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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
Rosa Maria Farah
Ciberespaço e seus navegantes:
novas vias de expressão de antigos conflitos humanos
PROGRAMA DE ESTUDOS PÓS-GRADUADOS EM PSICOLOGIA CLÍNICA
NÚCLEO DE ESTUDOS JUNGUIANOS
SÃO PAULO
2009
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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
Rosa Maria Farah
Ciberespaço e seus navegantes:
novas vias de expressão de antigos conflitos humanos
Dissertação apresentada à Banca Examinadora como exigência
parcial para a obtenção do título de Mestre em Psicologia Clínica
pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, sob a orientação
da Profa. Doutora Liliana Liviano Wahba.
SÃO PAULO
2009
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BANCA EXAMINADORA
Orientadora: _________________________________
Profa. Dra. Liliana Liviano Wahba
Examinadores: _______________________________
_______________________________
À geração dos “nativos digitais”, representada por
Thales Guimarães Farah, meu sobrinho, habitante
deste planeta desde a chegada da Internet. E às
novas gerações de psicólogos, que se preparam para
acolhê-los.
Agradecimentos
___________________________________________________________________
À Dra. Liliana Liviano Wahba, por acolher com simpatia, atenção e generosidade a
orientação desta pesquisa, sobre tema tão pouco explorado em nossa área.
A cada um dos integrantes do grupo do NPPI, pelo nosso convívio: o campo fértil onde as
ideias aqui reunidas foram germinadas.
Ao colega e amigo Lorival de Campos Novo, que mesmo ausente se faz presente em nosso
grupo e nestas páginas.
À Ruth G. da Costa Lopes, amiga, colega e madrinha do NPPI: com seu estímulo
persistente tornou-se corresponsável pela concretização deste trabalho.
À Ana Maria Galrão Rios, pelas muitas ajudas, dicas, apoios e pelo seu bom humor, capaz
de transformar cada percalço do preparo de uma tese em graça estimulante.
Aos amigos e colegas do Grupo Sándor (da Net), espaço virtual rico em trocas, incentivos e
treino nessa nova forma de estarmos juntos, mesmo distantes.
Aos colegas das aulas da Pós em Clínica, pelo convívio afetuoso que me permitiu relembrar
como é bom ter com quem dividir dúvidas, dicas, textos, cafezinhos, “figurinhas” e todas as
cumplicidades implícitas nessas pequenas / grandes atenções.
Aos meus alunos, pois voltar a ser aluna, nesta etapa da vida, me permitiu recordar os
privilégios e angústias de se estar nessa posição.
À Bárbara e Antonio Jorge, meus irmãos, pelos apoios afetivos e logísticos em mais esta
etapa, como sempre tem sido.
À minha mãe, por manter, no seu silêncio atual, a capacidade de sorrir, e dessa forma ainda
me animar.
Ao Odair, companheiro de sempre, por incentivar cada passo desta jornada entre tantas
percorridas em parceria amorosa.
Resumo
_______________________________________________________________
Farah, Rosa Maria. Ciberespaço e seus navegantes: novas vias de expressão de antigos
conflitos humanos, São Paulo, 2009.
O objetivo deste trabalho é descrever comportamentos e vivências dos usuários da
Internet, de acordo com observações feitas durante a coordenação do NPPI - Núcleo de
Pesquisas da Psicologia em Informática, o Serviço de Informática da Clinica Escola da PUC-
SP. O método adotado foi a Observação Participante. Os comportamentos e vivências
descritos foram analisados qualitativamente segundo o referencial da Psicologia Analítica.
O trabalho se inicia por uma revisão da literatura da qual constam publicações sobre
o tema Internet e seus desdobramentos, fundamentadas em diferentes enfoques
psicológicos. São relacionadas publicações de áreas afins (filosofia, sociologia etc.) por
conterem estudos que tangenciam fatores psicológicos envolvidos na análise dos usos da
Internet. Ao final, são apresentados trabalhos junguianos referentes ao tema.
Na sequência, insere-se breve histórico sobre a criação e desenvolvimento dos
computadores e da WEB e suas repercussões para a relação homem
ÅÆ máquina, com o
objetivo de relacionar a evolução das novas tecnologias ao desenvolvimento da consciência,
como processos que ocorrem em sincronia.
Compondo o quinto capítulo são apresentados inicialmente conceitos e proposições
sobre o ciberespaço como espaço psíquico. Em seguida, a noção do corpo virtual e
ilustrações sobre a presença de imagens referentes à tecnologia nos sonhos da atualidade.
O ciberespaço é ocupado pelos internautas como palco de expressão de conflitos e de
ensaio de novas formas de estruturação da subjetividade, estabelecimento de vínculos e
relacionamentos em renovadas expressões. Como contraponto, observa-se a
experimentação de alternativas de construção do conhecimento, com a utilização dos
recursos e ferramentas colaborativas oferecidas pela comunicação informatizada. Os
últimos itens do quinto capítulo compõem um painel ilustrativo sobre essas expressões do
ser humano no campo da virtualidade.
Palavras-chave: Internet e psicologia, Internet e Psicologia Analítica, Jung e
tecnologia, psicologia e ciberespaço, simbolismo e Internet, arquétipos e Internet.
Summary
___________________________________________________________________
Farah, Rosa Maria. Cyberspace and its surfers: New paths for the expression of old
human conflicts, São Paulo, 2009.
The objective of this work is to describe behaviors and experiences of the Internet
users according to observations made during the coordination of the NPPI – Núcleo de
Pesquisas da Psicologia em Informática (Center for Psychological Research about
Informatics), which is part of the Clinical School of the Psychology Department at PUC-SP.
The behaviors and situations described were qualitatively analyzed having the concepts of
Analytical Psychology as a reference.
The work starts with a revision of the material that has been published about the
Internet and its developments, and this material comes from different psychological schools.
Many publications from other areas are listed (philosophy, sociology, etc), since they also
study the psychological factors that are present in the analysis of the Internet usage. A few
Jungian works related to the topic are presented as well.
A brief summary about the creation and development of computers and the Web and
their effects on the relationship man
ÅÆ machine is used to examine the relationship
between the evolution of new technologies and the development of consciousness
considered as processes that occur synchronically.
The fifth chapter presents concepts and ideas proposed about the cyberspace as a
psychic space. After that, it discusses the notion of a virtual body and presents examples
about the presence of the images related to technology in dreams that people have
nowadays. The cyberspace is occupied by the internauts who use it as a stage for
expressing conflicts, as well as a place for experimenting with new forms for structuring the
subjectivity and for establishing relationships and connections. On the other hand, we also
notice attempts to create new forms of knowledge, through the use of resources and tools
that allow for activities in group and that are offered by the communication made possible
through informatization. The last topics of the fifth chapter offer a picture of these
expressions in the field of virtuality.
Key words: Internet and psychology, Internet and Analytical Psychology, Jung and
technology, psychology and cyberspace, symbolism and Internet, archetypes and Internet.
Sumário
_______________________________________________________________
Introdução
................................................................................................................................ 11
1. Revisão da literatura .......................................................................................................... 22
1.1 Pesquisas empíricas sobre os usos da Internet .............................................................. 23
1.2 Trabalhos teóricos sobre os usos da Internet ............................................................
...... 26
1.3 Trabalhos sobre aplicações clínicas das interfaces Psicoinfo ......................................... 31
1.4 Artigos de autores junguianos sobre a Internet ............................................................... 32
1.5 Comentários sobre os trabalhos localizados ................................................................... 41
2. Objetivo................................................................................................................................. 44
3. Método
.................................................................................................................................. 45
3.1 Considerações sobre o método ....................................................................................... 45
3.2 Método ............................................................................................................................. 47
3.3 Procedimentos ................................................................................................................. 47
4. Origem e desenvolvimento da Internet ........................................................................... 49
4.1 Breve história do computador e da WEB ......................................................................... 49
4.2 Chegada e difusão no Brasil ........................................................................................... 60
4.3 Evoluções previstas de usos ........................................................................................... 68
4.4 A relação homem
ÅÆ computador ................................................................................. 70
5. Ciberespaço como espaço psíquico ........................................................................ 75
5.1 O corpo no espaço virtual ............................................................................................... 79
5.2 Sonhos informatizados: presença da tecnologia no imaginário ...................................... 94
5.3 Novas vias de expressão de antigos conflitos humanos ............................................... 106
5.3.1 Comunicações e navegações polêmicas ............................................................. 115
5.3.2 Identidades virtuais ............................................................................................... 120
5.3.3 Prática do cyberbullyng ........................................................................................ 128
5.3.4 Invasão de privacidade ......................................................................................... 130
5.3.5 Usos compulsivos ou excêntricos dos acessos à Internet ................................... 133
5.4 Quantos “eus” nos habitam? ......................................................................................... 140
5.4.1 Ego - origem e desenvolvimento .......................................................................... 143
5.4.2 Espaço potencial / Espaço virtual ......................................................................... 144
5.4.3 Subjetividade(s) na pós-modernidade .................................................................. 145
5.5 Novas formas de construção do saber .......................................................................... 150
5.5.1 Expansão dos registros e acessos à informação ................................................. 150
5.5.2 Acessos colaborativos .......................................................................................... 154
5.5.3 EAD - Educação a distância ................................................................................. 157
5.5.4 Democracia eletrônica
/ “Inteligência coletiva” ..................................................... 159
5.5.5 A “memória coletiva viva” ..................................................................................... 162
5.5.6 Outras repercussões para o ensino / aprendizagem ............................................ 164
6 Considerações finais ......................................................................................................... 167
Referências ............................................................................................................................ 175
Glossário 1: Termos junguianos
......................................................................................... 189
Glossário 2: Termos de uso corrente entre os internautas
............................................. 192
Apêndice: Sobre o NPPI - Núcleo de Pesquisas da Psicologia em Informática
........... 201
Lista de Figuras
_______________________________________________________________
Figura 1: Ábaco Babilônico ......................................................................................... 50
Figura 2: Ábaco romano reconstituído ........................................................................ 50
Figura 3: Ábaco do século III d.C. ............................................................................... 51
Figura 4: Ábaco moderno ............................................................................................ 51
Figura 5: Pascalina ...................................................................................................... 52
Figura 6: O tear de Jacquard ....................................................................................... 52
Figura 7: Máquina analítica de Babbage ..................................................................... 53
Figuras 8 e 9: Máquina tabuladora de Hollerith – 1890 ............................................... 54
Figura 10: MARK I – 1943 ........................................................................................... 55
Figura 11: ENIAC ........................................................................................................ 55
Figura 12: Um dos primeiros modelos desktop utilizado para jogos ........................... 57
Figura 13: Modelo avançado: tela e teclado são componentes virtuais da máquina... 57
Figura 14: Smarthphone: integra as funções de telefone e computador pessoal ....... 57
Figura 15: Evolução do registro de informações ao longo da história ........................ 51
Figura 16: Kindle ....................................................................................................... 153
11
INTRODUÇÃO
_______________________________________________________________
Está por vir uma grande aceleração.
Aguardem e vocês assistirão.
(SÁNDOR, em aula da década de 1980)
1
Algumas circunstâncias casuais fizeram com que me tornasse usuária dos
computadores e da Internet. A prática, gradualmente, passou a despertar também meu
interesse em compreender o significado do surgimento desse recurso tecnológico para
a vida humana, bem como estudar os efeitos da intensa difusão de seus usos -
especialmente sobre aqueles aspectos relacionados às correspondentes vivências
propiciadas ao ser humano no espaço onde ocorrem: o espaço virtual.
Em meados dos anos 80, a necessidade da produção de um material didático
2
e a pouca familiaridade com a datilografia me levaram a experimentar a grande
novidade da época para a produção de textos: o computador do tipo PC–XT, uma
daquelas máquinas pioneiras nas quais os caracteres digitados eram visualizados em
verde fosforescente sobre tela escura. Surpreendentemente, digitar no novo
equipamento me pareceu tarefa bem mais rápida, prática e eficiente do que a
datilografia convencional, embora os recursos de edição dos softwares da época
fossem muito reduzidos em comparação aos atuais.
Não existia ainda a possibilidade de interatividade, ou seja, o acesso a outros
micros. Ouvia-se falar, apenas, que os computadores de centros de pesquisa no
exterior já estariam interligados de forma a permitir a troca de dados. Operar o micro
era, portanto, uma atividade isolada, ainda não interativa. Mas logo surgiram relatos de
pessoas que começavam a usar redes internas de comunicação instaladas nos
computadores das empresas nas quais trabalhavam. Era a época da utilização das
BBSs (sigla para bulletin board system
3
). Formato precurssor das atuais comunidades
virtuais, as BBSs
congregavam grupos com interesses afins, em especial profissionais
1
A declaração, feita por Sándor nas aulas do curso de especialização em Cinesiologia Psicológica, do Instituto Sedes
Sapientiae de São Paulo parece-nos aplicável ao ritmo das transformações geradas pela informatização.
2
Material publicado em 1995, como livro básico do curso O Corpo na Psicologia, oferecido na Faculdade de Psicologia
da PUC-SP: Integração psicofísica – o trabalho corporal e a psicologia de C. G. Jung (FARAH, 2008, 2. ed.).
3
Há dois glossários anexados a este trabalho: os significados dos termos de uso comum entre os internautas são
apresentados no Glossário no. 2; os termos junguianos são apresentados no glossário no 1.
12
de determinadas áreas, como o caso da Psicnet, provavelmente a primeira iniciativa
brasileira dedicada à interação virtual entre os profissionais da Psicologia.
A curiosidade sobre essas novas formas de interação motivou meu ingresso na
Psicnet, e permitiu o acesso à interface gráfica utilizada a partir do lançamento da
outra grande inovação: o Windows 3.0
4
. Impressionou-me perceber as possibilidades
de comunicação virtual abertas por esse canal, ainda que fosse muito reduzido o
número de psicólogos participantes desses primeiros contatos no ciberespaço.
A constatação do alcance da comunicação estabelecida durante essa
experiência motivou a idealização de uma proposta para a Clínica Escola da
Faculdade de Psicologia da PUC-SP: projeto bastante modesto da versão digital do
Boletim Clínico
5
, publicação interna, à época recém lançada pelo professor Efraim
Boccalandro (1995). O projeto ganhou a adesão de alguns colegas de trabalho
6
, além
do apoio informal da chefia da Clínica, dando início à formação da pequena equipe de
professores denominada Núcleo de Pesquisas da Psicologia em Informática (NPPI),
voluntariamente empenhados na criação da publicação virtual.
Aquele momento coincidiu com a chegada da Internet aberta em nosso meio.
De imediato, tornou-se evidente o caráter extremamente ágil que a informatização
imprimiria ao diálogo clínica-comunidade. Assim, o projeto inicial foi ampliado,
assumindo o formato da proposta da primeira versão da home page da Clínica Escola
da PUC-SP. Durante o planejamento da página, percebemos a variedade de aspectos
psicológicos potencialmente envolvidos nessa via de comunicação, fato que gerou
novas ampliações da proposta inicial do grupo, especialmente o interesse em
desvendar esses mesmos aspectos.
E este trabalho começou a ser delineado. A princípio, apenas como uma
coletânea de impressões pessoais a respeito das inúmeras histórias e situações
inusitadas registradas na tarefa de coordenação das atividades do NPPI. Mas essa
função propiciou as condições para minha progressiva inclusão no espaço da
virtualidade, ainda que em posições alternadas: ora como simples usuária do
computador e da Internet, ora como observadora dos processos e vivências humanas
4
O Windows 3.0 foi o primeiro ambiente de navegação realmente “amigável” lançado pela Microsoft, facilitando a
navegação na Internet.
5
A versão digital do boletim pode ser acessada na página da clínica:
<http://www.pucsp.br/clinica/publicacoes/boletim_clinico.html>
6
Referimo-nos a Ruth G. da Costa Lopes e Lorival de Campos Novo, componentes do quadro de supervisores da
Clínica Psicológica da PUC-SP. Na época a chefia da Clínica estava a cargo da professora Márcia Almeida Batista.
13
acessadas por força do exercício dessa mesma função. Essa condição,
aparentemente ambígua, revelou-se especialmente vantajosa e privilegiada, pois criou
a oportunidade da observação imersiva do processo de informatização ao qual
estamos todos sendo submetidos, gradativamente.
Foi dessa maneira que, circunstancialmente, adotei na prática os
procedimentos da metodologia de pesquisa caracterizada como “observação
participante”, tal como proposta por May (2004), segundo o qual:
Se as vidas sociais das pessoas estão mudando constantemente,
devemos nos tornar parte delas para entender como mudam;
devemos participar delas e registrar as nossas experiências dessas
transformações, os seus efeitos sobre as pessoas, assim como as
suas interpretações. (MAY, 2004, p. 175)
Mas o lugar do psicólogo participante comprometido com a observação de um
processo em curso nem sempre é confortável, pois seu envolvimento frente ao tema
de seu interesse é também um fator gerador de constantes questionamentos quanto
ao rigor adotado em seu trabalho. Uma autoexigência decorre, em grande medida, da
nossa formação acadêmica, tradicionalmente pautada pelo cultivo da objetividade, a
qual nos cobra, passo a passo, posicionamentos e análises conceituais imparciais
frente aos fenômenos observados.
Byington (1995) expressou claramente o conflito do pesquisador, durante a
apresentação de suas reflexões sobre a pesquisa científica acadêmica na perspectiva
da Pedagogia Simbólica
7
para uma plateia de pesquisadores. Destacou, por exemplo,
o atual anseio por uma ciência não mais exclusivamente racionalista, bem como a
necessidade do cultivo de um “saber” que admita a subjetividade do pesquisador como
parte integrante da constituição dessa ciência conectada ao “todo”. A certa altura,
formulou a questão central: “O orientador, o pesquisador e o examinador querem
aprender esse novo caminho para fazer ciência. [...] Como é que se faz ciência com
base nessa experiência subjetiva?” (BYINGTON, 1995, p. 55). Inspirado no
pensamento junguiano, Byington elencou preciosas pistas para a elaboração da
resposta a essa questão. Algumas retomamos a seguir:
Nós já fazemos isso no processo existencial, que Heidegger
denominou ontológico e que Jung chamou de processo de
individuação. [...] A criatividade humana está sempre incluída nessa
vivência de busca e de caminhada em direção à integração e à
7
Método pedagógico proposto por Byington (1995, 2004), inspirado no pensamento de C. G. Jung.
14
formação desse todo. Aquilo que o Ser está pedindo ao pesquisador
não está só no início da formação da consciência na infância, mas em
qualquer encontro profundo com o desconhecido durante toda a vida.
[...] É impossível não sonhar com sua pesquisa e não ter com ela as
fantasias mais variadas até chegar à objetividade. (BYINGTON, 1995,
p. 55-56)
Meu ingresso no programa de pós-graduação em Psicologia Clínica, oferecido
pelo Núcleo de Estudos Junguianos da PUC-SP, gerou a oportunidade da elaboração
deste estudo, com o objetivo de descrever comportamentos e vivências expressas
pelos usuários da Internet, de acordo com as observações feitas no processo de
criação e coordenação do NPPI
8
, o núcleo resultante do projeto original acima
mencionado.
Cabe mencionar o privilégio de ter contato, ao longo do trajeto, com a parceria
amiga e inspiradora do colega de trabalho Lorival de Campos Novo
9
– dono de uma
visão perspicaz e privilegiada frente aos fenômenos da virtualidade. Desde a
idealização do NPPI até data recente, sua participação nos trabalhos da equipe foi
essencial para o estabelecimento das bases dos serviços psicológicos informatizados
desenvolvidos no núcleo, e a orientação dos estudos e reflexões grupais sobre os
temas da cibercultura.
Não era tarefa fácil, à época, conquistar os apoios institucionais
imprescindíveis para a concretização da home page proposta. A criação da primeira
versão da página teve ajuda de colaboradores voluntários, incluindo sua primeira
hospedagem, viabilizada no endereço da Psicnet por gentileza dos seus
mantenedores
10
. Somente após sua apresentação em evento internacional, em
novembro de 1997
11
, o site da Clínica passou a ser hospedado no portal da PUC-SP,
recebendo endereço ‘pucsp.br’. A partir dessa incorporação, a página tornou-se
interativa, oferecendo endereço de e-mail para contato, fato que gerou novos
desdobramentos do projeto inicial.
A inclusão do endereço de e-mail no site da clínica propiciou a chegada das
primeiras demandas espontâneas dos internautas, na forma de mensagens contendo
pedidos de ajuda psicológica e/ou orientações frente a variados tipos de dificuldades.
8
NPPI – Núcleo de Pesquisas da Psicologia em Informática / Serviço de Informática da Clinica Escola da PUC-SP.
9
De 1995 até o final de 2007 o professor Lorival de Campos Novo participou do NPPI, atuando principalmente na
criação e supervisão dos serviços de Orientação Psicológica via e-mail
desenvolvidos pela equipe.
10
A Psicnet foi criada pelo casal Tatiana e Alexandre Dowbor, mas com a rápida difusão da Internet aberta a partir de
1995/96, a Psicnet teve vida breve.
11
Um relato sobre a criação e implantação dessa página foi apresentado no XXVI Congresso Interamericano de
Psicologia, realizado em julho de 1997, na PUC-SP (FARAH, LOPES e NOVO, 1997).
15
As solicitações causaram surpresa à equipe, pois, em princípio, não havia intenção da
oferta de atendimentos via Internet uma vez que essa forma de intervenção
psicológica não era ainda regulamentada em nosso meio. No entanto, dois fatores nos
levaram a assumir o desafio de buscar formas de atendimento às demandas. O
primeiro por já contarmos com uma equipe estruturada, composta por jovens
psicólogos interessados na criação de serviços psicológicos mediados por
computadores. O segundo, o fato de estarmos inseridos em uma clínica escola, local
por definição dedicado às atividades de ensino, pesquisa e prestação de serviços à
comunidade.
Com equipe ampliada
12
, o NPPI desenvolve atualmente trabalho bastante
significativo na nova área da Psicologia: a Psicoinfo
13
. O relato detalhado sobre as
atividades do grupo seria muito extenso para o corpo deste trabalho
14
. Mas, cabe
assinalar que a função de coordenação dessa equipe reforçou o interesse inicial em
estudar mais amplamente a Internet como fenômeno psicológico.
As atividades anteriores como docente e psicoterapeuta, embasadas na
abordagem da Psicologia Analítica, serviram como fundamento ao estudo dentro
desse enfoque, pois, ao pesquisar a literatura a respeito das interfaces Psicoinfo e
seus desdobramentos, constata-se serem raros
15
e pontuais os artigos publicados
sobre os temas, na abordagem junguiana.
O explosivo avanço da utilização das novas tecnologias de comunicação
acontece nas mais variadas áreas das atividades, dos relacionamentos e do existir
humano. De modo especial, a difusão da Internet aberta e o crescimento exponencial
da sua utilização para diferentes finalidades acarretam mudanças culturais
expressivas a ponto de nos referirmos a este tempo como sendo a “era da informação
e das comunicações”.
Concomitante à difusão dos usos originais da WEB – registro e comunicação
de dados - observa-se também o acelerado desdobramento das aplicações das
tecnologias digitais em diferentes campos de atividades, além das comunicações
propriamente ditas. A informatização é utilizada para inúmeras funções: do mero
12
Em setembro de 2008 o NPPI realizou – na PUC-SP - a III Jornada sobre Psicologia e Informática. Os anais desse
evento podem ser consultados no site: <http://www.pucsp.br/nppi/jornada/index.html>.
13
Psicoinfo é a denominação adotada para designar a área de estudo das interfaces Psicologia / Informática.
14
Uma síntese sobre as principais atividades do NPPI é apresentada em apêndice, ao final deste trabalho.
15
Os artigos mencionados serão citados adiante, na revisão da literatura.
16
controle de estoque dos estabelecimentos comerciais a sofisticados procedimentos
cirúrgicos; do registro e controle das operações financeiras às previsões
meteorológicas; dos registros de dados realizados pelas agências governamentais ao
controle da navegação dos artefatos espaciais. Já há algum tempo estamos imersos
na estrutura da “sociedade em rede” prevista e descrita por Castells em 1996, ano da
edição original de seu clássico livro A sociedade em rede (CASTELLS, 2005):
Em razão da convergência da evolução histórica e da transformação
tecnológica, entramos em um modelo genuinamente cultural de
interação e organização social. Por isso é que a informação
representa o principal ingrediente de nossa organização social, e os
fluxos de mensagens e imagens entre as redes constituem o
encadeamento básico da nossa estrutura social. (CASTELLS, 2005,
p. 573)
No entanto, em seus aspectos mais abrangentes, as implicações psicológicas
das novas experiências humanas propiciadas pela Internet são questões ainda pouco
estudadas pela Psicologia. Conforme demonstra a revisão da literatura, com certa
frequência as pesquisas desenvolvidas por psicólogos sobre essas questões têm
como ponto de partida concepções valorativas prédefinidas acerca da WEB,
produzindo conclusões parciais a respeito dos processos estudados.
No entanto, nessa mesma revisão foram localizados dois sites junguianos
contendo propostas incomuns entre representantes da Psicologia Analítica: o primeiro,
denominado Psybernet.com (acesso em 11/02/09) é assinado por Logeman,
psicoterapeuta que se apresenta como filiado à Christchurch da Nova Zelândia.
Situando sua abordagem, Longeman declara-se eclético, mas coloca a ênfase do seu
trabalho no enfoque junguiano, oferecendo aos interessados, no espaço do site citado,
uma modalidade de atendimento psicoterápico on-line. O segundo site localizado -
Cyberdreamwork (acesso em 19/02/09) - também se caracteriza como junguiano, com
outra proposta inusitada: oferece aos internautas uma espécie de roda de sonhos on-
line; seus autores - Robert Bosnak e Jill Fischer - se apresentam como filiados à
International Society for Embodied Imagination, e oferecem “treinamentos on-line” para
essa modalidade de “trabalho não terapêutico com sonhos”.
Parece, portanto, que os recursos oferecidos pela WEB para fins terapêuticos e
psicoterápicos começam a despertar a atenção dos junguianos, fato que reforça a
atualidade de mais essa vertente das utilizações da Internet. No entanto, observações
e estudos mais apurados sobre a natureza das vivências na virtualidade ocorrem de
17
forma ainda tateante - ou mesmo distanciada - por parte dos pensadores da Psicologia
profunda de modo geral, e da Psicologia Analítica em particular. Além de relativamente
raras, em sua maioria as publicações se atêm aos comportamentos observados,
deixando de abordar de modo mais significativo os aspectos simbólicos das vivências
já em curso no espaço da virtualidade.
No âmbito mais amplo da Psicologia, as análises também se concentram nos
aspectos predominantemente comportamentais da sua utilização, focalizando
preferencialmente os possíveis efeitos danosos do uso excessivo, compulsivo ou
excêntrico dos computadores como via de acesso à Internet. Exemplos são os estudos
de Young (1996) e Prado (1998), entre outros, relativos aos primeiros casos de “vícios
em computadores”.
A preocupação dos pesquisadores frente aos comportamentos tidos como
patológicos - ou no mínimo vistos como desviantes da normalidade –, resulta na
elaboração de um saber psicológico centrado prioritariamente na ênfase sobre tais
sintomas. Portanto, tende a ser colorido por uma visão patologizante dos processos e
vivências observados no ciberespaço. Em decorrência, embora pioneiras e relevantes
para o estudo desse aspecto do comportamento dos internautas, as análises
apresentadas nessas publicações detém-se nos aspectos objetivos ou sintomáticos
dos comportamentos observados. Mas, esses sintomas destacam-se como pontas de
um iceberg, indicando estar em curso fenômenos bem mais complexos, resultantes de
processos ainda pouco estudados do ponto de vista do seu significado psicológico
mais profundo.
Exemplos dessa visão patologizante a respeito das vivências virtuais podem
ser observados imprensa atual, que divulga uma série de conclusões - não raro
contraditórias e precipitadas - sobre as conseqüências do uso das novas tecnologias
sobre a vida psíquica da atualidade. Alguns exemplos: em junho de 2008 o jornal
Estado de S. Paulo publicou a opinião do professor americano Mark Bauerlein
(BAUERLEIN, 2008, Acesso em 20/06/08), da Universidade Emory, em Atlanta.
Segundo ele, as “distrações digitais” (como as mensagens instantâneas, os sites de
relacionamento como Orkut, MySpace e Facebook, e mensagens de texto pelo celular)
estão “emburrecendo” a juventude.
No mesmo mês, o jornal Folha de S. Paulo apresentou informações claramente
contrastantes às do estadão. A manchete da matéria era: “Einsteins na adolescência -
18
Os jovens de 12 a 20 anos respiram bits e pixels, questionam a autoridade e
encontram respostas imediatas - é a geração mais capacitada da história”. Nessa
mesma notícia há a seguinte informação:
O cientista político neozelandês James Flynn analisou nos anos 1980
os registros históricos do Q.I. (quociente de inteligência) em vinte
países e mostrou que o QI médio da população cresce entre cinco e
vinte e cinco pontos, de uma geração para a seguinte: é o agora
chamado efeito Flynn. (FLYNN, 2008, Acesso em 20/06/08)
Como se percebe a tendência da mídia de forma geral é atribuir à WEB um
papel decisivo e determinante das mudanças do comportamento dos jovens da
atualidade - tanto para o bem quanto para o mal. No entanto, os acessos às novas
tecnologias digitais não deveriam ser as únicas variáveis consideradas na nossa
análise dessas transformações. Mudanças nos hábitos alimentares e maior acesso à
educação, entre outros fatores, certamente concorrem para as transformações
observadas nas novas gerações.
Até onde se observa as análises psicológicas a respeito da grande rede, e seus
efeitos, estão embasadas principalmente nas constatações pontuais dos
pesquisadores, ou seja, apoiadas em dados colhidos por meio de experiências
relativamente limitadas da sua utilização. Embora o fato não ocorra por uma omissão
intencional dos pesquisadores - mas em boa medida até mesmo pela origem recente
do próprio fenômeno em pauta -, corre-se o risco de agir como os personagens da
antiga parábola sobre os cegos que apalpavam o elefante
16
: diante do fenômeno cuja
real dimensão ultrapassa significativamente o alcance da percepção individual, cada
um atribuirá interpretações e valorações parciais aos fragmentos acessíveis ao seu
olhar e crivo de valores.
Cabem então, real interesse e objetividade diante dos fatos e eventos já em
curso no ciberespaço, bem como da estrutura da grande rede, para melhor
compreendermos seu funcionamento e as formas de inserção humana em seus
domínios. Sem essa percepção, continuaremos a nos referir à Internet apenas ampla e
genericamente, sem delimitar qual das suas múltiplas facetas está sendo mencionada
e avaliada naquele momento. Sem tal clareza, torna-se praticamente impossível, ao
16
Antiga parábola oriental, na qual a idéia central é a seguinte: seis cegos, sem saber do que se tratava, começam a
apalpar um elefante. Um cego tocou o lado do corpo do elefante e disse
que era um muro. Outro tocou a orelha do
animal e disse que era um grande abano. Outro segurou uma das suas pernas e pensou que fosse o tronco de uma
árvore. Outro, ainda, segurou a tromba e disse que era uma cobra. Outro cego tocou uma das presas de marfim e
pensou que se tratava de uma lança. Finalmente, outro cego tomou a cauda do elefante nas mãos e julgou estar
segurando uma corda. Desse modo, cada um atribuiu ao animal, até então desconhecido, uma interpretação parcial, de
acordo com o alcance de sua percepção.
19
psicólogo, avaliar o significado essencial da WEB como fenômeno expressivo da alma
humana do nosso tempo.
Ao lidar com questões da atualidade – e de modo especial com o surgimento
da Internet e suas implicações psicológicas - será extremamente valioso ter-se em
conta a advertência expressa por Jung em Civilização em transição, sobre a busca de
respostas frente a problemas que apenas recentemente se mostraram à observação
(JUNG, 1993, § 148):
Moderno é o homem que surgiu há pouco, e um problema moderno é
uma questão que surgiu, mas cuja resposta ainda está no futuro. [...]
Além disso, trata-se de algo tão geral – para não dizer vago – que
supera em muito a força de compreensão de um único pensador, de
maneira que temos todas as razões do mundo para abordar este
problema com toda modéstia e o maior cuidado.
Talvez falte ainda o distanciamento histórico / temporal necessário para se
observar e analisar a WEB de maneira menos apaixonada e mais objetiva. No entanto,
sua rápida expansão, e a correspondente difusão de seu uso cotidiano, exigem o
posicionamento dos profissionais da área, ao menos em grau suficiente para a
compreensão dos seus efeitos mais diretos e imediatos sobre a vida das pessoas que
os procuram em busca de acolhimento psicológico. Nesse sentido, este estudo
pretende contribuir para o reconhecimento da WEB como novo espaço de expressão
da alma humana, merecedor, portanto, da atenção do psicólogo.
Por outro lado, conforme se pretende demonstrar na revisão da literatura,
estudos abrangentes sobre essa temática são realizados já há algum tempo em outras
áreas do conhecimento (filosofia, sociologia, comunicações, entre outras). Esse
descompasso evidencia a urgência de que a Psicologia – em especial a Psicologia
Analítica – se apropriar do tema e contribuir para ser ampliada a visão sobre as
dinâmicas psíquicas envolvidas nas experiências humanas atualmente expressas na
WEB. O contexto delineado é a principal justificativa para a realização do presente
trabalho.
O trabalho se inicia por uma revisão da literatura. Do levantamento constam as
principais publicações sobre o tema Internet e seus desdobramentos, fundamentadas
em diferentes enfoques da Psicologia. São relacionadas também publicações de áreas
afins (filosofia, sociologia, etc.) por conterem estudos pioneiros relevantes que
20
tangenciam fatores psicológicos envolvidos na análise dos usos da Internet.
Finalmente, são apresentados os trabalhos junguianos publicados até o momento.
Em seguida, insere-se um breve histórico sobre a criação e desenvolvimento
dos computadores e da WEB e comentários sobre as repercussões dessa evolução
para a relação homem
 máquina. O objetivo desse capítulo é relacionar a evolução
dos usos das novas tecnologias ao desenvolvimento da consciência, como processos
que ocorrem em sincronia.
Nos itens do próximo capítulo, são apresentados conceitos básicos e
proposições sobre o ciberespaço como espaço psíquico, iniciando pela conceituação
dos termos virtual, real e presencial, segundo a acepção adotada. Em seguida,
tomando como referência a noção do corpo virtual – o “hipercorpo” proposto por Levy
(LEVY, 2005) - são apresentadas reflexões sobre o tema, segundo a visão junguiana.
Na sequência, ilustrações sobre as formas com as quais a tecnologia se faz presente
no imaginário da atualidade por meio da presença dos aparatos tecnológicos nas
imagens dos sonhos.
As observações indicam que o ciberespaço é ocupado pelos seus navegantes
como palco da manifestação de conflitos, bem como do ensaio de novas formas de
estruturação da subjetividade, estabelecimento de vínculos e relacionamentos,
permeados por encontros e desencontros em renovadas expressões. Como
contraponto, observa-se também, nesse espaço, a experimentação de formas
alternativas de construção do conhecimento, com a utilização dos recursos e
ferramentas colaborativas viabilizadas pela comunicação digital. Os três itens finais do
quinto capítulo compõem um painel ilustrativo dessas manifestações do ser humano
na virtualidade.
A proposta deste trabalho é altamente estimulante e ousada, mesmo tendo em
mente o alcance delimitado dos temas selecionados para estudo. Pois existe sempre
algum risco – de erro e acerto – envolvido no percurso de novos caminhos da jornada
humana. Assim, finalizando esta introdução cabe lembrar a recomendação do poeta
para quem, “se calhar, tudo é símbolos” (PESSOA, 1969, p. 387), como orientadora
desse percurso.
Em sua “Mensagem”, Pessoa nos alerta sobre as cinco qualidades ou
condições necessárias ao intérprete para entendê-los, sem as quais os símbolos
21
“serão mortos para ele”. Por ordem, cita a simpatia: “Tem o intérprete que sentir
simpatia pelo símbolo que se propõe a interpretar”. A seguir, a intuição: “aquela
espécie de entendimento com que se sente o que está além do símbolo, sem que se
veja”. A terceira, a inteligência, aquela que “analisa, decompõe, reconstrói num outro
nível o símbolo”. A quarta é a compreensão, diferenciando-a da erudição - a soma de
conhecimento - e da cultura - a sua síntese. Por fim, o poeta cita a quinta condição:
A quinta é menos definível. Direi talvez, falando a uns que é a graça,
falando a outros, que é a mão do Supervisor Incógnito, falando a
terceiros, que é o Conhecimento e a Conversação do Santo Anjo da
Guarda, entendendo cada uma destas coisas, que são a mesma, da
maneira como as entendem aqueles que delas usam, falando ou
escrevendo. (PESSOA, 1969, p. 70)
22
REVISÃO DA LITERATURA
_______________________________________________________________
A limitação inevitável que acompanha qualquer observação psicológica
é a de que ela, para ser válida, pressupõe a equação pessoal do observador.
(JUNG, 1984, § 213)
As transformações observadas na sociedade a partir do surgimento das
ferramentas informatizadas foram previstas por Norbert Wiener em 1950, data da
primeira edição de Cibernética e sociedade: o uso humano de seres humanos
(WIENER, 1958). É interessante observar como Wiener antecipou discussões
fundamentais que só mais recentemente passaram a ocupar espaço e atenção
coletiva, na medida em que a cibernética
17
ganhou contornos mais concretos e
visíveis na forma dos equipamentos e artefatos informatizados. No primeiro capítulo de
seu livro, o autor nos fornece uma introdução à sua tese central:
A tese deste livro é de que a sociedade só pode ser compreendida
através de um estudo das mensagens e das facilidades de
comunicação de que disponha; e de que, no futuro o desenvolvimento
dessas mensagens e facilidades de comunicação, as mensagens
entre o homem e as máquinas, entre as máquinas e o homem, e
entre a máquina e a máquina, estão destinadas a desempenhar um
papel cada vez mais importante. (WIENER, 1958, p. 16)
Um breve histórico sobre o desenvolvimento dos computadores e da Internet
será apresentado em um próximo capítulo. No entanto, para situar no tempo os
trabalhos relacionados nesta revisão, cabe mencionar que a popularização do uso das
ferramentas informatizadas teve início nos EUA, na década de 1990. Nessa fase, que
antecedeu a difusão dos acessos à Internet aberta, o primeiro uso dos computadores
a se tornar popular foram os games, forma de lazer que se tornou comum entre os
estudantes das mesmas universidades onde as pesquisas sobre essa tecnologia eram
desenvolvidas. Assim, foi também nos EUA que ocorreram os primeiros casos de usos
compulsivos dos jogos - e posteriormente da WEB - despertando a atenção dos
pesquisadores do comportamento e motivando as primeiras publicações sobre os
prejuízos gerados pelas novas tecnologias aos seus usuários.
17
Cibernética, do grego cybernetics: Estudo comparativo dos mecanismos de comunicação e de controle nas
máquinas e nos seres vivos, do modo como se organizam, regulam e aprendem. Fonte: Dicionário Aulete digital.
23
A difusão da WEB mobilizou o interesse de outras disciplinas das ciências
humanas, gerando publicações de caráter teórico e reflexivo, em geral mais
abrangentes do que as produzidas nas primeiras pesquisas da psicologia, pois
abordam vários aspectos dos usos da Internet além das manifestações abusivas ou
excêntricas de navegação.
Para fins de ordenação das publicações localizadas, serão relacionados
inicialmente os trabalhos relativos às pesquisas empíricas, seguindo-se os trabalhos
de caráter teórico / reflexivos e os trabalhos referentes aos estudos sobre as interfaces
Psicologia / Informática. Por fim, serão apresentados os trabalhos publicados por
autores junguianos.
1.1 Pesquisas empíricas sobre os usos da Internet
O trabalho de Young (1996) da University of Pittsburgh at Bradford, marcou
época, tornando-se referência internacional na descrição dos comportamentos que
passaram a ser popularmente conhecido como “vício em computadores” ou no “uso da
Internet”. Para realizar as primeiras pesquisas junto aos universitários americanos,
Young adaptou um questionário autoaplicável baseado em um instrumento até então
utilizado para diagnóstico da adição a jogos compulsivos de outros tipos. Em nova
versão, esse questionário visa oferecer aos usuários dos computadores um meio de
avaliar as formas de utilização dessa tecnologia, bem como os eventuais prejuízos
gerados pela atividade em sua vida presencial. O instrumento se tornou um recurso
bastante conhecido e passou a ser utilizado em outros trabalhos sobre o tema, com a
finalidade da identificação da vigência (ou não) dessa adição nos sujeitos
pesquisados. Young continua em destaque atualmente, pela oferta on-line de uma
série de atividades e procedimentos terapêuticos relacionados ao tema “vício”, além
de publicações e outros tipos de serviços que visam tratar os usuários compulsivos da
Internet, em suas diferentes manifestações
18
.
Vários relatos de pesquisas publicados por Young e seus colaboradores estão
disponíveis no site intitulado Center of Internet Addiction (YOUNG, 2008). Uma relação
parcial desses trabalhos fornece uma visão geral da ênfase do grupo à investigação
das formas mais polêmicas de navegação e utilização da WEB: “Internet Addiction:
18
Uma visita ao site assinado por Young <www.netaddiction.com> poderá ilustrar a variedade de ofertas dirigidas a
leigos e profissionais ali apresentadas.
24
the emergency of a new clinical disorder” (YOUNG, 1996); “The Relationship Between
Depression and Internet Addiction” (YOUNG and RODGERS, 1998); “Internet
Addiction: syntoms, evaluation and treatment” (YOUNG, 1999); “Cyber-Disorders: the
mental health concern for the new millennium” (YOUNG, PISTNER and BUCHANAN,
2000); “Internet Abuse in the Workplace: new trends in risk management” (YOUNG
and CASE, 2004).
O destaque ao estudo dos comportamentos compulsivos frente à WEB,
considerados potencialmente patológicos ou danosos ao internauta, criou escola,
especialmente nos EUA. Recentemente um psicólogo brasileiro (ABREU, 2008)
revisou essas pesquisas em diferentes bancos de dados - MedLine, Lilacs, SciELO e
Cochrane -, localizando cento e sete publicações sobre a “dependência da internet e
dos jogos eletrônicos” na população em geral, entre os anos de 1997 e 2007. Destes,
selecionou trinta e seis artigos para análise, visando “avaliar a evolução desses
conceitos no decorrer da última década e contribuir para a melhor compreensão do
quadro e suas comorbidades”
19
(ABREU, 2008).
Na análise das publicações coletadas Abreu questiona os trabalhos
apresentados pelos autores, a começar pelos procedimentos adotados quanto à forma
de aplicação do principal instrumento utilizado nesses estudos - o mencionado
questionário adaptado por Young (1996) - e quanto aos critérios de seleção dos
sujeitos estudados, por terem sido, ambos, realizados on-line (via Internet). Outro
questionamento apresentado por Abreu refere-se à aplicação dos termos “adição” ou
“dependência” ao problema em questão, pois, diferentemente da maior parte das
demais dependências, no caso de usos problemáticos dos jogos informatizados e dos
acessos compulsivos à Internet não ocorre ingestão de qualquer tipo de substância
por parte dos sujeitos envolvidos.
Outro aspecto discutido por Abreu (2008) é a grande variação dos índices de
prevalência apontados nos diferentes estudos (desde 2,7% até 37,5%), variação que
parece estreitamente associada aos critérios adotados para o levantamento e análise
dos dados coletados em cada uma dessas pesquisas. Dentre os trabalhos analisados,
a proposta de critério diagnóstico formulada por Shapira foi destacada positivamente
por Abreu. Nesse enfoque, os comportamentos estudados entrariam na classificação
de “usos problemáticos da Internet” (SHAPIRA apud ABREU, 2008), pois, dessa
19
Boa parte dos artigos coletadas na WEB para esta revisão foram editadas em formato no qual não é possível a
identificação das páginas ou a data da publicação. Nesses casos, será citada apenas a data da edição ou do acesso.
25
maneira, esses comportamentos estariam amparados pela classificação dos
“transtornos de controle do impulso”. Ilustra-se assim a prevalente preocupação dos
pesquisadores com a “classificação” etiológica dos comportamentos estudados.
Concluindo, Abreu reafirma a inegável existência do problema referente aos
usos excessivos da Internet, em várias versões, e dos prejuízos gerados para uma
parcela significativa dos internautas, fato evidenciado em sua experiência
ambulatorial
20
. No entanto, em suas conclusões Abreu reforça a necessidade de
novos estudos antes do estabelecimento de conclusões seguras sobre a natureza
essencial do problema em pauta, seu diagnóstico, e aprimoramento das modalidades
de atendimento terapêutico dirigidas a esses casos.
Conforme mencionado, em meados da década de 1990 a utilização da WEB no
Brasil estava em fase inicial e pouco expressiva. Por essa razão, somente no final
dessa década os estudos sobre as diferentes formas e efeitos de seus usos passaram
a despertar o interesse dos pesquisadores do nosso meio
21
.
Em 1998, um graduando da Faculdade de Psicologia da PUC-SP dedicou seu
trabalho de conclusão de curso a um estudo exploratório sobre “os hábitos de uso e
vício em Internet” (PRADO, 1998). Em seguida, como dissertação de mestrado, Prado
pesquisou outro tema da área Psicoinfo, dessa vez observando e avaliando a relação
terapêutica estabelecida na Psicoterapia via Internet, segundo a abordagem
comportamental (PRADO, 2002).
Em 1999, outro graduando, finalizando a formação em Psicologia na PUC-SP
escolheu como tema de trabalho de conclusão as “relações interpessoais via Internet,
nos chats” (Lopes, 1999). No mesmo período, ainda na PUC-SP, Paulo Sergio de
Carvalho (1999) dedicou a dissertação de mestrado em Psicologia Clínica ao tema da
Interação entre humanos e computadores, posteriormente publicada sob o mesmo
título pela EDUC (CARVALHO, 2000).
Fortim (2004) apresentou dissertação de mestrado Alice no país do espelho:
realidade virtual baseada em texto e imaginação, ao Programa de Pós Graduação em
Ciências Sociais, da Antropologia, PUC-SP. Nessa pesquisa, Fortim investigou a
20
A observação de Abreu coincide com nossa experiência, no atendimento realizado pela equipe do NPPI na Clínica
Escola da PUC-SP via site <www.pucsp.br/nppi>.
21
Cabe aqui uma breve menção à memória de Paulo Barros, um dos primeiros psicólogos brasileiros a se interessar
pela Internet. Embora não tenha publicado trabalhos na área, em meados dos anos 90 Barros gravou, em mídia digital,
um “passo a passo” com o objetivo de introduzir os psicólogos no uso das ferramentas oferecidas na WEB.
26
adesão de uma significativa população de jovens brasileiros com ao MUD, um tipo de
game realizado on-line. O MUD não apresenta imagens na tela; apenas descrições
verbais, por meio das quais os participantes criam imagens mentais, tanto a respeito
do ambiente virtual no qual são realizadas as atividades dos jogadores, quanto dos
personagens (avatares
22
) criados pelos participantes para representá-los no jogo.
1.2 Trabalhos teóricos sobre os usos da Internet
Se os estudos psicológicos sobre a virtualidade e a informatização da
comunicação humana ainda são relativamente raros, conforme assinalado, em outras
áreas as publicações sobre esses temas são numerosas. Por essa razão, para esta
revisão serão selecionados apenas os trabalhos mais representativos.
Desde o início da década de 90 pensadores de diferentes disciplinas da área
de humanas (filosofia, sociologia, comunicação, antropologia, entre outras) publicam
estudos sobre as vivências humanas no espaço da virtualidade, analisando
teoricamente temas envolvidos na então recém surgida “cibercultura
23
”. Os autores se
dedicam à descrição e análise das vivências humanas observadas no espaço da
virtualidade: desde as interações pessoais estabelecidas pelas vias virtuais até as
possíveis implicações desse fenômeno para a estruturação da identidade dos seus
protagonistas, além dos possíveis efeitos sobre a organização e a dinâmica das
interações sociais.
Na filosofia, destaca-se a obra de P. Levy, pensador que, desde o início
caracterizou-se por apresentar análises entusiásticas sobre a Internet e as
manifestações humanas no espaço virtual. A primeira edição francesa de O que é o
virtual (LEVY, 1995) foi lançada em 1995, e sua produção sobre temas correlatos
tornou-se referência internacional. Dentre as obras traduzidas para o português, ao
menos três outros títulos de Levy são considerados leituras fundamentais: Cibercultura
(2000), As tecnologias da inteligência (2000) e A inteligência coletiva (2006). Os
termos presentes em seus títulos (virtual, cibercultura, inteligência coletiva) tornaram-
se significativos nos meios acadêmicos em boa medida por força da repercussão de
suas publicações.
22
Vide Glossário 2.
23
Mais conhecido a partir da obra de Levy (LEVY, 2000), o termo Cibercultura é utilizado em vários sentidos. De modo
amplo, pode ser entendido como: “a forma sociocultural que advém de uma relação de trocas entre a sociedade, a
cultura e as novas tecnologias de base micro-eletrônicas surgidas na década de 70, graças à convergência das
telecomunicações com a informática”. Fonte: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Cibercultura> Acesso em 08/09/07.
27
Em função do tratamento adotado nas análises sobre a Internet e o
ciberespaço, Levy é tido como um pensador basicamente otimista. Costuma destacar,
em suas considerações, os aspectos positivos e promissores das aplicações das
ferramentas informatizadas, avaliadas como poderosos aliados para a difusão e
democratização do conhecimento, especialmente quando utilizados no contexto das
comunidades virtuais criadas na WEB com essa finalidade.
Ao descrever os possíveis efeitos da utilização das ferramentas tecnológicas
sobre o desenvolvimento do pensamento no âmbito coletivo, Levy propõe uma
ecologia cognitiva (LEVY, 2006). Outro conceito fundamental para a compreensão das
ideias de Levy, será a sua concepção sobre a inteligência coletiva:
É uma inteligência distribuída por toda parte, incessantemente
valorizada, coordenada em tempo real, que resulta em uma
mobilização efetiva das competências. Acrescentemos à nossa
definição este complemento indispensável: a base e o objeto da
inteligência coletiva são o reconhecimento e o enriquecimento mútuos
das pessoas, e não o culto de comunidades fetichizadas ou
hipostasiadas. (LEVY 2007, p. 28)
Levy prevê, para futuro próximo, a aceleração da ampliação da consciência
coletiva, em sentido amplo: não apenas em termos quantitativos (ampliação da difusão
e democratização do saber), mas também no que se refere à expressão qualitativa
dessa evolução. Nesta perspectiva, a construção do conhecimento coletivo deverá –
segundo Levy - ser regida por novas dinâmicas, propiciadas pela virtualidade:
O coletivo inteligente não submete nem limita as inteligências
individuais; pelo contrário, exalta-as, fá-las frutificar e abre-lhes novas
potencias. Esse sujeito transpessoal não se contenta em somar as
inteligências individuais. Ele faz florescer uma forma de inteligência
qualitativamente diferente, que vem se acrescentar às inteligências
pessoais, uma espécie de cérebro coletivo ou hipercórtex. (LEVY,
2007, p. 94)
Turkle, professora de Sociologia do prestigiado MIT (Instituto de Tecnologia de
Massachusest), é considerada pioneira no estudo das interações humanas no
ciberespaço. Seu trabalho mais conhecido, Life on the Screen: identity in the age of
internet (TURKLE, 1997), foi originalmente publicado em 1996, momento em que as
experimentações das vivências humanas na virtualidade já ocorriam nos Estados
Unidos, embora em grau ainda incipiente se comparado às proporções que assumiu
na atualidade.
28
Integrando o enfoque psicanalítico à formação em Sociologia Turkle dedica-se
ao estudo das comunidades virtuais e temas correlatos. Conforme declarou em
entrevista concedida a Casalegno (1999): “Sempre me interessei pelos “lugares” da
Internet onde as pessoas podem estabelecer vínculos que não são transitórios. A
comunidade não pode existir no transitório. São termos antagônicos.” (TURKLE apud
CASALEGNO, 1999, p. 117). Nessa entrevista, Turkle esclarece que seu interesse nas
comunidades virtuais decorre da possibilidade de observação dos múltiplos efeitos que
a participação nesse tipo de organização pode produzir, inclusive sobre a constituição
da subjetividade dos seus componentes. Demonstrando sintonia com as ideias de
Levy, Turkle questiona a noção do senso comum segundo a qual o significado
atribuído à expressão “vida virtual” seria entendido como sinônimo de “vida irreal”:
Acho que se comete um erro grave ao falar-se em vida real e em vida
virtual, como se uma fosse real e a outra não. Na medida em que as
pessoas passam tempo em lugares virtuais acontece uma pressão,
uma espécie de expressão do desejo humano de tornar mais
permeáveis as fronteiras do real e do virtual. Em outros termos, creio
que enquanto os especialistas continuam a falar do real e do virtual,
as pessoas constroem uma vida na qual essas fronteiras são cada
vez mais permeáveis. (TURKLE apud CASALEGNO, 1999, p. 118)
Em contraste às posições otimistas expressas por alguns autores frente à
WEB, há outros pensadores que expressam visões diametralmente opostas,
correspondendo àqueles analistas informalmente mencionados como “apocalípticos”.
Nessas publicações verifica-se uma forte ênfase sobre fatores considerados negativos
ou ameaçadores - para o ser humano - decorrentes da difusão da WEB, conforme
exemplos a seguir.
Como contraponto à posição otimista adotada por Levy, cita-se a obra
Simulacros e simulação e Tela total: mito-ironias da era do virtual e das imagens
(BUADRILLARD, 1991, 1997). Um estudo comparando as posições apresentadas por
Levy e Buadrillard ilustra o contraste entre as posições assumidas pelos autores frente
aos fenômenos desencadeados pela virtualidade:
Enquanto Baudrillard entende o virtual como o esvaziamento do real
e o fim da comunicação, Levy interpreta o virtual como o exercício da
criatividade e a garantia da permanência dos processos
comunicacionais. Para Baudrillard, o virtual significa o fim do sentido,
para Levy é a criação de novos sentidos: a virtualização seria uma
característica da própria comunicação (da linguagem), estando
presente desde o momento em que a humanidade passou a produzir
textos. (COELHO, 2001, acesso em 2008)
29
Na clássica Sociedade em rede, Castells (2005) situa e descreve as
reestruturações sociais promovidas pelo surgimento das redes informatizadas e
analisa as implicações do atual predomínio dessa forma de organização social.
Embora focalize especialmente as repercussões sócio-econômicas das
transformações assinaladas, Castells (2005) ressalta outras implicações decorrentes
dessa revolução, conforme ilustra sua afirmação:
Os processos de transformação social sintetizados no tipo ideal de
sociedade em rede ultrapassam a esfera de relações sociais e
técnicas de produção: afetam a cultura e o poder de forma profunda.
As expressões culturais são retiradas da história e da geografia e
tornam-se predominantemente mediadas pelas redes de
comunicação eletrônica que interage com o público e por meio dele
em uma diversidade de códigos e valores, por fim incluídos em um
hipertexto audiovisual digitalizado. (2005, p. 572)
Prefaciando a obra de Castells, Cardoso adianta que, em sua extensa análise,
o autor considera detalhadamente “a maneira pela qual o novo formato de organização
social se traduz, não apenas em novas práticas sociais, mas em alterações da própria
vivência do espaço e do tempo como parâmetros de experiência social” (CARDOSO,
2005, p. 36-37). Desse modo, Castells posiciona-se como um dos pensadores que
inclui, em suas considerações sobre a cibercultura, elementos que tangenciam os
fatores psicológicos implicados nos fenômenos da virtualidade.
