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CLODOALDO MEDINA JUNIOR
BEM-VINDOS À NOSSA HISTÓRIA!
Teatro Experimental de Comédia de Araraquara (1955-1962)
Tese apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Artes do Instituto de Artes da
Universidade Estadual de Campinas, para
obtenção do título de Doutor em Artes.
Orientadora: Profa. Dra. Neyde de Castro
Veneziano Monteiro.
CAMPINAS
2009
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iv
FICHA CATALOGRÁFICA ELABORADA PELA
BIBLIOTECA DO INSTITUTO DE ARTES DA UNICAMP
tulo em ingles: “Welcome to our history! Teatro Experimental de Comédia de
Araraquara (1955-1962).”
Palavras-chave em inglês (Keywords): Theater Brazil ; Brazilian theater -São
Paulo (State) – History.
Titulação: Doutor em Artes.
Banca examinadora:
Profª. Drª. Neyde de Castro Veneziano.
Profª. Drª. Sara Pereira Lopes.
Profª. Drª. Regina Polo Muller.
Prof. Dr. Luiz Flavio de Carvalho Costa.
Prof. Dr. Alexandre Luiz Mate.
Prof. Dr. Marcio Aurelio Pires de Almeida.
Profª. Drª. Anna Maria Martinez Corrêa.
Data da defesa: 20-01-2009
Programa de Pós-Graduação: Artes.
Medina Junior, Clodoaldo.
M468b Bem-vindos à nossa história! Teatro Experimental de
Comédia de Araraquara (1955-1962). / Clodoaldo Medina
Junior. – Campinas, SP: [s.n.], 2009.
Orientador: Profª. Drª. Neyde de Castro Veneziano.
Tese (doutorado) - Universidade Estadual de Campinas,
Instituto de Artes.
1. Teatro – Brasil. 2. Teatro brasileiro - São Paulo (Estado) -
Hisria. I
.
Veneziano, Neyde de Castro. II. Universidade
Estadual de Campinas. Instituto de Artes. III. Título.
(em/ia)
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v
vii
Ao tio Wallace,
pela cultura em minha vida.
ix
Agradeço
à minha mulher, Ana Cláudia, pelo amor e pelo apoio constante;
a meus filhos, Joaquim e Alice, pela pacncia;
a meus pais, Dora e Clodoaldo, e a meus avós, Ninira e Rafael, pelo
amor ao Wallace e à família;
à Profa. Dra. Neyde Veneziano pelo carinho, entusiasmo e dedicação;
ao Prof. Dr. Luiz Flávio de Carvalho Costa, pela amizade e por ter
sempre acreditado neste trabalho;
aos atores, atrizes e amigos do TECA, com quem convivi nos últimos
anos e que se tornaram parte da família, com muito carinho, e uma
lágrima a Ruth Magali Miranda;
aos amigos Abel Rocha, José Consani, Karla Bessani Travassos,
Marcos Moreira Gonçalves, Viviane Cristina Pinto e a todos que
contribuíram para a construção desta história.
xi
Resumo
O teatro, como processo criativo, é uma arte para ser exercida em conjunto,
por vários, e não isoladamente. A montagem de um espetáculo, ainda que um
monólogo, exige trabalho intelectual e também braçal, exige um grupo de pessoas
organizadas com o mesmo objetivo. A história do teatro no Brasil pode, portanto,
ser contada pelas histórias de seus grupos e companhias teatrais. Grupos que, em
suas diversas localidades e épocas, fizeram parte do contexto sócio cultural em
que se inseriam.
Compreender sua história é compreender melhor não apenas a história do
nosso teatro, da nossa cultura, mas tamm a do próprio país.
Esta tese é o resultado de uma pesquisa sobre um desses grupos: o Teatro
Experimental de Comédia de Araraquara (TECA), grupo de teatro amador atuante
na cidade de Araraquara, interior do Estado de São Paulo, de 1955 a 1962 e de
seu diretor, Wallace Leal Valentim Rodrigues.
xiii
Abstract
Theater, as a creative process, is an art form to be exercized in group, by
many, and not isolated. The set-up of a play, even a monologue, requires
intellectual and heavy work, requires a group of people organized with the same
objectives. The history of Brazilian theater can, therefore, be explained by the
histories of its groups and theater companies. Groups that, in their different
communities and times, were part of the social and cultural context where they
belonged.
Understanding their histories is to understand not only our theater history
better, but our culture, and also our own country.
This thesis is the result of a research on one of these groups: the Teatro
Experimental de Comédia de Araraquara (TECA), an amateur company active in
Araraquara, a town at São Paulo State, from 1955 through 1962 and of its stage
director, Wallace Leal Valentim Rodrigues.
xv
Sumário
INTRODUÇÃO ....................................................................................... 1
1. ARARAQUARA E OS ANOS 1950................................................... 13
1.1 As Origens .................................................................................. 13
1.2 A Estrada de Ferro e os imigrantes ............................................ 14
1.3 Diversões públicas...................................................................... 18
1.4 O Teatro Municipal...................................................................... 24
1.5 O torvelinho dos anos 1940 ........................................................ 29
1.6 O que fazer em Araraquara? ...................................................... 33
1.7 Os grupos ................................................................................... 35
2. OS PRIMEIROS ANOS DO TECA ................................................... 41
2.1 O fracasso de um filme ............................................................... 41
2.2 Fazer teatro................................................................................. 42
2.3 O Teatro de Arena de São Paulo................................................ 44
2.4 A estréia do TECA ...................................................................... 45
2.5 O TBC – Teatro Brasileiro de Comédia....................................... 58
2.6 Uma Mulher do outro Mundo ...................................................... 63
2.7 Segunda série de espetáculos.................................................... 68
2.8 Terceira série de espetáculos..................................................... 78
2.9 Reapresentações e outras atividades......................................... 88
3. O APOGEU DO TEATRO................................................................. 99
3.1 Um ministro na vida do TECA..................................................... 99
3.2 Quarta série de espetáculos ..................................................... 100
3.3 Preparativos para a viagem ao Rio........................................... 107
3.4 Em terras cariocas .................................................................... 114
3.5 A volta a Araraquara................................................................. 130
3.6 Reapresentações e outras atividades....................................... 136
3.7 Viagem e desfile ....................................................................... 143
4. A IMPORTÂNCIA DO CINEMA ...................................................... 151
xvi
4.1 Um ano de preparativos............................................................ 151
4.2 Viagem a Poços de Caldas....................................................... 153
4.3 Arabela Filmes .......................................................................... 158
4.4 Os ensaios................................................................................ 160
4.5 As filmagens ............................................................................. 163
4.6 Festival de Teatro de Santos .................................................... 170
4.7 Dois anos de ausência.............................................................. 175
4.8 Santo Antonio e a Vaca ............................................................ 180
5. OS ÚLTIMOS ANOS ...................................................................... 193
5.1 A Parceria com a Faculdade de Filosofia.................................. 193
5.2 À Margem da Vida .................................................................... 200
5.3 Pluft, finalmente montado ......................................................... 203
5.4 Festival de Teatro de Porto Alegre ........................................... 206
5.5 Fechado para reformas............................................................. 211
6. BASTIDORES ................................................................................ 217
6.1 A escolha do repertório............................................................. 218
6.2 Dois mundos amigos................................................................. 220
6.3 Dramas psicológicos................................................................. 226
6.4 A técnica ................................................................................... 234
6.5 Os espetáculos ......................................................................... 240
6.6 Flanela e lona ........................................................................... 243
CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................ 251
REFERÊNCIAS.................................................................................. 255
APÊNDICE I. CRONOLOGIA............................................................. 289
ANEXO I. PROGRAMAS.................................................................... 295
ANEXO II. ARTIGOS ESPECIAIS ...................................................... 319
ANEXO III. CÓPIA EM DVD DE SANTO ANTONIO E A VACA......... 355
1
INTRODÃO
O TECA - Teatro Experimental de Comédia de Araraquara, foi um grupo de
teatro amador existente na cidade de Araraquara, Estado de São Paulo, que
deixou uma história de realizações, até hoje lembrado pela qualidade de seu
repertório e de suas produções apresentadas, em sua maioria, “em teatro de
arena”
1
, no Teatro Municipal local. A companhia se apresentou tamm nas
cidades de São Carlos, Catanduva, Taquaritinga, Poços de Caldas, Santos, Porto
Alegre, além de uma temporada de grande sucesso no Rio de Janeiro.
Sob a direção de Wallace Leal Valentim Rodrigues, o TECA iniciou suas
atividades em 1955, tendo se apresentado com regularidade até 1962. Além de
um repertório variado e rico de textos e peças teatrais, apresentando autores do
porte de Luigi Pirandello, Tennessee Williams, George Bernard Shaw, John
Steinbeck, Machado de Assis, entre outros, a companhia tamm realizou um
longa-metragem, Santo Antonio e a Vaca, um dos primeiros exemplos do cinema
rural brasileiro, filmado em Araraquara.
O teatro, nas décadas de 1940 e 1950, vivia um momento de grande
euforia, contagiando as novas gerações, principalmente os estudantes. O sucesso
do Teatro do Estudante do Brasil - TEB, fundado no Rio de Janeiro por Paschoal
Carlos Magno, em 1938, logo começaria a incentivar a criação de grupos
amadores em todo o Brasil. Em São Paulo esses grupos eram formados em torno
das grandes universidades, sempre contestando os espetáculos teatrais até então
montados, onde a figura da grande atriz, ou do grande ator, era privilegiada em
detrimento do texto, ou do espetáculo como um todo
2
.
1
A expressão “em teatro de arena era utilizada pelo grupo para se referir à forma como a peça era
apresentada, com a platéia circundando os atores em um palco, não a um espaço físico específico. Espetáculos
“em teatro de arena eram apresentados no centro da platéia do próprio Teatro Municipal de Araraquara, com
suas cadeiras retiradas e reagrupadas em círculo. uma peça apresentada em cima do palco, com o público
sentado na platéia, da maneira mais convencional, era referida como “em teatro de caixa”. Ao longo deste
trabalho, respeitou-se estas expressões.
2
Principalmente nas Faculdades de Direito e de Filosofia da USP (LESSA MATTOS, 2002, p. 203).
2
O teatro amador teve, assim, o seu esteio no meio universitário, ambiente
propício para a troca de idéias e reflexões onde os jovens, embalados pelo espírito
coletivo do trabalho teatral, descobriam o teatro não mais como uma atitude
marginal, mas como uma atividade artística diferenciada, associando-a à literatura,
à filosofia, à busca do conhecimento. Foi esta a principal motivação dos jovens
araraquarenses que se uniram em torno da idéia de formarem uma companhia de
teatro na cidade.
Este estudo, que busca mostrar a história desta companhia, não poderia se
realizar sem levantamentos hisricos da época. Os arquivos do jornal O Imparcial,
o mais tradicional jornal da cidade, ainda em circulação, formaram a fonte principal
de informações, além de outros artigos em jornais e revistas diversas, inclusive na
revista O Cruzeiro. A vasta bibliografia sobre a história da cidade e da região
tamm foi consultada, com destaque para os artigos de Ignácio de Loyola
Brandão, jornalista araraquarense que viveu com intensidade o período coberto.
Entrevistas com ex-atores e ex-atrizes da companhia gravadas, em sua
maioria, e realizadas dentro de uma sistemática única, trouxeram uma grande
quantidade de novos materiais de investigação. Algumas informações, em
decorncia do longo tempo decorrido e da lembrança longínqua dos
acontecimentos, conflitaram com as versões dos jornais. Em algumas situações,
as informações escritas revelaram-se incorretas, face à unanimidade das
declarações colhidas. Por fim, graças à riqueza do material iconográfico reunido e
aos programas das peças, foi possível traçar um panorama histórico bastante
verdadeiro.
Não existe um trabalho específico sobre a companhia, cuja importância
para Araraquara se evidencia pelo mero expressivo de matérias de jornal
coletadas. O teor dessas matérias e entrevistas atesta o orgulho que a cidade
nutria pelo grupo, que colaborou para elevar a auto-estima da comunidade. Este
sentimento aparece, ainda hoje, nas entrevistas realizadas: todos se referem ao
TECA não apenas com saudades, o que seria natural, mas sempre de uma forma
3
positiva e unânime, elogiando a qualidade das montagens assistidas e o repertório
diferenciado.
Este estudo busca tamm refletir sobre a companhia em toda a sua
complexidade cênica e teórica e em sua relação com a história, não apenas local,
mas com a própria história do teatro brasileiro nas décadas analisadas. Com o
apoio de minha orientadora, Neyde Veneziano e da bibliografia consultada, este
objetivo foi buscado e refletido durante todo o trabalho, valendo-se de análise dos
textos montados, de suas motivações, das cnicas de direção de atores
empregada, das dificuldades cênicas e de sua superão.
Os espetáculos apresentados pelo TECA baseavam-se em textos de
escritores consagrados e eram montagens que buscavam envolver o público,
emocionar. A proposta não era a de refletir sobre teatro ou montar textos
paradigmáticos ou encenações simbólicas. Tampouco era um teatro físico ou com
preocupações políticas e reivindicatórias. Faziam uso da palavra e da ação para
comunicar, apresentavam comédias de costumes, comédias de situações, dramas
domésticos, fantasias, farsas, melodramas, todos com um objetivo: o de
emocionar. E através da emoção, trazer a reflexão.
Por fazer este tipo de teatro, muito mais emotivo do que racional, a própria
lembrança que os entrevistados têm do TECA acaba sendo bastante emocional.
Fato comum foi os entrevistados revelarem menos os acontecimentos históricos
ou o momento político, e muito mais os envolvimentos pessoais, as sensações
despertadas, a emoção vivida, a experiência sensorial de participar ou assistir aos
espetáculos.
A relevância da companhia dentro da história do teatro paulista foi motivo
de reflexão especial. Afinal, o TECA foi apenas uma companhia amadora, formada
por jovens de classe média, com sede no interior do Estado, atuando à margem
das grandes companhias paulistas da época, como o TBC - Teatro Brasileiro de
Comédia e o Teatro de Arena.
4
Em Santos, o Teatro do Estudante de Vanguarda TEV, em Campinas, o
Teatro do Estudante de Campinas TEC e em São Jodo Rio Preto, o Grupo
Teatral Riopretense, são exemplos de bons grupos amadores de teatro. Outras
cidades paulistas, impulsionadas pelos Festivais de Teatro do Estudante,
organizados por Paschoal Carlos Magno, tamm se organizaram, mas as
opines sobre o TECA são enfáticas e parciais.
Alguns fatos levantados durante a pesquisa mostraram-se decisivos para se
chegar a um quadro aproximado sobre essa propalada qualidade artística. E
opines como esta abaixo, da diretora Teresa Aguiar
3
foram corroboradas por
outros.
Sem sombra de vida, o Teatro Experimental de Comédia de Araraquara
foi o melhor de todos os grupos do interior naquela época,quer pela escolha
do repertório, quer pela realização dos espetáculos, quer pela qualidade de
seus participantes (AGUIAR, 1992, p. 100).
José Renato Pécora, por exemplo, o Jo Renato, diretor do Teatro de
Arena de São Paulo, um dos mais importantes grupos teatrais brasileiros das
décadas de 1950 e 1960, e colunista dos jornais O Estado de S.Paulo e Diário de
São Paulo, visitou a cidade em maio de 1956 e dedicou “aplausos calorosos” ao
TECA, declarando-se maravilhado com a montagem de A Mão do Macaco, de W.
W. Jacobs; Um Pedido de Casamento, de Anton Chekhov
4
e Se os Homens
Jogassem Cartas como as Mulheres, de George S. Kaufman.
Entrevistado em 2008, quase 50 anos após aquela visita, agora como
diretor do Teatro dos Arcos em São Paulo, lembra-se do convite de Wallace e que
ficou encantado com os “detalhes bem cuidados” das produções que assistiu
5
.
3
A diretora Teresa Aguiar seria a responsável pela criação do “Rotunda”, considerado o primeiro grupo de
teatro profissional do interior do Estado, fundado em Campinas, em 1967, originário do TEC Teatro do
Estudante de Campinas, de 1948.
4
A grafia do sobrenome Chekhov, apesar de ser diferente da utilizada pelo grupo, segue as normas do Manual
de Redação e Estilo do jornal O Estado de S.Paulo, a não ser quando o autor é citado por outra fonte, quando
então manteve-se a citação no original (MARTINS, 1997, p. 194).
5
Entrevista com José Renato Pécora.
5
Neste ano de 1956, Alfredo Mesquita, diretor da EAD Escola de Arte
Dramática, veio assistir, no camarote do Teatro Municipal de Araraquara, ao jovem
Sebastião Campos, funcionário da EFA Estrada de Ferro Araraquara e principal
ator da companhia, na montagem de O Protocolo, de Machado de Assis,
convidando-o a ingressar em sua escola, celeiro de grandes atores. Meses depois,
em dezembro de 1957, Sebastião substituiria Walmor Chagas, ao lado de Cacilda
Becker, como ator do TBC em Adorável Júlia, de Sauvajon.
Paschoal Carlos Magno, o dinâmico ministro plenipotenciário de Juscelino
Kubitschek, ator, diretor e crítico teatral, visitava São Carlos em maio de 1957,
quando soube de um grupo de teatro amador na vizinha Araraquara. Foi assistir à
tripla montagem, em teatro de arena”, de O Menino de Moony o Chora, de
Tennessee Williams; Sobre os Danos que traz o Tabaco, de Anton Chekhov e
Amigos de Viagem, de Noël Coward, uma montagem que foi improvisada no
Clube Araraquarense, pois a temporada havia acabado e o Municipal estava
ocupado com um concerto sinfônico.
O resultado dessa visita foi avassalador: Paschoal, impressionado com o
que viu, de volta ao Rio de Janeiro, escreveu um artigo para o jornal O Correio da
Manhã
6
, onde enaltecia os espetáculos e chamava a atenção para o talento de
Wallace na direção: “não esquecerei seu nome para sempre”, acabando por
convidar toda a companhia a apresentar-se no Rio, capital do país, no mês de
setembro daquele mesmo ano, no Hotel Glória.
A revista O Cruzeiro, de 14 de setembro de 1957, apresentou uma matéria
com o título “Alvíssaras para Araraquara, comentando a temporada carioca e com
foto da montagem de Os Dois Faladores, de Miguel de Cervantes.
Superlativos sempre eram utilizados pela imprensa araraquarense para
descrever os espetáculos da companhia, mas, na realidade, não havia críticos
profissionais de teatro na cidade. No entanto, a mais importante revista brasileira,
6
Vide Anexo II. Artigos Especiais.
6
O Cruzeiro, descrever como “grande acontecimento artístico” a apresentação do
TECA no Rio de Janeiro, em crítica assinada pelo dramaturgo A. Accioly Netto,
era outra história.
7
Paschoal Carlos Magno se tornou, desde aquele momento, um amigo
fraterno da companhia e o seu maior incentivador, convidando-a sempre aos
Festivais Nacionais de Teatros de Estudantes, que organizava pelo Brasil. O
TECA apresentou-se nos Festivais de Santos, em 1959 e no de Porto Alegre, em
1962. No início de 1958, em reunião da Associação Brasileira de Críticos Teatrais,
o mesmo Paschoal deixou claro seu entusiasmo pelo TECA ao declarar seus
votos em Wallace, como diretor revelação do ano e em Mario Barra, como ator
revelação.
O mesmo Mario Barra, junto com outro ator da companhia, Moacyr
Marchese, faria parte de uma das primeiras peças montadas pelo Teatro Oficina
em São Paulo, dirigida por outro araraquarense, José Celso Martinez Corrêa, em
1956: A Engrenagem, de Jean Paul Sartre.
As opiniões, as críticas e, acima de tudo, os fatos aqui descritos, foram
determinantes para chegarmos à conclusão sobre a importância e a necessidade
de se fazer este trabalho.
Os espetáculos tinham o aval de sua qualidade dado tamm pela
população da cidade que as matérias dos jornais o unânimes em afirmar
sempre lotava o “alquebrado” Teatro Municipal. O TECA era uma companhia
popular, sem ser popularesca, montando obras elaboradas, difíceis, que exigiam
reflexão, obras de grandes escritores, fato que não pode ser desconsiderado.
Esta pesquisa foi sempre acompanhada do meu envolvimento pessoal.
Wallace Leal Valentim Rodrigues, falecido em 1988, era meu tio-avô, irmão da
minha avó paterna, com quem convivi vários anos de minha vida e a quem aprendi
a amar e respeitar. Wallace era não apenas o diretor cênico, mas um líder
7
Vide Anexo II. Artigos Especiais.
7
espiritual para os jovens da companhia: escolhia os textos que seriam montados,
os cenários, figurinos, organizava a divulgação, escrevia os textos dos programas,
ajudava na maquiagem, penteados, agia em todas as áreas da produção, muitas
vezes se assinando com heterônimos. Um importante arquivo familiar me foi
disponibilizado, com fotos e programas, além de escritos pessoais e inéditos dele.
Portanto, mostrar um pouco de sua importância para a cultura araraquarense é
algo que este trabalho buscará mostrar
8
.
Dessa forma, a redação deste estudo procurará não ser eminentemente
técnica e acadêmica, uma liberdade tomada em virtude do assunto que está
sendo tratado, acerca da reflexão sobre os processos de criação cênica da
companhia dentro do contexto histórico da década de 1950.
As declarões dos atores da companhia e das pessoas que viveram
aquele momento levaram a buscar algo mais próximo a um texto jornalístico, com
aquele sentimento a permear o texto. Sem perder, no entanto, a perspectiva e o
enfoque histórico sobre o tema. Isto se da nos capítulos onde a história da
companhia será relatada em seu dia a dia, com todas as circunstâncias que
acabao, em sua essência, criando um mosaico social e nos ajudarão a
compreender melhor aquele período da história.
O TECA, como companhia de teatro amador, teve uma vida curta: apenas
oito anos de atividades. Surgiu de uma experiência fracassada de um grupo de
jovens que queria fazer cinema e acabou fazendo teatro para viabilizar aquele
sonho. Terminou, entre outros motivos, em decorrência de outra experiência
cinematográfica, desta vez mais bem sucedida, mas não o suficiente para que a
companhia se firmasse. Foi uma companhia de teatro que sempre buscou o
cinema.
A situação financeira da companhia sempre foi muito frágil, sempre contou
com as finanças pessoais dos envolvidos. Bilheterias não bastavam. Em 1959, um
8
O escritor araraquarense Igcio de Loyola Brandão, contemporâneo do grupo do TECA, também reclama
da falta de uma biografia sobre Wallace e seu trabalho. Vide Anexo II. Artigos Especiais.
8
empréstimo bancário pesado foi feito para terminar e distribuir o filme e o retorno
deste investimento foi incipiente. Com a EFA Estrada de Ferro Araraquara, por
exemplo, onde boa parte do maquinário do filme havia sido construído, a dívida foi
negociada em troca de tecidos da Casas Texidal, de propriedade de um tio de
Wallace, usados para fazer os uniformes dos ferroviários.
Trabalhar em condições financeiras precárias é ainda hoje uma realidade
de muitos grupos artísticos, que vêem no amor pela arte e no voluntarismo a saída
para a falta de apoios e patrocínios. Há, no entanto, um fato inconteste: trabalhar
nessa situação por um longo período de tempo acaba trazendo desmotivação e
cansaço ao artista, muitas vezes responsável por uma dura realidade, uma triste
conseqüência: a falta de criatividade.
Outra dura realidade em uma companhia amadora é a rotatividade de seus
membros e com o TECA não foi diferente, alguns dos jovens se formavam, outros
mudavam-se da cidade, ou desinteressavam-se de fazer teatro. Na montagem de
De Ratos e Homens, de John Steinbeck, em 1961, dos dez atores em cena,
apenas Maria Aparecida Assis e Oscar Rodrigues atuavam com a companhia
desde o seu início, os demais eram todos novatos.
O TECA perdeu seu principal local de apresentações, o Teatro Municipal,
que já apresentava sinais de deterioração e abandono durante as temporadas, em
1962, último ano da companhia. Foi fechado e depois demolido, sob protestos, em
1966. Fruto de uma época onde a mentalidade desenvolvimentista ceifou outros
importantes edifícios históricos do país, a perda do Municipal, local de ensaio de
apresentações e principal ponto de encontro do grupo, foi, sem dúvida, um duro
golpe.
O Teatro Municipal era cedido à companhia, mas sempre em situação tão
precária, que todos se viam obrigados a arcar com despesas na sua manutenção.
Nos primeiros anos ainda contaram com o apoio do Prof. Lysanias Oliveira
Campos, Superintendente de Cultura do município que, junto com sua esposa, D.
Olga Ferreira Campos, Presidente de Honra do TECA, trabalhavam como
9
facilitadores e amigos. Mas, a rigor, as autoridades locais nunca ajudaram ao
TECA de uma forma constante e significativa.
O advento da televio, que na década de 1960 começou a ser uma
realidade em vários lares do país, pode ajudar a explicar uma queda de público
nos espetáculos. No interior, por falta de outras opções constantes de lazer, a
televisão foi um forte elemento de fixação da família e um inibidor de saídas mais
freqüentes.
O estilo das peças montadas pela companhia, os temas escolhidos, um
novo público que se formava, a evolução dos gostos e costumes, a própria
segmentação de um blico de teatro que talvez o TECA não tenha conseguido,
de forma efetiva, formar na cidade, devem ter contribuído na diminuição da platéia.
Este trabalho relata, em sua estrutura, a história da companhia de forma
cronológica, nos capítulos 2, 3, 4 e 5. Este relato é precedido por um capítulo, o de
número 1, que se dedica à contextualização do panorama cultural do interior de
São Paulo e, em particular, de Araraquara, na década de 1950, principal palco das
ações descritas. O capítulo 6, Bastidores, busca mostrar os aspectos mais
relevantes do “fazer teatro”, a escolha do repertório, as motivações, as
dificuldades, os ensaios, os espetáculos, a estética advinda da precariedade e a
poética do TECA.
A opção pelo eixo temporal coloca os anos de 1955 e 1956 no capítulo 2,
intitulado Os Primeiros Anos do TECA. O ano de 1957 é descrito no capitulo 3: O
Apogeu do Teatro. Pelo volume de informações contidas, pela quantidade de
espetáculos e pela viagem ao Rio de Janeiro, este ano foi, sem sombra de dúvida,
o ano mais produtivo da companhia. A volta do Rio de Janeiro trouxe a todos o
sonho da realização de um filme e os anos de 1958, 1959 e 1960 foram
dedicados, em sua essência, ao cinema, do título do capítulo 4: A Importância
do Cinema. Os dois últimos anos, 1961 e 1962, foram agrupados no capítulo 5: Os
Últimos Anos. A cronologia, listada no Apêndice I, servirá de base para o
acompanhamento da história.
10
Na relação de fontes listadas em Referências, vale ressaltar que, como os
artigos de jornal, a rigor do jornal O Imparcial, de Araraquara, foram fundamentais
para a reconstituição histórica dos fatos ano a ano, optou-se por, obedecendo às
normas técnicas, listá-los em ordem cronológica. Este critério, além de facilitar
eventuais consultas, visa deixar evidente a enorme quantidade de matérias
encontradas nos primeiros anos da companhia em comparação com um mero
bastante reduzido nos anos finais, reflexo do menor interesse da imprensa pelo
assunto.
As fichas técnicas dos espetáculos foram incluídas ao longo do texto, logo
após os mesmos. Algumas delas, quando baseadas nos programas das peças,
têm informações completas e detalhadas. Outras, que foram baseadas em
informações dos jornais e em entrevistas, são menos detalhadas, mas corretas.
Alguns programas foram digitalizados e incluídos no Anexo I, com o objetivo de
mostrar a estética da companhia tamm neste item.
Cópia recente do filme Santo Antonio e a Vaca, recuperada pelo Serviço
Social do Comércio – SESC de Araraquara em DVD, foi incluída como Anexo III.
Os nomes de alguns atores e do pessoal técnico eram grafados de formas
diferentes, quer nos programas, quer nas matérias dos jornais. Além disso, na
própria ficha técnica da companhia havia alguns equívocos, ou alguma liberdade.
A utilização, por exemplo, da letra “y” em substituição ao “i” original de alguns
nomes, como Ligia grafado Lygia, ou Jaime como Jayme. Esta adoção de nomes
mais sofisticados, ou nomes artísticos, prática comum ainda nos dias hoje, foi
respeitada neste trabalho e os nomes mantidos, como eram utilizados nos
programas, em consideração à opção dos artistas na época e pelo fato de nenhum
dos nomes ter sido adulterado de forma exagerada.
O passado nos deixa vestígios de formas variadas. Na reconstrução desta
história, difícil pelas muitas auncias naturais de alguns dos principais
personagens, e tamm, pela distância temporal dos fatos para os personagens
ainda ativos, as imagens acabaram por se tornar um referencial valioso. A
11
quantidade de imagens utilizadas buscou se adaptar ao texto, à referência
histórica, sem exageros. As ausências de fotos de algumas montagens, por
exemplo, nos fizeram refletir sobre sua importância, sobre o silêncio de sua falta.
O material coletado foi de difícil acesso e é valioso. Torná-lo público, portanto, era
importante para o trabalho.
Essas são, portanto, as principais diretrizes que nortearam esse estudo. O
TECA fazia um teatro atuante e de qualidade no interior do Estado e a sua
trajetória transcende os fatos descritos, inserindo-se, de maneira harmônica, na
própria história da cidade de Araraquara. Em oito anos de atividades, vinte e uma
peças foram montadas e um longa-metragem realizado, uma produção cultural
significativa e digna de reflexão.
Imagem
: Mario Barra em
Os Dois Faladores
.
Teatro
Municipal de Araraquara, agosto de 1956. Acervo: Maria
Cristina Moura.
12
Imagem
:
cartaz
anunciando
o ator Procópio Ferreira em
peça do
araraquarense Francisco A. Gurgel. Com a presença de outro arar
aquarense
no elenco, Rodolpho Arena. Teatro Municipal de Araraquara, 6 de
fevereiro de 1938. Acervo: MIS Araraquara.
13
1. ARARAQUARA E OS ANOS 1950
Situada na região central do Estado de São Paulo, a cidade de Araraquara
se valeu de sua posição geográfica estratégica para se firmar como uma das
principais cidades do Estado. No culo XVIII, os campos de Araraquara
significavam um limite claro ao avanço do progresso em direção à divisa do
Estado, aos rios Grande e Paraná, às minas de Mato Grosso e Goiás e ao interior
do Brasil. Além dos campos de Araraquara, ficava o inóspito e o desconhecido.
1.1 As Origens
O fortalecimento de núcleos urbanos na região era fundamental para a
colonização e a exploração daquele sertão, não apenas para efeitos de
colonização e avanço econômico, mas também para as autoridades religiosas. Em
3 de outubro de 1816, o Vigário Colado de Piracicaba, Manoel Joaquim do Amaral
Gurgel, enviava às autoridades religiosas o seguinte apelo:
Atesto e faço certo que o distrito de minha freguesia de Piracicaba
compreende os extensos Campos de Araraquara, que já tem muitos
moradores e cada ano se aumenta mais, alargando os ditos Campos... Por
todos estes motivos me parece exigir o interesse da religião e do Estado a
ereção de uma nova paróquia naqueles Campos (FRANÇA, 1979, p. XII).
Em 22 de agosto de 1817, os moradores dos “campos de Araraquara”, sob
a liderança de Pedro José Neto, um foragido da justiça de Itu, conseguiram
finalmente se separar da Freguesia de Piracicaba, Comarca de Itu, transformando-
se na Freguesia de São Bento de Araraquara, resolução assinada pelo Conde da
Barca, ministro de El-Rei, o Senhor Dom João VI. O nome é originado de
Araquara ou Aracoara, ara significando dia e coara significando morada; morada
do dia, ou morada do sol, na língua dos índios guayanás, primeiros habitantes da
região.
14
A agricultura de subsistência foi a atividade econômica principal da
freguesia. Na estatística provincial ou estadual, já que os Estados eram
chamados de Províncias - de 1837, por exemplo, encontra-se uma população de
2.764 habitantes e a produção de 440 arrobas de açúcar, 70 “canadas”
9
de
aguardente, 1.735 alqueires de arroz, 3.654 alqueires de feijão, 61.131 de milho,
157 arrobas de fumo, 84 de algodão, 5.883 porcos, 287 cavalos, 4 burros, 2.667
bois, 181 carneiros. E, curiosamente, nenhum café sendo produzido na região,
enquanto em todo o Estado, 400.000 arrobas de café foram produzidas. em
1.862, por exemplo, vê-se 20.000 arrobas de casendo produzidas, ao lado de
30 fábricas de açúcar (FRANÇA, 1979, p. XVII).
A Guerra do Paraguai, conflito que durou de 1864 a 1870, trouxe um
momento de muito orgulho, mas tamm de muita dor à cidade quando um
número expressivo de araraquarenses foi alistado para enfrentar as tropas de
Francisco Solano Lopez, como voluntários da pátria, e sucumbiu combatendo.
1.2 A Estrada de Ferro e os imigrantes
O término da guerra, em 1870, o isolamento das tropas brasileiras nos
campos de batalha, além da necessidade econômica cada vez mais premente,
apressaram a resolução do Governo Imperial de se criar uma ferrovia que fosse
um rápido meio de transporte ao centro do país, ligando Rio Claro aCuiabá, no
Estado de Mato Grosso, passando por São Carlos e Araraquara. Em 1874, a
população chegava a 7.128 pessoas, 5.711 livres e 1.417 escravos. A ligação
de Santos a Jundiaí estava em operacão desde 1868, caminho percorrido pelo
enorme contingente de imigrantes que começava a chegar no porto de Santos e
subia a serra do mar para São Paulo onde, da Hospedaria do Imigrante,
embarcava para o seu destino final. Foi a 18 de janeiro de 1885, às 16h, que
Araraquara recebeu o primeiro trem vindo de Rio Claro.
9
Canada: antiga medida de capacidade que levava quatro quartilhos. Língua Portuguesa On-Lline. Disponível
em: http://www.priberam.pt/dlpo/dlpo.aspx. Acesso em: 12 out. 2008.
15
A EFA Estrada de Ferro Araraquara, foi criada neste mesmo ano, em 17
de setembro e seria a responsável pela ampliação da malha ferroviária, a partir
dali em direção ao interior do Estado. Em virtude desta importância geográfica, as
oficinas da EFA em Araraquara eram bastante aparelhadas e acabariam sendo
importantes para uma parte da história do TECA, na década de 1950.
A ferrovia foi estratégica para o desenvolvimento da cidade e da região.
em 6 de novembro de 1886, o povoado recebia com alegria o Imperador D. Pedro
II e grande comitiva, tendo o Coronel JoPinto Ferraz e o Major Joaquim Duarte
Pinto Ferraz oferecido um
almoço na casa do Dr.
Margarido da Silva, seguido
de visita à Igreja da Matriz, a
diversas escolas públicas,
ao gabinete de leitura do
Clube Araraquarense, à
cadeia (onde havia quatro
presos) e à máquina de
beneficiar café do
americano Sr. Eduardo
Kneese (FRANÇA, 1979,
p. LI).
Araraquara, no final do século XIX, era um núcleo urbano que existia
principalmente em relação ao universo rural que o cercava, principalmente a
lavoura cafeeira, em expansão e que atraía cada vez mais imigrantes de outros
países.
Com o final da escravidão, em 1888, o governo brasileiro incentivou a
entrada de imigrantes europeus. Havia a necessidade de mão-de-obra qualificada
para substituir os escravos, milhares de imigrantes chegaram para trabalhar nas
Imagem
:
m
apa do Estado de São Paulo atual com destaque para o
município de Araraquara. Fonte:
http://commons.wikimedia.org/wiki/Image:SaoPaulo_Micro_Araraq
uara.svg. Acesso em: 11 dez. 2008.
16
fazendas de café do interior de São Paulo, assim com em indústrias e em outras
regiões do país.
A vontade de enriquecer, de “fazer a América”, trouxe, por exemplo, a
família do relojoeiro Theodoro Lupo, imigrantes italianos, ao Brasil, em maio de
1888. Ao invés do “civilizado, mas já em princípios de decadência, Vale do
Paraíba, a família acabou optando, mesmo sem muita certeza, por Araraquara. Na
estação de São Carlos, após o desembarque em Santos e a viagem a São Paulo
(Hospedaria dos Imigrantes) e Rio Claro, enquanto a família descia os baús na
estação, um senhor de nome Maldonado abordou-os:
- Vocês levam tantos baús! Vieram de onde? Para onde vão? Fazem o quê?
Theodoro, misturando o italiano, tentou responder.
- O senhor não parece camponês, como os outros.
- E não sou. Sou um relojoeiro. Também trabalho como ourives.
- E porque vai descer aqui em São Carlos? Tem alguém à espera?
- Não, é que me pareceu um bom lugar para começar.
- Bom, se tem profissão, tente Araraquara! Um pouco mais adiante, 40 km.
Uma vila maior, mais desenvolvida. será melhor! Aqui, vai terminar em
uma fazenda. E arrematou aos italianos assustados: Depois de
Araraquara, começa o sertão (BRANDÃO, TELAROLLI, 1998, p. 23).
Sete anos depois, já falando a língua e instalados na poeirenta Rua 2, a
principal rua do comércio em Araraquara, onde consertavam relógios e vendiam
jóias, a febre amarela chegava à cidade com toda a violência. Um terço da
população abandonou a cidade, ou acabou por falecer, inclusive a pobre Rachela,
esposa de Theodoro que, por sua vez, foi recolhido por precaução ao Lazareto, a
“casa da morte”, uma instituição para casos suspeitos. A epidemia durou a o
segundo semestre de 1896, quando a vida retornou pouco a pouco ao normal,
deixando nas autoridades a certeza de que medidas sérias de saneamento básico
teriam que ser tomadas, assim como uma profunda reurbanização
10
.
10
A população de Araraquara guarda a tradição de se referir às suas ruas por números e às suas avenidas
pelos nomes. A principal rua do comércio, atual Rua 9 de Julho, se chamou Rua de Santa Cruz e Rua do
Commercio, mas sempre foi conhecida, e “chamada”, de Rua 2. Esta tradição será mantida neste trabalho.
17
A família Lupo sobreviveu a estes episódios e cresceu. Hoje, com a fábrica
de meias que leva seu nome, se destaca no meio industrial da cidade e do Brasil.
O ano de 1897 começou com outro epidio dramático para a cidade: um
grupo numeroso invadiu a cadeia local e, em frente à Matriz, organizou o
linchamento de Rosendo de Sousa Brito e de seu tio Manoel, presos acusados do
assassinato do coronel Antonio Joaquim de Carvalho. Um episódio que trouxe
repercussão nacional negativa à cidade.
Em 1909, a cidade começava a mudar seu aspecto físico:
Em grande parte da cidade se vê em um abrir e fechar de olhos
transformarem as intransitáveis calçadas, as ruas e péssimas sarjetas em
amplos e cômodos passeios e ruas e sarjetas ótimas na extensão da
palavra. Em parte da cidade se admira o belíssimo aspecto que apresentam
as ruas e avenidas que passaram por melhoramentos. É de crer que
brevemente ao menos o centro da cidade estará radicalmente transformado
(CORRÊA, 2008, p. 213).
Em 1914, se contabiliza uma população de 12.000 habitantes no núcleo
urbano e de quase 55.000 no município e uma atividade econômica mais
diversificada. O crescimento da população explica-se pelo maior desenvolvimento
econômico da região. Dados da Hospedaria dos Imigrantes, no período de 1925 a
1929, mostram que, para Araraquara, se dirigiram famílias de espanhóis (26,1%),
italianos (24,2%), portugueses (19,5%), de outras cidades e Estados brasileiros
(16,9%), além de um enorme contingente não contabilizado. Essas pessoas iriam
mudar o cenário urbano da cidade, trazendo a diversidade e a sofisticação da
burguesia européia, ainda que com a rusticidade dos primeiros imigrantes
(CORRÊA, 2008, p. 214).
A educação passava a ser prioridade para as autoridades. O primeiro grupo
escolar da cidade data de 1903 e o segundo de 1914, ambos atendendo apenas
ao ensino primário e a uma pequena parcela da população. Para o ensino
secundário, os jovens araraquarenses tinham que estudar em outras cidades. Em
1914, as organizações Mackenzie abriram o Araraquara College, atendendo a 65
18
alunos do curso secundário e 127 alunos do curso primário, em um edifício
imponente, ainda existente na Rua 3, esquina com a Avenida Espanha. Em 1924,
outra instituição particular, o Colégio Progresso, filial do Colégio Progresso
Campineiro se instala na cidade, destinado à instrução de meninas, apenas. Em
1928, a Escola Nacional de Comércio de Araraquara, destinada ao ensino
profissionalizante, é fundada por iniciativa do Sr. Jorge Borges Corrêa.
É da década de 1920 tamm a criação do Conservatório Dramático e
Musical, sob os auspícios do governo municipal.
1.3 Diversões públicas
No final do século XIX e início do século XX, se começa a ter notícia das
primeiras atividades culturais organizadas na cidade, as chamadas diversões
públicas. Até então não se tem registros dessas atividades, com exceção da
música coral em Te Deums nas igrejas, em atividades religiosas e apenas em
datas significativas.
A não existência de um teatro fazia com que os raros espetáculos, vindos
em sua maioria de São Paulo, fossem realizados em clubes.
Em 1884, fundou-se o Clube Araraquarense, “sociedade de danças e
jogos”, que cedeu, mais tarde, seu lugar ao Cine Paratodos, depois Cine Capri. O
salão de daas era cedido a companhias teatrais que armavam palco,
transformando-o em teatro. O Circolo Itália, clube que floresceu de 1898 a 1900,
construiu tamm um pequeno espaço, que funcionava como teatro, na Rua
Gonçalves Dias, a Rua 1. Em virtude do Circolo ter-se mudado para a Avenida
Brasil, num prédio menor, o teatro foi transferido para o prédio da Rua Gonçalves
Dias, esquina da Avenida Duque de Caxias, onde funcionara, em 1886, o Colégio
Ipiranga. Esse espaço acolheu diversas companhias, tendo tido maior duração.
A primeira temporada lírica da cidade de São Paulo data de 1874, no Teatro
Provirio, mas é somente a partir de 1876, por iniciativa da colônia italiana, com a
19
construção do Teatro São José, que as companhias européias iriam incluir a
cidade em seus roteiros. “O público reclamava da vinda dos grandes cantores que
do Rio de Janeiro seguiam para Buenos Aires sem passar por São Paulo
(CERQUEIRA, 1954, p. 4).
O mercado brasileiro começava a ficar interessante para os empresários,
dentre eles o grande Ângelo Ferrari e mais G. Serpi, Vincenzo Tartini, entre
outros. O empresário alugava o teatro no Brasil para a sua temporada e ficava
com a arrecadação de bilheteria. Contratava e trazia da Europa os regentes, os
músicos principais e os solistas, alguns elementos cênicos e o guarda-roupa; o
restante da orquestra, assim como papéis secundários, era conseguido no próprio
local. Com isso, em breve, algumas companhias brasileiras começavam a se
formar em São Paulo, compostas, em sua maioria, por músicos estrangeiros que
decidiam se radicar no país. Eram essas as companhias que, em geral, viajavam
ao interior do Estado, apresentando espetáculos que tinham, no repertório italiano,
a sua maior característica.
Em Araraquara, o Centro Espanhol recebeu vários espetáculos, como os da
Companhia Eduardo Rocha, em 1903, com a pa A Família Maldita. O Clube
Araraquarense recebeu a Companhia Brandão que, também em 1903, apresentou
Casa Tamponim, Tintim por Tintim
11
e A Doida de Monte-Maior, destacando-se a
atriz Maria del Carmen como a doida. Ainda neste ano, a Companhia Cosilo
apresentou A Cabana do Pai Tomás.
A necessidade da construção de um teatro de porte na cidade data desta
época e projetos foram apresentados à Câmara Municipal, todos discutidos e
adiados.
11
Tintim por Tintim, revista de Souza Bastos, chegou ao Rio de Janeiro em agosto de 1892 e foi a revista
portuguesa mais remontada no Brasil durante anos, em diversas cidades brasileiras (VENEZIANO, 1996,
p. 40).
20
O cinema começava a aparecer como um forte concorrente do teatro. As
primeiras apresentações de um cinematógrafo
12
foram feitas no Circo Martinelli,
armado na Rua 3, onde mais tarde seria construído o Teatro Municipal e
mostravam um cachorro que procurava uma criança que havia sido raptada. O
filme durava 7 minutos e era repetido o dia inteiro. Mais tarde, Martinho Rolfsen
construiria um barracão na mesma Rua 3, ainda sem luz elétrica, com um motor e
uma espécie de lanterna (CORRÊA, 2008, p. 219).
O primeiro espaço completo na cidade foi o Bijou Théâtre
13
, podendo
abrigar cinema e teatro e com eletricidade. De propriedade de Joaquim Vieira
dos Santos, inaugurado em 1911, tinha 400 lugares, 85 lâmpadas elétricas e teve,
em um mesmo ano, 170 representações cinematográficas. O antigo barracão dos
Rolfsen foi, em seguida, ainda no mesmo ano, reformado, passando a ter 690
lugares, 80 lâmpadas elétricas e chamar-se Íris Teatro, com um moderno projetor
Pathé Fres. O Íris Teatro recebeu a primeira companhia de operetas a se
apresentar na cidade, a Companhia de Operetas Camerata.
O mesmo Joaquim Vieira dos Santos, dono do Bijou, em sociedade com
Antonio Vieira dos Santos e Alberto e Bernardino Vieira, resolveu transformá-lo no
“elegante, espaçoso e confortável” Polytheama, inaugurado em setembro de 1913.
Com 1.400 lugares, o Polytheama tinha uma orquestra, composta por 10 músicos
e regida pelo “irrepreensível” maestro José Tescari, um “vasto e magnífico” bar e
um aparelho de projeção cinematográfica considerado o primeiro do interior do
Estado” (CORRÊA, 2008, p. 219).
Recebeu, no ano de sua inauguração, 10 operetas, 5 dramas em língua
estrangeira e 365 representações cinematográficas. Entre as atrações, a
12
Cinematógrafo: invento do fim do século XIX que consta de equipamento de fotografia e de projão capaz
de colher, em rápida seqüência, uma série de instantâneos de objetos que se movem e de projetá-los numa
sucessão igualmente rápida e intermitente, de modo a produzir a ilusão de cenas em movimento.
DICIONÁRIO Houaiss de Língua Portuguesa. Disponível em http://www.dicionariohouaiss.com.br. Acesso
em: 15 out. 2008.
13
Os nomes dos teatros são cópias dos teatros e espaços culturais das capitais brasileiras, que, por sua vez,
imitavam nomes de teatros europeus.
21
Companhia de Operetas Gomes & Grijó, a atriz Clara della Guardia, a Companhia
de Óperas e Operetas Hespanhola, atrações contratadas por meio do empresário
paulista Joaquim de Almeida Rosa, arrendatário. Mais tarde o Polytheama foi
transformado em cinema, o Cine São Bento, em seguida no Cine Veneza, na Rua
3, entre as Avenidas Espanha e Duque de Caxias. o “velho” Íris receberia,
neste ano, 4 óperas micas, 25 operetas, 32 dramas em língua portuguesa e 3
dramas em língua estrangeira.
São quantidades impressionantes de espetáculos e que as décadas
posteriores não conseguiriam suplantar em Araraquara. Mesmo nos dias de hoje,
para os grandes teatros das capitais brasileiras, o números muito expressivos.
Isto refletia um momento especial que as artes viviam na capital da República, a
cidade do Rio de Janeiro e de uma forma mais modesta e anos depois, por São
Paulo. Foi uma época de grandes transformações e de euforia mundial, causadas
pela evolução dos meios de transporte e comunicação, expansão dos mercados,
aumento populacional, situação que perduraria até a desilusão trazida pela
Primeira Guerra Mundial.
Companhias de teatro, ópera, operetas, chegavam de Portugal, Espanha,
Itália e Fraa e se apresentavam nos teatros da região da Praça Tiradentes, no
Rio, atraindo multidões para seus espetáculos. O teatro mais sério começava a
dar lugar para as revistas de ano, as farsas musicais, as comédias leves e a
alegria do vaudeville francês e o cancã, principalmente quando parodiadas.
Exibindo mulheres com pouca roupa, um humor ferino, sátira política, dança e
muita música, o teatro de revista atraía e divertia.
Além de receber companhias teatrais e apresentar atrações
cinematográficas, os teatros araraquarenses exibiam concertos de artistas
famosos na época, como o violinista cubano Dias Albertini, Vespasiano de
Carvalho, Giulieta Dionesi, o barítono Silva, Edmundo André e Carlos Banouim.
No Clube Araraquarense, saraus beneficentes eram organizados com freqüência e
talentosos artistas locais começavam a aparecer, dentre eles o Maestro José
22
Tescari que, dentre outras atividades, dirigia a orquestra residente do Polytheama.
Um fato que merece destaque, que a grande maioria das atrões culturais da
cidade era oferecida por companhias e artistas de fora da cidade.
Os bailes eram populares e freqüentes, quer em casas de família, por
ocasião de aniversários ou casamentos, ou em clubes, assim como as festas
populares e cívicas, onde então as bandas de música eram imprescindíveis.
Grupos musicais começaram a aparecer no final do culo XIX, com
destaque para a Corporação Musical Carlos Gomes, de 1889, composta por
Francisco Lia, Vitorio Bonetti, Ângelo Bonetti, Bortolo Colturato, Antonio Fruscaldo,
Guilherme Zerbini, Julio Porta, João Catanzaro, Antonio Zerbini, Germano
Destefani, João Petito, Guido Bonetti, João Napole e Henrique Bonetti. Era dirigida
pelo maestro Florindo Castelan e constituída, quase em sua totalidade, por
descendentes de italianos.
Também atuante era a Lyra Araraquarense, de 1910, a orquestra do Salão
Favorita, formada por Zico Salomé, Álvaro Monteiro, Flaminio Ramalho, Joaquim
Candido, Anor Arruda, Benedito Gomes, Luiz do Amaral Gurgel e o sobrinho de
Joaquim Cândido, tendo como maestro, Raul Tobias Monteiro e composta, em sua
maioria, por descendentes de portugueses.
O Coro de Santa Cruz, criado em 1921 pelo Padre Luiz Gonzaga, na igreja
de mesmo nome, para atender aos seus serviços religiosos, acabou tendo vida
longa, apesar de intermitente, até a década de 1950.
A formação cultural brasileira deve muito ao processo imigratório, as
influências das diversas culturas que se mesclaram e foram sendo incorporadas
umas às outras é visível na multiplicidade do Brasil de hoje. No início deste
processo imigratório, no entanto, a distância fez com que os imigrantes
buscassem se organizar em clubes ou associações, onde pudessem cultivar os
seus valores, a sua cultura, as suas tradições. Araraquara não foi exceção a esta
regra: além dos clubes citados, várias associações em áreas como saúde,
23
ensino e mesmo política, foram formadas e os imigrantes ostentavam em seus
comércios, o orgulho da terra natal
14
.
O governo local, mesmo com dois teatros em franca atividade na cidade, o
Polytheama e o Iris Teatro e mais um em construção, o Teatro Central, prosseguiu
em seu plano de construção de um Teatro Municipal, na mesma e tradicional Rua
3, entre as atuais Avenidas Duque de Caxias e Portugal. O Teatro Municipal de
São Paulo havia sido inaugurado em 1911 e Araraquara precisava também ter o
seu teatro oficial. Foi organizada uma sociedade anônima para a sua construção,
em terreno desapropriado pela Prefeitura e cedido a esta sociedade, sob a
presidência de Bento de Abreu Sampaio Vidal.
14
No Álbum de Araraquara de 1915, vê-se várias páginas de propaganda com fotos da Padaria Hespanhola,
de Emilio Rodrigues & Com, da Pharmacia Italiana, de Francisco Satriani, da Loja Árabe Brasileira, de João
Nemer Matuk & Com, da Padaria Franceza, de Casimiro Perez, da Casa Brazileira, de Gurgel & Amaral, da
Alfaiataria Ítalo-Brazileira, de Jo Donzelli, entre outras (FRANÇA, 1979, p. 6-57).
24
1.4 O Teatro Municipal
Em setembro de 1914, foi inaugurado oficialmente o Teatro Municipal de
Araraquara, com uma série de magníficos espetáculos da Companhia de Operetas
Clara Weiss, companhia lírica de revistas. Os registros da época descrevem-no
com orgulho:
Construído em estilo mourisco, planta do arquiteto Alexandre de
Albuquerque, é atualmente o melhor teatro do Estado, depois do Teatro
Municipal da capital. A iluminação elétrica é completa e deslumbrante em
quantidade de lâmpadas e beleza do material e distribuição, a pintura,
executada por hábeis profissionais, é distinta, mobiliário, tapeçaria, cenários
riquíssimos, vinte e dois camarins: dois salões para coristas, pano de boca,
jardins, grades, bar, gabinetes, cozinha, ventiladores elétricos, tudo forma
um conjunto magnífico (FRANÇA, 1979, p. 29).
Imagem
: Teatro Municipal de Araraquara
,
1914. Acervo: MIS Araraquara
.
25
O Municipal tinha três andares e capacidade para 918 espectadores, as
cadeiras eram de palhinha, importadas da Áustria. Na platéia 334 lugares, no
balo 68, nas frisas 110 e nos camarotes 106, além da galeria com capacidade
para mais 300 pessoas. O piso móvel da platéia se reclinava, ou nivelava, de
acordo com os eventos que ali se realizavam. Além da programação artística de
concertos, óperas, operetas, dança e teatro, como as cadeiras podiam ser
retiradas, tamm bailes, exposições, desfiles de moda e formaturas eram
realizadas nas dependências do teatro.
À época, a diretoria do Teatro
era formada por pessoas de projeção
na cidade. Na presidência, Bento de
Abreu Sampaio Vidal; vice-presidente:
Carlos Necke, engenheiro alemão e
superintendente da Estrada de Ferro
Araraquara; tesoureiro: Nélson de
Carvalho e Epaminondas França,
secretário.
Apesar de inaugurado, o Teatro
Municipal não entrou em atividade
regular até o ano de 1916, quando
então conheceu dias de glória.
Grandes companhias e notáveis
artistas desfilaram em seu palco,
proporcionando esplêndidas noites de
arte.
No entanto, a sociedade
comandada por Bento de Abreu Sampaio Vidal não conseguiria pagar suas
contas, apelando para a Câmara Municipal, a fim que a Prefeitura comprasse o
teatro de volta para o poder público, o que ocorreu neste mesmo ano de 1916.
Imagem
:
c
artaz anunciando recital da pianista
Guiomar Novaes. Teatro Municipal de Araraquara, 25
de
setembro de 1938. Acervo:
MIS Araraquara.
26
Grandes nomes pisaram seu palco, dentre outros, na área da música: Villa
Lobos, Guiomar Novaes, Souza Lima; e atores e atrizes do porte de Procópio
Ferreira, Mario Lago, Tônia Carrero, Adolfo Celli, Paulo Autran, Cacilda Becker,
Walmor Chagas, entre outros. Sem falar em Jean-Paul Sartre e Simone de
Beauvoir.
Em 1948, o Teatro já mostrava sinais de deterioração física, era então o
único teatro em atividade na cidade e acabava tendo uma ocupação intensa, não
apenas com atividades artísticas, mas também sociais, como bailes e festas de
formaturas, exposições e encontros. Suas paredes externas ressentiam-se da falta
de pintura, tornando seu aspecto triste e desolador.
Imagem
: Teatro Municipal de Araraquar
a, sem as cadeiras da platéia,
sendo utilizado para o baile de
formatura da Escola Normal Bento de Abreu. 16 de dezembro de 1951. Acervo: Dora Galvão Medina.
27
em 1953, sob a gestão do Prefeito Antônio Tavares Pereira Lima,
engenheiro, homem de grande empreendedorismo, o Teatro veria seus melhores
dias de volta, sem dúvida em virtude da criação da Superintendência de Cultura
Artística da cidade, equivalente hoje a uma Secretaria Municipal de Cultura,
entregue à direção do Prof. Lysanias de Oliveira Campos. O Prof. Lysanias era,
além de homem de grande cultura e regente do Coral Araraquarense, uma pessoa
de relacionamento na cidade, junto com sua esposa D. Olga Ferreira Campos,
tamm professora.
Imagem
: T
eatro Municipal de Araraquara
em primeiro plano, com o Clube Araraquarense ao lado, d
écada
de 1940. Foto: Photo-Studio, de Rivas Autulo. Acervo: MIS Araraquara.
28
Imagem
:
c
artaz anunciando temporada lírica
da Organização Eduardo Marchetti
. Teatro Municipal de
Araraquara, 10 e 11 de dezembro de 1955. Acervo: MIS Araraquara.
29
Os diversos grupos da cidade, ligados a atividades artísticas, viam, assim,
na presea do casal Lysanias e Olga, um grande apoio a seus projetos. Foi o
caso do Teatro Experimental de Comédia de Araraquara, o TECA, que sob a
direção de Wallace Leal Valentim Rodrigues, estrearia em 1955.
Em 1962, o Municipal encerrava suas atividades de forma triste: a
Prefeitura, alegando a necessidade de uma reforma urgente, arrancou o assoalho
e desligou a rede elétrica do teatro. O tempo passou e nada foi feito, o Teatro ficou
quatro anos em situação de completo abandono, com goteiras transformando tudo
em um triste monte de lixo.
O industrial Rômulo Lupo, descendente do relojoeiro Theodoro Lupo, que
chegara a Araraquara em 1885, em sua segunda gestão como Prefeito, foi o
responsável por sua demolição, em 1966. O projeto para o local, um condomínio
residencial de 20 andares, denominado Paço das Artes, destinava o subsolo para
um teatro. Com a falência da construtora, a Prefeitura arcou com os prejuízos,
devolvendo aos condôminos as importâncias já recebidas e daí partiram para a
construção da sede da Prefeitura Municipal, atualmente no local.
No ano de 1966, o Teatro Municipal de Araraquara era demolido, quando
completava 52 anos.
1.5 O torvelinho dos anos 1940
Na virada do século o mundo se transformava e o Brasil tamm, sua
economia começava a se transformar de agrária e exportadora para industrial,
trazendo uma forte urbanização causada pela migração de milhões de pessoas
para as cidades, principalmente nos Estados do Rio de Janeiro e São Paulo. A
Primeira Guerra Mundial, o crack da bolsa norte-americana em 1929, a Revolão
Constitucionalista de 1932, o Estado Novo de Getúlio Vargas e a Segunda Guerra
Mundial: Araraquara passou por todos estes acontecimentos e manteve um
crescimento econômico estável e uma taxa de urbanização sempre crescente. No
30
início da década de 1940, a população urbana era de 28.000 habitantes, enquanto
a zona rural atraía cerca de 20.000. O café ainda era a grande riqueza local,
seguido do algodão, que abastecia as duas grandes fábricas de óleo da cidade, a
Anderson Clayton e a Dianda Lopez, e da cana de açúcar começava a ganhar
importância (TELAROLLI, 2003, p. 179 - 183).
A década de 1940 testemunhou mudanças urbanas importantes na cidade
e configurou muito do que seria a Araraquara dos dias de hoje. O centro da
cidade já tinha o seu calçamento, enquanto os bairros do Carmo, São Geraldo,
Vila Xavier, ainda viviam enlameados. A Rua 2, atual Rua 9 de Julho, desde a
fundação da cidade foi a rua do comércio, enquanto a Rua 3, atual Rua São
Bento, era a rua dos bancos e serviços, mas tamm da diversão, dos cinemas,
do Teatro Municipal que, ao lado do Clube Araraquarense, formavam a Esplanada
das Rosas, onde tinha lugar o passeio noturno dos futuros namorados, o famoso
footing.
Imagem
: Clube Araraquarense, com o Teatro Municipal em se
gundo plano. Araraquara, Esplana
da
das Rosas. Rua 3, década de 40. Foto: Photo-Studio, de Rivas Autulo. Acervo: MIS Araraquara.
31
Anos 40, o movimentado footing das noites cálidas da Rua 3 dos oitis
enfileirados e das milhares de rosas de todas as cores, num clima de lirismo
e romance igual ao das telas de cinemas ali bem próximos; as filas
intermináveis no São Bento e no Paratodos, quando o filme tinha no elenco
Bette Davis, Humphrey Bogart, Ingrid Bergman; o bar Tamoio em frente ao
Teatro, o do Monteiro bem em frente ao imponente Clube Araraquarense,
onde os moços esvaziavam os canecões e as tulipas de chopp depois que
deixavam as namoradas em casa (TELAROLLI, 2003 p. 185).
A década de 1940 traria tamm os aparelhos de rádio para dentro das
casas e com o rádio, um mundo novo de informações e divero. Em Araraquara,
a dio Cultura, PRD-4, criada em 1932, por dois ferroviários apaixonados por
rádio, José Araújo Quirino dos Santos e Alcides
Alves Ferreira, tinha uma audiência fiel e lançava,
sob a esmerada direção de Jofre David, o rádio
teatro, imperdível e deliciosa diversão de toda uma
geração de jovens e que viria a revelar, também,
vários talentos artísticos locais, inclusive para o
TECA. Sob a direção de Jofre David, montaram
um grupo de teatro amador, o Conjunto Dramático
Araraquara da PRD-4 e se apresentaram no
Teatro Municipal em várias ocasiões. Moacyr
Martim, Iracema Margarida, Celso D’Avila, Oscar
de Barros, Julia Aguinaldo e Elisabeth Nunes
protagonizaram um de seus maiores sucessos, a
peça Jangadeiros, texto do Dr. Raimundo de
Menezes.
Os clubes se firmavam como los de atração com suas atividades
esportivas, mas principalmente por suas brincadeiras dançantes e seus bailes, no
tradicional e elitista Clube Araraquarense, na Sociedade Italiana, no Clube 22 de
Agosto, mais democrático, no Grêmio Ferroviário ou mesmo no 27 de Outubro.
As poucas atrações que visitavam o Teatro Municipal e alguns conjuntos
locais de jazz-band, como o do Abrita, o Luiz do Carmo, o Ferroviário, entre
Imagem
10
:
c
artaz
anunciando o rádio
teatro da Rádio Cultura de Araraquara,
PRD-4. Acervo: MIS Araraquara.
32
outros, o Trio Marajó ou o Trio Schumann, não escondem um mero bastante
tímido de eventos culturais na cidade, se comparados ao início do século. A
quantidade de espetáculos realizados na cidade nos primeiros anos do século XX
nos impressiona e não terá paralelo nos demais anos da história da cidade,
inclusive na década de 1950. Esta diminuição de público não é notada apenas em
Araraquara, mas em outras cidades brasileiras, principalmente Rio de Janeiro e
São Paulo.
Os anos 1940 trouxeram uma acomodação. No início do século havia uma
febre, uma ânsia por consumir todo tipo de espetáculo, qualquer peça ou teatro de
revista tinha que fazer dezenas de apresentações até se esgotar, algumas delas
ficavam em cartaz por meses seguidos. O público estava ávido por conhecer, por
consumir. Pouco a pouco esta situação foi se tornando mais natural, se
acomodando. Se, do ponto de vista do público, a sede por novidade havia
diminuído, por outro lado, para os produtores, os custos dos espetáculos
profissionais começaram a ficar mais caros e significativos. Os cachês dos artistas
tinham que ser negociados, os custos dos cenários, figurinos, aluguel de teatros e
divulgação passaram a ser itens de custo importantes. Am da inflação dos
preços, ninguém mais estava disposto a colaborar, apenas pelo prazer de fazer
parte do espetáculo. Uma era de ingenuidade acabava, novos tempos chegavam,
onde todos tinham que ser pagos e a indústria do show business tinha que se
profissionalizar. Apesar da facilidade dos meios de transporte, este aumento de
custos acabou levando a uma diminuição na oferta de espetáculos para outras
cidades, fora do local original da produção.
Paralelo a isso, a sociedade vivia uma febre consumista por bens materiais.
Era a industrialização que trazia os o sonhados eletrodomésticos a preços
acessíveis. Máquinas de costura, geladeiras, fogões a gás, batedeiras,dios,
pouco a pouco os televisores preto e branco passavam a fazer parte do cotidiano
de muitos lares. As saídas noturnas da família para o lazer, para o divertimento,
para o consumo de bens intelectuais, passaram a ser muito mais controladas. E
33
quando isso ocorria, o cinema aparecia como a primeira grande opção, em
detrimento dos outros espetáculos.
As produções de Hollywood acabavam monopolizando todas as atenções.
Os nomes dos artistas eram conhecidos de toda a sociedade, como se fossem
velhos amigos, revistas com suas fotos e fofocas de suas vidas eram disputadas
nas bancas de jornais, as jovens colecionavam as figurinhas dos artistas que
vinham nas balas Fruna e cada lançamento trazia sempre um público numeroso.
Na década de 1960, a televisão traria uma situação ainda pior para a
indústria do show business. A sua presença em um mero cada vez maior de
casas, sua programação cada vez mais variada e sofisticada, com novos artistas,
novos ídolos da juventude, iria afastar ainda mais o público dos teatros, iria limitar
ainda mais as já escassas saídas noturnas.
1.6 O que fazer em Araraquara?
Em julho de 1952, Araraquara contava com uma população estimada em
63.552 habitantes, segundo o jornal O Imparcial, de 22 de agosto de 1954. Não
apenas apresentava ótimos índices de qualidade de vida como também era uma
cidade agradável e bucólica para se viver, longe da agitação das grandes cidades,
com uma rede de ensino de qualidade e uma grande oferta de bons serviços. Sua
economia migrara, de forma sólida, do café para a cana de açúcar
Mas esta tranqüilidade oferecia um problema a uma parcela de sua
população jovem: o que fazer de criativo na cidade?
A escola, sem dúvida, preenchia boa parte do cotidiano, os bailes, os
esportes e os clubes, com certeza, outra. Mas havia algo mais em termos de
diversão que acabava sendo muito incipiente, uma biblioteca pública ainda
pequena, uma papelaria que fazia às vezes de livraria, pouquíssimos espetáculos
de teatro, música ou dança, apenas os cinemas – que viviam superlotados -
34
acabavam trazendo algo diferente e criativo para animar os sonhos daquela
geração.
Araraquara contava com dois excelentes cinemas no centro da cidade,
ambos na Rua 3, a uma quadra do Teatro Municipal, os Cines Odeon e Paratodos,
propriedade da empresa Graciano & Filhos, ambos com “CinemaScope e Tela
Panorâmica”, ponto obrigatório dos jovens nas noites dos finais de semana.
A TV Tupi, criada por Assis Chateaubriand, data de setembro de 1950, mas
a influência da televisão como um fator importante na cultura popular da
sociedade brasileira e araraquarense seria sentida mesmo a partir da década
de 1960.
