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Universidade do Estado do Rio de Janeiro
Centro de Educação e Humanidades
Instituto de Letras
Marcos Rogério Ribeiro Ponciano
A Língua Portuguesa no vestibular:
ensino, leitura e conhecimento prévio
Rio de Janeiro
2009
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Marcos Rogério Ribeiro Ponciano
A Língua Portuguesa no vestibular:
ensino, leitura e conhecimento prévio
Tese apresentada, como
requisito parcial para obtenção
do título de Doutor, ao
Programa de Pós-Graduação
em Letras, da Universidade do
Estado do Rio de Janeiro. Área
de concentração: Língua
Portuguesa.
Orientadora: Profª. Drª. Maria Teresa Gonçalves Pereira
Rio de Janeiro
2009
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CATALOGAÇÃO NA FONTE
UERJ/REDE SIRIUS/CEHB
P795 Ponciano, Marcos Rogério Ribeiro.
A língua portuguesa no vestibular: ensino, leitura e conhecimento
prévio / Marcos Rogério Ribeiro Ponciano. – 2009.
223 f.
Orientador: Maria Teresa Gonçalves Pereira.
Tese (doutorado) Universidade do Estado do Rio de Janeiro,
Instituto de Letras.
1. Língua portuguesa Estudo e ensino Teses. 2. Redação
Teses. 3. Vestibular – Teses. 4. Compreensão na leitura – Tesse. I.
Pereira, Maria Teresa Gonçalves. II. Universidade do Estado do Rio
de Janeiro. Instituto de Letras. III. Título.
CDU 806.90(07)
Autorizo, apenas para fins acadêmicos e científicos, a reprodução total ou parcial desta tese
__________________________ __________________
Assinatura Data
Marcos Rogério Ribeiro Ponciano
A Língua Portuguesa no vestibular:
ensino, leitura e conhecimento prévio
Tese apresentada, como requisito parcial
para obtenção do título de Doutor, ao
Programa de Pós-Graduação em Letras, da
Universidade do Estado do Rio de Janeiro.
Área de concentração: Língua Portuguesa.
Aprovado em 31 de março de 2009.
Banca Examinadora:
_____________________________________________
Profª. Drª. Maria Teresa Gonçalves Pereira (Orientadora)
Instituto de Letras da UERJ
_____________________________________________
Prof. Dr. Cláudio Cezar Henriques
Instituto de Letras da UERJ
_____________________________________________
Profª. Drª. Denise Salim Santos
Faculdade de Educação e Letras da UNIG
_____________________________________________
Prof. Dr. José Carlos de Azeredo
Instituto de Letras da UERJ
_____________________________________________
Profª. Drª. Norimar Pasini Mesquita Júdice
Instituto de Letras da UFF
Rio de Janeiro
2009
DEDICATÓRIA
À Edna Lúcia, companheira de vida.
AGRADECIMENTOS
À Professora Maria Teresa, orientadora, por ter doado a sua visão de língua, desde
os tempos da graduação, pelo carinho, pela paciência e firmeza nos momentos mais
difíceis do percurso.
Aos professores Cláudio Cezar Henriques e José Carlos de Azeredo, pela leitura
atenta do texto de Exame de Qualificação e pelas indicações preciosas no
desenvolvimento da pesquisa.
Aos professores de Língua Portuguesa do Programa de Pós-Graduação em Letras
da UERJ, pelas aulas, pelo auxílio, carinho e incentivo constantes.
À Capes, pela bolsa concedida.
Aos colegas do Doutorado, pelo ânimo e compartilhamento de dúvidas e certezas.
RESUMO
PONCIANO, Marcos Rogério Ribeiro. A Língua Portuguesa no vestibular: ensino,
leitura e conhecimento prévio. 2009. 155 f. Tese (Doutorado em Língua Portuguesa)-
Instituto de Letras, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2009.
Esta tese objetiva a análise de provas discursivas de Língua Portuguesa de
vestibulares, na perspectiva da leitura, focando a compreensão de texto, suas
estratégias e os conhecimentos prévios necessários ao egresso do Ensino Médio.
São analisadas as provas discursivas de Língua Portuguesa da UERJ, UNIRIO, UFF
e UFRJ, realizadas nos vestibulares 2006, 2007 e 2008. Parte-se das seguintes
hipóteses: as provas solicitam conhecimentos prévios baseados nos programas,
habilidades e competências a serem desenvolvidos no nível médio; a dificuldade
apresentada na realização das questões está relacionada não só ao conhecimento
disciplinar de língua portuguesa, mas também à capacidade/estratégia de leitura dos
enunciados e à dificuldade de seleção e interação de diferentes conhecimentos
específicos relacionados ao seu uso pragmático. A partir de tais hipóteses, propõem-
se os seguintes objetivos: levantar os conhecimentos específicos relativos ao ensino
de língua portuguesa; compreender a relação do processo de leitura na ativação do
conhecimento prévio; relacionar o processo de avaliação do vestibular ao contexto
da educação básica; buscar explicação para as questões com nota média baixa.
Para atingir os objetivos, contextualiza-se o ensino de Língua Portuguesa no Ensino
Médio; aborda-se a leitura, no viés da compreensão de texto, focalizando
principalmente conhecimentos prévios e inferências; faz-se uma breve história do
vestibular, seus objetivos e seu papel; a seguir, analisam-se as provas indicadas,
levantando-se conhecimento prévio, habilidades e competências envolvidas no
processo de compreensão de texto. As principais conclusões são: as questões das
provas analisadas estão de acordo com os programas publicados pelas
universidades e com os PCNs; o nível de exigência é graduado, conforme as
competências e habilidades variadas; o conhecimento prévio organizado e
esquematizado é fundamental para a realização de inferências adequadas.
Palavras-chave: Língua Portuguesa. Vestibular. Ensino. Leitura. Conhecimento
prévio.
ABSTRACT
This dissertation aims the discursive exam analysis of Portuguese language in
admission tests on a reading perspective focusing the text comprehension, its
strategies and previous knowledge needed to High School graduation. The analysis
is made out on UERJ, UNIRIO, UFF and UFRJ universities’ discursive exams in
Portuguese language performed in admission tests of 2006, 2007 and 2008. We start
from the following hypothesis: exams require previous knowledge based in programs,
skills and competences to be developed at medium level; the difficulty presented
when performing questions is not only related to the disciplinary knowledge of
Portuguese language, but also to the reading capacity/strategy of the enunciated and
to the selection and interaction difficulty of different specific knowledge related to its
pragmatic use. Starting from these hypotheses, the following objectives are
proposed: to raise specific knowledge related to Portuguese language teaching; to
understand the reading process relationship in the activation of previous knowledge;
to relate the evaluation process of the admission exam to the basic educational
context; to look for explanations to questions with low average mark. In order to meet
the objectives, Portuguese language teaching is put in the same context as high
school; the reading approach in the sense of text comprehension focuses mainly
previous knowledge and inferences; a brief history of the admission exam is made,
its objectives and its role are followed by indicated exam analysis, raising previous
knowledge, skills and competences involved in the text comprehension process. The
main conclusions are: questions of analyzed exams are according to programs
published by universities and with PCNs (National Curricular Parameters); the
demand level is graduated according to varied competences and skills; the organized
and schematized previous knowledge is fundamental when performing adequate
inferences.
Key Words: Portuguese language. Admission tests. Teaching. Reading. Previous
knowledge.
LISTA DE SIGLAS
INEP - Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira
DCNEM – Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio
ENEM – Exame Nacional do Ensino Médio
LDB – Leis de Diretrizes e Bases
LPLB – Língua Portuguesa e Literatura Brasileira
LPI – Língua Portuguesa Instrumental
MEC – Ministério de Educação e Cultura
PCNEM - Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio
PCNs – Parâmetros Curriculares Nacionais
PISA - Programa Internacional de Avaliação de Alunos
PNE – Plano Nacional de Educação
SAEB – Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica
SEB – Secretaria de Educação Básica
SEMTEC – Secretaria da Educação Média e Tecnológica
UERJ – Universidade do Estado do Rio de Janeiro
UFRJ – Universidade Federal do Rio de Janeiro
UNESCO - Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura
UNIRIO – Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro
UFF – Universidade Federal Fluminense
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ........................................................................................... 10
1 O ENSINO MÉDIO E A LÍNGUA PORTUGUESA ....................................... 14
1.1 Breve histórico: do século XIX ao XXI ...................................................... 14
1.2 As bases do ensino atual ........................................................................... 25
1.2.1 Propostas e legislações
................................................................................ 25
1.2.2 O contexto do Ensino Médio
......................................................................... 34
1.3 As principais correntes que organizam o ensino de língua
portuguesa no Ensino Médio ..................................................................... 39
1.4 A importância do ensino da leitura e de suas estratégias ...................... 44
2 LEITURA ....................................................................................................... 61
2.1 A leitura: uma abordagem estratégica ...................................................... 63
2.2 A construção do sentido: aspectos linguístico-discursivos .................. 67
2.2.1 - Interação texto e leitor .................................................................................. 69
2.2.2 - Conhecimento prévio ................................................................................... 71
2.2.3 Inferências .................................................................................................... 80
3 O VESTIBULAR ............................................................................................ 81
3.1 Breve histórico do vestibular ..................................................................... 83
3.2 As provas de língua portuguesa: orientações e programas ................... 90
4 AS PROVAS DE VESTIBULAR ................................................................... 96
4.1 Análise geral das provas ............................................................................ 97
4.2 Análise de questões com médias baixas ................................................ 115
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................ 132
REFERÊNCIAS ........................................................................................... 136
ANEXO A – Programas de provas UERJ ................................................... 143
ANEXO B – Programa de prova UFRJ ....................................................... 147
ANEXO C – Programa de prova UFF ......................................................... 148
ANEXO D – Programa de prova UNIRIO .................................................... 149
ANEXO E – Provas de Língua Portuguesa e Lit. Bras. UERJ e gabaritos
(2006-08) .............................................................................. 150
ANEXO F – Provas de Língua Portuguesa Instrumental UERJ e gabaritos
(2006-08) .............................................................................. 170
ANEXO G – Provas de Língua Portuguesa e Lit.Bras. UFF e gabaritos (2006-
08) ........................................................................................ 183
ANEXO H – Provas de Língua Portuguesa e Lit.Bras. UFRJ e gabaritos
(2006-08) .............................................................................. 198
ANEXO I – Provas de Língua Portuguesa e Lit.Bras. UNIRIO e gabaritos
(2006-08) .............................................................................. 210
10
INTRODUÇÃO
Esta tese surgiu do incômodo em relação ao trabalho docente e suas
repercussões no ambiente escolar, no tocante à aprovação de alunos em
universidades. Como professor, a vivência próxima ao Ensino Médio me fez ouvir
diversas vozes, muitas que atacavam e outras, em menor número, que defendiam a
influência do vestibular sobre o ensino básico. Posições tão diversas me chamaram
a atenção, assim, resolvi buscar uma resposta, pois, em geral, as vozes
discordantes não apresentavam razões claras, não havia, nas críticas, nenhuma
análise mais organizada.
Ao iniciar a minha atividade docente, introduzi-me desde o início no fim do
processo da educação básica, sendo contratado como professor do 1º ao 3º ano do
Ensino Médio. No colégio particular, situado na zona sul do Rio de Janeiro, cabia-me
desenvolver todo o trabalho relacionado à Língua Portuguesa e Literatura Brasileira,
englobando os processos de leitura e produção textual. Lá, não havia um trabalho
específico voltado para o vestibular.
Mais tarde, em outro colégio, também particular, da mesma região da cidade,
a minha função foi a de ministrar somente aulas de Língua Portuguesa, já que havia
professores específicos para Literatura Brasileira e Redação. Além das aulas
regulares, foram-me solicitadas outras de preparação para o vestibular, englobando
todos os aspectos dos programas de vestibulares: Língua Portuguesa, Literatura
Brasileira, compreensão de texto e produção escrita. A postura do colégio, como é
comum, buscava dar ao aluno aquilo que, em geral, procurava em cursos
preparatórios.
No desenvolvimento do trabalho realizado nos dois colégios, não encontrei
material específico para me embasar e acabei por seguir as solicitações dos
programas publicados pelos vestibulares, utilizando cópias das provas anteriores,
como fonte de revisão e exercícios.
Os resultados alcançados foram satisfatórios, mas percebia que as
necessidades de se desenvolverem nos alunos capacidades para uma boa
realização das provas previamente eram pouco analisadas, deslocando-se para o 3º
ano do Ensino Médio trabalho específico. Via-se, por consequência, o vestibular
como um problema, algo desconectado do processo de ensino regular.
11
As dificuldades que encontrava em sala de aula, em relação às provas de
vestibular, relacionavam-se basicamente a três aspectos: 1) falta de conhecimento
específico da área, ministrado nas séries anteriores; 2) incapacidade de leitura do
enunciado, o que também decorria por falta de conhecimento específico; 3)
dificuldade de relacionar os conhecimentos específicos aos textos e às solicitações
presentes nos enunciados das provas, levando a respostas parciais ou com
problemas de seleção de conhecimento prévio necessário.
No ambiente escolar, a culpabilização do vestibular ganha destaque,
indicando-se que as provas cobram capacidades para além do nível médio. Essa
postura sempre me incomodava e, ao pensar em um projeto para o doutorado em
Letras/Língua Portuguesa, procurei unir as provas de vestibulares ao processo de
ensino de Língua Portuguesa, levando em consideração o aspecto da leitura, a
compreensão de texto necessária para a realização das provas, sendo, para mim,
um dos principais aspectos desconsiderados no ambiente escolar.
A minha impressão, como a de alguns outros professores com quem
trabalhava, era a de que a escola se organizava principalmente pelos conteúdos
explícitos nos livros didáticos, estabelecendo, assim, como encaminhamento das
disciplinas uma forma tradicional de ensino, calcada no processo de memorização e
reprodução dos tipos de atividades nas avaliações dos alunos.
Ao organizar o projeto de trabalho para o doutorado, fiz uma pesquisa para
levantar bibliografia e outras teses e dissertações que analisassem a relação dos
exames vestibulares e o ensino da Língua Portuguesa no Ensino Médio, já que este
é o nível de estudo necessário para o processo de seleção para o Ensino Superior.
O resultado da pesquisa constatou pouquíssimos textos que se referiam ao
processo dos vestibulares, em geral de forma negativa, e, em relação à língua
portuguesa, havia muitas teses e dissertações sobre a produção escrita somente.
Tal constatação me levou, então, a organizar o projeto, com alguma
dificuldade, por não haverem outros trabalhos acadêmicos que tomassem as provas
de Língua Portuguesa de vestibulares como objeto de análise, não encontrando
referências em que pudesse me apoiar. Sabendo o que iria estudar, era necessário
delimitar a pesquisa. Como os processos de seleção para o ensino superior são bem
variados, busquei analisar as provas que concentrassem número significativo de
candidatos, egressos do Ensino Médio. Estabeleci, como primeiro critério, as provas
de Língua Portuguesa de universidades públicas, por elas apresentarem grande
12
número de candidatos, oriundos de regiões e níveis socioculturais distintos. Como
segundo critério, estabeleci as universidades públicas mais procuradas no Rio de
Janeiro: Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), Universidade Federal
Fluminense (UFF), Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e Universidade
Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO).
Foi necessário, então, decidir a quantidade de provas a serem analisadas: os
processos de seleção de três anos sequenciais, os vestibulares de 2006, 2007 e
2008
1
. Esses critérios geraram ainda um elevado número de provas objetivas e
discursivas. Realizando teste de análise, percebi que as provas discursivas e as
objetivas, apesar de estarem, por vezes, ligadas a um mesmo programa, são
concebidas de diferentes formas, exigindo dos candidatos diferentes posturas: as
provas objetivas já trazem alternativas a serem julgadas; as provas discursivas
precisam ser formuladas, organizadas textualmente. Como a perspectiva traçada
está relacionada ao ensino escolar de Língua Portuguesa, preferiu-se, aqui, optar
pela análise das provas discursivas. Chegou-se, assim, às provas a seguir:
Instituição Nome da prova
Língua Portuguesa Instrumental com Redação
UERJ
Língua Portuguesa e Literatura Brasileira
UFF Língua Portuguesa e Literatura Brasileira
UFRJ Língua Portuguesa e Literatura Brasileira
UNIRIO Língua Portuguesa e Literatura Brasileira
É necessário ainda esclarecer dois pontos, em virtude dos critérios
anteriormente estabelecidos: 1) a proposta de Redação do primeiro item fica
excluída do estudo; 2) as questões referentes ao conhecimento específico do campo
da Literatura Brasileira e da Teoria Literária também serão excluídas da análise
2
.
O nosso interesse é analisar as provas, sem julgar as bancas de vestibulares,
focando as solicitações realizadas aos candidatos e a pertinência em relação ao
ensino escolar de Língua Portuguesa.

1
Os anos indicados são os de entrada, conforme indicado nos processos de seleção; as provas analisadas,
dessa forma, foram aplicadas no segundo semestre do ano anterior.
2
Algumas questões ligadas à Literatura que não demandem conhecimento prévio específico serão tratadas
como questões relacionadas à compreensão de texto.
13
Esta tese parte das seguintes hipóteses, formuladas a partir da minha
experiência de sala de aula:
as provas de língua portuguesa solicitam conhecimentos prévios baseados
nos programas, habilidades e competências a serem desenvolvidos no
nível médio;
a dificuldade apresentada na realização das questões refere-se não só ao
conhecimento disciplinar de Língua Portuguesa, mas também à
capacidade/estratégia de leitura dos enunciados e à dificuldade de seleção
e interação de diferentes conhecimentos prévios relacionados ao seu uso
pragmático nos textos dados nas provas.
A partir de tais hipóteses, propõem-se os seguintes objetivos:
levantar os conhecimentos específicos relativos ao ensino de língua
portuguesa solicitados nas provas;
compreender a relação do processo de leitura na ativação do
conhecimento prévio necessário para a realização das questões;
relacionar o processo de avaliação do vestibular ao contexto da educação
básica;
buscar explicação para as questões com nota média baixa.
Para atingir tais objetivos, a tese se apresenta da seguinte forma. O primeiro
capítulo busca contextualizar o ensino de Língua Portuguesa no Ensino Médio. O
capítulo dois introduz o vestibular, fazendo um resgate da sua constituição histórica,
seus objetivos e seu papel na sociedade e no ensino. O terceiro capítulo trata da
leitura, no viés da compreensão de texto, incorporando concepções da Linguística e
Análise do Discurso, assim como de outros campos que estudam a Cognição; a sua
função é estabelecer os aspectos teóricos envolvidos na análise das provas. No
capítulo quatro, faz-se a análise das provas indicadas, levantando-se conhecimento
prévio necessário, habilidades e competências envolvidas no processo de
compreensão de texto, além de conduzir uma discussão sobre os dados levantados
e a sua relação com o ensino de Língua Portuguesa no ambiente escolar.
14
1 O ENSINO MÉDIO E A LÍNGUA PORTUGUESA
1.1 Breve histórico: do século XIX ao XXI
A educação no Brasil se atrela a um histórico de colônia. Essa condição custou um atraso no
processo educacional, que se manteve dependente dos interesses da metrópole. Os colégios vão-se
constituindo a partir das necessidades daqueles que integram a classe elitizada e, por condição
histórica, se mantêm nas mãos dos jesuítas por muitos séculos; afinal, o ensino era atribuição da Igreja
Católica, assim como o alargamento da fé.
No século XVIII, em decorrência da visão de mundo iluminista/racionalista e
por questões de poder, o Marquês de Pombal entra em conflito com os jesuítas e os
retira da atribuição de educadores legítimos. Dessa forma, estabelece-se a abertura
para o sistema de ensino leigo (não religioso).
Com o bloqueio continental, no século XIX, a corte portuguesa vem para o
Brasil. Com isso, é necessário desenvolver a cidade do Rio de Janeiro, criando a
infraestrutura necessária em diversos níveis (cultural, urbanístico, político etc.).
Dentre outras ações para a busca de autonomia para a nação, criam-se as
Faculdades de Direito e Medicina. Já é possível, então, ter a formação superior no
Brasil (AZEVEDO, 1996).
Com tal processo desenvolvimentista, acrescido do processo de independência
política, é fundamental melhorar a formação escolar no Brasil. Para isso, é instituído o
atual Colégio Pedro II, fundado em decorrência da reorganização do antigo Seminário
de São Joaquim, conforme projeto apresentado à Regência de Araújo Lima (1837-
1840) pelo então Ministro Bernardo Pereira de Vasconcelos. Inaugurado em 1837, na
data de aniversário do Imperador (2 de Dezembro), foi denominado Imperial Colégio
de Pedro II. O ato foi oficializado por Decreto Regencial a 20 desse mesmo mês, e as
aulas se iniciaram em março do ano seguinte.
O Colégio tinha como objetivo ser o modelo da escola secundária. O nível de
ensino era superior aos demais estabelecimentos, sendo o mais bem organizado e o
único oficial durante algum tempo. Suas classes eram pouco numerosas e o currículo
bem exigente (SOUZA, 1999).
15
A maioria dos alunos pertencia à elite econômica e política do país, apesar de
haver a previsão para estudantes sem recursos. Imbuído dos valores europeus de
civilização e progresso, os alunos do Imperial Colégio saíam com o diploma de
Bacharel em Letras, aptos a ingressar nos cursos superiores, em especial os de
Direito, por ser a Faculdade que preparava intelectuais e administradores para o
país (AZEVEDO, 1996). Os professores, disseminadores e formadores das novas
gerações, também são intelectuais que integram a elite da corte, endossados pelo
Imperador (a partir de 1847, passa-se a realizar concursos públicos para o
magistério). O corpo docente mantém esse perfil – intelectuais reconhecidos – até o
século XX (SOUZA, 1999).
Ainda no século XIX, diversos colégios seguem a concepção de ensino
proposta pelo Colégio Imperial, o que enfatiza a sua importância. Tal disseminação é
bastante ampla, pois alcança as regiões centrais de vários Estados: Rio de Janeiro,
Minas Gerais, Bahia, São Paulo e Sergipe.
Esse modelo nos permite analisar o encaminhamento dado ao ensino como
forma de perceber a visão daquela época. O currículo inicial do Colégio apresentava
a seguinte grade de aulas semanais por série:
8ª. e 7ª. séries: 24 aulas – gramática nacional 5; gramática latina 5, aritmética 5, geografia 5,
desenho 2, música vocal 2.
6ª. série : 24 aulas – latinidade 10; língua grega 3; língua francesa 1; aritmética 1; geografia 1;
história 2; desenho 4; música 2.
5ª. e 4ª. séries
: 25 aulas – latinidade 10;grego 5; francês 2; inglês 2; história natural 2;
geometria 2; história 2.
3ª. série
: 25 aulas – latinidade 10; grego 5; inglês 1; ciências físicas 2; álgebra 5; história 2.
2ª. série
: 30 aulas – filosofia 10; retórica e poética 10; história 2; ciências físicas 2; matemática
6.
1ª. série
: 30 aulas – filosofia 10; retórica 10; ciências físicas 2; história 2; astronomia 3;
matemática 3.
(FÁVERO, 2002, p.72)
A estrutura curricular evidencia “não só uma ênfase acentuada nos estudos
clássicos (latim e grego) e na retórica e filosofia, mas, também, um pequeno número
de aulas de gramática nacional” (FÁVERO, 2002, p. 73), estudada somente nas
duas primeiras séries. A explicação para tal fato, segundo Azevedo (1996), está
relacionada à elitização do alunado, uma vez que, ao entrar na escola, já traz o
domínio da norma culta; daí, serem mais importantes o latim e a retórica do que a
16
gramática filosófica
3
e nacional, presentes no currículo somente dos dois primeiros
anos.
Várias reformas foram necessárias na história do Colégio. Algumas delas são
significativas para a percepção da importância do ensino de língua. Em 1841,
acentuou-se a predominância das humanidades. O curso para sete anos e o estudo
de gramática geral e nacional passa a ser ministrado somente no primeiro ano. Em
1856, pela primeira vez, são propostos e aprovados programas de ensino, havendo
também indicação de livros. Para o estudo de língua, no entanto, o Conselho Diretor
não estabelece normas, indicando unicamente “leitura, gramática, conversação e
versão fácil”; para a disciplina gramática geral e nacional, estudada somente no
primeiro ano, é previsto que, depois de algumas preleções de gramática geral, o
aluno se aperfeiçoe na “Gramática e Língua Portuguesa”, o que explicita o pouco
interesse dado, pois os demais programas são “extensíssimos e pretensiosos”
(FÁVERO, 2002, p. 82). Em 1857, por novo decreto, acabam-se as aulas avulsas no
ensino secundário com o objetivo de aumentar as vagas gratuitas. Há a criação do
5º ano especial para os que quisessem terminar os seus estudos nessa série, e a
cadeira de Gramática Geral e Nacional passa a se denominar “Português”, com o
seguinte programa:
PORTUGUÊS – GRAMÁTICA, LEITURA
Recitação e exercícios ortográficos.
Os livros propostos foram:
Cirilo Dilermando da Silveira: Gramática da Língua Portuguesa
Fr. Francisco de S. Luís: Sinônimos
Barker: Biblioteca Juvenil
Pe. Antônio Vieira: Cartas, Seletas
Pe. Caldas: Poesias Escolhidas
(FÁVERO, 2002, p. 84)
Com isso, o ensino do português começa a se configurar como disciplina,
apesar de ainda só estar presente no primeiro ano. Esse processo de gramatização
tem por finalidade “descrever e instrumentar uma língua na base de duas
tecnologias (...): a gramática e o dicionário” (AUROUX, 1992, p.65). No programa
acima, percebe-se tanto o uso de gramática como o de dicionário de sinônimos.
Segundo Auroux (1992), o “interesse prático da gramática se estende da filologia (no
sentido lato do acesso ao texto escrito), o seu lugar de origem, em direção ao
domínio das línguas, aí compreendidas como as línguas maternas”. A gramática,

3
Azevedo (1996) usa tal terminologia, mas Fávero & Molina (2006) refere-se à “Gramática Geral e Nacional”.
17
dessa forma, torna-se “uma técnica pedagógica de aprendizagem das línguas e um
meio de descrevê-las” (p. 36).
Há também a disciplina de retórica e poética que, consideradas mais difíceis,
eram aplicadas nos últimos anos, conforme indicado por Quintiliano, nas Institutio
Oratória: a primeira educação ocorre “com o grammaticus (por volta dos sete anos) e
depois, com o rhetor, se aprendesse retórica (por volta dos catorze anos)”
(FÁVERO; MOLINA, 2006, p. 54).
A formação secundária, nesse tempo, valoriza acentuadamente a cultura
literária, um ponto essencial para a formação de cunho humanista. Pela falta de
Faculdades de Humanidades no Brasil, o Colégio Pedro II também toma para si a
formação literária em grau mais avançado, saindo o aluno com o título de Bacharel
em Letras (SOUZA, 1999). Dessa forma, o Colégio é também o ambiente
concretizador do processo da organização de um sistema de ensino e, por
consequência, de gramatização no Brasil (ORLANDI; GUIMARÃES, 2001).
O ensino no Colégio Pedro II continua se desenvolvendo, mas, a partir do Ato
Adicional de 1834, as províncias passam a responsabilizar-se pelo ensino primário e
secundário, enquanto o governo central administra “o ensino superior e toda a
organização do Município Neutro (futuro Distrito Federal)” (FÁVERO, 2002, p. 85).
Com isso, o ensino público não consegue se desenvolver organizadamente, pois se
paralisa o centro diretor nacional, de onde deveria partir uma política de educação
mais ampla. Passa-se, então, ao seguinte quadro: as províncias, responsáveis
apenas pelo ensino primário e secundário, não podem completar seus sistemas e
erguê-los ao nível das escolas superiores; o governo, responsável pelo ensino
superior, também não pode dirigir, de forma consistente, um sistema nacional de
educação (AZEVEDO, 1996). Isso faz com que o Colégio Pedro II perca o lugar de
referência do ensino.
O acesso ao nível superior, nessa época, não exige a conclusão do curso
secundário regular. Além da idade mínima de dezesseis anos, aos alunos de
sistema público do Município Neutro (Rio de Janeiro) é exigida a aprovação nos
exames parcelados (realizados por quem estuda nos cursos preparatórios); aos
alunos das escolas particulares ou dos sistemas provinciais é cobrada a aprovação
nos exames (o equivalente ao vestibular de hoje); já aos alunos do Pedro II, não é
necessário prestar exame, pois o grau de bacharel em Letras, conferido ao final do
curso, possibilita a matrícula nas faculdades.
18
O levantamento realizado nos possibilita, apesar de inicial, notar que o
acesso ao nível superior de ensino, desde o século XIX, é um desejo da maior parte
dos alunos secundaristas. Como a clientela dos colégios é elitizada, ela se interessa
somente pelo diploma de nível superior. Uma demonstração disso é a criação da já
citada 5ª série especial, pelo Colégio Pedro II, que confere certificado de conclusão
a quem quiser cursar somente o ensino secundarista. O fato é que ninguém se
matricula no curso, buscando o primeiro ano do curso regular, com acesso direto à
faculdade (FÁVERO, 2002).
No desenvolvimento do processo escolar oitocentista, a denominação
“gramática geral” aparece nos programas até 1870, substituída pela “análise lógica e
gramatical”, que passa a ocupar lugar de destaque. Acrescenta-se o estudo histórico
da língua, devido à divulgação do método histórico-comparativo, exposto na obra de
Adolfo Coelho, A língua portuguesa, publicada em 1868.
Na década de 1880, o ensino de língua portuguesa no Colégio Pedro II segue
as novas tendências linguísticas, incorporando as ideias de Bopp e Bréal, dentre
outros. Tais incorporações provocam o aparecimento de várias gramáticas, como as
de Maximiano Maciel, Júlio Ribeiro e Alfredo Gomes. (FÁVERO, 2002)
Em 1887, é publicado um “programma para os exames geraes de
preparatorios em todo o império.”, com base no decreto nº 9694 de outubro de 1886
e no aviso nº 974 de março de 1887. Nele, informa-se que “O exame de Portuguez
precederá a qualquer outro” (RIBEIRO, 1887, p. 85).
O exame de Português divide-se em uma prova escrita e uma oral. A primeira
“consistirá em uma composição livre sobre assumpto que a sorte designar dentre os
pontos organizados pela comissão julgadora.” (RIBEIRO, 1887, p. 86), sendo
equivalente à prova de redação atual.
A prova oral também consta de duas partes. A primeira trata de “analyse
phonetica, etymologica e sintática de um trecho de extensão razoável, escolhido
pela comissão julgadora em uma pagina sorteada, na fórma do regulamento vigente,
de um dos livros abaixo indicados” (RIBEIRO, 1887, p. 86).
Para essa etapa do exame são indicados:
Livros do exame
Camões, Lusiadas, seculo XVI.
Lucena, Historia do padre Francisco Xavier, idem.
Fr. Luiz de Souza, A vida do Arcebispo, seculo XVII.
Gabriel de Castro, A Ulysséa, idem.
19
Santa Rita Durão, O Caramurú, seculo XVIII.
Padre Theodoro de Almeida, O Feliz Independente, idem.
João Francisco Lisboa, Vida do Padre Antonio Vieira, seculo XIX.
Barão de Paranapiacicaba, A Camoneana, idem.
O sistema adotado é o sorteio, tanto do livro quanto das páginas para
arguição. O candidato “tambem deverá ser arguido sobre o sentido preciso de cada
palavra do trecho sorteado, e sobre o sentido geral do mesmo trecho” (RIBEIRO,
1887, p. 87).
A segunda parte da prova oral também é organizada por sorteio. Realiza-se
uma exposição de um dos pontos gramaticais indicados. Listam-se 46 pontos,
iniciando por “1. Observações geraes sobre o que se entende por grammatica
geral, por grammatica historica ou comparativa e por grammatica descriptiva ou
expositiva. Objecto de grammatica portugueza e divisão do seu estudo.[...]”
(RIBEIRO, 1887, p. 88).
O programa prossegue com as seguintes divisões: do item 2 ao 5 – pontos
relativos à “Phonologia: os sons e lettras” (p. 88); do 7 ao 11 “Classificação de
palavras”; item 12 – “Agrupamentos de palavras por famílias e por associação de
idéias”; do 13 ao16 “Flexão dos nomes” e “verbos”; do 18 ao 28 – formação de
palavras, constituição do léxico português e etimologia; do 29 ao 41 – aspectos
variados relativos à Sintaxe; do 42 ao 46 – pontos de Estilística. O último item é: “46.
A syntaxe e o estylo”.
Julio Ribeiro, ao examinar o programa, em suas Procellarias, observa ser
“este [...] organizado scientificamente, sobre as bases [...] da sciencia da linguagem.”
(RIBEIRO, 1887, p. 92). No texto, indica que “o programma de Portuguez [...] está de
accordo exacto, perfeito com os principios da grammatica scientifica que, em 1881,
[...]” ele publica. Cita estudos e estudiosos, como Pacheco Jr., Adolpho Coelho,
Fausto Barreto, mas indica que a sua “Grammatica é a única grammatica por onde
se possa preparar um alumno para enfrentar com o actual programma de exames.”
(p. 93-94). Termina o texto apontando que a gramática oficial indicada está em
desacordo com a modernidade do programa.
A publicação do programa e a posição de Julio Ribeiro mostram o contexto
preparatório para os exames de ingresso ao nível superior. Há muitas similaridades
entre aquela época e a atual. Buscam-se critérios mais objetivos para as etapas da
seleção, modernizando-se o programa de português, ao incorporar as “novas ideias
20
linguísticas”. Os estudos gramaticais realizados ”beneficiavam-se dessa reorientação
científica, mas nem por isso abandonaram as motivações normativas de sua origem
greco-romana” (Azeredo, 2008, p. 32). Alguns estudiosos procuram aplicar tais
conhecimentos ao ensino, afetando tanto os programas quanto o ensino de língua.
Isso reforça que a relação do vestibular com o ensino secundarista/médio é
histórica, possibilitando, muitas vezes, a mudança do ensino a partir dos programas
para acesso ao nível superior.
Ao se instalar a República, o Colégio Pedro II mantém o posto de escola-
modelo. Os seus Programas tornam-se referência para os exames preparatórios e
todas as escolas do país que se queiram equiparar devem-se orientar pelas suas
indicações (FÁVERO; MOLINA, 2006).
Em 1895, a disciplina Português é ministrada somente nos três primeiros
anos, com quase todos os livros de autores brasileiros. Já há uma relação bastante
intensa, nesse momento, entre ensino e livros “didáticos”.
Em 1898, o ensino de português se estende para seis anos e tem sua carga
horária ampliada; em 1899, a carga horária é reduzida (10 horas) e passa a ser
ministrado somente nos primeiros quatro anos, ficando a literatura nos dois últimos
anos com quatro horas semanais. Rivadavia Correia, em 1910, institui os exames
vestibulares, feitos nos vestíbulos das faculdades em vez de se realizarem nas
escolas secundárias.
Em 1918, Julio Nogueira publica o livro Exame de portuguez, que pretende
“offerecer uma disposição methodica das materias que constituem o programma de
portuguez, facilitando assim o trabalho dos candidatos ao exame desta disciplina” (p.
5). A seguir, o autor marca a sua posição e critica posturas conservadoras no ensino
de língua materna:
“O que o leitor vae encontrar aqui são as idéas correntes, as idéas vencedoras no
ensino da lingua portugueza, pois o gênero e os fins de nosso trabalho não
comportariam diversões eruditas, scismas, opiniões pessoaes, que seriam fóra de
proposito.”(p. 5).
A proposta é produzir um material de apoio ao candidato que prestará os
exames orais, devido à elevação do nível de concorrência, a fim de guiar “o
estudante para certos pontos que convem insistir desde logo” (p. 5). Propõe, então,
dez itens para o estudo: 1) “Distinção entre grammatica expositiva, histórica,
comparada; glottologia, philologia, literatura”; 2) “Historia resumida da lingua
21
portuguesa”; 3) “Estudo summario das leis phoneticas observadas na transição do
latim ao portuguez”; 4) “Alterações morphologicas: obliteração dos casos;
suppressão do genero neutro; graduação dos substantivos e adjectivos;
modificações no quadro das conjugações; formação dos futuros e condicionaes
romanicos; voz passiva”; 5) “Elementos formadores do lexico portuguez”; 6)
“Processos formativos de palavras. Estudos de prefixos e sufixos”; 7) “Etymologia.
Formas convergentes e divergentes”; 8) “Mudanças que as alterações
morphologicas introduziram na syntaxe e no stylo do idioma”; 9) Anomalias
gramaticaes mais em uso no Brasil e em Portugal. Erros de pronuncia. Erros
morphologicos. Erros syntacticos”; 10) “Noções sobre as principaes phases literárias
em Portugal e no Brasil” (Nogueira, 1918, p. 7).
Após a exposição dos pontos, o autor faz indicações sobre a “prova escripta”
(redação), que seguia, em geral, os seguintes “gêneros de composição” (p. 295):
“Descripções”, “Cartas”, Narrações”, “Dialogos”, “Scenas”, “Paisagens”, “Noticias de
jornal”, “Desenvolvimento de um thema”. Por fim, indica “Recommendações de
ordem pratica” sobre: quando e como preencher o cabeçalho, a releitura da prova,
atender o número de 30 a 40 linhas na composição e usar um sistema de grafia
coerente com que esteja familiarizado, não cometendo “infracções de um systema
com preceitos de outro” (p. 300).
É importante notar que as indicações para estudo procuram ser mais
científicas, mais objetivas e sistematizadas, seguindo a linha iniciada ao fim do
século XIX, diferenciando concepções de gramática, passando por fonética,
morfologia e sintaxe, além de pontos sobre o campo literário. Dessa forma, parece
esclarecer aos candidatos pontos de estudos necessários para a boa realização da
prova.
O livro de Julio Nogueira não pretende substituir os já utilizados nas salas de
aula, mas incrementar o estudo por parte daqueles que buscam passar nos exames,
o que evidencia um aumento de concorrência para o nível superior. A chancela do
trabalho é dada pelo “Prof. Dr. José Oiticica”, “lente de portuguez do Collegio Pedro
II”, que prefacia a obra.
Em 1918, já temos exemplos de exploração comercial de livros extraescolares
para o estudo, o que permanece até hoje, em outras proporções (internet, revistas
etc.), evidenciando a busca dos candidatos por materiais que melhorem a sua
condição para o concurso.
22
Tanto no caso de Julio Ribeiro como no de Julio Nogueira, percebemos uma
preocupação com o rigor quanto à sistematização do ensino da língua, momentos
nos quais o debate em torno da metodologia mais adequada, mais embasada
cientificamente, é buscada. Isso mostra que, por vezes, a motivação gerada para os
exames vestibulares, historicamente, traz contribuições para o ensino de língua
portuguesa.
