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UNIVERSIDADE CATÓLICA DE GOIÁS
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE GOIÁS
CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ANÁPOLIS
CARBAMAZEPINA NO ESTADO SÓLIDO E SUA
SUSCEPTIBILIDADE POLIMÓRFICA
Wilma Gomes Galvão
Goiânia GO
2009
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UNIVERSIDADE CATÓLICA DE GOIÁS
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE GOIÁS
CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ANÁPOLIS
CARBAMAZEPINA NO ESTADO SÓLIDO E SUA
SUSCEPTIBILIDADE POLIMÓRFICA
Wilma Gomes Galvão
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Gestão, Pesquisa e Desenvolvimento
em Tecnologia Farmacêutica, oferecido por uma
associação entre a Universidade Católica de Goiás,
a Universidade Estadual de Goiás e o Centro
Universitário de Anápolis, para obtenção do tulo de
mestre
Orientador: Prof. Dr. Hamilton Barbosa Napolitano
Goiânia GO
2009
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Dedico este trabalho primeiramente a Deus que me
deu forças para chegar até aqui. Dedico também a
minha família, em especial aos meus filhos, Marília
e Guilherme, por serem tão admiráveis enquanto
pessoas, fonte de estímulos, que me
impulsionaram a buscar vida nova a cada dia,
meus sinceros agradecimentos por terem aceitado
se privar de minha companhia pelos estudos,
concedendo a mim a oportunidade de me realizar
ainda mais.
AGRADECIMENTOS
Á Deus, o que seria de mim sem a fé que eu tenho nele.
A minha família, em especial meu esposo que sempre acreditou que seria possível.
Ao Professor Dr. Hamilton Barbosa Napolitano pela paciência e persistência durante
todo este processo, pelas sugestões apresentadas na orientação, pela inspiração no
amadurecimento dos meus conhecimentos e conceitos que me levaram a execução
e conclusão desta dissertação.
A todos os professores que tive durante o Mestrado de Gestão, Pesquisa e
Desenvolvimento em Tecnologia Farmacêutica, pelo carinho, incentivo e esforços
para conosco, mesmo com todas as dificuldades.
Aos funcionários da Fundação de Medicina Tropical do Tocantins por todo o suporte
e pelo sorriso no rosto ao resolver nossos problemas.
Aos amigos que fiz durante esse curso, pois sei que vivemos momentos bons que,
com certeza, ficarão guardados para sempre em nossas mentes.
SUMÁRIO
RESUMO..................................................................................................................... 7
ABSTRACT ................................................................................................................. 8
LISTA DE FIGURAS ................................................................................................... 9
LISTA DE TABELAS ................................................................................................ 10
LISTA DE ABREVIATURAS ..................................................................................... 11
1. INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 12
2. POLIMORFISMO .................................................................................................. 14
2.1 Importâncias na Indústria Farmacêutica ......................................................... 15
2.2 Métodos de Caracterização dos Polimorfos ................................................... 16
2.2.1 Calorimetria diferencial de varredura (DSC) ................................................ 17
2.2.2 Termogravimetria (TG) ................................................................................... 17
2.2.3 Ressonância Magnética Nuclear (RMN) ....................................................... 18
2.2.4 Espectroscopia de Infravermelho (IR) e Espectroscopia de infravermelho
com transformada de Fourier (FT-IR) .................................................................... 18
2.2.5 Microscopia óptica e eletrônica .................................................................... 19
2.3 Tipos de Polimorfismo ...................................................................................... 20
2.4 Estabilidades Relativas dos Polimorfos.......................................................... 21
3. CONSIDERAÇÕES SOBRE A CARBAMAZEPINA ............................................. 25
3.1 Conhecimento Estrutural da Carbamazepina ................................................. 27
3.1.1 Introdução à cristalografia ............................................................................ 27
3.1.2 Simetria ........................................................................................................... 29
3.1.3 Sistema Cristalino .......................................................................................... 32
3.1.4 Redes de Bravais ........................................................................................... 34
3.1.5 A difração dos Raios X .................................................................................. 36
3.2 Importância do conhecimento estrutural ........................................................ 40
4. DESCRIÇÃO DOS POLIMORFOS DA CARBAMAZEPINA ................................ 43
4.1 Forma III Monoclínica β .................................................................................. 47
4.2 Forma I - Triclínica γ.......................................................................................... 50
4.3 Forma II Trigonal α ......................................................................................... 52
4.4 Forma IV - Monoclínica de Face Centrada ...................................................... 54
4.5 Descrições da Estrutura Molecular ................................................................. 55
4.6 Análise Conformacional ................................................................................... 56
4.6 Transformações polimórficas .......................................................................... 57
4.6.1 Por Aquecimento ............................................................................................ 58
4.6.2 Por Hidratação ................................................................................................ 60
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................. 62
REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 64
7
RESUMO
Muitos produtos farmacêuticos encontram-se no estado lido por motivos de
estabilidade ou por facilidade no manuseio durante as etapas de desenvolvimento
da droga. O polimorfismo é a cristalização de uma mesma substância em diferentes
arquiteturas cristalinas. Este fenômeno é muito comum em produtos farmacêuticos e
está associado às diferenças nos arranjos da embalagem cristalina. A presença de
diferentes formas cristalinas para um mesmo fármaco pode alterar algumas das suas
propriedades físico-químicas, tais como a solubilidade, o que pode afetar
diretamente sua biodisponibilidade e sua eficácia terapêutica. Neste contexto, a
carbamazepina tem servido de composto modelo para o estudo do polimorfismo,
onde uma alise de sua multiplicidade estrutural tem buscado avaliar a
susceptibilidade polimórfica. Significantes diferenças entre as formas polimórficas
anidras da carbamazepina foram caracterizadas por métodos espectroscópicos e
difratométricos, em especial a difração de raios X, pelas importantes informações
estruturais fornecidas. Onde a suscetibilidade polimórfica para forma mais estável
pode ser observada em função de vários fatores entre eles se destaca o conteúdo
energético.
Palavras-chave: Carbamazepina; solubilidade; multiplicidade estrutural;
suscetibilidade polimórfica; estabilidade.
8
ABSTRACT
Many pharmaceutical products are in solid state for reasons of stability or ease of
handling during the stages of drug development. The polymorphism is the
crystallization of the same substance in different crystalline architectures. This
phenomenon is very common in pharmaceuticals and is associated with differences
in packing arrangements of crystalline. The presence of different crystalline forms for
the same drug can change some of its physicochemical properties such as solubility,
which can directly affect their bioavailability and therapeutic efficacy. In this context,
carbamazepine has served as a model compound for the study of polymorphism,
where an analysis of its structural diversity has sought to evaluate the susceptibility
polymorphic. Significant differences between the polymorphic forms of anhydrous
carbamazepine were characterized by spectroscopic methods and difratometria,
especially the X-ray diffraction, the important structural information provided. Where
Polymorphic susceptibility to the more stable form can be observed due to several
factors including the energy content is highlighted.
Keywords: Carbamazepine; Solubility; Structural Multiplicity; Polymorphic
susceptibility; Stability.
9
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 - Diagrama de Energia Livre versus Temperatura (E/T) para um Sistema
Enantiotrópico ...................................................................................................................... 22
Figura 2 - Diagrama de Energia Livre versus Temperatura (E/T) para um sistema
Monotrópico ......................................................................................................................... 23
Figura 3 - Fórmula Estrutural da Carbamazepina ................................................................ 26
Figura 4 - Representação esquemática do retículo cristalino de um cristal de NaCl e sua
respectiva cela unitária ........................................................................................................ 30
Figura 5 - Representação da cela unitária e seus parâmetros de caracterização ................ 31
Figura 6 - As 14 Redes de Bravais ...................................................................................... 35
Figura 7 - Difração de Raios X ............................................................................................. 37
Figura 8 - Representação esquemática fora de escala da Lei de Bragg. ............................. 39
Figura 9 - Espectros obtidos por FTIR para as quatro formas polimórficas anidras da
carbamazepina (GRZESIAK, et al., 2003) ............................................................................ 47
Figura 10 - Fotomicrografia da forma monoclínica obtida de microscópio eletrônico de
varredura (LOWES, et al., 1987). ......................................................................................... 49
Figura 11 - Padrões de PXRD para os quatro polimorfos anidros da carbamazepina
(GRZESIAK, et al., 2003). .................................................................................................... 50
Figura 12 Empacotamento da Forma monoclínica formando dímeros via ligações de
hidrogênio ............................................................................................................................ 50
Figura 13 Empacotamento da Forma Triclínica, grupo espacial P1 .................................. 51
Figuras 14 - Fotomicrografias da forma trigonal (LOWES, et al., 1987) .............................. 52
Figura 15 Empacotamento da Forma trigonal com grupo espacial R3. ............................. 53
Figura 16 - Empacotamento da Forma Monoclínica de face centrada. ................................ 55
Figura 17 - Diagrama de Energia livre versus Temperatura para polimorfos I, II e II da
carbamazepina, onde G representa energia livre de Gibbs e H a entalpia( KRHAN; MIELCK,
1987). .................................................................................................................................. 58
Figura 18 - DSC dos quatro polimorfos anidros da CBZ sob taxa de 20ºC/min de
aquecimento (GRZESIAK, et al., 2003)................................................................................ 59
10
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 - Os sete sistemas cristalinos ................................................................................ 32
Tabela 2 - Grupos Espaciais para os Sistemas Cristalinos Triclínico, Monoclínico e Trigonal
............................................................................................................................................ 36
Tabela 3- Tabela apresentada por GRZESIAK et al.2003. ................................................... 44
Tabela 4 - Dados cristalográficos obtidos pelo banco de dados CCDC para os polimorfos da
Carbamazepina ................................................................................................................... 46
Tabela 5 - Formas de Obtenção dos polimorfos da Carbamazepina .................................... 48
Tabela 6 - Cálculos de Energia baseado no método Hartree- Fock em conjunto de base 3-
21* ....................................................................................................................................... 57
11
LISTA DE ABREVIATURAS
CBZ Carbamazepina
CCDC Cambridge Crystallographic Data Center
DSC Calorimetria Diferencial de Varredura
FDA - Food and Drug Administration
FT-IR Espectroscopia de Infravermelho com Transformada de Fourier
IR Espectroscopia de Infravermelho
IUPAC - International Union of Pure and Applied Chemistry
P&D Pesquisa e Desenvolvimento
RMN Ressonância Magnética Nuclear
SAXS Espalhamento de Raios-X a Baixo Ângulo
SEM Microscopia Eletrônica de Varredura
TG Termogravimetria
TGA Análise Termogravimétrica
USP United States Pharmacopoeia
XRPD Padrão de Difração de Raios X
12
1. INTRODUÇÃO
De acordo com BRANDÃO (2007), a seleção de matérias primas, no processo
de desenvolvimento de um novo medicamento, deve ser efetuada, visando
caracterizar, em especial, a substância ativa. As monografias descritas nos
compêndios oficiais, em geral, apresentam os ensaios para determinação da
qualidade da droga, referindo-se a seus aspectos qualitativos e quantitativos, assim
como os ensaios para a avaliação de pureza. Tais ensaios são fundamentados,
entre outras, nas informações referentes à síntese e às propriedades físico-químicas
da substância submetida à análise. Porém, essas especificações oficiais podem não
se referir a características específicas, como mudanças na estrutura cristalina,
relacionadas às possíveis alterações nos processos produtivos.
A grande maioria dos medicamentos comercializados é formulada em formas
farmacêuticas lidas de uso oral. Tais formas farmacêuticas, apesar de serem de
administração cômoda ao paciente, podem sofrer alterações durante seu processo
de produção, como por exemplo, o polimorfismo que, segundo VILA JATO (2001), é
a capacidade das moléculas cristalizarem-se em duas ou mais formas. Tal fato é
decorrente das condições empregadas na ntese e na purificação da substância,
dependendo do solvente utilizado e da temperatura de reação conforme rota
adotada pelo fabricante.
A estrutura cristalina de uma substância ativa pode afetar a estabilidade e/ou a
solubilidade de um fármaco. Esta, por sua vez, será o fator limitante para o processo
de absorção de fármacos administrados por via oral, podendo comprometer a
qualidade dos produtos disponibilizados e ter como resultado falha terapêutica ou
toxicidade, o que irá representar um alto risco ao usuário (GIRON, 1995). Portanto, o
conhecimento estrutural, ou, ainda, a determinação do arranjo dos átomos nas
moléculas e no cristal é extremamente útil para o entendimento das propriedades
químicas, físico-químicas e biológicas dos compostos.
Para conhecer uma estrutura no seu nível atômico, é preciso -la, ainda que
para tal seja necessário lançar mão de recursos indiretos. Várias técnicas têm sido
desenvolvidas e, em geral, estão ligadas a métodos espectroscópicos e
difratométricos, que, embora muito úteis, não estão rotineiramente disponíveis para
se conhecer a distribuição espacial dos átomos constituintes de uma dada molécula.
Estas ferramentas ou recursos indiretos são (1) difração de raios X por monocristais,
13
(2) difrações de nêutrons, (3) ressonância magnética nuclear, (4) espalhamento de
raios-X a baixo ângulo em solução(SAXS), (5) microscopia eletrônica (6) modelagem
teórica e outros. (NAPOLITANO, et.al., 2005). O todo que permite conhecer a
disposição tridimensional dos átomos na estrutura molecular dos compostos no
estado cristalino é o método cristalográfico, cuja alta resolução permite descrever
sua densidade eletrônica, (DRENTH, 1999). A qualidade destacada neste método
dispensa o conhecimento a respeito do composto ab-initio (GIOCOVAZZO et al.,
1992).
Assim, a metodologia de determinação da estrutura molecular e da estrutura
cristalina, chamada cristalografia de raios X, baseia-se no fenômeno de difração que
ocorre devido à interação da radiação eletromagnética com a matéria cristalina. Hoje
em dia, são utilizados para análise de cristais raios X de comprimento de onda bem
determinados, produzidos por um tubo de raios X e selecionados por difração e,
quando este feixe definido difrata em um cristal desconhecido, a medida do(s)
ângulo(s) de difração do(s) raio(s) emergente(s) permite elucidar a distância dos
átomos no cristal e, consequentemente, a estrutura cristalina. Os ângulos dos feixes
resultantes da difração são lidos pelo equipamento e processados por computador,
que calcula e mostra as prováveis configurações dos átomos no cristal. Esse método
de análise é muito procurado, como o objetivo é principalmente a análise estrutural,
é perfeitamente adequado para a caracterização de polimorfos e solvatos
1
.
