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um empreendimento econômico, ou seja, trata-se de patrimônio de afetação. Com efeito, se
há independência entre o patrimônio da empresa e o patrimônio do titular, há patrimônio de
afetação, pelo que as obrigações vinculadas a tal patrimônio deveriam ser apenas por ele
garantidas. Demonstra-se, portanto, ser insustentável o não reconhecimento da
independência do patrimônio da empresa em relação ao do seu titular, mantendo-se o
princípio da responsabilidade ilimitada do empresário individual.
Como se viu, o Direito Empresarial é bem representado através do binômio atividades
empresárias e mercado. Com efeito, mediante a noção de viabilidade econômica atrelada à
função social da empresa
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, tem-se que as atividades empresárias que se revelarem
economicamente viáveis devem ser preservadas, e o Estado precisa garantir tal preservação,
para o bem e o bom funcionamento do mercado. É a atividade que qualifica o sujeito
enquanto empresário; é a atividade empresária que passa a primeiro plano, quando da
mudança de perspectiva da disciplina. Este é o entendimento da Rachel Sztajn (2004, p. 10):
Mercado e organizações, creio, são o cerne do moderno Direito Comercial.
Portanto, os princípios norteadores do Direito Comercial, mesmo com a unificação
do direito privado, não afastam a antiga concepção sobre ser ele um direito
especial em relação ao direito comum, direito civil, agora, entretanto, não mais
relacionado aos atos de comércio, de criação francesa, mas como direito dos
mercados e das empresas. Não um direito classista ou corporativista, mas um
direito de caráter econômico que replica a microeconomia.
Atenta-se contra a função social da empresa a manutenção do status quo. Urge que se
regule a limitação de responsabilidade do empresário individual. Deve, portanto, o
patrimônio da empresa ser o alvo único de obrigações empresariais, não se misturando, nem
se confundindo, do ponto de vista de responsabilidades, o patrimônio empresarial e o
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Tem sido extremamente rico o debate em torno do que seria a denominada função social da empresa. De um
lado há aqueles, como Milton Friedman (1988), na obra Capitalismo e Liberdade, que evidenciam que a função
social da empresa não pode ser outra senão a maximização dos lucros. Existe todavia uma corrente doutrinária
que entende que o lucro não poderia ser colocado em primeiro plano, como um fim em si mesmo, havendo a
necessidade de inserção do empresário no que tange às “preocupações sociais e ambientais por parte das
empresas nas suas operações e na interação com a comunidade”, como se percebe em Eduardo Tomasevicius
Filho (2005, p. 40). Nesse viés, só teria função social aquelas empresas que empregassem seus esforços a partir
de um compromisso ético e socialmente responsável. Como se percebe, na verdade, esta segunda corrente
confunde as noções de função social da empresa e de responsabilidade social da empresa. Aquela é
obrigatória de ser cumprida e deve ser entendida, em seu conteúdo material, como sendo a busca pelo lucro,
desde que atendidas as condicionantes legais, ou seja, as prescrições do ordenamento jurídico; a
responsabilidade social, por sua vez, não pode ser vista como outra coisa que não seja um mero ato de
voluntariedade do empresário, que só vai praticá-lo se, e até o momento em que lhe parecer interessante, da
prática de tais atos socialmente responsáveis seja viável ao ponto de se poder retirar dela algum proveito. É
desse modo que ressalta Viviane Perez (2008, p. 212): “Como se percebe, pois, a distinção se acentua no fato
de a responsabilidade social ser uma postura voluntária do empresariado, enquanto a função social incide sobre
o exercício da atividade empresarial e é de observância cogente por força do comando constitucional”.