Em 1925, a carga horária de português é aumentada para 15 horas,
distribuídas por cinco séries do ensino secundário, estendido para seis anos. A
literatura passa a chamar-se Literatura Brasileira, ensinada na sexta série com três
horas semanais. A reforma permanece até 1930. No período republicano, o ensino
da Língua Portuguesa consolida-se com aulas de leitura, redação e gramática
(FÁVERO; MOLINA, 2006). Até os anos 1940, a disciplina português mantém a
“tradição da gramática, da retórica e da poética” (SOARES, 2002, p. 164).
Soares (2002) aponta que, nas primeiras décadas do século XX, há diversas
gramáticas para o uso escolar. Afirma a autora que “as de presença mais intensa e
duradoura” são: as Gramáticas expositivas, de Eduardo Carlos Pereira (uma para o
ensino médio e outra para o superior), publicadas em 1907, persistindo com
dezenas de edições até os anos de 1950; O idioma nacional – Gramática para o
Ginásio e O idioma nacional – Gramática para o Colégio, ambas de 1944; a
Gramática normativa da língua portuguesa, de Francisco da Silveira Bueno, também
de 1944; o Português prático, de José Marques da Cruz, que, em 1955, tem 166 mil
exemplares impressos.
A concepção de professor da época é a daquele que produz e utiliza livros e
coletâneas, sendo capaz de realizar exercícios, discutir textos, sem a necessidade
de material de auxílio. Em geral, o professor de português é um estudioso que se
dedica também ao ensino.
A partir de 1950, o contexto começa a mudar. Com a pressão das classes
populares para a escolarização, modifica-se o perfil do alunado: os filhos dos
trabalhadores povoam também as salas de aula (BRITTO, 2004). Segundo Soares
(2002), na década de 1960, o número de alunos no ensino médio quase triplica. Em
decorrência disso, há a necessidade de recrutamento de um número maior de
professores, nem sempre bem preparados, o que leva ao rebaixamento salarial da
função docente. Com isso, o professor é impelido a relegar a tarefa de preparar
aulas e exercícios ao material didático.
23
Nessa época, mudam-se as condições pedagógicas e escolares, já que as
recém-criadas faculdades formam professores com conteúdos de língua, literatura,
pedagogia e didática. “É então que gramática e texto, estudo sobre a língua e estudo
da língua começam a se constituir realmente uma disciplina com um conteúdo
articulado” (SOARES, 2002, p. 167).
Azeredo (2007) indica, na segunda metade dos anos 1960, o aparecimento
de duas obras, Rio de toda gente e Português através dos textos, que se preocupam
“em mostrar que o uso linguístico é fruto da escolha e combinação das unidades
integrantes de um amplo repertório de unidades e meios de expressão” (p. 117). A
iniciativa revela que o êxito de língua materna depende, expressivamente, da
diversidade de textos representativos das variedades de língua portuguesa.
Nos anos de 1970, o ensino de português, como todas as demais disciplinas
curriculares, sofre alterações pela nova LDB, de 1971, submetendo a educação à
perspectiva do regime militar, instaurado em 1964. A educação, então, é posta a
serviço do desenvolvimento nacional, e a língua torna-se instrumento para tal fim.
No 1º grau, nas séries iniciais, a disciplina chama-se “Comunicação e expressão”, e
nas séries finais, “Comunicação em língua portuguesa”; no 2º grau, atual ensino
médio, denomina-se “Língua Portuguesa e Literatura Brasileira” (SOARES, 2002). A
Teoria da Comunicação ganha espaço, para dar vazão ao utilitarismo e
pragmatismo. Procura-se desenvolver o uso da língua e não mais o estudo da ou
sobre a língua, reduzindo-se, assim, o espaço para o estudo gramatical.
Após o processo de redemocratização, em 1985, é recuperada a
denominação “Português”, para a disciplina dos ensinos fundamental e médio. A
partir de então, chegam ao ensino de língua as aplicações das teorias linguísticas, já
que fazem parte dos currículos de Letras e há o desenvolvimento de pesquisas em
nível de pós-graduação. Em primeiro lugar, há a indicação das variedades
linguísticas presentes nas escolas, decorrentes da democratização escolar, o que
exige uma postura diferente dos professores. Em segundo lugar, a linguística
contribui com a descrição dos processos da língua, tanto escrita como falada, que se
opõem à hegemonia dada à prescrição. Em terceiro lugar, ganha força a vertente
textual, introduzindo-se a gramática do texto, o que acaba por relacionar a
semântica à linguística textual.
Além dessas contribuições, o ensino de português sofre influências
concomitantes da pragmática, da teoria da enunciação e da análise do discurso,
24
elaborando uma nova concepção de língua, que se inscreve no processo de
enunciação/discursivo, incluindo as relações da língua com os seus interlocutores,
com o contexto em que é utilizada, considerando-se as condições sociais e
históricas de seu uso.
Em geral, a educação média ganha importância ao se buscar o
desenvolvimento socioeconômico do país. Em termos educacionais, as discussões
giram em torno do acesso à formação que dê condições para o trabalho e para a
continuidade dos estudos.
Em tempos de globalização, há um intenso jogo de forças para solicitar da
escola a formação necessária a fim de que as pessoas possam entrar no mercado
de trabalho ou seguir para a faculdade (e com formação específica) e, depois,
inserirem-se no mundo produtivo. Essa é outra discussão que encontramos na
pesquisa em termos de formação.
Acácia Kuenzer (1997), aponta a distinção feita entre a formação profissional
média, meramente produtora de mão-de-obra técnica, e o Ensino Médio voltado
para uma formação geral e crítica. A autora, em seu estudo de cunho sociológico,
procura mostrar como o discurso da escolha é aparente, já que há uma distinção de
classes sociais: as famílias com condições de vida menos favoráveis levam seus
filhos à educação profissional média, enquanto outras famílias, as mais abastadas,
procuram levar seus filhos a uma educação geral mais extensa com a concepção de
melhor prepará-lo. Mostra ainda a diferença de classes nas escolas públicas e
privadas. Nove anos antes, há a mesma indagação, sem estar atrelada ao plano
político-econômico neoliberal, por Piletti (1988), em Ensino de 2º grau: educação
geral ou profissionalização?
No início da década de 1990, é realizada uma pesquisa de campo por Strehl e
Fantin (1994) que buscam, em Porto Alegre, responder à seguinte questão: Ensino
Médio – qualificação profissional ou preparação para o vestibular? Opção consciente
ou manipulada?
Tais preocupações indicam o conflito gerado pelo contexto no campo
educacional acerca do papel do Ensino Médio. É certo que, ao aparecem trabalhos
publicados em diversas regiões, a discussão já havia sido fomentada anteriormente.
Nessa época, segunda metade dos anos 1980, com o fim do regime militar e a
abertura política (1985), há a possibilidade de debate mais abrangente do processo
educacional.
25
É importante notar que o projeto de escola e o seu papel está diretamente
relacionado, segundo Filmus (2002): ao plano governamental, que legisla sobre o
tema; ao ambiente empresarial, que seleciona para o trabalho (dessa forma, valida
ou não a formação escolar); ao campo dos educadores (professores, pedagogos,
pesquisadores etc.). É na discussão e conflito de interesses entre esses três grupos
da sociedade que as propostas da educação são elaboradas.
Na exposição realizada, percebemos que, no contexto histórico, há ganhos e
retrocessos. O processo da globalização e as crises do capitalismo trazem novos
atores e pressões à cena educacional. Atualmente, encaminhar uma concepção de
língua para o ensino médio, o seu papel, as suas atribuições para a formação dos
alunos, é de fundamental importância.
1.2 As bases do ensino atual
1.2.1 Propostas e legislações
Em termos de marcos históricos, no Brasil, a Constituição Federal de 1988
propicia, depois de vários debates, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional (Lei 9.394/96). Dessa forma, o poder legislativo dá encaminhamento a
questões discutidas em vários fóruns sociais. Com a lei, o ensino passa a ter dois
segmentos básicos: I – Educação Básica (ensino infantil, fundamental e médio); II –
Ensino Superior. Passa a ser função também do Estado propiciar a formação mais
extensa, criando-se metas para o crescente número de estudantes no Ensino Médio.
Outra novidade é o estabelecimento de trabalhos por projetos interdisciplinares ou
transdisciplinares, indicando a inter-relação entre os saberes.
Para que isso ocorra, o MEC encaminha ao Conselho Nacional de Educação
o Aviso 307/97, no qual indica a necessidade do Ensino Médio e obrigatoriedade
governamental em propiciá-lo:
A Constituição portanto confere a este nível de ensino o estatuto de direito a todo o cidadão. O
Ensino Médio passa pois a integrar a etapa do processo educacional que a nação considera
básica para o exercício da cidadania, base para o acesso às atividades produtivas, inclusive
para o prosseguimento dos estudos dos níveis mais elevados e complexos da educação, e
para o desenvolvimento pessoal (...)
(BRASIL/MEC, 1997)
26
No Aviso, há a afirmação de que o Ensino Médio, dentre outras atribuições,
deve ser base “inclusive para o prosseguimento dos estudos dos níveis mais
elevados e complexos da educação”. Dessa forma, deve oferecer condições básicas
para cursar o ensino superior e, para lá chegar, sendo base também para os
exames de ingresso à graduação.
O Ensino Médio tem a característica de finalização do ensino básico, já que,
no artigo 35 da LDBEN (Leis de Diretrizes e Bases da Educação Nacional), deve
realizar: “I. a consolidação e o aprofundamento dos conhecimentos adquiridos no
ensino fundamental, possibilitando o prosseguimento de estudos”.
No contexto da Educação Básica, a Lei nº 9.394/96 determina a construção
dos currículos, no Ensino Fundamental e Médio, com uma Base Nacional Comum, a
ser complementada, em cada sistema de ensino e estabelecimento escolar, por uma
parte diversificada, exigida pelas características regionais e locais da sociedade, da
cultura, da economia e da clientela (art. 26).
A Base Nacional Comum traz consigo a dimensão de preparo para a
continuidade dos estudos e, como tal, deve caminhar para a construção de
competências e habilidades básicas. Além disso, ela objetiva a formação geral do
educando, assegurando o perfil de saída do egresso do Ensino Médio, conforme as
finalidades propostas em lei.
É certo que a criação de leis e direitos, por si só, não assegura ao aluno
formado a continuidade dos estudos, mesmo porque não há vagas suficientes para
todos. Há, no entanto, a necessidade de condições mínimas para que os egressos
de educação básica possam escolher e ter o desenvolvimento de competências e
habilidades para, de fato, concorrerem a uma vaga em cursos de graduação,
passando pelo processo de seleção dos vestibulares.
Essa tese é uma primeira preocupação nossa em estabelecer o básico
necessário ao candidato que deseja uma vaga no ensino superior, já que o ensino
no país não dá condições sequer próximas para quem não tem acesso a uma escola
de nível médio com alguma qualidade. De forma não sistemática ainda, percebemos
que há uma preocupação com o vestibular, em muitas escolas particulares e em
algumas públicas, levando ao desenvolvimento de trabalhos e materiais adicionais
para tal fim. Explicitar o que é solicitado nas provas de vestibular pode ser uma
verificação do mínimo necessário para se solicitar algum tipo de trabalho ou de
material para o desenvolvimento no curso do Ensino Médio. A possibilidade de
27
democratização do acesso ao nível superior passa pelo direito à clareza do que um
aluno precisa ou não para lá chegar.
A LDB, ao destacar as diretrizes curriculares específicas do Ensino Médio,
aponta para a necessidade de planejamento e desenvolvimento do currículo de
forma orgânica, pretendendo superar a segmentação por disciplinas estanques,
possibilitar a integração e articulação dos conhecimentos, num processo
permanente de interdisciplinaridade e transdisciplinaridade. Essa proposta está
contida no Art.36, segundo o qual o currículo do Ensino Médio
destacará a educação tecnológica básica, a compreensão do significado da ciência,
das letras e das artes; o processo histórico de transformação da sociedade e da
cultura; a língua portuguesa como instrumento de comunicação, acesso ao
conhecimento e exercício da cidadania.
(p.26)
A necessidade de organicidade dos conhecimentos fica mais evidente ainda
quando, no mesmo artigo, é estabelecido, em seu parágrafo 1º, as competências
que o aluno, ao final do Ensino Médio, deve demonstrar:
Art. 36, § 1º. Os conteúdos, as metodologias e as formas de avaliação serão
organizados de tal forma que ao final do Ensino Médio o educando demonstre:
I - domínio dos princípios científicos e tecnológicos que presidem a produção
moderna;
II - conhecimento das formas contemporâneas de linguagem;
III - domínio dos conhecimentos de Filosofia e de Sociologia necessários ao
exercício da cidadania.
O perfil de saída do aluno do Ensino Médio está diretamente relacionado às
finalidades desse ensino, conforme determina o Art. 35 da Lei :
O Ensino Médio, etapa final da Educação Básica, com duração mínima de três anos,
terá como finalidade:
I - a consolidação e aprofundamento dos conhecimentos adquiridos no ensino
fundamental, possibilitando o prosseguimento de estudos;
II - a preparação básica para o trabalho e a cidadania do educando como pessoa
humana, incluindo a formação ética e o desenvolvimento da autonomia intelectual e
do pensamento crítico;
III - a compreensão dos fundamentos científico-tecnológicos dos processos
produtivos, relacionando a teoria com a prática, no ensino de cada disciplina.
Com essas medidas, há a preocupação em estabelecer os pilares e a
identidade ao Ensino Médio, indicando a criação, por documento específico, dos
Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio, que prevê a organização
28
das propostas escolares em três linhas principais: “Linguagens, códigos e suas
tecnologias”, “Ciências humanas e suas tecnologias”, “Ciências da Natureza,
Matemática e sua tecnologias”.
A área de “Linguagens, códigos e suas tecnologias” contempla Língua
Portuguesa, Artes, Educação Física e Informática.
Nessa perspectiva, a linguagem é considerada como capacidade humana de
articular “significados coletivos em sistemas arbitrários de representação”,
compartilhados e que variam de acordo com as necessidades e experiências da vida
em sociedade. A principal razão de qualquer ato de linguagem é a produção de
sentido (BRASIL/SEMTEC, 2002a).
As linguagens, ao se inter-relacionarem nas práticas sociais e na história,
produzem a circulação de sentidos diferenciados. Isso envolve a apropriação
demonstrada pelo uso e pela compreensão de sistemas simbólicos em diferentes
suportes e de seus instrumentos, servindo para a organização cognitiva da realidade
e de sua comunicação. Envolve ainda o reconhecimento de que as linguagens
verbais, icônicas, corporais, sonoras e formais, dentre outras, se estruturam de
forma semelhante sobre um conjunto de elementos (léxico) e de relações (regras)
significativas; há prioridade para a Língua Portuguesa, como língua materna
geradora de significação e integradora da organização do mundo e da própria
interioridade (BRASIL/MEC, 1997).
Nesse contexto, cabe à formação escolar de língua portuguesa propiciar a
capacidade de inter-relação com o conhecimento, tratar do domínio da análise e
expressão das linguagens em geral, do funcionamento/regras do sistema linguístico,
levando em consideração não só o explicitado como também os aspectos
contextuais. Tal nível pressupõe a organização do conhecimento, das percepções,
reflexão, por meio das habilidades da leitura e da escrita, que supõem capacidade
de análise de procedimentos linguístico-discursivos.
O contexto da educação brasileira traz, com essa proposta, algumas
discussões pelo caráter abrangente dos PCNEM, publicados em 1997. Em 1998,
são publicadas as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio, como
necessidade de concretizar as abstrações do documento anterior. Em 2004, são
publicadas as Orientações Curriculares para o Ensino Médio. A comunicação da
Secretaria de Educação Básica do MEC com a sociedade tenta garantir a aplicação
29
da nova proposta para o Ensino Médio, já que, em 2001, é criado o Plano Nacional
de Educação:
O Plano Nacional de Educação, Lei nº 10.172/2001, sancionado pelo Congresso
Nacional em 2001, estabeleceu metas para a educação no Brasil com duração de
dez anos que garantisse, entre muitos outros avanços, a elevação global do nível de
escolaridade da população, a melhoria da qualidade do ensino em todos os níveis, a
redução das desigualdades sociais e regionais, a ampliação do atendimento na
Educação Infantil, no Ensino Médio e no Superior. O Plano Nacional de Educação,
tal como foi concebido, previu uma reavaliação de suas metas em quatro anos. Uma
das mais importantes metas do Plano Nacional de Educação no que tange o Ensino
Médio é a garantia do acesso a todos aqueles que concluam o Ensino Fundamental
em idade regular no prazo de três anos, a partir do ano de sua promulgação.
(BRASIL/MEC/SEB, 2006, p. 46)
Percebe-se que a proposta governamental é a abertura de acesso para todos,
pressupondo um contexto organizado, com regularidade no processo ensino-
aprendizagem. Isso é uma necessidade para o desenvolvimento do país, não só
cultural como também socioeconômica. Além disso, também há pressão externa,
devido ao processo de globalização e necessidades de habilitação de recursos para
os tempos atuais. A Unesco é a instituição que tem procurado auxiliar/delinear, junto
com os países da América Latina, um desenvolvimento educacional mais eficiente
(Filmus, 2002). Em 1997, o Brasil é convidado por essa Organização a participar do
WEI – World Education Indication – o que levou o INEP, instituto que se preocupa
com a medição dos resultados em educação, a ter acesso e produzir indicadores
seguindo padrões técnicos internacionais (Castro, s/d). O Exame Nacional do Ensino
Médio é a avaliação criada pelo INEP e mais divulgada como instrumento de
aferição do ensino, sendo os resultados amplamente divulgados. A nossa proposta
difere da apresentada nesse tipo de avaliação, não se pautando somente pelas
habilidades e competências, mas também pelas estratégias de leitura e
conhecimentos prévios necessários para realizar as provas de vestibulares.
Em relação a propostas de ensino/avaliação, é necessário estar sempre
atento para alterações necessárias que melhorem o processo. As Orientações
Curriculares têm essa finalidade. Os organizadores da parte de Linguagens, códigos
e suas tecnologias são os professores Roxane Rojo, para língua materna, e Luiz
Paulo Lopes, para língua estrangeira.
Nesse documento, há várias críticas apontando limitações, inconsistências
teóricas dos PCNs. As DCNEM (Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino
Médio), segundo os autores, ao tratarem da contextualização do ensino, fazem
30
referência às noções de conhecimento e aprendizagem cotidianos e sistemáticos ou
científicos. Embora os perceba como processos bastante diferenciados e
complementares, o documento parece encaminhar uma visão de que, no Ensino
Médio, devem-se reconstruir conceitos cotidianos, por meio do aprendizado de
conhecimento sistemático ou científico. Isso pode ser percebido, pela ordem, dos
verbos utilizados nos objetivos a serem alcançados pela área de Linguagens,
Códigos e suas Tecnologias: “compreender e usar (3 vezes); entender (2 vezes);
analisar, interpretar e aplicar; contra um confrontar e um aplicar (depois de entender
por 2 vezes)”. Tudo é colocado como se, no Ensino Médio, “estando as construções
cotidianas completadas, fosse necessário, primeiro analisar, interpretar, entender,
compreender, para, depois, usar e aplicar” (BRASIL/MEC/SEB, 2006, p. 14).
Entretanto, os indícios de aprendizado do alunado de Ensino Médio são outros,
dependentes do perfil que o aluno desse nível de ensino apresenta ou das
necessidades sociais que a ele se apresentarão, ao final da Educação Básica.
No que se refere ao perfil discente, primeiramente, o estudante de Ensino
Médio já deverá ter-se apropriado, pelo menos parcialmente, de práticas letradas de
uso da linguagem mais complexas e menos cotidianas, em leitura e compreensão de
textos orais e escritos, assim como em sua produção de textos, devido, entre outros
fatores, à sua escolaridade no Ensino Fundamental. Essas práticas mais complexas
apresentam padrões linguísticos e textuais que, por sua vez, já exigem certo
conhecimento e certa prática de reflexão sobre o funcionamento da linguagem em
uso e sobre suas propriedades.
Os PCNEM começam por dividir as competências básicas em três blocos -
Representação e comunicação, Investigação e compreensão e Contextualização
sociocultural. Os dois primeiros blocos retomam a divisão já clássica no ensino de
línguas entre produção (comunicação) e compreensão, superada em favor da
integração das competências nos PCNs de Ensino Fundamental, 3º e 4º Ciclos, por
exemplo. Esses dois primeiros blocos fazem, de novo, referência às competências
de uso (comunicação, compreensão) e competências cognitivas (representação,
investigação). Dos dois, o segundo bloco – o da compreensão – é o mais carregado
de objetivos ou competências básicas a serem atingidas, confirmando a tendência –
também já expressa nos PCNs de Ensino Fundamental e talvez devida aos
resultados do alunado nos exames – de se privilegiar as capacidades de
31
compreensão (leitura, no caso do ensino de línguas) em relação às de produção
(BRASIL/MEC/SEB, 2006).
Em vez de operacionalizar as competências básicas em habilidades,
conhecimentos, atitudes e valores a serem trabalhados ao longo do Ensino Médio,
“os PCNEM as copiam literalmente nestes dois primeiros blocos, fazendo apenas
pequenos acréscimos” (BRASIL/MEC/SEB, 2006, p. 16). O procedimento é que
torna o documento pouco operacional para referenciar a elaboração de um plano ou
projeto de escola, conforme pretendido nas DCNEM. Se esse grau de generalidade
cabe e é desejável quanto às diretrizes, já não acontece o mesmo com um
documento que pretende referenciar a elaboração de planejamentos escolares
(MEC/SEB, 2006).
Os pequenos acréscimos realizados para a área de Linguagem, Códigos e
suas Tecnologias apontam para a visão de linguagens e de língua, de texto e de
discurso, adotadas no documento:
em situações intersubjetivas, que exijam graus de distanciamento e reflexão
sobre os contextos e estatutos dos interlocutores; e colocar-se como
protagonista no processo de produção/ recepção.
condições de produção/recepção (intenção, época, local, interlocutores
participantes da criação e propagação de ideias e escolhas, tecnologias
disponíveis etc.)
(BRASIL/MEC/SEB, 2006, p. 18)
Quando se passa da área de linguagens para tratar especificamente de Língua
Portuguesa, não há acréscimo em operacionalização e concretização do documento
e muito se perde, com esta disciplinarização do que se pretendia interdisciplinar.
Num mundo onde as diferentes linguagens não andam mais separadas, mas se
apresentam sempre em textos e discursos multimodais – tanto nos impressos, como
revistas de variedades, de divulgação científica, nos jornais, nos livros didáticos, como
em ambiente digital multimidiático -, compreender e produzir textos não se restringe
mais ao trato do verbal (oral ou escrito), mas à capacidade de colocar-se, em relação
às diversas modalidades de linguagem – oral, escrita, imagem, imagem em
movimento, gráficos, infográficos -, para delas retirar sentido. Esta é, aliás, uma das
principais dificuldades de leitura dos alunos do Ensino Médio, apontada nos diversos
exames e avaliações.
(BRASIL/MEC/SEB, 2006, p. 19)
O objeto de estudo da área são as várias linguagens e os códigos por elas
estruturados, nas manifestações particulares que deles se valem (textos) para
32
estabelecer diferentes formas de comunicação. São explicitados os seguintes
objetivos instrumentais:
conhecer e utilizar eficazmente procedimentos de análise textual,
conhecer a dinâmica da interlocução, distinguir realidade de construção
simbólica do real, recuperar as formas instituídas de construção do
imaginário coletivo, dominar os componentes estruturais das diversas
linguagens e seus arranjos possíveis, compreender criticamente a
diversidade das linguagens (competências que fazem parte do domínio da
Investigação e Compreensão);
a compreensão do contexto em que se produzem os objetos culturais
concretizados nas linguagens, percebendo o seu caráter histórico, é
fundamental também para que o funcionamento das linguagens seja
entendido, investigado e compreendido na sua perspectiva social, e não
apenas como manifestações isoladas de um indivíduo.
Tais objetivos instrumentais mostram um distanciamento entre texto e contexto:
“primeiro, um texto pode ser estudado e compreendido do ponto de vista de análises
estruturais, desde que não se desconheça o obscuro conceito de dinâmica da
interlocução” (MEC/SEB, 2006, p. 23). A contextualização sociocultural permanece
separada e complementar às análises de textos, que parecem ter bases em
paradigmas clássicos da Linguística: análises estruturais, sociolinguística.
Por exemplo, são definidos como conceitos estruturantes da área, para o bloco
de competências Representação e comunicação:
1. Linguagens: verbal, não-verbal, digital
2. Signo e símbolo
3. Denotação e conotação
4. Gramática
5. Texto
6. Interlocução, significação, dialogismo
Rosane Rojo indica que, na apresentação dos conceitos acima, há uma única
menção à perspectiva enunciativa de língua/linguagem assumida nos PCNEM, no
item 6. Interlocução, significação, dialogismo, “mas, para defini-los, o texto recorre a
um esquema reversível e interacional entre os interlocutores – Teoria da
33
Comunicação – para definir interlocução e a intertextualidade – Teoria Textual“,
diferentemente dos “construtos enunciativos bakhtinianos” do texto original dos
Parâmetros Curriculares (MEC/SEMTEC, 2002b, p. 25).
As habilidades ligadas a esta parte são:
1. utilizar linguagens nos três níveis de competência: interativa, gramatical e
textual;
2. ler e interpretar;
3. Colocar-se como protagonista na produção e recepção de textos;
4. Aplicar as tecnologias da comunicação e da informação em situações
relevantes.
As habilidades propostas nos Parâmetros Curriculares devem fazer parte do
ensino regular de Língua Portuguesa. O que se percebe, hoje, é a dificuldade de
implantação dessas ideias na prática escolar. Os esforços para a melhoria da
condição do ensino passam pela capacitação dos professores, melhoria dos livros
didáticos, com a revisão de metodologias calcadas na memorização e implantação
do caráter pragmático da língua, de nível discursivo (MEC, 2007).
Pressupondo que os estatutos básicos relativos ao funcionamento da língua
portuguesa foram aprendidos ao longo do Ensino Fundamental, cabe ao Ensino
Médio oferecer aos estudantes oportunidades de uma compreensão mais aguçada
dos mecanismos que regulam nossa língua, tendo como ponto de apoio textos
escritos. “Se o ensino tende a uma especialização disciplinar progressiva, no Ensino
Médio aumenta o peso específico dos conceitos, fatos e dados no conteúdo
disciplinar, mas estes não devem constituir sua preocupação exclusiva”.
Procedimentos e atitudes, valores e normas também “integram os conteúdos dessa
etapa da escolaridade” (BRASIL/MEC/SEB, 2006, p. 32).
Percebe-se, em relação à legislação e aos PCNs, uma preocupação em
estabelecer um ensino de Língua Portuguesa ligado às correntes que incorporam o
nível pragmático da língua aos níveis tradicionalmente estudados. Com isso, busca-
se formar um cidadão capaz de pensar o discurso como forma de interação social,
podendo estabelecer, além da semântica básica da frase, as intenções discursivas
dos enunciadores na sociedade.
34
1.2.2 – O contexto do Ensino Médio
Para se pensar o ensino de Língua Portuguesa, é importante perceber o perfil
pressuposto do aluno ao chegar ao Ensino Médio:
No que se refere ao perfil do alunado, primeiramente, o estudante de Ensino Médio
já deverá, é claro, ter-se apropriado, pelo menos parcialmente, de práticas letradas
de uso da linguagem mais complexas e menos cotidianas, em leitura e compreensão
de textos orais e escritos, produção de textos, devido, entre outros fatores, a sua
escolaridade no Ensino Fundamental. Estas práticas mais complexas apresentam
padrões linguísticos e textuais que, por sua vez, exigem já certo conhecimento e
certa prática de reflexão sobre o funcionamento da linguagem em uso e sobre suas
propriedades.
(BRASIL/SEMTEC, 2002b, p. 42).
Se levarmos em consideração o exposto nas Orientações Curriculares acima,
quando da chegada ao Ensino Médio, perceberemos que a proposta não condiz com
a realidade encontrada, em seu maior número de alunos. Há, ainda, muitos
problemas relacionados à leitura de textos, além dos conhecimentos adquiridos,
também na saída da formação escolar, o que leva à questão de acesso aos estudos
de nível superior. Como as melhores universidades são muito concorridas, o
egresso da educação básica, em grande número, não terá condição de disputar uma
vaga por meio dos vestibulares. Em virtude disso, é necessário compreender tal
contexto.
O Plano Nacional de Educação, Lei nº 10.172/2001, estabelece metas para a
educação no Brasil com duração de dez anos que garanta, entre muitos outros
avanços, a elevação global do nível de escolaridade da população, a melhoria da
qualidade do ensino em todos os níveis, a redução das desigualdades sociais e
regionais, a ampliação do atendimento na Educação Infantil, no Ensino Médio e no
Superior. O Plano Nacional de Educação, tal como foi concebido, prevê uma
reavaliação de suas metas em cinco anos. Uma das mais importantes metas do
Plano Nacional de Educação, no que tange ao Ensino Médio, é a garantia do acesso
a todos aqueles que concluam o ensino fundamental em idade regular no prazo de
três anos, a partir do ano de sua promulgação (BRASIL/MEC, 2001).
Em dezembro de 2006, foi instituído e regulamentado o Fundo de Manutenção
e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da
35
Educação - Fundeb. Iniciado em janeiro de 2007, sua implantação ocorre de forma
gradual até 2009, quando o Fundeb deve atender a todo o universo de alunos do
ensino básico.
Dados de 2005 da Pesquisa Nacional por Amostragem de Domicílios do
Instituto Brasileiro de Geografia e de Estatística (PNAD/IBGE) indicam que do total
da população na faixa etária entre 15 e 19 anos (18 milhões), apenas 45% (cerca de
4 milhões de jovens) encontravam-se matriculados nesse nível de ensino (básico).
A inserção dessa faixa etária no Ensino Médio é fundamental para a qualificação
solicitada hoje pelo mercado de trabalho mais competitivo (Filmus, 2002).
Em 2004, a Revista do Ensino Médio mostra o crescimento em ritmo mais
acelerado que os demais segmentos da educação. Isso decorre, principalmente, da
busca da continuidade de formação por aqueles que tinham parado seus estudos,
acrescido dos egressos do ensino fundamental.
Última etapa de escolarização da educação básica, o Ensino Médio apresenta
um crescimento de 84% de 1994 a 2004. Embora a expansão do número das
matrículas tenha ocorrido também na educação fundamental e superior, nenhum
deles chega perto do volume alcançado pelo Ensino Médio. Quando se percebe a
quantidade de formandos, os dados são ainda mais significativos: o número de
jovens que estão terminando a educação básica – “prontos”, portanto, para ingressar
na educação superior e no mercado de trabalho – é mais que o dobro desde 1994,
alcançando 1,9 milhão em 2002.
Outras informações levantadas pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
Educacionais Anísio Teixeira (INEP) do Ministério da Educação ajudam a traçar o
quadro do Ensino Médio no Brasil. Hoje, são mais de nove milhões de estudantes
estudando nas 22 mil escolas de Ensino Médio que existem pelo País e dois e meio
milhões seguindo a Educação de Jovens e Adultos. Dos matriculados no ensino
regular, 88% estão em escolas públicas e as mulheres são maioria.
Praticamente toda a oferta acontece na área urbana e quase metade dos
estudantes está no período noturno. São cerca de 4,3 milhões de jovens que, em
grande parte, trabalham durante o dia. Dados do Exame Nacional do Ensino Médio
(ENEM) 2003 revelam que 47% dos participantes trabalham ao mesmo tempo em
que estudam e 20% estão à procura de emprego (BRASIL/MEC/SEMT, 2004).
A grande expansão do Ensino Médio nos últimos anos apresenta, entre suas
razões, o problema do acesso da população a esse nível de ensino. Pesquisas
36
desenvolvidas por organizações internacionais, organizadas pela Unesco, mostram
que, na faixa etária de 25 a 64 anos, 25% da população brasileira têm pelo menos o
nível secundário. No Chile, esse índice é de 44% e, na Argentina, de 42%.
No Brasil, na faixa etária considerada ideal para o Ensino Médio – de 15 a 17
anos –, 83% dos jovens estão na escola, mas apenas 33% esse segmento
(MEC/SEMT, 2004).
Para se traçar um panorama mais claro do Ensino Médio, é preciso recorrer a
outros indicadores. O atraso escolar, por exemplo, é um problema que atinge cinco
de cada dez alunos desse nível de ensino. A distorção idade-série é apontada, nas
avaliações realizadas pelo Ministério da Educação, como um dos fatores associados
ao baixo desempenho.
O atraso escolar é resultado da repetência e do abandono, problemas crônicos
na educação brasileira. No Ensino Médio, 20% dos estudantes repetiram, em 2002,
a mesma série em que estavam no ano anterior. O abandono atinge 15% dos
alunos.
A situação do Ensino Médio é bastante diferente nas diversas regiões do País.
Na Sudeste, estão concentrados 44% dos alunos, seguido pela Nordeste, com 28%.
Na região Norte, o atraso escolar é de 69% e, na região Sul, é metade desse valor.
Já a taxa de abandono é de 20%, na região Norte, e de 12% na Sudeste.
Um dos traços significativos do Ensino Médio é aprofundar os conhecimentos
do ensino fundamental, tornando-os mais complexos, e desenvolver a capacidade
de leitura em vários níveis.
Pelos resultados do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica
(SAEB), realizado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais
Anísio Teixeira (BRASIL/MEC/INEP, 2002), 42% dos alunos da 3ª série do Ensino
Médio encontram-se em estágios de defasagem quando o assunto é leitura. Eles
leem apenas textos narrativos e informativos simples e enfrentam dificuldades diante
de questões que exigem interpretação de gêneros literários variados.
A comparação do desempenho dos alunos nas três séries avaliadas pelo SAEB
2001, que também abrange a 4ª e 8ª séries do ensino fundamental, permite aferir a
distância que os separa do estágio adequado de aprendizado. Dos alunos da 3ª
série do Ensino Médio, 74% dominam habilidades em leitura compatíveis com o que
deveria ser ensinado entre a 4ª e 7ª séries e 21% adquiriram competências que
deveriam ser desenvolvidas na 8ª série. Apenas 5% estão no patamar desejável.
37
Esse baixo desenvolvimento de habilidades e competências é o resultado de
um déficit acumulado ao longo da educação básica.
O PISA (Programa Internacional de Avaliação de Alunos) avalia a capacidade
de leitura, conhecimentos práticos de ciências e de matemática. Para a leitura, o
Programa tem uma concepção cognitiva como extração e relação entre informações
contidas em textos de diferentes gêneros e linguagens, tais como folhetos, gráficos
retirados de Atlas, diagramas, os quais constituem práticas de leitura escolares e
não escolares.
Segundo Jurado (2003), o programa, em 2000, quando avaliou a leitura,
selecionou “três capacidades básicas:
localização, identificação e recuperação de informação;
interpretação e reflexão – subdivididas em 5 níveis, exigidas na leitura;
compreensão de uma diversidade de gêneros.
O quarto nível de leitura, por exemplo, já exige a capacidade de leitura crítica e
de compreensão responsiva.
No Relatório PISA 2000, dentre alunos de 15 anos, de 32 países diferentes, os
brasileiros obtiveram os piores resultados nas capacidades de leitura. De fato, os
dados do SAEB realizado em 2001 não são muito diferentes. O relatório atesta que
32,11% dos alunos da 3ª série do Ensino Médio que prestaram o exame encontram-
se no nível 5, caracterizado por capacidades de leitura muito simples, tais como:
localizar informações explícitas e implícitas em fragmentos de textos narrativos
simples; inferir, tanto em provérbios como em notícias de jornal, o sentido de
palavras e expressões de maior complexidade, levando-se em conta o grau de
abstração; inferir o sentido de palavras ou expressões em textos narrativos simples,
relatos jornalísticos, histórias e poemas; identificar o tema de textos narrativos,
informativos e poéticos; interpretar textos publicitários com auxílio gráfico,
correlacionando-o com enunciados verbais; gráficos sobre boletins meteorológicos;
e identificar a finalidade de texto informativo em revista de divulgação científica.
Segundo o relatório, esses adolescentes são, ainda, capazes de estabelecer
relação entre tese e argumento em pequenos textos jornalísticos de baixa
complexidade e de reconhecer o efeito de sentido decorrente da exploração de
recursos morfossintáticos. Sem dúvida, os alunos da 3ª série do Ensino Médio
situados no nível 5 possuem, mais consolidadas, as habilidades de leitura, não se
38
apresentando, todavia, como leitores críticos, aptos a participarem das práticas
sociais de leitura do mundo letrado. Os alunos posicionados no nível 6 (20,43%) já
são capazes de identificar recursos discursivos mais sofisticados utilizados pelo
autor; no nível 7 (3,91%) e no nível 8 (1,44%) apresentam habilidades de leitura
mais compatíveis com a série cursada. Em contrapartida, vale ressaltar que abaixo
do nível 5, em que se situa a média da 3ª série do Ensino Médio, encontram-se
41,31% dos alunos que não demonstram habilidades de leitura niveladas com a
série cursada (BRASIL/MEC/INEP, 2002, P. 108).
Isso quer dizer que 41% dos jovens avaliados, ao final do Ensino Médio,
apresentam capacidades de leitura abaixo das citadas no relatório para o nível 5,
extremamente simples, além de exercidas a respeito de textos curtos e muito pouco
complexos. Além disso, o relatório admite que apenas 5,35% dos jovens apresentam
capacidades de leitura compatíveis com o esperado ao término do Ensino Médio.
Os resultados são bastante compatíveis com os do Relatório PISA/2000.
Jurado (2003) mostra que, dentre os jovens na faixa de 15 anos que frequentam a
escola, aproximadamente 10% não chegaram a alcançar o nível 1 de leitura; 30%
chegaram ao nível 1; 35% conseguiram alcançar o nível 2; 19%, o nível 3; 5%, o
nível 4; e somente 1% dos nossos jovens chegou ao nível 5. Os dados refletem o
tipo de ensino. A maior parte dos jovens avaliados - 65% (entre os níveis 1 e 2) mal
conseguem localizar informações que podem ser inferidas em um texto; reconhecer
a ideia principal em um texto, compreendendo as relações ou construindo um
sentido; construir uma comparação ou várias conexões entre o texto e outros
conhecimentos extraídos de experiência pessoal. Ainda assim, os dados apontam
que, no que se refere à localização de informações, os resultados são ainda piores
quando está em jogo a leitura de gráficos, mapas, diagramas. Muitos desses
gêneros têm pouca circulação na escola e, quando circulam, não são objetos de
ensino.
Algumas características dos alunos ajudam a compreender a gravidade do
problema. A maioria daqueles que apresentam um desempenho muito ruim está
matriculada no ensino noturno, concilia trabalho e estudo e tem idade acima da ideal
para a série. Em geral, são filhos de mães com baixa escolaridade. Diante de uma
pressão cada vez maior por vagas no Ensino Médio, os órgãos governamentais
buscam encontrar soluções estratégicas que elevem o desempenho para melhorar a
qualidade da formação dos jovens brasileiros, havendo, então, desenvolvimento
39
cultural/intelectual e, consequentemente, socioeconômico. Com isso, pode-se
pensar em melhores condições para se ampliar o número de alunos mais bem
qualificados no ensino superior, sendo o objetivo governamental
(BRASIL/MEC/SEMTEC, 2004).