A importância do estudo do polimorfismo tem sido extensivamente relatada
nessas últimas décadas. Entre os fármacos descritos na literatura que se
apresentam sob a forma cristalina e possui polimorfismo, a carbamazepina é um dos
que se destacam pelo impacto que os diferentes polimorfos causam no seu perfil de
dissolução e biodisponibilidade
2
. Por esse motivo, temos como objetivo neste
trabalho, descrever estruturalmente a carbamazepina (CBZ) para ilustrar a
importância da descrição estrutural do fármaco no estado sólido e de sua
multiplicidade estrutural buscando avaliar sua susceptibilidade polimórfica para uma
dada formulação.
1
Sólidos farmacêuticos que quando cristalizados a partir de diferentes solventes, podem formar um complexo
molecular que tem moléculas de solvente incorporadas em locais determinados da estrutura do cristal (SINKO,
2008)
2
A biodisponibilidade de um fármaco é definida como a fração da dose do fármaco que é encontrada na
circulação geral (GILMAN et al., 1991).
14
2. POLIMORFISMO
Polimorfismo pode ser definido como a habilidade de um composto cristalizar
em duas ou mais fases cristalinas com arranjos e/ou conformações moleculares
diferentes, nas unidades dos cristais. Portanto, polimorfos são diferentes formas
cristalinas de um mesmo composto químico puro. O fenômeno do polimorfismo em
cristais moleculares é análogo para o alotropismo entre elementos.
Aproximadamente um terço dos compostos orgânicos e cerca de 80% dos
medicamentos comercializados exibe polimorfismo sob condições
experimentalmente acessíveis. Em diferentes descrições de arranjos e/ou
conformações de moléculas, polimorfos exibem diferentes propriedades físicas e
químicas. Estas diferenças desaparecem em fases líquidas e vapor (HILFIKERI,
2006).
Atualmente, o estudo de polimorfos está bem avançado, a ponto de hoje fazer
parte na descrição de patentes de substâncias e produtos. Coisa rara, até segunda
metade da década de 90. Além disso, estudos clínicos caros podem apresentar
resultados não reprodutíveis se o polimorfismo não for observado. Portanto, durante
a pesquisa e o desenvolvimento da molécula, procura-se obter e determinar todas
as formas possíveis de cristais. Geralmente, buscam-se formas mais solúveis e
estáveis.
Determinar a estrutura cristalina de um composto ativo é uma das primeiras
etapas do desenvolvimento farmacêutico. A estrutura cristalina de uma droga pode
sugerir quão facilmente ela pode ser formulada, ter aplicabilidade biológica e
informar sua durabilidade. O conhecimento dos diferentes polimorfos de um cristal é
vital, bem como verificar a existência de polimorfos antes dos estudos clínicos e dos
testes de estabilidade. A descoberta de um novo polimorfo, mesmo que seja
metaestável, mas que pode ser produzido de forma controlada por uma empresa
farmacêutica concorrente, é uma ameaça à patente do princípio ativo de uma
empresa. Uma vez descoberta uma nova droga, normalmente é a forma cristalina
que é patenteada. Os polimorfos podem causar os seguintes problemas: um
competidor poderia patentear e comercializar um polimorfo diferente; um polimorfo
indesejado (e potencialmente tóxico ou inerte) poderia ser manufaturado; diferentes
condições de manufatura ou condições de formulação podem produzir diferentes
polimorfos; é muito difícil determinar todos os possíveis polimorfos por
15
experimentação; podem ter propriedades inteiramente diferentes com base na
formulação desejada padrão (NAPOLITANO et al., 2005).
Analogamente, podemos frisar que as formas polimórficas podem apresentar
diferenças nas propriedades físicas e físico-químicas como pontos de fusão e
sublimação, condutividade, volume, densidade, dureza do cristal, forma do cristal,
cor, índice de refração, solubilidade, higroscopia, reações no estado sólido,
estabilidade e perfil de dissolução (GIRON, 1995; BOTTON, 1999). A existência de
formas polimórficas de fármacos pode afetar o desempenho de formas
farmacêuticas sólidas, afetando seu perfil de dissolução, biodisponibilidade e/ou
estabilidade. Pode afetar, também, a reprodutibilidade dos lotes industriais, tanto da
produção do fármaco quanto do medicamento (BRYN, 1995).
É reconhecido amplamente que a completa identificação e caracterização do
estado sólido nas diferentes formas de uma determinada droga são essenciais para
o processo de pré-formulação e para alcançar uma formulação adequada, onde a
caracterização das formas polimórficas e solvatadas implicam uma análise
quantitativa das várias propriedades físico-químicas.
2.1 Importâncias na Indústria Farmacêutica
A Indústria farmacêutica é muitas vezes surpreendida quando tem que lidar
com o fenômeno do polimorfismo, quando se quer obter um princípio ativo.
Normalmente estas surpresas estão relacionadas ao comportamento do sólido
obtido, quer seja durante sua caracterização química ou durante seu processamento
e armazenamento. Um ponto de fusão variável dependendo do lote, uma
insolubilidade inesperada do produto em solventes normalmente utilizados sem
problema, lotes do produto com propriedades físicas inconsistentes ou variações da
cor e da forma do sólido cristalino obtido, pode ser, entre outros, indícios da
presença do fenômeno do polimorfismo (HILFIKERI, 2006).
Este fenômeno tem importante implicação na indústria farmacêutica em
primeiro lugar por afetar a estabilidade química do princípio ativo, como referido
anteriormente, o que pode levar a diferentes propriedades físicas, daí os polimorfos
serem mais ou menos inertes em diferentes condições de umidade e temperatura.
Além disso, a velocidade de absorção (biodisponibilidade) também será afetada,
onde alguns polimorfos de um mesmo composto apresentarão atividade mais baixa
em relação a outros com velocidades superiores de dissolução. Assim, a aplicação
16
farmacêutica de um princípio ativo em uma única forma polimórfica depende de uma
série de fatores, entre eles, que o polimorfo em questão seja suficientemente
estável, solúvel e mantenha a mesma forma nas condições de processamento e
fabricação sem experimentar nenhuma transformação polimórfica. Portanto, para
poder avaliar estes fatores é necessário conhecer o número de polimorfos do
princípio ativo, a estabilidade relativa de todos eles e se as formas metaestáveis
podem ser estabilizadas. O desconhecimento das diferentes formas cristalinas e a
influência destas no preparo de uma droga tesérias implicações na vida de uma
sociedade, e também te influência direta no aspecto econômico de uma indústria
farmacêutica, pois envolve patentes de diferentes formas de uma mesma substância
ou, então, de novas formas de substâncias comercializadas (PROHENS;
PUIGJANER, 2007).
Desta forma, o polimorfismo tem contribuído significativamente no
desenvolvimento de novos produtos pela indústria farmacêutica, química e
alimentícia propondo desafios aos investigadores no desenvolvimento de fármacos e
medicamentos, o que se converte numa ferramenta única na engenharia de sólidos
que mediante a manipulação das estruturas cristalinas e suas propriedades se
podem desenhar fármacos mais seguros e eficazes.
2.2 Métodos de Caracterização dos Polimorfos
Qualquer propriedade física ou química pode, a priori, variar entre os
polimorfos, visto que, estes possuem diferentes estruturas cristalinas. Assim,
qualquer técnica que possa medir as propriedades de um sólido pode, em princípio,
ser utilizada para detectar o fenômeno do polimorfismo e caracterizar as diferenças
entre as estruturas polimórficas. Algumas técnicas são mais sensíveis a estas
diferenças na estrutura cristalina e, portanto, são mais adequadas. Estes métodos
envolvem principalmente fenômenos ópticos (difratometria de pós por raios X,
infravermelho, microscopia de Raman) térmicos (calorimetria diferencial,
termogravimetria). Há outras técnicas que podem ser aplicadas, como a microscopia
óptica e a determinação do ponto de fusão que, no entanto, não apresentam a
resolução necessária para diferenciar polimorfos de fármacos (PROHENS;
PUIGJANER, 2007). Alguns dos principais métodos utilizados para detecção e
caracterização dos polimorfos são descritos a seguir.
17
2.2.1 Calorimetria diferencial de varredura (DSC)
Este método tem sido um dos principais meios utilizados para o estudo do
polimorfismo, uma vez que, proporciona dados úteis tanto para identificação como
para caracterização das espécies polimórficas. Esta técnica mede a potência
calorífica absorvida ou liberada por uma amostra, visto que, as alterações de estado
físico, morfológico ou químico de uma substância em uma determinada faixa de
temperatura ocorrem com consumo de energia (alterações endotérmicas) ou com
liberação de energia (alterações exotérmicas).
O método consiste no aquecimento, em paralelo, de uma amostra e de um
padrão de referência inerte, ambos submetidos a uma mesma taxa de aquecimento,
registra-se a quantidade de calor necessária para manter o aquecimento. Quando
ocorrer uma variação na quantidade de calor fornecida ao sistema teste é indicado
uma transformação térmica na amostra testada (SINKO, 2008).
Na avaliação de substâncias que apresentam diferentes formas cristalinas, é
possível determinar a mudança de estrutura cristalina, as temperaturas de fusão e
dessolvatação, que aparecem em sinais endotérmicos e exotérmicos na curva de
DSC. Este registro do DSC, denominado termograma, é um registro que mostra
fenômenos endo e exotérmicos. Permite, ainda, a discriminação entre os sistemas
polimórficos como monotrópico ou enantiotrópico
3
e auxilia na previsão e análise
para a descoberta de hidratos e solvatos. Estudos de sorção
4
-dessorção
5
também
podem ser avaliados por esta técnica, provendo maiores detalhes para a
caracterização de estruturas polimórficas (GIRON, 1995). Tendo como grande
vantagem a versatilidade e lançar mão de pequenas quantidades de amostra para
ser desenvolvido. Sua principal desvantagem está no fato de, em alguns momentos,
resultarem em registros de difícil interpretação ou o surgimento de falsos resultados
(positivos ou negativos para polimorfismo), (BRYN et al., 1995).
2.2.2 Termogravimetria (TG)
A análise termogravimétrica (TGA) mede as alterações da massa da amostra
3
Mudanças que as formas polimórficas podem sofrer. Quando a mudança de uma forma para outra for
reversível, ela é dita enantiotrópica. Quando a mudança ocorre somente em um sentido, ou seja, não é
reversível, ela é dita monotrópica (SINKO, 2008).
4
Conjunto de fenômenos de absorção, adsorção e dessorção.
5
É a libertação das moléculas adsorvidas.
18
em função do tempo ou temperatura. Os processos de dessolvatação ou de
decomposição são muitas vezes acompanhados através de TGA. Esta técnica não
permite o estudo de fenômenos que envolvam fusão e modificação de fase
cristalina, contudo, é bastante útil quando se trata da análise de uma mistura entre
polimorfos, hidratos e solvatos (BRYN et al., 1995).
2.2.3 Ressonância Magnética Nuclear (RMN)
A ressonância magnética nuclear no estado sólido está sendo usada com
maior freqüência na identificação dos polimorfos, é uma técnica o destrutiva e
analisa toda a amostra simultaneamente eliminando o inconveniente de analisar
apenas uma porção da amostra. Baseiam-se na absorção da radiação na região da
rádio freqüência do espectro eletromagnético que resulta em modificação na
orientação do spin do núcleo quando submetido a um campo magnético. Consiste
em submeter um núcleo, cujo spin seja diferente de zero, a um campo magnético e
detectar o seu momento magnético, ou sua ressonância magnética. Como cada
núcleo tem um momento diferente, pode-se definir que tipo de ligação química
aquele núcleo está realizando. É uma técnica onde a intensidade do sinal é
proporcional ao número de núcleos, o que provê condições apropriadas para uma
boa sensibilidade do método. Para pesquisa de polimorfos é excelente, pois tem
capacidade de diferenciar estruturas sólidas. No entanto, é passível a ocorrência de
uma gama de erros em estudos quantitativos em amostras no estado sólido (BRYN
et al., 1995).
É um método poderoso para determinar as variações na rede de ligações de
hidrogênio e conformações moleculares entre polimorfos (VIPPAGUNTA, et
al.,2001).
2.2.4 Espectroscopia de Infravermelho (IR) e Espectroscopia de infravermelho
com transformada de Fourier (FT-IR)
A espectroscopia de infravermelho (IR) permite a identificação de uma
substância orgânica ou mineral pelos grupos funcionais presentes no material em
análise. Baseia-se na medida da energia absorvida para a vibração de cada uma
das ligações químicas presentes na substância. Nesta técnica, a amostra é
submetida a uma radiação de comprimento de onda na região do infravermelho. Um
espectro de infravermelho apresenta grande quantidade de sinais chamados de
19
bandas e é característico de uma molécula como um todo, porém os grupamentos e
ligações apresentam absorções que geram bandas de formato característico da
estrutura da molécula (BRITTAIN, 1999). A transformada de Fourier (FT-IR) utiliza-
se do mesmo princípio da espectroscopia em infravermelho, ou seja, diferindo
apenas no domínio onde o espectro é mensurado. A FT-IR é uma função
matemática que converte o domínio do tempo para o domínio da freqüência. Dentro
do campo das ciências farmacêuticas, tem grande aplicação no controle de
qualidade de fármacos, que esta metodologia permite identificar moléculas com
uma boa margem de segurança, uma vez que o resultado é único para cada
substância existente, a exceção dos isômeros ópticos, que apresentam os mesmos
espectros (USP 30, 2007).
Ao contrário da análise por infravermelho convencional, que não apresenta
uma boa capacidade de detecção de algumas transformações, mostrando registros
bem semelhantes, a espectroscopia em infravermelho com transformada de Fourier
pode diferenciar claramente polimorfos e hidratos em uma mistura ternária ou com
maior número de componentes. No entanto, em alguns casos devem-se considerar
outros métodos, uma vez que os registros podem ser bem parecidos, gerando
confusão (BRYN et al., 1995).
2.2.5 Microscopia óptica e eletrônica
A microscopia é uma técnica importante para a caracterização de polimorfos,
pois, através dela pode-se observar a forma cristalina de uma substância, como por
exemplo, o tamanho e a forma dos cristais (BRITTAIN, 1999).
O microscópio óptico tem a iluminação e o conjunto de lentes como seus
elementos básicos. Para materiais opacos à luz, observa-se uma superfície polida e
utiliza-se a luz refletida na amostra. A superfície polida pode ou não sofrer ataque
químico para evidenciar a presença de alguns cristais. O aumento máximo de um
microscópio óptico é da ordem de 2000 vezes. Consequentemente, alguns
elementos estruturais, por serem muito pequenos, tornam-se difíceis de serem
observados neste tipo de microscópio. Neste caso, emprega-se o microscópio
eletrônico de varredura (SEM).
