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CENTRO UNIVERSITÁRIO CURITIBA
PROGRAMA DE MESTRADO EM DIREITO
ROSANA MARIA FECCHIO
A ATIVIDADE EMPRESARIAL EM CONSONÂNCIA COM OS PRINCÍPIOS E
DIREITOS FUNDAMENTAIS SOCIAIS E DA DIGNIDADE DA PESSOA
HUMANA
CURITIBA
2007
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ROSANA MARIA FECCHIO
A ATIVIDADE EMPRESARIAL EM CONSONÂNCIA COM OS PRINCÍPIOS E
DIREITOS FUNDAMENTAIS SOCIAIS E DA DIGNIDADE DA PESSOA
HUMANA
Dissertação apresentada ao Programa de
Mestrado em Direito Empresarial e
Cidadania do Centro Universitário
Curitiba, como requisito parcial para
obtenção do Título de Mestre em Direito.
Orientadora Professora Doutora Marta
Marília Tonin.
Co-orientadora Professora Doutora
Gisela Maria Bester.
CURITIBA
2007
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ROSANA MARIA FECCHIO
A ATIVIDADE EMPRESARIAL E M CONSONÂNCIA COM OS PRINCÍPIOS E
DIREITOS FUNDAMENTAIS SOCIAIS E DA DIGNIDADE DA PESSOA
HUMANA
Dissertação apresentada como requisito parcial para a obtenção do Título de
Mestre em Direito pelo Centro Universitário Curitiba.
Banca Examinadora constitu ída pelos seguintes professores:
_____________________________________________
MARTA MARÍLIA TONIN – ORIENTADORA
______________________________________________
GISELA MARIA BESTER – CO-ORIENTADORA
______________________________________________ _
MEMBRO EXTERNO
______________________________________________
MEMBRO INTERNO
Curitiba,_____de dezembro de 2007.
Dedico este trabalho aos meus pais Miguel e
Lourdes, ao meu esposo Cristiano, à minha filha Júlia, à
pequena Collie.
AGRADECIMENTOS
Agradeço à minha orientadora, professora Dra. Marta Marilia Tonin, e a minha co -
orientadora, professora Dra. Gisela Maria Bester, por terem assumido a orientação
e co-orientação desta dissertação em um momento tão d elicado, mesmo sabendo
das dificuldades que teríamos pela frente. Certamente foi a colaboração de ambas
que possibilitou a conclusão do trabalho e a sua apresentação para a Banca
Examinadora. Poucos têm a coragem de assumir tarefa tão grandiosa.
Agradeço ao professor Doutor Clayton Reis, pelos primeiros impulsos e pelo
entusiasmo com o tema escolhido, fazendo -me ver o quão interessante seria
discorrer sobre um assunto tão rico e vasto, como é o caso dos princípios e
direitos fundamentais.
Agradeço, finalmente, aos meus pais, meu esposo, à Júlia, à pequena Collie, à
Nine e à Mari, por terem participado tão intensamente do processo de construção
desta dissertação, contribuindo, cada um a seu modo, para a conclusão do
trabalho.
RESUMO
A observância dos pri ncípios constitucionais fundamentais pela empresa, na
busca da lucratividade, vem ganhando importância no contexto histórico da
atividade empresarial , especialmente no Brasil, com a promulgação da
Constituição Federal de 1988 e, mais recentemente, com o ad vento do Código
Civil de 2002. A empresa, no exercício de sua s atividades e tendo em vista a
teoria da eficácia horizontal dos direitos fundamentais nas relações interprivadas ,
deve preocupar-se com a preservação desses direitos, não dos seus
empregados, como de toda a sociedade, respeitando o s princípios da dignidade
humana e da solidariedade, sob os seus mais variados aspectos, sob pena de
arcar com a responsabilidade civil pelos dano s patrimoniais e extrapatrimoniais
que possa ocasionar .
Palavras-chave: Empresa; Atividade Empresarial; Direitos Fundamentais; Assédio
Moral; Responsabilidade Civil.
ABSTRACT
The observance of fundamental constitucional principles by the company, in
search of profitability, is gaining importance in the historical context of the
enterprise, especially in Brazil, with the promulgation of the Federal Constitution of
1988 and, more recently, with the advent of the Civil Code of 2002. The company,
in the exercise of their activities and with a view to the theory of effective horizontal
fundamental rights in inter private relations, should concern itself with the
preservation of those rights, not only of its officials, as the entire society, respecting
the principles of human dignity and solidarity, in its most varied aspects, under
penalty of bear civil liability for damage property and sheet are caused.
Keywords: Enterprise; Business Activity; Fundamental Rights; Moral Harassment;
Liability.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO.........................................................................................................
9
1 OS FUNDAMENTOS DA ATIVIDADE EMPRESARIAL .......................................
11
1.1 Antecedentes históricos a evolução do conceito de atividade empresarial.. ...
11
1.2 A atividade empresarial face à globalização......................................................
14
1.3 A atividade lucrativa da empresa........................................................................
16
1.4 A função social da empres a com base na Constituição Federal de 1988..........
18
1.5 A empresa e o empresário de acordo com o Código Civil brasileiro de 2002....
21
2 A VINCULAÇÃO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS AOS SUJEITOS DE
DIREITO PRIVADO.......................................... ........................................................
26
2.1 Os fundamentos constitucionais dos direitos e garantias fundamentais da
pessoa humana........................................................................................................
26
2.2 A teoria da eficácia horizontal dos direitos fundamentais nas relações
interprivadas.............................................................................................................
31
2.3 O poder hierárquico no âmbito da empresa.... ...................................................
36
2.4 Os direitos da personalidade..............................................................................
40
2.4.1 As lesões aos direitos da personalidade dos empregados .............................
44
2.5 Os conflitos decorrentes das relações laborais na empresa e a observância
dos direitos fundamentais.........................................................................................
46
2.5.1 As proteções constitucionais contra discrim inações na relação de emprego .
50
2.5.2 O ambiente de respeito entre os empregados da empresa como fator de
incentivo....................................................................................................................
54
2.5.3 O assédio moral na empresa...........................................................................
57
3 OS PRINCÍPIOS SOCIAIS, DA DIGNIDADE HUMANA E DA
SOLIDARIEDADE APLICADOS À ATIVIDADE EMPRESARIAL ...........................
60
3.1 Os princípios sociais trab alhistas.......................................................................
60
3.1.1 Os direitos de liberdades sociais direitos fundamentais dos trabalhadores .
63
3.1.2 A atividade empresarial e a realização da justiça social .................................
67
3.1.3 Os direitos individuais e coletivos – direitos sociais........................................
68
3.1.4 A função social da empresa no III milênio .......................................................
72
3.2 O princípio da dignidade da pessoa humana.....................................................
75
3.2.1 O princípio da dignidade da pessoa humana no âmbito do Direito
Constitucional brasileiro ........................................................................................ ....
80
3.2.2 O princípio da dignidade da pessoa humana no Direito Comparado ..............
82
3.2.3 Proteção e limites da dignidade da pessoa humana – limites à restrição dos
direitos fundamentais ......................................................... .......................................
84
3.3 A atividade empresarial face ao princípio da solidariedade...............................
87
4 RESPONSABILIDADE CIVIL DA EMPRESA DECORRENTE DE DANOS
ADVINDOS DA NÃO OBSERVÂNCIA DOS DIREITOS E PRINCÍPIOS
FUNDAMENTAIS EM SUAS RELAÇÕES LABORAIS ...........................................
90
4.1 Os danos patrimoniais e extrapatrimoniais oriundos das relações laborais no
âmbito empresarial......................................................................... ..........................
90
4.2 Os fatores concorrentes dos danos na atividade empresarial............................
95
4.3 A indenização dos danos oriundos das relações laborais..................................
97
4.4 A responsabilidade civil da empresa perante seus empregados.......................
102
CONCLUSÃO...........................................................................................................
106
REFENCIAS............................................................... .........................................
110
1
INTRODUÇÃO
O objetivo desta dissertação é verificar a questão da aplicabilidade dos
princípios e direitos fundamentais na atividade empresarial, especialmente em
relação ao respeito à dignidade da pessoa hu mana. Para isso, far-senecessário
realizar observações sobre as formas que o empresariado possui para dar
cumprimento e respeitar os direitos sociais, o princípio da solidariedade, bem
como os direitos de personalidade, especialmente em relação à qualid ade de vida.
Diante desta proposta, este estudo iniciar -secom um histórico evolutivo
da atividade empresarial e seus fundamentos, discorrendo, por conseguinte, sobre
a posição ocupada pelo “lucro” no contexto empresarial, sobre as influências
advindas com o advento da globalização, bem como sobre as novas obrigações
atribuídas aos empresários diante da consagração de princípios e direitos
fundamentais na Constituição Federal de 1988, além das alterações advindas com
a entrada em vigor do Código Civil bra sileiro de 2002.
A partir daí, tratar-sede aspectos relacionados à constitucionalização do
direito privado, cujo aspecto primordial foi ter estendido aos sujeitos de direito
privado a aplicabilidade imediata e direta dos direitos e das garantias
fundamentais asseguradas na Constituição Federal de 1988. Ver -se, portanto,
as conseqüências para os empresários da aplicação no âmbito do direito privado
dos princípios e direitos fundamentais, discorrendo -se sobre os principais
aspectos que passaram a ser ana lisados no âmbito da atividade empresarial com
a finalidade de o ferir direitos e garantir as condições mínimas exigidas para
uma vida digna a cada um de seus empregados e à sociedade como um todo.
Neste contexto, priorizar -se a discussão em torno de a lguns dos
principais princípios e direitos fundamentais que devem ser considerados no
exercício da atividade empresarial, embora, de maneira geral, todos os direitos e
garantias fundamentais devam ser assegurados aos indivíduos. Contudo, cuidar -
se dos princípios e direitos sociais trabalhistas, dos direitos de liberdades
sociais, da realização da justiça social e da função social da empresa no III
milênio. Igualmente, verificar -se o princípio da dignidade da pessoa humana,
2
discorrendo sobre sua proteção e limites, além de analisar -se a questão da
atividade empresarial em face do princípio da solidariedade.
Finalmente, discorrer-se-á sobre o instituto da responsabilidade civil e sua
aplicabilidade às empresas em decorrência da eventual não observação dos
princípios e direitos fundamentais. Tratar -se-á sobre aspectos relacionados aos
danos patrimoniais e extrapatrimoniais, especialmente em relação à figura do
trabalhador, além de citar fatores concorrentes dos danos que podem ser
observados na atividade emp resarial e, por conseguinte, a questão da indenização
naqueles casos onde a efetiva ocorrência do dano restar comprovada.
Deste modo, evidencia -se a adequada aderência do tema desta
dissertação, intitulada “A atividade empresarial em consonância com os pri ncípios
e direitos fundamentais sociais e da dignidade da pessoa humana”, com a Linha
de Pesquisa “Atividade Empresarial e Constituição: inclusão e sustentabilidade”, à
qual as professoras orientadoras estão adstritas, bem como com a Área de
Concentração deste Mestrado – “Direito Empresarial e Cidadania”.
3
1 OS FUNDAMENTOS DA ATIVIDADE EMPRESARIAL
1.1 Antecedentes históricos a evolução do conceito de atividade
empresarial
Ao se pretender dar uma visão histórica da evolução do conce ito de
atividade empresarial, o primeiro problema que se coloca é quanto ao seu próprio
nome. É essencial lembrar que o termo “atividade empresarial”, em qualquer
ângulo que for estudado, vai sempre se referir ao conceito de empresa, e que o
conceito desta varia apenas em termos terminológicos de acordo com a época em
que for localizada.
De qualquer modo, pode -se dizer que “empresa”, atualmente, refere -se a
quem exerce profissionalmente alguma atividade econômica de forma organizada
para a produção e venda de bens ou serviços.
Márcia Mallmann Lippert, ao discorrer sobre “empresa” e “empresário”, traz
os seguintes conceitos:
[...] poder-se-ia dizer que: a) é empresário ou empresária
todo aquele ou toda sociedade que exerce profissionalmente
uma atividade, por meio da organização dos fatores de
produção (mão-de-obra e capital), em atividade, e desde
que tenha assumido o risco do empreendimento; b) empresa
significa os fatores de produção organizados e postos em
atividade pelo empresário ou pela sociedade empre sária,
por meio do estabelecimento.
1
1
LIPPERT, Márcia Mallmann. A empresa no código civil: elemento de unificação no direito
privado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p. 136.
4
Adiante, ao analisar o conceito de empresário sob o enfoque do digo
Civil vigente, prossegue a autora afirmando que empresário pode ser conceituado
“como sendo o titular (sujeito de direito) que investe capital, coo rdena e exerce a
atividade, seja o empresário pessoa jurídica [...], seja pessoa física”.
2
Para Miguel Reale, a empresa é composta por três fatores: “[...] a
habitualidade no exercício de negócios que visem a produção ou a circulação de
bens ou de serviços; o escopo de lucro ou resultado econômico; a organização ou
estrutura estável dessa atividade”.
3
Todavia, nem sempre foi assim, embora seja tarefa difícil estabelecer
quando o homem iniciou a prática da atividade comercial, que sempre houve de
diferentes formas o exercício de tal necessidade. De fato, a origem histórica da
atividade comercial, e conseqüentemente empresarial, surgiu em função das
próprias necessidades de sobrevivência do homem, que variou segundo as
facilidades de cada época.
Contudo, sabe-se que a evolução dos conceitos de empresa e de atividade
empresarial deu-se em três fases mais marcantes: a mercantil, a comercial e a
empresarial propriamente dita.
Na primeira fase, que se iniciou em torno do ano de 1500, predominavam
na Europa as chamadas “corporações”, formadas por profissionais como alfaiates,
ferreiros, sapateiros, etc., além dos mercadores, que eram os responsáveis pela
negociação dos produtos confeccionados pelas corporações. Nesse período,
surgiu o conhecido Direito Mercantil, criado pelos mercadores da época para a
realização dos seus objetivos comerciais.
Sobre essa fase, importante transcrever a lição de José Francelino de
Araújo a respeito das atividades dos artesãos:
Outro fator evolutivo foi o artesanato. Os artesãos traz iam
para a praça e, posteriormente, para o mercado, suas
artesanias e ali, numa espécie de feira, realizavam os atos
de compra e venda. Os mercados tiveram muita importância
2
Idem, ibidem, p. 141.
3
REALE, Miguel. O projeto de Código Civil: situação atual e seus problemas fundamentais. São
Paulo: Saraiva, 1986, p. 98 -99.
5
principalmente na Itália, onde este sistema de venda teve
maior impulso. Quando o artesão não pagava o seu bito,
os credores compareciam ao mercado e, literalmente,
quebravam a banca do devedor, surgindo daí, a expressão
bancarrota, para designar a quebra.
4
A segunda fase, conhecida como “comercial”, iniciou -se em torno do ano de
1807 e foi marcada pelo desaparecimento da classe dos mercadores e das
corporações bem como pelo advento da burguesia, fruto da Revolução Francesa
de 1789. Assim, o Direito Mercantil foi substituído pelo Direito Comercial,
principalmente pela influência do digo Comercial francês de 1807, que entrou
em vigor em 1808, cuja inovação foi concentrar a atividade comercial nos atos de
comércio, e não mais na figura do comerciante, como ocorria até então. Neste
sentido é a lição de Alfredo de Assis Gonçalves Neto, q ue afirma: “Esse Código
teria rompido a tradição histórica para transformar -se no Código de uma classe de
atos, os atos de comércio, independentemente da qualidade do sujeito que os
praticasse”.
5
A terceira fase, por sua vez, chamada de “empresarial”, que vai de 1942 até
os dias atuais, iniciou -se com o aparecimento do Código Civil italiano e espalhou -
se pelo mundo todo, estabelecendo uma nova visão da atividade comercial,
inclusive com a substituição do Direito Comercial pelo Direito Empresarial, tendo
como base de sua organização a conhecida “teoria da empresa”.
No Brasil, o que de mais recente ocorreu em relação ao Direito Comercial
decorre da recente promulgação do Código Civil vigente, ocorrida em 2002, que
traz entre suas normas, a previsão legal de empresário”, de “sociedade
empresarial” e de “estabelecimento”.
De acordo com o artigo 966, do Código Civil, cuja redação segue abaixo
transcrita, empresário conceitua -se da seguinte forma:
4
ARAÚJO, José France lino de (Coord.). Direito empresarial. Porto Alegre: Sagra Luzzatto, 1998,
p. 10.
5
GONÇALVES NETO, Alfredo de Assis. Manual de direito comercial . 2. ed. Curitiba: Juruá,
2002, p. 45.
6
Art. 966 Considera-se empresário quem exerce
profissionalmente atividade econômica organizada para a
produção ou a circulação de bens ou de serviços.
Parágrafo único: não se considera empresário quem exerce
profissão intelectual, de natureza científica, literária ou
artística, ainda com o concurso de auxiliares ou
colaboradores, salvo se o exercício da profissão constituir
elemento de empresa.
Não é demais lembrar, como já restou afirmado no início, que o termo
atividade empresarial vai sempre se referir ao conceito de empresa.
Assim, com base nas considerações acima realizadas, é possível, portanto,
observar os caminhos traçados pela atividade empresarial até alcançar os
contornos atuais. o obstante, existe uma série de outros aspectos que devem
ser analisados no que tange à atividade empresarial, especialmente aque les
relacionados à observância dos princípios e direitos fundamentais, que serão
tratados oportunamente.
Entretanto, antes de adentrar -se na seara dos princípios e direitos
fundamentais, tratar-se dos impactos gerados sobre a atividade empresarial em
decorrência do fenômeno da globalização, nos termos do item a seguir.
1.2 A atividade empresarial face à globalização
Trata-se a globalização de um processo de transformação que vem
ocorrendo mundialmente no campo econômico e político, cujo objetivo é ab rir
fronteiras no sentido de transformar o mundo numa “aldeia global”.
No que se refere à atividade empresarial, embora a globalização tenha
beneficiado algumas empresas nacionais, outras tantas foram seriamente
prejudicadas, haja vista terem ficado sem co ndições de competir com as
empresas dos países ricos, refletindo tal fator diretamente na expansão da
desigualdade econômica e social, verificada principalmente pelo aumento do
7
desemprego e no desrespeito aos direitos humanos fundamentais, conforme
afirma Carlos Berzosa:
La desigualdad económica es el rasgo más característico del
mundo en que vivimos. Todos los países del mundo
padecen dentro de sus fronteras la desigualdad, aunque
unos más que otros, pero en todos existe, lo que pone em
evidencia es que, a pesar de los avances conseguidos por la
ciencia y la tecnologia y el crecimiento económico
alcanzado, no se han dado pasos que resulten realmente
significativos em la consecución de una economía más
eqüitativa.
6
Em relação à proteção dos direitos socia is, prejudicada diante da
globalização, Norberto Bobbio, aliás, já afirmava que:
[...] o tremendo problema diante do qual estão hoje os
países em desenvolvimento é o de se encontrarem em
condições econômicas que, apesar dos programas ideais,
não permitem desenvolver a proteção da maioria dos
direitos sociais.
7
Além disso, outros fatores internos também são influenciados pelo processo
de globalização econômica, refletindo tais mudanças diretamente nas atividades
das empresas nacionais, como se pode observa r dos ensinamentos de Flávia
Piovesan, ao lecionar que a globalização tem por plataforma:
[...] o neoliberalismo, a redução das despesas públicas, a
privatização, a flexibilização das relações de trabalho, a
disciplina fiscal para a eliminação do déficit público, a
6
BERZOSA, Carlos et al. El subdesarrollo, una toma de conciencia para e l siglo XXI. In:
BERZOSA, Carlos et al. Derechos humanos y desarrollo . Bilbao: Mensajero, 1999, p. 22 -23.
7
BOBBIO, Norberto. A era dos direitos . 2. ed. Tradução de Carlos Nelson Coutinho. Rio de
Janeiro: Elsevier, 2004, p. 63.
8
reforma tributária e a abertura do mercado ao comércio
exterior.
8
No mesmo sentido, Maristela Basso afirma que o surgimento das empresas
multinacionais, ocorrido após o advento da globalização, foi uma decorrência da
não auto-suficiência das empresas nacionais:
Após a II Guerra Mundial, os Estados e, conseqüentemente,
as empresas, deram-se conta de sua não auto -suficiência e
da necessidade de cooperação internacional. A
internacionalização dos negócios, o surgimento das
parcerias empresariais e das empresas multinacionais,
assim como o esforço dos países menos industrializados de
desenvolver suas exportações, são as principais
características da nova economia mundial.
9
Aliás, como conseqüência desse fenômeno, não se pode deixar de
comentar a inevitável ocorrência da flexibilização das relações de trabalho, que
o Estado, pressionado pelos interesses das empresas multinacionais, tem
diminuído seu poder de interferência na proteção do empregado.
Conseqüentemente, o que se verifica é uma certa desregulamentação das leis
trabalhistas, permitindo, de certa forma, que haja uma sobreposição dos
interesses econômicos das empresas sobre os interesses sociais dos
trabalhadores.
Outro resultado da globalização sobre o Direito do Trabalho é o fato de ter
tornado totalmente dispensável no mercado aquele empregado que não possui
qualificação, fato este que vem corroborar o aumento da exclusão social, cujos
níveis cresceram de forma alarmante a partir do início do fenômeno em estudo.
Daniel Sarmento, com p ropriedade, resume o resultado da globalização
sobre a atividade empresarial, lecionando:
8
PIOVESAN, Flávia. Globaliz ação econômica, integração regional e direitos humanos. In:
PIOVESAN, Flavia (Coord.). Direitos humanos, globalização econômica e integração regional .
São Paulo: Max Limonad, 2002, p. 62.
9
BASSO, Maristela. Introdução às fontes e instrumentos do comércio internacional. In: ARAÚJO,
José Francelino de (Coord.). Direito empresarial. Porto Alegre: Sagra Luzzatto, 1998, p. 115.
9
Enfim, a globalização vem alimentando o processo de
esfacelamento do Estado -Previdência, na medida em que
vai corroendo o seu poder de efetivamente subordinar, de
modo soberano, os fatores econômicos e sociais que
condicionam a vida de cada comunidade política.
10
Resta evidente, portanto, que uma parte das empresas nacionais foi
seriamente prejudicada devido à globalização, que projetou novos contornos à
esfera econômico-social. Entretanto, no intuito de minimizar os prejuízos e riscos
dela decorrentes, os direitos fundamentais tiveram sua eficácia reforçada e
serviram de parâmetros na reestruturação destas empresas, especialmente diante
da necessidade de se garantir o s direitos sociais básicos da população.
Assim, analisadas as conseqüências da globalização sobre a atividade
empresarial, discorrendo sobre os principais prejuízos dela advindos,
destacaremos a seguir de que forma a empresa superou tais intempéries e part iu
em busca da lucratividade.
1.3 A atividade lucrativa da empresa
Como se sabe, o papel da empresa no sistema capitalista, além de
desenvolver a sua função social, é proporcionar lucros aos seus proprietários
como retorno do capital investido, conform e esclarece Sebastião José Roque:
Toda empresa tem seu objeto e seu objetivo: o objeto é o
seu ramo de atividade; o objetivo, o lucro. O intento lucrativo
é da essência da empresa; ninguém monta uma empresa
por diletantismo, por passatempo, por beneficênc ia ou por
vaidade. O empresário é um profissional, pois investe seu
dinheiro na empresa, para fazê -la gerar lucros com que
possa viver. Este é o objetivo da empresa: proporcionar
lucros para si, para distribuí -los aos empresários.
11
10
SARMENTO, Daniel. Direitos fundamentais e relações privadas . 2. ed. Rio de Janeiro: Lúmen
Júris, 2006, p. 29.
11
ROQUE, Sebastião José . Tratado de direito empresarial . São Paulo: Ícone, 2003, p. 80.
10
A matéria relativa ao lucro gerado pela empresa está disposta no Código
Civil brasileiro, quando o legislador estabelece a estrutura jurídica da sociedade,
verificada no Título II (Da Sociedade), do Livro II (Do Direito de Empresa), em
especial o artigo 981, do citado codex, que explica:
Art. 981 - Celebram contrato de sociedade as pessoas que
reciprocamente se obrigam a contribuir, com bens ou
serviços, para o exercício de atividade econômica e a
partilha, entre si, dos resultados.
O que realmente caracteriza o contrato de so ciedade é o objetivo comum às
partes contratantes de se unirem na busca por um resultado pretendido. A esse
fator subjetivo a doutrina o nome de affectio societatis
12
, entre os quais,
obviamente, inclui-se o lucro.
Nesse contexto, o se pode deixar de c itar o disposto no artigo 2.247, do
Código Civil italiano, que da mesma forma, referencia a divisão dos lucros obtidos
entre as pessoas que compõem a sociedade, determinando o seguinte:
Art. 2.247 - Com o contrato de sociedade, duas ou mais
pessoas contribuem com bens ou serviços para o exercício
comum de uma atividade econômica, com o escopo de,
entre si, dividir os lucros.
De Plácido e Silva, em anotações referentes às características do comércio,
sintetiza a importância do lucro afirmando:
[...] porquanto não se pode admitir o comércio, como
instituição jurídica, quando não se anota semelhante intuito
ou intenção. O proveito ou o meio de vida, a par do espírito
especulativo, evidenciados no exercício dele é que lhe
imprimem o traço dominante para o fun dar como figura
12
RODRIGUES, Silvio. Contratos e declarações unilaterais da vontade . 29. ed. atual. de acordo
com o novo Código Civil (Lei n. 10.406, de 10 -1-2002). São Paulo: Saraiva, 2003, v. 3, p. 311.
11
jurídica, concomitantemente com os demais elementos de
sua formação.
13
Contudo, apesar de o empresário ter direito à obtenção do lucro, nos
tempos modernos a empresa tem que cumprir a sua “função social”, ou seja, a sua
existência e funcionamento devem ser compatíveis com os interesses da
sociedade, que a empresa não deve proporcionar benefícios apenas aos seus
proprietários, mas à toda coletividade, como ver -se-á no decorrer desta
dissertação.
Sobre o assunto, conforme análise do artigo 421, do Código Civil brasileiro,
no próprio contrato celebrado para o nascimento das sociedades, é obrigada a
observação da sua função social, senão vejamos : ”Art. 421 - A liberdade de
contratar será exercida em razão e nos limites da função social do cont rato”.
Por função social do contrato, entende Sílvio Rodrigues que “revelar -se-ia
na idéia de relativo equilíbrio das prestações devidas por cada um dos
contratantes”.
14
Assim, ainda que a atividade lucrativa da empresa faça parte dos seus
objetivos, exige-se que os seus meios de produção sejam também destinados a
uma finalidade social, isto é, que tenha por objetivo principal, ao lado da obtenção
de lucro, a melhora da qualidade de vida da população. É sobre este assunto que
se tratará a seguir.
1.4 A função social da empresa com base na Constituição Federal de 1988
Para que se tenha uma melhor compreensão da função social da
propriedade no âmbito constitucional, é necessário entender, primeiramente, o que
vem a ser função social da propriedade.
13
SILVA, De Plácido e. Noções práticas de direito comercial. 14. ed. Rio de Janeiro: Forense,
1992, p. 6.
