96
da narrativa que permite à imaginação do leitor o preenchimento das ―lacunas‖. Para Paz
(1982, p. 138), "a imagem não explica: convida-nos a recriá-la e literalmente revivê-la".
Quanto ao primeiro aspecto — a relação entre a imagem e a escrita —, recorro, ainda, a
Ferreiro & Teberosky (1999), que afirmam que:
a escrita também é um objeto simbólico, é um substituto (significante) que
representa algo. Desenho e escrita - substitutos materiais de algo evocado –
são manifestações posteriores da função semiótica mais geral. No entanto,
diferem. Por um lado, o desenho mantém uma relação de semelhança com os
objetos ou com os acontecimentos aos quais se refere; a escrita não. [...]
Tanto a natureza como o conteúdo de ambos os objetos substitutos são
diferentes. (FERREIRO & TEBEROSKY, 1999, p. 70)
Quanto ao segundo aspecto — as características das histórias em quadrinhos —, Franco &
Oliveira (2009) afirmam que:
a leitura dos quadrinhos desencadeia um processo duplo: leitura de textos e de
imagens em sua maioria. Além do que, o enredo é repleto de surpresas. De
acordo com Fogaça (2002, p. 212), o argumento no decorrer da narrativa é
completo, tem problemas a serem solucionados, e existem obstáculos à
solução desses problemas e ao final a solução é uma surpresa.
A HQ tem a vantagem de poder, ao mesmo tempo, mostrar a cena e fazer as
personagens falar, pronta a fazer com que o dito contrarie a imagem,
trabalhando, assim, com o humor e também com a ironia. Assim, Melo (2003)
expõe que uma das características marcantes dos quadrinhos é seu caráter
lacunar, uma vez que, por trás do dito, há toda uma instância do dizer, a
evidenciar que a significação da tira vai muito além da simples manifestação
verbal.
Desse modo, uma das funções do leitor é o preenchimento do que não foi dito
pela recuperação dos implícitos e pela percepção dos efeitos de sentido
desejados pelo autor. As inferências são processos mentais de decodificação,
enriquecimento, reconhecimento, pressuposição, processamento, validação e
conclusão de uma palavra e/ou enunciado, em um contexto. .Sempre podemos
fazer muitas inferências a partir dos elementos de um texto, uma vez que os
textos mostram uma quantidade mínima de coesão formal, abrindo muitas
linhas de possíveis inferências. (Melo, 2003), o que normalmente requer que o
leitor faça quantas inferências forem necessárias para obter a compreensão do
texto.
O leitor é sempre responsável pela projeção do sentido que melhor lhe
convier, a partir da posição política, social, econômica e pessoal que ocupe.
Portanto, a interpretação das tiras depende também das inferências, ou seja,
das conexões que as pessoas fazem, quando tentam estabelecer a compreensão
do que lêem. Os textos dúbios, como são os textos de humor exigem que o
leitor realize várias inferências para construir o sentido, e o resultado dessas
inferências leva ao riso. (FRANCO & OLIVEIRA, 2009, p. 423)