo, 1993), que são:
88
a regulação por montante em um canal regulado por montante, a vazão na
admissão determina as vazões a serem distribuídas, que obedecem a calendários ou
esquemas de distribuição pré-estabelecidos. Portanto, o funcionamento do canal é regulado
pela admissão de água a partir da fonte ou das fontes;
a regulação por jusante a vazão a ser admitida no canal é determinada pela
vazão retirada pelos irrigantes nas suas tomadas d’água; assim, são os irrigantes ou o
canaleiro que ao abrir ou fechar as tomadas d’água que determinam o funcionamento do
canal.
O controle dos canais depende da obtenção de informações que permitam
estabelecer a estratégia de operação dos reguladores. Uma outra classificação da operação
do sistema de canais é a que indica a posição relativa dos reguladores e dos órgãos de
obtenção dessas informações. Assim, os sistemas podem ter (Rijo, 1993):
Comando por montante os ajustes necessários que devem ser realizados
nos reguladores são baseados nas informações que são obtidas a montante destes
reguladores. Normalmente, as informações utilizadas são a profundidade (y) e as vazões
(Q). Estas informações podem ser obtidas com o uso de sensores colocados a montante do
regulador ou considerar as variações de vazão provocadas pelo canaleiro a montante deste
regulador. A informação é transmitida de montante para jusante, sendo que este comando é
compatível com a regulação por montante.
Comando por jusante os ajustes necessários baseiam-se em informações
que vem de jusante, que podem vir de um sensor colocado a jusante do regulador ou ser
baseada na variação de vazão provocada pelo canaleiro ou irrigante com a operação das
tomadas d’água. A informação é transmitida de jusante para montante, até a admissão da
água.
A figura 9 apresenta esquematicamente estes dois comandos, enquanto que a figura
10 apresenta a relação possível entre regulações e comandos, adotando-se os conceitos de
regulação e controle do autor.
o controle indica o nível de tomada de decisão. Os diferentes métodos de
distribuição de água podem ser definidos atendendo a diversos graus de liberdade
89
oferecidos aos irrigantes para a organização das regas em termos de vazão, frequência e
duração das distribuições. Então, o controle pode ser (Rijo, 1993):
Local a decisão sobre as distribuições é tomada pelo irrigante, sem
intervenção do responsável pelo sistema de irrigação;
Intermediário a decisão é por acordo entre o irrigante e o responsável pelo
sistema;
Central a decisão sobre as distribuições é tomada pelo responsável pelo
sistema.
Figura 9 Comando por montante e comando por jusante (Rijo, 1993)
Existem outras classificações para designar a operação de sistemas de canais e
muitas vezes os conceitos de regulação, controle e comando são utilizados como sinônimos.
90
Para designar os métodos básicos de operação de um sistema de canais são encontrados na
bibliografia diferentes conceitos de diferentes autores (Ankum, 1995). ASAE, de acordo
com Burt e Plusquellec (1990), propõe: (i) controle convencional por montante; (ii)
controle automático por montante; (iii) controle por jusante com canal em nível; (iv)
controle por jusante com canal em desnível. ICID propõe para a operação do sistema de
canais (Goussard, 1993): (i) controle por montante; (ii) controle por montante próximo; (iii)
controle por montante distante. Já o Banco Mundial propõe para estratégias de controle
(Plusquellec et alli, 1994): (i) controle proporcional; (ii) controle por cota de vazão
ajustável; (iii) controle por montante; (iv) controle por jusante; (v) monitoramento remoto;
(vi) controle remoto .
Figura 10 Possibilidades de combinação entre regulação e comando (Rijo, 1993)
91
Aparentemente é mais prático adotar uma classificação baseada no nível de água
que é mantido pela estrutura de regulação. Assim, cinco métodos básicos de operação
(Ankum, 1995):
o controle proporcional, em que a vazão de entrada é distribuída de acordo
com partes predefinidas. Não há um nível constante de água em toda a extensão do canal;
o controle a montante, sendo um nível constante de água no lado de montante
do regulador sendo o objetivo operacional. A vazão derivada para o sistema de distribuição
pode ser alterada apenas após uma mudança intencional na vazão de entrada (a partir de um
rio ou barragem) gerada pelo gestor do sistema, uma subsequente derivação na estrutura de
repartição e após um certo espaço de tempo. Esse espaço de tempo é relacionado, de forma
negativa, com o armazenamento dinâmico do canal.
o controle por jusante, também chamado de controle por jusante com canais
em nível, sendo um nível constante de água do lado de jusante do regulador o objetivo
operacional. O sistema de distribuição reage positivamente e pode prover imediatamente a
vazão requerida de saída, pois a alteração do armazenamento dinâmico no canal é positiva.
Bermas em nível são requeridas para este sistema. De acordo com Rijo e Arranja (2006) o
controle local por jusante apresenta-se como muito eficiente e perdas operacionais nulas. O
controle por jusante também pode ser realizado à distância, quando a comporta do início do
trecho regulado é operada de acordo com a informação de nível que vem da comporta do
fim do trecho, mas neste caso o comportamento da linha da água será semelhante ao do
controle por montante.
o controle BIVAL, também denominado controle de volume constante, com a
manutenção de um nível constante no meio do trecho do canal a montante. Não um
estoque dinâmico efetivo no canal. O controle BIVAL assemelha-se ao controle por
jusante, respondendo imediatamente os requisitos de vazão. Entretanto, os taludes do canal
podem ser mantidos em um nível baixo em parte do trecho, enquanto a telemetria e
comportas eletromecânicas são necessárias;
o controle ELFLO, também denominado controle por jusante em canais
inclinados, sendo um nível constante de água a jusante o objetivo a ser alcançado. Este
92
controle requer telemetria e comportas eletromecânicas. O controle ELFLO responde
positivamente a mudanças de vazões de saída, como no controle por jusante e no controle
BIVAL. Por outro lado, o canal sob controle ELFLO assemelha-se ao canal sob controle
por montante, pois seus taludes são paralelos ao fundo e as mudanças na vazão de saída
somente poderão ser atendidas após um certo espaço de tempo, porque um estoque
negativo no trecho do canal.
O controle local por montante é o mais utilizado em nível mundial nos sistemas de
transporte e distribuição de água em canais (Rijo, 2002 apud Rijo, 2007). Isto acontece
porque o dimensionamento dos canais pode ser otimizado, sendo possível projetar canais
com uma seção transversal constante em todo o percurso de um trecho e com uma altura de
água correspondente à altura do escoamento uniforme correspondente à vazão de projeto
deste trecho, somando-se o bordo livre ou folga. Assim, as bermas do canal serão paralelas
a esta linha da água na vazão máxima. Soma-se a isto o fato de que os equipamentos de
controle das alturas de escoamento e das vazões podem ser mais simples. Contudo, este
controle é exigente em mão de obra para operação e gestão, sobretudo quando os
equipamentos de controle forem de atuação manual e existirem muitas tomadas de água.
(Rijo et alli, 2007)
Plusquellec (1992) relata que sistemas concebidos para operar por controle por
montante em países em desenvolvimento apresentavam, como situação típica, um grande
número de comportas reguladoras, de operação manual ou motorizada, sem condições de
funcionamento por falta de manutenção ou por vandalismo de irrigantes descontentes com
o fornecimento de água. O autor coloca que este controle deve estar associado a uma
programação de distribuição de água aos irrigantes, seja por calendário pré-definido ou por
uma decisão do órgão central, baseada em informações de campo e no desenvolvimento das
lavouras. Em qualquer dos casos, o controle por montante requer uma estimativa da
eficiência da distribuição e da condução da água no sistema, de forma a definir a vazão que
deve ingressar no canal principal.
Um sistema de regulação é composto por: a) algoritmo de regulação e b) arquitetura
da rede de distribuição física, com determinadas características físicas dos canais e dos
equipamentos de regulação (Rijo, 1993). Um algoritmo de regulação, ou algoritmo de
93
controle, é um procedimento lógico que processa informações tais como níveis da água nos
canais e demandas de vazão por parte dos irrigantes, e resulta em ações de controle, como a
abertura ou fechamento de comportas. O controle de redes simples pode ser realizado por
operadores humanos, que são os cantoneiros e os canaleiros, sendo os primeiros
responsáveis pela ação dos últimos. Neste caso, embora exista apenas na mente do
cantoneiro ou canaleiro, o algoritmo de controle pode ser bastante efetivo e flexível,
dependendo de sua experiência.
Em redes mais complexas, desde a fase de projeto ou em um processo de
modernização, a tendência tem sido a implantação de sistemas de controle baseados em
comportas eletromecânicas e sensores eletrônicos de nível e vazão, distribuídos ao longo da
rede. Neste caso o algoritmo de controle é executado em um sistema eletrônico, em geral
central, para o qual convergem as informações coletadas pelos sensores, e do qual partem
as decisões sobre as ações a serem executadas em cada comporta ou regulador. Diferentes
algoritmos de controle, com grande flexibilidade e eficiência, têm sido desenvolvidos para
este tipo de sistema (Rogers e Goussard, 1998).
Saenz e de León Mojarro (1992) colocam que no distrito de irrigação mexicano de
La Begoña, as funções de vazão das comportas foram extraviadas e os operadores
adotavam uma função simples de número de roscas do parafuso da comporta em relação a
uma vazão pretendida. As medições a campo mostraram que os canaleiros sempre
subestimavam a vazão na ordem de 10 a 15%.
A seleção do método de operação mais apropriado para um sistema de distribuição
para irrigação, como proporcional, montante ou jusante é bastante complexo. Além disto, as
consequências do método de operação selecionado não são muitas vezes bem entendidas.
Então, a seleção é usualmente baseada na experiência passada. Um processo sistemático de
seleção é recomendado, sendo composto por passos iterativos:
O objetivo operacional do sistema de distribuição deve ser definido primeiro;
Seleciona-se inicialmente um método de operação seguindo o objetivo
operacional, que será discutido posteriormente;
94
Certas características do método do controle são, então, determinadas pela seleção
inicial, como o desempenho hidrodinâmico, o projeto e os aspectos construtivos, as
necessidades operacionais e de manutenção, entre outras. A avaliação deste conjunto de
informações terá que dizer se o método de operação selecionado é aceitável. Se não, o
objetivo operacional original para o sistema de distribuição será revisado, e um outro
método de operação deverá ser seguido.
O objetivo operacional de um sistema de distribuição é especificado por três fatores
fundamentais:
o processo de decisão sobre a entrega de água nos canais terciários, isto é, quem
decide sobre a distribuição de água nos canais terciários;
o método de distribuição de água nos canais terciários, ou como a água é
distribuída no canal terciário;
o método de distribuição de água adotado no sistema principal, ou como a água
será distribuída por meio do sistema principal de canais.
Replogle (1992) afirma que o controle por montante é o mais comum em sistemas
de irrigação, sendo que a operação das estruturas de controle, usualmente comportas, pode
ser manual ou automática ou controlada remotamente. A operação desta estrutura deveria
ser realizada a cada irrigação, mas o comum é a fixação de diversas aberturas e ir ajustando
o nível no canal. A dificuldade hidráulica deste processo é a tentativa de estabelecer o
mesmo nível de água no canal para diferentes vazões.
Na prática, os métodos ativos de operação de um canal podem ser entendidos como
um conjunto de comporta, normalmente vertical, e vertedores adjacentes a esta comporta.
Segundo o autor, as possibilidades de operação são:
Fluxo sobre os vertedores canais laterais são construídos de forma que a
receber a vazão que passa sobre os vertedores por uma ação imposta por uma comporta,
normalmente vertical. Os vertedores podem ser em labirinto, laterais, oblíquos ou bico de
pato. A vantagem deste método é poder atender a variações da demanda a jusante gerando
pequenas variações na altura de carga sobre o vertedor;
95
Operação muitos centímetros abaixo do nível da crista dos vertedores
manutenção de um volume dentro do trecho regulado do canal, buscando um nível
constante. É um método adequado para controle automático ou remoto, mas pode exigir
muito dos operadores de um sistema manual;
Operação com nível da água próximo à crista do vertedor o objetivo deste
método é mostrar ao operador de forma rápida uma mudança na vazão, permitindo realizar
pequenos ajustes na comporta. Exige muitas operações de comporta para compensar as
alterações de vazão, mas não permite um rápido esvaziamento do canal;
Híbrido este método busca a manutenção de um nível nos trechos
regulados onde tomadas de água ativas com o fluxo sobre comportas ou vertedores nos
trechos sem demanda.
Existem métodos passivos de controle, que incluem reservatórios, vertedores
laterais, canais de grande declividade, e orifícios submetidos a grandes cargas. Estes
arranjos ajudam a estabilizar a vazão no canal, permitindo uma entrega mais uniforme aos
irrigantes, mas algumas situações podem apresentar problemas com aportes de sedimento.
O processo de decisão no sistema de distribuição de água no canal terciário deve ser
definido primeiro. Três opções são possíveis: entrega ditada (programada), na qual os
irrigantes não opinam sobre a distribuição de água; alternativamente, os irrigantes podem
requerer uma mudança no sistema de distribuição, que será efetivada após endosso do
centro de distribuição de água e após algum tempo (distribuição programada); na terceira
opção, os próprios usuários são que decidem pela distribuição de água, que será entrega
imediatamente ou após um tempo determinado (distribuição por demanda)
Também três opções do processo de distribuição aos canais terciários. O
processo tradicional de distribuição é o de vazão repartida, onde o fluxo é disponibilizado
igualmente por todo o sistema por estruturas proporcionais. O segundo método, vazão
intermitente, é frequentemente aplicado em esquemas de cultivos de sequeiro, onde uma
vazão unitária é aplicada entre áreas individuais, de forma rotativa. A escolha de um
sistema intermitente não diz respeito a como o processo de decisão sobre a distribuição será
escolhido. O terceiro método de distribuição é o de vazão ajustável, usualmente aplicado a
áreas de arroz irrigado, onde picos de vazão são requeridos, como na fase de preparação da
96
terra e as descargas são gradualmente reduzidas durante o período de irrigação fora de
ponta.
O processo de distribuição em um sistema de canais pode também ser baseado na
vazão repartida, vazão intermitente ou vazão ajustável, assim como vazão rotativa pode ser
aplicada quando os canais secundários são supridos de forma intermitente por um sistema
de rotação de vazão no canal principal.
Assim, é óbvio que somente poucas opções de programação de distribuição podem
ser combinadas com um objetivo operacional, de acordo com a figura 11.
A lógica de seleção para o método de operação segue o objetivo pretendido:
O método de operação por demanda é compatível com controle proporcional ou
controle por montante. Controle proporcional requer unicamente estruturas que distribuam
a vazão proporcional em razões fixas. Controle por montante é mais adequado para vazões
intermitentes e vazões ajustáveis nos canais terciários.
O método de operação por demanda programada é adequado para controle por
montante com gerenciamento centralizado. Controle por jusante, BIVAL e ELFLO também
podem operar na base da vazão de demanda programada quando a água disponível é
insuficiente para atender as necessidades. Então, a requisição de água para unidades
individuais será confirmada primeiramente comparando com a disponibilidade de água, e a
distribuição real ocorrerá somente após o endosso da agência de operação e manutenção.
Portanto, um tempo de ajuste é introduzido no sistema.
O método de operação por solicitação de demanda pode ter uma resposta positiva.
O controle por jusante e o BIVAL respondem estas requisições de vazão imediatamente.
Uma operação alternativa interessante pode ser o controle ELFLO, que também pode
responder positivamente, mas irá exigir um intervalo de tempo para o ajuste do volume de
espera dinâmico do canal.
97
Figura 11 Seleção do processo de operação de canal de irrigação (Ankum, 1996)
Também é possível utilizar diferentes métodos em um mesmo projeto, como um
controle composto, onde as comportas são reguladas normalmente por um controle de
jusante, mas podem trocar para um controle por montante sob certas condições (Goussard,
1993). Além disto, isto é frequentemente muito efetivo utilizar diferentes métodos de
operação para diferentes locais do sistema principal, por exemplo, controle de jusante nos
canais primários de irrigação com controle por montante nos canais secundários.
O termo sistema de gerenciamento de entrega refere-se ao gerenciamento de um
sistema de entrega de água como um conjunto, que deve combinar a descarga de saída com
a vazão de entrada. O manejo do sistema principal pode ser (Ankum, 1995):
sem sistema de gerenciamento (ou dia-a-dia), quando a regulação das
estruturas não é possível e/ou requerida. Isto é aplicado em sistemas de distribuição sob um
controle proporcional para a divisão de vazões; com um controle por montante com uma
regra fixa para a distribuição de água durante toda a época de irrigação;
98
sistema de gerenciamento central, quando uma central de operação de água
tem que compatibilizar a vazão de entrada no sistema com a vazão requerida pelo esquema
de distribuição. É aplicado em sistemas controlados por montante;
sistema de gerenciamento responsivo, quando o sistema de entrega se ajusta
por si mesmo para mudanças de vazão de saída. É uma característica dos sistemas de
controle por jusante, BIVAL e ELFLO.
Muitas combinações podem ser definidas a partir do nível de decisão (controle) e do
tipo de distribuição, conforme Rijo (1993) apresenta em forma de Tabela. Observa-se que
nem todos os métodos de distribuição são compatíveis com os diferentes níveis de tomada
de decisão. Desta forma, ao selecionar-se um método de distribuição e um nível de decisão
na concepção do projeto do sistema de distribuição, indiretamente também se definem as
possibilidades de variação da frequência, vazão e duração da entrega da água ao irrigante.
99
Tabela 12 Métodos de distribuição e modos de controle e sua influência nas
variáveis de operação do sistema de canais (Rijo, 1993)
Categoria
Frequencia (F)
Vazão (Q)
Duração (D)
Controle local
Pedido
Pedido com Q limitada
Pedido com F acordada
I
I
A
I
L
L
I
I
I
Controle intermediário
Acordo prévio
Acordo prévio com Q limitada
Acordo prévio com volume constante
D imposta com Q constante
Acordo prévio com Q imposta
A
A
A
A
A
A
L
C
C
F
A
A
C
F
C
Controle central
Sistema central
Volume imposto
Rotação
Rotação com Q contínua
Rotação com volume variável
Rotação com Q imposta e calendário variável
V
V
F
--
F
F(V)
V
F
F
F(V)
F(V)
F
V
F
F
--
F(V)
F(V)
Legenda: I sem restrições; L limitado a um máximo, mas até este valor pode ser
acordado; A acordado entre o irrigante e o responsável; C acordado entre o irrigante e o
responsável para toda a campanha (constante); F fixado ou imposto pelo responsável, por
toda a campanha; V variável ao longo da campanha (critério do responsável); (V)
variável ao longo da campanha ou de campanha para campanha (critério do responsável)
100
4.4. Sistemas de distribuição por canais não revestidos
O escoamento em condutos à superfície livre apresenta particularidades que o
tornam mais complexo do que o escoamento em tubulações. A determinação da vazão de
um canal não pode ser realizada, a não ser em casos concretos de escoamentos permanentes
e uniformes, a partir da determinação de suas características físicas e geométricas.
O escoamento da água em canais de irrigação classifica-se, na maior parte dos casos
reais, como um escoamento turbulento, em que cada partícula apresenta, além da
velocidade no sentido do escoamento, velocidades transversais ao escoamento, devidas ao
movimento de agitação.
O escoamento turbulento pode apresentar-se nas seguintes condições (Rijo 1993):
escoamento permanente no qual a vazão é constante e a velocidade em um
ponto é função das coordenadas, mas independente do instante de tempo considerado, isto
é, a velocidade varia de um ponto a outro, mas, em cada ponto, mantém-se constante ao
longo do tempo, o que se traduz pela condição:
0
_
t
V
4.33
que significa que a aceleração do escoamento é nula neste ponto. No caso dos
escoamentos turbulentos, esta condição tem sentido em relação à velocidade média do
escoamento; logo,
_
V
é o vetor velocidade média na seção líquida e t é o tempo;
o escoamento uniforme (ou escoamento em regime uniforme) é um caso
particular do escoamento permanente, em que a velocidade média não varia de seção para
seção. Considerando x a direção predominante do escoamento, este escoamento pode ser
traduzido por:
0
_
x
V
4.34
A constância da velocidade, nos componentes módulo, direção e sentido, tem como
consequência que as áreas das seções líquidas transversais também sejam constantes, pela
101
Equação da Continuidade, e, portanto, a linha da superfície livre será paralela ao fundo do
canal. A profundidade do escoamento uniforme designa-se, habitualmente, por
profundidade normal.
O regime uniforme raramente se observa em canais de irrigação, podendo ser
verificados em trechos retilíneos de grande comprimento e de rugosidade constante, que
praticamente não existem. Devido à presença de estruturas de regulação, obstáculos
transversais ao canal ou curvas, o escoamento observado normalmente é o permanente
gradualmente variado. Heras (1981) coloca que
é realmente pouco frequente que seja preciso estudar regimes variáveis nas redes
de irrigação, que, salvo falsas manobras nas comportas e o fenômeno de enchimento, se
produzirão ondas semelhantes às das enchentes e a variação de vazão em uma mesma
seção será muito gradual e completamente controlada; a prática usual consiste em
estudar, simplesmente, o que ocorre quando o regime está estabilizado e é uniforme para
uma nova vazão, desprezando os fenômenos inerentes aos estados intermediários.
Estritamente, este escoamento ocorre em canais de taludes paralelos. Para o
escoamento subcrítico, que é o observado normalmente nos canais de irrigação não
revestidos, é necessário a existência de trechos de grande extensão sem interferências a
jusante para que essa situação adequada à medição seja observada. Na prática, muitas
situações de cursos d’água natural e de canais se aproximam deste regime, mesmo que em
pequenos intervalos de tempo.
Os princípios que governam a relação entre profundidade, inclinação do fundo e
vazão para o escoamento uniforme dependem inteiramente da energia dissipada.
Para um canal que apresente:
Escoamento estacionário, com vazão local invariável;
Escoamento unidirecional, com distribuição uniforme das velocidades e
repartição hidrostática das pressões;
Eixo retilíneo;
Geometria prismática, sendo a seção molhada uma função da profundidade;
102
Pendente constante e não muito grande (I<10%); e
Características de rugosidade constantes
existe um escoamento que se desenvolve em profundidade constante, denominada
de profundidade normal y
N
. Neste escoamento, as perdas de carga são devidas à
rugosidade.
Utilizando a profundidade normal pode-se até encontrar uma estimativa da vazão,
com um erro inferior a 5% (Sinniger e Hager, 1989), com o uso de relações como a
apresentada a seguir, válida para y
N
/b<0.2 e m>3:
1
2
5
3
1
5
4
mmqy
NN
4.35
Onde q
N
é a vazão específica normal e m é a inclinação dos taludes em relação à
profundidade.
O problema colocado para canais em terra é a variação das características de
rugosidade, da pendente e da geometria ao longo do tempo, uma vez que escorregamentos
de taludes, crescimento de ervas invasoras nos taludes e no fundo e processos erosivos
alteram estas condições.
De Buffon (1861) coloca que a utilização de equações que considerem o movimento
como uniforme esbarra na observação da realidade destas estruturas, apontando dois
problemas básicos: (1) os elementos geométricos do canal modificam-se com o tempo e (2)
as equações apresentam elementos de difícil mensuração. Como exemplo, coloca a
definição da pendente do canal, onde um erro de milímetros entre duas seções afastadas de
poucas centenas de metros, mudaria completamente o comportamento esperado do canal.
O escoamento permanente gradualmente variado apresenta vazão constante, mas a
velocidade média varia de seção para seção, segundo a condição
0
_
x
V
4.36
103
Assim, a profundidade do escoamento varia (
0
x
y
), mas esta variação ocorre de
forma gradual, com a curvatura das trajetórias definida como o lugar geométrico dos
pontos ocupados por uma partícula ao longo do tempo assumindo um valor pequeno.
Como normalmente os canais de irrigação apresentam baixas declividades, a montante das
estruturas de regulação ou em cada trecho de canal regulado, o escoamento é normalmente
gradualmente retardado (
0
x
y
), com a profundidade na seção de jusante, junto à estrutura
de regulação, maior do que a da seção de montante, gerando uma curva de remanso do tipo
M1. Nesta situação, a profundidade normal será maior do que a profundidade crítica e há o
crescimento da profundidade em relação ao desenvolvimento do canal. A curva da linha da
água é assintótica à horizontal e à profundidade normal.
Para um canal sem estruturas de regulação e com base constante, a profundidade do
escoamento seria uma função biunívoca da vazão, do tipo potência. Para as pequenas
vazões, a profundidade seria muito pequena, o que impediria a alimentação das tomadas de
água, que normalmente ficam nas laterais dos canais e em cotas mais elevadas do que o
fundo. Com as estruturas de regulação, impõem-se uma variação pequena da profundidade,
o que faz com que as alturas de carga sobre as tomadas também não variem muito, de modo
a que as variações das vazões entregues a cada parcela não ultrapassem valores de
referência estabelecidos pelo projeto ou entre o irrigante e o operador do sistema. Com a
presença de reguladores as profundidades são, quase sempre, superiores às profundidades
normais e as suas variações são bastante reduzidas.
A figura 12 apresenta a variação da profundidade sem e com as estruturas de
regulação, mostrando a variação da profundidade entre a situação de vazão nula e a vazão
máxima.
104
Figura 12 Variação da profundidade em canais para as situações de vazão máxima e
vazão nula, de acordo com a lógica de controle (Rijo, 1997)
No escoamento variável a velocidade em um ponto é função das coordenadas do
ponto e do instante considerado, isto é, em cada ponto as velocidades das partículas que
passam por ele variam de instante para instante. É o caso mais geral de escoamento, sendo
traduzido por
0
_
t
V
;
0
_
x
V
4.37
O escoamento variável que habitualmente ocorre nos canais de irrigação é o
gradualmente variável, isto é, as variações de velocidade e das profundidades ocorrem de
maneira gradual, correspondendo a soluções matemáticas contínuas. Ocorre, quase sempre,
entre dois regimes permanentes, sendo um inicial e um final, recebendo a designação de
regime transitório. A manobra de uma comporta provoca uma variação de vazão à qual
correspondem variações de profundidades, conforme a figura 13.
Figura 13 Variação de nível em canal de acordo com manobras das estruturas
transversais (Rijo, 1997)
105
No caso (a), um incremento no fechamento da comporta (Δa negativo) gera a
formação de uma onda de translação positiva para montante e de outra negativa para
jusante. A frente da onda, à medida que avança, vai-se atenuando, devido às forças de
resistência ao escoamento, deslocando-se a uma velocidade , em relação ao canal, que é
uma função da geometria do mesmo, sendo relacionada com a velocidade média pela
expressão
V¹ = V ± c 4.38
Onde c é a celeridade da onda ou a sua velocidade relativamente ao escoamento,
sendo calculada por:
_
ygc
4.39
onde
BAy /
_
é a profundidade média do escoamento, definida pela relação entre a
área da seção líquida transversal (A) e a largura superficial da mesma (B). O sinal positivo
refere-se às ondas que se deslocam para jusante, no mesmo sentido do escoamento, e o
sinal negativo refere-se às ondas que se deslocam para montante.
A velocidade da onda é um dos parâmetros mais importantes para determinar o
tempo decorrido entre a operação de uma estrutura de regulação e a chegada da perturbação
em outros pontos de interesse, como as tomadas parcelares. Considerando-se dois pontos
afastados de uma distância L, este tempo será definido por
1
1
V
L
t
4.40
.
Este tempo significa a chegada da frente da onda ao segundo ponto. No caso de um
aumento de vazão, a vazão começa a aumentar a partir deste tempo, mas um novo regime
permanente será estabelecido depois de decorrido um período de tempo suplementar,
designado por tempo de resposta, que é o intervalo de tempo que realmente interessa à
gestão, pois nesta nova situação é possível atender às tomadas de forma estável. Os
tempos de resposta dependem dos volumes armazenados no sistema de canais e da variação
imposta pela operação da estrutura de regulação. Os volumes armazenados, por sua vez,
dependem do espaçamento entre estas estruturas, ou seja, do comprimento do trecho
regulado. Se o espaçamento for grande, o volume de água envolvido numa passagem de
106
uma vazão Q
a
para uma vazão Q
b
é elevado, uma vez que o remanso provocado por um
regulador (R
2
, na figura) só é sentido em um pequeno comprimento do trecho. As linhas de
superfície livre, correspondentes às situações com Q
a
e com Q
b
, são praticamente paralelas
e o volume compreendido entre elas se praticamente prismático. Colocando-se
reguladores intermediários, os volumes envolvidos diminuem e os efeitos de remanso
passam a ser observados em uma maior extensão do canal e o volume em transição passa
ter uma forma de cunha. Pode-se dizer, segundo Rijo (1993) que, de forma aproximada e
inicial, que a duplicação do número de estruturas de regulação diminui pela metade o
volume em jogo no caso da passagem de um regime permanente a outro. O tempo de
resposta t
r
do sistema entre dois pontos pode ser aproximado por:
Q
v
t
r
, 4.41
em que
v
e
Q
são, respectivamente, a variação de volume e a variação de vazão
observadas com a passagem do regime permanente inicial ao regime permanente final.
Ainda segundo Rijo (1993), pode-se dizer que as mudanças de regime necessárias à
gestão diária dos canais far-se-ão tão mais rapidamente quanto mais se reduzir o
espaçamento entre os reguladores ou quanto mais se reduzirem as variações necessárias do
volume de água. Dito de outra forma (Rijo e Betâmio de Almeida, 1996), os tempos de
resposta tendem a ser menores quando existirem estruturas reguladoras, o que faz com que
o canal ganhe em flexibilidade. A capacidade de resposta às variações de demanda aumenta
substancialmente com os reguladores, principalmente com o uso de comportas automáticas.
Os canais em terra apresentam as seguintes vantagens e desvantagens:
Vantagens
baixo custo de execução
a sua realização pode ser feita com mão de obra local
Desvantagens
As perdas de água por infiltração através das paredes e do fundo;
A erosão dos perfis mesmo para velocidades muito baixas
107
O ravinamento realizado pelas águas da chuva ou pela passagem de
animais;
Os trabalhos de manutenção importantes e permanentes controle de
ervas invasoras, desassoreamento e manutenção do perfil transversal;
A limitação de sua construção em terrenos muito arenosos
Portanto, os canais de terra são normalmente encontrados onde a água é abundante
ou quando a rentabilidade marginal impõe equipamentos de baixo custo.
Gurovich (2001) coloca que a medição de vazão se constitui em um problema difícil
em muitas zonas de irrigação, pois:
o A altura disponível nos disponíveis de um sistema de irrigação pode ser
demasiadamente pequena para permitir a realização de uma medição exata;
o As necessidades variáveis de água nas áreas irrigadas e as variações da
distribuição de água resultam em flutuações nos níveis de água dos canais, em alterações da
velocidade do escoamento ou ambas mudanças ao mesmo tempo;
o A presença de ervas invasoras, a deposição de sedimentos, a dificuldade de
manter uma precisão adequada na construção dos canais ou na manutenção dos mesmos são
elementos que podem reduzir a exatidão das medições de vazão.
Desta forma, estimar a vazão em um canal de terra de grande desenvolvimento a
partir de medições das dimensões da seção e estimativa da declividade pode resultar em
erros consideráveis, até por conta das perdas.
Para canais não revestidos, as perdas por infiltração levarão a uma redução da vazão
transportada nestes trechos de grande extensão, levando a inclusão de mais uma fonte de
erro, que se somará aos erros de leitura, efeito do vento, alteração da rugosidade e da seção
de escoamento, entre outros.
De acordo com SOCIÉTÉ (1976), as perdas de água por infiltração nos canais de
terra podem ser estimadas por:
108
2
1
cLPRq
- fórmula de Molesworth e Yennidumia aplicada no Egito, onde
q representa as perdas por infiltração e evaporação, em m
3
/s; L, comprimento do canal
em km; P, perímetro molhado em m; R, raio hidráulico, em m; c, coeficiente que
depende da natureza e da temperatura do solo, sendo c = 0.0015 para argila e c = 0.0030
para areia; 4.42
V
Q
CS 2.0
, fórmula de Moritz (USBR), onde S são as perdas por
infiltração em ft
3
/s por milha de comprimento de canal;Q é a vazão em ft
3
/s;V é a
velocidade do escoamento em ft/s; C é uma constante dependente do tipo de solo que varia
entre 0,34 (cascalho cimentado e solos franco arenosos endurecidos) e 2,20 (solos arenosos
com materiais grosseiros). 4.43
Em unidades do Sistema Internacional, a expressão é apresentada como
V
Q
CS 000108.0
, para Q em m³/s, V em m/s e S em por km de canal 4.44
100
QL
sS
, fórmula de Offengenden, sendo S as perdas de água por km de
comprimento do canal, em %; L o comprimento do canal, em km; Q, a vazão, em m
3
/s; s
calculado pela fórmula
m
Q
A
s
, em que A e m são constantes empíricas que dependem
da permeabilidade do solo; 4.45
As perdas de água também podem ser estimadas a partir de expressão
Aq *20
,
sendo q a perda em l/s
para cada km do canal e A a área da seção transversal em m², para
solos arenosos (Espanha, 1963). 4.46
De acordo com Tiercelin (1998) as perdas por infiltração em canais de terra são da
ordem de 0,09 m³/dia.m² para solos argilosos; 0,18 m³/dia.m² para solos argilo-siltosos e
0,5 m³/dia.m² para os solos arenosos. As perdas por infiltração em canais não revestidos são
importantes na adoção da rotação. A infiltração e a evaporação direta decrescem com o
aumento de vazão, sendo que, segundo Mayer (1945) são da ordem de 16% da vazão por
quilômetro, quando a vazão é menor do que 0,030 /s, reduzindo-se para menos de 1%
109
quando a vazão supera os 6 m³/s. Poiree e Ollier apresentam as perdas em canais não
revestidos de forma distinta, relacionando o volume perdido com a área das paredes em
contato com a água, como apresentado na Tabela 13.
Os valores citados pelos autores não são contraditórios, pois, em um mesmo canal,
para vazões menores esperam-se perímetros molhados relativamente maiores, que
dificilmente consegue-se adotar seções de máxima eficiência hidráulica em canais
construídos para pequenas vazões. Isto se deve ao fato de que a dimensão da base do canal
deve ser adequada à dimensão do equipamento disponível para sua construção.
Tabela 13 Perdas de água em canais não revestidos Poiree e Ollier (1963)
Natureza do terreno
Perdas em 24 horas, em m³, para cada m² de
parede molhada
Argila impermeável
0,09
Argilo-siltoso
0,18
Argilo-arenoso
0,20 a 0,40
Arenoso
0,50
Arenoso (aluvião)
0,75
Cascalho permeável
1,00 a 1,80
As perdas por evaporação, segundo Poiree e Ollier, têm, em geral, pouca
importância em relação às perdas por infiltração. São estimadas como sendo iguais a, no
máximo, 10% destas, podendo-se adotar valores entre 2 e 5% como referenciais. Por isso,
muitas vezes são desprezadas. No total, as perdas de água nos canais situam-se entre 5 a
40%, utilizando-se para anteprojetos valores entre 10 e 20%.Todas as equações falham em
não prever o efeito da colmatação resultante dos limos transportados pela água de irrigação,
fenômeno de expressiva importância em Portugal. De acordo com informações dos
canaleiros responsáveis pela operação do perímetro do Vale do Sado, a presença de limos
nas paredes dos canais já levou a situações em que a vazão máxima transportada era
equivalente a 30% da vazão de projeto do canal, além de inúmeras situações de
desabastecimento e perdas por vertimento lateral dos canais de distribuição. O controle dos
110
limos é realizado com o uso de grelhas e limpa-grelhas automáticos e limpeza manual e
mecânica dos taludes dos canais.
111
4.5. Eficiência da irrigação
L’irrigation est l’art d’obtenir de la terre, par un bon emploi des eaux, des produits plus
abondants, plus variés, et surtout plus réguliers que ceux auxquels on peut peténdre par la
culture ordinaire. Son but est d’augmenter les facultés productives du sol par l’emploi d’un
agent naturel. Elle est donc la plus réelle, la plus permanente des ameliorations que
réclame l’agriculture.
L’ irrigation es un art; car sa pratique consiste dans une suite d’opérations dont le succès
dépend beaucoup du plus ou moins d’intelligence, du plus ou moins d’habileté qu’on y
apporte. L’irrigation est une science; car soit qu’on veuille envisage à fond le rôle qu’elle
joue dans l’économie végétale, soit qu’on veuille s’assurer des moyens de la pratiquer,
avec ordre et économie, par une exacte distribution des eaux, on est ainsi conduit, d’une
part, jusqu’aux considérations théoriques les plus délicates, le plus inexplorées, da la
chimie ágricole; de l’autre, jusqu’aux problèmes le plus ardus de l’hydraulique. Il en est
ainsi peut-être de beaucoup d’autres opérations a alogues; toutes ont du moins leur théorie
et leur pratique. Mais ici le théorie et la pratique, ou, en d’autres termes, la science et
l’art, se trouvent plus étroitement unis que partout illeurs; et les découvertes progressives
de la science n’ont été nulle part aussi immédiatement mises à profit.
De Buffon, 1861.