Na fase inicial da popularização da WEB, outros autores publicaram trabalhos
abordando as interações humanas permeadas pelas novas tecnologias e suas
possíveis implicações, incluindo considerações sobre fatores psicológicos desses
processos. Exemplos são Romanyshyn, com Technology as Symptom & Dream (2006)
e Stefik, com Internet Dreams – Archetypes, Myths and Metaphors (2001)
24
. As
primeiras edições dessas obras datam, respectivamente, de 1992 e 1996.
A partir de 1995, a chegada da Internet ao Brasil motivou alguns psicólogos –
em geral mais jovens - a realizar estudos teóricos sobre as interfaces que começavam
a ser verificadas entre a Psicologia e a Informática. Começava a se delinear a
Psicoinfo, como área de estudo dessas interfaces. Três publicações resultaram dos
primeiros eventos
25
sobre o tema, promovidos em parceria pelo CFP e o CRP-06 (São
24
As ideias dos autores serão comentadas na apresentação dos trabalhos junguianos, em especial os artigos de Brien
(1997, 2005).
25
A saber: Psicoinfo – Primeiro Seminário Nacional sobre Psicologia e Informática. Promovido pelo Conselho Federal
de Psicologia em São Paulo, outubro de 1998; Primeiro Simpósio sobre Psicologia e Informática, promovido pelo
CRP/06 em São Paulo, em abril de 2000, e III Psicoinfo, promovido pelo CFP em São Paulo, 2006.
30
Paulo). Contando com a participação de vários autores as publicações foram
respectivamente organizadas por: Elisa Sayeg (SAYEG, 2000); Ivelise Fortim e Oliver
Z. Prado (FORTIM e PRADO, 2005); Oliver Z. Prado, Ivelise Fortim e Leonardo
Cosentino (PRADO, FORTIM e COSENTINO, 2006). Apoio semelhante foi fornecido
pelo CRP/06 e pelo CFP à realização da III Jornada do NPPI sobre Psicoinfo (em
setembro de 2008), possibilitando outra publicação na área, desta vez realizada em
formato digital (NPPI, 2008).
Em 1999 o economista e sociólogo Gilson Schwartz participou na criação da
Cidade do Conhecimento (SCHWARTZ, 2008) - centro de pesquisa e extensão
vinculado à Universidade de São Paulo -, dedicada à incubação de projetos que
integram tecnologias digitais aos processos educacionais, em diversos formatos e
modalidades. Uma de suas publicações aborda a necessidade de se integrar a
habilidade no uso das novas tecnologias à formação dos futuros profissionais: Os
profissionais do futuro (SCHWARTZ, 2000). Essa iniciativa está inserida na área da
educação, mas aborda aspectos psicológicos relativos aos usos das novas tecnologias
e suas aplicações ao ensino.
Em 2000, Daniela A. G. Sousa, então aluna da Faculdade de Psicologia da
PUC-SP apresentou como trabalho de conclusão da graduação estudo preliminar
sobre “Internet, imaginário coletivo e religiosidade no mundo contemporâneo”
(SOUSA, 2000). No mesmo ano, Elisa Sayeg publicou artigo sobre as “A interação
entre ser humano e computador e a linguagem” (SAYEG, 2000[b]). Entre outros
trabalhos na área, no mesmo ano Sayeg defendeu tese de doutoramento:
“Lexicografia e Cognição: Exercícios Exploratórios Envolvendo a Construção de um
Protótipo de Dicionário Enciclopédico Eletrônico Hipertextual“ (SAYEG, 2000[c]).
Em 1996 Lemos criava, em Salvador, o Ciberpesquisa, grupo vinculado ao
Programa de Pós-graduação em Comunicação e Cultura Contemporânea, da
Universidade Federal da Bahia (LEMOS, 1996). Um de seus estudos aborda os efeitos
da publicação dos diários pessoais na Internet, bem como da utilização das webcams
nas comunicações virtuais sobre a subjetividade dos seus respectivos autores /
usuários: “A arte da vida: diários pessoais e webcams na Internet” (LEMOS, 2003).
No Rio de Janeiro, Nicolaci-da-Costa publicou Na malha da rede (NICOLACI-
DA-COSTA, 1998), livro que aborda o surgimento dos “impactos íntimos da Internet”.
31
Nicolaci prossegue na área, orientando pesquisadores interessados, e publicando
outros títulos sobre temas correlatos (NICOLACI-DA-COSTA, 2002, 2006/2006).
Na PUC-SP, Santaella e seu grupo pesquisam desde a década de 90 vários
aspectos da virtualidade adotando a perspectiva da Semiótica. Exemplo da sua
produção é Linguagens líquidas na era da mobilidade (SANTAELLA, 2007).
Paula Sibilia – antropóloga argentina radicada no Brasil – publicou estudo
sobre os efeitos das novas tecnologias sobre o corpo humano. Em O homem pós-
orgânico: corpo, subjetividade e tecnologias digitais, Sibilia (2002) expõe uma análise
pouco otimista sobre as transformações que a vivência da corporalidade, permeada
pela biotecnologia, estaria gerando para o homem do nosso tempo:
Afastados da lógica mecânica e investidos pelo novo regime digital,
os corpos contemporâneos se apresentam como sistemas de
processamento de dados, códigos, perfis cifrados, feixes de
informação. Assim, entregues às novas cadências da tecnociência,
o corpo humano parece ter perdido a sua definição clássica e a sua
solidez analógica: inserido na esteira digital, ele se torna permeável,
projetável, programável. (SIBILIA, 2002, p. 19)
Abordando o mesmo tema, O homem máquina (NOVAIS, org., 2003) contém
uma coletânea de dezoito artigos sobre a manipulação do corpo humano pela ciência
da atualidade. Na obra, autores de diferentes áreas apresentam análises críticas sobre
as transformações geradas para esse mesmo corpo a partir das manipulações sobre
ele exercidas por meio dessas intervenções.
1.3 Trabalhos sobre as aplicações clínicas das interfaces Psicologia /
Informática
Em meados de 1995 na PUC-SP, tiveram inicio as atividades do NPPI - Núcleo
de Pesquisas da Psicologia em Informática - grupo responsável pelo Serviço de
Informática da Clínica Psicológica da PUC-SP
26
. A descrição da criação dos serviços
oferecidos pelo núcleo resultou em um primeiro relato sobre a implantação dos
atendimentos via e-mails realizados nesse setor da clínica escola (FARAH, NOVO e
LOPES, 1997; FARAH, 1999). Publicações posteriores relatam, respectivamente, os
primeiros desdobramentos dos serviços de orientação original, a saber: “A Orientação
26
Mais informações sobre os serviços oferecidos pela Clínica Escola da PUC-SP pode ser obtidas no site:
<http://www.pucsp.br/clinica/servicos/index.htm>.
32
Psicológica via e-mail” (FARAH, 1999, 2004, 2006) e a “Orientação Profissional via
Internet” (ZACHARIAS, 2005).
Em publicação mais recente, o NPPI comunica a terceira modalidade de
serviço psicológico mediado por computador, dirigida aos usuários compulsivos dessa
tecnologia. Uma avaliação preliminar dessa modalidade de orientação foi apresentada
em 2008, no evento realizado na PUC-SP (ESCALEIRA, DUPRAT, ZACHARIAS, e
NOLF, 2008) publicada em mídia digital. Os serviços mencionados são prestados de
forma gratuita aos usuários virtuais da clínica-escola da Faculdade de Psicologia, setor
da PUC-SP onde o NPPI está sediado. O acesso aos serviços citados é oferecido no
site do núcleo
27
.
A partir de 2004 o psicólogo Cristiano Nabuco de Abreu deu início, no Instituto
de Psiquiatria da USP - Universidade de São Paulo -, ao atendimento terapêutico
grupal presencial aos usuários compulsivos de computadores e Internet (ABREU,
2008).
1.4 Artigos de autores junguianos sobre a Internet
Na pesquisa referente à Psicologia Analítica, foram localizados autores
interessados na observação e análise dos comportamentos humanos verificados na
Internet, e outros, também junguianos, que manifestam sua preferência por se
manterem a parte dessas questões, considerando de pouco interesse (ou pertinência)
o estudo desse tema. Foram identificados ainda autores que parecem oscilar em
relação às duas atitudes mencionadas.
Brien é uma representante do pensamento junguiano que argumenta em favor
do estudo da Internet, por considerá-lo campo fértil para o entendimento do espírito do
nosso tempo. Afirma, por exemplo:
A Internet não é somente um grande avanço tecnológico, é também
um evento de profunda importância psicológica. Aqueles que se
recusam a usá-la (junguianos, entre eles), a enxergam como uma
outra armadilha tecnológica que nos rouba tempo, dinheiro e energia.
É uma pena que eles pensem dessa forma porque a Internet é um
local extraordinário para se reconhecer as profundezas do
inconsciente coletivo do nosso tempo. Pode ser um campo
27
Site do NPPI: <http://www.pucsp.br/nppi/>
33
psicológico tão fértil quanto o dos contos de fada, do folclore e dos
mitos antigos. Na Internet novos mitos têm se formado, até agora
ignorados, contendo arquétipos que estão chegando, e novas
aventuras para a psique nos aguardam (BRIEN, 1997).
No entanto, nesse artigo Brien está revendo posições críticas que assumira
anteriormente, ao analisar o livro de Mark Stefik
28
(STEFIK, 1996) quando de sua
edição original. Na introdução do novo artigo a autora reconhece, anos depois, a
evolução verificada na Internet desde suas primeiras observações sobre a WEB, e
recorre a uma declaração de Jung sobre os arquétipos para fundamentar a revisão da
sua posição. A relevância dessa citação de Jung para o este estudo do tema, justifica
sua reprodução:
Já que não podemos negar os arquétipos ou torná-los inócuos de
algum modo, cada nova etapa conquistada na diferenciação cultural
da consciência confronta-se com a tarefa de encontrar uma nova
interpretação correspondente a essa etapa, a fim de conectar a vida
do passado, ainda existente em nós, com a vida do presente, se este
ameaçar furtar-se àquele. Se esta conexão não ocorrer cria-se uma
consciência desenraizada, que não se orienta pelo passado, uma
consciência que sucumbe desamparada a todas as sugestões,
tornando-se susceptível praticamente a toda epidemia psíquica.
(JUNG, 2008, § 267)
Segundo Brien, Stefick (1996) “está interessado em metáforas, primeiro,
porque elas expressam os nossos pensamentos sobre as coisas e, finalmente, porque
elas parecem incorporar arquétipos profundamente inconscientes” (BRIEN, 1997). No
mesmo artigo, Brien sintetiza e concorda com a posição de Stefik ao identificar
Hermes – com seus principais atributos - como sendo o arquétipo central observado
na Internet: “O Guardião do Conhecimento, o Comunicador, o Negociador e o
Aventureiro” (STEFIK apud BRIEN, 1997). Brien finaliza seus comentários retificadores
sobre o trabalho de Stefik com a seguinte afirmação:
Uma última palavra – se o conhecimento da Internet é um deus, esse
deus tem que ser Hermes: mediador, comunicador, o enganador,
mensageiro, o viajante sempre se movendo. Seus atributos
inesgotáveis como os da Internet, de quem ele parece ser a alma.
(BRIEN, 1997)
Bostock é outro autor que se manifesta em defesa do estudo da WEB,
mencionando Hillman (e os representantes da Psicologia arquetípica) como
pensadores avessos ao estudo da Internet. Retrucando as críticas da abordagem
arquetípica em relação ao estudo da Internet (por pressupor a exclusão da
28
Segundo Brien (BRIEN, 1997) M. Stefik é um cientista vinculado ao Xerox Palo Alto Research Center.
34
corporeidade como um efeito da vivência humana no ciberespaço) Bostock destaca o
fato de estarmos assistindo o nascimento do “corpo cibernético” - correspondente ao
“corpo virtual” mencionado por P. Levy (1995) - e acrescenta: “Se a psicologia
arquetípica não virar suas lentes para o corpo cibernético, ela poderá estar virando as
costas para o futuro. A divindade escondida no buraco da persona cibernética pode
ser nosso deus tentando a encarnação” (BOSTOCK, 2003, acesso 2007).
No entanto, em artigo anterior – “Cyberspace: Shadow of the Cultural
Imagination?” - Bostock relatara de forma avaliativa sua vivência pessoal durante a
experimentação de um game futurista denominado MindWave, parecendo, ao final
dessa análise, concordar com a posição de Hillman:
Então, quando falamos de ciberespaço (ou qualquer outra
tecnologia), devemos parar e nos perguntar, como Fausto nunca fez,
se a alma está sendo servida ou não pela abdicação temporária do
corpo. Nós podemos decidir deixar o corpo por necessidade do ego –
para obter informações, enviar e-mails, dirigir um carro até – mas nos
deixar levar com o meio na fantasia de salvação através de “re-
tribalização” é na verdade pegar o sintoma da anima mundi banida.
(BOSTOCK, 1997-1998)
Entretanto, na finalização de artigo mais recente, Bostock reconsidera: “Talvez
o próprio Self esteja de fato pedindo pela encarnação no ciberespaço” (BOSTOCK,
2003 – acesso 2007). Refletindo sobre sua vivência pessoal no MindWave, Bostock
declara-se como alguém que oscila entre as posições de “viciado em Internet” e de um
“cínico” diante da utilização desse aparato: Confessa ter passado por períodos em
que, alternadamente, ora agiu como um usuário compulsivo desse jogo virtual, ora
sentiu-se culpado por tal uso, de forma semelhante à vergonha que algumas pessoas
sentem por assistirem à televisão (BOSTOCK, 1997 / 1998 – acesso em 2008 ). Ao
mesmo tempo, Bostock recrimina os psicólogos – particularmente os junguianos – por
ignorarem os meios tecnológicos, atribuindo-lhes o caráter de “destruidores das
almas”:
A dispensa do ciberespaço por tantos psicólogos arquetípicos me
intriga porque, como eu disse antes, este meio é puramente
imaginativo e, de acordo com a visão hillmaniana, as imagens são a
base da psique. Claro que as imagens têm caráter variado. Imagens
podem ser degradadas na sua representação e certamente as
imagens no ciberespaço variam muito a esse respeito. Mas não
devemos dispensar toda a arte com base em uma pintura ruim.
(BOSTOCK, 2003 - Acesso em 2007)
35
Em outro artigo - “Deiknymena
29
: Erotic revelations in cyberspace” (BOSTOCK,
1997/1998) - Bostock traça paralelos entre as fartas imagens de caráter sexual
presentes na WEB, e etapas dos rituais dionisíacos que envolviam a contemplação de
material semelhante, composto por figuras e imagens eróticas.
Gomes considera a Internet como “espaço psíquico”, estabelecendo paralelo
entre os estudos de Jung sobre o vaso alquímico e os processos psíquicos coletivos
os quais, segundo a avaliação do autor, estão em curso na Internet:
A concentração de material em um lugar, ali colocada por uma massa
de vontade e desejo individual, faz da Internet um lugar de intensa
numinosidade. [...] A Internet começa a funcionar como um espaço
alquímico intermediário, como eu chamo, um lugar de gestação
psíquica, que passa entre um consciente e inconsciente pessoal e
coletivo que mapeia uma mudança e um movimento na psique do
usuário. (GOMES, 2003, acesso em 2007)
Outras correlações entre os fenômenos expressos na virtualidade e a Alquimia
são propostas por Krapp, em artigo no qual, desde o título, o autor estabelece
analogias entre o processo alquímico e os fenômenos observados no funcionamento
dos computadores: “Alchemy in Computer? The interplay of word and image, sound
and music” (KRAPP, 1997). Nessa análise Krapp explora vários ângulos da questão,
relativas aos canais sensoriais ativados durante os processos de comunicação
humana, em diferentes épocas. Tanto os tradicionais – que segundo o autor enfatizam
a percepção visual –, quanto os atuais, mediadas pelo computador, sendo que estes
últimos favoreceriam a integração de outros canais sensoriais além do visual. Citando
McLuhan, Krapp avalia que a característica sensorial diferenciada presente nas
comunicações atuais promove repercussões amplas sobre consciência humana:
Hoje a inclusão de uma entrada musical para a psique está se
tornando uma necessidade, porque a mídia das comunicações
eletrônicas se apresenta através da imaginação e da música. De
acordo com McLuhan (1968), uma extensão de todo o sistema
nervoso central (SNC) reage com a mídia eletrônica, e não apenas
um único sentido como com a impressa. O potencial conectivo do
circuito elétrico pode realizar o fator paralelo e simultâneo da rede
neural e por isso estimula o SNC na dinâmica dos sentidos e até da
consciência. Então a humanidade pode se perceber como uma
totalidade, e não apenas como fragmentos. “Toda a humanidade se
torna a nossa própria pele” (MCLUHAN, 1968, p. 23). Apesar disto
poder causar ansiedade, “a era da ansiedade e da mídia eletrônica é
também a era do inconsciente e da apatia. Mas é também a era na
29
Nos rituais, na “Noite dos Mistérios” reencenava-se o mito de Demeter e Perséfone em três estágios: das Coisas
Ditas (legomena), das Coisas Feitas (dromena), e das Coisas Reveladas (deiknymena). As revelações ocorreriam
através da contemplação das imagens eróticas. (RECONSTRUCIONISMO HELÊNICO, acesso em 01/09/08).
36
qual tiramos o consciente do inconsciente.” (MCLUHAN, apud
KRAPP, 1997, p. 424)
Giegerich (acesso em 2008) situa-se entre os autores que avaliam como
pertinente o estudo da Internet, de início identificando duas possibilidades de análise:
A primeira seria a que se ocupa apenas dos aspectos “externos” da utilização da
tecnologia. Nesta perspectiva, a psicologia se deteria em:
[...] estudar o que é um uso ‘saudável’ da Internet, e quando o nosso
comportamento frente a ela passa a ter uma natureza de adição;
dentro dessa perspectiva pode-se estudar em que medida as novas
formas de comunicação são liberadoras e cheias de alma, ou
possivelmente inautênticas. (GIEGERICH, acesso em 2008).
No entanto, a seguir o autor adverte: “A psicologia, entendida desta forma,
opera dentro da oposição do interior versus exterior, sujeito versus objeto, pessoa
humana versus realidade factual” (GIEGERICH, acesso em 18/08/08). Na sequência,
apresenta sua opção pela segunda alternativa de análise - voltada aos aspectos
subjetivos dos usos da WEB - e relaciona os fenômenos observados na Internet,
apresentando suas reservas e críticas frente aos mesmos. Como ilustração, citaremos
suas considerações sobre as “imagens” presentes na modernidade de modo geral e
na Internet em particular, imagens que Giegerich considera “inanimadas” (sem alma):
Justamente por isso, a imagem moderna como simulação de imagem,
significa que a imagem é reduzida a uma espécie de invólucro
externo que esconde e afasta a substância e a verdade interiores.
Dentro de si mesma, a imagem, logicamente, nega a sua própria
substância, volta-se contra si própria. Ela agora é toda apresentação,
exibição, sem ser realmente a apresentação de alguma substância
imaginal ou profundidade. (GIEGERICH, acesso em 2008)
Em entrevista concedida a Brien (2005), Romanyshyn comenta as ideias
centrais apresentadas em seu livro Technology as Symptom & Dream
(ROMANYSHYN, 2006). Na entrevista, Romanyshyn é convidado por Brien a situar
seu pensamento e o enfoque sobre o qual baseou a elaboração do livro tema da
entrevista. Em resposta, Romanyshyn insere suas ideias na perspectiva evolutiva da
história humana, e não apenas na observação dos fenômenos subjetivos, referindo-se
à tecnologia como “um sonho cultural compartilhado”. Em certos pontos das respostas
à Brien, Romanyshyn aproxima-se da visão crítica de Giegerich, por exemplo, ao
detalhar a expressão “tecnologia como sintoma”, por ele cunhada:
Refiro-me ao que é abandonado e deixado nas sombras dessa fuga
da mente em relação à natureza e ao corpo. Por um lado o que é
37
deixado para trás é a noção da natureza como uma coisa animada.
Como espetáculo para nossa observação e exploração, a natureza,
incluindo os animais, se torna inanimada. Nós acabamos assim, com
uma alma internalizada sem um mundo, e um mundo inanimado, um
mundo sem alma. (ROMANYSHYN apud BRIEN, 2005)
Em seguida, Romanyshyn se refere às vivências humanas no ciberespaço
como um “sonhar acordado”, delineando parcialmente a hipótese do surgimento de
uma nova forma de consciência humana:
Robert: Eu me pergunto às vezes se Deus, incluindo a sua sombra,
está no ciberespaço.
Dolores: Você pode falar mais sobre isso?
Robert: Na verdade não. É só um pensamento nesse momento. Mas
eu posso dizer que a cyber-realidade é esse tipo de consciência que
nos pede não só para estarmos conscientes de que estamos sempre
sonhando, mesmo quando acordados, sonhando com os olhos bem
abertos, mas também nos desafia a tomar responsabilidade pelo que
nossos sonhos criam. E eu acho que é muito importante nós
tomarmos essa oportunidade, porque nós perdemos uma
oportunidade antes com as origens do trabalho de Freud e Jung.
(ROMANYSHYN, apud BRIEN, 2005)
Roesler (2008), em artigo intitulado “Self no ciberespaço” correlaciona análises
atuais sobre a formação da identidade nas sociedades pós-modernas aos impactos
gerados pelas mídias da comunicação. Ao destacar o caráter pluralista das ideias
junguianas, propõe que a atitude dos junguianos em seus estudos deva expressar
essa mesma característica: “Eu peço que o trabalho de Jung seja usado dentro dessa
mesma perspectiva, como uma pluralidade de explicações que circundam as questões
centrais, ainda muito relevantes para nós”. (ROESLER, 2008, p. 432)
Logeman é outro junguiano que advoga o estudo do ciberespaço e dos
processos psicológicos que ocorrem em seus domínios. Em “Archetypes of
Cyberspace” (Acesso em 2008), menciona Moreno (o criador do Psicodrama) e
McLuhan, como pensadores que teriam intuído o surgimento da WEB bem antes da
sua criação. Revisando as posições dos junguianos a respeito da WEB, Logeman
comenta as posições de Bostock, Brien, e Hillman, recorrendo a metáforas mitológicas
para tecer seus argumentos. Conclui identificando no ciberespaço a manifestação de
um arquétipo e propõe um paralelo entre a psicoterapia e o ciberespaço, na medida
em que, em ambos, o imaginário e a comunicação são ferramentas essenciais do
trabalho a ser realizado.
38
Na edição de número 54, de 2009, o Journal of Analytical Psychology publicou
dois artigos bem distintos sobre o tema em pauta. No primeiro, Galimberti apresenta
extensa análise dos impactos da tecnologia ao longo da história evolutiva da
civilização humana. A perspectiva adotada por Galimberti se aproxima das
comentadas visões críticas - tidas como “apocalípitas” - conforme exemplifica a
afirmação introdutória ao seu artigo (GALIMBERTI, 2009, p. 54):
Não se pode mais discutir se a tecnologia é boa ou ruim de acordo
com o uso que fazemos dela, já que a tecnologia agora faz uso de
nós e assim transforma a nossa ética, nossos relacionamentos
sociais e nosso ser psicológico.
Em outro artigo do mesmo Journal, Hauke (2009) apresenta trabalho sobre a
influência das novas tecnologias de comunicação, analisando seus impactos sobre a
psicoterapia e as sessões analíticas. Especialmente suas repercussões cotidianas e
práticas, destacando as influências sobre as formas de intervenção utilizadas pelo
terapeuta em seu trabalho. O autor amplia suas considerações para além das
ferramentas características da Internet, refletindo também sobre os usos de filmes,
DVDs, fotografias etc., como recursos de utilidade potencial no processo analítico.
Inicialmente prevista para o segundo semestre de 2008, em março de 2009 foi
publicado o volume de número 80 do Spring Journal. A edição foi anunciada como
dedicada aos estudos sobre tecnologia, ciberespaço e psique. No entanto, embora a
maioria dos seus artigos verse sobre o tema, outros assuntos são também abordados,
o que faz supor que as colaborações enviadas não tenham sido suficientes para
compor o volume de acordo com a proposta original. Breves resumos, apresentados a
seguir, ilustram o teor de seus capítulos mais representativos, confirmando a tônica
prevalente nos trabalhos junguianos sobre o tema.
Em The Arquetypal Alchemy of Technology: Escape and Return to Materiality’s
Depth, Maziz (2008) inspira-se em Giegerich para encaminhar sua análise sobre as
interações humanas observadas no ciberespaço, destacando, nessas vivências, os
aspectos avaliados como “restritivos”.
Conforme anuncia no título - The Melting Polar Ice: Revisiting Technology as
Symptom and Dream –, o estudo de Romanyshyn (2008) retoma e atualiza as
preocupações do autor quanto aos efeitos destrutivos dos avanços tecnológicos,
39
especialmente no que tange ao aquecimento global do planeta (ROMANYSHYN,
2008).
Analisando sites que propõem enviar mensagens póstumas aos familiares dos
internautas falecidos, o estudo intitulado Thanatos in Cybespace: Death, Mythology
and Internet, demonstra que, em função das características técnicas dos programas
(pouco conhecidas pelos internautas) seu funcionamento adquire para o usuário
aparência misteriosa ou mesmo um caráter ritualístico simbólico, regido pelo
pensamento mágico (BROTTMAN, 2008).
Outros temas específicos são abordados nos capítulos assinados por Gros
(2008) e Mariani (2008). No primeiro, são considerados os aspectos simbólicos dos
celulares ao integrarem recursos avançados de navegação na Internet: Encountering
the Symbolic: Aspects of the Smartphones (GROS, 2008); No segundo – Analytical
Psychology and Entertainment Technoloy: Idle time and Individuation Process – o
autor estabelece relações entre o tempo de lazer passado na Internet e o processo de
individuação (MARIANI, 2008).
O artigo mais interessante e abrangente da seleção publicada pela Spring
consiste na entrevista realizada por Leigh Melander (2008) com Derek Robinson:
Paradox Neverending: Psyche and the Soul os the Web: A Conversation with Derek
Robinson. Curiosamente, o entrevistado não é psicólogo, mas pesquisador do campo
da bioinformática, e colaborador de diversos projetos relevantes - dentre os quais o
projeto Genoma Humano. Segundo a apresentação de sua interlocutora Robinson é
também “um pensador sobre a criatividade, um filósofo da Internet” desde a década de
70 (ROBINSON in MELANDER, 2008, p. 208) A entrevista gira em torno da questão
inicial proposta por Melander, sobre a localização histórica da origem da Internet, ou,
em suas palavras, a respeito do nascimento da “alma da ideia da WEB” (Ibid, p. 209).
Em resposta, Robinson desenvolve ampla reflexão, incluindo dados históricos sobre
autores dos séculos 17 e 18 que ambicionavam criar linguagens que poderiam tornar
viável a comunicação global. Por essa linha de raciocínio, encaminha sua justificativa
do destaque dado ao potencial de interatividade e a “revolucionária” possibilidade de
“comunicação lateral”
30
, viabilizadas na rede, afirmando: “talvez isso possa realmente
transformar a consciência coletiva” (ROBINSON in MELANDER, 2008, p. 216). Suas
30
Ideia semelhante é desenvolvida por Levy em A conexão planetária, utilizando a expressão “comunicações
transversais” para se referir a essa característica das comunicações típicas da Internet. A proposição de Levy será
abordada no item 5.54 do capítulo 5, na apresentação de observações sobre a “democracia eletrônica”.
40
respostas a Melander são permeadas por dados históricos e explicações técnicas
acessíveis, relevantes para a compreensão das suas ideias.
Relembrando Teilhard de Chardin, Robinson afirma que a estrutura da rede
anima o arquétipo da circularidade, concedendo um sentido à sua dinâmica
caracteristica em direção à Noosfera e à ideia de um “cérebro global” (Ibid. p. 218) - o
passo evolutivo que segue a Biosfera como postulou Chardin (CHARDIN, 1970).
Dessa maneira, segundo Robinson, a consciência coletiva começa a dar forma para o
mundo à nossa volta (ROBINSON in MELANDER, p.218). Nas considerações finais
Robinson volta a destacar a relevância das interações virtuais e seus efeitos sobre a
subjetividade, mencionado o que Merleau-Ponty teria antecipado sobre a importância
do olhar do outro para a auto-significação do ser humano. Na WEB, a possibilidade
aberta da experimentação coletiva do “sonho compartilhado” - de propósitos e valores
-, está em fase inicial, mas promissora de sua evolução (Ibid., p. 225).
Reservado para o final da revisão, há outro artigo de Brien, pois mesmo não
sendo tão recente, pois seu conteúdo é de relevante interesse para este estudo. No
artigo Brien (1999) apresenta uma breve revisão das referências feitas por Jung à
tecnologia, evidentemente considerada nos termos da sua época. Conforme a autora
informa, foram poucas as menções de Jung a respeito do tema, e, a princípio, nessas
oportunidades não se mostrou otimista quanto aos desenvolvimentos observados
nessa área das iniciativas humanas. Seguindo indicações de Brien (1999), localizamos
algumas de suas declarações. No primeiro parágrafo, Jung expressa opinião crítica
sobre o desenvolvimento técnico observado em seu tempo:
Podemos dizer, em geral, que a técnica representa para o homem
moderno um desequilíbrio que gera insatisfação no trabalho e na
vida. Afasta o homem da versatilidade natural de suas ações e deixa
inexplorados muitos de seus instintos. Como consequência, temos
uma resistência cada vez maior contra o trabalho em geral. O
remédio seria deslocar a indústria para fora das cidades, um período
de trabalho de quatro horas, e o resto do tempo trabalhar na terra,
num terreno que fosse propriedade do trabalhador – se algo parecido
fosse possível. Na Suíça isso poderia ser feito com o tempo. Outra
coisa, naturalmente, é a mentalidade proletária de grandes
populações operárias, mas isto é um problema à parte. (JUNG, 2001,
§ 1405).
Conforme se verifica, a sugestão de Jung para amenizar os efeitos negativos
da tecnologia sobre a vida humana soaria utópica em nossos dias. No entanto, em
princípio, a recomendação não difere daquelas que expressas na atualidade sobre a
41
necessidade de se manter ao máximo o contato com os elementos da natureza como
forma de compensação frente aos fatores altamente estressantes, vigentes nos
grandes centros urbanos. Entretanto embora se expresse de modo cauteloso em
relação ao tema em pauta, no próximo parágrafo da mesma obra, Jung faz uma
afirmação coerente com o espírito essencialmente aberto do seu pensamento:
Considerada em si mesma, como atividade humana legítima, a
tecnologia não é boa nem má, não é perigosa nem inofensiva. Usá-la
para o bem ou para o mal depende exclusivamente da atitude
humana que, por sua vez, depende da tecnologia
. (JUNG, 2001, §
1406).
1.5 Comentários sobre os trabalhos localizados
De modo geral, os estudos realizados por psicólogos se enquadram em duas
categorias. Na primeira, incluem-se as pesquisas de caráter empírico: na maioria
realizada no exterior, são voltados à observação e análise do comportamento dos
internautas frente à WEB e focalizam principalmente a análise dos usos considerados
abusivos ou compulsivos. Na segunda categoria enquadram-se estudos de caráter
teórico, menos numerosos se comparados à produção das demais vertentes das
ciências humanas.
Quanto aos trabalhos de autores junguianos, além de relativamente pouco
numerosos, de modo geral correspondem a reflexões e trabalhos teóricos nos quais se
apresentam análises pontuais sobre aspectos psicológicos observados na presença
humana no mundo virtual. Outra característica observada nesses artigos é o fato de
alguns autores apresentarem opiniões valorativas sobre tais processos, em termos
bastante pessoais. Alguns deles - como é o caso de Brien (1997) e Bostock (1997,
2003) -, em sucessivas publicações revisam e reformulam posições expressas
anteriormente, na medida em que observam e acompanham as transformações da
Internet.
Em outros os autores manifestam de forma cautelosa suas posições e
conclusões sobre os processos psíquicos verificados na WEB. Alguns, mais
entusiasmados, demonstram-se empenhados em defender a validade e pertinência do
estudo da Internet (ou da cibercultura) pela Psicologia Analítica e advogam a
realização de análises mais amplas sobre o tema por parte de seus pares.
42
Outra observação, referente aos junguianos mais interessados no estudo dos
fenômenos da virtualidade (como Gomes, Bostock e Logeman): observam-se algumas
imprecisões na aplicação de conceitos essenciais da abordagem, ao longo de suas
análises. Em alguns trechos dos artigos conceitos fundamentais - como arquétipo e
Self, entre outros - são empregados estabelecendo analogias pouco esclarecidas nos
respectivos contextos. É possível que tal fato se deva ao afã dos autores em
demonstrar a pertinência e relevância do emprego das ideias junguianas para a
compreensão das vivências e comportamentos dos internautas. No entanto, parece
necessária uma revisão quanto a essa aplicação, em nome da precisão do seu
emprego, bem como visando demonstrar seu efetivo valor heurístico e aplicabilidade
na análise dos processos em estudo.
Embora não tenha sido possível localizar as declarações nas quais Hillman
possa ter se pronunciado diretamente sobre o tema
31
, em ao menos dois dos autores
citados são feitas alusões às severas restrições que Hillman teria feito às imagens
presentes na WEB (Bostock, 2003 e Logeman, 2008). Desse modo, isto é, a julgar
pelas posições expressas nas referências às suas ideias, Hillman consideraria as
imagens presentes na WEB como praticamente ilegítimas, por serem desprovidas de
espontaneidade, e, portanto, não se justificaria seu estudo como expressão da alma
humana. Por extensão - de modo generalizado - o estudo das vivências humanas na
virtualidade seria um tema pouco interessante para a Psicologia Arquetípica.
Como contraponto à posição atribuída a Hillman, localiza-se em Imagem e
individualidade, de Gaiarsa (2001), outra análise sobre a profusão de imagens
providas ao homem de hoje, pelas diversas mídias, e sua avaliação sobre o conjunto
dessas imagens como poderoso fator de estímulo à percepção e à autopercepção do
indivíduo enquanto tal, bem como à ampliação de sua consciência. Gaiarsa vai além,
estabelecendo um paralelo entre os múltiplos acessos às imagens, característicos da
atualidade e a técnica da fantasia ativa, proposta por Jung (GAIARSA, 2001, p. 54):
Em termos de Jung, estamos todos experimentando – sem perceber
e sem dar ao ato este nome – a técnica da “fantasia ativa”,
semelhante á “visualização” dos indianos. Ao nos colocarmos diante
de tantas imagens, ao selecionarmos programas e reportagens,
estamos permitindo que nossa atenção seja chamada para esse ou
31
Apenas uma publicação foi localizada, na qual Hillman tangencia o tema da utilização das novas tecnologias, ao
criticar o empobrecimento da linguagem atual por força da pressão cultural em direção ao universalismo. Ao enumerar
as condições geradoras dessa pressão, a linguagem utilizada pela tecnologia é citada pelo autor como uma, dentre
essas pressões. (HILLMAN, 2008)
43
aquele elemento da cena. Podemos assim encontrar símbolos
adequados ao nosso momento
.
Enquanto a psicologia questiona a realidade - e pertinência (ou não) - do
estudo das vivências presentes na WEB e sua respectiva análise, cabe lembrar, como
referência, uma das declarações de Jung a respeito da chamada “realidade psíquica”:
“Tudo o que eu experimento é psíquico. A própria dor física é uma
reprodução psíquica que eu experimento. Todas as percepções de
meus sentidos que me impõem um mundo de objetos espaciais e
impenetráveis são imagens psíquicas que representam minha
experiência imediata, pois somente eles são os objetos imediatos da
minha consciência. [...] Tudo o que nos é possível conhecer é
constituído de material psíquico. A psique é a entidade real em
supremo grau, porque é a única realidade imediata. É nesta
realidade, a realidade do psíquico que o psicólogo pode apoiar-se”.
(JUNG, 1984, § 680)
Ainda são muitas as questões por formular e pesquisar a respeito desses
temas à luz da Psicologia Analítica. A intenção deste trabalho é oferecer uma
colaboração e, principalmente, um estímulo nessa direção.
Um dos itens mencionados na revisão - a entrevista conduzida por L. Melander
(ROBINSON in MELANDER, 2008) - evidencia outro aspecto fundamental para o
estudo da Internet e suas derivações: a importância de se estabelecerem diálogos
com profissionais das áreas afins, como, no caso, um especialista nos aspectos
técnicos da informática. Isto porque, em parte, o entendimento do funcionamento
básico dos equipamentos e softwares acionadores dos processos de comunicação é
altamente esclarecedor sobre as funções psicológicas que adquirem para os usuários.
Por outro lado, as estruturas básicas e funções originais desses recursos - uma vez
assimiladas – por si mesmas permitem ao psicólogo elaborar análises amplificadoras
sobre o potencial significado simbólico envolvido na sua concepção, bem como na
evolução das respectivas formas da sua utilização.
Visando oferecer ao leitor uma breve introdução a alguns desses aspectos do
processo de informatização, o próximo capítulo consiste em um apanhado histórico
sobre o surgimento e evolução do computador, propiciando a criação da Internet e sua
integração ao cotidiano humano da atualidade. Antes, porém, serão apresentados o
objetivo e o método adotado na realização do trabalho.
44
OBJETIVO
_______________________________________________________________
O objetivo deste estudo é descrever comportamentos e vivências expressas
pelos internautas no uso da Internet, buscando compreendê-los com base no
referencial teórico oferecido pela Psicologia Analítica.
45
MÉTODO
_______________________________________________________________
Todo psicoterapeuta não só tem o seu método:
ele próprio é esse método. (JUNG, 1985, § 198)
3.1 Considerações sobre o método
Surgido em plena vigência da ciência pautada pelo racionalismo cartesiano, o
pensamento junguiano colocou-se à frente de seu tempo. Jung anteviu e descreveu
não apenas dinamismos essenciais da psique humana expostos em sua obra - como
também antecipou proposições metodológicas só mais recentemente reconhecidas e
integradas pela comunidade científica da pós-modernidade.
Questionam-se na atualidade, por exemplo, o caráter extrovertido da chamada
ciência moderna – e sua abordagem supostamente objetiva dos fatos observados – e
a pretendida exclusão dos aspectos subjetivos do pesquisador do processo de fazer
ciência. No entanto, Jung já equiparava, em relevância, a observação dos fatos em
estudo e a auto-observação atenta do pesquisador da psique como condições
essenciais à construção de uma visão dialética, aberta à diversidade e complexidade
do seu objeto de análise. Ao lado da busca da harmonização dos opostos - sem que
se anulem as diferenças -, estas são algumas proposições que, segundo Penna,
caracterizam o pensamento junguiano como “afinado com as características da ciência
pós-moderna”. (PENNA, 2006, p. 19)
Dessa forma, o paradigma junguiano de pesquisa e construção do
conhecimento sobre a psique antecipou as propostas epistemológicas surgidas na
pós-modernidade. A inclusão do sentimento e da intuição
32
do pesquisador como
funções “indispensáveis ao conhecimento psicológico” são apontadas por Penna
(2006, p. 18) como características ilustrativas do caráter antecipatório do método de
Jung.
32
Sentimento e intuição são empregados no sentido junguiano desses termos, isto é: como componentes subjetivos
das funções da consciência (JUNG, 1989, § 40).
46
Byington (1995) desenvolve a proposta junguiana sobre o processo de fazer
ciência, ao considerar a investigação sobre a psique como processo estreitamente
interligado à individuação do próprio pesquisador (BYINGTON, 1995, p. 56):
No que diz respeito à sua pesquisa, a pergunta é: se vocês querem
uma pesquisa que reúna a subjetividade com a objetividade, mas
querem ao mesmo tempo fazer ciência, a primeira coisa é recorrer ao
seu processo de individuação. É perguntar: Qual sua relação
emocional com sua pesquisa? Há um chamado para sua pesquisa?
[...] Vocês sentem seu Ser, sua alma, sua integridade em jogo? [...] se
vocês quiserem fazer ciência à luz da modernidade, vocês têm que
procurar essa ligação da pesquisa com seus sonhos, suas emoções,
com suas esperanças, com seus interesses pessoais, com as suas
motivações políticas, sociais, mas absolutamente únicas dentro de
vocês.
Para Byington (1995), é justamente desse envolvimento visceral do
pesquisador com seu objeto de estudo que emergirá a objetividade pretendida e
cultivada em seu trabalho. Inicialmente imersa no símbolo, a objetividade será o fruto
resultante desse empenho confiante do investigador: “Então, se nós mergulhamos na
inspiração e no simbólico, a objetividade aparecerá. O esforço da busca dessa
objetividade é que vai ser o caminho da tese.” (BYINGTON, Ibid. p. 57). Na pesquisa o
“Eginho” do investigador torna-se uma espécie de “para-raio do cosmos e da
sociedade complexa” na qual está imerso, e passa a desempenhar a função de um
canal de expressão do coletivo (BYINGTON, Ibid.).
A consideração da subjetividade do pesquisador como elemento relevante para
a produção de conhecimento não é tendência exclusiva da Psicologia. Localiza-se
ideia semelhante em autores de outras disciplinas das ciências humanas. O sociólogo
Wright Mills (1982) apresenta proposições que poderiam ter sido enunciadas por
algum representante da Psicologia Analítica: “Os pensadores mais admiráveis não
separam seu trabalho de suas vidas. Encaram ambos demasiados a sério para
permitir tal dissociação, e desejam usar cada uma dessas coisas para o
enriquecimento da outra”. (MILLS, 1982, p. 211-212). É interessante mencionar
também o título do capítulo onde está inserida a formulação de Mills, pois fornece uma
referência sobre a tônica do seu pensamento: “Do artesanato intelectual”.
Na apresentação da “Observação Participante”, publicada por May (2004) há
uma proposta metodológica também sintonizada às ideias acima expostas. Essa forma
de pesquisa qualitativa advoga a participação imersiva do pesquisador no seu campo
de estudo de tal maneira que - inserido no contexto onde ocorre o processo alvo da
47
sua investigação – possa ele melhor identificar seus aspectos relevantes, em lugar da
convencional definição a priori dos mesmos aspectos: “[...] este método encoraja os
pesquisadores a mergulharem nas atividades do dia a dia das pessoas as quais eles
tentam entender. Diferentemente da testagem de ideias (dedução) elas podem ser
desenvolvidas a partir das observações (indução)” (MAY, 2004, p. 174-175).
Prosseguindo, May explicita também a inclusão dos fatores subjetivos do observador
como elementos integrantes da sua busca de entendimento da situação em estudo:
[...] a meta de entender é reforçada concretamente pela
consideração de como eles são afetados pela cena social, o que
acontece nela e como as pessoas, incluindo eles mesmos (os
pesquisadores) atuam e interpretam nas suas situações sociais – daí
o termo observação participante.” (MAY, 2004, p. 181).
Conforme a introdução deste trabalho, é mais correto dizer que, em lugar de
termos “escolhido um método” para a elaboração deste estudo, a Observação
Participante foi assumida naturalmente durante seu desenrolar. A coordenação das
atividades do NPPI
33
implicou na automática imersão no ciberespaço, condição que,
por sua vez, gerou oportunidades de observação e registro dos comportamentos e
relacionamentos expressos no espaço da virtualidade. Simultaneamente, o interesse
pelo estudo dos fatos observados à luz da Psicologia Analítica direcionou a opção
teórica fundamental deste trabalho, bem como a definição do seu objetivo.
3.2 - Método
Este estudo foi realizado por meio da Observação Participante. Os
comportamentos e situações coletados e registrados foram analisados
qualitativamente segundo o referencial da Psicologia Analítica.
3.3 Procedimentos
A maior parte dos casos selecionados para descrição e análise foi recolhida em
duas fontes principais: na prática clínica desenvolvida pelo NPPI e nos diversos meios
de divulgação da imprensa. Outros – como os sonhos que ilustram o capítulo 5.2 -
33
Núcleo de Pesquisas da Psicologia em Informática – Serviço de Informática da Clínica Escola da PUC-SP.
48
foram relatados e enviados, via e-mail, pelos próprios sonhadores, ou através de seus
terapeutas. Em cada apresentação indica-se suas fontes.
Simultaneamente à observação e registro de casos houve a revisão da
literatura acerca das publicações contendo estudos psicológicos sobre a Internet, sua
origem e seus desdobramentos, incluindo análises teóricas e pesquisas sobre as
vivências verificadas no espaço virtual. Para essa revisão coletaram-se livros,
publicações on-line, dissertações de mestrado e teses de doutorado, abordando o
fenômeno Internet, seus usos e implicações para o comportamento e os
relacionamentos humanos. Os artigos e demais publicações relacionados foram
selecionados a partir de palavras chave: Internet e psicologia, Internet e Psicologia
Analítica, Jung e tecnologia, psicologia e ciberespaço, simbolismo e Internet,
arquétipos e Internet, e outras que se mostraram pertinentes no desenrolar da
pesquisa.
As fontes consultadas foram revistas científicas impressas e as disponíveis na
Internet (como Medline, Lilacs); bibliotecas convencionais e on-line, ou seja, todas que
se mostraram úteis no desenrolar da pesquisa, como o caso da enciclopédia virtual
Wikipédia. O período das publicações pesquisadas abrangeu janeiro de 1995 a março
de 2009.
A análise das observações foi feita com base no referencial teórico oferecido
pela Psicologia Analítica. Os comportamentos e situações considerados na análise
foram organizados em torno de três tópicos ou temas centrais:
Ciberespaço como espaço psíquico.
Ciberespaço como novo campo de expressão de antigos conflitos humanos.
Ciberespaço como campo de expressão de novas formas de construção do
saber e ampliação da consciência.
Durante a análise dos temas centrais foram destacados três subtemas, indicados
no sumário sob os títulos:
o O corpo no espaço virtual
o Sonhos informatizados: a presença da tecnologia no imaginário
o Quantos “eus” nos habitam?
49
ORIGEM E DESENVOLVIMENTO DA INTERNET
_______________________________________________________________
As grandes inovações jamais vêm de cima, sempre de baixo, como as
árvores que não nascem do céu, mas germinam do solo, ainda que suas
sementes tenham caído do alto. (Jung, 1993, § 177)
Quando se menciona a Internet, a imagem que de imediato surge é sua
estrutura atual, ou seja, a grande rede de comunicação global interativa, formada pela
conexão de um número incalculável de computadores interligados. Porém, a
apresentação de uma breve retrospectiva sobre a evolução dos recursos essenciais à
sua criação pretende deixar claro que, como toda criação humana, um longo processo
antecedeu o surgimento da WEB (World Wide Web) em sua forma de hoje. A começar
pelos artefatos que precederam a criação do próprio computador - equipamento
essencial ao seu funcionamento - até as novas gerações de aparelhos que também
viabilizam o acesso à Internet como, por exemplo, os celulares, entre outros em uso.
Desse modo, pretende-se estabelecer alguns paralelos entre a evolução tecnológica,
sua apropriação pelas pessoas, e o desenvolvimento coletivo humano.
4.1 Breve história do computador e da WEB
O termo computador origina-se do latim computare - o ato de contar -,
operação que despertou o interesse do ser humano desde os tempos mais remotos
(contar o tempo, as suas propriedades etc.). Essa função, por sua vez, está
estreitamente ligada à habilidade humana de fazer cálculos e à criação dos primeiros
recursos destinados a facilitar as operações. Com essa finalidade, surgiu o ábaco.
Segundo algumas fontes esse instrumento teria sido
criado pelos fenícios há mais de
4 mil anos, em sua forma mais simples: uma placa de argila ou areia, sobre a qual se
registravam os elementos a serem contatos. Segundo outras informações, o ábaco
teria surgido há cerca de 5.500 anos, na Mesopotâmia, também em formato bastante
elementar. (WIKIPEDIA, acesso em 26/07/08)
50
De toda maneira, com pequenas variações em seu formato, há registros do uso
do ábaco em diferentes épocas e culturas ancestrais: egípcios, romanos, gregos,
hindus, índios norte-americanos, chineses, japoneses etc., sendo considerada a
primeira máquina de calcular para as quatro operações básicas: adição, subtração,
multiplicação e divisão. Em formatos mais recentes, compõe-se essencialmente de
uma moldura retangular de madeira, com varetas acopladas às laterais. Inseridas nas
varetas, pequenas pedras ou contas coloridas deslizantes permitem que os cálculos
sejam feitos. O ábaco mostrou-se tão eficiente que ainda é utilizado em algumas
regiões, especialmente para o ensino introdutório da aritmética e das operações
básicas. Nas culturas orientais, em particular entre chineses e japoneses, seu uso é
tradicionalmente mantido, sendo habilmente empregado para cálculos complexos,
rápidos e eficientes.
Figura 1 - Ábaco Babilônico
34
: o ábaco mais antigo e sofisticado, usado por mercadores babilônicos.
Consistia numa simples tábua onde pequenas pedras se dispunham em colunas paralelas para
representar os números.
Figura 2 - Ábaco romano reconstituído: mais sofisticado, o ábaco romano era formado por base em
metal, com ranhuras paralelas nas metades superior e inferior, e pequenas bolas: uma em cada ranhura
superior e quatro em cada ranhura inferior. A bola na ranhura superior valia 5 e na ranhura inferior 1.
34
Fonte das ilustrações deste capítulo:<http://images.google.com.br/> – Acesso em 25/06/08.
51
Figura 3 - Ábaco do século III d.C.: com discos ou contas móveis para
acelerar as operações matemáticas.
Figura 4 - Ábaco moderno: utilizado em escola primária da Dinamarca
Além desse primeiro artefato, somente em meados do século XVI surge outro
instrumento com finalidade semelhante. Em 1642, o matemático francês Blaise Pascal,
filho de um coletor de impostos, inventou a máquina de somar mecânica, a
“Pascalina”. Pascal estava empenhado em facilitar o trabalho de seu pai, porém a
máquina simulava apenas as operações de soma e subtração. Em 1673, Gottfried
Leibniz aperfeiçoou a máquina de Pascal, e em 1694 seu primeiro protótipo efetuava,
além da soma e subtração, as operações de multiplicação, divisão e raiz quadrada.
52
Figura 5 - Pascalina – a máquina de Pascal – detalhes do interior
Posteriormente, ainda na França, agora já em 1804, J.M. Jacquard criou o
sistema de cartões perfurados por meio do qual automatizou o funcionamento dos
teares de sua indústria, além de obter efeitos especiais nos tecidos produzidos nesse
tipo de equipamento. Vinte anos depois, na Inglaterra, Charles Babbage aplicou o
mesmo princípio dos cartões perfurados para criar sua máquina diferencial, capaz de
realizar cálculos mais elaborados (funções diferenciais e logarítmicas), com base em
tabelas concebidas a partir dos cartões de Jacquard.
Figura 6 - O tear de Jacquard – de 1804
53
Em 1834, o mesmo Babbage propiciou novo avanço na área, projetando a
primeira máquina capaz de ser programada: a calculadora mecânica e automática, a
chamada “Máquina Analítica”. Embora não tenha sido imediatamente concretizado -
por falta de recursos tecnológicos e financeiros -, seu projeto foi o primeiro embrião
dos computadores modernos. Babbage passou a ser considerado o precursor dos
equipamentos atuais.
Figura 7 - Máquina analítica de Babbage
Algum tempo depois, já no final do século XIX, nos EUA, Hermann Hollerith
retomou e aperfeiçoou o sistema de cartões de Jacquard com a finalidade de agilizar a
contagem dos dados do censo nacional então em curso. Com esse sistema, Hollerith
conseguiu reduzir o tempo da estatística, de dez para três anos, um ganho muito
significativo para a época.
54
Figuras 8 e 9 - Máquina tabuladora de Hollerith - 1890.
A partir do êxito de Hollerith, foi criada uma pequena empresa - a TMC:
Tabulation Machine Company –, empresa que em 1924, associada a duas outras, deu
origem à International Business Machine, a mundialmente conhecida IBM. A partir
daquele momento ocorreu a aceleração do processo de desenvolvimento dos
equipamentos, pois passaram ser integrados, em seus sistemas, recursos de natureza
eletromecânica.
Os primeiros computadores da era atual começaram a ser idealizados por volta
de 1937, em um contexto bélico, pela equipe de Alan Turing. Os avanços buscados no
desenvolvimento das máquinas destinavam-se a finalidades militares, conforme ilustra
o relato apresentado em site dedicado a historiar a origem e evolução dos
computadores:
Com a chegada da Segunda Guerra Mundial houve a necessidade de
se projetar máquinas capazes de executar cálculos balísticos com
rapidez e precisão para serem utilizadas na indústria bélica. Com isso
surgiu, em 1944, o primeiro computador eletromecânico. [...] O MARK
I, era controlado por programa e usava o sistema decimal. Tinha
cerca de 15 metros de comprimento e 2,5 metros de altura, era
envolvido por uma caixa de vidro e de aço inoxidável brilhante. Os
420 interruptores dessa máquina eram ajustados manualmente para
que os valores fossem introduzidos, e possuía as seguintes
características:
760.000 peças;
800 km de fios;
420 interruptores para controle;
realizava uma soma em 0,3 s;
realizava uma multiplicação em 0,4 s;
e uma divisão em cerca de 10 s
55
Figura 10 - MARK I – 1943 - Fonte: <Widesoft.com.br> (11/06/08)
Nos anos quarenta teve início o período das grandes máquinas, em que os
computadores ocupavam grandes espaços, conforme ilustra a foto abaixo do ENIAC, e
demandavam a participação ininterrupta de várias pessoas para a sua operação. O
ENIAC consumia energia equivalente a um bairro inteiro da cidade de Filadélfia, e sua
importância reside no fato de não ser destinado apenas a operações bélicas: podia
servir para outros fins, de forma semelhante aos computadores atuais.
Figura 11 - ENIAC
Fonte: <http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/4/4e/Eniac.jpg>
56
Detalhe interessante a ser observado nestas imagens é a presença feminina já
nessa primeira fase do desenvolvimento da informática, fato que foi historiado por
Plant (1999) em Mulher Digital, com destaque para o papel fundamental de várias
pesquisadoras na evolução dos computadores. No entanto, a autora frisa também o
fato dessas personagens permaneceram praticamente anônimas na história oficial do
desenvolvimento dessa tecnologia. Exemplo seria Lovelace, jovem colaboradora de
Babbage: participou ativamente dos estudos sobre a Máquina Analítica, chegando a
antecipar teoricamente a idealização das “matrizes” - estruturas hierárquicas de dados
- que mais tarde tornariam possível concretizar uma das ferramentas mais utilizadas
nas redes de comunicação, os atuais “hipertextos” tão presentes na WEB atualmente.
(PLANT, 1999, p. 18)
Em 1948 foi criado o transistor, componente eletrônico que substituiu as
válvulas, melhorando o desempenho das máquinas e reduzindo sensivelmente o
tamanho dos computadores. Em 1960 surgiram os Circuitos Integrados, e em 1964, os
primeiros computadores com essa tecnologia, se tornavam minúsculos em
comparação ao pioneiro ENIAC.
A partir dos anos 70 começaram a ser produzidos os microprocessadores e,
com eles, os microcomputadores pessoais – os chamados PCs –, equipamentos agora
destinados ao uso doméstico. No novo contexto, os primeiros PCs foram utilizados
principalmente para jogos. Até o surgimento da primeira planilha de cálculos, o
VISICALC, recurso que propiciou finalmente o uso profissional dos
microcomputadores. Teve início, então, a grande expansão do IBM-PC e seus
compatíveis. De tal maneira que durante largo período essa sigla chegou a ser
empregada na linguagem corrente praticamente como sinônimo do termo
microcomputador.
Mais recentemente, se observa a acelerada evolução dos equipamentos,
acompanhada da multiplicação e miniaturização dos seus formatos. Vários - como os
telefones celulares – integram em suas funções vários aplicativos (programas de
operação) permitindo a utilização em múltiplas funções: comunicação, redação e
armazenamento de arquivos de textos, acesso á Internet, jogos on-line,
armazenamento de arquivos musicais, fotografias, filmes etc.
