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UNIVERSIDADE DE SANTA CRUZ DO SUL – UNISC
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO – MESTRADO
ÁREA DE CONCENTRAÇÃO EM DIREITOS SOCIAIS E POLÍTICAS PÚBLICAS
Claudine Freire Rodembusch
A IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS A PARTIR DO PODER
LOCAL EM DIREÇÃO À PREVENÇÃO E AO COMBATE DA VIOLÊNCIA
INTRAFAMILIAR DE QUE SÃO VÍTIMAS AS CRIANÇAS E OS
ADOLESCENTES NO MUNICÍPIO DE RIO PARDO
Santa Cruz do Sul, novembro de 2008
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Claudine Freire Rodembusch
A IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS A PARTIR DO PODER
LOCAL EM DIREÇÃO À PREVENÇÃO E AO COMBATE DA VIOLÊNCIA
INTRAFAMILIAR DE QUE SÃO VÍTIMAS AS CRIANÇAS E OS
ADOLESCENTES NO MUNICÍPIO DE RIO PARDO
Santa Cruz do Sul, novembro de 2008.
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Claudine Freire Rodembusch
A IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS A PARTIR DO PODER
LOCAL EM DIREÇÃO À PREVENÇÃO E AO COMBATE DA VIOLÊNCIA
INTRAFAMILIAR DE QUE SÃO VÍTIMAS AS CRIANÇAS E OS
ADOLESCENTES NO MUNICÍPIO DE RIO PARDO
BANCA EXAMINADORA
Dr. Ricardo Hermany
Professor Orientador
Profª. Drª. Maria Luiza Pereira de Alencar Mayer Feitosa
Universidade Federal da Paraíba
Profª. Drª. Marli Marlene Moraes da Costa
Universidade de Santa Cruz do Sul - UNISC
Dedico este trabalho especialmente ao meu
pai, o qual me serviu de exemplo por sua
incessante luta pela vida. Sempre presente
com uma palavra amiga, levando-me a lutar
por meus objetivos e enfrentar as
dificuldades surgidas no decorrer de minha
trajetória. Espero que, de onde esteja, saiba
o quanto foi e continua sendo importante
para mim e para o meu desenvolvimento
pessoal, pois me fez acreditar nas mudanças
e de que é possível sim, transformar este
país em um lugar melhor de se viver. A ele,
toda a minha admiração, respeito e amor.
AGRADECIMENTOS
Aos meus amados pais, Claudionor e Ione, que dedicaram suas vidas aos
filhos, deixando, muitas vezes, de lado os seus sonhos, para que pudesse
alcançar meu objetivo maior. Essas pessoas são portadoras de toda a minha
admiração.
Ao meu grande e verdadeiro amor Pablo Rocha, que sempre esteve ao
meu lado, me apoiando e lutando comigo, na busca da realização dos meus
sonhos.
À equipe do Serviço Sentinela, do Município de Rio Pardo, pois esteve
sempre ao meu lado, me incentivando e auxiliando na busca de informações
pertinentes ao trabalho realizado.
Aos usuários do Serviço Sentinela, do Município de Rio Pardo, que se
tornaram grandes amigos e me fizeram refletir sobre a importância das Políticas
Públicas para essas famílias fragilizadas.
A meu orientador, Ricardo Hermany, pela orientação, empenho, paciência
e dedicação, as quais foram imprescindíveis para a realização deste trabalho.
À querida professora e amiga Marli Costa, grande pesquisadora que luta
por uma sociedade mais justa para todos e que sempre esteve ao meu lado,
sendo para mim um exemplo de vida.
A todos que torceram pela minha vitória, apoiando-me nesta difícil
caminhada.
Muito Obrigada!
“A criança e o adolescente têm direito à proteção à vida
e à saúde, mediante a efetivação de políticas sociais
públicas que permitam o nascimento e o
desenvolvimento sadio e harmonioso, em condições
dignas de existência”.
(Art. 7º - Capítulo I – Do Direito à Vida e à Saúde; Título II – Dos
Direitos Fundamentais; Lei n. 8.069/1990. Dispõe sobre o Estatuto da
Criança e do Adolescente, e dá outras providências)
RESUMO
Este trabalho visa a analisar a possibilidade de o Poder Local contribuir
com a elaboração e execução de políticas públicas, que garantam às crianças e
aos adolescentes, vítimas de violência intrafamiliar, os direitos e garantias
fundamentais contemplados na Constituição Federal e detalhados e
instrumentalizados através do Estatuto da Criança e do Adolescente. Dessa
forma, o tema escolhido para dissertar é a violência intrafamiliar de que são
vítimas crianças e adolescentes, especialmente a partir de uma pesquisa de
campo sobre o projeto social do Serviço Sentinela, no Município de Rio Pardo, RS,
concatenado com a hipótese de gestão de políticas públicas de combate e
prevenção desses sujeitos, a partir do poder local. O método de abordagem
adotado foi o hipotético-dedutivo e a técnica de pesquisa foi empírica, ou seja,
uma pesquisa de campo, realizada no Serviço Sentinela do Município de Rio
Pardo, RS, o qual trata de crianças e adolescentes vítimas de violência, bem como
de suas famílias. Foi adotado o levantamento de dados por amostragem,
delimitando-se o número de famílias beneficiadas com o Serviço Sentinela, em 42
sujeitos. Para tanto, foi aplicado um questionário, contendo 14 perguntas
fechadas, formuladas aos pais ou responsáveis por infantes vítimas de violência
intrafamiliar. Verificou-se na coleta dos dados que 71,7% dos agressores são
familiares das vítimas infantes, ao passo que 28,3% de agressores não familiares.
O Município de Rio Pardo desenvolve o Serviço Sentinela como forma de proteção
jurídica aos infantes vítimas de violência intrafamiliar. Porém, o Município tem
condições para a implementação de mais políticas públicas que atendam as
necessidades dessas vítimas, através de um trabalho conjunto do Estado e da
sociedade civil, atendendo as demandas de forma mais satisfatórias.
PALAVRAS-CHAVE: Violência Intrafamiliar Políticas Públicas Poder Local
Crianças – Adolescentes.
ABSTRACT
This work aims at to analyze the possibility of the Local Power to contribute
with the elaboration and execution of public politics, that garantee to children and
the adolescents victims of inside family violence, the contemplated rights and basic
guarantees in the Federal Constitution and the Statute of the Child and the
Adolescent. Of this form, the chosen subject to discourse is the inside family
violence that adolescent children are victims, especially from a field research on
the social project of the Service Sentry, in the city of Rio Pardo, RS, concatenated
with the hypothesis of management of public politics of combat and prevention of
these citizens, from the local power. The adopted method of boarding was the
hypothetical-deductive and, the technique of research was empirical, that is, one
research of field, carried through in the Service Sentry, in the city of Rio Pardo, RS,
which deals with children and adolescents violence victims, as well as its families.
The data-collecting for sampling was adopted, delimiting itself the number of
families benefited with the Service Sentry, in 42 citizens. For in such a way, a
questionnaire was applied, contends 14 closed questions, to the responsible
parents or the infants victims of inside family violence. It was verified in the
collection of the data that 71.7% of the aggressors are familiar of the victim’s
infants, compared with 28.3% of not familiar aggressors. The city of Rio Pardo
develops the Service Sentry as legal protection to the infant’s victims of inside
family violence. However, the city has conditions for the implementation of more
politics publishes that take care of the necessities of these victims, through a joint
work of the State and the civil society, taking care of the more satisfactory
demands of form.
KEYWORDS: Inside Family Violence Public Politics Local Power Children
Adolescent.
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 - Caracterização do usuário - faixa etária.................................................103
Tabela 2 - Caracterização do usuário – gênero ......................................................104
Tabela 3 - Caracterização do usuário - etnia...........................................................105
Tabela 4 - Renda familiar do usuário ......................................................................106
Tabela 5 - Vínculo do agressor com o usuário do Serviço Sentinela ......................107
Tabela 6 - Escolaridade da criança ou adolescente atendidos pelo Serviço
Sentinela .................................................................................................................109
Tabela 7 - Escolaridade do agressor.......................................................................110
Tabela 8 - Ano em que foi encaminhado ao Serviço Sentinela...............................111
Tabela 9 - Antes do encaminhamento ao Serviço Sentinela recebeu atendimento
em outro serviço especializado...............................................................................112
Tabela 10 - Esse atendimento foi considerado suficiente para as suas
necessidades ..........................................................................................................113
Tabela 11 - Grau de satisfação com o Serviço Sentinela........................................114
Tabela 12 - Quais são as principais dificuldades enfrentadas pela família do
usuário do Serviço Sentinela...................................................................................115
Tabela 13 - Condições habitacionais ......................................................................116
Tabela 14 - Idade em que começaram as agressões .............................................117
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO..........................................................................................................10
1
VIOLÊNCIA INTRAFAMILIAR ...........................................................................14
1.1
Evolução da família ..........................................................................................14
1.2
A família e a infância.........................................................................................25
1.3
Histórico sobre a violência contra a criança e sobre as políticas de
prevenção..........................................................................................................32
1.4
Tipos de violência de que são vítimas os infantes........................................40
2
O PAPEL DO ESTADO E DO MUNICÍPIO NA IMPLEMENTAÇÃO DE
POLÍTICAS PÚBLICAS DE COMBATE E PREVENÇÃO DA VIOLÊNCIA
INTRAFAMILIAR................................................................................................54
2.1
Aspectos gerais das políticas públicas..........................................................54
2.2
O Estado e as políticas públicas .....................................................................63
2.3
O Município e as políticas públicas de atendimento à criança e ao
adolescente a partir da Constituição Federal de 1988...................................72
3
PODER LOCAL COMO ESPAÇO DE CONCRETIZAÇÃO DE POLÍTICAS DE
PREVENÇÃO E COMBATE À VIOLÊNCIA INTRAFAMILIAR..........................92
3.1
O Município e sua interface com a sociedade civil........................................92
3.2
O Município de Rio Pardo ................................................................................99
3.3
As faces atuais da violência intrafamiliar de que são vítimas crianças e
adolescentes na cidade de Rio Pardo...........................................................102
3.3.1
Alternativas de prevenção e combate da violência intrafamiliar ...................118
3.4
A reinserção do princípio da solidariedade (integração social) e a
participação popular como requisito para a efetivação da cidadania dos
infantes vitimizados........................................................................................122
CONCLUSÃO.........................................................................................................128
REFERÊNCIAS.......................................................................................................134
ANEXO ...................................................................................................................146
Anexo A - Questionário a ser respondido pelo(s) pai(s) ou responsável(veis)
pelo menor que utiliza(zou) o Serviço Sentinela no Município de Rio
Pardo................................................................................................................147
INTRODUÇÃO
A violência contra as crianças e os adolescentes vem décadas
chamando a atenção, porém, somente recentemente, este assunto começa a ser
visto, falado e discutido em todas as instâncias da sociedade. É realmente muito
difícil ter uma idéia exata da amplitude e do que seja essa realidade, pois existe
um grande medo por parte dos infantes em revelar as agressões, como também
receio dos adultos em escutá-las.
se passaram dezoito anos desde a edição da Lei n. 8.069/90 e, ainda
assim, muitas pessoas e, até mesmo aquelas tidas como esclarecidas, não dão a
devida importância para o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Apesar de
serem relatadas quase que diariamente notícias envolvendo casos de violência
contra os infantes, a posição de alguns permanece inerte, como se fosse uma
realidade distante e rara.
Na luta contra a violência às crianças e aos adolescentes é necessário
que haja uma conscientização social, uma mudança de conceitos e atitudes. Daí a
importância da sociedade civil, que vai aparecer para atuar em conjunto com o
Estado, pois este não pode ser tido como único responsável por todos os
problemas que ocorram no País e em especial no que concerne ao tema objeto do
presente trabalho.
A participação faz com que haja um fortalecimento da cidadania, tornando,
dessa forma, a sociedade mais democrática, fazendo com que o cidadão tenha
possibilidades de escolhas junto ao governo. Percebe-se, então, a importância do
espaço público local, proporcionando políticas públicas mais direcionadas para os
interesses locais. Portanto, justifica-se o estudo e aprofundamento dessa temática,
tendo em vista que os infantes, hoje violentados, serão o futuro do Brasil,
constituindo-se um dever pessoal de cada pessoa proteger as crianças e os
adolescentes contra todas as formas de violência, para que esses, hoje
vitimizados, possam ter um futuro digno e não se tornem futuros agressores.
Atualmente, vislumbra-se uma tendência de fortalecimento do
municipalismo, na qual o ente local figura como referência de cultura e cidadania,
tornando-se importante espaço estratégico de atuação para a salvaguarda dos
valores e interesses daqueles que residem nesses territórios. Então, como não
poderia deixar de ser, verifica-se que o estudo desenvolvido enquadra-se na linha
de pesquisa das políticas públicas, pois são essas que concretizam os direitos
sociais declarados e garantidos em lei, bem como, devem ser entendidas como
sendo uma ação criada pelo Estado, como resposta deste às demandas que
surgem na sociedade.
Nesse sentido, o tema deste trabalho representa na realidade regional, um
desafio não teórico, mas essencialmente prático. A violência familiar contra
crianças e adolescentes ocupa lugar no duro cenário de vida, principalmente, das
camadas mais pobres da população. Prevenção e combate à violência são temas
legitimamente ancorados nas políticas públicas, ou seja, nas ações
governamentais protetivas, entre outros, dos direitos fundamentais dos homens.
A partir dessa constatação, o poder local, enquanto governança que mais
proporciona a participação local, parece ter a capacidade de melhor implementar a
vontade de todos em erradicar a violência, combatendo-a e prevenindo-a a partir
da própria sociedade organizada, pois é ela que sente as agruras da cotidiana e,
em muitas vezes, silenciosa violência contra os infantes.
Diante disso, emerge a delimitação do tema do estudo, ou seja, a
implementação de políticas públicas a partir do poder local em direção à
prevenção e ao combate da violência intrafamiliar de que são vítimas as crianças
e os adolescentes.
Sendo assim, tem-se como problema deste estudo o seguinte
questionamento: Quais são as possibilidades e perspectivas de implementação de
políticas públicas locais, direcionadas à prevenção e ao combate da violência
intrafamiliar que vitimam crianças e adolescentes no Município de Rio Pardo?
A partir do questionamento, formulou-se o objetivo geral deste trabalho
que é o de analisar e verificar a possibilidade de o poder local contribuir para a
elaboração e execução de políticas públicas que assegurem os direitos e
garantias fundamentais, previstos na atual Constituição Federal e no Estatuto da
Criança e do Adolescente, aos infantes vítimas de violência intrafamiliar,
emprestando eficácia social (efetividade) aos direitos.
Como objetivos específicos tem-se: demonstrar a importância do papel do
Estado na proteção de crianças e adolescentes vítimas de violência; refletir sobre
a função do poder local no desenvolvimento de políticas públicas de prevenção e
combate à violência intrafamiliar de que são vítimas crianças e adolescentes no
Município de Rio Pardo, bem como avaliar as políticas existentes; analisar o papel
da família no desenvolvimento e proteção do ser humano; verificar o grau de
satisfação dos sujeitos da pesquisa, quanto à implementação de determinado
projeto social de proteção e prevenção de violência contra os infantes; avaliar a
utilidade e necessidade de manutenção e aprimoramento de projetos sociais
como, por exemplo, o projeto Sentinela na cidade de Rio Pardo; examinar, a partir
dos resultados da pesquisa, a necessidade de inclusão de novos paradigmas
teóricos próprios ao desenvolvimento local, regional e nacional como, por
exemplo, através de institutos como a democracia participativa e o poder local.
Desse modo, para se alcançar tais objetivos e responder ao problema
deste estudo, o método de abordagem adotado foi o hipotético-dedutivo e, a
técnica de pesquisa foi empírica, ou seja, uma pesquisa de campo, realizada no
Serviço Sentinela, no Município de Rio Pardo, RS, o qual trata de crianças e
adolescentes vítimas de violência, bem como de suas famílias.
Foi adotado o levantamento de dados por amostragem, delimitando-se o
número de famílias beneficiadas com o Serviço Sentinela, especificando a faixa
etária da vítima, o sexo, a escolaridade, a renda familiar, o autor da violência (se
pai, tio, irmãos, padrasto, desconhecido, amigo entre outros). Para tanto, foi
aplicado um questionário, contendo 14 perguntas fechadas, aos pais ou
responsáveis pelos infantes vítimas de violência intrafamiliar.
A pesquisa de campo contou com a participação de 42 sujeitos, todos
voluntários e entrevistados pessoalmente pela pesquisadora. Ressalta-se que a
pesquisa foi individual e restrita ao sujeito e pesquisador, sem a interferência ou
participação de qualquer outra pessoa.
Nesse sentido, houve por bem dividir-se este trabalho em capítulos, os
quais se acham estruturados da seguinte forma: o primeiro capítulo trata de
violência intrafamiliar, onde se pode encontrar itens como: a evolução da família; a
família e a infância; o histórico sobre a violência contra a criança e sobre as
políticas de prevenção; e, os tipos de violência de que são vítimas os infantes. O
segundo capítulo traz o papel do Estado e do Município na implementação de
políticas públicas de combate e prevenção da violência intrafamiliar. o terceiro
capítulo trata-se da pesquisa em si, onde se tem o poder local como espaço de
concretização de políticas públicas de prevenção e combate à violência
intrafamiliar, vislumbrando o Município e sua interface com a sociedade civil;
dados sobre o Município de Rio Pardo; as faces atuais da violência intrafamiliar de
que são vítimas os infantes na cidade de Rio Pardo; e, a participação popular
como requisito para a efetivação da cidadania dos infantes vitimizados. Por fim,
apresenta-se a conclusão do estudo.
1 VIOLÊNCIA INTRAFAMILIAR
1.1 Evolução da família
O tema sobre a família foi - e ainda é- explorado através de sua história,
utilizando-se diferentes fontes de dados e de informação, como: fotografias,
museus, diários de família (onde se anotavam os acontecimentos domésticos),
obras pictóricas, trabalhos literários, registros paroquiais (nascimentos, batismos,
casamentos), censos populacionais para explorar as origens e a evolução da
família em diferentes comunidades.
Família é um termo que se define por si, tomando-se sua abrangência em
duas acepções, ampla e restrita. No sentido amplo, família compreende o
agrupamento de pessoas vinculadas pela consangüinidade, pela adoção e pela
afinidade, na linha reta e na colateral, além dos cônjuges e dos companheiros. Em
sentido restrito, família envolve os cônjuges (família conjugalizada ou
matrimonializada), ou os conviventes (família não matrimonializada ou união
afetiva consensual), e seus filhos. À família assim constituída se denomina
biparental. Também se circunscreve no sentido restrito a família monoparental,
composta apenas por pai (família patrilinear), ou apenas por mãe (família
matrilinear), e por seus filhos, sejam estes consangüíneos ou adotivos,
matrimoniais ou não matrimoniais. A família em sentido restrito constitui a família
nuclear.
Na Antigüidade, a família estruturava-se em torno da autoridade paterna e
marital, cuja função era velar pela boa conduta dos membros, com plenos direitos
de julgar e punir. Este quadro atenuado na civilização grega e acentuado na
romana sofreu uma mudança sutil com a difusão da palavra de Jesus Cristo,
pregando o amor ao próximo e afirmando que a autoridade paterna não se
estabelecera no interesse do pai, mas no do filho, e que a esposa-mãe não era
sua escrava, mas sua companheira. Também como decorrência da ideologia
cristã, foi promulgada em 374 d.C. a primeira lei contra o infanticídio.
Ao longo do tempo, a família emerge muito vinculada ao estudo da
estrutura social, econômica e política das diferentes sociedades, tanto no período
pré-industrial como industrial, ao ser considerada a unidade básica da sociedade.
Em sua estrutura, processo e funções, a família tem sido uma resposta às
necessidades habituais dos povos. As diferentes formas de viver a família,
segundo estudiosos do assunto, não fazem mais do que espelhar aspectos
fundamentais da mentalidade de cada época.
O sentido de família, ao longo de sua história, esteve ligado à habitação
ou teto, reprodução, regulação do sexo, organização familiar, vínculos
sangüíneos, produção, transmissão de valores, socialização dos membros de uma
sociedade ou ao cuidado dos enfermos. Na Idade Média dois critérios se
impuseram para definir a família: primeiro foi o da consangüinidade, logo seguido
pelo da coabitação; ambos estavam relacionados mais à estrutura do que às
funções que a família desempenhava.
A primeira forma de união entre homens e mulheres não ocorreu através
do casamento, dava–se, presumivelmente, pela captura da fêmea pelo macho, tal
qual ocorria entre os animais. Como se refere Sampaio:
A mulher começa em sendo escrava do homem, confirma Guizot. Senhor
absoluto da natureza e do mundo, apoderando-se das coisas e
subjugando os animais, o homem também estende à mulher seu domínio
pleno e incontestado. [...] Unida pelo sangue, fez-se a mulher submissa
pelo trabalho. Jungida à gleba, como elemento de força e riqueza, entrou,
por tal forma, para o patrimônio individual do homem [...].
o casamento, por sua vez, surgiu da religião e da necessidade estatal
de povoamento por cidadãos e soldados. O casamento não foi inventado pelo
legislador, preexiste ao direito positivo, antecede a cultura jurídica. Suas origens
foram religiosas e sociais, conforme visão de Aguirre: “fueron los magos,
hechiceros, brujos, sacerdotes, quienes oficiaban en nombre de la divinidad o
divinidades. Por eso es congruente afirmar que el matrimonio siempre fue
religioso, es decir, un hecho misterioso, un sacramento”.
Diniz faz a seguinte definição: “O casamento é o vínculo jurídico entre o
homem e a mulher que visa o auxílio mútuo material e espiritual, de modo que
haja uma integração fisiopsíquica e a constituição de uma família”.
A família e, especialmente, o casamento tiveram um desenvolvimento
histórico e legislativo fortemente influenciado pelos costumes, pela religião e pelos
interesses políticos e econômicos do Estado, em cada época. Assim, no decorrer
da história várias mudanças ocorreram no âmbito familiar, seja no seu interior
como também na sua relação com a sociedade. Através da obra História Social da
Criança e da Família, Áries faz um estudo da trajetória da família desde a época
Medieval à Moderna. Primeiramente o autor trata da sociedade tradicional
européia, assinalada pela transmissão geral de valores e conhecimentos com
relação à socialização da criança. Descreve que a família tinha por incumbência, a
conservação dos bens, a prática de um ofício comum a todos, e a ajuda mútua no
dia-a-dia de um mundo em que o homem e a mulher não poderiam sobreviver
isolados.
A partir do século XVI algumas mudanças significativas ocorrem na
família, aonde se assiste a um processo de nuclearização da família,
acompanhado da individualização de seus membros. Engels ao estudar as fases
clássicas da evolução da cultura a divide em três grandes estágios: estágio
selvagem, barbárie e civilização. Segundo o autor, desde os tempos pré-
históricos, a evolução da família consiste numa redução constante do círculo em
cujo interior predomina a comunidade conjugal entre os sexos, rculo este que
originariamente abarcava a tribo inteira.
No estágio selvagem, considerado como infância do gênero humano,
corresponderia à estruturação por grupos, onde cada homem pertencia a todas as
mulheres, assim como toda a mulher pertenceria a todos os homens. O período
chamado de barbárie trataria da família sindiásmica, aonde aparece a redução do
grupo e a sua unidade última que é o par, ou seja, o casal. Por fim, no estágio da
civilização, o modelo correspondente é o da monogamia.
Tanto a cultura grega como a romana traduzem com bastante severidade
a forma de organização da família monogâmica. Esta foi a primeira forma de
organização familiar que se baseava em condições econômicas, e significou o
triunfo da propriedade privada sobre a propriedade comum primitiva, originada
espontaneamente.
A Revolução Francesa (1789), que inaugurou a entrada da sociedade
capitalista na era contemporânea, foi responsável por profundas transformações
políticas, sociais e econômicas, alterando o comportamento do homem europeu.
Essa transformação baseou-se no princípio da igualdade entre os homens,
abolindo privilégios nos direitos público e privado, constituindo-se num dos pilares
do liberalismo e das instituições democráticas. Teve, ainda, a capacidade de
irradiar suas idéias político-ideológicas através do mundo, influenciando
movimentos de independência das colônias Latino-Americanas.
Assim, as transformações profundas ocorridas na sociedade
contemporânea relacionadas à ordem econômica, à organização do trabalho e ao
fortalecimento da lógica individualista, vieram a atingir e afetar diretamente a
relação familiar, seus hábitos e costumes. Nota-se que as famílias entraram em
processo de empobrecimento acelerado e de (des)territorialização gerada pelos
movimentos migratórios, além da perda gradativa da eficiência do setor público na
prestação de serviços. Nota-se também que as famílias começaram a reduzir em
número de membros, um aumento das variedades de arranjos familiares
(monoparentais, reconstituídas).
coincidências quando se identificam os motivos que levaram a essas
mudanças na família e a adquirir importância dentro da sociedade, ao identificar
as novas formas econômicas monetárias como a principal causa, como sintetiza
Casey: “a verdade é que a família, em qualquer de suas formas, é apenas um
conceito heurístico que nos ajuda a explicar a estrutura econômica e política de
uma sociedade particular”.
Ao longo do tempo as relações familiares estiveram completamente
comprometidas com as relações de propriedade, determinando, assim, a
coisificação da mulher. Isso ocorria porque o casamento estava configurado como
uma relação social de dominação patriarcal monogâmica, baseada na
preocupação em se garantir a legitimidade dos filhos, pois, na qualidade de
herdeiros diretos, deveriam entrar na posse do patrimônio paterno. Para a
ideologia burguesa, a família (tradicional ocidental) se constitui como a base da
sociedade e do Estado, a partir disso, a relação homem/mulher fica regulada por
este, através do casamento civil (contrato de casamento), protegido pelo digo
Civil, e é definido pela Igreja como sagrado e indissolúvel.
De acordo com López:
El modelo – cultural – tradicional de la familia cristiana occidental se
presenta como un difícil equilibrio en el que la autoridad del marido
sobre la mujer, de los padres sobre los hijos aparece compensado por
el sacrificio de quienes mandan y la consideración de quienes obedecen
como valiosos en sí mismos.
Entretanto, com a crescente demanda por mão-de-obra, causada pela
industrialização, a mulher das classes populares começou a entrar no mercado de
trabalho, em meados do século XIX, na Europa Ocidental, como assalariadas nas
indústrias e nas oficinas. Dessa forma, o processo de modernização e o
movimento feminista provocaram mudanças na família e o modelo patriarcal,
vigente até então, passava a ser questionado.
Para Engels:
A única coisa que se pode responder é que a família deve progredir na
medida em que progrida a sociedade, que deva modificar-se na medida
em que a sociedade se modifique como se sucedeu até agora. A família
é produto do sistema social e refletirá o estado de cultura desse sistema.
Tendo a família monogâmica melhorado, a partir dos começos da
civilização e, de maneira notável, nos tempos modernos, é lícito pelo
menos supor que seja capaz de continuar seu aperfeiçoamento.
