106
“A fusão do desejo e da técnica viabilizando a imagem e a imagem, por sua vez, exigindo sua própria carne e osso.
O porto e o centro histórico carregam a degradação de atividades comerciais que lutam contra imposições naturais...o
mangue, a água salobra, a presença vibrante da serra do mar, as árvores que nascem nas paredes esquecidas e colori-
das pelo tempo. A luz que banha este lugar está impregnada de sal, de fuligem das torrefações de café e enxofre dos
galpões do porto.
O lugar é construído desta luz, da memória xada nas paredes dos casarões que exibem um gradiente de cor indenida,
reetindo a consciência dos passantes acostumados com o esquecimento.
Lopes Leão mostrou o vermelho-rosa desta longitude.
A madeira tensiona o desenho e a cor principia-se na talha, golpes de luz que indicam a presença e a ausência da ação.
A matriz gravada como uma camada pictórica independente.
A imagem impressa aponta para os procedimentos da pintura, e a cor participa como elemento intuitivo, sobrepondo,
anulando e somando-se a camadas anteriores. A imagem surge, de forma não linear, transbordando conteúdos de ma-
trizes diversas.
Um jogo de signicados entre o desenho gravado, a cor e a imagem impressa.
Muitas vezes um trabalho diverso aponta o caminho, a cor, a trama a ser utilizada em uma outra imagem. Não posso
medir esse tempo, tampouco prever as inter-relações de signicados que levam meses para claricar, e por vezes se
dissipam sem cerimônia.
A formulação da cor atua de forma independente, e cada imagem exigirá uma necessidade técnica.
A paleta de cores desenvolvida para centro histórico de Santos reete a vontade de corresponder-se com o meio, ofer-
ecer algo que aproxime o trabalho do ambiente, do estado e da natureza das coisas.
O amarelo porto é uma lama verde do mangue, cor úmida.
O vermelho índio é o que vibra ao fundo das construções, o vermelho utilizado pelo artista andarilho da cidade, o de-
senhista portuário, político que constrói seus materiais com restos de gesso, giz, tinta industrial, sobras de armazéns,
terra e limo das construções.
O verde frontaria é a raspagem da Casa da Frontaria Azuleijada – antigo depósito na rua do Comércio.
O azul mercado alude a água do canal do porto,da bacia do Macuco de onde saem as catraias.”