14
RODRIGUES, Silvio. Contratos e declarações... Op. cit., p. 61.
12
No entendimento de Ana Prata, citada por Laura Beck Varela e Marcos de
Campos Ludwing:
[...] a Constituição Portuguesa encerra duas idéias sicas
sobre função social: (a) a proteção da propriedade enquanto
esta for produtiva, a desvelar a obrigação de utilizar o
respectivo bem de produção; (b) a proteção da propriedade
enquanto esta for instrumento de instauração de novas
relações sociais e de produção, a atingir a questão dos bens
e a estruturação dessas relações ‘entre os sujeitos
proprietários e os outros suj eitos que estão em alguma
medida interessados no uso do bem’.
15
o termo “propriedade”, segundo aceitação doutrinária, tem nos tempos
modernos um sentido mais abrangente, devido ao valor que está sendo dado à
sua destinação social, razão pela qual, obvia mente, abrange também as
empresas. Assim, de acordo com essa nova visão, o direito de propriedade passa
a ter uma função social a ser cumprida, tornando -se um direito plural e solidário.
Para Pontes de Miranda, a expressão “propriedade” pode ser analisada sob
vários sentidos:
Em sentido amplíssimo, propriedade é o domínio ou
qualquer direito patrimonial. Tal conceito desborda o direito
das coisas. O crédito é propriedade. Em sentido amplo,
propriedade é todo direito irradiado em virtude de ter incidido
regra de direito das coisas. Em sentido quase coincidente, é
todo direito sobre as coisas corpóreas e a propriedade
literária, científica, artística e industrial. Em sentido estrito, é
só o domínio.
16
Constitucionalmente, apesar da imprecisão do termo, vários dispositivos
enunciam a “função social da propriedade”, destacando -se o artigo 5, incisos XXII
e XXIII, da Constituição Federal vigente, que determina :
15
Apud VARELA, Laura Beck; LUDWIG, Marcos de Campos. Da propriedade às propriedades:
função social e reconstrução de um direito. In: MARTINS-COSTA, Judith (Org.). A reconstrução
do direito privado: reflexos dos princípios, diretrizes e direitos fundamentais constitucionais no
direito privado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 773.
16
MIRANDA, Pontes de. Tratado de direito privado . Campinas: Bookseller, 2001, v. 11, p. 37.
13
Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e a os estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e
à propriedade, nos termos seguintes:
[...]
XXII - é garantido o direito de propriedade;
XXIII - a propriedade atenderá a sua função social;
[...]
Da mesma forma, o artigo 170, da Constituição Federal de 1988, ao tratar
dos princípios gerais da atividade econômica, traz em seu inciso III a peculiaridade
desta função:
A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na
livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme
os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:
[...]
II - propriedade privada;
III - função social da propriedade;
[...]
Ressalte-se que a função social da propriedade sempre foi alvo do
legislador nacional em vários dispositivos legais, tais como: Lei n. 6.404/76 (Lei
das S/A), Lei n. 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor), Lei n. 10.257/01
(Estatuto da Cidade), além da Lei n. 10.406/02 (Código Civil de 2002).
Com base na análise do texto constitucional, percebe -se que a função
social da empresa é decorrente da ampliação do princípio da função social da
propriedade. Aliás, com a promulgação da Constituição Federal de 1988, que
definitivamente delineou os contornos do referid o instituto, houve uma nova visão
da empresa, no sentido de exigir que a mesma também cumpra sua função social.
Ademais, pode-se constatar da leitura dos dispositivos acima, que o
legislador constitucional consagrou a ordem econômica com base na valorizaçã o
do trabalho em uma economia capitalista, cujo objetivo é assegurar a todos uma
existência digna, enumerando, logo a seguir, os princípios que dão base a tais
objetivos.
14
Desta maneira, pode -se afirmar que a função social da atividade
econômica, dando cump rimento ao preceito contido no caput do artigo 170, da
Constituição Federal, é a satisfação das necessidades prioritárias da população,
quais sejam: saúde, educação, habitação, transporte etc.
Por conseguinte, a função social das empresas, ou seja, a funçã o social
dos meios de produção é atender tais necessidades básicas das pessoas, no
sentido de lhes oferecer bens e serviços de qualidade, proporcionando a todos
uma existência digna, principalmente no que diz respeito à geração de empregos.
Com o intuito de tutelar as necessidades básicas dos indivíduos,
promulgou-se no Brasil o Código de Defesa do Consumidor (Lei n. 8.078, de
11/09/90), sendo certo que tal defesa encontrava -se, antes de tudo, agasalhada
pela Constituição Federal, nos termos do inciso XXXII , do artigo 5, que determina:
“[...] XXXII - o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor; [...]”.
A função social da empresa manifesta -se, ainda, com relação à
conservação do meio ambiente, como exposto no inciso VI, do artigo 170, da
Constituição Federal de 1988:
Art. 170 [...]
VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento
diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de
seus processos de elaboração e prestação; (Redação dada pela
Emenda Constitucional n. 42, de 19.12.2003)
[...]
De fato, a preservação do meio ambiente é um dos princípios da ordem
econômica, cabendo às empresas, portanto, rumo ao seu d esenvolvimento
econômico, planejar o desenvolvimento sustentável, no sentido de atender as
suas necessidades do momento sem colocar em risco a sobrevivência das
gerações futuras.
Assim, que mencionamos o assunto, cumpre -nos citar que no artigo 225,
da Constituição Federal de 1988, o legislador constituinte tratou especificamente
da preservação do meio ambiente, determinando o seguinte:
Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente
ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e
15
essencial à sadia qualidade de vida, impondo -se ao Poder
Público e à coletividade o dever de defendê -lo e preservá-lo
para as presentes e futuras gerações.
Desse modo, é dever do Estado e obrigação dos empresários de promover
a dignidade do homem, que se manifesta, entre ou tras formas, quando desfruta de
um meio ambiente ecologicamente equilibrado, ou nas palavras de José Antônio
Peres Gediel, é necessário “[...] descaracterizar o trabalho como mercadoria
mensurável a preço de mercado, para reconhecê -lo como função social”.
17
Feitas estas observações, cuidar -sea seguir da figura da empresa e do
empresário em face das novas alterações e determinações advindas com o
Código Civil brasileiro de 2002.
1.5 A empresa e o empresário de acordo com o Código Civil brasileiro de
2002
Com a promulgação do Código Civil brasileiro (Lei n. 10.406, de 10 de
janeiro de 2002), que entrou em vigor em janeiro de 2003, no tocante à figura do
empresário, houve uma radical mudança no ordenamento jurídico brasileiro em
relação ao sistema baseado no Código Comercial de 1850.
No Código Civil vigente o legislador destinou um livro específico ao Direito
da Empresa que, além de inovar com a figura jurídica do empresário, ainda
apresenta uma nova estrutura aos diversos tipos de sociedades, como se extr ai da
lição de Celso Marcelo de Oliveira:
Com a unificação do Direito Comercial com o Direito Civil, no
novo Código Civil brasileiro, desaparece a distinção entre
sociedade civil e comercial. Neste desiderato, o Código
contemplou a existência das sociedad es ‘não
17
GEDIEL, José Antônio Peres. A irrenunciabilidade a direitos da personalidade pelo trabalhador.
In: SARLET, Ingo Wolfgang (Org.). Constituição, direitos fundamenta is e direito privado. 2. ed.
rev. e ampl. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006, p. 155. (grifos originais)
16
personificadas’, divididas entre ‘sociedades comuns’ e
‘sociedades em conta de participação’, e das ‘sociedades
personificadas’, divididas em ‘sociedades simples’ e
‘sociedade empresarial’.
18
Contudo, o Código Civil de 2002 o define o que vem a s er “empresa”,
ficando a cargo da doutrina tal tarefa, contentando -se apenas em conceituar o
“empresário”, o que fez no artigo 966, já transcrito no item 1.1
19
.
Pela simples leitura do caput do artigo supracitado, percebe -se que o
legislador apresentou todas as características necessárias para a qualificação da
figura do empresário.
Afora tal conceituação legal, Sebastião José Roque define “empresário” da
seguinte forma:
Pessoa física ou jurídica que dirige a empresa. É possível,
portanto, que uma empresa s eja também empresária, como
o caso de uma empresa que tinha, como sócias, três outras
empresas, e as três exerciam a gerência. O empresário é o
titular da empresa e seu representante legal: a empresa
assina um contrato por intermédio do empresário, seu
representante legal. É o pessoal que exerce diretamente a
atividade empreendedora e faz a empresa exercer a
atividade que cabe a ela.
20
Por outro lado, o parágrafo único do artigo supracitado, descreve as
situações que descaracterizam a figura do empresário, ou seja, apesar deste
produzir bens e serviços, o se encaixa na situação de empresário pelo simples
fato de faltar o elemento de organização dos fatores de produção.
Percebe-se que o legislador pecou na redação do parágrafo único em
estudo, já que se o e xercício de profissão intelectual, de natureza científica,
18
OLIVEIRA, Celso Marcelo de . Direito empresarial: à luz do novo código civil. Campinas: LZN,
2003, p. 54.
19
“Art. 996 - Considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica
organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços.
Parágrafo único. Não se considera empresário quem exerce profissão intelectual, de natureza
científica, literária ou artística, ainda com o concurso de auxiliares ou colaboradores, salvo se o
exercício da profissão constituir elemento de empresa”.
20
ROQUE, Sebastião José. Op. cit., p. 73.
17
literária ou artística não constitui elemento de empresa, obviamente que não se
enquadra na definição do caput. Este também é o entendimento da maioria da
doutrina.
O comercialista Luiz César Quint ans, ao se referir à redação do referido
parágrafo, adverte “como a composição da norma não ficou perfeita, apenas o
futuro, através de julgados, secapaz de confirmar o que poderá realmente ser
considerado como exclusão ao conceito de empresário”.
21
Frise-se que a ultrapassada denominação de comerciante, constante do
Código Comercial, com a nova lei passou a chamar -se empresário, além do que,
as antigas sociedades comerciais, a partir de então, passam a se denominar
sociedades empresariais.
Ressalte-se que, de acordo com a nova lei em comento, o comerciante e os
chamados atos de comércio perderam seu tradicional significado, constante do
revogado artigo 4, do Código Comercial, dando lugar, respectivamente, à figura do
empresário e à atividade comercial.
Outrossim, faz-se mister tecer alguns comentários acerca do novo perfil da
empresa, após a unificação do direito obrigacional levada a efeito com a
promulgação do novo Código Civil.
Embora não haja um consenso a respeito do conceito de empresa, visto
que este varia segundo os diversos entendimentos do que seja o fenômeno
econômico que lhe serve de subsídio, pode -se citar o conceito dado por Maurício
Godinho Delgado, para quem empresa “é o complexo de bens materiais e
imateriais e relações jurídicas que se re únem como um todo unitário, em função
de dinâmica e finalidade econômicas fixadas por seus titulares”.
22
Para Celso Marcelo de Oliveira “a empresa seria a própria atividade
empresarial, ou seja, a força de movimento rotacional que implica a atividade
empresarial dirigida para determinada finalidade produtiva”.
23
Neste sentido, conforme assevera o doutrinador Sebastião José Roque, é
importante destacar que:
21
QUINTANS, Luiz César. Direito de empresa. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 2003, p. 6.
22
DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho . 4. ed. São Paulo: LTr, 2005, p.
396.
23
OLIVEIRA, Celso Marcelo de . Op. cit., p. 16.
18
Quando falamos em empresa, ficam incluídas as empresas
públicas e as prestadoras de serviços. A empresa pública e
a de economia mista pertencem ao governo; todavia, sua
função é produzir e vender, transformando -se juridicamente,
não em um órgão da administração pública, mas num centro
de interesses, regido pela legislação empresarial. Ao
incluirmos a empresa cujo objeto social seja a prestação de
serviços, procuramos arredar os efeitos da não exigência de
registro n Junta Comercial, sendo assim considerada uma
empresa civil.
24
Em anotações ao conceito de empresa, Orlando Gomes e Elson Gottschalk
também prestam importantes esclarecimentos, sintetizando, do ponto de vista do
Direito do Trabalho, três elementos básicos para caracterizá -lo, quais sejam: “uma
tarefa a executar; uma autoridade que dirige esta execução; um pessoal que
assegura a realização”.
25
Como se pode notar pelas notas acima transcritas, o conceito de empresa é
praticamente aquele constante do artigo 2.082, do Código Civil italiano, que
determina: “Art. 2.082 - É empresa quem exerce profissionalmente atividade
econômica organizada, para a produçã o e venda de mercadorias ou de serviços”.
Aliás, o livro II, do Código Civil vigente, que trata do Direito da Empresa,
segundo a opinião de boa parte da doutrina nacional, foi totalmente inspirado no
Código Civil italiano de 1942, que da mesma forma que o legislador nacional,
também não definiu juridicamente a empresa.
Levadas a efeito estas observações, pode -se afirmar que a modernização
das práticas comerciais necessitou que fosse desenvolvida uma teoria que
facilitasse a aplicação da lei no sentido de re gular e, conseqüentemente, ampliar a
atividade comercial, que a teoria dos atos de comércio não atendia tais
objetivos. Tal necessidade deve -se, também, à dificuldade encontrada pelo
legislador em estabelecer os parâmetros da teoria dos atos de comércio que
24
ROQUE, Sebastião José. Op. cit., p. 73.
25
GOMES, Orlando; GOTTSCHALK, Élson. Curso de direito do trabalho . Rio de Janeiro:
Forense, 1995, p. 62.
19
serviu de referência ao Código Comercial brasileiro no sentido de estabelecer as
diretrizes da atividade comercial.
De fato, esse entendimento foi adotado pelo legislador italiano em 1942,
assim como pelo legislador brasileiro, por ocasião da promulga ção do Código Civil
de 2002, conforme visto, estabelecendo -se a denominada Teoria da Empresa,
visando ampliar a incidência da atividade comercial, não considerando mais o ato
de comércio como base da referida teoria, mas sim, a atividade empresarial.
Neste aspecto Sebastião José Roque ensina:
[...] o antigo Direito Empresarial, o chamado Direito
Comercial, adotava um critério objetivo, por assentar -se no
ato de comércio, enquanto o moderno, da fase empresarial,
assenta-se na teoria da empresa.
26
Continua o autor, enfatizando que:
O moderno Direito Empresarial, adotando critério subjetivo,
por considerar a empresa como pedra angular de sua
doutrina, toma em consideração o ato de comércio, não
isolado, mas os atos de comércio constituindo uma
atividade. O Direito Empresarial é uma ciência jurídica e
uma ciência o pode partir de fatos isolados [...]. A
atividade não significa ato, mas uma série de atos
coordenáveis entre si, uma função de uma finalidade
comum.
27
Estas são, portanto, as principais alterações ocorridas sobre a figura da
empresa e do empresário em razão da nova disciplina do Código Civil de 2002.
Entretanto, juntamente com elas, tantas outras modificações foram observadas,
especialmente no modo de atuação da empresa e nas obrigações e
responsabilidades dos empresários, destacando -se dentre elas a obrigatoriedade
da observância dos direitos fundamentais no exercício da atividade empresarial,
tema principal deste trabalho.
26
ROQUE, Sebastião José. Op. cit., p. 67.
27
Idem, ibidem.
20
Desta forma, torna -se importante pontuarmos quais são as novas
obrigações e responsabilidades atinentes à empresa e ao empresário no tocante à
observância dos direitos fundamentais. É este assunto, portanto, o objeto de
análise no capítulo seguinte.
2 A VINCULAÇÃO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS AOS SUJEITOS DE
DIREITO PRIVADO
2.1 Os fundamentos constitucionais dos direitos e garantias fundamentais
da pessoa humana
A questão concernente aos direitos e garantias fundamentais da pessoa
humana e o papel da Constituição remonta à época do Iluminismo. O monumento
do Iluminismo legitimou o poder da Constituição, cuja importância foi inserida no
artigo 16 da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, que
assim determinava: “toda a sociedade, na qual a garantia dos direitos não é
assegurada, nem a separação de poderes de terminada, não tem constituição”.
28
Contudo, foi com o advento das Constituições dos Estados democráticos,
ocorrido durante todo o século XX, notadamente nos países romano -germânicos,
28
SARMENTO, Daniel. Op. cit., p. 9.
21
que os princípios fundamentais passaram a fazer parte dos textos das
Constituições, e por tal motivo, tornaram -se normas diretivas, inclusive no que se
refere ao Direito Privado. Entretanto, conforme acentua Ingo Wolfgang Sarlet:
Desde o seu reconhecimento nas primeiras Constituições,
os direitos fundamentais passaram por dive rsas
transformações, tanto no que diz com seu conteúdo, quanto
no que concerne à sua titularidade, eficácia e efetividade.
[...] Com efeito, não como negar que o reconhecimento
progressivo de novos direitos fundamentais tem o caráter de
um processo cumulativo, de complementaridade, e não de
alternância [...].
29
Trata-se a Constituição de um conjunto de normas jurídicas imperativas,
que devem ser respeitadas por todos e cuja aplicabilidade pode ser pleiteada em
juízo quando suas normas não forem observada s livremente. Portanto, é a
Constituição dotada de uma “superioridade normativa”.
30
Conforme ensinamento de Daniel Sarmento:
[...] constituições como a brasileira, a alemã, a espanhola e
a portuguesa, que representam marcos na superação de
formas estatais autoritárias, são timbradas pela preocupação
com a promoção de valores humanitários de dignidade
humana, liberdade, democracia, igualdade e justiça, que não
podem ser desconsiderados no momento da sua
interpretação e aplicação.
31
Com respaldo na assertiva a cima, o resta dúvida de que um dos
assuntos mais palpitantes inseridos na Constituição Federal de 1988 diz respeito
aos direitos e garantias fundamentais da pessoa humana. Aliás, na expressão
”fundamentais”, segundo José Afonso da Silva, “acha -se a indicação de que se
29
SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais . 2. ed. atual. Porto Alegre:
Livraria do Advogado, 2001, p. 48 -49.
30
Neste sentido, ver SARMENTO, Daniel. Op. cit., p. 51.
31
SARMENTO, Daniel. Op. cit., p. 121.
22
trata de situações jurídicas sem as quais a pessoa humana não se realiza, não
convive, às vezes, nem mesmo sobrevive”.
32
De outro lado, para José Joaquim Gomes Canotilho, direitos fundamentais
“são os direitos do homem jurídico -institucionalmente garantidos e limitados
espaço temporalmente”.
33
No que se refere aos princípios, são eles o elo entre a ética e os ideais de
justiça no Direito, especialmente o Direito Constitucional, tratando -se de
verdadeiras normas jurídicas. Ao discorrer sobre sua importância, Gisela Maria
Bester ensina que:
Os princípios possuem hegemonia axiológica. Tanto isto é
verdade que [...] um conflito entre regras se resolve na
dimensão da
BhEt4w0 14(s.)]TJmensão da
23
de paradigmas que decorre da própria evolução da humanidade, como bem
salienta o mestre Norberto Bobbio:
Os direitos do homem constituem uma classe variável, como
a história destes últimos séculos demonstra suf icientemente.
O elenco dos direitos do homem se modificou, e continua a
se modificar, com a mudança das condições históricas, ou
seja, dos carecimentos e dos interesses, das classes no
poder, dos meios disponíveis para a realização dos
mesmos, das transformações técnicas etc. [...]. Não é difícil
prever que, no futuro, poderão emergir novas pretensões
que no momento nem sequer podemos imaginar [...]. O que
parece fundamental numa época histórica e numa
determinada civilização não é fundamental em outras
épocas e em outras culturas.
36
De qualquer modo, registre -se que os princípios e direitos fundamentais,
mesmo que de forma restrita, sempre constaram nas Constituições brasileiras,
inclusive, a própria Constituição Imperial estabelecia a inviolabilidade do s
direitos relativos à liberdade, à segurança e à propriedade, que serviu de
referência para as Constituições subseqüentes. Neste aspecto, importante
lembrar, como fez Ingo Wolfgang Sarlet, que:
[...] os ideais da Revolução Francesa igualdade, liberdade
e fraternidade são ainda hoje a fonte axiológica de onde
promanam, como de um manancial inesgotável, os direitos
fundamentais. [Entretanto, no direito brasileiro, foi a
Constituição Federal de 1988 a primeira que previu] um
título próprio destinado aos princípios fundamentais [...].
37
Continua o autor, sobre a Constituição Federal de 1988, assinalando que:
[...] o Constituinte deixou transparecer de forma clara e
inequívoca a sua intenção de outorgar aos princípios
36
BOBBIO, Norberto. Op. cit., p. 38.
37
SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na
Constituição Federal de 1988 . Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001, p. 61.
24
fundamentais a qualidade de normas emb asadoras e
informativas de toda a ordem constitucional, inclusive [...]
das normas definidoras de direitos e garantias fundamentais
[...].
38
Embora exista controvérsia sobre qual seria a interpretação mais adequada
sobre as diferenças entre direitos e gara ntias, que o próprio legislador
constitucional não fez tal distinção, pode -se dizer que algumas das garantias estão
dispostas nos próprios incisos do artigo 5, da Constituição Federal de 1988, como
adverte André Ramos Tavares:
Reconhecem-se alguns direitos, garantindo-os (como no inc.
V). Em vez de declarar -se o direito à resposta proporcional
ao agravo, ‘assegura -se’ o mesmo. De outra parte, garantias
propriamente ditas são gramaticalmente declaradas.
Finalmente, fundem -se num mesmo dispositivo
constitucional o direito e seu instrumento de garantia
correspondente.
39
Nas palavras de Geleotti e Liñares Quintana, citado por Paulo Bonavides, o
termo “garantia” etimologicamente se explica:
[...] pela sua derivação de garant, do alemão gwähren-
gewähr-leistung, cujo significado, acrescenta, é o de
Sicherstellung, ou seja, de uma posição que afirma a
segurança e põe cobro à incerteza e à fragilidade.
40
Assim, para uma melhor compreensão didática do assunto, apresentar -se-á
abaixo a classificação dos direitos fu ndamentais feita por José Afonso da Silva
41
,
que os dividiu em seis grupos, quais sejam:
1) Direitos individuais (artigo 5);
2) Direitos à nacionalidade (artigo 12);
38
Idem, ibidem, p. 62.
39
TAVARES, André Ramos. Curso de direito constitucion al. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 602.
40
Apud BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional . 14. ed. rev. e atual. São Paulo:
Malheiros, 2003, p. 525. (grifos originais)
41
SILVA, José Afonso da. Op. cit., p. 183.
25
3) Direitos políticos (artigos 14 a 17);
4) Direitos sociais (artigos 6 e 193);
5) Direitos coletivos (artigo 5);
6) Direitos solidários (artigos 3 e 225).
Ao discorrer sobre o presente e futuro dos direitos do homem, interessante
relembrar a lição de Norberto Bobbio:
Com efeito, o problema que temos diante de nós não é
filosófico, mas jurídico e, num sentido mais amplo, político.
Não se trata de saber quais e quantos são esses direitos,
qual é sua natureza e seu fundamento, se são direitos
naturais ou históricos, absolutos ou relativos, mas sim qual é
o modo mais seguro para garanti -los, para impedir que,
apesar das solenes declarações, eles sejam continuamente
violados.
42
No tocante aos direitos individuais, constantes do artigo 5, da Constituição
Federal, trata-se de direitos inerentes à pessoa humana, sendo, ipso facto,
irrenunciáveis e inalienáveis.
Saliente-se, da mesma forma, que os direitos e garantias individuais
também não poderão ser abolidos por intermédio de emendas constitucionais,
conforme estabelecido no inciso IV, parágrafo 4, do artigo 60 da Constituição
Federal. Todavia, frise -se que algumas restrições podem ser impostas aos direitos
fundamentais.
Sobre o assunto, Alex Robert, após afirmar que as propostas de
classificação das restrições aos direitos fundamentais são numerosas e de
diferentes tipos; que as diferenças resultam da s diferentes finalidades de
classificação e em parte se baseiam nas obscuridades dos conceitos
fundamentais, especialmente dos conceitos de restrição, classifica as restrições
em diretamente e indiretamente constitucionais.
43
42
BOBBIO, Norberto. Op. cit., p. 45.
43
Los derechos fundamentales, entanto derechos de rango constitucional, pueden ser restringidos
sólo a través de, o sobre la base de, normas con rango constitucional. Por ello, las restricciones de
26
Assim, no direito constituciona l pátrio, tem-se os casos de estado de defesa
(artigo 136) e estado de sítio (artigo 137), nos quais os direitos fundamentais
podem ser restringidos visando preservar ou restabelecer a ordem pública ou a
paz social ameaçada e em outros casos previstos nos referidos artigos.
Por fim, ressaltamos lição de Daniel Sarmento, que ao se referir sobre a
Constituição e direitos e garantias fundamentais, assim leciona:
Neste quadro, no Brasil, onde nosso ordenamento se
alicerça sobre uma Constituição fundada sobre p rincípios e
valores humanitários, como a dignidade da pessoa humana
e o Estado Democrático de Direito, e que conta com um
capítulo tão generoso de direitos fundamentais,
desencadear a força normativa da Lei Fundamental e
projetá-la sobre todos os setores d a vida humana e do
ordenamento jurídico torna -se essencial, para quem se
preocupe com a promoção da justiça substantiva.
44
Resta evidente, portanto, que no cumprimento das diretrizes advindas dos
direitos e garantias fundamentais da pessoa humana, a Consti tuição, como norma
superior a todas as demais, é de importância ímpar. Por encontrarem -se tais
direitos e garantias inseridas na norma constitucional, são oponíveis a todos os
indivíduos, indiscriminadamente, e devem ser observadas em grau máximo pelos
intérpretes do direito, prevalecendo sobre as normas contidas nas demais
codificações, especialmente aquelas que tratam de direitos privados, como
veremos no tópico seguinte.
derechos fundamentales son siempre o bien normas de rango con stitucional o normas de rango
inferior al de la Constitución, a las que autorizan dictar normas constitucionales. Las restricciones
de rango constitucional son directamente constitucionales; las restricciones de rango inferior a la
Constitución, indiretame nte constitucionales. [...] Las restricciones indirectamente constitucionales
son aquéllas cuya imposición está autorizada por la Constitución. La competência para imponer
restricciones inderectamente constitucionales se expresa de manera clarísima en las cláusulas de
reserva explícitas. Cláusulas de reserva explícita son aquellas disposiciones iusfundamentales o
partes de disposiciones iusfundamentales que autorizan expresamente intervenciones,
restricciones o limitaciones. (ROBERT, Alex. Teoria de los derechos fundamentales . Versión
castellana por Ernesto Garzón Valdés. Madrid: Centro de Estudos Constitucionales, 2001, p. 227 -
228).
44
SARMENTO, Daniel. Op. cit., p. 55.
27
2.2 A teoria da eficácia horizontal dos direitos fundamentais nas relações
interprivadas
Durante muito tempo existiu uma distinção clara entre Direito Constitucional
e direito privado. Este tratava de questões relacionadas aos indivíduos, enquanto
aquele, de temas ligados ao Estado. Evidenciava -se neste período a dicotomia
entre direito constitucional e direito civil. Uma das características marcantes era a
forte opressão do Estado sobre o indivíduo e um grande individualismo por parte
dos particulares em relação ao Estado.