É importante, nesse contexto, pensar que a chegada ao nível superior deve
contemplar a passagem pelos vestibulares. Propiciar uma boa formação no ensino
médio é dar condições de competitividade por uma vaga em instituições públicas.
Nesse sentido, as provas de vestibulares e seus resultados são um termômetro do
ensino básico existente hoje.
O contexto de avaliação objetiva por percentuais e gráficos faz parte de um
contexto mais amplo em relação à educação brasileira. Na década de 1990, mais
acentuadamente em 1995, o Brasil envolve “grandes esforços no desenvolvimento e
implantação de sistemas nacionais de avaliação e de indicadores educacionais”.
Como resultado dessa política, cria-se “um eficiente sistema de informações que
abrange todos os níveis e modalidades de ensino, da educação infantil à pós-
graduação” (CASTRO, s/d, p. 1).
Em 2006, 2 milhões de alunos concluíram o Ensino Médio. Cerca de 400 mil
jovens ingressaram nas universidades, o que representa a chegada de 20% dos
formandos ao nível superior. É certo que não há vagas em universidades para todos,
mas é necessário dar aos egressos do Ensino Médio uma clareza maior do processo
de passagem para o ensino superior. Ao discutir o tema, levantar conhecimentos e
habilidades necessários para a realização das provas de vestibulares, há a
pretensão de contribuir com um pouco mais de clareza em relação a tal processo de
passagem, dentro da especificidade de língua portuguesa.
1.3 – As correntes que organizam o ensino de língua portuguesa no Ensino
Médio
Uma discussão sobre o papel da disciplina Língua Portuguesa no contexto do
Ensino Médio deve envolver, necessariamente, uma reflexão sobre o projeto
educativo que se implementa. Considerando-se que a LDBEN/96 toma o Ensino
Médio como etapa final da educação básica, essa fase de estudos pode ser
40
compreendida como o período de consolidação e aprofundamento de muitos dos
conhecimentos construídos ao longo do ensino fundamental.
Segundo o PCNEM, espera-se dessa etapa de formação o desenvolvimento
de capacidades que possibilitem ao estudante: avançar em níveis mais complexos
de estudos; integrar-se ao mundo do trabalho, com condições para prosseguir, com
autonomia, no caminho de seu aprimoramento profissional; atuar, de forma ética e
responsável, na sociedade, tendo em vista as diferentes dimensões da prática social
(MEC/SEB, 2006).
Desse ponto de vista, em síntese, o Ensino Médio deve atuar de forma que
garanta ao estudante a preparação básica para o prosseguimento dos estudos, para
a inserção no mundo do trabalho e para o exercício cotidiano da cidadania, em
sintonia com as necessidades político-sociais de seu tempo.
O processo de ensino e de aprendizagem deve levar o aluno à construção
gradativa de saberes sobre os textos que circulam socialmente, recorrendo a
diferentes universos semióticos. Pode-se dizer que as ações realizadas na disciplina
Língua Portuguesa, no contexto do Ensino Médio, devem propiciar ao aluno o
refinamento de habilidades de leitura e de escrita, de fala e de escuta. Isso implica
tanto a ampliação contínua de saberes relativos à configuração, ao funcionamento e
à circulação dos textos quanto ao desenvolvimento da capacidade de reflexão
sistemática sobre a língua e a linguagem.
Pelo que os PCNEM expõem, a função de Língua Portuguesa, no Ensino
Médio, deve levar em consideração principalmente o processo de comunicação
como interação concreta, desenvolvendo para embasá-la os conhecimentos
linguístico-gramaticais e discursivos pertinentes a fim de concretizar tal objetivo.
As transformações dos estudos da língua e da linguagem, no Brasil e no
exterior, assim como dos estudos especificamente vinculados ao processo de ensino
e de aprendizagem da Língua Portuguesa como língua materna provocam, nas
últimas décadas, a reflexão e o debate acerca da necessária revisão dos objetos de
ensino em nossas salas de aula (FONSECA, 1977; BAGNO; STUBBS; GAGNÉ,
2002).
Num primeiro momento, por volta dos anos 1970, o debate centra-se em torno
dos conteúdos de ensino. Trata-se de integrar, às práticas de ensino e de
aprendizagem na escola, novos conteúdos além daqueles tradicionalmente
priorizados em sala de aula.
41
Essa primeira mudança de paradigma preconiza a importância de
compreender as dificuldades vivenciadas pelos alunos no processo de
aprendizagem à luz dos fatores envolvidos na variação linguística. Defende-se,
portanto, que o planejamento, a execução e a avaliação dos resultados das práticas
de ensino e de aprendizagem levem em conta fatores como classe social, espaço
regional, faixa etária e gênero. Tais fatores deveriam ser considerados em relação
às situações de uso da língua que determinam tanto o grau de formalidade e o
registro utilizado quanto à modalidade de uso, se falada ou escrita.
O que se defende, nesse momento é uma descoberta dos estudos científicos
de Linguística e Linguística Aplicada. Trata-se, especificamente, de promover o
debate sobre o fato de que, se as línguas variam no espaço e mudam ao longo do
tempo, então o processo de ensino e de aprendizagem de uma língua – nos
diferentes estágios da escolarização – não se pode furtar a considerar tal fenômeno
(BAGNO; STUBBS; GAGNÉ, 2002; CASTRO, 2008; AZEREDO, 2008).
Ao mesmo tempo, assume-se a necessidade de trazer à sala de aula textos
que circulem na sociedade, não apenas os literários, mas também os jornalísticos,
os escritos e os falados (MEC/SEB, 2006; CASTILHO, 2003).
Não se pode dizer, entretanto, que tenha havido, nesse período, uma
alteração de fato significativa em termos de objetos de ensino, até porque, muitas
vezes, compreende-se que a defesa do respeito ao modo de usar a língua pelos
diferentes sujeitos e nas diferentes situações significa enfatizar o ensino de
variedades linguísticas não-padrão. Abrir a escola para reflexões dessa natureza é
considerado ameaça ao conhecimento sobre a língua que até então impera nas
salas de aula (CEREJA, 2002)
No debate que se estabelece, tais questões não são avaliadas por muitos em
sua efetiva importância: a de que considerar a variação e a mudança linguísticas
como fatos intrínsecos aos processos sociais de uso da língua deve contribuir para
que a escola entenda as dificuldades dos alunos e possa atuar mais pontualmente
para que eles compreendam quando e onde determinados usos têm ou não
legitimidade e possam, tendo alcançado essa consciência social e linguística, atuar
de forma também mais consciente nas interações de que participam, vinculadas às
práticas orais ou às práticas escritas de interação. Falta certa convicção quanto à
importância das questões relativas à variação e à mudança linguísticas, como efeito,
42
inclusive, da abordagem estruturalista nos estudos linguísticos, valorizando
excessivamente o estudo da forma.
O estágio em que se encontram os estudos acerca da língua e da linguagem,
naquela época, apresenta sustentação teórica e metodológica que oferece aos
professores condições para, em sua formação inicial e continuada, construírem os
caminhos que apenas se anteviam. Se o texto está na sala de aula, o conhecimento
sobre seu funcionamento e, mais precisamente, sobre os usos da língua e da
linguagem pelos quais os textos se configuram são ainda um dos grandes
problemas dos estudos científicos e das abordagens pedagógicas até então
propostas (FONSECA, 1977).
Além disso, deve-se lembrar que os cursos de Letras inserem, na década de
1970, a Linguística como disciplina efetiva e obrigatória, trazendo uma nova
percepção, ainda que gradativa, às salas de aula. Tal efeito é realizado também com
o incremento das pesquisas realizadas no nível de pós-graduação, o que trouxe
maior produção de textos teóricos e de metodologia de ensino nas décadas
seguintes (SILVA, 2004; AZEREDO, 2008).
O desenvolvimento do campo leva, posteriormente, de forma mais específica
nos anos 1980, a que se considere a variação dos usos da língua afeita a variações
individuais dos produtores e dos receptores bem como a variações das situações de
interação, o que só se pode compreender quando considerada a materialidade do
texto em relação ao contexto de produção de sentido, o que envolve tanto o contexto
imediato em que se dá a interação quanto a esfera social de que ela emerge
(NEVES, 2006). Esse período é marcado, junto à comunidade acadêmica, por um
relativo consenso sobre o fato de que entender os usos da língua significa
considerar os recursos e os arranjos pelos quais se constrói um texto, num dado
contexto. É, então, que adquirem força os estudos acerca da construção da
configuração textual, particularmente sobre os mecanismos pelos quais se manifesta
a coesão dos textos bem como sobre os elementos que concorrem para a coerência
textual.
Isso produz uma mudança sensível de paradigma: o texto passa a ser uma
totalidade que só alcança esse status por um trabalho conjunto de construção de
sentidos, no qual se engajam produtor e receptor (MEC/SEB, 2006).
A nova perspectiva passa a ser essencial para o amplo desenvolvimento dos
estudos dos gêneros discursivos no momento atual. Segundo a exposição presente
43
nas Orientações para os PCNEM de Língua Portuguesa, a perspectiva do ensino
atual deve considerar as variações encontradas no processo de produção e/ou
recepção dos textos em suas múltiplas dimensões:
(a) linguística, vinculada, portanto, aos recursos linguísticos em uso
(fonológicos, morfológicos, sintáticos e lexicais);
(b) textual, ligada, assim, à configuração do texto, em gêneros discursivos ou
em sequências textuais (narrativa, argumentativa, descritiva, injuntiva,
dialogal);
(c) sociopragmática e discursiva, relacionada, por conseguinte:
• aos interlocutores;
• aos seus papéis sociais (por exemplo, pai/filho, professor/aluno,
médico/paciente, namorado/namorada, irmãos, amigos, etc., que envolvem
relações assimétricas e/ou simétricas);
• às suas motivações e aos seus propósitos na interação (como produtores
e/ou receptores do texto);
• às restrições da situação (instituição em que ocorre, âmbito da interação
(privado ou público), modalidade usada (escrita ou falada), tecnologia
implicada, etc.);
• ao momento social e histórico em que se encontram engajados não só os
interlocutores como também outros sujeitos, grupos ou comunidades que
eventualmente estejam afeitos à situação em que emerge o texto.
(d) cognitivo-conceitual, associada aos conhecimentos sobre o mundo –
objetos, seres, fatos, fenômenos, acontecimentos, etc. – que envolvem os
conceitos e suas inter-relações.
Dessa forma, orienta-se o ensino de Língua Portuguesa para a materialidade
do processo comunicativo, ampliando a função tradicional dos estudos gramaticais.
Segundo tais Orientações, há o risco de apropriação dos estudos
desenvolvidos para uma abordagem em sala de aula que se paute à mera
identificação e classificação dos fenômenos linguísticos num dado texto. O que se
tem nessa forma de abordagem dos fenômenos é a duplicação de práticas
classificatórias e prescritivas vinculadas às gramáticas pedagógicas tradicionais,
adotando-se apenas uma nova nomenclatura, agora vinculada à Linguística Textual,
às Teorias da Enunciação e/ou à Análise do Discurso.
44
Em relação ao ensino de Língua Portuguesa, entenda-se que os estudos
linguístico-gramaticais devem fazer parte da compreensão textual, já que
[...] a língua ocorre sempre em um contexto (cognitivo, cultural e social), é sensível
ao contexto (domínios culturais, sociais, psicológicos e textuais que penetram em
todos os níveis da linguagem), é sempre comunicativa (sempre endereçada a um
recebedor) e é projetada para a comunicação). Fica assentado que a língua é usada
(e, portanto, organiza estruturas) a serviço de metas e intenções do falante (que são
tomadas e realizadas em relação aos ouvintes), e é da organização dessas metas
que emerge a ação (ou a realização de ações) discursiva.
(NEVES, 2006, p. 25)
O fragmento acima citado mostra, por meio da visão funcionalista, de cunho
pragmático, a inter-relação entre os aspectos linguísticos e os discursivos, pois a
língua subsidia a materialidade comunicativa, é o instrumento por meio do qual a
interação verbal ocorre. Dessa forma, o aprofundamento de tal conhecimento
relacionado às práticas discursivas e aos textos em geral promoverá um indivíduo
proficiente no processo social e um leitor arguto dos textos veiculados.
O processo de ensino de Língua Portuguesa no Ensino Médio deverá
contemplar todos esses aspectos expostos, a fim de garantir capacidade crítica para
a vida adulta e o conhecimento necessário para a continuidade dos estudos,
incluindo a possibilidade de se candidatar a uma vaga para o ensino superior
público.
1.4 – A importância do ensino da leitura e de suas estratégias na escola
O acesso ao aprendizado da leitura apresenta-se como um dos múltiplos
desafios da escola e, talvez, como o mais valorizado e exigido pela sociedade.
Como afirma Foucambert (1994, p.123), o acesso à escrita é o único meio de
alcance da democracia e do poder individual, o qual ele define como “a capacidade
de compreender por que as coisas são como são” e que não se confunde com os
“poderes” permitidos ou facilitados pelo status social do indivíduo. Diferencia o
“Poder” dos “poderes”, dizendo que o primeiro permite ir além do que é evidente,
possibilitando a descoberta das relações por detrás das circunstâncias, situações ou
coisas, estando, portanto, ligado à transformação; enquanto os poderes encontram-
se na reprodução e na compreensão estática e não reveladora do real.
45
Ainda de acordo com Foucambert (1994), o acesso ao “Poder” só é possível a
partir da reflexão, distanciamento e teorização do real, ou seja, através de uma
atitude científica frente ao mundo, a qual, nos moldes da própria Ciência, favorece a
transformação da realidade. Segundo esse autor, no entanto, isso só é possível
através do acesso ao processo de produção do saber e não, apenas, por meio da
transmissão dos saberes, os quais são imbuídos de neutralidade e se apresentam
como objetos separados dos processos que os geram, promovendo a uniformidade
entre os indivíduos que a eles têm acesso.
Como, então, permitir o acesso ao poder e ao processo de produção dos
saberes? Será que apenas o acesso à escola, tão enfatizado e buscado pelos
projetos políticos atuais, tem garantido a possibilidade de acesso aos processos de
transformação do real?
Para Foucambert (1994), a escola atual continua pretendendo atingir o
objetivo de alfabetização para o qual é idealizada no período de industrialização da
sociedade e tem como propósito, apenas, favorecer o acesso dos trabalhadores aos
procedimentos e técnicas de leitura e escrita, com vistas ao aperfeiçoamento em
massa dessa ferramenta de produção para atender às exigências do
desenvolvimento do mundo do trabalho. Tais exigências se restringem ao
automatismo e à repetição das atividades, sem a necessária reflexão sobre elas ou
sobre suas implicações e consequências.
Desse modo, o acesso à escrita se dá estritamente por meio do ensino do
código, negando-se uma relação laboriosa, complexa e de domínio do indivíduo com
a escrita e a leitura, e privilegiando-se, em contrapartida, a homogeneidade dos
alunos, vistos como se estivessem todos em um mesmo estágio cognitivo e como se
pudessem desenvolver a habilidade de leitura ao mesmo tempo, a partir do treino de
suas diversas “habilidades componentes”, separadamente. Essa concepção de
alfabetização rejeita a ideia de que ler é uma atividade social e compartilhada, que
se desenvolve por meio da própria atividade de leitura e através da participação de
pessoas com competências variadas e com subjetividades diversificadas.
Percebe-se, na proposta de alfabetização imposta à escola e à sociedade
desde o século XIX, que são evitadas relações mais elaboradas entre o sujeito-leitor
e a escrita, fazendo-se desta um privilégio social de poucos, que se tornam leitores
em contraposição aos decifradores, vistos como os mal-sucedidos e
academicamente fracassados.
46
Apesar das pretensões sociais no século XXI serem outras, a escola ainda
continua respondendo a uma exigência que já não lhe é mais adequada. Esse
projeto de alfabetização não foi e não é suficiente para permitir a imersão na escrita,
para possibilitar a reflexão e para responder às questões que os indivíduos se
colocam para compreenderem si mesmos e a realidade em que se inserem.
Embora, hoje, existam outras mídias que permitem o acesso fácil às
informações necessárias para o viver no cotidiano, a escrita ainda se coloca como
um meio mais eficaz e fundamental de acesso à informação, oferecendo a
possibilidade de escolha e de liberdade face aos caminhos apresentados. Ao ler, o
indivíduo constrói os seus próprios significados, elabora suas próprias questões e
rejeita, confirma e/ou reelabora as suas próprias respostas. É ele quem inscreve ou
reinscreve o significado do escrito a partir de sua própria história.
Segundo Foucambert (1994; 1997), a escrita é o instrumento do pensamento
reflexivo e só o contato com ela pode favorecer o desenvolvimento de um
pensamento abstrato, complexo e de natureza diferenciada daquele permitido pela
linguagem oral. É a escrita que permite a construção de pontos de vista e de uma
visão de mundo e a atribuição de sentido ao mundo. Já a leitura busca esses pontos
de vista, verificando-os, questionando-os e investigando os meios de sua
elaboração. A leitura, entendida como uma atividade social e reflexiva, propicia uma
relação criativa, crítica e libertadora com a escrita, mostrando-se como um desafio
para qualquer processo de democratização e mudança social coletiva.
Smith (1999) e Solé (1998) defendem um ensino de leitura no qual se
aprende a ler praticando, onde o aprendiz pode estar em contato com os mais
diversos tipos de textos sociais dos quais precisa e se utiliza no cotidiano, e no qual
o único pré-requisito para esse aprendizado é a capacidade de questionar sobre as
coisas do mundo. Para ele, o saber-ler não se confunde com o saber-codificar, pois
o acesso ao código por si só não garante o “mergulho” nas malhas de significado do
texto e nem o desenvolvimento da capacidade de ver além do que é visível aos
olhos. Nesse sentido, a leitura é uma atividade para os olhos e não para os ouvidos,
querendo dizer, com isso, que a leitura não se restringe ao aprendizado das
correspondências letra-som, mas que o extrapola.
Segundo Solé (1998, p. 52), “ler não é decodificar, mas para ler é preciso
saber decodificar”. Baseada nesse pressuposto, a autora defende que o ensino do
código deve-se fundamentar em contextos significativos para a criança e não em
47
situações de ensino do código isoladas e descontextualizadas. Postula, ainda, que o
ensino deve partir das concepções iniciais que a criança constrói nas situações
sociais de leitura, fora da escola, e que lhe permitem pensar, por exemplo, que a
escrita diz coisas significativas.
Segundo a autora, é preciso que se mostre à criança o que precisa ser
construído por ela no âmbito do aprendizado da leitura. Solé (1998) defende que o
ensino da leitura deve ocorrer em todas as etapas de sua realização, ressaltando-se
o ensino de estratégias de leitura para cada uma dessas etapas: 1) antes: predições
iniciais sobre o texto e objetivos de leitura; 2) durante: levantamento de questões e
controle da compreensão e; 3) depois: construção da ideia principal e resumo
textual.
Nessa perspectiva construtivista, na qual a autora se insere, o ensino
constitui-se como uma ajuda proporcionada ao aluno para que ele organize a sua
aprendizagem, sendo o responsável por esse processo de elaboração de
conhecimento. O adulto tem o papel de orientar a criança, servindo-lhe de guia e
suporte para a sua aprendizagem, o que deve ser retirado paulatinamente, à medida
que a criança conquista a sua independência enquanto usuária da língua escrita.
Solé (1998) argumenta, no entanto, que o ensino da língua deve privilegiar o
desenvolvimento da habilidade metalinguística, o que possibilita o pensar sobre a
linguagem enquanto objeto de reflexão. Além disso, defende que é o
aperfeiçoamento desta habilidade que fornece um maior conhecimento sobre a
estrutura e o código da língua. É o contato com a escrita que permite continuamente
o desenvolvimento da habilidade metalinguística que, como em um sistema em
espiral, quando implementada, facilita o desenvolvimento da competência na leitura
e escrita.
Por outro lado, Foucambert (1994; 1997) e Smith (1999) afirmam que, em
relação à leitura, a responsabilidade do adulto (pais ou professores) é facilitar o
aprendizado desta atividade através do acesso da criança a uma variedade de
textos. Para os autores, as habilidades de leitura são desenvolvidas por meio da
imersão na escrita e na prática da leitura, não podendo ser ensinadas de maneira
isolada e descontextualizada das práticas sociais. Entende-se que os referidos
autores diferenciam a atividade de ensino baseada em métodos que dividem a
leitura em suas habilidades componentes, da atividade de orientação, na qual o
leitor experiente tem a função de tornar possível a aprendizagem da atividade.
48
Segundo tal proposta, o adulto, para facilitar a entrada da criança no mundo
da leitura e escrita, deve ler para ela, mostrando-lhe como se usam os escritos que
circulam no cotidiano, a fim de compreender os seus sentidos. Segundo Smith
(1999), a criança só é capaz de compartilhar de tal mundo quando compreende o
seu significado, sendo esse descobrimento e o descobrimento da diferença entre a
fala e escrita os dois insights necessários para o aprendizado inicial da leitura.
De acordo com Smith, o contato com a escrita significativa e funcional, como,
por exemplo, o contato com outdoors, placas, anúncios e embalagens, pode
favorecer o aprendizado da leitura. Acredita que só a prática de leitura proporciona o
desenvolvimento das habilidades que a compõem, não sendo elas possíveis de
serem diretamente ensinadas. Para ele, o significado precede a leitura da palavra
enquanto unidade específica, estando a compreensão, o núcleo da leitura, além das
palavras ou da informação visual.
Partindo de uma perspectiva mais política, Foucambert (1997) afirma que o
aprendizado da leitura é garantido quando se desvela ao seu aprendiz o poder de
transformação e mudança que apenas o escrito possui; um poder que é capaz de
livrar o sujeito-leitor das malhas da resignação, da obediência, da determinação e da
impotência, já que só esse tipo de relação com o escrito pode levá-lo a perceber o
mundo de uma outra perspectiva, permitindo-lhe a teorização da experiência
cotidiana e uma nova organização dos fatos.
É diante disso que o autor propõe um “Projeto de Leiturização
4
”, do qual não
só a escola e/ou os professores sejam os responsáveis, mas também outros
segmentos da sociedade, como a família, a biblioteca, as empresas e as
associações de bairro. Ele afirma que as transformações no âmbito das relações
entre o indivíduo e a escrita só podem ocorrer a contento, dentro da escola, se esta
for uma questão da comunidade e não, unicamente, da escola (FOUCAMBERT,
1994; 1997). O autor defende que a leiturização não se deve restringir aos já
leitores, mas alcançar, sobretudo, os não-leitores alfabetizados, que devido à
distância da escrita podem-se tornar novamente analfabetos, analfabetos funcionais
ou iletrados.
Foucambert (1994) enfatiza que, para que o projeto de leiturização se efetive,
faz-se necessário o surgimento de dois movimentos sociais: um de reinvenção da

4
Embora não dicionarizada, foi mantida a forma “leiturização”, conforme a tradução proposta por Bruno Charles
Magne.
49
escola e outro de desescolarização da leitura. Para que o primeiro se estabeleça,
deve ocorrer uma intervenção das instâncias e movimentos de educação popular.
Ainda para Foucambert (1994), os termos analfabetismo, analfabetismo
funcional e iletrismo não têm o mesmo significado. O analfabetismo diz respeito à
impossibilidade de compreender e reproduzir uma mensagem escrita simples,
enquanto que o analfabetismo funcional caracteriza-se por esta mesma
impossibilidade, porém envolvendo indivíduos com anos de escolaridade. Por fim,
define o iletrismo como o afastamento do indivíduo das redes de comunicação
escrita que pode levá-lo à perda dos saberes alfabéticos conquistados previamente.
Compartilhando de concepções semelhantes, Kramer (2001) também acredita
que o acesso à alfabetização (enquanto desenvolvimento de uma postura reflexiva
sobre a língua), à leitura e à escrita é um direito do cidadão e que, portanto, exige o
comprometimento com um projeto de sociedade que vise à democratização e à
justiça social. Defende que a escola não deve assumir sozinha as mudanças que
precisam ser efetivadas nessa área, argumentando ser necessário tanto o
desenvolvimento de um projeto econômico como o de um projeto de emancipação
cultural dentro e fora da escola, que favoreça o contato dos indivíduos com o bem
cultural produzido pela humanidade em todas as áreas do conhecimento.
Desse modo, parece propor um acesso às várias leituras, não apenas a do
escrito: a leitura da escultura, da pintura, do movimento, da dança, da fotografia, da
música, etc. Além da proposta de emancipação da cultura que expande os limites
geográficos da escola, Kramer (2001) salienta dois outros aspectos mais restritos às
ações dentro da escola, os quais Foucambert (1994), talvez devido à sua realidade
socioeconômica diferenciada da realidade brasileira, não traz para a discussão, por
dizerem respeito: 1) aos salários e condições dignas de vida e trabalho de seus
profissionais; 2) aos projetos de formação continuada dos professores. Ela acredita
que o professor mostra-se como o cerne desta mudança, apesar de não ser o
responsável único. Percebe-se que tanto Foucambert (1994) como Kramer (2001),
diferentemente de outras posturas, distribuem a responsabilidade de mudança da
escola e da aprendizagem da leitura com os vários setores da sociedade, aliviando a
escola e os professores do peso esmagador até então não compartilhado com seus
outros membros. Ambos, portanto, desmistificam a onipotência atribuída a essa
instituição e, especialmente, aos seus professores, quanto à mudança a ser
50
efetivada na escola e, consequentemente, na sociedade, via o acesso à
alfabetização e/ou à leiturização. (FERREIRA; DIAS, 2004)
No que se refere a Foucambert (1994), apesar de acreditar que a
transformação radical da escola não se efetiva por ela própria e pelos professores,
sob o risco de levá-la a um duplo fracasso (o da alfabetização e o da leiturização),
defende que os professores apresentem ações determinantes tanto dentro como
fora da escola, não esperando, de maneira passiva, que tal tipo de mudança seja
germinado na sociedade. Assim, para ele, o professor se torna uma peça
fundamental do processo, postulando que o mesmo pode engendrar o início da
mudança.
Foucambert (1997) sustenta que, como acontece com o leitor-aprendiz, é
necessário que o professor tenha acesso, em processo de formação inicial ou
continuada, ao poder da escrita para que possa colocar-se em uma posição que lhe
permita a construção de um novo ponto de vista em relação à atividade de leitura e à
sua natureza. Somente a aproximação do professor com a informação pertinente e,
portanto, com o escrito, lhe concede a liberdade de escolha sobre o que é possível
fazer em sala de aula. É essa informação teórica que permite ao profissional a
ampliação de sua percepção, via reflexão e distanciamento do real, e consequente
ampliação de sua ação. Para ele, formar-se professor é ter acesso aos instrumentos
que possibilitam a formação do leitor, compreendê-los, agir sobre eles e transformá-
los.
No entanto, não é isso que tem sido evidenciado em nossa realidade
educacional. A formação de professores por si só, hoje, não parece garantir esse
poder. Pelo contrário, o que se observa em cursos de formação de professores e em
professores em serviço é que a relação com a escrita e, portanto, com a leitura é
uma relação técnica, mecânica e, quase sempre, sem motivação e prazer. Em geral,
tem sua origem na história de vida familiar, social e acadêmica do sujeito-leitor.
Kramer (2001), por meio de uma análise da história de leitura de professores
com histórias de vida, idades e experiências acadêmicas variadas, ressalta a
importância de se implementar uma cultura de formação de professores na qual seja
possível dar aos profissionais uma nova chance de se tornarem leitores afetivos e
efetivos, tanto oferecendo condições de tempo e espaço (bibliotecas, salas de
leituras, grupos de estudo), como favorecendo, dentro dos programas de formação,
o contato com a literatura não de modo instrumental, mas como experiência do
51
prazer pelo belo, pelo artístico e pelo estético, a fim de fazê-los resgatar ou construir
o gosto pela leitura.
Smith (1999) e Solé (1998) acreditam que a resolução para o problema da
formação de leitores, dentro da escola, não está na disseminação de novos métodos
de ensino que, em geral, são elaborados por especialistas distanciados da realidade
da escola e da sala de aula. Ela está na mudança da concepção que o professor
tem sobre a leitura e que está na base de sua ação pedagógica e a orienta. Para
tanto, o professor precisa envolver-se com a leitura enquanto objeto de
conhecimento, compreendendo a sua natureza, os processos cognitivos nela
envolvidos e o modo como a criança aprende. Isso, por sua vez, exige um projeto de
formação de professores continuamente assistida, auxiliando-os no processo de
aproximação e exploração desse objeto, valorizando-se o seu saber pedagógico
prévio.
Como ressaltam Solé e Coll (1999), ao discutirem a concepção construtivista
de ensino, as teorias ou referenciais explicativos devem possibilitar ao professor a
análise e reflexão tanto sobre a realidade da escola como sobre a prática
pedagógica e as variáveis nela implicadas. Elas devem funcionar como um
instrumento que permite ao professor responder às questões levantadas durante o
processo de ensino e da aprendizagem, permitindo-lhe integrar as diversas
respostas em um todo coerente e significativo.
O referencial teórico ou explicativo precisa vincular também as considerações
a respeito de aprendizagem, cultura, ensino e desenvolvimento, levando em conta o
papel social da instituição escolar e sua repercussão sobre o sujeito individual.
Enfim, o referencial tem a função de facilitar ao professor a compreensão do porquê
dos fatos e sua explicação para além do que acontece no ambiente de sala de aula.
No caso particular do aprendizado da leitura, ele precisa compreender e explicar, por
um lado, como o sujeito aprende e o que é necessário para que aprenda e, por
outro, o que impede a elaboração de um projeto de leitura eficaz dentro da escola e
quais as repercussões do aprendizado ou da sua ausência sobre as transformações
sociais coletivas.
Ainda no que se refere ao papel fundamental do professor enquanto agente
de transformação do ensino da leitura, Cramer e Castle (2001), e Dwyer e Dwyer
(2001) enfatizam que a atitude positiva do profissional frente à leitura mostra-se
como um fator preponderante no desenvolvimento da habilidade entre os seus
52
alunos, incluindo-o no envolvimento afetivo e na motivação “permanente” para tal
atividade humana. Os autores postulam, ainda, que o âmbito afetivo desse ensino,
quando presente e estimulado dentro de sala de aula, pode favorecer a
aprendizagem do código sem dificuldade, permitindo, por outro lado, o surgimento
de uma atitude de comprometimento com a mesma atividade.
Assim como Foucambert (1994; 1997), Cramer e Castle (2001) e Dwyer e
Dwyer (2001) não restringem o aprendizado da leitura ao domínio do código, mas
defendem que ele se constrói na interação entre seres sociais de uma dada cultura,
tendo o professor um lugar especial no processo de construção do conhecimento.
Diferentemente do primeiro, os autores apostam na postura e crença do professor
como principal fator de mudança e transformação do aluno-leitor.
Além disso, eles se atêm à mudança psicológica, cognitiva e individual
possibilitada pela leitura e não à mudança coletiva e social, que, segundo
Foucambert (1994; 1997), só o contato estreito com a escrita pode desenvolver e se
efetivar. Verifica-se, também, que Dwyer e Dwyer (2001), contrariamente ao
defendido pelo primeiro autor, acreditam que a mudança educacional pode ser focal,
restringindo-se à sala de aula onde haja um clima de valorização pessoal e uma
perspectiva positiva frente à capacidade de cada um para aprender, cabendo ao
professor facilitar esse processo.
O professor apresenta-se como aquele que confere um modelo de leitura para
o aluno-leitor, servindo-lhe de espelho, especialmente quando os pais do aluno não
desenvolveram uma atitude positiva frente à leitura nem encorajam esse tipo de
atitude nos filhos. Segundo Nell (2001), que também ressalta o âmbito afetivo do
ensino da leitura, a escola deveria traçar e alcançar dois objetivos principais quanto
ao ensino: (1) aumentar o número de leitores capazes; (2) aumentar o número de
crianças e adultos que apresentem motivação e afeto frente à atividade, a fim de
torná-la satisfatória e frequente no decorrer da vida do indivíduo.
Apesar de acreditarem que os aspectos afetivos são relevantes para o
aprendizado da leitura, Cramer e Castle (2001) reconhecem, a partir de suas
experiências com professores norte-americanos, que os profissionais, mesmo tendo
consciência da importância de tal habilidade, têm pouco ou nenhum treinamento
nesse âmbito em particular. Desse modo, se o aspecto afetivo, como defendem os
autores, é o principal possibilitador de mudança do ensino e aprendizado da leitura,
53
então, falta ao professor a instrumentalização necessária para efetivação de sua
prática em sala de aula.
O que se verifica é que os programas de formação inicial do professor, assim
como os programas de formação continuada, mantêm-se privilegiando a formação
técnica e enfatizando o aspecto cognitivo em prejuízo do aspecto afetivo-emocional
desse profissional que, paradoxalmente, terá a responsabilidade de desenvolver o
ser integral e holístico.
Pensa-se, portanto, que a mudança deve partir de uma reestruturação dos
cursos de formação inicial e continuada de professores, em que o aspecto afetivo
seja resgatado, vivenciado e trabalhado, a fim de se possibilitar o autoconhecimento,
o controle das emoções, o desenvolvimento da sensibilidade e das habilidades de
saber ouvir empaticamente, saber respeitar as diferenças e saber observar.
Diante desse quadro, se ainda não existem programas de leiturização que se
estendam por toda a sociedade e se o professor ainda não tem recebido uma
formação afetivo-cognitiva desejável, qual o alcance da escola no âmbito do
aprendizado da leitura?
A escola não tem cumprido o seu papel no tocante à formação do aluno-leitor
maduro, crítico, competente e reflexivo e, portanto, na formação de cidadãos
críticos, como propõem os Parâmetros Curriculares Nacionais, de Língua
Portuguesa, de 1997. O que se observa é que a escolarização prolongada não se
mostra como fator suficiente para garantir o bom desempenho do indivíduo em
atividades de compreensão de leitura, como atestam as evidências obtidas através
de alguns estudos realizados com esse tipo de população (Marcuschi, 1985).
Costa (1998), por exemplo, ao investigar os processos cognitivos que
dificultam a compreensão de leitura de estudantes universitários, verifica que,
apesar de se diferenciarem quanto à memória de trabalho e, mais estritamente,
quanto ao domínio de conhecimento específico, os grupos de bons e maus
compreendedores de sua amostra não se diferenciam significativamente quanto à
tarefa de monitoramento, composta de dois textos com passagens inconsistentes. É
um dado interessante, visto que demonstra uma passividade dos leitores desses
dois grupos frente aos textos oferecidos para a realização da tarefa. Os estudantes
são divididos em grupos de bons (15 estudantes) e maus (15 estudantes)
“compreendedores”. Os do segundo grupo não apresentam uma postura crítica e
reflexiva, enquanto leitores, o que evidencia uma deficiência metacognitiva por parte
54
deles e, consequentemente, uma falha da escola, que parece não possibilitar a
reflexão sobre o texto e sobre a intenção do autor, impondo, muitas vezes, uma
única forma de ler e uma total submissão à autoridade do texto escrito. O estudo
ratifica a tese de Paulino e Cosson (2004) que indica a escola como a que evoca,
tradicionalmente, uma leitura legitimada pelo crítico, tomada por base pelo professor,
falhando por não trabalhar os aspectos discursivos, tão preconizado pelos PCNs.
Costa (1998) argumenta que o resultado pode indicar uma precária atividade
de leitura por parte do indivíduo, gerando dificuldades de compreensão. Como
consequência, o fato restringe o acesso a um maior número de conhecimentos e
desmotiva-o para atividades de leitura, constatando-se, portanto, um movimento
circular que leva ao fracasso. Isso parece indicar, também, que as condições reais
de leitura do indivíduo têm sido restritas. Já que a escola é um lugar onde
tradicionalmente circulam os mais variados tipos de texto e em que as mais variadas
formas de leitura podem ser suscitadas, evidenciando as condições de leitura da
escola não satisfatórias.
Outros estudos sistematizados e realizados com crianças do ensino
fundamental de 1ª e 4ª séries de escolas particulares e de metodologias distintas
(Archanjo, 1998); e com crianças de 3ª série de escolas particulares e de 4ª série de
escolas públicas demonstram que elas apresentam melhor performance sobre
questões literais quando comparada à performance sobre as questões inferenciais.
Esse tipo de resultado parece indicar que a escola não tem garantido o
desenvolvimento de habilidades inferenciais elaboradas e, portanto, o surgimento de
leitores maduros através da valorização da reflexão e da reconstrução do
conhecimento, perpetuando, ao contrário, a prática da leitura reprodutiva, calcada na
perspectiva empirista do conhecimento e, consequentemente, o desenvolvimento da
passividade, da falta de criatividade e de crítica do aluno-leitor.
Isso, por sua vez, explica o mau desempenho de alunos universitários nesse
tipo de atividade, já que a escola não tem possibilitado a construção de condições
para que, durante o “período de aprender a ler”, o aprendiz pratique e adquira as
estratégias necessárias para alcançar o estágio da leitura proficiente, marcada pela
autonomia do leitor.
Por outro lado, os resultados dos estudos de Archanjo (1998) e de Ferreira e
Dias (2004) demonstram que as crianças investigadas não falham em responder a
todas as questões inferenciais. As respostas inferenciais podem surgir como
55
respostas a questões literais, o que sugere a existência, entre essas crianças, da
capacidade de estabelecer relações de significado, podendo ser limitada pelo tipo de
conhecimento ou raciocínio exigido para a efetivação de cada inferência.
Tais estudos, infelizmente, não se restringem ao ensino fundamental. Os
relatórios de avaliação de ensino, como o SAEB e PISA, demonstram que a escola
não tem formado um leitor crítico. Segundo o SAEB/2001, mais da metade dos
alunos de 3º ano do ensino médio também apresentam dificuldades de realizar
inferências, executando melhor a leitura das informações explícitas.
Isso indica a necessidade de se proporem aos alunos atividades de leitura em
que eles possam perceber que o significado do texto a ser construído depende tanto
dos objetivos e das perguntas do leitor como da natureza do texto e de sua
macroestrutura. Como insiste Solé (1998), é importante e necessário que a criança
aprenda a utilizar as estratégias de leitura usadas pelo leitor maduro, a fim de que se
torne também um leitor eficiente e autônomo.
De acordo com a autora, as estratégias, assim como os procedimentos
(também chamados de regras, técnicas, métodos, destrezas ou habilidades),
definem-se como um conjunto de ações voltadas para execução de uma meta. Elas
têm a função de regular a ação do sujeito, já que lhe permitem avaliar, selecionar,
persistir ou mudar determinadas ações em favor de seus objetivos. Diferentemente
dos procedimentos (microestratégias), as estratégias (macroestratégias) possibilitam
a generalização de sua aplicação, ao mesmo tempo em que exigem a sua
contextualização para que sua aplicação seja efetiva.
As estratégias requerem tanto consciência dos objetivos perseguidos como
autocontrole em relação ao comportamento executado para o alcance do objetivo,
avaliando-o, supervisionando-o ou modificando-o.