A diferença básica entre o microscópio óptico e o eletrônico é que neste
último não é utilizada a luz, mas sim feixes de elétrons. No microscópio eletrônico
20
não lentes de cristal e sim bobinas, chamadas de lentes eletromagnéticas. O
microscópio eletrônico de varredura (SEM) é um equipamento que alcança um
aumento máximo muitas vezes maior que o óptico. Ele permite a obtenção de
informações estruturais como tamanho e forma dos cristais. O SEM é um tipo de
microscópio eletrônico capaz de produzir imagens de alta resolução da superfície de
uma amostra. Devido à maneira com que as imagens são criadas, elas têm uma
aparência tridimensionais característica e, são úteis para avaliar a estrutura
superficial de uma dada amostra (LACHMAN, et al., 2001).
Fica claro que, o estudo do polimorfismo de um princípio ativo exige uma
abordagem multidisciplinar. Os diferentes métodos analíticos fornecem uma ampla
gama de informações estruturais e termodinâmicas, muitas vezes complementando
uma a outra, e levando a um conhecimento da relação entre os diferentes
polimorfos.
2.3 Tipos de Polimorfismo
Baseados em diferenças nas propriedades termodinâmicas, os polimorfos
podem ser classificados em um dos dois tipos: enantiotrópico ou monotrópico. Um
sistema é enantiotrópico quando a mudança de uma forma cristalina para outra é de
caráter reversível. Por outro lado, um sistema é monotrópico se a mudança da forma
cristalina acontece em uma única direção, quer dizer, em forma irreversível. Do
ponto de vista termodinâmico, o cristal passa sempre de uma forma menos estável a
uma forma mais estável. Do ponto de vista farmacêutico, a forma mais estável não é
sempre a mais desejada pelos farmacêuticos, desde quando tem estabilidade
termodinâmica maior, isto é, menos solúvel, e, por conseguinte terá menor
biodisponibilidade. Recordemos que as transições, nos sistemas enantiotrópicos são
reversíveis, porque eles podem acontecer em ambos os sentidos do mais estável
para menos estável ou vice-versa, tudo depende da droga em questão e dos
tratamentos térmicos aos que esteja exposta. (LACHMAN, et al., 2001)
Segundo BURGER e RAMBERGER (1979) e VIPPAGUNTA, et al (2001) é
possível estabelecer quatro controles úteis para se determinar qualitativamente a
natureza enantiotrópica e monotrópica das relações entre polimorfos. São eles: o
controle do calor de transição; o controle do calor de fusão; o controle de
infravermelho e o controle da densidade. Um aspecto importante é determinar a
existência, ou não, de uma temperatura de transição entre duas formas polimórficas,
21
o que é muito importante porque é a temperatura na qual um polimorfo transforma-
se em outro. Esta temperatura pode ser atingida em etapas diferentes de elaboração
de um produto farmacêutico, por exemplo, pelo calor recebido durante a trituração,
granulação ou armazenamento. Nessa temperatura, ambas as formas apresentam
energia livre idênticas, podendo coexistir, apresentar solubilidades iguais em
qualquer solvente ou apresentar pressões de vapor iguais. Se pelo uso dos
controles for determinado que uma droga específica seja enantiotrópica ou
monotrópica, então a próxima meta é definir termodinamicamente a propriedade
estável ou metaestável de cada fase da substância como uma função da
temperatura. É necessário então, saber em que condições de inter-conversão
alcançam-se uma forma estável. A forma termodinamicamente mais estável
apresenta, abaixo da sua temperatura de fusão, a menor energia livre,
correspondente a menor solubilidade ou pressão de vapor, (VIPPAGUNTA, 2001;
BERNSTEIN, 2008).
Durante a pré-formulação de um fármaco, é importante identificar o polimorfo
que é estável à temperatura ambiente e determinar qual das transições polimórficas
ocorre dentro da gama de temperaturas usadas nos estudos de estabilidade e
durante o processamento (secagem, moagem, etc.). As variações de energia livre
entre polimorfos podem ser obtidas usando várias técnicas a diferentes
temperaturas, em que um composto polimórfico é caracterizado preferencialmente
por meio de diagramas de fase, tais como: temperatura vs energia livre; pressão vs
temperatura; solubilidade vs temperatura; taxa de dissolução vs temperatura. No
geral, esses diagramas contêm uma grande quantidade de informação de forma
compacta e pode fornecer um sumário visual e facilmente interpretável das
complexas relações entre os polimorfos (BERNSTEIN, 2008). Nas Figuras 1 e 2 são
demonstrados diagramas de temperatura vs energia livre de Gibbs para sistemas
polimórficos. Uma forma mais direta de determinar a temperatura de transição é por
observação microscópica das amostras ou ainda por meio da calorimetria diferencial
de varredura (LACHMAN, et al., 2001).
2.4 Estabilidades Relativas dos Polimorfos
A estabilidade relativa dos polimorfos depende de suas energias livres, bem
como a do polimorfo mais estável que tem uma menor energia livre. Sob um cenário
22
de condições experimentais definidas (com exceção dos pontos de transição)
apenas um polimorfo tem uma menor energia livre. Este polimorfo é a forma
termodinamicamente estável e o outro polimorfo(s) é determinado como uma
forma(s) metaestável. Uma forma metaestável é aquela que é instável
termodinamicamente, mas tem uma existência finita como um resultado de uma taxa
relativamente lenta de transformação (HILFIKERI, 2006).
No diagrama da Figura 1 G representa a energia livre de Gibbs e H é a
entalpia. Este diagrama representa uma situação para um sistema enantiotrópico,
para dois polimorfos I e II, onde as curvas GI e GII cruzam-se no ponto de transição
(Tp I/II) que se localiza abaixo do ponto de fusão dos respectivos polimorfos. Nesse
ponto os dois polimorfos podem coexistir como misturas em equilíbrio, tendo a
mesma estabilidade. Na relação termodinâmica enantiotrópica, como descrito
anteriormente, os polimorfos convertem-se um no outro de forma reversível. A curva
Gliq representa a fase líquida, onde suas intersecções com as curvas GI e GII
representam respectivamente o ponto de fusão desses polimorfos. No diagrama
acima, o polimorfo I é a forma mais estável (tem a menor energia livre de Gibbs)
abaixo do ponto de transição e presumivelmente a temperatura ambiente. Existe
Energia
Tp,I/II
Temperatura (K)
GI
HI
HII
Hliq
PfI PfII
Figura 1 - Diagrama de Energia Livre versus Temperatura (E/T) para um
Sistema Enantiotrópico
23
uma tendência termodinâmica para a forma menos estável se transformar na forma
mais estável.
No diagrama da figura 2 os símbolos G e H têm o mesmo significado. Este
diagrama representa uma situação para um sistema monotrópico, onde não há
ponto de transição abaixo dos pontos de fusão dos polimorfos I e II. O que é
representado pela ausência do cruzamento das curvas GI e GII. Nestas condições,
para relação termodinâmica monotrópica, os dois polimorfos I e II não se convertem
um no outro. Sendo o polimorfo I mais estável em todas as temperaturas.
Na indústria farmacêutica, a forma metaestável é, algumas vezes, desejável
em relação a suas propriedades especiais, tais como alta biodisponibilidade, melhor
comportamento durante a trituração e compressão, ou menor higroscopicidade. No
entanto, uma forma metaestável tem uma tendência termodinâmica em reduzir sua
energia livre pela transformação na forma estável. Tais transformações polimórficas
são muitas vezes prejudiciais para a eficácia da formulação. Além do mais, nos
processos de produção e processamento farmacêutico, tais como compactação,
moagem, granulação úmida e secagem, podem também resultar em transições
Energia
Temperatura (K)
GI
GII
Gliq
HI
HII
Hliq
PfI PfII
Figura 2 - Diagrama de Energia Livre versus Temperatura (E/T) para
um sistema Monotrópico
24
polimórficas. A extensão da transição polimórfica depende das condições de
processamento e da estabilidade relativa dos polimorfos em questão. A
termodinâmica nos fornece um quadro no qual a estabilidade relativa dos polimorfos
pode ser determinada (HILFIKERI, 2006).
Portanto, apenas no ponto da transição termodinâmica é que duas formas
polimórficas podem coexistir em misturas em equilíbrio; em outra temperatura as
tendências termodinâmicas conduziriam a transformação para forma mais estável.
Isso implica que, exceto na temperatura de transição, os polimorfos terão uma
existência limitada (BERNSTEIN, 2008).
O conhecimento da natureza enantiotrópica ou monotrópica da relação entre
polimorfos pode ser usado para dirigir processos de cristalização, dos quais se
pretende obter polimorfos desejados e excluir os indesejados. Para os sistemas
dimórficos temos quatro possibilidades:
I. A forma termodinamicamente estável em um sistema monotrópico: nenhuma
transformação de uma forma para outra pode realizar-se, e nenhuma precaução
necessária será tomada para preservar essa forma ou prevenir uma transformação.
II. A forma termodinamicamente estável em um sistema enantiotrópico:
precauções devem ser tomadas para manter as condições termodinâmicas, isto é,
temperatura, pressão, umidade relativa, etc., nas quais a curva da energia livre de
Gibbs para o polimorfo desejado é abaixo daquela para o polimorfo indesejado.
III. As formas termodinamicamente metaestáveis em sistemas monotrópicos:
uma transformação cineticamente controlada pode acontecer para formas estáveis
termodinamicamente indesejáveis. Para prevenir tal transformação é necessário
empregar condições drásticas para reduzir os efeitos cinéticos, isto é, temperaturas
muito baixas, condições de secagem, estocagem no escuro, etc.
IV. As formas termodinamicamente metaestáveis em sistemas enantiotrópicos: a
informação para a obtenção e a manutenção desta forma é essencialmente
encontrada nos diagramas de energia livre vs temperatura.
Portanto, a importância prática nos estudos de pré-formulaçao de um
fármaco, é determinar se um sistema de polimorfos é monotrópico ou enantiotropico,
sendo capaz de escolher o controle sobre o polimorfo desejado (BERNSTEIN,
2008).
25
3. CONSIDERAÇÕES SOBRE A CARBAMAZEPINA
A carbamazepina é um agente efetivo para controlar a epilepsia e tratar a
nevralgia do trigêmeo, as enfermidades maníacas depressivas e os pacientes que
apresentam crises convulsivas generalizadas tônico-clônicas (GILMAN, et al. 1991).
Foi descoberta em 1953 pelo químico Walter Schindler, em Basiléia, na Suíça, que
procurava encontrar um composto tricíclico com propriedades antipsicóticas
semelhantes à clorpromazina, que tinha sido introduzida no mercado recentemente.
Destas investigações surgiu a carbamazepina, uma molécula estruturalmente muito
semelhante, sintetizada em 1960, antes mesmo de suas propriedades anti-
epilépticas terem sido descobertas. Essa descoberta aconteceu por acaso, no final
dos anos 60, passando então a ser utilizada como anti-epilético, mostrando-se eficaz
no tratamento de primeira linha das crises parciais e tônico-clônicas (GOUVINHAS,
et al., 2005; SIMON; BROWN, 2000). Somente em 1974, a carbamazepina foi
aprovada nos Estados Unidos para uso como agente anticonvulsivante.
O mecanismo de ação da carbamazepina foi parcialmente elucidado.
Sabe-se que ela estabiliza a membrana do nervo hiperexcitado, inibe a descarga
neuronal repetitiva e reduz a propagação sináptica dos impulsos excitatórios.
Considera-se que a prevenção de estímulos repetitivos dos potenciais de ação
sódio-dependentes na despolarização dos neurônios, via bloqueio do canal de sódio
voltagem-dependente, pode ser o principal mecanismo de ação. Enquanto a redução
da liberação de glutamato e a estabilização das membranas neuronais podem ser
consideradas responsáveis principalmente pelos efeitos anti-epilépticos, o efeito
depressivo no turnover (quantidade metabolizada) de dopamina e noradrenalina
poderiam ser responsáveis pelas propriedades anti-maníacas da carbamazepina
(LIMA, 2002).
A carbamazepina é absorvida de forma lenta e irregular no trato gastro-
intestinal, distribuindo-se em todas as partes do corpo ligada às proteínas
plasmáticas (aproximadamente 75 %). Por ser capaz de induzir o seu próprio
metabolismo, sua meia-vida após uma dose única pode ser até de 48 horas. No
entanto, após administração repetida por várias semanas, a meia vida cai
substancialmente. Sua metabolização ocorre no fígado e um de seus metabólitos
primários, o 10,11-epóxido carbamazepina, é tão ativo quanto a droga original, e
suas concentrações no plasma e no cérebro equivalem a aproximadamente a 50%
26
das de carbamazepina. É excretada na urina, quase totalmente, na forma de seus
metabolitos, sendo muito pouco excretado nas fezes (GOUVINHAS et al., 2005;
EUROPEAN PHARMACOPOEIA, 2002).
A carbamazepina tem parentesco químico com os antidepressivos tricíclicos,
sendo um derivado do iminostilbeno com um grupo carbamil na posição 5. Essa
tração é essencial para a potente atividade anticonvulsivante. Sua fórmula estrutural
é mostrada a seguir, na Figura 3:
Figura 3 - Fórmula Estrutural da Carbamazepina
Na literatura, sua descrição é vasta e sua caracterização vem sendo
desenvolvida desde 1968. Existem diversas cnicas propostas na literatura para a
identificação, a caracterização e a quantificação da carbamazepina. Como exemplo,
tomamos os ensaios e os métodos de análise físico-químicos propostos pelos
compêndios oficiais. Tais referências demonstram que, quanto às suas propriedades
físicas, o fármaco é caracterizado por ser um cristalino branco amarelado, com
ponto de fusão entre 189 e 193ºC, sendo praticamente insolúvel em água e éter,
levemente solúvel em etanol e acetona, e solúvel em clorofórmio e propileno glicol.
Deve ser armazenada em recipientes hermeticamente fechados, abaixo de 40°C e
preferencialmente, entre 15 e 30°C e, ao abrigo da luz (EUROPEAN
PHARMACOPOEIA, 2002; USP, 2007).
Estudos do FDA indicaram que comprimidos de carbamazepina poderiam
perder até um terço da sua eficácia, se conservados em condições úmidas. Isto
parece ser devido à formação de um dihidrato, forma que conduz ao endurecimento
do comprimido, resultando em uma dissolução e absorção. Como o dihidrato
também tem sido detectado após armazenamento sob condições ambientes,
OCNH
2
27
sugere-se que o armazenamento com sachês de sílica gel pode ser necessário para
evitar a deterioração física dos comprimidos de carbamazepina (EUROPEAN
PHARMACOPOEIA, 2002). Destacamos, igualmente, a referência de que esse
fármaco apresenta o fenômeno de polimorfismo.