Este isolamento e esta pouca oferta cultural, pelas razões expostas, fez
com que a década de 1950 testemunhasse o florescimento de uma série de
grupos de jovens dispostos e motivados a criar alternativas para aquela situação
de peria no campo das artes. Grupos que muitas vezes se comunicavam,
pessoas que tinham interesses diversos e que, portanto, faziam parte de várias
atividades. Em artigo publicado no jornal O Imparcial, de Araraquara, em
dezembro de 1996, o escritor Ignácio de Loyola Brandão lembra-se que:
Naquela Araraquara pequena, tranqüila, arborizada, que parecia se
conservar à margem do processo de revolução que agitava o Brasil e o
mundo (industrialização, rock) um grupo unido agitava culturalmente,
tentando fazer cinema, montando peças, formando o Clube de Cinema,
aliando-se ao Foto-Cine Clube, convivendo com os pintores da Escola de
Belas Artes, assistindo aos espetáculos da Escola de Balé, escrevendo
críticas de cinema e teatro, estabelecendo polêmica pelos jornais, realizando
programas de cinema na Rádio Cultura.
Fazer parte de um grupo, ser aceito por um grupo de pessoas, de amigos, é
de importância vital para qualquer jovem, mesmo que este grupo seja
relativamente pequeno e sem maior importância para a sociedade. A necessidade,
a motivação de se criar, de se envolver em alguma atividade cultural, de fazer
qualquer coisa para escapar do marasmo, também é característica da juventude.
No entanto, estas duas explicações isoladas não são suficientes para se explicar
35
todo o movimento que acabou por existir na cidade naqueles anos 1950, o
nascimento de tantos grupos.
Lideranças foram importantes, pessoas com conhecimento e com
capacidade para aglutinar, para motivar, para criar. E elas, por sorte, existiram:
Ignácio de Loyola Brandão em suas atividades jornalísticas e no cinema, Wallace
Leal V. Rodrigues no teatro, Prof. Lysanias de Oliveira Campos no movimento
coral e como responsável maior pela Prefeitura na área cultural, Mario Ybarra de
Almeida nas artes plásticas, entre outros, além do incansável Araken de Toledo
Pires que, de dentro de seu escritório na Rádio Cultura, parecia participar de tudo.
Pessoas que souberam tamm lutar para obter o apoio da sociedade civil e do
poder público para seus projetos.
Outras cidades, mesmo no interior de São Paulo, que tiveram situações
econômicas e sociais semelhantes a Araraquara, não apresentaram a riqueza e a
diversidade cultural encontrada neste período. Ainda no mesmo artigo de 1996,
Brandão complementa:
O assombro vinha do isolamento em que as cidades do interior viviam. Era
como se fôssemos habitantes de feudos medievais, murados, longe de tudo.
A angústia de se encontrar dentro desta situação batia nos jovens que
procuravam fugas, modos de escapar a um destino que, pela acomodação,
nos conduziria, fatalmente, ao funcionalismo público, ao comércio
estagnado, aos bancos, escritórios da estrada de ferro ou do DER, à fábrica
de meias Lupo. Pouco para a imensidão dos sonhos.
1.7 Os grupos
Alguns grupos em atividade na década de 1950 tinham uma história na
cidade, é o caso, por exemplo, do Coro da Igreja de Santa Cruz, fundado em
1921, pelo Padre Luiz Gonzaga; do Trio Marajó, criado em 1945 com o nome de
Namorados do Samba e com sua nova formação com Manoel (Néco), Emilio
(Doca) e Joaquim Teixeira (Tico); e do Trio Schumann, fundado em 1947 e
composto por Ângelo Bonetti (violino), Luiz Bonetti (piano) e Francisco Cortese
(violoncelo). A antiga jazz-band do Abritta, a Jazz Abritta foi re-fundada com o
36
nome de Orquestra Marabá em janeiro de 1951, dirigida por Cesar Alves Pereira,
uma das favoritas dos bailes da cidade.
Escolas de arte importantes da cidade continuavam ativas, como é o caso
do Conservatório Dramático e Musical de Araraquara, fundado em 1926, e dirigido
pela Profa. Maria de Lourdes Tescari, irmã do maestro José Tescari, que sempre
apresentava concorridos recitais de seus alunos no Teatro Municipal.
Também a Escola de Belas Artes de Araraquara, fundada em 1935 pelo
mesmo Bento de Abreu Sampaio Vidal, que fundara o Teatro Municipal, aglutinava
jovens estudantes sob a direção do Prof. Mario Ybarra de Almeida, filho do ilustre
pintor nacionalista Almeida Junior. A Escola teria na figura do Comendador Helio
Morganti o seu principal mantenedor e um corpo de professores de grande valor:
Lafayette Carvalho de Toledo, Sidney Rodrigues, Lucila Toledo Mezzótero,
Francisco Amêndola da Silva, Dr. Genaro Granata, Domenico Lazzarini, Julieta
Grazziato. Dentre seus alunos, os nomes de Arthur Batelli e de Ernesto Lia, este
que acabaria sendo a figura mais importante das artes plásticas de Araraquara.
Em julho de 1950 foi criada a primeira escola de dança da cidade, a Escola
de Ballet Mímica, sob a direção da coreógrafa e professora Madame Maria
Carmen Brandão, “a fada de cuja varinha encantada brotou essa realidade
encantadora” e de Lucilia de Toledo Mezzótero, esta professora da Escola de
Belas Artes. A “menina e moça, fugidia e frágil” Leonice Borges, uma das “Sílfides
da Morada do Sol” encantaria o “repórter” Wallace Leal V. Rodrigues em artigo
publicado no jornal O Imparcial de Araraquara na edição especial de aniversário
da cidade, de 22 de agosto de 1954.
O Foto Cine Clube Aracoara organizava salões de arte fotográficas desde
1951, procurando talentos entre os fotógrafos amadores da cidade. Eduardo
Salvatora, José Vicente, Eugenio Yalenti e Plínio Mendes, do Foto Cine Clube
Bandeirantes de São Paulo, orientavam os trabalhos.
37
O Clube Filalico e Numismático, fundado em novembro de 1951, pelo Dr.
Walter Medeiros Mauro, com 122 sócios inscritos, organizava concorridas mostras
de selos, atraindo a curiosidade dos jovens. Nomes ilustres participavam da
iniciativa, dentre eles o Sr. José Leandro de Barros Pimentel, Oscar Mayer,
Salvador Martins Bonilha, Dr. Leonardo Barbieri, Dr. Sirtes De Lorenzo, Roberto
José Fabiano, Dr. Moacir Porto, Moacir Joarez Pirola, Jorge Takabayashi, Dr.
Paulo Aguiar, Leopoldo Carvalho de Oliveira Filho, Hélio de Lima Veiga, Weber
Dini, Lucilio Corrêa Leite Junior, Vicente Corrêa Miranda, Cladis De Carli e o
saudoso Antonio Zarachi.
em 1952, o Prof. Lysanias de Oliveira
Campos iria fundar e reger o aclamado Coral
Araraquarense, composto por 35 vozes:
“senhoras, senhorinhas e cavalheiros da
sociedade araraquarense, como eram
apresentados os coralistas no programas. O Trio
Coringa foi fundado em agosto de 1956 e trazia
música popular brasileira com Daniel (violão),
Geraldo (afouché) e Dirceu (tumba).
O Centro Cultural Alberto Torres, fundado
em 1952, organizava conferências e cursos sobre
economia, política, sociologia, psicologia, história,
filosofia, religião e arte, além de dar um
expressivo destaque à poesia, tendo organizado
o Festival de Poesia de Araraquara, em 1956,
no Teatro Municipal. A historiadora Anna Maria Martinez Corrêa, irmã do polêmico
diretor José Celso Martinez Corrêa, era professora ativa do Centro e tamm tinha
um grupo de teatro amador, tendo montado anos depois, A Megera Domada, com
Imagem
11
: c
artaz do Coral
Araraquarense. Arte: Francisco
Amêndola da Silva Acervo: MIS
Araraquara.
38
a presença de seu irmão mais novo, Luiz Antonio Martinez Corrêa, também diretor
de teatro
15
.
O TECA, fundado em 1955, tem sua história bastante ligada à do Clube de
Cinema de Araraquara. A começar pela iia de sua criação, que foi do próprio
Araken de Toledo Pires, o incansável diretor da Rádio Cultura, que viria a ser o
principal aliado de Wallace na criação do TECA. Ignácio de Loyola Brandão,
jornalista de O Imparcial, logo se apaixonou pela idéia e foi buscar inspirão para
a organização do Clube que ficou assim constituído, após várias reuniões na
Rádio Cultura, com a presença de representantes do Núcleo de Belas Artes, da
Equipe Experimental de Cinema e do Cine Foto Clube: Presidente: Araken de
Toledo Pires; Vice-Presidente: Ignácio de Loyola Brano; 1º Secretário: Pedro
Evaristo Schiavon; Secretário: Maria Aparecida Assis; Tesoureiro: Arthur
Batelli; Tesoureiro: Gustavo Trotta; Conselho Fiscal: Prof. Lafayette C. Toledo,
Wallace Leal V. Rodrigues e Auny Leite.
Em sua primeira sessão dois filmes de Charlie Chaplin foram exibidos: No
Parque, Campeão de Boxe e um filme sobre “o truque no cinema”. Mais uma vez
Ignácio de Loyola Brandão lembra, em artigo publicado no jornal O Imparcial, em
18 de maio de 1989, que:
Ser excluído do grupo, ou não ter acesso, significava, na época, estar um
tanto à margem do acontecimento cultural. Porque tudo se interligava: havia
pintores da Belas Artes, que participavam do TECA e do Clube de Cinema.
O Clube abrigava também o grupo de fotógrafos do excelente Foto-Cine
Clube. A equipe de cinema juntou TECA, Foto-Cine Clube, Clube de
Cinema, Belas Artes, Conservatório. Correndo por fora havia a Escola de
Balé.
Vários outros grupos amadores existiram na cidade, alguns mais ativos que
outros, mas os relacionados acima, eram os mais atuantes.
Não se faz teatro sozinho. Nem cinema. Mesmo a literatura, a música, a
dança ou as artes visuais, qualquer criação artística, por mais isolado que possa
15
Entrevista com Anna Maria Martinez Corrêa
39
vir a ser o seu processo criativo, depende do ambiente onde está inserida,
depende de uma troca constante de iias e de motivação, depende de pessoas.
E isto é ainda mais premente quando se fala de grupos artísticos amadores, onde
a criação artística é muito mais uma realização pessoal do que um projeto de vida.
A jovem estudante de dança Leonice Borges lembrava a Wallace Leal V.
Rodrigues, em entrevista publicada no jornal O Imparcial, de 22 de agosto de
1954, a sua motivação com a dança:
Não é o palco que me tenta, mas a realização de nós mesmos, o que é
possível alcançarmos na dança. Todas as pessoas amam e procuram obter
sua paz interior para poderem viver nela. Nunca alcanço esta paz e tanta
serenidade como quando danço. Talvez por isso aprecie tanto esta forma de
arte.
Imagem
12
:
v
ista aérea de Araraquara, década de
19
50. Vê
-
se a Rua São Bento (Rua 3) se alongando
arborizada e o Teatro Municipal em destaque no terceiro quarteirão à esquerda. Acervo: MIS
Araraquara.
41
2. OS PRIMEIROS ANOS DO TECA
Os integrantes do TECA Teatro Experimental de Comédia de Araraquara
eram amigos e conhecidos que se envolviam em diversas atividades da cidade.
Em praticamente tudo referente à cultura. Alguns freqüentavam mais a Biblioteca
Mario de Andrade, outros a Escola de Belas Artes. Uns eram ligados à Rádio
Cultura, outros escreviam na imprensa. Todos, com certeza, freqüentavam o
footing da Rua 3 e não perdiam uma sessão de cinema e, mais do que isso, se
relacionavam e procuravam fazer algo criativo naquela Araraquara arborizada e
modorrenta dos anos 1950.
2.1 O fracasso de um filme
Uma reportagem, assinada pelo então colunista, e hoje escritor, Ignácio de
Loyola Brandão, publicada no principal jornal da cidade, O Imparcial, no dia 6 de
dezembro de 1953, informava: “iniciaram-se nesta cidade as filmagens” de Aurora
de uma Cidade. E complementava com a notícia de que a principal atriz do filme,
Maria Ignes de Souza, havia deixado a produção, por motivos pessoais, sendo
substituída por Maria Aparecida Assis. O jornal estampava duas fotos da bela
Maria Ignes. Gumercindo Ferreira Junior e seu irmão, Gerson Ferreira, tamm
faziam parte do elenco.
O filme, um curta-metragem em 16 mm, contava a história de Araraquara,
com Sebastião Campos fazendo o papel do fundador da cidade, Pedro José Neto,
e a “bonequinha” Maria Aparecida Assis, como sua esposa, Maria Ignácia.
No ano seguinte, a edição especial do mesmo jornal, no 13 aniversário da
cidade, dia 22 de agosto de 1954, às páginas 78 e 79, trazia a informação que as
filmagens haviam sido suspensas. O filme Agfa havia desaparecido do mercado
por problemas de importação e os da marca Ferrania e Fuji, testados pela equipe,
não se revelaram com a mesma qualidade, baldados foram todos os esforços”.
42
A matéria tinha duas páginas com o título “O esforço de uma equipe
obstinada e trazia fotos das filmagens de Aurora com os atores em roupas de
época e até com uma espingarda. Explicava a decisão tomada pela equipe:
“Enquanto espera que se resolva a situação do filme, os seus responsáveis tratam
da encenação de uma peça teatral...”. Com os recursos do teatro, voltariam a
filmar, prometia a imprensa araraquarense: “Asseguramos que Aurora de uma
Cidade continuará a ser filmada”.
Aurora jamais foi completada e os poucos rolos do filme até hoje não foram
encontrados
16
.
2.2 Fazer teatro
A equipe envolvida nas filmagens era parte da Equipe Experimental de
Cinema de Araraquara (ou Cinema Experimental de Araraquara), organizada
formalmente em 1954, o que poderia se chamar de embrião do TECA. Lá estavam
Araken de Toledo Pires como presidente, Ignácio de Loyola Brandão como vice,
Arthur Batelli, Gustavo Trotta e o próprio Wallace Leal V. Rodrigues.
Sebastião Campos, ator do filme e futuro ator do TECA, tem uma versão
mais prosaica para aquele momento: “Acabou a grana!
Lembrando-se do filme e
do grupo que começou o projeto do teatro, ressalta a figura de Wallace:
Ele era o grande pólo, o Wallace. Eu, ele e o Araken (Toledo Pires); foi
que tudo começou... Eu conhecia o Wallace, fui ali naquele porãozinho dele
[refere-se ao porão onde Wallace trabalhava quando residia com sua irmã,
Ninira Medina, no casarão da Avenida 15 de novembro, 440]. Eu conhecia o
Arthur Batelli, que era muito amigo dele, o outro que era pintor [...] o Ernesto
Lia [...] Começamos a falar, a falar do que gostávamos, começamos.
17
Teatro é uma atividade menos dispendiosa que cinema, pois prescinde dos
inúmeros equipamentos cnicos, em geral, importados e muito caros na época. A
proposta inicial do grupo era ainda mais barata: montar peças “em teatro de
16
Vide Anexo II. Artigos Especiais para um relato mais detalhado das filmagens de Aurora de uma Cidade.
17
Entrevista com Sebastião Campos.
43
arena” no Teatro Municipal de Araraquara. O novo Superintendente de Cultura da
cidade, o Prof. Lysanias de Oliveira Campos, amigo de todos, maestro do Coral
Araraquarense, era um homem de cultura, o que, na certa, facilitaria a cessão do
teatro. O Municipal seria a casa ideal para o TECA.
A inspiração do Teatro de Arena de São Paulo foi importante. O grupo,
criado por José Renato em 1953, já encantava a todos pela ousadia do repertório
e do novo formato de encenação. Wallace conhecia o trabalho e tinha certeza de
que poderiam fazer algo parecido em Araraquara. Sem cenários, apenas com
bons atores, luz, figurinos e elementos de cena.
Sebastião Campos lembra-se da primeira reunião, em janeiro, mas o da
data exata:
[...] fizemos uma reunião lá no Auditório da dio Cultura - porque o Araken
era da Rádio, e aí decidimos [...] Tinha várias pessoas nessa reunião, tinha o
Ignácio [de Loyola Brandão], que já estava com a gente no filme, o Luiz
Roberto Salinas [Fortes], o Plínio Pimenta - eu tinha 17 anos.
O Teatro Experimental de Comédia de Araraquara nascia em janeiro de
1955. As discussões de orçamento comaram imediatamente, os levantamentos
das peças que poderiam ser montadas e o elenco. o apenas o elenco
disponível, mas agora com talento suficiente para enfrentar o público frente a
frente e o apenas as lentes de uma câmera de cinema. Uma das primeiras
decies foi convidar a esposa do Prof. Lysanias, D. Olga, para Presidente de
Honra do grupo. Uma decisão acertada.
Teatro de Arena foi o nome popular adotado pelo TECA em seu início. Não
apenas a imprensa, mas os primeiros programas da companhia ostentavam na
capa este nome. A popularidade do Arena, de São Paulo, era, sem dúvida, um
grande atrativo.
44
2.3 O Teatro de Arena de São Paulo
Fundado em 1953, em São Paulo, pelo ator e diretor José Renato Pécora,
ou simplesmente José Renato, o Teatro de Arena surgiu como uma alternativa ao
tipo de teatro praticado pelo TBC – Teatro Brasileiro de Comédia, que montava um
repertório internacional, com produções mais sofisticadas. O objetivo era produzir
espetáculos de dramaturgos nacionais e incentivar o surgimento de diretores
brasileiros, que o TBC investia nos talentos europeus, principalmente italianos.
O Arena trazia consigo, portanto, a modernidade e a renovação, com montagens
simples, de baixo custo, mas com grande empenho por parte do elenco, da
direção. Fiéis a discursos contra as injustiças sociais, o Arena inovava e
conseguia se comunicar com um público jovem.
A companhia, formada por José Renato, Geraldo Mateus, Henrique Becker,
Sergio Britto, Renata Blaunstein e Monah Delacy, entre outros, estreou nos salões
do Museu de Arte Moderna de São Paulo com a montagem de Esta Noite é
Nossa, de Stafford Dickens. Ainda em 1953, produziu O Demorado Adeus, de
Tennessee Williams, e Uma Mulher e Três Palhaços, de Marcel Achard, ambas
sob direção de Jo Renato. As apresentações ocorriam em clubes, fábricas e
salões. No final de 1954, o Arena se instalava em seu teatro na Rua Teodoro
Baima. A partir de 1958, o Arena se firmaria.
O Teatro de Arena de São Paulo evoca, de imediato, o abrasileiramento do
nosso palco, pela imposição do autor nacional. Os Comediantes e o Teatro
Brasileiro de Comédia, responsáveis pela renovação estética dos
procedimentos cênicos, na década de quarenta, pautaram-se basicamente
por modelos europeus. Depois de adotar, durante as primeiras temporadas,
política semelhante à do TBC, o Arena definiu a sua especificidade, em
1958, a partir do lançamento de Eles Não Usam Black-Tie, de Gianfrancesco
Guarnieri. A sede do Arena tornou-se, então, a casa do autor brasileiro. O
êxito da tomada de posição transformou o Arena em reduto inovador, que
aos poucos tirou do TBC, e das empresas que lhe herdaram os princípios, a
hegemonia da atividade dramática. De uma espécie de TBC pobre, ou
econômico, o grupo evoluiu, para converter-se em porta-voz das aspirações
vanguardistas de fins dos anos cinqüenta (MAGALDI, 1984, p. 106).
45
A tradição de se montar um espetáculo “em teatro de arena”, ou, em ings,
theatre-in-the-round é muito antiga, anterior até à disposição da cena italiana
tradicional. Tem suas raízes no teatro grego e no teatro medieval inglês do século
XVI, onde o próprio Wiliam Shakespeare se apresentava como ator e tinha seus
espetáculos montados, inclusive no primeiro Globe Theatre de Londres, em uma
estrutura em forma de anfiteatro ao ar livre. Em meados do século XX, este tipo de
espetáculo, com a platéia rodeando os atores, como em um circo, tomou forma.
Em 1951, a diretora teatral norte-americana, Margo Jones, escreveu um livro a
respeito, Theater-in-the-Round e começou a promover seus espetáculos neste
formato. Neste mesmo ano, um grupo de alunos da EAD, em São Paulo, encenou
O Demorado Adeus, de Tennessee Williams, sob a direção de Jo Renato, o
primeiro espetáculo de arena em nosso país (GUINSBURG, FARIA, LIMA, 2006,
p. 37). Na Inglaterra e nos Estados Unidos, no século XX, o teatro de arena se
tornou muito popular, com vários espaços cênicos sendo construídos.
Sua popularidade se explica pela possibilidade de se acomodar uma grande
audiência e pela proximidade do público com os atores. Além disso, requer um
maquinário cênico reduzido, pouca luz, poucos técnicos e quase nenhum cenário,
sendo, portanto, muito mais barato. Por tudo isso, foi um formato muito utilizado
por grupos experimentais de teatro, como o TECA.
2.4 A estréia do TECA
O Teatro Municipal de Araraquara apresentava excelentes possibilidades
para a montagem de peças “em teatro de arena”, pois todo o seu piso era móvel e
suas cadeiras retiráveis. Uma situação encontrada em pouquíssimos teatros no
Brasil. O palco era rebaixado e ficava na mesma altura da platéia, formando um
grande espaço nico. As cadeiras arrumadas ao redor de um pequeno palco,
redondo, colocado bem no centro do espaço. A área original do palco, rebaixada,
era utilizada para a montagem de um bar – uma das inovações do TECA
enquanto os camarins podiam ser utilizados naturalmente.
46
O jornal O Imparcial trazia, em sua edição de 12 de junho de 1955 a notícia
da estia do grupo:
Merecem os nossos aplausos um pugilo de moços da cidade que, num
esforço titânico, digno dos maiores encômios, levam de vencida a luta para
dotar Araraquara de um grupo de teatro.
Este pugilo de moços” tinha a liderança de Wallace, não apenas o diretor
cênico da companhia, mas um homem de muitos talentos. Wallace tinha ao seu
lado um amigo que lhe fazia o contraponto necessário: Araken de Toledo Pires,
uma pessoa mais velha e experiente, de uma cultura geral invejável e diretor da
Rádio Cultura. A produção, orçamentos e o planejamento seriam de sua
responsabilidade, sua experiência na Rádio o credenciava. Destas duas pessoas
dependia o sucesso da companhia.
A decisão sobre a escolha do repertório a ser apresentado coube a
Wallace, como seria de praxe na vida da companhia. Suas sugestões eram
sempre acatadas. Uma Mulher do Outro Mundo, de Noël Coward, que ele havia
visto em São Paulo, no TBC, foi a primeira idéia. Mas era uma peça cara, com
muitos atores e, pior, teria que ser levada “em teatro de caixa”, em cima do palco
do Teatro. Uma idéia não muito aconselhável naquele momento. Resolveram
montá-la depois, quando as coisas melhorassem.
A decisão final foi a montagem de três pequenos textos, três peças de um
ato apenas, com dois intervalos, formando, assim, um espetáculo único. Um
espetáculo composto de três peças apresentadas em conjunto e em teatro de
arena”. A primeira obra seria um drama, a segunda, algo mais leve e romântico e
a peça final uma comédia, fazendo com que o público saísse do teatro mais leve,
mais feliz.
47
Este formato não era muito comum em teatros de arena, o próprio Arena de
São Paulo não o fazia, mas era bastante criativo e popular, tendo se firmado como
uma tradição do TECA e se revelado eficiente e agravel a todos os públicos
18
.
A tradição de se apresentar duas e até três obras diferentes em uma
mesma sessão, vem, provavelmente, do teatro popular italiano. O teatro popular
itinerante dos figli d’arte, que mambembavam pelo interior da Itália desde o início
do séc XIX, apresentava esta configuração de sessões com mais de um
espetáculo. Pelo interior de São Paulo, este modelo estrutural de espetáculos se
difundiu no século XX, com as companhias itinerantes de Comédias e Teatro de
Revista. Entre os anos de 1920 e 1940, estas companhias itinerantes, ao
chegarem às pequenas cidades, apresentavam sempre um programa duplo: antes
da Revista, uma comédia musical ou um pequeno sainete
19
.
Na Itália, pesquisando a tradicional Companhia I Rame (da família de
Franca Rame), Neyde Veneziano nos informa:
Girando pelas cidades do interior da Lombardia, a companhia apresentava,
numa mesma sessão, duas ou três peças. Portanto, cada função dessas
companhias mambembes comportava duas ou três histórias, que iam de
tragédias adaptadas, passando pelo drama e melodrama até o gênero
grand-guignol, todos levados a soggetto e misturados às crônicas e aos
fatos da vida real. Encerrava a noite uma “farsa final”, uma breve
apresentação de caráter cômico, com toques satíricos, porém menos ligada
ao cotidiano. O objetivo da companhia, ao incluir a farsa final no programa,
era que os espectadores saíssem satisfeitos e felizes após terem dado boas
risadas (VENEZIANO, 2002, p. 122).
Seguindo a tradição e iniciando sua história, as três peças escolhidas para
a estréia do TECA, no Teatro Municipal de Araraquara, dia 23 de junho de 1955,
sábado, às 20h, foram:
18
Vide Capítulo 6. Bastidores.
19
Sainete: peça musicada e curta de sabor naturalista, que retrata tipos populares sem grandes preocupações
com a estrutura dramática. nero de origem espanhola que surgiu no século XVIII substituindo o entremez
(GUINSBURG, FARIA e LIMA, 2006, p. 277)
48
O Homem da Flor na Boca
O Caso das Petúnias Esmagadas
Como Ele Mentiu ao Marido Dela
FICHAS TÉCNICAS
Nome da peça
O Homem da Flor na Boca L'uomo dal fiore in bocca
Autor Luigi Pirandello (1867-1936) Itália
Gênero Drama em 1 ato
Ano de montagem
1955
Freguês pacato Edson Lessi
O Homem da Flor na Boca Mario Barra
Personagem/
Ator, por ordem
de entrada em
cena
A mulher Fanny Carati
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Cenários Antonio Auny Leite
Figurinos Felipe Luiz (heterônimo de Wallace), executados por Ida Darlan
Maquiagem Arthur Batelli
Produção Araken de Toledo Pires, Wallace Leal V. Rodrigues e Antonio Auny Leite
Supervisão Geral Araken de Toledo Pires
Obs Montada “em teatro de arena”
Nome da peça
O Caso das Petúnias Esmagadas The Case of the Crushed Petunias
Autor Tennessee Williams (1911–1983) EUA
Gênero Fantasia lírica
Ano de montagem 1955
Dorothy Simple Fanny Carati
Guarda Jayme Maurício Leal
O jovem Sebastião Campos
Personagem/ Ator,
por ordem de
entrada em cena
Miss Dull Maria Aparecida Assis
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Cenários Antonio Auny Leite
Figurinos Felipe Luiz (heterônimo de Wallace), executados por Ida Darlan
Maquiagem Arthur Batelli
49
Produção Araken de Toledo Pires, Wallace Leal V. Rodrigues e Antonio Auny Leite
Supervisão Geral Araken de Toledo Pires
Obs Montada “em teatro de arena
Nome da peça
Como ele Mentiu ao Marido Dela How He Lied to Her Husband
Autor George Bernard Shaw (1856-1950) Irlanda
Gênero Comédia
Ano de montagem 1955
Ele Noemio Lerner
Ela Maria Aparecida Assis
Personagem/ Ator,
por ordem de
entrada em cena
O Marido Eugenio Geraldo Casale
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Cenários Antonio Auny Leite
Figurinos Felipe Luiz (heterônimo de Wallace), executados por Ida Darlan
Maquiagem Arthur Batelli
Produção Araken de Toledo Pires, Wallace Leal V. Rodrigues e Antonio Auny Leite
Supervisão Geral Araken de Toledo Pires
Tradução Edgar Cavalheiro
Obs Montada “em teatro de arena
Teatro Experimental de Comédia de Araraquara
Presidente de Honra Olga Ferreira Campos
Superintendente Araken de Toledo Pires
Diretor Admiistrativo Gustavo Trotta
Tesoureiro Geral Sebastião Campos
Tesoureiro Auxiliar Fanny Carati
Ensaiador Permanente Wallace Leal V. Rodrigues
Cia. Permanente do TECA
Srtas. Fanny Carati, Maria Aparecida Assis e Ediméa Zuchini
Srs. Edson Lessi, Eugenio Geraldo Casale, Jayme Maurício Leal, Mario Barra, Noemio Lerner e
Sebastião Campos
Cenógrafo Antonio Auny Leite
Figurinista Felipe Luiz (heterônimo de Wallace)
Maquiagem Arthur Batelli
Fonte: programa do espetáculo.
50
No que viria a ser chamada de a primeira série de espetáculos da
companhia, vê-se de forma clara as diferenças de cada peça e o formato final do
espetáculo.
O texto de Pirandello, cujo título se refere a um câncer, epitelioma (il fiore in
bocca), propõe uma atmosfera concentrada e mostra o diálogo de dois
personagens em um bar de uma estação. O homem da flor na boca é o
personagem cujos sentidos estão aguçados com a perspectiva da morte próxima e
o pacato freguês um homem que aceita a vida como ela é, sem grandes reflexões.
O texto de Tennessee Williams, uma fantasia lírica, faz um contraponto à
densidade de Pirandello; é uma história fantasiosa onde a puritana Miss Dorothy
Simple suas queridas petúnias serem esmagadas por um desconhecido e com
elas, todos os seus mecanismos de defesa contra as paixões da vida.
A comédia de Bernard Shaw é irreverente, mostra a mediocridade
pavoneada e vazia da sociedade inglesa em um texto com muita malícia, ideal
para o final do espetáculo
20
.
O Teatro Municipal de Araraquara estava lotado e o jornal O Imparcial dos
dias seguintes não poupou elogios em suas manchetes: Empolgou o espetáculo
do Teatro de Arena”. “Novo e grandioso êxito do Teatro de Arena”. “23 de junho:
uma data notável na cultura araraquarense”. “Notável, o último espetáculo do
teatro de arena de Araraquara”.
O sucesso da companhia havia sido surpreendente, sob todos os aspectos.
Araraquara nunca havia visto nada igual. Foram quatro espetáculos apenas, a
estréia do dia 23 de junho, sábado, e apresentações nos dias 24, domingo, 26,
terça-feira e 27, quarta-feira. Todas com o teatro lotado e com um público
entusiasta.
O discurso inaugural de D. Olga encantou a todos. O apoio do casal, D.
Olga e Prof. Lysanias, foi de importância vital para o início das atividades do
20
Vide Capítulo 6. Bastidores.
51
TECA, por terem sempre acreditado no projeto e por terem colocado todo o
prestígio de que gozavam na sociedade araraquarense como um aval à qualidade
da companhia. Wallace sempre lhes foi grato por isso.
As colunas sociais fervilharam de notícias sobre quem havia sido visto e
quem havia freqüentado o Iemanjá Bar nos intervalos, outro grande sucesso da
temporada. Como o teatro não tinha seu próprio bar e os espetáculos tinham dois
intervalos, a equipe do TECA se encarregou de criar um bar no palco original do
teatro. A inspiração veio do famoso Nick Bar, que existia em São Paulo, ao lado
do TBC, e se transformou em ponto de encontro da gente de teatro. O nome foi
inspirado na primeira peça apresentada no TBC em 1949, The Time of Your Life,
de William Saroyan, dirigida por Adofo Celli, cujo roteiro tem lugar no Nick's Bar,
em San Francisco.
O Iemanjá, com sua decoração tropical e aperitivos especiais, logo se
transformou em ponto de encontro e local de grande movimentação e trocas de
opines sobre as peças. Ao final dos espetáculos, os atores e diretores da
companhia se uniam ao público para se confraternizarem.
Mario Barra, que viria ser o ator mais popular do TECA, não apenas pelo
seu talento, pelo físico e estilo de galã, mas tamm pelo seu jeito despojado e
bonachão de se comportar com todos na cidade, sentava-se ao piano e lembrava
Charles Trenet, atacando sua música preferida: Que reste-t-il de nos amours. Que
reste-t-il de ces beaux jours?
52
Com o passar dos anos, o bar do TECA mudaria até de nome, mas nunca
de importância como elemento agregador do público com os atores.
O diretor Wallace Leal foi entrevistado pelo amigo, então cronista social da
cidade, Ignácio de Loyola Brandão, na edição do jornal O Imparcial do dia 28 de
junho de 1955, em matéria de uma página com o sugestivo título “Valeu a pena”:
DEZ PERGUNTAS DE IGNÁCIO DE LOYOLA.
DEZ RESPOSTAS DE WALLACE LEAL V. RODRIGUES SOBRE O
TEATRO DE ARENA E OUTRAS COISAS.
P – Que impressões teve do primeiro espetáculo social e artisticamente?
R Socialmente esplêndidas. Toda a gente mais fina de Araraquara, numa
verdadeira parada de bom gosto e elegância, estiveram presentes ao nosso
primeiro espetáculo de Arena. Como se tratava de uma pré-estréia, o fato
assumiu singular significação. Afora isso, sentimo-nos cheios de confiança e
de uma compreensível alegria. Artisticamente nos mostramos na linha
padrão que eu estabelecera como um objetivo a ser alcançado. Estio
como diretor dirigindo atores todos estreantes. Previamente estudando as
chances que nhamos, estabeleci um topo x a ser alcançado. E agora faço
Imagem
13
: o
Iemanjá Bar, montado pelo grupo do TECA no Teatro Municipal de Araraquara.
Setembro
de
1956. Acervo: Maria Aparecida Assis.
53
uma confissão, creio que em conjunto ultrapassamos esse topo. Fruto de
muito trabalho, disciplina e amor.
P – Que diz do rendimento dos atores nas três peças?
R Perdoe-me se, de franco, estiver parecendo imodesto, mas creio que o
meu pessoal manteve-se inteiramente a contento. A meu favor, contei
sempre com uma disciplina que garantiu a harmonia de conjunto tão
elogiada pelos entendidos em nosso espetáculo. Muito elogiam-nos pelo fato
de, em generalidade, as interpretações terem se mantido uniformes, cada
ator defendendo firmemente o seu terreno...
P – O que diz dos autores e das peças representadas?
R – Esplêndidos. Mostramos a Araraquara o que de melhor existe em
dramaturgia. E é com imenso orgulho que gostamos de deixar expresso que,
pela primeira vez em toda a América do Sul, nossa cidade assistiu à primeira
representação de dois maravilhosos trabalhos: O Caso das Petúnias
Esmagadas, traduzida especialmente para nós, e Como Ele Mentiu ao
Marido Dela. Muita gente julgava um atrevimento nosso a seleção que
havíamos feito. Todavia, toda a questão está no estudo da peça a ser
apresentada, no estudo das tendências do autor (que justamente estão nas
entrelinhas) e que exigem um conhecimento global do mesmo. Feito isso,
vem a necessidade de transmitir os personagens, a visão interior e exterior
da encenação a ser feita. É extenuante, mas tem de ser feito. Gosto das
peças, e quem não apreciaria os seus grandes autores? E parece-me ainda
que elas compuseram imensamente bem o espetáculo. De marcação lenta,
pesada, oleosa, de Pirandello, evoluímos para a movimentação harmônica e
natural de Williams, terminando na frenética agitação de Shaw, todo ele um
duelo de intenções cortantes e ferinas.
O sucesso foi inesperado, acima de tudo. Em sua primeira experiência com
teatro, recebiam elogios pouco comuns, tanto do público, que os cercava com
carinho, como da imprensa.
A improvisação, no entanto, havia sido a tônica do primeiro espetáculo. A
falta de experiência e a falta de recursos acabaram por tornar tudo um pouco
precário. A começar pelos ingressos, que tiveram que ser vendidos durante o dia
na Casas Texidal, na Rua Padre Duarte, Rua 4, onde Wallace trabalhava junto
com seu cunhado, Sebastião Leal; e também na Mercearia do Sr. Chafih, ao lado
do Teatro, na Avenida Duque de Caxias. À noite, no próprio Teatro Municipal,
quando então os bilheteiros vinham trabalhar.
54
Também as peças, os móveis, os tapetes, foram todos emprestados pelas
famílias dos atores e por amigos. O transporte feito com a camionete da Casas
Texidal e os próprios atores os carregadores.
Esta precariedade, comum ainda nos dias de hoje em companhias
amadoras, iria fazer parte da vida do TECA e determinar, de certa forma, sua
estética. Para os atores e atrizes, no entanto, não chegava a ser um elemento
negativo e desestimulante. Encaravam as dificuldades com jovialidade e espírito
de equipe e lembram-se, ainda hoje, com orgulho das dificuldades vencidas.
Wallace contara com a ajuda do amigo Arthur Batelli na maquiagem,
sempre elogiada, assim como a cenografia de Antonio Auny Leite. Na supervisão
geral, Araken em seu corre-corre pelos bastidores, seguido por Gustavo Trotta. Os
Imagem
14
: Edson Lessi
e
Mario Barra em
O Homem da Flor na Boca
.
Estréia do TECA no
Teatro
Municipal de Araraquara, junho de 1955. Foto: Lucilio Leite. Acervo: Fanny Carati.
55
figurinos sempre seriam a principal preocupação de Wallace, que os desenhara e
fiscalizara a execução. No programa do espetáculo, vê-se o nome de Felipe Luiz
assinando os figurinos, um de seus heterônimos
21
.
A composição dos elencos foi complicada. Wallace conhecia a desenvoltura
de Cidinha (Maria Aparecida Assis), que havia atuado no incompleto Aurora de
uma Cidade e mostrava desenvoltura suficiente nos desfiles de moda dos quais
participava na cidade. Sebastião Campos também havia atuado no filme e era um
amigo intelectual querido. Mario Barra, velho conhecido, foi uma feliz aposta.
Barra era dono de uma personalidade marcante e com dotes humorísticos, mas
colocá-lo no palco como o homem da flor na boca, um papel dramático, foi uma
ousadia de Wallace. Uma ousadia que acabou funcionando bem, Mario Barra foi
ovacionado pelo público.
Muitos anos depois, Barra confessaria ao amigo Ignácio de Loyola Brandão,
em uma viagem de ônibus de Araraquara a São Paulo, que ele tinha certeza que
O Homem da Flor na Boca havia sido o seu melhor papel no TECA. Ainda se
lembrava de trechos inteiros, recitava-os e sonhava revivê-los. Ignácio,
lamentando a morte prematura do amigo, é enfático em seu artigo “Continuemos a
aplaudir o Barra: um personagem de nossa cidade”, publicado no jornal O
Imparcial, de Araraquara, em dezembro de 1996:
Deveríamos todos, seus amigos, os que o conheceram apenas de nome, ter
dado um jeito de levar a ele uma única certeza: de que milhares de pessoas
que viram O Homem da Flor na Boca, naqueles tempos do TECA, nunca
mais o esqueceram. Por aqueles momentos ele merece uma placa, uma
estátua, uma homenagem.
21
Heterônimo: nome imaginário que um criador identifica como o autor de obras suas e que, à diferença do
pseudônimo, designa alguém com qualidades e tenncias marcadamente diferentes das desse criador.
Dicionário Houaiss de Língua Portuguesa. Disponível em http://www.dicionariohouaiss.com.br. Acesso em:
15 out. 2008. Vide Capítulo 6. Bastidores, para maiores detalhes sobre os heterônimos de Wallace.
56
Jovens estudantes araraquarenses, o “compenetrado” Edson Lessi e a
“expressiva Fanny Carati completaram o elenco do Pirandello de forma
consistente. O personagem de Lessi funcionava mais como um contraponto às
falas principais, as mais dramáticas, que ficavam mesmo com o personagem
vivido por Mario Barra. Fanny era “a mulher de negro que permanecia silenciosa
e com uma capa negra, à distância, durante toda a peça
Silenciosa na primeira peça da noite, a “graciosaFanny Carati teria o seu
melhor momento como a puritana Miss Simple em O Caso das Petúnias
Esmagadas. Jayme Maurício Leal, primo de Wallace, tamm foi muito elogiado.
O “nervoso estreante” Sebastião Campos e Maria Aparecida Assis, a aristocrática
escandalizada”, completavam o elenco. Um texto onde Tennessee Williams fala
Imagem
15
: Sebastião Campos
e Fanny Carati
em O Caso das Petúnias Emagadas
. Teatro Municipa
l
de
Araraquara, junho de 1955. Acervo: Fanny Carati.
57
sobre a vida tacanha de uma cidadezinha do interior norte-americano e da eterna
necessidade de liberdade do ser humano
22
.
Para a comédia de Bernard Shaw, Wallace escalou Maria Aparecida Assis
ao lado de outros dois estreantes, o “ardoroso” adolescente Noemio Lerner e
Eugenio Geraldo Casale, o marido traído. Cidinha, discreta na peça anterior, teve
ótimas críticas como a bela e frívola Aurora. Outro grande êxito, um elenco coeso,
fechando a noite com as esperadas gargalhadas
23
.
Não havia na cidade um crítico de teatro profissional, aliás, havia poucos no
país. O que se nas notícias da imprensa, em geral, é muito mais uma crítica de
costumes, impressões sobre os espetáculos, sem um maior aprofundamento
técnico. Vale notar, isto sim, a unanimidade das ótimas avaliações.
Terminada a temporada, tudo voltava à rotina, os atores da companhia,
depois de serem ovacionados no teatro e nas esquinas da cidade durante aqueles
dias, voltavam a ser pessoas normais. Como em qualquer companhia amadora.
Muitos trabalhavam. Wallace na Casas Texidal, Araken na Rádio Cultura,
Sebastião na EFA – Estrada de Ferro Araraquara. Barra e Jayme estudavam
Odontologia, as atrizes todas estudavam.
Ensaios eram realizados apenas aos finais de semana ou em uma noite ou
outra da semana, sempre dependendo do horário de rmino, que todos tinham
compromissos pela manhã.
Terminadas as comemorações, a companhia começava a pensar em seu
novo espetáculo: Uma Mulher do Outro Mundo, de Noël Coward. Havia sido a
primeira sugestão de Wallace ao criarem a companhia, que havia ficado
impressionado com a montagem do TBC, em São Paulo, assistida no ano anterior,
direção de Adolfo Celli, com Tônia Carrero e Paulo Autran no elenco.
22
Os adjetivos entre aspas foram utilizados para descrever os atores nas matérias do jornal O Imparcial.
23
Vide Capítulo 6. Bastidores.
58
2.5 O TBC – Teatro Brasileiro de Comédia
O TBC foi criado em 1948 por Franco Zampari, industrial de origem italiana
radicado em São Paulo. Com um elenco estrelar e com técnicos e diretores
trazidos da Itália, dentre eles Adolfo Celi, Aldo Calvo, Ruggero Jacobbi e Gianni
Ratto, logo se firmou como a principal referência teatral do Brasil.
No princípio, o TBC era apenas um espaço físico, uma antiga garagem na
Rua Major Diogo, 311, transformada em uma pequena sala de espetáculos de 365
lugares. Grupos amadores, dentre eles o Grupo de Teatro Experimental e o Grupo
Universitário de Teatro, o utilizavam de forma regular. Pouco a pouco, com a vinda
dos italianos, uma companhia de teatro tomava forma, uma companhia que iria se
transformar em um divisor de águas na história do teatro brasileiro:
Imagem
16
: Eugenio Geraldo Casale, Noemio Lerner e Maria Aparecida Assis em
Como ele Mentiu ao
Marido Dela.
Teatro Municipal de Araraquara, junho de 1955. Acervo: Maria Aparecida Assis.
59
O trabalho dos amadores paulistas já vinha sendo de primeiríssima ordem
nestes últimos tempos, mas sempre no sentido da maior naturalidade e
discrição possível. Celi modificou ligeiramente tais características, dando ao
elenco do TBC um senso de espetáculo, mais teatralidade, uma tonalidade
mais agressiva e mais viva, de acordo com o caráter da peça. O rendimento
que obteve dos atores neste ponto foi excelente (MAGALDI e VARGAS,
2000, p. 212).
Cacilda Becker foi a primeira atriz contratada como profissional pela
companhia. Outros nomes estelares como Paulo Autran, Sergio Cardoso, Cleyde
Yáconis, Maria Della Costa, Ziembinsky, Walmor Chagas, Tônia Carrero, Antunes
Filho passaram pelo TBC durante os seus 16 anos de existência. Seu repertório
buscava priorizar os grandes textos da dramaturgia universal, mais ainda, “os
textos de valor que tenham possibilidades de bilheteria”, dizia Zampari,
emendando: não se pode imaginar que uma peça escrita em cima do joelho
possa se apresentar no TBC” (MAGALDI e VARGAS, 2000, p. 223)
Muito mais que uma poderosa companhia de teatro, o TBC impôs um
padrão de excelência, foi um empreendimento que trouxe conceitos de estrutura
de espetáculo para o teatro brasileiro, como a formação e o treinamento do ator, a
concepção da encenação, a importância da técnica cênica e, também, um projeto
de uma moderna casa de espetáculos com palco e platéia, marcenaria, arquivo,
guarda-roupa, bilheteria e divulgação.
Em Araraquara, o jornal O Imparcial, de 9 de julho de 1955 noticiava: Noël
Coward entre nós”, estampando uma foto do grupo, na sala da residência de D.
Olga, iniciando as leituras de sua nova empreitada, desta vez “em teatro de caixa”,
abandonando momentaneamente a arena. O tema em si era muito querido de
Wallace, uma história de espiritismo. No original inglês, Blithe Spirit, espírito
brincalhão.
Wallace, assim como toda a sua família, era um espírita fervoroso. Seguia a
religião, freqüentava o Centro Espírita, lia muito, traduzia textos, livros e publicava
com regularidade artigos para o jornal O Clarim e para a Revista Internacional de
Espiritismo. A família tinha uma amizade fraterna com líderes importantes do
60
espiritismo no Brasil, entre eles, com o Dr. Herculano Pires e com o médium Chico
Xavier, a quem visitavam em Uberaba e que os visitava sempre em Araraquara
24
.
Antes de estrearem, no entanto, atenderam a
um convite do Rotary Clube da cidade de Catanduva,
distante 120 Km de Araraquara, para repetirem as
peças de sua primeira série “em teatro de arena”, nos
dias 29 e 30 de outubro, no Tênis Clube local.
O jornal O Imparcial noticiava tamm um
convite para uma apresentação da companhia no
distrito de Tamoio, em Araraquara, onde a família
Morganti tinha sua residência. Tudo nos leva a crer
que esta apresentação o foi realizada. Os
entrevistados não se recordam desta apresentação,
apenas da realizada no ano seguinte, 1956, na
residência da família Morganti, em Araraquara.
Os espetáculos de Catanduva tiveram a mesma
configuração e as mesmas fichas técnicas dos
espetáculos de Araraquara:
24
Vide Capítulo 6. Bastidores.
Imagem
17
: Fanny Carati
como Miss Simple. O Caso
das Petúnias Esmagadas.
Teatro Municipal de
Araraquara, junho de 1955.
Acervo: Fanny Carati.
61
O Homem da Flor na Boca
O Caso das Petúnias Esmagadas
Como Ele Mentiu ao Marido Dela
FICHAS TÉCNICAS
Nome da peça
O Homem da Flor na Boca L'uomo dal fiore in bocca
Autor Luigi Pirandello (1867-1936) Itália
Gênero Drama em 1 ato
Ano de montagem 1955
Freguês pacato Edson Lessi
O Homem da Flor na Boca Mario Barra
Personagem/ Ator,
por ordem de
entrada em cena
A mulher Fanny Carati
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Cenários Antonio Auny Leite
Figurinos Felipe Luiz (heterônimo de Wallace), executados por Ida Darlan
Maquiagem Arthur Batelli
Produção Araken de Toledo Pires, Wallace Leal V. Rodrigues e Antonio Auny Leite
Supervisão Geral Araken de Toledo Pires
Obs Montada “em teatro de arena”
Nome da peça
O Caso das Petúnias Esmagadas The Case of the Crushed Petunias
Autor Tennessee Williams (1911-1983) EUA
Gênero Fantasia lírica
Ano de montagem 1955
Dorothy Simple Fanny Carati
Guarda Jayme Maurício Leal
O jovem Sebastião Campos
Personagem/ Ator,
por ordem de
entrada em cena
Miss Dull Maria Aparecida Assis
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Cenários Antonio Auny Leite
Figurinos Felipe Luiz (heterônimo de Wallace), executados por Ida Darlan
Maquiagem Arthur Batelli
62
Produção Araken de Toledo Pires, Wallace Leal V. Rodrigues e Antonio Auny Leite
Supervisão Geral Araken de Toledo Pires
Obs Montada “em teatro de arena”
Nome da peça
Como ele Mentiu ao Marido Dela How He Lied to Her Husband
Autor George Bernard Shaw (1856-1950) Irlanda
Gênero Comédia
Ano de montagem 1955
Ele Noemio Lerner
Ela Maria Aparecida Assis
Personagem/ Ator,
por ordem de
entrada em cena
O Marido Eugenio Geraldo Casale
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Cenários Antonio Auny Leite
Figurinos Felipe Luiz (heterônimo de Wallace), executados por Ida Darlan
Maquiagem Arthur Batelli
Produção Araken de Toledo Pires, Wallace Leal V. Rodrigues e Antonio Auny Leite
Supervisão Geral Araken de Toledo Pires
Tradução Edgar Cavalheiro
Obs Montada “em teatro de arena”
Fonte: programa do espetáculo.
A viagem para Catanduva, que envolveria dois pernoites fora de casa,
incluiu os novos atores da companhia que, entre um espetáculo e outro,
aproveitaram e fizeram um improvisado ensaio geral aberto ao público de Uma
Mulher do Outro Mundo, no Catanduva nis Clube. Viajaram, portanto, com
quatro peças ensaiadas. A pequena nota descrevendo a viagem da confiante
comitiva do TECA pelo jornal O Imparcial, de 29 de outubro de 1955, é aqui
reproduzida:
A COMITIVA
Em automóvel, seguem Araken de Toledo Pires, chefe, Noemio Lerner,
Eugenio Geraldo Casale, Francisco A.P.S. Peixoto e Mario Barra, em carro
do acadêmico Melchior, que acompanhará a delegação.
63
Pelo trem das 13h30 da E.F.A. seguirão Sebastião de Campos, chefe,
Wallace Leal Rodrigues, Arthur Batelli, Antonio Reis Silva, Edson Lessi,
Fanny Carati, Maria Aparecida Assis, Ediméa Zuchini e Sra. Carati.
Percebe-se a preocupação de Wallace Leal com viagens da companhia, o
que ficará mais bem evidenciada na viagem ao Rio de Janeiro, em agosto de
1957. Ele designava chefes, distribuía responsabilidades e insistia em levar
algumas mães das jovens atrizes. A mãe de Fanny, a Sra. Carati, acompanhou a
comitiva. Com tudo isso, a viagem e os espetáculos em Catanduva foram um
sucesso, detalhados pelo colunista Ignácio de Loyola Brandão, que acompanhou a
tournée. Para que não restasse qualquer dúvida sobre o “recato” da viagem, todos
ficaram hospedados em residências de rotaryanos; Fanny e a mãe, inclusive, na
casa do próprio Prefeito da cidade
25
.
2.6 Uma Mulher do outro Mundo
Alguns dias depois, de volta a Araraquara, anunciava-se a segunda
temporada do ano, a montagem, pela primeira vez “em teatro de caixa”, de Uma
Mulher do Outro Mundo. A estréia deu-se a 11 de novembro de 1955, sexta-feira
feira, às 20h, no Teatro Municipal de Araraquara. Foram realizados apenas quatro
espetáculos: dias 11, 13, 14 e 15 de novembro:
25
Entrevista com Fanny Carati.
64
Uma Mulher do Outro Mundo
FICHA TÉCNICA
Nome da peça
Uma Mulher do Outro Mundo Blithe Spirit
Autor Noël Coward (1899-1973) Inglaterra
Gênero Comédia em 3 atos e 7 quadros
Ano de montagem 1955
Ruth Condomine Maria Aparecida Assis
Edith Ediméa Zuchini
Carlos Condomine Sebastião Campos
Dr. Bradman Tito Peixoto
Sra. Bradman Clementina Bonazzi
Sr. Arcati Mario Barra
Personagem/ Ator,
por ordem de
entrada em cena
Elvira Fanny Carati
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Produção Araken de Toledo Pires
Assistente de
direção
Antonio Reis da Silva
Cenários Diego de Vega (heterônimo de Wallace)
Figurinos Felipe Luiz (heterônimo de Wallace), executados por Cleyde Picolli
Tradução Carlos Lage
Obs Montada “em teatro de caixa
Fonte: programa do espetáculo.
O segundo programa traria a ficha técnica do TECA com mais nomes:
Teatro Experimental de Comédias de Araraquara
Presidente de Honra Olga Ferreira Campos
Superintendente Araken de Toledo Pires
Diretor Admiistrativo Gustavo Trotta
Tesoureiro Geral Sebastião Campos
Tesoureiro Auxiliar Fanny Carati
Ensaiador Permanente Wallace Leal V. Rodrigues
65
Cia. Permanente do TECA
Srtas. Fanny Carati, Maria Aparecida Assis, Ediméa Zuchini e Clementina Bonazzi
Srs. Edson Lessi, Eugenio Geraldo Casale, Jayme Maurício Leal, Mario Barra, Noemio Lerner,
Sebastião Campos e Tito Peixoto
Cenógrafo
Antonio Auny Leite e Diogo De Vega
(heterônimo de Wallace)
Figurinista Felipe Luiz (heterônimo de Wallace)
Maquiagem Arthur Batelli
Fonte: programa do espetáculo.
A história da peça é
bastante divertida, a mulher do
outro mundo do título é o espírito
da primeira esposa do Sr.
Condomine (Sebastião Campos),
que volta ao mundo dos vivos
para atrapalhar sua vida com a
nova esposa (Maria Aparecida
Assis). Tudo conduzido com
extravagância por um
“portentoso” Mario Barra vivendo
um médium atrapalhado (uma
mulher no texto original) e por
uma “atarantada criadinha”, papel
que caberia à jovem estreante,
Edméia Zuchini, bastante
aplaudida pelo público e elogiada
pela crítica
26
.
No elenco, Fanny Carati
fazia uma vivaz” mulher do outro mundo, enquanto os estreantes Tito Peixoto e
26
Os adjetivos entre aspas foram utilizados para descrever os atores nas matérias do jornal O Imparcial.
Imagem
18
:
E
diméia Zuchini
assusta
-
se com o espírito de
Fanny Carati em foto-montagem de Uma Mulher do Outro
Mundo
. Teatro Municipal de Araraquara, novembro de 1955.
Foto-montagem: Lucilio Leite. Acervo: Ediméia Zuchini.
66
Clementina Bonazzi, apesar de nervosos, não decepcionaram no papel do casal
amigo dos Condomine.
O jornal O Imparcial destacou o sucesso da nova temporada com os
seguintes adjetivos: “magistral”, “estupenda”, exitosa”, portentosa”,
“extraordinária”, “irrepreensível”, grandiosa”, magnífica”. Sem dúvida, a primeira
experiência da companhia “em teatro de caixa” havia sido um sucesso.
Mais uma vez as colunas sociais noticiavam a sociedade local, presente
aos espetáculos e ao Iemanjá Bar, “com seus motivos praieiros”. O jornalista
Almeida Santos, sob o pseudônimo de Mara Koojah, atestava no jornal O
Imparcial do dia 13 de novembro, a grande estréia. Os elegantes locais que
ocupavam as frisas eram citados com nome, sobrenome e descrição do que
vestiam.
Uma estréia do Teatro Experimental constitui sempre um acontecimento
social. Nossa gente bem comparece. A noite de estréia é deles. Desfilam as
finas toiletes, os perfumes custosos, as jóias finas e as mais elegantes. De
uns tempos para cá, a cidade vem sendo marcada pela finura e elegância
dos acontecimentos sociais.
A nota cômica da temporada ficou por conta do jornalista Th. Dias Jr., que,
assumindo ares de crítico profissional de teatro, comentou assim a atuação de
Sebastião Campos na edição de 22 de novembro de O Imparcial: “Só não são
cowardianas as atitudes basculantes da cabeça e a solene ptose palpebral
meditada
27
.
Ninguém entendeu nada daquilo, o que foi motivo de brincadeiras dentro do
grupo por semanas. Até hoje, Sebastião não sabe o que o crítico quis dizer, mas
não esqueceu a frase que repete em sonoras gargalhadas:ptose palpebral
meditada!
28
.
27
Ptose palpebral: queda da pálpebra superior devido a desenvolvimento deficiente ou paralisia do músculo.
Medical Doctor Dictionary. Disponível em: http://www.medicaldoctordictionary.com/portuguese. Acesso em:
12 out. 2008.
28
Entrevista com Sebastião Campos.
67
Ao final do mesmo artigo, no entanto, o novo crítico da cidade se rende à
qualidade do espetáculo, mas ainda dentro de seu estilo peculiar:
Essas observações, não as faço na sublimação crítica de deficiências
próprias, que a inveja do inatingido suscitaria, senão no mais puro sentido
construtivo, augurando ao TECA messe cada vez mais exitosa e promissora.
Se me permitem a repetição, o “E” do TECA pode ser mantido por
razão eufônica, porque artisticamente foi grandemente superado o
“experimental”.
Em meio a pedidos para a repetição da primeira série de espetáculos “em
teatro de arena”, a imprensa destacava, com certo orgulho, o custo da nova
produção do TECA. O guarda-roupa foi orçado em Cr$ 30.000,00 (trinta mil
cruzeiros), a mesma quantia para cenários e outros materiais, móveis etc. “É muito
dinheiro, mas para apresentar ao culto povo araraquarense, tem que ser um
espetáculo grandioso”, atestava o jornal.
Algumas semanas depois, no entanto, logo após os espetáculos, e sob o
sugestivo título “Compreensão”, o mesmo jornal ostentava uma foto de Araken de
Toledo Pires com o cenho franzido e alertava a seus leitores que, apesar do
sucesso de público e crítica, o espetáculo havia dado prejuízo à companhia. Como
solução, ele pedia a compreensão do público, e anunciava que seria repetida em
breve, a pedidos, a primeira série de espetáculos em teatro de arena”.
Araken acabaria não conseguindo cumprir sua promessa; no ano seguinte
as peças montadas foram todas inéditas. Somente em 1957 a companhia foi
capaz de repetir uma série de espetáculos.
As primeiras críticas às condições físicas do Teatro Municipal começam a
aparecer na imprensa nesse momento: O nosso vetusto e querido Teatro
Municipal”. “As cadeiras. Ah, o velho problema do Municipal”, mostrando a falta de
manutenção do casarão da Esplanada das Rosas.
68
O primeiro ano chegava ao fim com dois grandes momentos de sucesso
para a companhia em Araraquara, uma ótima viagem a Catanduva, muita alegria e
entusiasmo. As finanças, no entanto, ainda eram um problema, os recursos para o
filme teriam que esperar.
2.7 Segunda série de espetáculos
O ano de 1956 traria mudanças no elenco do TECA e grandes mudanças
no cenário político do Brasil.
Juscelino Kubitschek assumia a Presidência. Eleito no final de 1955 pela
aliança PSD-PTB, o popular e simpático JK faria um governo inovador e traria um
Imagem
19
:
E
d
i
méia
Zuchini (de costas)
,
Mario
Barra, Sebastião
Campos
,
Maria Aparecida Assis
e
Tito
Peixoto observam o espírito de Fanny Carati em foto-montagem de Uma Mulher do Outro Mundo. Teatro
Municipal de Araraquara, novembro de 1955. Foto-montagem: Lucilio Leite. Acervo: Maria Aparecida
Assis.
69
clima de confiança para o país. Durante o seu governo, até 1961, o Brasil viveu
um período de avanço econômico e estabilidade política até então nunca vistos.
JK foi o responsável pela construção de Brasília e por promover um grande
desenvolvimento no interior do país.
Essa onda de otimismo que tomou conta do país tinha sua boa dose de
sustentação no governo do Estado de São Paulo, exercido desde 1955 pelo futuro
Presidente, nio Quadros. Jânio ficaria no poder do governo paulista até 1959.
Apesar do estilo controverso e da vitória apertada nas urnas contra seu rival
Ademar de Barros, logo ganhou grande popularidade, pautando o seu estilo pela
moralização da administração pública e por grandes obras.
O Brasil começava a viver um período de intenso otimismo e de um grande
empreendedorismo. Tudo estava para ser feito, tudo estava para ser construído.
Os serviços blicos nas cidades, saúde, educação, saneamento básico,
transporte, precisavam ser melhorados. Pontes, viadutos, estradas, escolas,
postos de saúde eram construídos. O que era velho já não servia, o novo
precisava ser feito, ser construído.
Uma mentalidade que ainda iria custar muito caro ao velho Teatro
Municipal, o casarão da Esplanada das Rosas.
Mudanças no Brasil, mudanças no elenco. A pequenina Fanny Carati
deixava a companhia para se casar; seu namorado e futuro marido, que estudava
Odontologia na cidade, havia se formado, tendo que voltar a São Paulo. Ela, que
tantos suspiros havia arrancado dos fãs em Araraquara e em Catanduva, como
Miss Simple e como Elvira, iria abandonar os palcos. Histórias comuns em uma
companhia de teatro amador
29
.
Novas atrizes e atores foram incorporados em 1956, o TECA começava a
fazer sucesso com a juventude da cidade. Alice de Oliveira, aluna do curso
Normal, J. B. Aranha, Moacyr Marchese e Aldemir Mussi. Além de Julia Abrahão,
29
Entrevista com Fanny Carati.
70
já conhecida dos araraquarenses por suas interpretações no rádio teatro da PRD-
4. Julia, além de grande atriz, tinha um vozeirão que encantava a todos e foi uma
ótima aquisição, permanecendo com a companhia até o final
30
.
Para a nova temporada, a produção dos cenários e figurinos seria
complicada. Ainda mais depois de um ano sem grandes resultados financeiros. O
texto de Anton Chekhov, Um Pedido de Casamento, principalmente, exigia, pela
primeira vez, roupas e mobiliário de época. Por isso, o aviso abaixo, na coluna
“Coisas da Cidade”, de 17 de maio de 1956, assinado pelo colunista Ignácio de
Loyola Brandão, veio em boa hora:
Um aviso que é um pedido: para servir de modelo, a direção do TECA es
necessitando de um espartilho. Uma cartola também es sendo um
pequeno problema. Se houver algum disposto a conseguir uma dessas
peças, dirija-se ao colunista ou ao Araken.
Araken, apesar de preocupado, ao invés de repetir a temporada do ano
anterior, muito mais barata, anunciava novos títulos, e mais custosos. Wallace
havia conseguido convencê-lo, tinha um jeito todo especial de lidar com ele que,
por sua vez, nunca havia sido uma pessoa impositiva. Eram amigos, antes de
mais nada.
O contraponto, o diálogo entre a área administrativa e a artística é o ponto
nevrálgico de qualquer atividade cultural. Deste embate, sadio sob todos os
aspectos, é que nasce a coesão do grupo, os objetivos comuns e as chances para
o sucesso. Com o TECA não poderia ser diferente.
Os jornais anunciavam a nova série de espetáculos, a segunda “em teatro
de arena”. Os ingressos estavam à venda, desta vez, além dos pontos
habituais, tamm na Rádio Cultura, com o sempre presente Araken. A estréia,
marcada para quinta-feira, dia 24 de maio de 1956, tinha as seguintes peças:
30
Segundo Julia Abrahão, o teleteatro na Rádio Cultura já começava a decair um pouco nesta época.
Entrevista com Julia Abrahão.
71
A Mão do Macaco
Um Pedido de Casamento
Se os Homens Jogassem Cartas como as Mulheres
FICHAS TÉCNICAS
Nome da peça
A Mão do Macaco The Monkey's Paw
Autor William W. Jacobs (1863-1943) Inglaterra
Gênero Conto
Ano de montagem 1956
Mr. White Mario Barra
Alberto Eugenio Geraldo Casale
Mrs. White Julia Abrahão
Sargento Morris Edson Lessi
Personagem/ Ator
Mr. Sampson Jayme Maurício Leal
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Tradução Madalena Nicol
Obs Montada “em teatro de arena”
Nome da peça
Um Pedido de Casamento The Proposal
Autor Anton Chekhov (1860-1904) Rússia
Gênero Comédia em 1 ato
Ano de montagem 1956
Giusicov Mario Barra
Lomov Sebastião Campos
Personagem/ Ator
Natalia Stepanova Alice de Oliveira
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Tradução Leonid Timochenko
Obs Montada “em teatro de arena”
72
Nome da peça
Se os Homens Jogasse Cartas como as
Mulheres
If Men Played Cards as Women
Do
Autor George S. Kaufman (1889-1961) EUA
Gênero Comédia
Ano de montagem 1956
John Moacyr Marchese
Bob Oscar Rodrigues
George Tito Peixoto
Personagem/ Ator
Marc Gerson Ferreira
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Tradução Wallace Leal V. Rodrigue
Obs Montada “em teatro de arena”
Fonte: jornal O Imparcial e entrevistas.
Nos ensaios, Wallace exigia o máximo de seus novos atores, “simples e
ativos, otimistas, francos e exuberantes de vida”. O resultado o animava, a
principal preocupação era o texto de Chekhov. Sabia que Mario Barra e Sebastião
Campos seriam exigidos ao máximo, tinham falas complicadas e muita briga em
cena, mas tinha confiança em sua melhor dupla de atores. Sabia, acima de tudo,
que aquela peça teria que ser bem feita, com qualidade, senão tudo ficaria com
um ar muito pobre e, pior, provinciano.
O ambiente russo foi criado por Aldemir Mussi, estreante da companhia e
aluno da Escola de Belas Artes local. Os figurinos russos foram criados, outra vez,
pelo próprio Wallace, apesar de assinados por seu heterônimo, Felipe Luiz,
“também elemento da terra”, como queria fazer crer o repórter Mara Koojah na
edição de 5 de maio de 1956 do jornal O Imparcial.
E a responsabilidade ficava maior a cada dia, agora agravada com a notícia
de que José Renato, o respeitado diretor do Teatro de Arena de São Paulo e
colunista dos jornais O Estado de S.Paulo e Diário de São Paulo, viria assistir aos
espetáculos, a convite do próprio Wallace.
73
A imprensa noticiava a nova temporada com um destaque até então nunca
visto. Páginas inteiras, como esta:
Imagem
20
:
j
ornal
O
Imparcial
de 5 de maio de
1956 mostrando os atores de
Um Pedido de Casamento.
Reportagens de igual
tamanho, com fotos de
Furquim, sairiam nos dias
seguintes, sobre os outros
dois textos a serem
montados. Foto:
Viviane Cristina Pinto.