57
Figura 12 - Um dos primeiros modelos ‘desktop’, utilizado para jogos
Figura 13 - Modelo avançado: a tela e teclado são componentes virtuais da máquina
Figura 14 - Smarthphone: integra as funções de telefone e computador pessoal
58
Os dados demonstram que, por volta dos anos 60, os computadores - ainda
limitados em comparação às máquinas atuais -, eram voltados a diversas utilizações,
especialmente finalidades associadas à segurança militar e pesquisas em diferentes
áreas.
Por outro lado, no final dos anos 50 havia se iniciado a chamada Guerra Fria,
expressão usada para designar o tenso relacionamento político entre as potências
dominantes no Ocidente e no Oriente (EUA e União Soviética), deflagrado pelo
processo que passou à história como Corrida Espacial. O conjunto de fatores presente
no cenário político levou o Ministério da Defesa norte-americano a estudar formas de
proteger os registros dos dados militares frente a um possível ataque inimigo (GUIA
DO HARDWARE.NET, Acesso em 28/07/08).
A Rússia havia lançado ao espaço seu primeiro satélite – o Sputnik –, em
outubro de 1957. No mesmo mês, nos EUA, Eisenhower criava a Advanced Research
and Projects Agency (Arpa), que originalmente teria como objetivo desenvolver
projetos espaciais norte-americanos. No ano seguinte, com a criação da Agência
Espacial Americana (Nasa), a Arpa aparentemente perdeu sua razão de ser. Porém,
logo depois, a mesma agência recebeu da Força Aérea norte-americana a doação de
um computador poderoso para a época – o IBM Q-32 -, sediado na Universidade da
Califórnia (Ucla). A partir daí a Arpa orientou suas pesquisas para a área da recém-
nascida Informática, de modo geral, e à idealização de um sistema de segurança
voltado à proteção dos dados militares
35
.
A solução idealizada foi a criação de uma rede eletrônica de dados. Nessa
estrutura, os mesmos dados deveriam estar armazenados em diversos computadores,
distantes entre si. Essa rede previa ainda que os diferentes computadores deveriam
estar interligados, a fim de permitir que os dados registrados em cada um fossem
atualizados (trocados) em todos os computadores no menor espaço de tempo
possível. Cada computador deveria ter várias opções de vias de comunicação com os
outros. Dessa forma, a rede continuaria funcionando mesmo que um computador ou
uma das vias de comunicação fossem destruídos. Estava, portanto, sendo idealizada a
estrutura original de “rede” (web), que daria forma à Internet. Porém, era necessária a
criação da tecnologia que permitisse o funcionamento desse tipo de estrutura.
35
Uma curiosidade: o pesquisador contratado para dirigir e coordenar esse trabalho foi o psicólogo - Joseph Lincklider -
que já era renomado especialista em computadores. Mais tarde, outro psicólogo – Robert Taylor – daria continuidade
ao seu trabalho na Arpa. (Museu do Computador, acesso em 22/07/08).
59
Por meio da Arpa, no final da década de 60, teve início o projeto experimental
de conexão de apenas quatro computadores dos departamentos de pesquisa de três
universidades norte-americanas
36
. No primeiro momento a velocidade de transmissão
de dados da pioneira rede era de apenas 110 bps (bits por segundo), correspondentes
a apenas 825 caracteres de texto por minuto. Porém, para a época, os números eram
extremamente significativos e, como se constatará, muito promissores.
A partir da primeira solução, ainda foi necessário um intenso trabalho
colaborativo para o desenvolvimento de recursos técnicos que tornassem viável a
interligação das diversas redes, naquela altura já criadas por diferentes fabricantes de
equipamentos. Além disso, era preciso desenvolver sistemas de segurança da
transmissão das informações, isto é, criar condições para que os dados trocados
pudessem chegar ao seu destino sem distorções, além da abertura de caminhos
alternativos para a sua transmissão. Caso um dos “nós” da rede apresentasse avaria,
a informação deveria percorrer outras vias até o seu destino final.
Finalmente, em agosto de 1972, utilizando ainda a rede telefônica, outros
computadores foram interligados à rede original, e pouco a pouco foi se configurando
a complexa estrutura que deu origem à grande rede - a WEB - hoje conhecida como
Internet.
A Internet ganhou dimensões globais a partir da década de 90, graças a dois
inventos. O primeiro, criado em 1973 pelos engenheiros americanos Vinton Cerf e
Robert Kahn: Internet Protocol (IP), protocolo de comunicação entre computadores. O
segundo foi o desenvolvimento em 1990, da WWW (World Wide Web), conhecida
como “teia mundial”. Criada pelo físico inglês Tim Berners-Lee, revolucionou as formas
de navegação e apresentação dos conteúdos, pois permitiu a integração de textos e
imagens por meio de hiperlinks e conexões instantâneas, em linguagem HTML (Hyper-
text Markup Language).
Em paralelo, no início da década de 90 surgem, nos EUA, os primeiros
“navegadores” - Gopher e Mosaic –, programas que permitem aos usuários acessar a
Internet por meio de interfaces “amigáveis” e a visualização dos sites: as páginas nas
quais não apenas textos, mas também arquivos de som e imagem passaram a ser
compartilhados e acessados. Esse tipo de recurso tornou a navegação na rede muito
36
Stanford Research Institute, na Universidade da Califórnia, Universidade de Santa Barbara e Universidade de Utah,
nos EUA.
60
mais atrativa e acessível ao usuário comum. Começou a partir daí a explosiva difusão
da sua utilização, a princípio nos Estados Unidos, expandindo-se progressivamente a
outras partes do mundo.
4.2 Chegada e difusão no Brasil
Os primeiros acessos brasileiros à Internet ocorreram a partir de 1988, no
ambiente acadêmico. Com o apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa de São Paulo
(FAPESP) e da Secretaria Estadual de Ciência e Tecnologia, os professores Oscar
Sala e Flávio de Fava Moraes, da Universidade de São Paulo, iniciaram projeto, em
parceria com o Fermilab
37
, que permitiu efetivar o primeiro acesso oficial à WEB. Na
mesma época, iniciativas semelhantes foram acionadas por instituições do Rio de
Janeiro e do governo federal. Em 1992, durante a ECO-92
38
, ocorreu a primeira
conferência eletrônica brasileira, dando início à gradual utilização da rede no meio
acadêmico nacional.
As vias de acesso não vinculadas ao espaço acadêmico ainda eram escassas.
Além das Intranets, já mencionadas em capítulo anterior, outra possibilidade de
acesso à Web eram as BBSs. Sigla para Bulletin Board System, as BBSs
correspondiam a um tipo de programa (software) que permitia a distribuição de
serviços baseados em menus interativos, por meio de linha telefônica. Essa forma de
comunicação foi bastante utilizada nos EUA a partir de 1978 até o início dos anos 90.
Entre usuários brasileiros sua utilização prolongou-se um pouco mais: até a chegada
da Internet aberta, por volta de 1995 (CORREIA at all, 2003, p. 30).
O ano de 1995 pode ser considerado o marco-zero da Internet
comercial no Brasil e no mundo. Foi quando surgiram nos Estados
Unidos alguns dos mais importantes nomes da Internet, como o site
de busca Yahoo! e a livraria Amazom.com, além dos primeiros
protagonistas da WEB brasileira.(VIEIRA, 2003, p: 11)
Na fase inicial, os acessos à rede eram feitos apenas por meio de ligações
telefônicas - as conexões discadas – e, portanto, mediados pelas empresas
telefônicas, na época, estatais. No entanto, estava em curso, no Brasil a privatização
37
Fermilab (Fermi National Accelerator Laboratory) é um laborátório norte-americano próximo a Chicago, especializado
em física de partículas de alta energia (WIKIPÈDIA, 2008).
38
A ECO-92, Rio-92, Cúpula ou Cimeira da Terra, como ficou conhecida a Conferência das Nações Unidas para o
Meio Ambiente e o Desenvolvimento (CNUMAD), foi realizada em junho de 1992 no Rio de Janeiro. Seu objetivo
principal foi buscar meios de conciliar o desenvolvimento sócioeconômico com a conservação e proteção dos
ecossistemas da Terra (WIKIPÈDIA, 2008).
61
dos serviços de telecomunicações, processo que redistribuiria as atribuições das
empresas que atuariam no mercado. Como parte dessa regulamentação, em 1996, o
governo federal criou o Comitê Gestor da Internet (CGI), órgão composto por
representes de vários segmentos da sociedade que ainda hoje define parâmetros e
normas de funcionamento da Internet no Brasil. Paralelamente ao surgimento dos sites
de busca e de comércio eletrônico norte-americanos, a Internet no Brasil ganhava
impulso crescente em diversas áreas de atividade, como relata Vieira (2003, p. 16):
Enquanto o Yahoo! e a Amazon.com ditavam as regras da Internet
comercial na condição de pioneiros da indústria nos Estados Unidos,
a WEB brasileira acompanhava com atenção o surgimento de
centenas de pequenos provedores de acesso à rede. A venda de
computadores pela primeira vez havia superado a de aparelhos de
TV e o consumo de linhas telefônicas aumentou gradualmente, até a
explosão observada após a privatização do setor, em 1988. Os
bancos e as instituições financeiras passaram a adotar a WEB em
suas operações, tornando-se referências internacionais em Internet
banking. Jornais, revistas e demais meios de comunicação impressa
também acompanharam o fenômeno de perto, inaugurando suas
versões digitais a partir de então. A prova definitiva de que a Internet
havia chegado realmente para valer na vida das pessoas foi a criação
da declaração on-line do Imposto de Renda, pela qual a Receita
Federal conseguiu praticamente eliminar o uso de papel. Hoje (2003),
nada menos do que 97% das declarações são enviadas pela WEB.
Avaliar precisamente o número de internautas ao redor do mundo é
praticamente impossível. Como esperado, a maior adesão inicial de usuários se deu
nos Estados Unidos, seguida dos países de maior nível de desenvolvimento. Porém,
com a rápida difusão da rede em termos globais, a concentração não segue
necessariamente essa mesma lógica em tempos recentes. Segundo o jornal on-line La
Vangardia, em abril de 2008 Pequim anunciou que a China já teria se tornado o país
com o maior número de internautas. Eram 221 milhões de pessoas conectadas, contra
215 milhões de norte-americanos, e estaria ainda em crescimento, com aumento de
cerca de 15 milhões de usuários/mês. (LAVANGARDIA, acesso em 24/08/08) Em
outubro do mesmo ano, uma manchete do portal de notícias UOL informava que o
número de usuários na China ultrapassou os 275 milhões (UOL, acesso em 20/01/09).
Dados publicados durante o ano de 2008 pelo site Acessa São Paulo, do
governo do estado de São Paulo, reproduzem informações divulgadas pelo site
IDGNow, segundo o qual o total de internautas, em âmbito mundial, já ultrapassou 800
milhões:
O número de pessoas que acessam a internet atingiu 824 milhões em
janeiro de 2008, um crescimento de 10,4%, de acordo com estudo
divulgado nesta terça-feira (18/03/08) pela empresa de pesquisa
62
comScore. A pesquisa mostra que a internet já deixou de ser uma
mídia centrada nos Estados Unidos, para se transformar em global.
Hoje, 21% das pessoas que acessam a internet são dos Estados
Unidos. Em 1996, eram 66%. (ACESSASP, acesso em 24/08/08).
Em janeiro de 2009 a mesma fonte – o site IDGNow – reviu esses números,
informando que a população mundial de internautas ultrapassa um bilhão de pessoas.
A China lidera o ranking, com 179,7 milhões de usuários da rede (IDGNow, acesso em
25/02/09).
Sem dúvida, as previsões sobre a evolução desses números somente serão
confirmadas com o passar do tempo. Mas, segundo notícia do Caderno de Informática
da Folha de S. Paulo, de 26/06/08, 25% da população do planeta deverão ter acesso à
Internet até o ano de 2012, chegando a 1 bilhão e 800 milhões de pessoas conectadas
(CADERNO DE INFORMÁTICA, acesso em 26/06/08). A versão on-line da mesma
Folha de S. Paulo apresenta projeções menos otimistas, como é o caso da opinião
expressa por Karl Albrecht. Em matéria veiculada em 05/05/08 é reproduzido artigo no
qual o futurólogo questiona as previsões sobre o crescimento acelerado e amplo da
rede mundial, qualificando as previsões como “mitos” da atualidade (ALBRECHT,
acesso em 12/05/08).
Analogamente, registros sobre a evolução do número de internautas brasileiros
ainda são imprecisos, e variam conforme a fonte consultada, ou ainda o critério
utilizado para o levantamento dos dados. Porém, as variações são entendidas se
considerarmos as diferentes formas de acesso possíveis ao mundo virtual. Além dos
computadores domésticos, outras vias de acesso são utilizadas pela população de
menor renda: locais de trabalho, escolas públicas e privadas e núcleos comunitários
de inclusão digital. Além das lan houses, que se multiplicam em tempos recentes, e
são locais onde o custo do acesso é muito acessível. Por essas vias, muitos
brasileiros até aqui tidos como “excluídos digitais”, encontram formas de acesso à
Internet, mas não são necessariamente alcançados pelas estatísticas oficiais.
A mídia impressa e digital divulga com frequência exemplos de situações de
inclusão surpreendentes ou inesperadas, se comparadas aos padrões de acessos
convencionais à WEB. Citam-se apenas três exemplos, emblemáticos e ilustrativos.
Um deles foi noticiado no site G1-Globo.com e relata o caso de um jovem morador de
rua – Ubirajara da Silva - que conseguiu se candidatar e ser aprovado em um
concurso público, com exigência de formação escolar de nível médio. Segundo a
63
mesma notícia, a vitória desse rapaz de Recife foi amplamente comemorada pelos
amigos, também frequentadores do site de relacionamentos Orkut, onde mantém seu
“perfil”. Indagado sobre como conseguia acessar e participar do site, Silva relata usar
computadores em bibliotecas públicas e lan houses que cobram preços baixos: “Eu
escolho entre comer ou acessar a Internet” (G1- GLOBO.COM, acesso em 03/10/08).
O segundo exemplo foi testemunhado por Fortim (FORTIM, 2004) durante sua
permanência de vinte e quatro horas em uma lan house, visando observar a variedade
de tipos humanos bem como o comportamento dos frequentadores:
Passado mais algum tempo, duas crianças (com cerca de 10 anos),
visivelmente pobres, passam pela porta da Lan vendendo vassouras,
e as oferecem à minha amiga. Como não se interessou pelo produto,
os meninos perguntam se é verdade que se jogarem uma hora (que
custa R$ 3,00), ganharão mais meia hora. Dada a afirmativa, pedem
que suas vassouras sejam guardadas e, misturando-se aos outros
jovens, jogam uma hora e meia de Counter, ao fim das quais, seguem
seu caminho e retomam a venda das vassouras. (FORTIN, 2004, p.
201).
O terceiro exemplo foi noticiado em uma série de matérias sobre a evolução do
uso da Internet no Brasil, veiculada entre os dias 26 e 30 de maio de 2008 pelo Jornal
Nacional, da Rede Globo de Televisão. No primeiro programa da série (26/05/08) o
tema foi a inusitada solução encontrada por alguns indígenas da tribo Ashaninka para
por fim ao conflito com invasores do seu território, situado na longínqua fronteira com o
Peru. Segundo o relato, alguns membros da tribo estariam preparando armas para
enfrentar os madeireiros peruanos, mas alguns indígenas resolveram tomar outro tipo
de providência: utilizando o computador da tribo (movido por energia solar e uma
antena parabólica) enviaram um e-mail ao governo federal, em Brasília, solicitando
ajuda militar. O relato prossegue ilustrado (com som e imagem) mostrando como o
confronto entre os invasores fortemente armados com fuzis e metralhadoras, e os
indígenas, armados de arcos e flechas, foi evitado mediante a intervenção do Exército,
em atenção ao apelo virtual dessa tribo (JORNAL NACIONAL, 2008).
Ainda que caibam algumas reservas quanto à sua exatidão, os dados
apresentados nas estatísticas oficiais são interessantes, e indicam o crescimento
acentuado no número de usuários. Eis alguns números, segundo o Ibope
39
:
39
IBOPE: Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística:<www.ibope.com.br>
64
Fevereiro de 2001: 4 milhões e 400 mil usuários ativos com acesso doméstico
(acessaram a rede de casa pelo menos uma vez ao mês). No entanto, a quantidade
total de internautas no país nesta mesma data foi de 9 milhões e 800 mil pessoas.
Abril de 2003: 7 milhões e 700 mil usuários domésticos, com média mensal de 11
horas de navegação.
Março de 2006: 14 milhões e 100 mil internautas, com média de 19:24 horas e vinte
e quatro minutos de navegação mensal - a segunda na escala internacional. Em maio
do mesmo ano, segundo o Comitê Gestor de Internet o número total de brasileiros que
acessaram a WEB foi de 30 milhões.
Janeiro de 2008: 21 milhões e 100 mil usuários domésticos, com um tempo médio de
navegação atingindo 23 horas e 12 minutos por pessoa/mês – o primeiro na
classificação mundial. No mesmo período, foram computados no Brasil 39 milhões de
pessoas com 16 anos ou mais com acesso à Internet em qualquer ambiente como em
casa, trabalho, escolas e telecentros. Em junho do mesmo ano, novos números foram
divulgados pelo IBOPE: No primeiro trimestre de 2008, 41 milhões e 500 mil pessoas
com 16 ou mais acessaram a Internet em vários ambientes (casa, trabalho, escola,
cybercafés, bibliotecas etc.). No mês de maio, 23 milhões e 100 mil pessoas
acessaram a WEB a partir de suas casas. O número representa ainda 29% de aumento
sobre os 17 milhões e 900 mil de maio de 2007.
Janeiro de 2009: Segundo o IBOPE/NetRatings, o número de internautas atingiu 43
milhões e 100 mil; Ou, 64 milhões e 500 mil, segundo notícia do DataFolha de
agosto de 2008. A discrepância entre os números deve-se à diferença de metodologia
adotada na pesquisa, mas ambos os institutos consideraram apenas os internautas
maiores de 16 anos. Ainda segundo o DataFolha, nas áreas urbanas, 44% da
população e 97% das empresas brasileiras estão conectadas à Internet.
Março de 2009: O número de internautas que já usaram Internet no país (seja em
escolas, no trabalho ou na própria residência) chega a 62 milhões e 300 mil, segundo
dados divulgados nesta terça-feira (24/03) pelo Ibope. Isso representa um aumento de
quase 45% em relação aos dados referentes ao último trimestre de 2008, estimados
em 43 milhões e 200 mil (FOLHAONLINE, Acesso em 16/06/09).
São vários os fatores que colaboraram para o crescimento desses números.
Entre eles, o barateamento dos equipamentos, especialmente a redução do custo dos
computadores. Simultaneamente, a popularização das conexões via banda larga
também contribuiu, a partir da redução do valor pago pelo usuário pelo tempo de
navegação. A tecnologia da banda larga sem fio (wireless) auxilia de modo especial a
expansão. Em 09/03/09, o Jornal Nacional veiculou matéria sobre a instalação de uma
rede wireless na favela Dona Marta, no Rio de Janeiro. Por iniciativa do governo
65
estadual os moradores passaram a ter acesso gratuito à Internet (JORNAL
NACIONAL, Acesso em: 19/04/09).
A rigor, a avaliação da expansão deveria considerar também outros possíveis
desdobramentos da utilização da WEB. Por exemplo, a facilitação do acesso da
população às mídias jornalísticas. Em entrevista transmitida pela Televisão Cultura
40
o
jornalista Caio Túlio Costa (COSTA, 2008) apresentou números: considera haver no
Brasil cerca de 45 milhões de pessoas conectadas à Internet, portanto, com acesso
potencial às versões digitais das cinco principais revistas informativas brasileiras. O
jornalista comparou esse número ao total de leitores potenciais das versões impressas
dessas mesmas mídias: as edições impressas das mesmas cinco maiores revistas
somam 2 milhões e 500 mil exemplares semanais. Ainda que cada exemplar seja lido
por cinco pessoas, haverá um universo de apenas 12 milhões e 500 mil leitores.
É uma estimativa relativamente modesta, pois a rigor seriam acrescidos os
acessos dos usuários de telefonia celular, que segundo o site Jornalistas da WEB no
momento passam de 150 milhões de brasileiros. Essa notícia informa ainda que oito,
em cada dez brasileiros, utilizam essa forma de comunicação (Acesso em 01/05/09).
Considerando-se a tendência desses usuários de migrar rapidamente para aparelhos
que oferecem o acesso do tipo wireless (conexão sem fio), o total dos potenciais
leitores de notícias digitalizadas tende também a se ampliar rapidamente. Assim,
Costa (2008) considera a Internet o maior fator de democratização do acesso à
informação já surgido na história humana.
Em meio ao universo de dados presentes na WEB, há uma significativa
quantidade de informações distorcidas, inexatas, ou ainda aquelas a serviço de
interesses os mais variados: de intuitos meramente comercias até os francamente
escusos. Mas a diversidade da qualidade da informação oferecida não é exclusiva –
nem foi gerada – pelas mídias digitalizadas. A confiabilidade - ética, moral ou científica
- das informações veiculadas pela imprensa é inerente ao fator humano que as
formula e divulga, e não aos canais de sua expressão. O grande diferencial com o qual
se defronta é a ampliação geométrica da sua difusão e alcance - para o bem ou para o
mal.
O propósito da inserção - a seguir – de referências sobre as possibilidades de
utilização da WEB é a ilustração da variedade e amplitude das formas de
40
Programa “Roda Viva” de 27/07/08 – veiculado pela TV Cultura de São Paulo.
66
comunicação, contato e interação presentes na grande rede. Não se pretende esgotar
a descrição dessas possibilidades, nem tampouco explorar suas características
técnicas. Ainda que algumas modalidades de uso descritas envolvam breves
explicações, a fim de compreendermos as interações estabelecidas pelos internautas,
suas formas de expressão e algumas implicações para a psicodinâmica dos seus
participantes.
A conexão à Internet varia quanto às funcionalidades: desde aquelas voltadas
às atividades profissionais, culturais, comerciais, quanto outras, voltadas ao lazer e
entretenimento, em atividades lúdicas. Há ainda as menos evidentes ao cidadão
comum, por exemplo, no sistema financeiro e burocrático: todas as pessoas que
possuem uma conta bancária acessam a Internet, direta ou indiretamente, ao realizar
suas operações nos caixas eletrônicos, ou ao efetuar o pagamento de seus débitos
nas próprias agências bancárias.
Os arquivos e registros dos órgãos governamentais, jurídicos e demais
recursos e vias de prestação de serviços e de controle social também são
progressivamente informatizados. Os dados pessoais tornaram-se virtualmente
acessíveis a um simples ‘clique’ de mouse. Porém, aqui serão relacionadas apenas as
formas de utilização mais diretas da WEB, feitas pelas pessoas “comuns”. A pesquisa
cita as principais vias de comunicação e formas de uso no cotidiano. A intenção da
exposição é ilustrar a amplitude dessas opções, pois esgotá-las seria tarefa sempre
incompleta, uma vez que novas modalidades de acesso e utilização da WEB são
criadas ao redor do mundo a cada momento.
Principais vias de comunicação da WEB
Navegação – pessoa sites (Home Pages comerciais ou institucionais)
Via e-mail – pessoa  pessoa ou pessoa  grupo(s)
Via chats – pessoa  pessoa (ou pessoa  grupos, presentes nas “salas”)
Programas de comunicação instantânea – Messenger / ICQ – pessoa  pessoa
Comunidades virtuais pessoa  grupos (Exemplos: sites de relacionamento
como o Orkut ou o My Space, ou ainda os grupos dedicados à prática dos jogos on-line
e os grupo de discussão, disponibilizados pelos provedores de acesso à Internet).
Principais modalidades de uso da WEB
Pesquisas de “conteúdo: consultas aos sites que contêm informações culturais e
científicas, ou sobre serviços públicos e/ou privados (inscrições para cursos e
concursos, consultas a guias, mapas, listas telefônicas ou semelhantes).
67
Prestação de Serviços comerciais, públicos, ou semelhantes: consultas sobre a
oferta e/ou venda de produtos, pagamento de serviços públicos, movimentação
bancária, reservas de viagens etc.
Comunicações de caráter pessoal: por meio da troca de e-mails, salas de chat, ou
ainda programas de comunicação instantânea, as trocas podem acontecer com os
propósitos os mais variados.
Comunicações grupais variadas: por meio de grupos ou fóruns de discussão (Yahoo
Groups). Ou videoconferências com finalidades científicas, culturais, comerciais etc.
Educação a Distância: por meio de sites que hospedam os conteúdos e atividades de
cursos, ou via grupos e/ou fóruns de discussão temáticos, como parte integrante do
planejamento de cursos presenciais. Contemplando essa forma de ensino, o MEC
(Ministério da Educação e Cultura) desde 2001 autoriza que até 20% das atividades
das disciplinas dos cursos universitários regulares possam ser realizadas à distância,
via Internet
41
.
Serviços Psicológicos informatizados – este tema merece atenção porque existe
significativo número de profissionais e instituições da área ‘psi’ oferecendo serviços
psicológicos informatizados via WEB. Constata-se, simultaneamente, empenho por
parte dos conselhos de classe visando a regulamentação da oferta desses serviços. A
emergente área de estudo das Interfaces entre a Psicologia e a Informática – a
Psicoinfo - vem recebendo a atenção de profissionais que se dedicam ao estudo
dessas questões
42
.
Cada uma das modalidades citadas se desdobra em várias formas de
expressão. Exemplos são as salas de chat, subdivididas em categorias por idade,
localidade, interesses e objetivos do contato (busca de amizade, namoro etc.) ou
segundo preferências sexuais. As comunidades virtuais assumem características
multifacetadas: existem as que apenas promovem encontros e relacionamentos entre
pessoas de diferentes “tribos” (grupamentos sociais) com interesses variados (música,
literatura, estudos de temas específicos) até as dedicadas aos jogos on-line realizados
em rede, das quais participam vários jogadores, podendo eles tanto estar na mesma
sala, como em países ou continentes diferentes.
Sobre as modalidades de uso e acesso na área Psicoinfo, deve ser destacada
a aplicação (ou avaliação) de testes informatizados, função que se tornou rotineira nos
processos de recrutamento e seleção de pessoal. Desde a publicação da primeira
41
Portaria no. 2.253, de 19/10/01 - do MEC (Ministério da Educação e Cultura) - regulamenta as atividades em EAD
inseridas nos cursos regulares.
42
Em novembro 2006 ocorreram na PUC-SP os eventos conjuntos – III “Psicoinfo” e “II Jornada sobre Psicologia e
Informática”, promovidos em parceria pelo CFP / CRP-SP e o NPPI – Núcleo de Pesquisas da Psicologia em
Informática, o Serviço de Informática da Clínica Escola da PUC-SP. Em setembro de 2008 teve lugar a III Jornada do
NPPI, realizada na mesma universidade.
68
regulamentação
43
, em setembro de 2000, cresce, de modo constante, a solicitação ao
Conselho Federal de Psicologia de credenciamento de sites que visam oferecer
serviços psicológicos mediados por computadores. Até julho 2009 foram aprovados
cerca de 50 sites, e havia 42 em processo de avaliação. Outros 110 sites foram
avaliados, mas não cumpriram os critérios necessários para obter o credenciamento
pelo CFP.
4.3 Evoluções previstas de usos
Conforme evoluem as ferramentas informatizadas, seus usuários também
criam novas maneiras de utilizá-las. Consequentemente, algumas alternativas de
navegação podem surgir de modo não planejado, em decorrência da participação dos
usuários em suas interações com as máquinas, em uma espécie de sinergia
acelerada.
Segundo a visão evolutiva da Internet, já se iniciou a sua terceira fase. A
primeira – denominada WEB 1.0 – correspondeu à criação da possibilidade de acesso
do internauta aos grandes bancos de dados, ou seja, o acesso aos primeiros sites. Na
segunda fase - a WEB 2.0 -, foi acrescida a possibilidade de interação entre o
internauta e os espaços virtuais. A terceira fase - a WEB 3.0 - tem como principal
característica a oferta da possibilidade da imersão virtual do internauta no ambiente de
navegação, condição que altera significativamente a intensidade e a qualidade da
interação homem
 máquina. Embora a conceituação mais exata sobre as fases da
Internet seja ainda pouco definida, tudo indica que as diferenças básicas - para os
usuários - são essencialmente funcionais, gerando ampliações quantitativas e
qualitativas da sua utilização, como ilustra a definição da Wikipédia:
Web 2.0 é um termo cunhado em 2004 pela empresa estadunidense
O’Reilly Media para designar uma segunda geração de comunidades
e serviços baseados na plataforma Web, como wikis, aplicações
baseadas em folksonomia
44
e redes sociais. Embora o termo tenha
uma conotação de uma nova versão para a Web, ele não se refere à
atualização nas suas especificações técnicas, mas a uma mudança
na forma como ela é encarada por usuários e desenvolvedores.
(WIKIPEDIA: WEB 2.0, acesso em 22/11/08).
43
Os textos das Resoluções promulgadas pelo CFP podem ser consultados no seguinte link do site do Conselho
Federal: <http://www.pol.org.br/pol/cms/pol/legislacao/resolucao/>
44
A “folksonomia” é uma maneira de indexar informações. Esta expressão foi cunhada por Thomas Vander Wal. É uma
analogia à taxonomia, mas inclui o prefixo folks, palavra da língua inglesa que s refere a povo, popular, companheiros.
69
O termo wiki, adotado do idioma ancestral havaiano significa “rápido”, sendo
utilizado no linguajar do ciberespaço para designar um tipo de software (programa)
que permite a edição simples, rápida e colaborativa de documentos construídos
coletivamente, on-line, pelos integrantes de redes sociais.
Já a partir dessas referências podemos deduzir que a primeira evolução da
WEB (a WEB 2.0) consistiu essencialmente em uma mudança na qualidade da
utilização da plataforma de comunicação já existente, visando à ampliação da
participação interativa dos usuários na direção da construção coletiva do
conhecimento. Essa observação confirma as previsões de Levy (LEVY, 2000, 2001,
2006) expostas em suas primeiras reflexões sobre a Internet.
A principal característica inovadora da WEB 3.0 é o caráter imersivo da nova
forma de participação interativa do internauta nas navegações e interações com
sistemas e programas, imersão essa propiciada pelo desenvolvimento dos recursos da
realidade virtual:
Realidade Virtual, ou ambiente virtual, é uma tecnologia de interface
avançada entre um usuário e um sistema computacional. O objetivo
dessa tecnologia é recriar ao máximo a sensação de realidade para o
internauta durante interações com o sistema, levando-o a adotar tais
interações como uma de suas realidades temporais. Para isso, essa
interação é realizada em tempo real, com o uso de técnicas e de
equipamentos computacionais que ajudem na ampliação do
sentimento de presença do usuário. Em suma, trata-se de uma
realidade ficcional, contudo através de relações intelectuais, a
compreendemos como sendo muito próxima do universo real que
conhecemos.
(WIKIPEDIA: Realidade Virtual, acesso em 22/11/08)
A aplicação desse tipo de recurso às interfaces dos programas e sites propicia
aos usuários cinco características principais, conforme destaca Braga (2001, p. 2-3,
acesso em 09/08/08): “A navegação se torna imersiva, intensiva, interativa, ilustrativa,
e informativa”. Esse recurso tecnológico é explorado para diversas finalidades
experimentais, educacionais e de lazer, ainda que só mais recentemente tenha se
tornado conhecido, em função da divulgação pela mídia, do Second Life
45
, programa
que é exemplo desse tipo de navegação. Algumas aplicações já desenvolvidas
ocorrem nas áreas de lazer (games e viagens virtuais); saúde (simulação de cirurgias,
e outras intervenções, além da reabilitação); negócios (maquetes e outras formas de
demonstração de produtos); e treinamento (simulador de vôo, treinos esportivos). A
45
O Second Life é um ambiente virtual tridimensional que simula aspectos da vida real e social do ser humano. Mais
informações sobre o SL são fornecidas no Glossário 2.
70
educação é área na qual as aplicações desse recurso estão sendo pesquisadas, por
exemplo, pelos criadores da Escola do Futuro
46
(SCHWARTZ, 2008) da Universidade
de São Paulo – um laboratório interdisciplinar que investiga como as novas
tecnologias de comunicação contribuem para o aprendizado, nos vários níveis e
modalidades de aplicação.
Os desdobramentos da WEB acima relacionados correspondem apenas às
principais modalidades de utilização da realidade virtual, viabilizadas e
experimentadas. Certamente outras já existem, ou estão em processo de
planejamento e aplicação, além das que certamente serão idealizadas em futuro
próximo.
4.4 A relação homem
 computador
Cosentino (2006) analisou a interação homem
 computador a partir de uma
perspectiva evolutiva. Para encaminhar esse estudo, o autor propõe que a revisão
histórica não se restrinja aos últimos 60 ou 70 anos, época em que os primeiros
computadores começaram a surgir, mas que “[...] voltemos um pouco mais,
aproximadamente dois milhões e meio de anos, data das mais antigas evidências
arqueológicas das primeiras tecnologias de fabricação de ferramentas” (COSENTINO,
2006, p. 62).
De acordo com seu levantamento, desde os primeiros artefatos produzidos
pelos humanos, as ferramentas sempre guardaram estreitas correlações com
aspectos centrais da nossa evolução. De tal forma que, ao longo do processo de
hominização, a evolução cultural e a evolução biológica ocorrem em estreito
paralelismo, conforme afirma Cosentino:
Desse modo, o crescimento cerebral, a organização social, a
transmissão de conhecimento e a fabricação e o uso de ferramentas
são alguns dos importantes pontos desse processo, formando um
complexo conjunto de características que possuem uma relação entre
elas. (COSENTINO, 2006, p. 64)
De acordo com uma perspectiva evolutiva análoga, se considera que o
desenvolvimento do aparato tecnológico necessário ao surgimento da Internet
46
Endereço de acesso à Escola do Futuro - USP: <http://www.futuro.usp.br>
71
aconteceu na medida em que passou a existir, por parte do ser humano, algum tipo de
“prontidão” muito específica para a sua utilização. Segundo Novo, tal prontidão se
manifesta na medida quando “[...] o humano reúne condições para que graus de
virtualidade e de simbolização possam ocorrer, concebendo ferramentas segundo seu
momento histórico” (NOVO, 2004, p. 87).
Esta breve observação da história da Internet permite supor que, na fase inicial
da sua concepção, seus criadores dificilmente imaginariam os desdobramentos
posteriores, nem a rapidez com que iria se multiplicar o número de seus usuários.
Novo (2004) ilustra esse movimento utilizando a metáfora do homem que olha para o
horizonte e, dali avistando ali um morro, por um momento sente-se confortado pela
ideia de que o mundo acabaria naquele ponto. Novo complementa sua metáfora
sugerindo a seguinte continuidade para a cena imaginada:
Mas surge uma excitação, de compreensão do mundo que o cerca.
Anima-se e escala o morro, e lá ele descobre que existem incontáveis
coisas além, descobrindo também o quanto estava iludido na sua
cosmogênese. Ao olhar para adiante do morro, pode descobrir um
novo mundo, um mundo globalizado, conectado em rede. Qual
necessidade humana estaria sendo satisfeita com a conexão mundial
em rede?(NOVO, 2004, p. 89)
As possibilidades oferecidas ao ser humano, a partir da viabilização do acesso
ao ciberespaço, desdobram-se em distintas formas de expressão: quebra dos padrões
de tempo e espaço; possibilidade de interação entre humanos sem ser necessário o
contato presencial; acesso e processamento de quantidade e variedade de
informações antes inimaginável; viabilidade de ação a distância propiciada pelos
recursos da chamada Realidade Virtual, entre outras.
Segundo analistas e usuários mais versados, as aplicações atuais dos recursos
digitais em geral, e da Internet em particular, correspondem a etapa comparável ao
ensaio geral da sua efetiva utilização futura. Nos seus discursos, é praticamente
unânime a afirmação de que as ferramentas tecnológicas – o computador e derivados
- ainda se encontram em fase incipiente de desenvolvimento, se comparadas ao
potencial de evolução. Em entrevista concedida ao jornal Le Monde, Vinton Cerf – um
dos responsáveis pela criação da tecnologia do e-mail – prevê que em breve o acesso
à Internet via telefones celulares ultrapassará as formas convencionais de acesso via
computadores (CERF, 2008, acesso em 17/07/08). Por meio da ampla utilização da
72
conexão sem fio (wireless) e dos “semicondutores
47
”, as novas tecnologias serão
aplicadas a outros objetos, permitindo maior mobilidade, miniaturização e multiplicação
das formas de acesso e utilização da rede mundial.
Conforme mencionado, a evolução tecnológica dos artefatos informatizados
traduz-se também em alternativas de navegação e participação do usuário nas
interações com as máquinas. Tudo indica que, de modo especial, a ampliação da
interatividade e o caráter imersivo - propiciados à navegação na Internet pelo
desenvolvimento das Webs 2.0 e 3.0 - deverão em pouco tempo, gerar inovações.
Desse modo, a fronteira entre a vida presencial (por muitos ainda vista como a “real”)
e a vida virtual, tende a tornar-se cada vez mais fluida – e difícil de ser identificada.
Para que pudesse transitar por essas novas “realidades” é provável que uma
espécie de “prontidão” já estivesse em preparo na psique do ser humano. Em outros
termos, é provável que certo ‘quantum’ de energia psíquica estivesse disponível, para
que tal processo pudesse ter se iniciado e tomado a forma da criação das tecnologias
que propiciaram a existência da grande WEB, bem como das expressões e vivências
humanas no ciberespaço.
Na época da chegada da Internet aberta ao Brasil, alguns autores se
manifestaram antecipando as dificuldades que seriam enfrentadas para a sua
abordagem e análise no âmbito da Psicologia. Como exemplo, o alerta registrado por
Nicolaci-da-Costa (1998) no prefácio de citado estudo sobre os impactos gerados pelo
surgimento do ciberespaço:
Não é fácil estudar o novo. E não é fácil porque o velho sempre tende
a atrapalhar, principalmente quando já temos formas consolidadas de
ver e interpretar o que nos cerca. O novo sempre requer um novo
olhar e novos olhares geralmente geram inseguranças naqueles que
olham sem fazer uso de referencias conhecidos, ao mesmo tempo
em que provocam a ira daqueles que não querem abandonar a
segurança desses referenciais. Partir do que já é conhecido é sempre
mais confortável, O problema é que, em se tratando de algo
completamente novo, quando se parte do conhecido tende-se a
encaixar o novo no velho, o que é uma forma de não o enxergar
(NICOLACI-DA-COSTA, 1998, p. 7).
Os psicólogos possivelmente ainda estão aturdidos diante da constatação
desse fenômeno de dimensões planetárias. Do qual, por um lado, são espectadores,
47
Inovação tecnológica que promete imprimir nova onda de desenvolvimento e ampliação dos artefatos informatizados
em muitos campos de suas aplicações, de modo especial na “nanotecnologia”.
73
mas por outro, são também agentes, como usuários, mesmo que apenas em
potencial. Essa condição talvez ainda não facilite o distanciamento mínimo necessário
- entre o profissional e a Internet - para a realização de suas análises. A maioria dos
psicólogos ainda parece estar se familiarizando com o simples fato de sua existência,
formas de utilização e manejo.
Temer e evitar o novo e o revolucionário são reações recorrentes do ser
humano ao longo da história. No século XV, quando foi criada a prensa móvel, a
invenção de Gutemberg foi temida e apontada como algo que colocaria em risco a
“sanidade” dos indivíduos mais vulneráveis - pelo “excessivo” acesso ao conhecimento
– e o equilíbrio dos poderes, como estabelecidos na época.
Em relação à máquina a vapor, quando iniciada a sua aplicação como
propulsora de veículos (especialmente os trens), vozes se levantaram em alerta: o
organismo do ser humano não toleraria viajar nas altas velocidades desse modo
viabilizadas. Mais recentemente, a televisão foi amplamente execrada pelo seu
suposto poder de embotamento cognitivo das gerações mais jovens. Como o nosso
tema envolve o uso das novas tecnologias, é fundamental relembrar as acaloradas
discussões dos anos 60 a respeito dos prejuízos que o uso das calculadoras
eletrônicas acarretaria à aprendizagem da matemática. Essas têm sido,
historicamente, as primeiras reações diante da novidade: estranhamento, temor,
afastamento. Ou seus opostos: paixão, fascínio, e variantes. Atitudes compreensíveis,
algumas vezes justificáveis. Mas o tempo é sempre o mais qualificado juiz,
especialmente quando os fatos em pauta são da ordem e magnitude envolvidas no
surgimento da Internet.
Em O Nome da Rosa, Umberto Eco (ECO, 2003) criou uma bela alegoria sobre
as atitudes peculiares de o ser humano se posicionar em relação às inovações que
“desestabilizam” a ordem vigente: no mosteiro de Melk, onde ambientou seu romance,
os monges que ousassem apenas “tocar” os livros proibidos estariam
irremediavelmente condenados à morte, por envenenamento. Relatando um dos
diálogos mantidos com seu mestre – Frei Guilherme, frade sábio -, outro personagem-
chave do enredo, o jovem protagonista do romance confessa sua curiosidade a
respeito das máquinas intrigantes, sobre as quais ouvira falar (relógio, astrolábio, ímã).
Perguntando a respeito da localização de tais inventos – de cuja existência duvidava -
recebeu do mestre a seguinte resposta:
74
Disse-me que já tinham sido feitas na antiguidade, e algumas até em
nossos tempos: ‘Exceto o instrumento para voar, que não vi nem
conheci quem o tivesse visto, mas conheço um sábio que o imaginou.
E é bem possível fazer pontes que atravessem os rios sem colunas
ou qualquer outro sustentamento e outras máquinas inauditas. Mas
não precisas ficar preocupado se não existem ainda, porque não quer
dizer que não existirão. E eu te digo que Deus quer que existam, e
certamente já estão em sua mente, ainda que meu amigo de Ockham
negue que as ideias existam desse modo, e não porque podemos
decidir pela natureza divina, mas justamente porque não podemos
impor-lhe limite algum (ECO, 2003, p. 25).
Ao elaborar a resposta do mestre, o protagonista/narrador conclui: “É verdade,
no entanto, que aqueles eram tempos obscuros, em que um homem sábio precisava
pensar coisas contraditórias entre si” (ECO, 2003, p. 25).
Analogamente, em relação à Internet, talvez estejam sendo vividos os
“obscuros tempos” do seu recente surgimento. Durante esse tempo é imprescindível
tolerar as reações paradoxais geradas pela observação (e pela experimentação) das
vivências humanas nos espaços da virtualidade. Reagindo, ora com encantamento,
ora com desconfiança. Outras vezes com espanto, ou mesmo um misto de entusiasmo
e incredulidade. Ao menos, até o momento no qual a compreendamos e a integremos
como um dos mais impactantes fenômenos da nossa era.
75
CIBERESPAÇO COMO ESPAÇO PSÍQUICO
_______________________________________________________________
O que é real? Como se define o real?
Se estamos falando do que podemos sentir, do que podemos provar,
do que podemos cheirar e ver, então o real é simplesmente uma séria de sinais elétricos
interpretados pelo seu cérebro. (MORFEUS, em Matrix, 1999)
Este capítulo requer a introdução de alguns termos e conceitos fundamentais
para a compreensão dos comportamentos e vivências humanas observados na
virtualidade
48
. A começar pelo conceito de ciberespaço, designativo do campo onde
ocorrem as experiências humanas mediadas pelos computadores; e seu correlato,
designativo da chamada cibercultura. Na sequência, serão apresentadas definições
dos conceitos de virtual, real e presencial, de acordo com a acepção adotada no
contexto deste estudo.
Ciberespaço
O termo ciberespaço – do inglês cyberspace – tornou-se popular a partir da
expansão dos acessos à WEB e da ampla utilização da Internet como via de
comunicação virtual. A repercussão das ideias de Levy a respeito do fenômeno da
virtualidade (LEVY, 1995, 1997) favoreceu a difusão dessa expressão nos meios
acadêmicos. Frequentemente o conceito de ciberespaço é associado ao seu nome e
às proposições apresentadas em sua obra. Originalmente esse termo foi empregado
em 1984, pelo escritor canadense William Gibson em seu romance Neuromancer, uma
obra de ficção científica
49
. Nesse livro, como não é raro acontecer, a ficção antecipou
ou, ao menos, inspirou a terminologia adotada posteriormente pela ciência.
Na primeira edição (francesa) de O que é o virtual, Levy (1995
50
) esboçou a
primeira definição da sua concepção desse conceito, tomando como referência
48
Os termos e conceitos aqui apresentados permitiriam discussão mais ampla. No entanto, tal ampliação iria além dos
objetivos do trabalho. Os conceitos serão sinteticamente apresentados segundo acepções adotadas para o relato das
observações dos fenômenos humanos expressos no espaço da virtualidade.
49
Evoluindo de Blade Runner e antecipando Matrix, Neuromancer é o primeiro - e ainda hoje o mais famoso - livro de
William Gibson. É considerado o romance que deu origem ao gênero cyberpunk.
50
Neste ponto, nos referimos às datas das primeiras edições francesas das publicações de P. Levy, na intenção de
localizá-las no tempo quanto às suas edições originais. Nas próximas referências serão citadas as respectivas
traduções para o português.
76
observações a respeito do processo de virtualização do computador, como se
verificava na época:
Enfim, e sobretudo, um computador ramificado no hiperespaço pode
recorrer às capacidades de memória e de cálculo de outros
computadores da rede (que por sua vez fazem o mesmo). [...] É um
computador cujo centro está em toda parte e a circunferência em
nenhuma, um computador hipertextual, disperso, vivo, pululante,
inacabado, virtual, um computador de Babel: o próprio ciberespaço.
(LEVY, 2005, p. 47)
Atendendo a solicitação do Conselho Europeu, Levy elaborou relato sobre os
fenômenos sociais e culturais gerados pelo surgimento da comunicação virtual. Ao ser
publicado como livro, intitulado Cibercultura (LEVY, 2000), tornou-se referência para
os estudiosos da área. Na publicação Levy retomou a definição do termo ciberespaço,
destacando o caráter digital
51
dos registros das informações trocadas nesse espaço
de interação como a principal característica distintiva daquele ambiente: “Eu defino o
ciberespaço como espaço de comunicação aberto pela interconexão mundial dos
computadores e das memórias dos computadores” (LEVY, 2000, p. 92).
Cibercultura
Na mesma publicação, Levi (2000) explicitou o termo cibercultura como o
“conjunto de técnicas (materiais e intelectuais) práticas, atitudes, modos de
pensamento e valores que se desenvolvem juntamente com o crescimento do
ciberespaço” (Ibid. p. 17). Gradativa, e proporcionalmente aos avanços tecnológicos
característicos da nossa época, os fenômenos humanos observados no âmbito da
cibercultura adquirem significados cada vez mais relevantes. Na mesma medida –
conforme observado em capítulo anterior
52
- esses fenômenos têm recebido atenção
da Sociologia, da Antropologia, da Filosofia e demais ciências humanas e sociais, com
a produção de estudos amplos visando sua descrição e análise pelos pesquisadores
dessas áreas.
51
A digitalização corresponde ao fundamento técnico da virtualidade: digitalizar uma informação corresponde ao
processo de codificá-la em números (dígitos) para que possa ser transmitida e, posteriormente, decodificada. No caso
da CMC (comunicação mediada por computadores) os conjuntos de informações codificadas em formato digital são
transmitidos e posteriormente atualizados, sem que se percam dados durante a transmissão. (LEVY, 1999, p. 50-51)
52
Referimo-nos à revisão da literatura apresentada.
77
Ciberespaço como espaço psíquico
Para os objetivos deste trabalho, interessa observar as manifestações
humanas sob o enfoque psicológico. Assim, a expressão “ciberespaço como espaço
psíquico” será empregada em referência ao novo “campo” no qual o ser humano se
manifesta em variadas formas, expressando sua subjetividade: criando e
estabelecendo novas formas de interação, comunicação e relacionamento,
manifestando afetividade, e/ou expressando fantasias em formas criativas e
construtivas, como ocorre na criação artística ou cultural; ou manifestando conflitos,
por meio de comportamentos e/ou atitudes que sugerem a expressão de processos
psicológicos de caráter mais ou menos conscientes, em formas diretas, explícitas ou
projetivas. Desse modo, o ciberespaço será aqui entendido como um novo campo no
qual podemos observar expressões da vida psíquica, com suas respectivas
peculiaridades e dinamismos.
Real / Virtual / Presencial
Após o advento da Internet, o termo virtual, até então pouco presente na
linguagem popular, passou a ser expressão de uso comum. Mas seu emprego com
frequência ocorre de forma pouco precisa. A noção de virtualidade ainda é empregada
em conversas cotidianas – e mesmo na imprensa – se referindo a fatos, situações ou
atributos “irreais” dos eventos abordados. Nessas situações, os conceitos de virtual e
de real são geralmente entendidos como antônimos.
O dicionário Aulete Digital assim os define:
Virtual (do latim virtualis): 1. Que não existe no momento, mas pode
vir a existir: Potencial; 2. Diz-se de algo cuja concretização é tida
como certa; 3. Inf. Que existe somente como efeito de uma
representação ou simulação, feita por programa de computador
(museu virtual; realidade virtual); 4. Fil. Diz-se daquilo que está
predeterminado e que contém as condições essenciais à sua
realização; 5. Suscetível de ser usado, de ser posto em ação ou
funcionamento; 6. Que equivale a outro; que pode exercer as funções
de outro.
Real: 1. Que existe verdadeiramente; 2. Verídico, autêntico, genuíno;
3. O que tem existência real, o que não é fictício ou imaginário; 4. A
vida real; 5. Realidade.
Como se constata nas definições acima (resumidas) os termos real e virtual
não são deveriam ser entendidos como opostos. Um fato ou evento virtual pode ser
78
entendido como real, ainda que em estado de latência ou possibilidade. Em
Cibercultura Levy (2000) propõe ao menos três significados para o termo virtual: o
técnico, relativo à terminologia da informática; o corrente, conforme definido nos
dicionários, e o sentido filosófico, segundo o qual o virtual corresponde a uma
dimensão especial da realidade. Para aplicação na análise dos fenômenos
característicos da cibercultura, Levy assume a última acepção:
... a rigor, em filosofia o virtual não se opõe ao real mas sim ao atual:
virtualidade e atualidade são apenas dois modos diferentes da
realidade. Se a produção da árvore está na essência do grão, então a
virtualidade da árvore é bastante real (sem que seja, ainda, atual). É
virtual toda entidade “desterritorializada”, capaz de gerar diversas
manifestações concretas em diferentes momentos e locais
determinados, sem, contudo, estar ela mesma presa a um lugar ou
tempo em particular. [...] Repetindo, ainda que não possamos fixá-lo
em nenhuma coordenada espaço-temporal, o virtual é real. (LEVY,
2000, p. 47-48)
Outro exemplo: ao navegar na Internet, o acesso a um determinado site – ou
seja, a percepção - pelo internauta - das suas respectivas informações somente se
“atualiza” na tela na medida em que uma matriz informacional é decodificada (“lida” e
traduzida pela máquina na forma de imagens). Por esse ângulo, o mundo virtual pode
ser entendido como um conjunto de códigos digitais que, por sua vez, corresponde a
um “potencial” de representação de imagens e informações, à semelhança daquelas
contidas na semente da árvore, na metáfora de Levy.
Neste trabalho, considera-se o virtual como uma das possíveis expressões do
real, podendo manifestar-se na forma de comunicações, interações, eventos ou
vivências derivadas das ações humanas mediadas pelo computador. Assim, a “vida
virtual” de uma pessoa corresponderá ao conjunto de suas vivências, relacionamentos
e ações experimentadas ou estabelecidas de forma mediada por essa máquina. E a
sua “vida real” corresponderá ao conjunto de suas vivências - virtuais e não virtuais.
Finalmente, serão denominados “presenciais” os aspectos da vida do sujeito que
ocorrem fora dos domínios do ciberespaço (fatos, relacionamentos, etc.) ainda que
possam, por vezes, acontecer em decorrência de experiência ou contato iniciado no
espaço da virtualidade.
79
5.1 O corpo no espaço virtual
Qualquer coisa experimentada fora do corpo, num sonho,
por exemplo, não é experimentada, a menos que a
incorporemos, porque o corpo significa o aqui e agora.
(JUNG, 1930, p. 301)
Há, atualmente, maior compreensão sobre o papel essencial atribuído por Jung
à vivência do corpo para o desenvolvimento da plena expressão do potencial humano:
a individuação. No entanto, há cerca de duas décadas atrás, as menções à
abordagem corporal integrada à Psicologia Analítica ainda causavam surpresa nos
meios junguianos. Felizmente, já contamos com significativos exemplos dessa
integração, graças aos trabalhos desenvolvidos por vários autores, alguns dos quais
mencionaremos ao longo deste capítulo. O ingresso na era da comunicação tornou
ainda mais urgente a elucidação das correlações corpo
 psique, especialmente
quanto às formas com que a corporalidade humana é vivida e experimentada pelas
vias da informatização.
Os recursos da moderna biotecnologia propiciam inúmeras possibilidades de
manipulação do corpo para fins curativos ou visando a sua “reformatação” estética e
rejuvenescimento, e toda a gama de expansões dos limites biológicos da vida
humana. Simultaneamente, na prática clínica nos deparamos com relatos de
inusitadas vivências e relacionamentos humanos estabelecidos no ciberespaço,
campo no qual o ser humano da pós-modernidade experimenta novas formas de
estruturação e expressão da identidade e dos afetos, bem como surpreendentes
manifestações virtuais da corporalidade.
O caso de uma adolescente mostra como essa complexidade se manifesta no
consultório. Angela voltou de férias, e estava ansiosa para contar à terapeuta sobre
seu primeiro beijo. Para surpresa da profissional, Angela explicou que se tratava de
um beijo virtual. Usando o nome de uma atriz famosa ela havia criado um perfil fake,
um tipo de identidade virtual
53
na época muito em moda entre os adolescentes.
Começou então a se corresponder com o fake de um garoto que adotou uma
identidade semelhante para se apresentar no Orkut. Como namorados, marcaram um
encontro virtual em uma praia, também virtual, onde teria acontecido o primeiro beijo
53
As identidades virtuais, incluindo os fakes, serão abordadas com mais detalhes no item 5.3.2
80
entre eles, que foi “realizado” a partir da digitação da palavra “beijo”. Algumas
semanas depois Angela descobriu que o namorado fake a “traía” com garotas da
mesma comunidade. Diante da “infidelidade” eles procuraram encontrar uma solução,
e chegaram a um acordo: ambos criaram novos perfis fake, para manter entre si uma
relação de namoro monogâmico. Seus fakes anteriores continuaram a se
corresponder na WEB, mas agora apenas como “amigos”.
É importante lembrar que Angela se refere ao seu namorado virtual como um
garoto, mas não se sabe quem é, de fato, a pessoa com a qual namorou na WEB. No
campo presencial o fake pode ser qualquer pessoa: um garoto – como ela acredita –
exercitando o contato com as meninas, ou um adulto agindo de má fé, como alertam
organizações empenhadas em prevenir atividades ilícitas ou ilegais via Internet.
Os terapeutas estão preparados para ouvir e compreender relatos semelhantes
ao desta jovem? Estão aptos a acolher os “nativos digitais”, habitantes do ciberespaço,
como clientes, e acompanhá-los no percurso terapêutico rumo à estruturação da
identidade?
O objetivo inicial neste capítulo é caracterizar algumas das principais
repercussões da cultura tecnológica sobre o corpo humano. Em seguida, ilustra-se a
pertinência da aplicação dos princípios da Psicologia Analítica ao estudo da
corporalidade. Partindo das referências da obra de Jung, apresentaremos as
contribuições mais recentes de seus seguidores no desenvolvidas desses estudos. Ao
final, como exemplo das situações surgidas recentemente na prática clínica, há o
relato da síntese do caso originalmente apresentado por Pitliuk (2005) durante o
Simpósio sobre Psicologia e Informática, promovido pelo Conselho Regional de
Psicologia de São Paulo, em abril de 2000.