A carbamazepina está disponível no mercado farmacêutico sob as formas de
comprimidos, cápsulas e suspensões orais (KOROLKOVAS, 2004; LUND, 1994). No
Brasil, movimenta US$ 23 milhões por ano. Somente o Instituto de Tecnologia em
Fármacos (Farmanguinhos, FIOCRUZ) produz anualmente 43 milhões de
comprimidos deste fármaco (CATELOES, 2002). Cabe ressaltar que a
carbamazepina faz parte da Relação Nacional de Medicamentos Essenciais
(RENAME), elaborada pelo Ministério da Saúde. Esses fatos denotam o interesse,
tanto da Indústria Farmacêutica como de Órgãos Federais por este fármaco, (FDA,
2008; BRASIL, 2008).
3.1 Conhecimento Estrutural da Carbamazepina
O conhecimento da estrutura é usado para melhorar o processo de
desenvolvimento de novos produtos farmacêuticos, neste caso, determinar a
estrutura cristalina de um composto ativo é uma das primeiras etapas do
desenvolvimento farmacêutico. Neste contexto a cristalografia de monocristais, por
difração de raios X, fornece as mais precisas informações estruturais de compostos
cristalinos, como parâmetros de cela unitária, densidade, desordem cristalina,
conformação molecular, empacotamento molecular, ligações de hidrogênio.
3.1.1 Introdução à cristalografia
Um cristal é um sólido no qual os elementos constituintes, sejam eles átomos,
moléculas ou íons, estão organizados num padrão tridimensional bem definido, que
se repete no espaço, formando uma estrutura com uma geometria específica
(também chamada de retículo). Essa estrutura pode assumir a forma externa de um
sólido de faces planas regularmente arranjadas, em geral com elevado grau de
simetria tridimensional (NETZ; ORTEGA, 2002).
No momento da cristalização, os elementos constituintes do cristal formam
com seus vizinhos, um conjunto de ligações químicas, desde ligações iônicas a
ligações fracas, que determinam a posição espacial que as moléculas tenderão a
ocupar dentro do cristal. Como resultado, forma-se uma estrutura tridimensional,
28
mantida por essas ligações de forma mais ou menos intensa, formando um sólido
cuja ordenação interna tem uma forte tendência para simetria, por isso são
chamados de cristais.
Os cristais iônicos consistem de uma rede de íons, sendo à força de ligação
do cristal a atração eletrostática entre os íons de cargas opostas, em que, de um
modo geral, esses cristais são duros e quebradiços e possuem altos pontos de
fusão. Nos compostos orgânicos, os cristais são formados por moléculas como suas
unidades básicas, em que as mesmas se mantêm coesas pela ação das forças de
Van der Waals, forças coulômbicas e ligações de hidrogênio, o que explica as
ligações fracas e os baixos pontos de fusão desses cristais.
Segundo a organização dos elementos constitutivos do cristal, isto é, o
arranjo das moléculas dentro do cristal, este pode ser classificado em lido
cristalino ou sólido amorfo. Os sólidos amorfos podem, em um primeiro contato,
serem considerados líquidos, por possuírem átomos ou moléculas arranjadas de
maneira aleatória, como no estado líquido. Os sólidos cristalinos (chamados de
cristais), como descritos anteriormente, caracterizam-se pela repetição espacial,
tridimensional de suas unidades estruturais, que se encontram dispostas em
padrões geométricos fixos. lidos cristalinos, diferentemente de líquidos, possuem
formas definidas e um arranjo ordenado de unidades. As diversas formas cristalinas
são divididas em sete sistemas cristalinos distintos, com base na simetria, como será
discutido em detalhes posteriormente (ex.: cúbico, monoclínico, triclínico). Enquanto
a morfologia de uma forma cristalina, freqüentemente chamada de hábito, é definida
em relação a uma mesma estrutura, mas de aparências externas diferentes (SINKO,
2008).
Os fármacos sólidos podem existir como substâncias cristalinas ou partículas
amorfas, sem estrutura identificável. O caráter amorfo ou cristalino de uma
substância pode afetar sua estabilidade e atividade. De modo geral, a forma amorfa
apresenta maior solubilidade, velocidade de dissolução e biodisponibilidade que a
forma cristalina, uma vez que, no estado amorfo, a energia necessária para a
separação das moléculas, coesas ao acaso, é menor que na forma cristalina. Por
outro lado, formas cristalinas são mais estáveis que as formas amorfas (SINKO,
2008; SHARGEL e YU, 1999).
29
3.1.2 Simetria
Simetrias são observadas por toda parte, no mundo que nos rodeia,
ocorrendo em várias áreas do interesse humano, como na geometria, na
matemática, na física, na biologia, na arquitetura, nas artes entre outros. Os
conceitos das operações geométricas de reflexão, rotação e inversão, bem como o
de isometria, têm uma relação direta com o conceito de simetria. Segundo os
princípios da geometria euclidiana se, ao rodarmos uma figura invertendo-a, se ela
for sobreponível ponto por ponto essa figura é simétrica. Dada uma imagem de uma
figura, a sua simetria preservará comprimentos de ligação e ângulos, mas nem
sempre manterá a direção e o sentido das várias partes da figura, mesmo porque
muitas imagens simétricas não são sobreponíveis ponto a ponto.
Uma das características mais importantes de um cristal é a simetria. Um
estudo da simetria de um cristal é importante para compreender certos processos
dinâmicos como, por exemplo, as transições de fase, nas quais ocorrem quebras de
simetria. A própria idéia de periodicidade tem implícita, a idéia de que devem existir
certas simetrias nos cristais. A possibilidade de caracterização de um monocristal a
partir de uma unidade fundamental, por meio da simetria, simplifica o trabalho de
determinação estrutural, o que é de fundamental importância na cristalografia. Para
se perceber a natureza periódica e o arranjo dos cristais, é necessário conhecer as
operações de simetria, que são aplicadas nas moléculas ou nos objetos a partir dos
elementos de simetria. Esses elementos são constituídos por um ponto, um eixo ou
um plano. As operações de simetria são caracterizadas pelas inversões em relação
a um ponto, rotações em torno de um eixo, e reflexões sobre um plano. Essas,
quando associadas, geram as operações de simetria compostas que são: rotação
helicoidal, reflexão deslizante (deslizamentos), roto-reflexão e roto-inversão
(GLASSER, 2001).
Existem, no geral, dois tipos de simetria a pontual e a translacional. Esta
descreve uma repetição periódica de um aspecto estrutural através de um
comprimento, de uma área ou de um volume. A simetria pontual descreve a
repetição em torno de um ponto (ex.: reflexões, rotações e inversões)
A característica primordial de uma estrutura cristalina é que ela é simples e
repetitiva, cujos arranjos espaciais de átomos ou moléculas podem ser
representados por unidades básicas conhecidas como celas unitárias, que são a
menor parte do cristal que contém as suas caractesticas. A forma e tamanho da
30
cela unitária de cada cristal dependem das dimensões, da valência química e do
estado de ionização dos átomos ou moléculas que o compõem e das condições em
que o cristal se formou.
A repetição dessa unidade estrutural é possível através da simetria
translacional. Todos os cristais perfeitos apresentam, necessariamente, simetria
translacional nas três dimensões. No entanto, outros elementos opcionais de
simetria, como rotações, inversões e reflexões, também podem estar presentes
(TRUEBLOOD, 2004; LAKE, 2004). A estrutura cristalina completa pode ser
representada pela descrição do conteúdo de uma unidade de repetição (cela
unitária), pela expressão numérica que fornece os parâmetros dessa unidade, e pela
forma como esta unidade se repete por simetria translacional, sendo esta definida
pela rede da estrutura (TRUEBLOOD, 2004). A rede da estrutura é caracterizada
pelo grupo de pontos iguais em um arranjo infinito e regular nas três dimensões
(Figura 4). A rede mostra o padrão em que ocorre a repetição, mas não mostra o
conteúdo desta unidade de repetição estrutural.
Figura 4 - Representação esquemática do
retículo cristalino de um cristal de NaCl e sua
respectiva cela unitária
Os parâmetros da cela unitária ou parâmetros de rede são caracterizados por
três vetores, que por sua vez definem a geometria completa da rede. Por
convenção, os três vetores são chamados de a, b e c, e os ângulos são chamados
α, β e γ, sendo que α é o ângulo existente entre b e c, β é o ângulo formado pelos
vetores a e c, e γ é o ângulo formado entre os vetores a e b. (Figura 5)
31
Figura 5 - Representação da cela unitária e
seus parâmetros de caracterização
A estrutura geométrica tridimensional, constituída de um paralelepípedo
denominado cela unitária, é constituída desses três vetores e nove outros
equivalentes. Uma cela unitária, deste modo, é a unidade básica para a
reconstrução da estrutura cristalina completa (LAKE, 2004). Portanto, podemos
concluir que uma cela unitária possui orientação e forma definidas pelos vetores
translacionais, tendo, desta forma, seu volume também definido, contendo os
átomos e moléculas necessários para geração do cristal.
A cela unitária preferida por convenção é aquela com os menores vetores não
coplanares na rede, apesar de existirem muitas escolhas diferentes de celas
unitárias possíveis para uma rede qualquer. A simetria translacional dos materiais
cristalinos possibilita o fenômeno da difração de raios X. Qualquer arranjo regular de
objetos pode atuar como ―rede de difração‖ de ondas que tenham comprimento de
onda da mesma ordem de grandeza que a distância interna entre objetos idênticos.
Os cristais atuam como redes de difração tridimensionais (TRUEBLOOD, 2004).
Na simetria pontual a descrição da repetição periódica se em torno de um
ponto, assim temos como operações desse tipo de simetria as reflexões, rotações,
inversões. Todas as operações de simetria para moléculas individuais podem ser
classificadas em: rotações próprias, isto é, rotações de uma determinada fração de
360° em torno de um eixo de rotação, e rotações impróprias, sendo a combinação
de uma rotação e uma reflexão simultânea em um plano perpendicular ao eixo. As
operações de rotação e inversão são casos especiais das operações de rotação
impróprias.
Em moléculas simples, todos os elementos de simetria (ponto, eixo e plano)
devem passar através de um ponto comum no centro da molécula. Por esta razão, a
32
coleção de todas as operações de simetria para uma molécula constitui os grupos
pontuais, que possuem característica própria e um símbolo convencional,
exemplificado na Tabela 2. Cada um destes grupos possui uma combinação
possível dos elementos de simetria cristalográfica. Existem 32 grupos pontuais
cristalográficos, que por sua vez, são derivados da combinação dos eixos de rotação
próprios e impróprios sendo respeitadas as suas restrições quanto às combinações.
O arranjo interno de um cristal pode ser descrito pelos chamados grupos
espaciais. Existem apenas 230 maneiras diferentes de organização interna de um
cristal de forma a se preencher todo o espaço periodicamente e ordenadamente.
Estes arranjos de simetria são combinações de operações de simetria translacionais
(rotações helicoidais, reflexão deslizante ou deslizamento) com os grupos pontuais
cristalográficos. Estas combinações nos fornecem todas as diferentes maneiras
possíveis de se empacotar a matéria (LAKE, 2004).
3.1.3 Sistema Cristalino
Em função dos parâmetros de rede, isto é, do comprimento dos lados e dos
eixos do paralelepípedo elementar da cela unitária, e dos ângulos que as suas faces
formam entre si, pode-se identificar sistemas de cristalização, ou sistemas cristalinos
básicos. Neste contexto, um sistema de cristalização é o grupo pontual da malha
cristalina, isto é, o conjunto de simetrias de rotação e reflexão permitidas ao manter
fixo um ponto da malha, ignorando os átomos ou moléculas contidos em cada cela
unitária (LAKE, 2004). A análise geométrica dos sistemas de cristalização permite
concluir que existem sete sistemas distintos (Tabela 1), discutidos logo a seguir.
Tabela 1 - Os sete sistemas cristalinos
Sistema Cristalino
Eixos e ângulos
Tipos de cela
Triclínico
abc, αβy90
P
Monoclínico
abc, α=y=90° β90
P, C
Ortorrômbico
abc, α=β=y=90°
P, C, I, F
Tetragonal
a=bc: α=β=y=90°
P, I
Trigonal
a=bc: α=β=y90°
P (R)
Hexagonal
a=bc: α=β=90°, y=120°
P
Cúbico
a=b=c: α=β=y=90°
P, I, F
33
Segundo a disposição espacial dos pontos reticulares obtêm-se as seguintes
variantes dos sistemas de cristalização (HAHN, 2006):
P Cela unitária primitiva, ou simples, onde todos os pontos reticulares
estão localizados nos vértices do paralelepípedo que constitui a célula;
F Cela unitária centrada nas faces, apresentando pontos reticulares nas
faces para além dos localizados nos vértices. Quando apresentam somente pontos
reticulares nas bases são designadas pelas letras A, B ou C , segundo as faces que
contêm os pontos reticulares;
I Cela unitária de corpo centrado tendo, para além dos pontos que
determinam os vértices, um ponto reticular no centro da célula.
R Cela unitária primitiva com eixos iguais e ângulos iguais, ou hexagonal,
tendo, para além dos pontos que determinam os vértices, pontos duplamente
centrados no corpo.
O sistema cristalino triclínico agrupa todos as formas cristalinas que não
podem ser acomodados em qualquer um dos outros sistemas, exibindo apenas
simetria translacional ou inversão. Permite apenas dois grupos espaciais. Os cristais
com este sistema caracterizam-se pela ausência de eixos ou planos de simetria,
apresentando três eixos cristalográficos com comprimentos desiguais e oblíquos
entre si.
Os cristais do sistema Monoclínico, em geral, apresentam apenas um eixo de
simetria binário, ou um único plano de simetria, ou a combinação de ambos, por
isso, requerem um eixo de rotação binário e um plano reflexo. Permite ainda 13
grupos espaciais. Possui três eixos cristalográficos, todos com comprimentos
diferentes, dos quais, dois eixos formam um ângulo oblíquo entre si, sendo o terceiro
perpendicular ao plano formado pelos outros dois.
No sistema Ortorrômbico os cristais possuem três eixos cristalográficos
perpendiculares entre si, todos com comprimentos diferentes, demandando três
eixos binários de rotação ou um eixo de rotação binário e dois planos de imagem
reflexa. Permite 59 grupos espaciais. Produz estruturas de grande complexidade
tendo como característica comum a todos os cristais deste sistema apresentarem,
ao menos, um eixo binário de simetria. Os sistemas cristalinos ortorrômbico,
monoclínico e triclínico apresentam um grau de simetria menor, sendo necessários
três parâmetros de cela para caracterizá-los.
34
Todos os cristais do sistema tetragonal têm a característica de possuírem,
três eixos cristalográficos perpendiculares entre si, sendo os dois horizontais de
igual comprimento e o vertical de comprimento diferente. Apresentam um eixo
quaternário de simetria, permitindo um eixo quaternário de rotação e 68 grupos
espaciais.