O manejo racional da irrigação consistiria na aplicação da quantidade necessária de
água às plantas no momento correto. Segundo Lima et alli (1999), por não adotar um
método de controle da irrigação, o produtor rural usualmente irriga em excesso, temendo
que a cultura sofra um estresse hídrico. As eficiências médias para cada sistema de
irrigação indicadas neste estudo são apresentadas na Tabela 15 a seguir. A eficiência de
irrigação pode ser definida como a relação entre a quantidade de água requerida pela
cultura e a quantidade total aplicada pelo sistema para suprir essa necessidade. Quanto
menores as perdas de água devido ao escoamento superficial, evaporação, deriva e
drenagem profunda, maior será a eficiência de irrigação de um sistema. (Lima et alli,
1999)
Hagan et alli (1974) fazem uma outra proposta para a definição da eficiência, ao
somar os volumes necessários para atender a evapotranspiração com o necessário para
manter uma concentração salina favorável no perfil do solo agrícola.
Além disto, dividem a eficiência em três parcelas:
112
Eficiência do armazenamento da água: razão entre o volume de água entregue
pelo reservatório para a irrigação e o volume recebido pelo reservatório, superficial ou sub-
superficialmente;
Eficiência de distribuição: razão entre o volume de água entregue pelo sistema
de distribuição e o volume entregue pelo reservatório a este sistema;
Eficiência de aplicação: razão entre a água utilizada para compensar a
evapotranspiração em uma determinada área mais o necessário para manter o teor de sais da
solução do solo em um nível adequado e o volume recebido do sistema de distribuição.
Tabela 14: Eficiência e consumo de energia de diferentes métodos de irrigação.
Método de Irrigação
Eficiência de Irrigação (%)
Uso de Energia (kWh/m
3
)
por superfície
40 a 75
0,03 a 0,3
por aspersão
60 a 85
0,2 a 0,6
Localizada
80 a 95
0,1 a 0,4
Fonte: Marouelli, W.A. e Silva, W.L.C., 1998, citados por Lima et alli (1999).
Albuquerque e Durães (2008) colocam que a eficiência na irrigação é a relação entre
a água útil e a água bruta, sendo que a eficiência de irrigação é dividida em três parcelas:
condução, distribuição e aplicação. A condução diz respeito à trajetória da água desde a
fonte até sua entrada na área a ser irrigada. No caso de uma condução por gravidade, seria o
percurso dos canais principal e secundário. A distribuição refere-se à circulação da água
dentro do projeto, ou seja, aos canais terciários e quaternários. A aplicação é relacionada
com a parcela manejada pelo irrigante. (ver expressão 4.22)
A relação básica que controla a aplicação de água sob diferentes técnicas é função
da resposta de uma cultura específica ao fornecimento de água, que relaciona a produção
obtida com os níveis de água armazenados no solo e facilmente disponíveis para as plantas
em cada evento de rega e ao longo de toda a temporada de irrigação. A função de produção
proposta por Doorembos e Kassam (1979) é a seguinte:
113
XIMA
REAL
y
M
R
ET
ET
K
P
P
11
4.47
sendo P
R
a produção real, em kg/hectare; P
M
a produção máxima, em kg/hectare; K
y
o coeficiente de estresse hídrico; ET
REAL
a evapotranspiração real da cultura, em mm/safra;
ET
MÁXIMA
a evapotranspiração máxima da cultura, em mm/safra.
Substituindo-se o valor de P
R
pelos preços ou custos, a função de resposta fornecerá
valores monetários para o atendimento ou não das necessidades hídricas das culturas
irrigadas. As propriedades da função de resposta sugerem que tecnologias que impliquem
em custos efetivos da água maiores utilizarão uma irrigação mais eficiente e os
investimentos em irrigação terão rentabilidades mais elevadas. Por esta razão, para valores
da água muito baixos, o uso de tecnologias tradicionais trará uma rentabilidade mais
elevada do que a obtida com tecnologias mais modernas. No entanto, cada situação tem
condições edafoclimáticas que levam a custos de água críticos, acima dos quais os outros
insumos requeridos vão exigir uma irrigação mais eficiente, para que atinja a rentabilidade
esperada para a totalidade dos investimentos realizados. Estes custos críticos diminuem
com a qualidade do terreno, segundo o conceito de Gurovich (2001): solos de baixa
qualidade são os arenosos, os com uma pendente abrupta ou os argilosos; solos de alta
qualidade são representados pelos de textura franco-arenosa a franco-argilosa e terrenos
planos, que resultam em características de infiltração e retenção de água mais favoráveis.
Os níveis de água armazenada no solo estão associados com a forma de aplicação de
água no campo. As diferentes tecnologias de irrigação têm níveis diferentes de eficiência de
rega, assim como diferentes requerimentos de capital e energia e, por tanto, o custo efetivo
da água também é diferente.
A maximização do benefício associado às tecnologias de irrigação tem dois
resultados possíveis (Gurovich, 2001):
a) As tecnologias modernas deverão ser selecionadas para situações com custos da
água e da produção relativamente elevados e onde a qualidade do terreno é baixa, pois
incrementam a rentabilidade, aumentam a produção e melhoram a eficiência do uso da
água; e
114
b) Nas áreas com terrenos planos e solos de alta qualidade e com água de baixo
custo, disponível em grandes volumes, pode-se utilizar tecnologias de irrigação
tradicionais, com melhor relação custo/benefício para o irrigante.
Em Portugal, a eficiência de utilização da água na agricultura é de cerca de 58%
(PORTUGAL, 2001), sendo proposto um valor referencial a ser alcançado de 66% em um
período de 10 anos. Este aumento de eficiência significaria uma poupança para a sociedade
portuguesa de 65 milhões/ano.
Testezlaf et alli (2002) colocam que o uso da irrigação na produção agrícola tem
sofrido sérias críticas ultimamente, sobretudo por aqueles que a consideram uma das
grandes responsáveis pelo problema de escassez de água e de energia no país. Ao
defenderem a irrigação a partir de seus impactos sociais, econômicos e em relação à
segurança alimentar, alertam para as possíveis consequências do domínio de uma única
visão radical entre planejadores e legisladores, que poderão ser profundamente prejudiciais
à população, por serem potencialmente negativos à produção rural e ao desenvolvimento
agrícola no Brasil. Os autores ponderam que a evolução da irrigação nos últimos anos
introduziu uma série de inovações tecnológicas que possibilitam aos equipamentos
controlar de forma mais adequada e automatizada a aplicação da água. Isto se traduz em
um processo mais eficiente, permitindo manejar de forma mais precisa as demandas
hídricas das culturas, de forma a possibilitar, assim, aumentos importantes na qualidade e
na quantidade dos produtos explorados. Utilizados corretamente, os novos sistemas de
irrigação elevam os rendimentos, reduzindo ao mínimo as perdas, diminuindo a
necessidade de drenagem e promovendo a integração da irrigação com outras operações
simultâneas, como a adubação, o controle de pragas e doenças. O objetivo dos esforços de
desenvolvimento tecnológico em curso, em relação às técnicas de irrigação, resume-se em
disponibilizar métodos de fornecimento e controle de água que maximizem sua efetiva
utilização pelas culturas, reduzindo perdas e aumentando a eficiência dos processos de
condução, distribuição e aplicação de água, simultaneamente com a redução do consumo
de energia; em última análise, o objetivo final a alcançar, de forma permanente, é a
otimização da relação água captada/ produção de alimentos.
115
Notadamente, pelos exemplos apresentados no texto, os autores referem-se à
exploração agrícola em regiões áridas e semi-áridas.
De fato, a preocupação sobre o uso de água na irrigação no Brasil é mais destacada
na região Nordeste (incluindo a região mineira do Polígono das Secas), pelas condições
climáticas e pela existência de instituições federais de atuação estritamente regional, como
a CODEVASF e o DNOCS. Dados da própria CODEVASF mostram que essa
concentração de interesse no Nordeste ainda está mais vinculada a uma questão de oferta do
que propriamente à gestão da demanda. A área irrigada no Brasil, em 2003, era de 3,15
milhões de hectares. A região Nordeste respondia por 21% deste total; a região Sul, por
39%. Do total da área irrigada, 33% referiam-se ao método de inundação, típico da lavoura
orizícola (CODEVASF, 2004). Em 1999, o Rio Grande do Sul representava 34,8% da área
irrigada nacional (Lima et alli, 1999). Assim, a região Sul apresenta mais necessidade de
gestão da demanda do que as demais regiões brasileiras, o que não é atendido pelo arranjo
institucional existente.
O Ministério da Integração Nacional (BRASIL, 2008), na apresentação do
Programa Eficiência na Agricultura Irrigada, coloca que:
Apesar da significativa contribuição da agricultura irrigada para o PIB do setor
primário, o seu desempenho está, ainda, longe do ideal. As produtividades médias
alcançadas, a eficiência de utilização de água, o emprego de insumos modernos, a
capacitação da mão de obra, a integração dos projetos com as cadeias produtivas, dentre
outros aspectos, são passíveis de melhoria substancial. Pode-se afirmar que, em boa parte
da área irrigada, pratica-se uma agricultura tradicional, decrescendo, substancialmente,
os benefícios decorrentes da aplicação de água. (...) A implementação do programa
traduzir-seem uma substancial redução do consumo agrícola de água, economia de
energia elétrica e geração de novos empregos, resultando no aumento da oferta de
alimentos a custos inferiores aos atuais. A liberação de água e energia elétrica para o
mesmo uso ou para outros, aliada a elevação do rendimento dos fatores de produção,
resultarão em crescimento econômico.
Arrojo (2000) coloca que a política de implantação da infra-estrutura de irrigação na
Espanha gerou uma filosofia de atendimento de demandas a custos quase nulos,
116
especialmente nos projetos de irrigação com água superficial. Estes projetos apresentam
elevado nível de ineficiência cnica e econômica, com uma eficiência global estimada em
40%. A manutenção desta política gerou uma quebra dos princípios de racionalidade e
rentabilidade econômica, no qual novos projetos de irrigação são considerados atrativos por
um deformado conceito de interesse público, nos quais os custos marginais crescentes
reduzem os benefícios marginais esperados.
Como práticas para elevar a eficiência da irrigação de uma cultura qualquer, Hagan
et alli (1974) colocam que é necessário:
Conhecer a magnitude das perdas e desenvolver técnicas para controlá-las
Ter uma estrutura adequada de controle e de medida da água utilizada na
irrigação, como forma de permitir a aplicação necessária;
Aplicar a água de modo uniforme nas parcelas de rega;
Aplicar métodos, instrumentos critérios e técnicas da economia como base para
a decisão das culturas a serem irrigadas e do volume a ser aplicado.
No caso de lavoura de arroz irrigado por inundação, o uso da expressão de
Doorembos e Kassam (1979) é prejudicado, pois, ao menos que ocorra o esvaziamento dos
quadros de irrigação, a evapotranspiração máxima sempre será garantida pelo completo
encharcamento do solo, o que tornará a água sempre facilmente disponível.
Uma forma de expressar a relação do consumo e a real necessidade de água na
lavoura do arroz é a concepção de balanços hídricos na lavoura. As figuras abaixo
apresentam duas diferentes proposições, citadas no projeto da bacia do rio Mekong.
117
Figura 14- Esquema de balanço hídrico (Phengphaengsy e Okudaira, 2006)
Tradicionalmente, são consideradas “perdas de água” as que não forem utilizadas
para atender a evapotranspiração
De acordo com a figura acima, o balanço de água na lavoura é definido por:
AWS = (P+DIV+CS)-(ET+N+C) 4.48
sendo: AWS suprimento de água disponibilizado para a área delimitada; P
precipitação total sobre a lavoura; DIV fornecimento de água pelo sistema de canais e
fluxo superficial natural ingressante na lavoura; CS mudança no estoque de água
subterrânea ou ingresso de água subterrânea de áreas vizinhas; ET evapotranspiração real;
N parcela não utilizada da água fornecida pelo sistema de canais (ou água drenada); C
fluxo de água superficial para áreas vizinhas, por indicações legais ou acordo entre
irrigantes.
118
Figura 15 -Balanço hídrico concebido para o projeto da bacia do Mekong
(Phengphaengsy e Okudaira, 2006)
119
4.6. Eficiência em sistemas de irrigação
Em 1474, durante o reinado de Philibert na região do Piemonte, foi criada uma
medida de distribuição de água no canal de Ivrée. Embora imperfeita, a medida foi o
começo da criação de um sistema de controle da água distribuída aos irrigantes, que, após
passar por sucessivas melhorias, definiu um novo módulo métrico e a criação de regras
precisas de distribuição e incentivou a abertura de novos canais. (De Buffon, 1861)
Parker (1913), analisando sistemas de irrigação na Índia, aponta que para cada
unidade de vazão que ingressava no início do canal principal, os irrigantes recebiam 0,53
unidades e utilizavam apenas 0,28 unidades.
Para Rieu e Trieul (1994), os sistemas antigos de irrigação superficial da França
apresentam perdas de até 70% da água utilizada na irrigação, quando não apresentavam
regulação da distribuição aos irrigantes. A eficiência de condução dos projetos mais
modernos época) atingia valores entre 70 e 80% em relação ao volume distribuído. Para
os projetos já existentes, a reabilitação, melhor gestão, a regulação da água distribuída e um
controle maior da irrigação na parcela são ações necessárias para a economia de água.
As eficiências de condução são definidas como a relação entre a soma das vazões
parcelares entregues e a vazão remanescente no final do canal, e a vazão total que ingressou
no canal, ou seja,
4.49
Krinner et alli (1994), analisando projetos de irrigação na Espanha, encontraram
registros de volumes de ingresso no sistema de distribuição em muitos projetos, mas muito
poucos tinham o registro da água distribuída.
Em Portugal, consideram-se sistemas coletivos de irrigação os de responsabilidade
estatal ou privada, nos quais o fornecimento de água é feito a partir de reservatórios ou
linhas de água, por meio de uma rede de transporte e distribuição (PORTUGAL, 2001). Os
sistemas localizados no centro e no sul do País possuem extensas redes de transporte e
distribuição em superfície livre ou sob pressão, sendo equipadas com estruturas hidráulicas
de regulação e controle mais ou menos complexas. Os sistemas do norte do País têm menor
dimensão e redes de distribuição mais simples.
120
As perdas de água nestes sistemas são consideradas significativas. No vale do Sado,
as perdas são estimadas em 21% do volume total armazenado. Parte destas perdas é devida
a infiltrações, fugas e mau funcionamento hidráulico ocasionado pela acumulação de
sedimentos, limo e infestação de invasoras dentro dos canais.
A eficiência global de sistemas de irrigação superficial de arroz não excede 21%,
segundo estudo da ICID, citado por Plusquellec (2002).
Tabela 15 Taxas de eficiência global baseada em pesquisas da ICID
Gestão e comunicação
Eficiência de aplicação (%)
Sulcos
Aspersão
Arroz
57
67
32
Eficiência de distribuição
Eficiência global (%)
Adequada
65
37
43
21
Suficiente
55
31
37
18
Insuficiente
40
23
27
13
Fonte: Plusquellec, 2002
Krinner et alli (1994) definiram uma eficiência de condução da água no sistema de
canais da ordem de 10% do volume total disponibilizado no canal principal. Sendo a perda
teórica por evaporação direta nos canais entre 0,2 e 1,1%, com valor referencial médio de
0,5%, a maior parte das perdas refere-se à infiltração ou ao manejo das estruturas de
controle.
Os mesmos autores encontraram maiores eficiências no sul da Espanha, onde a água
é mais escassa, do que no norte. Os fatores que foram estudados quanto à influência sobre a
eficiência dos sistemas de irrigação foram:
Método de irrigação (gravidade ou pressurizados);
Dotação hídrica anual, definida como a relação entre o volume consumido e
a área irrigada;
Idade do sistema de irrigação;
Tipo de tarifa de irrigação;
Valor total pago pela água;
Evapotranspiração potencial;
Área irrigada total;
121
Área irrigada por produtor;
Número de empregados do órgão responsável pela manutenção e operação
do sistema.
Destes fatores, apenas os cinco primeiros apresentaram uma relação estatística
significativa com a eficiência.
Flynn (1892) considerava que as perdas de água em sistemas de irrigação eram
devidas a diversos fatores relacionados com o terreno, a cultura irrigada e a gestão da
irrigação, entre os quais cita a experiência dos irrigantes, a duração da irrigação e a forma
de cobrança pela água, colocando que o pagamento por volume era uma boa forma de fazer
os irrigantes economizarem água.
Os métodos que necessitam de água pressurizada apresentaram uma eficiência
média de 80%, contra 54% da irrigação gravitacional. As maiores perdas foram observadas
nos sistemas mais antigos, sendo que os implantados nos anos 70 e seguintes apresentaram
uma eficiência de 84%, contra 62% dos construídos entre 1950 e 1970 e 57% dos
implantados antes dos anos 50. Na década de 50, os canais passaram a ser revestidos em
concreto e, a partir dos anos 70, houve um incremento significativo da aspersão.
Quanto à dotação hídrica, os sistemas gravitacionais consumiram 9.300 m-³.ha.ano
contra 5.800 m-³.ha.ano dos sistemas pressurizados. O estudo mostra que quanto maior o
volume consumido, menor é a eficiência.
Por fim, a tarifa de água e o custo total da água. Os sistemas que cobram apenas
pela área apresentam uma eficiência de 57%, contra 77% dos que cobram uma tarifa
binomial, por área e por volume.
Focando a análise apenas nos sistemas de irrigação por aspersão que cobram por
área ou de forma binomial, os autores observaram eficiências de 71% e 90%,
respectivamente.
Plusquellec (2002) afirma que os sistemas de irrigação com canais apresentam
performances relativamente pobres e têm muitas dificuldades para gerenciar a distribuição
122
de água, resultando em retornos abaixo dos esperados. A eficiência é determinada por um
conjunto de fatores físicos, institucionais e políticos.
Segundo PORTUGAL (2001), outra parte significativa das perdas deve-se a
liberação de vazões excessivas, decorrentes do método de regulação das redes. A maior
parte dos perímetros irrigados foi concebida pelo método de regulação por montante, que
permite um elevado nível de controle (e eficiência) quando a distribuição de água obedece a
sistemas rígidos de distribuição, como o da rotação. Rijo e Betâmio de Almeida (1994)
complementam, colocando que os perímetros antigos foram concebidos com base no
binômio rotação e regulação por montante, resultando em um arranjo ineficiente para
distribuição por pedido. Havendo a flexibilização da gica de distribuição, o controle por
montante passa a ter a desvantagem de não dispor de uma reserva capaz de atender
prontamente a novas demandas ou acumular os excedentes dentro dos trechos regulados,
como ocorre na regulação por jusante. Para atender as variações de demanda e aumentar a
flexibilidade, os gestores dos sistemas adaptam métodos de controle manuais muito
exigentes em mão de obra e que funcionam com uma baixa eficiência no transporte de
água, principalmente nos períodos e horários de menor demanda. No caso de sistemas
atendidos por reservatórios de acumulação, sobretudo nos que têm uma função de
regularização intra-anual, a busca por um aumento de eficiência global do sistema a partir
da manutenção da água no reservatório poderá reduzir a capacidade de acumulação no
período de enchimento em detrimento da utilização dessa água para usos alternativos,
dentre os quais o aumento da área irrigada e a manutenção de ecossistemas.
Segundo o mesmo estudo, nos projetos localizados ao norte do país, quando existem
reservatórios ao longo do sistema de distribuição, a água circula por mais tempo dentro da
bacia. As perdas ocorridas a montante significam acréscimos de vazão a jusante, porém
com possibilidade de utilização variável. O aumento da eficiência a montante pode,
portanto, gerar situações de déficit a jusante e um fluxo mais rápido para o oceano.
A proposta constante no Programa Nacional para o uso eficiente da água
(PORTUGAL, 2001) inclui o estabelecimento de calendários de distribuição por acordo
entre os agricultores e o gestor das redes em substituição aos horários rígidos de
distribuição e o alargamento dos horários de fornecimento de água de forma a buscar uma
123
distribuição mais continua de água ao longo do dia e da semana, diminuindo os picos de
demanda e/ou fornecimento de água. O ganho possível com a adoção destas medidas é
estimado em 15%, passando a eficiência média de transporte e distribuição de 70 para 85%.
A importância de ampliação do período de distribuição foi demonstrada por Rijo e
Pereira (1987, apud Ministério, 2001), que encontraram valores entre 59 a 76% nos dias de
semana e entre 48 e 59% nos finais de semana. Considerando-se apenas as horas efetivas de
trabalho dos irrigantes, as eficiências variaram entre 69 e 88%. Segundo os autores, as
eficiências durante os períodos em que não se rega podem ser bastante menores no caso de
perímetros em que não se pratique a rega continua da cultura do arroz.
Para garantir maior flexibilidade na distribuição de água nos sistemas com
regulação clássica por montante, é possível reconfigurar estes sistemas, seja pela introdução
da automação e centralização das decisões de controle, seja pela inclusão de reservatórios
intercalares de regulação.
Os reservatórios intercalares permitem compensar as diferenças entre a vazão
máxima admitida no canal e vazão de pico necessária. É uma intervenção estrutural, que é
muito exigente em termos de obras e necessita de uma automatização de controle para ser
eficiente. Como vantagem principal, é capaz de responder bem a flutuação da demanda.
John (1992) propõe controle por montante na parte inicial ou superior dos sistemas
atendidos por canais de forma a possibilitar a retomada da regulação de grandes descargas
realizada na estrutura de armazenamento ou no próprio sistema de canais. Na parte inferior,
ou na área das tomadas de água para irrigação, indica o controle por jusante para permitir
uma maior flexibilidade de uso ao irrigante.
A automatização das diferentes estruturas de controle e regulação, como os
partidores de água, comportas, módulos de distribuição e estações elevatórias, pode ser
realizada com diferentes níveis de complexidade, investimentos e eficiências. a
possibilidade da introdução de telemedição ou de telealarme para apoio das decisões do
gestor do sistema. As principais vantagens são o aumento da eficiência e a redução da mão
de obra necessária para a operação do sistema. Como desvantagem, o custo inicial da
automação pode ser muito elevado.
124
Em uma situação mais avançada, pode ser adotado o telecomando das manobras
necessárias, a partir das informações coletadas pela telemedição. Nesta opção, é possível
antecipar as manobras necessárias para responder eficientemente as variações da demanda.
Esta solução exige conhecimento mais aprofundado do funcionamento hidráulico do
sistema de distribuição e de suas estruturas de controle, além de ser tecnologicamente
exigentes. A possibilidade de redução das perdas no transporte e na distribuição é estimada
em 20%, de acordo com as condições de exploração dos perímetros.
Raposo (1996) afirma que o desenvolvimento da eletrônica permitiu a evolução da
gestão em canais, por meio de uma modalidade semelhante a contra-pedido, que é o
controle dinâmico, que permite alterar a lógica de controle para jusante e uma distribuição
mais próxima de uma demanda livre.
Para esta alteração, são instalados medidores de nível nos canais, conectados a uma
central de controle, que determina a abertura ou fechamento de estruturas de regulação, de
modo a fornecer a vazão necessária.
A adoção de sistemas como SCADA - Supervisory, Control And Data Acquisition
permite a gestão destes processos, que podem incluir o controle de níveis, de vazão ou
ambos, com totalização ou não dos dados e rotinas de alarme e manobras de segurança para
o sistema. Por estes razões, o SCADA é superior ao simples controle automático, como no
caso obtido pelo uso de comportas hidromecânicas.
Plusquellec (2002) afirma que os padrões antigos do USBR foram adotados por um
grande número de projetos. Este arranjo é compatível com condições semelhantes a alguns
estados do oeste americano: estação chuvosa curta, boa rede de estradas e comunicação,
operadores dedicados e treinados. Todas estas condições não são encontradas geralmente
nos países onde foram implantados os projetos.
Basicamente, são projetos com uma rede de canais equipados com estruturas
operadas manualmente. Reguladores transversais aos canais são equipados com uma ou
mais comportas planas ou radias, manuais ou motorizadas. Em alguns casos, vertedores
laterais são colocados para uso emergencial, não para operações normais. Tomadas de água
para funcionamento com altura de carga constante sobre orifícios são responsáveis pela
125
entrega e medição da vazão. Esta infra-estrutura é, teoricamente, compatível com diferentes
métodos de distribuição de água: rotação, calendário prévio ou centralizado.
Um grande número destes projetos apresenta baixas performances hidráulica,
agronômica e econômica, conforme estudo da FAO.
O mesmo autor havia colocado anteriormente (Plusquellec, 1992) que a visão sobre
a ineficiência de sistemas coletivos de irrigação havia sofrido uma evolução. Na década de
70, o entendimento geral era de que a ineficiência maior era dos irrigantes nas parcelas.
Muitos investimentos foram realizados n a gestão dos canais terciários, na irrigação
parcelar e na organização dos produtores, mas com resultados abaixo do esperado.
Na década seguinte, passou a ser amplamente aceito que os problemas na parcela
eram influenciados pelo manejo do sistema de distribuição. As conclusões obtidas levaram
à compreensão de que o uso eficiente por parte do agricultor não seria obtido se a
distribuição fosse realizada de forma inadequada quanto ao tempo de fornecimento e ao
volume entregue. Um fornecimento de água deficiente resulta em anarquia, conflito entre
usuários, desrespeito pelas normas estabelecidas e não pagamento das taxas referentes à
água.
A criação do IIMI International Irrigation Management Institute, com sede no Sri
Lanka, ocorreu nesta época e com o objetivo de melhorar a eficiência da gestão da
irrigação. (Plusquellec, 1992)
A modernização de perímetros irrigados tipicamente inclui a gestão da demanda
para incentivar o uso eficiente da água e impõe novas externalidades no sistema de
irrigação em termos ambientais, econômicos e financeiros. Neste aspecto, o preço da água é
básico nesta modernização.
Segundo relato da AUSTRALIAN (2000), os processos de modernização
implantados em diversos perímetros irrigados australianos mostram resultados positivos
quanto à elevação da eficiência de distribuição de água e redução de mão de obra na
operação dos sistemas. Sobre a robustez de alguns componentes, no entanto, não uma
opinião unânime entre os gestores entrevistados, que relatam perdas de informações,
dificuldades de comunicação entre o gestor e a estrutura de controle, presença de insetos
126
afetando os sensores ou controladores, falha no fornecimento de energia elétrica ou da rede
de comunicações, entre outros.
O processo de modernização de sistemas de irrigação iniciou na década de 40
(Plusquellec, 1992), com a introdução das comportas automáticas, sendo incrementada três
décadas depois com o avanço das telecomunicações, sensores eletrônicos e computadores.
Em projetos de irrigação na Ásia, implantados nas décadas de 60 e 70, apresentam
uma gestão da distribuição de água que foi se adaptado às condições ao longo do tempo,
influenciadas pelo afrouxamento da disciplina e fragilidade institucional. No entanto, essas
condições foram favorecidas por outros problemas:
- Deficiências no projeto inicial do sistema;
- Extrapolação de conceitos de projeto além da sua faixa de validade;
- Dificuldade em controlar e operar os sistemas;
- Sistema projetado com uma hierarquia confusa entre os seus componentes;
- Estratégia de operação falha;
- Inconsistência entre as regras de operação nos vários níveis;
- Inconsistência entre as regras de operação e as demandas dos agricultores;
- Mudanças nas demandas dos agricultores não refletiram em mudanças na
política de gestão do sistema;
- Baixa qualidade do sistema de distribuição de água;
- Muita flexibilidade na gestão em todos os níveis.
O resultado é que a gestão atual é muito distinta do que a projetada, com um esforço
significativo para recuperar o controle da distribuição da água, mas também implementar a
medição da água distribuída.
Plusquellec (1992) também afirma que a velocidade de modernização de perímetros
irrigados é lenta, apesar das evidências favoráveis apontadas em termos de economia de
água, melhoria da eficiência global, maior segurança para o irrigante e redução de conflitos
entre irrigantes e entres estes e o órgão gestor do sistema. Uma das razões para isso é o
tempo necessário para a apropriação de tecnologias. Mesmo na década de 80, quando
muitas tecnologias haviam sido desenvolvidas e confirmadas, em muitos países
127
observou-se a implantação de sistemas de distribuição por canais nas mesmas condições
observadas no passado. Outro fator é a visão equivocada que a gestão de canais com uso de
novas tecnologias é mais complicada para países em desenvolvimento, desprezando a
existências de estruturas simples e sem componentes eletrônicos como vertedores de crista
de grande desenvolvimento e módulos de distribuição de vazão ou a adoção do controle por
jusante para canais de dimensões médias dentro do sistema de distribuição, como forma de
eliminar parcialmente a intervenção humana.
O custo estimado para modernização do controle de canais situa-se entre 5 e 10% do
custo de um sistema convencional, podendo ser inferior se a gestão for concebida ainda na
fase de projeto.
Ainda segundo Plusquellec (1992), existem três grupos que resistem naturalmente à
modernização de perímetros de irrigação. O primeiro inclui os técnicos responsáveis pelas
agências de irrigação que devem estabelecer as orientações de projeto. Este grupo, por uma
falha de comunicação com o pessoal de campo, desconhece as dificuldades de operação das
estruturas existentes. O segundo grupo inclui as empresas de consultoria, que não têm
incentivos para tentar mudanças na filosofia de projetos, seja pelo tempo escasso que tem
para cumprir os contratos, seja por evitarem conflitos com os clientes representados pelo
primeiro grupo. O terceiro grupo é o dos técnicos das agências financiadoras internacionais,
que sofrem pressões das agências e poucos têm experiência em práticas modernas de gestão
de irrigação.
Os irrigantes e os operadores do sistema, que são os últimos beneficiários,
normalmente não teriam interesse de estudar ou poder para impor técnicas de melhorias na
operação do sistema de distribuição por canais.
John (1992), a partir da análise de projetos de irrigação, avalia que os mesmos
foram projetados por engenheiros que desconheciam as necessidades reais dos agricultores
e definiram o sistema de distribuição com base em um calendário de rotações e uma
quantidade de água teoricamente suficiente para atender as necessidades, buscando o menor
investimento possível, mas trazendo inconvenientes em sua operação.
Segundo o autor, o projetista ideal seria um engenheiro que esteja atualizado com
as técnicas modernas; que tome decisões baseadas em um calendário de irrigação flexível
128
e na automação do sistema e que tenha capacidade de entender as necessidades locais de
um agricultor educado.
A sustentabilidade de novos arranjos dos perímetros públicos de irrigação,
resultantes da emancipação dos mesmos em relação à gestão pública, depende da
capacidade desta nova gestão em prover um serviço de distribuição de água adequado, com
controle e alocação de água capaz de resultar em ganhos de produtividade agrícola. Isso é
essencial para que os irrigantes paguem pela água para viabilizar a manutenção da entidade
gestora.
Algumas questões relacionada a esta transferência de gestão, que deve estar
intimamente relacionada com processos de modernização de perímetros de irrigação,
necessitam ser respondidas:
- Pode um projeto de engenharia levar em conta aspectos humanos e
institucionais?
- Qual é a repercussão destes aspectos sobre o tipo de tecnologia?
- Como se gera um projeto simples, com procedimentos de operação
transparentes e exequíveis?
- conhecimento para projetar e implantar um sistema de irrigação com
controle e gestão orientados pela distribuição da água?
- Quais são as ferramentas e processos para a tomada de decisão nos
diferentes níveis de serviço, nas regras operacionais, no planejamento e projeto dos
trabalhos de reabilitação destes perímetros?
- Como os irrigantes estarão envolvidos?
- Como essas decisões sobre a gestão estarão relacionadas com as decisões
financeiras taxas e contribuições pagas pelos irrigantes para a manutenção da estrutura
física?
- Como essas mudanças estão relacionadas com a elevação da qualidade de
gestão?
129
uma necessidade urgente de modernizar e melhorar os sistemas de controle de
água na maior parte dos grandes sistemas de irrigação, com a adoção da cobrança por
volume, ao invés de facilitar a diversificação cultural.
Plusquellec (2002) afirma que os irrigantes tendem a buscar soluções para suas
necessidades de água, principalmente em sistemas de irrigação superficial. Essa resposta é
gerada por mudanças econômicas, como o preço de certos produtos, mas também por uma
gestão deficiente, serviço inadequado ou vazões insuficientes para uma irrigação intensiva.
Neste sentido, os irrigantes buscam maior flexibilidade, maiores volumes fornecidos e
recuperação de parte da água drenada. Também podem reduzir a demanda por
modernização das práticas agrícolas (seguindo um pensamento econômico, com a
otimização dos recursos investidos) ou pela adoção de práticas ilegais ou em desacordo
com as regras do sistema, como a criação de um mercado paralelo de água, a manipulação
de estruturas de controle, o uso de fontes adicionais (bombeamento do canal e de drenos),
exploração da água subterrânea, entre outros. O autor afirma que isso é inevitável, e os
irrigantes vão subverter as regras de distribuição de água se essas não forem adequadas e
confiáveis para que eles atinjam seus objetivos.
Quando os custos de operação e manutenção são totalmente assumidos pelos
irrigantes, a relação entre o custo do serviço de distribuição e a sua qualidade é analisada
com mais detalhe pelos usuários (Plusquellec, 1992).
O autor também coloca que algumas práticas de modernização foram ou estão sendo
adotadas em alguns projetos de irrigação das décadas de 50 e 60, como:
- A implantação dos canais terciários pelo governo, nos projetos onde isso
seria responsabilidade dos irrigantes, que não o fizeram corretamente por falta de recursos
ou de técnica;
- Criação de grupos de usuários de água no nível de canais terciários;
- Refinamento do processo de medição da água, sendo largamente aceito o
conceito de que a medição da água consumida é essencial para uma efetiva gestão da água;
Segundo Plusquellec (2002), a mudança de gestão no projeto Dantiwada, na Índia,
manteve como elemento de controle o nível de montante em cada uma das oito seções de
regulação do canal principal de 46 quilômetros. Entretanto, cada operador se comunica com
130
o operador a montante, orientando sobre a alteração da vazão de entrada no trecho, como se
fosse um controle por jusante. Esta alteração elevou a eficiência do sistema, mas exigiu um
esforço prévio na qualificação dos operadores.
É fácil atender a demanda de água solicitada com um sistema manual operado com
controle a montante, se a vazão fornecida for superior à demanda atual. No entanto, esta
situação gera perdas de água excessivas no final do sistema, principalmente quando a
demanda é pequena, sobretudo à noite.
Phengphaengsy e Okudaira (2006) apresentam um estudo sobre aumento de
eficiência da irrigação na bacia do Mekong. Para melhorar o desempenho de sistemas de
irrigação, os autores colocam que é necessário:
Identificar os stakeholders responsáveis pela tomada de decisão pela
distribuição de água dentro do sistema de irrigação para entender os diferentes processos e
sua influência na implementação das alterações que serão propostas;
Examinar a estrutura organizacional dos stakeholders (gerentes de irrigação,
usuários de água) envolvidos na tomada de decisão, incluindo os agentes formais e
informais, de forma a auxiliar a identificar os níveis de intervenção em termos de
capacidade de desenvolvimento e implantação dos projetos;
Examinar os procedimentos da alocação de água como o contrato de
irrigação e as fontes de água do projeto e também identificar as regras e regulação da
distribuição de água para diferentes usuários do sistema. As regras formais e informais
definirão as bases para a prática de distribuição de água e, de certa forma, influenciarão a
eficiência de irrigação.
As regras formais devem ser coletadas de forma separada, de forma a responder
uma série de questões:
Quais são as regras formais utilizadas no projeto?
Como são as atuais práticas de distribuição de água no projeto?
Quais são as vantagens que as atuais regras e práticas trazem para o
gerenciamento do sistema?
131
Que critérios são adotados pelas autoridades do sistema de irrigação para
alocar a água entre os diferentes usuários?
As autoridades do sistema distribuem a água de diferentes formas para os
diferentes usos?
O critério utilizado pelas autoridades do projeto na prática é diferente das
regras formais? Qual é essa diferença?
A água é distribuída ao longo de todo o tempo?
Hamed e Chávez Ariosto (1992) indicam que a medição da água utilizada pode
sustentar a cobrança por volume e este, por sua vez, possibilita a definição de políticas de
dotação e distribuição baseadas em critérios de produtividade hídrica das culturas, expressa
em unidades monetárias recebidas por m³ utilizado.
132
4.7. A lavoura de arroz irrigado no Rio Grande do Sul
A determinação da vazão que deve ser transportada pelo sistema de canais depende
da estimativa da vazão unitária, que por sua vez depende das informações do clima, da
cultura e do tipo de manejo e da eficiência global prevista.
No caso específico do Rio Grande do Sul, o predomínio absoluto da irrigação da
cultura do arroz, cuja área atualmente cultivada ultrapassa os 1.000.000 hectares. Este é o
estado brasileiro que apresenta a maior área irrigada nacional (Righes, 2000). Na
elaboração dos planos de bacia ou do diagnóstico dos usos ou das disponibilidades quali-
quantitativas dos recursos hídricos, a irrigação desponta como um dos principais usos e, na
maior parte das vezes, como o uso preponderante em volume. Para a irrigação superficial
do arroz em particular, caracterizada como de baixa eficiência, com perdas que podem ser
superiores a 50%, o diagnóstico do uso de água em algumas bacias gaúchas mostra uma
situação clara de concentração, sendo que os irrigantes respondem por mais de 90% do
volume consumido anualmente em toda a bacia, mesmo que a irrigação seja realizada
apenas em um período não superior a cinco meses.
Em 1998, o estado apresentava uma área irrigada de 998.800 hectares, com um
volume derivado dos mananciais de 11.421.278.000 m³/ano, o que representava 33,81% do
total brasileiro. (Lima et alli, 1999). Em 2005, a área irrigada apenas com arroz somava
1.039.421,7 hectares (Fischer, 2006).
