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nossas lembranças? Se temos boa memória, tendemos a confiar em nossas
lembranças, mas os mecanismos que as elaboram pedem cautela.
No âmbito da Psicologia Experimental e da Psicologia Cognitiva, considera-se
que as falsas memórias sejam geradas de duas formas alternativas: ou emergem
espontaneamente ou de maneira autosugerida. As memórias espontâneas resultam
do processo normal de compreensão, isto é, são fruto de distorções mnemônicas
endógenas. Já as memórias induzidas decorrem de informações sugeridas por
alguém, sendo assumidas pelo sujeito como verdadeiras ou vivenciadas.
A indução a uma falsa memória pode se dar tanto através de uma interação
oral quanto através da interação com o texto escrito. Num ato de leitura, o leitor, por
falta de conhecimento prévio, pode não saber quase nada a respeito de determinado
domínio de estudo ou sobre um dado modo de produção. Para obter uma
compreensão global e efetiva do que lê, no entanto, ele buscará preencher as
lacunas com informações familiares, nem sempre compatíveis com as idéias
enunciadas no texto. Posteriormente, se questionado sobre o texto lido, poderá
lembrar-se de determinada informação como sendo dada no texto. No entanto, essa
informação, de fato, poderá ser “inventada” ou inferida, e em tal situação se
caracterizaria a emergência de uma falsa memória. Além disso, outras pessoas
podem influenciar o leitor afirmando, por exemplo, que certas informações constam
em um dado texto, e ele, a partir daí, teria sua visão retrospectiva fortemente
influenciada por esses informantes, reconfigurando o texto lido, tornando-se, então,
autor de um novo texto, que não mais seria aquele originado de sua leitura inicial. O
mesmo pode acontecer com sujeitos detentores de vasto domínio de conhecimento,
que podem expandir as idéias de um texto, agregando-lhe seu conhecimento prévio,
adicionando, possivelmente, falsas memórias ao dito no texto.
Até o presente momento não conhecemos nenhum estudo que trate desse tipo
de falsa memória, emergente a partir da leitura. Em vista disso, este estudo visa a
relacionar, teórica e empiricamente, os conceitos advindos das áreas da Psicologia
Experimental e da Psicologia Cognitiva à questão da leitura, não apenas à questão
das lembranças de fatos (narrativas autobiográficas), como descritos nas pesquisas
existentes, mas à relação do conhecimento prévio com as memórias a partir da