O sistema cristalino trigonal ou romboédrico apresenta três eixos
cristalográficos de mesmo tamanho e simétricos em relação a um eixo de simetria
ternária, com o qual fazem ângulo diferentes de 90º. Permitindo 25 grupos espaciais.
o sistema hexagonal é considerado por vezes como mera variante do
sistema trigonal (por duplicação). Neste sistema todos os cristais possuem um eixo
ternário de simetria, ou um eixo senário (eixo de ordem seis). Possuem quatro eixos
cristalográficos, dos quais três são horizontais, com comprimentos iguais e
cruzando-se em ângulos de 120°, e o quarto é o vertical, com comprimento diferente
dos demais; permitindo 27 grupos espaciais.
O sistema Cúbico (isométrico) fornece quatro eixos ternários de rotação, o
que permite um número de 36 grupos espaciais. Produz estruturas simples e
lineares e seus eixos cristalográficos possuem comprimentos iguais e o
perpendiculares entre si.
Desta forma, é possivel concluir que o sistema cúbico é o mais simétrico e
também o mais simples, por apresentar a simetria do cubo, que se beneficia da
isometria de suas faces. Sendo a ordem descrescente de simetria dos sistemas
restantes: hexagonal, tetragonal, romboédrico, ortorrômbico, monoclínico e triclínico
(GLASSER, 2001).
3.1.4 Redes de Bravais
Foram estabelecidas 14 estruturas cristalinas básicas, as denominadas
Redes de Bravais, em homenagem a seu criador Augusto Bravais (1811-1863).
Essas redes foram estabelecidas em função das possíveis localizações das
partículas (átomos, íons ou moléculas) na cela unitária, e seu padrão de vizinhança
(topologia). Todos os materiais cristalinos até agora identificados pertencem a um
dos 14 arranjos tridimensionais (Figura 6), correspondentes às estruturas cristalinas
básicas de Bravais (GIACOVAZO, 1992).
A estrutura cristalina elementar de um sólido pode ser determinada pela
definição da forma geométrica da rede, sendo necessário estabelecer as posições
35
dos átomos, íons e moléculas na cela unitária, onde os mesmos são denominados
pontos retículares e são constituintes do retículo cristalino. Retículo é uma rede
tridimensional de pontos, gerada pelos vértices das celas unitárias, o que implica em
que cada um desses pontos tenha exatamente a mesma vizinhança em todas as
direções.
Resumindo, cada cristal pode ser classificado como um membro de um dos
sete possíveis sistemas cristalinos que o definidos pelas relações entre as
dimensões individuais, a, b e c, e entre os angulos individuais α, β e γ de uma cela
unitária. Os cristais podem ser classificados segundo os grupos pontuais de
operações de simetria que une suas faces. Estes grupos são em número de 32.
Uma vez que as operações de simetria de cada um dos 32 grupos pontuais
cristalogficos são aplicados aos 14 Retículos de Bravais, resultando em 230
grupos espaciais, que descrevem de maneira unívoca, todo arranjo de objetos
idênticos, dispostos num retículo periódico infinito. Pode-se considerar que os 230
grupos espaciais são gerados pela adição de dois novos tipos de operações de
simetria, aquelas encontradas nos grupos pontuais. Os elementos de simetria
complementares são os eixos helicoidais (―eixos parafuso‖) e os planos de
deslizamento. Dessa forma, a estrutura de um cristal pode ser designada por uma
das sete Redes de Bravais e por um dos 230 grupos espaciais, demonstrada
Figura 6 - As 14 Redes de Bravais
36
resumidamente na Tabela 2. Todos os 230 grupos espaciais possíveis e suas
simetrias, e as simetrias de seus padrões de difração, estão descritos na
International Tables for Crystallography (HAHN, 2006).
Tabela 2 - Grupos Espaciais para os Sistemas Cristalinos Triclínico, Monoclínico e
Trigonal
SISTEMA
CRISTALINOS
GRUPOS
PONTUAIS
GRUPOS
ESPACIAIS
Triclínico
1
1
P1
P
1
Monoclínico
2
m
2/m
P2 C2 P2
1
Pm Cm Pc Cc
P2/m C2/m P2
1
/m P2/c P2
1
/c C2/c
Trigonal
3
3
32
3m
m/23
P3 P3
1
P3
2
R3
P
3
R
3
P312 P321 P3
1
12 P3
1
21 P3
2
12 P3
2
21 R32
P3m1 P31m P3c1 P31c R3m R3c
P
m13
P
c13
P
1m3
P
c13
R
m3
R
c3
3.1.5 A difração dos Raios X
Os raios X são um tipo de radiação eletromagnética que, por sua vez, é uma
forma de energia que se propaga através do espaço como campos oscilantes
elétrico e magnético, ambos perpendiculares entre si e em relaçao à direçao de
propagação. Esses raios apresentam um comprimento de onda da ordem das
distâncias inter-atômicas (cerca de 1,54 angstrons). Quando um feixe de raios X
atinge algum material cristalino, seus elétrons são forçados a oscilar devido ao
campo eletromagnético da radiação incidente, tornando-se uma nova fonte
espalhadora em todas as direções, pois os raios X o espalhados pelos elétrons
em torno dos átomos individuais das moléculas dos cristais (SINKO, 2008). O
arranjo regular dos atomos no cristal faz com que algumas direções interfiram em
outras direções, construtivamente ou destrutivamente. Eis a importância do uso de
instrumentos modernos que permitem detectar o padrão de difraçao de raios X.
Este padrão é o resultado da superposição das ondas espalhadas devido às
interferências construtivas e destrutivas, causadas por objetos que são da mesma
ordem de grandeza do comprimento de onda da radiação (NAPOLITANO et al.,
2005). Esses padrões de difração podem ser detectados por meio de uma placa
sensível colocada atrás do cristal, e é uma ‗sombra‘ do reticulo cristalino que os
produz.
37
Quando os raios X incidem numa chapa fotográfica, após difratarem em um
monocristal, formam um conjunto de pontos chamados pontos de Laue, (Figura 7),
que correspondem aos máximos de difração da radiação pelo cristal, (USP. 2007). A
posição desses pontos depende dos detalhes da rede cristalina e do comprimento
de onda dos raios X incidente, cujo entendimento é explicado pela lei de Bragg,
referida logo a seguir.
Sendo assim, a difração de raios X possibilita o estudo de detalhes do
reticulado cristalino, podendo medir variações de milésimos de Ångstrons,
possibilitando a determinação de distâncias inter-atômicas, ângulos de ligação e
vários outros aspectos estruturais.
Figura 7 - Difração de Raios X
Cada cristal de um composto cristalino produz padrões de difração de raios X
característicos. Esses padrões podem ser derivados de um cristal único
(monocristal) ou de espécies em do material, contendo numerosos cristais.
Usando métodos computacionais, é possível determinar as conformações das
moléculas, bem como a relação entre elas na estrutura. Isso resulta em uma
descrição completa da estrutura, incluindo o menor dos blocos estruturais, a cela
unitária. É possível determinar a densidade eletrônica e, consequentemente, a
posição dos átomos em estruturas complexas, a partir de um estudo matemático
exaustivo do padrão de difração de raios X. Quando cristais isolados não estão
disponíveis ou são inadequados para análise, a substância pode ser analisada na
38
forma de (SINKO, 2008). O padrão de difraçâo de raios X aplicado ao pode
ser considerado a impressâo digital da estrutura de um cristal. A comparação da
posição e intensidade das linhas em tais padrões com as linhas correspondentes
nos padrões de uma amostra conhecida nos permite uma análise qualitativa e
quantitativa.
Assim, o principal uso das informações da difração de monocristais é para a
determinação do peso e para análises da estrutura do cristal a nivel atômico. No
entanto, as difrações estabelecidas para monocristais podem ser utilizadas para
apoiar um padrão de pós específico (USP, 2007).
Conforme citado anteriormente, as substâncias sólidas podem ser
classificadas como cristalinas ou amorfas, sendo estas substâncias pobres difratoras
de raios X, resultando em amplos e difusos padrões de difração, ao contrário das
substâncias cristalinas, cujos padrões são bem definidos. Vale ressaltar que dois
polimorfos terão dois padrões distintos de difração de raios X. A presença de um
solvato (estrutura cristalina que contém uma molécula de solvente como parte
integral de sua estrutura) também irá influenciar o padrão de difração de raios X por
, porque o solvato terá a sua própria estrutura cristalina singular. Isso pode levar
uma forma polimórfica aparecer como uma forma mutável ou de dois polimorfos
distintos.
Uma maneira de verificar se a presença de uma alteração em um padrão de
difração de raios X por pós é devida a um solvato ou a um polimorfo separado é
medir o padrão de difração de raios X em várias temperaturas (SINKO, 2008). Uma
vez que os solventes tendem a ser expelidos das estruturas abaixo do ponto de
fusão, a medida dos padrões de difração de raios X em várias temperaturas pode
eliminar o solvente e revelar a forma não solvatada. A ausência de alterações nos
padrões de difração em diferentes temperaturas é um forte indício de que a forma
não é realmente solvatada, bem como pequenas alterações podem indicar uma
estrutura que mantém seu motivo de empacotamento sem a presença do solvente.
O principio fundamental deste todo baseia-se no fato de que um feixe
alinhado de raios X monocromáticos é difratado em várias direções quando ele é
afetado pela rotação do cristal ou pela orientação aleatória do cristal em pó. O cristal
funciona como uma grelha de difração tridimencional para esta radiação. Este
fenômeno é descrito pela Lei de Bragg, que afirma que a difração (interferência
construtiva) pode ocorrer quando ondas que estão espalhadas em diferentes
39
regiões do cristal, em uma determinada direção, viajam distâncias diferindo por
números inteiros (n) e de comprimento de onda λ. Sob tais circunstâncias, as ondas
estão em fase. Esta condição é descrita pela equação de Bragg, descrita abaixo:
2d
hkl
sinθ= nλ
Eq. (1)
A Equação (1) foi obtida pelos físicos ingleses Sir William Henry Bragg e seu
filho Sir William Lawrence Bragg, em 1913, para explicar por que as faces clivadas
de cristais refletem feixes de raios X a certos ângulos de incidência (ângulo de
difração, θ). A variável d
hkl
é a distância entre camadas atômicas em um cristal (ou
entre os espaçamentos interplanares) e a variável lambda λ é o comprimento de
onda do feixe de raios X incidente; n é um número inteiro. A equação de Bragg é
uma consequência da periodicidade da rede cristalina e é a condição para que
ocorra a interferência construtiva em um feixe espalhado por duas camadas
adjacentes de planos reticulares. Esta condição estabelece que a diferença de
caminho ótico seja um múltiplo inteiro do comprimento de onda do feixe incidente
(GIOCOVAZZO, 1992). Essa relação matemática permite, na cristalografia,
determinar as direções de interferência construtivas em um cristal formado por uma
distribuição discreta de densidades eletrônicas.
Com o objetivo de localizar geometricamente as direções de interferência
construtiva, representa-se um cristal por uma distribuição discreta de densidade
eletrônica, parcialmente representada na Figura 8
Figura 8 - Representação esquemática fora de
escala da Lei de Bragg.
Quando um feixe de raios X incide sobre um cristal, os planos de átomos
deste cristal funcionarão como espelhos e farão com que o feixe seja refletido. Esta
40
reflexão ocorre porque o espaçamento entre os planos atômicos de um cristal é da
ordem do comprimento de onda dos raios X. Quando dois raios incidem em planos
diferentes do cristal, um deles percorrerá um caminho um pouco maior. Esta
diferença de caminho caracterizará a diferença de fase entre os raios difratados, que
está diretamente relacionada ao tipo de interferência que ocorrerá entre os raios.
Como se sabe, sempre que a diferença de fase entre duas ondas for um número
inteiro de comprimentos de onda (nλ, para n= 1, 2, 3, etc), estas irão interferir
construtivamente, isto é, suas amplitudes se somam. E quando a diferença de fase
entre duas ondas for um número inteiro mais meio comprimento de onda [(n+1/2) λ,
para n= 1, 2, 3, etc], estas irão interferir destrutivamente, isto é, suas amplitudes se
subtraem (GIOCOVAZZO, 2002).
Em suma, a difração de raios X de monocristal é tradicionalmente o meio
preferido para estabelecer a estrutura de cristais, mas não se pode negar que este
método também essujeito a dificuldades a partir de fatores como, por exemplo,
desordem estática ou dinâmica, adequação do cristal, geminação, etc. Conforme
mencionado, tem sido demonstrado que em casos onde nenhum monocristal
adequado possa ser obtido, a descrição da estrutura a partir das informações de
raios X por pós é uma alternativa promissora e de sucesso.
3.2 Importância do conhecimento estrutural
Em 1858 e 1861, Kekulé, Couper e Bultlerov, dispuseram a base para uma
das teorias mais fundamentais na química: a Teoria Estrutural. A partir de então,
muitos dos problemas enfrentados pelos cientistas começaram a ser elucidados.
Com o surgimento da Mecânica Quântica, no início do século XX, ampliou-se a
perspectiva de interpretar a estrutura dos materiais, que até então era somente fruto
de especulações (SOLOMONS; FRYHLE, 2005).
A determinação do arranjo dos átomos nas moléculas e no cristal é
extremamente útil para o entendimento das propriedades químicas, físico-químicas e
biológicas dos compostos sólidos, visto essas propriedades serem determinadas por
sua composição e por sua estrutura (NAPOLITANO, et al., 2005). As propriedades
dependem intimamente da estrutura, e variações na estrutura podem e irão conduzir
a variação nas propriedades. As propriedades de pigmentos, explosivos, materiais
orgânicos eletricamente carregados, materiais orgânicos magnéticos, etc., estão
todas profundamente relacionadas às suas estruturas no estado sólido
41
(BERNSTEIN, 2008). A procura e a caracterização de formas cristalinas é uma das
mais ativas e desafiantes áreas de pesquisa da química estrutural moderna.
Conforme mencionado anteriormente, alguns compostos farmacêuticos
importantes apresentam a habilidade de existir em mais de uma estrutura cristalina.
As diferenças podem, às vezes, não ser grandes, ou mesmo não ser detectáveis por
métodos analíticos, mas podem ser substanciais. A solubilidade e os pontos de
fusão o muito importantes em processos farmacêuticos, incluindo dissolução e
formulação (SINKO, 2008). O que explica a razão primária do motivo pelo qual nos
interessamos pelos polimorfos. Portanto, as pesquisas relacionadas às diferenças
de solubilidade apresentadas por polimorfos de um mesmo fármaco têm ocupado
local de destaque. Em casos como esse, o resultado é a existência de um polimorfo
terapeuticamente mais ativo do que outro polimorfo do mesmo fármaco.
As diferenças na estrutura do cristal dos polimorfos surgem quando estes
cristalizam em diferentes arranjos de empacotamento do cristal e/ou diferentes
conformações. A ocorrência do polimorfismo é muito comum entre moléculas
orgânicas.