Da área irrigada em 1993, 43% das propriedades utilizavam o abastecimento por
processos de distribuição por gravidade e os 57% restantes utilizavam a captação por
bombeamento (Righes, 2000). AGÊNCIA (2009), citando o censo da lavoura orizícola de
2006, coloca que na Fronteira Oeste do Rio Grande do Sul as estruturas de armazenamento
são mais importantes, respondendo por 61,6% das captações de água para as lavouras,
sendo o restante atendido por bombeamentos. Em 2005, (Fischer, 2006) 29,7% da área total
foi irrigada de forma natural, ou seja, por gravidade. Neste caso, um aumento do consumo
não significará, necessariamente, uma elevação nos custos da lavoura. A energia elétrica foi
utilizada em estações de recalque responsáveis por atender 56,7% da área, sendo que
motores a diesel responderam pelos restantes 13,5%.
133
No entanto, açudes ou barragens são a fonte primária de 48,5% da água utilizada, o
que pode significar que o produtor não estará disputando a água com outros usuários, o que
é mostrado pelo grau de satisfação em relação à disponibilidade de água: mesmo após uma
grande seca (2004-2005), o número de insatisfeitos com a disponibilidade de água
representava apenas cerca de 30% do total dos agricultores, sendo que 50% estavam
satisfeitos e 20% eram indiferentes a este indicador.
Fischer (2006) coloca que a água “própria” era responsável por 60,5% da irrigação,
sendo que a água “arrendada” respondia pelos restantes 39,5%.
Esta visão da água “própria” reflete uma visão ainda relativa ao Código de Águas
de 1934, mas muito presente entre os agricultores e um dos maiores dificultadores da
cobrança pelo uso da água e do próprio processo de outorga, embora este fosse um
instrumento já previsto pelo Código.
A figura da água “arrendada” remete ao “mercado de água”, mas não na visão
corrente da gestão de recursos hídricos, o que leva a um certo grau de confusão, observado
nas pesquisas a campo do levantamento da Disposição a Pagar, quando eram propostos
inicialmente valores muito acima da expectativa e próximos ao valor do “arrendamento” da
água na região.
Em relação à área, as terras próprias responderam por 40,6% das lavouras, o que
significa que 59,4% das lavouras eram sobre terras arrendadas.
A irrigação da lavoura de arroz no Rio Grande do Sul pode ser considerada como
uma consequência natural da disponibilidade de terras planas, de difícil drenagem natural,
das condições climáticas do período da primavera e do verão e uma relativa abundância de
água.
O início da irrigação mecânica do arroz (com o uso de bombas elevatórias) data de
1904, na região de Pelotas. O avanço da lavoura ocorre de forma mais significativa no
período da Segunda Guerra, sendo que a área irrigada nos anos de 1942/43 era de 162.000
hectares, subindo para 200.000 hectares nos anos de 1944/1945, com um acréscimo de 25%
em dois anos. (Rio Grande do Sul, 1946)
134
A partir disto, a área irrigada foi sendo ampliada até atingir valores próximos de um
milhão de hectares.
Segundo Vieira e Telles (2001), a irrigação por inundação na região Sul somava 990
mil hectares em 1988.Os autores classificam essa irrigação como “facilitada”, devido às
extensas áreas, à abundância de água e à topografia adequada, que facilitam
sobremaneira a implantação de tabuleiros para a irrigação de arroz. Nesta área estão
40% da irrigação do País, utilizando o método de inundação, porém com baixo nível
tecnológico.
O estado do Rio Grande do Sul apresenta cerca de 5.300.000 hectares de solos de
várzea, assim considerados os que apresentam características hidromórficas. (Klamt, 1985).
A área ocupada com a lavoura de arroz varia de acordo com as condições de mercado e
clima. O Instituto Rio-Grandense do Arroz mantém o registro das áreas cultivadas e
colhidas no estado, desde 1921. O Gráfico a seguir apresenta a evolução de área colhida e
da produtividade sobre o ano base 1921/1922, com uma área de 79.120 hectares e
produtividade média de 44 sacos por hectare, até o ano agrícola 2007/2008, com uma área
plantada de 1.068.339 hectares e uma produtividade média de 141 sacos por hectare.
A análise das curvas mostra uma certa estagnação entre as décadas de 20 e 40. A
partir da ação do IRGA, especialmente da pesquisa e da extensão rural, observa-se uma
evolução de produtividade e de área plantada. No entanto, é na cada de 70, coincidente
com a Revolução Verde, que a produtividade cresce de forma significativa em curto espaço
de tempo. Observa-se, também, na cada de 80, uma evolução constante da área irrigada,
reflexo de uma política definida de preços mínimos e pela ação de programas de incentivo à
irrigação, como o PROVÁRZEAS. Na década de 90, inicia-se a crise do arroz, com a
abertura de importação do produto a preços menores que o custo de produção, o que tem
reflexos tanto na evolução da área plantada, como no aumento da produtividade média.
Observa-se, assim, que a existência de políticas agrícolas influencia a área irrigada, o que
poderia alterar o valor da elasticidade-preço para a água. Da mesma forma, evidencia-se
que a possibilidade de utilizar insumos químicos altera o excedente do produtor, desde que
sob custos marginais menores do que os benefícios marginais obtidos, e influenciará na sua
disposição a pagar pela água, se esse for o fator limitante para a produção.
135
Figura 16 - Evolução da área cultivada e produtividade da lavoura de arroz no Rio
Grande do Sul 1921-2008 Fonte dos dados básicos: INSTITUTO, 2008
SOSBAI (CONGRESSO, 2005) coloca que os sistemas de cultivo utilizados na
cultura do arroz irrigado basicamente diferenciam-se quanto:
ao processo de preparo do solo;
métodos de semeadura; e
manejo inicial da água
Os sistemas de cultivo atualmente encontrados no Rio Grande do Sul são os
seguintes (CONGRESSO, 2005):
a) Sistema convencional envolve operações de preparo do solo mais
profundas, com uso inicial de arado seguido de tratamento com grades ou plainas. O teor de
136
umidade no solo é importante para estas operações. A semeadura é realizada a lanço ou em
linha;
b) Cultivo mínimo ocorre a redução dos trabalhos mecanizados, quando
comparado com o sistema convencional. O preparo do solo pode ser realizado em diversas
épocas do ano, e o uso de dessecantes para eliminar a cobertura vegetal existente na
época da semeadura do arroz.
c) Plantio direto o solo não é revolvido e a semente é depositada em um
pequeno sulco. O controle de invasoras é realizado com herbicidas, antes da semeadura.
d) Pré-germinado a utilização de sementes previamente germinadas. O
preparo do solo é realizado com a formação de lama, seguido do nivelamento e alisamento
realizados com o solo inundado. Os implementos utilizados são o arado, a grade, a enxada
rotativa e pranchões de madeira para alisamento.
e) Mix é uma variante do pré-germinado, com o preparo antecipado do solo,
o desenvolvimento de ervas invasoras, o dessecamento com herbicidas e a semeadura de
sementes pré-germinadas.
f) Sistema de transplante de mudas o preparo do solo, manejo d’água e
controle de invasoras é idêntico ao sistema pré-germinado. A produção de mudas utiliza
sementes pré-germinadas, que são posteriormente transplantadas em solo inundado.
Conforme o Censo da Lavoura de Arroz Irrigado do RS ( INSTITUTO, 2006, citado
por AGÊNCIA, 2009) a distribuição das áreas cultivadas por cada modelo na Fronteira
Oeste do estado são:
cultivo mínimo 86,9% ;
convencional 8,4%;
plantio direto 4,1%;
sistema pré-germinado 0,6% da área.
Para o estado como um todo, Fischer (2006) apresenta os seguintes valores:
cultivo mínimo 61,1% ;
137
convencional em linha 17,6%;
convencional a lanço 4,3%;
plantio direto 5,7%;
sistema pré-germinado 11,2%
Outros 0,1% da área.
Segundo a SOSBAI (CONGRESSO, 2005), a quantidade de água exigida para o
cultivo do arroz é o somatório da água necessária para saturar o solo, formar uma lâmina,
compensar a evapotranspiração e repor as perdas por percolação vertical, as perdas
laterais e dos canais de irrigação. Esta quantidade depende, principalmente, das condições
climáticas, do manejo da cultura, das características físicas do solo, das dimensões e
revestimento dos canais, da duração do ciclo da cultivar, da localização da fonte e da
profundidade do lençol freático. No sistema de plantio com sementes pré-germinadas, além
da água necessária durante o ciclo da cultura, deve-se somar as necessidades para o
preparo do solo, que normalmente é feito sob condições de inundação.
A necessidade de água do arroz durante o ciclo para os sistemas de cultivo
convencional, cultivo mínimo e plantio direto podem ser atendidas por vazões contínuas de
1,5 a 2,0 l/s.ha, em um período médio de irrigação entre 80 e 100 dias. Para o sistema pré-
germinado, deve-se prever o acréscimo de 1.000 a 2.000 m-³.ha para a fase de preparo do
solo.
Marcolin e Macedo (2003), citando EMBRAPA (1999), colocam que o volume de
água consumido na irrigação depende da textura do solo, da declividade do terreno, e de
fatores climáticos, que determinam vazões contínuas de 1,5 a 2,0 l/s.ha num período médio
de irrigação de 80 a 100 dias. No estudo, encontram valores de vazão unitária entre 0,82,
0,95 e 1,06 l/s.ha para os sistemas de plantio pré-germinado, direto e convencional,
respectivamente, sendo que para o pré-germinado não foi considerado o volume necessário
para o preparo do solo.
Righes (2000) coloca que o consumo médio da lavoura de arroz é de 2 l/s.ha, com
eficiência de irrigação entre 40 e 45%, podendo atingir até 60% em condições adequadas de
solo, relevo e manejo da água. Carrera-Fernandez e Garrido (2002) indicam uma vazão
138
continua de 2 a 2,5 l/s.ha, considerando uma irrigação 24 horas por dia para o método de
irrigação por inundação, no estado da Bahia.
De Buffon (1861) indica uma vazão específica média 2,5 l/s.ha para as lavouras de
arroz no norte da Itália, contra um valor médio de 1 l/s.ha para as pastagens e de 0,8 l/s.ha
para os outros cultivos. Ramos (1985) cita a utilização de vazões entre 2 e 2,5 l/s.ha tendo-
se em conta todas as necessidades e perdas.
Machado et alli (2000) estudaram o consumo de água na lavoura de arroz, para
diferentes métodos de irrigação, obtendo os resultados apresentados abaixo. Neste estudo, o
consumo de água foi monitorado diariamente com hidrômetros instalados nas parcelas,
sendo a água conduzida por tubulações fechadas e pressurizadas. A lâmina da água foi
mantida com um valor máximo de 10 cm. As parcelas, de 160 m², foram aplainadas e
isoladas para evitar perdas de água por infiltração lateral. Os consumos obtidos são
coerentes com a necessidade de água para o arroz irrigado, sendo apresentada referência de
valores entre 5.130 e 8.016 m-³.ha. No entanto, são muito inferiores aos valores referenciais
brutos, devido ao grande volume de perdas observado na irrigação por inundação e nos
sistemas de distribuição correntes.
Righes (2000), citando Cauduro (Apontamentos de irrigação, IPH/UFRGS, 1996)
apresenta um consumo aproximado de 11.513 m-³.ha, distribuídos conforme a Tabela 17.
Em trabalho recente desenvolvido para a bacia do Quaraí, AGÊNCIA (2009)
apresenta um fluxograma para determinação da demanda de água para a lavoura de arroz na
bacia do rio Quaraí para fins de outorga. Este fluxograma é apresentado pela figura 17.
A partir deste modelo, os resultados encontrados sugerem uma necessidade de
8.773,3 m-³.ha, considerando-se uma eficiência de irrigação de 60%. A este valor foi
acrescido um volume adicional de 1.500 m-³.ha, sendo 1.000 no início de irrigação e
500 m-³.ha no final da irrigação para possibilitar maior flexibilidade na condução das
lavouras, resultando um valor referencial para outorga de 10.273,3 m-³.ha.safra.
139
Tabela 16 Consumo de água, rendimento de grãos, eficiência do uso da água,
início e período de irrigação de diferentes sistemas de cultivo do arroz irrigado, em dois
anos agrícolas (Machado et alli, 2006)
Denominações
Sistemas de cultivos
1
CV (%)
SC
CM
PRÉ
3
MIX
3
TM
3
Ano agrícola 2000/01
Consumo de água (m³.ha
-1
)
5.998
5.431
6.216
6.308
6.422
6,42
Rendimento de grãos (kg.ha
-1
)
8.134
7.963
8.283
7.851
8.019
7,32
Eficiência do uso da água (kg. m
-3
)
1,35
1,46
1,33
1,24
1,25
---
Início da irrigação
2
23
23
3
3
3
---
Período de irrigação (dias)
103
103
124
124
124
---
Ano agrícola 2001/02
Consumo de água (m³.ha
-1
)
5.487
5.374
5.852
5.716
5.581
5,31
Rendimento de grãos (kg.ha
-1
)
8.134
7.992
8.181
7.792
7.897
8,34
Eficiência do uso da água (kg. m
-3
)
1,48
1,48
1,39
1,36
1,41
---
Início da irrigação
2
21
21
3
3
3
---
Período de irrigação (dias)
101
101
121
121
121
---
SC sistema convencional; CM cultivo mínimo; PRÉ pré-germinado; MIX mix de pré-germinado; TM transplante de mudas
Dias após a semeadura (PRÉ e MIX), emergência (SC e CM) ou do transplante de mudas
3
Volume de água gasto no preparo do solo (1.285 m
3
.ha
-1
)
Tabela 17 Valores aproximados do consumo de água em lavouras de arroz
Parcelas do Consumo
Consumo (m-³.ha)
Consumo (%)
Saturação do perfil
900
8,0
Formação de lâmina
1.000
8,5
Evapotranspiração
5.550
48,0
Percolação
4.020
35,0
Infiltração lateral
43
0,5
Total
11.513
100,0
Fonte: Righes, 2000.
140
DADOS METEOROLÓGICOS
Necessidade de irrigação líquida
= Etc Pe (mm)
Coeficiente de cultura (Kc)
Precipitação efetiva
e provável
Evapotranspiração
de referência (Eto)
Evapotranspiração
da cultura (Etc)
Cultura
Estágio de desenvolvimento
Eficiência da irrigação
Método de irrigação
Manejo da irrigação
Tipo de solo
Horas de captação mensal
Vazão da captação
Volume mensal
Volume diário
Correções do Kc
DADOS DAS CULTURASPROJETO DE IRRIGAÇÃO
Necessidade de irrigação bruta (mm)
Área a ser irrigada
Dias/mês de captação
Tempo de captação/dia
Necessidade de irrigação bruta (m
3
)
Ventos
OPERAÇÃO DA
CAPTAÇÃO
DADOS METEOROLÓGICOS
Necessidade de irrigação líquida
= Etc Pe (mm)
Coeficiente de cultura (Kc)
Precipitação efetiva
e provável
Evapotranspiração
de referência (Eto)
Evapotranspiração
da cultura (Etc)
Cultura
Estágio de desenvolvimento
Eficiência da irrigação
Método de irrigação
Manejo da irrigação
Tipo de solo
Horas de captação mensal
Vazão da captação
Volume mensal
Volume diário
Correções do Kc
DADOS DAS CULTURASPROJETO DE IRRIGAÇÃO
Necessidade de irrigação bruta (mm)
Área a ser irrigada
Dias/mês de captação
Tempo de captação/dia
Necessidade de irrigação bruta (m
3
)
Ventos
OPERAÇÃO DA
CAPTAÇÃO
Figura 17 Fluxograma para a determinação de demanda. Fonte: AGÊNCIA, 2009
Em trabalho desenvolvido em condições de campo, Marcolin et alli (2007,a)
apresentam valores de consumo de água entre 7.706 e 8.606 m-³.ha em lavouras localizadas
em Camaquã e Santo Antonio da Patrulha, com áreas entre 2,82 e 5,74 hectares,
respectivamente. O volume consumido foi estimado pela equação de uma comporta
atendida por um canal com nível variável e controlado por um linígrafo e pelo uso de um
hidrômetro, respectivamente. Os autores colocam diferenças de manejo, de épocas de
semeadura, rompimento de taipas e duração do período de irrigação para justificar as
diferenças encontradas. Também ressaltam que as perdas por condução não foram
consideradas na avaliação. A precipitação pluviométrica, determinada por pluviômetros
instalados na lavoura, respondeu por 70% do consumo em Camaquã e 55% em Santo
Antonio da Patrulha.
141
Em outro estudo, Marcolin et alli (2007,b) colocam que o volume de água depende
da época do início da irrigação, sendo que quanto mais precoce for a entrada de água, maior
será a eficiência do uso da água na lavoura.
Parsinejad, M. e Yazdani, M. R. (2002) afirmam que mais de 50% da água
fornecida para a lavoura de arroz irrigado por inundação são perdidos. No entanto, se for
considerado que 80% da água drenada pode ser reutilizada, essa eficiência pode ser elevada
em 15%. Os autores recomendam para melhorar a eficiência da irrigação que (1) sejam
controladas as perdas laterais, (2) seja medida a quantidade de água utilizada; (3) a
programação do preparo do solo utilize a água proveniente da precipitação pluviométrica e
(4) seja utilizada a aplicação de água periodicamente ao invés de manter a lavoura
continuamente inundada.
Consumo total:
10.273,3
m
3
/ha
1.705,8
2.311,5
2.388,1
2.573,7
1.294,2
0,8916 L/s/ha
0,6369 L/s/ha
0,8918 L/s/ha
0,9609 L/s/ha
0,5350 L/s/ha
+ 500 m
3
/ha
+ 1000 m
3
/ha
0
250
500
750
1.000
1.250
1.500
1.750
2.000
2.250
2.500
2.750
Out Nov Dez Jan Fev
s de irrigação
Volumes mensais (m
3
/ha)
Figura 18 Distribuição temporal do volume de irrigação da lavoura de arroz na
bacia do rio Quaraí, RS. Fonte: AGÊNCIA, 2009
142
Walker (1999) coloca que as perdas laterais não ocorrem onde as taipas de contorno
são reformadas todos os anos, concordando com Cauduro, que aponta uma pequena
importância das perdas laterais.
A otimização do manejo da água na lavoura de arroz é difícil por envolver um
grande número de fatores (Pereira et alli, 1986). De fato, a capacidade do arroz em se
adaptar a diferentes condições de alagamento, faz a cultura ser adotada por um grande
número de agricultores. Entre os fatores envolvidos no manejo da irrigação estão:
i. Fatores biológicos, relacionados com variedades, estágio de crescimento, e
desenvolvimento do ciclo vegetativo;
ii. Fatores ambientais, como tipo de solo, profundidade da lâmina de água,
temperatura, radiação solar e outras variáveis climáticas;
iii. Fatores físicos, relacionados com condições de irrigação, nomeadamente os
métodos de distribuição de água, drenagem, dimensão das lavouras, sistematização do
terreno;
iv. Fatores agronômicos, como preparação do solo, método de semeadura,
aplicação de herbicidas, fertilizantes, uso de reguladores de crescimento;
v. Fatores econômicos, principalmente os concernentes a relação entre preço do
produto e custo dos fatores aplicados, incluindo os custos de investimentos e os custos da
água;
vi. Fatores sociais, como treinamento dos agricultores, capacidade de
gerenciamento dos agricultores e tradições culturais.
Vieira e Telles (2001) citam pesquisa de Telles sobre o cadastro parcial dos
irrigantes no estado de São Paulo. Este estudo observa que:
Os agricultores não dispõem de informações referentes às necessidades de
água para as culturas;
A absoluta maioria das propriedades não faz controle dos seus consumos de
água e tem tendência de usar mais água do que é preciso;
143
Sistemas de irrigação são implantados sem projeto adequado e são
superdimensionados;
Os irrigantes não dispõem de assistência técnica efetiva; e
Apenas uma pequena parte dos irrigantes possui algum tipo de treinamento.
O estudo conclui que tal situação gera frequentemente o desperdício de água e
energia.
No caso do arroz no Rio Grande do Sul, Fischer (2006) cita que 26,3% dos
arrozeiros não recebem assistência técnica.
O grau de escolaridade dos produtores de arroz irrigado em geral é baixo, com
65,8% apresentando no máximo o ensino “primário”. A adoção desta antiga nomenclatura
pode gerar uma estimativa equivocada da escolaridade, uma vez que o antigo ensino
primário contemplava apenas os primeiros quatro anos de ensino. As respostas possíveis da
pergunta, de acordo com o quadro de respostas, eram: nenhum (1,1%), primário (64,7%),
secundário (22,5%), universitário (10,5%) e pós-graduação (1,1%). Neste caso, para quem
cursou apenas o primário, o primário e o ginásio, o primeiro grau ou o ensino fundamental,
de forma completa ou incompleta, só haveria uma única resposta possível.
Os anos de experiência do agricultor com o arroz irrigado é normalmente elevado.
Com 30 e mais anos de experiência, existiam, em 2005, 2706 produtores, representando
32,6% do total. Com menos de 10 anos de experiência, 20,4% dos produtores.
Estes valores reforçam a dificuldade citada sobre a correta gestão da água na
lavoura de arroz.
144
4.8 - Sistemas coletivos de irrigação no Rio Grande do Sul
Os projetos coletivos de irrigação no Rio Grande do Sul são destinados,
prioritariamente, à exploração da lavoura de arroz. Em número, a maior parte destes
sistemas é privada e atende a poucos usuários cada. As poucas intervenções
governamentais respondem por menos de 5% da área irrigada média anual e têm um
formato semelhante, sendo alimentadas por barragens localizadas a montante e em cota
mais elevada, evitando-se ao máximo o uso de recalque mecânico. A distribuição da água é
realizada por um sistema de canais em terra, sem revestimento, com estruturas simples de
controle. O fornecimento de água nesses projetos é realizado ou por semi-demanda ou por
vazão contínua.
Na concepção técnica usual de projetos de irrigação atendidos por sistemas de
canais de distribuição, uma especial atenção é dada ao controle das vazões que são
derivadas para canais secundários e terciários e para cada irrigante. O objetivo da operação
de um sistema de irrigação é a administração, distribuição e fornecimento de água para
irrigação, de forma racional, eficiente e de acordo com as reais necessidades dos cultivos,
bem como dirigir o pessoal do projeto e gerenciar adequadamente os recursos, a fim de que
seja possível alcançar os objetivos do projeto.
Em número, a maior parte destes sistemas é privada e atende a poucos usuários
cada. Muitas das soluções hidráulicas encontradas nos projetos privados de irrigação
coletivos no Rio Grande do Sul, na realidade, se justificam pela escassez da água ou por
margens de produção atrativas da lavoura de arroz, o que ocorre de forma eventual e
imprevisível. Nesta situação estão canais que necessitam de mais de duas instalações de
recalque, canais de dupla função, reservatórios em áreas planas e obstrução de vertedores,
rios e arroios. Os sistemas públicos de irrigação, mesmo que resultantes de projetos de
engenharia, também refletem essa lógica.
Os projetos públicos gaúchos têm um formato semelhante entre si, sendo
alimentados por barragens localizadas a montante e em cota mais elevada, evitando-se ao
máximo o uso de recalque mecânico, que é utilizado normalmente para a devolução de
águas drenadas para o sistema. Exemplos destes projetos abastecidos por barragens:
Perímetro de Irrigação do Arroio Duro (década de 60), o Perímetro de Irrigação da
145
Barragem do Arroio Capané (início das obras em 1947, início da irrigação 1948 (Fagundes,
1997)), o Sistema de Irrigação do rio Vacacaí (início das obras em 1990, início da irrigação
1994), o Sistema de Irrigação do Arroio das Canas (início das obras em 1990, início da
irrigação 1994), o Distrito de Irrigação do Arroio Chasqueiro (início das obras em 1979,
início da irrigação 1982) e o sistema de São Marcos ou Sanchuri (início das obras em 1943,
início da irrigação 1946), além de um número considerável de sistemas de irrigação
implantados e controlados por particulares.
A distribuição da água é realizada por um sistema de canais em terra, sem
revestimento, com estruturas simples de controle. No geral, na irrigação de arroz as
estruturas de controle dos canais são precárias, muitas vezes formadas por aterro, pilhas de
sacos de areia ou tábuas dispostas transversalmente na seção do canal, que são
denominadas regionalmente de trancas. Já as tomadas de água das parcelas irrigadas são
comportas metálicas ou de madeira, ou são simples aberturas nas taipas de contorno com o
uso de pás de corte, o que torna difícil não apenas um manejo eficiente, como a própria
classificação da lógica ou da estratégia de gestão para o conjunto dos projetos de irrigação.
No caso dos distritos públicos, estas estruturas são representadas basicamente por
comportas metálicas.
Existindo um reservatório ou uma estrutura de derivação e uma área a irrigar é
necessário existir uma regra operativa que harmonize o volume previsto como disponível
no início do período de plantio com o plano agrícola proposto pelos irrigantes.
Um fator complicador no caso gaúcho é a rotação de áreas, com a adoção de pousio,
o que faz com que as áreas atendidas por cada canal mudem todos os anos. No sistema do
arroio Duro, é feita uma programação anual dependendo do volume armazenado na
barragem localizada a montante e na capacidade de bombeamento recentemente construída
junto ao rio Camaquã. A partir disto, é realizado um rateio desse volume entre os irrigantes.
Destes, o projeto foca especificamente o projeto do Arroio Chasqueiro.
O Sistema de Irrigação do Arroio Chasqueiro localiza-se no município de Arroio
Grande, na bacia da Lagoa Mirim. Foi implantado pela extinta Superintendência de
Desenvolvimento da Região Sul SUDESUL, no início da década de 80. O projeto previa
uma diversidade de culturas irrigadas, com predomínio do arroz (4.000 hectares/ano), o que
146
não foi observado, sendo que atualmente o sistema atende cerca de 7.000 hectares de
arroz/ano.
O sistema de canais original previa a construção de 40.220 m de canais em terra,
com 37 tomadas de água (Ministério do Interior, 1980). O projeto era considerado um
piloto para um plano mais abrangente na bacia da Lagoa Mirim, dentro de um Acordo de
Cooperação Binacional, que incluiu também a construção da eclusa do Canal de São
Gonçalo, mas que foi parcialmente abandonado a partir de 1990, com a extinção da
SUDESUL por ato do Governo Federal.
Um ponto interessante do projeto do sistema de canais foi a manutenção de uma
mesma seção transversal ao longo de toda a extensão de cada canal, permitindo a condução
de uma ampla faixa de vazões, de acordo com a demanda dos irrigantes atendidos por cada
estrutura. Esta situação exige, evidentemente, um investimento maior na fase de
implantação, mas é mais adequada para projetos sem redistribuição fundiária, pois não
como obrigar os proprietários a utilizar a água. No caso do sistema de canais dos projetos
do Arroio das Canas e do rio Vacacaí (VAC 04, VAC 06 e VAC 07), no município de São
Gabriel, implantados no início da cada de 90, o critério foi de redução da seção
transversal ao longo da extensão do canal, fixando uma vazão máxima derivada em cada
tomada de água. Apesar de reduzir o custo inicial de implantação do canal, esta solução
demonstrou-se inadequada a partir da crise da lavoura de arroz nos anos seguintes à
inauguração do sistema, quando vários produtores desistiram da lavoura, e também nos
anos em que houve um acréscimo por demanda de novos proprietários localizados no fim
dos canais, que não puderam ser atendidos por falta de capacidade de condução desta
estrutura.
No sistema do arroio Chasqueiro, a tendência é que cada irrigante mantenha uma
área uniforme ao longo dos anos, alterando a sua localização dentro da propriedade.
As tomadas de água dos irrigantes nos perímetros são basicamente comportas
metálicas que regulam orifícios, comportas de madeira ou tubulações. Nas lavouras em
geral, podem ser simples aberturas nas taipas de contorno com o uso de s de corte, o que
torna difícil não apenas um manejo eficiente, como a própria classificação da lógica ou da
estratégia de gestão para o conjunto dos projetos de irrigação.
147
Pode-se, preliminarmente, definir que a lógica desses projetos coletivos é o
comando por montante, tendo em vista que o manejo da tomada de água da barragem ou da
comporta que alimenta um canal é a principal forma de alteração da vazão. A partir da
alteração da vazão, as alterações necessárias nos reguladores vão sendo executadas, ou de
montante para jusante ou no sentido oposto.
Os irrigantes, na maior parte dos casos privados, podem exercer o controle local,
alterando a abertura das bocas. No caso dos perímetros públicos, o controle local é exercido
ou controlado pelo canaleiro.
Seguindo a tendência de que a vazão retirada assuma um valor contínuo com o
passar do tempo e que as manobras realizadas pelos irrigantes serão, na maior parte do
tempo, no sentido de aumentar a retirada, as bermas dos canais projetados seguem a
declividade do fundo, em uma concepção de obra mais econômica. Evidentemente, nesse
caso, as perdas por manobras equivocadas ou não planejadas podem ser consideráveis, pois
inexistem volumes de reserva dentro dos canais, ou seja, os canais não conseguem fornecer
instantaneamente um aumento de vazão, por uma solicitação não planejada, bem como não
conseguem absorver um excesso de vazão, pela desistência ou redução de uma retirada
previamente acordada.
A definição do controle da irrigação no distrito do Chasqueiro e nos outros sistemas
públicos do Rio Grande do Sul, no entanto, não é tão evidente. Para o controle ser realizado
por montante, o que seria compatível com o comando por montante, o gestor do sistema
deveria definir as vazões que seriam entregues em cada trecho do canal. A partir disto, as
estruturas de controle seriam abertas de montante para jusante, de acordo com o tempo de
resposta do sistema. A variável a ser controlada é o nível de água a montante das estruturas
de controle, que deve ficar em um nível tal que atenda as tomadas de água também
localizadas a montante. Para que isso aconteça em um sistema operado manualmente, o
gestor deve definir com os canaleiros quando irá liberar a água na comporta do barramento
e qual será a vazão liberada. Percebe-se, então, que a variável ideal a ser controlada seria a
vazão e não o nível, uma vez que o canal não é revestido e ao longo do tempo a relação
vazão x profundidade tende a se alterar, seja por colmatação do fundo e das laterais dos
canais, reduzindo a infiltração, seja pelo motivo oposto, de aumento de infiltração pelo
148
processo de limpeza do canal, ou, ainda e de forma mais evidente, pela alteração do perfil
do canal por erosão ou sedimentação de materiais grosseiros.
No entanto, o controle por jusante também é possível e ocorre quando o irrigante
solicita a abertura ou fechamento da comporta fora da programação inicialmente proposta.
No caso de uma redução de consumo em um trecho da rede, o gestor é obrigado a solicitar
que o canaleiros operem as comportas no sentido de diminuir o fluxo naquela direção, ao
mesmo tempo em que opera a tomada de água da barragem. Para a parte da água que
estava circulando no sistema, não opção de recuperação e este volume será acumulado
ao longo do trecho regulado. Como não há estruturas de limitação do nível ao longo de todo
o sistema de canais, este excesso será desviado para as lavouras, por conta do aumento de
carga relacionado com a elevação do nível. Esta “perda” torna-se de difícil mensuração,
pois será distribuída por uma área inundada e resultará em alteração de uma variável que
não é controlada usualmente de forma precisa, que é a altura da lâmina na lavoura.
No caso oposto, de aumento da demanda não planejada motivado pela abertura de
uma ou mais tomadas de água parcelares, o gestor e os canaleiros atuarão no sentido de
irem abrindo as comportas necessárias para atender o trecho em questão. Nesta situação, o
nível no canal irá variar de montante para jusante, reduzindo a profundidade até que a onda
gerada pelo aumento da vazão liberada na barragem chegue e estabeleça uma nova situação
de estabilidade. Da mesma forma que a situação anterior, a vazão das tomadas parcelares
irá se alterar, para mais ou para menos, de acordo com o nível da água no canal. As
lavouras então receberão mais ou menos água do que o previsto, sendo esta diferença de
difícil determinação.
A variável de regulação sempre é o nível da água, que não estruturas de
medição de vazão (exceção feita no trecho inicial do sistema de canais do arroio
Chasqueiro, em que uma calha Parshall). Quando o nível controlado é o de jusante de
uma estrutura, a gestão destes perímetros insere-se na situação descrita por Rijo (1993, a),
na qual esta situação é naturalmente ineficiente.
As épocas mais propícias para a alteração do controle de montante previsível para
um indesejado controle de jusante são o início e o final da irrigação, que são as fases nas
149
quais os agricultores m um maior grau de liberdade de decisão quanto às práticas e aos
cronogramas que serão obedecidos.
Antes do plantio, no caso dos anos com primaveras secas, alguns agricultores
podem solicitar um volume de água para o umedecimento adequado do solo. Se for adotado
o plantio pré-germinado, a necessidade da formação de uma lâmina para o preparo final
do solo, seguida de um período sem consumo de água. Essas situações particulares no meio
de um sistema coletivo geram a necessidade de um planejamento minucioso por parte do
gestor, que poderá ser abandonado frequentemente por interferências externas e não
previsíveis, como a ocorrência de precipitações intensas (quando os agricultores tendem a
fechar as tomadas de água), ou de períodos secos mais prolongados na fase de implantação
da lavoura. Na época final da lavoura, a forma de preparar a lavoura para ser colhida irá
variar de produtor a produtor. Assim, a supressão da irrigação será solicitada em datas
definidas pelo interesse do produtor, sendo uma variável sem controle por parte do gestor.
A distribuição pode ser considerada como sendo de vazão fixa, com frequência
anual. Observa-se, na realidade, que a vazão inicial é mais elevada, reduzindo-se à medida
que a perdas por infiltração estabilizam. A lógica de aumento ou redução da vazão depende
do manejo da lavoura, que pode ser alterada repentinamente na ocorrência de pragas ou
pela definição da necessidade de adubação de cobertura, entre outros tratos culturais, bem
como acidentes por ocorrência de chuvas intensas, que podem exigir a interrupção da
irrigação por um curto período ou a exigência de um volume maior de água para retomar a
condição de inundação.
O controle da água na parcela é realizado pela abertura ou fechamento de bocas no
lado oposto ao da entrada da água, retirando a água para os drenos ou esgotos da lavoura.
Em muitas situações, o esgoto de uma lavoura será o canal de irrigação de outra parcela,
sendo que não são raros os casos de bombeamento da água dos esgotos para alimentar
canais de irrigação mais elevados ou diretamente outras parcelas. A complexidade desta
lógica de operação, aliada a simplicidade das estruturas e o controle essencialmente
manual, resulta em uma baixa eficiência no uso da água.
150
4.8. Sistemas de irrigação coletivos em Portugal
De acordo com PORTUGAL (s.d.), existem 54 sistemas coletivos públicos de
irrigação no continente português, dos quais 25 são ou foram de responsabilidade do Estado
(Tabela 18).
Segundo Raposo (1996) o cultivo do arroz irrigado em Portugal é praticado
principalmente nos seguintes projetos de irrigação:
Vale do Sado
Vale do Sorraia;
Divor e Campilhas e São Domingos;
A cultura do arroz é um caso especial na agricultura portuguesa. Raposo (1996)
afirma que o arroz é a cultura com a menor produtividade específica em relação à água, isto
é, com o menor valor de produção por de água utilizado na irrigação. Por este critério,
essa cultura deveria ser abandonada em benefício de outras mais produtivas. No entanto,
aspectos sociais e econômicos mantêm a exploração do arroz no país. Entre estes aspectos,
Raposo (1996) cita:
O arroz é uma cultura tradicional nos perímetros públicos, nos quais
apresenta uma produtividade comparável com as melhores do mundo;
Utiliza terras com muitas limitações, como os solos muito impermeáveis e
argilosos, com graves problemas de drenagem e com teores de sais relativamente elevados;
Tem interesse estratégico para Portugal, que é um importador do produto.
As necessidades de água na lavoura em Portugal são apresentadas na Tabela 19,
para as diferentes regiões produtoras. Observa-se que os consumos aumentam com o
aumento da latitude, devido à necessidade de um maior controle térmico na lavoura.
151
Tabela 18 - Aproveitamentos Hidro-agrícolas em exploração ou em execução*, por
região administrativa
CENTRO
1. Alfaiates
2. Calde
3. Cerejo
4. Cova da Beira
5. Idanha-a-Nova
6. Matança
7. Mondego
8. Mortágua
9. Rabacinas
10. Toulica
11. Vale do Liz
12. Vermiosa
LISBOA VALE DO
TEJO
1. Alvega
2. Alvorniha
3. Carril
4. Cela
5. Leziria Vila Franca de Xira
6. Loures
7. Óbidos
8. Paul de Magos**
9. Vale do
Sorraia
ALENTEJO
1. Apartadura
2. Caia
3. Campilhas
e Alto Sado
4. Corte Brique
5. Crato
6. Divor
7. Fargela
8. Lucefécit
9. Minutos
10. Mira
11. Odivelas
12. Pardiela
13. Vale do Sado
14. Veiros
15. Vigia
16. Roxo
17. Xévora
ALGARVE
1. Aljezur
2. Almada do Ouro
3. Alvor
4. Barlavento Algarvio
5. Malhada de Péres
6. Pessegueiro
7. Pinhal
8. Silves Lagoa e Portimão
9. Sotavento
Algarvio
10. Vale Beliche
11. Vale do Loulé
NORTE
1 Burgães
2. Chaves
3. Macedo de
Cavaleiros
4. Prada
5. Vilariça
(*) Os aproveitamentos destacados são de responsabilidade do Estado. (**) O
aproveitamento Paul de Magos é administrado em conjunto com o Vale do Sorraia
Fonte: PORTUGAL (s.d.)