74
As peças escolhidas formavam um conjunto talvez mais harmonioso que a
primeira rie, em 1955. A comar pelo conto de W. W. Jacobs, A Mão do
Macaco, hoje um dos textos obrigatórios em qualquer antologia das melhores
histórias sobrenaturais, um clássico do conto de terror. A mão do macaco (garra,
no original inglês) é um amuleto africano que acaba sendo usado de forma
equivocada pela Sra. White, com resultados terríveis para seu próprio filho. Mais
uma vez o tema preferido de Wallace, o mundo espiritual, reaparece
31
.
O conto de Jacobs seria a primeira experiência de Wallace na adaptação de
um texto literário para o teatro. Outros se seguiriam, dentre eles, Um Drama na
Malásia, conto de Somerset Maugham; Enganado, Espancado e Satisfeito, uma
das novelas do Decamerão, de Boccaccio e De Ratos e Homens, de Steinbeck.
Um Pedido de Casamento nos remete aos melhores textos de Chekhov, um
dos mestres do conto moderno que, com inteligência, acaba criando situações
inusitadas sobre enredos simples. Um singelo e esperado pedido de casamento
acaba se transformando em uma guerra verbal, quase física, entre o pretendente
e o pai da noiva, envolvendo até a própria. Ao final, tudo acaba bem.
Por fim, a peça de George S. Kaufman, Se os Homens Jogassem Cartas
como as Mulheres, tem a leveza dos demais textos do escritor, bem ao estilo de
seus grandes sucessos da Broadway, e trata de uma das atividades favoritas do
ser humano: falar da vida alheia. Os quatro homens se comportam de forma
bastante feminina enquanto jogam cartas.
O visitante José Renato, entrevistado ao final do espetáculo pelo jornal O
Imparcial de 30 de maio, dedicou aplausos calorosos”, declarando-se
maravilhado com a montagem e propôs emprestar os figurinos de sua produção
do Teatro de Arena de Escola de Maridos, de Moliére, para ser montado pelo
TECA. Uma parceria que acabou não se viabilizando.
31
Vide Capítulo 6. Bastidores.
75
José Renato ainda hoje se lembra da visita, do repertório corajoso, da
qualidade dos espetáculos e dos “detalhes que eram tão bem cuidados”
32
.
A segunda série de espetáculos “em teatro de arena” teve, portanto, seis
espetáculos, de 24, quinta-feira, a 29 de maio de 1956, terça-feira, todos no Teatro
Municipal. A novidade foi que o último espetáculo, do dia 29, foi a preços
populares. As montagens de 1955 tiveram apenas quatro apresentações cada.
Outra novidade da temporada foi a melhora substancial no palco da arena,
o tablado montado no centro da platéia tinha agora um “chapéu”
33
delimitando o
32
Entrevista com José Renato Pécora.
33
Vide Imagem 23.
Imagem
21
: Wallace Leal V. Rodrigues,
Iglá
Aiévoli, José Renato e Araken de
Toledo Pires. Araraquara,
maio de 1956. Acervo: Wallace Leal V. Rodrigues.
76
espaço, com direito a luzes mais focadas nos atores, tudo providenciado pelo hábil
Iglá Aiévoli, “com acessórios e materiais elétricos da Rádio Elétrica Geral e Oficina
N.S. Aparecida”.
O jornal O Imparcial nos dá a sua habitual cobertura carregada de
superlativos: Começou corajosamente”, “Teca, e sempre Teca” “Magistral a
estréia do Teatro de Arena, “E os espetáculos corresponderam”.
Os estreantes e os veteranos foram muito bem avaliados, sem nenhuma
crítica negativa, todos notando uma clara evolução na qualidade das
interpretações. Mas algumas matérias são bastante saborosas. Vale a pena
reproduzir a coluna “Coisas da Cidade”, do jornal O Imparcial, de 27 de maio de
1956, assinada por Ignácio de Loyola Brandão, para uma noite de estréia do
TECA, omitindo-se as dezenas de nomes de personalidades citadas:
UMA ESTRÉIA NO VELHO MUNICIPAL.
O austero casarão da Rua São Bento abrigou na noite de quinta-feira nossa
gente bem que ali compareceu para a estréia do Teatro de Arena.
Noite de elegância. A temperatura fria favoreceu para a exibição de belas
peles. Toiletes finas desfilando. Aos poucos o teatro perde suas cadeiras
vazias. Lotação completa quando apagam-se as luzes para o início do
espetáculo
A Mão do Macaco provoca frisson na platéia. Eugenio, Julia, Edson e Barra,
na Arena, prendem a atenção do público. Cada um dá o máximo de si. E o
bom êxito da peça é coroado com os aplausos longos e agradecido dos
assistentes.
“L’Hermitage” é o bar. Tranqüilo e acolhedor como as velhas hospedarias da
boa Inglaterra ou França. Um piano, por vezes melancólico, constrói o
ambiente.
E o pessoal circulando, bebericando, conversando. Comenta-se a peça,
cumprimenta-se o diretor. As mesas são tomadas...
Muitas srtas. presentes. Sempre o ar novo e alegre de uma nova geração...
Início do O Pedido de Casamento. Sebastião, Barra e Alice se movimentam
bem na divertida farsa. No fim da peça, Maria Lucia Galvão sobe à Arena e
entrega a Alice uma corbeille de flores; aliás, Julia Abrahão, no término de
sua peça, também recebera uma das mãos de Maria da Gloria Sampaio.
Enquanto os cenários vão sendo mudados, vamos anotando os presentes...
Vamos para o bar. Com a especial laranjada nas mãos circulamos para
anotar. Sr. e Sra....
Início de Se os Homens Jogassem Cartas como as Mulheres. Fino e
especial o seu conteúdo e especialmente dirigido às mulheres que, por sinal,
gostaram. Ao redor da Arena estavam Sr. ...
Depois do espetáculo, disse-nos o crocodilo, reuniram-se algumas pessoas
na frente do teatro, e o assunto foi um pouco da vida alheia. Isto muito
77
naturalmente, até que chegou alguém e perguntou: Jogando cartas? O
grupo dissolveu-se.
O “L’Hermitage” acolhedor ficou aberto até altas horas. Muitos ali ficaram
tendo ainda presente a magnífica impressão do espetáculo apresentado.
Gente fumando na platéia do Teatro durante o espetáculo, isso sim é um
comportamento passível de crítica, segundo o repórter J.C. Nantes:
Não sabemos se a evolução, atingindo tamm as regras de etiqueta social,
permite comportamento diferente como nos quiseram fazer acreditar, na
noite de domingo, alguns cidadãos (inclusive numa frisa) com exibições de
seus fumarentos cigarros.
O nome do bar, passando de Iemanjá Bar para L’Hermitage provocou
revolta: Era o estrangeirismo, neste caso, absolutamente indispensável?”.
Em meio aos elogios às peças, o Teatro Municipal voltava a ser criticado
em artigo assinado por Sandra, no O Imparcial de 29 de maio:
Imagem
22
:
Gerson Ferreira, à esquerda e Tito Peixoto em
Se os Homens Jogassem Cartas como as
Mulheres
. Teatro Municipal de Araraquara, maio de 1956. Acervo: Gerson Ferreira.
78
O velho Teatro, tão mal agasalhado no gibão gasto de suas paredes nuas,
sentiu-se retemperado pelo calor do entusiasmo de uma platéia seletíssima
que cobriu de aplausos os figurantes das três peças apresentadas.
Não faltou nada na cobertura da primeira temporada do ano, nem aquela
tradicional matéria, assinada por Mara Koojah, falando dos compromissos
financeiros do TECA, desta vez intitulada “Equilíbrio Orçamentário”.
Não faltou nem o reconhecimento oficial da cidade. Isto veio em forma de
um ofício datado de 4 de junho de 1956, assinado pelo Presidente da mara
Municipal da cidade, Dr. Pedro Marão, endereçado a Wallace Leal Valentim
Rodrigues, digno e honrado ensaiador permanente do TECA, aprovando a
proposta do Vereador Hermínio Pagotto, requerimento número 323/56, e
“apresentando-lhe sinceras congratulações pela segunda temporada de
espetáculos em Arena”. E concluía o documento:
O Teatro Experimental de Comédia de Araraquara marca uma nova e
retumbante era na vida artística desta cidade, com a merecida acolhida que
lhe deu o povo, numa demonstração sincera, que aliás, peculiar aos
araraquarenses em tributarem méritos àqueles que se fazem merecedores,
pelo trabalho, pela luta e pelo ideal.
2.8 Terceira série de espetáculos
Oficialmente parabenizados, a ordem agora era falar dos novos
espetáculos. em 9 de junho, a imprensa noticiava a temporada de agosto. A
terceira série de espetáculos “em teatro de arena” seria:
79
Um Drama na Malásia
O Protocolo
Os Dois Faladores
FICHAS TÉCNICAS
Nome da peça
Um Drama na Malásia Before the Party
Autor Somerset Maugham (1874-1965) Inglaterra
Gênero Conto
Ano de montagem 1956
Kathleen Lygia Fabiano
Millicent Ruth Magali Miranda
Mrs. Skinner Ivete Alves Costa
Mr. Skinner Edson Lessi
Personagem/ Ator
A Criada Ediméa Zuchini
Produção Araken de Toledo Pires
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Assistente de
direção
Mario Barra
Cenografia Diego de Vega (heterônimo de Wallace), executada por Iglá Aiévoli
Maquiagem Arthur Batelli e Leda de Oliveira Pinto
Figurinos Felipe Luiz (heterônimo de Wallace)
Sonoplastia Alekan (heterônimo de Araken)
Iluminação Toni R. Martinez
Acessórios e
materiais elétricos
Oficina N.S.Aparecida
Obs Montada “em teatro de arena”
Nome da peça
O Protocolo
Autor Machado de Assis (1839-1908) Brasil
Gênero Comédia em 1 ato
Ano de montagem 1956
Elisa Maria Aparecida Assis Personagem/ Ator
Venâncio Alves Sebastião Campos
80
Sr. Pinheiro Tito Peixoto
Lulu Alice de Oliveira
Produção Araken de Toledo Pires
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Assistente de
direção
Mario Barra
Cenografia Diego de Vega (heterônimo de Wallace), executada por Iglá Aiévoli
Maquiagem Arthur Batelli e Leda de Oliveira Pinto
Figurinos
Felipe Luiz (heterônimo de Wallace). Vestidos de Maria Aparecida Assis e
Alice de Oliveira executados por Amélia Ferreira. Guarda-roupa masculino por
Lucilio Leite.
Sonoplastia Alekan (heterônimo de Araken)
Iluminação Toni R. Martinez
Acessórios e
materiais elétricos
Oficina N.S.Aparecida
Obs Montada “em teatro de arena”
Nome da peça
Os Dois Faladores Los Habladores
Autor Miguel de Cervantes (1547-1616) Espanha
Gênero Entremez
Ano de montagem 1956
Roldan Mario Barra
Sarmiento Moacyr Marchese
Transeunte Edson Lessi
Homem da Lei Sebastião Campos
Homem da Lei Oscar Rodrigues
Homem da Lei Everton Aiévoli
Beatriz Julia Abrahão
Inês Maria Cristina Moura
1a. Dama Alice de Oliveira
Personagem/ Ator
2a. Dama Clélia Miari
Produção Araken de Toledo Pires
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Assistente de
direção
Mario Barra
Cenografia Diego de Vega (heterônimo de Wallace), executada por Iglá Aiévoli
81
Maquiagem Arthur Batelli e Leda de Oliveira Pinto
Figurinos Felipe Luiz (heterônimo de Wallace). Trajes executados por Amélia Ferreira.
Sonoplastia Alekan (heterônimo de Araken)
Iluminação Toni R. Martinez
Mestre de armas Tito Peixoto
Acessórios e
materiais elétricos
Oficina N.S.Aparecida
Obs Montada “em teatro de arena”
Fonte: programa do espetáculo.
Nesse primeiro momento, Um Drama na Malásia foi anunciado na imprensa
como Antes da Festa, que o título original em ings é Before the Party; mas
Wallace resolveu utilizar-se de outro nome que julgava mais atrativo para o
espetáculo, aproveitando o local exótico da ação
34
. Esta seria uma longa
temporada, com dez apresentações. A estia foi a 31 de agosto, ainda dentro do
mês de aniversário da cidade, comemorado a 22 de agosto, ficando em cartaz até
o dia 9 de setembro de 1956.
Pela primeira vez a companhia teria problemas com o local para os ensaios
da temporada. O Municipal estava ocupado com uma exposição fotográfica
promovida pelo Cine-Foto-Clube Aracoara e, apesar da boa vontade de todos, a
solução foi mesmo procurar locais alternativos que acabaram sendo cedidos, os
salões do Clube 27 de Outubro e do Clube 22 de Agosto.
Em meio aos preparativos, a imprensa noticiava que Wallace havia sido
convidado para dirigir a companhia de teatro amador de Lotte-Sievers, que se
exibia no Teatro Leopoldo Fróes, em São Paulo. O convite foi recusado pelo
diretor, uma atitude vista como “um desafogo e uma satisfação honrosa para
Araraquara artística, o gesto de Wallace e o convite recebido”.
34
Somerset Maugham tem em sua bibliografia um romance chamado The Narrow Corner, cujo título foi
traduzido em português para Um Drama na Malásia. No entanto, o texto montado pelo TECA foi Before the
Party, que é hoje conhecido pelo tulo Antes da Festa.
82
O problema com o local dos ensaios acabou dando ensejo a se falar na
construção de um teatro para o TECA, a cidade precisava de um teatro moderno
em contraponto ao “nosso vetusto e querido Teatro Municipal”.
O jornalista Almeida Santos, sob o pseudônimo de Mara Koojah, informava
os detalhes das produções nas edições do jornal O Imparcial durante o mês de
julho. A ambientação e guarda-roupas eram caríssimos: Cr$ 35 mil por O
Protocolo e Os Dois Faladores, mais Cr$ 8 mil por Um Drama na Malásia.
O figurino de O Protocolo, era uma grande preocupação de Wallace Leal “e
de seu figurinista” (o próprio Wallace, diga-se de passagem). Lucilio Leite, o
Imagem
23
:
Ivete Alves Costa, Lygia Fabiano, Edson L
essi e Ruth Magali Miranda em
Um Drama na
Malásia
. Teatro Municipal de Araraquara, agosto de 1956. Acervo: Gerson Ferreira.
83
atarefado alfaiate local, foi também acionado e, num gesto de fidalguia e
compreensão”, executara os figurinos de Sebastião e Tito. as atrizes,
”espartilhadas, trazendo anquinhas, refolhos e camafeus, Aparecida e Alice
tornaram-se encantadoras figuras de quadros antigos”.
Lembra ainda o artigo de O Imparcial que para O Protocolo “nem o pince-
nez foi esquecido, e ainda uma bela marqueza gentilmente cedida por Dna. Sinhá
Fortes Vaz”. O mobiliário Luiz Felipe pertencia “à Dna. Ninira Medina e os
lampiões e os móveis Império à Dna. Cecy Rodrigues Silva”. Estas duas últimas
senhoras eram irmãs de Wallace.
Para Um Drama na Malásia
o repórter, que assistiu aos
ensaios, destaca os sucessivos
véus que vão paulatinamente
caindo e desvendando aos olhos
do espectador uma história rude e
brutal que enche de horror uma
família inglesa antes de uma
festa”. Nesta peça estrearam Ruth
Magali Miranda, Lygia Fabiano e
Ivete Alves Costa.
A peça de Cervantes, Os
Dois Faladores, é uma comédia,
na verdade, um entremez
35
, um
gênero com canto e dança.
Percorrendo os ensaios de Os
35
Entremez: nos banquetes da Idade Média, entre um prato e outro, eram apresentados alguns números
micos, que posteriormente deram origem a uma pequena comédia em tom burlesco, principalmente na
Península Ibérica, onde o gênero se desenvolveu a partir do século XVI (GUINSBURG, FARIA e LIMA,
2006, p. 131).
Imagem
24
: Maria Aparecida Assis e Sebastião Campos em
O Protocolo. Teatro Municipal de Araraquara, agosto de
1956. Acervo: Maria Aparecida Assis.
84
Dois Faladores, a reportagem de O Imparcial destaca que jograis seriam
executados com música de Leonardo da Vinci e que a luta de esgrima e a
coreografia das furlanas
36
que Alice dançava em uma cena, estavam perfeitas.
Uma roca antiqüíssima, inexistente em Araraquara, foi obtida em Igarapava para
uma pequena cena em que Julia fiava. Uma lâmpada a óleo do século XVI,
descoberta em Ouro Preto por esses moços extraordinários que, como formigas
ativas, andam a carregar para cá tudo quanto encontram de valor histórico”.
36
Furlana: dança italiana, viva e alegre, que se originou entre os camponeses da região de Friuli. Michaelis.
Moderno Dicionário da Língua Portuguesa. Disponível em : http://michaelis.uol.com.br/moderno. Acesso em:
8 dez. 2008.
Imagem
25
: Alice de Oliveira, Julia Abrahão, Maria Cristina Moura e Clélia Miari em
Os Dois Faladores
.
Teatro Municipal de Araraquara, junho de 1956. Acervo: Maria Cristina Moura.
85
Sarmiento encontra-se com o falador Roldan e, entusiasmado, leva-o para
casa tentando curar sua mulher, Beatriz, la mayor habladora que se ha visto
desde que hubo mujeres em el mundo. Sua fórmula é simples: um falador fala
tanto que emudece uma faladeira.
Após a estréia, mais uma vez, a coluna “Coisas da Cidade”, assinada por
Ignácio de Loyola Brandão, em 2 de setembro de 1956, é aqui reproduzida
integralmente pela riqueza de detalhes descritos, mas tamm pela extensa
relação de nomes tradicionais da cidade presentes à estréia, mostrando que o
TECA havia se incorporado como um orgulhoso patrimônio da cidade.
ESTRÉIA DO TECA – NOITE DE GALA
31 de Agosto, 20 horas e meia. Esplanada das Rosas. Refletores potentes
iluminam a fachada do Teatro Municipal, destacando os anúncios da
apresentação do Teatro Experimental de Comédias de Araraquara. É esta a
estréia da terceira série de espetáculos em Arena.
É o último grande acontecimento social de agosto. Uma noite de gala na
sociedade araraquarense. Gente bem em um desfile super de toiletes, de
elegância, de finura e distinção.
21 horas. O Casarão tradicional está cheio. E diferente. Nota-se que as
luzes são mais profusas, que o prédio traz aspecto novo, interiormente.
Corro a vista pelos assistentes. na primeira fila vejo a figura ímpar de D.
Sinhá Fortes Vaz, acompanhada do filho Carlos Armando e sra. O rumor
confuso das vozes. Vejo a Sra. Waldemar Andrade do Nascimento, elegante
em um vestido claro, verde, com estola de pele. Ao lado sua irmã Mariinha e
o pai, sr. Edmundo Lupo. Logo à frente observo o sr. e a sra. Bazilio
Chackur, ela em costume cinza claro.
Início da primeira peça. Um Drama na Malásia. Ruth Magali Miranda, Lygia
Fabiano, Yvete Alves Costa e Edson Lessi se desenvolvem na Arena.
Primeiro intervalo. Enquanto suaves luzes azuis se derramam pela platéia, o
pano de boca é levantado e os presentes redescobrem o Iemanjá Bar.
Motivos praieiros, redes, tarrafas, esteiras, folhas de palmeiras, lampiões
originais sobre as mesas. Muita gente circulando.
Dr. Wilton Lupo e sra., esta toda em negro; sr. e sra. Cid Moura Ferrão; sr. e
sra. Elvio Lupo; todos reunidos o lado de “Horse-Necks” e “Cuba Libres”, em
conversas amistosas, falando sobre a peça e tudo mais.
Gil Cadaval ao piano. E a voz de Natercia de Almeida, garota bonita, toda
em branco, cantando músicas brasileiras, prendendo a atenção dos
presentes.
Frente ao balcão vejo o sr. e a sra. Luiz Lacerda de Carvalho e filha, Titã. Dr.
Sirthes de Lorenzo e sra., esta em negro e branco. Sr. e sra. Lysanias de
Oliveira Campos. Dr. Silvio Berenger e sra.; Dr. Paulo Redner e sra.; sr. e
sra. Dr. José Benevenuto Fortes. Sra.cero Muniz.
O sinal para a segunda peça. Vão voltando aos seus lugares os presentes.
Vemos ainda o sr. e a sra. Carlos Zaramella; Dr. Ednam Nogueira e sra.; Dr.
Humberto Morabito e sra.; Sr. e sra. Joffre David; Sr. e sra. José Araújo
Quirino dos Santos; D. Henriquetta Lupo Aufiero.
86
O Protocolo. Sebastião de Campos, Maria Aparecida de Assis, Alice de
Oliveira e Tito Peixoto com classe e segurança na Arena.
Entre os que aplaudem estão o sr. e a sra. Arlindo Rodrigues. O Dr. Paulo
de Aguiar e sra, esta toda em negro; sr. e sra. Luiz Batista Pereira de
Almeida, ela em um costume cinza. Srta. Marina Morabito em lilás claro.
Elegantes senhoritas estavam no aumento do brilho social da estréia.
Maria da Glória Sampaio, em lilás; Maria Lucia Galvão, em azul e branco;
Yvone Cortez, em branco; Maria Ernestina Lupo, em azul; Maria Helena e
Eda Quirino dos Santos; Vera e Catarina Zélia de Oliveira, Marilia Caldas,
Vera Lygia Donine, Wanda Maria Cambiaghi, Maria José Marins, Letícia
Carboni, Astrid Zaramella, Maria Cecília Biffi, Alda Lupo.
Notei ainda na noite de sexta-feira a presença de um de nossas garotas
mais finas. É a srta. Cheisa R. Rocco, que esteve muito alinhada, toda em
branco.
Segundo intervalo. Poucas pessoas no bar. Lembro-me de ter visto junto ao
piano o Dr. José Péricles Freire e sra., esta em amarelo e com casaco cinza.
Sr. e sra. Raphael Luiz Lia que ocuparam sempre a mesma mesa em todos
intervalos. Sr. e sra. José Maria Ferraz, ela em azul e trazendo bonito broche
dourado. Sr. Leopoldo Formani e sra. que vi no TECA pela primeira vez.
Os Dois Faladores. Barra, Sebastião, Cristina, Moacyr, Edson, Everton,
Oscar, Alice, Clélia, Julia movimentam-se na farsa de Cervantes, em roupas
coloridas enchendo a vista.
Em primeira fila estão o sr. e a sra. Sebastião Gomes Leal, Dr. Set-Hur
Cardoso e sra.; sr. e sra. Lucilio Correia Leite Junior, sr. e sra. Osório de
Souza Mello, Dr. Ruy Soares e sra., sr. e sra. Roberto José Fabiano, sr. e
sra. José Mariottini.
Vou correndo a vista pelas filas. Dr. Francisco Osvaldo Castelucci e sra., sr.
e sra. Julio Herculano Mazzei, Dr. Agenor Pereira e sra., sra. Laura
Capellatto, Dr. Luiz Bento Palamone e sra., Dr. João Pimenta de Castro e
sra., sr. J. C. Nantes, Dr. Miguel Tedde Netto e sra., sr. e sra. Dylson de
Oliveira Abade, Orlando Toledo e sra., sr. e sra. Olavo Copertino, srta.
Cleide Romangnole, sra. José João Birri.
Havia também geração circulando. Carlos e José Eduardo De Lorenzo, Luiz
Augusto Muniz, Isabel Maria De Lorenzo.
Numa frisa, sempre insepaveis, os srs. Antonio Marques Lopes e sra. e
José Monteiro e sra..
Fim do espetáculo. Ainda o poucos que vão circular no bar, enquanto
Natercia canta outra canção. Ali estão numa mesa o sr. e sra. Renato Correa
Rocha, ela ostentando um belo conjunto de broche, pulseira e anel, em prata
custosamente trabalhada.
E é tudo. Os ponteiros estão juntos no doze. Mais um dia, mais um mês,
mais uma grande estréia. Como sempre brilhou nossa sociedade ao
participar de um acontecimento, no fazer elegância numa realização.
A noite que anunciei tanto já aconteceu. Vou para casa pensando não só no
lado social, mas vendo ainda que o TECA é figura vigorosa, dotada de boa
vontade e ideal. Para gáudio do Almeida, do Mara Koojah e de todos nós
araraquarenses.
87
As matérias do O Imparcial dos dias posteriores eram unânimes em apontar
a evolução da companhia e elogiar as novas estréias: “Impressões de um belo e
grande espetáculo”, saudava Joffre R. David. “Uma estréia auspiciosa”,
comemorava o sempre presente Mara Koojah. E até o reticente Th. Dias Jr. se
abria em elogios: Terceira grande série do TECA”, apesar de continuar atento ao
pobre Sebastião Campos que esteve bom e seguro em seu papel, embora os
trejeitos faceirosos ainda o persigam muito”.
Mas a vingança de Sebastião Campos o tardou a chegar. No mesmo dia
da matéria, 5 de setembro de 1956, o espetáculo daquela noite teve um convidado
especial, um dos mais importantes homens do teatro na época, o Diretor da EAD –
Escola de Arte Dramática, de São Paulo, Dr. Alfredo Mesquita, veio assistir as três
peças, a convite da direção do TECA. Ficou encantado com o que viu, elogiou
muito o trabalho de Wallace, de Mario Barra e em uma “noitada proveitosa”,
sugeriu que a companhia se apresentasse tamm no palco do Municipal e não
Imagem
26
: Mario
Barra em
Os Dois
Faladores
. Teatro
Municipal
de
Araraquara, agosto
de
1956. Acervo: MIS
Araraquara.
88
apenas em arena; mas gostou mesmo foi do jovem ator do Protocolo, Sebastião
Campos, a quem convidou, ainda nos camarins, a ingressar em sua escola
Sebastião, surpreso e morrendo de medo
37
, aceitou o convite e seguiu para
São Paulo para estudar na EAD, em busca da tão sonhada profissionalização.
no ano seguinte, em dezembro, estrearia no TBC, sob direção de Ziembinsky, em
substituição a Walmor Chagas, contracenando com Cacilda Becker em Adorável
Júlia, de Marc-Gilbert Sauvajon, um início de carreira vertiginoso.
Mario Barra e Moacyr Marchese tentaram seguir carreira em São Paulo,
mas Sebastião Campos foi o único ator da companhia a ter se profissionalizado.
Não se encontra comentários do “crítico” Th. Dias. Jr. sobre o fato
38
.
2.9 Reapresentações e outras atividades
Outra surpresa que o ano de 1956 reservava foi, logo após o encerramento
da terceira série, a reapresentação da segunda série de espetáculos “em teatro de
arena”, a primeira série do ano, a do mês de maio. Desta vez, a pedidos, em
temporada popular, com um elenco um pouco modificado:
37
Entrevista com Sebastião Campos.
38
Mario Barra e Moacyr Marchese participaram, em 1960, do espetáculo A Engrenagem, de Jean-Paul Sartre,
montagem do Teatro Oficina.
89
A Mão do Macaco
Um Pedido de Casamento
Se os Homens Jogassem Cartas como as Mulheres
FICHAS TÉCNICAS
Nome da peça
A Mão do Macaco The Monkey's Paw
Autor William W. Jacobs (1863-1943) Inglaterra
Gênero Conto
Ano de montagem 1956
Mr. White Mario Barra
Alberto J. B. Aranha
Mrs. White Julia Abrahão
Sargento Morris Edson Lessi
Personagem/ Ator
Mr. Sampson Jayme Maurício Leal
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Tradução Madalena Nicol
Obs Montada “em teatro de arena”
Nome da peça
Um Pedido de Casamento The Proposal
Autor Anton Chekhov (1860-1904) Rússia
Gênero Comédia em 1 ato
Ano de montagem 1956
Giusicov Mario Barra
Lomov Sebastião Campos
Personagem/ Ator
Natalia Stepanova Alice de Oliveira
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Tradução Leonid Timochenko
Obs Montada “em teatro de arena”
90
Nome da peça
Se os Homens Jogasse Cartas como
as Mulheres
If Men Played Cards as Women Do
Autor George S. Kaufman (1889-1961) EUA
Gênero Comédia
Ano de montagem 1956
John Moacyr Marchese
Bob J. B. Aranha
George Tito Peixoto
Personagem/ Ator
Marc Aldemir Mussi
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Tradução Wallace Leal V. Rodrigues
Obs Montada “em teatro de arena”
Fonte: jornal O Imparcial e entrevistas.
No total, foram 10 espetáculos da terceira série, de 31 de agosto a 9 de
setembro, e 2 espetáculos da segunda rie, dias 11 e 12 de setembro. Um tour
de force considerável para uma companhia amadora de teatro.
“Uma soberba reapresentação”, saudava o jornal O Imparcial, de 13 de
setembro de 1956 e lembrava que a companhia havia tido ainda tempo para
saborear, naquele sábado, uma suculenta feijoada oferecida pelo Sr. Crocce,
“diligente” proprietário do Restaurante Riviera, “em uma grande reunião onde
selou-se de forma ineqvoca, a grande amizade que congrega aquela plêiade de
jovens em torno do teatro araraquarense.
Logo no mês seguinte, em outubro, no Teatro Municipal, sob os auspícios
do Centro Cultural Alberto Torres, organizava-se o Festival de Poesia de
Araraquara. O Centro Cultural Alberto Torres existia desde 1952, com o objetivo
de formar líderes e incentivar os intelectuais da cidade a participar da organização
da sociedade brasileira através de estudos de filosofia, história, literatura, poesia.
Dentre seus diretores na época, destacava-se a futura cientista política e
historiadora, Anna Maria Martinez Corrêa, autora, entre outros, do estudo
91
Araraquara 1720-1930. Um capítulo da história do café em São Paulo,.e nomes
como Plínio Pimenta e Luiz Roberto Salinas Fortes, intelectuais importantes da
cidade
39
.
A noite de encerramento do Festival, 21 de outubro, foi um espetáculo de
declamação a cargo do grupo do TECA e do Coral Araraquarense, com o nome de
Poesia na Noite, em uma verdadeira “sinfonia de vozes”, segundo o repórter V. O.
Casella, em artigo publicado no jornal O Imparcial, de 14 de outubro. O espetáculo
teve a direção de Wallace Leal V. Rodrigues, roteiro de Carlos Eduardo Meirelles
Matheus e foi idealizado por José Celso Martinez Corrêa, o futuro polêmico diretor
do Teatro Oficina, irmão de Anna Maria, eno um jovem araraquarense de 19
anos se preparando para estudar Direito em São Paulo.
Sobre o grupo de estudantes que criaria o Teatro Oficina, em 1958, na
Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, o teatrólogo Fernando Peixoto,
em artigo publicado na edição de janeiro de 1982 da Revista Dionysos nos lembra:
O novo grupo, ainda sem nome, nasce independente. Até um pouco
repudiado internamente: seus integrantes, vistos como espécie de “casta
intelectual”, não participavam, ao menos coletivamente, nas lutas da política
estudantil. Muitos vinham de uma cidade do interior, Araraquara. Não seria
absurdo afirmar que Araraquara, existindo em torno de plantação e
industrialização de laranja, tenha também gerado o Oficina. Há uma mancha
negra no passado de alguns: intensa participação no Centro Cultural Alberto
Torres, entidade integralista. Foi lá que José Celso realizou sua primeira
experiência em direção, em novembro de 57: um festival de poesia.
De Araraquara para São Paulo: seria este o tema de uma trilogia de textos
de José Celso. Uma das temáticas iniciais do Oficina. Seria ampliado em
diferentes veis: a análise da família viria a ser uma das linhas mestras do
repertório do grupo. Entenda-se: família de classe média. Neste nível o
Oficina nunca se equivocou: produzido por artistas e intelectuais da classe
média, mesmo tendo, em diferentes fases, de diferentes maneiras, assumido
uma perspectiva de defesa, até mesmo radical e agressiva, da revolução
proletária, sempre procurou e soube dirigir-se à platéia historicamente
concreta e real que tinha diante de si. Ou seja: a própria classe média. Isto
talvez explique sua fúria e seus limites: um transbordante ato de rebeldia.
Fascinante sempre, mas às vezes idealizado e idealista.
39
Luiz Roberto Salinas Fortes, participaria em 1958 da primeira montagem do Teatro Oficina em São Paulo,
A Ponte, texto de Carlos Queiroz Telles, direção de Amir Haddad.
92
O Festival de Poesia, assim como o espetáculo final, foram coroados de
sucesso e o vencedor geral foi o próprio Wallace Leal, decisão unânime, tal a
força revelada pelo poema apresentado”.
Wallace ainda iria achar tempo naquele ano, no dia 30 de outubro, para
ajudar sua velha amiga professora de francês, Profa. Fanny Maraccini, a ensaiar
seus alunos do IEBA Instituto de Educação Bento de Abreu para o Festival
Estudantil Hispano-Francês, realizando no “nosso vetusto e querido” Teatro
Municipal, entre outras atividades, a peça de La Fontaine, Le Loup et l’agneu (O
Lobo e o Cordeiro), repetida na cidade de São Carlos, no Auditório da Rádio
PRYA-6, no dia 8 de novembro. No elenco, como Mestre de Cerimônias, Aldo
Benedito Pierre, a cordeirinha Zélia Catarina de Oliveira Faria e Américo Aguiar
Borges, que viria a ser o responsável musical pelo filme Santo Antonio e a Vaca,
como um lobo assustador
40
.
O TECA foi convidado de última hora para se apresentar na vizinha cidade
de São Carlos, nos dias 9 e 10 de dezembro. E para mostrar as duas ries de
espetáculos do ano, seis peças diferentes em dois dias.
O convite pegou a companhia de surpresa. Mario Barra estava de férias em
São Paulo visitando seus, agora, novos conhecidos, José Renato e Alfredo
Mesquita, assistindo ao maior número de espetáculos possíveis e teve que voltar
às pressas. J. B. Aranha não poderia participar por motivos particulares. Seria
uma “prova duríssima” para todos, mas uma oportunidade importante, já que seria
a segunda vez que a companhia se apresentaria fora de Araraquara e de seu
público, após o êxito de Catanduva o ano anterior.
40
Entrevista com Américo Aguiar Borges.
93
E “O TECA brilhou em São Carlos” estampava O Imparcial do dia 14 de
dezembro, destacando as duas “noitadas”: a primeira, no dia 9, domingo com as
seguintes peças: Um Pedido de Casamento, O Protocolo e A Mão do Macaco. E
no dia seguinte, segunda-feira: Um Drama na Malásia, Os Dois Faladores e Se os
Homens Jogassem Cartas como as Mulheres. No entanto, a edição do dia 9 do
mesmo jornal nos traz informações conflitantes e o programa original do dia 10
nos dá a informação correta destas apresentações. Às 20h30 do domingo, dia 9
de dezembro, no Instituto Cultural Ítalo-Brasileiro, à Rua General Osório, 1090, em
São Carlos, o TECA apresentaria:
Image
m
27
: Maria Aparecida Assis e
Alice de Oliveira em O Protocolo.
Teatro Municipal de Araraquara,
agosto de 1956. Acervo: Maria
Aparecida Assis.
94
A Mão do Macaco
Um Pedido de Casamento
Se os Homens Jogassem Cartas como as Mulheres
FICHAS TÉCNICAS
Nome da peça
A Mão do Macaco The Monkey's Paw
Autor William W. Jacobs (1863-1943) Inglaterra
Gênero Conto
Ano de montagem 1956
Mr. White Mario Barra
Alberto Gerson Ferreira
Mrs. White Julia Abrahão
Sargento Morris Edson Lessi
Personagem/ Ator
Mr. Sampson Jayme Maurício Leal
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Tradução Madalena Nicol
Obs Montada “em teatro de arena”
Nome da peça
Um Pedido de Casamento The Proposal
Autor Anton Chekhov (1860-1904) Rússia
Gênero Comédia em 1 ato
Ano de montagem 1956
Giusicov Mario Barra
Lomov Sebastião Campos
Personagem/ Ator
Natalia Stepanova Alice de Oliveira
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Tradução Leonid Timochenko
Obs Montada “em teatro de arena”
95
Nome da peça
Se os Homens Jogasse Cartas como as
Mulheres
If Men Played Cards as Women
Do
Autor George S. Kaufman (1889-1961) EUA
Gênero Comédia
Ano de montagem 1956
John Moacyr Marchese
Bob Gerson Ferreira
George Tito Peixoto
Personagem/ Ator
Marc Aldemir Mussi
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Tradução Wallace Leal V. Rodrigues
Obs Montada “em teatro de arena”
Fonte: jornal O Imparcial e entrevistas.
E no dia seguinte, segunda-feira, dia 10 de dezembro, no mesmo local,
seria a vez de:
96
Um Drama na Malásia
O Protocolo
Os Dois Faladores
FICHAS TÉCNICAS
Nome da peça
Um Drama na Malásia Before the Party
Autor Somerset Maugham (1874-1965) Inglaterra
Gênero Conto
Ano de montagem 1956
Kathleen Lygia Fabiano
Millicent Ruth Magali Miranda
Mrs. Skinner Ivete Alves Costa
Mr. Skinner Edson Lessi
Personagem/ Ator
A Criada Ediméa Zuchini
Produção Araken de Toledo Pires
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Assistente de
direção
Mario Barra
Cenografia Diego de Vega (heterônimo de Wallace), executada por Iglá Aiévoli
Maquiagem Arthur Batelli e Leda de Oliveira Pinto
Figurinos Felipe Luiz (heterônimo de Wallace)
Sonoplastia Alekan (heterônimo de Araken)
Iluminação Toni R. Martinez
Acessórios e
materiais elétricos
Oficina N.S.Aparecida
Obs Montada “em teatro de arena”
Nome da peça
O Protocolo
Autor Machado de Assis (1839-1908) Brasil
Gênero Comédia em 1 ato
Ano de montagem 1956
Elisa Maria Aparecida Assis Personagem/ Ator
Venâncio Alves Sebastião de Campos
97
Sr. Pinheiro Tito Peixoto
Lulu Alice de Oliveira
Produção Araken de Toledo Pires
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Assistente de
direção
Mario Barra
Cenografia Diego de Vega (heterônimo de Wallace), executada por Iglá Aiévoli
Maquiagem Arthur Batelli e Leda de Oliveira Pinto
Figurinos
Felipe Luiz (heterônimo de Wallace). Vestidos de Maria Aparecida Assis e
Alice de Oliveira executados por Amélia Ferreira. Guarda-roupa masculino por
Lucilio Leite.
Sonoplastia Alekan (heterônimo de Araken)
Iluminação Toni R. Martinez
Acessórios e
materiais elétricos
Oficina N.S.Aparecida
Obs Montada “em teatro de arena”
Nome da peça
Os Dois Faladores Los Habladores
Autor Miguel de Cervantes (1547-1616) Espanha
Gênero Entremez
Ano de montagem 1956
Roldan Mario Barra
Sarmiento Moacyr Marchese
Transeunte Edson Lessi
Homem da Lei Sebastião Campos
Homem da Lei Oscar Rodrigues
Homem da Lei Everton Aiévoli
Beatriz Julia Abrahão
Inês Maria Cristina Moura
1a. Dama Alice de Oliveira
Personagem/ Ator
2a. Dama Clélia Miari
Produção Araken de Toledo Pires
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Assistente de
direção
Mario Barra
Cenografia Diego de Vega (heterônimo de Wallace), executada por Iglá Aiévoli
98
Maquiagem Arthur Batelli e Leda de Oliveira Pinto
Figurinos Felipe Luiz (heterônimo de Wallace). Trajes executados por Amélia Ferreira.
Sonoplastia Alekan (heterônimo de Araken)
Iluminação Toni R. Martinez
Mestre de armas Tito Peixoto
Acessórios e
materiais elétricos
Oficina N.S.Aparecida
Obs Montada “em teatro de arena”
Fonte: programa do espetáculo.
A temporada de São Carlos teria uma importância estratégica para a
companhia pois, no ano seguinte, o ministro Paschoal Carlos Magno, em visita à
cidade, ouviria dos sãocarlenses elogios às qualidades do TECA, o que o motivou
a visitar Araraquara.
O ano terminava com a coluna de O Imparcial: “Vamos ao Teatro”, de 25 de
dezembro de 1956, bastante animada:
Auspiciosa notícia. Dia 20 último, o TECA reuniu alguns de seus valiosos
elementos para a leitura da estupenda peça O Urso, do famoso dramaturgo
russo, Chekhov.
Noticiava oficialmente que Sebastião Campos deixava o grupo para ir tentar
sua sorte em São Paulo e, por fim, o colunista, com intimidade, “desejava a todos
os integrantes do TECA um querido Feliz Natal e um 1957 cheio de felicidades”.
99
3. O APOGEU DO TEATRO
O ministro Paschoal Carlos Magno entraria na vida do TECA, como um
verdadeiro mecenas, no dia 20 de maio de 1957.
3.1 Um ministro na vida do TECA
Filho de imigrantes italianos, Paschoal Carlos Magno foi ator, crítico, autor e
diretor teatral, mas sua atuação política em favor do teatro, principalmente do
teatro amador, foi o marco mais importante de sua vida. Já em 1937, inaugurava a
Casa do Estudante do Brasil e o TEB Teatro do Estudante do Brasil, que viria a
revelar, entre outros, o ator Sérgio Cardoso. A viagem do TEB pelo Brasil e seu
entusiasmo fizeram com que grupos amadores de teatro proliferassem pelo país.
Transformou sua própria casa, no bairro de Santa Teresa, no Rio de Janeiro, em
um pequeno teatro de 100 lugares, o Teatro Duse. Nomeado responsável pelo
setor cultural e universitário da Presidência da República, por Juscelino
Kubitschek, com o status de ministro, viajou pelo país todo em busca de jovens
talentos, facilitando a criação e a dinamização de espaços e grupos teatrais.
Este generoso agitador cultural encontrava-se em visita oficial à cidade de
São Carlos, no mês de maio de 1957, para a abertura dos Jogos Universitários,
quando ouviu falar do sucesso do TECA, na vizinha Araraquara. A revista Vio,
em sua edição de 18 de abril, tamm trazia uma matéria sobre o teatro
araraquarense. Resolveu checar. Chegou a Araraquara em uma segunda-feira,
dia 20, um dia após o término da primeira rie de espetáculos do ano. A arena
estava desmontada, o Teatro Municipal ocupado com um concerto sinfônico.
Wallace, no entanto, percebendo a importância daquela visita, não titubeou.
Recrutou sua equipe de produção: Araken, Antonio Reis e Everton Aiévoli,
comandou a remontagem do tablado, chamou a todos os atores, conseguiu
emprestado o grande sao do primeiro andar do Clube Araraquarense e ali
100
mesmo, vizinho ao velho Teatro na Rua 3, em uma sessão improvisada e com
convidados, o grupo do TECA se apresentou e conquistou o coração do ministro.
Ao final da noite, Paschoal abraçava a todos e se mostrava esfuziante com as três
peças assistidas.
Convidou imediatamente a companhia a se apresentar no Rio de Janeiro
ainda naquele ano, garantindo acomodação e refeições a todos durante a estada
na capital. Poucos dias depois, já de volta ao Rio, no dia 25 de maio, seu artigo,
publicado no jornal Correio da Manhã trazia todos os seus elogios, principalmente,
para a figura do diretor:
Mas a mão que amoldou todos esses temperamentos; a sensibilidade que
unificou todos os elementos que tornaram digno de encômios o espetáculo a
que assisti, chama-se Wallace Leal V. Rodrigues. ouviram alguma vez
falar nele? Eu, nunca. Mas não esquecerei seu nome para sempre. Tem
vinte e dois anos. Magríssimo. Comprido. Com um ar de adolescente na
cara e nos gestos. Trabalha numa camisaria e só fez o curso ginasial. Tem
uma biblioteca teatral no crânio. Conhece tudo quanto se tem escrito ou feito
em teatro, desde o começo do mundo. É um diretor capaz, como poucos
neste país. Suas marcações o inteligentes, de acordo com as situações,
valorizando o texto de maneira impressiva.
41
3.2 Quarta série de espetáculos
As peças apresentadas ao ministro no Clube Araraquarense faziam parte da
primeira série de espetáculos do ano, a quarta série de espetáculos “em teatro de
arena” do TECA. A estréia se dera no dia 10 de maio de 1957 no Teatro Municipal
e, no total, foram sete apresentações, dias 11, 12, 14, 15, 16 e um espetáculo
extra no dia 18. Algumas noites tiveram caráter beneficente, uma delas com a
bilheteria doada à Liga Paulista de Combate ao Câncer e outra ao Clube Espírita
Lívia Cornélia.
41
Vide Anexo II. Artigos Especiais.
101
O Menino de Moonyo Chora
Sobre os Danos que traz o Tabaco
Amigos de Viagem
FICHAS TÉCNICAS
Nome da peça
O Menino de Moony não Chora Moony's Kid Don't Cry
Autor Tennessee Williams (1911-1983) EUA
Gênero Fantasia dramática
Ano de montagem 1957
Jane Ruth Magali Miranda Personagem/ Ator,
por ordem de
entrada em cena
Moony Gumercindo Ferreira Junior
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Produção Araken de Toledo Pires
Assistentes de
direção
Mario Barra, Antonio Reis da Silva e Oscar Rodrigues
Figurinos Felipe Luiz (heterônimo de Wallace), executados por Amélia Ferreira
Cenografia Diego de Vega (heterônimo de Wallace)
Maquiagem Leda Oliveira Pinto e John Brown (heterônimo de Wallace)
Sonoplastia Alekan (heterônimo de Araken)
Iluminação Everton Aiévoli e Nelson Gullo
Obs Montada “em teatro de arena”
Nome da peça
Sobre os Danos que traz o Tabaco On the harmfullness of tobacco
Autor Anton Chekhov (1860-1904) Rússia
Gênero Monólogo
Ano de montagem 1957
Personagem/ Ator Ivan Ivanowitch Husmeadorov Mario Barra
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Produção Araken de Toledo Pires
Assistentes de
direção
Mario Barra, Antonio Reis da Silva e Oscar Rodrigues
Figurinos Felipe Luiz (heterônimo de Wallace), executados por Amélia Ferreira
102
Cenografia Diego de Vega (heterônimo de Wallace)
Maquiagem Leda Oliveira Pinto e John Brown (heterônimo de Wallace)
Sonoplastia Alekan (heterônimo de Araken)
Iluminação Everton Aiévoli e Nelson Gullo
Obs Montada “em teatro de arena”
Nome da peça
Amigos de Viagem Hands across the Sea
Autor Noël Coward (1899-1973) Inglaterra
Gênero Comédia
Ano de montagem 1957
Elizabeth Izabel Reina
Marina Gilpin Julia Abrahão
Peter Gilpin Tito Peixoto
Alipio Corbert Moacyr Marchese
Abigail Wilson Lygia Fabiano
Fred Wilson Oscar Rodrigues
Mr. Smith Gerson Ferreira
Clara Maria Cristina Moura
Personagem/ Ator,
por ordem de
entrada em cena
Bob Benjamin Soares de Azevedo
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Produção Araken de Toledo Pires
Assistentes de
direção
Mario Barra, Antonio Reis da Silva e Oscar Rodrigues
Figurinos Felipe Luiz (heterônimo de Wallace), executados por Amélia Ferreira
Cenografia Diego de Vega (heterônimo de Wallace)
Maquiagem Leda Oliveira Pinto e John Brown (heterônimo de Wallace)
Sonoplastia Alekan (heterônimo de Araken)
Iluminação Everton Aiévoli e Nelson Gullo
Direção de dança Cleide Braga
Tradução Carlos Lage
Obs Montada “em teatro de arena”
Fonte: programa do espetáculo.
A peça de Tennessee Williams nos mostra um embate, um duelo verbal
entre Jane e Moony, um casal que vive um relacionamento deteriorado pelas
103
condições econômicas e pela falta de respeito mútuo. Ao tentar deixá-la, o violento
Moony acaba sendo surpreendido quando Jane atira-lhe o bebê nos braços:
“Toma! Aqui está seu menino, Moony! Leve-o consigo. Claro. Agora podem ir, os
dois! Eu não posso ter trabalho com fedelhos”. E o aturdido Moony acaba
desistindo de seus planos.
no texto de Chekhov, vê-se um homem transformado em conferencista,
à força, por sua mulher. Ao falar dos males do tabaco, acaba saindo do tema e
falando de sua própria vida, reclamando dos maus-tratos infligidos pela mulher.
A última peça da noite, de Noël Coward, trazia o efeito final esperado,
fechando os espetáculos com o seu peculiar humor inglês, onde os tais amigos de
Imagem
28
: Ruth Magali Miranda em
O Menino de Moony não Chora
.
T
eatro Municipal de Araraquara,
maio de 1957. Acervo: Wallace Leal V. Rodrigues.
104
viagem se reencontram em Londres e, ao final percebem que nem sabem
exatamente de onde se conheceram.
A imprensa araraquarense, particularmente o jornal O Imparcial, cobriu
todos os meses de ensaios e preparação com detalhes, trazendo entrevistas com
as atrizes Julia Abrahão, “rádio-atora”, Maria Cristina Moura, “estudante do ano
clássico do IEBA, nascida em Rincão, após ter praticado cestobol, hoje é assídua
freqüentadora da piscina da Ferroviária”, e com Lygia Fabiano, “admirável no
papel de Abigail”.
Os planos da companhia, de voltar a fazer cinema, apareciam em meio às
entrevistas. Julia Abrahão chegou a adiantar o título do filme planejado:
Acredito no cinema araraquarense. Se não nos faltarem meios materiais,
Araraquara toda se orgulhará de nossos feitos, pois não nos faltam ideais
sadios, desejos de vencer, honestidade e uma grande confiança. O enredo
de Madona das Ruas Mortas é belo e poético, denso e dramático.
O período de ensaios trouxe outra vez problemas de agenda no superlotado
e multidisciplinário Teatro Municipal, primeiro com ensaios do grupo de teatro
juvenil da cidade, dirigido por José Roberto Bueno, e depois com a antecipação de
um desfile de modas, Modas Carone, que estava agendado. Tudo acabou sendo
negociado a contento e aa bela Ruth Magali Miranda acabaria representando o
TECA e participando do desfile, com um vestido desenhado pelo próprio Wallace.
Mario Barra, que se destacava naturalmente no grupo como um grande
ator e capaz de improvisos e adaptações a todas as situações, sem falar em seu
constante bom humor, ganharia uma recompensa inesperada. Wallace, que vinha
se utilizando de seus talentos como um auxiliar de direção não reconhecido, o
deixaria finalmente assumir a direção de Amigos de Viagem. Wallace faria apenas
a supervisão. Esta informação, no entanto, não consta do programa do
espetáculo.
105
Ainda neste período a cidade receberia a visita do ex-ator da companhia,
Sebastião Campos, agora estudante da EAD, em São Paulo e prestes a se
profissionalizar. Sebastião foi homenageado carinhosamente pelos colegas e
amigos.
Na série de matérias que sempre antecedia uma estréia do TECA, nota-se
uma de 10 de maio, onde os demais membros não atores da companhia são
destacados, desde o produtor Araken de Toledo Pires, mostrando seu profundo
conhecimento artístico teatral”, até a menção de Antonio Reis da Silva, como
assistente de direção em O Menino de Moony não Chora e Oscar Rodrigues como
I
magem
29
: Sebastião Campos recebendo homen
agem das mãos de Wallace Leal, rodeado por seus ex
-
colegas: Julia Abrahão, Ruth Magali e Mario Barra, entre outros. Abril de 1957. Acervo: Wallace Leal V.
Rodrigues.
106
assistente no monólogo de Chekhov. Os figurinos de Felipe Luiz (o próprio
Wallace), foram executados pela competência de Amélia Ferreira. A maquiagem
pelos “grandes e queridos colaboradores”: Leda Oliveira Pinto e John Brown (o
próprio Wallace). Destacam ainda os trabalhos de Alekán na sonoplastia
(heterônimo de Araken), de Diego de Vega (outra vez o próprio Wallace) na
cenografia, a iluminação por Everton Aiévoli e Nelson Gullo, todos grandes
colaboradores do TECA. Cleide Braga, a responsável pela direção de dança
42
.
Mais uma vez a estréia foi saudada pelo jornal O Imparcial, em 11 de maio,
com elogios: Estréia auspiciosa do TECA”, um “êxito marcante”, os atores
colheram “justos e calorosos aplausos”. Nos dias seguintes, cada ator era
brindado com adjetivos superlativos: ”soberbo trabalho de Ruth Magali Miranda,
“estréia grandiosa de G. Ferreira Junior”, “a estreante Izabel Reina cativou a
platéia”, Benjamin Azevedo mostrou-se muito bem”, “Lygia Fabiano voltou a
agradar”, “Mario Barra num nível excepcional de interpretação, Julia Abrahão
confirmou seus dotes artísticos”, Christina Moura, irrequieta, também dominou a
platéia”, “Tito com uma interpretão bastante agradável”, “Moacyr Marchese saiu-
se notável”, “Oscar Rodrigues consagrou-se como comediante”. Ainda com direito
a homenagens, segundo O Imparcial de 18 de maio:
Quinta-feira última quando terminado o espetáculo que deveria ser o último
da série, foram homenageados pelo Departamento Artístico da Rádio
Cultura de Araraquara, na pessoa do Sr. Jofre David, o consagrado Mario
Barra pelo seu magistral desempenho no famoso monólogo de Tchecov.
Também Julia Abrahão, irrepreensível na comédia Amigos de Viagem,
mereceu daquele Departamento jusssima homenagem, recebendo, como
seu estimado colega, linda corbeille de flores. Foram, na ocasião,
aplaudidíssimos pelo grande público presente.
A quarta série era mais um sucesso da jovem companhia, que iria
completar dois anos em junho. Mas o melhor ainda estava por vir, a visita de
Paschoal Carlos Magno. O jornal O Imparcial, em sua edição de 21 de maio,
destacava o que toda a cidade já comentava: a presença do ministro, o espetáculo
42
Vide Capítulo 6. Bastidores.
107
extra montado às pressas na noite do dia 20, no Clube Araraquarense e o
entusiasmo da acolhida. não imaginavam que as coisas iriam se tornar tão
sérias.
3.3 Preparativos para a viagem ao Rio
“O TECA no Rio de Janeiro” era a manchete da coluna “Teatro”, do jornal O
Imparcial, de 22 de maio de 1955. Parecia inacreditável. E a reportagem trazia
todos os detalhes daquela noite, os comentários elogiosos de Paschoal, o convite
oficial para a viagem ao Rio e a alegria da companhia, com direito a champagne e
salgadinhos e a um Parabéns a você”, endereçado a Araken de Toledo Pires,
mas que acabou valendo para toda a companhia. A iia de Paschoal era uma
temporada de dez dias na capital no mês de julho, com direito, inclusive, à
gravação de programas de TV.
O artigo de Paschoal Carlos Magno no jornal Correio da Manhã, apesar de
bastante positivo, trazia críticas às atuações de Ruth Magali Miranda e
Gumercindo Ferreira Junior em O Menino de Moony não Chora:
Quando o segundo souber melhor usar a voz que Deus lhe deu e a primeira
aprender a não mutilar seus movimentos, tornando-se mais espontânea,
poderão perfeitamente competir com o Sr. Mario Barra, que viveu de
maneira soberba, digna, como um artista completo, em Sobre os Danos que
traz o Tabaco.
Críticas que, segundo Ruth Magali Miranda, foram bastante justas, pois
aquela foi uma apresentação problemática:
Quando nós estávamos subindo a escada do Clube Araraquarense para a
apresentação, ele (Gumercindo) virou para mim e disse: “Eu o vou”. Eu
disse: “Comoo vai? E comecei a chorar. O Wallace chegou e ficou
conversando com ele. ele subiu. Meu Deus do Céu! Eu dei a deixa e ele
não entrou. Foi horrível!
43
43
Entrevista com Ruth Magali Miranda.
108
Todos da companhia estavam, naturalmente, felizes, mas também
alvoroçados com a notícia. Nem tiveram tempo para comemorar, pois os
preparativos já começaram na semana seguinte: que peças levar ao público
exigente do Rio, como conseguir patrocínio para a viagem de trem, como fazer
com as agendas de cada ator, já que praticamente todos eram estudantes, como
convencer os pais e as mães que liberassem, principalmente suas filhas para a
aventura. Questões importantes a serem discutidas. E o jornal O Imparcial trazia
matérias diárias, muitas delas bem enfáticas quanto à seriedade da empreitada
araraquarense na capital. A de 26 de maio, por exemplo, atestava que:
O tempo no Rio de Janeiro será estritamente para as representações, aulas,
conferências e visitas educacionais e as horas de passeio serão
aproveitadas sob severo regime disciplinar. Isso vem demonstrar que não se
irá ao Rio para fazer turismo ou simples passeio, mas, tão somente,
trabalhar, levando ao povo carioca o valor cultural de Araraquara, que é o
escopo principal.
Para que não restassem vidas da seriedade do projeto, no dia 29 de
maio foi noticiada uma reunião do TECA na casa de D. Olga onde foi lido um
regulamento, preparado por D. Olga e Wallace, “tido como um código disciplinar e
administrativo, vigorante desde o momento da partida desta cidade”. Se a viagem
a Catanduva já havia sido cercada de cuidados, esta ao Rio de Janeiro deveria ser
ainda mais rígida, afinal o Rio, capital do país, poderia ser uma cidade
assustadora para jovens interioranos. Além da própria D. Olga, outra mãe foi
escalada para a viagem, a de Lygia Fabiano, D. Olívia. Com o tempo, muitos
outros araraquarenses se programariam para estar no Rio durante os espetáculos,
afinal o TECA era motivo de orgulho para qualquer araraquarense.
O Comendador Hélio Morganti, importante usineiro local e amante das
artes, por exemplo, programou no domingo, dia 9 de junho, em sua residência, no
“solar da Avenida D.Pedro II, 1.195”, uma sessão fechada a amigos, em sua
maioria vinda de São Paulo, da última série de espetáculos da companhia em
comemoração ao aniversário de sua neta, a galante” Márcia Emilia, que
completava 3 anos de idade.
109
O Menino de Moonyo Chora
Sobre os Danos que traz o Tabaco
Amigos de Viagem
FICHAS TÉCNICAS
Nome da peça
O Menino de Moony não Chora Moony's Kid Don't Cry
Autor Tennessee Williams (1911-1983) EUA
Gênero Fantasia dramática
Ano de montagem 1957
Jane Ruth Magali Miranda Personagem/ Ator,
por ordem de
entrada em cena
Moony Gumercindo Ferreira Junior
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Produção Araken de Toledo Pires
Assistentes de
direção
Mario Barra, Antonio Reis da Silva e Oscar Rodrigues
Figurinos Felipe Luiz (heterônimo de Wallace), executados por Amélia Ferreira
Cenografia Diego de Vega (heterônimo de Wallace)
Maquiagem Leda Oliveira Pinto e John Brown (heterônimo de Wallace)
Sonoplastia Alekan (heterônimo de Araken)
Iluminação Everton Aiévoli e Nelson Gullo
Obs Montada “em teatro de arena”
Nome da peça
Sobre os Danos que traz o Tabaco On the harmfullness of tobacco
Autor Anton Chekhov (1860-1904) Rússia
Gênero Monólogo
Ano de montagem 1957
Personagem/ Ator Ivan Ivanowitch Husmeadorov Mario Barra
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Produção Araken de Toledo Pires
Assistentes de
direção
Mario Barra, Antonio Reis da Silva e Oscar Rodrigues
Figurinos Felipe Luiz (heterônimo de Wallace), executados por Amélia Ferreira
110
Cenografia Diego de Vega (heterônimo de Wallace)
Maquiagem Leda Oliveira Pinto e John Brown (heterônimo de Wallace)
Sonoplastia Alekan (heterônimo de Araken)
Iluminação Everton Aiévoli e Nelson Gullo
Obs Montada “em teatro de arena”
Nome da peça
Amigos de Viagem Hands across the Sea
Autor Noël Coward (1899-1973) Inglaterra
Gênero Comédia
Ano de montagem 1957
Elizabeth Izabel Reina
Marina Gilpin Julia Abrahão
Peter Gilpin Tito Peixoto
Alipio Corbert Moacyr Marchese
Abigail Wilson Lygia Fabiano
Fred Wilson Oscar Rodrigues
Mr. Smith Gerson Ferreira
Clara Maria Cristina Moura
Personagem/ Ator,
por ordem de
entrada em cena
Bob Benjamin Soares de Azevedo
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Produção Araken de Toledo Pires
Assistentes de
direção
Mario Barra, Antonio Reis da Silva e Oscar Rodrigues
Figurinos Felipe Luiz (heterônimo de Wallace), executados por Amélia Ferreira
Cenografia Diego de Vega (heterônimo de Wallace)
Maquiagem Leda Oliveira Pinto e John Brown (heterônimo de Wallace)
Sonoplastia Alekan (heterônimo de Araken)
Iluminação Everton Aiévoli e Nelson Gullo
Direção de dança Cleide Braga
Tradução Carlos Lage
Obs Montada “em teatro de arena”
Fonte: programa do espetáculo.
111
No dia 2 de junho, o jornal O Imparcial publicava uma longa entrevista com
o diretor Wallace Leal, ainda relutante sobre a realização da viagem, da qual aqui
transcreve-se os principais trechos:
Recebi a notícia da chegada do ministro Dr. Paschoal Carlos Magno com
grande surpresa pois o nosso teatro fantasma armado de cada vez no
Municipal, já tinha sido desmontado, e ele declarava que viera a Araraquara
tão somente para conhecer o nosso grupo. Isso criava um caso sério. O
Municipal estava tomado com um concerto. O Sr. Lisanias de Oliveira
Campos e o Dr. Sirthes De Lorenzo foram os heróis da hora, conseguindo-
nos imediatamente o Clube Araraquarense. O resto o senhor viu acontecer.
[...]
Paschoal Carlos Magno é uma das maiores autoridades em teatro no Brasil.
Ele pode gabar-se de ser amigo dos maiores homens de teatro do mundo. É
ainda pessoa de extremo bom gosto, conhecedor de arte, colecionador de
antiguidades, escritor conhecido em toda a Europa, onde foi nosso
representante muitos anos. Foi ainda aquele que revelou os talentos de
Cacilda Becker e Sérgio Cardoso e ainda o fundador do teatro do estudante
do Brasil e do Teatro Duse, que existe até hoje. Todos esses títulos
intimidavam. Entretanto foi o que garantiu a força de expressão com que
pronunciou-se quanto a nós do TECA. A homenagem que prestou ao nosso
espírito de sacrifício e à nossa capacidade de luta, foi muito justa. Não é
certo, porém, e foi apenas bondade sua dizer que sou um dos maiores
mestres de cena do Brasil. Talvez eu alcance posição de certo relevo se a
Provincia Divina não me faltar. O que acontece é apenas que laboro num
grupo maravilhoso, de moços mentalmente sadios, cultos, idealistas,
empreendedores e generosos, de que me orgulho imensamente. Por outro
lado existe o apoio valiosíssimo e sempre retificador dessa mulher sobre
todos os pontos admirável e que cresce, dia a dia, em nosso conceito: D.
Olga Ferreira Campos. E existe ainda o Prof. Lisanias de Oliveira Campos à
testa da Superintendência de Cultura Artística. Creio que sem este último
fenômeno, o TECA nunca teria existido, pois nem ao menos disporíamos de
um local para os constantes ensaios. Ele nos facilita tudo, compreensivo e
acessível ao mesmo tempo, garantindo-nos, por assim dizer, a sobrevivência
nestes dois anos de lutas. [...]
[Paschoal] Disse que repassando o Brasil de Norte a Sul, Leste a Oeste não
encontrou outro grupo igual do ponto de vista de um teatro honesto e bem
elaborado. Achou Magali e Gumer excelentes, exaltou-se com o Barra e
sobre a última peça (Amigos de Viagem) disse que era um jogo de roubar
cenas contínuo, cada qual levando a melhor sobre os outros a cada fala e
movimento. Acho o mecanismo cênico perfeito, lírico, mico e dramático
nos exatos momentos. [...]
O Sr. ministro prometeu de blico apresentar-nos à crítica especializada do
Rio através do teatro de arena do Hotel Glória e da televisão. Entretanto,
muito embora marcasse essa data para julho, talvez tenha impedimentos,
pois é um homem público de grandes afazeres. Se formos, isso representará
um poderoso veiculo de propaganda para Araraquara. [...]
[No Rio] Teremos, em grupos, aulas de mímica, dicção, ritmo etc., com os
melhores professores do Rio, se tudo der certo e se realmente formos.
Visitas a museus e contatos com os grandes autores e diretores daquela
cidade. Tudo isso é excepcionalmente interessante.
112
Se formos, nem por um momento tiraremos de mente o fato de que
estaremos com o cartão de visita às mãos, frente aos cariocas. A
responsabilidade é enorme. Não se esqueçam de que temos apenas dois
anos de vida e de que, do ponto de vista artístico, muito embora o grupo seja
esforçado e ativo, o diretor, além de ser da roça, é bastante... burrinho. Não
façamos sonhos exagerados pois encaremos os fatos com espírito esportivo,
alegria e simplicidade. [...]
Dr. Carlos Magno sugeriu: O Menino de Moony não Chora, Sobre os Danos
que faz o uso do Tabaco, Amigos de Viagem, Se os Homens Jogassem
Cartas como as Mulheres, O Protocolo e O Pedido de Casamento. Deu-nos,
porém, liberdade de escolha. Estou estudando o assunto. Se a televisão for
mesmo apresentar-nos, os lançamentos dependerão de decupagem e de
entendimentos entre a nossa direção e os câmeras. na devida época
poderei falar em definitivo a respeito. [...]
O Prefeito Rômulo Lupo, além de oferecer um terreno para a construção de
um teatro especialmente para o TECA, aprovou uma ajuda financeira à companhia
e Araken e Antonio Reis viajaram ao Rio em junho, para checar as condições
oferecidas pelo ministro Paschoal, para se reunirem com ele, para visitarem o
Hotel Glória, palco das apresentações e as acomodações oferecidas. A princípio,
o TECA teria que se preocupar apenas com a viagem de Araraquara ao Rio,
que, na capital, todas as despesas seriam cobertas pelo governo federal, ou pelo
próprio Paschoal, isso ninguém sabia.
Não existem referências claras aos custos totais da viagem, nem tampouco
a ajudas locais efetivamente recebidas. Todos os entrevistados são unânimes em
afirmar ter sido, de fato, o ministro, ou seja, o governo federal, o único responsável
pelo pagamento das despesas.
O sucesso do TECA se refletia até em Campinas, onde o jornal Correio
Popular, em sua edição de 27 de junho de 1957, trazia matéria lamentando, de
forma provocativa, o fato do TECA ter seus espetáculos sempre lotados,
encenando grandes autores e nada de comediazinhas chués de Paulo
Magalhães”, como se fazia naquela cidade.