As estratégias de leitura são capacidades cognitivas de ordem mais elevada e
intimamente ligadas à metacognição, que permitem uma atuação inteligente e
planejada da atividade de leitura, já que, enquanto ações metacognitivas, permitem
conhecer sobre o próprio conhecimento. Como indica Solé (1998), tal afirmação traz
contidas em si duas implicações: 1) as estratégias leitoras precisam ser ensinadas;
as crianças não nascem sabendo utilizá-las: “ensinam-se - ou não se ensinam – e se
aprendem – ou não se aprendem” (p. 70); 2) o ensino de estratégias leitoras deve
privilegiar o desenvolvimento de práticas que possam ser generalizadas a outras
situações e não se atenham a técnicas precisas, receitas infalíveis ou habilidades
56
específicas. Ensinam-se com ênfase na capacidade de metacognição: avaliação,
controle e flexibilidade de ações que serão mudadas em decorrência das situações
de leitura, o que implica dizer que conhecer um vasto repertório de estratégias é
menos importante do que saber utilizá-las. Conhecê-las não é o suficiente. A criança
precisa saber mobilizá-las e utilizá-las em face da variedade de situações de leitura.
Diante disso, a autora defende a retirada progressiva do suporte dado ao
aluno-leitor, até que ele alcance mais autonomia e possa controlar sua própria
aprendizagem. No entanto, não se explica o processo de interiorização desse
ensino.
Essa ideia é também defendida por Smith (1999). Apesar de não acreditar no
ensino da leitura, ressalta que a postura solícita do professor, diferentemente do que
se pensa, não favorece o desenvolvimento de um comportamento de dependência
ou espera por parte da criança, já que ela é capaz de negar a ajuda de outro mais
experiente quando se sente segura e com domínio sobre o conteúdo ou tarefa
explorada.
Palincsar e Brown (1984) também verificaram que o treinamento para o uso
de estratégias de compreensão mostra-se mais efetivo quando ocorre em situação
de reciprocidade entre uma criança com problemas de leitura e um adulto leitor
competente. Ao empregar o procedimento de reciprocidade, caracterizado pela
atuação de um adulto-modelo que guia o estudante na interação mais sofisticada
com o texto e com o qual reveza a responsabilidade de explorá-lo, as autoras
perceberam que as crianças paulatinamente adotavam as estratégias do adulto de
maneira cada vez mais sofisticada e independente, tornando-se mais capazes de
assumir a liderança do diálogo, demonstrando um papel ativo em detrimento da
passividade inicialmente apresentada.
Em estudos realizados em situação experimental e em situação de sala de
aula, Palincsar e Brown (1984) constataram o poder significativo desse tipo de
procedimento para favorecer a promoção da habilidade de compreensão e de seu
monitoramento. Verificaram que os alunos que participaram do treinamento
melhoraram seus resultados de compreensão em sala de aula e foram capazes de
transferir as habilidades conquistadas para outras tarefas, como a habilidade para
usar regras de condensação para sumarizar, habilidade para prever questões que
um professor poderia fazer em relação a um segmento de um texto e habilidade
para detectar sentenças incongruentes encravadas em passagens de prosas.
57
As autoras atribuem o sucesso do procedimento do ensino, primeiramente, ao
fato de o aprendiz ter acesso às estratégias utilizadas pelo leitor maduro, no
momento em que esse realiza a leitura, oferecendo ao primeiro um modelo eficiente
de atuação frente ao texto. Em segundo lugar, por ser uma situação interativa, esse
tipo de procedimento permite que o aprendiz revele o seu nível de competência,
permitindo ao leitor adulto fazer um diagnóstico imediato e atribuir um retorno
apropriado, de modo a favorecer os ajustes necessários.
Palincsar e Brown (1984) argumentam que, muito mais importante do que a
instrução para o uso das estratégias de predizer, questionar, sumarizar e clarificar,
que foram enfatizadas no estudo, a interação de co-responsabilidade entre o leitor
maduro (investigador ou professor) e estudantes mostrou-se como o ponto central
desse processo de aprendizagem e mudança - interação que está próxima das
situações naturais de aprendizagem em que o adulto se apresenta como guia ou
suporte do processo.
Não é a instrução direta e mecânica por si só que garante o aprendizado da
leitura e o uso eficaz de estratégias de compreensão leitora, mas o envolvimento
cognitivo e afetivo do aprendiz com a tarefa. O leitor-aprendiz precisa engajar-se
significativamente no processo de sua aprendizagem e o adulto leitor maduro (pais
ou professores) tem a função de facilitar e promover esse tipo de relação entre
aprendiz (criança ou adulto) e a construção do saber exigido pela leitura.
Ainda circula na escola, no entanto, a crença no treinamento de habilidades
como requisito básico da alfabetização, havendo ou uma ênfase na utilidade futura
da leitura e escrita como meios de ascensão social, ou uma desconsideração em
relação ao seu uso nas atividades práticas do cotidiano (Kramer, 2001).
Outro aspecto relacionado ao problema do ensino da leitura na escola diz
respeito à inexistência ou falta de funcionalidade de bibliotecas escolares. Quando
existem, ou o acervo é pobre e insuficiente e/ou o horário de funcionamento é
irregular e assistemático, dificultando o acesso de professores e alunos ao material
impresso e ao espaço de estudo e pesquisa. Faltam também bibliotecários para
administrar esse espaço e para coordenar, junto aos professores atividades que
incentivem o gosto pela leitura e a autonomia para o estudo e pesquisa (Silva,
1996).
Como objeto de conhecimento, a leitura precisa ser explicitada. Defende-se
que as estratégias de leitura devem ser ensinadas para que o leitor-aprendiz se
58
torne um leitor autônomo e competente. É fundamental esse ensino ocorrer em
situações contextualizadas e significativas, de modo que o aluno-leitor reconheça a
leitura como uma atividade social que permite a sua atuação no cotidiano e sua
inserção no mundo letrado, capaz de mudar o indivíduo e suas relações sociais,
favorecendo a possibilidade de transformações coletivas. Para que isso ocorra, faz-
se necessário enfatizar a importância da linguagem escrita, que pode começar a
partir de uma mudança no projeto político de escola e na concretização de uma
proposta social de leitura.
A escola, em relação ao aspecto social, carece de um desenvolvimento
metodológico mais claro e específico. As atividades de compreensão de texto, em
geral, não apresentam por parte do professor um objetivo claro.
Silva (1999) indica que a escola, ao lidar com a leitura toma uma postura
simplista. O autor levanta, a partir de suas pesquisas, algumas concepções
redutoras de leitura. A primeira delas é “Ler é traduzir a escrita em fala” (p. 12): a
leitura é reduzida à ação de oralizar o texto em voz alta. A segunda é “Ler é
decodificar mensagens” (p. 13): indica-se a passividade do leitor, mero recebedor da
mensagem. A terceira, “Ler é dar respostas a sinais gráficos” (p. 13): o autor a
relaciona ao esquema S (estímulo) – R (resposta), indicando a impossibilidade de
respostas diversas, somente a do professor ou a do material didático está correta. A
quarta é “Ler é extrair a idéia central”: o leitor tem a impressão de que sempre a
idéia central está explícita e presente, o que nem sempre ocorre, e é incapaz de
perceber as inter-relações entre as partes do texto. A quinta concepção é “Ler é
seguir os passos da lição do livro didático” (p. 14): o leitor é levado a realizar leituras
somente a partir de solicitações, não sendo cobrado dele uma posição ativa no
processo leitor. A última é “Ler é apreciar os clássicos” (p. 14): quanto à apreciação
dos clássicos, o autor defende a ideia da expansão para a vasta tipologia textual que
circula no mundo contemporâneo.
Para a mudança do contexto escolar, Silva (1999) propõe uma visão
interacionista da leitura: ler “é uma prática social de interação com signos,
permitindo a produção de sentido(s) através da compreensão-interpretação desses
signos” (p. 16). Para ele, as principais implicações da mudança de perspectiva é
conseguir formar cidadãos leitores que produzam novos significados para a vida
social através da criatividade, do posicionamento crítico e da cidadania. Além de
mudança de mentalidade, é necessário urgentemente estabelecer o currículo de
59
leitura ao longo das diferentes séries, sem redundâncias, permitindo “o planejamento
de uma sequência mais pedagógica – e menos improvisada – das competências de
leitura a serem praticadas junto aos grupos de estudantes ao longo das séries de 1º
e 2º graus” (p. 17), atuais ensino fundamental e médio.
Aguiar (2004), preocupada com a formação do leitor em ambiente escolar,
propõe “possíveis idades de leitura” (p. 25):
Pré-leitura: da fase da pré-escola ao período preparatório para
alfabetização, quando a criança desenvolve capacidades e habilidades
que a tornam apta à aprendizagem da leitura – construção de símbolos, o
desenvolvimento da linguagem oral e da percepção, relacionando imagens
e palavras; seus textos devem explorar mais a linguagem visual que a
verbal.
Leitura compreensiva: a fase do 2º e 3º anos do ensino fundamental, na
qual a criança começa a decifrar o código escrito e faz leitura silábica e de
palavras; os livros selecionados devem estimular a fantasia, criatividade e
o raciocínio do leitor iniciante.
Leitura interpretativa: do 4º ao 6º ano, o aluno evolui da compreensão
imediata à interpretação das ideias do texto, adquirindo fluência no ato de
ler; apresenta capacidade de ordenar e enumerar fatos e dados, causas e
consequências; volta-se ainda para temas de fantasia, explorando também
a realidade imediata que o cerca.
Iniciação à leitura crítica: do 7º ao 8º ano, o estudante atinge o estágio das
operações intelectuais abstratas, da formação da personalidade e da
inserção afetiva e intelectual na sociedade dos adultos; a “capacidade de
discernimento do real e a maior experiência de leitura favorecem o
exercício de habilidades críticas e permitem ao leitor não só interpretar os
dados fornecidos pelos textos”, como também se posicionar diante deles,
“organizando seus referenciais éticos e morais” (p.26), o que o leva a
questionar a realidade, ampliando sua dimensão social.
Leitura crítica: do 9º ano ao fim do Ensino Médio, quando o aluno elabora
seus juízos de valor e desenvolve a percepção dos conteúdos estéticos; a
busca da identidade individual e social e o maior exercício da leitura levam
60
à postura crítica diante de textos, através de comparações de ideias, da
conclusão, da tomada de posições.
A exposição de Aguiar mostra que o aluno, ao entrar no Ensino Médio, já está
em processo de desenvolvimento da criticidade. Os relatórios e estudos nos
mostram que há um grande atraso em relação à formação do leitor em nossa
sociedade. A escola, ao não cumprir as etapas anteriores de formação do leitor,
transforma o egresso da educação básica em uma pessoa incapaz funcionalmente
de se posicionar na sociedade, de perceber os discursos que a envolvem,
permanecendo à margem do processo social.
É necessário investir rapidamente na capacitação dos professores para que
eles possam ser leitores-guia do processo afetivo-cognitivo de leitura nas séries
iniciais, devendo o aluno estar exposto a uma grande variedade de textos,
desenvolvendo a capacidade leitora conforme as etapas e capacidades.
Como isso ainda está longe da nossa ampla realidade, é necessário
estabelecer um currículo prático para desenvolvimento da capacidade leitora. Em
muitos documentos e artigos, como nos PCNs, lemos a necessidade de formar um
leitor crítico, mas tal conceito não apresenta clareza nem objetividade.
A metacognição é fator necessário para que o leitor, ao fim do processo
escolar, tenha gestão sobre os seus recursos cognitivos para a produção de sentido
dos textos. Desenvolver tal capacidade é fundamental para a não-automatização
dos processos, conforme indicam os estudiosos da leitura. Ter gestão do processo
leitor é fundamental para a boa realização de tarefas, como os exames vestibulares
já que as provas verificam as habilidades e competências. O controle e seleção do
conhecimento prévio por parte do candidato em uma memória de trabalho faz parte
da necessidade cognitiva para a elaboração da resposta discursiva. Torna-se, então,
necessário que o trabalho sobre a leitura nas escolas introduza aspectos relativos à
explicitação de estratégias e à metacognição envolvida em todo o processo.
61
2 A LEITURA
A leitura tem sido alvo de preocupações em âmbitos variados: casa, escola,
sociedade, etc. Em todos eles, parece haver a certeza de que isso modifica a
capacidade de produção de sentidos e de conhecimento. Podemos lembrar as
campanhas governamentais e não governamentais sobre a necessidade de “ler”,
aperfeiçoar “a leitura”. A maior parte delas volta-se para o ensino fundamental,
momento importante da formação do leitor, por entender que a capacidade leitora
depende também das fases de desenvolvimento (AGUIAR, 2004).
Apesar de, hoje em dia, o termo “leitura” ser bastante veiculado, apresenta
polissemia, nem sempre percebida (ORLANDI, 1996b). Usa-se o termo para
designar uma série de “conceitos implícitos” (decodificação da língua, compreensão
de sentidos, dentre outros). O processo de leitura é realizado por um leitor em
determinadas condições (tempo, sociedade, cultura, etc.), que o influenciam. Ele,
enquanto sujeito, inscrito em dada situação, poderá produzir sentidos particulares
e/ou polissêmicos, pertinentes ao seu repertório cultural. A produção da leitura
entrelaça aspectos contextuais com traços particulares e de subjetividade do leitor
(ORLANDI, 1996a, 1996b). Toda leitura envolve “projeto de compreensão”
(propósito para a leitura, sua finalidade) e processo de interpretação (leitura a partir
de paradigmas ou teorias sedimentadas no repertório do leitor), que condicionam a
produção de sentidos (SILVA, 1999).
O ato de ler não se inscreve somente ao âmbito escolar, mas tem nele a
tentativa de incorporação do hábito, das habilidades e dos conhecimentos
necessários para a construção de um repertório para o leitor. Na escola, aumentam-
se as iniciativas de leituras extracurriculares e de acessos a bibliotecas, para que os
educandos possam “ampliar”/“desenvolver” sua capacidade de leitura. Essas
iniciativas têm maior força no ensino fundamental. No Ensino Médio, a preocupação
com a leitura, em geral, segue o percurso dos textos literários clássicos. Nesse tipo
de leitura, há a condução dos alunos a percorrerem os caminhos de leitura dos
críticos e/ou professores (PAULINO; COSSON, 2004).
A compreensão de texto no Ensino Médio liga-se à ideia de percurso, quando
se amadurece a capacidade crítica. Nesse estágio, trabalha-se para ampliar a
62
capacidade de ler, compreender textos os mais variados, percebendo a sua
organização, estratégias discursivas, etc.
As inferências, para a leitura nesse nível, são muito importantes. No processo
de compreensão, elas integram conhecimentos/habilidades do leitor em sua relação
com o texto. Para compreendê-lo adequadamente, é necessário relacionar ideias
explícitas com outras implícitas, acrescidas do conhecimento de mundo do leitor
(TEBEROSKY, 2003).
A formação do leitor deve considerar sua autonomia futura. Em geral, o
aspecto diferencial na leitura é admitido por haver sujeitos com histórias e
experiências distintas. No contexto do vestibular, a multiplicidade de possíveis
leituras leva a uma grande variedade de respostas, o que se torna problemático, já
que é necessário prever as respostas para que haja correção dentro do tempo
estabelecido pelas Comissões de Vestibulares das Universidades.
Britto (2004) estuda a relação do Ensino Médio (antigo secundarista) com o
vestibular. Nota que, desde os anos 1950, tal nível é afetado pelos programas dos
vestibulares, que, de fato, vão nortear o programa de ensino dos colégios. Passa a
ser o Ensino Médio uma preparação para os vestibulares, tomando, como fim, o que
seria consequência de aprendizagem. Como vimos anteriormente, a relação é
histórica e muito anterior aos anos 1950. A nossa posição na tese é a de que o
vestibular não é o oposto a um processo de aprendizagem. Em nossa prática com
alunos de escolas particulares do Rio de Janeiro, percebemos que é possível, com
uso das provas de vestibulares, melhorar o tipo de leitura por meio de estratégias. É
importante deixar claro que a posição defendida não exclui o processo mais amplo
da formação do leitor e do seu acervo.
A leitura tem sido objeto de estudo interdisciplinar, acumulando inúmeros
estudos, que partem de áreas e de modelos diferentes para a compreensão desse
fenômeno. Ferreira (2001), em A pesquisa sobre leitura no Brasil – 1980-1995,
mostra isso com base nas dissertações de mestrado e teses de doutorado
realizadas no período. Tais trabalhos estavam nas seguintes áreas: Biblioteconomia,
Comunicação Social, Educação, Letras, Física, Psicologia. Seus focos foram:
desempenho; proposta didática/análise do ensino; leitores: gostos, hábitos, histórias;
professor/bibliotecário como leitor; texto de leitura; memória de leitura/leitor/livro;
concepção de leitura.
63
Como nosso propósito é, dentre outros, compreender o processo de leitura
que envolve especificamente a realização de provas discursivas de vestibulares,
trabalharemos com duas explicações próximas: uma, de cunho cognitivista, ligada
ao campo da Inteligência Artificial, que busca explicar o processo leitor por modelos
de processamento; e outra, já com aplicações ao texto, mais próxima do ambiente
acadêmico de Letras e, por consequência, organizadora da perspectiva linguístico-
textual-discursiva.
2.1 – A leitura: uma abordagem estratégica
Nas pesquisas realizadas, encontramos Leonor Lencastre (2003), que
trabalha com esquemas de compreensão de texto. Sua fundamentação busca o
funcionamento cognitivo, ligado ao conhecimento prévio. A testagem de suas teorias
se faz no campo da Inteligência Artificial, possibilitando a verificação, por meio de
processamento em computadores, da validade de suas propostas.
A autora faz também uma revisão da literatura ligada à área e que
fundamenta sua posição teórica. Ela aponta que, desde os anos 70, a questão da
compreensão de texto é estudada com intensidade por várias disciplinas das
Ciências Humanas e Sociais. As raízes históricas dessa problemática localizam-se
anteriormente, “podendo-se falar de modelos estruturais do texto, como é o caso da
poesia e do drama, com mais de dois mil anos” (p. 12).
Os estudos sobre a linguagem humana na área da psicologia influenciam
bastante a visão sobre a compreensão da leitura. Chomsky, em 1959, faz uma
crítica à teoria de Skinner de 1957. Na visão behaviorista, a linguagem consiste na
associação de palavras ou classes de palavras, que, por sua vez, formam séries de
palavras. Essa visão da Psicologia é contestada por Chomsky que defende a
importância da estrutura sintática na organização da língua e, consequentemente,
na produção de sentido. Tal reformulação possibilita novo rumo para as pesquisas
ligadas ao processamento de informações/textos, desenvolvendo significativamente
o campo da Inteligência Artificial.
Lencastre (2003) aponta, como a visão mais atual dos estudos sobre o
processo de compreensão de textos, o “processo construtivo, fruto da interacção de
dois grandes grupos variáveis, inerentemente mais ligadas ao leitor ou ao texto”,
sem esquecer “os condicionalismos da situação particular de leitura” (p. 97). A
64
compreensão depende de duas grandes fontes de informação: a informação
corrente, recebida do texto, e a informação armazenada, memorizada pelo leitor. A
todos os níveis do “processo de compreensão (codificação de palavras, análise
sintática, semântica, análise da situação referida no texto)” se pode afirmar a
existência de “uma interacção entre o processamento dos estímulos físicos,
orientado pelo texto, e o contexto fornecido por variáveis mais ligadas ao leitor” (p.
98), como o conhecimento prévio (particular para cada leitor).
Relativamente aos principais fatores pertencentes ao leitor, pode-se mencionar
o conhecimento prévio, a perspectiva, os interesses e as atitudes, a capacidade
cognitiva, o objetivo da leitura, as estratégias e estilos de processamento da
informação textual.
Segundo uma visão construtivista da compreensão de textos, o conhecimento
prévio do leitor é determinante para a compreensão. Os leitores são capazes de
entender informação, à medida que a podem assimilar ou representar, tendo como
referência o seu próprio conhecimento (LENCASTRE, 2003).
A perspectiva, os interesses e as atitudes do sujeito influenciam na
compreensão do conteúdo do texto. A perspectiva pode ser definida como o
contexto prévio que indica o conteúdo global do texto. Alguns estudos, segundo
Lencastre (2003), demonstram que a perspectiva do leitor influencia fortemente a
evocação de um texto. Quando se pede aos sujeitos para mudarem de perspectiva
para fazerem uma segunda evocação (sem relerem o texto) os sujeitos produzem
significativamente mais informação, que é importante para a segunda perspectiva,
mas não para a primeira. Parece que evocam mais informação, quando esta é
relevante para a perspectiva assumida. Dessa forma, percebe-se que a
compreensão varia de acordo com o enfoque dado pelo leitor. A perspectiva, a
nosso ver, poderá ligar-se diretamente ao objetivo de leitura e às estratégias
utilizadas no texto-prova do vestibular.
Lencastre (2003) apresenta o estudo de Anderson, Reynolds, Schallert &
Goelz, realizado em 1977, no qual se verifica que os interesses dos leitores afetam
profundamente a forma de interpretar. Outro trabalho apresentado pela autora é o de
Dutta e Kanungo, em 1975, percebendo-se que se obtêm melhores resultados, em
testes de memória, para informação com uma avaliação positiva do que para
informação com uma avaliação negativa, levando em conta as opiniões do sujeito,
ou seja, o leitor lida mais facilmente com textos com os quais concorda e que
65
acrescentam ao seu acervo.
Outra hipótese muito testada é a de que a informação do texto, congruente
com as opiniões e atitudes (organização das opiniões em formas mais complexas)
dos leitores, é mais evocada. Também se verifica que a evocação pode induzir ao
erro, quando os sujeitos lêem textos que contradigam suas expectativas.
As atitudes do leitor e o seu conhecimento podem ser vistos como partes do
mesmo sistema. A atitude parece ser responsável pelo resultado do processo de
compreensão, quando a informação processada é relativamente simples e
consistente com as expectativas. O conhecimento e as atitudes constituem fatores
importantes no desenvolvimento de uma leitura apropriada dos conteúdos do texto,
sendo a contribuição relativa de cada um desses fatores uma função da relação
entre os conteúdos do texto e o conhecimento do indivíduo e as suas expectativas
(LENCASTRE, 2003).
Na proposta da nossa tese, o vestibulando não encontrará obrigatoriamente
posições com as quais concorde; terá de trabalhar com textos de variados pontos de
vista. Os interesses e atitudes do leitor não serão, no momento da realização da
prova, relevantes; necessário será perceber o encaminhamento dado,
independentemente de suas opiniões. Do ponto de vista da seleção, não trabalhar
diretamente com suas posições é importante, já que, ao ingressar no ensino
superior, precisará adquirir conhecimentos diversos, de variadas fontes,
necessitando rever/testar os adquiridos, o que pode levá-lo a quebras de
expectativas e reformulação de posições anteriores.
Relativamente à capacidade cognitiva, pode-se falar num conjunto de
capacidades básicas do sistema de processamento de informação, que, de uma
maneira geral, são relativamente insensíveis a intervenções de aprendizagem, nas
quais se inserem, por exemplo, a capacidade da memória operatória e a rapidez da
ativação dos conceitos. Percebe-se a capacidade geral de leitura como um conjunto
de competências, algumas das quais se encontram mais voltadas para a
decodificação da informação e outras para a sua compreensão (SMITH, 1988). Algu-
mas das competências de compreensão, que para alguns devem ser encaradas
mais como estratégias de processamento de informação são, por exemplo, a
determinação da importância da informação, a sumarização da informação, a
realização de inferências, a realização de questões e o controle da compreensão
durante a leitura.
66
As competências de compreensão são fundamentais assim como a capacidade
operatória e a rapidez da ativação de conceitos. As provas de vestibulares são
organizadas com a indicação de tempo máximo para a realização de tarefas, logo a
capacidade de operação e o seu tempo são fatores que infuenciam nos resultados
da realização dessa tarefa.
A maior parte das investigações sobre as diferenças individuais na capacidade
geral de leitura analisam um único fator de cada vez, comparando sujeitos com
diferentes capacidades de leitura. Para além do nível da palavra, os sujeitos com
baixa capacidade de leitura também têm dificuldades no processamento da estrutura
sintática das frases e em processar dispositivos linguísticos, tais como anáforas,
mantenedoras da coesão entre frases sucessivas, e em realizar inferências
relevantes a partir do conteúdo do texto. Para os sujeitos com baixa capacidade
geral de leitura, a decodificação da palavra é muito importante, enquanto que os
sujeitos com elevada capacidade de leitura centram-se na compreensão do texto.
A memória também aparece como outro fator importante. Como a memória
humana é limitada, o leitor, em geral, dirige a sua atenção para o texto de forma
seletiva. Essas limitações de processamento são especialmente críticas para os
jovens leitores, pois muitas competências necessárias ainda não foram bem
apreendidas e, por isso, exigem-lhes muita atenção.
O objetivo que o leitor tem em mente influencia o processo de leitura. De
maneira geral, o objetivo principal da leitura é a compreensão do conteúdo, havendo
outros, como o de memorizar, resolver problemas, sumarizar ou simplesmente ler
por prazer, buscar a fruição do texto. Se busca compreender objetivamente o texto,
o leitor centra a atenção no que reterá. Se o interesse é estético, foca sua atenção
nas sensações, imagens e sentimentos. É a tarefa que estrutura a atividade do
leitor, para a qual ele utilizará determinada estratégia de leitura.
Lencastre (2003) resgata um estudo de 1985, realizado por Horowitz, sobre a
leitura de textos científicos. Verifica-se em tal estudo que o treinamento de sujeitos
para o reconhecimento de padrões do tipo de texto não é suficiente para se atingir
os resultados esperados. Além disso, foi necessário treiná-los “na forma como se
espera que manifestem o seu conhecimento sobre esses padrões, ou seja, de forma
a poderem utilizá-los estrategicamente” (p. 105). Outro estudo relacionado à
pesquisa foi realizado por Carrel, também em 1985, que concluiu: o “treino sobre a
forma de reconhecer e utilizar a estrutura de nível superior parece melhorar a
67
evocação de materiais textuais, ao passo que o mero reconhecimento dessa
estrutura de nível superior parece não ter influência na totalidade da informação
evocada” (p. 105). Por fim, um terceiro estudo que segue a mesma linha de
investigação, realizado por Cook e Mayer, em 1988, apresenta efeitos positivos na
identificação de nível superior de textos expositivos, quando lhes são ensinadas
estratégias para focarem sua atenção nesse tipo de estruturas.
As estruturas de texto “de nível superior” são equivalentes ao conceito de
macroestrutura proposto por Van Dijk (1980), que o define como: estrutura especial
global, de natureza semântica, uma representação abstrata de estrutura global de
significado de um texto; proporciona a ideia global do significado, o que permite dizer
do que trata o texto. Segundo o autor, uma comprovação disso seria a produção de
resumo por parte de diferentes pessoas, pois, apesar de diferenças da elaboração,
seguem-se as mesmas macrorregras, que permitem acesso à macroestrutura
textual, criar resumos e hierarquizar informações (abordagem global partes). O
texto é uma estrutura, na qual, no nível superior, há uma proposição que dá conta do
tema do texto; no nível inferior, há proposições “menores”, relativas aos detalhes;
entre os dois níveis, relacionando-os estaria as macroproposições. Os problemas de
compreensão de texto podem ser atribuídos à incapacidade de os leitores
acessarem a essas à macroestrutura sem estratégias devidas de identificação de
ideias principais e resumo (VAN DIJK, 1996).
Refletindo sobre a proposta de Van Dijk, mais antiga, à de Lencastre,
percebemos a indicação da necessidade, apesar da criação de modelos distintos
para o fenômeno de compreensão, de haver estratégias para o processo de leitura.
Além disso, é necessário também saber operar com o texto, dependendo do
objetivo, relacionando partes ao todo, percebendo os processos de construção de
sentidos na leitura.
2.2 A construção do sentido: aspectos linguístico-discursivos
No percurso dos estudos linguísticos, concebe-se a linguagem de diversas
maneiras. Nesta seção, apresentamos a concepção de linguagem que norteia a
pesquisa e, por conseguinte, as de sujeito e texto que dela decorrem.
Koch (2000) esclarece que as concepções de sujeito e de texto derivam do
conceito de linguagem adotado. A autora apresenta as principais concepções
68
desses elementos do discurso, conforme explicitado a seguir.
A primeira considera a linguagem como representação do pensamento: o
homem representa o mundo para si por meio de linguagem e, também por meio
dela, transmite essa representação para o outro. Assim, a expressão se constrói no
interior do pensamento e sua exteriorização é apenas uma tradução (TRAVAGLlA,
2005).
A concepção de sujeito que decorre dessas ideias é a de sujeito psicológico,
que se caracteriza por ser individual no ato de se expressar. Ele constrói uma
representação mental por meio da linguagem e imagina que ela seja captada pelo
interlocutor da maneira como foi mentalizada, considerando-se o único responsável
pelo sentido de seus textos. Compreende-se o texto, nessa ótica, como um produto
lógico do pensamento. Na verdade, trata-se apenas da materialização em palavras
de uma representação mental.
A segunda concepção compreende a linguagem como estrutura, ou seja,
como um código, um conjunto de signos que se combinam segundo algumas regras
(TRAVAGLlA, 2005). O código linguístico, por si só, é capaz de transmitir
mensagens, desde que os sujeitos da comunicação o dominem.
O sujeito é considerado de um ponto de vista de assujeitamento diante do
sistema, caracterizado por uma espécie de não-consciência e não é dono de seu
discurso ou de sua vontade. Sua consciência, quando existe, é produzida pelo
mundo exterior. Conforme explica Koch (2000), quem fala, na verdade, é um sujeito
anônimo, social, em relação ao qual o indivíduo que, em dado momento, ocupa o
papel de locutor é dependente, repetidor. O texto é considerado como um simples
produto da codificação de um locutor a ser decodificado por um interlocutor.
A terceira concepção trata a linguagem como processo de interação.
Travaglia (2005, p.23) destaca que
o que o indivíduo faz ao usar a língua não é tão-somente traduzir e exteriorizar um
pensamento, ou transmitir informações a outrem, mas sim realizar ações, agir,
atuar sobre o interlocutor (ouvinte/leitor). A linguagem é pois um lugar de interação
humana, de interação comunicativa pela produção de efeitos de sentido entre
interlocutores, em uma dada situação de comunicação e em um contexto sócio-
histórico e ideológico.
Na concepção interacional da linguagem, o sujeito é compreendido como
uma entidade psicossocial que participa ativamente do evento comunicativo em que
69
se insere. Em outros termos, os sujeitos “(re)produzem o social à medida que
participam ativamente da definição da situação na qual se acham engajados, e são
atores na atualização das imagens e das representações sem as quais a
comunicação não poderia existir” (KOCH; TRAVAGLIA, 1999, p.15).
O texto, por sua vez, é o lugar da interação, e sua compreensão deixa de ser
considerada como mera captação de representações mentais ou como simples
decodificação de mensagens. A produção de sentidos constitui, por conseguinte,
uma atividade altamente complexa, na qual o produtor do texto possui um projeto
de dizer e se vale de estratégias para concretizar sua intenção comunicativa. O
interpretador, por outro lado, insere-se com uma participação ativa nesse processo
e parte de pistas e sinalizações que o texto oferece. Para Koch e Travaglia (1999,
p.17),
o sentido de um texto é, portanto, construído na interação texto-sujeitos (ou texto-
co-enunciadores) e não algo que preexista a essa interação. Também a coerência
deixa de ser vista como mera propriedade ou qualidade do texto, passando a dizer
respeito ao modo como os elementos presentes na superfície textual, aliados a
todos os elementos do contexto sociocognitivo mobilizados na interlocução, vêm a
constituir, em virtude uma construção dos interlocutores, uma configuração
veiculadora de sentidos.
Adotamos a concepção de língua como lugar de interação, por entendermos
que tanto as atividades de produção textual quanto as de leitura dependem do
diálogo que se estabelece entre autor e leitor em um determinado evento de
comunicação. Especificamente em relação à leitura, consideramos que o ato de ler
se constitui em um processo no qual o leitor realiza um trabalho ativo de construção
de sentido, considerando, nesse momento, algumas estratégias para estabelecer
os sentidos do texto. Dessa forma, ele também se torna um sujeito, um co-autor no
texto (LEFFA, 1996; KATO, 2007; ORLANDI, 1996a, 1996b).
2.2.1 - Interação texto e leitor
A concepção de língua e texto que se adota no presente trabalho permite
afirmar que há uma interação entre o leitor e o texto. A interação que se estabelece
entre o texto escrito e o leitor difere daquela estabelecida entre duas pessoas
quando conversam. Na última situação, estão presentes, além das palavras, outros
70
elementos, como gesticulação, expressão facial, entonação da voz, que dão
sentido à fala. No texto escrito, o autor não está presente para completar as
informações e, por isso, é natural que o leitor faça uso de estratégias para, a partir
do que o texto traz, complementar, enquanto lê, informações não explícitas.
Diante de tais constatações, Brandão (1998) argumenta que o processo de
leitura é abrangente e complexo, privilegiando-se a capacidade de interação do
leitor, ou seja, sua capacidade de dialogar com o outro por meio da palavra.
Consequentemente, a leitura de um texto não se compreende, conforme
mencionamos, como um ato passivo, já que seu autor escreve pressupondo a
presença de alguém que o lerá. O sentido de um texto só se concretiza no momento
em que o lemos e, nessa perspectiva, a autora pondera:
o texto, na sua superfície linguística, não diz tudo objetivamente. Em graus
diferentes de complexidade, um texto é sempre lacunar, reticente. Segundo Iser,
apresenta 'vazios' - implícitos, pressupostos, subentendidos - que, enquanto espaço
disponível para o outro, devem ser preenchidos pelo leitor. A operação do leitor
para pôr em funcionamento o texto é, portanto, uma atividade cooperativa de
recriação do que é omitido, de preenchimento de lacunas, de desvendamento do
que se oculta nos interstícios do tecido textual.
(BRANDÃO, 1998, p.198-199)
Brandão também destaca que o trabalho de recriação realizado pelo leitor se
configura dentro de alguns limites e se fundamenta em alguns fatores, tais como:
um sistema linguístico comum ao locutor e ao interlocutor;
a existência de conhecimentos relevantes para a compreensão do texto;
a pressuposição de que há uma coerência temática presidindo a
construção do texto;
o reconhecimento de contextos situacionais.
A compreensão de um texto somente é possível, portanto, se o leitor possuir
previamente algum conhecimento do qual partir para processar as informações
contidas no texto. Para compreender um texto, como observa Kintsch (1990), o
leitor precisa estabelecer relações entre elementos de informação diferentes: o
conteúdo expresso pelo texto e seus conhecimentos prévios.
A leitura é o resultado da interação entre o que o leitor já sabe e o que ele
retira do texto. Desse ponto de vista, os conhecimentos prévios do leitor assumem
a mesma importância que as informações contidas no texto.
71
No que se refere à compreensão textual, decorrente da interação texto e
leitor, enfatizamos que, para que ela se estabeleça, o leitor lança mão de algumas
estratégias: ativação de conhecimentos prévios, estabelecimento de
intertextualidade e reconhecimentos de aspectos relacionados aos implícitos que se
configuram no texto. As estratégias ocorrem a partir dos conhecimentos prévios do
leitor, linguísticos, gerais e de outros textos, com o reconhecimento do contexto que
envolve a situação comunicativa e com raciocínio baseado nesses elementos.
Dizemos que, na leitura, estão envolvidas estratégias linguísticas e cognitivas,
utilizadas na construção de sentidos.
Com o propósito de compreender a interação texto e leitor, vários estudiosos
se dedicam à análise e teorização do texto e do discurso. Beaugrande e Dressler
(1981) postulam a existência de alguns fatores para que o texto cumpra seu papel
social, o de propiciar a comunicação entre sujeitos envolvidos no processo de
leitura. Tais fatores são os princípios de textualidade e compreendem: a coesão, a
coerência, a intencionalidade, a aceitabilidade, a informatividade, a situacionalidade
e a intertextualidade.
O conhecimento dos aspectos ligados à textualidade é um elemento de
fundamental importância para o processo de leitura. Dos elementos propostos pelos
autores acima, são bastante explorados nas provas de vestibulares, principalmente,
a coesão, a coerência e a intencionalidade. A situacionalidade, a intertextualidade e
a informatividade são elementos que promovem, juntos com os que já destacamos,
a construção do sentido do texto.
Para se tornar uma pessoa crítica, o egresso do ensino médio deve ser
capaz de conhecer, monitorar e controlar os seus processos de significação, não
funcionando por mero automatismo. A metalinguagem e a metacognição são
fatores que auxiliam a promoção da autonomia do indivíduo. Dessa forma, a
interação do leitor com o texto deve levar em consideração vários conhecimentos
prévios para que a textualidade seja estabelecida.
2.2.2 - Conhecimento prévio
Para Kleiman (1999), a compreensão de um texto somente é possível se o
leitor possuir previamente algum conhecimento do qual parta para processar as
72
informações. A autora ressalta que só se compreende o que não se conhece
quando se estabelece uma relação com algo já conhecido. Em consequência, como
ressalta Cabral (2005), o leitor precisa estabelecer relações entre elementos de
informação contidas no texto com os conhecimentos armazenados em sua
memória, pois são as relações entre o conhecido e o novo que permitirão a
construção de sentidos.
Kleiman (1989) indica que o conceito de conhecimento prévio engloba
diferentes tipos de conhecimento: a) os que se referem à língua e seu
funcionamento, aos textos e suas estruturas, ao mundo em geral e à especificidade
da situação de comunicação; b) os que se referem aos conhecimentos adquiridos
por meio das experiências pessoais do leitor. A ativação de todos eles permite ao
leitor transformar uma estrutura isolada e fragmentada na memória numa entidade
mais completa e coerente.
Van Dijk (2002) propõe um modelo estratégico de processamento de
discurso, de base interdisciplinar, que parte de pressupostos cognitivos e
contextuais. Consideramos que esse modelo pode auxiliar na compreensão das
estratégias utilizadas pelo leitor no processo de interação com o texto, uma vez
que, assim como os aspectos linguísticos, os cognitivos e os contextuais também
são fundamentais na construção de sentidos.
No que se refere aos pressupostos cognitivos, o autor os classifica em:
construtivista, interpretativo, on-line, conjetural e estratégicos.
O pressuposto construtivista parte da ideia de que construímos
representações na memória com base em informações visuais e linguísticas. Então,
tanto as pessoas que presenciaram determinado fato quanto àquelas que apenas
ouviram o relato do mesmo fato são capazes de construir representações mentais
acerca dele. São capazes também de ativar essas representações durante a leitura
de um texto. Nesse sentido, o pressuposto construtivista constitui um conhecimento
prévio.
O pressuposto interpretativo, por sua vez, considera que as pessoas não
apenas representam os dados visuais e verbais, mas também os interpretam. Van
Dijk considera, principalmente, os aspectos semânticos do discurso.