152
Tabela 19 Necessidades hídricas anuais do arroz em diferentes regiões produtoras de
Portugal
Região
Necessidades hídricas (m-³.ha)
Vale do Vouga
30.000
Vale do Mondego
25.000
Vale do Tejo (inclui Sorraia)
18.000
Caia
16.000
Vales do Sado e do Mira
15.000
Algarve
12.000
Fonte: Raposo (1996)
Vale do Sorraia
A Obra de Rega do Vale do Sorraia beneficia 16.351 hectares. Destes, foram
irrigados em 2007 uma área de 12.266 hectares. A cultura do arroz ocupou 4.297 hectares
com registro do volume de água fornecido e 98,2 hectares sem registro. O arroz é cultivado
principalmente nas áreas mais a jusante do perímetro, por conta das condições de solo e
clima.
A área irrigada é atendida por um sistema de dois reservatórios de acumulação
(Montargil e Maranhão) e complexa rede de distribuição que abastece as duas margens do
rio Sorraia, afluente do rio Tejo. Um outro sistema de menor porte Paul de Magos, com
397,4 hectares irrigados integra a área de atuação da Associação de Regantes e
Beneficiários do Vale do Sorraia, responsável pela operação e manutenção das estruturas.
Os consumidores de água são a agricultura e a indústria (1,9% do total do volume
fornecido em 2007). A estrutura tarifária é bem definida e registrada. Para a orizicultura, a
taxa de exploração e conservação em 207 foi de 0,0111/m³, sendo este o maior valor da
série de 1959 a 2007, atualizada a valores de 2007.
153
O sistema de distribuição conta com comportas hidromecânicas e módulos
parcelares, que garantem o controle da vazão entregue aos irrigantes. O comando é
realizado por montante, assim como o controle.
A medição dos volumes entregues aos agricultores é realizada na quase totalidade
do perímetro 97,8% dos irrigantes. Com isto, é possível acompanhar a evolução do
consumo de água médio unitário. Em 2007, este valor foi de 12.449,3 m-³.ha, valor que foi
adotado para a cobrança das áreas não controladas.
Os valores das taxas unitárias, dos consumos de água, da área irrigada e do total
pago por hectare é apresentado na Tabela 20, a seguir.
Baixo Mondego
O perímetro do vale do Mondego é abastecido por um sistema de comportas situado
dentro do rio Mondego, a jusante da cidade de Coimbra. A partir deste, um sistema de
canais domina o vale irrigável.
O perímetro apresenta uma situação distinta dos demais. Localizado ao norte de
Lisboa, entre a cidade de Coimbra e o Oceano Atlântico, atende a uma população maior de
irrigantes 2.660 agricultores, em uma área de 7.845 hectares, o que resulta em uma área
média irrigada inferior a 3 hectares (Associação de Beneficiários de Obra de Fomento
Hidroagrícola do Baixo Mondego, 2008).
O perímetro de rega equipado é menor, somando 5.332,5 hectares. Destes, 5.243,4
hectares tiveram solicitação para fornecimento de água em 2007. O total de agricultores
beneficiários em 2007 foi de 1.604, situados em 5.139 prédios, designação que engloba as
seguintes situações:
o Um lote explorado por um agricultor;
o Parte de um lote dividido entre dois ou mais agricultores;
o Vários lotes explorados por um único agricultor.
154
Tabela 20 Arrecadação de recursos no Vale do Sorraia por volume consumido e
por hectare
Ano
Volume consumido (m-³.ha)
Taxa (€.m-³)
Área irrigada (ha)
Taxa cobrada (€.ha-¹)
1959
25,789.40
0.00007
1.85
1960
28,894.50
0.00008
2.45
1961
31,333.40
0.00009
2.96
1962
29,942.00
0.00009
2.84
1963
27,769.30
0.00010
2.77
1964
26,691.40
0.00011
2.93
1965
29,090.80
0.00011
3.19
1966
26,045.90
0.00011
2.87
1967
27,303.00
0.00015
4.10
1968
25,198.60
0.00015
3.81
1969
22,233.60
0.00015
3.37
1970
24,384.80
0.00015
3.63
1971
22,673.20
0.00017
3.93
1972
23,448.80
0.00020
4.68
1973
21,432.00
0.00020
4.25
1974
21,159.30
0.00026
5.53
1975
20,218.60
0.00037
7.50
1976
11,993.00
0.00050
5.98
1977
19,848.80
0.00049
9.76
1978
17,988.60
0.00049
8.85
1979
16,905.50
0.00084
14.22
1980
19,049.70
0.00124
23.67
1981
14,996.10
0.00199
29.90
1982
17,103.50
0.00198
33.88
1983
14,003.80
0.00299
41.92
1984
15,207.60
0.00347
52.81
1985
14,428.90
0.00408
58.86
1986
15,945.90
0.00471
75.05
1987
15,259.90
0.00499
76.15
1988
14,960.10
0.00538
80.47
1989
16,191.30
0.00583
94.32
1990
17,397.70
0.00632
110.02
1991
17,277.80
0.00712
123.03
1992
15,356.20
0.00395
60.72
1993
(*)
(*)
(*)
(*)
1994
13,009.20
0.00849
110.46
1995
16,108.00
0.00898
144.63
1996
13,796.60
0.00949
4605
130.89
1997
14,531.00
0.00947
4299
137.60
1998
13,547.70
0.00948
3949
128.42
1999
14,168.40
0.00899
3641
127.31
2000
12,841.30
0.00898
3284
115.36
2001
13,115.10
0.00977
3552
128.15
2002
15,524.70
0.00973
3570
151.13
2003
12,789.00
0.00977
3791
125.00
2004
11,406.60
0.01068
3735
121.81
2005
12,765.00
0.01063
4110
135.71
2006
11,756.50
0.01061
4213
124.72
2007
12,449.30
0.01103
4630
137.26
(*) em 1993, devido à forte seca, não houve fornecimento regular de água, nem medição
dos volumes consumidos
155
Em 2007, a área média irrigada por agricultor foi igual a 4,14 hectares, a área média
por prédio, 1,02 hectares e o número de prédios por beneficiário igual a 4,06. As
explorações com área inferior a 1 (um) hectare representaram 51,2 % do total, o que
confirma uma intensa fragmentação da área irrigada.
O sistema equipado significa que a distribuição é realizada por meios de hidrantes
em rede de baixa pressão, o que dificulta muito ao controle do volume distribuído. Os
hidrantes são localizados em pequenas chaminés de equilíbrio na cabeceira dos lotes, sendo
que o nível máximo nestas chaminés é o nível estático no canal. Os registros de gaveta
atuais não permitem o cálculo do volume distribuído e a colocação de medidores de volume
significaria um investimento de €500/unidade, o que é excessivo, frente aos valores
cobrados pela água.
A distribuição de água é feita por pedido e o arroz é irrigado principalmente à noite.
Quando no mesmo setor de irrigação ocorre o plantio de milho e arroz simultaneamente,
fica impedida a rotação por canal distribuidor ou secundário.
A situação de controle neste perímetro é também distinta dos demais. Segundo o
relatório do ano de 2007, devido à falta de regulação do Canal Condutor Geral, o nível de
água junto às tomadas de água para as regadeiras tem flutuações muito acentuadas. Por
este motivo, não se pode fazer qualquer correspondência minimamente válida entre
pedido de água e caudal fornecido e não podem ser estimados os consumos de água de
rega.
O pedido total de água foi de 71,5 milhões de (...) o volume unitário de pedido
foi de aproximadamente 13.500 m³.
O arroz ocupou 1.796 hectares, sendo superado pelo milho (2971,2 hectares). O
milho ocupa os solos mais arenosos e o arroz os solos salinos e mais argilosos.
Os valores cobrados são distintos para as diferentes situações existentes, conforme
as Tabelas a seguir. O valor da irrigação para cada irrigante é definido antes do plantio, na
forma de um orçamento. A inadimplência é insignificante, sendo que em 2007 foi menor do
que 0,5% dos irrigantes.
156
Existem, ainda, duas outras situações de cobrança, definidas de acordo com a
existência ou não de facilidades e de garantia do fornecimento de água, que são:
Quinta da Foja € 2,5 /ha
Zona do Bloco de Maiorca € 26,33 /ha
Para um consumo igual ao valor médio (13.500 m-³.ha), o total a ser pago seria de
92,75 €.hapara o sistema atendido por hidrantes (Escalão 2 A) e de 47,25 /ha para os
prédios externos ao perímetro de rega (Escalão 5), que são valores muito superiores aos dos
outros escalões. No entanto, a água entregue pelos hidrantes está sob baixa pressão, mas
acima do nível do solo, sendo facilmente distribuída na lavoura e sem custos de
bombeamento.
Tabela 21 Valores da taxa de exploração e conservação aplicadas no perímetro de
rega equipado ou áreas próximas do Baixo Mondego
Escalão
Valor
Âmbito
1
50 € /ha
Prédios deixados em pousio
2 A
79 € /ha + 0,0025 €.m-³,
acima de 8.000 m-³.ha
Prédios de São Martinho e São João em que se
faça o uso de hidrantes
2 B
70 € /ha
Prédios de São Martinho e São João em que não
se faça o uso dos hidrantes
3
79 € /ha
Todos os prédios não abrangidos pelos outros
escalões
4 A
115 € /ha
Prédios ocupados com estufas, em que se faça uso
das infra-estruturas de rega fora da campanha
normal (abril a outubro)
4 B
86 € /ha
Prédios não ocupados com estufas, em que se faça
uso das infra-estruturas de rega fora da campanha
normal (abril a outubro)
5
0,035 €.m
Prédios exteriores ao perímetro de rega, com
fornecimento de água a partir da rede de São
Martinho
Fonte: Associação de beneficiários da obra de fomento hidroagrícola do baixo Mondego -
Relatório anual 2007 (*) 1 aguilhada = 4 m²
Segundo o responsável técnico pelo perímetro, não são consideradas perdas no
sistema, pois os excedentes de água nos canais e a drenagem na área de montante
abastecem o leito abandonado do rio Mondego, também gerenciado pela Associação e cujas
águas também são tarifadas.
157
O valor da água é definido previamente, pela confecção de um orçamento para a
gestão da irrigação naquele ano.
Tabela 22 Valores por unidade de área nos Campos de Pranto (€/aguilhada*)
Campo
Escalão A
Escalão B
Canal de Fora
3,46
1,15
Amieira
2,63
0,88
Paul
1,79
-
Ribeira da Telhada e
Paul do Quinto
3,02
1,00
Calçada
1,38
0,46
Velho e Marnoto
1,50
0,50
Porto de Ferro
1,60
0,53
Conde
1,97
0,66
Frade
2,05
0,68
Quinta do Seminário
1,09
-
Individuais
0,37
0,12
Fonte: Associação de Beneficiários da Obra de Fomento Hidroagrícola do Baixo Mondego
- Relatório anual 2007 (*) 1 aguilhada = 4 m²
Tabela 23 Valores cobrados por área no Vale do Arunca (€/aguilhada)
Escalão
Âmbito
(€/aguilhada)
1
Terrenos não cultivados no
período primavera-verão
0,00
2
Terrenos cultivados no
período primavera/verão,
mas sem rega
0,55
3
Terrenos cultivados no
período primavera/verão
com rega
1,62
Fonte: Associação de Beneficiários da Obra de Fomento Hidroagrícola do Baixo Mondego
- Relatório anual 2007 (*) 1 aguilhada = 4 m²
O sistema de gestão é baseado na distribuição a pedido e o fornecimento da água
para irrigação do arroz é realizada apenas à noite. No caso de canais que irriguem apenas
arroz, é possível realizar uma distribuição por rotação. Quando o mesmo canal atende
lavouras de milho e arroz, isso não é possível e é adotada uma distribuição contínua,
atendendo as lavouras de milho durante o dia e as de arroz à noite.
158
Vale do Sado
O perímetro do vale do Sado localiza-se ao sul de Lisboa, no Concelho de Alcácer
do Sal, desenvolvendo-se até o litoral. Por isso, apresenta solos salinos junto ao estuário do
Sado, em áreas que foram drenadas (sapais) para permitir a sua ocupação agrícola. O teor
de sais no solo limita a exploração destas áreas à cultura do arroz irrigado. Esta situação
contribui para uma peculiaridade do sistema: o volume de água destinado às porções de
jusante, mais próximas ao litoral e sob a influência das marés, são maiores do que as de
montante, de forma a possibilitar a lavagem dos sais. Assim, existem dois valores limites,
antes que seja aplicada uma sobretaxa ao consumo: 14.000 e 18.000 m-³.ha.
O sistema de distribuição conta com comportas hidromecânicas e módulos
parcelares, que garantem o controle da vazão entregue aos irrigantes. O comando é
realizado por montante, assim como o controle.
Existem dois reservatórios a montante e um complexo sistema de canais, que se
interligam e avançam pelas cotas mais elevadas, dominado a várzea do Sado. Atualmente, o
projeto encontra-se em fase de modernização, sendo prevista a substituição dos reguladores
que controlam a vazão entregue aos canais secundários por comportas planas operadas à
distância por um sistema autômato, com regulação proporcional e integral (PI).
As estruturas mostram sinais de desgaste pelo tempo de uso, sendo que o sistema
conta mais de 50 anos em operação ininterrupta, mas o sistema de distribuição com
controle por comportas hidromecânicas funciona dentro do esperado. O processo de
modernização é necessário para modificar a lógica de distribuição, que passará a ser por
demanda e controle por jusante.
Completam o sistema duas centrais hidrelétricas, localizadas junto aos reservatórios.
O sistema é gerenciado pela Associação de Regantes e Beneficiários do Vale do
Sado. A partir das demandas de água, é realizado um planejamento de irrigação, que vai
sendo cumprido de acordo com as solicitações dos irrigantes. No caso de uma demanda
menor do que a projetada, os excessos de água são realocados entre os demais irrigantes,
sendo este balanço realizado constantemente.
159
4.9.- Estudos sobre vertedores e orifícios como medidores de vazão em canais de
irrigação
A medição precisa da água de irrigação é de
fundamental importância para um bom manejo
da irrigação, assim como o entendimento
perfeito de alguns princípios primários
relativos a essa mensuração.
Hanna, 1913, apud ESTADOS, 1918
4.9.1.- Importância da medição de vazão
A necessidade de determinação de vazão em canais de irrigação assume cada vez
maior importância, dada as novas legislações que, em diferentes países, estabelecem a
cobrança pela água utilizada na irrigação.
A cobrança por volume efetivamente consumido exige, evidentemente, um rigor na
definição da quantidade de água entregue a cada irrigante.
Mayer (1945) coloca textualmente:
Atinge-se a máxima perfeição de funcionamento de uma rede
de distribuição quando, realizadas as demais condições, se
consegue ainda estar em circunstâncias de conhecer com
facilidade e rapidez, em qualquer ocasião, em qualquer
órgão do sistema e em qualquer seção, o caudal que passa
por essa seção. Se assim suceder, não se fica em
condições de estabelecer que o regante pague apenas a água
que recebe, como também se torna possível vigiar e avaliar
as perdas de água, descobrir derivações abusivas e, de um
modo geral, todas as irregularidades de funcionamento que
se produzam na rede. Para este efeito, é preciso instalar na
rede de distribuição aparelhos medidores, ou contadores, de
que grande número de tipos, baseados em princípios
diversos.
160
Villasante (1995) coloca que a conveniência de conhecer a quantidade de água que
se distribui e aplica nas redes de rega é evidente. Tal afirmação, por mais óbvia que
pareça, não é a realidade em muitos projetos de irrigação coletiva.
Wilson (1911) afirma que
That water flowing in open canals may be sold by
quantity it is necessary that the volume admitted to the
canal may be readily ascertained at any time, and that
the method of admission may be so regulated that it
cannot be tampered with. As no method has yet been
devised for easily and cheaply accomplishing this,
water is almost universally disposed of by some means
than by quantity.
O fato do texto acima ter sido publicado em 1911, praticamente um século, não
significa que o mesmo esteja desatualizado em grande parte dos projetos coletivos de
irrigação no Brasil.
Gurovich (2001) coloca que a determinação da vazão em canais de irrigação serve
para assegurar a manutenção dos programas de entrega de água aos irrigantes, determinar
as quantidades de água distribuída, descobrir anomalias no consumo e estimar e averiguar
as perdas que se observam na condução. A esses objetivos, deve-se agregar a satisfação das
necessidades reais e os direitos legais, assim como criar uma base lógica de estimativa para
a cobrança da água.
Ainda segundo Gurovich (2001), a distribuição eficiente deve acompanhar o grau de
precisão que vem se obtendo com o avanço do conhecimento sobre as propriedades do solo
e da planta, que definem o momento e a quantidade precisa de água a ser fornecida, com
uma máxima eficiência de irrigação e um dano mínimo ao solo.
Os pontos mais adequados para a determinação da vazão (Gurovich, 2001) são na
saída da água da barragem que alimenta o sistema, nas cabeceiras dos canais, em pontos
estratégicos e nas derivações laterais dos canais e nas tomadas de água parcelares.
161
Em sistemas com muitas saídas de água, a medição de vazão em cada ponto de
retirada de água necessitará de uma organização muito custosa, com contratação e
treinamento de pessoal para realizar a medição. O fator custo assume importância maior
nos casos onde a rentabilidade é baixa. Para estes casos, dispositivos de medição simples,
mesmo que com menor precisão, devem ser preferidos. A medição simplificada da
velocidade apresenta como inconvenientes a incerteza sobre a distribuição das velocidades
no perfil e, ainda, da alteração das características da seção.
As condições em sistemas de irrigação são muito diferentes das medições de vazão
para estudos hidrológicos ou pesquisas hidráulicas. A repetição de medições convencionais
requer treinamento e dedicação dos operadores e não previnem o mau funcionamento das
estruturas de controle.
Heras (1981) afirma que o controle das vazões circulantes pelos canais tem grande
interesse para a exploração do mesmo, já que é necessário saber a vazão na cabeça do canal
e, ao longo do mesmo, nos trechos onde variação desta vazão, seja pela existência de
tomadas de água ou por influência de obras que gerem perda de carga. Na cabeça do canal,
se as comportas são de admissão superior ao vertedor, pode-se calcular a vazão ingressante
em função da lâmina vertente; no caso mais frequente, de admissão inferior, pela elevação
das comportas, a precisão desta estimativa é menor, sendo função do nível a montante e da
abertura da comporta, sendo necessário fazer uma calibração por meio de medidas diretas.
A jusante, nos trechos do canal em que seja necessário, devem ser instalados dispositivos
de controle adequados.
O controle da vazão de cada canal secundário ou terciário em um sistema de canais
não é realizado comumente.
ESTADOS (1972) coloca que a necessidade corrente de utilizar-se toda a água
disponível, mesmo em regiões úmidas, e o aumento de custos para desenvolver novos
recursos hidráulicos torna imperativo que a água seja aproveitada economicamente e sem
desperdícios. Isto não se pode lograr se não se utilizam sistemas de medição.
O Departamento do Interior do governo norte-americano é responsável por uma
série de publicações e estudos sobre a irrigação e seu manejo. Em um dos mais antigos
destes trabalhos (ESTADOS, 1918, edição de um estudo de 1913), é definida a necessidade
162
de medir a água utilizada na irrigação de maneira adequada. Embora não seja citada a
finalidade específica desta medição, a leitura do texto cita a necessidade de uniformização
das unidades de medidas utilizadas nos estados do Oeste americano, denotando uma
preocupação com a possibilidade de comparação entre os consumos entre os irrigantes.
4.9.2.- Medidores de vazão
MEASUREMENT OF WATER.
A meter for measuring water for irrigation purposes must be cheap
and simple in construction and must cause little loss of head. No
machine has yet been invented that fulfills all these conditions. The
great difficulty is the fluctuation of the level of the water in the main
canal.
It is believed, however, that a machine can be devised to fulfill these
conditions that will give a close approximation to the quantity of
water used. When the same method of measurement is used toward
all the irrigators they will be treated on perfect equality and no one
will have good reason to complain of injustice more than another.
(Flynn, 1892)
Um medidor de vazão é um dispositivo que determina, geralmente por uma única
medida, a quantidade (peso ou volume) por unidade de tempo que passa através de uma
dada seção. Entre os medidores de vazão estão incluídos: orifícios, bocal, medidor Venturi,
rotâmetro, vertedor e medidor de vazão em massa. (Streeter, 1977).
A evolução das técnicas e dispositivos para a medição de vazão tem sido
desenvolvida de forma independente em muitas partes do mundo (Gurovich, 2001), o que
resulta em uma quantidade de desenhos e tipos, criados para fazer frente a condições locais
determinadas. A medição com exatitude pode ser obtida melhorando a calibração,
construindo estruturas que se ajustem com mais rigor às dimensões normalizadas.
Quase todos os tipos de obstáculos que restrinjam parcialmente a corrente da água
em um canal de irrigação podem ser utilizados como dispositivo de medição, sempre que
seja possível calibrá-los, desde que ocorra a alteração da velocidade do escoamento e que
seja possível conhecer as relações entre as velocidades e perdas de carga.
163
A calibração e a normalização poderiam beneficiar a economia da medição de
vazão, como se, por exemplo, se utilizasse os bueiros existentes nos canais como estruturas
medidoras.
Os ensaios de calibração podem ser muito custosos e podem exigir muito tempo;
assim, se justifica estudar um novo dispositivo quando o mesmo possa ser utilizado para
múltiplos fins. Para pequenas vazões, considerando o limite de 1 m³/s, segundo Gurovich
(2001).
De acordo com Wilson (1911), em projetos de irrigação situados na Índia a vazão
era medida com o uso de um vertedor colocado no canal, enquanto que a vazão em
aquedutos era medida com o uso de flutuadores ou vertedores triangulares. Outra
possibilidade era o uso de orifícios em caixas fechadas, com o inconveniente de haver uma
incerteza em relação à altura de carga a montante do orifício. Nenhum dos módulos
existentes na época era satisfatório para medir grandes volumes de água. Os vertedores
eram considerados pelo autor como os mais satisfatórios métodos de obter-se, de forma
acurada, o volume de água conduzido por um canal.
Os procedimentos mais empregados para determinar a vazão em sistemas de
irrigação se baseiam em estimar (1) a velocidade média em uma seção conhecida ou (2)
aplicar alguma função de vazão em função de uma variável hidráulica facilmente medida
(Villasante, 1995). Embora estes sejam os mais frequentes e objeto de um estudo mais
detalhado, existem diversas maneiras de determinar a vazão aduzida pelo sistema de canais.
Villasante apresenta as seguintes opções:
a medição do volume ou do peso da água aportada por uma corrente em um
determinado tempo, também medido, compõem os métodos volumétricos e gravimétricos,
apropriados para vazões pequenas e úteis para avaliar a aplicação de água no campo;
a estimativa da velocidade média, com o uso de traçadores ao longo de uma
distância mínima com seção constante;
uma estimativa grosseira, com o uso de flutuadores;
equipamentos com precisão de laboratório, como anemômetro a fio quente
ou aplicação do efeito Doppler e raios laser;
164
medição da velocidade em uma dada seção com o uso de molinetes,
procedimento muito comum em canais de irrigação e em estudos hidrológicos
uso de contadores totalizadores e proporcionais em uma posição adequada
dentro da corrente líquida;
uso de medidores ultra-sônicos adaptados a processos de automação de
sistemas de irrigação, embora não sejam frequentes na medição de vazão em canais;
ainda mais rara, a utilização de medidores eletromagnéticos.
Entre as opções disponíveis, os medidores com hélices, são adequados para sistemas
onde não se podem permitir perdas de altura para a medição e onde se cobra por volume,
pois realizam a totalização do volume entregue ao irrigante.
De Buffon (1861) coloca que a medição da velocidade média é muito mais viável
do que a medição do volume. Para determinar a velocidade média, o autor recomenda
flutuadores, pêndulo hidrométrico, tubo de Pitot, tacômetro de Brunings e molinete de
Woltmann. Entre os métodos de determinação da vazão, cita vertedores, um método
complicado,composto por uma eclusa e ramal lateral, definido por Prony e o módulo
milanês, considerado pelo autor como de uma exatidão bem consistente, com a grande
vantagem de não necessitar de nenhuma fórmula ou cálculo para definir a vazão derivada.
A altura da boca é constante e fixada em 0,20 m, sob uma pressão da água de 0,10
m. Com uma parte móvel, entre duas ranhuras horizontais, o orifício é regulado para
permitir a passagem da vazão exata desejada. O módulo exige uma queda de água maior do
que 0,5 metro.
Heras (1981) apresenta os seguintes mecanismos de determinação de vazão:
medidores de ressalto, baseados nos tubos de Venturi, dentre os quais a
Calha Parshall é a mais utilizada;
escalas e linígrafos.
As possibilidades de medição apresentadas para a irrigação por ESTADOS (1918)
são:
165
Vertedores, quando uma queda adequada e os volumes a serem medidos
não sejam muito grandes;
Orifícios submersos, quando não uma queda disponível, quando a vazão
for pequena e não houver o carreamento de materiais grosseiros;
Seções de medição com o uso de molinetes ou outros dispositivos similares,
quando não há queda suficiente para um vertedor e para vazões maiores.
Para o caso do uso de vertedores, o texto indica o perfil Cippoletti e o vertedor
retangular, contraído ou não, sempre em parede delgada e vertical. Nos orifícios, a seção
retangular com paredes verticais é a indicada.
Trisoldi (1967) lista as seguintes possibilidades de medição:
Tomadas hidrométricas: Orifícios livres em parede delgada; Orifícios em
parede espessa; Tubos adicionais; Orifícios submersos; e
Vertedores (Vertedor Bazin; Cipolletti; triangular; e de escala linear)
Verificação da velocidade média e da seção líquida, com o uso de
o Flutuador, Tubo de Pitot ou Molinete
o Recipientes de capacidade conhecida;
o Soluções salinas; e
o Medidores de ressalto hidráulico.
Daker (1987) apresenta as opções de medição direta por volume (para pequenas
vazões), vertedor, flutuador e molinete.
166
Figura 19 Vertedor triangular parede espessa em canal de irrigação. Fonte:
(ESTADOS, s.d.)
Outra possibilidade muito citada na bibliografia é a utilização de medidores de
regime crítico, sendo o mais conhecido o medidor ou calha Parshall. Estas estruturas
forçam o escoamento a passar pelo regime crítico por meio de uma combinação de
estreitamento e elevação do fundo do canal, seguidos de uma garganta e rebaixamento do
fundo e ampliação da abertura do canal.
O medidor Parshall apresenta muitas vantagens, entre as quais as mais destacadas
são a pequena perda de carga, uma exatidão razoável para uma faixa ampla de vazões, a
insensibilidade à variação da velocidade de aproximação e o reduzido efeito que estes
dispositivos tem sobre o transporte de sedimentos. Apresenta como inconveniente o seu
custo de implantação, pois necessitam ser realizadas em alvenaria para os canais maiores.
Além disto, em terrenos com baixa capacidade de suporte, exigem reforços estruturais.
Replogle (1992) coloca que a medição da vazão em todos os pontos de entrega da
água costuma ser impraticável, podendo a vazão ser controlada em dois ou mais canais
terciários e em pontos específicos da rede de distribuição. Dentre as possibilidades de
medição de vazão, destaca as calhas de grande desenvolvimento, por serem precisas,
facilidade e economia de construção, flexibilidade de dimensões e do formato do canal e
baixa perda de carga.
167
Israelsen (1963) lista as seguintes possibilidades para canais: orifícios, vertedores de
parede delgada, orifícios submersos, calha Parshall e molinete. Larsen (s.d.) cita as mesmas
opções e mais uma calha de seção trapezoidal. Rebour e Deloye (1971) limitam estas
opções ao vertedor triangular, ao retangular e a calha Parshall.
Uma outra possibilidade é a utilização de vertedores de parede espessa, com ou sem
contração lateral. Os estudos realizados pelo Bureau of Reclamation estão sistematizados
no programa WinFlume, desenvolvido pelo Departamento de Agricultura dos Estados
Unidos (Torres et alli, 2001) que permite o dimensionamento destas estruturas. Estes
vertedores de parede espessa ou calhas de garganta larga fazem parte da classe de
medidores de fluxo crítico, sendo adaptáveis a muitas situações que envolvem canais
artificiais ou naturais. A sua teoria de funcionamento e projeto foi descrita por Bos,
Replogle e Clemmens (Torres et alli, 2001). O fluxo crítico é obtido por uma elevação do
fundo e pela contração das parede laterais, formando uma soleira espessa, em uma extensão
que deve ser 0,1<H
montante
/comprimento soleira<1.
As vantagens destes medidores são as seguintes:
Os erros esperados são menores que 2%;
A seção da garganta pode ter qualquer formato, permitindo estabelecer uma
faixa de vazões com uma boa precisão;
A perda de carga requerida é mínima;
As calhas podem trabalhar com uma submergência parcial
A transição convergente gradual, desde que construída adequadamente, o
representa obstáculo a objetos flutuantes;
Podem ser aplicadas a canais com fluxo subcrítico e com sedimentos em
suspensão
A construção da estrutura é econômica
A instalação é adaptável a canais existentes.
Estas calhas são constituídas de um canal de acesso, uma transição convergente,
uma seção de controle, uma seção divergente (opcional) e um canal de transição a jusante
do controle. A seção de controle é a conjunção de um vertedor de parede espessa com a
168
garganta ou apenas uma destas opções, selecionada de forma a assegurar o regime crítico
nas condições informadas pelo projetista.
O canal de acesso orienta o desenvolvimento das condições de fluxo uniforme e
simétrico e o estabelecimento de uma altura de água estável que pode ser determinada com
precisão. Este canal pode ser construído em terra.
A seção convergente de transição conduz o fluxo subcrítico da entrada de forma
suave e moderada até a garganta, sem permitir a ocorrência de descontinuidades ou
separação do fluxo da estrutura.
A garganta é a seção onde ocorre o fluxo crítico. Esta seção deve ter o fundo plano.
A transição divergente é que possibilita a redução da velocidade, gerando uma
dissipação de energia. O canal a jusante da estrutura deve devolver o escoamento à
condição original. O nível a jusante é um elemento importante na concepção da estrutura,
pois pode assegurar a ocorrência do fluxo crítico sem submersão na garganta. Por fim, deve
ser considerada a colocação de um linímetro ou escala no canal de acesso, que. deve medir
a diferença entre a seção de montante e a garganta.
A figura 20. apresenta a configuração básica deste medidor.
Para garantir uma boa precisão de medida na determinação do fluxo máximo
previsto, devem ser obedecidos alguns condicionantes:
O número de Froude não deve ser superior a 0,5 na estação de medição ou
para uma distância de 30 vezes a altura de carga na seção à montante.
As condições são mais favoráveis à medição se o Froude for igual ou inferior
a 0,2, condição que pode ser alterada no caso de elevado transporte de sedimentos.
O canal a montante deve ser reto e uniforme em uma distância maior do que
30 vezes a altura de carga. Para valores inferiores a este limite mas superiores a 6 vezes a
altura de carga, a precisão é reduzida em 3%;
O programa WinFlume projeta calhas virtuais baseadas nos critérios fornecidos pelo
usuário e as avalia de acordo com critérios primários e secundários:
Critérios primários
169
a. o número de Froude a montante deve ser menor que 0.5
b. o bordo livre a montante para o fluxo máximo previsto deve atender aos
critérios do projetista, que deve saber da existência e das condições de estruturas ao longo
do trecho a ser monitorado.
c. nível de água a jusante aceitável deve ser maior do que o nível em condições
de vazão mínima; e
d. nível de água a jusante aceitável deve ser menor do que o nível em
condições de vazão máxima;
Critérios secundários
a. o projeto deve apresentar os requisitos de precisão na vazão mínima;
b. o projeto deve apresentar os requisitos de precisão na vazão máxima.
Figura 20 Configuração básica de uma calha Parshall (FAO, 1997)
Além disto, a calha deve estar afastada de qualquer estrutura que descarregue água
de forma turbulenta, como caídas, comportas e saltos hidráulicos. Se não quedas no
170
fundo da calha para compensar as perdas de carga, o nível a montante se elevará, reduzindo
a capacidade de transporte do canal, que pode passar a transbordar. Por isso, o programa
estabelece como padrão um freeboard igual a 20% da altura de carga de referência.
O nível de jusante deve ser considerado com muita atenção, que nem sempre
dependerá apenas da vazão, das características geométricas e da rugosidade das paredes e
fundo do canal, como é o caso dos canais operados por comportas transversais com efeito
de remanso. O efeito da operação destas estruturas deve ser conhecido ainda na fase de
projeto.
A deposição de sedimentos deve ser evitada, fazendo-se coincidir a curva de vazão
e profundidade na seção de controle com a curva da seção a montante.
A proteção dos taludes deve cobrir uma extensão superior a quatro vezes a
profundidade máxima no canal a jusante e não menos do que 1,5 metro.
Um dos atrativos do WinFlume é a obtenção de escalas (que podem ser impressas)
para a colocação nas paredes do canal, e que consideram a inclinação destas paredes. As
unidades de escala podem ser métricas ou de vazão, facilitando a leitura e o entendimento
do operador ou do irrigante.
Rijo (1993) descreve a concepção, a instalação e a operação de uma soleira espessa
modificada, seguindo os estudos de Bos, Clemmens e Replogle. A estrutura, instalada no
canal de Salvaterra, foi construída em madeira tratada e preenchida com sacos de areia. O
processo de concepção exigiu a definição da faixa de vazões a ser medida. De posse das
dimensões da seção de controle, é necessário determinar os valores de vazão, profundidade
crítica e profundidade de montante, o que é possível por iteração a partir da fixação de
um dos valores, normalmente a vazão. A estrutura implantada possibilitou a medição da
vazão máxima com uma sobre-elevação a montante de 0,12 m, quando o freeboard
disponível era de apenas 0,18 m. Os erros observados foram de 4,25% para a vazão mínima
e 1,44% para a vazão máxima.
Os bueiros, comumente utilizados para travessia do sistema viário pelo traçado dos
canais, também podem ser utilizados para determinar a vazão. No entanto, essa utilização é
complexa pela multiplicidade de situações que podem ocorrem nestas estruturas, podendo o
escoamento ser como um canal, orifício ou conduto forçado (Baptista et alli, 2003).
171
A figura 21 mostra as possibilidades de escoamento segundo Chow.
Figura 21 Condições hidráulicas de funcionamento de bueiros (Chow, apud
Baptista e Lara, 2003)
Existem, segundo Cardoso Neto (1997), cinco possibilidades de escoamento em um
bueiro e não seis, pois se a saída estiver submersa, todo o conduto também estará. Assim,
os tipos de escoamento são:
I Seção interna parcialmente ocupada e saída livre (casos d, e ou f da figura 21)
172
II Seção interna parcialmente ocupada e saída parcialmente submersa (caso c da
figura 21)
III Seção interna plenamente ocupada e saída completamente submersa (caso a da
figura 21)
IV Seção interna plenamente ocupada e saída parcialmente submersa (não esta
situação na figura 21)
V Seção interna plenamente ocupada e saída livre (caso b da figura 21)
Na situação (I), o escoamento será definido como canal, sendo que o
comportamento da altura da água dentro do bueiro dependerá da declividade, das perdas de
carga localizadas e da rugosidade das paredes. A subida do nível a jusante (tipo II) terá
maior influência quando esse se aproximar do nível de montante. O escoamento como canal
pode ser verificado nos regimes subcrítico, crítico e supercrítico.
No tipo III, o bueiro funcionará como conduto forçado, sendo a vazão relacionada
com a perda de carga. No tipo IV, o escoamento é instável, com o conduto cheio, mas com
saída parcialmente ou totalmente livre (tipo V, situação limite do tipo IV).
A dificuldade em adotar-se um bueiro para definição de vazão está no número de
opções de escoamento, que podem ainda incluir a formação ou não de ressalto no interior
do bueiro, o comportamento como tubo ou canal hidraulicamente curto ou longo, a
presença ou não de singularidades ao longo do canal, entre outras.
Estas dificuldades aumentam com a inclusão de comportas na entrada do bueiro ou
o efeito de remanso na saída, motivado, por exemplo, pela operação de uma comporta a
jusante
A possibilidade de cálculo da vazão em um bueiro sem comportas é:
Considerar que o fluxo no bueiro, incluindo a saída, é livre e a altura de
carga a montante regula a vazão neste caso, a vazão é determinada por montante, e o
cálculo é simples, aplicando apenas a equação dos orifícios para altura de carga sobre o
centro do orifício;
173
Considerar a profundidade de jusante, no final do bueiro, como altura crítica
para esta vazão neste caso, a altura de carga a ser considerada em relação ao orifício é a
diferença entre as alturas de montante, conhecida, e a de jusante, que é a de jusante do
bueiro corrigida pela declividade. Não haverá a formação de ressalto se a declividade for a
declividade crítica ou superior à crítica. Este cálculo, provavelmente errado, serve para
definir um limite inferior para a vazão. A relação entre os dois valores de vazão (máximo e
mínimo) a margem de erro que se está cometendo, que deve ser inferior aos 10%
pretendidos.
