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TRATADO
DA
PROVA EM MATERIA CRIMINAL
ou
EXPOSIÇÂO COMPARADA
DOS PRINCIPIOS DA PROVA EM MATERIA
CRIMINAL, ETO.,
DE SUAS APLICAÇÕES DIVERSAS NA ALLEMANHA F
RANÇA,
INGLATERRA, ETC.
PELO
DR C.J.A.MITTERMAYER
PRESIDENTE DA
CAMARA DOS DEPDTADO , DO GRÂO-DUCADO
DE BADEN, PROFESSOR NA UNIYEBSIDADR DE HEIDELBERG, MEMBRO
f'OBRESPONDEN'TE DO INST1TUTO DE PRANÇA, l.TC.
TRADUZIDO PELO ADVOGADO
ALBERTO
ANTONIO SOARES
NA LIVRARIA DO EDITOR
A. A. DA CRUZ COUTINHO
75 RUA DE S. JOSÉ 75
1871
DR C.J.A MITTERMAYER
ALBERTO ANTONIO SOARES
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TYPOGRAPHDE FRANCISCO ALVSS DE SOUZA
118 RUA DO GENERAL CAMARA 118
I
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ADVERTENCIA DO TRADUCTOR
Um livreiro desta côrte, corn quem temos relações, pedio-nos
com urgencia a traduâo desta monumental obra de Mither-
maier, da versao fnnceza de C. A. Alexandre para o nosso
idioma ; pois que estando esgotada a edâo dessa versão, e nao
podendo elle reimprimi-la, não poderia servir aos seus numero-
sos freguezes, senão imprimindo uma nqva traduâo desta im-
portante obra em nosso idioma.
Com o intento de lhe ser util, e aos 0que precisas da obra,
en-carregamo-nos desta tarefa.
A urgencia exigida, e outros trabalhos importantes que
actualmente prendem a nossa atteao, não permittirão que po-
lissemos o nosso trabalho de modo desejavel no espo de pou-
cos mezes, e nem que lhe additassemos grande peculio de notas
com o desenvolvimento correspondente, relativas à economia
do novo processo, e à nossa organisa çao judiciaria.
Pedimos indulgencia, portanto, ao publico illustrado, e desde
jà nos compromettemos a brevemente dar à luz uma segunda
ediçao desta versao acompanhada das referidas notas.
Conservamos as importantes notas do traductor francez (*),
e addiccionamo-lhes algumas nossas (S).
Kio de Janeiro, 20 de Agosto de 1870,
INDICE
Quart a parte.
Da conûssâe do iudiciaUo.
CAPITULO XXXI
Molivos <la prova por confissào . •.................................. » ••
CAP1TUL0 XXXII
D* economia da confissào o das suas condlçScs sogundo adifleronça
das legislaç.Qes o dos principios constitutivos do procusso criminal
CAPITULO XXXIII
I Condiçôes requeridos. quanto ao fundo. em materia de confissào . I
CAPITULO XXXIV - [
Das condiçôes da confissào quanto â forma. . . ..................................
CAPITULO XXXV
Dos effeitoa da conflssào em relaçuo ao corpo de delicto partieular-
mente.'.................................................................................................
I CAPITULO XXXVI
Da ccnlissào qualificada (ou limitada) ................... - >.....................
CAPITULO XXXVII
Da retraetaftâo da confissào..............................................................•
Qulnta parte.
Da prova te^temunlial.
CAPITULO XXXVIII
Da prova testemunhal cm gérai. . . , .. ............. .
CAPITULO XXXIX
Organisaçâo da prova testemunhal, sogundo a divevsidade das le-
IV
.PAO CAPITULO XL
Doconstrangimonto dodopoimnito .1/,1, . ? ... ; .... .
CAPITULO XLI
[.' que iricroccm as tostcmunhns. — Dos se us divcrsos grùos, e
mais espccialinonla das tcstomanlias denominadas incapazsg . .
CAPITULO XI.II
Das testa») u alias suspeitas . . . . . ' . . , . , ......................... . . .
CAPITI'LO XLIII
Dos moios do aprcciito da detida ds tcstemitnhas .....................
CAPITULO XLIV
Dos fundainoutos do podcr do tostcmuulio.......................................
CAPITULO XLV
Do elToito do tostemuuho . . • • ........................................;
CAPITULO XLV1
Do offoito do depoimento dodo por militas tosterouuhas saspeitas
CAPITULO XLVI1
Da coatradicçao dos dopoimontos.............................. .' .
>
.'T. .
Soxta parte. Do
prova por titulos o peças do convic^âo
CAPITULO XLVIII Eui, que consiste a
prova por titulos e peças d? convieçào. . f
I CAPITULO XLIX 9
Das divarsas espocios do titulos.......................................................
CAPITULO L
Condiç.ôos extrisscas da producçào dos titulos. . .......
CAPITULO LI
>
Vèriflfcaçâo da veracidado dos titulos. ...................... "•
GAPITULO LU
v
-i cllbito do tiiiulo yuantu ao> sou conteïulo, »_• . . t'ijt • •
. v
IA01NAS
Set i ma parte
Da prova polo concitrso de circumstancias
CAPITULO LUI
C.iraet'-r de prova circumstancial........................ ..-i ............................. 207
CAPITULO LIV
Sj'stemas das diversas legislaeôas em mate ri a de prova arti
ficiel, .s.'..................................................................................................
%
gi2
- CAPITULO ÏJV Dos indicios c presnmpçôen.
Das diverses cspeeies de indicios. 830
CAPITDLO LVI
Indicios da innocencia. Contra indicios .......................*..'•... 287
CAPITULO LVfl
Investi gaçàes dos indicios. . . *'JW&HJrJ •• V*..............................Ç 229
r~U CAPITULO T.VIII
Avaliaçâo do força probatoria dos indicios .....'...,.., 242
CAPITULO LIX Da força da prova artifichl cm
thoso gérai. . J% . . .*..*«,. . .- 245
CAPITULO IX Da força probatoria dos
indicios. segundo as fontes do direito cotn-
fflum............... $r .............................................................. ... .. .W 253
CAPITULO LXI Systenia das novas lois allemàs
em materia de prova por indicios. 265
Oltava parie. Do
ronenrso das di versas provas ou da composta.
CAPITULO LX1I '
Definiçào da prova composta....................................................... . . 275
CAPITULO LX1U.
Dos oifeitos da* prova composta as segnndo différentes legislaçôes
*
a».
VI
l'AGlNAS
Noua parte.
; * s?
Da prova imperfeita.
CAPITULO LXIV "
Quai o valor da prova imperfeita no processo ci'iminal ................... 283
CAPITULO LXY I
Da absolviçào de instancia (absolutio ab instantia] ........................ 285
CAPITULO LXVI
Do juramento. coma complemcnto da prova imperfeita; do seu
deferimento; e do juramonlo suppletorio em particulav . .... 297
CAPITULO LXV1I
Do juramento pnrgatorio ; da sua origom e dos sous progressos.
Quai o juizo que a sou respeito se dove fazer, ............................ 300
CAPITULO LXVIII
Da applicaçâo do juramento purgatorio no dlreito coramnm allemâo 836
CAPITULO LXIX m
Das penas extraordinarias........................ . .'.................................. 309
M CAPITULO LXX
Dos meios de segurança permittidos no caso de prova incsmnleta . 8231
Cosci.usXo.......................................................,............................ 328
RB-
PREFACIO DO TRADUCTOR FRANCEZ
O fini àa lei pénal é a repressâo do delicto, mas antes de
puni-lo, é mister verificar a sua existencia ; dahi a necessidade
da prova.
Como fazer a prova? Como procurar a justiça os meios de
uma apreciaçâo certa do facto, e da intençâo, qualificadora do
crime ? Como dar ao niesmo tempo, à ordem social lesada as
garantias de uma infallivel repressâo, ao cidadao accusado as
garantias dévidas ,â liberdade que a lei social promulga, ao
homem, innocente talvez, as dévidas à sua segurança indivi-
dual ? Problemas immensos, ciija soluçao comprehende a orga-
nisaçâo de todo o processo pénal !
Com rao se disse, que a lei, que fixa o modo* e a taxa da
pena, é menos importante talvez do que a lei do processo, que
termina as formas necessarias para assegurar sua applica-
çao. Quando a prova é manifesta, a pena é sempre uma con-
sequencia necessai ia, e portante ganha com isto a causa da
justiça. Quando pelo contrario a prova é mal ordenada, a sen-
tença, em lugar da verdade, de décrétai- o erro, em lugar do
culpado, .condemnar o innocente ;, pôde fazer nascer em todos
os espiritos a descjnfiança, e nelles destruir o respeitoâ lei em
seu principio, que é a base sagrada da ordem publica.
Em 1836 a a en demi a das sciencias moraes e politicas propoz
para objecto do premio extraordinario a seguinte questSo : «
Déterminai' os mei'>s, com cujo amilio se pôde com mais cer-
teza estabclecer a verdade dos factos, que sâo o objecto dos deba-
tesjudiciarios, quer em materia civil, quer em materia criminal.;
comparar os diversos processo» empregados, para obier este re-
sultado, pelos povos civilisados e fazer conhecer os sens ineon-
venientes e vantagens. Este programma, quanto a parte cri-
minal ; anteriormente tinha sido executado pelo sabio pro-
fessor M. Mittermaier.
VIII
Julgâmos que séria coupa util - fazer em França conhecido o
seu livro a respeito do quai um critico distincto (*) disse que
podia servir ao mesmo tempo de modelo e de lâo aos legislado-
res, e aos jurisconivitos.
Em uraa epoca em que as soluçOes até aqui dadas pela his-
toria
9
e pelas outras sciencias politicasr, parecem dispostas a
soffrer modificaçsës parciaes ou totaes, ou novas consagraçoes,
importa principelmente pôr em relevo, para o legislador, o
principio philosoph'ico das jurisdicçOes populares e suas con-
sequencias légitimas com relaç&o a lei da prova, e examinar
summariamente no dominio datheorîa, e dos factos, quaes os
modos, quaes as formas, que correspondent ao fim da justiça
pénal.
' Parece-nos que este livro offerece vasto campo de estudo ao
jurisconsnlto,ao juiz, ao magistrado instructor principalmente,
que tem pormissao investigar e fornecer os materiaes da prova.
A lei denossopaîz deixa e deixarâ sempre vasta margem â
consciencia do juiz ; mas dando-lhe por unica regra a voz da
sua convicçâo intima ella quer que esta seja razoavel, e que se
funde sobre graves motivos, dos quaes possa dar contas à sua
propria consciencia, eraboranao as de ao publico. Dabi decorre,
paratodos os espiritos serios, a necessidade do exame das bases
fundamentaes da prova, das formas diversas da sua adminis-
traç'ao, e sobre tudo das regras de apfeeiaçâo que a lei, a lo-
gica, e a s5 experiencia recommendao. Neste sentido todoscom-^
prehenderào o alcanqe pratico
t
deste livro. Nossos deveres de
traductor exigiab- uma exactidao fiel na sua reproducçSo em
nossa lingua, e o leitor deve sempre terem lerabranCa, quando
encontrar algumas dissertaçoes que lhe pareçfto pertencer ao
dominio exclusîvo da jurisprudencià allemâ, que o autor teve
em vista n&o &6 expôr os 'principios da prova derivados dos"
pontos pbilosopbicos de direito, mas tambem investigar, e se-
(*) M. Oh. Uiraud. Bévue de législation et de jurisprudence. 1.19 Janvriei
1844. pag. 144.
«s».
-
#
guir as suas applicaçOes positivas tanto no passado como no
présente das principaes legislaçGes europêas- Negar as vanta-
gens de um tel systema, séria o mesrao que negar a sciencia
da legislaçao comparada.
AlAm disso, este livro forma uma especie de introduao a
uma obra mais complète, e mais desenvolvida. M. Mittermaier
publicou um tratado do Procmo criminal comparado, que
chegou à sua quarta ediçao. Actualmente publica um Tratado
de Direito pénal comparado, tendo apparecido muitos volu-
mes. Comecamos a traducçao destas obras, e se n&o houver
embaraço, esperamos cbegar ao cabo cora a nossa empreza, e
dotar a França cora um trabalho completo sobre a legislao
criminal comparada, do quai cora justo titulo a sciencia allema
p6de gloriar-se. Os alumnos das nossas escolas ahi acharao
um esboço dos estudos, que lb.es faite, se bera que nao possa
supprir inteiramente a palavra activa dos professores dos cursos
especiaes de legislao comparada : os magistrados, os juris-
consultes e os legisladores, ahi acharao reunidos por quem nao
é estranho a particularidade e alguma da sciencia, o quadro
methodico de instituOes seculares ou novas, cuja theoria e
historiaé mister conhecer, assim como os seus inconvenientes e
vantagens, para julga-las, aboli-las ou aperfeiçoa-las.
Sômente, para advertencia, lembraremos alguns esclareci-1
mentes que apresentamos sob a ferma de notas, sempre que os
julgamos utéis ao leitor, e concluindo, agradecemos cordial-
mente a M. Mittemaier o benevolo concurso que nos prestou ;
as addicçoes, que no3 remetteo manuscriptas, forao transcriptas
embaixodo texte, as quaes, pelas particularidades que encerrao
dao a obra um caracter de actualidade, que, sob o ponto de
vista historico, poderia ter perdido em parte, pois que a sua
publicaçao original teve lugar em 1834.
Reims, 5 de Marco de 1848.
2
*
PRBFACIO DO AUTOR
Ha muito que se deseja saber, se a lei allema procedeu coni
acerto organisât!do systematicamente as provas criminaes (*) [
questao que nao pôdé ser resolvida em terroos absolutos, por
exigir o profundo exame dos monumentos législatives, e da
praxe especial a cada estado. E' vendo-o funecionar que se pôde
julgar o systema, e dizer se a sua tendencia principal é a sal-
va-guarda da innocencia, se o seu fim exclusivo é a manifes-
tao da verdade, e se o mesmo se conserva fiel as regras sobe-
ranas, que .présidera a sua investigaçso, combinadas com as
nfto menos judiciosas da liberdade de consciencia do juiz. O
estudo deste problema conduz natuçalmente ao dos principios
fundamentaes do processo crimiual, ao das formas accusatoria
e inquisitorial, ao da influencia da publicidade do debate sobre
a prova ; e finalmente a investigar se as prescripçOes da lei
em materia de prova sao compativeis com a instituao do jury.
Nesta parte o autor nacla mais fez do que desenvolver a dou-
trina dos jurisconsultes inglezes, que tratarao da prova, de
Chitty, Philipps, Starkie, Russel, e (recentemente) Greenleaf.
As opinioes destes sabios bastao para fazer couhecer quaes as
idéas dominantes em um paiz, em que o jury te m raizes tâo
antigas.
{*) O systema das provas légats dominou tambem em França. A ordenaçao
de 1670 foi para este paiz, o que a Carolina e as lots locaes forâo, ha bem
pouco tempo, para a Ailemanha. O traductor, relativamente a antiga legisla-
çâo franceza, remette o leitor para a obra de Paustin Hel. Historia do pro-
cesso criminal, cap. 9, onde encontrarâ minuoiosidades précisas e complétas ;-
abstendo-se da comparaçào entre as legislôes, pois qne o seu estudo 86
mente offerece um interesse historico. Actualmente o movimento politico e
social, que tambem impelle a Ailemanha, sem duvida nella farâ necessaria-
meute triumptaar por toda a parte a instituiçao do jury ; a prova légal des-
apparecerà como desappareceu em França depois de 1789,
«
XII
0 autor tratou de recorrer as fontes philosophicas da theoria
das provas legaes, de sèguir os principios em todas as suas
applicaçOes, de colher as soluçOes que a experiencia fornece,
de examinar as tentativas de conciliaçao entre os diversos sys-
teraas, e fazer sobresahir as differenças entre o systema alle-
m&o, e o das legislaçOes ingleza efranceza. Espéra que os sens
esforços nâo serao totalmente infructuosos.
Heidelberg, Janeiro de 1864.
#
PARTE PRIMEIRA
r»a prova em materia orimlnal> e do sua organlsaçao aiversa, conforme
a sentença deva ser proferid» por juizes propriamente Alton
(letrados), on polos jurados.
CAPITULO.il
• IMP0RTANCIA DA PROVA NO PR0CESS0 CRTMINAL.
As leis que decretao penas contra os seus infractores, mesmo
as mais sabias, tornar-se-hiao inuteis, se os culpados, que per-
turbassem a paz publica, despresando os seus preceitos, nSo
fossem irremissivel mente condemnados aos castigos que ellas
annunciao. A unica consideraçao capaz de impedir a pratica
do crime, a unica e verdadeira garantia que a lei offerece a so-
ciedade, é convencer o ctilpado da impossibilidade de escapar
aos seus déctes vingadores e as penas que o delicto provoca.
Um crime nao punido origina dez outros novos, uma luta de-
clarada empenha-se entre o delinquente e a lei fraquissima-
Além disso, em todos os paizes em que a lei crirainal se mos-
tra rigorosissima (1) a consciencia publica a reprova, e a ex-
periencia demonstra, que os crimes augment&o-se sô pela razao
de que os delinquentes esperao, que o julgador antes quererâ
declarar a sua nao culpabilidade, do que accusar-se depois a si
proprio de ter cooperado para a applicaçao de uma pena
excessiva.
(1) Vide as particularidades curiosas forxiecidas por WakefleW no seu es-
cripto intitulado. Facts relating to the punishmmt of doath in the métro-p
0
Us
(Documentes relativos â applicaçSo da pena de morte na métropole.)
Londres 1831.
14
Em toda a sentença proferida sobre a culpabilidade de nm
accasndo é parte essencialj a que décide seo delicto foi com-
mettido, se o foi pelo accusado, e que circurostancias de facto
deterrainao a penalidade ; quando-estes diverses pont os sso affir-
mativamente resolvidos, a seguuda parte da sentença torna-se
corollarîo irirffiertiato da primeira ; ao juîz cumpfë stSntettte
applicar entaô a sancçao pénal ao facto provado.
Tambera, desde que uni povo chega a' comprehender o va-
lor das liberdades ci vis e indivïduaes, reconhece perfeita-
mente, que se pôde converter o processo criminal em peri-goso
instrumenta contra essas liberdades ; reconhece de sum-ma
importa ncia, que estejao sabiaraente reguladas as pres-
cripçoes legaes relativas à sentença, que se tem de proferir
sobre o ponto de facto ; e que finalmente tem tambem sobre os
seus Goncidadaos direito de vida e de morte aquell'es, que tem
por missao decidir, se sao elles ou nSo culpadôs. Vio-se subir
ao cadafalso muitas victimas immoladas pelo p'oder, sômente
por terem repudia'do as idéas entâo dominantes, e todavia con-
demnadas segundo pretendidas formas juridicas. Perdidas esta
vao logo que os juizes, encarregados de decidir da proce-
dencia ou improcedencia da accusaçîlo, proferiao o terrivel ver-
dietura de culpabilidade. Aos juizes de direito nada mais
cumpria fazer do que pronunciar, sangrando-lh.es o corâçao
talvaz, uraa condemnaçao capital.
Esta sentença que pronuncia sobre a verdade dos factos da|
accusaçao tem pof base a prova. Fornecer a destes factos, . tal é
a missao da accusaçao ; quanto ao accusado côrnpete-lhe
oontestar as provas adversas e sustentar as que o escusao. 0m
terceiro personagem, o jnia formador da culpa, estabelecea seu
turno a prova dos différentes factos decisivbs do processo ; e,
finalmente, os juizes baseao sua decisao sobre aquelles que
conaiderao demonstrados. Corao se vê,a parte mais importante
das prescripçOes legaes em materia de processo criminal versa
sobre a prova.
15
Essas prescripçôes, em qualquer legislaçao, referem-se : 1.° A'B
pessoas, as quaes a lei confia a decisao do pouto de facto.—Sao,
oujurados (2), istoé, cidadâos escolhidos para cada causa, no seio
dasociedade, a cujo verdictum o accusado, usando do mais amplo
direito de recusaçâo, subruette-.se pre-viamente, como emanando
de verdadeiros juizes ; ou entao juizes nomeados pelo governo
para conhecer e decidir em todas as causas crimes ; ao passo que
os jurados nao devem seguir senao a sua intima convicçao, sein
obrigaç&o de expôr os mo-tivos, os juizes regulares, pelo
contrario, sao ordinariamente adstrictos a certas regras de prova jà
previamente determinadas*. As garant in s concedidas ao réo em
relaçâo à justiça da sen-tença a proferir-se, differem segundo o
tribunal, perante o quai tem de comparecer, ou o do jury, ou o de
simples juizes. Quando é o jury, sâo ellas de uatureza
principalmente politica ; o accusado deve esperar que os
sorteados dentre o povo,. e que, depois do julgameuto, volt&o ao
seu seio, preoccupar-se-h&o em primeiro lugar dos perigos, que
corre a liberdade por uma accusaçâo injusta, e que, independentes
do poder, erabora aos olhos dos seus orgaos podessero ser
considerados convenciâos do crime, terao a coragem de obedecer
tao somente as suas con-vicçses e absolve-lo, se é caso disso. E é
principalmente nos crimes politicos, que o accusado pôde
contarcom essa garantia, poique é julgado precisamente por
cidadâos familiarisados com todas as circumstancias da vida
social, altameute intéressa dos na mantença da ordem, e
conseguintemente, mais aptos para examinar, se o facto imputaflo
constitue uma real violaçao dos direitos do Estado, ou se esta
compreliendido no exercicio legi-timo das liberdades civicas (3).
(2) Solïre a uatureza do Jury ride o Processo crimvnal comparado do antor,
4* edic. (Heidelberg 1315) cap. 42. e a Iraduccâo franceza, ib.
v3; Partindo deste motiva, certos escriptores., raesmo os quo considéras o
jury totalmente insulïicienle em. inateria de delictos ordinarios, desejào vê-lo
upplicado nas causas publicas. Vid., por exempta. Carmignani, Teoria dette
leggi sisurexsa sociale, Pisa, 1832, vol. 4, pag. 865.
16
Qnando o- accusado tem de comparecer perante juizes régu-
lâtes, garantias de uma outra ordem sao-lhe concedidas, que
desta vez provém da propria lei, porquanto a lei dizendo ao juiz :
« Coodemnaras â, vista de tal ou tal prova », impede o arbitrio,
e obriga o magistrado a apreciar o valor dos factos sômente
pelos meios determinados ; ao mesmo-tempo ordena-lhe', pela
declaraçao dos motivos que influirao no julgamento, a expen-
der exactamente as razoes da sentence.
2." Os preceitoa da lei relativos a prova referem-se tambem
aos meios postos à disposiçao do juiz instructor para descobrir
a verdade. Aqui dous systemas apresentao-se, de cuja appli-
caçao decorrem graves différences : ou o legislador autorisou a
tortura, ou entao, prescrevendo todo o constrangimento, cir-
cumscreveu a acçao do formador da culpa (4) [inqwrent, juiz
instructor) emiim circulo de meios probatorios, derivados im-
roediatamente dos principios ministrados pela razao e pela
experiencia dos tempos, como eminentemente favoraveis à in-
dagaçao e manifestaçao da verdade. E ainda aqui apresentao-
se dous systemas diversos; n'um, a lei autorisa em materia
criminal os meios empregados no processo civil, o juramento
porexemplo; n'outro, os repelle como nao podendo ter valor
no processo crime, que nao poderia tolerar ao accusado, por
exemplo, o abandono dos seus direitos.
3.° Emfim e principalmente o systema da prova légal varia,
conforme a lei prescreve, ou nao, regras ao juiz de facto ; e em
ultimo caso conforme tem determinado peremptoriamente, nao
o numéro de provas necessarias à sentença affirmativa, como
tambem todas as outras condiçOes de probabilidade exigidas,
de sorte que se estas se acharem cumpridas no processo, é o
(4) O systema das penas denominadas de desobedieneia (que extraviarâo
tantas vezes o legislador) conduz bem depressa na realidade ao processo do
constrangimento. que torna perigosa a investigaçSo da verdade. Yid. Arnim.
Dos delietos e das penas 1, pag. 32. Vid. o Processo criminal comparado, Ut.
I, cap. 82.
V
juiz obrigado a considerar a prova. «omo existent^ ou con-
forme temaMnlimitado aestabelecer certos laites, a quem
dos quaes tal prova de tal ou tal natureza nao pode^amotiyar
uma condemnaçâo (a existencia, por exemplo, de uma testemu-
nha mente}. Quanto mais severas forem as regras da prova,
quauto mais restricto fôr o numéro das admissiveis, tanto mais
tambem diminuirao as sentencas condemuatorias, e tantamais
ver-se-hao surgir disaidencias entre as decisOes da opiniao pu-
blica, e as proferidas pelojuizj escravo das prescripçoes legaes.
A' medida que cresce a dissideucia, os cidadaos lastimao a
inefficacia da justa pénal-, e a'impunidade desagradavel con-
cedida a indiduos pelo clamof publico declarados criminôsos.
Os motivos que guiao o legislador, determinando as regras da
prova, sao os mesmos geraes, que presidirao à toda organisaçao
do processo criminal. Sao: 1*, o interesse da sociedade, a neces-
sidade da punao do criminoso; , a protecçao vida as
liberdades individuaes e eivis, que poder-se-Mao acbar grave-
men compromettidas pelo processo criminal ; emfim, 3", a
necessidade de nunca punir-se um innocente.
O primeiro motivo deve estimular o legislador a concéder
toda a liberdade à apreciaçao do juiz de facto, porquanto re-
gras excessivaniente restrictas poderiao obstar a condemnaçâo
do culpado ; mas emquauto trata de alargar o circulo das pro-
v sobre que deve fundamentar-se uma condemnaçâo, e de nao
amontoar prescripçoes nuraerosissimas e severas quanto as con-
diçQes de probabilidade a exigir'de Cad a umalias ; emquanto
finalmente, receia, que, pelafaltado cumpriraento de uma sim-
ples condiçâo,o culpado escape à pena merecida ; entao, outros
motivos, os de que fallamos em segundo lugar, vem tambem
pesar na balança. Nao deverâ temer que um juiz nienos babil,
menos familiarisado com as apparencias enganadoras de certos
meioa de prova, deixe-se levar ao ponto de conceder-lb.es um
crédite exagerado, que de certo nao lhes concederia se tivesse
mais experiencia? Movido por estas consideraçûes novas o le-
8
18
gisïador preferira erigir algumas condiçoes mais, antes de decla-
rar tal ou tal prova admissivel ; erigira em regras geraes certes
motivés de escrupulo y que actuao ordinariamente no juiz,, quando
examina o valor do documento apresentado. |S)i Este receio de
condemnar o innocente lèverao legislador a restringir o mais
possivel o modo de prova aceitavel e décisive no pïocesso, e a
lei a esse respeito manifestar-se-ha mais ampla,ou mais rigorosa,
conforme quaesquer destas considéra eues oppostas que iunuirem
no aninio de seu autor. Quando se tem collocado no seguridô
ponto de vista o legislador nao ousa por exemple autorisar .a
condemnacao baseada no concurso sômente de indicios, re-
cordando-se de quantas vezésé fallaza prova artiiiciak esforça-
se em evitar o azar de uma condemnacao injuste, exigindo o
cumprimento de uma multidao de cireumstaneias para que se
profira a sentença affirmativa. Quando, pelo contrario, esta
preoccupado de preferencia com as necessidades da segurança
publica, e da utilidade da puniçâo des culpados, deixa o ma-
gistrado decidir, segundo o seu criterio, se os indicios, em tal
caso dado, fazem ou nao prova plena ; contenta-ee em estabelecer
algumas regras de theoria gérai autorisadas pela experiettda,
que advertem e previnera sufficientemente o espirito do juiz,
evitando todas as prescripçoes, todas as prohïbiçCês absolûtes.
Nao é sômente no final do processo, no momento em que a
sentença définitive vai decidir se é verdadeira"» aceusaçao, se
a culpabilidade existe, que o problema do valor das provas
produzidas se apresenta, é tambem no correr, e em cada uma
das phases do processo : o juiz formador daculpa, com effeito,
deve examinar se tal crime foi verosimilmente commettido, se
f5) Citemos, por exempta, as regras estabelecidas pelo legislador para o
exaine da prova résultante dos indicios. Procédera prndentemente sem dn-
vida, advertindo ao juiz, que no processo deve haver necessariamente con-
curso de indicios anteriores e concumitantes ; mas, ainda 0 repetiuiosj sub-
rhettér a prova a condiçôes absolutas, ria pear a conviSo intelligente do
inagistrado, e obrigalo a absolver muitas vezes verdadeiros culpados.
10
tal ou tal pessoa é lie çulpado., e conseguintemente se deve
procéder a taes ou taes diligencias. Esta questao offerece-se ao
juiz todaS as vezes que examina ; 1.* Se pôde procéder contra
iima pessoa determinada ; 2.° Se as presumoea sâo bastante
graves para autorisar uma prisse; 3." Se estao cumpridas as
condiçOes que autorisao a pronuncia ou se (quanto ao processo
allemao) de passar ao processo espécial da formaçao da
culpa (S) I
(S)0 nesso Oodigo do Processo arts. 144 e 145 siattsfaz en grande parte a
estes requisitos, mas desejavamos que a hem da pa« publica, ado sooego do
cidadâo, admittisse que o accusado tambem podessa dar no juiza da forma-
çào da culpa em sua defesa a mesma prova summaria, que ao auctor é per-
mittida. Que inconveniente baveria uisso ? Pois assim como com docnmen-
tos de o accusado destroir as allegaçôes do autor, e itiidir a sua prova. e
presumôes, tembem poderia com testenmnhas. E verdade que nisso ae le-
varia mais alguns dias, mas nâo valeria apena, em troco desse pequeno in-
conveniente, obter-se maior garantia para o cidadâo ? Na formaçSo da culpa
o autor é mais favorecido do que o réo, contra as regras geraes do processo
Dizem que nâo ha uisso inconveniente porque a sentence da pronuncia
nâo jttlga, e nâo condemna,- mas o cidadâo pôde soffrer muito pelas conse-
qnencias da pronuncia, nâo obstante nâo ser condemnado ; bas ta attender-se
para a privaçSo do exercicio de certes direitos, para a prisâo, ou para a
fiança, que muitas vezes é excessiva em relâo a certos individnos, e para
o espectaoulo judiciatio do jury. Se o inconveniente, que os apologistas da dis-
posiçâo légal apono em contrario, é a demora em concluir-se o processo da
formao da culpa e por conseguinte mais f&cilidade de escapar-se o crimi-
noso, pôde ser facilmente removid concedendo-se-lhe uma dilao fatal e
brève antes da pronuncia, ou mesmo depois desta a da fiaa, on da prisSo
nos crimes inaflançaveis.
NSo cremos que neste systama de processo haja usurpaçâo das attribui-
ç3es do jury, porque a este Bca sempre reservado o conhecimento plenario
do facto, competindo ao formador da culpa sômente o conhecimento summa-
rio independente de mais alla indagaçào. E de mais, segundo o processo
actuel, o juiz summariante sempre prejnlga & vista dos documentes apresen-
tados pelo réo ; ora segundo o nosso systema continua a prejulgar sempre
brave e snmraariamento com mais uma garantia para o réo. f- j
Alguns jnizes e autoridades ainda acanhSo mais a disposio légal por uma
interpretaçâo jndaica, ou applicando mal certos prineipios. Assim nos cri-
mes de natitreza complexa, cuja existencia dépende da verificaçâo de certas
condSes legaes, negâo-se a tomar conhecimento da defesa puramente jnri-
dicado réo, que consiste em demonstrar. que exigindo o direito que se verifl-
ao
CAPITULO H
HIST0RIA DO PBOGRESSO DAS IDBAS KM MATERIA DE PROVA.
Todo3 os povos, mesnio aquelles que ainda se achSo em lugar
inferior na escala da civilisaçSo, possuem certas nocôes sobre a
economia da prova, e por consequencia sobre os meios facul-
tados ao accusador ou ao accusado, afim de convencerem os jui-
zes da verdade de suas allegaçOes sobre os motivos de prova,
nos quaes terao de basear a sentença.— Em toda prova, qual-
quer que ella seja, destingue-se a idéa de uma verdade formai,
ou de uma verdade material, que é o seu objecto, isto é, no
primeiro systenia, sem ter em consideraçâo a intima convïc-
çao do juiz, ou os motivos de decidir fornecidos pela razao e
pela experiencia, a lei força-o a considerar verdadeira tal
demonstraçao, fundada sômente em certos motivos puramente
formaes ; no segundo, pelo contrario, tem o juiz o direito de
basear sua convicçào nos meios os mais seguros para chegar à
verdade ; aqui, as regras estabelecidas pelo legislador origiuso-
se do principio que vem sanccionar oa unicos meios de certeza,
mais conformes ao seum, à verdade absoluta (1). Se, por exem-
plo, a economia da prova concedesse uma grande influencia as
presumpçûes legaes, por isso preferiria o systemada verdade
formai, em opposiçâo as legislOes modernas, cujas tendencias
em gérai encaminhao-se para verificar a material. Essas mes-
quem taes e taes circumstancias, para se considerar existir tal crime, e nio se
achando verificadas, nio pode o juiz jnlgar ter pleno conhecimento da exis-
tencia do delicto, qne nào existe ; porcrae, àizem elles, isto ja constitue
defesa do réo, e portanto deve ser apresentada nojuizo plenario, sem reflectir
que esta defesa. qne nada tem corn as atténuantes ou justiBcatiras, e nem
com a excusa da pessoa do delinquente, mas sômente versa sobre o preten-
dido crime, base de todo o processo criminal, e nem pende de alta indaga-
çSo, acha-se virtualmente permittida no art. 145 que prohibe ao juiz profe-
rir a pronuncia sem pleno conhecimento do delicto.
fl) Betham-Holweg. Ensaios sobre dlversas partes te theria do processo
dTil, pag. 852.
.'
mas tendencias, até um certo ponto, domin tambem a èwP
nomia da prova em um povo pou civilisado, naqual os in*
viduos e os juizes, paulatinamente e quasi sein intençSo preme-
ditada, formulao para si certes théories afim de decidiretn o
melhor possivel da Verdade dos factos. Existe no fundo destas
idéas uma especie de logica de Instinct» dirigindo as suas in-
vestigaçoes (2).
As opiniOes nacionaes (3), certes preconceitos moraes ovt reli- s
giosos (4), certas instituiçôes politicas, influem directamente
no systema da prova.
A fé, porém, depositada nos conjuratores [Eideshelfer), a
confiança nos ordalios (juizos de Deos), testemunhao em alto
grâo varias tendencias para o principio da verdade formai ; o
que pôde ser considerado como uma consequencia da crenca
enraizada no povo, de que a voz de Deos acaba por descubrir
a verdade e auxiliar o bom direito ; quanto aos conjuratores
deverao tambem a sua origem à essas antigas tradiçOes de
mutua solidariedade, notaveis nas sociedades germanicas (Ge-
sammtburgschaft) (5).
Os juizos de Deos constituera meios de prova decididamente
formai, obrigando o juiz, embora opponha-se directamente a
sua convi&o ao resultado, a tomar este por base e motive de-
cisfao da sentença. Mais tarde uma circumstancia capital in-
fluirâ poderosainenté no desenvolvimento do principio da prova
entre os povos, e farà repellir a instituiçao dos juizes regulares
conhecendu do facto : fajlamos da ia precoz do senso poli-
tico e das opiniôesliberaes ; entao o cidadao quer ver as liber-
dades communs ao abrigo dos ataques possiveis do podet: »'
(B) Oarmignani. Das lois vol. 4 pag. 58.
(3) Por enemplo as que dizem respeito ao duelo judiçiario.
(4) Por exemplo os que dizem respeito ao juizo de Deos.
(5) Biokes, Thesaur, ling. sept, in dissert, prœlim., p. 85, — Sohildener,
Investigaçôes sobre o direito germaniço, p. 84; Grimm. Antiguidade dos
direito» p. 860.
s^B BEI
23
essas opiniOes mostr&o-lbe» no juiz de facto, nm homem de
posse de um ;terriyel, instrument», tudo, podendo sobre a for-
tuna, honra,vida de sens concidadaos : ensinao-lhe finalmente
que, para melhor garantir a segurauça-e liberdadê indiyidûaes',
nao é ao magistrado, mas sim ao «orteado. para cada causa, a
quem, se deyerà confiar tao importante decisao. Km tal povo a
convicçao intima do juiz constituirà lei, e o legislador em
materiadeprova contentar-se-ha corn algumas, regras geraes.
Desde que pela contrario o magistrado é juiz tambem de facto,
o legislador érige logo, cotno regras de apreciaçao da prova,
certos principios conaagrados pela experiencia usual, limita a
liberdado julgameutOj « nao permitte, por «xemplo, a cou-
deranaçfto, se hou ver uma s'ô testemunha, ou ainda déclara
peremptorias certas provsimplesmente formaes, por exem-
plo: o juramento ou as presumpçôet legaes. i
Quem. estudar as disposiooes da lei romana sobre a prova em
materia crirainal convencer-se-ba facilmente de que nenhumas
regras especiaes poderao entrar no System a de processo seguido
na Republica (6). Nesta época, era o povo quem pronun-
ciava,. reunido em comicio por.centuaria3 ou tribus, e desde
entâo uma apreciaçao juridica das provas (7) nao era consa
possivel. (S).
(6( E' certo que o accusado se esforçava em produzir todas as provas pos-
siveis, de qualquer natureza que fossem. O estùdo das Verrinas o convence.
(!) On laudatores (testemunhas da boa reputaçâo do indiciado) représenta-
nte entre outras um papel importante. Tratava-se de produzir 0 maior nu-
méro possivel. Rosshirt, Arch. de Dirtito Çriminal, 11, p. 392.
(S) O processo no tempo da realeza é desconhecido : oo rei julgava sô,
ora com o senado, e ora delegava a jurisdicçào a duumviras e questores, mas
ainda se ignora a forma e marcha do processo, e nom mesmo se sabe, se a
appellaçâo para o povo era uma excepçâo à regra, concedida em certos casos,
ou se era regra gérai. Dèpois de estabelecida a republica, a lei Valeria, dentro
dos limites de Roma, deu aos comicios a jurisdicçào suprema. e elles decidiâo
em ultima instancia de todos os processos ; e fora desses limites o consul
reassumia todo o imperium. A lei das 12 taboas confirmou o processo da lei
Valeria, cuia promulgaçSo foi por mais de uma vez repetida ; e a. lei Porcia.
33
Reunindo à autoridade législatifs o direito de graça e o pôder
;
judieiario', o povo,cencebe-se, deiïâva-së levar pelos ser-viços
anteriormente prestados, era movido por mil cqnsidera-çOes
diversas, e Tnuiïas vezes absolvia um criminpso (8)j entao nad
ei'a separada a questao de facto da de dirai ta |9.)>, as ior-mulas
usadas absolvo, condcmno, continhaô uma e entra decisao.
Os Justices dos Quœsiiones perpetuœ, erâo juizes popnlares, que
seguiao sômente a suaconvicçâo, e que, H9o tendo contas a dar,
nao podiao dèïxar de attender à eonipaixâô ou ainfluencias
politicas. Todavia cedo foiTio postas em pratica certas fermas
concernentes à- inquiriçâo de testemunhas (10), e ao vàïôr pro-
batorio dos documentos ; e na tortura se pôde eneonlrar mai*
do que um germeii da prova formai, pois que osJ.udiees erâo
obrigados a acceitar os seus Tesultados como probatorios. Ve-se
finalmente que as Leges prescreverào sobre a materia, quando
îi i
para assegurar a execuçâo da lei Valeria, decretou penas contr i os magistra-
dos que violassem as disposiçôes d'aquella. Tambem a promulgagSo da lei
Porcia foi mais de uma vez repetida, pois que a sua missâo era protéger o
cidadSo contra o arbitrio e a violencia dos consules, determinando que ne-
nhuma sentehoa consular de condemnaçSo capital séria posta em execuçâo
antes da denisâo em tillima instancia dos comicios. Estes erâo nos primiti-
vos tempos compostos sômenie de patricios (curïas) mas depuis que o prin-
cipio democratico começou a désenvolver-se Toi "creado o comicio por centii-
rias, que narepublica veio adominar exclusivamente, quando as envias cabirâo;
Os comicios por tribu* nâo tinhSo juris'diccâo senSo para conhecer de certos
crimes, e décrétât certas penas pecuniarias. Portanto o poVo reunido em co
micios deoidia absolutamente de facto, e de direito, sem atténçâo a regra
alguma da prova, e como entendia em sua consciencia. E. Labonlaye. Eisai
sur les lois criminelles des Romains; FaustlB Hellie, Traité de l'instruction
criminelle.''
'
(8) Feuerbaob, Ensaios sobre a jtuUicidade dos processus e a discussao
oralb, 2G9
(9) Oarmignanl. Dos luis 1. 4 p. 244.
(10) Briss'onias, de FormùKs; p. 246.
24
determinarfy,, reliitivamente a tal ou tal delicto, quaes as
pessoas excluidas, quaes as admissiveis ao depoimento (11)(S).
(11) i. S 5. L. 13 e 18, dito de Testibus. (S) A. primeira destas leis.re-
fere-se à lèi Julia de vi càvetur, que prohibiu que o liberto depuzesse em
causa do seu ex-senhor ou na do filho Jeste, assim como prôhîbque depu-
zessem em qualquer causa certas pessoas, cujo depoimento nâo poderia m&
recer em razâo de serem indignos ou infâmes, como as meretrizes, os con-
demnados. os que locassem os seus serviços para nos circos combaterem com
as feras, e os condemnados por terem recebido dinlieiro para depbrem. A se-
gunda contém um preceito de Modestino relativo ao depoimento dos condem-
nados como calumniadores, que nâo estavâo inhibidos de depôr por lei
alguma anterior. A terceira contém uma decisâo de Paulo, que referindo-se
a lei Jnlia, que prohibe que deponha a mulher condemnàda por adulteiio,
conclue que podem der as outras, que nâo estiverem nasse csso.
(S) As Qstiones perpetuœ, commissôes ou tribunaes permanentes, erâo
formados de jurados que tivessem a idade légal (a principlo de trinta, e
dépôts de 25 an nos), alistados annualmente pelo pretor nas très classe dos
senadores, cavalleiros, ou patricios. e. tribunos do erario, conforme o censo
estabalecido pela lei Pompea, e do pretor, que como présidente do tribunal
tomâva o nome do questor. As classes, das quaessetiravâo os jurados, forSo
depois augmentadas, O pretor era escolhido pelos comicios. Esta instituiçào
adquirio o seu complète desenyolvimento no VII seculo. da era rpmana,. e
nella é que se deve ir buscar a origem do nosso jury, e nâo no pnocesso j,u~
diciario dos barbaros germanos, como snppoz Montesquieu.
O pretor, quando nâo podia presidir ao tribunal, delegava as suas attribui-
es a um cidadào, que tomava o nome de judex quœstiones. O présidente,
com quanto nâo votasse nos julgamentos, nelles intluia consideravelmente,
porque era elle qnem formulava os quisitos, sobre os quaes tinha o tribunal
a pronunciar-se, e aient disso dirigia os trabalbos, e fazia a policia do tri-
bunal.
O pretor assemelhava-se ao nosso jniz de direito, e os judices jurati aos
nossos juizes de facto : o primeiro tinha Ajurisdictto e o imperium, e os se-
gnndos a cognitio,
A marcha doprocesso criminal era a seguinte:
Quem queria accusar alguem dirigia-se ao pretor, e pedia-lhe permissâo
para o fazer, jurando que de boa (é, e sem calomnia o fazia : era o que se
chamava postulatio.
Permittindo o pretor, o accusador designava o crime, e a pessoas contra
quem dava aqueixa, e pedia a sua citaçâo—nominis oucrimenis delatio.
Gomparecendo o accusado, e sendo interrogado, o pretor mandava tomar o
interrogatorio por termo.assignado por ambas as partes.e nessa mesma oocaso
estabelecia os quesitos que deviâo ser decididos pelo tribunal : era o que se
chamava —inseripUo, que nâo podia mais ser alterada até final.
|
No Imperio cahem os antigos tribunaes judiciarios ; entre-
tanto ainda nao ftracciona um systema de provas legaes tal
Depois destas formalidades, o pretor recebia solemnemente a accusaçâo
contra o accusado, e designava o dia em que as partes tinhSo de compare-car
perante o tribunal — nomitti* receptio, que équivale a nossa pronuncia. Depois
da nominis receptio o accusado ficava privado do exercicio de certes direitos.
Ko intervallo tanto o accusador, como o accsuado recebiSo do pretor um
mandado le*—., corn o quai podiSo ir busoar, examinai?, e preparar-se corn
qualquer prova que entendessem conveniente, obrigando a qualquer pessoa a
exhibir documentos, e a depâr como lestemunba.
No dia designado, aberta a audiencia, o arauta apregoava os jurados, as partes
e seus defensores—eifbantur aprœconeprcetorio.— Nûo conpaiecendo o
accusador, o processo findava por peremào, e nâo comparecendo o accu,
sadoipso-factoeracondemnado segundoaqueixa, salvoseconstava ter-se exi-lado,
porqne entâo o tribunol limitava-se a decretar o exilio perpetuo. O' exilio era
um dos modos de extinguir o processo criminal, porque era entre os romanos
cousiderada penamuito grave o exilar-se, ouperder a qualidade de cidadào.
Depois de apregoados os jurados, e as partes, o pretor tirava de uma nma por
sorte os nomes daquelle«, que devise formar o conselho (' •nsilium), os quaes,
além da escusa propria motivnda. podiâb ser recusados pelas partes, sem
declaraçSo do motiyo até ao nlthno, o que obrigava o pretor a fazer uni
segundo e ultimo sorteio, nâo se sabendo hoje ao certo quantos ainda as partes
podiâo recusar neste.
O tribunal podia tSobem ser composto por'outro modo, editio. Em lugar do
sorteio, ambas as partes propunhSo 100 jurados. e cada uma délias podia
recusar 50 do contrario ; os 100 restantes compuuhaO o tribunal ; mas este
inodo foi abolido pela lei Oornelia repetwndarwn
l
. Havia outra forma da
ed.tio—, e consistia em propôr o accusador 4 tribus, podendo o accusado délias
recusar uma; parece porém que esta era especial aos processos da lei Lieinia
soldaliciis. O que é certo é que o sorteio foi a regra gérai depois do VII seculo.
Nomeâdos os jurados, estes prestav&O juramento, e d'alii lbes vem o nome
iojwati ; e logo em seguida o accusador dedusia oral mente a accusaçSo, e o
accusado da mesma forma a defesa, por si ou por sens detensores (patroni,
advocati). sem replica, e nom tveplica, mas tendo cada um o diteito de dis-
cutir directamente com o seu adversario [allercationes), tudo deutro do es*
paço de tempo que a cada um fosse concedido, e que era regulado pela
elepsydra.
ÉrSo interrogadas depois: as testerqunhas, sob juramento, pelas partes que
as produsiào, ou seus defensores, e findo, o intorrogatorio os juradas julga-
vâo, votando por escrutinio secreto, e escrevendo cada um o seu voto do se-
36
como hoje entendemos, adstringindo o juiz a considérer como
demonstrado, por exemplo, todo o facto provado pelo depoi-
mento pelo menos de duas testemunhas (S/.
gninte modo : A, que queria dizer absolva, C, que queria dizer coniemno
e M, S, que queria dizer non Uquet. Ssto é, que nSo estavSo suffi te
informados para julgar, e remettiâo o processo a novainstancia. da jurado
era obrigado a escrever oseu voto,sem que ninguem visse, en deposita-lo na
urna cora o braço , e occultando a letra. Por utua excepcSo ereada pela loi
Servilia nos processus de concussâo, os jurados erâo obrigado? a decidir no
mesmo dia, depois de uma segunda audiencia, que tinha iugar posteriormente
as provas, e que se chamava ctmperendinatio.
Dos julgamentos proferidos pelas i/uœ-ilianes perpétua nSo havia recarso
algum, nem para o povo. como nos processos anteriores das commises de-
legadas ou dos comicios.
Nem todos os crimes se processavSo perante as quœstiones perpétua; estas
podo conhecer daquelles que jâestivessem determinados ein leis especiaes?
os outros erâo julgados exclus!vamente pelo senado, consul, ou pretores ; de
sorte que durante a republica havia duas formas de processo o das œs-
Hones perpétua, que tomava a denominaçâo depuhlica judicia, e que era a
regra, e a do senado ou consules ou pretores exdusivamente, que tomava o
nome de judicia exlraordlnaria, 0 direito de accusaçâo pertencia a todos os
cidadâos, e se nâo apparecia accusador, o crime ficava impune, porque era
entâo desconliecido o direito da sociédade de fazer punir os crimes, que af-
fectassent mais profundamenle a ordem publica.
Todo o processo se fazia publicauiente à excepçâo do voto. Autores citados
e Delpon, Essai sur l'Histoire de l'Action Publique ; Trebutien, Cours élé-
mentaire de Droit Crim.—,2
e
Partie, Chap. 1.
(S) A institniçSo assim organisada continuou por algum tempo no imperio.
Tiberio deu-lhe o primeiro golpe transferindo para o senado o julgaments dos
crimes politicos, que comprehendiSo pela sua importancia muitos crimes par-
ticulares, e dando ao mesmo senado a attribuiçSo de nomear os pretores, e os
outros magistrales, que anteriormente pertencia aos comicios. antes Au-
gusto tinha conferido jurisdicçSo ao senado e ao prefeito urbano para conhe-
cer de certos crimes publicos. Mas a instituiçào durou seculos ainda, porém
cada vez mais enfraquecfda, até que cedeu o passo a novos trjbunaes corn
nova organisaçào. Depois de Dominiciano as quœstiones perpétua dao pou-
cos signaes de vida. A.' proporçâo que estas definhavào as attribuiçôes do se-
nado e dos prefeitos augmentavSo.
A forma do processo era a dos judicia extraordinaria, que se tornou a
regra gérai. 0 processo e as penas erâo arbitrarias. Por este processo forâo
julgados os christàos. As quœstiones perpetuœ forSo annal abolidas por Deo-
cleciano.
Os juizes obedecero à sua convicçfio sômente como anterior-
mente. Todavia os imperadores decretâo sas constituGes algu-
A institaSo o podia mais subsistir. o por causa da corruâo, que
profundamente lavrava no soio do povo, e que fazia depender a sorte dos
julgamentos da maior riqueza ou maior influencia de qualquer das partes ,
como porque nos ùltimos tempos havia grande difficuldade em reunir-se o
consiliwn ; pois que os cidadâos evitavâo, um onua, que nenhum proveito
lhes dava.
Estes novos tribunaes judiciarios forâo instrumentos do arbitrio, violen-
cias e crimes dos cesares, e nem mesmo Trajano, sob o quai elles florescerao,
conseguiu curar esse mal de origem. Os novos tribunaes caliirâo tambem,
assim como as qstiones pertua, quando foi creaclo o tribunal do impe-
rador e o seu conselho. (sacrum consistorium)
O processo seguido nos tribunaes creados no tempo do imperio era diverso do
seguido nos tribunaes republicanos. Nestes havia garanties tanto para oaccu-
sador como parao accusado, formulas que asseguravâo ajnstica. publicidade,
dilaçôes, e regras especiaes para rada crime on instancia.*0 senado porérn era
tribunal supremo, que podia ou nâo receber a accusao, que podia a seu arbi-
trio abolir as formulas, ou ordenar as que quizesse em cada processo, A parte
nâo podia com facilidade accusar, por si ou por seu advogado; era forçado
a recorrer a um senador. O imperador, como consul e présidente do senado,
dispnuha soberanamente da sorte dos processos. O julgamento era feito
do seguinte modo : um dos senadores propnnha-o de certo modo* os outros,
ou concordavâo, ou faziSo propostas diversas; e a propost.i,.jue obtinha
maioria relativa, era a que decidia. (discesHo)
A sentença nâo era proferida em presença do accusado, mas depois de es-
cripta era Ihe intimada pelo questor em nome do consul. Délia havia o
recurso de graca para o imperador.
O processo nâo se fazia publicamente, pois que, além das partes,
podiSa ter entrada no senado as pessoas, que tinhâo esse previlegio. A
tortura, que no tempo da republica sô era applicada aos escravos, foi appli-
cada tambem aos homens livres no tempo do imperio.
Todavia a par de moitos vicios do novo processo, que em grande parte se
devem attribuir à decadencia dos costumes, alguns principios novos, lioje
considerados salvadores no processo moderno, entrao na organisaçâo e
marcha do processo no tempo do imperio, principios que poderemos conside-
rar como conquistas da ohilosophia stoica, e da religiâo christâ. Trajano flr-
mou o principio de que é melhor deisar impune um criminoso do que punir
um innocente, e dahi concluiu que nâo se podia condemnar um ausente sô
por esse facto, lei5° Dig. de pceuis. Bnoera o accusado i ut i m ado para com-
parecer sob.pena de desobediencia. e se nâo comparecia, era punido com esta
pena, mas nâo com a da accusaçao,
No tempo da republica o havia recurso das sentenças, e o condemnado
muitas vczes era victima das paies do momento. Deocleciano estabeleceu
26
mas regras de prova; militas repellera o depoimento de certas
pessoas ; e outras declarao que tal e tal genero de prova (por
G regulou a appellao om todas as causas criminaes para o principe, ou para o
tribunal dos judifes sacri.
No tempo darepubliea todo o processo era verbal ; no imperio, as princi-
paes pecas do processo erSo escriptas, e portante mais dnraveis e prestando-
se mais à reflexSo.
No tempo da republica, se nSo havia aeensador, 08 criminosos flcavSo impu-
nes;no imperio. nos crimes que mais profnndamente ofTendiSo a ordem publica,
nomeava-se nm aeensador publico em falta de particnlar. Pode-se considerar
esta innovaçâo como nm germen da institniçSo do ministerio publico.
Durante a republica o processo da ïnstrueçao era feita polo aeensador mu-
nido do mandarin judicial lex— .No imperio depois da abolSo dos publica
judlcia, esse processo preparatorio era feito pelo juiz que conhecia do crime,
e que po.Ua mandar prender prévenir amen te o accusado, quando se tratava
de certos crimes, o que anteriormente nSo se podia fazer, poisqne o respeito
& liberdade individnal era tâo grande, qne em caso algum o accusado podia
ser preso, senâo depois da sentença, podendo este prestar em todo o caso
fiança.
Estas am de outras consideraçSes s5o sufficientes parademonstrar que se o
processo criminal perdeu algnma cousa com o imperio, ganhou o direito por
outro lado.
Contra a corrupcâo dos costumes é que nào havia remedio, e essa corru-
âo* começou no tempo da republica, O direito nunca floresceo tant" como do
seculode Angusto por diante, isto é, na decadencia da republica e no tempo
do imperio, na época classica, e na época christS; e se bem que nesta ul-
tima nào apparecessem genios, como no periodo dos Antoninos, todavia o
direito, e mesmo o processo no tempo de Justiniano erSo superiores aos do
periodo classico sob o ponto de vista da razào e da equidade, nSo obstante
ser lhes inferior sob o ponto de vista da logica e do methodo. Triboniano,
alterahdo os textos dos grandes jurisconsultes, para os r em harmonia com
o desenvolvimento do direito, mei-ece severa censura perante a arte, mas
elogios perante a scioncia pratica, pois que prestou grande serviço à causa
da humanidade'.
A' philosophia e caridade ohristà se devem, mais do que â philosophia
stoica, o aperfeiçoamento no direito e no processo, e o melhoramento das
penas.
Para se conhecer que o direito e o processo pregredirSo, basta recordar que
forSo conqnistas do imperio. e principalmente o do periodo christâo, a re-
constituiçâo da familia sobre bases mais naturaës, dando-se ao parentesco
real o* mesmos direitos que ao parentesco civil; abolindo-se a differença entre
agnatos e cognatos ; elevando-se a mulher ao nivel do homem ; regulando-se
de nm modo mais justo e natural a transmissio inlcr-vivos e causa mortis ;
abolindo-se a differença entre as cousas mancipi e nec numeipi; igtialando-
£9
exemplo o depoimento de uma testemunha) nâo poderia con^
vencer (12) (S). 3
Argumentando com a lei ullima Cod. de probationibus (S)
pode-se demonstrar que nos ultimes do Imperio certas idéas se
tinhao formulado pela pratica judieiaria, relatives aos meios
probatorios a fornecer ao processo antes de poder ser a prova
considerada perfeita (13) (S) todavia jamais se deveria ir busse a todos
os respeitos o dominio quiritario e a possessio bonorum; prohibin-do-se as
prisées arbitrarias pot dividas, e inesmo as prisées preventivas dos
individuos, salvo em caso de necessidade reconhecida; roelhorarando-se
a
sorte dos presos e coudemnados ; delerminando-se a rapidez nos seus
processos, e a 'visita semanaria dos juizes as prisées para inquirirem da
sorte dos presos. e dos motivos das prisées, aflm de providenciarem a
respeito. En fi m no nltimo periodo a organisâo judieiaria tbrnoa-se mais
uniforme, e os recursos melhor graduados dos magistrados inferiores para os
su perfores, e destes para o imperador.
Se o Christianisme nâo fez mais, foi porque nSo pôde extirpar de todo as
profundas e seculares raizes, que o paganismo tinha creado nos costumes de
urne sociedade profundamente corrompida ; e tanto mais que nessa luta o
christianismo nào podia empregar todas as suas foas, parte das quaes era
obrigado a distrahir para combater as heresias. Por isso a idade moderna
recebeu ainda os tristes legados dos tormentos, como prova judieiaria, e a
escravidào. Laurent, Histoire du Droit desyens, Tom. 4; Troplong. Influence
du Christianisme sur le Droit civil des Romains ; Thierry, Tableau te l'Em-
pire romain.
(12) L. 9 g 1, Cod. de test. (S) Prohibe expressamente que se faca obra
pelo depoimento singular de uma testemunha, ainda que esta se ache revos-
tida da dignidade sénatorial.
(S) Saibào todos os accusadores que nào dtsvem denunciar d jusliea senào
nquillo, que for provado por testemunhas idoneas ou documentos clarissi-
mas, ou indicios indubitaveis e mais claros do que o dia.
(18) L. 10,11 Cod. de testibus. (S) A primeira exige que as testemunhas
sejâo livres, e nâo tenhSo interesse na causa. A segunda termina que so
uma testemunha for recusada por ser escravo, aamrmar ser livre, deve-se
primeiramente decidir esta queso h vista das provas fornecidas ; e se jurar
que o titulo da sua alfoma. que nâo trouxe comsigo. esta em diverso lugar,
o seu depoimento deve ser tomado, para ser depois admittido ou repellido à
vista do referido titulo; e além disso détermina que seja recusada a testemu-
nha, entre a quai e a pessoa contra qnem vai jurar, houver processo crime,
antes do seu julgamento ; nâo assim se o processo for pecuniario ; porque
nestc caso deve-se tomar o seu depoimento, e remetter as questées a respeito
desta suspeiçâo para a discussâo da causa.
«.
30
car na legislaçao romans um systema de regras absolu ta s e
especificadas. Os jurisconsultos de Roma pouco importavao-se
com o estabelecer uma theoria especial, contentavao-se apenas
com algumas observaçOes (14) (S) com alguns conselhos (por
exemplo sobre o epme da procedencia do uma confis-'tfo<15)
(S.) (»)
(14),Exemplo : sobre a apreciaçSo da con fiança dévida as testemunhas: Lei
3 Dig de Testib. (S). E' certo que a causa soutenir, provada por testemunhas,
sein oulros legitimos adminiculos, nenhuma consideraçXo mère et.
(15) Lei 8D.de confessio., Lei 23 g 11 ad leg Aquil. (S) A primeira déter-
mina que nSo se deve condemnar aquelle que confessa dever cousa, cuja exis-
tencia seja incerta. A segunda détermina que nâo fique sujeito à disposiçSo
da lei Aqnilia aquelle que, tendo oonfessado falsameute ter assassinado um
oseravo, se eom promette r a apreseuta-lo vivo; a confissSo neste caso sômente
aproveita ao autor, para nSo obriga-lo a provar, que foi aquelle quem assas-
sinou o seu osera vo; bas ta que o escravo tenha sido assassinado, embora por
outro, para que a confisaâo sujeite o confesso à pena da lei Aquilia.
A pena estabelecida nessa lei era pagar o assassino o escravo ao seu se-
nhor pelo maior valor do mercado nesse anno, eo dobro se negassc o crime,
tendo causado a morte sem razâo. Vide as leis 2 e seguintes eod. Ht.
(*) Para comprehender-se bem o systema de administracSo da prova segui-
da pelos Komanos em materia criminal, convém distingui-la segundo as
épocas :
1.° No tempo da republfca nâo ha theoria légal da prova ; os juizes sâo
livres na sua apreciaçSo ; e sômente ve-se que 0 accusado é logo condem-
nado pela confissâo, sem que seja necessavio examinar mais a fundo o seu
valor real. Todavia certas regras apparecem ; por exemplo, os individuos
qualilicados improbi. etc., nâo podem depor como testemunhas.
2.« No ultimo periôdo da era republicana, os jurisconsultos erigirâo nu-
merosos preceitos em materia de apreciaçào do valor dos meios de prova ;
os quaes referem-se principalmente a prova testemunhal (Vide a notavel dis-
sertaçâo de Escher, de Testium ratione quee Romce Giceronis cetate obtinuit.
Zurich 1842) sobre os preceitos em vigor nos tribunaes no tempo de Oicero),
S.o No tempo dos imperadores os jurisconsultos ampliâo mais estas regras,
e os proprios juizes acostumâo-se a observa-las fielmente ; os rescritos, e
constituiçôes imperiaes tambem contém frequentemente indicaçôes para os
magistrados relativamente ao exame das provas, ou à prohibiçSo expressa
de admittir taes e taes testemunhas (vide a obra mais minneiosa de Geib.
Historia do processif crim. dos Romanes, Leipsiok, 1842, p. 137—144, p. 327,
355 e p. 610—645. Nota manuscrita do autor.)
331
Em resumo, todos os seus escriptog testemunufto uma ten-
dencia mui positiva â indagar a verdade materi&L
Oprocesso criminal no antigo direito germanico teve por
base um systema légal de prova ? Esta questao foi por rauito
tempo debatida. (16) Naohavia,nem podia existir um systema
do prova, no sentido em que o comprenendemos actualmente;
a verdade materiàl, nos tempos os mais remotos principalmente,
nao era o fim primordial, e importa va pouco que, eomo actual-
mente, as testemunhas fossem escrupulosa e conscienciosamente
inquiridas, o que concebe-se ; o accusado tinha o direito de
livrar-se pelo juramento ; gs conratorei ou Eideshelfer (17)
que representavao a familia, a associ&o antiga, vino soc-
correl-o em iuizo (S), e os ordalios (18y e o duello decidiao da
procedencia ou imprqcedenoia daaccusâo (S). Mas é preciso
(16)
Rogg. systema judiciario dos Germanos, pag. 93.—Wigaud, Trifhtnaes
Wehmieot pag. 371, 385Oropp, no artigo'critico ioAnnuario de Heidél-berg,
1825, n. 41 pag. 669,
(17) Vide o Processo criminal comparado, 1, cap. 15, n. 11, e aot. 39.
(S) Nos casus duvidosos, ou quaudo o havia prova, decidia-se o processo
conforme o juramento do accusado, que se denominava purgaçSo aunonica
Nos casos duvidosos tambem o processo era decidido segundo o depoimento
dos conjttratores (testemunhas abonatorias da mesma classe ou superior do
accusado). O numéro destas variava conforme as classes, e a importaiicia do
processo, sendo necossario o de setenta o dous nos processo contra um bispo,
quarenta e quatro contra um padre e dose contra um leigo. DeviSo ser pessoas
probas, visinhas, e depôr em jejum, Cantu, Histoire universselle. Tout. 8, chap.
XVI.
(18)
Vide Tittimann, Historia dos leis pentes do Allemanha, pag. 53-,
(S) Os juisos de Deus represeno um papel importante no primeiro pe-riodo
da idade média no processo barbare Erào p'rovas puramente formaes, e cujos
Tesultados erào attribuidos â divindade. As mais seguidas, e que mais
perdurarâo, forâo a prova do fogo, a prova d'agua, e o combate judiciario. A
primeira consistia em segurar o accusado em uma barra de ferro em brazà, ou
por a mâo em um guante de terro em braza sem se queimar, depois de ter
jejuado très dias. Era natural que ahl houvesse algum segred'o sô conhecido do
clero (que presidia ao processo da prova) que obstasse, quando quisesse, â
queimadura. A segunda dividia-se em prova d'agua fer-vendo, e prova d'agua
fria : a de agua fervendo consistia em tirar o accu-
33
attender, que essas prâticas diverses er&o verdadeiras regras de
decis&o relativas â prova, porque era obrigado o juiz a toma-las
emconsideraç&o, quando proferisse a sentence,.
Notâmos serem estas provas puramente forrnaes. Nao era,
portant», a verdade material o seu objecto ; preferia-se confiar
na intervençao directa da Divindade ou nas crenças de iden-
tica natureza. Finalmente, e corn auxilio do costume (19),
sado um anel, ou outro qualquer objecto do fundo de uma vasilha cheia de
agua fervendo, sem se queimar, e o da agua fria consistia em ligar-se a mâo
direita com o esquerdo do accusado, e lança-lo assim à agua : se sobre-
nadava era culpado, se subraevgia-se era innocente. Outras provas ha via,
por exemplo a da cruz, a do pâo bento, a do cadaver ainda usada na Alle-
manha no seculo passado, Themis, Tom. 5 Art. de Charles Weber.
Anteriormente os processos decidiào-se pelos juramentos tanto das partes
como das testemunhas, mas sendo fréquentes os perjurios, o obstante se-
veras penas, os juizos de Deus tornarâo-se a regra gérai da prova nos pro-
cessos. De pois de XI seculo estas provas comarâo a ser menos praticadas,
sendo subtituidas pelo coin bâte judiciario. Todas ellas porém fundavâo-se
na prcsumpçao de que Deus protegia a innocencia.
O coin bâte judiciario dava-se entre todas as classes com a differença se-
guinte : se um nobre autor tinha de comhSter contra um plebeo accusado,
via faze-lo a pé com escudo, se com outro nobre, com as armas proprias da
nobreza ; se uma das partes ou ambas nào podiSo sustentai
-
pessoalmente o
combate, .escolhiâo um campiio. O combats judiciario tambem se dava entre
uma das partes, e uma das testemunhas da outra an tes de jurai
-
, para provar
que ella era suspeita. As mulheres e os menores nào erao obrigados a acei-
tar o combate judiciario.
Conforme o resultado do combate proferia-se adecisâo, da quai nào havia
recurso. Os combates nào tinhâo lugar tratando-se da decisâo final ou
diffinitiva, como tambem das interlocutorias ou dos incidentes, de sorte que
processos havia, que nâo erào mais do que uma série de combates. Este ge-
nero de prova começou a ser abolido em alguns paizes da Europa desde o
seculo XIV. Montesquieu, Esprit des lois. Tom. 2, ehap. XVI e seg.; Merlin
Repert. verb. Ordalies e Combat judiciaire ; Hallan, Histoire de l'Europe
au Moyen Âge, Tom. 4, chap IX; Oantn, Histoire Universelle, Tom. 7 pag.
336 nota B.
(19) Os capitulares dos reis franco» contém diversas disposiçôes sabiàs em
materia de pena.—Vide Tittmann. 1 c, p. 68. (S).
(S) Os capitulares erao leis? assim denominadas porque se dividiâo em
eapitulos, promulgadas no periodo carlovingiano, nas grandes assembléas
dos nobres e ecclesiasticos presididas pelo imperante. Nem todos continhâo
33
uma especie de systeroa de prova (20) logo estabeleceû-se ;
quand o tratava de certos crimes (por exemplo do estupro)
r
taes
testemunhas, taes circumstancias havia, que se deveriao conai-
derar fora de duvida (indicia indubitata): o flagrante delicto,
e o nao flagrante (liandhaftiger That, ubernœchtiger Th) (21),
disposiçSes novas, pois que grande parte limita va-se a conlirmar e sanccio-nar
os costumes existantes, e os preceitos do direito romano incorporados nos
codigos barbaros. Dos cento e quarenta e seis capitulares dos Carlovin-gianos
sessenta e cinco sâo devidos & infatigavel actividade de Oarlos Magno.
Examinados sob o ponto de vista do direito e do processo criminal, nelles se
encontrào alguns principios pkilosophicog, e algumas regras, que fazeni honra
aos seus autores. Beslringirâo a pena de morte (exeepto para os Saxo-nios);
determinarâo a publieidade dos processos, dando a qualquer o direito de
denunciar; prohibirâo que sem processo regular alguem fosse preso e menos
julgado, à excepçâo dos salteadores; udmittirôo a fiança ou cauç&o, para que 0
accusado podesse defender-se livre ; determinarâo que ninguom fosse con-
demnado sem provas, (e as mais geraes destas nesse tempo erao a confissSo, o
juramenlo das partes, o depoimento, quer positivo, quer negativo das teste-
munhas testes, conjùratores, e o juizo de Deos menos os combates judicia-rios,
que Carlos Magno prohibio, porque erao condemnados pela doutrina e pratica
da igrejaj ; obrigarâo osjuizes arsaber de côr a lei.e a conservarem-se ligados as
suas obrigaçôes ; créai So ou organisarào a instittiiçâo dos scabmi. e a dos mùit
dominici, que erâo corragedores, obrigados a percorrer a sua circumscripcao
em certas épocas do anno, afim de tomarem contas aos juizes inferiores,
reverem os processos, e providenciarem sobre as injustices, por elles
commettidas. Faustin Ilellie obr. cit. Tom. 1 cap. G ; Cantu obr. cit. Tom. 8
cap. XVI; Du Boys, 11 Ut. du Droit erim. des Peuples Modernes.
(20) Albrecht, Doct, de probal. secund. jus germ. mediïi mvi. Regin, 1825.
(81) Espelho da Saxonia, 11, 35.—Drever, Uoras vagas, p. 38; Vigand, Trt-
bunaes Wehmicos, p. 395.—Processo criminal comyarado, 1, cap. 15, n. le
nota 68. (S).
(S) O Espelho daSazconia foi a primeira compilaçjïo das leis, e costumes da
Allemanba, feita no seculo XJH por Eike de Repgon. assim como o Espelho
da Suabia foi uma compilaçâo feita posterior inente, mas sem originalidade,
porque o MU autor se limitou a commentai' a primeira, accrescentando -
mente textos de direito romano e canonico. Esta ultima foi uma obra feita no
sentido de favorecer os interesses do pontificado; Du Boys na obra citada
extrada ambas, no que toca ao direito e processo criminaes, e as commenta. Na
primeira encontra-se a diffiniçâo de flagrante delicto, que e hoje aceita pelo
nosso direito, e pelo dot povos civilisados.
5
34
emfim a conducta anterior do accusado, motivavao a applicaçao
de taî ou tal genero de prova.
Este predominio decidido da prova formai se perpétua até a
idade média; deve-se a ella referir o systemados indicios deri-
vados dos phenomenos externos, por exemplo, do sangue que
corria das feridas, quando o accusado tocava no cadaver (22/, e
tainbem a obrigaçao para o queixoso de apresentar-se em juizo
com sete testemunhas. (Das uebersiebnen) (23) (S).
Havia porém cid&des (24) nas quaes uma prematura civili-
saçso fixera* abandonsr os ordalios e os duellcs, e onde as idéas
do direito romano se infiltrer cedo; em outras forao postas em
pratica os meios da pjova em harmonia com o principio da
verdade material, sem que todavia se tratasse de os erigir em
theoria especial e compléta. As sentenças dos scabini (schaffen),
durante c tempo em que julgarao, nao tiverao outras bases
além da sua propria convicçâo, mediante comtudo a observan-
cia das regras legaes (S).
(22) Conm aqui citar a'inda o Balirrecht (de Bahre, bière, recht, droit)
direito—Tittmann, I, c. p. 46.
,,(23) Malblank, {Hist. da jus. pen.) p. 73.—Haltaus, Glossar.
(S) Vide a errata da versâb franceza-
(24) Donandt, Hist. do dir. polit de Bremen, II, p. 117.
(S) A institniçâo dos tcabini remonta ao periodo dos Carlovingianos, e que
da França se espalhou por toda a Europa. Antes, os processus erâo decididos
pelas assembléas dos homens livres, rachinbovrgt ou boni homines; mas
tornando-se difflcil a reuniào dessas assembléas por ser um omis para o
povo, que podia comparecer on nao, crearâo-se os scabiui
t
juizes com caracter
publico, e que erâo obrigados a comparecer em cada processo em numéro
de sete, de sorte que uonca faltassem juizes para juigar, ainda que fal-
tassem os boni bomines, que, comparecendo, tomavào parte no jtdgamento,
Erâo escolbidos pelas assembléas do povo presididas pelo conde ou governa-
dor. O processo tin ha entâo alguma analogia com a do tempo dos judices
jwrati dos romanos, com a difTerença pom, que neste os judices jv/rati erâo
alistados pelo pretor, e decidiSo sômente do ponto de facto, naquelleos
tcabini erâo nomeados pelas assembléas populares, que se renniào pelo
menos ts vezes ao anno, ( ao principio forâo tambem nomeados pelo coude )
e decidiâo tanto do facto, como do direito, nâo tendo o conde présidente
35
Quando posteriormente as opiuiOes mais reflectidas iâo gene-
ralisando-se em todos os paizes, veiô o direito canonico, que
mostrou-se favoravel ao seu desenvolvimento. (25) Tornou-se
principio noprocesso da îormaçao da culpa ser o juiz obrigado
a indagar a verdade por todos meios possiveis : o que era is-
tituir o systema da verdade material ; e, a partir de entao, as
provas formaes do direito germanico, juizo de Deus e outras
forao inteiramente inadraissiveis. /26) (S)
direito algum de votar, délibérai' ou decidir, e sômenta o de convocar o tribunal
presidi-lo, policia-lo, e fazer executar as suas sentenças ; e os scabinii o
tinbâo tâo absolnta liberdade na decisâo, como pensSo alguns ; elles erSo
obrigados a conformar-se com as leis, e ao seu cnmprimeato erào chamados
pelo conde présidente, e por isso os capitulares exigiâo que este soubesse a lei
de cor. Havia mesmo uma classe de homens doutos denominados Sagiba-rôes
(cuja organisaçâo é pouco conbecida) cu]a missâo consistia em aconse-lbar e
illustrai' aos scabini sobre o ponto de direifo, Savigny, Histoire du droit romain
au Moyen Age, Tom. 1, §§ 68 e seguintes. Sobre a forma do processo nos
diversos periodos da idade média e nos diversos estados da Europa, vide Du
Bctys Histoire du droit crim. des Peuples Modernes ; Gui-zot> Essais sur
l'Histoire de France, IV, cap. 2 § ô.
(25) Thomasius, de Fidejurid., § 62.
(26) G. 1.3, X, de Purg. vulg.; c. II, quoet. 5. (S) Prohibent os combates
judiciarios, e outras purgaçSes vuîgares, sob o fnndamento, de que nâo se
dévia tentar a Deus.
(S) A Igreja prohibio primeiramente o combate judiciario, tolerando os
ordalios, como uma coiicessâo forçada aos costumes da epoca. Depois probi-
bio tambem estes ; e por causa da influencia da igreja comarào a ser pouco a
pouco abolidos das legislaçôes dos povos europeos estes meios de prova
exclusivamente dependentes do acaso ou da fraude.
Âssim como se deve a igreja o ter salvado as letras e a civilisaçâo da cor-
rupçâb e queda do imperio romano, deve-se-lhe tambem o te-las conservado
nos sanctuarios dos conventos e igrejas, como um deposito sagrado, que tinha
de entregar a geraçôes menos rudes do que os barbaros. No periodo da idade
média ve-se duas jurisdiccôes p'ocessando deversamente, a leiga e a eccle-
siastica. Naquêlla os processus se decidiâo pejo acaso e pela sorte (juizos de
Deus e combate judiciario); nesta o processo era regulado por prescricpçôas
maisracioifaes, pois a igreja comecou cedo a abolir o .combate judiciario, por
ter horror ao derramamento de sangue ; e logo depois os juizos de Deus, per
serem supertiçôes indignas de uma sociedade illustrada, e de posse do direito
3e
Osjuizes ecclesiasticos naose assemelhao aos antigos scabini :
sflo verdadeiros magistrados, jnlgando conforme a lei ; tàm-
bem nao é mais à simples conviçRo que devem seguir : uma
romano. A invasao da igreja na ordem temporal, a absorpçâo graduai da
competencia, a inflnencia e predominio sobre a saciedade temporal, que che-
ao seu auge nos pontilîcados de Gregorio VU e Innocencto m, forâo utéis à
causa da civilisacSo. e da humanidade. A. igreja, que à principio reclamara
a sua competencia para conhecer dos crimes de todos os que tivessem ordens
sacras, estendeu-a depois aos fracos,opprimidos, e miseraveis, e a todos os cri-
mes que, m'csmo indirectamente, affectassem a religiâo ; mas a humanidade
f raca e opprimida ganbou com esta usurpapào, porqne encontrou nos tribu-
naes ecclesiasticos nâo um processo mais racional e mais livre para fazer
valer os sens direitos, como peiias mais bumauas. Por causa do borror ao
sangue a igreja nâo podia pronunciar a peua de morte, e nem a da mutila-
çâo ; ereou entao a de prisSo perpétua, como mais em harmonia com o fin
principal da pena, que era, sob o ponto de vista da igreja, a emenda do cri-
mi noso.
Oreou tambem a instituirâo dos promotores publicos, e organisou os recur-
sos. A. influencia da jurisprudencia ecclesiastica. quer ao direito, quer no
processo civil, e criminel, em todas as legislùes dos povos cnltos, é ma-
nifesta. A jurisprudencia ecclesiastica depnrou o que havia ainda de barbaro
e superstisioso no direito romano.
Nâo nos referimos ao processo inquisitorial, que deminou na igreja durante
très seculos, e que foi transitorio; que a principio eomecou pelas denuncias
crétas, continuou pelos devassas sécrétas e processus secretos, sob o pré-
texte, de nâo causai' escandalos, e acabou com horriveis torturas. E' a pagina
negra da historia da igreja. Nem mesmo pôde servir de desculpa a necessidade
que tinba de se armar com penas mais fortes do que a excorumunhâb contra a
hydra da reforma e das heresias ; porque durante o paganismo combateu-o
ella com mais vantagem com a U, humildade, e resignaçâo nas fogueiras e
nos tormentos.
Nos primeiros seculos da igreja os processus erao regulados pelas prescrip-
coes dos livros santos, pela tradiçlo e pelos costumes ; depois de organisada a
jerarchia ecclesiastica tambem pelos crètes dos cencilios e dos papas.
A primeira compilaçao ûe leis ecclesiasticas da igreja latina foi feita no
secnlo V por ordem de S. Leâo.
A segunda foi feita no seculo VI, por Dionisio tomando a primeira por
base, e é conbecido pela dominaçâo de codex Dionysîanwn, codex canonum
e'cclesiasticorum, codex Hadrianum, porqne foi revista pelo papa Adriano no
Vin seculo ; e ultimamente no seculo XVII tomou a denominaçâo de codex
conottum vêtus Bcctesiœ romance. '"'i *
A terceira compilao foi feita por S. Isidoro no VII seculo, nâo se devendo
confundir esta com a collecçâo de Isidoro Mercator ou Peccator (hoje reco-
3V
apreciao juridica da prova dicta-lhes a sentença ; e emquanto
os papas procurao dar-lhes instmCes especiaeé (2*7),"os dot-
tores em direito canonico guiados cegamente pelo methodo
êscolastico, entao dominante (S), erigem uma multidao de re-
nhecida aprocripha sob a denominaçâo de falsas decretaes que dominou
durante très secolos. H
A quarta compilante foi feita pelo monge Graciano no seculo XJI, e teve,
pot fim methodisar e facilitar o estudo do direito canonico, afim de poder
revalisar com a escola fundada por Irnerio. —O author deu-lhe o titulo de
Concordia discordqptium canonutn : raasé mais conhecida sob 0 titulo—J3e-
cretum Gratianum. Esta compilaçâo foi a origem e a primeira parte do Cor-
pus juris canonici, e desdeque foi ella concluida, o estudo do direito canonico
começou a revalisnr com o do direito romano, dando nascimento a uma escola
de jurisconsultes glossadores do direito canonico. Graciano devidio a sua
obra segundo a natureza e diversidade das materias, e nâo cbronologica-
mente.
A. quinta colleâo é a de Gregorio IX , feita pelo monge Raymundo de
Pennaforte no seculo XHI, e é citada pela letra X eu pela palavra extra
precedida do numéro do capituio ou das palavras iniciaes, e seguidas da ru-
brîca do titulo. A palavra extra quer dizer extra Decretum Gratiannm.
Aos cincos livros da compilaçâe Gregoriana Bonifacio Vlll ajnntou mais nm
Iivro contendo a compilâo das leis de igreja posteriores a Gregorio IX.
A sntima foi feita por Clémente V, e mandada exécuter por Joâo XXII, eé
conhecida sob a denominaçâo de Corutitutiones Glementi.
Depois foo addiccionadas ao corpus juris canonici divers as collecçôes de
decretaes, conhecidas sob a denominaçâo de extravagantes, desde Joâo XXII.
até Xisto IV, collecionadas por J. Ghapuis.
No seculo XVI uma nova e gérai compilâo foi encarregada por Ko IV a
uma commiso de trinta e cinco membros com poderes de modificar, glossar,
e augmentar os textes ; e depois de concluido o trabalho foi approvado por
Gregorio XTH, de quem tomou o nome.
Posteriormente forâo addicionados ao Corpus Juris nm livro de decretaes
a Xisto V, ufnoutro até Alexandre lit, nm outro de Innocëncio IV, é final-
mente as Institutas de Lancelot mandadas incorparav por Paulo V. Fauttin
Hellie.obr. cit, tom. I ; Etchbach, Introduction nérale a tude du droit-
André, Cours âlphab. et method. de Droit Canon, dans ses rapports avec U
droit civil ecclesiast. verb. Droit Canon et Duel.
(27) 0. 2,18,14 de prœsumt ; c. 10, X, de Probat.
(S) A philoBophia escolaslicaé a expressâo da idade média, cujo principal ca-
racteristico é o predominio da igreja : a theologia era o seu fundo. e a philoso-
phie de Aristoteles a sua forma. Desde o seculo VIII, em que a escola foi fun-
gras, construem um systema, combinando-as com as proprias
expressOes dos livros biblicos (por exemplo, quanto ao numéro
detestemunhas exigidas) (28), e de certes textes dos juriscon-
sultes romanos.
Neste tempo apparece Scbwartzemberg, o autor da ordena-
çao da justiça pénal de Carlos V (1532), cujos esforçps tendem
evidentemente a dirigir os processos no sentido da verdade
material, é o caracter impresso em toda a sua obra ; embe-
bido, como acbava-se nas theorias reinantes, 'elle quiz fixa-las
em principios de lei.
Vê-se o desde entao, procurar obstar a essas injustas (29)
condemnaçoes (30) baseadas em probabilidades simples, esta-
belecer regras mais précisas, emittir certas normas sobre o uso
das fontes das provas, enuneiar os principios, que deverao
guiar o Jutz (31) na apreciaçao dos casos difficeis (por exem-
pte nada prova artificial (32) ; e além disso, formula certas
prescripçOes relatilamente a algumas provas de natureza en-
dada , por Alcuino. chamado por Carlos Magno para ensinar nos scholos que
fundara (e d'nhi vem-lhe a denominaçào de scolastica) até o XVII seculo, isto é até
Descartes, a philosophia scolastica acompanhou e reflectio as phases po-liticas
dessa idade historica. A principio erao predominio absoluto da theo-logia ; na
segunda epoca a tentativa constante de emancipaçâo, e na ultimaa rervindicacâo da
independencia do pensamento. Porém mesmo nessa tutella do pensamento, que a
igreja exerceu durante a idade média, e nâo obstante a lucta dos realistns e
nominalistas, o direito e o processo muito lucrarâo com o desenvolvimento
scientifico das idéas do bem, do justo. da verdade. de Deos emfim, que sahiâo cada
vez mais depuradas dessa lucta entre os theologos sco-lasticos.
(28) C. 5,10.23. X de Testants.
(29( Biener, Ensaio historico sobre o processo por viadainquisiçao.
(30) Art. 22.0. C. C.
(31) Exemplo : Art. 71, id. » '
(32) Exemplo.: art. 2345id.
(*) Desigua-se assim commumente a Carolina, cujo titulo erdadeiro é Cons-
tihriio crimnalis Carlina.Maitas traducçôes latinas tem sido feitas, citaremos a de
Gobler (1643), de Remua (1694),reimpressa em 1831 por Abegg. Nota du
traductor France*.
ganaclora), por exemplo, a emanada dos cumplices (33); déter-
mina imperativamente sobre quaes deva proferir-se a condem-
naçao (34); e em. termos n&o menos peremptorios exclue certas
outras, cujos resultados fallazes parecerao-lbe dever receiâr-se.