Essas transformações desencadearam um processo de fragilização dos
vínculos familiares, o que tornou as famílias mais vulneráveis. A maior
vulnerabilidade é notada nas famílias menores, com a presença de apenas um
adulto, que vivem distantes de sua parentela, na gestão da própria vida cotidiana e
em eventos como mortes, doenças, desemprego. Cada vez mais se nota a
exigência de as famílias desenvolverem estratégias complexas de relações para
sobreviverem.
Conforme salienta Gámez:
Frente a una concepción abierta de la familia, la ciencia sociológica
contemporánea ha remarcado de forma inadecuada el carácter “nuclear”
de la familia, hasta hace pocos lustros. Esta familia conyugal o nuclear,
para algún autor, reposa en el matrimonio y se encuentra relativamente
aislada del parentesco amplio. La familia nuclear se caracteriza por su
residencia neolocal (en el sentido de que se ubica en un hogar distinto
del de los progenitores), cuenta con un sistema bilateral de parentesco y
sus valores están orientados hacia la racionalidad. Los lazos emocionales
sólo se contemplan en la esfera íntima de la familia nuclear, que queda,
se dice, aislada y fortalecida.
Porém, com a evolução das idéias sociológicas, observa-se que o
conceito de família também se modificou. Dessa forma, a realidade atual indica
que as formas de organização das famílias são totalmente diversas e se
modificam, continuamente, para atender às exigências que lhe o impostas pela
sociedade, pelos sujeitos que a compõem e pelos eventos da vida cotidiana.
Para Juárez:
La familia ha sido considerada siempre una institución esencial para los
cambios políticos y sociales, sea para activarlos o detenerlos. Esta
situación se acrecentó en un proceso político tan singular como el de la
transición española desde 1975. Las consecuencias del cambio social
sufrido no fueron menores para la familia que para las instituciones
políticas. La familia se convirtió en un espacio estratégico de la nueva
realidad política y los cambios familiares se utilizaron como símbolos de
la ruptura con el pasado.
Nesse sentido, segundo Singly, mudanças que essa instituição (família)
conheceu e conhece ao longo da segunda metade do século XX sobretudo nos
países ocidentais: o decréscimo dos casamentos, das famílias numerosas, o
crescimento de outros tipos de famílias, dos divórcios, das famílias pequenas, das
famílias monoparentais, recompostas, do trabalho assalariado das mulheres.
Corroborando com essas afirmações, Gámez sustenta que:
[…] hay diversos modelos de familia y que a su vez tales modelos no son
estables sino que las familias se hayan en constante transformación. Se
puede constatar empíricamente, desde el punto de vista sociológico, una
gran variedad y mutabilidad de situaciones familiares: matrimonios,
divorcios y separaciones, personas que conviven sin haber contraído
matrimonio, formas no tradicionales de familias. Se ha producido una
desafección a un modelo de familia que se basaba en el compromiso y la
durabilidad y se han incrementado las dificultades para compaginar la
vida personal, profesional y familiar.
As estruturas das famílias pós-modernas poderiam ser classificadas, além
da tradicional família nuclear e família extensa, como famílias de um só pai,
famílias combinadas, famílias de sexo, casais sem filhos, companheiros de igual
sexo e certos grupos extensos.
Quando o assunto abordado refere-se à família brasileira, percebe-se a
existência de uma pluralidade de formas de organização familiar. Enfoca-se uma
família patriarcal, tão bem descrita por Freyre, em sua obra Casa Grande e
Senzala (1996), com a figura do grandioso patriarca. Visualiza-se o patriarca como
chefe supremo de uma grande família matrimonializada e legítima. Destaca-se
também uma família nuclear, na qual o pai, sendo o provedor que vai ao espaço
público buscar o sustento do lar; a mulher sensível e frágil restringe-se ao espaço
privado. Por fim, vislumbra-se uma família pós-nuclear, em que a mulher
profissional ocupada, com pouco tempo para acompanhar o desenvolvimento
educacional de seu único filho, cuja paternidade biológica é atribuída a um doador
de material genético para inseminação artificial; tem que conciliar o papel de mãe
e trabalhadora.
Dessa forma, percebe-se que significativas mudanças ocorreram na
sociedade brasileira. Sua transformação de sociedade rural, na qual predominava
a família patriarcal e fechada em si mesma, para uma sociedade de bases
industriais com as suas implicações de mobilidade social, geográfica e cultural
acarretou transformações igualmente marcantes na estrutura do modelo
tradicional de família.
Os conflitos e as transformações que acontecem na família, ocorridos pelo
processo de modernização, são explicados por Vaitsman:
O desenvolvimento da sociedade capitalista, mais tarde sociedade
industrial moderna, levou a uma redefinição não da relação entre as
classes, mas também das relações de gênero. A família privatizou-se e
transformou-se em família conjugal moderna, perdendo suas funções
produtivas segundo a concepção econômica que passou a representar
como produtivas apenas as relações exercidas na esfera do trabalho
remunerado.
Senna e Antunes mencionam que a constituição das famílias brasileiras,
especialmente nos trinta últimos anos, está sofrendo inúmeras mudanças do ponto
de vista demográfico e, embora tais alterações aconteçam de forma diferenciada
nas diversas regiões do país, algumas ocorrem de forma mais ou menos similares,
como a redução de natalidade e o aumento da longevidade das pessoas.
As transformações da família no século XX foram profundas, entre as
quais identifica a gradual eliminação de seu papel como unidade produtiva por
modificações na estrutura produtiva; o individualismo e a autonomia crescente dos
jovens e mulheres debilitam o poder patriarcal, além da separação entre
sexualidade e procriação. Tudo isso leva a diluir as funções da família como
unidade social, permanecendo apenas uma série de vínculos familiares, vínculos
entre pais, pais e filhos, entre irmãos e vínculos com parentes mais distantes.
Assim, a tradicional família nuclear que engloba pai, mãe e filhos, não é
mais a regra, pois se observa na sociedade contemporânea uma mudança na
estrutura do modelo familiar. Outros padrões de casamento e de família vão se
estruturando e passam a ser legitimados, fazendo com que as relações entre seus
integrantes se tornem cada vez mais complexas.
Em todo o mundo, o conceito de família nuclear e a instituição casamento
intimamente ligada à família, passaram por transformações. A expressão mais
marcante dessas transformações ocorreu no final da década de 60, onde cresceu
o número de separações e divórcios, a religião foi perdendo sua força, não mais
conseguindo segurar casamentos com relações insatisfatórias. A igualdade
passou a ser um pressuposto em muitas relações matrimoniais.
A partir daí, surgem inúmeras organizações familiares alternativas:
casamentos sucessivos com parceiros distintos e filhos de diferentes uniões;
casais homossexuais adotando filhos legalmente; casais com filhos ou parceiros
isolados ou mesmo cada um vivendo com uma das famílias de origem; as
chamadas “produções independentes” tornam-se mais freqüentes; e mais
ultimamente, duplas de mães solteiras ou já separadas compartilham a criação de
seus filhos.
Nesse sentido, a Constituição Federal de 1988 representou um marco na
evolução do conceito de família. Uma nova concepção de família tomou corpo no
ordenamento jurídico brasileiro. É uma família fundada na afetividade, onde não
há mais a necessidade de um vínculo positivado juridicamente, presente no papel,
ou seja, o casamento não é mais a base única dessa família. Questiona-se a idéia
de família exclusivamente matrimonial. A hierarquia entre os membros da família
está comprometida pelo princípio da igualdade, pois a Constituição consagra a
direção da família para ambos os cônjuges.
Para Perlingieri, “a família como conceito legislativo o é absolutamente
unitária […]. A pluralidade de modelos familiares, o fato de que sua organização
não se esgote nas restritas formas de uma família nuclear, […] não devem ser
ignorados na análise jurídica”.
Assim, verifica-se que a concepção jurídica de família de ter a
flexibilidade suficiente para renovar-se em harmonia com as transformações
sociais, tendo em vista o importante papel que desenvolve para a realização de
seus membros, configurando-se enquanto espaço de abrigo sentimental e afetivo.
É o que se chama de repersonalização das relações familiares, que significa
valorizar mais os interesses da pessoa humana do que o patrimônio que
detenham. Segundo Lôbo: “a família, convertendo-se em espaço de realização de
afetividade humana, marca o deslocamento da função econômico-procracional
para essa nova função”.
Com o disposto na Constituição Federal de 1988, os artigos do antigo
Código Civil que se baseavam na desigualdade conjugal e na superioridade do
marido, perderam a eficácia, consagrando o Princípio da Isonomia entre homens e
mulheres. Nas palavras de Wald:
O texto da vigente Constituição não deixa mais dúvida de que ficou
abolida a figura do chefe da sociedade conjugal. Não mais se concede ao
marido qualquer privilégio e as decisões que interessam à família
deverão ser tomadas por ambos os cônjuges (art. 226, § 5º, da CF).
Dessa forma, chega-se ao século XXI com a família pós-moderna ou
pluralista, como tem sido chamada, pelos tipos alternativos de convivência que
apresenta.
O atual Código Civil, no diapasão do texto constitucional, determina que o
casamento deve ser baseado “na igualdade de direitos e deveres entre os
cônjuges” (Código Civil, artigo 1.511). Estabelece também, que caberá a ambos
os cônjuges o exercício da direção da sociedade conjugal, “sempre no interesse
do casal e dos filhos” (Código Civil, artigo 1.567).
Sendo assim, a igualdade entre os gêneros, estabelecida no ordenamento
jurídico brasileiro, em não colocando nenhum dos cônjuges em posição inferior,
teve a preocupação de harmonizar o interesse comum da família.
1.2 A família e a infância
Segundo Ariès, até meados do século XV, o sentimento de família e
infância era ausente na vida cotidiana das pessoas. As crianças eram vistas como
“adultos em miniatura”, havendo um único mundo para adultos e crianças, dando-
se a educação e as aprendizagens pela interação direta. Posteriormente, o
sentimento de infância começou a ser desenvolvido, primeiro transformando-se a
criança em fonte de distração para os adultos e, em seguida, pela preocupação
moral dos eclesiásticos e moralistas, defendendo os colégios como espaço para
proteger e ensinar as crianças.
A progressiva construção do conceito de infância teve início no século
XVI, quando a importância pessoal da noção de idade se afirmou, desde que os
reformadores religiosos e civis a impuseram nos documentos escolares.
Inicialmente restrito às classes sociais mais instruídas, que desfrutavam do
privilégio da escolarização, o registro da idade se difundiu para a sociedade como
um todo, passando a constar em diversas formas de documentos. Nos retratos,
por exemplo, marcava o aniversário do retratado como sinal suplementar de
individualização – hábito que se manteve após a invenção da fotografia, três
séculos mais tarde.
Para Ariès, a partir do século XVII:
A família tornou-se o lugar de uma afeição necessária entre cônjuges e
entre pais e filhos, algo que ela não era antes. Essa afeição se exprimiu,
sobretudo, através da importância que se passou a atribuir à educação.
Não se tratava mais apenas de estabelecer os filhos em função dos bens
e da honra. […] A família começou então a se organizar em torno da
criança e a lhe dar uma importância, que a criança saiu do anonimato,
que se tornou impossível perdê-la ou substituí-la sem uma enorme dor,
que ela não pôde mais ser reproduzida muitas vezes, e que se tornou
necessário limitar seu número para melhor cuidar dela.
O conceito de infância nessa perspectiva histórica indica que o se pode
compreender a criança fora de suas relações com a sociedade na qual está
vivendo e desvinculada de suas interações com os sujeitos e com a cultura do
grupo social no qual está inserida. Essas relações são constituintes de sua
subjetividade, isto é, de sua forma de sentir, pensar e agir sobre o mundo.
Tanto a família aristocrata quanto a camponesa, até os séculos XVI e
XVII, era composta por um grande número de membros. Apesar das tentativas de
moralização engendradas pela lógica teocêntrica vigente, costumava-se admitir a
livre atividade sexual de homens e mulheres, chegando-se a tolerar as
manifestações explícitas da sexualidade infantil. O cuidado dos filhos não se
centralizava nas mãos dos pais, cabendo aos criados que habitavam o castelo, no
caso da aristocracia, e à comunidade, no caso do campesinato. A família operária
do século XIX também se caracterizava pelos fortes elos comunitários e por uma
educação infantil informal, sem maiores preocupações.
Assim, nas palavras de Castro, “emprestar um sentido de construção
histórica à infância implica analisar como as práticas sócio-culturais (sejam elas os
discursos, as ações ou as instituições) possibilitam, circunscrevem e determinam
certos tipos de experiência durante a infância”.
Para Heywood, “a fascinação pelos anos da infância, um fenômeno
relativamente recente”, fez com que o conceito de infância sofresse alterações
significativas ao longo da história. A mudança de paradigma no que se refere ao
conceito de infância está diretamente ligada com o fato de que as crianças eram
consideradas adultos imperfeitos. Sendo assim, essa etapa da vida provavelmente
seria de pouco interesse. “Somente em épocas comparativamente recentes veio a
surgir um sentimento de que as crianças são especiais e diferentes, e, portanto,
dignas de ser estudadas por si sós”.
Na família moderna, a criança passou a ocupar posição de destaque,
engajando todos os membros em prol de seus projetos de vida, a começar pelos
cuidados com sua saúde e educação. Esta atenção à criança passou a ser
norteada pelo conjunto de idéias que se associaram a ela, desde então: a
ingenuidade, a inocência, a pureza ainda não “contaminada” pelos segredos
adultos. Assim, inaugura-se o “conceito de criança como uma classificação
específica de seres humanos que requerem um tratamento especial, diferente
daquele aplicado ao adulto”.
No Brasil, nos primeiros séculos da colonização, a infância representava
“um tempo sem maior personalidade” na mentalidade coletiva. Para se referir às
crianças, usavam-se termos como “meúdos” ou “infantes”. Pela medicina, o que
hoje se concebe por infância era definido como “puerícia” e dividia-se em três
fases. A primeira durava até o final da amamentação, por volta dos três ou quatro
anos. Na segunda, até os sete anos, a criança crescia à sombra dos pais,
acompanhando-os nas tarefas do dia-a-dia. Daí em diante, ela poderia trabalhar
(desenvolvendo pequenas atividades), estudar (a domicílio ou nas escolas régias,
criadas na segunda metade do século XVIII) ou aprender algum ofício, tornando-
se um “aprendiz”.
As crianças e os adolescentes são sujeitos de direitos e encontram-se
resguardados por determinadas garantias legais, dentre elas a convivência
familiar, essencial para um desenvolvimento pleno e digno. A família,
indiferentemente da maneira como é conceituada e caracterizada, é a base da
sociedade, a primeira forma de socialização do indivíduo. A convivência familiar é
condição relevante para a proteção, crescimento e desenvolvimento da criança e
do adolescente.
A família deve, portanto, se esforçar para estar presente em todos os
momentos da vida de seus filhos, sendo que tal presença pressupõe
comprometimento. Em suma, a família deve ser o espaço indispensável para
garantir a sobrevivência e a proteção integral dos filhos e demais membros,
independentemente do arranjo familiar.
De acordo com Farinatti, é no cotidiano da família que a criança aprende o
significado de viver. Porém, cada família possui suas próprias características,
enfrentando as situações da maneira que lhe for mais conveniente, ou seja, o
cenário familiar está engendrado por determinantes socioeconômicos, políticos e
culturais.
Como mencionado anteriormente, a família tradicional, formada de pai,
mãe e filhos, tornou-se uma raridade. Hoje, existem famílias dentro de outras
famílias, pois em virtude do aumento de separações e dos novos casamentos,
aquele núcleo familiar mais tradicional tem dado lugar a diferentes famílias
vivendo sob um mesmo teto. Estas novas configurações da família geram
inúmeras vezes uma sensação de insegurança e até mesmo de abandono, pois a
idéia de um pai e de uma mãe cuidadores lugar a diferentes pais e mães
“gerenciadores” de filhos que nem sempre são seus.
Com o despontar da mulher no mercado de trabalho, se acirrou uma
disputa entre pais e mães na busca de uma carreira profissional estável. Enquanto
que, antigamente as funções exercidas dentro da família eram bem definidas, hoje
pai e mãe, além de assumirem diferentes papéis, conforme as circunstâncias,
saem todos os dias para desempenhar suas atividades profissionais. Com isso,
muitas crianças e adolescentes acabam ficando aos cuidados de parentes,
estranhos ou das chamadas babás eletrônicas, voltando a ver seus pais somente
à noite.
Nesse sentido, López comenta que:
[…] A nuestro juicio, el trasvase femenino de la familia a la empresa,
tanto de las mujeres solteras como de las casadas (dejando a un lado lo
que haya de necesidad económica, que no siempre es fundamental, y
especialmente en los países más desarrollados), tiene, ciertamente, una
motivación positiva de atracción hacia el trabajo personal y el servicio a la
sociedad, pero también se basa, y muy radicalmente, en la decepción
femenina ante el futuro de frustración y estrechez de miras que brinda
una institución familiar, abatida por todas las crisis y en constante
retirada.
Tanto os pais como os filhos devem pensar na família como um local
aonde exista uma convivência grupal de objetivos comuns, fixando meios para
confrontar-se com as dificuldades e para se tentar uma melhor condição de vida.
Diversos autores vêm se dedicando à reflexão sobre as relações entre
infância e contemporaneidade, denunciando, entre outros aspectos: o isolamento
dos sujeitos e o empobrecimento das relações comunitárias e familiares; a perda
crescente de espaço físico interno e externo, com moradias cada vez menores e
precárias e a não utilização das crianças dos espaços públicos para brincadeiras
coletivas. Entre esses autores encontra-se Olivares que se posiciona da seguinte
maneira:
La familia es una de las instituciones básicas de la sociedad. Su
importancia radica en el tipo de funciones que cumple, entre las que
tenemos que destacar la función de protección ante un entorno cada vez
más complejo y cambiante; la función afectiva fomentando las relaciones
afectuosas entre sus miembros y ofreciendo el apoyo pquico necesario
para hacer frente a una sociedad exigente, cada día más deshumanizada
y carente de valores; sin olvidarnos de la función de socialización que
cumple con los menores siendo un marco de referencia indispensable
para ellos a los que debe proporcionar cuidados, cariño y las condiciones
necesarias para que se desarrollen como personas y se integren en la
sociedad.
Tudo o que acontece no seio familiar, conseqüentemente, reflete-se na
formação da personalidade da criança. De acordo com Juárez:
[…] Los padres siguen contribuyendo a forjar el futuro de sus hijos de
varias maneras: en primer lugar, mediante los valores que les transmiten
a través de la socialización. En la sociedad moderna el éxito depende de
manera capital de las aspiraciones y valores de logro que reciben los
jóvenes. Estos valores resultan insuficientes si no van acompañados de
una cierta estabilidad emocional. Unos valores adecuados y un buen
equilibrio emocional constituyen una buena base, pero no lo son todo en
la vida. […]
Na estrutura familiar, as crianças são os membros mais vulneráveis às
situações de conflitos no grupo e, neste sentido, estão mais expostas que os
demais, justamente por não ter autonomia e capacidade plena de defesa e
resolução. Com relação aos adolescentes, a situação é praticamente a mesma,
com o agravante de que, muitas vezes, eles são depositários de expectativas e
esperanças de ascensão do grupo familiar, sofrem com a frustração destas
expectativas, tanto pelo contexto familiar de sobrevivência, como pelo contexto de
possibilidades de inserção social.
É na família que acontece a transmissão de cultura, de experiência, onde
se molda a personalidade de uma pessoa, pois é nela que a criança passa a maior
parte do tempo. Bittar acrescenta que:
É no seio da família que se molda a personalidade da pessoa, em
ambiente de moralidade, de respeitabilidade recíproca, de afeição e de
segurança, permitindo a seus integrantes o desenvolvimento normal de
suas potencialidades.
Para Becker, o consenso a respeito da família como locus privilegiado
para o adequado desenvolvimento humano está consagrado em documentos
internacionais e, no Brasil acha-se regulamentado pela Constituição Federal de
1988 e pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Segundo a autora:
no preâmbulo da Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da
Criança (20/11/89), os Estados Partes declaram-se “convencidos de que
a família, como elemento básico da sociedade e meio natural para o
crescimento e o bem-estar de todos os seus membros, e em particular
das crianças, deve receber a proteção e assistência necessárias para
poder assumir plenamente suas responsabilidades na comunidade” e
reconhecem que “a criança, para o pleno e harmonioso desenvolvimento
de sua personalidade, deve crescer no seio da família, em um ambiente
de felicidade, amor e compreensão”.
A família é essencial à conquista da maturidade do filho, pois ela pode
proporcionar um caminho de transição entre os cuidados dos pais e da vida social.
Sua função é oferecer o colo como espaço simbólico e regresso, bem como a
contenção necessária para que este desenvolvimento aconteça de maneira
saudável. Pois, a criança contemporânea amadurece precocemente, dada as
estimulações ofertadas no meio circundante. De notável inteligência e criatividade,
precisam ser ouvidas e consideradas como parte integrante da sociedade. Mesmo
tendo adquirido certa independência desde cedo, é inestimável o apoio, a
proteção e o contato do adulto, auxiliando-a nas suas escolhas, na constituição
dos princípios e valores baseados na justiça e na solidariedade, proporcionando a
construção de um olhar crítico frente o mundo em que se encontra inserida.
assim se estará preparando as crianças para viverem plenamente estes novos
tempos.
1.3 Histórico sobre a violência contra a criança e sobre as políticas de
prevenção
A violência contra crianças e adolescentes não é um fenômeno da
contemporaneidade. Relatos de filicídios, de maus tratos, de negligências, de
abandonos, de abusos sexuais, são encontrados na mitologia ocidental, em
passagens bíblicas, em rituais de iniciação ou de passagem para a idade adulta,
fazendo parte da história cultural da humanidade. Tais relatos são ricos em
expressar, de forma bem elaborada, a violência que os pais e/ou responsáveis
infligiam as suas crianças e adolescentes era, geralmente, justificada como
medida disciplinar, de obediência. Por muito tempo, ela foi uma prática instituída
sem qualquer sanção, uma vez que na relação estabelecida, o pai tinha poderes
de vida ou de morte sobre seus filhos.
A violência contra os infantes vem desde a Antiguidade, ou seja, a criança
medieval muitas vezes representava um empecilho, um fardo a ser carregado
pelos pais – requerendo despesas, após o parto, e o desconforto de uma gestação
sem o amparo médico. Assim como na Antigüidade, o sacrifício exigido pelo
sustento dos filhos, dissociado do amor parental, poderia levar ao abandono físico
e/ou moral da criança.
Na França, a recusa materna a amamentar (num sinal de rejeição ao
bebê) fez com que surgissem, no século XIII, as primeiras agências de amas de
leite, inicialmente contratadas apenas pela aristocracia e mais tarde requisitadas
até pelas classes mais baixas da população, até o século XVIII. Badinter cita as
palavras de Montaigne, em seus ensaios dos anos 1580-1590, criticando esta
prática embora tenha, ele mesmo, a endossado, apesar de não pertencer à alta
aristocracia:
Em troca de um pequeno benefício, arrancamos todos os dias crianças
dos braços das mães e a estas encarregamos de nossos próprios filhos;
obrigamos essas mães a abandonar os filhos a alguma pobre ama a
quem não desejamos entregar os nossos, ou a alguma cabra.
Para os casais mais pobres da sociedade européia, um filho chegava a
ameaçar sua própria subsistência, pois contavam com poucos recursos para
sustentá-lo. Nesses casos, tinham três alternativas: abandoná-lo num orfanato (o
que não lhe dava grandes possibilidades de sobrevivência), entregá-lo à ama
menos exigente possível (por vezes, deixando-o entregue a ela indefinidamente)
ou assumir “comportamentos mais ou menos tolerados, que levavam a criança
rapidamente para o cemitério”. Entre esses comportamentos, destaca-se o hábito
de dormirem os pais na mesma cama que recém-nascidos, provocando acidentes
mortais por sufocação.
A partir do século XVIII, escandalizava a opinião pública européia o
número de bebês abandonados que eram deixados pelas mães à noite, nas ruas
sujas, muitas vezes devorados por cães e outros animais que viviam nas
proximidades ou vitimados pelas intempéries ou pela fome. Em outros casos,
eram largados próximos à praia, onde acabavam afogados pela maré, ou deixados
nas naves das igrejas ou às portas dos conventos, na esperança de que algum
padre ou freira os alimentassem e lhes conseguissem um lar.
Para amenizar os sofrimentos dos enjeitados, foram criadas as rodas dos
expostos, nas Santas Casas de Misericórdia, seguindo a tradição portuguesa.
Somente a partir do século XVII, é que se encontram notícias dos expostos. No
Brasil, as primeiras rodas foram instaladas em Salvador e no Rio de Janeiro, no
século XVIII, o que caracteriza um problema urbano. A deposição da criança
nessa roda garantia o anonimato dos genitores.
A criança que entrava pelo mecanismo da roda passava sua existência
caracterizada por uma constante circulação que a destinava a uma categoria de
excluídos, marginalizados, com dificuldades quase intransponíveis para a
formação de sua identidade.
Na Europa, a violência contra crianças foi cientificamente estudada pela
primeira vez pelo médico legista francês Tardieu que, em 1860, publicou um
estudo no qual descrevia vários tipos de ferimentos dispensados a crianças por
seus pais, responsáveis e professores, estabelecendo pela primeira vez o conceito
de criança maltratada.
No Brasil colônia, as atitudes de ternura e afeto pela criança pequena
eram condenadas pelos moralistas defensores da “boa educação”, que para eles
implicava em castigos físicos e nas tradicionais palmadas. Segundo Del Priore:
O castigo físico em crianças não era nenhuma novidade no cotidiano
colonial. Introduzido, no século XVI, pelos padres jesuítas, para horror
dos indígenas que desconheciam o ato de bater em crianças, a correção
era vista como forma de amor. O “muito mimo” devia ser repudiado. Fazia
mal aos filhos. [...] O amor de pai devia inspirar-se naquele divino no qual
Deus ensinava que amar “é castigar e dar trabalhos nesta vida”.
Este tipo de preocupação pedagógica tinha como fim a formação da
criança como um indivíduo responsável. Atualmente, a violência é um risco ao
qual toda a população, de modo geral, está exposta. Porém, inúmeros estudos
têm comprovado que as mulheres e as crianças são os principais alvos de
agressões. Atuando em diversos âmbitos e níveis da vida social, a violência
apresenta-se em diferentes graus, tais como atentados à integridade física,
emocional ou sexual.
Discursos em jornais e revistas do final do século XIX lançavam a culpa do
abandono e desproteção da criança às famílias. Na primeira metade do século XX,
os juristas apontavam, como causa do abandono, as condições econômicas da
população e a desagregação familiar. Tal concepção ganhou espaço no meio
jurídico, começando-se a entender que caberia ao Estado implantar uma política
de proteção e assistência à criança, conforme estabeleceu o Decreto n. 16.272, de
novembro de 1923.