O reperrio para a viagem começava então a ser planejado. Os ensaios
recomeçavam, agora com a volta de Maria Aparecida Assis, a simpática Cidinha,
que tinha ficado de fora da última série, assistindo. Cidinha iria protagonizar a
113
cobiçada viuvinha Elena Popovna, de O Urso, de Chekhov, peça que iria ser
apresentada apenas no segundo semestre. O próprio Wallace pensava em
encenar um texto inédito seu, Caatinga, sobre a luta de dois irmãos, projeto logo
abandonado. Neuza Varella, nova aquisição do TECA, ensaiava Ressonâncias, de
Alice Gerstenberg, ao lado de Alice de Oliveira, Lygia Fabiano e Ruth Magali
Miranda.
O jornal O Imparcial especulava diariamente sobre o repertório, mas
Wallace relutava, não sabia exatamente que peças levar, talvez fosse melhor não
arriscar com nenhum texto novo e levar apenas o que a companhia fazia, e
bem.
Araken Toledo Pires e Oscar Rodrigues (substituindo Antonio Reis, citado
na reportagem) retornaram do Rio reclamando muito da burocracia que tiveram
que enfrentar com os servidores federais, mas com boas novidades: a viagem
seria mesmo no dia 1º de agosto, com retorno previsto por volta do dia 10.
Apresentações no Teatro da Cultura Artística, na sede do Ministério da Educação
e na sede da ABI Associação Brasileira de Imprensa estavam acertados. Foram
entrevistados “por locutores especializados da Rádio MEC e muito bem tratados
nas poucas vezes que viram o ministro Paschoal, que os municiava de bilhetes
enderados aos seus amigos nas repartições federais, mas o poderiam
imaginar que a tournée seria muito diferente da que anunciaram.
De volta aos preparativos, o fotógrafo Toni R. Martinez, “especializado
nesta atividade por contato direto com os estúdios de Hollywood” foi contratado
para criar um material fotográfico digno para a publicidade no Rio e Xeque-Mate,
peça de Kenneth Sawyer Goodman, com Barra, Tito, Julia e Oscar, era anunciada
como a terceira novidade para a temporada carioca
44
.
Finalmente, a companhia que, segundo os planos do meticuloso Araken,
sairia a de agosto, acabou saindo mesmo no dia 2, sexta-feira, e, de acordo
44
Vide Anexo I. Programas.
114
com a edição de O Imparcial de 31 de julho, chegando ao Rio no domingo, 4 de
agosto. Viagem feita, naturalmente, até São Paulo e de lá, ao Rio de Janeiro.
3.4 Em terras cariocas
O Rio de Janeiro vivia uma efervescência social e cultural até então nunca
vista na cidade. Eram os anos 1950, os anos JK. Além de ser a capital federal,
centro político e econômico do país, a cidade tinha uma vida cultural de fazer
inveja. Sem falar nas suas tão cantadas belezas naturais.
Era o início da Bossa-Nova, com a turma de Roberto Menescal e Ronaldo
Bôscoli se reunindo em Copacabana no apartamento de Nara Lo, trazendo
ainda Carlos Lyra, Tom Jobim e João Gilberto de lambuja, este acabando de voltar
definitivamente da Bahia e pronto para revolucionar a música brasileira.
Era a época do Cinema Novo, que teve no Rio os seus principais nomes e
se contrapôs às chanchadas e ao cinema produzido pela Vera Cruz, em São
Paulo, um cinema que imitava os europeus, principalmente o neo-realismo
italiano, sem qualquer relação com o país. Rio, 40 Graus, de Nelson Pereira dos
Santos inaugura o Cinema Novo e logo nomes como Glauber Rocha, Joaquim
Pedro de Andrade, Cacá Diegues e outros começariam a surgir com “uma mera
na mão e uma iia na cabeça”.
O Theatro Municipal do Rio de Janeiro era parada obrigatória, ao lado de
Buenos Aires, no roteiro das grandes orquestras internacionais, companhias de
dança e de teatro em viagem pela América do Sul. O Tâtre National Populaire
da França, de Jean Vilar, estava em cartaz na cidade semanas antes da chegada
do TECA.
O teatro produzido no Rio de Janeiro era coisa muito séria. Afinal, o Vestido
de Noiva, de Nelson Rodrigues, dirigido por Ziembinski, à frente do grupo Os
Comediantes, marco do início do moderno teatro brasileiro, estreou no Theatro
Municipal do Rio em 1943. Quem estava em cartaz naquele mês de agosto era o
115
talentoso Walter Pinto, com mais uma de suas revistas, É de Xurupito, que
estreava no Teatro Recreio, o music-hall carioca, com seus 34 quadros, entre
cortinas, sketches e números dançantes, com cenografia de Gianni Ratto, um
engraçadíssimo Walter D’Ávila, um numeroso grupo de girls e a nova vedete,
Rose Rondelli, ainda tímida, segundo O Cruzeiro, de 24 de agosto de 1957.
Em meio a toda essa efervescência, a comitiva de quase 30
araraquarenses do TECA desembarcava no Rio, no domingo, dia 4 de agosto, à
noite. Um ônibus do Ministério os aguardava. Logo na chegada, os desencontros
começaram. Descobriram, por uma notícia no jornal Correio da Manhã, que a
estréia não seria mais no dia seguinte, 5 de agosto, mas somente no dia 15 e no
teatro de arena do Hotel Glória, um espaço exíguo de apenas 120 lugares no
primeiro andar do hotel e com um tablado menor que o utilizado em Araraquara.
Imagem
30
:
g
rupo do TECA na piscina do hotel Glória. Rio de Janeiro, agosto de 1957.
Acervo: Maria
Cristina Moura.
116
Nada de muito grave, afinal o Hotel Glória ainda hoje em atividade no
bairro da Glória, próximo ao centro do Rio era um espaço muito respeitado na
cidade e recebia spedes internacionais famosos, rivalizando-se com o Hotel
Copacabana Palace. O próprio Teatro de Arena de São Paulo, comandado por
José Renato, já havia se apresentado no mesmo local.
Outro desencontro foi a situação dos alojamentos oferecidos, “inaceitáveis”
para as meninas da companhia, segundo D. Olga. Imediatamente encontrou-se
uma solução negociada: as meninas ficariam hospedadas no próprio Hotel Glória,
em dois apartamentos, enquanto a ala masculina amargaria os rigores de um
alojamento. As refeições seriam feitas no restaurant do CACO Centro
Acadêmico ndido de Oliveira, que oferecia “elogiosa condição sanitária e
higiênica além de uma refeição substancial e bem preparada”.
Apesar da ajuda de Paschoal Carlos Magno, o organizadíssimo Araken
estava sofrendo com aquilo tudo, cada dia era uma novidade, diziam que o
Presidente Juscelino viria para a estréia, depois desmentiam, falavam em levar o
TECA a Niterói, depois esqueciam.
Com o adiamento da estréia, a solução era buscar o que fazer. Tinham dez
dias para conhecer o Rio e aproveitar sua vida cultural. E o colunista Ameida
Santos, enviado especial do jornal O Imparcial, informava todos os detalhes, em
matérias quase diárias. Foram assistir À Margem da Vida e cumprimentar
Henriette Morineau; viram no Teatro da Maison de France o ensaio geral de
Adorável Júlia, foram recebidos por Ziembinsky, Walmor Chagas, Cleyde Yáconis
e Cacilda Becker; assistiram Gata em Teto de Zinco Quente, aproveitaram a praia
e a piscina e o bar do hotel.
Histórias engraçadas eram narradas pelo jornalista:
Nestas excursões, como em outras, sempre suceder algo aos
participantes. Aqui, pois, tem surgido algum caso que tem servido para boas
gargalhadas, e também para demonstrar o quanto a turma está unida,
formando um bloco coeso e disposto. A primeira vítima foi o nosso Oscar
Rodrigues. O ônibus estava cheio. Ele ficou perto da porta. Nisto, o carro
117
freia. Um ciclista vinha atrás e breca. Outro ciclista não teve tempo e
foram os dois ao chão. Oscar meteu a cabeça pela porta para espiar e o
motorista fechou a porta. O rapaz ficou com a cabeça presa. A turma
aproveitou para o barulho e “para! Abre! Ai Jesus...” etc., e o Oscar safou-se.
Mas foi susto. Mais adiante quando foi saltar, ia espiando para fora da
porta quando recuou depressa. Lá do canto do ônibus um gaiato berrou: - Aí,
mocinho, aprendeu, hein! Oscar teve que agüentar o resto do dia, que a
turma não lhe deu sossego.
Viram tamm Frankel, de Antonio Callado, no Teatro Dulcina, com nia
Carrero, Adolfo Celli e Paulo Autran e Lotaria, com a “sempre jovemEva Todor.
Assistiram de a uma montagem amadora de O Tempo e os Conways , de JB
Priestley, no Teatro O Tablado, no Jardim Botânico, onde tiveram um encontro
com a atriz e escritora Maria Clara Machado Solidificava-se ali a vontade de
montar o Pluft, o Fantasminha, texto de Maria Clara estreado em 1955, naquele
mesmo teatro.
Imagem
31
:
g
rupo do TECA em visita à
escritora Maria Clara
Machado. Teatro O Tablado
,
Rio de Janeiro,
agosto de
1957. Acervo: Maria Cristina
Moura.
118
Foram ao Pão de Açúcar, Corcovado, Urca, Niterói e até visitaram o Museu
Imperial de Petrópolis. Leonardo Barbieri, Deputado Federal por Araraquara, foi de
valiosa ajuda, recebeu a companhia no domingo à noite na Estação, levou-os a
um passeio pelo Rio, ofereceu um almoço na Churrascaria Gaúcha, um aperitivo
em sua residência, além de prestigiar todos os espetáculos. Mario Barra era dos
mais se divertiam na companhia, e divertia a todos.
Barra, acompanhado por Wallace, Araken e pelo colunista Almeida Santos,
gravou um especial para a TV Rio, no dia 14. O monólogo que o havia tornado
conhecido do público araraquarense: Sobre os Danos que traz o Tabaco, de
Chekhov. Apesar de ter agradado aos diretores da TV Rio, a apresentação não
agradou ao colunista de O Imparcial, por ter tido que ser adaptada às duas
câmaras da televisão, perdendo toda a marcação feita para a arena por Wallace,
além de ter sido condensada para atender à demanda da emissora.
Finalmente, a 15 de agosto de 1957, se daria a estréia do TECA no Rio de
Janeiro. O patrocínio da Sociedade de Teatro de Arte acabou não acontecendo
para aquela apresentação, somente para o dia 16, e o Teatro Duse leia-se
Paschoal Carlos Magno assumiu aquela data com os seguintes espetáculos:
119
Xeque-Mate
Amigos de Viagem
Os Dois Faladores
FICHAS TÉCNICAS
Nome da peça
Xeque-Mate The Game of Chess
Autor Kenneth Sawyer.Goodman (1883-1918) EUA
Gênero Drama
Ano de montagem 1957
Alexis Alexandrovitch Mario Barra
Constantino Tito Peixoto
Governanta Julia Abrahão
Personagem/ Ator
Boris Ivanovitch Shamaryeff Oscar Rodrigues
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Produção Araken de Toledo Pires
Obs Montada “em teatro de arena”
Nome da peça
Amigos de Viagem Hands across the Sea
Autor Noël Coward (1899-1973) Inglaterra
Gênero Comédia
Ano de montagem 1957
Elizabeth Izabel Reina
Marina Gilpin Julia Abrahão
Peter Gilpin Tito Peixoto
Alipio Corbert Moacyr Marchese
Abigail Wilson Lygia Fabiano
Fred Wilson Oscar Rodrigues
Mr. Smith Gerson Ferreira
Clara Maria Cristina Moura
Personagem/ Ator,
por ordem de
entrada em cena
Bob Benjamin Soares de Azevedo
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Produção Araken de Toledo Pires
120
Assistentes de
direção
Mario Barra, Antonio Reis da Silva e Oscar Rodrigues
Figurinos Felipe Luiz (heterônimo de Wallace), executados por Amélia Ferreira
Cenografia Diego de Vega (heterônimo de Wallace)
Maquiagem Leda Oliveira Pinto e John Brown (heterônimo de Wallace)
Direção de dança Cleide Braga
Tradução Carlos Lage
Obs Montada “em teatro de arena”
Nome da peça
Os Dois Faladores Los Habladores
Autor Miguel de Cervantes (1547-1616) Espanha
Gênero Entremez
Ano de montagem 1957
Roldan Mario Barra
Sarmiento Moacyr Marchese
Transeunte Edson Lessi
Homem da Lei Tito Peixoto
Homem da Lei Oscar Rodrigues
Homem da Lei Everton Aiévoli
Beatriz Julia Abrahão
Inês Maria Cristina Moura
1a. Dama Alice de Oliveira
Personagem/ Ator
2a. Dama Ruth Magali Miranda
Produção Araken de Toledo Pires
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Assistente de
direção
Mario Barra
Cenografia Diego de Vega (heterônimo de Wallace), executada por Iglá Aiévoli
Maquiagem Arthur Batelli e Leda de Oliveira Pinto
Figurinos Felipe Luiz (heterônimo de Wallace). Trajes executados por Amélia Ferreira.
Mestre de armas Tito Peixoto
Obs Montada “em teatro de arena”
Fonte: jornal O Imparcial e entrevistas.
121
Altas personalidades do mundo literário, jornalístico e social atenderam ao
convide do ministro e mais de 200 pessoas se espremeram para conhecer a
companhia. Dentre elas a notável declamadora de renome internacional”,
Margarida Lopes de Almeida, o crítico teatral Jota Efecê, o escritor Austregésilo de
Athayde, A. Accioly Neto, editor da revista O Cruzeiro, Álvaro Moreyra, Joracy
Camargo, Clô Prado, o diretor teatral Geraldo Queiroz, Gustavo Doria, Celso Kelly,
Bricio Leite, Raymundo Magalhães Jr., Carlos D. Andrade, Ernani Fornari, o
fotógrafo Heinz Pellwitz, entre outros.
O ministro Paschoal abriu a noite com um discurso onde relatava a sua
surpresa ao encontrar, no interior paulista, um grupo com a qualidade do TECA e
que fizera queso de mostrá-la ao público carioca. D. Olga, em seguida,
agradeceu emocionada
Imagem
32
:
D. Olga Ferreira
Campos discursando
antes da estréia do
TECA. Cenário da
peça Xeque-Mate
montado. Teatro de
arena do Hotel
Glória, Rio de
Janeiro, 15 de agosto
de 1957. Acervo:
Lygia Fabiano.
122
Ao final, um enorme sucesso, mais uma estréia consagradora do TECA,
desta vez, na capital do país. Wallace era trazido ao palco pelos atores para os
aplausos finais, os presentes não cansavam de elogiar e aplaudir de pé. Uma
frase pitoresca: Estão querendo nos tapear, trouxeram teatro profissional e m
com essa história de amadores”.
Após o espetáculo, o Dr. Eduardo Tapajoz, gerente do Hotel Glória,
ofereceu um coquetel a todos na Boite Beguin, no próprio hotel, onde a orquestra
espanhola Suspiros de España animava a festa, ao lado da “revelação paulista”,
Almir Ribeiro, e do “simplório cantor americano”, Johnny, todos bons amigos da
companhia. Mais tarde, naquela noite, Barra reclamou para o Tito: “Acende a luz
que eu quero ver o que eu estou comendo”. Quando lhe serviram um consomé,
iguaria até então desconhecida, ele gritou ao garçom: “Como é que eu vou tomar
isso aqui?” Tudo sem agressividade, num tom de sarcasmo que todos adoravam
45
.
No dia seguinte, 16 de agosto, no mesmo local outra vez lotado, a
companhia repetiria Amigos de Viagem e faria duas novas peças, já de repertório:
45
Entrevista com Maria Aparecida Assis e Julia Abrahão.
123
A Mão do Macaco
Se os Homens Jogassem Cartas como as Mulheres
Amigos de Viagem
FICHAS TÉCNICAS
Nome da peça
A Mão do Macaco The Monkey's Paw
Autor William W. Jacobs (1863-1943) Inglaterra
Gênero Conto
Ano de montagem 1956
Mr. White Mario Barra
Alberto Gerson Ferreira
Mrs. White Julia Abrahão
Sargento Morris Edson Lessi
Personagem/ Ator
Mr. Sampson Oscar Rodrigues
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Tradução Madalena Nicol
Obs Montada “em teatro de arena”
Nome da peça
Se os Homens Jogasse Cartas como
as Mulheres
If Men Played Cards as Women Do
Autor George S. Kaufman (1889-1961) EUA
Gênero Comédia
Ano de montagem 1956
John Moacyr Marchese
Bob Oscar Rodrigues
George Tito Peixoto
Personagem/ Ator
Marc Gerson Ferreira
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Tradução Wallace Leal V. Rodrigues
Obs Montada “em teatro de arena
124
Nome da peça
Amigos de Viagem Hands across the Sea
Autor Noël Coward (1899-1973) Inglaterra
Gênero Comédia
Ano de montagem 1957
Elizabeth Izabel Reina
Marina Gilpin Julia Abrahão
Peter Gilpin Tito Peixoto
Alipio Corbert Moacyr Marchese
Abigail Wilson Lygia Fabiano
Fred Wilson Oscar Rodrigues
Mr. Smith Gerson Ferreira
Clara Maria Cristina Moura
Personagem/ Ator,
por ordem de
entrada em cena
Bob Benjamin Soares de Azevedo
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Produção Araken de Toledo Pires
Assistentes de
direção
Mario Barra, Antonio Reis da Silva e Oscar Rodrigues
Figurinos Felipe Luiz (heterônimo de Wallace), executados por Amélia Ferreira
Cenografia Diego de Vega (heterônimo de Wallace)
Maquiagem Leda Oliveira Pinto e John Brown (heterônimo de Wallace)
Direção de dança Cleide Braga
Tradução Carlos Lage
Obs Montada “em teatro de arena”
Fonte: jornal O Imparcial e entrevistas.
Finalmente, no dia 17, o jornal O Imparcial noticiava que o TECA se
apresentaria nos jardins do Teatro Duse, no bairro de Santa Teresa, mas a
companhia não trabalhou neste bado, apenas saboreou uma feijoada oferecida
por Paschoal Carlos Magno em seu teatro, que era tamm a sua bela mansão de
Santa Teresa, regada a música, muita conversa sobre teatro e a poesia,
declamada por Margarida Lopes de Almeida.
125
O jornalista e escritor Antonio Callado lembra-se do amigo Paschoal Carlos
Magno e dos encontros promovidos no Teatro Duse.
A discussão sobre teatro, no Duse, era uma coisa permanente. Inclusive
havia circulando por lá, sempre, moças e rapazes do interior (além dos do
Rio, é claro), que faziam teatro em suas cidades. Gente que ficava por lá,
dormia lá, e isso dava uma certa permanência à discussão sobre teatro,
assunto de toda hora, no Duse. E assim, o Duse, como a casa do Paschoal
Carlos Magno, era na verdade, um centro de estudos de teatro, uma espécie
de albergue teatral, também. Então, não digo que houvesse no Duse uma
discussão formal sobre teatro, com hora marcada e pauta detalhada. Havia
sim, uma vivência em torno do teatro, uma coisa com constância e
permanência.
46
Pelas informações colhidas com o jornal O Imparcial, apenas duas
apresentações, as dos dias 15 e 16, estão relatadas e com os detalhes acima.
Apesar de noticiada pelo jornal, a apresentação do dia 17 de agosto, sábado, não
ocorreu efetivamente, por unanimidade nas entrevistas realizadas. No entanto, os
mesmos entrevistados insistem que foram mais que apenas duas apresentações
realizadas no Rio de Janeiro, apesar de não saberem precisar quais e em que
datas.
Têm certeza que O Protocolo e Um Pedido de Casamento foram
apresentadas, informação esta que acaba sendo corroborada e pelas fotos a
cores destas duas peças na Revista Esso. Tamm pelo texto da revista O
Cruzeiro, de 24 de agosto de 1957, que cita a peça de Chekhov e tamm O
Menino de Moony não Chora, inclusive com elogios à atuação de Ruth Magali
Miranda, possivelmente por esta peça. Assim, cabe-nos imaginar, com bastante
certeza, que estas três peças também foram levadas. Se juntas ou separadas, não
se pode afirmar.
46
REVISTA Dionysos. Teatro do Estudante do Brasil. Teatro Universitário Teatro Duse. Coordenação de
José Arrabal. Ministério da Educação e Cultura. SEC. Serviço Nacional de Teatro. Edição n° 23. Setembro de
1978.
126
Quanto à data mais provável, ou datas mais prováveis, outra vez tem-se
que fazer algumas conjecturas. A estréia se deu no dia 15 de agosto. Sabe-se
que a companhia chegou em Araraquara no dia 21 de agosto à noite
47
, portanto
deve ter saído do Rio de Janeiro no dia 20, sem tempo para uma apresentação
neste dia. Portanto, poderiam ter feito espetáculos nos dias 18, domingo, e/ou
19, segunda-feira, que no dia 17, sábado, passaram o dia na casa de Paschoal
e o se apresentaram, segundo as entrevistas de Maria Aparecida Assis, Lygia
Fabiano e Julia Abrahão. Assim, no dia 18 ou 19, ocorreu a seguinte
apresentação:
47
Entrevista com Maria Cristina Moura.
Imagem
33
: Lygia Fabian
o,
Izabel Reina e Maria Cristina
Moura com os figurinos de
Amigos de Viagem
. Hotel
Glória, Rio de Janeiro, agosto de
1957. Acervo: Maria Cristina
Moura.
127
O Menino de Moonyo Chora
O Protocolo
Um Pedido de Casamento
FICHAS TÉCNICAS
Nome da peça
O Menino de Moony não Chora Moony's Kid Don't Cry
Autor Tennessee Williams (1911-1983) EUA
Gênero Fantasia dramática
Ano de montagem 1957
Jane Ruth Magali Miranda Personagem/ Ator,
por ordem de
entrada em cena
Moony Gumercindo Ferreira Junior
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Produção Araken de Toledo Pires
Assistentes de
direção
Mario Barra, Antonio Reis da Silva e Oscar Rodrigues
Figurinos Felipe Luiz (heterônimo de Wallace), executados por Amélia Ferreira
Cenografia Diego de Vega (heterônimo de Wallace)
Maquiagem Leda Oliveira Pinto e John Brown (heterônimo de Wallace)
Obs Montada “em teatro de arena”
Nome da peça
O Protocolo
Autor Machado de Assis (1839-1908) Brasil
Gênero Comédia em 1 ato
Ano de montagem 1957
Elisa Maria Aparecida Assis
Venâncio Alves Moacyr Marchese
Sr. Pinheiro Tito Peixoto
Personagem/ Ator
Lulu Alice de Oliveira
Produção Araken de Toledo Pires
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Assistente de
direção
Mario Barra
128
Cenografia Diego de Vega (heterônimo de Wallace), executada por Iglá Aiévoli
Maquiagem Arthur Batelli e Leda de Oliveira Pinto
Figurinos
Felipe Luiz (heterônimo de Wallace). Vestidos de Maria Aparecida Assis e
Alice de Oliveira executados por Amélia Ferreira. Guarda-roupa masculino por
Lucilio Leite.
Obs Montada “em teatro de arena”
Nome da peça
Um Pedido de Casamento The Proposal
Autor Anton Chekhov (1860-1904) Rússia
Gênero Comédia em 1 ato
Ano de montagem 1957
Giusicov Mario Barra
Lomov Moacyr Marchese
Personagem/ Ator
Natalia Stepanova Alice de Oliveira
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Tradução Leonid Timochenko
Obs Montada “em teatro de arena”
Fonte: jornal O Imparcial, revista O Cruzeiro, Revista Esso e entrevistas.
Exaustos e felizes, deixavam o Rio de Janeiro satisfeitos com os aplausos
recebidos do público, mas ainda sem saber da opinião da crítica. Cidinha, Maria
Aparecida Assis, deixava no Rio um apaixonado Dr. Tapajoz, o solícito gerente do
Hotel Glória, que durante anos lhe mandaria flores no aniversário com propostas,
sempre recusadas, de casamento
48
.
48
Entrevista com Maria Aparecida Assis.
129
Imagem
34
:
Revista Esso
com parte de matéria assinada por Geraldo Queiroz.
Rio de Janeiro, 1958
Edição nº 1, página 22. Na foto, cena de Os Faladores, com Alice de Oliveira, em primeiro plano, Ruth
Magali Miranda, à esquerda, Julia Abrahão, acima e Lygia Fabiano à direita. Acervo: Maria Aparecida
Assis.
130
3.5 A volta a Araraquara
Embalados pelo sucesso e de volta à realidade de Araraquara, o TECA
seria recebido no dia 21 de agosto de 1957 por uma legião de parentes e amigos
e receberia algumas homenagens na cidade, dentre elas um jantar oferecido pelo
Rotary Clube local e muito reconhecimento nas ruas para os atores. Alice de
Oliveira e Cidinha ficaram em São Paulo por uns dias, chegando a tempo da nova
temporada araraquarense.
Imagem
35
: c
hegada do TECA a Araraquara. Na primeira fila Wallace, abraçado à sua mãe e Ruth Magali
Miranda, Lygia Fabiano, Gerson Ferreira, o colunista Almeida Santos e Everton Aiévoli, entre outros. 21 de
Agosto de 1957. Acervo: Lygia Fabiano.
131
Mas a cabeça de todos estava ainda no Rio de Janeiro. Haveria alguma
crítica, afinal? Todo aquele esforço seria reconhecido? Uma matéria assinada por
João da Ega, no jornal Última Hora, de 20 de agosto, traria os primeiros elogios:
As realidades que tornaram esse conjunto digno dos mais sinceros
aplausos, fazem com que o T.E.C.A. esteja à altura de qualquer platéia
civilizada e, por isso mesmo, nós, cariocas, ficamos até com um pouco de
vergonha por não termos muitas outras equipes impregnadas do mesmo
fervor e do mesmo amor pela causa do teatro.
Logo depois viriam outras: O Mundo Ilustrado, Revista Esso, a revista
Manchete trazendo fotos da companhia, inclusive na capa. A revista O Cruzeiro
era a principal revista semanal do país e contava com um time de colaboradores e
colunistas de primeira, como David Nasser, Gilberto Freyre, Austregésilo de
Athayde, A. Accioly Netto, Rachel de Queiroz, Vão Gôgo (Millôr Fernandes),
Péricles, Dinah Silveira de Queiroz, João Conde, Carlos Castello Branco, entre
outros. Foi, portanto, uma completa surpresa que, na sua edição de 14 de
setembro de 1957, a prestigiosa coluna TEATRO, assinada por A. Accioly Netto,
trouxesse uma foto de Alice de Oliveira (citada de forma equivocada como Maria
Cristina Moura), Mario Barra e Oscar Rodrigues em “uma primorosa edição” de
Um Pedido de Casamento, com o subtítulo: “Alvíssaras para Araraquara
49
.
Uma crítica excelente, inesperada até e que colocava a companhia como
uma realidade nacional e o apenas um fenômeno local, caipira. Wallace tinha
ilusões quanto a um subsídio constante da Prefeitura e voltava a alimentar seus
planos de fazer cinema.
Na ausência do TECA, o Municipal continuava a ser bastante utilizado,
inclusive, agora, com a existência do Teatro Juvenil de Araraquara, um grupo
criado por José Roberto Bueno, que ensaiava Dias Felizes, de Claude André
Puget, para ser estreado ainda em 1957.
49
Vide Anexo II. Artigos Especiais.
132
Mas o público araraquarense estava ávido para ver o TECA outra vez em
ação, agora depois do sucesso carioca. Assim, apenas 3 semanas após sua
chegada à cidade, a companhia anunciava sua quinta série de especulos “em
teatro de arena”, que estrearia no dia 6 de setembro e ficaria em cartaz até o dia
11:
133
Xeque-Mate
Ressonâncias
O Urso
FICHAS TÉCNICAS
Nome da peça
Xeque-Mate The Game of Chess
Autor Kenneth Sawyer.Goodman (1883-1918) EUA
Gênero Drama
Ano de montagem 1957
Alexis Alexandrovitch Mario Barra
Constantino Tito Peixoto
Governanta Julia Abrahão
Personagem/ Ator
Boris Ivanovitch Shamaryeff Oscar Rodrigues
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Produção Araken de Toledo Pires
Obs Montada “em teatro de arena”
Nome da peça
Ressonâncias Overtones
Autor Alice Gerstenberg (1885-1972) EUA
Gênero Fantasia
Ano de montagem 1957
Hettie Ruth Magali Miranda
Harriet Neuza Varella
Margaret Lygia Fabiano
Personagem/ Ator
Maggie Alice de Oliveira
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Produção Araken de Toledo Pires
Tradução Esther Mesquita
Obs Montada “em teatro de arena”
Nome da peça
O Urso The Boor
Autor Anton Chekhov (1860-1904) Rússia
134
Gênero Comédia
Ano de montagem 1957
Luká Mario Barra
Elena Popovna Maria Aparecida Assis
Personagem/ Ator
Grigori Stiepanovitch Smirnov Moacyr Marchese
Dirreção Wallace Leal V. Rodrigues
Tradução Wallace Leal V. Rodrigues
Obs Montada “em teatro de arena”
Fonte: jornal O Imparcial e entrevistas.
O Municipal voltava a receber o público araraquarense em grande número,
o público do TECA se podia dizer. O Iemanjá Bar voltava a brilhar nos
intervalos, montado com muito bom gosto por Iglá e Everton Aiévoli. Do repertório
escolhido, Xeque-Mate havia sido apresentada no Rio, já O Urso e Ressonâncias,
Imagem
36
: Tito Peixoto, Mario Barra, Julia Abrahã
o e Oscar Rodrigues em cena de
Xeque
-
Mate.
Teatro
Municipal de Araraquara, setembro de 1957. Acervo: Lygia Fabiano.
135
que agora faziam suas estréias, haviam sido ensaiadas antes da viagem mas,
devido ao espaço reduzido da arena do Hotel Glória, acabaram não sendo
apresentadas.
A imprensa mais uma vez elogiou as montagens. O jornal O Imparcial, de 7
de setembro, trazia a seguinte manchete: “Estreou auspiciosamente o TECA”,
destacando as atuações dos estreantes, as de Cidinha, Moacyr e Barra, o
ambiente de semi obscuridade de Xeque-Mate e os figurinos de O Urso.
Imagem
37
: Lygia Fabiano,
Alice de Oliveira, Neuza
Varella
e Ruth Magali Miranda
em Ressonâncias. Teatro
Municipal de Araraquara,
setembro de 1957. Acervo:
Lygia Fabiano.
136
Nota-se que, apesar de toda a expectativa, uma primeira menção a que um
dos espetáculos, o de domingo, não havia alcançado a sua lotação, “uma casa
pequena, provocada talvez pela afluência aos cinemas”. O cinema fazia parte da
história da companhia; em 1954, com o projeto da filmagem de Aurora de uma
Cidade, um grupo de intelectuais da cidade havia se juntado, dando início ao
TECA, todos tendo no cinema sua principal fonte de inspiração. A indústria do
cinema começava a atrair multidões a seus filmes, os astros de Hollywood eram
referência para a juventude e não é de se estranhar que a concorrência do cinema
tenha sido um problema a mais para a atração do público. E para complicar, o
Teatro Municipal de Araraquara ficava na Rua São Bento, Rua 3, no quarteirão
entre os dois principais cinemas da cidade, o Odeon e o Paratodos.
3.6 Reapresentações e outras atividades
A quinta temporada terminou no dia 11 de setembro de 1957, após 5
espetáculos e logo no dia 12, quinta-feira, voltaria em cartaz, a o dia 16, a
reapresentação, em temporada popular, da terceira:
137
Um Drama na Malásia
O Protocolo
Os Dois Faladores
FICHAS TÉCNICAS
Nome da peça
Um Drama na Malásia Before the Party
Autor Somerset Maugham (1874-1965) Inglaterra
Gênero Conto
Ano de montagem 1957
Kathleen Lygia Fabiano
Millicent Ruth Magali Miranda
Mrs. Skinner Ivete Alves Costa
Mr. Skinner Edson Lessi
Personagem/ Ator
A Criada Izabel Reina
Produção Araken de Toledo Pires
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Assistente de direção Mario Barra
Cenografia Diego de Vega (heterônimo de Wallace), executada por Iglá Aiévoli
Maquiagem Arthur Batelli e Leda de Oliveira Pinto
Figurinos Felipe Luiz (heterônimo de Wallace)
Sonoplastia Alekan (heterônimo de Araken)
Iluminação Toni R. Martinez
Acessórios elétricos Oficina N.S.Aparecida
Obs Montada “em teatro de arena”
Nome da peça
O Protocolo
Autor Machado de Assis (1839-1908) Brasil
Gênero Comédia em 1 ato
Ano de montagem 1957
Elisa Maria Aparecida Assis
Venâncio Alves Moacyr Marchese
Personagem/ Ator
Sr. Pinheiro Tito Peixoto
138
Lulu Alice de Oliveira
Produção Araken de Toledo Pires
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Assistente de direção Mario Barra
Cenografia Diego de Vega (heterônimo de Wallace), executada por Iglá Aiévoli
Maquiagem Arthur Batelli e Leda de Oliveira Pinto
Figurinos
Felipe Luiz (heterônimo de Wallace). Vestidos de Maria Aparecida Assis e
Alice de Oliveira executados por Amélia Ferreira. Guarda-roupa masculino
por Lucilio Leite.
Obs Montada “em teatro de arena”
Nome da peça
Os Dois Faladores Los Habladores
Autor Miguel de Cervantes (1547-1616) Espanha
Gênero Entremez
Ano de montagem 1957
Roldan Mario Barra
Sarmiento Moacyr Marchese
Transeunte Edson Lessi
Homem da Lei Tito Peixoto
Homem da Lei Oscar Rodrigues
Homem da Lei Everton Aiévoli
Beatriz Julia Abrahão
Inês Maria Cristina Moura
1a. Dama Lygia Fabiano
Personagem/ Ator
2a. Dama Ruth Magali Miranda
Produção Araken de Toledo Pires
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Assistente de direção Mario Barra
Cenografia Diego de Vega (heterônimo de Wallace), executada por Iglá Aiévoli
Maquiagem Arthur Batelli e Leda de Oliveira Pinto
Figurinos Felipe Luiz (heterônimo de Wallace). Trajes por Amélia Ferreira.
Mestre de armas Tito Peixoto
Obs Montada “em teatro de arena
Fonte: jornal O Imparcial e entrevistas.
139
E a repetição tamm da quarta série de espetáculos:
Imagem
38
:
Os Dois Faladores
. Teatro Municipal de Araraquara, agosto de 1956. Acervo: Maria Cristina
Moura.
140
O Menino de Moonyo Chora
Sobre os Danos que traz o Tabaco
Amigos de Viagem
FICHAS TÉCNICAS
Nome da peça
O Menino de Moony não Chora Moony's Kid Don't Cry
Autor Tennessee Williams (1911-1983) EUA
Gênero Fantasia dramática
Ano de montagem 1957
Jane Ruth Magali Miranda
Personagem/ Ator
Moony Gumercindo Ferreira Junior
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Produção Araken de Toledo Pires
Assistentes de
direção
Mario Barra, Antonio Reis da Silva e Oscar Rodrigues
Figurinos Felipe Luiz (heterônimo de Wallace), executados por Amélia Ferreira
Cenografia Diego de Vega (heterônimo de Wallace)
Maquiagem Leda Oliveira Pinto e John Brown (heterônimo de Wallace)
Sonoplastia Alekan (heterônimo de Araken)
Iluminação Everton Aiévoli e Nelson Gullo
Obs Montada “em teatro de arena”
Nome da peça
Sobre os Danos que traz o Tabaco On the harmfullness of tobacco
Autor Anton Chekhov (1860-1904) Rússia
Gênero Monólogo
Ano de montagem 1957
Personagem/ Ator Ivan Ivanowitch Husmeadorov Mario Barra
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Produção Araken de Toledo Pires
Assistentes de
direção
Mario Barra, Antonio Reis da Silva e Oscar Rodrigues
Figurinos Felipe Luiz (heterônimo de Wallace), executados por Amélia Ferreira
Cenografia Diego de Vega (heterônimo de Wallace)
141
Maquiagem Leda Oliveira Pinto e John Brown (heterônimo de Wallace)
Sonoplastia Alekan (heterônimo de Araken)
Iluminação Everton Aiévoli e Nelson Gullo
Obs Montada “em teatro de arena”
Nome da peça
Amigos de Viagem Hands across the Sea
Autor Noël Coward (1899-1973) Inglaterra
Gênero Comédia
Ano de montagem 1957
Elizabeth Izabel Reina
Marina Gilpin Julia Abrahão
Peter Gilpin Tito Peixoto
Alipio Corbert Moacyr Marchese
Abigail Wilson Lygia Fabiano
Fred Wilson Oscar Rodrigues
Mr. Smith Gerson Ferreira
Clara Maria Cristina Moura
Personagem/ Ator,
por ordem de
entrada em cena
Bob Benjamin Soares de Azevedo
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Produção Araken de Toledo Pires
Assistentes de
direção
Mario Barra, Antonio Reis da Silva e Oscar Rodrigues
Figurinos Felipe Luiz (heterônimo de Wallace), executados por Amélia Ferreira
Cenografia Diego de Vega (heterônimo de Wallace)
Maquiagem Leda Oliveira Pinto e John Brown (heterônimo de Wallace)
Sonoplastia Alekan (heterônimo de Araken)
Iluminação Everton Aiévoli e Nelson Gullo
Direção de dança Cleide Braga
Tradução Carlos Lage
Obs Montada “em teatro de arena”
Fonte: jornal O Imparcial e entrevistas.
Uma ousadia aceita por Wallace, a pedidos da Prefeitura, acabaria lhe
rendendo críticas pela “forma atabalhoada” com que foi programada as reprises,
142
“sem a devida publicidade e pelas substituições dos artistas”, reclamava O
Imparcial, em sua edição de 15 de setembro.
Wallace e os atores e atrizes do TECA se envolviam, amiúde, em outras
atividades na cidade. Maria Aparecida Assis e Ruth Magali Miranda, por exemplo,
sempre participavam de desfiles de modas, com modelos desenhados pelo próprio
Wallace.
Festa da Ginástica era uma comemoração muito comum nas décadas de
1950 e 1960, toda cidade do interior de São Paulo organizava a sua. Em
Araraquara, o Estádio da Fonte Luminosa, da Associação Ferroviária de Esportes,
era sempre o palco escolhido para acolher os jovens estudantes de todos os
colégios da cidade que se revezavam em demonstrações de ginástica
sincronizadas. O Clube dos Professores de Educação Física da cidade, pensando
em angariar fundos para a Festa, organizou 3 dias de shows variados no Teatro
Municipal, com o nome Prata da Casa, dias 18, 19 e 20 de setembro.
Com o apoio da Superintendência de Cultura, os principais grupos da
cidade se apresentavam, com toda a bilheteria se revertendo para a Festa da
Ginástica. Assim, realizaram-se, além das exposições de fotografia do Foto Cine
Clube Aracoara, de selos antigos do Clube Filatélico e Numismático, de pinturas,
esculturas e cerâmica dos alunos da Escola de Belas Artes, curtas apresentações
da Orquestra Marabá, do Trio Marajó, do Coro de Santa Cruz, de alunos do
Conservatório Dramático e Musical da cidade, do Coral Araraquarense, do Trio
Schumann, Trio Coringa e da Escola de Ballet Mímica. O TECA participou, com a
reapresentação de:
143
Um Pedido de Casamento
FICHAS TECNICAS
Nome da peça
Um Pedido de Casamento The Proposal
Autor Anton Chekhov (1860-1904) Rússia
Gênero Comédia em 1 ato
Ano de montagem 1957
Giusicov Mario Barra
Lomov Oscar Rodrigues
Personagem/ Ator
Natalia Stepanova Lygia Fabiano
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Tradução Leonid Timochenko
Obs Montada “em teatro de arena”
Fonte: jornal O Imparcial e entrevistas.
No elenco, Mario Barra, Oscar Rodrigues e Lygia Fabiano no lugar de Alice
de Oliveira, dando “mais naturalidade à peça”.
No programa vê-se ainda o nome do jovem José Celso Martinez Corrêa,
futuro fundador do Teatro Oficina de São Paulo, representando o Centro Cultural
Alberto Torres
50
.
3.7 Viagem e desfile
A companhia ainda teria, em 1957, fôlego para uma viagem a Taquaritinga,
onde nos dias 5 e 6 de outubro, um final de semana, apresentaria duas séries de
espetáculos no Clube Imperial daquela cidade, desta vez mesclando as obras do
já vasto repertório. No dia 5 apresentaram:
50
De acordo com o teatrólogo Fernando Peixoto, em artigo publicado na revista Dionysos em sua edição de
janeiro de 1982, esta pode ser considerada a primeira experncia em direção do futuro diretor do Teatro
Oficina, José Celso Martinez Corrêa.
144
A Mão do Macaco
O Urso
Amigos de Viagem
FICHAS TÉCNICAS
Nome da peça
A Mão do Macaco The Monkey's Paw
Autor William W. Jacobs (1863-1943) Inglaterra
Gênero Conto
Ano de montagem 1956
Mr. White Mario Barra
Alberto Gerson Ferreira
Mrs. White Julia Abrahão
Sargento Morris Edson Lessi
Personagem/ Ator
Mr. Sampson Oscar Rodrigues
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Tradução Madalena Nicol
Obs Montada “em teatro de arena”
Nome da peça
O Urso The Boor
Autor Anton Chekhov (1860-1904) Rússia
Gênero Comédia
Ano de montagem 1957
Luká Mario Barra
Elena Popovna Maria Aparecida Assis
Personagem/ Ator
Grigori Stiepanovitch Smirnov Moacyr Marchese
Dirreção Wallace Leal V. Rodrigues
Tradução Wallace Leal V. Rodrigues
Obs Montada “em teatro de arena”
Nome da peça
Amigos de Viagem Hands across the Sea
Autor Noël Coward (1899-1973) Inglaterra
Gênero Comédia
145
Ano de montagem 1957
Elizabeth (Annete) Izabel Reina
Marina Gilpin Julia Abrahão
Peter Gilpin Tito Peixoto
Alipio Corbert Moacyr Marchese
Abigail Wilson Lygia Fabiano
Fred Wilson Oscar Rodrigues
Mr. Smith Gerson Ferreira
Clara Maria Cristina Moura
Personagem/ Ator,
por ordem de
entrada em cena
Bob Benjamin Soares de Azevedo
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Produção Araken de Toledo Pires
Assistentes de
direção
Mario Barra, Antonio Reis da Silva e Oscar Rodrigues
Figurinos Felipe Luiz (heterônimo de Wallace), executados por Amélia Ferreira
Cenografia Diego de Vega (heterônimo de Wallace)
Maquiagem Leda Oliveira Pinto e John Brown (heterônimo de Wallace)
Direção de dança Cleide Braga
Tradução Carlos Lage
Obs Montada “em teatro de arena”
Fonte: programa do espetáculo.
No dia seguinte, domingo, 6 de outubro, às 20 horas, o Clube Imperial de
Taquaritinga assistiu:
146
Um Pedido de Casamento
Se os Homens Jogassem Cartas como as Mulheres
Os Dois Faladores
FICHAS TÉCNICAS
Nome da peça
Um Pedido de Casamento The Proposal
Autor Anton Chekhov (1860-1904) Rúsia
Gênero Comédia em 1 ato
Ano de montagem 1957
Giusicov Mario Barra
Lomov Oscar Rodrigues
Personagem/ Ato
Natalia Stepanova Lygia Fabiano
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Tradução Leonid Timochenko
Obs Montada “em teatro de arena”
Nome da peça
Se os Homens Jogasse Cartas
como as Mulheres
If Men Played Cards as Women Do
Autor George S. Kaufman (1889-1961) EUA
Gênero Comédia
Ano de montagem 1956
John Moacyr Marchese
Bob Oscar Rodrigues
George Tito Peixoto
Personagem/ Ator
Marc Mario Barra
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Tradução Wallace Leal V. Rodrigues
Obs Montada “em teatro de arena”
Nome da peça
Os Dois Faladores Los Habladores
Autor Miguel de Cervantes (1547-1616) Espanha
Gênero Entremez
147
Ano de montagem 1957
Roldan Mario Barra
Sarmiento Moacyr Marchese
Transeunte Edson Lessi
Homem da Lei Tito Peixoto
Homem da Lei Oscar Rodrigues
Homem da Lei Everton Aiévoli
Beatriz Julia Abrahão
Inês Maria Cristina Moura
1a. Dama Lygia Fabiano
Personagem/ Ator
2a. Dama Ruth Magali Miranda
Produção Araken de Toledo Pires
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Assistente de
direção
Mario Barra
Cenografia Diego de Vega (heterônimo de Wallace), executada por Iglá Aiévoli
Maquiagem Arthur Batelli e Leda de Oliveira Pinto
Figurinos Felipe Luiz (heterônimo de Wallace). Trajes executados por Amélia Ferreira.
Mestre de armas Tito Peixoto
Obs Montada “em teatro de arena”
Fonte: programa do espetáculo.
A cidade de São Carlos comemorava o seu centenário no dia 4 de
novembro de 1957. Apesar da rivalidade histórica, nada mais educado e
apropriado que convidar a companhia de teatro da cidade vizinha a se apresentar
na cidade em desfile em carro aberto. Mesmo sem ter havido uma apresentação,
as fotos do desfile, com Neuza Varella e Mario Barra nos figurinos de Amigos de
Viagem, merecem ser reproduzidas.
148
Imagem
39
:
desfile no
centenário da
cidade de São
Carlos. Neuza
Varella e Mario
Barra em figurinos
de Amigos de
Viagem. São
Carlos, 4 de
novembro de 1957.
Acervo: Lygia
Fabiano.
149
Ao final do ano Paschoal Carlos Magno ainda teria outra novidade. Na
votação dos melhores de 1957 da Associação Brasileira dos Críticos Teatrais, o
TECA recebera o trou Apolo, como o melhor conjunto teatral amador do ano,
Wallace como revelação de diretor e Mario Barra como revelação de ator. Uma
escultura em bronze de Bruno Giorgi, o troféu Apolo, desapareceu dos arquivos de
Wallace e da companhia.
Um grande ano chegava ao final e ainda com promessas de que o TECA se
apresentaria na cidade de São Paulo. O Deputado araraquarense José Alfredo do
Amaral Gurgel garantia que o Governador Adhemar de Barros iria dirigir um
convite oficial à companhia, o que acabou não acontecendo, assim como a ajuda
financeira, prometida pela Prefeitura, nunca chegou aos cofres do TECA.
150
Imagem
40
: Wallace Leal V.
Rodrigues nas filmagens de
Santo Antonio e Vaca
. Araraquara, 1958. Acervo:
Américo Aguiar Borges.
151
4. A IMPORTÂNCIA DO CINEMA
No início de 1958, a recém lançada Revista Esso traria em seu primeiro
número uma matéria sobre o teatro amador no Brasil, uma reportagem de duas
páginas com fotos coloridas das montagens no Rio de Janeiro, “prova do
desenvolvimento amadorista brasileiro, assinada por Geraldo Queiroz, diretor de
O Tempo e os Conways, montagem que o grupo havia assistido no Teatro O
Tablado, no Rio de Janeiro e que havia assistido aos espetáculos do TECA no
Hotel Glória.
4.1 Um ano de preparativos
Todo o sucesso da companhia em 1957 teve um desfecho que não poderia
ser considerado inesperado: o de retomar o projeto inicial de se fazer um filme de
longa metragem em 35mm. Desde aquele projeto histórico de 1953, Aurora de
uma Cidade, cinema sempre havia sido o principal objetivo de todos. O teatro,
apesar do envolvimento e da motivação, acabara ocorrendo quase que por acaso
e agora, quando todos se sentiam mais confiantes com o êxito alcançado, o
assunto voltava à tona.
Mas as coisas haviam evoluído, Wallace sentia-se agora atraído pelo
folclore. Um filme histórico não era mais sua prioridade. Em conversas com sua
amiga Inah Perez Bittencourt, foi se envolvendo nas histórias simples da região de
Araraquara, tão cheias de mensagens humanas. Durante meses havia convivido,
sempre aos domingos, com moradores do meio rural no entorno da cidade e
começara, já em 1957, a rascunhar o roteiro do que seria o seu novo filme.
Inah era uma mulher avançada para sua época. Trabalhava na Padaria
Perez, de propriedade da família e ponto de encontro de boêmios e artistas
152
notívagos
51
. Fazia parte ativa do grupo intelectual da cidade, era poetisa,
pesquisadora e, uma curiosidade, foi a primeira mulher araraquarense a tirar um
brevê para pilotar aviões. O músico e autor da trilha sonora do filme, Américo
Aguiar Borges, lembra de seu encontro com Inah, em setembro de 1957, quando o
primeiro esboço do roteiro do filme foi discutido e a idéia da trilha sonora foi
pensada: “Ela apareceu de uniforme na minha casa”
52
.
A atividade cinematográfica no Brasil começou a se industrializar no final da
década de 1940, com a criação da Companhia Cinematográfica Vera Cruz, um
projeto cuja gênese está ligada ao mesmo grupo do TBC. O cineasta brasileiro,
com sólida carreira na Inglaterra e na Fraa, Alberto Cavalcanti, foi convidado a
dirigir a companhia e nos relata o que encontrou:
Em fins de 1949 fui convidado pelo Sr. Assis Chateaubriand para fazer uma
rie de conferências no Museu de Arte de São Paulo, aqui chegando em 4
de setembro. Como tinha vivido na Europa durante 36 anos, tendo feito
nesse tempo uma viagem de três meses ao Rio, resolvi aceitar. Quase no
fim de minha estada, fui apresentado aos senhores Franco Zampari, Adolfo
Celi, Ruggero Jacobbi, pelo Sr. Francisco Matarazzo Sobrinho. Aqueles
senhores (todos os três completamente alheios ao cinema, sob o ponto de
vista industrial) convidaram-me para visitar, em São Bernardo do Campo, os
terrenos pertencentes ao último, onde planejavam instalar a futura
Companhia Cinematográfica Vera Cruz (PELLIZZARI e VALENTINETTI,
1995, p. 159).
Cavalcanti descreve sua decepção nos primeiros anos com a falta de
estrutura e de profissionalismo da equipe montada por Franco Zampari, o que
chamava de “alergia ao planejamento”. Reclamava de Aldo Calvo: “cenógrafo,
cuja irresponsabilidade tornou-se notória”; de Adolfo Celi que, além de o
conhecer a cnica cinematográfica, o que eu sabia, era um diretor lento e
hesitante no manejo dos atores, e possuía um sentido um tanto grosseiro na
direção das cenas onde havia uma certa sensualidade”; e até mesmo da equipe
de dirigentes: “O nervosismo do Sr. Franco Zampari nesse período [filmagem de
51
Vide Anexo II. Artigos Especiais, texto de Ignácio de Loyola Brandão intitulado “Na Madrugada, estrelas
comem pão quente”. (BRANDÃO, 2006, 100).
52
Entrevista com Américo Aguiar Borges.
153
Terra é sempre Terra] tornou-se insuportável e cenas de estrelismo à italiana se
sucediam” (PELLIZZARI e VALENTINETTI, 1995, p. 159-165).
Se esta desorganização, relatada em maiores detalhes pelo organizado
Cavalcanti em seus artigos, era encontrada na maior estrutura de cinema do
Brasil, a Vera Cruz, imagine-se o que seria fazer um filme em Araraquara.
Em suas viagens a São Paulo, Wallace havia conhecido uma pessoa que
entendia muito bem a técnica cinematográfica, um profissional que seria
fundamental em todo o processo araraquarense: Edward Freund, um verdadeiro
homem de cinema. Freund, polonês de nascimento, havia sido ator, diretor,
escritor, editor, fotógrafo, era especialista em iluminação, sonoplastia, montagem,
tudo o que uma companhia de cinema precisava, que ninguém sabia nada de
técnica cinematográfica. Teve uma carreira intensa no cinema brasileiro, tendo
atuado, na cada de 1970, em muitas pornochanchadas e dirigido, entre outros,
A Virgem e o Bem Dotado e Diário de uma Prostituta, além de diversos filmes de
faroeste. Em 1957 Freund, que estudara na Escola de Lods, passara pelo cinema
italiano, trabalhara um pouco na Vera Cruz, estava ainda no início de sua curiosa
e movimentada carreira no Brasil. Além disso, era uma pessoa de muito cil
acesso, diferente do “pernóstico” grupo local do Cinema Experimental de
Araraquara, que não foi convidado a participar do filme
53
.
Freund, ou Eduardo, como todos o chamavam, mudou-se para Araraquara
e foi incorporado de imediato à companhia, sendo a única pessoa do grupo a fazer
jus a um salário de Cr$ 20 mil cruzeiros por mês, pago sempre com muito esforço.
4.2 Viagem a Poços de Caldas
O ano de 1958 foi dedicado, quase que por completo, aos ensaios e
filmagens de Santo Antonio e a Vaca. A companhia viajou apenas a Poços de
Caldas, MG, para reapresentações de peças de suas últimas séries, no dia 7 de
53
Entrevista com Américo Aguiar Borges.
154
março, às 21 horas, no Salão Nobre do Palace Cassino do Grande Hotel de Poços
de Caldas, dentro da Conferência do Rotary Clube naquela cidade.
Maria Aparecida Assis, que vivia em São Paulo à época, lembra-se de um
telegrama de Wallace convocando-a a estar em Poços de Caldas urgente para
esta apresentação. E de ter se desesperado: ”Como é que eu vou sozinha pra
Poços de Caldas?”
54
.
Apresentaram nesta data os seguintes espetáculos, com o sucesso de
sempre, testemunhado pelo incansável colunista de O Imparcial, Almeida Santos,
na edição do dia 13 de março de 1958:
54
Entrevista com Maria Aparecida Assis.
155
O Urso
Amigos de Viagem
Os Dois Faladores
FICHAS TÉCNICAS
Nome da peça
O Urso The Boor
Autor Anton Chekhov (1860-1904) Rússia
Gênero Comédia
Ano de montagem 1958
Luká Mario Barra
Elena Popovna Maria Aparecida Assis
Personagem/ Ator
Grigori Stiepanovitch Smirnov Moacyr Marchese
Dirreção Wallace Leal V. Rodrigues
Tradução Wallace Leal V. Rodrigues
Obs Montada “em teatro de arena”
Nome da peça
Amigos de Viagem Hands across the Sea
Autor Noël Coward (1899-1973) Inglaterra
Gênero Comédia
Ano de montagem 1958
Elizabeth (Annete) Izabel Reina
Marina Gilpin Julia Abrahão
Peter Gilpin Tito Peixoto
Alipio Corbert Moacyr Marchese
Abigail Wilson Lygia Fabiano
Fred Wilson Oscar Rodrigues
Mr. Smith Mario Barra
Clara Ruth Magali Miranda
Personagem/ Ator,
por ordem de
entrada em cena
Bob Benjamin Soares de Azevedo
Direção
Wallace Leal V. Rodrigues
Produção Araken de Toledo Pires
156
Assistentes de
direção
Mario Barra, Antonio Reis da Silva e Oscar Rodrigues
Figurinos Felipe Luiz (heterônimo de Wallace), executados por Amélia Ferreira
Cenografia Diego de Vega (heterônimo de Wallace)
Maquiagem Leda Oliveira Pinto e John Brown (heterônimo de Wallace)
Direção de dança Cleide Braga
Tradução Carlos Lage
Obs Montada “em teatro de arena”
Nome da peça
Os Dois Faladores Los Habladores
Autor Miguel de Cervantes (1547-1616) Espanha
Gênero Entremez
Ano de montagem 1958
Roldan Mario Barra
Sarmiento Moacyr Marchese
Transeunte Edson Lessi
Homem da Lei Tito Peixoto
Homem da Lei Oscar Rodrigues
Homem da Lei Everton Aiévoli
Beatriz Julia Abrahão
Inês Ruth Magali Miranda
1a. Dama Lygia Fabiano
Personagem/ Ator
2a. Dama Maria Aparecida Assis
Produção Araken de Toledo Pires
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Assistente de
direção
Mario Barra
Cenografia Diego de Vega (heterônimo de Wallace), executada por Iglá Aiévoli
Maquiagem Arthur Batelli e Leda de Oliveira Pinto
Figurinos Felipe Luiz (heterônimo de Wallace). Trajes executados por Amélia Ferreira.
Mestre de armas Tito Peixoto
Obs Montada “em teatro de arena”
Fonte: jornal O Imparcial e entrevistas.
157
A viagem foi feita em ônibus emprestado pela Associação Ferroviária de
Esportes, o tradicional clube de futebol local e com auxílio da Prefeitura. Nas fotos
pode-se observar alguns dos “agregados do TECA”, amigos assim chamados e
que formavam uma corrente, para ajudar em tudo o que fosse necessário. Dentre
eles vale destacar o pintor Ernesto Lia, hoje o nome mais importante das belas
artes na cidade.
A relação do TECA com o Rotary Clube - além desta viagem, as viagens a
Catanduva e Taquaritinga haviam sido a convite do clube - deve-se muito a Rafael
Medina, cunhado de Wallace, casado com sua irmã, Ninira Rodrigues Leal, e que
Imagem
41
:
g
rupo do TECA em Poços
de Caldas, MG. Março de 1958.
Acervo: Lygia Fabiano.
158
era diretor do Rotary. As relações familiares, se eram importantes nas
montagens teatrais com as costuras das roupas e os empréstimos e o transporte
de peças dos cenários, passariam a ser fundamentais para a consecução do filme.
Até uma empresa produtora, a Arabela Filmes, foi fundada.
4.3 Arabela Filmes
O interior do Estado de São Paulo, nos lembra o Prof. Maximo Barro,
possuía na década de 1950 alguns pequenos grupos regionais de cinema, em
Campinas, Lucélia, Piracicaba, São José dos Campos, Santa Rita do Passa
Quatro e Santos. “Deles participaram pessoas e entidades como prefeituras,
igreja, comércio, turismo e até maçonaria”
55
.
Em Araraquara, pesquisando as Atas da Câmara Municipal, Anna Maria
Martinez Corrêa nos relata que, em 1919, “O interesse demonstrado pelo cinema
levou o pintor Francisco de Carli, radicado em Araraquara, a elaborar um filme sob
o tulo A vida é um drama, sobre assuntos da cidade(CORRÊA, 2008, p. 221).
Após esta data, apenas em 1953 encontra-se registros da tentativa de se realizar
um filme, Aurora de uma Cidade, do mesmo grupo que agora se organizava, outra
vez, para uma nova empreitada.
Organização era agora uma necessidade se a decisão fosse fazer cinema
profissionalmente. Uma empresa seria criada: a Arabela Filmes, cuja sede era na
residência de Wallace, um casarão construído em 1933, na Avenida XV de
novembro, 440, e que pertencia a Rafael Medina. Wallace vivia nesta casa com o
cunhado (que iria participar do filme como Moisés) e a irmã, onde tinha tamm o
seu porãozinho”, local de reunes, ensaios e futura armazenagem dos
equipamentos e rolos de filmagens. A garagem abrigava a biblioteca, repleta de
livros e textos. Os sócios da empresa eram, além de Wallace, seu sobrinho Perí
(Péricles Medina, tamm ator no filme), seu tio Nino (Antonino Rodrigues Leal, o
55
O Prof. Maximo Barro é pesquisador e professor de cinema na FAAP (Fundação Armando Álvares
Penteado), em São Paulo e autor do texto do Folheto: Loucos por Cinema. (SESC, 2008).
159
Nino da camisaria, que viveria o personagem São Pedro no filme) e o amigo
Savério Ianelli
56
.
A equipe ficaria completa com Araken de Toledo Pires como produtor, e
tamm com Pedro Peiró, como assistente, além do sempre fiel Everton Aiévoli,
como assistente de câmera e eletricista. Everton ficaria pouco tempo, sendo
substituído por José Claudio Borges, irmão de Américo Aguiar Borges, uma ótima
aquisição.
Apesar da ajuda familiar e de algum dinheiro em caixa devido aos sucessos
do ano anterior, Wallace imaginava que precisaria de um empréstimo. Senão para
a compra dos equipamentos e dos filmes, pelo menos para sua finalização. As
viagens a São Paulo, em companhia do imprescindível Freund, começaram e as
visitas à boca do cinema”, região próxima à Rua Santa Ifigênia, passaram a ficar
constantes. Eram comprados, em geral, equipamentos de segunda mão, inclusive
filmes preto e branco, alguns com prazo de validade já quase expirando.
O jornal O Imparcial acompanhava tudo. Em 25 de abril, noticiava um
convite ao TECA para se apresentar em Recife, PE, no I Festival Nacional de
Teatros de Estudantes, outra das idéias inovadoras de Paschoal Carlos Magno. O
convite foi aceito, a princípio. Pensou-se até em renovar o guarda-roupa da
companhia, mas o tempo foi passando e nada se decidia. Por fim, Wallace achou
melhor recusar. O projeto do cinema precisava ser priorizado, segundo ele.
O TECA iria ao segundo e ao quarto Festivais de Teatro de Estudantes. Em
1959 em Santos e em 1962, em Porto Alegre.
56
As informações sobre os bastidores do filme Santo Antonio e a Vaca foram baseadas em entrevistas com os
integrantes da companhia, principalmente nas realizadas com Américo Aguiar Borges, responsável pela trilha
sonora do filme, e também no texto de João Bosco Lopes Brandão no Folheto: Recuperação da memória do
filme Santo Antonio e a Vaca (UNIARA, 2003).
160
4.4 Os ensaios
O jornal O Imparcial, de 25 de março de 1958, noticiava, com orgulho, que
os ensaios para o filme começariam naquele mesmo dia.
Todos os principais atores do TECA participaram do filme: Mario Barra,
Oscar Rodrigues, Tito Peixoto, Moacyr Marchese, Benjamim Soares de Azevedo,
Maria Aparecida Assis, Julia Abrahão, Lygia Fabiano, Ruth Magali Miranda e
Izabel Reina. Seria efetivamente o grupo de teatro do TECA que iria fazer cinema,
as legendas do filme deixam isso claro.
Novos nomes foram convidados, como sempre. Maria Cleide Valentim se
lembra de estar subindo a Rua 5 um dia e ter encontrado Wallace, a quem não
conhecia: “Você não quer fazer cinema?”, perguntou ele, de surpresa. Cleide,
jovem e assustada, respondeu, meio sem jeito, que achava que sim, mas que
precisava falar com seu pai. “Então fale e apareça no Municipal esta noite, você é
o tipo físico que eu estou precisando para o filme”. E assim surgiria a “assanhada”
Rita, do Sítio do Santo Antonio e a futura esperta criadinha Cristina, de A Cova de
Salamanca. O que acabou se revelando outra ótima escolha
57
.
Wallace, Araken e Pedro Peiró, produtores oficiais do filme, rodavam toda a
cidade à procura dos locais para as filmagens. As locações externas, após
algumas procuras, seriam feitas na Fazenda Salto Grande, cedida pela família
Lupo, com a ajuda do amigo e diretor da Rádio Cultura, José Quirino dos Santos.
Era um local próximo à cidade, conhecido como Recanto do Caetano, no início da
rodovia para Jaú, atualmente campus da UNESP Universidade Estadual
Paulista. Lá existia um casebre, um ribeirão e uma boa situação de trabalho,
segundo Freund. Outros locais foram tamm utilizados: os arredores do
Matadouro Municipal e um trecho do Ribeirão do Ouro.
57
Entrevista com Maria Cleide Valentim.
161
As locações internas foram mais trabalhosas de se conseguir. O SENAC
Serviço Nacional do Comércio cederia um barracão desocupado da companhia,
localizado a apenas duas quadras da residência de Wallace, na Avenida Brasil,
entre as Ruas 3 e 4, ao lado da Igreja Matriz da cidade, local onde hoje está
localizado o Hotel Morada do Sol, ex Hotel Eldorado. Ali seriam construídos os
interiores da casa do sítio e filmadas as cenas do céu caboclo, segundo a visão de
Inah Perez Bittencourt, que havia pesquisado o assunto.
Uma mera alemã de segunda mão, marca Ascani, foi comprada, assim
como um gravador Ampex. Refletores foram improvisados pelos amigos Ivo Giraldi
e José Baptistella. os fios, cabos e lâmpadas vieram de São Paulo, onde era
mais barato. O inventivo Nelson Gullo, que havia colaborado com o TECA na
Imagem
42
: Maria C
leide Valentin em
Santo Antonio e a Vaca
. Araraquara, 1958. Acervo: Maria Cleide
Valentin.
162
montagem da quarta série “em arena”, em maio de 1957, mesmo o fazendo
parte dos créditos do filme, improvisaria um poderoso ventilador.
Freund insistia que teriam que montar um laboratório para a revelação do
filme, laboratório localizado no porão da casa, que afinal foi utilizado apenas em
parte. Wallace recorreu ao Dr. Hermírio Amorim Jr, diretor da EFA, onde, além do
laboratório, outros equipamentos de apoio foram construídos, inclusive um
pequeno trem para os travellings. O filho do Dr. Hermínio, Hermínio Amorim Netto,
trabalhou no filme como o menino Tião.
Como sempre acontecia nas peças de teatro, os empréstimos foram
essenciais: roupas, objetos de cena, cadeiras, mesas, carroças, cavalos e até a
própria vaca Mimosa. A família foi fundamental nesta ajuda. Os tecidos eram da
Casas Texidal, de propriedade de Sebastião e Cinira Leal, irmã de Wallace. Os
moldes, maquinários e mão de obra da Camisarias Nino, de propriedade de
Antonino Rodrigues Leal, o Nino, que contava ainda com a ajuda de sua mulher,
Wanda e da irmã, Ceci.
O transporte seria outro problema a ser resolvido no âmbito familiar, com a
ajuda da Fonseca, a popular camionete da Camisarias Nino e de duas outras
camionetes da Casas Texidal, uma Dodge e uma Studebaker 1955, sem falar nos
carros dos atores e produtores que fariam o caminho entre a Fazenda Salto
Grande e a cidade inúmeras vezes por dia. Ao final do dia, todo o equipamento
tinha que ser guardado na casa da Avenida XV de Novembro.
Atenção especial foi dada à música. A canção “Canto do Ribeio Triste”
tem letra e música de Wallace, cantada por Dirceu de Freitas Iani, participante do
Trio Coringa. "Meu Santo Antonio", tem letra de Jayme de Oliveira e música de
Américo Aguiar Borges. Os arranjos são de Zairo Marinoso ao violão. Foram, ao
final, gravados nos estúdios da Cia. Cinematográfica Vera Cruz.
163
4.5 As filmagens
O jornal O Imparcial, de 18 de junho, noticiava que as filmagens finalmente
teriam início e a notícia logo se espalhou pela cidade. Muitos curiosos iam passear
na Fazenda Salto Grande para conferir as filmagens. Outros preferiam os
barracões do SENAC, no centro da cidade, que se animava com a novidade.