Entretanto, hoje não mais é possível negar a vinculação dos pa rticulares
aos direitos fundamentais. Para tanto, é necessário admitir que Estado e
sociedade não podem mais viver em guerra, mas devem unir -se na defesa da
dignidade da pessoa humana, tornando -se Estado e sociedade uma realidade,
objetivando os mesmos fins.
O grande resultado dessa mudança foi que normas constitucionais que
anteriormente regulavam apenas o Estado, passam agora a regular também as
pessoas de direito privado, antes submetidas apenas às regras estabelecidas em
seus códigos.
Sobre o assunto, Melina Girardi Fachin e Umberto Paulini lecionam:
[...] ao contrário do movimento codificador que tinha como
valor necessário a realização da pessoa em seus aspectos
patrimoniais, o constitucionalismo social, abraçado pela
Constituição Cidadã de 1988, acentua a raiz antropocêntrica
do ordenamento jurídico. O patrimônio assume papel de
coadjuvante, num fenômeno que de denominou de
repersonalização.
45
45
FACHIN, Melina Girardi; PAULINI, Umberto. Problematizando a eficácia dos direitos
fundamentais nas relações entre particulares: ainda e sempre sobre a constitucionalização do
Direito Civil. In: TEPEDINO, Gustavo; FACHIN, Luiz Edson (Org.). Diálogos sobre Direito Civil.
Rio de Janeiro: Renovar, 2007, p. 214. (grifos originais)
28
Eugênio Facchini Neto também presta grande contribuição em relação à
matéria, discorrendo da seguinte for ma:
Parte dessa regulamentação passou a ter tamanha
importância que foi elevada à dignidade constitucional.
Temos, então, o fenômeno da constitucionalização de certos
princípios e institutos fundamentais do direito privado, como
é o caso da família, da pr opriedade, da atividade econômica
[...].
46
Como resultado desse processo, diversos valores constitucionais migraram
para o direito civil, sendo o principal deles o princípio da dignidade da pessoa
humana.
47
Conforme acentua Maria Celina Bodin de Moraes, “[. ..] são os valores
expressos pelo legislador constituinte que devem informar o sistema como um
todo”.
48
Terminológicamente, a vinculação dos direitos fundamentais aos
particulares foi denominada por várias expressões, tendo sido chamada de
“eficácia perante terceiros” pela teoria alemã ( Drittwirkung), além de “eficácia
horizontal”, “eficácia privada”, “eficácia horizontal dos direitos fundamentais no
direito privado” e “eficácia dos direitos fundamentais nas relações entre
particulares”, sendo esta última rmula, para Melina Girardi Fachin e Umberto
Paulini, a que expressa melhor a vinculação dos direitos fundamentais aos sujeitos
de direito privado
49
. que se advertir, todavia, sobre a existência de corrente
doutrinária, minoritária, saliente -se, que defende a não vinculação dos particulares
aos direitos fundamentais, baseada na alegação de que é exclusivamente do
Estado o dever de proteger os direitos fundamentais, idéia com a qual não
coadunamos.
46
FACHINI NETO, Eugênio. Reflexões histórico -evolutivas sobre a constitucionalização do direito
privado. In: SARLET, Ingo Wolfgang (Org.). Constituição, direitos fundamentais... Op. cit., p. 31.
(grifos originais)
47
Idem, ibidem, p. 34.
48
MORAES, Maria Celina Bodin de. O conceito de dignidade humana: substrato axiológico e
conteúdo normativo. In: SARLET, Ingo Wolfgang (Org.). Constituição, direitos fundamentais...
Op. cit., p. 109. (grifos originais)
49
FACHIN, Melina Girardi; PAULINI, Umberto. Op. cit., p. 202.
29
No que se refere aos modos de vinculação dos particulares a os direitos
fundamentais, verifica-se que podem ser direto (ou imediato) ou indireto (ou
mediato). O “modo indireto” defende a vinculação dos direitos fundamentais aos
particulares, entretanto, sua eficácia está sujeita à mediação do legislador ou de
um ju
30
3) eficácia mediada pelo magistrado: deriva do poder de decisão do
magistrado, que deve na busca por uma solução justa, interpretar as
normas de direito privado à luz dos direitos fundamentais;
4) eficácia perante os poderes privados: trata -se de eficácia verificada em
casos entre particulares, onde uma das partes envolvidas na questão
possui um determinado poder econômico e social e o utiliza sobre um
grande número de pessoas, influindo na solução do problema. Em tais
casos, os direitos funda mentais terão sua eficácia exercida perante
terceiros, que não o Estado, assumindo sua função objetiva de proteção e
devendo ser respeitados em grau máximo;
5) eficácia de liberdade do indivíduo: refere -se a uma espécie de limite à
eficácia, não cabendo ap elação aos direitos fundamentais em tais casos,
vez que a liberdade é igualmente um direito constitucionalmente
assegurado.
A respeito da eficácia mediada pelo Magistrado, Eugênio Facchini Neto
ensina:
[...] cabe ao magistrado assegurar a fundamentalidade dos
direitos humanos, interpretando o ordenamento jurídico de
forma que respeite e fomente tais direitos, garantindo a
preferencialidade de tal interpretação sobre quaisquer outras
possibilidades hermenêuticas que se abram. Igualmente é o
magistrado que, no caso concreto, usando o método da
hierarquização axiológica [...] deverá ponderar os interesses
em conflitos, concretizando a proteção a um dos direitos
humanos invocados, em detrimento de outro direito,
igualmente fundamental, que abstratamente possa s er
invocado.
52
Assim, diante desta nova visão dos direitos fundamentais, inegavelmente
vinculantes aos sujeitos privados, surge um novo papel para a Administração, que
tem o dever de zelar para que tais direitos o sejam violados, bem como criar
52
FACHINI NETO, Op. cit., p. 54. (grifos originais)
31
meios práticos para que os mesmos sejam gozados, o que se através de
políticas públicas
53
.
De outro modo, nasce para o legislador uma nova obrigação, de caráter
positivo, conforme salienta Eugênio Facchini Neto:
Quanto ao legislador, o reconhecimento da eficácia jurídica
dos direitos fundamentais impõe ao mesmo deveres
positivos, no sentido de editar legislação que regulamente
as previsões constitucionais, desenvolvendo os programas
contidos na Carta. o basta abster -se de editar leis
inconstitucionais, impõe -se o dever de agir positivamente..
54
Também o Judiciário deverá, por meio dos Juízes, interpretar e aplicar o
direito privado, observando atentamente as normas constitucionais, nas quais se
encontram inseridos os direitos fundamentais.
55
Entretanto, em que pe se o avanço alcançado no sentido de vincular aos
particulares os direitos fundamentais, o que como vimos, na maioria dos casos,
pode ocorrer de maneira direta, surge uma questão relacionada com o momento a
partir do qual cessa a eficácia da Constituição.
Sobre esse aspecto, há que salientar -se que, sempre que houver
incompatibilidade entre uma norma ordinária e a norma constitucional,
impossibilitando a aplicação dos direitos fundamentais, haverá de ser declarada a
inconstitucionalidade, haja vista que a C onstituição é a lei mais importante de todo
o sistema normativo, além de estar fundamentada nos direitos fundamentais.
Com propriedade, Daniel Sarmento ensina:
Caso não seja possível aplicar a norma ordinária existente
em conformidade com os direitos fund amentais, deve o
órgão jurisdicional exercer o controle incidental de
constitucionalidade, para afastar o preceito viciado da
resolução da questão, e, diante de eventual ausência de
normal, solucionar o litígio através da invocação direta da
53
Neste sentido, ver Idem, ibidem, p. 44.
54
FACHINI NETO, Op. cit., p. 44.
55
Idem, ibidem, p. 45.
32
Constituição. De resto, esta obrigação deriva do próprio
princípio da supremacia da Constituição e da vinculação do
Judiciário, como órgão estatal, aos direitos fundamentais
nela positivados.
56
No mesmo sentido, Eugênio Facchini Neto leciona: “[...] que entre as muitas
possibilidades de interpretação, todas conforme a Constituição, deve -se escolher
aquela em que a eficácia dos direitos fundamentais encontra a sua máxima
expressa, [...]”.
57
Oportuno esclarecer que a aplicação no direito privado das disposições
relativas aos direitos fundamentais não ocorre apenas por meio das cláusulas
gerais
58
, sendo passível, em alguns casos, a aplicação direta da Constituição,
sobre a qual encontram -se firmadas as cláusulas gerais.
59
Relativamente à autonomia privada e seu eventual conflit o com os direitos
fundamentais, Daniel Sarmento ensina que a autonomia privada não
necessariamente deixará de ser exercida em prol dos direitos fundamentais.
Entretanto, sempre que se verificar uma situação de desigualdade entre as partes,
“[...] mais intensa será a proteção ao direito fundamental em jogo, e menor a tutela
da autonomia privada”.
60
Assim, tecidas estas breves considerações sobre a questão da eficácia dos
direitos fundamentais nas relações interprivadas, passar -seno item seguinte a
verificar de que forma estes direitos fundamentais têm sua eficácia garantida
quando nos deparamos com uma situação onde um dos particulares possui
poderes econômicos e sociais sobre o outro.
2.3 O poder hierárquico no âmbito da empresa
56
SARMENTO, Daniel. Op. cit., p. 256.
57
FACHINI NETO, Eugênio. Op. cit., p. 40.
58
Neste sentido, ver SARMENTO, Daniel. Op. cit., p. 248.
59
Neste sentido, ver FACHIN, Melina Girardi; PAULINI, Umberto. Op. cit., p. 212.
60
Neste sentido, ver SARMENTO, Daniel. Op. cit., p. 261.
33
Conforme analisado no tópico anterior, uma das expressões utilizadas para
a vinculação dos direitos fundamentais aos particulares é Drittwirkung”. Esta
expressão deriva do direito alemão e significa “eficácia perante terceiros”. Existem
na sociedade atual diversas entidades pr ivadas que possuem um enorme poder
econômico e social, a ponto de influenciar a vida dos demais indivíduos como se
fosse o próprio Estado.
Em tais situações uma clara hipossuficiência de uma das partes das
relações e, ainda que se trate de relação entr e particulares, que ser invocada a
eficácia máxima dos direitos fundamentais, os quais contêm princípios
ordenadores para a vida social e que vinculam também as relações privadas, que
não podem contrariar os princípios básicos e estruturantes de um orde namento
jurídico. Dentre os direitos que poderiam ser invocados em tais casos, encontram -
se a dignidade humana, o livre desenvolvimento da personalidade, a isonomia
entre homens e mulheres, a proibição da discriminação etc.
No âmbito das relações de empreg o e considerando-se o exercício da
atividade empresarial de acordo com os princípios e direitos fundamentais,
constata-se que o empresário/empregador, detentor de poder social e econômico,
não pode, em tempos modernos, agir de forma autoritária com o traba lhador,
estando sujeito, portanto, aos limites impostos pelo legislador, no que diz respeito
ao seu poder de comando.
Juan María Bilbao Ubillos, ao discorrer sobre a teoria da Drittwirkung e sua
aplicação nas relações de trabalho, leciona:
A nadie puede sorprender, por tanto, que gênesis y el
desarrollo más fecundo de la teoria de la Drittkirkung haya
tenido como escenario el campo de lãs relacionas laborales.
Esa especial reptividad no es casual: se explica por la nota
de subordinación intrínseca al c umplimiente de la prestación
por el trabajador. Aunque la empresa dejado de ser una
zona franca en la que el empresário ejerce una autoridad
indiscutida y hemos asistido em s últimas cadas a un
proceso de penetración de la Constitución dentro de lãs
fábricas y de progresivo reconocimiente de los derechos
fundamentales de los trabajadores en tanto que ciudadanos,
lo cierto es que, como organización econômica, estructurada
34
35
Antes, porém, de conceituar o poder hierárquico, importante salientar que
tal expressão está sendo ultimamente bastante criticada por vários doutrinadores,
em função de sua con otação autoritária e ultrapassada que não coaduna mais
com a moderna noção que se tem atualmente de poder empresarial.
Neste sentido é o entendimento de Maurício Godinho Delgado, ao fazer a
seguinte afirmação a respeito do termo:
Tal expressão, afinal, ca rrega-se de rigidez incompatível
com qualquer processo de democratização do fenômeno
intra-empresarial de poder. Trazida ao Direito do Trabalho
por inspirações administrativistas ou institucionalistas
superadas longa época pela mais arejada teoria
justrabalhista, a expressão, mesmo hoje, não deixa de
evocar uma lembrança severa, implacável e hirta do
fenômeno do poder na empresa.
64
Prossegue o autor, ensinando:
Hierárquico seria o poder deferido ao empregador no âmbito
da relação de emprego consiste nte em um conjunto de
atribuições com respeito à direção, regulamentação,
fiscalização e disciplinamento da economia interna à
empresa e correspondente prestação de serviços. O poder
hierárquico abrangeria todas as demais dimensões do
fenômeno do poder no contexto empresarial interno (assim
como a nova expressão poder empregatício)
65
De qualquer forma, nas palavras de Octávio Bueno Magano, “o poder
hierárquico do empregador constitui a capacidade que lhe é atribuída para dirigir a
prestação subordinada de serviço”.
66
O que se tem, pelo visto, é que o poder hierárquico, para fins de estudo no
presente trabalho, a partir das explanações supracitadas, terá que ser considerado
64
DELGADO, Maurício Godinho. Op. cit., p. 630.
65
Idem, ibidem.
66
MAGANO, Octávio Bueno. Manual de direito do trabalho . São Paulo: LTr, 1993, v. 2, p. 206.
36
do ponto de vista da doutrina atual, subdividindo -se em poder diretivo, poder
regulamentar e poder disciplinar.
Aliás, esta é a concepção de Octávio Bueno Magano, ao realçar que “o
poder hierárquico, ou poder diretivo lato sensu, subdivide-se em poder diretivo
stricto sensu, em poder regulamentar e em poder disciplinar”.
67
Assim, conforme Maurício Godinho Delgado,
Poder diretivo (ou poder organizatório ou, ainda, poder de
comando) seria o conjunto de prerrogativas tendencialmente
concentradas no empregador dirigidas à organização da
estrutura e espaço empresariais internos, inclusive o
processo de trabalho adotado no estabelecimento e na
empresa, com a especificação e orientação cotidianas no
que tange à prestação de serviços.
68
Em uma linguagem mais simples, Amauri Mascaro Nascimento leciona que
“poder de direção é a faculdade atribuída ao empregador de determinar o modo
como a atividade do empregado, em decorrência do contrato de trabalho, deve ser
exercida”.
69
Poder regulamentar, por sua vez, explica Maurício Godinho Delgado, “seria
o conjunto de prerrogativas tendencialmente concentradas n o empregador
dirigidas a fixação de regras gerais a serem observadas no âmbito do
estabelecimento e da empresa”.
70
Geralmente, nas grandes corporações, tais prerrogativas são concentradas
nos chamados Regulamentos de Empresas, que por sua vez, estabelecem a s
normas genéricas que deverão ser seguidas pelos funcionários no âmbito da
empresa. Aliás, tais regulamentos, em alguns casos, são elaborados com a
participação dos empregados, através das comissões de empresas.
Poder disciplinar é o poder que tem o empre gador de aplicar sanções
disciplinares aos trabalhadores, ou nas palavras de Maurício Godinho Delgado, “é
67
Idem, ibidem, p. 207. (grifos originais)
68
DELGADO, Maurício Godinho. Op. cit., p. 631.
69
NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de direito do trabalho: história e teoria geral do direito:
relações individuais e coletivas do trabalho. 18. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 562.
70
DELGADO, Maurício Godinho. Op. cit., p. 632.
37
o conjunto de prerrogativas concentradas no empregador dirigidas a propiciar a
imposição de sanções aos empregados em face do descumprimento por esses de
suas obrigações contratuais”.
71
Assim, as sanções trabalhistas, dependendo de cada caso concreto, podem
ser aplicadas pelo empregador, principalmente nos casos de infrações cometidas
com desrespeito às situações taxativamente referidas no artigo 482, da
Consolidação das Leis Trabalhistas, aplicáveis à todos os trabalhadores regidos
pelo referido codex, sendo que a mais grave das sanções é a dispensa por justa
causa.
Não obstante, Aldacy Rachid Coutinho adverte:
[...] O trabalho é salário, mas salário o é tudo; trabalho
sempre será um processo de identificação dos momentos da
reprodução social, reinventada a cada momento e a
conquista de condições dignas de vida expressas em
direitos.
72
Desta forma, em que pese a possibilidade legalmente atribuída ao
empresário/empregador de, no comando da atividade empresarial e respaldado
em seu poder hierárquico, aplicar determinadas sanções aos seus empregados,
jamais poderá ele distanciar -se dos direitos fundamentais que cada um desses
empregados possui, direitos es tes irrenunciáveis, destaque -se, como os direitos
de personalidade, que serão estudados no tópico seguinte.
2.4 Os direitos da personalidade
A Constituição Federal de 1988, ao arrolar os direitos fundamentais da
pessoa humana, não se referiu especifica mente aos direitos da personalidade,
71
DELGADO, Maurício Godinho. Op. cit., p. 636.
72
COUTINHO, Aldacy Rachid. A autonomia privada: em busca da defesa dos direitos fundamentais
dos trabalhadores. In: SARLET, Ingo Wolfgang (Org.). Constituição, direitos fundamentais... Op.
cit., p.170.
38
encontrando-se os mesmos distribuídos ao longo do texto, ficando a cargo da
doutrina e da jurisprudência a sua identificação.
Já o Código Civil brasileiro vigente, ao contrário do anterior, que não tratava
especificamente dos direitos da personalidade, apresenta um capítulo próprio para
tratar de tais direitos, do artigo 11 ao artigo. 21, do capítulo II, do Título I (Das
Pessoas Naturais), mostrando a preocupação do legislador em protegê -los.
De acordo com Amauri Mascar o Nascimento, direitos da personalidade
assim podem ser conceituados:
São prerrogativas de toda pessoa humana pela sua própria
condição, referentes aos seus atributos essenciais em suas
emanações e prolongamentos, são direitos absolutos,
implicam num dever geral de abstenção para a sua defesa e
salvaguarda, são indisponíveis, intransmissíveis,
irrenunciáveis e de difícil estimação pecuniária.
73
Ao se referir aos direitos da personalidade, Carlos Alberto da Mota Pinto
afirma que “designa-se por esta fórmula um certo número de poderes
pertencentes a todas as pessoas, por força do seu nascimento”
74
Washington de Barros Monteiro ensina:
[...] a pessoa é detentora de direitos inerentes à sua
personalidade, entendida esta como as características que a
distinguem como ser humano, ao mesmo tempo em que
integra a sociedade e o gênero humano. São características
inerentes ao indivíduo, que se intuem facilmente, que até
dispensariam menção, dada sua inarredabilidade da
condição humana, e que configuram pressuposto da própria
existência da pessoa, mas que nem sempre são fáceis de
explicar..
75
73
NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Iniciação ao direito do trabalho. 31. ed. São Paulo: LTr,
2005, p. 131.
74
PINTO, Carlos Alberto da Mota . Teoria geral do direito civil . Coimbra: Coimbra Editora, 1999,
p. 206.
75
MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil . Parte geral. 40. ed. rev. e atual. por
Ana Cristina de Barros Monteiro França Pinto. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 96.
39
Segundo afirma Maria Celina Bodin de Moraes, “[...] Não mais, de fato,
que se discutir sobre uma enumeração taxativa ou exemplificativa dos direitos da
personalidade [...]”.
76
Assim, de acordo com os parâmetros do presente estudo,
serão enfocados, sob o ângulo da Constituição Federal, aqueles direitos de
personalidade que mais diretamente estão ligados ao exercício da atividade
empresarial. Dessa forma, trataremos dos direitos ine rentes à figura do
trabalhador no exercício de sua atividade laboral, quais sejam: direito à vida e à
integridade física, à intimidade, à liberdade de pensamento.
Sabe-se que a matéria referente ao Direito do Trabalho encontra -se
positivada em Lei própria, qual seja, a Consolidação das Leis do Trabalho. É sobre
as normas ali constantes que os conflitos decorrentes da relação de trabalho
devem ser resolvidos. Subsidiariamente, contudo, naqueles assuntos em que a
legislação especial for lacunosa, a lei comum e a legislação constitucional poderão
ser aplicadas.
Ao discorrer sobre os direitos de personalidade no âmbito do Direito do
Trabalho, José Antônio Peres Gediel ensina:
Pode-se afirmar, portanto, que a importância do trabalho
para a economia de mercado al iada ao modelo positivista
das disciplinas jurídicas imprimiram ao Direito do Trabalho
um caráter instrumental e patrimonialista, que dificulta,
sobremaneira, o trânsito dos direitos da personalidade nas
relações contratuais, que têm por objeto a atividade laboral.
Por isso, os movimentos de humanização, repersonalização
e ressistematização do Direito Privado, que deram lugar ao
aparecimento de legislações nitidamente voltadas à tutela
dos sujeitos envolvidos em relações patrimoniais e não -
patrimoniais, apenas começam a se comunicar com a
doutrina juslaboralista.
77
Como foi analisado anteriormente, com a Constituição Federal de 1988 é
que os direitos fundamentais passaram a estruturar a ordem jurídica. Com relação
ao trabalho e ao trabalhador, o inciso IV , do artigo 1, da Constituição vigente, “[...]
76
MORAES, Maria Celina Bodin de. Op. cit., p. 144.
77
GEDIEL, José Antônio Peres. Op. cit., p. 155.
40
eleva ao patamar de direitos fundamentais os direitos da personalidade e os
direitos sociais dos trabalhadores”.
78
O direito à vida é o mais importante dos direitos da personalidade, sendo
decorrente do princíp io da dignidade da pessoa humana, constante no artigo 1,
inciso III, da Constituição Federal, podendo -se a afirmar, nas palavras de
Estevão Mallet, de que deste inciso III se tira um “direito geral de personalidade”.
79
Logo, no caso das relações de trabal ho, o trabalhador não pode ser colocado à
exposição de atividades que coloquem sua vida ou sua integridade psicofísica em
risco, salvo as permissões legais.
Sobre integridade psicofísica, Maria Celina Bodin de Morais leciona:
[...] a integridade psicofísic a vem servindo a garantir
numerosos direitos da personalidade (vida, nome, imagem,
honra, privacidade, corpo, identidade pessoal), instituindo,
hoje, o que se poderia entender como um amplíssimo ‘direito
à saúde’, compreendida esta como completo bem -estar
psicofísico e social.
80
A modernização das empresas face ao inevitável desenvolvimento industrial
facilitou o surgimento de certas situações que repercutiram diretamente no
ambiente de trabalho do obreiro, fazendo com que este não possua a devida
proteção da sua intimidade, até mesmo como decorrência do poder diretivo do
empregador, que tem o direito de fiscalizar os serviços prestados pelo trabalhador,
seja por intermédio de aparelhos eletrônicos, seja por intermédio de revista
pessoal.
De qualquer forma, tais procedimentos têm seus parâmetros estabelecidos
em lei e na jurisprudência, implicando em ofensa aos direitos de personalidade
sempre que extrapolarem os limites pré -estabelecidos. Aliás, nos dois exemplos
acima citados (fiscalização do trabalho por a parelhos eletrônicos ou por revista
pessoal), desde que haja conhecimento por parte do empregado no primeiro caso,
e um relativo equilíbrio entre o procedimento e a necessidade de tal medida no
78
GEDIEL, José Antônio Peres. Op. cit., p. 155-156.
79
MALLET, Estevão. Direito, trabalho e processo em transformação . São Paulo: LTr, 2005, p.
19.
80
MORAES, Maria Celina Bodin de. Op. cit., p. 127.
41
segundo caso, tem-se permitido que o empregador assim proceda, principalmente
nas revistas relacionadas às atividades ligadas à comercialização de produtos de
valor considerável ou de fácil subtração.
No que diz respeito à liberdade de pensamento, o inciso IV, do artigo 5, da
Constituição Federal, determina que: “Art . - [...] IV - é livre a manifestação do
pensamento, sendo vedado o anonimato; [...]”. De fato, o pode o trabalhador
sofrer qualquer restrição à sua forma de pensamento, seja ela de ordem política
ou filosófica. Aliás, é muito comum o empregado ser de spedido por defender
idéias de sindicatos não simpatizantes com as convicções patronais. Este é um
claro exemplo de desrespeito ao princípio da dignidade da pessoa humana e aos
direitos da personalidade.
Ressalte-se, todavia, que ocorrendo violação de qual quer dos direitos
supracitados, ou a qualquer dos demais direitos constantes no texto constitucional
e demais leis esparsas, pode o trabalhador, pedir que cesse imediatamente a
ameaça ou lesão (artigo 12, Código Civil), requerer indenização pelo dano moral
sofrido, além de rescindir o contrato de trabalho motivadamente, com amparo na
alínea “b” do artigo 483, da Consolidação das Leis Trabalhistas.
Apesar disso, o que se verifica em larga escala é a contratação de
trabalhadores pelas empresas, através de con tratos p-elaborados, onde
aspectos relacionados à personalidade do trabalhador sequer são analisados. Tal
fato se dá, principalmente, devido à condição de desvantagem econômica do
trabalhador, como alude José Antônio Peres Gediel.
81
Trata-se, obviamente, de situação ofensiva à dignidade e aos direitos de
personalidade do trabalhador. E para que os direitos fundamentais do empregado
sejam realmente garantidos na atividade laboral, é necessário que a empresa
instrumentalize a eficácia dos direitos fundament ais e atribua ao empregado o seu
verdadeiro valor social, respeitando e assegurando seus direitos.
Quando os direitos fundamentais não o observados no exercício da
atividade laboral, dentre eles o direito de personalidade do empregado, a
conseqüência sea lesão a outros direitos constitucionalmente assegurados, o
81
GEDIEL, José Antônio Peres. Op. cit., p. 161-162.
42
que pode acarretar o rompimento do contrato de trabalho e busca pela reparação
do dano através das vias judiciais, assunto este que será abordado a seguir.
2.4.1 As lesões aos direitos da pe rsonalidade dos empregados
É sabido que o legislador infraconstitucional vem, há algum tempo, se
preocupando com os direitos das pessoas predominantemente excluídas da
sociedade, com o objetivo de fazer valer as normas constantes na Constituição
Federal de 1988. Por essa razão, o Código Civil de 2002 dedicou um capítulo
próprio aos direitos da personalidade, constantes no Capítulo II, do Título I (das
pessoas naturais), do Livro que trata das pessoas.
No que se refere às questões trabalhistas, o legislado r não se preocupou
em tratar dos direitos da personalidade, a não ser em algumas hipóteses relativas
aos atos lesivos da honra ou da boa fama, além dos casos de agressão física.
Todavia, tal lacuna foi preenchida, em parte, com a autorização do uso subsidi ário
do direito comum, segundo o disposto no artigo 8, da Consolidação das Leis do
Trabalho.
Assim, como ensina Carlos Alberto da Mota Pinto
82
, várias são as formas
de manifestação do direito da personalidade, os quais incidem especialmente,
sobre a vida da pessoa, sua saúde e integridade física, sua honra, sua liberdade
física e psicológica, seu nome, sua imagem etc.