Em 12 de outubro de 1927, o Decreto-Lei n. 17.943-A instituiu o primeiro
Código de Menores no Brasil, buscando sistematizar a ação de tutela e coerção
que o Estado passou a adotar. Com tal Decreto, o Brasil começou a implantar o
seu sistema público de atenção às crianças e jovens em circunstâncias
especialmente difíceis.
o Código de Menores de 1979, disciplinado pela Lei n. 6.697, de 10 de
outubro de 1979, ofereceu assistência, proteção e vigilância a “menores” até 18
anos, cuidando de catalogar casos em que o mesmo pudesse estar em “situação
irregular”, ainda que estivesse em companhia dos pais ou responsáveis,
descrevendo seis categorias: a) abandonados, b) carentes, c) em abandono
eventual, d) com desvio de conduta, e) infratores, f) timas – vocabulário utilizado
para referenciar crianças que sofreram maus tratos impostos por seus pais ou
responsáveis, ou em perigo moral por se encontrarem de modo habitual, em
ambiente contrário aos bons costumes, conforme art. 2º, II e III do Código de
Menores.
Nos Estados Unidos da América, em 1962, a violência contra a criança foi
discutida pelos médicos Silverman e Kempe, como a Síndrome da Criança
Maltratada, e, desde 1975, foi classificada pela Organização Mundial de Saúde
(OMS) na Classificação Internacional de Doenças (CID). Esse trabalho trouxe
várias repercussões, passando o fenômeno a ser estudado internacionalmente por
médicos, sociólogos, psicólogos, iniciando um movimento que resultou em
legislações, programas educativos, propostas de tratamento na Europa e nos
Estados Unidos.
No Brasil, a realidade dos maus tratos à infância, muitas vezes, começa
pela mão do próprio governo pelo abandono social e condições de subcidadania
impostos às famílias vitimizadas. Afinal, “quando o abandono faz parte da vida
individual, executá-lo com o filho é vivenciá-lo duas vezes”.
Dessa forma, a preocupação com a violência contra a criança, suas várias
formas de apresentação e as estratégias para combatê-la tem sido mais
claramente identificadas a partir do século XX, especialmente a partir dos anos 60
quando o tema dos Direitos Humanos e dos Direitos da Criança passou a integrar
a agenda internacional. Embora seja um fenômeno muito estudado, é ainda pouco
conhecido. Trata-se de um tema complexo, principalmente por sua múltipla
determinação. Segundo Ferreira et al., a violência é resultado de fatores
vinculados ao agressor e à criança individualmente, à família, à comunidade e à
sociedade ou cultura.
No Brasil, em meados da década de 80, começaram a ser criados os
primeiros espaços com o objetivo de denunciar e encaminhar os casos de
violência praticada por pais ou responsáveis contra seus filhos. Assim, surgiu o
Centro Regional de Atenção aos Maus-Tratos na Infância (CRAMI), em 04 de julho
de 1985, ligado à Pontifícia Universidade Católica de Campinas, em São Paulo,
realizando um trabalho de recebimento de denúncias de toda a comunidade e
fazendo os encaminhamentos médicos e legais.
Em 08 de fevereiro de 1988, em São Paulo, começou a funcionar, em
caráter experimental, o Serviço de Advocacia da Criança (SAC), constituído pela
Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) São Paulo, Secretarias de Justiça e do
Menor, e pela Procuradoria Geral do Estado, articulado à Rede Criança, programa
da Secretaria do Menor, instalado para combater de forma organizada e
sistemática a violência contra a criança. O objetivo maior do SAC foi oferecer à
criança um profissional de advocacia que defendesse seus direitos, visando
sempre o que melhor atendesse aos interesses do cliente e não de familiares e/ou
responsáveis ou da sociedade.
Os primeiros serviços de recebimento de denúncias e encaminhamentos
em outros Estados brasileiros, também começaram a ser criados nessa época: o
de Goiânia, anterior ao CRAMI; o SOS-Criança de São Paulo; o Disque-Criança
de Belo Horizonte; o SOS-Criança do Recife.
O estudo da ONU sobre violência contra a criança, lançado em 2006,
mostrou que a violência contra a criança acontece no mundo inteiro. O estudo
mostra que a violência está presente na família, na escola, na comunidade, em
locais de trabalho e em abrigos para as crianças. Em alguns países, chama a
atenção à forma como o castigo físico continua a ser interiorizado pelos adultos e,
às vezes, até pelas próprias crianças. Porém, em todos os países, as crianças
falaram sobre a necessidade de se acabar com os castigos físicos.
La violencia contra los niños jamás es justificable; toda violencia contra
los niños se puede prevenir. A pesar de todo, el estudio pormenorizado
sobre la violencia contra los niños (el Estudio) confirma que dicha
violencia existe en todos los países del mundo, independientemente de
las culturas, clases sociales, niveles educativos, ingresos y origen étnico.
En contra de las obligaciones que exigen los derechos humanos y de las
necesidades de desarrollo de los niños, la violencia contra éstos está
socialmente consentida en todas las regiones, y frecuentemente es legal
y está autorizada por el Estado.
No Brasil, a doutrina de proteção integral à criança e ao adolescente foi
consolidada (art. 227, da Constituição Federal de 1988), buscando promover,
nessa população, os direitos atribuídos a todos os cidadãos, pela sua condição
peculiar de pessoas em desenvolvimento e em situação de risco, expressando um
conjunto de direitos a serem assegurados com absoluta prioridade por meio das
políticas públicas.
Nesse sentido, o Poder Judiciário passou a dar segurança as crianças e
aos adolescentes, podendo estes ter acesso às políticas sociais básicas e aos
programas assistenciais. As políticas de atendimento podem ser caracterizadas,
em um primeiro momento, pela “situação irregular e a institucionalização” e, em
um segundo, de acordo com os “sujeitos de direitos e a proteção especial”.
Na década de 90, multiplicaram-se, pelo Brasil, organizações
governamentais e não-governamentais que se dedicam ao combate sistemático
da violência infringida a crianças e adolescentes por aqueles que deveriam cuidá-
los e protegê-los, realizando denúncias, pesquisas, publicações, programas de
atendimento, com o objetivo maior de contribuir para a redução de incidência
desse problema, apoiando e orientando as famílias e responsabilizando e tratando
o abusador. Nesse sentido:
El buen desempeño de la paternidad, el desarrollo de vínculos afectivos
entre padres e hijos y una disciplina afirmativa y no violenta son algunos
de los factores que suelen favorecer la protección de los niños contra la
violencia, tanto en el hogar como en otros entornos. Algunos de los
factores proclives a proteger a los niños de la violencia en la escuela son
las normas generales y los planes de enseñanza eficaces que fomenten
actitudes y comportamientos no violentos y no discriminatorios. Se ha
demostrado que los altos niveles de cohesión social tienen un efecto
protector contra la violencia en la comunidad, aun cuando otros factores
de riesgo están presentes.
Assim, Silva e Nóbrega, em um interessante artigo sobre a violência
infantil, comentam que, como a Constituição Federal de 1988 prevê, em seu artigo
227, a consolidação dos direitos e garantias individuais de crianças e
adolescentes, posteriormente, esses mesmos direitos e garantias foram
reafirmados através da Lei n. 8.069, de 13 de julho de 1990, conhecida como
Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), em seu art. 5º.
Dessa forma, ocorrendo a violência, e esta chegando ao conhecimento
das autoridades competentes, a atuação do Estado se dará daí por diante,
optando por medidas capazes de garantir proteção à vítima. O Estatuto da Criança
e do Adolescente (ECA) em seu art. 13 estipula que os casos de suspeita ou
confirmação de maus-tratos sejam obrigatoriamente comunicados ao Conselho
Tutelar da respectiva localidade, sem prejuízo de outras providências.
1.4 Tipos de violência de que são vítimas os infantes
A violência, em suas inúmeras modalidades e expressões, vem se
tornando, em anos recentes, um dos problemas que mais angustia esta
sociedade, quer seja devido à divulgação de fatos do cotidiano ou dados
estatísticos, ou a uma sensação difusa de insegurança e desconfiança que se
propaga. Institui-se, assim, um círculo vicioso no qual “a violência gera o medo,
mas este gera igualmente a violência”, numa escala que pode chegar ao grau de
“psicose coletiva”.
Chauí concebe a violência:
[…] como conversão de uma diferença e de uma assimetria, numa
relação hierárquica de desigualdade com fins de dominação, de
exploração e de opressão [...], como a ação que trata o ser humano não
como sujeito, mas como coisa. Esta se caracteriza pela inércia, pela
passividade e pelo silêncio.
A violência pode ser vista como um fenômeno condicionado ao modo de
organização social, que é historicamente construído. A chamada violência
estrutural é constitutiva da condição de ser humano condição essa que tem nas
relações sociais o próprio espaço das relações de poder. Relacionando-se à
violência entre classes sociais, resultante do modo de produção das sociedades
desiguais, chamada de violência estrutural. A violência de caráter interpessoal
nem sempre tem seus determinantes na violência estrutural.
Entre as possíveis causas da explosão da violência, Chesnais cita os
fatores socioeconômicos, entre eles a pobreza e a fome. Entre as camadas mais
pobres da população, a subsistência é precária. A miséria conduz ao roubo e à
prostituição como a prostituição infantil e o turismo sexual. O desemprego ou a
ausência de renda levam à tentação da ilegalidade. Quanto aos fatores
institucionais, o autor menciona a omissão do Estado na prevenção e repressão
da violência. Também cita os fatores culturais como: a demografia urbana e sua
explosão nas últimas décadas, a partir de 1950; a influência dos meios de
comunicação, em especial a televisão; o processo da globalização, em que a
economia tende a abolir a noção de fronteira, facilitando a proliferação de
atividades ilegais e do crime organizado entre outros.
A violência oculta atrás dos muros das casas, a violência sexual, as rixas
familiares e as crianças espancadas são conhecidas muito parcialmente,
mesmo em caso de falecimento das vítimas; as circunstâncias das mortes são,
então, esmagadas sob uma capa de silêncio.
A violência é aqui compreendida como uma força opressiva sobre o outro,
causando-lhes danos diversos. O ato violentador pressupõe a idéia de privar, isto
é de destruir, despojar alguém de suas coisas, de seu modo de ser e se
comportar, de seu direito de se realizar como pessoa e como cidadão. Violência é
uma força carregada de desejo, consciente ou inconsciente, que tem o seu caráter
de irresistibilidade, de coerção, de penetração e de destruição. A violência é o
emprego da agressividade com fins destrutivos, principalmente para a vítima.
Conforme Morago; Delgado e Sage:
Un aspecto de especial interés sobre la incidencia del maltrato dentro del
contexto familiar tiene que ver con el hecho de si es una situación que
afecta a todos los hermanos o si, por el contrario, se centra de forma
exclusiva en alguno de los hijos. Según la primera tesis, la situación de
maltrato no tiene necesariamente que afectar a todos los niños presentes
en el contexto familiar. Algunos hijos tendrán más posibilidades, en
función determinadas características físicas o psicológicas, de ser
maltratados. A pesar de que no haya demasiada evidencia empírica a
favor de esta teoría del chivo expiatorio, ha sido ampliamente aceptada
[…]. Este aspecto guarda un relación estrecha con los enfoques
centrados en la vulnerabilidad del niño.
Para caracterizar as diferentes formas de violência das quais as crianças e
os adolescentes são vítimas, Azevedo e Guerra referem-se a dois processos de
fabricação que não são excludentes: a vitimação, conseqüente das situações de
desigualdades socioeconômicas; e a vitimização, conseqüente das relações
interpessoais abusivas adulto-crianças. Enquanto o primeiro acontece com
crianças e adolescentes que vivem mais agudamente os efeitos das
desigualdades socioeconômicas; o segundo atinge aquelas vítimas da violência
doméstica e/ou intrafamiliar que estão em todas as camadas sociais.
Muito se têm visto e discutido sobre a violência e, principalmente, sobre a
violência dentro da família. É importante ressaltar, que a violência doméstica
sempre existiu e entendimento de que ela esteja associada a vários elementos
como o álcool, a pobreza, o desemprego, o isolamento e as doenças. Porém vale
ressaltar, que a violência doméstica não está limitada a baixa classe social. Ela
permeia todas as classes e sociedades.
Geralmente atribui-se a existência de violência doméstica/intrafamiliar às
classes sociais menos favorecidas, mas nos parece que tal tipo de
interpretação, além de revelar desconhecimento do problema, resulta de
uma leitura distorcida da questão. O que pode acontecer é que as
pessoas socialmente mais favorecidas contam com recursos materiais e
intelectuais mais sofisticados para camuflarem o problema, como o
acesso mais fácil a profissionais em caráter particular e sigiloso; histórias
e justificativas mais convincentes quanto aos “acidentes” ocorridos com
suas crianças e adolescentes; poder aquisitivo para burlar a lei etc.
Diferentemente, aquelas pessoas que pertencem às classes populares
são denunciadas com maior freqüência e não dispões de recursos
materiais para utilizarem serviços profissionais particulares, tendo que
recorrer aos serviços públicos de saúde no socorro a suas vítimas.
Sendo assim, entende-se que a violência doméstica e/ou intrafamiliar
contra crianças e adolescentes é um fenômeno disseminado, mantido com a
complacência da sociedade, que estabelece com as famílias um acordo tácito, o
que dificulta o acesso ao que realmente acontece com relação ao problema. Os
dados estatísticos, que se tem hoje registrados, representam uma pequena parte
da incidência do fenômeno, devido, principalmente, a essa banalização da
violência, que dificulta a denúncia, e também à maneira como são tratadas as
situações de violência doméstica e/ou intrafamiliar de acordo com a classe social a
que pertence a família.
A violência doméstica é uma das várias modalidades de expressão de
violência que a humanidade pratica contra suas crianças e adolescentes, sendo
que as raízes desse fenômeno também estão associadas ao contexto histórico,
social, cultural e político em que se insere e não pode ser compreendido somente
como uma questão decorrente de conflitos interpessoais entre pais e filhos.
Mesmo este relacionamento interpessoal, a qual configura um padrão abusivo de
interação pai-mãe-filho, foi construído historicamente por pessoas que, ao fazê-lo,
revelam as marcas de sua história pessoal no contexto da história
socioeconômica, política e cultural da sociedade.
Destaca-se a noção de que, ainda que a violência seja um fenômeno
universal, ela se torna acirrada nos países subdesenvolvidos, na medida em que o
“stress” decorrente das dificuldades econômicas das famílias contribui
sobremaneira para o seu aparecimento.
Segundo Gregory, Azevedo e Guerra a violência doméstica é definida
como aquela que acontece dentro de casa, caracterizada por: discussões, brigas,
agressões entre marido e mulher, pais e avós que tratam mal os filhos e netos. É
difícil acreditar que a própria família produz a violência, justo àquela que
consideramos como núcleo fundamental de vida e da sociedade, que desde os
gregos era considerada sagrada, fonte de todas as energias para produzir ou criar
seres humanos, agora passa a ser geradora de tristeza e sofrimento.
Para López, a violência na família é concebida como um “abuso de
autoridade”. Segundo o autor:
Sin embargo, aunque muchas de las formas de violencia familiar sean
ejercidas por el padre, otras tienen a la madre o incluso al padre y a la
madre como autores, y otras, por último, son protagonizadas por los
hijos, o se manifiestan como riñas o peleas entre unos y otros.
É importante considerar que a existência de um ambiente familiar hostil,
onde não são garantidas as condições mínimas de sobrevivência e segurança
para adolescentes e crianças, oferece um conjunto de condições negativas que
vão indicando o caminho da rua, ou seja, mais da metade das razões que
estimulam a fuga de crianças e adolescentes de seus lares é representada por
castigos corporais – a violência de pais contra filhos.
La permanencia en el hogar se torna desagradable, al menos cuando
está en el sujeto represor, tanto si se trata del padre, de la madre o, más
aún, de ambos. Aunque lo más frecuente es que sea el padre quien
encarne tal papel […] y que la madre actúe, entonces, como mediadora-
encubridora, con el fin de crear márgenes de evasión permisiva, para los
hijos y para ella misma.
Entre as causas de violência, podem ser destacadas: a desestrutura do
espaço doméstico causado pelo aumento das famílias monoparentais, em
especial aquelas em que a mulher assume a chefia do domicílio, a questão
migratória, por motivos de sobrevivência; a ausência de uma das figuras paternas
(pai ou mãe). Estas causas podem tornar o domicílio objeto das freqüentes
ameaças agravadas pela degradação do meio ambiente, dificuldade de acesso
aos serviços urbanos básicos, escassez de recursos produtivos e pelo
desconhecimento dos diferentes métodos de planejamento familiar.
A Violência Doméstica Contra a Criança e o Adolescente tem suas raízes
na maneira como nossa sociedade percebe a criança e o período de
infância, concepção essa que pode ser compreendida e transformada
dentro do seu contexto histórico. […] Dentre as formas de manifestação
do fenômeno em questão, culturalmente a Violência Física é adotada
pela sociedade como método educativo e disciplinar.
Portanto, de todas as violências, a mais velada é a intrafamiliar, que
acontece junto ao lar, dentro da família. Sendo que nesta modalidade de violência
impera o pacto tacitamente assumido do silêncio. A violência intrafamiliar
praticada contra crianças e adolescentes pode ser dividida em categorias: física,
psicológica, sexual ou negligência (sendo que alguns autores ainda acrescentam o
trabalho infantil).
Conceitua-se a violência intrafamiliar como:
Todo ato ou omissão praticado por pais, parentes ou responsáveis contra
crianças e /ou adolescentes que sendo capaz de causar dano físico,
sexual, e/ou psicológico à vítima – implica de um lado numa transgressão
do poder/dever de proteção do adulto e, de outro, numa coisificação da
infância, isto é, numa negação do direito que crianças e adolescentes
têm de ser tratadas como sujeitos e pessoas em condição peculiar de
desenvolvimento.
A violência física é aquela caracterizada por atos violentos com uso da
força física de forma intencional, não acidental, com o objetivo de ferir, lesar ou
destruir a criança ou adolescente, deixando ou não marcas evidentes em seu
corpo. Pode-se chamar de atos violentos desde tapas e beliscões até agressões
com objetos, armas branca ou de fogo e queimaduras. Tais atos violentos
geralmente vêm justificados como forma de educar os infantes.
De acordo com Morago; Delgado e Sage:
[…] con frecuencia niños y niñas sufren situaciones de plurimaltrato: Es
decir, son víctimas de más de un tipo de maltrato […] los casos de
maltrato en los que se describe la asociación de diferentes tipos es muy
frecuente encontrar situaciones de negligencia y maltrato emocional a las
que se une eventualmente el maltrato físico. Es evidente que estas
situaciones pueden compartir algunos de los factores de riesgo de
carácter general que pueden provocar dentro de una misma persona o
dentro de una misma familia distintas expresiones de un fenómeno de
victimización y rechazo al niño o a la niña.
Guerra menciona que a agressão física se caracteriza pelo emprego de
força sica contra a criança de forma não acidental, causando-lhe diversos tipos
de ferimentos e perpetrada por pai, mãe, padrasto, madrasta...”.
Abuso e/ou violência física são atos de agressão praticados pelos pais
e/ou responsáveis que podem ir de uma palmada até ao espancamento ou outros
atos cruéis que podem ou não deixar marcas físicas evidentes, mas as marcas
psíquicas e afetivas existirão. Tais agressões podem provocar: fraturas,
hematomas, queimaduras, esganaduras, hemorragias internas, podendo,
inclusive, causar até a morte.
La violencia física viene a menudo acompañada de violencia psicológica.
Injurias, insultos, aislamiento, rechazo, amenazas, indiferencia emocional
y menosprecio, todas ellas son formas de violencia que pueden
perjudicar el desarrollo psicológico del niño y su bienestar, especialmente
cuando estos tratos provienen de una persona adulta respetada, por
ejemplo del padre o de la madre. Es de vital importancia alentar a los
padres a que utilicen exclusivamente métodos no violentos de disciplina.
Dessa forma, a violência psicológica ocorre quando o adulto
constantemente deprecia a criança, bloqueando seus esforços de aprendizagem e
auto-aceitação, ameaçando-a de abandono e agressões e provocando sofrimento
psíquico.
O abuso psicológico se encontra inserto em todas as outras formas de
violência contra crianças e adolescentes, uma vez que a indiferença afetiva, a falta
de ternura, propiciam o desenvolvimento de outras formas de maus-tratos infantis.
Da mesma forma, ao contrário, a presença de afeto e de amor em relação à
criança seria exatamente o elemento impeditivo para a perpetração de qualquer
crueldade em relação à criança.
Abuso e/ou violência psicológica é uma forma de violência doméstica que
praticamente não aparece nas estatísticas, por sua condição de invisibilidade.
Manifesta-se na depreciação da criança ou do adolescente pelo adulto, por
humilhações, ameaças, impedimentos, ridicularizações, que minam a sua auto-
estima, fazendo com que acredite ser inferior aos demais, sem valor, causando-
lhe grande sofrimento mental e afetivo, gerando profundos sentimentos de culpa e
mágoa, insegurança, além de uma representação negativa de si mesmo, que
podem acompanhá-lo por toda a vida. A violência psicológica pode se apresentar,
ainda, como atitude de rejeição ou de abandono afetivo; de uma maneira ou de
outra, provoca um grande e profundo sofrimento afetivo as suas vítimas,
dominando-as pelo sentimento de menos valia, de o-merecimento, dificultando
o seu processo de construção de identificação-identidade.
A violência psicológica deixa marcas mais visíveis que a própria violência
física. O maior obstáculo é que a violência psicológica é de difícil verificação, bem
como, existe grande dificuldade em avaliar e em quantificar o prejuízo que está
causa ao desenvolvimento do infante.
A negligência é caracterizada pela omissão no provimento das
necessidades básicas, físicas, emocionais e sociais da criança ou adolescente,
isto é, quando os pais ou responsáveis falham em alimentar, vestir, manter a
higiene dos filhos e do ambiente, em fornecer educação formal, desde que tais
falhas não sejam resultado de condições de vida além do seu controle.
A negligência ainda pode ser caracterizada “como o fato da família se
omitir em prover as necessidades físicas e emocionais de uma criança ou
adolescente”. A falta de cuidados e omissão de atitudes assinala a negligência,
podendo ser praticada em todas as classes sociais.
Especificamente em relação à negligência, o alcoolismo tem uma grande
importância, sobretudo ocasionando violências incontroláveis e, no caso de ser
crônico, provocando negligência e abandono dos cuidados com o filho”.
A negligência pode se manifestar além da ausência dos cuidados físicos,
emocionais e sociais, em função da condição de desassistência de que a família é
vítima, como um desleixo propositadamente infligido em que a criança ou o
adolescente são mal cuidados, ou mesmo, não recebem os cuidados necessários
às boas condições de seu desenvolvimento sico, moral, cognitivo, psicológico,
afetivo e educacional.
Tem-se ainda como forma de violência à criança e ao adolescente o
trabalho infantil. Nesse sentido, Silva considera que:
[…] este tipo de violência contra crianças e adolescentes tem sido
atribuído à condição de pobreza em que vivem suas famílias, que
necessitam da participação dos filhos para complementar a renda
familiar, resultando no processo de vitimação, mencionado. Porém, se
considerarmos que muitas dessas famílias obrigam suas crianças e
adolescentes a trabalharem, enquanto os adultos apenas recolhem os
pequenos ganhos obtidos e, quando não atendidos em suas exigências,
cometem abusos, podemos dizer que a exploração de que são vítimas
essas crianças e esses adolescentes configura uma forma de violência
doméstica/intrafamiliar tanto pela maneira como são estabelecidas as
condições para que o trabalho infantil se realize como pelo fim a que se
destina: usufruir algo obtido através do abuso de poder que exercem,
para satisfação de seus desejos, novamente desconsiderando e violando
os direitos de suas crianças e de seus adolescentes.
As manifestações contra a exploração do trabalho de crianças e
adolescentes vêm da constatação das condições de degradação física, afetiva e
moral que afetam aqueles que estão vivendo um estágio de suas vidas em que os
direitos à educação, à saúde, ao esporte, ao lazer, à dignidade, ao respeito e às
convivências familiar e comunitária são prerrogativas garantidas pelo Estatuto da
Criança e do Adolescente.
Dessa forma, o trabalho infantil revela uma inversão de valores de uma
grande parte da sociedade brasileira, levando-a a aceitar que crianças e
adolescentes sejam explorados no mercado de trabalho, e a inversão é esta: a
necessidade se impõe sobre os direitos. Assim, o trabalho infantil, mesmo sendo
considerado um problema social grave, é tolerado, ou mesmo “justificado” a partir
da ótica da necessidade, como sendo uma forma de minorar a pobreza familiar.
Os tipos de violência cometida contra os infantes podem ser classificados
da seguinte forma:
Tipo 1 Maltrato físico: Acción no accidental de algún adulto que
provoca daño físico o enfermedad en el niño/a, o que le coloca en grave
riesgo de padecerlo como consecuencia de alguna negligencia
intencionada. […]
Tipo 2 Negligencia: Situación en la que las necesidades físicas básicas
de un niño/a y su seguridad no son atendidas por quienes tienen la
responsabilidad de cuidarlo. […]
Tipo 3Abuso sexual: Utilización que un adulto hace de un menor de 18
años para satisfacer sus deseos sexuales. […]
Tipo 4 Maltrato emocional: No se toman en consideración las
necesidades psicológicas del niño o de la niña, particularmente las que
tienen que ver con las relaciones interpersonales y con la autoestima. […]
Tipo 5 Mendicidad: El niño es utilizado habitual o esporádicamente
para mendigar, o bien el niño ejerce la mendicidad por iniciativa propia.
[…]
Tipo 6 Corrupción: Conductas de los adultos que promueven en el niño
pautas de conducta antisocial o desviada, particularmente en las áreas
de la agresividad, la apropiación indebida, la sexualidad y el tráfico o el
consumo de drogas. […]
Tipo 7 Exploración laboral: Se asigna al niño con carácter obligatorio la
realización de trabajos (sean o no domésticos) que exceden los límites de
lo habitual, deberían ser realizados por adultos e interfieren de manera
clara en las actividades y necesidades escolares del niño. Se incluye la
utilización del niño en las tareas agrícolas por temporadas. […]
Tipo 8 Maltrato prenatal: El bebé recién nascido presenta alteraciones
(crecimiento anormal, patrones neurológicos anómalos, síntomas de
dependencia sica a sustancias) imputables al consumo de drogas,
alcohol o a la falta de cuidados durante el embarazo por parte de la
madre. […] (grifos do autor)
Todas as formas de violência são repugnantes, contudo a que tem sido
mais estudada atualmente é a agressão sexual, pois a própria cultura não admite
que os infantes tenham sua sexualidade estimulada.
Algunos estudios indican que los niños pequeños corren mayor riesgo de
sufrir violencia física, mientras que la violencia sexual afecta
principalmente a los que han alcanzado la pubertad o la adolescencia.
Los chicos corren mayor riesgo de sufrir violencia física que las chicas,
mientras que las chicas están más expuestas a sufrir violencia sexual,
abandono y prostitución forzosa. Los modelos socioculturales de
conducta y los estereotipos de comportamiento, así como factores
socioeconómicos tales como el nivel de ingresos y el nivel educativo
tienen gran importancia.