Por décadas, a carbamazepina tem servido de modelo para o estudo do
polimorfismo. Ela é um rmaco que apresenta polimorfismo e é classificada
biofarmacêuticamente como classe II, apresentando alta permeabilidade intestinal e
baixa solubilidade em água (NAIR, 2002). Desta forma, sua biodisponibilidade é
limitada pela sua solubilidade. MEYER et al., (1992) realizaram estudos de
comparação da biodisponibilidade em diferentes lotes de carbamazepina, onde as
causas das diferenças na biodisponibilidade não ficaram totalmente esclarecidas
(KOBAYASHI, et al., 2000). Entretanto, a contribuição dos fatores como as
diferenças na forma cristalina e/ou o tamanho da partícula ressaltam a importância
do conhecimento da estrutura do cristal nesse processo.
Na literatura especializada, existem vários trabalhos, que demonstram um
considerável esforço em caracterizar estruturalmente esse fármaco. Assim, foram
descritas quatro formas polimórficas anidras: forma I - triclínica (ou γ), forma II -
trigonal (ou α), forma III - monoclínica (ou β), e forma IV - monoclínica de face
centrada, e pelo menos um dihidrato, (GRZESIAK, et al., 2003; LOWES, et al.,
1987). Portanto, o estudo do polimorfismo desse fármaco é de extrema importância,
uma vez que o polimorfo mais estável em temperatura ambiente é a forma
monoclínica padronizado pela Farmacopéia Americana. Em geral, a forma estável
42
de uma substância polimórfica exibe ponto de fusão mais alto, menor solubilidade
com o máximo de estabilidade química, portanto, mantém sua integridade química
dentro de limites especificados, mantendo as mesmas propriedades e características
durante o período de uso e armazenamento (LACHMAN, et al., 2001). Todas as
outras estruturas polimórficas são consideradas metaestáveis
Diversos trabalhos foram realizados com o objetivo de caracterizar essas
formas polirficas utilizando as mais diversas técnicas analíticas, tais como:
microscopia eletrônica de varredura (SEM), difração de raios X para pós (XRPD),
espectrofotometria na região do infravermelho (IR), espectroscopia de Raman,
espectroscopia de infravermelho com transformada de Fourier (FT-IR), calorimetria
exploratória diferencial (DSC), termogravimentria (TG) e ressonância magnética
nuclear (RMN), (GRZESIAK, et al., 2003; LOWES, et al., 1987; SINKO, 2008;
RUSTICHELLI, et al., 2000; KOBAYASH, 2000).
Uma avaliação detalhada que possa encontrar possíveis variações nos dados
cristalográficos, agora é essencial para o desenvolvimento de uma nova droga,
portanto a caracterização física de sólidos tem se tornado uma área extremamente
importante na farmácia e tem sido o objeto de muitos estudos envolvendo os
diferentes métodos analíticos (RUSTICHELLI, et al., 2000).
43
4. DESCRIÇÃO DOS POLIMORFOS DA CARBAMAZEPINA
A carbamazepina (CBZ) é uma substância química de origem sintética, sendo
estruturalmente semelhante à fenitoína. É denominada quimicamente por 5H-dibenz
[b, f]azepina-5-carboxamida, e possui fórmula molecular C
15
H
12
N
2
O e peso
molecular 236,27 (USP, 2007).
Essa droga tem sido investigada por muitos autores por razão da sua
habilidade em existir em diferentes estruturas cristalinas (polimorfismo) e da
estabilidade física das suas várias fases sólidas. Contudo, parece haver algumas
variações no que se refere ao número de modificações e suas exatas
caracterizações, (RUSTICHELLI, et al., 2000; KRAHN; MIELCK, 1987). Para essa
droga, foram descritas, no mínimo, quatro formas polimórficas anidras, três das
quais já foram bem caracterizadas estruturalmente por difração de raios X para
monocristais. Em alguns dos relatos também foram descritas as formas cristalinas
dihidratos e solvatos, que ocorrem quando moléculas de solvente estão presentes
na estrutura cristalina, sendo o fenômeno denominado de ‗pseudopolimorfismo‘, e as
formas são chamadas de solvatos; quando essa molécula de solvente é a água, são
chamados hidratos e os termos hemidrato, mono hidrato e dihidrato descrevem as
formas hidratadas em equivalentes molares de água correspondendo a meia, uma
ou duas moléculas de água. (LACHMAN, et al., 2001; SINKO, 2008).
A identificação de formação de hidratos é importante, uma vez que a sua
solubilidade em água pode ser menor do que a observada para as formas anidras. A
transformação de um fármaco anidro em hidratado pode reduzir a sua velocidade de
dissolução e a sua absorção. Na literatura, é vasta as referencias da rápida
conversão da carbamazepina anidra em forma hidratada, quando em presença de
água ou vapor d‘água, por sua vez é recomendado acondicionamento em
recipientes hermeticamente fechados para garantir maior segurança quanto à
conservação do fármaco, uma vez que é bem conhecido que a CBZ é instável sobre
condições de umidade.
Outro ponto que tem gerado muitas confusões se refere à nomeação dos
polimorfos da CBZ. Numa tentativa de evitar mais desentendimentos, alguns autores
sugerem a adoção do nome da modificação com maior ponto de fusão de ‗I‘ e as
demais modificações de acordo com seus pontos de fusão descendentes.
Igualmente, em um estudo realizado por GRZESIAK, et al., (2003), os dados
44
anteriormente publicados foram sumarizados de forma organizada, onde se
destacam a relação dos principais nomes das formas polimórficas da CBZ descritas
na literatura, seus autores, bem como seus métodos de caracterização (Tabela 3).
Tabela 3- Tabela apresentada por GRZESIAK et al.2003.
Ano
Referência
Triclínica
Trigonal
P-Monoclinica
C-Monoclinica
Método de Confirmação
1968
Kuhnert et al.
I
III
Calores de fusão
1975
Pohlmann et al.
Cs
C3
C1
PXRD, IR
1981
Reboul et al.
Monoclínica
Estrutura cristalina
1984
Kaneniwa et al.
III
II
I
PXRD,DSC
1984
Umeda et al.
III
II
I
PXKD,DSC
1986
Kala et al.
I
II, IV
III
PXRD,DSC
1986
Lefebvre et al.
Α
β
PKRD,DSC
1987
Krahn et al.
I
III
II
b
PXRD,DSC
1987
Lowes et al.
α,Trigonal
β
Estrutura Trigonal, PXRD,DSC,IR
1991
Behme et al.
I
III
DSC, preparação
1991
Dugué et al.
γ
α
β
Preparação
1992
Borka et al.
I
III
IR, calores de fusão
1996
MacMahon et al.
I
III
PXRD
1997
Céolin et al.
Triclínica
Informações de cela, PXRD
2000
Roberts et al.
α
β
PXRD, SEM
2000
Kobayashi et al.
III
I
PXRD,DSC
2000
Rustichelli et al.
I
III
II
b
PXRD, DSC, IR
2002
Lang et al.
IV, C-Monoclinica
Estrutura cristalina
2003
Grzesiak et al
I
II
III
IV
PXRD,DSC, IR
"Cada forma foi verificada pelo método listado bem como pelo método de preparação de cada forma.
b
Estas formas são mais semelhantes a CBZ C-Monoclinica, por mais que, as diferenças notadas no texto existam.
Considerando que as estruturas polimórficas da CBZ apresentam a mesma
estrutura química, transformações de uma forma em outra não envolvem uma
mudança molecular do fármaco. As estruturas polimórficas podem ser
interconvertidas por processos mediados por solventes ou transformações de fase
que são induzidas através de calor, ou stress mecânico, (RUSTICHELLI, et al.,
2000). Em geral, as diferentes formas cristalinas não possuem o mesmo fator de
empacotamento atômico, assim essas transformações de fase são acompanhadas
por variações de volume e densidade. As transformações de uma estrutura em outra
envolvem apenas pequenos movimentos atômicos, pois as combinações do
reagente e do produto coincidem, mas mesmo assim, é necessário romper as
ligações existentes e rearranjar as moléculas segundo uma nova estrutura cristalina.
Na CBZ, a variabilidade cristalina, isto é, diferenças de empacotamento
molecular, devido ao polimorfismo e ao pseudopolimorfismo, irão levar a diferenças
nas propriedades físicas e químicas das várias formas cristalinas desse fármaco.
45
Diferenças nas propriedades podem afetar a biodisponibilidade e o uso clínico eficaz
da CBZ (LOWES, et al., 1987).
Existem muitos relatos na literatura a respeito das transformações
polimórficas da CBZ, da caracterização das formas encontradas e da influência
dessas formas no comportamento da dissolução, farmacocinética, fotoestabilidade,
formulações, etc. (LOWES, et al., 1987). No entanto, existem muitas discrepâncias
entre as conclusões destes estudos, onde a relação entre as propriedades físico-
químicas das formas polimórficas e pseudopolimórficas da CBZ e sua
biodisponibilidade não são completamente entendidas (KOBAYASHI, et al., 2000).
Dada essa importância, as formas polimórficas da CBZ têm sido estudadas
intensamente ao logo do tempo, de forma a definir suas características estruturais e
físico-químicas. Com este intuito, a metodologia cristalográfica se apresenta como
poderosa ferramenta para determinação estrutural.
Os dados cristalográficos apresentados na Tabela 4 a seguir, para os
polimorfos da carbamazepina foram obtidos do banco de dados Cambridge
Crystallographic Data Center (CCDC) em arquivos no formato CIF, e foram
analisados graficamente através do software Mercury (MACRAE, et al., 2008). Estes
dados cristalográficos obtidos no formato CIF contêm todas as informações
necessárias para a obtenção da estrutura molecular e cristalina, tais como os
parâmetros da cela unitária, o sistema cristalino e o grupo espacial em que está
―acomodada‖ a estrutura, a fórmula química e o nome dado pela International Union
of Pure and Applied Chemistry (IUPAC) do composto, o número de unidades
assimétricas dentro da cela unitária, as operações de simetria pertinentes ao grupo
espacial em questão, o volume da cela unitária, as coordenadas cartesianas de cada
átomo desta molécula no cristal dentre outras informações.
46
Tabela 4 - Dados cristalográficos obtidos pelo banco de dados CCDC para os polimorfos da Carbamazepina
Dados
Cristalográficos
Sistema
cristalino
Grupo
Espacial
a
b
c
α
β
ɣ
Volume
da cela
unitária
Fator R
(%)
Z
1
CBMZPN02
Monoclínico
P 21/n
7.534(1)
11.150(2)
13.917(3)
90
92.94(4)
90
1167.55
8.4
4
1
CBMZPN10
Monoclínico
P 21/n
7.537(1)
11.156(2)
13.912(3)
90
92.86(2)
90
1168.3
3.9
4
3
FEFNOT02
Monoclínico
P 21/c
10.066(2)
28.719(5)
4.831(1)
90
103.45(1)
90
1358.27
7,29
4
2
FOMXAH
Monoclínico
P 21/n
5.1815(4)
26.0450(19)
20.5735(15)
90
91.302(2)
90
2775.72
5.65
8
2
UNEYOB
Monoclínico
P 21/c
10.3335(18)
27.611(5)
4.9960(9)
90
102.275(3)
90
1392.86
5.45
3
2
UNEZES
Monoclínico
P 21/n
5.0961(8)
17.595(3)
19.647(3)
90
90.917(3)
90
1761.44
5.22
4
2
UNEZIW
Monoclínico
P 21/c
5.1206(4)
15.7136(13)
18.4986(15)
90
96.546(1)
90
1478.75
4.92
4
2
UNEZOC
Monoclínico
P 21/c
5.2031(9)
14.741(2)
17.882(3)
90
98.132(3)
90
1357.74
5.33
4
2
VUBCAW
Monoclínico
P 21/n
10.869(4)
5.341(3)
25.153(11)
90
100.90(3)
90
1433.82
11
4
2
VUBCEA
Monoclínico
P 21/n
11.051(3)
5.464(2)
24.928(9)
90
100.81(4)
90
1478.51
5.3
4
2
XAQREN
Monoclínico
P 21/n
13.7605(10)
17.4574(13)
14.6240(11)
90
115.876(1)
90
3160.8
4.31
4
1
CBMZPN03
Trigonal
R -3
35.454(3)
35.454(3)
5.253(1)
90
90
120
5718.32
6.9
18
1
CBMZPN11
Triclínico
P -1
5.1705(6)
20.574(2)
22.245(2)
84.124(4)
88.008(4)
85.187(4)
2344.82
5.06
8
2
CRBMZA
Triclínico
P -1
9.001(3)
7.441(2)
13.755(3)
119.48(1)
78.96(2)
101.61(2)
780.943
5.4
2
1
CRBMZA01
Triclínico
P -1
7.3985(15)
8.9054(18)
11.873(2)
95.809(3)
93.401(4)
101.362(3)
760.479
7.68
2
2
UNEZAO
Triclínico
P -1
7.5140(11)
10.4538(15)
12.6826(18)
83.642(2)
85.697(2)
75.411(2)
957.015
4.58
2
2
UNEYIV
Triclínico
P -1
7.3254(19)
8.889(2)
12.208(3)
94.840(5)
94.926(5)
100.048(5)
775.836
7.95
2
2
UNEZUI
Triclínico
P -1
9.1567(12)
10.1745(13)
10.5116(14)
72.850(2)
70.288(2)
67.269(2)
834.909
4.99
2
2
UNIBOI
Triclínico
P -1
5.1077(11)
16.057(3)
17.752(4)
73.711(3)
89.350(3)
88.636(3)
1397.06
7.66
4
2
QANQUS
Triclínico
P -1
7.7118(4)
9.1503(4)
11.6969(6)
100.192(3)
95.379(2)
101.908(3)
787.584
4,77
2
2
SAPDUJ
Triclínico
P -1
10.236(2)
12.937(2)
13.614(2)
62.419(2)
88.218(2)
84.286(2)
1589.76
4,64
4
2
XAQQUC
Triclínico
P -1
7.1053(8)
11.8010(13)
19.648(2)
93.657(2)
92.800(2)
91.061(2)
1641.77
4.87
2
1
CBMZPN12
Monoclínico - C
C 2/c
26.609(4)
6.9269(10)
13.957(2)
90
109.702(2)
90
2421.93
3.57
8
2
UNIBAU
Monoclínico - C
C 2/c
32.531(5)
5.2697(8)
24.159(4)
90
98.191(3)
90
4099.29
15.56
8
2
UNIBEY
Monoclínico - C
C 2/c
34.355(8)
5.3795(13)
23.654(6)
90
93.952(6)
90
4361.17
6.19
8
2
UNIBIC
Monoclínico - C
C 2/c
18.388(4)
12.682(3)
16.429(3)
90
100.491(6)
90
3767.14
4,33
8
2
XAQRAJ
Monoclínico - C
C 2/c
37.013(3)
12.1319(9)
13.5991(10)
90
99.173(1)
90
6028.42
4.16
8
3
FEFNOT
Ortorrômbico
A b a m
28.659(9)
4.924(2)
19.748(5)
90
90
90
2786.78
10.5
8
2
XAQRIR
Ortorrômbico
P 21 21 21
7.2083(14)
14.644(3)
17.577(4)
90
90
90
1855.4
3.4
4
3
VACTAU02
Ortorrômbico
P b c a
9.0592(4)
10.3156(5)
25.0534(12)
90
90
90
2341.27
4.16
8
1
CBZ Anidra;
2
Solvatos de CBZ;
3
Dihidratos de CBZ
47
Como observado na Tabela 4 existem apenas seis formas polimórficas
anidras, das vinte sete formas restantes quatro são hidratos e os demais são
solvatos. Estes sendo obtidos durante as diferentes fases manufaturação da CBZ,
na presença de diferentes solventes e temperaturas. Algumas das maneiras de
obtenção das formas polimórficas da CBZ para análises de identificação e
caracterização estão descritas na Tabela 5 em relação a seus respectivos
pesquisadores. As formas anidras foram extensivamente descristas nos últimos
anos, algumas características importantes são descristas a seguir.