Desde esta epoca os criminalistas praticos vao buscar nos
textoa do direito romano e do canonico, e no que é concernente
à Allemanha, no texto da Carolina, os materiaes d'uma theoria
compta da prova. Antes os escriptores do XIV e XV seculos,
os Gandinus, e os Bonifacius tinhao ftrmado princïpios nesta
materia ; o primeiro occupâra-se dos indicios (35) ; o segundo
mais complète jâ, tratâra da prova em gérai (36) ; reconhecêra-
lhe cinco cathegorias ; aprofundàra a força demonstrativa da
prova por testera imhas ; exigira o .depoimento de duas pelo
menos (37), para que houvesse condemnaç&o ; e pela pnmeira
vez estabeleceu a divisso em prova plena e semiplena, que per-
durou aténôs.
A obra de Jul. Clarus attesta progressos muito mais nota-
veis ainda ; este autor quer, em todos os casos, a prova com-
pléta, e diz sob que condiçoes o testemunho (38) e a confissao
devem merecer fé. Ao mesmo tempo prescreve o exarae es-
crupuloso de todas as circumstancias accessorias, e discute as
questoes controvertidas sobra a materia (39). Fariniacius (40),
(33) Exemplo art. 31 id.
(34) Art. 67 id.
(35) Gandinus, de Meleficiis (em seguida da edic. d'Angélus Arretinus.
(36) Tractat.de Maleficiis, cap de Probat. e de Testib.
(37) Pelas explicacàes que da, pag, 141, vè-se que muitos juriaconsnltos con-
temporaneos exigiâo pelos menos très testemuuhas.
(38) Olarus.Sent. $ fi**, gumsl. 66 n. S.
(39) Clarus I c, quast. 21,55.65. ,
(40) Farinacii, Protêts et theoria critnin. et alia opéra critnin. Duaci 1618.
*
40
Mithœus (4C Imberto^P), Mathœi (4^todos fallârao no
mesmo sentido.
Uma apreciaçao mais recta e mais segura do que a dos seus
antecessores, a exactid&o das divisCes, e sobretudo uma preâi-
lecçao decidida em favor da verdade material, se observa em
B. Carpson. Como muitos outros, nao pôde todavia isentar-se
do preconceito, que faz crer-lhe, que nao sendo a prova com-
pléta,' em vez da pena maior, deve ser pronunciada uma me-
nor (44). Estimamos menos os escriptos de Menochius (45) e
de Mascardus (46), que, consagrando longas explicaçOes mi-
nuciosas a theoria da prova, reunirao, sem motivos solidos,
uma multidao de regras tiradas de grande numéro de textos
das leis romanas ; empenharao-se em erigi-las em prescripçoes
absolûtes, quando o legislador em Roma nao teve em vista
sen&o depositar certos principios na consciencia do juiz ; vè-se
por exemple, tratando da incapacidade das testemu.nb.as,
npplicar sem restrieçao à lei nova certas disposiçoes, que s6-
meute o processo romano podia adraittir ; formar uma lista de
innumeras presumpçOes ; e contribuir principalmente para'
espalhar a idéa erronea, de queasentençaserla fallivel, quando
condemnasse pelo .depoimento de duas testemunhas sômente.
Segundo elles,' a economia da prova transforma-se em um
calculo arithmetico ; ha meia prova, prova além ou àquem da
(41)
Millœus,
Praxis crimin. persequendi.
Paris, 1541.
(42)
Imberti,
Institut, forent.
Paris 1585.
(43)
A. Mathœi na obra intitulada :
de Qriminibus ad libros
47, 48. Dig. Ultra J.
1644.
(44)
.Prose,
crim.,
p. III,
quant.
G.—Este systema é tambem seguido pelos autores
fancezes contemporaneos (Vide Papon, 1. 24, t. 8. n. 1 da sua
Coh lecçtto de
arestos,
fragmento citaclo por M. Bon nier,
Tratado da prova.) Nota do traductor
Frimcex.
(45)
Menochius, de
Prœsumpt.
Colon., 168G.
(46)
Mascardus,
Conclus, de probat.,
vol. 4 Francfurt, 1684,
41
meia prova. distincçOes que so servent para confundif os juizes.
De todas as legislaçôes do XIV seculo, a da Bavière (47) é que
reproduz com mais fidelidade as idéas dominantes entre os
praxistas de entao.
Admitte, porém, a tortura, e no caso de prova incomplèta
permitte decretar uma pena excepcional (48) j nao pôde-se
conseguintem ente dizer que o seu System a pienamente satis-
faça aos principios.
-
A ordenaçao de justiça pénal de José II trouxe melhoramen-
tos essenciaes, abolindo a tortura (49), e o juramento purgatorio,
e autorisando a condemnaçao no caso de concurso de indicios.
Uma notaval tentativa ahi se fez : a de déterminai
4
completa-
mente sob que condiçfies pôde-se decretar a pena por simples
indicios, de sorte a nao haver perigo, nem para a sociedade, riem
para a innocencia. Devemos tambem citar, corao particu-
larmente notavel, a lei promulgada em 1786 por Leopbldo, gran-
duque daToscana (50), que abolio igualmente a tortura; a par de
tendenoias decididas em favor da verdade material, o legislador
continuameute esforça-se para abrigar o indiciado de todo
tratatnento injuste. Todavia, nao soube escapar a um reste de
preconceitos timidos (51); récusa *>da a força probato-ria aos
indicios, e, por maior que seja o numéro dos que con-
(47) Cod. maxim. bavar. crim de 1751, part, II, cap, 5.
(48) C. c, cap, 5. gS I. 8 e 18.
(49) Promulgado em 1788, cap. 8II.
(50)
Vide Carmignani na Itevisla de legislagHo esirangeira do M. M. Mit-
termaier e Zacharioe t. 1 n. 19.
(51) Cad, de I.eopoldo, de 30 de Novembro de 1786, art. 110.
6
43
correin na causa, sûmente autorisa a applicaçEo de penasmeno-
res, como banimento, prisao, etc. (52).
No fini do XVIII seculo manifesta-se uni movimento consi-
deravel nas idéas, e o espirito de aperfeiçoamento, que régénéra
a sciencia, nao permitte desprezar a theoria da prova.
Nesta parte como nas outras é Beccaria (53) quem ini-
ciativa a novas investigOes ; estabelece o principio do que a
certeza, essencialmente exigida em materia crimiual, nao pôde
ser comprehendida em regras scientilicas ou legaes ; que ella
funda-se no senso intinio e innato, queguia o homeai nos actos
importantes da vida, e que, portanto, os jurados sûo OR
raelhores juizes do delicto.
Apés elle, todos os criminalistas da sua escola indagao
tâobem, quai deva ser a economia da prova judiciaria ; quai a
preferivel, se a convicçao intima dos jurados, ou se uma theo-
ria gal, que dictasse a sentenç?. a juizes regulares.—Filan-
gicri (54), entre outros^ que aprofundou a questao, chegou a
concluir, que a certeza moral réside sômente na consciencia do
juiz ; porém que ria mais prudente submefctè-la a uma espe-
cie de critérium légal- (55j, por meio de aigu m as regras
inscriptas no Codigo, que ligassem sua opiniao : depois, pas-
sando da theoria â a]*plicaçâo, tentou traçar estas regras (b&) ;
porém outros, que lhe succedêrao, (57) demonstrarâo facilmente
(52)
Carmignani tenta justificar esta meclida ; vide
lie Leggi,
vol. 4, pag, 272.
(53)
Dei Déliai e délie Pêne, arts. 7 e 8.
(54)
Filangieri,
Sciensa lie le gitlasione,
v.il liv. 3 cap. 10 é 15. Edieâo de
Philadelphia 1799 pag. 311.
v
(55)
Sciensa,
I, c, vol. II, cap. 15, pag» 393.
(56)
Scimza,
I. c, vol. II. cap. 15 p. 393.
(67) Pasquale.
Liberatore saggio sulla giurispruden+a penaH,
Napoli 1814,
p. 180.
lH
..
I
43
o vicio de prescripçoes demasiado geraes e dando azo a uma
intetpretaçao arbitraria, que militas vezes nao sao totalmente
verdadeiras, e se converteriao com facilidade n'uma fonte de
etros.
D'ahi tentou-se, ora reduzir a um syslema mathematico a
theoria da certeza em materia cviminal, ora applicar o calculo
das probabilidades ( 58 ) â jurisprudencia ( 59, ) ora aprofun-
dar a natureza e fontes da certeza ; em quanto outros, divi-
dindo e subdividhido ao infinito, esforçavao-se em fixar as
regras e as condiçôes de cada espeeie de prova. Globig, na
obra a mais notavel pelo seu alcatice philosophico, sem todavia
ter em vista as leis positivas, analysou a natureza da prova em
gérai (60); pelo contrario Ranft (61), ffleinschrod (62) e
Stubel (63) tentàrao construir, para o juiz, uma theoria ba-
seada sobre os principios do direito commun) e opinioes acre-
ditadas dos praxistas. Foi entao que na Allemanba susci-
tou-se a questao—se dever-se-4a ahi introduzir o jury, e essa
questao de tanta monta, 'veio dar aos estudos sobre a prova uma
direcçfto nova. Geraes erao os clamores contra os inconvenientes
do System a vigente ; a consciencia do juiz estava peada ; obri-
gado de um lado a obedecer as prescrioes da Carolina, dessa
legislaçao, que tinba-instituido o seu systema, sob a falsa in-
(58) Vide sobre este assumpto um escripto notavel intitnlado; Saggio sopra
i principi i fundamenti délia probabUUa, Livorno, 1790 ; e sobretudo a
Logica de probabili applicala a giudizi criminali, por M. Pagano, Milauo,
1806. '
a V
(59) Gitaremos, como tendo refereucia a questSo, o Essai philosophique sur
les probabilités, de Laplace. Paris, 1819.
(60) Globig, Theoria da probabilidade, Regensb., 1806, vol. 2.
(61) Eauft, Da prova em materia pénal, Freiberg, 1801.
(62) Kleinschrod, Archiv. do direito crim., vol. 4, art. 8 n. 4.
(63) Stubel, Do corpo de delicto, Wittenberg, 1806.
44
fluencia da confiança na admissibilidade da tortura, nao tinha,
d'outro lado, o poder de pronunciar imia coademnaçfto, ainda
mesrao que um poderoso concurso de indicios élevasse quasi â
certeza a mais compléta a verosimilhança da culpabilidade do
réo. Esperàva-se encontrar no jury remedio para estes incon-
venientes ; por isso examinou-se a fundo o valor desta insti-
iuiçao sob o ponto de vista do direito criminal ; investigou-ae a
natureza da verdade absoluta ; tratou-se enfim de saber,, se
uma theoria légal de prova é cousa possivel. Os estudos enge-
nhosos e ao mesmo tempo profundos de Feuerbach (64) pu-
zerao a questao na ordem do dia ; e Meyer no seo livra ( 65 ) a
commissâo immnliala instiluida na Prussia (66), e Gxo-vell
(67) no exame^que fez dos trabalhos desta, expenderao
observaçOes importantes.
As prescripçOes de direito commum allemao levavao militas
vezes ao erra, como acabamos de dizer, porque abafavâo as
convicçoes livres do juiz sob uma multidâo de regras, e o for-
çavao outras vezes a absolver um réo realmente culpado," ligado
como estava ao System a restricto ta Carolina ; mas nesta época
atacou-se em seo principio a propria theoria da prova, e em
lugar de limitar-se as applicaçOes restrictas, e inintelligentes,
que délia se fizerao na Allemanha, quiz-se inteiramente ridi—
cnlarisa-la. Alguns escriptores francezes, que tambem. criti-
cârâo o systema da lei allemao, quasi nunca apreciârao o seu
verdadeiro espirito e resultados possiveis, caso se houvesse feito
délie uma applicaçao racional ( 68 j.
(64) De Feuerbarch, Consideraçdes sobre o Jury, Landshut, 1813.
(65) Meyer, Espirito, Origem e Progresso dos instituiçôes judiciarias, La Hoge
1819, p. 506.
(66) Relatorio da Commissâo prussiana sobre o Jury, Berlin, 1819.
(67) Groevell. Exame do relatorio da commissâo, etc., Leipsick, 1819 part. 2.
(68) Disto convence a leitura, entre qutros, de Loorè, Législation criminelle de la
France, I, p. 159, Meyer tambem nâo tem' inteiramente a verdade du seu lado.
45
Entretânto osgovernos allemaes, quetambem desejàr&o orga-
nit completamente o processo criminal, sentirao a necessi-
dade de ampliar esta organisso a todos os principios da prova.
Seus esforços attestao uma teudencia évidente para a verdade
material, e o desejo de couverter em lei todos os preceitos nas-
cidos de uma melhor praxe, ou fornecidos pela doutrina, pre-
ceitos uteis para dirigir a attençao do juiz ; plantât balizas,
que lhe sirvao de guia ; e encerrar nos mais acanhados limites
o arbitrio, queria militas vezes funesto à. innocencia.
O Codigo austriaco ( 69) satisfaz-se em traçar algumas regras
geraes ; insiste todavia nos meios probatorios, que devem servir
de base ao julgamento ; indica sob que condiçôes tem elles
força probatoria ; ordena ao juiz que verifique sempre as proba-
bilidades, que encontrar na causa, e a unanimidade das teste-
munhas por meio de todas as outras prôvas ao seu dispôr (70) ; e
ao mesmo tempo deixa à apreciao do juiz uma latitude suf-
ficiente ( "71 ) ; e cuidadosamente évita todas as disposkOes abso-
lutas, e de natureza a constrangel-o a considérai
1
como verda-
deiro [ sob o pretexto, por exemple de haver concurso de certas
provas (72), aquillo que a sua consciencia desmentisse ener-
gicamente. Enfim, e de um outre lado, o Codigo austriaco mos-
tra-se, na economia da prôva, mais livre que o direito commum
da Allemanha; assimé que admitte, que o depoimento de dons
cumplices, que o concurso ( 73 ) das circunstancias da causa
(69) Codigo pénal de 1803, part. 1, cap, 10 (tradusido por V. Fouetter).
(70) No caso de confissâo, por ex. : cap. 10. Art. 400.
(71) Por ex. : quando se trata de decidir da influencia no processo de uma
c
onfissâo, sobre a quai o accusado se tivesse retractado. Art. 403.
(72) O Art. 404 nâo diz que o juiz devecondemnar quando duas leste-mu n
lias déposèrent sobre o mesmo facto/diz inente : Em rai para que lioja
prova de direito é necesaaria a affirmaçio de duas testemwnhus.
(78) Art. 410.
4e
possao demonstrat pleua e cabalmente (74). A ordenaçao cri-
minnl daPrussiatevetambemem viataaverdadematerial (75),
porém as .suas prescripçOes ja sao mais absolutas, e peao mais
0 juiz ( 76 ) ; a sua doutrina é bem pouco justa, quando classi-
fica na mesma cathegoria a par dos indicios, -todas as provas
naturaes impérféitas, por exemplo o depoimento de uma teste-
munha, a confissâo extrajudicial ( 77 ). Porém principal-
meute azo à censura po'r nao attribuir força alguma aos indi
cios, embora fossem, no seu concurso, démonstratives até à
evidencia ; e por autorisai
1
a condemnaçao à uma pena extrbr-
dinaria ( 78 ) em termos concebidos de modo a favorecer no juiz
a opiniao, de quêtai pena é attendivel nocaso de prova incom-
pleta, abrindo assim. a porta a condeiqnaçQes por simples
suspeita.
E' na ordenaçao criminal da Baviera (79) que encontra-se a
tbeoria mais compléta, mais notavel enfim, pela observancia
rigorosa dos principios scientificos sobre a materia. Deve-se,
comtudo, reconbecer, que desejando prinçipalmente formular
um systema, em que nada faltasse, e muito preoccupado talvez
em encerrar o juiz em estreitos limites, determinando-lhe sob
que coudiçOes necessarias a prova p6de ser inteira, assignan-
do-lhe regras absolutas, contendo normas positivas ou prohi-
biçOes, nao soube o legislador evitar certes defeitos. Assim,
em muitos casos, o juiz nao pôde seguir a sua convicçao, e,
mào grado seu, vê-se forçado a proferir a absolviçao do crime
(74) Art. 412.
(75) Ordenao criminal de 1805. tit. IT, secc. 6.
1
(76) Por ex. : o art. 366 attribue muito peremptoriamente força compléta à
prova testemunhal, se ha afflrmaçao de duas testemunhas.
(77) Art. 898.
(78) Art. 405.
(79) Orden- crim. da Baviera promulgada em 1813 part. 3, tit. IV.
47
ou a absolvao da instancia. Adoptando a qualificaçao de meia
pr&oa, den à sua obta o caracter mathematico de uma tarifa
(80) ; deixa, por outra parte pouca latitude 80 magistrado, e
emèra iimalonga série de individuos incapazes de depôr (81),
quando as menores circuostancias na causa poderiao leva-lo
a apreci&r o grâo de confiança, que devesse concéder a- s-
temunha.
E'm resumo, uma multidao de prescripçOes rigorosissimas
sobre a prova foi introdusida na ordenaçao bavara, as quaes
podem motivar a impunidade doindividuo verdadeiramente
culpado (82). Querendo deixar a menor margera possivel ao
arbitrio do iuiz no caso principalmente, em que os meios pro-
batorios sâo fallazes por sua natureza, o legislador exigio um]
conjuncto de condiçOes, que mui raras vezes serao satisfeitas,
devendo o iuiz absolver, ainda que faite sô uma délias (83).
Depois, prescrever, como elle o faz, a penâ de morte, quando
nao houvesse prova compléta pelos indicios (84), mas por indicios
sômente, nao é ao mesmo tempo commetter uma grave incon-
sequencia, e pôr o fim de lado (85)? Nao é inquinar de sus-
(80) Art. 286.
(81) Por ex.: art. 278 n. G e 7:—Todos os que forSo condemnadot, ou mesmo
que nao forSo completamente absQlvidos por crime de perjurio. Este pres-
cripçâo nâo séria rigorosa no caso em que a testemunha excluida tivesse ante-
riormente prestado um falso juramento por piedade sômente, e para nâo perder
um accusado?
(82) O art. 283 diz pur ex. : que'—O âepoimento do pessoa lesada pelo crime
'jamais poderia faner plena fê contra 0 indiciado ; ora como applicar esta
doutrina no caso de estupro ? H
(83) Vide o art. 3S8 que exige o concurso de indicios anteriores, concuini-
tantes, e posteriores para que os factos revelados sejSo considerados certes.
(84) A censura nâo poderia applicar-se a Feuerbach, que pelo contrario
criticou esta disposiçào noseu livro intitulado Causas memoraveis part. 2 > p.
191.
(85) Art. 330.
48
peita toda a condemnaçao baseada em indicios, e abandorial-a
antecipadamente, por assim dizer, à censura da opini&o popu-
lar? E' ainda a consequencia do preconceito fatal a segurança
publica, ao quai no direito commura, o juiz era forçado a obe
decer, nos terni os do art. 22 da Carolina ; por isso é que vejnos
em muitos estados allemaes o legislador tentar remedial-o, ao
menos provisoriamente, e autorisar o juiz a pronunciar a con-
demnaçao sobre simples indicios. Com este fini forao ordena-
çoes promulgadas nos estados de Weimar (86), Anhalt, Des-
sau (87), Hanover (88), e de Lippe (89), as quaesnos outros
pontos essenciaes limitao-se a copiar a lei bavara.
As theorias de codificaçoes novas obrigarao a estudar ainda
a questao da prova. A sciencia emittio diversas thèses sobre a
natureza da verdade ; indagou sobretudo se ô objectiva ou
subjective; examinou-se de novo, se uma theoria légal da prova
é cousa possivel (90) e especialraente tambem se os indicios
poderi&o fazer prova compléta ; se a lei prussiana teve ou nao
razao para décréter em semelhante caso a pena extraordinaria;
se finalmente n&o séria preferivel abandonar qualquer ten-
tetiva de uma theoria légal, e autorisar simplesmente o juiz a
obedecer à convicç&o interna. De mais, o clanior levantado de
todos os lados contra os codigos allemaes, e suas prescrip-çoes
rigorosas (91), fez assentar as doutrinas, consagradas
(86) Lei de Weimar de 1819» vide Arehivos do direito crim. t. 6 p. 259.
(87) Ordenaçâo do processo d'Anhalt de 1822, t-ît. "21 § 2.
(88) Ordenaçâo de 25 de Maio de'1832.
(89) Ordenaçâo de Schaumbonrg, Lippe de 11 do Setembro de 1828.
(90) Jarke, Arehivos do direito crim. t. 8 p. 98—Weber. ibid.» t. 8 p. 502— Vide
tambem muitos artigos no Jornal de direito eriminal prwtsiano de Hit-,sig n. 17. p.
150; n. 19 pag. 131—Zum Bach, OpiniSes e ohsercaçSes sobre o objecto do
direito çrimittal. p. 326.
(91) Vide sobretudo Gmelio. Da administraçào da justiça eriminal non estados
vequenos, Tubingue, 1831.
pelas centes ordenCes criminaes, em bases mais largas do
que as que serviao de fundamento aos processus do direito
commum, e as legislaçses locaes, como o codigo bavaro.
Assim, o projecto de lei para Wurtemberg (92), reduz a
dous (93) o numéro dos individuos absolutamente fucapazes de
der em juizo, e todos aquelles, que erSo excluidos pelo co-
digo bavaro, achao-se nelle classificados como meramente
suspeitos. Todas essas condOes peremptorias, todas essas exi-
gencias formuladas no mesmo codigo a proposito de cada meio
de prova, o projecto, de que nos occupamos, transforma-as em
simples recommendOes geraes, a que deverà attender o juiz,
sem deixar se dominai' por ellas \94). Da mesma sorte quanto
aos indicios, os escrupulos menos rigorosos do legislador trans-
fqrmao-se em simples conselhos ao magistrado (95); todavia
este projecto manteve a Tegra da lei bavara, que proscreve a
pena de morte, quando os indicios constituent a unica prQva
(96 e 96 A).
Devemos igualmente fallar do projecto de lei hanoveriano,
que se nao afastava tanto do codigo bavaro : nelle a economia
da pTOva estava regulamentada, e o juiz sempre peado (97).
(92) Este projecto data de 1830 ; acha-se no segundo supplément» extraordi-
nario da coUeccâo das actas da Oamara dos Représentantes 1830, cap. 4.
(93) Art. 254.
(94) Vide principalmente o artigo GO sobre as declatacôes do cumplice.
(96) Art. 280.284,287.
(96) Art. 289.
(96 a) Este projecto, que data, como se disse (nota 8 p. 26) de 1830, admittia
tambem uma quasi publicidade no fim dos processus. Mas na sessâo de 1838,
as camaras Wurtemberguezas votarSo uma moçâo pedindo uma ordena'çâo de
processo criminal baseado inteiramente sobre o dobate oral e publico. A lei de
22 de Junlio de 1843 attendeu ao seu voto (vide mais abaixo a nota manus-
cripta) mas sômente em parte (Nota do traduetor francex).
(97) Este projecto é de 1830—Vide part. 2, secc. 8.
7
so
Por uma inconsequencia singular, o legislador distinguira,
conforme a accusaçSo motivasse uma pena grave, ou levé ; no
primeiro caso mostrava-se mais severo (98), como se a certesa
nSo fosse uma, enRo devesse sempre ser a mesma, qualqner que
fosse a natureza da pena. Exigia além disso um numéro ex-
cessive de condiçtes, e entre ellas. as que se referiao à con-
fiasfto erao formuladas de um modo absoluto, o que é grave
erro ; porquanto, se por um lado a eonfiss#o nem sempre rae-
rece plena fé, nao é menos verdade, qne «mitas vezes, quando
mesmo um interrogatorio capeioso a provocasse (99). n3o resr
tarda duvida no espirito dos juizes. O numéro dos incapases
para depôr como tèstemunhas era tambem muito considera-vel
(i00),o que é um mal, porquanto o juiz, algumas vezes, nao
pôde fundar a prova senao no depoimento de uma sô tes-
temunha, que as circunstancias da causa conseguem demons-
trar digna de confiança. Para obviar a estes inconvenientes
possiveis, o legislador despresa sempre a prova assim produ-
sida, impedindo o magistrado de aproveitar-se das declaraçôes
tao uteis desta unica testemunna : n'outra parte cahia o pro-
jecto no excesso contrario (101), quando, impondo ao tribunal
uma verdadeira coacçao, declarava mais do que meio prôva-
dos {nuhr ois haib bewiesen) os factos contidos no depoimento
de um officiai publico [landesherriicher Dïener), com tanto que
a causa nao produzisse senao uma pena levé. Ora a experien-
cia desmente quotidianamente semelhante presumpçao. A
regra de que duas tèstemunhas fazem prova plena achava-se
(9S Art. 301.202.
(99) O art. 2fl9, n. 2. estabelecia a prineipio que. para qne a confissâo pro-vasse,
era necessario qne nao tivesse sido obtidà por un interrogatorio inâ-
dioso.
{100} Art. 214.
(101', Art. 290.
SI
tombera ahi estabelecida em termos muito absolutos (102). Os
indicios sômente, como no codigo bavaro, nao podiâo autori-sar
uma conderanaçao capital (103). Deve-se entretanto reco-nnecer
que, quanto ao mais, este projecto de lei mostra-se mais libéral
que o seu modelo; e que nelle se encomtrao adver-tencias uteis e
coucebidas em termos mais geraes sobre a admi-nistraçao e
apreciaçao da prova (103 A).
Finalmente, na Baviera estuda-se nm novo projecto de codigo
do processo crirainal, que affasta-se totalmente do System a
antigo. Admitte uma especie de jury, neste seutido, pelo rnenos,
que entre os juizes, cinco devem decidir do facto, e quatre do
direito ; e os primeiros, depois de um debate publico, sem serem
adstnctos à regra alguma, décidera conforme a sua consciencia,
se o accusado é ou nao culpado (104).
Entretanto no meio de todas essas reformas, o projecto admitte
ainda uma especie de theoria negativa da prova (105); os juizes
nao poderiao declarar a culpabilidade, se a confissâo nâo fusse
feita solemnemente em audimcia, e nâo fosse corro-borada par
outras provas, ou se os indicios, nao corroborados tambem por
outras provas se baseassem mente no depoimento de uma
unica testemunha. Mais tarde examinaremos a fundo este System
a. (*)
(102) Art. 222.
(103) Art. 249.
(103 a) Este projecto foi seguido da lei de 8 de Setembro de 1840 que orga-
nisa o processo criminal. Outra lei de 19 de Novembo do mesmo anno organisa
o processo policial (Nota do traductor Froncez).
(104) Este projecto é de 1831. Vide o artigo 164.
(106) 168,
(*) Durante estes ultimos sais annos a theoria da prova foi muito aperfei-
coada nas diversas legislaçôôs da AUemanha. TJmas formulando antes regras
negativas por assim dizer, ou prescripçôes concebidas n'um sentido mais largo,
deixâo plena liberdade ao jui z na sua apreciaçao da prova, ao mesmo tempo
S 3
Entre as obras especiaes que, nos tempos contemporaneos,
tÎTerio sobre as idéas a influencia a mais nniversal, detre ci-
tar-se o tratado de Bentham (106), do quai Damont publicou
um extracto (107) Ardente em combater os preconeeifos, onde
que o ao aeeusado fodas as garantâs necewin contra mn julgamentg
arbitrarioou predpitado. Outras preoeupao-aa damais corn a neeessidade de
reguiareom predsâo a prora par indicim c "* âeooannada circunstanciada
Vide 7* parte/ ; detennmao aob que cocdiçôes easeBdaesojuïz pôde em tal
taso déclarer a culpabilidade.
Entre as Seis que se conforma» coca o primeiro Systems dtaremos: !• A de
Meklemboorg de 12 de Janeiro de 1841, *o* m proen ou proteste criminel:
Ado Oantâo de Berne de 3 de Norembro de lS42tamBem sobre aprora.
que comeea deelarando mnito jndidsamente, artigo 2* : para que passa
ha/cer condemnaçSo sâo necessarias a eristencia deprova reeonhecidada pela
lâ.taemcif.a*da culpabttiàade nojuix. Desde entio este nâoémais obri-gado
a eondemnar. por mais perSâtas que sejâoas provas aos olhosdalei. qaando
nâo estirer convecddo de que o aeeusado é enlpado :
S* A orienaçao do processo pénal do Wurtemberg, de 22 de Junho de 1813
(Videacima nota :>5 a;.— Os artigos234—339 encero preseripçdes minudosas
sobre a materia, asqnaes, como se percebe bem depressa, sâo antes de mna na-
tur negativa. Sâo tambem mnito mais simples, que as inscriptas no eodigo
Bararo. Quasi sempre os artigos deasa lei sâo concebidos de modo a deisar ao
juiz toda a sua Uberdade de apredaeâo.
Mas é na ordenaeâo do processo pénal Badez de 6 de Marco de 1845que
ha progresso; suas preseripcôes sobre a materia.aila.248 e 271, détermina* cer-
tes limites à ime eonsdenda do juiz.-elle nâo pôde eondemnar em todos os easos
em que faltar qualquer das condiçôes requeridas, e o art. 270 dispôe que:
Quando mesmo todasas condiçôes estùtessem plenamentepreenchidas,nto
deterd pr&nuncûtr a condemnaçSo senSo quando a sua couvieçSa seja com-
pléta e posiiïca : quando ma présenta das fartai da coûta, dd plena fi as
prora* directas produsidas,- mumdo te sentir trresistioelmente arrastaào
por um concurso de indieios, que se enraaeûo, e m appoiSo uns sobre os ou-
tras, os quaes seriâo phenomenot inesplicaseis em qualquer outra hfpethese.
—Note mannseripta do autor. <
(108) Bentham, RationmU ofjudieiale etidense, Londres, 1827, roi. 5.
(107) Bentham» Tratado das proras jmdiciarias. Paris. 1823. Poiesteex-
traoto prindpalmente que fez eonheeer o trabalho original.
53
os encontra, Bentham quiz demonstrar, que em materia de prôva
judiciaria houve err/> anteriormente, até elle, de queref traçar
regras geraes de apreciaçao, e de suppôr-se que poder-se-hia
determinar na lei os diversos grâos da verdade. Entre» gou-se a
novas investigaçôes relativas à verdade, e à sua essen-eia, e
crendo ter descuberto as leis da natureza humana, avança certos
principios, cnja applicaçao ao exame dos depoimentos humanos
elle aconselha, tomando a experiencia porguia. Parte
systematicamente do principio da disconfiança, e prétende en-
sinar quaes as sancçoes penaes, com. o auxilio das quaes a con-
fiança poderia renascer, e apparecer mais brilhante.
O seu livro esta cheio de observaçOes excellentes, attestando
nm conhecimento profundo dos homens, porém muitas vezes
tambem mais especiosas do que justas ; é o que se reconhecerâ
facilraente, quando sujeitarmos o seo systema a um 'exame mais
profundo. Ad ver sari o radical das instituiçôes existentes, nao se
mostra justo em todos os seos ataques, e n&o tendo uma idéa
perfeita da theoria légal da prova, pois que nao estudou, nem a
legislaçao, nem a jurisprudencia allema, combate-a a todo o
transe (108.)
Novas investigaçoes vierao enriquccer mais a sciencia (109),
quando penetrarao na Europa os principios do systema das prova
s admittido nas leis, e na pratica judiciaria da Inglaterra. Os
trabalbos dos Philips (110), dos Starkies (111) dos Rus-
(108) A escola de Bentham produsio doua tratados mais p'equenos, sob a
forma de dissertaçôes academicas, que é conveniente citar aqui: Bolin, De
probatione delictorum, Gand, 1826;—Swaving, De judicis anitni sententia in
cntninalibus opHtna judtciorum modératrice, Lugdum Bat., 1826.—Vide o
processo criminal comp. do autoivcap. 18—19» que é m.ais dôsenvolvido.
(109) Um tratado apreciavel foi publicado sob o titulo de Evidentia, Lugdum.
1825, por J. A. Joubert.
(110) Philips, Tratado das leis da prova. Londres 1824, 6* ediç. 2 vol.
(111) Starkie, Tratado etc., 1834, Londres, 3 vol.
*
34
sels (112) forSo estudados com cuîdado ; pouco tempo depois
oCodigo das provâs (Code of Evidence) redigido por Levingston
na America do Norte (113) vèio deraonstrar que n&o ha in-
compatibilidàde absoluta entre um corpo de regras sobre a
prova e o systema do jury. Indagon-se entao se, era lugar de
uma theoria formai, nao séria melhor redigir uma simples
instrucç&o sobre a prova (114); depois ensaios legislativos
muito récentes, que, ao passo que conservavao a instituiç&o
dos juizes regulares, abandonav&o a antiga theoria, e deixav&o
a estes plena e inteira liberdade na decisao do ponto de facto,
servirao de texto a estudos, como se vê, diariamente renas-
centes (115).
De todos os autores modernos, o que desenvolveo com mais
profundidade os principios da theoria gal da prova, foi
Carmignani (116), o quai no seo livro dedicou-se a comparar
os dous caminhos oppostos que conduzem à verdade, o exclu- >
sivamente instinctivo que segue o homem partindo do senso
intimo, e innato, e o traçado pela sciencia e baseado na obser-
vaçao expérimental, e que,estahelecida esta comparaçao, cide
que as melhores garantias da equidade dos julgamentos con-
(112) Russel, Dos crimes e delictos, Londres, vol. 1,1826; vol. 2.1828.
(113) Um resumo foi publicado nos Archivos de dir. erim., 1.12, n. 16.
(114) Vide o artigo publicado pelo autor na collecçao precitada, vol. 13, n. 16;
vol. 18, n. 4 e 9.
(115) Vide por exemplo, Gans, Ensaios sobre a reforma da legislaçâo prus'
siana, vol. 1, n. 6.
(116) Carmignani, Theoria délie Leggi délia sicurexa sociale. Piza, 1832,
vol. 4, p. 101 e seguintes.
sistem na economia da prova bem regulada pela Bhf*)'. (8)r-^
(*l A Allemanha acolheu com estima a obra de M. Bonnier (Tratado das
Provas). Pela leitura deste livra roconhece-se o jurisconsulte consumado. M.
Bonnier estabeleceu com claresa os principios geraes da prova; sua classifica-
çâo é bem concebida; a prova testemunhal, e a prova preconstituida, on pur
litulos, ahi sâo sobretudo sabiamente desenvolvidas. Devemos igualmente fazer
orna mençSo especial do Tratado da prova (2 vol., 2 ediç., Boston 1844) do
americano Greenleaf, professor em Boston. Este escriptot faz derlvar as regras
da prova dos principios geraes da philosophia, e da psychologia. Tira partido
dos tratados especiaes, que apparecerâo na Inglaterra, mas sem nada perder por
isso da originalidade, e da clareza que o distinguent e para quem salie quanto é
grande nos Inglezea e Americanos do Norte, o poder dos pdentes, e com
que cuidado particular se toma nota das questôes, que tem relaçao com a
administraçSo da prova, sera facil apreciar o merito de uni livra, no quai
abundâo as regras, as decisôes e as observaçôes praticas (Nota ma-nuscripta do
autor.)
(8) Diremos alguma causa sobre a bistoria da legislaçSo em Portugal.
Depois da invasâc dos barbaros, e preponderando os visigodos na peuinsula
iberica, foi esta regida pelo Fuerojwgo, on codigo visigotbico, que começado
por Eurico foi concluido por Levigildo, no seculo VI. Nesse codigo se fazia
distincçâo entre crimes publicos, e particulares, e nelle se encontrao, assi m
como em todas as outras legislnçôes da epoclia, como meios de prova, os tor-
mentos, os juizos de Deos, e os combates judiciarioa, e como penas, a morte, a
prisio, as multas, flagelaçôes e rnutilacôes. Deve-se notar porém que os visi-
godos nâb erSo nraito prodigos da pena de morte.
Entre elles creara raizes o principio de que sô se podia condemnar algue m
por crime, que estivesse previsto na lei, e se algSm caso apparecia, sobre o quai
fosse a lai silenciosa, era decidido pelo inopérante. As lois protegi&o os fracos
contra os fortes, e erâo menos crueis do que as dos outras povos; e an tes da
proscripçSo do direito romano, este (isto 6, o dos codigos theodosiano, e
alariciano) concorda com as leis visigothicas, â escolha do réo.
Depois da invasâo dos arabes as leis visigothicas continuario a reger os
venoidos, porque os vencedores deixarâo a estes os seus magistrados e as suas
leis. Os godos das Asturias forSo regidos pelas mesmas leis anteriores & inva-
sâo.
No seculo X Affonso V de Leâo fez uma reforma délias, alterando-as, re-
forma que foi conflrmada no coineco do seculo seguinte pelo concilio gérai da
Lusitania e da Gallecia.o que dénota que o poder legislativo residia tambem
nas assembléas nacionaes, cuja mais perfeita expressâo naquella épocha erâo
os concilies nacionaes, cuja missâo era mais politica e civil do que espiritual; o
que é confirmado pelos concilios e cartes seguintes.
Desde o Gonde Henrique que se encontrao vestigios da legislaçâo dos pri-
mitives tempos d» monarquia portugueza: regiSo as mesmas leis visigoticas.
îse
CAPITULO m.'
INFLTJENCIA SOBRE A PBOVA DAS DUAS FORMAS FUNDAMEOTAE8
DO PROOESSO, .QP DO PROCESSO POE VIA DE ACCUSAÇAO, E 0
POE VIA DE INSTBUCÇÀO. '
0 processo criminal pôde ostentar duas formas fundamen-
mas sempre alteradas successivamente pelas leis geraes pronralgadas pelos reis e
concilie» ou côrtes ; pelas especiaes a cada cîdade, denominadas foraes, nos quaes
se encontrâo regras sobre o direito pénal, e processo criminal; pelo direitoromano
dos codigos barbaros; e pelos costumes.
Nos primitives tempos encontra-se a mesma organilaçao judiciaria e forma do
processo, que nos outros povos os urocessos tanto civis como criminaes, erSo
julgados pelos—boni hommes segundo as leis geraes ou municlpaes, ou segundo
os costumes, nas assembléas presididas pelo conde, ou governador, com recurso
para o imperante, que podia interprétai* e supprir as lacunas das leis em vigor.
Nas côrtes de Coimbra no seculo XIII, e sob o reinado de Affonso II, fez-se
outra reforma legislativa, cuja base foi ainda o codigo visigotbico, o direito
romano dos codigos barbaros, e os costumes; e muito provavelmente entrou nella
alguma cousa do direito canonico.
Desdè entâo começa a pronunciar-se melhor a feicâo do direito portuguez, que
durante a idade média nào foi inferior ao dos outros povos.
Na reforma de Affonso II, foi prohibida a guerra e a vindicta particulares, e a
acquisiçSo de beus de raiz pelos ecclesiastis e mosteiros; mas os sens esforços
para moralisai
-
o clero, e oppor-se as suas invasSes, derâo lugav â lucta com a
tiara. .
Talera entâo a influencia eccleslastica que Euy Gomes, prior dosPregado-res,
promulgou um codigo para todo o reino, usurpando assim direitos mages-taticos
do imperante, que continhà em si todo o poder temporal, o que obiigou oreia
cassal-o.
A segunda reforma on compilaçào das leis portuguezas foi feita sob 0 reinado
de Affonso III, no meiado do seculo XIII.
Nesta legislaçào encontra-se as mesmas regras sobre o direito e processo
criminaes, que nos outros povos, abundando as penas pecuniarias, segundo o o
espirito da epoca. Affonso 3" continuou a lucta com o poder ecclesiastico, e
cpnseguio limitai- a jurisdicçâo temporal do bispado do Porto, que llie tinha sido
outorgado pela rainbfl D. Thereza.
A terceiiîi compilaçào ou reforma (disemos terceira, porque classilicamos na
segunda reforma as duas compilaçôes. i'eitas por Affonso III com intervalle de
très annos) foi feita sob o reinado de D. Dihiz no um do seculo XVIII, e esta foi a
que servie de base paia as ordenaedes affonsinas, manoelinas, e felippinas
5T
talraente distinctas, a de accusaç&o e a da iustrucçio (1). N&o
différera sgmente por seos traços exteriorea, por exemplo, em
D. Diniz conseguio flndar a lucta com a tiara corn proveito para 08 direitos
magestaticos. Restringio a competencia judiciaria da igreja, que se tinha erigido
em juiz supremo de recurso, nâo sô tirando-lhe o conhecimento de alguns
processus, como instituindn a appellaçâo immediata para a corôa de todas as
seutenças proleridas por quaesquer juizes. Ao* poderio ecclesia**rtico den uni
grande golpe promulgando a lei da amortisaçâo» cujo germon tinha sido
introdusido ha legislaçâo pelos seus antecessores. Para contrebalançai' o poder
da intelligencia e a influencia da igreja, e para queo poder temporal, tivesse a
seu favor um elemento intelligente, e militante, creou a Universidade de Liaboa
(que mai* tarde foi transferida para Coùnbra). Para que os proces-sos
estivessem a par de todas as intelligencias mandou qne fossem escriptos em
ingua patria, pois an tes erâo em latin.
Devemos notar quejâ nesta epoca influiào na legislaçâo do paiz o Decreto
Graciano, e a lei das Partidas de Castella.
0 processo passou por diversas phases, cujas divisôes chronologicas nâo se
podem precisar ; mas pôde-se afnrmar qne até o seculo XVIII ainda vigorava o
processo dos l'Ont hommes oujurati decidindo conforme a sua consciencia ;
depois os processos forâo decididos por juizes annuaes de eleiçâo municipal, e
por fini por juizes de nomeaçào regia. qnando a monarchia se tornou de todo
absoluta.
Os successores de D. Diniz continuarâo a melhorar a legislaçâo anterior, e a
restringir o poderio da igreja ; e entre elles distingue-se D. Pedro I, que sujeitou
ao placito regio as bullas pontificias para terem execuçâo em Portugal, e
promulgon diversas leis sobre materia criminal approvadas pelas côrtes d'Blvas,
e qne forâb compiladas nas Ordenaçôas affonsinas.
No fim da primeira dynastia, além das leia ja apontadas, comecarao a ter
influencia em Portugal, nâo a legislaçâo de Justiniano, entâo descoberta
como as decretaes de Gregorio IX.
Abre a segunda época da legislaçâo portugueza o reinado de D. Joâo I,
célèbre pelos dotes pessoaes do Monarca, e pela influencia* que nelle exerceo
o Dr. Joâo das Regras.
Este foi o autor da célèbre toi mental promulgada no reinado seguinte, e de
uma traducçâd do codigo Justinianeo, com as glossas de Accursio e Bartholo,
Desde entâo as opiniôes destes glossadores tiveo decisiva influencia na
jurisprudencia.
D. Joâo I tambem encarregou a Joâo Mandes a missâo da confeccionar
(1) Vide uma comparaçâo destas duas formas no PrOcesss criminal oom-
parado do autor, I. cap.£33, e nota 108, cap, 81, que cita escriptos especiaes.
—Vide tambem a collecçSo italiana Antologia di Firenze, o numéro d'Abril p.
12.—Vide sobretudo Carmignani dette Leggi, etc. vol 4.
8
H9
que em uma apparece primeiro um accusador,e que o procasso,
travando-se entre este è o «ccuaado. segue mua marcha ana-
loga a doprocesso civil, emquanto que no segundo. nm magis-
trado instructor obra e précède ex-officio : a diSerença profnn-
um codigo, ou compUacio das lets riantes, que sô foi promuteado DO reiaado
de D. Aphonso V eom a denominarâo de Orienaçôes aSonsisas, as es
imitarâo adrrisao das Decremesde Gregorio IX. tiataudoolrtro 5 do direito
criminal. O proeeaso criminal remlaaavee pelas mesmas regras do proeeaso
crvïlde L.*S. com as ponças exeepcôes do L.5* .
Qoera comparar esse oodigo com o estado aetual do direito Écart horrori-
sado com a berberidade das penas, com as soperstiçôea e com a injustice
relative entre as diversas classes da soeiedade : mas qnem se coUocar, por
abstiaeâo. ne época em qne foi promulgado. eo comparar com os eoiigos
dos ootros poTos contemporaneos. reconbecerà que nenhum destes UM ê
snperior.
O eodigo afioasino é a base dos posferiores. e a fonte de algomas dispo-
stçôss de nossa legislacâo criminal, e entre eiias apontatemos a do art. 205
do Cod. Crim. (que tem dado lugar a iatenninaveis questôes, que Um por
fonte a Ord. affons. L.* 3 T.» 123.
Os autores dos codigos posceriores nâo fixerâo mais que copier o aSbnsino
com algumas alteraeôes, e nem sempre para melhor, eomo pensa V.J. Fer-
reira Cardoso.
Pouco mais de meio seculo depois D. Manoel enearregou a uma commiso
composta da Rni Botte, Bai da Grâ. Joâo Cotrim a revisâo e alteraçâo do
Codigo aSbnsino, e esta nova compflaçâo foi împressaem 1521 com pequena-
alteracâo do codigo aSbnsino, excepta no que disia respeito aos mouros e
judeos, , .a
Pela lei de 30 de Janeiro de 1519 D. Manoel creara juizes de pas sob a
denommacâo de avindores. ou eoncerîadores, mas esta lei nâo foi consolidada
no codigo manoelino.
No mesmo reinado forào reYistos. e reformades todos os foraes. que se
oppunhâo à harmonie, e unidade da legislacâo. e com egeito esta sa tornon
depois mais gérai e harmonica, porqne os priYiiegios,e exçepçôes dos foraes Èr
rào restrictos as prestacôes. impostos. e honras. que pouce releçâo tinhào com
o systema gérai da legislacâo.
Moi tas outras lets forào promulgadas até o reinado de D. Sebastiâo. as
qoaes forào compiladas por Duarte Nanes de Leâo sob a deneminacâo de
extravagantes, e confirmadas por Âlvarâ de 14 de Feveiro de 1569.
Este foi operiodo do florescimento das letras em Portugal, mas tambem foi
nelie que se introdusio a inqnisiçâo sob o reinado de D. Joâo m.
Depois da occnpacâo hespanhola Felippe I maudou rêver e consolider as
leis existentes, e este obm na quai trabalharào, Pedro Barboee. Paulo
BO
da que os sépara consiste antes na direcçSo gérai, no caraçter
principal dos actos diversos que os constituem, conforme o
ponto de partida., que tomârâo,. ou o da acçusac, ou o da
instrucçâo ; e como o processo criminal se desenvolve de con-
Affonso, Danâo de Aguiar, e Jorge Cabedo, foi pnblicada em 1608, com o
titulo de Ordennçiïet fettppinas:
Foi um copia sem merito das ordenôes manoeliuas e das extravagantes
de D. Sebastiâo, e para conhecer a ponça eritica, on precipitâo com que foi
feita, basta recordar que ainda llas, se aeo anthorisadas como subsidiosj
legislativos as opines de Accursio e Bartliolo.que, importantes no seu tempo
tinhSo no seculo auterior ncado muito a quem do denvolvimento e pro-
gvesso do direito, depois do nascimentoda esoola fundada por Alciato, deno-
minada cujaciana por causa do grande Cujacio.qûe depnron o direito rotriàno,
e empregon na sua interpretaçâo um methodo mais raeional, e pbilosophico.
Desde ahi comecou em Portugal o direito a decabir e a tornar«ae rotineiro,
e a rotina creou tâo fundas raizes, que nSo pode ser de todo extirpada pela
lei de 18 de Agosto de 1769, e pelos Estatutos da Universidade de Coimbra-
Assim como as ordenôes anteriores, a felippina trata do direito e processo
criminaes no livro , especialmente do processo criminal do tit. 184 em
diante.
Nas ordenôes jà nâo se encontrâo vestigios dos processos jnlgados pelos|
front homines ou jurati ; e por consequencia a verdade formai é o fim quasi
exclusivo da prova. Além deste defeito encontrâo-se outros como a das inqui-
riçôes séctas, os tormentos, como meio, de prova, e a severidade em certas
penaa. Em compensacSo porém vemos ja nas fiaas uma nomenagem â se-
gnrança individual.
A legislao soffreo compléta reforma sob o reinado de D. José I, e pela
influencia do marquez de Pombal. Além de outras a lei de 18 de Agosto de
1769 abrio nova era na legislaçao e jurisprudencja. Foi tirada a autoridade
as opines de Accursio e Bartbolo, e de quaesquer outros dontores, e mesmo
aos proprios textes da legislao romana, quando nâo fossem fundada em
boa razâo; classificarâo-se e graduao-se os subsidios legislativos'segundo a
natureza das materias, e obrigou-se ojuiz a decidir pela sua rao, e nâo pelo
que dizia este ou aquelle ju.nsconsulto, nas palavras das quaes se Imitava a
jurar anteriormente.
Incontestavelmente o reformedor pertencia a escola Gnjaciana, a quai se
deve além de outras cotisas o imperio da razâo philosophiea na interpreta-
çâo dos casos dnvidosos. A reforma foi nma reacçâo.
A regra da boa rao nâo deixa de ser um pouco vaga, e mesmo arbitraria ;
mas 6 sem duvida melhor do que o anterior metbodo scolastico, superaticioso,
e acanbado que considerava em tndo a legislao romana qoanto ao direito
com a mesma força do que o evangelho quanto a religo.
Mas nâo obstanle as reformas na legislaçao civil, o direito e processo cri-
BO
formidade corn ùm systema logico, e cobrdënâdô em todàs as
suas partes, segùe-sé que os princSpios, que président à admi-
nistraçao, e â apreciaçao das penas, variao entre si em razao da
forma dos processus.
Quem estudk a historia d esta s duas formas (2), convence-se
logo que a organisaçao da sociedade poiitica exercera sobre
seos desenvolvimentos uma poderosa influencia (3), que onde
reina a democracia, domina o processo de accusaç&o ; o povo
em qualquer accusaçao proraovida contra um cidadao uma
offensa perigosa â liberdade civil e individual-, e se mostra
disconfiado em relaçao ao poder, ao quai a accusaçao vai dar
armas. Porisso mesmo esforça-se em augmentar, tanto quanto
lhe é possivel, as garanties existentes contra todos os abusos
possiveis ; quasi que nao vê no processo ctiminal senao a ques-
tao poiitica, despresando muitas vezes a questao puramente
judiciaria.
minaes continu&râo estacionarios, ao passo que a civilisaçâo caminhava.
E este estado continuou até o présente seculo nao obstante as tentativasfei-
tas (lesdesl778.
B nés ta epoca havia tSo grande antipathia entre a legislaçâo antiga e
as idéas, que muitas leis cahirSo em dezuso como o reconheceu o decreto de
81 de Margo de 1678.
Em 1783 foi encarregado a Pascoal José de Mello Freire o trabalho de
confeccionar um codigo civil, e outro ctiminal, trabalho que elle levou ao
cabo, mas que nao foi dado à execuçâo, e até a nossa independencia con-
tinuou a reger a legislaçâo antiga, com a sua penalidada barbara, na quai
predominaya a idéa da vinganca e do terror, e com o seu processo compara-
tivamente menos defeitoso do que a penalidade, mas contendo sempre os
sous vicios de origem.
Nocorrer da obra fallaremos sobre o nosso direito actual. Mello Freire,
Operajom. 6 ; Coelho da Rocha, Ensaiot sobre a historia do governo e da
legislaçâo de Portugal ; Sitaa Ferrâo. Theoria de Dir. pen.tom. 1, cap. I e 2:
Ord. affons., Prefaçâo ; Figueiredo, Sinopsis Ohronologica, Introduççâo ; Fr.
Brandao Monarchia I.usitana,
(2) Vide o Processo crim. comp., part. 1, cap, 71,
(3) Garmignani, delk Leggi, etc. vol. 4. p. 81 e seguiutes.
et
À forma inquisitorial, pelo contrario, pertence principal-
mente ao systema moharcnico ; adquire todo o seo desen-
olvimento nos estados, nos quaes o movimento das ias
politicas é contido, por um poder active-, central, dando im-
pulso a agentes subordinados, que em todos os sentidos se
graduao em gerarehia : este poder supremo ordena a persegui-
ç8o dos crimes no interesse da segurança, e da ordem publica ;
por instrucçoes erigidas em leis guia para este fim os passos
da justiça ; e emquanto sujeita os factos'a um exame lento tal-
vez, mas aprofundado ; emquanto obriga o magistrado a seguir
sempre as vias legaes, o processo criminal nâo é a os seos olhos
senao um simples negocio de administraçâo. Assim è que na
antiguidade, e sobretudo no tempo das republicas, vemos pre-
dominar a forma da accusaçao, como tarabem, vèmo-la em
vigor no antigo direito germanico, emquanto o poder popular
deo vida instituiçao dos scabinos ; assim é ainda que no Baixo
Imperio romano (4) se mostrSo pela primeira vez algumas ins-
tituiçOes com caraeter inquisitorial ; da mesma sorte na dia
idade o processo de instfucçao esteve em vigor por toda a
parte em que o poder central mais crescera, por toda a parte
em que se considerava a pena como umaconsequencia do crime,
reclamada principalmente pelos interesses sociaes (5). E'facil
agora explicar porqne nas monarcbias constitucionaes, nas
quaes domina a necessidade de cercar de garantias as liberda-
des individuaes e ci vis, e nas quaes o processo criminal é con-
siderado como um meio possivel, e terrivel de oppressao, œa-
nifesta-se uma tendencia pronunciada a favor do regimen da
(4) Nâo deveria haver mais discussao sobre a nâo existencia do processo in-
quisitorial • no direito romano ; poder-se-liia sem duvida prender ao princi-| pio
inquisitorial o estabelecimento de certes fancionarios nomeados para a
pesquisa dos delictos (Trenarchçe, stationarii) ; mas, no fundo, a accusaçao
nâo deixou de ser a forma fundamental.—-Vide o Procès, crim. camp., part. 1,
cap. 31, e notas 15 el6,
(5) Por isso os primeiros traços do processo inquisitorial se manisfestâo nas
cidades. —Vide o Procès, crim. convp., part. I, cap. 31 e notas 48e 49.
«3
*
«scusaçSo, rm a» menas de algamas da» «as Sfemas partarn-Laresj
e porque as mais rer.en.ta» ieariahgH systema mixte, Todawia,
qnamïa>sJ
aigos» para a iamor.enaa kn6e as
goâerâh» fcaer aos er> prmcfç&-
j
r
aSo po4enéo
processa
Considerado por v» dTs&caaa partes
ad^eraaa. da» a
verdad* daa aaas
asâërçô^sjTëMÏj
final na causa, O acenaador em] dispor para
estabelecer a aua querd aado emprega em
aua defeza Codas a* aroïas^e^S conqaiatar
a *et> E&vor a opiniâo do|ufz, El fada, no
tempo doa jriizos de Deos
r
e dos accusado e
o acenaador ae coIIûca-v2û aj hoje que o
processo ae ressente dos progresses da civxIiaaçao-
T
é ainda an
cotnbate que m trava, coeabate ao quai aSo postas em jogo todaa aa
potencîas do espîrîto; no quai a palabra e a per-suarSo Sio aa arma*
permittidaa. •qne, -leepindo a befU fraze 4e GaTBÛgnani | 7)
T
tem
par terreno a ©josrienci» do jrâ, que oa doua adreraarios ae eaforçao
de convencer, e conqoiatair. Enfi.m , o meamo jniz nâo sera urna
terceira força passfra, «$ne recebe o seo împalao daa outras duasî
Portante rê-se qoe ao proceaso por aecuaaçâoa îndagaçSo da
verdade opera-ae por via de synthèse: arabe» os antagonisias
apresentSo nm corpo de afErmaç/îe» précisas, s ocerecem as provas
defla».
(B) Sobre a v»n&cdeiro aentfeto do pracesso pot via da irirpriairtâo, xrâfe
OErsted, Observasses IMII« saôre o objecta da legistaçfCo- erirn^ p. 284, — VM'e
nm aïtijçn do aator nos Archivas de dvr. cri-m, t. II, p, 4R9-
(7) Ct#m%<yna*i, faite Leggi,. t, 4, p^SSi.
os mconveni
pondo-
se aei
eliherdade:
da ae^asaçSfr,
na »aa essenc
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OU
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suivi oe meîos J
LveQceropiizjo
accu
w,e prétende ta
mhe
m
s
afâs
-
#•»•"
rn. flu race uo c
œtro;
63
Assim, logo no eoraeço do processo o accusador apresenta-se
©articula a sua queixa ; porém esta vantagem tem o seu reverso ;
tendo os processus uma publicidade îllimitada, o seu effeito é
tanto mais pernicioso ao accusado ; o legîslador vio-se obri*
gado, por consequencia, a conceder-lhe garantias contra a accu-
saçao calumniosa, quer exigindo do accusador uma eauçao,
quer ameaçando-o com a pena de prisao, etc.
A accusâio uma vez intentada dispensa a -necessidade da
instrucçao pr'eliminar ( 8 ), os processus instaurao-se immedia-
tamente :
r
o accusador e o accusado entrao na arena sob as vistas
do jury, a quem desejao persuadir.
Os interrogatorios do accusado differem essencialmente dos
que se fazem no processo inquisitoxial ( 9 ). Com effeito, depois
da accusaçSo formulada publicamente pelo accusador, basta
explicar a suaqueixa, e ouvir a justificaçao do accusado, sem
que o juiz tenha necessidade de provocar uma confissao ; é esta
uma consequencia da maxima, dominando todo o processo
d'accuaao, que a prôva incumbe ao accusador, e que nao lia
necessidade de fazer da confissao do réô o fira das inyestigaçoes
do juiz.
Nao se poderia tambem constranger o accusado a responder.
A tortura é um meio inteiramente estranho ao processo d'accu-
saçao, e se o roinano a admittio (10) foi partindo d'uma outra
(8) Esta instrucçao ao me nos se restringe a uma especie de exame prsvio
(indaga-se, por exemplo, se o accusador é qualificado) depois do que tômâo-se
logo as medidas prep irasorias para a instrucçao principal e publica.
(9) Vide o Prosso crim. comp. part, 1. cap. 100.
(10) Dig. L. i, T. 18 ; Cod.. L. 9. T. 41 (S).—Vide o Processo crim, comp.
cap. 18.
(S) O direito romano nos lugares citados sob o titulo de Qucetionibus, nao se
mostra muito favoravel a este meio de prova. Q jurisconsulte Ulpiann, e o
Imperador Augusfo declarào que nâo se deve começar o processo pela tortura,
e sômente se poderâ empregar esta como prova accessoria, quando houver
outras.
A tortura era empregada contra os escravos, por excepçao contra os ho /
4
ê
64
idéa, e coïnô uma medida util ( 11} para reforçar a veracidade
das testemunhas (12). Mais tarde, é verdade, o accusado foi
igualihente a ella submëttido ; porém entao nota-se jâ na legis-
laçao româna a influencia do processo inquisitorial:
E' da essencia do processo de accusaçao que seja debatido
inteiraniente perante o juiz definitivo ; por ser principalmente
sobre elle que o accusador e o accusado querem actuar por todos
os meios convincentes, de que podem dispor. Quanto ao jtaiz,
naode ser instituido pelo soberano ; de outro modo, e por causa
das idéas politicas inhérentes ao systema accusatôrio, incorreria
na desconfiança publica. O povosô pôde ser juiz, ou delegados
esoolhidosem seo seio, defensores vigilantes e zeladorés das li-
berdades ; a elles sômente confiarâ a sociedade o poder temivel
de decidir dos diréitos mais sagrados dos cidadftos. Perante
taes juizes os processos serao, por assim dizer, postos total-
mente em acçao ; cercar-se-hao de solemnidades numerosas,
reguladas conforme a importancia do drama que représentai.
Sera, repito, uma acçao de scenas ciirtas, onde figurarao
ambasas partes, produzindo cada uma suas provas respectivas,
edirigindo-seé. conscienciado juiz; depois, terminada a lucta,
este, sem mais demora, decidindo sob impressoes ainda récen-
tes, dira de que lado esta a justiça ( 13 ).
mens livres em crimes de lésa magestade, e nunca contra os condecorados
com alguma dignidade.
Bmregra os escravos nao podiâofazer carga contra os seus'seiiliores para nao
se os obrigar a quebrar a fé, que llies era dévida, salvo muito poucas exee-
pçôes.
Mas nao se dava as torturas a plena fé, que tiverSo na idade média, e pelo
contrario a lei 1 g 28 dig. eod. tit. nega-lhes essa iuteiva confiança, que ti-
nliâo os outras provas. , ^
A regra era, que o juiz nao era adstrioto aos resultados da tortura, mas
tinha o prudente àrbitrio de os accitar, ou regeitar, como entendesse ;' porqne
erao pouco seguros, perigosos e tràhiâo o verdade.
(11) Assim applicava-se a certos indivlduos que pareciâo nâo ser inteira-
menta dignos de fé,' lei 15 pr- D. de Quœst.
(12)
Carmignani, délie Leggi. t. p. 70.
(13) Jamais acontecerâ no processo da aocusaçâo que ojûiz ordene mais
amplas infovmagôes antes de proferir sentença.
65
A administraçao das provas devehdo ser feita inteiramente
perante o juiz, e a sociedade tomando parte immediata no resul-
tado desse négocie grave, o processo devera ser publics, e o
debate oral ; uma instruceao escripta afastar-se-hia do fim, e
séria além dissosurperflua, viâto o juiz sentencear sem recurso,
e assistir à toda lucta. ^'.t
O principio, que gula a apreciao da prova, basea-se na
maxime, de que esta apreciao é uma operaçao ao alcance de
todos os cidadaos dotados de razao.sa, e amadurecidos pela edu-
caçao e pela experiencia ; e com effeito, trata-se mente aqui
de usar convenientemente do senso intimo, que guia tcdos os
homens para a verdade, trata-se de decidir, segundo as impres- '
sOes nascidas dos debates : se o acçusado ê ou nao criminoso.
O processo inquisitorial tem um caracter inteiramente di-
verso ; seu fim principal e fundamental é lirar partido de todos
os indicios tendentes ao crime ; é o exercicio de todos os meios
investigatorios authorisados pela lei, por intermedio d'um ma-
gistrado instituido pelo Kstado, circunscripto em suas attri-
buiçOes pelos termos expressos das instituiçôes legaes emanadas
do Estado. O alvo final e a prova da verdade material em sua
express&o a mais compta, afim de que possa ser decidido, se
tal crime fora commettido, se o acçusado fora o seu autor.—
Este processo segue portante uma marcha totalmente analy-
tica (14), e o magistrado applica, por s'jsim dizer, a dûvida e a
observaçao philosophica a todos os pontos peculiares, que
podem conter materna descobrir. Nao ha aqui, como no processo
de accusao, mais dous antogonistas, entre os quaes colloca-se
o juiz, tendo nas maos a balança; nao ha mais desde o começo
esta imputaçao détermina da, esta af&rmaçao positiva dos factos
constitutivos do crime : a cada passo â medida que os pontos
da prevençai adquirem maior publicidade,e dirigem-se mais
directamente ao acçusado, à medida tambem que as diligencias
(U) Oarmignani, dette leggi, t. 4, p. 24.
.a _
jadaes padem le mai* OS abattus deste, cada na dos actes
judkiarios dete jusnficar-se por présupposes seancreata»
tes. e rtsultados do procès» anterior. Por isso as priaieirôs
trahalW do pros» tnqutàtarial J*D secnetos, e îsto BO> m**»
do iodiciado : poruuanto* o disse*, este sTStenta USo
admùte que se passa indiciar prer pnhlkameate* fHfi
caininha-se an silencio a procura da «erdade. Par esta ratio
aiuda. te interajçatorios n3o podem* «a*rr»T «s mesi-ttu
formas que uo procès?*} accrcsatorio. Rerelar «a motiros de
sospeita contra o indkiado ©bstaria a eon§ss3o d*.* facîos. Cra
teudo-se en Tista principalmente a cooquista da rerdade ma-
tériel, o processoinquisitorial tende a proTocar a c^nfiseso. que,
obtida e.tosàencior.»eate. e prudenten.ente vmfkada corn o
aimlio des outras pieras. parera dever por excelleoc» garantir
a Terdade da imputacao. B* rerdads que, derèando-sc anastar
de mais par esta tendenda,eae^* fecilmente ao emprego da
tortura, À histru ecan as suas phases, e gsèas dhersos.
com esta diretçao constanteniente sruida. sera fcreosameate
certa lenti&o. Xobstante. devendo alla passa? soVosolhos
dos joiass definitnw. * neaessarfe ledozMa a peças esniptas;
adquire tanibeni non grande importance*, ^trâto** proresso ife.
qnisàtoria! admittir a terurso.
Passaudo a «v oatio pente et vista : o procès» e julgsmento
dos deltoosnestesTstoa* appaBam ente n» nesudodeEstad*
a&rtandotodaasocieaade; par isso m deàsio das causas cri-
minées dererà ser eoonadn a jure» noneado* peio pader
centrât vas Ma sa Uses pode concéder, cas» «as jetées papa-
lare o sentenc Krceacnte conforme a cjaoseïeneïa. e sem
enunciar os sens motifs. Assim como toàss as outres maris-
trados. dexen os jues sesuir as instruses Ssadas pek» legfe-
ledor, e pois que o procès» nSo ê ®ass uraa espeefe de dnefe
S Ytè»o*rtM>.>4»»a»«r ».« X*n» «rchn*r *«r. «TIM. t. Il p. V*.
«**r
judiciario, porquanto n&osetrata simplesmentede dëcîdîr quom
tem razao, se o accusador, se o accusado, era necessnrio que a
lei, dedicando-se exclusivamente è. investigaçao da verdade
material, estabelecesse certas bases de prova, que a escperiencia
ha longo tempo verificou serem as fontes mais seguras da cer-
teza ; e determinando. que mente sobre ellas se baaeasse o
julgamento, deixando a menor latitude possivei ao arbitrio do
juiz, era necessario que confeccionasse uni systema inteiro da
prova dominado por um espirito scientifico, ao mesmo tempo
que os interessesda verdade e da innccencia ahi achassem ga-
rantias as mais desejaveis.
O processo criminal allemâo applicou fielm'ente todos estes
principios do processo inquisitorial.
DisEemos, que o predominio de uma ou outra forma em um
Estado pende principalmente da sua constituiçfto politica: nao
é de admirar, pois,quese encontrem naslegisloes europeas, e
nos moder-nos projectos législatives, certas tendencias para a
forma accusatoria. 0 processo inglez, entre todos, parece tel-as
adoptado em sua pureza, e no entanto séria um grave erro
julgal-o analogo ao systema da lei romana. Na Inglnterra,
como em Roma, é verdade, o juiz naode proder ex-officio,
e a instaurao do processo sô de ser provocada por uma
accusaçao privada(16), nemha entre os inglezes um magistrado'
encarregado como accusador publico de collegir os indicios do
crime e persegui-lo (17), communicando-o ao juiz processante
çom a sua requisitoria, Da auseocia deste magistrado e da
propria existencia do processo accusatorio, procède nm
augmenta funeste dos crimes neste paiz ; porém examinando-
(16) Vide o Processo crim. comp., part. 2 cap. 187.
(17) D'alii uma impunidade fréquente e esndalosa, que mesmo na Ingla-
terra tem dado lugav u vrvos clamores. —Vide o Processo crim. comp. loc.
cit., not. 1, 2, 3 e 4. . .
v
«vn
68
se mais acuradamente a jurisprudencia nota-se differenças im-
portantes entre a deste povo e a dos romanos. Prende-se rouito
ao systema monarcbico e ao principio racional, que moetra no
processo criminal itm grave negoeio interessando em alto grâo
a toda a sociedade. As antigas tradiçoes fazem do rei guardà
supremo da paz (18); vella sobre a sua conservaçao por inter-
medio dos sens officiaes (19), entao tem elle proprio um inte-
resse pessoal na pnniçâo dos delictos. Tal é o fdndamento da
acçao do juiz de paz (20), que collige em uma instrucçao pre-
liminar os materiaes da decisao a preferir sobre os factos de
infracçâo à paz publies ; e sabe-se que em segoida tenta fre-
quentemente provocar a confissao do accusado (21). O sys-
tema das antigas corporaçôes civis (22,) originou o grande jury]
que constitue uma garantia benefica para o accusado, e sbsta a
que accusaçôes temerarias e ineptas sejao levadas aos tribunaes
publicos; além disso o Estado nunCa deixa de mostrar o vivo
interesse que toma nos processos; e a formaeao da lista dos ju-
rados torna-se uma attribuieâo dos roagistrados (23). Em con-
sequencia da lucta entre o poder real e o popular foi necessa-
rio tracar entre ambos umalinha de demarcaçao ; d'ahi a ins-
tituieâo do jury e as suas relaçOes com os tribunaes compostos
dejuizes nomeados pelo chefe do Estado; d ahi a divisa© esta-
belecida entre o ponto de facto e o de direito. Os progressos
(18) Bracton, de Legibus Angliœ. 3, c. 10.
(19) Osheriff comb o juiz de paz devem ser incluidos na mesma classe qae
estes officiaes.
(20) Vide o Processo erim. comp., t. 2 cap. 137.
(21) Eussel, Dos crimes e delictos, IIp. 645,640.
(22)
Vide Processo crimeomp ., Particularidoies Mstoricas. 1.1 cap. 4L
(23) Ados do parlamento de 23 de Jnnho de 1825. — Vide Processo erim.
comp. 1.1, cap. 21.
69
da civilisaçao, a influéncia das idéas espalhadas nos povos vi-
sinhos sobre o processo ex-officio, e a importancia da verdade
material ; a influéncia tambem dos tribanaes espirituaes (24). que
na Inglaterra, como em outros lugares, vigorarao durante toda a
idade média e ainda por muito tempo depois, tod'as essas causas
reunidas derao ao processo inglez um caracter décisive de
organisaçao systematica ; um moviraento drama-tico da ferma
accusatoria ahi nao apparece, para dar lugar as solemnidades
graves e menos ruidosas de uma devassa. A prova desde entao
foi regulada por leis e prescripçoes nume-rosas (25) ; a sua
apreciaçao foi submettida a uma espécie de theoriageralmente
aceita,favoravel principalmenteâ verdade material; e o jury, em
sua decisâo, todas as vexes que se apreseutavao questfies de
direito, deixava-se guiar pelo juiz togado- (26).
Mesmo hoje, e em razao dos motivos supra menciqnados,
cada dia a Inglaterra avança neste caminho de organisaçao
systematica, que tem por fim principal o descobrimento da
verdade material (2*7).
Sustentou-se muitas vezes tambem que o processo criminal na
França basea-se no principio da accusaçao, mas esta opiniao
porém é erronea, muito mais do que em relaçao a Inglaterra.
Algumas partieularidades secundarias, prendendo-se à forma
accusatoria, nao podem institui-la. Além disso, o que prova o
(24) Os processos by information derivâo délies. Vide o Processo crim.
comp. t.1 cap. 21.
(25) Pouco importa que a maior parte destas regras nao tenha sido consig-
nada nas leis escriptas : ellas existent na common lato e esta é na Inglaterra
considerada sagrada da mesma sorte que o Slalute law, Vide o Pro~
cesso crim. comp. t. 2, cap.' 195.
(26)
Vide o Processo crim. comp. t. 2 cap, 21, 9.
(27) Oonvem mencionar entre outras as dissertacôes recentemente publi-
cadas relativatimenle à questâo da unanimidade dos votos. Law magazine
liv. 16. p. 44 46,
TO
predominio de forma inquisitorial na França '28,) é a institiii-
çâo de iim rainisterio publico, fonccionando em nome da so-
ciedade (29), fazendo obrar o juiz processante por nieio das
suas requisitorias, e transmittindo-lhe todas as ptovas jâ des-
cobertas na causa : é tambem esta lei de imparcial attençâo
que deve guiar este juiz, qoando colhe e renne essas provas,
lei que traça igual prtcedimento ao inquisidor.allemâo £10).
Em cada uma dessas importantes phases a instrucçâo prelimi-
nar do processo soffre o exame de um tribunal nao menos im-
parcial, e por consequencia torna-se impossivel o abuso da
parte da inquisidor (31). Ha casos finalmente em que o processo
de ser instaurado. independeutemente da provocaçao do roi-
nisterîo publico, pelo magistrado ex-ojficio: sao os de flagrante
deiclo (32). O tribunal de appellaçao mesmo péde, qnando lhe
parecer que oprocurador doreise conserva em uma ina&o pre-
meditada (porcausa, porexemplo,de motivos politicos,) impe-
dir os effeitas da immobilidade prejudicial do accusador publico,
iniciando por si mesmo o processo (33). O tribunal (âesmises
en accusation) nao esta rigorosamente limitado no exame da
questâo aos diverses pontos da instrucçâo, e aos roateriaes por
ella fornecidos ; pôde ainda no interesse da sociedade ordenar
(28) Vide o Processo crim. camp. t. I, cap. 33,
(29) Vide o Processo crim. comp. t. 1, cap, 13 e2Q.
(30) Ao menos assim deveria ser, e os juizes de instrucçâo conscienciosos
lhe obdecein em França.
(81) Com effeito nos termos do codigo de instrucçâo criminal, art. 197, o
juiz de instrucçâo é obrigado a dar contas, uma vez por semana, dos nego-
cios. enja instruâo lues foi encarregada, e a provocar uma decisSo dos juizes
rennidos em tribunal.
(33) .Codigo de instr. crim. art.32.
(33) Cod. instr. crim. 235.
maik amplas diligencias (34) ; e o processo principal, in corno os
debates publicos e oraea, que se seguein ao decreto profèrido par
este tribunal,' têmsempre por fim a investiga-oao da verdade (35)
: por oonsequeneia o présidente tem o direito de fazer oiivir eao-
oflîcio qnalquer testemunha ou perito no correr dos debates (39,)
embora estes individuos nào estir vessem no roi das testernûnhas
da acçusaçao on da defeza. Emfim a audienciâ de todos, dirigida
pelo présidente en) pes-soa, vem tambem attestât, por nma
tendencia pronunciada para a verdade material, quâo grande é a
influencia do principe inquisitorial no processif firancez.
CAPITULOIV
FORMAS MIXTAS DO PROCESSO
Muitas legislaçoes modemas, por exemplo a napolitana (i), a -
dos Paizes- Baixos (2), a de Wurtemberg (3), o projecto ba-naro
(4), e a naaior parte dos Oodigos promulgados nos can-toes
saissos der&o evidentemento ao processo criminal uing. forma
mixta, en me explico : o legislador foi escolher entre as 'diversas
legislaçoes existences, n&o as que se baseào no principio da
accnsaçâo, como os que se baseào no da instrue-
(34) Coà. instr. crim., art. 228-
(35) Vide o Processo crim, convp. t. 2 cap. 156.
(36) â. inst. crim. art. 269,
(lj DëlSl9, Vide o meu artigo a respeito, na Revista da juvisprudencîa
titrangeira, vol. 5, p. 128.
(2) Vide o meu art i go na mesmi Revista, t. 1, n. 20; t. 2. n. 6. Este
projecto en de 1888, mas umalei definitiva foi promnlgada em 1836.
(3) De 1813, Vide tambem o projeto de 1811, e o que mais acima, cap. 8,
not. 69*. se disse em referencia a elle.
(4) De 1834.
*3
çBo, as formas e as instituiçOes as mais proprias para faci-
litar a descoberta da verdade absolut», a puniçao dos culpa-
dos, e a salvaguarda da innocencia. Estas formas mixtas
recentemente encontrarBo em Carmignani o mais violento e o
mais poderoso adversario (5). Na sua opiniao existem, nas
duas formas de accusaçao e instrucçao, dons elementos eom-
pletamente heterogeneos, e inconciliaveis, cu combinaçao
nfto pôde deixar de produzir funestos resultados. O processo
de accusaçao, que corresponde ao systema democr se
inicia, diz elle, por uma affirmaçao claramente estabelecida, e
logo depois, sem previa instrucçao, sent que seu curso seja
suspenso por qualquer obstaculo, sem que o tribunal, por
exemplo, tenha de pronunciar-se sobre o recebimento da ac-
cusaçao, deve ser profirida a decisao definitiva, baseadanas
provas fornecidas pelo accusador, e nas justificaçoes do aceu-
sado.
Era reaumo, continua elle, a forma da accusaçao pudia o
processo escripto; existindo a confissao, faz prova absoluta ;
juizes tir ad os do seio do povo decidem entre o accusador e o
accu&ado, sem estar ligados a regras de prova, sem outra lei
além da sua propria conviccao.—No processo inquisitorial, ao
contrario, Carmignani uma série nao interrompida de
actos legaes ; s6 é necesario o processo escripto; a confissao e
o depoimento de testeraunhas sao os unicos meios de provas
admissireis, e os indicios jamais podem fazer a base de uma
condemnaçao regular. Emfim, quando o juiz quer exprirair
suas duvidas sobre a innocencia do indiciado (6), tem
necessariamente de proferir a absolviçao provisoria da
instancia.
A instituiçao de um accusador publico lhe parece uma
(5) Nâ sua obra precitada, vol. 4, p. 281—813.
(6) Na sua obra precitada, vol. 4, p. 282.
i
i
•73
inconsequencia profunda (7) : a publicidade do debate prin-cipal
nao 3e pôde harmonisar corn o caracter do processo, e, na sua
opiniâo, autorisar o juiz regular a condemnar sobre simples
indicios, séria prender erradameiite o principio da liberdade
absoluta das convicçSes ao principio da theoria légal da prova.
Nao ha duvida que muitas cousas s3o verdadeiras nas idéas de
Carmignani. Nao séria injusta a censura, que se fizesse aos
legisladores modernos principalmente, de se deixarem seduzir
pela novidade, de terem em vista concepçOes originaes, e de,
querendo agradar a todos os partidos, rrem pedir empres-tados
artigos de lei à todas as legislaçûes possiveis ; de esque-cerem
emfim, que estando elles ligados a um corpo, a um complexo de
prescripçOes logicamente ordenadas, arrancal-as dahi para as
transporta? para outro lugar, é querer créât um edincio sem
harmonia. Assim, quando o processo é escripto e secreto, torna-
se inutil (8) a instituiçâo de um accusador publico (9). Assim,
nao se consegue o fîm, quando se imagina constituir a
publicidade no processo escripto, tal como se pratica na
Allemanha, ou obter délia todas as van-tagens, por se
autorisar a defeza publica em uma especie de processo secreto
(10); quando se dà a juizes régulâtes graduados.em direito a
faculdade de seguir sua propria con-vicçao (11), ou ainda
quando se persiste em autorisar a absol-
(7) Tbid.. TOI. 4, p. 284.
(8) Em algumas provincias do Hanover, em Bremen, por exemplo, depois do
encerramento da instrucçâo preliminar, um fiscal offerece, e lavra o auto de
accusaçào : mas nisso nao vemos utiliclade, e pelo contrario vemos uma causa
de delongas.
(9) Tambem nâo podemos approvar a instituiçâo do accusador publico no
systema da nova lei de Wurtemberg.
(10) Vide Feuerbach, Constderaçôes sobre a publicidade, t. 1. p. 98.
(11 Vide o meu artigo nos Archivos de direito crtminal. 18, n. 4.
10
•74
viçao de instancia (11 bis), sendo publics e oral a instrucç&o
principal, e tendo os juizes gulâtes liberdade pleua e conv
pleta de apreciaçEo (12).
Taes tentativas nao podera deixar de ser severamente censu-
radas, mas segue-se dabi, que se deva com razao combater a
todo o trance qualquer forma mixta de processo criminal ?
Pode-se com razao pôr em relevo os erros seguintes no sys-
tema de Carmignani :
Demais attribue exclusivamente ao principio da accusa-
çao, tal como o quer comprebender, muitos caractères essen-
ciaes a todo processo criminal, e corollarios de suas premis-
s&s fundamentaes ; por uma distincçao absolutamente deci-i
siva oppôe a este principio o da inquisiçao, como nao podendo
jamais na sua opiniao admittir estes mesmos caractères,
apauagio especial da accusaçîio. Nao sera com effeito erigir
uma tbeoria arbitraria, o sustentar que sô no processo de
accusacao pôde ser proferida a condemnaçâo baseada na prova
dos indicios? o que é consequencia da opiniao, desde ha muito
sustentada, de que os indicios nao podem dar lugar & prova
compléta, aquella que satisfaz plenamente a intelligencia.
Nao sera igualmente arbitrario ver no absohilio ab instàntiâ
uma medida necessaria do processo de inquisiçao ? (S) '
(Il bis) A absoluiio ab instantia é o lançamento pvovisorio do processo,—
Nota dotraductor.
(12) O que faz o Godigo napolitano.
(S) A nossa legisliçSo criminal fornece exemples, a favor do autor e con-
tra Carmignani, de que ha principios que podem existir em qualquer forma.
A principio liouve a intençâo de dar-se ao nosao processo a forma da
accisaçâo, e tanto que nào obstante separar-se a formaçâo da culpa do
Julgamento deflnitivo, todavia era sempre a Jury quem tinha de proferir a
pronuncia, e por consequencia com a liberdade de pronuuciar, ou nao, se-
gundo a sua convieçào. "i^.-.
Depuis a pronuncia foi encarregada a juizes regulares, e ao juiz foi dei-
xado o julgamento deflnitivo (em regra). '
»
T5
2° Carmignani engana-se ta-nfbem, çjuando considéra certas
fermas, como coi'ôllarios necessarios de um pu outro systema.
somente pelo facto (sem outra razao além do accaso) de se
encontrarem mais ordinariamente em um ou em outro pro-
Talvez estejamos em erro, mas sympathisamos mais com o primeiro sys-
tema mais conforme com o logiez.
Hoje o nosso processo nâo pôde deixar de ser considerado mixlo, pois que
partecipa d« ambas as formas.
A o mltimo recurso da pronuncia o juiz instructor de empregar os
meios ao seu alcancc para o descobrimente do verdade, mesmo ex-officio em
certos crimes.
Depois da prenuncia, e de affecto o processo ao jury, a forma é a da accusa-
çâo com a differença que, nâo sô a parte offendida. como o promotor publico
em certos crimes podem promovel-a. Mas nâo obstante â processe ser aqui
accusatorio, passar como inconcussa a regrade que os juradospodem deci-
dir segundo a sua conscieocia, e nSo ter o julgamento recurso ordinario
(pois que consideramoà extraordinarios ou excepcionaes os recursos, que se
podem interpôr da sentença do jury) ; todavia osjuizes nâo sao tào livres
como parece à primeira vista, sendo uma das primeiras regras, a que estâo I
sujeitos, a do art. 36 do Cod. Crim.
Ha muita cousa boa na forma mixta do nosso processo, mas ha tambem
alguraa cousa que se dévia reformar.
A confusâo das attribuiçSes judiciarias e criminaes das autoridades poli-
ciaes tem provocado justes clamores.
Am disso ha crimes, cnjo conhecimento definitivo deve ser restituido ao
jury, ficando reservado as autoridades policiaes o conhecimento somente dos
delictos propriamente policiaes ou contravençôes policiaes. Entre nos nâo ê
a natureza do delicto, que lhe dâ o caracter policial, mas sim a taxa da pena.
Deve-se limitar o numéro dos processos especiaes.
As injurias, mesmo as impressas, deviào ser julgadas pelo jury mais livre
de attender as escusas do réo, mormente subsistindo o principio, de que as
injurias a particulares, ainda que provadas, nâo relevâo da pena, principio
que nos parece admittido pelo nosso Godigo Criminal (talvez com demasiada
severidade) nâo obstante a opiniâo contraria, que suppôe achar appoio no
art. 239 segunda parte.
A sociedade nâo lucra com a punâo das injurias, que mutuamente se
dirigem DO momento da contenda doue individuos, que brigâo : o jury podia
cm sua conscienoia absolvel-os como permittia o direito romano, e alguus
Codigos modernos, e que nâo pode fazer o juiz regular, pois nâo deve
aceitar aqui a doutrina da compensaçâo por ser contraria aos principios
rigorosos do direito, e a lei o deveria permitti-la expressamente por ser
perigosa; devendo deixa-la à conscienoia e prudente arbitrio do jury.
TO
cesso ; quando» por exemplo^pelo facto de existir o debate
oral nas legislaçpes bàseadas no principio da accusaçao ,
déclara logo ser elle o caracter essencial do processo de accu-
saçao. Tambem nao tem raz&o em attribuir exclusivamente ao
prinacipio da accuaacao a instituiç&o da accusaç&o pri-vada,
livre em sua acçto (13); e em dizer que somente nesta forma
de processo o accusado pôde em continenti e em todos 08
casos promover a abertura do debate entre elle e o accusado.
O nosso processo de instruccâo 6 muito severo contra o accusado, como j&
dissemos, podendo d'ahi resultar graves mules para este, som que a sociedade
col ha utiliiladc ajgunia em moles tar o innocente, que deixaria de soffrer
tanto, se se lho deixnsse a mosma foculdade na formaçSo da culpa, que ao
accusador on denunciante é concedida.