Tanto os fatores externos, como também os psicológicos, colaboram para
a permanência do segredo no abuso sexual intrafamiliar. A interrupção do
segredo, conduzindo à denúncia do fato, pode ser influenciada por alguns fatores,
como, por exemplo, a ameaça isolada ou combinada com medo da perda de
integridade física; tentativa de suicídio; contágio por doença sexualmente
transmissível; receio de perpetuação da vitimização com irmãs/irmãos; risco de
gravidez; restrição de atividades típicas da adolescência; desconfiança da mãe e
disque-denúncia.
Quando o abuso sexual acontece na relação intrafamiliar, percebe-se que
é muito complicada a chegada do caso ao sistema de justiça. Tal relação
incestuosa tende a se estender por vários anos, podendo apresentar as seguintes
situações: “O pai pode ter uma personalidade passiva e introvertida e inúmeras
vezes a vida sexual deste casal é pobre”. A mãe, mesmo tendo ciência da relação
incestuosa, pode se calar ou incentivá-la, “pois assim sua filha a estará
substituindo num papel onde se sente incapaz”.
Complementando a assertiva anterior, tem-se que, a exemplo de uma
explicação especificamente psicológica do problema, que o pai: “inicia a relação
com sua filha durante um período de stress’, solidão e dependência. A atividade
do incesto pode não ser motivada pelo sexo, mas representa uma necessidade de
afeto”.
Em casos como esses, geralmente se trata de mães jovens,
despreparadas para o casamento e para a maternidade. Em geral a gestação não
foi desejada, sendo que mãe pode rejeitar a criança, muitas vezes o caçula.
A problematicidade da prática do abuso sexual dentro da esfera familiar
reside no fato de que sua descoberta depende de que as vítimas saiam do estado
de dominação e passividade em que se encontram, o que, por sua vez, depende
de que elas tenham condição de fazê-lo. Assim, por exemplo, quando uma criança
é muito nova, ela não tem meios para tanto. Nesse caso, é preciso que outro
parente, próximo ou distante, ou mesmo outra pessoa das relações da vítima,
descubra o fato e faça a denúncia, o que, como se sabe, pode levar muito tempo
para ocorrer, devido a vários fatores que vão desde o medo da reação do
maltratante, até o desconhecimento e a ocultação de fato.
O abuso ou violência sexual pode ser definido não somente quando
ocorreu a penetração vaginal ou anal na criança ou adolescente, mas também
tocar suas genitais ou fazer com que a criança ou adolescente toque os genitais
do adulto ou de outra criança ou adolescente mais velho, ou o contato oral-
vaginal.
Furniss cita Schechter e Roberge, os quais afirmam que a exploração
sexual refere-se ao envolvimento de crianças e adolescentes dependentes,
imaturos desenvolvimentalmente em atividades sexuais que eles não
compreendem totalmente, às quais são incapazes de dar um consentimento
informado e que violam os tabus sociais dos papéis familiares.
Dessa forma, a violência sexual deixa a criança e/ou o adolescente
expostos a situação desagradáveis, de estímulos psicoemocionais não
compatíveis com sua idade cronológica. As modalidades de abuso sexual
praticados contra a criança e o adolescente podem ser divididas em duas, sem o
contato físico e com contato físico.
Na modalidade sem o contato físico encontram-se o abuso sexual verbal
que são conversas sobre atividades sexuais, para despertar o interesse da criança
e adolescente ou chocá-los; telefonemas obscenos, os quais costumam ser feitos
por pessoas que querem gerar ansiedade na criança e adolescente e na família; o
exibicionismo que se caracteriza pela mania de exibir as partes sexuais, com
intenção de chocar a vítima; e, o voyeurismo em que o abusador obtém prazer de
observar atos ou órgãos sexuais da vítima.
Por sua vez, quando o contato físico existem junto os atos físicos
genitais que são as relações sexuais com penetração vaginal, anal ou oral,
carícias nos órgãos genitais, masturbação ou mesmo a tentativa de relação
sexual; o sadismo que se configura no abuso sexual com violência, tortura,
flagelação e surras; e, a pornografia e prostituição que é a exploração sexual
visando fins lucrativos.
É muito comum que as vítimas do abuso sexual encontrem-se sempre
aterrorizadas, confusas e muito temerosas de contar sobre o incidente.
Permanecem na maioria das vezes silenciosas, pois assim, não prejudicarão o
abusador, nem provocarão uma desagregação familiar, como também possuem
receio de serem consideradas culpadas ou castigadas.
Azevedo e Guerra enumeram algumas medidas imprescindíveis para a
eficácia da intervenção judicial, em casos de violência contra os infantes:
a) quando a separação entre agressor e vítima for necessário, deve-se
decidir pelo afastamento do agressor do lar (art. 130, ECA), com o
intuito de não revitimizar a criança e /ou adolescente;
b) todos os componentes da família devem ser encaminhados
compulsoriamente para tratamento psicológico;
c) a consideração da violência física doméstica como crime. A
legislação no Brasil contempla como prática criminosa os “castigos
imoderados”, não prescrevendo o que seja “castigos moderados”,
ficando sob a apreciação da autoridade judiciária;
d) a separação da família, quando for absolutamente impossível
solucionar o caso de outra forma;
e) a criança-vítima pode e deve ter um advogado de defesa (art. 141, §
1º ECA).
Em termos legais, pode-se dizer que o Brasil está bem instrumentado,
pois o ECA tem se mostrado um instrumento moderno e competente. Porém, para
que os instrumentos presentes no Estatuto surtam efeitos é necessário o empenho
de todos, pois de nada adianta saber que as crianças e adolescentes são sujeitos
de direitos, se estes não são efetivos.
Depois de verificar a fundamentação a respeito da violência intrafamiliar,
tem-se por bem analisar o papel do Estado e do Município na implementação de
políticas públicas de combate e prevenção da violência intrafamiliar, tema do
capítulo seguinte.
2 O PAPEL DO ESTADO E DO MUNICÍPIO NA IMPLEMENTAÇÃO DE
POLÍTICAS BLICAS DE COMBATE E PREVENÇÃO DA VIOLÊNCIA
INTRAFAMILIAR
2.1 Aspectos gerais das políticas públicas
Em sua origem, natureza e conteúdo as políticas públicas advêm do
esforço de amplos setores da população que lutam pela melhoria de suas
condições de vida, cumprindo seu poder de participação política, exercendo a
democracia. Segundo os princípios vigentes nas sociedades modernas ocidentais,
organizadas a partir da dicotomia entre o público e o privado, para se conceituar
política pública é preciso refletir sobre o papel da política e da democracia.
A procura do interesse geral define as políticas públicas e, por
conseqüência, seu conteúdo plural, tolerante e, sobretudo, ético. Sua finalidade se
resume, ao nível ideológico, em reduzir as desigualdades sociais e assegurar a
justiça. Assim, ao introduzir o pluralismo como um dos seus princípios
norteadores, a democracia defende as diversas formas de participação política e
de pressão de interesses, levando os diferentes grupos sociais a passar à posição
de atores políticos, a partir da organização de seus interesses, status e prestígio.
Portanto, pensar em política pública exige desmitificar o velho raciocínio
por dualidades, tão próprio da lógica ocidental. A dicotomia Estado x sociedade
implica o risco de uma análise que não considere devidamente os diversos grupos
de interesses, os atores políticos que, como a experiência demonstrou, atuam
dentro do Estado, o enfrentam, disputam com ele e, muitas vezes, o subordinam.
Dessa forma, a política pública visa assegurar o redirecionamento da sociedade,
isto é, garantir que as mutações por ela geradas propiciem o bem estar do
conjunto de sua população. Tem, portanto, mais do que paliativa, uma natureza
preventiva e organizativa da sociedade.
Para se discutir os aspectos gerais das políticas públicas é mister abordar
a questão da participação social na elaboração, execução e fiscalização dessas
políticas, passando necessariamente pela discussão histórica da participação e
pela questão da cidadania, instrumento que tornou possível a interferência positiva
da sociedade para operacionalizar transformações jurídicas, políticas e culturais
em um Estado.
Para melhor compreender a questão da participação, Gohn afirma que
existem diversas formas de se entender a mesma. Algumas já são consideradas
“clássicas” e deram origem a interpretações, significados e estratégias distintos, a
saber: a liberal, a autoritária, a revolucionária e a democrática. Na concepção
liberal – dados os pressupostos básicos do liberalismo, que busca sempre a
constituição de uma ordem social que assegure a liberdade individual, a
participação objetiva o fortalecimento da sociedade civil. A participação liberal,
portanto, se baseia em um princípio da democracia de que todos os membros da
sociedade são iguais, e a participação seria o meio, o instrumento para a busca de
satisfação dessas necessidades.
A participação comunitária também é um derivativo da concepção liberal.
Ela concebe o fortalecimento da sociedade civil em termos de integração dos
órgãos representativos da sociedade aos órgãos deliberativos e administrativos do
Estado. A forma autoritária é aquela orientada para a integração e o controle
social da sociedade e da política. Ocorre em regimes políticos autoritários de
massa de direita, como o fascismo, e de esquerda, como as grandes
demonstrações de massa em celebrações e comemorações nos regimes
socialistas.
A soberania popular é o princípio regulador da forma democrática: a
participação é concebida como um fenômeno que se desenvolve tanto na
sociedade civil em especial entre os movimentos sociais e as organizações
autônomas, da sociedade, quanto no plano institucional nas instituições formais
públicas. Nas formas revolucionárias, a participação estrutura-se em coletivos
organizados para lutar contra as relações de dominação e pela divisão do poder
político. Dependendo da conjuntura política, poderá se realizar nos marcos do
ordenamento jurídico em vigor, ou se desenvolver por canais paralelos; ou ainda
um misto das anteriores utilizam-se os canais existentes para reconstruí-los,
sendo que a luta tem diferentes arenas: no sistema político (especialmente no
parlamento) e nos aparelhos burocráticos do Estado.
A participação é, segundo Moisés, um relevante aspecto da categoria
democracia aqui compreendida como: [...] um importante instrumento de
ampliação do conceito de cidadania que, dessa forma, expande-se para o terreno
da própria produção do direito”.
Por sua vez, a cidadania é resultado da participação, é uma conquista da
burguesia e significa a realização democrática de uma sociedade, compartilhada
por todos os indivíduos, ao ponto de garantir a todos o acesso ao espaço público e
condições de sobrevivência digna. Exige organização e articulação política da
sociedade, voltada para a realização de seus interesses comuns. Segundo
Mendez, historicamente, os direitos inerentes à pessoa humana não incluem os
direitos da cidadania, que se caracterizam pela existência de um determinado
status político-jurídico que mais especificamente implica a capacidade plena para
o exercício dos direitos do homem, da pessoa humana.
Para Corrêa, é preciso estabelecer um nexo entre cidadania e espaço
público, pois cidadania tem a ver fundamentalmente com a participação na
comunidade política na qual o cidadão é inserido pelo vínculo jurídico. O processo
político de construção da cidadania tem por objetivo fundamental oportunizar o
acesso igualitário ao espaço público como condição de existência e sobrevivência
dos homens enquanto integrantes de uma comunidade política.
A participação da sociedade nas políticas públicas é prevista no art. 204,
da Constituição Federal de 1988. Assim, ao reconhecer ações de co-participação
entre sociedade e poder público e ao respeitar os direitos individuais e sociais, a
Constituição Federal de 1998 trouxe a possibilidade de uma democracia
participativa.
De acordo com Raichelis, a dinâmica sociopolítica dos anos 1990
expressou um movimento de grande complexidade em função da confluência
perversa entre os objetivos do Estado e os da Sociedade Civil. No âmbito do
projeto participativo que vem sendo construído desde os anos 1980, tratou-se de
um processo que difundiu novos discursos e práticas sociais relacionados com a
democratização do Estado e com a partilha de esferas de decisão estatal entre os
segmentos organizados da sociedade civil. A invenção de novos desenhos e
formas de implementação das políticas públicas animaram diferentes sujeitos
sociais, empenhados na experimentação de mecanismos democratizadores da
gestão das políticas sociais, como fóruns da sociedade civil em defesa das
políticas públicas, plenárias populares, conferências nos três níveis de governo,
orçamento participativo, audiências públicas, ouvidorias sociais e conselhos de
direitos e gestores de políticas públicas que, nessa última década, foram
adquirindo importância peculiar como espaço público de exercício do controle
social.
No âmbito do Estado capitalista é através das políticas públicas de corte
social que se observa a ação estatal, via projetos de governo para determinados
grupos populacionais que demandem tais ações. Diversos autores debruçam-se
sobre a discussão das políticas sociais, entretanto seu conceito não apresenta um
caminho único para análise. Santos destaca a dificuldade de definição das
políticas sociais e os múltiplos conceitos criados não apontando para uma
unidade. Marshall ressalta que: “Política Social é um termo largamente usado,
mas que não se presta a uma definição precisa”.
Nessa discussão, Santos relaciona as falhas do mercado como
produtoras, quase que exclusivamente, dos problemas sociais contemporâneos,
porém nem todas as políticas públicas estão direcionadas às falhas do mercado, e
define “política social como o conjunto de atividades ou programas
governamentais destinados a remediar as falhas do laissez-faire”, atribuindo à
relação Estado-Mercado a criação de demandas para ação das políticas sociais.
Sendo assim, pode-se dizer que as políticas públicas representam os
instrumentos de ação dos governos, numa clara substituição dos “governos por
leis” (government by law) pelos governos por políticas” (government by policies).
O fundamento mediato e fonte de justificação das políticas públicas é o Estado
Social, marcado pela obrigação de implemento dos direitos fundamentais
positivos, aqueles que exigem uma prestação positiva do Poder Público.
Bucci define políticas públicas como sendo “programas de ação
governamental visando a coordenar os meios à disposição do Estado e as
atividades privadas, para a realização de objetivos socialmente relevantes e
politicamente determinados”.
No entendimento de Comparato, as políticas públicas são programas de
ação governamental. O autor segue a posição doutrinária de Dworkin, para quem
a política (policy), contraposta à noção de princípio, designa aquela espécie de
padrão de conduta (standard) que assinala uma meta a alcançar, no mais das
vezes uma melhoria das condições econômicas, políticas ou sociais da
comunidade, ainda que certas metas sejam negativas, por implicarem na proteção
de determinada característica da comunidade contra uma mudança hostil.
Nas palavras de Dworkin:
Los argumentos de principio se proponen establecer un derecho
individual; los argumentos políticos se proponen establecer un objetivo
colectivo. Los principios son proposiciones que describen derechos; las
políticas son proposiciones que describen objetivos.
Nesse sentido, as políticas públicas devem ser a expressão pura e
genuína do interesse geral da sociedade, o que, num processo legítimo,
pressupõe seja a demanda social auscultada em instâncias democráticas,
enfrentada de forma realística pela instituição formuladora e solucionada à luz do
possível consenso entre os atores sociais a partir de eficaz fluxo de informações.
Sendo assim, as funções que sustentam as políticas públicas são o planejamento,
concepção ou formulação das políticas; o orçamento, alocação de recursos para
viabilização das políticas; e a execução, ou seja, a implementação ou
operacionalização das medidas para realização das políticas públicas.
A formulação e implementação de políticas públicas referem-se à ação
governamental que tem por objetivo atingir um grupo de cidadãos ou a população
como um todo, com a finalidade de causar algum tipo de impacto na sociedade.
Na visão clássica ou canônica da ação governamental, a implementação
constitui uma das fases do ciclo de política (policy cycle). A implementação
corresponde à execução de atividades que permitem que ações sejam
implementadas com vistas à obtenção de metas definidas no processo de
formulação das políticas. Baseada em um diagnóstico prévio, e em um sistema
adequado de informações, na fase de formulação o definidas não as metas,
mas também os recursos e o horizonte temporal da atividade de planejamento.
Definidos esses parâmetros, pode-se aferir a eficiência dos programas ou políticas
e seu grau de eficácia.
A política pública deve ser entendida como sendo uma ação coletiva,
criada pelo Estado, como resposta deste às demandas que surgem na sociedade.
É a expressão do compromisso que deverá atuar em uma determinada área, a
longo prazo. As políticas públicas concretizam direitos sociais declarados e
garantidos em lei.
Heringer leciona que a política pública “se refere a princípios de ação de
determinado governo, orientado para atingir fins e população específicos, ou seja,
é um meio para se atingir determinada meta econômica ou social”.
As políticas públicas têm, em cada Estado, o respaldo legal da
Constituição Federal, da Constituição Estadual e Lei Orgânica do Município.
Podem ser definidas como o conjunto de programas de ação governamental
voltadas à concretização de direitos sociais. Caracterizam-se como um
instrumento de planejamento, racionalização e participação popular.
Para Couto, a dimensão das políticas públicas concerne ao produto da
atividade política no âmbito de um determinado Estado. É política pública tudo
aquilo que o Estado gera como um resultado de seu funcionamento ordinário.
Pode-se dizer, por isso, que a produção das políticas públicas é condicionada
tanto pela política competitiva, como pela política constitucional, sendo que esta
define duas coisas. Primeiramente, o parâmetro possível no âmbito do qual a
competição política pode se desenvolver. Em segundo lugar, os conteúdos
legítimos das políticas públicas concretizadas como um desfecho do jogo político –
determinando os programas de ão governamental iniciados, interrompidos,
alterados ou que têm prosseguimento.
As políticas públicas constituem um campo de estudo descoberto
recentemente pelo Direito, especialmente no que diz respeito às especializações,
e isso se deve ao fato de que cada vez mais se tem buscado em todos os campos
da sociedade uma maior participação desta no processo de Administração
Pública.
Segundo Azevedo as políticas públicas possuem duas características
gerais, são elas: a busca do consenso em torno do que se pretende fazer ou
deixar de fazer, sendo que, quanto maior for o consenso, mais facilmente as
políticas propostas serão implementadas e a definição de normas e
processamento dos conflitos, essa definição de normas pode ser tanto para a
ação como para a resolução dos conflitos entre os indivíduos e o agentes sociais.
Através das políticas públicas é que irá ocorrer a redistribuição dos bens e
serviços sociais, conforme forem as demandas da sociedade. Assim, o direito que
as fundamenta é um direito coletivo e não um direito individual.
Vallès destaca que a política pública é um conjunto inter-relacionado de
decisões e de não-decisões que tem como foco uma área determinada de conflito
ou tensão social. O autor também destaca quatro grandes categorias de políticas
públicas: as regulativas, as distributivas, as redistributivas e as institucionais.
A elaboração e implantação de políticas públicas implicam em uma série
de atividades individuais e coletivas, podendo-se distinguir quatro etapas básicas:
a iniciação (identificação do problema e incorporação à agenda pública),
elaboração (formulação de alternativas e seleção de respostas), implantação,
avaliação e seguimento da política.
As políticas públicas na concepção de Viana se traduzem em quatro fases
ou etapas e, em diversos estudos da área, autores como Lindblom e Labra
identificam as mesmas como:
1 construção da agenda: diz respeito ao espaço de constituição da lista de
problemas ou assuntos que chamam a atenção do governo e do cidadão,
ou seja, reconhecimento de determinado tema enquanto problema de
ordem pública;
2 formulação de políticas: pode ser definida como a elaboração de
alternativas de ação/intervenção de ordem pública em resposta a
problemas que constem na agenda política;
3 implementação de políticas: é a etapa em que a política formulada se
transforma em programa, se implantam intenções para obter impactos e
conseqüências;
4 avaliação de políticas: é a análise crítica que apreende em que medida as
metas estão sendo alcançadas.
Para Labra, não estão à disposição modelos acabados ou consensuais
para o estudo do processo de produção e implementação de uma determinada
política, mas de variadas correntes, pensamentos e abordagens, pois não uma
teoria que, por si só, dê conta de responder a estas questões.
Muitas políticas públicas resultam fracassadas, devido à falta de
planejamento das mesmas, não existindo desenho estratégico e direção para tais
políticas. A história recente divulga esta carência, no entanto, procura inovar ou
qualificar a gestão através de processos de participação.
2.2 O Estado e as políticas públicas
Aristóteles, em sua obra “Política”, conceitua Estado da seguinte forma:
[...] a observação nos mostra em primeiro lugar que cada comunidade
(pólis) ou Estado é uma forma de associação, em segundo lugar, que
toda associação é instituída com o propósito de alcançar algum bem,
que todos os homens agem com o fim de alcançar algo que, na opinião
deles, seja um bem.
a sua definição de cidadão e cidadania guarda uma relação com o
Estado e sua administração, dessa forma:
[...] o Estado é uma composição de cidadãos, o que nos obriga a
considerar quem deve propriamente ser chamado de cidadão e o que
realmente significa o cidadão [...]. O cidadão propriamente dito não é o
que adquire essa posição em virtude de residir num determinado lugar:
estrangeiros residentes e escravos partilham de um lugar comum de
residência (com cidadãos), mas o são cidadãos. Nem se pode atribuir
o nome de cidadão àqueles que gozam dos direitos civis apenas para
poderem demandar e serem demandados nos tribunais [...]. O cidadão
[...] é aquele que participa da administração da justiça e exerce cargos
públicos.
Portanto, a base da cidadania é a constituição do Estado, isto é, uma
associação política, e a pólis constitui o tipo de associação mais elevada que o
homem pode desenvolver e ser administrada por uma cidadania interessada
apoiada nos comerciantes, artesãos, trabalhadores entre outros.
Para Gramsci, o Estado não pode ser tomado como sujeito, nem
tampouco como objeto, afirmando-se, isso sim, enquanto uma condensação de
relações sociais, o que obriga, necessariamente, a vê-lo enquanto atravessado
pelo conjunto das relações de classe, presentes na própria formação histórica,
incorporando os conflitos vigentes na sociedade.
De acordo com Bobbio existem quatro formas que o Estado Moderno
assumiu: o Estado Liberal, o Estado Social, o Estado Socialista e o Estado
Neoliberal sob os auspícios da globalização. Sua definição de Estado está
alicerçada nos “problemas subjacentes ao desenvolvimento do Estado
Contemporâneo é a análise da difícil coexistência das formas de Estado de Direito
com os conteúdos do Estado Social”. Portanto, os direitos fundamentais
representam a garantia do status quo e os direitos sociais são imprevisíveis e
surgem do contexto social. Essa relação entre o Estado de Direito e Estado Social
se dá no âmbito dos Poderes Legislativo e Executivo.
Sendo assim, o papel do Estado enquanto provedor de uma série de bens
e serviços públicos visando promover a justiça social é um consenso universal do
século XX.
A hegemonia globalizante convenceu, durante os anos 90, os governos
brasileiros a concentrarem suas forças no sentido de implementar um “Estado
Mínimo”, pré-requisito para a modernidade que, ao abdicar de seu poder de
intervenção no mercado acabaria com a inflação, reduziria seu déficit financeiro e
poderia investir em setores sociais essenciais. Porém, o que se verificou foi que as
políticas públicas implementadas pelo Estado Brasileiro com o objetivo de
desregulamentar a economia, quadruplicaram a dívida interna em cinco anos, o
que gerou uma avassaladora elevação do déficit público e a privatização, a preços
vis, de empresas lucrativas financiadas pelo Banco Nacional de Desenvolvimento
Econômico e Social (BNDES) com o dinheiro do próprio cidadão contribuinte.
Seja realizada através de uma perspectiva contratualista (que engloba
desde o Welfare State até o Estado Mínimo) ou pelo viés da luta de classes (que o
concebe como um instrumento de dominação/opressão da classe dominante) a
análise do papel do Estado convergirá sempre para o enorme poder de influência
que ele exerce sobre a vida dos indivíduos que vivem sob as suas normas.
De acordo com Brum:
Las políticas sociales tienen por objetivo explícito mejorar las condiciones
de vida de la población. Durante la vigencia del Estado de bienestar,
modelo impulsado fundamentalmente en los países desarrollados
después de la Segunda Guerra Mundial y replicado parcialmente en
América Latina, se trataron de resolver los más diversos problemas del
conjunto de la sociedad […]. Esto implicó la superación de la situación de
igualdad formal de los ciudadanos ante la ley para transformarla en una
igualdad real, en términos de las condiciones sustantivas de vida y mayor
cohesión social. Para eso, el Estado amplió su campo de acción y creó
nuevas instituciones, transformando la acción gubernamental en el eje
del modelo. […] El Estado de bienestar asumió también entre sus
funciones la ampliación de los derechos sociales.
Percebe-se que o Estado, nos últimos 70 anos, foi caracterizado pela
implementação de políticas públicas que fossem convenientes às classes
detentoras do capital e meios de produção. Essa compreensão do agir do Estado
em detrimento dos interesses da maioria permite vislumbrar que as grandes
mazelas sociais do Brasil são produtos de uma violência estrutural que se
materializa na perpetuação da hegemonia do capital que, ávido de lucros, reclama
para si a propriedade privada das políticas públicas.
Nesse sentido, Mendonça coloca que estudar o Estado é verificar a que
interesses, quase sempre conflitantes, suas várias agências privilegiam, ao definir
e perpetrar suas mais distintas políticas. Estudar o Estado é estudar o conflito e
não a homogeneidade. Somente assim, segundo a autora, será viável
compreender a efetividade de determinadas políticas públicas, em detrimento de
outras, ou ainda por que determinadas práticas estatais encontram-se, muitas
vezes, superpostas, oriundas de agências diferenciadas. O essencial para a
análise do Estado e das políticas públicas é tomá-los enquanto resultado do
embate entre frações de classes distintas, em disputa pela inscrição de seus
projetos junto às agências de Estado restrito.
O Estado Brasileiro está atravessando um momento de transição entre o
modelo de Administração Pública tradicional, centralizada, burocrática, sob a
égide do Estado interventor e promotor do desenvolvimento e, o modelo de
Administração Pública gerencial, flexível, descentralizado e desconcentrado,
democrático, transparente, participativo e interativo com a sociedade, porém,
mantendo para o Estado as funções de regulador, fiscalizador e mantenedor das
atividades essenciais para a sociedade. A redefinição das funções do Estado e de
suas políticas públicas está voltada para as demandas da sociedade que precisam
ser supridas pelos aparelhos do Estado sem, no entanto, prescindir da
participação e da parceria na gestão dos serviços públicos.
Dessa forma, a capacidade governativa ou governança envolve três
dimensões. A primeira, a capacidade de comando e de direção do Estado, tanto
interna quanto externamente. Trata-se da capacidade de dar direção ao processo
de produção de políticas públicas, definir e ordenar prioridades, fazer e sustentar
escolhas, garantindo a sua continuidade ao longo do tempo. Trata-se de formular
o sentido mais geral da ação pública, as estratégias, as diretrizes gerais que
integrem e dêem consistência às diversas facetas do processo decisório nas
várias áreas do governo, buscando integrá-las às metas globais.
A segunda dimensão, a capacidade de coordenação do Estado entre as
distintas políticas e os diferentes interesses em jogo, buscando integrá-los de
forma a garantir a coerência e a consistência das políticas governamentais. A
coordenação diz respeito à capacidade de agregar politicamente os diversos
interesses que estão presentes na arena decisória, buscando compatibilizar as
diversas visões. Assim, está presente nessa dimensão tanto a administração do
conflito quanto a organização das formas de cooperação entre interesses. Esse é
um processo dinâmico que requer procedimentos contínuos de negociação e
compromisso com um projeto que compatibilize o leque diversificado e
contraditório das demandas sociais. As capacidades de comando e de
coordenação são elementos fundamentais para garantir a autonomia do Estado,
com a anuência das regras do jogo democrático, em face das pressões
clientelistas e particularistas.
