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antes de retornar para Salvador. Cabe ressaltar que esses e outros capoeiristas que deixaram a
“linha de frente” da Roda não deixaram de freqüentá-la, porém essas visitas tornaram-se mais
esporádicas. Outros capoeiristas simplesmente deixaram de praticar a capoeira pelos mais
diversos motivos, da conversão evangélica à conversão ao crime
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. Mas outros capoeiristas
incorporaram-se mais assiduamente à Roda e são citados por Russo como sua terceira
geração.
Um dos membros dessa terceira geração, o Mestre Baba, relata que quando começou a
freqüentar a Roda de Caxias, em 1980, o fazia clandestinamente. Já que até a sua saída, em
1985, da Academia de Capoeira da qual era membro, participar de rodas de rua ainda era
prática proibida entre os capoeiristas federados:
Vivíamos num período de ditadura militar, a cidade era área de segurança
nacional. (...) Alguns tinham medo de perder aquele documento que dava
liberdade para praticar capoeira. Porque, se você estivesse jogando Capoeira
no meio da rua, e fosse preso, com certeza se tivesse esse documento seria
solto. Mas, os outros que não tivessem poderiam ficar presos durante um
período, acusados de vadiagem. (...)É uma relação que tem muito a ver com o
período em que os escravos capoeiristas foram proibidos pelo império de se
manifestar em público. Esse período, em Caxias, coloca a Capoeira,
praticamente, no mesmo ângulo, só que em décadas diferentes, em épocas bem
diferentes. Acho que o século XIX retratou uma coisa forte de proibição, de
prisão e até de morte de capoeiristas, porque o império achava que aquela
manifestação era muito perigosa para a sociedade da época. E, em pleno
século XX, vivemos em Caxias, nas décadas de 70 e 80, também um período
muito forte em relação a essa proibição.
(...) O pior período da roda foi de 70 até 83, 84. De 85 em diante ela já
começou a ter um pouco mais de folga, porque os militares estavam saindo do
poder. Também o movimento das “Diretas Já” ajudou não só a roda, como
outros movimentos culturais que eram reprimidos
58
.
Iniciado oficialmente em 1979, com a anistia aos crimes políticos sentenciados pelo
Regime militar, o processo de redemocratização da sociedade brasileira manifesta-se também
em um relaxamento do controle de atividades outrora consideradas subversivas, como certas
manifestações populares - que demandavam uma agregação ou organização popular, temidas
pelos militares. A Capoeira de rua - que fugia ao controle exercido pelos militares através da
“academização” de sua prática - assim como os terreiros de umbanda e candomblé vão,
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Durante o meu trabalho de campo não soube de nenhum freqüentador da Roda que tenha abandonado a
Capoeira devido às atividades criminosas. Mas vi um dos alunos mais dedicados de Russo abandonar a Capoeira
depois que entrou para uma Igreja Evangélica. E, curiosamente, pude acompanhar o retorno gradativo de um
membro veterano da Roda, o Irmão Moura, que vem conciliando a vida religiosa com uma atuação cada vez
mais presente e elogiada como capoeirista.
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Entrevista com Mestre Baba realizada em 22/06/05.