Som alterar a instituiçâo do jury na sua essencia, podia se estndar refor-
mas, que o collocassem em cstado de offerecer garantias, e produzir os sens
beneflcos effeitos, sem tornar tSo onerosa a missâo do jurado.
Isto nao 6 novo, alguma cousa se tem projectodo, mas nada se tem levado
a offeito, porque entre nos se trata em regra, e quasi exclusivamente. de
oleiçSes e de politica, e muitas vezes da politica peqnena; e por excepçâo, de
alguma cousa util. Todos conhecem o mal, mas ninguem se reconhece cul-
pado, e cada um atira sobre o vizinho a oulpa que tambem 6 sua.
Os proprios Poderes Politicos queixâo-se uns dos outros, e explicâo assim
a sua inacçào e a inutilidade da sua vida activa.
Com algum trabalho o nosso processo se tornaria mais logico e scientificos
pois os sens maiores defeitos consistem na confusâo, desharmonia, falta de
logica, e pouca sciencia dos que, inimigos do pensamento que inspirou a
constituirâo e o Codigo do processo, tem cooperado para se derroca-los pouco
a pouco, e em sou lugar construir um edificio tâo desharmonico em suas
partes.
' No que levamos dito nâo ha a minima allusao especial a este ou aquelle
partido ; todos sào réos e cumplices desse attentado, nâo sô pelo que fazem
e deixâo fazer, mas tambem pelo que coneervâo, reconhecendo que émâo.
Hoje trabalha-se muito nesteassumpto, e as tendencias geraes sào para a
forma ccusatoria, mesmo na Allemanha, que erao baluarte da forma inqui-
sitorial a quai o autor nao pôde deixar de mostrar a sua predilecçlo, nSo
obstante a primeira vista parecer eccletico.
(13) Na Escossia ha um accusador publico, e nâo obstante o processo as-
semelha-se essencialmente ao processo inglez. (Vide o Processo crim. comp.
1.1, cap. 45)
Vf
3* Erra ainda quando attribue necessaria e absolutamente
o predominio de cada uma das duas formas à natuseza das
instituoes politicas do paiz, onde vigor&o ; quando assigna
somente as deraocracias o processo de accusao, e as roonar-
chias o processo inquisitorial ; nao ignoramos a inûuencia
real e poderosa no systema politico nas formas do processo
criminal, e sabemos que a accusaçao naso nas republicas
antigas. Mas tambem é verdade que as noçOes fundamentaes
sobre a pena fazem de igual sorte fortemente pender a ba-
lança, e estas noçOes sao completamente independentes das
instituiçoes politicas. (14)
Desde que um povo, em virtude de sua cUltura intellectual,
cbega ao ponto de comprehender clararaente, que o meio mais
seguro de dar foa à lei, e garantia Compta à ordem publica,
réside na boa organisaçao do processo criminal, préfère a
forma inquisitorial, porque a contraria nao lhe parece bastante
aptae segura para a perseguiçao e descoberta dos crimes (15).
Nao é verdadeira a proposiçâo, de que o jury, e a faculdade
de decidir segundo a intima convicçâo, prodera exclusiva-
mente do principio democratico.
Reconhecemos a raaxima, segundo o quai o monarcha,
depositario supremo dopoder no Estado, exerce a justiça, des-
roembramento deste poder; mas délia tiraria uma fraca conse-
quencia de quem pretendesse que, facto é elle quem julga; limi-
tasse a ordenar que os julgamentos o mais possivel comformes
à justiça, e a sanccionar, no interesse bem entendido da socie-
dade, a forma do processo, que melhor conduz ao seu objecto.
Erafim Carmignani esquece que diversos caminhos
podem conduzir ao mesmo fini, e que a mesma idéa se ex-
prime sob diversas formas. Pouco importa que a imputaçao
(14) Vide tambem Biener, Ensaios historicos sobre o processo de inqtti-çOo,
p. 8.
(15) Esta opiniào foi manisfestada desde a idade média.
78
procéda de ùm personagem pàrticular, ou de utn accusador
ipublieo : a sua substancia permanece sem alteraçao. O pro-
cesso secreto e escripto na Allemanha péde,- êob certas condi-
çoes, fazer apparecer a verdade de uma accusaçao, assim como,
e sob outras condiçoes, o pode fazer o processo publieo com o
debate oral (16). A legislaçEo mais prudente séria sem daivida
aquella, que, conservando-se fiel a nàturezadas in'sti-tuiçoes e
dos principios fundamentaes, satisfizesse a todas as exigenciasy
nSo desprezasse caminho algum que pudesse cn'e-gar ao fim, e
escolhesse sobretudo as fermas, que facilitas-sem a sua
obtençao, ao mesmo tempo que, dando oùvi-dos ao
testemunho da experiencia, prevenisse os abusos que esta
assignalasse em umas e outras; e que, em uma palavra, antes
deadoptar estas ouaquellas medidas, tal ou tal systema,
indagasse sempre previamente, se elles sao os que correspondem
melhor â economia especial do Estado, ao grao do sen des-
envolvimento, e à sua constituiçao politica.
Extremando-se as distincçûôs que separâo as duas formas,
parece que se esquece mùitas vezes que ha, em um sentido,
uma accusaçao em todo o processo-criminal (17); que a dis-
posiç&o natural de suas dïversas partes se desenvolve tanto
mais, que se tem considerado sobretudo a accusaçao e a defeza
como seus dous elementos principaes, e que a devassâ, que no
interesse de verdade absoluta vem lançar em uma e outra
bacia da balança factos e argumentes pro e contra, tem sido
mais justamente apreciada segundo a sua verdadeira utilidade.
Com effeito n&o é a devassa, que reune os materiaes necessa-
(16) O peior é qtie os apologistas de uma das duas, os da publicidade, por
exemple, cahem em exageraçôes de toda a especie, e, fazendo notar
alguns abusos, que podem ser encontrados no systema contrario, tirando
conaequencias foadas de alguns faetos extraordiuarios, condemo logo
qualquer forma, que o se prenda a sua theoria favorita.
(17) Vide o Processo tri/m. comp. t.1 cap. 60.
•7©
nos do julgamento
-
?' ufto é por ella, que fica era posse desses
materiaes, o juiz encarregado de decidir da procedencia da
accusaçao ? Além disso, aquelle, que quizer estudar a historia
do processo inquisitorial, logo se convencerâ, que sempre se
pensou, que uma accusaçao fazia a baze de todo o processo
culminai, que somente em certos casos via-se o accusador,
mala fuma (18), e o acto de accusaçao no articulado da de-
vassa.
Assim pois, 1°, todo o processo criminal funda-sé ' em
uma accusaçao ; a parte lesada pelo delicto apresenta-se pri-
meiro articulando os seus aggravos, pedindo a suareparaçSb,
e pela sua queixa promove a instauraçao do processo.
A. Ora o delicto sera considerado como-um attentado aos
direitos de uma pessoa, ou de uma familia, e a pena respec-
tiva como uma composiçâo, uma satisfaçao dà mesma natu-
reza : neste caso o processo tem por base uma accusao par-'
ticular. B. Ora, pelo contrario, a pena parece antes imposta
no interesse da sociedade ; ella A principalmente a sancçBo
da loi : neste segundo caso a propria sociedade toma a peito
a perseguiçâo do delicto pelo orgâo' de um accusador publico,
ou tambem por intermedio de magistrados especiaes, tendo
par missao manter.-a paz, protéger os interesses sociaes, e por
consequencia pesqùizar os vestigios de todos os delictos. (19)
Assim pois, em toda a aao criminal estabelece-se raani-
festamente um processo contraditorio entre o accusador e o
accusado neste sentido, que o primeiro faz couhecer ao se-
gundo os artigos'da sua accusao e as suas provas, e assigna
a este uma dilaçao, dentro da quai deve apresentar a sua de-
feza. Ora, este processo adraitte da mesma sorte tanto o sys-
(18)
Processo brim. eomp. 1.1, cap. 13 e 81*
(19) Qiuquisidor (inqwrent) allemâo reune até certo ponto a dupla missâo de
accusador publico, e de magistrado iustructor. ^M
so
tema da accusaçao privada com a exposiçao publ ca dos di-
versos artigos da queixa, aos quaes o accusado é chamado a
responder, oomo o methodo prudente e determinado previa-
mente, segnndo o quai os artigos da accusaçao sao pouco à
pouco nos interrogatorios communicados aos indiciados.
Assim pois, todas as legislaçOes reconhecem oomo uma
necessidade fundaraental, a de prévenir as accusaçoes teroe-
rarias, ou infundadas, que poderiao prejudicar a liberdade
individual, e os direitos do accusado. Ora, pode-se conseguir
este fim, obrigando-se o accusado particular à inscriptio in
crimen, decretando-se contra elle a prizao, ou quaesquer ou-
tras medidas rigorosas (20,) e estatuindo-se, na doutrina da
accusaçao, e da .instrucçao ex-ofjicio, a necessidade de pro-
nunciar-se o indiciado, e sugeita-lo à accusaçao por intermedio
de um tribunal de accusaçao ,(ou pas3ar-se à instrucçao
especial no processo allemûo).
Assim pois, é principio corrente que a prova dos factos
da accusaçao inoumbe ao autor, e por consequencia, na falta
de prova compléta, o accusado deve ser absolvido..(21). Pois
bem I este onus da prova nao poderà ser igualmente imposto
ao magistrado encarregado de dirigir a devassa, de descobrir
os indicios, de verificar a existencia dos factos decisivos na
causa, da mesma sorte que é imposto ao accusador no systema
da accusaçao privada ? Tanto em um, como em outro systema,
(20) Assim como o fasia a lei romana (S), e o fez mais tarde a Carolina.
(31) O que prova a inexacticlSo da absoltUio ab instantia
(S) Valentiniano e Theodosio decretarâo a prisâo preventiva contra o ac-
cusador, vinculado pela itudrtptio, cod. th. 8 e 19 de Accusât, afim de quenSo
escapasse as penas, em que por ventura incorresse, porter feito uma accusa-
çao calumniosa ou fraudulenta, mas ngo sômente termeraria, {torque podia
o accusador ter justos uioti vos para queixar-se do accusado, e nâo poder apre-
sentar prova compléta, segundo a decisào de Papiniano, lei 1 § 5, Dig. Ad.
senatusc. Turpill.
f
c
81
se a prova do crime nao é sufficiente, o accusado deve ser ne-
cessariamente absolvido, sem que seja obrigado a provar a sua
innocencia.
Se se quer investigar, no systema gérai da accusao, que
apparelho funccionaria mais efflcazmente em um coïpo de leis ;
consideraçOes da natureza diversa se offerecem logo ao pensa-
mento. Sur 4
Em primeiro lugar deverâ ser preferida a forma, que mais
seguramente attingir o fim do processo criminal, a descoberta
infallivel do crime, e a puniçao do seu autor. Depois o legis-
lador, convencido de que, o nâo autorisar osprocessos senao por
uma accusao privada (22) ,é provocar a impunidade fréquente,
preferi a instituiçSo de um accusador publico, analogaâ que
existe naFrançae na Escossia,ou nomearà, dentrode certacir-
cumscripçao, um magistrado com a attribuâo ex-oflîcio de
descobrir os crimes, e os seus indicios,relatando-os em uma in-
formaçao preliminar. (23)
Deverâ tambem ser escolhida aquella forma, que fôr mais
apta para a investigao da verdade absoluta ; ora, desde que
a lei considéra esta como o fim de suas tendeucias, nao pôde
deixar de consagrar o principio da inquisiçao ; de decretar a
instrucçâo preliminar, que tem por objecto reunir todos os
materiaes uteis para julgar da procedencia do accusao, e fa-
zer délies o uso mais proveitoso para a manisfestaçao da ver-
dade dos factos : operaçao inteiramente imparcial, na quai as
investigôes do magistrado se dirigera tanto sobre as provas
do crime, como sobre as da defesa, sem que lhe importe saber
(22) A Inglaterra fornece um exemple notavel desta impunidade. Um re-
latorio on constabulary forée, feito em 1839,, diz que esistem na Inglaterra
mais de quiuhentas associôes, cujo fim é évitai- esta impunidade tâo fatal,
e que se encorregào directameute da pesquisa, e perseguiçâo dos crimes.
(73) Vide o meuartigo nos Archiv. âir. crim. t II, p. 446.
11
a
82
se o accusado tomou sobre si esssa tarefa (24). Quanto à forma
da devassa, séria boni que se escolb.es.se a que raelhor condu-
sisse à manifestaçao da verdade, e neste assumpto devemos
apontar em primeiro lugar a seguida na Allemanba com seos
interrogatorios prudentemente dirigidos, e as informâmes ex-
trahidas do depoimonto das testemunhas (25).
Rccommendaremos sempre em todo processo criminal o
systema, que previne o mal irreparavel de uma accusaçao pu ••
blica e infundada. Neste systema, quando a instracç&o preli-
minar esta terminada, as suas peças sao transmittidas a um
tribunal designado (pouco importando que seja um grande jury
como na Inglaterra, um tribunal de accusaçao como na França,
ou um tribunal de instrucçao especial como na Allemanba)
.Neste ponto, sao examinadas as provas da primeira in-
formaçao;indaga-se, se ha vebemente probabilidade de ter sido
0 crime commettido, e se ha indicios sufficientes contra o ac-
cusado, para que possa ser decretada a accusaçao. Este exame
preliminar poupa a este muitos gravâmes eprejuizos, e ao esta
do despesas consideraveia. (26).
Mas a que tibunal, e sob que condiçoes deve ser confe-
rido o direito de proferir a sentença definitiva
1
? Aqui décide
um oufro principio ; o legislador deverà seguir o partido mais
proprio para inspirar ao povo plena e inteira confiança
inajustiça dos julgamentos (27). Naose devetratar deiudagar,
se os juizes regulares, possuindo a sciencia das leis, merecem
(34) O art. 44 da Oarolina ordena ao juiz do procut ex-offlcio a prova de
innocencia.
(25) Sobre o caracter dos interrogatorios, vide "o Processo crim. comp. cap.
100 aeguintes.
(26) Vide o meu artigo nos Arch. Air .crim. t. II. p. 461.
(27) Vide o meu artigo nos Arch. dir. crim., 1.1 p. 280.
83
esta cbnfiança com mais justo titulo do que ùm tribunal de
juràdos ; trata-se somente de saber, se elles a possuena. No
ponto de vista da lei criminal concedemos, que os juizes regu-
lares, que decidem comforme as regras de uma theoria légal,
scientifica e prudentemente orgauisada no intéresse da inno-
cencia, podem offerecer garantias pela sua intelïigencia mais
vasta, por causa de uma apreciaç&o mais scientifica dos fac-l
tos, e mais rigorosamente comforme à lei : mas os jurados
tambem, pela natureza da sua iustituiç&o, pela sua compléta
independencia, e além disso pela sympathia, que sempre se
lhes attribue a favor do accusado, offerecem garantias politi-'
cas, que sera impossivel encontrar nos juizes regulares. Quai
dos dous systemas seja o melhor para a segurança social, é o
que n3,o se de afBrmar absolutamente ; tudo dépende do
grào de civilis&o, e dos costumes politicos decada paiz (28).
5" Em todo o caso o processo, para que se lhe reconbeça
uma organisaçao perfeita, quer a sentea final pertença ao
jury, quer a juizes regulares, deverâ. sobretudo habilita-los a
decidir por um complexû de provas scinceras e pïenas, e
nunca por simples peçàs arbitrariamente extrabidas dos pro-
cessus verbaes ; deyerao mesmo ouvir o accusado em pua d
feza, e as testemunbas em seu depoimento, e pelas perguntas
feitas a proposito, esclarecerem todas as suas duvidas, e forma-
rem, em uma palavra, sua plena convicçao. Perante elles, com
effeito, sao interrogados os accusados, os peritos e as testemu-
nbas, e somente estas provas, que se manifestao no debate, po-
dem servir de base ao julgamento, que elles m de proferir.
Vê-se pois que uma legislaçao criminal sabiamente organi-
sada reune perfeitamente as fermas da accusaçao e da instruc-
(28) Tomaremos a este assumpto com mais desenvolVimento, quando exa-
minants o merito da theoria légal dayrova.
84
çfto ; e, comtanto que as suas partes se harmonisent entre si,
parece évidente que o pôde deixar de attingir o seu fim. *
(*} Ha algnns an nos que na Allemanha se opéra uma revolâo compléta nas
idéas relativamente ao processo criniinal. Agora se esta reconhecendo cada
vez mais por toda a parte, quanto é visioso e prejudicial o systema da instru-
ào escripta. e créta, que vigorou até nossos dias. Cada um proclama bem
alto que este systema nSo obtem a confiança do povo e esta longe de assegurar
a manisfestaçâo da verdade. Por isso de todos os lados nas camaras se apre-
sentâo .moçôes tendentes à introclucçâo de um processo modelado sobre o da
França ou o da Inglaterra. Mes os governos ainda nâo se desfizerâo das suas
disconfianças, das suas velhas inquietaçôes ; temem o apparecimento da nova
legislaçâo como se fosse um golpe contra a estabilidade da ordem de cousas.
En frétante' nâo obstante os seus esforços, o principio do debate oral tem a
preferencia em todos os paizes da Europa, e verificamos com especialidade o
seu progresso em um escripto cente {Do debate oral, do principio da aecu-
saçâo, da publicidade dos processus, e do jury Stuttgart 1845) O primeiro
passo para um melhor systema na Allemanha foi dado pela ordenacâo Wur-
tembergueza de 1843 (jâ citada, cap. 3, not. 96 bis),, a quai, conservando
sempre todo o antigo processo de instrucçâo sécréta e escripta, decretou uma
especi9 de debate oral final, em que o accusado com o seu defensor compa-
rece perante os juizes. O auto de accusaçâo é lavrado por um orgâodomi-
nisterio publico (é um dos juizes que représenta este panel, pois nâo ha func-
cionario algum especial para este fim) ; os processus tornâo-se publicos an tes
de ser encerrados : o defensor apresenta a sua defesa escripta, e o debate se
trava entre elle, e o magistrado exercendo as funcçôes de ministerio publico.
Esta organisacâo do processo foi oalorosamente acolhida, nâo obstante a
sua insufficiencia, e as suas numerosas lacunas ; ao menos serve para
demonstrar o reconhecimento da superioridade do processo oral. Mas
repelimos, nelle nâo ha senào meias medidas : 1.° Nâo se applicando a lei
senào aos crimes mais graves, résulta d'ahi que as antigas leis es-tâo ainda
em vigor na maioria dos casos ; 2 as testemunhas nâo com-parecem, e os
juizes nâo conhecem os seus depoimentos senào pelas re-produçôes militas
vezes infieis e truncadas emanadas do orgâo do ministerio publico ou do
defensor ; 3.° a publicidade é restricta, o ingresso ho audi torio nâo é
concedido senào a certas pesseas de posicào (Ehrbaren) e é sempre
recusado As mulheres. Vide, na obra precitada, a critica mais especial desta
ordenacâo, p. 108—278.
A nova ordenacâo badeza (jâ citada, cap, 2, 1.° nota munuscrispta) de 6 de
Marco de 1845 adiantou-se mais na via do progresso. Ha aqui um ministerio
publico instituido como em França, cujas requisiçôes motivâo a informaçào.
A instrucçâo preliminar é sécréta, termina-se pela decisâo do tribunal, que
décréta a accuscçào : depois, sempre como em França, instaura-se non pro-
85
CAPITULO V.
RELÔES E ANALOGIAS ENTRE A PROVA EM MATERIA CRIMINAL E A
PROVA EM MATERIA CIVIL.
Existe entre o processo civil e o processo criminal certas
analogias geraes : de um outro lado a sciencia dirigio suas
meditOes mais cedo para o primeiro do que para o segundo ;
e-como enfim a rei romana em muitos lugares parece confundir
ambos em suas disposiçoes, d'ahi resultou que muitas vezes
as nOes e os principios relativos a um se estenderâo ao outro,
e, convém dizer, com grande prejuizo deste (1). Assim (cita-
rem os um exemplo ) quiz se transportar do processo civil
para o criminal as regras usadas em materia de perempçRo,
e de cousa julgada ( 2 ). D'onde se segue que as diversas
cesso oral e publico : com a differença porém que nâo é o jury, mas sim jui-zes
regulares, os que julgâo ; a lei traça-lhes regras de prbvas, sua sentença deve ser
moth'ada mesmo quanto aos factos, e o condemnado tem o seu re-cnrso livre
para o tribunal superior, como em França em materia correccio-nal. Mas ainda
aqui ha meias medidas, e é por esta forma que se fazem abortar as melhnres
idéas : 1." supprimio-se o tribunal de accusaçâo do c >digo franzez por um
espirito de economia muito mal entendido : é o tribunal do districto, que jâ esta
ligado pela primeira decisâo nainstracçâo preliminar, que tem de décrétai' a
accusaçâo (art. 304) : 2.° o processo é inteiramente publico perante os juizes
defînitivos, mas, nos termos do art. 295, o tribunal pnde supprimir a
publicidade, se lhe parece haver perigo para o Estado, ou para a segurança
publica ; as mulheres nâo tem ingresso no auditorio, salvo se foi uma mulher
accusada ; e enfim o indiciado tem direito de requerer a audiencia créta (art.
224227) :3e sempre por causa da economia, a ordena-çào autorisa o juiz a
prescindir do comparecimento de todas as testemunhas, e a pronunciar pela
simples leitura das peças da instrucçâo preliminar (art. 211).
Vide a critica desta lei no escripto citado p. 181—139,805; 345.
î
(1) Por exemplo no que diz respeito & doutrina da incapacidade das teste-
munhas, e das contradictas a oppor-se-lhes.
(2) Vide o Procès, critn. comp., vol. 2, cap. 202.
80
theorias (3 ) nao se fixarao, « calquante que uns (4) separ&o
absolutamente o civil do criminal em materia de prova, como
em tudo o mais, cit&remoe outro, escriptor distincto ( 5), que
se esforça em construir um systema, que'seja commum a ambos.
Séria sem duvida um erro recusar-lb.es certos pontes de
contacto : 1.° no civil como no crime um processo è sempre um
processo, e tanto em um como em outro devem apparecer alguns
caractères genericos communs; 2.° era ambos igualmente o fim
a attingir é a manifestaçao da verdade. Da primeira pro-
posiç&o surgem diversas consequencias ; e em primeiro lugar,
existem certos principios communs, que decorrem da propria
natureza do processo em gérai : é preciso que haja de facto
duas partes contrarias collocadas face a face, estabelecendo
conclusses respectivamente adversas : e é da verdade de sua
affirmaçao, que dépende a admissibilidade de suas proprias
conclusses. Entre estas consequencias communs deve-se espe-
cialmente classificar a regra fundamental, que pSe a prova dos
factos a cargo de quem a allega ( quer seja o autor no civel,
quer o magistrado que toma a peito a accusaçSo criminal em
nome da sociedade ) e que faz absolver o réo, quando a prova
nao foi feita.
De ser sempre a manifestaçao da verdade o objecte do pro-
cesso, qualquer que seja a sua natureza, segue-se que certas
regras forneeidas pela razao e pela experiencia, como os meios
aptes para esta manifestaçao, certas prescripçoes ordenadas
pela prudencia, para desviar toda a illusao prejudicial, devem
(8) Iteinhard, De Probat. civil, ac. crimin, conv..et disçonven. Erford,
11732.
(4) Goenner, Manual de procès, ci®., t. 1, p. 109. H
(5) Olobig na sua obra, Systema da lei em materia de procès, judic, Lei-
psick. 1809, p. 25.
87
guiar igualmente o juiz civil, e o criminal,; taes sao, entre
outr.os, os preceitos,que deterininao a força probatoria de certos
depoimentos de testemuniioa, ou a apreciaçao da confiaa
dévida a ellas pessoalmente.
Mas um exaine mais attento faz bem depressa reconhecer
graves differenças entre os processus civil e criminal.
PHIMEIRA DIFFERENÇA FUNDAMENTAL. A ACÇÀO DO JUIZ SE FAZ SENTIE
EM AMBOS EM DIBECÇlO DIAMETBALMENTE OPPOSTA.
O processo civil inia-se por um articulado preciso gra
vâmes, pela affirtnaçao de certos direitos da parte uma
pessoa determinada em relaçâo a outra pessoa igualmeute de-
terminada ; mas no crime, e principalmente no processo inqui-
sitorial, por uma circunstancia, que lhe é peculiar, raras vezes
as queixas articuladas se dirigem desde o principio a um o
designado. Muitas vezes tambem a natureza do delicto nao é
bem especificada, e com effeito os seos caractères sao manifes-
tados pela informao da queixa feita posteriormente : quando,
por exemplo, se trata de ferimentos, nem sempre se poderia
dizer previamente, se ha delicto de ferimentos intencionavel-
mente feitos, ou se,tentativa de morte. :,
A razâo tambem requer, que as attribuiçôes do magistrado
encarregado do processa civil sejEo diversas das do magistrado
encarregado da devassa criminal. No processo civil a discussao
contem duas phases bem salientes : na primeira as pretençoes
respectivas das partes colloc&p-se uma em face da outra: a
administrao da prova occupa a seguuda ; mas no crime nao
pode ser assim : logo que a offensa é denunciada, e conforme
o *eo fundamentp, applicao-se contra o accusado algumas me-
didas, que muitas vezes compromettem a sua liberdade, e que
sô podem ser ordenadas pelo juiz, quando as probalidad.es as
mais vehemontes as justificao,—De ordinario tambem o facto
chega ao conhecimento do instructor na occasiao, em que
obtem a prova délie ( pelas declaraçôea de uma testemunha por
exemplo ) e quando, podendo a prova desapparecer por quai-
quer demora, o seo dever lhe ordena tirar logo délia o partido,
que julgar conveniente. Ao contrario do processo civil, em que
a prova é fornecida pelas partes, e assim feita serve de unico
ponto de partida ao juiz, a intervençao do instructor criminal
na administraçao da prova se mostra até o fim activa e
incessante : ve-se-o primeiro procura-la ex-officio, depois tirar
délia todos os elementos de convicçao que encerra, e consi-
Lrna-los nos autos; e ainda depois examinar attentarnente a
importancia dos resultados obtidos, an tes de julgar-se autorir-
sado a proseguir na instrucçao.
No processo civil as partes sao pessoas certas e conhecidas,
e o juiz, que assiste à administraçao da prova,limitarse a exami-
nar, corn o auxilio dos meios propostos por cada uma délias,
se estao provados os factos, que servem de base a acçao ou a
defesa. Mas no crime a èsphera de acçao do instractor é mais
ampla ; esforça-se ao mesmo tempo em obter a prova do
deHcto, o reconhecimento do seo autor, e a mons-traçao
Clara e perfeita de todas as circunstancias peculiare3, das
quaes pode depender a justa applicaçao da pena. E sempre que
examina os lugares, e os objectes, ou que interroga uma
testemunba, trata de esclarecer todos estes factos, todos estes
accessorios da causa, que talvez nao terao na sentença sen&o
uma influencia tardia e mediata.
Enfîm as diversas phases do processo de accusaçao accusao
novas differenças no objecte irarned iato dos esforços do juiz. E' na
instrucçao preliminar, que o processo inquisitorial mais mani-
festa tendencias multiplas e variadâs; e a razao é porque antes
de tudo é necessario chegar ao terreno mais solido, em que a
accusao toma o seo lugar. Muitas vezes, é verdade, basta no
principio tirar partido das presumpçôes, cuja existencia verifi-
cada da lugar a diversas medidas, e actos do processo, e per-
89
mitte, por exemplo, resolver a questao da opportunidade da
prisa» preventiva; presumpcOes enfim, que vindo coufirmar a
probabilidade da existencia doncrirae
M
e da culpabilidade do
indiciado, podem auxiliar a decidir, se ha ou nao lugar para a
instrucçao especiaL Mas como a instrucçao preliminar tambem
tem por missao colher logo os materiaes da sentençadefinitiva, e
como além disso pode desapparecer mais tarde esta ou aquella
prova, a devassa deve reuni-las todas, e conatituir, sendo
possivel, a certeza requerida aos olhos da loi. Enfim quando a
instrucçao se faz na parte principal do processo, ha-vendo um
accusado determinado, a prova, que se tem.de for* necer, parece
coneentrar-se de prefereneia sobre don» poatos mais especiaes : o
accusado foi o autor do facto? em qne grao é culpado ?
Segunda differençà fondamental. Mesmo em relaçâo ao
principio da prova, e ao problema a resolver em todo o processo
civil ou criminal, notamos differenças ainda mais profundas (6).
No civel trava-se a lucta sobre a existencia, e extensao dos
direitos de propriedade, ou dos direitos pessoaes, que a ella se
prendem, e por consequencia susceptiveis de uma livre desis-
tencia ; mas no crime, sendo o interesse publico a razao dos
processus, estes nao podem ficar peremptos pela desistencia das
partes (7). As necessidades da sociedadeexigera, que o trans-
gressor das leis soffra a pena correspondente, porque a impu-
nidade afrouxa os laços da ordem civil, e diminue o reapeito
(6) Carmignani, délie Leggi, 1. c, p. 118.
(7) Lei 33, D. de Partis. Jus publicnm privatorum partis, mutari non
pote.it[S)0 direito romano nâo perrnitlia ao accuaidor senâo a desistencia mo-
tivada, e punia-o; quando por coriluio com o accusado procedia de modo, que
este fosse absolvido, como se pode ver em diversos textos do Dig. no» Tilt, de
smalusc. Turp.; de Preoaricat.; e de Abolit.
18
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civil, e ocriqrinal, admittirSo (9) (a confissao, por exemplo)
comportao um principio différente, quer em uin, quer em ou-
tr No primeiro a confissao judiciaria da parte faz fé, porque
ella podia definitivamente renunciar ao seu diito ; no segun-
do, pelo contrario, a confissao do indiciado, seu compareci-
raento volantario, o facto emfim de se denunciar a si proprio,
nao poderiao satisfazer plenamente. E' mister em todos os
casos, que para o juiz resuite certeea compléta, do exame dos
motivos, que o arrastarao a dar esse passo, de todo o seu pro-
ctdimento, da concordancia entre os factos especiaes compre-
hendidos na confissao e as outras provas dos autos, da verosi-
milhança da confissao, e da probabilidade do crime imputado
ao accusado ; sômente nestas condiçoes pôde a confissao auto-
risar a condemnaçao.
3." A desistencia do accusado tambem n&o tem infiuencia
no processo. e na administraç&o da prova em materia criminal.
No civel uma parte poderia desistir do juramento de uma teste-
munha ; uma testemunha suspeita poderia deixar de ser defei-
tuosa mente por nao ter sido contraditada pela parte, contra
quem foi produzida ; mas em materia criminal, onde predo-
minao interesses os mais elevados da justiça, a vontade do
accusado nao poderia ter. infiuencia (10) ; ainda mesmo que n&o
quizesse oppor-se a algum acto do processo contrario à lei, e
clarasse, por exemplo, que aceitava como valido o depoi-
mento de uma testemunha nao juramentada, ou uma vistoria
illégal.
4.° Finalmente no civel ha certes prescrioes legaes, que
derivao do principio da desistencia ; as quaes n&o podem ter
(9) Manifestaremos mais destenvolvidamente as nossas idéas a respeito,
quando tratarmos separadamente desles diversos meios.
(10) Vide o Processo crim. comp., 1.1. cap. 61.
oa
applicaçào' no processo erirdioal. Neatë nao ha terinos pe-
remptoriôk determinados para taes ou taes actos (11) ; porque
nao se pôdé ligar a um espaço de tempo dëterminado a mani-
festac&o da verdade, fim deflnitivo do processo ; e nao se pôde
assignat ao accusado ou ao seu defensor um termo fatal para
produzir a sua prova (S). Pela mesma razâo a cotisa julgada nao
pôde ter no crime o mesmo sentido, que se lhe dâ no eivel ft).
Emfim, emquanto que nocivel a revelia importa a condemnà-
çao, o contrario se em materia criminal. O revel, o que
récusa responder (13), nao pôde ser ôorigado a explicar-se
deritro de certo termo assignado, sob pena de se o julgar con-
fesse dos factos imputados, pois que esta reconhecido, que a
propria confissao expressa nao pôde por si fazer prova ple-
na, senao quando contiver certas qu alidades requeridas, e
quando achar-se em harmonia com as circumstancias jâ
verificadas.
(11) Stubel, Proc. crim., g 2376.
(S) Em' qualquer reforma que se fizesse do nosso processo devo og refor-
madores ter em vista este principio, porque boje muitas vezes os àccusados
sâo tomados de surpreza, e as vezes sào intimados no dis antécédente para
se verem processar e defenderem-se no dia seguinte, ignorando os fados,
pelos quaes sâo àccusados, pois que os Mandados citatorios nâo os explicâo;
limitando-se a dizer, que vâo ser processados como incursos ueste ou
naquelle artigo do Codigo criminal.
(12) Martin, Annûarios da legislaçâb saxonica, 1° anno, n. 1.
* (18) As disposiçôes de ordinario cohtidas nas logislaçôes, mesmo
nas mo-dernas, relativamente aos que nâo comparecem, estâo muitas
vezes em contradicçSo com os principios mais rudimentaes de direito.
Vide o Processo crim. camp., t. 2, cap. 209, e principalmente 211 in princ.
©3
CAPITULO VI
DA PROVA EM GBKAL B ESPECIALMENTE DA PROVA ' NO PROCESSO
CRIMINAL
Sempre que um individuo apparece como o autor de um acto,
ao quai a lei liga consequencias affiictivas, e que se trata de lh'às
applicar, a condemnaç&o a proferir se basea na ce*-teza dos
factos, na conviccçao pvoduzida na consciencia do juiz.
O complexo dos motivos productores da certeza chama-se
prova (1). Quando se discutem estes motivos, tera lugar no
espirito do juiz uma operaçao igual a que tem lugar no espi-rito
de todo aquelle, que procura convencer-se da verdade dos factos
nos negooios do paiz. E' na certeza adquirida, ou ao menos nas
mais fortes probabilidades, que firmamos o nqsso juizo antes de
entrarmos em tranzaçoes corn certas pessoas ; é essa a base das
nossas especulaçOes de qualquer natu-reza, e tanto mais -
importante for o negocio, quanto mais prudentes somos antes de
obrar, e maior garantia de probalili-dade exigimos. Nesta
investigaçao da verdade o espirito hu~ mano pode comparar-se a
uma balança, posta em movimento por circumstancias
exteriores, e por impressôes, que o homem recebe do mundo
externe Nelle residem as forças necessarias para pezar os factos.
O impulse em nos produzido em face da prova, e que
communica o movimento ao que chamaremoa fiel da balança de
consciencia, de ser mais ou menos forte. Se é menos
vigoroso, sô provoca a desconfiança, sô faz uascer uma pre-
(1) Vide as opiniôes diversas dos autores sobre a prova : Martin e Walch.
Repert. de procès., t. 1, p. 68 ; Weber, Preceitos para servirent d adminis-
traçao da prova, § 2; Geusler, Arch. de praU civil, 1.1, p. 26, i
; «té nqâlft eiggawriSwel, SK fasser.
~~j»; es eesfiessa, %w WBH
A ocîgaa -ia prawaL
adS eux cgssstsso '"îf. E" pw w ^o? ans im
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!» Carmi^MiM. &£fe £^jx, «Li §•- Sft
*
circunstancias occultas, que muitaa vezes podem esclarecer os
fados, e apresental-os gob a sua légitima apparencia, fica ira
passivel em face de provas, que actuariSo decisivamete em
uni espirito inexperiente. As prevençoes podem fazer dar a
certes circunstancias uina importancia, que nao séria reco cida
por um juiz, cuja consciencia fosse délia» isenta. Quantas vezea,
por exerapio, nao ae tem visto nos debates considérar como
factos muito graves as mentiras, e as contradic nu-merosas
do indiciado ! Quantas vezes a prevençao, de ser elle o auctor
real do crime, no3 leva a dar uraa explicaçao injusti-ficavel a
circunstancias insignifiantes, julgnndo ter descoberto o intime
da aima. Emfim, as disposOes do momento podem dar maior
ou menor accesso as impressOes produsidas pel factos, nos
quaes a provn se funda.
E esta observaçao é principal mente applicavel em materia
politica ; ae o juiz é timido, se sonha a cada momento coin
revoloes imminentes, ae considéra em perigo a ordem pu-
blica, sa pelo facto de perceber symptomas de um movimento
extraordinario nos espiritos ; entao certes demonstracces, u
procedimento de varias pessoas, Ihe parecem ameaçadores, e
caracteristicos de intençOes funestes para o Estado ; pelo con-
trario um juiz mais cordato, que quer a liberdade e o movi-
mento no dominio da intelligencia, e rende homenagem à in-
dependencia do pensamento, pensa no perigo, quando elle é
actual. Todas estas impressOes, todos estes impulses em aentido
diverso produsidos pelos factos no juiz, dao lugar a uma es-
pecie de luta entre os motivos pro e contra, e a convieçao se
forma por aquelles, que triumphao. O fiel da balança de con-
sciencia, servindo-nos ainda desta metafora conhecida, va-
cilla antes de fixar-se, e os seus movimentos déterminai» a
proporçao entre as razoes, que levao a dar credito aos factos
em questao, e as que levao a recnsar-lhea. Assini pois, quando
as razOes affirmativas predominâo pelo numéro e pelo peso,
»
_MM0K0HNiHHHiflM]
___________ |aqî*Se qœ fcnww os BH*I*W d**«
aûaasaa» da oaerâdfe»; f de «air lad© «quelle, pewaieo ««1
alla ê prodenda. Ifo yiiumto caao a palabra prew * *o-jjjlf 5-JH-
ni i MWIIIV: <wûmoi eeferr-» feâtos pA parte para Cnaar a
twaniciAo ao oapmto Ao jm, m eoftora-k> «aestsào de decsdzr
cou tais a cerfesa dos fcrte» da cassa. N«*e «ea-ttda «rana, e
40MàKr»taCroçâa Ai jwww, sao synrïaiB^^^^rJ i» «ae ao mat
a* parte? tealïe dnsotKtrar afl « pot àaa »v ao criae Te-« logo a
priaàp», |_^_^__^ «i dnouartttf «a filial,—
arca".adaraobstit«ido par as ÏBS-tranar ao proceaw ïuqnîâî «isL i
qoal, ao intéressé da w-dade, prorata « veetifi safertaos HB
ianaateriaaa, verîScs-•*,«* ê posâreJ. qoaudo «Ses diana
respeâîoao ccrpo dede-&r«a, a* apeate « à «aa ealpaHBiada, aa
«vaado podeaa eoa-tribaà para eariarenar a religiSa do
Hîsgsstraâo, qne liai de proferir a iwteaça.
A palaTia araaaaaraa-» STDCCUIQU deoertw», oo&âderaado-a
et ajja^laaaBa^peTaav» a qnai eUa « pr<daâda ; « «•#»
fer, e eaaaprebeade o «aaipleso dos modros
_________[âaëTâSëW coadoir <aaa tada a segaraxiça a ireaÏÏds-
liëdoslacftis da aeeosaçia,
HÉfc» se faiàar» esc aaaia »M,fn esta oaaâde-
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Sppjiçada mais especialmente ,£a maierias criminaes (3) a
prova offerece particularidades notateis.
1.° No crime trata-se de demonstrar a evidencia dos factos
passados, que por conseguinte nao podera mais na sua prirài-tiva
pureza ser submettidos ao exame material do juiz, e cuja
realidade nao pode ser estabelecida senao por via de indacçSo,
tomando-se por ponto de partida os effeitos, os signaes caracte-
rîsticos, os vestigios de toda a sorte.
Mesmo no caso de delicto factipermanentis, no caso de assa-
sinato por exemple, o exame tem importancia por permittir a
verîfieaçâo da existencia de uni cadaver, mas o facto Consti-
tutive do crime nao pôde ser reprodusido perante o juiz. O
exame nao lhe fornece mais do que os dados, dos quaes lhe é
possivel tirar por indueçao uma relaçao de causalidade entre
certes factos primordiaes, e a morte da victima. Em resumo, as
fontes de convicçao, que auxiliâo ao historiador, que vai
procurar a verdade nos factos do passade, sao as mesmas, nas
quaes o juiz vem buscar a sua convicçao, qùando se occupa da
existencia, e das circunstancias de um crime.
2." Além disso em materia criminal encontrSo-se maioreà
diffieuldades, do que em materia civil. No processo civil as
partes esforçao-se por demonstrar os factos constitutives de um
vinculo de direito entre ellas existante : fazem comparecer
testemunhas expressamente para certificar o compromisso do
adversario, quando este vinculo se formou pelo contracto, e
exhibem os titulos enunciativos das suas mu tuas obrigaçOes >
mas, no crime, o autor do delicto tomou todas as precauçoees
imaginaveis para tornar impossivel a prova délie, e para fazer
desapparecer todos os seus vestigios.
(S) Sobre a deftniçâo da prova em materia criminal vide Rolin. de Probal
dect., p, 34; Stubel da eorpo de delicto, p. 281; Tittmann, Mariual de dir,
yen., p.838. ¥ide o Procès, crim. çomp.. 1.1, cap. 87, t. 3, 'cap, 157. •
13
98
3.° No eivel, de ordinario, tràta-se de demonstrar factoa, que
sao do dominio dos sentidos, e que o testemtinlio oral pôde dé-
terminât facilmente : no crime o juiz é obrigado a esclarecer
oircunstaiieias impalpaveis para os sentidos, e que pertencem
ao fôro-interior.
A imputa bilidade moral do indiciado, a situaçao do seu es-
pirito no momento do crime, a lucides de suas faculdad.es de
conaciencia, a ma intenç&o e a sua intensidade : eis outrés
tantos objectes, sobre os quaes é preciso dirjgiv os instrumen
tas de prova, mas cujos resultados nao podem ser obtidos pelos
meios ordinariameute applicaveis nos factos exteriores, nao se
podendo obter a certeza senao por via de inducçao. I
4.* Finalmente, resta-nos ainda assignalar uraa particule*
ridade ; o magistrado encarregado da instrucçao do processo
tem por missao especial indusir o indiciado a uma confissao
espontanea e compléta da verdade ;, da quab(desapparecendo
todas as duvidas sobre a veracidade da sua confissao) dimana
para o juiz definitivo mais uma garanti» a favor da sua con-
vicçao, que séria difficil obter de outro modo ; com effëito
quanto mais franco fôr o autor do delictô sobre todos os factos
de cohsciencia, tanto mais lhe sao prejudiciaes as suas pala-
vras, e tanto menos se pôdesnppor, que o interesse as dicte.;
de outro lado divulgando todo o seu procedimento, da lugar a
que o juiz possa facilmente pelas suas confîssoes verificar os
depoinientos proferidos no processo, os das testemunhas, dos
peritos, ou quaesquer outros.
CAPITULO VII
DA VERTtADB, DA* CERTEZA E DA CONYICÇÂO
demonstramos que fazer prova é em fundo querer demons-
trar a verdade, e convencer o juiz, o quai, para decidir, tem
necessidade-de adquirir plana certeza ; convém agora exami-
99
nar a fundo a natureza de prqva, e pot consequencia entrât
em, alguns desenvolvimentos do que se chama : verdade, con-
viâo, certeza. .-,
Verdade (1) é a. concordancia entre um facto real, e a idéa
délie representada em. ,nosso.espirito. Supponhamos um indi-
viduo querendo conveneer-se da realidade de uraa cousa, e
pesq.uisando-a. j a verdade apparece, quando a convieç&o ad-
quirida se acba em correlaçào perfeita com o seu objecte. Nao
ca,be aqui o examinar, se a verdade propriamente dita, ou antes,
a verdade absohita dos çousas pâde ser submettida as investi-
gâçCes do. espirito humano, ou se este é obrigado a conten-tar-
se com a simples apparencia (2). Séria completamente inutil um
detido exame das divisôes da escola (3). N&o nos demoraremos
em expUcar a verdade logica, à quai, ao contrario da verdade
matériel.,- chegamos pelo raciocinio, e que résulta do facto de
estarem em harmonia com as leis conhecidas as noçGes,
;
qué
concebemoa das causas ; e de passagem classifi-caremos nesta
divisao a crivel e possivel logicamente. Nem mesmo
discutiremos a natureza da verdade traitscendental, que é do
dominio da philosophia, por ser o conhecimento do mundo
(1| Kmg, da-oonviccâo, dos sens grdos e dos seus moàos diversoa. Iena
1797. Stubel, do cargo de delicto, 1166, etc. Relatorio da commissBo imme-
diata prussiana sobre o jury. 1819, part. 1.; Grœvell.Kacama deste Relatorio,
tït. 11, p. 117 ; Weber, Arch. do Mr. Crim., tit. 8. p. 562 ; Weiland, Ensaios
sobre a natnreta dajustiça critnimal. Délit., 1836, p. 34; ArUgos na Renista de
Jurixprudencia Crim. prussiana, a. 17. p. 150; n. 19, p.. 131, n. 42, p. 239.
(2) Os glozadores raciocinSo como os nossos philosophos, quando ua Gloza
sobre a-Novel. 78. cap.l.' estabelecem esta questào : Quid est veritas ? ipse
Deus. Veritas vero humanitatis polest diei notUia certes rei maxime per visum.
(3) Weber, Arch- precitados, 8, p. 963.
tbb
dbtyhjfl^^Hfc'quereril^An^^^^^^H^H^^^^^^I
pfiîèafàmsG ajffi&Mtatiàto iaititihâb tvHètoet, e pk rim é
«ufficientepara nelle dirigfr uossas acçoes. Deixamosde parte s
verdade matfamatka, sem tôdavia deixar dé reennheéw^que
adpèradiO do e»pirito,qne ittnx appareeer (4j, 'édftetsada que
condtiz'"âo eonhedmentb da vtttAktffi'WtitMca ;qfte éftta JPo
total He rnûttâ»sommas,-eiÉéapplfoa prinéipalraeii & nftÇSsv
das quantïdades.
À'Vefâade hiètbrica ei»'' o ofijecto dos "nossos estuddff (l^
5
;
eis o alvo, que tfàtarao* de attingfosempre quèièmos em Vfsta;
asBegûrarrao-nos da realidade de cefto* acontecimentos, e de
certes acte» praticados no tempo e no espaco.
Percotrendo o tempo e o espa^o, eolhem em 'rtttwo eaminho
uma'maltfdio de circutwtancias isoladàa, e as encâdeiatitox
uma's na« outras ; entas por seu turnonos gniao,gqua'ndo com
o «eu auxillo chcgamos ao fi m das nomas in vtig/f, pode-
mos julgar com confiança, se os accmteeimentba passades de
que se trata, sao eom effeito reaes, e quai é a sua nàtureza^'î
âcreditamos possuir a rdade no moment/) êm que as nossas
idéais sobre oobjecto das nossas ïnvést%aço'efl nos pareeem os-|
tarera perfeita concordancia com elle. Em ontros termoa, ha
nesta- operaçao do nosso espirito correlacao «ntre o sujeito qu
e
jiilga, e oobjeito julgado; d'an, ni procède a «egiiinte quentao
tao controvertida (0) : a verdade sera aubjectiva ou objectiva S
(4) Weber, 1, 0„ p. 589; Jarke, na ttevUla de Hiizig,tU>. 19, pi 147:Œin*
«III M, dajuvi.liM pénal, p. 142.
' (Sf Hfcafoel, do cofpo de fi.Mir.io, % 181, Video Procttto aomp. M. 1,1
(S) OracvcJ, î. G., llfi.Vidc Feuerbflçh, OomidcraçTiea sobre o )ury, p. 135;
Wefland 1, C; p. 70, Jarke, IleKlstàpréfiUada de BiM/j, M^J^jj/99.
ittl
todfis as disetis'soes sobre o sentido destasexpressOesdimana
àô' menos no îùndo, umâ conclusao importante, ë a quest&o
dèvé ein riôss'â Ôpiniâo, redùsir-sô aos seguintes termos : a vér-
daHë pode r denominada objectiva no sentido de ser comple-
tameâté independente do sujéito, que a jufga ? Funda-se ella em
"bazes fixas de tal sorte, que' deva imprimir os mesmos
iîfipùlsos, os mesmas ima^èns
1
em todos os espiritos a séîi pe-sar
* ou convira antes detiomraa-la subjectiw no sehtid'o de
depender a sua noçao de aptidoes especiaes do individuo, que
tem de ser cbnvencido, do espirito que ifata de examina* a
fundo, dé sorte que para qualquer nada haja de vefdadeiro se-nâo
0 que elle tem por vefdadeiro ? A questao assira formulada dévia
preoccupar vivàmente o legislador, e, com a sua reso-Iuçflo,
dévia tambem forçosamente decidir, se pôde ser decre-tada nma
theona légal da prcva ; e depois quai dos dous System as deveter
a preferencia, se o jury, se o que attribue a sen-tença a juizes
regulares e jurisconsultes.
Sendo a verdade denominada objectiva o legislador è obri-
gado logo a erigir uma Iheoria daprova, é de appoia-la nas
raesmas bases, nas quaes se funda a ' pretendida verdade obje-
ctiva. Desde que for admittida esta theoria, a decis&o do ponto
de facto pôde ser confiada a juizes regulares. Lancemos as
nossas vistas para a vida habituai ; n&o vemos ahi o vefdadeiro
exercer pouco a pouco o seu poder sobre todos os espiritos ? e
nâô disemos frequentemente, que é impossivel desconhecer a
realidade de certos factos, salvo se de todo se impossibilita o ac-
cesso à convicçao, ou se se tem aintelïigencia obtusa*? tomemos,
porexemplo, o caso em que tivessemos verificado com ssos
proprios olhos os ditos factos. Da mesma sorte observemos o
que se passa em um tribunal criminal allemâo compostode
seisjuises : nelle veremos frequentemente tal prova produsir em
todos elles uma impressâo identica ; e por todos unani-mimente
ser decretada a culpabilidade do individuo. Quando
îoa
dous homens dignes de nos attest&o uni facto, a que assis-
tirfto, podemos recusar-nos a admittir a sua verdade? Ijî.' pois
fora de duyida, que ha na verdade uma força de impulso, cujo
effeito nao falha em todos os homens, e que entre os meios
que auxiliao a sua manisfestaç&o, algunsha, cuja influencia se
propaga igualmente em todos os espiritos-, e lhes imptie uma
irijesistivel convieçao. Observàmos ainda, que em tal caso o in-
dividuo çonyencido, quera quer seja, pôde mqtivar a sua con-
vieçao, e que esses motivps sâo sempre os mesmos, ainda que
os individuos sejao diversos. Nao parece sulter de tudo isso
certas lois de correlaçao necessaria entre o sugeito que julga, e
p objecta que é julgado '? e da perfeita concordancia entre as
idéas do primeiro e o seu objecto nao resultâo certas garantias ?
em concluaao a convieçao nao surge das proprias entranbas da
verdade ; e plenamente independente do espirito, que julga, e a
seu pesar, nao lhe impoe ella a sua lei ? Neste sentido
seguraroente se pôde dizer que a verdads é objectiva.
De outrolado, séria desconheçer a existenciadephenomenos
nao menos évidentes, equererviver em uma illus&o compléta
{!), o esquecer que em toda a causa,em que se trata de decidir
em fundo onde esta a verdade, a convieçao procède da iudi-
vidualidade do juiz. Sua missao obriga-o a examinar os pontes
isola dos, nos quaes a prova se funda, a liga-los uns aos
outros, a deduzir as suas consequencias, e, depois de ter minu-
ciosamente aferido uns pelos outros, com o auxilio dos motivps
pro e contra, a assentar uma conclusao definitiva sobre os re-
sultados diversos de todos estas operaçoes mentaes ; mas todos
os nossos actos conm o sello do nosso caracter pessoal, da
nossaindividualidade, e a nossa physionomie se reproduz até
nos trabalhos do nosso espirito. Ora, quera poderia sustentar
que o mesmo nao acontecerâ com o juiz, qne investiga a ver-
dade nos factos submettidos a sua decisao ?
(7) Relatorio da Oommissâo de Justiça prussiana sobre o jury, p. 1—17.
103
Indubitavelmente ha cevtos processos efficases, que permit-
tem ao homem attingir o fim ; concedemos que aigu mas vexes
(querri frequenfou por muito tempo os Tribunaes dejustiça
poderâ dizer se acontece militas vezes) as provas sâo tao for-
tes, e de tal natureza, que todos os juizes.por ëllas se conven-
cem inteiramente. Todavia mesmo neste caso a individualidade
de cada nm se faz sentir, quando se profère a sentença. Sup-
ponbamos o caso bastante raro, em que a convicçao se produz
uniformemente em todos os espiritos, quando por exempta hou-
ver concordancia perfeita nas declaraçCes de duas testemu-
nbas ; cada um dos juizes considerarà demonstrada a culpa-
bilidade por différente motivo ; este, que conhece a primeira
testemunba cpmo homem de bem, nem um instante pode
snppor que ella tenha perjurado ; aquelle observou as particu-
laridades intimas e circumstanciadas, nas quaes entrou a se-
gunda testemunba ; outro ficou convencido vendo o depoi-
mento de ambas combînar exactamente com as circumstancias
consignadas nos autos, e fiualmente nm outro vendo-as com-
binar entre si a nas minimas circumstancias. Se pois fosse pos-
sivel assistir, no espirito de todos, ao nascimento e aos pro-
gresses das convicçOes, que nelle se desenvolvem, quando o
tribunal tem de julgar sobre as provas artificiaes, que lbe sao
apresentadas, reconbecer-se-bia a diversidade dos seus moti-
vos. Quando um raagïstrado tem uma longa experiencia da
perversidade humana, da leviandade ordinaria dos juramentos,
do cornplexo do idéal e da realialidade, que no fim de certo
tempo se apossa da memoria, seu juizo, habituado a um exame
severo das cousas, besita em face de taes ou taes provas, e
nao se deixa arrastar a proferir sua decisao tao depressa, como
o faria um collega menos experimentado, raenos iniciado nos
segredos da consciencia e da vida. O nuro das testemunbas
nao defeituosas, cla$dens (se assim podem ser denomiuadas), é
extremamente restricto; quasi sempre na causa ha alguma
ip4
difficuldade cm, relaçao a ejlas, e p juiz deve autes de tudo
examinar, se se lhes deve dar crédite; e até que ponte. QuBo
delicadas sao almas vezes as questOes, que elle tem de resol-
ver ! Vio-se uma moça depôr a favor de seu amante centra seu
irmao : quai das vozes do coraçao era aqui a mais forte? a que
fallava pelo irmao, ou a que fallava' pelo amante? E o juiz,
tendo de decidir tal questao, nao ouvirâ ao seu proprio cora-
çao? nao consultarâ os sentimentos de sua vida privada? Era
uma palavra, o seu juizo nao sera subjective ?
De toda a discussao précédente conclue-se,que a investigaçao
da verdado esta subordinada a certas regras decisivas ; que
ella deve seguir certes e determinados camiuhos, que a razao e
a experiencia demonstrao serem 03 mais aptes para fazer
chegar ao fim ; que a verdade assim estabelecida funda-se em
bases de tal natureza,que convencem infallivelmente 0 espfrito
de todos os juizes; mas é, licite concluir tambem, que antes de
decidir dos factos, cada um dos juizes soffre "s influencia do
seu caracter individual, de sorte que a sentença profer-ida é
evidentemente subjectiva.
se disse (cap. 6) que a verdade, ou os motivos dos quaes
ella dériva, imprimem um movimento à balança da çoniençia,
e que a este movimento corresponde um estado determinado do
nosso espirito. Entao acontece algumas vezes,que sentimos em
nos mesmos a certeza, que em nosso espirito poderia produzir
0 exacte rigor da deducçao mathematica ; julgamos possuir a
mais elevada evidencia, a verdade absoluta;em outros casos as
bacias da balança sâo apenas agitadas, e entâo sô podemos for-
mar urne conjectura, entramos em desconfiança, conceberaps
uma suspeita, etc. ; mas entre estes dous estados extremos ha
uma multidao de outros possiveis Em um délies espe-
cialmente o espirito, sem poder perfeitamente explicar por-
que motivos, sem os ter sufficientes para a conviççao, vai até
o ponto de considerar como verdadeiros os factos da
ÎOB
causa. Nao é raro r tambem o juiz clarai
1
, que, subjec-
tive/mente fallando, esta plenamente convencido da culpa
do accusado, ou que considéra verdadeiros os artigos da
accusaç&o, mas que ver-se-hia em apuros se tivesse de deduzir
os motivos sufficientes da sua convifto. Da mesma sorte o
publico, que assiste as audiencias, nos lugares em que s&o pu-
blicas, mostra-se frequentemente convencido da culpabilidade,
e todavia muitos dos espectadores, que pretendem estar conven-
cidos, se fossem obrigados a uma analyse minuciosa dos moti-.
vos que os arrast&o, ver-se-hi&o na impossibilidade de os pro-
duzir, e reconheceriao. que obedecerao a um sentimento obscuro
e mal definido ; uns confessariao ter sido abalados pela attitude
do accusado ; ontros, para o declarar culpado, recorreriào à sua
vida, aos seus funestos accidentes. Neste ponto sômente a con-
vicç&o ê facilmente fallaz ; as influencias do momento, as pa-
lavras persuasivas de um terceiro podem dar-lbe origem ; mas
como ella nao tem base solida, nao poderia, mesmo nas causas
habituaes da vida, satisfazer ao homem prudente e conscien-
cioso, nem fornecer-lhe uma regra de conducta. Ainda menos
deveria satisfazer ao juiz, que tem de decidir de direitos dis-
putados, ou da cupabilidade deum accusado, e cujo erro de
destruiros mais preciosos bens, os mais sagrados direitos dos
cidad&os. Mas se a opini&o do juiz tem por base motivos suffi-
cientes, e dos quaes tem elle, sonsciencia, sô entao pôde decidir
affirmativamente, e a sua sentença passai* por justa aos olhos do
publico.
Ora o estado do espirito, que considéra os factos como ver-
dadeiros, appoiando-se em motivos plenamente solidos é a con-
vicç&o propriamente dita (8).
(8) Tambem existent controversias sobre o sentido desta palavra. Vide
par exemplo Weber, ArW. de direito crim,, 8, p. 567 ; Jarke, Revitta de
Hitsig, n, 19, p. 138; Heinroth, id. n. 48. p. 241.
14
———
dissenios mais de unïa vez,que a o raomento em que se fir-
me, a conviao, em que a decisao se profère, trava-se em nosso
espirito uma especie de combate entre os motivos pro e contra.
Ora estes motivos podem pesar diversamente uns relativamente
aos outros.
1.° Assim,os motivosaffirmativos,por exemplo quando se trahi
de dizer se o indiciado é o autor do facto, tomados em «Le iso-
lados de todas as razoes contrarias, podem parecer nao sufficien-
temente concludentes, quando por outvo lado naja du vidas so-
bre a existencia mesmo do facto;eé oque acontece quando uma
testemiinha singular os attesta, quando o indiciado retracta-se
da sua confiss&o, quando cedeu ao constragimento illegp&l—
mente empregado na instrucçao.
2.° Assim, recorrendo a outra combinaçao, os motivos, dos
quaes se conclue a culpabilidade, podem ser poderosos por si
sôs. Concordantes até nas suas circunstancias as mais intimas,
complètes, e adaptando-se a todos os factos da causa, parecem
autorisar plenamentd a convicçao. Mas ao lado destes motivos,
outros contrarios podem surgir, edespertar a duvida : 1." Ao
lado das razoes, que dao existencia â convicçao, outras vem es-
tabelecer positivamente o contrario ; tal séria o caso por exem-
plo, em que em face de testemunhas classicas uma terceira viesse
affimar,que o autor do delicto é pessoa diversa do accusado. 2
Mesmo o processo de fornecer motivos contrarios estabele-
cendo a impossibilidade dos factos da accusaçao, quando por
exemplo duas testemunhas affirmao,que no dia do crime o in-
diciado estava em um lugarmuito distante da quelle, em que o
crime foi commettido. 3.° Outras vezes motivos fornecidos pé-
los autos tornao inverosimil a accusaçao ; supponhamos o caso
de ter o indiciado o maior interesse, em que vivesse o assassi-
nado, por ser este o seu unico bemfeitor ; supponhamos aiuda
o caso de n&o ser-lhe a sua morte proveitosa em cousa alguma.
4.° Os motivos de defesa podem tambem basear-se em uma
109"
simples possibilidade que, nas suas circunstancias especiaes, nao
seja extraordinaria por sua natureza, e seja facilmente concebivel
; figureraos uraa hyphothese : as teatemunhas affir-rnào ter
reconhecido o accusado na obscuridade, a este nega
obstinadaraente ; ora aqui era possivel o engauo das testemu-
nhas. 5-.° Esses mesraos motivos fînalmènte podem ser admissi-
veis aos olhos da razao, e nao serem provaveis : duas tesrau-nhas
depoem contra o accusado ; ora em rigor é possivel que sejao
animadas pelo odio, que tenhao juntas tramado o crime, que
falsamente imput&o ao accusado, e que tenhao de proposito
combinado entre si as circunstancias concordantes dos seus de-
poimentos.
Quando a convieçâo chega ao pontp de repellir victoriosa-
mente todos os motivos contrarios, e quando estes nao podem
mais abalar a massa importante dos motivos affirmatîvos, en-
t&o toma o nome de certeza (9). Sô a certeza nos parece bastante
poderosa para servir de regra aos nossos actos, e a razao ap-
prova esta conclus&o, poisque o homem, nos seus esforços para
attingir a verdade bistorica, n&o pôde esperar ir mais longe, do
que alla.
A certeza (10), para existir (11), exige o preenchimento" de
certes condoes essenciaes.
1.° Exige dm complexo de motivos, sanccionados pela razao
e pela experiencia, para servir de base â convicç&o.
(9) Canz de Probabilitale juridicâ, g 12; Klein, Annaes, vol. 26, p. 43
-Rolin de Delictis, p. 32; Tittmann, Manual, § 225.
(10) A palavra ingleza évidence significa ao mesmo tempo prova e.certega. Vide
sobre este assumpto: Bentham, Tratado da Prova judiciaria, vol. 1. p. 17—24. '
(11) Weber. Areh. 8, p. 573; Jarke, 1, c, na Revista e Hitzig, n, 19, p. 132. ,
108
-&°. Exige que seja precedida por um esforçô série, e impar-
cial, qne tenba estudado afundo, e desviado osmeios, que ten-
dessem a fazer admittir a soluçao contraria. Quem deseja ad-
quirir a certeza, nao cerra a porta â duvida: pelo contrario de-
tem-»se no exame de todos Os indicios que a ella poderiao con-
dnsi-lo ; e sô quando tem conseguido faze-la desapparecer com-
pletamente, é que a sua decisao se firma, e esta appoia-se na
base indestructivel dos motivos da convicçao affirmativa. Estes
principios, seja dito de passagem, dao ao precesso inquisito-
rial nm poderoso alcance, um caracter imponente, quando a
sua organisaçâo é prudentemente combinada : porque o ins-
tructor dedica-se com igual ardor à investigaçao dos materiaes,
que mais tarde poderao auxiliar a defesa. Faria notar comçui-
dado o mais ligeiro indicio, mesmo contra uma testemunha da
accusao, se lie se podesse deprehender, que aquella vive
menos honradamente, ou que a sua veracidade deve ser sus-
peita, ou finalmente que é inimigo pessoal do accusado.
3.° A certesa nao pôde existir antes de terem sido repellidos
todos os motivos constantes dos autos, que tendessem a fazer
considerar a accusaçao como baseando-se em uma impossibili-
dade, ou a estabelecer um resultado positivamente contrario ao
fornecido pelos outros motivos. 0 juiz ousaria por ventura
condemnar, mesmo quando duas testemunbas affirmassem ser
o accusado autor do crime, se uma terceira viesse affirmar, que
em tal época o accusado residia em lugar bem distante daquelle
que foi theatro do crime î .
4." 0 espirito quer ver repellidos, antes que a certeza pré-
domine, mesmo os motivos, que nâo tenhao por base senao uma
possibilidade em sentido contrario. Assim se explicao as inves-
tigaçdes minuciosas do instructor ; assim quando elle examina
os lugares, o corpo de delicto, tendo em consideraçao o lugar,
em que se achavfto as testemunbas, e notando o tempo e a
hora, deve perguntar a si mesmo, seera possivel, que aquellas
109
reconhecëssem claramente o eulpado ! Em quanto restar alguma
sombra de duvida, nto haverâ certeza possivel para o juiz
consciencioso.
5." O espirito nfto poderâ além disso deixar passar em silencio
as circumstancias simplesmente imaginaveis, ainda que pouco
usuaes, desde que na causa existem indieios, por mais levés que
sejao, e que estabelecem uma probabilidade, ainda a mais
remota. Deverâ pois mostrar-se duplamente attento, se por
exemplo descobrir, que uma das testemunhas da accusacao é
inimiga do accusado.
Faça-se o que se fizer, um amigo sincero da verdade deverà
reconnecer, que a certeza, com a quai é obrigado a contentar-se,
nao escapa ao vicio da iroperfeiçao humana ; que de sempre
suppor-se o contrario do que admittimos como verdadeiro (12).
Finalmente a imaginaçao fecunda do sceptico, lançando-se DO
mundo da possibilidade, sempre acharà cem razôes de duvida.
Com effeito em todos os casos pode-se imaginar uma com-
binaçao possivel, o espirito nao ficarà raenos satisfeito, quando
motivos sufficientes servirem de base â certeza, quando todas as
hypothèses rasoaveis tiverem sido examinadas e rejeitadas |
depois de maduro exame; entâo o juiz julgarâ certamente estar de
posse da verdade, unico obiecto das suas investigaçôes ; e além
disso o legislador quiz que fosse esta certeza da razao a base do
julgamento (13). Exigir mais, séria querer o impos-sivel ; porque
nunca a verdade absoluta pôde ser attingida em todos os factos.
que pertencem ao dorninio da verdade historica. Se a legislaçao
récusasse systematicamente admittir a certeza,
(12) Stubel, Do corpode dilicto, 167.
(18) A. Ordenaçâo eriminal da Prussia, diz no S 393 : O julx tem uma
suffUAente certeza, quando existem motivos plenamente convincentes da
verdade do facto," e quando, secundo o curso ordVnario dot cousets, for
diffleil imaginar utn motivo grave em contrario.
no
sempre que uma hypothèse contraria fosse imaginavel, fica-
fiâo impunes os maiores culpados, e por conseguinte a anaxH
chia se introduziria fatalmente na sociedade.
E* preciso bem éiStinguir a probàbilidq !$, da certeza (14).
Ha probabilidade quando a razfto, appoiando-se em graves
motivos, considéra um facto como verdadeiro, mas comtanto
que nao sajao completamente anniquilados os rootivos graves
em contrario (15). Résulta ella, ou da circunstancia de nfto se
apresentarem na especie com todas as condiçOes requeri-das
(16) as provas, que deverifto estabelecer averdade, ou da
circumstancia de, em face dos motivos por ella fornecidos,
existirem outres tambem procedentes em sentido contrario (17)
ou do facto de basear-se a convicçao em dados (18), que, nao
obstante a sua reuniao, nao sao ainda bastante poderosos para
produzirem a certeza.
Em todo o caso a probabilidade nao pôde ser tomada por
base uma condemnaçSo, pois que fica sempre margem â
dnvida, ea consciencia nao poderia ficar satisfeita, eraquanto
nao fosse repellida a possibilidade do contrario.
Em compensaçao a probabilidade (19) encontra toda a sua
(14) Os antigos deflniâo a probalidade : Probabile quoi qwidetn sui
habet rationem sed nondum ex omni parte sufficientem.
(ïï>) Ord. Crim. da Prussla, g 396.
(16) Exemplo: Uma testemnnha nâo prestoti o juramento em forma.
(17) Exemplo : Uma testemunha da defeza contradiz formalmente as decla-
raçôes de duas da accusaçào.
(18) Exemplo : Nâo ha se nâo simples indicios.
(19)
Wach. De VerisimilHudine crim. Iena, 1785 ; Stubol, Do corpo de
deliclo, g 172. ' ,
tw
.
111
importancia no curso do processo ; ella guia os passos da
instrucçao, e autorisa as medidas graves ahi exigidas. Sabe-se
com effeito, que o processo inquisitorial caminha em um andar
compassado e reflectido, e que para sujeitar o accusado a uma
nova phase de rigores, é mister que estes antes de tudo se ju$-
tifiquem pelos dados da informaçao précédente (20). E' por isso
que a prisao é decretada, quando ha graves presum-pçOes ; e
que, para que se possa passar à instrucçao especial (ou principal),
é mister que o ponto de facto pareça pelo menos fundado em
véhémentes probabilidades, e que as provas sejso fortes contra o
accusado. Portanto sô a probabilidade existente pôde pot em
movitnento o juiz no limite de suas attribui-çOes, muitas vezes
sô ella apparece no curso do processo. Tambem é graduada
segundo o seu poder ; quanto mais nu-merosos e dirimentes
forem os motivos da amrmativa, tanto menor sera, a inftuencia
dos contrario» ; e, concluindo, citemos um exemplo : uma unica
testëmunha, *vindo corroborar nume-rosos indicios da
accusaçâo, dâ à probabilidade muito maior força, que a que
poderia dar o seu depoimento nu e isolado, on o facto isolado de
serem encontrados em poder do accusado os objectos furtados.
CAPITULO VIII
DO SYSTEMA SEGUIDO PELO LEGISLADOR NA ORGAttlSAÇÂO DA INVES-
TIGAÇÂO DA PKOVA
Em toda a legislaç&o (1) a sentença criminal nEo é mais do
que o corollario da decisao sobre o ponto do facto, pois que o
legislador suppôe previamente que a referida decisao émana
(20) Oarmignani na Kevista de Jurisprudencia estrangeira, part. 1, SS
3-33. i
Cl) Sobre os deveres do legislador em materia da prova, vide Bentban.
Tratado da prova t. 1, p. 26.
I*
112
da intima convicçao do juiz, da certeza por elle adquirida dal
verdade dos. factos, cuja existencia serve de base à accusaçao.
Por isso trata-se de a cercar do maior numéro posaivel de
garantias; é mister que ella comprehenda os factos sob o mais
amplo ponto de vista, que as suas disposiçGes sejao sô-mente
dictadas pela certeza ; e quando tôdos os cidadaos acre-ditao
ter a condemnaçao racahido sobre o verdadeiro culpado, a
pena adquire a sua mais compléta efficacia.
No momento em que o legislador tiver de traçar as regras
da certeza gérai, pôde, collocando-se em dous pontos de vista
différentes, escolher entre dous System as :
r Escolbera o primeiro systeraa, se entende que todo o ho-
mem ua investigaçao da verdade, e na apreciaçao da prova
tem em si um correspondente poder de instincto que o guia ;
se por conseguinte julga que a sentence, que tem de ser profo-
nde sobre factos reconhecidos como certos, deve resultar, mais
da impressao gérai sentida por todo o espirito cultivado em
face das provas produzidas, do que de motivos fixos e deter-
ininados ; se finalmeute é de opiuiao, que o juiz nao de ser
obrigado a dar conta severa de sua convicçao : 0 grande nu-
ro de votos exigidos para que possa baver condemnaç&o ; a
qualidade das pessoas. as quaees a sentença é confiada, e cuja
posiçao tende a conciliar os interesses supremos da ordem pu-
blica com a sympatbia sempre vida a um concidadao accu-
sado ; finalmente a mais ample liberdade, a este concedida, de
recusar os sus juizes ; taes sao naste systemaas garantias, pelas
quaes a lei se exforça em assegurar a justiça rigorosa das sen-
teuças.
No segundo systema, a investigaçao da certeza légal nao é
mais do que uma operaçao puramente scientifica, baseada em
regras fixas, cuio desenvolvimento é possivel ao. legislador
dirigir. A sciencia juridica é aqui requerida ; e pôde ser
confiada uma tal missao a quem uma longa pratica uma edu-
113
cacao scientifica. e conhecimentos juridicos collocao na altra
do seu dever ; e de quera sede rigorosamente exigir a mani-
festa ç&o dos motivos da sua convicçao.
Partindo-se do primeiro systema chega-se ao jury; e do se-
gundo à theoria gal da prova, e as regras que ella impôe a
juizes femiliarisados com a sciencia do direito.
Este seguodo systema foi preferido pelos jurisconsultes alle-
mâes em materia de processo criminal, desde o dia em que se
tentou dar a este uma organisaç&o scientifica, e pelos legisla-
dores nos seus numerosos ensaios de reforma para a Allema-
nha; mas modemam ente tem sido impugnado por numerosos
adversarios (2). Devemos enumerar summariamente as princi-
paes objecçoes que contra o mesmo se tem levautado :
E' loiicura, diz-se, querer comprimir por normas fixas o
oda faculdade, innata em todos os homens, de investigar e
descobrir a verdade das cousas, faculdade que auxiiia o ho
mem nas occurrencias quotidianas da vida privada ; encadeiar
assim o juiz prudente e experimentado, nao sera encerra-lo em
um circulo que o pode transpôr? Nao sera crear para o juiz
ainda novo e inhabil uma tutella sem effieacia, que jamais
lhe darà a prudencia que lhe faite? A sciencia pôde, sem du-|
vida, formulai' certas regras uteis para a investigaçao da ver-
dade, mas estas regras s&o por sua natureza conselhose nao
ordens, sao avisos geraes. que para serein applicados ao caso
particular, basta que em relaçao a elles a prudencia os acon-
selhe ; mas a lei deve fugir de estabelecer taes regras, porque
tornar-se-hiao absolutas e imperativas, e séria tao pouco rasoa-
vel prescrever a cada individuo um modo de pensar, como um
modo de convicçao.
2.o Qualquer tentativa neste sentido deve necessariamente
(2) Vide especialmente o relatorio da commissRo immediala prussiana.
part. 1; e Meyer, Espirito, origem e progresso das instituiçUes judiciaes, vol.
6, p. 363.
15
%
114
abortar (3) ; é impossivel comprehonder sob doùs ou très
acanhados artigos de lei a multiplieidade dos casos a julgar
com suas côres diversas, esuas infinitas combinaçOes ; e jamais
passarâ pela mente do legislador sensato estatuir uma regra
distincta para cada especie possivel, salvo se quizer confeccio-
nar um codigo înteiro da pTOva cora seus milhares de artigos,
oque é absurdo. Pode-se affirmar com certeza, que o juiz nao
acharia neste codigo uma sô disposlçâo applicavel a uma
multidâo infinita de especies : querendo a lei que a certeza
sômente tenha por fundamento certas provas determinadas,
sera o juiz obrigado a pronunciar ueste caso a absolviçao ?
(Figuraia seguinte hypothèse : um indiciado confessa o crime,
e a sua confissao é corroborada pelas declaraçfies de qu atro
cumplices, que nada tem a ganhar em fallar neste sen-tido ! )
3.° Em qualquer Theoria légal da prova 6 necessaria uma
ennumeraçâu das diversas provas : pois bem ! esta euuume-
raçâo necessariamente restrictiva muitas vezes faz com que
0
juiz nao possa dar toda a importancia a estas ou aquellas cir-
cumstancias, queo legislador deixou de parte por causa da sua
apparente insignificancia. Ma3 nem por isso deixâo ellas de
exercer muitas vezes, e necessariamente, a mesma impressao
poderosa em todos 03homens, convencendo da cnlpabilidade
no sentir daquelles, que tem justo e profundo conhecimento do
espirito humano ; notentanto o juiz deverâ conservar-se im-
passivel diante délias, e nao poderâ obedecer as grandes leis
da natureza, que tao claramente lhe mostrflo o caminho a se-
gufr. Pouco importa que um menino de nove annos tenha
presenciado o homicidio, e désigne Titius como o seu autor ; que
o proprio Titius perante uma testemunha, e no momento em q ue
(3) Zentner, no livra intitulado — Do Jttry tom o debate-jiublico a oral
mostrou-se ser um dos mais severos adversarios do sy tema da organisaçûo
légal da pena.
tis
o cadaver da sua victima vai ser sepultado, exclame vencido
pelo remorso, que elle é o culpado; que o cao da vietim a, toraan-
do a ver repentmamente o assassino, que vira no momente do
crime,se lance sobre elle furioso, e nao queiralarga-lo : nao ob-
stante serem provas bem fortes todas estas circumstancias, o
juiz nao podera toma-las em eonsideraçao !
4 O legislador engana-se, se considéra a conviao do juiz
como resultado das provas organisadas conforme o seu syste-
ma ; pelo contrario ella dériva da lei natural, sulta do con-
curso de uma multidao infinita de motivos, apoia-se em uma
interminavel série de pequenas circumstancias ; e de tudo isto
o juiz nao poderia apresentar uma exposiçao motivada : os
pretendidos motivos enunciados na sentea nao sao pois os
verdadeiros ; a condemnao tem lugar, nao porque duas tes-
temunhas depozerao no mesmo sentido, mas porque os depoi-
mentos se harmonisao perfeitamente com o caracter do accu-
sado, com os motivos especiaes, que elle tinha para assim obrar,
e porque elles vem confirmar indicios importantes ; e refle-
ctindo melhor, descobre-se facilmente, que é uma circumstan-
cia difrente que prédomina, e firraa a certeza no espirito de
cada juiz.
5." Querendo o legislador prescrever um modo de prova
obrigatoria para o juiz, subjuga ipso-facto a consciencia des-
te, e arrisca-se a causar injustiças. Imaginemos o caso de ter
a lei declarado que deve ser tido por verdadeiro um facto
affirmado por duas testemunhas : farao realmente plena prova
os depoimentos simples destas duas testemunhas, quandotal-
vez nao devao senao a uma circumstancia (por exemple a
sua qualidade de estrangeiros no paizonde o desconhecidos)
o nao serem classificados na cathegoria de testemunhas sus-
peitas ? A razao nao nos diz, que o que convence, nao é o de-
poimento de ambas, mas a verosimilhaa intima das suas
palavras, sua phisionomia durante o interrogatorio, o cuidado e
K
ne
exactid&o, que presidirao a este, a concordancia do seu depoimen-
tti cbm 08 faetos articulados ? Séria pois erro grave dizër a lei,
que a prova deve necessariamente resultar do concurso de duas
testesmunhas.
6." Do facto de fbrmar-se semprea consciencia do jtiiz por
meio de circumstancias quasi inapreciaveis, e de ser impossi-
vel exprimi-las nos motivos juridicos e rigorosamente dedu-
sidos, deve-se ainda concluir a impossibilidade da Teoria lëg
da prova. Accresce que o jute, a despeito de todas as regras
q«e lhe forao traçadas, de modo algum se deixa guiar por
ellas, e cide as mais graves questfles sômente pelos dados da
sua propria consciencia. Lei alguma no mundo pôde dizer por
exemplo se uma testemunha é inimiga do indiciado (4), ou se
tem algum interesse indirecte no resultado da questao ; entre-
tanto todo o processo dépende de saber-se, se essa testemunha
é classica, sem defeito, ou se deve ser considerada suspeita.
Desta questao dépende a septença, e o juiz nao pôde achar a
sua soluçSo senflo na sua consciencia,' pelos mesraos tramites
e meios que um jurado. Vamos mais longe : se a lei lhe ordena
de prestar à confiss&o produzida nas condiçoes requeridas,
acharia elle nas regras da prova soluçao para a questao da ve-
rosimilhança, no oaso em que a dite confîssao encerrasse res-
triccOes, que parecessem verosimeis *? Certamente que nao, de-
veria simplesmente appellar para o seu bom senso. Admitta-
mos mesmo que alei possa declarar, que fazem prova plena
duas testemunhas contestes nos pontes mais essenciaes; ainda
aasim é preciso que o juiz décida, como se fosse simplèzmente
uro jurado, se ha verdadeira concordancia, e quaes stto os
pontes essenciaes. Finalmente é cousa reconhecida por todos,
(i) A inimisade conipoe-so de uma sorte de relaçôes hostis, mas das quaes
naila se pôdo dizer, em qtftuito se ignora o encadeiamento dos faetos, o modo
de ser dos personagonB, seus motivos, saas manifesl8es exlerioros eto. ew.
HT
que as regras, por mais numerosas que sejâo, nao tem appli-
câo ao caso, em que os juizes tratao de examinar o concnrso
de circumstancias, e o séu effeito na causa, assim como acontece,
quandoo juiz examina a questao da culpabilidade (5).
*7 O legislador, que quer regular a prova por uma lei, col-
loca-se na segninte alteruativa. Se se mostra preoccupado com
uma justa solicitude. se qner principalmente que ainnocencia
nfto corra perigo, e estabelece prescripçOes absolut amen te com-
plétas, constrangera infallivelmente o livre arbitrio do juiz ;
formarâ uma longa lista de testemunhas inadmissiveis ou
suspeitas, proscrevera qualquer condemnaçao, que for so-
mente baseada no depoimento de testemunhas por elle clas-
sificadas na categoria das suspeitas ; enumerarâ milhares de
condiçOes, das quaes mente possa resultar a convicçao gal
(exemplo : no caso da prova artificial). Se préfère o systema
opposto, satisfaz-se em estabelecer algumas regras puramente
geraes, ea sua Theoria da prova proclama uma doutrina mais
liral ; de-se citar como exemplo a legisl&o hollandeza.
Agora eis as consequencias. No primeiro caso o juiz é obrigado
muitas vezes a absolver indiciados realmente culpados, mas
cnja culpabilidade nao pôde ser legalmente proclamada por
faltar na causa uma sô talvez das circumstancias exigidas.
Como se vê, um tal systema arrasta comsigo todos os inconve-
nientesda impunidade, e da absolulij ab instantia. Por ter a
lei dito que a confissao nao faz prova, senao quando nao r
extorquida por suggestôes; porter ella exigido que os indicios,
para que sobre elles possa appoiar-se a certeza, sejao corrobo-
rados pelo concnrso de circumtancias anteriores, concomitan-
tes ou posteriores, nao se segue que em caso de suggestao a
(f<) Vide as dissertaçôos do autor nos Sovos Archivos do direito criminal.
t. 12, p. 497-
118
confisK&o nunca possa convencer, e nem que os indicios jamais
poss&o taxer prova por falta de uma circumstaticia posterior (6).
No segundo caso, enunciar o legislador raente algumas re-
gras geraes, é o mesmo que dizer que os juizes podem con-
demnar, desde que estiverem convencidos, nao sendo as ditas re-
gras sen&o o desenvolvimento destei axioma. Demais tautolo-
gias funestas vem desfigurar amaiorparte destas regras sobre
a pena ; e feliz sera o legislador, se na sua t&orai compren-
hençao nao deixar introduzir-se, sem que elle saiba, algum
viciou mais grave aiuda, algum principio falso e que le o
juiz ao erro CI).
I CAPITULO IX
DOS EN8AI0S TENTADOS EM DlVERSOB FAIZBH PABA CONSTRUIR UMA
TUEORIA OU SYSTEM* LEGAL DA PROVA.
Quando se estudao as diversas legislaçfics, nas quaes a prova
foi organisada em systeuia, e quando se acompanha a ideia
mai, o piano ,de marcha do legislador, quando elle Ihe estabe-
leceo regras, ve-se logo que estas leis especiaes se dividem em
roui tas categorias.
Pi
1. Mtas vexes a lei limita-se a eatabelecer como principio
a inadmissibilidade de certas provas ; détermina que taes pa-
(0) Sobre oslo ponto pode-se consulter M tentativat feitas em diversos
pnizos para chegar A exposSo satisfatoria das condiçSes da validade da pro-
va por indicios —Vide o Proe. crim. conyp.'t. 11. cap. 182.,
( )Achar-no-h4o boa» informôes aobre eslo assumpto em Umolitn Da ad-
minittraçâo dajmtiça pénal nos jteqneiios Estados, p. 317e seguintes.
9
119
rentes, que os meninos, etc., nfto podem der como testemu-
nhas ; ou prescreve certas formalidades relativas à admihis"
trâo dos meios de prova, como o juramento das testemunhas.
Nesta categoria poder-se-hiao classcar as leis inglezaa e
francezas, e neste sentido poder-se-hia dizer, que ellas tambem
regularao a prova até um certo ponto.
2. Ao lado destas regras o legislador algumas vezes confec-
ciona uma especie de instruccfto sobre a prova que, sem ligar
absolutamente o juiz, deve sempre ficar-lhe présente ao espirito
no curso do debate, e servir-lhe de medida normal em todas
as occasions : harmonisfto-se com este systema a Commom lato
(lei commum) dos Inglezes, e o Code of évidence (Codigo da
prova) da America do Norte.
3. Em certos lugares a lei contém regras fixas, indicando
aos juizes quaes as provas, nas quaes deve basear-se a sentea
pénal, quaes as condiçôes, que devem ser observa das em relaçao
a cada uma das provas, quando sfto de natureza a obter uma
decisao; regras que prendem invariavelmente o magistrado,
e Ihe recusfto o direito de pronunciar a condemnfto, quando
a certeza adquirida pelo seo espirito nfto entra iuteiramente no
circulo das formulas legaes. Tal é o systema das leis penaes
da Baviera, Prussia, e Austria; e que na substancia se encon-
tra nas novas leis, e nos novos projectos para os outros estados
allemâes.