Com efeito, no momento da prestação do serviço, o empregador deve
preservar os direitos de personalidade do empregado, apropriando -se somente da
sua força-trabalho e, assim mesmo, dentro dos limites estabelecidos em lei, como
afirma Paulo Emílio Ribeiro de Vilhena:
Em razão disso, antes que potencialmente, efetivamente,
como integrante da empresa como objeto de direito, a força -
trabalho do homem está implicada no processo e isso,
82
PINTO, Carlos Alberto da Mota. Op. cit., p. 87.
43
porque a sua cessão ao empregador, por mais ampla,
encontra sempre limites na tutela dos direitos
personalíssimos do prestador.
83
No mesmo sentido é o entendimento de Marco Antônio Scheuer:
A verdade é que os direito s da personalidade, aporque
indestacáveis da própria pessoa, não podem se integrar a
um contrato de trabalho, e, mesmo, não podem se integrar a
contrato nenhum, salvo a exploração econômica da obra do
autor, mas, a paternidade dela será sempre devida ao seu
criador.
84
O autor, continuando sua explanação, ressalta ainda:
Sendo intransferíveis, não como se acharem debaixo de
um contrato de trabalho. E não podendo estar debaixo dele,
não podem permitir argumento contratual para evitar a
responsabilização daquela pessoa que vier a lesar direitos
de personalidade da parte que se acha no outro pólo da
relação obrigacional estabelecida.
85
Verifica-se, assim, que ocorrendo lesão a qualquer dos direitos da
personalidade dos trabalhadores, por ocasião da prest ação dos serviços relativos
ao contrato de trabalho celebrado, tem o trabalhador direito de ser indenizado,
além de poder pleitear, judicialmente, a rescisão do trabalho nos termos do artigo
483, letra “b”, da Consolidação das Leis do Trabalho.
A propósito, três são as espécies de tutela à disposição do empregado nos
casos de lesão aos direitos da personalidade, quais sejam: no “âmbito trabalhista”,
pleitear o rmino do contrato de trabalho, por intermédio da rescisão indireta
conforme visto acima, no “âmb ito civil”, ser reparado pelo dano moral sofrido e,
83
VILHENA, Paulo Emílio Ribeiro de. Op.cit., p. 183.
84
SOUZA, Marco Antonio Scheuer de. O dano moral nas relações entre empregados e
empregadores. Erechim: Edelbra, 1998, p. 195.
85
Idem, ibidem.
44
finalmente, no “âmbito do Direito Penal”, ingressar com a ação penal
correspondente.
Assim, no intuito de evitar -se lesionar direitos dos empregados, deve a
empresa evitar estabelecer com os mesmos relaç ões conflituosas. Não obstante,
naqueles casos onde isso não for possível, para a solução do impasse incidirão e
deverão ser observados os direitos fundamentais, conforme ver -se-á adiante.
2.5 Os conflitos decorrentes das relações laborais na empresa e a
observância dos direitos fundamentais
Inicialmente, convém esclarecer que desde os primórdios da civilização, os
interesses dos patrões, detentores do capital e os interesses dos trabalhadores,
detentores da força de trabalho, sempre foram antagônicos, resultando deste
relacionamento inúmeros conflitos , decorrentes da própria natureza humana.
A palavra conflito deriva do latim conflictus, e na concepção de Sergio
Pinto Martins:
[...] tem o significado de combater, lutar, designando dizer
que as controvérsias são inerentes à vida humana, sendo
uma forma de desenvolvimento histórico e cultural da
humanidade. [...] Muitos dos conflitos são gerados por
questões sociais ou problemas econômicos, decorrentes da
desigual distribuição de riquezas. [...] Do pont o de vista
trabalhista, os conflitos são também denominados
controvérsias ou dissídios, tendo sido utilizados, na prática,
com o mesmo significado”.
86
No tocante à denominação conceitual, sabe -se que nossas leis não são
claras a respeito do sentido das pal avras quando se refere à causa levada ao
conhecimento da Justiça, utilizando -se de vários termos, tais como: conflito,
86
MARTINS, Sergio Pinto. Direito processual do trabalho: doutrina e prática forense. 25. ed. São
Paulo: Atlas, 2006, p. 46.
45
controvérsia, reclamação ou dissídio. De qualquer forma, a maioria dos
doutrinadores prefere utilizar a palavra conflito para caracteriza r a luta entre o
empregador e os trabalhadores, tais como: Cesarino Junior, Rossumano, P
Rodriguez, Guilhermo Cabanellas etc.
Destaque-se que a Constituição Federal de 1988, nos termos do inciso V,
do artigo 114, com a redação dada pela Emenda Constituci onal 45, de 2004,
usa a expressão “conflitos” para designar a competência da Justiça do Trabalho,
todavia, usa a expressão “controvérsia” no inciso IX do mesmo artigo para
igualmente designar a competência da dita Justiça trabalhista.
Amauri Mascaro Nascimento, ao discorrer sobre “conflitos nas relações de
trabalho”, leciona:
A COMPOSIÇÃO DOS CONFLITOS. Nas relações de
trabalho surgem conflitos individuais e coletivos, aqueles
entre o empregado e o empregador individualmente
considerados, e estes entr e o grupo de trabalhadores e o de
empregadores ou uma empresa.
87
De qualquer forma, da lição de Domingos Sávio Zainhaghi
88
, extrai-se que
os conflitos trabalhistas podem ser classificados em conflitos individuais e
coletivos; e conflitos de direito e confli to de interesse.
Os conflitos individuais podem assim ser entendidos quando apenas um
reclamante. Será coletivo quando houver dois ou mais. Esta classificação é
conhecida como subjetiva. Se for adotada uma classificação objetiva, considera -se
como individual o conflito fulcrado no contrato individual de trabalho. o coletivo
se fundamenta nas normas coletivas, sobretudo numa convenção coletiva.
Uma outra classificação, esta mais atual, divide os conflitos em conflitos de
direito e de interesses. O prim eiro é aquele que versa sobre a interpretação e
aplicação de um direito adquirido e atual, não interessando se o mesmo seja
derivado dos ditames formais de uma lei ou de uma cláusula de um contrato
87
NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Iniciação ao direito... Op. cit., p. 94.
88
ZAINAGHI, Domingos vio. A solução extrajudicial dos conflitos trabalhistas no Brasil.
São Paulo: LTr, p. 23-24.
46
individual de trabalho ou de uma norma coletiva. O conflit o de interesses, por sua
vez, não tem como fundamento a interpretação de um direito adquirido, mas sim
numa reivindicação que busque alterar um direito existente ou, de outra forma,
criar um novo direito.
Não obstante, como bem alertou Domingos Sávio Zaina ghi, “as
classificações acima, na realidade, se confundem, podendo -se afirmar que são
elas independentes e harmônicas entre si. Geralmente, as controvérsias ou são de
direito (individuais), ou de interesses (coletivos)”.
89
Nesta linha de pensamento, não se pode discorrer sobre conflitos de
trabalho sem que se faça, ainda que sucintamente, uma abordagem acerca dos
conflitos coletivos de trabalho e os modos de solucioná -los, que nos conflitos
chamados individuais, os confrontos são resolvidos de uma forma m ais simplória
entre as partes contratantes.
Para Maurício Godinho Delgado, são conflitos coletivos trabalhistas
“aqueles que atingem comunidades específicas de trabalhadores e empregadores
ou tomadores de serviços, quer no âmbito restrito do estabeleciment o ou empresa,
quer em âmbito mais largo, envolvendo a categoria ou, até mesmo, comunidade
obreira mais ampla”.
90
Destaque-se que existem basicamente duas modalidades de solução de
conflitos, quais sejam: a autocomposição, que ocorre quando as partes
conflitantes resolvem por si só, isto é, de forma autônoma o conflito gerado, sem
socorrer-se de terceiros; e a heterocomposição, que ocorre quando as partes
conflitantes confiam a um terceiro a solução do conflito, por não ter sido possível a
solução do mesmo pe las vias autônomas. A segunda modalidade, por sua vez,
pode manifestar-se por meio da arbitragem ou pelo processo judicial (Poder
Judiciário), que no caso do direito do trabalho, caracteriza -se pelo chamado
dissídio coletivo, que resulta na sentença normat iva.
Uma vez apresentadas as formas que podem ser utilizadas para a solução
de conflitos decorrentes das relações laborais, importa salientar a importância que
89
ZAINAGHI, Domingos Sávio. Op. cit., p. 24.
90
DELGADO, Maurício Godinho. Op. cit., p. 1291.
47
os direitos fundamentais possuem por ocasião da análise do caso concreto e da
conseqüente decisão pelo Juiz.
Todo o processo evolutivo pelo qual passou o direito privado, com a sua
constitucionalização e vinculação aos direitos fundamentais, também passa o
Direito do Trabalho. Em razão disso, “os movimentos de humanização,
repersonalização e ressiste matização do Direito Privado [...] começam a se
comunicar com a doutrina juslaboralista”.
91
Luiz Edson Fachin e Carlos Eduardo Piznovsky Ruzyk, oportunamente
observam:
[...] sendo o sujeito livre, ele pode vender seu trabalho, cujo
produto pode ser apropri ado por aquele que o adquire.
Desse modo, todos são reputados igualmente proprietários:
aquele que não é proprietário de bens é proprietário de sua
força de trabalho. [...] A propriedade é, nessa fase liberal -
jusnaturalista, o direito fundamental por excel ência, que cria
o limite entre as espacialidades pública e privada.”
92
Mais adiante, ressaltam ainda que “[...] os direitos fundamentais não são
apenas liberdades negativas exercidas contra o Estado, mas são normas que
devem ser observadas por todos aquele s submetidos ao ordenamento jurídico”.
93
Decorre disso que os direitos fundamentais devem ser observados não
apenas por ocasião da contratação de um trabalhador, mas também quando, da
relação laboral, surgir algum tipo de controvérsia. A Justiça do Trabalho tem dado
cumprimento à determinação Constitucional, solucionando os conflitos em
conformidade com os direitos fundamentais. Como exemplo, podemos citar
inúmeras decisões que consideram abusivas as fiscalizações não permitidas pelo
empregado, bem a violaçã o de correspondência, o uso indevido da imagem do
trabalhador sem a prévia autorização, a dispensa baseada em racismo, sexo, cor
ou religião etc.
91
GEDIEL, José Antônio Peres. Op. cit., p. 155.
92
FACHIN, Luiz Edson; RUZYK, Carlos Eduardo Piznovsky. Direitos fundamentais, dignidade da
pessoa humana e o novo Có digo Civil: uma análise crítica. In: SARLET, Ingo Wolfgang (Org.).
Constituição, direitos fundamentais... Op. cit., p. 94.
93
Idem, ibidem, p. 100.
48
Assim, uma vez elucidada a imprescindibilidade da observância dos direitos
fundamentais na solução dos conflit os derivados das relações laborais, passar -se-
á a seguir a tratar de matéria de igual importância, relativa à proteção
constitucional contra os casos de discriminação verificados no exercício da
atividade laboral, elucidando a importância que os princípios constitucionais
adquirem, rechaçando a sua prática e impondo sanções àqueles que a praticam.
2.5.1 As proteções constitucionais contra discriminações na relação de
emprego
Discriminar tem o sentido de diferenciar, discernir, distinguir, estabelecer
diferença. Pode-se afirmar que os critérios legais que proíbem discriminações o
decorrentes da aplicação ampla do princípio da igualdade.
94
Para Maurício Godinho Delgado “discriminação é a conduta pela qual se
nega à pessoa, em face de critério injustamente desqualificante, tratamento
compatível com o padrão jurídico assentado para a situação concreta por ela
vivenciada”.
95
No mesmo sentido está lição de Maria Celina Bodin de Moraes, que ao
discorrer sobre o princípio da igualdade, ensina que o mesmo consiste “[...] no
direito de não receber qualquer tratamento discriminatório, no direito de ter direitos
iguais aos de todos os demais”
96
.
Neste contexto, o princípio da igualdade surge como fator proibitivo de
discriminações arbitrárias e injustificadas, segundo lição de José Carlos Vieira de
Andrade:
[...] o princípio da igualdade enquanto proibição de
discriminações se refere a uma igualdade material e se
94
Neste sentido, ver MARTINS, Sérgio Pinto. Direito do trabalho . 22. ed. São Paulo: Atlas, 2006,
p. 465.
95
DELGADO, Maurício Godinho . Op. cit., p. 772.
96
MORAES, Maria Celina Bodin de. Op. cit., p. 120.
49
dirige especialmente às actuações arbitrárias ou
injustificadas determinadas por diferenças como o sexo, a
religião, as convicções políticas, etc.
97
Ainda, importante transcrever observação realizada por Maria Celina Bodin
50
[...]
IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo,
cor, idade e quaisquer outras for mas de discriminação;
[...]
As práticas mais comuns de tratamentos discriminatórios estão
relacionadas à diferenciações infundadas baseadas em raça, sexo, cor, credo,
orientação sexual, nacionalidade, classe social, doença etc.
No que se refere às relaçõ es de trabalho, não se pode olvidar que a
Constituição Federal de 1988 trouxe novos contornos à proibição da
discriminação, na medida em que estabeleceu dispositivos específicos sobre o
assunto.
Exemplificativamente, pode -se dizer, sem sombra de vidas, q ue qualquer
restrição ao mercado de trabalho da mulher esteja totalmente eliminada a partir
Constituição Federal de 1988, pois mesmo com as Constituições anteriores se
referindo à discriminação em função de sexo, sabe -se que a mulher sempre foi
alvo de práticas discriminatórias nas relações de emprego. Tal prática, sem
dúvida, constitui uma afronta ao princípio da igualdade e da dignidade da pessoa
humana.
Ademais, estabeleceu o legislador constituinte, nos incisos XX e XXX, do
artigo 7, da Constituição Fed eral vigente:
Art. 7º - São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros
que visem à melhoria de sua condição social:
[...]
XX - proteção do mercado de trabalho da mulher, mediante incentivos
específicos, nos termos da lei;
[...]
XXX - proibição de diferença de salários, de exercício de funções e de
critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil;
[...]
De fato, no caso da mulher, acentua Maurício Godinho Delgado, que “hoje,
a diferença sexual não pode ser utilizada, em s i, como critério de valoração; hoje,
se essa diferença for utilizada como fator desqualificante, será tida como fato
injusto, inaceitável, discriminatório”.
99
99
DELGADO, Mauricio Godinho. Op. cit., p. 774.
51
Em relação ao trabalho do menor, igualmente pode ser invocado o inciso
XXX, do artigo 7, da Consti tuição Federal, acima referenciado, além do artigo 227,
da Constituição Federal, no que diz respeito ao tratamento diferenciado à criança
e ao adolescente, já que o legislador, neste caso, foi ainda mais claro na proibição
da discriminação, nos termos segu intes:
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à
criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à
saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à
cultura, à dignidade, ao respeito, à liber dade e à convivência familiar e
comunitária, além de colo -los a salvo de toda forma de negligência,
discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
§ 3º - O direito a proteção especial abrangerá os seguintes aspectos:
[...]
II - garantia de direitos previdenciários e trabalhistas;
III - garantia de acesso do trabalhador adolescente à escola;
[...]
No tocante aos trabalhadores estrangeiros, principalmente aqueles oriundos
dos países em desenvolvimento, sabe -se que têm sido freqüentemente
discriminados nos vários países onde buscam guarida empregatícia. Todavia, no
território nacional, aqueles que se encontrem nestas situações de discriminação,
poderão invocar judicialmente, entre outros dispositivos legais aplicáveis à
espécie, a incidência do artigo 5, da Constituição Federal, que estabelece o
princípio básico da igualdade.
Neste contexto, importante trazer a crítica feita por Sergio Pinto Martins, no
sentido de apontar a configuração de discriminação e revogação do artigo 354, da
Consolidação das Leis do Trabalho, nos seguintes termos:
Pelo próprio caput do art. da Constituição se verifica
que não pode haver discriminação entre brasileiros e
estrangeiros, que são, portanto, iguais, sem nenhuma
distinção, salvo as existentes na própria Le i Magna. Neste
ponto, entendemos discriminatório e revogado o art. 354 da
CLT quando estabelece que nas empresas deverá haver
uma proporção de 2/3 de brasileiros e para 1/3 de
estrangeiros
100
.
100
MARTINS, Sergio Pinto. Direito do... Op. cit., p. 466.
52
Na parte relativa à discriminação em função do tipo de trabalho, na
verdade, o legislador combinou o disposto no inciso V com o inciso XXXII,
superando definitivamente, nas palavras de Maurício Godinho Delgado, “antiga
polêmica acerca da validade ou não do estabelecimento de pisos salariais em face
de uma certa categor ia profissional por preceito normativo convencional ou
judicial”.
101
De fato, assim estabelece o inciso XXXII, do artigo 7, da Constituição
Federal:
Art. 7º - São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros
que visem à melhoria de sua condiç ão social:
V - piso salarial proporcional à extensão e à complexidade do trabalho;
[...]
XXXII - proibição de distinção entre trabalho manual, técnico e intelectual
ou entre os profissionais respectivos;
[...]
No que tange ao trabalhador avulso, houve, na verdade, uma igualdade de
direitos, ao invés de proibição de discriminação, conforme visto até então, de
modo que deve haver isonomia de direitos entre o trabalhador com vínculo
empregatício permanente e o trabalhador avulso, conforme estabelece o inciso
XXXIV, do artigo 7, da Constituição Federal : Art. - [...] XXXIV - igualdade de
direitos entre o trabalhador com vínculo empregatício permanente e o trabalhador
avulso”.
Também vale a pena ressaltar outra importante inovação legal no que diz
respeito ao trabalhador com deficiência, nos termos do inciso XXXI, do artigo 7, da
Constituição Federal :
Art. 7º - [...]
XXXI - proibição de qualquer discriminação no tocante a salário e
critérios de admissão do trabalhador portador de deficiência;
[...]
101
DELGADO, Mauricio Godinho. Op. cit., p. 786.
53
Entretanto, é certo que todo e qualquer tipo de discriminação que venha a
ser praticada pela empresa contra seus empregados, seja na figura do proprietário
empregador ou de um preposto, dará lugar a responsabilidade civil e a
indenização, conforme será analisado e m tópico posterior.
Com efeito, depreende -se dos referidos instrumentos normativos que houve
uma mudança substancial a partir da Constituição Federal de 1988, havendo uma
expansão das proteções relativas às discriminações na relação de emprego,
apesar de que, ainda muita coisa a ser feita para que estas normas,
efetivamente, sejam incorporadas no dia -a-dia das empresas, de forma que não
sejam lesados aqueles direitos inerentes aos indivíduos e assegurados pelos
princípios constitucionais.
A seguir, tratar-sede questão relativa ao ambiente de trabalho, onde o
respeito entre as partes envolvidas na atividade laboral, qual sejam, empregado e
empregador, é visto como fator determinando não apenas como observância dos
direitos fundamentais, mas também como fator de incentivo.
2.5.2 O ambiente de respeito entre os empregados da empresa como fator de
incentivo
O trabalho ainda é, nos dias atuais, o principal meio de promover o sustento
familiar, suprir as necessidades econômicas e incluir o indivíduo na es fera social.
Assim, a força de trabalho, propriedade de todos os seres humanos, é colocada à
disposição do proprietário do capital, que irá determinar o tipo de trabalho que
será realizado, bem como a forma como isso ocorrerá.
Aldacy Rachid Coutinho, aos d iscorrer sobre condições de trabalho e
direitos fundamentais, traz a seguinte lição:
No espaço consolidado da democratização do país, especialmente com
o despertar constitucional, o aviltamento da condição humana que se
54
expropriada do direito de sobrev iver com o fruto de seu trabalho, nesta
sociedade em que coabita o regime escravocrata com o trabalho livre na
casa da sociedade pós -industrial, encontra os olhos de quem percebe a
emergência de uma eficácia dos direitos fundamentais como resposta ao
descalabro. que falar de direitos fundamentais [...] significa tratar de
uma dignidade da pessoa humana ameaçada e violada, sobretudo por
medidas de ajuste econômico estrutural que se propagam pela ideologia
da competitividade e da eficiência e que precisa s er recuperada,
inclusive na sua auto-estima.
102
A promoção de um ambiente de respeito dentro do ambiente de trabalho,
sem vida, está de acordo com os princípios e direitos fundamentais,
constitucionalmente assegurados a todos os indivíduos.
Com vistas a se obter um ambiente de respeito entre os componentes da
empresa objetivando incentivá -los, é importante entender, primeiramente, quais os
principais obstáculos ao crescimento de uma empresa, tomando -se por referência
a convivência e a comunicação entre os empregados e seus superiores. Aliás, a
relação profissional e as influências individuais, se não trabalhadas
adequadamente, podem gerar conflitos que irão refletir diretamente na
produtividade da empresa.
É interessante ressaltar que até há pouco tempo, no Brasil, a questão da
harmonia e até mesmo de respeito no ambiente de trabalho não eram priorizadas
e o que se podia notar era a obrigatoriedade nos relacionamentos e no convívio
patrão/empregado, de forma que apenas um mandava e os demais obedeciam.
Ainda, o que se verificava era “[...] exigências de mobilidade funcional e espacial
constante e adaptabilidade em novas e imprevisíveis condições de trabalho nas
dinâmicas empresas”.
103
Com o advento da globalização e na busca pelo atendimento aos princípios
constitucionais, pôde-se observar como os demais países abordavam tal questão.
Assim, a individualidade e a participação do empregado, que outrora não se
cogitava, passam, agora, a ser pauta na reformulação dos paradigmas de inter -
relacionamento na empresa.
Conseqüentemente, percebeu -se que a participação de cada indivíduo é
fundamental, que o ouvir as diversas opiniões, enfim, adiciona possibilidades. A
102
COUTINHO, Aldacy Rachid. Op. cit., p. 169.
103
Idem, ibidem, p. 175.
55
partir daí, focaliza-se uma busca de melhorias no ambiente de trabalho, onde o
respeito à opinião de cada um é fator essencial, pois neste contexto, a diversidade
contribui para a solução de velhos e novos problemas.
De acordo com estes ensinamentos, observou -se que o preparo profissional
do gestor (chefe) é de suma importância para que os trabalhadores se sinta m
seguros, motivados e comprometidos com os objetivos da empresa, conforme
esclarece Harry Levinson, que ao tratar dos conflitos gerados no ambiente de
trabalho em razão da promoção do funcionário, destaca a necessidade de
conhecimentos psicológicos para q ue se possa tratar os subordinados com
respeito, ao dizer que “deverá também aprender que os conhecimentos
psicológicos são tão importantes para ele como os conhecimentos sobre mercado,
finanças e produção”.
104
Desta forma, em um ambiente onde todos têm sua criatividade valorizada e
seus direitos respeitados, os conflitos que naturalmente surgem das diferenças
passam a ser canalizados de forma que o produto final será a colaboração mútua
na definição e objetivação das propostas prioritárias.
Vale ressaltar que conflitos sempre existirão, pois em um ambiente em que
haja variedade de opiniões, também as ações serão diferenciadas. Assim, cabe ao
superior hierárquico perceber as potencialidades de cada indivíduo e direcioná -las,
para que este possa sentir -se comprometido e confiante em relação às suas
possibilidades como profissional que tem potencial intelectual valorizado e
incentivado. Somente assim estará o empresário cumprindo com os princípios
constitucionais tratados no presente estudo.
Todavia, alguns tipos de lesões ao empregado são verificados com
bastante freqüência, em que pese a obrigatoriedade constitucional de observância
dos direitos e princípios fundamentais. Costumeiramente observa -se nas relações
laborais, por exemplo, casos de assédio moral. A se guir, analisar-se alguns
aspectos deste tipo de lesão e as implicações advindas ao empresário naquelas
situações onde sua responsabilidade restar comprovada.
104
LEVINSON, Harry. Saúde mental na empresa moderna . Tradução de Nair B. Maz za. São
Paulo: Ibrasa, 1970, p. 161.
56
2.5.3 O assédio moral na empresa
De uma maneira bastante simplificada, pode -se afirmar que o assédio moral
na relação empregado/empregador caracteriza -se pela sujeição reiterada do
trabalhador pelo empregador, durante a relação de trabalho, a condições que lhe
violem a integridade psíquica, objetivando ameaçar o seu emprego e até mesmo
atingir a sua dignidade humana.
A palavra “assédio” provém do latim assedium, e possui o significado de
insistir teimosamente junto a alguém. A expressão “moral”, por sua vez, origina -se
do latim moralis e refere-se às faculdades morais de cada indivíduo. Aliás , a moral
individual, na acepção de José Afonso da Silva, “sintetiza a honra da pessoa, o
bom nome, a boa fama, a reputação que integram a vida humana como dimensão
imaterial”.
105
Sobre o assunto, importante transcrever lição de Norberto Bobbio:
O problema da moral foi originariamente considerado mais
do ângulo da sociedade do que daquele do indivíduo. E não
podia ser de outro modo: aos códigos de regras de conduta
foi atribuída a função de proteger mais o grupo em seu
conjunto do que o indivíduo singular.
106
A partir da Constituição Federal de 1988, o assédio moral passou a ter a
esperada relevância jurídica, que o legislador constituinte consagrou a
dignidade da pessoa humana como um dos pilares da ordem jurídica nacional.
105
SILVA, José Afonso da. Op. cit., p. 200.
106
BOBBIO, Norberto. Op. cit., p. 73.
57
Aliás, no caso do dano moral, es tabeleceu, inclusive, as diretrizes para a devida
indenização, nos termos dos incisos V e X, do artigo 5, da Constituição vigente :
Art. 5º - [...]
V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da
indenização por dano material, moral ou à imagem;
[...]
X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das
pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral
decorrente de sua violação;
[...]
Maria Celina Bodin de Morais, em estudo sobre danos à pe ssoa humana,
ensina que:
O dano moral tem como causa a injusta violação a uma
situação jurídica subjetiva extrapatrimonial, protegida pelo
ordenamento jurídico através da cláusula geral de tutela da
personalidade que foi instituída e tem sua fonte na
Constituição Federal, em particular e diretamente decorrente
do princípio (fundante) da dignidade da pessoa humana
(também identificado com o princípio geral de respeito à
dignidade humana).
107
Sabe-se que em relação à figura do trabalhador, o princípio da prot eção
inicialmente preocupava -se somente com a valorização do seu aspecto físico,
sendo a proteção psicológica um fator relativamente novo no contexto do Direito
do Trabalho, tratado apenas recentemente pela doutrina e jurisprudência.
Entretanto, a Constitu ição Federal de 1988, suprimiu esta deficiência, garantindo,
também ao trabalhador, os benefícios inseridos nos direitos fundamentais.
Portanto, o reconhecimento do direito à reparação de danos que atinjam a
dignidade da pessoa humana é pacífico, conforme assevera Fernando Noronha:
Hoje, porém, em que se reconhece ao ser humano uma
iminente dignidade, no desenvolvimento da ética
107
MORAES, Maria Celina Bodin de. Danos à pessoa humana: uma leitura civil-constitucional dos
danos morais. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, p . 132-133.