4.1 Forma III Monoclínica β
Essa forma representa a forma descrita na farmacopéia americana, sendo
também a mais estável a temperatura ambiente.
Os testes de espectrofotometria contribuíram significativamente para
identificação das formas polimórficas. Os espectros de absorção de infravermelho,
comparados com o obtido concomitantemente para o correspondente padrão de
referencia da USP, forneceram uma das mais conclusivas evidências de identidade
da substância que pode ser realizada a partir de algum teste individual. Em um
estudo aprofundado usando espectroscopia de infravermelho com transformada de
Fourier (FTIR), foram detectadas diferenças substanciais entre os espectros de
infravermelho da forma monoclínica e das outras formas polimórficas da
carbamazepina (Figura 9).
Figura 9 - Espectros obtidos por FTIR para as quatro
formas polimórficas anidras da carbamazepina
(GRZESIAK, et al., 2003)
48
Tabela 5 - Formas de Obtenção dos polimorfos da Carbamazepina
Krahn
(1987)
Lowes
(1987)
Rustichelli
(2000)
Grzesiak
(2003)
FORMA
I
Obtida quando Dihidratos
recém obtidos são
desidratados em forno por 3h a
70ºC. Ou através de
cristalização a partir de solução
de metanol com evaporação do
solvente
Aquecimento da CBZ
comercial por 170ºC
por 1h ou a 150ºC por
1h e 45 min.
Aquecimento da
CBZ comercial ou
por recristalização
a 150ºC por 3h.
FORMA
II
Cristalização a partir de
solventes com baixa
constante dielétrica,
como o tetra cloreto de
carbono e cicloexanos,
independente de sua
taxa de resfriamento
Dissolução da
CBZ comercial em
solução de etanol
a 80ºC. A solução
foi resfriada
rapidamente a
5ºC por 5h
FORMA
III
Forma obtida segundo
parâmetros aceitos por
compêndio oficial (USP) ou
ainda a CBZ presente na forma
farmacêutica que é
comercializada. Ou ainda:
Processo de cristalização a
partir de solução de metanol,
onde a redução da temperatura
é feita lentamente durante o
processo.
Forma obtida segundo
parâmetros aceitos por
compêndio oficial (USP)
ou ainda a CBZ presente
na forma farmacêutica
que é comercializada. Ou
ainda: Cristalização a
partir de solventes que
apresentam alta
constante dielétrica,
assim como o álcool sec-
butil, o álcool n-propil,
etanol e metanol. Já sua
pureza é obtida quando
se mantém uma taxa de
resfriamento lenta
durante todo o processo
de cristalização
Obtida por
Cristalização a partir
de solução de metanol
( ou outros solventes
com alta constante
dielétrica)pela redução
da Temperatura feito
lentamente durante o
processo.Outras
tentativas de cristalizar
a partir de outros
solventes sempre
conduz a forma I. Ou é
a Forma obtida
segundo parâmetros
aceitos por compêndio
oficial (USP).
Cristalização a
partir de solução
de etanol com
evaporação lenta
a temperatura
ambiente
FORMA
IV
Obtida quando Dihidratos
recém preparados são
desidratados a 20ºC em
dessecador a vácuo com P
2
O
5
Obtida pelo processo
de cristalização a partir
da CBZ comercial, a
partir de uma solução
etanólica. Faz adição
de água gelada e
resfriamento imediato
com banho de gelo. Os
cristais obtidos após 1h
foram filtrados e secos
por 24 h em dissecador
a vácuo com sílica gel
Cristalização a
partir de solução
de metanol com
evaporação lenta
a temperatura
ambiente.na
presença de
hidroxipropil
celulose.
Hidratos
São obtidos por cristalização a
partir da solução de metanol e
etanol com acréscimo de água
destilada, promovendo o
resfriamento durante 5h a
20ºC. Sendo filtrados e secos a
20ºC por 3h.
Segundo Grzesiak, et al., (2003) as três regiões principais para identificação e
distinção entre os polimorfos da carbamazepina são: 3500-3392; 1731-1629 e 1427-
1317 cm
-1
. Onde para forma monoclínica ocorrem picos de absorção em 3466, 169
49
e 1395 cm
-1
esses valores estando de acordo com os valores encontrados em outros
relatos anteriores presentes na literatura (USP, 2007).
As fotomicrografias obtidas apartir de microscópio eletrônico de varredura
(SEM) mostram que os cristais da forma monoclínica apresentam morfologia do tipo
prismas, sendo estes bem definidos, como mostrados na Figura 10 (LOWES, et al,
1987).
Figura 10 - Fotomicrografia da forma
monoclínica obtida de microscópio
eletrônico de varredura (LOWES, et al.,
1987).
A difratometria de raios X (XRPD) é uma técnica poderosa para identificação
das fases sólidas cristalinas, desse modo, muitas fases sólidas cristalinas
apresentam um único padrão de difração de raios X, o que compõe a base para sua
identificação. Com este propósito, é mostrado na Figura 11 o padrão de difração
para cada uma das quatro formas polimórficas anidras da carbamazepina, onde os
picos de difração indicativos de diagnóstico para forma monoclínica, foram
detectados em 2θ = 15.36, 19.56, 25.0 e 27.47cm
-1
(GRZESIAK, et al., 2003)
apresentando padrão de difração idêntico ao do padrão da referência da USP.
O sistema cristalino da forma III possui um arranjo cristalino monoclínico
primitivo cujo grupo espacial é P2
1
/n, com os seguintes parâmetros de rede: a =
7,534(1) Å; b = 11,150(2) Å; c = 13,917(3) Å, α = 90; β = 92,94(4) e γ = 90º e volume
igual a 1167.55 Å
3
, encontrando-se bastante empilhado, assim o apresentando
espaços vazios, o que explica esta forma apresentar a maior densidade entre as
quatro formas anidras.
50
Figura 11 - Padrões de PXRD para os quatro
polimorfos anidros da carbamazepina (GRZESIAK, et
al., 2003).
A forma monoclínica forma dímeros centrossimétricos via ligações de
hidrogênio intermoleculares (Figura 12) entre os grupos carboxamida (KOBAYASHI,
et al., 2000).
Figura 12 Empacotamento da Forma monoclínica
formando dímeros via ligações de hidrogênio
4.2 Forma I - Triclínica γ
Uma questão antiga no polimorfismo da carbamazepina tem sido a
identificação da forma triclínica, modificação estável em altas temperaturas. Estes
51
trabalhos levantaram a hipótese da existência de quatro ou oito moléculas
independentes por unidade de cela, a partir do volume de 2389Å encontrado para
uma cela triclínica. Tais observações tornariam a estrutura triclínica muito mais
complexa do que as outras três formas, que apresentam apenas uma molécula na
unidade assimétrica No entanto estudos estatísticos demonstraram que essas
ocorrências são raras, demonstrando que mais estudos são necessários para
caracterização dessa forma. Existem poucos relatos sobre esta forma no Cambridge
Structural Data Base (CSD). Talvez isso possa ser explicado pela dificuldade
associada com a determinação dessas estruturas, levando a uma menor freqüência
nos registros do CSD, muitas vezes abaixo da sua taxa de ocorrência natural
(GRZESIAK, et al., 2003).
A forma I cristaliza em uma cela triclínica (P1) com os seguintes parâmetros
de rede: a=5,1705(6); b=20,574(2); c=22,245(2) Å, α=84,12(4); β=88,01(4) e
γ=85,19(4)º. A estrutura cristalina completa dessa forma pôde ser especificada,
descrevendo o conteúdo da unidade de repetição (cela unitária). Sua unidade
assimétrica consiste de quatro moléculas que formam anti dímeros ligados por
pontes de hidrogênio através da carboxamida (Figura 13) doadora de H e do
carbonil aceptor (GRZESIAK, et al., 2003).
Figura 13 Empacotamento da Forma Triclínica, grupo
espacial P1
52
A forma triclínica é morfologicamente semelhante à forma trigonal, assim seus
cristais assemelham-se a agulhas. Ambas as formas apresentam padrões de
ligações de hidrogênio fracas. Onde cada oxigênio atua como aceptor de
hidrogênios a partir de dois carbonos próximos. Essa forma apresenta significantes
espaços hexagonais incluídos no interior do cristal devido a três dímeros estarem
formando uma estrutura triangular, o que resultará em dois aspectos importantes
desta forma: facilidade da invasão das moléculas de água dentro do cristal, o que
conseqüentemente acelera sua transformação em dihidrato e uma densidade menor
do que a encontrada na forma monoclínica padrão da USP (KOBAYASHI, et al.,
2000).
Os padrões de difração de raios X caractesticos dessa forma estão
explicitados na Figura 11, apresentando picos característicos de identificação em
2
Ɵ
= 7.92, 9.37, 12.28 e 19.99 (GRZESIAK, et al., 2003).
4.3 Forma II Trigonal α
A morfologia dos cristais da forma trigonal, detectadas nas fotomicrografias
obtidas apartir de SEM, são estruturas predominantemente parecidas com agulhas.
Um aspecto distinto desta morfologia é que, em uma secção transversal hexagonal
das agulhas, estas muitas vezes aparecem como tubos ocos conforme Figura 14
(LOWES, et al., 1987).
Figuras 14 - Fotomicrografias da forma trigonal (LOWES, et al.,
1987)
53
Essa forma apresenta sistema cristalino trigonal primitivo com grupo espacial
R3, com os seguintes parâmetros de rede: a=35,454(3); b=35,454(3); c=5,253(1) Å,
α=90; β=90 e γ=120º e volume de 5718.32. É valido ressaltar que, nos estudos
usando o método difratometria de pós para monocristais, o motivo do cristal na
forma II é um dímero centrossimétrico de ligações de hidrogênio, entre os grupos
carboxamida, onde a embalagem desses dímeros é um resultado significativo dos
‗espaços vazios‘ hexagonais (Figura 15) dentro do cristal (LOWES, et al., 1987).
Figura 15 Empacotamento da Forma trigonal com grupo
espacial R3.
A diferenciação das formas triclínica e trigonal não representam uma tarefa
trivial, portanto é necessário um estudo cuidadoso analisando os padrões de raios X
de monocristais bem como as medidas de calorimetria diferencial de varredura para
auxiliar nesta tarefa. Segundo estudos de GRZESIAK, et al., (2003), a partir do
PXDR a forma trigonal é reconhecível porque apresenta poucos picos de alta
intensidade (Figura 11), sendo seus picos de identificação localizados em 2θ= 8.68,
13.26, 18.56 e 24.54.
Através da análise dos espectros obtidos por FTIR para essas formas (Figura
9) confirmaram-se as semelhanças observando-se as similaridades nas absorções
entre ambas as formas, onde foram encontrados para forma trigonal os seguintes
valores: 3485, 1688 e 1396 cm
-1
e valores muito próximos para forma triclínica sendo
estes 3485, 1690 e 1395 cm
-1
(GRZESIAK, et al., 2003), portanto concluiu-se que
54
essas formas apresentam espectros praticamente idênticos com variação menor do
que 3 cm
-1
.
4.4 Forma IV - Monoclínica de Face Centrada
Recentemente a estrutura da forma monoclínica C foi publicada e designada
pelos autores como a nova forma IV. No entanto, esta forma já tinha sido descoberta
em 1968 por Kuhnert-Brandstatter et al. (chamada de forma II) e foi observada mais
tarde por muitos outros autores (HARRIS et al., 2005). Apresenta uma
caracterização abrangente, sua forma é semelhante à forma monoclínica padrão da
USP, podendo ser diferenciada das outras formas polimórficas através da análise
dos espectros de FTIR (Figura 9) onde essa apresenta dois picos em 773 e 765 cm
-1
sendo que nesta posição as outras formas polimórficas apresentam apenas um
único pico de absorção (GRZESIAK, et al., 2003).
Essa forma apresenta padrões de raios X obtidos a partir da PXRD (Figura
11), com picos característicos em 2θ= 14.11, 17.89, 21.79 e 33.11º. A forma IV
cristaliza em uma cela monoclínica de face centrada (C2/c) com os seguintes
parâmetros de rede: a=26,609(4); b=6,9269(10); c=13,957(2) Å, α=90; β=109,702(2)
e γ=90º e volume de cela de 2421,93.
Ambas as formas monoclínicas tem cadeias infinitas C(7) através de um
hidrogênio vinílico do anel azepine e um oxigênio aceptor. As ligações C-H....O que
ligam as unidades diméricas (Figura 16) de ambas as formas monoclínicas tem
cumprimentos de 2,48Å e 2, 28Å, para as formas monoclínica e monoclínica de face
centrada, respectivamente(GRZESIAK, et al., 2003).
55
Figura 16 - Empacotamento da Forma Monoclínica
de face centrada.
4.5 Descrições da Estrutura Molecular
Todas as formas anidras da carbamazepina existem como dímeros no estado
sólido, o que demonstra um consistente sentido de dimerização em todas as formas
anidras, no que diz respeito as suas fortes redes de ligações de hidrogênio. Este tipo
de ligação envolve um mecanismo doador-aceptor de elétrons, entre os grupos
carboxamidas, das moléculas de CBZ que compõem o dímero, dependem
diretamente da distância entre as moléculas envolvidas na ligação e sua formação
contribui para lipossolubilidade das moléculas associadas, o que acarreta em uma
alta permeabilidade trans membrana, mas em contrapartida provoca uma diminuição
da solubilidade dessa molécula em água, o que esclarece sua absorção irregular.