Finalmente, a terceira dimensão, a capacidade de implementação supõe a
adequação entre as diversas decisões tomadas e os recursos técnicos,
institucionais, financeiros e políticos necessários para que as decisões se
materializem. A implementação depende da qualidade da informação disponível
sobre esses recursos no momento decisório, da continuidade da produção de
informação nos momentos subseqüentes, como também do gerenciamento e
controle continuado desses recursos.
Nesse sentido, a Administração Gerencial emerge como resposta à
necessidade de se adequar a Administração Pública Burocrática ao sistema
democrático, ao surgimento de novos atores da sociedade com sua participação
mais intensa nas fases de formulação e implementação das políticas públicas, às
novas tecnologias em todas as áreas do conhecimento, às limitações de recursos
físicos e financeiros do Estado, e às exigências da população usuária por serviços
públicos com qualidade e agilidade no seu atendimento. Trata-se de um avanço e
não de rompimento com a Administração Burocrática.
A reforma do aparelho do Estado no Brasil propõe a transformação da
Administração Pública Federal Tradicional, Burocrática, em Administração Pública
Federal Gerencial. Tal projeto não deve ser interpretado como um processo de
antagonismo sistemático em relação à burocracia, mas como ações voltadas para
a adequação e superação de procedimentos que não agregam mais eficácia,
eficiência e efetividade ao Estado, e de incrementar aqueles que ainda seriam
indispensáveis para um gerenciamento de alto nível de desempenho. Portanto, o
modelo de administração tradicional perde eficácia, eficiência e efetividade, uma
vez que possui em seu modelo de gestão e formas de gerenciamento
competência limitada para a resolutividade das demandas sociais complexas.
Sendo assim, a proposta do Plano Diretor da Reforma do Aparelho do
Estado consiste em caracterizar tanto os aspectos que estão superados na
Administração Burocrática quanto àqueles que permanecem válidos e vigentes. A
implantação da Administração blica Gerencial trouxe importantes inovações: a)
a noção de descentralização e desconcentração na formulação e implementação
das políticas públicas; b) a ampliação do conceito de cidadania, que passa a
agregar uma dimensão de comunidade, de coletivo, que demanda por serviços
essenciais e fundamentais garantidos na Constituição Federal; c) a clara definição
dos objetivos; d) autonomia dos administradores para atingir os objetivos
contratados; e) redução dos níveis hierárquicos; f) adoção de formas flexíveis de
gestão e gerenciamento; g) permeabilidade da organização à participação da
sociedade civil, h) concentração nos resultados e processos; e i) controles
administrativos a posteriori.
De acordo com Brugué e Gallego:
[…] el papel de la administración resulta crucial, ya que ofrece el espacio
donde, para una red limitada de actores, los conflictos se hacen a la vez
comprensibles y resolubles. La participación en la administración es la
participación a partir de intereses y valores lo suficientemente concretos y
comprensibles como para generar opiniones y diálogos; a la vez que es
la participación que puede desembocar en conclusiones concretas o, en
otros términos, en capacidades reales de influir en las decisiones […].
Dessa forma, uma das características básicas da gestão social das
políticas públicas é a ampliação da participação popular, a inclusão de novos
atores sócio-políticos, possibilidade de escolha de alternativas no espaço do
processo decisório democrático e consciente que deve sobrepujar os limites da
análise histórica técnico-científica tradicional, e capaz de direcionar também suas
premissas e possibilidades para um cenário futuro real, onde se pretende
equacionar a interdependência entre aspectos quantitativos e qualitativos, técnico-
científicos e humanistas. Nesse sentido, tal processo decisório reflete as
dicotomias e suas respectivas imprevisibilidades concernentes às escolhas de
alternativas e, principalmente, sua interatividade com outras escolhas e como
serão coordenadas, implementadas e mantidas.
Conseqüentemente, a gestão social racional implica, para as políticas
públicas, procedimentos, normas e regras objetivas e coerentes, universais e
inclusivas, capacidades e competências essenciais para uma Administração
Pública responsável, sensível e consciente da autonomia e da igualdade dos
cidadãos. Essa legalidade democrática está acoplada à racionalidade auto-
impositiva do modelo gerencial. Esta consiste em um equilíbrio dinâmico e flexível
da relação entre a sociedade geral com os objetos por ela criados e o processo de
interação entre os indivíduos e grupos de indivíduos, com seus interesses e
poderes o capitalismo vigente, organizado e reorganizado, substância primária
que permeia todas as objetividades e subjetividades da sociedade).
O modelo gerencial deve contribuir de forma fundamental para viabilizar a
democratização das instituições políticas e econômicas, baseado em um processo
de interação e comunicação, de participação popular, o que tornaria factível uma
sociedade baseada na solidariedade real, no consenso, no entendimento entre os
interesses particulares e os interesses gerais da sociedade, condição sine qua non
para a implementação de um processo de resolução definitiva para as complexas
demandas sociais.
Na concepção de Höfling, políticas públicas o entendidas como o
“Estado em ação”; é o Estado implantando um projeto de governo, através de
programas, de ações voltadas para setores específicos da sociedade. O Estado
não pode ser reduzido à burocracia pública, aos organismos estatais que
conceberiam e implementariam as políticas públicas. As políticas públicas são
aqui compreendidas como as de responsabilidade do Estado quanto à
implementação e manutenção a partir de um processo de tomada de decisões que
envolve órgãos públicos e diferentes organismos e agentes da sociedade
relacionados à política implementada.
Nesse sentido, políticas públicas não podem ser reduzidas a políticas
estatais. E políticas sociais se referem a ações que determinam o padrão de
proteção social implementado pelo Estado, voltadas, em princípio, para a
redistribuição dos benefícios sociais visando à diminuição das desigualdades
estruturais produzidas pelo desenvolvimento socioeconômico. As políticas sociais
têm suas raízes nos movimentos populares do século XIX, voltadas aos conflitos
surgidos entre capital e trabalho, no desenvolvimento das primeiras revoluções
industriais.
É de fundamental importância que se reflita sobre o papel do Estado e da
sociedade civil, pois a prática de parceria entre Estado e sociedade civil numa
perspectiva substantivamente democrática requer a união de ambas as vontades
políticas e ao mesmo tempo um profundo respeito pela autonomia dos atores e
uma clara definição de responsabilidades.
Dessa forma, o processo de definição de políticas públicas para uma
sociedade reflete os conflitos de interesses, os arranjos feitos nas esferas de
poder que perpassam as instituições do Estado e da sociedade como um todo.
Um dos elementos importantes deste processo – hoje insistentemente incorporado
na análise das políticas públicas diz respeito aos fatores culturais, àqueles que
historicamente vão construindo processos diferenciados de representações, de
aceitação, de rejeição, de incorporação das conquistas sociais por parte de
determinada sociedade. Com freqüência, localiza-se procedente explicação
quanto ao sucesso ou fracasso de uma política ou programas elaborados; e
também quanto às diferentes soluções e padrão adotados para ações públicas de
intervenção.
Indiscutivelmente, as formas de organização, o poder de pressão e
articulação de diferentes grupos sociais no processo de estabelecimento e
reivindicação de novas políticas públicas, são fatores fundamentais para que estas
se tornem eficazes instrumentos de ampliação dos direitos sociais, incorporados
ao exercício da cidadania.
2.3 O Município e as políticas públicas de atendimento à criança e ao
adolescente a partir da Constituição Federal de 1988
Ao longo dos anos 80, recuperaram-se as bases do Estado Federativo no
Brasil. A democratização particularmente, a retomada de eleições diretas para
todos os níveis de governo e a descentralização fiscal da Constituição de 1988
alteraram profundamente a natureza das relações intergovernamentais. A
autoridade política de Governadores e Prefeitos não deriva do governo central,
mas do voto popular direto. Paralelamente, estes últimos também expandiram
expressivamente sua autoridade sobre recursos fiscais uma vez que se ampliou
a parcela dos tributos federais que é automaticamente transferida aos governos
subnacionais –, assim como passaram a ter autoridade tributária sobre impostos
de significativa importância.
Dessa forma, no Brasil pós-1988, a autoridade política de cada nível de
governo é soberana e independente das demais. Diferentemente de outros países,
os Municípios brasileiros foram declarados entes federativos autônomos, o que
implica que um Prefeito é autoridade soberana em sua circunscrição. Nessas
condições, a redefinição de competências e atribuições da gestão das políticas
sociais tem-se realizado sob as bases institucionais de um Estado Federativo, o
que significa dizer que o modo pelo qual os governos locais assumem funções de
gestão de políticas públicas é inteiramente distinto daquele sob o qual elas foram
assumidas no regime militar.
Em Estados Federativos, Estados e Municípios porque dotados de
autonomia política e fiscal assumem funções de gestão de políticas blicas ou
por própria iniciativa, ou por adesão a algum programa proposto por outro nível
mais abrangente de governo, ou ainda por expressa imposição constitucional.
Assim, a transferência de atribuições entre níveis de governo supõe a adesão do
nível de governo que passará a desempenhar as funções que se pretende que
sejam transferidas.
A recuperação das bases federativas do Estado Brasileiro tem impacto
sobre o processo de descentralização das políticas sociais no país pelo fato de
que, resguardados pelo princípio da soberania, Estados e/ou Municípios assumem
a gestão de políticas públicas sob a prerrogativa da adesão, precisando, portanto,
ser incentivados para tal. Isto significa que as agências federais não dispõem
dos mecanismos de alinhamento dos governos locais autoridade política
delegada pelo centro e centralização fiscal de que dispunham sob o regime
militar. Assim, no Estado Federativo, tornam-se essenciais estratégias de indução
capazes de obter a adesão dos governos locais.
Independentemente do espaço de poder onde o geradas, se no Poder
Legislativo discutindo e aprovando as leis, os planos e os orçamentos
necessários à sua implementação ou na Administração Pública, é correto
concluir que as políticas públicas são atividades marcadamente administrativas e
submetidas ao regime jurídico administrativo. As funções de planejar, governar,
gerir e direcionar os recursos financeiros são próprias do Poder Executivo, em
função das regras legais cogentes.
Municipalizar significa promover a articulação das forças do Município
como um todo para a prestação de serviços, cujos co-responsáveis seriam a
Prefeitura Municipal e organizações da sociedade civil. A municipalização deve ser
entendida como o processo de levar os serviços mais próximos à população, e
não apenas de repassar encargos para as prefeituras. Municipalização é a
passagem de serviços e encargos que possam ser desenvolvidos mais
satisfatoriamente pelos Municípios. É a descentralização das ações político-
administrativas com a adequada distribuição de poderes políticos e financeiros. É
desburocratizante, participativa, não-autoritária, democrática e desconcentradora
do poder.
A descentralização e a municipalização, como estratégia de consolidação
democrática, estão sempre ligadas à participação e mostram que a força da
cidadania está no Município. É no Município que o cidadão nasce, vive, constrói
sua história. É no Município que o cidadão fiscaliza e exercita o controle social. O
Município é, de fato, a entidade político-administrativa que oferece melhores
condições para a prática da participação popular na gestão da vida pública.
Havendo mais proximidade, existe mais facilidade de comunicação e de interação:
as ações e as intenções do governo são percebidas e acompanhadas diretamente
pela população.
O Poder Municipal tem a função constitucional precípua de promover a
melhoria das condições locais de vida. O Executivo Municipal, entre todos os
níveis de governo, é o único capaz de funcionar adequadamente como poder
local, ou seja, como o poder responsável pelos serviços e equipamentos públicos
que compõem o contexto no qual os cidadãos enfrentam seu dia-a-dia, com maior
possibilidade de assumir o compromisso de se organizar por meio da participação
popular. Os conselhos setoriais (saúde, assistência social, criança e adolescente,
educação) que existem hoje nos Municípios são formas básicas de mediação
entre a sociedade civil e o Poder Executivo. Funcionam, inclusive, como estratégia
de divisão do poder no governo local.
Percebe-se, assim, que as políticas públicas se desenvolvem de forma
mais eficiente nos Municípios, embora algumas correntes doutrinárias, como
Martins, defendam que os Municípios não são entes da Federação, nem gozam de
status federativo, apesar de gozarem de status de 2ª classe ou 2º grau.
No entanto, entende-se que o status constitucional no qual se inserem os
Municípios na Constituição vigente reflete a inovação de conteúdos, tanto formal
quanto material, com competências definidas, que lhes colocam como entes
efetivos de forma implícita no plano da Federação. Castro afirma que no plano da
Federação Brasileira, com todas as peculiaridades que o circunscrevem, o
Município brasileiro posiciona-se em patamares ímpares aos demais Municípios
de todas as outras Federações do mundo.
A questão constitucional dos Municípios deve ater-se aos predicamentos
de sua autonomia política, auto-organizatória, administrativa e financeira,
desdobrando-lhes os aspectos orgânicos ou formais (art. 1º, 18 e Capítulo IV do
Título III da Constituição Federal) e os aspectos materiais (na explicitação
exclusiva de suas competências, art. 29, 30 e 31 da Constituição Federal). De
acordo com essas competências que são asseguradas aos Municípios, o artigo 30
da Constituição Federal é categórico.
Dessa forma, nas atribuições que lhes foram outorgadas pelos ditames
constitucionais, alguns Municípios realizaram, com êxito, experiências em vários
campos de atuação do Poder Público.
A consideração da família, bem como, da criança e adolescente nas
políticas sociais é fundamental no contexto de reformas que vem sendo observado
pela maioria dos países da América Latina. No início da década de 90, a maior
parte dos países da região criou fundos de investimento social e iniciou programas
de caráter setorial, de geração de emprego, de apoio à gestão produtiva e de
estímulo à organização social dos distintos setores da sociedade e programas
emergenciais de assistência social. O Chile, por exemplo, além de enfatizar nas
políticas sociais a cultura da cooperação e solidariedade e o papel do Estado
como regulador e coordenador do desenvolvimento, orientou suas políticas para
questões de gênero como a maior integração das mulheres nas esferas
econômica, jurídica, de saúde, educação e fomento às organizações da sociedade
civil.
O impacto dos benefícios concedidos pelo setor público aos indivíduos
não se limita apenas a eles, mas afeta também suas famílias e indiretamente a
suas crianças e adolescentes. Nesse sentido, é importante que a focalização das
políticas sociais considere a família como critério de seleção, porém sem
superestimar seu peso na definição de grupos-alvo das políticas. Critérios mais
rigorosos permitem maior justiça alocativa, um grave problema das políticas
públicas em países subdesenvolvidos, como mostrou Jimenez.
Segundo Fonseca, historicamente, Estado e sociedade têm exigido das
famílias considerável responsabilidade de provisão do bem estar dos seus, porém,
sem a contrapartida da efetiva oferta de recursos públicos facilitadores, apesar de
caber a este mesmo Estado, a responsabilidade de proteger e apoiar as famílias
no cumprimento de seus deveres.
Atualmente, não se busca uma democracia formal, mas principalmente
uma democracia material dos direitos. Nessa busca, se o Estado na forma de
governo não toma a iniciativa, a sociedade deve impulsioná-lo a tomar medidas
para garantir os direitos fundamentais às crianças e aos adolescentes, através de
programas e ões especiais políticas públicas às famílias, pois “a família,
base da sociedade, tem especial proteção do Estado”, segundo o art. 226 da
Constituição Federal de 1988.
A referência à família nas políticas sociais é fortemente associada à saúde
reprodutiva e às desigualdades entre os sexos. No projeto de recomendações
para políticas do CELADE (Centro Demográfico da América Latina), por exemplo,
podem ser destacados os seguintes objetivos: a) promover a igualdade de
gêneros; b) harmonizar medidas de ajuste econômico com processos que
promovam a estabilidade e bem-estar das famílias, especialmente as
monoparentais; c) assegurar que a legislação sobre a família incorpore
mecanismos orientados a prevenir e impedir a violência, a discriminação e a
exploração dos membros, com destaque para a segurança das mulheres; d)
enfatizar a distribuição eqüitativa dos serviços de saúde, em especial os de saúde
reprodutiva, materno-infantil, atenção primária às crianças; e) promover a
paternidade responsável; f) promover a educação sexual e o planejamento
familiar; g) controlar as doenças sexualmente transmissíveis; h) reduzir a
incidência do aborto e a gravidez na adolescência; i) melhorar o acesso ao
tratamento da infertilidade e à fertilidade assistida; e j) fortalecer a atuação de
movimentos feministas e outras organizações não-governamentais nas decisões
governamentais, em especial as que tratam dos temas referentes à população e
ao desenvolvimento.
Dessa forma, diversas razões justificam a importância de se conhecer as
famílias para elaborar políticas sociais. A primeira delas diz respeito ao impacto de
as políticas sociais não se limitarem aos indivíduos beneficiários. As famílias são
instituições que atuam redistribuindo recursos entre seus membros, logo toda
política social tem impactos sobre os diversos membros das famílias, sejam ou
não eles beneficiários diretos. Assim, as relações entre membros da família que
regem esse mecanismo redistributivo podem gerar externalidades positivas ou
negativas à sociedade.
Nesse sentido, um Estado e uma sociedade comprometidos com a
importância dos vínculos familiares, enquanto condição de desenvolvimento pleno
de seus membros, devem envolver-se com a criação de possibilidades para a
reconstrução ou resgate de famílias que necessitam da intervenção social, a fim
de satisfazerem as necessidades essências para as crianças e adolescentes: o
amor, a proteção, a aposta em seu desenvolvimento enquanto um ser em
crescimento.
Hoje, vislumbra-se uma tendência de fortalecimento do Municipalismo, na
qual o ente local figura como referência de cultura e cidadania, tornando-se
importante espaço estratégico de atuação para a salvaguarda dos valores e
interesses daqueles que residem nestes territórios.
É a partir da Constituição Federal de 1988 que se verifica uma inovação
no tratamento até então dispensado ao ente local, ganhando, este, relevância.
Neste sentido, lembra Horta que “a ascensão do Município desfaz antigas
reservas que se opunham às relações diretas entre a União e o Município”.
Justamente a partir desta nova perspectiva de inserção do Município
dentro do Federalismo Brasileiro, que Hermany destaca a amplitude do papel a ele
aferido:
Diante disso, o Município, no federalismo brasileiro, deve ter o seu
espectro ampliado para além de um simples estudo de enumerações de
competências, passando para uma verificação dos instrumentos e
estruturas capazes de permitir a atuação da sociedade civil como sujeito
ativo do processo decisório, sem olvidar, contudo, a necessária
vinculação aos princípios constitucionais referenciais.
O referido autor destaca que este fenômeno contribui para a
descentralização e conseqüente democratização da participação popular nas
decisões, ocasionando a apropriação do espaço público pela sociedade,
garantindo a construção de uma cidadania participativa junto ao governo local, a
partir de instrumentos de socialização do processo legislativo e das decisões
quanto às demandas e interesses locais.
Caracterizando-se a descentralização como princípio base do federalismo
brasileiro, é a partir do ente local, o Município, que se verifica que a maior parte
das ações públicas, tendentes a solucionar as demandas sociais existentes,
deveriam ser consideradas de interesse local, sendo necessário, para tanto, o
engajamento de todos os atores sociais no sentido de reivindicarem a
Municipalização das principais políticas públicas, como forma de efetividade das
mesmas no espaço local.
Não se quer, de forma alguma, responsabilizar o Município por todos os
problemas locais e sobrecarregá-lo com cobranças; porém é notório que as
políticas públicas são mais eficazes quando provêem do poder local. Isso se
porque dirigentes políticos, como Prefeitos, Vereadores e Secretários, convivem
na mesma cidade dos demais cidadãos, “onde as relações políticas se dão com
maior intensidade”.
Como bem observa Saule Júnior, até pouco tempo, o Poder Municipal era
reflexo do Poder Central. A legitimidade política municipal era anulada pelos
interesses de grupos políticos centralizados. A ausência de lideranças políticas
locais somava-se ao despreparo administrativo, causando dependência ao poder
central e aos seus interesses não coincidentes com os das comunidades locais.
Porém, com a descentralização política, os Municípios adquiriram maior
autonomia para decidir as políticas públicas de sua responsabilidade, dando
prioridade às ações que atendam as demandas da população local.
Duriguetto pondera que a estratégia da descentralização da
operacionalização das políticas e serviços sociais é justificada pela positividade de
aproximar as demandas sociais, a gestão delas e o envolvimento popular. O
entendimento dessa positividade pela Administração Municipal reflete o debate
sobre as estratégias de reforma administrativa do Estado presente na década
de 1980 e que tem, no discurso da descentralização, o seu princípio ordenador.
Os dirigentes públicos locais são vistos como figuras indispensáveis para
garantir os direitos fundamentais, previstos na atual Constituição Federal e no
Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), devido à proximidade das angústias
da população, podendo cada Município ter problemas diversificados, o que
confirma, ainda mais, a teoria de que Estados e União devem auxiliar os
Municípios na execução de políticas públicas voltadas às crianças e aos
adolescentes.
Somente através da união de esforços da União, Estados, Município e
Sociedade é que as crianças e os adolescentes brasileiros poderão desfrutar de
políticas públicas que auxiliem no seu desenvolvimento, caminhando-se assim
para a construção de verdadeiros cidadãos.
Dessa forma, o objetivo das políticas públicas é minimizar as
desigualdades sociais sejam elas econômicas, raciais, de gênero, cultural entre
outras, dando a todos um tratamento específico conforme as suas necessidades.
Observa-se que as políticas públicas somente serão benéficas se privilegiarem as
características locais como diferenciais competitivos e facilitadores do processo de
desenvolvimento econômico, sócio-político e ambiental. Destaca-se ainda que o
processo deve ser participativo, com presença da população do local
independente de diferenças políticas, religiosas ou de qualquer ordem.
Portanto, compreender uma política de atendimento também envolve
definir e estabelecer uma inter-relação com as políticas públicas em geral. Nesse
aspecto, define-se políticas blicas como a associação de respostas dadas pelo
sistema político às necessidades públicas e sociais, que são apresentadas pelos
diversos atores políticos e sociais na esfera pública. No que versa a
implementação de determinada política pública, três dimensões merecem ser
observadas. A primeira delas perpassa a necessidade e valor dado pelos atores
envolvidos; a segunda centra-se no poder do processo de decisão política, sua
forma de distribuição como fator também determinante no processo de decisão. E,
por último, o grau de pressão, a cobrança e a fiscalização, que estão sujeitos
àqueles que deverão tomar a decisão pública.
A Constituição Federal de 1988 trouxe inovações, uma vez que concedeu
a União, aos Estados e ao Distrito Federal a competência de legislar
concorrentemente sobre a “proteção à infância e à juventude”, como preceitua seu
artigo 24 (inc. XV). Portanto, não restou excluída a possibilidade de serem
editadas leis municipais sobre a matéria, pois a própria Constituição em seu art.
30, estabelece que compete aos Municípios suplementar a legislação federal e
estadual.
Não qualquer disposição constitucional, reservando à União, aos
Estados ou aos Municípios a competência para a prestação de serviços visando à
garantia dos direitos ou à proteção da infância e da juventude. Assim sendo, todos
esses setores da organização pública são responsáveis conjuntamente e
colaborativamente pela adoção de providências a fim de que se garanta às
crianças e aos adolescentes os seus direitos, bem como se dispense a eles a
necessária proteção.
Nos dizeres de Machado, em benefício do interesse social na efetivação
dos direitos dos infantes é que a Constituição da República Federativa de 1988
impôs ao Estado, à sociedade e à família o dever de proteção e garantia de tais
direitos, por isso o seu convite a participar tanto na tutela jurisdicional como
também nas políticas públicas, expressa no parágrafo do artigo 227 do
mencionado diploma legal.
Sendo assim, acredita-se que os Municípios possam concretizar os
direitos sociais, desde que os projetos tenham como objetivos atender as
necessidades da comunidade e não apenas de grupos empresariais sem levar em
consideração as necessidades coletivas. A autonomia adquirida pelos Municípios
Brasileiros poderia propiciar a melhoria das condições humanas locais, se não
fosse a falta de acompanhamento, ou seja, de uma fiscalização das políticas
públicas no momento de sua implementação.
Nesse sentido, os conselhos de direito, juntamente com o Ministério
Público são os principais responsáveis pela fiscalização das políticas públicas
desde seu planejamento até a implementação de suas ações. Também, a
participação da população na formulação, gestão, desenvolvimento, avaliação e
até na fiscalização das políticas públicas dão maior efetividade aos direitos
humanos.
Sousa Santos defende uma articulação entre a democracia representativa
e a democracia participativa, esta última assumindo uma dinâmica mais
promissora na defesa de interesses de grupos mais vulneráveis socialmente,
tendo como contexto, iniciativas locais:
[...] o modelo hegemônico de democracia (democracia liberal,
representativa), apesar de globalmente triunfante, não garante mais que
uma democracia de baixa intensidade baseada na privatização do bem
público por elites mais ou menos restritas, na distância crescente entre
representantes e representados e em uma inclusão política abstrata feita
de exclusão social. Paralelamente a este modelo hegemônico de
democracia sempre existiram outros modelos, como a democracia
participativa ou a democracia popular, apesar de marginalizados ou
desacreditados. Em tempos recentes, [...] a democracia participativa tem
assumido nova dinâmica, protagonizada por comunidades e grupos
sociais subalternos em luta contra a exclusão social e a trivialização da
cidadania, mobilizados pela aspiração de contratos sociais mais
inclusivos e de democracia de mais alta intensidade. Trata-se de
iniciativas locais, em contextos rurais ou urbanos, em diferentes partes do
mundo, e que crescentemente vão desenvolvendo nculos de
interconhecimento e de interação com iniciativas paralelas [...].
Habermas reintroduziu a dimensão social no debate democrático
contemporâneo. “Para Habermas, a esfera pública é um espaço no qual indivíduos
mulheres, negros, trabalhadores, minorias raciais podem problematizar em
público uma condição de desigualdade na esfera privada”. Com isso, as ações em
público dos cidadãos permitem-lhes questionar a sua exclusão de arranjos
políticos por meio de um princípio de deliberação societária. Dessa forma,
Habermas recoloca no interior do debate da democracia um procedimentalismo
social e participativo.
Ao se falar em participação popular junto à administração pública traz-se à
lembrança o Princípio da Subsidiariedade, o qual permeia as relações simples e
complexas entre a sociedade civil e governo.
De acordo com Baracho, o termo subsidiariedade tem vários significados,
entre eles, a imagem ou característica do que é secundário; noção de
supletividade, complementaridade e suplementariedade.
O Principio da Subsidiariedade vincula-se diretamente com a organização
da sociedade, pois este princípio apesar de sugerir uma função de suplência,
deve-se ressaltar que compreende também a limitação da intervenção de órgão
ou coletividade superior. “Pode ser interpretado ou utilizado como argumento para
conter ou restringir a intervenção do Estado”.
Dessa forma, o Princípio da Subsidiariedade leva a problemas efetivos da
descentralização, necessitando “ampliar a liberdade e os poderes das
coletividades, chamadas também de territoriais, sem sacrificar o essencial quanto
às funções do Estado”. Este princípio deve ser interpretado como inerente à
preservação das individualidades, dentro dos vários agrupamentos sociais.