Os dias eram passados nas filmagens, entre o Salto Grande para as
externas e o barracão, para as internas. À noite era hora da revelação, trabalho
sempre feito no laboratório montado na casa de Wallace. Depois, de
madrugada, vinha a análise das tomadas feitas, a decisão das cenas que seriam
aproveitadas e das que teriam que ser refilmadas, a montagem do copião que
serviria de guia para a montagem e o acabamento final do filme, que teria que ser
feito, necessariamente, em São Paulo. O trabalho de revelação durou até quase
metade do filme, quando decidiram enviar as latas com os filmes para a empresa
Imagem
43
: Wallace Leal V. Rodrigues e Edward Freund nas filmagens de
Santo Antonio e a Vaca
Araraquara, 1958. Acervo: Américo Aguiar Borges.
164
Bandeirantes da Tela, em São Paulo, via motoristas da Empresa Cruz, de ônibus.
Em três dias o trabalho estava pronto e de volta. Muito mais prático.
A história do filme Santo Antonio e a Vaca é baseada em “causos” contados
pelo povo simples dos campos de Araraquara. Uma temática diferente de tudo o
que Wallace havia dirigido até então Os textos montados até aquele momento
eram dramas psicológicos, comédias de costume, não guardando qualquer
relação com o texto mais simples agora escolhido. A idéia havia sido de Inah
Bittencourt, que tivera a capacidade de convencer Wallace a aceitá-la
58
.
O filme mostra uma situação singela, os personagens não têm qualquer
sofisticação, são caipiras que levam suas vidinhas sem grandes preocupações,
um dia após o outro, sem criatividade, à espera de um milagre de Santo Antonio
que possa vir salvá-los.
Um ponto em comum que se pode destacar em relação às peças teatrais
montadas é o fato de que o inesperado, o oculto, desta vez personificado na figura
de Santo Antonio, aparece outra vez, agindo como uma força do destino. O mundo
espiritual vem atuar na vida daqueles personagens alterando-as, a exemplo do
que acontece em peças como O Caso das Petúnias Esmagadas, A Mão do
Macaco, Uma Mulher do Outro Mundo, sem mencionar toda a fantasmagórica
história de Pluft, o Fantasminha. A morte da vaca Mimosa pela ação do santo é o
elemento externo, espiritual, que age naquele universo e o modifica.
O enredo mostra um pequeno sítio à beira do Ribeirão Triste, onde uma
família vive em situação de extrema miséria. Seu sustento é tirado apenas do leite
da vaca Mimosa, que vendem diariamente ao leiteiro. E este mínimo necessário
acaba criando, nas três irmãs e nos dois irmãos, uma situação de completa
acomodação, onde os sonhos de cada um acabam suprindo a realidade e o
isolamento traz uma desesperança, uma ignorância e uma tristeza sufocantes.
58
Vide Anexo II. Artigos Especiais.
165
Santo Antonio resolve agir e, por meio da morte da vaca Mimosa, trazer
uma inquietação à família, forçando-os a agir, a buscar alternativa para aquele
destino. A morte de uma das irmãs, Zabelinha (Isabel), personagem vivida por
Lygia Fabiano, traz o momento mais triste do filme. A situação da família melhora
e dois casamentos trazem um pouco de alegria ao final do filme.
O neo-realismo italiano dos mestres Roberto Rosselini e Vittorio De Sica,
fontes de inspiração sempre citadas por Wallace, aparece de forma clara, não
apenas no tema do filme, que busca retratar uma realidade social e econômica
daquela época, como tamm na atmosfera. Uma atmosfera densa, realçada pela
fotografia em preto e branco, pelos jogos de luz e sombra e com a ajuda da
música, um belíssimo tema em forma de lamento triste ao violão. A narração, a
cargo de Moacyr Marchese, conduz a história como se a dominasse, como se
Imagem
44
:
Edward Freund com a câmera, cercado por Jo Cláudio Borges (ao fundo, de chapéu), Américo
Aguiar Borges, Araken de Toledo Pires e o jovem Everton Aiévoli nas filmagens de Santo Antonio e a Vaca.
Araraquara, 1958. Acervo: Américo Aguiar Borges.
166
fosse o próprio destino, possibilitando ao espectador certo distanciamento da
aridez da ação, uma atitude mais confortável, como um clima de documentário
59
.
Uma longa entrevista com o moço” Wallace Leal Valentim Rodrigues foi
publicada no jornal O Imparcial, de 14 de junho, e trazia um resumo dos últimos
acontecimentos:
- Quais os propósitos teatrais do TECA por agora?
- Receber o troféu que levantou no Rio como o melhor conjunto teatral
amador de 1957, o “Apolo”, que tinha sido dos pernambucanos em 1956 e
que s ganhamos para São Paulo. O ministro Paschoal Carlos Magno
também nos convidou para o Festival do Recife. Esta viagem, porém,
depende de uma série de circunstâncias favoráveis e ainda não está de todo
resolvida. Temos um pouco de receio também. Todos conhecem o nosso
nível artístico, mas o nosso guarda roupa é feito de flanela e lona. Sabemos
que em Belo Horizonte a prefeitura gastou 700 contos com o guarda-
roupa de seus representantes, que vão apresentar O Crime na Catedral, de
T.S.Elliot. Não dispomos de fundos, somos um grupo pobre. A nossa
prefeitura tem problemas seríssimos na frente do nosso. De que valeria
exigirmos cetins e veludos enquanto aqui dentro nos falta tanta coisa!
Estamos estudando o assunto e depois eu conto.
- Então o TECA está parado?
- Absolutamente. Temos recusado inumeráveis propostas para excursões
por problemas pessoais de cada um dos seus elementos. Somos amadores,
afinal! Estamos com o filme de estréia praticamente ensaiado.
- E porque vocês se abstiveram de informar o blico a este respeito até
agora?
- Queríamos ter certeza de que tudo não passava de um sonho. Agora
posso falar à vontade. temos em nossa mão todo o material para
iniciarmos. a câmera, uma “Ascani” alemã com que trabalharemos, é
uma garantia de qualidade. É uma das melhores do mercado, usada nos
estúdios europeus e americanos. O filme virgem, lâmpadas, um gravador
Ampex próprio para filmagens já se encontram em Araraquara. Os refletores
estão sendo feitos aqui mesmo por esse grande amigo da cultura
araraquarense, o Sr. Ivo Giraldi que, espontaneamente tem feito tudo quanto
tem podido em favor do grupo, visando o bom nome da cidade. Para os
estúdios, os Srs. Vitório e Mario Barbugli ofereceram suas instalações,
gratuitamente, para facilitar o trabalho e estimular o movimento. Amigos da
cidade e pessoas de cultura, esses dois cidadãos abriram mão de todos os
seus recursos para garantir a vitória desta iniciativa. De toda parte oferecem-
nos facilidades e apoio. Tem sido uma maravilha.
- E do que se trata o filme? Como se chamará?
- O tulo será Santo Antonio e a Vaca e é bem anterior a O Santo e a Porca,
de Suassuna, não tendo nada que ver com essa peça teatral. Trata-se de
assunto brasileiríssimo. Muito embora já tenha dirigido dezessete autores
estrangeiros no teatro, escolhi um tema muito nosso para estrear no cinema.
Foi tirado do folclore dos campos de Araraquara, com tipos, situações,
59
Vide Anexo III. Cópia em DVD de Santo Antonio e a Vaca.
167
músicas e danças seus. Acho que a paisagem araraquarense vai fazer
sucesso, pois está funcionando maravilhosamente nos testes. O grupo do
TECA todo participa, com desempenhos equilibrados, fazendo tipos roceiros.
Inezita Barroso, que ouviu as músicas, quis levá-las para São Paulo.
temos propostas para lançamento em discos, antes da apresentação do
filme.
- No cinema, que posição você toma como diretor?
- Subjetivamente acho que Rosselini está com a razão. Bom mesmo é o
realismo psicológico, em que pretendo me aprofundar com todo o grupo.
Formalmente, acho que os italianos tamm estão com a razão e por isso
formo ao lado dos neo-realistas.
- Tecnicamente com quem você conta?
- Com um grupo da terra capitaneado por um profissional de singular
competência, o polonês Edward Freund, que virá trabalhar conosco
principalmente porque reconheceu as qualidades do grupo. O som sai
daqui mesmo. Gostaria imensamente de apresentar o Coral Araraquarense,
que reputo excelente. E vou lançar um artista plástico da terra que acho um
grande furo: Mestre Dito, bem maior que Mestre Vitalino. Depois eu falo mais
a respeito. O filme mostra a terra, que neste caso é araraquarense, e o u,
que, neste caso, é caboclo, com anjos de asas de papel crepom, cantando o
Tutu Maram. O tema, de tão brasileiro, tem empolgado os intelectuais.
previsões de que, se conseguirmos nível artístico e técnico, agradaremos
em cheio aos estrangeiros, com nossa cor local. Pessoalmente acho que a
linguagem do sentimento é universal. Em qualquer parte ama-se, odeia-se,
morre-se e nasce-se. E disso é feito o nosso filme. Temos uma linda lição de
renúncia, trabalho e ternura que todos entenderão. Quase metade do filme
sefeita em exterior. A falia Lupo veio ao nosso encontro e cedeu-nos
suas terras, seus recursos, seu apoio e sua bondade, com simplicidade e
calor. Precisávamos de tudo isso. Os locais são belíssimos. Estamos
gratíssimos. Acho que vocês, que gostaram de nós no teatro, também nos
aplaudirão. Precisamos de todos para vencermos. o teríamos conseguido
o que conseguimos com o TECA, não fora a generosidade geral. Agora
então é que precisamos mais ainda. Não estaremos nos dirigindo a grupos
isolados, como no teatro. Todo o Brasil vai nos ver, nos julgar. Dizer que, ou
somos sangue novo e esperança pátria ou fabricantes noviços de abacaxis,
desta vez sediados na província. Temos trabalhado muito, trabalhado até a
exaustão. E estamos no começo da labuta. À prefeitura de Araraquara
não vamos pedir o que não nos pode dar, mas iremos pedir. E estamos
certos de receber de “seu” Rômulo (Lupo, prefeito) e dos nossos bons
amigos da Câmara o apoio de que tanto necessitamos nesta grande
aventura.
- E o capital, Wallace, de onde veio?
- De um grupo que acredita no nosso talento e acha que o moço precisa de
plataforma para construir o Brasil de amanhã. E nesse grupo, um homem
singular, o Sr. Savério Ianelli, o mais entusiasta de todos e que, sem
conhecer, como o afirma sorrindo confiante, coisa nenhuma de cinema, diz
que o talento, o idealismo e o valor que temos demonstrado nunca
passariam sem apoio numa cidade civilizada, a menos que tivesse morrido o
último coração reconhecido de Araraquara. Na realidade temos feito um
pouquinho só. Mas se Deus ajudar, faremos muito ainda pela nossa
sociedade e o mundo em que vivemos. Pessoalmente, faço cinema pelo
mesmo motivo porque fiz teatro: porque o mundo es tão pobre, triste e
desesperançoso. A gente tem que oferecer um pouquinho de beleza ou de
amor ou de esperança. Dentro de alguns dias daremos a primeira rodada de
168
manivela. Não have champagne, mas estaremos muito felizes. O meu
grupo sofreu para sair da linguagem teatral e ganhar expressão
cinematográfica. Agora vão indo melhor. Com alguns meses vocês verão o
resultado. Pretendo fazer do TECA uma escola de representação, pois
sempre estarei precisando de atores novos. O teatro é uma grande escola.
Creio que, proximamente, montarei Casona, Pirandello e Cocteau. E se o
primeiro filme der certo, como esperamos, filmarei A Donzela Balduina, tema
nordestino. Em todos estes dois roteiros, apresento um talento excepcional e
modesto ao mesmo tempo, que honra nossa cidade, a poetisa magnífica que
é Inah Bittencourt, que escreveu os diálogos difíceis dos dois filmes e que,
nesse novo terreno, me parece ser uma das grandes novas revelações. E
creio que é só, por enquanto.
O projeto do filme A Donzela Balduina nunca se concretizou, mas os
principais atores do TECA, sem a presença oficial de Wallace na direção, em vista
de seus afazeres na edição final do filme, ainda se engajariam em outro projeto
cinematográfico logo após as filmagens de Santo Antonio e a Vaca: o longa-
metragem Férias no Arraial.
Férias no Arraial, uma comédia rural, foi rodado em Araraquara, tamm na
Fazenda Salto Grande e dirigido por Edward Freund. No elenco, os profissionais
Milton Ribeiro e Annik Malvil vieram de São Paulo contratados para atuar ao lado
de nomes conhecidos, como Mario Barra, Julia Abrahão, Moacyr Marchese, Ruth
Magali Miranda e Izabel Reina. A música era de Américo Aguiar Borges, o mesmo
de Santo Antonio. Férias no Arraial foi lançado em 1962 e teve apenas uma
exibição. Doada pelo diretor a Maximo Barro, professor de cinema da FAAP
Fundação Armando Álvares Penteado, a cópia original do filme pertence ao
acervo da faculdade e foi recuperada e digitalizada para uma sessão do Sesc
Araraquara em julho de 2008, dentro do projeto Loucos por Cinema.
Ainda no ano de 1958, o ministro Paschoal Carlos Magno receberia o título
de Cidadão Araraquarense, iniciativa da Câmara Municipal.
Um artigo de 20 de novembro, assinado pelo pprio Wallace, em O
Imparcial, traz elogios ao Teatro Oficina, recém fundado, e ao sucesso de “três
novos elementos, irmãos e amigos nossos de tantos e tantos anos”, os
169
araraquarenses José Celso Martinez Corrêa, Luiz Roberto Salinas Fortes e a
figurinista Dora Miari:
Estrearam juntos num espetáculo da Oficina 58, Teatro dos Novos de São
Paulo. José Celso como autor apresentando Vento Forte para um Papagaio
Subir, peça em um ato. Dorinha e Dedeto representaram os primeiros papéis
de A Ponte, original de Carlos Queiroz Teles. Dorinha, apaixonada por arte,
colaborara de mil maneiras no primitivo Teatro de Estudantes de
Araraquara e é quem assina também os figurinos das peças levadas à cena.
José Celso Corrêa foi o idealizador e o realizador dos dois únicos festivais
de poesia que Araraquara já viu, como todos se lembram. As peças
estreadas tiveram direção de Amir Haddad e cenários de Belucci...[...]. O
grupo possui, além do mais, na pessoa de Luiz R.S.Fortes, uma espécie de
teórico encarregado de definir, em sentido mais ou menos amplo, os seus
propósitos...[...]. Faço blicos os incondicionais aplausos dos meus
companheiros do TECA e meus, particularmente, a esses velhos-amigos-
moços e companheiros...[...]. Parabéns Araraquara!
Vento Forte para um Papagaio Subir faz parte do que ficou conhecido como
o Ciclo Araraquara do início da carreira do Teatro Oficina. A peça tem como
personagem principal um rapaz, João Ignácio (ou o próprio José Celso), em uma
pequena cidade do interior, Bandeirantes (ou Araraquara) e a sua vontade de ir
embora para a cidade grande, o que acaba acontecendo depois de uma
tempestade com um vento forte. As outras peças do ciclo são: A Incubadeira, que
estreou em junho de 1959 no Teatro de Arena de São Paulo, onde uma família
interiorana se sente sufocada pela cidade grande e Cadeiras na Calçada, texto
anunciado, mas jamais encenado pelo grupo
60
.
Terminadas as filmagens, Wallace se dedicava à montagem do copião, às
dublagens, feitas nas madrugadas no Cine Odeon, à trilha sonora e a tantos
outros detalhes técnicos do filme. Em companhia de Edward Freund e Péricles
Medina, sobrinho e responsável pelas finanças, viajava a São Paulo com
freqüência em busca de dinheiro para finalizar o filme.
O jornal O Imparcial de 5 de maio de 1959 noticiava que o filme Santo
Antonio e a Vaca estava sendo examinado por críticos paulistas no Museu de Arte
60
REVISTA Dionysos. Teatro Oficina. Organização de Fernando Peixoto. Ministério da Educação e Cultura.
SEC. Serviço Nacional de Teatro. Edição n° 26. Janeiro de 1982.
170
Moderna em São Paulo, dente eles os Srs. Flavio Tambelini e Miroel da Silveira. E
já adiantava a próxima viagem do TECA.
4.6 Festival de Teatro de Santos
Mais uma vez Paschoal Carlos Magno aparecia na vida da companhia,
desta vez para um convite para o TECA se apresentar em julho, na cidade de
Santos, no II Festival Nacional de Teatro de Estudantes, uma das paixões de
Paschoal
61
. Foi um momento de alegria para os atores, que já se sentiam longe do
contato mais próximo com o público. Fazer cinema é uma atividade onde o ator
convive muito mais com os técnicos do que com o público.
A cidade de Santos estava em festa com o Festival, cerca de 2.000
estudantes de todo o Brasil enchiam as ruas com espetáculos de todos os tipos
em vários lugares da cidade. O grupo ficou hospedado no Colégio Escolástica
Rosa, escola tradicional da cidade em frente ao mar, na Ponta da Praia, onde
tamm fizeram suas refeições.
De volta à velha fórmula “em arena” que o consagrara, os textos que o
TECA escolhia agora eram desta vez, anunciados com um título sugestivo: Três
Atos de Infidelidade, já que as peças tinham esse tema em comum. Data provável
da apresentação: domingo, 26 de julho.
61
O primeiro Festival havia sido no ano anterior, em Recife. Paschoal ainda organizaria o de Brasília, em
1961, de Porto Alegre, em 1962 (este com a participação do TECA), da Guanabara (Rio de Janeiro), em 1968
e, finalmente, no centro cultural Aldeia de Arcozelo, criado pelo próprio Paschoal, no município fluminense
de Paty do Alferes, em 1971.
171
Como Ele Mentiu ao Marido Dela
Enganado, Espancado e Satisfeito
A Cova de Salamanca
FICHAS TÉCNICAS
Nome da peça
Como ele Mentiu ao Marido Dela How He Lied to Her Husband
Autor George Bernard Shaw (1856-1950) Irlanda
Gênero Comédia
Ano de montagem 1959
Henrique Oscar Rodrigues
Aurora Maria Aparecida Assis
Personagem/ Ator, por
ordem de entrada em
cena
Teddy Mario Barra
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Produção Araken de Toledo Pires
Figurinos Felipe Luiz (heterônimo de Wallace)
Ambientes Diego de Vega (heterônimo de Wallace)
Maquiagem John Brown (heterônimo de Wallace)
Iluminação Everton Aiévoli
Som Inah Perez Bittencourt
Assistentes de direção
Mario Barra e Oscar Rodrigues
Tradução Edgar Cavalheiro
Obs
Montada “em teatro de arena”
Nome da peça
Enganado, Espancado e Satisfeito
Decameron. Novella settima
della Settima Giornata
Autor Giovanni Boccaccio (1313-1375) Itália
Gênero Farsa
Ano de montagem 1959
Prólogo Roberto Duarte
Mésser Egano Mario Barra
Beatriz Ruth Magali Miranda
Brunela Maria Aparecida Assis
Personagem/ Ator
Anichino Roberto Hage
172
A Estátua Maria Auxiliadora Colombo
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Produção Araken de Toledo Pires
Figurinos Felipe Luiz (heterônimo de Wallace)
Ambientes Diego de Vega (heterônimo de Wallace)
Maquiagem John Brown (heterônimo de Wallace)
Iluminação Everton Aiévoli
Som Inah Perez Bittencourt
Assistentes de direção Mario Barra e Oscar Rodrigues
Adaptação Alejandro Casona
Obs
Montada “em teatro de arena”
Nome da peça
A Cova de Salamanca La cueva de Salamanca
Autor Miguel de Cervantes (1547-1616) Espanha
Gênero Entremez
Ano de montagem 1959
Pancrácio Mario Barra
Leonarda Neuza Varella
Cristina Maria Cleide Valentim
Estudante Laert de Barros
Reponce Oscar Rodrigues
Nicolau Benjamin Soares Azevedo
Personagem/ Ator
Leoniso Antonio Furlan
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Produção Araken de Toledo Pires
Figurinos Felipe Luiz (heterônimo de Wallace)
Ambientes Diego de Vega (heterônimo de Wallace)
Maquiagem John Brown (heterônimo de Wallace)
Iluminação Everton Aiévoli
Som Inah Perez Bittencourt
Assistentes de direção Mario Barra e Oscar Rodrigues
Tradução Wallace Leal V. Rodrigues
Obs
Montada “em teatro de arena”
Fonte: jornal
O Imparcial
e entrevistas.
173
O resultado foi mais uma vez noticiado pela imprensa araraquarense, em
28 de julho, com muito orgulho: O TECA brilhou em Santos”. O grupo exibiu-se
em teatro de arena no Grill do Hotel Atntico, diante de um público numeroso e da
Comissão Julgadora, presidida pela atriz Henriette Morineau. Localizado na praia
do Gonzaga, na esquina da Avenida Ana Costa com Presidente Wilson, o Hotel
Atlântico, ainda hoje em atividade, foi um dos primeiros hotéis cassino do Brasil e
era, ao lado do Parque Balneário Hotel, o local freqüentado pela elite santista da
época.
Competindo com companhias de 50 cidades, o TECA ganhou o troféu
Paschoal como o melhor espetáculo em um ato: Enganado, Espancado e
Satisfeito. Mario Barra obteve a segunda classificação como melhor ator, Neuza
Varella foi diplomada como uma das primeiras atrizes”, Ruth Magali Miranda, a
mais bonita e Maria Cleide Valentim, a Lollobrigida do Festival”, ou a “Lolô
Perturbada”, como Ignácio de Loyola Brandão costumava chamá-la
62
. O grupo em
si foi considerado o mais intelectual entre os presentes. O troféu Paschoal era a
figura de Hamlet com o rosto do próprio Paschoal.
Com o sucesso, vieram as promessas de mais viagens pelo Brasil, o que
acabou não se concretizando neste ano. Em Santos, Wallace teve a oportunidade
de assistir a uma montagem de De Ratos e Homens, de Steinbeck, da qual não
gostou muito, mas que acabaria sendo um dos próximos títulos do TECA.
Em entrevista ao jornal O Imparcial, de 28 de julho de 1959, em Santos,
Wallace falava sobre os destinos do TECA:
- O que é o TECA em face dos outros grupos?
- Dos melhores grupos entre os quais se situa, apenas um grupo obstinado
de moços dispostos à luta. Os bons grupos todos pertencem às faculdades,
às universidades, aos departamentos de cultura. São subvencionados e
amparados a tal ponto que podem contratar professores e diretores
profissionais. A direção da Faculdade de Filosofia de Araraquara, todavia,
esnos acenando com formosas esperanças nesse sentido. Aguardemos.
Quanto a nós mesmos, assisti a uma entrevista do grande crítico paulista,
Sábato Magaldi com Mario Barra e que visava a colocação definitiva deste
62
Entrevista com Maria Cleide Valentim.
174
nosso jovem ator num dos melhores grupos profissionais de São Paulo.
Cogita-se mesmo na transferência de repartição do nosso Barra para
facilitar-lhe a mudança. Ele mesmo é que decidirá.
- A Rádio Cultura também divulgou dois convites que lhe foram feitos. É
certo?
- É sim. Fui solicitado para dirigir no grupo mantido pela Faculdade de Belo
Horizonte com contrato por um prazo mínimo de um ano. Outro grupo de
São Paulo pretende a minha direção por um prazo nimo de seis meses.
Em 1957 recusei duas propostas havidas no Rio. Estou pensando nestas.
Gostaria de me distanciar por algum tempo, uma vez que me sinto fatigado e
necessitado de um refazimento nervoso. Oportunamente me decidirei.
- Porém o que nos oferecerá o TECA entre essas decisões?
- Gostaria de fazer a Via Sacra, de Henri Geon, se obtivesse a permissão
para utilizar uma de nossas igrejas. É um espetáculo muito formoso e que
interessaria vivamente à coletividade calica de Araraquara. Por enquanto
peço a todos que nos prestigiem como sempre em nossa próxima
apresentação de agosto. Fomos obrigados a consideráveis gastos,
inesperadamente, para nossa apresentação no Festival Santista. Se não
pudermos nos refazer de pronto, o mais certo é que o TECA venha a
extinguir-se e exatamente num momento tão propício, quando até um
pequeno teatro próprio nos ofereceram. Oportunamente voltarei a falar-lhes
sobre a nossa cultura, as nossas lutas e os nossos intentos.
Nota-se aqui, pela primeira vez demonstrado ao público, um desalento do
diretor com o futuro da companhia. Ao mesmo tempo em que cita os convites
pessoais recebidos, o futuro apoio da Faculdade de Filosofia local, a possibilidade
de um teatro próprio e a sua satisfação com o nível artístico do grupo, o que fica
desta entrevista é uma sinalização, um primeiro aviso de que a situação financeira
era muito frágil: “o mais certo é que o TECA venha a extinguir-se”.
Uma curiosidade da mesma matéria é o nome de outro araraquarense no
Festival de Santos, filho de estimada família aqui residente”, José Celso Corrêa
Borges, leia-se José Celso Martinez Corrêa, como vencedor do prêmio de melhor
autor teatral com a peça A Incubadeira, drama em três atos. Oportunamente
obteremos de Walace Leal V. Rodriques, maiores esclarecimentos e aditamentos
críticos sobre a obra do jovem autor araraquarense”
63
.
63
Outros premiados no Festival: Aldomar Conrado, autor pernambucano, Plínio Marcos, autor santista, Maria
Silvia, diretora paraense, Almir Haddad, Carlos Miranda e Etty Fraser. Fonte: revista Dionysos, 1978.
175
4.7 Dois anos de ausência
O Imparcial, de 2 de agosto de 1959, noticiava que, “após dois anos de
ausência”, o TECA voltava ao Municipal. O espetáculo era composto por três
peças com um tema em comum: a infidelidade. A estréia da sexta série de
espetáculos “em teatro de arenadeu-se no dia 5 de agosto, num total de sete
apresentações, até o dia 11 daquele mês.
Imagem
45
: Neuza Varella, Laert de Barros e Maria Cleide Valentim em
A Cova de Salamanca
. Teatro
Municipal de Araraquara, agosto de 1959. Acervo: Maria Cleide Valentim.
176
Como Ele Mentiu ao Marido Dela
Enganado, Espancado e Satisfeito
A Cova de Salamanca
FICHAS TÉCNICAS
Nome da peça
Como ele Mentiu ao Marido Dela How He Lied to Her Husband
Autor George Bernard Shaw (1856-1950) Irlanda
Gênero Comédia
Ano de montagem 1959
Henrique Oscar Rodrigues
Aurora Maria Aparecida Assis
Personagem/ Ator, por
ordem de entrada em
cena
Teddy Mario Barra
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Produção Araken de Toledo Pires
Figurinos Felipe Luiz (heterônimo de Wallace)
Ambientes Diego de Vega (heterônimo de Wallace)
Maquiagem John Brown (heterônimo de Wallace)
Iluminação Everton Aiévoli
Som Inah Perez Bittencourt
Assistentes de direção
Mario Barra e Oscar Rodrigues
Tradução Edgar Cavalheiro
Obs Montada “em teatro de arena”
Nome da peça
Enganado, Espancado e Satisfeito
Decameron. Novella settima
della Settima Giornata
Autor Giovanni Boccaccio (1313-1375) Itália
Gênero Farsa
Ano de montagem 1959
Prólogo Roberto Duarte
Mésser Egano Mario Barra
Beatriz Ruth Magali Miranda
Brunela Maria Aparecida Assis
Personagem/ Ator
Anichino Roberto Hage
177
A Estátua Maria Auxiliadora Colombo
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Produção Araken de Toledo Pires
Figurinos Felipe Luiz (heterônimo de Wallace)
Ambientes Diego de Vega (heterônimo de Wallace)
Maquiagem John Brown (heterônimo de Wallace)
Iluminação Everton Aiévoli
Som Inah Perez Bittencourt
Assistentes de direção Mario Barra e Oscar Rodrigues
Adaptação Alejandro Casona
Obs Montada “em teatro de arena
Nome da peça
A Cova de Salamanca La cueva de Salamanca
Autor Miguel de Cervantes (1547-1616) Espanha
Gênero Entremez
Ano de montagem 1959
Pancrácio Mario Barra
Leonarda Neuza Varella
Cristina Maria Cleide Valentim
Estudante Laert de Barros
Reponce Oscar Rodrigues
Nicolau Benjamin Soares Azevedo
Personagem/ Ator
Leoniso Antonio Furlan
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Produção Araken de Toledo Pires
Figurinos Felipe Luiz (heterônimo de Wallace)
Ambientes Diego de Vega (heterônimo de Wallace)
Maquiagem John Brown (heterônimo de Wallace)
Iluminação Everton Aiévoli
Som Inah Perez Bittencourt
Assistentes de
direção
Mario Barra e Oscar Rodrigues
Tradução Wallace Leal V. Rodrigues
Obs Montada “em teatro de arena”
Fonte: programa do espetáculo.
178
E no programa, a ficha técnica geral do TECA atualizada:
Teatro Experimental de Comédia de Araraquara
Presidente de Honra Olga Ferreira Campos
Presidente Antonio Reis da Silva
Diretor Superintendente Araken de Toledo Pires
Tesoureiro Geral Julia Abrahão
Secretário Geral Mario Barra
Diretor Ensaiador Permanente Wallace Leal V. Rodrigues
Elenco Permanente
Srtas. Maria Cleide Valentim, Izabel Reina, Julia Abrahão, Maria Aparecida Assis, Maria
Auxiliadora Colombo, Neuza Varella e Ruth Magali Miranda.
Srs. Antonio Furlan, Benjamin Soares de Azevedo, Everton Aiévoli, Laert de Barros, Mario Barra,
Moacyr Marchese, Oscar Rodrigues, Roberto Duarte, Roberto Hage e Tito Peixoto.
Fonte: programa do espetáculo.
Como ele Mentiu ao Marido Dela, sucesso da estia do TECA em 1955, foi
outra vez ovacionada. Desta vez com Maria Aparecida Assis no lugar de Fanny
Carati, Oscar Rodrigues substituindo Noemio Lerner e Mario Barra como o
ciumento marido interpretado por Eugenio Gerado Casale.
Enganado, Espancado e Satisfeito, uma das pequenas novelas do
Decamerão, trazia o tema do adultério de forma bem mais debochada que o texto
inglês. Frustrada com seu marido, Egano, a esperta Beatriz consegue manter o
amante, Anichino e ainda fazê-lo espancar o feliz marido.
A Cova de Salamanca, outro entremez de Cervantes, traz o marido traído,
Pancrácio, que se obrigado a afastar-se da bela Leonarda para uma viagem.
Ajudada pela criada, Cristina, um jovem estudante é recebido na casa, mas
Leonarda acaba tendo seus planos destruídos pela volta inesperada do marido.
179
Outra vez sabe-se do “magnífico sucesso alcançado pela nova série de
espetáculos pela edição do jornal O Imparcial do dia 7 de agosto. Sabe-se
tamm dos preços praticados: preços populares: Cr$ 30,00, frisas: Cr$ 150,00.
Após o espetáculo do dia 7, houve uma sessão de debates com estudantes.
No entanto, as notícias começam a escassear. Nos primeiros anos da
companhia, a imprensa noticiava durante meses a preparação de cada
espetáculo, entrevistava cada ator, com fotos e biografia e, após a estréia, fazia
outra série de reportagens e críticas que duravam várias semanas. Agora, o que
começa a se perceber é uma reportagem mais enxuta, mais informativa e menos
bairrista e superlativa.
Imagem
46
: Maria Cleide Valenti
m (abaixo)
e
Neuza Varella (ao lado) em A Cova de
Salamanca. Teatro Municipal de Araraquara,
agosto de 1959. Acervos: Maria Cleide Valentim
e MIS Araraquara.
180
Isto pode ser explicado em decorncia de que uma estréia do TECA, já em
seu quinto ano de atividades, o era mais uma notícia nova. O sucesso das
outras temporadas, de alguma forma, presumia que a temporada atual tamm
seria coroada de êxito, portanto a imprensa podia se dar ao luxo de divulgar a
temporada como uma notícia corriqueira. Tamm é fato que o filme havia tirado o
foco da imprensa das atividades teatrais da companhia. Santo Antonio havia sido
rodado em 1958 e até aquele momento, dois anos depois, não se tinha notícias de
sua estia, o que dava certo ar de frustração às notícias do TECA.
A notícia mais aguardada seria a estréia do filme e não a estréia de uma
nova série de espetáculos teatrais no Municipal.
4.8 Santo Antonio e a Vaca
O término do filme estava bastante difícil. O copião, a cópia positiva de
todas as tomadas, estava pronto, com indicações dos cortes e da sonorização,
mas faltavam recursos para para o acabamento final, a montagem em estúdio, um
processo caro que só poderia ser feito em São Paulo. A frustração tomou conta de
todos.
A notícia de que o Banco do Estado de São Paulo havia aberto uma linha
de financiamento para a indústria cinematográfica nacional trouxe uma esperança.
Péricles Medina, com a ajuda do gerente local do banco e com as latas do copião
em mãos, agendou uma reunião com o Diretor Superintendente do banco e, junto
com Wallace, foram, cheios de esperança, “de Kombi”, para São Paulo.
Quando a projeção do copião teve início, no sexto andar da sede do Banco
do Estado de São Paulo, Wallace sabia que estava jogando sua última cartada.
Eram 10 horas da noite e ele teria que ser o mais convincente possível para os
técnicos do banco. E o foi. Durante quase duas horas explicou com muito
conhecimento e idealismo todos os detalhes da pesquisa, do roteiro, das
181
filmagens, da música, fazendo com que aquele copião ganhasse vida e,
finalmente, o tão esperado financiamento. A viagem de volta “foi uma alegria só”.
Tiveram algum trabalho, no início do ano, com a burocracia para a liberação
do empréstimo de Cr$ 1.300.000,00 (Hum milhão e trezentos mil cruzeiros), mas
eram recursos mais do que suficientes para o término do filme
64
.
No começo de abril, a sonorização e mixagem estavam prontas. Foram
feitas 10 cópias do filme e a estréia marcada para o dia 27 de maio, sexta-feira, às
21h, no cine Odeon de Araraquara, a uma quadra do Teatro Municipal. Wallace
queria que a estréia se desse no próprio dia de Santo Antonio, 13 de junho, mas
cairia em uma segunda-feira, fazendo com que desistisse da idéia
65
.
Em artigo, datado de 24 de maio, Wallace reclamava de preconceitos com o
nome do filme:
64
Entrevista com Péricles Medina.
65
Entrevista com Lygia Fabiano.
Imagem
47
: Oscar R
odrigues como Santo Antonio nas filmagens de
Santo Antonio e a Vaca
. Araraquara,
1958. Acervo: Américo Aguiar Borges.
182
O nosso filme tem a pretensão de reunir numa história feita de muita ternura,
um irmão menor que, neste caso, é a vaquinha Mimosa e o protótipo da
espiritualidade que neste caso é o santo. Talvez que, se o filme chamasse
Santo Antonio e o Tigre, ninguém reclamasse. Creio que o substrato de tudo
seja uma questão de respeito humano. O nosso respeito e acatamento à
Igreja Católica não podem ser desmentidos por quem quer que seja. Os
prelados que leram o roteiro do filme não tiveram absolutamente qualquer
censura a formular.
66
A imprensa araraquarense, na véspera, dia 26 de maio, voltava a se animar
e noticiava os últimos detalhes:
Amanhã Araraquara estará engalanada. Um sonho, uma pertinácia
transforma-se em realidade. Jovens cheios de sol se deram as mãos,
formando uma corrente de princípios de boa vontade objetivando metas
culturais.
Finalmente, a 27 de maio de 1960, estreava o tão esperado Santo Antonio
e a Vaca, o primeiro longa-metragem realizado em Araraquara. A noite de estréia
foi um dos acontecimentos culturais e sociais mais importantes da história da
cidade. O jornal O Imparcial abria sua primeira página neste dia com o seguinte
título: Autêntico acontecimento histórico-artístico-social a avant-première de
Santo Antonio e a Vaca”. No dia 29 de maio, a manchete do jornal viria confirmar
as expectativas: “Assistimos a uma das mais belas festas realizadas na história
de Araraquara”, reportagem de duas páginas assinada por Amêndola da Silva,
com fotos de Lucio A.C. Silva e Geraldo Cesarino.
Faixas e cartazes anunciando o filme tomaram a fachada do cinema.
Guardas da Força Pública fecharam o trânsito na Rua 3, entre as Avenidas Duque
de Caxias e Espanha. Holofotes, emprestados pela Associação Ferroviária de
Esportes, iluminavam a fachada do cine Odeon.
66
Vide Anexo II. Artigos Especiais.
183
Os curiosos lotavam a rua. Os convidados começavam a chegar, os artistas
de smoking, os homens de terno e gravata, as mulheres muito elegantes, como
em uma estréia do TECA no Teatro Municipal. D. Bela, que trabalhava há anos no
cinema, começava a ficar impaciente, afinal nunca havia visto o seu Odeon com
“características de festas de gala”. Todos os convites haviam sido vendidos, com a
renda destinada a uma entidade assistencial da cidade.
Imagem
48
:
j
ornal O Imparcial
de 29
de maio de 1960.
Reportagem de
Amendola da Silva.
Fotos de Lucio A.C.
Silva e Geraldo
Cesarino. Foto de
Viviane Cristina Pinto.
184
Os mestres de cerimônia, Rafael Medina, Domingos Abrita e Antonino
Rodrigues Leal chegaram, acompanhados do Deputado Scalamandré Sobrinho e
da atriz Lola Brah.
Às 20h50 o cinema já estava lotado quando Denisar Alves chamou ao palco
o Dr. Miguel Tedde Netto para fazer a abertura solene. Em seguida, Wallace, “sob
estrondosa salva de palmas e visivelmente comovido”, subiu ao palco. Citou os
nomes de todos os artistas e técnicos, convidando-os a subir ao palco, sob
aplausos. A rainha da beleza araraquarense, Srta. Luzon Colino, também foi
homenageada e exemplares “do escrito que serviu de feitura do filme” foram
distribuídos às bibliotecas da cidade. Dirceu Ianni cantou Meu Santo Antonio” e
“Canto do Ribeirão Triste” e Zairo Marinoso executou a trilha sonora. O formalismo
Image
m
49
: Wallace Leal V. Rodrigues, Ruth
Magali Miranda, Lygia Fabiano e Hermírio
Amorim Netto chegam ao Cine Odeon para a
avant-première de Santo Antonio e a Vaca.
Araraquara, 27 de maio de 1960. Foto:
Geraldo Cesarino. Acervo: Wallace Leal V.
Rodrigues.
185
inicial deu lugar à emoção no final “e a espontaneidade e satisfação
transvassavam dos corações daquela seleta platéia”.
Lola Brah, “um dos grandes nomes da cinematografia nacional”, encantou a
todos ao ser entrevistada ao final:
Gostei imensamente do filme, impressionando-me o excelente trabalho de
Mario Barra, salientando dentro de um ótimo vel interpretativo dos demais
atores. Se houver outro filme como este, voltarei correndo para Araraquara,
cidade que me encanta.
As fotos destacavam tamm as presenças de Roberto Affonso,
proprietário do cinema; do jovem José Roberto Bueno, organizador do Festival
de Cinema de Araraquara; do Dr. Paulo Guimarães da Fonseca, diretor da
Faculdade de Filosofia; do Dr. Clodomiro Lemos e Sra e do Sr. José Galli,
Presidente da Câmara Municipal, senhora e filha.
A cerimônia teve discursos, aplausos, música e a tão esperada projeção do
filme. Após as solenidades e o filme, um coquetel foi oferecido a todos nas
depenncias do Clube Araraquarense, ao lado do cinema.
Imagem
50
:
a
vant
-
première
de
Santo Antonio e a Vaca
.
Cine Odeon, Araraquara, 27 de maio de 1960. Fotos:
Geraldo Cesarino. Acervo: Wallace Leal V. Rodrigues.
186
Santo Antonio e a Vaca
FICHA TÉCNICA
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Direção Técnica Edward Freund
Assistência Técnica José Claudio Borges
Produção Araken de Toledo Pires
Assistente Pedro Peiró
Maquiagem John Brown (heterônimo de Wallace)
Cenários Oscar Rodrigues e Diego de Vega (heterônimo de Wallace)
Figurinos Felipe Luis (heterônimo de Wallace)
Diálogos Inah Perez Bittencourt
Roteiro Axel de Fersen (heterônimo de Wallace)
Esculturas do Mestre Dito
No sítio do Santo Antonio do Ribeirão Triste
Mané Tito Peixoto
Tonho Mario Barra
Zica Julia Abrahão
Zabelinha Lygia Fabiano
Rita Maria Cleide Valentim
e a vaca Mimosa
No sítio do Seu Bento
Seu Bento Geraldo Brandão
Pedro Moacyr Marchese
Joaninha Ruth Magali Miranda
Tião Hermínio Amorim Netto
No Céu
Santo Antonio Oscar Rodrigues
São Pedro Antonino Rodrigues Leal
Moisés Rafael de Medina
Os Noivos
Severino Jayme Maurício Leal
Elenco
Zé Tupete Antônio Furlan
187
No Sonho
Avô Januário Mario Barra
Parceiros do Jogo Alceu Ianelli, Pedro Peiró e Alcides Undiciatti
As Comparsas Maria Aparecida Assis e Izabel Reina
E ainda
1º moço do leite Péricles Medina
2º moço do leite Benjamim Soares de Azevedo
Moça da Vila Maria Helena Belda
Canto do Ribeirão
Triste
Letra e música de Wallace Leal V. Rodrigues
Canções
Meu Santo Antônio
Letra de Jaime de Oliveira, música de Américo Aguiar
Borges
Cantor Notívago Dirceu de Freitas Ianni
Música e Arranjos Zairo Marinoso
Laboratórios Cia. Cinematográfica Vera Cruz e Cia. Cinematográfica Bandeirantes
Exteriores Filmados na Fazenda Salto Grande, Araraquara
Interiores
Filmados nos estúdios montados na Escola SENAC, Araraquara
Fonte: programa da avant-première e ficha técnica do filme.
O programa da noite
67
, dobrado de uma forma criativa e o linear, trazia
um texto de Wallace, em letras minúsculas:
67
Vide Anexo I. Programas.
188
1960
maio
27
sexta-feira
neste dia, às 21 horas, tendo por local o cine odeon, o teatro experimental de comédia de
Araraquara, promove a apresentação histórica da primeira produção cinematogfica realizada em
Araraquara.
o movimento tem por lema: viva o brasil, e oferece ao público a fixação da paisagem
araraquarense com seus tipos rurais, músicas e danças, no ano de graças de 1960, com atores,
diretor, produtor e financiadores araraquarenses, santo antonio e a vaca deverá mostrar aos quatro
pontos cardeais do Brasil, feito de poesia, sentimento e compreensão humana, o rico veio do
folclore nativo até então praticamente relegado ao esquecimento.
o movimento vale, antes de tudo, pela afirmativa dos altos e nobres ideais da juventude
brasileira que se levanta disposta, mesmo com duros sacrifícios, à valorização da pátria e à
afirmativa emocionante de seu corpo e de sua alma.
Nos dias seguintes, os comentários de toda a cidade eram sobre o filme. A
imprensa noticiava que todos os que haviam assistido haviam gostado muito. E
entrevistaram muitos araraquarenses “inteligentes”, que corroboravam esta
opino. Nas outras sessões, as filas se formaram em frente ao cine Odeon, todos
queriam conferir, orgulhosos, o filme araraquarense e saiam tristes pela morte
precoce de Zabelinha, personagem que maior empatia causava no público.
Santo Antonio e a Vaca o é um filme fácil ou comercial e que possa ter
agradado a toda a população. Pode ser considerado hoje como um filme cult, não
apenas por sua temática social, mas tamm pelo ritmo de sua narrativa, com
uma fotografia escura, cenas longas e densas. Portanto, por mais que todos os
que tenham assistido, tenham gostado, não se poderia imaginar que o filme
tivesse uma carreira comercial consistente, ficando boa parte das opiniões
superlativas emitidas dentro do orgulho de estarem testemunhando e se sentido
parte de um acontecimento histórico da cidade.
Depois da avant-première, a distribuição das 10 cópias começava a se
tornar difícil, ainda mais tentar fazer com que o filme tivesse uma carreira
comercial. As distribuidoras não se interessavam pela temática e nem tampouco
pelo filme em si, que não tinha nenhum grande nome do cinema nacional para
ajudar na bilheteria. O representante da distribuidora Meca, Sr. Rubens Regino,
189
esteve na estréia em Araraquara, tirou fotos, deu entrevistas, elogiou a tudo e a
todos, mas relutava em assinar um contrato de distribuição.
Ainda tentou-se contratar a Irmãos Vitalle, distribuidora localizada na Rua
Aurora, em São Paulo, e a Copacabana Discos para um eventual disco com a
trilha sonora. Tudo em vão. Recebiam borderôs com platéias menores que 100
pessoas, quando, na realidade, a lotação era bem maior. Descobriram, pouco a
pouco, que o tinham condições de acompanhar a distribuição e o desempenho
do filme. Inexperientes, estavam sendo enganados
68
.
Além de Araraquara, onde o filme foi visto com alguma freqüência nos anos
seguintes, apenas alguns cinemas das cidades vizinhas acabaram exibindo-o,
durante um período curto. Depois foi esquecido, sendo lembrado hoje em dia
68
Entrevista com Péricles Medina.
Imagem
51
:
c
ena da morte da vaca Mimosa no film
e
Santo Antonio e a Vaca
. Araraquara, 1958. Acervo:
Julia Abrahão.
190
apenas em datas comemorativas. Em 2003, teve uma cópia restaurada graças à
iniciativa da universidade local, a UNIARA, com o objetivo de preservar a memória
da cidade. Foi exibido na TV Morada do Sol e teve algumas sessões organizadas
em um dos cinemas locais.
Em 2008, o SESC local organizou a Mostra Loucos por Cinema, com
exposições, encontros, oficinas e exibições de filmes antigos e onde uma
homenagem foi prestada aos Nossos Loucos por Cinema, às atrizes e atores
ainda vivos da companhia. Painéis fotográficos com cenas dos ensaios e do filme
foram montados e sessões organizadas, quando Santo Antonio e a Vaca e Férias
no Arraial, puderam ser vistos pelos araraquarenses. Iniciativa do Núcleo de
Eventos do SESC Pompéia, SESC Araraquara, com a assessoria do Prof. Maximo
Barro e o apoio entusiasta de Américo Aguiar Borges.
Ainda no primeiro semestre de 1960, Wallace começava a se dar conta
da triste realidade: o filme, apesar das qualidades, era um fracasso de bilheteria,
pelo menos oficialmente. E pior, a Arabela Filmes havia ficado com uma dívida
enorme a ser paga com o Banco do Estado. A saída foi apelar à família outra vez.
E a família, mais uma vez, o ajudou. Dentre as negociações da época, uma delas
se mostrou bastante criativa: tecidos da Casas Texidal, da família, foram doados
para serem utilizados para a confecção dos uniformes dos funcionários da EFA,
com quem a companhia ainda tinha dívidas
69
.
Em junho daquele ano, ainda dentro do sucesso do lançamento do filme, o
jornal O Imparcial, do dia 16, anunciava que Santo Antonio voltava em cartaz por
mais alguns dias, mas já começavam a cobrar o que teria acontecido ao TECA e a
seu teatro:
O que constatamos no trabalho foi que Wallace acabou esquecendo o TECA
depois do êxito e das glórias conquistadas: o Teatro Experimental de
Comédias de Araraquara desapareceu.
69
Entrevista com Péricles Medina.
191
O TECA dependia do Teatro Municipal para poder existir. No dia 5 de
agosto de 1960, O Imparcial cobrava a premência de uma reforma no já combalido
teatro, noticiando que o Vereador Miguel Tedde Netto, que havia proferido
elogiado discurso na avant-première do filme, havia estado em Brasília na
companhia do deputado federal, Dr. Ernesto Pereira Lopes, pleiteando verbas
federais para a tão sonhada reforma.
Imagem
52
:
Julia Abrahão em
Santo Antonio e a Vaca
. Araraquara, 1958. Acervo: Julia Abrahão.
192
Imagem
53
: Teatro Municipal de Araraquara e a Esplanada das Rosas, década de
19
5
.
Foto: Photo
-
Studio, de Rivas Autulo. Acervo: MIS Araraquara.
193
5. OS ÚLTIMOS ANOS
O esforço dedicado ao filme havia sido excessivo. O ano de 1961 se
iniciava e estavam todos exaustos. Mais do que exaustos, como a carreira do
filme não havia sido o sucesso esperado, estavam muito desapontados. A
burocracia para a distribuição não era algo com que soubessem lidar, o controle
das bilheterias também. As exibições já se tornavam esporádicas. Haviam
confiado nas pessoas erradas e, para piorar, sobraram dívidas a saldar.
As notícias sobre o TECA na imprensa local começavam também a se
escassear. A quantidade de matérias dedicada à companhia, após a excessiva
exposição do filme no ano anterior, tornou-se pequena.
5.1 A Parceria com a Faculdade de Filosofia
Portanto, quando o diretor da Faculdade de Filosofia local, Dr. Paulo
Guimarães da Fonseca, procurou o TECA para uma parceria, aquele gesto
representou um novo alento. O Dr. Paulo havia estado na cerimônia de estréia do
filme, era um entusiasta do trabalho do grupo e tivera a idéia de encenar os textos
estudados pelos alunos da escola para ampliar a percepção e o debate sobre os
temas.
A Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Araraquara FFCLA foi
autorizada a funcionar em 13 de abril de 1959, ano em que iniciou suas atividades
com os cursos de Pedagogia e de Letras. A partir de 1976, a Faculdade passou a
fazer parte da recém criada Unesp. A Faculdade de Filosofia de Araraquara tem
em seu currículo, entre outras realizações, a organização de uma conferência com
o escritor e filósofo francês Jean-Paul Sartre
70
.
70
Jean-Paul Sartre esteve na cidade no dia 4 de setembro de 1960, evento que contou com a presença de
Simone de Beauvoir, sua mulher, acompanhados de Jorge Amado, lia Gattai, Bento Prado, Fernando
Henrique e Ruth Cardoso, entre outros intelectuais.
194
Por sua localização à Rua 3, entre as Avenidas Duque de Caxias e
Espanha, em frente ao Cine Odeon local da avant-première do filme - e muito
próximo ao Teatro Municipal, a Faculdade de Filosofia não era uma escola
isolada. Ao contrário, fazia parte de Araraquara, era ponto de encontro obrigatório
dos grupos mais informados da cidade, mesmo que o estivessem cursando a
escola.
Logo, no dia 22 de maio, o Prof. Dante Moreira Leite, em meio a uma
conferência intitulada “A Realidade Americana às Avessas” surpreenderia o
auditório da Faculdade com os atores do TECA ilustrando o assunto com jogos
Imagem
54
: Maria Aparecida Assis cercada p
or
Oscar Rodrigues, amparando
-
a, Roberto Duarte e
Odemir
Teixeira de Faria. De pé, da esquerda para a direita: Dorival Teixeira de Faria, Nildson Leite Amaral, Ary
Vargas da Silva, Milton de João e Isaias Arsênio, todos em roupas de ensaio. De Ratos e Homens, Teatro
Municipal de Araraquara, maio de 1961. Foto: Geraldo Cesarino. Acervo: MIS Araraquara.
195
cênicos extraídos da peça De Ratos e Homens, de John Steinbeck
71
, que estrearia
na semana seguinte.
A parceria com a Faculdade de Filosofia garantiria três montagens naquele
ano de 1961: além do texto de Steinbeck, o TECA montaria mais um clássico de
Tennessee Williams, À Margem da Vida e a primeira e única peça infantil do
grupo, um projeto antigo de Wallace, Pluft, o Fantasminha, de Maria Clara
Machado. Todos apresentados no alquebrado Teatro Municipal, “em teatro de
caixa”.
A notícia da parceria alegrara a todos, que viam uma forma da companhia
se manter com alguma verba pública, desta vez estadual. No entanto, esta ajuda
traria também uma situação paradoxal. Buscando se adaptar às necessidades da
Faculdade de Filosofia e a seus textos e assuntos, Wallace não poderia mais ter a
liberdade de outrora, os textos curtos “em teatro de arena”, por exemplo, marca
registrada da companhia, não mais seriam montados. A última série “em arena”
seriam as peças dos Três Atos de Infidelidade, montados em 1959.
O TECA já havia pensado em montar À Margem da Vida e Pluft. Eram
textos de referência para qualquer companhia. Mesmo De Ratos e Homens havia
impressionado Wallace quando de sua estada no Festival de Teatro de Santos. O
problema não era o repertório em si, mas o fato de que a companhia iria, de agora
em diante, se concentrar muito mais em textos sérios do que em comédias. Muito
mais “em teatro de caixa” do que “em teatro de arena”, e com isso, de alguma
forma, perder uma se suas mais importantes características.
71
De Ratos e Homens havia sido montada com muito sucesso, em 1956, pelo Teatro de Arena de São Paulo,
com direção de Augusto Boal.
196
Mas estas considerações não passaram pela cabeça de ninguém naquele
momento, nem os diretores da Faculdade de Filosofia teriam qualquer intenção de
prejudicar a companhia neste sentido. Ao contrário, todos estavam muito felizes
com a parceria, que renderia à Inah Perez Bittencourt e ao próprio Wallace, um
emprego regular junto à área cultural da Faculdade.
Assim, a 30 de maio de 1961, uma terça-feira, às 21h, estreava o segundo
espetáculo “em teatro de caixa” da companhia:
Imagem
55
: Nildson Leite Amaral, Maria Aparecida Assis e Dorival Teixeira de Faria em foto dos ensaios
de De Ratos e Homens, sem os figurinos da peça. Teatro Municipal de Araraquara, maio de 1961. Foto:
Geraldo Cesarino. Acervo: MIS Araraquara.
197
De Ratos e Homens
FICHA TÉCNICA
Nome da peça
De Ratos e Homens Of Mice and Men
Autor John Steinbeck (1902-1968) EUA
Gênero Drama
Ano de montagem 1961
George Dorival Teixeira de Faria
Lennie Nildson Leite Amaral
Candy Odemir Teixeira de Faria
Patrão Ary Vargas da Silva
Curley Laert de Barros
Mulher de Curley Maria Aparecida Assis
Slim Oscar Rodrigues
Carlson Milton de João
Walt Roberto Duarte
Personagem/ Ator
Crooks Isaias Arsênio
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Obs Montada “em teatro de caixa”
Fonte: jornal O Imparcial e entrevistas.
Os espetáculos se estenderiam até o dia 7 de junho e seriam em
homenagem ao Prof. Lysanias de Oliveira Campos, Superintendente de Cultura da
cidade. Mesmo abandonando o formato “em arena”, o TECA conseguiu levar,
segundo a imprensa, quatro mil pessoas ao já decadente Teatro Municipal.
O Cidadão Araraquarense Paschoal Carlos Magno foi outra vez convidado,
agora pelo próprio Diretor da Faculdade, Dr. Paulo Guimarães da Fonseca, para a
estréia. Na ocasião, entregaria o troféu Paschoal, aquele que o TECA havia ganho
no II Festival Nacional de Teatro de Estudantes, em Santos, em julho de 1959,
pelo melhor espetáculo em um ato: Enganado, Espancado e Satisfeito, de
Boccaccio.
198
Ratos e Homens (sem o De original), havia sido montada pelo Teatro de
Arena em 1956 e valeria ao jovem estreante diretor, Augusto Boal, o seu primeiro
prêmio da Associação Paulista de Críticos de Artes, APCA, como diretor revelação
daquele ano. No elenco, Gianfrancesco Guarnieri e Milton Gonçalves, que fazia
então a sua estréia no Arena.
A ação se passa na época da Depressão, na rudeza das plantações do sul
dos EUA, a “poucas milhas ao sul de Soledad”, e tem no gigante abobalhado
Lennie, interpretado pelo futuro radialista Nildson Leite Amaral, e na mulher de
Curley”, os pivôs da história. Lennie traz a mensagem de sonho e ternura que
acaba por contaminar o grupo. A mulher de Curley é vista como tentação, mas
tamm como perigo e dela os homens se afastam amedrontados”, nos
explicava o Prof. Dante Moreira Leite, em matéria publicada em O Imparcial, de 30
de maio de 1961.
George Milton e seu amigo Lennie Small vagam pelas paisagens do sul dos
EUA à procura de trabalho. Amizade, solidão e alienação estão presentes ao
longo do texto: “Caras como nós que trabalham em fazendas são os caras mais
solirios do mundo. Não m família. Não pertencem a nenhum lugar”, diz
George. Ao que Lennie responde: “Mas nós não. E sabe por quê? Por que eu
tenho você para tomar conta e você tem a mim para tomar conta. Por isso”.
Conseguem um trabalho temporário em uma plantação, onde o filho do
patrão, Curley, não se mostra muito amistoso com a dupla. Provocado pela mulher
de Curley e sem conseguir controlar sua força e sem saber bem porque, Lennie
acaba estrangulando-a, neste conto que mescla ternura e brutalidade e é
considerado uma das obras primas de John Steinbeck.
O elenco era numeroso, dez atores, como em Os Dois Faladores. Muitos
estreantes e uma novidade: Isaias Arsênio, que viria a ser o único ator negro da
companhia. Wallace havia pensado em Ruth Magali Miranda para o papel da
mulher de Curley, precisava de uma atriz com sensualidade e tamm com
personalidade suficiente para atuar sozinha entre nove homens. Mas Magali
199
acabou não aceitando, só restando ao diretor enviar um telegrama à versátil
Cidinha, Maria Aparecida Assis, que estava em São Paulo na ocasião. Um pouco
receosa, Cidinha se achava sem o sex appeal da amiga, “eu era muito magrinha”,
mas acabou aceitando, confiando que Wallace saberia o que fazer. De fato, o
resultado foi muito convincente: “Eu usava só um peignoirzinho”
72
.
A imprensa, em artigo assinado por O. S. M., em 3 de junho, concordou
com a escolha, mas acabou por achar um inusitado deslize na sua atuação:
Com maior traquejo de palco, pois é elemento de base do TECA, soube
vestir a personagem com suas características fundamentais. Ademanes, voz
e entradas à perfeição. Muito boa na cena em que coquetemente se e a
provocar o gigante e é, afinal, vitimada por ele. Somente careceu um pouco
mais de imobilidade após a morte.
O jornal O Imparcial, de 1° de junho, saudava a grande estréia, com a casa
cheia, os “cenários em três planos, montados de uma forma das mais sugestivas
impressionavam pela beleza da sua simplicidade funcional”.
A peça agradou plenamente; empolgou até. O desempenho dos atores foi
dos mais felizes, mesmo com o natural nervosismo dos estreantes. Nildson
Leite do Amaral foi magistral como estreante, interpretando Lennie, um
desequilibrado mental e pivô da peça. Maria Aparecida Assis, muito bem no
papel da inquieta e volúvel esposa de Curley; George, interpretado por
Doriva de Faria. Uma grata revelação do TECA, como o foi Isaias Arsênio da
Silva, no papel de Crooks, o negro ferreiro da fazenda, das margens do rio
Salinas, em um dos Estados sulinos da América do Norte.
Baladas foram introduzidas na montagem e cantadas magistralmente” por
Isaias Arsênio, o baixo do Coral Araraquarense. O jornal O Imparcial ainda
lembrava que a renda do espetáculo de estréia seria direcionada para as Caixas
Escolares dos Grupos Primários da cidade. O que não ajudava em nada o
problema da dívida.
72
Entrevista com Maria Aparecida Assis.
200
5.2 À Margem da Vida
No mês de setembro, um desafio seria colocado pelo novo parceiro, montar
um dos clássicos da dramaturgia moderna, À Margem da Vida, de Tennessee
Williams, outra vez “em teatro de caixa”. Um texto sempre sonhado pela
companhia, principalmente por Araken de Toledo Pires. Wallace, que conhecia a
peça de cor, acabou aceitando o desafio e dando ao grande amigo um presente
mais que merecido, a oportunidade de dirigir o seu primeiro especulo. Wallace
ficaria apenas como assistente e na criação dos cenários.
A primeira encenação brasileira de À Margem da Vida data de 1947, em
São Paulo, com Alfredo Mesquita à frente do Grupo de Teatro Experimental, um
elenco onde se destacavam Abílio Pereira de Almeida e Nydia Licia. Em 1955, o
Teatro de Arena voltaria a montar o texto, dirigido por José Marques da Costa,
espetáculo assistido por Wallace e naquele mesmo ano de 1961, a Theatre Guild
American Repertory Company traria a peça com o patrocínio do governo norte-
americano, em uma turnê pela América Latina, uma montagem, em inglês,
aplaudidíssima em São Paulo, com a primeira-dama do teatro norte-americano,
Helen Hayes, no elenco (MAGALDI e VARGAS, 2000, p. 419).
Apesar dos detalhes do programa da peça, não foi possível precisar a data
exata desta estréia, nem tampouco o número total de apresentações, devido à
falta de acesso às informações da imprensa. Os entrevistados também não foram
precisos quanto a estes dados.
201
À Margem da Vida
FICHA TÉCNICA
Nome da peça
À Margem da Vida The Glass Menagerie
Autor Tennessee Williams (1911-1983) EUA
Gênero Drama em 2 atos
Ano de montagem 1961
Tom Wingfield Aloisio Figueira
Amanda Wingfield Julia Abrahão
Laura Wingfield Maria Aparecida Assis
Personagem/ Ator
Jim O'Connor Milton de João
Direção Araken de Toledo Pires
Cenário Wallace Leal V. Rodrigues
Fotografias Geraldo Cesarino
Indumentárias Felipe Luiz (heterônimo de Wallace)
Som Alekan (heterônimo de Araken)
Iluminação Renato Bazolli
veis Irmãos Micelli
Lustres Oficina Rádio Elétrica N.S. Aparecida
Coordenação Geral Inah Perez Bittencourt
Tradução Esther Mesquita
Obs Montada “em teatro de caixa”
Fonte: programa do espetáculo.
No programa, uma nota trazia a informação que Julia Abrahão vestia uma
crião da Maison Worth, bordada em fios de ouro e que fazia parte da colão
Primavera-Verão de 1925 do modista.
202
O clima da peça é intenso, pesado e os personagens vivem sob constante
pressão, a ponto de quase se quebrarem como peças de vidro em uma coleção. O
título original em ings é uma coleção de pequenos animais de vidro: The Glass
Menagerie.
Laura é uma moça mida, delicada, mas meio manca
73
, que vive sob o
poder de uma mãe autoritária e que busca casá-la de qualquer maneira. Amanda
Wingfield é uma figura tragicômica, que vive da glória do passado, do tempo em
que era casada e tinha melhores condições de vida. Tennessee Williams diz que
“ela não é paranóica, mas sua vida é paranóia”. O pretendente Jim é “um rapaz
73
Maria Aparecida Assis diz que saia mancando do Teatro Municipal após os espetáculos, demorando a se
recompor. Entrevista com Maria Aparecida Assis.
Imagem
56
: À Margem da Vida. Julia Abrahão em primeiro plano, Maria Aparecida Assis, Aloísio Figueira
e Milton de João. Teatro Municipal de Araraquara, setembro de 1961. Foto: Geraldo Cesarino. Acervo: MIS
Araraquara.
203
simpático e comum”, nas palavras de Williams, mas que acaba fugindo daquele
compromisso que começavam a lhe impor. O irmão, Tom, narrador da história,
poeta e revoltado contra a situação em que se encontra, a de ter que tomar conta
da família e trabalhar em uma fábrica e não poder viver uma vida de aventuras
como a que seu pai viveu. É um personagem bastante autobiográfico
74
.
5.3 Pluft, finalmente montado
Com a aproximação do final do ano, Wallace conseguiu convencer seu
novo parceiro, a Faculdade de Filosofia, assim como a Superintendência de
Cultura da cidade a montarem o primeiro espetáculo infantil da companhia, um
projeto planejado muito tempo, na verdade desde o início da companhia: Pluft,
o Fantasminha, um clássico da literatura infantil de Maria Clara Machado. Wallace
havia estado com a autora no Rio de Janeiro em 1957 no próprio Teatro O
Tablado, onde a peça estreou em 1955, e se empolgara com a idéia de um dia vir
a montá-la
75
.
No elenco araraquarense, entre outros, Tereza Rocha Leite, como o
fantasminha Pluft e dois parentes de Wallace: Cinira Rodrigues Leal, como Maribel
e Carlos Roberto Leal Andrade, outro sobrinho, filho de sua querida tia Mariinha,
como um dos policiais. Assim, em outubro de 1961, estreava:
74
Informões do programa da peça, em texto assinado por A.S.G..
75
Vide Capítulo 6. Bastidores.
204
Pluft, o Fantasminha
FICHA TÉCNICA
Nome da peça
Pluft, o Fantasminha
Autor Maria Clara Machado (1921-2001) Brasil
Gênero Peça infantil
Ano de montagem 1961
João Edson R. Martins
Julião Roberto Duarte
Sebastião João Aldo do Carmo
Pluft Tereza Rocha Leite
Mãe Fantasma Ruth Magali Miranda
Perna de Pau Oscar Rodrigues
Maribel Cinira Rodrigues Leal
Tio Gerúndio Odemir Teixeira de Faria
Policial fantasma Henrique Zambelli
Personagem/ Ator por
ordem de entrada em
cena
Policial fantasma Carlos Roberto Leal Andrade
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Assistente Inah Perez Bittencourt
Coordenação Alice Spinola Gama
Produção Araken de Toledo Pires
Figurinos Felipe Luiz (heterônimo de Wallace)
Cenário Diego de Vega (heterônimo de Wallace)
Iluminação Renato Bazolli
Som Alekan (heterônimo de Araken)
Maquiagem John Brown (heterônimo de Wallace)
Obs Montada “em teatro de caixa”
Fonte: programa do espetáculo.
E no programa, a ficha técnica geral do TECA, apenas com o elenco
permanente:
204
Pluft, o Fantasminha
FICHA TÉCNICA
Nome da peça
Pluft, o Fantasminha
Autor Maria Clara Machado (1921-2001) Brasil
Gênero Peça infantil
Ano de montagem 1961
João Edson R. Martins
Julião Roberto Duarte
Sebastião João Aldo do Carmo
Pluft Tereza Rocha Leite
Mãe Fantasma Ruth Magali Miranda
Perna de Pau Oscar Rodrigues
Maribel Cinira Rodrigues Leal
Tio Gerúndio Odemir Teixeira de Faria
Policial fantasma Henrique Zambelli
Personagem/ Ator por
ordem de entrada em
cena
Policial fantasma Carlos Roberto Leal Andrade
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Assistente Inah Perez Bittencourt
Coordenação Alice Spinola Gama
Produção Araken de Toledo Pires
Figurinos Felipe Luiz (heterônimo de Wallace)
Cenário Diego de Vega (heterônimo de Wallace)
Iluminação Renato Bazolli
Som Alekan (heterônimo de Araken)
Maquiagem John Brown (heterônimo de Wallace)
Obs Montada “em teatro de caixa”
Fonte: programa do espetáculo.