O pressuposto on-line fundamenta-se na ideia de que a construção da
representação de um fato qualquer e, em particular, de seu significado, ocorre
simultaneamente ao processamento da informação.
73
Já o pressuposto conjetural enfatiza que nossas experiências prévias são
importantes para o processamento de informações. Para que o processo de
interpretação se efetive, considera-se necessária a ativação de informações mais
gerais sobre os fatos, bem como de informações cognitivas relacionadas às
crenças, opiniões ou atitudes. Esse pressuposto constitui também um
conhecimento prévio ativado durante a leitura.
Por fim, o pressuposto estratégico considera que processamos as
informações de forma estratégica, de acordo com nossas intenções ou objetivos. O
autor argumenta que “os acontecimentos não são compreendidos in vácuo, mas
como parte de situações ou contextos sociais mais complexos” (VAN DIJK, 2002,
p.15). Por conseguinte, a construção de sentidos implica o estabelecimento de
relações entre os acontecimentos e as situações em que eles se inserem.
No que diz respeito aos pressupostos contextuais, Van Dijk classifica-os em
pressupostos da funcionalidade, pragmático, interacionista e situacional.
O pressuposto da funcionalidade estabelece que o discurso não se constitui
apenas como um evento cognitivo; sua compreensão configura-se em processos
funcionais dentro de um contexto social, baseados na intenção de um locutor e no
objetivo de um interlocutor. Podemos afirmar que informações dos acontecimentos,
da situação ou do contexto, além de informações das pressuposições cognitivas,
são elementos que o leitor ativa e combina para a construção da representação
mental dos fatos, visto que, conforme mencionamos, eles não ocorrem isolados de
uma dada situação, mas em contextos sociais complexos.
Por seu turno, o pressuposto pragmático considera não apenas objetos
linguísticos, mas também os efeitos de sentido provenientes das intenções e dos
objetivos dos sujeitos que participam de uma cena enunciativa. A respeito, Van Dijk
(2002) ressalta que, como intenções estão envolvidas no discurso, estamos lidando
não só com objetos linguísticos como também com os resultados provenientes de
algum tipo de ação social.
O pressuposto interacionista consiste na generalização do pressuposto
pragmático: as intenções e os objetivos são partes essenciais de uma situação de
interação. Em outros termos, a interpretação de um texto só se consolida na
interpretação de todo o processo interacional entre os participantes de um evento
comunicativo. Transferindo esse conceito para o âmbito da leitura, na compreensão
de um texto, consideram-se os objetivos do leitor, ao entrar em contato com um
74
determinado texto, e também com o contexto em que se instaura no texto, a que o
texto faz referência.
Finalmente, o pressuposto situacional enfatiza que as funções pragmáticas
do discurso se relacionam a um contexto. Dessa maneira, os participantes em uma
situação de comunicação
podem ter certas funções ou papéis; pode haver diferenças de local ou contexto,
além de poder haver regras específicas, convenções ou estratégias que
determinem as possíveis interações em tal situação. Não se pode dizer qualquer
coisa que nos venha à cabeça em qualquer situação. Possíveis ações e,
consequentemente, possíveis objetivos e, consequentemente, possíveis discursos
são restringidos pelas várias dimensões das situações.
(VAN DIJK, 2002, p.18)
Com base em tais pressupostos, Van Dijk afirma que a compreensão ocorre
por meio da interação texto-leitor e não envolve apenas processos cognitivos, pois
não se constitui somente em construções de representações de um discurso. Assim
como ele, acreditamos que compreender significa também interpretar ações em um
processo interacional.
Esclarecemos que a classificação de Van Dijk serve para fins operacionais
de análise e que, durante a leitura esses pressupostos agem de forma imbricada,
interligada. No processo de interação texto e leitor, há todo um jogo de intenções
que, dependendo do contexto enunciativo, determinam um tipo de ação social do
produtor do texto sobre o leitor e também podem nortear a compreensão. O
contexto determina a compreensão textual.
Conforme explicitado anteriormente, o processo de compreensão é amplo, e
envolve não só a construção de representações, mas todo um processo interacional
entre os interlocutores de uma situação comunicativa. Em situação de leitura, esse
processo se completa quando o leitor participa ativamente, interpretando e
construindo sentidos no texto. Devemos considerar também as diferenças que
caracterizam os usuários da língua. Em outras palavras, os leitores possuem
conhecimentos diferentes, tanto de ordem linguística quanto pragmática e as
diferenças influenciam a compreensão. Para além das diferenças de conhecimento,
consideramos ainda diferenças de idade, de gênero e de credos, implicando que os
sentidos de um texto são construídos também dependendo dos interesses do leitor.
O tema de um texto não é extraído unicamente da compreensão de cada
uma de suas frases. O indivíduo lança mão, antes de tudo, de hipóteses e
75
expectativas a respeito de seu sentido global e faz apelo a elementos que lhe
permitem criar expectativas, como, por exemplo, o título e a área em que se insere
o texto e o entorno da leitura, suas experiências pessoais, suas expectativas. Ele lê
um texto com um propósito, mesmo o de simplesmente fazer o tempo passar e
distrair-se.
Desse modo, o contexto manifesta-se como um dado a ser considerado,
uma vez que as atividades envolvidas na compreensão textual não se limitam,
como dissemos, a aspectos linguísticos.
De acordo com Van Dijk (2002), o contexto é anterior ao processamento,
mas se enriquece com ele e se reelabora, passando a exercer novas influências
sobre ele.
Koch (2000) explica que não há consenso sobre o contexto e de que modo
ele afeta a compreensão. Há consenso, entretanto, sobre a sua importância para a
compreensão e sobre o fato de que um texto pode ser interpretado de maneiras
bastante diferentes em contextos diferentes, o que vem ao encontro da afirmação
de que o sentido de um texto, em qualquer situação comunicativa, não depende
somente da estrutura textual em si mesma.
A autora destaca os seguintes tipos de contexto:
contexto como entorno verbal (co-texto) - o contexto é resgatado apenas
pelo nível linguístico;
contexto de situação - refere-se apenas a algo dado no mundo real: lugar
real, espaço fisicamente delimitado, situação mediata em que o discurso
se manifesta;
contexto social – refere-se à situação, ao cenário, ao lugar, aos sujeitos,
à intenção do autor, à bagagem do falante, à forma da mensagem, ao
gênero textual;
contexto cultural – considera, de forma mais ampla, o entorno cultural que
envolve a mensagem (crenças e valores culturais);
contexto cognitivo – engloba os conhecimentos partilhados dos sujeitos.
Nessa perspectiva, é importante destacar que, ao analisarmos uma
mensagem, devemos partir do princípio de que, para atribuirmos sentido em um
evento comunicativo, os falantes devem inserir-se em contextos cognitivos
76
semelhantes; é necessário que eles partilhem o mínimo de conhecimentos.
Koch (2000) destaca ainda que, na comunicação escrita, se preenchem as
lacunas por meio de estratégias de sinalizações textuais (contextualizadores). O
texto fornece pistas para a identificação da necessidade de preenchimento de
lacunas. O contexto situa o leitor, auxiliando a ativar os conhecimentos prévios.
Com respeito à relação entre os conhecimentos prévios e a leitura, Cabral
(2005) apresenta cinco tipos de conhecimentos prévios que participam de forma
ativa da compreensão em leitura.
O primeiro tipo de conhecimento prévio, que engloba conhecimentos gerais
sobre a língua, ativados já na percepção do texto, diz respeito não apenas às
palavras, mas também à ordem das palavras no texto, à forma como os parágrafos
se organizam, à estrutura textual global. Conforme observa Cabral (2005), os
conhecimentos linguísticos participam da percepção, mas são conhecimentos já
armazenados na memória do leitor, ativados no momento da percepção e cuja
ativação se mantém durante as demais operações do processo de compreensão.
O segundo tipo, que constitui o conhecimento textual, se define como o
conjunto de noções e conceitos sobre o texto. Faz parte desse conhecimento o
domínio das estruturas textuais próprias a cada tipo ou gênero textual. A esse
respeito, Kleiman (2004) observa que quanto maior for o conhecimento textual do
leitor, melhor será a compreensão daquilo que ele lê.
O terceiro tipo, que consiste no conhecimento de mundo, corresponde aos
conhecimentos que o leitor adquiriu em seu processo de aprendizado formal e
informal, incluindo-se aí suas experiências. As experiências acumuladas ao longo da
vida permitem a construção de esquemas, scripts e frames, armazenados na
memória e podem ser ativados durante a leitura para complementar informações
que não aparecem no texto.
O conhecimento de mundo desempenha um papel decisivo no
estabelecimento da coerência e no estabelecimento dos sentidos de um texto, pois
se o texto tratar de assuntos que não conhecemos, será difícil calcularmos o seu
sentido e ele nos parecerá destituído de coerência. Adquirimos esse conhecimento à
medida que vivemos, tomando contato com o mundo que nos cerca e
experienciando uma série de fatos.
O conhecimento de mundo é decisivo para o estabelecimento do sentido de
um texto, pois é necessário que haja correspondência entre os conhecimentos
77
ativados no texto e o conhecimento de mundo do leitor, armazenado em sua
memória de longo prazo. Se essa correspondência não se efetiva, isto é, se o leitor
não possui os conhecimentos necessários para que ela ocorra, o texto não faz
sentido. É importante que o professor, antes de trabalhar um texto em classe, tenha
clareza dos conhecimentos que o texto exige para a sua compreensão e os trabalhe
com seus alunos antes da leitura ou durante ela.
O quarto tipo, que consiste no conhecimento social, diz respeito aos
conhecimentos sobre a realidade social. Trata-se de um tipo de conhecimento
construído pela sociedade e partilhado pelos seus integrantes. Van Dijk e Kintsch
(1996) ressaltam a importância do grupo social e da cultura para se compreenderem
as representações e destacam, ainda, a importância do entorno no qual o indivíduo
interage. Esse conhecimento diz respeito não apenas a crenças e valores sociais,
mas também a comportamentos estereotipados relativos a determinados grupos, ou,
simplesmente, a conceitos que remetem ao modo como as coisas acontecem no
contexto social. O conhecimento social entra em jogo para a decifração de
implícitos, pois muitos conteúdos implícitos justificam-se por regras sociais e delas
dependem para que sejam compreendidos.
O quinto tipo, que consiste no conhecimento pragmático, refere-se à relação
entre texto e contexto, isto é, trata dos conhecimentos que o sujeito possui a
respeito do funcionamento dos princípios discursivos.
Também com relação aos conhecimentos prévios, é importante observar que
a divisão tem função de análise apenas; o limite entre um tipo e outro de
conhecimento não é definido. Além disso, devemos considerar a imbricação que há
entre eles.
O fato de os conhecimentos prévios referirem-se às experiências
individuais de cada participante da interação não quer dizer que tais
conhecimentos sejam totalmente diferentes em cada sujeito. É importante, para a
compreensão, que o leitor de um texto tenha algum conhecimento em comum
com o escritor de um texto, caso contrário, a compreensão se inviabilizaria. Esse
conhecimento comum entre os participantes da interação chama-se
conhecimento partilhado. Com respeito aos conhecimentos partilhados, Koch e
Travaglia (1999) afirmam ser impossível que duas pessoas partilhem exatamente
o mesmo conhecimento de mundo, mas é possível terem, ao menos, uma boa
parcela de conhecimentos comuns.
78
Em situação de leitura, quanto maior a parcela, menor a necessidade de
explicações no texto, uma vez que o leitor será capaz de suprir as lacunas, por
exemplo, por meio de inferências. Os elementos textuais, que remetem ao
conhecimento partilhado entre os interlocutores, constituem, segundo Koch e
Travaglia (1999), a informação velha ou dada, ao passo que o introduzido a partir
dela constituirá a informação nova trazida pelo texto. Em um texto coerente, deve
haver um equilíbrio entre as informações.
A continuidade de sentidos entre os conhecimentos ativados pelas
expressões do texto garante, segundo Beaugrande e Dressler (1981), a unidade de
sentido do texto como uma totalidade. A continuidade diz respeito ao modo como
os componentes do mundo textual, ou seja, o conjunto de conceitos e relações
subjacentes à superfície linguística do texto, são acessíveis e relevantes. A
construção dos sentidos de um texto, à qual costumamos associar a construção da
coerência, depende de vários fatores interligados, como, por exemplo, a ativação
de conhecimentos prévios, o estabelecimento de relações de intertextualidade e o
reconhecimento de implícitos.
Para Beaugrande e Dressler (1981) e Koch e Travaglia (1999), a coerência é
um dos princípios responsáveis pelo estabelecimento da interação entre produtor e
leitor, estando diretamente ligada à possibilidade de se estabelecer um sentido
para o texto. Deve ser compreendida como um princípio de interpretabilidade,
ligada à inteligibilidade do texto em uma situação de comunicação (Orlandi, 1996) e
à capacidade que o receptor tem para calcular o sentido do texto, que advém do
todo, pois a coerência é global. Para haver coerência dos sentidos de um texto, é
preciso que haja possibilidade de estabelecer alguma forma de unidade ou relação
entre seus elementos.
Devemos considerar que, em um texto, as relações estabelecidas não são
apenas de ordem semântica, mas também de ordem pragmática; e que a leitura
constitui um processo ativo de interação entre o leitor e o texto. O leitor pressupõe
uma coerência textual e procura meios para estabelecer sentidos para o texto; por
isso, se o texto lhe parece a princípio incoerente, ele adiciona informações por
meio da ativação de seu conhecimento prévio, pela construção de conteúdos
implícitos, o que nos permite afirmar que o leitor constrói a coerência do texto.
Koch e Travaglia (1999) explicam que os processos e mecanismos utilizados
no estabelecimento dos sentidos de um texto sofrem restrições que obedecem a
determinações psicológicas e cognitivas, socioculturais, pragmáticas e linguísticas.
79
O estudo da compreensão tornou-se um campo inter e pluridisciplinar, recebendo
contribuições da Psicologia, da Sociologia, da Filosofia, da Teoria da Computação
e Informática, além da Linguística em geral e de alguns de seus ramos em
particular. Cada uma das disciplinas fornece elementos indispensáveis a uma
compreensão global da interação comunicativa realizada por meio de textos
linguísticos.
Esses autores, com base em Charolles, destacam que, em relação aos
estudos da compreensão, cabe à linguística
delimitar, na constituição e composição textuais, qual é a parte e a natureza das
determinações que resultam dos diferentes meios que existem nas diferentes
línguas, para exprimir a continuidade ou a sequência do discurso. O linguista deve,
assim, fazer a análise das marcas de relação entre unidades de composição textual
que a língua usa para resolver, o melhor possível, os problemas de interpretação
que seu uso possa gerar. Isto para além da generalidade dos processos psico e
sociocognitivos que intervêm na interpretação do discurso.
(KOCH; TRAVAGLIA, 1999, p. 70)
Fica evidente que a construção dos sentidos de um texto decorre de uma
multiplicidade de fatores. Embora não seja possível construir o sentido de um texto
com base apenas nas palavras que o compõem e na sua estruturação sintática, é
indiscutível a importância dos elementos linguísticos do texto para o
estabelecimento da coerência e a construção de sentidos. Na concepção dos
autores, tais elementos servem como pistas para a ativação dos conhecimentos
armazenados na memória e constituem o ponto de partida para a elaboração de
inferências, para o estabelecimento de relações entre as partes do texto, tão
importantes para a coerência e a construção de sentidos.
A exposição sobre a leitura tem por função operacionalizar a análise. É
importante até aqui levantarmos alguns pontos relevantes para o nosso estudo. No
contexto da prova de vestibular, parte-se da condição satisfatória para a realização
da prova, ou seja, pressupõe-se a capacidade de memorizar informações, assim
como ativá-las em tempo hábil. Embora importantes, não aprofundaremos tais
aspectos.
Outro aspecto bem marcado é a interação do processo de comunicação, seu
caráter pragmático. Essa é a perspectiva atual do ensino de língua materna,
abordando o aspecto pragmático da produção dos textos, levantando aspectos
relevantes no nível discursivo.
80
Em relação aos tipos de conhecimentos prévios propostos por Cabral,
selecionamos quatro tipos básicos para a análise das provas: 1) linguístico
gramatical (conhecimentos gerais sobre a língua); 2) textual (domínio de tipos e
gêneros textuais); 3) conhecimento de mundo (conhecimento adquirido, organizado
a partir de esquemas); 4) discursivo (relacionado ao contexto em que se insere o
texto).
Na indicação acima, agrupamos o conhecimento prévio social e o discursivo,
por entender que o conhecimento prévio discursivo engloba o conhecimento social,
o que, para os elementos de análise propostos, é mais produtivo.
Como percebemos na exposição dos autores, estabelecer a coerência é
fundamental para o processo de leitura. Se aplicarmos ao texto das provas de
vestibular, devemos pensar que o candidato-leitor esperado deve dominar uma
gama de conhecimentos prévios para realizar não só a resposta discursiva
esperada, mas também a compreensão da questão, ativando os conhecimentos
prévios necessários em sua memória operatória (ou de trabalho). A falta da
compreensão do enunciado pode levar a um encaminhamento equivocado.
Tal leitor deverá administrar estratégias para o satisfatório cumprimento da
tarefa dada. Em provas de vestibulares, é importante ativar conhecimentos prévios
distintos; a memorização de dados em blocos mentais estanques impede também
uma boa realização da prova, já que falta o processamento cognitivo estratégico.
Para compreender o texto, o leitor realiza inferências. Os estudos recentes
sobre inferências citam principalmente as propostas de Kinst e de Marcuschi.
2.2.3 Inferências
De acordo com Kintsch (1998), é importante diferenciar as inferências dos
processos de recuperação de conhecimento. Para ele, as primeiras caracterizam-se
como processos de resolução de problema, favorecendo a geração de uma nova
informação; enquanto os processos de recuperação apenas resgatam na memória
conhecimentos preexistentes. As inferências e a recuperação de conhecimento
podem ser automáticas (geralmente inconscientes) ou controladas (geralmente
conscientes). O autor considera, especialmente, as inferências elaboradas a partir
81
das relações entre proposições do texto e entre estas e a estrutura de conhecimento
geral do leitor.
Para o autor, a memória de longo prazo torna, automaticamente, a
compreensão possível. Quando o processo automático não é capaz de recuperar
informações na memória de curto prazo, é necessário controlar o processo de
recuperação. Trata-se de um processo estratégico que deve variar de acordo com o
tipo de texto envolvido ou tipo de linguagem utilizada.
Diferentemente dos processos de acesso a informações, as inferências geram
novas informações a partir de conhecimentos mantidos na memória de longo prazo.
No processo de geração automática, o leitor infere uma nova informação, mas não
percebe se ela está explícita no texto ou não. Já no processo controlado, a
inferência ocorre quando há um problema de compreensão. Para realizar a tarefa, o
leitor precisará elaborar algum raciocínio (Kinst, 1998).
Dell’Isola (2001), Ferreira e Dias (2004) apontam para a variedade de estudos
sobre as inferências, mostrando que muitos deles trabalham especificamente com
um tipo de texto, o que particulariza a teoria. Os dois estudos apontam para a
posição de Marcuschi, que procura superar essa limitação, propondo uma
classificação generalizante.
Marcuschi (1985) aponta para a consideração dos vários tipos de inferências
construídos nos diferentes níveis da representação textual, enfatizando as relações
entre o texto, o sujeito e o contexto. Esse estudo serve como base para muitos
trabalhos, como o de Regina Dell’Isola, que procura evidenciar a variação
sociocultural na produção de inferências.
A proposta do autor apresenta três grupos de inferências com vários subtipos,
a saber:
- Inferências lógicas: baseadas nas relações lógicas existentes entre as
proposições e submetidas aos valores-verdade. Podem ser dedutivas, indutivas
ou condicionais;
- Inferências analógico-semânticas: baseadas no texto, nos conhecimentos
lexicais e nas relações semânticas. Podem ocorrer por identificação referencial,
por generalização, por associações, por analogia e por composições ou
decomposições;
82
- Inferências pragmático-culturais: baseadas nos conhecimentos, experiências,
crenças e ideologias individuais. Podem ser conversacionais, experienciais,
avaliativas e cognitivo-culturais.
Em trabalho posterior, Marcuschi (1989) fez revisão dessa classificação,
explicitando-a da seguinte forma:
- Inferências de base textual: lógicas (dedutivas, indutivas, condicionais),
sintáticas e semânticas (associativas, generalizadoras, co-referenciais);
- Inferências de base contextual: pragmáticas (intencionais, conversacionais,
avaliativas), práticas (experienciais) e cognitivas (esquemáticas, analógicas e
composicionais);
- Inferências sem base textual: falseamentos e extrapolações infundadas.
Marcuschi (1985; 1989) ressalta o encontro entre os mundos do leitor e do
processo mais objetivo de leitura na compreensão de texto, destacando o papel da
elaboração de inferências. O processo inferencial demanda conhecimento prévio e
apresenta limites interpretativos. Quando o leitor é guiado apenas pelos seus
conhecimentos de mundo, em detrimento daquilo que o texto aponta, pode-se
chegar a conclusões/percepções inválidas.
Na tese, utilizamos a classificação de Marcuschi, por considerarmos coerente
com a nossa proposta de análise. Como as provas de vestibulares se inserem em
um concurso público, é necessário garantir a objetividade das solicitações
realizadas, assim como a possibilidade de respostas específicas. Para esse tipo de
prova, as inferências devem-se basear principalmente nas informações trazidas nos
textos da prova.
Ao fim do Ensino Médio, espera-se um leitor capaz de organizar a leitura para
variados fins. A baixa capacidade leitora não permitirá ao vestibulando realizar bem
as provas: a “visão túnel”, terminologia de Smith (1988) para marcar o leitor iniciante,
preso à decodificação de palavras, impede a compreensão de aspectos ligados à
proposta global do texto e do contexto (nível discursivo da língua/linguagem).
Aspectos importantíssimos para a boa realização das provas são o desenvolvimento
de habilidades (descrever, hierarquizar informações, explicar procedimentos etc.), de
estratégias de leitura e a evocação de conhecimento prévio, já que as provas testam
também conhecimentos escolares.
83
3 O VESTIBULAR
3.1 - Breve histórico do vestibular
Segundo Correa (2008), a história dos exames vestibulares, meio de acesso
ao ensino superior, começa a ser escrita, assim como a da própria criação de um
sistema de educação no Brasil, a partir da transferência da corte portuguesa para o
Brasil, em 1808.
Com o movimento amplo de rápida estruturação da sociedade para a
existência da corte no Brasil, criam-se os primeiros cursos superiores – Medicina,
Engenharia e Direito –, destinados à formação profissional, em uma perspectiva de
universidade franco-napoleônica, caracterizados por uma organização
profissionalizante, centrando-se em cursos e faculdades que visam à formação de
burocratas para desempenharem as funções de Estado.
“Preocupado em controlar o exercício profissional, o poder central tratou de
vincular o exercício”, no caso de profissões de importância estratégica, “à obtenção
de diploma de curso superior. Como medida complementar necessária para exercer
esse controle, o poder central tomou para si também o controle do acesso aos
cursos superiores” (CORREA, 2008, p. 166).
O governo, no Império ou na República, estabelece regras e fiscaliza o seu
cumprimento no que se refere ao ingresso no ensino superior. Procura garantir que
fiquem impedidos de
ter acesso à profissionalização estudantes que não atendam às
exigências de formação estipuladas pelos sucessivos governos (CORREA, 2008).
A implantação oficial do exame vestibular no Brasil data de 1911. Antes disso,
o ensino secundário da época procurava dar condições para a realização dos
exames preparatórios, realizados nas poucas faculdades ou no Colégio Pedro II.
No século XIX, foi criado o Colégio D.Pedro II, que serviu, ao mesmo tempo,
de
modelo para os demais estabelecimentos de ensino e de agente de avaliação e
certificação do Estado, atestando a qualidade dos candidatos aos cursos superiores.
Seus alunos eram dispensados de prestar os chamados exames preparatórios,
exigência feita, no período que antecede a existência dos vestibulares (1808-1911),
aos que
pretendem matricular-se em cursos superiores.
84
Nesses exames, há variados tipos de provas: “escritas, orais, práticas, com
conteúdos abrangentes e diversificados”, englobando as seguintes áreas “Línguas
Vivas, Línguas Mortas, Matemática, Astronomia, Ciências Físicas, Biologia,
Zoologia, Botânica, Sociologia, Moral, Geografia e História Universal” (Silveira, 2005,
p. 17). As avaliações ocorrem de uma série para outra e no final dos cursos. Tais
processos de seleção são extremamente rigorosos, por isso há alta taxa de
reprovação.
Mesmo assim, a demanda dos concluintes do ensino de Humanidades, o
equivalente ao atual Ensino Médio, em busca do ensino superior aumenta
progressivamente.
Em 1901, é assinado o decreto 3.890, que trata dos “institutos officiaes de
ensino superior”, sem, contudo, introduzir qualquer novidade quanto ao ingresso de
estudantes nos cursos.
Em 1911, pela primeira vez, há mais candidatos que vagas na Escola
Politécnica do Rio de Janeiro, fator que fortemente contribui para a criação do
exame vestibular. Aponta Ribeiro Neto (1987) que há, na época, uma preocupação
de o vestibular passar a ser “um elemento de distorção dos objetivos do então
ensino secundário” (p. 18), realizando já a oposição ensino secundário – exames
vestibulares.
Em abril de 1911, o Decreto 8.659 indica, pela primeira vez, a exigência de
que os candidatos se submetam a um exame de ingresso aos cursos superiores:
“Artigo 65. Para concessão da matrícula, o candidato passará por exame que
habilite a um juízo de conjunto sobre o seu desenvolvimento intellectual e
capacidade para emprehender efficazmente o estudo das matérias que constituem o
ensino da faculdade.”
Em 1915, o governo publica novo decreto, o de número 11.530, para
reorganizar “o ensino secundario e o superior da Republica”. No Artigo 77 desse
decreto aparece, pela primeira vez em nossa legislação, a exigência de approvação
no exame vestibular” para ingresso no ensino superior.
Para candidatar-se ao vestibular, o estudante precisa obter certificado de
aprovação em todas as matérias do curso ginasial do Colégio D. Pedro II, conferido
pelo próprio estabelecimento escolar oficial ou pelos institutos a ele equiparados
(CORREA, 2008).
85
Dez anos depois, em 1925, vigora novo decreto, o de número 16.872 que
reforma o ensino secundário e o superior”. Apesar de o decreto anterior ser pioneiro
no uso do termo vestibular, é o Decreto 16.872 que introduz pela primeira vez o
caráter classificatório nos exames de admissão ao ensino superior, ao dispor, nos
itens d e e do Artigo 206, que
[...] para a matricula no primeiro anno dos cursos superiores, os candidatos a
requererão provando: (...) d) approvação no exame vestibular; e) classificação, neste
exame, dentro do numero maximo de matriculas annualmente fixado, ou prova de
que algum dos classificados nesse numero não se matriculará, de modo a haver
vaga.
Logo a seguir, no Artigo 207, o decreto dispõe que caberá aos diretores “das
escolas officiaes de ensino superior e secundario” propor ao Ministro da Justiça o
limite anual para a matrícula no primeiro ano dos cursos (CORREA, 2008).
A partir daí, o ensino secundarista/médio passa por várias transformações,
sem alteração expressiva na legislação do vestibular de 1925, o que só ocorre em
1968. Boa parte das modificações ocorre por meio de decretos e leis educacionais.
Algumas delas mostram a relação significativa do nível médio de instrução com o
processo dos vestibulares.
Em 1932, o ministro Francisco Campos consolida as disposições sobre a
organização do ensino secundário no Brasil, por meio do decreto 21.241. Na mesma
época, o ministro explicita em livro:
O Ensino Secundário é um simples curso de passagem e um mero sistema de
exames, destituído de virtudes educativas e reduzido às simples linhas essenciais
de sua estrutura estreitamente pragmática e utilitária de instrumento de acesso aos
cursos superiores.
(CAMPOS, 1940, p. 47)
O reconhecimento do fato leva o governo a investir em cursos
profissionalizantes de nível médio, formando profissionais para todos os setores da
economia nacional, e não só para os estudos universitários. Em 1942, ainda no
governo de Getúlio Vargas, a Reforma Capanema institui o Clássico e o Científico,
cursos que continuam com o objetivo prioritário de preparar os alunos para os
86
exames vestibulares que, em sua maioria, envolvem processos seletivos bem
rigorosos, por vezes com exames orais.
Apesar de tal rigor, os vestibulares, naquela época, são compostos de provas
específicas para a carreira pretendida, o que leva a uma formação parcial e
fragmentada, já que, em seu processo de aprendizagem, o aluno privilegia apenas
as disciplinas que lhe são cobradas no vestibular, vistas como base para a sua
formação universitária (SILVEIRA, 2005).
Nos anos 1950, há uma procura ainda maior pelos cursos superiores. São
anos de busca de desenvolvimento econômico do país, o que leva a um maior
incremento no campo educacional, principalmente no governo de Juscelino
Kubitscheck (1956-1961), com a realização de “50 anos em 5”.
Há uma busca, por parte da classe média, acreditando na necessidade de um
diploma de nível superior para seus filhos, por escolas particulares que garantam os
meios necessários para o ingresso de alunos no nível superior, ou seja, uma escola
focada no processo de seleção do vestibular (ABAURRE, 1995, p. 36):
Justamente porque o número de vagas sempre foi muito inferior à demanda, a
sociedade passou a procurar, na escola, os meios que garantissem sucesso no
momento de seleção. O resultado desse processo é bastante conhecido: as escolas
particulares passaram a privilegiar um ensino conteudístico com vistas a garantir que
seus alunos dispusessem de afirmações para um bom desempenho nas provas de
exames vestibulares. (...) a escola foi deixando de ser o espaço de formação de
novos cidadãos conscientes para se transformar no local de “treinamento” de jovens
que desejassem ser aprovados em testes (...).
A partir da década de 1960, políticas governamentais ampliam a oferta de
vagas no ensino superior.
Em 1968, há a reformulação do ensino superior no Brasil por meio da Lei
5.540. De acordo com o Artigo 21 dessa lei, o vestibular “abrangerá os
conhecimentos comuns às diversas formas de educação do segundo grau sem
ultrapassar este nível de complexidade para avaliar a formação recebida pelos
candidatos e sua aptidão para estudos superiores”.
Esse texto expressa, mais claramente do que os anteriores, a intenção de
consolidar a dupla função do vestibular como instrumento de seleção: avaliar a
formação (leia-se escolarização) básica do candidato e, ao mesmo tempo, a sua
aptidão para ingressar no ensino superior (CORREA, 2008).
87
Outra importante mudança promovida pela Lei 5.540, constituindo um marco
na história dos vestibulares, é introduzir a determinação de que os exames sejam
unificados, conforme o parágrafo único do Artigo 21:
Dentro do prazo de três anos a contar da vigência desta Lei o concurso vestibular
será idêntico em seu conteúdo para todos os cursos ou áreas de conhecimento afins
e unificado em sua execução, na mesma universidade ou federação de escolas ou
no mesmo estabelecimento isolado de organização pluricurricular de acordo com os
estatutos e regimentos.
Para regulamentar essa disposição legal, o governo publica, em 1971, o
Decreto
68.908, que, em seus Artigos 5º, 6º, 7º e 8º, apresenta determinações para
a realização dos exames vestibulares, resumidas em seis itens:
a) para as instituições oficiais, ser realizado, em todo o território nacional, em
data fixada pelo MEC;
b) conter as disciplinas obrigatórias do ensino de grau médio, eventualmente
uma língua estrangeira, e revestir-se de complexidade que “não ultrapasse o
nível de escolarização regular desse grau.”.
c) ser organizado com técnicas que assegurassem a verificação de aptidão
para estudos superiores, sem vinculação a cursos ou ciclos de formação
profissional;
d) ser idêntico para toda a instituição ou grupo de instituições, admitindo-se
variações de
perfis e de ponderação;
e) ser elaborado por órgão próprio da instituição ou do grupo de instituições;
f) poder ser planejado e executado por organizações especializadas, de
caráter público ou privado.
Com base no que prevê o sexto item (f), são criadas fundações para
organizar os exames
vestibulares. No caso do Estado do Rio de Janeiro, a
Fundação Cesgranrio tem papel muito importante.
Inicialmente é uma associação de 12 instituições universitárias, tornando
possível a criação do Centro de Seleção de Candidatos ao Ensino Superior do
Grande Rio, em 12 de outubro de 1971. O Centro é instituído por convênio firmado
com o Ministério da Educação e Cultura, sendo Ministro, na época, o Senador
Jarbas Passarinho e Diretor do Departamento de Assuntos Universitários do MEC, o
professor Newton Lins Buarque Sucupira.
88
Em 1972, com o professor Carlos Alberto Serpa de Oliveira à frente, um grupo
de educadores implementa, como projeto-piloto, os primeiros vestibulares unificados
do Grande Rio.
O grande êxito alcançado no vestibular de 1972 e na realização do exame de
1973 possibilita as universidades signatárias do Convênio Cesgranrio pleitearem,
junto ao Ministério da Educação, a criação de uma fundação privada autônoma, por
elas instituída, que se dedique permanentemente à organização dos exames de
acesso ao ensino superior e às correlatas atividades educacionais. Surge, em
consequência, em 04/01/1973, a Fundação Cesgranrio.
Em fevereiro de 1977, já como resposta a uma preocupação crescente na
sociedade em relação aos efeitos negativos gerados pelos vestibulares unificados
gerenciados pela Fundação Cesgranrio – constituídos exclusivamente de questões
de múltipla escolha –, publica-se o Decreto 79.298. As principais modificações
contidas, em relação ao que dispunha o decreto de 1971 sobre o vestibular, são
assim definidas, logo no seu Artigo primeiro: a) introdução, a critério da instituição,
de prova de habilidade específica; b) possibilidade de realizar o concurso em mais
de uma etapa; c) utilização de mecanismos de aferição que assegurem a
participação, na etapa final do processo classificatório, apenas dos candidatos que
comprovem um mínimo de conhecimento em nível de 2º grau e de aptidão para
prosseguimento de estudos em curso superior; d) inclusão obrigatória de prova ou
questão de redação em língua portuguesa.
Em cumprimento ao disposto no item d do Artigo Primeiro do decreto, a
Fundação Cesgranrio passa a incluir em seus exames, a partir de 1978, a exigência
de que os candidatos façam uma prova de redação. Essa inclusão, embora saudada
como avanço, não se mostra suficiente como medida para atender à cobrança cada
vez maior de que os exames vestibulares mudem e, consequentemente, provoquem
modificações no ensino de primeiro e de segundo graus. Nesse contexto, a prova de
Redação relaciona-se à prova de Língua Portuguesa (Castro, 2008).
Nos anos 1980, o vestibular unificado perde força com a saída gradativa de
universidades públicas e particulares, que criam seus processos de seleção.
É importante entender que o processo unificado é marcado pelo período de
ditadura. Após o processo de abertura e redemocratização, em 1985, as
universidades buscam, com êxito, o seu processo de autonomia. O vestibular de
89
múltipla escolha, baseado no processo de grande memorização de dados, perde
prestígio em prol de novas práticas educacionais, mais críticas e contextualizadas.
Como os materiais sobre os vestibulares são escassos e fragmentados, para
compor um pouco da sua história recente, dirigimo-nos às comissões de vestibulares
das universidades selecionadas para o estudo na tese. Em geral, há pessoas
preocupadas com o processo histórico, mas sem condições de organizá-lo.
Destacamos algumas informações a que tivemos acesso por relatos ou pela
manipulação de provas antigas.
No processo de autonomia das universidades, há progressiva descentralização
das seleções realizadas. Busca-se a melhor forma de gerir o espaço da universidade
pública, assim como o processo de seleção dos futuros alunos.
Outro aspecto importante é a introdução de questões discursivas em maior
número. Os principais argumentos explicitados são: avaliar de modo mais integral o
conhecimento do aluno, já que ele poderá redigir a resposta a partir do seu acervo; e
dar maiores condições aos alunos oriundos da escola pública, que, em geral, não
podem pagar um curso preparatório para lidar com a especificidade das questões de
múltiplas escolhas. No contexto, há um marco importante em 1986: a Unicamp
realiza seu vestibular somente com provas discursivas.
Em relação aos processos de seleção, obtivemos as informações
principalmente na UFRJ e na UERJ.
Em 1988, UFRJ e CEFET fazem seu vestibular separadamente no Rio de
Janeiro. Em 1989, UERJ compõe o grupo do “Vestibular Integrado” com UFRJ. As
provas de Língua Portuguesa são compostas de 10 questões discursivas. Em 1990,
ENCE também integra o grupo. Em 1991, a UFRJ faz vestibular próprio, separando-
se da UERJ, que integra o “Vestibular Associado”, junto com a UFF, UFRRJ,
UNIRIO, ENCE e CEFET. Em 1992, a UERJ se separa, realizando o “Vest Rio”, com
CEFET e ENCE.
Durante a década de 1990, as universidades começam a gerir um processo
autônomo de seleção. Há um aumento significativo de provas a serem realizadas
por um aluno que termina o Ensino Médio. No caso das universidades selecionadas,
os vestibulares ocorrem separadamente. A motivação principal, segundo os relatos
das comissões de vestibulares, é a busca de perfis diferenciados de futuros alunos
para os seus cursos de graduação.
90
3.2 – As provas de língua portuguesa: orientações e programas
Os programas publicados pelas universidades para os seus vestibulares, em
relação à área de Língua Portuguesa, apresentam três linhas básicas: 1)
compreensão e interpretação de texto; 2) Língua Portuguesa; 3) Literatura Brasileira.
Como já delimitado anteriormente, na Introdução, desconsideramos questões
ligadas à Literatura Brasileira, por não ser objetivo de nosso estudo.
As universidades, ao lançarem edital para os exames vestibulares, além de
informarem os programas das disciplinas, procuram esclarecer suas concepções e
encaminhamentos teórico-metodológicos, por meio de orientações gerais.
Destacamos, abaixo, fragmentos das orientações presentes nos editais e/ou
manuais do candidato. É necessário perceber, neles, o caráter pedagógico de expor
as competências necessárias.
Os programas apresentam, em sua exposição, diferenças do nível de
detalhamento e de alguns pontos a serem cobrados.
A UERJ faz duas apresentações distintas, por realizar duas provas
discursivas: a de Língua Portuguesa e Literatura Brasileira (LPLB) e a de Língua
Portuguesa Instrumental com Redação.
Para a prova de LPLB, a UERJ explicita as suas concepções:
Hoje em dia, no estudo da Língua Portuguesa, impõe-se a necessidade de formação
de sujeitos detentores de uma competência reflexiva sobre a língua, capazes de
adequá-la aos diversos gêneros textuais que as necessidades comunicativo-
expressivas lhes exigem em sociedade. Da mesma forma, o estudo da Literatura
Brasileira, em uma perspectiva de integração a área da leitura, requer o
entendimento do papel do discurso literário na construção do imaginário dos leitores
e na formação das identidades culturais.
