Eco) quanto na distopia (“sentido caricatural”), a intenção crítica manifesta por meio da
projeção:
Obviamente, a intenção primária de Thomas More ao escrever Utopia era produzir uma
comunidade ideal. Todavia, assim que nos detemos sobre o assunto, somos capazes de
perceber que o que More realmente tinha em mente era o desejo de criticar a sociedade
de sua época, ou seja, a organização social inglesa do século dezesseis. (...) O trabalho
de More pretende denunciar e criticar os abusos sociais ingleses. Levando tal fato em
consideração, eu proponho que a insatisfação do autor com a sociedade de seu próprio
tempo, ou quaisquer de seus aspectos, conforme evidenciado por meio de sua crítica
social, em qualquer forma que ela possa aparecer, como sátira, ironia, zombaria,
comparação, contraste ou ataque direto, deve ser considerada a premissa básica a marcar
a literatura utópica e distópica.
42
Santee, mais adiante, discerne com clareza a utopia da distopia, ponto que
interessa especialmente a este trabalho. Ele observa que a distopia “critica e mostra os
prováveis resultados que os aspectos negativos [da sociedade empírica] devem fazer
surgir”
43
. A forma que a crítica social toma na distopia é posta em oposição à do gênero
utópico, que “além de criticar, apresenta soluções para as questões percebidas”
44
.
Mostra-se tênue a separação entre utopia e distopia, como se vê. Ciente disso,
Santee propõe:
[U]ma das principais diferenças entre a literatura utópica e a distópica se encontra na
impressão do autor: se ele acredita que está descrevendo uma sociedade melhor, ele está
criando utopia. Neste caso, as qualidades distópicas que aparecerem são involuntárias;
contudo, se ele acredita que está descrevendo uma sociedade repulsiva, o que ele está
criando é uma sociedade distópica. Neste caso, ele força as situações e os aspectos a
serem repulsivos, então eles não são de forma alguma acidentais. Em ambos os casos, a
crítica da sociedade é um elemento central.
45
42
Tradução de “Of course [Thomas More] primary intention in writing Utopia was to produce an ideal
commonwealth. Nevertheless, once we begin to dwell upon the matter we are able to perceive that what
More really had in mind was the desire to criticize the society of his time, that is, the sixteenth-century
English social organization. (...) More’s work intends to denounce and criticize the English social abuses.
Taking this fact into consideration I propose that the author’s dissatisfaction with the society of his own
time, or any of its aspects, as evinced through his social criticism, in whichever form it might appear, i.e.:
satire, irony, mockery, comparison, contrast, or direct attack, be considered the basic premise to mark
utopian and dystopian literature” (SANTEE, 1988, acessado em 14/12/2005).
43
Tradução de “criticizes and shows the probable results the negative aspects might arise” (SANTEE,
1988, acessado em 14/12/2005)
44
Tradução de “besides criticizing, presents solutions to the issues perceived” (SANTEE, 1988, acessado
em 14/12/2005).
45
Tradução de “one of the main differences between utopian and dystopian literature lies in the author’s
impression: if he himself believes he is describing a better society, he is creating utopia. In this case the
dystopian qualities which might appear are involuntary; however, if he believes he is describing a
63