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1.2. Os Valores do Patrimônio
A primeira tentativa de estruturação sistêmica dos valores ligados ao patrimônio foi feita por
Reigl (1999), que estabeleceu uma teoria a partir de dois pontos básicos: os valores de
rememoração, ligados ao passado, subdividindo-os em para a memória, para a história e de
ancianidade; e os de contemporaneidade, que dizem respeito ao presente, separando-os entre o
artístico (relativo e de novidade) e do uso.
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No entanto, a atribuição de valores, contempla uma
gama de aspectos que invariavelmente relaciona-se ao tempo e ao meio. Assim, já na segunda
metade do século XX, Argan (1993, p.228) afirmou que se conserva o que tem valor. Contudo,
perguntou-se: “Mas o que tem valor? E que tipo de valor?”. Buscando responder esta questão,
colocou que a atribuição de valores é feita por todos os homens, e não apenas pelos técnicos, e
que o valor de uma cidade depende do que lhe é atribuído pelo grupo social.
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Mais além, ao abordar o valor conferido ao patrimônio urbano, Choay (2001) trata do que chama
de figuras: a memorial, a histórica (com os papéis propedêutico e museal) e a historial. Como
figura memorial, a autora cita Ruskin
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, ao dizer que a cidade desempenhou, ao longo da história,
mesmo que isso não tivesse sido percebido o papel de rememoração. O papel propedêutico da
figura histórica decorre da possibilidade de estudo da forma e do espaço da cidade que ficou para
trás, o que se assemelha ao valor cognitivo. Já o papel museal representa o caráter singular, o
valor histórico e artístico da cidade antiga, que estão ameaçados de desaparecer e, por isso,
deveriam ser protegidos. A autora considera a última figura, a historial, como a síntese e
superação das anteriores, que vigora contemporaneamente. Contudo ressalta, que os conjuntos
urbanos antigos possuem valor de uso e museal e, por isso, devem ter uma nova destinação que
promova a integração à cidade, porém a nova utilização deve ser compatível com sua
preservação.
Em complemento Lacerda (2002) trata dos valores intangíveis ou subjetivos, que oscilam do
artístico e histórico ao da memória e identidade
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, e principalmente, acrescentou o valor
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O que mais interessou a Riegl foi o valor de ancianidade, considerado por ele como característica mais importante
para a proteção do patrimônio, e do valor de uso, que, para o autor, entrava em conflito com o valor do antigo, por
promover uma série de adaptações para uma nova utilidade funcional.
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O autor tratou dos valores estéticos e históricos, considerando-os como duas faces de um objeto, pois a atribuição
do valor estético a um monumento, muitas vezes, se dá em função dele ter subsistido pelo valor histórico: ele passa
então a integrar a estética da cidade. O inverso também ocorre, pois aquilo que subsiste em razão do valor estético
passa, com o decorrer do tempo, a ter também valor histórico.
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Ruskin que, no final do século XIX, tratou do valor de reverência, onde, para ele, a arquitetura é a única forma de
conservar uma ligação com o passado que é integrante de nossa identidade, o que faz com que o patrimônio
desempenhe, no presente, um papel memorial.
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Ao valor artístico Lacerda (2002) adota os conceitos de Riegl, de valor de arte absoluto e relativo, que varia
segundo o avaliador; já o valor de antiguidade, se manifesta pelo aspecto não-moderno do patrimônio; e o valor
histórico como representante de época, de modos de vida e características que não podem ser mais reproduzidas; no
cognitivo, o patrimônio é o meio de transmissão de conhecimento; no cultural, se refere a identidade coletiva,
estruturada em função da consciência do passado; de opção, um valor que remete ao uso possível no futuro; e por
fim, o de existência, diz respeito ao simples fato de um bem existir, dada a sua singularidade e a impossibilidade de
reverte-lo ao seu estado original caso seja modificado.