A observação das mutações do corpo humano na sociedade tecnológica
demonstra que, embora corresponda à sede da vida instintiva e da conexão com a
Terra, o mesmo corpo é também modelado pela cultura na qual está inserido. Couto
verificou a intensa aceleração desse processo, nos tempos atuais:
Concebido muito mais no limite da cultura que da natureza, o corpo
vive da sua ininterrupta mutação. Isso quer dizer que ele vem sendo,
há muito tempo, entregue a uma espécie de destino camaleônico que
é acelerado no culto contemporâneo, no qual a mixagem homem-
máquina aponta novos rumos para a existência humana. (COUTO,
1998, p. 11).
81
Na análise sobre o processo da “virtualização do corpo”, o filósofo Pierre Levy
(2005) descreve as formas pelas quais se experimentam, de modo amplificado as
vivências corporais. Conforme capítulo anterior, ao definir o que entende por virtual
Levy deixa claro que a manifestação de qualquer fenômeno na sua forma virtual não
se opõe à forma real da sua existência, mas ao que ele chama de ”atual”. Ou seja,
para Levy, a virtualidade é apenas mais uma forma de “ser”. Na mesma obra,
apresenta sua concepção do chamado corpo virtual - o “hipercorpo” –, entendido como
espécie de corpo coletivo: resultante híbrido dos acoplamentos dos corpos humanos
individuais, somado às intervenções tecnológicas sobre esses mesmos corpos (LEVY,
2005, p. 30).
Exemplificando alguns dos processos de construção do hipercorpo, Levy
relembra que o que torna o corpo humano visível – convencionalmente – é a
possibilidade de percepção da sua superfície: a rigor, a pele e suas estruturas
diferenciadas. Porém, um variado arsenal tecnológico (endoscopia, ultrassonografia,
ressonância magnética etc.) é capaz de atravessar a pele sensível, tornando visíveis
as estruturas que o autor denomina como “outras membranas”. O organismo humano
é “revirado como uma luva” e “visto” internamente (LEVY, 2005, p. 30).
Cabe considerar ainda as possibilidades de acoplamentos e implantes ao
corpo, próteses ou órgãos e tecidos transplantados, transfusões sanguíneas,
medicamentos obtidos por meio da cultura de tecidos e células embrionárias, entre
outros procedimentos. Se forem acrescentadas as várias possibilidades de
compartilhamento de percepções a distância (telefone, televisão, imagens e cenas
gravadas ou vistas em conjunto em tempo real via internet), as alterações das noções
de distância e velocidade, geradas pelas novas formas de comunicação e
deslocamentos humanos, as possibilidades de “ação a distância”, nas quais, por meio
dos recursos da Realidade Virtual
54
(RV), o homem da atualidade age literalmente a
distância, manipulando equipamentos sofisticados. Muitas cirurgias complexas
acontecem dessa forma, bem como o controle de equipamentos e robôs que
conduzem naves espaciais e operam máquinas industriais.
A concepção de um corpo coletivo deixou de ser apenas uma metáfora
religiosa para se tornar uma construção tecnológica presente na cultura. Nas palavras
54
Realidade Virtual (RV): tecnologia que propicia interface avançada entre o usuário e o sistema computacional. O
objetivo dessa tecnologia é recriar a sensação de realidade durante a navegação nesse sistema. Em suma, trata-se de
realidade ficcional, contudo, experimentada por meiode relações intelectuais, a compreendemos como muito próxima
do universo real que conhecemos. Fonte: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Realidade_virtual> Acesso em 19/05/09.
82
de Levy, “meu corpo pessoal é a atualização temporária de um enorme hipercorpo
híbrido, social e tecnobiológico” (LEVY, 2005, p. 33). Ele propõe alguns cuidados
frente à virtualização do corpo, individual e coletivamente, pois entre outros riscos,
existe a possibilidade da mercantilização dos processos de intervenção tecnológica
sobre o organismo humano (LEVY, 2005, p. 33).
A cultura propicia a formulação de um paradoxo: de um lado, o anseio coletivo
pela superação dos limites do corpo, com a utilização das novas tecnologias como
ferramentas poderosas para sua manipulação e expansão, chegando a manifestar
fantasias de onipotência humana. De outro, a abordagem do corpo na Psicologia ainda
vista, por alguns profissionais, como questão polêmica, com estranheza ou certa
reserva.
Embora razões históricas e metodológicas complexas tenham contribuído para
que o corpo permanecesse à parte das considerações da maioria dos enfoques
psicoterápicos, não é objetivo detalhar tais razões. Optou-se por um olhar prospectivo,
destacando a extrema atualidade do tema, pois parece existir, em nosso meio, maior
prontidão, além de grande urgência da sua consideração.
Essa urgência é expressa, por exemplo, pelas pessoas que procuram os
profissionais da psicologia em busca de atendimento, relatando queixas para as quais
não haverá respostas adequadas se não se considerar o cliente como um ser uno em
sua constituição psicofísica. O sofrimento humano é percebido - em suas múltiplas e
simultâneas expressões psicofísicas - pelas próprias pessoas que buscam
atendimento psicológico.
Ao mesmo tempo, a medicina tradicional começou a se dar conta dos seus
limites frente à tarefa de acolher, compreender e cuidar da dor humana nas suas
expressões anímicas. As chamadas doenças da nossa época (anorexia/bulimia,
transtorno do pânico, doenças auto-imunes, citando as mais presentes na mídia) são
verdadeiros desafios à competência de profissionais sérios e dedicados, justamente
por se manifestarem na forma de sintomas multifacetados, variando entre o físico e o
psíquico. Os avanços das pesquisas médicas apontam, a cada passo, achados que
reforçam a sutileza dos limites que ainda se tenta estabelecer entre a constituição
física e psiquismo do ser humano.
83
A linguagem simbólica do corpo se expressa, sincronicamente, por meio da sua
forma, função e constituição anatômica, e pela “fala” dos sintomas e da dor. Porém,
por maior que seja a empatia frente ao sofrimento implícito na doença – física ou
psíquica -, ao psicoterapeuta cabe manter a especificidade da sua função, mesmo
diante da dor física presente nas queixas do cliente, pois a ele não cabe “curar”.
Refletindo sobre os objetivos da psicoterapia, Jung afirmou ser função do terapeuta
“muito mais desenvolver os germes criativos existentes dentro do paciente do que
propriamente tratá-lo”. (JUNG, 1985, § 82).
Ainda assim, muitas vezes fica-se “tentado” a amenizar o sofrimento de quem
nos procura, por mais que se saiba que essas vivências são parte integrante de um
trajeto maior, necessário ao caminho da redenção da psique. Mas, se não nos cabe ao
psicólogo curar a dor (física ou psíquica), cabe-lhe outra tarefa, não menos essencial
ao cultivo da saúde do cliente - entendendo o termo saúde como equilíbrio dos
opostos: favorecer seu processo de individuação.
Na mesma obra citada acima, Jung afirmou que cerca de um terço de seus
clientes não era propriamente neurótico, mas, estaria sofrendo devido à falta de
conteúdo e sentido em suas vidas. Referiu-se a essa condição coletiva da sua época
como sendo a “neurose contemporânea generalizada”. (JUNG, Ibid. § 83). Que diria
Jung hoje, se vivesse nesta era da informatização? Convidamos o leitor a fazer um
exercício de imaginação reflexiva, juntos buscando a resposta a essa questão.
Ainda que vivesse em tempos talvez menos complexos, Jung se antecipou,
fixando muitas setas indicativas do caminho a ser percorrido pelos pesquisadores, na
busca do mais amplo entendimento do sentido da vida. Porém, apenas mais
recentemente se apreende com maior clareza alguns aspectos especialmente
avançados da contribuição de Jung sobre as interações corpo
 psique. Talvez
porque só agora se tenham reunido (em nossa própria psique) as condições
necessárias à compreensão do real alcance de suas observações sobre tais
processos.
Ao final da vida, Jung se permitia ser bastante enfático ao expressar suas
posições sobre o tema, como exemplifica um pequeno trecho de entrevista por ele
concedida, em 1959, ao jornalista Georges Duplain (in MCGUIRE E HULL, 1982). O
tema da entrevista eram as mudanças e adaptações necessárias à entrada da
humanidade no terceiro milênio. Em certo ponto, o entrevistador solicitou que Jung
84
elencasse recomendações para minimizar as dificuldades que seriam encontradas
nessa passagem. A resposta de Jung foi precisa e enunciada em quatro itens: 1. Maior
abertura em relação ao inconsciente; 2. Maior atenção aos sonhos; 3. Gosto mais
ativo pelo autoconhecimento. E o quarto item foi expresso nos seguintes termos: “Um
sentido mais agudo da totalidade do físico e do psíquico, de sua indissolubilidade”
(JUNG, in MCGUIRE e HULL, 1982, 364).
Afirmações semelhantes não são raras na obra de Jung, farta em alusões ao
corpo e ao reconhecimento das estreitas correlações existentes entre os processos
psicofísicos. Em alguns momentos, porém, Jung foi cauteloso nas afirmações a
respeito da complexidade das interações corpo
 mente. Chegou a atribuir um
caráter “misterioso” a essa relação, como, por exemplo, ao responder um
questionamento da plateia em uma das conferências da série proferida em Tavistock.
Em resposta a uma pergunta da plateia, Jung chegou a afirmar: “Corpo e psique são
os dois aspectos do ser vivo, e isso é tudo o que sabemos. Assim, prefiro afirmar que
os dois elementos agem simultaneamente, de forma milagrosa, e é melhor deixarmos
as coisas assim, pois não podemos imaginá-las juntas”. (JUNG, 1989: § 70)
No entanto, observando o contexto das cinco conferências, supõe-se que sua
intenção naquele momento foi evitar discussão a respeito das conexões psicofísicas
nos termos propostos pela plateia, ou seja, nos termos “dualistas” das relações “causa
e efeito”
55
. Pois, conforme fica claro em seguida, sua concepção a respeito desse
tema já havia avançado além desse ponto: propunha a aplicação do conceito de
sincronicidade para uma compreensão não causal dessa conexão. (JUNG, Ibid. § 70 e
143).
Ainda que historicamente seu trabalho não seja associado ao estudo do tema,
o papel central atribuído por Jung à corporalidade
56
é observado nos termos com os
quais definiu vários dos seus conceitos fundamentais. Por exemplo, ao explicitar sua
concepção de “consciência” como sendo “sobretudo, o produto da percepção e
orientação no mundo externo, que provavelmente se localiza no cérebro, e sua origem
seria ectodérmica”, (JUNG, 1989, § 14); Nessa definição, Jung antecipou em vários
anos o alicerce dos estudos mais tarde desenvolvidos por Montagú (1988), autor que
55
A pergunta que antecedeu a afirmação de Jung foi: “O Prof. Jung crê que o afeto, segundo sua própria definição, é
causado por condições fisiológicas características ou que a alteração fisiológica seria, diremos, o resultado de uma
invasão?” (JUNG, 1989, § 68).
56
Uma observação detalhada sobre a atenção dedicada por Jung ao corpo e às correlações psicofísicas foi publicada
por FARAH no capítulo O corpo em Jung (FARAH, 2008, cap. 10, p. 275-285)
85
pesquisou as relações entre as conexões embrionárias da pele com o sistema nervoso
central e o papel do “toque” nas interações e no desenvolvimento do ser humanas.
Ao definir o ego, Jung comenta também as conexões entre o ego e a
consciência, destacando a autopercepção sensorial – a autoimagem do corpo - como
fator gerador não apenas do próprio ego, mas também do desenvolvimento da
consciência: “E o que seria o ego? É um dado complexo formado primeiramente por
uma percepção geral de nosso corpo e existência e, a seguir, pelos registros de nossa
memória”. (JUNG, Ibid. § 18)
Prosseguindo – o objetivo de Jung era a apresentação das suas ideias a um
público leigo em Psicologia Analítica - discorre sobre o conceito de “complexo”,
resultante das clássicas experimentações com os testes de associações. E novamente
a explanação inclui referências às conexões fisiopsíquicas: “O complexo, por ser
dotado de tensão ou energia própria, tem a tendência de formar, também por conta
própria, uma pequena personalidade. Apresenta uma espécie de corpo e uma
determinada quantidade de fisiologia própria, podendo perturbar o coração, o
estômago, a pele”. (JUNG, Ibid., § 149)
Em outros momentos, dirigindo-se a grupos mais restritos, Jung permitiu-se
formas mais livre de expressão, recorrendo a frases quase poéticas para referir-se ao
contato com o corpo como fator determinante e necessário ao processo de
individuação:
É assim a individuação, só pode ocorrer se primeiro retornamos ao
corpo, à nossa terra, só então ela se torna verdadeira. […] A
individuação só pode ocorrer quando é percebida, quando alguém
está lá e a registra; de outro modo, é a eterna melodia do vento no
deserto... (JUNG, 1997, p. 1313-1314)
Na Psicologia ocidental de modo geral, a consideração mais atenta da vivência
da corporalidade - e suas estreitas conexões com as dinâmicas psíquicas - ainda
aguarda pelas atenções que merece receber por parte dos psicoterapeutas e dos
pesquisadores da área
57
. Mas, no âmbito da Psicologia Analítica, há vários empenhos
relevantes nessa direção, embora relativamente pouco numerosos. Mas são
contribuições originais e criativas de aplicação das ideias junguianas à compreensão
da estrutura psicofísica do ser humano, bem como suas respectivas aplicações
57
Exceção feita aos trabalhos de Reich e seus seguidores, além de algumas propostas de intervenção corporal tidas
ainda hoje como formas de trabalhos terapêuticos “alternativos” e, portanto, pouco reconhecidos pela Psicologia
Acadêmica.
86
terapêuticas. No âmbito internacional, há nomes representativos, a começar por
McNeely, analista junguiana radicada nos EUA, criadora da “somatoterapia” – uma
modalidade de terapia que considera o simbolismo dos processos corporais como
parte integrante da psicoterapia (MCNEELY, 1987).
Inspirado em Jung, A. Mindell contribuiu com várias publicações nas quais
desenvolve o conceito do “corpo onírico” e investiga o “papel do corpo no revelar do si-
mesmo” (MINDELL, 1989, 1990, 1991, 1991b, 1993). M. Woodman (1980),
inicialmente reconhecida pelos estudos sobre as complexas condições psicofísicas
presentes nos casos de transtornos alimentares (obesidade / anorexia / bulimia), é
autora de outros estudos sobre a corporalidade, relativos à repressão da feminilidade
em nossa cultura e suas correlações com a individuação. Outra contribuição é
apresentada por J. Chodorow (1991): a proposta de um método de trabalho
terapêutico que integra o movimento à Imaginação Ativa, de Jung. A. Greene (2001)
propõe um método de trabalho psicoterápico que integra a leitura da linguagem
simbólica do corpo e o toque como instrumento terapêutico às intervenções verbais.
Cabe ainda uma referência ao livro de Conger (CONGER, 1993) – Jung e
Reich: o corpo como sombra – no qual estabelece paralelos entre as ideias dos dois
pioneiros, além de apresentar possibilidades de aproximação entre as propostas
terapêuticas contidas no pensamento de Jung e Reich. No Brasil - antecedendo a
proposta conceitual de Conger -, J. A. Gaiarsa desenvolveu, ao longo de extensa
experiência clínica, a metodologia de abordagem corporal que integra as ideias e
práticas terapêuticas de Jung e Reich. Na introdução de um de seus seu livros mais
significativos - Respiração e Angústia –, Gaiarsa dedica seu trabalho aos seus “dois
mestres”, declarando: “A meu modo, sou eles. Este livro é nosso.” (GAIARSA, 1971, p.
14)
Extenso trabalho relativo às interações corpo
 psique sob o enfoque da
Psicologia Analítica foi desenvolvido no Brasil por P. Sándor, médico e psicoterapeuta
húngaro radicado em São Paulo de 1949 a 1992. O nome de Sándor tornou-se
especialmente associado à Calatonia – trabalho corporal realizado por meio de toques
sutis (SÁNDOR, 1982). No entanto seu trabalho foi muito além da criação de uma
técnica de trabalho corporal, pois a Calatonia consiste em um método de intervenção
psicoterápica que integra o trabalho corporal aos princípios da Psicologia Analítica,
87
propiciando ao indivíduo que passa por esse processo a gradual reorganização da sua
estrutura psicofísica
58
.
Ainda entre os brasileiros, outro exemplo representativo dos estudos
junguianos sobre a corporalidade é o trabalho de D. Ramos na área da pesquisa em
psicossomática. Com base em sua experiência clínica Ramos desenvolve a análise da
doença “como expressão simbólica”, e propõe a aplicação do modelo analítico ao
entendimento das doenças orgânicas, por exemplo, em duas de suas principais
publicações, respectivamente, Psique do coração (RAMOS, 1990) e Psique do corpo
(RAMOS, 2006).
De modo geral, o processo de ampliação da consciência - e por decorrência o
próprio desenvolvimento humano - é entendido pelos junguianos aqui citados como
estreitamente integrado ao desenvolvimento da consciência corporal. Nessas
publicações enfatiza-se especialmente o dinamismo da “imagem corporal”, bem como
suas eventuais disfunções, distorções ou vivências peculiares, envolvidos que estão –
esses aspectos - nas formas pelas quais a corporalidade é vivida e experimentada
pelo ser humano.
A exposição detalhadas sobre a origem, formação e desenvolvimento da
imagem corporal extrapolaria o objetivo e o espaço deste capítulo
59
. Será relembrada
apenas sua definição original, segundo Schilder: “Entende-se por imagem do corpo
humano a figuração de nosso corpo, formada em nossa mente, ou seja, o modo pelo
qual o corpo se apresenta para nós”. (SCHILDER, 1981, p. 11)
De forma sintética, cabe relembrar que o processo sensorial / perceptivo pelo
qual o indivíduo cria a imagem de si próprio – nos termos de seu corpo – corresponde
a uma “apercepção”
60
, ou seja: essa imagem coincide apenas relativamente com a
estrutura corporal objetiva do seu portador, uma vez que essa apercepção é permeada
por inúmeros fatores subjetivos de ordem afetiva e valorativa. E ainda, quanto maior a
distância entre a “imagem corporal” assim internalizada e a “realidade” objetiva do
corpo do indivíduo, maior será a chance desse indivíduo apresentar dificuldades
58
Relatos detalhados sobre os trabalhos desenvolvidos por P. Sándor foram publicado por FARAH (1995 / 2008) e
DELMANTO (1997). Outra fonte de informações sobre a Calatonia pode ser acessada no site: <www.calatonia.net>
59
Uma exposição detalhada sobre a origem, desenvolvimento e relevância da imagem corporal, bem como seu papel
no desenvolvimento da consciência dentro da visão junguiana foi publicada por Farah. (Ibid. cap. 3: Imagem Corporal:
um conceito básico para fundamentar o trabalho corporal)
60
“A apercepção é um processo psíquico em virtude do qual um novo conteúdo é articulado de maneira tal a conteúdos
semelhantes previamente existentes, que pode ser considerado como compreendido, inteligido ou claro” (JUNG, 1974,
p. 483).
88
quanto ao desenvolvimento e ampliação da sua consciência. Lowen, em O corpo
traído, expressou de forma muito clara essa condição ao afirmar que para saber quem
ele é, o indivíduo precisa ter consciência de seus sentimentos, de suas próprias
sensações, expressões faciais, de sua postura – estática e dinâmica. Do contrário,
torna-se um ser dividido: “um espírito desencarnado e um corpo sem alma”. (LOWEN,
1979, p. 21.)
As peculiares vivências do corpo na pós-modernidade despertam atenções de
autores de áreas paralelas à Psicologia, empenhados em observar e descrever os
efeitos dos usos das novas tecnologias. A antropóloga Sibilia (2002) propõe o conceito
do Homem Pós-Orgânico, correspondente a um homem cujo corpo biológico está se
tornando obsoleto, submetido ao controle da sua natureza, controle esse propiciado
pelos avanços da biotecnologia. Para orientar sua análise Sibilia traça um paralelo
entre a perspectiva “prometeica
61
”, que teria prevalecido até recentemente na tradição
da ciência ocidental, e a proposta “fáustica
62
”, para a qual se estaria migrando
atualmente:
Em oposição à tradição “prometéica”, que pensa a tecnologia como a
possibilidade de estender e potencializar gradativamente as
capacidades do corpo (sem aspirar ao infinito, guardando certo
respeito pelo que é humanamente possível e pelo que ainda pertence
ao território divino), a corrente “fáustica” enxerga na tecnologia a
possibilidade de transcender a condição humana. (SIBILIA, 2002, p.
13)
A análise do filósofo espanhol Francisco Ortega (2008) destaca as implicações
das tecnologias médicas sobre o corpo humano e descreve seus impactos como
geradores de uma nova forma de “ascese” do corpo, própria da cultura
contemporânea. Fala sobre um corpo “incerto” como um corpo “submetido à
submissão ao (próprio) corpo”. Submissão que se expressa, por exemplo, na ênfase
do “culto ao corpo”. Ortega entende essa atitude contemporânea como reação coletiva
à longa tradição ocidental de desprezo pelo corpo, gerador da dicotomia mente /
matéria (ORTEGA, 2008, p. 42).
Kehl é a única representante da psicanálise entre os especialistas que
colaboraram para uma coletânea organizada por Novaes sobre o tema da
manipulação do corpo pela ciência (NOVAES, 2003). Destacam-se, em suas ideias, as
61
Prometeico – Referente a Prometeu, o personagem mitológico que ousou roubar o fogo dos deuses (símbolo do
conhecimento) para entregá-lo aos homens.
62
Fáustico - Referente a Fausto, o personagem da tradição alemã que teria feito um pacto com o demônio em troca da
juventude eterna.
89
implicações corporais da vivência subjetiva do tempo, cada vez mais acelerada, em
consonância com os ritmos impostos ao ser humano na transição da era industrial
para a era da informação: “Nossos corpos, que há cem anos pulsavam como motores
mecânicos, hoje estão mais rápidos ainda: vibram no ritmo das ondas
eletromagnéticas, decompõem suas funções em bits de informação, antecipam-se ao
futuro, ultrapassam o comando do Eu” (KEHL, 2003, p. 244)
Nas publicações desses autores, verifica-se o reconhecimento da relevância da
imagem corporal, ainda que o termo não seja literalmente empregado. Relevância que
se percebe na ênfase com que os autores ressaltam os efeitos das novas tecnologias
sobre a imagem que os indivíduos formam de si próprios, em termos individuais e nas
expressões culturais coletivas. Entre essas expressões, destacam-se a seguir as
vivências corporais experimentadas pelos navegantes do ciberespaço.
A cultura tecnológica acrescenta complexidades à nada simples vivência
corporal humana, bem como à nossa tarefa – como pesquisadores - de buscar
compreendê-la. Como exemplos dessas recém surgidas vivências virtuais, citam-se as
experimentações do chamado “sexo virtual” ou “cibersexo” - tanto por parceiros que
mantêm simultaneamente aos encontros virtuais uma relação presencial, quanto
outros, que se “encontram” e se relacionam apenas no ciberespaço. Ou, ainda, a
criação das “identidades virtuais”: personagens assumidos pelos internautas cuja
aparência, idade, e mesmo o gênero, correspondem ou não às características “reais”
(presenciais) do seu criador.
A complexidade das vivências corporais expressas no ciberespaço se torna
mais evidente quando nos deparamos com casos clínicos. Como exemplo, será
relatada a síntese de um caso no qual se destacam os aspectos referentes à
reestruturação da imagem corporal experimentada pela paciente a partir da suas
vivências na virtualidade.
A psicoterapeuta Pitliuk (2005) relata o caso de uma paciente que parece ter
utilizado o computador, conectado à Internet, como instrumento de reestruturação de
seus relacionamentos externos e internos. As relações estabelecidas por meio da
Internet à paciente a possibilidade de resignificar vários aspectos de sua psique, até
então mal percebidos por ela mesma, inclusive a imagem que tinha de si própria e de
seu corpo.
90
Trata-se de uma mulher inteligente e articulada que a terapeuta chamou de
Silvia. Sua história analítica ultrapassava dez anos de duração e as principais queixas
eram experiências e vivências agressivas nos relacionamentos, com o
estabelecimento de vínculos muito intensos, seguidos de rompimento abruptos que
ocasionavam importantes crises depressivas e sentimentos de angústia. Silvia
descrevia-se como uma “montanha de lixo”, em todos os aspectos. O casamento
estava em ruínas, odiava seu mundo profissional, seu cotidiano, seu corpo e as
pessoas de modo geral. Em dois anos Silvia se divorciou e começou a frequentar
salas de bate papo na Internet, e criou uma relação de dependência com o mundo
virtual. Sua vida presencial - trabalho, casa, dinheiro e família - passou a ter menos
importância, e as duas únicas coisas que lhe importavam eram sua análise e a
Internet.
Ela estabeleceu um vínculo muito intenso com um homem que conheceu em
uma sala de chat, mas a relação aconteceu somente no ambiente virtual, pois Silvia se
recusou a ter com ele qualquer tipo de contato que não fosse via computador. O
homem, embora resistisse de início, aceitou a limitação. Estabelecidas as condições
da relação, Silvia passou a experimentar o que chamou de “liberdade incrível de não
ter que fingir”. Naquele momento, o computador funcionou como mediador da relação,
como “ponte” de contato entre seus mundos, externo e interno, o que lhe possibilitou
uma reestruturação pessoal.
Com a persistência e a evolução do relacionamento virtual, Silvia permitiu ao
interlocutor ver fotos suas na tela, ainda que as fotos mostrassem apenas
“fragmentos” de seu corpo - pés, cabelos, barriga, nuca -, mas nunca a sua imagem
integral. Por causa da receptividade de seu parceiro virtual, passou a usufruir de
sentimentos positivos em relação ao próprio corpo, ao mesmo tempo em que seduzia,
e se expunha à sedução de seu par. Todavia, mantinha a recusa em relacionar-se
presencialmente, com medo de “fracassar” na relação que assumira grande
importância afetiva em sua vida. A vivência permitiu a Silvia mudanças bastante
significativas. A imagem corporal passou por uma reorganização, por meio da
integração de valorações positivas a respeito de si mesma. Começou a se encontrar
com outros amigos da Internet, com quem estabeleceu contatos presenciais. Enfim,
mudou os padrões de comportamento. Ela resume sua descoberta: “Besteira isso de
eu ser maravilhosa ou ser lixo, por dentro ou por fora, tudo isso é imagem. Não sou
nenhum adjetivo. Preciso descobrir o que eu sou capaz de viver e fazer – esse é o
único real.” (PITLIUK, 2005, p. 68)
91
Para Pitliuk (Ibid. p. 63), a mediação do relacionamento pelo computador
permitiu parcializações, e a “regulagem da distância”, por vezes impossíveis nas
relações presenciais. Comentando as reavaliações feitas por Silvia a respeito de si
mesma a partir da reestruturação da imagem corporal, Pitliuk propõe:
Desconstrução do imaginário... Mas, feita com imagens – fotográficas
e verbais! Construção de um corpo que, ao mesmo tempo, já estava
ali. São paradoxos. Não é surpreendente pensar que através do
computador e de fotografias, essa moça caminhava para “mais
realidade” do que conseguia em suas relações face a face? (PITLIUK,
Ibid. p. 69)
Sem dúvida, a vivência corporal ocupou praticamente o centro da experiência
vivida por Silvia na virtualidade. Em sua maioria, não é dessa forma que as
experimentações acontecem no ciberespaço. No entanto, os relatos dos internautas
costumam conter várias alusões aos aspectos corporais da identidade que assumem
ao estabelecer relacionamentos via Internet: ora atribuindo um valor relativamente
menor à aparência física para o estabelecimento desses vínculos, ora enaltecendo a
possibilidade de criar personagens com aparência modelada ao seu gosto e vontade,
experimentando-se, por exemplo, como alguém do sexo oposto, com outra idade (que
não a sua verdadeira) ou ainda com uma aparência apenas idealizada, supostamente
mais atraente do que aquela que considera ter, na vida presencial.
Em seu conjunto, os comportamentos dos internautas constituem, sem dúvida,
um painel projetivo das suas fantasias e/ou possíveis conflitos. De momento, porém,
importa destacar o caráter simbólico que reveste as vivências corporais
experimentadas pelos internautas. No ciberespaço o internauta manifesta sua
subjetividade por meio de um corpo virtualmente onírico, idealizado ou modelado
segundo parâmetros ditados pelas fantasias às quais seu inconsciente recorre para se
expressar no ciberespaço. Em suma: um corpo simbólico.
As pesquisas junguianas a respeito da psicossomática têm confirmado a
concepção segundo a qual o simbolismo do corpo se manifesta sincronicamente, tanto
por meio da sua forma e funções naturais, quanto pela expressão dos seus sintomas
e/ou da dor. Ramos (2006) avançou na reflexão sobre essa questão, ao propor a
aplicação da teoria de Rossi sobre a “transdução” (RAMOS, 2006, p. 69-72) na
compreensão dos processos de elaboração e ressignificação observados durante o
atendimento psicoterápico de pacientes portadores de patologias orgânicas.
92
Segundo Ramos, Rossi define consciência como “um processo de transdução
autorrefletida da informação” (ROSSI apud RAMOS, Ibid. p. 69), do qual resultam as
manifestações simbólicas, incluindo aquelas que ocorrem na forma de somatizações.
Sintetizando suas considerações sobre a compreensão da doença como expressão
simbólica em perspectiva finalista, a autora afirma:
Um complexo tem sempre uma expressão simbólica corpórea, por
intermédio da qual podemos ter a chave para a compreensão da
doença. Nesse caso, o símbolo aponta uma disfunção, um desvio que
precisa ser corrigido quando a relação entre o ego e o Self se altera.
(RAMOS, Ibid. p. 68):
O trabalho de Ramos representa significativo avanço para a compreensão da
psicodinâmica das patologias orgânicas, bem como sua elaboração psicoterápica
segundo a abordagem junguiana.
As vivências e expressões do corpo na virtualidade nem sempre expressam
estados patológicos ou disfunções orgânicas, conforme ilustra o caso relatado. Ainda
assim, podem ser consideradas em seu caráter simbólico, sendo provável que um
processo análogo ao descrito por Ramos ocorra nas vivências corporais observadas
no espaço da virtualidade. A observação atenta do corpo simbólico manifesto pelos
internautas poder ser fonte de dados relevantes sobre a estruturação da identidade e
da subjetividade humana, em seus termos atuais.
Segundo Ramos, Jung propôs vários métodos de amplificação da vivência
simbólica por meio dos quais pode ocorrer a mencionada transdução: Imaginação
Ativa e uso das técnicas expressivas como pintura, modelagem (RAMOS, 2006, p. 71).
Analogamente, é possível que o ciberespaço configure um novo campo, propício a
esse tipo de processo, pois permite ao internauta a manifestação simbólica de
conteúdos inconscientes, favorecendo o acesso desses conteúdos à sua consciência,
bem como sua possível elaboração e integração. Assim, o espaço da virtualidade
apresenta-se ao observador atento como mais um campo potencial de expressão do
simbolismo do corpo: quando simplesmente idealizado, pode expressar fantasias e
desejos, ou mesmo revelar potenciais criativos ainda não manifestos na vida
presencial do indivíduo; quando “sintomático”, pode revelar conflitos ou mesmo
patologias psíquicas. De toda forma, são “reais” do ponto de vista da dinâmica
psíquica dos seus protagonistas. E, analogamente às vivências corporais presenciais,
são também elementos potencialmente participantes da estruturação da identidade.
Utilizando o modelo de análise oferecido por Ramos, cabe lembrar que essas
93
manifestações tanto podem permanecer como “sintomas“, quanto servir como via de
ampliação da consciência, se elaboradas e integradas pelo seu protagonista.
Estamos cientes do caráter preliminar das ideias e proposições apresentadas
neste capítulo, pois o fenômeno “corpo virtual” é um fato ainda mais recente do que o
surgimento do ciberespaço. E este, por sua vez, é um terreno ainda muito pouco
explorado pela Psicologia, um território no qual a maior parte dos psicólogos ainda se
sente um “estrangeiro” visitando novas paragens, pouco conhecendo seus habitantes,
seu “idioma” e códigos, perdendo-se, às vezes, nos trajetos das “infovias” pelas quais
já navegam habilmente os internautas. Mas o hipercorpo – o corpo permeado pelas
novas tecnologias - é mais um tema a ser pesquisado e desvendado pelo psicólogo,
sob pena de não acompanhar os próximos passos evolutivos do ser humano habitante
do futuro. Futuro que, dia a dia, se faz presente.
94
5.2 Sonhos informatizados: a presença da tecnologia no imaginário
Os motivos básicos dos mitos são os mesmos e têm sido sempre os mesmos.
A chave para encontrar a sua própria mitologia é saber a que sociedade você se filia.
(CAMPBELL, 1990, p. 23)
Este capítulo tem como objetivo apresentar ilustrações sobre a presença de
equipamentos derivados das novas tecnologias de comunicação nos sonhos da
atualidade: os computadores propriamente ditos, seus componentes e modos de
operação - monitor e sua tela, mouse e seus comandos –, além de outros aparelhos
informatizados como telefones celulares, walkmans, radares eletrônicos etc.
Certamente caberá às novas gerações de terapeutas a tarefa de desvendar os
significados das analogias presentes no imaginário do homem do século 21. No
entanto, ainda que haja ajuda dos próprios clientes - em geral mais versados no
manejo desses equipamentos - alguma familiaridade com os aparatos tecnológicos já
está sendo exigida dos psicólogos, conforme demonstrarão os relatos selecionados,
nos quais as imagens estão presentes.
Segundo Jung, os sonhos – em sua função compensatória - nos alertam sobre
a necessidade corrigirmos os possíveis desvios do trajeto que nos cabe trilhar rumo a
um desenvolvimento natural (JUNG, 1989, § 247). Von Franz, porta voz do
pensamento junguiano, esclarece essa função dos sonhos (VON FRANZ, 1988, p. 25):
Os sonhos não nos protegem das vicissitudes, doenças e eventos
dolorosos da existência. Mas eles nos fornecem uma linha mestra de
como lidar com esses aspectos, como encontrar um sentido em
nossa vida, como cumprir nosso próprio destino, como seguir nossa
própria estrela, por assim dizer, a fim de realizar o potencial de vida
que há em nós.
A comunicação consciente
 inconsciente acontece pela linguagem dos
símbolos, pois o inconsciente não se expressa nos sonhos por meio da linguagem
racional: “Pelo contrário, um sonho revela o inconsciente sob a forma de imagem,
metáfora e símbolo, numa linguagem intimamente associada à arte” (VON FRANZ,
1988, p. 36). Assim, para que possamos compreender as mensagens do inconsciente,
faz-se necessário decifrar o significado das imagens dos sonhos por meio da
observação das analogias presentes em suas representações.
95
Gradativamente, os sonhos incorporaram as imagens dos artefatos criados
pelo homem durante o século 20. Ao longo desse período, inúmeros inventos
relativamente recentes na história humana se tornaram familiares, aos sonhadores e
aos seus intérpretes: automóveis, aeronaves, telefones, naves espaciais, entre tantos
outros. A compreensão das funções objetivas desses artefatos, bem como respectivos
significados simbólicos potenciais – em termos pessoais e coletivos – não representa
desafio. No entanto, em pouco mais de uma década (a partir de 1995, no caso do
Brasil), o imaginário humano passou a incorporar as representações referentes ao
universo da informática e da virtualidade, provavelmente em ritmo mais acelerado do
que aquele alcançado pela nossa capacidade de identificar, assimilar e compreender
seus respectivos usos e funções.
Passa a ser fundamental adquirir um repertório de conhecimentos a respeito
desse universo, ao menos em grau suficiente para acompanhar nossos clientes na
tarefa de decifrar as analogias e respectivas mensagens expressas nos seus sonhos.
Sem dúvida, as associações do próprio sonhador são pistas régias para esse
entendimento. Mas, ainda assim, é imprescindível conhecer suas funções, utilidades e
mesmo o funcionamento básico dos artefatos utilizados pelo inconsciente para compor
essas imagens. Dizendo de outro modo, talvez deva ocorrer em breve uma espécie de
“inclusão digital” dos psicólogos, ao menos sobre o significado dos termos presentes
nas imagens dos sonhos da era da informação digital.
A atividade onírica não é o único campo de expressão dessas analogias,
presentes também nas artes, nas atividades lúdicas e de lazer, nas comunicações e
na própria psicoterapia – quando esta se utiliza de outros recursos expressivos além
do verbal – também são observadas. No entanto, o universo dos sonhos talvez seja a
área de expressão do imaginário na qual essas manifestações se mostram mais
fartamente acessíveis à observação.
Antes dos relatos propriamente ditos, seguem esclarecimentos sobre a coleta
do material que serviu de base para a elaboração deste capítulo
63
. A motivação inicial
surgiu durante a participação da autora em um newsgroup - um grupo de discussões
via Internet, dedicado às trocas e comunicações sobre temas da Psicologia. Como é
costume nessa forma de comunicação virtual, variam os assuntos das conversas
grupais e, em certo momento, o centro das discussões foi justamente o surgimento
63
Agradecimentos: aos sonhadores, que generosamente forneceram os relatos; aos componentes do “GrupoSándor”
o newsgroups composto por ex-alunos dos cursos iniciados por P. Sándor no Sedes Sapientiae de São Paulo - e aos
demais colegas terapeutas, pelo envio dos relatos.
96
dos aparatos tecnológicos nos sonhos. A partir das discussões
64
, o assunto pareceu
oportuno como tema de um seminário a ser apresentado em uma das disciplinas
65
do
Curso de Pós-Graduação em Psicologia Clínica da PUC-SP.
Para iniciar o levantamento do material necessário a essa ilustração foi enviada
uma mensagem, ao mesmo grupo de colegas psicólogos (via e-mail) informando sobre
o propósito. Além de convidar os demais componentes a nos enviar – também via e-
mail – relatos dos próprios sonhos e/ou de pessoas que o autorizassem, que
correspondessem a essa característica: conter imagens relacionadas a computadores
ou seus derivados.
As respostas rapidamente começaram a chegar, com relatos remetidos pelos
participantes do grupo. A partir daí, tomando conhecimento do interesse pelo tema,
outros psicólogos, além de amigos e colegas do curso citado, também enviaram
relatos semelhantes. Em boa parte dos casos, o remetente informava que os relatos
enviados haviam sido feito por amigos, familiares ou mesmo clientes, que os
autorizaram a fazer tal comunicação. Consideramos relevante explicitar esses
detalhes, pois envolvem uma das características marcantes dos newsgroup presentes
na WEB: de modo geral, seus participantes se comportam de forma bastante
colaborativa, sempre que o tema em pauta atenda a algum objetivo de interesse
comum.
Como a intenção deste capítulo é apenas ilustrar a presença dos artefatos
informatizados no imaginário, o trabalho não se deterá na interpretação dos sonhos e
demais vivências registradas. Os relatos serão sinteticamente apresentados,
constituindo-se basicamente da seleção dos trechos dos sonhos em que aparecem as
referências aos artefatos objeto do estudo. Cada sonho será situado brevemente por
meio do destaque das palavras-chave correspondentes aos recursos tecnológicos
presentes no seu contexto, acrescido de um breve perfil do sonhador.
O agrupamento dos sonhos seguirá a ordenação que parece ser a mais
elucidativa: no primeiro bloco serão apresentados os sonhos que contêm referências
diretas aos computadores, seus componentes e comandos. No segundo bloco estão
os sonhos com referências aos demais equipamentos eletrônicos. Finalmente, além
64
Com base nessas discussões grupais foi elaborado estudo preliminar publicado como capítulo do livro Psicologia e
Informática: o ser humano diante das novas tecnologias (FARAH, 2004 [c]).
65
O seminário sobre Sonhos informatizados foi apresentado em aula da disciplina Os sonhos e a imaginação na clínica
junguiana, ministrada pelo prof. dr. Durval Luiz de Faria, no segundo semestre de 2007.
97
dos sonhos, há dois relatos de vivências análogas: uma cena criada em sessão de
Sand Pay, e uma imagem hipnagógica espontaneamente experimentada pelo
remetente.
Sonhos com computadores e seus componentes
Sonhadora: Mulher, 35 anos, pós-graduanda em Psicologia.
No. 1 - Computador, teclado:
Achei muito interessante sua pesquisa, e vou relatar a você um sonho que tenho tido
com frequência, nesta época estressante de escrever minha dissertação. Estou tendo
muita dificuldade de escrever, isso está ligado a vários fatores que venho trabalhando
em minha análise.
Bom, vamos ao relato: meu sonho começa com a imagem de um teclado branco, em
seguida minhas mãos logo aparecem teclando rapidamente a minha dissertação como
se em alguns minutos eu conseguisse escrever tudo o que não consegui até o
momento... É meio louco mas é isso. O mais interessante é que o teclado do meu
computador é preto (rsrsrsrs). Segundo minha analista, o branco pode estar
relacionado à clareza das ideias... Mas sei que minha dificuldade tem a ver com
questões muito profundas que neste sonho está simbolizada na cor do teclado. Espero
que eu tenha ajudado.
Sonhadora: Mulher, 29 anos, psicóloga.
No. 2 – Antivírus:
Se este sonho ajudar, aí vai: pela 1ª vez sonhei, esta noite, q havia um vírus no meu
pc. A tela em preto, computador desligado, alertava para um vírus: luz branca com
brilho, escrita AVAST. Ao acordar lembrei que AVAST é um anti-vírus...
Sonhadora: Mulher, 32 anos, psicóloga.
No. 3 – Página de “perfil” do Orkut:
Sonhei que entrava na página do Orkut da atual namorada do meu ex-marido. Entrava
no álbum dela e descobria que ela era uma mulher muito pobre e de muito baixo nível.
Uma mulher sem educação. Podia ver a casa onde ela morava no fundo das
fotografias. Me sentia inconformada por saber que ele escolhia ela e não eu.
Sonhador: Homem, 42 anos, publicitário (série dos próximos sete sonhos).
No. 4 - Computador, seus componentes e comandos:
Trabalho numa sala de paredes texturizadas de azul celeste e branco, iluminada
apenas pela tela de um computador desktop. A CPU, o monitor e o teclado são
silhuetas, e mal é possível percebê-los. Sem olhar para o monitor digito uma palavra
(que não sei qual é) e teclo o comando de busca. Viro para o monitor e percebo que
digitei errado, escrevi alguma coisa como “D/eos”: como se tivesse enroscado os
dedos, mas não era essa a palavra. Re-digito, e o computador congela. Pressiono o
98
comando de restart
66
, mas a máquina não responde. Tiro o computador da tomada e a
CPU desliga, mas o monitor continua ligado.
No. 5 - Comandos do computador:
Dou um comando de busca no meu computador, mas erro por algum motivo, e o
computador começa a abrir todos os arquivos na tela, onde as pastas são muito
pequenas visualmente. Tenho que fechar essas pastas imediatamente, uma vez que o
computador não suporta todas elas abertas. Consigo fechar todas as pastas e, ao
acordar, me vem à mente a imagem de D. uma menina de 11 anos.
No. 6 - Comando do computador é estendido a uma situação convencional:
Estou numa aula de astronomia no ginásio. O professor pede que eu explique alguma
coisa a respeito da matéria. Encho o quadro até o ponto que não consigo discernir o
que está escrito. Dou um comando de zoom na lousa, como se faz no computador.
Então a informação é distorcida e não consigo recuperá-la. Começa uma prova a
respeito da matéria e vejo meus colegas resolvendo as equações que não conheço.
Falta meia hora para acabar e penso em colar.
No. 7 - Internet, criação de uma rede:
Numa empresa, M. S. (um publicitário de renome) recebe a tarefa de construir uma
rede de conexões, uma espécie de Internet. Ele aceita a tarefa sem questionar, e se sai
bem. Será que ele foi remunerado? Vejo um Fusca, preparado para rally, passar sem
problema por cima de um monte de terra na calçada.
No. 8 - Computador, e skate motorizado:
Estava em uma casa com escadarias e saí apressadamente para ir a uma festa. Mas
esqueci o local e voltei andando num skate motorizado. Tentei abrir meu
microcomputador moderno, mas esqueci a frase que era a senha.
No. 9 - Laptop e seus componentes:
Estou trabalhando no meu laptop, quando percebo que o harddisk está diferente. De
repente a tela escurece e ele desliga. Perco a conexão com a Internet.
No. 10 – Falha no sistema operacional do equipamento:
Estou trabalhando no Powerbook quando ele dá um pau de sistema. Os nomes das
pastas se tornam desconexos e os ícones regrediram do sistema operacional 8.6, o
atual sistema, ao sistema 6.0, o primeiro sistema. O nome do Hd modificou para
alguma coisa como Ro_hdl
.
Sonhadora: Mulher, 38 anos, empresária.
No. 11 - Mensagem de e-mail presente na tela do computador:
Vejo a tela do computador do M. (companheiro da sonhadora). A página do e-mail está
aberta e nela consta uma mensagem vinda de uma mulher de nome R., mais seu
sobrenome abreviado. No assunto vejo: “Sobre nosso encontro” ou algo semelhante,
que diz respeito a algum assunto entre eles. No próprio sonho me dou conta que isto
explica o comportamento distante que ele tem apresentado nos últimos tempos: Ele
66
Restart: comando de “reinicialização” do computador, que consiste em encerrar e, em seguida, reiniciar seu
funcionamento.
99
está se relacionando com outra mulher. Sinto-me invadindo o espaço dele só de olhar a
tela do computador e, ao mesmo tempo, tentada a abrir a mensagem e ler o conteúdo.
Mas acabo não fazendo. Em seguida, vejo um parafuso e uma porca que se
desenroscam e caem no chão, seu tilintar no solo me faz acordar assustada e com o
coração disparado.
Sonhadora: Mulher, 27 anos, estudante.
No. 12 – Mensagem de e-mail presente na tela do computador:
Eu estava vendo e-mails no meu computador, em casa. Aí me deparei com um e-mail
que tinha certeza que era um vírus, enviado pelo meu ex-namorado. Mas não me
contive, quis desafiar e abri a mensagem. Eu imaginava que era vírus, mas não
consegui me segurar, me deixei seduzir e abri o e-mail. Então, imediatamente ao abrir,
a tela ficou toda preta e uma mensagem apareceu no meio da tela, com algo dizendo
que eu havia me "ferrado". E ao mesmo tempo parecia que tinha pessoas ao redor
debochando de mim, rindo, dizendo como eu podia abrir o e-mail, sabendo que era
vírus.
Sonhadora: Mulher, 35 anos, psicóloga.
No. 13 – Mensagem de e-mail presente na tela do computador:
Sonho que ao abrir minha caixa de e-mail há um, de uma professora e analista, a quem
conheço apenas formalmente. Ao abri-lo, vejo uma mensagem super-bonitinha, bem
colorida e com alguns desenhos com motivos de céu, estrelinhas e nuvenzinhas. Está
escrito ‘minimize’ (com letras redondinhas). Penso, então, no momento de sofrimento
intenso que estou passando na minha vida.
Sonhadora: Mulher, 21 anos, estudante.
No. 14 - Notebook parece ter vida própria:
Estava no meu quarto mexendo no notebook. Minha psicóloga estava no sofá-cama
deitada. Minha mãe entrou no quarto e fui apresentá-las. Quando minha mãe saiu do
quarto voltei para o computador. O notebook dava algum problema: vi várias peças
quebradas e fora do lugar. Ele tinha aberto e começava a tocar uma música que eu
tentei fazer parar de todas as formas e não consegui. Desliguei o computador, tirei a
bateria, mas a música continuava tocando. Sai do quarto com a peça do notebook onde
fica o cd, e nada de parar. Minha psicóloga acordou, foi ao banheiro e depois limpou o
chão da cozinha que estava molhado.
No. 15 – Notebook parece ter vida própria:
Estava no meu quarto mexendo no meu notebook q está com vírus em cima da minha
cama. Não esperava q ele fosse ligar e quando ligou vi vários arquivos que não eram
meus na área de trabalho. Meu tio chegou para arrumar e quando ele saiu as peças do
notebook estavam todas espalhadas em cima da cama.
Sonhador: Menino, 11 anos, estudante.
No. 16 - Noteboock parece ter vida própria:
Eu tive um sonho que eu ganhei um notebook e ele falava. Tinha tudo dentro. Tinha
câmera, tinha MP3, tudo. Aí o Lap Top materializou umas pernas e começou a fazer o
mal. Daí virou um monstro e contra a minha vontade, tive que destruir ele.
100
Sonhador: Homem, 39 anos, militar.
No. 17 – Mouse aparece no sonho com outra função:
Nunca sonhei, mas meu marido sonha de vez em quando, pois ele trabalha com
informática. Uma vez ele sonhou que deslizava sobre um mouse, ele até disse que era
uma espécie de "mouseboard", como se estivesse fazendo um esporte radical sobre o
mouse... Foi como ele me contou! Detalhe: É ele quem faz a manutenção dos
computadores no quartel onde trabalha!
Sonhadora: Mulher, 26 anos, nutricionista.
No. 18 – Tela do monitor:
Sonha que está presa dentro da tela do computador; Ela só se recorda disto. (Nota: a
terapeuta que enviou este relato informa que a sonhadora - sua cliente - é uma moça
extremamente preocupada com dietas, “lipos”, e emagrecimento.)
Sonhos com telefones celulares ou outros equipamentos informatizados
Sonhadora: Mulher, 37 anos, pedagoga.
No. 19 – Telefone celular:
Estava numa loja e podia escolher o celular que quisesse, só que eu não entendia
nada e não sabia qual era o melhor. Escolhi um que eu mais gostava sem saber se era
o melhor. Depois encontrava umas pessoas e via que o celular que elas tinham eram
sempre melhores do que o meu. Eu ficava com raiva, mas pensava que era besteira
porque tinha escolhido o que eu mais gostava, e que não precisava ser o melhor.
Sonhador: Homem, 42 anos, publicitário (série dos próximos sete sonhos).
No. 20 - Walkman:
Chego perto de um sujeito que bebe cerveja numa mesa e troco algumas palavras.
Aparece X (pessoa conhecida) e conversamos. Pergunto qual o seu trabalho, ele
trabalha numa empresa de estandes no Anhembi. Ele me diz: “Eu vendo sentimentos”.
Tenho na mão um walkman com uma fita, que toco sempre do mesmo jeito. Mostro o
aparelho para Y (outro personagem), que me ensina outro modo de tocar: 10 segundos
de música de um lado e 10 do outro. Lembro da música Jazz Musician da Grace Jones
e me emociono. Acordo do devaneio e não consigo mais acionar o walkman.
No. 21 - Telefone celular, walkman:
Estou na XX (uma empresa de publicidade), e as instalações me lembram os tempos
da YY (outra empresa da área). Sinto-me à vontade no ambiente de trabalho. Logo o
prédio se mistura com minha antiga casa. Recebo um telefonema no meu celular com
fones de ouvido de walkman e a voz é de M. (figura feminina conhecida do sonhador).
Fico contente dela ter me ligado depois de tanto tempo sem nos falarmos. Logo
percebo que é um trote de P. (figura masculina) e ouço risadas dele com seu filhinho,
no outro lado da linha. Fico bravo e atento para desmascará-lo, mas o telefone fica
mudo, apenas com ruído ambiente.
101
No. 22 - Telefone celular:
Estou na calçada conversando com C. (amigo do sonhador) que está dentro do seu
carro branco. Ele recebe ou está fazendo uma ligação do seu celular. O meu celular
toca e vejo meu sobrenome no visor. Quando aperto a tecla talk a bateria se esgota.
No. 23 - Telefone celular:
É dia, e F. (figura feminina) está me visitando na minha antiga casa. Marcamos um
outro local para nos vermos, e depois, enquanto eu a aguardava recebi no visor do
celular uma mensagem sua, dizendo que gostava muito de mim, mas sentia muito e
não viria. Fico desapontado.
No. 24 - Telefone celular:
O meu celular cai dentro do vaso sanitário, mas consigo recuperá-lo a tempo. Uma
turba ensandecida estoura pelas ruas, e vejo pessoas vindo dos dois lados. Tenho dois
celulares, um em cada mão, mas não sei o que fazer com eles. Eu e C. (personagem
masculino) nos cumprimentamos timidamente.
No. 25 - Telefone celular:
Cortei caminho circundando um jardim com muros altos de uma bela casa no bairro do
Ibirapuera. O meu celular começa a receber mensagens. Parece que mensagens
antigas que eu não conhecia estavam sendo apagadas, mas na verdade a companhia
telefônica estava re-programando e mandando códigos de acesso rápido, 2x32, 4x16,
que permitiam a utilização mais fácil e rápida do aparelho.
No. 26 - Radar eletrônico:
Entro num túnel estreito e iluminado e vejo um radar de velocidade na minha frente.
Vou caminhando normalmente, e ao me aproximar o flash me ilumina. Acabo de ser
fotografado.
Sonhadora: Mulher, 55 anos, psicóloga.
No. 27 - Conexão bluetooth:
Outro dia sonhei com uma tecnologia que ainda não existe... rsrsrs - Tipo ficção
científica. Sabe aquela geringonça que tem no celular (conexão bluetooth), que permite
repassar um conteúdo sem ser arquivo ou discado? Então... Eu nem sabia disso, mas
um amigo que também é fã do Star Wars (como eu) passou pra mim, dessa forma, a
música de abertura do filme para o toque do meu celular. Fiquei pasma... pois sou uma
anta nessas coisas. Ele me explicou que "abre uma porta" e o que estiver por perto
capta... Isso faz alguns meses.
Bom, na semana retrasada sonhei que "materializava" no bebedouro do meu
consultório antigo, uma garrafa (de vidro, antiga e pequena) de Coca-cola. Um paciente
meu, que estava esperando ser atendido, me explicou que se tratava de uma
tecnologia nova, tipo bluetooth, que permitia materializar coisas... E acrescentou que
tinha sido enviada por um "admirador" meu (um grande amigo, na verdade). Junto com
esse presente que ele havia enviado pro meu bebedouro, vieram inúmeras folhas de
computador (antigo, daqueles enormes IBM), daquelas listradinhas, com uma
mensagem escrita, que eu deveria ler...
102
Relatos de outra natureza contendo imagens semelhantes
No. 28 - Cena em Sand Play: um psicólogo enviou o seguinte relato, sobre a forma
escolhida por seu jovem cliente para finalizar o atendimento em psicoterapia infantil:
Não sei se ajuda no seu trabalho sobre sonhos com computadores. Não é sonho e não
chega a ser bem com computador, mas aconteceu a seguinte cena com um
pacientinho meu de seis anos na sessão de alta da psicoterapia com a utilização da
Caixa de Areia:
Ele pegou dois computadores de brinquedo na estante, montou duas "salas", disse que
ali era a empresa dele e que ele era meu chefe. Uma das salas, com computador, era a
dele, e a outra era minha. Pegou um bolo de dinheiro de mentira da estante, dividiu ao
meio, pegou metade e me deu a outra metade. Pegou dois telefoninhos celulares de
brinquedo, um para si e me deu o outro dizendo: "Esse é pra você, pra eu te achar
quando eu quiser".
Isso me marcou tanto, porque foi tão leve! O celular simbolizando nossa ligação,
mesmo depois da alta, uma ligação "sem fio". Não sei se interessa, mas achei legal lhe
passar assim mesmo.
No. 29 - Imagem / vivência: relato enviado por um homem de cinquenta e três anos,
técnico em informática:
Acho que não estava dormindo, mas, talvez, em estado hipnagógico. De repente, abriu-
se uma “janela” que mostrava a entrada de uma caverna. Tudo era prateado. Fui
entrando na caverna e cheguei a uma sala que era como um pequeno escritório de
informática. Mas os scanners – lembro-me especialmente deles – eram bem grandes.