58
sistematizada por Kant no final do século XVIII e conhecida
como personalismo ético [...], e em que as próprias
constituições destacam a importância da tutela da pessoa
(assim, entre nós é princípio fundamental do Estado
Democrático de Direito a proteção da dignidade da pessoa
humana [...] assume especial relevo a tutela da integridade
física, psíquica e moral da pessoa, com o conse qüente
reconhecimento do direito à reparação por todos os danos
resultantes de atos ou fatos que atentem contra ela.
108
De qualquer forma, não a menor dúvida de que o interesse em afastar
do âmbito do trabalho as pessoas com tendências à prática de proce dimentos que
gerem danos morais se sempre da empresa, que é ela que será
responsabilizada pelo pagamento das indenizações porventura pleiteadas.
No nosso ordenamento jurídico não uma tipificação do assédio moral,
ficando a cargo da doutrina e da ju risprudência estabelecer os seus contornosraebel
59
É uma forma de violência no trabalho que pode configurar -
se de diversos modos (ex: o isolamento intencional para
forçar o trabalhador a deixar o emprego, também chamado,
no direito do trabalho, de disponibilidade remunerada, o
desprezo do chefe sobre tudo o que o empregado faz
alardeado perante os demais colegas deixando -o em uma
posição de constrangimento moral, a atribuição seguida de
tarefas cuja realização é sabidamente impossível
exatamente para deixar a vítima em situação desigual à dos
demais colegas.
109
Cumpre, enfim, particularizar cada um dos “tipos” de assédio moral, quais
sejam: “horizontal”, quando ocorre entre os próprios colegas de trabalho,
geralmente com o intuito de uma melhor colocação dentro da empresa,
“descendente”, quando se origina do empregador, que é o caso mais corriqueiro
de assédio, considerando -se o grau de dependência do empregado e,
“ascendente”, quando ad vém de um ou de vários subordinados, visando um
superior hierárquico.
Assim, uma vez analisadas neste capítulo a constitucionalização do direito
civil e a vinculação dos direitos fundamentais aos sujeitos de direito privado,
traçando-se, ainda, breves come ntários sobre as principais alterações advindas
em decorrência deste fato, especialmente no que se refere aos direitos do
trabalhador, passar-se no capítulo seguinte a tratar dos princípios
constitucionais que regem o ordenamento jurídico e que estão dir etamente
vinculados à atividade empresarial.
3 OS PRINCÍPIOS SOCIAIS DA DIGNIDADE HUMANA E DA SOLIDARIEDADE
APLICADOS À ATIVIDADE EMPRESARIAL
3.1 Os princípios sociais trabalhistas
109
NASCIMENTO, Amauri. Mascaro. Iniciação ao... Op. cit., p. 136.
60
Ao legislador não cabe estabelecer conceituações, mas ao intérprete da
Lei. Aliás, doutrinas, tanto nacional e internacional, se abstêm do conceito de
princípios. Todavia, no sistema jurídico brasileiro, pode -se afirmar que os
princípios sociais significam um conjunto de orientações que refletem os critérios
que servem de parâmetros ao legislador, visando à positivação de um
determinado direito, geralmente em prol dos menos privilegiados. Assim, são os
princípios sociais que regem os direitos sociais.
Na conhecida lição de Amauri Mascaro Nascimento depreende -se que “os
princípios jurídicos são valores que o Direito reconhece como idéias fundantes do
ordenamento jurídico, dos quais as regras jurídicas não devem afastar -se para
que possa cumprir adequadamente os seus fins”.
110
De outra forma, José Joaquim Gomes Canotilho, ao tratar da Constituição
como sistema de regras e princípios, ao diferenciar estes daqueles, ensina:
Os princípios são normas jurídicas impositivas de uma
optimização, compatíveis com vários graus de concretização
consoante os condicionamentos cticos e jurídico s; as
regras o normas que prescrevem imperativamente uma
exigência (impõem, permitem ou proíbem) que é ou o é
cumprida.
111
Feitas estas observações, cumpre -nos informar que os direitos sociais
encontram-se enumerados no artigo 6, da Constituição Federal de 1988:
Art. - São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia,
o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à
infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.
(Redação dada pela Emenda Constitucional n. 26, de 2000) .
Pela leitura do enunciado supracitado, nota -se que o legislador
constitucional não apresenta um conceito de direitos sociais, apenas
estabelecendo uma enumeração dos mesmos, cabendo, pois, à doutrina tal tarefa,
110
NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Iniciação ao... Op. cit., p. 128.
111
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Op. cit., p. 1147. (grifos originais)
61
aliás, como bem adverte Carlos Henrique Bezerra Leite, “não é tarefa fácil
conceituar os direitos sociais, uma vez que , lato sensu, todo direito é social”.
112
A respeito da expressão “direitos sociais”, Maurício Godinho Delgado
constata:
A expressão Direito Social marca -se pela dubiedade. Designa, às vezes,
não somente todo o Direito do Trabalho (individual e coletivo), como
também seu ramo associado, Direito Previdenciári o e Acidentário do
Trabalho. Pode ser utilizada também para se referir ao ramo juscoletivo
trabalhista.
113
Outro traço essencial dos direitos sociais, por oportuno, é o fato de que os
mesmos, por força dos tratados internacionais celebrados entre os países, devem
fazer parte do ordenamento jurídico interno dos Estados, para que possam
efetivamente ser exercidos, conforme leciona Flávia Piovesan:
A efetivação dos direitos econômicos, sociais e culturais não é apenas
uma obrigação moral dos Estados, mas uma o brigação jurídica, que tem
por fundamento os tratados internacionais de proteção dos direitos
humanos, em especial o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos,
Sociais e Culturais.
114
Assim, conforme se infere do texto do artigo 6, da Constituição Federal de
1988, acima transcrito, os direitos sociais devem ser observados também em
relação às questões trabalhistas.
Sobre o assunto, Carlos Henrique Bezzerra Leite ensina que “os direitos
sociais dos trabalhadores podem ser classificados em: a) direitos traba lhistas
individuais (CF, art. 7º); b) direitos trabalhistas coletivos (CF, arts. 8º. a 11)”.
115
Ressalte-se, todavia, que a própria Consolidação das Leis Trabalhistas, no artigo
8, estabelece que as autoridades administrativas e a Justiça do Trabalho só
aplicarão os princípios nos casos de falta de disposição legal, senão vejamos:
112
LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Constituição e direitos sociais dos trabalhadores . São
Paulo: LTr, 1997, p. 22.
113
DELGADO, Mauricio Godinho . Op. cit., p. 1281.
114
PIOVESAN, Flávia. Globalização ec onômica... Op. cit., p. 70.
115
LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Op. cit., p. 26.
62
Art. - As autoridades administrativas e a Justiça do
Trabalho, na falta de disposições legais ou contratuais,
decidirão, conforme o caso, pela jurisprudência, por
analogia, por eqüidade e outros princípios e normas gerais
de direito, principalmente do direito do trabalho, e, ainda, de
acordo com os usos e costumes, o direito comparado, mas
sempre de maneira que nenhum interesse de classe ou
particular prevaleça sobre o interesse p úblico.
Desta forma, os princípios sociais trabalhistas podem ser aplicados
objetivando solucionar os conflitos surgidos entre empregadores e trabalhadores,
já que possuem eficácia normativa, conforme acabamos de demonstrar.
Assim, apesar das divergências doutrinárias quanto à classificação de tais
princípios, serão relacionados a seguir alguns dos principais princípios sociais
trabalhistas dispostos no capítulo II, da Constituição Federal de 1988, quais sejam:
princípio da aplicação da norma mais favoráve l (artigo 7, caput); princípio da
proteção da relação de emprego (artigo 7, inciso I); princípio da irredutibilidade do
salário (artigo 7, inciso VI); princípio da proteção ao salário (artigo 7, incisos IV, V,
VI, VII, X); princípio da proteção em face da automação (artigo 7, inciso XXVII);
princípio da igualdade de tratamento (artigo 7, inciso XXX); princípio da igualdade
salarial (artigo 7, inciso. XXX); princípio da não -discriminação (artigo 7, incisos
XXX, XXXI, XXXII); princípio da liberdade sindical ( artigo 8, caput); princípio da
autonomia sindical (artigo 8, inciso I); princípio do direito de greve (artigo 9) e
princípio da representação dos trabalhadores na empresa (artigo 7, inciso XI e
artigo 11).
Advirta-se, porém, que outros princípios sociai s inscritos nos artigos 193
a 231 da Constituição vigente, reservados à Ordem Social, tratando, entre outros
assuntos, da seguridade, assistência e previdência social. Todavia, integram o
capítulo dos direitos sociais apenas os artigos supracitados.
Na verdade, deve-se ter sempre em mente a necessidade da efetivação
dos princípios sociais na Constituição, pois a sua aplicação é de suma importância
na defesa dos direitos dos trabalhadores, além de outros princípios e direitos a
eles inerentes, como os direit os de liberdades sociais, que serão abordados no
item seguinte.
63
3.1.1 Os direitos de liberdades sociais direitos fundamentais dos
trabalhadores
À expressão “liberdade”, pode -se atribuir inúmeros significados, conforme
se vê abaixo:
1 Estado de pessoa livre e isenta de restrição externa ou
coação física ou moral. 2 Poder de exercer livremente a sua
vontade. 3 Condição de não ser sujeito, como indivíduo ou
comunidade, a controle ou arbitrariedades políticas
estrangeiras. [...] 6 Dir Isenção de todas as restrições,
exceto as prescritas pelos direitos legais de outrem. [...]
poder de praticar tudo o que não é proibido por lei. [...].
116
Trata-se de mais um daqueles vocábulos difíceis de conceituar, mas que
possui, para o Direito, grande importância, deve ndo ser por ele protegido e
garantido.
É preciso analisar a questão da liberdade, considerando -se os demais
aspectos que envolvem a vida do homem, como é o caso do aspecto social e
econômico. Neste momento, cuidaremos apenas da liberdade com base no
aspecto social.
A Constituição Federal de 1988 atribuiu contornos protetivos à liberdade,
especialmente no que tange à autonomia privada, que é um de seus componentes
e que significa a capacidade que todos os sujeitos de direito possuem para
determinar os aspectos de sua vida individual, sem qualquer tipo de interferência
do Estado ou de outro particular. Como exemplo de exercício da autonomia
privada, pode-se citar o direito que cada um dos indivíduos possui de escolher se
116
MICHAELIS: moderno dicionário da língua portuguesa . São Paulo: Companhia
Melhoramentos, 1998, p. 1251. (grifos originais)
64
vai ou o realizar um determinado negó cio, optar por um determinado credo,
determinar onde quer viver etc. Trata -se, portanto, de escolhas que podem ser
feitas pelo próprio indivíduo, não cabendo sequer à Constituição fazê -lo.
Assim, no rol dos direitos fundamentais, a liberdade é vista com o a mais
ampla forma de exercer a autonomia privada. Ademais, em decorrência do
reconhecimento da dignidade da pessoa humana, a liberdade encontra -se
juridicamente garantida não em relação ao Estado, mas também aos
particulares.
Todavia, para que o dire ito de liberdade possa ser exercido, é necessário,
antes de tudo, dar condições aos indivíduos para que não vivam em situação de
miséria, fome, exclusão social etc.
Para Norberto Bobbio
117
, as liberdades classificam -se em negativas ou
positivas. A liberdade será negativa quando o indivíduo tem a faculdade de agir ou
não agir, isento da interferência de outros indivíduos. Será positiva a liberdade
quando o indivíduo possui o direito de decidir sobre determinada coisa, sem
preocupar-se com a vontade emanada por outro indivíduo. Entretanto, não nos
ocuparemos deste assunto no presente estudo, preocupando -nos apenas com a
questão dos direitos de liberdades sociais enquanto direitos fundamentais dos
trabalhadores.
Atualmente, em decorrência da vinculação dos direit os fundamentais aos
sujeitos de direito privado, e tratando -se a liberdade de um direito fundamental,
pode-se afirmar que a mesma está garantida em relação à figura do trabalhador,
especialmente porque também a autonomia privada encontra -se garantida, como
acabamos de ver. Todavia, é importante lembrar que a autonomia privada não
possui caráter absoluto, haja vista que somente pode ser exercida com a
observância do direito de liberdade, também garantido aos demais indivíduos.
Sobre este aspecto, Daniel Sarm ento pondera:
Portanto, é inevitável que o Estado intervenha em certos
casos, restringindo a autonomia individual, seja para
117
Neste sentido, ver BOBBIO, Norberto. Igualdad y libertad. Tradução de Pedro Aragon Rincón.
Barcelona: Paidós, 1993, p. 96.
65
proteger a liberdade dos outros [...] seja para favorecer o
bem comum e proteger a paz jurídica de toda sociedade. [...]
Com isto, tais intervenções se reconciliam com a idéia de
liberdade num sentido mais amplo.
118
Prossegue o autor, ensinando que também as liberdades fundamentais não
são absolutas, haja vista que em certos casos podem lesionar certos direitos
fundamentais. Vejamos:
Nesta hipótese, poderá ser necessário, diante dos contornos
do caso, restringir a liberdade em questão, de forma
proporcional, visando a otimização de interesses. É
exatamente isto que ocorre quando se discute a aplicação
dos direitos fundamentais na esfe ra privada, em que torna
necessário ponderar esta autonomia com o direito que
estaria sendo lesado pela conduta do particular.
119
A Constituição Federal de 1988 cuidou de maneira especial da “liberdade”.
Pela leitura do texto constitucional é possível verif icar a preocupação do
constituinte com a realização da liberdade, especialmente no sentido de dar
condições para o seu exercício, o que foi feito através da proclamação dos direitos
sociais.
Para realçar esta importância, citaremos alguns dos artigos da Co nstituição
vigente que tratam da questão das liberdades sociais: Artigo 1, inciso IV (refere -se
aos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa), artigo 170 (assegura à todos
uma existência digna, conforme os ditames da justiça social), artigo 5, inc isos XXII
e XXIII e artigo 170, incisos II e III (determinam que a proteção da propriedade
privada é condicionada ao cumprimento da sua função social) etc.
Sabe-se que os direitos sociais, chamados doutrinariamente de direitos de
segunda dimensão, deram in ício a uma nova ordem social ao exigirem do Estado
uma atuação prestacional perante o indivíduo, além de ter abandonado o
individualismo puro dos chamados direitos da primeira dimensão, adotando -se o
118
SARMENTO, Daniel. Op. cit., p. 155.
119
SARMENTO, Daniel. Op. cit., p. 156-157.
66
sistema da igualdade social, visando, principalmente, as novas necessidades dos
hipossuficientes.
120
Sobre o assunto, são relevantes os ensinamentos de Ingo Wolfgang Sarlet,
ao destacar que:
Ainda na esfera dos direitos da segunda dimensão, que
atentar para a circunstância de que estes não englobam
apenas direitos de cunho positivo, mas também as assim
denominadas “liberdades sociais”, do que dão conta os
exemplos da liberdade de sindicalização, do direito de greve,
bem como do reconhecimento de direitos fundamentais aos
trabalhadores, tais como o direito a fé rias e ao repouso
semanal remunerado, a garantia de um salário mínimo, a
limitação da jornada de trabalho, apenas para citar alguns
dos mais importantes.
121
Continua o autor, ao se referir sobre direitos de liberdades sociais em
sentido amplo, ensinando que :
[...] a exemplo dos direitos da primeira dimensão, também os
direitos sociais (tomados no sentido amplo ora referido), se
120
Considerando as dimensões dos direitos fundamentais, Ingo Wolfgang Sarlet faz a seguinte
classificação, inserindo em cada uma delas os direitos fundamentais que, no seu entendimento, as
compõe. 1) Direitos fundamentais da primeira geração: incluem -se nesta dimensão “os direitos à
vida, à liberdade, à propriedade e à igualdade perante a lei”. Ressalta o aut or, ainda, que
complementam esta dimensão os vários tipos de liberdades, como por exemplo, “liberdades de
expressão, imprensa, manifestação, reunião, associação, etc”; 2) Direitos fundamentais da
segunda geração: nela estão incluídos os direitos à assis ncia social, saúde, educação, trabalho,
etc”. Ainda sobre os direitos desta dimensão, salienta o autor que os mesmos “não englobam
apenas direitos de cunho positivo, mas também as assim denominadas ‘liberdades sociais’, do que
dão conta os exemplos da libe rdade de sindicalização, do direito de greve, bem como o direito a
férias e ao repouso semanal remunerado, a garantia de um salário mínimo, a limitação da jornada
de trabalho”; 3) Direitos fundamentais da terceira geração: trata -se de direitos “também
denominados de direitos de fraternidade ou solidariedade, trazem como nota distintiva o fato de se
desprenderem em princípio, da figura do homem -indivíduo, como seu titular, destinando -se à
proteção de grupos humanos (família, povo, nação), e caracterizando -se, conseqüentemente,
como direitos de titularidade coletiva ou difusa”. Dentre eles, cita o autor “os direitos à paz, à
autodeterminação dos povos, ao desenvolvimento, ao meio ambiente e qualidade de vida, bem
como o direito à conservação e utilização do pa trimônio histórico e cultural e o direito de
comunicação”. Finalmente, refere -se o autor sobre “a tendência de se reconhecer a existência de
uma quarta dimensão, que, no entanto, ainda aguarda sua consagração na esfera do direito
internacional e das ordens constitucionais internas”. (SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos...
Op. cit., p. 50-51).
121
SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos... Op. cit., p. 57.
67
reportam à pessoa individual, não podendo ser confundidos
com os direitos coletivos e/ou difusos da terceira
dimensão.
122
Como se pode notar pelos exemplos supracitados, nos direitos da segunda
dimensão exige-se do Estado uma atuação objetivando o reconhecimento e a
preservação das necessidades básicas e dos direitos fundamentais do trabalhador
(férias, salário mínimo etc.), englobando , inclusive, as denominadas “liberdades
sociais” (direito à sindicalização, direito de greve etc.).
Neste sentido, importante destacar a lição de José Carlos Vieira de
Andrade:
Em primeiro lugar, os direitos fundamentais incluem, como
vimos, faculdades de exigir ao Estado a proteção dos bens
jurídicos e da liberdade contra a violação por terceiros. Essa
proteção jurídica, plasmada sobretudo na legislação penal e
civil, é devida pelo Estado, pelo menos no que toca ao
núcleo essencial dos direitos fundamenta is [...].
123
Realmente, o que tem ocorrido não em nosso país como no resto do
mundo, é que houve um assustador crescimento da industrialização a partir do
século passado, ocasionando, inevitavelmente, uma nova gama de reivindicações
em termos de direitos sociais, como resultado da exploração da mão -de-obra
excedente. Em outras palavras, os chamados direitos de primeira geração, em
face dos novos problemas sociais surgidos, não mais atendiam as necessidades
surgidas pelas novidades industriais, exigindo -se do Estado uma atuação mais
positiva na realização da justiça social.
Conclui-se, portanto, que o direito de liberdades sociais encontra -se
constitucionalmente garantido e, por tratar -se de um direito fundamental, é
amplamente aplicável ao trabalhador, ass im como os demais direitos
fundamentais já tratados neste estudo.
122
Idem, ibidem.
123
ANDRADE, José Carlos Vieira de. Op. cit., p. 290. (grifos originais)
68
Contudo, outro aspecto social que também possui grande importância e
está diretamente relacionado à atividade empresarial, é a realização da justiça
social. Atualmente, em decorrência de sua imposição constitucional, a realização
da justiça social passou a ser um dos objetivos da empresa, de cunho tão
importante quanto à obtenção do lucro, conforme analisar -se-á no item adiante.
3.1.2 A atividade empresarial e a realização da justiça social
Quando o assunto é justiça social, o que vem à mente, em primeira
instância, é a responsabilidade do Estado pelo cumprimento de determinadas
tarefas. Todavia, justiça social é assunto de responsabilidade geral, incluindo -se
aí, a responsabilidade dos en tes privados, dentre eles os empresários.
Justiça social não pode ser confundida com caridade. Vale salientar que
antes de social vem a palavra justiça, e esta, enquanto imperativa, é direito e
quanto a este, não cabe filantropia.
Assim, enquanto particip ante efetiva do social, à empresa cabe uma parcela
desta responsabilidade, sendo de suma importância que quem detém o sustento
da economia preocupe-se também com o seu planejamento.
É neste contexto que a retribuição da empresa para com a comunidade irá,
se positiva, contribuir para amenizar a desigualdade social. Vale esclarecer que
quanto maior a desigualdade, menor será o poder aquisitivo e conseqüentemente
também, o consumo; ou seja, a empresa que não se preocupar com a injustiça
social, está assim, de certa forma, deixando de se preocupar com o seu próprio
destino.
Tais fatos, conforme foi analisado no primeiro capítulo, são evidenciados
em função da abertura econômica face à globalização, com a inevitável influência
das empresas multinacionais sobre o controle da economia interna dos países em
desenvolvimento.
Flávia Piovesan, ao se referir às atitudes das empresas multinacionais em
relação ao processo de globalização, ensina que:
69
[...] ao imperativo da eficácia econômica deve ser conjugada
e exigência ética de justiça social, inspirada em uma ordem
democrática que garanta o pleno exercício dos direitos civis,
políticos, sociais, econômicos e culturais.
124
No Brasil, não como abordar a questão da justiça social senão como
sendo quase uma utopia, po is em um país em que a maior fatia econômica é
distribuída entre um número pequeno de pessoas e que em contrapartida a menor
desta é quase que dissolvida entre os 90 % da população, vale acordar que justiça
social e atividade empresarial, na verdade, não c ombinam. Aliás, o preceito
constitucional da livre iniciativa (artigo 170 da Constituição Federal de 1988)
fará sentido na medida em que as empresas efetivamente objetivarem e
realizarem a justiça social, observando igualmente os demais direitos
fundamentais, como por exemplo, os direitos sociais, que serão abordados a
seguir.
3.1.3 Os direitos individuais e coletivos – direitos sociais
Na esfera dos direitos inerentes à pessoa humana, encontram -se “direitos
individuais”, relativos a cada um dos indi víduos, e “direitos coletivos”, que se
referem ao indivíduo, porém, sob o enfoque de que ele encontra -se inserido dentro
de uma sociedade.
Não se pretende, aqui, realizar uma análise crítica sobre as terminologias
usadas pelos doutrinadores sobre a classif icação dos direitos. Entretanto, pode -se
afirmar que direitos individuais (direitos de primeira dimensão) são aqueles
destinados a proteger os indivíduos isoladamente, caracterizando -se por ser
apenas um direito de resistência do indivíduo perante o Estado , não se exigindo
uma atuação positiva por parte deste, sendo utilizados pelo legislador no que diz
124
PIOVESAN, Flávia. Globalização econômica... Op. cit., p. 74.
70
respeito à vida, à igualdade, à liberdade, à segurança, à propriedade, nos termos
do artigo 5, da Constituição Federal de 1988, que determina:
Art. 5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer
natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no
País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à
segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
[...]
Cabe ressaltar que, dentre os direitos acima descritos, o direito à vida, na
verdade, serve de ponto de partida para a realização de todos os demais, visto
que é o mais básico de todos os direitos fundamentais. Aliás, nas palavras de
André Ramos Tavares, “[. ..] o conteúdo do direito à vida assume duas vertentes.
Traduz-se, em primeiro lugar, no direito de permanecer existente, e, em segundo
lugar, no direito a um adequado nível de vida”.
125
De fato, é inegável que para se tenha uma vida saudável, é necessário q ue
o Estado propicie condições de uma vida digna, que inclua o atendimento a outras
necessidades, tais como vestuário, saúde, educação, moradia etc.
No que se refere aos direitos coletivos, por sua vez, apesar das
controvérsias quanto às questões terminoló gicas, pode-se afirmar que são
aqueles caracterizados como direitos sociais (direitos de segunda dimensão) e
estão espalhados pelo texto constitucional, caracterizando -se por exigir uma
atuação estatal em prol do indivíduo, tais como direito de greve, libe rdade de
reunião e de associação profissional, entre outros citados por ocasião do estudo
dos princípios sociais trabalhistas.
Sobre a diferenciação entre direitos individuais e sociais, principalmente no
tocante à atuação do Estado, Carlos Henrique Bez erra Leite assim se pronuncia:
Enquanto os direitos individuais, modernamente
denominados por renomados publicistas de direitos
humanos de primeira geração, são uma espécie de
comando negativo imposto ao poder estatal, limitando a
atuação deste em função das liberdades públicas
asseguradas ao indivíduo, os direitos sociais, também
chamados de direitos humanos de segunda geração,
125
TAVARES, André Ramos. Op. cit., p. 387.
71
impõem ao Estado uma prestação positiva, no sentido de
fazer algo de natureza social em favor do indivíduo.
126
A respeito da utilização da expressão “social” para caracterizar os direitos
coletivos, importante transcrever a lição de Ingo Wolfgang Sarlet, o qual enfatiza:
A utilização de tal expressão encontra justificativa, entre
outros aspectos [...] na circunstância de que os dire itos da
segunda dimensão podem ser considerados uma
densificação do princípio da justiça social, além de
corresponderem às reivindicações das classes menos
favorecidas, de modo especial da classe operária, a título de
compensação, em virtude da extrema des igualdade que
caracterizava (e, de certa forma, ainda caracteriza) as
relações com a classe empregadora, notadamente detentora
de um maior ou menor grau de poder econômico.
127
Por este motivo, no estudo do presente pico será dado um
direcionamento para as situações mais peculiares de tais direitos que, sem dúvida,
se caracterizam pela defesa de interesses dos hipossuficientes, como se referiu
o renomado autor. Ademais, buscar -se-á delinear o estudo de maneira que aborde
a questão da atividade empresaria l em face aos direitos individuais e coletivos
assegurados ao trabalhador.
Nesta linha de raciocínio, convém esclarecer que individualmente, cabe
ao empregador assegurar aos seus empregados, no exercício da atividade
empresarial, o gozo de todas as prerr ogativas asseguradas ao indivíduo e
tratadas anteriormente, tais como ambiente de trabalho saudável, liberdade de
pensamento, liberdades físicas, além, é claro, de garantir todos os demais direitos
previstos na legislação trabalhista.
No tocante aos direitos coletivos, percebe -se que o legislador constitucional
não expõe claramente a seu respeito, deixando a cargo da doutrina sua
discussão, além do que, não na Constituição um capítulo específico para tais
126
LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Op. cit., p. 11.
127
SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos... Op. cit., p. 57-58.
72
direitos, estando os mesmos espalhados desorde nadamente em vários capítulos
do texto constitucional.
Sobre o assunto, assim se pronuncia José Afonso da Silva:
A rubrica do Capítulo I do Título II anuncia uma especial
categoria dos direitos fundamentais: os coletivos, mas nada
mais diz a seu respeito . Onde estão, nos incisos do art. 5º,
esses direitos coletivos? Houve propostas, na Constituinte
de abrir-se um capítulo próprio para os direitos coletivos.
[...]. Muitos desses ditos direitos coletivos sobrevivem ao
longo do texto constitucional, caracter izados, na maior parte,
como direitos sociais.