Buscando suprir essa necessidade, este programa tem como elemento central o
texto – leitura, escrita e análise de seus mecanismos de funcionamento. Considera-
se o texto como o resultado de uma operação discursiva, cujo sentido não se
constrói simplesmente pela sequenciação de seus elementos, mas, sobretudo, pela
complexa interligação entre vários componentes ativados na interação comunicativa
(sujeitos da comunicação, situação social,etc.).
[...]
O Exame Discursivo de Língua Portuguesa e Literatura Brasileira priorizará, assim, o
domínio dos mecanismos de funcionamento da língua na efetivação do ato
comunicativo, integrando os contextos linguísticos e situacionais, em uma
abordagem que congrega diferentes níveis de análise: a gramática da palavra, da
frase e do texto.
Há um investimento no detalhamento de informações. A UERJ enfatiza a
necessidade de “formação de sujeitos detentores de capacidade reflexiva sobre a
língua”, capazes de perceber as “necessidades comunicativo-expressivas de seu
91
uso”. A seguir, indica a centralidade do texto, “resultado de operações discursivas”.
Com tais formulações, os fatos da língua são ativados diretamente a partir das
necessidades discursivas dos sujeitos presentes nas interações sociais, deixando
clara a perspectiva textual-discursiva em que os elementos linguísticos se inserem.
A realização extrapola a necessidade de informações para a prova; há um caráter
pedagógico ao se destacar que o texto “não se constrói simplesmente pela
sequenciação de seus elementos”, combatendo, assim, uma perspectiva mais
tradicional do ensino de língua portuguesa.
A exposição do programa dessa prova, desconsiderando Literatura, é dividida
em duas partes. A primeira, denominada “Leitura e interpretação de diferentes
gêneros textuais – literários ou não-literários”, abrange diferença entre “linguagem
literária e não-literária”, modos de organização do discurso e relações “entre
elementos linguísticos, em seus aspectos estilísticos e semânticos, na organização
textual”. A segunda parte, “Organização do pensamento na forma escrita,
considerando o registro culto da língua e seu funcionamento textual-discursivo”,
subdividida em: “Gêneros textuais”, abordando desde o aspecto comunicacional às
marcas linguísticas presentes; “Gramática do texto”, indicando fatores ligados à
coerência e coesão textuais; “Gramática da frase”, morfossintaxe, classes e funções,
dentre outros aspectos da abordagem tradicional da sintaxe; “Gramática da palavra”,
envolvendo os vários aspectos do estudo da palavra, desde semântica até
ortografia.
Para a prova de LPI, indica-se:
O estudo da Língua Portuguesa, no Ensino Médio, deve partir do enfoque da
linguagem em seu valor instrumental, ou seja, como garantia do desenvolvimento de
nossa capacidade de comunicação, de compartilhamento de sentidos no dia-a-dia
como agentes sociais. Logo, considerar que a língua funciona por meio de textos,
em situações concretas de interação – não por meio de palavras e frases isoladas
ou descontextualizadas –, e de importância fundamental para a eficácia
comunicativa. Só assim torna-se possível compreender que [...]a gramática de fato
atua e que ela representa, na verdade, a língua em uso.
Este programa está organizado com base no pressuposto, de que a competência
linguística – a compreensão e a produção proficiente de textos – está diretamente
condicionada pela maneira como somos capazes de perceber o que é gramática: um
conjunto de elementos que estabelecem relações entre si, causando diferentes
efeitos de sentido e organizando a trama textual. Essa é nossa aposta, esse é nosso
desafio: avaliar a compreensão e o uso da gramática para além dos limites da frase,
partindo de necessidades práticas de leitura e interpretação de textos, de produção
escrita, práticas comunicativas de interação com o outro que caracterizam e definem
nossa humanidade.
Desse modo, o exame de Língua Portuguesa Instrumental com Redação priorizara o
emprego efetivo da língua em situações concretas de comunicação sobre o
conhecimento de nomenclatura e regras da gramática normativa.
92
A Prova de Língua Portuguesa Instrumental apresenta a mesma abordagem
no tocante ao aspecto textual-discursivo. Mais uma vez, o caráter pedagógico
aparece, já que enfatiza a abordagem desejada no ambiente escolar, mais
especificamente no Ensino Médio:
O estudo da Língua Portuguesa, no Ensino Médio, deve partir do enfoque da
linguagem em seu valor instrumental, ou seja, como garantia do desenvolvimento de
nossa capacidade de comunicação, de compartilhamento de sentidos no dia-a-dia
como agentes sociais.
A seguir, indica que a língua se realiza nas interações concretas de
comunicação, por meio de textos. Novamente há a necessidade de desconstruir
uma das concepções de ensino de língua tradicional, explicitando que a língua não
deve ser vista “por meio de palavras e frases isoladas ou descontextualizadas”,
apontando a necessidade de se focar na “eficácia comunicativa”, já que a prova
parte do pressuposto da “competência linguística”. Há um esforço continuado de
estabelecer um conceito de gramática: “um conjunto de elementos que estabelecem
relações entre si, causando diferentes efeitos de sentido e organizando a trama
textual”. Mais à frente, ratifica-se a posição em relação ao processo de avaliação,
que deve contemplar “a compreensão e o uso da gramática para além dos limites da
frase, partindo de necessidades práticas de leitura e interpretação de textos, de
produção escrita, práticas comunicativas de interação com o outro que caracterizam
e definem nossa humanidade”. Em suma, só “assim torna-se possível compreender
que [...] a gramática de fato atua e que ela representa, na verdade, a língua em uso.”
Quanto ao programa, ele é apresentado em duas partes somente. A primeira,
chamada de “Conhecimento da gramática descritiva na dimensão do funcionamento
textual-discursivo dos elementos da língua”, aborda diferenças de graus de
formalidade, relação de texto e contexto e análise do sistema linguísticos. A
segunda, “Habilidade de leitura e interpretação como reconstrução de textos em
diferentes níveis”, contemplando aspectos ligados ao discurso, à textualidade, à
enunciação, à organização interna do texto e relações entre textos.
Relacionando orientações e programas, a UERJ mostra uma coerência em
sua abordagem. Em relação ao ambiente escolar, o programa apresenta termos
nem sempre incorporados ao ensino de Língua Portuguesa, oriundos da Linguística
Textual, da Análise do Discurso, Teoria da Enunciação. Apesar de nem todos
figurarem em materiais didáticos, os termos estão, de certa forma, previstos nos
93
PCNs. É necessário, no entanto, certo cuidado na formulação dos enunciados para
que o hermetismo teórico não prejudique a compreensão dos enunciados.
A UFRJ assim expõe ao candidato suas concepções acerca da prova:
A prova de Língua Portuguesa e Literatura Brasileira envolverá leitura, interpretação
e produção de textos. Será avaliada a sua capacidade de compreender um texto, de
discorrer sobre sua organização interna e de relacioná-lo com outros textos nos
aspectos gramaticais, estilísticos e temáticos.
O programa da UFRJ baseia-se nos “subsídios para conteúdos programáticos
de Língua Portuguesa e Literatura Brasileira, publicados pela Secretaria de Estado
de Educação e Cultura, Estado do Rio de Janeiro”. A apresentação da parte II –
Língua Portuguesa – contempla: Língua Falada e Escrita; Noções de Fonética e
Fonologia; Morfossintaxe; Teoria da Comunicação; Noções de Semântica; Sistema
Ortográfico vigente. A exposição apresenta a formulação mais tradicional das
universidades, havendo pouco detalhamento das informações sobre os arcabouços
teóricos. De qualquer forma, indica-se a relação entre leitura e interpretação de
texto, a sua organização interna e outros textos nos “aspectos gramaticais,
estilísticos e temáticos”. Explicita ainda, na parte I – “Compreensão e interpretação
de texto, leitura e análise de texto”, que a atividade “supõe não só a apreensão do
significado textual, mas também das técnicas empregadas na construção desse
significado. Gramática da Frase e Gramática do Texto.” Dessa forma, a UFRJ
também indica a inter-relação entre texto e gramática, reforçando a perspectiva
textual contextualizadora. Apesar da exposição reduzida, a terminologia mais
tradicional é coerente com a proposta de se basear nas indicações da Secretaria
Estadual, o que não traz ao candidato nenhuma dificuldade em relação à
compreensão do programa, por utilizar nomenclatura mais próxima dos livros
didáticos.
A UFF e UNIRIO apresentam orientações e programas idênticos:
O domínio da língua portuguesa em seus vários usos e a capacidade de analisar,
interpretar e aplicar seus recursos expressivos, situando textos em relação a seus
contextos, constitui o embasamento indispensável à formação integral da pessoa e à
conquista da cidadania.
94
Na orientação geral, indicam que será cobrado o “domínio da Língua
Portuguesa em seus vários usos”, levando-se também em consideração “a
capacidade de analisar, interpretar e aplicar seus recursos expressivos, situando
textos em relação a seus contextos”, o que é fundamental para o exercício da
cidadania. Embora brevemente, as universidades relacionam implicitamente que o
domínio da língua envolve outros conhecimentos textuais e contextuais,
relacionando o aspecto linguístico-gramatical ao textual. Essa breve exposição está
apoiada em habilidades expostas a seguir:
Espera-se, portanto, que o candidato através do programa possa:
- reconhecer no idioma nacional elementos de produção de sentido, para que se
concretizem a conservação, renovação e transmissão da cultura brasileira;
[...]
- inferir que, sob as variações pelas quais uma língua se manifesta, concretamente,
há uma estrutura comum que permite a intercompreensão de todos os falantes;
- verificar que a abordagem da norma padrão deve considerar sua
representatividade, como variante linguística de determinado grupo social, e o valor
atribuído a ela, no contexto das legitimações sociais;
[...]
- classificar, descrever e relacionar, adequadamente, as formas linguísticas
delimitadas pelas condições de produção/interpretação dos enunciados
determinados pelos contextos de uso da língua;
- ler e interpretar textos em língua materna, considerando-a como geradora de
significação e integradora da organização de mundo e da própria identidade;
[...]
As habilidades esperadas informam sobre o aspecto interativo da linguagem,
trazendo o aspecto pragmático da comunicação, estabelecendo a relação implícita
entre língua, texto e discurso, presente nos fragmentos: “as variações pelas quais
uma língua se manifesta, concretamente, há uma estrutura comum que permite a
intercompreensão de todos os falantes” e, a seguir, “as formas linguísticas
delimitadas pelas condições de produção/interpretação dos enunciados
determinados pelos contextos de uso da língua”.
Quanto aos seus programas, a UFF e a UNIRIO apresentam a mesma
segmentação que a UFRJ. A parte I – “Compreensão e Interpretação de Texto” –
indica leitura e análise de texto, identificação de gêneros do discurso, estrutura do
parágrafo, fatores da textualidade e tipos de discurso. A parte II – “Língua
Portuguesa” – é subdividida em: “Língua falada e escrita”, graus de formalidade,
adequação da língua ao contexto e sistema ortográfico vigente; “Morfossintaxe”; e
“Semântica e estilística”. A terminologia utilizada não traz problemas ao egresso do
Ensino Médio por ser habitual em seus livros didáticos, à exceção de gêneros do
discurso, enumerados: “narração, descrição e dissertação.”
95
De forma geral, apesar da diferença de exposição, nota-se que as orientações
e os programas estão de acordo com os PCNs. Todas as universidades percebem a
língua e os aspectos a ela referidos como organizadora do discurso verbal,
deflagrada pelas necessidades discursivas, que envolvem o processo de interação
humana.
Quanto à relação vestibular-Ensino Médio, as solicitações realizadas, como já
vimos, afetarão diretamente o ensino escolar. Como elas estão de acordo com as
legislações e orientações educacionais, os programas reforçam necessidades
pedagógicas importantes para a formação do indivíduo leitor e conhecedor da língua
como instrumento de interação social, não se fundamentando as críticas realizadas
ao vestibular, em relação ao ensino de Língua Portuguesa como processo
contraproducente para a educação. Encaminha-se a discussão sobre a utilização de
termos oriundos de teorias aplicadas à língua, como a Análise do Discurso,
Linguística Textual. Muitas delas já vêm sendo utilizadas, como coerência e coesão
textual, ligadas à produção escrita, sendo necessário utilizá-la também como fator
de apreensão e análise de textos.
É importante frisar o caráter pedagógico dos programas. O cuidado em
explicitar concepções de língua e de ensino evidencia a percepção, por parte da
banca de vestibular, de seu papel ativo no cenário educacional.
Os vestibulares, em tese, avaliam candidatos para o ingresso na
universidade. A sua atividade, como já indicado antes, apresenta uma dupla função:
selecionar os futuros universitários e, secundariamente, poder pensar o ensino
básico.
96
4 - AS PROVAS DE VESTIBULAR
As provas de seleção para o acesso aos cursos de graduação, nas
universidades pesquisadas, apresentam-se independentes umas das outras,
buscando cada instituição a melhor avaliação possível dos candidatos. Tendo em
vista o perfil de aluno desejado, as comissões de vestibulares constituem bancas
para a formulação das provas.
O recorte proposto para esta pesquisa foram as provas de acesso ou
vestibulares 2006, 2007 e 2008.
Em relação ao impacto das provas discursivas, temos: na UFRJ, a prova de
Língua Portuguesa e Literatura Brasileira (LPLB) é feita por todos os candidatos; na
UERJ, há duas provas discursivas: uma de Língua Portuguesa Instrumental (LPI),
realizada por todos os candidatos (a redação faz parte da metade da pontuação
dessa prova, mas só será levada em consideração a prova LPI, devido ao objetivo
proposto), e outra, de Língua Portuguesa e Literatura Brasileira (LPLB), realizada
como específica para algumas áreas; na UNIRIO e UFF, as provas de Língua
Portuguesa e Literatura Brasileira (LPLB) são também aplicadas para grupos
específicos. Dessa forma, percebe-se que as provas de maior impacto, por serem
aplicadas a todos os candidatos, são as da UERJ e da UFRJ.
Antes da análise, verificou-se, nas páginas da internet das universidades e
nos jornais O Globo e Folha Dirigida, se houve algum problema de formulação de
questões ou de publicação de gabaritos. As análises das provas variam, mas não foi
relatado problema algum que viesse a comprometer o exame das questões
selecionadas. A análise das provas, nos jornais indicados, é realizada por
professores de cursos preparatórios e de colégios. Seria possível analisar a
repercussão das provas nesses jornais em relação aos graus de
facilidade/dificuldade, mas se veiculam comentários parciais e generalizantes feitos
por poucos profissionais, o que não os validaria como referência acadêmica. Todas
as observações indicam a pertinência das questões em relação aos programas, não
relatando nenhum comprometimento do processo seletivo.
As questões específicas do campo literário não são analisadas, sendo
indicadas com o termo “Literatura”. Esses casos englobam conhecimentos relativos
97
à Teoria Literária, às estéticas e aos aspectos históricos. Como a maior parte das
provas são de Língua Portuguesa e Literatura Brasileira, há questões referentes a
textos literários relacionadas à compreensão textual ou relação entre textos, sendo
essas computadas.
Neste capítulo, o processo de análise se divide em dois momentos: no
primeiro, são analisadas as provas de forma geral, levantando aspectos
relacionados às solicitações realizadas e aos tipos de conhecimento prévio,
conceitos e habilidades envolvidos e das inferências necessárias; no segundo, há
uma análise das questões de maior dificuldade para os candidatos. São analisadas
somente as provas da UERJ e UFRJ (2006 e 2008) das quais tivemos acesso às
notas médias por questão.
4.1 Análise geral das provas
O processo de análise, nesta parte, é feito a partir de quadros separados por
instituições. Neles, cabem as seguintes indicações: ano da prova, número da
questão, habilidade solicitada, conceitos/habilidades envolvidos, tipo de
conhecimento prévio e de inferência solicitados.
O uso do quadro busca a exposição visual de dados relevantes para a análise
dos aspectos destacados, conforme objetivos propostos nesta tese. Após a leitura
de cada questão, são relacionadas as informações presentes nos enunciados
(solicitações), os conceitos, as habilidades e os conteúdos envolvidos. A partir daí,
são indicados os tipos de conhecimento prévio necessários, assim como o tipo de
inferência realizada, de acordo com o embasamento teórico exposto anteriormente.
Em relação à habilidade solicitada, há a transcrição do verbo de ação
presente na prova ou de expressão equivalente. Isso, na análise dos dados, é
relacionado às competências, que se baseiam no quadro proposto pela UERJ,
conforme a seguir:
98
COMPETÊNCIAS HABILIDADES
OBSERVAR
IDENTIFICAR, INDICAR, RECONHECER, NOMEAR, APONTAR,
REPRESENTAR GRAFICAMENTE
INTERPRETAR
CALCULAR, utilizando procedimentos pessoais ou convencionais;
COMPOR OU DECOMPOR em fatores ou elementos básicos;
DESCREVER, utilizando diferentes formas de representações;
EXPLICAR, EXEMPLIFICAR, demonstrando compreender relações já
estabelecidas;
DISCRIMINAR, estabelecendo diferenças entre níveis de estratégias;
CLASSIFICAR, ORDENAR, de acordo com um critério.
ANALISAR
FAZER antecipações sobre o resultado de experiências e sobre a
continuidade de acontecimentos;
TRANSFERIR conhecimentos estabelecidos anteriormente a
situações novas;
LEVANTAR hipóteses, demonstrando o estabelecimento de relações
novas;
JUSTIFICAR acontecimentos, resultados de experiências, opiniões,
interpretações, decisões.
AVALIAR
CRITICAR, JULGAR, com base em critérios internos ou externos.
CRIAR
APRESENTAR CONCLUSÕES a respeito de ideias, textos,
acontecimentos, situações;
FAZER GENERALIZAÇÕES fundamentadas, com produção de novas
formas e novos conteúdos.
UERJ Manual do Candidato [2ª Fase: Exame Discursivo] / Anexo V
Anexo V: Competências / Habilidades
As competências, pelo que se pode perceber no quadro acima, partem da
mais elementar, “OBSERVAR”, aumentando sequencialmente a complexidade.
Em relação ao tipo de conhecimento prévio, indicamos os seguintes números
relacionados aos tipos, conforme proposta de Cabral (2005), por nós adaptada:
1) linguístico-gramatical (conhecimentos gerais sobre a língua);
2) textual (domínio de tipos e gêneros textuais);
3) conhecimento de mundo (conhecimento adquirido, organizado a partir de
esquemas);
4) discursivo (relacionado ao contexto em que se insere o texto).
Sobre a classificação das inferências, utilizamos as letras “T” e “C”, conforme
proposta de Marcuschi:
99
T – inferência de nível textual
C – inferência de nível contextual
A seguir as provas são analisadas por meio de quadros numerados:
QUADRO I
UERJ – LÍNGUA PORTUGUESA INSTRUMENTAL (2006-2008)
LPI Nº Solicitação
Conceitos
habilidades envolvidos
Conhec
prévio
Infer
1 Identifique relação subtítulo ao tópico dado 2,3 T
2 Reescreva
relação de sentido/orações
subordinadas/
conjunções
1,3 T
3 Explicite
ponto de vista central e o recurso
utilizado argumentação, estratégias
discursivas
1, 2,3,4 C
4 Explique figuras de linguagem 1,3 T
2008
5 Explique / indique
estranhamento "verbo medo"/ o seu
sentido
função morfológica, semântica no
texto
1,3 T
1 Transcreva
passagens - degradação do ambiente
funções da linguagem, modo de
organização do discurso
3,4 C, T
2 Indique e retire
relação de sentido/ exemplo de
estrutura uso de pronome,
reconhecimento de padrão sintático
1,3 T
3 Transcreva trechos
Interlocução, situação comunicativa -
estratégias discursivas
2,4 C, T
4 Transcreva/indique relação tema – texto 2,3 T
2007
5 Reescreva/identifique semântica/conjunções-orações 1,3 T
Explique ideias paradoxais 3 T, C
1b Indique semântica/conjunções 1,3 T
2ª Aponte semântica/substantivo 1 T
2b Reescreva denotação/conotação 1,3 T
3a Identifique/defina comparação: mecanismo de coesão 1,2,3 T
3b Cite comparação: diferença/semelhança 2,4 T,C
Explique semântica de palavras/metáforas 1,3 T
4b Indique intenção do enunciador 3,4 C
Aponte intenção do enunciador 3,4 C
2006
5b Identifique comparar características de textos 2,3 T
As provas de vestibular precisam apresentar clareza em suas solicitações.
Para que isso ocorra, é necessário, por parte da banca, estabelecer uma expectativa
de conhecimento prévio para o egresso do Ensino Médio. É por meio do
levantamento das provas que perceberemos as necessidades mencionadas.
100
As questões das provas, em geral, evidenciam dois momentos: um de
contextualização e outro de solicitação.
Para ilustrar, o que se apresenta no Quadro I, vejamos dois exemplos:
QUESTÃO 1 [VESTIBULAR 2008]
O texto desenvolve o alerta feito no título, expondo duas ameaças à rede mundial de
computadores. Essas ameaças são apresentadas, especificamente, pelos dois
subtítulos.
Identifique a que ameaça se refere cada um dos subtítulos do texto.
QUESTÃO 5 [VESTIBULAR 2007]
A vela que ilumina é uma vela alegre. (l. 4)
O conectivo que, além de introduzir uma caracterização para o substantivo vela,
estabelece relações lógicas entre as duas orações presentes no período acima.
Reescreva esse período de duas maneiras diferentes, sempre substituindo o
conectivo que, de modo a explicitar dois tipos de relações lógicas entre as orações.
A seguir, identifique o tipo de relação estabelecida em cada um dos períodos
reescritos.
Como se percebe, as duas questões trazem um aspecto de contextualização.
Isso serve, segundo os estudos cognitivos, para ativar o conhecimento prévio,
liberando-o para a memória de trabalho. A solicitação indica a(s) tarefa(s) a ser(em)
cumprida(s), com um verbo de ação no imperativo. A relação entre as duas partes
dará ao candidato leitor a capacidade de buscar o conhecimento prévio adequado,
para a realização da tarefa. Embora as questões se relacionem a textos, não cabem,
na avaliação, várias possibilidades de leitura, o que se espera é um leitor
estratégico, capaz de selecionar conhecimentos relevantes para a resposta. A
interpretação, em outras perspectivas, é necessária no processo escolar para que o
candidato possa organizar conhecimentos esquematizados para a realização das
provas. Aqui, tocamos em um ponto importante. No Quadro I, notamos que o tipo de
conhecimento prévio de número 3 aparece várias vezes. Ele indica o conhecimento
de mundo organizado pelo leitor, em forma esquemática, tanto para os chamados
“conteúdos escolares”, como estratégias para a solução de problemas. Sem a
organização esquemática, o candidato perderá mais tempo fazendo a prova, o que
lhe trará prejuízo na avaliação.
Outro aspecto a se notar é o elemento coesivo presente entre as duas partes.
Na primeira questão apresentada, a coesão ocorre em torno da palavra “ameaça(s)”.
Já na segunda, os elementos coesivos importantes são “relações lógicas”, “a seguir”
e “tipo de relação”. O leitor precisará perceber o encaminhamento para realizar uma
leitura coerente do enunciado, para selecionar o conhecimento prévio necessário.
101
Em relação à visão global da prova de Língua Portuguesa Instrumental,
apresenta, em seus enunciados, 16 menções à competência OBSERVAR, por meio
de “Identifique”, “Cite”, “Indique”, “Transcreva”, Retire” e correlatos. Isso mostra a
indicação mais básica das competências. Ao olharmos o quadro acima, podemos
verificar que tais comandos relacionam-se com aspectos mais complexos: “relação
textual entre parte x todo”, “relações entre aspectos textuais e linguísticos”, dentre
outros. É importante observar que as questões são complexas, mesclando variados
conhecimentos prévios, competências e habilidades. A análise por meio só de
competências não é suficiente. Para a compreensão da questão, são necessários
conhecimentos escolares organizados, esquemas prévios para soluções de
problemas, conhecimento conceitual/terminológico, pois a falta de conhecimento de
uma palavra que expresse um conceito pode comprometer o entendimento da
questão para o candidato. Analisamos tais fatores no item 4.2.
A segunda competência mais utilizada nas provas acima foi INTERPRETAR,
com a utilização dos verbos “Explique”, “Explicite”. O uso de tais verbos também
envolve a discussão realizada no parágrafo anterior.
A solicitação de habilidades/competências exigida dos candidatos vai da
básica à média, coerente com o caráter prático dado pela banca, um caráter
instrumental.
Em relação aos conceitos/habilidades envolvidos, foram solicitados:
Conhecimentos
textual-discursivos
Relação entre as partes do texto e compreensão global, entre tese e
argumento; entre tema-texto; modos de organização do discurso;
situação comunicativa, interlocução, intenção estratégias
discursivas; comparação de características de textos e de diferença
de abordagem temática entre textos; mecanismo de coesão.
Conhecimentos
linguístico-
gramaticais
Relação de sentido/orações subordinadas/conjunções; figuras de
linguagem; classes de palavras, semântica no texto; funções da
linguagem; reconhecimento de padrão sintático;
figuras de linguagem (paradoxo e metáfora); denotação/conotação.
Quanto aos conhecimentos prévios solicitados, todos estão listados e de
acordo com o programa apresentado ao candidato. As questões são embasadas nos
textos e dele partem como fator de contextualização, previsto nos PCNs.
Quanto aos tipos de conhecimento prévio, toda a prova demanda um
conhecimento linguístico básico para a leitura das questões. É necessário perceber
102
que o conhecimento linguístico solicitado nas provas, em geral, demanda um
aprofundamento e sistematização conseguidos a partir dos estudos linguísticos. São
poucas as questões que estão em um nível elementar de uso automático da língua.
No Quadro I, podemos verificar todos os conhecimentos solicitados, indicando
uma necessidade de o vestibulando participar com os conhecimentos adquiridos,
como já enfatizamos antes.
Percebemos, na última coluna, a predominância de inferências textuais,
segundo a indicação de Marcuschi. Isso aponta para a prova ser organizada com
forte relação entre as questões e o texto fornecido. O candidato, no entanto, terá de
suprir as lacunas deixadas com o seu conhecimento prévio, de vários níveis,
inclusive terminológicos, pois, por exemplo, necessita saber “funções da linguagem”
e “ideias paradoxais”. O uso de terminologia específica, nessas provas, ocorreu nos
enunciados, não como solicitação de resposta, o que ratifica o caráter instrumental
até aqui evidenciado.
Passemos, agora, ao outro tipo de prova da UERJ.
QUADRO II
UERJ - LÍNGUA PORTUGUESA E LITERATURA BRASILEIRA (2006-2008)
LPLB Nº Solicitação
Conceitos/habilidades
envolvidos
Conhec
prévio
Infer
1 Nomeie/caracterize rima/metáfora
2,3 T
2 Relacione/Identifique
campo semântico/identidade e
oposição
2,3 T
3
Classifique
orações/reescreva-as
conjunções, orações,
coordenação e subordinação
1,3 T
4 Explicite conteúdos Subentendidos
3,4 T
5 Explique e transcreva
distinguir abordagem sobre o
tema dado passagem que a
comprove
1,2 T,C
6 Literatura
7 Indique/justifique
pronome demonstrativo e
função textual/coesão
2,3 T
8 Literatura não analisada
9 Literatura não analisada
2008
10 Indique/Caracterize varição lgtca/uso do diminutivo
1,3 T
1 Literatura não analisada
2 Literatura não analisada
2007
3
Transcreva
orações/reescreva-as
separação orações/ordem
direta-inversa/sujeito-predicado
2 T
103
4 Reescreva
ponto de vista externo/uso de
pronomes e verbos
1,3 T,C
5 Literatura não analisada
6 Correlacione e identifique
referenciação - elementos e
personagens no texto
1, 2 T
7 Identifique e cite variação linguística
1,3 T
8 Explique
processo de formação de
palavras
1,3 T
9 Identifique / explique
função sintática / efeito
estilístico
3 T
10 Nomeie/descreva
processo de formação de
palavras/ efeito estilístico
1, 3 T
1
Reescreva/transcreva/
Identifique
interlocução-uso de imperativo
tu-você/forma verbal subjuntivo
1,4 T, C
2 Explique-indique/reescreva
atitude enunciativa/sinônimos
de palavras
1,4 T, C
3
Indique-explicite/transcreva-
justifique
ambiguidade/localizar verso -
sentido dado
1,2 T
4
Identifique-
transcreva/Indique-
reescreva
polissemia/infinitivo-sinônimo
1, 3 T
5
Transcreva-
explicite/Reescreva
termos acessórios ao texto-
papel argumentativo/padrão
sintático
1,3,4 T, C
6 Literatura não analisada
7 Cite/Explique
vantagem-desvantagem/tópico
dado
2, 4 T, C
8 Nomeie/Identifique
modos de organização do
discurso/semântica dos verbos
1,3,4 T,C
9
Transcreva-
indique/Identifique-explique
figura de linguagem-valor
expressivo/relação se sentido-
oposição
1,3 T
2006
10 Identifique
tópico textual/substantivos-
elementos coesivos
1,2,3 T
As questões das provas acima (Quadro II) apresentam também dois
momentos: um de contextualização/afirmação e outro de solicitação.
Para comprovar, trazemos um exemplo:
QUESTÃO 1 [VESTIBULAR 2008]
De modo geral, a crônica apresenta uma linguagem simples e despretensiosa,
próxima da conversa de todo dia.
Murilo Mendes, porém, elabora a sua crônica com recursos expressivos comumente
associados à função estética da linguagem.
Observe o trecho abaixo, no qual estão sublinhados dois desses recursos.
Não é fácil ver-se o lixeiro. Trata-se de um personagem kafkiano, quase marciano.
Deixa-se a lata do lado de fora, e ele, pisando com pés de lã
, invisível aos olhos
mortais, discreto, Obediente, esvazia a esfera azul. (l. 12-16)
Nomeie cada recurso e caracterize seu valor expressivo.
104
Como se percebe, a questão apresenta contextualização/afirmação,
indicando, a seguir, a tarefa. Também utiliza os elementos coesivos importantes
entre os parágrafos, começando com “recursos expressivos”, depois aparece “a
indicação de “dois desses recursos sublinhados” e, por fim, “cada recurso e
caracterize seu valor expressivo”.
A prova de Língua Portuguesa e Literatura Brasileira da UERJ apresenta, em
seus enunciados, nas 23 questões analisadas, 20 menções à competência
OBSERVAR, por meio de “Identifique”, “Cite”, “Indique”, “Transcreva”, Retire”
A segunda competência mais utilizada nas provas acima foi INTERPRETAR,
conforme a Prova Instrumental, com a utilização também dos verbos “Explique”,
“Explicite”, aparecendo, além deles, “Classifique”, “Relacione”, “Descreva”. Aparece,
nas provas de Língua Portuguesa e Literatura Brasileira, o comando “Justifique”,
referente à competência ANALISAR. Isso mostra que a prova mede conhecimentos
mais específicos, sendo necessário um grau um pouco maior de aprofundamento.
Em relação aos conceitos/ habilidades envolvidos, foram solicitados:
Conhecimentos
textual-discursivos
Relação entre partes do texto (vantagem/desvantagem) e entre
textos diferentes a partir de tópico dado, atitude enunciativa e papel
argumentativo de termos linguísticos; modos de organização do
discurso; processos coesivos a partir de elementos linguísticos,
interlocução; subentendidos, referenciação - elementos e
personagens no texto
Conhecimentos
linguístico-
gramaticais
Campo semântico/identidade e oposição; conjunções, orações,
coordenação e subordinação; pronome demonstrativo e função
textual/coesão; separação orações/ordem direta-inversa/ sujeito-
predicado; ponto de vista externo/uso de pronomes e verbos;
variação linguística/uso do diminutivo; processo de formação de
palavras; função sintática / efeito estilístico, uso de tempos e modos
verbais; sinonímia; ambiguidade; polissemia; figuras de linguagem-
valor expressivo.
Quanto aos conhecimentos prévios solicitados, todos estão listados e de
acordo com o programa. As questões são embasadas nos textos e dele partem
como fator de contextualização, previsto nos PCNs. A diferença dessa prova para a
Instrumental é que há uma ênfase maior nos aspectos linguísticos, necessitando o
candidato de um acervo mais extenso e grau de aprofundamento maior, já que os
conhecimentos escolares cobrados são mais vastos e as competências um pouco
105
mais exigidas. São cobrados também os conhecimentos textuais e os discursivos,
embora em menor número, relacionados constantemente aos elementos da língua.
Na última coluna, permanece a predominância de inferências textuais, o que
aponta para a prova ser organizada com forte relação entre as questões e o texto
fornecido. Sendo as provas um elemento fundamental na seleção dos candidatos, é
necessária uma limitação de possibilidades interpretativas de cada candidato, para
não haver uma proliferação de respostas válidas, o que pode levar à falta de
objetividade do processo. O candidato, apesar do embasamento textual, deverá
suprir as lacunas deixadas com o seu conhecimento prévio, de vários níveis,
inclusive terminológicos. Nas provas de Língua Portuguesa e Literatura Brasileira, a
metalinguagem utilizada nos enunciados é mais variada, o que aumenta o grau de
dificuldade para o candidato, embora, em sua maior parte, eles estejam presentes
nas falas dos professores em aulas e nos livros didáticos. O grau complicador está
na cobrança de vários conhecimentos em uma mesma questão, relacionando os
aspectos linguístico-gramaticais aos textual-discursivos.
De forma geral, a UERJ, em seu processo seletivo, cumpre com o previsto
nos programas.
Passemos, agora, às provas da UFRJ.
QUADRO III
UFRJ - LÍNGUA PORTUGUESA E LITERATURA BRASILEIRA (2006-2008)
LPLB Nº Solicitação
Conceitos/habilidades
Envolvidos
Conhec
prévio
Infer
1 Transcreva
oração subordinada adverbial –
hipótese
1,3 T
2 Comprove a vitalidade sufixo diminutivo 1,3 T
3 Substitua o vocábulo "mormente" – sinonímia 1 T
4 Literatura não analisada
5 Explique/identifique
elementos
fônicos,morfossintáticos/relação
semântica no plano vocabular
1,3 T
6 Literatura não analisada
7 Literatura não analisada
8 Identifique
4 processos de formação de
palavras/estrutura de palavras
1,3 T
9 Justifique a afirmativa
julgar, relacionando à
organização do plano sintático
1,3 T
2008
10 Relacione ideias específicas em dois textos 2,4 T,C
2007
1 Identifique/Diferencie palavra+sufixo+prefixo / duas 1,3 T
106
categorias dadas
2 Identifique/Descreva
sentido de palavra / estruturas
gramaticais-variação de forma
1,3 T
3
Identifique a
passagem/Explicite
diferentes pontos de vista-
perspectivas/ambiguidade da
expressão dada
1, T, C
4 Comprove a afirmativa
relação entre textos - aspectos
positivos e negativos
2 T
5 Nomeie recurso formal
Indicador de hipótese, uso de
verbo
1,3,4 T
6 Explicite espaços subjetivos
uso de elementos repetidos pelo
poeta
2, 4 C
7 Literatura não analisada
8 Literatura não analisada
9 Literatura não analisada
10 Explique
alternância no discurso 2ª e 3ª
pessoa
1,4 T,C
1 Explique semântica das palavras 1 T
2 Identifique e justifique
emprego de tempo verbal na
narrativa
1,3 T
3 Literatura não analisada
4 Explique/justifique
interlocução- leitor - situação
comunicativa
3, 4 C
5 Explicite uso argumentativo da conjunção 1,4 C
6 Explicite/justifique oposição - campos semânticos 1,3 T
7 Literatura não analisada
8
Explique
semelhança/identifique
recurso linguístico
Comparação entre textos tópico
dado - elemento coesivo
1,2,3 T,
9 Compare
Compreensão de texto - relação
entre textos
2,3 T
2006
10 Explique
Distinção da abordagem sobre o
tema dado
2,3 T
As questões das provas da UFRJ apresentam também dois momentos: um de
contextualização/afirmação e outro de solicitação, como ocorre na questão 4, do
vestibular de 2007:
QUESTÃO 4 [VESTIBULAR 2007]
O texto I tem seu foco principal num tipo de comportamento cuja visão de mundo é
contrária à do personagem do texto II.
Comprove o conteúdo dessa afirmativa no que se refere às atitudes manifestadas,
em ambos os textos, diante de fatos que seriam considerados, em geral, positivos
ou negativos.
A prova realizada pela UFRJ traz o verbo de ação em negrito, para destacá-lo
ao candidato. Isso tem por objetivo marcar o que se pede, facilitando a leitura, o que
pressupõe um leitor menos hábil e menos estratégico. Os elementos coesivos
107
também estão presentes: a primeira frase é uma afirmação, depois ela é retomada
por “conteúdo dessa afirmativa”.
A prova de Língua Portuguesa e Literatura Brasileira da UFRJ apresenta, em
seus enunciados, nas 22 questões analisadas, 13 menções à competência
OBSERVAR, por meio de “Identifique”, “Cite”, “Indique”, “Transcreva”, Retire”. A
predominância segue as provas analisadas anteriormente.
A segunda competência mais utilizada nas provas acima foi INTERPRETAR,
com 9 menções, englobando os verbos “Explique”, “Explicite” e “Descreva”.
Em referência à competência ANALISAR, são usados os verbos “Justifique” e
“Compare”, com 6 menções.
Além dessas, aparece, diferentemente das outras provas, duas questões com
o comando “Comprove”, nos vestibulares de 2007 e 2008, atingindo a competência
AVALIAR e CRIAR. Na questão 2 (vestibular 2008), solicita-se que o candidato
“Comprove a vitalidade do sufixo diminutivo”, para isso, além de observar, o
candidato precisa fazer algum nível de generalização em seu uso no texto; dessa
forma, ele necessita CRIAR essa vitalidade. Na questão 4, do vestibular de 2007, o
texto é “Comprove a afirmativa”; com isso, o candidato precisa julgá-la, envolvendo a
competência AVALIAR.
Em relação aos conceitos/habilidades envolvidos, foram solicitados pela
UFRJ:
Conhecimentos
textual-discursivos
Diferentes pontos de vista/perspectivas relação entre textos;
interlocução - leitor - situação comunicativa, relacionando-a à
organização do plano sintático; alternância no discurso 2ª e 3ª
pessoa; relação comparativa entre textos – semelhanças e
distinções de abordagens acerca do tema dado.
Conhecimentos
linguístico-
gramaticais
Oração subordinada adverbial – hipótese; uso de diminutivo;
sinonímia; elementos fônicos,morfossintáticos/relação semântica no
plano vocabular; processos de formação de palavras/estrutura de
palavras; estruturas gramaticais-variação de forma; ambiguidade;
emprego de tempo verbal na narrativa; uso argumentativo da
conjunção; campos semânticos.
Em relação aos conhecimentos prévios solicitados, todos estão listados e de
acordo com o programa apresentado ao candidato. As questões são embasadas nos
textos e dele partem como fator de contextualização, previsto no PCN. Seguindo o
padrão da Prova de Língua Portuguesa e Literatura Brasileira, há uma cobrança de
108
conhecimento linguístico variado, em geral, aplicado aos textos. Algumas questões,
como a de estrutura e formação de palavra, não demandam uma volta ao texto,
podendo tê-lo ou não como apoio.
