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vozes, onde haveria o confronto entre aquelas vozes que querem ser ouvidas por outras e
querem demonstrar suas visões de mundo. Como afirma Brait (2003, p. 15):
Tanto as palavras quanto as ideias que vêm de outrem, como condição discursiva,
tecem o discurso individual de forma que as vozes – elaboradas, citadas, assimiladas
ou simplesmente mascaradas – interpenetram-se de maneira a fazer-se ouvir ou a
ficar nas sombras autoritárias de um discurso monologizado.
Um discurso encontra o discurso de outrem e estabelece uma relação viva e intensa
com ele, constituindo o sujeito que se enuncia em sujeito do discurso. Assim, a palavra
veicula, de maneira privilegiada, a ideologia, sendo a língua a representação das relações e
das lutas sociais. A palavra seria, então, construída através de uma multidão de fios
ideológicos, que representariam as relações sociais, no processo de interação com o outro.
Deste modo, “As relações dialógicas são um fenômeno quase universal, que penetram
toda a linguagem humana e todas as relações e manifestações da vida humana, em suma, tudo
o que tem sentido e importância” (BAKHTIN, 1997, p. 42), sendo o ponto articulatório entre
sujeito, história e ideologia.
Apesar de muitas vezes serem usadas como sinônimas, as palavras dialogismo e
polifonia diferenciam-se no ponto em que esta última se instaura como uma estratégia
discursiva, em um texto em que é possível perceber claramente a presença de muitas vozes.
O diálogo é a condição da linguagem e do discurso, mas há textos polifônicos e
monofônicos, segundo as estratégias discursivas acionadas. No primeiro caso, o dos
textos polifônicos, as vozes se mostram. No segundo, o dos monofônicos, elas se
ocultam sob aparência de uma única voz. Monofonia e polifonia de um discurso são,
dessa forma, efeitos de sentido decorrentes de procedimentos discursivos que se
utilizam em textos, por definição, dialógicos. Os textos são dialógicos porque
resultam do embate de muitas vozes sociais: podem, no entanto, produzir efeitos de
polifonia, quando essas vozes ou algumas delas deixam-se escutar, ou de monofonia,
quando o diálogo é mascarado, e uma voz, apenas, faz-se ouvir. (BARROS, 2003, p.
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Trazida por Bakhtin, a partir da análise dos romances de Dostoiévski, a noção de
polifonia se liga à ideia de realidade em formação, de não acabamento, de uma natureza
multifacetada que traduz a multiplicidade social, cultural e ideológica representada. Para ele,
o autor de um romance polifônico não definiria os personagens apenas, mas deixaria que
estes, através de suas enunciações, se revelassem num processo interativo muitas vezes não
concordante com apenas uma voz. É a polifonia o ponto alto de um discurso, que se constrói
através do diálogo de muitas vozes, que se olham de posições sociais e ideológicas diferentes,
construindo o discurso no cruzamento desses pontos de vista. Como pontua Bezerra (2008, p.
198), “Polifonia é aquela multiplicidade de vozes e consciências independentes e imiscíveis