Foi tudo muito rápido. Voltei logo ao normal. Quando tive essa experiência, tinha saído
de um emprego onde dava assistência a usuários de microcomputadores da empresa,
e já estava desempregado há alguns meses.
Conforme assinalado, optou-se por não entrar nos detalhes da análise
individualizada do simbolismo contido nos sonhos relatados. Para tanto, cada caso
deveria ser contextualizado, o que escapa do alcance deste trabalho. Na sequência,
comentários sobre o conjunto das imagens expressas nesses sonhos.
Nos relatos, a julgar pela forma com que são empregados os jargões que
designam os aparatos informatizados, a primeira impressão é de que esses recursos
fazem parte integrante da vida dos sonhadores, bem como o emprego dos termos que
os designam. Os protagonistas mais jovens – mesmo as crianças – e os adultos em
geral mencionam com familiaridade o computador, seu manejo, seus componentes e
os demais equipamentos, como instrumentos de uso comum e rotineiro. Os
instrumentos, nos sonhos, são utilizados com a mesma desenvoltura com que
103
provavelmente o fazem em sua vida de vigília, especialmente no que diz respeito às
suas funções como instrumentos de comunicação.
Mas algumas vezes a função original (de comunicação) aparece nos sonhos
em forma expandida, ou mesmo dotada de modo de funcionamento aparentemente
mágico, ou premonitório, como no caso do sonho no. 11, no qual a sonhadora “vê” na
tela do seu sonho o nome da possível amante do seu marido
67
.
Com certa frequência, alguns artefatos parecem adquirir uma espécie de vida
própria, passando a funcionar ou a “agir” no sonho, à revelia do ego onírico do
sonhador. A ideia da criação que passa a agir à revelia do seu criador não é inédita, e
vem sendo apresentada pela ficção científica há algum tempo. Este tema foi
magistralmente explorado por Stanley Kubrick, no clássico filme “2001, uma odisséia
no espaço” no final da década de 1960, baseado na obra de Artur Clark. O
computador Hall 9000 - a princípio um mero equipamento da nave espacial - ganha
autonomia, e passa a “agir” independentemente da vontade dos seus operadores,
determinando o desfecho do enredo e o destino dos tripulantes da nave.
O cinema ilustra há décadas as formas adotadas pelo imaginário coletivo para
expressar fantasias contidas nas relações estabelecidas entre o homem e máquinas
informatizadas. Segundo Fortim (2004a), desde meados do século passado a
filmografia referente à ficção científica acompanha a evolução dessa tecnologia,
Inicialmente, as máquinas informatizadas eram apresentadas no cinema como
grandes calculadoras, ainda que envolvidas em certo mistério. Posteriormente, como
instrumentos dotados de inteligência artificial, seguida da fase em que os PCs se
popularizaram, na qual os filmes passaram a destacar as relações homem

computador e os seus usos para comunicação via Internet. Mais recentemente, surgiu
a figura do ciborg, fruto do efetivo acoplamento do humano aos componentes
tecnológicos (FORTIM, 2004, p. 109).
Analogamente, os sonhadores expressam fantasias semelhantes. Por exemplo,
quando “forças”, estranhas ao ego onírico, assumem o comando da ação na cena, à
revelia do sonhador, sugerindo que nesse momento os complexos – presentes em sua
psique - encontraram uma via para manifestação por meio das imagens dos artefatos
informatizados. Como no sonho do menino ganhador de um “super-equipado laptop”
67
Neste caso em particular a sonhadora enviou um relato complementar no qual adicionou informação, segundo a qual
confirmou-se que, na ocasião, seu parceiro estaria realmente envolvido em uma relação extraconjugal.
104
(sonho no. 16): ao adquirir vida própria, passa a “fazer o mal”, levando o ego onírico a
destruí-lo, mesmo “contrariando sua vontade”.
Na série de entrevistas realizadas por Bill Moyers com J. Campbell – o
reconhecido estudioso dos mitos - foi abordado o tema da utilização dos
computadores e da possibilidade de estarmos assistindo o surgimento de novas
mitologias relativas a essa tecnologia. Campbell foi cauteloso em suas respostas às
questões propostas por Moyers. Ao dizer, por exemplo: “Vejo a possibilidade de novas
metáforas, mas não creio que já tenham se tornado mitológicas” (CAMPBELL, J. &
MOYERS, B, 1990, p. 19). O diálogo entre Campbell e Moyers continua, com a
formulação de outras questões pelo entrevistador: “Na sua opinião, quais são os mitos
que vão incorporar a máquina ao novo mundo ? Você divisa, emergindo dos modernos
meios de comunicação alguma nova metáfora para as velhas verdades universais ?”
Em resposta, Campbell ressalta os aspectos sob os quais essas questões devem ser
abordadas. Destacaremos algumas das suas considerações, pois parecem
especialmente interessantes para a reflexão sobre o tema (CAMPBELL, Ibid., p. 33-
34):
Você não pode prever que mito está para surgir, assim como não
pode prever o que irá sonhar esta noite. Mitos e sonhos vêm do
mesmo lugar. Vêm de tomadas de consciência de uma espécie tal,
que precisam encontrar expressão numa forma simbólica. E o único
mito de que valerá a pena cogitar, no futuro imediato, é o que fala do
planeta e de todas as pessoas que estão nele. Esta é a minha ideia
fundamental do mito que está por vir. [...] Quando a Terra é avistada
da Lua, não são visíveis, nela, as divisões em nações ou Estados.
Isso pode ser de fato, o símbolo da mitologia futura. Essa é a nação
que iremos celebrar, essas são as pessoas às quais nos uniremos.
Campbell nasceu em 1904 e faleceu em 1987, quando a Internet, como a
conhecemos hoje, estava ainda sendo esboçada. Portanto, não chegou a conhecer a
WEB, e os usos mais recentes do computador como instrumento de comunicação
global. Nem acessou o ciberespaço – o espaço virtual planetário no qual ocorrem as
inumeráveis interações humanas, de forma plenamente independente das fronteiras
geográficas nacionais. A experiência da imersão coletiva na WEB talvez seja ainda
muito recente para permitir uma avaliação segura. Porém, parece plausível admitir que
a nova vivência humana - possibilitada pela virtualidade – expresse, em futuro
próximo, a mitologia global planetária antecipada por Campbell nessas considerações.
105
5.3 Novas vias de expressão de antigos conflitos humanos
Percebi que é inútil falar aos outros sobre coisas que ainda não sabem.
Compreendi que uma ideia nova, isto é, um aspecto inusitado
das coisas só se afirma pelos fatos. (JUNG, 1981, p. 100)
A Internet certamente revolucionou as comunicações, mas os efeitos de sua
difusão vão além desse campo, ao transformar amplamente as relações humanas: os
contatos se estenderam, ampliando os círculos dos relacionamentos. Mas acontece
também o oposto, pela possibilidade de ali se manifestarem comportamentos de
isolamento, ocultação e anonimato, propiciados por características da rede mundial de
computadores. Os relacionamentos estabelecidos por meio da Internet proporcionam às
pessoas um espaço intermediário entre a solidão e o contato real. Trata-se de um espaço
compartilhado, no qual facilmente podem ser vivenciadas situações de aparente
anonimato. Nessa condição, o internauta pode sentir-se acima da lei e da ética, e sentir-
se estimulado a dar vazão a variadas fantasias. O espaço virtual, percebido pelo
internauta como um “lugar” mais reservado, oferece também possibilidades inéditas de
intimidade e de expressão de aspectos do eu não conhecidos ou elaborados. Tanto os
potenciais criativos quanto aspectos imaturos, conflituosos ou sombrios da personalidade
são expressos mais facilmente na forma de simples atuação, ou de ter a chance de
conscientização e posterior integração.
Este capítulo descreve comportamentos e interações observadas no espaço
virtual, buscando entender as novas formas de expressão da psique humana em alguns
de seus modos de manifestação na era pós-moderna. Ao comunicar-se na WEB, o
internauta manifesta diferentes aspectos de si mesmo, explorando-os, desenvolvendo
habilidades até então não reconhecidas e, eventualmente, integrando-os à sua identidade.
Por ser um novo habitat do humano e de seres humanos em relação, com frequência
ocorre o desenvolvimento de “personas virtuais”, que tendem a se adaptar às regras do
ciberespaço comportando-se de modo a adequar-se a essa mídia específica.
Observando, por exemplo, o comportamento amoroso dos internautas, verifica-se,
nas parcerias afetivo-sexuais iniciadas na WEB (e naquelas vividas de forma
exclusivamente virtual), a projeção do animus ou da anima em parceiros desconhecidos
na vida presencial. Constatam-se nessas relações, manifestações efusivas de afeto e
106
depoimentos de intenso encantamento mútuo (ou mesmo de paixão) ainda que as
pessoas envolvidas nas interações talvez nunca tenham se encontrado presencialmente.
As proposições apresentada por Guggembül-Craig (1978) sobre a complexidade
dos relacionamentos humanos nos auxiliam na análise das nuances inusitadas que
parcerias afetivas e sexuais assumem no espaço da virtualidade. Discorrendo sobre o
“mistério” da comunicação humana, e desejando saber “como atua uma alma humana
sobre a outra”, afirma (GUGGENBÜHL-CRAIG, 1978, §. 2):
Será acertado falar sobre um
relacionamento entre dois seres humanos?
O indivíduo, isolado, configura-se das mais diversas camadas,
componentes e complexos e esses entram em relacionamento entre si. A
alma humana, segundo a visão junguiana, não constitui uma unidade,
mas, compõem-se, em parte, de psicóides bastante independentes e
cada parte entra em contato com cada parte do seu oposto. (grifo do
autor)
Craig recorre a um esquema bastante conhecido entre os junguianos, composto
pelas possibilidades de comunicações existentes entre consciente e inconsciente de duas
pessoas em contato. No esquema, as vias representadas pelas setas são como canais
abertos às trocas que podem ocorrer nas interações. (GUGGENBÜHL-CRAIG, 1978, § 3):
CONSCIENTE
EU TU
EU INCONSCIENTE TU
É certo que Guggembül-Craig, em sua época, se referia às relações presencias,
mas suas ideias, inspiradas no pensamento junguiano, parecem especialmente úteis para
elucidar as relações humanas observadas no espaço da virtualidade. Inclusive porque, ao
entender a estrutura do indivíduo como composta por uma multiplicidade de camadas
(incluindo os elementos psicóides, conforme citação acima), Guggembül-Craig antecipa
concepções presentes nas atuais teorias sobre a constituição multifacetada da identidade
do ser humano.
107
Com base nessa concepção das interações humanas, julgamos plausível supor
que nas interações virtuais possa ocorrer a captação de conteúdos mais ou menos
inconscientes de cada parceiro, tal como na vida presencial. Porém, no virtual tal dinâmica
se expressa de forma mais transparente ao observador, em função das características do
novo habitat humano: o anonimato, o afrouxamento das defesas do ego e a maior
liberdade que o internauta se permite para expressar fantasias, entre outras. Ou seja, é
possível que, na interação virtual as trocas e os eventuais “diálogos” entre consciente

inconsciente (e mesmo inconsciente
 inconsciente) dos parceiros amorosos ocorram
em formas menos veladas, se comparadas às mesmas manifestações na vida presencial.
A irrupção dos complexos, em variados conteúdos e múltiplas maneiras de
expressão, é constatada nas interações virtuais: pela mera projeção de “fantasias”
(expressas apenas virtualmente) até sua efetiva “conversão em ação virtual”,
concretizando-se (ou não) em um “ato” no espaço presencial. Conforme descreveremos
adiante, os personagens assumidos pelos internautas ao adotarem as chamadas
“identidades virtuais” demonstram, com frequência dramaticamente, esse tipo de
processo, chegando a configurar-se o acting out, no sentido original do termo. Já ao
escolher - e depois ao adotar - determinadas “identidades” - geralmente contrastantes
com a persona assumida socialmente - o internauta pode dar vazão a impulsos até então
reprimidos, “atuando” (virtual ou presencialmente) sua respectiva expressão. Segundo
Stein: “quando o ego é possuído desse modo, acaba assimilado ao complexo e aos
propósitos do complexo, e o resultado é aquilo que chamamos acting out” (STEIN, 1998,
p. 57). A observação dessas manifestações no ciberespaço coloca novas e atuais
questões à nossa reflexão: devem ser ou não consideradas “reais” essas atuações,
especialmente quando expressas apenas na virtualidade? Estaremos assistindo ao
surgimento de um novo tipo de manifestação do acting out?
Os newgroups - grupos de discussão constituídos nos espaços virtuais - são ricos
em possibilidades de colaboração e troca de conhecimentos, expressões criativas ou
artísticas. E também propícios às manifestações de opiniões irrefletidas e
relacionamentos tingidos por afetos os mais diversos. De modo provavelmente
inconsciente, por meio desses grupos Eros e Logos permeiam o espaço virtual que é
também um potencial portal para o religioso, pois congrega os seres humanos num
“espaço sem espaço”, num tempo eterno, em redes de significados.
Valendo-se da Internet como instrumento e metáfora, em Portais secretos –
acessos arcaicos à Internet, o rabino Bonder (1996) estabelece paralelos entre a dinâmica
108
central da WEB e os ensinamentos tradicionais judaicos. Compara, por exemplo, a
possibilidade de “superposição de lugares”, mencionada pelos profetas bíblicos da
tradição religiosa judaica, e a corrente noção de “acesso” aos vários “espaços” ou
“janelas” virtuais da atualidade. (BONDER, 1996, p. 10). O autor menciona que o próprio
ato de orar ao Criador pressupõe a existência de algum “portal”, por meio do qual se torna
possível o “acesso à rede” (Ibid. p. 46). E ainda, para que tal ação ocorra, é necessária a
noção de que tudo está ”interligado”. Esta teria sido então, segundo o autor, a primeira
concepção de uma grande NET (rede).
Sem dúvida, Bonder (1996) deixa claro que está se valendo de metáforas para o
desenvolvimento de suas ideias. No entanto, são metáforas que estimulam nossa
reflexão, não apenas sobre a Internet como fato atual, mas também a respeito da noção
de virtualidade como concepção muito antiga, ou seja, um conceito existente no tempo em
que os profetas falavam sobre a possibilidade de as pessoas estarem juntas, embora não
estivessem “presentes” em um mesmo lugar. Quanto a esse aspecto, deve-se observar
que algumas referências feitas pelos participantes das comunidades virtuais -
extremamente populares e difundidas - guardam semelhanças com a sensação de
“pertencimento” (declaram sentir-se “religados”) possivelmente evocativa de experiências
análogas às vivências de religiosidade, hoje tão pouco atendidas pelas instituições
originalmente destinadas a essa função.
Os encontros estabelecidos no espaço virtual obedecem temporalidade própria e
dependem da iniciativa e disponibilidade daquele que se propõe a conectar o computador,
pois ir ao encontro da interação virtual (ou da mensagem) é uma decisão do ego de se
relacionar. A elaboração escrita da comunicação propõe outra estruturação, diferente da
comunicação oral, e as respostas, além de não necessitarem ser imediatas – pois os que
estão se relacionando dispõem de tempo para sua elaboração -, não contemplam itens
reveladores, como o tom de voz, o olhar ou a postura dos interlocutores. A comunicação
mediada pela Internet prescinde, a princípio, da linguagem corporal
68
. Mas, ainda que os
internautas utilizem a transmissão de som e/ou imagem nos contatos (hoje bastante
acessíveis), esses recursos podem ser manipulados de forma a compor imagens
corporais virtuais, de acordo com a fantasia ou desejo dos participantes. Essa via de
contato provê ao ego um novo modelo de persona protetora que, pelo lado negativo,
facilita enganos, mentiras e atos delinquenciais derivados da aparente irresponsabilidade
68
Referimo-nos às comunicações assíncronas mais frequentes na WEB, como, por exemplo, aquelas via e-mail. No
entanto, cabe lembrar que a utilização de câmeras, com transmissão de imagem e som em tempo real durante a
comunicação virtual está se difundindo rapidamente.
109
provida pelo suposto anonimato. De outro lado, pode levar ao fortalecimento do ego,
oferecendo um espaço de treino de relacionamento ou complementação deste.
Jung começou a mencionar a sombra ainda antes de definir o conceito, mas já
enfatizando a importância da sua conscientização para o desenvolvimento da
personalidade por meio de várias referências em sua obra. Durante a primeira conferência
da Tavistock, abordando as funções endopsíquicas da consciência, ou seja, referindo-se
aos componentes subjetivos ainda não acessíveis ao ego, chega a afirmar: “As coisas
obscuras são as interiores. Nesse lado sombrio há uma camada de dados psíquicos que
formam uma espécie de moldura de consciência à volta do ego.” (JUNG, 1988, § 37)
O reconhecimento gradativo dessas potencialidades do ego – tidas como
desagradáveis, negativas, ou apenas estranhas ao próprio ego – é mencionada como
uma das condições necessárias ao desenvolvimento e ampliação do
autoconhecimento, ainda que custe alto preço, conforme alerta Jung na sequência da
mesma palestra:
Mas nesta tomada de consciência da sombra trata-se de reconhecer
os aspectos obscuros da personalidade, tais como existem na
realidade. Este ato é a base indispensável para qualquer tipo de
autoconhecimento e, por isso, via de regra, ele se defronta com
considerável resistência. Enquanto, por um lado, o autoconhecimento
é um expediente terapêutico, por outro lado implica, muitas vezes, um
trabalho árduo que pode se estender por um largo espaço de tempo.
(JUNG, 1988, § 14)
Mas, ainda no dizer de Jung, ao reconhecer e integrar os aspectos sombrios da
sua personalidade, o indivíduo é premiado com a possibilidade de sentir-se mais
íntegro e humano e, ao mesmo tempo, integrado à coletividade (JUNG, 1988, § 134).
Através do tempo e da reflexão Jung desenvolveu o conceito de sombra, significando
o conjunto de aspectos ocultos, inconscientes, bons ou maus, negados ou reprimidos,
que deveria ser encarado como um problema moral a desafiar a personalidade do eu:
“A figura da sombra personifica tudo o que o sujeito não reconhece em si e sempre o
importuna, direta ou indiretamente, como, por exemplo, traços inferiores de caráter e
outras tendências incompatíveis”. (JUNG, 2002, § 513). Por meio desse mecanismo,
não é raro que o indivíduo reprima também (na sombra) potenciais simplesmente
humanos, como sua capacidade de ser “agressivo” (ou assertivo) ou “sedutor” no
sentido erótico do termo.
Interessa, no contexto deste trabalho, entender o conceito de sombra em seu
significado mais abrangente, referentes àqueles componentes da personalidade
110
caracterizados por traços e atitudes tidos como positivos ou negativos, que são
rejeitados pela consciência, ou seja, que por algum motivo, não sendo aceitos pelo ego,
tendem a ser reprimidos. Lembrando sempre que, para haver real desenvolvimento
pessoal, é essencial a efetiva assimilação destes conteúdos pela personalidade do
indivíduo, para a qual não basta apenas sua conscientização meramente intelectual. É
fundamental o contato consciente com tais elementos para que o tesouro neles contido
possa ser não apenas reconhecido, mas também “assimilado” ao ego.
Von Franz (1969), ao discorrer sobre o processo de individuação, menciona que
não conhecemos o propósito secreto da sombra que se avizinha, exigindo ser
conscientizada. “A sombra contém geralmente valores necessários à consciência, mas
que se expressam em uma forma que torna difícil integrá-los em nossa vida” (VON
FRANZ, 1969, p. 170). Atualmente, essas fantasias podem ser expressas por meio dos
personagens virtuais adotados pelas pessoas nos sites de relacionamento, ou em várias
outras formas de manifestações desenvolvidas no espaço aparentemente protegido pelo
anonimato da Internet. Ao discorrer sobre o tema da individuação, Ulanov (2002) ressalta
o papel fundamental do contato com a sombra para o êxito dessa caminhada rumo à
diferenciação:
Somos conclamados por algo além de nós mesmos para nos
tornarmos tudo de nós mesmos. Sentimos o Si-mesmo “pesado como
chumbo”, chamando-nos para fora das nossas identificações
inconscientes com as convenções sociais (a persona ou a máscara
que adotamos para funcionamento social), forçando-nos a reconhecer
até aquelas partes de nós mesmos que preferiríamos negar e
repudiar, aquelas que habitam o que Jung chama de sombra.
(ULANOV, 2002, p. 280)
Na WEB, a sensação real ou imaginária de anonimato propicia aos internautas a
fantasia da impunidade
69
, ampliando a chance de expressão daqueles aspectos
reprimidos da personalidade que passaram a constituir sua sombra. Especialmente
aqueles cuja valoração é tida como negativa pelas convenções sociais vigentes. Tal fato,
ocorrendo no espaço virtual – um espaço intermediário entre o puro fantasiar, dentro do
próprio mundo interno, e o relacionamento concreto e presencial com os outros -, pela
maior permissividade de expressão, pode favorecer a conscientização de aspectos
sombrios da personalidade. As vivências na virtualidade propiciam aos internautas
inúmeras oportunidades de expressão de fantasias e potenciais, desde os mais criativos,
69
Gradativamente as instâncias policiais e jurídicas estão desenvolvendo recursos adequados para a denúncia,
identificação, enquadramento e punição dos autores de atos ilegais ou ilícitos realizados no mundo virtual. Um exemplo é a
lei 3773/08, que qualifica e determina punição para crimes de pedofilia na Internet aprovada em novembro de 2008 pelo
congresso nacional.
111
até aqueles envolvem – uma vez ‘atualizadas’
70
- a irrupção dos complexos, fantasias e
outros conteúdos não conscientes da personalidade.
Jung entende por “fantasia” dois processos distintos, dependendo do contexto em
que emprega esse termo. Em, primeiro lugar como “fantasma”: “um complexo de
representações que se distingue de outro complexo de representações pelo fato de que
não lhe corresponde uma situação exteriormente real” (JUNG, 1974, p. 499); Em segundo
lugar como “atividade imaginativa”, correspondendo, nesse caso, à “expressão direta da
atividade psíquica vital, da energia psíquica que só é dada à consciência na forma de
imagens ou conteúdos, do mesmo modo que a energia física só aparece na forma de um
estado físico que, por via física, estimula os órgãos sensoriais” (JUNG, Ibid., p. 505). Jung
distingue ainda duas formas nas quais a fantasia pode ser entendida: a causal e a
finalista; Na primeira, é entendida como “sintoma” de um estado fisiológico ou pessoal
resultante de um evento anterior; Na segunda, é entendida em seu caráter “simbólico”,
podendo indicar uma diretriz ou uma “linha evolutiva” do processo psíquico do indivíduo
em questão (JUNG, Ibid., p. 504).
O ato de fantasiar, no ambiente virtual, guarda semelhanças com a condição do
devaneio, ou ainda a entrada em estado de relaxamento (consciência rebaixada) obtido,
por exemplo, pela fantasia dirigida: alteração das noções de espaço e tempo; capacidade
do individuo se emocionar frente à cena imaginada (ou, no caso, frente à cena virtual)
como se fosse real (ou presencial) etc. Vista por este ângulo, é possível que a navegação
na Internet, dentro de certas condições, propicie um afrouxamento das defesas do ego,
favorecendo o emergir de conteúdos inconscientes, em suas diferentes formas de
expressão.
Desse modo, como nos sonhos ou nos devaneios, virtualmente (no duplo sentido
do termo) qualquer conteúdo psíquico pode ser projetado e expresso como fantasia do
internauta e, eventualmente, transformar-se em atuação (apenas como ato virtual ou
passando ao ato presencial). A proposta deste capítulo é demonstrar a diversidade com
que essas manifestações vêm ocorrendo no ciberespaço, favorecidas pela possibilidade
da experimentação simultânea de diferentes níveis de realidades - virtual e/ou presencial -
ali oferecidas.
70
O termo “atualizar” é utilizado por Levy com o significado de “solução de um problema”. Exemplo: o “problema” da
semente é “fazer brotar uma árvore” (LEVY, 2005, p. 16). Em síntese, este processo corresponde à concretização de um
potencial em um ato, ou fato concreto.
112
Certamente, a mera expressão virtual das fantasias e conteúdos não assegura o
êxito da sua elaboração e integração, uma vez que, para tanto, poderão concorrer
inúmeros fatores, análogos aos observados nas demais situações da vida cotidiana onde
essa oportunidade se oferece. No que se refere aos conteúdos de caráter sombrio, são
muitas as situações cotidianas que podem servir como estímulos à sua conscientização,
desde que recebam a devida atenção: a observação e análise dos sonhos; os
depoimentos ou as reações daqueles com quem convivemos frente aos nossos
comportamentos; lapsos e manifestações de senso de humor e reações frente a situações
que causam impactos emocionais, entre outras. Porém, mesmo nas situações do dia a
dia, o simples fato de vivenciá-las não garante sua integração por parte do indivíduo. É
necessário que tais conteúdos sejam reconhecidos e acolhidos como elementos
componentes da sua totalidade psíquica. Não se pode ainda afirmar com segurança que a
experimentação dessas situações no espaço virtual efetivamente “facilita” de alguma
maneira essa integração. Mas as observações feitas até aqui indicam que no espaço da
virtualidade certamente ocorre a multiplicação exponencial das oportunidades para que tal
processo aconteça, pois os dois níveis de realidade (presencial / virtual) se alternam
continuamente na experiência do internauta, estimulando a tomada de consciência em
relação aos seus atos, fantasias, sensações etc.
Dentro das chamadas salas de bate-papo, nos sites de relacionamento e
comunidades semelhantes, como o Orkut, e o My Space
71
, entre outros, a exposição dos
participantes se dá geralmente dentro de um universo ético próprio. A Internet, sob esta
ótica, é espaço diferenciado, com regras de comportamento específicas, ainda que nem
sempre claramente explícitas, oferecendo oportunidades de serem burladas, ao mesmo
tempo, as normas de comportamento social e também a moral que pertence à nossa
consciência coletiva. Partindo dessas observações, evidencia-se que os complexos – em
suas inúmeras expressões – encontram na WEB um campo propício para sua eclosão.
Assim como os potenciais criativos da personalidade ainda não atualizados pelo indivíduo,
que podem ter nesse mesmo ambiente, espaço de ensaio e integração.
Uma das chances de identificação e possível integração dos traços e atitudes
mencionados é a conscientização do internauta a respeito do tipo de comunicação que
estabelece, e dos comportamentos que expressa nessa nova mídia. Os exemplos são
numerosos, e a descrição, neste trabalho, dos comportamentos e atitudes característicos
71
O Orkut e o My Space são “sites de relacionamentos”: espaços virtuais onde os internautas se organizam em
comunidades visando estabelecer relações de amizade, parcerias afetivas ou sexuais. São também ser utilizadas por
grupos, para a organização de atividades nem sempre pacíficas. Exemplos são as torcidas organizadas, que por vezes
combinam, no virtual, ações violentas contra os grupos rivais.
113
das comunicações e relacionamentos virtuais pretende ilustrar algumas das possibilidades
assim abertas à possível assimilação pelos internautas. Tão variadas quanto os tipos de
usos da Internet são essas situações. Por esta razão, o objetivo deste estudo deverá ser
delimitado, visando exemplificar as mais frequentes, sem a pretensão de esgotá-las. Em
forma intercalada, serão feitos comentários e análises relativas aos comportamentos
descritos.
Os casos descritos foram recolhidos e selecionados nas seguintes fontes: casos
registrados na prática clínica do NPPI, respeitada a preservação da identidade dos seus
protagonistas
72
; relatos recolhidos em diversos meios de divulgação da imprensa e da
literatura; há ainda relatos, enviados por colegas terapeutas. Antes de passarmos aos
relatos, cabem alguns esclarecimentos sobre o material coletado, e sobre os
procedimentos adotados para a sua organização e análise.
A primeira explicação refere-se a algumas características das comunicações
virtuais e suas implicações: a interatividade e o amplo alcance das ações exercidas no
ciberespaço. Se de um lado essas características constituem fortes atrativos do ambiente
virtual, de outro, são também geradoras de alguns complicadores dessas interações. Um
deles é o fato das informações ou ações dos internautas circularem na rede de modo
muitas vezes “fora de controle”, alcançando pessoas, grupos ou instituições de modo não
previsível, gerando repercussões e efeitos os mais variados, pretendidos, ou não.
Em muitos momentos das interações virtuais a alternância das clássicas posições
de “emissor e receptor” das mensagens ocorre tão rapidamente que se torna difícil
distinguir qual delas o internauta ocupa nos sucessivos passos da interação em curso. No
entanto, na apresentação, o foco será preferencialmente colocado sobre o
comportamento do internauta que – em cada situação relatada - deu início à mesma.
Ainda que muitas vezes o seu receptor possa se tornar também um protagonista da
situação relatada, pelo simples fato de estar on-line naquele dado momento. Conforme se
perceberá, as condições da comunicação virtual acarretam consequências inusitadas para
as interações na WEB. Consequências relevantes, por exemplo, quando as interações
envolvem comportamentos que tangenciam ou violam as leis, a ética e/ou a moral
vigentes.
72
Alguns casos foram recolhidos no noticiário da imprensa, portanto, são casos públicos. Outros foram atendidos pelo
Serviço de Orientação Psicológica realizado pelo NPPI, na Clínica Psicológica da PUC-SP. Nestes, os protagonistas são
informados, no site onde o atendimento é oferecido, sobre o caráter de pesquisa e concordaram que seus dados fossem
utilizados, desde que preservada sua identidade. Essa providência atende à Resolução
012/2005, do CFP, que
regulamenta os atendimentos psicológicos mediados por computadores.
114
Algumas situações selecionadas se enquadram nas condições limítrofes ou
mesmo francamente transgressoras. No entanto, para o objetivo deste trabalho, seu
caráter transgressor será considerado apenas em seus aspectos psicológicos,
potencialmente reveladores de conteúdos inconscientes dos seus protagonistas, e não
quanto à sua ilegalidade, em que pese a relevância desse fator para as esferas jurídica,
ética e moral.
Outro esclarecimento preliminar: ao acompanharmos os relatos das situações
coletadas, percebe-se que alguns dos comportamentos são sugestivos de condutas
possivelmente patológicas ou, ao menos limítrofes, por parte dos internautas que as
protagonizam. No entanto, na análise não nos ocuparemos dos aspectos diagnósticos dos
casos. Em razão do objetivo definido para este trabalho, e do fato de dispormos de dados
pessoais relativamente restritos sobre os protagonistas dessas situações, ao considerar
tais comportamentos, nos ateremos aos indicadores das possíveis expressões do
inconsciente dos internautas de forma pontual e circunscrita ao fato mencionado.
Por razões semelhantes às citadas, evitaremos apresentar interpretações
detalhadas ou análises extensas sobre a natureza última dos conteúdos inconscientes
manifestos pelos internautas. Por exemplo: se se dispõe apenas do relato factual de um
episódio de bullying, seria uma especulação afirmar que seu autor tenha sido movido
especificamente pela agressividade, insegurança, inveja, ciúme, competição etc., a menos
que houvesse mais detalhes sobre os personagens envolvidos. A fenomenologia da maior
parte dos casos é suficientemente exuberante para o leitor familiarizado com o
pensamento junguiano identificar com relativa facilidade a manifestação dos diferentes
complexos (sombra, animus / anima etc.) e outros dinamismos psíquicos potencialmente
expressos nessas situações (atuações, identificações, projeções etc.).
Finalmente, cabe ainda informar sobre o critério utilizado para o agrupamento e
ordenação dos exemplos. Optou-se por organizá-los de acordo com o tipo de
comportamento predominante - em termos da ação do internauta - em lugar de destacar
seus objetivos ou finalidades. Cada uma das ações, quando exercida na virtualidade pode
se prestar a diferentes objetivos, desde os meramente lúdicos, imaginativos ou
exploratórios dos espaços virtuais, como os francamente lesivos, ilegais ou ilícitos.
Exemplificando: a criação de personagens virtuais pode ser parte das consignas de um
game (jogo on-line) educativo, ou ser usada para o exercício do assédio sexual visando à
prática da pedofilia ou do cyberbullyng.
115
5.3.1 Comunicações e navegação polêmicas
Dissimulados na forma de mensagens eletrônicas supostamente verídicas, os
envios de vírus têm como propósito da simples interferência no funcionamento das
máquinas alvo, à destruição dos sistemas dos computadores pessoais e institucionais que
os recebem se ativados inadvertidamente pelo usuário.
A intenção de alguns envios pode ser travar seu funcionamento, destruindo os
dados ali armazenados. Em outros casos, o hacker pode ter como objetivo apenas
demonstrar poder ou habilidade técnica, e nesse caso a ação consistirá apenas em
“entrar” na máquina alvo e deixar algum registro de sua passagem. Por exemplo, sua
marca na forma de uma pichação virtual, demonstrativa da fragilidade do sistema.
Outro objetivo possível é a instalação dos chamados “cavalos de tróia” ou
phishing. Popularmente também conhecidos como “vírus”, essas mensagens contêm mini-
programas auto-executáveis que, instalados no computador alvo, “abrem” suas portas
virtuais, fazendo com que seja viável o acesso remoto ao equipamento infectado. Desse
modo, equipamentos domésticos ou empresariais tornam-se vulneráveis às invasões dos
hackers. Por essa via os invasores acessam as mais variadas e privilegiadas informações:
bancos de dados de instituições financeiras, senhas pessoais, números de CPF ou de
cartões de crédito digitados nas operações financeiras. Esse recurso pode ser utilizado,
por exemplo, para a transferência indevida de valores entre contas bancárias, ou para
compras on-line à revelia, em nome do real portador, entre outras operações. Estas são
algumas das modalidades de roubos e crimes informatizados mais frequentes.
As variantes dos e-mails potencialmente lesivos são inúmeras, e procuram sempre
simular um envio normal, rotineiro ou amistoso de instituição, órgão público ou pessoa
comum, supostamente interessada em entrar em contato com o destinatário. Geralmente
o teor das mensagens tenta tirar partido da eventual fragilidade do receptor da
mensagem: explorar a ingenuidade do destinatário frente às ofertas “tentadoras” (“clique
aqui para receber seu brinde”, ou “seu computador está infectado, clique aqui para
receber a vacina antivírus gratuita”); a sua curiosidade ou insegurança (“um amigo quer te
rever”, ou “você está sendo traído: veja as fotos você mesmo”); a eventual carência
afetiva (mensagens contendo supostas declarações amorosas), ou ainda a culpa,
ambição ou desejo de obter vantagens financeiras (“seu CPF está bloqueado por débitos
não pagos” / “você acaba de ganhar duas passagens aéreas da GOL – clique aqui para
116
confirmar sua reserva” / “o depósito já foi feito em sua conta – clique no link abaixo para
conferir o valor”).
Nestes primeiros exemplos constata-se que não apenas o remetente das
mensagens, mas também o receptor pode (ou não) vivenciar as ocorrências como
oportunidades de tomada de consciência da real motivação inconsciente: ao usar suas
competência e habilidades para tais fins, o hacker pode agir na forma descrita movido por
necessidades não conscientes de auto-afirmação ou desejo de reconhecimento; por outro
lado, a ação da vítima (ao clicar no link oferecido na mensagem), pode ser motivada
apenas pela curiosidade ou falta de habilidade no trato com essa via de comunicação.
Mas também, com alta frequência, sua ação é regida por motivações inconscientes
(cobiça, culpa, carência afetiva, entre outras).
São numerosas e populares na WEB ações consideradas violação dos direitos
autorais envolvendo a propriedade intelectual ou artística. A modalidade mais frequente é
o download direto da WEB (em sites como o 4Shared e o Pirate Bay) ou a troca de
gravações musicais ou filmes por meio de programas criados para essa finalidade como o
Kazaa, o Morfheus.
Conforme assinalado, não está em discussão a legalidade da ação do internauta
que “baixa” esses arquivos, mas os possíveis significados do ponto de vista psicológico,
indicativos de algum conflito, compensação, etc. Essas atitudes dos internautas podem ter
como objetivo apenas burlar as normas vigentes, obtendo acesso gratuito a conteúdos
pelos quais pagaria, caso adquirisse a mídia física (CDs); ou, simplesmente, atender ao
desejo de acesso às informações e produções culturais. Desse modo, esses
comportamentos dos internautas podem – ou não – ser considerados como indicativos da
manifestação de algum aspecto não consciente de sua personalidade, dependendo do
seu objetivo ou interpretação atribuída.
Como se trata de ação virtual muito popular e generalizada, especialmente entre
os mais jovens, as repercussões coletivas se fazem sentir, gerando polêmicas.
Argumentando, os seus protagonistas e defensores alegam a irrestrita liberdade de
expressão e acesso à informação que devem imperar na Internet visando democratizar
conteúdos. Por seu lado, os autores das obras compartilhadas rebatem com argumentos
éticos e financeiros, em defesa de seus direitos. Soluções conciliatórias para esse conflito
de interesses começam a ser experimentadas na WEB. Cantores e instrumentistas
oferecem download gratuito de uma parcela das suas produções como forma de divulgar
117
a obra. Em contrapartida, nos mesmos sites, divulgam e colocam à venda as produções
integrais e/ou ingressos para shows.
O fácil acesso às publicações virtuais propicia o plágio de textos e de diversos
tipos de criação intelectual. Mas o próprio meio virtual provê formas de identificação e
controle dessas ações: digitando no Google um fragmento de texto pode-se facilmente
localizar o(s) site(s) onde esse conteúdo está sendo plagiado. Dessa maneira, as cópias,
plágios ou clonagens podem ser identificados com razoável agilidade. Provavelmente
seria bem mais difícil detectá-las, caso fossem realizadas nas formas impressas
tradicionais. De certa maneira, a intenção escusa (ou “sombria”) do autor do plágio virtual
é “iluminada” pela ferramenta da qual se utiliza.
No entanto, as questões colocadas em pauta a partir do compartilhamento virtual
de arquivos vão além dos efeitos pessoais gerados pela pretensa (ou real) violação do
direito à propriedade intelectual individual. Talvez exponham também alguns aspectos da
sombra coletiva da cultura atual, regida pelo consumo. Cultura na qual, segundo Byington
(2008, p. 284):
A fixação matriarcal do consumo obsessivo e compulsivo transforma a
aquisição de bens numa atividade compulsiva, alimentada por um
marketing perverso, que manipula o ontológico através do ôntico, e
identifica consciente e inconscientemente a posse das coisas com a
realização do Ser.
As polêmicas geradas por essas últimas formas de navegação mencionadas vêm
suscitando questionamentos mais amplos, bem como o surgimento de formas alternativas
de criação, distribuições, partilha e comercialização dos bens culturais. Nas
considerações finais serão retomados alguns desdobramentos desses processos, nos
seus termos coletivos.
Outro tipo de navegação polêmica, desta vez na área médica, é a busca, por
leigos, de informações sobre sintomas, diagnósticos, tratamentos e prognósticos dos
males que os afetam, disponíveis nos sites sobre medicina e saúde. Alguns médicos
relatam receber, em seus consultórios, pacientes ansiosos após terem pesquisado na
Internet a respeito de seus sintomas. Atribuem tal condição ao fato dessas pessoas terem
acessado descrições de patologias frequentemente acompanhadas de imagens das
piores evoluções possíveis, impressionado-os de forma negativa, pois não detêm as
informações necessárias para discriminar quais as características da doença que
realmente lhes dizem respeito.
118
Em função dos efeitos possivelmente lesivos, a veiculação dessas informações
desperta a atenção dos meios da saúde, que apontam o papel da indústria farmacêutica,
de alguns médicos, da imprensa em geral - e da Internet em particular - no estímulo do
chamado disease-mongering, uma expressão traduzida por Melo (2008) como “promoção
da doença”. No artigo, o autor descreve algumas estratégias utilizadas pela indústria
farmacêutica visando promover o aumento da venda de seus produtos: “A I F (indústria
farmacêutica) interage com os médicos de diversas formas (visita de delegados, de
informações médicas, apoio na formação, jornais, correios, Internet, etc.) tendo como
objetivo final a promoção do medicamento” (MELO, 2008). Prosseguindo na análise, além
de destacar o papel do médico na orientação e esclarecimento do seu doente -
minimizando os seus efeitos danosos - avalia também as consequências desse
procedimento para a coletividade:
O papel do médico deve ser informar as pessoas sobre os benefícios e
riscos do tratamento (ou do não tratamento) para a sua condição
particular. Não é por acaso que nos países mais ricos, e
comparativamente aos países mais pobres, quanto mais as pessoas
estão expostas aos cuidados de saúde e a toda essa retórica da
promoção da doença, mais inseguras e mais doentes se sentem. (MELO,
2008, Acesso em 10/07/08)
Em estudo publicado sob o título “A internet, o paciente expert e a prática médica:
uma análise bibliográfica”, um grupo de pesquisadores brasileiros investigou até que
ponto o paciente expert - portador de informações disponíveis na Internet - consegue
interferir na autoridade e prestígio social do médico e, consequentemente, alterar a
relação médico-paciente, tradicionalmente baseada na assimetria de informações. A
hipótese inicial foi de que “o aumento do poder (empowerment) do paciente nessa relação
pode levar, em condição extrema, à desprofissionalização do médico” (GARBIN,
PEREIRA NETO e GUILLAN, 2008). A pesquisa consistiu na análise de quinze artigos
onde o tema é abordado por autores médicos. Como conclusão, constatou a falta de
consenso nos artigos analisados sobre o potencial que as informações obtidas na Internet
têm de modificar ou interferir na relação médico-paciente, pois foram identificadas
posições distintas e até antagônicas sobre essa possibilidade. No entanto, foi salientada a
valorização crescente do papel da Internet no fornecimento de informações acessíveis a
qualquer momento, de forma rápida e atualizada. Destacam – além dos sites - o papel das
comunidades virtuais dedicadas às doenças crônicas, raras ou estigmatizantes, que além
de informações fornecem também apoio e orientações especificamente voltadas a esses
grupos de pessoas. Como o estudo foi realizado com base em trabalhos na maior parte
publicados Inglaterra, os pesquisadores sugerem que a mesma questão deva ser
averiguada em nosso meio. Mas, outra consideração apresentada na conclusão do
119
trabalho interessa-nos de modo especial (HENWOOD et al. 2003, apud GARBIN,
PEREIRA NETO e GUILLAN, 2008):
De qualquer forma, as informações disponíveis na Internet têm potencial
para modificar a relação médico-paciente. Ao elevarem o poder decisório
do paciente, colocam em questão a formação e autoridade profissional
médica e desafiam o médico a estar constantemente atualizado. Assim,
criam a possibilidade de decisões mais compartilhadas.
No trabalho desenvolvido na Clínica Escola da PUC-SP observa-se uma versão
análoga desse processo ocorrendo na área da Psicologia, quando leigos enviam e-mails
solicitando orientações
73
após realizarem pesquisas na Internet a respeito de seus
próprios sintomas, de algum familiar ou pessoa próxima. Essa demanda tende a se
acentuar em algumas ocasiões como, especialmente, após a publicação - pela mídia
impressa ou digital - de matérias sobre os riscos envolvidos nos usos das novas
tecnologias (computadores e seus derivados).
É possível que algum dano realmente ocorra, quando os dados acessados por
leigos são apresentados de forma apenas aparentemente bem fundamentada, pois nem
sempre é possível ao internauta avaliar a credibilidade das fontes citadas pela mídia
digital. Por outro lado, não pode ser ignorado o aspecto positivo implícito nas divulgações
no que se refere à ampliação do acesso às informações gerado pela informatização das
mídias jornalísticas. Conforme apontamos no capítulo 4, a população tem hoje amplo
acesso às notícias divulgadas pela imprensa, e se considerada por este ângulo, a questão
proposta pode ser avaliada – também - sob outro ângulo: em muitos casos, o cliente mais
informado, mais crítico, está mais capacitado a assumir o papel de corresponsável pela
busca da sua “cura”. A distinção entre as duas condições se dará, evidentemente, em
função de grau de discernimento crítico e diferenciação pessoal, condições que não são
“geradas”, mas apenas “evidenciados” pelo acesso às diversas mídias, digitais ou
impressas.
Dessa maneira, o comportamento do cliente internauta pode indicar o início de
uma nova etapa na vivência coletiva do arquétipo do “curador – ferido”; uma fase na qual
talvez possam surgir formas alternativas do exercício do “poder” nas relações de ajuda de
forma geral - incluindo o magistério, a medicina e a psicoterapia -, tema descrito de forma
emblemática por Guggenbül-Craig ao analisar essas relações e apontar os problemas
73
Referimo-nos ao Serviço de Orientação Psicológica via e-mail oferecido pelo NPPI às pessoas que apresentam usos
compulsivos ou excêntricos dos computadores. A oferta desse serviço pode ser acessada no seguinte endereço
eletrônico:
<http://www.pucsp.br/nppi/orientacao_email.html>.
120
decorrentes da cisão do arquétipo envolvido nessas relações (GUGGENBÜHL-CRAIG,
1978). Este tema será retomado nas considerações finais do trabalho.
5.3.2 Identidades virtuais
A criação de identidades virtuais ocorre em vários contextos e diferentes
ambientes do ciberespaço, e são utilizadas para diversas finalidades: algumas são
questionáveis, por serem ilegais, lesivas ou ilícitas; outras têm função nitidamente lúdica
como em alguns jogos on-line (o MUD ou o Second Life), nos quais a criação dos
personagens é parte integrante das regras do jogo. A escolha e adoção dos nicks é uma
das expressões aparentemente mais simples e, ao mesmo tempo, potencialmente
reveladoras das motivações mais ou menos inconscientes do protagonista. Consiste na
adoção de um apelido com o qual o internauta passa a se identificar (e ser identificado)
nas participações em chats ou sites de relacionamentos. A observação dos nicks
escolhidos pelos internautas permite levantar hipóteses sobre as diferentes expressões
psicológicas e manifestações dos usuários diante dos contatos estabelecidos nos
ambientes virtuais: projeções, atuações etc.
Existem casos em que a expressão de aspectos da personalidade não assumidos
socialmente (na vida presencial) pelos detentores - mas presentes no nick escolhido -
permite aventar a hipótese de que a escolha do apelido, por si mesma, se constitui em
uma forma de “atuação” dos seus usuários. Em outros, esse comportamento também
pode ser entendido como irrupção da sexualidade excessivamente reprimida na vida
presencial. Em artigo sobre a relação entre os nicks e a criação de personagens virtuais,
Fortim (2000) menciona vários exemplos com nítidas alusões sexuais: “Gatinho_24”, “Don
Juan_DF”, “Lobo”, “Lindona”, “Sex Machine”, “Gata_Sarada”, entre muitos outros
(FORTIM, 2000, Acesso em 22/08/08).
Ainda segundo Fortim (2004) o nick expressa quem esta pessoa é, no espaço
virtual, ou, ao menos, qual é sua proposta de relacionamento, uma vez ser essa a sua
principal forma de apresentação aos demais participantes ali presentes. Embora os
internautas costumem identificar-se fortemente com o nick adotado, não é raro assumirem
simultaneamente diferentes nicks, com características até mesmo opostas, para uso em
diferentes ocasiões expressando (ou talvez explorando) aspectos contrastantes de sua
identidade, imersos na condição virtual.
121
A possibilidade de se manter o anonimato nas salas de chat - facilitada pelo uso de
nicks - abre prerrogativa para serem criadas identidades virtuais bastante elaboradas,
com a finalidade de estabelecer contato, de naturezas diversas: da simples
experimentação da comunicação virtual, à busca de parcerias amorosas e/ou sexuais.
Desse modo as pessoas procuram romper as barreiras da timidez ou do isolamento
social, sentindo-se protegidas ou estimuladas a buscar parcerias, a partir das condições
propiciadas pelo ciberespaço. Já são numerosos os casais que assim se conheceram e,
posteriormente passaram a namorar “presencialmente” e se casarem na vida “real”.
Mas também por meio desse artifício, os internautas criam personagens falsos
quanto à sua real idade, gênero, profissão etc., e passam a agir de modos que não
sustentariam, caso tivessem que se responsabilizar moral ou legalmente por suas ações.
Por exemplo, a sedução de menores visando à pratica da pedofilia, sedução de pessoas
adultas para em seguida roubá-las, e demais atos criminosos, imorais ou ilegais,
favorecidos pelo anonimato. Muitos casos de golpes conhecidos como “boa noite
Cinderela” são articulados dessa forma: o internauta, virtualmente seduzido, literalmente
abre as portas de sua intimidade (e de sua casa) ao sedutor que aplica seu golpe
adicionando drogas à uma bebida ou alimento a ser ingerido pela vítima. Em seguida,
tirando proveito de sua inconsciência (ou semiconsciência) rouba pertences e/ou induz ao
fornecimento das senhas de cartões ou de contas bancárias.
Inúmeros casos de pedofilia noticiados pela imprensa
74
são articulados via Internet
por adultos que, apresentando-se com identidades falsas – até mesmo passando-se por
outras crianças ou jovens - conquistam a confiança de menores em salas de chat para
posterior sedução e indução a práticas sexuais. Segundo dados divulgados em seu site,
somente em janeiro de 2009 a Safernet
75
registrou 3.180 denúncias de ocorrência de
pornografia infantil na WEB. Ocorrências que envolvem a participação de pedófilos que
produzem e colocam on-line páginas contendo fotos de crianças e jovens, consideradas
sensuais. Ou seja, para páginas serem veiculadas na WEB, é necessário que alguém
alicie as crianças para concordarem em posar para fotos presumidamente excitantes do
ponto de vista sexual, mediante ameaças ou sedução. As fotos podem ser obtidas on-line,
com a utilização de webcans, ou presencialmente. No outro extremo, é necessário que
haja um espectador (eventualmente pagante) interessado em ter acesso às imagens.
74
Como ilustração sobre a denúncia de mais um caso de pedofilia, na cidade de Catanduva (S. P.), segue o link da
noticia publicada pelo jornal Folha on-line no dia 15/03/09:
<http://www1.folha.uol.com.br/folha/cotidiano/ult95u534922.shtml>
75
Criada com a finalidade original de coibir este tipo de prática, a Safernet Brasil (Central Nacional de Denúncias de
Crimes Cibernéticos) é uma ONG que vem desenvolvendo desde 2005 atividades de pesquisa e campanhas de
prevenção em relação a este e outros tipos de crimes virtuais. No site desta organização podem ser consultados os
empenhos governamentais, civis e jurídicos voltados a essa área: <http://www.safernet.org.br/site/indicadores>
122
De acordo com as divulgações na imprensa, os criadores das páginas e os
frequentadores são pessoas aparentemente comuns, geralmente prestigiados nos
círculos sociais e profissionais: médicos, religiosos, juízes, professores, pais de família
tidos como acima de qualquer suspeita no ambiente social ao qual pertencem na vida
presencial, mas provavelmente dotados de personas extremamente rígidas.
No site da Safernet são constantemente divulgadas informações sobre denúncias
e investigações a respeito dessas ocorrências, com ênfase nos seus aspectos jurídicos e
legais. Para este trabalho, o interesse recai sobre os protagonistas das ações,
especialmente porque envolvem pessoas aparentemente insuspeitas, pois a julgar por
suas personas, tudo levaria a crer que seriam imunes a esse tipo de expressão sombria
da sexualidade. Mas, do ponto de vista psicológico essa situação paradoxal pode ser
compreendida à luz do princípio da enantiodromia. Referida por Jung como “uma das
mais fantásticas leis da Psicologia”, a enantiodromia, ou a “função da regulação dos
contrários” adverte que “um dia, tudo reverte em seu contrário” (JUNG, 1978, p. 111-112).
Ou seja, uma das possibilidades, do ponto de vista da enantiodromia, é que esses
personagens tenham se tornado não apenas autores de delitos que ferem a moral e a lei
vigente, mas também vítimas da unilateralidade da sua própria consciência.
Além disso, sem pretender avaliar ou julgar as manifestações da sexualidade -
mas apenas sobre elas refletir, do ponto de vista psicodinâmico – cabe considerar a
advertência de Jung a respeito das limitações da própria consciência quando
confrontada com a observação de processos dessa natureza (JUNG, 2008, § 397):
Devo, porém, ressaltar que o grande Plano segundo o qual é
construída a vida inconsciente da alma é tão inacessível à nossa
compreensão que nunca podemos saber que mal é necessário para
que se produza um bem por enantiodromia, e qual o bem que pode
levar em direção ao mal. Muitas vezes, o probate spiritus
76
,
recomendado por João não pode ser senão a espera paciente e
prudente de ver como as coisas se encaminham.
Em outros momentos Jung aborda a questão do mal, reconhecendo a dificuldade
de se lidar com o tema, por exemplo, ao ser evocado pela “voz interior”; mas destaca sua
relevância para o desenvolvimento da personalidade. Menciona por exemplo, seu aspecto
“tentador” e “perigoso”, mas potencialmente redentor, ”curativo”, desde que, ao confrontá-
lo, se recorra ao livre arbítrio, assumindo a responsabilidade das escolhas (JUNG, 1991, §
319):
76
Transcrição da referência cotada na edição da obra citada: “Provai os espíritos, para saber se vêm de Deus” (1 João
4,1).
123
A voz interior apresenta o mal de maneira tentadora e convincente a fim
de conseguir que a pessoa sucumba a esse mal. Se a pessoa não
sucumbe, nem ao menos parcialmente, então nada desse mal
aparentemente nela penetra, mas também não poderá haver nenhuma
renovação ou cura. [...] Se o “eu” sucumbir inteiramente à voz interior,
então seus conteúdos atuarão como se fossem outros tantos demônios, e
segue-se a catástrofe. Se o “eu” sucumbir apenas em parte e puder e
puder salvar-se de ser totalmente devorado, fazendo uso da auto-
afirmação, então poderá assimilar a voz; e deste modo esclarece-se que
o mal era apenas uma aparência de mal, sendo na realidade o portador
da salvação e da iluminação.
No entanto, como foi dito, nem sempre a identidade virtual é utilizada pelos
internautas de forma oculta ou para fins lesivos. Em vários contextos do ciberespaço –
como é ocaso dos jogos on-line – os participantes assumem identidades virtuais como
parte das regras e normas do próprio jogo. Nesses casos, toda a comunidade de
jogadores conhece e concorda com essa condição, vivendo uma espécie de fantasia
coletiva compartilhada. O MUD (Multi-user Dungeon) é uma variante informatizada dos
jogos de RPG (Role Playing Game), na qual os participantes assumem identidades
virtuais inspiradas em personagens medievais, fantasiosos ou míticos, componentes a
priori do ambiente do jogo. Os participantes agrupam-se formando “famílias virtuais”,
assumindo personagens que talvez não correspondam ao sexo biológico, idade ou outras
características da sua identidade na vida presencial. Já o Second Life, envolve outro tipo
de proposta, ao ser definido como:
Um ambiente virtual tridimensional que simula em alguns aspectos a vida
real e social do ser humano. O nome second life significa em inglês
segunda vida que pode ser interpretado como uma vida paralela, uma
segunda vida além da vida principal, real. Dentro do próprio jogo, o jargão
utilizado para se referir à primeira vida, ou seja, à vida real do usuário, é
RL ou Real Life que se traduz literalmente por vida real. (WIKIPÉDIA,
acesso em 24/07/08)
Nessa modalidade de vida virtual, a “segunda vida” do participante pode – ou não -
guardar analogias (mais ou menos estreitas) com a vida presencial. É interessante
observar que não apenas pessoas, individualmente, marcam presença nesse ambiente,
mas instituições de vários tipos (universidades, bancos, imobiliárias, livrarias e outras
empresas comerciais de vários tipos) instalaram equivalentes virtuais nos espaços do
Second Life, realizando ali – de forma aberta, embora virtual - eventos e demais
atividades, como divulgação e lançamento de produtos. Portanto, no S. L., nem sempre
as identidades virtuais criadas são falsas, ou se prestam a fins escusos. Mas essa
condição não impede que avatares presentes nesse ambiente estejam a serviço da
expressão da face socialmente oculta dos seus protagonistas. Como exemplo, o relato de
Abreu (2008) a respeito de uma clientes - estudante universitária e usuária compulsiva do
124
Second Life – que fez da participação do seu avatar nesse game uma fonte de renda
considerada por ela bastante satisfatória, desempenhando a função de uma “prostituta
virtual”
77
.