128
A mesma observação é feita por Carlos Henrique Bezerra Leite, ao afirmar
que:
Durante a fase de elaboração do texto constitucional
projetos diversos contemplavam, em capítulo separado, os
direitos coletivos, incluindo os direitos de liberdade de
reunião, de associação civil, profissional e sindical e o direito
de greve. A Constituição, contudo, acabou por suprimir o
sobredito capítulo, separando o seu conteúdo entre o
capítulo dos direitos individuais e cole tivos (CF, Título II,
Capítulo I) e o relativo aos direitos sociais (CF, Título II,
Capítulo II). Assim, os direitos coletivos individuais passaram
a integrar o rol dos direitos e deveres individuais e coletivos;
enquanto que os direitos coletivos dos trab alhadores foram
inscritos no elenco dos direitos sociais.
129
Importante destacar que o Direito Coletivo do Trabalho é parte integrante do
Direito do Trabalho, não importando, desta forma, em um ramo autônomo, como
bem explica Carlos Henrique Bezzera Leite:
Urge destacar que o Direito Coletivo não constitui ramo autônomo do
Direito, e sim parte integrante do Direito do Trabalho cujo objeto consiste
no estudo da organização sindical, da representação dos trabalhadores
na empresa, das negociações coletivas de trabalho e dos conflitos
coletivos do trabalho e soluções.
130
128
SILVA, José Afonso da. Op. cit., p. 194.
129
LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Op. cit., p. 103.
130
Idem, ibidem, p. 105.
73
Conforme ressaltado, percebe -se que no âmbito constitucional uma
determinada confusão legislativa no tocante à classificação de tais direitos,
inclusive, na denominação dos direitos coletiv os. Todavia, a tendência mais atual
é a utilização do termo Direito Coletivo do Trabalho, apesar de parte da doutrina
defender o uso dos termos Direito Sindical e Direito Social do Trabalho.
De qualquer forma, importante trazer o conceito de “direito colet ivo do
trabalho”, que para Maurício Godinho Delgado:
É o complexo de institutos, princípios e regras jurídicas que
regulam as relações laborais de empregados e
empregadores e outros grupos jurídicos normativamente
especificados, considerada sua ação cole tiva, realizada
autonomamente ou através das respectivas entidades
sindicais.
131
Assim, tem-se que nas relações jurídicas coletivas, sendo os interesses
pertencentes a uma determinada coletividade, as partes conflitantes,
empregadores e trabalhadores, geral mente são representadas, respectivamente,
pelos sindicatos patronais e trabalhistas. De fato, nem todas as relações jurídicas
coletivas são representadas pelos sindicatos, já que no ordenamento jurídico
brasileiro é permitido, nos termos do artigo 11, da C onstituição vigente, as
representações de trabalhadores no âmbito das empresas.
Todavia, o fato é que, independentemente de tratar -se de direitos sociais
individuais ou coletivos, os mesmos devem ser respeitados, haja vista estarem
inseridos no rol dos dir eitos fundamentais, conforme mencionamos
anteriormente. Em especial, considerando -se a questão colocada no presente
estudo, tais direitos devem ser observados e respeitados no desenvolvimento da
atividade empresarial, haja vista estar sujeita a empresa ao cumprimento da sua
função, conforme ver-se-á adiante.
131
DELGADO, Mauricio Godinho. Op. cit., p. 1282.
74
3.1.4 A função social da empresa no III milênio
A Constituição Federal de 1988, ao enunciar a função social da
propriedade, destaca nos incisos XXII e XXIII, do artigo 5:
Art. 5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer
natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no
País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à
segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
[...]
XXII - é garantido o direito de propriedade;
XXIII - a propriedade atenderá a sua função social;
[...]
Da mesma forma o faz no artigo 170, inciso III, ao tratar dos princípios
gerais da atividade econômica, onde determina :
A ordem econômica, fundada na valorização d o trabalho humano e na
livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme
os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:
[...]
II - propriedade privada;
III - função social da propriedade;
[...]
Contudo, o que se nota é que muitas empresas ainda estão longe do
cumprimento de suas funções sociais humanitárias. Todavia, pode -se perceber
uma gradual mudança de comportamento da empresa em relação às suas
funções sociais. Uma delas está relacionada ao seu sucesso, pois os empresários
têm percebido que este está intrinsicamente ligado à condição social de seus
consumidores, bem como ao bem -estar de seus empregados, à qualidade de vida
da comunidade onde a empresa está inserida e, também, ao que se dá muito valor
hoje, à conscientização da preservação do meio ambiente.
Assim, a empresa não pode ignorar o fato de que é também fruto do
mesmo sistema social, que seu surgimento é reflexo deste. A necessidade por
novos produtos ou serviços se à medida que o poder aquisiti vo se eleva.
75
Assim, a empresas que não se preocupam com a desigualdade social também
não estão se preocupando com a ampliação de sua própria clientela.
Com efeito, de acordo com a Constituição Federal de 1988, as atividades
da empresa têm que estar em cons onância com os princípios da ordem
econômica e social por ela traçados, no sentido de promover a dignidade da
pessoa humana e desenvolver a solidariedade social, nos seus mais diversos
aspectos, objetivando, em última análise, o respeito aos direitos human os
fundamentais.
Dessa forma, a empresa tem que respeitar tais direitos humanos, que
lentamente estão se internacionalizando, submetendo não as empresas como
os próprios Estados aos ditames internacionais, que a rede de proteção dos
direitos humanos internacionais está sempre definindo qual é a matéria de
exclusiva jurisdição interna dos Estados, como bem esclarece Flávia Piovesan:
Fortalece-se, assim, a idéia de que a proteção dos direitos
humanos não deve se reduzir ao domínio reservado do
Estado, isto é, não deve se restringir à competência nacional
exclusiva ou à jurisdição doméstica exclusiva, porque revela
tema de legítimo interesse internacional.
132
Rubens Requião, na VII Conferência Nacional da Ordem dos Advogados do
Brasil, realizada na cidad e de Curitiba-PR, sob o tema “A Função Social da
Empresa no Estado de Direito”, fez a seguinte explanação:
Mas hoje, o conceito social de empresa, como exercício de
uma atividade organizada, destinada à produção ou
circulação de bens ou de serviços, na qu al se refletem
expressivos interesses coletivos, faz com que o empresário
comercial não seja mais o empreendedor egoísta, divorciado
daqueles interesses gerais, mas um produtor impulsionado
pela persecução do lucro, é verdade, mas consciente de que
constitui uma peça importante no mecanismo da sociedade
humana.
133
132
PIOVESAN, Flávia. Globalização econômica... Op. cit., p. 42-43.
133
REQUIÃO, Roberto. A função social da empresa no estado de direito . VII Conferência
Nacional da Ordem dos Advogados do Brasil em 08 -04-1978.
76
Como visto, a ânsia pelo lucro contribui para a disseminação da
desigualdade social, aliás, vale destacar que esta não se desenvolve apenas fora
da empresa. Ela pode, inclusive, ser fruto desta, qu ando os empregados não são
motivados, ou a empresa não lhes oferece qualificação, assim como também,
quando desrespeito quanto aos encargos trabalhistas e ainda outras situações
que oprimam e denigram o caráter humano dos empregados. O que fica claro, é
que, num contexto social, a empresa irá receber um retorno positivo ou negativo,
dependendo exclusivamente de seu comportamento diante de suas
responsabilidades para com a sociedade.
Ante o exposto, pode -se afirmar, nas palavras de Amauri Mascaro
Nascimento, que “a empresa, sob o ângulo trabalhista, interessa apenas de um
modo: como organização que tem empregados e que, portanto, deve cumprir o
apenas fins econômicos, mas também sociais”.
134
Verifica-se, assim, que o empresário do III milênio, se quiser so breviver no
mercado competitivo, tem se adaptar às modernas práticas de gestão,
principalmente no que diz respeito à distribuição dos lucros, como bem esclarece
José Francelino de Araújo:
Hoje não mais se admite o empresário atrasado,
ganancioso, espertalhão e voraz, pois estes serão o lixo da
atividade empresarial, como a Revolução Industrial arrasou
o domínio dos senhores feudais. Atualmente predomina a
Revolução Tecnológica, onde as modernas práticas de
gestão o diferenciadas pelo aspecto científico d a
produção e da distribuição dos recursos.
135
Analisadas todas estas conotações da função social da empresa, vale
salientar, ainda, a necessidade de investimentos por parte desta, nas áreas da
educação e lazer, pois tais procedimentos não reduzem a desig ualdade social,
como também valorizam a dignidade humana.
134
NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Iniciação ao... Op. cit., p. 553.
135
ARAÚJO, José Francelino de. Op. cit., p. 11.
77
Em face deste entendimento, frise -se que a própria Constituição brasileira,
visando o bem-estar de toda a sociedade, destacou no artigo 205 e no parágrafo
3, do artigo 217, a importância da educação e do lazer, nos termos seguintes :
Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e
da família, será promovida e incentivada com a colaboração
da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa,
seu preparo para o exercício da cidadania e s ua qualificação
para o trabalho.
[...]
Art. 217. É dever do Estado fomentar práticas desportivas formais e não -
formais, como direito de cada um, observados:
[...]
§ - O Poder Público incentivará o lazer, como forma de promoção
social.
[...]
Como se pode notar, o empresário neste início de século tem que
direcionar suas atividades para a realização das funções sociais, tanto por uma
questão de imposição legal, por meio da exigência de adequação de suas
atividades aos princípios constitucionais, como tam bém por uma exigência da
própria sociedade como um todo.
Estes são, portanto, os novos contornos atribuídos à empresa em razão da
declaração constitucional da função social da propriedade, que juntamente com os
demais princípios e direitos fundamentais, de vem ser observados no
desenvolvimento da atividade empresarial, conforme verificar -se no próximo
item.
3.2 O princípio da dignidade da pessoa humana
As normas constitucionais, apesar da sua imperatividade, apenas
estabelecem o referencial de como dev e ser a vida em sociedade, por representar
os anseios desta mesma sociedade, relativamente aos costumes culturais que são
aceitos como parâmetros da boa convivência.
78
Nesse sentido, Luis Roberto Barroso ensina:
O ponto de partida do intérprete há que ser s empre os
princípios constitucionais, que são o conjunto de normas que
espelham a ideologia da Constituição, seus postulados
básicos e seus fins. Dito de forma sumária, os princípios
constitucionais são as normas eleitas pelo constituinte como
fundamentos ou qualificações essenciais da ordem jurídica
que institui.
136
A respeito da importância dos princípios Paulo Bonavides esclarece que “os
princípios fundamentais da Constituição, dotados de normatividade, constituem,
ao mesmo tempo, a chave de interpretação dos textos constitucionais”.
137
Dentre os princípios fundamentais constitucionais encontra -se o princípio da
dignidade da pessoa humana. Sobre seu conceito, André Ramos Tavares ensina:
O princípio da dignidade da pessoa humana encontra, assim
como o direito à vida, alguns obstáculos no campo
conceitual. Aliás, em boa medida as dificuldades são
aquelas próprias dos princípios, normas que, como se
verificou, são extremamente abstratas, permitindo diversas
considerações, definições e enfoques os mais variado s.
138
Neste contexto, Maria Celina Bodin de Moraes acentua que “a dignidade
humana, então, não é uma criação da ordem constitucional, embora seja por ela
respeitada e protegida”.
139
Sabe-se que o princípio da dignidade humana é um dos fundamentos do
ordenamento jurídico, servindo de referência para todos os demais princípios, ou,
nas palavras de Marçal Justen Filho, “o princípio da dignidade da pessoa humana
136
BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição . 6. ed.
São Paulo: Saraiva, 2004, p. 151.
137
BONAVIDES, Paulo. Op. cit., p. 292.
138
TAVARES, André Ramos. Op. cit., p. 392.
139
MORAES, Maria Celina Bodin de. O conceito de dignidade humana: substrato axiológico e
conteúdo normativo. In: SARLET, Ingo Wolfgang (Org.). Constituição, direitos fundamentais...
Op. cit., p. 117.
79
é o princípio fundamental de que todos os demais princípios derivam e que norteia
todas as regras jurídicas”.
140
A propósito, ao discorrer sobre o referido princípio, Luis Roberto Barroso,
assevera que “o princípio da dignidade da pessoa humana identifica um espaço de
integridade moral a ser assegurado a todas as pessoas por sua existência no
mundo”.
141
De qualquer forma, apesar das inúmeras conceituações sobre o princípio
da dignidade da pessoa humana, visto que o mesmo está em permanente
processo de construção e não se sujeita a qualquer numerus clausus, pode-se
dizer que dignidade, conforme acepção de Ingo Wolfang Sarlet, “é acima de tudo,
a qualidade intrínseca do ser humano e que o torna merecedor ou, pelo menos,
titular de uma pretensão de respeito e proteção”.
142
Nesta ordem de idéias, o autor ressalta, ainda:
Onde não houver respeito pela vida e pela i ntegridade física
e moral do ser humano, onde as condições mínimas para
uma existência digna o forem asseguradas, onde não
houver limitação do poder, enfim, onde a liberdade e a
autonomia, a igualdade (em direitos e dignidade) e os
direitos fundamentais não forem reconhecidos e
minimamente assegurados, não haverá espaço para a
dignidade da pessoa humana e esta (a pessoa), por sua
vez, poderá não passar de mero objeto de arbítrio e
injustiças.
143
Acrescente-se que somente a análise do texto constitucional n ão é o
bastante para se chegar à compreensão do tema, sendo necessário recorrer à
análise doutrinária para entender como o assunto é tratado.
Assim, pode-se dizer que o princípio em tela remonta da antiguidade
clássica, visto que nesse período buscava -se a proteção das pessoas no que
diz respeito aos seus valores internos. Aliás, o Código de Hamurabi, de certa
140
JUSTEN FILHO, Marçal. O direito das agências reguladoras independentes . São Paulo:
Dialética, 2002, p. 319.
141
BARROSO, Luis Roberto. Op. cit., p. 334.
142
SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana. .. Op. cit., p. 139.
143
SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana... Op. cit., p. 59.
80
maneira expressava interesse em proteger a dignidade e os direitos do ser
humano.
Neste aspecto, chama atenção a influência do cristianismo que , pela
primeira vez, preocupou -se em atribuir a cada indivíduo a idéia de uma dignidade
pessoal, como explica Maria Celina Bodin de Moraes:
O desenvolvimento do pensamento cristão sobre a
dignidade humana deu -se sob um duplo fundamento: o
homem é um ser originado por Deus para ser o centro da
criação; como ser amado por Deus, foi salvo de sua
natureza originária através da noção de liberdade de
escolha, que o torna capaz de tomar decisões contra o seu
desejo natural.
144
Desta forma, é inquestionável que a idéia de que todos somos filhos de
Deus e, por isso, feitos à sua imagem e semelhança, defendida pela filosofia
cristã, é um marco na influência do princípio da dignidade da pessoa humana nas
mais diversas legislações pelo mundo, que tal pensamento trad uz a noção de
uma igualdade de todos os homens, independentemente de seus padrões sociais
ou culturais.
De fato, o referido princípio estava esculpido desde 1948 na Declaração
Universal dos Direitos do Homem elaborada pela Organização das Nações
Unidas, que logo no seu artigo 1, estatui: Art. - Todos os seres humanos
nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de
consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade”.
É de suma importância que se tenha u ma divulgação do princípio num
instrumento jurídico internacional, que de certa forma, deixa bem claro para os
demais Estados a universalidade e a indivisibilidade do mesmo, inclusive, criando
no meio internacional um real interesse dos Estados em recep cioná-lo nos seus
ordenamentos jurídicos internos, como decorrência do inevitável processo de
internacionalização dos direitos, conforme acentua Flávia Piovesan:
144
MORAES, Maria Celina Bodin de. Op. cit., p. 112-113.
81
Assim, o processo de internacionalização dos direitos
humanos traz reflexos no âmbito normati vo interno, na
medida em que as Constituições contemporâneas hão de
respeitar parâmetros internacionais mínimos voltados à
proteção da dignidade humana, convertida em pressuposto
ineliminável de todos os constitucionalismos.
145
Aliás, no direito pátrio, log o no artigo 1, inciso III, a Constituição Federal de
1988 estabelece:
Art. A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel
dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui -se em Estado
Democrático de Direito e tem como funda mentos:
[...]
III - a dignidade da pessoa humana;
[...]
Resta evidente, portanto, que o princípio da dignidade da pessoa humana é
um dos fundamentos da República Federativa do Brasil, constituindo -se num valor
supremo do ordenamento jurídico, servindo de referência para todos os demais
direitos, não dos trabalhadores, mas de toda a sociedade, proporcionando -lhes
os meios necessários para uma sobrevivência digna.
Sobre o assunto, Irany Ferrari aduz:
É bem verdade que a dignidade da pessoa humana é
genérica, ou seja, toda a pessoa deve ser digna e, para
tanto, deve ter os meios necessários para uma
sobrevivência à altura dos padrões morais, culturais e
econômicos no meio social em que vive. Tais meios
necessários são obtidos, obviamente, pelo trabalho ho nesto
e digno, qualquer que ele seja, a saber: como empregado,
como autônomo, como avulso, como empresário, como
servidor público.
146
145
PIOVESAN, Flávia. Globalização econômica... Op. cit., p. 59.
146
FERRARI, Irani; NASCIMENTO, Amauri Mascaro; MARTINS FILHO, Ives Gandra da Silva.
História do trabalho, do direito do trabalho e da justiça do trabalho . São Paulo: LTr, 1988, p.
60.
82
O legislador constitucional de 1988 enumerou o princípio da dignidade de
forma totalmente dispersa ao longo do texto, o que não descaracteriza a sua
importância, como defende Eros Roberto Grau:
[...] é que cada direito não é um mero agregado de normas,
porém um conjunto dotado de unidade e coerência
unidade e coerência que repousam precisamente sobre os
seus (dele = de um d eterminado direito) princípios.
147
Diante disso, pode-se afirmar que as diretrizes do referido princípio se
manifestam claramente nos incisos do artigo 3, da Constituição vigente, quais
sejam, sociedade livre, erradicação da pobreza e desigualdade social e a
promoção de todos sem qualquer preconceito, conforme abaixo transcrito:
Art. 3º - Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do
Brasil:
I - construir uma sociedade livre, justa e solidária;
[...]
III - erradicar a pobreza e a marginaliza ção e reduzir as desigualdades
sociais e regionais;
IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo,
cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação;
[...]
A disposição do artigo 5 e inciso II, do artigo 170, da Constituição pát ria,
também é uma forma de manifestação do referido princípio no que diz respeito à
garantia da propriedade privada:
Art. - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de
qualquer natureza, garantindo -se aos brasileiros e aos
estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à
vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade,
nos termos seguintes:
[...]
Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho
humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos exi stência
147
GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988 (interpretação e crítica).
10. ed. rev. e atual. São P aulo: Malheiros, 2005, p. 267.
83
digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes
princípios:
II - propriedade privada;
[...]
Ressalte-se, ainda, que a partir da Emenda Constitucional n. 45, de 2004,
os Tratados e Convenções sobre Direitos Humanos, incluindo -se o princípio da
dignidade humana, que forem aprovados pelo Poder Legislativo, serão
equivalentes às emendas constitucionais, no ordenamento jurídico nacional, nos
termos do parágrafo 3, do artigo 5, da Constituição Federal de 1988.
A seguir, analisar-seas implicações do princípio da dignidade da pessoa
humana no âmbito do direito constitucional brasileiro, verificando seus aspectos
mais importantes e a sua forma de aplicação.
3.2.1 O princípio da dignidade da pessoa humana no âmbito do direito
constitucional brasileiro
Do ponto de vista da fundamentação da República e do Estado
Democrático de Direito, a primeira Constituição nacional a mencionar princípio da
dignidade humana foi a promulgada em 1988, por influência das Constituições de
outros países, que adotam o referido princípio em seu texto constitucional.
Registre-se, todavia, que a Constituição brasileira de 1934 foi a primeira a
se referir ao assunto, conforme preceitua o seu artigo 115:
Art. 115 A ordem econômica deve ser organizada
conforme os princípios da justiça e as necessidades da vida
nacional, de modo que possibilite a todos existência digna.
Dentro desses limites, é garantida a liberdade econômica.
[...]
Percebe-se, pelo enunciado supracitado, que mesmo se referindo apenas à
ordem econômica, uma preocupação do legislador em estabelecer a todos
84
os cidadãos uma existência digna. Aliás, tal preocupação é repetida de uma
maneira mais clara na Constituição de 1946, em seu artigo 145, que abaixo segue
transcrito:
Art. 115 - A ordem econômica deve ser organizada conforme
os princípios da justiça social, conciliando a liberdade de
iniciativa com a valorização do trabalho humano.
Parágrafo único. A todos é assegurado trabalho que
possibilite existência digna. O trabalho é obrigação social.
A iniciativa de estabelecer o princípio em estudo coube ao legislador
constituinte de 1967, que estabeleceu pela primeira vez o princípio da valorização
do trabalho como base da dignidade do ser humano, nos termos do inciso II, do
artigo 157:
Art. 157 A ordem econômica tem por fim realizar a justiça
social, com base nos seguintes princípios:
[...]
II valorização do trabalho como condição da dignidade
humana.
[...]
No que se refere ao reconhecimento normativo do referido princípio, não
resta dúvida de que a Constituição de 1988 foi um marco com relação às
Constituições anteriores ao prever um título próprio para os direitos fundamentais
e estabelecer o princípio da dignidade da pessoa humana como um valor supremo
da ordem jurídica nacional, ac eitando-o como fundamento da República e do
Estado Democrático de Direito, como já foi dito.
Importante transcrever uma vez mais o artigo 1, da Constituição Federal de
1988, que estabelece claramente a importância do princípio da dignidade,
dispondo em seu inciso III a seguinte afirmativa:
Art. - A República Federativa do Brasil, formada pela união
indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui -se
em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
85
[...]
III - a dignidade da pessoa humana;
[...]
Percebe-se, desta maneira, que com o novo entendimento dado ao
princípio pela Constituição vigente, reconhecendo -o expressamente como
princípio fundamental que serve de referência para todos os demais, o princípio da
dignidade da pessoa humana representa um conjunto de valores que se estende
para todo o ordenamento jurídico nacional, assim como acontece em muitos
países que recepcionaram tal princípio em suas Constituições.
Pela leitura do texto constitucional, percebe -se, por exemplo, que o
princípio da dignidade da pessoa humana, além de constar no capítulo que trata
dos direitos fundamentais, encontra -se expresso em vários outros capítulos, como,
por exemplo, no que trata da ordem econômica (artigo 170, caput), que assegura
a todos uma existência digna, no capítulo que trata da ordem social (artigo226,
parágrafo 6º), determinando que o planejamento familiar seja realizado com base
nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável,
bem como assegurando o direit o à dignidade à criança e ao adolescente (artigo
227, caput), dentre outros que podem ser observados no texto constitucional.
Assim, segundo entendimento de Ingo Wolfgang Sarlet:
Consagrando expressamente, no título dos princípios
fundamentais, a dignida de da pessoa humana como um dos
fundamentos do nosso Estado democrático (e social) de
Direito (art. 1º, inc. III, da CF), o nosso Constituinte de 1988
a exemplo do que ocorreu, entre outros países, na
Alemanha -, além de ter tomado uma decisão fundamenta l a
respeito do sentido, da finalidade e da justificação do
exercício do poder estatal e do próprio Estado, reconheceu
categoricamente que é o Estado que existe em função da
pessoa humana, e não o contrário, que o ser humano
constitui a finalidade precí pua, e o meio da atividade
estatal.
148
148
SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana... Op. cit., p. 66.
86
Todavia, o reconhecimento da dignidade da pessoa humana no âmbito
constitucional brasileiro, sem dúvida, seguiu a tendência que vinha sendo
verificada em Constituições estrangeiras, conforme veremos a seguir, ao a nalisar
o princípio da dignidade na seara do Direito Comparado.
3.2.2 O princípio da dignidade da pessoa humana no direito comparado
Foi a Constituição da Alemanha, de 1949, a primeira a estabelecer
expressamente na sua lei fundamental a dignidade da p essoa humana como um
direito fundamental, conforme se infere da leitura de seu artigo 1, que determina:
“Art. 1º, 1 – A dignidade da pessoa humana é inviolável. Respeitá -la e protegê-la é
obrigação de todos os Poderes estatais”.
A partir desse reconhecimen to formal, diversas Constituições de outros
países seguiram o mesmo caminho, esculpindo em suas leis fundamentais o
referido princípio, tais como a Constituição portuguesa, espanhola e italiana. Frise -
se que até mesmo alguns países do Leste europeu reconhe ceram em suas
Constituições o referido princípio, como por exemplo, a Constituição da Croácia
(1990), da Romênia (1991), da Bulgária (1991), da Estônia e da Lituânia (1992)
etc.
A Constituição espanhola de 1978 faz alusão ao princípio da dignidade da
pessoa humana ao estabelecer no n. 1, do artigo 10:
Art. 10.1 - A dignidade da pessoa, os direitos invioláveis que
lhe são inerentes, o livre desenvolvimento da personalidade,
o respeito à lei e aos direitos dos outros são fundamentos da
ordem política e da pa z social.
[...]
A constituição de Portugal, promulgada em 1976, em seu artigo 1, também
aduz: “Art. - Portugal é uma república soberana, baseada na dignidade da
87
pessoa humana e na vontade popular e empenhada na construção de uma
sociedade livre, justa e solidária”.
Igualmente, o Estado da Bélgica, em seu artigo 23, nos termos da revisão
de 1994, afirma: “Art. 23 Cada um tem o direito de levar uma vida de acordo com
a dignidade humana”.
Na França, entretanto, apesar de ser um país modelo relativamente à
instituição dos direitos universais, não há nenhuma menção constitucional ao
princípio da dignidade da pessoa humana. De fato, tal princípio aparece somente
como uma criação jurisprudencial, conseqüência da aplicação tanto pelo Conselho
Constitucional como pelo Conselho de Estado daquele país.
Sendo assim, percebe -se que quase todas as Constituições dos Estados,
cada uma dentro de suas peculiaridades, referem -se ao princípio da dignidade da
pessoa humana como uma diretriz para o legislador infraconstituci onal, podendo-
se citar ainda as Constituições da Grécia, China, Peru, Venezuela, Colômbia, Índia
etc.
Entretanto, Ingo Wolfgang Sarlet faz a seguinte observação:
Assim, ainda que incompleto o quadro apresentado, os
exemplos garimpados no direito comparad o ilustram, de
forma representativa e contundente, que a dignidade da
pessoa humana (ao menos nesta formulação e no que diz
com sua expressa previsão pelo direito constitucional
positivo), ainda não foi integrada de forma definitiva à
totalidade das Constituições de nosso tempo, muito embora
esta seja, ao que nos parece, a benfaseja e assim
esperamos também irreversível tendência a ser saudade
com entusiasmo e esperança, sem que com isto se esteja a
recair na ingenuidade de não reconhecer que a positiva ção
jurídica, por si só, não tem o condão de impedir violações
concretas da dignidade das pessoas.
149
Contudo, da mesma forma que o constituinte tem o direito de proteger os
indivíduos por meio do princípio da dignidade da pessoa humana, também tem o
149
SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana... Op. cit., p. 65-66.
88
dever de impor limites à restrição de alguns direitos fundamentais, conforme ver -
se-á a seguir.