Considerar a altura de jusante afogando ou não o ressalto Com a equação
do ressalto e as duas profundidades, pode-se calcular o F na seção 1 e, com a profundidade
(abertura x coeficiente), calcula-se a seção 1, e estima-se o comprimento do ressalto e sua
localização. Se estiver dentro do bueiro, verifica-se a possibilidade de afogamento. Para
ressalto livre, volta-se para a situação 1; para ressalto afogado, despreza- se a perda de
carga e determina-se a vazão pela situação 2.
Para a caracterização do escoamento no ressalto utiliza-se a seguinte expressão:
181
2
1
2
1
1
2
y
y
4.50
Na qual y
1
e y
2
são as profundidades conjugadas e F
1
é o número de Froude da
seção 1.Na situação de bueiros controlados por comportas, as equações a serem utilizadas
são as do escoamento por orifícios, afogados ou livres, conforme o caso.
4.9.3. Limitantes dos medidores de vazão em canais não revestidos
A aplicação das soluções até agora apontadas para canais não revestidos também
têm inconvenientes:
174
No uso de estruturas em alvenaria, que considerar-se a capacidade de
sustentação do terreno em condições de saturação, que é a situação observada na época de
irrigação;
A estrutura será colocada no fundo do canal, sendo necessário prever um
modo de esvaziar o canal no inverno, para permitir o controle de ervas invasoras;
Podem ser afetadas pela presença ou operação de reguladores mesmo
distantes, de acordo com a declividade do fundo do canal e da rugosidade das paredes,
sendo que canais em terra normalmente conjugam as situações mais desfavoráveis destes
fatores;
A faixa de medição da estrutura é limitada, sendo que a seleção de um
arranjo depende da prévia definição de uma faixa de valores de vazão que deverão ser
medidos com um nível de precisão aceitável;
A estrutura exige uma preparação de um trecho considerável do canal, com
estruturas de convergência e divergência.
A medição de vazão com o uso de molinetes ou de ADCP tem o
inconveniente de obterem valores pontuais, além de exigirem pessoal especializado, o que
resulta em um custo elevado para obter-se uma cobertura adequada de dados.
Estes limitantes de determinação da vazão em canais de irrigação não revestidos
resultam em uma situação de baixo índice de coleta de dados de vazão em canais de terra.
Especificamente nos sistemas públicos de irrigação do Rio Grande do Sul, a medição de
vazão é realizada por medidor Parshall apenas no Distrito do Arroio Chasqueiro; os outros
sistemas utilizam a estimativa da vazão ingressante no sistema de canais pela equação das
comportas localizadas das tomadas de água. A medição de vazão não é realizada em
nenhum outro ponto dos sistemas.
Em sistemas particulares, a vazão é estimada com base no comportamento das
bombas instaladas, sendo que existem serviços de assistência cnica que utilizam
medidores de ultra-som ou eletromagnéticos nas tubulações de adução. Estas medições, no
entanto, também são pontuais e dispendiosas.
175
A maior ou menor necessidade de medição da vazão está em função do sistema de
distribuição de água empregado. A distribuição sobre demanda conta com a medição da
água como base para sua distribuição equitativa, assim como o cálculo da cobrança. Onde a
água é distribuída mediante rotação entre os agricultores ao longo de um canal de
distribuição e onde a quantidade entregue a cada agricultor pode ser diferente, a medição da
vazão pode ser realizada apenas na saída do canal.
Dentre as opções apresentadas, foram analisados, com mais detalhe, os orifícios e os
vertedores, por serem os mais adaptados aos canais não revestidos, pela recomendação de
um grande número de autores, por serem de baixo custo e facilmente implantados.
4.9.4.- Escoamento em orifícios
Os orifícios são considerados como dispositivos muito precisos na medição de
vazão. Segundo Lencastre (1996), um orifício, no sentido hidráulico, é uma abertura de
perímetro fechado de forma regular praticada na parede ou no fundo de um recipiente,
através do qual sai o líquido contido neste recipiente, mantendo-se o contorno
completamente submerso, isto é, abaixo da superfície livre.
Os orifícios são de parede delgada se o líquido toca o perímetro da abertura apenas
segundo uma linha; no caso contrário, seum orifício de parede espessa. Conti (1912)
coloca critérios simples para definir estes orifícios. Se a espessura da parede for menor do
que qualquer dimensão do orifício, este será de parede delgada; se a espessura da parede for
igual ou até três vezes maior do que a menor dimensão, será um orifício de parede espessa.
De forma geral, o valor da vazão escoada através de um orifício é obtido por
ghSQ 2
, 4.51
sendo μ um coeficiente de correção de vazão, S a seção do orifício e h a distância
vertical entre a superfície livre e o centro de gravidade do orifício.
O coeficiente de correção de vazão é afetado pela viscosidade, velocidade,
turbulência, distribuição das velocidades e a forma do orifício (Javan e Shahrokhnia, 2006).
O valor deste coeficiente de vazão é obtido a partir da determinação de outros dois
coeficientes, um de contração da seção de escoamento e outro de alteração da velocidade
do jato.
176
O coeficiente de contração, C
c
, é a relação entre a seção contraída S
c
e a seção do
orifício S (
S
S
C
c
c
). O coeficiente de contração, geralmente, é superior a 0,5.
O coeficiente de velocidade, C
v
, traduz a influência da resistência das paredes e da
viscosidade. Seu valor varia entre 0,96 e 0,99. Em um escoamento livre, a velocidade varia
entre um valor mínimo no centro, igual a 0,6.(2gh)
0,5
e um máximo, nos bordos, igual a C
v
.
(2gh)
0,5
. Essa variação é devida a distribuição de pressões, segundo a qual a pressão
máxima apresenta-se no centro do orifício, com um valor igual a 0,6γh, sendo igual à
pressão atmosférica nos bordos. Sendo δ a distância vertical entre o plano do orifício e a
seção contraída, a velocidade média pode ser obtida por
)(2
hgCV
v
. 4.52
sendo que para cargas elevadas a influência de δ é desprezível.
Quando os orifícios são considerados grandes em relação à carga, as velocidades
nos filetes do jato são muito diferentes e não se pode considerar a velocidade do filete
médio como velocidade média do jato. Essa diferença pode ser desprezada se a carga é, ao
menos, o dobro do valor da dimensão vertical do orifício.
O escoamento em comportas assemelha-se, em geral, ao escoamento através de
orifícios. Nesse caso, o valor da carga é considerado a partir do fundo do canal, e não sobre
o centro de gravidade do orifício.
Balloffet et alli (1948) apresentam uma descrição detalhada sobre o comportamento
do escoamento em orifícios submersos em canais abertos, como o caso da passagem da
água através de uma comporta colocada sobre o fundo do canal, conforme a figura 22.
A solução do problema é realizada pela análise das seções I e III, situadas,
respectivamente, na abertura da comporta e mais a jusante, após a acomodação da
velocidade do fluxo.
177
Figura 22 Orifício afogado em canal. Fonte: Balloffet et alli (1948)
Aplicando-se o teorema de Bernoulli entre estas seções se obtém:
t
J
g
v
h
g
v
ilAh
22
2
3
33
2
1
11
4.53
onde v
1
e v
3
são as velocidades médias nas duas seções do canal, α
1
e α
3
são os
coeficientes corretivos das energias de velocidade em cada uma das seções, que são, em
geral, diferentes, pois as velocidades em cada seção apresentam distribuições distintas; J
t
é
a perda de carga total que se observa entre as duas seções; A é a abertura da comporta; h
1
e
h
3
são as profundidades nas duas seções do canal; e il e é o rebaixamento do fundo do canal
devido à inclinação do mesmo. Sendo
hhilAh
31
4.54
t
J
g
v
g
v
h
22
2
1
1
2
3
3
4.55
A perda de carga J
t,
que se observa entre as duas seções, pode ser considerada como
a soma das perdas distribuídas e localizadas ao longo da distância entre elas. Pode-se
aceitar que a perda de carga total é sensivelmente igual à perda localizada pelo alargamento
brusco da seção, sendo que este valor pode ser obtido pela aplicação da fórmula de Borda:
K
g
vv
JJ
Et
2
2
3
4.56
178
sendo K é um coeficiente experimental próximo da unidade e v a velocidade teórica
na seção contraída logo após a passagem pela comporta (seção II na figura).
Assim, a perda de carga pode ser reescrita como
K
g
vv
g
v
g
v
h
222
2
3
2
1
1
2
3
3
4.57
Esta expressão pode ser reescrita da seguinte forma
g
v
g
v
hg
K
vv
22
(2
1
2
3
3
2
1
13
4.58
A velocidade real na seção contraída é menor do que esse valor teórico, inserindo-se
o coeficiente de redução de velocidade(C
v
), ligeiramente menor do que a unidade. Assim
g
v
g
v
hg
K
vCv
v
22
(2
1
2
3
3
2
1
13
4.59
Fazendo
S
S
2
, , essa equação pode ser reescrita como
g
v
g
v
hg
K
vSQ
22
(2
1
2
3
3
2
1
13
4.60
Esta expressão não pode ser resolvida diretamente, pois as velocidades nas seções 1
e 3 dependem da vazão, que é a incógnita do problema. Aplicando-se a equação da
continuidade e transformando-se algebricamente, obtém
hg
SSSS
K
Q
2
11
1
2
3
3
2
1
1
2
3
4.61
No caso de existir uma velocidade de chegada V
0
na direção do eixo do orifício, a
vazão será calculada por
179
gHS
g
V
hgSQ 2
2
2
2
0
, 4.62
sendo H a carga total a montante do orifício.
Um orifício é considerado afogado ou submerso quando o jato descarrega debaixo
d’água.
Um orifício diz-se totalmente submerso quando a água, a jusante, está em um nível
acima do bordo superior do orifício. O orifício diz-se parcialmente submerso quando a
água, a jusante, está em um nível compreendido entre os bordos superior e inferior do
orifício.
Yen et alli (2001) citam estudo de Swame (1992) que estabelece uma condição de
submersão para orifícios a partir das profundidades da água a montante e a jusante de
comportas, conforme mostrado nas figuras 23 e 24.
Figura 23 Escoamento livre sob uma comporta (Yen et alli, 2001)
180
Figura 24 Escoamento afogado sob uma comporta (Yen et alli, 2001)
De acordo com Swamme (1992, apud Yen, 2001), o escoamento será:
Livre, se
Submerso, se
No caso de orifícios totalmente submersos, a vazão é dada por:
2
2
2
1212
'
2 VVhhgVSQ
4.63
onde μ’ é o coeficiente de vazão para orifícios submersos, S é a área da seção
transversal, V
1
é a velocidade média a montante e V
2
é a velocidade média a jusante e h
1
e
h
2
as alturas de montante e jusante, respectivamente. Sendo as velocidades desprezíveis,
segundo Forchheimer, a vazão é dada pela equação:
21
'
2 hhgSQ
4.64
O valor dos coeficientes de descarga para orifícios afogados são um pouco menores
do que os correspondentes à descarga livre. Segundo Balloffet et alli (1948), Lencastre
(1996) e Forchheimer (1950), Weisbach e posteriormente Gibson, apontam para a
181
necessidade de aplicação de um coeficiente entre 0,98 e 0,986 sobre o coeficiente de vazão
para descarga livre.
Por outro lado, se as velocidades de escoamento em um canal, parcialmente
obstruído por um orifício, não são desprezíveis a montante e a jusante deste, as energias de
velocidade devem ser consideradas e a equação fica assim apresentada:
g
Vv
g
v
hz
g
V
z
222
0
2
1
2
22
2
1
1
4.65
sendo o último termo a perda de carga devida à expansão do jato.
Desenvolvendo-se e isolando-se o valor de v, obtém-se
)
22
(2
2
3
2
2
g
V
g
v
hgvSQ
4.66
sendo μ o coeficiente de vazão, que varia entre 0.50 e 0.67.
Ruiz et alli (1992), citando Cunge e Woolhaiser (1975), definem as condições de
contorno para um canal alimentado por uma comporta vertical plana:
4.67
4.68
4.69
4.70
Onde µ = b(2g/γ)¹
/
²; a é a abertura da comporta; H é o nível da água a montante da
comporta; h é o nível de jusante; b é a largura da comporta; γ é um coeficiente de perda de
carga.
Quanto à contração do jato, nem sempre é verificada a contração total. Se nem todo
o contorno do orifício apresenta-se como uma aresta viva, a contração diz-se parcial; se as
182
paredes do orifício estão muito próximas do recipiente, a contração será incompleta ou
parcialmente suprimida; por fim, se o orifício apóia-se em uma parede, a contração é
considerada como suprimida. Para cada uma destas situações, o coeficiente de contração (e,
consequentemente, o de vazão) terá um valor distinto.
O orifício é dito de contração incompleta quando a água não se aproxima livremente
do orifício em todas as direções, o que ocorre quando o mesmo não está afastado
suficientemente das paredes e do fundo. Segundo Neves (1970), para uma contração
completa, o orifício deve estar afastado ao menos três vezes a sua menor dimensão das
paredes e do fundo. Com contração incompleta, o coeficiente de contração é alterado e a
vazão aumenta. Rubio (1949) afirma que a contração é completa quando a distância dos
bordos do orifício às paredes laterais ou ao fundo são iguais ou maiores que o dobro da
mínima dimensão do orifício. Para corrigir este efeito, Rubio apresenta duas relações:
)15,01(
'
'
p
p
para orifícios retangulares; 4.71
)13,01(
'
'
p
p
para orifícios circulares. 4.72
Sendo p o perímetro total do ofício e p’ a parte deste perímetro onde não
contração e μ’ o coeficiente de vazão para orifícios com contração incompleta.
Bidone, citado por Neves (1970), apresenta uma relação um pouco diferente da
anterior, com validade para p’/p < ¾.
p
p
'
'
155,01
4.73
Lencastre (1969, página 147, citando King, 1939) apresenta valores diferentes deste
coeficiente, de acordo com o tipo de contração do orifício. Para orifícios sem contração, ou
seja, com contração totalmente suprimida, significando que as arestas do orifício
coincidem com os lados do canal, um orifício de 200 mm x 200 mm apresenta um
coeficiente de 0,95, para uma carga de 0,90 m. (ver também Brater, 1996, página 4.9).
No caso de um orifício incompleto, sem contração de fundo, Lencastre aponta para
o uso da altura de carga a montante com referência ao fundo do canal. Para a situação de
183
bordo superior arredondado e contração suprimida em baixo e nos lados, Lencastre,
referindo-se a Willians apud King (p. 600), apresenta um valor de μ=0,776.
4.9.5.- Estudo sobre vertedores
A vazão em canais pode ser medida por um vertedor, que é uma obstrução que faz
com que o fluido escoe sobre a mesma. Determina-se a vazão medindo-se a altura da
superfície da água a montante. Os vertedores são usualmente apresentados como de parede
delgada e de parede espessa.
Os construídos a partir de chapas metálicas ou outro material de tal modo que o jato
ou jorro passe livremente ao deixar a face de montante são denominados de vertedores de
soleira delgada.
A distinção entre vertedores de parede delgada e parede espessa pode ser calculada
pela seguinte expressão (Bos, 1976, apud Tuyen, 2006)
4.74
onde H é a energia a montante do vertedor e L é a largura da crista do vertedor.
Respeitando esta inequação, o vertedor é de parede espessa. Segundo Lencastre, para
valores menores de H
1
/L, as perdas de energia sobre o descarregador não são
desprezáveis; para valores maiores, a curvatura das linhas de corrente são acentuadas e não
é observada a distribuição hidrostática de pressões.
Os vertedores de soleira espessa, mantém o escoamento numa direção longitudinal.
No vertedor de soleira espessa, o escoamento do jorro é tal que a variação da pressão é
hidrostática em 2
A equação de Bernoulli pode ser aplicada entre os pontos 1 e 2, determinando a
velocidade v
2
, na altura z, desprezando a velocidade de aproximação.
)(
2
00
2
2
zyz
g
H
v
4.75
onde z é a cota da soleira do vertedor e y a espessura da veia líquida sobre a crista.
184
Figura 25 Escoamento sobre vertedores de parede espessa (King, 1957)
Segundo Lencastre (1996), um vertedor ou descarregador de soleira delgada é um
dispositivo muito preciso de determinação de vazão. Nestes dispositivos, a parte da soleira
que está em contato com a água tem dimensões muito reduzidas, com valores entre 1 e 2
mm.
Ramos (1985) indica a utilização de vertedores de parede delgada para
determinação da vazão. Como critério, indica a necessidade de que a velocidade de
escoamento no canal a montante deve ser inferior a 0,15 m/s, o que equivale a águas quase
tranquilas. Para maior precisão, a espessura da água sobre o vertedor não deve ser superior
a 1/3 de sua largura, mas não deve ser inferior a 5 cm, para não dificultar a leitura do nível
a montante. O escoamento deve ser livre, não sendo afogado pelo nível de jusante, e deve
haver um espaço vazio por debaixo da lâmina e a parede do vertedor. Uma proteção a
jusante deve ser prevista, para evitar processos erosivos.
Segundo Trisoldi (1967), o desprezo da velocidade pode ser realizado para valores
iguais ou menores que 0.2 metros por segundo. Resolvendo a soma de Bernoulli em relação
à v
2
, obtém-se:
)(2
2
yHgv
4.76
Sendo v
2
constante na seção 2, a vazão para um vertedor de largura l, normal ao
escoamento, a vazão teórica é
)(2
2
yHglylyvQ
4.77
185
Uma comporta ou outro obstáculo colocado na seção 3 da figura pode interromper o
escoamento, fazendo Q=0 e y=H, Mantendo-se H constante e permitindo um pequeno
escoamento na seção 3, com a abertura da comporta, por exemplo, a profundidade y torna-
se um pouco menor do que a carga H. Elevando-se ainda mais a abertura da comporta, a
relação vazão profundidade segue a tendência de elevação da vazão e a redução de y, até
que a vazão atinge um valor máximo. Após este ponto, qualquer elevação da abertura da
comporta a jusante não significará aumento da vazão na seção 2, pois a velocidade nesta
seção será igual a
gy
, que é exatamente a velocidade de uma onda elementar em um
líquido em repouso de profundidade y; por isso, o efeito de qualquer alteração da superfície
de jusante no sentido de elevação da abertura da comporta não pode caminhar para
montante para modificar o valor de y. Esta profundidade é denominada de profundidade
crítica. O gráfico da função da vazão em relação à profundidade é mostrado na figura a
seguir.
O valor da profundidade crítica é obtido (Streeter, 1977) por
0dydQ
para H
constante. Assim:
)(2
)2(
2
1
)(20
yHg
g
lyyHgldydQ
4.78
4.79
A passagem do escoamento pela profundidade crítica significa uma relação unívoca
entre a profundidade e a velocidade do escoamento nesta seção, permitindo a determinação
da vazão apenas com uma medida, desde que conhecido o valor da largura do canal.
Rubio (1947) apresenta o desenvolvimento da determinação da velocidade do jato
em um vertedor, conforme a figura 26.
Chamando de g
0
o centro de gravidade da parte superior da corrente líquida, situada,
portanto, entre a crista do vertedor e a superfície livre em um ponto a montante da crista e
g
1
o centro de gravidade da lâmina vertente sobre a crista; de z
0
e z
1
suas alturas referentes
ao plano da crista; z
0
’ a carga na seção de montante. Admitindo-se v
0
como nula e o regime
186
hidrostático entre a seção de montante e a crista e η a espessura da lâmina vertente. A carga
varia de h a h η, sendo η<h, já que a carga não pode ser negativa, sendo h a altura da água
desde o nível da superfície livre na seção de montante sobre a crista do vertedor. A
aplicação do teorema de Bernoulli entre as duas seções resulta
)
2
(2
2
)(
2
2
1
1
'
00
2
1
0
'
0
1
2
1
hgv
hzzz
g
v
z
zp
z
p
g
v
aa
4.80, 4.81 e 4.82
O valor de η é obtido experimentalmente e oscila entre 0,72h e h. Tomando o valor
médio de 0,86h, obtém-se
hhhhv 344,357,062,19)86,0
2
1
(62,19
1
4.83
Designando b como a largura da crista do vertedor, e considerando um valor médio
para μ = 0,62 e agregando os valores numéricos constantes em uma variável auxiliar r,
obtém-se
hbhQ
ghrbhQ
r
ghbhhghbQ
78,1
2
57,086,062,0
2403,057,0286,0
4.84, 4.85, 4.86 e 4.87
Rubio também coloca que o valor de μ para vertedores de cristas vivas varia entre
0,63 e 0,68, enquanto μ para vertedores arredondados varia entre 0,80 e 0,83, para
aplicação na equação de gasto apresentada acima.
187
Figura 26 Desenvolvimento do jato de um vertedor livre (Rubio,1947)
Se ao vertedor segue um canal, a velocidade v
1
é dada por
)(2
1
hgv
4.88
e a vazão por
)(2
hgbQ
4.89
A vazão máxima que pode ser observada é
ghbhghhbQ
hh
gb
Q
2385,0
3
2
3
2
3
2
;
2
32
2
2
4.90 e 4.91
Na maior parte dos casos, a velocidade na seção de montante (v
0
) não pode ser
desprezada e a equação de gasto tem que ser modificada para
g
v
hg
g
v
hbQ
2
2
2
2
0
2
0
4.92
de onde
2
3
2
0
2
3
2
0
2
12
2
2
g
v
ghhb
g
v
hgbQ
4.93
188
A situação da lâmina também foi estudada por Bazin (Rubio, 1947; Bauzil, 1952).
Quando a lâmina passa pelo umbral e é criado um espaço de modo que o ar circule por
baixo da mesma, sendo a pressão embaixo da lâmina é a pressão atmosférica, a lâmina é
considerada livre, sendo que o vertedor pode ser considerado como de parede delgada.
Se, pela disposição das paredes do canal a jusante não a ventilação na face
inferior da lâmina, a água apresenta contato com as paredes a montante e a jusante. O ar
torna-se rarefeito, a corrente líquida a jusante se eleva e a pressão exterior aproxima a
lâmina líquida do vertedor, ocasionando uma depressão na lâmina, que passa a ser
considerada como lâmina deprimida. O coeficiente de gasto se eleva até 1,08 vezes do
valor do coeficiente da lâmina livre.
Quando a altura de carga sobre o umbral é pequena, a corrente permanece sobre o
parâmetro de jusante e a lâmina torna-se aderida, aumentando o coeficiente de gasto em até
1,3 da situação livre.
Finalmente, quando a relação p/h está entre 0,4 e 2,5, e pela elevação do nível de
jusante, a lâmina permanece sem se separar do parâmetro de jusante, denominando-se de
lâmina submergida inferiormente, variando o coeficiente de gasto segundo a relação p/h até
1,12 do coeficiente para lâmina livre.
A lâmina submersa é menos frequente que a mina ondulada, sendo que o limite
entre as duas é dado por
11
6
1
5
1
PouHH
4.94
sendo a seção 1 a seção de jusante, após a região do turbilhonamento. H é a carga
total e P é a altura existente entre a soleira do vertedor e o fundo do canal.
Segundo Gurovich (2001), o vertedor é o dispositivo mais prático e econômico para
a medição de vazão, sempre que se disponha de altura suficiente. Os vertedores de medição
de vazão requerem uma altura relativamente grande, uma manutenção considerável do
vertedor e proteção do canal a jusante e abaixo da crista. A exatidão da medição é
razoavelmente boa. A seleção do vertedor deve considerar os seguintes fatores:
189
o A altura não deve ser inferior a 6 centímetros nem superar 60 centímetros
para a vazão prevista;
o Para vertedores retangulares ou trapezoidais, a altura não deve exceder a 1,3
vezes o valor do comprimento;
o A crista do vertedor deve situar-se a uma altura suficiente para que a água
que fluirá sobre o vertedor caia livremente, deixando um espaço de ar debaixo do jato.
Quando a formação de um jato livre, a vazão pode ser determinada apenas pela leitura
da altura de carga a montante, se as dimensões e forma do vertedor forem conhecidas
previamente;
o Se não se permite a aeração da parte inferior do jato, pode ser verificado um
aumento da vazão para a mesma altura de carga, pelo efeito de uma zona de baixa pressão a
jusante. Quando o nível da água a jusante sobe acima da cota da crista, se considera que o
jato está submergido. Isto pode ou não afetar o regime de descarga de forma mensurável,
mas nestas condições a confiança da medição diminui. Quando o nível de jusante sobre a
crista ultrapassa no mínimo 66% (2/3) da altura de carga sobre a crista, o grau de imersão
afeta apreciavelmente a vazão. Nestas condições de submersão, a vazão necessita da
determinação dos níveis a montante e a jusante. Os fluxos submergidos e não ventilados
não são convenientes para condições normais, devendo ser evitados.
Israelsen (1963) coloca que os vertedores apresentam vantagens como medidores de
vazão, pois são (i) exatos, (ii) simples de serem construídos, (iii) duráveis e (iv) não são
obstruídos por corpos flutuantes. Por outro lado, (i) necessitam de quedas grandes, com
razoável perda de carga, o que torna esta opção impraticável para terrenos nivelados, (ii)
causam a acumulação de materiais grosseiros, areia e limo a montante, o que afeta a
precisão da medição.
Parker (1913) cita inúmeras estruturas destinadas a reter sedimentos antes de seu
ingresso nos canais de distribuição, relatando o fracasso de algumas intervenções, como
vertedores instalados no fundo de canais, que resultaram em redução de velocidade do
escoamento e precipitação do material em suspensão, como mostra a figura 27.
190
Figura 27 Detritos acumulados junto à estrutura de controle em canal (Corrales
Main Canal) Fonte: ESTADOS, s.d.
As condições de implantação dos vertedores retangulares em geral são bem
definidas (ESTADOS, 1918):
A crista do vertedor e seus lados do lado de montante devem ser delgados e a
distância da crista ao fundo e dos lados às margens do canal devem ser maiores que o dobro
da profundidade da água sobre o vertedor e nunca menores que 1 pé (0,305 m).
O jato de água sobre o vertedor deve tocar apenas uma linha da crista e de
seus lados
O ar deve circular livremente sob o jato e pelos seus lados
A face de montante do vertedor deve estar na vertical
A crista do vertedor deve estar em nível em toda a sua extensão
Os lados devem ser verticais
A altura de carga sobre o vertedor deve considerar o nível da superfície livre
e ser realizada a montante do mesmo, a uma distância entre 4 e 10 pés (1,22 e 3,05 metros)
do vertedor
191
A seção transversal do canal a uma distância de 20 a 30 pés (6,1 e 9,15
metros) a montante do vertedor deve ter uma área no mínimo seis vezes maior do que a
área molhada sobre a crista.
A correção da velocidade de aproximação deve ser realizada na altura de
carga.
Um descarregador retangular sem contração lateral é designado por descarregador
Bazin (Balloffet et alli, 1948), que, devido ao grande número de observações, permite obter
boa precisão na medição dos canais. Trisoldi (1967) descreve um vertedor Bazin com sendo
uma estrutura proposta para a existência de velocidade de chegada, com um umbral delgado
e horizontal que atravessa vertical e perpendicularmente a direção da corrente. O espaço
subjacente a veia líquida que cai tem comunicação direta com a atmosfera, permitindo a
entrada de ar na face inferior do jato. A precisão desta medida pode variar entre 98 e 99%,
de acordo com Cauvin (1949).
Para assegurar uma boa precisão na determinação da vazão com o uso do vertedor
Bazin são necessários certos cuidados na sua construção:
Não deve haver contração lateral, sendo a largura da soleira descarregadora
exatamente igual à largura do canal. A contração da lâmina líquida é completa em toda a
largura do vertedor e é suprimida dos lados, uma vez que os flancos do vertedor estão
alinhados com as paredes do canal de chegada;
A altura do vertedor não pode ser muito baixa e a soleira deve ser realizada
numa lâmina delgada;
Os valores de H (carga sobre o umbral) devem estar compreendidos entre 0,1
e 0,6 metros e a altura p do umbral deve estar entre 0,2 e 2 metros.
O canal a montante deve ter um comprimento mínimo de 20 vezes o valor de
h, sendo h a distância vertical entre a superfície livre e a soleira, no qual deve possuir uma
seção constante para permitir o estabelecimento do movimento uniforme;
192
As velocidades de chegada ao descarregador devem ser uniformemente
distribuídas;
A leitura da carga deve ser feita a uma distância nunca inferior a 5h ou
mesmo 10h;
A ventilação deve ser completa, de modo a manter-se a lâmina sempre livre;
para cargas muito pequenas, a lâmina descarregadora impede a passagem do ar e a lâmina
torna-se aderente ao parâmetro de jusante do vertedor.
No caso de vertedores de seção trapezoidal, é necessário corrigir o coeficiente de
vazão. Brater et alli (1996) apresentam uma proposta de variação de acordo com a
inclinação das paredes e da altura de carga, segundo a Tabela a seguir.
Tabela 24 Variação do valor do coeficiente de descarga C para vertedores em
canais de seção trapezoidal, de acordo com a carga e com a inclinação dos taludes
Inclinação
montante
Inclinação
jusante
Carga H, cm
5
10
15
20
25
30
40
50
1:1 (h:v)
1:1
2.35
2.29
2.27
2.27
2.25
2.17
2.07
1:1
2:1
2.11
2.10
2.08
2.10
2.12
2.13
2.13
2.12
1:1
3:1
1.96
1.92
1.91
1.91
1.92
1.92
1.91
2:1
2:1
2.14
2.13
2.10
2.11
2.13
2.14
2.14
2.14
1:2
2:1
2.07
2.05
2.04
2.06
2.06
2.07
2.06
2.05
1:3
2:1
2.02
2.01
2.03
2.03
2.04
2.04
2.03
2.02
Vertical
2:1
1.97
1.92
1.94
1.96
1.98
1.98
1.98
1.97
Fonte: Brater et al. (1996)
Apesar de ser uma recomendação com cerca de um século, observa-se na
bibliografia sobre irrigação que a medição de vazões em canais com o uso de vertedores de
paredes delgadas continua sendo a mais indicada, por não necessitar de um grande
desenvolvimento no seu comprimento.
O inconveniente da proposta de utilização de vertedores em canais com escoamento
livre para a determinação da vazão é justamente a condição de não influência de jusante, o
que resulta na necessidade de uma elevação considerável do vertedor, causando, por
consequência, uma elevação do nível da água a montante, que, por sua vez, será sentida a
uma distância considerável, pois os canais em terra normalmente têm pequenas pendentes.
Por outro lado, a exigência de alturas de cargas mínimas pode reduzir a aplicação do
193
vertedor ao longo da irrigação, pois as vazões nos canais tendem a variar muito entre o
início e o final da irrigação. Outra dificuldade criada é quanto à manutenção dos canais em
terra, que seria dificultada pela presença de uma estrutura permanente. Ainda que se
considerar o efeito da queda da água na seção de jusante, o que pode causar processos
erosivos importantes em canais de terra.
A jusante de um vertedor seguido de um canal pode ser esperada a formação de um
ressalto hidráulico. Segundo Chow (1994), os ressaltos podem ser classificados de acordo
com o valor do número de Froude do fluxo que ingressa no canal, ou seja, do fluxo que sai
do vertedor:
Para F
1
= 1, o fluxo é crítico e não há a formação de ressalto;
Para 1<F
1
<1,7, a superfície da água apresenta ondulações e o ressalto é dito
ondulante;
Para 1,7<F
1
<2,5, são observados redemoinhos sobre a superfície do ressalto,
mas a superfície da água a jusante permanece uniforme, e o ressalto é considerado débil;
Para 2,5<F
1
<4,5, existe um jato oscilante que entra no ressalto desde o fundo
até a superfície, com oscilações irregulares, sendo o ressalto denominado de oscilante;
Para 4,5<F
1
<9,0, o ressalto estará mais bem balanceado e o seu
comportamento melhor caracterizado, apresentando uma dissipação de energia entre 45% e
70%. Este ressalto é chamado de estável.
Por fim, quando F
1
≥9,0, o ressalto é denominado de forte e a dissipação de
energia pode atingir até 85%.
Havendo a elevação do nível de jusante de forma a influenciar o escoamento sobre o
vertedor ou a redução da altura de carga a montante, é necessário considerar essas
influências sobre o comportamento hidráulico da estrutura.
Segundo Neves (1970) e Daker (1987), o vertedor é considerado afogado ou
incompleto quando o nível de jusante á superior ao da crista. Segundo Neves (1970), Bazin
cita que, se a crista é plana, espessa ou arredondada, não grande redução de descarga se
194
H/H
1
>0,5, pois para estas cristas um considerável abaixamento da superfície da água e
consequentemente um aumento da velocidade, mesmo antes da lâmina deixar a crista.
O escoamento observado em vertedores afogados pode ser de dois tipos:
A lâmina vertente parece escoar sobre a superfície de jusante, formando uma
série de ondas (lâmina ondulada); ou
A lâmina vertente mergulha sob a superfície de jusante, de modo que a
queda d’água afasta o líquido de jusante (lâmina submersa). A água desce ao fundo e volta
gradualmente à superfície, formando um movimento turbilhonar. Isso é observado quando a
carga é elevada.
Neves (1970) apresenta uma equação para vertedores submersos, definida a partir
dos elementos já considerados
3
3
211
2
3
2
)(2)( zzhgbzhghhbQ
4.95
com os valores para μ
1
e μ
2
situados entre 0,63 e 0,83, dependendo se contração
ou não e se o vertedor é arredondado ou em crista viva.
De acordo com Rubio (1947), Bazin apresenta a seguinte expressão para os
vertedores submersos
ghbh
h
hh
p
h
bQ 2
'
5
05,1
3
4.96
sendo h’ a diferença de cotas entre o nível a jusante e a crista do vertedor e p a
altura deste.
A descarga de um vertedor de lâmina ondulada também pode ser calculada pela
expressão de Redtembacher, supondo o escoamento dividido entre um vertedor livre, acima
do nível de jusante, e um orifício afogado, na parte inferior
1
3
2
121
(22
3
2
HHglHHglQQQ
ov
4.97
195
Bazin (apud Rubio, 1947) distingue dois casos de acordo com a influência ou não
do nível da água a jusante. Quando não há influência, o valor do coeficiente é
2
2
0075,047,0
h
p
4.98
Havendo influência, o coeficiente é expresso por
h
h
1
15,005,1
4.99
sendo h
1
o nível da água a jusante em relação à crista do vertedor.
Escribá Bonafé (1988) coloca que se o nível de jusante ultrapassar certo patamar,
relacionado com a altura do vertedor e com a profundidade crítica, uma estrutura colocada
no fundo do canal deixa de ser um vertedor e passa a se comportar como um obstáculo de
fundo. Neste caso, o comportamento hidráulico pode ser de um vertedor afogado ou de um
estreitamento do canal. Embora estas soluções possam ser analisadas numericamente,
percebe-se na prática que as diferenças entre o nível de montante, sobre a crista e o nível de
jusante reduzem-se consideravelmente, induzindo a erros de leitura.
O autor apresenta uma tabela de valores máximos a serem observados, que foi
transformada em um sistema de equações, que permitiram definir o valor máximo de vazão
para que a estrutura trabalhasse como vertedor.
4.9.6.-Vertedores de paredes curtas
Entre estes os vertedores de parede delgada e os de parede espessa, Lencastre
(1996) apresenta, por uma questão se sistematização, uma classificação adicional, a qual
denomina descarregadores de soleira curta. Estas estruturas são as que, não apresentando
uma soleira em aresta viva, não são suficientemente espessas para que se estabeleça sobre
elas o paralelismo das linhas de corrente, com a consequente distribuição hidrostática das
pressões.
Entre estes descarregadores, estão os de perfil circular. Chanson e Montes (1998)
afirmam que o uso de vertedores de formato cilíndrico era comum no século XIX e no
196
começo do século XX, antes do desenvolvimento de vertedores na forma de ogiva, como o
de perfil Creager. Bazin realizou uma série de investigações sobre essa possibilidade, sendo
seguido por Rehbock (em 1929), Fawer (em 1937) e Sarginson (em 1972).
Segundo Lencastre (1996), para um perfil curvo genérico somente o estudo de um
modelo reduzido permitirá fixar o coeficiente de vazão. Desta forma, o uso de tubulações
com seção circular definida tem esta vantagem adicional.
A situação de escoamento em canais e a posição da tubulação podem levar ao
afogamento do vertedor. Em uma situação desta, o coeficiente de vazão muda, sendo
inferior ao coeficiente observado no escoamento livre. Lencastre (1969, pg. 186) aponta
para estudos do U.S. Bureau of Reclamation para a determinação da redução do coeficiente
em vertedores de soleira normal. Não referências a vertedores de seção circular O
comportamento do escoamento pode ser dividido em quatro tipos, mostrados na figura 28.
Os tipos de afogamento são os seguintes:
Tipo I a diminuição do coeficiente de vazão não é causada pela submersão,
mas sim somente pela posição do leito a jusante;
Tipo II o coeficiente de vazão será alterado subindo o leito a jusante ou
reduzindo a relação entre a profundidade e a carga (
H
y
),
Tipo III continuando a diminuir o grau de afogamento (
H
y
) , embora
a lâmina quida continue a seguir o parâmetro de jusante do vertedor, a profundidade da
água a jusante é tal que o ressalto toma características de ondulado, salvo para valores de α,
sendo
H
hy
, muito pequenos; e
Tipo IV zona inferior do gfico para valores ainda menores de β,
aparece o escoamento nitidamente afogado. O afogamento é muito instável, exceto para
valores muito pequenos de α. É nesta zona que a diminuição do coeficiente de vazão é mais
acentuada.
