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de todo apoio aos músicos do choro, compôs, em 1956, a Suíte Retratos - homenagem
a Pixinguinha, Ernesto Nazareth, Anacleto de Medeiros e Chiquinha Gonzaga - e uma
suíte para bandolim, conjunto regional e orquestra de cordas. Nessa carta de Jacob do
Bandolim, pode-se perceber a relação carinhosa entre Radamés e os músicos de
choro:
"Meu caro Radamés:
Antes de Retratos, eu vivia reclamando: "É preciso ensaiar..." E a coisa
ficava por aí, ensaios e mais ensaios.
Hoje, minha cantilena é outra. "Mais do que ensaiar, é necessário
estudar". E estou estudando. Meus rapazes também (o pandeirista já
não fala mais em paradas). "Seu Jacob, o Sr. Aí, quer uma fermata?
Avise-me, também, se quer adágio, moderato ou vivace..." Veja,
Radamés, o que você arrumou. É o fim do mundo.
Retratos: valeu estudar e ficar fechado dentro de casa, durante todo o
Carnaval de 1964, devorando e autopsiando os mínimos detalhes da
obra, procurando descobrir a inspiração do autor no emaranhado de
notas, linhas e espaços e, assim, não desmerecer a confiança que em
mim depositou, em honraria pródiga demais para um tocador de
chorinhos.
Mas o prêmio de todo esse esforço foi maior do que todos os aplausos
recebidos em 30 anos: foi o seu sorriso de satisfação. Este é que eu
queria, que me faltava e que, secretamente, eu ambicionava há muitos
anos. Não depois de um chorinho qualquer, mas sim em função de algo
mais sério. Um sorriso bem demorado, em silêncio, olhos brilhando, tudo
significando aprovação e sensação de desafogo por não haver se
enganado. Valeu. Ora, se valeu.
E se hoje existia um Jacob feito exclusivamente à custa de seu próprio
esforço, d’agora em diante há outro, feito por você, pelo seu estímulo,
pela sua confiança e pelo talento que você nos oferece e que poucos
aproveitam.
Meu bom Radamés: sinto-me com 15 anos de idade, comprando um
bandolim de cuia e um método simplório na loja do Marani & Lo Turco, lá
no Maranguape. Vou estudar bandolim.
Que Deus, no futuro, me proteja e Radamés não me desampare.
Obrigado, Mestre.
NB – Perdoe-me. Sei que você fica inibido com elogios de corpo
presente. Daí esta carta. Sua modéstia julgará que é absurda, sem
motivo e, até mesmo, ridícula. Mas eu tinha que escrevê-la agora, para
não estalar de um enfarte, tá?
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Carta de Jacob do Bandolim a Radamés Gnatalli in TÁVOLA, Senador Artur da. Discurso proferido em 12 de
agosto de 1999 pelos 30 anos da morte de Jacob do Bandolim em 12 de agosto de 1999. Disponível em
http://www.senado.gov.br/web/senador/tavola/Discursos/disc99/Ds120899_1.htm
Acesso em: 26/02/2004.