E no programa, a ficha técnica geral do TECA, apenas com o elenco
permanente:
206
lembra-se dos lindos cenários e das filas de crianças ao redor do Municipal e de
ser parada na rua, anos depois da peça, com exclamações de: “Maribel, Maribel,
dos lábios cor de mel
76
”.
No programa pode-se ler, anunciado o próximo espetáculo da companhia, a
comédia Arsênico e Alfazema, de J. Kesselring. Este espetáculo jamais seria
montado. Pluft acabou sendo o último espetáculo apresentado pelo TECA no
Teatro Municipal de Araraquara. Da mesma forma que em À Margem da Vida,
apesar dos detalhes do programa da peça, não foi possível precisar a data exata
desta estréia, nem tampouco o mero total de apresentações, devido à falta de
acesso às informações da imprensa. Os entrevistados tamm não foram precisos
quanto a estes dados.
5.4 Festival de Teatro de Porto Alegre
O ano de 1962 se iniciou com um convite para a companhia se apresentar
no IV Festival Nacional de Teatro de Estudantes, de 13 a 21 de janeiro, em Porto
Alegre, RS, “o já tradicional certame teatral criado e organizado por Paschoal
Carlos Magno”. E se foi, a 9 de janeiro, a comitiva do TECA, formada por 15
pessoas, mais uma vez - pela segunda vez agora - em uma longa viagem, feita
em três etapas: De trem até São Paulo, dali à Curitiba e do Paraná a Porto
Alegre, por ônibus especiais”. Além dos atores e atrizes, Wallace, Araken, Inah
Perez Bittencourt, que após o filme havia se incorporado ao grupo, José Bizelli e
Renato Bazoli. O jornal O Imparcial, de 9 de janeiro de 1962, noticiava em
detalhes.
A viagem teve a parada prevista em Curitiba, onde as atrizes da companhia
ficaram acomodadas com as Irmãs Paulinas, enquanto os rapazes, na Escola da
Polícia Militar da cidade. Chegaram a Porto Alegre na manhã do dia 13 de janeiro.
76
Entrevista com Cinira Rodrigues Leal.
207
Outra vez, apesar das entrevistas e das reportagens do jornal O Imparcial,
não foi possível precisar as datas e os locais exatos dos espetáculos de Porto
Alegre. Foram apresentadas, as duas últimas peças encenadas em Araraquara.
Ao ar livre, em uma praça perto do porto onde ventava muito, segundo os
entrevistados, possivelmente no domingo, 14 de janeiro, levaram:
Pluft, o Fantasminha
FICHA TÉCNICA
Nome da peça
Pluft, o Fantasminha
Autor Maria Clara Machado (1921-2001) Brasil
Gênero Peça infantil
Ano de montagem 1962
João Edson R. Martins
Julião Roberto Duarte
Sebastião João Aldo do Carmo
Pluft Tereza Rocha Leite
Mãe Fantasma Ruth Magali Miranda
Perna de Pau Oscar Rodrigues
Maribel Cinira Rodrigues Leal
Tio Gerúndio Wallace Leal V. Rodrigues
Personagem/ Ator por
ordem de entrada em
cena
Policial fantasma Aloísio Figueira
Direção Wallace Leal V. Rodrigues
Assistente Inah Perez Bittencourt
Coordenação Alice Spinola Gama
Produção Araken de Toledo Pires
Figurinos Felipe Luiz (heterônimo de Wallace)
Cenário Diego de Vega (heterônimo de Wallace)
Som Alekan (heterônimo de Araken)
Maquiagem John Brown (heterônimo de Wallace)
Obs Montada “em teatro de caixa”
Fonte: jornal O Imparcial e entrevistas.
208
Uma exigência da organização do Festival era que cada grupo convidado
apresentasse um espetáculo infantil. Uma montagem que acabou sendo das mais
complicadas, pelas condições técnicas: o palco era improvisado e eles levaram
apenas o guarda roupa e elementos de cena. Além disso, alguns atores que o
haviam participado da montagem original. E para complicar ainda mais as coisas,
uma repentina doença do Barra, que teve que voltar às pressas para São Paulo,
deixou o papel de Tio Gerúndio tendo que ser assumido pelo próprio Wallace, que
se desempenhou dele com algumas ressalvas, segundo suas atrizes
77
.
77
Depoimento de Maria Aparecida Assis em 18/10/08.
Imagem
58
: Paschoal Carlos Magno em primeiro plano, seguido pelo governand
or gaúcho, Leonel Brizola, o
segundo após o ministro. Na parte inferior, Cinira Rodrigues Leal, Ruth Magali Miranda e Oscar Rodrigues,
com Inah Bittencourt logo atrás. Porto Alegre, janeiro de 1962. Acervo: Julia Abrahão.
209
Dias depois, durante a semana, no então centenário Theatro São Pedro,
o mais antigo e tradicional da cidade, levaram aquela que viria a ser a última peça
apresentada pelo TECA
78
:
À Margem da Vida
FICHA TÉCNICA
Nome da peça
À Margem da Vida The Glass Menagerie
Autor Tennessee Williams (1911-1983) EUA
Gênero Drama em 2 atos
Ano de montagem 1962
Tom Wingfield Aloisio Figueira
Amanda Wingfield Julia Abrahão
Laura Wingfield Maria Aparecida Assis
Personagem/ Ator
Jim O'Connor Oscar Rodrigues
Direção Araken de Toledo Pires
Cenário Wallace Leal V. Rodrigues
Fotografias Geraldo Cesarino
Indumentárias Felipe Luiz (heterônimo de Wallace)
Som Alekan (heterônimo de Araken)
Iluminação Renato Bazolli
veis Irmãos Micelli
Lustres Oficina Rádio Elétrica N.S. Aparecida
Coordenação Geral Inah Perez Bittencourt
Tradução Esther Mesquita
Obs Montada “em teatro de caixa
Fonte: jornal O Imparcial e entrevistas.
Assistiram, entre outros espetáculos, uma montagem do Auto da
Compadecida, de Ariano Suassuna, pelo grupo Teatro do Estudante de Campinas,
78
Entrevista com Ruth Magali Miranda.
210
com a jovem atriz, Regina Duarte, como Nossa Senhora. Viram ainda uma
remontagem de Vento Forte para um Papagaio Subir, do conterrâneo José Celso
Martinez Corrêa, dirigida por Fuad Jorge Khoury, e com o futuro político, então
estudante da Escola Politécnica, José Serra, no papel de João Ignácio:
A apresentação foi feita no Festival de Teatro da Juventude, organizado pelo
Paschoal Carlos Magno, ele um grande personagem, com notável bom
gosto para o teatro e uma extraordinária capacidade de organização. Foi em
Porto Alegre, janeiro de 1962. Eu tinha 19 anos.[...] Fomos de ônibus para
Porto Alegre, junto com gente de São Paulo, inclusive a Regina Duarte,
acompanhada pela mãe. Era uma gracinha, bem menininha, tímida, e
ganhou um prêmio, com o “Auto da Compadecida”. Do festival, participavam
o Plínio Marcos, o Sérgio Mamberti, a Dina Sfat. Ela foi integrando o elenco
da engenharia do Mackenzie como não tinha mulheres, arranjaram a Dina,
que, salvo engano, era funcionária do centro acadêmico ou algo assim.
Creio que o Sérgio também não estudava engenharia, mas estava com o
grupo, que levou “Os Fuzis da Mãe Carrar”, do Brecht. A atriz principal, a
mãe, era a Iara (que morreu naquele naufrágio do Bateau Mouche). Na
montagem, eles cantavam hinos dos republicanos espanhóis, que aprendi e
lembro até hoje.
79
79
Depoimento dado em 22/04/2007 ao Blog “Cacilda”, dos jornalistas da Folha de S. Paulo On Line: Lenise
Pinheiro e Nelson de Sá. Disponível em http://cacilda.folha.blog.uol.com.br/arch2007-04-22_2007-04-
28.html. Acesso em: 11 nov. 2008.
Imagem
59
:
n
a foto da esquerda, Cinira Rodrigues Leal,
Maria Aparecida Assis e Julia Abrahão. Na foto acima
Inah
Bittencourt, Julia Abrahão, Ruth Magali Miranda e Cinira
Rodrigues Leal. Porto Alegre, janeiro de 1962. Acervo:
Julia Abrahão.
211
Seriam nove dias de Festival, de 13 a 21 de janeiro, com quase 100
espetáculos sendo apresentados naquela capital. E Paschoal Carlos Magno
queria tamm mostrar o Santo Antonio e a Vaca, o filme de que tanto falavam
80
.
5.5 Fechado para reformas
Na longa viagem de ônibus de volta de Porto Alegre para Araraquara, o
assunto de todos era Arsênico e Alfazema, de Joseph Kesselring, um dos
sucessos do TBC e que deveria ser a próxima peça a ser montada pelo grupo,
tendo sido, inclusive, anunciada no programa do Pluft. Uma comédia de humor
negro onde duas velhinhas envenenam velhos solitários no bairro do Brooklyn, em
Nova York, para desespero de seu sobrinho.
No entanto, a realidade seria muito diferente ao chegarem em casa. A
Prefeitura havia decidido, o Teatro Municipal, que mostrava claros sinais de
decadência durante os últimos anos, seria fechado para reformas. O assoalho
começara, inclusive, a ser arrancado e a rede elétrica desligada.
A notícia caiu como uma bomba para todos. Na falta do seu principal
espaço, a companhia perdia seu eixo de referência, sua casa de ensaios e
espetáculos. Wallace sabia que não havia alternativas viáveis na cidade, a
conclusão seria óbvia: encerrar as atividades.
Uma sede permanente é uma das condições básicas necessárias de
sobrevivência de uma companhia de teatro, é o lugar onde realiza todos os seus
ensaios, planeja suas peças, onde pode manter seu guarda roupa e seus
cenários, pode manter pessoas envolvidas no projeto, seu escritório, manter um
diálogo permanente com a comunidade, onde desenvolve a sua linguagem, a sua
poética e faz a sua própria história.
80
Dentre os premiados do Festival, Maria José Campos Lima, diretora pernambucana, Claudio Hermann, ator
gaúcho, e Maria José, atriz de Mossoró (RN), intérprete de Eles não usam Black-Tie, prêmio de melhor
espetáculo. Fonte: revista Dionysos. Setembro de 1978.
212
O Teatro Oficina, em São Paulo, criado por outro araraquarense, José
Celso Martinez Corrêa, lutou e ainda luta para manter a sua sede à Rua Jaceguai,
520, no bairro do Bexiga, contando com o apoio da grande imprensa e apelando
até ao Presidente da República contra especuladores imobiliários.
As reformas, explicavam os cnicos araraquarenses, não durariam muito,
apenas alguns meses seriam suficientes. Mas o tempo passava, o ano de 1962
chegava ao fim e todos ficavam em compasso de espera; uma única opinião se
ouvia por parte dos cnicos da Prefeitura: a reforma era muito cara. Wallace
tentava argumentar com o Prefeito Benedito de Oliveira, mas sem sucesso. Pouco
a pouco se instalava na cidade um morno debate com poucos adeptos da
demolição e a maioria dos envolvidos, propondo a reforma” (TELLAROLI, 2003,
p. 206).
Poucos queriam a demolição, a maioria queria a reforma, a preservação,
mas o debate era morno”, não envolvia mobilização popular ou mesmo, a
exemplo do Teatro Oficina, apelos a autoridades superiores. Eram outros tempos,
tempos de desenvolvimento, tempos onde a sociedade ainda não tinha adquirido
um espírito de conservação da natureza e de seu patrimônio histórico e cultural,
como se neste século XXI. Eram tempos de se construir o novo, de se abrir
estradas, de ousar, onde uma cidade tinha que parecer moderna, tinha que
apresentar novos edifícios, novas construções para atestar o seu progresso. A
qualquer custo, até ao custo de se derrubar o velho. Mesmo que a sociedade
quisesse a preservação do Municipal, esta opinião jamais foi expressa de forma
contundente, que que se considerar que, na década de 1960, mesmo que
existisse essa vontade, existia, em contraponto, a fascinação pelo novo, pelo
moderno, pelo arrojado.
O historiador araraquarense Rodolpho Telarolli complementa:
Diga-se que o debate envolvia uma parcela pequena da população, uma
elite econômica e cultural apreciadora dos espetáculos, um grupo de
intelectuais ou nem isso, de pessoas de algum preparo intelectual e outro da
classe média, ligada às atividades artísticas (TELLAROLI, 2003, p. 206).
213
E o moderno foi, enfim, proposto: no local do Teatro teria lugar a construção
de um arrojado Edifício das Artes, com apartamentos e escritórios e, pasmem, um
teatro em seu subsolo.
O novo Prefeito, o industrial Rômulo Lupo, descendente do relojoeiro
Theodoro Lupo, que chegara a Araraquara em 1885, assumiria o cargo, em sua
segunda gestão, em 1964, mas ainda nenhuma decisão era anunciada. O jornal O
Imparcial, em editorial de sua edição especial de 22 de agosto de 1964, cobrava
uma solução:
Com a promessa de ser recuperado e essa recuperação adiada sine-die, lá
es o nosso Teatro Municipal encenado em casa de horrores, com seu
assoalho arrancado e seu palco transformado em monturo, tal se, por último,
tivesse sido palco para as apresentações dos cavaleiros do Apocalipse.
Wallace e toda a sua família sempre tiveram ligações estreitas com a
família Lupo, desde quando chegaram à cidade na década de 30, principalmente
durante as filmagens do Santo Antonio e a Vaca e ainda acreditava, ainda em 22
de agosto de 1964:
- Não vejo vantagens em derrubar essas paredes respeitáveis para se fazer
no lugar um barracão vulgar que pode contentar aos espíritos medíocres,
mas não resistirá ao julgamento da posteridade. Penso que o Prefeito
Rômulo Lupo deve, com urgência, mandar reparar as goteiras que lavam o
interior do teatro, reparar o seu assoalho, que foi arrancado não sabemos
por que nem para que, e restabelecer a ligação elétrica. Isso até que seja
possível iniciar efetivamente a reforma. Não faz mal que esteja tudo feio,
funcionando o espírito, a parte material que espere.
Mas sem sucesso, os interesses financeiros enfim prevaleceram. O prédio
foi enfim demolido, em 1966, para a construção do moderno Edifício das Artes. No
entanto, a empresa responsável pela construção do edifício logo foi à falência,
fazendo com que a Prefeitura tivesse que arcar com os prejuízos e devolver aos
condôminos as importâncias já recebidas. A solução acabou sendo a própria
Prefeitura Municipal, anos mais tarde, ocupar o edifício, fazendo dele a sua sede,
o Paço Municipal, que ocupa o local até os dias de hoje, sem o teatro no subsolo.
214
A demolição do Teatro Municipal de Araraquara foi uma decio desastrosa
sob todos os aspectos, até do ponto de vista financeiro, para o município. A
reforma do Teatro teria custado bem menos aos cofres blicos e a cidade teria o
seu patrimônio artístico e cultural preservado. A morosidade na tomada das
decies, a primeira pela demolição e a segunda, pelo rmino das obras
inacabadas, fazendo do novo edifício a sede da Prefeitura, foram desastrosas,
deixando a cidade conviver com dois prédios abandonados, no mesmo local,
durante quase uma década.
Hoje o edifício, dentro de uma perspectiva arquitetônica e histórica das
construções da década de 1960, é considerado um edifício feio e sem maiores
atrativos, não pela população, como também por arquitetos e, além de tudo,
não se harmoniza com as preservadas e bem cuidadas fachadas do Clube
Araraquarense e do Hotel Municipal, ao lado, o que acaba trazendo um
descompasso arquitetônico para um dos pontos mais nobres da cidade.
Que o tão lamentado e sentido “sacrifíciodo velho Teatro (sentimentos que
vigoram mesmo nas gerações que não haviam ainda nascido em 1966),
sirva de perene mbolo, lembrança e alerta à consciência coletiva
araraquarense, tão pouco atenta aos cuidados e proteção que merece o
pouco que resta do patrimônio urbano da cidade, que se foi sob uma quase
geral indiferença, indo por terra, em nome de uma falsa concepção
modernizadora, quando não para atender mesquinhos interesses do
mercenarismo imobiliário. Na maior parte das vezes, sem nenhum grito de
repulsa (TELLAROLI, 2003, p. 207).
Quanto ao TECA propriamente dito, ninguém tomou ou anunciou qualquer
decio oficial de se encerrar a companhia. As coisas foram parando”
81
e
morrendo lentamente, o havia espaço para os encontros, não havia local para
se ensaiar ou para se apresentar e o se anunciava nenhuma temporada.
Enquanto ainda insistia com as autoridades locais, Wallace tinha outros afazeres
agora na Faculdade, sem falar em suas traduções e seu envolvimento sempre
intenso com a doutrina espírita, o que o mantinha, de certa forma, ocupado. Os
81
Entrevista com Maria Aparecida Assis.
215
atores e atrizes tinham seus estudos e seus trabalhos e ficavam esperando uma
decio. A impressão que o grupo tinha era de impotência frente a tantos
problemas maiores, que fugiam de seu cotidiano de ensaios e apresentações.
Nem mesmo a Faculdade de Filosofia, parceira, ou a própria imprensa da
cidade, eterna aliada do grupo, questionavam de público a ausência dos
espetáculos da companhia, preocupados muito mais com o destino de seu maior
teatro. Como se o TECA fosse uma conseqüência natural do pprio Teatro
Municipal, como se, salvando-se o Teatro, o TECA também continuaria existindo,
estaria salvo, como se fosse parte integrante do mesmo, sua alma. Ou seu
espírito, como diria Wallace. O que acabou se revelando uma verdade, pois o
TECA deixou de existir, encerrou suas atividades, exatamente em virtude do
fechamento do Teatro.
Por ironia, Araraquara voltaria a ter o seu Teatro Municipal no ano de
1977, com arquitetura moderna e em outro local da cidade, no bairro da Fonte
Luminosa, construído pelo então Prefeito Clodoaldo Medina, sobrinho do próprio
Wallace, filho de sua irmã, Ninira.
216
Imagem
60
: À Margem da Vida foi a última p
a apresentada pelo TECA em janeiro de 1962, em Porto
Alegre. Aloísio Figueira, Maria Aparecida Assis, Julia Abrahão e Milton de João. Teatro Municipal de
Araraquara, setembro de 1961. Foto: Geraldo Cesarino. Acervo: MIS Araraquara.
217
6. BASTIDORES
Um texto escrito para teatro, ou adaptado para o palco, não pode ser
considerado uma obra totalmente acabada. Apesar de seus méritos literios, é no
palco que o texto transcende e assume o seu maior significado. Sara Pereira
Lopes comenta, na introdução de seu estudo, que:
A concretização da obra, no teatro, só é possível na apresentação pública da
encenação. A dramaturgia, então, não é produto final e sua existência
apenas se justifica na publicação do espetáculo, uma vez que o teatro não
se faz na literatura. Assim, o texto dramático, formal ou não, também não é
obra acabada. Mesmo compreendendo outros significados na arte teatral,
um texto é para ser dito (PEREIRA LOPES, 1997, Introdução).
A figura do diretornico assume, portanto, uma importância vital em todo o
processo criativo. É ele quem vai ter a responsabilidade de dar vida ao texto, de
traduzi-lo, o apenas a seus atores e atrizes, buscando encontrar, no melhor
formato da apresentação, todas as intenções do autor, mas traduzi-lo de uma
forma que o público o receba bem, que o entenda e que se deixe envolver por ele.
então o espetáculo estará completo e o texto ganhará o seu real e maior
significado.
Conhecer, portanto, a matéria prima com que se trabalha, as idiossincrasias
de cada um dos artistas de sua equipe e de seu elenco, suas deficiências, suas
limitações e seus pontos fortes, assim como as expectativas do público específico
que estará assistindo ao espetáculo, requer sensibilidade, sabedoria e uma
enorme dose de dedicação e entusiasmo. Em uma companhia formada por jovens
amadores, como o TECA, no interior do Estado, longe das principais capitais do
país, com rias limitações financeiras e precariedades técnicas e estruturais de
toda ordem, essa tarefa era ainda mais árdua, requerendo talento, sem vida,
mas, acima de tudo, um grande espírito de liderança
82
.
82
Este capítulo foi construído basicamente à luz das entrevistas dos ex-atores e atrizes da companhia.
218
6.1 A escolha do repertório
Entre os entrevistados, é unânime a afirmação de que a escolha dos textos,
ou a idéia para o repertório a ser apresentado, era exclusividade do diretor da
companhia. Wallace aparecia com um texto, nos explicava do que se tratava e
nós começávamos a ler. Ninguém reclamava, todos adoravam
83
.
É verdade que para essas sugestões, Wallace com certeza se valia de suas
leituras, trocava idéias com alguns amigos mais próximos, com o próprio Araken e
se valia de viagens que fazia a São Paulo, onde acompanhava as atividades do
TBC e do Teatro de Arena.
O que o deixa de ser intrigante, no
entanto, é a capacidade de Wallace para esta
tarefa. Considerado um líder, um intelectual de
peso por toda a companhia, a realidade é que
aquele jovem com um ar de adolescente na
cara e nos gestos”, como o descrevia
Paschoal Carlos Magno, em seu artigo no
jornal Correio da Manhã, em 1957, era, antes
de qualquer coisa, um autodidata. Sem uma
formação universitária específica, apesar de
ter cursado Administrão de Empresas e,
mais tarde, ter trabalhado na própria
Faculdade de Filosofia de Araraquara, era de
suas leituras que Wallace tirava o seu
conhecimento e impressionava ao próprio
Paschoal: “Tem uma biblioteca teatral no
crânio. Conhece tudo quanto se tem escrito ou
83
Entrevista com Maria Aparecida Assis e Julia Abrahão.
Imagem
61
: Noemio Lerner e Maria
Aparecida Assis em Como ele Mentiu ao
Marido Dela
. Teatro Municipal de
Araraquara, junho de 1955. Foto: Lucilio
Leite. Acervo: Maria Aparecida Assis.
219
feito em teatro, desde o começo do mundo”.
Os livros lhe deram cultura geral e as informações importantes para que,
naquele momento e naquelas circunstâncias, assumisse, de forma anatural, a
liderança de um grupo de jovens intelectuais da cidade, mas não lhe deram um
embasamento sólido e uma seguraa intelectual e emocional que lhe trouxessem
uma relação tranqüila com a vida, em sua velhice. Disso Wallace tinha plena
consciência e era um dos principais motivos de sua insegurança mais íntima. Sua
liderança era aceita por todo o grupo e exercida, acima de tudo, com a sabedoria
espiritual que adquirira. Ignácio de Loyola Brandão expressa a mesma impressão
em artigo publicado no jornal O Imparcial, em 14 de setembro de 1988:
Talento, fina sensibilidade e conhecimento das pessoas davam a Wallace
liderança e autoridade. Lia bastante e abrangia muitos assuntos. Mesmo
quando não sabia, ou o dominava a matéria, mostrava tal segurança que
convencia. Discutia coisas variadas, de história ou filosofia, teatro, cinema,
religião, moda, maquilagem. A vida inteira tive certeza que ele era formado
em universidade. pouco é que fiquei sabendo que era autodidata. Vivia
mergulhado em livros, revistas, enciclopédias. Soube também que alguns de
seus livros sobre filosofia ou história não passavam de condensações
baratas, superficiais, vulgarizações da matéria. O que importa? Quase
quarenta anos atrás numa cidade carente de informações, deficiente em
todos aspectos (biblioteca escassa, livrarias que eram mais papelarias,
pouquíssima imprensa das capitais aparecendo nas bancas; aliás me
lembro da banca de jornais e revistas do Nelson Rossi, no Cine Paratodos),
sem faculdades de Humanas, o pouco que viesse era muito. Interessa o que
Wallace deu, transmitiu, superando as próprias deficiências. E ele me
passou coisas importantes, como a necessidade constante de leitura para
poder aprender também a escrever. Indicou-me livros, ensaios e romances,
me ajudou a ver (eu era crítico de cinema) nos filmes elementos além da
técnica, fotografia e montagem. Acima de tudo, o que conta foi o legado de
Wallace à cidade de Araraquara: o erguimento do TECA, uma equipe de
arena que se projetou no cenário nacional, e a batalha para fazer cinema.
Wallace, assim como toda a sua família, seguiu seriamente o espiritismo
84
e
isto sempre foi sua principal motivação na vida, tendo deixado, além dos trabalhos
com o TECA, uma obra importante em traduções e organização da difusão da
84
Espiritismo: religião ou doutrina de cunho filosófico-religioso, de aperfeiçoamento moral do homem
através de ensinamentos transmitidos por espíritos mais aprimorados de pessoas mortas, que se comunicam
com os vivos especialmente através dos médiuns. Dicionário Houaiss de Língua Portuguesa. Dispovel em:
http://www.dicionariohouaiss.com.br. Acesso em: 12 out. 2008.
220
literatura espírita em todo o Brasil. Amigo fraterno de Chico Xavier, a quem
sempre visitava e a quem recebia quando de suas vindas a Araraquara, Wallace
tinha, graças à sua espiritualidade (“era um espírito de luz
85
”), uma enorme
aceitação social na cidade e uma liderança natural sobre o grupo, sendo lembrado
até hoje com respeito e carinho.
6.2 Dois mundos amigos
A escolha do repertório da companhia acabava, portanto, sendo fruto de
suas paixões pessoais, de sua vida mergulhada em livros. Além de livros espíritas,
gostava muito da literatura inglesa, de autores onde podia sentir o que ele
explicava como uma motivação
espírita por trás da trama, mesmo de
autores que não tinham a então
sido definidos como autores da
doutrina propriamente dita.
A atmosfera da vida das irmãs
Brontë, Emily e Charlotte e de seu
irmão Branwell, nas charnecas de
Yorkshire; o clima denso descrito em
O Morro dos Ventos Uivantes
(Wuthering Heights), por exemplo, o
fascinava. A vida trágica da família,
as mortes precoces, o sofrimento, a
não aceitação de seus talentos em
uma pequena comunidade rígida e
retrógrada, o reconhecimento público
vindo somente após a morte, como
85
Entrevista com Ruth Magali Miranda.
Imagem
62
: Fanny Carati
vestida como um espírito,
em
Uma Mulher do Outro Mundo. Teatro Municipal de
Araraquara, novembro de 1955. Foto: Lucilio Leite.
Acervo: Fanny Carati.
221
se a morte fosse um elemento de redenção, de sublimação.
Daphne du Maurier era outra de suas autoras “espíritas” preferidas, desde
sua primeira novela, The Loving Spirit, escrita em 1929, na casa de sua família em
Cornwall - outra paisagem inglesa que fascinava Wallace - o espírito da jovem
Janet Coombe voltava para várias gerações de sua família. Em sua autobiografia,
The Rebecca Notebooks, Daphne du Maurier explica essa sua convicção, dizendo
acreditar na habilidade de membros de uma mesma família poderem se comunicar
com outros membros da mesma família através das gerões, ou se
reencarnarem, como Wallace preferia dizer.
Alguns traços comuns unem as vidas das irmãs Brontë e de Daphne du
Maurier e se viram espelhadas na vida do próprio Wallace. Foram jovens de
talento, que se sentiam diferentes da comunidade onde viviam, que sofreram com
a necessidade de se adaptar ao estilo de vida estabelecido, que tinham outras
motivações, desejos de seguir suas próprias intuições, de perseguir sonhos de
liberdade, de serem independentes para escrever, para viverem suas próprias
vidas.
Defendia que Charles Dickens era, tamm, um autor espírita e
exemplificava sua opinião citando que o seu conto Um Conto de Natal (A
Christmas Carol), que chegara a traduzir, a história do velho sovina Ebenezer
Scrooge sendo atormentado por fantasmas na noite de Natale obrigado a rever
sua vida, tinha claras conotações espíritas. Mesmo William Shakespeare, cuja
religiosidade é ainda hoje disputada por protestantes e católicos, não escapava à
definição irrefutável de spiritualist, pela presença explícita do fantasma, ou
espírito, do pai do jovem e atormentado Hamlet, sem falar em bruxas e outras
constantes aparições shakespearianas.
222
Curiosamente, Wallace não montou textos de nenhum dos escritores
mencionados
86
, mas peças como O Caso das Petúnias Esmagadas, Uma Mulher
do Outro Mundo, A Mão do Macaco, Ressonâncias e, por que não, o próprio Pluft,
o Fantasminha, m a temática do mundo espiritual interferindo no mundo real. O
filme Santo Antonio e a Vaca é outro exemplo desta motivação, apesar de sua
temática rural e bastante diferente das outras montagens do TECA, a interferência
da espiritualidade se dá na presença de Santo Antonio.
Tennessee Williams chamou sua peça O Caso das Petúnias Esmagadas de
comédia e de fantasia lírica. Dorothy Simple, proprietária de uma pequena loja na
Nova Inglaterra, a Simple Notion Shop, suas queridas e bem cuidadas petúnias
amanhecerem esmagadas, pisoteadas à frente da loja. Chama um policial,
sentindo-se violentada com aquela agressão e exigindo que as marcas deixadas
pelo do agressor sejam investigadas. É quando aparece um jovem misterioso
que confessa o crime. É ele quem vai ser o elemento libertador da Srta. Simple,
mostrando que aquele seu mundo simples, de cultivar petúnias, era muito
pequeno, muito medroso. Mesmo quando o jovem desaparece, outra vez
misteriosamente, Dorothy sente-se libertada e disposta a sair daquela cidade para
sempre.
A história de Uma Mulher do Outro Mundo é bastante divertida, a mulher do
outro mundo do título é o fantasma, ou o espírito, da primeira esposa do Sr.
Condomine, que volta ao mundo dos vivos para atrapalhar sua vida com a nova
esposa. No texto original de Coward, a figura da médium
87
, Madame Arcati, é
bastante ridicularizada, uma excêntrica senhora inglesa que anda de bicicleta,
portadora de poderes mediúnicos, mas sempre se metendo em confusões. Na
montagem do TECA, Wallace o iria ridicularizar desta forma a médium, acabou
86
Anna Maria Martinez Corrêa relata que Wallace tinha muito respeito por Shakespeare e receio de montar
qualquer obra sua, declinando seu convite de participar de uma montagem de A Megera Domada em
Araraquara, em 1965. Entrevista com Anna Maria Martinez Corrêa.
87
Médium: segundo o espiritismo, pessoa capaz de se comunicar com os espíritos, pessoa detentora de dons
que supostamente lhe permitem conhecer coisas, dados, ocorrências etc. por meios sobrenaturais. Dicionário
Houaiss de Língua Portuguesa. Disponível em http://www.dicionariohouaiss.com.br. Acesso em: 3 out. 2008.
223
dando o papel a um Sr. Arcati, vivido por Mario Barra, um charlatão sem qualquer
poder mediúnico, ficando para a criadinha, Edith, vivida por Ediméa Zuchini, a
mediunidade exigida. Para deleite da platéia, Ediméia atrapalhava-se com a
mediunidade que, aentão, não sabia possuir, mas não expunha seus poderes
com a conotação negativa que lhe dera Coward. Liberdades como esta eram
tomadas em outras ocasiões.
Os fantasmas, ou espíritos, das esposas do Sr. Condomine, diga-se de
passagem, não eram tampouco nada assustadores. Ao invés do branco, Wallace
optou por um verde claro para os figurinos, que viria a usar também na montagem
de Pluft, anos depois.
A Mão do Macaco, ou
em uma tradução literal mais
precisa, a garra (pawn) do
macaco, é hoje um dos textos
obrigatórios em qualquer
antologia das melhores
histórias sobrenaturais, um
clássico do conto de terror do
inglês William Wymark
Jacobs.
A mão do macaco é
um amuleto africano com
poderes malignos que acaba
sendo usado de forma
equivocada pela Sra. White,
com resultados terríveis para
seu filho. Arrasada com a
morte do filho, ocorrida em
decorncia de um pedido
Imagem
63
:
Mario Barra e Maria Aparecida Assis em
Uma Mulher
do Outro Mundo. Teatro Municipal de Araraquara, novembro de
1955. Foto: Lucilio Le
ite. Acervo: Maria Aparecida Assis.
224
seu, ela o evoca de volta do mundo dos mortos. O final da peça “era assustador”
88
,
quando fortes pancadas na porta anunciavam o espírito do filho voltando.
Ressonâncias é um verdadeiro duelo verbal entre duas amigas e seus
“espíritos”. A peça de Alice Gerstenberg, Overtones, coloca o inconsciente
freudiano no palco, onde Margaret e Harriet se encontram e têm um diálogo gentil,
formal, social e refinado, enquanto as terríveis e primitivas Maggie e Hetty, dizem
o que estão pensando uma da outra. São, na verdade, as mesmas mulheres, seus
egos se conversam formalmente, enquanto seus ids “depósito dos impulsos
instintivos, sexuais e agressivos”, se digladiam. Segundo Freud, o ego representa
o que pode ser chamado de razão e senso comum, em contrate com o id, que
contém as paixões” (KAHN, 2003, p. 48).
88
Entrevista com Lygia Fabiano.
Imagem
64
:
Ruth Magali Miranda, Neuza Varella, Lygia Fabiano e Alice de Oliveira em
Ressonâncias
Teatro Municipal de Araraquara, setembro de 1957. Acervo: Lygia Fabiano.
225
Durante o seqüestro de Maribel, o assustado Pluft pergunta: “Mamãe, gente
existe?” e arremata: “Mamãe eu tenho tanto medo de gente!” É a mesma pergunta
que as pessoas se fazem, que gente pequena, ou grande se faz: “Fantasma
existe?”, ou “Espírito existe?” Resposta que Wallace tinha pronta sobre esses
seus dois mundos amigos:
Para um fantasma (nunca nos ocorrerá) o acontecimento mais extraordirio
é o encontro com o homem, e por isso o pequeno fantasma vive no terror do
homem e na curiosidade de saber algo a seu respeito. mesmo nele,
como na mãe, uma vaga nostalgia do mundo dos homens, que exerce sobre
as impalpáveis figuras o fascínio irreprimível do medo. Mas pela graça,
bondade e instintiva generosidade infantil, os dois mundos o dos
fantasmas e o dos homens! que um secular terror mútuo aflige e domina,
encontram-se, fundem-se, tornando-se amigos.
89
Por fim, em Santo Antonio e a Vaca, “um assunto brasileiríssimo”, os dois
mundos outra vez aparecem. A figura do Santo Antonio é o elemento
desencadeador da ação. Mesmo estando no mundo espiritual, ele desce à terra e
acaba por tirar da família seu único sustento, o leite ordenhado da vaca Mimosa.
Com isto, a família terá que buscar outras alternativas. Existem no filme cenas no
“céu caboclo”, onde o destino das pessoas é discutido por dois santos, Antonio e
Pedro, e tamm pelo profeta israelita Moisés.
89
Texto original de Wallace Leal V. Rodrigues no programa de Pluft, o Fantasminha, outubro de 1961.
Imagem
65
: o céu caboclo
de Santo Antonio e a Vaca,
com Oscar Rodrigues e
Antonino Rodrigues Leal.
Araraquara, 1958. Acervo:
Américo Aguiar Borges.
226
A escolha de O Homem da Flor na Boca (L'uomo dal fiore in bocca) peça
em um ato de Luigi Pirandello para a primeira produção da companhia, em 1955, é
sintomático, pois trata desses dois mundos a que Wallace se refere e da
passagem de um para outro.
A peça é um diálogo e se passa à noite, em um café de uma estação de
trem. Um homem perdeu seu trem e conversa com outro homem, que está
morrendo de uma doença chamada epithelioma (a flor na boca). É o diálogo
entre alguém que leva a vida sem se preocupar gastando seu tempo, se dando ao
luxo de perder seu trem sem maiores problemas e outro que está com poucas
horas de vida e quer vivê-las intensamente, antes de partir para outro mundo. É a
dialética entre a vida e a morte, diálogo este que logo se transforma em um
monólogo sobre a morte, sobre alguém que está prestes a entrar em outro mundo,
mas sem medo, com alegria, vendo tamm com alegria o mundo que está
prestes a deixar, entendendo toda a beleza das pequenas coisas do cotidiano que
deixará de viver. Vê com lucidez a vida que o está levando à morte, sem sensação
de arrependimento, quase que, ainda que de forma amarga, tendo prazer neste
fim próximo, tendo prazer em sentar-se em um café e observar a vida das outras
pessoas, tentando entender o seu sentido
90
.
6.3 Dramas psicológicos
O repertório do TECA se completa quando, dentro de suas características
mais gerais, incluímos os dramas psicológicos como um de seus conceitos
norteadores.
Neste terreno dramático, em seus variados gêneros e subgêneros,
encontra-se a maioria das peças montadas pelo TECA: a fantasia lírica, a fantasia
romântica, a fantasia dramática, a comédia de costumes, a comédia de época, a
90
Este foi o maior papel da vida de Mario Barra, segundo ele próprio confessou a Ignácio de Loyola Brandão
em artigo intitulado “Continuemos a aplaudir o Barra” Vide Anexo II. Artigos Especiais.
227
comédia negra, a infantil, o drama, o drama satírico, o drama urbano, o rural, o
entremez espanhol, a sátira e até o terror.
O drama urbano, de classe média, feito de pequenas mentiras e de meias
verdades era, dentre todos os gêneros, a maior paixão de Wallace.
A literatura de língua inglesa (inglesa, irlandesa e norte-americana) tem,
entre seus escritores, verdadeiros mestres na construção de obras onde a
fragilidade humana, a inadequação social, os conflitos familiares, a brutalidade do
mundo exterior são temas recorrentes. Bernard Shaw, Somerset Maugham,
Tennessee Wiliams, Noël Coward, são exemplos desta literatura. Seus diálogos
ágeis, cheios de humor, inteligentes, estão presentes na dramaturgia do TECA e
imprimem a ela uma de suas principais características.
Como ele Mentiu ao Marido Dela (How He Lied to Her Husband) é uma
comédia escrita pelo irlandês George Bernard Shaw, cheia de wit, o consagrado
humor britânico, com frases espirituosas, finura, perspicácia, agudeza e
sagacidade. Lady Aurora tem um amante, Henry, um jovem de 18 anos, poeta
romântico e caloroso. Teddy, o marido, descobre versos comprometedores dele à
mulher e Henry tem que mentir ao marido dela, negando a relação: “Acontece que
eu não admiro sua mulher neste sentido”. Situação à qual, para perplexidade do
jovem, o marido fica chocado: “O quê? Pois eu lhe digo que ela já foi admirada por
homens melhores que o senhor”. E, partindo para cima do jovem, arremata:
“Minha mulher não é boa o suficiente para o senhor?”
228
A comédia de costumes traz sempre uma tira social, quando os
comportamentos e os costumes de uma época o mostrados à luz de
personagens muitas vezes coniventes com certo grau de amoralidade. Vida
amorosa, situação econômica, desejo de ascensão social, são algumas das
preocupações dos personagens retratados dentro de uma atmosfera sempre
cômica e espirituosa, mostrando o cinismo e a superficialidade das relações.
O mesmo autor de Uma Mulher do Outro Mundo, Noël Coward, foi um dos
mais prolíficos homens de teatro do século XX e nos deixou outro texto, onde a
superficialidade da sociedade inglesa é retratada em seu mais alto grau: Amigos
de Viagem, um dos maiores sucessos do TECA. Aqui vê-se outra das liberdades
que Wallace tomava em relação a alguns textos. Todos os entrevistados o
Imagem
66
: "Minha mulher não é boa o suficiente para o s
enhor?", brada Eugenio Geraldo Casale a Noemio
Lerner, sob as vistas de Maria Aparecida Assis em Como ele Mentiu ao Marido Dela. Teatro Municipal de
Araraquara, junho de 1955. Foto: Lucilio Leite. Acervo: Maria Aparecida Assis.
229
unânimes em afirmar, inclusive o jornal O Imparcial da época, que Amigos de
Viagem era uma tradução da peça International Relations e que Wallace havia
optado por trocar o nome para evitar pagar direitos autorais muito caros.
Não existe um texto de Coward chamado International Relations em
nenhuma das relações de suas obras completas. No entanto, os personagens
Lady Maureen Gilpin (Piggie) e Commander Peter Gilpin, assim como o Lieutenant
Commander Alastair Corbett (Marina Gilpin (Nina), Peter Gilpin e Alipio Corbert na
versão do TECA) são encontrados no texto Hands Across the Sea, uma das peças
em um ato do projeto Tonight at 8:30, uma série de nove peças em um ato para
serem apresentadas em várias combinações de três peças por noite. Tonight at
8:30 estreou no Manchester Opera House, em outubro de 1935 e no ano seguinte
em Londres, no Phoenix Theatre, sendo até hoje montada com regularidade. O
próprio Coward fez o papel de Peter Gilpin nas estréias.
É a mesma história de Amigos de Viagem, sendo que os demais
personagens tiveram seus nomes convenientemente mudados. A ação se passa
na sala de estar do apartamento do casal Gilpin, em Londres, onde esperam a
visita de ingleses que conheceram em viagem que fizeram pelo mundo. O casal
Wadhurst, no original (Wilson, na versão de Wallace), é recebido e confundido
com os Rawlingson, em meio a coquetéis e a várias conversas paralelas e sem
sentido, ao telefone, que acabam mostrando que, na realidade, os Gilpin o
sabem exatamente quem o aqueles hóspedes, nem de onde conhecem seus
amigos de viagem. Situação confusa, mas sempre tratada com muita polidez: How
lovely to see you again.
230
Ainda um detalhe diferente desta produção, uma das mais bem sucedidas
da história do TECA, era a ambientação da peça nos anos 1920, onde uma
animada Julia Abrahão, como a faladora Nina Gilpin, teve, inclusive, que usar
“vestido no joelhoe Maria Cristina Moura, então com 15 anos, aprendeu a dançar
o “charleston”
91
.
Um Drama na Malásia, de Somerset Maugham, traz esta mesma carga de
superficialidade e cinismo. O conto se passa outra vez em Londres onde, antes de
saírem para uma festa, Millicent confessa aos pais, o casal Skinner e à sua irmã,
Kathleen, ter matado seu marido bêbado quando ambos viviam muitos anos na
Malásia. Todos acreditavam, até então, que Harold havia se suicidado. A
confissão é tomada com surpresa, com indignação até, mas o o suficiente para
que pensem em qualquer punição ou que seja levada à polícia pela família.
Enquanto saem juntos para a festa, o pai resume o sentimento de todos, com
91
Charleston: dança originária da cidade norte-americana de Charleston, Carolina do Sul, variante de foxtrote
sincopado, muito em voga na década de 1920, cujo passo característico consiste em balançar os joelhos para
dentro e para fora e afastar as pernas, com um giro rápido e brusco dos calcanhares. Dicionário Houaiss de
Língua Portuguesa. Disponível em http://www.dicionariohouaiss.com.br. Acesso em: 9 out. 2008.
Imagem
67
: jornal
O
Imparcial
de 28 de julho de
1957. Julia Abrahão em cena
de Amigos de Viagem. Foto:
Viviane Cristina Pinto.
231
certa rispidez: “Você nunca deveria ter me contado. Acho que você foi
extremamente egoísta”.
Se incluirmos neste grupo de autores o brasileiro Machado de Assis e o
russo Anton Chekhov, tem-se um painel bastante amplo desta motivação: a escrita
inteligente, o diálogo ágil, a surpresa, a perspicácia, a elegância.
Machado de Assis, bebendo da fonte dos mestres da comédia de
costumes, Martins Pena e do popular Artur Azevedo, nos deixou textos cheios
deste humor; dentre eles, O Protocolo se destaca. Montado pela primeira vez no
Teatro Ateneu Dramático, em novembro de 1862, a ação se passa no Rio de
Janeiro, onde Elisa está recém casada com Pinheiro e passa por uma pequena
crise, enquanto recebe a corte do amigo do casal, o insinuante Venâncio Alves:
“Quer me parecer que nuvens no céu conjugal?” Lulu é a prima que vai ser o
anjo da reconciliação” e alertar o primo incrédulo que “é mal desamparar a ovelha
havendo tantos lobos”. E arremata: ”Vejo no Venâncio Alves um arzinho de
pretendente”.
Por fim, um álbum com uma dedicatória a Elisa chega às mãos de Pinheiro:
“Se me privas dos teus aromas, ó rosa que foste abrir sobre um rochedo, não
podes fazer com que eu te não ame, contemple e abençoe”. Convencido das más
intenções do amigo e reatado com a mulher, graças a Lulu, Pinheiro questiona
Venâncio, sobre “este protocolo”, mostrando-lhe o álbum. resta a Venâncio,
constrangido, a porta da rua e o casal, acompanhado de Lulu, comemora “o
tratado de paz” em um jantar.
Anton Chekhov, um dos maiores e mais sérios escritores russos, teve três
de seus textos montados pela companhia: Um Pedido de Casamento, Sobre os
Danos que traz o Tabaco e O Urso, todos comédias em um ato. Textos elegantes
e cheios de malícia, onde a sociedade russa é satirizada, principalmente a
instituição do casamento.
232
Um Pedido de Casamento (A Marriage Proposal ou The Proposal) mostra
um pedido de casamento onde a intenção é preservar a riqueza familiar através de
um casamento arranjado, costume muito comum em classes mais abastadas na
Rússia, inclusive. O casal acaba esquecendo de qualquer sentimento, vive
discutindo sobre pequenas coisas do cotidiano e o pedido mesmo acaba
demorando muito a sair.
Sobre os Danos que traz o Tabaco (On the harmfullness of tobacco) é o
monólogo de Ivan Ivanovich Nyukhin, ou Ivan Ivanowitch Husmeadorov, na versão
do TECA, que se obrigado, por sua dominadora mulher, a fazer uma
conferência sobre os males do fumo, apesar de ser ele mesmo um inveterado
fumante. Medroso, ele acaba sempre adiando o assunto e aproveitando para falar
de sua mulher e de seus planos de deixá-la após tantos anos de casamento. Ao
final, ele nada falou dos males do fumo, mas pede à audiência que o o traia e
não conte o que ele falou à mulher.
Ainda outro casamento está no enredo de O Urso (The Boor), onde uma
jovem e bonita viúva, Elena Popovna, chora a recente morte do marido fazendeiro
e promete nunca mais se interessar por qualquer homem. Grigori Stiepanovitch
Smirnov, outro fazendeiro, grosseiro e grandalhão como um urso, chega para
cobrar uma velha vida do marido para com ele e se interessa pela viúva. Sendo
repelido até com um revólver, ele fica cada vez mais interessado: Que mulher!
Doze mulheres repeli, nove me repeliram, mas a nenhuma delas amei como a
amo. Estou conquistado, perdido.” Ao final, este amor acaba sendo recompensado
com um longo beijo.
Cabe, enfim, lembrar que, em sua grande maioria, as peças montadas pela
companhia tinham poucos personagens, a maioria tinha dois, três ou, no máximo,
quatro personagens. Apenas um monólogo foi montado: Sobre os Danos que traz
o Tabaco. As exceções ficam por conta de Os Dois Faladores que, apesar do
título, tinha um total de doze personagens, de De Ratos e Homens e Pluft, o
Fantasminha, ambos com dez, e, tamm, do filme Santo Antonio e a Vaca.
233
Com um elenco formado por amadores, por jovens estudantes nem sempre
disponíveis e sempre em mero bastante reduzido e ainda com certa
rotatividade, a escolha de peças com poucos personagens nos parece uma
solução bastante inteligente. Vale ressaltar que, em geral, a maioria dos textos
curtos tem mesmo um mero limitado de personagens, muito em virtude da
maior efetividade da ação dramática desejada pelo autor. Mesmo em textos
montados com grande número de personagens, como, por exemplo, em Os Dois
Faladores, a ão fica restrita, na maior parte do tempo, apenas aos dois
personagens faladores principais, Roldan e Beatriz, funcionando os demais como
apoio, como coadjuvantes, com poucas falas.
Com a quase inexistência de cenários, apenas com elementos cênicos, as
peças montadas “em arena” tinham, nos figurinos, uma grande exposição e
atratividade. Pela proximidade do público, os figurinos tinham que ser perfeitos,
pois cada detalhe era percebido pela exigente platéia, o que significava certo
investimento e um capricho extra nos acabamentos. Uma peça poderia ser
percebida como de excelente qualidade muito em decorrência da elegância dos
seus figurinos e Wallace, que os desenhava e supervisionava a confecção, sabia
disso e sabia que um elenco reduzido significava uma economia importante
tamm neste item.
Ainda que não de forma consciente, esta decisão, por razões óbvias de
economicidade, trazia tamm ao espaço cênico do teatro de arena uma agilidade
especial nas montagens e desmontagens durante os dois curtos intervalos entre
as três peças da noite. Era também reduzido o número de pessoas a se
movimentar, a utilizar os camarins, a trocar roupas, fazer maquiagem, cabelos,
dentro do tempo exíguo de um intervalo de cerca de quinze minutos, apesar de
que o próprio Wallace cuidava de tudo nestas horas. ”era ele quem fazia a
maquiagem, tudo era ele”
92
.
92
Entrevista com Maria Aparecida Assis.
234
Vale ressaltar, por fim, que esta escolha de repertório era percebida pelo
grupo não como uma imposição do diretor e sim como uma sugestão, ainda que
não se tenha notícia de qualquer sugestão que tenha sido rejeitada pelo grupo.
“Tem esta opção”, “eu estava pensando”, “olha essa peça”, eram expressões
usadas de uma forma educada, “com filosofia”, para comunicar sua decisão
93
.
6.4 A técnica
Os espetáculos apresentados pela companhia eram baseados em textos
consagrados e em montagens que buscavam emocionar, envolver o público. A
escolha do repertório refletia o gosto pessoal de Wallace no campo da literatura, o
que imprimia à poética do grupo um realismo e uma opção pelo drama
psicológico, em detrimento a quaisquer propostas mais sociais ou simbólicas. No
entanto, Wallace não havia feito qualquer estudo, acadêmico ou não, qualquer
preparação formal para ser um encenador, um diretor de teatro, um metteur en
scène, uma pessoa capaz de colocar um texto em cena, em ação.
Wallace não tinha a técnica formal necessária para desempenhar o seu
trabalho; tudo o que sabia era fruto de suas leituras e de suas constantes viagens
a São Paulo, onde assistia às montagens do Teatro de Arena e do TBC. E,
tamm, aos filmes que assistia. Essa deficiência formal ou acadêmica, no
entanto, era compensada por muito esforço e, principalmente, pela sua
curiosidade, intuição e talento. E disso ele tinha plena consciência, como em
entrevista em 28 de junho de 1955, ao jornal O Imparcial:
Estréio como diretor dirigindo atores todos estreantes. Previamente
estudando as chances que tínhamos, estabeleci um topo x a ser alcançado.
E agora faço uma confissão, creio que em conjunto ultrapassamos esse
topo. Fruto de muito trabalho, disciplina e amor.
93
Entrevista com Ruth Magali Miranda.
235
Trabalho, disciplina e amor são sempre citados nas entrevistas como a
base de todo o sucesso artístico do TECA, muito mais do que qualquer técnica
mais elaborada utilizada.
A escolha do elenco era critério do diretor, mas contava tamm com
indicações dos amigos, de Araken e dos próprios atores da companhia, além de
encontros casuais, como o ocorrido entre Wallace e Maria Cleide Valentim em
uma rua da cidade, Wallace apelava tamm para parentes. Jayme Maurício Leal,
seu sobrinho, apareceu na primeira montagem da companhia como o oficial do
Caso das Petúnias Esmagadas; outros parentes viriam a se incorporar em outras
montagens e no elenco do filme.
Dentre os primeiros artistas, Maria Aparecida Assis, a Cidinha, trabalhava
como rádio-atriz e desfilava nos concorridos Desfiles Bangu
94
, era amiga de
Wallace e uma jovem bonita e de grande talento. Uma escolha natural. Julia
Abrahão e Ediméa Zuchini também trabalhavam na Rádio Cultura, com Jofre
David. Sebastião Campos e Mario Barra eram desenvoltos o suficiente para que
Wallace tivesse total confiança neles. Lygia Fabiano lembra como foi a sua
entrada na companhia:
Era um grupinho assim de amigos, eu fui por influência do Barra. Eu morava
na Avenida Barroso e o Barra morava na Barroso, esquina com a Rua 2. Em
frente à casa do Barra era a Padaria Perez, da Inah (Bittencourt). Então, eu
tinha amizade com eles. O Barra, uma vez estava indo ensaiar uma peça, ia
começar algum espetáculo e ele falou: “escuta, você não quer ir lá?”. E eu:
“Ah, eu não sei”. “Ah, vamos lá.” Daí ele me levou um dia e o Wallace me
deu uma coisa para eu ler. eu li e ele me disse: “Vamos ver”. No fim eu
acabei entrando.
95
Ainda que pequeno e nada exacerbado, pode-se dizer que a cidade
mostrava algum preconceito em relação aos atores do grupo, principalmente em
relação às atrizes. Preconceito motivado muito mais pela curiosidade com a
94
Promovidos em várias cidades brasileiras pela fábrica Bangu, os desfiles tinham a finalidade de divulgar a
marca e também a qualidade do algodão e da tecelagem brasileira. Wallace chegou a dirigir alguns destes
desfiles.
95
Entrevista com Lygia Fabiano.
236
novidade do que por outros motivos mais intransigentes. As famílias se dividiam.
Alguns pais, como os de Lygia Fabiano, não se importavam de ter a filha fazendo
parte e até acompanhavam sua carreira, inclusive na viagem ao Rio de Janeiro. Já
o pai de Maria Aparecida Assis a proibia, o que fez com que a filha se utilizasse de
todo tipo de subterfúgio para escapar da vigilância, inclusive do pseunimo
Marion em suas atividades como rádio-atriz da dio Cultura. Quando conseguiu
convencer o pai a assisti-la, foi o último espetáculo da companhia: À Margem da
Vida, lembra-se, entristecida
96
.
A companhia não tinha elenco fixo; não havia, tamm, um processo claro
de audições para novos atores. Alguns tipos físicos se adequavam a alguns tipos
de personagens: a ingênua, o galã, a provocadora, o caricato; e esta escalão
era sempre definida pelo diretor.
Constantin Stanislavski e seu método, ou sistema, eram conhecidos de
Walace e de alguns membros do grupo, através de livros; Araken e Barra, com
certeza, o conheciam bem. Ainda que não explicitamente entendido ou explicado
aos atores, o método era utilizado durante os ensaios, a fim de se chegar à
emoção cênica, ao ilusionismo que Wallace pretendia.
Wallace, em 1960, muito provavelmente por influência do amigo polonês
Edward Freund, tamm já conhecia algo do trabalho do também polonês Jerzy
Grotowski, ainda que Grotowski tenha iniciado suas atividades em 1958 e,
portanto, não havia ainda revolucionado o mundo teatral com sua teoria sobre o
teatro pobre e sobre a ênfase no ator como o centro da arte de performance.
O cinema sempre foi sua paixão e a influência desta linguagem na
condução dos espetáculos teatrais era notada por olhos perspicazes, como os de
Paschoal Carlos Magno, em artigo do jornal Correio da Manhã:
96
Entrevista com Maria Aparecida Assis.
237
Percebe-se no todo e nas minúcias a influência cinematográfica da
interpretação mecânica. O espectador menos atento condena certa
mímica, que nada mais é que reminiscência do cinema mudo.
97
Todo o processo de montagem de um espetáculo tinha início com uma
primeira sessão de leituras. Isso poderia acontecer em qualquer das casas das
pessoas do grupo, na casa onde vivia com sua irmã Ninira, à Avenida XV de
Novembro, ou na casa de sua irmã Ceci, na Avenida Sete de Setembro.
Passavam semanas em trabalho “de mesa”, quando então se esgotava o texto.
Wallace datilografava o texto, entregava as cópias e distribuía os papéis
que havia pensado para cada um. Explicava a história, o contexto da peça, de
quando havia sido escrita, falava sobre o autor, sobre a época da ação, sobre
97
Vide Anexo II. Artigos Especiais.
Imagem
68
: jornal
O Imparcial
de 9 de julho de 1955. Grupo do
TECA na casa de D. Olga
Ferreira Campos, para uma das
primeiras leituras de Uma
Mulher do Outro Mundo
. Foto:
Viviane Cristina Pinto.
238
cada um dos personagens. então começavam as leituras, com todos
atentando para suas “deixas”. Sobre as leituras, Lygia Fabiano lembra-se que:
Como todo mundo trabalhava, estudava, nós nos reuníamos aos sábados e
domingos; durante a semana cada um cuidava da sua vida. Se o Teatro
estava fechado., tinha aqueles bancos verdes em volta do Teatro e a gente
fazia (as leituras) ali mesmo, do lado de fora.
98
O teatro praticado pelo TECA não era um teatro de imagens. Era, acima de
tudo, um teatro de textos e, portanto, o grupo tinha que ter bons textos para poder
montá-los. E bons textos tinham que ser bem falados, bem ditos, bem declamados
para serem bem entendidos.
A fala, portanto, a correta dicção dos atores, a impostação da voz, era uma
primeira preocupação. entrava o preciosismo do trabalho de D. Olga, talvez a
mais exigente professora de Português da cidade e uma pessoa de grande
cultura. Todos tinham que falar de forma correta, isto era ponto de honra da
companhia e Wallace concordava. Muitas leituras eram realizadas, a ponto de,
quando os atores subiam no palco, as falas estavam todas exaustivamente
decoradas. Exercícios eram realizados logo nas primeiras leituras:
Nós fazíamos exercício de impostação de voz. O Wallace ficava lá na porta
e nós na caixa [palco] do Teatro falando, lendo e ele queria ouvir sem
gritar, sem nada, que você jogasse a voz lá. Menino, vo não pode
imaginar como ele era.
99
Os gestos eram estudados, inclusive adequados à época das peças, sem
exageros, sem impostações, sempre naturais. “Falávamos como personagens e
não como atores. Mesmo porque, a maioria das pessoas que iam nos assistir
nunca tinha estado em um teatro”. Wallace não gostava de exageros, nem de
98
Entrevista com Lygia Fabiano.
99
Entrevista com Ruth Magali Miranda.
239
“cacos”, ou de envolvimento do personagem com a platéia: “eu não tinha
participação nenhuma com o público”, lembra Cidinha
100
.
Quando o grupo estava seguro, com o texto decorado, já próximo aos
espetáculos, o Teatro Municipal era eno utilizado. Poucos exercícios de
respiração ou relaxamento eram praticados. “Nossa mãe!, a gente ensaiava
bastante. Meses. A gente podia ensaiar no teatro redondo logo perto da peça
porque o Teatro era usado”. Lygia Fabiano lembra-se de como faziam para
conciliar os horários dos ensaios que, em geral, eram noturnos e duravam cerca
de duas a três horas:
Depois da sessão do cinema a gente ia ao Teatro e ficava até tarde. Depois,
quando acabava, tinha um grupo que descia e que era o da Magali e tinha
um grupo que subia a Barroso, que era eu e a Cidinha. Então eles [os
rapazes do grupo] acompanhavam a turma de e os que moravam pra
acompanhavam a turma de cá.
101
Marcações de cena eram feitas no pequeno palco com giz e os ensaios
continuavam, agora sem folhas de papel na mão para leitura: O Wallace riscava
todo o chão e a gente decorava como fazia, vofalava isso e vinha para cá”,
lembra Ruth Magali Miranda
102
. Se a movimentação tinha marcações rígidas, os
gestos eram livres. Wallace deixava os atores à vontade e interferia se algo o
desgradasse muito. Ouvia aos atores, principalmente ao Barra e procurava
sempre saber se estavam confortáveis fazendo aquela determinada cena.
Figurinos, perucas, sapatos, elementos cênicos, adereços chegavam
sempre em cima da hora, para o ensaio geral, o que podia causar algum
desconforto, principalmente se fossem roupas de época, quentes e pesadas. Por
esta razão, na maioria das fotografias de divulgação distribuídas do grupo, os
artistas estavam ainda com suas roupas pessoais, de ensaio.
100
Entrevista com Maria Aparecida Assis.
101
Entrevista com Lygia Fabiano.
102
Entrevista com Ruth Magali Miranda.
240
Em uma época de diretores tiranos como a década de 1950, a técnica
utilizada por Wallace revela inteligência, principalmente por estar lidando com um
grupo de amadores, sendo ele tamm um diletante. Vê-se pouco de Stanislavski
em um palco todo marcado, mas vê-se neste formato uma forma prática de dar a
seus inexperientes atores confiança na hora da ação. Quanto mais precisa fosse a
marcação, mais segurança todos sentiriam em cena, mesmo porque o texto
principal preocupação do diretor estava bem decorado. De certa forma, Wallace
dava liberdade gestual aos atores, dando-lhes confiança e naturalidade, mas
enquadrava-os dentro de uma forma rígida e precisa de movimentação.
6.5 Os espetáculos
A dinâmica dos espetáculos seguia o padrão estabelecido até hoje em
casas de teatro. Ao terceiro sinal o espetáculo tinha início, havia um black-out, as
luzes se apagavam e em seguida apenas um foco sobre a arena, a luz do palco
era acesa. Os atores entravam, ou podiam estar dentro da arena, tendo
utilizado o black-out para se posicionarem: “Entravam na penumbra e às vezes
eles estavam em cena quando acendia a luz”. Ao final de cada peça, as luzes se
apagavam e, assim que os aplausos começavam, acendiam outra vez.
Terminados os agradecimentos, os atores se retiravam para os camarins que
ficavam atrás do palco original (que em espetáculos de arena era utilizado como
bar). Quinze minutos de intervalo e a outra peça tinha início dentro do mesmo
padrão técnico. Ao final da noite, todos vinham ao palco para os aplausos,
inclusive o diretor e a equipe técnica.
Não existiam camareiras, nem do teatro, nem da companhia. Dentro do
camarim, “o Wallace cuidava de tudo”, desde comandar as trocas de figurinos com
os atores, até ficar de olho na maquiagem, ajudado neste ítem por Arthur Batelli,
Ernesto Lia e Leda Oliveira Pinto. Araken era quem ficava mais na frente da casa,
conversando com o público, com os convidados, vendo problemas de bilheteria de
última hora, junto com Antonio Reis da Silva, nos primeiros anos. Wallace
241
conseguia comandar a arrumação do palco, ajudado por Antonio Auny Leite no
primeiro ano e logo por Everton e Iglá Aiévoli, Aldemir Mussi e outros, que se
juntaram à companhia nos anos posteriores.
Apesar de Wallace insistir para que todos soubessem os seus papéis e
tamm os demais papéis, para uma eventualidade; em geral, cada peça tinha um
grupo de atores definido e muitos atores se especializaram em determinados
personagens. Em uma mesma noite, em um mesmo espetáculo, um ator
trabalhava em apenas uma peça. o dava tempo de trabalhar em muitas, em
uma delas (Os Dois Faladores) eu toquei bandolim, mas era um papel pequenino.
Nós fazíamos e depois assistíamos as outras peças”.
103
O público tinha notícia dos
espetáculos através da imprensa, das
chamadas na dio Cultura e da
cobertura do jornal O Imparcial. As
matérias sobre o TECA eram quase
diárias nos primeiros anos e foram se
escasseando com o tempo. Como o
Municipal ficava em pleno centro da
cidade, na movimentada Rua 3, entre
os dois principais cinemas, qualquer
anúncio colocado na frente do teatro
trazia repercussão imediata. O início
das vendas dos espetáculos na
bilheteria já era o suficiente para dar
origem ao “boca a boca, todos
comentando sobre o próximo
espetáculo. Em uma cidade pequena
como Araraquara, este método era o melhor.
103
Entrevista com Maria Aparecida Assis.
Imagem
69
: jornal
O Imparcial
de 22 de agosto de
1955 trazendo Fanny Carati na capa. Foto: Viviane
Cristina Pinto.
242
No ano de 1957, vê-se o único exemplo de uma publicidade paga do TECA,
anunciando sua primeira série do ano. Propaganda que não foi paga, mas sim
permutada com a direção do jornal, como sempre faziam.
Cada espetáculo tinha o seu programa de mão impresso e distribuído ao
público, peça fundamental para a comunicação do grupo com um público, até
então, pouco familiarizado com teatro. Os programas do primeiro ano, 1955, eram
melhores, eram em formato de livro, de 15 cm de largura por 20,5 de altura, com
dez páginas grampeadas. Suas páginas tinham textos – em sua maioria de autoria
de Wallace - sobre a companhia, sobre as peças e autores e fotos dos ensaios.
Muitas ginas tinham propagandas de empresas locais, que era a forma
encontrada por Wallace para pagar parte da produção, dando, em retorno aos
serviços prestados por cada empresa, ou ao
material emprestado pela empresa, uma
contrapartida de visibilidade no programa. As
empresas quase nunca ajudavam
financeiramente.
Nos primeiro programa do TECA, em
junho de 1955, vê-se publicidades das
seguintes empresas, referentes aos seguintes
apoios: Eletro Tamoio (móveis emprestados,
empresa que pertencia ao sobrinho de
Wallace, Clodoaldo Medina), Meias Lobo
(Lupo), Casa Santelli (bijuterias emprestadas),
Marcenaria e Carpintaria São Bento (móveis
emprestados), Oficina São Geraldo (acessórios
de decoração), Marcenaria e Carpintaria
Irmãos Micelli (móveis emprestados), jornal O
Imparcial (apoio pela cobertura jornalística),
Publiara (pela impressão do programa),
Imagem
70
: jornal
O Imparcial
de 10 de
maio de 1957 com propaganda da quarta
série de espetáculos do TECA. Foto:
Viviane Cristina Pinto.
243
Restaurante Riviera (que cedeu algumas refeições ao grupo), Foto Studio dos
Irmãos Autullo (pelas fotos da publicidade), Casas Texidal (tecidos emprestados,
empresa que pertencia a seus cunhados Rafael e Sebastião e onde ele
trabalhava), Fábricas de Móveis Irmãos Cortese (móveis emprestados), Rádio
Elétrica Geral (iluminação), Esporte Paulista (roupas emprestadas) e Ótica Lupo
(óculos emprestados). Uma quantidade considerável de apoios, mesmo para os
dias de hoje. Apoios oficiais, já que existiam os amigos e familiares.
Nos anos seguintes, os programas foram ficando mais simples e mais
baratos, em geral apenas uma página de papel impressa frente e verso, mas aí
residia mais uma vez a criatividade de Wallace dobrada de forma pouco
comum
104
.