197
Figura 28 Alteração no coeficiente de vazão de acordo com o afogamento do
vertedor (Lencastre, 1996)
A utilização da figura apresentada acima para cálculos pode gerar muitas
imprecisões nas faixas dos tipos III e IV, que são as que mais devem observadas em canais
reais de irrigação não revestidos, pois as situações I e II implicam em maiores velocidades
e, portanto, maior risco de erosão. Em canais com baixas velocidades e maiores alturas do
escoamento, os níveis de montante e jusante devem se aproximar, reduzindo o valor de y e,
consequentemente, o valor de β. Da mesma forma, não sendo previstos degraus ou elevação
do fundo, o valor de α nestas situações será próximo da unidade. Nesta situação, a
dificuldade de inferir os valores entre duas curvas do gráfico.
198
O trabalho de Bauzil (1952) apresenta um estudo sobre a variação do valor do
coeficiente de descarga C para situações de afogamento na forma de uma curva de
correção, com variação entre 2,16 e 2,21, para utilização na equação
2
3
2
2
g
V
HCLQ
. 4.100
O escoamento sobre um cilindro pode gerar um escoamento com lâmina aderida, o
que leva a um aumento do coeficiente de descarga entre 15 e 20% (Chanson e Montes,
1998). O processo de formação da lâmina aderida é uma forma do efeito Coanda, causado
pela curvatura convexa, que induz uma pressão de sucção sobre a parede do cilindro. A
lâmina continuará aderida no quadrante inferior do lado de jusante da seção circular do
vertedor, separando-se do mesmo junto ao fundo do canal por efeito da presença do leito do
canal ou das estruturas de suporte do cilindro.
O coeficiente de descarga de um vertedor cilíndrico em função da carga total sobre
a soleira (H) e o seu raio de curvatura desta, foi determinado por alguns autores, entre eles:
Chanson e Montes (1998), considerando duas situações distintas a montante:
; para escoamentos parcialmente desenvolvidos e valores de
0,45<H/R<1,9 4.101
; para escoamentos plenamente desenvolvidos e valores de
0,45<H/R<1,9 4.102
Fawer (1937) (apud Lencastre, 1996):
2
010.0085.0385.0
R
H
R
H
4.103
De acordo com Chanson e Montes (1998), a espessura da lâmina vertente (η) sobre
o cilindro é menor do que a profundidade crítica, porque a curvatura da superfície implica
em um gradiente de pressões menor do que uma distribuição hidrostática e a distribuição de
velocidades do escoamento sobre a crista é rapidamente variável.
199
Os autores concluem que a relação entre a espessura da lâmina vertente sobre a
geratriz superior do cilindro e a profundidade crítica para a mesma vazão é, em média,
0,85, podendo esta relação ser estimada pela fórmula, válida para 0,02<H/R<2,63 e
0,042<R<0,117 m.:
4.104
A perda de carga em um vertedor circular pode ser estimada por:
4.105
Fazendo o valor de H variar em função do diâmetro de tubulação de acordo com a
expressão de Fawer, (4.103), percebe-se que a função apresenta um valor de máximo, onde
o coeficiente vale 0,5656 e a altura de carga é 2,125 vezes o valor do diâmetro.
4.9.7.- Combinação de vertedor e orifício
A evolução do estudo da localização das tubulações em relação ao fundo do canal
levou a elevação destes, formando duas estruturas complementares: um orifício com
contração apenas na parte superior e um vertedor de parede curta, definido pela geratriz
superior da tubulação, considerando que este se encontra na horizontal.
Esta estrutura apresentaria, para vazões pequenas, o escoamento em orifícios até o
limite apresentado pela geratriz inferior do tubo; um escoamento em orifício até que o nível
a montante atingisse o valor da geratriz superior; e um escoamento misto, a partir deste
ponto, dividido entre o vertedor na parte superior e o orifício na parte inferior.
A vantagem desta concepção é a passagem livre do escoamento pelo orifício, não
acarretando a deposição de sedimentos a montante, o que afetaria o comportamento da
estrutura. De acordo com a concepção, esta estrutura também tem a vantagem de ser
removível, permitindo uma manutenção mecanizada do canal. Outra possibilidade seria a
troca de diâmetro das tubulações, de acordo com a faixa de vazão a ser medida.
A figura 29 a seguir apresenta o comportamento desta equação.
200
Figura 29 Alteração do coeficiente de vazão de acordo com Fawer
Samani e Mazaheri colocam que o uso de vertedores e comportas combinados
podem minimizar problemas de sedimentação e deposição. Afirmam, ainda, que poucos
estudos sobre esta combinação foram realizados antes de 1985.
As questões que se colocam, a partir desta concepção, podem ser assim resumidas:
Qual a perda de carga deste arranjo, ou, dito de outra forma, qual é a
elevação do nível a montante da estrutura para possibilitar a passagem da vazão desejada?
Qual o diâmetro mínimo que a tubulação tem que ter para permitir a
determinação da vazão com uma precisão aceitável?
Qual é a distância mínima da tubulação a partir do fundo do canal?
Qual é a distância máxima?
Qual é a velocidade de saída da água desta estrutura?
Qual é a influência do nível de jusante?
O estudo de estruturas semelhantes foi realizado por Negm (2002 a,b), tanto para
vertedores de parede espessa como de parede delgada. O autor encontra relações entre
dimensões facilmente calculáveis ou mensuráveis do problema e a estimativa de vazão
201
total, com correlações que atingem valores superiores a 0,9 e erros menores que 15%. Os
melhores resultados são obtidos pela construção de redes neurais artificiais.
Segundo Negm, a vazão total pode ser obtida pela soma das vazões parciais do
vertedor e do orifício (ou comporta), que podem funcionar livremente ou afogados.
De forma geral, o autor indica a seguinte expressão:
4.106
Onde d é a abertura do orifício (ou comporta), b é a largura do vertedor, b
1
é a
largura do orifício, A
0
e A
1
são coeficientes de regressão que dependem da razão b
1
/b.
De acordo com Negm, o fluxo contínuo pode ser estimado por:
)(22
3
2
1
5,1
ddgeedw
hHgdbChgbCFQ
4.107
Onde F é um fator de ajuste, obtido por interação, h
e
é a carga efetiva sobre o
vertedor, C
dw
é o coeficiente de descarga do vertedor, b
e
é a largura efetiva do vertedor, C
dg
é o coeficiente de vazão do orifício, b
1
é a largura do orifício, H é a profundidade a
montante do orifício e h
d
é a profundidade a jusante do orifício.
Combinando as equações de Fawer ou de Chanson e Montes com as equações de
Negm, obtiveram-se as seguintes expressões alternativas:
ddgee
hHgdbChgbFQ (22)0,0260(H/R - )0,0221(H/R+1
1
5,12
4.108
ou
)(22)1,1268(H/R
1
5,10,1811
ddgee
hHgdbChgbFQ
4.109
O trabalho de Ferro (2000) apresenta outra abordagem para a solução do problema,
com base no π teorema de análise dimensional de Buckingham. A partir da definição de
profundidades críticas para o escoamento comportando-se como orifício, apenas como
vertedor e a máxima altura que a água pode atingir no lado de montante sem escoar pelo
vertedor, o autor define relações entre a abertura do orifício, a altura de montante, a posição
202
da crista do vertedor, o comprimento da crista e a vazão, corrigidos por coeficientes
multiplicadores e de potência. Considerando-se que todos os outros elementos podem ser
obtidos, a vazão e os coeficientes são as incógnitas a serem encontradas.
As relações apresentadas por Ferro (2000) são:
; 4.110
; 4.111
4.112
4.113
Onde H é a profundidade da água a montante, z é a abertura do orifício, K
b
é a
profundidade crítica para o funcionamento apenas do orifício, K
s
é a profundidade crítica
para o funcionamento apenas do vertedor, h é a altura de carga sobre a crista do vertedor, p
é a distância da crista do vertedor ao fundo do canal, g é a aceleração da gravidade, Q
b Max
é a vazão máxima para que o escoamento ocorra apenas pelo orifício, K
*
é a profundidade
crítica para a vazão total menos a Q
bmáx
e as letras a, b, c, n, q e i representam os
coeficientes de ajuste.
A solução proposta por Ferro negligencia o efeito da viscosidade e da submergência
na relação entre altura de carga e vazão. A viscosidade é desconsiderada, pois o seu efeito é
muito pequeno para valores do número de Reynolds maiores do que 10
4
.
203
5. METODOLOGIA
Na apresentação da metodologia, retomam-se os objetivos pretendidos, de forma a
relacionar as pesquisas realizadas com a finalidade do estudo.
O objetivo geral é a avaliação da possibilidade de alteração na gestão da água em
canais de irrigação não revestidos a partir do princípio usuário-pagador, considerando-se a
cobrança por volume efetivamente consumido.
Somam-se a este os objetivos secundários de comparação entre os perímetros
irrigados gaúchos e portugueses analisados, a proposição de uma estrutura de medição e a
análise de valores referenciais para a cobrança de água na lavoura de arroz. O foco da
análise foi centrado na irrigação das lavouras de arroz, pela sua importância em termos de
área cultivada e de consumo unitário de água. O campo de análise refere-se a sistemas
coletivos de irrigação, mais complexos quanto à operação do que as lavouras individuais,
mas com maior número de dados registrados.
O objetivo principal pode ser atingido a partir da análise da situação atual da
gestão de irrigação em canais não revestidos. Para realizar esta avaliação, foi considerado o
sistema do arroio Chasqueiro como estudo de caso. Sobre este sistema, foram levantadas as
informações sobre operação das estruturas de controle durante a safra 2008/2009, com
registros dos próprios operadores. Além disto, as estruturas foram avaliadas quanto ao seu
comportamento hidráulico, gerando informações sobre vazão e volume consumido.
Quanto ao princípio usuário pagador, os estudos iniciaram ainda em 2006, quando
foram estudadas formas de definir os valores de água para irrigação da lavoura de arroz.
Esta necessidade foi originada pela ação de extensão que se desenvolvia na bacia do rio
Gravataí junto ao projeto de assentamento do INCRA no município de Viamão. A situação
da bacia, após duas safras seguidas sob condições severas de seca, indicava a necessidade
de reorganização dos usos de água, sendo que a adoção de instrumentos econômicos
deveria ser analisada. Outra parte do estudo sobre o princípio usuário-pagador foi
desenvolvido na bacia do rio Quaraí, no âmbito do projeto TwinLatin. Nesse caso, foi
abordado o efeito da eliminação de áreas de arroz na economia regional.
Por fim, foram realizadas outras determinações sobre a tarifa da água em Portugal e
no sistema de irrigação do arroio Chasqueiro.
204
A comparação entre os projetos de irrigação foi realizada a partir dos dados
levantados nas entrevistas e na leitura dos relatórios fornecidos pelos gestores.
A proposição de uma estrutura de medição que possa ser aplicada em canais não
revestidos sem os inconvenientes apresentados pelas alternativas disponíveis foi analisada
com base em estruturas instaladas em laboratório e em campo, tanto em Portugal como no
Chasqueiro. No caso do Chasqueiro, foi analisado o uso de estruturas existentes no
sistema de canais. A estrutura alternativa proposta foi analisada apenas em canais
revestidos, dada a necessidade de um preciso registro da vazão circulante para a obtenção
dos parâmetros necessários.
Assim, a metodologia aplicada neste estudo foi dividida em dois grandes itens: a
referente aos aspectos econômicos e de gestão; e a correspondente aos temas hidráulicos.
5.1.- Princípio usuário-pagador
A cobrança pela água ainda não é praticada no Rio Grande do Sul, mesmo que
prevista na legislação gaúcha sobre o sistema estadual de recursos hídricos (Lei 10.350, de
31 de dezembro de 1994) seja anterior à legislação federal. A inexistência das agências de
região hidrográfica, a inexistência de planos de investimentos consolidados, a falta de
definições dos valores a serem cobrados por parte dos Comitês de Gerenciamento e a
inexistência de comitês de gerenciamento em algumas bacias inviabilizam ou justificam
essa situação. No caso das bacias dos rios Santa Maria, Quarai e Gravataí, que já
apresentam comitês instalados, os valores considerados para a cobrança são baixos, mas
não são insignificantes, pois os irrigantes sabem do conflito pelo uso da água com outros
setores e com outros irrigantes e estariam dispostos a pagar pela água, desde que houvesse
uma garantia desta possibilidade de uso.
Para a bacia do Gravataí, que apresenta uma atividade econômica mais diversificada
do que as demais e um contingente populacional maior, pode-se esperar a elevação do custo
de oportunidade para a irrigação, considerando-se o frequente quadro de escassez hídrica na
época de irrigação. Para as demais bacias, com baixa diversidade industrial e contingente
populacional não tão expressivo, o custo de oportunidade tende a reduzir-se rapidamente, se
atendido o volume necessário para abastecimento público e diluição de esgotos.
205
Para as três bacias, no entanto, se considerada a externalidade da concentração de
efluentes junto às cidades, ocasionada pela redução da vazão nos rios, o custo de
oportunidade para a irrigação apresentará outro comportamento.
Na bacia do Quarai, UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
(2008) mostra que os custos de tratamento dos efluentes junto às cidades de Quaraí e
Artigas seriam da ordem de US$ 1462/tonelada de DBO, para uma redução de 95% de
contaminação. A produção de DBO/dia é da ordem de 2,3 toneladas, o que significa um
custo de tratamento igual a US$ 3.573/dia. A vazão necessária para diluição dos esgotos até
a classe 3 seria de 1.54 m³/s, que é igual ao consumo de hipotéticos 1.025 hectares de arroz
a montante destas cidades. A partir de definição de um valor a ser cobrado aos irrigantes
por hectare cultivado, definiu-se que o valor a ser arrecadado nesta área seria de US$
276,75/dia, no período de irrigação. Assim, verifica-se que a disposição a pagar dos
irrigantes estaria em um valor aquém do necessário para a diluição de esgotos, cujo valor
alternativo de tratamento é muito mais elevado do que o custo da diluição.
Na questão econômica e de gestão, a metodologia básica foi a realização de
entrevistas estruturadas, para a obtenção da Disposição a Pagar (DAP). Aplicou-se o
mesmo questionário utilizado nas pesquisas realizadas nas bacias dos rios Gravataí
(Stampe, 2007) e Quaraí (UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL,
2008), considerando-se os pontos positivos obtidos nestes estudos. A realização destes
estudos durante a elaboração da presente tese foi possível pela aceitação da proposta de
trabalho desenvolvido por Stampe (2007) pelo Programa de Pós-Graduação em Economia
da UFRGS, no caso da bacia do rio Gravataí, e pela coordenação de economia do Projeto
TwinLatin, no caso da bacia do Quaraí.
A base metodológica desses trabalhos foi a de Oweiss, Sheed e Gabr (s.d.), que
desenvolveram três modelos para estimar a demanda por água: Modelo de Insumos Fixos,
Modelo de Insumos Variáveis e o Modelo de Satisfação. Esses modelos foram ajustados
pelo Método dos Mínimos Quadrados. Basicamente, a diferença entre esses modelos -se
pelas variáveis que são escolhidas como explicativas. Para a validação dos modelos são
recomendadas três medidas de eficiência, as quais servem de suporte para a escolha do
206
modelo mais adequado: Erro Absoluto Médio (MAE), Raiz do Erro Quadrático Médio
(RMSE) e Erro Percentual Absoluto Médio (MAPE). (Stampe, 2007)
No Modelo de Insumos Fixos existe uma restrição quanto à quantidade de água
disponível, que é fixa em um determinado período e deve ser alocada entre produtos
competitivos. No Modelo de Insumos Variáveis, a demanda por água é obtida pela derivada
parcial da função de lucros restrita em relação ao preço da água. Por fim, no Modelo de
Satisfação parte-se do pressuposto que a quantidade de terra utilizada determina a
quantidade de água utilizada, considerando-se todos os preços variáveis e desconsiderando-
se à restrição quanto à disponibilidade da água.
No estudo desenvolvido por Stampe (2007) na bacia do rio Gravataí, buscou-se uma
função para o preço da água que não dependesse da quantidade de água utilizada e vice-
versa, ou seja, a quantidade de água utilizada não dependesse do preço da água. A oferta da
água foi considerada como fixa, ou seja, totalmente inelástica em relação ao seu preço.
Também considerou-se que mudanças na demanda não teriam influência o preço da água.
A elasticidade foi obtida com a transformando-se a equação de demanda para um modelo
Log-linear. A partir da curva de demanda, pode-se obter uma estimativa para o preço para
uma dada quantidade demandada. Esta quantidade também pode ser obtida por meio da
curva de demanda estimada e da obtenção de seus parâmetros por métodos estatísticos.
Também é possível encontrar-se um valor de preço médio ao considerar-se a média da
quantidade demandada. O valor da água na bacia obtido pelo método da elasticidade,
conforme indicado anteriormente, situa-se entre 1,76 e 2,52 sacos/hectare.
Na bacia também foi aplicado o Método de Valoração à Contingente (MVC), no
qual o valor do recurso ambiental é obtido diretamente da Disponibilidade a Pagar (DAP)
ou Disposição a Aceitar (DAA) um valor fixado por alguém ou alguma instituição
competente para tal. De acordo com Stampe (2007), o método sugerido por Ciriacy-
Wantrup (1947) consiste em entrevistar pessoas e descobrir o valor monetário que elas
atribuem ao bem, perguntando aos indivíduos quanto eles estão dispostos a pagar por
quantidades adicionais sucessivas de um bem coletivo que não se encontra no mercado. Se
cada indivíduo de um determinado grupo social for interrogado, todos os valores
individuais (e não quantidades) serão agregados. Isso corresponderia a um plano de
207
demanda. Portanto, o Método de Valoração à Contingente (MVC) consiste na criação de
mercados hipotéticos a partir de uma pesquisa de campo para estimar valores de DAP ou
DAA. A pesquisa de campo é realizada por meio de questionários, os quais buscam
espelhar o mundo real, de forma que as respostas indiquem o verdadeiro valor que o
indivíduo estaria disposto a pagar (ou receber) pelo bem em questão caso existisse um
mercado real para o mesmo.
No caso da bacia do Gravataí, o “mercado” ainda não existe, mas a cobrança pelo
uso da água é uma realidade premente, considerando-se o avanço da implantação do
sistema de gerenciamento de recursos hídricos no Rio Grande do Sul.
O MVC incorpora a aleatoriedade no processo de maximização de utilidade e pode
ser obtido a partir de diversas técnicas. No caso do estudo da bacia do rio Gravataí,
primeira experiência desenvolvida neste caso, foram adotadas as técnicas Open-Ended e do
Referendo, sendo a primeira uma forma direta e o segundo um forma indireta de obter-se o
valor para o bem analisado.
Com a aplicação do método do Open-ended perguntou-se diretamente qual o valor
máximo que a pessoa está disposta a pagar pelo uso da água, da seguinte maneira:
Sabendo que voatualmente paga apenas pelo serviço de distribuição de água, e
que já existe uma lei estadual (LE 10.350/94) e uma lei federal (LF 9433/97) que permitem
o estabelecimento da cobrança pelo uso da água, se você tiver certeza que essa lei será
implementada, qual o valor máximo que você está disposto a pagar por utilizar a água na
agricultura?
No caso do referendo, o entrevistado é confrontado com um valor fixado pelo
entrevistador, respondendo se, após uma reflexão sobre o valor anteriormente perguntado,
aceitaria pagar o valor sugerido. O método do Referendo estima uma função de
probabilidade para a DAP ou DAA com o uso do Sistema de Escolha Probabilístico (PCS),
que utiliza modelos econométricos de escolha probabilística. O valor proposto foi de um
centavo por metro cúbico (o que equivale a aproximadamente sete sacas/hectare). Pode-se
perceber que o início da pergunta é igual ao método Open-ended, uma vez que inicialmente
é feita apenas uma caracterização da situação, o que muda é a pergunta em si:
208
“Sabendo que você atualmente paga apenas pelo serviço de distribuição de água, e
que existe uma lei estadual (LE 10.350/94) e uma lei federal (9433/97) que permitem o
estabelecimento da cobrança pelo uso da água, se você tiver certeza que essa lei será
implementada, você estaria disposto a pagar um centavo de reais por metro cúbico por
utilizar a água na agricultura?”
O valor utilizado para questionamento sobre a DAP foi o apresentado por Magna
(1996) no estudo da bacia do rio dos Sinos, na qual a agricultura irrigada não é a base da
economia da região e há problemas de quantidade e qualidade para o abastecimento público
e industrial nas maiores cidades da bacia, que estão localizadas no trecho final. Neste caso,
o valor da água tende a ser mais elevado.
Os valores sugeridos foram, no momento da entrevista, transformados em sacos de
arroz por hectare, por ser a unidade tradicional de negociação e valoração da lavoura.
Na bacia do rio Gravataí, foram entrevistados 27 produtores de arroz em dois
municípios da bacia, Viamão e Santo Antônio da Patrulha, buscando diferentes condições
de abastecimento, tamanho de propriedade e solos. O valor obtido como referencial para o
preço da água foi de 2,56 sacos por hectare.
Na bacia do Quaraí, o mesmo questionário foi aplicado, mas em uma situação
distinta. Os produtores de arroz entrevistados estavam em uma oficina sobre gestão de
recursos hídricos com dois dias de duração, o que talvez explique o valor um pouco mais
elevado para a DAP, que é de 2,7 sacos por hectare. Ao contrário do estudo do Gravataí, o
valor estabelecido a partir dos dados coletados foi reapresentado aos irrigantes para sua
validação, sendo posteriormente utilizado para a análise de efeitos.
A aplicação do Método dos Efeitos na análise da bacia do rio Quaraí buscou
entender a relação entre um reordenamento do uso da água a partir da aplicação de critérios
de gestão em uma situação onde não o controle efetivo deste uso. A utilização deste
método exigiu a formação de cenários futuros estimativos, o que foi possível a partir da
inserção dos pressupostos da legislação brasileira sobre gestão de recursos hídricos. Com
isto, pode-se determinar o efeito na economia a partir da perda de áreas de arroz na bacia,
para possibilitar o uso da água em outras atividades agrícolas (eucalipto) ou humanas
(diluição de esgotos domésticos).
209
Embora esses estudos tenham sido realizados dentro do plano da pesquisa e visando
a obtenção do objetivo principal, entendeu-se que deveriam ser utilizados apenas os
resultados principais dos mesmos, por já terem sido publicados.
Estas informações foram completadas com entrevistas realizadas no Chasqueiro e
em três perímetros irrigados em Portugal, que foram comparadas com as levantadas na
revisão bibliográfica.
No caso da entrevista aplicada no Sistema de Irrigação do Arroio Chasqueiro,
considerando-se as especificidades da bacia e do Comitê correspondente, foram analisadas
as opções de valores referenciais existentes para a lavoura de arroz no Rio Grande do Sul,
que são os obtidos nos estudos das seguintes bacias: do Quaraí; e do Gravataí, com valores
mais elevados e em bacias com maiores limitações; do Pardo-Pardinho (Alvim e Carraro,
2006); e do Santa Maria (Forgiarini et alli, 2007 ) que foi o referencial adotado durante a
entrevista.
No caso da irrigação em Portugal, o mesmo questionário desenvolvido por Stampe
(2007) foi aplicado junto aos projetos de irrigação selecionados. O valor referencial para o
questionário foi o definido na portaria do Instituto Nacional de Águas, ou seja, os gestores e
irrigantes foram inquiridos sobre um valor que teria sido estipulado pelo órgão responsável
para ser aplicado no ano agrícola seguinte, embora o mesmo não tivesse sido oficializado
até a data das entrevistas. As entrevistas foram registradas e eventuais discrepâncias foram
retomadas com os entrevistados em outras ocasiões.
Quanto à gestão, o processo de operação dos sistemas coletivos portugueses e do
Chasqueiro foi definido com base nas entrevistas com o gestor e acompanhamento a campo
dos canaleiros e cantoneiros, observando a sua prática e questionando a sua lógica de
manobras frente às situações possíveis.
5.2. Medidores de vazão em canais de irrigação
Para os estudos hidráulicos sobre medidores de vazão em canais de irrigação foram
utilizados protótipos de laboratório e estruturas reais.
210
Em laboratório, os estudos foram realizados inicialmente no Laboratório de Ensino
do IPH, sendo repetidos no Laboratório de Hidráulica da Universidade de Évora e
complementados no Laboratório de Estruturas Hidráulicas do IPH.
5.2.1 Ensaios realizados no IPH e no Sistema de Irrigação do Arroio Chasqueiro
Na primeira fase, foram adotadas tubulações comerciais de PVC apoiadas no fundo
do canal do IPH. O canal tem seção retangular, revestimento em cimento alisado de ótima
qualidade e inclinação de fundo igual a 0,002 m/m. A vazão é determinada na admissão do
sistema, com o uso de um vertedor retangular de parede delgada. O fornecimento de água é
garantido por um reservatório de nível constante e a vazão é regulada por uma válvula
gaveta.
Uma série de experimentos foi realizada para verificar a validade das equações
pesquisadas, a definição dos erros cometidos e sua relação com a vazão. Foram utilizados
dois tubos, de 100 e 150 mm de diâmetro externo. A fixação dos tubos no canal foi
realizada pela simples colocação de pesos metálicos no seu interior.
Verificadas as condições de funcionamento, foi instalado um vertedor apoiado no
fundo de um canal não revestido no sistema do arroio Chasqueiro. A seleção deste local foi
realizada pelo gestor do sistema, considerando-se as condições ótimas para o
estabelecimento de um regime uniforme (trecho retilíneo de características constantes),
baixas velocidades e facilidade de acesso para medição. Neste caso específico, o canal era
alimentado por uma instalação de recalque que recuperava água do sistema de drenagem.
Esta instalação poderia ser utilizada para complementar a vazão necessária no sistema de
canais, no caso de ocorrência de um período de estiagem significativo. Por outro lado, uma
lavoura situada no início do canal poderia também ser alimentada a partir do sistema de
canais; nesse caso, a direção do escoamento seria invertida, o que não seria um problema
para essa estrutura.
Para a construção do vertedor foram utilizados tubos de esgoto de concreto, com
diâmetro externo de 0,5 m. Uma sapata de concreto magro foi implantada no fundo do
canal, sendo os tubos assentados diretamente sobre ela. As paredes do canal, de seção
trapezoidal, foram recobertas em um trecho de 10 metros de cada lado com uma tela
211
metálica flexível (tela de galinheiro), fixada nos taludes com estacas de madeira. Sobre esta
tela foi aplicada uma camada de concreto, revestindo apenas essa seção de medição para
possibilitar a colocação de réguas apoiadas. O custo do material desta estrutura foi de R$
1.200,00, para um vertedor de 5 metros de crista.
A figura 30 mostra a estrutura implantada e observa-se que o nível da água é
superior na parte superior da fotografia, que corresponde à alimentação do trecho do canal a
partir do sistema principal. O trecho inferior é o atendido a partir da estrutura de recalque,
que não operou na safra na qual foram tomadas as informações utilizadas.
Considerando-se previamente a possibilidade de não operação deste sistema, foram
estudadas as possibilidades de medição de vazão a partir das estruturas existentes. Foram
utilizados os bueiros e as comportas transversais existentes nos canais principais.
Foram selecionados sete pontos de controle de vazão nos canais de distribuição, de
acordo com a experiência do gestor do sistema, que está no cargo há 12 anos:
Estrutura de controle 2 do canal C 2.1
Estrutura de controle 4 do canal C 2.1
Canal C1, bueiro 6 (dois bueiros independentes)
Canal C1, bueiro 12
Canal C2, bueiro 4
Canal C2, bueiro 8
Canal C2, bueiro 10 (dois bueiros independentes)
Cada uma destas estruturas foi levantada com topografia de campo, sendo medidas
as cotas de montante e de jusante, comprimento, diâmetro do bueiro, altura da comporta,
abertura mínima e máxima da comporta.
212
Figura 30 Vertedor construído com tubos de concreto em canal do sistema de
irrigação do arroio Chasqueiro
Foram instaladas réguas linimétricas nas paredes de montante e de jusante, sendo o
referencial o ponto mais baixo do bueiro. Assim, o zero da régua de montante refere-se à
geratriz inferior do bueiro a montante, enquanto que o zero do bueiro de jusante está
amarrado à geratriz inferior do bueiro de jusante. A instalação de guas é mostrada na
figura 31.
213
Figura 31 Colocação de réguas de medição na seção de jusante de uma estrutura
de controle
Com o auxílio dos canaleiros, foi determinada a forma de abertura das comportas,
ficando consolidado o critério de operações de módulo igual a 1,0 (um) centímetro, que
era adotado pelos operadores. Este valor é determinado pela medida da rosca do parafuso
sem fim que fica exposta acima do volante, com o uso de uma trena metálica simples. O
operador gira o volante até que esta medida seja um valor inteiro, considerando a unidade
de medida.
Uma comporta típica deste sistema é apresentada na figura 32.
214
Figura 32 Estrutura de controle do sistema de irrigação do arroio Chasqueiro,
mostrando o volante e o parafuso sem fim. A comporta da esquerda mostra um vertedor
tulipa acoplado, responsável pela segurança do canal.
Os canaleiros foram orientados a medir os níveis de montante e jusante e a abertura
da comporta em todas as operações realizadas. O dia e a hora de cada operação também
foram registrados, sendo um controle para cada estrutura.
Um esquema gráfico, apresentado na figura 33, foi fornecido para controlar a saída
do bueiro, que poderia estar com um nível menor do que a metade, parcialmente cheio ou
cheio, representando o escoamento como canal, uma situação próxima ao limite, indicando
a possibilidade de formação de ressalto no interior do bueiro, ou como conduto forçado. A
cada operação, o canaleiro assinalava a figura que melhor representava a situação de
jusante.
215
ESTRUTUR
A
Área em
irrigação
Data
hora
minuto
Leitura
Abertura
comporta
Situação boca jusante
montante
Jusante
Figura 33 Ficha de coleta de informações sobre a operação de cada estrutura do
Sistema de Irrigação do Arroio Chasqueiro
Essa informação foi coletada como um controle da coleta do dado de jusante e
também para confirmar a condição de escoamento calculada a partir das informações e do
coeficiente de rugosidade adotado.
Pelos dados coletados, foi caracterizado o escoamento no bueiro, que poderia ser
livre ou afogado; canal ou orifício; torrencial ou fluvial; controlado por montante ou por
jusante.
Para cada situação, foi adotada uma formulação distinta e definida a vazão.
Foram realizadas duas campanhas de medição de vazões, com o uso de molinetes
hidrométricos, sendo uma na safra 2007/2008 e outra na safra 2008/2009, e o levantamento
topográfico dos pontos de medição, o que permitiu a aferição e a conferência das equações
e a definição de elementos geométricos dos canais.
Com a vazão e o tempo, foram definidos os volumes que passaram em cada
estrutura ao longo da safra. Com a vazão e a área irrigada dia a dia, foram calculadas as
vazões específicas médias na safra 2008/2009, ou seja, as relações entre a vazão
determinada na estrutura em um determinado dia e a área que estava sendo atendida por
esta água.
216
5.2.2 Ensaios realizados na Universidade de Évora
Durante o estágio em Portugal, os ensaios de laboratório foram retomados,
considerando-se a possibilidade de refinamento dos parâmetros encontrados de escoamento
sobre os tubos, a análise de novas equações obtidas em novas referências bibliográficas,
como a de Fawer, e a simulação em outras condições de ensaios, especialmente as
possibilitadas pelo uso do canal controlado do NUHCC.
Ensaios em laboratório
Nos ensaios realizados no Laboratório de Hidráulica da Universidade de Évora foi
inicialmente utilizado o canal fornecido pela empresa Armfield, apresentado na figura 34.
Este é composto de um trecho retilíneo de 7,2 m, com paredes paralelas em vidro,
inclinação regulável, câmara de amortecimento na entrada e dissipação de energia na saída.
uma comporta de fundo que permite elevar o nível da água a jusante. Os acessórios que
acompanham este canal e de interesse do experimento são um vertedor triangular, de parede
delgada, um vertedor de parede espessa e um perfil Creager. As opções de medição de
vazão passam pelo uso destes acessórios, sendo que, após simulações, foi adotado o
vertedor de parede espessa localizado no final do canal. Desta forma, obteve-se um trecho
com menor influência da estrutura de medição. No caso do laboratório da Universidade de
Évora, para implementar o vertedor proposto foram utilizadas tubulações metálicas, com
diâmetros externos de 75, 90 e 110 mm, visando verificar a influência dos diâmetros no
comportamento das equações selecionadas.
A vazão do sistema é mantida por um sistema de bombeamento que faz a água
circular em um circuito fechado, composto ainda por quatro reservatórios inferiores
interligados. O comportamento do sistema de bombeamento foi monitorado por um
manômetro diferencial colocado em dois pontos da tubulação de adução, sendo as leituras
de vazão com o uso dos vertedores e dos níveis da água no canal a montante e a jusante do
tubo ensaiado realizadas após confirmação da manutenção da perda de carga nessa
tubulação, verificada pela estabilidade da leitura do manômetro. No entanto, entende-se que
pequenas variações de vazão devem ser consideradas como fontes de erro neste sistema.
217
Figura 34 Canal do Laboratório de Hidráulica da Universidade de Évora
O acionamento do canal com vazões mais elevadas gerava ondas que influenciavam
as leituras de nível, principalmente nos primeiros metros do canal. O amortecimento destas
ondas foi realizado com a implantação de um dissipador de energia montado com o uso de
canudos plásticos, confinados em uma estrutura prismática que ocupou toda a largura do
canal e com uma altura superior à altura referente à vazão máxima permitida pelo sistema
de bombeamento. Este amortecedor é apresentado na figura 35
Uma ponta linimétrica móvel, que podia ser deslocada sobre trilhos paralelos ao
fundo do canal, possibilitou a determinação das alturas a montante, sobre a crista, a jusante
do tubo, a montante e sobre a crista do vertedor de parede espessa. Estes trilhos também
podem ser observados na figura 35.
218
Figura 35 Sistema de amortecimento de ondas na entrada do canal
Com a alteração da gica de posicionamento do tubo, com a formação de um
orifício e um vertedor, cada um dos três tubos recebeu uma porca soldada, à qual era
inserido um fuso metálico construído nas oficinas da Universidade. A outra ponta deste
fuso era conectada com uma luva que tinha roscas invertidas nas duas extremidades. Na
extremidade inferior, um outro fuso, de extremidade cilíndrica e sem rosca era inserido. A
extremidade lisa era colocada em um orifício existente no próprio canal. Assim, o giro da
luva permitia a elevação ou o abaixamento do tubo, sem a necessidade de retirá-lo do canal,
facilitando a colocação do tubo em diversas alturas e sem a necessidade de fixá-lo contra as
paredes de vidro.. A figura 36 apresenta o tubo apoiado sobre o fuso, verificando-se
também a posição da luva.
219
Figura 36 Estrutura de ensaio com tubo de diâmetro de 75 mm e haste de elevação
ensaio com uso de solução de permanganato de potássio
O estudo das linhas de fluxo sob e sobre o tubo exigiu o uso de corantes para definir
visualmente a distribuição da água entre o orifício e o vertedor, como forma de confirmar
uma das hipóteses de cálculo (Akerman e Martín, 2005), que considerava uma igualdade
entre as velocidades de escoamento. Uma ponta metálica oca foi adaptada à sonda de
Prandtl, pela qual foi injetada, inicialmente, uma solução de permanganato de potássio.
Depois, optou-se por tinta preta para caneta tinteiro, que permitiu um melhor contraste para
a obtenção de imagens.
Ensaios no canal externo
Os ensaios no canal do NUHCC foram realizados após a recuperação desta
instalação e reajuste de todos os sensores eletrônicos, responsáveis pela leitura dos níveis
220
da água em diversos pontos dos canais e dos reservatórios, bem como de calibração do
programa de controle de vazão e níveis, que utiliza o software SCADA.
Figura 37 Vista geral do canal do NUHCC Canal superior, canal inferior,
comportas planas, tomadas de água e caixa de sensores de nível.
O sistema de canais do NUHCC apresenta dois reservatórios (inferior e superior) e
dois canais (superior e inferior). O canal superior é controlado por três comportas planas,
junto às quais existem três tomadas de água. Ao final do canal superior, uma over shot
gate. As tomadas de água e a saída da over shot gate são direcionadas para o canal inferior,
que possui uma comporta hidromecânica AMIL e um vertedor tipo bico de pato, que
controlam o nível de água sobre dois conjuntos de módulos de vazão. Do canal inferior e
dos módulos de vazão, a água retorna para o reservatório inferior. A vazão no sistema do
NUHCC é controlada por uma válvula MONOVAR e sua medição é realizada por um
medidor ultra-sônico. Há o controle dos níveis dos reservatórios inferior e superior e da
221
rotação de uma das duas bombas que fazem a ligação entre os dois reservatórios. A partir
da definição do nível do reservatório superior, o sistema de gerenciamento controla a
abertura da válvula MONOVAR, permitindo a manutenção de uma vazão constante. A
segunda bomba não possui controle de rotação, sendo ligada e desligada de acordo com a
necessidade de elevação do nível no reservatório superior. O funcionamento de todas as
estruturas e o controle do nível em todos os pontos do sistema é controlado pelo SCADA.