3.2.3 Proteção e limites da dignidade da pessoa humana limites à restrição
dos direitos fundamentais
No âmbito internacional, no que diz respeito aos direitos h umanos, uma
preocupação dos chamados blocos internacionais em difundir regras de proteção
aos Estados-membros, como ocorre no caso da União Européia, nas palavras de
Flávia Piovesan:
No que tange aos direitos humanos, cumpre ainda ressaltar
que, no âmbito da União Européia, firma -se, paulatinamente,
além dos direitos sociais dos trabalhadores, um catálogo de
direitos humanos concernentes à proibição da discriminação
baseada em nacionalidade, bem como à liberdade de
movimento dos trabalhadores, o que req uer a harmonização
de leis internas dos Estados -membros, na medida em que
vige o princípio do primado do Direito Comunitário pelo qual
é reconhecida primazia às normas editadas pela
comunidade em relação às leis internas de cada Estado.
150
Assim, como acentuam Carla Bertucci Barbieri e José Guilherme Carneiro
Queiroz, os Estados têm que respeitar as orientações impostas pela comunidade
internacional, no que se refere à proteção dos direitos humanos:
Os dispositivos constitucionais apontam a formação de um
Estado democrático de direito, o qual tem em seu
documento maior a orientação de atenção, pelo Estado, à
proteção dos direitos fundamentais de seus cidadãos, e que
não pode figurar, perante a comunidade internacional, seja
atuado como membro de um bloco sup ranacional, seja
150
PIOVESAN, Flávia. Globalização econômica... Op. cit., p. 52-53.
89
agindo individualmente, como desrespeitador dos direitos
humanos.
151
Todavia, ressalte-se que como os Estados possuem a obrigação de
proteger os direitos humanos, entre os quais se inclui o direito à dignidade da
pessoa, da mesma forma poss uem a liberdade de restringir o exercício de certos
direitos ditos fundamentais, atingindo, de certa forma, diretamente a pessoa no
exercício de alguns direitos, entre os quais, o direito à dignidade, ora em estudo.
Desse modo, tal restrição pode ocorrer, desde que seja em nome da
preservação da ordem pública, como ocorre no Brasil, nos casos de estado de
defesa e nos de estado de sítio, nos termos dos artigos 136 e 137,
respectivamente, da Constituição Federal de 1988, conforme se observa abaixo:
Art. 136. O Presidente da República pode, ouvidos o
Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional,
decretar estado de defesa para preservar ou prontamente
restabelecer, em locais restritos e determinados, a ordem
pública ou a paz social ameaçadas por grave e iminente
instabilidade institucional ou atingidas por calamidades de
grandes proporções na natureza.
Art. 137. O Presidente da República pode, ouvidos o Conselho da
República e o Conselho de Defesa Nacional, solicitar ao Congresso
Nacional autorização para decretar o estado de sítio nos casos de:
I - comão grave de repercussão nacional ou ocorrência de fatos que
comprovem a ineficácia de medida tomada durante o estado de defesa;
II - declaração de estado de guerra ou resposta a agressão armada
estrangeira;
Parágrafo único. O Presidente da República, ao solicitar autorização
para decretar o estado de sítio ou sua prorrogação, relatará os motivos
determinantes do pedido, devendo o Congresso Nacional decidir por
maioria absoluta.
Dos textos acima e de ac ordo com ensinamento de José Afonso da Silva,
extrai-se que:
151
BARBIERI, Carla Bertucci; QUEIROZ, José Guilherme Carneiro. Da necessária construção de
um constitucionalismo regional no âmbito do Mercosul. In: PIOVESAN, Flávia (Coord.). Direitos
humanos... Op. cit., p. 434.
90
[estado de defesa] é uma situação em que se organizam
medidas destinadas a debelar ameaças à ordem pública ou
à paz social [e] estado de sítio são as situações críticas que
indicam a necessidade da instauração de correspondente
legalidade de exceção (extraordinária para fazer frente à
anormalidade manifestada).
152
Justificam-se os referidos procedimentos, pois conforme foi ilustrado, o
princípio da dignidade da pessoa humana constitui -se num valor supremo do
ordenamento jurídico, sendo referência para todos os demais direitos, que de uma
maneira geral são irrenunciáveis, podendo sim ser limitados, desde que em
determinadas situações constitucionalmente previsíveis e desde que não ofendam
a ordem pública.
A respeito das limitações aos direitos fundamentais, José Joaquim Gomes
Canotilho destaca:
A solução do problema não pode reconduzir -se a
alternativas radicais porque a restrição dos direitos,
liberdades e garantias deve ter em atenção a função d os
direitos na vida comunitária, sendo irrealista uma teoria
subjectiva desconhecedora desta função, designadamente
pelas conseqüências daí resultantes para a existência da
própria comunidade, quotidianamente confrontada com a
necessidade de limitação dos direitos fundamentais mesmo
no seu núcleo essencial [...].
153
Nesse momento, cumpre particularizar as ditas limitações aos direitos
fundamentais no âmbito da relação de emprego, pois como se sabe, o limite
imposto ao exercício do direito da dignidade do tra balhador decorre do poder
diretivo do empregador, resultante da sua prerrogativa em dirigir os trabalhos dos
seus funcionários, além de outros limites de ordem constitucional ou contratual.
Conseqüentemente, em função da dependência do empregado, como
decorrência da sua subordinação ao empregador, este pode ultrapassar alguns
limites, ofendendo a dignidade do trabalhador. Ao exemplificar casos em que se
configuram situações violadoras da dignidade humana, Maria Celina Bodin de
152
SILVA, José Afonso da. Op. cit., p. 739.
153
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Op. cit., p. 449.
91
Morais ensina que “[...] cabe referir desde a revista íntima a que é submetido o
empregado, o exame toxicológico determinado pelo empregador [...], ou a
impossibilidade de receber tratamento médico por motivo religioso, etc”.
154
Importa descartamos, ainda, a afirmativa de Ingo Wolfgang S arlet, que
sobre o assunto aduz que:
[...] o princípio da dignidade da pessoa humana impõe ao
Estado, além do dever de respeito e proteção, a obrigação
de promover as condições que viabilizem e removam toda
sorte de obstáculos que estejam a impedir às pes soas de
viverem com dignidade.
155
Desta forma, vislumbra -se que dentre outras funções, o princípio da
dignidade da pessoa humana tem o condão de impor condutas tanto positivas,
quanto negativas, como é o caso da imposição de limites, estudada no presente
capítulo.
Assim, uma vez discorrido sobre os principais aspectos do princípio da
dignidade da pessoa humana e as conseqüências dele advindas sobre a vida das
pessoas humanas, passar -se-á a seguir a tratar do princípio da solidariedade no
âmbito da atividade empresarial.
3.3 A atividade empresarial face ao princípio da solidariedade
Para entendermos do que se trata o princípio da solidariedade, é importante
que antes compreendamos o próprio significado de solidariedade. Para Daniel
Sarmento:
[...] a solidariedade implica o reconhecimento de que,
embora cada um de nós componha uma individualidade,
154
MORAES, Maria Celina Bodin de. Op. cit., p. 138.
155
SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana... Op. cit., p. 109.
92
irredutível ao todo, estamos também todos juntos, de
alguma forma irmanados por um destino comum. Ela
significa que a sociedade não deve ser o lócus da
concorrência entre indivíduos isolados, perseguindo projetos
pessoais antagônicos, mas sim um espaço de diálogo,
cooperação e colaboração entre pessoas livres e iguais, que
se reconheçam como tais.
156
Nesta linha de raciocínio, pode -se afirmar que para que uma socied ade seja
solidária, é necessário certo abandono do individualismo e a busca de cada
indivíduo pela realização da justiça social, especialmente em relação àqueles
menos favorecidos.
No que se refere à atividade empresarial, saliente -se que esta se encontra
vinculada às diretrizes da ordem econômica, que determinam que as empresas,
no exercício de suas atividades, devem atender aos princípios da dignidade
humana, da construção de uma sociedade livre, justa e solidária e atender aos
ditames da justiça social.
Conclui-se, portanto, que para atender os ditames da ordem econômica, a
empresa, além de perseguir o lucro, deve objetivar o desenvolvimento nacional, a
erradicação da pobreza, a redução das desigualdades sociais etc.
Todavia, encontra-se também a empresa obrigada à observância dos
valores constitucionalmente assegurados, como é o caso da solidariedade social.
Para tanto, a preocupação com o homem deve estar no centro de interesses da
empresa, devendo o mesmo ser considerado não apenas como valor econômico,
mas como pessoa, dotada de direitos e garantias.
Neste sentido, encontra -se o discurso de Eduardo Teixeira Farah, que
afirma:
[...] a autonomia empresarial, que age de acordo com as
forças do mercado, deve estar adstrita aos fundamentos e
diretrizes constitucionais, quais sejam a dignidade da
pessoa humana e a valorização do trabalho humano.
157
156
SARMENTO, Daniel. Op. cit., p. 296.
157
FARAH, Eduardo Teixeira. A disciplina da empresa e o princípio da solidariedade social. In:
MARTINS-COSTA, Judith (Org.). A reconstrução do direito privado... Op. cit., p. 686-687.
93
Surge, então, questão relacionada com a forma pela qual as empresas
poderiam garantir a solidariedade social? Ora, tal garantia pode e deve decorrer,
por exemplo, de um comprometimento por parte da empresa de permanecer ativa
e economicamente estável, utilizando -se, para tanto, dos meios que lhe são
disponibilizados para garantir a obtenção do lucro.
Mas que se enfatizar que, também na busca pelo lucro, deve a em presa
observar o princípio da solidariedade social, sob pena de incorrer em injustiça
moral. Pode-se dizer que para que o princípio da solidariedade social seja
observado, é necessário, por exemplo, que a empresa não deixe de cumprir com
suas obrigações, especialmente em relação aos seus empregados, em prol do
aumento da sua lucratividade.
Em relação aos trabalhadores, o artigo 7, da Constituição Federal de 1988,
determina expressamente quais são seus direitos.
É certo, portanto, que em relação ao trabalhad or, a empresa deve, além de
atender o princípio da solidariedade social, observar o valor da dignidade do
trabalho humano. É o trabalho o meio mais comum de inserção social e, por isso,
para que o princípio da solidariedade social seja atendido, é necessár io que a
empresa esteja envolvida com a geração de empregos.
Em razão disso, pode -se citar como formas de a empresa atender ao
princípio da solidariedade, remunerar adequadamente o trabalhador, permitindo -
lhe o gozo de uma vida digna, inclusão do trabalhad or na divisão de lucros,
oferecimento de planos de saúde, carreira etc.
Agindo conforme as premissas do princípio em estudo, a empresa estaria
não apenas dando a ele atendimento, como também incrementando seu próprio
negócio, na medida em que um empregado que tem reconhecido seu trabalho,
demonstra um comprometimento maior com a função que exerce e com a
empresa para quem trabalha. Neste aspecto, o atendimento do princípio da
solidariedade serviria, ainda, como meio de incentivo aos trabalhadores, que
contribuirão para o crescimento da empresa.
94
Contudo, hoje ainda verifica -se que o princípio da solidariedade não está
sendo amplamente observado pelos empresários. Entretanto, não se pode perder
a esperança de um dia vermos uma sociedade justa e equilibrada, on de os direitos
e garantias de todos os cidadãos possam ser efetivamente assegurados, inclusive
no que se refere à sua personalidade, conforme analisar -se no Capítulo
seguinte.
4 RESPONSABILIDADE CIVIL DA EMPRESA DECORRENTE DE DANOS
ADVINDOS DA NÃO OBSERVÂNCIA DOS DIREITOS E PRINCÍPIOS
FUNDAMENTAIS EM SUAS RELAÇÕES LABORAIS
4.1 Os danos patrimoniais e extrapatrimoniais oriundos das relações
laborais no âmbito empresarial
A expressão “dano” provém do latim damnun, e possui os seguintes
significados:
95
1 Mal ou ofensa que se faz a outrem. 2 Dir Ofensa ou
diminuição do patrimônio moral ou material de alguém:
‘Dano, em sentido amplo, é toda diminuição dos bens
jurídicos da pessoa’ [...]. 5 Perda. D. emergente, Dir: o que
resulta da falta de cu mprimento de um contrato.
158
Para Maria Helena Diniz, “o dano é um dos pressupostos da
responsabilidade civil, contratual ou extracontratual, visto que não poderá haver
ação de indenização sem a existência de um prejuízo”.
159
Resumidamente, pode -se dizer que “dano” significa todo e qualquer
prejuízo econômico ou não -econômico, de ordem material ou moral, causados a
outrem.
Em relação à classificação do dano em “patrimonial” e ”extrapatrimonial”,
Fernando Noronha ensina que “é patrimonial o dano que se reflete no patrimônio
do lesado, enquanto extrapatrimonial é aquele que afeta exclusivamente a esfera
dos valores espirituais ou afetivos”.
160
De qualquer forma, pode -se afirmar que os “danos patrimoniais” são
aqueles que atingem o “patrimônio” (bens materiais) da p essoa, pecuniariamente
determináveis. De outro lado, os danos “extrapatrimoniais” são aqueles que
atingem interesses não suscetíveis de avaliação pecuniária, como é o caso, por
exemplo, dos direitos da personalidade da pessoa, onde a lesão atinge “valores
morais do indivíduo”. Tratam -se os danos patrimoniais, portanto, de danos a
coisas, enquanto que os danos extrapatrimoniais referem -se à pessoa, embora o
dano possa advir de uma lesão a coisas, que pode gerar danos à pessoa,
conforme ver-se-á adiante.
Em um primeiro momento, tem -se a impressão de que a única classificação
de danos que interessaria ao nosso trabalho seria a dos danos extrapatrimoniais,
haja vista que estes estão diretamente relacionados a “pessoas”, “valores morais
158
MICHAELIS: moderno dicionário... Op. cit., p. 635. (grifos originais)
159
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro . 17. ed. aum. e atual. de acordo com o
novo Código Civil (Lei n. 10.406, de 10 -1-2002). São Paulo: Saraiva, 2003, v. 7, p. 58. (grifos
originais)
160
NORONHA, Fernando. Op. cit., p. 567.
96
do indivíduo”, enfim, ques tões correlatas aos direitos fundamentais. Entretanto,
conforme leciona Fernando Noronha:
O interesse econômico não está necessariamente ligado a
coisas do mundo externo, tal como o interesse espiritual ou
afetivo não está necessariamente associado a bens
internos. O interesse econômico pode ser afetado pela
violação de bens (valores) internos da pessoa: uma
difamação viola valores espirituais, mas pode também afetar
interesses econômicos. Similarmente, o interesse espiritual
ou afetivo pode ser atingido p ela lesão de coisas: um álbum
de velhas fotografias familiares pode ou não ter valor
econômico, mas certamente que o tem afetivo.
161
Desta forma, denota-se que, ao se considerar a possibilidade de um dano
ter ou não “valor patrimonial”, eles classificam -se em “patrimonial” e
“extrapatrimonial”. Esta é a classificação fundamental dos danos, e também a
mais conhecida. Todavia, ao se considerar a “natureza do bem lesado”, surge uma
outra classificação, que é a dos “danos a coisas” e “danos a pessoas”, sendo qu e
este último, na acepção de Fernando Noronha, “ainda se subdivide em dano
biológico (ou corporal) e anímico (ou moral em sentido estrito)”.
162
Ao analisar a classificação dos danos em patrimonial ou extrapatrimonial, a
idéia principal que surge é de “patrim ônio”, ou seja, da existência de um direito
que pode ser avaliado economicamente.
De fato, os “danos patrimoniais” são aqueles que violam interesses capazes
de ser avaliados em termos econômicos. Esses danos, nos termos do artigo 402,
do Código Civil vigen te, subdividem-se em “danos emergentes” (que
correspondem a real diminuição do patrimônio do lesado) e “lucros cessantes”
(que se refere àquilo que o lesado esperava ganhar caso não tivesse ocorrido o
dano).
os “danos extrapatrimoniais”, ao contrário, atingem interesses que não
são possíveis de serem avaliados economicamente, ou seja, valores espirituais ou
161
NORONHA, Fernando. Op. cit., p.557.
162
Idem, ibidem.
97
afetivos dos indivíduos, cuja reparação submete -se ao “princípio da satisfação
compensatória”.
Os danos extrapatrimoniais também são conhecidos com o “danos morais”,
denominação adotada nos incisos V e X, do artigo 5, da Constituição Federal e no
artigo 186, do Código Civil. Entretanto, “[nem] sempre o dano extrapatrimonial terá
natureza moral: a palavra ‘moral’ tem carregado conteúdo ético [...] e o dano
extrapatrimonial não tem necessariamente esse conteúdo”.
163
Desta feita, em que
pese serem também denominados de “danos morais”, tratam -se os danos
extrapatrimoniais de “danos morais em sentido amplo”.
Contudo, ao trazer para a realidade situações corri queiras de danos, pode -
se notar que, embora os danos patrimoniais digam respeito a coisas e os
extrapatrimoniais estejam relacionados a pessoas, inúmeras situações onde
danos patrimoniais decorrem de ofensa à pessoa (por exemplo, aposentadoria por
invalidez), bem como situações onde os danos extrapatrimonias advêm de lesão à
coisa (por exemplo: perda de objeto de valor significativo por aquele a quem os
cuidados foram confiados).
Essa situação de intercruzamento de danos também pode ser verificada ao
tomar como ponto de partida da análise os danos à pessoa e a coisas. Assim,
poder-severificar situações em que o dano é decorrente de ofensa à pessoa, à
sua dignidade, mas possui cunho patrimonial. Como exemplo, pode -se citar o
caso em que um profissional é caluniado e, além da ofensa à sua moral, acaba
sofrendo danos também de ordem patrimonial, como a redução de sua clientela.
Neste aspecto, importante lembrar consideração de Fernando Noronha, no
sentido de que “[...] com relação aos danos a coisas poderemos dizer que são
sempre de natureza patrimonial, ainda que das lesões a coisas possam resultar
reflexos anímicos para as pessoas a elas ligadas [...]”.
164
Independentemente das classificações acima mencionadas (danos
patrimoniais ou extrapatrimoniais, dano s a coisas ou danos a pessoas), o dano
também pode ser classificado das seguintes formas:
163
NORONHA, Fernando. Op. cit., p. 567.
164
Idem, ibidem, p. 570.
98
1) “Dano individual”, quando atinge interesses de pessoas determinadas, ou
“dano coletivo”, quando recai sobre interesse de toda a comunidade. A
preocupação com dano s coletivos tem sido alvo de grande interesse e
evolução, especialmente no que diz respeito às áreas do direito ambiental e
do consumidor;
2) “Dano direto”, quando é efeito imediato do fato lesivo, ou “dano indireto”
também chamado de dano por ricochete ou reflexo - que atinge pessoas
ligadas à vítima direta;
3) “Danos presentes”, verificados no momento em que ocorre o fato lesivo,
e “danos futuros”, que somente são verificados após um determinado lapso
de tempo;
4) “Dano certo”, quando é objeto de prova suficiente para comprová -lo, ou
“dano incerto”, quando se trata apenas de uma hipótese, sem que haja
provas de sua ocorrência.
A respeito da importância da amplitude da noção de bem, objeto do direito
de propriedade e objeto de direito, no que diz respeit o aos direitos da
personalidade, Pontes de Miranda, traz a seguinte lição:
A noção de bem, objeto de direito de propriedade, é mais
estreita que a noção de objeto de direito, a que corresponde
o conceito de bem da vida, mais largo. A personalidade, o
nome e a honra são bens da vida, sem serem bem, em
sentido estrito, objeto de direito patrimonial e sem serem
bem em sentido estritíssimo, que é o bem coisa imóvel ou
móvel, objeto de direito de propriedade. Coisa, objeto de
propriedade, não é, hoje, somente a coisa corpórea. O
direito entendeu que a noção de coisa não é naturalística ou
física; é econômica-social.
165
Como se percebe, houve um avanço na conceituação de “coisa”, objeto de
propriedade, devido à necessidade de proteger e, conseqüentemente, de
indenizar os interesses extrapatrimoniais dos lesados. Pode -se dizer que este
165
MIRANDA, Pontes de. Op. cit., p. 43.
99
avanço está intrinsicamente relacionado com o reconhecimento ao ser humano de
uma “dignidade”, sendo de grande importância a tutela da integridade física,
psíquica e moral da pessoa e o direito à devida reparação em casos de dano.
Os danos à pessoa, normalmente, advêm de uma violação do seu direito de
personalidade. Podem ser corpóreos, quando atingem a integridade físico -
psíquica da pessoa e podem ser morais, quando atingem seus senti mentos, sua
alma.
166
Nas relações trabalhistas, os danos podem se manifestar por meio de
lesões aos bens patrimoniais ou extrapatrimoniais do trabalhador, dependendo da
análise de cada caso concreto, que a diferenciação do que é patrimonial ou
moral advém dos efeitos da lesão sofrida, conforme vimos acima, através da
lição de Fernando Noronha. Para realçar esta idéia, segue abaixo transcrito
ensinamento de Maria Helena Diniz, no mesmo sentido:
O caráter patrimonial ou moral do dano não advém da
natureza do direito subjetivo danificado, mas dos efeitos da
lesão jurídica, pois do prejuízo causado a um bem jurídico
econômico pode resultar perda de ordem moral, e da ofensa
a um bem jurídico extrapatrimonial pode originar dano
material. Realmente, poderá até mesmo suceder que, da
violação de determinado direito, resulte ao mesmo tempo
lesões de natureza moral e patrimonial
167
.
Assim, como exemplo de danos patrimoniais decorrentes das relações de
trabalho, pode-se citar aqueles ocorridos sobre quaisquer bens ma teriais do
trabalhador e, até mesmo, aqueles danos oriundos das lesões aos bens
extrapatrimoniais (saúde, honra, vida etc.), mas com reflexos nos bens
patrimoniais do trabalhador (despesas com o tratamento dico ou psicológico,
incapacidade para o trabalh o etc.).
Em relação ao trabalhador, pode -se afirmar que seu direito de
personalidade (bem extrapatrimonial) se expressa por meio do direito à vida e à
166
Neste sentido, ver Idem, ibidem, p. 560.
167
DINIZ, Maria Helena. Op. cit., p. 85.
integridade física, à intimidade, à liberdade de pensamento etc. Maria Helena
Diniz, com propriedade, acr escenta que:
[...] os direitos da personalidade são os direitos subjetivos da
pessoa de defender o que lhe é próprio, ou seja, a
identidade, a liberdade, a sociabilidade, a reputação, a
honra, a autoria etc. Por outras palavras, os direitos da
personalidade são direitos comuns da existência, porque
são simples permissões dadas pela norma jurídica, a cada
pessoa, de defender um bem que a natureza lhe deu, de
maneira primordial e direta.
168
Contudo, em que pese extensa classificação acerca dos danos, é certo
afirmar que os mesmos sempre deverão ser reparados, conforme acentua
Fernando Noronha, ao lecionar que:
[...] sempre que tivermos interesses legítimos, sejam
econômicos ou não, haverá obrigação de reparar o dano,
seja este resultante da violação das cois as, ainda que
incorpóreas, seja resultante da violação dos bens espirituais
ou afetivos a que esses interesses estejam ligados.
169
Assim, ocorrendo violação de qualquer dos direitos supracitados, ou a
qualquer dos demais direitos constantes no texto constit ucional e demais leis
esparsas, pode o trabalhador pedir que cesse imediatamente a ameaça ou lesão
(artigo 12, Código Civil), requerer indenização pelo dano moral sofrido, além de
rescindir o contrato de trabalho motivadamente, com amparo na alínea “b” do
artigo 483, da Consolidação das Leis Trabalhistas.
Todavia, casos existem onde se verifica que a culpa pelo dano sofrido não
advém da ação de apenas uma pessoa, mas de duas. Nesses casos, estar -se
diante do que se chama de “culpa concorrente”, assunto qu e analisar-se a
seguir.
168
Idem, ibidem, p. 67.
169
NORONHA, Fernando. Op. cit., p. 570.
4.2 Os fatores concorrentes dos danos na atividade empresarial
Para que a responsabilidade civil possa ser apurada, é necessário antes
analisar alguns fatores determinantes para, então, averiguar sobre quem recairá a
responsabilidade pela reparação do dano. Assim, para concluir de quem é a
responsabilidade por determinado ato danoso, é preciso estabelecer uma “relação
de causalidade entre o dano e a ação que o provocou”. A essa relação -se o
nome de “nexo causal”.
170
É a existência de nexo causal entre o dano ocorrido e a ação que o
provocou que gerará a responsabilidade pela reparação.
Contudo, danos em que a culpa não pode ser atribuída apenas a um
sujeito, haja vista ter decorrido da ação de duas pessoas. Nesses casos, con forme
ensina Fernando Noronha:
[...] estamos perante uma concorrência efetiva de causas , [...] designada
de concausalidade, ou causalidade concorrente propriamente dita , em
que temos duas causas reais do mesmo dano [...], implicando a
responsabilidade solidária de ambos os autores [...]. Somente será
possível falar em concurso efetivo de causas quando os dois fatos
tenham contribuído realmente para o dano, isto é, quando haja um nexo
de causalidade adequada entre cada uma delas e o evento.
171
Em situações de “culpa concorrente”, tanto o lesado quanto o lesante
possuem culpa por um mesmo prejuízo, em que pese tenham seus atos lesivos
sido realizados de forma independente.
No âmbito do direito do trabalho, além dos direitos garantidos aos
trabalhadores, a Consolidação das Leis Trabalhistas também elencou as principais
figuras de infração do empregador, as quais estão dispostas no artigo 483, abaixo
transcrito:
170
Neste sentido, ver DINI Z, Maria Helena. Op. cit., p. 96.
171
NORONHA, Fernando. Op. cit., p. 661. (grifos originais)
Art. 483 - O empregado poderá considerar rescindido o contrato e
pleitear a devida indenização quand o:
a) forem exigidos serviços superiores às suas forças, defesos por lei,
contrários aos bons costumes, ou alheios ao contrato;
b) for tratado pelo empregador ou por seus superiores hierárquicos com
rigor excessivo;
c) correr perigo manifesto de mal cons iderável;
d) não cumprir o empregador as obrigações do contrato;
e) praticar o empregador ou seus prepostos, contra ele ou pessoas de
sua família, ato lesivo da honra e boa fama;
f) o empregador ou seus prepostos ofenderem -no fisicamente, salvo em
caso de legítima defesa, própria ou de outrem;
g) o empregador reduzir o seu trabalho, sendo este por peça ou tarefa,
de forma a afetar sensivelmente a importância dos salários.
A conclusão alcançada em relação à questão, portanto, é que, em casos de
culpa concorrente, a responsabilidade será solidária de ambos os autores, sendo
que cada um deles responderá pelo dano, proporcionalmente à parte que teve
culpa. “Haverá uma bipartição dos prejuízos, e a vítima, sob uma forma negativa,
deixará de receber a indeniza ção na parte relativa à sua responsabilidade”
172
,
conforme ensina Maria Helena Diniz.
A seguir, uma vez analisada a questão da culpa concorrente, far -se uma
rápida abordagem sobre a responsabilidade pela indenização de danos oriundos
das relações laborais.
4.3 A indenização dos danos oriundos das relações laborais
Ao tratar-se da questão dos danos patrimoniais e extrapatrimonias item
4.1 acima teve-se a oportunidade de discorrer sobre o significado da expressão
“dano”, que corresponde a “lesão”, no sentido de reduzir ou destruir um bem de
outrem.