Por breve período de 2008
78
, outro personagem virtual muito popular entre pré-
adolescentes foi o chamado perfil fake (falso). Personificado principalmente no Orkut, o
fake era uma forma deliberadamente fantasiosa de participação nessa comunidade virtual.
O autor elaborava um personagem fictício, mas minucioso quanto à sua identidade: nome
próprio, gênero, fotos, atividades, apresentando-se como membro de comunidade do
Orkut e estabelecendo vínculos virtuais com outros fakes. A partir daí, em acordo tácito,
passavam a viver (virtualmente) relacionamentos com distintos vários graus de
comprometimento afetivo (namoro, amizade ou mesmo casamento). Nos relatos dos
adolescentes, as vivências no fake costumavam ser acompanhadas de forte carga
emocional, e o cultivo dos personagens demandava boa parte do tempo e da energia do
off
79
, conforme ilustra o depoimento transcrito abaixo, publicado por uma adolescente no
Orkut. A forma da escrita da jovem mostra a estrutura da linguagem utilizada nessa
comunicação virtual:
faaaaake... um mundo mágico! só quem gosta realmente disso aqui, sabe
do que eu to falando !
muitas pessoas não entendem, não enchergam graça nenhuma em
passar um dia inteiro mechendo no computador, respondendo scraps, as
vezes os próprios offs refletem , nem que seja por alguns instantes , se
isso aqui faz algum sentido , não , não faz. A gente dedica horas do
nosso dia a isso aqui , sem ganhar nenhum tustão , sem pedir nada em
troca , que atire a primeira pedra um só off que nunca mentiu pra mãe ou
pro pai pra poder mexer no fake , mesmo de castigo ou em semana de
prova ! quem nunca abriu uma página do fake e outra do google ou do
wikipédia , fazendo a tal “pesquisa do colégio” ? haha . eu duvido muito
que ninguém nunca fez isso ou algo parecido ! e sabe porque a gente
chega ao ponto de mentir pros próprios pais só pra mexer no fake ?
paixão incompreendida ! paixão por esse mundo que todo mundo que
todo mundo pode ser o que quiser , rico , com uma mansão perfeita e
baladeiro de plantão . ou lésbica ou gay , ou sei lá cada um aqui , é o que
muitas vezes queria ser no off ! [...]
aproveitem galera . porque um dia a gente vai cresce e querendo ou não ,
a magia fake acaba e gente delata ! pra muitos isso vai ser o passatempo
da adolescência , coisa boba e sem sentido . pra outros vai ser a
lembrança de um refúgio quando o off tava triste e queria botar um
sorriso no rosto . quando a vida na casa off tava um cú e no fake tudo as
mil maravilhas . aproveita pra mexer aqui . aproveita enquanto a gente
77
No ambiente do SL circulou uma “moeda virtual” – o linden – que poderia ser convertida e trocada por moeda “real” (ou
presencial). No auge da sua utilização - por volta de 2006 – algumas atividades virtuais exercidas pelos internautas no SL
foram remuneradas nessa moeda.
78
Algumas modalidades de uso da WEB são relativamente breves: ao surgir atraem um grande número de usuários – como
os fakes e mesmo o Second Life – e após um período variável, mas relativamente breve, caem no esquecimento dos
usuários.
79
No jargão do Orkut, o “off” era o autor do “fake”, ou seja o personagem presencial (real) que o criou.
125
tem 11 , 12 , ou 13 anos e ainda tem tempo livre pra mexer aqui.
aproveita porque no futuro , isso não vai passar de uma brincadeirinha
de infância . é difícil aceitar isso , mas todo mundo sabe que isso vai
acontecer ! beijem , namorem , pulem , dancem , bebam e fiquem
bêbados...aproveitem o fake até não poder mais...
80
No conteúdo da mensagem facilmente se identifica o destaque com o qual são
expostas questões típicas da pré-adolescência do off, expressas pelo seu fake: a começar
pela possibilidade do mergulho deliberado e passional no universo da fantasia,
experimentando “ser”, no virtual, tudo o que supostamente deseja ser (“paixão por esse
mundo que todo mundo pode ser o que quiser, rico, com uma mansão perfeita e baladeiro
de plantão, ou lésbica ou gay, ou sei lá, cada um aqui, é o que muitas vezes queria ser no
off”); os conflitos vividos nas relações com os pais (“que atire a primeira pedra um só off
que nunca mentiu pra mãe ou pro pai pra poder mexer no fake, mesmo de castigo ou em
semana de prova”); ou ainda expressando a relativa consciência de estar passando por
uma época transitória da vida (“aproveita enquanto a gente tem 11 , 12 , ou 13 anos e
ainda tem tempo livre pra mexer aqui”). O fake - enquanto durou sua popularidade -
exerceu a função de uma via de expressão (na forma apenas de catarse ou eventual
elaboração) das ansiedades típicas dessa etapa do desenvolvimento do seu off: questões
sobre como lidar com a autoridade paterna (e/ou materna); questões de identidade e
gênero; autoestima e autoafirmação; busca de reconhecimento grupal e social, etc.
Existem contextos nos quais a criação de personagens virtuais é deliberadamente
oculta, podendo seus protagonistas se valerem dessa identidade para diversos fins. O
internauta poderá utilizar esse meio para realizar fantasias relativamente inócuas,
identificando-se como alguém do sexo oposto ao seu sexo biológico em uma sala de chat,
visando apenas observar as reações dos demais frente a essa sua “persona virtual” e
assim explorar aspectos inconscientes da sua anima (ou animus). No entanto, por esse
caminho podem se configurar situações ambíguas, nas quais o falseamento da verdadeira
identidade presencial do internauta pode gerar situações constrangedoras ou francamente
conflituosas, especialmente para os demais internautas involuntariamente envolvidos nas
relações estabelecidas por essas vias, conforme atestam os próximos casos.
O primeiro tem especial interesse para os profissionais da Psicologia: duas amigas
foram, durante algum tempo, clientes de uma mesma terapeuta. Uma delas finalizou o
processo e deixou de manter contato com a psicóloga, em função de uma mudança de
cidade. Aquela que continuou em atendimento criou uma conta de e-mail falsa, em nome
80
Depoimento publicado no Orkut e divulgado via e-mail por um outro adolescente em dezembro de 2008. Quando
tentamos recuperar a URL, sua autora já havia “deletado” (retirado do ar) o seu fake. Na reprodução foi mantida a
ortografia, bem como as demais características originais da sua redação.
126
da primeira, e passou a se comunicar com a terapeuta fazendo-se passar pela amiga
distante. Após algum tempo, colhida pela armadilha que criou para si mesma, entrou em
contato com o serviço de orientação psicológica via e-mail, relatando a situação de
conflito na qual se envolvera, pedindo ajuda, pois não estava mais conseguindo tolerar a
situação transferencial inusitada. Segundo ela, tudo começara como uma espécie de
“brincadeira”, mas, agora buscava ajuda por não mais “dar conta” do conflito moral
acarretado pela situação: não conseguia pôr às claras seu ato (perante a terapeuta e sua
amiga), nem conseguia encontrar uma forma tolerável de simplesmente encerrar a
situação.
Há um caso que merece exposição detalhada: uma jovem mulher – cujo nome
será Ana - que se envolveu em situação inusitada. Segundo suas palavras, Ana procurou
ajuda psicológica via Internet por não estar sabendo lidar com a situação de “sentir
ciúmes de si mesma”. Serão mantidas algumas frases literais utilizadas por Ana ao
descrever seu impasse. Descreve-se como casada há cerca de quinze anos, mãe de uma
criança de nove anos. Sem atividades profissionais, passa a maior parte do tempo em
casa em companhia da criança e da empregada, ocupando-se com artesanato. Ama seu
marido e afirma que ele também declara amá-la, ainda que as discussões sejam
frequentes na vida do casal. Apesar de sua vida relativamente equilibrada, sentia que
“faltava algo”, até o casal adquirir um computador, e ela descobrir as salas de chat,
atividade com a qual se encantou. Passou a “viver para o chat”. Encontrou pessoas com
quem conversar, e das quais recebia atenção. Porém, ao contrário do que se poderia
supor, não foi o envolvimento com um internauta desconhecido a causa dos conflitos. Ana
criou uma personagem virtual e um novo e-mail, e começou a se corresponder com seu
marido, disposta a seduzi-lo.
Ana relata que de início ele resistiu, argumentando ser fiel à esposa, mas não foi
tão difícil convencê-lo a viver a aventura extraconjugal, pois “o conhecia bem”, e só lhe
dizia coisas que o agradavam. O processo de sedução foi longo, e Ana, persistente.
Trocaram mensagens apaixonadas e Ana chegou a enviar ao marido uma foto (uma
imagem colhida na Net). Disfarçando a voz, chegou a conversar com ele ao telefone antes
de conseguir marcar um encontro presencial. Durante aproximadamente três meses, em
casa Ana observava o comportamento do marido e o percebia diferente: “Feliz como
quem está apaixonado”. Ela também afirma que se sentia apaixonada pelo novo homem
com quem estaria se correspondendo. Por fim, marcado o encontro presencial, Ana
compareceu usando disfarce. Mas, ao chegar, revelou a identidade ao marido, que
rapidamente também a reconheceu. Segundo ela foi um momento “dramático”, no qual
127
ambos se sentiram traídos, mas conseguiram se reconciliar e continuar a relação, agora
fortalecida do ponto de vista sexual.
É a partir deste ponto que Ana fala da sua insatisfação: se percebe hoje mais
apaixonada do que antes, embora “ele tenha voltado a ser o seu marido de sempre”, meio
distante, e não mais “o homem carinhoso que ela conheceu via WEB”. Ana agora sente
ciúmes da personagem que criou e que “conquistou o coração de seu marido”, pois com a
personagem ele “era o homem que ela desejava para ser seu parceiro”. Chega a dizer
que pensou em tornar-se a “outra”, mas agora isso seria impossível, pois o fato de ter lhe
enviado a foto de uma pessoa torna inviável a realização dessa fantasia.
A história vivida por Ana fornece algumas pistas para a compreensão da dinâmica
das identidades virtuais, ao menos parcialmente. Não se sabe exatamente que aspectos
da sua personalidade – até então ocultos ou não integrados à persona presencial – foram
expressos pela personagem virtual. Mas Ana parece ter entrado em contato com aspectos
da sua feminilidade aparentemente bastante atraentes para seu marido e, portanto,
provavelmente teria bons motivos para integrá-los à sua realidade presencial, fato que
não parece ter ocorrido. Conforme antecipado, é possível que certas condições
experimentadas no ciberespaço propiciem aos internautas a vivência de estados
relativamente alterados de consciência, facilitadores da expressão de conteúdos
inconscientes: tanto em relação a aspectos tidos como negativos, quanto os positivos,
mas não reconhecidos como próprio, pelo ego. Mas se, ao voltar à rotina da realidade
presencial essas características não forem assimiladas e integradas ao ego, o internauta
volta a agir dentro dos seus padrões habituais.
As variações dos comportamentos propiciadores da expressão de conteúdos até
então inconscientes, são proporcionais às inúmeras possibilidades de utilização da WEB.
Assim, existem muitas alternativas de uso do contato virtual para o estabelecimento de
relacionamentos que, por alguma razão, não se sustentariam à luz da consciência.
Em outro caso atendido pelo NPPI uma mulher buscou ajuda psicológica via
Internet após envolver-se na seguinte situação: recém-separada do marido, começou a
participar de um site voltado a encontros amorosos. Conheceu alguém que se apresentou
como sendo um homem jovem, mais novo do que ela, residente em cidade diferente da
sua. O relacionamento cresceu em intensidade e envolvimento emocional, até o momento
em que surgiu a chance de um primeiro encontro presencial do casal. Só então o suposto
rapaz revelou sua verdadeira identidade feminina. A protagonista viu-se extremamente
128
perturbada e confusa diante da ambiguidade de seus sentimentos. Por um lado percebia-
se fortemente vinculada a essa parceria amorosa, mas encontrava dificuldade em integrar
essa relação à estrutura da sua vida presencial, em especial ao convívio dos filhos ainda
menores. Dizia temer, inclusive, as possíveis repercussões desse envolvimento sobre as
providências judiciais de seu divórcio, em andamento na época.
Os relacionamentos afetivo/sexuais podem ser iniciados pela participação dos
internautas nas comunidades virtuais (como Orkut), além dos sites especificamente
voltados aos encontros amorosos. Cabe lembrar que, evidentemente, nem todos os
encontros amorosos iniciados no ambiente virtual seguem os trajetos exemplificados. Já
são numerosos os relatos de casais que se conheceram no virtual para, a partir do
primeiro contato, passar a cultivar relações afetivas bem-sucedidas quando avaliadas
pelos padrões e normas de conduta dos namoros e uniões da vida presencial.
5.3.3 Prática do cyberbullyng
Cyberbullying ou Bullying virtual é termo de origem inglesa utilizado para descrever
atos de violência física ou psicológica, intencionais e repetidos, praticados por um
indivíduo – bully, o valentão -, ou grupo de indivíduos, com o objetivo de intimidar ou
agredir uma ou mais pessoas, incapazes de se defender. Na sua forma virtual consiste no
envio de mensagens de caráter agressivo ou difamatório, individual ou coletivamente,
visando claramente caluniar ou agredir uma pessoa ou grupo em particular.
Nesse comportamento observa-se a migração da antiga e popular fofoca para o
ambiente virtual. O fenômeno aparentemente trivial e inofensivo foi abordado em detalhes
por Gaiarsa em seu Tratado geral sobre a fofoca (GAIARSA,1978). O autor aponta os
aspectos destrutivos e sombrios implícitos na atuação do “fofoqueiro”, seus efeitos muitas
vezes lesivos para o desenvolvimento da personalidade dos indivíduos alvos dos ataques,
bem como sobre a psicodinâmica de grupais e psicossociais. Conforme mostram os
próximos exemplos, processo semelhante ocorre no cyberbullying, embora tenham se
sofisticado os meios utilizados para a efetivação da maledicência. O fato novo, no caso da
fofoca virtual, é a ampliação das repercussões, potencializada pela Internet, podendo
agora gerar reações dramáticas em suas vítimas mais frágeis, ingênuas ou desavisadas.
O primeiro caso ocorreu com uma menina de onze anos que tinha por hábito
partilhar sua senha do MSN com as colegas, como prova de confiança e intimidade. Ela
129
teve sua identidade virtual assumida por outra garota (que acessou o MSN como se fosse
ela) revelando segredos de uma terceira amiga, colocando a primeira em uma posição de
traição. Indo além, a mesma colega revelou, ao menino de quem a primeira “gostava”, os
seus sentimentos, mas expressando-se de forma vulgar. A menina em questão, sentindo-
se exposta e desesperada, atuou seu sentimento de vulnerabilidade e exposição
ingerindo grande quantidade de bebida alcoólica do bar doméstico dos pais. Em seguida
saiu pela rua, a pé, e em local ainda próximo de sua casa passou mal, sendo socorrida
quase em coma por um transeunte.
Em outro caso, um menino de catorze anos, com raiva de outro aluno de sua
turma, usou a senha do colega para adulterar seu perfil do Orkut, “declarando-se”
homossexual. E ainda divulgou on-line o número do celular do colega, inscrevendo-o em
comunidades homossexuais. O menino alvo desse procedimento entrou em pânico diante
das repercussões da ação do seu colega. Por outro lado, o autor desta “façanha” alegou,
como explicação do seu ato, que estaria apenas “brincando com o colega”.
Esses comportamentos geralmente ocorrem em comunidades virtuais ou sites de
relacionamento – como Orkut ou My Space. As ofensas ou agressões tornam-se públicas
dentro da comunidade, com a possibilidade de atingir a rede de contatos da vida
presencial da pessoa atingida. Como exemplo, há o caso de uma universitária do interior
de São Paulo, que teve fotos divulgadas em sites, mantendo supostas relações sexuais
com vários rapazes da sua classe, durante festa da turma. O evento – forjado, segundo a
moça envolvida - foi amplamente divulgado na imprensa local, gerando comoção na
cidade e polêmica generalizada na vida da família e da universidade.
Em formas levemente variadas, as ações acima colocam em evidência um tipo de
atuação que não é novo: a chamada “maldade juvenil”, conhecida dos pais e educadores,
mas geralmente minimizada em nossa cultura, talvez em função de certa idealização
ainda reinante na concepção a respeito das fases mais precoces do desenvolvimento
humano. A maledicência, a inveja e ciúme não são atitudes exclusivas dos adultos. Os
mais jovens também são suscetíveis e, quando reprimidas, chegam a gerar atuações
destrutivas dirigidas aos pares. Mas, quando esses comportamentos ocorrem no virtual
seus efeitos são potencializados e ampliados, provocando intensa comoção nos
personagens envolvidos. Por vezes, até mesmo sobre seus próprios autores, como foi o
caso do menino que declarou pretender apenas “brincar” com seu colega de classe. É
possível que, conscientemente, fosse apenas essa a intenção.
130
No caso da fofoca virtual praticada por adultos, é provável que exista maior
consciência do autor sobre suas reais motivações. No entanto, é provável que se
suponham impunes, e acreditem que a autoria da ação não possa ser identificada no
ciberespaço. Esse é um dos mitos desmentidos a respeito dos envios virtuais. Conforme
mencionado, existem meios técnicos para o rastreamento do trajeto das mensagens,
possibilitando a identificação e a localização da máquina da qual foram emitidas. A partir
desse ponto, a identificação do autor torna-se passível de investigação policial e ação
judicial, como qualquer outro ato lesivo a terceiros, do ponto de vista moral ou material.
5.3.4 Invasão de privacidade
Pelas vias da Internet a intimidade dos internautas pode se tornar pública, por
meio da divulgação de informações não autorizadas, ou pela coleta, difusão e distorção
dos dados por eles mesmos colocados, ingênua ou inadvertidamente em sites de
relacionamentos ou comércio eletrônico. Essa forma de obtenção e publicação de
informação frequentemente se transforma em violação da privacidade.
Como ocorre na maioria das condutas descritas, aqui também há várias nuances
ou graus de repercussão e consequências a partir da exposição da intimidade dos
internautas: da utilização das informações coletadas sobre os hábitos de consumo,
visando ao posterior envio de mensagens contendo ofertas de produtos, até casos em
que a intimidade dos relacionamentos virtuais - supostamente secretos - é exposta de
formas variadas.
Uma jovem de vinte e quatro anos, depois de formada, foi cursar pós-graduação
no exterior. Do país distante enviou e-mail para a ex-terapeuta contando as angústias a
respeito de novas experiências sexuais que vivenciava, apesar de ter deixado o namorado
no Brasil. Comentou também sobre a continuidade do uso de maconha, de como havia
experimentado outra droga e o que sentira nessa experiência. Sua mãe, que havia
descoberto sua senha, estabeleceu o hábito de ler as mensagens enviadas pela filha a
outras pessoas, e teve acesso à mensagem dirigida à terapeuta. Chocada com as facetas
da vida de filha – até então desconhecidas - entrou em pânico: promoveu um grande
escândalo, expondo a intimidade da jovem perante a família e amigos. Ao cair em si, a
mãe entrou em depressão e precisou recorrer a atendimento psicológico acompanhado de
medicação psiquiátrica.
131
Situação quase rotineira surgida com a popularização da Internet (e dos
relacionamentos virtuais) é o desvelamento das práticas sexuais tidas como secretas,
para um dos parceiros de um casal, como mostra este exemplo: uma jovem esposa,
aparentemente bem casada, com filhos ainda crianças, moradora de uma cidade
pequena, resolveu pesquisar as atividades virtuais de seu marido internauta. Na pesquisa
identificou a foto do seu “corpo” em uma comunidade homossexual do Orkut. Abrindo a
questão com o parceiro, ele admitiu ter mantido essas atividades, chegando a vivenciar
contatos sexuais presenciais com homens, mas alegou ter sido motivado apenas por
curiosidade. A descoberta dessa face do companheiro gerou grande insegurança,
especialmente sobre o futuro de seu casamento, e na forma como passou a encarar a
sexualidade vivida pelo casal. Desorientada e aflita, buscou ajuda do serviço de
atendimento psicológico.
Nessa situação observa-se, simultaneamente, a expressão de conteúdos (ou
“intenções”) pouco conscientes, por parte dos dois parceiros: verifica-se, de maneira
simétrica, de um lado, a infidelidade vivida de forma supostamente secreta, e a atitude de
desconfiança assumida pela esposa, ao procurar investigar as atividades por ele
exercidas na Internet. Seu ato de acessar (de forma dissimulada) o perfil do marido no
Orkut provavelmente envolveu algum grau de suspeita, a ponto de invadir desse modo a
privacidade do parceiro.
Nas expressões virtuais, a infidelidade conjugal é revelada por novos indícios. Não
mais a tradicional marca de batom, mas suas versões informatizadas, como mensagens
de correio eletrônico, perfis mantidos em sites de relacionamento, ou ainda registros de
acesso a conteúdos pornográficos. Indícios intencionalmente investigados pelo parceiro
traído, ou vistos “acidentalmente”, quando o parceiro infiel “esquece”, aberta, a tela do
computador doméstico. Nesses casos, novamente surge a hipótese da atuação do
inconsciente do casal, trazendo à tona elementos que provavelmente rondavam a
dinâmica da relação, à espera apenas da oportunidade para se expressar. Cabe a
formulação da seguinte questão: nessas situações, estaremos lidando com novas e
perversas dinâmicas, geradas pela Internet - como apregoam veementemente alguns dos
críticos da vida virtual - ou apenas com novas vias de expressão de antigos conflitos
humanos? Parece-nos bem mais plausível a segunda opção.
Em alguns casos de infidelidade virtual desvendada, o acesso ao conteúdo
supostamente secreto é praticamente facilitado (ou viabilizado, ainda que
inconscientemente) pelo seu protagonista. O fato faz pensar em certo grau de desejo (ou
132
mesmo necessidade, mesmo não consciente) do seu autor em ter sua atitude revelada.
Em caso positivo, qual seria a possível função da revelação, tendo em mente a dinâmica
conjugal? Para Jung: “Qualquer segredo pessoal atua como pecado ou culpa,
independentemente de ser considerado assim ou não, do ponto de vista da moral
convencional” (JUNG, 1985, § 129). Supõe-se que uma possível função do desvelamento,
por parte do parceiro infiel perante seu cônjuge, seja atender à sua necessidade íntima de
confissão, ou busca de alívio da culpa, ainda que a ação se expresse inconscientemente.
Sobre o segredo, Hillman (1993) oferece algumas luzes ao entendimento dessa
fugidia nuance da alma humana. Para Hillman, “o sigilo é básico para a individualidade”
(HILLMAN, 1993, p. 197), pois é necessária essa condição de “separação” em relação
aos demais para se descobrir a alma individual. No entanto, Hillman fala também a
respeito dos “segredos indevidos”, ou seja, aqueles que “isolam e envenenam”:
Segredos indevidos e aqueles guardados erroneamente nos isolam e
agem como veneno a partir de dentro, de modo que a confissão é
catártica e a comunicação terapêutica. A exigência paranóide de lealdade
absoluta, aquele medo de traição e exposição, demonstram que não
somos mais capazes de amar e ser feridos. O amor existe quando a
traição é possível: caso contrário, não há risco. Amar em segurança é a
parte menor do amor. (HILLMAN, 1993, p. 197)
Entre outras possíveis interpretações, vista por esse ângulo paradoxal, a
infidelidade revelada talvez seja entendida como expressão da necessidade - consciente
ou inconsciente - do parceiro infiel de realizar uma espécie de “prova” ou teste da
resistência da vinculação afetiva existente por parte do seu par.
De toda forma, a violação da privacidade por esses meios gera efeitos
perturbadores, de forma simétrica, para ambos os parceiros envolvidos, e pode repercutir
de maneira impactante tanto para a pessoa investigada quanto para o seu invasor.
Impactos desse gênero atingem não apenas a vida dos casais, em função de infidelidades
postas à luz, mas alcançam grupos mais amplos, conforme ilustram os casos relatados.
133
5.3.5 Usos compulsivos ou excêntricos dos acessos à Internet
Os vários usos compulsivos ou excêntricos da tecnologia são o tema que maior
atenção tem despertado por parte dos pesquisadores das interfaces Psicologia /
Informática, em especial dos psicólogos e psiquiatras. Mesmo assim, se carece de dados
estatísticos confiáveis sobre o perfil dos usuários, modalidades de uso, danos
eventualmente causados etc., especialmente no que se refere aos usuários brasileiros. As
pesquisas internacionais permitem estimar que cerca de 10% dos internautas se
enquadram em alguma das modalidades, ainda que por um período transitório, em geral
nas fases iniciais do seu contato com a WEB - em torno do seu primeiro ano como usuário
da Internet. Essa observação permite admitir que uma parcela dos usuários passa por
uma fase inicial de encantamento e certo fascínio diante dos recursos, para em seguida
se adaptar a formas mais controladas e funcionais de uso da tecnologia. Contudo, há a
possibilidade de se ficar refém dessa condição inicial, apresentando, por um tempo mais
prolongado, as dificuldades que serão descritas.
Existe uma ampla variedade de comportamentos compulsivos, expressos em
diversos usos da Internet: os que a mídia denomina de modo genérico como “vícios em
computadores”, até as variantes de comportamentos compulsivos presenciais, agora
manifestos em suas versões on-line como, por exemplo, a participação intensa em jogos
(geralmente jogos “em rede”, chamados games on-line). Ou a participação compulsiva em
salas de bate-papo, que chega a levar seus adeptos a negligenciar as atividades sociais,
afetivas e profissionais, e mesmo à verificação quase constante da chegada de e-mails.
Critérios já foram definidos pelos pesquisadores dedicados ao tema, para
caracterizar os usos por demais intensos da Internet como “compulsões”, “dependências”
“adições” ou, no mínimo, merecedores de atenção profissional, e discriminá-los dos usos
considerados saudáveis. Fortim (2004, p. 165) apresenta uma relação de sinais ou
sintomas indicadores dessas condições:
1. Preocupação constante com a Internet quando estão off line.
2. Necessidade contínua e crescente de utilizar a Internet como forma de
obter a excitação desejada.
3. Irritabilidade e dificuldade quando tentam reduzir o tempo na Internet.
4. Utilização da Internet como forma de fugir de problemas, ou de aliviar
sentimentos de impotência, culpa, ansiedade ou depressão.
5. Hábito de mentir para familiares e pessoas próximas, com o intuito de
encobrir a extensão do seu envolvimento com as atividades on line.
6. Comprometimento social e profissional (redução dos contatos e / ou
produtividade profissional ou escolar).
134
7. Comprometimento nas articulações motoras utilizadas na digitação
(LER
- Lesões por Esforços Repetitivos).
8. Falta de interesse em atividades fora da Internet.
9. Sensação de estar vivendo um sonho, durante um período prolongado
na Internet.
10. Tempo exagerado de conexão, observado e explicitado por outras
pessoas.
11. Conversas exclusivas sobre assuntos relacionados com a Internet.
12. Comprometimento na qualidade do uso. Exemplo: o uso é do tipo
repetitivo, pouco criativo.
Destacam-se certas observações, em relação a esses usuários, ainda que em
caráter preliminar. O procedimento adotado no Serviço de Orientação dirigido a pessoas
que apresentam essas dificuldades, pelo NPPI
81
, forneceu a chance da seguinte
constatação: de modo geral, quem busca ajuda, de início refere queixa relativa ao “vício”
ou uso compulsivo da máquina (presumido ou efetivo). Porém, no prosseguimento do
contato estabelecido na orientação oferecida, verifica-se que essas pessoas geralmente
apresentam diversas dificuldades em distintas áreas da vida, paralelamente ao problema
que motiva a busca de orientação: da condição de timidez ou solidão, passando pelo
estado de depressão em variados graus, até dificuldades referentes a relacionamentos
interpessoais, autoaceitação, autoimagem ou autoestima, integração social, familiar ou
profissional etc. Essa observação leva a considerar a hipótese de que os usos
compulsivos ou excêntricos das máquinas configuram uma sintomatologia expressiva da
defesa ou fuga – ou ao menos de um evitamento temporário – da tomada de consciência
desses conflitos ou dificuldades presentes em suas vidas
82
.
Em meio a essas condições, a WEB – e suas alternativas - surge para essas
pessoas como uma espécie de refúgio aconchegante, no qual as dificuldades da vidas
presencial são minimizadas, ou mesmo parecem sanadas, ao menos temporariamente: o
adolescente tímido torna-se o garoto mais popular do MSN; o executivo estressado age
como jovem inconsequente, participando, noite adentro, de game violento; a dona de casa
entediada passa horas emocionantes, entretida com o amante virtual etc. Acrescente-se
ao cardápio a possibilidade da adoção de uma identidade virtual – com frequência
compensatória à realidade presencial – protegida pelo anonimato, e entende-se em boa
medida fatores que levam essas pessoas a apresentar sérias resistências em se
perceberem como necessitadas de ajuda. Ou seja, a condição da vida virtual
81
Referimo-nos à modalidade de Orientação Psicológica via e-mail, dirigida aos usuários compulsivos de computadores e
Internet, oferecida pelo NPPI a partir de julho de 2006. (ESCALEIRA, F. G., DUPRAT, M., ZACHARIAS, J. e NOLF, A.,
2008)
82
Esta é, até o momento, a hipótese orientadora do trabalho da equipe do NPPI, elaborada com base na observação dos
casos atendidos até o momento no Serviço de Orientação oferecido no setor. Projetos de pesquisa estão em andamento, e
novos dados poderão eventualmente ser acrescidos às conclusões do grupo.
135
experimentada é considerada prazerosa e gratificante. Segundo relato de Fortim,
(FORTIM, 2004, p. 167)
De modo geral, o dependente de Internet parece ter dificuldade em
reconhecer-se como alguém que vive um problema. Dentro desta
condição, o possível dependente aparentemente não padece de sintomas
tão dramáticos quanto, por exemplo, os de um dependente químico. Com
maior frequência, quem nos procura são as pessoas relacionadas aos
dependentes, preocupados que estão com algum familiar, amigo ou
colega, a quem vêem como necessitado de ajuda.
A condição descrita acima é uma das razões pelas quais essas pessoas têm
grande dificuldade em “chegar” a um atendimento psicológico. De modo geral esse
quadro só se altera quando as repercussões começam a afetar seriamente as relações ou
atividades centrais da vida presencial do internauta: rendimento escolar, desempenho
profissional, relações afetivas ou conjugais. E ainda assim, quando os efeitos começam a
se tornar evidentes, o constrangimento muitas vezes causado pelo comportamento em
pauta pode se tornar outro fator que dificulta sua busca de ajuda. Exemplos são as
modalidades de usos compulsivos ou excêntricos da Internet que envolvem a prática do
sexo virtual. Muito frequentes, são formas de compulsão geradoras de intensa polêmica e
repercussão na mídia - e na reação da população -, alimentando em boa medida o
arsenal de argumentos dos críticos da WEB em seus ataques às experiências vividas na
virtualidade.
Com relação à proliferação de vivências eróticas no ciberespaço, Cliff Bostock
(1997-1998) apresenta uma importante contribuição, por tornar viável uma reflexão
amplificada sobre o tema. Conforme seu relato, ainda como usuário comum da Internet,
Bostock teve a atenção despertada pela profusão de imagens eróticas presentes na WEB,
e o fascínio mobilizado sobre os internautas. Partindo dessa observação, estabeleceu
correlações entre tais imagens com significado erótico e sua ressonância com elementos
de antigos cultos de mistérios gregos, em especial o procedimento ritualístico denominado
Deiknymena. Uma breve digressão visa elucidar este termo, tomando como referência o
artigo de Nikasios (2003) no qual discorre sobre os mistérios de Eleusis:
Mysteriotides Nychtes: a noite dos mistérios. Reencenava-se o mito de
Demeter e Perséfone em três estágios: o das Coisas Ditas (legomena),
Coisas Feitas (dromena), e Coisas Reveladas (deiknymena). [...] O efeito
dos Mistérios no iniciado é profundamente transformador, representando
a esperança da vida renovada, a coragem em enfrentar as sombras e o
medo da morte, e a confiança no eterno ciclo das reencarnações
(NIKASIOS, 2003, acesso em 28/09/08).
136
Bostock assinala e destaca o fato dos procedimentos ritualísticos de cultos antigos
também conterem muitos elementos eróticos. As “coisas mostradas” (deiknymena =
reveladas) consistiriam de uma profusão de imagens eróticas, de caráter ritualístico
(BOSTOCK, 1997-1998, acesso em: 17/07/08):
Então, nós podemos concluir que o poder dos mistérios mantinha uma
ligação com a apresentação das imagens eróticas. Havia um sentido no
ato de vivenciar o fator erótico do corpo e depois dar-se um passo atrás,
para observá-lo como uma imagem. Algo é capturado além do sexual
através da sua abstração.
Em suas observações Bostock assinala as semelhanças verificadas entre os
procedimentos destes cultos antigos e as formas com as quais os internautas lidam com
as imagens eróticas presentes na Internet. Como semelhança mais evidente, o autor
assinala a manutenção do “segredo” presente na conduta das pessoas envolvidas nos
rituais iniciáticos e na modalidade de navegação na Net, isto é, nas duas situações as
pessoas mantêm ocultas suas identidades, usando nomes fictícios ou criando
personagens para participar nos respectivos eventos. Outra semelhança, em sua
avaliação, é a profusão de imagens eróticas - e mesmo pornográficas - nos dois casos.
Bostock (1997-1998) menciona ainda o fato de o sexo servir a funções além dos
propósitos procriativos e hedonistas, prestando-se (ou se propondo ser) uma via de
transformação da identidade:
Quando ligamos o monitor, abrimos nossos olhos para um trabalho de
imagens deikynema. Nos tempos de mistérios, essas imagens – de
acordo com o pouco que conhecemos – causaram uma transformação de
experiência através do “mostrado”. Não podemos presumir que um
“absoluto” foi capturado. No máximo podemos presumir que houve uma
penetração individual das imagens arquetípicas, da forma com que
James Hillman descreve as propriedades de cura das imagens
(BOSTOCK, 1997-1998, acesso em 17/07/08).
O autor cita que no contexto helenístico e no ciberespaço, o mundo em que
ocorrem esses eventos é um mundo paradoxalmente encolhido e expandido, de forma
simultânea: as pessoas que se encontram para os dois eventos não teriam como
promover tais contatos por outras vias; ao mesmo tempo, a exposição ao material ali
ofertado aumenta e amplia o universo da experiência e imaginação.
Outra semelhança: as pessoas participantes podem estar submetidas a uma
espécie de fascínio, no qual pode ocorrer uma alteração da vivência do tempo, pois,
navegando na Internet pode-se passar horas, sem se dar conta da duração efetiva do
tempo despendido. Fenômeno semelhante é relatado nos cultos dos mistérios, nos quais
137
o participante é tomado pela experiência e pelo deus cultuado. Como consideração final,
Bostock (1997-1998) alerta sobre a possibilidade da constelação da sombra coletiva em
decorrência natural das manifestações da “mente coletiva” no ciberespaço:
Se a mente coletiva
83
trabalhando no ciberespaço nos dá a possibilidade
da concepção auto-reflexiva da alma na matéria (incluindo a tecnologia),
um mundo re-encantado por Eros, a sua sombra pode exigir o sacrifício
dos genitais e o completo sacrifício do Self, como os mártires cristãos.
Será que a prova mais assustadora do caráter auto-reflexivo do
ciberespaço até agora foi a sua expressão de sombra? O culto Heaven’s
Gate
84
anunciou abertamente o seu suicídio, planejado em seu site
semanas antes de ter acontecido. É um reverso completo, como qualquer
outra expressão de sombra do inconsciente: um bilhete de suicídio
deixado para ser lido antes de acontecer. Talvez ninguém tenha se
alarmado porque estava realmente no inconsciente de um novo
organismo psicológico. (BOSTOCK, 1997-1998, acesso em 17/07/08)
Outra modalidade de uso compulsivo muito presente e numerosa na WEB é a
participação nos games on-line. Geradora de compreensível preocupação em pais e
educadores, essa forma de lazer oferecida pela Internet é sedutora, especialmente para
os mais jovens. Mas há entre os adeptos pessoas de todas as idades, níveis
sócioeconômicos, sexo, grau de instrução etc. Uma das características polêmicas dessa
atividade virtual está relacionada com o componente de violência, presente em boa parte
dos games preferidos pelos adolescentes. Novamente percebem-se as possíveis
manifestações de aspectos reprimidos da personalidade presencial dos seus
participantes: o garoto franzino, intimidado na escola pelos colegas, se torna, no game, o
“matador invencível”; o funcionário estressado e pressionado pelo chefe na atividade
profissional burocrática assume no jogo a identidade de um policial, tido como justiceiro
implacável. Contudo, cabe lembrar os diversos outros usos e aplicação dos games
voltados à educação e treinamento, em diversas áreas profissionais, especialmente
quando associados aos recursos da realidade virtual.
Ao descrever neste capítulo o painel de conflitos humanos expressos nos domínios
do ciberespaço, há o risco de estimular as reservas existentes nos meios “psi” diante da
WEB, em função do destaque dado aos os perigos - em certa medida reais - presentes na
Internet. No entanto, não é essa a intenção. Ao contrário, parte-se da premissa de que
83
Bostock não chega a definir o conceito de “mente coletiva”, nem o que entende por “caráter auto-reflexivo do ciberespaço”,
mencionados no parágrafo citado. No entanto, a forma com que os termos são mencionados remete às ideias de P. Levy
sobre a “inteligência coletiva”, e sua proposição da “ecologia cognitiva” (LEVY, 2006 e 2007). Em Levy, os conceitos estão na
base das novas formas de construção do conhecimento em curso no ciberespaço e serão retomados em próximo capítulo.
84
Heaven's Gate (Entrada para o Céu): seita Americana liderada por Marshall Applewhite e Bonnie Nettles. O fim da seita
coincidiu com a aparição do cometa Hale-Bopp em 1997. Applewhite convenceu 38 discípulos a cometerem o suícidio para
que as suas almas fossem levadas numa nave espacial que eles acreditavam existir, escondida atrás do cometa e na qual
estaria Jesus. Fonte: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Heaven%27s_Gate_%28seita%29> Acessado em 01/08/08.
138
somente se avaliará e compreenderá adequadamente os canais virtuais de expressão e
interação na medida em que se tornem familiares, os meandros e sutilezas da sua
utilização. Além disso, espera-se que os relatos mostrem, suficientemente, o quanto os
opostos da sombra / luz se alternam e se mesclam nas vivências descritas, como ocorre
em todo e qualquer espaço de integração e desenvolvimento humano.
Cabe relembrar não ser função da Psicologia a realização de julgamentos morais a
respeito dos comportamentos expressivos dos conflitos humanos, mas procurar
compreendê-los à luz de visão abrangente. E, sempre que possível, contextualizá-los e
inseri-lo em referenciais que considerem não apenas a sua adequação, mas buscando
elucidar seus possíveis significados amplificados. Ainda que, por vezes, a busca dessa
compreensão represente um desafio à personalidade do pesquisador, pois exige dele um
grau de imparcialidade nem sempre fácil de ser atingido, como é o caso dos
comportamentos nos quais os aspectos conflituosos ou sombrios se fazem presentes em
formas explícitas e radicais.
Diante da constatação do amplo leque de experiências vividas pelas vias virtuais -
às vezes apenas curiosas ou exóticas, outras chocantes para o julgamento do senso
comum, ou mesmo atravessando os limites da ética, da moral e/ou da legalidade vigente
em nossa época – abre-se uma questão que não pode ser ignorada pela Psicologia:
ignorar a existência dessas vivências não é resposta adequada ao impacto causado pela
sua manifestação. Do contrário, não haverá respostas a oferecer, por exemplo, à pessoa
que procura atendimento psicológico ao ver-se envolvida em situação desse gênero.
Munidos apenas da perplexidade diante das vivências virtuais, certamente será
restrita a possibilidade do psicólogo de acolher esse cliente, e menor ainda sua habilidade
para atendê-lo e auxiliá-lo na busca de autocompreensão e desenvolvimento. É
importante ressaltar que a demanda ocorre não apenas no contexto clínico, pois as
questões psicológicas derivadas do entrelaçamento das vivências presenciais / virtuais
estão presentes em todos os espaços onde a intervenção do psicólogo é requisitada, ou
seja, ambientes profissionais, educacionais e nas áreas da saúde de forma geral.
No entanto, a presença humana no ciberespaço não se manifesta apenas por meio
das expressões de conflitos descritas, mas também em exuberantes e criativas
possibilidades de ampliação da consciência, construção do conhecimento e partilha do
saber, sendo esse o tema abordado no item 5.5 deste mesmo capítulo.
139
Antes, porém, de observar essa outra face das repercussões da tecnologia digital,
a pesquisa se deterá brevemente em considerações sobre os modos de estruturação da
subjetividade, atualmente verificadas.
140
5.5 Espaço virtual / Espaço potencial: quantos “eus” nos habitam?
O homem contemporâneo é apenas o mais recente fruto
maduro na árvore da raça humana.
(JUNG, in MCGUIRE & HULL, 1982, p. 69)
Novas formas de estruturação da subjetividade têm sido observadas
atualmente, e a reflexão sobre esse tema pode ser ampliada se conduzida em
correlação com a difusão das novas tecnologias digitais. Não se pretende estabelecer
relações causais (“dualistas”) entre os dois processos, mas destacar alguns paralelos
verificados por diferentes autores entre a evolução dos artefatos – criados pelo homem
- e sua própria evolução, adotando uma perspectiva análoga na reflexão sobre o tema
proposto.
Hoje nos referimos à evolução da relação homem
 máquina, no entanto, a
origem dessa relação, a rigor, situa-se em épocas remotas da história, quando mais
exato seria nos referirmos à relação homem
 ferramenta. Cosentino (2006)
elaborou uma síntese sobre as observações apresentadas por vários autores a
respeito do tema: estudos antropológicos situam há cerca de dois milhões de anos o
início do uso das ferramentas líticas para o processamento da carne. O uso desses
instrumentos primordiais, por sua vez, foi fundamental para o processo evolutivo
denominado “hominização”, na medida em que repercutiu sobre as formas de
organização social dos grupamentos humanos então existentes, as complexas
interações sociais entre os membros desses grupos e a transmissão de conhecimento.
Além da cultura, a própria evolução da estrutura fisiopsíquica dos seres humanos foi
codeterminada, ao longo do tempo, pela interação desses fatores:
[...] o crescimento cerebral, a organização social, a transmissão de
conhecimento e a fabricação e uso de ferramentas são alguns
importantes pontos desse processo formando um complexo conjunto
de características que possuem uma relação de influências entre
elas. (COSENTINO, 2006, p. 64)
Outros animais são capazes de usar instrumentos para fins como alcançar
alimentos, porém somente na evolução humana se verificaram estreitas relações de
interdependência entre o uso de artefatos e a sobrevivência como espécie. A partir do
momento em que a evolução cultural e a evolução biológica se entrelaçaram, o ser
141
humano se tornou dependente da tecnologia para sobreviver. Esse processo
impulsionou o “surgimento de formas avançadas de acúmulo e transmissão de
informações e, consequentemente, um avanço extremo da tecnologia”. (COSENTINO,
ibid, 67)
Milênios transcorreram entre as primeiras pinturas rupestres, registradas nas
cavernas por meio de instrumentos criados pelo homem, e o surgimento das atuais
tecnologias. Em largos intervalos contados em séculos ou milênios, ocorreram vários
adventos culturais, como o surgimento e utilização da roda, do fogo (manipulação dos
metais), instrumentos voltados à agricultura, pecuária, imprensa etc. No entanto, mais
recentemente observou-se redução nos intervalos decorridos entre o surgimento das
inovações revolucionárias, sua disseminação cultural e suas repercussões (ou
correlações) para a evolução humana. Essa aceleração acontece de maneira
crescente, tornando-se mais breves os intervalos que até então talvez nos servissem,
coletivamente, como períodos de contato e assimilação gradativa das inovações.
Intensas transformações são assimiladas pela cultura humana em ritmo cada
vez mais rápido, principalmente nos meios urbanos. Um exemplo é a aplicação da
energia elétrica em inúmeros desdobramentos: na indústria, nos transportes, nas
comunicações, na vida doméstica e automação de modo geral. Pouco mais de um
século transcorreu desde o início da utilização efetiva dessa energia.
Em sintonia com a aceleração do ritmo do surgimento das inovações
tecnológicas, a informatização – como conhecida hoje – data de menos de um quarto
de século. No entanto, a difusão das suas aplicações ao cotidiano se evidencia,
alcançando mesmo habitantes de localidades nas quais a distribuição da energia
elétrica ainda não está plenamente estabelecida
85
. Segundo Cosentino: “Atualmente,
a tecnologia (informatizada) media ou interconecta praticamente todas as ações do
cotidiano do ser humano habitante dos grandes centros urbanos” (COSENTINO, 2006,
p. 67). O filósofo da virtualidade Pierre Levy afirma: “... a hominização, o processo de
surgimento do gênero humano, não terminou, mas acelera-se de maneira brutal”
(LEVY, 1994, p. 15). A perspectiva é avaliada pelo autor como promissora (Ibid., p.
15):
85
Em tópico anterior (4.2) relatamos o uso de computadores conectados à Internet feito por tribos de indígenas
brasileiros situadas em regiões fronteiriças do país.
142
Porém, ao contrário do que ocorreu no momento do nascimento da
nossa espécie, ou por ocasião da primeira grande mutação
antropológica (a do neolítico, que viu surgir a pecuária, a agricultura,
a cidade, o Estado e a escrita), temos agora a possibilidade de
pensar coletivamente essa aventura e influenciá-la.
Mas tradicionalmente o novo assusta, fascina e intriga, até se tornar familiar e
se integrar à consciência e à cultura, gerando inevitáveis questionamentos. Refletindo
sobre o computador como instrumento e ferramenta, Novo (2004) propõe a questão:
”O que ocorre primeiro? A ferramenta ou a necessidade da ferramenta?” Ele mesmo
responde:
Cremos que ambos aparecem ao mesmo tempo. Um
desenvolvimento técnico pode tornar acessível um determinado
número de ferramentas e, premido pela necessidade, podemos
construir instrumentos no sentido de atender a uma demanda que os
use. Nessa direção, o humano reúne condições para que graus de
virtualidade e de simbolização possam ocorrer, concebendo
ferramentas segundo seu momento histórico. Essa disponibilidade
mental, na era contemporânea, permitiu a concepção da ferramenta
computador. (NOVO, in FARAH, 2004, p. 87)
O autor apresenta um entendimento sincrônico (no sentido quase junguiano do
termo) a respeito do surgimento da Internet, ao traçar paralelo entre sua criação e o
processo evolutivo por meio do qual o ser humano desenvolveu uma espécie de
“tolerância emocional à virtualidade”, tornando-se capaz de lidar com a matéria não
palpável, e ainda assim, “visível”: “É como se a relação humana, hoje, pudesse
prescindir, por conquistas do processo de simbolização, da concretude da presença.”
(NOVO, in FARAH, 2004, p. 91)
Talvez, a tolerância à virtualidade, ressaltada por Novo, seja a mais recente
manifestação humana observada na Noosfera, a esfera correspondente ao atual ápice
evolutivo descrito por Teilhard de Chardin. Na sua clássica obra - O fenômeno humano
- Teilhard de Chardin (1970) apresenta a Noosfera como sendo a “camada pensante”.
Seguindo as anteriores - Litosfera, Hidrosfera, e Biosfera - a Noosfera corresponde,
para Chardin, à expressão de uma nova fase da evolução humana, iniciada com o
surgimento do pensamento. Hipóteses semelhantes à proposta por Novo foram
formuladas por Longueman, e Levy, ao estabelecerem analogias entre o ciberespaço
e a Noosfera de Chardin. (LONGUEMAN, Acesso em 20/11/08, s/p.) e Levy (LEVY,
2001, p. 125-156).
143
Conforme o tópico anterior a este capítulo, o ciberespaço é utilizado como
campo propício à expressão das novas versões de antigas mazelas humanas. Mas,
pode também ser vivenciado como palco de experimentação de potencialidades
criativas até aqui impensáveis – tema este a ser tratado em um próximo tópico. Diante
das vivências humanas inéditas, expressas na virtualidade pergunta-se: “Quantos ‘eus’
nos habitam, afinal?!”
5.4.1 Ego – origem e desenvolvimento
A busca de resposta se inicia por breve reflexão, retomando aspectos da
concepção junguiana sobre o ego - sua origem e formação – nas primeiras etapas do
desenvolvimento humano, e suas possíveis correlações com o tema central deste
trabalho, de acordo com as visões sobre a subjetividade na pós-modernidade. Para
Jung, o ego:
É um dado complexo, formado primeiramente por uma percepção
geral do nosso corpo existência e, a seguir, pelos registros de nossa
memória. Todos temos uma certa ideia de já termos existido, quer
dizer, de nossa vida em épocas passadas; todos acumulamos uma
longa série de recordações. (JUNG, 1989, § 18)
Segundo Neumann (1991), no início da vida humana não há ego, não há um
sujeito, não há diferenciação entre eu e mundo, entre o eu e a mãe-ambiente-
circundante. A criança, imersa no inconsciente, passa, ao nascer, aos braços de
alguém que se propõe a estabelecer uma interlocução com ela, que se propõe a
contê-la, cuidá-la e ser testemunha de sua vida.
A participacion mystique entre mãe e filho orienta um através do
outro. O filho inconscientemente “lê” o inconsciente da mãe na qual
vive, da mesma forma que - normalmente - a mãe exerce uma função
reguladora ao reagir inconscientemente à conduta inconsciente do
filho. (NEUMANN, 1991, p. 20)
Inicialmente o bebê apenas experimenta ciclos rítmicos de bem-estar / mal-
estar, expressando seu mal estar através do choro, provocando algo que o
apaziguará: a mãe aparece e cuida de suas necessidades. Esse padrão se repete
indefinidamente nos primeiros meses, durante os quais o bebê vai, lentamente,
diferenciando-se do outro, criando um eu. No começo a mãe é, para o bebê, o todo-
circundante, e a relação que o bebê estabelece com ela prefigura a que vai
144
estabelecer com as outras pessoas, com o ambiente, e até como será sua relação
ego-Self, homem-Deus.
À medida que a criança se desenvolve, e a memória implícita dos ciclos de
fome e saciedade se estabelece, torna-se capaz de antecipar o que acontecerá e
aprende a esperar. No início desse processo, sente somente mal-estar e ansiedade.
Quer ou precisa de algo, mas não identifica o quê. Somente quando o seio chega à
sua boca, percebe que era isso o que queria. Segundo Winnicott (1975), quando a
experiência de ser amamentado se repete muitas e muitas vezes - e o padrão de ser
satisfeito em suas necessidades por uma mãe suficientemente boa se estabelece -, a
criança começa a poder esperar, enquanto, por solicitações naturais da vida, a mãe
começa a frustrá-lo em suas expectativas de ser atendido imediatamente. Da
experiência de frustração - no intervalo de tempo entre o desejo e sua gratificação que
ocorre na relação com o cuidador num contexto de segurança básica -, abre-se o que
se chama de espaço mental, espaço de fantasia, espaço de representação. Existe, no
começo da diferenciação entre o eu e o outro, um “lugar” que ainda não é eu nem é o
outro. É interno e externo, pertence a mim, e ao mesmo tempo, ao não eu. É o espaço
potencial, no qual os objetos externos começam a ganhar representação interna.
Ao brincar, a criança institui situações organizadas em termos de
espaço e de tempo. Brincando, ela funda mundos. Ao brincar, ela não
está simplesmente projetando conteúdos psíquicos no jogo, mas está
constituindo mundos e estabelecendo a possibilidade de transformar
a realidade dada por meio do seu gesto. (SAFRA, 2006, p.13)
5.4.2 Espaço virtual / Espaço potencial
No início do desenvolvimento, o ego da criança, ainda em formação, não tem
contornos definidos e nem continuidade. O espaço de formação deste ego é, portanto,
o espaço do brincar, da experimentação de papéis, sentimentos, possibilidades. Trata-
se de um lugar transicional, de ensaio do ser. Nesse espaço, estabelecem-se
relacionamentos “como se” ou “ainda não”, que funcionam como ensaios de
existência. O que está no mundo interno pode se expressar sem ainda coagular no
mundo real, externo, material, que tem suas regras e limites, no qual a potencialidade
do ser adquire forma e substância, permanência e compromisso. O mundo da
realidade é um mundo de atritos limitadores, no qual somos chamados a assumir
algumas formas como nossas, e não outras, e certamente não todas.
145
O espaço do brincar é, para a criança, o lugar do desenvolvimento dos
potenciais, da experimentação de si mesmo em vários papéis, tentando integrar
aspectos, ampliando continuamente o campo da consciência. Brinca-se o mundo
interno e o externo, e brinca-se também as suas inter-relações. Descobre-se, dentro
do espaço potencial - não externo e nem interno - as regras do interno e do externo. O
espaço lúdico é anárquico, e, quando tem regras, é transgressor no sentido da
construção da consciência, ou de sua ampliação.
Mais tarde, quando se estabelece o ego adolescente ou adulto, para onde vai o
espaço de experimentação, de criação, construção e desconstrução do ser humano?
Segundo Safra (2006) ao discutir essas questões, Winnicott (1975) mostrava-se mais
preocupado com o bloqueio do brincar, do que com o conteúdo expresso pela
brincadeira. Entendia que no momento em que o brincar se estanca há adoecimento.
“Pelo fato de que o brincar constitui os modos de ser, os mundos possíveis, o sonho
do futuro, a sustentação do devir humano, ele é em si mesmo terapêutico.”
(WINNICOTT apud SAFRA, 2006, p.16). Não seria o espaço virtual - esse espaço
provido pela Internet – uma alternativa a esse espaço potencial da criança, o espaço
da criação contínua do ser? À frente do computador o internauta está sozinho e, ao
mesmo tempo, “em relação” como em espaço transicional. O “outro” está
suficientemente distanciado para permitir que o eu se expresse com maior liberdade,
de modo mais protegido do que na relação factual que, no contexto deste trabalho
corresponderia à relação denominada “presencial”.
O espaço virtual, ao permitir a experimentação de potencialidades do ser, sem
a pressão das regras morais do campo da consciência - ou com suas regras próprias,
dentro do espaço “como se” - pode substituir o brincar da criança no que esse oferece
de possibilidade de experimentação. Talvez provenha daí parte do fascínio exercido
pelo mundo virtual, principalmente para egos mais frágeis que precisam mais
proteção; Ou para os mais rígidos, que não se permitem, conscientemente, a
indispensável liberdade de experimentação.
5.4.3 Subjetividade(s) na pós-modernidade
Na era moderna, depois da revolução industrial e durante boa parte do século
passado, a subjetividade, segundo Jameson (1997), caracterizava-se por um ego
contínuo e alienado. Na modernidade o eu era entendido como uno, profundo e
146
contínuo, embora alienado de seu significado ou incapaz de atribuir significado a si
mesmo. Na modernidade, por exemplo, uma obra de arte trazia em si significados
profundos e ocultos, o que não ocorre na pós-modernidade, que, caracterizada
segundo Jameson, pela superficialidade, não tem significados ocultos, sendo aquilo
mesmo que, de imediato, parece ser. O mesmo autor atribui à pós-modernidade a
característica de fragmentação do ego, decretando o fim do modelo da “mônada”, com
a indivisibilidade e a centralidade do ego: “O indivíduo era percebido por si mesmo e
pelos outros, tal qual uma mônada, indivisível e dotado de um cerne, de uma instância
central ou uma miragem desta - que não parece existir na organização subjetiva pós-
moderna.” (JAMESON apud ROMÃO Dias, e NICOLACI-DA-COSTA, 2005, p. 74).
