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tros, silentes, se vêem, se julgam e se perdoam” (RIBEIRO, 2001, p. 160); “Só há fartura de
água, de céu, de luz” (RIBEIRO, 2001, 167); “Tira algum gozo recôndito desta mirada furti-
va, roubada, envergonhada. É a primeira vez que vê, desde rapaz, uma mulher em pêlo, nua,
nuela, pelada. É a primeira vez na vida que vê uma fêmea despida, peludíssima, em armas”
(RIBEIRO, 2001, p. 185); “Saem agora, clarinhas, matinais, resplandecentes” (RIBEIRO,
2001, p. 265); “Debaixo da minha luz: tecnicolor, cintilante, luminoso” (RIBEIRO, 2001, p.
285); “O corpo todo está aceso, pronto, de alcatéia. A cabeça erguida, ameaçante, vigilante. O
tronco gira livre sobre as pernas, os braços se abrem com gosto, as mãos e os dedos são bons
para apalpar, para acariciar, bolinar” (RIBEIRO, 2001, p. 285); “Logo virão as chuvas, e vai
haver muita folha nova, folha verde, folha vermelha” (RIBEIRO, 2001, p. 304); “Tratando
quantos doentes há, quantos peçam, quantos queiram” (RIBEIRO, 2001, p. 304); “Anulados
no próprio convívio estereotipado: ‘bom dia’, ‘passe bem’, ‘muito prazer’” (RIBEIRO, 2001,
p. 328); “Tudo seria repartido para que cada família tivesse sua roça, sua vaca, seu cavalo”
(RIBEIRO, 2001, p. 335).
Mesmo em momentos de pura repetição enfática de vocábulos e expressões, aparece
com freqüência a forma trinária, como nesta epizeuxe: “Quero que o meu filho que cresce
dentro de mim seja igualzinho, igualzinho, igualzinho a Jaguar” (RIBEIRO, 2001, p. 330).
O que se verifica, sempre, é, como já disse acima, uma linguagem catóptrica, que se di-
namiza a partir de um processo de duplicação estilística. Se não se expressam apenas semanti-
camente, as duplicações mostram-se ainda por paralelismos fonéticos, em que são os sons que
se repetem, aliando as palavras e irmanando-as. Eis alguns casos: assonâncias e aliterações em
“Quem do mando é o dono manda em tudo, mas não manda na sua sina” (RIBEIRO, 2001, p.
78); “Lá estão eles revivendo o vivido: constantes, contentes” (RIBEIRO, 2001, p. 331); “O
Iparanã, contido a custo no seu leito, corre vertiginoso, vibrante e vermelho como uma leoa
suçuarana” (RIBEIRO, 2001, p. 351); aliterações e rimas imperfeitas em “O cerimonial vai
chegando ao máximo para alcançar o término” (RIBEIRO, 2001, p. 99) e “Isaías se concentra,
mascando seu talo, calado” (RIBEIRO, 2001, p. 311); rimas coroadas em “Obrigado, Lilith,
Lilithinha minha” (RIBEIRO, 2001, p. 311).
Em trechos mais desenvolvidos, as figuras de harmonia se combinam numa profusão de
sons, uma música de caos, como neste excerto: “Na cara, o sorriso mais claro. Em todo o cor-
po as alegrias raiadas de urucum e jenipapo. Na cabeça, esvoaçante, a enorme cabeleira ne-
gro-azulona, provocante. A franja cobrindo a boca. As pernas enfaixadas com embiras, abom-
badas, barrocas”; “Brotos, renovos da vida que desabrocha, renova” (RIBEIRO, 2001, p.
265); ou ainda: “Que fazer? Se submerjo e confluo, emerjo com os mais, confundido. Fico.
Mas, se estaco, me destaco no instante de glória, mas me acabo. Passo. Esquecido? Ignora-