As provas da UFRJ apresentam resultado similar aos da Prova de LPLB da
UERJ: há uma ênfase maior nos aspectos linguísticos (conhecimento prévio
espontâneo e esquematizado 1 e 3), necessitando o candidato ter um acervo mais
extenso e grau de aprofundamento maior, já que os conhecimentos escolares
cobrados são mais vastos e as competências um pouco mais exigidas. São
cobrados também os conhecimentos textuais (2) e os discursivos (4), embora em
menor número, sendo esses relacionados constantemente aos elementos da língua.
Na última coluna, segue também a mesma predominância de inferências
textuais, o que aponta para a prova organizada com forte relação entre as questões
e o texto fornecido.
A UFRJ, em seu processo seletivo, cumpre com o previsto nos programas,
inserindo competências diferenciadas: AVALIAR e CRIAR.
Passemos, agora, às provas da UFF.
QUADRO IV
UFF - LÍNGUA PORTUGUESA E LITERATURA BRASILEIRA (2006-2008)
LPLB Nº Solicitação
Conceitos/habilidades
envolvidos
Conhec
prévio
Infer
1 Transcreva afirmativas / indique
diferentes pontos de
vista/importância dada
pelo autor
2, 4 T,C
2
Reescreva no padrão culto /
Justifique a função expressiva
conc. nominal, uso de
pronome, verbo irregular,
flexão de adj/adv.
1,3 T
3
Destaque o jogo linguístico
(charge)
Ressignificação do título a
partir da pontuação,
abordagem crítica de
política no país, diferença
de sentido pelo uso de
artigo.
2,4 T,C
4 Transcreva passagem
Relação
causa/consequência
2, 3 T
2008
5 Literatura não analisada
1
Compare textos e aponte /
Retire e reescreva
comparação de
tema/assunto, passar para
padrão culto (grafia,
concordância, regência e
pontuação)
1,2,3 T
2007
2 Explique a criação de novo Ressignificação de texto 1,3 T
109
sentido conotação/denotação
3
Estabeleça relação entre lgem
não verbal/verbal
Relação entre partes do
texto
2 T
4
Interprete a leitura crítica do
cotidiano / Exemplifique
leitura literária, leitura
global do texto/aspectos
estilísticos
2, 4 C
5
Identifique / Nomeie / Retire /
Identifique
intertextualidade,
linguagem verbal/não
verbal, referente
1, 2, 3 T
1 Transcreva oração reconhecimento vocabular 1, 3 T
2 Redija +/- 5 linhas
Variação linguística, com
ironia, humor, uso
coloquial etc.
1, 2, 4 T, C
3 Identifique /Transcreva
relaciona aspectos
textuais (progressão,
retomada) a aspectos
gramaticais (pronome,
aspecto sintático-
semântico
1, 2, 3 T
4 Aponte / Justifique
interlocução autor-leitor,
formas pronominais
1,3,4 T, C
4b Literatura não analisada
2006
5 Apresente/exemplifique
diferença de linguagem
que caracteriza gêneros
textuais - textos V e VI
2 T
Na prova de 2008, há elementos verbais e não-verbais, sendo abordado
principalmente o aspecto verbal em campanha publicitária, quadrinhos e charge. Há
solicitação da relação dos elementos verbais e não-verbais em várias questões. Só
há uma imagem, que acompanha um texto verbal, sem necessidade de sua
apreensão.
As questões das provas da UFF apresentam também, em sua predominância,
dois momentos: um de contextualização, afirmação ou instrução e outro de
solicitação.
QUESTÃO 1 [VESTIBULAR 2006]
O trecho acima retrata o modo de vida de migrantes segundo dados culturais
regionais ressignificados pela influência da mundialização.
Transcreva do texto uma oração que apresenta uma apropriação vocabular
resultante do fenômeno da mundialização.
Na prova de Língua Portuguesa e Literatura Brasileira da UFF, em seus
enunciados, nas 23 questões analisadas, há 13 menções à competência
OBSERVAR, por meio de “Identifique”, “Cite”, “Indique”, “Transcreva”, Retire”. A
predominância segue as provas analisadas anteriormente.
110
A segunda competência mais utilizada nas provas acima (Quadro IV) foi
INTERPRETAR, com 5 menções, englobando os verbos “Interprete”, “Apresente”,
“Explique”, “Estabeleça [a relação]”, “Explicite” e “Descreva”.
Em referência à competência ANALISAR, são usados os verbos “Justifique”,
com 2 menções.
Além dessas, diferentemente das outras provas, há uma questão, do
vestibular de 2006, em que foi solicitada uma pequena redação de 5 linhas, exigindo
o uso de variação linguística popular, presente nos textos dados. Essa é uma
questão inusitada que não mais apareceu nas provas. Além disso, houve o uso de
elementos não-verbais nas provas de Língua Portuguesa, o que é incomum, já que
se prioriza, nas provas discursivas, o texto verbal.
Em relação aos conceitos/habilidades envolvidos, foram solicitados:
Conhecimentos
textual-discursivos
Aspectos textuais (progressão, retomada) relacionados a aspectos
gramaticais (pronome, aspecto sintático-semântico); interlocução
autor-leitor; diferença de linguagem que caracteriza gêneros
textuais; relação comparativa de textos a partir de tópico dado;
ressignificação de texto pelo novo contexto; conotação/denotação;
relação entre partes do texto e sua leitura; pontuação; aspectos
discursivos em relação ao autor.
Conhecimentos
linguístico-
gramaticais
Variação linguística; uso de formas pronominais, uso padrão da
língua (grafia, concordância, regência e pontuação);
intertextualidade, linguagem verbal/não verbal; verbo irregular, flexão
de adjetivo/advérbio; aspecto semântico do uso de artigo; relações
de causa e consequência.
Quanto aos conhecimentos prévios solicitados, todos também estão listados e
de acordo com o programa. Deve-se notar a notoriedade dada ao aspecto textual e
discursivo em relação aos elementos linguístico-gramaticais, se comparados,
proporcionalmente, às provas similares da UFRJ e UERJ.
Na última coluna, segue a mesma predominância de inferências textuais, o
que aponta para a prova organizada com forte relação entre as questões e o texto
fornecido.
De forma geral, a UFF, em seu processo seletivo, cumpre com o previsto nos
programas, enfatizando um pouco mais o conhecimento prévio textual, relacionando,
quando solicitados, os conhecimentos linguísticos aos textuais e discursivos.
Apresenta uma questão que, diferentemente das demais, solicita conhecimento
111
prévio social para a análise da charge (questão 3, do vestibular 2008). Esse tipo de
questão é pouco encontrado. Na nossa análise, só houve uma recorrência.
Passemos, agora, às provas da UNIRIO.
QUADRO V
UNIRIO - LÍNGUA PORTUGUESA E LITERATURA BRASILEIRA (2006-2008)
LPLB Nº Solicitação
Conceitos/habilidades
Envolvidos
Conhec
prévio
Infer
1
Transcreva 2
expressões/Explique
por que
Aspectos discursivos 3,4 C
2 Escreva aspectos discursivos, argumentação 2,4 C
3
Destaque do texto 2
formas
verbais/Reescreva
registro culto padrão
Uso padrão: regência 1,3 T
4 Explique por que
Relação entre visão dos
personagens e contexto discursivo
3, 4 C
5
Transcreva 3 versos
consecutivos
exemplos de hipérbole 1,3 T
6
Transcreva verso da
3ª estrofe
antecipa o verso ... da 5ª estrofe 2 T
7
Escreva o valor
semântico
do imperativo em ... e ... 1,3 T
8 Literatura não analisada
9
Transcreva
integralmente
exemplo de consequências 2,3 T
2008
10 Escreva
tese defendida/argumento
contundente pró-tese
2,4 C
1
Transcreva a
sequência de 2 versos
ironia - figura de linguagem 3, 4 T
2 Literatura não analisada
3
explique sequência de
orações interrogativas
aspectos textuais - relação entre
parágrafos e título, retomada
enfática
2,3,4 T, C
4
Explique tipos de
pessoas pelas atitudes
agrupar os tipos que aparecem no
texto, analisar e criar grupos
3 T
5
Transcreva
frase/explique recurso
Uso discursivo de pronome 1, 3, 4 T, C
6 Explique sentido
semântica de expressão "lata
voadora"
1 T
7
Interprete (na quebra
de sequência
discursiva)
função do 2º e 3º parágrafos,
progressão textual, situação
comunicativa
2,4 T, C
2007
8
Transcreva do texto I
e II, segmentos que
exemplifiquem verso
dado
relação semântica entre textos 2, 3 T
112
9 Explique
recurso semântico do uso de
exemplo, relação textual - coerência
na argumentação, aspectos
discursivos
2, 4 T
10
Reescreva a
expressão
uso de locuções conjuntivas,
elemento coesivo, coesão textual,
uso de tempo e modo verbal
1, 2, 3 T
1
Que semelhanças?/A
que tempo se
referem?
experiências semelhantes em
momentos de vida diferentes -
compreensão de texto
2, 3 T
2
Diga o significado da
expressão
semântica da expressão no texto 1, 2 T
3
Qual o estado de
espírito do
emissor/Transcreva
compreensão textual, localização de
exemplo.
2, 3 T
4 transcreva 2 falas
apresentem argumentação e contra-
argumentação, aspectos discursivos
2, 4 T, C
5 Transcreva trecho
intenção discursiva em fatos
narrados
2,4 T, C
6 Interprete
compreensão de vocábulo
relacionado à compreensão global
do texto
1, 2 T
7
Qual a finalidade da
forma verbal
emprego do presente do indicativo
em frase, aspecto verbal
(presentificação)
1,3 T
8 Literatura não analisada
9
Identifique sentidos
distintos para
"menino(s)
semântica de vocábulo, polissemia,
aspecto interpretativo
1, 3 T
2006
10
Qual o significado das
estruturas sublinhadas
(mesmo valor
semântico)
relação argumentativa, uso de
conjunções no texto
1, 2, 3 T
As questões das provas da UNIRIO não apresentam, no período analisado, o
mesmo padrão das demais universidades.
No vestibular 2006, havia, na maior parte das questões, o padrão descrito nas
provas anteriores:
QUESTÃO 7 [VESTIBULAR 2006]
Nos três primeiros parágrafos do texto Pecado e Virtude, predomina o uso do verbo
no presente do indicativo.
Qual a finalidade do emprego da forma verbal nesta primeira fase do texto?
Diferentemente, não aparece um verbo de ação, mas pronome interrogativo.
Isso ocorreu em quatro questões.
Também nessa prova, em algumas questões, há somente a solicitação,
seguida de um breve aspecto contextual:
113
QUESTÃO 6 [VESTIBULAR 2006]
Interprete o advérbio “duplamente”, considerando o sentido global do 5º parágrafo.
A partir do vestibular de 2007, não aparecem mais pronomes interrogativos,
somente verbos de ação. Quanto ao formato das questões, há variação: a
contextualização/afirmação pode anteceder a solicitação; ou, como no último
exemplo, a solicitação pode vir junto a uma breve contextualização. Isso pode ser
visto em dois aspectos: 1) positivo, há pouco texto na questão, facilitando a leitura;
2) negativo, a falta de contextualização traz dificuldades de ativação do
conhecimento prévio por parte dos candidatos.
A prova da UNIRIO solicita, como as demais, maior nível de inferência textual,
por motivos já anteriormente expostos: deve-se diminuir a possibilidade de variações
de resposta, já que a avaliação deve ser corrigida em um tempo curto, previamente
determinado pelas comissões de vestibular.
A prova da UNIRIO de Língua Portuguesa e Literatura Brasileira apresenta,
nas 27 questões analisadas, 11 menções à competência OBSERVAR, por meio de
“Identifique”, “Cite”, “Indique”, “Transcreva”, “Escreva”. O último verbo é pouco
usado pelas bancas de língua portuguesa, provavelmente por haver outros mais
específicos e objetivos, como “Aponte”, “Indique”. A predominância segue as provas
analisadas anteriormente.
A segunda competência mais utilizada nas provas acima (Quadro V) foi
INTERPRETAR, com 9 menções, englobando os verbos “Interprete”, “Explique”,
“Escreva”.
Em relação aos conceitos/habilidades envolvidos, foram solicitados:
Conhecimentos
textual-discursivos
Aspectos discursivos; argumentação; tese/argumento;
argumentação e contra-argumentação; relação entre partes do texto:
parágrafos e título, retomada, progressão textual; relação semântica
entre textos; uso de locuções conjuntivas/ conjunções como
elemento coesivo (coesão textual) e de coerência, relação
argumentativa, aspectos discursivos,
intenção discursiva de fatos narrados; compreensão de vocábulo
relacionado à compreensão global do texto.
Conhecimentos
linguístico-
gramaticais
Uso padrão de regência; semântica de vocábulo, polissemia,
aspecto interpretativo; uso de tempo e modo verbal, aspecto verbal;
figuras de linguagem; uso de conjunções; uso discursivo de
pronome; sinonímia.
114
Quanto aos conhecimentos prévios solicitados, todos estão listados e de
acordo com o programa apresentado ao candidato. Deve-se registrar a notoriedade
dada ao aspecto textual e discursivo em relação aos elementos linguístico-
gramaticais, como também ocorre nas provas da UFF. Há, nessas provas, como nas
outras, uma abordagem textual-discursiva dos elementos linguístico-gramaticais.
A UNIRIO, em seu processo seletivo, cumpre com o previsto nos programas,
enfatizando um pouco mais o conhecimento prévio textual, relacionando, quando
solicitados, os conhecimentos linguísticos aos textuais e discursivos.
De forma geral, percebemos, nas provas de diferentes universidades, as
mesmas tendências gerais. Destaca-se, em primeiro lugar, a competência
OBSERVAR, seguida de INTERPRETAR e ANALISAR. Isso mostra a organização
das provas por competências consideradas mais básicas e médias, condizente com
a visão que as bancas têm dos alunos egressos do Ensino Médio.
Em relação aos conceitos e habilidades solicitados, partem de uma visão de
língua incorporada ao discurso, às situações de comunicação. Desse modo, os
elementos da língua estão a serviço do processo comunicativo dos interlocutores. A
UERJ e a UFRJ, nas provas de Língua Portuguesa e Literatura Brasileira, cobram
uma variação maior de conhecimento sobre a língua. A UFF e a UNIRIO também o
fazem, destacando, proporcionalmente, os elementos textuais. Apesar da variação,
todos estão incorporados aos PCNs, não pensando a língua de forma dissociada do
seu aspecto discursivo-pragmático. Não se pode dizer, então, que o vestibular cobra
além do especificado para o nível médio.
Quanto ao tipo de conhecimento prévio solicitado, percebemos que, em geral,
para uma mesma questão, são solicitados conhecimentos diversos, levando o
candidato a operar, de forma estratégica, com o conhecimento prévio construído em
sua vida, dentro e fora da escola. São poucas as questões que permitem resposta
com o conhecimento linguístico elementar (tipo 1). O conhecimento de mundo
esquematizado, organizado, é de fundamental importância para a realização das
provas, tanto na realização da tarefa, como no cumprimento do tempo destinado à
prova. Sem a esquematização prévia dos conhecimentos necessários, os candidatos
resgatam da memória de longo prazo para a memória de trabalho dados
fragmentados, pouco úteis para a solução da questão, já que ela é organizada, em
geral, para a utilização de mais de um conhecimento prévio.
115
O conhecimento prévio organizará o texto, possibilitando as inferências
necessárias. Nas colunas indicadas, utilizamos a distinção textual x contextual,
proposta por Marcuschi, percebendo a necessidade de se pautar a questão na
materialidade do texto, evitando abertura para conhecimentos de variação subjetiva.
Apesar das indicações de diferenças socioculturais de inferências, como demonstra
Dell’Isola (1992), o candidato ao vestibular precisa ter domínio dos conhecimentos
especificados, a maior parte deles acessível durante a jornada escolar. Assim, terá
capacidade de fazer as inferências corretas para os textos e enunciados, atingindo,
então, a resposta esperada.
O nosso objetivo, nesse subitem, foi levantar as solicitações realizadas nas
provas, envolvendo conhecimento prévio, inferências e competências/habilidades. A
seguir, procuramos pensar os fatores que levam os candidatos ao baixo nível de
acerto.
4.2 – Análise de questões com médias baixas
Analisamos, nesta parte, as questões que trouxeram maior dificuldade ao
candidato, com base no ensino de português do Ensino Médio, para compreender as
variáveis envolvidas.
Em contato com as comissões de vestibulares, solicitamos um relatório de
notas médias das questões de vestibulares. As comissões da UFF e UNIRIO
declararam que não tinham essa informação. A da UFRJ disse que estavam
disponíveis na página da internet, foram levantados os índices de provas de 2006 e
2008. Depois, por várias vezes, foram solicitados os índices da prova de 2007, mas
não houve a possibilidade de resgate dessas informações. A comissão de vestibular
da UERJ me enviou todos os relatórios necessários. Por esses motivos, só serão
analisadas as provas da UERJ e da UFRJ, de 2006 e 2008.
É nossa intenção perceber quais fatores levam ao maior número de erro, o
que ocorre, pelas nossas hipóteses, em relação ao tipo de solicitação, o uso de
linguagem mais/menos técnica, conhecimento prévio solicitado, nível de inferência
necessária em relação ao enunciado e ao texto dado. A análise apresenta um
caráter exploratório, para possibilitar, mais tarde, estudos empíricos.
116
Ao serem produzidas, as provas procuram escalonar diferentes graus de
dificuldade, solicitando, em geral, mais de uma solicitação ao candidato. As notas,
por ser o vestibular uma seleção pública classificatória, apresentam diferentes graus
para, assim, elencar uma lista decrescente de notas, selecionando os aprovados
para ingresso no nível superior.
Abaixo estão relacionadas as questões indicadas. No campo “pontuação”, há
a nota média aritmética por questão, informada pelas comissões da UERJ e UFRJ.
Como as notas da UFRJ chegam ao máximo de um ponto e as da UERJ ao máximo
de dois, transformamos todas as notas em índice percentual até 100%, representado
em número decimal equivalente de até 1,00.
QUADRO VI
Questões com indicação de nota média
UERJ - LÍNGUA PORTUGUESA INSTRUMENTAL
Prova Nº Pontuação Solicitação
Conceitos/habilidades
envolvidos
Média
infor-
mada
Média
propor
c %
1 1,42 0,71
Identifique relação subtítulo
ao tópico dado
Análise textual
2 0,39 0,20
Reescreva oração de 2
maneiras diferentes
relação de sentido/orações
subordinadas/conjunções
3 0,74 0,37
Explicite ponto de vista
central e o recurso utilizado
argumentação, estratégias
discursivas
4 1,01 0,50 Explique figuras de linguagem
2008
5 0,67 0,34
Explique estranhamento
"verbo medo"/indique o seu
sentido
função morfológica, semântica
no texto
1 0,85 0,43
Transcreva passagens -
degradação do ambiente
funções da linguagem, modo de
organização do discurso
2 0,76 0,38
Indique relação de sentido e
retire exemplo de estrutura
uso de pronome,
reconhecimento de padrão
sintático
3 0,8 0,40
Transcreva trechos –
interlocução
situação comunicativa -
estratégias discursivas
4 0,96 0,48 Transcreva/indique relação tema – texto
2007
5 0,39 0,20 Reescreva/identifique semântica/conjunções-orações
1a 0,76 0,38 Explique ideias paradoxais
1b Indique semântica/conjunções
2a 0,49 0,25 Aponte semântica/substantivo
2b Reescreva denotação/conotação
2006
3a 0,41 0,21 Identifique/defina
comparação: mecanismo de
coesão
117
3b Cite
comparação:
diferença/semelhança
4a 0,46 0,23 Explique
semântica de
palavras/metáforas
4b Indique intenção do enunciador
5a 0,67 0,34 Aponte intenção do enunciador
5b Identifique comparar características
QUADRO VII
Questões com indicação de nota média
UERJ -LÍNGUA PORTUGUESA E LITERATURA BRASILEIRA
1 0,52 0,26 Nomeie / caracterize rima/metáfora
2 0,76 0,38 Relacione / Identifique
campo semântico/identidade e
oposição
3 0,31 0,16
Classifique
orações/reescreva-as
conjunções, orações,
coordenação e subordinação
4 0,47 0,24 Explicite conteúdos Subentendidos
5 1,05 0,53
Explique avaliações e
transcreva passagem que a
comprove
distinguir abordagem sobre o
tema dado
6 0,88 0,44 Literatura não analisada
7 0,74 0,37 Indique / justifique
pronome demonstrativo e
função textual/coesão
8 1,39 0,70 Literatura não analisada
9 0,93 0,47 Literatura não analisada
2008
10 0,37 0,19 Indique/Caracterize varição lgtca/uso do diminutivo
1 0,28 0,14 Literatura não analisada
2 0,68 0,34 Literatura não analisada
3 1,04 0,52
Transcreva orações /
reescreva-as
separação orações/ordem
direta-inversa/sujeito-predicado
4 1,45 0,73 Reescreva
ponto de vista externo/uso de
pronomes e verbos
5 0,88 0,44 Literatura não analisada
6 1,23 0,62 Correlacione e identifique
referenciação - elementos e
personagens no texto
7 0,81 0,42 Identifique e cite variação linguística
8 0,62 0,31 Explique
processo de formação de
palavras
9 0,22 0,11 Identifique / explique
função sintática / efeito
estilístico
2007
10 0,58 0,29 Nomeie / descreva
processo de formação de
palavras/ efeito estilístico
1 0,45 0,23
Reescreva / transcreva /
identifique
interlocução-uso de imperativo
tu-você/forma verbal subjuntivo
2 0,37 0,19 Explique-indique / reescreva
atitude enunciativa/sinônimos
de palavras
2006
3 0,83 0,42
Indique-explicite / transcreva-
justifique
ambiguidade/localizar verso -
sentido dado
118
4 0,64 0,32
Identifique-transcreva /
Indique-reescreva
polissemia/infinitivo-sinônimo
5 0,8 0,40
Transcreva-
explicite/Reescreva
termos acessórios ao texto-
papel argumentativo/padrão
sintático
6 0,25 0,13 Literatura não analisada
7 1,11 0,56 Cite / Explique
Comp.Texto: vantagem-
desvantagem/tópico dado
8 0,24 0,12 Nomeie/Identifique
modos de org.
discurso/semântica dos verbos
9 0,53 0,27
Transcreva-indique /
Identifique-explique
figura de linguagem-valor
expressivo/relação se sentido-
oposição
10 0,36 0,18 Identifique
tópico textual/substantivos-
elementos coesivos
QUADRO VIII
Questões com indicação de nota média
UFRJ - LÍNGUA PORTUGUESA E LITERATURA BRASILEIRA
1 0,608 0,61 Transcreva
oração subordinada adverbial –
hipótese
2 0,024 0,02 Comprove a vitalidade sufixo diminutivo
3 0,495 0,50 Substitua o vocábulo "mormente" – sinonímia
4 0,369 0,37 Literatura não analisada
5 0,305 0,31 Explique / identifique
elementos
fônicos,morfossintáticos/relação
semântica no plano vovabular
6 0,373 0,37 Literatura não analisada
7 0,571 0,57 Literatura não analisada
8 0,239 0,24 Identifique
4 processos de formação de
palavras/estrutura de palavras
9 0,038 0,04 Justifique a afirmativa
julgar, relacionando à
organização do plano sintático
2008
10 0,627 0,63 Relacione
ideias específicas em dois
textos
1 0,4208 0,42 Explique semântica das palavras
2 0,6061 0,61 Identifique e justifique
emprego de tempo verbal na
narrativa
3 0,2761 0,28 Literatura não analisada
4 0,652 0,65 Explique / justifique
interlocução- leitor - situação
comunicativa
5 0,4486 0,45 Explicite
uso argumentativo da
conjunção
6 0,5093 0,51 Explicite / justifique oposição - campos semânticos
7 0,3143 0,31 Literatura não analisada
8 0,5808 0,58
Explique semelhança /
identifique recurso linguístico
Comp.Texto comparação tópico
dado - elemento coesivo
2006
9 0,556 0,56 Compare tópico dado Compreensão de texto -
119
relação entre textos
10 0,3425 0,34 Explique
distinguir abordagem sobre o
tema dado
Para operacionalizar a análise, separamos quatro níveis de nota média por
questão, totalizando 65 questões. Excluímos as questões específicas de literatura
brasileira (12 questões), totalizando 53 questões de acordo com os critérios
estabelecidos.
O objetivo da análise é compreender as variáveis que envolvem as maiores
dificuldades apresentadas pelos vestibulandos, após todo o ciclo de ensino de
português. É nossa opção estabelecer quatro faixas, buscando as questões que
trouxeram maior dificuldade:
Faixa de nota média das
questões
Quantidade de ocorrências Estabelecimento de faixas
de 1,00 a 0,75 Zero Ignorada
de 0,74 a 0,5 15 questões Maior facilidade
de 0,49 a 0,25 23 questões Intermediária
de 0,24 a 0,00 15 questões Maior dificuldade
É essencial notar que a nota média mais alta foi 0,71 e a mais baixa 0,02.
Não houve nenhuma questão na faixa mais alta, o que nos leva a desconsiderá-la,
havendo, então, três faixas. Como o que nos interessa é indicar pontos a serem
incorporados ao ensino, optamos por analisar as questões que apresentam maior
dificuldade, faixa de 0,24 a 0. A faixa de 0,49 a 0,25 foi estabelecida como faixa
média, alcançada medianamente, e a faixa de 0,50 a 0,75 foi o segmento de notas
mais altas, não constituindo fator de grande preocupação.
Ao analisar as questões indicadas, percebemos que, em cada questão,
geralmente se faz mais de uma solicitação, trabalhando, por vezes, mais de uma
habilidade e competência, o que exige do candidato uma atenção maior para a
resposta. Também se deve ter em mente a diferença de pontuação de cada questão
entre UERJ e UFRJ. Tal diferença tende a levar a UERJ a fazer maior número de
solicitações, já que as questões valem 2 pontos, o dobro da UFRJ. Isso nos leva a
pensar em algumas hipóteses: o maior número de solicitações ou o tipo de
solicitação (habilidade) está diretamente relacionado à média da questão.
120
Se levarmos em consideração somente a solicitação, a fim de isolarmos o
aspecto competências/habilidades, percebemos grande variação nas notas médias
das questões:
Questões que apresentam a solicitação Variam de Até
Explique / Interpretar 0,65 0,11
Justifique / Analisar 0,61 0,04
Cite/Nomeie/Classifique/ Observar 0,29 0,12
O quadro acima mostra que a solicitação, ou seja, a habilidade solicitada,
baseada nas competências, não é suficiente para apresentar o grau de dificuldade,
já que a variação é muito acentuada, indo da faixa mais baixa à faixa média ou mais
alta.
A quantidade de solicitações em uma mesma questão também poderia ser
um fator de dificuldade. Levando em consideração as questões que fazem de 3 a 4
solicitações, temos uma variação de 0,19 a 0,40, sendo só uma abaixo da faixa
mediana de 0,25 ponto. Tal resultado mostra que a quantidade de solicitações
também não é o fator determinante da dificuldade.
Com essas observações, temos como hipótese que a questão da
compreensão de enunciado atrelada ao conhecimento prévio específico deve ser
fator de dificuldade. Para isso, selecionamos as questões de maior dificuldade (faixa
de 0 a 0,25). Ao analisarmos as questões, abordamos três fatores:
linguagem utilizada (uso de terminologia conceitual, de fácil compreensão ou
não);
elementos de ancoragem para a compreensão do texto (pistas), o que diminui
o grau de inferências necessárias (mais baseada no texto que no contexto ou
extratexto);
conhecimento prévio necessário (linguístico, textual,de mundo ou discursivo).
A seguir, separamos as 15 questões selecionadas. Como se percebe, há
variadas solicitações, referentes a distintas competências. Os conceitos/habilidades
envolvidos também apresentam diferentes níveis: de aspectos linguísticos a
discursivos.
121
QUADRO IX
Questões com nota média inferior ou igual a 0,25
UERJ
Prova Nº Pontuação Solicitação
Conceitos / habilidades
envolvidos
Média
Média
proporc
aproxim
LPI
2008
2 0,39 0,20
Reescreva oração de 2
maneiras diferentes
relação de sentido/orações
subordinadas/conjunções
LPI
2007
5 0,39 0,20 Reescreva/identifique semântica/conjunções-orações
2a Aponte semântica/substantivo
2b
0,49 0,25
Reescreva denotação/conotação
3a Identifique/defina
comparação: mecanismo de
coesão
3b
0,41 0,21
Cite
comparação:
diferença/semelhança
4a Explique
semântica de
palavras/metáforas
LPI
2006
4b
0,46 0,23
Indique intenção do enunciador
3 0,31 0,16
Classifique
orações/reescreva-as
conjunções, orações,
coordenação e subordinação
4 0,47 0,24 Explicite conteúdos Subentendidos
LPLB
2008
10 0,37 0,19 Indique/Caracterize varição lgtca/uso do diminutivo
LPLB
2007
9 0,22 0,11 Identifique / explique
função sintática / efeito
estilístico
2 0,37 0,19 Explique-indique/reescreva
atitude enunciativa/sinônimos
de palavras
8 0,24 0,12 Nomeie/Identifique
modos de org.
discurso/semântica dos verbos
LPLB
2006
10 0,36 0,18 Identifique
tópico textual/substantivos-
elementos coesivos
122
QUADRO X
Questões com nota média inferior ou igual a 0,25
UFRJ
Prova Nº Pontuação Solicitação
Conceitos / habilidades
envolvidos
Média
Média
proporc
aproxim
2 0,024 0,02 Comprove a vitalidade sufixo diminutivo
8 0,239 0,24 Identifique
4 processos de formação de
palavras/estrutura de palavras
LPLB
2008
9 0,038 0,04 Justifique a afirmativa
julgar, relacionando à
organização do plano sintático
A seguir, agrupamos questões que solicitam conhecimentos próximos.
Inicialmente, destacamos três questões que solicitam conhecimento de
orações/conjunções, uso e valores semânticos.
QUESTÃO 2 (LPI 2008) UERJ
Sem ferir a liberdade de expressão
, essa medida pode ser um duríssimo golpe na
diversidade cultural e política da Internet. (l. 24-26)
A oração sublinhada estabelece uma dada relação de sentido com o restante do
período.
Reescreva essa oração de duas maneiras diferentes, substituindo sem por outro
conectivo e mantendo a relação de sentido original. Faça apenas as alterações
necessárias.
PADRÃO DE RESPOSTA:
Duas das maneiras:
Embora não fira a liberdade de expressão.
Mesmo não ferindo a liberdade de expressão.
Ainda que não fira a liberdade de expressão
A questão acima solicita conhecimento específico de orações subordinadas
em relação ao seu valor semântico específico. O enunciado oferece as palavras
“oração” e “conectivo”, que poderiam ativar o conhecimento prévio necessário. Os
candidatos não conseguiram relacionar a palavra “sem” ao campo dos valores
semânticos de orações e conjunções, não estabelecendo o valor semântico
concessivo. Isso, provavelmente, decorre da baixa capacidade de percepção
semântica do texto, ao pouco exercício ligado à reescritura de orações, o que não
criou um conhecimento prévio bem organizado para os candidatos.
123
Outra questão similar, aplicada no ano anterior, apresentou a mesma nota
média (20% do valor da questão). A solicitação é similar, pedindo a reescritura,
como a anterior, mas solicitando também a explicitação do valor semântico, o que
seria um conhecimento a mais.
QUESTÃO 5 (LPI 2007) UERJ
A vela que ilumina é uma vela alegre. (l. 4)
O conectivo que, além de introduzir uma caracterização para o substantivo vela,
estabelece relações lógicas entre as duas orações presentes no período acima.
Reescreva esse período de duas maneiras diferentes sempre substituindo o
conectivo que, de modo a explicitar dois tipos de relações lógicas entre as orações.
A seguir, identifique o tipo de relação estabelecida em cada um dos períodos
reescritos.
PADRÃO DE RESPOSTA:
Dois dentre os exemplos de reescritura:
A vela, porque ilumina, é uma vela alegre.
A vela, visto que ilumina, é uma vela alegre.
A vela, por iluminar, é uma vela alegre.
A vela, enquanto ilumina, é uma vela alegre.
A vela, ao iluminar, é uma vela alegre.
A vela, iluminando, é uma vela alegre.
A vela, se ilumina, é uma vela alegre.
A vela, caso ilumine, é uma vela alegre.
A vela, desde que ilumine, é uma vela alegre.
A vela, à medida que ilumina, é uma vela alegre.
A vela, à proporção que ilumina, é uma vela alegre.
Os vestibulandos, em sua maioria, apresentaram dificuldades ao resolverem a
questão, evidenciando a pouca habilidade e baixo conhecimento prévio específico
para realizar a tarefa, o que traz problemas também para os aspectos de coesão e
coerência dos textos escritos. É importante lembrar que o uso de conjunções é
desenvolvido tradicionalmente na escola, já incorporado aos livros didáticos. Talvez
o processo se restrinja à reprodução mecânica, sem o aluno perceber que o
processo de subordinação permite uma variedade de relações semânticas distintas.
QUESTÃO 3 (LPLB 2008) UERJ
Considere a seguinte passagem:
mesmo contrariando Ortega y Gasset, mesmo reconhecendo o interesse dum certo
lado da obra de Murilo, o lado mais realista, não o situo no plano dos outros três
pintores. (l. 35-39)
Classifique as orações reduzidas quanto à circunstância adverbial que expressam.
Em seguida, preservando esse sentido, reescreva as orações com tempo e modo
adequados, coordenando-as por meio de uma conjunção aditiva.
causa
tempo
condição
proporção
124
PADRÃO DE RESPOSTA:
Concessivas.
Ainda que (embora, não obstante, mesmo que) contrarie Ortega y Gasset e
reconheça o interesse dum certo lado da obra de Murilo, o lado mais realista, não o
situo no mesmo plano dos outros três pintores.
A questão 3 (LPLB 2008) envolve o uso de valores semânticos concessivos
como a questão 2 (LPI 2008), acrescido da “coordenando-as por meio de uma
conjunção aditiva”, pista dada no enunciado, para a reescritura do período
composto. Além disso, o fragmento dado começa com “mesmo contrariando”,
indicando que poderia ser relacionada à locução conjuntiva “mesmo que”. O
percentual da média da questão é próximo das demais, mostrando a pouca
habilidade dos vestibulandos com o tipo de solicitação.
Apesar das indicações aparecerem no texto, acreditamos que o rendimento
esteja ligado a dois fatores: baixo conhecimento prévio específico, não conseguindo
estabelecer para si a solicitação realizada, por não conseguir compreender as pistas
dadas, e dificuldade de aplicação de tal conhecimento para a solução de problemas
de ordem prática.
A questão abaixo relaciona o aspecto estilístico do uso da letra minúscula
inicial ao conhecimento de mundo de cunho social.
QUESTÃO 2 (LPI 2006) UERJ
No conto de Victor Giudice, o personagem principal da história chama-se joão.
A) Aponte duas justificativas para a forma particular com que se encontra grafado o
nome desse personagem
ao longo de todo o texto.
B) joão transformou-se num arquivo de metal. (l. 39)
Reescreva a oração acima, eliminando o cunho “fantástico” nela presente, mas
conservando seu valor denotativo.
PADRÃO DE RESPOSTA
a) A perda da identidade do personagem em função de sua acomodação aos
abusos que lhe são impostos no trabalho. O personagem pode ser considerado o
representante de uma grande massa anônima de empregados que são explorados
no ambiente de trabalho.
b) Uma dentre as orações:
joão aceitou passivamente a exploração.
joão transformou-se em um escravo do trabalho.
joão submeteu-se às imposições de seu empregador.
Quanto ao aspecto linguístico que envolve a questão, não se conseguiu
operar com os conceitos de substantivo próprio e comum, indicando, então, que
“joão" perdeu a condição de pessoa (uso de maiúscula inicial). Além disso, é
necessário observar contexto discursivo (condição social), para se organizar a
resposta da letra “A”. A letra “B” demanda capacidade linguística básica de
expressão verbal, notando que a frase proposta não trata de uma realidade
125
concreta, mas de linguagem figurada. Com isso, deveria utilizar a linguagem escrita
formal denotativa. Assim, tal como na resposta anterior, era necessário notar as
relações sociais de trabalho. A nota média foi 0,25 ponto, o que provavelmente se
deveu à dificuldade de leitura em outras perspectivas, menos concretas, por não
levar em conta a especificidade do texto literário proposto, além da aplicação de
conhecimentos linguísticos ao seu uso textual-discursivo.
Como a questão anterior, as outras duas abaixo demandam também
conhecimentos ligados ao contexto (aspectos sociais) e conhecimentos linguísticos
e textuais.
QUESTÃO 3 (LPI 2006) UERJ
O homem de grandes negócios fecha a pasta de zíper e toma o avião da tarde. O
homem de negócios miúdos enche o bolso de miudezas e toma o ônibus da
madrugada. A mulher elegante faz Cooper e sauna na quinta-feira. A mulher não
elegante faz feira no sábado. (l. 1 - 3) Na passagem citada, estão implícitas
comparações, que se constroem por meio de um mecanismo de coesão
determinado.
A) Identifique e defina o mecanismo de coesão que estrutura essas comparações.
B) Cite uma diferença e uma semelhança entre os elementos comparados.
PADRÃO DE RESPOSTA:
A) Paralelismo. Apresentação de estruturas sintáticas semelhantes.
B) Diferença: os elementos comparados representam classes sociais diversas.
Semelhança: os elementos comparados seguem um modo geral de organização,
uma rotina imposta por diferentes grupos sociais.
Para a boa realização da questão, o vestibulando deve ter domínio de
conhecimentos textuais, para perceber a repetição do padrão sintático, notando o
paralelismo. Ele só perceberá tal fato se também inferir conhecimentos de mundo
seus, de cunho social, de nível discursivo, texto na construção de sentido (letra A).
Para a segunda parte da questão, precisa explicitar semelhanças e diferenças numa
perspectiva social, a partir da inferência de diferença de classes, que, distintamente,
se impõem sob o jugo da rotina produtiva.
No texto dado na prova, igualmente narrativo, não há menção explícita a
questões sociais, o que leva a uma maior dificuldade, acrescida da falta de
indicações sobre esse aspecto no enunciado.
A questão abaixo também segue a perspectiva social, apresentando
dificuldade de leitura, já que, pelo que parece, os candidatos não notaram o enfoque
dado. Na primeira parte da questão, letra “A”, é solicitada a explicitação, com uso de
linguagem formal denotativa, do uso metafórico de duas palavras, que
imageticamente se encaixam na relação complementar sociedade x indivíduo. O
126
enunciado dessa parte apresenta o termo “metaforicamente”, bastante usado em
ambiente escolar.
QUESTÃO 4 (LPI 2006) UERJ
Há que readaptá-lo depressa à engrenagem familiar e social, apertar esses
parafusos docemente frouxos.