Discorrendo sobre a pós-modernidade, Jameson a caracteriza pela prevalência
da superfície sobre o profundo, da simulação sobre o real, do jogo sobre a seriedade.
A era moderna seria representada por símbolos como a chaminé da fábrica, as
máquinas e os robôs. A Internet, de acordo com a visão desse autor, poderia ser o
símbolo da pós-modernidade, em sua peculiar construção da subjetividade.
Em Life on the Screen, Turkle relata sua pesquisa sobre o impacto da Internet
na construção da subjetividade tomando como ponto de partida o modelo de
subjetividade proposto por Jameson, e sugere um modelo alternativo, que substitui a
fragmentação pela ideia de multiplicidade: “Na simulação que a realidade virtual
permite, a identidade pode ser fluida e múltipla, um significante não mais aponta
claramente para algo que é significado, e a interpretação é menos provável de
proceder pela análise do que pela navegação no mundo virtual” (TURKLE apud
ROMÃO DIAS, e NICOLACI-DA-COSTA, 2005, p. 75). Seu modelo de subjetividade
envolve um eu flexível, não fragmentado, mas múltiplo; e essa multiplicidade
funcionaria ainda de maneira simultânea (ao mesmo tempo) ou sincrônica (não ao
mesmo tempo, mas com relação de significado), em analogia, por exemplo, com o
sistema Windows dos computadores pessoais, no qual várias formas do ser são
experimentadas simultaneamente: janelas abertas para diferentes possibilidades.
Embora evidentemente ainda haja a instância centralizadora que clica o mouse, várias
possibilidades do ser são experimentadas sem haver, necessariamente,
fragmentação. A autora propõe a experiência de ser, de modo múltiplo, como
possibilidade dentro da normalidade.
O trabalho de Turckle inspirou a pesquisa feita em 2005 por Romão Dias e
Nicolaci-da-Costa, na PUC do Rio de Janeiro. Para esse trabalho foram entrevistados
147
usuários da Internet que se propuseram a comentar o seguinte depoimento, extraído
do livro de Turkle (1997):
Sinto que, quando estou no IRC
86
, posso ser qualquer coisa. E, no
meio de todas aquelas janelas e canais, onde sou linda, homem,
loura, mulher, feia, criança ou velha, sinto que essas janelas são
partes da minha vida, e a vida real é mais uma, dentre muitas janelas
possíveis. (TURKLE, apud ROMÂO DIAS e NICOLACI-DA-COSTA,
2005, p. 77)
O material das respostas foi analisado a partir da “análise do discurso”, e
embora todos os entrevistados, sem exceção, relatassem ter maior facilidade de
expressão na rede do que quando interagem presencialmente, os resultados
permitiram que fossem divididos em dois grupos: o primeiro, com menos de 20% das
respostas, abarcou aqueles que consideravam os relacionamentos pela Internet como
frustrantes ou mentirosos, e que a facilidade de expressão não os levava a relações
que considerassem sólidas ou verdadeiras. Entenderam os papéis que assumem na
Internet como máscara ou muro de proteção, e consideraram mentiras o que era
expresso como realidade virtual. O contato presencial era sempre decepcionante, e
havia desconfiança em relação ao virtual, com a constatação de que as pessoas não
são, fora da rede, como dizem ser dentro dela, o que é percebido como falsidade. Na
nossa linguagem, como expressão de má fé, ou, na melhor das hipóteses, do
inconsciente ou da sombra.
O segundo grupo de entrevistados, embora perceba diferenças entre o on-line
e o off-line, não considera falso o que se passa na WEB. Ao contrário, falam de
diferentes níveis de realidade. Relatam que podem agir, pensar e até sentir de modo
diferente quando estão na Internet, sem que isso signifique faltar com a verdade.
Relatam que suas personagens virtuais são possibilidades da mente, resultados de
experiências ou leituras, testes de si mesmos, forma de reconhecer potenciais
adormecidos. Essas pessoas percebem-se na Internet com comportamentos que não
teriam presencialmente, por timidez ou qualquer outra razão. Mas depois de
experimentá-los virtualmente, talvez os integrem ao repertório de comportamentos na
vida fora da WEB. Depois da integração, não se veem como pessoas diferentes, mas
experimentam o espaço virtual como um laboratório de comportamentos.
86
Internet Relay Chat (IRC) é uma modalidade de comunicação que já foi bastante utilizada na Internet, basicamente
para bate-papo e troca de arquivos, permitindo a conversa em grupo ou privada. Surgiu em 1993, tornando-se muito
popular no final dos anos 90. Atualmente caiu
praticamente em desuso, substituido pelos mensageiros instantãneos
como o MSN e pelos sites de relacionamento como o Orkut e o My Space.
148
Aparentemente, segundo as pessoas do primeiro grupo, para haver verdade
era esperado que não houvesse diferença entre o presencial e o virtual. Inexistiria a
possibilidade de, sem mentir, vivenciar aspectos diferentes do ser. Provavelmente
essas pessoas se identificam com o “ego contínuo” e tem sensação de estabilidade e
unidade em relação a si mesmas, de modo semelhante a que Jameson chamou de
“centralidade” ou “miragem de centralidade” típicas do sujeito da modernidade
(JAMESON apud ROMÃO DIAS, e NICOLACI-DA-COSTA, 2005, p. 74).
Quanto aos membros do segundo grupo, também se sentem mais desinibidos
na rede do que fora dela, e sabem que as pessoas dizem o que querem a seu próprio
respeito na Internet, norma que vale para eles mesmos e para os outros. Mas os
membros desse grupo não se incomodam em criar personagens e lidar com a
possibilidade de que os outros também os criem. Mesmo que tais personagens
tenham pouca semelhança com a personalidade presencial, mas sendo percebidos
como portadores de habilidades criativas de se relacionar dentro de outros padrões
que não os definidos pelo encontro no mundo presencial. Não entendem o hiato entre
a realidade virtual e o presencial como mentira ou farsa. Usam o espaço virtual como
um ambiente lúdico-criativo.
Ao analisar estes dados, as pesquisadoras recorreram à visão de Turkle,
segundo a qual, provavelmente, esses sujeitos se percebem como muitos e não como
um só, “sendo”, ao mesmo tempo, “alguns aspectos e seus opostos”. Essa estrutura
corresponderia àquela que a autora denominou “múltiplos selves
87
”, na qual existe a
instância centralizadora, o ego, mas um ego que - dentro do padrão pós-moderno -
tende a ser flexível e continua a buscar espaços do brincar, atualizando na idade
adulta o espaço potencial da formação do ego típico da infância (TURKLE apud
ROMÃO DIAS, e NICOLACI-DA-COSTA, 2005, p. 76).
Roesler (2008) em estudo sobre a formação da identidade nas sociedades pós-
modernas demonstra que as ideias de Jung já estariam sintonizadas aos
desenvolvimentos acima apontados. Por exemplo, ao prever a fragmentação das
referências culturais como um dos efeitos das intensas transformações sociais da sua
época, Jung antecipou a necessidade que o indivíduo da sociedade moderna teria de
encontrar a estabilidade da sua identidade em si mesmo, e não mais nas normas,
valores ou padrões de comportamento estabelecidos pelas instâncias externas.
87
Embora corresponda ao plural de self, o termo não é usado pela autora na acepção junguiana: para Turlke “o sujeito
atual, invés de ser composto por várias partes, vários pedaços de um todo, é constituído de vários todos, ou seja,
vários selves”. (TURKLE apud ROMÃO DIAS, E NICOLACI-DA-COSTA, 2005, p. 76)
149
Podemos dizer também que Jung quase pensou de forma
pós-moderna quando viu a personalidade composta de partes
- os complexos – aos quais atribuiu certa autonomia. Para
Jung a questão crucial era: diante dessas parcelas de
identidades parcialmente autônomas, como uma pessoa pode
formar um centro interno apto a manter integradas as partes
divergentes da personalidade? (ROESLER, 2008, p. 423)
Talvez a necessidade do contínuo desenvolvimento da consciência rumo à
individuação – integrando diferentes conteúdos inconscientes que precisam vir à luz
em busca de maior plenitude e significado - possa elucidar ao menos em parte o
fascínio gerado pela Internet. É possível que a oferta do campo diferenciado - virtual –
seja vivida como potencial transicional, no qual a psique que busca ampliação
encontra mais uma via para sua realização.
Para que o psicólogo possa se manter em sintonia com o espírito atual - frente
à questão inicialmente proposta - será necessária a atitude cautelosa de não assumir
conclusões precipitadas. Em outra publicação, na qual discorre justamente sobre “O
Psicólogo na Sociedade em Rede”, Nicolaci-da-Costa (2006, p. 28) finaliza sua
reflexão com uma sugestão que nos parece pertinente adotar aqui: “Essas conclusões
são necessariamente provisórias porque, nos dias de hoje, a única coisa constante é,
paradoxalmente, a própria transformação”.
Para observar com atenção essas transformações - agora sob outro ângulo -
serão descritas, a seguir, algumas das novas formas de construção do saber
presentes na WEB.
150
5.5 Novas formas de construção do saber
É o universo que pensa e passa em nós.
(LEVY, 2001, p. 173)
Enquanto a psicologia avalia a pertinência de estudos mais abrangentes sobre
a presença humana no espaço virtual, o desenvolvimento das aplicações da
tecnologia digital prossegue a passos largos. Da mesma maneira que teria sido
impossível - em capítulo anterior - esgotar a descrição dos aspectos conflituosos das
vivências presentes na WEB, seria inviável, neste capítulo, abarcar toda a gama de
ferramentas derivadas da informática em uso nas diversas áreas da cultura: artes,
ciências, e educação, além da difusão de informações relativas a outras áreas do
conhecimento e inúmeras aplicações na vida cotidiana dos grandes centros urbanos.
Por essa razão, delimitaremos o objetivo deste capítulo à ilustração seletiva
dessas aplicações e suas repercussões em termos da psique. Para contextualizá-las,
serão necessárias breves descrições de suas ferramentas, em relação aos
mecanismos por meio dos quais contribuem para a facilitação do acesso ao
conhecimento e ampliação da consciência, individual e coletivamente. De forma
intercalada às descrições, nos ateremos às respostas da psique aos recursos
oferecidos pela digitalização. Esperamos que a seleção de exemplos, mesmo restrita,
forneça ao leitor um painel representativo das modalidades de construção do saber
características da era digital.
5.5.1 Expansão dos registros e acessos à informação
Conforme comentamos ao descrever as linhas gerais da evolução da Internet,
a primeira grande inovação promovida pelo surgimento da WEB1 foi possibilitar a
digitalização das informações, recurso que revolucionou o armazenamento e
compartilhamento dos registros de dados da cultura. O surgimento das primeiras
Home Pages foi motivo de admiração e entusiasmo generalizados, pois viabilizaram o
livre acesso coletivo aos acervos de museus, bibliotecas, registros científicos e,
virtualmente, a consulta a qualquer tipo de informação passível de ser digitalizada,
ainda que em forma unilateral, não interativa.
151
A digitalização multiplicou geometricamente não só a capacidade de
armazenamento, mas a velocidade da geração e registro de dados sobre as
informações. A imagem inserida abaixo, embora não recente, ilustra esse avanço.
Basta observar a ascensão da curva a partir de 1999.
Figura 15 – Evolução do registro de informações ao longo da história
(destaque para o efeito gerado pelo surgimento da Internet
88
)
A matéria publicada no site IDGNow, em 18/05/09 fornece uma ideia atualizada
dessa magnitude. Segundo a edição, o volume dos registros digitais gerados
mundialmente em 2008 atingiu 486,5 bilhões de Gigabytes (3,9 sextilhões de bits)
representando um aumento de 61% em relação aos 281 bilhões de GB registrados em
2008. Traduzidos parcialmente, os números equivalem a: 237 bilhões de leitores
Kindle carregados; 4,8 quatrilhões de transações bancárias on-line; 3 quatrilhões de
feeds (“alimentos” ou conteúdos) do Twitter; 162 trilhões de fotos digitais; 30 bilhões
de Apple iPod Touches totalmente carregados; 19 bilhões de DVDs Blu-ray totalmente
carregados. O mesmo informe prevê ainda que, nos próximos quatro anos mais 600
milhões de pessoas terão acesso à Internet a partir de celulares e, em consequência,
88
Fonte da imagem original: <http://berkeley.edu/>
152
as interações via e-mail, mensagens instantâneas e redes sociais aumentem oito
vezes.
Os números mencionados nos remetem à facilitação das comunicações pessoa
 pessoa e pessoa  grupo(s), propiciadas pela interatividade característica da
rede e desdobrada em inúmeras formas de trocas de informações. A começar pelo
simples envio de mensagens eletrônicas – os e-mails – passando pelos mencionados
“grupos de discussão” – também conhecidos como e-groups, newsgroups ou fóruns. O
movimento de intensificação das interações entre indivíduos e grupos (e intra-grupos),
naturalmente preparou o campo para a participação humana na segunda etapa de
atividade da WEB: a chamada WEB2, ou seja, a etapa da Internet interativa, na qual
os internautas deixaram de ser apenas espectadores dos sites, passando a explorar
as possibilidades de interação criadas “dentro” desses espaços virtuais, além de
também interagir entre si (ou grupalmente) nos mesmos espaços.
A grande popularidade das salas de bate-papos – os chats – na fase inicial
desse processo representou provavelmente a primeira forma da participação interativa
na Internet perceptível ao coletivo. Atualmente, a interatividade é exercida, por
exemplo, nos blogs e nas diversas comunidades virtuais temáticas, dedicadas aos
variados fóruns voltados aos interesses comuns dos seus participantes.
A imprensa divulga diariamente matérias que exemplificam a contínua
ampliação da interatividade da rede, mostrando alternativas da sua utilização e de
facilitação dos acessos à Internet. Em matéria intitulada “Teles e elétricas disputam
Internet”, a Folha de São Paulo de 04/04/09 (Acesso em 06/04/09) informou as
providências em curso na EMBRATEL visando multiplicar os acessos via banda larga
pela da rede elétrica. Por essa nova via, inúmeros internautas brasileiros serão
beneficiados em qualidade e custo do acesso à WEB.
Em 23/05/09, o mesmo jornal publicou reportagem com o título “Encolheram o
livro” (FOLHA ON LINE, acesso em 10/06/09), comentando o lançamento do Kindle,
aparelho com formato de tela digital, equipado com sistema de recepção de dados
capaz de fazer donwload de publicações variadas, de livros a periódicos. As
publicações são “baixadas” diretamente das editoras, livrarias ou outras possíveis
fontes de distribuição de publicações, como jornais e revistas digitais. O Kindle
dispensa o uso do computador propriamente dito, pois supre, ao mesmo tempo, as
funções de receptor do tipo wireless (sem fio) e de “biblioteca digital”.
153
A atual capacidade de armazenamento do Kindle varia conforme a marca ou
modelo, mas os primeiros lançados pela livraria on-line Amazon
89
podem conter
publicações que equivalem de 350 a 3.500 livros. Na mesma matéria, editores
brasileiros se declaram dispostos a aderir a essa forma de publicação, pois seus
títulos mais recentes são editados em mídia digital, exigindo, portanto, providências
relativamente simples para sua distribuição no novo formato. Seguem as imagens de
dois modelos.
Figura 16 - Kindle: Dois modelos do equipamento que reúne as funções de receptor e
leitor digital lançado pela Amazon.com
Em abril de 2009 a Unesco, em parceria com a biblioteca do Congresso
Americano lançou a Biblioteca Mundial Digital
90
, iniciativa que tem a participação de
32 instituições, permite acesso gratuito a inúmeros manuscritos, mapas, filmes,
fotografias e livros raros de várias bibliotecas em todo o mundo. A biblioteca
informatizada colocará informações em árabe, chinês, francês, inglês, português,
russo e espanhol, e deverá incluir também conteúdos de todos os países membros da
Unesco (PUBLICOPT, acesso em 11/06/09). Cabe registrar que essa biblioteca é um
apenas exemplo entre outras iniciativas semelhantes presentes na Internet, em
formatos mais especializados ou regionalizados.
89
Endereço: <www.amazon.com>
90
Endereço da Biblioteca Digital Mundial: <www.wdl.org>
154
5.5.2 Acessos colaborativos
Quando de seu lançamento, a Wikipédia
91
– enciclopédia digital colaborativa –
foi alvo de críticas e avaliações reticentes sobre a confiabilidade dos dados oferecidos,
principalmente nos meios acadêmicos. Tais reações provavelmente ocorreram pelo
fato da sua elaboração prever a livre inclusão de verbetes, por qualquer pessoa
interessada em participar da sua construção on-line. Ainda se observam reações
dessa natureza, especialmente por parte de pessoas que ainda não utilizaram esse
recurso de consulta – disponível em vários idiomas - e que, portanto, desconhecem os
meios criados para seu aprimoramento. Entre as formas de filtragem das informações
incluídas na Wikipédia, destaca-se a participação de colaboradores voluntários,
especialistas em diversas áreas do conhecimento que atuam como moderadores ou
“cuidadores” de algum verbete em particular: os voluntários acompanham
continuamente as postagens realizadas pelos internautas, zelando pela qualidade das
informações em relação ao tema da sua especialidade, e acompanhamento das
eventuais invasões por hackers e pichações virtuais. É interessante registrar que, em
função das dimensões da base de dados registrados na Wikipédia, esse exército de
colaboradores faz um trabalho hercúleo, especializado, e totalmente voluntário.
Com formato e estrutura de funcionamento semelhante, estão disponíveis
outras bases de dados derivadas da Wikipédia original, como a Wikicommons,
especializada em fotos, vídeos, imagens e documentos sonoros de domínio público, e
a Wikinotícias
92
, especializada na publicação de notícias e informações sobre
diversas áreas do conhecimento.
Outras fontes de consulta de grande popularidade são o Youtube
93
, voltado ao
compartilhamento de vídeos sobre os mais variados temas; ou ainda o Google Earth e
o Google Maps
94
, sites que utilizam programas de alcance global dedicados à
localização de endereços e mapas, permitindo o traçado de rotas de acesso aos locais
pesquisados. Sistema semelhante é utilizado nos equipamentos conhecidos como
GPS (do inglês Global Positioning System) utilizados pelos motoristas em trânsito para
finalidades semelhantes.
91
Endereços: <www.wikipedia.com>; <www.wikipedia.com.br>; <www.wikipedia.com.pt>; etc.
92
Respectivamente: <http://commons.wikimedia.org/wiki/Main_Page> e
<http://pt.wikinews.org/wiki/P%C3%A1gina_principal>
93
<www.yutube.com>
94
Respectivamente: <http://earth.google.com> e <http://maps.google.com>
155
Estima-se que há cerca de 1 trilhão de sites disponíveis na Internet. Essa
imensa quantidade de dados remete a outra questão crucial: a necessidade de se
contar com ferramentas eficientes para a busca e filtragem de dados, ou seja, que
possibilitem ao internauta não apenas localizar, mas também avaliar a confiabilidade
das informações acessadas, discriminando o joio do trigo. A princípio essa função é
suprida pelos sites de busca, porém de forma ainda relativamente elementar.
Cientes das limitações, os buscadores (como o Google e o Yahoo) estão
pesquisando novas soluções, baseadas em análises semânticas dos dados digitados
na consulta feita, além de outros recursos matemáticos sofisticados. Um exemplo foi
apresentado no blogspots português Átomo e Meio em 20/05/09 (entre outras fontes
no mesmo período), ao informar sobre o estágio atual do Wolfram Alpha
95
, o sistema
de buscas desenvolvido pelo físico Stephan Wolfram: com objetivo e funcionamento
diferentes do Google (que apenas busca na rede endereços de sites associados à
palavra chave digitada pelo internauta), o novo sistema fornece respostas às
perguntas propostas na consulta: “Depois de feita uma pergunta, o sistema processa
as respostas, recolhendo dados de várias páginas e bases de dados contendo
unicamente informações relevantes para essa pergunta em concreto”. (ÁTOMO E
MEIO, Acesso em 11/06/09). Segundo essa fonte, compreender o conteúdo das
páginas e das perguntas do internauta – e não apenas localizar palavras-chave - é
apontado por muitos analistas como o futuro da pesquisa na Internet. Tanto o Google
como o Yahoo têm cientistas trabalhando nessa área.
Outra reportagem – “Teste de sabedoria” -, publicada no Caderno de
Informática da Folha de S. Paulo em 17/06/09, ressalta o interesse dos usuários por
esse tipo de serviço virtual. Segundo o texto, o site Answers do Yahoo.com
96
é o
segundo em número de acessos, depois do Wikipédia, recebendo 177,8 milhões de
usuários por mês e computando cerca de 680 milhões de respostas para 100 milhões
de perguntas, de teores extremamente variados. Um dado interessante é o fato de o
Brasil ser o segundo país que mais usa esse serviço. Em primeiro lugar estão os
Estados Unidos. No site as perguntas são enviadas por qualquer pessoa e
respondidas voluntariamente pelos internautas, sem receber qualquer tipo de
remuneração. (CAPANEMA, 2009)
95
<http://www.wolframalpha.com/>
96
<br.answers.yahoo.com>
156
A matéria informa ainda que um serviço semelhante foi oferecido em 2002 pelo
Google, incluindo a proposta de remuneração pelas respostas, que variaria de US$
2,00 a US$ 200,00 dólares. O projeto fracassou e foi desativado em dezembro de
2006. O Asnwers não oferece remuneração pelas respostas, mas mantém um ranking
com o cômputo das participações individuais dos colaboradores e avalia as melhores
respostas. Segundo Boucinhas, diretor de produtos do Yahoo: “Achamos que o que
move o produto é a comunidade, a troca de experiências. Não é o dinheiro”.
(BOUCINHAS, apud CAPANEMA, 2009). Essas constatações parecem falar a favor do
predomínio – na WEB - do espírito colaborativo sem fins lucrativos do ponto de vista
financeiro, ao menos nos grupos compostos por internautas “pessoas comuns” (como
na Wikipédia), movidos principalmente pelo prazer em participar das atividades
grupais em que o principal objetivo é troca de informações.
O sucesso atual dos Blogs, especialmente os mantidos por jornalistas e
pessoas públicas, também indica o entusiasmo dos internautas na participação na
comunicação em rede, como uma atitude que supera - ao menos em certas áreas - os
objetivos de lucro financeiro imediato.
De acordo com as observações, a digitalização da informação é apenas o
recurso, que assume a forma de diferentes ferramentas que, por sua vez, têm
diferentes aplicações e tendem a se entrelaçar com as demais mídias existentes,
conforme descrição de Levy (LEVY, 2006, p. 269):
O ciberespaço, a Internet e as novas formas de comunicação e de
interconexão entre todos os computadores do planeta não se
constituem em um meio de comunicação em particular, e, sim, em
uma espécie de metameio que está em vias de integração com todos
os outros.
Outra forma do uso dos recursos digitais - relativamente discreta, do ponto de
vista da sua visibilidade -, é o favorecimento da inclusão social pelas vias
informatizadas. Diversas aplicações nessa área estão em andamento, beneficiando
especialmente grupos de pessoas portadoras de deficiências motoras ou visuais. Um
exemplo é o sistema operacional DOSVOX
97
que permite às pessoas cegas utilizar um
microcomputador comum (PC) para desempenhar uma série de tarefas, adquirindo
assim um nível alto de independência no estudo e no trabalho. Outra iniciativa
relevante nessa área é ilustrada pela REDESACI
98
: um portal (site centralizador de
97
<http://intervox.nce.ufrj.br/dosvox/>
98
<http://saci.org.br/>
157
informações) que atua como facilitador da comunicação interativa e da difusão de
informações sobre deficiência, visando a estimular a inclusão social e digital, a
melhoria da qualidade de vida e o exercício da cidadania das pessoas com deficiência.
5.5.3 E A D – Educação a distância
As ampliações quantitativas das comunicações estabelecidas por meio das
vias digitais geram transformações de teor qualitativo nas trocas estabelecidas. Um
dos exemplos de atividade em vias de ser radicalmente transformada, em quantidade
e em qualidade, é o ensino há muito conhecido como “educação à distância”, a EAD.
Os antigos cursos por correspondência chegaram a ser populares no século XX,
abrangendo da datilografia à formação de técnicos em montagem de rádios, cursos
supletivos (na época conhecidos como “madureza”) e o ensino de idiomas.
Os cursos mencionados eram relativamente depreciados quando comparados
aos regulares ou convencionais, provavelmente por serem mais procurados por
adultos em busca do estudo tardio, ou seja, pessoas que por diversas razões, na
infância ou adolescência tiveram dificuldades de acesso à educação escolar regular. A
incorporação do rádio e da televisão na difusão desses cursos chegou a elevar
relativamente o seu conceito, mas não em nível suficiente para evitar que a
atualmente chamada EAD via Internet viesse a se tornar alvo de preconceitos e
discriminações, especialmente nos ambientes acadêmicos mais tradicionais. No
entanto, essa é talvez a área na qual se observam os mais significativos avanços da
educação popular em nosso país, especialmente se computados os acessos a
diversos cursos viabilizados para quem reside em regiões distantes dos grandes
centros urbanos.
Reportagens veiculadas em abril de 2009 pelo Jornal Nacional, da Rede Globo
de Televisão (Acesso em 11/06/09), reuniram dados sobre os avanços. Na primeira
matéria de uma série, o informe principal se referia à qualificação em grau superior de
16 mil professores de ensino básico, que até então só haviam cursado o nível médio
de estudos. A formação foi realizada em intervalo de cinco anos, propiciada pelos
cursos a distância a professores residentes em locais como São Gabriel da Cachoeira,
município localizado a duas horas de avião ou três dias de barco de Manaus.
158
Em outra reportagem, a informação central se referia ao aumento da oferta e
procura por cursos da mesma natureza no Brasil. Os números são expressivos:
segundo o Ministério da Educação, a oferta de cursos superiores no país cresceu
571% entre 2003 e 2006. Outro levantamento, de 2007, mostra que o número de
alunos avançou 356% em três anos, sendo que 73% deles estudam em escolas
particulares. Deve-se ressaltar que os números não incluem os estudantes brasileiros
que frequentam cursos semelhantes oferecidos por universidades sediadas do
exterior. Em São Paulo, a Pontifícia Universidade Católica - oferece cursos de
extensão nessa modalidade há cerca de dez anos. A USP – Universidade de São
Paulo – após seis anos de ensaio, anunciou recentemente sua estreia na modalidade,
com oferta de curso de graduação para formar professores de Ciências, área carente
de profissionais qualificados. O curso em questão prevê aulas presenciais em
laboratórios somente aos sábados e deverá receber a primeira turma composta de 360
alunos
99
.
Mas o potencial de alcance da EAD mediada pela Internet está longe de
representar solução mágica para o crônico problema do acesso das populações mais
carentes à educação, pois a expansão dessa metodologia de ensino exalta desafios a
serem vencidos nessa área. A EAD via Internet exige – do aluno e do professor –
novas posturas diante das tradicionais tarefas envolvidas no ensino. Por parte do
aluno, requer disciplina, iniciativa e boa dose de autonomia e responsabilidade. E do
professor, ao contrário do que se supõe, a EAD exige grande empenho de adaptação
ao sistema, envolvendo apurado preparo antecipado do material didático e
planejamento minucioso das atividades previstas para cada etapa dos cursos
oferecidos, além de significativa disponibilidade para acompanhar o desempenho dos
alunos de forma tão individualizada quanto possível.
Quando as condições citadas são efetivamente atendidas, surpreende o grau
de proximidade e atenção individualizada alcançado nas relações professor
 aluno
e alunos
 alunos nesse tipo de curso, a ponto de muitas vezes superar o êxito
obtido nas aulas presenciais. Essa tem sido a nossa constatação na experiência dos
cursos oferecidos nessa modalidade pelo NPPI, através da COGEA / PUC-SP
100
.
99
Ao lado do pedido de reajuste salarial, o fim dos cursos à distância compôs a pauta de reivindicação da greve de
alunos e professores dessa universidade que perdurou de 05/06 a 01/07/09; Esse fato exemplifica a dificuldade de
aceitação dessa modalidade de ensino ainda reinante em nossos meios acadêmicos. Ao final dessa greve, o início do
curso mencionado acima foi adiado. (FOLHAONLINE, acesso em 02/07/09).
100
Informações sintéticas sobre os cursos em EAD oferecidos pela equipe do NPPI são descritas no Apêndice “Sobre o
NPPI”, ao final deste trabalho.
159
O leitor atento poderá ter observado que o fator quantitativo é o primeiro a se
destacar sempre que nos ocupamos em observar a difusão das informações na WEB.
A magnitude dos números envolvidos é impressionante e por si mesma
potencialmente revolucionária no que se refere às aplicações no campo da educação.
No entanto, os números mencionados nos exemplos descritos, estão longe de
representar o diferencial mais relevante da informatização como ferramenta de ensino
e acesso ao conhecimento, conforme demonstram os próximos relatos.
Tangenciando o tema da EAD há outra possibilidade de aplicação educacional
dos recursos oferecidos pelas tecnologias digitais, de forma integrada à programação
regular dos currículos convencionais. Em abril de 2009 o caderno LINK, do jornal
“Estado de São Paulo” publicou ampla matéria sobre escolas paulistanas tradicionais
que já avançam nessa direção: por meio da criação de redes sociais de comunicação
interna, alunos e professores de uma mesma instituição podem trabalhar de forma
grupal. Essas mesmas redes estão ensaiando trabalhos colaborativos entre escolas,
envolvendo até mesmo colégios de outros estados ou países, dependendo do
conteúdo em pauta. É interessante observar que, em decorrência dessas inovações,
começam a florescer efetivamente antigas propostas pedagógicas contidas nas
reformas curriculares oficialmente implantadas, mas que se mostraram difíceis de ser
efetivadas na prática do ensino:
Mais do que conectar virtualmente os estudantes, essas redes têm o
potencial de mudar o foco da própria escola: se antes o professor era
o cento do conhecimento (embora continue importante) agora é o
aluno que tem a oportunidade de assumir esse papel. (MARTINS,
Acesso em: 07/04/09)
5.5.4 Democracia eletrônica / “inteligência coletiva”
A facilitação do acesso às informações é um importante fator de suporte à
democracia, nos vários sentidos em que esse termo é entendido. A começar pelo
sentido político, fato exemplificado na recente eleição do primeiro presidente negro
dos EUA: segundo noticiário internacional, o apoio popular à campanha eleitoral do
presidente Obama foi basicamente organizado e articulado pelos blogs, veículo
jornalístico que superou, nessa função, os canais de comunicação convencionais da
imprensa americana (MUNDODOMARKETING, acesso em 20/03/09).
160
Outro exemplo emblemático de utilização da WEB – integrada a alguns
desdobramentos – ocupou as manchetes no mês de Junho de 2009: as notícias se
referiam à reação popular frente às denúncias de fraude nas recentes eleições no Irã,
e à repressão do governo atual às manifestações. O teor foi sintetizado na chamada
do Jornal Nacional de 17/06/09: “Irã: celulares e câmeras são os olhos do mundo”. O
texto acrescenta: “Pela Internet, os iranianos rompem o bloqueio imposto aos meios
de comunicação pelo governo do país. As sete mortes e dezenas de feridos não
bastaram para silenciar os partidários reformistas.” (JORNAL NACIONAL, acesso em
17/06/09).
A partir do momento em que a imprensa estrangeira passou a ser impedida de
divulgar informações sobre a repressão aos protestos populares, os iranianos
passaram a utilizar celulares com câmeras – e o próprio Twiter – para divulgar fotos,
textos e imagens filmadas aos canais do exterior por meio dos quais continuaram a ser
amplamente publicados. A mesma matéria – com as respectivas imagens – resumiu a
função assumida pelos equipamentos: “os celulares e câmeras digitais se
transformaram nos olhos e ouvidos do mundo”, abalando as estruturas de um dos
regimes teocráticos mais opressivos da atualidade.
No Brasil observa-se procedimentos semelhantes: durante o mês de julho de
2009, as denúncias de nepotismo dirigidas ao então presidente do Congresso
Nacional continuaram a ocupar as manchetes jornalísticas, mesmo em meio ao
recesso daquela casa. Em boa medida, esse fato se deu em função da contínua
divulgação de denúncias, novas e agravantes, nos blogs dedicados ao assunto.
Contrariando – segundo essas mesmas fontes – a “expectativa” dos personagens
envolvidos, que contariam com o arrefecimento do interesse popular durante o
intervalo das atividades do parlamento. Algumas iniciativas dos “blogueiros”
recorreram, inclusive, ao humor como forma de incentivar o protesto popular frente aos
abusos aparentemente cometidos pelas autoridades envolvidas
101
.
Os exemplos descritos mostram como os recursos da WEB são utilizados para
manter e expandir a liberdade de expressão e a democracia, em seu sentido mais
amplo, popular e convencional. Segundo Levy “há uma correlação muito forte entre o
progresso das técnicas de comunicação, em especial, e a democracia” (LEVY,
2001[b]). Segundo o autor, a Grécia não teria criado esse sistema de governo sem que
101
Em uma clara alusão ao atual presidente do Senado Nacional, um blog denominado “Tirem o bigode” convida os
internautas a postarem uma foto “usando um bigode” que só terá retirado após a renúncia do político em foco.
<http://tiremobigode.blogspot.com>
161
antes tivesse surgido o alfabeto e a possibilidade de os cidadãos conhecerem a “lei
escrita”. Posteriormente a história repetiu em várias ocasiões a mesma relação:
quando das revoluções (e respectivas transformações políticas) que sucederam a
criação da imprensa e a consequente formação gradativa de uma “opinião pública”,
matriz geradora da atual noção de “direitos humanos”. Como exemplo mais recente,
Levy menciona as relações entre o surgimento da televisão, dos satélites, e os
progressos da telefonia à queda dos regimes totalitários no final da década de 1980,
além das transformações sociais em curso a partir da intensificação das comunicações
“transversais” propiciadas pelo desenvolvimento das novas tecnologias. Ele ressalta:
Quando há muitas comunicações transversais numa sociedade,
quando a informação circula facilmente e sabemos o que ocorre fora,
a mente não pode mais ser controlada por uma ditadura totalitária.
Aliás, é por esse motivo que, hoje, todos os regimes ditatoriais do
planeta tentam, desesperadamente, controlar a Internet, pois é uma
ameaça para eles. (LEVY, 2001[b], acesso em 27/02/08)
102
.
Mas, embora reconheça e valorize a contribuição das comunicações à
ampliação da democracia no sentido clássico, no desenvolvimento de suas ideias Levy
propõe uma nova acepção para o conceito, prevendo para breve o surgimento da
chamada “democracia eletrônica”. Em sua visão, o evento deverá gerar múltiplas
repercussões, não apenas em termos políticos, mas nas suas versões econômicas,
sociais e culturais, justamente porque representará avanço em relação às hierarquias
burocráticas “verticais” (fundadas na escrita estática), que até aqui coordenaram a
inteligência, a experiência e a imaginação dos seres humanos. (LEVY, 1994, 2001[a] e
2001[b]).
Levy entende a emergência da “democracia eletrônica” de forma estreitamente
associada ao surgimento simultâneo da “inteligência coletiva” - mais um de seus
conceitos fundamentais - viabilizada pelas novas tecnologias:
As tecnologias intelectuais não se limitam a ocupar um setor entre
outros da mutação antropológica contemporânea; elas são
potencialmente sua zona crítica, seu lugar político. É preciso enfatizá-
las? Os instrumentos da comunicação e do pensamento coletivo não
serão reinventados sem que se reinvente a democracia, uma
democracia distribuída por toda parte, ativa, molecular. (LEVY, 1994,
p. 15)
102
É interessante observar como as posições e “previsões” expressas por Levy nas citações (observar datas) são
gradativamente confirmadas pela evolução das formas de utilização da Internet em recentes desdobramentos. Outras
previsões serão mencionadas na continuidade deste capítulo.
162
Nossa intenção é destacar a face democrática da WEB, sincronicamente
expressiva dos processos interativos coletivos eliciados pelas comunicações digitais.
Processo perceptível, por exemplo, na multiplicação geométrica das comunicações
pessoa
 pessoa, pessoa  grupo, grupo  grupo, responsáveis por outra
transformação, talvez mais discreta, e menos evidenciada nas estatísticas relativas à
WEB. Mas, esse é um processo em curso, em proporções possivelmente tão
significativas quanto as outras inovações, talvez mais atraentes para constar nos
noticiários jornalísticos. Referimo-nos aos incontáveis grupos e fóruns de discussão
em atividade ao redor do planeta por meio dos newgroups, comunidades virtuais,
blogspots, e mais recentemente por meio do Twiter; A difusão dessa forma de
comunicação - caracterizada “transversal” por P. Levy - parece dar margem ao
surgimento do “novo nomadismo” descrito pelo mesmo autor em A inteligência coletiva
(LEVY, 1994, p. 15):
O espaço do novo nomadismo não é o território geográfico, nem o
das instituições ou o dos Estados, mas um espaço invisível de
conhecimentos, saberes, potências de pensamento em que brotam e
se transformam qualidades do ser, maneiras de constituir sociedade.
Não os organogramas do poder, nem as fronteiras das disciplinas,
nem tampouco as estatísticas dos comerciantes, mas o qualitativo,
dinâmico, vivo da humanidade em vias de se auto-inventar,
produzindo seu mundo.
5.5.5 A “memória coletiva viva”
Sem dúvida, a WEB é percebida como um enorme banco de dados, a imensa
memória coletiva registrada em forma digital. Mas essa percepção popular da grande
rede, embora verdadeira, é restrita, parcial e estática, pois não abarca seu dinamismo,
ou seja, a forma como os seus co-criadores – os seres humanos – ativam
continuamente sua sinergia intrínseca. A humanidade acumula e registra dados da
memória cultural há milênios. A mera possibilidade de ampliar essa base de dados -
por meio da digitalização - não constitui um valor especial em si mesmo. O fato novo
consiste nas formas pelas quais os registros são elaborados, acessados, integrados e
utilizados pelos internautas que, ao acessá-los, atuam sobre os mesmos, acionando
sua contínua reconstrução.
Referindo-se à “memória coletiva viva” em construção na WEB, Levy compara
esse conjunto de dados a um “hipertexto em reestruturação permanente”,
diferenciando-o dos arquivos da biblioteca convencional, em geral estática (LEVY,
163
2006[b], p. 274). Destaca também o fato de seu caráter universal derivar da
articulação das subjetividades de todos os internautas participantes da construção da
rede (LEVY, 2006[b], p. 273-274):
O que vale é a inteligência coletiva se autonutrindo. [...] Quando eu
crio o meu site, eu trago alguma coisa a este documento. Quando eu
construo os meus laços (links), eu me pergunto o que mais vai se
aproximar daquilo que é importante para mim ou para o meu
propósito. E qualquer um que criar um site sobre o mesmo assunto
poderá contribuir para a estrutura da WEB com sua perspectiva.
Ela (a memória coletiva) está sendo construída por todas as
memórias subjetivas. [...] Neste sentido, não existe esta oposição
demarcada entre o universal e o subjetivo, pois o universal é
modelado pela interconexão das subjetividades. E, mais uma vez,
pelas subjetividades coletivas.
Ainda segundo Levy (2006[b]), um dos fatores que garante a universalidade,
dinamismo e vitalidade da memória resultante da cibercultura é a ausência de “um”
núcleo estruturante da sua construção. Essa é, para o autor, a “essência paradoxal da
cibercultura”. O paradoxo reside justamente no fato de a ausência de um elemento
centralizador se tornar a condição que impulsiona o caráter convergente e universal da
sua configuração (LEVY, 2006[b], p. 257). Os incontáveis links presentes no imenso
banco de dados disponibilizado na rede podem ser reorganizados em infinitas
combinações, pelos internautas, a cada vez que os acessa. Desse modo, para Levy
(2001, p. 151[a]):
“O ciberespaço é uma espécie de objetivação ou de simulação da
consciência humana global que afeta realmente essa consciência,
exatamente como fizeram o fogo, linguagem, a técnica, a religião, a
arte e a escrita, cada etapa integrando as precedentes e levando-as
mais longe ao longo de uma progressão de dimensão exponencial.”
A nova etapa da evolução cultural, gerada a partir do surgimento da WEB,
permite a conjugação de competências individuais em torno de objetivos e tarefas que
seriam inexequíveis se propostas em forma individual ou mesmo grupal. O projeto
“Genoma Humano” é talvez o primeiro exemplo emblemático desse tipo de
colaboração possível na esfera científica internacional, desde que mediada pela WEB:
iniciado em 1990, com término previsto para 2025, reúne mais de 5000 cientistas de
250 diferentes laboratórios distribuídos ao redor do planeta, empenhados no
mapeamento do código genético humano. (WIKIPÉDIA, acesso em 09/07/09)
164
5.5.6 Outras repercussões para o ensino / aprendizagem
A relevância dos empenhos colaborativos possibilitados pela Internet não
reside apenas nas repercussões dos seus resultados objetivos mais visíveis ou
midiáticos, como o exemplo do genoma. Outras repercussões do dinamismo da WEB
podem ser percebidas, embora até o momento tenham menor visibilidade. Exemplo
são as transformações nos processos de aprendizagem, em decorrência das trocas
transversais propiciadas pela WEB nas atividades de ensino. Essa nova condição
permite não apenas a efetiva intersecção dos componentes subjetivos individuais e
coletivos dos seus protagonistas – alunos e professores – mas também produz efeitos
sobre o resultado final – a produção do conhecimento - e sua apropriação pelo ser
humano.
Todos os que fomos alunos, e eventualmente professores, acompanhamos nas
últimas décadas a série de reformas curriculares - bem intencionadas do ponto de
vista educacional - nas quais alguns tópicos têm sido definidos como objetivos
recorrentes. Um deles é a constante proposta da revisão dos tradicionais papéis e
relações estabelecidas entre professores e alunos, os quais, no entanto, continuam a
ser exercidos de forma predominantemente “vertical” na transmissão do
conhecimento. Outra proposta sempre presente nas reformas é a inversão da
tendência que enfatiza os aspectos intelectuais / racionais da aprendizagem, em favor
da atenção ao desenvolvimento global da personalidade e/ou da sensibilidade e
criatividade do aluno. No entanto, o resultado das tentativas tem sido sempre relativo,
apesar do empenho dos educadores.
Alguns dos fatores que até aqui dificultaram o sucesso efetivo das reformas
começam a ser diluídos a partir da introdução dos dinamismos característicos da
cibercultura no espaço educacional. Alguns desses fatores são abordados direta ou
indiretamente por Byington, ao longo da exposição sobre a “Pedagogia Simbólica” -
sua proposta de ensino fundamentada na Psicologia Analítica -, ao mesmo tempo em
que oferece alternativas de ação (BYINGTON, 2004). As referências oferecidas podem
nos servir de guia para uma breve reflexão sobre as novas faces do binômio ensino /
aprendizagem, emergentes na era da comunicação. A proposta apresentada por
Byington é muito ampla para ser resumida em poucas linhas. Mas algumas das suas
premissas podem fornecer visão geral a respeito das suas propostas e princípios, ao
menos com relação aqueles que se harmonizam com as ações predominantemente
realizadas pelos internautas nas atividades educacionais.
165
Inspirado em Jung, Byington elaborou sua proposição com base em na
vivência como médico, psiquiatra e professor, experiências nas quais percebeu que
seu desenvolvimento pessoal sempre foi interdependente não apenas da formação
acadêmica, mas essencialmente interligado aos contatos estabelecidos com as
pessoas – colegas, clientes etc. A propósito do seu método afirma: “A Pedagogia
Simbólica Junguiana propõe um saber iniciático, adquirido pela elaboração dos
símbolos dentro dos parâmetros da Ciência Simbólica. Um saber do Todo pela
vivência das partes, como símbolos estruturantes” (BYINGTON, 2004, p. 20).
Citando Teilhard-de-Chardin como um dos pilares da Pedagogia Simbólica,
Byington estabelece um paralelo entre a “noosfera”
103
- a camada de comunicação
que integra a “Consciência Planetária” - e a Internet, exemplo expressivo dessa
unificação, especialmente em função de duas das suas características essenciais: a
descentralização, impeditiva do seu bloqueio; e a capacidade de expansão ilimitada da
sua estrutura.
Byington é explícito: “Quem vivencia não decora. Apreende a vida formando a
identidade do Ego e do Outro.” (BYINGTON, 2004, p. 17). Ao utilizar o termo “Outro”, o
autor se refere a tudo que é o “não-Ego” na consciência, seja entidade viva (por
exemplo, o professor ou o colega de turma do aluno) ou qualquer outro recurso que
estimule a transformação de “assuntos” em “vivências”, ampliando a consciência do
aprendiz: técnicas expressivas (como o desenho ou a pintura), técnicas corporais ou a
Sand Play etc. Acrescentaríamos a essa relação, as experimentações e as trocas
estabelecidas pelos internautas nos ambientes virtuais, buscadas espontaneamente
pelo novo aprendiz internauta – muitas vezes autodidata buscador - ou estimuladas
pela instituição de ensino à qual está vinculado.
Byington destaca a imaginação como componente subjetivo valioso para o
processo de aprendizagem. Embora reconheça a possibilidade de a imaginação poder
se expressar em formas patológicas, Byington questiona as visões psiquiátricas que
tendem a patologizar de forma generalizada essa potencial fonte de criatividade
humana (BYINGTON, 2004, p. 348-352). E o autor vai além, mencionado a “realidade
virtual” – viabilizada pelas novas tecnologias – como revolucionária e promissora via
de reencontro da imaginação, que pode ser vivida na forma de “alucinação normal”
(Ibid. p. 353). Em síntese, ao longo de sua exposição, ao incluir os fatores subjetivos
103
Conceito proposto por Teilhard de Chardin, a Noosfera (derivada do grego nous, mente) é entendida como "esfera
do pensamento humano", surgida evolutivamente como etapa do desenvolvimento do planeta em suscessão à
Geosfera (matéria inanimada) e à Biosfera (matéria viva). (TEILHARD DE CHARDIN, 1970)
166
no processo de aprendizagem, Byington transpõe, para a esfera do ensino, um modelo
de desenvolvimento humano análogo ao que Jung denominou “processo de
individuação” (BYINGTON, 1995, p. 55).
Neste ponto, serão retomadas proposições de Levy, visando exemplificar a
sintonia do seu pensamento às ideias junguianas, amplificadas por Byington na obra
acima comentada. Para Levy, o pensamento “individual” é ilusão: “Minha língua e
minha cultura falam em mim” (LEVY, 2001[a], p. 173). A fala da cultura, por sua vez,
expressa as inúmeras vozes de toda a humanidade, características de cada cultura,
sintetizadas e expressas nas falas de cada indivíduo. No entanto, esse caráter
“transpessoal do pensamento” não leva o autor à desvalorização do indivíduo, mas, ao
contrário, o conduz à “ideia infinitamente regozijante de que todo espírito está
(virtualmente) presente em cada um”. Para Levy: “É o universo que pensa e passa em
nós” (LEVY, 2001[a], p. 173). Parece que atualmente esse processo pode ser
claramente percebido e conscientizado, ao menos em algumas etapas, pois acontece
diante dos nossos olhos - ainda que em forma virtual - na WEB.
Estas reflexões sobre as novas formas de construção do saber não pretendem
esgotar tema tão amplo, complexo e recentemente possível de ser objetivado sob a
ótica das tecnologias de comunicação digitais. Ao contrário, pretendem apenas
ressaltar sua relevância e algumas perspectivas segundo as quais pode vir a ser mais
amplamente abordado, especialmente pela Psicologia Analítica.
167
CONSIDERAÇÕES FINAIS
_______________________________________________________________
Somos céus atravessados por nuvens de
energias vindas da profundidade dos tempos.
(LEVY, 2001, p. 174)
O conjunto dos casos descritos nos capítulos anteriores evidencia que a
presença do ser humano no espaço da virtualidade é um fato, e não uma opção de
realidade a ser feita segundo preferências pessoais, ou de acordo com convicções
teóricas. A estrutura da Sociedade em Rede, prevista por Wiener (1958) e descrita por
Casttells (2005), permeia de maneira cada vez mais entrelaçada e entretecida a vida
presencial da atualidade. Essas constatações se tornam ainda mais impactantes se
considerado o breve intervalo de tempo decorrido entre o surgimento da WEB, sua
configuração mais recente e a difusão das inúmeras formas de sua utilização.
Está em pauta, nas considerações da atualidade, não a simples opção pela
experimentação - ou não - da virtualidade ou pela vida exclusivamente presencial,
mas, que tipo de vida pretende-se experimentar - e construir - após o advento do
ciberespaço. Como evoluirão as relações, as formas de ensinar e aprender, as
maneiras de estar no mundo já híbrido dos dois níveis da realidade.
Levy (2007) anteviu o surgimento de um novo tipo de “nomadismo” humano: “O
desenvolvimento dos novos instrumentos de comunicação inscrevem-se em uma
mutação de grande alcance, à qual ele impulsiona, mas que o ultrapassa. Numa
palavra: voltamos a ser ‘nômades’” (Ibid., p. 13). O autor não está se referindo apenas
à intensificação dos deslocamentos humanos de um ponto a outro da Terra, também
destacado quanto em outros momentos da sua obra (Ibid. p. 36-37), mas às
comunicações “transversais” viabilizadas pelas ferramentas virtuais que aceleram as
transformações científicas, técnicas econômicas, profissionais, mentais etc. Para Levy,
“somos imigrantes da subjetividade” (Ibid., p. 14) e nosso “processo de hominização
ainda não terminou” (Ibid., p. 146), mas passa atualmente por uma intensa aceleração,
tanto do ponto de vista quantitativo quanto qualitativo.
168
No entanto, conforme se verifica na revisão da literatura, com raras exceções
ainda é restrito, pontual e delimitado o estudo sobre os efeitos dessas transformações
sobre a subjetividade humana, sob a ótica da psicologia. A percepção da aceleração
evidencia-se no diálogo cotidiano das pessoas e em outras áreas das ciências
humanas, mas ainda não ocupou o espaço devido nas considerações da psicologia
em geral e da Psicologia Analítica em particular.
Entre os psicólogos os efeitos e dimensões dessa condição coletiva ainda são
captados de maneira relativamente vaga, na forma de certo incômodo pessoal ainda
pouco elaborado quanto às suas repercussões no desempenho e atuação
profissionais. Em “Solidão e desamparo na prática clinica”, Leitão (2006) apresenta
resultados da pesquisa na qual entrevistou psicoterapeutas sobre como se sentiam
diante das vivências virtuais relatadas por seus clientes. O resultado da investigação
indica um tipo inusitado de impacto, relatado pelos profissionais da psicologia que
atuam na clínica, e por aqueles dedicados à pesquisa:
Aqueles que têm como objetivo o estudo das transformações
subjetivas introduzidas pela Internet estão, sem dúvida, mais
próximos da turbulência gerada por esses impactos. No entanto,
aqueles que se pensavam bem distantes dos efeitos da difusão da
Rede, também foram atingidos por eles. Cabe a todos nós, portanto,
a reflexão crítica sobre os efeitos desse período de turbulência sobre
nós mesmos e sobre o nosso campo de conhecimento. (LEITÃO,
2006, p. 159)
Os pesquisadores da psicologia ainda não se apropriaram do tema na
proporção exigida. Portanto, não se mobilizaram no sentido de produzir as
contribuições que estão capacitados a elaborar para a elucidação conceitual dos
processos psíquicos em curso no campo da virtualidade. Uma das condições que
poderá favorecer avanços nessa pesquisa psicológica é a aproximação com outras
áreas do conhecimento. Não apenas em relação aos especialistas das áreas da
informática – conforme ressaltado em capítulo anterior
104
-, mas também por meio do
estreitamento do contato e das trocas com as demais áreas já envolvidas nesses
estudos: comunicações, filosofia, antropologia, educação, neurociências e os
estudiosos já dedicados ao desenvolvimento da “inteligência artificial”. Além das
análises e hipóteses apresentadas no decorrer dos capítulos anteriores, as
considerações finais pretendem reforçar algumas dessas possibilidades.
104
Referimo-nos à revisão da literatura.
169
Ao lado do identificação do potencial da WEB como campo propício à
ampliação da consciência e integração dos aspectos criativos da personalidade dos
internautas, é necessário reconhecer os riscos potencialmente envolvidos nas
vivências e contatos humanos realizados no universo da virtualidade. Retomando o
episódio vivido por Angela (a adolescente enamorada pelo fake), apresentado na
abertura do item 5.1, questiona-se: seria ele realmente um jovem enamorado,
conforme declarou o seu fake? Ou um adulto movido por intenções ilegais ou ilícitas?
A rigor, poderia ser qualquer pessoa. O assédio a jovens e crianças na WEB, por parte
de adultos que visam seduzi-los para a prática da pedofilia ou do sexo virtual, é
apenas uma das variantes de manifestação da sombra, comuns no ciberespaço.
Em qualquer espaço no qual o humano se instala, o inconsciente também o
acompanha e encontra canais de manifestação. O anonimato e a suposta impunidade
propiciados pelo ciberespaço estimulam os internautas predispostos a algum tipo de
transgressão a utilizar identidades virtuais para a prática de atividades ilícitas ou
ilegais. Não se pretende retomar as considerações apresentadas sobre a presença
dessas manifestações no espaço da virtualidade, mas cabe o alerta sobre o risco de
se incorrer no cultivo de uma idealização romântica e ingênua a respeito das vivências
humanas realizadas nos vastos domínios da Internet.
No entanto, a constatação de que conflitos, aspectos imaturos ou mesmo
patológicos do ser humano marcam presença na WEB - como em todos os espaços
habitados pelo homem -, não deveria surpreender, mas, ao contrário, estimular as
observações e análises sobre os domínios da virtualidade. Tendo em mente, por
exemplo, o pronunciamento várias vezes enunciado por Sándor em suas aulas,
ministradas no Instituto Sedes Sapientiae de São Paulo: “Sempre que as forças da Luz
têm uma autorização para se manifestar, as forças das trevas obtêm licença igual”
(SÁNDOR, 1991). Para Sándor, concordando com Jung, ao humano cabe o livre-
arbítrio, além da ampliação da consciência, individual e coletivamente.
Em se tratando do coletivo - e da sombra coletiva – retoma-se outro exemplo
relatado no item 5.3.1, visando ampliar a reflexão sobre as repercussões da
democratização do acesso aos bens culturais. Conforme ressaltado na descrição do
comportamento dos internautas que compartilham arquivos na WEB, há autores que
advogam a necessidade de revisões e atualizações dos códigos regentes do direito à
propriedade artística e intelectual, a partir do novo contexto mundial criado pela
virtualização das informações. As tradicionais fórmulas regulamentadoras dessa
170
matéria têm se demonstrado inadequadas, ou mesmo obsoletas em diferentes
esferas: econômicas, financeiras e mesmo quanto a alguns princípios mais amplos,
implícitos nas normas coletivas. Dowbor (2007), por exemplo, analisa os dilemas da
chamada “democracia econômica” em paralelo à “economia do conhecimento”,
surgida a partir da criação das novas tecnologias, e afirma:
Andamos todos um tanto fracos na compreensão destas novas
dinâmicas, oscilando entre visões tétricas do Grande Irmão, ou uma
idílica visão da multiplicação das fontes e meios que levariam a uma
democratização geral do conhecimento. A realidade, como em tantas
questões, é que as simplificações não bastam, e que devemos fazer
a lição de casa, estudar o que está acontecendo. (DOWBOR, 2007,
p. 84)
Reconhece, na passagem do século XX para o XXI, uma importante transição:
a evolução da economia centrada na “propriedade dos meios de produção” para outra,
focada na “propriedade intelectual”. Assim, se estaria transitando da era na qual a
ênfase econômica recaía na produção de bens materiais, para uma sociedade que
deverá ter como eixo a produção do conhecimento, mas ainda regida pelas leis da era
industrial. Na sociedade do conhecimento, o “produto” em negociação só se
transforma em valor monetário quando apropriado por alguém, que passa a cobrar
uma espécie de “pedágio” como via de acesso a esse bem (Ibid., p. 85). Porém, o
novo produto - o conhecimento – é indefinidamente reproduzível. O autor ressalta a
importância da revisão das relações de produção e distribuição desses novos bens de
consumo (Ibid. p. 86):
A questão central de como produzimos, utilizamos e divulgamos o
conhecimento envolve, portanto um dilema: por um lado é justo que
quem se esforçou para desenvolver conhecimento novo seja
remunerado por seu esforço; por outro lado, apropriar-se de uma
idéia como se fosse um produto material termina por matar o esforço
de inovação.