6.6 Flanela e lona
Um número tão grande de apoios revela, por um lado, uma grande inserção
que a companhia, por meio de seus diretores e atores, tinha com a sociedade
local, com as empresas locais. Uma relação de parceria, de companheirismo, de
solidariedade que um estrato social mais elevado de Araraquara tinha com os
propósitos do grupo, como se todos estivessem dispostos a colaborar, não apenas
pelas pessoas envolvidas no projeto, mas pelo próprio bem da cidade, por uma
noção, ainda que não percebida, de orgulho provinciano, de cidadania.
Por outro lado, no entanto, não deixa de revelar uma séria precariedade,
uma falta de recursos que, apesar de bastante comum em grupos amadores, não
apenas naquela época, mas até nos dias de hoje, era bastante séria, preocupante
e, ao final, acabou sendo determinante para o destino que teve a companhia.
em 14 de junho de 1958, Wallace reconhecia, em uma longa entrevista
ao jornal O Imparcial, as precárias condições financeiras da companhia e que,
segundo ele, se isto não os afetava artisticamente, era um elemento limitador em
104
Vide Anexo I. Programas.
244
sua linha estética. Chegava a isentar as autoridades locais da responsabilidade de
assumir despesas maiores com o seu grupo de teatro em face das outras áreas
sociais ainda carentes da cidade.
Todos conhecem o nosso nível artístico, mas o nosso guarda roupa é feito
de flanela e lona. Sabemos que em Belo Horizonte a prefeitura gastou
700 contos com o guarda-roupa de seus representantes, que vão apresentar
O Crime na Catedral, de T.S.Elliot. Não dispomos de fundos, somos um
grupo pobre. A nossa prefeitura tem problemas seríssimos na frente do
nosso. De que valeria exigirmos cetins e veludos enquanto aqui dentro nos
falta tanta coisa!
No entanto, era uma situação bastante frustrante; na maioria das vezes,
sua intenção era ter uma companhia envolta emcetins e veludos”. Não reclamava
nunca, valia de sua criatividade para contornar todos os problemas advindos desta
precariedade e buscava ver, nesta superação, algo do poder espiritual elevado
que procurava manter em todos do grupo. A utilização de heterônimos era uma
faceta engraçada desta precariedade.
Wallace aparecia nos programas como um inglês ou norte-americano John
Brown quando fazia maquiagem. Era Felipe Luiz, talvez um figurinista francês. Era
Axel de Fersen, o roteirista do filme. Foi também o cenógrafo espanhol Diego de
Vega. Araken tamm o escapou aos heterônimos e acabou sendo Alekan, o
responsável pela sonoplastia de diversos espetáculos, mesmo quando não as
fazia. Wallace, a exemplo do escritor Fernando Pessoa, fez uso de heterônimos e
não pseudônimos, como os próprios atores da companhia mencionam, já que
assinava nomes que faziam atividades diferentes das que ele próprio, como
diretor, realizava
105
.
A intenção era mostrar que a companhia era mais numerosa do que a
realidade e que contava até com estrangeiros trabalhando. Estes detalhes, no
entanto, passavam quase desapercebidos do grande público, o aspecto mais
105
Os heterônimos do escritor Fernando Pessoa: Ricardo Reis, Álvaro de Campos e Alberto Caieiro, para
citar os mais conhecidos, escreviam em um estilo diferente do escritor Fernando Pessoa. Eram vistas,
inclusive, como outras pessoas, com biografias diferentes, criadas pelo próprio escritor.
245
visível desta precariedade podia ser testemunhado pelo lado técnico dos
espetáculos montados: o resultado final dos espetáculos não conseguia esconder
a falta de uma estrutura profissional, apesar do apuro e da dedicação de toda a
companhia.
Outro aspecto a ressaltar é a utilização de nomes dos integrantes da
companhia grafados de uma forma que buscava ser, ou parecer, mais sofisticada,
com o “y” substituindo o “ioriginal de muitos nomes, por exemplo. Esta prática é
ainda adotada no meio artístico com resultados estéticos questionáveis.
Os empréstimos constantes faziam com que cada produção fosse muito
trabalhosa e uma verdadeira maratona antecedia uma nova montagem. A rua do
Imagem
71
: Mario Barra (de costas), Sebastião Campos, Ediméia Zucchini (sentada), Fanny Carati e Maria
Aparecida Assis (como fantasmas) em Uma Mulher do Outro Mundo. Teatro Municipal de Araraquara,
novembro de 1955. Foto: Lucilio Leite. Acervo: Fanny Carati.
246
comércio da cidade, a Rua 2, era percorrida de cima a baixo em busca de objetos
emprestados. Uma cadeira de fórmica emprestada, um sofá xadrez ou bancos de
bambu, como na foto da montagem de Uma Mulher do Outro Mundo, por exemplo,
acabavam tendo que ser utilizados em uma tradicional casa inglesa do início do
século XX.
Os objetos de cena e adereços eram, em sua maioria, emprestados pelas
famílias envolvidas, pela família de Wallace, dos atores e dos amigos, o que às
vezes trazia conflitos de estilos para uma peça. Problemas de estilo à parte, era
um momento de grande alegria quando alguém reconhecia o seu abajur, seu
castiçal, sua toalha ou a sua cadeira em cena. Até hoje a maioria dos móveis da
foto acima, da montagem de O Protocolo, podem ser vistos decorando a sala da
casa da tia de Wallace, Ceci.
Imagem
72
: Tito Peixoto, Alice de Oliveira
, Sebastião Campos (de costas) e Maria Aparecida Assis
em
O
Protocolo
. Teatro Municipal de Araraquara, agosto de 1956. Acervo: Maria Aparecida Assis.
247
Nos espetáculos “em teatro de caixa”, os cenários, em geral, abusavam dos
tecidos para os fundos de palco. E isto tinha uma razão bastante prática: a Casas
Texidal vendia tecidos e era de propriedade dos cunhados de Wallace.
A Casas Texidal o providenciava os resistentes tecidos para os
cenários, como também os mais finos para os figurinos, que tinham que ser o
ponto forte das montagens “em teatro de arena”. Disso Wallace tinha certeza, pois
a proximidade dos espectadores revelaria os menores detalhes. Os desenhos
eram sempre de Wallace, ou Felipe Luiz, como assinava, os moldes para as
camisas eram da Camisarias Nino, cujo proprietário era tio do diretor, o Nino. Tudo
era costurado com muito capricho, as roupas masculinas mais sofisticadas, pelo
melhor alfaiate da cidade, o Sr. Lucilio Correia Leite, as roupas femininas por
Dona Ida Darlan, ou pelo exército de empregadas de suas irmãs, Ninira e Ceci.
Imagem
73
: Tereza Cerqueira Leite, como Pluft, Ruth Magali Miranda, como a Mãe Fantasma e Cinira
Rodrigues Leal, como Maribel, em Pluft, o Fantasminha. Teatro Municpal de Araraquara, outubro de 1961.
Acervo: Wallace Leal V. Rodrigues.
248
O transporte dos itens mais pesados da produção contava com a Fonseca,
como era conhecida a caminhonete Studebaker 1955 de estimação da Camisarias
Nino.
O som dos atores o era amplificado. Para isto, contava-se com os
exercícios de impostação de voz e com a excelente acústica do Teatro Municipal e
a disposição “em teatro de arena, próximo ao público, facilitava o entendimento. A
música era usada raramente e era sempre assinada por Alekan, que apesar de
ser o heterônimo de Araken, acabava sendo cuidada pelo próprio Wallace, com
ajuda de Iglá ou Barra. Nestas ocasiões, um gravador era o suficiente. Maria
Aparecida Assis lembra-se de pouca música sendo utilizada, mas particularmente
da cena final de À Margem da Vida, quando Tom Wingfield abandona sua mãe, aí
a música “foi emocionante.
Pode-se dizer que a luz era outro item de menor importância para a
companhia. Com exceção do período das filmagens de Santo Antonio e a Vaca,
quando refletores foram construídos, nas produções teatrais a luz era utilizada no
“chapéu”, muito mais focada na arena, em planos gerais e com graduações para
situações mais intimistas.
As finanças do grupo eram controladas por Araken, com o título de Diretor
Superintendente. Na época das filmagens, com a criação da Arabela Filmes,
Péricles Medina, sobrinho de Wallace, acabou assumindo esta responsabilidade,
que voltou a ser de Araken após o filme. A companhia o tinha um custo fixo de
aluguel, manutenção ou de salários que, por ser um grupo amador, não eram
pagos. A única exceção foi Edward Freund, no período da filmagem do Santo
Antonio e a Vaca. Os custos todos vinham das montagens específicas. Os direitos
autorais das peças, via de regra, não eram pagos. Muitas vezes, Wallace
conseguia um texto, fazia ele mesmo a tradução e montava o espetáculo.
Algumas vezes com o cuidado de mudar o nome da peça e até os nomes dos
personagens. Os empréstimos, apoios e permutas já descritos diminuíam bastante
a necessidade de dinheiro, mas sempre alguma coisa tinha que ser investida.
249
entrava outra vez a família de
Wallace, suas irmãs sempre o ajudavam.
Uma situação que, se não chegava a criar
conflitos abertos nos familiares, deixava
alguns desconfortos com a alegada proteção
que as irmãs tinham com o irmão caçula,
Wallace, e suas “invenções
106
.
A principal receita do TECA era a
bilheteria dos seus espetáculos, o que
acabava sendo uma fonte incerta, já que
muitos deles, pelo apoio da Prefeitura em
ceder o teatro, acabavam tendo sua receita revertida a entidades beneficentes.
O texto do próprio Wallace, que abre o programa do Festival de Poesia,
em 1956, é significativo:
Realizamos o espetáculo na possibilidade de nossas forças e em face da
exigüidade do tempo. Reunidos, demos o melhor do nosso esforço, do
nosso entusiasmo na valorização da cultura araraquarense. E cremos que,
agora, mais não nos resta do que falar ao público generoso tal qual como
Shakespeare falou ao seu público isabelino, na voz coral do prólogo ao
sublime poema de amor que é o seu imortal Romeu e Julieta: “Queira o
auditório dar-nos atenção. E relevar a nossa imperfeição”!
A estética advinda da precariedade dos recursos existentes, ressalta-se no
próprio nome da companhia: Teatro Experimental de Comédia, onde a palavra
experimental não significava novos e ousados empreendimentos ou técnicas
teatrais. Ao contrio, o grupo era bastante tradicional em seus textos e suas
montagens. A palavra experimental acabou entrando no nome do grupo muito
mais como uma desculpa estética a uma eventual precariedade no resultado final
das montagens do que uma ousadia estética. Wallace sabia que, apesar de
106
Entrevista com Deborah Medina Lepre.
Imagem
74
: Fonseca, caminhonete da Casas
Texidal. Acervo: Wallace Leal V. Rodrigues.
250
amadores, o grupo seria cobrado e tinha, assim, uma resposta pronta: “Não foi
uma peça, foi um experimento”.
Imagem
75
: Tr
oféu Apolo, recebido
pelo TECA como o
melhor conjunto teatral amador do ano de 1957, pela
Associação Brasileira de Críticos Teatrais. Escultura em
bronze de Bruno Giorgi.
251
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A construção da história do teatro brasileiro passa pelo resgate das
histórias de cada um de seus diversos grupos teatrais. Não apenas de grandes
grupos, como o TBC ou o Teatro de Arena, em São Paulo; ou Os Comediantes, no
Rio de Janeiro, mas tamm de grupos de outras cidades e outros Estados
brasileiros que, por serem menores e de lugares menos conhecidos e distantes
dos grandes centros, acabam sendo esquecidos pela história oficial.
O processo que cercou e construiu a hisria destes grupos teatrais em
suas diversas localidades é parte do contexto sócio cultural em que se inseriam.
Compreendê-lo é compreender melhor não apenas a história do nosso teatro, da
nossa cultura, mas tamm a do próprio país.
A trajetória do TECA Teatro Experimental de Comédia de Araraquara,
narrada em detalhes neste estudo, nos apresentou aspectos de relevância que o
coloca como um grupo de teatro – e de cinema – atuante e de excelente qualidade
artística no interior do Estado de São Paulo. Comprova, também, sua completa
inserção na história social, política e cultural da cidade de Araraquara nas cadas
de 1950 e 1960.
Em oito anos de atividades (1955-1962), a companhia apresentou uma obra
importante e significativa, composta de vinte e um títulos montados, todos eles
repetidos, alguns em anos e locais diferentes, inclusive em outros Estados
brasileiros. Tamm produziu um longa-metragem em 35 mm, Santo Antonio e a
Vaca, sem falar na experncia frustrada de Aurora de uma Cidade, o curta-
metragem de 16 mm, que ficou inacabado, em 1953.
Toda essa produção foi realizada inteiramente na cidade de Araraquara, por
atores, diretores e técnicos locais, todos amadores. A única exceção foi a
presença do polonês Edward Freund, contratado para os trabalhos cnicos do
filme Santo Antonio e a Vaca.
252
A qualidade artística do trabalho do grupo foi reiterada inúmeras vezes, não
apenas nas entrevistas com integrantes da companhia, como por pessoas que
acompanharam as apresentações do grupo na época, conterrâneos do TECA em
Araraquara. Dentre eles destaca-se o consagrado jornalista e escritor Ignácio de
Loyola Brandão que, através de artigos da época, assim como em crônicas em
seus livros e artigos atuais, é sempre enfático em atestar esta qualidade.
Chama atenção tamm os artigos de periódicos do Rio de Janeiro, então
capital federal, dentre eles o artigo da revista O Cruzeiro, assinado pelo crítico de
teatro, A.Accioly Netto, o do jornal Correio da Manhã, assinado pelo ministro
Paschoal Carlos Magno e os do jornal Última Hora, assinados pelo jornalista João
da Ega. Todos unânimes em realçar a qualidade dos espetáculos assistidos. Estes
artigos estão transcritos no Anexo II. Artigos Especiais.
A cópia do filme Santo Antonio e a Vaca, que acompanha este estudo em
DVD como Anexo III, deve tamm servir para mostrar as características gerais da
crião artística e poética do grupo, trazendo as imagens dos principais atores da
companhia em ação, mostrando as peculiaridades cnicas e as qualidades da
direção. Apesar de ser uma linguagem cinematográfica, e não teatral, vale a pena
ter o filme como uma referência e reiterar a influência que o cinema teve na
dramaturgia e na história do TECA, uma companhia de teatro que fez cinema.
Lembrando uma frase de Paschoal Carlos Magno, ao assistir a um dos
espetáculos em 1957:
Percebe-se no todo e nas minúcias a influência cinematográfica da
interpretação mecânica. O espectador menos atento condena certa
mímica, que nada mais é que reminiscência do cinema mudo.
A direção de Wallace Leal Valentim Rodrigues foi outro aspecto destacado
nesta história do TECA. Em uma época onde diretores teatrais eram conhecidos
por sua firmeza e rudeza até, Wallace era um contraponto. Sua forma de lidar com
os atores, com ternura e afetividade, lembrada em todas as entrevistas, é
importante para explicar o sucesso que a companhia obteve. Sua compreensão
253
abrangente de várias artes, ainda que dentro de um diletantismo romântico e
innuo, o fez ser um líder aceito por todos.
Sua tarefa de levar a modernidade à Araraquara não foi fácil. Com exceção
do pequeno grupo de intelectuais com quem convivia, a cidade vivia alheia às
atividades culturais, e ao teatro em particular. Havia uma grande curiosidade, mas
tamm um grande receio. Sua tarefa foi a de traduzir esta modernidade para a
cidade da melhor maneira possível, fazendo concessões, adaptando-se às
condições, dirigindo seus atores de uma forma prática e objetiva, fazendo com que
se expressassem, mas preservando-os de qualquer exposição constrangedora, ao
mesmo tempo. Escolhendo textos e mostrando-os de uma forma que as pessoas
entendessem, perdessem seus receios e se envolvessem.
A história desse teatro que, à luz da modernidade, pode parecer até
innuo, mostra a necessidade de expressão artística de toda uma sociedade,
que se viu representada, espelhada por aqueles “moços maravilhosos”, naquele
momento, em cada uma daquelas peças. Uma sociedade que se lembra com
orgulho e com carinho daqueles anos, que se apega a eles com um misto de
melancolia e saudades, como se falasse da história de suas próprias vidas. O ciclo
de vida do TECA foi natural, a história da companhia seguiu o seu curso, como
uma vida bem vivida.
O teatro do TECA, assim como o teatro feito por outros grupos do interior
de São Paulo, desenvolvia-se, quase sempre, em torno de um elemento
aglutinador, capaz de impulsionar a cultura de sua região. Eram grupos que o
tomavam partido político, mas faziam, também, um teatro de resistência, vivo e
provocador.
Nesta pesquisa, dentro do contexto teatral, foi possível estabelecer uma
relação entre a figura aglutinadora de um diretor que, pela época e pela sociedade
em que viveu, exerceu mais que um papel de encenador. Wallace exerceu
funções de organizador, administrador, conselheiro, amigo e um pouco pai,
254
tamm. Artista, também ele, impulsionava e ensinava teatro, que se materializou
no TECA.
A relação do TECA com sua comunidade foi uma relação de inserção e
aceitação. O mesmo não se pode dizer, infelizmente, do papel desempenhado
pelas autoridades locais em relação ao grupo. O incentivo, fruto de uma política
cultural de investimento constante, pensada a médio e a longo prazo, nunca
existiu. A figura do Prof. Lysanias Oliveira Campos, como facilitador, representou,
por sua cultura e visão, um momento isolado, uma época que hoje pode ser
considerada uma época de ouro da cidade.
A mesma importância que Wallace teve em relação ao seu grupo, o Prof.
Lysanias teve em relação à comunidade, do ponto de vista cultural. Apesar de
poderem ser considerados figuras emblemáticas de Araraquara, a história de uma
comunidade, deve prescindir de líderes carismáticos e se pautar por políticas
culturais sérias, consistentes e longevas.
Recuperar a história regional, também a da cultura, é trazer a consciência
do nosso passado, da nossa memória, para as novas gerações O Teatro
Municipal de Araraquara e o TECA têm histórias que se confundem, como se o
TECA fosse a alma do velho casarão da Esplanada das Rosas, que se
transformou em um ícone para todos os araraquarenses, mesmo para aqueles
que não o conheceram. São histórias lembradas com orgulho e que fazem parte
de um sentimento maior de cidadania. Resgatá-las é um dever que aqui se
cumpre.
255
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CHEKHOV, Anton - Um Pedido de Casamento. Tradução inglesa: The
Proposal, publicada em Plays by Anton Tchekoff. Trans. Julius West. New York:
Charles Scribner's Sons, 1916. Disponível em: <http://www.one-act-
plays.com/comedies/proposal.html>. Acesso em: 22 ago. 2007.
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_________ O Urso. Tradução inglesa: The Boor, publicada por Contemporary
One-Act Plays. Ed. B. Roland Lewis. New York: Charles Scribner's Sons, 1922.
Disponível em: <http://www.theatrehistory.com/plays/boor.html>. Acesso em: 22
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COWARD, Noël Amigos de Viagem. Título original: Hands across the sea. A
light comedy in one act from Tonight at 8:30. Samuel French. New York, EUA.
1963
GERSTENBERG, Alice Ressonâncias. Título original: Overtones. Fonte:
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& Co., 1916. Disponível em: <http://www.one-act-
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Chess. Editado por William-Alan Landes. Players Press, Inc. New York, EUA.
1992
JACOBS, W.W. – A Garra do Macaco. Titulo original: The Monkey’s Paw.
Maravilhas do Conto Inglês. 4ª. Edição. Introdução e notas de Edgard
Cavalheiro. Organizão de Diaulas Riedel. Editora Cultrix, São Paulo. s/d.
MACHADO, Maria Clara Pluft, o Fantasminha. Coleção “O Teatro de Maria
Clara Machado”. Ilustrações de Sergio Kon. Companhia das Letrinhas, São
Paulo. 2001.
MAUGHAM, W. Somerset Um Drama na Malásia. Título original: Before the
Party. Penguin Twentieth-Century Classics. Collected short stories: Volume 1.
Penguin Books, New York, EUA. 1977.
PIRANDELLO, Luigi O Homem da Flor na Boca. Título original: L'uomo dal
fiore in bocca. Edizione elettronica: Giuseppe Bonghi, Milano 1990. Disponível
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SHAW, Bernard George Como Ele Mentiu ao Marido Dela. Título original:
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STEINBECK, John De Ratos e Homens. Título original: Of Mice and Men.
Steinbeck Centennial Edition (1902-2002). Penguin Books. New York, EUA.
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WILLIAMS, Tennessee À Margem da Vida. Título original: The Glass
Menagerie. Signet Book. Nova York, EUA.1987.
___________ – O Caso das Petúnias Esmagadas. Título original: The Case of
the Crushed Petunias. El caso de las Petunias Pisoteadas. Piezas Cortas.
Alianza Editorial, Madrid, Espanha. 1968.
____________ O Menino de Moony não Chora. tulo original: Moony’s Kid
Don’t Cry. Tradução original datilografada de Wallace Leal Valentim Rodrigues.
Araraquara. s/d.
Filmes sobre textos e peças montadas pelo TECA
À MARGEM da Vida. Direção: Paul Newman. Intérpretes: Joanne Woodward,
John Malkovich, Karen Allen, James Naughton. Título original: The Glass
Menagerie. Texto de Tennessee Williams. Produção: Cineplex-Odeon Films.
EUA. 1945. Legendas em português e ings. NTSC, colorido. DVD vídeo, 134
min.
DE RATOS e Homens. Direção: Gary Sinise. Intérpretes: John Malkovich, Gary
Sinise, Ray Walston, Casey Siemaszko, Sherilyn Fenn, John Terry, Richard
Riehle, Alexis Arquette, Joe Morton, Noble Willingham, Joe D’Angerio, Tuck
Milligan, David Steen, Moira Harris, Mark Boone Junior. Título original: Of Mice
263
and Men Texto de John Steinbeck. Produção: Metro-Goldwin-Mayer. EUA.
1992. Legendas em português e inglês. NTSC, colorido. DVD vídeo, 115 min.
UMA MULHER do Outro Mundo. Direção: David Lean. Produção e roteiro: Noël
Coward. Intérpretes: Rex Harrison, Constance Cummings, Kay Hammond,
Margaret Rutherford, Hugh Wakefield, Joyce Carey, Jacqueline Clark. Título
original: Blithe Spirit. Texto de Noël Coward. DVD Classic Collection. Two Cities
Film. Grã-Bretanha. 1945. Legendas em português e inglês. NTSC, colorido.
DVD vídeo, 91 min.
Filmes com a equipe do TECA
SANTO ANTONIO e a Vaca. Direção: Wallace Leal V. Rodrigues. Produção:
Araken de Toledo Pires. Dirão Técnica: Edward Freund. Diálogos: Inah Perez
Bittencourt. Roteiro: Axel de Fersen (heterônimo de Wallace). Intérpretes: Tito
Peixoto, Mario Barra, Julia Abrahão, Lygia Fabiano, Maria Cleide Valentim,
Geraldo Brandão, Moacyr Marchese, Ruth Magali Miranda, Hermínio Amorim
Netto, Oscar Rodrigues, Antonino Rodrigues Leal, Rafael de Medina, Jayme
Maurício Leal, Antônio Furlan, Alceu Ianelli, Pedro Peiró, Alcides Undiciatti,
Maria Aparecida Assis, Izabel Reina, Péricles Medina, Benjamim Soares de
Azevedo e Maria Helena Belda. Arabela Filmes. Brasil, 1960. NTSC, preto e
branco. DVD vídeo, 78 min.
FÉRIAS no Arraial. Direção: Edward Freund. Produção: M. Kleinsinger e J.
Auada. Fotografia, montagem, argumento e adaptação: Edward Freund.
Diálogos: Inah P. Bittencourt. Intérpretes: Milton Ribeiro, Annik Malvil, Mario
Barra, Moacyr Marchese, João S. Cabral, Névio J. Bonetti, Ruth Magali
Miranda, Julia Abrahão, Geraldo M. Brandão, Izabel Reina, Jamil Abrahão,
Natália de Oliveira, Hai Maria, Mário Valentim, Maria Cândida C. Borges,
Sônia Maria C. Borges, Bolival A. Mendonça, Inês Dinorá Durante, Márcia
Odete Dias, Zuleika Nelli Tedeschi, Nivaldo Oliveira, Elena Antonia Vitiver,
264
Terezinha Vitiver, Cleonísio Paulilo, Pedro I. Bombarda e Américo A. Borges.
K.A.F. Ltda. Brasil. 1962. NTSC, preto e branco. DVD vídeo, 58 min.
Artigos em Jornais e Revistas
1953
RODRIGUES, Wallace Leal V.. Pedro José Netto, este outlaw. Fotos de Rivas
Autulo e Lucilio Leite. Jornal O Imparcial. Araraquara. Pág. 3 a 8. Paulo A C
Silva, redator chefe. Edição de 22.08.1953.
BRANDÃO, Ignácio de Loyola. Filmando em Araraquara. Jornal O Imparcial.
Araraquara. Pág. 3 a 8. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 22.08.1953.
BRANDÃO, Ignácio de Loyola. Aparecida de Assis, a nova descoberta. Fotos
de Lucio Silva. Jornal O Imparcial. Araraquara. Pág. 7. Paulo A C Silva, redator
chefe. Edição de 06.12.1953.
1954
SCHIAVON, Sidney. O que é a Escola de Belas Artes de Araraquara. Fotos de
Lucio Silva e do arquivo da escola. Jornal O Imparcial. Araraquara. Edição
comemorativa do 137° aniversário da cidade. Págs. 21-23 e 104. Paulo A C
Silva, redator chefe. Edição de 22.08.1954.
NANTES, J.C.. A Filatelia em Araraquara. Jornal O Imparcial. Araraquara.
Edição comemorativa do 137° aniversário da cidade. Págs. 24-26. Paulo A C
Silva, redator chefe. Edição de 22.08.1954.
CINEMASCOPE e Tela Panorâmica nos Cines Odeon e Paratodos. Jornal O
Imparcial. Araraquara. Edição comemorativa do 137° aniversário da cidade.
Pág. 36. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 22.08.1954.
265
BRANDÃO, Ignácio de Loyola. A propósito do Clube de Cinema de
Araraquara”. Jornal O Imparcial. Araraquara. Edição comemorativa do 137°
aniversário da cidade. Pág. 48. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de
22.08.1954.
FREIRE, José Péricles e SOARES, Ruy. Elaboração de orçamento para
serviços locais de saúde pública. Jornal O Imparcial. Araraquara. Edição
comemorativa do 137° aniversário da cidade. Pág. 49-52. Paulo A C Silva,
redator chefe. Edição de 22.08.1954.
O ESFORÇO de uma equipe obstinada. Jornal O Imparcial. Araraquara.
Edição comemorativa do 137° aniversário da cidade. Pág. 78 e 79. Paulo A C
Silva, redator chefe. Edição de 22.08.1954.
RODRIGUES, Wallace Leal V.. Un Pas de deux entre Araraquara e a Dança.
Fotos de Lucio Silva e Lucilio Leite. Jornal O Imparcial. Araraquara. Edição
comemorativa do 137° aniversário da cidade. Págs. 81-84 e 105. Paulo A C
Silva, redator chefe. Edição de 22.08.1954.
1955
DIA 23, estréia do Teatro de Arena. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A C
Silva, redator chefe. Edição de 12.06.1955.
FINALMENTE estréia o Teatro de Arena. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo
A C Silva, redator chefe. Edição de 15.06.1955.
EUDATOS. Vai bem, obrigado. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A C
Silva, redator chefe. Edição de 21.06.1955.
ESTRÉIA hoje o Teatro de Arena. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A C
Silva, redator chefe. Edição de 23.06.1955.
266
SANTOS, Almeida. Empolgou o espetáculo do Teatro de Arena. Jornal O
Imparcial. Araraquara. Fotos de Lúcio A. C. Silva. Paulo A C Silva, redator
chefe. Edição de 24.06.1955
NOVO e grandioso êxito do Teatro de Arena. Jornal O Imparcial. Araraquara.
Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 26.06.1955.
NANTES, J.C.. 23 de junho: uma data notável na cultura araraquarense. Jornal
O Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 28.06.1955.
NOTÁVEL o último espetáculo do Teatro de Arena em Araraquara. Jornal O
Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 28.06.1955.
BRANDÃO, Ignácio de Loyola. Valeu a pena. Entrevista de Wallace Leal ao
autor. Coluna “Coisas da Cidade”. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A C
Silva, redator chefe. Edição de 28.06.1955.
DIAS Jr., Th.. Teatro experimental. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A C
Silva, redator chefe. Edição de 06.07.1955.
SANTOS, Almeida. Quem será ele? Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A C
Silva, redator chefe. Edição de 08.07.1955.
KOOJAH, Mara. Noël Coward entre nós. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo
A C Silva, redator chefe. Edição de 09.07.1955.
KOOJAH, Mara. Reflexos. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva,
redator chefe. Edição de 16.07.1955.
KOOJAH, Mara. Estudando a peça. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A C
Silva, redator chefe. Edição de 17.07.1955.
KOOJAH, Mara. Reprise especial. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A C
Silva, redator chefe. Edição de 31.07.1955.
267
KOOJAH, Mara. Continuam os ensaios. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo
A C Silva, redator chefe. Edição de 14.08.1955.
KOOJAH, Mara. Auspiciosa notícia. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A C
Silva, redator chefe. Edição de 13.10.1955.
KOOJAH, Mara. Uma Mulher do Outro Mundo. Jornal O Imparcial. Araraquara.
Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 15.10.1955.
KOOJAH, Mara. Notável iniciativa. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A C
Silva, redator chefe. Edição de 19.10.1955.
RODRIGUES, Wallace Leal V.. Teatro e literatura. Jornal O Imparcial.
Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 25.10.1955.
KOOJAH, Mara. Sábado em Catanduva. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo
A C Silva, redator chefe. Edição de 27.10.1955.
O TEATRO de Arena hoje em Catanduva. Jornal O Imparcial. Araraquara.
Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 29.10.1955.
BRANDÃO, Ignácio de Loyola. O Teatro de Arena obtém amplo sucesso. Jornal
O Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 01.11.1955.
KOOJAH, Mara. A grande estréia. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A C
Silva, redator chefe. Edição de 08.11.1955.
KOOJAH, Mara. Uma Mulher do Outro Mundo. Jornal O Imparcial. Araraquara.
Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 11.11.1955.
KOOJAH, Mara. Grande estréia. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A C
Silva, redator chefe. Edição de 13.11.1955.
SILVA, Paulo A.C.. TECA. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva,
redator chefe. Edição de 17.11.1955.
268
DIAS Jr., Th.. Teatro experimental. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A C
Silva, redator chefe. Edição de 22.11.1955.
SILVA, Paulo A.C.. Teatro. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva,
redator chefe. Edição de 26.11.1955.
KOOJAH, Mara. A tão esperada reprise. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo
A C Silva, redator chefe. Edição de 06.12.1955.
KOOJAH, Mara. Compreensão. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A C
Silva, redator chefe. Edição de 10.12.1955.
1956
KOOJAH, Mara. Estrea a 24 de maio. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo
A C Silva, redator chefe. Edição de 01.05.1956.
KOOJAH, Mara. As estréias no TECA. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A
C Silva, redator chefe. Edição de 03.05.1956.
KOOJAH, Mara. Reportagem mero um. Jornal O Imparcial. Araraquara.
Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 05.05.1956.
KOOJAH, Mara. Reportagem número dois. Jornal O Imparcial. Araraquara.
Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 06.05.1956.
KOOJAH, Mara. Reportagem número três. Jornal O Imparcial. Araraquara.
Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 09.05.1956.
KOOJAH, Mara. Começou corajosamente. Jornal O Imparcial. Araraquara.
Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 17.05.1956.
BRANDÃO, Ignácio de Loyola. TECA, sempre o TECA. Jornal O Imparcial.
Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 17.05.1956.
269
KOOJAH, Mara. Equilíbrio orçamentário. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo
A C Silva, redator chefe. Edição de 20.05.1956.
KOOJAH, Mara. Amanhã, finalmente, a estréia. Jornal O Imparcial. Araraquara.
Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 23.05.1956.
KOOJAH, Mara. Hoje tem marmelada? Tem sim sinhô. Jornal O Imparcial.
Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 24.05.1956.
KOOJAH, Mara. Magistral a estréia do teatro de arena. Jornal O Imparcial.
Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 25.05.1956.
KOOJAH, Mara. Hoje, o terceiro. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A C
Silva, redator chefe. Edição de 26.05.1956.
KOOJAH, Mara. Um Pedido de Casamento. Jornal O Imparcial. Araraquara.
Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 27.05.1956.
BRANDÃO, Ignácio de Loyola. Uma estréia no velho Municipal. Coluna “Coisas
da Cidade”. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe.
Edição de 27.05.1956.
SANDRA. Noite de estréia. Crônica. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A C
Silva, redator chefe. Edição de 29.05.1956.
KOOJAH, Mara. Você já foi ao teatro? Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A
C Silva, redator chefe. Edição de 29.05.1956.
KOOJAH, Mara. José Renato, nosso amigo. Jornal O Imparcial. Araraquara.
Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 30.05.1956.
BRANDÃO, Ignácio de Loyola. Ainda sobre teatro de arena. Coluna “Coisas da
Cidade”. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição
de 31.05.1956.
270
KOOJAH, Mara. E os espetáculos corresponderam. Jornal O Imparcial.
Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 02.06.1956.
RICCI, Lincoln R.. “T.E.C.A.”. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva,
redator chefe. Edição de 03.06.1956.
NANTES, J.C.. TECA Impressões de um espectador. Jornal O Imparcial.
Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 03.06.1956.
KOOJAH, Mara. Os novos espetáculos do TECA. Jornal O Imparcial.
Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 09.06.1956.
SANTOS, Almeida. Apresta-se o TECA. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo
A C Silva, redator chefe. Edição de 20.06.1956.
KOOJAH, Mara. O Protocolo. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva,
redator chefe. Edição de 21.06.1956.
KOOJAH, Mara. Pluft, o Fantasminha. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A
C Silva, redator chefe. Edição de 27.06.1956.
KOOJAH, Mara. conhecidos os intérpretes. Jornal O Imparcial. Araraquara.
Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 05.07.1956.
PARA fins de agosto. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva, redator
chefe. Edição de 12.07.1956.
KOOJAH, Mara. Dia 30 de agosto a estréia. Jornal O Imparcial. Araraquara.
Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 14.07.1956.
KOOJAH, Mara. Em fins de agosto, novos espetáculos do TECA. Jornal O
Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 22.07.1956.
KOOJAH, Mara. Uma explicação. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A C
Silva, redator chefe. Edição de 27.07.1956.
271
KOOJAH, Mara. Aproxima-se o grande dia. Jornal O Imparcial. Araraquara.
Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 09.08.1956.
KOOJAH, Mara. Está empolgando... Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A C
Silva, redator chefe. Edição de 11.08.1956.
O ASCENDENTE teatro araraquarense. Jornal O Imparcial. Araraquara. Pág.
15. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 22.08.1956.
KOOJAH, Mara. Um Drama na Malásia. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo
A C Silva, redator chefe. Edição de 25.08.1956.
KOOJAH, Mara. Aproxima-se o dia 31. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A
C Silva, redator chefe. Edição de 29.08.1956.
KOOJAH, Mara. Finalmente, amanhã o Teatro de Arena. Jornal O Imparcial.
Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 30.08.1956.
KOOJAH, Mara. Hoje, a estréia da série de espetáculos de arena. Jornal O
Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 31.08.1956.
BRANDÃO, Ignácio de Loyola. Estréia do TECA noite de gala. Jornal O
Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 02.09.1956.
Coluna Coisas da Cidade.
DAVID, Joffre R.. Impressões de um grande e belo espetáculo. Jornal O
Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 04.09.1956.
KOOJAH, Mara. Uma estréia auspiciosa. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo
A C Silva, redator chefe. Edição de 04.09.1956.
BRANDÃO, Ignácio de Loyola. Debutantes, TECA e mais dez tópicos. Jornal O
Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 05.09.1956.
272
KOOJAH, Mara. O Protocolo. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva,
redator chefe. Edição de 05.09.1956.
DIAS Jr., Th.. Terceira grande série do Teca. Jornal O Imparcial. Araraquara.
Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 05.09.1956.
HOJE a reapresentação dasérie. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A C
Silva, redator chefe. Matéria de capa. Edição de 11.09.1956.
KOOJAH, Mara. Soberba reapresentação. Jornal O Imparcial. Araraquara.
Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 13.09.1956.
KOOJAH, Mara. Outra valiosa opinião. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A
C Silva, redator chefe. Edição de 18.09.1956.
DAVID, Joffre R.. Espetáculos do TECA fonte perene de emoções. Jornal O
Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 26.09.1956.
KOOJAH, Mara. A noite da poesia e o T.E.C.A. Jornal O Imparcial. Araraquara.
Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 10.10.1956.
CASELLA, V. O.. I Festival de Poesia. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A
C Silva, redator chefe. Edição de 14.10.1956.
KOOJAH, Mara. Nada de positivo ainda. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo
A C Silva, redator chefe. Edição de 18.10.1956.
NANTES, J.C.. À margem do I Festival de Poesia de Araraquara. Jornal O
Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 26.10.1956.
KOOJAH, Mara. Parabéns, mocidade da Morada do Sol. Jornal O Imparcial.
Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 06.11.1956.
KOOJAH, Mara. O T.E.C.A. em S.Carlos. Jornal O Imparcial. Araraquara.
Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 29.11.1956.
273
KOOJAH, Mara. A capacidade interpretativa dos atores do TECA. Jornal O
Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 09.12.1956. .
KOOJAH, Mara. O T.E.C.A. brilhou em São Carlos. Jornal O Imparcial.
Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 14.12.1956.
KOOJAH, Mara. Vamos ao teatro. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A C
Silva, redator chefe. Edição de 25.12.1956.
1957
DIA 11 de maio a estréia. Coluna Teatro. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo
A C Silva, redator chefe. Edição de 15.04.1957.
O GOVERNO paulista e o interior. Coluna Teatro. Jornal O Imparcial.
Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 17.04.1957.
UMA carta honrosa. Coluna Teatro. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A C
Silva, redator chefe. Edição de 18.04.1957.
COMO pode sobreviver o teatro amador? Coluna Teatro. Jornal O Imparcial.
Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 20.04.1957.
OS DANOS que causa o uso do tabaco. Coluna Teatro. Jornal O Imparcial.
Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Pág. 7. Edição de 21.04.1957.
O PRÓXIMO espetáculo do TECA. Coluna Teatro. Jornal O Imparcial.
Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 23.04.1957.
SOBRE os Danos que traz o Tabaco. Coluna Teatro. Jornal O Imparcial.
Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 24.04.1957.
O MENINO de Moony o Chora. Coluna Teatro. Jornal O Imparcial.
Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 25.04.1957.
274
A ENTREVISTA de Julia Abrahão. Coluna Teatro. Jornal O Imparcial.
Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 26.04.1957.
OS DANOS que causa o tabaco. Coluna Teatro. Jornal O Imparcial.
Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 27.04.1957.
ATORES e atrizes de Amigos de Viagem”. Coluna Teatro. Jornal O Imparcial.
Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 28.04.1957.
ANTECIPADA a estréia. Coluna Teatro. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo
A C Silva, redator chefe. Edição de 01.05.1957.
ÚLTIMOS preparativos. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva,
redator chefe. Edição de 04.05.1957.
MARIA Christina Moura. Coluna Teatro. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo
A C Silva, redator chefe. Edição de 07.05.1957.
SEXTA-FEIRA a estréia. Coluna Teatro. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo
A C Silva, redator chefe. Edição de 08.05.1957.
AMIGOS de Viagem e Mario Barra. Coluna Teatro. Jornal O Imparcial.
Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 09.05.1957.
PRODUTOR Araken de Toledo Pires. Coluna Teatro. Jornal O Imparcial.
Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 10.05.1957.
TEATRO Experimental de Comédias de Araraquara. Anúncio. Jornal O
Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 10.05.1957.
ESTRÉIA auspiciosa do Teca. Coluna Teatro. Jornal O Imparcial. Araraquara.
Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 11.05.1957.
A GRANDE segunda noitada do Teca. Coluna Teatro. Jornal O Imparcial.
Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 13.05.1957.
275
SALINAS, Samuel Sérgio. A mocidade e o TECA. Jornal O Imparcial.
Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 14.05.1957.
PROSSEGUEM os espetáculos com geral agrado. Coluna Teatro. Jornal O
Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 14.05.1957.
LYGIA Fabiano, entrevistada. Coluna Teatro. Jornal O Imparcial. Araraquara.
Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 15.05.1957.
DESPEDE-SE o T.E.C.A. hoje. Coluna Teatro. Jornal O Imparcial. Araraquara.
Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 16.05.1957.
CESAR, Aldo. Hoje melhor que Ontem. Coluna Aconteceu... no “Society”. Jornal
O Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 16.05.1957.
UM ESTÍMULO dos mais honrosos. Coluna Teatro. Jornal O Imparcial.
Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 17.05.1957.
NÃO FOI encerrada a temporada do TECA. Coluna Teatro. Jornal O Imparcial.
Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 18.05.1957.
PASCHOAL Carlos Magno na cidade. Coluna Teatro. Jornal O Imparcial.
Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 21.05.1957.
O TECA no Rio de Janeiro. Coluna Teatro. Jornal O Imparcial. Araraquara.
Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 22.05.1957.
CESAR, Aldo. Especial em todos os sentidos. Coluna Aconteceu... no “Society”.
Teatro. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição
de 23.05.1957.
GRANDES atividades de Wallace Leal. Coluna Teatro. Jornal O Imparcial.
Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 23.05.1957.
276
MAGNO, Paschoal Carlos. Teatro Experimental de Comédia de Araraquara.
Jornal Correio da Manhã. Rio de Janeiro. Edição de 25.05.1957.
UM MÊS e meio para os preparativos. Coluna Teatro. Jornal O Imparcial.
Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 24.05.1957.
O MENINO de Moony não Chora e a crítica. Coluna Teatro. Jornal O Imparcial.
Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 26.05.1957.
O CONJUNTO do Grêmio Estudantil da E.I.A. Coluna Teatro. Jornal O
Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 29.05.1957.
NÃO LEVARÁ outras peças o TECA. Coluna Teatro. Jornal O Imparcial.
Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 30.05.1957.
UM FESTIVAL de comédias. Coluna Teatro. Jornal O Imparcial. Araraquara.
Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 01.06.1957.
UMA ENTREVISTA que se fazia necessária. Coluna Teatro. Jornal O
Imparcial. Entrevista com Wallace Leal V. Rodrigues. Araraquara. Paulo A C
Silva, redator chefe. Edição de 02.06.1957.
O TEATRO Experimental volta à cena. Coluna Teatro. Jornal O Imparcial.
Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 08.06.1957.
PASCHOAL Carlos Magno fala do TECA no Rio de Janeiro. Coluna Teatro.
Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de
09.06.1957.
PASCHOAL Carlos Magno e o TECA. Coluna Teatro. Jornal O Imparcial.
Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 11.06.1957.
O TEATRO juvenil e as férias escolares. Coluna Teatro. Jornal O Imparcial.
Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 13.06.1957.
277
O CANGACEIRO. Coluna Teatro. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A C
Silva, redator chefe. Edição de 16.06.1957.
DEVERÁ chamar-se Caatinga e não O Cangaceiro. Coluna Teatro. Jornal O
Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 19.06.1957.
O TEATRO e a imprensa campineira. Coluna Teatro. Jornal O Imparcial.
Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 27.06.1957.
AS PEÇAS para a temporada no Rio de Janeiro. Coluna Teatro. Jornal O
Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 30.06.1957.
ATIVAM-SE os preparativos para a viagem. Coluna Teatro. Jornal O Imparcial.
Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 03.07.1957.
O TEATRO juvenil de Araraquara e sua estréia. Coluna Teatro. Jornal O
Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 04.07.1957.
RETORNARAM do Rio os diretores do TECA. Coluna Teatro. Jornal O
Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 06.07.1957.
OS JOGRAIS no interior do Estado. Coluna Teatro. Jornal O Imparcial.
Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 07.07.1957.
ATIVAM-SE os ensaios das peças. Coluna Teatro. Jornal O Imparcial.
Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 13.07.1957.
NANTES, J.C.. O nosso Teatro Municipal. Jornal O Imparcial. Araraquara.
Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 13.07.1957.
QUANDO os próximos espetáculos do TECA? Coluna Teatro. Jornal O
Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 18.07.1957.
ADMIRÁVEIS peças serão estreadas no Rio. Coluna Teatro. Jornal O
Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 21.07.1957.
278
APROXIMA-SE o dia da partida. Coluna Teatro. Jornal O Imparcial.
Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 24.07.1957.
O TEATRO e os poderes blicos. Coluna Teatro. Jornal O Imparcial.
Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 25.07.1957.
TENNESSEE Williams e o blico carioca. Coluna Teatro. Jornal O Imparcial.
Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 27.07.1957.
OS QUE cooperam com a temporada do TECA. Coluna Teatro. Jornal O
Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 28.07.1957.
DEVERÁ seguir sexta-feira o TECA. Coluna Teatro. Jornal O Imparcial.
Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 31.07.1957.
A CRÍTICA carioca. Coluna Teatro. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A C
Silva, redator chefe. Edição de 01.08.1957.
SANTOS, Almeida. A temporada do T.E.C.A. no Rio (Correspond. de Almeida
Santos). Coluna Teatro. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva,
redator chefe. Edição de 11.08.1957.
SANTOS, Almeida. A temporada do T.E.C.A. no Rio (correspond. de Almeida
Santos). Coluna Teatro. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva,
redator chefe. Edição de 14.08.1957.
GENTILEZAS do Centro Acadêmico Cândido de Oliveira. Coluna Teatro. Jornal
O Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 18.08.1957.
SANTOS, Almeida. EM busca de novas peças (correspond. de Almeida
Santos). Coluna Teatro. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva,
redator chefe. Edição de 22.08.1957.
279
NOVOS horizontes, novas responsabilidades. Coluna Teatro. Jornal O
Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 25.08.1957.
A REAPRESENTAÇÃO do TECA. Coluna Teatro. Jornal O Imparcial.
Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 28.08.1957.
DEPOIS da estréia. Coluna Teatro. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A C
Silva, redator chefe. Edição de 29.08.1957.
A PRESENÇA do TECA no Rio. Coluna Teatro. Jornal O Imparcial.
Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 30.08.1957.
OS QUE estiveram ao lado do TECA. Coluna Teatro. Jornal O Imparcial.
Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 31.08.1957.
BARBIERI, o amigo dos araraquarenses no Rio. Coluna Teatro. Jornal O
Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 01.09.1957.
ESTRÉIA dia 4 amanhã com a 5ª série, o TECA. Coluna Teatro. Jornal O
Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 03.09.1957.
AMANHÃ o T.E.C.A. apresentará sua quinta série. Coluna Teatro. Jornal O
Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 05.09.1957.
COM três peças o TECA volta hoje ao Municipal. Coluna Teatro. Jornal O
Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 06.09.1957.
ESTREIOU auspiciosamente, ontem, o TECA. Coluna Teatro. Jornal O
Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 07.09.1957.
ENTRE todas, destacou-se a farsa de Tchecov. Coluna Teatro. Jornal O
Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 10.09.1957.
CONTINUAM os espetáculos da série. Coluna Teatro. Jornal O Imparcial.
Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 12.09.1957.
280
NETTO, A. Accioly. Teatro no Rio. Coluna Teatro. Revista O Cruzeiro. Rio de
Janeiro. David Nasser, redator principal. Pág. 115. Edição de 14.09.1957.
TEATRO no Rio de Janeiro. Coluna Teatro. Jornal O Imparcial. Araraquara.
Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 15.09.1957.
SHOW Prata da Casa”. Coluna Teatro. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo
A C Silva, redator chefe. Edição de 20.09.1957.
CONVIDADO o TECA a se apresentar em São Paulo. Coluna Teatro. Jornal O
Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 22.09.1957.
1958
QUEIROZ, Geraldo. De Cervantes a Priestley, amadores fazem teatro. Revista
Esso. Páginas 22 e 23 com fotos. Rio de Janeiro. Edição n° 1. 1958.
PASCHOAL Carlos Magno esteve em São Paulo. Jornal O Imparcial.
Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 09.01.1958.
SEGUE hoje o Teatro Experimental de Comedia. Jornal O Imparcial.
Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 05.03.1958.
O TECA em Poços de Caldas. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva,
redator chefe. Edição de 08.03.1958.
SANTOS, Almeida. Retorna hoje o TECA. Jornal O Imparcial. Araraquara.
Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 09.03.1958.
SANTOS, Almeida. Espetacular sucesso do TECA em Poços de Caldas. Jornal
O Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 13.03.1958.
SANTOS, Almeida. Constróe-se um teatro em Araraquara. Jornal O Imparcial.
Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 25.03.1958.
281
O T.E.C.A. no Festival de Teatro do Recife. Jornal O Imparcial. Araraquara.
Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 25.04.1958.
SANTOS, Almeida. O TECA no Festival do Teatro Municipal. Jornal O
Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 11.05.1958.
O TECA reformará seu valioso guarda-roupa. Jornal O Imparcial. Araraquara.
Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 10.06.1958.
CINEMA de Araraquara para o Brasil. Entrevista com Wallace Leal V.
Rodrigues. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe.
Edição de 14.06.1958.
“SANTO Antonio e a Vaca” Poema de ingenuidade e ternura. Jornal O
Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 18.06.1958.
RODRIGUES, Wallace Leal V.. Autor novo, novo autor. Jornal O Imparcial.
Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 20.11.1958.
1959
O FILME araraquarense examinado no Museu de Arte Moderna de São
Paulo. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição
de 05.05.1959.
O TECA brilhou em Santos: quatro premiações para Araraquara. Jornal O
Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 28.07.1959.
A., E.. Depois de amanhã, no Municipal, o TECA. Coluna Vamos ao Teatro.
Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de
02.08.1959.
A., E.. Hoje, a estréia do TECA. Coluna Vamos ao Teatro. Jornal O Imparcial.
Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 04.08.1959.
282
LACÔRTE, Toribio César. TECA. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A C
Silva, redator chefe. Edição de 04.08.1959.
hoje estréia o TECA. Coluna Vamos ao Teatro. Jornal O Imparcial.
Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 05.08.1959.
A., E.. Hoje, o segundo espetáculo do TECA. Coluna Vamos ao Teatro. Jornal
O Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 06.08.1959.
LACÔRTE, Toribio sar. Vamos ao teatro. Coluna Estudantil. Jornal O
Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 07.08.1959.
A., E.. Hoje, mais um grande espetáculo do TECA na Arena do Teatro
Municipal. Coluna Vamos ao Teatro. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A C
Silva, redator chefe. Edição de 07.08.1959.
A., E.. Hoje a última apresentação. Coluna Vamos ao Teatro. Jornal O
Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 11.08.1959.
1960
ALGUMAS cenas do filme. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva,
redator chefe. Edição de 22.05.1960.
RODRIGUES, Wallace Leal V.. Porque Santo Antonio e a Vaca? Jornal O
Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 24.05.1960.
BLENGINI, Roberto. Santo Antonio e a Vaca: realização araraquarense. Jornal
O Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 25.05.1960.
PINTO FILHO, Antonio Pedroso. Louvas ao TECA e Arabela Filmes. Jornal O
Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 26.05.1960.
283
SILVA, Amendola da. Autêntico acontecimento histórico-artístico-social a
“avant-premiére” de Santo Antonio e a Vaca. Jornal O Imparcial. Araraquara.
Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 27.05.1960.
SILVA, Amendola da. Assistimos a uma das mais belas festas. Jornal O
Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Fotos de Lucio A.C.
Silva e Geraldo Cesarino. Edição de 29.05.1960.
TAVARES, Naylor Dias. Teatro e cinema. Jornal O Imparcial. Araraquara.
Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 12.06.1960.
SANTO Antonio e a Vaca. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva,
redator chefe. Edição de 16.06.1960.
OLIVEIRA, Jayme. Ainda, o filmSanto Antonio e a Vaca”. À margem do
sucesso de um bom film. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva,
redator chefe. Edição de 26.06.1960.
CENSURADO Santo Antonio e a Vaca. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo
A C Silva, redator chefe. Edição de 09.07.1960.
A REFORMA do teatro. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva,
redator chefe. Edição de 05.08.1960.
1961
“SANTO Antonio e a Vaca” será exibido no próximo sábado, em Matão. Jornal
O Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 08.02.1961.
HOMENAGEIA o Prof. Lisanias de Oliveira Campos o próximo espetáculo do
TECA. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição
de 03.05.1961.
284
PASCHOAL Carlos Magno na estréia de Ratos e Homens. Jornal O Imparcial.
Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 07.05.1961.
WALLACE Leal em nova arremetida teatral. Jornal O Imparcial. Araraquara.
Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 14.05.1961.
“RATOS e Homens”; uma séria experiência para o teatro araraquarense. Jornal
O Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 19.05.1961.
RATOS e Homens no dia 30 terça-feira. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo
A C Silva, redator chefe. Edição de 28.05.1961.
ESTRÉIA hoje o TECA com “Ratos e Homens”. Jornal O Imparcial. Araraquara.
Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 30.05.1961.
RATOS e Homens; uma grande estréia para um grande trabalho. Jornal O
Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 01.06.1961.
M., O.S.. WALLACE, o arrojado. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A C
Silva, redator chefe. Edição de 03.06.1961.
1962
SEGUIU hoje rumo ao Sul do País o conjunto do TECA. Jornal O Imparcial.
Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 09.01.1962.
CUMPRIDA a etapa da viagem: S.Paulo a Curitiba. Jornal O Imparcial.
Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 20.01.1962.
1964
UM TEATRO a ser restaurado ou Araraquara - o nosso velho Municipal. Jornal
O Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 22.08.1964.
Editorial.
285
1974
TEATRO em Araraquara. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva,
redator chefe. Edição comemorativa do aniversário da cidade, Páginas 99-101.
Edição de 22.08.1974.
1988
BRANDÃO, Ignácio de Loyola. Quem foi Wallace Leal Rodrigues? Jornal O
Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 14.09.1988.
FAMÍLIA de Wallace prepara lançamento de livro póstumo. Jornal O Imparcial.
Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 20.12.1988.
SILVA, Paulo A. C.. Reminiscências. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A C
Silva, redator chefe. Edição de 1988.
1989
BRANDÃO, Ignácio de Loyola. Loyola retrata Wallace em três artigos. Jornal O
Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva, redator chefe. Edição de 18.05.1989.
1996
BRANDÃO, Ignácio de Loyola. Continuemos a aplaudir o Barra: um
personagem de nossa cidade. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva,
redator chefe. Edição de 15.12.1996.
1999
BRANDÃO, Ignácio de Loyola. A fotomemória de minha cidade. Jornal O
Estado de S.Paulo. Caderno 2. São Paulo. Edição de 19.09.1999, p. C-2.
286
2002
COSTA, Luiz Flavio de Carvalho. Uma cidade no tempo. Jornal Tribuna
Impressa. Araraquara. Pag.1-8. Edição de 2002.
2007
MOSTRA Wallace Leal Valentim Rodrigues homenageia um dos maiores
nomes do teatro. Jornal O Imparcial. Araraquara. Paulo A C Silva, redator
chefe. Edição de 26.10.2007.
2008
OLIVEIRA, Regina. Férias no Arraial tem exibição histórica. Jornal Tribuna
Impressa. Araraquara. Editor-chefe: José Eduardo de Carvalho. Edição de
02.07.2008.
BRANDÃO, Ignácio de Loyola. Wallace na cultura da cidade. Jornal Tribuna
Impressa. Araraquara. Editor-chefe: José Eduardo de Carvalho. Edição de
27.07.2008.
Entrevistas
Com integrantes do TECA:
Lygia Fabiano, em 04/08 e 18/08/07, Araraquara.
Ruth Magali Miranda e Lygia Fabiano, em 18/08/07, Araraquara (Ruth Magali
Miranda veio a falecer em 28/10/08).
Cinira Rodrigues Leal, 08/09/07, Araraquara.
Sebastião Campos, em 29/09/07, Santos
Idiméa Zuchini, em 02/11/07, Araraquara.
Péricles Medina, em 03/11/07, Araraquara.
Fanny Carati, em 27/11/07, São Paulo.
287
Maria Cleide Valentim, em 09/08/08, São Paulo.
Julia Abrahão e Maria Aparecida Assis, em 16/08/08, em Itanhaém.
Américo Aguiar Borges e Cinira Rodrigues Leal, em 20/09/08, em Araraquara.
Maria Aparecida Assis, em 18/10/08, em Santos.
Américo Aguiar Borges e José Claudio Borges (por telefone), em 01/11/08, em
Araraquara.
Maria Cristina Moura, em 15/11/08, em Santa Lúcia.
Gerson Ferreira, em 16/11/08, em Araraquara.
E ainda com:
Dora Galvão Medina, em 04 e 05/08/07, em Araraquara.
Ernesto Lia, em 13/10/07, em Araraquara.
José Renato Pécora, em 10/06/08, em São Paulo.
Anna Maria Martinez Corrêa, em 14/10/08, em São Paulo.
Deborah Medina Lepre e Maria Ninira Medina Lepre Iglésias, em 01/11/08, em
Araraquara.
288
Imagem
76
:
f
lâmula do TECA. Acervo: Lygia
Fabiano.
289
APÊNDICE I. CRONOLOGIA
1955
Mês Histórico Obras apresentadas Local
O Homem da Flor na Boca
O Caso das Petúnias Esmagadas
Junho
Dias 23, 24, 26 e 27.
Total: 4 espetáculos.
Como Ele Mentiu ao Marido Dela
Teatro
Municipal de
Araraquara
O Homem da Flor na Boca
O Caso das Petúnias Esmagadas
Outubro
Dias 29 e 30.
Total: 2 espetáculos.
Como Ele Mentiu ao Marido Dela
Catanduva
Tenis Clube
Novem-
bro
Dias 11, 13, 14 e 15.
Total: 4 espetáculos.
Uma Mulher do Outro Mundo
Teatro
Municipal de
Araraquara
290
1956
Mês Histórico Obras apresentadas Local
A Mão do Macaco
Um Pedido de Casamento
Maio
Dias 24, 25, 26, 27,
28 e 29.
Total: 6 espetáculos.
Se os Homens Jogassem Cartas como as
Mulheres
Teatro
Municipal.
Araraquara
Um Drama na Malásia
O Protocolo
Agosto/
Setem-
bro
Dias 31 de agosto, 1,
2, 4, 5, 6, 7, 8 e 9 de
setembro.
Total: 10 espetáculos.
Os Dois Faladores
Teatro
Municipal.
Araraquara
A Mão do Macaco
Um Pedido de Casamento
Setem-
bro
Dias 11 e 12.
Total: 2 espetáculos.
Se os Homens Jogassem Cartas como as
Mulheres
Teatro
Municipal.
Araraquara
A Mão do Macaco
Um Pedido de Casamento
Dezem-
bro
Dia 9.
Total: 1 espetáculo.
Se os Homens Jogassem Cartas como as
Mulheres
Instituto
Cultural Ítalo-
Brasileiro.
São Carlos
Um Drama na Malásia
O Protocolo
Dezem-
bro
Dia 10.
Total: 1 espetáculo.
Os Dois Faladores
Instituto
Cultural Ítalo-
Brasileiro.
São Carlos
291
1957
Mês Histórico Obras apresentadas Local
O Menino de Moony não Chora
Sobre os Danos que traz o Tabaco
Dias 10, 11, 12, 14,
15, 16 e 18.
Total: 7 espetáculos.
Amigos de Viagem
Teatro
Municipal.
Araraquara
O Menino de Moony não Chora
Sobre os Danos que traz o Tabaco
Maio
Dia 20.
Total: 1 espetáculo.
Amigos de Viagem
Clube
Araraqua-
rense.
Araraquara
O Menino de Moony não Chora
Sobre os Danos que traz o Tabaco
Junho
Dia 9.
Total: 1 espetáculo.
Amigos de Viagem
Resincia
do Dr. Helio
Morganti.
Araraquara
Dia 14.
Total: 1 espetáculo.
Sobre os Danos que traz o Tabaco
Gravação no
estúdio da
TV Rio. Rio
de Janeiro
Xeque-Mate
Amigos de Viagem
Dia 15.
Total: 1 espetáculo.
Os Dois Faladores
Hotel Glória.
Rio de
Janeiro
A Mão do Macaco
Se os Homens Jogassem Cartas como as
Mulheres
Dia 16.
Total: 1 espetáculo.
Amigos de Viagem
Hotel Glória.
Rio de
Janeiro
Agosto
Dia 17.
O Menino de Moony não Chora
Hotel Glória.
292
O Protocolo
Total: 1 espetáculo.
Um Pedido de Casamento
Rio de
Janeiro
Xeque-Mate
Ressonâncias
Dias 6, 7, 8, 9, 10 e
11.
Total: 6 espetáculos.
O Urso
Teatro
Municipal.
Araraquara
Um Drama na Malásia
O Protocolo
Dias 12, 13 e 14.
Total: 3 espetáculos.
Os Dois Faladores
Teatro
Municipal.
Araraquara
O Menino de Moony não Chora
Sobre os Danos que traz o Tabaco
Dias 15 e 16,
Total: 2 espetáculos.
Amigos de Viagem
Teatro
Municipal.
Araraquara
Setem-
bro
Dia 18.
Total: 1 espetáculo.
Um Pedido de Casamento
Show Prata
da Casa.
Teatro
Municipal.
Araraquara
A Mão do Macaco
O Urso
Dia 5.
Total: 1 espetáculo.
Amigos de Viagem
Clube
Imperial.
Taquaritinga
Um Pedido de Casamento
Se os Homens Jogassem Cartas como as
Mulheres
Outubro
Dia 6.
Total: 1 espetáculo.
Os Dois Faladores
Clube
Imperial.
Taquaritinga
293
1958
Mês Histórico Obras apresentadas Local
O Urso
Amigos de Viagem
Março
Dia 7.
Total: 1 espetáculo.
Os Dois Faladores
Salão Nobre
do Palace
Cassino.
Grande Hotel.
Poços de
Caldas
1959
Mês Histórico Obras apresentadas Local
Enganado, Espancado e Satisfeito
A Cova de Salamanca
Julho
Dia 26, data
provável.
Total: 1 espetáculo.
Como Ele Mentiu ao Marido Dela
II Festival
Nacional de
Teatro de
Estudantes.
Grill do Hotel
Atlântico.
Santos
Enganado, Espancado e Satisfeito
A Cova de Salamanca
Agosto
Dia 5, 6, 7, 8, 9, 10 e
11.
Total: 7 espetáculos.
Como Ele Mentiu ao Marido Dela
Teatro
Municipal.
Araraquara
1960
Mês Histórico Obras apresentadas Local
Maio Dia 27.
Santo Antonio e a Vaca
Avant-
première do
filme. Cine
Odeon.
Araraquara
294
1961
Mês Histórico Obras apresentadas Local
Maio/
Junho
Dias 30 e 31 de
maio, 1, 2, 3, 4, 5, 6
e 7 de junho.
Total: 9
espetáculos.
De Ratos e Homens
Teatro
Municipal.
Araraquara
Setembro
Estréia provável: dia
15.
À Margem da Vida
Teatro
Municipal.
Araraquara
Outubro
Estréia provável: dia
12.
Pluft, o Fantasminha
Teatro
Municipal.
Araraquara
1962
Mês Histórico Obras apresentadas Local
Dia 14, data provável.
Total: 1 espetáculo.
Pluft, o Fantasminha
IV Festival
Nacional de
Teatro de
Estudantes.
Ao ar livre.
Porto Alegre
Janeiro
Dia 16, data provável.
Total: 1 espetáculo.
À Margem da Vida
IV Festival
Nacional de
Teatro de
Estudantes.
Theatro São
Pedro. Porto
Alegre
295
ANEXO I. PROGRAMAS
1955
Imagem
77
: Programa
de junho de 1955,
primeiro programa do
TECA. Desenho de
Helena Almeida. Capa e
contracapa acima.
Páginas 2 e 3 ao lado.
Acervo: Fanny Carati.
296
Imagem
78
: Programa de
j
unho de 1955, primeiro
programa do TECA.
Páginas 4 e 5 acima.
Páginas 6 e 7 ao lado.
Acervo: Fanny Carati.
297
Imagem
79
: Programa de
junho de 1955, primeiro
programa do TECA.
Páginas 8 e 9 acima.
Páginas 10 e 11 ao lado.
Acervo: Fanny Carati.
298
Imagem
80
: Programa de
junho de 1955, primeiro
programa do TECA.
Páginas 12 e 13 acima.
Páginas 14 e 15 ao lado.
Acervo: Fanny Carati.
299
Imagem
81
: Programa de
junho de 1955, primeiro
programa do TECA.
Páginas 16 e 17 acima.
Páginas 18 e 19 ao lado.
Acervo: Fanny Carati.
300
Imagem
82
:
Programa de
novembro de 1955.
Capa e contracapa
acima. Páginas
centrais ao lado.
Acervo: Fanny
Carati.
301
1956
Imagem
83
: Programa de junho de 1956. Frente. Acervo: Lygia Fabiano.
302
Imagem
84
: Programa de junho de 1956. Verso. Acervo: Lygia Fabiano
.
303
1957
Imagem
85
:
Programa de maio
de 1957. Acervo:
Lygia Fabiano.
304
Imagem
86
:
Programa de maio
de 1957. Acervo:
Lygia Fabiano.
305
Imagem
87
:
Programa de maio
de 1957. Acervo:
Lygia Fabiano.
306
Imagem
88
: Programa do dia
9 de junho de 1957. Acervo:
Lygia Fabiano.
307
Imagem
89
: Programa institucional de 1957. Fot
os e orientação gráfica:
Toni
R.
Martinez. Acervo: Lygia
Fabiano.
308
Imagem
90
: Programa institucional de 1957. Fotos e orientação gfica:
Toni
R.
Martinez.
Acervo: Lygia Fabiano.
309
Imagem
91
: Programa institucional de 1957. Fotos e orientação gf
ica:
Toni
R.
Martinez.
Acervo: Lygia Fabiano.
310
Imagem
92
: Programa institucional de 1957. Fotos e orientação gfica:
Toni
R.
Martinez. Acervo:
Lygia Fabiano.
311
1959
Imagem
93
:
Programa de agosto de 1959. Acerv
o: Maria Cleide Valentim.
312
Imagem
94
:
Programa de agosto de 1959. Acervo: Maria Cleide Valentim.
313
1960
Imagem
95
:
Program
a da
avant
-
première
de
Santo Antonio e a Vaca.
27 de maio de 1960. Acervo: Lygia
Fabiano
314
Imagem
96
:
Programa da
avant
-
première
de
Santo Antonio e a Vaca.
27 de maio de 1960. Acervo: Lygia
Fabiano
315
1961
Imagem
97
:
Programa de setembro d
e 1961.Acervo: Maria Aparecida Assis.
316
Imagem
98
: Programa de setembro de 1961.Acervo: Maria Aparecida Assis.
317
Imagem
99
: Programa de outubro de 1961. Acervo: Cinira Rodrigues Leal.
