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Platão e Homero; ou ágape que está relacionada com o grego das Escrituras (desde a Bíblia
dos Setenta até as epístolas apostólicas) (SPONVILLE, 1995, p.290)
A célebre frase do Evangelho de São João – “Deus é amor” – é um convite para
Sponville retomar a reflexão sobre a falta: “Se Deus é amor, esse amor não pode ser falta, pois
a Deus nada falta. Nem amizade, pois Deus não se regozija com um ser, que seria causa de
sua alegria e o faria existir mais” [...] (SPONVILLE, 1995, p.290). Então esse amor de Deus o
que é? É o amor que dá origem, que cria, ainda que esses atos não aumentem a sua alegria,
sua potência, sua perfeição, mas ao contrário, amputem-nas, ferem-nas e até mesmo
crucifiquem-nas. “Daí – afirma o autor - que se deve partir esse amor de Deus: da criação e da
cruz”. (SPONVILLE, 1995, p.291). Mas não para procurar Deus, mas o amor: ágape o amor
divino que existe independente da existência de Deus.
Pode-se falar agora de um amor ágape: um reencontro da paixão, mas não no sentido
de Eros; é a paixão de Cristo, dos mártires; um amor louco que não é dos amantes, mas da
cruz. (SPONVILLE, 1995, p.295) A esse amor podemos denominá-lo de doação. E é
interessante observar que fala Sponville fala de um Deus da cruz: um Deus que morre na cruz
para salvar a humanidade. Então não se está falando de um Deus todo poderoso, um Deus
absoluto; mas um Deus que morre, e morre numa cruz. Nisto está à humildade, a doação de
Si. Esse amor acontece também entre os seres humanos? Certamente. Existem pais, mães que
dão a vida por seus filhos. “Por quê? – questiona-se Sponville. – Por amor: para deixar mais
lugar, mais poder, mais liberdade a seus filhos, [...] para não os impedir de existir, para não os
esmagar com sua presença, sua potência seu amor” (SPONVILLE, 1995, p.295). Também
pessoas como Gandhi, Dom Romero, Martin Luther King entre outros. São pessoas que
doaram suas vidas em benefício do outro. Por amor enfrentaram desafios para que os outros
fossem mais livres, tivessem seus direitos respeitados.
Essa é a ideia de um amor desinteressado, diz Sponville. Um amor que não carece
mais de nada, pois ele basta a si mesmo. Um amor que não é falta, nem depende do amor do
outro para existir. Não é eros nem philia, mas é ágape, que se esquece de si mesmo e se doa
pelo outro:
Não mais a falta, a paixão, a cobiça (eros), não mais a potência alegre e
expansiva, a afirmação comum de uma existência reciprocamente
aumentada, o amor a si mesmo duplicado pelo ao outro (philia), mas a
retirada, mas a doçura, mas a delicadeza de existir menos, de se afirmar
menos, de se estender menos, mas a autolimitação de seu poder, de sua
força, de seu ser, mas o esquecimento de si, o sacrifício de seu prazer, de seu
bem estar, ou de seus interesses, o amor que não falta nada mas que, nem por
isso é cheio de si [...] (SPONVILEE, 1995, p.298).