A reorganização da economia foi antecipada por Levy (2001), ao refletir sobre
as tendências “unificadoras” do mercado planetário: “Em uma economia global em que
o conhecimento se tornou o principal fator de concepção, de produção, de venda e,
finalmente produto, qualquer comércio é um comércio de idéias mais ou menos
objetivadas” (LEVY, 2001, p. 55).
Ainda na esfera jurídica, outra polêmica se instalou a partir da publicação de
obras ou ofertas de serviços virtuais, pois frequentemente seus autores se valem das
diferenças entre os códigos legais vigentes nos países nos quais estão alocados os
171
“servidores” que hospedam seus sites. Exemplo: um internauta pode colocar on-line
algum tipo de conteúdo – considerado como antiético, ilícito ou ilegal pela legislação
do seu país - em provedor situado fora do seu local de origem ou residência
105
,
tentando escapar às sanções legais. Situações desse tipo não são raras e mostram a
necessidade de revisão dos códigos e acordos internacionais relativos às intersecções
das legislações locais e globais.
Em suma, os efeitos do conjunto de ações exercidas na WEB podem ser
observados e analisados restritamente, quanto às repercussões pontuais tidas como
subversivas à ordem vigente do ponto de vista ético, legal ou financeiro. Mas deveriam
ser considerados em perspectiva mais ampla, se analisados em relação aos
significados implícitos às necessidades de revisão das normas coletivas que acabam
mobilizando, agora não mais apenas em termos nacionais, mas também planetários.
Parece incontestável: as tradicionais formas regionalizadas de regulamentação se
mostram anacrônicas e ineficazes para o controle da circulação global de bens,
serviços ou produtos, especialmente quando o bem em pauta se traduz como “produto
informação / conhecimento”, característico da economia planetária. A observação de
fatos recentes veiculados na imprensa (por exemplo, o compartilhamento de
gravações musicais) demonstra que, quanto mais se acirram as tentativas tradicionais
/ patriarcais de controlar os comportamentos de internautas tidos como subversivos da
ordem vigente, mais rapidamente soluções alternativas são cridas pelos protagonistas.
A dinâmica dessa reação coletiva em direção à renovação é descrita por Byington:
Quando aumenta a exuberância patriarcal, o trickster, na sua função
heróica, se torna claramente transgressor. [...] Na alteridade, no
entanto, o trickster exerce sua função heróica de expressar o
Arquétipo Central enfrentando os cânones patriarcais pela astúcia,
humor e criatividade, subvertendo a maneira tradicional de ver o
mundo e desequilibrando a ordem estabelecida. Sem exercer o
antagonismo patriarcal radical, o trickster ultrapassa o dever
convencional e reúne as polaridades, inclusive a vida e a morte, no
processo de autorealização. (BYINGTON, 2008, p. 234).
Conforme itens anteriores, simultaneamente aos comportamentos virtuais –
individuais e coletivos – geradores de estranheza, questionamento ou polêmica pelos
observadores externos (ocupando maior espaço na mídia), outra gama de ações e
processos criativos manifestam-se no ciberespaço em formas mais discretas, e talvez
105
Esse tipo de recurso vem sendo utilizado por alguns psicólogos brasileiros que oferecem TOL (Terapia On-Line)
veiculando anúncios em sites do exterior. Dessa forma, tentam driblar as normas estabelecidas pela resolução No.
012/2005, do CFP, que regulamenta os atendimentos psicológicos mediados por computadores.
172
menos visíveis ao observador pouco atento. Mas, nem por isso são menos
significativas quanto ao potencial de renovação e aceleração da evolução coletiva.
As novas formas de construção do saber apresentadas no item 5.5 - integradas
às vias da sua difusão e partilha -, já desempenham função significativa na ampliação
da consciência, individual e coletivamente. A análise de algumas modalidades permite
perceber que a ampliação não ocorre apenas em termos cognitivos ou intelectuais,
mas se expressa como transformações de atitudes e disposições psíquicas do ser
humano da era da informação. Entre as mudanças de atitude, uma foi antecipada por
Byington (2004), ao comentar as implicações do surgimento do computador para as
futuras formas de lidar com o próprio conhecimento (BYINGTON, 2004, p. 37):
Depois do desenvolvimento do computador, a capacidade de
memorização do Ego tornou-se algo tão irrisório que toda a empáfia
do Ego de armazenar erudição sem vivência foi desmoralizada.
Acabou-se a glória das pessoas eruditas que citavam de cor o
conteúdo das páginas dos grandes autores. [...] Desta forma, a
tecnologia favorece o abandono do culto do saber enciclopédico,
economizando energia para cultivar o saber de Ser, que nenhuma
máquina pode nos dar. O computador, além de ser uma máquina
maravilhosa para armazenar erudição, tornou-se assim um fiel
escudeiro na jornada heróica para separar a erudição da sabedoria.
Alguns desses efeitos já se fazem sentir coletivamente, promovidos pela
facilitação do acesso às informações: conforme relatamos no item 5.3.1, o acesso de
leigos a sites informativos sobre doenças e tratamentos já motivam pesquisas e
discussões a respeito das relações entre os médicos e seus clientes. Segundo
Guggenbül-Craig (1987, p. 101-106), um dos obstáculos ao bom êxito da relação
médico
 cliente (e das demais relações de ajuda, incluindo a psicoterapia) é a
cisão do arquétipo “curador-ferido”. Essa cisão, por sua vez, tende a se acentuar
sempre que o complexo do “poder” ganha espaço indevido nessa relação, sendo que
uma das formas de se deter poder nessas situações é ser “dono do saber”. A
facilitação do acesso às informações tem promovido a revisão do desempenho dos
papéis (e respectivos “poderes”) vigentes nessas relações, de médicos e
psicoterapeutas diante dos seus clientes.
Na esfera da educação há sinais equivalentes. Mesmo na educação presencial
tradicional, a introdução das ferramentas informatizadas (nas aulas ou mesmo na vida
extraescolar dos alunos) por si mesma altera e exige revisões dos papéis
desempenhados nas relações professor
 aluno e nas próprias concepções de
ensino. As aulas convencionais, onde alguém supostamente apenas “ensina”
173
enquanto outros apenas “aprendem”, já não conseguem manter a atenção dos jovens,
que têm à disposição recursos multimídia interativos, capazes de estimular suas
potencialidades de maneira muito mais atraente e interessante. O próprio papel da
escola passa por revisões e atualizações, gerando a possibilidade promissora de uma
efetiva reforma de ensino acabar por acontecer como resultado de uma mobilização
coletiva “horizontal”, em lugar das tradicionais tentativas anteriores, implantadas por
meio da legislação, de forma “vertical”.
O psicólogo do futuro deverá estar preparado para atuar nesse novo contexto
qualquer que seja sua área de intervenção. Mas, para que possa desempenhar seu
papel a contento, será necessária a construção de um saber psicológico pertinente,
que alcance, abarque e inclua a vivência da virtualidade não mais como exceção, mas
como mais uma dentre as condições da vida humana da atualidade.
Esse profissional poderá ainda reconhecer o potencial das ferramentas
informatizadas como recurso de apoio para a criação de novas formas de intervenção
psicológica. Não para - como supõem e temem alguns – substituir as tradicionais
modalidades de atendimento, mas como preciosos instrumentos de ampliação do
acesso das populações aos novos serviços psicológicos que poderão ser criados por
esses meios.
Certamente muitas outras facetas da WEB e dos comportamentos dos
internautas – além dos aqui relatados – mereceriam ser selecionados e considerados.
Estamos cientes de que cada temas aqui abordado permitiria ainda diversas
considerações. O mesmo pode ser dito em relação ao ciberespaço, o qual, por estar
em ampliação contínua, em alguns dos aspectos aqui mencionados provavelmente já
se transmutou durante a elaboração das análises aqui apresentadas. Mas, por fim -
pois deve-se finalizar - se este trabalho despertar em seus leitores o interesse pela
continuidade da investigação dos temas propostos, terá cumprido seu objetivo.
Retomando a ideia de Campbell - mencionada no item 5.2 - a respeito da
“mitologia da atualidade”, é possível agora reconsiderá-la em paralelo às proposições
de Levy. Disse Campbell: “o único mito de que valerá a pena cogitar, no futuro
imediato, é o que fala do planeta e de todas as pessoas que estão nele”. (CAMPBELL,
J. & MOYERS, B, 1990, p. 33-34). Na época, essa era sua idéia fundamental do mito
que estaria por vir: um mito relativo à humanidade reunida em uma nação planetária,
sem fronteiras, semelhante à imagem da Terra quando “avistada da Lua”.
174
A visão de Campbell parece antecipar o evento que, na concepção de Levy, se
concretiza. Ao avaliar os efeitos planetários do desenvolvimento da inteligência
coletiva Levy prevê o “fim das fronteiras“, que são, na atualidade, como “ruínas, em
pé, de um mundo em revolução” (LEVY, 2001, p. 33). Segundo o autor: “Pela primeira
vez a idéia de uma Terra sem fronteiras não aparece como a aplicação de um
princípio abstrato ou como um devaneio utópico, mas como o prolongamento realista
de uma tendência que cada um pode observar”. (Ibid., p. 36)
Nesse planeta, visto do alto, os habitantes de um novo tempo-espaço
aguardam pela atenção e análise do psicólogo: novo campo de expressão, expandido,
multifacetado, misterioso às vezes, mas extremamente familiar, pois nele habitamos.
175
REFERÊNCIAS
_______________________________________________________________
ABREU, C. N. et al. Dependência de Internet e de jogos eletrônicos: uma revisão.
Revista Brasileira de Psiquiatria. São Paulo, v. 30, n. 2, Junho/08. Disponível em:
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1516-
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189
GLOSSÁRIO 1 - Termos junguianos
_______________________________________________________________
Anima – As imagens arquetípicas do eterno feminino na consciência de um homem,
que formam um elo entre a consciência do ego e o inconsciente coletivo, e abrem
potencialmente um caminho para o Si mesmo (SELF) (STEIN, 1998, p. 205).
Animus – As imagens arquetípicas do eterno masculino na consciência de uma
mulher que formam um elo entre a consciência do ego e o inconsciente coletivo, e
abrem potencialmente um caminho para o Si mesmo (SELF) (STEIN, ibid.).
Arquétipo - Padrão potencial inato de imaginação, pensamento ou comportamento,
encontrado entre seres humanos em todos os tempos e lugares (STEIN, ibid.).
Complexo – “Um complexo é um aglomerado de associações – espécie de quadro de
natureza psicológica mais ou menos complicada – às vezes de caráter traumático,
outras, apenas doloroso e altamente acentuado.” (JUNG, 1989, § 148). “O complexo
forma, por assim dizer, uma pequena psique fechada, cuja fantasia desenvolve uma
atividade própria” (JUNG, 1985, § 125).
Ego – Centro da consciência, o “eu” (STEIN, ibid.).
Eros – Relativo às funções regentes do principio feminino: o que une, conserva,
promovendo o relacionamento (JUNG. Cartas. v II, p. 71 e 152, 2002).
Fantasia – “Atividade espontânea da alma, que sempre irrompe quando a inibição
provocada pela consciência diminui ou cessa por completo, como no sono. Durante o
sono, a fantasia manifesta-se em forma de sonhos. Mas mesmo acordados,
continuamos sonhando subliminarmente, e isso principalmente devido aos complexos
recalcados ou de algum modo inconscientes” (JUNG, 1985, § 125).
Imaginação – Jung distingue os termos fantasia e a imaginação: “Realmente prefiro o
termos “imaginação” a “fantasia”, pois existe diferença entre as duas coisas [...] a
190
fantasia é coisa meramente sem sentido, um fantasma, uma impressão passageira;
mas a imaginação é ativa, cheia de propósitos criadores” (JUNG, 1989, § 396).
Imaginação ativa – “[...] a imaginação ativa, como o termo o denota, designa imagens
dotadas de vida própria e os acontecimentos simbólicos se desenvolvem de acordo
com uma lógica que lhes é peculiar – quer dizer, logicamente, se a imaginação
consciente não interferir”. (JUNG, 1989, § 397). O termo refere-se também a um dos
“métodos de investigação dos processos psicológicos inconscientes” propostos por
Jung (JUNG, ibid, § 4).
Inconsciente / Inconsciente coletivo – Porção da psique situada fora do
conhecimento consciente. Os conteúdos do inconsciente são constituídos por
memórias recalcadas e por material, como pensamentos, imagens e emoções, que
nunca foi consciente. O inconsciente está dividido em inconsciente pessoal, o qual
contém os complexos, e o Inconsciente Coletivo, que aloja as imagens arquetípicas
e os grupos de instintos (STEIN, 1998, p. 205).
Individuação – O processo por meio do qual: “Uma pessoa torna-se si mesma, inteira,
indivisível e distinta de outras pessoas ou da psicologia coletiva (embora também em
relação com estas)” (SAMUELS, A., SHORTER, B., PLAUT, F., 1988, p. 107).
Logos - Relativo à linha mestra da atitude masculina em geral; corresponde ao
elemento que propicia a discriminação, base necessária para a o julgamento
intelectual (JUNG, ibid., § 265).
Persona – Interface psíquica entre o indivíduo e a sociedade, que constitui a
identidade social de uma pessoa (STEIN, ibid., p. 206).
Realidade psíquica – “Todas as percepções dos meus sentidos que me impõem um
mundo de objetos espaciais e impenetráveis, são imagens psíquicas que representam
minha única experiência imediata, pois somente eles são os objetos imediatos da
minha consciência. Minha psique, com efeito, transforma e falsifica a realidade das
coisas em proporções tais, que é preciso recorrer aos meios artificiais para constatar,
o que são as coisas exteriores a mim; é preciso constatar, por ex., que um som é uma
vibração do ar de certa frequência e que uma cor é determinado comprimento de onda
da luz. [...] Tudo o que nos é possível conhecer é constituído de material psíquico. A
psique é a entidade real em supremo grau, porque é a única realidade imediata. É
191
nesta realidade, a realidade do psíquico, que o psicólogo pode se apoiar” (JUNG,
1984, § 680).
Self / Si-mesmo – “O centro, fonte de todas as imagens arquetípicas e de todas as
tendências psíquicas inatas para a aquisição de estrutura, ordem e integração”
(STEIN, 1988, p. 206).
Sincronismo / Sincronicidade – “Para meu próprio uso, cunhei um termo que ilustra
essa existência simultânea; penso que existe um princípio particular de sincronicidade
ativa no mundo, fazendo com que fatos de certa maneira aconteçam juntos como se
fossem um só, apesar de não captarmos essa integração.” (JUNG, 1989, § 70). Ou
ainda: “A sincronicidade é definida como uma coincidência significativa entre eventos
psíquicos e físicos” (STEIN, ibid. p. 186).
Sombra – Os aspectos rejeitados e inaceitáveis da personalidade que são recalcados
e formam uma estrutura compensatória para os ideais de si mesmo do ego e para a
persona (STEIN, ibid. p. 206).
192
GLOSSÁRIO 2 - Termos de uso corrente entre os internautas
_______________________________________________________________
Avatar – Personagem virtual criado para fazer parte de um jogo on line; pode ser
considerado como a imagem do ‘eu virtual’ (FARAH, org., 2004, pág. 221).
Banda larga – Denominação usada para definir qualquer conexão à Internet acima da
velocidade padrão dos modens analógicos (56 Kbps). Existem várias modadlidades de
banda larga, mas, em geral seu custo é em média bem mais acessível do que o custo
da conexão por meio de linha telefônica convencional.
Fonte: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Banda_larga>
Blogs – Endereços da WEB (semelhantes aos sites) disponibilizados pelos próprios
provedores de acesso à Internet para uso pessoal dos internautas. Geralmente são de
fácil manejo, permitindo que seus autores editem e façam a manutenção do conteúdo.
Permitem ainda a interatividade com os visitantes, que deixam registrados
comentários e observações sobre o material postado.
Blu-ray – Do inglês: “raio azul” – refere-se ao disco óptico considerado atual sucessor
do DVD. Com maior capacidade de registro (equivalente a cinco CDs), permite a
gravação de filmes em alta definição em mídia de aspecto muito semelhante e
dimensões equivalentes. O termo “azul” refere-se ao tipo de raio laser utilizado para a
leitura dos dados.
Bullyng - Denominação dada às provocações e constrangimentos que algumas
pessoas infligem a outras, alvos escolhidos possivelmente por portarem alguma
característica que as diferencia da maioria (gordinhos, magrinhos, pertencentes a
grupos raciais minoritários etc.). Uma de suas variantes é o Cyberbulling, na qual os
mesmos tipos de constrangimentos podem ser causados, agora pelas vias virtuais.
CMC – Sigla frequentemente usada entre os estudiosos da área, para se referir à
Comunicação Mediada por Computadores.
193
Cibernética - Do grego cybernetics: Estudo comparativo dos mecanismos de
comunicação e de controle nas máquinas e nos seres vivos, do modo como se
organizam, regulam e aprendem; Fonte: Aulete – Dicionário digital (versão on-line).
Cibercultura – Refere-se ao conjunto de técnicas (materiais e intelectuais) de
práticas, de atitudes, de modos de pensamento e valores que se desenvolvem
juntamente com o crescimento do ciberespaço (LEVY, 2000, p. 17).
Ciberespaço – Também utilizado como sinônimo de Internet é o novo meio de
comunicação surgido a partir da interconexão mundial dos computadores. O termo
especifica não apenas a infraestrutura mundial da comunicação digital, mas também o
universo oceânico de informações que ela abriga, e os seres humanos que navegam e
alimentam esse universo. Termo proposto por Pierre Levy (LEVY, 2000, p. 17).
Comunidades virtuais – Agregações sociais que emergem da Internet quando várias
pessoas entram em discussões públicas, com carga de afeto suficiente para formar
teias de relacionamentos pessoais no ciberespaço. Algumas se mantêm apenas no
espaço virtual. Outras, porém, transpõem seus contatos para o âmbito presencial,
chegando a marcar encontros regulares.
DownloadDerivado do inglês down: ato de baixar arquivos ou programas,
disponíveis na WEB, para instalá-los ou assisti-los (no caso de filmes ou gravações
musicais) no computador.
FakeDo inglês “fake” (falso), o termo designa um dos tipos de identidade virtual
criadas para a participação nas comunidades virtuais, especialmente no Orkut, mais
comum entre adolescentes. Ao contrário da maioria das identidades virtuais
assumidas pelos internautas, um perfil fake costuma ser sabidamente “falso”, isto é, os
jovens que os utilizam mantêm relacionamentos entre si (na WEB) sem esconder que
estão protagonizando um personagem virtual.
Feeds (do Twitter) – Do inglês “alimento”, refere-se aqui aos conteúdos trocados
pelos participantes dessa rede social.
Fotolog (ou FLOG) – Registro publicado na WEB com fotos colocadas em ordem
cronológica, ou apenas inseridas pelo autor sem ordem, de forma semelhante a um
blog. Ainda pode haver legendas, retratando momentos de lazer. A diferença em
194
relação a um blog é a predominância de fotos ao invés de texto. A palavra é uma
abreviação de fotolog, que por sua vez surge da justaposição de ‘foto’ e ‘blog’ (do
inglês, diário). Fonte: <http://pt.wikipedia.org/wiki/flog> Acesso em 08/08/08.
Google - Um dos mais utilizados sites de busca da atualidade: consiste basicamente
de um programa (do tipo “banco de dados”) dedicado a localizar na WEB as mais
variadas informações. Endereços de acesso ao site: <www.google.com> ou
<www.google.com.br>.
Hacker – No conceito popular atual, o hacker é o indivíduo que acessa um sistema
computacional sem autorização, visando fins ilícitos. Historicamente, porém, a função
original dos hackers era a demonstração das falhas dos sistemas e das redes de
computadores. A rigor, invasores maliciosos e os ciberpiratas que agem com o intuito
de violar ilegal ou imoralmente sistemas cibernéticos seriam os crackers, e não os
hackers.
Hipertexto – Texto em formato digital, ao qual se agregam outros conjuntos de
informação na forma de blocos de textos, imagens ou sons, cujo acesso se dá através
de referências específicas denominadas hiperlinks, ou simplesmente links. Os links
permitem destacar termos no corpo de texto principal, e têm a função de interconectar
os diversos conjuntos de informação, oferecendo acesso a informações que estendem
ou complementam o texto principal. O leitor “navega” entre os vários blocos de texto
conectados ao texto principal. Essa forma de “navegar” entre os blocos de informação
interligados é típica da Internet. Fonte: <http//pt.wikipedia.org/wiki/hipertexto> - Acesso
em 15/07/08
I Pod - Marca registada da Apple Inc., e refere-se a uma série de tocadores de áudio
digital projetados e vendidos pela Apple.
Fonte: < http://pt.wikipedia.org/wiki/I_pod > Acesso em 15/06/09.
IRC - Internet Relay Chat - Modalidade de comunicação bastante utilizada na
Internet, basicamente para bate-papo e troca de arquivos, permitindo a conversa em
grupo ou privada. Surgiu em 1993, tornando-se muito popular no final dos anos 90.
Atualmente foi substituido pelos mensageiros instantãneos como o MSN e sites de
relacionamento como o Orkut e o My Space.
195
Interface – Na acepção original, o termo significa a superfície entre dois espaços; No
contexto da Internet, as imagens atualizadas na tela do computador correspondem à
interface existente entre o usuário e o sistema operacional da máquina. Refere-se
ainda ao conjunto de imagens que virtualmente criam um ambiente de navegação.
Kazaa – Programa de computador destinado ao compartilhamento de arquivos po
meio da tecnologia P2P. Permite a troca de arquivos de música, imagens e outros
arquivos do género. Muito perseguido pela RIAA, a associação das gravadoras norte-
americanas, pela troca de arquivos ilegais, pois geralmente os registros
compartilhados contém obras protegidas por direitos autorais.
KindleDo inglês, o termo kindle significa “brilhar”, “entusiasmar”, “incitar”. Neste
contexto refere-se ao equipamento compacto criado pela Amazon – a conhecida
livraria virtual norte-americana, com a função principal de ler e-books (livros
digitalizados disponíveis na Internet) podendo também funcionar como aparelho
receptor de jornais, revistas ou outras publicações digitalizadas. Dependendo do
modelo (ou versão) o Kindle pode ter autonomia de funcionamento (carga de bateria)
de vários dias, capacidade de armazenar de centenas a milhares de livros e outras
publicações.
Lan house – Estabelecimento comercial dedicado principalmente à prática de jogos
informatizados em rede, utilizado também pelos seus freqüentadores para navegação
e outras funções de comunicação que dependam da conexão à Internet.
Link – A palavra inglesa link entrou na língua portuguesa por via de redes de
computadores (em especial a Internet), para designar as hiperligações do hipertexto.
Significa “atalho”, “caminho” ou “ligação”. Pelos links é possível produzir arquivos não
lineares ou simplesmente inserir ilustrações em arquivo de texto. Fonte:
<http//pt.wikipedia.org/wiki//link> Acesso em 17/07/08
Modem – O termo vem da junção das palavras modulador e demodulador: dispositivo
eletrônico que modula o sinal digital em onda analógica, pronta a ser transmitida pela
linha telefônica, e demodula o sinal analógico e o reconverte ao formato digital original.
Utilizado para conexão à Internet, BBBs ou a outro computador.
Morfheus – Programa de compartilhamento de arquivos, semelhante ao Kazaa,
descrito acima.
196
MSN – O mesmo que Microsoft Network, o MSN é simultaneamente portal (site) e rede
de serviços oferecidos pela Microsoft. A sigla tornou-se bastante popular quando um
dos seus serviços – o programa de comunicação instanânea - passou a ser utilizado
pelos internautas para o estabelecimento de contatos via Internet, por meio de
conversas que podem ser realizadas em “tempo real”. Recurso de comunicação dos
mais usados pelos adolescentes, mesmo enquanto desempenham, simultaneamente,
outras atividades de navegação.
MySpace - MySpace (disponível em <http://www.myspace.com> é um serviço de rede
social que utiliza a Internet para comunicação on-line por meio de rede interativa de
fotos, blogs e perfis de usuário. É no momento a maior rede social em uso na WEB,
com mais de 110 milhões de usuários. Inclui um sistema interno de e-mail, fóruns e
grupos. MySpace é um site muito ativo, com novos membros entrando no serviço
diariamente e novos recursos adicionados com freqüência. A crescente popularidade
do site e sua habilidade em hospedar MP3s fizeram muitas bandas e músicos se
registrar, algumas vezes tornando a página de perfil seu site oficial. Fonte:
<http//pt.wikipedia.org/wiki/My_Space> Acesso em 10/08/08.
Nanotecnologia – Tecnologia associada a diversas áreas (medicina, eletrônica,
computação, física, quimica, biologia, etc.) de pesquisa e produção na escala nano
(escala atômica). O princípio básico é a construção de estruturas e novos materiais a
partir dos átomos (tijolos básicos da natureza). É uma área promissora: embora ainda
em desenvolvimento, mostra resultados surpreendentes (como na produção de
semicondutores, nanocompósitos, biomateriais, chips, entre outros). Fonte:
<http://pt.wikipedia.org/wiki/Nanotecnologia> Acesso em 10/09/08.
Newsgroups – O mesmo que “grupos de discussão” correspondem a espaços virtuais
onde os participantes fazem perguntas a outros internautas, ou acessam respostas já
dadas a questões de seu interesse, formuladas por outras pessoas. Normalmente,
cada grupo se dedica a apenas um tema. O conjunto de participantes é considerado
uma comunidade de ajuda mútua em relação a questões ou problemas comuns. A
noção de comunidade, embora abranja o conceito de harmonia, generosidade e até
mesmo fraternidade, também envolve a expressão de conflitos e disputa de
interesses, mais ou menos explícitos.
197
Nick – Abreviação de nick name: nome fictício adotado pelos internautas nas suas
incursões no ciberespaço. Mais do que simples apelido, o nick passa a ser parte
integrante da identidade virtual do sujeito, de forma bastante intensa e muitas vezes
apaixonada e/ou reveladora das suas intenções e propósitos na vida virtual.
Orkut – Um dos mais populares sites da Net, o Orkut (disponível em:
<www.orkut.com.br>) congrega inúmeras comunidades virtuais, em torno dos temas
variados. Em princípio, qualquer pessoa pode se inscrever nesse site, e a partir dessa
inscrição cria a sua própria comunidade ou ingressa nas existentes. É muito utilizado
para a localização de pessoas, por meio de pesquisa dos “perfis” dos usuários.
Presencial – Termo usado para definir contatos, encontros ou relacionamentos que
ocorrem face a face, ou seja, sem a intermediação do computador.
Realidade Virtual (RV) – Tecnologia que propicia uma interface avançada entre o
usuário e o sistema computacional. O objetivo desse recusro é recriar ao máximo a
sensação de realidade durante a navegação nesse sistema. Em suma, trata-se de
uma realidade ficcional, experimentada através de relações intelectuais, a
compreendemos muito semelhante ao universo “real” que conhecemos. Fonte: <
http://pt.wikipedia.org/wiki/Realidade_virtual> Acesso em 19/05/09.
Second Life - Também abreviado como SL, é um ambiente virtual tridimensional que
simula alguns aspectos da vida real e social do ser humano. Desenvolvido em 2003,
mantido pela empresa Lindem Lab. Dependendo do tipo de uso, é encarado como
jogo, mero simulador, comércio virtual ou rede social. O nome "second life" significa,
em inglês "segunda vida", interpretada como "vida paralela", uma segunda vida além
da vida "principal" e "real". Dentro do jogo, o jargão utilizado para se referir à "primeira
vida", ou seja, à vida real do usuário, é "RL" ou "Real Life" que se traduz literalmente
por "vida real".
Semicondutores - Sólidos cristalinos de condutividade elétrica intermediária entre
condutores e isolantes. Os elementos semicondutores podem ser tratados
quimicamente para transmitir e controlar as correntes elétricas. Seu emprego é
importante na fabricação de componentes eletrônicos, como diodos, transistores e
outros, de diversos graus de complexidade tecnológica: microprocessadores e
nanocircuitos, usados em nanotecnologia. Atualmente, o elemento semicondutor é
198
primordial na indústria eletrônica e confecção de seus componentes. Fonte:
<http://pt.wikipedia.org/wiki/Semicondutor> Acesso em 10/09/08.
Servidores ou provedores de acesso - Em inglês Internet Service Provider, ISP -
são sistemas de computação que fornecem serviços a uma rede de computadores.
Esses serviços são de natureza diversa, como correio eletrônico, hospedagem de sites
e blogs, entre outros.
Fonte: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Provedor_de_acesso_%C3%A0_Internet>
Acesso em 22/07/08
Sexo virtual - Espécie de masturbação a dois, realizada em conexão, na qual as
pessoas se excitam de acordo com o que o parceiro escreve na tela do computador, a
descrição de seu corpo e fantasias sexuais. Atualmente também ocorre com a
utilização de WebCams.
4Shared Site destinado ao compartilhamento de vários tipos de arquivos: Musicais,
filmes, livros, etc.; Disponível em: <http://www.4shared.com/>
Skype – Programa que permite a comunicação telefônica - e a conversação - entre
duas ou mais pessoas, via computador. Por meio desse programa as ligações são
realizadas via WEB, barateando significativamente o custo.
Smartphones – Do inglês, telefone “inteligente” é um tipo de aparelho celular com
funcionalidades avançadas que podem ser estendidas por meio de programas
executados no seu sistema operacional. Usualmente o smartphone possui capacidade
de conexão com redes de dados para acesso à Internet, capacidade de sincronização
com os dados do computador pessoal e agenda de contatos que utiliza toda a
memória disponível no celular.
Spans – Literalmente “lixo”, em inglês, o termo é amplamente usado para designar as
mensagens de e-mail indesejadas, por conter informações não solicitadas pelo
destinatário. Geralmente de caráter comercial, as mensagens têm origem duvidosa,
muitas vezes difundindo boatos, informações falsas ou alarmistas, ou ainda as
chamadas “correntes” de oração ou de suposta solidariedade, visando, na verdade
coletar endereços de e-mails para serem comercializados.
199
TOL - Abreviatura de “terapia on-line” é termo corrente entre psicólogos interessados
na área de intersecção da Psicologia / Informática.
Twitter – Rede social e servidor para microblogging, que permite aos usuários enviar
e ler atualizações pessoais de outros contatos (em textos de até 140 caracteres,
conhecidos como tweets), por meio da própria WEB ou por SMS (mensagens de texto
enviadas por celulares). O termo em inglês significa trinar ou gorjear, e tweets, por sua
vez, trinado ou gorjeio (dos pássaros).
URL (de Uniform Resource Locator) - Em português “Localizador de Recursos
Universal”, é o endereço de um recurso (um arquivo, uma impressora etc.) disponível
em uma rede: seja a Internet, ou uma rede corporativa, uma intranet. Uma URL tem a
seguinte estrutura: protocolo://máquina/caminho/recurso. Corresponde também aos
“endereços” dos sites presentes na WEB. Fonte: <http://pt.wikipedia.org/wiki/URL>
Acesso em: 19/07/09.
Vida real - É toda a vida do sujeito, o que engloba os aspectos virtuais e presenciais
da sua existência. Realidade entendida de forma semelhante à “realidade psíquica”,
proposta por Jung. Para Jung, existe uma realidade psíquica tão inflexível e
insuperável quanto o mundo exterior, tão útil e cheia de recursos quanto a externa.
Portanto, a vida virtual e a presencial são reais para o sujeito, pois ambas têm grande
repercussão na sua afetividade (JUNG, 1986, § 680-681).
Virtual – Em termos gerais, significa “mediado pelo computador”, ou seja, qualquer
fenômeno que ocorra nos domínios do ciberespaço. Ainda, qualquer relacionamento
ou comportamento que exija um computador como mediador aqui será chamado de
virtual. Termo proposto por Levy (LEVY, 2005).
Vírus, Trojans, Phishing – Genericamente conhecidos como vírus, na verdade estas
são algumas das várias modalidades de mensagens dissimuladas, que na verdade
contém anexos perniciosos ao equipamento alvo, ou arquivos ocultos com finalidades
maliciosas ou criminosas.
WEB - Sigla designativa da World Wide Web. Expressão que, em português, significa
“rede de alcance mundial”, é também utilizada como desginação ou sinônimo da
própria Internet. Em síntese, a WEB corresponde ao sistema de documentos em
hipermídia que são interligados e executados na Internet. Fonte:
<http://pt.wikipedia.org/wiki/World_Wide_Web> Acesso em 24/01/09.
200
WebCam - Câmera acoplada ao equipamento de navegação que permite às pessoas
em contato via Net se verem na tela do computador. Originalmente criadas para o uso
em vídeo conferências, atualmente são utilizadas para contatos virtuais de diferentes
naturezas.
Wireless - Tecnologia capaz de unir terminais eletrônicos, geralmente computadores,
pelas ondas de rádio ou infravermelho, sem necessidade de utilizar cabos de conexão
entre eles. O uso da tecnologia wireless vai desde transceptores de rádio como walkie-
talkies até satétite artificiais no espaço. Seu uso mais comum é em redes de
computadores: a grande maioria dos usuários dela utiliza-se para navegar pela
Internet no escritório, em um bar, um aeroporto, um parque, em casa etc.
Fonte: <http//pt.wikipedia.org/wiki//Wireless> Acesso em 10/08/08.
Wikipédia - Enciclopédia multilíngue on-line. Livre e colaborativa é escrita por pessoas
de diversas regiões do planeta, contando também com especialistas que acompanham
e, voluntariamente, “moderam” a postagem dos verbetes relativos à sua área.
Disponível em: <http://www.wikipedia.org> Acesso em 12/07/06.
201
APÊNDICE
_______________________________________________________________
Sobre o NPPI – Núcleo de Pesquisas da Psicologia em Informática
Origem do núcleo
A elaboração da proposta do NPPI iniciou-se em fins de 1995, tendo como
meta original a criação de uma edição informatizada do Boletim Clínico, - da Clínica
Escola da PUC-SP, publicação então recém-criada pelo professor Efraim Boccalandro.
À época, o uso da Internet em nosso meio era ainda restrito aos ambientes
acadêmicos, mas ao ser iniciado o planejamento se deu conta da agilidade e
versatilidade que a informatização poderia imprimir ao diálogo Clínica
ÅÆ
Comunidade. Percebeu-se que esse diálogo seria ampliado por meio da criação de um
site da clínica, do qual constariam não apenas informações sobre os trabalhos de
ensino e pesquisa realizados na Clínica, mas outros informes como, os serviços de
atendimento oferecidos à população usuária.
Contando com o apoio informal da chefia, o projeto assumiu a proposta da
primeira versão da home page da Clínica Psicológica da PUC-SP, versão apresentada
em julho de 1997 durante o XXVI Congresso Interamericano de Psicologia, na PUC-
SP (FARAH, LOPES e NOVO, 1997). Na fase embrionária, a equipe do NPPI era
composta pelos professores Lorival de Campos Novo, Rosa Maria Farah e Ruth G. da
C. Lopes, da Faculdade Psicologia da PUC-SP. Conforme informado, a primeira
veiculação da página foi possível pela generosa hospedagem oferecida pela PsicNet.
Posteriormente revisto e ampliado, o site da Clínica passou a ser veiculado por meio
do servidor PUC-SP. Atualmente é acessível no endereço <www.pucsp.br/clinica>.
Simultaneamente à rápida popularização do uso dos computadores e da
Internet, surgiram no Brasil algumas ofertas de psicoterapia via Internet. Esse fato
despertou a atenção da imprensa, mas também dos conselhos de classe, motivando o
Psicoinfo - o Primeiro Seminário Brasileiro de Psicologia e Informática - em Outubro de
1998 – promovido pelo Conselho Federal de Psicologia, em São Paulo. O convite para
a participação da autora desta dissertação em uma das mesas desse evento (FARAH,
LOPES e NOVO, 1998) permitiu explicitar a proposta do NPPI, com destaque para a
definição dos seguintes objetivos como norteadores de trabalho:
202
1. Implementar a informatização da comunicação Clínica Escola ÅÆ
Comunidade.
2. Implementar projetos de reflexão e pesquisa visando investigar – do ponto de
vista psicológico - os efeitos gerados pela difusão dos recursos da informática
nos diversos campos da atividade humana.
3. Implementar o desenvolvimento de serviços psicológicos informatizados.
À época, não se supunha a amplitude e desdobramentos posteriores da tarefa
então assumida, embora soubéssemos - já nas primeiras etapas do processo -, que se
tratava de um projeto pioneiro. E que envolveria desafios extremamente instigantes.
Por outro lado, o pioneirismo acarretaria grandes dificuldades para sua execução - de
ordem operacional e institucional. Dificuldades que em vários momentos ameaçariam
a continuidade do projeto. Mas a paixão despertada pela tarefa assumida - aliada à
criatividade da equipe de estagiários agregada - compensou, em vários momentos, a
carência de condições de trabalho mais adequadas. Como resultado, há atualmente
um significativo leque de atividades em andamento no núcleo, que ultrapassam as
nossas melhores expectativas iniciais. Resumidamente, assim ocorreu essa evolução.
Estrutura atual da equipe
Em março de 1999 teve início a primeira etapa da participação de psicólogos
estagiários no NPPI, fato que colaborou para a consolidação do núcleo como um dos
“serviços
1
” da clínica-escola: o Serviço de Informática. Atualmente (período letivo
2008/2009) a equipe do NPPI é composta de nove psicólogos colaboradores e três
psicólogos estagiários, além da professora responsável pela coordenação
2
. O acesso
dos psicólogos ao estágio oferecido no núcleo é feito através da sua inscrição no de
Curso de Aprimoramento Clínico realizado pela Clínica Ana Maria Poppovic. O NPPI
se constitui como uma das opções da complementação do estágio clínico dos alunos
desse curso.
Principais atividades atuais do NPPI
Abaixo as principais atividades atualmente em pauta no NPPI, e em seguida
1
Os “Serviços” da clínica compõem o conjunto de atendimentos que dão sustentação às atividades cotidianas da
clínica escola, a saber: Triagem, Serviço Social, Psiquiatria, Neurologia, NPPI, entre outros. Para mais informações
acessar: <http://www.pucsp.br/clinica/servicos/index.htm>.
2
Composição da equipe no período letivo 2008/2009 – Professora responsável pela coordenação - Rosa Maria Farah;
Psicólogos Colaboradores: Andréa J. Nolf; Erick Itakura; Guilherme T. O. de Souza; Ivelise Fortim; Juliana Zacharias;
Katty Z. Pareja; Luciana Ruffo; Maluh Duprat; Paulo A. Lopes; Psicólogos estagiários: Alexandre Pill; Bruno Oliveira;
Fernanda Gastin Escaleira; Nádia Destefani Rodrigues.
203
comentários sobre a evolução e implicações.
1. Atualização do conteúdo do site do Núcleo <www.pucsp.br/nppi>
2. Continuidade das pesquisas e reflexões sobre os efeitos gerados pela
difusão dos recursos da informática nos diversos campos das atividades e
interações humanas e produção das respectivas publicações.
3. Desenvolvimento e oferta dos Serviços de Orientação Psicológica
mediados por computadores
4. Oferta de campo de estágio aos psicólogos interessados no estudo e
pesquisa das interfaces Psicologia / Informática..
5. Oferta de disciplinas eletivas aos alunos da Faculdade de Psicologia da
PUC-SP, sobre os temas de estudo do Núcleo.
6. Oferta de cursos de extensão, a distância, sobre os temas de estudo do
Núcleo, através da COGEAE/PUC-SP.
7. Oferta de orientações à comunidade, por meio da publicação de artigos em
sites e outras mídias, palestras e entrevistas à imprensa.
8. Promoção e participação em eventos na área, além da participação, junto
aos órgãos de classe, visando elaborar as questões éticas envolvidas nos
serviços psicológicos mediados por computadores.
Alguns aspectos do trabalho
Desde o início das atividades do NPPI as questões éticas envolvidas nessa
nova área da Psicologia colocavam-se naturalmente como temas centrais das
reflexões da equipe. E não poderia ser de outra forma, pois pelo fato de estar inserido
em uma Clínica Escola, o trabalho do núcleo acabaria se tornando referência para
outros profissionais da área. Em outubro de 1998, o convite para participar - no
Psicoinfo - de mesa-redonda sobre as questões éticas envolvidas no atendimento
psicológico mediado pela tecnologia destacou a questão, motivando a sistematização
das considerações feitas no núcleo sobre o tema (FARAH, LOPES e NOVO, 1998).
Buscando referências que balizassem essa participação, consultamos os
Conselhos - Regional e Federal – a respeito de parâmetros porventura já
estabelecidos pelos órgãos que regulamentam as atividades do Psicólogo. No entanto,
não existia, até aquele momento, posicionamento que regulamentasse os
procedimentos. Essa situação ilustra o "espírito do nosso tempo": a rapidez do
desenvolvimento tecnológico adianta-se à sistematização das reflexões, e cobra
204
posicionamentos a partir de práticas já instaladas nos meios acadêmicos e entre os
profissionais que desejam responder às novas e urgentes demandas da comunidade.
Situação similar ocorreu pouco depois, durante o desenvolvimento das
atividades centrais do núcleo: as orientações psicológicas mediadas pela Internet. Em
fins de 1999 iniciava-se no NPPI a oferta da Orientação Psicológica via e-mail. Estava
em curso também a criação do Programa de Orientação Profissional via Internet,
posteriormente veiculado pela COGEAE - órgão da PUC-SP (FARAH, 2004b). Por se
tratar de serviços abertos à população, os cuidados éticos a serem observados
voltaram a exigir atenção, motivando a participação junto ao GT-ATMC, o grupo de
trabalho criado pelo CRP/06 - de São Paulo, sob a coordenação da professora Elisa
Sayeg, com a finalidade de congregar profissionais interessados na reflexão sobre os
temas relativos ao atendimento mediado por computadores.
Na época, questionamentos relativos à viabilidade da psicoterapia mediada
pela Internet mobilizavam intensamente a mídia e os psicólogos. Mas as análises
desse grupo de trabalho pautaram-se em abordagem ampla da questão. Desse modo,
o trabalho iniciado pelo GT-ATMC resultou no primeiro Simpósio Regional sobre
Psicologia e Informática, promovido pelo CRP/06, em abril de 2000, bem como,
posteriormente, na elaboração da minuta da Resolução no. 003/2002, do CFP, que
passou a regulamentar as atividades dos psicólogos interessados em atuar na área
3
.
A partir desse documento diferenciou-se a prática da Psicoterapia via Internet das
demais modalidades de intervenção e serviços psicológicos mediados por
computadores. Foi criada também, por solicitação do CFP, a Comissão Nacional
prevista na mesma resolução, responsável pela análise e credenciamento de sites
contendo oferta de serviços psicológicos informatizados.
A participação do NPPI nos eventos promovidos pelos Conselhos de Psicologia
ocorre desde então, sempre que se mostre necessária e oportuna. Nessa emergente
área da Psicologia - ágil e mutável - a Resolução em vigor ainda não contempla
plenamente todas as necessidades de regulamentação dos atendimentos mediados
por computadores. Cabe aos profissionais envolvidos intensificar a participação junto
aos órgãos de classe e grupos de pesquisa, visando subsidiar a elaboração de
soluções mais abrangentes, dinâmicas e satisfatórias.
3
Posteriormente substituída pela resolução no. 12/2005, a íntegra dessa resolução pode ser consultada no site do
CFP: <http://www.psicologiaonline.org.br>
205
Outro aspecto a ser comentado brevemente nesta apresentação refere-se ao
enfoque psicológico norteador dos trabalhos do Núcleo. Em função da forma de
acesso ao NPPI, os alunos interessados em estagiar no Núcleo optaram, previamente,
pelas diferentes abordagens adotadas nas respectivas modalidades do curso de
Aprimoramento ao qual se vincularam. Por essa razão, a opção dos professores na
época responsáveis pelo NPPI
4
foi acolher o interesse dos candidatos como principal
critério para o ingresso, assumindo - na mediada das possibilidades - a composição
pluralista para na equipe. Procurou-se fazer com que a diversidade de enfoques
representados no Núcleo se tornasse um recurso enriquecedor dos trabalhos grupais.
Para finalizar o relato sobre o NPPI, relacionaremos as principais atividades da
equipe durante o período letivo de 2008/2009. Iniciando pelos números relativos aos
serviços de orientação psicológica via e-mail, prestados em 2008, incluindo em
seguida outras formas de orientação e atendimento à comunidade e dados sobre
trabalhos apresentados em eventos acadêmicos e cursos oferecidos.
Rotinas de trabalho em 2008 / 2009
1. Reuniões presenciais: A equipe se reúne duas vezes na semana, para
atividades de supervisão dos casos em atendimento, discussões e execução de
atividades presenciais (planejamento dos cursos, entrevistas, publicações, palestras,
eventos, etc.)
2. Trabalhos realizados a distância: em função da agilidade exigida pelas
atividades do núcleo, a equipe desenvolve parte das atividades via Internet, por meio
de comunicação grupal via e-mail, a saber: acesso ao webmail para verificação de
chegada de pedidos de orientação; comunicação sobre os casos urgentes recebidos
no webmail; trocas de informações sobre os encaminhamentos desses casos aos
respectivos estagiários; preparo de aulas e acompanhamento do desempenho dos
alunos dos cursos de extensão a distância; revisão de textos e planejamento das
atividades semanais da equipe etc.
4
De 1995 a 2007, os professores Lorival de Campos Novo e Rosa Maria Farah responderam pelos trabalhos de
supervisão e coordenação do NPPI, respectivamente. Lamentavelmente, a partir de 2008 o Prof. Lorival afastou-se das
suas funções por limites de saúde.
206
Atendimentos em orientação realizados em 2008
5
Atendimentos de caráter clínico
1. Atendimentos em Orientação Psicológica via e-mail, sobre temas gerais, ou
seja, pontual e focada na queixa do remetente: 149 casos.
2. Atendimentos na modalidade Orientação sobre “Vício”, envolvendo usos
compulsivos ou excêntricos da Internet: 45 casos.
3. Total de casos atendidos em orientação de caráter clínico: 194 casos.
Outros atendimentos via e-mail
1. Informações sobre “como ser atendido na clínica”: 55
2. Pedidos de bibliografia e ajuda para pesquisas na área Psicoinfo: 28
3. Pedidos envolvendo contatos de outras instituições: 19
4. Pedido de informações sobre a III Jornada do NPPI: 376
5. Outros pedidos variados: 65
Balanço dos contatos realizados pela equipe via e-mail
1. Mensagens enviadas em resposta aos atendimentos clínicos: 378
2. Mensagens enviadas em resposta aos demais pedidos: 543
3. Mensagens trocadas em função do trabalho intra-equipe: 1067
4. Total geral: 1988 mensagens enviadas
Outros trabalhos da equipe
1. Entrevistas e palestras
: a partir da expansão dos usos das novas
tecnologias, ampla gama de problemas comportamentais tem despertado a atenção
dos meios de comunicação. Em decorrência, o NPPI é frequentemente procurado pela
imprensa em busca de esclarecimentos e orientações à comunidade sobre aspectos
psicológicos envolvidos nessas questões. Sempre que possível atendemos aos
pedidos de entrevistas de diversos órgãos da imprensa: jornais, rádios, emissoras de
televisão, sites etc. Em 2008 os componentes da equipe concederam 96 entrevistas
com esse teor. São freqüentes, também, solicitações de palestras sobre os mesmos
temas, em eventos promovidos por colegas e professores de outras instituições.
5
Os detalhes sobre a metodologia desenvolvida no núcleo para a oferta dos serviços psicológicos são apresentados
por FARAH (1999, 2004), COSENTINO E FORTIM (2007), além das publicações em mídia digital da III Jornada do
NPPI (NPPI, 2008).
207
2. Organização de evento na área Psicoinfo: O NPPI promoveu a III Jornada
sobre Psicoinfo, realizada na PUC-SP no dia 20/09/08. O evento contou com: Quatro
mesas redondas, dezesseis comunicações orais e expostos seis pôsteres. O total de
participantes inscritos foi de 152 pessoas: 120 pessoas de São Paulo e 32 de 14
Estados do Brasil. Organizadores
: FARAH, R. M.; Fortim, I.; Cosentino, L. M.; Ruffo,
L., contando com a intensa colaboração dos demais membros da equipe. Os anais
completos, contendo os relatos dos trabalhos apresentados estão publicados em mídia
digital (ISSN19834233), e podem também ser acessados no seguinte endereço:
<http://www.pucsp.br/nppi/jornada/index.html>
3. Trabalhos apresentados em eventos acadêmicos
3.1 Trabalhos apresentados durante a III Jornada do NPPI:
FORTIM, I.; COSENTINO, L. M.; Mulheres e games, uma aproximação: diferenças
inter-sexuais no uso e preferências de jogos eletrônicos. In: III Jornada do NPPI, 2008,
São Paulo. Anais da Jornada do Núcleo de Pesquisas da Psicologia em Informática,
2008. ISSN19834233
COSENTINO, L. M.; FORTIM, I. WIKI: Relato de experiência do ensino on-line de
Psicologia e informática em um curso de extensão universitária. In: III Jornada do
NPPI, 2008, São Paulo. Anais da Jornada do Núcleo de Pesquisas da Psicologia em
Informática, 2008. ISSN19834233
JOTTA, A. Orientação psicológica via e-mail do NPPI para usuários compulsivos de
computador: relato de caso. In: III Jornada do NPPI, 2008, São Paulo. Anais da
Jornada do Núcleo de Pesquisas da Psicologia em Informática, 2008. ISSN19834233
FARAH, R. M. Psicologia e Informática: a subjetividade atravessada pela tecnologia:
uma experiência de ensino. In: III Jornada do NPPI, 2008, São Paulo. Anais da
Jornada do Núcleo de Pesquisas da Psicologia em Informática, 2008. ISSN19834233
ESCALEIRA, F.; DUPRAT, M.; ZACHARIAS, J.; JOTTA, A. Orientação psicológica via
e-mail para casos e uso compulsivo do computador. In: III Jornada do NPPI, 2008, São
Paulo. Anais da Jornada do Núcleo de Pesquisas da Psicologia em Informática, 2008.
ISSN19834233
OLIVEIRA, B. Algumas reflexões sobre imagem. In: III Jornada do NPPI, 2008, São
Paulo. Anais da Jornada do Núcleo de Pesquisas da Psicologia em Informática, 2008.
ISSN19834233
PILL, A. GTA: Uma experiência de jogo. In: III Jornada do NPPI, 2008, São Paulo.
Anais da Jornada do Núcleo de Pesquisas da Psicologia em Informática, 2008.
ISSN19834233
3.2 Trabalhos apresentados em outros eventos acadêmicos:
208
FORTIM, I. VI Jornada Paulista de Gestalt Terapia - Relações humanas na
Contemporaneidade: Sociabilidades e Socialidades virtuais. 2008.
DUPRAT, M. - Participação em nome do NPPI, da 35ª Semana de Psicologia da
Universidade Católica de Santos - Unisantos. Tema da palestra: Internet: virtude e
vício; 26/08/08.
FARAH, R. M. Palestrante convidada na comemoração do primeiro aniversário do
Fórum Junguiano <http://www.forumjunguiano.com.br/> com palestra sobre o tema:
Novas Tecnologias de Comunicação, suas aplicações e desafios para a Psicologia.
Realizada na sede do Fórum promotor do evento, em São Paulo no dia 18/10/08;
FARAH, R. M. – Semana Acadêmica PUC-SP 2008 – Simpósio EU CORPO – Palestra
sobre o tema: Hipercorpo, de Pierre Levy – A vivência do corpo na atualidade. PUC-
SP - 30/10/2008.
4. Publicações realizadas em 2007/2008
4.1 Publicações convencionais (impressas):
FORTIM, I.; COSENTINO, L. M.; Serviço de Orientação via e-mail: novas
considerações. Psicologia Ciência e Profissão, v. 27, p. 164-175, 2007.
FARAH, R. M. (Org.) FORTIM, I. (Org.); Relacionamentos na era digital. São Paulo:
Giz Editorial, 2007. v. 1. 182 p.
4.2 Publicações em mídia digital - 2008:
Relação dos artigos de divulgação e orientação dirigidos ao grande público,
publicados mensalmente em 2008 no site Vyaestelar, veiculado pelo UOL (Universo
On-line), na coluna Ciberpsicologia, mantida pelos participantes da equipe do NPPI.
Disponível no endereço:<www.vyaestelar.com.br>
Janeiro/08
- Celebridades virtuais: Por que alguns fazem tanto sucesso na Web? -
Ivelise Fortim
Fevereiro/08
- Internet: a tênue fronteira entre o hábito e o vício de navegar - Maluh
Duprat
Março/08
- Interferências e Intercorrências da Web 2.0 na Educação - Andrea Nolf
Abril/08
- Evolução humana e computação evolutiva - Leonardo Cosentino
Maio/08
- Tempo on-line não é o fator mais importante para caracterizar uso
compulsivo de internet - Juliana Zacharias
Junho/08
- Você já imaginou seu cotidiano sem internet? - Erick Itakura
209
Julho/08 - Digite sua senha! - Ivelise Fortim
Agosto/08
- GTA IV: uma experiência híbrida de jogo - Alexandre Pill
Setembro/08
- III Jornada do NPPI sobre Psicologia e Informática - Katty Zuniga
Outubro/08
- Novas tecnologias, velhas histórias - Bruno Oliveira
Novembro/08
- Cyberbullying: ofensas e humilhações na Internet - Maluh Duprat
Dezembro/08
- A inclusão digital e seu papel na prevenção de crimes eletrônicos -
Guilherme Oh.
Janeiro/09
- Reflexões sobre a percepção do impacto tecnológico – André Sendra
Assis.
Fevereiro/09
Fake - As mil faces da adolescência atual - Andréa Nolff
Março/09
Fake – Nada mais do que um lado de nós – Luciana Ruffo
Abril/09
A calcinha da Demi Moore vale um milhão ? - Alexandre Pill
5. Cursos oferecidos em 2008/2009
5.1 Disciplina Eletiva
oferecida no segundo semestre de 2008 aos alunos da
graduação da Faculdade de Psicologia da PUC-SP: Psicologia e Informática: a
subjetividade atravessada pelas novas tecnologias.
5.2 Disciplina Eletiva
proposta e aprovada para oferta aos alunos da graduação
da Faculdade de Psicologia da PUC-SP no biênio 2009 / 2010: Relacionamentos na
era digital: as vivências humanas no ciberespaço.
5.3 Cursos de Extensão
6
oferecidos em 2008/2009, via COGEAE/PUC-SP no
formato de módulos: Psicologia e Informática: um panorama sobre os relacionamentos
virtuais e os serviços psicológicos mediados por computadores. Cada módulo do curso
em 2008/2009 teve duração de 32 horas, distribuídas em oito semanas, ministrados
via Internet, pela COGEAE / PUC-SP.
Módulo I: Homem e Tecnologia: a subjetividade na era digital.
Módulo II: Usos da Internet e da informática: possibilidades contemporâneas.
Módulo III: Serviços Psicológicos Mediados por Computadores.
6
Endereço eletrônico do curso: <http://cogeae.pucsp.br/curso.php?cod=173509&uni=D&tip=RE&le=E&ID=7>
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