O canal superior, que apresenta uma declividade de 0,0015 m/m, 0,15 m de base e
inclinação das paredes igual a 1V:0,15 H. (Rijo, 2003). O outro, no canal de retorno, com
base de 0,23 m e inclinação das paredes de 1V:1,428H, conforme apresentado pelas figuras
38 e 39.
Para estes ensaios, foram colocados tubos nos canais trapezoidais superior e
inferior, mostrados na figura 37. Foram utilizados tubos plásticos de dois diâmetros
distintos, 110 e 200 mm. A fixação destes foi realizada por meio de colocação de pesos no
interior dos tubos. As extremidades dos tubos foram cortadas com a mesma inclinação dos
taludes, de forma a obter-se o melhor ajuste possível e considerando-se que os mesmos não
poderiam danificar as paredes dos canais.
Definidas as posições dos tubos, foram coladas escalas às paredes do canal para
determinação das alturas de montante, jusante e sobre a crista para a série de vazões
ensaiadas, cujas leituras foram corrigidas pela inclinação dos taludes para a definição das
alturas de montante e jusante. Para o trecho superior, as velocidades são maiores, pois a
seção é propositalmente pequena, permitindo a medição com uma variação maior das
alturas. As figuras 38 e 39 mostram os tubos nos canais inferior e superior,
respectivamente.
222
Figura 38 Tubo e escalas de medição colocados no canal trapezoidal inferior do
NUHCC
Foi necessário eliminar a formação das ondas a montante da tubulação colocada no
canal inferior, que apresentava uma oscilação excessiva por conta da passagem do
escoamento pela comporta over shot gate. Para isto, foram utilizadas grades metálicas e
telhas cerâmicas, que permitiram a tranquilização do escoamento, como mostra a figura 40.
Estabilizada a vazão, foram realizadas as respectivas leituras dos níveis de montante e
jusante e sobre a crista do vertedor.
A partir dos dados coletados, a análise dos resultados foi realizada a partir da
comparação dos valores medidos com os estimados pelas diversas equações utilizadas. Para
cada valor coletado, foi determinado o erro em relação ao valor medido, definindo-se qual a
melhor equação e quais os melhores fatores de ajuste encontrados.
223
Figura 39 Tubo e escala colocados no canal trapezoidal superior do NUHCC
Figura 40 Amortecimento das ondas provocadas pela over shot gate
224
6. RESULTADOS E DISCUSSÃO
6.1. Sobre a aplicação do Princípio Usuário-Pagador
Durante o estágio realizado junto à Universidade de Évora, foram contatados os
gestores de três perímetros irrigados públicos onde o arroz é a principal cultura irrigada. Os
perímetros visitados foram o do Vale do Sado e do Vale do Sorraia e mais o distrito do rio
Mondego, sendo o primeiro ao norte e os outros dois ao sul de Lisboa. Os gestores e
representantes dos irrigantes foram entrevistados para a obtenção das informações
necessárias para correlacionar o comportamento dos irrigantes gaúchos com o dos
portugueses.
Os valores obtidos pelos métodos de Valoração Contingente e Elasticidade Preço-
demanda nas entrevistas na bacia hidrográfica do rio Gravataí permitem definir os
patamares possíveis da taxa pelo uso da água para irrigação no Rio Grande do Sul e em
bacias com conflitos quali-quantitativos, e podem ser testados em outras bacias em situação
semelhante.
Para análise da Disposição a Pagar, foi utilizado o valor referencial estabelecido
pelo projeto do governo português para a implementação efetiva da Lei 58/05, de 29 de
dezembro de 2005 (Rijo, 2007). A proposta, de março de 2007, regulamenta o artigo de
lei, que determina o Regime Econômico e Financeiro e a Taxa de Recursos Hídricos
(TRH), calculada como:
TRH = A + E + I + O + U
Sendo:
A utilização de águas do domínio público hídrico do Estado
E descarga de efluentes
I extração de inertes
O ocupação do domínio público do Estado
U utilização de águas sujeitas a planejamento e gestão públicas
Para os perímetros públicos de irrigação, as parcelas a serem cobradas são a A e a
U.
225
No caso do Vale do Sorraia, a parcela A seria de €0,003/m³ e a parcela U igual a
€0,0006/m³. A parcela A é majorada pela aplicação de um coeficiente de escassez hídrica,
que varia de 1 a 1,2, sendo a porção sul de Portugal a mais seca e com o maior valor para
este coeficiente. Para os Vales do Sorraia e do Sado, este valor é de 1,1; para o Baixo
Mondego, o coeficiente é igual a 1.
Estes valores ainda devem considerar a eficiência do transporte e da distribuição,
uma vez que a cobrança será sobre a água armazenada. O valor considerado como média
foi 60%, considerando-se os históricos dos projetos.
O calculo final da TRH fica apresentado da seguinte maneira:
TRH = (€ 0,003 x 1,1 + € 0,0006) / 0,6= € 0,0065/m³
Em relação aos valores pagos até 2007, referentes apenas à TEC Taxa de
Exploração e Conservação, esta nova taxa significaria um acréscimo de cerca de 60% no
custo da água.
A mudança de paradigma sobre a cobrança pela água só ocorrerá de fato e de forma
eficaz se induzir a economia deste recurso, o que pode ocorrer se a unidade de
arrecadação for o volume consumido. Em Portugal, observa-se a preocupação do irrigante
em utilizar a menor quantidade de água possível nos sistemas do Sorraia e do Sado, que são
cobrados por volume, não ocorrendo o mesmo no vale do Mondego, onde a cobrança
por área. No sistema do arroio Chasqueiro, a determinação da vazão aponta para consumos
unitários diferentes entre os trechos do mesmo canal, mas, como a cobrança é por área, não
iniciativas dos irrigantes em aumentar a sua eficiência no uso da água. As perdas no
sistema não são determinadas pelos gestores do Mondego e do Chasqueiro, sendo que as
lavouras ao longo do sistema de canais terminam por receber volumes de água acima do
necessário.
No entanto, cobrar por volume exige medição de vazão e totalização das
informações, de maneira ágil, segura, econômica e confiável. Assim, de posse dos valores
de vazão, a proposta mais racional seria implementar a cobrança pelo volume total ou pelo
volume médio entregue aos irrigantes do trecho regulado.
226
Em canais de irrigação não revestidos e com baixas declividades, as opções de
medição de vazão são poucas e, quando não são caras, são pouco exatas. Uma possibilidade
a ser discutida é a possibilidade de aproveitar estruturas existentes, como bueiros, para a
determinação da vazão conduzida pelo sistema de canais. A adoção de sensores de pressão
também é uma possibilidade, mas a sua confiabilidade quanto a funcionamento nas
condições de campo, assim como a comunicação com uma estrutura de gestão centralizada
e o armazenamento dos dados, são fatores que se demonstraram críticos em condições
reais.
As entrevistas realizadas são apresentadas a seguir.
o Entrevista com o produtor e Engenheiro José Nunes Vale do Sorraia
Além da gerência técnica do perímetro, o Engenheiro José Nunes é o responsável
por uma área irrigada de 115 hectares, sendo 90 hectares com arroz e 25 hectares com
milho.
O volume anual faturado pela Associação dos Regantes e Beneficiários do Vale do
Sorraia é da ordem de 103hm³, sendo que o volume útil armazenado varia entre 130 e
140hm³, com perdas de 20hm³ por evaporação direta do lago.
Os lotes não irrigados pagam uma taxa de pousio de €10/hectare. O custo de pessoal
corresponde a 80% do valor faturado, restando pouco para recuperação ou modernização do
perímetro, sendo que a obra de Paul de Magos é da década de 40.
O custo de produção do arroz é de €1.300,00 por hectare, enquanto que a receita
bruta é igual a €1.500,00 por hectare. Esta margem é ampliada com a percepção de
subsídios da Comunidade Econômica Européia que situavam-se, em março de 2008, em
cerca de € 600,00 por hectare, mas de forma variável entre os agricultores. Para receber este
subsídio, o produtor enfrenta uma burocracia significativa e é submetido a um rígido
controle. A limitação da aplicação de nitrogênio na adubação de base e em cobertura, o uso
de sementes certificadas, o período de preparo do solo fora da estação mais chuvosa e a
obediência a normas agroambientais são alguns dos controles realizados. O consumo de
água situou-se próximo a 14.000 m³/vem, com um custo unitário de € 0,0111/m³ e um valor
227
total de 150/vem. A aplicação do método de valoração contingente revelou uma
disposição a pagar inicial de €10/hectare ou €0,0007/m³. A partir da apresentação do valor
proposto pela Lei 58/2005, o produtor se dispôs a pagar 0,0036/m³ líquidos ou
0,0065/m³ pela água armazenada nos reservatórios ou € 91/hectare.
Quanto à aplicação da nova determinação legal, o Engenheiro comentou que há uma
forte indisposição a pagar, pois os valores arrecadados seriam inicialmente destinados à
instalação da organização necessária e não para a gestão e o controle efetivo dos recursos
hídricos. Também colocou que a federação nacional dos irrigantes (FENAREG Federação
Nacional de Regantes de Portugal) não foi consultada antes da emissão final da lei, mesmo
sendo um dos setores mais interessados no tema. A avaliação da FENAREG (do qual o
entrevistado é um dos diretores) é que a cobrança terá impactos positivos, mas a atual
condução do órgão responsável (INAG Instituto Nacional de Águas) visa apenas ao valor
arrecadado, e não à preservação do meio ambiente, implantando um sistema de gestão
muito centralizado. Mas salienta que a cobrança deve mesmo ser implantada, pois na
Espanha a previsão é que em 2010 já esteja sendo aplicada uma taxa de irrigação e a França
cobra €10/hectare irrigado. Por uma questão de competição por mercados, coloca que o
ano de 2010 também deveria ser adotado por Portugal e não 2009 (como previsto na
época).
O Engenheiro também analisa a situação do mercado do arroz e de outros cereais.
Entre 2005 e 2006, os preços dos cereais estavam baixos, sendo que houve uma elevação
por conta do avanço dos bio-combustíveis. Assim, nos anos de 2007 e 2008, os preços dos
produtos subiram, mas acompanhados pela elevação do preço dos insumos.
O preço de proteção do arroz na Comunidade Econômica Européia é de 0,25/kg,
sendo que este preço iniciou uma queda três anos, acompanhando o valor internacional
de €150/tonelada. um regulador comunitário da política agrícola, que é a OCM
Organização de Comando do Mercado. Esta organização define o preço de referência e os
subsídios comunitários. Em 2001 e 2002, houve um auxílio para a lavoura de arroz de
€200/hectare mais €280/tonelada colhida. Em 2004 e 2005, este subsídio foi de
€1.000/hectare mais €150/tonelada colhida. Com a reforma de Política Agrícola Comum
(PAC), esta ajuda atualmente é de 450/hectare e mais €550/hectare pelo histórico dos
228
subsídios anteriores, mas apenas para os agricultores que tinham recebido este auxílio.
Atualmente, o subsídio incentiva a produção de 25.000 hectares de arroz em Portugal, com
um subsídio básico de €450/hectare.
o Entrevista com o Sr. Antonio Ferreira Lima Baixo Mondego
O Sr. Antonio Lima é o administrador da propriedade denominada Quinta de Foja,
sendo responsável pelo plantio de 160 hectares de arroz. Os custos de produção foram
apresentados em planilhas atualizadas. Questionado sobre a decisão de plantio de arroz,
responde que as condições da terra impõem este cultivo, que esta decisão não depende do
valor de venda do produto e que o consumo de água não depende do preço, mas de
recomendações cnicas. Perguntado sobre a disposição a pagar, o administrador revela
uma posição interessante, na qual inclui os subsídios recebidos. Para cada hectare de arroz
na safra de 2006, o custo calculado para o plantio do solo realizado a seco era igual a €988
e com plantio realizado com lama de €981. Em termos de receita, a venda do produto
(produtividade de 6.300 kg/ha) gerou 1323, com uma margem de 342/ha ou 34,4% de
rentabilidade média entre os dois sistemas de preparo do solo, sem contar o custo da água,
que foi apenas de 2,50/ha. No entanto, a propriedade recebeu os seguintes subsídios para
cada hectare cultivado: Regime de pagamento único (€ 396,80), Agroambientais (€ 505,80)
e Prêmio específico (€ 438,78), com um total de €1341,38, ou 136% do custo de produção
ou 101% do valor da produção. Considerando a margem de produção e os subsídios
somados (€ 1680), estes representam 80% do ganho recebido pela lavoura. Por isso, o
administrador não problemas em pagar o previsto no projeto do governo de Portugal,
que seria um valor de €0,0036/m³ (ou €43,2/ha, para um consumo estimado de 12.000 m-
³.ha), mesmo que isso representasse uma redução de cerca de 13 % de sua margem de
produção. Na comparação com a lavoura de milho, a importância dos subsídios na lavoura
de arroz fica ainda mais evidente. Cada hectare de milho recebeu €490, devido a
compensações agroambientais, o que somado a margem de produção resultou em um ganho
de cerca de €700/hectare, para uma produtividade de 11500 kg/hectare, cifra elevada para
os padrões correntes.
229
o Entrevista com o Sr. Mateus Rosa Vale do Sado
O Sr. Mateus Rosa é o presidente da Associação dos Regantes e Beneficiários do
Vale do Sado. A sua entrevista foi realizada em duas etapas, por inconsistência em algumas
respostas, que se demonstraram importantes na formulação do contexto.
Este produtor cultivou 36,16 hectares com arroz em 2007, com uma rentabilidade
média de 6.200 kg/hectare. O arroz foi vendido a um valor de €310/tonelada. Na área de
plantio de arroz, não outra opção de cultivo, pelo teor de sais no solo. O consumo da
água foi igual a 15.500 m-³.ha, sendo pagos €0,015/m³, mais €34 por hectare. Sobre a
disposição a pagar, inicialmente o produtor citou um valor de €0,005/m³, mas aceitou o
valor proposto de €0,0065/m³.
Questionado sobre a lucratividade do arroz, na primeira entrevista o produtor
afirmou que a lavoura não lhe dava nenhum retorno líquido e que sua renda pessoal era
oriunda de proventos de aposentadoria, do cargo de gerente de uma instituição financeira.
Ele disse ainda não saber do custo exato da lavoura. Isso seria incoerente com o esperado
para uma atividade produtiva (e com a antiga profissão do entrevistado), sendo que o
produtor estaria disposto a transferir todo o seu excedente para a sociedade.
Em um segundo contato, o produtor, sendo confrontado com os dados de suas
respostas, revelou uma lucratividade líquida entre 8% e 15%. Além disto, recebia uma
grande soma de subsídios por hectare cultivado e colhido, que deixariam de ser pagos caso
ele abandonasse a atividade agrícola. Entende, ainda, que se a cobrança pela água for
realmente implementada, haverá a criação de um novo subsidio, de valor idêntico ou
próximo ao da taxa, de tal forma que não onere o produtor. O Sr. Mateus revelou ainda que
a lavoura de arroz estava saindo da pauta de subsídios da Comunidade Econômica Européia
e que a recente elevação do mercado internacional de grãos, motivada pela possibilidade de
fabricação de etanol combustível a partir do milho, fez com que fosse mantido um subsidio
correspondente a uma área de 25.000 hectares de arroz em Portugal.
o Entrevista com o Eng. José Núncio Vale do Sado
O engenheiro José Núncio é o responsável técnico pela operação do sistema de
irrigação do Vale do Sado. Segundo ele, o nível de perda do sistema é de 21%, do total
armazenado, considerando-se a água que se encontra nos reservatórios e as efetivamente
230
distribuídas, sendo que este valor mantém aproximadamente constante ao longo dos
últimos anos. Estas perdas são distribuídas no rateio dos custos de operação e manutenção,
sendo consideradas nos cálculos de todas as taxas. Os volumes excedentes são
redistribuídos entre os usuários desde a década de 50. Cada usuário recebe a informação do
volume consumido a cada 15 dias. O valor referencial é normalmente suficiente para a
irrigação da lavoura, não sendo normal o pagamento de sobretaxa por um consumo
excessivo. Não inadimplência no perímetro. Os irrigantes são predominantemente
pequenos (50% do total), que possuem menos de 40 hectares; os médios, com áreas entre
40 e 100 hectares, ocupam 25% do perímetro; os grandes, com áreas maiores que 100
hectares, são responsáveis pelos 25% restantes.
A cobrança da Lei das Águas irá significar um acréscimo de 46% no valor da água.
O engenheiro espera uma pequena redução de área, principalmente entre os pequenos
produtores, que neste extrato a ocorrência de subsídios é menor, pelas dificuldades
burocráticas e administrativas em obter e manter estes benefícios. A maior economia
deverá ser observada entre os irrigantes mais velhos, que têm o maior consumo. Não é
esperada uma mudança significativa na programação dos cultivos ou plano de irrigação (ou
seja, não deve ser observada uma troca de cultivos de acordo com o princípio da
elasticidade-renda). A existência de subsídios afeta diretamente o comportamento dos
irrigantes. Perguntado se a Associação assumiria alguma parcela do custo oriundo da
aplicação da Lei, o engenheiro descartou esta possibilidade, colocando que a FENAREG
Federação Nacional dos Regantes estava questionando a aplicação da referida lei,
principalmente por não ter sido consultada a respeito dos valores e da forma de cobrança,
que incluirá os volumes de perda no armazenamento.
o Joaquim Carriconde Filho, Distrito de Irrigação do Arroio Chasqueiro
O Eng. Joaquim Carriconde é o gestor do Distrito de Irrigação do Arroio
Chasqueiro 12 anos, sendo também produtor rural. A gestão do sistema de irrigação é
realizada pela abertura e fechamento de comportas transversais e pela abertura da comporta
que regula a vazão afluente da barragem.
A entrevista realizada com o engenheiro Joaquim Carriconde revela três pontos
importantes:
231
Os irrigantes aceitariam o pagamento por volume, desde que confiassem na
forma de medição e houvesse a combinação prévia quanto a isto;
Se o pagamento for por volume, os irrigantes terão ainda mais cuidados na
gestão da água. Neste caso, haverá uma demanda para fechamento de todas as tomadas de
água no caso de ocorrência de chuva, o que exigiria uma ação muito eficaz por parte dos
canaleiros. Se esta ação não ocorrer, o volume de reclamações irá aumentar;
Os irrigantes pagariam para a sociedade pelo uso da água se fossem
obrigados a isso. O valor referido pelo estudo da bacia do rio Santa Maria, de 0,5% do
custo de produção, seria aplicável.
Então, definida a forma de medir e aferida a sua precisão, uma cobrança da taxa de
distribuição de água pode ser implantada a partir do próximo ano (safra 2009/2010),
enquanto que a cobrança pelo uso da água dependerá do início de operação efetiva do
sistema de recursos hídricos, tanto federal como estadual.
6.2. Sobre a medição de vazão
A partir dos dados de níveis, informações geométricas e abertura da comporta,
foram calculadas as vazões que passaram em cada estrutura controlada no sistema de
irrigação do arroio Chasqueiro
Cada estrutura apresenta uma série de valores própria, pois nem todas são operadas
com a mesma frequência, embora sejam examinadas praticamente todos os dias. Os valores
obtidos mostram que os canaleiros do sistema de irrigação do arroio Chasqueiro tendem a
manter um mesmo nível a montante da estrutura de controle. Para as estruturas principais,
foram calculadas as vazões totais, as vazões específicas e, depois, os valores de vazão
específica sobre vazão específica média e da altura de montante sobre a altura média de
montante, obtendo-se valores normalizados.
Os resultados da operação das estruturas também foram analisados preliminarmente
com o gestor do sistema, que os considerou coerentes e de acordo com a sua expectativa.
As figuras 41 e 42 apresentam os valores absolutos da vazão específica e do nível a
montante das estruturas denominadas de Controle 2 e Controle 4 do Canal C 2.1.
232
Figura 41 Valores de vazão específica e nível a montante da estrutura de controle
2 do Canal C 2.1
Figura 42 Valores de vazão específica e nível a montante da estrutura de controle
4 do Canal C 2.1
233
Observa-se, na figura 43, a permanência do nível de montante no valor próximo do
valor médio, com variação praticamente restrita ao valor mínimo de 90% do valor médio e
no máximo 110% deste mesmo referencial. Em termos absolutos, apenas duas leituras
ficaram fora deste intervalo, ou 3,03% das leituras, o que demonstra a pouca variabilidade
do valor medido. O comportamento da vazão específica, no entanto, é muito irregular. Isso
mostra que a variável de regulação é mesmo o nível e, neste caso, a operação é muito
eficiente, pois mantém o nível com uma variabilidade entre +10% e -10%.
Já a vazão altera-se com uma amplitude muito maior. O uso da comporta obstruindo
o bueiro permitiria um cálculo estimativo da vazão, mas não é essa a prática dos operadores
ou do gestor do sistema. Mais da metade (53,03%) das medidas ficam fora do intervalo
entre 90% e 110% do valor médio, indicando a busca por parte dos operadores de acertar o
nível de montante às constantes variações de vazão sugeridas ou exigidas pelos irrigantes
ou pelo gestor do sistema. Esta variação não indica uma falta de precisão ou de eficiência
do manejo, mas a desvinculação entre o manejo e a vazão específica.
Figura 43 Valores normalizados de vazão específica e nível de montante para o
canal C2.1, controle 2
234
O mesmo comportamento é observado no controle a jusante do primeiro, conforme
a figura 44.
Figura 44 Valores normalizados de vazão específica e nível de montante para o
canal C2.1, controle 4
Neste caso, observa-se um controle ainda mais eficiente quanto à manutenção do
nível a montante em relação ao valor médio, o que pode ter sido facilitado pelo manejo da
estrutura a montante. Da mesma forma que a estrutura anterior, a vazão específica mostra
variações importantes, principalmente no início da irrigação (entre novembro e dezembro).
Comparando-se a vazão específica entre os controles 2 (montante) e 4 (jusante) no
mesmo canal (C 2.1.), verifica-se que os valores mostram uma situação não usual, pois a
estrutura a montante do canal C 2.1 apresenta uma vazão específica menor do que a da
estrutura de jusante em 45% do tempo, ou seja, os irrigantes a montante estariam utilizando
menos água do que os de jusante. Esta situação tem uma explicação vinculada à forma de
gestão da irrigação, na qual o sistema não apresenta perdas aparentes, pois toda a água é
lançada para as lavouras. No entanto, a manutenção do nível no canal nos trechos regulados
leva a um certo controle a montante, enquanto que o final do sistema receberá todo o
volume excedente, independente da solicitação dos irrigantes. Assim, a vazão específica
235
pode ser maior a jusante. A figura 45 apresenta a comparação entre os dois controles quanto
a vazão específica, utilizando como apoio uma reta com 45º de inclinação, representando a
igualdade entre os valores de vazão específica.
Figura 45 Comparação entre a vazão específica (l/s.ha) dos controles 2 e 4, Canal
C 2.1
Outra explicação possível seria a prevenção do gestor e sua equipe em lançar mais
água para jusante, no intuito de compensar perdas na condução.
As perdas de água no sistema não foram medidas, mas puderam ser estimadas a
partir das equações apresentadas no capítulo 4.
Para verificar a coerência das diversas equações de estimativa de perda de água em
canais não revestidos, considerou-se o levantamento de diversas seções ao longo do
sistema, bem como o valor da vazão medida com o uso de molinetes hidrométricos,
realizada por hidrotécnicos do IPH. Para fins de comparação entre as equações, adotou-se
como padrão a equação de Offengenden (45).
Considerando-se os valores medidos e estimados, a perda de água por infiltração
varia entre 0,00018% e 0,00552% da vazão instantânea medida no levantamento de campo,
coerente com a baixa importância desta perda destacada nos estudos analisados. No
236
entanto, a discrepância dos valores gerados pelas equações de estimativa de perda gera a
necessidade de levantamentos específicos, como testes de infiltração nas paredes e no
fundo dos canais do sistema, para a obtenção de coeficientes específicos de perda de água
por km, por de seção ou por metro linear de paredes e fundo para os canais do sistema,
de forma a refletir melhor as perdas envolvidas na condução e distribuição de água na
época de irrigação.
Tabela 25 Estimativa de perda de água em pontos distintos do Sistema de
Irrigação do Arroio Chasqueiro (l/s.m)
Equação
Canal
Em relação à Offengenden
C1
C2
C 1.4
C1
C2
C 1.4
Offengenden (4.44)
0,382243
0,1470
0,023
100,00%
100,00%
100,00%
Moritz (4.43)
0,580886
0,5232
0,384
151,97%
355,83%
1678,98%
Molesworth e
Yennidumia (4.42)
0,019366
0,0169
0,010
5,07%
11,51%
44,42%
Espanha (4.46)
0,074324
0,0669
0,049
19,44%
45,53%
214,82%
Fonte dos dados primários: medida direta
Em algumas estruturas, foram obtidas curvas de vazão específica que apresentam
um comportamento da vazão específica mais próximo ao esperado em relação à demanda
da lavoura e o ciclo vegetativo do arroz para a região. Como exemplo, a figura 46 apresenta
o comportamento da vazão no bueiro 6, situado no canal C1. Na curva da vazão específica,
observa-se uma demanda maior no início, que é a época do enchimento dos quadros da
lavoura, seguida de uma redução, correspondente à fase de crescimento vegetativo inicial.
A vazão específica sobe no mês de dezembro e atinge um patamar máximo no final do ano.
Mantém-se elevada no mês de janeiro e volta a diminuir no mês de fevereiro.
Este comportamento é compatível com a época de plantio e irrigação na região, que
deve evitar que a floração ocorra no mês de fevereiro, quando podem ser registradas noites
frias e a esterilização das flores.
237
Figura 46 Vazão específica e nível de montante no bueiro 6 do canal C1.
Os valores normalizados para esta estrutura também apresentam uma maior
uniformidade do nível de montante, indicando que o operador específico pode ter um maior
conhecimento ou experiência de controle, que não qualquer outra forma de controle.
A variação da vazão específica em relação à média indica a existência de períodos mais
favoráveis à coleta de dados representativos, no caso de buscar-se a análise do
comportamento de uma safra em termos de consumo de água.
Nas estruturas que apresentaram uma série maior de valores, foi definido o volume
de consumo médio por hectare, obtendo-se resultados entre 10.456,14 e 11.651,66 m-³.ha
para a safra 2008/2009.
Estes valores, embora sejam menores que os adotados nas entrevistas para definir
valores contingentes para a água (14.000 m-³.ha), são bem menores do que o observado
pouco mais de uma década em outros sistemas, como o do arroio Canapé, para a mesma
cultura o arroz. Da mesma forma, são maiores do que os indicados pela pesquisa agrícola,
238
uma vez que refletem as perdas na condução, distribuição e do manejo da irrigação dentro
dos quadros.
Figura 47 Valores normalizados para vazão específica e nível a montante no
bueiro 6 do canal C1
Comparando-se com o valor definido pela ANCIA (2009) para a bacia do rio
Quaraí (10.273,2 m-³.ha.safra) observa-se que os valores calculados são maiores do que o
critério de outorga estabelecido pela necessidade hídrica da cultura e uma eficiência global
de 60%, mas dentro de uma mesma ordem de grandeza. Em termos médios, a diferença
entre eles é de 7,6%.
Os valores encontrados concordam com os de Cauduro (apud Righes, 2000) e, por
outro lado, muito superiores aos de Machado et alli (2006), que consideram o consumo em
uma área experimental de pequenas dimensões.
Considerando-se uma média entre os extremos dos consumos calculados e o valor
citado por Machado et alli (2006) para o sistema convencional, encontra-se uma eficiência
239
referencial para o Sistema de Irrigação do Arroio Chasqueiro igual a 51,95%, ou seja, o
consumo real é praticamente o dobro do registrado pela pesquisa.
Evidentemente, este valor é apenas uma ordem de grandeza, uma vez que as
condições climáticas são distintas, bem como deveria ser realizada a ponderação dos
sistemas de cultivo para a safra analisada no sistema do arroio Chasqueiro. Contudo, o
valor reforça o distanciamento entre os valores definidos para a lavoura e os referentes ao
manejo da irrigação em sistemas coletivos, sendo que as perdas nestes continuam sendo
muito importantes para a definição dos valores de retirada de água dos corpos hídricos e de
reservatórios.
A vazão específica média registrada foi igual a 1,182 l/s.ha, considerando-se a
média da série dos valores calculados. Este valor é inferior aos apontados pela maior parte
das diferentes referências citadas, mas próximo aos valores definidos pelos autores que
encontraram o valor mínimo (Marcolin e Macedo, 2003) para o plantio convencional, que é
de 1,06 l/s.ha. Os valores máximos de vazão específica encontrados são, no entanto,
coerentes com a maior parte dos valores referenciais. No caso do Chasqueiro, valores de
vazão específica de 1,8 l/s.ha poderiam ser adotados como critérios de dimensionamento
dos canais, mas não como critérios de gestão na maior parte do tempo, pois valores
semelhantes são observados apenas nos picos de demanda da lavoura.
6.3. Sobre o medidor IPH
A constatação de que são poucas as alternativas existentes para medição de vazão
em canais não revestidos e, dentre estes, os de baixa declividade, motivou a busca por uma
alternativa tecnologicamente simples e de baixo custo, em comparação com alternativas de
estruturas usualmente implantadas em canais.
A primeira opção foi pelos vertedores de parede espessa, considerando as
experiências de Rijo no Vale do Sorraia e a proposta do WinFlume. Estas estruturas
demonstraram-se limitadas para o uso no Sistema de Irrigação do Arroio Chasqueiro,
especialmente nos trechos nos quais havia influência de comportas localizadas a jusante.
Nestes casos, a precisão de medição era muito baixa, ou havia a necessidade de elevação do
vertedor, causando transbordamento a montante ou a necessidade de elevação das bermas
do canal, situação que seria inviável na prática.
240
Uma estrutura ideal deveria ter uma gama de medição mais ampla do que vertedores
de parede espessa situados junto ao fundo do canal, uma facilidade construtiva e baixo
custo de implantação.
Isso levou a opção do estudo da utilização de tubulações plásticas ou de concreto
armado como vertedores, pois são materiais facilmente encontrados, apresentam dimensões
razoavelmente uniformes entre as peças e têm baixo custo de aquisição.
A definição da localização dos tubos iniciou por um estudo do seu comportamento
apoiado diretamente no solo, como os vertedores de parede espessa. Os inconvenientes
deste arranjo seriam os relacionados com a manutenção do canal, uma vez que impediriam
parcialmente a livre circulação da água e seriam elementos dificultadores do trabalho
mecanizado.
Como pontos favoráveis das tubulações estão o baixo peso relativo, a possibilidade
de serem implantados sem a necessidade de técnicos especializados, o pequeno tempo
necessário para a sua construção e o custo acessível.
Seguindo o disposto por Escribá Bonafé (1988), foram determinadas as equações
para a definição da vazão limite para manter o escoamento como vertedor, evitando-se a
situação do obstáculo de fundo de canal, dada a menor alteração nas alturas de montante e
jusante e uma maior influência da precisão de leitura das escalas no resultado final.
Inicialmente, seleciona-se o diâmetro do cano a ser utilizado. Definem-se, a partir
disto, os valores da base do canal, da declividade de fundo, da rugosidade das paredes e da
inclinação dos taludes, elementos estes de fácil obtenção. Estabelecendo-se valores de
vazão aleatórios, são calculadas as séries de valores para a profundidade normal, por meio
da equação de Manning, e a profundidade crítica. A profundidade normal do escoamento
passa a ser considerada como a profundidade de jusante da estrutura proposta. As séries de
dados permitem estabelecer duas equações, que relacionam profundidade normal em
relação à vazão e profundidade crítica somada com o diâmetro do cano com relação à
vazão. O cruzamento das duas curvas indica o valor máximo de vazão que pode ser medido
na condição de vertedor trabalhando livremente, que é a situação recomendada. Como os
valores de vazão são limitados em um sistema de canais existente ou são dados de
241
projeto para a concepção de um sistema de canais, verifica-se que todas as informações
necessárias estão disponíveis ou são facilmente arbitradas de forma coerente.
A figura 48 a seguir mostra o comportamento de um tubo de diâmetro de 0,15 m
colocado no fundo de um canal de base 0,5 m, inclinação 0,002 m/m, coeficiente de
rugosidade 0,012 e paredes verticais, existente no IPH. Para esta situação, a vazão máxima
a ser medida é igual a 0,275 m³/s.
Para lâminas afogadas, Bauzil (4.100) apresenta uma curva de correção do
coeficiente C para C’, de acordo com um coeficiente de submersão, definida como a
relação entre a altura h, obtida da diferença entre o nível de jusante e a crista do vertedor, e
a carga H a montante. Esta curva foi transformada em uma tabela, permitindo o acesso da
planilha de cálculo para diferentes valores do coeficiente de submersão.
Esta correção do coeficiente de descarga proposto por Bauzil foi lançada sobre o
coeficiente proposto por Fawer (4.103), possibilitando a obtenção de um novo coeficiente
que somasse as características do perfil circular com a situação de afogamento. Sendo
conhecido o coeficiente de descarga e os valores das alturas a montante e a jusante, a vazão
sobre o vertedor pode ser definida.
Para testar a aplicação das equações apresentadas, foi utilizado o canal experimental
do IPH. O primeiro passo foi definir a rugosidade do canal, a partir da realização de
escoamentos com vazão conhecida e medição da profundidade em quatro pontos do trecho
a ser ensaiado. A partir deste valor, pode-se definir a profundidade normal do escoamento
para determinada vazão. Para valores conhecidos de vazão, foram estimados os valores de
altura de carga que deveriam ser observados nas medidas no laboratório, considerando as
situações de vertedor livre e afogado. A figura 49 a seguir apresenta os valores encontrados
e sua relação com os valores medidos, com uma reta a 45º que marca a coincidência entre
valores medidos e estimados. Os resultados apresentaram valores estimados muito
próximos dos medidos, com exceção dos estimados para as vazões menores (Q<55,0 l/s).
Desprezando-se estes valores, o erro médio obtido foi igual a 2,54%, indicando a
necessidade de limitação para o uso do tubo apoiado para valores de vazão superiores a um
limite a ser definido.
242
Figura 48 Limite de utilização da tubulação apoiada no fundo do canal como um
vertedor livre, segundo Bonafé (1988).
Figura 49 Relação entre alturas de montante da tubulação estimada e medida
243
Os ensaios realizados confirmam que vertedores de perfil circular, colocados no
fundo dos canais, apresentaram uma capacidade de escoar vazões maiores do que outros
tipos de vertedores, como o de parede delgada e o de parede espessa. O coeficiente médio
de vazão destes vertedores, segundo os ensaios realizados, é igual a 0,5407, contra 0,41
para vertedores de parede delgada (Francis) e 0,35 para vertedores de parede espessa
(Lesbros). Assim, para as mesmas condições de altura e largura do vertedor, a vazão
observada seria maior.
Uma série de observações foi realizada em um canal experimental em vidro, no
laboratório de engenharia rural da Universidade de Évora. Considerada estabilizada a
vazão, os níveis de montante, crista e jusante do tubo e a montante e crista do vertedor de
parede espessa foram medidos com o uso de uma ponta linimétrica. Estes dois últimos
valores foram utilizados para definir a vazão do sistema. Os primeiros três valores
definiram o comportamento do sistema, complementados pelos dados de diâmetro do tubo
e pela posição da crista. Foram testados três diâmetros distintos de tubos de aço, que
puderam ser posicionados em diferentes alturas com o uso de uma coluna regulável, que se
apoiava em um dos dois orifícios de sustentação dos acessórios do canal de vidro.
Lencastre apresenta o valor de 0,776 para orifício de bordo superior arredondado e
contração suprimida em baixo e dos lados, que é a situação projetada. A aplicação deste
valor, corrigido com o valor de Weisbach, sobre os dados experimentais, demonstrou-se
muito coerente para a realidade ensaiada, embora tenha resultado em valores estimativos
superiores aos medidos no laboratório.
Para selecionar a equação a ser utilizada, foi adotado o critério de Cunge e
Woolhaiser, mas adotaram-se correções para as alturas de carga. No caso de a>2/3 H, a
vazão foi determinada por:
Quando a<2/3 H, a vazão foi calculada por
244
Sendo m = 0,61*1,1, onde 0,61 é o coeficiente geral para orifícios simples e 1,1 é o
acréscimo do valor do coeficiente pelo perfil arredondado. Os valores observados em
laboratório mostram erros médios de 2,58%, comparando a vazão estimada e a vazão real.
Por fim, foi ensaiada a solução que conjuga o vertedor e o orifício, buscando
identificar uma forma de prever a vazão que passa por esta estrutura a partir da
determinação das alturas de montante e jusante e do conhecimento das informações
relacionadas com o tubo. Esta previsão é dificultada por uma situação de indefinição de
qual é a parte do escoamento que passa pelo orifício e qual a que passa por sobre o
vertedor, uma vez que ambas dependem do valor da altura de carga a montante e do
afogamento causado pelo nível de jusante.
O primeiro critério examinado para separação do escoamento é o proposto por
Akerman e Martí (2005), no qual as energias de velocidade nas duas situações devem ser as
mesmas, ou seja,
g
V
g
V
vertedor
orifício
22
2
2
.
O escoamento pelo vertedor ocorre quando a altura a montante supera a posição
da crista, sendo influenciado ou não pelo nível de jusante. Conhecidos estes valores,
portanto, pode-se calcular a vazão que passa pelo vertedor, a velocidade do escoamento e,
portanto, a energia de velocidade. Este valor é lançado na equação do orifício, obtendo-se a
vazão correspondente. A soma das duas vazões deve corresponder à vazão circulante pelo
canal.