4. Em outros lugares a lei estatue alguns preceitos rapide*,
que nfto sfto prupriamente senfto principios geraes ; mas nfto
obriga o juiz a condemnar pela prova apresentada, se elle nfto
esta plena e intimamente convencido. Portanfo neste systema,
diversamente do anterior, nfto basta haver essa especie de cer-
teza légal ; é preciso além disso que haja a convicçao peasoal
do magistrado, a quai por seo turno séria insufficiente, se
tambem os factos nfto fossem demonstràdos com o auxiiio
de uma prova considerada compléta aos olhos da lei.— Esta
»
130
theoria é a da nova ordenaç.5o criminal da Hollanda (i|, que
rauito se desvia dos tramites ordinariamente seguidos na
Alleraanha nas suas disposiçCes especiaes sobre a prova teste-
munhal (2), por exemplo sobre a confissao (3) etc.
5. Finalmente a lei pôde libertar os juizes de facto de todo
os obstaciilos, e louvar-se absolutamente na sua consciencia s
na sua convicçao ; mas para evitar os inconvenientes de cou-
demnaçoes nSo motivadas, ella abraça uma especie de systema
negativo, e lhes prohibe sob pena de nullidade, basear suas
declaraçoes em certas provas determinadas.
Tal é o systema adoptado pelos redactores do ultimo projecto
de regulamento do processo criminal (4) da Raviera (submet tid'o
as Camaras em 1831): o projecto exige além disso que todo o
(1) Ordenaçâo criminal de 1870. Vide sobre este assumpto Van-Deu-
Tex ua Retista cri lira de legislaçBo, e jwisprudencia ettrangeira. publi-
cada sob a direcçSo do autor, t. 5. p. 171.
(2) O art. 7, titulo 90, diz : O depoimento isolaâo de uma testemimha sin-
gular nSo fax fé coma prova légal : todavia se os depoimentot singulares e
isolados de diversas pessoas relativamente a factos diversos, tendent pelo
seu concurso, e pela relaçffo entre elles, a protar um facto gérai, fica d
prudencia do juis o attribuir a estes depoimentos singulares a força da
prova légal.
(8) O art. 18 dispôe: A confissao do accusado, feiia perante ojuix, de ter
commettido o delicto que Ihe è imputado. pode fomecer uma prova compléta
da sua culpabilidade, se ella fôr acompanhada de uma indicaçSo précisa
e eccacla dus circunstancias conhecidas, er pela declaraçSo conforme da
pessoa lesada, quer por outras provas concordantes.
' (4) O artigo 168 assim se exprime : Os juises sâo inteiramente livres de
sâmente seguirem a sua consciencia e a sua convicetto na apreciaçâo dos
provas produxidas na causa ; o poderâo, quando declararem a culpabi-
lidade, basear-se em uma confissao, que niïo tiver sido solemnemente'feital
na audiencia, ou que nâo for corroborada por outras provas ; e nem no
depoimento de uma testemunha singular, se tambem nSo for corroborado
por outras provas.
tribunal se componha de noyé juizes, dos quaes unco decidirao
do facto, e quatro do direito (*).
I CAPITULO X
QUAL É 0 VERDADEIRO CARACTER, E QUAL 0 VALOR REAL DA
THEORIA DA PROVA SEGUIDA NA ALLEMANRA
0 systema de uma theoria légal da prova provoca nutnero-
sas, objecçôes, que enumeramos acima (cap. VIII), e que
certamente tem uma r muita especiosa;mas quem as examina
a fundo de a , conhece bém depressa, que ellas s6 se appoiao
pela maior parte em equivocâçCes, na ignorancia das cousas, e
da jurisprudencia allema ; ou antes, que ellas originao-se do
desejo mal dissimulado de fazer cahir o systema sob o peso do
(*) Entre os trabalhos législatives, que devem excitar a attençâo do juris-
consulte, oonvem citai- muito particularmente o codigo napolitano de 1819,
Este codigo confère a juizes regulares o direito de proferir a sentea difn-
nitiva, sem lhes assignar prescripçôes de alguma theoria da prova ; sômente
os obriga (nâo obstante deixal-os livres de nio seguirem nos sua i decisôes
senâo o seu critérium moral crittrio morale, art. 392—) a motivar corn-
pletamente qualquer condemnâo por elles proferida ; a dar contas por co
seguinte de todo'o trabalho de espirito, que uelles geroua convieçao. Sua
sentença nâo tem appellâo e o unie» recurso admittido é o de revista.
O Tribunal supremo ê pois ohamado muitas vezes a decidir, entre outras
cousas, se os motives sâo erroneos ; se sào concebidos em termos tfio geraes,
que a sentença, propriamente fallando. nâo seja motivada no sentido exigido
pela lei ; se a decisâo se funda em bases inconciliaveis entre si, ou em base-
falsas ; se é contrariada pelos depoimentos produzidos do processo. Verifi-
cando-se qualquer dessas hypothèses o tribunal de cassacSo pôde annullar a
sentença ; mas esta annulSo o tem Ingar, quando a sentença 6 sim-
plesmente defeituosa nos motivos, se as razôes da convieçâo do juiz, por
exemplo, parecem simplesmente fracas, e esta menos solidamente firmada ;
e com efleito é essa uma questâo que nâo poderia ser resolvida pelos magis.
trados do Tribunal (Cour),''pois que elles nâo assistirâo ao debate. Vide
sobre este systema da lei napolitana, Nicolini, Quistioni di diretto, vol. 5,
p. 287, e numerosos arestos do Tribunal de cassaçâe de Napoles na Qaxetta
dei trïbwnaXi, creada em Napoles em 1845, e exclusivamente consagrada
a publiençâo dos debates e sentenças judiciarias —- (Nota manuscrita do
autor.)
16
K
1*B*
rediculo, imputando-lhe exageraçSes condemnaveis, e os
abusos, que por ventura commetter&o juizes menos habeis; em
appoio desta assercao nao sera necessario mais do que citar a
accusaçao tantas vezes reprodusida, e tao exagerada : « Q jmz
na Allemanha é obrigado a dar plana ao depoimento de duas
testemunhas, quando sào contestes. » Qualquer magistrado alle-
mao, mesmo o menos pratico, pode dizer se este facto é exacto,
e se nao sera mais exacto dizer, que o juiz nao ao depoi-
mento de duas testemunhas, senao quando as circumstancias
da causa convencem da sua veracidade, depois de maduru
exame. Neste sentido pois ria sem fundamento a censura de
ter o legislador peado a consciencia do juiz corn pretendidos
embaraços.
As outras objecçoes nao affectao o systema na sua conceao
fundamental ; nao affectao senao as formas acanhadas ou fu-n
estas, com as quaes o revestirao ; certamente condemnaremos o
legislador, que determinar uma lista, por demais numerosa, de
testemunhas suspeitas ou inadmissiveis, e que, por este meio,
tirar ao juiz toda a possibilldade de apreciar as» circumstancias
da causa, que sao as unicas, que podem demonstrar, se a
testemunha merece creditp,
?
e formar uma convieçao bem
fundada, ouando esta testemunna Ihe parecer digna de plena
fé. Tarabem nao séria razoavel deixar pouca liberdade à con-
sciencia do juiz, e exigir numerosas condiçOes para a validade
das provas (como de jamais admittir a confiso provocada por
suggestCes ou questOes capçiosas). Mas uma jndiciosa theoria
da prova n&o contém necessariamente todas essas restricçOes
condemnaveis. A lei dara sufficientes garantias ao accusado,
mostrando simplesmente aos juizes nos seus preceitos geraes
as condiçoes, sob as qnaes a confissao pôde ter força proba-
toria.
Finalmente é por uma petiç&o de principio que os adversa-
rios da theoria légal chegâo a dirigir-lhe golpes de outra es-
c
1»3
pecie. Suppoem elles que s6 um sentiraento intlrao, instin-
ctivo, infalîivel, pôde guiar o homem no encalço da verdade
e na sua descoberta, e concorrer para firmar a sua convicçao
(1). -Assim raciocinando desconhecem completamejpte, nao sô
o verdadeiro sendo da theoria gal, como suas verdadeiras
relaçûes com o trabalho necessario do espirito, quando se de-
dica à pesquiza da verdade. Passamos a expôr as "diversas
vantagens da theoria, quando a lei a organiaou judiciosa-
mente, mas antes convém estabelecer uma distincçao funda-
m entai.
Ou o legislador préfère confiar a decisao definitiva ao jury,
ou a juizes regulares : no primeiro caso, a theoria légal da
prova, no sentido em que é praticada na Allemanha, torna-se
inutil, pois que o jury offerece garantias équivalentes; mas no
segundo caso, torna-se indispensavel, e vamos prova-lo.
1.* Os juizes regulares nao podera dar as mesmas garantias
politicas, pelas quaes o jury attrahe a confiaa gérai : relati-
vamente a elles o direito de recusaçao do accusado é muito
mais restricto; além disso a multiplicidade de votos, que é
cousa tao imponente, nao pôde ter lugar em um tribunal ne-
cessariamente composto de muito limitado nuro de mem-
bros ; ora como compensai", em relaçao aos juizes regulares,
a perda de tantas vantagens? Um meio existe : é mister
que o publico se convea, que todas as sentenças por elles
proferida, sâo perfeitamente conscienciosas, exactamente con-
formes as judiciosas instrucçôes, da lei da prova, instrucçOes,
cujo fim é assegurar a salvaçao da innocencia : é mister que
esta sentença esteja ao abrigo de qualquer suspeita de arbitrio;
e que pareça ser a propria lei, que deeide ; é mister tinal-
mente, para que a confiança se augmente, que o juiz seja
obrigado a motit rigorosamente a sua decisao.
(1) Vide Carmiguani, t. 4, p. 160, que combate vivamente esta opiuiâo.
«
134
2." 0 legislador nfto é puramente arbitrario no traçar destas
instrucçOes ; ellas sfto a sancçfto de verdades geraes confirma-
das pela razao ; de methodos mais seguros para obter a cer-
teza, e de jegras abstractas, as quaes a experiència tem dado
valor; e estas se harmonisao perfeitamente coni as prèscripçoes
legaes, que salvaguardfto a înnocencia, estabelecendo limites,
além dos quaes nfto se pôde passar, sempre que as provas sfto
frageis, e de natureza a illudir ; no momento em que o homem
cultivado, cuja recta consciencia aspira a verdade antes de
tudo, esforça-se em adquirir a certesa, opera-se no seu espi-
rito um trabalho notavel. Examina a fundo o valor das di-
versas provas, que nelle fizerfto impressfto ; applica-lhes as
regras que julga as mais efficases, e as melhor fundadas na
experiència adquirida ; e s6 depois que pesou tudo madura-|
mente, é que chega a concluir. Ora sfto précisa mente, este novo
methodo, estes mesmos mcios consagrados pela razfto, e pot
uma longa experiència, que o legislador emprega como bases
essenciaes das instrucçOes determinadas ao juiz. Numerosas
experiencias, e os factos por muito tempo observados o guifto ;
e como o juiz os toma todos os dias por termos de comparaçfto,
quando examina è aprecia as provas, segue-se que quanto
maior fôr o seu numéro, tanto mais fundada é a sentença pro-
fêrida. Ora se nfto houvesse, para ponto de appoio, um corpo
de regras sobre a prova, como poderia o juiz dar conta da sua
missfto, nfto podendo tirar partido senfto das experiencias
pouco numerosas de sua curta vida, nfto tendo por horizonte
senfto as mudas paredes do seu gabinete de estudo, ou o es-
treito circulo de sua familia ? Como poderia por exemplo dis-
cernir os milhares de motivos, que muitas vezes impellem o
innocente a fazer declaraçôes, que o compromettem, sob a
forma de confissfto, ou a perversidade profunda do accusado,
que o leva facilmente a accusar pessoas innocentes como seus
cumplices? Em todos estes casos nos o veriamos dar cega-
c
135
mente à confissao, à pretehdida cumplicidade. NSo é melhor
que a lei venha em seu auxilio (2), e que, aproveitando-se das
experiencias, e das observaçOes dos seculos, lhe mostre o ca-
minho a seguir, lhe forneça indicaçfies e conselhos, lhe déter-
mine barreiras, sendo preciso, e lhe ponha entre as maos uni
instrumenta talhado com o auxilio da razao, e da experiencia
para aquilatàr a prova?
3." Mas, ohjecta-se, réside em nos uma força innata, que nos
impelle para a verdade : concedamos que assim seja ; mas deve-
se confessar, que esta força, como tudo o' que é hiimano, é de
natureza perfectivel, e desenvolve-se com o uso; que, sendo
aperfeiçoada, a sua applicaçao torria-se mais segura; que uma
longa observaçao pôde perfeitamente estabelecer regras que a
governem, que a sciencia p^de coordenar estas regras em
systemas, e eleva-las a principios certos. O que é verdade em
relaçao as forças phisicas, em relaçao as forças immateriaes do
pensamento, é igualmente verdade em relaçao à força espe-cial,
que se applica ao exame da prova dos factos ; e quando aquella
tiver sido cultivada e desenvolvida pelo juiz, que déclara o
resultado de suas convicçOes, a confiança publica certamente
augmentara.
Em resumo, a theoria légal da prova nada mais é do que a
expressao das regras instituidas pela experiencia, e que de-
senvolvem e fecundao em nos a força instinctiva de investi-
gaçao da verdade.
4." Admittamos por um momento que a lei se reporte exclu-
sivamente a este instinto, com que se argumenta ; o que acon-
tece ? O juizo sobre a qualidade das provas apresentadas na
causa é, como se sabe, o resultado de certos inovimentos por
ellas communicados ao espirito dos juizes ; estes movimentos
por seu turno reagem sobre as proprias impressôes, dao-lhes
(2) Garmiguani. t. 4, p. 120.
1»G
de algum modo um corpo, uma figura determinada. Sendo
assim, nao deve o legislador temeï que certas provas affectem
deronsiadamente a imaginaçao mais ardente do primeiro juiz ;
que o segundo as receba com demasiado exclusivismo em uma
especie de sobreexcitaçao momentanea ; que esta ou aquella
prova especiosa à priraeira vista, mas em fundo illusoria em
muitos pontos, sedusa mui vivamente a inexperiencia de um
magistrado, e o arraste a profèrir uma sentença condemna-toria
em uma especie, em que outro jura mais sollicito em pro-fundar
suas investigaçOes, mais habil e mais rico de experien-cia, nao
teria duvida em absolver 1 E' preciso absolutamente que a lei
previna os effeitos possiveis desta sobreexcitaçao peri-gosa, é
mister que ella corrija esta inexperiencia funesta ; e este fini,
consegue-o, impondo regras à descoberta da verdade. 5." A tal
obra préside um interesse de ordera superior ; trata-se de fazer
com que os julgamentos nunca sejâo inqui-nados do arbitrio, e
da conséquente discordancia ; as sentenças pois devem ser
selladas com o sello da lei e da uniformidade. Mas se os juizes
se achassem entregues a si mesmos, naopode-rià deixar de
haver diversidade nos julgamentos em especies inteiramente
semelhantes, quando, por exemplo, as provas fossem as
mesmas; porque o tribunal ora séria composto de juizes mais
difficeis, e mais experimentados, ora de juizes mais faceis, e
menos traquejados ; ao passo que, sendo as provas reguladas
pela lei, os julgamentos dos diversos tri-bunaes adquirem um
caracter uniforme, e cresce prodigiosa-mente a confiança em
suas decisOes.
6.° Nesta materia a missfto do legislador é pois especial : i
de ordinario applica-se a consagrar os direitos dos cidadaos, e a
firmar relaçôes juridicas entre elles ; mas aqui tem elle por
principal objecto conserVar inviolaveis as leis eternas da
verdade, e lias escolher regras, e erigi-las em leis positivas.
Por este meio o magistrado, mesmo novato, e menos habil em
12*
comprehender bera os moviraentos da sua consciencia, seguin-do
as prescripçoes Iegaes, acha-se no caso de fazer uma appli-caçSo
segura das leis eternas, das quaes aquellas derivao (3)-
Convém agora examinât mais a fando as especiaiidades da
theoria da prova judiciosamente organisada, e enumerar os seus
principaes caractères. Ver-se-ha depois que nem os intéresses do
accusado, e nem os da verdade sao postos em perigo.
1." 0 legislador deve primeiro que tudo formar a lista dos
meios de prova, nos- quaes possa o juiz basear a sentença ; mas é
essencial impedir que tal prova sufficiente no civel ( o juramento
por exemplo ) possa ser decisiva no crime aos olhos de nm
magistràdo, que nao soubesse bem distinguir o civel do cri min
al. Ve-se fréquente mente na praxe allemâ, nos processos de
instrucçâo dos crimes levés, o accusador autorisado a défera*
juramento ao accusado, ou a completar a meia prova pelo
juramento suppletorio, mas isto nao prova senao que, na falta de
uma lista dos meios legaes da prova, ou na falta de prohi-biçûes
especiaus em relaçao a certas provas, o juiz, nao tendu barreira
que o faça parar, deixa-se levar ao ponto de prestar a provas,
que uma lei prudente deveria sempre repellir.
2.° A maior parte das regras da prova nao sao mais do que
preceitos fornecidos pela experiencia, que indicao o me-lhor
methodo a seguir nos casos occurrentes. E' com effeito a
experiencia que demonstra, quaes devâo seras formas do in-
terrogatorio das testemunhas ; como se pôde evitar as sugges-
toes perigosas ;.comoobrigar as testemunhas adar razûes plau-
siveis de sciencia que pretendem ter dos factos : somente destas
formas derivao o raerito, e confiança nos depoimeutos (4). E'
ainda a experiencia que somente pôde por fim fazer eu-
(3j Carmignani, t. 4, p. 120.
(4) Vide, o Process. crim. eomp., t. L cap. 87. .'^frï*«
138
nhecer quaes as medidas de prudencia, das quaes se deve
cercar a confissâo para ser digna de fé. O legislador esforça-se
prudentemente em fazer concordar suas prescripçoes corao fim
de cada um dos actos do processo,e a sua confiait ça n&o se torna
compta senao no momento,em que reconhece, qne a adminis-
traçao das diversas provas foi perfeitamente regulada. Sobre
este ponto nunca confiara no livre arbitrio do juiz, ou no feliz
acaso de estar muito familiarisado com as suas funcçoes o ma-
gistrado instructor.
3." Ha outras regras, que é preciso considerar antes corao
indicaçoes destinadas aos juizes novatos, e sem as quaes estes
poderiSo nao cuidar em certas forraalidades, cuja importancia
nîto lhes fosse demonstrada pela experiencia ; por exemplo no
caso da prova fornecida pelos cumplices. S6 sob certas condi-
çfies exigidas pela prudencia é que as declaraçoes destes ulti-
mes podem merecer ; ora o legislador,que quer exigir uma
prova efficaz, exige necessariamente que antes de tudo estas
condiçôos tenh&o sido escrupulosamente observadas.
4.° Ainda ha outras regras feitas para o juiz novato, mas que
so tem por objecto dispertar a sua attençao ; tem applica-ç5o
por exemplo as vestorias. Quem sabe que em muitos ca-sos o
corpo de delicto (em materia de infanticidio, de envene-mento
etc.) se prova por vestoria, nao ignora tambem que raras vezes
o exame e conclusses desta satisfazem inteiramente a um
magistrado escrupuloso. Além disso mesmo neste caso é
sempre necessaria uma grande habilidade pratica ; é preciso
r & devassa a sua verdadeira direcçao, e assim assegurar o va-
lor das. respostas dos peritos. Sobre todos estes pontos uma
boa theoria légal da prova nao pide deixar certamente de ter
efficacia.
5.° Nao se acharâ em uma grande parte das regras da prova,
fallando propriamente, senao consideraçôes, que parecem antes
do dominio da sciencia ; a lei confia na pr udencia do juiz para
profundar e fixai o seu verdadeiro sentido. e délias fazer a âp-
plicaeaorequerida; mas, appressemo-nos em dizer, èpor graves
motivos que estas regras sao inscriptas nos codigos ; fôrçao
o magistrado,no momento de proferir a sentea, a nao esque-
cer as recommendOes que ellas contem ; elle as tem sob as
vistas, quando aprecia as provas, e submette-as successlvâmente
à prova desta especie de balança légal, quando no tribunal
examinar todos os motivos da decis3o,que temdeser proferida.
Talria o artigo de lei ,segundo o quai as declarGes das tes-
temunhas, para valerem, deveriao concordar com todas as
circunstancias sultantes dos autos, e entre si nas circumstan-
cias as mais essenciaes.
6.° Am disso as leis sobre a prova quasi sempre determinfto
ao juiz limites, que nao lhe épermittido transpor.O legïslador
perfeitamentesabeque em circumstanciasfavoraveis certas pro-
vas podem conseguirconvencer; mas familiarisado com os inci-
dentes diarios da vida, e conhecendo perfeitamente a natureza
dos diversos meios de prova, nao pode deixar detomar em con-
siderao as particularidades, que a seus olhos se offerecem, e
que demonstrao a sua fallibilidade. Um acaso poderà certa-
mente fazer com que nasça a conviâo por tal ou tal prova ;
mas sendo esta prova facilmente fallaz, é de muita importan-
cia o protégera innocencia contra os seus funestos effeitos. Por
isso nâu hésita,e preferindo a proteâo vida a todos os inno-
centes à uma impunidade pouco provavel mas possivel, de um
culpado,prohibe ao juiz que appoie a condemnaçao em uma prova
de tal natureza, ou ao menos satisfaz-se em attenuar-lhe a sua
força. Assim vemos a prova por indiciôs proscrîpta na Carolina
art. 22. Assim fazem as legisloes.que proscrevem a convicçâo!
baseada na declaraçSo de uma testemunha singûlar, e a3 que
decretao a incapacidade de certos individuos como testemu-
nhas. Tem-se visto meninos de onze annos, com espirito bas-
tante desenvolvido, e cujas palavras sao reconhecidas como
17
i&9
verdadeiras, a non.ijo de por, ellas dever Q juiz, fieja elle quai
fôr, pranimçiar uma sentenca çondeninatoria ; mas este caso é
extraordinario, ecomo alei nao se préoccupa.prinoipalmente
senao do que acontece commumente, ella obra judiciosameute,
classificando os nieninos entre os incapazes. Jâ tiyemos oceasiâp
de demonstrar mais de uma vez os inconvenientes de unaa de-
masiada extensao das categorias de testemnnlias incapazes ou
suspeitas ; poisque liaveria excesso de circunspecçao da parte
do legislador, que se privaria gratuitamente dos meios certos
de crear a convicçao,no caso era que osjuizes obedecessem fiel-
m ente as suas prescripçoes. Estas consideraeOes pore m serâo
mais desenvol vidas, quando tratarmos da prova testemunhal.
Encerrando-se o legislador dentro destes limites, que esta-
belecemos, nao se deixando desgarrar pela opinao. eraonea, de
que é possivel traçar para todos os casos regras précisas, a eujp
exame os juizes devem entregar-se, e encadeiar completa-
mente a liberdade das suas apreciaçoes ; nao se pode negar que
elle faz uma obra util e mesmo necessaria, construindo um
systema légal da prova, sempre que attribuir a um tribunal de
juizes regulares a façuldade de proferir a sentenca. Mas corao
consequencia dos principios por n6s expostos, estes juizes | nao
podem decidir defiuitivamente das accusaçOes dirigidas) contra
oscidadaos, sem dar contas dos motivos dasua sentenca; da
mesma sorte é im possivel que um s6 colley io possa conbecer da
causa um ultima instancia ; a ordem das cousas requer que os
motivos, que em materia civil militao a favor do systema da
appellaçao (5), adquirao uma dupla gravidade em materia
criminal. Deve ser permittido a todo o condemnado recorrer a
um tribunal superior, e submetter a decisao final do processo
ao exame de novos juizes, que tem de tomar co-
(5) Vide a obra do autor intitnlada : Processo allemGo conforme o diriito
commun* civil, Bonn. 1832. pag
L
2^__ AMmSta I
nhecimento e rêver a causa. A exposiçâo dos motivos do jul-
gamento, e a faculda de appellar, eis os caractères insepara-
veis da jurisdicçâo réguler. A necessidade de uma theorïàïegal
da prova ainda se demonstra pelo seguinte: pela exposiçâo dos
motivos os juizes declarao que, proferindo a sentença, tomarao
por guias sômente a justa e os seus deveres ; que, em relao
ao ponto de facto, ha certeza adquirida ; ora a lei, regulando
a prova, nao faz senâo trar preceitos, que podem ser deno-
minados a pedra de toque da certeza, cuja existencia se trata
precisamente de verificar. Com taes regras as deliberaçoes dos
magistrados adquirem uma base solida ; desde que o juiz sabe
que tem dedar contas, nao se deve temer a leviandade de espi-
rito, e os preconceitos. Nisso tambem lucra a sociedade, que
pode comparar a sentença com os seus motivos, e qualquer p6de
examinar se aquella é justificada por estes, e assim se da satisfa-
çao â opiniao publica ; mas é o occusado, (on o seu defensor por
elle) quem tira a maior vantagem ; os motivos do julgamento fa-
zem-lbe primeiro conhecer que provas influirao mais forte-
mente no juiz (6), ou em que ponto as suas justificaçGes forâo
consideradas insufficientes. Em caso de appellao é lhe entao
facil dar-lhes melhor^e mais efficaz direcçao,e corrobora-lascom
novas provas. Muitas vezes o accusado calla-se sobre o depoi-
mento de uma testemunha da accusaçao, porque .suppoe, que
os autos demonstrao sufficientemente, que ella merece pouco
credito. Mas quando elle que o tribunal deu-lhe , pode
na appellao demonstrar a sua falsidade por provas decisivas.
Pode tambem addusir em sua defesa novas provas, que por ne-
gligencia deixou de apresentar na primeira instancia, crendo
ter apresentado sumcientes, mas que a sentença mostra depols
que elle se tinha enganado. Os motivos do julgamento
podem pois tambem influir na
(6) Grandaucr, Ensaios da Legisln.çâo,publicad'is par Zurhcin, vol. 2 p.169.
13»
manifestaçao da verdade material. Em resurao, a theoria légal
tem por consequencia immediata a deraonstracao dos motivos
da sentença, que é causa importante ; donde é mister concluir
que, dando à prova regras prudentemente concebidas. a lai
segue o melhor caminho em relaçao nom o fim do processo cri-
minal. (7) (*)
tïl
I
(7) Sobre a ntilidade de am systema légal da prova,vide a obra do autor inti-
tulada : Da a&ministraçRo dajustiça orimmal por meio do debale oral e pu-
blico. Landshtit, 1810, p. 33 ; Feucrbach, ConnideraçSo sobre o jury, p. 140;
Jarke. Revista et Hitgig. n. 19, p. 147 ; Zum Bach, Considérâmes, p. 339.—
Vide Hinsberg. BecordafSes sobre os dous projcetos do codigo bavaro de
1831, p. 94 ; Abegg, Tratado do Procès, crim., conforme o dir. commum,
Kœnisberg. 1829. p. 145.-—Mas o mais habil, e o mais ardente defensor da
theoria légal é Carmignani no sen livro : Délie leggi délia sicuresxa t. 4. p, 80
e200.
(*) O autor actualmente mais persuadido esta de que, se se persiste em re-
pellir o jury, e em attribuir a sentença a juizes regulares, é preciso, para ser
conséquente, instituir uma theoria légal da prova. E' imposaivel autorisai- um
tribunal, composte ordinariamente do pequeno numéro de juizes, a seguir -
mente a sua intima conviccâo sem a obngaçâo de enunciar os seus motivos.
Bntretanto assim se pratica na Sardenha, e na Toscana desde 1838 ; mas to-
dos, tanto as pessoas letradas, como as nâo letradas, tanto o povo como os
jurisconsultes, clamâo contra um tal systema. Nâo é possivel dar plena
sem condiçôes a juizes, que nâo possuem as garanties, que tornSo o juiz tâo
popular ; nâo se sabe, e quer-se saber que motivos déterminante a sua con-
viccâo. A theoria das provas, como a comprehendemos. ecomo a comprehen-
derâo os autores das no vas leisjà citadas de Wurtemberg e do ducado de Ba-
den, o deve ser confuudida em a antiga theoria das provas legaes (a que
Faustiu Helie Tratado da instrucçiïo criminal. t. 1 p. 649, sabiamente
discreve) : esta obrigava o juiz a considérai
-
os factos como certes e demons-
trados, desde que tivesse certas condiçôes legaes : ella se desenvolviaem um
circulo de numerosos preceitos, e se esforçava, mas em vâo, de comprehender
nas suas formulasdictadas de antemào a infinita variedade. as multiplas com-
binaçôes dos incidentes da vida. Em nosso pensamento, a theoria da prova'
tem simplesmenle por objecte terminai- aoarbitrio do juiz limites, que sal-
vaguardem a innocencia, prohiber eondentnaçâo quando faltem estas ou
aquellas condiçôes ; mas nâo obriga o juiz a aceitar a seu pesar os factos como
certes ; porque ainda quando Ihe pareçâo perfeitamente preenchidas as for-
malidadades da lei, ppde sem pie absolver, se a sua conviccâo nâo se formai
plena e inteiramente. Nâo obstante, se se quer estudar as regras incriptas
nas récentes legislaçôes da Allemanlia, ve-se as concebidas em termos tâo
geraes, o aniplos, que na realidade deixâo de ter alcance e effieacia ; por-
que a pesar délias o juiz flca senipre o arbitra da sua conviccâo : e além disso
o legisladoi" jamais pode prever todos os casos. E' por isso que na Allemanha o
systema moderno da prova légal perde sectarios todos os dias, e por pare-cer
impossivel organisa-la de um modo completamente _efficaz, os sabios, em
nuro maior hoje do que nunca, clamâo pela instituiçâo do jury.
(Nota manuscrita do autor.)
133
CAPITULO XI
EXAME DA THEORIA DA PBOVA SEGUNDO O PBOJBCTO BAVARO
DE 1831
Em outro lugar ( cap. IX ) fallâmos de um systema mixto, de
uma especie de meio termo adoptado pelo novo projecto do
Codigo bavaro (de 1831 ). Este projecto institue um tribunal
composta de nove juizes regulares, dos quaes cinco devem julgar
do facto, e quatro de direito. As convicçôes dos primeiros nao
estao sujeitas a regra alguma de pTova; à excepçao sô-mente de
dous casos, em que sao-lhes traçados limites.
Très idéas fundamentaes apparecem neste systema :
1.° Afim de prévenir os inconvenientes de uma theoria légal,
autorisa-se aos juizes regulares a seguirem sômente as suas
convieçôes.
2.° Introduz-se uma apparencia do jury, separando-se a
decisao sobre o facto da sobre o direito.
3.* Entretanto o projecto érige uma especie de theoria nega-»
tiva da prova, quando, para éviter o perigo do demasiado ar-
bitrio deixado ao juiz, proscreve qualquer condemnaçao ba-
seada no depoimento de uma testemunha singular.
Nada disto tem justincaçao ; cedeo-se ao funesto -desejo de
dar razao a todos os systemas, confundindo uns com os outros;
mas esta tentativa teve a sorte ordinaria de todas as meias me-
didas ; nao satisfez a ninguem. Esta combinaçao de elementos
heterogeneos nao p6de além disso deixar de causar numerosos
inconvenientes. Mais adiante demonstraremos o inconveniente
da seutença emauada de juizes regulares com a faculdade de
decidir conforme» sua intima convicçao.Mas em primeiro lugar
diremos, que ha grave erro em considerar como um melhora-
mento, o ter-se confiado a cinco juizes à decisao sobre o facto:
—estes cinco jui-zes nunca poderao dar as garantias politicas,
134?
que se encontr&o no jttèf (T), sao pseudos jurados (2) que o
accusado nfto tem direito de recusar. Sendo o seu numéro t&o
restricto, très votes bastao para constituir raaioria, e h sua
sentença toma-se irrevogavel.porque a appellac&o é proscripta.
Depois, porquenao seconfiou adecis5o,tanto sobre o facto,como
sobre o direito,a estescinco juizes, que reunem as mesmas capa-
cidades que os quatro juizes de direito. nâo existindo em relaçSo
a elles os roesmos motivos, que militarao para se attribuir aos
jurados somente a decisao do facto'? Ninguem o poderia dizer
(3).. Nfto creia o legislador que o seu systeraa possa tornar-se
popular, e que os bavaros supponliâo possuir um jury apert'ei-
coado. .
A theoria negativa, sobre a quai ja dissemos alguma cousa,
é tambem pouco sustentavel (4). O projecto /art. 168) prohibe
a condemnào bàseada em uma cossâo, que o tiver sido
feila solemnemente na audiencia, ou que nfio for corroborada
por outros meios de prova (4 bis): quai o alcance da palavra
solemnemente ? A disposiçao da lei em sua totalidade é conce-
bida.em termos tao pouco précises, que nfto se sabe como fir-
mar o seu exacte sentido. A confissfto sera- sufficientemente
corroborada, quando as circumstancias, que relata, nao sào
contrariadas pelas outras provas ? os simples indicios serao
considerados como taes? Como se vê, somente a apreciaçao do
juiz podera decidir a questao de saber, se a confissao é,ou nao,
corroborada por outras provas.
A lei n5o permitte dar-se fe ao depoimento de uma teste-
munha singular, que nao for corroborado por qualquer outra
prova. Neste ponto ainda apparecem novas difficuldades. A
(1) Vide o nosso >riigo nos Arch. do Dit. Crié.. 18, p. 126 o saguintes.
(2) Afttryeschworne.assim os chanta M- de Hinsberg nas suas Recordat&es
(vide a nota setitna do capitulo précédente),% 4
fi) Vide o arfcigo do autor na collecçào citada. nota 1, p, 131. tit. 18. (D
Vide o inesmo artigo. p. 134.
I
13B
que testemunha se réfère *? Como entender o apoio das outras
provas ? Bastarâ que o depoimento concorde simplesmente com
alguns indïcios, ou com uma confissâo extra-judicial ?
Em resumo, o legislador nâo é conséquente, porque nâo
obstante ter resolvido encadeiar o livre arbitrio do jujz, toda-via
nao o faz senao em dous unicos casos,deixando-o completa-
mente livre nos outros; de sorte que pôde acontecer, que simples
indicios, ou depoimentos de testemunhas com razao sus-peitas,
sirvâo de base a uma condemnaçao. E foi em vâo que sequiz dâr
garantias a defesa, concedendo-lhe a acçao de nulli-dade por
violaçao d > art. 168 (5). E' certo que quazi sempre nôde ter
lugar este recurso ; sera sempre facil provar que a confissâo ou o
depoimento das testemunhas nao forâo devida-mente
corroborados, que a confissâo foi retractada, ou que esta
inquinada de algum vicio. De sorte que, na realidade, os pre-
tendidos juizes de direito a maior parte das vezes julgarâo sobre
os factos ; e como a sua missâo nâo é aprecial-os logo desde o
principio, podeacontecer que nao tenhâo prestado uma firme
attençâo à exposiçâo dos seus deseuvolvimentos no curso do
procêsso, e no entanto sobre elles venhâo a proferir decisâo, por
esto meio mediato. Pondo de parte as despe-zas considéraveis
que causarà tal systema, bastarâ faze-lo funccionar um momento,
para que appareç&o a toda a luz a sua natureza hybrida, a sua
lentidao e seus defeitos (6)
(4 bis) Vide a nota 4, cap. 9, onde reproduzimos o proprio texto do art. 1G8,
(5) M. de Hinsberg, I, c. p. 7, demonstra perfeilamente qoe esta acçâo de
nullidado nâo aproveita mnito ao accusado.
(6) Dreseh, Archivos du LegislaçSo moderna, publicados por Muller, tit. I.
liv. 3, p. 476. Este autov combate moi judiciosaraeu te o systema bavaro.
îse
CAPITULO XII
EXÀME DO SYSTEMA SESUIDO NOS PAIZES BAIXOS EM CONSEQUEN-
CE DA PROMULGAÇÂO DA ORDENAÇAO CRIMINAL DE 1830
Jâ fallamos ( cap, IX ) da ordenaçao criminal neerlandeza, e
dos caractères especiaes que a distinguem : tambem nesta o
legislador esforçou-se em reunir as vantagens inhérentes ao
jury, e os résultantes da theoria légal; e nao obstante estabe-
lecer regras de prova, as quaes os juizes regulares sao obri-
gados a obedecer, todavia nao os obriga a condemnar senâo
quando a sua convicçao for completamente neste sentido.
Mas, tratando-se de determinar o sentido das prèscripçôes
desta ordenaçao, vemos surgir inevitaveis difficuldades ; séria
a intençao do legislador, que o juiz nao fosse sempre e irrevo-
gavelmente ligado pela existencia de certas provas reconhe-
cidas pela lei; (1) que nao fosse rigorosamente obrigado a con-
demnar, ainda havendo o depoimento de duas testemunhas ;
ou pelo contrario séria a sua intençao instruil-o, que lhe é
preciso an tes de tudo examina r, se a sua convicçao é compléta,
isto é, se o concurso de toclas as circumstancias torna verosimeis,
e concordantes os resultados fornecidos pela prova? Se foi isto
o que o legislador teveera vista, deve-se concluir, que nenhuma
differença existe entre o seu systema, e o da theoria légal
ùsada na Allemanha ; porque na-Allemanha tambem o juiz
nao é escravo das regras estabelecidas pela lei em materia de
prova ; pois que tambem nâo é obrigado a condemnar pelo
depoimento de duas testemunhas, sendo necessario além disso
que a harmonia compléta das suas declaraçOes, que a verosi-
milhança dos seus depoimentos venhao corroborer as outras
circumstancias estabelecidas, e demonstrem claramente qne
(1) Contra este systema da ordenaçao em questSo, vide oart. do antor nos
novos Areh. precitados. tit. 12. p. 491.
merecem plena ; e entao é que o juiz condemna. Com-
prehendida neste sentido a ôrdenaç&o critninal hollandeza nâo
contem systema algum novo (2),
A intençao do legislador séria ir mais longe, e decretar que,
mesmo no caso em que os factos se tornassem certos, conforme
o critérium légal, o jtriz tem o direito nao obstante
1
os cbiV-
siderar coino incertos, quando as suas conviOes como humêm
nao concorde ni perfeitamente com os resultados raatefiaes" das
provas, e fosse o caso de absolver, se fosse jura "? Se esté "é
o verdadeiro sentido da lei, a segunda parte da disposiçSo
annulla a primeira ; pois que desde que se diz que o jûiz ve
antes de tudo estai- inteiramente convencido, deixa de r'jufz,
e torna-se jurado ; sômente a sua consciencia toma- o arbitro
da sentença, nâo podendo déclarer culpado o accusado, se
restar uni a duvida no seu espirito, ainda que plenatnente
probatorias sej&o as provas. Como nao é de uso déclarer os
motivos da intima convicçao, basta uma simples declaraçâo no
tribunal das deliberaçôes ; basta dizer:—Eu o estou conven-
cido; para a condemnaçâo setornar impossivel. Ora'é fora de
duvida, para qualquer magistrado, que laver alguma pratica
dos tribunaes de justica, que uma ligèira duvida pôde subsîs-|
tir muitas vezes, mesmo no 'caso em que qualquer magistrado
prudente consire a certeza como adquirida nos termos das
regras das provas as'mais severas: Assim é, que em uma espe-
cie, nao se pôde bem comprehender como o accusado, sendo
pequeno e fraco, poude praticar um 'acto, que exigia, uma
grande força phisica ; em outra, nao se pôde perfeitamente
(3) Existent dissertaçoes intéressantes sobre as prescripçôes contidas nos
projectos de lei anteriores sobre a prova, e sobre as regras da prova. Vide
principalmente Eappard, Observâmes sobre ,q projecto do Codigo Cr\m.,\
cap. 1, p. 30; Den Tex. Observâmes sobre o projecto do Codigo Crim.
cap. 4, p. 417, et. **,»7
18
138
ex pli car, como o accusado, condemnandu-se a si proprio pela
sua confissao, se hoave para eonsumar o crime de incendie No
systema, de que tratamos, uma talduvida é sufficiente paru
autorisar o juiz a negar o seu voto para a condemnaçâo i e|
quando se considéra que as regras de prova em toda a legisla-
çao judiciosamente concebida sâo o producto da experièneâa e|
do boni senso applicados à investigaçâo da verdade, parece
extraordinario que o juiz, por causa de uma simples duvida.
tenha o direito de nullifîcar os resultadus fornecidos por estas
mesmas regras, e que se tenha assim qnerido reunir dous ele-|
mentos inconciliaveis, a obediencia à theoria légal, a a liber-
dade de apreeiaçâo do jury.
Nos terraos desta mesma ordenaçao, ao lado dos motivos da
sentença de condemnaçâo, e -além dos fundamentos, que nâo
o sen&o a applioaçao das regras da prova, deve ser declarado)
quet os juizes estào intimamente convencidos culpahilïdade\
do indiciado; donde se segue que,se alguns sâo de opiniao con-
traria, disso se deve coin cuidado fazer meneao". Ora, como n&o
sera desagradavel a fmpressâo feita sobre o publico ! Como
n&o tomarà corpo a descondança, quando a sentença mons-j
trar, que nâo foi proferida senao por simples maioria !
Em resumo, a ordenaçao criminal da Hollanda nâo consti-
tue, nem garantias novas quanto à verdade dos julgamentos,
nem melhoramentos reaes quanto à jurisdiç&o.
CAPITULO XIII
1)0 JURY EM RUAS RELAÇÔES COM O SVSTEMA I)AS PROVAS LEOABS
As repetidas objecçOes (vide mais acima, cap. VIII), oppos-
tas à theoria légal da prova, impressionârâo os espiritos mu-
dernamente, e augmentârao a phalange dos partidistas exclu-
sives do jury. Pareceo-lhes sempre vêr a verdade surgir trium-
pliante perante o jury, mesmo fazendo abstraçâo das suas van-
139
tagens politicas, e considerando-o sômente aob o ponto de vista
do crîminalista. No jury a certeza nao reconhece outras regras
além das ordinarias, e nao é embaraçada na rêde de prescripçoes
legaes, que, sômente pela falta de uma das for-malidades, de uma
das condiçoes legaea, impôe no juiz uma sentença de absolviç&o
contra a quai se révolta a consciencia ; é que causa grave damne-
A sociedade, concedendo a imptini-dade a verdadeiros culpados.
Se bem que, conforme o piano deste livre, nfto tenhamos,
relativamente ao jury, senao uma questflo a resoïver', a de sa-
ber, se, por nao estar adstricto a prova légal, merece a prefe-
rencia sobre a instituiçao dos juizes regulares, e se é melhor, e
com mais segurança apto para a investigaçâo da verdade"-,
lodavia é-nos preciso examinar com cuidado a sua conslituiçao
interior, para podermos dar uma soluçâo.
E' sabido que os caractères especiaes do jury (1) resultao do
seguinte : 1," de serein para cada causa tirados de entre o povo os
cidadaos ebamados a jnlgar : 2.° de nao serem estes cida-dâos
senao juizes de facto : 3.° de nao serem obrigados a moti-var a
sua sentence, visto estarem livres de todas as regrn - de prova
légal, enûo obedecerem senao a sua convieçao pessoal ; | 4.° de
que os jurados dem parecer juizes da livre escolba do
accusado por ter este o mais amplo direito de recusaçao.
Os adversarios do jury nao possuem argumentas fortes para t»
combater sériamente.Examinemos summariamente as suas
objeeçoes (2).
(1) Littérature do jury. Vide o mou Procès. Crim. Comp., lit. 1, cap. 44»
notas 1, 2, e 3, -
(2) Oitaremos principatmento Feuorbach, nas suas Consideraçdes sobre o o
jury, Landshui, 1813; omesmo nas Considérasses sobre awublicidade dos
débites, e sobre o débat» oral, part. 2, p. 420—491,—Sparr Wangenstein no
seu livro Sobre o jury, Leipzig, 1849; Mezard, do Principio conserva-do r,
etc.. Paris, 1820. Os au tores ci tados no meu Proe. Crim., Ut. 1. cap. 44, nota
3. a respeito da introduecâo do jury no paiz de Vand; Bentham, da
organisacân judiciaria p. 225. Vide Den-Tex, nos sens JSnsaios de Juris-
prudencia, 1829, liv, 4. p. 287—847; emflm Garmignani, 14. p. 28,242 e 297.
è
140
1.' Sendo designados somente pelo acaso os jurados, que
devem julgar cada causa, é muito possivel que a sorte désigne
doze individuos sern cultura intellectual, e inhabeis para as
suas novas funcçoes; muitos podem mesmo ser fracos de espi-
rito. Ora, poder-se-ha pensar em tal eventualidade sem tre-
raec coni a idéa dos perigos que correrâ a sociedade, assim
como a innocencia de um acçusado seul culpa 1
2.» Nao sendo os jurados adstrictos a regra alguoia, e nao
tendo.contas a dar, nào pôde acontecer, que por uma fîinesta
confusâo se âeix-em arrastar segundo a disposiçâo momentauea
do seu espirito, como se houvesse prova feita na causa, e que,
ora illndidos pelos gestos hypocritas do acçusado, ora irrita-
dos pela sua postura altiva, somente obedeoao as suas im-
pressOes interiores, e no primeiro caso absolvao o culpado, e
no segundo condemnem o innocente?
3.°i Quantas vezes nao se tem visto dous ou très individuos
importantes e bem fallantes impur à uma assembléa inteira ?
Pois bem! Nao poderâ acontecer a mesma cousa em um .tri-
bunal de jurados, e o seu voto, expressao de uma pretendida
maioria, nao sera militas vezes o resultado.da influencia nelles
exercida pelas phrazes de algnns discnrsadores '?
4.
9
Dispensai- os jurados de consignar na sua sentença os
motivos da sua decis&o é pùr-lhes nas mâos uma arma terri-
vel ; uma cbstinacao de idéas (3)^ algumas vezes extravagan-
tes, em um ; a leviandade de espirito e o odio, era outro ; a
paixao em um terceiro, eis frequentemente os motivos das suas
opiniOes ; e como nenbum délies é obrigado a expôr as razôes
délias, segue-se que nao de haver deliberaçao verdadeira,
apreciaçao amplamente feita, e maduramente pesada. Por
consequencia nada ha mais que garanta a consciencia do
exame, nem a justiça do julgamento.
(3) Oitei os exemplos desta obstinâo de idéas G dos seus effeitos funestes
na miriha Revista de Legislaçiïo estrangeira, t. 5, p. 495.
#
141
5." A sentença do jury é proférida sera rectirso; novo motivo
de perigo para a sociedade e para a innocencia ; o condemnado
vê-se privado dos reeursos ordinarios, cnjo effeito séria sub-
raetter a causa ao exame de outros juizes.
6.» A experiencia, e sobretudo em França, nao é favoravel ao
jury (4). Os jurados, diz-se, em lugar de decidirein ' «informe a
sua consciencia, e conforme o' pfovado na causa, entresrao-se a
longos raciocinios sobre o rîgor das penas ins-criptas nas leis; e,
sob o pretexto da sua omnipolencia
:
(&), sob a capa immoral de
litn piedoso perjuriô, absolvem o accu-sado culpado, que
confessa o'crime, 8ô pelaVazâo de acharem a pena dura de mais.
1." A pretendida separaçao entre Q ponto de facto e o de
direito. a distin'cçao entre juizes ejurados, basetao preconisada
de suas mutuas relaçoes, no dizer dos adversarios do jury, é
muitas vezes iïïusoriâ (6), porque a maior parte das pretendi-das
questoés de facto, que sSo siibmettidas ao jury, nao contem
senflo pontos de direito. Àssim, a sentença que déclara o accu-
sàdo culpado de falsidade, de furto. ou de tentative de roubo,
encerra ao raesmo tempo tairibem uma sentença sobre o direito,
porque é a lei sômente que détermina os caractères m ateriaes *da
falsidade jiiridica, do roubo e da tentàtiva puniveî. Ora, quaiido
o juiz ordinario e formado tem necessidade de empregar toda a
sua intelligencia, todas as suas luzes especiaes, todos os'sôus
conbecimentôs praticôs, par poder dar a taes questoés a me-lhor
soluçao, poderà esta serdada por Um simples jurado, que
.4) Pôde-se consultai- a respeito um livro publicado em Berlim em 1819, e
intitulado Juizos notaveis 'sobre ojury feitos pelos jurisconsultes fronceses.
(5) Vide sobre este assumpto os autores citados no meu Proc. Crim. cap.
44. Van-den-Tex, 1. c, p. 804,
(6) Van-Feurbach, Consideraçdet. é, &, p. 201 ; Mezard» do l'rincipio. &, p.
100. "fciV À
14fc
nem 3e quer sabe o que é a sciencia das leis, que se vê isolàdo
corn a MII inexperiencia, perante uma tal sentença a pronun-
etar ? Em m'atéria de imprensa éimpossivel séparer ô «facto do
direito fly, a derwao do jury diz respeito tanto à existencia do
direito, como ans caractères juridteos do facto:—citar a forma
gérai usada na França e na Ingln terra (non coupable, nti
f/uUly) é qaanto basta para provar, que a sna sentença compre-
hende, nao a criminalidade do facto, como a sua raateriali-
dade.
8.0 Nas èpocas de commoçoes politicas, quando «s partes
estno présentes, o jury é um tribunal de terrer ; perdido esta . o
infeliz que tem por juizes um tribunal composto dos seus
adversarios politicos. De que lhe serveria recusar algnns dél-
ies, se contra elle se levanta ém massa o partido? Os jurados
sempre se deixao levar para onde os arrastao, o espirito das
paixoes populares, e os clamores das folhas publiées; portànto
nao se pôde esperar délies uma decisSo impartial. De outro la
do, se ogoverno é poderoso e energico, o jury, e mais facil-
mente do que os juizes regulares, soffrera a sua innuencia.
9.° Finalmente mesmo na pratica existe perigo, que nao
p'kle ser evitado pelos esforços do legislador, ainda que fortes
e varia dos sejao. Com que maiocia deverà ser proferida a sen-
tença? Ha sem duvida grandes diffieuldades em resolver este
problème. Sera bastante a simples maioria? mas isto parece
pouco rasoavel (8). Dever-se-ha exigir a unanimidade? Mas
nào se ha de querer certamente recomeçara triste experiencia,
que fez a Inglaterra,onde basta que um jurado tenha o espirito
obstinado e extravagante, e que seja mais robusto e mais capaz
do que os sens collèges de resistir é. fome e à sêde, para obri-
gal-os todos a votar contra a sua convicçao ; e, vencidos pela
(7) Vide a este respeito o meu l'roc. Crim. t. 2, cap. 195.
(8) Vide o Troc. Crim. comp., t, 2, cap. 190—196.
148
sua funesta pertinacia, a absolver ura eulpado, afin» de se li-
vrarem da situaçao penosa, a. que os. condemna a sua diver-
gencia.
Eis as objecçOes em toda a sua força. Serao ellas de natu-reza
a arrastar a opiniâo do observador sagâz e attenta? N&o o
cremos; porque ellas conduzém ao erro, e o que tera de espe-
cioso su nos deve excitar a examinannos com mais puidado, se
os vicios attribuidos ao jury sSo inhérentes â sua natureza, on se
derivao antes da sua organisaçâo defeituosa em certos pai-zes ;
se esta instituiçao admitte garantias importantes, de que carecem
as jurisdiçôes regulares, e se é mais apta do que qual-quer outra
para conciliar a eonfiança publica na equidade das sentenças.
Pois béni ! Nâo é possivel contestar-lbe por um momento a
vantagem de taes garantias.
1." Ao passo que os juizes ordinarios, algumas vezes bem
indifférentes à opiniâo dos seus concidadâos, frequentemente
mais sollicites do interesse do seu accesso, esforçando-se em
conquistar o favor daqueiles, dos quaes dépende a sua propria
fortuna, e a dos seus parentes, se aeobertao com as suas func-
çôes,. se collocao ao abrigo de qualquer censura publica, e nada
tem que temer das eonsequencias de uma sentença fal-litel ; pelo
contrario os jurados contrahem uma immensa res-ponsabilidade
moral para com um juiz soberano, e incor-ruptivel, para com a
opiniâo do paiz. Basta river em um paiz, em que vigoia o jury,
para saber que por toda a parte resoEo as suas sentenças ;.e
quando, encerrada a audiencia, o jurado entra no seio do povo,
acha-se desde logo perante a critica gérai ; ninguem lhe poupa a
sua censura, sendo caso disse, e a reprovaçâo publica p6de-o
ferir mui diversamente das censuras, queo juiz ordinario poderia
soffrer dos seus superiores; elle o sabe, epor i&so mesmo assiste
aos debates com muito mais conscienciosa e continuada
attençEo.
2." O juiz regular pôde interessar-se mediucremente pelo
#
14*'
bem estar do paiz; tendo certo o se» ordenado, nao tem interesse
immèdiatô na efficacia das sentenças penaes; mas os jurados,
quando a instituiçao funcciona por um mecanismo felizmente
combinado, comprehendem o seu interesse directe e pessoal ua
equidade das decisses. Sendo parte intégrante da sociedade, e
achando-se ainda a ella ligados pelo laço da propriedade,
devem desejar a manutençao da ordero social, e do respeito
devidô à lei pénal ; comprehendem as consequencias da impu-
nidade dos crimes, e é a sua propria segurança, que elles ga-
rantem,qnandocomo seu voto invperativo fazem cahir sobre o
culpado todos os rigores da pena. Ao mesrao tempo, pom,
preoccupao-se muito cbnf as eonsideraçoes dévidas à liberdade
individual, ecomo muito bem sabem,que offendel-a,é levantar
uma ameaça sobre as suas proprias cabeças, o seu intéresse
capital exige que, a sua pena nuncafira o innocente.
3-° O juiz ordiuario, como reconhecem os adversarios do
jury (9),: estando pelos sens trabalhos e vocaçao mais em
communiçâo diaria corn os livros xlo que corn os homens, acaba
por adquirir certas siogularidades de caracter, que parteci-pao
de systemas exclusivos ; por isso acoutece algumas vezes
comprehender elle mal as particularidades intimas 4a vida, e
as experienciàs, por serem raramente colfaidas, nao podemdiri-|
gil-o para julgar com segurança do valor das provas produ-
zidas, como, era de espèrar. Pelo contrario os jurados, que
todos os dias vivem em relaçoes continuas com os seusconci-
dadaos, e a cada instante registrao as liçoes da experiencia,
estao mais noscasos dedecidir dos factos e das,circumstancias,
que a vida quotidiana offerece à sua apreciaçao. (Tomemos por
exemple o caso, em que se tratasse de précisât até que ponto
poder-se-hia dar credito a uma testemunha jà condemnada
(9) Cannignaui, t. 4, p. 308.
te
145
criminalmente,ou de deeidir,se um horaera muito joven possue o
discernimento sufficiente. )
4.° Os roèsmos adversarios do jurz sSo obrigadôs a reconhe-
cer flOJ, que era materia politica deve ser com mais vantagem
confiada ao jury a decis&o sobre os factos, e que este pôde dizer
melhor do que os juizes ordinarios, se tal acto imputado como
crime constitue uma aggressaohostil contra o poder,ou se nada
mais é do que o exercicio legitimo dodireito constitucional. Em
taes actos nao serao quasi invisiveis os limites, além dos quaes
começa a crirainalidade? Uma critica dos abusos do poder audaz,
e energica, pela verdade e pela vivacidade das côres, o facto de
reunir assigna turas de cidadaos em uma petiç&o, a resistencia
légal opposta à illegalidade, tudo isso pôde parecer nma ag-
gressao real contra o poder aos olhos do juiz, que, estranho
muitas vezes aos movimentos da vida exterior, agita-se in-quieto
no fundo do seu gabinete de trabalho, e qualifica os actos
daquella segundo a letra ïnflexivel da lei; emquanto que os
jurados, vivendo rasob a égide de uma constituiçBo no meio
das livres manifestaçoes da opiniao publica, apreciar&o mais
judiciosameute os factos e nelles nâo verao senao o exercicio das
franquezas civicas (11). Depois, é mister dizel-o, em taes
materiasnâo é,nem no Corpus jtvris, nem nos Codigos criminaes
que poderao ser encontrados os dados e os elementos de um
julgamento equitativo proferido com conbecimento de Causa. A
preferencia, que aqui obtem o jury, deverâ ainda ser applicada a
todos os delictos da imprensa (12), e de injurias em gérai; porque
os jurados, melhor do que os juizes ordinarios, poderao
reconhecer a offensa causada a honra do quei-
(10) Carmignaui, t. 4, p. 365.
(11) Por isso na França e nos Paizes Baixos a competencia do jury se
estende a todos os negocios politicos, mesmo quando a pena nâo é crimineU,
e quando délies sô devem conhecer os tribnnaes correccionaes.
(12) Foi o que fez o projecto da lei Bavara sobre a imprensa (de 1831).
19
»
14<S
xoso e a intencionnlidade do delicto. Em taes causas aseutença
deve aer como que a expressao da opiniao (13), para conquistar
a approvap gérai e a estima popular; sem o que, nada tera
ganho o queixoso com ter obtido uma condemnaçao ; s&o os
concidadaos, que pronunciao o verdadeiro julgamento em
negocios de honra; o jury, quando pronuucia, nao é maU do
que o seu orgao, e séria difficil que o povo reconhecesse a sua
voz ua de alguns jurisconsultes.
5." Muito poucos membros compOem o tribunal cri minai
ordinario ; o do jury é mais numeroso (14j, e o seu numéro é
mais uma garantie, que atrahe para a sua sentença a confi-ança
gérai. Admittamos (o que ô raro; que seja necessario o numéro
de sete juizes para conpletar ura tribunal criminal, quatro votos
forBo a maioria e vencerao a condemnaçao. Mas quando se
considéra que o jury é formado de doze membros, que na
Inglaterra devem ser unanimes, e que na França deve ter a
maioria de 7 votos (14 bis) no minimum para a con-|
demn&o, compreliende-se faciroente, que uma sentença de
culpabilidade proferida por 12 ou 7 votos satisfaça melbor as
susceptibilidades publicas,do que se 4 juizes somente tivessem
votado. Finalmente, como jâ, se demostrou, os juizes decidem
do mesmo modo que os jurados em muitos pontos especiaes
em materia de prova, taes como a dévida as testemunhas, a
concordanci» dos seus depoimentos, &, & ; porém quanto
maior for o numéro de votos, tanto mais augmentarà a confi-
ança publica, porque é proprio do bornera darmais autoridade
À unanimidade do maior numéro de votantes.
(13) "Vide uni artigo do autor nos Atehivos novos (AIL), t. 13, p, 280.
(14) E' nm ponto concedido por Hinsberg, Recordaçdes. pag. 5.
(14 bis) O Oodigo da iust. crim. de 1808, Art. 34(5, exigia a simples maioria.
Este artigo foi revislo em 1882, e derogado no sentido de se exigir a maioria de
mais de 7 votos; mas em 9 de Setembro de 1835 foi pfomulgadaj umalei, que resta
beleeeu o principio anterior da maioria simples.
v
14*
6." Esta autoridade augmenta-se ainda,quando se considéra,
que o accusado em relaçao aos jurados exerce um direito de
recusaçâo inuito mais extenso do que em relaçao a um tribunal
ordinârio \lb). O juiz regular pôde tambem ser recusàdo, mas uao
o pôde ser senao nos casos previstos pela lei, e por motivos
previamente articulados. Ora, um tal direito de recusaçâo nao é
sufficiente : muitas vezes o accusado tem vagos motivos de
pensar que este, ou a quelle juiz, esta mal intencionado o seu
respeito; sabe porexemplo querelaçOes de affeiçao éx-| istem
entre o seu adversario e ojuiz A.;queeste pedio amâo da filha
(laquelle; que o juiz B. jamais lhe perdoara certa rixa, por velha
que seja; e no entanto nada disto pôde fazer valer,se nao lhe é
possivel articular, e provar os motivos de recusaçâo, que a lei
previo. £ nao se diga que um juiz honesto nao se deixa dominar
por taes infl uencias; porque jamais se despe compléta-mente da
fraqueza humana; e nas numerosas especies, em que a du vida o
conserva indeciso entre duas opinioes, se mâo grado seu certa?
paixoes pequeninas o assaltao, inlina-se do lado îiienos favoravel
ao accusado, acreditando, na melhor fé do mundo, na lealdade de
suas proprias convicçoes. Principal*
1
mente nas causas politicas
suas opinioes, suas preferencias de partido, exercera em seu
espirito uma immensa influencia. O accusado sabe que nao pôde
esperar a absolviçao de um homem iuquieto e devotado ao poder
; e no entanto nao o pôde récusa r senao no caso muito raro em
que a lei admitte os motivos que elle articula. Como é superior a
sua posiçao, quanto a este mesmo direito de recusaçâo, quando o
exerce em relaçao aos jurados ! Portante (e este é o resutado da
lei, que for judiciosa, nesta materia), aquelles que nao forera
recusados, apparecem como verdadeiros juizes, cuja decisao
futura é com confiance, e livremente aceita. Quanto ao povo, sua
fé na equidade dos
(15) Vide o meu Proc. Crim. comp. t. I, cap. 30.
9
148
julgamentos torna-se plena e inteira, logo que o tribunal lhe|
parece iraparcial. Ora desde que o accusado por essa forma
escolheu por si proprio os sens juizes, estes parecem dotados
no mais alto grào daquella imparcialidade tao desejada, e por
isso a confiauça nao lhes pôde ser recusada.
Eis-ahi grandes e numeroaas vantagens ; mas, é preciso di-
zel-o, o seu effeito séria destruido, se a parte cultivada da
naçao (deixamos de proposito de lado, como nao teudo impor-
tancia alguma, as impressoes docoramum dopovo, dessa mul-
tidao facil a mover
r
e a cegar), se deixasse possuirde duvidas, e
temesse* que os jurados,libertados de todas as regras de prova,
nao dessem ouvidos senao a voz do arbitrio seduzidos somente
pelas appareneias, e sem dar contas à sua propria conscien-cia
( S j. Em conclusao, de todas as explicaçôes précédentes
collige-se que, no que toca à investigaçâo da verdade, os jura-
dos possuem certamente boa vontade ; mas do querer a poder
vai grande distancia, e nao é fora de proposito indagar até que
ponto as regras legaes da prova seriâo conciliaveis com a
organisaçao do jury (16).
Taes regras parecem imcompativeis com o systema seguido
era França ; a lei nada diz a respeito, e a doutrina é igual-
mente muda. Quanto as simples instrucçOes que o Codigo en-
cerra (.11), ellas tendem expressamente à regeiçao de todas as
regras ordinariamente estabelacidas pela sciencia ; parecem
autorisar os jurados a nao tomar por guia senao as impressQes
intimas, mesmo mal definidas, e nao meditadas. Tal systema
nao pôdejustificar-se aos nossos olhos ; e, apressamo-nos em
(16) Vide o meu artigo nos Noues Areh. de dir. crim,, 1.13, p. 2M.
(17) Codigo de instr. crim. art. 342.
<w
149
dizel-o, foi o proprio legislador a primeira causa daa opiniôes
1 erroneas recebidas no paiz,por ter transplantado para a França a
constituiçao ingleza do jury (18) com incrivel precipitaçao,
e sobretudo por nao lhe ter dado uma organisaçao nera bem
clara, e nem bem précisa. A maior parte imaginârâo que a
operaçao, pela quai o jurado se applica a discernir a verdade
nos factos da accusaçao, era diversa daquella que serve de
guia ao juiz ordinario ; e entretanto vemos a lei na instrucç&o
de que se trata, fallar da impressâo que fizerâo as provas na
razâo dos jurado s. Ora dar-llies assim a niissao de examinai'
e pesa ras provas, nao era considerar esta apreciaçao como um
trabalho de intelligencia'? Demais o Codigo (19) estabeleceu
certas restricçôes formaes, prohibio os depoimentos dos ascen-
dentes, dos innaos e irmaes, e afins iios nvesmos graos, do
marido e da mulher ; estabeleceu tain bem alguns preceitos,
bastante incomplètes, sobre o emprego dos di versos meios de
prova.
Na Inglaterra, na patria do jury, o systema em vigor é
preferivel, e realmente conforme à essencia das cousas. Certa-
mente nao se acharâ. na lei as regras tao fréquentes, que se
enoontrao na legislaçao alletna; masao lado dostextos legaes
existe a common law (lei commum, nao escripta) (20), que en-
cerra ura corpo de preceitos juridicos perfeitamente precisos, e
fielmqute seguidos pelos tribunaes ; a common Une, parte a mais
preciosa talvez da legislaçao ingleza, que o povo conhece a
fundo, e cuja observancia religiosa exige antes de tudo, e que
vai-se aperfeiçoando todos os dias, graças as investigaçoes
M I
(18) M. de Golbery a este respeito consignou observaçôes muito intéres
santes na Revista de Jurisprudence/ estrangeira, publicada pelo autor, t. 3,
.».
(19) Codigo de instr. crim., art. 322.
(20) Vide o meu Proc. Crim. comp., t. 1,,-jap. 21. § 9-
ISO
da sciencia, e à pratica judiciaria. Encerra nma verdadeira
theoria de prova, aiialoga pelo fundo das idéas à usada na
Allemanha, um corpo de regras espëciaes (fuies ) estàturado
SÉfbre todos os pontos essenciaes (21).
1." Assim determin&o ell'as quaes os méios do'prova, de que
se pôde lançai" mao, quaes as testemtmhas, que pôdem, e quaes
as que nao pôdem ser ouvidas, deixando aos jurados a facul-
dade de apveciâr o grao de credito, que lhes é devido (22),
2.° Organisai) o emprego dos diversos meios de prova, e di-
zem como as testeraunhas devem ser interrogadas.
3." Determinao as condiçoes.sob as quaes a prova de fazer
; estabelecètn, por exemple, que ama confissâo deixa de
ter valor sendo extorquida por promessas ou araeaças (28).
4." Determinao as condiçSes, sob as quaes um titulo pôde
fazer prova.
5." Referem-se final mente a consideraçôes de ordem gérai,
que devem sempre guiar o juia na apreciaçao das diversas
nnturezas de prova (da artificial, por exemploj ('24.).
Pefcorrendo os escriptos de- Starkie, Philips e Bentham, vê-
se, que todos elles adoptao regras de prova essencialmente
semelh.ant.es as das leis allemaes; a unica differença, que as dis-
tingue, é que nao têm caracter absoluto ; a confissâo por exem-
plo nao pôde fazer plena prova,, senâo quando se yerificao estas
ou aquellas condiçôes, em quanto que na Inglaterra estas
mesmas regras nao sao mais quasi sempre do que baltzas indi-
(21) Vide a minha dissertaçâo noa Àrch, do clireito criminal l. 12, p. 506.
t. 18, p, 291.
(22) Por exemple : no caso de ser chamado um parente como testemunhn,
vide Philips, Tratado sobre a lei da prova, t. 1, p. 874.
(23) Bussel, Dos crimes e dos delictos, t. 11, p. 644.
(24) A este respeito vide uma dissertaçâo no Lato Magazine, n. 14, p.
348. V^ '*£
k
l?îl
eando ao jury a sua marcha. A lei Ingleza ofFereee, sob Qufaro
pontu de. vista, uma particularidade bem pronunciada: ,#«
questoes, que se se suscitarem sobre aadmissaode tal gênera de
prova, ou sobre a maior ou menor confiança, que deve ser
concedida a tal prova viciada de irregularidade, sao conside-
radas simples pontos de direito f25j, ligando-ae intimamente
com a lei da prova (lato of évidence), e cuja soluçSo é reservada
sdmente aos juizes regulares. Por ieso -se frequentemente,
no curso de um procea?o, o juiz decidir primeiro que esta ou
aquella prova é applicavel â especie; e posteriormente os jura-
dos acquiescerem religiosaménte a esta decisao. e seguir as
suas consequencias. Outras vezes, depois de ter 0 jury pro-
nunciado, pôde surgir uni a grave questao de direito sobre" a
mesina materia, a quai é logo defirida aos doze grandes juizes,
cuja sentença pôde deflnitivamente revogar a propria decisao
do jury, Uma multidao de escriptos, tornados populares,
inculcao, e explicao aos jurados ihgle'zes todas estas regras da
prova, transmittidas de século a seculo, celles sabera perfei-
tamenteque P6 éllas, e a lei da prova ém'gérai (lato of évi-
dence) devem dirigir os sens vbtos.
O Codigo da prova [Coâêof évidence) redigido por M. Livin-1
gston (26,),foi concebido no mesmo espirito.e muito se enganaria
quera pensasse, que esta obra legislativa tao notavel autorisa os
jiirados, abandoriados a si meâmos, a nao odecerem sènâo as
suas impressOes : além disso, 0 Codigo do processo, cujo autor
é tambem M. Livingston, dà ao tribunal 0 direito de reenviar 0
jury a camara das suas délibéra çOes, se lhe parece ter elle
violado a lei sobre a prova. ..
Estes exemplos indicao 0 verdadéiro systema a seguir
1
, e os
preceitos a impôr aos jurados. Quizeramos pois que a les cri-
(SJB Vide algumas minuciosidàdes no meu Proc. crim. comp. p. 196.
(96) Vide o iirtiao mais desenvolvido do autor nos Novo* Arch. de dir,\
erim.
15»
rainai régulasse em tempo e lugar a admissSo dos diversos
meios de prova, assîm como o modo da sua administrae&o ; e
contivesse instracçOes preciosas, que pudessem guiar a
apreciaçao dos jurados lativamente ao credito maior ou menor
devido as provas produzidas na causa, instrucçOes emfim de
natureza perfeitamente analoga à doutrina dos criminalistas
inglezes. As regras dos Codigos da Àllemanha deveriao ser
inscfiptas na lei, mas modificadas no que ellas têm de abso-
luto; as quaes,em lugar deligar os jurados ,sômentelhes recom-
mendassem attençâo. Pela formula do seu juramento os jura-
dos deviao-se coraprometter a examinar as provas de confor-
midade com asinstrucçOeslegaes,e basear asua decisao sômente
no resuit ado deste exame. O texto da lei dévia ser mostrado a
cada um lies. Entao existiria nos debates uma especie de
medida da prova,k quai se refeririao constantemente a accusa-
saç&o e a defesa, invocando para ella toda a attençâo dos jura-
dos ; o présidente depois a recomraendaria a estes como guia
do seu exame das provas produzidas, e finalmente os proprios
jurados poderiao achar na sala das suas propriaa deliberaçoes,
graças a ella, um ponte de apoio solido. Séria dar o golpe de
morte ao funesto prejuizo,que quer que os jurados nunca devao
seguir senSo as suas impressOes mente; e à decisao proferida
na forma, que acabamos de indicar, teria certaroente a seu
favor toda a autoridade de uma sentença fundada em uma
apreciaçao racional dos elementos da convieçao.
Do que précède concluimos que, para obter toda a efficacia
possivel, o jury deve reunir certas condiçoes, cuja existencia
em Franc*, convém dizel-o, a lei nao garantio de mode
algum.
Séria necessario : 1.° que a sua lei organica admittisse
que délie fizesse parte os cidadaos reconhecidamente dotados
de luzes sufficientes, e desejando sinceramente o bero estar
1B3
do paiz (27,). A posse de uma fortuna consideravel faz ordina-
rimeote presumir os sentimentos de ordem e o- vivo interesse
pela causa publica; mas nao é essa a unica base, que se deve
tomar, pois que ha classes de cidad&os que (fazendo-se abs-
tracçao de toda a consideraçâo de fortuna ), pela superiori-
dade de sua educaçao dfto todas as garanti as desejaveis de
capacidade, e podem com toda razao ser alistados. Se todos os
nomes,que compoem a lista, sfto de individuos, que merecem a
confiança publica, se a sua coroposiçao foi feita sôraente com
as vistas do bem publico (38), finalmente se o direito de recu-
saçao foi amplo e liberalmente concedido ao accusado, pôde-se
acreditar que os jurados designados para cada causa estSo
sufficientemente habilitados para reconhecer e distinguir a
verdade, eque devem ter vontade de o fazer, ede exprimir logo
a sua sincera convicçfto: 2.°jâ demonstramos a necessidade
de dar instruceoes aos jurados em materia de prova, e toc&mos
nos pontos essenciaes. Elias formariao a segunda das condiçOes
requeridas para a boa organisaçao do jury, porque s6 ella pôde
extirparo funesto prejuizo de que os jurados tem a livre facul-
dade de nao cederem senfto as suas impressOes, aos seus capri-
chos, as suas inclinaçOes ; sô ellas p6dem garantir o exame, e
a apreciaçao racional das ptovas. Ha engano, repetimo-lo, em
cousidera-las impossiveis nos systemas do jury francez e in-
glez; na França, sob este ponto de vista, a instituiçao é sem
duvida uma degeneraçao do typo originario, e pôde facil-
mente tornar-se a harmonisar com este ; na Inglaterra o jury
tem sempre diante dosolhos as regras de prova fornecidaspela
common laïc, e sabemos que esta lei é sagrada da raesma sorte
que a lei escripta. Além disso o jury, como qualquer outra ins-
(27)
Vide a
dissevtaçâo
do autor,
Arch. do dir. crim.
t. 18, p. 224.
(28)
Vide a
dissevtaçâo na
nota 87.
20
#
4<Sl
tituiçao, ésusceptivel de progresso e de aperfeiçoamento ; por-
que razao n&o se haveria de conservai" eternaraente as formas
primitivas, e creadas em épocas em que nao ha via um corpo, e
nem espirito de systema na legislaçao, quando a se itea era
proferida pelos scabinos em massa, e livres de qualquer regra
de prova ? 0 legislador sabio deve aprqveitar a expe-riencia
dos tempos ; revestir as antigas iustituiço'es corn as formas
novas, que as ennobreçao.
3.o Para que o jury exerça uma influenoia benefica, é mister
que a lei pénal, sabendo achar o juste peso dos delictos, e a
justa proporçao entre estes e as penas, jamais décrète castigos
que revoltem, que venhao desmentir os progressos da civili-
saçao ; é mister que nao deixe pouca margera a- livre apre-
ciaç&o do juriz (29), pois que no caso contrario os jurados uo
moinento de votarem se occuparâo exclusivaraente corn a
pena, nao obstante todas as prohibiçOes legaes ; e para nao car-
regarem a sua consciencia.elivrarem o accusado de umacondem-
naçao, que achao excessiva, preferirâO a todo o risco declaral-o
nao culpado. Todas as absolvîçoes escandalosas pronunciadas
pelo jury na Inglaterra e na França tem por unica causa os
rigores da lei pénal (30). portante os legisladores no futuro deve-
riao imitar a nova lei frànceza (31),. que détermina snibmetter à
decisao dos jurados o quesito das circumstancias atténuantes, e
que, no caso de resposta affirmativa.obriga o tribunal a dirai-
nuir uroou mais gràos na pena (32). Entfto os jurados, para dar
satisfaçao ao grito da sua consciencia, nao sao mais obn-
(29) E' geralmente reconhecido em França que aa. pwt pelo *»g8£;
algumasvVzesexcessive provoeâo a absolviçaode mutecimm.°so| esabe-se muas
sâo os resultados de taes absolvîçoes. - De Gregôrj, erojecwi au Codlgo nal
universal, Paris 1832, p. 6.
(30) Vide as partienlaridades ouriosas a respeito em Wakefleld Documentas
relativos à applicacSo da pena de morte.
(31) Lei de 28 de Abril de 1882. art 5,7 e94.-de a dissertaçao do autor nos
Arch. de dir. Crim., t. 15, p. 340.
(32) Chauveau, Codigo nal progressif Comment, sobre a 1er modifi-
caliva, Paris.
\
155
gados a absolverem, quando existe a culpa; sabem com cer-
teza, que a pena sera immediatamente minorada, desde que
declararem simplesmente, que existem circumstancias atté-
nuantes.
4." Julganios absolutamente necessarios certes melhoramen-
tos especiaes quanto ao modo actual de formulât os quesitos :
o - quesito, o accusndo è culpado ? é muito generico, e tem
muito grande comprehensao, sem fallar dos seus outros incon-
venientes (33); indnz facilmente os jurados em erro, pois que
estes dizem que o accusado nao é culpado, ou porque os factos
nao lhes parao provados, ou porque nao lhes pareçao cons-
tituir um crime. Séria facil délies obter respostas mais posi-
tivas, e mais catbegoricas, se lhes fossem apresentados os
quesitos mais dîvididos, e mais especiaes, por exemplo : 1." os
actes imputados forfto praticados? 2 forao praticados nestas
ou naquellas circumstancias? 3.» o indiciado foi o seu autor, ou
nelles tomou parte ? 4." é elle culpado por tel-os praticado
rom malicia ou por imprudencia, e aqui algumas vezes devia-
se tarabem accrescentar o quesito do discernimento? 5." houve
circumstancias atténuantes ?
5." Pinalmente sao sobre tudo as instituOes politic, e o
grâo de cultura da n.5o,que constituera o verdadeiro valôr do
jury, (34). Para que este lance fecundas raizes,é-lhe necessario o
solo de um paiz politicamente independente, e previamente
aberto as idéas politicas; conhecendo os seus direitos, estando
decidido a niante-los e a fortifica-los, collocando-re ousada-
mente em face do poder, sempre prestes a desconftar de qual-
quer instituâo,que possa facilitar offensas contra a liberdade
dos cidadaos, é-lhe preciso um povo que tome vivo interesse
(33) Vide Golden' ua Revista da LegislaçSo estrangeira, t. 5, p. '!93. (84)
Vide a dissertaçâo do autor. Arch. novot, 1.13, p. 281.
156
nos negocios publiées, que saiba coraprehender o valôr lai
indepedencia nos juizes, e cuja educaçao esteja bastante adian-
tada,para que seja possivel em qualquer termo do processo haver
em seu seio numéro sufficientede jurados imparciaes. Compte-
hende-se agora o erro daqnelles, que considéra o ojurj como a
unica ou melhor forma possivelda justice,no que toca à tnves-
tigaçao da verdade,e a organisaGao material judiciaria ; erro
tao fréquente, quanto funesto. Como se estas formas, e esta
organisaçao judiciaria, perfeitamente adaptadas a constituiçâol
de um .povo, podessem ser com as mesmas vantagens trans-
plautadas para outro povo ; como se uma instituiç&o, que se
reconhece sabia nestas ou naquellas condiçôes, devesse semprej
ser considerada a unica. e a melhor possivel ï As instituiçoes
judiciarias, pa ra terem boni exito, tambem nécessitée do climat,
solo e cultura convenientes. Relativamente ao processo crimi-
nal. a melhor forma da justice é a que garante melhor à socie-
dade a puniç&o de todos os criminosos, a segurança dos inno-
centes, e que, merecendo a confiance gérai, fax com que o povo
reconheça, que as sentences proferidas sao a rigorosa expressao
da justice. Se esta confiança falha, a administraçao Ijudiciaria
torna-se impotente, e sem efficacia para a conserva-ç&o da lei.
da quai è ella a unica defensora. E" preciso pois estudar todas
as particularidades da vida polit ica de um povo, para poder
decidir, se elle deposita confiance illimitada nas sentences
proferidas por juizes regulares, e nomeados pelo poder ; se
considéra sob o mesmo ponto de vista os julgamentos em
materia civil, e em materia criminel ; se reconhece nos
magistrados a coragem e independencia nersessarias para ao-
roente seguir a linha recta das suas convicçôes no caso, em que
o poder irritado quizesse perseguir o juiz rigido observador da
lei do dever; é tambem necessario o mesmo estudo para saber,
se o povo, aproveitando toda a importancia politica do processo
criminal, expérimenta certos movimentos de inquietaçao
1K7
perante uraa seutença proferida por juizes régal ares ; se
reconhece, que frequentèmente os cidadaos pbdem ser victimas
de graves aceusoes politicas, e se coraprehende claramente
em qne posao critica deve acb.ar-.se o juiz, que, collocado entre
os desejos daquelles, dos quaes pende a sua fortnna, e o
perigo de uma decisâo em sentido contrario, deve receiar de
comprometter o seu accesso ; ou, mesnio no caso de nao ser
sujeito a demlssao, de ser degradado para outra residencia, e
em circumstaneias quasi tao funestas para elle, como se fosse
demittido ?
Mas o legislador, se vè e pensa justamente, se nao esta pos-
fuûdo da falsa rrença na existencia de uma forma typica e
absoluta, deve fugir de decidir prematuramente, se esses re-
ceios, se essas objecçôes, sâo ou nao bem fundados; e se o povo
nao manifestar o voto de vêr o jury estabelecer-se em seu
Iseio, se tiver confiança nos seus juizes, nao deve o legislador
em qualquer hypotbese preferir a primeira forma. A vez do
jury terâ chegado no dia, em que por elle clamarem, a voz
popular, as idéas e as instituOes politicas ; e entao immedia-
tamente poder-se- reconhecer quâo pouco fundadas sao as
aggressoes contra elle dirigidas. Estas, o dissemos, nao
podem ser procedentes, senao no caso em que o jury fosse
inaugurado em circnmstancias desfavoraveis ; em que a sua
organisaçao fosse gravemente defeituosa, e ma a legislaçao
pénal ; em que esta mesma legislaçfio tendesse a alimentar o
preiuizo, de que os jurados devem ser abandonados as suas
simples impressoes, a os sens sentimentos intimos, suppondo-se
nao existirem para elles aquellas regras da prova, que (mesmo
fazendo-se abstrao das leis positivas, que a tivessem consa-
grado) sao altamente reoommendadas pela sabedoria, e pela
experiencia, como os guias mais seguros para çhegar à ver-
dade.
As formas especiaes do processo, propriamente ditas, esta©
158
constantemente en» relaç&o necessaria corn o jury; de sorte qu
B« por exempta H pnnliridiide dos detWtes foi introdnr.ida em
atn povo, o lepislador A bem dnpressa fatalmente levado a
introduxir a nova institnir.no ; pois de outra sorte o que veriRo
n sor os juives régulait», dépendantes do poder, perante a
mnUidflo attenta n todo o andamento do processo, e psente a
sentenea (35)? (*)
(3T»i VM«- Umkm Draw* (o célèbre adversarto do jswa) n Arth <U
AfHfcr. te |> 4*1.
(M O nutor tt'->a c,m mnlto main d<M«Milvimflnlo, • eob todu M •»,
<la qnestio 4n rr (que nenba d* set lr«tafido esn Genova pot nim tel •in
tau, • BO Cantào 4t V«M pela eonetueiefe de 19 de Jnlho 4« 18*5). no piroc
rrim. eeean.. ». 1,esp. fi. <*. * na su:» obratji eitad*) sobre o n*b*u \i,ml, pic.
'<.• trdtnMn). 388—WO. O nuro ring parttdarlos do jary SUR «MU
oonetantetnente nu Alternant»» ; o (adit te* mais v*o deseppareceadn ne
prejuuoe a eete n«petV>- Quanto a»aut»r. elle julgaque opruess»» do jury
pAde com t'uin HeguraïK't «-onduilr à verdado mmo o dos jalne regulares.
MA ftrmpm« le convencido de que dia vit* etn que Institulçio sent lam-
bem inirodazids na Alternant)*» «alvo se os gafornos. for tndœ meio* «o
seu alcanoa. oouaegui Am asaegurar a con fiança public-i ma aenleaçw dos
jotMe por atlas instituido*. Antes dleao, o senso pntitieo vai-so deeenwl-
vend» cada ver. mais : o poder oa MUS «Mante* «A enentrao orearantea
deeconnaoeaa. e ee etn un» nagocio poliUoo ojnix regular pronuneia uma con-
demnaçAo, uteamo poneo sevnra, acha-ec logo «m flagrante contradicAo com a
opinilo;«tant» maisaa onuaaa andarem. quantomais defonaores terûojnry.
Alem disso o nrocawo oral e publieo. & medida que for mal» gerntmonto
«•ado posto em vigor, irA tendo tttn effet to pronuit eiado sobre o povo eusi-
nur-llie-hn a cotejar as deeisôes dosdebates. que tiverom lugar oa sua
pmeenea ; a epraciar por ai mesmo o vnlor das «entencas ; habitna-lo-hn,
flmtlmente A intelligents dos negocios crimes. por outro Iftdo o atttor
julga, que o jury ulo poder* dar as garantiaa. que constituom o seu poder.
senao quando houver no povo grand e numéro de cidadioa intelligentes,
firmes, a independentes. E* mister que moralmonte ne tenhaa certesa, de que n
maioria dos nomtft altstados siïo de homens intsressados na ordem, e u»
segurança publioa. o tombent prestes a tomar a défera da liberdade dos sens
eoncidadane. A conqwsiçïo do jury, pois, 6 oousa du mais alta impor-tiinciii :
sera a aorte, on a eecolha que decidira ? oa sera melhor adopter o s\ sienm
franoei* \ inaior parte dos pubticislas nllemàes préférera n net» o systemn
inglei. — Contessamos tanibem que mesm<> hoje todas us
«,
15»
CAPITULO XIV
EXAME DO SYSTEMA MIXTO, QUE CONFERE A ATTRIBUIÇAO DE
PROFEEIEA SENTENÇA A JUIZES OKDINAKIOS, MAS 3EM LHE3 TRAÇAB
REGRAS DE PROVA.