(l. 12 - 13)
A) No fragmento acima, as palavras engrenagem e parafusos são usadas
metaforicamente.
Explique o sentido que cada uma dessas palavras assume no texto.
B) Indique o ponto de vista do enunciador do texto sobre a ideia de transgressão às
normas estabelecidas e retire do fragmento em destaque a palavra ou expressão
que comprova esse posicionamento.
PADRÃO DE RESPOSTA
A) Engrenagem: relaciona-se com a ideia de modo de organização e controle da
sociedade, que deve funcionar em perfeita ordem. Parafusos: referem-se aos indivíduos
que participam dessa engrenagem e que devem mantê-la em funcionamento perfeito (ou
referem-se à mecanização do homem na sociedade).
B) O enunciador aceita/defende a rebeldia, como fuga às imposições do sistema
social./Docemente/docemente frouxos.
Na segunda parte, há o uso de “o ponto de vista do enunciador do texto”, o
que deve trazer dificuldade para parte dos candidatos, já que os termos enunciação
e enunciador não figuram, em geral, nem no discurso dos professores em sala, nem
nos livros didáticos, que incorporaram alguns termos ligados à Análise do Discurso
(aspectos discursivos, modos de organização do discurso, dentre outros). Além
disso, a expressão “transgressão às normas estabelecidas” não explicita o aspecto
social relativo à expectativa social. Tais fatores, em conjunto, contribuem para o
baixo rendimento, evidenciando algumas dificuldades após a formação escolar.
A questão 4 abaixo também exige a percepção do que não aparece
explicitamente no texto:
QUESTÃO 4 (LPLB 2008) UERJ
Não examinava nem cheirava:
(....)
O bicho não era um cão,
Não era um gato,
Não era um rato.
O conjunto de versos acima remete a dois conteúdos subentendidos,
correspondentes a conhecimentos, crenças ou valores do senso comum.
Explicite esses dois conteúdos.
PADRÃO DE RESPOSTA
Certos animais cheiram o alimento antes de ingeri-lo.
O normal é que alimentos jogados no lixo sejam consumidos por cães, gatos e ratos.
127
A dificuldade apresentada na questão para os candidatos é operar com um
conceito explícito no programa da UERJ, mas que ainda é pouco trabalhado no
ambiente escolar: “pressuposto” e “implícito”. Oriundos da aplicação de estudos de
Ducrot (1987), tais conceitos ainda não chegaram aos livros didáticos, embora
fundamentais para a formação do indivíduo, pois possibilitam uma leitura crítica,
compreendendo o discurso para além das marcas linguísticas apresentadas.
As três últimas questões trabalhadas indicam uma necessidade de se voltar
para a integração das estratégias de leitura, ligadas ao conhecimento prévio, pois só
assim os candidatos realizarão inferências na perspectiva solicitada pelas bancas de
vestibulares.
As duas próximas questões relacionam aspectos discursivos (ou
enunciativos) aos elementos linguísticos.
QUESTÃO 2 (LPLB 2006) UERJ
O poema de Carlos Drummond de Andrade apresenta um conjunto de instruções
para o fazer poético que podem ser distribuídas em duas partes, conforme a
mudança de atitude enunciativa do eu lírico.
A) Explique em que consiste essa mudança e indique o recurso gramatical que a
explicita.
B) Uma dessas instruções refere-se ao corpo, tão infenso
à efusão lírica (v. 4).
Reescreva este verso, substituindo por sinônimos as palavras sublinhadas e
procedendo às alterações necessárias.
PADRÃO DE RESPOSTA:
A) O eu lírico passa da recusa/rejeição à proposta/recomendação. Emprego de
formas imperativas, negativas e afirmativas.
B) Uma dentre as alternativas:
avesso à emoção lírica
contrário ao arrebatamento lírico
incompatível com a veemência lírica
Na questão acima, aparece, mais uma vez, um termo ligado à enunciação,
“atitude enunciativa do eu-lírico”. Aplica-se aqui a mesma exposição realizada para a
questão anterior, sendo que a diferença é poder compreender a questão por “atitude
do narrador”. Para resolver a questão, era necessário perceber o aspecto as marcas
linguísticas do uso do imperativo, primeiro negativo, depois afirmativo, como forma
de mudança. Mais uma vez, o fator de dificuldade pode ligar-se ao que não é
explícito, já que o texto base é um poema que não apresenta elementos explícitos
em que os leitores menos capazes se pudessem apoiar. O enunciado da letra “B” é
bastante acessível, a dificuldade está ligada ao acervo vocabular dos candidatos
que não conseguiram, por meio do co-texto, estabelecer a sinonímia.
128
A questão, a seguir, solicita conhecimento textual, relacionando a sua
progressão a elementos coesivos. O enunciado é claro e necessita-se de um
exercício de leitura inicial, estabelecer o “tópico textual predominante” de cada parte
do texto. Para isso, o leitor precisa de uma visão global do texto e sua progressão,
para estabelecer as partes. Depois, cobra-se a percepção prática do texto, com o
levantamento de elementos coesivos, a relação das palavras indicadas. A
dificuldade não parece estar no enunciado, mas na falta de conhecimento textual
teórico e prático, o que, de fato, ainda se encontra em expansão nas aulas de
português e em materiais didáticos.
QUESTÃO 10 (LPLB 2006) UERJ
A progressão temática de A era do automóvel se dá em duas etapas, cada qual
caracterizada por um tópico textual predominante.
Identifique:
A) o tópico predominante em cada uma das etapas;
B) dois substantivos que explicitam lexicalmente a coesão entre essas duas etapas.
PADRÃO DE RESPOSTA:
A) Primeira etapa: automóvel. Segunda etapa: transformação da linguagem.
B) Reformador e reforma.
A questão abaixo solicita reconhecimento de modos de organização do
discurso, presentes em duas partes do texto. Depois, requer a indicação de
características semânticas e gramaticais do verbo.
QUESTÃO 8 (LPLB 2006) UERJ
Predominam no texto IV dois modos de organização do discurso: um caracteriza o
primeiro parágrafo, e outro, o restante do texto. Como consequência,
particularidades semânticas e gramaticais distinguem esses dois segmentos.
A) Nomeie esses modos de organização do discurso.
B) Identifique as características semânticas e gramaticais das formas verbais
presentes em cada um desses segmentos.
PADRÃO DE RESPOSTA:
A) Modo narrativo no primeiro parágrafo e modo argumentativo (ou dissertativo) no
restante do texto.
B) 1º segmento: verbos de ação/ tempo passado; 2º segmento: verbos de estado/
tempo presente
O termo “modos de organização do discurso” ainda não é tão divulgado nos
meios escolares, embora os termos “narração”, “descrição”, “dissertação” e
“argumentação” o sejam, levando a certa dificuldade de compreensão, se não o tiver
relacionado esquematicamente aos seus tipos (conhecimento prévio organizado).
Dessa forma, não conseguirá fazer as inferências esperadas. A segunda parte cobra
conhecimento linguístico específico acerca do uso de verbos. Separar aspecto
semântico de gramatical indica um nível de conhecimento gramatical mais
129
aprofundado, fazendo, por vezes, não compreender o que se espera dele.
Acreditamos que os candidatos tenham os conhecimentos indicados nas respostas,
mas a dificuldade parece estar na leitura do enunciado de forma coerente,
levantando, por meio de conhecimento prévio, as inferências que relacionem
enunciado à expectativa de resposta. É importante notar que o conhecimento
linguístico necessário para as provas carece de esquematização prévia por parte do
candidato.
As duas próximas questões exploram conhecimentos de estrutura e flexão de
palavras, relacionando-as ao uso da língua de formas distintas.
QUESTÃO 2 (LPLB 2008) UFRJ
O sufixo (z)inho, empregado repetidamente na passagem “festinha no rostinho
delazinha”, é de enorme vitalidade na língua. Comprove essa vitalidade, no plano
morfológico, a partir do uso do diminutivo nos vocábulos da referida passagem.
PADRÃO DE RESPOSTA
A vitalidade do sufixo (z)inho no plano morfológico fica comprovada por sua
aplicação não só a bases nominais (substantivos e adjetivos), como em festa e em
rosto, mas também a outras bases menos usuais, como, por exemplo, a pronomes,
como em (d)ela.
QUESTÃO 10 (LPLB 2008) UERJ
Em E o longo vale de florinhas cheio (v. 17) temos uma forma diminutiva no plural.
Este plural pode ser expresso por outras duas formas.
Indique-as e caracterize a diferença entre as três de acordo com a variedade de
usos da língua.
PADRÃO DE RESPOSTA
Florzinhas e florezinhas.
Florzinhas é a forma usual na língua falada espontânea; florezinhas é a forma
considerada padrão e, como tal, recomendada pelas gramáticas normativas;
florinhas, por sua vez, é forma que praticamente não se ouve hoje em dia, mas é
encontrada na língua literária.
A questão 2 (UFRJ) teve baixíssima nota média (0,04 ponto). O enunciado já
destaca o fato da língua, o uso do sufixo, que, em geral, apresenta conhecimento
mais amplo. A dificuldade encontrada deve-se relacionar ao uso de “Comprove”,
habilidade mais exigente, pouco usada em provas de Língua Portuguesa, associada
à baixa capacidade dos candidatos de realizarem inferências, a partir do termo
“vitalidade”, relacionado à explicitação do conhecimento organizado a partir de
“estrutura de palavras”, explicitando a extensão de uso não só a nomes, mas
também o expandindo para outras classes como a de pronomes. Outro aspecto
pode ligar-se à falta de conhecimento dos processos da língua relacionados ao seu
uso pragmático.
130
Já a questão 10 (UERJ) trabalha com a variação linguística, solicitando aos
candidatos os usos normativo, coloquial e literário. Apesar de não existirem termos
de difícil compreensão no enunciado, houve, por parte dos candidatos, o não
reconhecimento do uso literário de “florinha” e o não conhecimento do uso normativo
do diminutivo plural de flor. A média baixa da questão aponta para uma dificuldade
com cobranças mais específicas do conhecimento linguístico.
O conhecimento linguístico ligado ao uso pragmático parece também um fator
de dificuldade recorrente. A questão abaixo ratifica essa posição.
QUESTÃO 9 (LPLB 2007) UERJ
Observe os adjetivos sublinhados nas seguintes passagens dos textos II e III,
respectivamente:
e livre se foi marrom
para o telhado. (l. 8)
Vai-se embora o negro-preto, voando barulhento
que nem máquina de trem de ferro
(l. 21)
Ambos exercem a mesma função sintática, mas apenas no exemplo extraído do
poema a construção gramatical surpreende o leitor com um efeito estilístico especial.
Identifique a função sintática comum aos adjetivos sublinhados. Em seguida,
explique por que o efeito estilístico é surpreendente apenas no exemplo extraído do
poema.
PADRÃO DE RESPOSTA
Predicativo do sujeito.
O adjetivo marrom indica a cor natural do pássaro, mas empregado como
predicativo serve para qualificar o movimento.
A questão 9, acima, mostra a dificuldade de relacionar o conhecimento
sintático, indicado no enunciado pelo termo usual “função sintática”, ao seu uso
estilístico no texto, explicitando-o. O candidato precisa notar que “marrom”,
característica do pássaro, pela sua posição na frase, pode se relacionar ao ato de ir
(voo), criando um efeito inusitado.
Após as análises, verificamos alguns pontos. Não só habilidades e
competências estão relacionadas às dificuldades das questões de vestibulares. Uso
e solicitação de aspectos linguísticos mais específicos comprometem a realização
das questões. Percebeu-se o baixo grau de conhecimento linguístico de morfologia;
algumas questões de baixa média geral giravam em torno disso. A aplicação de
processos linguísticos relacionados a efeitos e necessidades discursivas ainda é um
campo que precisa de mais divulgação e aprofundamento no ambiente escolar.
Em relação à leitura, percebe-se, a partir das questões, que a falta de
conhecimento prévio esquematizado o que se deve conseguir por meio de estudo
é um dos principais fatores que conduz ao baixo rendimento, tanto na não
131
associação de terminologia mais técnica com os termos de domínio, como também
na impossibilidade de inferências esperadas, levando o candidato a inferências sem
base textual ou à não compreensão do solicitado.
132
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Nesta tese, pretendemos trazer ao campo acadêmico as provas discursivas
de Língua Portuguesa como material importante não para avaliar o ensino de forma
direta, mas como instrumento relevante para a percepção do ensino em geral.
Apesar das reclamações encontradas em relação ao processo de seleção do
vestibular e de sua influência negativa no ambiente escolar, é necessário ratificar o
aspecto positivo e pedagógico que o vestibular traz para a sociedade.
Em relação ao caso específico de língua portuguesa, os programas dos
vestibulares, assim como suas provas, alinham-se com os PCNs e com propostas
teóricas que mudaram a concepção de língua e o seu ensino, incorporando-se
gradativamente ao ambiente escolar e aos livros didáticos.
Ao realizar as suas cobranças, as bancas de vestibulares demandam um
ensino mais adequado às necessidades de formação dos indivíduos, chegando, por
vezes, a definir língua e gramática, como já indicado na análise dos programas, por
meio dos quais haverá também para o professor, principalmente do Ensino Médio,
indicações de necessidade de atualização.
Durante a pesquisa, notamos também a relação histórica entre o processo do
vestibular e o ensino secundarista/de 2ºGrau/médio. As legislações estão ligadas
aos processos de desenvolvimento e constituição do país. Com a ampliação da
escolarização e universalização do Ensino Médio, há uma demanda maior em
relação aos cursos superiores. É certo que há um afunilamento nessa progressão,
mas é fundamental também constituir essa história que hoje está fragmentada e vai-
se perdendo. Os diferentes processos por que passaram as concepções de
vestibular relacionam-se com os momentos históricos, recentemente há a oposição
ditadura x autonomia das universidades/processo de democratização. De certa
forma, a organização histórica, ainda que breve, pretende contribuir para o resgate
desse processo.
Uma das motivações para a criação do projeto que se concretizou em tese
era verificar se havia algo realizado pelas provas de vestibulares que tivesse em
desacordo com as propostas e procurar entendê-las a partir do processo de leitura,
do conhecimento necessário.
133
Com o desenvolvimento do trabalho, notamos que as solicitações realizadas
pelas provas estavam, sem nenhuma exceção, de acordo com os programas e com
as legislações e propostas educacionais para o ensino de Língua Portuguesa.
Em relação à compreensão das questões e de suas dificuldades, percebemos
que o processo de leitura exigido pelo vestibular demanda, como já apontado, várias
capacidades. A indicação de respostas nas provas discursivas deve partir de um
leitor atento, crítico e estratégico. Não cabem aqui várias possibilidades de leitura de
um texto, mas a leitura estratégica e suficiente para a solução de questões
propostas. Para isso, são necessários vários tipos de conhecimentos prévios. O
conhecimento linguístico que operacionaliza a leitura básica; o conhecimento textual,
organizador de macroestruturas e seu funcionamento; o conhecimento de mundo,
organizado pela exposição a vários meios, inclusive a escola que possibilita a
esquematização de saberes; e o conhecimento discursivo, que opera sobre a
interação social, partindo de uma necessidade concreta e prática de comunicação.
O conhecimento prévio possibilita as inferências, lacunas deixadas no texto, a
serem supridas pelo leitor. Em sua maioria, as inferências solicitadas na prova são
de nível textual e procuram, por meio do conhecimento do leitor, explorar sentidos e
elementos do texto, o que se deve principalmente ao contexto de uma seleção muito
disputada, que precisa, por questões operacionais, objetivar as possibilidades de
respostas, para cumprir prazos. As inferências de base contextual são também
necessárias para perceber o contexto social e discursivo presentes nos textos da
prova, as relações de poder, as situações comunicativas.
O conceito de leitura aplicado às provas de vestibular contempla o nível
discursivo, sendo necessário o leitor estratégico, capaz de notar as ausências, como
elementos importantes para a significação do texto. Implícitos, pressupostos e
intertextualidades são elementos presentificados por esse leitor. O processo de
leitura pressupõe vários domínios de conhecimento, integrando a língua como
elemento formador e concretizador da comunicação, diretamente relacionada à
situação de comunicação, norteadora das escolhas linguísticas.
A gramática, por sua vez, é um conhecimento regular necessário para
organizar a língua. As provas solicitam o conhecimento gramatical em vários níveis,
o linguístico, o textual e o discursivo. As questões requerem tanto o conhecimento
gramatical espontâneo, como o escolarizado, em suas perspectivas descritiva e
normativa.
134
Dessa forma, os conceitos de gramática, língua e leitura são conceitos que
interagem entre si, estando de acordo com as indicações dos PCNs, que organizam
o ensino no país.
As questões analisadas no subitem 4.1 nos mostram que a maior parte das
questões integra conhecimentos e habilidades de níveis diversos. O conhecimento
prévio linguístico é necessário para compreender o textual e o discursivo e estes são
necessários para a compreensão do primeiro; sem o conhecimento de mundo
organizado não é possível compreender os textos presentes na prova, incluindo os
enunciados. Também é importante notar a gama de conhecimentos solicitados pelas
questões, o que sinaliza, para o egresso do Ensino Médio, a necessidade de estudo,
conhecimento e esforço, indispensáveis ao ingresso na universidade e também ao
seu desenvolvimento.
As principais conclusões, na análise das provas, são: as questões das provas
analisadas estão de acordo com os programas publicados pelas universidades e
com os PCNs; o nível de exigência é graduado, conforme as competências e
habilidades variadas; o conhecimento prévio organizado e esquematizado é
fundamental para a realização de inferências adequadas.
Pedagogicamente, acreditamos que as provas de vestibulares são um bom
instrumento para a docência, devendo ser mais conhecidas e incorporadas ao
cotidiano escolar. A atual indicação, presente em muitos estabelecimentos, de só se
voltar para o vestibular no último ano de Ensino Médio atrapalha o desenvolvimento
do aluno.
Atualmente, existe a preocupação de as bancas de vestibulares dialogarem
com as escolas e os alunos. Isso se concretiza pelas visitas de participantes de
bancas e de comissões de vestibular a escolas, pela criação dos manuais do
candidato e revistas, como a “Revista Eletrônica” da UERJ. É essencial, ainda,
expandir as discussões e aumentar o acesso de candidatos e professores às
concepções de ensino das bancas.
Em relação às questões que apresentaram notas médias baixas, notamos
alguns fatores a serem mais trabalhados em ambiente escolar: o aprofundamento do
conhecimento gramatical e sua aplicação pragmática, incluindo o maior domínio de
termos conceituais, necessários para a expressão dos fatos da língua; dificuldade de
acesso ao que não está marcado no texto, aspectos ligados ao contexto, a
pressupostos, intertextualidades, dentre outros; melhor esquematização e
135
relacionamento entre conhecimentos e habilidades, para propiciar a capacidade de
se sair do “decoreba escolar”, artifício ainda muito utilizado pelos alunos. Esses
aspectos capacitarão melhor os estudantes a realizarem as inferências para a leitura
de textos em geral e também dos enunciados das provas, dando a eles uma real
possibilidade de concorrerem para a vaga na universidade pública.
Acreditamos, por fim, ser esta tese uma possibilidade para o trabalho
continuado que pense a inter-relação do vestibular com o Ensino Médio. A pesquisa
realizada possibilitou uma análise histórica e teórica dessa inter-relação no contexto
específico de Língua Portuguesa, enfatizando a necessidade de elaborar propostas
de ensino adequadas. A partir daí, pretendemos desenvolver pesquisas que
enfoquem o aspecto empírico dessa discussão, construindo, assim, propostas de
ensino que capacitem o aluno a obter melhores resultados nos exames de seleção
para o nível superior. Isso só ocorrerá com uma revisão de currículo do Ensino
Médio, no qual seja especificado o grau de aprofundamento dos conhecimentos
prévios necessários, incorporando de forma prática as habilidades e competências
relacionadas à leitura.
136
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143
ANEXO A – Programas de provas UERJ
144
145
146
147
ANEXO B – Programa de prova UFRJ
148
ANEXO C – Programa de prova UFF
Programas das Provas
Vestibular UFF 2007
Língua Portuguesa e Literatura Brasileira
Orientação geral
O domínio da língua portuguesa em seus vários usos e a capacidade de analisar, interpretar e aplicar seus recursos
expressivos, situando textos em relação a seus contextos, constitui o embasamento indispensável à formação
integral da pessoa e à conquista da cidadania.
Espera-se, portanto, que o candidato através do programa possa:
- reconhecer no idioma nacional elementos de produção de sentido, para que se concretizem a conservação,
renovação e transmissão da cultura brasileira;
- identificar a linguagem verbal e a não-verbal como um dos meios que o homem possui para representar, organizar
e transmitir, de forma específica, o pensamento;
- inferir que, sob as variações pelas quais uma língua se manifesta concretamente, há uma estrutura comum que
permite a intercompreensão de todos os falantes;
- verificar que a abordagem da norma padrão deve considerar sua representatividade, como variante lingüística de
determinado grupo social, e o valor atribuído a ela, no contexto das legitimações sociais;
- utilizar-se do idioma com propriedade, clareza, fluência e expressividade de acordo com a situação de produção do
texto;
- classificar, descrever e relacionar, adequadamente, as formas lingüísticas delimitadas pelas condições de
produção/interpretação dos enunciados determinados pelos contextos de uso da língua;
- ler e interpretar textos em língua materna, considerando-a como geradora de significação e integradora da
organização de mundo e da própria identidade;
- reconhecer a manifestação literária como uma linguagem de características formais específicas, que tem como
matéria-prima o idioma, em sua potencialidade expressiva;
- comparar os recursos expressivos da manifestação literária, em suas especificidades próprias, de acordo com as
diferentes épocas;
- identificar a criação das estéticas que refletem, no texto, o contexto do campo de produção e as escolhas
estilísticas geradas pelas lutas discursivas em jogo, em determinada época/local;
- perceber o caráter intertextual e intratextual imanente aos textos literários;
- relacionar o fenômeno literário brasileiro com os quadros da cultura nacional e internacional.
Programa
Parte I - Compreensão e Interpretação de Texto
- Leitura e análise de texto.
- Identificação do gênero do discurso: narração, descrição e dissertação.
- Estrutura do parágrafo.
- Fatores determinantes da textualidade: coerência, coesão, intencionalidade, aceitabilidade, situacionalidade,
informatividade e intertextualidade.
- Tipos de discurso: direto, indireto e indireto livre.
Parte II - Língua Portuguesa
- Língua falada e escrita; uso informal e formal da língua; o nível culto da linguagem; adequação ao contexto; o
sistema ortográfico vigente.
- Morfossintaxe: estrutura e formação de palavras; classes de palavras; flexões de palavras; frase, oração, período;
estrutura da frase; funções sintáticas; período simples e período composto; coordenação e subordinação; regência
nominal e verbal; concordância nominal e verbal; colocação dos termos na frase; pontuação.
- Semântica e estilística: sinônimos, antônimos, homônimos e parônimos; denotação e conotação; figuras de
linguagem; recursos estilísticos.
Parte III - Literatura Brasileira
- Teoria da literatura: criação estética; linguagem literária e não literária; gêneros literários.
- Processo literário brasileiro: momentos do processo literário brasileiro em conexão com a história e a cultura
brasileira; o fenômeno literário brasileiro no quadro da cultura e da literatura internacional; a expressão literária das
atitudes do homem em face do mundo; tradição e modernidade dos procedimentos de expressão literária culta ou
popular e do tratamento dado aos temas; classificação de textos em dada época literária em função de suas
características temáticas e expressionais.
- Romantismo no Brasil: renovação e permanência de temas e de meios de expressão da poesia romântica em
relação à do Barroco e à do Arcadismo; características temáticas e expressionais da poesia, da ficção e do teatro
romântico.
- Realismo no Brasil: a questão do Realismo na ficção do final do século XIX e início do século XX; o Naturalismo e o
Impressionismo na ficção; o Parnasianismo e o Simbolismo na poesia.
- Modernismo no Brasil: o Modernismo brasileiro no contexto da cultura do século XX; o Modernismo comparado às
épocas literárias passadas; elementos de permanência, oposição e transformação; características renovadoras na
ficção; principais tendências da poesia brasileira modernista; a poesia de 1945; tendências pós-45.
- Literatura contemporânea.
149
ANEXO D – Programa de prova UNIRIO
LINGUAGENS, CÓDIGOS e suas TECNOLOGIAS
LÍNGUA PORTUGUESA E LITERATURA BRASILEIRA
Orientação geral
O domínio da língua portuguesa em seus vários usos e a capacidade de analisar, interpretar e aplicar seus
recursos expressivos, situando textos em relação a seus contextos, constitui o embasamento indispensável à
formação integral da pessoa e à conquista da cidadania.
Espera-se, portanto, que o candidato através do programa possa:
- reconhecer no idioma nacional elementos de produção de sentido, para que se concretizem a conservação,
renovação e transmissão da cultura brasileira;
- identificar a linguagem verbal e a não-verbal como um dos meios que o homem possui para representar,
organizar e transmitir, de forma específica, o pensamento;
- inferir que, sob as variações pelas quais uma língua se manifesta, concretamente, há uma estrutura comum
que permite a intercompreensão de todos os falantes;
- verificar que a abordagem da norma padrão deve considerar sua representatividade, como variante lingüística
de determinado grupo social, e o valor atribuído a ela, no contexto das legitimações sociais;
- utilizar-se do idioma com propriedade, clareza, fluência e expressividade de acordo com a situação de
produção do texto;
- classificar, descrever e relacionar, adequadamente, as formas lingüísticas delimitadas pelas condições de
produção/interpretação dos enunciados determinados pelos contextos de uso da língua;
- ler e interpretar textos em língua materna, considerando-a como geradora de significação e integradora
daorganização de mundo e da própria identidade;
- reconhecer a manifestação literária como uma linguagem de características formais específicas, que tem como
matéria-prima o idioma, em sua potencialidade expressiva;
- comparar os recursos expressivos da manifestação literária, em suas especificidades próprias de acordo com
as diferentes épocas;
- identificar a criação das estéticas que refletem, no texto, o contexto do campo de produção e as escolhas
estilísticas geradas pelas lutas discursivas, em jogo em determinada época/local;
- perceber o caráter intertextual e intratextual imanente aos textos literários;
- relacionar o fenômeno literário brasileiro com os quadros da cultura nacional e internacional.
Programa
Parte I - Compreensão e Interpretação de Texto
- Leitura e análise de texto.
- Identificação do gênero do discurso: narração, descrição e dissertação.
- Estrutura do parágrafo.
- Fatores determinantes da textualidade: coerência, coesão, intencionalidade, aceitabilidade, situacionalidade,
informatividade e intertextualidade.
- Tipos de discurso: direto, indireto e indireto livre.
Parte II - Língua Portuguesa
- Língua falada e escrita; uso informal e formal da língua; o nível culto da linguagem; adequação ao contexto; o
sistema ortográfico vigente.
- Morfossintaxe: estrutura e formação de palavras; classes de palavras; flexões de palavras; frase, oração,
período; estrutura da frase; funções sintáticas; período simples e período composto; coordenação e
subordinação;
regência nominal e verbal; concordância nominal e verbal; colocação dos termos na frase; pontuação.
- Semântica e estilística: sinônimos, antônimos, homônimos e parônimos; denotação e conotação; figuras de
linguagem; recursos estilísticos.
Parte III - Literatura Brasileira
- Teoria da literatura: criação estética; linguagem literária e não literária; gêneros literários.
- Processo literário brasileiro: momentos do processo literário brasileiro em conexão com a história e a cultura
brasileira; o fenômeno literário brasileiro no quadro da cultura e da literatura internacional; a expressão
literária das atitudes do homem em face do mundo; tradição e modernidade dos procedimentos de expressão
literária culta ou popular e do tratamento dado aos temas; classificação de textos em dada época literária em
função de suas características temáticas e expressionais.
- Romantismo no Brasil: renovação e permanência de temas e de meios de expressão da poesia romântica
relativamente à do Barroco e à do Arcadismo; características temáticas e expressionais da poesia, da ficção e
do teatro romântico.
- Realismo no Brasil: a questão do Realismo na ficção do final do século XIX e início do século XX; o
Naturalismo e o Impressionismo na ficção; o Parnasianismo e o Simbolismo na poesia.
- Modernismo no Brasil: o Modernismo brasileiro no contexto da cultura do século XX; o Modernismo
comparado às épocas literárias passadas; elementos de permanência, oposição e transformação; características
renovadoras na ficção; principais tendências da poesia brasileira modernista; a poesia de 1945; tendências pós-
45.
- Literatura contemporânea.
PSD UNIRIO/ENCE CONCURSO VESTIBULAR 2008 (1)
150
ANEXO E – Provas de Língua Portuguesa e Literatura Brasileira UERJ e gabaritos
151
152
153
154
155
11/12/2005
Língua Portuguesa / Literatura Brasileira
P
ADRÃO DE RESPOSTAS
(valor de cada questão = 2 pontos)
Questão Resposta
A) Tenha paciência, se obscuros. Calma, se o/a provocam.
B) Forma verbal: deres.
1
Forma apta a substituí-la: dês.
A) O eu lírico passa da recusa/rejeição à proposta/recomendação.
Emprego de formas imperativas, negativas e afirmativas.
2
B) Uma dentre as alternativas:
avesso à emoção lírica
contrário ao arrebatamento lírico
incompatível com a veemência lírica
A) A forma verbal é ambígua no texto de Drummond.
Apresenta os sentidos de aguardar e desejar.
B) Um dentre os versos:
Lá estão os poemas que esperam ser escritos.
Ei-los sós e mudos, em estado de dicionário.
3
Em ambos os trechos, as palavras nada significam ou comunicam, porque estão isoladas e
inativas.
A) polissemia
Cada uma / tem mil faces secretas sob a face neutra.
B) consumar
4
Espera que cada um se realize e conclua/complete.
A) em última análise / com razão
em última análise: acrescenta um raciocínio conclusivo
com razão: expressa idéia de confirmação
5
B) Uma dentre as alternativas:
São o interesse e a incerteza das apreciações que explicam o fato...
O interesse e a incerteza das apreciações é que explicam o fato...
O interesse e a incerteza das apreciações explicam o fato...
A) Consiste na referência a um dado prosaico e circunstancial.
Uma dentre as explicações:
livre mistura de linguagens/estilos
não distinção entre assuntos poéticos e não poéticos
B) Gênero narrativo (ou épico).
6
Uma dentre as características:
relato de episódio
presença de narrador
uso de verbo de ação
criação de personagem
A) Uma dentre as vantagens:
economia de tempo
igualdade entre os homens
7
Uma dentre as desvantagens:
perda da identidade
desumanização produzida pela máquina
156
B) A escrita torna-se mais concisa e a ortografia, simplificada, com a criação de abreviaturas.
A) Modo narrativo no primeiro parágrafo e modo argumentativo (ou
dissertativo) no restante do texto.
B) 1º segmento: verbos de ação
tempo passado
8
2º segmento: verbos de estado
tempo presente
A) Bufando e eriçava.
Atribuição de agressividade ao automóvel e à cidade.
B)
Antítese.
9
Há uma relação de oposição entre as palavras.
A) Primeira etapa: automóvel.
Segunda etapa: transformação da linguagem.
10
B) Reformado e reforma.
157
158
159
160
161
162
10/12/2006
Língua Portuguesa / Literatura Brasileira
PADRÃO DE RESPOSTAS
(VALOR DE CADA QUESTÃO = 2 PONTOS)
Questão Resposta
Elemento: foco narrativo na 1ª pessoa.
Uma dentre as explicações:
expressa a subjetividade do narrador
manifesta o ponto de vista pessoal do narrador
Elemento: espaço físico ou natural
1
Explicação: ênfase na cor local
De Havia oito dias até há de passar.
2
Dois dentre os aspectos ou expressões:
Havia oito dias
desaparecera
a tinha interrogado,
as palavras dirigidas por Lúcia a Paulo no trecho indicado
Segunda oração: era cintilante o brilho
Terceira oração: que desferia a sua pupila negra.
3
o brilho que a sua pupila negra desferia era cintilante.
4
De bem longe Paulo avistou Lúcia que o esperava e lhe fez um aceno de
impaciência; ele apressou o passo para alcançar o portão do jardim. Ela estendeu-
lhe as mãos ambas risonha e atraindo-o, reclinou-se sobre o seu peito com um
gracioso abandono. Sentaram-se nos degraus da pequena escada de pedra,
mal sabendo que era na casa de Tia Antonieta / que nasciam as violetas
africanas.
5
Em Meus Oito Anos, a infância é uma fase da vida idealizada como uma
felicidade irremediavelmente perdida; em Jardim de Infância, trata-se de
um tempo em que temos contato com situações que podemos vir a
conhecer melhor, ou de outro modo, mais tarde.
163
aquele meio quilo de maldade / urubu – pedra
6
a maldita assombração / fazendeiro - urubu
7
Duas dentre as características e um dentre os possíveis exemplos:
emprego de um tom coloquial
Que o quê!,
Lá está o peste,
de plantão,
Refestelado que só ele
uso de expressões regionais
pé de angico,
quentando sol,
rapado jaraguá,
pombeia,
enjerizado
uso de linguagem oral
arroto de desprezo,
a gente,
Urubu nem cheirou nem fedeu,
que nem
Daninho é adjetivo criado por derivação sufixal a partir do substantivo
dano.
8
Bocejo é substantivo criado por derivação regressiva a partir do verbo
bocejar.
Predicativo do sujeito.
9
O adjetivo marrom indica a cor natural do pássaro, mas empregado como
predicativo serve para qualificar o movimento.
Neologismo.
A troca da primeira sílaba das palavras originais exprime uma confusão de
sensações.
Onomatopéia.
10
O uso de sons e formas repetidos imita o ruído provocado pelo bater das asas do
urubu.
164
165
166
167
168
169
170
ANEXO F – Provas de Língua Portuguesa Instrumental UERJ e gabaritos (2006-08)
171
172
173
174
11/12/2005
Língua Portuguesa Instrumental
com Redação
P
ADRÃO DE RESPOSTAS
(valor de cada questão = 2 pontos)
Questão Resposta
A) Se a empresa passava por um período excelente, em conseqüência, deveria
aumentar e não reduzir o salário do funcionário.
Se o funcionário sofreu um corte salarial, não deveria ter ficado satisfeito ou
agradecido.
B) Um dentre os conectivos que mantenham o paradoxo:
logo
assim
portanto
1
Um dentre os conectivos que eliminem o paradoxo:
mas
porém
todavia
contudo
entretanto
A) A perda da identidade do personagem em função de sua acomodação aos abusos
que lhe são impostos no trabalho.
O personagem pode ser considerado o representante de uma grande massa
anônima de empregados que são explorados no ambiente de trabalho.
2
B) Uma dentre as orações:
joão aceitou passivamente a exploração.
joão transformou-se em um escravo do trabalho.
joão submeteu-se às imposições de seu empregador.
175
3
A)
Paralelismo.
A
presentação de estruturas sintáticas semelhantes.
Diferença: os elementos comparados representam classes sociais diversas.
Semelhança: os elementos comparados seguem um modo geral de organização, uma
rotina imposta por diferentes grupos sociais.
4
A)
Engrenagem: relaciona-se com a idéia de modo de organização e controle da
sociedade, que deve funcionar em perfeita ordem.
Parafusos: referem-se aos indivíduos que participam dessa engrenagem e que devem
mantê-la em funcionamento perfeito (ou referem-se à mecanização do homem na
sociedade).
B)
O enunciador aceita/defende a rebeldia, como fuga às imposições do sistema social.
Docemente/docemente frouxos
A) Duas dentre as intenções:
motivar a reflexão
aproximar o enunciador do leitor
expressar uma dúvida do enunciador
exprimir estado emocional do enunciador
destacar o fato seguinte, independentemente de sua causa
5
B) Duas dentre as características:
rebeldia
persistência
ânsia de paixão
desejo de liberdade
anseio por ultrapassagem de limites
instinto para a defesa contra os perigos
176
177
178
179
10/12/2006
Língua Portuguesa Instrumental com Redação
PADRÃO DE RESPOSTAS
(VALOR DE CADA QUESTÃO = 2 PONTOS)
Questão Resposta
Um dentre os exemplos de função referencial:
e logo está a Cintura Industrial, quase tudo parado, só umas poucas
fábricas
e agora a triste Cintura Verde, as estufas pardas, cinzentas, lívidas,
1
Um dentre os exemplos de função expressiva:
que parecem fazer da laboração contínua a sua religião,
por isso é que os morangos devem ter perdido a cor, não falta muito para que sejam
brancos por fora como já o vão sendo por dentro e tenham o sabor de qualquer coisa que
não saiba a nada.
O pronome lhe indica que o personagem principal é o possuidor da louça ou indica posse.
2
Um dentre os fragmentos:
de repente, sem avisar, apertou-se-lhe
o coração a Cipriano Algor,
o cão subia-lhe
aos braços,
e lambia-lhe
a cara
3
Viremos agora à esquerda, lá ao longe, onde se vêem aquelas árvores, sim, aquelas
que estão juntas como se fossem um ramalhete,
que a água desta fonte não poderá matar-te a sede naquele deserto,
Mas há tantas músicas esperando ser escritas!
4
Estilização.
5
Dois dentre os exemplos de reescritura:
A vela, porque ilumina, é uma vela alegre.
A vela, visto que ilumina, é uma vela alegre.
A vela, por iluminar, é uma vela alegre.
A vela, enquanto ilumina, é uma vela alegre.
A vela, ao iluminar, é uma vela alegre.
A vela, iluminando, é uma vela alegre.
A vela, se ilumina, é uma vela alegre.
A vela, caso ilumine, é uma vela alegre.
A vela, desde que ilumine, é uma vela alegre.
A vela, à medida que ilumina, é uma vela alegre.
A vela, à proporção que ilumina, é uma vela alegre.
condição
proporção
causa
tempo
180
181
182
183
ANEXO G – Provas de Língua Portuguesa e Lit.Bras. UFF e gabaritos (2006-08)
UFFVESTIBULAR2006
184
UFFVESTIBULAR2006
185
UFFVESTIBULAR2006
186
UFFVESTIBULAR2006
187
UFFVESTIBULAR2006
188
UFFVESTIBULAR2007
189
UFFVESTIBULAR2007
190
UFFVESTIBULAR2007
191
UFFVESTIBULAR2007
192
UFFVESTIBULAR2007
193
UFFVESTIBULAR2008
194
UFFVESTIBULAR2008
195
UFFVESTIBULAR2008
196
UFF VESTIBULAR 2008
197
UFFVESTIBULAR2008
198
ANEXO H – Provas de Língua Portuguesa e Lit.Bras. UFRJ e gabaritos (2006-08)
199
200
201
202
203
204
2007
205
206
207
208
209
UFRJ 2008
210
ANEXO I – Provas de Língua Portuguesa e Lit.Bras. UNIRIO e gabaritos (2006-08)
UNIRI
O 2006
211
UNIRIO2006
212
UNIRIO2006
213
214
215
UNIRIO2007
216
UNIRIO2007
217
UNIRIO2007
218
219
UNIRIO2008
220
UNIRIO2008
221
UNIRIO2008
222
223
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