Conforme palavras de Costa e Hermany, “O Estado não agindo como um
fomentador, articulador de possibilidades implementadoras de política participativa
da comunidade no cerne das decisões, a sua identidade fica fragilizada […]”. Na
visão dos autores, a relação entre Município e sociedade nada mais é do que a
gestão compartida.
O aspecto político da pragmática empírica da gestão pública compartida é
o exame das condições em que se dão os engajamentos políticos na esfera
pública, preservando o acesso desta ao poder administrativo, e fundamentando a
maneira pela qual isto irá ocorrer.
Assim, as políticas públicas se destinam precipuamente a condicionar a
atuação da própria Administração Pública, incluindo, evidentemente, a atuação
dos órgãos e entidades dotados de poder/dever para sua execução no âmbito de
qualquer dos Poderes (Legislativo, Executivo e/ou Judiciário).
Nesse sentido, a gestão administrativa voltada ou orientada para a
execução de políticas públicas exige um perfeito domínio de todos os instrumentos
da máquina administrativa, de maneira a permitir a escolha da melhor alternativa
entre as variáveis possíveis, com criatividade, mas sem temeridade, sem
conservadorismo formalista, mas com segurança.
A dimensão política e administrativa, que comumente aparece associada à
democratização da gestão das políticas sociais, principalmente após a
Constituição de 1988, está focalizada no desenvolvimento de instrumentos e
canais institucionais conselhos de direitos; conselhos de desenvolvimento local;
comitês; subprefeituras; centros regionais entre outros que possibilitem fomentar
a participação das comunidades no nível municipal e o exercício de sua
fiscalização e acompanhamento dos processos de formulação e implementação
dos programas e projetos sociais.
Dessa forma, mesmo que a Constituição Federal de 1988 estabeleça a
criança e o adolescente como público prioritário das políticas públicas (art. 227),
são freqüentes os contingenciamentos e remanejamentos nessa área. Ambas as
medidas são previstas na Constituição Federal e na Lei de Responsabilidade
Fiscal (Lei Complementar n. 101, de 4 de maio de 2000). O governo, quando
constata a inviabilidade de determinado gasto, determina aos Ministérios, por meio
de decreto, onde e quanto deve ser bloqueado. Para José Moroni, membro do
colegiado do Instituto de Estudos Socioeconômicos (INESC), um dos problemas
do Brasil é que o orçamento é autorizativo, não obrigatório. Com isso, embora o
Legislativo autorize o uso da verba, não obriga o Executivo a aplicá-la.
Também as alíneas c e d do parágrafo único do artigo do Estatuto da
Criança e do Adolescente (ECA) dão preferência, no que concerne à formulação e
execução das políticas sociais públicas e ao privilégio na destinação de recursos
públicos, às áreas relacionadas com a proteção à infância e à juventude. No
entanto, um avanço significativo quanto à formulação de políticas públicas ocorreu
com a criação dos Conselhos Tutelares, pois o Poder Público e a sociedade
tornam-se coadjuvantes no processo de implementação das medidas que a
legislação propõe.
Quanto à participação da sociedade nesse processo, Andrade assevera
que é:
[…] no contexto das garantias constitucionais que surgem os
mecanismos viabilizadores da participação social e da concretização da
lei – os Conselhos. Seja pela oportunidade de participação na formulação
e controle das políticas blicas Conselhos de Direitos da Criança e do
Adolescente; seja zelando e fiscalizando diretamente os direitos
legalmente garantidos – Conselhos Tutelares.
Tem-se, então, que a política de atenção à criança brasileira sofreu, desde
a Constituição Federal de 1988, grande transformação. De acordo com Silva, as
experiências o governamentais de trabalho com crianças e adolescentes e o
processo de democratização do país foram fundamentais no processo de
mudança nos rumos das políticas públicas, a nível governamental, de sorte que
em 1988, com a promulgação da Constituição Federal, o Brasil passou de um
sistema da doutrina da situação irregular, na área do menor, para a doutrina da
proteção integral.
As mudanças foram sacramentadas com o advento do ECA, que constitui
grandes conquistas da sociedade, que passou a atuar diretamente na elaboração,
execução e avaliação das ões voltadas para a proteção das crianças e dos
adolescentes. Tal Estatuto contém dispositivos em relação à política de
atendimento ao menor, medidas para sua proteção, práticas de ato infracional,
medidas pertinentes aos pais ou responsáveis, Conselhos Tutelares, acesso à
justiça e crimes e infrações penais e administrativas praticados contra a criança e
o adolescente.
Conforme assevera Andrade, como legislação, o ECA rompe
definitivamente com a doutrina da situação irregular, até então admitida pela
legislação referente ao tema do infante, que ficou revogada. Estabelece, como
diretriz básica e única a doutrina de proteção integral. Deixou-se para trás os
momentos nos quais os direitos de crianças e adolescentes eram marcados pela
execução de normas e diretrizes repressivas e discriminatórias e o momento no
qual se desenhou uma política nacional caracterizada pela proteção e amparo
paternalistas para adentrar no momento histórico no qual se funda a concepção da
criança e do adolescente como sujeitos de direitos, isto é, cidadãos passíveis de
proteção integral, quanto aos direitos de desenvolvimento físico, intelectual,
afetivo, social e cultural.
O ECA veio, principalmente, proporcionar uma mudança importante no
que até então era realizado em termos de elaboração e execução de políticas
públicas de atenção à criança e ao adolescente. Essas passaram a se
desenvolver a partir dos Municípios, com a co-participação da sociedade civil
organizada e instituições públicas.
Um aspecto que se deve considerar é a diversidade de novas abordagens
produzidas para o enfrentamento das questões mais cruciais de violação dos
direitos. As iniciativas de educação social de rua que partiam exclusivamente da
sociedade civil hoje ganham status de política em muitos governos; o
enfrentamento de maus-tratos, abuso e exploração sexual encontra respaldo em
diversas instâncias do poder público; o combate à exploração do trabalho infantil
também. Assim, toda uma agenda que até bem pouco tempo era cumprida apenas
por organizações não-governamentais vem sendo assumida progressivamente
pelos diferentes níveis de governo.
Em muitos Municípios, iniciativas, ainda que midas, de interlocução entre
as políticas de saúde, educação e assistência social tiveram sua origem no
Conselho de Direitos. A participação de representantes de diferentes áreas do
Executivo num mesmo órgão estimulou o diálogo intersetorial e em muitas
situações evidenciou distorções e superposição de esforços e serviços,
apresentando perspectivas de atuação conjunta e integrada.
O Conselho Tutelar foi uma conquista da sociedade que por meio desse
órgão participa diretamente das políticas de atenção à criança e ao adolescente. A
Constituição Federal de 1988 estabeleceu as diretrizes para o trabalho dos
Conselhos, dando-lhes autonomia e garantindo-lhes o apoio de todas as
instituições que se dedicam à questão da criança. Dentre os problemas com que
os Conselhos se deparam a cada dia, destaca-se o da violência doméstica, que
oprime as crianças, tirando-lhes a segurança, a auto-estima, e, muitas vezes, até
a vida.
A criança brasileira enfrenta situações de maus tratos e abusos, dentro e
fora de casa. Na época contemporânea persistem as práticas violentas contra
crianças e adolescentes, manifestadas de todas as formas, seja nas ruas, nas
instituições, e, sobretudo, no ambiente doméstico, onde essas práticas são
comumente usadas como formas disciplinares, necessárias à educação dos filhos,
fundamentando-se na idéia culturalmente aceita da dominação dos pais sobre
eles.
Dessa forma, a criança e o adolescente, indefesos frente às
desigualdades, demandam atendimento, tanto em questões relacionadas com as
práticas de violência doméstica, como para possibilitar o exercício de seus
direitos, caso em que se enquadram a obtenção de registro civil, o acesso à
matrícula escolar, o atendimento médico entre outros. Nesse sentido, os
mecanismos jurídicos de atendimento a essa parcela da população sofreram uma
alteração significativa com a criação dos Conselhos Tutelares.
Segundo Andrade, o Estatuto da Criança e do Adolescente retirou do Juiz
de Menores o papel administrador de questões sociais relacionadas às crianças,
adolescentes e suas famílias frente às quais exercia função tutelar. O Conselho
Tutelar é visto como instância acolhedora de queixas e/ou denúncias de qualquer
fato que viole ou represente ameaça de violação dos direitos de crianças e
adolescentes. Também é sua responsabilidade tomar providências concretas e
imediatas para sanar a situação denunciada. Tal queixa constitui-se sempre numa
demanda concreta, podendo tratar-se da necessidade de um trâmite, de um
pedido de socorro, entre outras solicitações, reclamações ou denúncias, podendo
ser a ação do Conselho, inclusive, à revelia das crianças e dos adolescentes.
Sendo assim, o Conselho Tutelar constitui a efetivação da participação da
comunidade nas práticas de proteção dos direitos da criança e do adolescente. No
que diz respeito à discussão sobre o papel desempenhado pelos Conselhos
Tutelares e os desafios por eles enfrentados, Andrade analisa que a hipótese
proposta era que o Conselho Tutelar se constitua como órgão, instituição que
ocupa um lugar intermediário entre a sociedade civil e o Estado. Um espaço de
inserção entre o Estado e a sociedade civil ou um espaço lateral à justiça”.
Portanto, os Municípios têm um papel fundamental na consolidação dos
direitos sociais no Brasil, principalmente no que concerne ao avanço das políticas
públicas de atenção à criança e ao adolescente.
A atenção à criança e ao adolescente pressupõe a implementação do
Sistema de Garantia de Direitos, um esforço para assegurar a atuação articulada
em torno dessa população, de modo a atender ao estabelecido no artigo 86 do
Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA): “A política de atendimento dos
direitos da criança e do adolescente, far-se-á através de um conjunto articulado de
ações governamentais e não-governamentais, da União, dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios”.
O Sistema é composto pelo Conselho Tutelar, Conselho dos Direitos,
Juizado da Infância e da Juventude, Ministério Público, Defensoria Pública,
Delegacias de Proteção às Crianças e aos Adolescentes, organizações não-
governamentais de atendimento e defesa dos direitos da infância, e de serviços
públicos sicos. São três os seus eixos de atuação: promoção, controle social e
defesa. Conforme Girade e Didonet:
Promoção é o eixo responsável pelo atendimento direto dos direitos da
criança e do adolescente. Compreende os serviços públicos nas áreas de
educação, saúde e assistência social, entre outras, e as instituições não-
governamentais que oferecem atendimento à população infanto-juvenil. Por
envolver diretamente as políticas governamentais, o eixo da promoção é o que
tem participação mais destacada das Prefeituras. Os Conselhos dos Direitos e
outros conselhos setoriais, como os de assistência social, educação e saúde,
também são atores importantes, pelo seu papel de deliberar sobre políticas
públicas.
Controle social reúne os órgãos e as instituições responsáveis pela
vigilância, pelo acompanhamento e pela avaliação do funcionamento geral do
sistema. São atores importantes desse eixo os Fóruns e as frentes que
congregam organizações o-governamentais da área, responsáveis por exercer
o controle social; o Ministério Público, os Conselhos dos Direitos, os Conselhos
Tutelares, o Tribunal de Contas e as ouvidorias, que exercem o controle
institucional das políticas. O trabalho de monitoramento abrange tanto as políticas
governamentais quanto a atuação de entidades da sociedade civil.
Defesa atua na responsabilização pelo não-cumprimento ou violação
dos direitos previstos no ECA. São passíveis de responsabilização tanto um adulto
que tenha praticado um ato de violência contra a criança, por exemplo, quanto
secretarias municipais que deixam de atender aos direitos à educação e à saúde.
Os órgãos que fazem parte desse eixo são o Conselho Tutelar, o Juizado da
Infância e da Juventude, o Ministério Público, a Defensoria Pública, a Polícia Civil
e as entidades de defesa dos direitos da criança e do adolescente entre outros.
Nesse sentido, a base de funcionamento de todos os sistemas de políticas
sociais é a articulação intersetorial, com clara definição de responsabilidades e
competências, pressupondo a revisão e reflexão conjunta das ações propostas. A
divisão da administração pública em setores é um mecanismo para organizar
ações e facilitar fluxos, não podendo ser estratégia para formação de guetos e
disputa de poder.
Neste capítulo tratou-se da implementação de políticas públicas de
atenção à violência intrafamiliar. Dessa forma, no capítulo a seguir tem-se um
breve apanhado sobre o Município e sua interface com a sociedade, para então
passar-se ao estudo realizado no Município de Rio Pardo, com o objetivo de
verificar as faces atuais da violência intrafamiliar de que são vítimas crianças e
adolescentes daquele Município.
3 PODER LOCAL COMO ESPAÇO DE CONCRETIZAÇÃO DE POLÍTICAS DE
PREVENÇÃO E COMBATE À VIOLÊNCIA INTRAFAMILIAR
Neste capítulo são expostas algumas teorias sobre a relação do Município
com a sociedade, para então se proceder ao estudo realizado no Município de Rio
Pardo. Poder-se-ia, como introdução ao tema citar-se a célebre frase de
Guimarães, que afirmou que “ninguém mora no Estado ou na União, mas sim, que
todos moram em um Município.”. Tal assertiva põe em relevo o papel de tal ente
público, já colocado em destaque pela Constituição de 1988, como o primeiro
gestor das questões públicas, com um tratamento mais epitelial dos temas, com
melhor interação com o terceiro setor. No que se refere à temática da violência
intrafamiliar a intervenção do Poder Municipal é imprescindível e essencial,
conforme se verá adiante.
3.1 O Município e sua interface com a sociedade civil
Atualmente, tem-se institucionalizado o axioma de que a sobrevivência
dos regimes democráticos deriva do amparo dos cidadãos, assim como, de sua
confiança nas instituições e nos governantes. Embora seja impossível fixar o grau
de apoio necessário para fortalecer a segurança política, o consenso é de que,
sem ele, os regimes políticos não serão eficientes e terão pouca credibilidade.
Muitos clássicos da Democracia como Platão, Rousseau, Aristóteles entre
outros demonstraram a importância da cultura política e da sociedade civil. as
atuais reflexões tratam da importância de se trazer de volta o cidadão para a
esfera política como Habermas, Giddens, Mouffe entre outros, sendo a
reconfiguração da sociedade civil de suma importância tanto para o
desenvolvimento da participação dos atores sociais, como também, para a
constituição de espaços públicos, que são a representação da sociedade civil.
Com a idéia de direito, legitimado pela sociedade, abre-se a possibilidade
de a normatividade ter uma ligação maior com os anseios da sociedade. Nesse
sentido, Gurvitch menciona que a ordem jurídica que encontra sua legitimidade na
própria sociedade e não no processo legislativo oficial viabiliza a manifestação e
interpenetração de “uma pluralidade de ordenações autônomas (sic) de
agrupamentos particulares, excluindo o Estado”.
Assim, a legitimidade do direito e sua eficácia não ficam condicionadas ao
processo coativo, mas à identificação do sistema de direito com a estrutura social.
Trata-se da denominada “garantia social”, que não exige a organização e
estruturação de natureza formal, pois está desvinculada das instituições estatais.
De acordo com a teoria política, a confiança interpessoal e a confiança
nas instituições políticas são pré-condições para a constituição de associações
secundárias, sendo que essas possuem a faculdade de atuar como incentivadoras
da participação política, pois é imprescindível encontrar os meios através dos
quais haja uma maior ingerência dos cidadãos na política.
Putnam, em sua obra “Comunidade e democracia: a experiência na Itália
Moderna”, defende seu estudo afirmando que para haver cooperação é preciso
confiança e solidariedade e é através do uso constante desses recursos que eles
prosperam, podendo, porém, se esgotar com o desuso.
Existem ainda muitas dúvidas com referência à melhor forma de se
constituir cidadãos que interajam com o cenário político, levando-se em
consideração que o que se verifica na prática é uma situação de apatia e senso de
impotência para resolver as coisas.
No Brasil, as pessoas possuem laços sociais que raramente ultrapassam
a família, porém é necessário fortalecer as redes de solidariedade entre os
cidadãos, pois caso contrário, as células sociais serão praticamente destruídas,
impossibilitando o desenvolvimento da confiança e tolerância, tornando difícil a
solidificação de uma cultura política participativa.
Com o despontar da Constituição Federal de 1988 é que o princípio da
participação da sociedade civil ganhou importância, fazendo assim, com que o
poder do Estado pudesse ser compartilhado com a sociedade. Entre os espaços
implementados destacam-se os Conselhos Gestores de Políticas Públicas,
instituídos por lei, e os Orçamentos Participativos, que a partir da experiência
pioneira ocorrida na cidade de Porto Alegre, no Estado do Rio Grande do Sul,
foram criados em cerca de cem cidades brasileiras.
Cabe destacar que o registro da necessidade desse aumento da
participação da sociedade civil, não é um fato que possa ser considerado novo. O
professor Haddad, por exemplo, já em trabalho publicado em 1980, ainda no
período do Regime Militar, afirmava que era indispensável aumentar o grau de
participação das comunidades, dos vários grupos sociais, dos diferentes níveis de
governo, a fim de que possa haver maior mobilização de recursos para as
soluções alternativas que o mais bem conhecidas, em geral, pelos próprios
grupos afetados.
Nesse sentido, inúmeros são os argumentos que confirmam a
necessidade de uma participação ampla e efetiva da sociedade civil na formulação
e implementação das ações de governo, não apenas para produzir melhores
programas e projetos, mas também como instrumento para a construção de uma
sociedade mais dinâmica, mais justa e mais democrática.
Constatou-se que cresceu a materialização do cidadão no processo
político, principalmente no contexto do fortalecimento de entidades locais,
organizações não-governamentais (ONGs), associações de moradores, entre
outros. No campo de reativamento do poder local, por exemplo, várias
experiências têm mostrado que a guinada para o seu revigoramento tem
possibilitado uma ingerência maior dos cidadãos na política.
De fato, tem-se argumentado que as políticas para o desenvolvimento
local são mais eficientes quando formuladas e implementadas por uma
cooperação próxima entre os atores públicos e privados.
Nas transformações da sociedade brasileira, marcadas pela exclusão
social, demandas e domínios das minorias, a ingerência de novos atores, de
ordem coletiva, despertando a consciência do direito a ter direitos. A cidadania
passa a ser buscada com um novo sentido.
Ocorre que a própria cidadania, não mais se presta à condição de
expectadora, porque boa parte dela encontra-se exaurida diante de
tantos desmandos e silêncios frente às demandas que se avolumam,
deixando pouca margem de escolha, senão comportamentos de
autopreservação e autotutela que beiram mesmo a cenários e instâncias
de ilicitude [...].
Existem algumas linhas de raciocínio referentes à importância da
articulação dos atores sociais nas políticas voltadas para a promoção do
desenvolvimento, sendo elas as seguintes: é imprescindível a consulta aos
segmentos da comunidade diretamente afetados, quando da instituição de uma
política pública; a sociedade civil deve ser atuante na vida pública para que ocorra
uma governança transparente, combatendo assim, à possível corrupção no setor
público; deverá haver operação dos mecanismos participativos na formulação e
implementação de políticas públicas.
A participação faz com que haja um aumento da eficácia das ações
governamentais, pois a falta desta por parte da comunidade é apontada como
uma das causas fundamentais do fracasso das políticas, programas e projetos
diversos. Como conseqüência do desinteresse da comunidade, inúmeros
programas e projetos governamentais concebidos e implantados de cima para
baixo não sobrevivem às administrações responsáveis pelo seu lançamento, e
muitos são substituídos por outros igualmente passageiros, num ciclo patético que
envolve grande desperdício de recursos e contribui para aumentar o descrédito
com relação à eficácia das ações do setor público.
A revisão institucional da Administração Pública confere ao Direito,
segundo Habermas:
[...] que a deliberação pública, realizada fora do âmbito estatal,
constituiria a base de legitimação para a ação política. Este espaço, ao
menos em termos hipotéticos, permitiria a todos os potencialmente
envolvidos, poder opinar e interagir comunicativamente antes de que uma
decisão fosse adotada [...].
No Brasil, é recente a preocupação com a implantação de políticas
públicas, um produto do processo do estabelecimento de uma nova organização
do Estado, fundamentada na descentralização. Um dos objetivos da
descentralização é a eliminação de procedimentos clientelísticos na relação
Estado-Sociedade, pois visualiza o cidadão comum como um ator social com
poder e capaz de fazer prevalecer seu ponto de vista, em um contexto de
deliberação.
A privação das condições de vida e a ameaça permanente à integridade
física das crianças e adolescentes impulsionaram, desde a formação colonial da
sociedade brasileira, iniciativas de proteção a esse grupo social. Primeiramente,
sob a proteção da ordem jesuíta e, mais tarde, pela iniciativa de outras
irmandades religiosas e instituições legais. Surgia, desta forma, o embrião das
políticas públicas, voltadas para o atendimento das crianças e adolescentes, no
bojo das chamadas políticas sociais.
A implementação dessas políticas exige uma maior participação da
sociedade no sentido de que auxiliem na escolha das políticas públicas a serem
implementadas, surgindo assim a idéia de uma gestão pública compartida. A
sociedade passa a ter uma atuação participativa, no sentido de fiscalizar as
políticas existentes, bem como, solicitar a elaboração de outras, deixando de ter
um papel inerte, passando a fazer parte da tomada de decisões.
Tal perspectiva condiciona a legitimidade da Administração Pública no
Estado Democrático de Direito, à existência de um processo democrático
de comunicação política, que institui um espaço permanente de
construção de entendimentos racionais, sobre o que se pretende em
termos de sociedade e governo, a partir da organização de mecanismos
e instrumentos de co-gestão que garantam a visibilidade, compreensão e
debate das questões comunitárias relevantes (inclusive na definição de
quais sejam), para em seguida, se passar ao nível dos seus
dimensionamentos em políticas públicas efetivadoras das demandas que
elas representam. Ao depois, de maneira não menos importante, mister é
que o processo democrático de co-gestão se estenda ao plano da
executoriedade e avaliação daquelas políticas públicas definidas, eis que
momento particular de esvaziamento do que até então se estabeleceu
como tal (por expedientes de cooptação ideológica ou desvio de
finalidade política).
É com base nessa gestão pública compartilhada que o Estado conseguirá
atender as demandas de forma mais satisfatória, desenvolvendo políticas públicas
que possibilitem a inclusão social, uma vez que os atores sociais participarão do
processo de determinação dessas políticas, bem como de sua execução e
avaliação. Segundo Leal:
Tal participação não é formal ou circunstancial, mas fundacional, eis que
na ação de gestar a cidade, o cidadão a constitui enquanto lugar de
civilização, comunhão e existência digna; é nesta cidade que o homem
se torna ser no mundo, porque co-responsável pela sua criação e
desenvolvimento, e tudo que diz respeito à cidade diz respeito a ele,
simbólico, formal e materialmente.
O próprio Estatuto da Criança e do Adolescente entende que o Município,
em conjunto com o terceiro setor (sociedade civil), deva organizar e executar os
serviços sociais, pois a “municipalização é uma forma de ampliar a
democratização [...], descentraliza as decisões e permite a participação ativa da
comunidade nos planos e gastos locais”.
De acordo com Heringer um bom governo” se refere a colocar em prática
um estilo de governar no qual a separação rígida entre setor público e o setor
privado deixa de existir, predominando um espírito de colaboração mútua.
A conquista de canais de comunicação faz com que ocorra o
fortalecimento da cidadania participativa, veiculando o poder democrático do
centro para a periferia. Desse modo, a Constituição assume o papel de
garantidora desses canais ou procedimentos de ação comunicativa dos cidadãos,
para que estes criem seu próprio direito.
O Estado deverá assegurar a igualdade de oportunidades aos diferentes
projetos de institucionalidade democrática, bem como, garantir padrões mínimos
de inclusão que tornem possível à cidadania ativa, criar, monitorar, acompanhar e
avaliar o desempenho dos projetos de governo e proteger a comunidade. Tais
padrões mínimos de inclusão são indispensáveis para transformar a instabilidade
institucional em campo de deliberação democrática.
Carvalho leciona que:
consciência de que não bastam políticas. As premissas e as
estratégias que embasam seu desenham são fundamentais: o direito
social como fundamento da política social. Não há mais espaço para se
conduzir a política de forma clientelística, paternalista ou tutelar. O
reconhecimento da cidadania implica a adoção de programas e
estratégias voltadas ao fortalecimento emancipatório (empowerment) e
automização dos grupos e populações alvo das ões públicas. Uma
pedagogia emancipatória põe acento nas fortalezas dos cidadãos
usuários dos programas e, não mais tão-somente, nas suas
vulnerabilidades. Potencializa talentos, desenvolve autonomia e fortalece
vínculos relacionais capazes de assegurar inclusão social.
Deve-se, portanto, buscar essencialmente um maior entendimento, no
sentido de comunicação entre Estado, Administração Pública e sociedade civil,
para que assim se possa pensar numa implementação maior de políticas públicas
efetivas, que realmente garantam aos cidadãos a concretização dos seus direitos
fundamentais.
Somente através de uma interlocução mais ampla entre sociedade e
Estado é que sepossível lograr uma perspectiva de controle, decidibilidade e
executoriedade da gestão pública dos interesses sociais, substituindo-se um
modelo vertical por um modelo horizontal de relações intra-sociais. assim, o
Estado estará desempenhando a sua função social, tendo sempre como objetivo
principal o interesse coletivo, a garantia e a efetivação dos direitos fundamentais,
sem os quais o ser humano não tem condições de viver uma vida digna.
O objetivo não é a exclusão da presença efetiva do Estado, mas, sim, um
Estado que atue em conjunto com a sociedade, partilhando responsabilidades. O
Estado, sozinho, não possui mais condições de garantir todas as demandas da
sociedade, devendo, ambos (sociedade e Estado), através do princípio da
subsidiariedade, assumirem, juntos, a responsabilidade de prestar assistência aos
cidadãos, com políticas públicas eficazes.
3.2 O Município de Rio Pardo
Rio Pardo começou a formar-se como povoação regular a partir de 1750.
Em 08 de maio de 1769 foi criada a Freguesia de Nossa Senhora do Rosário de
Rio Pardo, a Quarta do Rio Grande do Sul, em função do progresso da região,
gerado pelo surgimento de grandes estâncias de gado e de desenvolvimento da
indústria pastoril.
Dois anos depois da criação da Freguesia, foi estabelecida a Comarca
Eclesiástica de Nossa Senhora do Rosário do Rio Pardo, tendo como vigário o
Padre Manoel da Costa Mata.
A 31 de março de 1846, pela Lei Provincial n. 3, Rio Pardo foi elevada à
categoria de cidade, em decorrência de seu progresso, e também como
conseqüência da visita do Imperador D. Pedro II, ocorrida em janeiro daquele
mesmo ano. Em 1865, D. Pedro II passou novamente por Rio Pardo, na viagem
que fez à Uruguaiana, onde assistiu à rendição das tropas de Solano Lopes,
durante a Guerra do Paraguai.
Até o final do século XIX Rio Pardo manteve um bom ritmo de progresso.