172
Neste sentido, ver DINIZ, Maria Helena. Op. cit., p. 99.
Igualmente, verificou-se nos ítens anteriores que a conseqüência para o
indivíduo que provocou o dano, uma vez provada sua responsabilidade, é a
obrigatoriedade pela indenização da vítima.
Conforme leciona Clayton Reis, “a idéia prevalecente acerca da
indenização envolve, de forma indiscutível, a noção de dano, prejuízo, diminuição
do patrimônio, visto que sem dano não indenização”.
173
Prossegue o autor,
afirmando que “a indenização [...] recompõe a diminui ção do patrimônio da pessoa
em decorrência da ação lesiva e ilícita perpetrada por um agente ofensor”.
174
Sabe-se que antes da promulgação da Constituição Federal de 1988, o
empregado encontrava -se desamparado quanto ao sistema indenizatório
decorrente do contrato de trabalho, que o ordenamento jurídico não lhe
propiciava um amparo à altura de sua expectativa, causando -lhe, inclusive, muitas
injustiças.
Todavia, após a Carta de 1988, as possibilidades indenizatórias se
estenderam significativamente, princi palmente, com o advento do Código Civil de
2002, abrangendo, inclusive, o dano moral, coisa até então inimaginável na seara
trabalhista.
Essa ampliação dos danos passíveis de indenização, segundo Fernando
Noronha, ocorreu devido a três aspectos: expansão dos danos suscetíveis de
reparação, objetivação da responsabilidade e sua coletivização”.
175
Tais aspectos
estão diretamente relacionados com a necessidade imposta pela sociedade no
sentido de que todos os danos fossem reparados, não ficando qualquer um sem a
devida indenização.
Para o autor acima citado, a ampliação dos danos suscetíveis de
reparação, consiste:
[...] na extensão da obrigação de indenizar aos danos
extrapatrimoniais e na tutela dos danos transindividuais,
correspondendo os dois aspectos à asp iração da sociedade
173
REIS, Clayton. Avaliação do dano moral . Rio de Janeiro: Forense, 2000, p. 121.
174
Idem, ibidem.
175
NORONHA, Fernando. Op. cit., p. 540. (grifos originais)
atual no sentido de que a reparação proporcionada às
pessoas seja a mais abrangente que for possível.
176
Prossegue afirmando que a objetivação da responsabilidade relaciona -se
com o “[...] princípio segundo o qual não poderia haver respo nsabilidade sem
culpa”.
177
Finalmente, salienta o ilustre autor que a coletivização da responsabilidade
demonstra “[...] o declínio da responsabilidade individual, perante o
desenvolvimento de processos comunitários para reparação de diversos danos,
especialmente os que atingem a integridade física ou psíquica das pessoas
[...]”.
178
Contudo, após a Revolução Industrial, o que também se percebeu em
relação ao instituto da responsabilidade civil foi a sua “objetivação”, podendo citar -
se como exemplo desse fenôme no a “teoria do risco de empresa”, a “teoria do
risco administrativo” e a “teoria do risco -perigo”. Todavia, embora a importância de
tais fenômenos, não serão os mesmos tratados nesta dissertação, ficando esta
tarefa para outra oportunidade.
Saliente-se que o agravamento da responsabilidade objetiva é percebido a
partir do momento em que a “culpa” deixou de ser requisito indispensável para a
obrigatoriedade da indenização
179
, conforme acentua uma vez mais o renomado
Fernando Noronha.
Assim, considerando -se as observações acima, pode -se afirmar que,
sofrendo o empregado qualquer tipo de dano (patrimonial ou extrapatrimonial) no
exercício da sua função, lhe é devida a correspondente indenização, a qual pode
ser pleiteada judicialmente, caso o causador do dano nã o indenize o lesado
espontaneamente.
Contudo, antes de se atribuir a determinada pessoa responsabilidade pela
indenização de dano causado a outrem, existem alguns aspectos que precisam
ser analisados, como por exemplo, a efetiva existência de um ato ilícit o, a
176
NORONHA, Fernando. Op. cit., p. 540.
177
Idem, ibidem.
178
Idem, ibidem.
179
Idem, ibidem.
diminuição ou destruição de um bem jurídico de uma pessoa (patrimonial ou
moral), a definição e classificação da culpa etc.
Uma vez apurados todos estes elementos e verificada a culpa do agente
lesante, a conseqüência direta é a obrigação pela indeniz ação correspondente aos
danos sofridos pelo lesado. Isto é regra e, portanto, aplica -se também nas
questões que envolvem o trabalhador, no âmbito da atividade empresarial.
Ademais, o artigo 932, incisos I a V do Código Civil, determina quem são as
pessoas responsáveis pela indenização em casos de dano, estipulando que a
obrigação pela indenização será do empregador ou comitente por seus
empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou
por ocasião dele.
Essa regra, obviamente , é válida também para os danos originados no
âmbito da atividade empresarial, em especial os danos sofridos pelos empregados
das empresas. Uma vez apurada a responsabilidade do lesante, é a indenização
devida tanto em casos de danos patrimoniais como extr apatrimonias.
Tratando-se de “danos patrimoniais”, a indenização poderá se dar de duas
formas:
a) indenização através de uma reparação específica (ou in natura), que
significa fazer com as coisas retornem ao seu estado original, tal como
eram caso não tivesse ocorrido lesão. Ressalte -se que quando estivermos
diante de um dano patrimonial indireto, ou seja, aquele advindo da lesão a
um interesse não-econômico, mas que gera conseqüências econômicas, a
indenização correspondea uma “situação material corresp ondente” ou na
indenização das “conseqüências patrimoniais” desse dano (dano
emergente ou lucro cessante);
180
b) indenização através de uma reparação equivalente: trata -se de
indenização com características pecuniárias, pois consiste em pagar ao
lesado o equivalente em dinheiro ao dano que sofreu.
181
180
Neste sentido, ver DINIZ, Maria Helena. Op. cit., p. 119.
181
Neste sentido, ver Idem, ibidem, p. 119-120.
os danos morais, necessariamente, terão que ser indenizados por meio
de indenização equivalente, ou seja, com o pagamento de um determinado valor
em dinheiro.
182
Maria Helena Diniz salienta que a indenização do dano moral
possui “[...] um caráter satisfatório para a vítima e lesados, e punitivo para o
ofensor”.
183
Prossegue ensinando:
Desse modo, o magistrado, para que possa estabelecer,
equitativamente, o quantum da indenização do dano moral,
deverá considerar a gravidade da lesão, baseado na
conduta culposa ou dolosa do agente, a situação econômica
do lesante, as circunstâncias do fato, a situação individual e
social da vítima ou dos lesados etc.
184
Sobre a responsabilidade pelas indenizações nos casos de dano mor al,
provenientes de ato ilícito, Maurício Godinho Delgado ensina que ”é do
empregador, evidentemente, a responsabilidade pelas indenizações por dano
moral ou à imagem resultantes de conduta ilícita por ele cometida, ou por suas
chefias, contra o empregado, sem relação com a infortunística do trabalho”.
185
Advirta-se, todavia, que não é qualquer atitude do empregador que
configura o dano moral. A obrigação da indenização, portanto, somente existirá
nos casos em que o empregador ofende o obreiro por meio de arg umentos
capazes de atingir a sua dignidade, sendo necessária a apreciação judicial com
análise do caso concreto.
Assim, nos casos de indenização de danos extrapatrimoniais, várias são as
hipóteses que surgem, cabendo citar algumas delas:
a) dano à vida e à integridade corporal: no caso de “dano à vida”, a
indenização deverá abranger o pagamento das despesas com tratamento
da vítima e, incorrendo em morte do ofendido, deverá a indenização, ainda,
cobrir os gastos com funeral, prestação de alimentos às pessoa s a quem o
defunto os devia, assistência aos herdeiros, etc. Tratando -se de “lesão
182
Neste sentido, ver REIS, Clayton. Op. cit., p. 122.
183
DINIZ, Maria Helena. Op. cit., p. 124.
184
Idem, ibidem. (grifos originais)
185
DELGADO, Mauricio Godinho. Op. cit., p. 617.
corporal” a indenização deverá abranger as despesas com o tratamento,
além dos lucros cessantes, que são devidos até final do período em que o
lesado estiver em recuperação e, finalmente, deverá abranger, ainda,
algum outro prejuízo que a vítima porventura tenha sofrido;
b) ofensa à honra: tratando -se de injúria ou calúnia, a indenização consistirá
na reparação do dano resultante da ação ofensiva do lesante. Caso o
mesmo não possa ser materialmente provado, caberá ao Juiz arbitrar o
valor da indenização, levando -se em conta, inclusive, a posição sócio -
política do ofendido;
c) danos contra a honestidade: interessa -nos neste aspecto a indenização
em caso de assédio sexual em amb iente de trabalho, onde além da
rescisão indireta do contrato de trabalho, é ainda devido à ofendida
indenização pelo dano moral advindo da ofensa à sua dignidade ou da
humilhação sofrida;
d) ofensa à liberdade pessoal: a indenização consistirá na reparaçã o dos
danos materiais sofridos pela vítima e, caso não seja possível prova -los,
deverá a indenização ser arbitrada pelo juízo;
e) ofensas ao direito à intimidade: em tais casos, o valor da indenização
deverá ser arbitrado pelo Juiz, levando -se em conta as circunstâncias que
geraram o dano;
f) dano ao nome das pessoas: trata -se de uma das formas de ofensa à
personalidade e a indenização pode ser pecuniária ou, se assim preferir a
vítima, pode a indenização ocorrer mediante a supressão do uso impróprio
do seu nome.
No que se refere ao quantum indenizatório, ressalte -se uma vez mais que,
sempre que possível, deverá ser suficiente para realizar a recomposição do
patrimônio do lesado, como tem observado Jair Lima Gevaerd Filho:
Por outro lado ante a necessidade de indenização de um
interesse extrapatrimonial lesado, o sentido de reconvenção
a justo será o da promoção de um equilíbrio entre o
determinismo do que era e o indeterminismo do que será.
Nessa equação é de rigor considerar não apenas as
necessidades ínsitas à recomposição mais ampla possível
do patrimônio lesado, mas as efetivas possibilidades do
autor do dano. A referência à circunstância fática perceba-
se – é inevitável.
186
No mesmo sentido encontra -se a lição de Clayton Reis, ao ensinar que “no
processo de aferição do dano sofrido pela vítima, a tutela jurisdicional aspira
sempre a equivalência, ou seja, a adoção de critérios indicativos, que sejam os
mais precisos para a fixação do quantum indenizatório ”.
187
Frise-se, desde já, que poderá haver inde nização se houver a existência
de um prejuízo, que a responsabilidade civil tem como pressuposto a existência
de um dano a ser restituído. Neste sentido, Rui Stoco afirma que “a doutrina é
unânime em afirmar, como não poderia deixar de ser, que não
responsabilidade sem prejuízo. O prejuízo causado pelo agente é o dano”.
188
Desta forma, sempre que restar comprovada prática de um ato lesivo,
resultando dele um dano, é obrigação legal a sua reparação, inclusive nos casos
verificados no âmbito das relações de trabalho, haja vista estar os direitos dos
trabalhadores assegurados constitucionalmente, conforme se teve oportunidade
de verificar em capítulos anteriores.
Desta forma, pode-se afirmar que, nos termos da doutrina e da legislação
vigentes, a empresa é civilmente responsável por seus empregados. É a respeito
desta responsabilidade que se tratará no item seguinte.
4.4 A responsabilidade civil da empresa perante seus empregados
186
GEVAERD FILHO, Jair Lima. Direito societário: teoria e prática da função. Curitiba: Gênesis,
2001, v. 1, p. 160.
187
Como se sabe, desde o advento da Revolução Industrial, o instituto da
responsabilidade civil vem sofrendo profundas alterações, decorrentes das novas
necessidades impostas pelo desenvolvimento tecnológico e industrial, visando dar
uma melhor proteção ao trabalhador.
O Código Civil Napoleônico, ao instituir a culpa como um dos pressupostos
para a reparação do dano, realmente inovou no instituto da reparação civil,
servindo de referência para as demais legislações de outros países, inclusive o
Brasil, por ocasião da promulgação do Código Civil de 1916.
Todavia, com o rápido avanç o industrial iniciado com a Revolução
Industrial, houve uma “enorme agravação dos riscos a que as pessoas
antigamente estavam sujeitas”
189
, sendo necessário abandonar o critério da
“culpa” (contratual e extra -contratual) como pressuposto para a responsabilid ade
civil, pois o mesmo estava, na realidade, prejudicando o trabalhador, haja vista
que em muitos casos, devido a sua condição de subordinação e insuficiência junto
ao empregador, acabava não conseguindo provar não ter agido com a culpa que
lhe era atribuída pelo patrão e, como resultado, ficava sem a devida reparação do
dano sofrido. Em decorrência disto, ocorreu a evolução do instituto da
responsabilidade civil, que passou a não mais considerar o elemento culpa como
referência para a reparação do dano, r esultando na conhecida “teoria objetiva
baseada no risco”.
No Brasil, desde a vigência do Código Civil de 1916, não houve nenhuma
inovação quanto à aplicação da responsabilidade civil, justificando, pois, a opinião
da doutrina no sentido da quase inutilida de de tal instituto, nos moldes como vinha
sendo aplicada a reparação do dano, até que a Constituição Federal de 1988,
definitivamente, reconheceu como direito de todos a reparabilidade do dano.
Na verdade, a responsabilidade civil, inclusive no que tange às empresas,
foi tratada pelo legislador com mais afinco somente a partir do atual Código Civil,
por meio de um Título próprio, estendendo -se do artigo 927 ao artigo 954, apesar
de ainda manter como regra geral a responsabilidade civil baseada na culpa
(teoria objetiva), conforme determina o caput do artigo 186, do Código Civil: “Art.
189
NORONHA, Fernando. Op. cit., p. 538. (grifos originais)
186 - Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência,
violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato
ilícito”.
Contudo, mais adiante, cuidou o legislador de estabelecer no parágrafo
único, do artigo 927, os casos que configuram a teoria objetiva, tornando o
empresário responsável pela reparação do dano ao empregado,
independentemente de culpa :
Art. 927. Aquele que, por ato ilícito, causar dano a outrem, fica obrigado
a repará-lo.
Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano,
independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou
quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano
implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.
Percebe-se pelo dispositivo acima, que o legislador não estabeleceu quais
seriam as atividades desenvolvidas que implicariam riscos para terceiros,
deixando tal função a cargo da doutrina, assim como também não diferenciou a
culpa do dolo, que a indenização, segundo disposto no artigo 944, do Código
Civil, será medida pela extensão do dano.
A propósito, nas palavras de Maria Helena Diniz:
Responsabilidade civil é a aplicação de medidas que
obriguem uma pessoa a reparar o dano moral ou patrimonial
causado a terceiros, em razão de ato por ela mesmo
praticado, por pessoa por quem ela responde, por alguma
coisa a ela pertencente ou de simples imposição legal.
190
De qualquer forma, os pressupostos da responsabi lidade civil da empresa,
de acordo com o caput do artigo 927 (teoria subjetiva), são: a conduta (comissiva
ou omissiva) do agente, a culpa ou dolo do agente, o nexo de causalidade, o dano
experimentado pela vítima. Os pressupostos para configuração do disp osto no
parágrafo único, do artigo 927 (teoria objetiva), por sua vez, caracterizam -se pela
simples comprovação pelo empregado do dano (acidente de trabalho) sofrido,
190
DINIZ, Maria Helena. Op. cit., p. 36.
para que haja a obrigação da reparação por parte do empregador,
independentemente deste t er agido ou não com culpa.
Com relação à teoria subjetiva, Caio Mário da Silva Pereira assim se
pronuncia:
A teoria da responsabilidade subjetiva erige em pressuposto
da obrigação de indenizar, ou de reparar o dano, o
comportamento culposo do agente, ou simplesmente a sua
culpa, abrangendo no seu contexto a culpa propriamente
dita e o dolo do agente.
191
No que diz respeito à teoria objetiva, Sílvio Rodrigues aduz:
A obrigação de indenizar o se apóia em qualquer
elemento subjetivo, de indagação sobre o c omportamento
do agente causador do dano, mas se fixa no elemento
objetivo, representado pela relação de causalidade entre o
ato causador do dano e este.
192
Atualmente, é cada vez maior a tendência dos juízes e dos tribunais em
aderirem à teoria objetiva par a responsabilizarem os empregadores nos casos de
danos acidentários, em virtude do aumento dos riscos de lesões nas atividades
laborativas, devido à busca desenfreada dos empresários pelo lucro. Aliás, nessa
linha de pensamento destaca -se a lição de Maria Helena Diniz:
[...] A responsabilidade objetiva funda -se num princípio de
eqüidade, existente desde o direito romano: aquele que
lucra com uma situação deve responder pelo risco ou pelas
desvantagens dela resultantes [...] Essa responsabilidade
tem como fundamento a atividade exercida pelo agente, pelo
perigo que pode causar dano à vida, à saúde ou a outros
bens, criando risco de dano para terceiros. [...] A
responsabilidade, fundada no risco, consiste, portanto, na
obrigação de indenizar o dano produzido por atividade
191
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade civil. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002,
p. 30.
192
RODRIGUES, Silvio. Op. cit., p. 156.
exercida no interesse do agente e sob seu controle, sem que
haja qualquer indagação sobre o comportamento do lesante,
fixando-se no elemento objetivo, isto é, na relação de
causalidade entre o dano e a conduta do seu causador.
193
Todavia, cumpre salientar que a responsabilidade objetiva pela
indenização, esculpida no parágrafo único, do artigo 927, do Código Civil, poderá
ser atenuada ou até mesmo excluída, em certos casos, como esclarece Maurício
Godinho Delgado:
Em primeiro lugar, a não cons istente comprovação do dano
[...]. Em segundo lugar, a não comprovação do nexo causal
entre o dano e o ambiente laborativo ou entre aquele e atos
ou omissões do empregador e seus prepostos. Em terceiro
lugar, a comprovação, pela empresa, de culpa exclusiva
pelo trabalhador no tocante ao surgimento da lesão. A culpa
exclusiva obreira, evidentemente, afasta a responsabilidade
empresarial.
194
Registre-se, da mesma forma, que possibilidade de exclusão da
responsabilidade da obrigação de indenizar se o emprega dor demonstrar que o
fato decorreu de caso fortuito ou força maior, nos termos do artigo 393, do digo
Civil:
Art. 393 - O devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso
fortuito ou força maior, se expressamente não se houver por eles
responsabilizado.
Parágrafo único. O caso fortuito ou de força maior verifica -se no fato
necessário, cujos efeitos não era possível evitar ou impedir.
Por fim, conforme foi mencionado nos capítulos anteriores, nenhum dano
pode ficar sem a devida reparação. Tra tando-se de danos que ofendam os
princípios e direitos fundamentais do trabalhador, maior ainda será a obrigação de
repará-los, haja vista estarem fundamentados no princípio da dignidade da pessoa
193
DINIZ, Maria Helena. Op. cit., p. 50-51.
194
DELGADO, Mauricio Godinho . Op. cit., p. 620.
humana, valor máximo do indivíduo, conforme teve -se a oportunidade de
demonstrar ao longo desta dissertação.
CONCLUSÃO
Como se pôde constatar ao longo desta dissertação, trata -se de tarefa
extremamente difícil discorrer sobre a vinculação dos direitos fundamentais aos
sujeitos de direito privado, especialmente por ser um assunto ainda novo no
âmbito do direito interno, em que pese os princípios e direitos fundamentais
muito estão sendo utilizados na defesa de direitos na esfera pública.
Observou-se nesta pesquisa que, pela evoluç ão do conceito de atividade
empresarial, é possível concluir que a empresa se refere a quem exerce
profissionalmente alguma atividade econômica de forma organizada, visando à
produção e venda de bens e serviços. Além do quê, a partir do aparecimento do
Código Civil italiano de 1942, estabeleceu -se uma nova visão do conceito de
atividade comercial, com a substituição do Direito Comercial pelo Direito
Empresarial, tendo como base a teoria da empresa, que teve aceitação em vários
países, inclusive no Brasil.
Estudou-se, a seguir, a questão da lucratividade e o grau de importância
que o lucro possui no contexto empresarial. Verificou -se que, apesar de a busca
pelo lucro ser um direito legalmente assegurado ao empresário, a empresa, hoje,
tem que atender inúmeras existências constitucionalmente impostas, sendo uma
delas, o cumprimento da sua função social. Em razão disso, juntamente com o
lucro, a função social passou a ser, também, um dos principais objetivos da
empresa, a qual foi obrigada a expandir sua cultura e trazer para a esfera de seus
interesses, aqueles interesses que também satisfaçam a sociedade.
no Código Civil brasileiro de 2002, em relação à empresa e ao
empresário, contatou -se a ocorrência de uma mudança radical no ordenamento
jurídico pátrio no que se refere ao sistema baseado no antigo Código Comercial de
1850. A partir da promulgação do Código Civil vigente, passou a existir um livro
específico destinado ao Direito de Empresa que, além de inovar com a figura do
empresário, apresenta uma nova e strutura do direito de sociedade e, nisto, inclui -
se a observância de certos princípios constitucionalmente assegurados aos
indivíduos.
Com referência à vinculação dos direitos fundamentais aos sujeitos de
direito privado, verificou -se que os fundamentos d e tais direitos encontram -se na
Constituição e, por serem inerentes à pessoa humana, são irrenunciáveis e
inalienáveis, sendo que os direitos e garantias individuais não poderão ser
abolidos por intermédio de emendas constitucionais, apesar de serem autori zadas
algumas restrições ao exercício desses direitos.
No tocante ao exercício do poder hierárquico no âmbito empresarial,
observou-se que o empregador não pode, nos tempos modernos, agir de forma
arbitrária com o trabalhador, sujeitando -se, portanto, aos limites impostos pela lei
(princípios e direitos fundamentais) e pelo contrato de trabalho.
As discriminações na relação de emprego também foram alvo de estudo,
observando-se que somente a Constituição Federal pode estabelecer algum
critério discriminatório, sendo pr42(d)-4(e)-4( )99 TzBT363(a)-4(l)1(g)5(u)-4(m)]TJETQ0 gq99 TzBTm
sujeição reiterada do trabalhador pelo empregador, durante a relação de trabalho,
a situações que violem sua integridade psíquica e até mesmo a sua dignidade
humana.
Quanto aos princípios sociais, viu -se que são eles que regem os direitos
sociais (educação, saúde, trabalho, moradia, lazer, segurança, previdência social,
proteção à maternidade e à infância, assistência aos desamparad os), devendo ser
observados também pelas empresas nas questões relativas a seus empregados,
proporcionando e assegurando -lhes meios para terem uma vida digna.
No que tange às liberdades sociais, verificou -se que a liberdade é vista
como a mais ampla forma de exercer a autonomia privada e, em decorrência do
reconhecimento da dignidade da pessoa humana, encontra -se garantida também
aos particulares. Contudo, para que o direito de liberdade possa ser exercido, é
necessário dar condições aos indivíduos para que estes não vivam em situação de
miséria, fome, exclusão social etc. e o que a Constituição Federal de 1988 fez
neste sentido foi justamente assegurar as condições para o exercício da liberdade,
proclamando, para tanto, os direitos sociais, que também na at ividade empresarial
devem ser observados, especialmente em relação à figura do trabalhador
em relação à questão da justiça social, viu -se que é assunto de
responsabilidade geral, incluindo -se aí, a responsabilidade dos entes privados,
dentre eles os empresários, haja vista a necessidade de que quem detém o
sustento da economia preocupe -se também com o seu planejamento. Assim, a
contribuição da empresa para com a realização da justiça social está diretamente
relacionada com a amenização das desigualdades sociais, proporcionando meios
para que a sociedade seja cada vez mais justa e humana.
Sobre direitos sociais individuais e coletivos, verificou -se que os direitos
individuais estão relacionados à proteção isolada do indivíduo (como exemplos,
cite-se o direito à vida, à igualdade, à liberdade, à segurança, à propriedade),
enquanto que os direitos coletivos visam à proteção de direitos de toda a
sociedade, encontrando -se espalhados por todo o texto constitucional, podendo -
se citar como exemplo o direito de gr eve, liberdade de reunião e de associação
profissional, entre outros. Ressalte -se, contudo, que a grande diferença entre eles
é que, enquanto os direitos individuais são uma espécie de comando negativo ao
Estado, os direitos coletivos pressupõem uma presta ção positiva do poder estatal,
exigindo dele alguma ação social em favor da sociedade.
Por sua vez, viu-se que o princípio da dignidade humana é um dos
fundamentos do ordenamento jurídico, servindo de referência para todos os
demais princípios, além de ide ntificar uma esfera de integridade moral, a qual
deve ser assegurada a todo ser humano pelo fato de sua existência. Está tal
princípio relacionado à dignidade do ser humano, elevando -o a uma condição de
respeito e proteção, o que deve ser verificado tam bém pelo empresário,
especialmente no que tange aos seus empregados.
O princípio da solidariedade, por sua vez, mostrou -se como norma diretriz a
ser seguida na busca por uma sociedade mais justa e igualitária, abandonando -se
o individualismo e partindo par a a busca da realização da justiça social,
especialmente em relação àqueles menos favorecidos. No que se refere à
atividade empresarial, saliente -se que as empresas, no exercício de suas
atividades, devem atender aos princípios da dignidade humana, da cons trução de
uma sociedade livre, justa e solidária e atender aos ditames da justiça social.
Com relação à responsabilidade civil decorrente de danos advindos da não
observância dos princípios fundamentais, constatou -se que as principais figuras
de infração do empregador encontram -se dispostas no art. 483 da Consolidação
das Leis do Trabalho. Aliás, verificou -se que após a Carta Constitucional de 1988,
as possibilidades indenizatórias se estenderam significativamente, principalmente
com o advento do Código Civ il de 2002, abrangendo, inclusive, o dano moral em
relação à figura do trabalhador.
Finalmente, com relação à responsabilidade civil da empresa perante seus
empregados, observou -se que o legislador do Código Civil brasileiro, apesar de
ainda manter como re gra geral a responsabilidade civil baseada na culpa,
estabeleceu, também, os casos em que se configuram a teoria objetiva, pela qual
não se cogita da culpa do empresário por ocasião da reparação do dano.
Contudo, a principal conclusão deste estudo foi que os princípios e direitos
constitucionais estão cada vez mais inseridos na vida das pessoas, seja através
do Estado, que os faz cumprir, seja por meio dos sujeitos de direito privado, que
com a constitucionalização do direito civil não podem mais fingir não estar vendo
as novas necessidades surgidas em decorrência da própria evolução da
humanidade, especialmente no que se refere ao respeito ao ser humano e à sua
dignidade.
Por fim, a atividade empresarial é mola propulsora do desenvolvimento de
uma nação, e uma nação que se denomina democrática não pode viver à mercê
das injustiças cometidas em sua sociedade. Assim, além de totalmente possível, é
obrigatória a observância dos princípios e direitos fundamentais no âmbito da
atividade empresarial e espera -se que o presente estudo sirva, ao menos, para
incutir este pensamento em todos aqueles que tiverem acesso a ele.
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