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solenidades, sobretudo ao “silêncio solene” e seu momento de representação na festa. “Há
também uma forma de expressão que corresponde e subordina-se à comemoração e à festa.
Fala-se de expressões solenes. Mas muito mais ainda que a expressão solene, pertence o
silêncio à solenidade da festa.”
237
Esse é um tipo de silêncio que se reflete na interioridade do sujeito, ele pode ser
observado quando realizamos uma experiência religiosa ou artística na qual experimentamos
um silêncio que nos toca a alma. Trata-se de um “silêncio solene” que se reflete pelo processo
impactante ocorrido quando de súbito nos deparamos com a religião e a arte. “Podemos dizer
do silêncio que ele como que se espalha, e assim acontece com qualquer um que é posto de
repente diante de um momento artístico ou religioso.”
238
O tempo da festa encontra raízes
intimamente relacionadas com a dimensão religiosa, nos momentos de comemoração e
celebração da festa a comunidade é convocada a reviver e a representar uma espécie de tempo
sagrado e, segundo Gadamer é “um tema teológico o que a festa e o tempo da festa são
propriamente”.
239
A experiência temporal que realizamos tomando parte no evento festivo é sempre
uma participação no tempo presente, uma festa nunca é a mesma, ela se modifica a cada nova
comemoração. A periodicidade característica do calendário festivo com o retorno das
comemorações não é, portanto, uma mera repetição do tempo, visto que a “festividade é,
antes, a comemoração, que é um presente sui generis”.
240
O tempo aqui é por assim dizer
diferenciado em sua sucessão, ele se comporta como um ente que está em devir.
Segundo o autor, as conceituações sobre o “dia da festa” no pensamento grego antigo
remontam à reflexão sobre o “ser do apeíron”.
241
A celebração da festa abriga uma
radicalidade existencial concreta, ela é como um ente temporal e nesse sentido é sempre
diferente, ou seja, uma festa nunca é igual a outra. Esse tipo de reflexão sobre o dia da festa
não se refere ao tempo como uma mera sucessão, tal qual experienciamos como tempo
comum, mas como um tempo de historicidade própria.
Quando pensadores originários pensavam o ser, isto é, a presença poderia parecer-
lhes o que era seu objeto à luz da comunicação sacral, em que se mostra o divino?
Para o próprio Aristóteles, a parusia do divino é, não obstante, o ser mais autêntico,
a energeia, não restringida por nenhuma dynamis (Met., XIII, 7). Este caráter
237
Hans-Georg GADAMER, A atualidade do belo: a arte como jogo, símbolo e festa, p. 62.
238
Ibidem.
239
Ibidem, p. 61-2.
240
Idem, Verdade e Método: traços fundamentais de uma hermenêutica filosófica, p. 204.
241
“Aristóteles, em sua caracterização de ser do apeiron, portanto, em sua relação com Anaximandro, refere-se
ao ser do dia e da competição, portanto, da festa. (Physica. III, 6,206 a 200). (...) No Parmênides 131 b, de
Platão, Sócrates procura ilustrar a relação da idéia com as coisas, com a presença do dia que é para todos.”
(Ibidem, p. 205, nota 225).