0 legislador, afîm de satiafar ambas as opiniGes contrarias,
tentou por vezes combinai- entre si as formas, que decorrem de
cada uma délias ; na esperança de obter dupla vantagem de
questôes nâo estâo complelamente esclarecidas. Que opiniSo précisa se potier â
formar do jury f Que resultados positivos se poderâ délie espérai- ? Sào
problemas, que certamente o futuro resolverà. Todavia pode-ae considerar o
jury sob dons pontos de vista : ou elle constitue uni tribunal de juizes que
reconbecem certas leis eni materia de prova. e nâo podem quando coude-mnâo.
entregar-se as impressôes arbitrarias do que se cliama a convicçào intima ; ou
nâo estâo sujeitos a regra algnma, e a sua unica lei é a intima convicçôo. Destas
dnas opiniôes contrarias, a primeira serve de prin-cipio fundamental aos jurys
inglez, escossez, e americano, a segunda ao jury francez. Citaremos com
relaçâo ao systema inglez : 1.° Reynolds, de vera Judicii jwratorum origine et
nalura, Heidelberg, 1822. O autor alii demonstra, p. 68, que na America os
jurados tomào sempre a lei da prova (lavo ofévidence) por base das suas
decisôes; 2°Greenleaf, Treaiïve on (he law of évidence (Tratado das leis da
prova/, Boston. 1844, que tiunbem demonstra, t. S, p. 60, que os jurados devem
obedecer a estas mesmas leis ; îl/'Coraisli, Manual ; 4.° Moymans, Légal Hand
book (Manuul de Dïreiio). Londres, 1843 : estes aie ensinâo as regras a seguir ;
emlim, 5." em urn notavel artigo da Law Hevieu), Londres 1845, n. 3, p. 28—
44, forâo sabia-mente deaenvolvidas as relaçôes entre as funcçôes dos juizen e
as dos jurados. Na America e un. Iuglaterra os jurados décide m segundo as
regras de lia muito sanccionadas pela razâo, pela experiencia e pela pratica
judiciaria ; chegâo sempre à convicçâo por via da logica : durante o curso do
processo a prova é debatida, tanto pelo aucusador como pelo accusado, por
todos os nieios, discutida em todas as suas partes, constanteineiile submet-tida
ao exame das regras ; estas o na mesma audiencia explicadas aos jurados
pelos juizes, que lues advertem, por exemple, que nâo se devem facilmente fiar
nas declaraçôes de um cumplice etc,; e finalmente, a sentença de condemnaçâo
pôde ser deferida aos quinze j uizes reunidos, os quaes examinâo se houve nu
nâo prova sufficiente. Nesle systema a sentença certamente reveste-se de um
caracter eminentenente grave, e as absol-
îeo
tal mistura, conferio, pois, a juizes regulares a attribuiçfio de
proferir a seutença sem dependencia de alguma theoria da
prova, que guiasse as suas apreciaçoes, e sem que fossem obri-
gados a raotivar as suas convicçfles, deixadas inteiramente
livres. Recentemente este aystema foi abraçado em todos os
estados, nos quaesse introduzio o processo criminal francez, mas
<lando-se aos juizes ordinarios as attribuiçOesdos jurados, porse
proscrever o jury, por exemplo, na Hollànda (1) e na Italia (2).
Taes sao tambem as disposiçOes da ordenaçâo criminal de Na-
viçôes arbitrai ias sâo tambem menos fréquentes. Na França nâo é assim :
os jurados nSo sao considerados como juizes submettidos a certas regras da
prova ; ahi se sustenta como axiotna, que o jury é a consciencta. do pois ;
mas, é preciso dizer, tal omnipotencia concedida ao que se chama a
oonvicçSo intima dà as sentenças alguma cousa de muito vago, e ao inesmo
tempo de muito arbitrarlo. A. este respeito, pois, parece preferivel o systema
inglez. Mas toda a duvida nâo versa sômente sobre isto: e o valôr e
efficaoia da instituiçâo dependom de uma multidâo de outras particulari-
dades de organisaçâo, cujo principio nâo foi ainda sufncientemente estudado.
Assim, dever-se-ha instituir nm jury especial em certes casos como na
Inglaterra, ou como na França em certa epoca ? Como deverâo ser formu-
lados os quesitos? Todos concordâo que a formula gérai, o accusado é
culpado, pecca por falta de precisSo ; e aie m disso de transviar o jury.
Dever-se-ha concéder aos jurados o direito de pronunciar uma decisSo es-
pecial, ou puramente de facto, como se pratica na Inglaterra ? Que influen-
cia dever-se-ha deixar-lhes na graduaçâo da pena? Poderâo elles declarar a
existencia das circunstancias atténuantes como na -Fiança, ou das cir-
cunstancias attenuantissimas. como em Genebra, as quaes ainda diminuem
nm grâo na pena? Decidirâo por simples maioria, como em França? ou
deverâo ser unanimes como na Iuglaterr* ? Todas estas graves questôes
devem ser completamente resolvidas, anles de se decidir em ultima ins-
tancia da superioridade do jury.
(Nota manuscripta do outor.J
(1) Vide, a respeito das alteraeôes que a legislâo franceza soffreo nos pai»
zes Baixos, Birnbaum, na Revista critica de jurisprudencia estrangeirq, t.
2, p. 4SI.
(2) Codice de Procedura pénale de 1807, art. 300 494.
«
pôles (3) ; e, se raerecem credito os documeutoa publia», qui»,
st tambem introduxir este systema na Prassia (4) ; e.
a Bberdadp das convicçoes do juiz constitue orna das dispo-
ilçoe* fundamrataes da récente lei, que régula a io
criminal no paix de Vaud (5).
Mas, appreasemo-nos a dixel-o, tal combinaç&o nlo pode sa*
tisfazer os votos da justiça : nao reprodux as vantagens da
jurisdicçao regolar baseada na theoria légal, e esta longe de
impôt silencio as voxes, que se elevfto a favor do jary. A aatu-
reza hybrida do systema (6 produs logo consequancias Fu-|
nés tas.
I.» Enganto-se redondamente, se esperao por esse meiovet
I reriver as vantagens politicas, que formlo oapanagio do jury;
o accusado aabe o que tem direito de esperar deste ; e 0 povo,|
assim como elle, nao ignora qne este tribunal reconbeceria bem
depressa todo o perigo, que uma injusta accusaçao faria correr
iftiiberdades ciricas ; eque se spresearia, na sua independen-
cia, a imparcialidade, em tomar o indiciado sob sua poderosa
protecçao ; mas no tal systema mixte, pelo contrario, so se v# j
niâtes assalariados pelo poder para proferirem a sentença, o
que bastaria para provocar a desconnancarai, e atetn disaaj
podendo livmnente seguir somente as suas eonriccOea, sein
A isayt *tts Pmwfcw m^méiti psasM est fffae tott DtttSkiH*.
Nasatl. tma *LWL
41 OURS, ANMfttrf* taslsff éat tet* fMr*Mri*WM. part. 1.0.6.
H Isl—S—là—i4m Pmmm jwwtf4s 18 daDw—itm> eSWKt (*)
,Rj Vuto S «anMim eMrgcaqwt HM dirige Fenrbach. M) «tas Conridtr*-
ft»f M*rv*SMettfMlMss«sral.t tif.fl.
O Rmotiteo lagar Jliiwni fjasa «OMtita*odcJSfciwthain deflnitivi»
m#ut# «Jurv ui> |«i« .te Vsmd VKW sapra a note manoacrita.
a
162
que délias se lhes peça^ contas. As descon fianças pois, longe de
ditninuirem, nao podera deixar de augmenter (1),
ÎJ.* Em vao se esperaria por outro feliz effeito do jury, isto
é, apparecer a sua sentença como a express&o do sentimento
publico. Graves motivos fazem com que os seus proprios adver-
sarios reconheç&o, que os delictos politicos, e os da imprensa
devéih ser-lhe deferidos. Confessao que, escolhidos os jurados
no seio do povo, e vivendo em contacto perpetuo com os seus
concidàdaos, estao, melhor do que outrés quaesquer juizes,
nocaSo de conhecer a opiniao coramum, quand'> se trata de
uma offensa â paz publica, de orna aggressfto crimi-noga
contra a sociedade, ou de qualqner outro crime de natu-reza
politica. E' preciso reconhecer ainda, que a sua sentença tanto
mais merece confiança, quantosabem perfeitamente, cir-|
cumspectos, prudentes, e familiarisados como estao com os
incidentes diarios da vida, distinguer o exercicio licito de um
direito constitucional, das offensas culpaveis à ordem social.
Mas nao se devera temer ao contrario, que os juizes regulares,
que tem pouca pratica da vida, e que muitas vezes nao vêm o
mundo, senao atravez dos muros do seu gabinete de estudo,
transportera para suas decisoes a parcialidade das suas vistss, e
que nelles nao possa a opiniao commum acnar um écho ?
3.° Nada é mais vacillante e incerlo do que a noçûo da
convicçao intima : algnmas vezes é nma palavra que serve
de véo as illusOes de um espirito leviano, ao attractivo da pai-
xao, ou de opinioes mal fundadas ; de sorte que dar ao juiz a
faculdade de decidir da culpabilidade dos seus concidàdaos li-
vremente, e sera dar contas dos seus motivos, é dar-lhe um
temivel direito de vida e morte, que jamais principe aïgum
possuio com tal extensao. Mas examinemos as cotisas de mais
(7) Hinsberjj. Recordôts, p. 8-
103
perto. Quando nfto ha nem confiss&o, e nem testemunhas, e
que o juiz pode condemnar por simples indicios, as suas pala-
vras nao terao o som da yoz do arbitrio, quando affirmarem
sem mais explicaçoes, que o accusado é culpado ? E o povo terà
confiança em tal condemnaç&o, proferida por simples suspectas,
por alguns magistrados nomeados pelo poder? Ninguem o
podérâ crer ? Entr étant o, mal da justa, cujos arestos n&o
obtiverera a approvaçao gérai ! Objecta-se que condemnando
tambem os jurados por simples indicios, porque se ha de recu-J
sar confiança a juizes honrados, fieis à sua miss&o, instruidos e
habeis ? Quem apresenta esta objeao, esquece que um tribunal
de juizes regulares jamais poderia offerecer ambas as
Lgarantias tao essenciaes, que dao ao jury a sua influencia de
confiança, isto é, o numéro de individuos que tom&o parte na
sentença e o amplo direito de recusaçao, que compete ao
accusado, e que faz com que os jurados apparao como juizes,
ou antes, como arbitras, cujas decisoes s&o por elle livremente
aceitas. O jury se eompoe de doze membros, e quando se refle-
cte que a sua unanimidade na Inglaterra, e que a maio-
ria pelo menos de sete votos em França, podem decidir a con-
demmaçâo , quando com esse nuro se compara o dos membros
de um tribunal allemao (seis juizes) no quai é suffioiente uraa
maioria de quatro votos, comprehende-se logo que.a decisao
dp jury deve inspirar mais confiança pelo facto de ser ella o
resultado de maior numéro de votos. O direito de recusaçao t
em ainda maior importancia. Nâo é bastante autorisar o indi-
ciado a reçu sar aquelle juiz mente, contra o quai puder ar-
ticular e firmar um motivo de recusao ; quanto maior liber-
dade se lhe deixar a este respeito, sem mesmo obrigal-o a
motivàr as suas conclusses, tanto mais razfto ter&o todoa de
acreditar, que elle tem inteira confiança naquelles, que n&o re-
cusou ; e mais se fortificarà a convicçao do publico, de que o
juiz deve ser necessariamente imparcial. Foi o que se reco-
164
nheceu no paiz de Vaud por occasiao da formaç&o da lei de
1832 (hoje àbrogada) sobre as basés do processo pénal (8). Nos
termos dessa lei o tribunal criminal se compunha de doze juizes,
sendo très nomeados pelo conselho d'Estado, très esco-lhidos
entre os présidentes dos tribunaes do districto, e os seis ultimos
erao juizes dos mesmos tribunaes. A lei tinha tambem designado
para todos os casos um numéro sufficiëntè de juizes supplentes.
Contra todos os juizes o accusado podia exercer p direito de
recusaçao motivada; mas alem disso podia exercer a recusaçao
absoluta contra um dos da primeira categoria, um dos da
segunda, e dous da terceira. Para a condemnaçao era preciso
baver maioria de très quartos (por consequencia 9 votos) ; a pena
era determinada pela simples maioria. Certamente esta
'ombinaçao constitue um progresso real, pois que a recusao *
absoluta pôde pelo menos effectuar-se contra quatro juizes, e é
pouco provavel, que entre doze haja mais de quatro contra os
quaeso accusado tenha desconfianças, que elle nao ousa articu-
lar, mas entretanto bastante graves para que nao se sujeite de
boa mente à sua jurisdiâo. Alem disso ,independentemente des-ta
faculdade, a recusaçao motivada lhe é permittida em relaçao aos
outros. Esta lei dava sein duvida bastantes garantias à de-feza ;
mas estava longe de preencher as lacunas, que constï-tuem o
vicio inhérente ao aystema, de que nos occuparoos, nao obstante
diminui-las o melhor pessivel.
4.° O que se entende pelas palavras intima côhvicçâo appli- -
cadas ao jury, nao pôdeser applicado da mesma sorte a juizes
regulares. Sahidos do meio dos seus considadaos, cujas 'opi-
niôes conhecem ; familiarisados com as exigencias da vida so-
cial,
;
occupando por posiçao e por dever um lugar mais proxi-mo
do accusado e das testemunhas, e tendo por isto, melbo
r
do que
ninguem, o meio de apreciar exactamente a veracidade
(8) Lei, cap. VIII. art. 71—74.
tes
e os gestos de uns e outros; forçados de alguma sorte, depois de
voltarern para ao seio dos seus concidadaos ao sahirem da audi-
encia, a darem contas severaa das suasdecisûes, osjurâdos cer-
tain ente para julgarem de facto estâo em uma situaçao das
mais vantajosas, e a sua sentea, baseada na sua intima con-
viâo , toma um caracter notavel de veracidade ; nao sendo
mais do que um testemnnho emanado dos concidadaos do in-
diciado. Masassim nao é em relaçao aos juizes regulares, ea
sua sentença nao pode obter omesmo resultado (9). Ainda o re-
petimos: os juizes regulares, pelo seu comroercio corn oslivros, e
nao com os homens, estao demasiadamente isolados dos seus
concidadaos, para que as suas sentenças possao satisfazer pie-,
I na e inteiramente, ainda que alléguera ter plena convicçao '.
e nalmente a sua posao no Estado, muïto' divers» da dos
jurados, oppOe-se tambem a isso.
5." Entretanto nao se pode negar que exista em muitos jui-]
zes a par da sciencia juridica, inhérente â sua instituiçio,
tanta habilidade pratica para discernir os factos verdadeiros
com o auxilio das provas apresentadas, tanta sinceridade e
fidelidade ao seu dever, como frequentemente em muitos jura-
dos inhabeis, e nao cultivados, e cujas funoes dependem do
acaso ; mas séria pouco razoavel o querer estabelecer entre uns
e outros comparaçoes de homem a horoem. O que é preciso ter
em vista, é a propria instituiçao, tal como a lei a organisou ; e
passando-se a este exame, reconhece-se que, para que um
tribunal de juizes regulares possa conquistar a confiança do
povo, é mister que os mesmos nao possao sahir de certos limites,
que o legisladorfixou-lb.es no interesse da innocencia ; é mister
que uma theoria da prova baseada na experiencia dos
(9) 0 proprio Oai'miguaui é forçado ao concordai' nitto, t, 4, p. 307.
160
séculos os guie nas suas investigaçoes, moti vendu eues as suas
sêntenças ; é mister finalmente que a sua decisao possa, que-
rendo o accùsado, ser submettida à appreciaç&o de um tribunal
superior. A obrigaçfto de motivar a seutença offerece vanta -
gens incalculaveis. Quem por muit-j tempo fez parte de um
tribunal sâbe de que formas diverses se revente o voto de um
juiz, e quanto melhor fundamentado parece, quando o juiz é
obrigado a ex por os seus motivos. Alem disso etn um système
légal da prova berà organisado elle acha um guia seguro das
suas apreciaçOes ; e previnem-sé muitos julgamentos temèra-
rios, obrigando-o a dar contas das suas convicçOes. Mas é o
accùsado quem mais ganha com tudo isso ; 6s motivos do jul-
gamento fazem-»lhe descobrir as lacunas da sua defeza, * e
mostrao-lhe as bases, nas quaes deverà appoiar a sua appel-
laçao. Nfto podemos deixar de repetir o que je. tivemos occâsiào
de dizer a respeito : se o legislador permitte ao juiz, que pôssa
condemnar pela sua simples convicçao, répudia sera motivo
todas estas vantagens ; porque o magistrado na occasifto de
voter nâo tem senfto uraa palavra a dizer, e ê, que esta conven-
cido ; nada faz conhecer os motivos da sua convicçao, que nfto
poderiào alem disso ser articulados em uma sentence, cujos
termos fossem somente dictados pela intima convicçao. Nés te
caso tambem o recurso de appellaçao nfto é admissivel ; como
poderifto os juizes da segunda instancia conhecer a justice ou
injustice da sentence proferida pelas conviçoes intimas dos
daprimeira ? e como conceber uma sentence de reforma, se m
que esta explique o erro dos primeiros juizes ? Haveria luta
entre duas convicçOes, e nada mais. Creraos ter demonstrado
que, para que um tribunal composto de juizes regulares possa
preferir sentences, que obtenhfto o assenso gérai, é mister éviter
todas essas tentativas de rais tu ras impossiveis, e a destrui-cao
dos caractères essenciaes, que constituera garanti as e appelles à
confiance, que nada poderia snpprir.
M&7
CAPITULO XV
DAS PONTES DÀ CRRTKZA. "
Quando diariamente se indaga quaes sfto os motivos déter-
minantes das nossas convicçoes em relfto à exiatencia de um
facto, quaes s&o aquelles, que, approvados pela experiencia dos
tempos, servem de guia aos juizos dos homens realmente pru-
dentes, chega-se logo ao ponto de considérai* o teatemunho dos
sentidos, como a verdadeira. e unica fonte da certeza. (1) Dia-
riamente temos a prôva da realidade dos objectai, que cahem
soi» os nossos sentidos. quando a impressSo experimentada esta
em harmon perfeita com esses objectas exteriores ; e como
aereditarnos. pelo que nos toca, que a observaeïlo pelos sentidos
géra a certeza ; segue-se, que tambem aereditarnos nos nossos
semelnantes, quando se baseao nas suas observaçûes pessoaes; e
por isso a confiss&o e a prova testemunhal convencem-nos. Com -
prehender-se-ha agora, porque muitas vezes o processocrimiual
nSo admitte, como provas complétas, senao aquellas, que pro-
dera da evidencia material directe ; como effeito s6 ellas pare-
cem de natnreza a formar a certeza (2), em quanto que outras
provas (osindicios por exemple), as quaes tem sido algumas
vezes admittidas, parecem o poder jamais fazer plena de-
raonstraç&o (3).
Mas levar esta doutrina a consequencias tâo riguvusas, séria ir
(1) Klein, Annaes de Legisl. t. 2fi, p. H. —Rolin de f'robot, délie t. p. 23. —
OolmanD, Tratado de Direito pénal p. 811.
(2) Gmelin, Da AdministraçSo da Juniça crim. nos pequenot r$ladut p. 152.
(3) Carmignani, Leggi délia Sicorezza, t. 4. p. 178.
168
muito longe talvez (4) ; a nossa crença nao se firma sômente
no testemunbû dos nossos sentidos, pois que teraos tambem
nas affirmaçOes da nossa razao, quando esta examina e con-
clue conforme os sentidos, e quando a certeza se forma em
nosso espirito, guiado pelos meios puramente logicos.
1 .* Entre estes meios fundamentaes (5), deve-se collocar em
primeiro lugar a condusào do possivel ao r&al. Quanto mais as
imagens transmittidas pelos sentidos estiverem em perfeita
harmonia com as nossas idéas do possivel, tanto mais nos in-
clinamos a considera-las como a realidade. Pelo contrario,
sempre que os nossos sentidos forem impressionados por um
phenomeno extr aordinario, e incomprehensivel, a du vida se
opéra em nosso espirito, somos levados a nao ver senao uma
illusao nestas imagens sensiveis. Quando vemos um homem
apontar para outro uma arma de fogo, em uma distancia, em
que a experiencia nosdizia nao poder a bala alcançar os objec-
tos, e fazel-o cahir morto, perguntamos a nos mesmos, se o
autor da morte foi aquelle com o tiro, que disparou sobre a vic-
tima, e nao saberaos como conciliai- o que vemos com o resul-
tado das nossas experiencias anteriores. Damesma sorte quan~
do se nos vem dizer, que um homicidio foi perpetrado por um
individuo de procedimento irreprehensivel, e que nenhum
interesse tinba em commetter o crime, começamos por descon-
fiar da verdade de tal noticia.
2.° Outro metbodo frequentemente, applicado pelo racioci-
nio a apreciaçao dosfactos, é a conclusâo por via da analogia
(ô), isto é, a conclusâo de uni caso para outro semelbante.
(4) Neste sentido é com razSo que Globig na sua Theoria das ProbabUida-
des, Part.. p. 87, classifioa a evidencia material na classe das conclusses
ordinarias.
(6) Globig. Theoria. Part., p. 20, etc. etc. M
(6) Globig, Theoria, part. p. 85,
169
Quanto mais exacta fôr a semelhança, quanto mais fréquente e
uniforme ella fôr, tanto mais convencidos nos sentimos. Um
individuo se mostra animado do mais violento odio contra outro ;
procura-o com o punhal na mfto proferindo ameaças de morte :
ve-se-o precipitar-se na residencia do seu inimigo, e depois sahir ;
e nella se acha o cadaver deste, a quem aquelle procurava ; nao
obstante nao se estar présente ao encontro do assassino com a sua
victima, é impossivel nao se ter a convic-j ç&o, de que o autor do
crime foi aquelle, que foi visto entrar na| casa da victima.
3.° Ha finalmente a conclusâo tirada das circumstancias para
o facto principal, quando estas circumstancias se encon-trfto de
ordinario em compléta relaçao com elle (7). Um arma-rio foi
aberto em uma casa com habilidade e destreza notaveis: depois
foi consumado um TOUDO ; posteriorroente vem-se a sa-ber, que
um homem de elevada estatura, conhecido pela sua maravilhosa
destreza em abrir assim as fechaduras, foi visto naquelles lugares
pouco tempo antes do crime : acredita-se logo com fundamento,
que elle tomou parte no roubo.
O espirito, pois, nao acha satisfaçao compléta, e a certeza nao
se forma nelle, senao quando, applicando alei doraciocinio aos
fesultados fornecidos pela 'observaç&o dos sentidos, encon-tra a
concordancia, e a harmonia, que o sedusem. E mesmo nos caeos,
em que por habito damos pleno credito ao testemunho dos
nossos sentidos, proceder-se-ha com prudencia em recorrer ao
critérium da razao, e nao decidir-se senao depois de maduro
exame das razOes pro e contra. Este methodo deve ser applicado
principalmente as materias criminaes, nas quaes o juiz, ainda
quando se convença pela inspecçao ocular do corpo de delicto,
jamais pode affirmar a existencia do acto criminoso, mas so-
(7) Globig. Theoria. 4. c., p. 68,
22
17 O
mente os seus reaultados (8) ; e somente por via de conclusse é
que elle pode chegar a couhecer, de que modo foi commettido
o crime, e quaes for&o os seus instrumentes, etc. etc. Quanto
ao juiz definitivo, forçado a decidir-se somente pelas peças dos
autos, nao tem, para guiar a sua certeza, nem mesmo a recor-
daçao do que ,vio, .porque s6 o magigtrado inatrûctor foi quero
procedeu à inspeeçao ocular. Se elle acredita firmemente nu
processo verbal da vestoria forraado por este ultimo, é porque
tem plena confiança na sua integridade, e na fidelidade das
particularidades por elle reveladas. Quando as provas appoiao-
se na evideia materiai mediata, na confiseao, no depoimento
de testemunhas, nao se pode affirmar ser essa evidençia media-
ta, que produz a certeza, mas antes as razOes, que milit&o no
espirito do juiz no sentido de leva-lo a prestar credito as affir-
maçOes deterceiros, que vem attestar, que os factos imputadps
cahirao sob a observaçao dos seus sentidos. Por affirmar um in-
dividuo—•eu vi A apimhalar B, o juiz s6 porissonao se decidirà
a condemnar ; e se o faz, é principalmente porque considéra a
testemunha digua de fé ; porque considéra que ella foi espec-
tadorado facto, e acredita ter ella a firme vontade d,e dizer a
verdade : porque o seu depoimento lue parece ao mesmo tempo
possivel, e verosimil ; porque ha concordaneia perfeita entre o
seu depoimento, as circumstancias materiaes, e os outros de.
poimentos prestados. O mesmo se deve dizer a respeito da con-
fissao ; se esta raerece credito, é por causa de uma multidao de
consideraçOes, que se encadeiao no espirito do juiz ; e séria
erro susteotar-se,, neste paso e em outros, que a certeza sô é
produzida pela evidençia materiai. Alem disso, nao se sabe que
ordinariamente as testemunhas nao podem affirmar terem
assistido â perpetraçao compléta do facto principal constituti-
vo do crime ? Figureraos a hypothèse de um assassinat» com-
(8) Zeiller, Awnaes de Jurisprudencia austriaca t. 2, p. 184,
in
mettido em unla" tixa ; se se dividir e desmembrar os depoi-
mentos das di versas testemunhas, ver-se-ha por fim que as suas
proprias assérçQes, e algumasvezes a certeza do juiz nao se ba-
sêao senao em presumpçôes
1
fundamentadas. Com effeito; virâo
declatar terem visto A lançar-se na briga com o punhal
levautado ; depois B cahir ferido, e ensanguentada, e te-lo ou-
vido gritar A tnatou-me. Assim formulada, a prova ria
compléta (9), e entretanto as tegemunhas nao virao A dar o
golpe mortal em B ; mas ellas deviao presumi-lo, nao permit-
tindo a situaç&o das cousas outra conjectura; e ouviudo-as, o
juiz sente a sua consciencia segura. O proprio juia, quando
suppoe condemnar conforme a evidencia material, que imagina
conter-se nas declaraçoes das testemnnhas, condemna entre-
tanto por umaevidencia da raaao.E' erronea, pois, a distincçao
que se tem feito, separando o que se chama prova artificial,
ou prova sultante do concurso, e da-harmonia das circums-
tancias, da prova natural, que ria o producto do exame ocu-
lar, dos depoimentos das testemnnhas ou da conss&o. Entre
ellas nao ha a differença pronunciada, que se tem julgado ba-
ver, e mais acerto nao se tem mostrado, recusando-se força
probatoria aos indicios, como nao podendo constituir a eviden-
cia material. As verdadeiras bases da certeza sao, tantoa cm-
fiança na fidelidade dos nossos sentidos, como no poder do ra-
ciocinio, que, tomando as experiencias anteriores por ponto de
comparaçao, com ellas coteja, como medida certa, os factos,
cuj a realidade trata elle de apreciar.
A certeza se forma em nos de dous modos : directamente,
quando as nossas sensaçôes pessoaes nos transmittem a imagem
do objecto ; e indirectamante, quando a sua existencia nos é
certificado por terceiros, que assegurao terem experimentado
(9) De Feuerbach, Causas memorais, t. 3, p. 638.
VXA*
a re&lidade do que afftrmao, ou que tt8o affirroao senfto csrtos
faotos parciees, mas cuja existeûcia e nature» fiuem logo
coneluir a existencia do facto principal em questfto. Sempre
que as relaçôes de uni a outro facto permit tem estas] especies
é% înferencias, cuja origem exposerons, • fc uestes mesmos
fados que a nuao, fortiticada com a experieûcia adquirida>
basea e détermina a sua certes* : tomao 10 a denominarfto de
indtfù% a de «mfcfcfr (10), « parecem mostrar com o dedoo
facto principal corrélative, Ainda «qui «i eneontra a dupla
iufluencia da evidencia dos seutidoa, e da evidencia raxao,
salva a seguinte diffère noa : qn&n-do se irata de provas
crdinarias, que se basèao sàmplesmen-te na évident»* material
médiate, a racao *ente-ee couven-cidn, com tente que os
terceitos. que vera depor sobre o que observa rao, mereçao que
sa de crédite as suas palavras, e que a experiencte nos diga. que
os factos referidos este» em petfeite harmonie com AS nossas
idéas do possivei» e| do verosinùl ; quando pelo contrario se
trata dos iudicios, coaio fonte de «eetteaa, a raxfto deve logo
eutregar-se a investigfies mais complieadas, autos de poder
dar-se por satisfeita. S" rais-ter ver em primeiro lugar por um
exame mais severo, se as re-laçties. que derivao destes iudicios.
nie podem ter outra expli-caeao diverse da procnrada j e para
faciliter este exame, co vem dar an cnlpado. segundo os
iudicios, oa meios, de justifie»-cao os mais amples (oomo por
exempta no caso de ter sido aehs>-do no lugar do crime um*
instrumente, que lue pertëneessë). Toda a direeeao por elle
indkada deve ser seguida a%6 ao fia, ; porque pôde aoontecer
que se chegue a res\jltedos tontrarios daqnelles, que derivao dos
dados da primitive imputeçUo : os resultedosdeste ïnvestïgacSo
lbe serso sempre communieados. afim de que desfaça as
duvidas, se lhe for possivel. ou possâ produzir novas
jnstificaçôes; mas, se apezar de todas estes in-
(10* thiielin, Dit AAmtmsttHre»* JusUpa peaai, p. S6.
1T3
vestigaçôes, dos seus «forces para se disculpar a6 resultao
mentiras ou impossïbilidades, se se chega ao ponto de nao poder
elle mais nada oppor com procedencia ao Systems funda-
mentado da accasaeao: entao a con vicçao se opère no espiritn ;
ha relaçao évidente de criminalidade entre elle e o facto.
Nao é tudo : a razao, levando as suas investigaçoes mais
longe, quer ver ainda corroboradas na especie estas relaccès, nao
pelas circumstancias accessorias dos factos. corao pela
conclusao do possivel ao real, no sentido de poder admittir
plenaro
en
te. que o accusado commetteo o acto imputado.
Enfim a razao quer achar entre os indicios uma concordan-cia
tal, que seja necessario absolut»mente, ou ter por certa a
perpetraçâo do facto pelo accusado, corao sua consequencia
direct» e necessaria, on lançar-ee no mundo do maravilhoso, e do
inverosimil, segundo o curso ordinario, das cotisas. Appliquemos
aqui a definiçao de certeza, que démos acima (Cap. Vil) : para
que o nosso espirito sinta a formar-se, deve achar-se em uma
situaçao tal, que a concordancia perfeita dos raotivos da
realidade faça totalmente desapparecer todos os motivos, que
poderiao fazer admittir o contrario. Portanto, -se depuis das mais
couscienciosas investigaçûes vè-se surgirem numerosas razôes
affirmativas e fortes, tendo a sua >rigeni na experiencio diaria
dosacontecirnentos. e dos actos humanos; se alem disso tudo se
fez para poder acreditar a inesmo na possibilidade do
contrario, nâu se pode negar, que a irnpressfto em nos produsida
por todas estas razGes é a certeza. Esta irnpressfto é-nos
communicada pelos indicios tarabem, -issitri corao quai quer
outra prova; e, a menos que nao se queira antes ex-plica-los por
hypothèses extraordinarias, e recusar a admittir a experiencia de
todos os dias, é impossivel abafar em nos a convicçAo da
culpabilidade de um iudiciado, quando ella résulta do seu
perfeito concurso na causa. (11)
fl'lj Vide o Proreito crim. eomp. t, 2, cap. 177. e seg. 181 6 182.
1T4
CAPITULO XV (BIS)
DOS MBIOS DA PROVA
Se é verdade que adrainistrar a prova ou constituir'» oer-l
teza é tender a» mesmo thn, deve ser tambem verdade, que todos
osmeios de produrir a certeza sao tambem meios dé prota. I*d-
de-se claasiftcar estes raeios em di versas cathegoTiss.
1.* HH a evidftncin materiat résultante da obsenraçto pes-
soal do juiz; inclue-ee ttesta classe a impecçno, ou wrificaç&o\
judiciaria.
2.* Inelue-se ordinnriaraente na mesma classe a prova pur
ejper/fw, no caso do jtris, procedendo em pessoa à inspafto
ocular, faxer-ae acompanhar de expertos sômente a titulo de|
auxiliares, e como para ajudar os seus sentidos, quando fosse
sempre duvioosa a efficacia de sua-s observaçoes, se os seus
«entidos nao tivessem taes auxiliares. Mas, apressemo-nos em
ldiae-lo, tal sysme é iciojn: os expertos em todo o éaso e*
minao por si mesmos ; e se se trata por exemplo de sonder a
pmfiindidade das feridas, de verificnr a forma, e o estado das
suas bordas, o exame do juiz é nullo e itnpo**ivel. parque nftn p-
Vh» «9e «r habil obaervador em tal mnteria ; sao «'«ment** os
Xpert'*, que, applicando a tal inspeccRo os proeeaao» 4a sua
larte, transmittero ao juiz os seus resnltados, que este nao eo»
nbece real mente sen&o pelo seu intermedio. E como nno espéra
délies mente um exame, mas tambem nm Hatorio, mai» «e |
orna impossivel, qnando se rcfleete, sustenter que o jtris
observa por si roesmo; este nada conclue por si, quattdo os
expertos affirmBo, que as feridas sao mortaes, on que o aamasi-
nato foi eonnummado coin o auxilio do veneno. A prova por |v j
rito* pois orna prova toda «spécial, que 4 preciso nao estv
fundir mm aquella. que résulta da insperrft'» do juiz ; «m um
k;..- caso tairas, qnando este examina an nHMmo tatnpo que
quelli"», la uééa âiwar que o§ en** proprio* olboa lar iramntoat
1TÎ5
a sinceridade da vestoria: mas em todos os outres a força proba-
toria desta appoia-se, ou na evidencia material aifirmada pelos
peritos conforme as observaçOes por elles feitas, ou na cou-
fiança, que inspirao as experiencias scientificas, e artisticas,
de que fizerao uso, ou finalmente na confiance,, que elles pro-
prios inspirao ; porque é por se os julgar habeis, que se pôde
acreditar, que forao bem applicados os processus da arte, que
as suas observaçoes sao complétas, fieis aos verdadeiros prin-
cipios e as leis da sciencia, e as suas conclusses conséquentes,
racionaes e exactas. Portan, analysando-se este genero de
prova, reconnece-se que a sua força side em puras presum-
ôes, e que é por basear-se nellas que o juiz se eonvence, que
os expertes acharao a verdade.
3.° A confissâo do indiciado tem sido tambem considerada
como um meio de prova emanado da evidencia material, mas
da evidencia mediata ; coraprehendemos que esta opiniao pa-
ra especiosa, para quem considéra a confissao como um teste
munho prestado sobre simesmo (!) : nada mais natural do que
acreditar no indiciado, que se fère as observaçOes dos seus
proprios sentidos, elle que, melhor do que ninguem, possue
o segredo de todos os pormenores do crime ; entretauto nao é
exacto suppôr, que este teste'munho forme a convicçao do juiz ;
alias toda a convicçao, qualquer que ella fosse, deveria forma-
la ; neste caso, como demonstrareraos mais tarde (2), a
coufiança do magistrado dériva tambem de deducçoes, e de infe-
rencias fundameuiadas; espontaneamente, e sem reflexao, nao se
poderia acreditar em um homem, que falla contra os seus in-
*
(1) Decisden do Tribunal de appellaçBo, de Parchim, publicadas por Net-
telbladt, 1« parte, p. 76.
(2) Vide o Procès, erim. comp. do antor, t. 2, cap. 161.
!TO
teresses, e qùë Oflo é levado à fafcè&b pb> vantagem aigu ma
proxima é preciso qttë 6' raciocinio nos mostre na confissao
do crime o effeito ptovidencial do grito da consciencia : e
quando o magistradb déclara flnalmente, 'que o accusado deve
ser acreditado, que as circunstancias contidae na confiss&o ptf*
1
!
recem vërbsimëis,* que estao em perfeita harmonia com as
constantes dos autos, é semprepor meio do raciocinio, c[ûè elle
fhega à firmar a sëntença.
4.o A mesma cousa se deve dir da prova testemunhal. A*
pfimeira vista parece, que as testemunhas fazem prova, por
se appoiarem nas suas observaçOes pessoaes ; mas, reflectindo-l
se com mais attençfto, percebe-se logo uma cadeia de itiducçOes.
pelas quaes o nosso espirito deve passar antes de chegar a conil
vencer-se -. é preciso em primeiro lugàr presumir, que as tes
temunhas ooservarao exactamente os factos; que a memotia
Ihes ficou fiel, e que dizem tudo o que sabem, e nada mais do
que sabem. Portante, affirmar que as testemunhas merecem
credito, é consagrar os resultados de um raciocinio por via de
inducçao ; para aqûellés, que s6 considerao possivel a prova
testemunhal, quando ha acôrdo nos depoimentos de duas tes
temunhas, é aiuda o raciocinio, que permitte julgar desse
acôrdo ; finalraente a mesma cousa acontece em ''grande parte,
quando graves e poderosos raotivos vem fixar a attençfto do
juiz, nfto obstante cada um déliés dar lugar a suspeitas.
\
5.» Mas quando se chega ao meio da prova résultante do
concurso de indiâos, a duvida nem mais um instante é possi-
vel. Ja demonstramos (cap. 15) que é um erro suppôr ser a
evidencia material a unica fonte da certeza ; os indicios de-
monstrfto sem replica, que o espirito, por mais sève» e timido
que seja, pôde por si mesmo adquirir plena e inteira convicçfto,
desde que nfto se desviar de certos limites prescriptos pela
prudencia.
6.o Os documentos e os titulos podem ser contados entre os
1T?
meios ou fontes da prova ; mas, sob nraitas relaçOes, é mister
mostrar-se ciroumspecto no effeito, que se lhes attribue; quando
délies fallarmos mais especialmente, ver-se-ba, que jamais podem
por si provar contra o accuaado a materialidade ,do crime ; que
esta prova é sempre secundaria, no sentido de nao poder ser
administrada senao com o auxilio da confiasao, ou da prova
testemunbal ; que, se fazem prova na maior parte dos casos, é.
com o auxilio de inducçGes, as quaes fornecem um ponto de
partida. Entretanto séria erro nao considera-los como uma fonte
de prova ; porque : 1., a sua importancia é grande, quando se trata
da verificaçao do ponto de facto (documentes) ; 2°, o effeito dos
instrumentas publi é por todos reconbecido ; e os proprios
documentes particulares podem trazer sensiveis modificaçGes ao
modo de administrer a prova. 7.o No direito criminal commum da
Mlemanba o jura-mento, ou uma das suas formas sômente, o
juramento purga-torio, pôde ser classificado entre as provas ;
porque o juiz allem&o tem o direito de tomar por motivos da sua
decisao as explicaçoes do accusado por elle corroboradas (3).
Citaremos sô um exemplo : a doutrina e as legislaçOes locaes
muitas vezes vao até ao ponto de autorizar a condemnaçfto, se o
accusado récusa prestar este juramento uma vez deferido. Mas
sendo o.legislador prudente, e dando à sua tbeoria da prova as
unicas bases, que a razao consagra, nao deve inscrever nos
codigos o juramento purgatorio, senao quando muito como um
simples meio de deasâo. Desejaraos fazer conhecer o systema do
direito commum allemao em materia de prova ; por isso julgamo-
nos obrigados a entrar mais tarde em alguns desen-volvimentos
sobre esta questao do juramento; porém, apresse-mo-nos desde jà
em dize-lo, a sa raz&o jamais reconbecerâ nelle uma fonte real de
prova.
(3) Vide o Procès, critn. «omp., t. 2, cap. 184185.
23
1*8
AppareceU recentemente uma tf?a controversia sobre o nu-
méro dos meios da prova, e sobre a distincçao entre estas ez~\
pressées eos inotiws deprova. A seiencia pouco tem a ganhar
com taes investiraçOes, que com razao forEo qùalificadas de
paras subtilezas (4). Para o juiz ellas sao sem valor, e n&o
vemos, que interesse possa haver em reconhecer com Gensler
na prova testemunhal (5) um meio de prova, a sàbér a teste-
muriha ; um moHvo positivo de prova, a saber o seu depoi-
mento', e um motivo juridico, a saber o que 6 juiz colhe para a
sua convicçâo como vnagist/rado.
No sentido légal os meios de prova, ou em uma palavra as
provas, 8&o as fontes, das quaes o juiz tira os motivos de con-
viccao, que a lei déclara sufficientes para délies emanar na-
turalmente a sentença (6), sendo applicados aos factos cons-
tantes da causa. Mas quaes as provas que devem ser adraitti-
das pelas legislaçOes bem ordenadas ? Este é tambem um
assumpto de discussOes inesgotaveis. Tem-se chegado até ao
ponto de indagar, se os indidos, mesmo irrecusaveis e no caso
de coucurso, podera ser classificados entre as provas ; porque
contestar o seu poder, n&o xecouhece-los como fonte de certeza,
é ao mesmo tempo risca-los da lista dos meios de prova. Final-
mente, conforme o ponto de vista, em que se colloque, pode-se
conservar na classe das provas, ou délia repellir, os docwnen~
tos. Julgamos nesta parte, como mais acima, que taes dis-
cussOes sEo total mente inuteis para a justiça, para o triumpbo
da verdade ; contentemo-nos em estudar profundamente a na-
tureza das diversas provas, e sera bastante em todos os casos.
(4) Muhlenbruch, Esboço do procetto civil, p. 154, na nota.
(5) Archivot da jurisprudencia civil, 1* parte; p. 29 e 40.
(6) E' por isso que o Codigo pénal bavaro, 3* parte, art. 260, détermina os
meios da prova, nos quaes o juiz é autorisado a basear a sentença de con-
demnaçâo.
VT9
CAPITULO XVI
DAS DIVISÔES DA PROVA, E MAIS ESRECIALMENTE DA PROVA
PEHFBITA E IMPERFEITA, NATURAL E ARTlÈlCIAL
Quando se à palavfa prova o mesmo sentido que à pala-
vra certeza, dâ-se azo'aos adversarios da theoria légal da prova
(1), e estes tratao de ridicularisar o systemà usado na
Allemanha, e zombar das divisOes, que elle parece comportar
(a meia prova, a prova mais que rneia). Se ta] fosse a signi-
ficaçao real destas divisOes, se se tivesse em mente considèrar
a prova como uma unidade mathematica, que depois se vi-
disse em fracçOes designa.es, as criticas seriao tambem fun-
dadas (2) ; mas, é mister dize-lo, quando os antigos juriscon-f
ultos começarao a fallar na semiplena probatio (3), e quandu os
modernos praxistas empregarao o termo de prova imperfeita
(4J sô quiserao définir o caso de, nao se tendo podido produzir
prova compta, e nao podendo a certeza dimanar do complexo
dos motivos da oonvicçao produzidos, existirem entretanto
esies, depois da instrucçao terminada, em sufficiente numéro,
e bastante graves, para que uma prevençao pareça sufficiente
e verosimil. Nao ha duvida que foi em materia civil (5) que
primeiro se fez sentir a necessidade de determinar os casos
precisos ; de fixai ao juiz pontos assignalados, que Ihe indicas-
(1) Meyer, Espirilo, Origem etc., liv. 2, cap. 14.
(5) Elscesser sobre a seguinte questâo . A verdade voie sor gradùada ? nas
Inoestigaçôes. jwridicas, por Gmelia et Elscesser, t. 2, p. 182.
(3) Vide Bonifacius de Maleficiis, cap. de Probat. — 3. Clarus, SenltM.Î liv.
5. qucBst.;63 v. 9.
(4) Vide ainrla Quistorp, Principiot,§Ç>1%; Steiger,MiscelUmea,Mayenca,
1819 n. 1 ; Tittman, Manual, III § 840.
(5) Schneider, Doutrina do. prova, p. 408.
18©
Rem o momento, em que fosse ceesario deferir o juramento
quando por exemplo, por nao ter podido uma das parte» pro-
dnzir uma unica testemunha, elle annula em deferir-lhe o
juramento suppletorio ; foi ent&o que apparecerao as ex-
pressOes —- meia prova. e prova mais que meia ; as quaes
forao bem depressa usadas em materia criminal ; quer porque
muitas vezes no curso do processo era necessaria a existencia
de certas presumpçoes contra o accuaado para justificar o em-
prego de um dos meios do processo, a applicaçao da tortura,
a priaao, a vestoria domiciliaria, ou finalmente a instrucçao,
eapecial etc. (6) ; quer porque o juiz se julgava autorisado, no
caso de presumpçaes véhémentes, a pronunciar contra o indi-
ciado, sem todavia o condemnar, uma sentença desfavoravel,
a deferir-lhe o juramento purgatorio flj ou a absolve-lo sim
ples! da instancia [absolutio ab inttantia) (B). Todos este#
meios de processo forao depois incluidos no que se chama
prova imperfeila ; pois que a praxe achou mais commcdo
comprehender sob esta rubrica gérai a meia prova, e as outras
provas fraccionarias. Entretanto estas expressoes sempre tive-
rao os sens adversarios (9), se bem que até hoje tambem tives-
(6) Dabi nasceo o Adagio : B' précise- que haja meia ptiova, para que se
posta passar d inttrucçâo especial.
(7) Oarpzow, Praxis, quœst. 116, n. 6â.
(8) Globig na Censura rei judicialis vol. 2, p. fô, em lugar destas exprès-
sôes emprega as de probaHo plence proprior, e de proba.Ho plence
remotior. .
(9) Mathmi, de Crim., lib. 48.1.15, e. I, n. 15, dizia : probare est flde*n
facere judLici, non facit autem fldem is, gui ut illi loawuntwr, semiplene
probat, — Vide tambem Kleinsehrod, nos Arch., t. 4, 3.« art., n. 4, g 7.
I
181
sem os seus defensores (10) ; e que a Carolina tivesse feito uso
délias (11).
Mas sera necessario que em um corpo de leis (12) se faça
meao da prova perfeita ou nao perfeita, e especialmente da
meia prova? Antes de responder a tal questao, é preciso primeiro
que se convenha no sentido que se liga a theoria légal ; sob o
regimen do jury, ou sob umalei, que confira aos tribunaes ordi-
narios o direito de pronunciar segundo a sua intima convicçSo,
comprehende-se naturalmente que taes divisOes sejao super-
fluas ; pois que os juizes sô teem a dizer : «estamos convenci-
do ou «nâo estamo& convencidos». No primeiro caso a peu a é
decretada em toda a sua plénitude; no segundo, a prevenç&o é
declarada insufficiente, e entre o accusado imperfeitamente
convencido e aquelle contra quem nao ha prova alguma, nao
se pôde estabelecer a menor distincçao. Em compensao jul~
gou-se que, sob a instituiçao de uma theoria légal, se podia
graduar a pena conforme o grâo correspondente da prova
produzida. E como, servindo-nos das expressOes de um escrip-
tor moderno (13), a extensao da culpa deve-se medir pela
consciencia que délia tem o culpado, imaginou-se que a pena
extraordinaria por si mesmo se justifica ; ao mesmo tempo
outros autores, partindo de outra idéa, e jamais reconhecendo
nos indicios lima prova sufficiente, julgarao que neste caso
devia-se declarar a prova imperfeita,e applicar a pena extraor-
dinaria (14) ; mas esperamos demonstrar mais tarde que uma
(10) Stuebel Do Corpo de Delicto, g 259-297 ; Bauer, Principios § 133.
(11) Carolina, art. 23-80.
(12) A lei bavara, art. 286, trata ainda da meia prova.
(13) Gatis, Ensaios de reforma legislatiw, n. 1 g 92. (14J
Oarmignani, t. 4, p. 223-226
îsa
[lei bem feita deve acolher como compléta a prova por indicios;
que, nem a pena extraordinmia, e nem a àbsolulio ah instan-
tia pôdem por cm momento resistir h critica; e con-cluindo
diremos, que, nao tendo razao de ser quanto a nos aj divisao da
prova em perfeita, e imperfeita, n&o pôde rasoa-velmeute ter
lugar a questao da prova plena e inteira.
Dividiu-se ainda a prova em natural e artificial on cirouns-
lancial (15), como explicaremos mais adiante. A primeira, que
tambem se denominon immediata (16), convence direc-
tameute o espirito dos rootivos de certeza quanto ao objecto,
cuja realidade se tratava de demonstrar. Pelo contrario a
segunde basea-se em motivos, que nao sSo concludentes,
MD&O por meio de induGes, que permittem. (17)
A prova natural comprehende, segundo as idéas commum-
mente recebidas, todos os meios fundados na evidencia mate-|
rial, em opposiçfto aos indicios, que constituent a prova artifi-
ciat ou circunstancial. Aq'uelles mesmos (18J, que nao que-
rem reconhecer jamais prova compléta nos indicios, nao pode-
riao negar a existencia da prova artificial, desde que reconhe-
cessem, que a prova e a certeza sao expressCes synonymas. À
primeira vista parece, que a prova natural ao ji maior
segurança, e que por conseguinte o legislador a ella deve
attribuir a faculdade de motivar a applicaçao detodas as penas
ainda as mais severas : e com effeito, desde que nao se tem
razao alguma de desconfiar do testeraunho dos sentidos da-
(15; Por exemplo, Bentham, Tratado da Prova, t. 3, p. 1.
»
(16) Tittoaun, Manual, ., fi 869. —Vide tambem Heinroth naBew'stode
IJUzxg, n. 42, pag. 257.
(17) Bauer, Principio$, g 186 ; Ranft, Da Prova, g 42.
(18) Carmignoni por exemplo.
183
quelle que depOe, opera-ae immediatamente a demonstraç&o
dos factos, em quanto que a prova artificial, go,, opéra a con-
vicçSo coiu o auxilio de conclusGes as vezes frageis, e da
relaç&o intima, que existe entre circuostancias numerosasJ
reunidas pelo acaso, e cuja aceitaç&o, ou regeiç&o, dependera
do espirito; porém apezar destas objecçOes especiosas, haja
lembrança do que dissemos; a raaior parte dos meios de
prova nao se baseao, corao se suppOe, na evidencia material, e
«é erro attribuir à esta ffepposiçîLo a confiança, que os
mesmos podem inspirar ; é mister antes de tudo que o espirito
os examine, os analyse, e so depois de ter passado por uma
série inteira de raciocinios, é que elle acredita na sua
veracidade, e se convence da realidade dos factos sujeitos à
demonstraçao (19). Se, pois, conseguirmos demonstrar, eomo
esperamos, que tambem os indicios fazem prova compléta,
sendo o seu mecanismo identico ao de todos os outros meios,
dever-se-ha concluir, que nenhum objecto pratico lem a divi-
33.0 em prova natural e artificial.
CAPITULO XVII
DO ONUS DA PROVA, ESTA EXPRESSÂO P0DE TER UM 8ENTID0
RIOOROSO NO PROCESSO CRJMINAL ?
Aquelle que, tomando em consideraç&o as observaçoes, que
consignàmos acima, reconhecesse as differeaa, que distin-
guera a prova em materia civil e em materia criminal, con-
vencer-se-hia facilmente dos inconvénients, que appare-
ceriao, se se desse demasiada importancia as analogias dos
dous processus, e se quizesse eiTadamente transportar para o
segundo os caractères, que sô convem ao primeiro. A' primeira
(19) Abegg, Tratado do Proc. crim., segundo o direilo com.mv.rn. Hœnis-
berg, 1833. S 93, na nota p. 225.
184
viata parece que esta observaçao gérai séria tambem appli-cavel
aquelles que, tratando da obrigiiçâo de provar, a in-cumbissem
mais especialmeute a uraa das partes no processo criininal. A
questao do onus da prova, dir-se-na, quando muito poderia ter
lugar no processo por, via da accusaçao ; no quai apparece um
accusador articulando factos, perseguin-do a reparaçao dos seos
direitos lezados, e collocando-se era face da parte, que por elle é
accusada (1), de sorte que todo o processo é um combate
singujP entre ambos ; e que cad
a
um, procurando convencer o
juiz a seu favor, é por isso obri-gado a produzir a prova ou a
contra prova, e que a absolvi-çao torna-se a consequencia
forçada da falta de prova, que dévia fazer o accusador (2). Mas
no processo por instrucçSo jà nao se trata siraplesmente da
prova da accusaçao ; nelle se vô um magistrado encarregado
pelo poder social de procurar a verdade, qualquer que ella seja,
pro ou contra ; o quai obra silenciosamente. Longe de affirmar,
como o accusador no outro systema, procède pela duvida; nunca
começa articulando uma accusaçao, que poderia prejudicar
injustamente ao accusado ; em uma palavra, todo o processo de
instrucç&o consiste na pesquisa estudiosa e constante de todos
os materiaes, de modo a esclarecer o juiz,. e a colloca-lo em
circumstancias de pronunciar.nem sempre uma
condemnaçao,mas sempre uma sentença justa. Portante o
instructor nao deve tomar s6 a cul-pabilidade por unico ponto de
mira, mas a verdade ; devçrâ fazer sobresahir com igual cuidado
todas as circumstancias favoraveis ao accusado ; poisque a
certeza, mesmo em relaçâo à eulpabilidade, nao poderia existir,
era quanto pairasse a minima duvida sobre a realidade dos
factos constantes da ins-
(1) Oarmignani, t. 4, p. 57.
0) L. 6. Cod. de Volo-malo. - L. ult. Cod. de Probation.
185
trucçSo. Em relaçao mente â- imparcialidade obrigatoria do
magistrado instructor é que repetimos ser pouco exacto dizer
que lue incnmbe o onus da prova da accusaçao ; incumbindo
ao accusado o da prova da defeza.
Entretanto esta conclusâo talvez seja demasiado superficial.
Ao lado das differeas que distinguent o System a da accusa-
çao, e o da instrucç&o, existera sempre em ambos os systemas
caractères communs, que derivao do processo em gérai, do
quai é o processo criminal uroa forma especial. Assim tanto
em um, como em outro, ha duas partes em frente uma da
outra ; ha sempre lucta sobre o fundo das allegaçoes da parte
que accusa contra a que se défende ; ha ainda lucta entre os
articulados de factos destinados* a fazer triumphar prétendues
contrarias. No processo por instrucç&o a parte autora é a
sociedade, ou o poder, que tomou por orgao o magistrado
encarregado da pesquisa dos crimes, e que, pelo seu interme-
dio, faz valer o seu direito ao castigo do culpado. E nao obs-
tante este processo nao basear-se em uma accusao em forma,
todavia é preciso redbnhecer,que uma accusaçao qualquer vem
iuiciar o processo, e motivar medidas publicamente tomadas
contra o réo ; é sempre este o ponto de partida. Um crime
foi commettido, e em todos os casos uma accusaçao positiva
surge no momento,em que começa a instruao especial; poiv
que ha um crime articulado, e um accusado formalmente
designado. Entao o poder social, quando affirma que o accusado
deve ser declarado culpado e punido, certamente é obrigado
a provar os factos, cuja existencia motiva a applicaçâo da
pena (3), E nao se argumente aqui com o famoso adagio. -
Quilibet prœsumilur bonus, donec coiitrarium probetur (4) ;
(S) Ordenaçiïo crim. prutsiana, g§ 360-364.
(4) Bolin, de Deliftor. Probat., p. 152; Beuthom L'ratado da Prova, U, p.
13 etc.
34'
ISO
porque esta presumpçao de virtude nao altéra a essencia is
cousas ; além disso nao esta consagrada na lei (5/, e levaria bem
depressa as mais falsas consequencias. Consulteras a marcha do
processo, eella nos mostrara claramente que os; actos da
instrucçao sao dirigidos contra um individuo desi-gnado como o
autor provavel do crime. Finalmente esta presumpçao séria
completamente superflua (6) ; independente délia subsiste o
principio — que a prova dos factos da accu-saçOo incumbe
âquelle que, por causa de illegalidades cora-mettidas, ésforça-se
em sujeitar um cidadao a pena de uma condemnaçfio judiciaria ;
porque longe estaria de ser suffi-ciente o limitar-se a affirmai' a
sua culpabilidade ; e violar-se-hitto as leis da justiça, se, por
causa da simples allegacao nao pTovada de uma contravençao,
se décrétasse contra o accusado um prejuizo légal. Seja como
fôr, é do processo por instrucçao que dimana a unica regral
fundamental, que é a seguinte : — sendo a verdade o fim das
investigaçOes do ma-gistrado instructor, este deve esforçar-se
em desfazer todas as duvidas, e ainda qnando as provas contra o
indiciado pa-reçao irrecusaveis,deve applicar-se com cuidado a
torna-las complétas, e a provar a certeza tanto quanto fôr
possivel, devendo ao mesmo tempo tomar em consideraçao as
provas, e quaes-quer meios favoraveis a defeza, (7). Por fim de
contas deve-se sempre recorrer à tbeoria que vê na certeza o
producto de um exame consciencioso, e do estado do espirito,
em que os moti-vos afBrmativos attingem um tal grào de
preponderancia, que fazem desapparecer a duvida e os motivos
de crt-nça
(5) Martin, trataio do processo crim. g 12, not*, 9.
(6) Werber, Da obrigaçdo de faxer a prova, nova ediçSo de Hesaler p. 95.
17) Vid« o Vrocmo crim. comp., 1.1, ap. 00 in fine.
1ST
na possibilidade da negativa. 0 jniz tem necessidade de ba-sear a
sua certeza em relaçao aos fatos imputados para deci-dir, se a
accusaçao é ou nao fundada : é mister pois que o magistrado
instructor nao deixe passar sem exame nenhum iodicio util à
defeza; deve ouvir sobre todos os objectes as testemunhas,
mesmo aquellas que, segundo 03 autos, po-dessem servir para
a justificaçao do culpado ou para a attenua-çao da- prova contra
elle. Por este meio (8), ainda que 0 indiciado desprese os pontos
favoraveis à sua defeza por timidez ou falta de conselhos, a sua
atteoçao é quanto a elles forçosamente despertada;nao obstante as
suggestOes geralmente proscriptas (9) ; todavia na pratica, se
estas têm a prova da defeza por objecto, nao sâo reprayaveis. (10)
Em resumo, e considerando em toda a sua extensao os deveres do
magis-trado instructor, reconhece-se que elle nao é um simples
accusador, e que séria erro impor-lhe especialmente 0 onus da
prova contra 0 accusado; porém, de outro lado, vendo-se as
cousas no ponto de vista do accusado, é tambem verdade que nao
se pode contestar a este 0 direito de exigir, antes Ida
condemnaçao tornar-se possivel, a prova compléta dos factos
Contra elle allegados, e cuja existencia o torna passivel da pena
indicada. ('11)
Passemos agora a outras consideraçôes. A accusaçao nao se
appoia sdmente nos fact03 exteriores ; ella affecta em grande
parte a questao da intençao ; e esquadrinha a conscien-
[8)
a Carolina no
art.
47 impôe esta obrigaçâo ao juiz.
(<y Sobre 0 verdadeiro sentido desta prpscriSo vide : Parât, daa
Sugges-
es.
p, 165 ; Tittmann,
Manual,
III, p, 393.
(10)
Codigo Pénal bavaro,
art.
185.
(11)
Vide 0
Proc. crin, camp.,
t. 2.
cap, 111,
p. 150.
188
<âa hnmana, enja profhndidade nâo pôde ser penetrada pelas
sentidos exteraos do obeerrador, e etijas segredos se podem
ser eonhecidos coin o aaxOio da instrucçSo tirada dos factes
exteriores. Ora, pareee que o magistrado instructor s
pôde dedicar-* à deraonstraçâo dos caractères materiaes do
crime, aendo diffieil exigir délie a prwa rigorosa do discerai-
mento, on da intençâo criminosa; depois de provados os
tectos materiaes, sa > os juizes os compétente para resolver
affirmativamente sobre a questâo da intençâo. Mas e
longe de mais, quando, partindo 4e mnitos erros, ebe-goa-se a
estabelecer como principio que a intençâo criminofa {dolna)
sempre se présume (12) on. ao menos, que é contra o indiciado
a presumpçâo de discernimento (13;. e que por conseguinte a
elle incumbe- a obrïgaçâo de destrui-la. Gon-fundiu-se
geralmente duas ideas, o que nâo se deveria fazer; porque a
intencionalidade se Terifica na maioria dos casos com o auxilio
das presnmpçoes e par via de inducçoes: acre-ditou-se na
existencia de uma presumpçâo légal (14) da intençâo
criminosa: o que nâo é exacte. Argumentava-se com diver-sos
textes das lâs r^manas (15) ; mas boje esta reconhecido que
estes textes nâo consagrâo a dite presumpçoo. A intençâo entra
no arîiculado essencial da accusaçâo ; porque nos termos da lei
a pena nâo pode ferir senâo aquelle, que commetteo o crime
maliciosamente ; e se é certo, por exempte no caso de
humicidio, que o accusado tem direito de exigir, que se prove a
verdade da prevençào, tambem se lhe deve reconhecer o
(12> Tal era a opiniâo ptimitiva de Feuerbaeh, Tratato.% 60.
(13) Xal é a opiniâo do Feaerbach, Traiado (noua ediçâo'j, f 86.
.14} O art. 43 do Godîgo bavaro '.«ubeleeeo como principio esta pre-
sompçâo.
(15) A este respeito vide Wening, Artk, do JHr. eritn., t 11, n, ».
189
direito de exigir que se prove uma parte especial da preven-
çao, isto é, a intençâo de«ommetter o crime (16J, Finalraente
de se poder presumir que todo o homem é intelligente, e que
obra com doliberâo,. nâo se segue forçosamente que o agente
accusado de um crime fosse movido por uma vontade culposa.
E' muito natural que durante a instrucçâo, achando-se o juiz
peraute os vestigios materiaes do crime, e as circunstancias
do facto, que tornao verosimil o dolo, tome estaverosimilhança
por ponto de partida, esupponha a existencia do dolo (17) ;
entretanto de modo alg»m se de julga-lo dispensado de pes-
quisar com o maior cuidado, tanto as circunstadcias accessorias,
que possâo corroborât as provas contra o indiciado, ,como
aquellas,que possâo constituir umaaiustificaçâo util ao mesmo.
Quando mais tarde se tratar de pronunciar a sentença, incum-
bira ao juiz compaginar com auxilio do raciocinio as expli-
caçoes dadas pelo indiciado sobre o acto imputado (18), com
as circunstancias accessorias, que constao da instrucçao; e pro-
cedendo por via de inferencia e de conclusao (19), tomando
as mesmas circunstancias por guia, decidirâ se ha crime ; é
por isso que no caso de homicidio a posiçao e a forma das
feridas, as ameacas anteriormente proferidas, devem dar-lhe
os elementosda sua conviçâo. Deve-se confessar, porôm, que a
maior parte das vezes o dolo nâo se demonstra senâo com o
auxilio do raciocinio ; mas d'ahi a dizer que elle é o objecto
(16) L. 6. God de Dolo malo.
(17) Arch. de Mr. crim., 6, p. 364.
(18) Por exemplo : quando o indiciado affirma que houve sômente MW-|
pruiencie.
(19) O dolo tambem pôde ser demonstrado com auxilio dos indicios nos
termes de um rescripto impérial de 1594 g 68.
ÎOO
de uma presumpçao légal vài muito : fie' onïra sorte naoi
havia necessidade de que elle fosse demonstrado, e o accusado
séria obrigado desde o principio a provar a sua nao exis-
tencia (20). I
O discernimento tambem nao se présu aos olhos da lei;
sempre que o indiciado sustenta nao o ter, nega o dolo, e é
dever do instructor colher.e verificar todas os materiaes,que
possao prova-lo, assim como verificar officialmente todas as
circunstancias, por menos importantes que sejao, que possao
mostrar, como verosimeis, as allegô%s mais ou menos justi-
ficativas do accusado (por exemplo a embriaguez) ; e a justiça
tambem exige, que, quando mesmo o accusado nao allègue a
doença de seu espirito«(21J o instructor, se fôr preciso,o faça
examinar por peritos no interesse da verdade (2,2) : basta para
isto que alguma duvida appareça depois do depoimento das
testemunhas, ou que o accusado dénote certa extravagan-cia
de gestos e postura. Ainda aqui os juizes tomao as circuns-
tancias accessorias por termos de comparaçao, e decidem por
inferencia, nao sendo jamais a sua decisao o producto de uma
presumpçao légal; com effeito, que necessidade baveria de recor-
rer a tal argumento, quando na causa o accusado nao se defen-
deu por uma allegaçâo defalta de discernimento, on quando se
demonstrou a inexactidâo das suas justificaçOes, ou finalmente
quando as circunstancias nao deixao sobre este ponto margem
â duvida ? Certamente, é muito natural pensar que os juizes
(20) Vide a IntroducçOo  arte da defesa pelo autor, g 44 ; Rossi, Tratado
do Direito Pénal, t. H, p. 228 243 ; Rosshirt, Exposiç&o dos principlos
do Dtreito pénal, p, 221.
(21 Além disso, é naturel, que aquelle, cujo espirito estiver realmente
doente, nSo allegaiâ por si esse estado.
{22) Vide sobre esta questâo Quando é necessario a emploratio men-
tis t — o Proc. crim. comp,, t. 2, cap, 160.
191
v&o buscar as provas da imputabiiidade nos proprios factos e
na sua natureza, na postura e respostas do fccusado ; e que
raciocinando do conhecido para o desconhecido é que chegûo
a convencer-se de que o indiciado tinha consciencia do acto
no momento em que o praticou (23).
As analogias do processo civil têm feito considerar as jus-
tificaçôes fornecidas pelo indiciado em relaçao as circunstan-
cias do facto, que lhe s&o favoraveis, como verdadeiras excep_
çoes, recahindo sobre elle a obrigaçâo de prova-las. Mas este
raciocinio é uni dos mais falsos e mais perigosos. A mesma
confusfto que reina frequentemente no dîle^o civil nesta
materia, encontra-se no processo criminal em que se introdu-
sio tal principio ; e assim como se tentou classificar no prin-
cipio sob diversas denominaçOes as excepçoes que o
r
réo pôde
produzir, assim tambem os autigos criminalistas tratarao da
exceptio alibi, e da exceptio culpœ;, e nâo obstante terem cahido
em desuso estas denominaçOes nos tempos modernos, todavia
sempre permaneceo em alguns espiritos a opiniao de que em
materia de excepçào (no caso por exemplo, da gitima de-
feza) a prova incumbe ao indiciado \24). Ora esta opiniao
mesmo restricta a um pequeno nuro de casos é iusustentavel
em materia de processo criminal (25) ; e produzio grande»
(23) Sobre a presuuipçâo de discernimento vide Helpp. Ensaius de juris-
prudencia crim.., n. (i; Eossliiii, Kxponiçiloetc. p. 218.
(24) Vide tambem Stubel, Processo Crim., § 2334.
(30) Gmelin, da AdminisltacHo da Jasliça crim„'p. 106-175; Rosshirt,
Exposiçào dos vrincipios de Dir. pénal, p. 220.
193
inconvénients sendo applicada pnncipalmente â confiée parcial
(qualificada). Com efteito ™vri**»«V*
n
acontede aqui o
mesmo que no processo civil, no quai o réo, nao obstante
confessar os factos, que servem de base a de manda, todavia
allega, pelas excepçoes introduzidas, que estao destruidas as
relaçOes de direito primitivamente gera-das pelos mesmos
factos. Com a excepeao do pegamento ou da compensacao
reconheca fundada a pretènçao origmana do do seu adver'sario;
mas ao mesnro tempo sustenta que o m-culo iuridico foL
destruido, sendo entao o caso de applicar a ««tas-AS ««*-* 0
«*r. Mas em ^teria cn-minal, quando o indiciado usa destas
defezas, que se quer considerar como excepçaesj nunca
reconhece a accusaçao corno fundada ; e quando prétende ter-se
achado no caso delegitima defeza, nega o dolo. parle "essencial
do delicto. Nao basta que existao os caractères essenciaes do
crime, para que a accusaçao tenha ganho de causa, e para que
Tito» seja con-vencido do assassinato perpetrado na pessoa de
Sempromus as suas explicaçoes com o fim de demonstrar que
elle nao e o autor do acto imputado, ou que nao o «*™^^ porque
é accusado, constituem uma justificaçao indivirfvel que tem por
fim evitar em parte ou toda a pena. Mesmo quando allega o caso
de légitima defeza nega dolo,epe Inde destruir as conclusses
que se podessem toatJo**> para a intençao; esforça-se em
tornar P»*^«^ sua innocencia aos olhos do juiz e em **«r
a
P
reve
^ de que uma vontade criminosa guiou a sua mao Se_ e qu^
F-W *. * ^r: as î5r-ïSS"-
concordamos, mas ^m a conaicao
den
ominada
forma da escepçao negatona, pu exemple d ^
excepti
onon ™^
e
%;;:>ZZL se por ultime
pude haver verdadeira «"*W"*- ^
argumenta se nos opposer o caso, em que
103
retira a actos posteriores ao imputado ; se se nos trouver o
exeraplo do ladr&o, que restitue a cousa furtada (nos paizes, nos
quaes a restituiçao voluntaria livra da pénal ainda persistiremos
era nossa opiniSo : neste caso como sempre, tratar-se-ha de uraa
affirmaçao de facto déstï-nado a evitar a applicacâo da lei pénal :
sera snfficiente que o tribunal nao a considère totalmente
inverosirail.
CAPITULO XVIII
PROVA DA ACCUSAÇlO ^
dissemos e repetimos, que a natureza do processo por via
de instrucçao exige antes de tudo a imparcialidade do juiz lns-
tructor ; que deve procurar, nao tanto as provas da culpabili-dade
do indiciado, mas principafniente as que servem para ! a
manisfestaçao da verdade, e para dar ao juiz definitivo os raeios
de decidir, segundo a justiça, da procedencia, ou iiripro-cedencia
da accusaçâo ; neste sentido a instrucçao forma uma obra de uma
peça (1), nSo podendo separar-se a prova da accusaçâo da da
defeza î assim deve procéder o instructor em todos os meiosde
prova, que emprega; por exemplo, quando in-terroga as
testemunhas, deve consignar com igual cuidadotudo quanto nas
suas declaraçoes parecer favoravel â defeza ; e se uma
testeraunha referir-se a um facto grave, se disser, por exemplo,
que o accusado é sujeito aos ataques de uma doença mental,
deve investigar afnndo a verdade desta asserçfto.
Mesmo na occasifto da sentença defmitiva (2) nao existe a re-
ferida separaçao da prova ; o juiz tem nas suas maos os mate
riaes compactes, que recebeu da instrucçao : calcula a somma
dos dados, que elles lhefornecem, e, sendo a convicçao prodûcto
(1) Vide tâobem Abegg, Tratado do Proe. erim. g 148.
(2) Vide o Processo erim. como., t. 2, cap. 187 el88.
96
1»4
da lucta entre as razOes pro e contra, pesa e aprecia justa-
mente todos os diverses rneios, que na causa contendem entre
si ; depois a sua convieçao se produz segundo os resultados do
«seu exame. Se o accusado confessa, o tribunal deve, antes de
prestar fé à connasâo, examina? as circunstancias, que esta
encerra, comparando-as com as de facto jâ provadas, e se,
confessando o acto, o accusado nega o dolo, sem apresentar
formalmente prova, que o justifique, deve, antes de proferir a
sentença, pesar com exactidao todas- as circunstancias, que
possao fazer presumir a nao existencia do dolo.
Considerando-se porém a prova em si mesma, em sua natu-
reza,, concebe-se entao perfeitamente a divisao em prova da
accusaçEo, e prova da defesa. A' primeira classe (3) pertence a
prova dos factos, que demonstra a existencia do acto imputado,
o quai sujeita o indiciado. à san'oçâu da lei pénal (4)» Esta prova
exige todos os esforços do magistradoioatructor ; que deve re-
correr a todas as fontes» que podem facilitar a verificaçao«dos
factos contra o accusado ; nao devendo omittir nenhuma das
formalidades legaes, as quaes sô por si podem muitas vezes au-
torisar o juiz do plenario a considerar a prova snfiiciente : fi-
nalmente deve desfazer todas as duvidas, que possao tonnai*
incertoo seu resultado.
A prova da accusaçEo ainda tem maiûr importancia ;. pois
que ô necessario que ella sejainteira e compléta, para que possa
ser decretada a pena ; e ella sô pôde ser considerada plena e
inteira, quando se tornao juridicamente certos todos os factos,
que motivao a applicaçao desta*.
Os objectes principaes da prova da accusaçao sao : 1.° A
verificaçao do ponto de facto, isto é, da existencia de todos os
factos, dos quaes résulta a materialidade do. acto dm-|
(3) Tittmann, Marnai lit, g 841,
(4) Vide o meu Proc. crim. comp., t. 2, cap. 158.
«
ÎOK
putado ; a morte, por exetnplo, no caso de homicidio ; a veri*
ficaçâo dos factos caracteristicos do crime (por exemplo da
propinaçao do veneno) ; a verificaeao dos factos que se pren-
demao crime especial, que se trata de punir (por exemplo. a
escalada no caso de roubo) ;
2.* A demonstraçao da participaefto cnlpada do accusado no
crime ;
3/ A investigaçao do seu estado mental, e da sua vontade no
momento do crime ; afim de que se possa apreciar, se houve
doïo, on simplesmente negligencia ;
4.° A manifestaçao da premeditaçao, quando a accusaçao
versa sobre um crime, do quai a premeditaçao é um dos ele-
mentos essenciaes (5) ;
5." A pesquisa da direcçao da intençao. quando elle deve ter
tido por objecto o acto im putado (6) ;
6." A demonstraçao da concordancia perfeita entre a intençao,
e os factos imputados, que se lhe assignala como conse-quencia,
ou a da imputabilidade, que em razao destas conse-quencis pode
ser attribnida ao agente (7).
CAPITULO XIX
PBO VA DA DE FEZ A
Quando se considéra a prova objectivamente, e como syno-nimo
da palavra certeza, épouco conséquente querer oppor-lhe a
conWdi^prova. Além disso, mesmo em relaçao à administrais)
Exemplo : para que a pena do assassinato possa ser pronunciada, é pre-ciso
que a premeditaçao esteja provada.
(6)
Exemplo : no caso de dolo.
(7)
Quando o accusado confessa que sô quiz ferir a sua victima, e entre-
tantoesta morreuem consequencia dos ferimentos.
106
çao da prova esta expressao s&o acha justificaç&o no processo
criminal allemao (processo inquisitorial) ; porque séria preciso
suppôt analogias, que nao existem entre este eo processo civil;
e vêr naquelle taobem duas partes em trente uma da outra. No
processo accusatorio dos antigos podia haver sem duvida prova
da accusaçao, no sentidode recahir sobre o accusador o onus da
prova da accusaçao, e prova da defesa no sentido de recahir
sobre o accusado o onus da prova da sua defesa. Mas este
Systems nao p>de ser completamente applicavel ao processo
accusatorio moderno, o quai admitte um m&gistrado ins-tructor,
procedendo à informaçao da mesma sorte que no processo
inquisitorial, preoccupando-se antes de tudo corn a mani-
festacao da verdade (1), e tomando em consideraçîto os interesses
do accusado ; que finalmente admitte uma verdadeira theoria
légal da prova, cuja regra nao pôde ser infringida pelo juix.
Nos systemas mixtos, como o que vigora em França, parece à
primeira vista ser mais facil separar-se da prova da accusaçao a
da defesa ; pois que o accusado é confiado aos cuidados de um
defensor, que parece ter por missao produzir a prova da defesa
(2) entretanto é ainda o systema inquisitorial, que domina na
marcha do processo
v
3) ; porquanto o direito conferido ao
présidente de fazer comparecer immediatamente na audi-encia
qualquer testemunha fora do numéro das que estao ins-criptas
nas listas notificadas (4), de tomar, em uma palavra,
(1) Martin, Tntado dos proc. erim. § 187.— Vide o Proc. eritn. compe.
do autor, t 2, cap. 218; Abegg, Tratado do proc. eritn., segundo o direito
commum, p. 289.
(2) Vide o Codigo et instr. crim., art. 815-
(8) Vide Proc. crim, comp., t. 1. chap, 32. n. 6, tn/lne
(4) Vide Cod. instr. crim., art.269.
10-7
sobre si o quejvlgar util para descobrir a verdade (ô), demonstra
claramante a indivisibilidade das provas da culpabilidade e da
defesa.
Na Allemanha durante todo o processo, que é de instrucçao, a
manisfestaçao da verdade constitue o objecto constante dos
esforços doinquisidor : qualquer que seja a natureza das provas,
de que pôde lançar mao, elle as applica a todas as circuns-
tancias, quer contrarias, quer favoraveis ao accusado: de sorte
que, Cumprindo fielmente o seu dever, prodùz igualmente a
prova a favor do accusado, e renne todos os materiaes uteis para
a defesa. Quando pois se falla isoladamente de uma ou outra das
duas provas, é em um sentido especial ; trata-se principalmente
da demonstraçao dos factos, que tem por fim destrnir a
imputaçao ou defender o indiciado, deraonstraçao, que tem por
ponto de partida, ou as petiçOes formaes feitas pelo indiciado no
curso da instrucçao, quando toma sobre si a tarefa da sua defesa
material, se assim se pôde dizer [&), ou uma allegaçao de factos
justificatives (a allegaçao da ausencia), on enfim que se basêa
nas provas expontaneamente produsidas pelo defensor (7).
Quiz-se por vezes concéder um favor excessivo a esta prova
(8) : chegou-se até a sustentar, que uma testemunha inquirida
irregularmente, ou justamente defeituosa, dévia ser crida no seu
depoimento sô por ser favoravel à defesa. Mas isto é dar à defesa
facilidades (9^)tao amplas até o absurdo ; os meios de ob-
(5) Vide God. instt.crim. art. 968.
(6) IntroducçSo d arte da defesa, pelo autov, §5.
(7) Id. 8 65.
f8) Cramer, Opuscul, t. 4. p. 191 ; Otto, De favore defetu. Geiss. 1718.
(9) IntroducçSo a arte da defesa § 18.
ÎOS
ter « certezn s5o sempre os mesmos; e o jtriz tiao pôde te
outros, quando trata de nssegurar, que a verdade esta do lado do
accusado ; offende- o bom senso, e desconhece-se de um modo
funesto oa.direitosdasociedade, quando, por sequerer subtrahir
pindieiado a uum peua merecida, afrouxâo-se as roedidas de
prudencia, que sao sempre os mais seguros giiias no carninho da
verdade ilO)- E* mister restringir dentro dos limites rasoaveiso
favor. concedido à. prova de defesa. O mais que se- pôde dizer- é
que. a accusacao deve ser provada, para queo juiz;a possa ad-
Imittir eomo procèdent©. ; nao podendo elle declarar culpado o
indiciado, emquanto restar duvida ; puisque esta por pi,-je
isufficiente para constituir a verosimilhança em proveito do
mesmo. Dp-nde.se segue, que, se nao hauver mais do que uma
testemunha affirmando que se deu o caso de légitima defesa,
ou se muitas testemunhas suspeitas attestarem a ausencia do
indiciado em outro lugar, é isto bastante sem duvida para impe-
dir a condemnaçao ; porque é principio corrente, que todos os
casos duvidosos se interpretao favoravelmente ao réo (11).
A mais importante das divisOes que se tem feito da prova da
defesa (12) é a de prova directa e indirecta.
A primeira tem por objecto factos, que vem directamente
destruir- a prova da accusacao (por exemplo uma testemunha
affirma que durante a rixa o indiciado conservou-se tranquillo,
entretanto que outras affirmâo, que elle nella tomou parte).
A segunda tem por objecto factos que, vindo destruir as
consequencias légitimante tiradas da prova da accusacao, tor-
(\0) Vide a este respeito a sabia disposiçâo do codigo bavaro, II, art. 336.
Cli; Encontra-se-ba o desenvolvimento deste principio na lniroducçâo à
arle da defesa, pelo autor, § 65.
(VU) Feuerbach, Tratado do direito pénal, § 570 : Stabel. Proc. critn., §
1094.
ÎOO
nao por isso mesmo impossivel a applicaçâo da pena, ouidimi-
nuem o seu vigor.
A prova directe da defesa se subdivide, segundo o seu fim
isto é, ou ella édestinada a deinonstrar, que sao inexatos os
factos articulados na fornaao da culpa provando o contrario
(13) ; ou é dirigida contra as proprias provas affirmativas (14).
No pegundo caso ainda se deve distinguir ; a prova de ser
destinada a demonstrar a irapossibilidade, ou a inverqsimi-
lhança compta da accusaçao (15) ; eu a destruir o valor dos
meios de prova empregados pela accusao, on pelos seus vicios
materiaes (16), ou pela omiso de formalidades (17) ; -final-,
meuto ella pode consistir no complexo de provas, que domona-
treio o contrario da prova da accusaçao ( 13).
. Entre as provas pela impossibilidade distingue-.se a que se
chaîna excepçâo alibi, ou aegatioa de luyar (neyaUwi locï)
(19) ; mas nao é uma verdadeira excepçâo ; pois que nada mais
é do que uma simples denegâo emanada do accusado, e ao
mesmo tempo uma demonstraçao de ter sido visto em um outro
(13} Exemple : duas testernuulias affirmâo a siiiceridade de uma allegaçâo
do indiciado, e duas negâo.
(14) Exemple : o indiciado demonstra, que forâo peitadas as testemunhas,
que depoem cbntra elle.
(15) Exemplo :um indiciado no crime de forçamento prova que é impotente_
(1C) Exemplo : o indiciado demonstra, que as testemunhas forâo peitadas,
, (17) Exemplo. : o indiciado demonstra a irregularidade do jnramento das
testemunhas, ou que este foi deferïdo por um magistrado incompétente para o
fazer.
(18) Exemplo : as testemunhas da defesa affirmâo precisamente o contrario
daquillo que affirmâo as da accusaçao.
(19) Hurlebusch, Dissertacôes de direita civil e eriminal, lif. I h. 14.
200
lugar determinado', na occasiao em que o crime foi commet-
tidQ> e por consequencia de nao ter podido achar-se ao mesmo
tempo no theatro do crime (20).
A prova da defesa indircita consiste, ou na demonstraçào
dos factos, que vem destruir as consequencias, que decorrem
de outros factos da accusacao, e que por isso dao ao juif a
convicçao de que o acto imputado foi consumado de modo di-
verso, e mais favoravel(21) ao indiciado, do que pareciao fazer
crer a accusacao, e certas circunstancias affirmativas (22) ; ou
na producçao de factos, vindo corroborar a verosimilhança das
restricçOes contidas em uma confissfto qualificada emanada do
accusado (23); ou na producçao de factos constitutivos de uma
situaçao, que, segundo a lei, livra da pena (24) ; ou finàlmerite
na de factos que a attenuao (25). Em relaçEo a esta prova
indirecta, fizemos ver mais acima (cap. XVII), que querer
transportar para o processo criminal o mecanismo das exce-
oes do direito civil, é cahir em nma das mais pèrigosas èàùM
fusses.
.(20) Convem usar de prudencia no exame daexcepçào alibi. Video
Proe. crim. comp. t. 2, cap. 187.
(21) Exemplo : o indiciado affirma uni facto, que tende a demonstara au-
sencia da vontade culpavel.
(22) Esta prova é muito importante quando a lei admitte a presumpçtto
de dolo ; por exemplo, o codigo bavaro, art. 43.
(23) Exemplo : o indiciado argumenta com a tiecessidade da légitima
defesa.
(24) Exemplo : o indiciado sustenta nâo ter feito mais do que obedecer à or-
dem dos seus superiores.
(25) Exemplo : o indiciado affirma ter cedido a seducçâo.