A validação da suposição de igualdade das energias de velocidade foi realizada com
o uso da sonda de Prandtl. A sonda foi inserida de montante para jusante, de forma a não
interferir ainda mais no escoamento.
Observam-se valores semelhantes das velocidades no eixo do orifício e na crista do
vertedor, mas nesta no trecho de queda. Utilizou-se como referencial colocar a sonda
sobre a crista e avançar na lâmina vertente até que houvesse a perturbação do escoamento
pela presença da sonda, sendo este o limite que não devia ser ultrapassado, conforme a
figura 50.
245
A medição de velocidade nos pontos indicados mostrou valores com uma diferença
média de 1,0 mm entre as taquicargas do vertedor e do orifício nas seções consideradas,
indicando que a hipótese de igualdade de velocidades teria alguma validade. Mas a
localização dos pontos de medição gerou dúvidas sobre a lógica de sua utilização, uma vez
que valores idênticos de velocidade poderiam ser encontrados, sem uma relação específica
com uma altura crítica ou uma seção de estrangulamento. Considere-se, ainda, o fator
complicador da rápida alteração da parede do tubo, a existência de áreas de depressão e seu
efeito sobre a velocidade. Além disto, há que considerar a alteração da velocidade a jusante
do orifício pelo efeito do mergulho do jato proveniente do vertedor.
Figura 50 Medição de velocidade com a sonda de Prandtl
246
A figura 51 mostra a relação entre os valores medidos da vazão circulante e os
estimados pela proposta de Akerman e Martin. Observa-se que uma tendência de ajuste
em uma parcela significativa de experimentos, mas também valores discordantes que
elevam o erro médio obtido, resultando em uma baixa correlação na linha de tendência.
Figura 51 Relação entre vazão estimada e vazão medida no conjunto orifício e
vertedor com a aplicação da proposta de Akerman e Martin
Em termos de previsão da vazão, do diâmetro a ser utilizado e da posição do tubo
em relação a canal, foram realizadas vários ensaios com diâmetros, posições e vazões
distintas. Foram observadas situações nas quais o uso de tubos como medidores de vazão
apresentaram algumas dificuldades:
Para velocidades baixas e posição do tubo elevada em relação à
profundidade normal, o escoamento ocorrerá como orifício. Dependendo do grau de
afogamento, não uma contração significativa do jato de água e uma velocidade de
escoamento baixa, que gera uma perda de carga pequena. Diferenças pequenas entre os
247
níveis de montante e jusante são difíceis de ser percebidas a olho nu no canal. Em situações
de campo, com o uso de réguas linimétricas, estas diferenças seriam de difícil
determinação, já que o erro esperado de leitura é superior a 1 mm, o que poderia gerar erros
importantes na avaliação da vazão para essas pequenas diferenças;
Para alturas a montante elevadas e para certas situações de seção do orifício,
observa-se a formação de vórtices. Estes vórtices resultam em perda de carga localizada
junto ao tubo, a montante deste. Essa perda de carga, por sua vez, implica em elevação do
nível a montante na seção de medição, sendo que esta elevação de altura pode gerar erros
na estimativa do escoamento.
Para situações em que o escoamento atinge e ultrapassa a profundidade
crítica, a formação de ressalto hidráulico a jusante. A simples presença do ressalto
interfere na medição da profundidade de jusante ou exige a transferência desta para uma
seção mais distante do tubo; por outro lado, a presença do ressalto garante a passagem pelo
regime crítico, conferindo mais precisão à medição de vazão. Para estas situações, foi
adotado como nível de jusante o nível da água a montante do vertedor de parede espessa,
localizado no final do canal.
Nas duas primeiras situações o erro observado entre a vazão medida e a vazão
calculada ultrapassou a margem de 10%, razão pela qual foi abandonada a proposta de
Akerman e Martin (2005).
A partir disto, analisou-se a possibilidade do uso das propostas de Ferro (2000) e de
Negm (2002 a, 2002 b).
O uso das relações propostas por Ferro levou a uma reconsideração dos coeficientes
a e n, que apresentaram melhor resultado com os seus valores básicos, isto é, a=2 e n=3, do
que os sugeridos pelos ensaios do próprio Ferro.
Os resultados obtidos no Laboratório do IPH mostram um erro médio de previsão de
vazão igual a 4,52% com o uso da solução proposta por Ferro. Este valor é próximo ao
proposto pelo WinFlume e da consideração do canal funcionando em regime permanente e
uniforme. Pela figura 52, observa-se que uma leve tendência de subestimação dos
valores de vazão.
248
Outra série de experimentos foi realizada no canal experimental do Núcleo de
Hidráulica e Controlo de Canais, da Universidade de Évora, mas em canais de seção
trapezoidal. No trecho inferior, de maior interesse, as primeiras medições não foram
satisfatórias, pela oscilação do nível a montante, causado por perturbações originadas pela
passagem da água por uma over shot gate e pela influência de uma comporta AMIL
localizada a jusante. Fez-se necessário a retirada da comporta e a tranquilização do fluxo a
montante.
Figura 52 Relação entre valores de vazão (m³/s) medidos e estimados com o uso
da equação de Ferro.
Para esta situação, a proposta de Ferro não demonstrou-se satisfatória, com erros
muito elevados, entre 65% e 122%. Observa-se que os valores da velocidade na seção de
montante são muito baixos, próximos ao limite de influência de 0,2 m/s e que a influência
do nível de jusante é muito mais expressiva. Conclui-se que a proposta de Ferro é adequada
para as situações de laboratório, mas não para canais de irrigação.
Por tanto, foi adotada a metodologia de Negm (2002 a,b), com o coeficiente de
vazão do vertedor definido por Fawer e o do orifício variando entre 0,61 e 0,95, de acordo
249
com a diferença entre os níveis de montante e jusante. Este coeficiente foi ainda corrigido
pelos valores obtidos na revisão bibliográfica, sendo multiplicado por 0,986 para
compensar a submersão por jusante e por 1,1 por conta do bordo arredondado. A vazão
obtida pelo somatório da vazão do vertedor e do orifício foi corrigida pelo fator F, que foi
calculado em função da relação entre o nível de montante sobre o nível de jusante. Utilizou-
se uma única faixa de critérios para a determinação do valor de F, aplicada tanto para o
canal superior, de paredes mais verticais, e para o canal de retorno, com paredes mais
abatidas.
No canal denominado de superior, com inclinação das paredes 1V:0,15H, o valor de
F variou entre 0,85 e 1,0. Os erros observados para a estimativa da vazão, no entanto, são
mais elevados do que o desejado, com valores de erro superiores a 20% e um valor médio
de 11,38%.
A Tabela 26 a seguir apresenta os valores obtidos em 22 ensaios.
Com o valor de F proposto pelo autor, o erro médio cai para 10,58%, mas o erro
máximo atinge 29,44%. Neste canal, as velocidades situaram-se próximas de 0,7 m/s,
enquanto que as perdas de carga, medidas pela relação entre a energia medida a montante
do tubo e a prevista para um movimento permanente e uniforme, têm um valor médio de
23,69%.
Para o canal de retorno, o valor de F variou entre 0,85 e 1,55, com média igual a
1,08, próximo da proposta do autor, que é de 1,037. Com esta sistemática, o erro médio
observado entre valores observados e medidos é igual a 2,55%, para a série de erros
absolutos, com um valor máximo de 4,80%. Se adotado um único valor de F (1,08), a
margem de erro sobre para 13,19%, com um valor máximo de 30,83%. Com o valor básico
proposto pelo autor (F=1,037, para escoamento submerso), o erro médio é igual a 12,05%,
mas com um erro máximo de 33,35%.
Os valores obtidos são apresentados na Tabela 27 a seguir.
250
Tabela 26 Resultados obtidos com o uso do medidor IPH no trecho superior do
canal do NUHCC de acordo com a equação de Negm
Relação
H/hjus
Q
vertedor
m³/s
Q orifício
m³/s
F
Q total
corrigida
m³/s
Q real
m³/s
Erro
Erro
absoluto
1,0658
-
0,0445
0,95
0,0423
0,0395
7,14%
7,14%
1,0802
-
0,0492
0,85
0,0418
0,0394
6,10%
6,10%
1,0711
-
0,0482
0,85
0,0410
0,0449
-8,78%
8,78%
1,0684
-
0,0473
0,95
0,0449
0,0442
1,61%
1,61%
1,0867
-
0,0546
0,85
0,0464
0,0494
-6,11%
6,11%
1,0741
-
0,0504
0,85
0,0429
0,0495
-13,39%
13,39%
1,0959
-
0,0588
0,85
0,0500
0,0542
-7,79%
7,79%
1,0959
-
0,0588
0,85
0,0500
0,0545
-8,29%
8,29%
1,0990
-
0,0614
0,85
0,0522
0,0600
-12,96%
12,96%
1,1035
-
0,0628
0,85
0,0534
0,0602
-11,29%
11,29%
1,1002
-
0,0632
0,85
0,0537
0,0642
-16,34%
16,34%
1,0831
-
0,0574
0,85
0,0488
0,0639
-23,62%
23,62%
1,0890
-
0,0576
0,85
0,0490
0,0569
-13,93%
13,93%
1,2600
0,0235
0,0442
1,00
0,0678
0,0545
24,34%
24,34%
1,2476
0,0213
0,0432
1,00
0,0645
0,0545
18,26%
18,26%
1,2399
0,0283
0,0433
1,00
0,0716
0,0590
21,28%
21,28%
1,2375
0,0249
0,0428
1,00
0,0677
0,0574
17,96%
17,96%
1,1919
0,0087
0,0376
1,00
0,0462
0,0500
-7,53%
7,53%
1,1647
0,0031
0,0437
1,00
0,0468
0,0474
-1,25%
1,25%
1,1566
0,0002
0,0418
1,00
0,0420
0,0434
-3,32%
3,32%
1,1164
-
0,0353
1,00
0,0353
0,0400
-11,72%
11,72%
1,1128
-
0,0420
1,00
0,0420
0,0380
10,58%
10,58%
Média
0,92
0,0500
0,0511
-1,78%
11,53%
Observou-se que no canal de retorno, com características mais pximas da
realidade de campo, a passagem do escoamento por cima e por baixo do tubo se faz de
forma tranquila, com a formação de uma superfície ondulada a jusante e pequena elevação
a montante, que é a situação desejada, pois:
A velocidade a jusante não é aumentada de forma a propiciar um aumento
dos processos erosivos, embora o revestimento da seção de controle seja recomendável para
garantir a estabilidade do controle;
251
A pequena elevação a montante corresponde à manutenção parcial do bordo
livre projetado;
A pequena ondulação a jusante não interfere tanto na medição como os
ressaltos hidráulicos formados no laboratório.
A perda de carga relativa média é igual a 12,27% da energia na seção de
montante, para velocidade média igual a 0,205 m/s.
Tabela 27 Ajuste do fator de F da equação de Negm para o canal inferior do
NUHCC
Relação
H/hjus
Q vertedor
Q orifício
F
Q total
corrigida
Q real
Erro
Erro
absoluto
1,014082
0,015338
0,012556
1,55
0,043236
0,0434
-0,38%
0,38%
1,022013
0,019339
0,015791
1,3
0,04567
0,0474
-3,65%
3,65%
1,027912
0,021509
0,017817
1,3
0,051124
0,05
2,25%
2,25%
1,031472
0,027696
0,019121
1,3
0,060862
0,059
3,16%
3,16%
1,031578
0,026198
0,019098
1,3
0,058884
0,0574
2,59%
2,59%
1,03256
0,014963
0,018902
1,1
0,037251
0,038
-1,97%
1,97%
1,033435
0,008085
0,018742
1,1
0,029511
0,031
-4,80%
4,80%
1,038555
0,017283
0,020631
1,1
0,041705
0,04
4,26%
4,26%
1,045339
0,027402
0,014685
1,1
0,046296
0,0449
3,11%
3,11%
1,045339
0,027402
0,014685
1,1
0,046296
0,0442
4,74%
4,74%
1,051958
0,024275
0,015568
0,95
0,037851
0,0394
-3,93%
3,93%
1,061928
0,026491
0,013883
0,95
0,038356
0,0395
-2,90%
2,90%
1,069669
0,038878
0,015012
0,95
0,051196
0,0494
3,63%
3,63%
1,069669
0,038878
0,015012
0,95
0,051196
0,0495
3,43%
3,43%
1,094612
0,046191
0,017494
0,85
0,054132
0,0542
-0,13%
0,13%
1,094612
0,046191
0,017494
0,85
0,054132
0,0545
-0,67%
0,67%
1,103351
0,05223
0,018371
0,85
0,06001
0,06
0,02%
0,02%
1,111782
0,038878
0,018652
1
0,05753
0,0569
1,11%
1,11%
1,119655
0,047369
0,015318
1
0,062688
0,0642
-2,36%
2,36%
1,120694
0,044449
0,01531
1
0,059759
0,0602
-0,73%
0,73%
1,129434
0,05038
0,015932
1
0,066312
0,0639
3,77%
3,77%
Valor médio
1,08
0,50%
2,55%
A precisão da estimativa tende a ser maior para as maiores vazões, independente do
diâmetro da tubulação utilizada, conforme mostra a figura 53.
252
Figura 53 Comportamento do erro de estimativa em relação à vazão de ensaio
Observa-se que a precisão média das estimativas por Negn pode situar-se acima de
90% com o ajuste do fator F, sendo este o patamar que pode ser obtido com o uso desta
instalação. Observa-se, também, que uma relação entre o valor do fator F e a relação
entre as alturas de montante e jusante, o que permite a correção do fator a partir de medidas
diretas e fáceis de serem realizadas.
Os valores de erros propostos por Clemmens, no WinFlume, como referenciais
máximos, estão entre 2 e 3%, sendo que a partir de uma estimativa de 8% de erro o próprio
software sugere a busca de uma otimização da solução proposta para o vertedor de parede
espessa. Este patamar também se situa na ordem de grandeza para a estimativa da vazão em
canais prismáticos, considerando-se o escoamento permanente e uniforme, mas tem a
vantagem de não estar baseado na suposição de que este escoamento esteja de fato
ocorrendo.
253
7. CONCLUSÃO
Os estudos realizados neste trabalho permitiram avaliar a situação atual da gestão
em diferentes sistemas coletivos de irrigação em Portugal e no Rio Grande do Sul,
identificando a importância, a viabilidade e os efeitos de uma cobrança pelo uso da água na
lavoura de arroz irrigado.
As entrevistas realizadas nas bacias do Gravataí e do Quaraí em conjunto com as
obtidas junto a gestores e representantes dos irrigantes nos sistemas coletivos levam à
conclusão de que apenas a cobrança de água por volume é efetiva para induzir a mudança
de hábitos desejada, enquanto que a cobrança por área gera desperdícios de água, mesmo
que não intencionais.
Quanto à aplicação do princípio usuário-pagador, a análise dos resultados obtidos
nas entrevistas e a comparação com outras pesquisas desenvolvidas em outros projetos de
irrigação mostra que o mesmo tem potencial para reduzir o consumo de água na lavoura de
arroz e induzir o abandono de áreas com condições menos favoráveis para a economia de
água. A condição de inelasticidade do consumo da água em relação ao seu preço deve ser
considerada adequadamente na hora de definir os valores possíveis de tarifa, sob pena de
inviabilizar a exploração agrícola irrigada. A tarifação aparece como a alternativa de
organizar a demanda a partir de uma ampliação do custo de produção, uma vez que o
volume de irrigação independe do preço de venda do produto, mas a decisão de cultivá-lo
sim. Os estudos mostram, também, que os Comitês de Gerenciamento de Bacias
Hidrográficas podem estimar o custo para a sociedade de uma possível redução de área
irrigada na bacia, o que permite avaliar o interesse de adotar um determinado valor pela
cobrança de água.
A utilização de bueiros localizados ao longo dos canais permite a estimativa da
vazão circulante, o que foi confirmado por determinação direta com o uso de molinete. Esta
determinação possibilita o cálculo de consumos médios ao longo de trechos regulados, e,
com isto, a verificação de desvios em relação ao consumo esperado.
O uso da estrutura proposta por Amaral e Righes é um avanço importante, sendo
uma alternativa para a medição de vazões entregues para parcelas, cujas dimensões serão
limitadas pelo diâmetro da tubulação necessária para sua confecção.
254
A proposta apresentada de determinação de vazão a partir do uso de uma tubulação
comercial demonstra uma precisão semelhante à de outras alternativas, como o vertedor de
parede espessa, mas necessita de uma estrutura muito mais barata e acessível. O grau de
precisão e a facilidade de obtenção dos dados necessários são pontos favoráveis a esta
proposta. Por outro lado, a necessidade de avançar nas definições e generalização dos
coeficientes adotados, embora possa ser adotado o fator geral de Negm com uma margem
de erro conhecida (10,58%).
Ainda sobre o medidor proposto, observa-se que seu comportamento é mais preciso
para valores mais elevados de vazão, quando também são observadas as menores perdas de
carga relativas.
Para manter-se a precisão dentro de valores aceitáveis, é necessário considerar a
variação do coeficiente de vazão do orifício, que diminui na medida em que a altura da
água a montante distancia-se da altura da água a jusante, e do fator de F para a expressão de
Negm, que variou entre 0,85 e 1,55, sendo este último valor observado quando a altura de
jusante era muito próxima da altura de montante.
Especificamente quanto aos perímetros irrigados, observa-se que, no Rio Grande do
Sul, as técnicas e os métodos de distribuição e controle são completamente defasados. A
adoção de um modelo composto por canais de distribuição controlados por comportas
verticais operadas manualmente para manter um nível constante a montante, próximo do
proposto pelo Bureau of Reclamation cem anos, gera uma dificuldade operacional que
não é devidamente quantificada ou qualificada pelos técnicos responsáveis. A lógica de
manutenção de um nível constante a montante de uma estrutura de derivação e controle não
guarda uma relação unívoca com a vazão efluente. A gestão concomitante de um conjunto
de estruturas em um mesmo canal é de eficiência discutível, dados os tempos de resposta
observados em canais de grande comprimento e pequena declividade. A alteração da lógica
de controle em certas fases da irrigação, utilizando informações de jusante para operar as
comportas a montante, leva a variações do nível controlado e, de forma mais acentuada, da
vazão específica.
Por outro lado, as possibilidades de recepção dos excedentes hídricos no sistema de
canais ou na lavoura e da redução da lâmina de inundação na lavoura por um tempo
255
indefinido, mascara a baixa eficiência de condução e distribuição nestes sistemas, tomando
como base o projeto Chasqueiro. A análise da diferença das vazões específicas e dos
consumos unitários em conjunto com o gestor do sistema revelou uma desigualdade entre
irrigantes de diferentes setores do sistema de canais que não pode ser explicada pelas
diferenças de solos, de métodos de cultivos ou plano de exploração agrícola, mas sim pelo
processo de distribuição de água.
A comparação entre os projetos portugueses e o projeto Chasqueiro mostra que a
concepção deste último tem vantagens em relação ao Mondego, que é reconhecidamente
deficitário quanto à gestão da irrigação. Hidraulicamente, o Chasqueiro é mais atrasado que
o projeto do Vale do Sado, apesar de ser 30 anos mais recente.
Voltando a analisar o consumo de água e o princípio usuário-pagador aplicado sobre
a área irrigada, observa-se que determinações como a adotada pela Agência Nacional de
Águas na bacia do rio Quaraí, que enfrenta um histórico de deficiência hídrica em alguns
trechos do rio principal, não levam à economia de água e podem gerar uma situação
contraditória, de aumento da área irrigada pela concessão de outorga com base na suposição
de um consumo menor do que o observado em condições de campo. Assim, se não houver
o aumento da eficiência na condução, distribuição e aplicação da água na lavoura de arroz,
a diferença entre a necessidade hídrica da cultura e o volume bruto necessário na captação
tende a manter-se ou, na melhor das hipóteses, sofrer uma redução gradual mas de pequena
intensidade.
A questão dos subsídios agrícolas na Comunidade Econômica Européia mostra-se
como forte delimitadora dos valores possíveis de serem cobrados pelo uso da água. Na
verdade, o subsídio inverte, e muito, a lógica de decisão dos irrigantes sobre muitos fatores,
criando uma situação artificial de análise que não pode ser considerada como parâmetro. A
aplicação de métodos como a disposição a pagar ou o princípio elasticidade-preço, nestes
casos, geram valores e comportamentos inconsistentes, o que também foi observado no
caso iraniano (Esmaeili e Vazirzadeh, 2009).
Por outro lado e com outro enfoque, a pesquisa agrícola aponta, cada vez mais, para
a redução da necessidade hídrica do arroz ou do consumo teórico, em parcelas
experimentais ou sob forte controle das variáveis envolvidas. Desta forma, seria evidente
256
que o consumo da água e os conflitos pelo seu uso estariam se reduzindo de forma
significativa, o que não corresponde à realidade da maior parte dos cursos d’água das
bacias brasileiras onde existe agricultura irrigada em superfícies importantes.
Para o caso brasileiro e especificamente do arroz irrigado no Rio Grande do Sul,
observa-se que o exemplo francês pode ser analisado como referencial para a implantação
da cobrança pelo uso da água. Como na França (BRASIL, 2001), o setor agrícola deve ser
resistente à cobrança e de difícil controle, o que deve levar à adoção de duas práticas: uma
tarifa reduzida, como forma de diminuir as resistências e o impacto sobre a produção, e
uma cobrança facilitada, com o uso da área como parâmetro de consumo.
No entanto, observa-se, ao contrário da França, situações localizadas de grande
escassez sazonal de água, motivadas pela irrigação. Nesta condição, parâmetros que não
levem à economia de água devem ser preteridos.
A solução que se apresenta para o Rio Grande do Sul, onde a água ainda não é
cobrada, mesmo após 15 anos de vigência da Lei Estadual sobre a gestão dos recursos
hídricos, é antecipar a posição dos agricultores franceses, que encontraram nos recursos
obtidos pelo pagamento da água na bacia uma fonte de subsídios.
Especificamente quanto aos projetos coletivos públicos vinculados à irrigação de
arroz, propõe-se que a cobrança pelo uso da água seja investida em melhorias nas estruturas
de condução, distribuição e controle da água de irrigação. Estes projetos têm a facilidade de
permitir a obtenção de parâmetros em um grande número de propriedades de forma
concentrada, gerando séries de dados de maior confiabilidade e uniformidade que poderiam
ser utilizados como controle dos dados obtidos em lavouras isoladas. Também estão
situados em bacias pequenas (arroio Duro, arroio Chasqueiro, arroio Capané, arroio das
Canas), com exceção do sistema VAC 04 (rio Vacacaí), e de menor histórico de conflito
pela falta da água.
Por fim, quanto ao valor da água para a irrigação do arroz, é urgente que os estudos
necessários sejam efetivados em todas as bacias do estado, como forma de definir valores
possíveis para a cobrança pelo uso da água, sem criar distorções artificiais e desnecessárias
de custo de produção entre as diferentes regiões produtoras.
Retornando às questões iniciais:
257
Quanto cobrar?
O patamar de cobrança deve estar entre 0,5% do custo de produção (cerca de US$ 5
ou 0,5 saco/hectare) e 2,7 sacos de arroz por hectare (cerca de US$ 28, na época da
pesquisa de campo), sendo estes valores obtidos nas pesquisas realizadas e na revisão
bibliográfica e referendados em diferentes bacias. Obviamente, valores mais baixos terão
menores efeitos na economia, na resistência ao pagamento e na economia de água. Para
obter-se um efeito de economia de água mais pronunciado, deve ser adotada uma base de
consumo tecnicamente possível, que deve ser utilizada como fator de referência para uma
cobrança mínima. A partir deste ponto, quando maior o consumo maior deve ser a tarifa,
mas não em escala linear, podendo ser adotado um escalonamento entre o valor mínimo e
um valor máximo admissível de acordo com as condições de demanda e oferta da bacia.
Atualmente, poderia ser proposta a divisão das tarifas nas faixas até 10.000 m-³.ha; entre
10.000 e 12.000 m-³.ha; entre 12.001 e 14.000 m³/ha; entre 14.001 e 16.000 m-³.ha; e acima
de 16.001 m-³.ha. Irrigantes que utilizassem menos do que 10.000 m-³.ha poderiam receber
benefícios na forma de descontos. Os valores propostos são mais elevados que os indicados
nas pesquisas realizadas, pois incluem as perdas na condução e na distribuição. Após as
primeiras medidas de consumo efetivo, estas faixas devem ser alteradas.
Ainda deve ser melhor discutida a cobrança da água armazenada em reservatórios
privados, mas aponta-se a necessidade de manter-se a função da tarifa de sinalizar para o
produtor o valor econômico da água. A possibilidade da adoção do princípio beneficiário
pagador, com pagamento ao irrigante que construa e opere um reservatório dentro do
interesse da bacia, com a geração de excedentes de água de qualidade adequada a outros
usos, como a recreação ou o abastecimento de cidades, pode ser adotada em situações
específicas. Verificou-se que a possibilidade de recuperação de água dentro da lavoura ou
da propriedade leva a uma redução da parcela de água que retorna à rede de drenagem
natural, reduzindo o efeito benéfico da existência do reservatório para a bacia como um
todo. Por outro lado, os proprietários de reservatórios podem ser incentivados a bombear
água dos cursos d’água no período de inverno com isenção de tarifa, por exemplo, para
reduzir a demanda no período da irrigação.
258
Como avaliação das metodologias utilizadas, verifica-se que o Método de Valoração
Contingente pode ser utilizado para a definição de valores a serem cobrados, desde que
com as complementações analíticas necessárias.
Como medir a unidade de cobrança?
A cobrança deve ser por volume, pois a cobrança por área não terá o efeito desejado
na otimização necessária do uso da água. A implantação da cobrança por área irrigada,
como ocorre com o mercado de água, levará ao desperdício. A fixação de valores
referenciais de consumo por área, com o uso de dados climatológicos, sem considerar as
elevadas perdas registradas em canais não revestidos e na própria lavoura de arroz em
condições distintas das observadas em canteiros de pesquisa, resultará, de fato, na outorga
de volumes mais elevados. Em algumas bacias em situação mais crítica entre oferta e
demanda, não deve ser descartada a possibilidade de se ultrapassar a oferta natural e
comprometer a situação do curso d’água, com prejuízo aos irrigantes, à sociedade e ao meio
ambiente. Esta situação seria próxima do que é atualmente observada, com dois
diferenciais: haveria a cobrança por um volume de água indisponível e a seria gerada uma
deficiência hídrica por irrigação de uma área previamente autorizada pelo órgão
competente.
No entanto, é necessária uma fase de transição entre a cobrança por área, que é a
alternativa atualmente possível, e a medição do volume consumido. A proposta é que uma
cobrança inicial que viabilize a implantação das estruturas necessárias para determinação
do volume ou contratação de serviços especializados para isso. Após isto, pode-se adotar a
tarifa composta por dois elementos, um fixo e outro por volume adicional. A parcela fixa
poderia ser referida a um volume unitário básico, como o de 10.000 m-³.ha.safra proposto,
enquanto que a de volume adicional significaria um aumento significativo do custo da água
para o irrigante menos eficiente. O medidor proposto pode ser utilizado em canais abertos,
com custo acessível, e com uma precisão de mesma ordem de grandeza do que outras
alternativas existentes, tendo a vantagem de não dificultar a manutenção dos canais.
259
Qual o efeito dessa cobrança na economia regional?
Seguindo a experiência da bacia do rio Quaraí, com a aplicação do Método dos
Efeitos (Chervell e Le Gall, 1989), observa-se que uma redução significativa de área
irrigada, motivada pela aplicação de uma tarifa muito maior do que a disposição a pagar,
teria impactos importantes na economia de algumas bacias com perfil predominantemente
agrícola e fortemente baseado na cultura do arroz. Por isso, a fixação de valores para a
tarifa da água para irrigação deve considerar (i) a inelasticidade preço-demanda e (ii) a
disposição a pagar. Cada Comitê deve realizar as pesquisas necessárias (ou demandar ou
viabilizar a sua execução) para a definição dos valores possíveis de cobraa, mas o
Conselho Estadual de Recursos Hídricos deve estabelecer um valor mínimo, diferente de
zero, para que a isenção da tarifa de água não seja utilizada como fator de incentivo
econômico à atividade produtiva.
Qual é o efeito da cobrança no comportamento do irrigante?
O efeito sobre o irrigante quanto à economia de água não deve ser observado na
cobrança por área, como relatado em outras experiências. Na cobrança por volume, o efeito
sobre o irrigante dependerá da política tarifária a ser implantada Também espera-se que os
irrigantes com mais tempo de experiência na irrigação tenham maior dificuldade em aceitar
a cobrança e em reduzir o consumo de água, assim como produtores de menor escolaridade
sejam mais resistentes em pagar pela água. Espera-se o abandono da atividade agrícola
irrigada pelos produtores menos eficientes em relação ao uso da água. Esta redução de área
terá pequeno impacto na produção de arroz, pois poucos produtores devem estar nesta
situação, tendo em vista o aumento da especialização da produção de arroz nos últimos
anos e a extensa cobertura de assistência técnica.
Com os resultados diretos obtidos, a hipótese sica, respeitando-se a condição da
cobrança por volume e a adoção de valores compatíveis com a intenção de pagamento da
maior parte dos produtores, é validada, devendo ser implantada nos sistemas de gestão de
recursos hídricos. O resultado desta combinação de propostas levará a uma economia do
uso da água e a uma arrecadação otimizada dos recursos necessários para a implantação das
intervenções estruturais e não estruturais definidas nos planos de bacia. Por outro lado, a
260
implantação desta hipótese deverá retirar do mercado produtor os agricultores menos
eficientes. O impacto desta retirada de produtores deve ser analisado em cada bacia,
podendo- adotar o Método dos Efeitos para isso.
No entanto, a hipótese negativa, de manutenção da cobrança por área, não é
totalmente excludente com a hipótese básica, pois ambas prevêem a cobrança pelo uso da
água. A hipótese negativa tem maior possibilidade de ser observada na maioria das bacias
brasileiras, seja por facilidade de definir o quanto cobrar, seja por concentrar-se a cobrança
sobre os setores industrial e de saneamento, colocando em segundo plano o setor agrícola.
Verifica-se, portanto, que mantida a atual sistemática de cobrança da água pela área
irrigada, com valores muito menores de tarifa do que os outros setores, que justamente o
setor de maior consumo de água será o de menor participação na sustentação do sistema de
gerenciamento de recursos hídricos, e o que terá a política tarifária menos eficaz quanto ao
incentivo a um uso econômico da água.
O campo de aplicação dos resultados da pesquisa é muito amplo. Quanto à cobrança
pelo uso da água na irrigação do arroz, os resultados podem ser aplicados à maior parte das
bacias do Rio Grande do Sul, que esta atividade agrícola é encontrada em grande parte
do estado.
Quanto à medição de água em canais não revestidos, o campo de aplicação é
praticamente o mesmo, que são poucas as áreas irrigadas que não o atendidas por
canais em terra.
Os estudos sobre gestão de perímetros coletivos podem ser aplicados nos projetos
públicos e nos privados. Pelos dados levantados, 39,5% das lavouras são atendidas a partir
do “arrendamento” da água. Considerando-se que esta água é entregue aos irrigantes a
partir da ação de um gestor, a possibilidade de se elevar a eficiência da distribuição da
água com a aplicação do princípio usuário-pagador e pela medição de vazão, fazendo com
que o irrigante passe a ser um agente diretamente interessado em um uso mais econômico
da água, conforme previsto pela filosofia que embasa a atual legislação de gestão de
recursos hídricos.
261
8. RECOMENDAÇÕES
As recomendações originadas por este estudo referem-se aos temas de gestão,
economia e hidráulica, coerente com o desenvolvimento do trabalho.
Em relação à gestão de sistemas coletivos, verifica-se que os atuais projetos
públicos do Rio Grande do Sul apresentam uma concepção e uma gica de operação e
estruturas de controle que são inadequadas ao manejo otimizado da água de irrigação. A
falta de medição de vazão e a deficiência de controle são evidentes, bem como a
dificuldade da sua alteração ou da substituição das estruturas existentes.
Estes sistemas devem ser analisados com detalhe suficiente para a concepção de
novas estruturas e práticas de gestão, que resultem em um controle melhor e uma maior
eficiência de distribuição e condução.
Verifica-se que se a função principal do canaleiro é a manutenção de um nível
aproximadamente constante, isso pode ser realizado de forma muito mais precisa e
constante por um vertedor de grande desenvolvimento. Portanto, recomenda-se o estudo da
viabilidade de implantação destas estruturas, a partir da qual é possível manter um nível
constante em trechos do sistema de canais e a adoção de estruturas padronizadas para
tomada de água parcelar, facilitando o controle da vazão efetivamente distribuída a cada
irrigante.
A discussão sobre formas de comando e controle de sistemas de irrigação atendidos
por canais não aparece na bibliografia nacional consultada. A sua inserção no ensino
superior formal ou complementar aparece como uma necessidade a ser suprida, uma vez
que é a partir da filosofia de distribuição e seu controle que os sistemas são concebidos.
O estudo do medidor IPH deve ser ampliado e aplicado em canais de terra, uma vez
que foi testado apenas em canais de concreto. Pela margem de erro encontrada, verifica-se
que o mesmo tem potencial de se tornar uma solução de estimativa de vazão em trechos de
sistemas de canais, auxiliando na definição de práticas de manejo, políticas de cobrança e
distribuição e controle de perdas ao longo do sistema.
A estimativa do valor da água para irrigação deve ser ampliada para as demais
bacias hidrográficas, como forma de subsidiar a definição de valores que possibilitem a
262
implantação dos planos de bacia, a observância de critérios de outorga e manutenção ou
melhoria da qualidade de água.
Em termos de gestão de recursos hídricos, propõe-se que seja implantada uma
sistemática de controle dos volumes outorgados para a iirgação, sendo que a medição destes
deve ser subsidiada por recursos obtidos pela cobrança do uso da água na irrigação do
arroz.
No primeiro ano, propõe-se uma cobrança generalizada por área, com um valor
mais baixo do que os obtidos nos estudos realizados nas bacias do Quaraí, Santa Maria,
Pardo-Pardinho, Sinos ou Gravataí. Esta cobrança não necessitaria ser materializada para o
Estado, mas convertida em investimento em estruturas de medição de vazão ou de volume
consumido, que seriam diferenciadas para lavouras irrigadas por gravidade ou por recalque
mecânico. Ou seja, a estrutura seria da propriedade, e não do Estado. A implantação destas
estruturas deveria abranger a maioria absoluta das grandes lavouras no primeiro ano e a
totalidade das médias lavouras no segundo ano, com o que se obteria o controle da maior
parte da área irrigada no Estado. Os pequenos agricultores deveriam estar cobertos até o
final do quarto ano. Em caso de impossibilidade técnica de implantação de qualquer
estrutura ou falta de interesse em implantá-la, o irrigante deveria contratar técnicos
especializados para a definição da vazão em períodos picos da lavoura (enchimento do
quadro e manutenção da lâmina, por exemplo, conforme avaliado no caso do Chasqueiro)
ou a intervalos de tempo determinados, como forma de estimar o volume consumido com
uma menor margem de erro.
A partir do segundo ano, os valores necessários para a irrigação poderiam ser
determinados por bacia, orientando o processo de outorga. A cada ano, os valores médios
de cada bacia definiriam a outorga para as lavouras ainda não medidas, enquanto que o
processo de implantação da medição de vazão continuaria avançando. Nesta proposição,
em quatro ou cinco safras, todas as lavouras de arroz atualmente existentes poderiam estar
controladas, seja por estruturas implantadas em canais, nos reservatórios ou nas estações de
recalque.
A fonte de recursos para isto seria essa antecipação da cobrança. Adotando-se um
referencial de 0,5 saco de arroz por hectare, o montante a ser arrecadado seria de meio
263
milhão de sacos ou, em termos médios, cerca de US$ 5 milhões a cada ano. Com este valor,
poderiam ser implantados equipamentos de medição e totalização de vazão em duas mil
bombas centrífugas em um ano, por exemplo, considerando-se um custo médio de R$
5.000,00. Para isto, seria necessária a atuação do Departamento de Recursos Hídricos junto
aos Comitês, no sentido de implantar esta cobrança generalizada e com finalidade
específica, o que não contraria a legislação.
Com a definição dos volumes consumidos e com a possibilidade de manter o
monitoramento do uso da água pela irrigação, uma política tarifária e de outorga poderia ser
definida, buscando a otimização do uso da água do ponto de vista social e a redução do
consumo para valores tecnicamente possíveis. A política tarifária poderia, então, definir
premiação ou punição aos irrigantes mais e menos eficientes, respectivamente.
Por fim, recomenda-se que sejam realizadas pesquisas sobre a eficiência de
condução de água em canais não revestidos na realidade da lavoura de arroz no Rio Grande
do Sul, considerando fatores como solo, região do estado, regime de chuvas, condições de
construção, conservação e operação do canal, entre outros, como forma de possibilitar a
definição de valores referenciais de perda de água. Com base nestes valores de perda, a
discussão sobre os valores referenciais de outorga não se dará mais a partir das
necessidades da lavoura, mas sim considerando todo o sistema hidráulico envolvido, que
as perdas por condução e distribuição terminam sendo responsáveis por volumes
significativos de retirada de água dos corpos hídricos que não chegam às lavouras.
264
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