Os termos essenciais que configuram o absurdo são três: homem, mundo e a
contradição entre ambos. A junção desses termos Albert Camus chama de “singular
trindade”
18
(CAMUS, 1965b, p. 120). Temos, em primeiro lugar, o homem com sua
exigência de clareza e de unidade, em segundo lugar, um mundo irracional (CAMUS,
1965b, p.117), “um universo indizível, no qual reinam a contradição, a antinomia, a
angústia ou a impotência” (PIMENTA, 2004, p. 47) e, em fim, em terceiro lugar, temos
o confronto entre o mundo indizível e o desejo de clareza e unidade. Portanto, a trindade
é, em si mesma, contradição (CAMUS, 1965b, p. 109). Não compreendemos
19
o mundo,
nada está claro, o apetite de clareza não é saciado em um universo onde reinam o caos e
a contradição. Um mundo compreensível é um mundo confiável, um mundo familiar,
“um mundo que se pode explicar, ainda que com más razões é um mundo familiar”
(CAMUS, 1965b, 101), assegura Camus em seu ensaio sobre o absurdo. A experiência
encontra o caos onde almeja encontrar a ordem. De um lado, o homem, de outro, a
natureza, que nessa dualidade se converte num paradoxo, por isso é afirmando no Mito
que “querer é suscitar paradoxo” (CAMUS, 1965b, p 112). Portanto, o espírito busca
unidade e encontra o absurdo.
O espírito, despertado por essa exigência, procura e nada encontra além de
contradições díspares. [...] Mas esses homens proclamam que nada é claro,
tudo é caos, os homens só mantém sua clarividência e o conhecimento preciso
dos muros que o cercam (CAMUS, 1965b, p. 117).
18
Trindade é um termo de cunho religioso que declara Deus como sendo uno e trino ao mesmo tempo, o
que “é impossível”, “é contraditório” (CAMUS, 1965b, p.120), assim como o absurdo. No livro Albert
Camus e o teólogo, Howard Mumma, mostra que Deus para o franco-argelino não é algo resolvido, é um
problema filosófico. Camus não ignora o pensamento cristão, a prova disso é o constante uso de termos
religiosos em sua obra: “o absurdo é um pecado sem Deus” (CAMUS, 1965b, p. 128), “transcendência”
(CAMUS, 1965b, p. 122, 131), “singular trindade” (CAMUS, 1965b, p. 120), além seu de seu trabalho
sobre Plotino e Agostinho, Métaphysique chrétienne et néoplatonisme, para obtenção de Diplôme
d’Études Supérieures.
19
“Compreender é antes de tudo unificar” (CAMUS, 1965b, p. 110).
25