13
afetiva (Vázquez, 1999; Vigotski
7
, 1999, 2003). A apropriação musical, por sua vez, está
sendo aqui entendida como um movimento de conversão do coletivo em singular, o qual
pressupõe um lugar ativo (co-criador) do sujeito-ouvinte que se apropria dos significados
expressos nas músicas e produz, a partir destes, novas zonas de sentido.
Assim, concebemos que a arte – em especial a música – participa do cotidiano das
pessoas como uma mediação entre o coletivo e o singular, possibilitando tornar pessoal
aquilo que era coletivo, sem deixar de continuar sendo social (Vigotski, 1999). Neste
prisma, “como toda vivência intensa, a vivência estética cria um estado muito sensível para
as ações posteriores e, naturalmente, nunca passa sem deixar marcas em nosso
comportamento posterior” (Vigotski, 2003, p. 234).
Parafraseando Sartre (1984), podemos dizer que não nos interessa o que o Rap faz
com os jovens, mas o que eles fazem de si a partir daquilo que o Rap fez deles
8
. Nosso
intuito não é falar por estes jovens, nem tão pouco ouvi-los. O que procuramos é a
dialogicidade, uma vez que, como Amorim (2006), entendemos que pesquisador e
pesquisado são produtores de texto, destacando que a produção de um não pode emudecer a
do outro, nem tão pouco realizar um tipo de fusão dos dois pontos de vista. Assim como a
autora, consideramos necessário manter o caráter dialógico da produção de conhecimento, a
fim de revelar as tensões existentes entre seus atores. Deste modo, o ato de dizer a própria
palavra, como considerava Freire (2004), não é privilégio de alguns, mas direito de todos,
já que a palavra é práxis e, como tal, permite ao homem pronunciar o mundo e, ao mesmo
tempo, transformar a si próprio e aos demais.
Por fim, é importante ressaltar que ao tomar os ouvintes como foco de estudo nossa
pesquisa não estabelece uma cisão entre estes e os artistas, uma vez que, a partir das
contribuições de Bakhtin (1926, 2003), reconhecemos ambos como integrantes de uma
mesma relação, onde cada posição deve sempre ser pensada a partir das outras com as quais
se constitui. Nesta perspectiva, “pode-se dizer que o poeta trabalha constantemente em
conjunção com a simpatia, com a concordância ou discordância de seus ouvintes” (Bakhtin,
1926, p. 10). Ou, como diria Marx (1987), produto e consumo não são atividades isoladas e
7
Utilizamos duas formas de escrita para o nome deste autor (Vygotski/Vigotski), respeitando o idioma de
edição da obra consultada.
8
A frase de Sartre é: “Para nós, o homem caracteriza-se antes de tudo pela superação de uma situação, pelo
que ele chega a fazer daquilo que se fez dele” (1984, p. 151-152).