Assim, o tipo de arranjo cristalino também exerce certa influência sobre a
solubilidade, onde partículas simétricas podem ser menos solúveis do que as
assimétricas. Isso se deve ao fato da solubilidade depender, em parte, do trabalho
necessário para separar as partículas de soluto cristalino. Um ponto importante que
também deve ser levado em conta são as redes de interações fracas, que também
podem influenciar a embalagem cristalina e por sua vez na solubilidade.
Uma comparação entre as formas anidras, quando se analisa as distâncias
entre as ligações de hidrogênio que formam o dímero, observa-se que as distâncias
no dímero da forma monoclínica apresentam distâncias da ordem de 0,07A o que
56
revela uma proximidade maior entre essas moléculas do que a distância
apresentada nos dímeros das outras formas anidras, refletindo numa organização
dentro da unidade de cela muito mais empilhada e consequentemente mais densa, o
que pode refletir em sua maior estabilidade e consequentemente em uma menor
solubilidade, o que não é observado nas formas trigonal e triclínica cujos espaços
vazios dentro da cela unitária se refletem numa menor densidade, sendo este
ambiente sujeito a maiores alterações, sendo demonstrada para estas formas uma
maior solubilidade. Detalhada comparação dos parâmetros moleculares mostram
que a forma trigonal é muito semelhante morfologicamente à forma triclínica,
principalmente no que se refere a seus padrões de ligações de hidrogênio. Em
ambas as formas cada oxigênio atua como aceptor de hidrogênio a partir de dois
carbonos próximos. A posição do carbono doador é idêntica em ambas as formas,
(GRZESIAK, et al.,2003).
4.6 Análise Conformacional
Como relatado durante este trabalho à determinação da configuração de
moléculas e complexos moleculares (também conhecida como arranjo espacial ou
configuração dos átomos nas moléculas.) é sem dúvida fundamental, pois leva a
determinação de como se encontram dispostos esses átomos nas moléculas, ou
seja, determina a estrutura dos compostos. É neste contexto que estudos teóricos,
empíricos e quânticos sobre estrutura molecular têm sido realizados. Onde os
todos físicos têm mostrado grande valor na obtenção de informações sobre a
estrutura molecular. Demos especial destaque a difração de raios-X de cristais
simples por nos oferecer informações importantes sobre parâmetros geométricos
determinados para amostras na forma cristalina.
Polimorfos diferem na embalagem do cristal (empacotamento) e/ou
conformação molecular, bem como na energia do retículo e entropia. O
conhecimento dos arranjos da embalagem do cristal e das varias forças
intermoleculares envolvidas nos diferentes arranjos de embalagem ajudarão a
predizer e preparar os polimorfos mais estáveis de um dado composto.
A conformação é definida pelos ângulos de torção em torno de ligações
simples. Segundo Lowes (1987) nas moléculas de carbamazepina sua conformação
é dada pelos ângulos de torção em torno do Carbono e o Nitrogênio (1), sendo
particularmente notável quando o átomo de N(1) desloca a partir do plano de seus
57
ligantes vizinhos e o ângulo de toão descreve a inclinação do grupo carboxamida
em relação ao anel azepine. O ambiente dos grupos carboxamida ligados por
hidrogênio está sujeito a perturbações.
Segundo GRZESIAK (2003), análises conformacionais foram feitas com todos
os quatro polimorfos por programa de computador quando estes foram sobrepostos.
Observando a sobreposição de moléculas individuais (monômeros), o maior desvio
quadrático entre as posições atômicas desses quatro polimorfos foi menor do que
0,15 Å. Entretanto, como todos os quatro polimorfos da CBZ existem como dímeros
no estado sólido, todos os pares diméricos equivalentes dos quatro polimorfos,
apresentaram menos de 0,4 Å de desvio quadrático médio (quando estes foram
sobrepostos e analisados por computador), demonstrando um consistente senso de
conformação e dimerização em todos os quatro polimorfos, considerando sua forte
rede de ligações de hidrogênio. Assim a CBZ é um excelente exemplo de cristal
polimórfico no qual a conformação e os esquemas de ligações fortes de hidrogênio
permanecem totalmente constantes em todos os polimorfos.
As diferenças cabem exclusivamente na embalagem das unidades diméricas
carboxamida. Estas podem ser descritas pelos padrões fracos de interações C-
H....O, o qual prevalece totalmente em todos os quatro polimorfos.
Através de cálculos baseados em métodos de química computacional
Hartree-Fock (LEVINE, 1991; CAMARGO; NAPOLITANO; OLIVEIRA, 2005),
observamos que a forma monoclínica apresenta menor conteúdo energético e por
isso mesmo, confirma sua maior estabilidade frente às outras formas polimórficas
anidras (Tabela 6), onde podemos observar a seguinte ordem III<IV<I<II energética.
Tabela 6 - Cálculos de Energia baseado no método Hartree- Fock em conjunto de base 3-21*
Notação
Sistema
Cristalino
Grupo
Espacial
Hartree
Kcal/mol
III
Monoclínico
P2
1
/n
-754,5552906
-473498,5359
II
Trigonal
R3
-753,9166601
-473097,7825
IV
Monoclínica - C
C2/c
-754,4627892
-473440,4895
I
Triclínica
P-1
-754,3948717
-473397,8699
4.6 Transformações polimórficas
58
4.6.1 Por Aquecimento
Há algum tempo, estudos têm procurado avaliar a cinética da transformação e
sua dependência da temperatura. O uso de diagramas de energia/temperatura
confirma o comportamento enantiotrópico entre as formas polimórficas da CBZ,
enquanto tais diagramas podem ser derivados de uma seqüência de pontos de
fusão, estabilidade termodinâmica a temperatura ambiente bem como a partir de
calores de transformação, onde esse comportamento é demonstrado pelos
termogramas obtidos das análises calorimétricas.
Nos estudos realizados por KRAHN; MIELCK, (1987) foi demonstrado a
relação enantiotrópica entre os polimorfos I II e III através de diagrama de energia
(Figura 17). A transição da forma monoclínica para a forma triclínica ocorre de
maneira reversível, ficando caracterizada como a forma mais estável a temperatura
ambiente por apresentar a menor energia de Gibbs (GIII). Como disse a
temperatura de transição é importante porque ajuda a determinar qual a forma mais
estável em temperaturas de interesse, nessas temperaturas as formas polimórficas
estão em equilíbrio entre si, apresentando solubilidades idênticas em um dado
solvente e a mesma pressão de vapor.
Figura 17 - Diagrama de Energia livre versus Temperatura para
polimorfos I, II e II da carbamazepina, onde G representa energia livre de
Gibbs e H a entalpia( KRHAN; MIELCK, 1987).
59
Todas as formas polimórficas da carbamazepina transformam-se para forma I
sob aquecimento. O que foi demonstrado a partir da calorimetria diferencial de
varredura (DSC), onde, a análise da forma I, não apresentou nenhuma transição,
apenas fundindo entre 189 a 193ºC.(Figura 18).
Figura 18 - DSC dos quatro polimorfos anidros da CBZ sob taxa
de 20ºC/min de aquecimento (GRZESIAK, et al., 2003).
Os termogramas obtidos da análise da forma III a partir da DSC conduzem a
conclusão de que usando taxas de aquecimento maiores (<10 a 20 kmin-1) ocorre a
fusão da forma III a 174ºC seguida da recristalização na forma I, usando taxas
de aquecimento lentas (>5 Kmin
-1
) a forma III se converte em forma I antes de seu
ponto de fusão, entre 150 a 160ºC.
A observação de cristais da forma II durante o aquecimento permitiu uma
explicação para a transformação direta dessa fase na forma I entre 135 e 170ºC sem
ocorrer sua fusão. Isso parece ser em grande parte devido a altas taxas de
aquecimento inicial para cristais com poucos defeitos.
Também sob aquecimento a forma IV funde a 183,5ºC e recristaliza
imediatamente na forma I, apresentando cristais tipo agulha típicos dessa forma.
sob baixas taxas de aquecimento a transformação em forma I se concretiza antes da
temperatura de fusão da forma IV, onde se mantendo o aquecimento apenas a
forma I funde, o que foi confirmado pelos termogramas obtidos pela DSC (Figura 18)
(GRZESIAK, et al., 2003).
60
Fica, pois, claro que as informações termoquímicas e de densidades indicam
claramente a relação enantiotrópica entre a forma monoclínica e a forma triclínica e
não dúvidas que a forma monoclínica mostra a menor energia livre de todas as
formas polimórficas da CBZ abaixo da temperatura ambiente. De acordo com
GRZESIAK et al.(2003), as quatro formas apresentam energias próximas e a ordem
de estabilidade a temperatura ambiente é forma monoclínica > forma triclínica>
forma monoclínica de face centrada > forma trigonal. Esta ordem é baseada no
papel da densidade, o qual define que ‗se a modificação de um cristal molecular tem
a menor densidade, é possível assumir como sendo ela a forma menos estável no
zero absoluto. A partir das informações termoquímicas avaliadas por GRZESIAK et
al.(2003), pode-se deduzir que a forma monoclínica-C e a forma monoclínica
também representam um par enantiotrópico, no entanto, a forma monoclínica-C e a
forma triclínica são relacionadas monotropicamente.
A forma trigonal é obviamente a menos estável das quatro formas anidras da
CBZ. Devido a sua rápida transformação na forma triclínica não é possível
determinar seu ponto de fusão de maneira tão rápida, desta forma a relação
termodinâmica desta forma polimórfica com as outras formas anidras permanece
confusa.
4.6.2 Por Hidratação
Mudanças de fase simultâneas ocorrem quando a CBZ é colocada em contato
com a água, onde se observa a formação de diidratos em poucos minutos. A
facilidade e as taxas de formação de dihidratos, bem como sua desidratação simples
para modificações labeis a temperatura ambiente são importantes fatores no
desenvolvimento e na produção de formas de dosagem sólidas (KRAHN; MIELCK,
1987).
O conteúdo de água presente nessas estruturas não excede 13,24%
independente da temperatura e da umidade relativa durante a estocagem. Os
hidratos quando aquecidos perdem água em uma faixa de temperatura que vai de
56 a 132ºC. Quando submetida a seguintes condições de estocagem: 40ºC e 98%
de umidade relativa por vinte e oito dias, a forma I exibiu um aumento gradual de
peso, devido à absorção de água, onde depois de dois meses apresentava 13,24%,
correspondendo ao valor estequiotrico do dihidrato. a forma III apresentou
nessas condições um aumento de 1,9%. O que foi confirmado pela difratometria de
61
raios-X o que demonstrou que a forma I se transforma muito mais pido em
dihidrato do que a forma III, onde nessas condições ocorre a conversão da forma III
na forma I, no entanto observando-se que com o passar do tempo, a forma I volta a
forma III gradativamente (KRAHN; MIELCK, 1987;KOBAYASHI, 2000).
Este comportamento tamm se repetiu nos estudos de dissolução, onde as
medidas obtidas na (DSC) confirmaram que ambas as formas I e III transformam-se
minuciosamente em dihidratos, no entanto as mudanças nas taxas de dissolução
das formas anidras eram devido à transformação em hidratos, sendo a taxa de
transformação da forma I mais alta do que a da forma III, padrão da USP
(KOBAYASHI, 2000).
62
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O estudo do polimorfismo ganhou, nas últimas décadas, grande importância
para a indústria farmacêutica. O conhecimento do tipo de polimorfismo que um
fármaco apresenta e suas diferenças estruturais enfatizam a necessidade de seu
estudo, sobretudo na pesquisa por novos fármacos e no estudo de pré-formulações.
Neste trabalho destacamos a importância dos métodos cristalográficos na
análise de fármacos e suas aplicações na obtenção das informações estruturais
precisas para a identificação e a caracterização dos polimorfos. A cristalografia por
difração de raios X apresenta-se como uma ferramenta de alta aplicabilidade no
trabalho de caracterização de compostos cristalinos, permitindo o entendimento da
relação entre a estrutura e as propriedades físico-químicos dos compostos. Através
dessa metodologia podem ser determinadas as posições relativas de todos os
átomos que constituem a molécula (estrutura molecular) e a posição relativa de
todas as moléculas que constituem a cela unitária (estrutura cristalina). É possível,
portanto, estabelecer os ângulos e as distâncias inter-atômicas da estrutura
cristalina, bem como as interações intermoleculares.
Observou-se que o polimorfismo, considerado um dos responsáveis pelas
diferenças nas propriedades físico-químicas dos compostos, como solubilidade e
dureza, é ocasionado principalmente pela formação de um dímero entre duas
moléculas de carbamazepina, que faz com que a formulação apresente baixa
solubilidade e baixa dureza, ocasionadas pelas forças de interação de natureza forte
entre os dímeros das moléculas de carbamazepina, principalmente as forças de van
der Walls e as ligações de hidrogênio.
Com isso, pode-se inferir que as interações de van der Walls no estado sólido
sob um dado conjunto de condições pode ocasionar a transição polimórfica, ou seja,
a forma polimórfica de maior energia tende a se transformar na forma de menor
energia, forma mais estável, o que vem a ser uma problemática para a indústria
farmacêutica. Além disso, nota-se que a molécula de carbamazepina exibe baixa
solubilidade em água e alta permeabilidade intestinal, ocasionado principalmente
pelo fenômeno da dimerização de moléculas de carbamazepina, fazendo com que a
solubilidade e as interações com o solvente diminuam.
A mínima modificação dos ângulos de ligação das moléculas de carbamazepina
foi responsável pela geração de um novo polimorfo, evidenciando a fragilidade e a
63
vulnerabilidade da estrutura molecular em questão. Podemos dizer que a formação
do dímero é um fator positivo do ponto da vista da estabilidade da carbamazepina, já
que o mesmo expressa certa rigidez na estrutura molecular, fazendo com que esta
mantenha suas propriedades físico-químicas e farmacológicas (Interação fármaco-
receptor). O processo de compressão do pó no processo produtivo pode gerar
polimorfos, fenômeno que é minimizado graças à propriedade de formação de
dímeros, que atribui certa ―elasticidade‖ à molécula de carbamazepina pela natureza
forte de suas ligações intermoleculares.
A existência difundida de drogas polimórficas tem se mostrado importante e
eficiente na estratégica caracterização consistente de seus polimorfos. O impacto
potencial na mudança da forma de um cristal durante o estágio de Pesquisa e
Desenvolvimento (P&D), em termos de custo do produto, justifica a caracterização
sistemática e avançada do polimorfismo. A compreensão das características
polimórficas, permite, também, a seleção do melhor polimorfo para o mercado ou o
mais estável. Nós expusemos uma aproximação da caracterização que fosse
baseado em reconhecer os elementos distintos em investigação do polimorfismo,
além de identificar estruturas, propriedades e relação entre as suas propriedades.
64
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