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servirem ao senhor no outro mundo. Quando o antecessor de Kublai
morreu, foram sacrificadas mais de 20 mil pessoas. (Idem, p. 50-51).
Como esses dois trechos extraídos da obra de Polo, livremente traduzida por
Machado, há muitos outros que comentam o mesmo fato: “Na capital de Fuchu, o
Grande Khan costuma manter um exército bem equipado, porque seus habitantes
são muito rebeldes.” (Ibid., p. 90). Ou ainda:
Quero agora falar dos muitos feitos de Kublai, Khan, cujo nome
significa “rei dos reis”. (...) Descendente direto de Gengis Kam, tem
portanto, o direito de ser senhor de todos os tártaros. (...) Antes de ser rei
participou de diversas batalhas, com grande bravura. Mas, depois de ocupar
o trono, Kublai só foi à guerra uma vez, em 1286.
Nessa época, um jovem chamado Naian, bisneto de um irmão de
Gengis Khan, tinha recebido muitas terras do Grande Khan. Aos 30 anos,
achando-se poderoso, decidiu não mais ser súdito do imperador, e quis
arrebatar de Kublai seu poder e seus domínios. Propôs então a Kaidu, um
ambicioso sobrinho de Khan, um ataque conjunto, para que o derrotassem
mais facilmente. Reuniram assim muitos cavaleiros e soldados para
combater o Grande Khan.
Quando Kublai soube da cilada que lhe preparavam, teve uma
surpreendente reação: declarou que não mais reinaria se não conseguisse
matar os dois traidores. Em segredo, sem que ninguém soubesse, a não ser
seus conselheiros, equipou um exército em apenas 22 dias, com 360 mil
cavaleiros e 100 mil soldados. Eram poucos, se comparados a todo o seu
exército. Porém, pretendendo que tudo ficasse em sigilo, Khan reuniu
apenas os homens de sua confiança. Chamou então os astrólogos, os quais
lhe disseram que venceria a batalha, e partiu com seus homens por
estradas secretas, para que ninguém os visse. Em 20 dias chegou à
planície onde estava Naian com seus 460 mil cavaleiros, sem saber que
estava prestes a ser atacado. Por isso mesmo, seu acampamento não tinha
guardas.
Antes de o dia amanhecer, enquanto Naian ainda dormia, o Grande
Khan começou a avançar com uma torre fortificada, sustentada por quatro
elefantes. No alto da torre tremulavam suas bandeiras, que podiam ser
vistas de longe. Kublai Khan distribuiu seus homens em volta do
acampamento e foi se aproximando. Quando Naian o avistou, pressentiu
que estava perdido; mas, para não desapontar seus soldados, ordenou que
se pusessem em posição de combate, empunhando sua bandeira com a
cruz de Cristo, pois era cristão batizado. Os exércitos esperavam apenas
que soassem os grandes tambores, os quais, segundo o costume tártaro,
marcariam o início da batalha. Enquanto aguardavam, cantavam e tocavam
vários instrumentos. Quando os tambores rufaram, iniciou-se a luta com
espadas e lanças. Foi uma batalha cruel, na qual morreu muita gente.
Venceu-a o Grande Khan. Naian foi preso e seus barões renderam-se.
(Ibid., p. 58-59).
Não há certeza se os relatos de Marco Polo são totalmente fiéis à história. No
entanto, para validar seus contos, a China apresentou à humanidade dois
monumentos literalmente concretos do que vem a ser seu fascínio pelas guerras: o
Exército de Terracota e a Grande Muralha (anexos 1 a 4), ambos idealizados e
materializados pelo primeiro imperador chinês, Shi huangdi, ou Qin, responsável