318
Imagem
100
: Programa de outubro de 1961. Acervo: Cinira Rodrigues Lea
l.
319
ANEXO II. ARTIGOS ESPECIAIS
Filmando em Araraquara
Ignácio de Loyola Brandão
algumas semanas, a convite da equipe de cinema local, fui assistir às
provas dos dois primeiros copiões de um documentário que está sendo realizado
nesta cidade. Vi e gostei. Aqueles dois copiões constituíram para mim uma
verdadeira surpresa, pois nada os diferenciava de outros que tive oportunidade de
ver nos estúdios paulistas. Aqueles dois rolos de filme brutos, sem som e sem
cortes, mais pareciam um trabalho de profissionais que de amadores fazendo
primeiras tentativas no campo da cinematografia. Havia coisas boas e coisas ruins
que deveriam ser rodadas novamente. As cenas boas, contudo, estavam
impecáveis. Lembro-me bem de uma que mostrava um homem batendo em um
pequeno riacho. As margens eram belas, cobertas de uma vegetação rasteira, o
rio cintilava sob o sol e, no meio das águas, estava o personagem, parcialmente
coberto de sombras, em admirável contraste com o ambiente cheio de luz que o
cercava. Indubitavelmente aquilo era uma obra de ótimos iluminadores. Naquele
pequeno pedaço de fita havia bastante de bom cinema. Havia ali um conjunto de
valores estéticos tão bem manipulados que me impressionaram sobremaneira.
Ante minha admiração e surpresa, os rapazes me convidaram para assistir a uma
das filmagens. Não me fiz de rogado.
No domingo, 2 de agosto, fui para o local das filmagens em um pequeno
furgão que carrega o material da equipe. Os exteriores do filme, ao contrário do
que muitos pensam, não estão sendo rodados em um local. A equipe ainda é
pequena, poucas são as suas possibilidades. Assim, é que as filmagens são feitas
em diferentes lugares. Houve uma seqüência que foi filmada em seis locais
diversos. Lembrei-me dos novos diretores italianos de tendência neo-realistas.
320
Mas, voltemos ao assunto. Aquele dia deveriam ser rodadas as cenas da chegada
de novos colonos nesta terra. As filmagens seriam realizadas em um local que
reproduzia perfeitamente a topografia de Araraquara. Assim que chegamos cada
qual tomou o seu posto e preparou-se para o cumprimento de suas funções. Ali
não havia camarins e nem outras comodidades típicas. Os atores já vinham dentro
das indumentárias características e a maquiagem era feita sob as árvores.
Dentro de meia hora tudo estava pronto para rodar. A um canto, o diretor
(Wallace) dava as últimas instruções a Lucilio Leite (que é também um dos
fotógrafos) e a Sebasto de Campos que deveriam contracenar, mais atrás o
diretor assistente (Loiola) preparava a claquette, enquanto o outro fografo
(Rivas) preparava as objetivas para a rodagem da cena. Agora tudo está em
ordem. O diretor o “Atenção”. Ouve-se o bater da claquette: Seqüência 5
Tomada 56 Prova 1”. A câmera para um minuto. Entram os atores e logo vem
outra ordem: “Câmera”, e em seguida um Ação”. A cena começou. Todos estão
em silêncio. Os atores dialogam entre si, diálogos estes que não serão ouvidos no
filme por se tratar de um documentário. Alguns gestos são esboçados sob o olhar
atento do diretor. Súbito ouve-se um “Corte”. A cena deve ser repetida novamente.
E tudo recomeça até que o diretor ache que a cena está boa. Enquanto nova cena
é preparada chego perto do Wallace, disposto a fazer-lhe algumas perguntas.
Deixando os ensaios e os preparativos por conta do Loiola, ele vem gentilmente
atender-me. O tempo de filmagem”, respondeu-me ele, “não poderei dizer-te ao
certo. Explicarei porque. As nossas condições de trabalho são as seguintes:
somente aos domingos e quando faz bom tempo. Isto em virtude da maioria dos
membros que compõem a equipe trabalharem durante a semana e de precisarmos
aproveitar os dias bons, pois o nosso material técnico é ainda escasso, de modo
que nós, não possuindo geradores, necessitamos da luz solar. Quanto ao
lançamento do filme tamm não poderei responder-te acertadamente. Tudo está
em função do tempo das filmagens. Assim que acabarmos de rodar todas as
seqüências, seguiremos para São Paulo, onde seo realizados os trabalhos de
321
laboratório, ou seja, a passagem do filme positivo para o filme virgem, para facilitar
a tirada de cópias e a sonorização.”
Vocês mesmos dirigirão os trabalhos dos laboratórios? pergunto. “Não,
acompanharemos o filme apenas para supervisionar os trabalhos; quanto à
sonorização pensamos em pedir a colaboração do Sr. Marcondes Machado, um
dos técnicos de som da Rádio Cultura.” E quanto ao tempo de projeção? “A minha
resposta vai surpreender muita gente. O filme deverá ter uns dez ou doze minutos
de projeção e não uma hora e tanto como muitos estão esperando.” Vocês estão
tendo dificuldades ou tem tido a colaboração irrestrita do povo? “Por enquanto
ainda não encontramos muitas dificuldades, os obstáculos que têm aparecido
foram resolvidos satisfatoriamente; o povo, como você deve saber, é um caso
difícil. Recebemos auxílio de diversos araraquarenses de boa vontade, todavia, no
geral, todos têm se mostrado um tanto indiferentes no tocante à colaboração
material.E o que você me diz a respeito do material técnico e dos componentes
da equipe? “Um problema de difícil solução para nós foi justamente esse, o do
material técnico. A câmera foi cedida pelo Rivas Autulo, os spot-lights foram todos
improvisados da melhor maneira possível, o mais interessante foi a grua
construída pelo Lucilio Leite inteiramente com canos de ferro. Era esta grua que
nos faltava para os movimentos de mera. O resto foi tudo feito, de acordo com
as possibilidades dos membros da equipe – cada qual ajudou um pouco – e desta
maneira conseguimos arranjar o material necessário. Devo dizer que estou
bastante satisfeito com os elementos da equipe. Todos m se mostrado
disciplinados e obedientes às ordens que tenho dado. É verdade que ás vezes
um pouco de displicência por parte de um ou outro elemento que eu, então,
“chamo a ordem”. Mas isto são coisas que acontecem.”
Neste momento Wallace foi chamado para dirigir a cena. Acho que
conversamos demais, tendo eu tomado um pouco do seu tempo. O diretor toma
sua posição na cadeira. O assistente com o roteiro na mão confabula com os
fotógrafos, o diretor entra no meio e umas sugestões; inicia-se uma pequena
322
discussão. Tudo se resolve pacificamente, como era de se esperar, e a cena
começa a ser rodada. Os trabalhos de filmagem são em média de 7 horas por dia,
3 horas pela manhã e 4 de tarde. Os trabalhos de hoje estão encerrados. O
material é arrumado e disposto sobre o furgão. Voltamos para a cidade depois de
uma tarde bastante interessante em que tive oportunidade de ver uma equipe
amadora trabalhar.
Artigo publicado no jornal O Imparcial, Araraquara, 22/08/53, pág.9 e 10.
323
Teatro Experimental de Comédia de Araraquara
Paschoal Carlos Magno
Araraquara tamm tem o seu Teatro Experimental de Comédia”. Tem,
sim. Com dois anos de vida somente. Em tempo tão curto representou peças
em arena: Pirandello, Tennessee Williams, Shaw, Jacobs, Tchekov, Kauffman,
Machado de Assis, Somerset Maugham, Cervantes.
Todos os seus artistas, diretores, caracterizadores, figurinistas,
maquinistas, eletricistas, o estudantes, operários, professores, empregados no
comércio, bancários, industriais, radialistas.
Encontrava-me em S.Carlos, quando me falaram a respeito desse grupo
teatral. Vai gente dos lugarejos vizinhos, das cidades próximas, de trem,
automóvel, ônibus, ver, sentir e aplaudir seus intérpretes, cujo comportamento
cênico é de profissionais de mérito.
Também fui. Que eu não ia perder a oportunidade de verificar se era
verdade o que me dissera um moço em Bauru: “Todas as estradas de S.Paulo
conduzem a Araraquara, onde se faz muito bom teatro”.
Por isso, segunda-feira última, assisti a um de seus programas, composto
das seguintes pas em um ato: “O Menino de Moony não Chora, de Tennessee
Williams, “Sobre os Danos que traz o Tabaco”, de Tchecow e Amigos de
Viagem”, de Noël Coward.
Houve defeitos de interpretação? Muitos. De impostação de voz? Tamm.
Gestos? Sim. Mas a srta. Ruth Magali Miranda e o sr. Gumer Júnior, dois
principiantes, aumentaram o interesse do ato angustiado de Tennessee Williams.
Quando o segundo souber melhor usar a voz que Deus lhe deu e a primeira
aprender a não mutilar seus movimentos, tornando-se mais espontânea, poderão
perfeitamente competir com o sr. Mario Barra, que viveu de maneira soberba,
digna, como um artista completo, em “Sobre os Danos que traz o Tabaco”.
324
Em “Amigos de Viagem”, tanto as srtas. Izabel Reina, Julia Abrahão, Lygia
Fabiano, Maria Cristina Moura, como os srs. Tito Peixoto, Moacyr Marchese,
Oscar Rodrigues, Gerson Ferreira, Benjamin Soares Azevedo exibiram maior
liberdade de interpretação. Cada um de seus tipos foi marcado de maneira
objetiva. Percebe-se no todo e nas minúcias a influência cinematográfica da
interpretação mecânica. O espectador menos atento condenará certa mímica, que
nada mais é que reminiscência do cinema mudo.
Mas a mão que amoldou todos esses temperamentos; a sensibilidade que
unificou todos os elementos que tornaram digno de encômios o espetáculo a que
assisti, chama-se Wallace Leal V. Rodrigues. ouviram alguma vez falar nele?
Eu, nunca. Mas não esquecerei seu nome para sempre. Tem vinte e dois anos.
Magríssimo. Comprido. Com um ar de adolescente na cara e nos gestos. Trabalha
numa camisaria e só fez o curso ginasial. Tem uma biblioteca teatral no crânio.
Conhece tudo quanto se tem escrito ou feito em teatro, desde o como do
mundo. É um diretor capaz, como poucos neste país. Suas marcações são
inteligentes, de acordo com as situações, valorizando o texto de maneira
impressiva. E o “tempo” desses três atos, tão diferentes em substâncias, diálogo,
personagens, como foi habilmente procurado e encontrado, de criar um clima de
interesse sem nenhuma queda, do começo ao fim. nele um sentido de escolha
apuradíssimo, quer com referência ao repertório, quer nos cuidados especiais que
lhe merecem os figurinos, quase todos de sua autoria, como a música que
sublinha certas passagens da ação dramática.
Era tão bom que a platéia carioca participasse da alegria de conhecer esse
grupo que é dos melhores que possuímos, trabalhando heróica e dignamente no
interior de S.Paulo.
Artigo publicado no jornal Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 25/05/57.
325
Viva o T.E.C.A.!
João da Ega
O Teatro Experimental de Comédia de Araraquara que, sob os auspícios do
Teatro Duce e de Paschoal Carlos Magno, estreou na arena do Hotel Glória, é
dessas coisas que, entre os fenômenos perceptíveis no Brasil, deixa o espectador
cheio de esperança.
As realidades que tornaram esse conjunto digno dos mais sinceros
aplausos, fazem com que o T.E.C.A. esteja à altura de qualquer platéia civilizada
e, por isso mesmo, nós, cariocas, ficamos até com um pouco de vergonha por não
termos muitas outras equipes impregnadas do mesmo fervor e do mesmo amor
pela causa do teatro.
Na noite da apresentação a 15 de agosto, desde a apresentação de
Paschoal, seguida de algumas palavras da Sra. Olga Ferreira Campos até o final
das três peças a que assistimos, foi a platéia sentindo o quanto aquele grupo de
moços e moças, levava a sério a sua tarefa. De pronto, Mário Barra e Oscar
Rodrigues em Xeque-Mate de Kenneth S. Goodman exibem fartamente suas
qualidades, com a marca da pureza, da honestidade profissional e da mais hialina
categoria. Em suma: trabalho limpo e levado a sério. Dramalhão puxado à Sardou,
com ares de Tosca”, mas onde seus intérpretes o permitem qualquer idéia de
ridículo, e onde igualmente Mário Barra e Oscar Rodrigues demonstram uma
(apenas) de suas múltiplas facetas de arte cinzelada.
Seguiu-se Amigos de Viagem, de Coward, onde quer a direção em geral,
com a marcação em particular, atendem a uma perfeição de detalhes e recursos,
que servem para valorizar a despretensiosa peça. A reconstituição figurinista
de 1925, por si só, já é um pequeno poema de humorismo.
A atuação de Julia Abrahão, de Lygia Fabiano e de Maria Cristina Moura
no “cast” feminino-, e de Oscar Rodrigues e Gerson Ferreira no masculino
326
tiram do blico as mais gostosas gargalhadas, muitas vezes fora do texto, o que
vem comprovar a alta qualidade da direção a cargo todas elas do pequeno gênio
araraquarense que é Wallace Leal Rodrigues.
Toda esta gente de primeiríssima para terminar, apresentaram pela
primeira vez no Brasil Os Dois Faladores, um entremez de Miguel de Cervantes. A
peça foi tratada num misto de à Barraud e à Silvestre Sampaio: ballet e sátira.
confirma-se o valor de Mario Barra e revelam-se a voz e o talento de Moacir
Marchese.
As roupas, de um bom gosto extraordinário, atendem igualmente à fiel
reconstituição de época, pois nesta noite três foram as exibidas: 1915, 1925 e
1950.
O Rio de Janeiro, penhorado, agradece a Paschoal Carlos Magno essa
oportunidade que lhe deu em conhecer essa moçada bonita e inteligente de
Araraquara.. E quanto ao mais, viva o T.E.C.A.!
*
O Teatro de Araraquara
João de Ega
Contaram-me que andam dizendo por que o Teatro Experimental de
Comédia de Araraquara é um bom conjunto para Araraquara. por isso estou
voltando ao assunto, por estar descrendo da sinceridade de tal afirmação.
Outros dizem que se se considerar o T.E.C.A. como um grupo amador do
interior, que ele é realmente ótimo.
Essas coisas são de irritar pela pobreza de conteúdo existente, se é que
não há maldade ou má vontade, ou ainda falta de sensibilidade.
327
Em primeiro lugar é preciso esclarecer que Araraquara o é cidade de
roça nem centro que saiba a ranço de província distante da civilização, onde seja
inacessível a cultura das livrarias.
Araraquara é uma esplêndida e progressiva cidade, ao da capital
paulista, havendo horários para trens elétricos (sempre obedecidos) e ruas
arborizadas com ipês.
O comentário leviano que deve desconhecer geografia do Brasil, parece
não ignorar que Araraquara não fica no território do Rio Branco, como é centro
de inúmeras e riquíssimas fazendas de café, de frutas, de algodão e de muitas
outras riquezas e também berço de grandes e tradicionais família brazonadas.
Mas de qualquer maneira, o conjunto teatral do T.E.C.A. é bom em qualquer
cidade do Brasil, não apenas pelo fato de “representar direitinho ou de ter de lutar
com mais dificuldades que a gente das capitais. Não porque usar da
relatividade para ter de elogiar as altas qualidades do T.E.C.A.; mas se
entretanto – considerarmos que equipeo nasceu, nem se criou na capital
paulista ou no Rio, servirá isso apenas para lhe aumentar os méritos. Nunca
porém para considerar que o T.E.C.A. é bom, situado o problema na província .
Isso jamais!
A direção e interpretação dessa maravilhosa equipe, dadas à peça de Noël
Coward, Amigos de Viagem, e ao entremez de Cervantes, Os Dois Faladores, são
vitórias que honram qualquer companhia de profissionais de alta qualidade.
Que se dê a esta mocidade talentosa e verdadeiramente artista um teatro,
deixando eles de trabalhar na ingrata arena e ver-se-á o quanto crescerão ainda
mais com éclairage e cenários.
Meu desejo é que esta pujante companhia araraquarense sinta que estas
restrições encontram alicerce apenas no esnobismo e que o esnobismo é o ranço
do asfalto, displicência estudada e falsa que medra oscilando entre os vapores da
gasolina de baixa octanagem e os efeitos do whisky de baixa qualidade.
328
Consagrado que está, o T.E.C.A. não poderia é claro deixar de ser alvo
de algumas pequenas injustiças sem maior importância.
Artigos publicados na coluna Ponto e Vírgula”, jornal Última Hora, Rio de
Janeiro, 20/08/57.
329
Alvíssaras para Araraquara
A.Accioly Netto
Quero acreditar que um dos acontecimentos teatrais de maior
importância, em 1957, haja sido a revelão ao público do Rio de Janeiro do
Teatro Experimental de Comédia de Araraquara. De fato, um acontecimento
mede-se com mais segurança por seu valor intrínseco, sua significação em
profundidade, pelas perspectivas que abre, do que propriamente por sua grandeza
e repercussão no meio em que se desenvolve. Assim sendo, a presença no Teatro
Municipal, de Jean Villar, e a primorosa organização artística do Théâtre National
Populaire, mundialmente famoso, sendo uma preciosa contribuição cultural para o
nosso público em geral e os estudiosos de teatro em particular, significa menos do
que a realização artesanal desses jovens amadores do interior paulista, no milagre
de improvisação que nos apresentaram no seu Teatro de Arena. Quando Jean
Villar apresenta, com primores de direção, numa apuradíssima interpretação,
dissecada às últimas conseqüências, Balzac, Victor Hugo, Molière ou Marivaux, é
a demonstração de um teatro adulto, de tradição quase milenar, desabrochando
no máximo de suas possibilidades de emoção e cultura – mas quando esse
modesto lutador que é Wallace Leal V. Rodrigues, que nunca visitou uma grande
cidade (que tira sua subsisncia num modesto emprego de comércio) e encena
sem nenhum alicerce de experiência cênica, Miguel de Cervantes y Saavedra,
Anton Tchekov, Noël Coward e Tennessee Williams, é uma demonstração de que
a boa e fecunda semente do teatro encontrou terra de seiva rica, e rapidamente se
desenvolveu, num prodigioso gigantismo tropical. Foi, portanto, com a satisfação
das descobertas inesperadas que assisti na arena do Hotel Glória, às
apresentações dos amadores paulistas, que trouxeram de Araraquara uma lição
de esforço consciente, do quanto se pode alcançar no campo artístico, pelo estudo
dirigido no sentido da construção objetiva sem intelectualismo estéril de crítica
impotente e destruidora. É certo que na apresentação de seu repertório em peças
de um ato, adaptáveis ao teatro de arena, onde um certo ecletismo no gênero nos
330
Se os Homens Jogassem Cartas como as Mulheres, de George S. Kaufman; A
Mão do Macaco, de W. W. Jacobs, ou Xeque-Mate, de Kenneth Goodman, ao lado
de pequenas obras-primas de Anton Tchekov (incluindo uma primorosa edição de
Um Pedido de Casamento), O Menino de Moony não Chora, de Tennessee
Williams; Amigos de Viagem, de Noël Coward (poesia e sátira) e alguns outros, é
índice de transigência ao gosto do público a que se dirige, e não propriamente a
orientação cultural do elenco. Da mesma forma não se pode afirmar que, em sua
totalidade, a interpretação desse grupo de amadoristas seja impecável, mas
apenas num bom nível de conjunto, com nomes a destacar, como Julia Abrahão,
Maria Cristina Moura, Ruth Magali Miranda, Mario Barra, Oscar Rodrigues ou
Moacyr Marchese. Porém, o mais importante está na constatação do pleno
amadurecimento em nossa juventude, não apenas a “idéia do teatro”, mas
sobretudo seu espírito, fórmula de ação, e sobretudo o que representa como
núcleo de existência de cultura, com todas as suas benéficas conseqüências. A
presença de (grupos) como o Teatro de Comédia de Araraquara não é única no
Brasil no Norte e no Sul, a exemplo do que aconteceu com a ação pioneira do
Teatro do Estudante, de Paschoal Carlos Magno, elencos teatrais de amadores
estão em plena efervescência criadora. Mas este conjunto especialmente,
nascendo e crescendo isolado, por circunstâncias especiais quase sem contatos
com os grandes centros, é um exemplo de que o movimento teatral em nosso País
adquire ritmo uniforme irreprimível, em bom sentido e boa direção. Assim é que,
dentro de uma organização tanto quanto possível perfeita, com espetáculos
basicamente estruturados (desde a criação até a cenografia, figurinos e luzes)
constituiu aquilo que chamo verdadeiramente como “grande acontecimento
artístico a segurança de que estamos em bom caminho. Em suma, a
importância singular de um marco inicial.
Artigo publicado na Coluna “Teatro”, revista O Cruzeiro, Rio de Janeiro,
14/09/1957.
331
Por que Santo Antonio e a Vaca?
Wallace Leal Valentim Rodrigues
Muitas são as pessoas que nos perguntam por que esse título, Santo
Antonio e a Vaca, que lhes parece, além de estranho até mesmo desrespeitoso.
Nestes dias em que nos empenhamos por conseguir uma casa boa, tanto pela
qualidade quanto pela quantidade para o nosso lançamento, o faltou mesmo
uma certa dama que devolveu indignada as entradas, alegando que jamais se
disporia a assistir a um filme com tal título.
Outras pessoas julgam ver uma influência da peça de Suassuna, O Santo e
a Porca, também folclórica, neste trabalho. E se o filme não estivesse sendo
lançado, agora que na França terminam, com o ator Fernandel, uma película
denominada O Artista e a Vaca, não faltaria quem encontrasse tamm
decalques para nosso roteiro.
Todavia,aqueles que assistirem aos noventa minutos do filme,
compreenderão perfeitamente os nossos propósitos: s captamos os episódios
folclóricos com honestidade e isenção de ânimos. O espírito caboclo foi, o quanto
possível, registrado e expresso. Pessoalmente cremos que, nos planos de luz
onde se encontra, Santo Antonio não está mal satisfeito conosco. Cremos também
que ele, pelo contrário, o olha com nenhum desprezo para os generosos e
nobres animais que, além dos filhos de Deus, são muito mais úteis, brandos e
pacientes do que muitos outros filhos de Deus. E isso porque Santo Antonio não
era Franciscano. E São Francisco denominava os animais de irmãos. Ele pôde
amar até um lobo selvagem e falar aos peixes.
O nosso filme tem a pretensão de reunir, numa história feita de muita
ternura, um irmão menor, que nesse caso é a vaquinha Mimosa, e o protótipo de
espiritualidade, que, neste caso, é o santo. Talvez se o filme se chamasse Santo
Antonio e o Tigre, ninguém reclamasse. Creio que, o substrato de tudo seja uma
questão de respeito humano. O nosso respeito e acatamento á Igreja Católica não
332
pode ser desmentido por quem quer que seja. Os prelados que leram o roteiro do
filme não tiveram absolutamente qualquer censura a formular. E se, efetivamente,
houvesse qualquer desrespeito ou desdouro na história, nós mesmos seríamos os
primeiros a recusá-la. Não foi outra coisa que não essa, o episódio da nossa
recusa em dirigir o Auto da Compadecida, de Ariano Suassuna.
No filme veremos Santo Antonio como um emissário da Providência Divina,
mostrando que mesmo os humildes instrumentos, como uma vaquinha e uma
mocinha simples e flertada (Zabelinha), podem se tornar instrumentos para a
retificação das almas e a concretização do Supremo Bem.
Creio que este esclarecimento é suficiente. Se o filme for passível de
censura, submeter-nos-emos pacificamente à reprimenda.
Outra coisa a respeito da qual desejamos tratar, é o trailler. Ele foi feito
dentro de uma bossa nova, num estilo que, daqui pela frente, será muito
empregado pelos produtores. Consiste em não mostrar o melhor do filme e dispor
os fatores de maneira que, ao invés do público já ter sentido todas as emoções na
primeira vez, ir sentindo compreensão e participão crescentes até ao
lançamento da película. Peço a todos que façam essa experiência. Isso evita,
principalmente, que se diga que o melhor de certo filme foi exatamente o trailler,
como acontece por vezes no cinema argentino e mexicano. Outra coisa que o
trailler tem, é o desejo de acentuar a música que foi intensamente aplaudida em
São Paulo. Não foi preciso que, como outros compositores e arranjadores, nos
locomovêssemos em direção aos lançadores. Eles próprios nos procuraram e os
contratos com Irmãos Vitalle e Copacabana foram assinados na semana
transata. Nós acreditamos que eles promoverão um grande interesse para nossa
cidade, pois que em suas capas farão uma referência especial a ela.
Gostaríamos que as pessoas que assistissem ao nosso trailler procurassem
correlatar o sentido e as emoções dos versos cantados às imagens filmadas. Sei
que se aperceberão então de todo o lirismo agreste e dramático de que se reveste
333
e que sem nenhuma influência do folclore nordestino ou sulista, é, com muita
força, coisa muito e muito nossa.
Quero tamm contar que, durante meses, em pequenos grupos rurais nós
convivemos, aos domingos, com os tipos que os espectadores irão encontrar.
Anotamos-lhes os tiques, as falas, as posturas e depois compramos-lhes as
vestes, novas ou surradas, que desabrigam os nossos personagens. Noventa por
cento de tudo quanto é o filme, é genuinamente araraquarense. Temos ainda a
alegria de, neste nosso esforço, termos feito o lançamento de Mestre Dito, que
morreu na miséria e deixou uma obra fracionária de tão alto valor expressivo que,
no momento que corre, foi endereçada para museus folclóricos da Bélgica e da
Dinamarca.
Artigo publicado no jornal O Imparcial, Araraquara, 24.05.60.
334
Loyola retrata Wallace
Ignácio de Loyola Brandão
Quando Wallace Leal morreu, eu estava passando por Araraquara. Escrevi,
às pressas, numa sala da Biblioteca Municipal, um artigo emocionado e mal
redigido, prometendo voltar. Passaram-se oito meses e a cada semana tentei
fazer este artigo, sem avançar. Alguma coisa indefinida me bloqueava. Até que
segunda-feira passada, dia 8, consegui dar início. Durante toda a semana escrevi,
e reescrevi, rasguei páginas e ginas, inquieto e insatisfeito. Terminei, e quando
reli, descobri que falava de tudo, de outras pessoas, de mim mesmo, daqueles
anos e pouco de Wallace. Ansioso, deixei como estava, até que me veio ao
pensamento uma verdade. Wallace foi toda uma época. Ele espelhou e refletiu
aquele tempo, e quando tudo mudou e aquele tempo deixou de existir ele se
apagou. Acho que foi assim com Wallace.
“Non voglio fare tutta la vita una puttana”, gritava, melodramática, Eleonora
Rossi Drago, estrela italiana, no filme Roma, 11 horas. “Tua música? Que música?
Essa música caipira?”, jogava Tônia Carrero, ironicamente, na cara de Anselmo
Duarte, em Tico-tico no Fubá, biografia romanceada de Zequinha de Abreu, um
dos sucesso de público da Vera Cruz. Estas duas frases banais não pertencem à
galeria dos diálogos imortais do cinema. E no entanto, nunca esqueci estas falas.
Ouço-as, como se estivessem sendo repetidas instantes atrás. Porque não estou
me lembrando de Rossi Drago ou Tônia e sim do Wallace Leal, imitando-as com o
mesmo timbre de voz. O ritual era o mesmo, saiamos do cinema e nos
colocávamos na esquina da Duque de Caxias com a Três. Um ponto fixo. O lugar
foi por nós apelidado Esquina da ilusão em 1953, quando a Vera Cruz, nossa
Hollywood cabocla, lançou o filme estrelado por Alberto Ruschel e Ilka Soares. No
começo dos anos sessenta, a mesma esquina ficou conhecida pelo encontro de
Sartre e Pelé. Antes que as discussões sobre os filmes começassem, Wallace
dava um pequeno show, imitando as atrizes com muita ironia. Ele era assim, entre
335
tantas outras coisas. Capaz de repetir diálogos inteiros de um personagem que o
tivesse tocado. Tônia Carrero, bonita, arrogante, e Eleonora Rossi Drago, com seu
aristocrático modo de representar, estavam entre as mulheres que ele mitificava.
Pois havia em Wallace um senso agudo de sofisticação e requinte, uma
necessidade constante de elegância. Ele cultivava estas qualidades, o apuro, a
cultura, proclamava que antes de tudo uma pessoa devia ter estilo, boas
maneiras. Vejo agora como começava a ficar deslocado num mundo que rejeitava
e hoje mais do que nunca tudo isso. Lembro-me particularmente de uma
pessoa que para Wallace era um mito, suprasumo, modelo de bom gosto e
virtuosidade: Mariinha. O rosto dele se iluminava quando falava da Mariinha. A tal
ponto que eu, tímido, introvertido, sempre metido em roupas mal ajambradas,
tinha pavor de um dia me defrontar com esta figura deslumbrante que nos era
descrita por Wallace. Curioso, passaram-se mais de trinta anos a eu conhecer
Mariinha, um encontro pode-se dizer prosaico, na farmácia do Samuel. Uma
pessoa doce, suave, elegante. Nessa altura, ele deteriorado, caminha para o fim,
lutava –consciente? inconsciente? com a imensa tragédia que o envolveu.
Falamos muito de Wallace.
Talento, fina sensibilidade e conhecimento das pessoas davam a Wallace
liderança e autoridade. Lia bastante e abrangia muitos assuntos. Mesmo quando
não sabia, ou não dominava a matéria, mostrava tal segurança que convencia.
Discutia coisas variadas, de história ou filosofia, teatro, cinema, religião, moda,
maquiagem. A vida inteira tive certeza que ele era formado em universidade.
pouco é que fiquei sabendo que era autodidata. Vivia mergulhado em livros,
revistas, enciclopédias. Soube tamm que alguns de seus livros sobre filosofia ou
história não passavam de condensações baratas, superficiais, vulgarizações da
matéria. O que importa? Quase quarenta anos atrás numa cidade carente de
informações, deficiente em todos os aspectos (biblioteca escassa, livrarias que
eram mais papelarias, pouquíssima imprensa das capitais aparecendo nas
bancas; aliás me lembro da banca de jornais e revistas do Nelson Rossi, no
Cine Paratodos), sem faculdades de Humanas, o pouco que viesse era muito.
336
Interessa o que Wallace deu, transmitiu, superando as próprias deficiências. E ele
me passou coisas importantes, como a necessidade constante de leitura para
poder aprender tamm a escrever. Indicou-me livros, ensaios e romances, me
ajudou a ver (eu era crítico de cinema) nos filmes elementos além da técnica,
fotografia e montagem. Acima de tudo, o que conta foi o legado de Wallace à
cidade de Araraquara: o erguimento do Teca, uma equipe de arena que se
projetou no cenário nacional, e a batalha para fazer cinema. Desta sua luta
resultaram o inacabado Aurora de uma Cidade, semi-ficção sobre a fundação da
cidade, e depois a possibilidade do longa Santo Antonio e a Vaca, recentemente
recuperado pelo MIS. Seria possível descobrir-se hoje o que foi filmado de
Aurora? Rivas Autulo e Lucilio Leite eram fotógrafos, iluminadores e meras.
Aliás, as câmeras eram do Rivas que também se encarregava da revelação dos
negativos. Wallace foi crítico de cinema, escreveu sobre literatura, fez traduções,
escreveu alguns romances, apresentou exposições de pintura, criticou balé e
não tenho certeza tentou a música. Tanto no teatro como nas filmagens,
orientava os atores, dava palpites na maquiagem (feita pelo Arthur Batelli e pelo
Ernesto Lia, também responsável pelos cenários), discutia iluminação, e ajudava
nos problemas técnicos. Foi ele quem desenhou um carrinho de ferro, com rodas
de borracha, que serviu de grua para os travellings do filme. Isto depois de ter
escrito (dei minha mãozinha) o roteiro.
Possuía capacidade de absorver e transmitir. Talvez por isso tenha sido um
bom diretor. Manipulava cada pessoa usando psicologia, mas sabia ser ditatorial
quando necessário. Ouvia, mas em certos casos levava em consideração se
interessasse aos objetivos dele. Gostava de sua posição e adorava posar de guru,
mostrar sua autoridade sobre o grupo, a ascendência conquistada, precisava da
“corte em volta. A admiração e os elogios do pessoal alimentavam o seu ego.
Demonstrava, às vezes, complacência para com o interlocutor impertinente,
deixando transparecer que se julgava superior, intelectualmente. Claro, tinha
defeitos, era um ser humano complexo, devido ao talento e à sensibilidade. Aos
inimigos reservava a ironia, o sarcasmo, para não dizer o desprezo absoluto.
337
Quando brigava com alguém, riscava essa pessoa do mapa, estava morta. Ser
excluído do grupo, ou não ter acesso, significava, na época, estar um tanto à
margem do acontecimento cultural. Porque tudo se interligava: havia pintores da
Belas Artes, que participavam do Teca e do clube de cinema. O clube abrigava
tamm o grupo de fotógrafos do excelente Foto-cine clube. A equipe de cinema
juntou Teca, Foto-cine Clube, Clube de Cinema, Belas Artes, Conservatório.
Correndo por fora havia a Escola de Balé. Engraçado, imagens se superpõem em
minha memória e me parece que entre Wallace Leal e José Celso Correia havia
uma “rusga”. Não se bicavam muito! Reservavam sempre farpas um para o outro,
ainda que mais tarde eu tenha ouvido o se referir com admiração ao
pioneirismo do Wallace.
Agosto de 1952. Escrevi uma crítica de cinema e levei ao Lázaro Rocha
Camargo, amigo de meu pai na estrada de ferro que me acolheu na Folha
Ferroviária. zaro: devemos a ele uma história da imprensa em Araraquara. E
que dizer de sua morte, até hoje o esclarecida, moído de pancadas num dito
sanatório? Escrevi por um tempo na Folha, transcrito no Correio Popular. Até o dia
em que Paulo Silva, passando por mim na rua, acenou: “O Brandãozinho! Não
quer escrever para o Imparcial? Representava o mesmo que alguém da
Bandeirantes ser chamado para o Globo. Fui falar com o Lázaro que me disse:
“Vá em frente! Faça sua carreira! Do Imparcial continue, não volte atrás!Dali em
diante me vi num jornal diário, suportado benevolamente pelo Antônio Silva, um
velho que eu temia e respeitava. O homem sabia, tinha fibra. Ele me assustava
principalmente pela ironia, qualidade que acabei adquirindo e mais tarde vi ser
essencial a um bom jornalista. Importante é que parecia acreditar em mim e
deixava transparecer. Fui fazendo cinema, depois reportagens, entrevistas,
aprendi linotipia, clicheria, fui até colunista social, acho que um dos pioneiros
desta cidade. Não me vanglorio tanto disto, mas fiz. É parte de minha carreira, me
diverti, diverti as pessoas. Eu ria muito e toda a minha turma quando certas
mulheres chegavam: “Ah, olha, não seja ruim, fulana de tal mandou fazer um
vestido só para aparecer na coluna, e voignorou. Ela vai usar de novo, veja lá.”
338
*
Wallace não era pessoa fácil, às vezes mostrava-se temperamental. Em
certas ocasiões tive certeza que adorava manipular os outros, tirando disto o
prazer de jogo, teste humano. Mistificava também, adotava valores que eu não
compreendia, não falava nunca de política. O que me colocava entre dois fogos,
porque o meu grupo da biblioteca e do Bar do Hotel Municipal era dirigido para
este lado, o da conscientização política. Estes me xingavam de alienado, de
querer tirar o corpo do real. No fim, acabavam todos no teatro, assistindo as peças
e aplaudindo: reconheciam o talento de Wallace, ainda que discutissem a sua
interpretação/ visão dos textos no palco.
Comentava-se: onde Wallace encontrava tempo para tanta coisa?
Trabalhava na Texidal em horário normal. Nunca soube direito o que fazia ali, uma
loja de tecidos. Recebia gente, escrevia, traduzia, escrevia artigos, cartas,
desenhava modelos, atuava na ação espírita, cuidava das pessoas. Ajudou tanta
gente! Ia ao cinema, discutia, fazia roteiros para futuros filmes. o me lembro
de vê-lo na mesa de um bar bebendo. Nunca vi, ao menos naquele tempo de
convincia araraquarense. Também nunca o vi de baixo astral. Empurrava as
pessoas para cima, dava uma gargalhada diante de uma desilusão, chateação,
frustrão, humilhação. E como foi humilhado através de olhares, palavras,
gestos. Menosprezado. Como riram e duvidaram dele. Teria conservado a o fim
o espírito que o fazia descartar o lado ruim?
O meu último encontro com Wallace foi em São Paulo, em 1977, numa rua
de Perdizes. Fazia um ano que eu tinha publicado Dentes ao Sol, história de um
sujeito de talento que nunca saiu de Araraquara, enlouquecendo aos poucos, mas
em completa lucidez. Deveria ter ido embora, nunca foi. De repente, Wallace me
disse:
– Tem gente louca na nossa terra. Imagine o que vieram me propor?
339
– Não tenho idéia.
– Querem que eu te processe.
– Você? Baseado em quê?
– Em Dentes ao Sol.
– O que tem a ver?
– Todos dizem que o personagem sou eu. É verdade?
Ficou me olhando. Era necessário que eu decidisse em segundos. Olhando
para o rosto dele, não sabia se a ansiedade resultava de querer ser o
personagem, ou de não querer. Súbito, ocorreu que ele gostaria de ter servido de
modelo, ao mesmo tempo que pensei: e se eu disser sim, pode ser uma grande
tristeza, o personagem não é dos mais corajosos, ao contrário, ele recusou a vida
e o real. Ele desejava ou odiava “ter sido” o modelo? Na verdade, não foi. Tirei o
personagem de meu próprio medo de ter ficado em Araraquarara, sem ter saído
em busca de meus sonhos. Respondi:
Você é uma pessoa criativa, Wallace. Sabe tão bem quanto eu como se
monta um personagem. Nunca é uma pessoa só, tem dez por cento de um, trinta
do outro, vinte de invenção. Aquele personagem no fundo foi o meu anti-EU!
Ele sorriu com a velha ironia. Não sei se aceitou ou não. Naquela altura da
vida, minha carreira estava engatilhada, Zero tinha acontecido no exterior e aqui,
havia boas perspectivas pela frente. Wallace devia se sentir contente por ter me
empurrado para fora do círculo de giz. Fins de 1956, eu terminava o científico,
devia me decidir, olhava assustado em volta: O que fazer? Num camarote do
Teatro Municipal, conversava com Wallace. Tínhamos assistido a um espetáculo
de mágica, um daqueles magos decadentes que apenas tiravam uma pomba da
cartola e faziam meia dúzia de truques pobres. O homem percorria o interior.
Cada vez que ele ia executar o truque, eu tinha medo que não desse
certo! Imaginou que decepção para a platéia, que martírio para um velho mágico?
340
Seus números o funcionam mais, e ele desiste, fica numa cidade como esta,
sem saber o que fazer para ganhar a vida.
– Isto é uma história, na sua cabeça!
– É. Claro que é!
– Ele vindo, eu indo.
– Vai embora?
– Quero, e não quero. Não sei, o que acha?
Não pode ficar! Não se amarre, solte as cordas. Você é ambicioso, vejo
nos olhos, tem vontade, não vou negar um certo talento desordenado, ainda não
sabe se quer fazer cinema, escrever livros, filmes, o que. Mas vai. VAI, não fique
um dia a mais do que o necessário. Acabou o teu ciclo araraquarense, troque a
pele, como as cobras.
Nos outros dias, foi me empurrando, me convencendo. E não foi apenas
comigo. Tocou também o Sebastião Campos para a frente. Talvez tenha feito o
mesmo com o Barra e o Moacyr Marchese, porque os dois tiveram uma
temporada paulistana, atuaram em algumas peças. Paradoxal Wallace que dava
força aos outros e parece não ter tido para ele, permanecendo enjaulado,
acreditando que fosse mais necessário aqui ainda que sem condições do que
. Ou toda a máscara escondia uma formidável insegurança, medo atroz de
enfrentar? Nunca saberemos, ficou com ele, se foi com ele, antes de mais nada! O
ser humano é complexo, admirável, incoerente, contraditório, sempre à procura de
alguma coisa. Na vio final, resta de Wallace o que ele fez de bem, e de bom.
Uma figura ligada à evolução da cultura nesta cidade. Sem herdeiros, e
continuadores. Hoje é o vazio. Este é um pequeno fragmento de sua vida. Ao
terminar, percebo que quase nada disse sobre ele, porque sei pouco. muitos
outros que deviam se associar a mim, para montarmos uma parte de sua vida. O
que trouxe foram lembranças desconexas, esfumaçadas, quem sabe distorcidas.
No entanto necessárias. Para resgatar Wallace Leal. Um homem que teve estilo.
341
Não são muitas as pessoas que têm, no mundo atual. Estilo de vida, o colocar-se
no mundo e na sociedade, a relação com os outros, o tentar a salvão através da
arte. Uma pessoa de estilo é diferenciada, e portanto assusta, o mundo hoje não
permite diferenciações, e muito menos estilo. Que não é qualidade que se defina.
É algo inerente, particular. Wallace foi uma pessoa rara. Com estilo.
Série de três artigos publicados no jornal O Imparcial, Araraquara,
transcritos apenas dois, o último deles do dia 18/05/89, página 4.
342
Continuemos a aplaudir o Barra: um personagem de
nossa cidade
Ignácio de Loyola Brandão
Lembro-me do Barra, começo dos anos 50, ao piano do Iemanjá, o bar
decorado com redes e palmeiras, imitando aldeia de pescadores, que ocupava
bastidores e palco do Teatro Municipal, durante as temporadas do Teca. A arena-
palco era montada no meio da platéia, cujo assoalho subia através de mecanismo
acionados por enormes manivelas, no subsolo. A platéia igualava-se ao palco,
formando um piso único, recurso prático para as formaturas de final de ano,
quando as escolas realizavam seus bailes no Municipal ou para as temporadas do
Teca. Havia uma canção que Barra tocava, como um hino ou obsessão que agora,
passados mais de 40 anos, pode ser encarada como premonição, pergunta
lançada ao futuro: Que reste t-il de nos amours, que reste t-il de nos beaux jours?
Ele era acompanhado por Arthur Batelli, Jayme Maurício Leal, Wallace Leal,
Moacyr Marchese, Auny Leite (era de Auny o cenário do bar?), Edson Lessi,
Cidinha, Maria Ignez de Souza, Heleninha Souza Almeida, Julia Abraão. Acho que
até dona Olga Ferreira Campos eventualmente cantava.
Mario Barra. Boaventura Mario Barra. Bibi. Barra. Um personagem da
cidade. Naquela Araraquara pequena, tranqüila, arborizada, que parecia se
conservar à margem do processo de revolução que agitava o Brasil e o mundo
(industrialização, rock) um grupo unido agitava culturalmente, tentando fazer
cinema, montando peças, formando o Clube de Cinema, aliando-se ao Foto-Cine
Clube, convivendo com os pintores da Escola de Belas Artes, assistindo aos
espetáculos da Escola de Balé, escrevendo críticas de cinema e teatro,
estabelecendo polêmica pelos jornais, realizando programas de cinema na dio
Cultura.
O Teatro Experimental de Comédias de Araraquara (Teca) se ims, num
tempo em que, em São Paulo, o TBC estruturava o moderno teatro brasileiro e o
Arena criava a temática social e política. Encenando Noël Coward, Bernard Shaw,
343
Pirandello, Kauffmann e outros clássicos, com ousadia e criatividade, o Teca
provocava espanto pela boa qualidade. O assombro vinha do isolamento em que
as cidades do interior viviam. Era como se fôssemos habitantes de feudos
medievais, murados, longe de tudo. A angústia de se encontrar dentro desta
situação batia nos jovens que procuravam fugas, modos de escapar a um destino
que, pela acomodação, nos conduziria, fatalmente, ao funcionalismo público, ao
comércio estagnado, aos bancos, escritórios da estrada de ferro ou do DER, à
fábrica de meias Lupo. Pouco para a imensidão dos sonhos.
Passávamos o dia na biblioteca municipal, ali onde hoje é a Câmara,
devorando livros, jornais e revistas. O mundo chegava através do Diário Carioca
(onde a leitura de Jacinto de Thormes me levaria a criar Coisas da Cidade, a
primeira coluna social de nossa imprensa), A Noite, Folha e Estado, A Carioca,
Manchete, O Cruzeiro, Cinelândia, Filmelândia, Cena Muda e Revista do Rádio.
Todas as noites estávamos nos cines Odeon ou Paratodos (hoje Veneza e Capri)
vendo os neo-realistas italianos, prodões francesas, esporádicos filmes suecos
ou alemães. Não perdíamos nada que pudesse ser diferente das produções
hollywoodianas que adorávamos, mas traziam o mundo chapado, igual. Wallace
Leal, líder do Teca, ia a São Paulo ver peças e voltava cheio de programas,
textos, revistas da SBAT, recortes de críticas, fotos autografadas. De tempos em
tempos chegava de pavilhão, armado na esquina da 7 de Setembro com a 5,
trazendo Nino Nello. Lotávamos a primeira fila que era nossa, bebíamos toda a
cultura que podíamos.
No Teca, Barra era estrela, primeira figura. Cheio de carisma, presença no
palco, bom físico e uma voz que alcançava o espectador da última fila com clareza
e limpidez. Extrovertido, se impunha. Conversador, dominava a roda. Contava
piadas, comentava o filme, refazia diálogos, falando como atores americanos ou
italianos, caricaturando com uma fidelidade que pasmava. Criava o tempo inteiro.
Não amigo que não tenha uma situação para recordar. Certa vez, subindo uma
escada rolante em São Paulo, bem atrás de uma figura aqui da cidade, séria,
tradicional, não fez a mímica denunciadora, como não resistiu, gritando alto,
344
para toda a galeria ouvir: “este homem soltou um peido!. Outra, levou um bando
de moças para a rodoviária. Elas iam para o Rio de Janeiro. Barra acompanhou-as
até a porta e, no corredor do ônibus, ficou dando conselhos: Você fulana, lave os
pés antes de dormir! Você apontava para outra tome o remédio para a prisão
de ventre. Você não se esqueça da toalhinha quando o corrimento vier. Cada uma
recebeu conselhos inusitados, como se viessem de uma aou tia preocupada
com detalhes íntimos. Os passageiros gargalhavam.
Dois dos milhares de casos que aprontou. Inocentes. Coisas mínimas,
numa vida dedicada a tirar existência o que ela tinha de engraçado, bem
humorado, ridículo. Ele trazia descrições arrasadoras. Era melhor ser um amigo.
Mas a maior vítima, um grupo a que chamávamos os “reizinhos” que vivia sentado
nos “tronos de vime” nas escadarias do Clube Araraquarense. Eram encarados de
forma devastadora, a feira de vaidades reduzia a pó. Mas havia quem se salvasse.
Porque dentro da elite araraquarense existiam pessoas que anteciparam aquilo
que é hoje o patrocínio cultural. Pessoas que possibilitaram a existência do Teca,
“teatro com melhor qualidade do Rio de Janeiro e São Paulo”, como disse a crítica
carioca, quando o grupo se apresentou no Rio.
Barra era um imitador inigualável. Repetia gestos, expressões, entonação,
tiques de qualquer um. Bastava um encontro, minutos de conversa e ele retratava,
acrescentando o toque irônico. Mais do que irônico, era mordaz. Inocentemente
sarcástico, porque não havia perversidade destruidora, era mais um exercitar
constante. Acima de tudo, ele sempre foi ator. E o ator se alimenta do que vê, do
que empresta, do que toma dos outros. Ele cresce com a observação. O ator é
“vampiro”, necessita desse sangue alheio, para reproduzir no palco as
dezenas/centenas de personagens/pessoas. É no palco que ele devolve, em
forma de arte, o que tomou. E isto Bibi os íntimos o chamavam assim fazia de
maneira impecável. Daí a ter sido, ao lado de Sebastião Campos, a figura principal
do teatro, naqueles poucos anos de existência.
345
Ir embora. Ir embora era necessidade, desejo, pressão constante. Para
fazer carreira em São Paulo ou Rio, onde estavam as grandes companhias, o eixo
cultural, os meios de comunicação, a televisão incipiente.
Certa vez, passou pela cidade o grupo Tônia-Celli-Autran, um dos primeiros
a se desligar do TBC para formar uma companhia independente, vertente forte
nos anos 50 e 60. Era o trio pesado do teatro brasileiro. Foi uma curta temporada,
lembro-me apenas de Entre Quatro Paredes (Huis Clos), de Sartre, talvez por
sermos uma geração muito sartreana. Terminado o espetáculo no Municipal
reunia-se aquele grupo da companhia (havia também Margarida Rei e Osvaldo
Loureiro) e percorríamos a cidade, na madrugada, conversando. Havia um clima
de Os Boas Vidas (I Vitelloni), enquanto andávamos pelas ruas desertas, a
atmosfera tomada pelo cheiro sufocado da vegetação. A Rua 3 era repleta de
árvores. Terminávamos na Padaria Perez, na Rua 2, chegando no momento em
que uma fornada fresca ia sair. Comamos es quentes, crocantes, deixando a
manteiga derretida escorrer voluptuosamente pelos cantos da boca, babando com
o que diziam Celli, Tônia e Paulo. Talvez nem dissessem nada de importante, nós
é que ficávamos fascinados de passear com eles, famosíssimos, nos dando
atenção. Fellini puro! Nos beaux jours fluíam tranqüilos externamente, excitados e
ansiosos interiormente.
Até o momento em que começamos a partir, entre os anos 56 e 58. Quase
todos se foram. Houve um intervalo curto, dois ou três anos, até nos
reencontrarmos em São Paulo, mais ou menos encaminhados. Barra passou pelo
Oficina, do Celso, junto com Moacyr Marchese (estiveram em A Engrenagem,
de Sartre), até se juntar a Tônia-Celli-Autran, onde fez algumas peças. Víamos
tanta coisa que nem me lembro agora do que ele participou. Mas, subitamente,
Araraquara ficou distante, etapa queimada. A ansiedade de sair substituída por
outra, a de evoluir, subir. Os que eram os primeiros em nossa cidade tinham que
disputar o mercado ferozmente, vinha gente de todas as partes, em busca dos
mesmos destinos. Anos de grande efervescência cultural, com o TBC
encenando autores brasileiros, os independentes aumentando (Cacilda Becker,
346
Valmor Chagas, Fernanda Montenegro, Sérgio Brito, e outros), atores e diretores
dispostos a novos caminhos e experimentações. Havia para onde se voltar,
sobravam imaginação e inteligência, campos inteiramente abertos e um país onde
reinava esperança e possibilidades de futuro.
Mario Barra viveu a intensidade destes anos, abrindo seu próprio caminho.
Período curto, esmagado com o golpe militar de 1964. Mas, enquanto existiu, foi
rico. No entanto, para Bibi, se havia esta inquietação natural, havia por outro lado,
uma angústia, a financeira. Teatro se fazia com garra, mal se ganhando para o
sustento. A televisão não fornecia o background que hoje oferece. Qualquer ator
de quinta, depois de participar de uma novela de terceira, no horário das sete,
parte em turnê, amealhando dinheiro. O hábito acaba sendo uma camisa de força,
com os atores presos a necessidade de sucesso permanente, não podendo
desaparecer da telinha e procurando, boa maioria, apenas faturar a própria figura,
sem ousadias. Naquele tempo flutuava no ar uma exigência formal e textual que
levava a enormes disputas saudáveis. Os resultados eram peças vigorosas e
provocativas. Este tempo rico foi vivido por Mario Barra. O ator em potencial,
moldado em Araraquara nos anos do Teca e de outros grupos amadores, estava
pronto para deslanchar e crescer.
Então surge a pergunta: a vida é que nos faz? Somos donos do nosso
destino? Escolhe ou somos escolhidos? Existe mesmo aquele instante fatal, de
decio, que nos leva para mais perto ou nos distancia do sonho?
Mario Barra desapareceu.
Para ressurgir em Araraquara, de volta à sua profissão: dentista. Quando
regressou de São Paulo não se dedicou ao teatro. Afastou-se da arte. A poucos
amigos confessava-se desapontado. Um grupo restrito o acolhia sem perguntas e
sem cobranças, ainda que intimamente todos perguntassem: por que ele
abandonou? Teve medo? Foi assustador? Quando enfrentou a competição o
teve forças ou se recusou a participar dos jogos? Preferiu ficar fora? Ou
subestimou seu talento? Perdeu a autoconfiança? Onde estava o Barra
desafiador?
347
Os anos passaram. Um dia, reencontrei Barra em Araraquara. Voltávamos
esporadicamente no Carnaval, Semana Santa, Natal, feriados. Ela, não. Todo final
de semana estava firme ali, como num cerimonial religioso, ainda que a velha
turma tivesse se dispersado.
Parecia cada vez mais solirio. o reunia em volta a platéia habitua que
se deliciava com sua conversa e espírito. Suas tiradas envelheciam. Os tempos
mudavam velozmente, a cidade crescia, se industrializava, estradas asfaltadas e
pistas duplas levavam a São Paulo rapidamente, veio a televisão, os cinemas
foram morrendo, desapareceram o Clube de Cinema e o Foto-Cine Clube, a
Escola de Belas Artes perdeu o vigor, os jornais se reduziram, o havia mais
críticas e polêmicas, o footing feneceu. A Rua 3, à noite, ficou deserta.
Neste dia de reencontro, arrisquei perguntar: “O que aconteceu?” E ele,
tranqüilo: “Eu precisava de segurança, ter uma coisa sólida. No teatro não tem
nada disto, é uma corda bamba”. Assim, Barra passou parte de sua vida dentro de
um consultório no INPS. Praticando sua profissão rotineiramente, sem grandes
vôos. Continuava indo a teatro, via tudo. Mas sempre persistiu um amargo que
cresceu e amadureceu que ele escondia atrás da máscara de sarcasmo e
irreverência. O que antigamente era entusiasmo e alegria se tornou dor crônica,
extravasada em comentários cada vez mais duros, pessimistas. Ele sabia que
tinha abandonado o caminho. Que não foi o que poderia ter sido. E o podia
acusar ninguém. Não havia justificativas, desculpas. Nada. Era uma coisa que
tinha escolhido e, a seu ver, escolhido errado.
Corajosamente, assumiu.
Uma tarde nos encontramos na esquina da Rua Caio Prado com a Augusta,
onde ele morava em São Paulo. Ele tinha ido à Europa diversas vezes, catorze
para ser exato. Depois de receber uma herança que, se não o tornou milionário, o
deixou muito bem. “Não vou ser um ator aposentado, triste e pobre, porque não
sou mais ator”, ele disse. Ainda que tenha continuado a representar um papel. “Fiz
minha vida do jeito que quis, só que não era assim que gostaria de ter feito”. Deve
ter feito uma força para arrancar esta confissão de dentro.
348
Certa manhã, tomamos o ônibus azul-prateado da Cometa. O da 8 horas
para São Paulo. Como eu, ele tamm não dirigia. Foram três horas de conversa,
uma reaproximação. Falamos de livros, filmes, teatro, dos amigos que se foram.
Wallace Leal tinha acabado de morrer. Nessa viagem, ele fez a revelação. O velho
sonho se reacendia.
“Quero interpretar outra vez no Teatro de Araraquara o novo, na Fonte
Luminosa, porque o velho, o Rômulo Lupo jogou no chão O Homem da Flor na
Boca, de Pirandello”.
Seu maior sucesso, seu maior papel, seu grande personagem.
Inesquecível! Um dos maiores espetáculos dirigidos por Wallace, monólogo
vigoroso e dolorido. Fiquei incumbido de conversar com Clodoaldo Medina, então
Prefeito, para que Barra viesse ao Municipal e a cidade revivesse um lance de
glória de sua vida cultural. Naquele ônibus, Barra disse trechos da peça, nunca a
esqueceu, continuava a sabê-la de cor. Comentou que desejava reformular o
personagem, a interpretação, seria um Pirandello revisado. Imaginei-o esses anos
todos no consultório, diante da boca aberta dos pacientes, pensando na flor na
boca, lembrando-se do Teca, dos momentos iluminados de arte que a cidade teve
naquele monólogo era uma fatia congelada de sua vida, onde ele se agarrava.
Sonhando voltar ao palco. Talvez apenas para resolver uma pendência com o
passado. Contas que ajustamos com a vida, respostas a cobranças que nós
mesmos nos fazemos. Reinterpretar aquele instante luminoso. Para se desligar de
um tempo em que toda uma geração araraquarense se atirou para o mundo.
Ah, nos beaux jours! Confesso uma culpa por nunca ter falado com Medina,
nem com outros prefeitos. Não dei um passo para ajudar a reviver Pirandello e
talvez o Barra. Sinto-me, às vezes, pretensiosamente responsável por não ter
acontecido este revival. Então, veio o derrame que o imobilizou. Nestes dois anos
e tanto de cama, paralisado, o que passou em sua cabeça? Estava lúcido? Sofria?
Porque quando velhas amigas o visitavam? Teve momentos de paz, ou nesses
meses todos reviveu sua vida? Quantas vezes naquela cama ele representou
outra vez as peças. Será que chorava ao ver a grande peça que a vida prega?
349
Como ter segurança se ninguém vive seguro neste mundo? Nascemos, vivemos e
morremos inseguros. Segurança é a grande utopia de mundo, da história do
mundo. No fundo não queremos salvação, felicidade, nada, queremos segurança.
Deveríamos todos, seus amigos, os que o conheceram apenas de nome, ter dado
um jeito de levar a ele uma única certeza: de que milhares de pessoas que viram
O Homem da Flor na Boca, naqueles tempos do Teca, nunca mais o esqueceram.
Por aqueles momentos ele merece uma placa, uma estátua, uma homenagem.
Barra é um homem e um personagem desta cidade. Teve momentos do
palco, mas fez da vida cotidiana seu palco permanente, divertiu, emocionou.
autores conhecidos por um livro só. Atores que tiveram uma única grande
interpretação. Cantores de uma música. Foram, no entanto, fulgurões. Barra
e o homem da flor na boca estão indissoluvelmente ligados na história da arte
araraquarense. Ele bem merece que diante de seu túmulo e em lugar de uma
oração a gente sorria e aplauda. Mais que orações, um ator adora, se alimenta, se
recondiciona com aplausos. Ele haverá de ouvi-los.
“Que reste-t-il de nos beaux jours?”
Artigo publicado no jornal O Imparcial, Araraquara, 15/12/96.
350
Na madrugada, estrelas comem pão quente
Ignácio de Loyola Brandão
A manteiga escorria dos lábios de Tônia Carrrero, enquanto Paulo Autran
tentava pegar, sem queimar as mãos, o pão quente saído do forno. Um dos
padeiros ajudava, apanhando os pães, cortando-os ao meio, enquanto Inah Perez
passava a manteiga e entregava a cada um. Eu estava fascinado com a cena, o
forno quente, a fornada de pães sendo colocada em cestas enormes, a fumaça
tênue que se desprendia, o cheiro delicioso. Alguém trouxe café fresco e não
havia pires, o cheiro do café se misturava ao do pão assado e ao perfume de
Tônia.
Não acreditava que estivesse participando da cena, não havia nenhum
espectador além de nós e eu tinha a certeza de que era um instante raro na vida
da cidade. Os dois maiores atores do Brasil nos fundo da Padaria Perez se
regalando com pãezinhos frescos e um café ralo, de caboclo. Fragmento que
poderia ficar na história cultural. Sempre foi mania minha deslocar as imagens de
seu contexto e projetá-las para o futuro, imobilizando-as como em uma fotografia.
Não havia nenhum fotógrafo perto, restaria apenas a tradição oral. Éramos poucos
ali. Wallace Leal, Artur Batelli, o cenógrafo, Mario Barra e Sebastião Campos, os
atores principais do Teatro Experimental de Comédias de Araraquara, o TECA,
Inah Perez, filha dos donos da padaria e irmã de Inaiá, amiga chegada de Ruth
Cardoso. Não me lembro se Geraldo Mateus, ator e administrador da Cia. Tônia-
Celi-Autran, estava junto naquele momento. Adolfo Celi seguramente não.
Era uma cena prosaica, inacreditável. Estávamos dentro do filme de Fellini,
éramos os Vitelloni araraquarenses seguindo a troupe que, horas antes, encenara
Sartre (Entre Quatro Paredes, Huis Clos) no velho Teatro Municipal. nia, que
tinha sido do TBC, mulher fulgurante, das mais belas do Brasil, um ícone, a estrela
do Tico Tico no Fubá e É Proibido Beijar, e de um filme que passou meio
despercebido, porque a crítica era altamente tendenciosa, Quando a Noite Acaba
351
(Perdida pela Paixão), neo-realista que antecedeu o Cinema-Novo brasileiro,
dirigido por Fernando de Barros, cineasta a quem devemos uma revisão. Ao
contrário do Zé Celso e do Wallace, atentos ao texto e à direção, me deixei levar
pela presença de Tônia e de Paulo Autran, dois mitos. Boa parte da platéia não
entendeu o texto, mas tamm tido ido ali pela fama dos atores. Terminada a peça
fomos para o Clube Araraquarense e a companhia jantou, fiquei isolado num dos
sofás. Perdi boa parte da conversa. Depois, todos saíram para a Esplanada das
Rosas, era uma da manhã, estava uma noite fresca. Celi voltou ao Hotel (ou Celi
não estava na cidade; me deu branco), enquanto Tônia, Margarida Rey e Paulo
quiseram continuar a caminhar.
Conversando (eu ouvindo), andamos mais de hora e meia, e quando vimos
estávamos na Rua 2, esquina com a Avenida Barroso, em frente à Padaria Perez.
Entramos por uma porta lateral e vimos os padeiros retirando a primeira fornada
de pães da noite. O cheiro era voluptuoso, como disse nia (anotei tudo,
imaginem se não). Inah se afastou e voltou com a lata de Manteiga Aviação. Os
pães começaram a sair, os padeiros apanharam alguns e colocaram numa pá,
avançamos sobre eles, cortamos, besuntamos e a manteiga derreteu, escorreu,
Tônia deu uma mordida, a manteiga desceu pelo queixo, caiu sobre a blusa, ela
riu, Paulo Autran foi o próximo. E se regalou, comeu um, dois, apareceu o café
fresco. Foi no final dos anos 50 ou começo dos 60? Perdi a noção e datas o
interessam, apenas aquela imagem gravada, de dois superstars, dos padeiros
anônimos e sem noção de quem eram Paulo e Tônia não existia tevê, nem a
mídia exacerbada – da manteiga escorrendo, da quentura do forno, da madrugada
silenciosa em torno.
Meses atrás e digo a data, 2005 passei pela mesma esquina e vi a
padaria sendo demolida e o velho forno transformado em sucata. Nenhum
daqueles homens com marretas e picaretas tinha iia do terreno sagrado em que
pisavam. A esquina agora é estacionamento. Mais um, eles estão devorando
casas, quintais, lojas falidas.
352
Artigo publicado no livro A Altura e a Largura do Nada (BRANDÃO, 2006,
p. 100-102).
353
Wallace na Cultura da Cidade
Ignácio de Loyola Brandão
Dia desses, na verdade há meses, passei pela Texidal na Rua 4. Fechada.
Acabou-se. Talvez a Tecidos Texidal Ltda. tenha durado uns 50 anos. Ainda se
pode saber dela por alguns bancos de jardim, desses de granito que ainda
existem e duraram uma eternidade nas praças. A loja acabou. Veio-me um
instante de nostalgia. No início dos anos 50 eu seguia o mesmo ritual todos os
dias. Voltava da aula do Ieba, almoçava, e saia em seguida, minha mãe
reclamava: “nem esquenta a cadeira”. Descia como se diz aqui – rumo ao
centro, atravessava o Jardim Público e entrava na Texidal. Cerca de 14 horas.
Perguntava pelo Wallace, que era Leal. Acho que tamm Valentim Rodrigues. Às
vezes ele estava ocupado, me mandava esperar. Eu subia a um mezanino que
existia no fundo da loja e aguardava. Curioso, agora estou pensando nisso. Qual
era a função do Wallace na Texidal? Não podia ser contador ou coisa assim. Não
era do seu temperamento. Conhecido pelo bom gosto e cultura, seria a pessoa
que escolhia os tecidos, conhecia tendências? Está aí uma palavra que não existia
com o sentido atual.
Logo me atendia (não me veio outra palavra). E cada dia era um assunto.
Ou a minha crítica de cinema com a qual ele concordava ou não. Ou um livro que
estava traduzindo. Passou uns seis meses na versão de Rochester para o
português. Como eu invejava essa capacidade dele de traduzir romances e peças
teatrais. Ou era um livro que estávamos ambos lendo, porque se eu via que o
Wallace (ou o Raphael Luiz, outro amigo, de apelido Dedão) estava lendo alguma
coisa, queria saber o que era e ia atrás. Às vezes me decepcionava e quando
comentava, via que ele tinha largado o livro no meio, não valia a pena. Dedão era
do grupo da Biblioteca Mário de Andrade, habitué de todas as tardes. Wallace
pouco aparecia na biblioteca, ao menos o tanto como nós. Ou ia em outros
horários. Quando chegava era para uma pesquisa, sabia exatamente o que
desejava. Não sei porque, Dedão não simpatizava com ele. Talvez ciúmes,
354
Wallace dominava intelectualmente um grupo que fazia coisas como teatro,
cinema, críticas. Por sua vez Wallace e José Celso também não se bicavam
muito, tanto que o Celso jamais aderiu ao TECA, o grupo de Arena da cidade.
O que havia de positivo nisso? A polêmica, a discussão, algumas vezes apor
meio de jornais.
Aquelas tardes na Texidal, durante hora, hora e pouco, eram necessárias
para mim, eu recebia dicas, informações, relatos, comentários. Por outro lado,
como eu também era um colunista social (como se dizia na época), que falava de
todos os assuntos, Wallace passava um pente-fino no que eu tinha escrito, dizia
“esta nota você poderia ter se aprofundado, melhorado”. Tinha uma noção crítica
do social. E um lado em que falava de elegância e beleza, sendo que o paradigma
era sua parente, a Mariinha, que ficou mitificada para mim. Naquele mezanino da
loja vi nascer projetos de peças que ele dirigiu, traduziu, vi nascer e colaborei
o roteiro do inacabado e desaparecido Aurora de uma Cidade , um filme feito em
16 mm, vi como ele programou projetos sociais, espírita que era. Um homem
eclético. Quando virá sua biografia? Quando se situará Wallace na cultura
araraquarense? Sei que Clodoaldo Medina Filho está pesquisando, recolhendo
material. Falta isso na bibliografia araraquarense.
Artigo publicado no jornal Tribuna Impressa, Araraquara, 27/06/08, p. 4.
355
ANEXO III. CÓPIA EM DVD DE SANTO ANTONIO E A
VACA.
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