SOI
CAPITULO XX
BELA.ÇÔES ENTRE UMA E OUTBA PROVA
A producçao da prova em materia criminal, quer da accusa
çao, quer da defesa. constitue uraa obra indivisivel, que tera
um unico fim, isto é, dar ao juiz os meios de pronunciar
conforme à justiça. A sentença é o resultado do exame con-
sciencioso de todas as razoes pro e contra produsid no curso
do processo ; e antes que a certeza, base essencial da condem-
naçao, possa formar-se na consciencia do magistrado, todas as
du vidas devem ser esclarecidas, e desviados todos os motivos da
verosimilhança negativa. E' por isso que nao se p6de cotnpa.
rar o exame destas duas provas com aquelle a que se entrera
o juiz no processo civil. Entre a prova da accusaçao e a da
defesa nao ha uma separaçao bem pronunciada : pelo contrario
no civel distingue-se perfeitamente a prova, que incumbe ao
autor, daquella, que incumbe ao rèo ; entretanto no crime,
quando o juiz pesa as provas da culpabilidade, quando, por
exemplo, examina o depoimento das testemunhas da accusa-
çao, elle tem diante dos olhos ao mesmo tempo todas as duvi-
das résultantes dos factos allegados pelo accusado em sua
defesa, todas as que nascem dos factos provados no curso do
processo, as quaes tem elle por missao como magistrado (é esse
um dos caractères do processo inquisitorial) ex'aroinar a fundo
ea>-ofJicio. Ainda que o accusado nada tenha allegiido contra a
veracidade de uma testemunha, nem por isso deverâ o juiz
deixar de tomar em consideraçfio todas as circunstancias, que
deponhao contra ella. Am disso, conforme a regra (cap. 17),
todos os factos da formaçao da culpa devem ser compléta e
juridicamente provados, para que a pena possa ser decretada ;
donde se deve concluir, que a prova da accusaçao deve ser o
primeiro objecto do exame do juiz : e se ella nao contém os
caractères exigidos da perfeao juridica ; se por exemplo (em
26
ao»
relaçao a certos paizes) uma unica testemunha é que sustenta a
accusaçao, nao ha necessidade de examinar-se a prova da
defesa. Entretanto coavém fazer uma observaçao era relaçao ao
pvocesso allemao : ainda que a prova seja imperfeita, tuas
como ella pôde collocar o indiciado em uma situaçao desfavo-
ravel, e motivar, ou a abselutio ab instantia, ou a prestaçao do
juramento purgatorio, etc., etc. ; torna-se importante te caso
examinar a procedencia da prova da defesa; porque pode
acontecer, que ella contradiga, ou atténue de tal sorte osfunda-
mentos da accusaçao (1), que seja impossivel decretar mesmo
as providencias autorisadas pela lei no caso de prova nao com-
pléta (2).
O juiz depois deve examinar, se o acto imputado foi real-
mente consummado, e se o accusado foi verdadeiramente o sen
autor.
1." A prova pôde ter sido produsida completamente, fazen-
do-se abstraçao da prova da defesa (3); mas vindo esta oppor-
se-lhe directamente, mesmo que nao se funde senao na verosi-
milhança, é isto bastante para impedir a condemnaçao ; porque
deixou de existir na causa a certeza, que exclue a possïbilidade
do contrario. Este caso pode reproduzir-se, ou quando uma
testemunha, mesmo unica, depoe a respeito de circunstancias,
que nao poderiao conciUar-se com a admissao dos artigus da
accusaçao, como certos (4) ;ou quando a prova da accusaçao
(1) Exemplo: no caso em que se demonstra, que uma testemunha da accu-
eaçBo é inimigo do indiciado ; ou que o seu depoimento esta em flagrante
contradicçSo com a de outra classica.
(3J De sorte que em lugar da absolviçâo da instancia deve ser pronun-
ciada a absolviçâo definitiva.
(3> Exemplo : dnas testemunhas classicas affirmâo ter visto A. matar B.
(l\ Exemplo : o accusado confessa ter assassinado A. a 21 de Janeiro de
1880, mas uma unica testemuulia affirma que a 20 vio A. vivo e com saude.
203
demonstra incompletamente, que o accusado é o autor do facto
imputado (5).
2 Outras provas podem ser oppostas em contradiao indi-
recta com a prova perfeita da accusaçao ; entao a certeza deixa
de existir, e a duvida nasce do conflicto de attestaçôes contra-
rias (6). Se a prova da defesa é destinada a combater uraa
prova determinada da accusao, uma testemunha por exem-
plo, convém examinar, se, pondo de parte esta prova, p6de
ainda existir a certeza; se a prova da accusaçao é feita por
outra testemunha e pelo concurso de indicios. Para privar de
fé qualquer prova, basta fazer valer utn raotivo verosimil de a
repellir) por exemplo, demonstrar o suborno provavel da tes-
tera unha); porque assim recahe-se naquelle estado de duvida,
que exclue toda a certeza.
3." Estando concluida a prova da accusaçao, se a da defesa
nao se réfère senao a circunstancias de facto, que nao sao in-
conciliaveis com o fundo da accusaçao, mas que tendem sd-
mente a tornar mais difficil a crença na culpabilidade do in-
diciado, a primeira affirmaçao nada perde por isso da sua
foa. Em todo o caso é sempre cousa delicada decidir, se se
de acreditar que um individuo é ou nao capaz de ter com-
mettido um crime : quem se condusio sem mancha a o mo-
mento do crime, talvez assim tivesse procedido por hypocrisia
ou falta de occasiao ; mas tendo chegado a hora da tentao, a
hypocrisia se desmascarou, ou a fraqueza snccumbio (7).
(5) Exemplo : Uma testemunha affirma, que o accusado estava ausente em
outro lugar.
(6) Mais adiante trataremos particularmente do conflicto dos testemunhos e
do conflicto dos indicios.
.7) Vide Feuerbacb, Caitsas célèbres, 11, p. 111.
204
Ainda que a prova do facto exista, e que seja certo ter sido o
accusado o autor do acto imputado ; isso nao é bastante : 6(5 a
criminalîdade résultante de todas as circunstancias accesso-îdas
de raotivar a applicaçao da pena, e ella de ser esta-
belecida, quando o juiz tivor tirado dos factos da accusaçao as
suas légitimas consequencias. E' neste momento que surge a
questao da inteneao, questao puramente de ordera moral, e de
provas de consciencia ; é mister entao que o juiz com o auxi-lio
da inducçao pénètre a vontade do accusado (8); ou que exa-
mine, se aao procedentes as explicaçCes do accusado, se tirao
ao acto imputado o seu caracter punivel (9), e se as circuns-
tancias, que allega, aao realmente atténuantes. Referimo-nos
sobre este ponto as nossas observaçOes acima desenvolvidas
(cap. 17) ; as allegaçûes do indiciado nao sao excepçOes pro-
priamente ditas ; e os principios do direito civil, que impOem
ao réo o onus da sua prova, nao tem aqui applicaçao -, o
indiciado nao é obrigado de modo algum a demonstra-las, para
que possao ser tomadas em consideraçao, pois basta que pare-
çao verosimeis para motivarem uma sentença, que lhe seja fa-
voravel. (10).
Tratando-se da prova do dolo, se a imprudencia fôr alle-
gada, e parecer algum tanto verosimil» o juiz nao pôde consi-
dérai' o dolo como certo. Tratando-se da prova da légitima
defesa, deve ainda o juiz procurai a explicaçao do facto em
todas as'circunstancias accessorias; e se estas autorisâo a con-
(8) Exemplo : houve dolo ?
(9) Exemplo : o accusado prétende nao ter feito mais do que obedecer as ordena
de seus superiores.
(10) Codigo pénal bavaro, art. 842—848 ; Hitzig, Annaei de Legislaçffo
crim. estrangevra, n. 12» p. 806 ; Homliorst, Annuarios do Tribunal Su-
premo de Baden, t. g, p. 105.
aos
cluir a probabilidade da allegaçao do indiciado, a duvida logo se
produz na consciencia do magistrado, e a condemnaçao nao é
mais possivel. Finalmente o mesmo diremos das cïrcunstan-cias
atténuantes ; a duvida se interpréta senipre a favor do accusado, e
a verosimilhança das suas allegaçoes te uni a assignalada
influencia na graduaç&o da pena.
CAPITULO XXI
DA VERIFICAÇAO JUDICIARIA EM GBRAL. DAS FONTES DA SUA
FOBÇA PROBATORIA.
A verificaçâo judiciaria consiste em um processo de expe-
riencia pessoal, por meio do quai o juiz vferifica a existencia de
certas cireunstancias em fundo decisivaa (1), e cuja des-cripçao
elle consigna nos autos depois do exame (2). E' mister que estas
circurastancias ainda nâo veriftcadas, e muitas vezes
contestadas, sejao examinadas pessoalmente pelo juiz, sem que
este recorra ao auxilio das sciencias especiaes •, outras vezes o
exame délias exige sentidos mais exercitados, e é en-tao o caso
de recorrer-se a peritos.
;1) Aoontece frequentemeute fazer o inquisidor exame local para saber se
era possivel ouvir e comprehender claramente as palavras, que se pro-ferirâo,
ou o motim que se fez pouco distante ; por exemplo, quando uma testemnnha
affirma ter ouvido isto ou aqûillo. e o indiciado affirma que era impossivel que
ellaouvisse. —Mas convem nâo confundir esta visita local especialissima corn
a verificaçâo judiciaria propriamente dita.
(3) A litteratura é muito pobre sobre a materia. A maior parte dos tra-balhos
scientiflcos que existera, tratâo da averiguaçâo judiciaria em materia civil.
Vide, por exemplo, Stryck, de Jure Sensuum dissert. 1,2 ; Klert, de Oculari
Inspect. Erlangen. 1776.—Ou enlâo sâo especialissimos, e nâo tratâo senâo do
exame do cadaver. Mais adiante teremos occasiâo de os citer. Kleinschrod foi
o unico que considerou a inspecçâo ocular em materia crimi -nal sob um ponto
de vista mais gérai : vide os Antigos archivas de Direito crim. t. G, liv. 8, e t. 4,
n. 1 ; — vide tombent Kittka, Da vercificaçâo do corpo dedelicto.p. 203.
aoo
A verificaçao judiciaria, propriamente dita, toma nm ca-
racter différente secundo os easos em que a lei, ou mitorisa o
raagistrado a procéder a ella por si, ou, para mais se asse-
guïar da sua imparcialidade
v
obriga-o a tomar auxiliares, e
testeniunhas, quecom elle examinera, cujoexameé corrobora-
do pelo délie, e depois por elle consignado em ura processo
verbal collectivo.
Tal é o systema seguidti pela lei austriaca (3) ; onde a ins-
pecçao judiciaria produz prova légal, quando o juiz tomou
como auxiliares du as pessoas dignas de fé, que depositao no
processif verbal o resultado das suas investigaçôes (4). Mas no
direi-to commum da Allemanha (assim como na França) o au-
xilio de testeniunhas nao é determinado, e desde que o juiz, na
qualidade publica e gal, verificou pessoalmente os factos, as
«lias conclusses sao juridicameute verdadeiras. Entretanto >esta
qualidade officiai é uma condiçâo essencial da prova; pois se o
juiz observou os factos como horaem particular, se os
acontecimentos forao por elle présenciados em um pas-seio, as.
suas obser.voes j& nao podem constituir por si sos a prova
juridica ; elle nao é mais do que uma testemunha or-dinaria.
Entrando mais na analyse da inspecçao ocular, e oonside-
rando-a em relaçao ao jùizdoplenario, convetn estabelecer uma
nova distinao : ou o juiz tem sob os olhos os objectos con-
stitutives de indicios graves, como o instrumente do crime, ou
a roupa rasgada, ou o craneo da victima retalhado pelos feri-
mento, que recebeu (5); ou a dita inspecçao nada lhe produzio,
(8) Vide o Oodigo da 1803, parte. §237 238—240 (tradurfdo pot V.
FoocherJ.
(4) Pratobeveza. Materiaespara servirent d sciencia das leis, vol. 8, p.
222 ; Jeun 11,0 Direitucrim. austriaco, 1* parte, p. 102,
f5) No processo alleo, segundo o direito commum, estes objectos sao
frequenteinento appensados aos autos, e com estes vào ao juiz. —• Vide Cod.
imlr. crim. franc, art. 133 e 291. Nota do trad. franc
307
e sômente acha conaignado nos autos o reaultado das observaçoes
do inquisidor. Noprimeiro caso parece exacto atribuir a confian-
ça dévida â inspecçâojudiciaria aos motivos deconvicçao adqui-
ridos pelo juiz na sua experiençia pessoal ; mas no segundo caso
jà elle nao tem o recurao da évidencia transraittida pelos seus
sentidos ; nao pode ter présente o objecte sugeito â verîficao : e
se aciedita no processo verbal da instruao, verdadeiro titulo
revestido de um caracter publicô, é porque nelle a expres-
sao fiel das observaçoes feitas pelo inquisidor *.'
7
importa
pois, no interesse da prova, que este tenha fiel e comple-
taraente observado, que tenba apanbado tudo o que era util
para o seu fim ; e que tenha conaignado corn inteira
sinceridade no processo verbal o que realmente vio. Vê-se
pois que n'este «caso o jnia nao tem mais por guia a évidencia
immediata dos sentidos ; e a prova material, que lhe é
fornecida, nao lhe chega senfio por iatermedio do raagistrado
instructor, que em relaçao a elle tornou-se uma verdadeira
testemunha ; finalmente no segundo caso a sua convicçao é
um producto puramente logico. Ha tambemum personagem,
eujo papel no processo deve ser bem definido : é o escri \ âo.
Encarregado de lavrar os processos verbaes, quai sera a sua
posiçao em relao ao inquisidor. '? Sera livre e independente,
e terâ direito de s6 consignai- os factoa reaes ta es quaes sao, e
taes quaes elle proprio observou 1 Em lugar de ser um instru-
mente passivo nas maos do magistrado, e de ter este o direito
de, dictando, dispor arbitrariamente da sua penna, terâ elle o
direito de parar, e recusar o seu officio a um dictado intiél ou
inexacte ? Os processos verbaes neste systeina adxjuireui maior
força probateria (6) ; o escrivao é tambem uma testemunha, e os
factos constantes do processo verbal, duplamente
(6) Por alii se vè que as funcçôesdo escrivao podem ter major importancia,
do que a que se pensa pommumente. —Vide o Proc. erim. comp. t. 1. cap. 39.
p. 194.
aos
affirmados por elle e pelo inquisidor, e demonstrados atitenti-
cw por este duplo testemunho» sao entao submettidos à âpre*
ciaçao do juie do plenario. Mas assim nao acontece • sempre
?;. infelizmeute na maior
parte dos tribunaes (6 bis) se vê no escrivao uma maquina
de escrever, reproduzindo servilmente tudo o que lhe é dicta-
do; um bornera da escolha do magistrado inquisidor ; neste
caso o escrivao nao pode ser considerad 1 testemunba, pois que
nao observa, e nao pode ter alem disso a coragem de resistir ao
seu supeiioT.
O inquisidor, procedendo a inspecçâo ocular, faz plena e in-
teira fé, mas este resultado é devido mais frinfluencia de is
qualidades, que lhe sao especines, do que ao proprio poder das
suas fnncçOes publicas. Essas qualidades sao éminentemente ef-
ficases para garantir a sua veracidade, desde que se applica, para
conhece-la, os mesmos principios usadog era ma teria de prova
iestemunhal.Com effeito uma testemunba parece merecer tan-
to maior fé, quanto melhor se recoubece a sua imparcialidade ;
que ella observou os factos com mais reflexao, sabendo que de-
porà sobre elles ; que nao deixou passar desappercebida nenhu-
ma das cireumstancias importantes, omittidas facilmente por
uma testemunba, que appareceo por acaso ; e que finalmente. co-
nbecendo toda a gravidade do seu testemunho, redobra de at-
tencSo e de esforços para nao cabir em erro, e nao fazer cahir
nelle aquelles, que deverào dar-lbe ouvidos. Ora o inquisidor,
quand o procède a inspeeçao em virtude dos poderes, que a lei
lhe confère, é precisamente esta testemunba conscienciosa e
imparcial, observa com sangue frio, previne-se contra qual-
quer illusao, e te m sempre diante dos olbos a importancia do
(6 bis) NaFranpa o escrivao énomeado por decreto real, e n5o pode ser
demiltido polos tribunaes. que tem o direito de reprehende-lo, e de de-
nuncia-lo ao ministre da justiça. Decreto de 20 de Abril de 1810, arti-
OQ KO,
8
Nota do trad. franc.
309
testemunho, que deve prestar. Finalmente, e é o que torna esse
testemunho mais forte e grave, o inquisidor iifto vem presta-lo
depuis de semanas, mezes, ou mesmo annos, como acontece
frequentemente com as testemunhas ordinarias nas causas
criminaes ; presta-o de prompto, e logo depois de terminado o
seu exame ; exame reflectido, e escrupuloso, cnjoa resultados
sa» por elle discriptos ; e entao nao é mais possivel ter receio de
coûter o seu testemunho, ede boa fé, conclusses truncadas,
embellesadas, ou transformadas pela imaginaçao desde o mo-
mento em que se produzirao, meio ficlicias emeio verdadeims.
Ve-se pelas pcédentes consideraçoes, que tinhamos razao,
quando dissemos, que a dévida à ingpecçao ocular nao se
basea na evidencia dos sentidos do juiz da causa, mas sim em
uma evidencia de logica. E' preciso antes de tudo ter fé na
exactidûo das observaçôes do inquisidor, no seu amor da ver-
dade, no seu sincero desejo de consigna-la nos autos ; é mister
contarcom a probidade do escrivao, e ter a certeza de que tudo,
quanto se acha no processo v -rbal, foi com effeito obser-vado
durante a inspecçao do juiz.
Quanto as origens deste modo de prova, as fontes do direito
commura na Allemanha pouco nos illustrao ; e o direito roma-
no nao é mertos pobre, o que nao deve causar admiraçao (7).
Em Roma o processo cri minai era exclusivamente de ac-
cusaçao : nao bavia inquisidor com qualidade officiai para
investigar a verdade ; a questao litigiosa era por assim dizer
todâ subjecHva. Tendo pouca importancia a natureza e os ca-
ractères materiaes do facto, era inutil fazer do seu exame um
objecto especial de investigaçao judiciaria.
Mais tardeveio aéra do processoinquisitorial, em que ojuiz
procède porgràos, e nao dirige directamente contra o accusado
(7) Alguma analogia talvez se encontre nos motivos da h, 1, Dig. lnspici-
endo ventre, e da L. 6, O. de Re-m«itart.
27
210
o processo da instrucçao, senao quando um crime foi rec
cido provavel (8).
Nesta época a inspecçao judiciaria adquirio uma irapor-
tancia notavel, e entao desenvolveu-se a doutrina do corpo de
delicto, que torna mais decisivos ainda os documentée, que ô
exame do juiz fornece à justice (9). Esta prova era considerada
riecessaria principalmente no caso de morte ; pois que era de
summa importanoia verificar antes de tudo (10) a existencia
do cadaver, e o seu estado, que ordinariamente faz concluir a
existencia do crime. POT isso foi ella declarada obrigatoria
pelo direitocanonico (11); e nas leis gevmanicas da média
idade (12) encontrao-se vestigios do exame do corpo da via-
tima.
Na Inglaterra este exame é regulado de um modo espeeiâ-
lissimo, e o coroner (13) (ooronator) tem por principal missao
verificar com o auxilio detestemunhasa existencia do cadaver,
ecomo aconteceu a morte (14).
(8)
Vide o
Troc. crim. cum/p.
1.1, cdp 63.
(9)
Bioner,
Rnsaios para servir cm a historia do Processo inquisitorial.
p. 94.
(10)
Gandinus,
de Maleflciis. lit. de Homicidiariis,
n. 24,
(11)
O. 18. X deHwnicid. volunl.
(12)
Stirnhoek.
de Jure Sueoum,
p. 848. Encontrar-se-hâo curiosas par-
ticularidades sobre o direito criminal em Âlkemade e Shelling,
Besehry-vmg van
den. lande van Voorne.
Rotterdam, 1729, p. 816.
(18) Braton,
du Legibus Angliot.
Hv. 3, c. 5, g 7.
(14)
O Jurisconsulte. Jornal de Jurispruiencia, n,
1 p. 50 ;
Hawkins, Plei-tos da
corôa,
2, p. 78.
an
Estas'idétfe geralmente espalhadas forfto a final reproduzi-
das naCorolina (15), que obriga o magistrado a procéder à
verificaçao judiciaria no caso de homicidio.
Estes principios forao pouco a poaco ampliados a todas os
processos cnminaes, e sendo cada vez mais reconhecida a
necessidade da verificaçao pelo corpo de delicto, firmou-se a re-
gra de recorrer â inspecçâo (16j em todos os casos, em .que o
jaiz podesse espérer que ella lhe fornecesse elementos de
convicç&o relativamente a certos factos décisives na especie.
Era entao gérai a opiniâo, de que se deviao dividir os delictos em
delicta facti transeuntis e facti permanente ; de que o unico
meio de prova para os ultirnos era a inspecçâo judiciaria \VJ)'
f
e
chegou-se até ao ponto de deixar de pronunciar a pena or-
dinaria, quando por acaso o cadaver n&o tivesse sido encon-
trado. Su modernamente é que este erro foi reconhecido (18):
hoje, que domina uma opiniâo mais acertada, sô vemos nesta
inspeâo um mcio de prova, como qualquer outro, O que como
tal nunca deve ser despresado pelo juiz, quando pode ser ap-
plicavel, porque serve de verificaçao das declaraçoes das tes-
temunhas, e alem disso porque o espirito no seu amor da ver-
dade sôfica inteiramente satisfeito, quando reconheoe, que fo-
rao empregados todos os meios para descobri-la. Finalmente
esta prova nBo é, como outr'ora, obrigatoria ou privilegiada
sobre as outras provas.
(15j O. O. O. art 140
(16) Clams, Prax. crim. guest. 4.
(17) Clarus, id. quest. 55, n. 11.
(18) Vide o Proc. crim. eomp. 1.1. cop. BU. que é mais minocioso.
319
Resta dfeëtvqiie^as leis môdërnife da A1]Ëiikï$riF[lQ), desde
que admittirao o systeraa da theoria légal da prota, n§o po-diao
deixar de determinar exactamente quaes as eondiçoes que se
devera exigir, para que a «wpecçao faça plena ; mas \ esta
nao é regulada de modo satisfatorio, e tn é incluida nas
attribuiçtes do juiz, com exclusao de qualquer outro funcciona-
rio, pelas legislaç/Jes que deixao larga margetn as convicçOes
intimas (20) e que, quanto à instrucçao preliminar, semostrao
menos severas nos tramites e meios de chegar à certeza, nao
obstante prescreverem o seu uso.
Àsairo, o procuradoT do rei, qualquer outro funccionario,
quepreencha as suas funcçoes, pode militas vezes, nao obstante
a sua parcialidade forrada, procéder pessoalmente a dita
inspecçao, podendo os magistrados decidir sobre o contexte do
seu relatorio.
CAPITULO XXII
(JUANDO SB DEVK PBOC'EDEB A* VEBIFICAÇÂO JUDICIAB1A I
Por ser de regra a verificaçao judiciaria nas informaçûes em
raateria de homicidio, por ter ella por fini entao o reconheci-
niento da existencia e do estado do cadaver, nao se segue que
seja esse o unico caso em que deva ser empregada ; é sômente
um daquelles nos quaes a sua applicaçao é "niais fréquente. A
verdadeira regra (1), que se deve seguir, pode ser formu"
(19) Codigo austriaco, £ '138. OrdenaçBo criminal austriaca g 134.—Co-
digo bavaro § 252.
(20) Vide, por exemple 0 Codigo de inslr. crim : da Fronça, art. 33, 62.
(1) Tittmann, Manual, 8, p. 291 ; Kitka, Da verificaçao do corpo de de.
lielo,X20&-~Vide o Proe. crim. comp., t. 1, cap. 90.
213
lada do segu'inte modo : convera procéder a ella, sempre qne o
inquisidor tiver espérance de poder cbegar por ella à desco-berta
de um facto importante para a manifestaçâo da verdade material,
e para a apreciaçâo rigorosamente exacta do facto imputado.
POT ahi se que ella pode ser applicada ao objecto directo
do crime (2); aos instrumentes que facilitàrao a sua execuçao (3);
a ontros objectos que fazem presumir a perpetraç&o de um crime
(4); aos proprios lugares, afim de neller achar indica-çûes sobre
o modo desta perpetraçao (5); ou afim de verificar a sinceridade
de certas allegaçOes doaccusado (6). A inspecçflo judiciaria nao
é pois simplesmente um meio de prova appli-cavel ao corpo de
delicto sômente, ou ao reconhecimento de certos factos (7), e,
nestes factos.ao decertos caractères constitutives do crime (8); ao
da natureza deste (9), ou finalmente ao das causas
concomitantes, que tiverem influido nas eonse-
(2) Por isso nâo se applica sômente à busca e exame do coda ver no caso de
homicidio, mas tambem a inform&o sobre o crime de falsidade» o 4 ve-
riflcaçâo dos titulos falsiticados.
(8) Exemplo : aos instrumentes que servirâo para o fabrico da inoedà falsa.
(4) Exempte : ao fato ensanguentado.
,5) Exemplo : quando se trata de ver, quem poderia ter estado no lugar. e
que vestigiosainda existem.
'6) Exemplo : quando se trata de terminai- a dlrecçâo das feridas em
consequencia da chapelet* da balte.
(7) Exempte : no caso de incendio da casa.
(8) Exemplo : se houve suicidio, ou se os golpes provierâo de orna mào
estranha.
(9) Exemplo . se houve forte com arrombamento.
314
quenciaa do actoiroputàdo (10)?Ella é, além ffisso, uma H
mais uteis provas para a descoberta meamo do agente Assnn
procedendo o inquisidor no exercîcio de suas funcçôes, de
assistir pessoalmente âperpetraeao de utn acto eriminoso (11);
ou pôde encontrar no lugar do crime vestigios, e indicios deci-
sivos contra uma pessoa determinada (12). H
A inspecçSo judîciarïa de tambem côncorrer para a des-
coberta de circumstancias accessorias, das quàe's se possa con-
cluir a verosimilhança da inteuçao criminosa, e possa résultat
a prova da sinceridade das testemunhas f 13)"; contribue para
demonstrar que a confissao do indiciado merece credito (14);
ou, finalmente, para verificar a procedencia da suadefeza (15).
Além disso é applicavel tanto as pessoas como as cousas, (16)
e entre as pessoas, tanto à parte lesada, como aoaccusado (17);
concorrendo frequentemente para a manifestaçâô de resulta-
dos decisivos o exame ao quai sao sujcitos.
(10) Exempte : se ha no lugar em que jaz o cadaver pedras pontagudas
que podessem fazer peiorar o estado do ferido, quando caliio.
(11) Exempte: os Eerimentos feitos por um individuo naquelle contra quem
se queixa.
•(12) Exempte : quando se descobrem vestigios, ou signaes do pegadas.
(13) Exempte : quando uma testemunha affirma ter visto pelo buraco de
uma fechadura.
(14) Exempte : quando o indiciado déclara que se occnltou desta on da-
quella maneira.
(15) Exempte : quando a acousada de infanticidio sustenta que as circuns-
taucias lugar (a calçada sobre a quai a criança fti precipitada) podem
explicar as contusôes observadas no cadaver.
(16) Exempte : no caso de ferimento, ou de forçamento.
(17) Exempte : o individuo ferido affirma que mordeu o seu aggressor no
braco ; examina-se se o accusado tem no braco o signal da mordedura.
315
CAPITULO XXIII
COMO SE PBOCEDB A VEBIFICAÇIO JtJDlOlABIA
1.* A verificaçâo judiciaria é um acto por raeio du quai o
juiz se certifica da existencia de certos factos ; mas para que
seja regular, e possa servir de base a uma sentença, é mister
em primeiro lugar que seja feita pelo juiz criminel compé-
tente (1). Militas vezes, quando se trata de objectos appaven-
temente menos importantes, o inquisidor delega esta operao
a officiaes auxiliares de ordem inferior (2) ; esta praxe é ma,
e cora effeito, se é verdade que as déclarâmes destea valem
como testerannbos, e que, como todas as declaraçfies de uma
testeraunha singular, podem coustituir uma probalidade da
existencia dfjs factos a verificar, nâo é menos verdade que
nellas nao ha verificaçâo judiciaria propriamente dita, istp é,
aquella que faz inteira ; porque, como dissemos acima,
esta procède de um magistrado imparcialissimo, que conhece
toda a importaucia do acto a que procède, que sabe précisa-
mente sobre o que deve versar o seu exarae, e cuja veracidade
é logo depois confirmada pelo éscrivao. Portante seriao justas
as criticas contra as inspecçOes e vestorias feitas pelos officiaes
de policia (3), ou pelûs funccionarios administrât!vos, que,
rares vezes (4), conm dize-lo, podem prpeeder com a calma
e intelligente circunspecçao do juiz crimiual. Quando o for
(1) Quistorp. Prineipiot, $ !W ; Grollmnnn, Principio*. g 463 ; Cotl. ba-
varo, g 285.
(2) Exemple, para examinai- os signaes de passos em direcçâo de um para
nutro lugar.
(8) O Codigo baoo.ro, 2» parte, art. 19, B. 8, autorisa a policia a procéder
a ïnspeccâo no casa de urgeuria.
216
posaivel a este tornar a fazer a inspecçao pessoalmente, devera
por prudencia chamar todos como testemunhas, e faze-los de^-
por, à novo, sob juramentp a reapeito de tudo quanto observa-
rao.
2.* Em segundo lugar, este meio de prova fornece résulta-
dos tanto mais verosimeis, quanto é certo que o processo
verbal é lavrado no mesmo lugar e logo depois de ter-minado
o exame ; previne-se por esse modo os desvios fa-cilimos de
uma memoria infiel, e as lacunns, que seriao mais tarde
completadas pela imaginaçao.
3.* Este processo verbal (5) deve ser redigido com uma cla-
reza perfeita, e os magistrados que nao tomarao parte no
exame dos objectos sujeitos a verificacao, mas que vâo julgar
sobre o conteudo deste documente deverao nelle achar uma
reprodueçao dos factos compléta e palpavel, que os faça, por
assim dizer, assistir a propria operaç&o ; por isso convém nao
despresar nenhum dos esclarecimentos que podem comportar,
como bosquejos, plantas, etc., etc. (6).
4.» 0 juiz nao deve limitar-se ao facto roaterial, quando
procède k inspecçao ; deve lembrar-se que, mais tarde, qual-
quer exame tornar-se-hia impossivel, ou que as alteraçoes, que
podem dar-se, raodificariao o sen resultado ; deve tambem
examinar com attençao todas as circunstancias uteis na ins-
trueçao ou importantes para a decisao futura, e figurar a si
proprio todas as hypothèses possiveis (7) ; deve tomar em con-
(5) Kleieschrod, AntigosArch.... t. 6, n. 3. p. 24; Pfister, Causa* erimi-
naes, p. 600. I
(C) Algumas vezes o inqnisidor e o escrivâo mettem-se a fazer por si bos-
quejos e plantas, que elle» podem entendu}-. Fazem mal, pois que neste
caso deve-se recorrer a peritos.
(7) Assim, no caso de homicidio pôde haver duvida, se a morte é o resultado
de um suicidio ou de um crime. As manchas do sangue no quarto, a situaçâo
e o ostado dos objectos existantes ao do cadaver tem entâo grande impor,
tancia. Vide o Proc. crim. corn?., t. 2, cap. 192.
217
aideracSo todas as circunstancias accessorias, que possao ter-
miner os caractères juricos do crime, de que se trata na de-
vassa, e, finalraente, todas as circunstancias de facto, que pare-
çfto mais ou menos constitutives destes diverses caracres (8).
6.° A verificaçao judiciaria requer a maior celeridade pos-
sivel : é necessario que as cousas fiquem no estado primitivo,
e que alteraçao alguma se opère de modo a apresenta-la sob
uma r erronea. Quando é necessario o auxilio de peritos, o|
ju deve fazer guardar o lugar, e impedir qoalquer movimen-
to antes da sua chegada ; outras vezes procède por si mesmo
ao exame, quando nao é preciso que este seja feito por ho-j
mens da arte; deixando de o fazer, e encarregando-o a estes,
no caso contrario (9). Finalmente, deve durante o exame ouvir
as pessoas, que chegarao em primeiro lugar, e que sendo os
primeiros, que observarao as cousas, estao habilitados para
fazer conhecer em que estado acharao o lugar, e que rfltera-
çOes houve (10J.
6.° Quando se procède à verificaçao judiciaria na occasiao
em que o processo de informaçao é dirigido contra um
accusado determinado, de acontecer que haja necessidàde de
obrigeste a assistif a diligencia. Assim se deve fazer, sem-
pre que as explicaçoes geraes por elle fornecidas nao attingi-
rem a um grâo de precisao necessaria, e tiverera fioado por
verificar certas circunstancias locaes por elle allegadas [ïl) ;
(8) Por exemplo, no caso de infantioidio. e sobretudo quando se trata das
consequencias da queda da criança. Vide o Proccrim. camp., t. S, eap. 123.
(9) Mas acontece muitas vezes que a inspecçào judiciaria e a vestoria nao se
podem séparai
-
, sob pena de se prejudioar a uma délias ; por exemplo quando
se muda de lugar o cadaver.
(10) Dirào se as manchas de sangue forâo lavadas ; se o cadaver foi con-
dusido de um para outro lugar,
(11J Por exemplo : quando se trata de déterminai* a posiçâo, que occupavâo
estas ou aquellaa pessoas.
feyu
"i |
28
218
eu qunndo os objectas tiverem de ser reconhecidos por elle M
Km todo o caso é util a sua presença no acto da diligencia, e o
inquisidor por este raeio podera mais facilrnente observât a sua
pessoa, ou provocar a sua confissao, proporciouando-lhe a
occasiao (13). Além, disso nenhum inconveniente haveria em
fazer assiatir logo o accusado ao exame, pois que, mesmo
ausente, elle deve ter noticia de todas as circunstancias, e mais
tarde deve-se receiar as suggestôes involuntarias ; assim,
mesmo aquelle que nao commetteu o crime, poderia aliegar
particularidades taes, que nunca poderiao ser connecidas por
um accusado innocente, e uma confissao da sua parte deveria
parecer logo verpsimil (14).
7.o Algumas vezes o exame judiciario é i'eito na pessoa do
accusado (15) : mas convém nao recorrer a elle senao quando
existirem provas bastante fortes para motivarem a sua pri_
sao preventiva. Esta inspeccao corporal offende a liberdade do
individuo, e muitas vezes o seu pudor, e além disso révéla ao
publico, que existem graves presumpçoes contra o accusado: e
a regra pois é que estas podem autorisar o exame cor
poral (16). I
8." Nao sendo contestado o principio de que qualquer cida-
[VI) Sobre o reconbecimento clos objectos (Recognitio), vide o Proe. crim
comp.. t. H cap. 69. I
[)Z) No thentro do crime a voz da consciencia falla com força h esiativel
ao criminoso, e o magistrado -procédera coin acerto nto deixando escapar
nada do que ne passa uelle nesle raomento. I
(14J Quanto mais concordai- a confissao, até nas menores circunstancias,
como o numéro, a forma dos ferimentos, etc., etc.. com o resul tado das outras
provas, tanto maior fi mereceva.
(V>) No caso de infanticidio, e de forcamento.
(IQ) Orden, crim, da Prussia, g 145 ; Cod. bavaro, g 80.
210
dao é obrigado a provocar a acç&o da justiça criminal, que se
exerce no interesse da segurança social, (17) e que a instrucçâo
ocular é um meio efficaz de verificar a verdade, segue-se que
nao se deveria negar ao inquisidor o direito de procurar veri-fica-
la em qualquer lugar (18); devendo porém faze-lo com
circumspeccao e prudencia no caso do exame corporal na pessoa
offendida (19).
CAPITULO XXIV
DAS RFGRAS QUE CONVBM OBSERVA a EM MATERTA DE VERIGAÇAO
. JUDICIARIA, 8BGUND0 A NATUREZA DIVERSA DOS CRIMES A CUJo|
PROCES80 DE AVERIGUAÇÀO SB PROCEDE
E' principalmente no caso de homicidio que a verificaçao
judiciaria tem «ma importancia especialissima, e o seu carac-ter
particular consiste em que de ordinario ella tem îugar
simultaneamente com o exame dos peritos (por exemplo quando
se faz a inspecçao do cadaver) ; mas esta simultaneidade nem
sempre é necessaria; e militas vezes é de lamentar que o in-
quisidor, confiando de mais na exactidao dos peritos, e al>an-
donando-lhes a averiguaçSo de todas as circumstancias uteis,
nao reconheça o seu dever, como juiz, de por si mesmo exa-
minar os mesmos pontbs sujeitos ao exame dos peritos, taes
como as feridas, a posiçâo do cadaver, as manchas de san-
(17) Tittmann, Manual.,., 8, p. 293.
(18) Por isso tem elle o direito de examinai- o interior de uma casa, na quai
desconfia que honve um infanticidio.
^19) Porque a voz publica déclara que uma senhora foi victima de um for-
çamento, nâo se segue que o inquisidor por estes simples dados, va de algum
modo arbitrariamente, para descobrir a verdade dos boatos que cir-cuo,
sujeitar a mesma a um exame corporal.
290
gue; etc., etc. Deve actes tomar como regra, assignai»* por
si' todas as circumstancias importantes, sem 0e preocctlpar
corn o trabalho que mais tarde farao os pérîtes" ; otf, no caso
de procederem ao exame simultaneamente, de consigner no
processo verbal as circumstancias, que tambem provocàrao o
exame dos peritos; assim observadas e verificadas pelo juir,
ellas vem confîrmar os resultados da vestoria. Km todos os
processos de averiguaçOes sobre homicidio o juiz, procedendo
à inspecçao officiai (1), deve tratar de reconhecer a existencia
do cadaver, as vestes que o cobrem, o nuro e estado dos feri-
ntentos; deve descrever com a mais minuciosa exactidaô o lugar
etn quejasia o cadaver, os objectas que o cerrào, os instrumentas
do crime, os objectas que pertenciào d viclima, ou as pessoas
que a cercao, a extensâo e a direcçâo dos manchas de sangue
sobre o cadaver, e ao redor délie: finalmente nao deve omittir
circumstancia alguma. por minima que pareça, como os ras-
es ou incisôes das vestes, os signaes de passos ao redor do
cadaver com direcçâo a elle ou para longe délie, e finalmente
a sua forma, e a sua natureza (2). * ,
A inspeao judiciaria no caso de homicidio tem por objecte
mais especial o proprio corpo de delicto, e tudo quanto pôde
auxiliar para decidir com toda certeza da sua existencia ; esta
operaçao é sobretnodo e particularraente efficaz, quando se trata
de verificar quai a causa da morte, e se se deve attribuil-a a
um suicidio, a um accidente natural, à imprudencia do morte,
ou à uma criminosa mao estranha (3). H
Convém entâo descrever exactamente a posiçao do cadaver
(1) Vide o Proc. erim. nomp., t. 2, cap. 122. '
(2) Sera sempve util appensar aos autos um desenho exacte.
13) Sobre esta materia as obras especiaes estâo citadas no Froc. crfm.
comp. t.'2, cap. 122, nota 1.—Deve-se accrescentar Wendler, de Mortis pro-
pria manu tibi paraiœ indagatione. Lipsice, 1830.
aai
(4); a distancia que sépara o intrumento do lugar em que
elle jaz (5); os signaes apparentes que iudicao utna causa de
morte facil de verificar na especie (6). Convém tambem
indagar quem veio ao lugar, em que jaz o cadaver, ou se
era absolutamente impossivel ' o accesso. Se se demons-
tra que a morte foi causada por nnm mflo estranha, todas as
circumstancias devera da mesma sorte ser assîgnaladas, por-
que pôdera demostrar, ou que o agente estranho so por si a
causou, ou que para ella tambem concorrerao causas interme-
diarias; e podem fazer conhecer de que modo foi consummado
o crime, e quaes forao os seus motivos (7).; assim torna-se pos-
sivel muitas vezes saber, a quem deve ser attribuido o crime,
pelo facto de terem sido subtrahidos certos objectas, que ordi-
nariaraente o morto trazia comsigo, ou que se achavao collo-
cados perto délie.
A inspecçao judiciaria passa por phases e direcçOes diffé-
rentes, segundo a natureza diversa do homicidio.
No caso de infanticidio o examedos homens da arte é indis-
pensavel; todavia é sempre util a inspecçao pessoal do juiz, que
deve examinar o estado do lugar, em que teve lugar o parto, os
signaes de ter sido este récente, e o local que occupao, »s cw-
tt) A vietima foi achada assentada ou deitada : -deitada de costasou de
bruços, etc., etc.
|5) Esta circumstancia é importante; muitas vezes pôde-se indagar se o
suicida teria podido arremessar para longe o instrumenta da morte.
(6) Exemple : se se trata de nm homem achado enforcado, deve-se examinar
se os pés tocào o chao. 0 processo da morte do duque de Bourbon offerece
um exemple frisante desta particularidade. Vide Hennequin. Ob,erva(fie*
sobre tu averiguaçôes relativas à morte do duque de Bourbon. Pans. 183-.
p. 96.
(7) Pôde-se presumil-os segundo a posicSo que occupavâo o accusado e o
seu antagoniste.
292
cumstancias, que teriao podido accelerar a morte da crianca (8^
Militas vezes esta inspecçao torna-se necessaria mestno no
curso do processo da instrucçao; pois quandoo açcusado allega
certos incidentes, que sobrerierao durante o parto, e certascâr-j
cumstancias, que parecem ter exercido funesta iufluencia, deve-
se examinar se estas allegaçGes sao ou n&o procedentes.
Se se desconfia de um envenenaraento, aléni da descripçSo
exacts do cadaver e do seu estado (9), que é o objecto da prin-
cipal missâo dos peritos ; è necessario procurar todas as subs-
tancias expellidas pelo defunto durante a sua ultima molestia,
os restos de alimentes, das bebidas, de remedios que lhe forflo
dados. Todos este.? objectos devera ser cuidadosatrente
conservados, como tambem todos os vasos, caixas ou gavetas
que guardaraos medicinaes ou quaesquer outros ; mais tarde
os peritos tertio de os examinar.
Quando a averiguaçao tem por objecto ferimentos, algumas
vezes nao é de absoluta necessidade que o juiz os examine
pessoalmente ; os peritos estao mais no caso de descrever o
estado do ferido, e de o examinar sem o mortificar ; mas nom
por isso deve o juiz deixar de considerar o tbeatro do crime
(10); e sômente por sua observaçao é que sera possivel reco-
nbecer a influencia de certas circumstancias estranhas (por
exemplo, a existencia de pedras ou ramos pontagudos, sobre
os qnaes canisse o ferido). Pôde-ee j)roceder tambem ao exa-
me na pessoa do cusado, quando affirma tersido aggredido
porque, havendo demora, séria rmpossiveldescobrir ainda nelle
os vestigios das violencias, por elle allegadas.
No caso de forçamento convem desde logo procéder ao
exame do corpo, e principalmente das partes sexuaes da pessoa
(8) Se por acaso existent pedras pontagndas no châo ; se a criança cahio
de uma escada, e quai a forma dos degraos, etc., etc.
I (9) Vide omen P'jfe.^gfc corap. t. 2, cap. 124. H
(10) Pfistej^caMsas crimAnats, t. 5, p. 606.
S23
que se queixa ; devendo-se tambein examinar a pessoa do ac-
cusado (11).
No caso de incendio voluntario (12) a verificaçao judiciaria é
absolutamentenecessaria. Por eila o juiz reconhece, se houve
effectivamente incendio, quai a extensao do damno, por onde o
fogo começou, que direcçao seguio, de que materia inflam-mavel
se servio o autor do crime, que distancia para o lugar do
incendio dos edifîcios visinhos (13).
No caso de furto (14) a inspecçao judiciaria tem por objecto o
lugar, em que elle foi commettido ; convem verificar quai o
lugar, em que estavao os objectes subtrahidos, de que modo
parece ter sido o furto consummado, se houve arrombamento,
escalada, etc., etc.; comoo ladrao se introduzio e evadio-se, e
finalmente se existera signaes de violencia.
No caso de fabrico de moeda falsa (15) a inspecçao tem por
fini a pesquisa dos instrumentes do crime, das materias
empregadas pelo moedeiro falso, e o que existe no lugar do
fabrico.
CAPITULO XXV
DAS BEGRAS DE APRBCIAÇÂO DA FORÇA PROBATORIA DA VERIFICAÇAO
JUDICIARIA E DOS EFFEITOS DESTA VERIFICAÇAO
O facto é considerado juridicamente provado, desde que é
verificado pela inspecçao judiciaria regularmente feita ; e a
dévida a esta tem por base o caracter especial do magistrado
f
(11) Vide Pros. crim. eotnp., t. 2, cap. 126.
(13) Cod. Bavaro, art 82. Ordn, crim. da Prussia, g 185.
(18) Tittmann, Manual. § 343 ; Pflater, 1.» o., t. 5, p. 519.
(14) Orden.' crim. da Prussia, g 179.—Vide o Proc. crim. comp., t. 2, cap.
126.
(15) Orden. crim. da Prussia, g 198,.— Pflster, Causas criminaes, t. 2, n. 8.
i
334
que faz coin que se oconsidère necessariamente como uma tes-
temunha digna de credito; tem tambem por origem as virtudes
fia processo "verbal officiai. Ora sendo o màgistrado verificador
uma verdadeira testemunha em relacao aos iuizes defmitivos
- * ^*t|
que têm de apreciar os resultados da inspecçao, segue-se que
todas as causas, que podein dirainuir a confiança no depoi-
mentode uma testemunha, podem igualmente attenuar a força
probatoriada inspecçao, no caso de se poder allegar com razao
os mesmos defeitos analogos ; por isso luctaria a defeza, se se
provasse, que a verificaçâo da identidade dos objectos nao foi
convenientemente feita; que quando se procedeu à inspecçao,
nao era possivel que ella se apoiasse em bases essenciaes (!)>; ou
se se arguisse o facto de ter o juiz, em lugar de examinai- por
si mesmo, aceitado as observaçOes de outra pessoa, conaignan-
do-as como suas no processo verbal (2).
Em relaçao a aseistencia do escrivao, de que fallamos acima
(cap. 21), poder-se-hia com ter ainda os termos do processo
verbal, demonstrando que, em lugar de confirmar as obser-
vaçOes do juiz pelas suas, nada mais fez do que escrever servil-
mente o que este lhe dicton (3).
Baseando-se ainda a força probatoria da inspecçao no facto
de serem incontinenti consignados em uma peça officiai e
authentica os resultado do exame do juiz, segue-se que se
attenuarà esta mesma força serapre que se provar que o pro-
(1) Por exemplo : quando sobre vierâo alteraçôes notaveis.
(2) Com effeito, militas vezes. e sem razSo, o inquisidôr encarrega a um
ofBcial de justiça de procéder ao exame, e consigna no processo verbal, como
suas, observaçôes estranhas.
(3) Por exemplo : quando o escrivao chegou depois de terminado o exame.
sas
cesso verbal nao foi lavrado immediatamente (4), ou que
omittio-se alguma das fofmalidades exigidas pela lei (5).
A inspecçao judiciaria tende ordinariamente a demonatrar
o corpe de delicto (6), ou ao menos, uma parte lie (7); nao
tem por fim a descoberta do autor do crime : todavia por ella
o juiz pôde chegar a sua descoberta mediata, ou immediata-
mente : immediatamente, quando, prevenido a tempo, chega
ao lugar, e sorprende o agente em flagrante delicto (8); me-
diatamente, quando verefica certas cireiimstancias raateriaes,
que fazem nascer suspeitas contra um cidadâo (9)
Finalmente ella de concorrer para a descoberta de factos,
que muito eselareç&o a questâo da intençâo, ou para provar
que o accusado se achara no caso de légitima defeza ( 10)
(4) O inquisidor faz sempre mal em nào lavrar o seu prooesso verbal no
proprio lugar da inspecçSo, contentando-se em tomar à pressa notas, para as
consultai" depols, quando voltar à sua residencia.
(5) Por exemplo : quando o mngistrado nào assignou.
(6) Exemplo : procura-se o cadaver, quando alguei» loi morto.
(7) Exemplo : veriflcar, se o furto foi effectuado oom arrombamento,
(8) Exemplo : o juiz pénétra em uma officina de moedeiros falsos em
actividade,
(S) Exemplo : o accusado mostra os ferimentos, que a parte queixosa af-
firma ter-lh'os feito.
(10/ Por exem.lo: quando a direcçâo, e natureza dos ferimentos dào lugar a
cver que o accusado nao podia tel-os feito senâo no "meio da lucta e depois de
ter derribado o seu adversario.
FIM DA SEGUNDA PARTE.
336
TERCEIRA PARTE
DA PROVA POR PERITOS
CAPITULO XXVI
NATUREZA DA PROVA POR VESTORIA
Tem lugar a vestoria sempre que se apresentarem no pro-
cesso criminal certas questoes importantes, cuja soluçao, para
poder convencer o juiz, requer o exame de homens munidos de
conhecimentos e aptidOes technicas e especiaes.
E' pois necessaria : quando se trata de verificar a existen-
cia de certos factos ; exigindo esta verificaçao indispensavel-
niente, para ser bem feita, os conhecimentos technicos, de que
acabamos de fallar : por exemplo, no caso de vetsar o exame
sobre os signaes da virgindade ou sobre a existencia do veneno
no corpo.
2." Quando se trata de decidir da natureza e das qualidades
de certos factos (1).
3." Principalmente quando a base da sentença deve apoiar-
se na admissibilidade de um facto como possivel ou prova-vel
(2) : por exemplo, quando uma testemunha affirma certos
factos, certas relaçoes de factos (3), e quando o indicîado allega
a existencia de certas circunstancias accessorias do crime,
(1) Exemplo : que direoçâo no corpo seguio o ferimento T
(2) Exemplo : de alguem ser ferido por uma bala em uma dislanoia de»
terminada ?
(3) Exemplo : era possivel que à testemunha visse o que se paasou na dis-j
tancia em que se achavaf
33T
cuja damonstraçao mente podesse provar a sinceridade da
sua confiss&o (4).
4.° Quando se trata de tirar- consequencias dos factos de-
monstrados. as qua'es podem ser tiradas pelo perito (5).
Do exposto se pôde concluir que é um erro grosseiro (6)
considerar a vestoria como inspecçao judiciaria com forma
diversa, opiniao esta muito espalhada ; em certos casos, sem
duvida, o exame dos peritos coincide com o do juiz (7); ou
versa sobre os mesmos factos, jà examinados pelo juiz, e que
estao sujeitos â percepçao immediata dos sentidos (8), quando
os mesmos peritos sao obrigados a ftmdamentar o laudo, que
délies se exige.
Além disso o inquisidor tem por missao dirigir adiligencia,
para a quai os tomou como auxiliares, e entao é natural que
provoque a sua attençao para os pontos decisivos da causa (9);
mas tudo isso nao prova que seja exacto dizer que a vestoria
é uma forma da iuspecçao judiciaria ; quando o juiz convoca
os peritos,*nao é para que elles o colloquem em posiç&o de
(4) Exemplo : o indiciado affirma que praticou o envenenamento com esta
ou aquella substancia.
(5) Exemplo : o ferimento foi mortal î o veneno causou a morte ?
(6) Esta theoria se acha ainda em alguns oodigos modernos {Godigo bavaro,
232—235).
;
«u
(7) Aasim, na occasiâo da inspecçào do cadaver, e no mesmo momento em
que o perito pratiea â autopsia, o juiz se occupa em descobrir todas as cir-
cunstancias aptas para decidir se houve suicidio ou homicidio, ou que podem,
por via de inferencia, fazer descobrir o agente.
(8) Exemplo : sobre a posiçSo do cadaver, sobre o ferimento no quai se
achao as pingas de sangue.
(9) Exemplo : segundo a forma e natureza dos ferimentos» qnal dévia ter
sido a posiçâo respectiva do agente, e da victima î
sas
observât pelos se us proprios olhos ; HO menos s6 muito raras
vezes assira poderà acontecer : (exemplo : quando a autopsia
foi praticada e o steruou levantado, o j.iU examina por si a
direcçao da bala). Mesmo em sua présence" ordinariamente sô-
aos olhos do pratico é que os factos apparecem claramente, e
na sua verdadeira natureza ; nao podendc o juiz deixar de K-
ferir-se as suas affirmaçôes sobre a existencia de caractères,
que se se revelao a vistas mais exercitadas (10).
Em couclusao diremos que em todos os casos, e mesmo
quando o juiz assiste i vestoria, esta nao é mais do que um
meio ; que conduz o perito à conclusao tecb.ni.6a que se espéra
délie. O meoico pratica a autopsia afim de certifîcar-se, se as
feridas sao uaortaes ; e o cbymico, por meio da analyse busca
convencer-se da existencia do veneno.
Estando pois bem conhecido o objecto principal da vestoria,
nao se tem conbecimento exacto da sua natureza, vendo-se
nella somente a inspecç&o judiciaria ; e tal opiniao menos ad-
missivel ainda é em todos os casos em que os peritxte sao inter-
rogados a respeito da possibilidade de certos factos em gérai
(II), ou emque o juiz, apoiando-se nos seus lâudos, décide que
estas ou aquellas allegaçôes produzidas merecem ou nao
credito.
Ha pouco se vio a que multidao de factos se applica esta
prova ; e portanto é impossivel que a seguinte questao, tao dis-
cutida em nossos dias ce os peritos sâo testemunhas ("$%}, ou
(10) Exemple : sobre as snas observaçôes quanto à cor dos pulmôes, à
existencia de tuberculos, etc., etc.
(Il; Exemplo : Titius, depois de ser ferido, poderia ainda ter gritado tâo
alto e por tanto tempo, quanto era necessario para ser onyido a uma distan-
cia determinada ?
(\%) Tal é a opiniSo de Schneider. Tratado da prova. § 176 ; Btubel, Do
corpo de delicto, § 237 ; Grollmann, Principios.,.. § 363.
339
simples auTtliare* do jttiz (12) ? » possa condusir à verdadei-m
definiçao da sua natureza (\A) ; pois esta divisSo em teste-
munhas e em auxiliares da justiça ofto pode coraprehender todos
os caaos, em qu • se faz uso dessa prova ^15}. Se sao chamados
para decidirem certas queatoes geraes, para di-zerero se (al facto
é ou nfio possivel, os peritos julgâo ; nao sao testemunbas.
porque nada tèm a observar. Se elles tèm de pronunciar-se s »bre
certes facto*, que exigera <> exame de um homem da arte, eutfto
as suas affirmnçoes se assemelhao, mas «omente em parle, an
depoi mente testemunhal ; poder-se-bia sustentar nesta
hypothèse, que o perito reconhece a exia-tencia de certes
caractères materiaes, os da gravidez por exempte, tfto
positivamente como uma testemunha a cor branca, negra etc. em
um objecte ; porem, nao obstante, em fundo é sempreum juizo
que elle emitte sobre a natureza e as relaçGes de um facto; nao
podendojamais ser bein cabido o titulo de testemunha, e nom ode
testemunha racinnal ' 17), ou de testemunha leltrada{lSj. Cbegsr-
*e-hia as mais errowas conae-quencias, se se quisesse fazer obra
por uma analogia evidente-mente fais» ; quando prestamos fé ao
depoimente de uma testemunha, é porque juigatnos que os se us
sentidos nao a enga-nartto ; acreditamos na sua simplez
aftirmaçao, sem exigir que a motive ; mas cousa diversa acontece
com o perito. A testemunha pode ser chamada a explicar-se em
qualquer terris; Tklé a opiniSo de Goenner, Manuat do Proc. crim. t. 3, f
412.
(W Pratobevera. Materims para servirent d sciencia das leis da Austria. 8, p.
218.
(\b) Kitka, Verïflcaçâo do corpo de AelirUi.% 204,
(\%) Vide o froc. crim. eomp. 11. cap. 85.
(Yt) Foi Grolman. Prindvioe, f 888. que propos esta donominaçâo,
f 18) Pratobevera, Moteriat* etc. 8. p. 218, serve-se dette termo,
330
mo do processo, nao bavendo necessidade de lUe dar uma
dilaçao para reflectir; mas o perito tem necessidade de uma
dilaçao sufficiente para preparar e amadurecer o seu laudo,
pois que tem de observar os factos, coteja-los com as experi-
encias jà adquiridas, e applicar-lhes as leis da sciencia.' Cada
uma das testemunhas depoe isoladamente ; no entanto que
muitos peritos podem reunir-se, concordar, e dar um pa-l reoer
em commum deliberado. Tambem nao séria exac considérer
os peritos como auxiliares da justiça ; seriao uma espe-cie de
juizes, sob a presidencia do magistrado director, do quai se
tornariao acolytos obedientes, enearregados simples-mente de
lne tornar intelligiveis os factos obscuros da causa, e de
facilitar-lbe a sua missao. Ora nao é isso o que acontece na
maior parte dos casos : os peritos sfto totalmente indepen-
dentes no seu laudo, e alem disso ignorao o que esta fora dos
sens conbecimentos especiaes ; e a sua opiniao détermina a
convicçSo dojuiz do plenario, sem que nella tenba .parte a au-
toridade do magistrado instructor, que dirigiu asinvestigaçoes.
A vestoria constitue, pois, uma prova nui j/enerù, e cuja apre-
ciaçao ao pôde ser feita segundo certos principios, que lhe sao
proprios. Outr'ora jà os doutores tinhno eonsider&do os exper-
tos como uma especie de arbitres (I9),
#
e partindo da regra (20)
da separaçao das attribuiçoes quanto à pronuncia do julga-
inento em materia de arbitramento, reconbeciao em certes pes-
soas a attribuiçfio de decidit das questoes preliminares e pre-
judiciaes, nas quaes os homens da arte sao compétentes ; nao
tendo depois o juiz nada mais a fazer do que applicar ao facto
principal esta decisao prepatoria. Em todo o caso este système
é verdadeiro, e nos tempos modernos o papel dos expertos tem
outro analogo, pois que estes sao juizes de facto semelbantes a os
(19; Vide o artigo do antor nos Arch. de Pr*c. CM». 2, p. 130.
f30; Millœus, Prtuns criminatis persegumdi. Paria, 15*1, f, 8.
231
iurados, ao menos no sentido deterem de fornecer umâsol&o
scientifica ao juiz, quando os convoca, e lhes propOe um quesi-
to de facto prejudicial (21) , para poder decidir definiiimen-
te ; por isso o juiz, antes de poder decidir se houve infanti-
cidio, tena necessidade de saber, se o recemnascido viveu ;
para que possa applicar a pena estabelecida contra o aborto,
tem necessidadede saber, se este foi realmente promovidb.
Em uma palavra, o juiz firma a sua sentença. na resposta for-
necida pelo perito à questâo prejudicial, salvo se tiver jusia
razao de duvidar, que ella seja solida e certa. Examinando-se
mais a fundo os motivos desta confiaa do juiz, quando assim
abandona a direcçao da sua convicçao as palavras do perito
a ponto de fazer lias a base da sentea final, chega-se à
intelligencia perfeita da natureza da prova de que nos oceu-
pamos.
1." Tem direito à confiaa, nos limites da sua artee das suas
declaraçOes scientificas, aquelles, que possuem os conheeinien-
tos especiaes exigidos, que sabem diacernir os caractères te-
chnicos nos factos do seu dominio, ou que sabem empregar
os meios sctentificos os mais proprios para a manifestSo da
verdade (22).
2." O juiz depois funda-se na lealdade do experto no curso
das observOes, que lbe sao pedidas ; e este deve procurar coni
mais cuidado a verdade, e su a verdado, pois que a santidade
do seu juramento o adverte duplamente, que se espéra délie
um exame consciencioso e sincero, e que o seu laudo vai inspi-
ra? o julgamento.
3 Da mesma sorte o juiz tem direito de esperar do experto
que tenha desejo de dizer sincera e inteiramente o que tiver
observado.
(21) Tal é a opiniâo de Gannignani, Leggi délia Sieur, vol. 4. p. 88.
(HZ) Carmignani, 1. 5. p. 88.
333
4." Alera da sua lealdade o juiz conta com a sua sciencia. e
corn a sua educaç&o pratica ; e esta convencido que n&o lhe
sera difficil achar as leis scientificas (23 as experiencias BUS-
ceptiveis de applicaçao aos factos etn questao.
5." Julga que depois de as ter achado farà a justa applicaçao
délias aosditos factos, ededuzirâ as consequencias autorisadas
pela razao e pela sciencia :
6." O laudo do perito inspira tanto rnaior confiança, < to
mais fortes forem os motivos principaes, e melhor firmada a
sua mutua relaçao : nelle ve o juiz o signal indicativo de um
exame attento de todas as circumstancias, da madureza, da
solidez das observa çoes.
7-° Finalmente a humanidade dos peritos constitue militas
vezes mais uma nova e poderosa garantia.
A força probatoria da vestoria é o resultado de presumpçoes
ligadas amas h* outras : é pelo effeito de uma presumpçao que
attribuiraos aos péri os conhecimentos especiaes sufficientes,
e o sincero desejo de achar so a verdade nas suas investiga-
çoes ; mas é mister que estas presumpçoes sejao corroboradas
por todas as circumstancias da causa, para que as declaraçOes
dos peritos possao formar no juiz uma convi&o«sufficiente ;
d'ahi nasce o seu direito importante deexaminar a fundo o seu
laudo. E se nos lembrarmos, que nao raras vezes elles sao obri-
gados a invocar, como regras, leis scientificas inuitau veees e
vigorosamente contestadas (24) ; a tomar, como ponto de pnrti-
da, experiencias sugeitasfacilmente ao erro (25); que, por ci,
em todos estes casos o seu juizo nada mais é do que a expressfio
,28; Tal é. ua prova LydroaUUc» dos pulmoes, a lei que gala rela-
çôes da respiraçâo e da vida do reeeuiua«cido
(-24) Por exemple ; tem sido muito criticada a prova Urada do ertado da»
pulmZet ou da bexxga.
(V» Exempta: qiando os peritos declarlo possivel ou nio a cura de un.
terimento.
333
das suas opiniOes pessoaes ; mais nos convencereraos da seguinte
verdade : que a vesèoria, como tantas outras provas, basea-se
iem uni encadeamento de presumpçCes.
Recentemente quiz-se (26j estabelecer uma distin&o entre
os peritos officiaes, nomeados pela administraçao para todas
as causas em rai, e aquelles nomeados especialménte pelas
partes (27). Neste systema os segundos constituem um meio
de prova, os primeiros os auxiliares necessarios do juiz. Tal
distinEo é erronea. 0 erro consiste em suppor que o perito
officiai tem maior autoridade, e é mais digno de fé, o que é
completamente inexacte. Quando a administraçao nomêa um
experto junto aos tribunaes para certes investigaçôes, tem
por fim os interesses da justa ; quer que haja certeza de se
encontrar sempre homens praticps e' habeis (28) ; e de ordi-
nario estes, assim nomeados, recebem um ordenado fixo.
Eis tudo o que os distingue ; mas a confiance que podem ins-
pirar, assim como os outros, procède da consideraçao em que
se os tem pela sua sciencia, e do merito racional que se nota
em o seu laudo : quando o juiz os proclama dig-nos de fé, tem
sempre em vista a sua educâo scientifica e especial ; e a sua
nomeaçao officiai é certamente'niais uma garanjia da sua sci-
encia ; mas esta mesma garautia pode tambem existir no di-
ploma, nos exames administratives, na reputaçao de habili-
(26) Reinhard» Manual de Proc. civ. 1* parte, p. 356 e seg.
(%l) Reinhard limita as suas observaçôes ao, processo eivil ;mas por via de
consequencia deveria da mesma sorte distinguir os peritos eseolhîdos e cha-
mades pelo laquisidor dos nomeados pela admimstragâo.
(W) Assim, em certes gaizes, nos termos dos regulamentbs medicos, ha
sempre um medico officiai. E' o fim do projecto de lei actualmente submetti-
do as camaras francezas, instit"indo medicos de Jistriclo.
(Nota do trad. fronces.)
334
dade do perito (29), etc. Km oiitro lugar faremos ver que o
auxilio de peritos officiaes de nenhum modo-é indispénsavel e
obrigatorio, e que em todo o processo é sempre licito ao in*
quisidor recorrer a outros.
CAPITULO XXVII. I
CARACTERES DA VRSTOBIA SEGUND0 AS DIFFERENTES LEGlSLAÇOÊi?.
Quaudo incidentemente esboçàmos acima (cap. 21) o caracte
r
do processo crimiual dos Romanos, dissemos quantb era su ffi_
ciente para fazer ver que uelle nao se encontrao regras e'spè-
ciaes em materia de vestoria ; os Romanos pouco se preoccu-
pavao com o côrpo de delicto (na accepçao modem a da pala-
vra) ecoma sua verificaç&o (l).Foi no processo inqùisitorial qu
e
esta investigaçfto adquirio toda a sua importancia ; o direito
canonico foi o primeiro que prescreveu ao juiz fazer-se acom-
panhar de peritos medicos (2), se bem que nesta época, e por
causa do estado da sciencia, a sua miss&o se limitasse à ins-
pecçâo exterior dos ferimentos. O direito germanico mostra 1
•vestigios de ter cedo adoptadoauso de chamar os medicos para
resolverem qûestôes technicas ; o que é provado por certas leig
municipaes beigas (3j e bbllandezas [A) ; e certamente a mesma
(29,} Supponhamoa que haja dous pareceres de peritos, um emanando de
nm cirurgiSo illustre, outro do perito officiai, dever-se-ha acreditar com pre-
ferencia no dô ultimo somente por ser perito officiai ?
(1) As lois romanas sào corapletameute mudas, mesmo em relaçâo ao caso de
homicidio ; nada nellas indica que se procedesse ao exame do cadaver por
intermedio dos medicos ; todavia vide Gericke, Progr. quo inspectio cada-veris
in homic. apud Êomanos in usu fuisse ostenditur. Helmst. 1739.
(2) C. 18. X. de Homic.
mémtÀ
(3) Direito municipal de Bruges em 1821, em Saint-Génois, Monumentos
antigos. Paris, 1782, p. 684. I
(4) Vide a obra de Akemade, citada acima, cap. 21, nota 12.
33S
cousa aconteceo na Inglateira, onde o coroner (5), encarregado
de provocar uma decis&o do jury sobre o genero de morte do
finado, e de preparar o pTocesso, tomava da mesma sorte como
auxfliares os bomens da arte. Finalmente os praxistas
italianos média idade davâo grande valor ao parecer dos
peritos (6), e pelos seus livros se vê, que a sua nomeaçao sô
pertencia ao inquisidor, quando o accusador e o accusado nao
se acordavao a respeito (7). Sendo esse o uso dès tribunaes
desde essa época, concebe-se porque razao mais tarde Schwart-
zenberg, o redactor da Carolina, tambera determinou que o
juiz os cbamasse como auxiliares (8) ; mas, nada mais exigia
do que o exame exterior dos ferimentos e o seu relatorio sobre
este exame ; e a razao é porque entao a arte das autopsias (9)
nao estava generalisada ' a ponto de se a empregar até nas
informaçôes judiciarias ; e os laudos dos peritos contempo-
raneos, que cbegâo até nos, nao se referem senao a esta ins-
pecçao superficial (10). Mas em brève a sciehcia fez progressos
notaveis ; e como querer a manifestaçao compta da verdade,
era querer que nao restasse duvida alguma por esclarecer, por
(5) Piener, Hiatoria do Processo de InquisiçSo, p. 280 ; e melhor ainda.
Tomlins, Diccionario de Jurisprudence, verb. Coroner, n. 2.
(6) Grandi-us, de MaleficiiB, tit. de Homicidio, n. 24, dizia entâo; que o
relatorio de dous ou très medicos merecia mais do que des ou vinte tes-
lèmunhas, que nâo fossem medicos.
(7) Grandinns, 1. c. n. 25.
(8) O. O. C, art. M8.
(9) E' esse ao menos un pontohistorico controverso: vide o Manual de Proe.
Pen. do autor, t. 1, p. 620. Oompare-sé a sua opiniào de entâo corn a se guida
por elle no Proc. critn. comp., c. 2, cap. 122, nota 25.
(VU) Mguns forào citados no Proe. orim. comp., t. 2, cap. 122, nota 24.
336
toda a parte fez-se uso da veston» ; oonsiderou-se dever do
inquisidor aproveiter-se das novas descobertas da sciencia, a fim
de, corn a maior segurança possivel, constituir a certeza nos
resultados da informaçâo. Ch»marao-se entfio os peritos, j nao
sômente para a verificaçao do corpo de delicto, mas \ tao bem
para a demonstraçao da ainceridade dos teste-munhos (11), e da
confissao (12), ou para apreciar (13) as faculdades de
discernimento do indiciado. Foi neste mais amplo sentido que as
leis penaes da Alleiuauha moderna regularao a vestoria.
A lei austriaca limita-se a simples indicaçoes, mas deixa ver i
clar ameute que a considéra uma prova sui generis (14).
A ordenaçâo criminal da Prussia contém prescripçoes muito
mais complétas (15 J : distingue cuidadosamente o simples rela-
tprio sobre os factos observados, que pode ser apreciado como
um depoimento testemunhal (16), do parecer motivado ; exige
que o juiz verifique sempre pessoalmente o exame, ao quai
procedem os peritos ; impoe-lhe o dever (VI) de dirigir as suas
observaçOes, e de exigir-lhes um parecer concludente e con-^
vincente (18).
(11) Exemplo : a testemunha affirma que o crime foi commettido deste ou
daquelle modo : é o que a vestoria verificarà.
|
(12) Exemplo : o perito examinait, se, segundo o que confessa o accusado, | era
possivel nao terem ficado vestigios do facto criminoso.
(18) Vide o Proc, crim. conyp., t. 2°. cap. 147.
(14) Codigo pénal austriaco de 1803, 2» parte, §§ 240— 247.
(15) Porém nâo se de affirmar que esta lei considère a vestoria como uma
especie de inspecçâo judiciaria.— Todavia vide Kitika, Da Verifkaçôùa do corpo
de delicto, p. 218.
(18) Orden. crim. da Prussia, §§ 141178.
(17) Orden. crim. da prussia, § 148
(18) Orden, crim. da Prussia, g 168.
33T
0 Codigo bavaro (19) enuncia uma theoria especial : consi-
ra a vestotia como uma forma de inspece&o judiciaria;
maior aos peritos officialmente nomeados pela administra-
çao (20) ; e quanto ao exame ocular dos factos, exige que se
cumprao as condiçOes ordenadas em materia de prova teste-
munhal (21), as quaes sôraente podem dar força plena ao seu
relatorio (22).
Seguem différente systema as legislaçoes, que considerâo
a publicidade dos processus como principio fundamental.
Na Inglaterra a vestoria é usada principalmente nas ins-
trucçOes preliminares, quando o coroner (23) informa so-
bre a morte de um individuo, e indaga quai foi a causa.
Aqui convera cbamar os medicos (24), cuja consulta déter-
mina a decisao do coroner (25). Mas esta decisao nao pode re-
ferir-se senao à questao da instrucçao preparatoria ; compe-
tindo ao jury pronuneiar sobre as provas produsidas, quando
se trata da instrucçao principal e publica. Perante elle com-
parecem os peritos, e no caso de infanticidio, quando se trata
de desmonstrar que os ferimentos causârao, ou poderiao ter
cauaado a morte, ete. etc., os seus pareceres sao rnuito impor-
tantes ; todavia elles sao citados e interrogados na audien-
(19) Cod. crim. bavaro. art. 385.
(20) Segundo o art. 236 basta um perito officiai ; sendo necessarios dous
dos outroe.
(21) Art- 264, 1.»
(22) Art. 264.
(23) Vide o Proe. crim. convp., t 1. cap. 41, p. 219. — Russell. Dos Crimes
e dos delictos, p. 261.
(24) O Jwrist, ou Jornal irimestral de Jvrispr., a, 1, p. 50.
(25) Tomlins. Dite, de Dir., ediç. de 1810, vol. 1, verb. Coroner.
338
cia (26) comb simples testemunhas. Finalmente nSo estando os
jurados ligados a regra algumadeprova, dépende délies concer-
der-lbes maior ou raenor autoridadë (2ft)'; mas na Inglaterra o
jury tem por habito examinât séria e maduramente as provas, e
decidir sempre de conformidade com os sens resul-tados : pot
isso, muito taras vezés regeita sem motivos grades os
pareceres de peritos habeis (28).
Em relaçao aos peritos, alei franceza é semelhante â ingle-za
; sao citados para comparecerem e interrogados como simples
testemunhuas(29), devendo os jurados decidir até que pouto
podem dar-lb.es credito ; mas, convem dize-lo, este Systems
provoca frequentemente discussOes medico-legaes inter"
minaveis, ôujo interesse os jurados raras veses sao capazes de
comprehender ; por isso ve-se-os algumas veses adoptar quasi
arbitrariamente a opiniao que lbes agrada, e proferir uma
deftisao correspondente. Durante a instrucçao preliminar os
peritos sao convocados do mesmo modo que no processo inqui-
citorial allemao ; mas aqui a lei é insufficiente. O procurador
do rei é quem frequentemente, e sem razao, pede o seu auxi-
lio, representando o papel de accusador publico (30). Na
França. alem disso, de ordinario nao setratadeverifîcar seria-j
mente o corpo de delicto, e d'abi résulta que a inspecçao ocu*-
lar technica é tambem muitas vezes superficial .e imperfeita,
(26) Philips, Regras das Prova,vol. 1, p. 90 ; Russel, obr. cit., 11, p. 268.
(27) Vide no Lato Magasine [n. 2) particularidades intéressantes sobre o
modo porque se faz uso dos testemunhos medicos na Inglaterra- H
•28) Por isso n indiciado tem o cuidado de incluir na lista das testemunhas
os nomes dos peritos favoraveis à sua defesa.
(29) Até que pouto podem ser consideradas simples testemunhas ? Vide
Gaxeta dos Tribimaes, 1838, n 837
(30; Legraverend, Tratado, t. 1, cap. B» g 5.
230
Nflo ha na lei prescripçao alluma pspecial(3l), a dando pou-
oo lugar os jurisconsultes nacionaes nos seus estudos à medi-
cina légal, segue-M que o magistrado nfto esta habilita-do
para dirigir o exame dos homens da arte, e nem para pro-
vocar um relatorio compte da parte d'elles (32) ; eoque mais
augmenta o mal. éque a lei nero mesmo detorminou quaes
os caractères, quaes as condicçoes, que os pérîtes devem pos-
suir para serem chamados a exercer estas graves funcçoes (33).
CAPITULO XXVin.
DAS RBGRAS A SBGl'TB Q0ASD0 TEM IXOAB A VE8T0BIA
1." Compete chamar os rîtes, em primeiro lugar, ao ma-
gistrado instruct ir encarregado no processo inquisitori.il de
pesquisar todos os factoa, que possao servir para a manifestao
da verdnde; mas em qualquer termo da causa pode o in-|
diciado, ou o seu defensor, requerer que elles sejao consultados,
sempre que for necessario um exame technico no intéresse <la
defeza ; assim como tambem os juiy.es définitivos podem or-
denar a vestoria, como supplemento da instruSo.
(31) Cod. de instr. criui. art. 13
(82) O art. 44 dix que os peritos fartto o stu relatorio sobre as causas da
morte, 4 sobre o estado do cadaver. O exame inaterial a o purecer do experto
s3o aqui perfeitamente distinctos.
33) Nos tormos do art. 44 sâo os officiaes de soude que devem ser cha-
mados. o que fax que muitas vezes esta missào t5o importante soja confiada a
rotineiros ignorantes, Bourguignon, Jurisprudeneia, t p. 158. (Na pra-lica o
magistrado iuatructor, conformando-se com um» circular ministériel) tam o
cuidado de chamar sempre um dos medicos de mais conceito entre os collegas
: no caso de urgencia, ou de auseucia deste é que se recorre a outro. Mas o
magistrado nunca hésita entre um doutor. • um officiai de
saude.
Nota do trad. franc.
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2.* 0 inquisidor tera sempre o direito de escolher os pe-
ritos, excepto quando s5o os juizes do plenario, os que pri-
meiro reconhecem a necesaidade da vestoriâ; pois qne entao
sao elles os que escolhem. Aindàque a vestoriâ seja motivada
pelas allegaçOea do accusado, e que este tenha designado os
peritos, nem por isso deixa o inquisidor de ter a faculdade de
cl os que quizer; poi* que nomeando o accusado este
ou aquelle perito, pôde dar lugar a desconfiar-se que elle sabe
que lhe é favoravel o nomeado. Quando se trata alem disso de
administrer qualquer prova, todos os esforços tem por fim
fazer derivar délia a verdade com a maior segurança possivel,
ora o proprio réo nao pôde ter se nao um interesse confessa
vel, e ô que seja demonstrada, racional e scien-tificamente, a
sua sinceridade em relaçao aos factos que allega; e para
conseguir este fim nao é necessario que o juiz seja obrigado a
acceitar o perito por elle nomeado (1); a missfto de que se trata
pôde ser desempenhada do mesmo modo por outro.
3.° Tendo a administraçao nomeado certos bomens da arte
(2) para examînar e dar o seu parecer sobre os factos do
dominio da eciencia, o inquisidor deverâ fazer-ee acompanhaf
délies em todos os casos comprebendidos na sua competencia
territorial. De um lado deve-se presumir que taes peritos
possuem os conhecimentos e a pratica necesssaria; e de outro
lado elles tem o direito pela lei de serein ouvidos em certos
casos (no de parto por exemplo) ; mas séria de mais, querer
que as suas palavras podessem fazer fé de preferencia a quaes-
quer outras (3), como se emanassem de verdadeiros magis-
trados. Quando os peritos officiaes estao impedidos, ou quando
m o havendo reprovas a oppor contra o perito proposto pelo defenso*.
nio dewà o juii reîeital-o sem motiw»: mas fica-lhe-salvo o direito 4e
consultar mais um outro sobre o mesmo objecto.
(3) Exemplo : um medico officiai. H
m Tambem nâo inadmiasiveis 88 opiniôes de Stubel. 8 2494, e de TU-ti,
T.&SMUTconsiderao.no como uma testemimha p«W.co.
-.341
qualquer demora fôr prejudicial, ou finalmente quando n&o
fore m encontrados immediatamente (4), o inquisidor pode cha-
mar outros (5); e isto é geralmente admittido (6). Ainda mais,
em caso algumde-se contest ao magistrado a faculdade de
chamar o perito mais apto (7J, desde que opersoaagem officiai
n&o lhe pareça merecer todo o credito (8) ; assini como muitas
vezes deve ser ouvido um outro, se o doente é tratado por este,
e uao pelo officiai. Corn effeitoria crueldade obrigar o doente
a supportar as visitas do ultimo, tendo elle depositado a sua
confiança em outro. O inquisidor farâ bem, empregando como
experto o medico particular, e juntamente o medico officiai
afim de ter dous pareceres sobre os factos. Acontece muitaR
vezes residir o experto nomeado em territorio estrangelro (9),
e neste caso tem-se sustentado erradamente nfio dever elle
(4) Se os ferimentos forâo feitos no limite mesmo da oircunscripçgo do
medico-official, e um outro medico mora no lugar e pode ser chamado im-
mediatameute, emquanto que o officiai acha-se na distancia de très léguas, nào
se deve hesitar em chamar aquelle de preferencia a este.
(5) Kittka. Da verificaçSo do carpo de deliclo. p. 212.
(6) A Orden. crim. da Prussia, g 160, permitte, no caso de necessidade,
chamar, em lugar do medico regularmente nomeado, o cirurgiâo de um re-
gimento, ou um medico ordinario, prestado o juramento previamente.
,7, Se o medico-official é parente ou affim do mortoou do accusado.
18) Tittmann tem razâo de dizer (Manual 3, p. 204; que a différence de
religiâo nâo deve tomar o medico incapaz de ser experto. Ainda que elle fosse
judeu, no lugar em que a lei prohibe que um judeu tenha um canoter officiai,
pode ser chamado em certos casos ; pois que a sua religiâo nâo pode totnal-o
indigno de fé. ( Esta observaçào é inutil em relaçâo '& França, onde os judeus
gozio de todos os direitos ci vis, e ci vicos )
Nota do trad. franc,
(9) Exemple : se a residencia do/erido sô esta distante nm quarto de légua ua
cidade visinha, situada em territorio estrangeiro, e se 0 medico-official mora
muito longe, o juiz deverà chamar o cirurgiâo da cidade.
81
343
rherecer ctédito algum (10). Quaudo se affirma que a sua com-
petencia, assim cotno a do juiz, nao ultrapassa os limites do
territorio, o erro provem de querer-se achar entre as operaçoes
do magistrado e aa do experto uma analogia, que nao é pro-
cedente. O juiz nao pôde validamente obrar e deeidir, senao
dentro dos limites que a lei Ihe traçou; mas a dévida ao
experto tem outra origem : acredita-se nelle, porque se tem
confiança nas seus conhecimentos e na sua habilidade espe-
ciaes ; ora, em materia de arte e de seiencià, nenhuma signi-
ficaçao tem as barreiras estabelecidas entre os Estados (12) -
4.° O primeiro dever do magistrado, em materia de vesto-ria, é
designar sempre na especie os homens mais aptos pela sua
sciencia e pela sua habilidade pratica, .para observarem os
factos, como convem, e aprecial-os racionalmente. Quando a
aceusaçao versa sobre um caso de envenenamento, nao séria
prudente chamar qualquer medico ; pois que nao se pôde es-
perar que elle esteja bastante familiarisado com questôes tao
delicadas, e que possua os instrumentas e apparelhos neces-
sariog, para procéder com segurança as experiencias, de ordi-
nario tao difficeis, que tem por fim a pesquiza do veneno (13).
iNeste caso é melhor escolher para experto um pharmaceutico
habilitado, ou um chimico babil. Tratando-se no caso de in-
(10) Boemer sobre Oarpzow, p. 55; Tittmann, Matinal, 3
a
parte, p. 396,
nota 1.
(U) GroUmann. Principios, § 477, nota 2.
(12J Mas o medico estrangeiro sempre que r chamado deverà prestar ju-
ramento espeoial, alem daquelle que por ventura tiver prestado no seu paiz
como officiai pubtico.
(18) A. Orden. crim. da Prussia parece querer que nos casos graves o me.
dico ponha de parte todas as substancias reservadas para o exame do chi-
mico.—Meckel. tratado de Medicina légal, p. 47,
243
fanticidio de examinar a pessoa da mai, o ioquisidor deve
lembrar-se que todos os raedicos nao sao parteiros, ou nao sfto
parteiros exercitedos sufficientemente, que podem facilmente
errar, e que é serapre mai» prudente chanjar de preferencia um
homem especial, ha muito familiarisado com a sciericia dos
partes (14). No caso de necessidade, mas sô 4e necessidade, sera
sufficiente uma parteira IIS), mas eutao convem asso-ciar-lhe um
medico (16).
5/ 0 indiciado tem o direito de recusar o perito designado
serapre que elle nao der as necessarias garanties de sciencia e de
habilidade (17), ou quando a sua imparcialidade poder ser posta
em du vida, e contra elle poderem ser oppostos os mes» mos
motivos, que ternao inadmissivel on suspeita a testemu-Inha
contra o accusado (18).Por um excesso de prudencia, que convem
nao levar tfto longe (19 ), sustentourse que para prati-car a
autopsia nao dévia ser chamado o medico,*que traton o finado na
sua nltima enfermidado ; e da-se como razao o receio que se deve
ter, de quêter elle occulter os erroe, que par Ventura tivesse
comraettido durante o tratamento; de nao prestar attenç&o
durante as operaçoes aoatoroicas, por se achar pre-
(14) Orden. crim. da Prusski, § 145.
(15) Meckol, 1, c. p. 47, g 33.—O cndigo baro é o unico que détermina, S
art. 80, que sejlo châmados 0 medico da jtutiça <iu nuis parteira jura-montada.
(18) Orden. crim. da Prussia, S145.
(17) Exempte : quando fdr provadb que jî o experte em outrai CMOB com-
metteu erroe grosseiros.
(18; Exemple : quando o medico chamado é proximo parente do finado, ou
inimigo do indiciado.
(19) Kleinschrod nos Antigos Arch, de Dir. crim., t. 5, v. 8, p. 29; Kittka,
Do corvo de delicto, p. 213.
344
venido elta seutido conturio, a certa circurastahcia das mais
importantes, ou ao menos de nSo fàzel-a sobreaahir (20); nfto
se concebe que posaa haver taes receios senao no caso de ter
havido verdadeiro tratamento medico ou cirurgico, e de terem
appareeido duvidas sobre as relaçoes de casualidade entre a
morte e um ferimento nao mortel ; mas se o medico nSo foi
chamado a cabeceira do ferido senao alguns instantes antes da
sua morte, se nao houve tratamento propriamente dito (21), se
o ferimento é evidentemente mortel, independen-temente de
todas as causas concomitantes ou intermediarias, segue-se que
sao improcedentes todas as objeoes que tem sido feitas. (22)
Como quer que seja, excluir systematicamente o medico do
doente pelo facto de lhe ter prestado os seus cuidados, é o
que nao podemos admittir, pois que melhor do que qualquer
ontro esta elle no caso de reconhecer e verificar os factos
importantes ; e sera sempre preferivel nomeal-o, po-dendo-se
associar-lhe um collega (23) que juntamente com elle
observarâ e darâ 'seu parecer . (24)
( 90) Taes aâo os inotivos da disposiçâo do art. 243, God. bav.; e'do g 12 da
InstrucçSo austriaca de 1814.
(21) Poderemos cltar peur exemplo o caso em que, tendo o medico sido cha-
mado meia hora antes da morte do paciente o sou tratamento consistin en
applioar ataduras.