Mas vários fatos se sucederam, fazendo declinar o progresso econômico, como a
Guerra do Paraguai, a epidemia de cólera-morbus, a Revolução Farroupilha, os
contínuos desmembramentos de seu território, a chegada da estrada de ferro, que
tirou o movimento do porto fluvial, e a retirada da Escola Militar.
Atualmente, o Município de Rio Pardo, no Estado do Rio Grande do Sul,
possui área de 2.050.53 km² e altitude de 56 metros acima do nível do mar.
Distancia-se da capital do Estado, Porto Alegre, em 140 km.
Segundo o censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, sua
população totaliza 37.783 habitantes, sendo desses, 18.473 homens e 19.310
mulheres. A população urbana é de 26.041 habitantes e a rural 11.742.
O Município de Rio Pardo situa-se na depressão do rio Jacuí.
É marcado por baixas altitudes, com ocorrência de coxilhas e cerros.
Ao norte predominam pequenas várzeas junto ao rio e predomina o relevo plano.
É uma zona tipicamente colonial, com predomínio de médias e pequenas
propriedades. Ao sul ocorrência de extensas várzeas, onde predomina a
pecuária em grandes propriedades. O rio Jacuí corre no sentido oeste-leste,
dividindo o Município em duas porções. o seu afluente, o rio Pardo, que
nome ao Município, corre no sentido norte-sul.
O clima é subtropical, apresentando verões muito quentes e invernos
muito frios, com ocorrência de geadas. As médias anuais de temperatura variam
entre 18° e 20°C.
A região do Vale do Rio Pardo apresenta uma grande variedade quanto a
sua fauna, ainda que em menor quantidade, comparada com a da flora. Os
animais dependem do ambiente em que vivem, ou seja, os campos, a mata, as
várzeas e as águas.
A base da economia do Município está assentada na atividade
agropastoril. Na agricultura destacam-se o arroz, soja, milho, fumo, mandioca e
trigo. Na pecuária o gado de corte, gado leiteiro e a pecuária ovina.
3.3 As faces atuais da violência intrafamiliar de que são vítimas crianças e
adolescentes na cidade de Rio Pardo
Foram convidados a participar desta pesquisa 42 (quarenta e dois)
sujeitos, responsáveis legais pelos infantes vitimizados, que se dispuseram a
responder ao questionário formulado (anexo A). A pesquisa de campo foi realizada
no Serviço Sentinela, no Município de Rio Pardo, Serviço este que trata de
crianças e adolescentes vítimas de violência, bem como de suas famílias, o
em Rio Pardo, mas em aproximadamente 50 Municípios do Estado do Rio Grande
do Sul. É um programa do Governo Federal, cujo objetivo principal é garantir às
crianças e adolescentes (também por via oblíqua às famílias destes) uma melhor
qualidade de vida e, também, proteção àquelas que são agredidas, constituindo-
se em verdadeiro instrumento de realização concreta de direitos e garantias
previstos na Constituição e detalhados no ECA.
Ressalta-se que, buscando resguardar os participantes e também a
fidelidade das respostas obtidas, as entrevistas foram individuais e restritas ao
sujeito e ao pesquisador, sem a interferência ou participação de qualquer outra
pessoa. O local escolhido para se darem as entrevistas foi o utilizado pelo
próprio Projeto Sentinela, da cidade de Rio Pardo/RS, qual seja o prédio da
Assistência Social, sede física do Serviço Sentinela, onde se realiza parte dos
respectivos trabalhos.
O questionário para a coleta dos dados (anexo A) constou de 14 (catorze)
perguntas fechadas. Dessa forma, os dados coletados das entrevistas realizadas
são apresentados em forma de tabelas. Detalha-se para um melhor entendimento
dos mesmos.
Tabela 1 - Caracterização do usuário - faixa etária
Faixa etária %
0 aos 06 anos
07 aos 11 anos
12 aos 15 anos
16 aos 18 anos
03
17
13
09
7,1%
40,6%
30,9%
21,4%
Total 42 100%
Observa-se que a faixa etária dos usuários do Serviço Sentinela em que
ocorre o maior número de violência intrafamiliar está localizada entre os 07 a 11
anos de idade com 17 (40,6%) dos usuários, e, em segundo lugar aparece a faixa
dos 12 aos 15 anos de idade com 13 (30,9%) dos usuários, contra 09 (21,4%) da
faixa etária dos 16 aos 18 anos e 03 (7,1%) usuários na faixa que vai do zero aos
seis anos de idade.
Ferrari e Vecina apontam que “três entre dez crianças de zero a doze
anos sofrem algum tipo de maus-tratos dentro da própria casa, perpetrados por
pais, padrastos ou parentes”.
Um estudo realizado por Soler, sobre crianças e adolescentes em situação
de rua, aponta que a faixa etária em que ocorre maior número de violência
intrafamiliar na região Nordeste do Brasil é do zero aos sete anos de idade, onde o
autor encontrou 53,4% dessas crianças vitimizadas por seus familiares.
Constata-se, então, que a violência intrafamiliar contra os infantes inicia
muito cedo na vida destes, pois neste estudo, aqui realizado, verifica-se a maior
incidência de violência intrafamiliar na faixa etária dos sete aos onze anos de
idade, segmento um pouco acima da referida por Soler.
Tabela 2 – Caracterização do usuário – gênero
Gênero %
Feminino
Masculino
26
16
61,9%
38,1%
Total 42 100%
Nos dados acima, verifica-se que o gênero feminino, 26 (61,9%) é a maior
vítima de violência intrafamiliar, enquanto no gênero masculino encontrou-se 16
(38,1%) dos usuários do Serviço Sentinela.
Meninas que o sexualmente abusadas por seus familiares são levadas,
muitas vezes, a sentir que a culpa foi também delas ou que foram elas próprias
que “provocaram a situação”. Pode lhes ter sido dito que “todos os pais fazem
isso”, ou que “estou somente lhe educando sexualmente”. Dessa forma, aceitam o
ponto de vista do agressor, que afirma que são úteis somente desempenhando
papéis que sejam de pouca importância ou que sejam predominantemente
sexuais.
Por sua vez, existem algumas barreiras para meninos e adolescentes do
gênero masculino relatarem o abuso sexual praticado contra eles por homens
mais velhos. Isso se deve a diversos fatores, entre eles o preconceito quanto ao
incesto e/ou homossexualidade e aceitar que não são capazes de se protegerem.
Nos dois casos, o abuso sexual infantil fornece a meninos e meninas
informações errôneas sobre relacionamentos entre adultos e crianças. Uma
relação envolvendo abuso sexual entre um adulto e uma criança, ou adolescente,
é baseada em poder e conhecimento desiguais.
Sendo assim, a violência doméstica está relacionada com a violência
estrutural, pelas desigualdades de gênero e geração. Ela representa um
verdadeiro fator de risco ao processo de desenvolvimento, sendo que pode trazer
sérias conseqüências para a vítima, implicando a perturbação da noção de
identidade e outros distúrbios de personalidade e de adaptação social.
Tabela 3 - Caracterização do usuário - etnia
Etnia %
Branca
Negra
Parda
Não sabe identificar
20
16
05
01
47,6%
38,1%
12,0%
2,3%
Total 42 100%
No que diz respeito à etnia ou origem étnica dos usuários do Serviço
Sentinela, vítimas de violência intrafamiliar, encontra-se a etnia branca com 20
(47,6%) em primeiro lugar, seguida da etnia negra com 16 (38,1%) usuários; a
etnia parda com 05 (12,0%) e sem saber identificar a etnia, 01 (2,3%) usuário.
A violência em relação à criança e ao adolescente não obedece a uma
etnia distinta. Percebe-se pelos dados obtidos na tabela 3 que tanto a etnia branca
como a negra estão muito próximas em percentual de agressões recebidas por
parte de pessoas mais velhas que as vítimas. Sendo assim, não porque se
afirmar que a violência intrafamiliar acontece mais em infantes de uma
determinada etnia. Ela é uma realidade em todas elas.
De acordo com Azevedo e Guerra, a violência doméstica contra crianças e
adolescentes é um fenômeno endêmico, onde nenhuma etnia, classe social ou
religião está imune.
Tabela 4 - Renda familiar do usuário
Renda familiar %
Até 01 salário mínimo
01 a 03 salários mínimos
Mais de 03 salários mínimos
27
15
00
64,3%
35,7%
0%
Total 42 100%
Nos dados coletados desta pesquisa, percebe-se que a população é de
baixa renda, sendo que a maioria vive, aproximadamente, com um salário mínimo
mensal e há desempregados.
Assim, quanto à renda familiar 27 (64,3%) relataram viver com até um
salário mínimo, seguidos de 15 (35,7%) que sobrevivem com um a três salários
mínimos e nenhum usuário possui renda familiar acima de três salários mínimos.
Verifica-se na sociedade como um todo que uma visão reducionista do
problema da violência doméstica, na medida em que se associa violência a fatores
excludentes e à única classe social, ou seja, a menos favorecida.
Até alguns anos atrás, pensava-se que a violência contra os infantes era
conseqüência de transtornos individuais, alcoolismo, toxicomania, ou de carências
financeiras ou educativas. Porém, segundo a literatura, chama atenção que a
violência é um problema da sociedade social e histórico, é um fenômeno que
possui raízes macroestruturais, formas de expressão conjunturais e atualização na
cotidianidade das relações interpessoais, sendo uma questão essencialmente
social. Ela é polimórfica, multifacetada, encontrando-se diluída na sociedade sob o
signo das mais diversas manifestações, que se interligam, interagem, alimentam-
se e se fortalecem.
Para Tavares, as desigualdades – econômicas, sociais e culturais, as
exclusões econômicas, políticas e sociais, o autoritarismo das relações sociais,
o racismo, o sexismo e a corrupção das instituições e de parte da elite dirigente
não são consideradas formas de violência, muito embora sejam as bases de uma
sociedade estruturalmente violenta. Porém, é essa violência estrutural e social que
atinge a classe mais pobre, reproduzindo a exclusão social e manifestando-se em
diversas formas de violência.
Assim, a violência pode ser considerada decorrência da desigualdade
social, podendo ser visualizada nas estruturas sociais e reconhecida como
conceito multifacetário. Ela tem um caráter instrumental, ou seja, é um meio que
necessita de orientação e justificação dos fins que persegue.
Tabela 5 - Vínculo do agressor com o usuário do Serviço Sentinela
Vínculo do agressor %
Pai
Mãe
Padrasto
Madrasta
Irmãos
Tios
Avós
Outros familiares
Outros
11
00
06
00
03
03
02
05
12
26,3%
0%
14,3%
0%
7,2%
7,2%
4,7%
12,0%
28,3%
Total 42 100%
A violência intrafamiliar praticada contra os infantes vem se constituindo
em uma realidade gritante e assustadora que tem como agressores os pais,
padrastos, irmãos e/ou parentes próximos.
Dessa forma, verifica-se que, quanto ao vínculo do agressor com o
usuário do Serviço Sentinela, a violência intrafamiliar é uma realidade no
Município de Rio Pardo, pois 11 (26,3%) dos agressores são os próprios pais dos
infantes, 06 (14,3%) são padrastos, 03 (7,2%) são irmãos, 03 (7,2%) são tios, 02
(4,7% são avós e 05 (12%) estão na categoria de outros familiares. Sem vínculo
familiar com as vítimas, mas conhecidos dessas, tem-se 12 (28,3%) de
agressores.
Na soma total, tem-se 71,7% dos agressores são familiares das vítimas
infantes, contra 28,3% de agressores não familiares.
Percebe-se, por esses dados, que o vínculo de afeto entre familiares foi
rompido ou, no mínimo, sofreu grave distorção. De acordo com Costa, a
convivência familiar, antes de ser um direito é uma necessidade, pois é na família
que se estabelece a primeira relação de afeto, sobre a qual de apóia todo o
desenvolvimento posterior do indivíduo”.
A autora, acima mencionada, cita Winnicott, grande estudioso do
comportamento humano, principalmente no que diz respeito à psicologia infantil, o
qual ensina que a família, por ser a única entidade capaz de atender as
necessidades do indivíduo, também é a mais adequada para proporcionar a ele a
maturidade emocional.
Da mesma forma, Olivares destaca que:
Sin lugar a dudas, la aparición de situaciones violentas en el contexto
familiar altera y dificulta el desarrollo normal del núcleo familiar lo que
tiene graves repercusiones psíquicas y sociales para las personas que la
componen.
Porém, o que se deduz dos dados obtidos na questão do vínculo do
agressor com o usuário do Serviço Sentinela é que família não está atendendo as
necessidades de seus infantes, tampouco proporcionando um ambiente saudável
e condições psicológicas adequadas para a sua maturidade emocional, uma vez
que seus integrantes são os principais violentadores de suas crianças e/ou
adolescentes.
Isso vem confirmar a doutrina de Azevedo e Guerra, as quais ponderam
que a violência doméstica é uma das várias modalidades de expressão de
violência que a humanidade pratica contra suas crianças e adolescentes, sendo
que as raízes desse fenômeno também estão associadas ao contexto histórico,
social, cultural e político em que se insere e não pode ser compreendida somente
como uma questão decorrente de conflitos interpessoais entre pais e filhos.
Portanto, as situações de abuso sexual intrafamiliar muitas vezes,
encontram-se relacionadas à violência doméstica e a crises no meio familiar. O
agressor é, com freqüência, um membro da família, podendo ser, em geral, os
próprios pais, parentes ou responsáveis, como se pôde verificar nos dados obtidos
na tabela 5. O agressor é uma pessoa que exerce autoridade sobre a criança ou
adolescente, estabelecendo, desse modo, uma relação de abuso do seu poder,
visando satisfazer suas necessidades pessoais.
Tabela 6 - Escolaridade da criança ou adolescente atendidos pelo Serviço
Sentinela
Escolaridade da criança ou adolescente %
Educação infantil
1ª a 4ª série do Ensino Fundamental
5ª a 8ª série do Ensino Fundamental
Ensino Médio
04
20
17
01
9,5%
47,6%
40,6%
2,3%
Total 42 100%
Na questão da escolaridade do infante atendido pelo Serviço Sentinela,
verifica-se que na sua maioria, 20 (47,6%) cursam entre a e série do Ensino
Fundamental, sendo que 17 (40,6%) freqüentam da 5ª a 8ª série do Ensino
Fundamental. Na educação infantil encontra-se 04 (9,5%) dos infantes vitimizados
atendidos pelo Serviço contra 01 (2,3%) que freqüenta o Ensino Médio.
Esses dados coadunam-se com os da tabela 1 que trata da faixa etária,
uma vez que ela se encontra entre os estudantes que cursam da a série do
Ensino Fundamental, onde foi encontrado o maior índice de crianças violentadas.
Seguindo a orientação da Doutrina da Proteção Integral, o Estatuto da
Criança e do Adolescente se preocupou em garantir uma educação que não esteja
voltada apenas para a transmissão de informações, mas, sobretudo, com a
formação do cidadão e cidadã. Isso pode ser constatado no art. 53 do referido
Estatuto.
Dessa forma, a educação para a cidadania busca mostrar a crianças e
adolescentes que eles são sujeitos de direitos e de responsabilidades, que devem
respeitar, mas que também devem exigir respeito. Que podem e devem participar
das decisões em sua família, comunidade, escola, cidade ou país.
A educação é um direito público subjetivo e o não oferecimento do ensino
obrigatório ou sua oferta irregular implica em responsabilização do administrador
público. Sendo a educação um direito público subjetivo, pode ser exigida
diretamente do Estado pelo cidadão.
Tabela 7 - Escolaridade do agressor
Escolaridade do agressor %
Não alfabetizado
Educação infantil
1ª a 4ª série do Ensino Fundamental
5ª a 8ª série do Ensino Fundamental
Ensino Médio
Ensino Superior
Não informado
03
02
09
11
01
00
16
7,2%
4,7%
21,4%
26,3%
2,3%
0%
38,1%
Total 42 100%
Quanto à escolaridade do agressor, percebe-se pelos dados coletados,
que 03 (7,2%) não são alfabetizados; 02 (4,7%) têm a educação infantil; 09
(21,4%) freqüentaram da 1ª a 4ª série do Ensino Fundamental; 11 (26,3%) da 5ª a
série do Ensino Fundamental; 01 (2,3%) possui o Ensino Médio, sendo que 16
(38,1%) não souberam informar a escolaridade do agressor.
Mesmo com o alto índice de não informação sobre a escolaridade dos
agressores, tem-se um segundo dado que aponta para a escolaridade de a
série do Ensino Fundamental com maior número de agressores. Supõe-se, então,
que um nível de escolaridade baixo pode vir a contribuir para a desinformação
sobre a violência intrafamiliar de infantes. Porém, isso não é justificável.
Sabe-se que um nível de educação satisfatório contribui para um maior
esclarecimento das vivências sociais entre familiares. Como ressalta Castro, “la
educación constituye un derecho natural de la persona, un derecho básico que los
estados incorporan como un servicio público de primer orden fundamento del
progreso y el bienestar social”.
Outro determinante na construção da violência intrafamiliar contra os
infantes é a cultura que, ao estabelecer normas, valores, costumes, determina
também como os indivíduos se relacionarão de acordo com a distribuição do
poder.
Tabela 8 - Ano em que foi encaminhado ao Serviço Sentinela
Ano %
2006
2007
2008
18
11
13
42,8%
26,3%
30,9%
Total 42 100%
Nos dados da tabela acima, verifica-se que 18 (42,8%) dos usuários,
portanto, a maioria, foi encaminhada ao Serviço Sentinela no ano de 2006, sendo
que em 2007 11 (26,3%) foram encaminhados ao Serviço e, no ano de 2008, 13
(30,9%) foram recebidos pelo Serviço Sentinela, em Rio Pardo.
É pouco o tempo de encaminhamento a este Serviço, porém, é nele que
os seus usuários encontram algum tipo de assistência, uma vez que ele se
configura como um projeto social de implementação de proteção pretendida
juridicamente.
Esse Serviço é o que se pode chamar de Centro de Defesa dos Direitos
de Crianças e de Adolescentes, o qual é uma entidade da sociedade civil que
ganhou status legal previsto no art. 87, inciso V, do Estatuto da Criança e do
Adolescente. Segundo esse dispositivo, uma das linhas de ação da política de
atendimento é a proteção jurídico-social por entidades de defesa dos direitos da
criança e do adolescente.
Tabela 9 Antes do encaminhamento ao Serviço Sentinela recebeu atendimento
em outro serviço especializado
Atendimento em outro serviço especializado %
Sim
Não
00
42
0%
100%
Total 42 100%
Nos dados acima, 42 (100%) dos responsáveis afirmam que os infantes
não receberam atendimento em outro serviço especializado antes do
encaminhamento ao Serviço Sentinela.
Porém, é necessário garantir condições dignas de vida para os infantes
vitimizados pela violência intrafamiliar, lutando pela ampliação do atendimento e
pela construção de políticas públicas integradas para a criança e o adolescente
violentados, capaz de mobilizar e provocar uma mudança de valores culturais na
sociedade brasileira, para que as crianças e os adolescentes sejam respeitados
como sujeitos de direitos.
Tabela 10 Esse atendimento foi considerado suficiente para as suas
necessidades
Atendimento suficiente %
Sim
Não
35
07
83,3%
16,7%
Total 42 100%
A questão acima se refere ao atendimento do Serviço Sentinela, sendo
que 35 (83,3%) afirmam ser o atendimento suficiente as suas necessidades,
enquanto 07 (16,7%) disseram que o atendimento não foi suficiente as suas
necessidades.
Sabe-se que, além do trabalho voltado para as conseqüências orgânicas
da violência intrafamiliar, a criança ou o adolescente e sua família poderão
necessitar do acompanhamento de profissionais, visando à abordagem e o
tratamento das conseqüências psicológicas e sociais.
O tipo de atendimento que o Serviço Sentinela presta aos seus usuários é
constituído por equipes multidisciplinares, semelhantes às dos Centros de Defesa
dos Direitos de Crianças e Adolescentes, as quais são compostas por advogados,
assistentes sociais, sociólogos, psicólogos entre outros.
Tabela 11 - Grau de satisfação com o Serviço Sentinela
O Serviço Sentinela possui um atendimento %
Ótimo
Bom
Regular
Ruim
Péssimo
20
16
06
00
00
47,6%
38,1%
14,3%
0%
0%
Total 42 100%
No que diz respeito ao grau de satisfação com o atendimento prestado
pelo Serviço Sentinela, 20 (47,6%) dos usuários referem que é ótimo, 16 (38,1)
que é bom, enquanto 06 (14,3%) acham que o atendimento é regular. Verifica-se,
portanto, que a maioria dos usuários está satisfeita com o atendimento recebido
no Serviço Sentinela.
Depreende-se que essa satisfação advém das alternativas de atendimento
no Serviço. Ou seja, da utilização do instrumental jurídico, social e político,
disponível na defesa dos direitos dos infantes vitimizados pela violência
intrafamiliar no Município de Rio Pardo. Também da articulação com órgãos
estatais, como o Ministério Público, a Polícia ou mesmo o Judiciário.
Nesse sentido, esse tipo de Serviço propicia à sociedade participar das
ações governamentais na área do atendimento às crianças e aos adolescentes e
na formulação da política quando forem membros dos Conselhos de Direitos.
Deve-se também levar em conta que o universo de pessoas que
responderam aos questionários constitui-se de indivíduos de baixa renda, os quais
raramente são objeto de atenção específica do Poder Público, sendo, através do
Serviço Sentinela, talvez e provavelmente pela vez primeira, alvo de cuidado
efetivo e amparo pela administração lato senso, o que leva a uma melhor
avaliação por parte do usuário do serviço, que acaba por avaliar não o serviço
do qual usufrui, mas também a pessoa que o presta.
Tabela 12 – Quais são as principais dificuldades enfrentadas pela família do
usuário do Serviço Sentinela
Principais dificuldades
Relacionamento entre os membros
Desemprego
Alcoolismo
Dependência química
Outras
27
33
24
10
05
A questão acima não foi avaliada percentualmente por haver mais de uma
escolha a ser feita pelos respondentes. Nota-se que a maioria das dificuldades
enfrentadas pela família do usuário do Serviço Sentinela é em relação ao
desemprego, logo a seguir tem-se o relacionamento entre os membros da família;
seguido pelo alcoolismo, pela dependência química e por outros motivos que não
foram questionados.
Para Chesnais, entre as camadas mais pobres da população, a
subsistência é precária. Grande número de crimes são cometidos sob o império da
necessidade. A miséria conduz ao roubo e à prostituição.
No que se refere às dificuldades expostas anteriormente, Costa
argumenta que os enfoques preventivos mais interessantes situam-se na família, a
qual deve intentar seus recursos pessoais e sociais, como objeto que pode
modificar as circunstâncias que incapacitam seu funcionamento socialmente
integrado. Isso pode exigir ajuda especializada, educativa e de assistência social
para enfrentar as necessidades econômicas mais urgentes e melhorar sua
qualidade de vida.
Mesmo o relacionamento interpessoal, o qual configura um padrão
abusivo de interação pai-mãe-filho, foi construído historicamente por pessoas que,
ao fazê-lo, revelam as marcas de sua história pessoal no contexto da história
socioeconômica, política e cultural da sociedade.
Nesse mesmo sentido, Costa e Reis fazem referência que o tratamento
centrado no sistema de interação familiar e nas funções que desempenham as
condutas delitivas na manutenção do equilíbrio ou desequilíbrio familiar tem duas
etapas genéricas, a primeira de natureza terapêutica, onde se tenta romper a
resistência da família diante da intervenção, e a segunda de natureza educativa,
onde se ensina à família habilidades de comunicação, de negociação e de solução
de conflitos.
Observa-se, assim, que a violência, qualquer que seja ela, instaura-se por
inúmeros e complexos fatores, passando desde a questão ambiental, o problema
da qualidade de vida, os vícios que atingem a realidade familiar, até o
comprometimento das relações. A violência intrafamiliar nos meios mais carentes
é favorecida pela promiscuidade e pode estar associada ao abuso de álcool e
drogas.
Tabela 13 - Condições habitacionais
Condições habitacionais %
Ótimas
Boas
Regulares
00
04
19
0%
9,6%
45,2%
Péssimas 19 45,2%
Total 42 100%
Confirmando os dados da renda familiar, tem-se as condições
habitacionais dos usuários do Serviço Sentinela. Assim, 19 (45,2%) dos
respondentes referem que as condições são péssimas, igual quantia afirma serem
regulares as condições habitacionais, enquanto 04 (9,6%) responderam que são
boas as condições de suas moradias.
Dessa forma, percebe-se o nível de pobreza e de exclusão social por falta
de condições dignas de moradia dos usuários do Serviço Sentinela, no Município
de Rio Pardo.
De acordo com Costa e Porto, “a exclusão social pode ser originalmente
identificada à situação de não ter”. Não ter trabalho, não ter renda suficiente para
atender às necessidades básicas, como moradia, alimentação entre outros.
Tabela 14 - Idade em que começaram as agressões
Idade em que começaram as agressões %
0 aos 06 anos
07 aos 11 anos
12 aos 15 anos
16 aos 18 anos
13
22
07
00
30,9%
52,4%
16,7%
0%
Total 42 100%
No que diz respeito à idade em que começaram as agressões, tem-se que
13 (30,9%) estavam na faixa etária do zero aos seis anos; 22 (52,4%)
encontravam-se entre os sete e os 11 anos de idade; e, 07 (16,7%) entre os 12 e
15 anos quando iniciaram as agressões aos infantes usuários do Serviço
Sentinela.
É sabido que a violência contra os infantes, em especial o abuso sexual,
ainda permanece oculta. Em geral, é o que tem menor número de notificações, em
comparação com as outras modalidades de violência. Esse tipo de violência
geralmente ocorre no lar, o que põe em xeque o tabu de que, nesse ambiente, as
crianças estariam protegidas de tal espécie de violência.
Quanto à violência de cunho sexual, muitas vezes, principia quando a
criança é ainda muito pequena, podendo se estender ao período da adolescência
e, em alguns casos, ter ainda uma continuidade.
3.3.1 Alternativas de prevenção e combate da violência intrafamiliar
Parafraseando Costa e Porto, o poder público, a sociedade civil e a
comunidade precisam estabelecer uma rede de apoio às famílias, desenvolvendo
projetos e implementando programas e políticas públicas que permitam resgatar a
qualidade de vida e condições dignas de sobrevivência, o que pode proporcionar
às crianças e aos adolescentes se desenvolverem com vínculos afetivos estáveis
com suas famílias, de forma a precaver a violência no seu ambiente.
Ainda de acordo com Costa, a incumbência pela formação de crianças e
adolescentes não é exclusiva da família ou da escola ou até mesmo da sociedade
de forma individualizada, “mas sim de todos os atores sociais, quer seja a família,
a escola ou a sociedade. Não se pode pensar em um mundo onde as
responsabilidades sejam atribuídas apenas a um ator social”.
Sendo assim, o Município é um espaço importante para a implantação de
políticas públicas que visem à prevenção e combate da violência intrafamiliar
contra crianças e adolescentes. Para tanto, busca-se a partir desse momento as
alternativas para esse combate e prevenção.