(22)
Vide tambem Meister, de Medico mtkuratum entrante, a] sectione non
excludendo. Helms, 1749; Genst. Observâmes medico-legaes sobre o Cad.
bav., p. 101.
(28) Tittmann, ilanuat, 8, p. 804.
(24) E' o que com razâotermina o projecto hanoveriano, S 475.
345
6»* Quai o numéro dos expertes que convera chamar nos
exames? Tudo dépende dos usos judieiarios, que frequentemen-te
vari&o. Se se argumenta por analogia coin a prova teste-1
munhal, onde a unanimidade de militas testemunhas parece
offerecer maiores garantias, pdisque o depoimento de nma serve
para verificar o de outra, oprincipio, que se deve esta-belecer, é
que nao pode baver menos de dous peritos. Entre-tanto algumas
vezes, quando ha uma autopsia a fazer, ou qnando se tratade um
exame puramente medico, nao se consulta sen&o um medico
(25) ; mas como, segundo a praxe (allema (26), alem do medico
que observa, ha o eirurgiao que procède â autopsia (27), e que
toma a si as operaçoes puramente mecanicas, segue-se que o
principio nao soffre alte-raçao, e o exame do corpo tem sempre
lugar por intermedio de dous expertos, sendo o cirurgiso
considerado ao menos como uma teatemunha sobre a vestoria ; e
somente sob esta con-diçao se pode affirmar ser sufflciente
orelatorio de um medico ; entretanto nos casos duvidosos o
juiz farâ bem em fazer juntar.os autos o parecer de um segundo
perito (28).
7." O hometn da arte sendo nomeado experto pelo juiz, sera
obrigado a acceita.t a miss&o por elle incumbida ? Tudo dépen-
de da posiçao que occupa, ou por outra, convem distinguir entre
o nomeado officialmente para o exame das questoes scien-
tificas, que o processo criminal provoca, e o que nao foi offi-
(25) Assim é que a Carolina détermina chamar um ou muitos eirurgiôes ;
porém como este artigo nao falla de autopsia, mas de um simples exame exter-
no, délie nada se pode inferir.
(26) Tittmann, 1 c. 8, p. 303. *
(27j A Ord: crim. da Prussia, § 148, exige a convocaçâo do medico e do
cirurgiSo.— O Godigo varo fiel ao seu systema distingue entre o perso-
nagem officiai e os outros expertos. Basta que seja chamado o primeiro.
(28) Kiltka, c. 220.—Vide umbem Heffter, Tratado do Air. crim. Halle
1833, p. 615.
346
cialmente noraeado (29). No primeiro caso n&o pode récusa* o
sen ministerio, porque compremetteo-se previa mente a exerce-
lo serapre que lhe fosse ordenado ; n&o sendo admissivel ex-
cepçao alguma a esta obrigaçao, senao quando pelos trabalhos
exigidos corresse perigo a sua vida ou a sua saude, como no
caso de autopsia de um ' cadaver em estado de decomposi-
ç&o /30) ; e raesmo contra esta excepç&o pode-se argumenter
vantajosamente com as experiencias recentemente feitas quanto
as precauç/tàs uteis para neutralisar os miasmas * deleterios,
que emanao do cadaver (31); de sorte que mesmo neste caso
n&o pode exigir sen&o que lhe seja permittido usar destas
precauçOes.-—N&o sendo o experte officialmente nomeado,
o pode ser obrigado a procéder, pois que n&o pôde ser consi-
derado como uma testemunha sempre obrigado a compare-
cer (32), nao havendo analogia alguma entre elles; uma teste-
temunha, cujas revelaçoes s&o importantes, nao pode ser arbi-
trariamente substituida por outra, mas em lugar do experto
nomeado, pode ser chamado um outro ; e convem lembrar que
a vestoria requer sempre perda de tempo e de iritelligencia,_o
que é inutil à testemunha que sô tem de declarar o- que vio.
8/ E' essencial o juramento do experto (33), que dâ uma
nova garantia da severidade conscienciosa do seu exame e da
(29) Vide o Proc. crim. cwnp., t. 1, cap. 93, 7.
(30) Henke, Tratado de medidna légal, p. 62 ; e Revista de mtdicin*
gal, 1834 n. 1, p. 18. I
(8«-< ) Mede, Tratado de medidna légal, 5" parte, p. 267. H
(32) Kittka, 1,0., p. 212, prétende estabeleoer esta analogia, que nenhum
fundamento tem.—Vide principalmente (hâo obstante sô se referir ao direitd
civil) a opiniâo de Nartia na dissertaçâo publicada nos Annaes da LegislaçSo
1
saamica, editor Martin, 1° anno n. 2, p. 179.
(33) Oarolina, art. 140; Kleinsohrod nos Antigos Arch. de dir. crim
5. p. 19 ; Tittmann, 3, p. 297.
&4X
sinceridade do seu laudo, e dâ testemunho da sua boa vontade em
fazer intervir toda a suasciencia, e contribuir como todos os
meios que ella fornece, para dar nma respostâ racional e positiva
aos quesitos que lhesao apresentados. E quando mesmo se queira
sustentar que este juramento frequentemente nos casos difticeis
sô vira attestar a opiniâo, a crença do experto (34) ; mesmo assim
tal argumenta nao sera sufficiente para provar nao ser o
juramento indispensavel ; pois que, se o experto é homem
consciencioso (35), ligarâ sera duvida maior importan-cia à
declaraçao feita sob a do juramento, naqual sediz convencido
tanto pelos dados actuaes de sciencia, como pelo leal exame dos
factos, do que a um simples juizo no quai sa-tisfar-se-ha em dizer
que étal a sua crença, ou que tal con-clusao lhe parece fundada,
ou provavel. Além disso no exame a que procède,nas conclusses
que tira, elle naodeve basear-se nas suas simples crenças, mas
sira na .sciencia. Hsvendo nomea-çSo officiai, etendo sido
previamente jnramentado o perito, basta este juramento gérai,
devendo-se sômente lembrar-lhe a santidadedo mesmo (36).
Sendo chamado um outro experto, pode bastar (37) o juramento
subséquente, pelo quai confirma a sua declaraçao.
(34) Assim pensa Stubel, Do Gorpo de Delieto, § 354.
(35) O Projecto hanoveriano, § 174, détermina a formula do juramento, exige
que os peritos fallem com sinceridade e lealdade. de_pois de terem bem
observado e formado a sua convicçSo com o auxilio das luzes e da expe-
riencia, fornecidas pela sciencia e pela arte.
(36) Tittmann, Manual, 3, p. 305; Ood. bavaro, g 230; Ood. de instr. crim.
franc, art. 44.
(37) Pela mesmarazSo porque se julga sufficiente o juramento subséquente
da testemunha. Vide a Proc crim. comp., cap.J8. 5 ; t. 2, cap. 183,1. 2, 8. e
notas (Na França o juramento précède obrigatoriamente o depoimento das
testemunkas, ou a declaraçao dos expertes. Vid. art. 44 e 317 do Cod. inst.
erim.)— Nota do trad. fr.
i i"V»-.'
348
9.* Sera necessario que os peritos proced&o ao exame na pre-
sença do juiz*? Aqui convem distinguir (38): ou este exame stz
parte da inspecçao judiciaria, na quai o juiz.procedendo tambem à
verificaçao dos mesmos objectos, procura a existençia de cer-tos
caractères, em quanto osperitos fazem appareceroutros (39),
sendo devido ao concurso dasduas operaçoes siniultaneas o po-
lder conseguir-se o fim ultimo e necessario da inspecçao ju-
diciaria ; ou o experto é simplesinente chamado para pronun-
ciar uma especie de juizo d'arte e de sciencia (40) em relaçao a
certos objectos de natareza transportavel, e que lhe o offr-
cialmente confiados; no primeiro caso é fora de duvida que o
exame deve fazer-se em presença do juiz (41) ; porque é entao
essencial que o objecto se conserve intacto no mesmo lugar, o
que acontece quando o juiz e peritos observao juntos , e porqu e
o primeiro pode muitas vezes indicar aos segundos os pontos
sobre os quaes no intéresse da instrucçao devero insistir espe-
cialmente (42). De tudo isso concluimos que a presença do
juizé muitas veses boa e util em si ; mas entretanto nao a
julgamos absolutamente necessaria para a manifestaçâo da
verdade , e ninguem poderâ sustentar que a declaraç&o dos pe-
ritos, que relatao as observaçoes feitas na ausencia do juiz, nao
(88) A maior parte dos codiqos modernos fazem uma applicaçâo demaaiar
daniente gérai do principio. Vide o Ood. bav.. art. 235. O novo Projecto
bauoveriaao, art. 171, diz corn mais exactidâo : Em todos os casos em que
a lei n&o détermina expressamente a presença do juin, este deve decidi
r
segundo as circumstancias, se ella é ou nfio necessaria na vestoria.
(89) Exemplo : durante a autopsia.
(40) Exemplo : sobre a existençia do veueno, ou da moeda fa Isa.
(41)
C. C. C, art. 49. Gonradi, De Inspectione çadaveris occisi a solig
medicis vicliosa. Helmst. 1738 ; Quistorpe, PHncipios, § 603 ; Sieiner nos
Ant. Arch. do Dir. crim., 6 vol., 4° art., p. (14.
(42) Ordem crim. Pruss., g 152; Cod. bav.. 235; Henke, Dissert, de
Medirina légal, 8, p. 165.
249
faz prova(48), quando elles forfto cl e vida m ente juramentados
e inteTfogndo.s era forma regular.—No segundo easo deixa de
ser essencial 41} a présence dp juta, sendo poatot de par-pe os
objectos que devera ser examînadoa, e depois entrevues aos
peritoa*. porque estes frequentemente Mo obrigodos a fa-zer
loogas iDvestigsoOci scientifica», ttes como experienaaa
chimica» ou outras {46), anieo meio de ofwervaçfto qne talvea
comporte a e*pecie,ou porque é meramente superficinl r» exaine
que délie» se espéra, tendo elles de reconheeer simples-mente
certoa caractères exteriores, deciaivos nos quesitos apre-
sentadoa; neste raao evidenteraente o juiz nflo poderia assistir à
opera^o senao como um espectador rondo, e indifférente.
Finalmente quando os expert os résident long*, e que urne
consulta lhea é'pedida, ou quando ne tem de oxatninar a pessos
de um individuo. e que a simples inspeco&o pelo homem da
arte beats para obter oa ro*ultadot procurados (46), tambem nûo
é necessaria n présence do fait : nisto todos concorda-rao. (47).
10. Neste caso, qualquer'que wja a liberdade deixada ao jais,
aempre lhe fica a attribuiçflo muito importante prerisar
claramente ot ponton sobre et quart pede o paxecer dos peritoa, e
nsquestoea-que estes tem de resoîver {0} : o aen parecar
(43 S<- i m
:
. i.if m ataaU «MB r--;.u -ii nia i, • ui|iiantO M lu aaatopatt, •al
volt i. '|iva;;il • .-si 1 mâà i <. fan dietor o procewo verbal, iwii lin
(44) Kittka. éa Ytrificaçito de Cerpo é» DAicto, j>. 014.—V. o Proe. crin.
comp., t. !.. cap. ft). n. 6, - nota».
(45) Henke. 1. «., S. p. MB : THtmaiiu. 9. p. W.
(40) Exemple: quando w trata de veriflcar ae uraa mulner ileo A lui. bseta
esaminar aa anaa partes gcnitaes.
(47) Vide tambem o Cod. havarn, art. 80.
{48; Orden. erim. Pruae., gg 100-175 \ Cod. bav., $ 288.
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«*»mt, p»t« y il*!!<>< gwf%M>if mmm prima* *NW»
obrigwiâootxp" *. iwfrlnaiai«f<iMi|W), _U. f«Hat
pie» patir * - i.n«tr».-t. tn««rart »f ^t» tMUBvmqor total m
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fWpMttir <|«t m tMtatsnbaiagtQ i^»^tttryMMb^r»û»|
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■■•«NB» fan» imirjlii s^ffli*tw» qal
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351
os pontos essenciaes que devem ser conhecidos, e princlpàl-
mente nao lhe deve transmittir senâo extractos espeeiaes (53).
Porém se, para poder dar um parecer plenamente satisfactorio,
elle tem realmente nécessidade de conbecer a série de depoi-
mentos, o juiz entao, para evitar os inconvenientes de uma
communicaçao incompleta, deve dar-lbe pleno conhecimento
de todas as peças do processo, que tenbao relaçao com os diversos
pontos, sobre os quaes deve versar a vestoria. Finalmente segun-
do o uso constante dos tribunaes allemaes os autos s&o apresen-
tados eta sua totalidade aos medicos superiores, quand o se lhes
pede o seu parecer sobre o relatorio apresentado pelo medico
legista.— E' escusado accrescentar que todos os objectos trans-
portaveia, taes como instrumentos e outros, cujp exame é abso-
lutamente necessario ao perito, para poder responder aos que-
sitos apresentados, devem ser-lbe entregues.
'
12. Quando os expertos pTocedem a um exame sob as vistas
do juiz, por exemplo, quando pra^cao uma autopsia (54), de-ve-
se consignar immediatamente no processo verbal o resultado das
suas observaçoes, e. discrever os objectos verificados no mesmo
lugar, e sempre perante, o juiz ; pois que assim sera facil
esclarecer logo qualquer duvida que occorrer. Todavia séria
demais, obriga-los a dar incontinenti o seu parecer moti-vado, e
exigir a inserçao immediata deste no processo verbal ; o que
pode dar-se nos casos simples, nos quaes fossem su-perfluas
longas meditaçOes ^55). Mas séria injustificavei esta
(53) Kittka, 1. c, p. 222.
(54) Devemos censnrar em muitos medicos o habito de toraar de passagem
notas das observaçôes que fazem, e reâigir mais tarde os resultados em forma
regular. Abre-se assim a porta ao erro ; pois que quando mais tarde appa.
recerem lacunas, ellas serâo preenchidas muitas vezes pela imaginaç&o.—
Vide tambem Kittka, 1. c, p. 327, na nota.
(55) Por exemplo, quando se pede a um serralheiro, ou a um arcabuseiro a
sua opiuiào sobre o estado de uma arma de fogo.
as»
exigencia, desde que o relatorio dénotasse algum trabalho de
reflexîio, ou de investigaçao, por mener que fosse, ou alguma
apreciaçao dosfactos por meïo de èxperiencias scientificas ; pois
que poderia produzir conelxies pouco meditadas. e pouco so-
lidas, e em tal caso sera, serapre mais prudeute exigir do ex-
perto um relatorio por escripto ('56}s Quando aconteça serem
consultados muitos homeni da arte, é snfficiente um rela-
torio por elles assignado ; se fossem simples testemunhas séria
interdicto qualquer depoimento collectivo ; masnao esqueçamos
que elles pronunciao um verdadeiro j ulgamento e que este pode
exprimir perfeitamente uma opini&o collectiva ; servindo de
fundamento ao seu parecer (57) a unanimidade de suas réso-
lue. Ses, deliberadas maduramente e em comtnum.
13. Na occasion das operaçoes, por exemplo, no moroento
da autopsia, devem serMesviados todos os espectadores inu-|
teis (58), de oûtro- modo stria abrir a porta a todos os falsos
boatos, que poderiao nascer das suas palàvras irreftectidas ; e,
o que serin peior, os resultados do exaine poderiao ser commit-]
nicados a outras pessoas, que délies nîio deixariîio de aprovei-
tar-se -. ver-se-liia entao qualquer individuo, que jamais teve
conhecimento pessoal dos factos em questîlo, produzir judicial"
mente uma confissfto falsa, ou um falso testemunho. mas reves-
rido das apparencias da verosimilhança (59).
H
(56) Kleinschred nos Ant. Arch. do dir. erim., 5. p. 96 ; Tittmauu, Manuat
3. p. 325 ; Mokel. Trttëdo de Medicina légal, p. 68.
(57) 8e uni délies (or da opini&o contraria, o MU relatorio devo tombent
ser appensado.
'58) Kittka, 1. c. p. 230.
05) SuppoDkamos que an individuo, nio ouatante Mr innocente, confewta
MT o uutor do crime, e que pnru provar désigna todoe oe feriineitios e t/vl*.
os instrument», dos qunes tem nolicia, ou por ter iuwistiilo a autopoia, oui
pela* c.ufiJeucuta de nm terceiro eapectndor : neste caso sera quasi impoa-
SIVL'I desrubrir « fel«<We das SUM couliasdea por causa do todas an r-
cumstancias indicadas.
353
14. 0 inquisidor na qualidade de director do processo (60),
deve ter sempre o cnidado de examinasse o relatorio dos peritos
esta era harmonia com o objecto sobre o quai devera versar a
sentença definitiva ; porque o seu primeiro dever é transmittir
aos juizes do plenario os materiaes complètes da sua decisao.
Daquio se deprehenda, que em nossa opiniao o parecer dos
peritos e a sua verdade material devem estar sujeitos a uma
nova experiencia scientifica, e que reconhecemos ter o inqui-
sidor uni direito de opiniao soberana (super arbitriim) ; o
que queremos dizer simplesmente é que o magistrado deve.
examinar se as conclusses do relatorio correspondent ao fim
ultimo do processo (61). Quandotiver verificado, estarem preen-
cnidas as formas e condoes substanciaes ; tiver comparado o
relatorio em si mesmo.com as outras fontes de informacao
existentes nos autos', I com os resultados de investigaçses
de ordem diversa, resultados que o devem ser-lhe desconhe-
cidos ; quando finalmente tiver examinado, se o relatorio é
completo em todas as suas partes (62), terà cumprido nesta
parte o seu dever. Se por acaso o parecer dos peritos nao lhe
parecer satisfatorio a todos os respeitos, deverà logo esclarecer
as duvidas e completar as lacuuas, antes de inserir nos autos o
processo verbal, como nos seguintes casos : quando o laudo nao
estiver motivado (63) ; quando carecer de precisao e clare-
(60) Kleiusclii'od, nos Antigos Arch., V. p. 31 ; Tittmann, 3, p. 283.
(61) O que é mais évidente ainda para quem considéra os peritos como
auxiliares do juiz ; porque é dacompetencia do juiz examinar o trabalho dos
sens auxiliares, e apreciar se as suas conclusses sào su^cientes.
(02) Vide o Proc. cri'm. comj»., t. 1, cap. 93, us. 18, 14,15. ! 66) E tambem
quando houver contradicçâo entre as proprias conclusôes.
3S4
za (84) ; quando n&o laver tomado em consider&o factos im-
portantes descobertos no processo (65) ; quando os peritos
estiverem em contradicç&o com as mais récentes experien-
Icias (66) ; e quando graves questOes ficarem sem solao. 0 in-
quisidor propora logo suas duvidas aos peritos, e lhes apresen-
tarâ novos quesitos. Se a segunda resposta ainda n&o der os
resultados esperados, e o magistrado perceber que os peritos
observao partindo de um ponto de vista' demasiadamente ex~
clusivo, deverà apressar-se em chamar outros para exami"
narem, a novo, os objectos sujeitos à verificaçao, se a inspecçao
ocular é ainda possivel, ou, no caso contrario, para darera ao
menos o seu parecer (67). Os juizes do plenario, assim como o
inquisidor, e do mesmo modo que elle, tem o direito de cri-tica
quanto ao relatorio (68), e, sendo necessario, de exigirera
segundo.
(64) Exemple quando o medicb se réfère as antigas theorias sobre os Ceri*
mentos mortaes on nâo mortaes, hoje reconkecidas falsas; se disser que ellas
sâo absolutamente mortaes. V. o cap- seg., v..l,
(65) Exempio : quando nào tivesse tomado em oonsiderâo as declaraçoes
dàs testemunhas.
(66) Exempio : quando o medico prestar inteira.,fé à prova hydrostatlca dos
pulmôes.
(67) Kittka. 1. c, p. 253.—Vide o art. doantor na Revista deJurisp. crim.
prussiana de Hitxig, p. 853.
(68) Kittka, 1, c, p. 233, observa com rao que o inquisidor nâo deve rejei"
tar o relatorio do experte, e pedir a outros explicaes mais catégorisas, sô por
ter este manifestado uma simples crença, ou por ter apresentado o seu laudo
como fiîmplesmente verosimil eo certo: taes casos ha, nos quaes a conscien-
cia do experte nào poderia ir mais longe ; e exigir-lhe mais, séria obriga-lo
a mentir. /
355
CATULO XXIX.
DA VESTORIA SEGUNDO AS DIVERSAS ESPECIES DE CRIMES, E DASJ
REGRAS A OBSERVAR EM CADA UM DOS CASOS.
A importancia à a prova por peritos varia segundo os crimes,
e a sua administraçao é regulada por regras especiaes". Indi-
caremos os casos mais ordinarios.
1. Quando se prode à informâo por causa de homicidio,
o officio do experto â vista do corpo de delicto.é facilitar a
decisao da seguinte preliminax : foi a morte o resultado de um
suicidio, de nm accidente (1), ou foi obra criminosa de raao
estranha ? Tambem pode ser, declarar e demonstrar ter sido
a morte 0 resultado de um acto de violencia, ou fazer ver
que rélao de causalidade existe entre a lesao e a morte. No
primeiro caso a informaçao technica serve (2) para fazer reco-
nhecer que os signaes descobertos no cadaver podem expli-
car-se pelo suicidio, ou que este fora siraplesmente possivel,
segundo.a posao do corpo no momento em que foi encon-
trado (3) ; ou finalmente que o assassino tentou dar ao assassin
nato as apparencias de um suicidio, reproduzindo o modo da
execao deste (4). Ohomemdaarte représenta igualmenteum
papel importante, quando se trata de verificar, se as lesoes obser-
vadas no corpo forâo praticadas durante a vida ou depois da
(1) Uma adega subterranea desmorona-se, e debaixo das suas rainas encon-
tra-se um cadaver, que dévia alii estai' ha mais tempo, e que contèm signaes de
lésées de diver.su natureza. Quid ?
(2) Vide no Proc. crim. comp., t. cap. 122, nota 1, um resumo da
litteratura especial sobre esta especie de vestoria. ^
(3) A différence de posiçào é muito importante. Pode-se tirar conclusses di
versas do facto de se ter acbado o cadaver assentado, ou deitado.
(4) Depois de consumado o assassinato pendurar a viotima, como se ti-
vesse enforcado.
356
morte (5), e, no caso de ss-encontrar ne agua o cadaver, se a im~
mersao foi a causa da morte, ou se esta deve ser attribuida aum acto
de violencia anterior.—Ha ainda outra questao muito grave,
cujasoluçao é frequentemente pedida aos peritos ; é a seguiute : as
lesôes erao mortaes '? Deverao evitar as theorias erroneas, outr'ora
em voga, segundo as qnaes (6) os ferimentos nao podiao ser
considerados morts es, senao quando a morte era a sua consequencia
inevitavel, fazendo-se absoluta abstracçao da constituiçao habituai,
ou momentanea da victima, e de todas as circumstancias
concomitantes, ou intermediarias ; pois que o caracter aggravante
das lesOes era conseguintemente posto em duvida, desde que
apparecia uraa causa intermediaria, que fizesse entrevêr uma funesta
influencia dévida à constituiez anormal do individuo ; desde que se
podesse suppor ter sido possivel evitar a morte, se se applicassem
em tempo opportun© os soccorros da arte, e o tratamento medico
(7). E' mais exacto dizer ter sido mortal todo o ferimento que foi na.
especie causa déterminante da morte ; e o magistrado, que adoptar
esta judiciosa theoria, deverâ separar com cuidado as' diversas
questOes a resolver : perguntara primeiro, se a victima (8) morreo
em consequencia das lesOes que se observao no cadaver ; e sô
"depois é que deve maudar que os peritos procurem e transmittao-
lhe os documentos necessarios para poder decidir quai a relaçao de
causalidade existente entre o ferimento e a
(5) Vide o Proc. crim. comp., t. 2, cap. 122, p. 53.
(6) Negava-se eutâo que um ferimento fosse mortal, se alem délie se encon-
trasse outra causa concomitante de morte, qualquer que cil a fosse.
(7) Sobre a nova e mais certa theoria, vide Ord. crim. da Prussia, g 169; Ood.
bavaro, 1* parte, art. 142—145-
w (8).Sobre o modo de formular os
quesitos vide. 0»'S. crim. da Prussia, g 68 ; Cod. bavaro. 2« parte, § 245.
35-7
morte, e se pode ser crido o accusado, quando affirma nSo ter
tido intençao de matar (9). Nesta occasiao convém forraular
muitos quesitos essenciaes :
1.° Os ferimentos erao necessariamente mortaes, ou nâo?
2." Causarao a morte pela sua propria natureza, ou em con-
sequencia da constituiçao anormal do individuo, ou de cir-
cumstancias accidentaes exteriores ?
3.° Produzirao a morte immediatamente, ou pelo effeito de
uma causa intermediaria ?
Finalmente omagistrado devera certificar-se que sâo comple_
tas as investigaçOes, e as conclusses do relatorio ; concebe-se
agora, que aindamesmo que se descubra em uma das très cavi-
dades do corpo uma causa sufficientede morte, que pareçadesne.
cessario abrir tambem as outras duas cavidades (10) para de-cidir
ser mortal o ferimento, todavia sempre se deve abrir as très
cavidades (11,
1
, para que seja possivel responder aos très
quesitos acima, relativos an facto importante da camalidade
felativa.
2. Se se trata de um infantecidio, é necessario chamar péri tos:
1", para verificarem o parto (12), e a sua época (13) ; 2.°,
examinarem o corpo da criança, abrindo-o, reconbecerem se
(9) Exemplo : o ferimento nâo foi mortal senâo por causa de nni vicio Je
organisaçâo extraordinario, que o accusado nâo podia prever na viotima.
(10) Sob o domiuio da antiga theoria se nâo se procedia à abertura do
abdomen, quando se descobria no peito um ferimento absolutamente mortal,
era nullo o exame. Era um grave erro.
(11) Cod. bavaro, 2* parte, art. 244.
(12) E' muitas vezes facil cabir-se em erro, principalmente quando o parto
nâo é récente. Vide no Proc. critn. comp. o resumo da littérature nesta
materia.
(18) E' importante a epoca, quando se trata de decidir se nasceu da accu-
sada a criança, cujo cadaver foi descoberto.
88
s s
veio a terrao, e em que mez de gxavidez ; se nasceu vivo ; 8e
nasceu viavel. Esta segunda série de quesitos dépende do em-l
prego de todos os meios de prova fornecidos pela sciencia (14) ;|
3.* E' mister depois indagar que causas determinar&o a morte,,
e ainda neste caso sao os peritos que decidem se ha lesOes no
cadaver; se estas sao o resultado de actos voluntarios de vio-
lencia da parte da mai, ou se devem ser attribuidos a causas
simplesmente naturaes, cujo effeito realisou-se durante o
parto (\b), ou depois délie, cotno no caso de cahir a criança de
lima certa altura (16). 4.°, Finalmente devem ser fiequen-
temente interrogados os peritos, para saber-se, se podem me-
recer fé certas allegaçoes do accusado (por •exemplo, sobre os
incidentes do parto).
3. No caso de envenenamento, a vestoria tepor objecto dé-
terminai, se a victima foi morta por meio do veneno (17). Os
homens da arte devem começar por examinai e abrir o cadaver,
quer para procurer o* vestigios exteriores perceptiveis do ve-
neno, quer os seus effeitos sobre os orgaos affectados ; depois
devem indagar todo o historico da molestia ; porque os acci-.
dentés que assignalarao a sua marcha, os symptomas que appa.
recerâo antes e logo depois da morte, dfto a conhecer ordina-
riamente, se houve ou nao propinaçao de substancia venenosa.
Depois, devem necessariamente procéder a uma analyse ehi-
mica (18), que de monstre a presença do veneno, a sua nature-
(14) Vide o Proc. erim. comp., t. â, cap. 123, p. 57, e seguintes.
(15) Por exemple quanclo a criança ficou por muito tempo presa no collo
da vagina.
(16) A este respoito ha muitos pontoa de controversia entre os sabios. Vide
o PrOe. erim. comp., t. S, cap. 128. p. 64, e nota45. H
(17; Vid. o Proc. erim. comp., cap. 124, t. 2.
(18) Eggest, Da Morte violenta sem lesdes exteriores, Berlim, 1832, p. 309 e
seg.
35©
za (19J, e os seuseffeitos sobre a organisao. Devem ào mesmo
tempo dirigir a sua attençao para os vasos destinados a conter
alimentes ou bebidas, dos quaes fez uso o morte na sua ultima
molestia, como tambem para os residuos das substancias acha~|
das nos armarios da casa. Finalmente se os vestigios do veneno
forao observados no cadaver, os expertes devem decidir, se a
causa da morte foi a substancia descoberta, ou se a quantidade
in concreto absorvida, ou se quaesquer outras causas interme-
diarias concorrerâo tambem pela sua parte,
4. No caso de ferimentos voluntariamente feitos, o petite
deve ser chamado para verificar a natureza das lesfles ; os seus
effeitos sobre o espirito e sobre o côrpo do ferido (20), e para
determinar, se causas intermediarias, se a constituBo deste,
contribuir&o, ou nao, para aggravar as consequencias do feri-
mento. Convém tambem fazer um exame do lugar : é esse o
meio de descobrir muitas vezes se as lesSes procédera, ou nao,
de um facto intencional da parte do accusado (21).
5. No caso de forçamento o exame ordinariamente faz-se na
pessoa da victima ; os peritos devem verificar a extensao e as
consequencias das lesoes, e determinar as probabilidades da
existencia do crime. O exame da pessoa do accusjido pode ser
tambem muito importante ; ha casos, era que certos signaes,
certes vestigios achados nas partes sexuaes, podem mostrar
que ha delicto consummado (22).
(19) A que ponto é uecessario que o experte détermine a natnreza do ve-
neno? Yide as obras citadas neste assnmpto no trac. crim. comp., t. 2, cap.
124, nota 2.
(20) Ord. crim. da Prussia, g 140.— Cod. bav., §79. — Pfister. Causas
criminaes, V, p. 606.
(21) Por exemplo, quando ha no lugar do crime pedras pontagudas, troncos,
raizes, etc.
(22) Vide0 Proe. crim. comp., t. 2, cap. 125» p. 71, e notas 10« 11.
»6©
6. No caso de furlo (23) a vestoria serve, quer para avalinr
os objectos furtados, quer para verificnr porque ios o furto
foi praticado.
7. Nas averiguaçôes sobre o caso de incendia os peritoe tem
de decidir (24), ou que o fogo nao podia deixar de ter sido
posto pela mao do homem, ou que deve antes ser attribuido a
causas naturaes, taes como a inflamacao espontanea de certas
materias (25) ; e tambem tem de averiguar se o incendio podia
ter sido ateado do modo allegado pelo accusa do, e ter-se desen-
volvido do modo porque o foi (26).
- 8. No caso de fabrico, e emissâo de moeda fnlsa devem ser
necessariamente consultados (27) sobre a exactidao do peso,
sobre a natureza da substancia das moédas suppostas falsas, e
sobre os meios, dos quaes se servirao os au tores do crime. _, 9.
Se se trata de uma falsidade em escriptura, os peritos veri-ficao,
se existem realmente alteraçOes, e quai a sua natureza » e
importancia. Tambem aqui a chimica presta um poderoso
auxilio, dan do rouitas vezes os meios de restabelecer o texto
primitivo (27 a).
(28) Ord. crim. da Prussia, % 187.
(24) Nem sempr-e convém chamar os phisicos, ou os komens profissionaes.
militas vexes outros estarïo mais no caso de dizer, *e O fogo pegou deste on
daquelle modo. Por oxemplo, em certes pajzes os pastores, que accendem
fogo nos campos, podem dar explicaçoes mais satisfactorias.
(25) Vide em Iiitzig, Annuel de Jurisprud. crim.estr., a. 28, p. 408, um dos mais
curiosos pareceres de experlo.
(26) Os peritos o tambem algumas vezes necessarios para avaliarem a
extensâo dp darnno. Vide Hitzig, Revitta de Jurispr. crim. pruss., n. 27, p. 338.
(27) Vide o Proc/crim. comp., t. 2, cap. 126, p. 4.
(27 a) Duvergier, Medicina légal, 2, p 174,177
361
10. Pinalmente em qualquer especie de processo o seu pare-
cer é decisivo a respeito do discemimento do accusado. Moder.
inaineute uma philantropia, totalmenle sceptîcaem relaçao aos
crimes, tem ampliado demais talvez o campo das molestias
mentaes, e multiplicado neste ponto os casos de vestoria (28) »
mas como em todo o caso o primeiro dever do inquisidor é
verificacar os factos era sua inteira verdade, e deaviar todas
as duvidas, segue-se que nao se pode censura-lo por chamar
seropre os peritos, logo que se possa duvidar ter sido o crime
commettido pelo accusado (29) ; quer em razao da propria na-
tureza do crime, quando parecer estar em contradiao coin os
andentes e os motivos conhecidos do seu autor; quer em
razao da singularidade da conducta deste ; quer por ser a ves-
toria provocada directa ou indirectamente pelo depoimento das
testemunhas ou por um requerimento do defensor (30). Neste
caso devem ser a présenta dos ao experto todos os documentes
que podem influir na sua decio, e o juiz nao lhe deve re-j
cusar (31j, se elle pedir, novo interrogatorio das teste-
munhas e dos iudiciados, afim de esclarecer melhor a sua
opiniao. Devendo o seu laudo ser reflectido e motivado, os
quesitos devem ser-lhe formulados de modo preciso e espe-
(28) Oitaremos para exemplo as opiniôes de Platuer. E' cahir em um ëx-
cessb ridieulo sustentai-, que é sempre o resultado de uma molestia do espirito
um desses grandes crimes que provoeâo a indignacSo e o pasmo gérai.
Foderé, Etuaio sobre as diversas especies de loucura, Strasbourg, 1822'
combate todas estas falsas tlieorias.
'(29) Jarke na Revista de Hitzig, n. 28, p 121,189.-. Fenerbach, Causa*
erimina.es célèbres, 11. p. 819.
(30) Gom tanto que os factos articulados nào parecSo destituidos de loda a
verosimilhauça.
^3i; Vide o Proc. crim. comp., cap. 14", t- 2.
363
cial (32) ; do contrario, o aeu relatorio nao poderâ conter senao
conclusses vagas e inapplicaveis : tatnbem nfto devern ser dema"
1
siadamente exclusivos, porque podem provocar respostas conce-
bidas em termos muito restrictos. Pinalmente, ainda o repe-
timos, se o perito deixar de responder sobre alguns pontos, se
o juiz acharque o seu parecer nïio é, nem bastante preciso, e
nem sufficientemente fundamentado, terâ- o cuidado de o
tornar a chamar, e mostrar-lhe as lacunas a preencher, os
pontos a rectificar *no seu relatorio supplementar, ou entao de
nomear novos peritos (33).
CAPITULO XXX
DAS KKGKAS DE A.PRECIAÇÂO DÀ FORÇA PBOBATORIA DAS VESTORIAS
Quando o juiz quer apreciar os resultados de uma vestoria,
trata primeiro de examinar se os factos, que ella verifica,
devem ser admittidos como verdadeiros ; e depois, se as conse-
quencias deduzidas destes factos podem convencer.
Quanto aos factos, ha muitas distinoes a fazer : podem cons-
tar do processo verbal da inspecçaO judiciaria, sendo a sua
existencia attestada ao mèsmo tempo pelo magistrado e pelo
expert» (1) ; ou podem ser attestados sômente pelo expert»,
por te-los observado (2). No primeiro caso sao elles tidos
por juridicamente provados ; mas aqui convem nao esquecer
que muitas vezes o processo verbal do magistrado
(32) Vide o artigo do autor na Eevista de Hitzig, n. 3. p. 287.— Proc
m
crim.
convp., t. 2, eap. 147, nota 23.
(33) Vide o Proc. crim. comp., cap. 147. u. 2 e 3.— Todas estas questôes sâo
ahi disoutidas com mais desenvolvimento.
(1) Bxemplo : se se trata do numéro dos ferimentos.
(2) Exemplo : quanto à extensâo e profundidade dos ferimentos.
363
relata certos factos, baseanclo-se s<5mente nas declaraçOes
dos peritos, que na vestoria usarao dos meios de verifica-
çao fomecidos pela sciencia, ou pela àrte : por exemple,
quando déclara a profundidade, a natureza e a forma exte-
rior dos ferimentos (3). Nesta hypothèse nao séria appli-
cavel a regra de apreciaçao da inspeao judiciaria, porque
examinando-se a fundo a verificaçao reprodusida pelo magis-
trado, ve-se que ahi somente ha o resultado das observaçoes
oculares do experto. Resta agora apreciar a sua procedencia.
Ora, estas observoes estao sujeitas as mesraas regras que
determinao a confiança vida à prova testemunhal ; e por
isso.se se demonstrasse que o experto na qualidade de testemu-
nha era inadmissivel, ou pelo menos suspeito, a sua autori-
dade na qualidade de perito ficaria tambem muito abalada.
0 juiz examina depois o modo pelo quai elle procedeu à ob-
servaçao dos factos. Se o experto nao foi chamado a tempo de
examinar os objectos no seu estado primitivo (4) ; se nao
empregou os meios technicos mais aptos para a sua missao
actual (5) ; se nao fez lies o uso conveniente (6) ; ou se as
suas observaçoes forao incompletas Ifl), a confiança do jui
z
(3) Se, nâo obstante ter estado présente, o iuquisidor o introdusio a sonda
na ferida, e no processo verbal relata o resultado da operaçâo du sonda,
nada mais faz do que reprodnzir a declaraçào dos expertes, por lue mère
cereiri fé.
(4) Supponhamos o caso de ser importante veriflcar a eôr das bordas da
ferida, e no entante uâo te-lo o experto podido fazer senao â claridade do
crepuscudo je adiautado, ou & luz de uma vêla.
(5) Exempte : quando nao forào feitas as experiencias indicadas pela sci-
encia para a pesquisa do veneno.
(6) Exempte : quando o pulmSo foi examinade com ô auxilio de mâos ins-
mentos.
(7) Exempte : quando as très cavidades do corpo liumano forao abertas.
aa4
deve diminuir. E' muito importante tambem a forma das de-
claraçOes do expert». Assim como uma testemunha merece
pouca , quando nao pode expor os motivos, que demonstrem
a verdade do que prétende ter visto, e quando o sëu depoimento
nadamaisédo que uma série de contradicçOes ou hesitaçOes,
assim tambem o experto deve merecer pouco credito, quando
incorre em graves censuras (8).
Quanto as suas conclusses e ao seu juizo, nao sao appli-
caveis as regras de apreciaçâo da prova testerannhal, pois o
perito pode retractar-se da sua opini&o precedentemente mani-
festada em um primeiro relatorio (9) ; a retractaeao da teste-
munha dénota, on que vio mal, ou que quer occultar a verdade
; mas modificar o exper) oseu primeiro juizo é dar prova de
zelo mais consciencioso e de um exame tanto mais profun-dado,
quanto é certo que as novas experiencias e deducçOes
scientificas devem leva-lo afirmar mais solidamente a seu pare-
Portanto este tira todos os elementos de convicçao que encerra:
1.* Dos principios. que o experto tomou por ponto de
parcer.
tida (10),e das leisscientificas, com as quaes prende os factos
observados (11) ; mas, para que o seu parecer mera fé,é mister
que estas leis e estes principios sejao reconhecidos sem contra-
dicçao, e que a sua appficaçao seja rigorosamente exacta:
(8) Stubel, Do eorpo de dilicto, §339-810. — Tittmann, m» p. 880.
i
(9) E' o qne acontece frequentenïente por culpa do inquisidor, quando
exige o parecer do experto logo depois de praUcada a autopsia. Mas quando
este mais tarde médita com mais calma no seu trabalho, e emprega com
mais reflexâo os meios scientiftcos de que pôde dispor, conliece nao ter fu
damento o seu primeiro parecer, e manisfesta um novo.
(10) Assim, nas queses de imputabidade e de discernimento, quando o
experto affirma nâo poder haver consciencia. quando hamol estia mental, nSo
pôde decidir ter havido na especie mania sine delirio.^
.(11) Exemplo : as relaçôes entre a reàpiraçSo e a vida sao reguladas por
uma lei phvaiologica, que serve de base a docimastica pulmonar.
36S
2.° Das deducçOes motiva das, com jas quaes corrobora a sua
opinifio ;
3.° Da sua concordascia com as premissas conhecidas,
constante das peças do processo. E se houver contradicçOes entre
a declaraçao dos peritos e o depoimento das testemu-nhas (l'2),
ou a confîssan do indiciado, devem ser attentamente discutidas.
Quando os factos, taes como forâo observados pelo" experto, sâo
totalmente inconciliaveis com as allegaçOes do indiciado. ou com
as declaraçoes das testemunbas ; mas sendo o relatorio
solidamente motivado, e, nao dando luorar à. descon-fiança/) juiz
deve acreditar no relatorio, ou ao menos deve com mais atteuçao
pesar e discutir as confissôes e os depoimentos. Se as
contradicçôes entre o experto e as testemunbas (13) ou o accu-
ndo (14) deixao as declaraçoes dos ultimos toda a sua força, deve-
se concluir queaqnelle se enganou, e o seu pare-cer'nâo deve ser
acreditado.
4.* Do acôrdo ou da unanimidade dos peritos, quando s&o
tnuitos (15). Se bouver divergencia, é mister distinguir. | Ou esta
versa sobre os-factos observados, ou sômente sobre as
conclusoes que cada um délies tirou. No primeiro caso, se os
resultados do exame feito por um délies sao corroborados por
outras provas estranhas â vestorisi, deve-se preferir a opi-niao
deste (16) ; versando a divergencia sobre um facto insi-j
(12) Orden. crim. daPrussia, §14
(13 Exemplo • as teslemunkas âTIirmào que a criança gritou, quando a re
o enterrava, e os expertos, que ella nSo podia ter nnscido viva.
(14) Exemplo : os expertes affîrmâo que o homicidio foi praticado por meio
de uma arma de fogo, e o accusido confessa que o praticou com uma facn seni
ponta.
(15) Pouco importa a differença, entre os motivos, se o resnltado é o mesmo
Orden. crim. da Prussia, S 388.
(16) Por exemplo, quando o mngistrado intructor, examinando o lugarl
observou o mesirïô facto
34
366
gnificante, (17) enao havendo suapeita de infidelidade volun-
taria ou involuntaria contra os peritos fl8), a autoridade destes
uada perde. Se pelo contrario se trata» de ura facto capital (19) j
a soluçao é mais diffi.il. Séria inutil remetter o relatorio a um
collegio de expertos superiores, porque estes nao poderiao deci-
dir quem tem vazao, senao observando nova e pessoalmente os
factos. Por outrolado nao séria acertado decidir sômente pela
plural idade de votos(20). Se a pluralidade é a regra em uni
collegio nomeado pelo governo, a mesma causa nao acon-tece
no caso vertente ; poisque foi o acaso que reunio 03 expertos
no mesmo lugar, perante os mesmos factos, sera que houvesse
um corpo délies constituido. Neste eentido quiz-se argmentar
com um texto da lei roman a (21), mas é improcedente 0
argumento (22) ; poisqie nelle nao se trata senao de uma
medida de cautela, que fica suffici-entemente justificada,
quando muitos peritos attestau a pro-babilidade de um facto
especial (a de u/ma gravidez). O que se deve fazer é provocar
um novo exame dos factos, sendo possivel. No caso contrario
os tribunaes nao poderao resolver a diflîculdade, senao
applicando as regras usadas no caso de desacôrdo entre as
teatemunbas, isto é, a verosimilhança dos depoimentos, sua
forma, e por ultimo tambem a pluralidade das opiniôes ; e, um
ultimo analyse, 0 juizdevera seguir a'opi-
(17) iSobre 0 numéro de certes ferimentos sem impovtancia.
(18) Por exemple quando é évidente poder-se errar facilmente. H
(19) Fxemplo : da existencia de um ferimento morlal.
(20) Eutretanto foi 0 que fez 0 Codigo bavaro, art. 205.
(21) L. 1> Dig. pr., de Inspiciendo ventre.
(22; Vide 0 artigo do autor nos Arch. de Jurirpr. ci». Il, p. 138.
3«T
niaomais favoravel ao o (23). Dissemos que a divergencia
entre os expert'>s pode tambem versar sobre as suas conclu-
sses (M) : neste caso é mister vêr dentre os expertes quai o que
deve ser preferido em razâo da sua sciencia e da sua babili-
dade pratica ; por iaso o doutor em medecina é preferido ao
simples cirurgi&o ; é mister tambem examinar quai a opiniao
que parece melhor motivada. Porém o juiz nao obraria com
prudencia, se quisesse fazer por si mesmo estas comparOes ;
procédera com mais acerto ebamando outros peritos, que por
lum novo relatorio tornariao mais facil a sua missâo ; ou pe-
dindo o parecer de uma facnldade medica superior, admittindo
este recurso a organisaçao local (25). Quando, nao obstante
todos os meios empregados, as duvidas continuao asubsistir, a
regra determiua que se siga mente a opiniao mais favoravel
ao accusado (26).
Deverâ o tribunal prestar absolutamente ao parecer dos
peritos, desde que fôr regular, e principalmente ao parecer de
um collegio medico? Porcerto que nao, corao dissemos : a
pcova por peritos basea-se em um encadeiamento de probabili-
dades racionaes, que o juiz deve pesar antesde declarar-se con-
vencido. Em cada uma das causas ttvà pois de decidir, se o
relatorio convence. As leis modernaa consagrao este princi-
pio (21), e dispoem que o parecer dos peritos nao pode ligar o
(23) Um perito muito digno de sustenta que verificou esistir no cada-ver
um ferimento, cuja existencia muito aggravaria a posiçâo do o : outro perito
tambem digno de desmente o facto. Neste caso, e faltando outras provas, a
prudencia ordena decidir neste ponto a favor do réo.
(34) Deinlin, De medic. inter sentent, medicor. leg. arbit. Alt. 1751.
Orden, crim- da Prussia, g 173.—Cod. bavaro, art. 265.
(25) Vide o Processo crim. comp. cap, 153, t. 2.
(26) Tittmam, L. O. III. p. 380.
f27) O Cod. do Proc. civ. francez diz no art. 322 .;• Osjuixes nSo s&o obrC
gados a seguir o parecer dos peritos, quando a sua convieçâo i contraria.
368
tribunal, senao quando èfundado na razflo e naverdade (2S) j
Reconhecem igualmente que o magistrado teni direito de per-
iguntar a si mesrao se a sua convicçao esta formada, e, nao]
seudo obrigado a conderanar senao se sentir profundamente
convencido, é évidente que nao é obrigado a seguir o parecer
dosperitos, senao quando conhecequeha certeza demoristrada.
E nao se objecte que,sendo assim, parece que ojuiz se attribue
conheciraentos superiores â sciencia especial dos expertos,
qnando pode decidir do valor de uma consulta scientifica
aquelle que possue a seiencia em grao eievado ; pojsque a
posiçao do juiz é muito simples, e exclue qualquer idéa de tal
censura : as suas funcçOes consistera em receber o relatorio
das mâos dos expertos, examina-lo e compara-lo na sua forma
e theor com os motivos, nos quaes se ftinda, com as circuns-
tancias e provas de diversa natureza existentes no processo.
Nao sendo o parecer motivado, o juiz s > o pode considérer
como uma opiniao puramente arbitraria, insufficiente para o
satisfazer (29). Quando os motivos sô contem em fundo asser-
çôes sem fundamento racional (30) ; quando parecem relatados a
pressa e sem harmonia, ou quando as premispas estabeleci-das
parecem deverautorisar consequencias diversasdastiradas, e
concluir que os expertos violarao as leis dalogica (31) ; o juiz
nao deve adraittir a sua decisao tao viciosa. Outras vezes o
relatorio ébem motivado e inexpugnavel na forma, mas sao
notoria e facilraente illusorias as leis scientificas, que elle
(28) Ord. crim. da Prossia, § 388.~Cod- hav., art. 269.
(29) Kleinsclirod, nos Arch. do Dir. crim,, V. n. 8, p. 25. Compare-sc a
sua opiniào com a de Kittka, p. 236, nota.
(80) Exemplo : conclue o medico qne houve envenenaraento do facto de
decompor-se rapidamente o cadaver.
(31} Exemplo : nâo obstante serem os expertos os primekos a reoonhecer
que sào iucertos e fallazes os principios e as experienciaa scientificas nas
quaes se fundào ;'todavia délies tirio conclusses précisas e positivas.
a«9
toma por ponto de partida ; ora o juiz, que isto sabe. nao pédel
esquece-lo sem razao 32) ; e a sua conviceao nao pode firmar-se
em opinioes que nâo lhe parecao fundadas ; mas como elle nao
pode substituir por outras leis, scientiftcamente reconhe-cidas,
aquellas que os expertos admittirao ; como. em nma palavra, nao
pude o juiz faser-se experto, segue-se que deve em ultima
analyse communicar a os expertos as suas duvidas, ou chamar
novos. Quando o relatorio, mal fundado era seus mo-tivos,
émana de um collegio medico, a mais elevada autori-dade do
paiz, e as leis locaes nao permittem uroa ultima vesto-ria ;
quando os homens da arte persistem *nas suas opinioes, nâo
obstante as duvidas manifestadas pelo juiz. e este continua a nao
ticar sufficienteniente convencido da verdade das suas opinioes,
lhe resta decidir favoravelmente ao accusado, des-presando
totalmente os factos constantes de um relatorio que naoo
convenceu (33). Os motivos dos expertos podem ftnalroente
apoiar-se, f6ra dequaesqner experiencias scientificas, em factos
constantes ~do processo ; neste caso deve o juiz verificar a sua
siuceridade por meio dos proprios autos (34), e ver se os dilos
factos forâo inteiramente considerados, e no seu verdadeiro sen-
tido,e, quando elle a char duvidas, deve mostrar aos homens da
arte onde esta o seu erro, ou, quando a vestoria é definitiva
(como acontece em certos paizes). recusa-lhe fé.
Estes pvincipios sao tambem perfeitamente ap'plicaveis nas
questOes de imputabilidade e de discernimento Porém sobre
(32) ExempLo : quando os peritos, no caso de infanticidio, dâo como infal-
liveis os resultados da experieucia pulmonar. Non. Arch. do Dir. Crim.
VU, p. 509.
'33' Exemplo : se os peritos sustentarem que a criança teve vida. H
!34) Exemplo : o experto em materia de envenenamento toma por texlo di-
'versos symptouias observados pelas lestemunhas durante a moleslia, mus nâo
reproduz a mesma iinguagem de que usarào.
3*70
este ponto ha outros priucipios especiaes, dos quaes devemos
dizer alguma cotisa (35).
Como os factoa de consciencia, que convém aqui examiner,
nftopertencem aodorainio das seiencias medicas, tendo tam-
bem legitimo direito de apreciâçao qualquer espirito cnltivado,
e dotado de conbecimentos psychologicos sufficientes, a missao
do juiz nesta vestoria especial adraitte maior liberdade e ex-|
tensao, e as opinioes dos horaens da arte estao mais do que
nunca suj'eitos ao aen exâme (36). Percebendo o magistrâdo
qne os peritos adraittera uma lei, ou um principio reco-nhecido
erroneo (por exempta em materia de liberdade liumana) ; que
attribuera a falta de discewùmento h um certo estado da aima,
quando o contrario é affirmado pelas sas theorias juridicas e
psychologicas (37) ; nao pode pres-tarfé a um laudo assim
baseado. em premissas radicalmente falsas. —- Acontece ainda
frequentemente que os peritos ulq trapassando os limites
assignados à sua missao (38), affir-mao sem razao a ausencia
do discerniraento ; sendo-lhes de ordinario apresentado o
segninte queaito, 0 accusatif) leria con~\ eiencia de si no momento
do aclo ? Séria victime/, de um desar-ranjo mental, que o privasse
da consciencia, ou o perturbasse compte lamente ? Deve-se
responder sômente a este simples que-sito, competindo depois ao
juiz apreciar a resposta conforme a
(85) Vide no Proç. crint, comp. t. 2, cap.* 147, uot. 1 e principalmente 2.
um resumo da litteratura especial sobre estas questôes tâo difflceis. e cou- j
Vrovertidas.
(36) 0 projecto daOrden. crim. uauov. de 1831. $ 198, déclara, que a deci-
sSo em mdteria de imputabilidade e de discernimento pertence inteiramente^
d apreciaçSo do juiz.
(37) Exemplo : os peritos expeudem uma falsa tlieoria a respeito de uma
pretendida Excandesçentia furibtmda, ou mania inc'eudiaria.
(88) Jarke» Manual do Dir. pen, allemt,. t. 1, p. 169. Woechter na Re-
vista critica de lubingue, t. 3, n. 1, p. 81.
avi
lei, e decidir se ha imputabilidade na especie. Algumas vezes,
porém, os peritos vao mais longe ; arrog&o-se um difeito," que
nao tèm, eaffirmao a nao existencia da imputabilidade. Tal
conclusao é inadmissivel ; e o jiiiz deverâ traze-los para den-
tro dos justos limites, pedindo-lhes novamente uma soluçao a
respeito das queses de simples facto ; e se o segundo parecer
r ainda defeituoso sob uma ou muitas das relaçôes acima
apontadas, o juiz nfio sera obrigado a segui-lo (39). Final-
mente, quando os peritos affirmarem a existencia de uni es-
tado mental realmente exclusivo do diecemimento, mas conti-
nuar o juiz a ter duvidas a respeito da verdade da sua opi-
niao, deverâ este declarar o accusado incapaz de discerni-
mento ; porque, no caso de divergencia entre a sua opiniâo e
a dos medicos, sera sempre mais prudente preferir o systeraa
favoravel ao occusado. Mas senao houver a rainima incompati-
bilidade entre o discernirneuto e o estado da aima affirmado
pelo experto, entao o juiz, sem fazér obra pelo parecer nega-
tivo, evidentemente eri-oneo, deverâ decidir conforme as suas
convicçoes juridicas e as disposiçOes da lei (40) (*).
(39) Vide oartigo do autor na citada Revista de Hiliig, n. 8. p. 824
(-10) Muitas vezes os medicos declarùo que o accusado obrou no estado de
embriaguez compléta e, por- couseguinte, nid tinha discerniinento. O juiz nâo
se couformarâ corn o .sen parecer, c pronuuciarâ a culpabilidade [culpa).
(*) Cada diamais se reconhece'quea economîa da vestoria é muito melBor
compreheudidana Allemanha do que na França.onde a economia de instruccao
crjminal estatuio algans preceitos completamente insafficientes. E' o que
muito bem demonstrào dous sabios hollaudeses, prinçip&lraente em relaçSo à
medicina légal (vide o excellente livro dos irmâos Vau-den Broeck.dos quoes
um é medico, e o outro àdvogado ; este livro'appareceuem Utrecht em 1845
sob o tituloseguinte : de Uitœfening der geregtijlhe Geneeskund Nederland)_
O principal inconveniente na França é a falta, em cada districto, de um
medico légal, officialmente nomeado e possnindo conhecimentos especiaes
necessarios ; dahi resulta.que a escolba do experto é total mente abandonada
ao 'procurador regio ou ao juiz da instrucQào, e que muitas vezes o experto
sa
chamado ngo tem as habilitaçôes sufilcientes. Nem ha «m Fronça eollegios
medicos enoarregados de oxaminar os relatorios dos primaires expertes. Mon»
disso quai n posiçâo dos expertes parante o tribunal do Jury î 0 Oodigo nâo
dix ; e ainda nesta parte tudo é deixado a» poder arbitrario do présidente.
Finalmcnte, é de lamentai- qne os estudantes de âiretto nâo o um curso de
raedecina gal ; porqne, quando cbégân a ser magistrados, é ftes| I inultas
vezes impossivel comprehender a importanciadesta ou daqnella cir-
cuustnncia, formular qnesitos, examinar por si o relatorio dos expertes, c,
depois desle ûxame, formar a nia opiniln indépendante. Na France existe
sem duvida nm certo numéro de escriptores célèbres em relacâo a materi e
os trabalhos de Orfila.de Devergie, de Olivier d'Angers, s5o com juste tituln
aprecindos na Allemanha : mas estes nuteres serSo RufAcientemente apreeia-
dns e estudados no «en proprio paiz?
Na Allemanha tedno estudante de direito o obrtgadn a assistir es es de
médecine légal, e por isso entra melhor preparndo na carreira judiciaria.
Junte à cada tribunal e para o seu distric existe um uiedioo légal officiai pag"
pelo Kstado.eqne sempre è chamado a dar o seu parecer nos easos emque
se apte*ei,ta iuna qneslâo intéressante da sciencia. Em cada provincin , fui
iccionn um collegio. ou pelo menos um relater medico (referont*, ao* quaes s5o
transroittidos os pareccres do medico légal officiai, quando o juiz o se ncha
sulïïcientemenle convencido. Finalmente lia na capital um rotttgio medico
superior. composte dos bornons mais notavela na sciencia, e qne é chamado
para dar o seu parecer em ultima instnncia, quando nâo forSo solvidas as
difAcnldades e duvidas. Ooucebe-se, pois, que auteridade o empregode
tedo» estes meios deve conferlr A vestoria.
Tem sldo muito discutlda a questSo de salier se os tribunaes flcSo ligados
pelo parecer dos expertes : os modernoe Godigos di Allemanha conferein
nestaparta compléta liberdade ao Juif. A lei wurtombergueza, art. 101—102
termina que quando o primeiro relaterte nâo sattsfnca, elle o remetta a
auteridade medlca superior; devendo prevalecor. no caso de duvida, a opniiSo
mats (avoravel ao aceusadn- (art. 294). Quando os medicos negfto ou duvidfio
da existenciado diacernimente no accusado. no quai reconheeem symptomns
do alienaçâo mental, o art. 295 do mosmo Oodigo obriga 0 juiz a aceitar as
conclusses do seu relatorio, com tante que se apoiem em motivos pura-
mente medicos__Nos termos da Orden. do Proe. crim. badez. art. 251, o
juiz, nesta hypothèse, résolve a quoot&o da iinpntabilidade, tomando por
ponte de partida o relatorio dos expertes ; m is deve tambem fazer eabedal
das declaraeôos das testemunhns, que vivorâo na intimidade do accusado, a
Tespeitede cujo caracter e estado mental conventeempre interroga-las ; final-
mente as suas observaçôes pessoaes tambem muito o auxiliâo para se escla- i
recer. e convencer-se. [Nota tnanuscripta do autor)
FIM DA. TEIiCEIRA PARTE
Nâo continuâmes, do cap. V. em diante, com as nossas annotaçôes, por nos
ter declarado o editor, por favor ao quai fizemos a traducçào, que qual-quer
demora poderia eausar-lhe graves prejuizos, visto estar outro editor imprimindo
outra traducçào da mesma obra. Por essa mesma rasào o nosso trabalho (feito
da noite para o dia) dévia conter, e contem numerosos vicios e erros, dos quaes
algûns nos escaparâo, e a maior parte sâo devidos aos compositores, que
tambem é natural que se descnlpem com a urgencia exi-gida. Nâo era possivel
incluir em uma errata todos estes vicios e erros ; por isso apontamos na
seguinte errata os mais notaveis, advertindo ao leitor que sômente fazemos uma
emenda para todos os erros de identica natu-reza ; e que nâo emendamos a
pontuaçSo que esta nmito errada, nâo por-que isso demandaria nmito
espaço, como porque sâo os erros de importancia secumlaria, e podem
facilmente ser percebidos.
EEEATA
PAGINA UNB
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ERRO
e alguma
prescrevendo
erigir
concumilanfes
centuarias
dito
quœstiones
qnisitos
considéra da
iuradas
N. S.
É
Dominiciann
previlegio
nos ultimos
improdenoia
cononica
processo
pena
tratava •
postas
deversamente
supertiçôes
saciedade
combateu-o
EMENDA
alguma
proscrevendo
exigir
concomitantes
centurias
Dig. ,
quœtionis
quesitos
considerado
iurados
N. L.
Domiciano
privilegio
nos ultimos tempos
improcedencia
canonica
processus
prova
se tratava
postos
diversamenie
superstiçôes
sociedade
combateu-as >
II
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LINHA
10
devidio
5
explicaçâes
21 limitar-se as ies
96 preecrever
a
pveocup
10
judicisamente
25
estivessem
26
seia
27
da
30
inesplicayeis
g
de qùerer^
8
da suppor
-
se
9
disconfiança
27
encontra
-
se
31
outorgado
34
seculo
XVIII
12
ingua
14
seculo
XVIII
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l'undada
30
linitava
3
penas
11
disconfiado
8
dosdes
5
dezuso
15
Opéra om
11
Jury
10
preferir
21
mas esta opiniâo
Z
J
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deicto. (32)
17
effeitas
21
no absohttio
H
7
accisaçâo
8
accaso
35
e que nâo H
5
prinscipio
7
o accusado pode
7
em contiuenti jfl
16
scientificos
24
ooucervào
26
acusatoria B
6
no systema
21
o qnal
24
de quem pretendesse que
facto
25 os julgamentos o mais
1 inquiçâo
24
em uma e outra bacia
10
accusado particulàr JC
e8
co informe
18
scinceras
3
visioso
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disconftauças
1
Existe
2
de outro lado
7
franzez
8
' que jà esta ligado
EMKNDA
dividii
explicaçôes
limitar-se a criticar as
applicaçôes
proscrever
preoccupâo-se I
judiciosamente
estiverem
fôr ,-..-.
der
inexplicaveis
em querer se .
:
I
em suppor-se
desconnança
encoutrâo-se
outorgada
seculo XIII HL
liugïia XIII fundados limita
va provas desconfiado
desde desuso Opéra omn
Juiz proferir ' esta opiniào
delicto (32) effeitos na
absolutio accusaçâo acaso
o que nâo prmcipio o
accusador pode in
contiuenti scientifico
conservâa accusatoria do
systema a quai quem
pretendesse que de
facto é os julgamentos
sejâo o
mais
inquiriçâo
em um e outro prato
accusador particulàr
conforma sinceras vicloso
desconflanças Existem
alem disso francez jà
ligado
ERRO
m
LINH
A
ERRO EMENDA
8 instracçâo instracçâo H
1
e emquanto que ans
em quanto uns
18
de quem a allega
de quem os allega
19
intencionanelmente
intencionalmentê
80
probalidades
probabilidade
8
que possa ser dada
qne possa ser dado
3
a bacia da balança
o prato de balança
24
synonimo de certeza
synonima da certeza
7
os mesmas
as mesmas
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bacias da balança
pratos da balança
21
cupabilidade
culpabilidade
17
ennttmeraçâo
enumeraçâo Ji
8
pena
pvova
29
desconhecidos
desconhecidas
11
RTOV6S
graves
27
simplezmente
siroplesmemte
27
appoiav
-
se H
apoiar
-
se H
10
viciera
vicio
16
ideia
idêa
1
1870
1880
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sào inteiramente livres
tem plena liberdade
18
base
bases
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do processo
no processo
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appoio
apoio
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proferida
proferidas
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de sciencia
da sciencia
o
appresseme
-
nos em dizer
appressemos em dize
-
lc
8
examinar
examina H
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a uma impunidade
â impunidade
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nppoie .
apoie
25
um ultima
em ultima
30
faltem
faltâo
6
capacidades H
condiçoes de icloueidade
19
partecipâo
participât
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forâo
favâo
18
iiilina
-
se
inclina
-
se
20
i m compati veis
incompativeis
14
irmâes
irmSas
14
juriz
jury
1
a absolvarem
a absolver
17
emfim
enfim
21
sô se vè
sô se vêem
24
por ponto de
por termo de
1
disculpai"
desculpar H
1
vestoria
vistoria
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documentes e
documentos materiaes e
12
(documentos)
(documentos materiaes)
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docttmentos
documentot materiaes
7
legados
lesados
4
imprudencie
imprudencia
o
fecusado
ac
evsado
7
pegamento
pagaroento
12
domonstrem
demonslrem
4
indireita
indirecte
7
consumado
consummado
8
provas de consiencia
de consciencia
IV
PAGINA
LIN 11 A
ERRO
BMISNDA*
205 antes do cap. XXI.
9 ncllc
24 os resultado
9 verefica
5 loi
9 para
comparecerem
27 podessem
3 que sejâo
chamados
5 casualidade .
5 por regras
SEGUND4
Da proval
çSo judidlaria
encia pessoal.
locale
nelles
os resultados
verifica foi
para comparecor
possao que seja
chamado
causaljdade por
meio de regras
i
f
I
PARTE
jelî fica-
(expcn-
e exaine
218
224
226
»
288
240
243 nota
244 265
nota
INDICE
PAGINAS
/
Advertencia do traductor...................... .. ........ ....................................... v
Prefacio do traductor froncez ........ .;-.'.'.:............ ...'................................ vu
Prefaeio do autor. ------ .......... ..................... v v-••••••• I-JJA^''-t
xl
Part© Primelra
Da prova em materia criminal e da sua organisaçâo divers», conforme a
sentença deva ser proferida por juizes propriamente dites (letra-dos),
on pelos jurados.
OAPITULO I
Importancia da prova no processo criminal............................................. 13
CAPITULO II P|
Historia do progresso das idéas em materia da prova............................... 201
CAPITULO IH
Influencia sobre a prova das duas formas fundameutaes do processo, ou
do processo por via da accusaçào, e do por via de instrucçào............... 56
OAPITULO IV
Formas mixtas do processo......................................... .......................— 71
OAPITULO V
Belaçôes e analogias entre a prova em materia criminal e a prova em
materia civil .......................................................................................... 85
CAPITULO VI •
Da prova em gérai e especialmente da prova uo processo criminal.... 93
CAPITULO VII
Da verdade, da certeza e da convicçào .................................................... 931
CAPITULO VU!
Do systema seguido pelo legislador na organisaçâo da investigacâo da
prova ..................................................................................................... 111
CAPITULO IX
Dos ensaios tentados em di versos paizes para construir uma theoria ou
systema légal da prova ................... ..................................................... 118
VI
PACHNAS
CAPITULO x
t
^1
i
si
Quai é o verdadeiro caracter, e quai o valor real da theoriada prova
seguida na Allemanha i,!^...!.{.t...t..s., .j.......................................... 121
GAPITULO XI
Exame da theoria da .prova segundo o projecto bavaro de 1881............. 133
CAPITULO XII
Exame do systema seguido nos Paizes Baixos em cons'equencia da pro-
mulgâo da OrdenaçSo criminal de 1880 .......... .............................. 136
I CAPITULO XIH '.
Do jury em suas relaçâes com o systema dprovas legâes. ........ u<„ t 138
GAPITULO XIV
Exame da systema mixto. que confère a attribuiçao de proferir a seu-tençaa
juizes ordinarios, mas sem tb.es traçar regras de prova...., 159
GAPITULO XV
Das fontes da certeza........................................................................... 167
GAPITULO XV (BIS)
l
Dos meios de prova..'. ."Â.
ftF
î:?.'?>, :\............:*W$%
!
'.(<f'iT &*.$?* &.1» 174
GAPITULO XVI
Dns divisôes da provas, e mais e~pecialmente da prova perfeita e im-
perfeita, natural e artificial............................................................... 179
GAPITULO XVII
Do omis da prova. Esta expressâo pode ter u sentido rigoroso no pro-
cessocriminal ?.......,. .. ............ :;...;•.•................................ :...,,. 183
GAPITULO XVDI
Pravas da occusaçâo................................ •-.....................•................ 193
GAPITULO XIX
Provas da defesa.............................................................................. n 195
GAPITULO XX I
Relaçôes entre uma e outra prova .............................................. •!.. 201
Segunda Parte Da prova por veriflcào
judiciaria (experiencia pessoal e exame local.
VII
PAGINAS
OAPITULO XXI
Da verificaçSo judiciaria em gérai. Das fontes da sua força probatoria. 2Û5
OAPITULO XXII
Quando se deve procéder à verificaçao judiciaria...................................... 21?
CAPÏTULO XXIH
Oomose procède n verificaçSo judiciaria................................................... 215
OAPITULO XXIV
Das regras que convem observar em materia de verificaçao judiciaria
segundo a naturczn diversa dos crimes a cojo processo de averigua-
çâo se procède ........................................................................ ......... 219
OAPITULO XXV
Das regras de apreciaçào -da força probatoria da verificaçSo judiciaria
e dos effeitos desta verificaçSo ..................................................... . . 223
Tercelra Parte
Da prova por peritos.
OAPITULO XXVI
Natureza da prova por vistoria...................................................... ....... 226
OAPITULO XXVII
Caractères da vistoria segundo as différentes legislaçôes......................... 234
OAPITULO XXVin
Das regras a seguir quando tem lugar a vistoria .................... .,, ............. » 239
OAPITULO XXIX
Da vostoria segundo as di versas especies de crimes, e das regras a
observar em cada nin dos casos........................................ f^Pfcf « .**» ' 255
OAPITULO XXX
Das regras de apreciaçào da força probatoria das vistorias ................... , 263
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TRATADO
PROVAEMMATERIA CRIMINAL
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TYPOGRAPHIA DE.J. M. A. A. DE AGUIAR
103 RUA DA AJUDA 106
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TRATADO
DA
' PMA 1 MATERIA CRIMINEL
ou
. EXPOSIÇÀO COMPARADA DOS PRINGIPIOS DA PROVA EM MATERIA
CMMINAL, ETC., DE SL'AS APPLICAÇÔES DIVERSAS NA ALLEMANiïA, FRANÇA
INGLATERRA, ETC.
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PRESIDENTE DA CAMARA DOS DEPtTADOS DO GRÂO-DUCADO
DE BADEN, PROFBSSOB KA UNIVERSIDADE DE HEIDELBEBG, MEMBBÛ
COBBESPONDENTE DO INSTITUTO DE FBANÇA, ETC.
TRADUZIDO PELO ADVOGADO
ALBERTO ANTONIOSOARES
TOMO II
NA LIVRARIA DO EDITOR A . A . DA
CRUZ COUTINHO
7S RU V OK S. JOSÉ V5
H 4871
w 1
QUARTA PARTE
Da confîssao do indiciado.
CA*PITULO XXXI.
MOTIVOS DA. PROVA POB CONFISSXo.
Em relaç&o a esta prova, o povo tem opinioes muito
notaveis ; nunca se convence tanto da culpabiliaade do in-
diciado, como quando sabe que este fez uma conssao com-
pléta (1). Mas, qualquer que seja a conssao, qualquer que
seja a sua forma, a convicçao da sua sinceridade nao se
opéra senao sob certas condiçoes. Quem ousaria con-
demnar o seu semelhante, sômente porque se apresenta em
juizo a denunciar-se a si proprio, como autor de um
assassinato consummado ha seis annos ? Requer-se an tes de
tudo a concordancia provada entre a confîssao e as cir-
cumstancias. do processo, e da parte do accusado, a postura
em perfeita harmonia co m a idéa que formâmes daquella,
que deve ter um homem impellido pela sua c'onsciencia a
descobrir a verdade (2).
Nestas condiçOeS cedemos ao predominio de uma presump-
(1 Na França observa-se tambem que os juradps, quando pronunciSo o
veredictum de culpabilidade, sentem a sua consciencia alliviada, logo quo o
indiciado confessa.
(2) Oarmignanï, I. & IV. p. 131 a 149.
(6
ç&o natural, segundo a quai a consciencia do malfeitor o tor-
tura, e lhe ordena a denunciar-se a si proprio (3). Todavia,
muitos escriptores antigos (4) e modernos (5) sustentao o
contrario : na sua opiniao a confissao é um phenomeno con-
trario a natureza ; pois que esta, dizem elles, impoe silencio ao
culpado ; qualquer homem de espirito sao trata de evitar o que
llie pôde causar prejuizo, e sômente uma perturbaçfto mental,
ou o desgosto profundo da* vida, o deria levar a expôr-se
espontaneamente a Um grave perigo. Em apoio deste systema
faz-se cabedal das opinioes correntes em Roma' (6) ; sustenta-
se que a lei roman a «considéra va a confissîio, como contraria
à natureza ; mas tal asserçâo é complétaiqente infundada ; e a
passagem de Quintiliano, com a quai se argumenta, explica-se
pela propria especie h que se réfère : nella trata-se de um
insensato que tinha feito uma confissao, e o grande orador
empeuha-se enï fazer sobresahir a redicula obstinaçao de um
juiz que queria"
1
condemnar, baseando-se *em uma confissao
frivola (7). Além disso, esta theoria esta em » compléta
contradicçûo com .as noçoes mais vulgares sobre a
consciencia hu-
(3) Hoinroth na Revisfa de Hitsig n. 41, p. 87 e, n. 42 p. 261.
(1) Filangioi'i,- Systema da Legislaç&o, c. S, p. 179. Risi, Animadvers. ad
jus rrim., p. 80.,
(5) Meyer, Espirito, Origem, etc., n. 6," cap. 12.
(6) Arguinp.ntn-sp com uma das declamaçSes attribuidas a Quintiliano, n. 318,
814, onde se l<*m ostas palavras: Eanatura estomnis con-fessionis. ut possitvideri
démens quiconfitetur de se.— Vid° Bonnier, Tra-t'ado das Prorcis, p. 270.
(7) Niccolini, Proneâura pinale 2—parte, vol. 1, ]?-• 230, segue a verda-doira
doutrina.
7
mnna (8). E'certo que nada pôde impur silencio a voz da
aima : desde que o crime foi consummado, trava-se uma
lucta interior no espirito do culpado ; a sua consciencia
falla tao alto como o. fseu interesse"; e elle nao pôde mais
encontrar o repouso interior sem alijar o fardo do seu
remorso ; confessa en tao, para obedecer as vozes da ver-dade
que o guia,. e préfère an tes expor-se & pena de seu crime,
do que prolonger por mais tempo um martyrio
insupportavel(9). A experiencia constantemente demonstra,
que, até o dia da confissao, elle manifesta todos os symp-
tomas da inquietaçao, de um tormento interno; depois da
confissao, mostra a calma de uma consciencia alli-viada. Se
elle persiste em negar
t
asuapostura emjuizo, em presença
dos motivos de suspeita e das provas contra elle produzidas,
o trahe frequentemente : quantas vezes- os jurados nao tôm
declarado o accusado culpado, pela razao de ser
necessario que elle se sentisse tal, para se collocar de certo
modo em sua presença ; pois que, mâo grado seu, o seu
aspecto lhes pareceu uma confissao muda (10) ? Ve-se, pois,
que a confissao do indiciado, isto é, a declaraç&o pela quai
afiirma a verdade de um facto que Ihe é imputado, e que lhe
ëj^por conseguinte, prerjudicial (11),
(8) Mguns autores (como Cremani jus crim., n— 3, cap. 27, § 12) vâo longe
de mais, austentando que a causa da confissao é o amor da verdade innato em
nos.
(9) Bentham, Tratado das provas, n. 1 p. 354.
(10) Esta tambem o a opiniâo de Heinroth, 1. c, nota 3.
L
(11) Vido sobre a confissao em gérai :—Heineccius, de Religione judicant.
circa reor. canf.In opusc. exerc. 17. —Willenberg, de Inefpcaci crim.
conf. Godau. 1721.— Hagenbruch. de Effectu confess. in crim., Lfps, 1739.
—Verbrucb, de Confess. rei et revocat.,Amstol, 1794.—Kleinsclu-od nos Ant
Arch. dodir. Crim V, 4 art,.-n 8.—Tittman, Da Confissao, e da Rétracta*
çâo em matdria criminal, Hallo, 180
8
tem muita importancia em materia criminal, se bem que seja
necessario considera-la de diverse modo, se-gundo a forma do
processo. Séria contrario h evidencia negar ser ella vm meio
de prova (12) ; em materia cîvjl concebemos que tivessé podido
ha vervida a respeito, quando se considerava a prova sob um
ponto de vistà exclusivo de mais. P6dia-se dizer : ja nâo ha
mais processo, quando existe a confissao, pois é mister que
haja contestaç&o da verdade de um facto em litigio, ainda que
tenha lugar a prova ; mas, em materia criminal n&o Se pôde
admit-tir esta asserçâo ; pois que para o juiz a confiss&o n&o
é mais do que um meio de formar a sua convicç&o, quando
aceita como verdadeiros os factos confessados peloréo (13).
Ha poi# grande differença entre a confiss&o, meio de con-
vicç&o no processo criminal, e a confiss&o ou o reco-
nhecimento no processo civil : este admitte o principio da
rcnuncia e da desistencia ; assim como é licito â parte, arbitra
dos seus intéressés pecuniarios, lançar fora e espalhar o seu
ouro, se llie parecer, assim tambem pôde ella renunciar a seus
direitos évidentes, ' quer confessando ô que n&o é veridico,
quer reconhecendo a procedencia das pretençoes contrarias :
mas o processo criminal n&o admitte esta desistencia, pois
que o seu fim é. a mani-festaç&o da verdade material absoluta
; o inquisidor deve investigar igual e escrupulosamente todos
os factos confessados, e as suas circumstancias, ainda as mais
acces-sorias ; porque é mister que o juiz possa decidir, se o
réo
(13) Vide o Proc. crim comp. t. 2, cap. 161.
(13) Vido lambeih Matlioei, de Crim, li'v. 48, Ut. 15 cap. 7,u 2, que nlo
quer ver na confissao os caractères da profit; mas nio sao procodentes o»
motivos que allcga
o
foi sincero na sua coufissao. Deste principio résulta, que o
accusado nao deve ser acreditado pela sua simples decla-raçao,
e que, para ter força probatoria, a confiâsao deve preencher
rauitas condiçoes, e rodear-se de presumpçoes de diversas
naturezas. Tendo-se sômcûte em vista a eviden-cia materinl,
parece que ella deve fazer prova compléta; e corn effeito," em
que consistirâ ella, se nao é em um testemunho referido por um
individuo sobre factos que cahirao sob a observaçao immediata
dos seus sentidos (14)? e nao sera mais digna de oredito esta
tcstemunha por ter representado o principal papel nos
acontecimentos por ella referidos, e cujas minuciosas
particularidades conhece melhor do que ninguem ? Mas
colloeando-se em outro ponto de vista, vê-se que o confitente
falla em causa propria, e que, desnaoralisado pelo crime, nao
pôde inspirar con-fiança alguma, salvo se circumstancias
especialissimas, fa-zendo desapparecer as duvidas,
comfirmarem ao mesmo tempo a sua veracidade. A
persuasâo que dimana da confîssâo 80 chega ao juiz corn o
auxilio de uma wul-tidao de presumpçoes, que se encadeiûo.
Em primeiro lugar, o réo, quando confessa, depoe contra os
seus intéresses (15) ; sabe que incorre na pena merecida pelo
seu crime, e ja isto é bastante para destruir a objecçao tirada do
facto de fallar em causa propria, ûepois, deve-se convir que é
preciso que um homem tenlia motivos muito graves, para dar
um passo tao insolito, quai o de denunciar-se
(U) Arestos do Tribunal Supremo, de Parchim, 1 pavte, p. 76
(15) L. 23j §11, D. ad leg. Aquil.— L. 58, D. de JRejttdic (S)
(S) Vide o que dissemos na nota (S) à nota 15 do Autor, Cap. 2, sobre a
primeira lei. A segunda lei. referindo-se a um decreto de Marco Aurelio. lirma
e regra de que a causa pôde ser decidida pelo juramento, porque o juramento
judicial ton a força de causa julgada.
II. 3k
«
V
a si proprio, expondo-se livremente e de boni grade « um mal
material. Dever-se-ha attribuir o motivo a uni desarranjo de
espirito, vendo-se no confitente um louco que no seu delirio se
arremeça à morte, e inventa, para este fim, falsas
circumstancias de Um pretenso crime (16) ? Dever-se-lia
attribui-lo antes a um calculo habilmente combinado na
esperanca de encontrar certos beneficios eventuaes (17), ou de
salvar outra pessoa (18) ? Finalmente, dever-se-lia attribui-lo
aos dictâmes irresistiveis da cons-ciencia? Quando, depois de
um estudo attento, parecer demonstrado, que o accusado
possue compléta sanidade de espirito, e que nada tem a ganhar
com a confissao, é muito naturel pensar que sô o remorso foi
o seu mobil.
O modo da confissao augmenta o credito que esta é car paz
de inspirer, é elle muitas vezes sufficiente para démons-trar
que o réo comprehende toda a gravidade das conse-quencias
das suas palavras (19) : e séria difficil admittir nBo serem
sérias as suas palavras, quando elle as profere,por exemplo,
perante o tribunal compétente para o condem-nar, ou perante
o juiz, cujos actos mais tarde serviras de base à sentença
defiuitiva.
Convém igualmente examinar por que meio foi o réo
levado a confessar ; se o juiz no interrogatorio se limitou
(16} Kitka, p. 120
(17) Tem-se viato iudividuos, condemnadas à prisào perpétua, decla-
rarem-se culpados de um crime, consummado longe do lugar em que se
lachâo, afim de serem alli conduzidos,e procurarem a possibilidade da evaaSo
(18) Por exemplo : na esperanca de salvar um amigo ou parente, auior
real do crima
(49) Benlham, Tratado da» Provas, \\. Il, p. SôU
t
11
strictamente a pedir-lho explicaçOes «obre os factos da
accusaçao, ai se absteve escrupulosamente de qualquer
suggestao funésta ; se, fazendo-lhe simples perguntas sobre o
facto, nao o levou, sem que elle o percebesse,. a responder a
ellas affiraiativamente, e sob a forma de confis-sao ; eutao o
confitente pôde ser acreditado nas suas palavras ; a sua
coûfissao é a expressfto do que fez, e do que vio ; o
interrogatorio dispertou-lhe os remorsos, e estes obrigàrao-no a
fallar.
Esta presumpç&o torna-se duplameute véhémente quando a
sua pessoa, no momento em que falla (20), révéla o pesar
profundo e sincero da ma acç&o que praticou, e a neces-sidade
de escapar por qualquer preço as torturas da consciencia.
Mas ha ura caso principalmente em que a confisstto
détermina irresistivelmente a convicçao em qualquer espi-rito
reflectido, que possua o instincto da verdade : é aquelle em que
os factos relatados sao demonstrados verdadeiros aliunde ; em
que as particularidades referidas podiao ser conhecidas pelo
autoï* do crime, de sorte que nao se possa eomprehsndor como
o réo poderia estar délias informado, se fosse innocente (21).
Tendo elle descripto exactamente os
(20) Por isso cousidera-se muito importante no processo criminal allemâo
verificar pelo processo verbal a postitra c os gestos do accusado (Geberden-
protokoll); por este meio o juiz, que nSo assiatio ao interrogatorio, fica co-
nhecendo, é verdade que imperfeitamente, quai a sua postura durantoa in-
formaçào. Vide o'artigo doautor non Arch. novos do D.C., t. 1, n. 112.(Na
Franca, onde a lei nao prohibe inserir nos autos estas uteis obser-aeôes, que
o juiz da ïnstrucçào bem poderia consignar nos interroga-torios, muito raras
vezes o temos visto faz»r, para nào dizer, nunca ( Nota do trad. fran.)
(31) G. O. O., art. 53.
ferimentos verificados no cadaver da vjctima ; tendo a, mente
as mesuras dimensoes das feridas a faca que elle désigna
como instrumente) do crime, como pôde elle saber tauta
cousa, se nao é. culpado ? E.' preciso, para o expli-car, nada
menos do que ura concurso de circumstancias extraordinarias.
Finalmente, um ultimo facto pôde demonstrar a since-
ridade da confissao a obstinaçBo inflexivel do réo em confir-
mar as suas primeiras declaraçOes (22) ; é a concordancia
perfeita em tempos diversos, e sob a influencia de différentes
impxessoes ; se o réo tivesse meiitido, a diversidade dais
circumstancias, sob cujo dqminio se achou, teria entfto
influido nas suas declaraçOes,
Portante, para nos é cousa fora de duvida : a tinta confissao
nao forma a conyieçao do juiz, e esta sô pôde ser foymada coin
o auxilio de presumpçOes* racionaes, tiradas da obser-vaçao
quotidiaua das leis da natureza humana, e da expres-sao das
physionoinias ; atlquiridas estas presumpçoes, o iuiz verifica
a confissao, recorrendo as outras fontes de informaçao
existentes ; e finalmente se a aceita como verda-deira sob
mua ultima condiç&o : é a de parecêr-lhe ter tido o réo firme
desejq de diçer a verdade (S)>
(22)0. 0. 0., art. 91.
(S). A nossa legislacâo reconhece na confissao um verdadeiro meio da
prova plena, deado que réunir certas condiçôes, isto é, ser feita perante
juizo comtente, ser livre, ecoincidU' cqm as circumstancias do facto.art. 94
do Cod. do Proc. Mas se. nàq ouatanteunir todas estas condôes, a con-
vieçào dos jurados reçus a-la ?
Muitos entendem que o nosao jury é soberano, e sô tem de dar contas
& sua consciencia e a Deos, e partindo de taes premissas, concluem que
pôde o jury deixar de condemnar. Em apoio desta doutrina ha opinioes
muito autorisadas.