O Estatuto da Criança e do Adolescente, em seu artigo 87, ressalta as
linhas de ação da política de atendimento que o Município, em parceria com
outros setores como a sociedade civil, deve organizar e executar os serviços
sociais, uma vez que a “municipalização é uma forma de ampliar a
democratização”, descentralizando as decisões e permitindo “a participação ativa
da comunidade nos planos e gastos locais”.
Por sua vez, o art. 88 do ECA traz as diretrizes da política de atendimento
à criança e ao adolescente por parte do Município e da sociedade civil.
Para além da crescente sofisticação na produção de instrumentos de
avaliação de programas, projetos e mesmo de políticas públicas é fundamental se
referir às chamadas “questões de fundo”, as quais informam, basicamente, as
decisões tomadas, as escolhas feitas, os caminhos de implementação traçados e
os modelos de avaliação aplicados, em relação a uma estratégia de intervenção
governamental qualquer.
E uma dessas relações consideradas fundamentais é a que se estabelece
entre Estado e políticas sociais, ou melhor, entre a concepção de Estado e a(s)
política(s) que este implementa, em uma determinada sociedade, em determinado
período histórico. Dessa forma, na análise e avaliação de políticas implementadas
por um governo, fatores de diferentes natureza e determinação são importantes.
Especialmente quando se focaliza as políticas sociais (usualmente
entendidas como as de educação, saúde, previdência, habitação, saneamento
entre outros) os fatores envolvidos para a aferição de seu “sucesso” ou “fracasso”
são complexos, variados, e exigem grande esforço de análise.
Como formas de prevenção à violência às crianças e aos adolescentes,
tem-se a educação, a moradia, a saúde pública, a geração de empregos. No que
diz respeito à educação, a escola com sua vocação para transmitir conhecimentos
de base: leitura, escrita, cálculo, deve acrescentar o aprendizado do civismo e da
tolerância. Essa mesma escola deve, também, oferecer formações de qualificação
técnico-profissional.
As políticas sociais e a educação se situam no interior de um tipo
particular de Estado. São formas de interferência do Estado, visando à
manutenção das relações sociais de determinada formação social.
Grande parte da população vem enfrentando carências agudas em sua
vida cotidiana, onde se estima que um terço da população ativa mundial vê-se
afetado por sérios problemas de desemprego e subemprego.
É sabido que a geração de empregos é cada vez mais remota. O que
cresce mesmo é o emprego informal ou subemprego, em que os trabalhadores
não têm nenhum tipo de direito assegurado, além de terem uma renda parca para
o atendimento das necessidades familiares. Outra causa, como se verificou na
coleta dos dados, da violência intrafamiliar.
Observa-se, porém, que as ações empreendidas pelo Estado não se
delineiam automaticamente, têm oscilações, incoerências e podem gerar
resultados diferentes dos esperados. Notadamente por se volverem para e
dizerem respeito a grupos diferentes, o impacto das políticas sociais
implementadas pelo Estado capitalista suportam o resultado de diferentes
interesses propagados nas relações sociais de poder.
Portanto, a prevenção ainda é a melhor forma de se evitar a violência
contra crianças e adolescentes. Dessa forma, tem-se que a prevenção primária,
segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), compreende um trabalho
informativo junto aos pais ou responsáveis sobre os processos de
desenvolvimento de uma criança ou adolescente; sensibilização da população em
geral e, em especial, dos profissionais de saúde, da área jurídica e de educação,
acerca dos fatores desencadeantes da violência intrafamiliar.
Deve-se fazer também um trabalho de orientação durante o período
escolar, pois a escola é, também, um espaço propício para um trabalho
informativo junto aos professores, pais, adolescentes e crianças.
Sendo assim, a prevenção primária é a maneira mais econômica, eficaz e
abrangente para se evitar a violência contra a criança e/ou adolescente. Através
da prevenção primária atua-se para modificar condutas e formar novas culturas,
sensibilizando e mobilizando a sociedade.
Por sua vez, na prevenção secundária, de acordo com o posicionamento
da OMS, inclui-se a capacitação de profissionais que lidam diretamente com
crianças e adolescentes violentados sexualmente e o atendimento direto à criança
vitimizada e sua família, por parte dos Conselhos Tutelares, Centros de Defesa e
Instituições Governamentais. Na prevenção terciária acompanha-se a criança ou
adolescente, o agressor e a família envolvida, através do atendimento médico,
psicológico, social e jurídico.
3.4 A reinserção do princípio da solidariedade (integração social) e a
participação popular como requisito para a efetivação da cidadania dos
infantes vitimizados
A Constituição Federal de 1988, ao estatuir os objetivos da República
Federativa do Brasil, no art. 3º, inciso I, estabeleceu a construção de uma
sociedade livre, justa e solidária. Na Constituição Federal não espaço para a
exclusão, nem para a resignação submissa. Dessa forma, de acordo com o
estabelecido no texto constitucional, a configuração do Estado Democrático de
Direito tem por fundamentos a dignidade humana, a igualdade substancial e a
solidariedade social, determinando a correção das desigualdades sociais e
regionais, com o propósito de reduzir os desequilíbrios entre os diversos Estados
e Municípios do país, buscando melhorar a qualidade de vida dos seus cidadãos.
O princípio de solidariedade é um fato social, na medida em que não se
pode conceber o homem sozinho e somente se pode pensar o indivíduo inserido
na sociedade. Nesse sentido, pensar no ser humano inserido na sociedade é não
excluí-lo, é proporcionar condições para que viva em uma sociedade de iguais.
Uma vez que, um dos argumentos para a relação de causalidade entre
distribuição de renda e crescimento econômico se encontra na idéia de que a
desigualdade e a pobreza geram estruturas de governança ineficientes, que
afetam não somente a eficiência dos pobres, mas também da sociedade como um
todo.
Com base no princípio da solidariedade, passaram a ser reconhecidos
como direitos humanos os chamados direitos sociais, que se realizam pela
execução de políticas públicas, destinadas a garantir amparo e proteção social
aos mais fracos e mais pobres, ou seja, aqueles que não dispõem dos recursos
indispensáveis para viver dignamente.
Para Moraes, o texto constitucional, ao imputar ao Estado e a todos os
cidadãos o encargo de construir uma “sociedade solidária”, através da distribuição
de justiça social, agregou um novo valor aos existentes. Referencia ainda a
autora, que a disposição não se trata, apenas, de impor limites à liberdade
individual, atribuindo inteira relevância à solidariedade social. Para ela, o princípio
cardeal do ordenamento é o da dignidade humana, que se busca atingir através
de uma medida de ponderação que oscila entre os dois valores, ora propendendo
para a liberdade, ora para a solidariedade.
Em decorrência, esse princípio acaba repercutindo nas relações
familiares, pois o indivíduo somente pode ser apreendido pelo Direito em sua
dimensão coexistencial, uma vez que a vida sem os outros nada mais é do que
uma abstração, afastada da realidade.
O princípio da solidariedade familiar implica respeito e consideração
mútuos em relação aos membros da família. O princípio da solidariedade, ao lado
do princípio da dignidade humana, constitui núcleo essencial da organização
sócio-politico-cultural e jurídica brasileira. A solidariedade familiar é fato e direito;
realidade e norma. No plano fático, convive-se no ambiente familiar para o
compartilhamento de afetos e responsabilidades. No plano jurídico, os deveres de
cada um para com os outros impuseram a definição de novos direitos e deveres
jurídicos.
A solidariedade é um sentimento recíproco que estabelece um vínculo
moral entre as pessoas e à vida, criando laços de fraternidade. E é assim que as
relações de afeto entre pais e filhos devem ser entendidas, superando-se a
concepção individualista de pessoa humana.
Dessa forma, é preciso haver um resgate do princípio da solidariedade no
que tange às crianças e aos adolescentes vítimas da violência intrafamiliar, uma
vez que é antagônico pensar em solidariedade num ambiente onde habita a
violência entre os familiares.
É por meio da participação da sociedade e do Estado na implementação
de políticas públicas contra a violência intrafamiliar no que se refere às crianças e
aos adolescentes que poderá haver uma efetivação da cidadania dos infantes
vitimizados.
Os maus-tratos cometidos contra crianças e adolescentes são tão
relevantes que existem mecanismos legais e instituições que se voltam para a
prevenção e para a intervenção frente a sua ocorrência. É o que acontece no
Município de Rio Pardo, com a instituição do Serviço Sentinela como um meio de
proteção aos infantes vitimizados pela violência intrafamiliar.
A percepção do espaço local, como elemento chave, está intimamente
associada ao processo de democratização do país, em que se configura a
compreensão e constituição das formas administrativas municipais e
descentralizadas enquanto espaço político e institucional das políticas sociais. É
neste sentido, que no campo das políticas públicas tem-se como uma das
principais inovações o elevado grau de participação popular nos diferentes níveis
de desenvolvimento e implementação das políticas.
Para Hermany, deve-se romper com a idéia de cidadão somente como
destinatário das políticas blicas, e trazê-lo para uma cidadania ativa e efetiva, e
inclusive emancipatória, que apenas será construída através de uma interação
entre o espaço público e a sociedade. E assim, o espaço local é o campo
favorável para se construir essa responsabilidade, que é potencializada pelo
sentimento de solidariedade e pertencimento.
Nesse sentido, o planejamento de ações municipais voltadas às crianças e
adolescentes tem como ponto de partida as diretrizes apresentadas no Estatuto da
Criança e do Adolescente (ECA) para a atuação do poder público municipal
principal responsável pela implementação de políticas públicas de proteção à
infância no Município –, da comunidade e da família, na garantia dos direitos de
cidadania da população infanto-juvenil.
É a articulação de ações entre estes três segmentos que pode assegurar
um salto de qualidade no enfrentamento dos problemas que atingem crianças e
adolescentes no Município. Nesse sentido, o pressuposto para que o
planejamento alcance resultados é que seja realizado de forma: conjunta, onde
planejar é, sobretudo, um processo grupal e participativo, que reúne o governo
municipal e a comunidade.
Para tanto, é preciso criar canais de participação na elaboração e
definição das propostas de ação da administração municipal; intersetorial, ou seja,
a articulação de ações das secretarias e órgãos municipais na prioridade à
infância, partindo do princípio que o foco na população infanto-juvenil é transversal
a todas as áreas sociais; descentralizada, para alcançar resultados é preciso
realizar o planejamento em vários níveis da Administração Municipal e com
setores da sociedade local, envolvendo quem conhece e sente os problemas que
serão enfrentados; contínua, planejar e atuar o processos simultâneos e
dinâmicos; orientada à ação, pois as ações transformam a realidade; coerente,
a soma das ações tem que garantir resultados; criativa, dar espaço para a utopia,
os sonhos e a inovação; realista, é preciso considerar os recursos e a
governabilidade existentes ou possíveis.
Para Hermany, a democracia participativa exerce papel fundamental
quando auxilia na inclusão social de maneira a constituir uma nova soberania
democrática, resgatando a cidadania de cada indivíduo. Sendo assim, o Estado
deve ser reestruturado para que possa participar ativamente da “nova sociedade”.
É imprescindível que se tenha consciência da necessidade de novas
possibilidades de relação entre sociedade civil e Estado, principalmente no que se
refere às novas modalidades de participação nas decisões.
Dessa forma, um dos avanços trazidos pela Constituição Federal de 1988
foi a abertura para a participação da sociedade nas decisões com relação à
formulação, ao implemento e à fiscalização das políticas públicas. Essa abertura à
participação não ocorreu por acaso, mas veio na esteira do processo de
redemocratização do país. Nesse sentido, convergiram dois interesses: o da
sociedade civil que ansiava por uma democracia participativa e o do Estado que
procurava dividir com a sociedade civil as responsabilidades por suas políticas
públicas.
Sendo assim, em diversos dispositivos, a Constituição prevê a criação de
espaços institucionais para a participação da sociedade, seja nos níveis Federal,
Estadual ou Municipal. São nesses espaços que as propostas são colocadas e
negociadas por representantes da sociedade civil e do Estado. Com relação à
criança e ao adolescente, a Constituição, quando trata da assistência social, em
seu art. 203, determina que entre os objetivos da mesma esteja a proteção à
família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice, além do amparo às
crianças e aos adolescentes carentes.
Por sua vez, o Estatuto da Criança e do Adolescente contemplou a
participação da sociedade nas decisões relacionadas às políticas públicas,
direcionadas à população infanto-juvenil, quando determinou a criação dos
Conselhos dos Direitos das Crianças e dos Adolescentes e dos Conselhos
Tutelares.
Em seu art. 88, inciso II, o Estatuto da Criança e do Adolescente assegura
que uma das diretrizes da política de atendimento a essa população é a criação de
conselhos municipais, estaduais e nacional dos direitos da criança e do
adolescente, órgãos deliberativos e controladores das ações em todos os níveis,
assegurada a participação popular paritária por meio de organizações
representativas, segundo leis federais, estaduais e municipais.
Dessa forma, a desconstrução da violência” exige o envolvimento dos
sujeitos, das instituições e da sociedade, em suas multidimensionalidades – física,
mental, emocional, ética, espiritual, econômica, jurídica, política entre outros. O
sistema educacional tem uma responsabilidade especial nesse processo, uma vez
que é inegável o papel crucial que a educação desempenha na formação
intelectual e moral das novas gerações.
Embora a prevenção da violência não seja atribuição ou domínio exclusivo
de qualquer setor, tanto a educação como a saúde têm um papel preponderante a
desempenhar. O impacto de tais programas será mais efetivo quanto maior for a
cooperação entre os vários setores e atores sociais, cada qual assumindo sua
parcela de responsabilidade num trabalho integrado que envolva crianças e
adolescentes, seus pais e mães, as escolas, as associações e lideranças
comunitárias, os grupos religiosos, os técnicos de saúde, os policiais entre outros.
A importância da comunidade nesse processo o deve ser
menosprezada, uma vez que os crimes violentos estão associados a contextos
onde há: a) desorganização social, entendida como pouca participação em
atividades coletivas; b) pouca filiação a igrejas; c) muita mobilidade dos
moradores; d) desemprego; e) forte densidade populacional. Por outro lado,
quando os adolescentes são “bem integrados na vida da comunidade, aumenta a
sensação de proteção, reduzindo-se a percepção de risco a despeito da ameaça
real”.
CONCLUSÃO
O objetivo deste trabalho foi o de analisar e verificar a possibilidade de o
poder local contribuir para a elaboração e execução de políticas públicas que
assegurem os direitos e garantias fundamentais, previstos na atual Constituição
Federal e no Estatuto da Criança e do Adolescente, aos infantes vítimas de
violência intrafamiliar, emprestando eficácia social (efetividade) a tais direitos.
Para tanto, foi realizada uma pesquisa de campo sobre o projeto social do Serviço
Sentinela, no Município de Rio Pardo, RS, com a aplicação de um questionário
que constou de 14 (catorze) perguntas fechadas a quarenta e dois sujeitos
responsáveis pelos infantes vitimizados, usuários do Serviço citado.
Sendo assim, o tema escolhido para abordar neste estudo teve grande
relevância social, especialmente por unir as dimensões teórica e prática, que
envolvem o grave problema social, hodiernamente enfrentado também na região
do Vale do Rio Pardo.
Respondendo ao questionamento proposto para este estudo, quanto à
possibilidade de o poder local contribuir para a elaboração e execução de políticas
públicas que assegurem os direitos e garantias fundamentais, previstos na atual
Constituição Federal e no Estatuto da Criança e do Adolescente, aos infantes
vítimas de violência intrafamiliar, verificou-se que o Município de Rio Pardo
desenvolve o Serviço Sentinela e possui condições para a implementação de
outras políticas públicas que atendam as necessidades dos infantes vítimas de
violência intrafamiliar, pois através do trabalho em conjunto do Estado e da
sociedade civil poderão ser desenvolvidas políticas públicas que possibilitem a
inclusão social, atendendo assim as demandas de forma mais satisfatória, uma
vez que os atores sociais participarão do processo de determinação dessas
políticas, bem como de sua execução e avaliação.
Desse modo, o trabalho empírico com a pesquisa de campo que examina
determinado projeto social de implementação da proteção pretendida
juridicamente, apresenta-se como uma resposta ao estudo, pois traz a lume a
realidade prática, aproximando o estudo, das necessidades sociais em pauta.
Percebeu-se que o Serviço Sentinela, enquanto projeto social de
implementação de políticas públicas de atenção aos infantes vitimizados pela
violência intrafamiliar, no Município de Rio Pardo, atende de maneira satisfatória
ao desiderato a que se propõe, como relata a maioria dos respondentes que
qualificam como ótimo ou bom o atendimento recebido no Serviço.
No Serviço Sentinela são atendidas mais vítimas do gênero feminino, com
idades que variam dos sete aos onze anos. Sendo que em relação à origem étnica
dos usuários do Serviço Sentinela, vítimas de violência intrafamiliar, encontra-se a
etnia branca com 20 usuários (47,6%) em primeiro lugar, seguida da etnia negra
com 16 (38,1%) usuários; a etnia parda com 05 usuários (12,0%) e sem saber
identificar a etnia apenas 01 usuário (2,3%).
Verificou-se, também, que o nível de renda familiar das vítimas de
violência intrafamiliar, atendidas no Serviço Sentinela é baixo, pois conforme
informações obtidas a partir do questionário aplicado, a maioria sobrevive com até
um salário mínimo, ou seja, 27 usuários (64,3%), enquanto 15 usuários (35,7%)
sobrevivem com um a três salários mínimos.
Sabe-se que a violência doméstica está presente em todas as classes
sociais, no entanto, pelos resultados obtidos nesta pesquisa, vê-se que é nas
classes menos favorecidas que assume maior visibilidade. Dessa forma,
evidenciou-se fatores como a pobreza, más condições de habitação, desemprego,
baixa remuneração, a presença de drogas e alcoolismo. Esses são alguns dos
fatores de vulnerabilidade e possíveis geradores de violência intrafamiliar.
Configurou-se o tipo de violência intrafamiliar entre as vítimas do Serviço
Sentinela, porque a maioria dos respondentes confirmou serem familiares os
agressores dos infantes atendidos, ou seja, em percentuais tem-se que 26,3% dos
agressores são os próprios pais dos infantes, 14,3% são padrastos, 7,2% são
irmãos, 7,2% são tios, 4,7% são avós e 12% estão na categoria de outros
familiares. Sendo assim, entre esses familiares, a maior referência de agressões
partiu dos próprios pais, não sendo verificado nenhum caso entre as mães. O
padrasto vem em um segundo momento, seguido por outros familiares não
especificados. E com menos casos de agressões, mas assim mesmo existentes,
encontra-se os irmãos e tios, e, por último os avós. Dessa forma, a pesquisa veio
confirmar o que a literatura apresenta, ou seja, que a violência contra crianças e
adolescentes geralmente acontece no meio familiar.
Assim sendo, no ambiente em que a criança e o adolescente deveriam
receber apoio, carinho, afeto e educação é onde eles encontram seus agressores.
Rompendo, assim, com o vínculo familiar e sentimental que possa haver no
contexto familiar. Essas crianças e adolescentes, muitas vezes, irão encontrar o
afeto que não vivenciaram em seus lares, no seio de sua família biológica, em
outras pessoas, ou mesmo o apoio para crescerem e se desenvolverem de uma
forma mais digna. Para tanto, tem-se que a prevenção ainda é a melhor medida a
ser buscada para o combate à violência intrafamiliar contra a criança e o
adolescente.
As alternativas de prevenção à violência contra crianças e adolescentes
encontram-se configuradas na educação, na moradia digna, no acesso à saúde
pública, na geração de empregos entre outras.
Sendo assim, a escola pode auxiliar, ainda, no aumento da auto-estima e
da auto-eficácia, por meio de oportunidades que requeiram habilidades sociais, do
relacionamento com o grupo de iguais, e de situações que discutam valores,
normas e regras. As relações de hierarquia presentes no contexto da escola
devem ser identificadas e avaliadas segundo seu potencial de risco ou proteção
para o desenvolvimento infantil.
No que tange à moradia, tem-se visto algum investimento por parte de
governos locais, com verba destinada pelo governo federal para a construção de
moradias populares. Porém, frente ao grande avanço demográfico que se percebe
em várias cidades do país, incluindo Rio Pardo, o número de moradias destinadas
à população de baixa renda é muito pequeno. A falta de moradia é inconstitucional
e fere o princípio da dignidade humana. Assim, a revolta que essa falta gera
implica o aumento do número da violência, seja ela intrafamiliar ou não.
Quanto à saúde, o governo, tanto local como federal, deve investir mais
capital no orçamento em prol da saúde pública. É fato que já existe o Programa de
Saúde da Família, com vários agentes de saúde visitando os lares mais carentes,
de acesso ao atendimento em Unidades, ambulatórios e hospitais. Mas, ainda, é
incipiente o alcance desse Programa.
Uma das alternativas de prevenção e combate à violência intrafamiliar é a
redução da pobreza. Como se verificou na coleta de dados da pesquisa, grande
parte das dificuldades das famílias dos usuários do Serviço Sentinela é o
desemprego. Atualmente, o nível de desemprego, não só no Município de Rio
Pardo, mas em todo o país e, mesmo no exterior, é alto. Isto pode acarretar uma
série de problemas, inclusive a violência intrafamiliar.
Nesse sentido, o art. 88 do ECA traz as diretrizes da política de
atendimento à criança e ao adolescente por parte do Município e também da
sociedade civil. Dessa forma, o espaço local deve implementar políticas públicas
de atendimento às famílias no que tange ao desemprego, promovendo condições
para que os responsáveis pelos infantes tenham um emprego digno para o seu
sustento e amenização da violência intrafamiliar, pois o Município é um espaço
extraordinário para a implantação de políticas públicas que visem à prevenção e
combate da violência intrafamiliar contra crianças e adolescentes.
Ao questionar sobre a temática políticas blicas, deve-se ter em mente
que essa não é uma atividade exclusiva do Estado, sendo necessária uma maior
participação da sociedade no sentido de que auxiliem na escolha de tais políticas
a serem implementadas, surgindo, assim, a idéia de uma gestão pública
compartida. Portanto, somente através de uma interlocução mais ampla entre
sociedade civil e Estado é que será possível lograr uma perspectiva de controle,
decidibilidade e executoriedade da gestão pública de interesses sociais.
A violência no núcleo intrafamiliar tem sido objeto recorrente de
preocupação do moderno legislador, conforme se pôde constatar através da Lei
11.343/06 (Lei Maria da Penha), a qual, na mesma senda da Lei 8069/90 (Estatuto
da Criança e do Adolescente), cumprindo com os compromissos assumidos pela
Carta Magna de 1988, vem a se constituir em eficiente meio de combate aos
verdadeiros e abusivos ataques aos direitos de crianças e adolescentes, ataques
estes que acabam por acontecer muitas vezes no núcleo familiar, justamente a
esfera de convivência básica e estrutural. Esta lamentável contradição entre
violência e núcleo familiar é objeto específico deste opúsculo, o qual visa trazer à
luz da discussão acadêmica o tema, eis que o núcleo familiar, por ser estrutura
basilar de proteção, deveria constituir-se a salvaguarda primeira contra qualquer
ato de violência e opressão, jamais o lugar onde, de modo ilícito e lamentável
ocorre a prática do ato nocivo aos direitos das crianças e dos adolescentes,
muitas das vezes praticados exatamente por aquelas figuras às quais a lei atribuiu
o papel de garantidores e fomentadores de um desenvolvimento saudável, quais
sejam os pais e parentes próximos.
A noção e a forma da família vêm se modificando através do tempo,
porém seu papel historicamente tem sido preservado, qual seja, o de lugar seguro
para a formação de indivíduos saudáveis e aptos para o convívio social. Tal
desiderato somente será definitivamente atingido quando as formas de violência
contra seus membros em formação (crianças e adolescentes) puderem
efetivamente ser alijados de seu meio, com crianças e adolescentes colocados a
salvo de toda a forma de violência intranuclear. É um desafio real, a ser
enfrentado e vencido por toda a sociedade que se propõe a evoluir, não se
podendo conceber vitória efetiva sem a participação e a interação dos segmentos
públicos (em seus vários níveis) e privados da sociedade. O Serviço Sentinela tem
se mostrado um bom exemplo de cooperação e enfrentamento racional da
questão.
A violência é fenômeno multifatorial e multifacetado, conforme
detalhado anteriormente, portanto sua solução e seu enfrentamento devem
obrigatoriamente ser objeto de ações plúrimas, em especial do setor Estatal, o
qual, através de políticas públicas (em ação concatenada com o terceiro setor)
deve não enfrentar a questão da violência, como fruto de ampla árvore mas
também e principalmente a estruturação familiar, raiz e origem maior do problema.
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ANEXO
Anexo A - Questionário a ser respondido pelo(s) pai(s) ou responsável(veis)
pelo menor que utiliza(zou) o Serviço Sentinela no Município de Rio Pardo
a) Caracterização do usuário/Faixa Etária:
( ) 0 a 6 anos de idade
( ) 7 a 11 anos de idade
( ) 12 a 15 anos de idade
( ) 16 a 18 anos de idade
b) Caracterização do usuário/Gênero:
( ) Feminino
( ) Masculino
c) Caracterização do usuário/Raça:
( ) Branca
( ) Negra
( ) Parda
( ) Não sabe identificar
d) Renda familiar do usuário:
( ) até 1 salário mínimo
( ) 1 a 3 salários mínimos
( ) mais do que 3 salários mínimos
e) Vínculo do agressor com o usuário do Serviço Sentinela
( ) pai
( ) mãe
( ) padrasto
( ) madrasta
( ) irmãos
( ) tios
( ) avós
( ) outros familiares
( ) outros
f) Escolaridade da criança ou adolescente atendido pelo Serviço Sentinela
( ) Educação Infantil
( ) Primeira a Quarta Série do Primeiro Grau
( ) Quinta a Oitava Série do Primeiro Grau
( ) Segundo Grau
g) Escolaridade do agressor
( ) Não alfabetizado
( ) Educação Infantil
( ) Primeira a Quarta Série Fundamental
( ) Quinta a Oitava Série Fundamental
( ) Ensino Médio
( ) Curso Superior
( ) Não informado
h) Ano em que foi encaminhado ao Serviço Sentinela:
( ) 2006
( ) 2007
( ) 2008
i) Antes do encaminhamento ao Serviço Sentinela, recebeu atendimento por outro
serviço especializado?
( ) sim
( ) não
j) Este atendimento foi considerado suficiente para as suas necessidades:
( ) sim
( ) não
l) O Serviço Sentinela possui um atendimento:
( ) ótimo
( ) bom
( ) regular
( ) ruim
( ) péssimo
m) Quais são as principais dificuldades enfrentadas pela família do usuário do
Serviço Sentinela?
( ) relacionamento entre os membros
( ) desemprego
( ) alcoolismo
( ) dependência química
( ) outras
n) Condições habitacionais:
( ) ótimas
( ) boas
( ) regulares
( ) péssimas
o) A partir de que idade iniciaram as agressões ao infante usuário do serviço?
( ) 0 aos 06 anos
( ) 07 aos 11 anos
( ) 12 aos 15 anos
( ) 16 aos 18 anos.
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