Ht, dissemos que a forma do nosso processo era mixto, nao obstante
10
CAPITULO XXXII.
DA ECONOMIA DA CONFISSAO, E DAS SUAS CONDIÇOES SEGUND0 A
DIFFEKKNÇA DAS LEGlSLAÇGES B DOS HtINCIPIOS CONSTI-TUTIVOS
DO PR0CESS0 CRIMINAL.
As differenças fundaraentaes entre o Systema dû" accu-
saçao e o da inquisiçao actuao sobre todas as partes do pro-
cesso, nao tendo a theoria da confissao escapado à sua
influencia.
approximar-se do systema accusatorio da lnglaterra e dos Estados-Unidos. A
lei preceitûa algumas vezes a verdade formai, isto é, aquella que na forma légal
deve ser tida como tal, desde que provier de oerta prova, e forem cumpridas
certas condiçôes. Para que nos ronvençamoa disto, basta 1er alguns preceitos
da nossa legislaçâo. 0 jury em relaçâo à prova esta su-jeito a algumas regras
legaes.
Nào deve eoudemnar pela prova circumstancial, desde que se basear em
pref umpçôes, por mais véhémentes que sejào, e ainda que o convençâo»
porque o art. 36 do Cod. Grim. é terminante a respeito.
Pelo contrario, deve condemnar pela confissao nas condiçôes legaes, ou mais
pi'opriamente, d'ive reconhecer provado o facto criminoso pela confissao
comos requisitos legaes, porque o art. 9i do Cod, do Proc. nas palavras—prova
o delicto—estatue uma regra de prova légal, à quai deve submetfcer-se o jury.
Basta a'ttender-se para a restricçâo fi nal desse orligo, sujeitando o réo à pena
immediata no caso de morte, quando nâo haja .outra prova, para se concluir
que o legislador estabeleceu aqui un meio de prova légal que prende o juiz,
seja elle quem for, ainda que a sua convlcçào o levé a considerar o 'aoousado
mais ou menos culpado.
Entre nos o jurado jura tor dinnte dos olhos Deos e a lei; logo deve obedeccr
a esta ainda que a sua convicçâo lhe dicte outra cousu (art. 253 do Ood. do
Proc.)
Portante ha tambem no nosso processo feieôes muito prouunciadas do
systema da instrucçâoï e julgamos que da harmonia destusduas formas.,
l
sta e,
do systema mixto, resultaràq maiores vantagensdo que da forma pura de
qualquer dos systemas.
Nào concordâmes com a theoria que considéra doudo todo aquelle que
confessa o seu crime, por ser wm facto extraordinario, contrario à natu-veza
humana. Quem assim pensa desconhece os phenomenos psycologicos do
espirito, e a natureza moral do homera. A voz da consciencia é 4g
Il
0 principio da accusaç&o exige o compareciinento em juiao
de um accusado, que logo a principio articula a perpetraçfio do
crime com todos os seuâ caractères, as provas que prétende
produzir, incumbindo-lhe aobrigaç&o de provar os diversos
artigos da accusaçao. Portante-., o processo cri-minal aqui
consiste em uma relaçfio entre as provas. da sua parte e as da
parte do accusado, e nos esforços de
vezes mais forte do que o insUucto de conscrvaçào ; impelle irresisti-
velmente o criminoso a confessur o aeu crime para alliviar o peso do
remorso, que se torna insupportavel no siloncio e na solidào.
Tanibem nào concordâmes com aquelles que quorem que se diminua nm
grao na pana sempre que a unica prova for a confiso. Julgamos que a
unica excepçào plausivel è a do art. 01 do Cod. do Proc, porque a pena de
morte é irreparavel.
Porque se lie dar mais crcdito â declaraçào de duas ou mais tes-temunhas
do que a voz da consciencia manifestada pela confissào, d%sde que reunir
as eondiçôes legaes ? Se para isao influe a possibilidade de confessar o
accusado falsamente o crime por querer perder-se, ou por qitérer salvar o
verdadeiro culpado, entào o argumento provaria de mais. porqup é mais
possivel que duas ou mais testemunhas so combinem por qualquer raotivo
para perder o accusado.
O legislador deve deixar toda a lifoerdade possivel à convieçào do jury.
mas nào tan ta que lhe concéda a omhipotencia. Algumas regras legaes de
prova tem a grande vantagem de, emum paiz pouco adiantado, conter o
jury em seus desvarios.
Nào duvidamos que a soberania do jury, naapreciaçàb das provas e no
julgamento, seja o idéal do processo ; mas esse idéal so pôde ser reali-
zadoem uma sociedade muito adiantada; c ê notorio que entre nos o jury
nào offerece as necessarias garantias para a puniçào dos culpados.
O proprio jury inglcz, que è cousiderado o typo do svstema, nem sempre
deu as mesmas garantias que hoje dâ; a historia dos reinados de Henri que
VIII, Carlos I, Carlos II o Jacques II o demonstra, Mittermaycr, Traité de
Proc. Crim. en Angleterre-, en Ecosse et dans l'Amérique du Nord. trad.
par Chauffard, § 1.
Finalmeute o art. 449$ 1 do Regul. de SI de Janeiro de 1842 demonstra
que, segundo a nossa legislagào, o jury nào é tào soVarauo e omnipotente
como se quer. E' essa uma prescripçào, que pertenee ao systema da prova
légal, e que esta em desharmonia com o systema accusatorio puro.
1-5
a»\bo« para obter cada um a seu faror a convicçjlo do juiz.
Este, nos interrogatorios a que procède, nada mais fax do
que dar publicamente ao accusado conhecimento da queixa, e
dos motivos em que esta se fuada, e colioca-lo em
circumstancias de poder allegar a sua defeza ; nao procura
extorquir-lhe uma confissao por perguntas capcio-sas, pois
que séria ir contra as tendencias do systema da accusaçao.
Qualquer coacçao para este fim séria contraria a justiça,
assim coino qualquer confissao ria contra a natureza.
Compete ao accusador produzir a prova, sera esperar ou
provocar uma confissao da parte do réo ; e colher os
documentes proprios para demonstrar os capitulos da
accusaçao, nao lbe sendo jamais permittido contar com a
confissao da parte do adversario. Dando-se todavia a con-
fissao, faz-se délia uso de modo analogo ao que acontece
no processo civil ; é o fim de toda a contestaçao, e da
defeza da accusado ; tornando-se completamente inutil exa-
minai se este é sincero, sendo o processo uma lucta tra-
vada entre ambas as partes ; e o accusador nao é obrigado a
produzir mais prova, desde que o seu adversario reco-
nbece pela confissao a procedencia das suas conclusoes.
Mas o contrario acontece sob o regimen do processo in-
quisitorial, onde o fim principal é a manifestaçao da verdade
material em toda a sua perfeiçao ; por isso, e pelos motivos
expostos no capitulo précédente, a confissao deve ter um
lugar muito importante entre os meios de verificar a
verdade. Isto torna-se ainda mais évidente, quando se at-
tende a que, no começo do processo, o juiz inquisidor co-
meça pela duvida a examinar os faetos isolados, dos quaes
parece sulter a imputaçao contra alguem ; esta longa
analyse, este exame attente de todas as circumstancias, este
emprego escrupuloso de todos os meios de prova, tém por
unico fim dar mais tarde ao juiz do plenariô os
16
eleutëiitôs da sua décisao sobre a verdade absolu ta da for-
îuaçao da culpa. Tomando em' Consideraçao os intéresses do
accusado, a qiïëfri muito convém conhecer desde logo *as
provas contrarias, o juiz summariante, nos seus ifrter-
rogatoriôs, procura fornecef-lhe todos os m'eibs" de se jus-
tificat plenamente, ao passo qUe trata de coiher ao mesmo
tempo os documentas essenciaes para apreciar os niotivbs
existantes de suspeita. Alêm disso, como a confissâo constitue
uma excellente fonte de Certeza, e se pôdè com ràzEb esperar
muito dos conselnos da consciencia, que mUitas vezes obriga
o culpado a faïïar, mâo grado seu, o juiz no interrogâtorio deve
tentar actuar sobre o seu'ëspirito, inspirar maior força aos
impetos da consciencia, diminuir a.influeucia da razâo do
interesse que talvez em tal mo-mento nao aconselhe senâo a
mentira ; e se forem felizes os seus esforços, o culpado,
cessando toda a resistencia, descobrirâ a verdade inteîra.
O interrogatorio, pois, ; deverà seï dirigido, segundo as
regras que decorrem do seu objecto (l) ; nao deve preju-dicar
ao innocente que, oppondo calmas denegaçoes as solicitaçôes
do juiz, justifica-se sufficientemente e faz desde logo canif a
accusac&o, limitando-se a narrar os factos sinceramente,
quanto a elle (2). A regra exige entâo (3) que cada facto Ihe
seja apresentado isolada e successivamente ; por este meio
pôde fazer conhecer a verdade incontinent^ dando explicaçees
sobre cada um. délies \ as per-
(1) Vide o Proc. Orim. comp., T. I, Oap. 100, 101.
(-<{} Désigna ndo, por exemplo, o lugar cm que se achava no mu-
mento do crime.
M
<» Carmignani, VÏi p. 65, 131, Ml.
i*
Quotas devein ser feitas ao seu alcance, segundo a sua condiçao
individual, e o juiz as modelarâ sobre as varia-çoes incessantes
do seu espirito, afim de aproveitar o rao-mento opportuno da
confissâo.. De outro lado, a verdade prohibe que ellas sejfto
formuladas de tal sorte, que deva ser considerado culpado o
accusado innocente, s<3 por confessar os factos ; o que équivale
a dizer que o juiz deve fugir de actuar oor Via de suggestso, ou
de astucia.
A confissâo, assim entendida, occupa lugar e représenta papel
muito mais importante no processo inquisitorial, do que no
processo accusatorio ; mas, como dissemos, nao faz prova
pelas declaraçoes do individuo, sendo-lhe necessario reunir
mais certas condiçoés para obter a con-vicçEo do juiz.
O direito commuai da Allemanba extrahio, de fontes muito
diversas, regras para a confissâo ; mas essa diver-sidade se
explica perfeitamente, segundo o predominio de uma ou de
outra das formas do processo criminal.
Passemos em revista summariamente - as fontes prin-cipaes.
Na legislaçfto criminal primitiva de Roma, devendo o
accusador comparecer em juizo com a sua prova prepa-rada,
ficava sem razao de ser o procurar-se obter a confissâo.
Todavia, se fosse necessario, poder-se-hiao citar alguns
exemplos, demonstrando que, no caso em que ella se dava,
convencia (4). Sob os imperadores, fez-se mais fréquente uso da
tortura, sendo introduzidos no processo certos ele-mentos da
inquisiçao ; a confissâo teve entâo mai or im-
(4) Sallust. in Catilina Cap. 33 — Nioolini, Procédure Pénale 2*
part., vol. 1, 228.
il. 8.
18
poïtancia (S), e os jurisconsultes roman os reconhecerfio a
necessidade de um exame menos superfîcial dos seus ti-
tuloe â confiança (6) {luas vai muito d'ahi a uma theo*
ria légal, e a um systenia regular '. Entao a confis-
sSo era ainda geralmente considerada como prova suffl-
ciente (7)-(S). Pj
Mais tarde as leis canonicas der&o-lhe lugar mais im-
portante. Tomando a conversao do culpado por principal
mobil, e considerando a confissSo. como um signal de ar-
rependimento e de submiss&o é pena merecida, devîâô tratar
de a provocar sempre ; o que, além disso, era conséquencîa
das maximas inquisitoriaes concernentes & neeeflsidade da
manifestaçao da verdade, matériel',' maximas que se ach&o
(5) L. 8, Cod. ad Leg. Julia, de vi publica et privata.—L. 16, Cod. de
Poenis (S).
(5) A primèira dostas leis referè-se à confîssào, como meïo sufficiente
de proya, mesmo nos crimes capitaes, jnaa sômeptç-, em relaçào aos es*
cravoS. A segunda porem estatue o mesmo prècefto em relaçào aos
homena livres,
(6) A prova esta nas expressoes de que se servem.—L. 8 Dig.—de
Confettis.—L. 1 g 84 Dig. de S. C Sillan.,Loi 1. g 4, 17 Dig. de Qucett.—
Lei 23, g IL Dig. ad Leg. Aquil. (S)..
(S) A priméira das leis citadas contém um preceito de P%ulo sobre a
confîssào em materia civil, quando é incerta a existencia do cousa
confessada. A segunda refere-se as torturas qUe deviào ser applicadas aos
escravos que nSo defendessem seus senhores, de cuio assassin ato
liouvesse certeza. A terceira, no § i contém um rescripto de Adrianol
determinando que nâo se dévia dar as declaraçôes de um es-cravo,
mas sitn dèoidir-se conforme as ' provds; e no g 17 contém um rescripto
de Severo determinando que o se dévia considerar a confîssào do
accusado, como uma prova do crime, salvo se outra prova viesse instruir a
religiào do juiz. Em relaçào à quarta, vide o que dissemos na nota (S) a
nota 15 do autor, Cap. 2.
(7) L- Ult. Ood. de Probat (S).
(S) Confessos injurepro judicatis Kaberi piacet.—Ln un Cod. de Cen
feu.
19
na essencia do processo canonico. 0 excesso do System a levava
directamente à appliqaçao immoderada da tortura. ; e com
effeito, dorante a média ïêCade esta*foi posta em pratica
constantemente, e ao lado * délia, a doutrina da confissao
dominou sem contestaç&o (8).
A Oarolina considéra a confissïlo como meio de prova
excellente (9), e segundo as suas disposiçOes o juiz a deve
provocar, empregando todos os seus esforços ; todavia ja nfto a
considéra como prova nnica, podendo o accusador; na falta
délia, ser conVencido por todas as outras. Além disso, a mesma
lei exige em todos os casos as maiores precauçôes da parte do
juiz (10), e, no caso de haver con-fiss&o, o escrupuloso exame
da sua sinceridade (11).
A pvaxe tentou pôr estes principios derivados de tantas
origens em relaç&o com o da manifestaçâo da verdade ma-terial
; e a doutrintt, fundada na jurisprudence a dos tribu-naes de. j
ustiça, fez tambem louvaveis esforços para salvar a innocencia
dos perigos, aos quaes podia expo-la um juiz demasiadamente
facil em admittir a confissao como prova compléta. Mas,
querendo determinar as condiçces,' sob as quaes deve ser
reconbecida a sua sinceridade, révéla algumas vezes escrupulos
excessives.
(8) Carmîgnani, IV. p. 137.
(9) Art. 22, 62, 69. C. C. O.
(10) Assim prohibe ao jttiz procéder por meio do auggestào (art 66)
mas examinando esta disposiçào e todas as outras analogas, eonvém nSo
esquecer -que se trata de uina que autorisa a tortura.
(11) Por exemplp, o juiz indaga se alguem, além do culpado, podia. ter
conhecimento das circumstancias ooatidas na coufissâo (art. 54).
SO
Quauto as legislaçces moderoas, deve ser-lhes tambem
lapplicado o que dissemo* % respeito das différences do
processo de qtcusaçlo,i«l do inquisitorial. Tambem dao â
confissao maior ou, mener iraportancia segundo se apro-
ximSo de uma, ou de outra das duas formas. Demais, como je
observâmos, nenhuma adoptou a ferma da accusacao pura ;
sendo facil achar alguns dos elementos da inqui-siçao nesta
farragem fréquente dos principios em todas, mesmo naquellas
Que parecem basear-se inteiramente em bases contrarias.
Entre as legisjaçôes mais geralmente fieis ao systema
accusatorio, convem citar as da Inglaterra ë da America do
Norte, que fazero pesar sobre o accusador o onus da prova da
accusacao. Tambem consïdér'aio ' à confissao como um
phenomeno raro, e contra a natureza, e nao permittem que ella
seja o objecte do processo. Além disso, afim de dar maior
segurança a liberdade individual, a constituiçao americana
estabelece oprineipio : que ninguem é obrigado a depôr contra
-si proprio (12). Nao se func-cionar entre os Inglezes e
Americanos o inquisidor-, ctijôS esforços tem
frequentemente'por fim a confissao (18)'; e a instrocçao
preliminar ô rapidamente concluida : esta consiste
aimplesmente na producçao por parte do accusador das provaa
da accusacao, e na communicaçao destas ao accusado, para
que este possa apresentar a sua defeza. EJssa é a theoria da lei
; mas na pratica Q juiz de paz
(12)
Bavard, Exposition of the Constitution of the United-States, PJil«
lâdelphia, 1837, p. 36. p. 138; Story. Gommentaries on thé Contt. of the
Unithed-Statvs, Boston, vol, 3, p. 660.
(13) O Codigo da Prova de Levingston, p. T2, dispôe foraalmente qua
os juradoa nao devem ûcar ligados pela confissao nua do accusado, o
que devem prineipalmente examinar, si se lhe pôde prestar fé.
21
inglez tenta frequentemente provocar a. confissao (14). Na
occasiao dos debates publicos, depois de ter sido recebida a
accusaçao, 6 impo*ssivél-quaiquer tentativa desta uatureza; sô se
trata de reproduzir isolâVlamente eada uma das provas, e de
analysa-las de certo modo sob as vistas dos jurados. Se a
confissao se faz, estes èxaminao a sua força probatoria, e
decidem conforme a sua con-vicçao. Além disso, no ponto de
vista do direito inglez, para que a confissao possa valer como
prova, é mister que seja feita na audiencia, e immediatamente
consignada nos autos (15) ; e como o povo, familiarisado como
esta com os principios do processo accusatorio, a considéra como
uma especie de violencia feita a natureza, é natural que o|
présidente, do tribunal, antes de ordenar a sua inserçao nos autos,
tenu* o cuidado de lembrar ao accusado as graves consequencias
da sua declaraçao, e de preveni-lo contra uma confissao
precipitada, da quai mais tarde talvez se arrependa (16). Na
Inglaterra, finalmente, a confissao tem maior ou menor
influencia no julgamento, conforme a resposta do accusado à
pergunta, que lhe é feita na aber-tura da audiencia, se elle é
culpado ou nao (guitityçor no guilty), isto é, conforme elle se
déclara autor do crime, pu defende-se de o ter commettido. Si se
déclara eulpado (17), o processo é logo encerrado, e nao ha mais
neoessidade
14) Philips, on Evidence, 1 p. 116.—Russel, on Crimes, p. 615.
(15) Stanndford. Pleas of the Crown, London, 1853, cap. 31.—Haie, PUas
of the Grovm (idem), p. 225.
(16) Benlham, Tratado da Proea. 11, p. 315.—Vide o Proe. Crim. camp., t.
2, cap. 135.
(17) Cottu, da Administraç&o da jusliça, p. 76.
22
de um wrediclwm do jury.; pela sua confissao o accusado
submette-se previamente à pena, e o juiz nada mais tem a
fazer do que pronunciar s%urido a lei. Este caso re-produz-se
fréquente inente ; ou porque o accusado espéra por esse meio
obter menor .severidade na condemnacao, ou por uma especie
de convenio entre elle e o accusador, pelo quai aquelle
confessa um crime menor, e este retira a sua queixa primitiva,
na quai articulavaraaior delicto (18). Na França nada se
détermina a respeito da confissao. O processo nao tem "as
formas puras da accusaçao, sendo a informaçâo preliminar
quasi inteiramente semelhante à inquisiçâo gérai da
Allemanha (19) ; e por consegùjnte o magistrado nunca deixa
de, no interrogatorio, perguntar ao accusado se confessa.
Emprega mesmo todos os seus esforços para provocar. a
confissao ; mas iafelizmente a lei, deixando-lhe uma liberdade
de acçao quasi illimitada, abrio a porta a mais de um abuso ; e
quando se consulta© alguns autos de informaçâo, nota-se
frequentemenfe nao se ter feito uso conveniente dos legitimos
meios de investigaçao da verdade (20). No tribunal, pelo
contrario, a confissao nSo é absolutamente o objecto das
preoccupaçOes do présidente ; o interrogatorio, ao quai o
accusado submettido, s<5 versa, nos termos da lei, sobre o
seu nome, idade, profissao, etc., etc., (21) ; e depois de cada
depoimento,
(18) A este respeito ackâo-se particularidades curiosâs em Wakefield,
Observaçôes sobre a applicaçâo da pena de morte, Londres, 1631.
(19) Vide o Proc. Crim. comp., t. 2, cap. 138.
, (20) Limitar-nos-hemos a lembrar o /procedimento abusivo das auto-
ridades no processo instaurado contra Fonk e Hamraacher. -(21) C.
inst., crim., art. 810.
23
pergunta-se-lfae siffiplesmente o que tem a resnder ao qui
acaba de ser dito contra elle (22). Se confessa, o jury ainda
tem o direito de examinât, e sd decidir sëguhdo a sua
convicçao : vê-se-o frequentemente absolver o accusaldo,
mesmo no caso de confissao ; nfto é obrigado em todo o
caso a dar contas do seu veredictum ; e, convém dizer tambeni,
a razao de assim procéder é que a pena lhe pareoe severa
de mais.
A confissao représenta différente papel nas legislOeS
especiaes da Allemanha, que tem inteiramente por base o
principio inquisitorial, e onde a prova. é sempre legal-
mente organisada. E' indispensav conhecer as prescripçoes
legaes sobre- a materia, quer as que se referem aos meios
de provocar a confissao de que o inquisidor pôde ûsar no
interrogatorio, qJrer as que se referem as condiçôes subs-
tanciaes «La confiosao em si mesma, as quaes sômente podem
dar-lhe fé em juizo.
A lei austriaca reconhece-a como prova juiidica (23) ;
mas refere-se à confissao cercada de todas as ndOes re-
queridas, as quaes nao sao por ella meneionadas de modo
complet©, e limitativo ; porque julgou ser bastante traçar
alguns principios geraes (24). Da mesma sorte évita esta-
belecer regras por demais absolutas, quando trata da sua
força probatoria (25) ; e também expoe em termos ge-
(22) art. 819.
(23) Cod. Pen. austr., art. 398.
(24) Assim o art. 390, letra D,., déclara que a confissao nâo pôde eon\ eistir
em um simplet—Si m—pronunciado em resposta a alguma pergtmta, mas
que é necessaria a NarraçBo dos factos pelo proprio accusado. E'
proscrever implicitamente as suggestôes.
(25) Vide o art. 400 sobre a concordancia entre a confissao e as outra»
circumstancias ; e o art. 40.2 sobre a retractaçSo.
24
nericos os diverses poutos que o juiz» nd momento de
decidir, deve ter em consideraçflo, poisque nfto quiz li-
mitar a liberdade do seu exame. m
A Orden. Crim. Prussia cide igualmente que a
confissao, (26) faz fé, estando cercada de certas condiçOes ;
pprépi, no mais, limita-se a expôr uma multid&o de pria'
cipios, que sa pertencem à pura theoria, e que, para ser bem
applicados, exigiriâo desenvolvimentos scientificos, dos quaes
as prescripçoes legaes nâo tem necessidade para ser
coinprehendidas (27).
O codigo bavaro quiz, como é s.abido, promulgar uma
theoria da prova mellior definida, e mais compléta em relaçao
ao assumpto de que nos occupamos : as condiçOes exigidas
nelle sao amplamente determinadas (28), Mas ainda ahi
grande numéro de prescrfpçoes legaes sao concebidas sob
uma forma inuito generica e de pura dou-trina, das quaes o
juiz nao pôde tirar proveito (29) ; pelo contrario, outras,
promulgadas em sentido moite acanhado, podem leva-lo ao
erro, e impedir que elle possa admitir a confissao como prova,
nfto obstante a evidencia, por lhe faltar algumas das
condiçOes declaradas subsp tanciaes (30). Querendo prévenir
todos os casos, e corn-
(26) Orden. crim. da Prussia,* § 370.
(27) Como a disposiçào relativa à confiasao qualiflcada, g 373.
(28) Assim o art. 267, n. 6 diz : que a cOtifissâo délié concordar com*
sigo em todos as suas partes, ou nâo cottter contradieçâo esseticial.
(30) sim, este mesmo artigo diz : a coflfissSo rttto detfe ser feita em
resposta a perguntas capeiosas.—Mas ha casos em que uma ou duas
perguntas deste genero nào podem produzir grande mal. (Todavia nâo
aconselhamos o seu uso).
as
prehender sob uma formula gérai «todos os elementos
soluçao possiveis em relaçao as distincçoes especiaes que
o juia deve fazer em cada especie, o legialador cabe quasi
sempre no vicio inhérente à lei bavara ; a regra por elle
estabelecida nada mais diz, ou o que diz se péde desviar o
magistrado do verdadeiro caminho (31).
Projectos récentes, e, entre elles, e da lei wurtember-
gueza (32), procurarao conl razâo as vantagens da sim-
icidade e da precisâo ; e deixarao à ra doutrina muitas
regras, que o codigo bavaro incluio nas suas disposi-çoes
(33). E quando tràçao alguns principios geraes, o fazem
com mais discernimento, conformando-se mais com as sans
theorias sobre a "materia (34).
I CAPITULO XXXIII.
îfÔ'NDÏÇpES ' REQttERÎDAS, QUANTO AO FUNDO, EM k.VMSfelA DE
CONFISSÀO.
Segundo as regras expostas anteriormenté (Cap. 31)' a
confissao s6 péde convencer quando, feita a compara-oBb
do seu conteùêo com os factos provados nos autos.
(31) Bar nxemplo, no faso do art. 272, sobre a conllssùo qUalifieada, aaâc a
Ici nfto falla da excegçRo do falta do dôlo, ou de légitimai de-feza : como se,
affirmai' a ausencia de dôlo, ou a légitima defeza, podesse nu'nca constitua'
uma excèpç'ào; côusa desconheclda no processo cri-miiial.
(32)
Prtfjecto revisto da Orden. do Proc. eriminal de 1830. Este projectoj
icomo é sabido, foi convertido em lei deppia da publiçacào deste Jivro. Vide a
nota manuscripta do autov do cap. 37.
(33) Don le se segue que este projecto (art. 35) mostra-so meaos exi-gente
do que as outras lois allemans cm materia dé conlissào
(34) Vide o art. 249 sobre a «onfissâo qûaliticada.
il. 4
36
nao pôde haver diivida de ter o accusado conscieiicia da
verdade, e de quérer declara-la. Para que a confissBo^
pois, faça prova, é mister que reûna diversas as
essenciaes.
A primeira é a rosirriUhança / para reconhece-la
n&o basta verificar ds factos da confissâo com o auxilio
das leis da natureza (1)
5
é mister Compara-los tambem
com os outros dados forhecidos pela inforraaç&o sobre a
pessoa do accusado, sobre o modo porque o erime foi
couimettido: é'por is?o que jamais poderiamos admittir,
como verosimil, a confissâo, pela quai um accusado
clarasse ter morto, sô com as suas maos, um homem evi-
dentemente muito mais robusto do que elle.
J
2° A seguuda condiç&o é a credibilidade. Aqui deve-se
considerar a confissâo sob diversos aspectos.
a). Considerando-se, como uma testemunba, o accusado que
confessa, indaga-se primeiro, se, como tal, elle pôde ob-servar
os factos de modo que as suas observaçoes ins-pirem
confiança. Donde se segue que a confissâo, para fazer fé, deve
versar sobre factos conhecidos pelo acciSn sa&o pessoalmente,
e pela evidencia dos sentidos ; si Qe referisse a factos -de
inducç&o, n&o convenceria da mesma sorte (2), porque
poderia ' facilmente ter-se enganado. Es-colhamos um exemplo
: déclara ter preeipitado o seu ad-versario da margem no leito
de um rio, e ter depois fugido ; e accrescenta que este dévia ter
morrido, poisque o vio
(1) Esta esame tem tambem uma grande importancia no. caso de
incendio» por exemplo, quando o accusado déclara ter posto o fogo por um
meio que é démons trado imposai vel por todas as experiencias e ensaios
praticadoSj ou cujo resultadoo poderia ter sido o que se ssguio.
<2) Klcinschrol nos Arch. ant. do D. C. IV, n. 4, p. 407.—Stubel-do
Corpo de Aelicto g 279.—Tittman, III, p. 477.
3T
submergir-se : mas ahi nada prova que a victima tivesaa
effectivamente perecido. Pela mesma razao, qunndo o ac-
cusado déclara um facto, cuja verificaçao pertence exclu-
sivâmente à sciencia (3), a sua confissao nao basta* af~
firma, por exemplo, ter propinado arsenico â um terceiro î
quid inde ? Concebe-se que elle possa affi.rm.ar ter com-
prado um branco ; mas a sua confissao nao prova que
fosse arsenico. E quando mesmo elle tenha conheei"
mentos especiaes, e que o facto pareça verosimil, o in-
quisidor deverà chamar os pentos, para desfazer todâs as
duvidas.
b). O estado physico e mental do accusado é ainda um
meio util de verificaçao, quanto 4 credibilidade da con-
fissao. E' mister que no momento do crime este estado lhe
tenha permittido ver bem, e que no acto da confissao lhe
permitta uma exposiçao exacta, fiel e digna de em todos
os pontos (4). Sendo o accusado, na época do crime,
criança ou menor, imbecil ou embriagado, nao deve ser
crido sobre as suas palavras (5) ; o mesmo se deve dizer, se
no jdia da confissao a imbecilidade ou a embriaguez
privao-no totalmente da consciencia.
c) Finalmente, para que a confissao contenha o cunho
da- veracidade, é mister que pareça produzida somente
pelo impulso da voz da consciencia e do instincto da
verdade ; é mister que nao haja razao de receiar ter fal-lado
o accusado somente por effeito do delirio, ou de um de-
sarranjo de espirito, ou ter mentido em ,-vista de alguma
(S) Martim, Trot, do Proa. civ., g 71» p. 301. Vido em sontido contrario,
Stubel, Proc. crim., § 737.
(4) Cod. Crim. austr., g 399, n. 6—Stubel, 1. e., S 7*4.
(5) Tittmann, Manual, III, p. 478.
2S
vantagem proxima. Este confessa (6) itejj eommettido- ui»
delicto em dia e hora determinados, com o fim militas
vezea do transviar a justiça e prévenir suspeitas a ces*
peito de outro crime inaior, GUJQ é eller?<o verdadeiro
autor (&) ; aquelle, confessando ser culpadô, tem o de-
signio de facilitar a fuga do verdadeiro cnminoso, 3q
perando fazer restabelecer mais tarde ai sa a innocencia ;
outro. finalmente, querendo fiazer mai a terceiro, por odio
ou por vingança, denuncia-o como çumplice de um crime
que confessa, sem te-lo eommettido (8). Deverâ ser sempre
feito com a mais escrupulosa attencâo o exame da -causa
da confissâo, quer seja .doea do espirito (9), quer es-
perança de quai quer pr-oveitoyott a eonsciencia atormen-
tada pelo remorso. O juiz indagarat se a confissâo foi
espontanea; se «réo compareeeu em juizo antes ou depoia
de jâ
1
haver qualquer processo contra elle, e se confessou
durante o interrogatorio ; se a sua expressâo indica
uma eonsciencia afcormentada, e« que quer.por todo. o pro
ver»-se livre da ferdo que a opprime ;a 3P- se ha na*. causa
factos que pareçifca ligar-se: a* algum dos-i mj&tivos: de in
téresse oui de outra natureaa, a que ha pouco- aliudi-
■■- ,
(G) ttïilka, Da Cbrpù de delicto. gi 120,i
(?) Titias, no dia de Junho* as 8 horas, commetteu com mào armada
um roubo com homicidio na cidade de A: e elle déclara que no mesmo dia
e à mesma hora oommetteti' ntn fàïto* simples na cidade B (distante do A.
très léguas).
(8) Titius déclara tor, envenenado sua osposa, ha pouco morta» e.
sustenta ter recebido das mâos de Sempronius o veneno para- esse fim.
<9) Vide, por exemplo, a especie citada por Hermann, IntroducçBa (t
Arte de redigir as defenas escriptat.
(lu) Exemplo : se o réo manifestou profundo arrepandimento.
mos (11); ir se o aspccto do accusado da lujrar s opi-nifto de
âoffrer elle de alguma molestia mental; si sel p<5de
acreditar ser elle capaz de tal crime (12); 6*' fï-nalmente, se
as circumstancias constantes da confissau est&o em perfeito
acôrdo com os dados fornecidos pelas outras provas.
Sfto tfto graves as consequencias da confiasao, que
coûvém que esta seja feita com extrema precieno. Sômente a
pteeisao pôde dar os meios de verificar o seu eonteûdo com o
auxilio das outras provas ; e, além disso, ella de-moDstra que
obra e falla seriamente o accusado que sabe a que perigos se
expoe. Nflo bastaria vir dizer «ftmplesmente : \CommeUi tal
crime, assammi tal individno ; puisque ao lado do facto
principal devem ser cl afameute de-clarados os factos
acceesorios (13). O mesmo deve-se de-cidir a respeito de
qualquer confiss&o emb;iraçada do accusado, por exemplo, a
respeito da que consistisse em dizer : Creio 1er feito vdo ; aquillo
pâde HT ; ouo netjo desde que a jus-tifa sabe. Em uraa
palavra, nfto pôde fozer pleua a confissao, desde que, -para
achar o exacto seutido das le j>os-| tas do accusado,. o juiz é
obrigado a recorrer h inter-pretaçao artificial, grammatical
ou logica.
4" Outra condiçao essencial è a yersislencia e a vmifor-
midude das coufissOes. Sendo estas uniformes em todos os
(11) Se vivoti cm inimizadc figadal com a peseoa, que déclara U-lo
fixcltado ap Crime.
(12) 8e. por nxcmplo, a sua unlcrior rond ne ta dénota tendencia para 0
crime de que se trata.
(13) L. 8, D. Confess. (S). G. C. G., art. 48, 68.—Kleinsckrod, g 12. ao
artigo ociinu citadu. not. 2.—IUiift, Da Prova, g 182.
(S) Vide Savigny. Traité du Droit Romain, tr. par Guenons. Tom. 1. g$
306, 307.
t
30
interrogatqrios, provao com isso que o réo, nas m diversas
situacoes do espirito, obedeceu sempre à voz da sua
consciencia e à da verdade. Coin effeito, se rem contradictorias
• entre si as declaraçoes feitas nos inter-rogatorios, sera- difficil
acreditar na sinceridade da con-flssao (14).. Todas as
"variaçfles graves saa um indicio positivo de mentira: sem
duvida o accusado, depois de ter invéntado a sua primeira
confîssao, esqueçeu-se de certas circumstancias ; se fosse
verdadeirp, «jamais ia-H riao. as suas narraçoes, poisque
emanarifto de facto s cer~ tificados pela cvidencia material.
Todavia uuia ou outra contradicçao militas vezes se. expliea
(15) ; poisque pdde versar sômente sobre circumstancias
accessorias, e conJ cebe-se facilmente que o accusado sô pouco
a pouco tcnka podido lembrar-se délias, pensando nisso muitas
vezes ; pode versar, por exemplo, sobre os termos de que outra
pessoa se servio no momento do crime, sobre o numéro 'dos
ferimentos, etc., etc. Outras vezes o accusado pôde hesitar, por
um natural sentimeuto de pejo, em declarar certos factos
aggravantes; ou pôde retr-actar-se das suas confissoes, por
temer a aggravae&o da pena. Em tpdos estes casos as
contradicçOes se explicao de modo tao simples, que ê
impossivel nao considerar como verdadeiros certos factos que
se reproduzem uniformemente em todas as con.i fissOes feitas
por occasiao dos interrogatorios. Mas se a differença das
versoes referidas pelo accusado parecer que nao é o resultado
de um simples erro ou da falta de me-
(14) Cod. bâv., art. 267.
(15) A Orden. erim. da Prussia, diz no art.' 377: Se um accusado. 'em
dioersas vezes, fixer muitas confisso'es différentes em um ou outro ponto,
sera admittida como mais veridica aguella que fôr mais cor-rçborada
pelos factos aîiunde -provados.
%
I
31
moria ; por exemjJlo, se na prinieira Vez" disseï que matou
o seu adversario corn uma punbalada, é na sëgund'a, que o
espancou corn um pâu, certamehte as suas Gottfissoes me-
reèerào pouca confiança. Ha principalmente um caso em
que as contradicçOes aS tornao totalmente inadmissivèiô :
è quando, n&o podendo o corpo de delicto ser inatefial.
mente verificado, o facto nao de ser provado sen&o pela
confiss&o do réo. Todavia Conm examinar no seu com-
plexe e como um todo as declaraçôes consignadas nos
diversos interrogatorios ; porquanto, pouco importa que o
téo deixe de relata? na segunda V6z certas circumstaucias
prhnitivamente Conféssadas (16), desde que n&o se retractar
da confiss&o, na quai tivesse declarado as mesmas càr-
cumstancias (17) ; no caso contrario* porém, o juiz n&o
de ir buscar arbitrariamente, nas diversas declaraçôes an-
teriores, esta ou aquella circumstancia, à quai o déclarante
ligava um sentido preciso, e que à ninguem é licito in-
terpretar isoladamente, e de modo diverso do accusado.
Finalmente, um ultimo caracter muitas vezes vem dar
â confiss&o appai'encia séria de credibilidade : é o acôrdo
mais ou menos pei'feito do seu conteûdo com as outras
provas constantes do processo (18) ; é mais a circumsjtan-
ci& de sô o culpado ter podido conbecer os factos. E' certo
(16) Exemplo: o numéro -dos ferimentos.
(17) Uma mulher, accusada de infantieidio, déclara ter premeditada-inente
afogado o sou filho, teudo este gritado: mais tarde ella retrac-ta-se de sua
confissào, e sustenta que deu â lus no seu leito sem ter consciencia do seu
estado, e que, voltando a si, achou o filho morto a seu lado. Neste caso, o juii
nào poderia conservar a cir-cumstneia dos gritos por se achar rctractada.
(18) L. 23,. S 11, D. rtd Leg. Aquil (S}, Art. 23, G. G. G.
(S) Vide Nota S à nota 15 do cap. 2.
I
33
tiile o accttsado parece enta© ter uma linguagem altaniente]
pincera (1-9) ; a concordaucia entre a conflssào e os
1
prin-
<
ciipaes faotos, *%Uw\de demonstrados, iem..como resultado
garantir até à certeza ter elle assistido a todos os incidentes do
crime ; e esta conclusao nos é iniposta pela força das cousas,
par exempta, quando a eonfîsaao détermina exactamente. o
numéro dos ferimentos, quando précisa a sua direeçao, e
quando a inspecçao do cadaver confirma o seu !po;ateudo
sobre este ponto< Mas nao séria acertado exjgir
necessariamente om todos os casos a jdemonstraçao, pelas
outras provas, de todos os factos referidos na con-fissaoj
porque entao esta tornar-ee-hia superflu»; e» além disso,
exigir essa demonstraçao é militas vezes querer o impossivel
(20) Quantas vezes n&o aconce,- gue sa 6 culpado
"(l
l
J) L. 1, g 17 D. do Quœst.: èbrifessiones reoruih; pro eoépraHs
fdoinwibus iMbdri oportere, -H' nulla pi'obatio tcUgSonem cognoscentis
instrwit ,(S). Sobre o senfcido dasto texte!, .vide Matkcei, de Griot., Uv-
48, t. 16, cap. 1, n. I, A..—Sbol, J>o Gorpb de Delicio,. § 216.—Vide Bon
nier, kratado ads Provàst p, ' 370.
(S) Os çounnontadoros o criminalistas aiitigos, guppofado havor an
t'inpiuin entai este toxto o os 'du L. 1 Dig. de Confessùs., da L: 56 Dig-de
Be Judic, o da, Loi 1, Codi de Oonfossis, entregarRo-se ao rngfftto
traimlho de os par do acôrdo, mas applican do-os todos as, malarias
crimlnaes. Hoje esta reconhecido que o preceito do imperador Soro
coatido ma 1* lei foi o que dominou no diraito KOinano om materla
criminal,, segundo o quai a conflssào via réunir portas condiçoes
logaos para autorisai- a cofldemnaô. "Os outres textes, (que [dàârft
'conflssào pura a força de cousa julgada, nâo tinlîao applicaçào senào
é materia civil.
Portante, nâo ô exacte suppor-se ter o direlto romano repellido ab-
solutamonto a conflssào da classe dos meiras de poova, coino pensa
Filangieri, fundando-se ont Quintiliano. Doclam., n. 814, que no lugar
fcitado, referia-so a©'. -cnso inuito espocial 4a conflssào de um doudo,
lela quai se pretendia condamna-do. Faustin' Hélie, Traité tVInstrttc-
jori criminelle, vol. 5, g 377.
(#0) Nos tcrmos do ai'.t.. 400 do Ood. austr. basta a démonstnïo
de algumaa circuis.taucias, que Venhâo corroborai- a confissào ; è mister
tambem" que nada se encontre que passa faïar duvidar da sinecridade
do seu conteùdo. A Ord. crim. pruss., g 70, diz, que a conflssào nâo
det>e ser contrariada pelai circumstancias protadas ma causa. O Ood.
bavaro, art. 267, n. 7, diz: a conflssào deve concordat na sua es*
aencia corn as circumstancias aKwtde demonstradas.
f
33
e a victima sao os unicos que podem conhecer certa ex-
pressao, certa circumstancia exterior ; e quamtas vezes aquella
nao « pôde ser ouvida, como no caso de homicidio t O
juiz deve fîcar satisfeito, desde que certas provas cir-
cumstanciaes tenderem a demonstrar a veracidade do réo ;
e desde que este, em relaçâo aos outros factos importantes,
nao cahir em contradicç&o alguma de natureza a di-minuir
a confiança (21). Em resumo, quando o magis-trado vérifie
a a exactidao da confissao com o auxilio das outras provas,
pôde rejeita-la em dous casos* especiaes * quando o
crime ou o seu facto principal nao pôde ser verdadeiro (22) ;
quando as circumstancias principaes do crime, taes
como o réo as "confessa, sao desmentidas pelas outras
provas, de sorte que naja iucompatibilidade total entre as
circumstancias j à verificadas e as da confissao (23), dando-
se o devido desconto aos erros involuntarios do accusado.
Em compensaçao, a divergencia entre o re-sultado das
provas e os factos confessados nao obsta a que se tenha
na confissao*.
a). Se ella versa sobre pontos accessorios e sem in-
fluencia quanto à decis&o da parte principal (24).
(21) Martin, Tratado, § 78, not. 10.—Quistorp, Principios, g 685^-
Tittinann,, Manual III, p. 585.
(22) Exemplo: as testemnnhas deelarSo que failarâo com a prelen. dlda
victima muitos dias depois (laquelle em que o accusado diz ter effectuado .o
assassinato.
(23) Exemplo : Titius confessa ter dado um tiro em Sempronius; e os
peritos sustentào que Sempronius morreu de uma facada,
(24) Exemplo : no caao de se tratar de factos "posteriores ao aoto
principal, e que acontecerào depois do agente ' ter fugido.
H. 5.
34
h). Se versa sobre factos, nos quaes podia o accusado ter
errado (25) ou ter-se esquecido (26).
c). Se ella se explica pelo facto de ter o accusado, oc-l
cultando a-verdade, querido sômente desviar certa aggra-
vaç&o da pena (27). I
d). Se, nalmente, ella nSo tem relaçâo senao com de-
claraçOes feitas pelo accusado a respeito dos seus cum-plices,
e nSo a seu respeito (28),
CAPITULO XXXIV.
DAS CONDIÇOjGS DA CONFISO QUANTO À FORMA.
A confissâo, para promover a necessaria convicç&o, deve,
pela sua propria forma, dar testemunho das in-tençoes sérias
do accusado confitente (1), scicnte das suas consequencias tao
graves.
, (23) Excmplo : sobre a indicaçàb précisa do tempo.
(26) Exemplo : sobre a côr do fato que trazia a victima.
(27) Exemplo : em relaçao ao numéro dos ferimentos, qualquer que soja
o crime, acontece fréquente niente nâo confessai- o accusado certas-
circumsfcancias por algum resto de pejo: vide um notavel exemplo em
Feuerbach, Causas crimes, t. 1, p. 80.
(28) Exemplo: o rêo clara que foi impellido ao crime por outra pessoa
que o instigou.
(1) Sob este ponto de vista, ha um caso.cuja appreciaçào pôde ser difficil :
é o da confissâo espontanea e livremente feita pelo accusado, antes de
qualquer processo ; lodavia pôde bem çxplicar-se pelo effeito da voz da
consciencia. L. 1 g 27, Dig. Quœst (S), Stubel, Do Corpo de Delicto, g 218.
(S) Ulpiano aqui firma a regra de nâo se dever prestar aempre à
confissâo espontanea, e cita o caso de um escravo que, para fugir ao mâo
tratamento de seu senhor, foi denunciar-se como autor de um crime.
Depois de condemnado, reconheceu-se que elle era innocente, e o Imperador
roncedeu-lhc graça, e ordVnoit ao juiz que ex-officio o mandasse vender com
a condiçào expressa de que jamais vollaria para o poder de seu senbor, a
quem mandou que se entregasse o preço da venda. Eis um exemplo 4e
dssapropriaçào forçada, que poderia ser apfoveitado nas reformas que
deve soffrer a noss-t legislaçào sobre escrayos.
nn
Deste principiu résulta:
1.*- Que a confissao, para fazer prova, deve ser feita em
juizo (à). Sendo feita extrajudicialmente, é nulla (3) ; nau
se podendo inuitas vezes considera-la, sendo assim feita,
seu&o como uiu acto de léviandade, a que o seu autor nao
liga importance alguma ; ora a confiss&o procède da
jactancia do confitente (4), ora do facto de querer este
zombar de terceira pessoa ou talvez do desejo de livrar-se
de alguma circumstancia oritica (5). A Carolina considerou
a confiasao extrajudicial como um indicio (6), cuja
apreciaçao é tambem submettida as seguintes regras : (a). A
primeira dimana da pessoa perante quem é feita. Sendo a
confissao, ainda que falsa, capaz de destruir a affeiçao e
estima daquelle, perante quem foi feita, e de quem
dependia o confitente, n&o é de suppor que este teuka
faltado à verdade (7). (b). Convem examinai
1
depois
(i) C. -1, X d« Judie. (S)—Quistorp, Principios, § 682.— Tittman, III. p 481
(S). No lugar citado détermina o diroito canonico que, para autorisât- a
condoinnaçiîo, a confissào dove ser foi ta perante o biapo compétente. e nâo
perante o juia aecular ; daqui procéda a regra da que a confiaano. para servir
de prova, devè ser feita em juizo, e em juizo compétente, regra aceita pelo
nosso Cod. do Proe. art. 94, segundo o quai a confiasao ox-trajudicial nfio
pôde ter os mosmos eff<*itos.
(3) Clarus, Quœst.,21, n. 31.—G lob i g. Tlworia dan ProbahiUd.ad.cs, II.
p. 121.—Stubel, Prit*. Crim., g 832 a 836.
(-1) Por exemplo, em materia de reluçôes ainorosas.
(5) Titius, a^ndo amnaçado por uma mulherde serporella denunciado | como
sou seductor, se nào lhe da 100 florins, paga para evitur esta accusnçôo.
(6) Aft. 32. O.O. 0.
(7) O superior f:iz vir à sua présenta o seu subordiuudo e lhe fuz pe*r-gnntas
a reapeito do crime, do quai se desconfla soi este autor: o subor-dinado
confessa..
36
se aKconfissao coutem todas as circumstancia accessorias,
provadas aliunde, ou se é «feita englobadamente em termos
geraes, sem enunciaç&o das circumstancias (8), (c). Deve-se
tambem ter em eonsideraçao o motivo ou a pessoa que
provocou a confissao: pode-se d'ahi iaferir muitns vezes, que o
culpado ' quiz dizer a verdade (9) depois de ter pesado as
consequencias das suas palavras e os graves motivos que o
impeliem a fallar (10) ; e outras vezes tambem-se pôdë
concluir que nao foi séria-) mente (11) que elle referio este ou
aquelle facto. (d).j Finalmente, a sua attitude concorre
especialmente para se conhecer, se disse a verdade (12), ou se
quiz zombar-daquelle que lhe presta ouvidos.
A confissao extrajudicial de ser escripta ; mas farâ plena
fé neste caso (13) ? Nao certamente ; pôde haver, quando
muito, maior presumpçao de ter o culpado con-siderado
maduramente as consequencias das suas reve-
(8) Quanto mais genoricos forem os termos em que a confissao é concebida,
tanto menor crédite mevecerà.
(9) Por exemple, quando o magistrado chega logo depois do crime, eo|
interroga.
(10) 'Pitius fere gravemente o seu amigo ; e depois» encontrando-o mori-
bundo no seu leito, pede-lhe perdào, confessando-se éulpado.
(11) Titius, tendo tidô promessa da parte de um terceiro de lhe dar 30
florins para espancar Sempronius, vem procura-lo, e na esperança de
receber as 90 florins, diz-lhe que executou as suas ordens.
(12) ^To acto da confissao, o culpado derrama lagrimas e manifesta pro-
fundo arrependimento.
(13) Titius, escrevendo a um amigo, dà-se por gracejo ou jactaneia por
perpetrador de um crime, cujas circumstancias lhe relata.
37
laçoes ; pois que é possivel que elle procéda sem o animus
confitendi, e sob/ o irapulso de motivos bem différentes (14).
2." A confissfto judicial, para fazer prova, deve ser feita
perante o juiz do processo, devidamente nomeado e compétente
na causa. Com effeito, é principio corrente, que os termos dos
autos nfto fazem plena prova senfto quando sfto lavrados em
forma, e sob as vistas do juiz criminal : e, além disso, é esse o
unico meio de obter cérteza de que as perguntas forao feitas
como deviâo ser, e que o accusado obrou com pleno
conhecimento de causa. Se a confissâo do crime (15) tem lugar
no curso de um processo civil (16), nao se deve esquecer que em
materia civil o principio da desistencia facultativa domina até a
apreciaçao da confissâo ; e que o réo, pouco receioso das suas
consequencias, pdde confessar um facto falso (17), visando um
interesse, mais importante a seus olhos.
Se a confissâo foi feita perante officiaes de policia (18), o
mag-istrado nao deve esquecer que estes, ordina-riamente, se
procedem a interrogatorios summarissimos ; que nao deixao de
recorrer frequentemente as stiggestOès,
(14) Vide, sobre a confissâo extrajudicial, Bontham, Tratado das provas
judiciaes, vol. 1, cap. 8.—Rolin. de Probation., p. 88.— Hohnhorst, An-nuario
do tribunal supremo de Baden, 1, p. 92.
(15) Tal séria a confissâo de um adultéra na acçâo de divorcio.
(16) Klèinschrod, 1. c. no cap. 33, not. deste livro.—J. Clams, setenl. quœst.
54, n. 5.
(17) Tôm-sc visto maridos confessarem o adulterio, por tlesejarem o di-
vorcio.
(18)
Vide Jenull, Direito criminal austriaco, IV, p. 18.
38
as përgûutas capeÏOSUT; et que dëvë desconfiar ^ëmprë
dos meios de provo cacao empregados.
3.* A confissao deve ser circumstancial; e deve-se lavrar
em, forma o processo verbal respectivo, no momento em que é
feito : sao essenciaes estas duas. condieçoes. Se a déclara-ç&o
com as .suas circumstancias fosse juuta aos autos mais tarde,
poder-se-bfa facilmente duvidar da fidelidade da me-moria.do
juiz e da exactidao da sua exposiçao (19).
A/confissao tacita (20), aquella que se deduz por via de
consequencia de certos actos ou de certas expressoes do ac-
cusado, n&o pode fazer prova plena. Valera somente como
nui indieio, sujeito à applicaçao de todas as regras usadas a*
respeito da prova artifieial.
O silencio obstinado do indiciado nao deve fazel-o considé-
rai- como autor do crime; o principio da desistencia pode fazer
admit-tir este systema no civel, mas no crime assim i n&o
acontece. Por consequencia, ainda mesmo que o juiz, para
vencer a sua obstinaç&o, lbe assignasse nui prazo para res-
ponder, sob peua de ser cousiderada verdadeira a aceusaçao,
nunca poderia abi baver confissao tacita (21); por que o accu-
sado podia calar-se por obstinaçfio, para cumprir uma pro-
nittssa loi ta a um terceiro, por outre qualquer motivo emfim.
Da mesma sorte a transacç&o sobre o crime (22) n&o é uma
(19) A imaginaçào do juiz séria tyilvez 1 évada coiu dem-.isiada facilidade
n fazer intercalaçôes involuntnrius: mas so o processo verbal,ainda mesiuo
tardiamente redigido. foi lido ao accusado, e este o approvou, a sua appro-
vaçito dissipa lodus duvidas e confère 4 confissao força probatoria.
(20) Stubel, Criminaloerf., § 736.—Martin, Tratado de D. C. § 76.
(21) Martin, id., g 76, nota 2.
(22) Exemplo: o accusado promette uma quantia âqnelle que foi roubado,
com a condiçào de nâo ser donunciudu.
39
roafissao tacita que sô ppr si deva motivai* a. condemnâo* :
muitas vexes vê-se um individuo innocente fazer ùtansacrifi-
cio pecuniario, para sahir 'de uma posâo incommoda, e évi-
tât uma denunc.ia que, ainda o fundada, pode causar-lhe
grave pi-ejuizo (23). A lëi romana seguiu entretatttd o sys-
tema contrario (24), mas somente em rélaçfio aos,delictos par-
ticulares (25). As penas decretadas contra estes.deîictos erSo
tao fracas que nâo se podia suppôr que o accusado, para
levital-as, se reconhecesse culpado, o o sendo realmente;
tratando-se porem de um crime ' capital, a mesma lei decrdia
de outro modo. Entao a transacçâo (26) nâo podia ser alle-
(23) Exemplo : uma in ni lier attribue a sua gravidez a um padre catbollco e
amcaçade denuncia-lo as autoridades ccclçsiasticas, s» nâo lue der 100 florins.
(24) L. 4, § Vit D, de Bis qui notant, infamia. L. 4, D. de Jure fisei* Vide
tSobetn L. 18, C. de transaction. (S).
(S) AprimoiraJJei déclara infâme oo aeexisador, que transige cooi o seu
adversario, sondo o crime, porque c accusado, furlo, injurias e ma . A sc-
gunda considéra infâmes os que transigirâo com os denunciantes nas causas
fiscaes, ainda mesmo que tenliâo dado a estes peqUcna quantia A le recira lei,
porém, parées estar em antimonia com as primeiras j mas des-apparere
esta.desdc que se attender que esse rescripto deDeoclcciano,eMaxi., miano
refere-Se, pof cxcepçâo, ao crime capital, salvo o adulterio, e que firma
expressamente aregra em contrario, isto é,que nâo se pode transigir nos crimes
publicos cuja pena nâo soja a capital, exceptuada a falsidade.
(25) Gluk, Explicaçâo das Pandectas,—Vide p. 68.
(26) L. 1 Dig. do Bonis eorum qui ante sentent, mort; ahi se o seguinte
trocho :
<( Ignoscendum censuerunt éi, qui sânguinem suum qualiter, qualiter
redenptttm Tutbere toluit » (S).
(S) Ulpiano referindo-so aos rescriptos imperiaes que permittirâo, por
cxcepcào de regra, transigir com o seu adversario nos crimes capitaes, dâ| a
seguinte -razàO: porque entenderSo que se dévia desculpar «quelle qtfe
proçurou de quàlquer modo salvar a vida.
io
gada contra o indiciado, e comprehendia-se perfeitamente que
este, ainda quando innocente, com receio de incorrer na pena,
preferisse evitar por dinheiro os perigos da accusaç&o. Os
:
praticos generalisarâo esta doutrina (27), euja applicaçao tem
lugar todos os dias na vida usual, e hoje, quer haj-aj crime,
quer delicto, a transaccao nâo opéra necessariamente. os
effeitos da confissao.
4.* A confissao deve ser'o producto da livre vontade do ac-
cusado ; é mister que elle tenha tido a firme intençfto de dizer
o que é ; que nem o temor, nem o constrangimento, nem a
astuoia, nem a inspiraçao estranha pareç&o ter-lhe ditado os
termos.
Tratemos de cada uma destas causas de nullidade.
à.) A confissao nâo faz prova, quando foi provocada por meio
de um constrangimento illégal (28). Convem examinar : 1* se
a confissao é pôsterior ao emprego dos meios de constrangi-
mento ; 2* se, depois de cessar todo o constrangimento,
quando o accusado tinha compléta liberdade de fallar ou de
calar-se, espontaneamente reprodusio as suas declaraçoes. No
primeiro caso, é fora de du vida. que a confissao é nulla (29) ;
nao é o resultado da vontade livre, e sempre se deve receiar
ter o accusado, para evitar dores into-leraveis, assumido
falsamente a responsabilidade do
(27) Tittmann III, p. 562.—Voetius, Comm. ad Pandect. Liv. 2, tit. 15,
ns. 17 a 20.
(28) Nâo nos referimos sômente â tortura, mas tambem as penas eor-
poraes conhecidas pela ilenominaçào de penas de desobediencia. (vide 0
Proc. Crim. Comp., t. 1, cap. 82), comtanto que sejâo prohibidas pelas
leis do paiz.
(29) Artt. 80 o 56, G. G. .--Gralman, g 470.—Da confissao, g îf.—Oee-
terding nosNov. Arch. de Dir. Crim. (Ail.), VI, p. 681.
crime (30). No segundo caso, pôde-se ainda receiar tao-| bem ter
o accusado reproduzido as suas declaraçOes, por temer ser posto
segunda vez em tortura no caso de retractaçfto. Pode-se sustentar
que esta segunda confissâo foi ainda feita sob a impressao do
terror (31) e da apprehensao mental ; entretanto o
constrangimento anterior pôde deixar de exercer influencia sobre
o espirito do accusado, e entao, sendo livre a sua confissâo, nâo
baveria razao para se a considérai- nulla, como a primeira.
Porém, mesmo assim, para que valba (32) é mister prpvar-se :
1°, que o inquisidor (33) conseguio fazer desapparecer o receio
de uma nova tortura (34) ; 2°, que, além dissô, o accusado n&o é
bomem facil em deixar-se dominar por tal receio, e que a sua
vontade ficou livre; 3°, finalmente, que as circumstancias
contidas na confissâo sao complétas e. corroboradas pelas outras
provas constantes do processo. b.) E'mister que a confissâo tenba
a sua origem na propria
(30) O Cod. austr., art. 401. déclara nulla qualquer confissâo extorquida
por ameaças ou violencias.—O Ood. bavaro, art. 186, déclara nulla a con
fissâo extorquida por meio de torturas corporaes. _
tk
r
,
(81) O Cod. pen. ailstr., sem attender à circumstancia de ter sido' obtida por
constrangimento a primeira confissâo, érige em prova a confissâo pos-terior,
desdo que o espirito do accusado parece inteiramente libertado de qualquer
influencia illégal, e forem-lhe concedidas todas as garantias a respeito para o
futuro. (Art. 401.)
(32) Trttman, III, p. 481. — Hohnorst, Ann. do tribunal supremo de
Baden, VI, 366.
" i , (34) Um excellente meio que se deve empregar
neste caso é sujeitar o
accusado a segundo iuterrogatorio de outro inquisidor.
(34) Déverse procéder neste caso corn cxtrema prudencia : vide um
exemplo nâ especie citada por Armin.t nos Fragmentas de Bir. Crim.
ri. 6.
vontade do accusado ', pôde ser provocada por algumas" per*
guntas genericas, mas nunca suggerida (35). Porém, se poï
acaso o juiz empregou de passagem alguma vez a Buggestao
nos interrogatorios (36), por isso sô nfto deve ser regeitada a
confissao. Convém entao indagar, se a suggestao foi a causa
dominante da confissao, pela quai o accusado assumio -a|
responsabilidade de um crime supposto, se ella teve sobre elle
bastante influencia para obrigar um innocente a confessar-se
culpado. Deve-se observar, porém, que fazer simplesmenté
conhecer ao accusado o que se précisa saber délie, n&o con-
stitue uma suggestao para se confessar culpado de um crime
imaginario, e para, aproveitando-se de algum modo da
pccasiao,responder affirmativamente à pergunta feita :•• ainda
mais, se uma suggestao provoca a falsa confissao, deve-se
primeiramente procurar com prudencia os motivoè desta* fora
da suggestao. O desgosto da vida e a exaltaçao conséquente ;
certas vantagens que se pôde ter em vista, dando^-se como
autor de um crime phantasiado, finalmente a tortura
empregada, que leva o paciente, vencido pela dôr, a aceitar a
accusaçao nao fundada, para escapar ao mal présente ; todos
estes motivos, e ainda outros, podem apparecer na causa.
Quanto à tortura, a lei romana (37) e a Caro-
(3ô) Bentham, Tratado da Prova, p. 3t.—Id. Tratado dos Provas, 1 p. 122,
Carmignani, IV, pag. 69,135.
(36) Vide, sobre as suggestdes, a nomenclatuffe dos eacriptos especiaes no
Procerim. comp., 1, cap. 107.
(37) L. 1» S 21, Dig. de Quœstion. (S). Vide o commenta rio respectivo na
idisscrtaçâo do autor,- de NuUitatib. in cousis erim., § 19
(S) Esta lei contém um preceito de Ulpiano, que fundado em um res-cripto de
Trajano, diz que o )jiiiz nOo deve interrogar do seguinte modo— SE tivios TITIUS
COMMETTE* o HOMICIDIOmas deve perguntar ent gérai quem o commettett :
porque, dé outro modo, pUrece que tintes se guet suggerir, do que procurar saber
a verdade.
t
43
lina (3£) prohibiao expressamente as suggestSes : receiava-se.
que,pondo-se o p'aciente- ao facto,nao mente dos principaes
artigos da accusao no seu todo, mas tambem de todas as cir-
cumstaiicias especiaes e caracteristicas, e .respondendo aff-
mativamente sobre todos os pontos^désse lugar a que se
acréditasse na sua culpabilidade, nao teudo elle, entretanto,
conhecimento das circumstancias açcessorias senao pelas
perguntas circumstanciadas do interrogatorio. No processo
moderuo nao ha mais tortura, nem, peuas por causa de deso
r
bedieucia ; e, portanto, corao era naturaj, as précédentes
prohibiçoes, em materia de suggestao, ficarao sem,applicao
possivel (39). Ainda que o inquisidor empregue a suggestao
nos interrogatorios, nao tendo o accusado interesse em con-
fessar-se falsamenie culpado, responderâ promptamente por
lima denegao pura e simples ; no caso contrario, sô poderia
haver duvida, se elle manifestasse uma exaltacao fora do
natural, ou se obrasse sob a influencia de motivos eviden-
tps ; entretanto', mesmo nesse caso, as suggestôes de modo
algum seriao perigosas, poisque o juiz reoonbeceria logo,
que, em virtude do estado do espirito do accusado, as suas
palavras nao poderiao merecer credito.
Em resumo, as suggestôes nem sempre viciao a confissao
de modo que esta deva ser absolutamente regeitada (40) ; além
disso, o interrogatorio é muitas vezes impossivel, se nao se
recorre a ellas (quando o accusado, por exemplo, nega qual-
quer resposta categarica as perguntas que lbe sao feitas).
Entao, para apreciar a confissao obtida por esse meio, deve-se
ter em consideraçao as seguintes regras :
(38) C. G. O., art. 58
(39)
Parst, Das suggeses, p. 63—Vide o Proc. crirn. comp. 1, cap. 107.
(40) StubeL Proc. Crim.. 1988.—GrolUnaur, g 471. Tittmann, III, p. 363.
44
î* Si se faz usa de raeios de constranginrcnto illégal, ana-
logos à tortura (41), a confissao nSo pôde absolutamente fazèr
fé, porque parece nao ser senao a consequencia dos meios de
suggestao empregados emquanto durava o cous-trangimento ;
2* O mesmo aoontece, quando, nao sendo o facto principal
provado senao pela confissao sômente, o inquisidor provoca,
por meio de suggesttes, uma confissao minuciosa a respeito
das circumstanciâs accessorias ' (42) ;
°3
a
Quando o accusado manifesta desgosto profundo da
vida, ou parece obrar sob a influencia de motivos da mesma
natureza ;
4* Finalmente, tem lugar a duvida, quando as perguntas do
inquisidor feferem-se aos cumplices (43), aos seus nomes, ou
à parte que tiverao no crime. Neste caso o accusado nao é
mais do que uma testemunha (43) ; nao estando em jogo o seu
interesse pessoal, pôde-se acreditar-, respondendo elle as
perguntas por uma simples affirînaçao, ter fallado muito le-
vianamente, ou entao ter-se aproveitado da occasiao offere-
(41) Mesmo nos paizes, onde estâo em vigor as penas de desobe-dicncia,
ojtiiz deve duvidar da veracidade da confissao, quando se nsou da
auggestâo em relaçào ao accusado,. durante o cumprimemfo das mesmas
penas"; estas penas corporaes militas vezes impressianâo vivamente
muitos individuos, e ha quem, nào obstante ser innocente, se confessa
culpado, para evita-las. _
(42) Exemplo : o accusado confessou o facto sem circumstanciâs, o o jute
suggerio-lhe esta ou aquelle circumstanoia.
(43) Ç. C. C, art. 31.
(44) Sobre o perigo das suggestôes nos interrogatorios das testemunhas:
Parst. 1, 1. c, p. 111 a 119. Kittka, Va verificaçtto'do cargo de delicto,
p. 188.
45
cida pelo juiz, respondendo pela affirmativa sem mais expli-
caçoes, para salvar os sens cuinplices reaes.
Mas em todos estes casos'nao pôde haver senâo duvida, -que
aliâs de desapparecer, e nunca nullidade absoluta. Tànto
assim é que a confissao poderâ gerar~.se no espirito do juiz, se,
em lugar de um si/m puro e 'simples, a reaposta contiver
circumstancias diversas das contidas na pergunta (45) ; se as
circumstancias suggeridas nao se referireni senâo a ac-cessorios
pouco importantes ; se a confissao livremente obtida, sera a
suggestao empregada pelo juiz, contiver numerosas
circumstancias,de que o accusador podia ter conheciméno ; e
finalmente, se o accusado nâo fôr homem capaz de chegar a
fazer confissOes tao graves por desgosto da vida, por le-
viandade ou por nao ter pesado maduramente o sentido das
perguntas que lbe sao dirigidas.
6.) Tendo sido feitas perguntas capciosas (46), convém
distinguir : ou a resposta do accusado é coucebida de modo que
nao se pôde razoavelmente délia induzit a confissao de ter elle
tomado parte no crime (47) ; ou entao, leyado ao extremo, e
apertado na rede das perguntns capciosas, faz uma confissao
formai e compléta. No primeiro caso, a* confissao nenhuma
prova faz ; séria quando rauito tacita (48), e como tel nao
poderia por si autorisar a condemnaçao. No segundo caso,
deve-se-lbe dar inteira fé, salvo se houver razoes plau-
(45) Heffter» Tratado de Dlr. Crim., Balle, 1833, g 616.
(46) Vide a respeito o Proe. crim. comp. do autor, 1.1° cap. 94.
(47) Exemplo : teado o accusado negalo constanternente scr o .autor do
assassinato, responde de repente—sim—âsegninte pergunta— fizestes fêri-
mtntos em Titi&s t
(48} Steckor, Das perguntas capciosas, p. 39.
46
siveis de receiar ter elle feito, sem o saber, a confissào de um
crime, de que nao é o autor, em virtude da surpresa occasion
nada pelas perguntas capciosas, ou por nao ter bem compre-
hendido o seu sentido e alcance. Mas, neste caso, uma loi
derivada da natureza humana, faz desappare'cer todas as du
vidas ; nao é de suppôr que um innocente se apresente como
culpado, e se sugeite espontaneamente* à pena; e de-mais,
como se pode ver nas ditas perguntas um motivo para o
accusado mudar de vontade e linguagein *? Se a coulissa o
reune as condiçoes requeridas, se é confirmada pelas outras
provas, as perguntas capciosas (42) so devem ser conside-
radas como um meio de fazer o accusado sahir do sîleilcio
guardado de proposito, e de obriga-lo a prestar ouvidos à voz
da sua conscienia (S). Nada Jia,pois,abi que logo ô. pri-meira
vista faça considerar oomo duvidosa a confîssîlo, que,
(49) Comtudo, aprossonio-nos em advertir.que quasi sempre é imprudente
fazer tp.es perguntas, e que, alem disso, sondo ellaa ordinariameate feitas
com astucia, sSo Indignas do magistrado.—Kittka. itevista de Jurispru-.
dencia Austriaca de Wagner, 1881, Agoato, p. 81.
(S) Entre nos, o interrogatorio da formaçSo da oulpa esta sujeito a res--
trictas formulas legaes ; alem da identidadn da pessoa do accusado, tem
por principal flm adefesa deste,como dizoSr.conselheiro Pimenta Bueno,
art. 98 do Ood. Proc, Mas o interrogatorio polo juiz de diroito no juizo
plenario sera tào restricto? Parece-nos qu'a nSo, à vista do art. 259 do God.
Proc. nas palavras—fard ao accusado as perguntas que julgar
cowoenicntes. Logo a confissào pode ser suggerida pelas perguntas do
juiz.e nem porisso a lei a considéra nulla, e pelo contrario ella faz prova,
desde que reunir as condiçoes do art. 91 do mésmo codigo. Se as sugges-
t5es o feitas de modo que incorrSo nos vieios apontados, a confissào
deixa de ser livre, c entSo cahe sob a regra do art. 91 ; so sSo feitas de
modo que provoquent o accusado a fallfer, ou a explicaf-se sobre o
facto principal n suas circumstancias, sem ameaças, sem promessas, e sem
astucia ou cavillaçâo ; o se, alem disso, a confissào coincidi r com as cir-
cumstancias ja provadas, nâo pôde doixar de considerar-se li vre, e fazer
prova.
/
47
sera esta circumstancia, via merecer plena (50) ; uraa
pergunto capciosa nao basta para levar alguem a confessar-se
culpado,-nfto o sendo. Para se poder duvidar, séria preciso
que o inquisidor tivesse fallado de circumstancias, a respeito
das quaes talvez o accusado nao tivesse senfto idéas muito
confusas (51) ; poisque podia acontec que, surpfeso, e per-
turbado, dissesse mais do que queria (52) ; augmentando-se
a desconfiança, se elle é timido ou fraco de espirito.
d.) A confissao de ser o resultado de um erro, quando o
accusado deixa-se levar por promessas ou esperanças chime--
licas (53) ; podem-se oppôr sérias objecçoes (54), no caso
de parecer ser o erro por ai capaz de provocar uma con-
fissao totalmente falsa, e de determinar o innocente a aceitar
a responsabilidade do crime. Tem-se visto accusados estipu-
larem a impuuidade para si, antes de denunciarem o seu
cumplice ; tem-se visto tambem magistrados ehgana-los com
a esperança de uma minoraçao da pena, com a condiçao
lies fallarem ; .assim como se tem visto accusados preferir
o castigo menos rigoroso, segundo esperBo, confessando-se
(50) Vide as excellentes observaçôeS de Stubel, Proc. Crim , g 1905.—
Tittmann, III, p. 361.
(51) Kxemplo : a um individuo que tinha estado de vigia, emquanto se
effectuava um roubo, perguntou-se : se tivesse apparecido algum< nâo terieis
feito fogoî
"(52) Esta objecçào é tambem previsfca por Martin, Curso do Proc. Crim., 1
g 73, nota 8. '
(53) Algumas vezes o inquisidor, e principalmente os officiaes de justiça
cm cumprimento de uma missâo especial, procèdent mal fazendo aos réos
promessas illusorias.
(54) Tittmanp, Iîï, p. 481.
48
culpados, à lentidâo dolorosa do processa de informaçao (55).
Mas pôde acontecer tambem que, nao obstante' ter o inqui-
sidor usado de astucia, de falsas promeasas ou de qualquer
outro vicio condemnavel, a confissâo nem por isso deixe de
ter valor incontestavel ; poisque o erro, por ter provocado a
confissâo, nao a vicia (56), desde que o confitente é reaimante
culpado (57) (S).
CAPITULO XXXV.
DOS EPl'EITOS DA CONtflSO EM RÊLAÇAO AO C'ORPO DE DE-
LICTO PABTICULARMENTB.
Desde que um facto foi regularmente confessado pelo
indic'iado, parece estar juridicamente demonstrado ; e este
principio tem applicaçao, quer a confissâo verse sobre o / crime
na sua totalidade, quer sobre a sua execuçao pura e simples,
quer sobre a culpabilidade intencional do autor, ou sobre lima
circumstancia aggravante. Presen-temente temos de tratar de
uma unica questao : na falta de qualquer outra pena, a confissâo
pôde servir de prova
(55) A confissâo deixa de inspirar conflança, desde que o individno inter-f
ogado falla para salvnr outro, cuja graça ou attenuaçao da pena lha foi
proniettida, sob a condiçâo de dar elle as explicaçôes pedidas.
(56) Exemplo : faz crer falsamente ao accusado que o seu cumplice con-fessou
jâ o crime commum.
(57) O jaiz tem o diraito de empregar a astucia ? Vide a respeito o Pro& crim.
comp., t. I, cap. 104 a 108.
(S) Entre nos as condieôes da confissâo estào determinadas no art. 04 do Ood.
do Proc.
V.
49
sufficieiite do corpo de delicto (1) ? Ha aqui duas hypothèses ;
em uma, nao existe prova alguma de ter sïdo com-mettido um
crime, e nem ha outro indicio além da confissâo do accusado (2)
; em outra, a existencia do crime é verosimilmente demanstrada
pelas circumstancias da causa, cujas particularidades todas vem
o accusado coii-fessar ; ora algumas ha entre estas, que nao sao
provadas por outro qualquer meio, emquanto que ha outras que
sao sufficientemente démonstradus por outras provas. No
primeiro caso, a confissîio n&o pôde bastar (3), nada prova a
existencia do corpo de delicto (4), e a primeira coudi-çao, para
que a confissâo mereça (5), é que concorde perfeitamente
coin as circumstancias da causa; ora na hypothèse de que
tratamos, nao havendo corpo de delicto, deixa absolutamente de
haver este meio de verifi cacao da veracidade da confissâo (6).
(1) Hagenbruch, de Effectu confessionis spont. in crim. deflc. cofp. del.
adhuc incerto. Lipsice, 1771).—Ilominol, an et quatenUs certitudo corp. del.
in Proc. crim. Lipsice, 1773.
(2) Exempta: Titius déclara en juizo, quej ha doze annos, teve na rua uma
rixa coin um desconuecido, que o matou e o lançon à agua : todas as outras
tenta'tivas de informaçâo. além (lestas declaraçôes, ficarâo sem re-Bultado.
.(8) Nem mesmo se sabc realmente, se existio o individuo, que o accusado
affirma ter^ssassinado,
(4) Vide Carmignani que aegue tambem esta opiniao. 4, p. 139.
(5) E' tambem a disposiçào da L. l.D. de Qucestion. ; que diz, que a con-
fissâo n&o basta, si nulla probatio religionetn cognoscentîs instruat.
(6) D. 1, § 24, D. ad S. 0.8ilvan.—L. 8,13. de Confessis (S).
(S) A primeira lei détermina, que para que os escravos possâo ser obri-
gados a confessai- a morte de seu senhor, é preciso que esteja provado ter
este sido assassinado.
A segunda diz, que nâo se deve condemnar aquelle que confessa dever
cotisa, cuja existencia é incerta/ Esta lei tem àppTicacâo especial à mu ter i a
civil, mas por analogia applica-s* à crlminal.
II. 7.
KO
Na segunda hypothèse, acreditou-se por muito tempo que
a confissao nao "podla servir de prova ao corpo de de-licto
(7) ; era a consequencia directa da erronea opiniao que nao
reconhecia como valida a sua verificaçao, sen&o quando
tinha havido inspecçao judiciaria (vide supra, 2 part., cap. 21)
: mas hoje jà nao se segue esse systema demasiadamerite
absoluto (8) ; sd se na inspecçao um meio, mas nao o
unico, de chegar â manifestaçao da vef-dade ; além disso,
qualquer que serja o crime, pôde acon-tecer que nao fiquem
vestigios, e neate caso, exigir ab~ solutamente a vistoria do
juiz, séria querer o impossivel (9). Nao acontece
frequentemente conseguir o malfeitor fazer desapparecer
todos os vestigios do crime? Portante, é in-contestavel que o
corpo de delicto pôde perfeitamente* em certos casos, ser
démonstrado pela confissao (11) ; mas, como neste caso,por
falta de outras provas,apparecem sempre duvidas, devem estas
ser completamente esciarecidas. De ordinario ellas se baseao :
No caracter do accusado, quando este, sendo Bem eo-
knhecido, o défende contra a imputaçao do crime que con-
fessa;
(7) Vide em Julius Clarus Sent, quant, 65, &. 11, quaes erâo as idéas do»
-antigos jurisconsultes a respeito.
(8) Stubel, Do Corpo de Delicto, g 306.—Tittmann, 111, p. 287.
(9) Vide o Proc orhn. comp. do aator, T. 1, Cap. 68,—T. 2, Cap. 164.
(10) Dma mSi mata seii ftlho, e dâ*b corpo aoa porcos para devora-lo.
) Zeiler, Dissertaedes annuaes, IL p, 187.—Tlttmann, Causas crimes
notaveis, ns. 8 e 4.—Wagner, Iimista de Jurisprudencia austriaca, 1826,
Maio, p. 237,1828, quademo 4, p. 195.—Bopp. Mbteriaes de Legislaç&o de
liesse, Liv. 5, p. 148.—Hohnhorst, Armuarios 7, p. 267.
I
51
Ko possivel desarranjo mental do accusado, porque vir
confessar-se culpado. de um crime desconhecido, e exr-se
de bom grado as penas da lei, parece que é procéder contra
a natureza ;
No facto de denunciar-se o accusado çomo autor de um
crime, do quai entretanto, nao existe vestigio algum ;
Finalraente, no facto de ter o corpo de delicto, em muitas
espeeies de crimes, certes caractères, cuja verificaçao nao •
p6de regularmente ter lugar, senEo corn o auxjlio dos meios
foraecidos pela sciencia (12).
Compete, porém, ao magistrado esclarecer todas essas
duyidas (13), e ao juiz, examinar se ellas desapparecer&o
completamente.
E' conveniente tratar coin algum deaenvolvimento da
primeira questao : si se péde acreditar ser o accusado cul-
pado do crime. Quando certas circumstancias fazem. con
r
cluir (14), que elle nao -tonna a força physica necessaria
para consummar o crime confessado, a confissao carece de
verosimilhança ; e como a verosimilhança a primeira
co'ndiçao da verdade de um facto,' segue-se que _ tal con-
fissao nao péde autorisar a condemnaçao- O mesmo acon-
tece (15), quaudo as circumstancias verificadas pela in&-
(12) Exemplo-: no caso de cnvenenamento.
(18) Os codigos modernos sSo unanimes neste ponto ; estabelecérâo con- •
diçôes muito différentes, mas que tém sempre por ftm guiar o juiz.—Cod. austr.,
art. 400.—Orden. crim da Prussia, § 136, 370, 876.—Cod. bav.. art. 269— Vide
Gmelin, da Administiaçflo da Justiça 'pénal, p. 158.
£14| Exemplo : um homem de força physica muito inferior denuncia-se
como teùdo assassinado^em luta outro muito mais forte do que elle.
(15) L. 1. $ 24, D. de Quaest. refere-se a esta hypothèse (S),
(S) A. citada lei diz que nâo sa deve prestar muita as declaraç5es dos li
nimigos, porque mentem facilmente; mas tanïbem nâo so ih?s deve negar
absolutamnnte fé, soi) o pretexto ie inimizades.
trucçfto tornao-se in concilia veis coin as essenciaes contidas
na confissao (16). Se é simplesmente em razSo dos bons
antécédentes do accusado que se trata de saber, se é pos-
sivel imputar-lhe o crime (17), nao séria acertado consi-
siderar inverosimil a confissao, por ter elle adquirido,
pelos précédentes da sua rida, uma presumpç&o favoravel ;
de orilinario é difficil decidir, si se pôde julgar um indi-
viduo capaz, ou nao, de certo acto condemnavel ; poisque
a ninguera é dado prescrutar claramente os arcanos do
coraçao humano. Nao se tem visto homens viverenï por
longo tempo sem reproche, emquanto as tentaçces nao os
assaltarao, e depois, um bello dia, cederem a uma tentaçao
mais poderosa e soltarcm as redeas as suas m as ten-
dencias? Nao se-tem visto outros enganarem os seus se-
melhantes com a mascara de uma longa dissimulaçao,
e depois, de repente, arranca-la na primeira occasiao, que
se lhes offerece (18) ? Mas, se * aos bons précédentes do
indiciado e as presumpçôes, que délies resultao, vem jun-
tar-se a circumstancia de <nao se poder descobrir motivos,
que tivossèm podido leva-lo ao crime : se, pelo contrario,
parece que, pela sua situaçSo particular, elle dévia ter
I' interesse em nao commette-lo (19) ; o juiz deve mostrar-sa
duplamente escrupuloso na apreciaçao das confissôes.
(16) Exempta : Titius déclara ter assassinado Sempronius a 4 do Janeiro
de 1833, e teste tnunhas afflrmào te rem visto este com perfelta saude no
dia 6 do mesmo mez e anno.
(17) O Codigo bavaro, art. 269, dispôe qae a confissdo ndo pôde servir de
vrova ao corpo de delicto, seniïo quando o accusado, de qualquer ipodo,
deu lugar a que a sua culyàbilidade nâo cause admiraçâo a ninguetn. '
(18) Feuerbacb reunio excellentes obscrvaçôes a respeito nas suas Causas
criminaes, 11, p. 111.
(19) Titius confessa ter sido o autor do assassinato de um homem, na
existencia do quai elle tlnha capital interesse, de um homem que satis-
fazia as suas necessidaâes, e cuja herança elle nâo podia pretender.
53
Segue-se o receio*de um desarranjo nas faculdades
mentaes do accusado. Mas este escrupulo, aprpssemo-nos em
dize-lo, tem a sua origem na opiriiûo erronea, que considéra a
confissao como um phenomeno contrario à natureza. Esquece-ae
o poder da voz da consciencia, que persegue o culpado a cada
momento, e o obriga a aliviar o coraçao pela confissao do crime,
ainda desconhecido até ahi. Dcmais, em todos os casos, bastarâ
observai* at-| tentamente o accusado para saber, se este receio é
ou nao fundado. Os précédentes da sua vida, sua conducta e pos-
tura na occasiao da confissao e durante o processo, a ave-
riguaçSo dos motivos, que o impellirao a fallar (20), sao Ioutros
tautos meios de apreciaç&o, e graças a elles, o juiz nao'pôde
deixar de ficar habilitado para decidir logo a questâo.
As duvidas, provenientes do facto de nao existir ves-
tigio algum do crime, nao devem embaraçar o juiz nos
casos seguintes : H
Quando o crime, por sua propria natureza, nao podia deixar
vestigios (21).
Quando, pelo modo porque foi commettido, nao se pôde
facilmente explicar a sua falta (22).
(30) Este ineio da apreciaçào o muito importante. Uma mulber apre-senta-
se cm juizo e déclara que matou occultamente, ha oito annos, um filho natural
que tinlia dado & luz ; que desde ahi a sua consciencia a persegue
constantomente ; que, ha seis mezes, achando-se gravemente doente, fez voto
de confessai* o sou crime; que um sacerdotc, a -quem se confessou, animou-a
na sua resoluçSo: toi as estas circumstancias provSo suflicientemonto que a
accusada obra cqm plena liberdade de ospirito.
(21) Exemplo : no caso de um delicto facti trai^seu/iUis.
(23) Exemplo : uma mulher confessa W queimado o corpo'de seu filho. ou
te-lo dado om pasto aos porcos.
rs4
Quando as circumstancias actuaes dao a razao porque nao
podem mais ser encontrados, ou porque o sao em pequeno
numéro (23). Sômente neste ultiino easo é que uma vistoria
torna-se frequenteiaente necessaria para ve-rificar, se o crime,
tal como o accusado o confessa, podia effectivamente nao ter
deixado vestigios (24).
Finalmente, se os escrupulos do magistrado provém da
circûmstancia de pertencerem ao dominio exclusivo da
sciencia certos caractères, que o corpo de delicto confcs-sado
dévia ter, convém uiuda procéder por via de dis-tmcçâo*.
Pôde acontecer que estes caractères, nao obstante pertence-
rem ao dominio da sciencia (25), nao obstem a que outras cir-
cumstancias, provadas, vennâo dissipai' todas as duvidas ;
certos factos podem * ser provados sem que limitas vezes
seja possivel explical-os ; mas se os caractères duvidosos sao
de tal nafureza que a vistoria se tome abselutamente
indispensavel, entao os factos provados deixao de ter a
mesma importancia (26).
A confissao nùa tambem nao pôde servir de prova plena
(23) Exemplo : o accusado déclara ter assassinado Titius, ha dons annos
e ter enterrado o cadavor.
/.
(24) Dirào, por exemplo, se é possivel, em razâo do lngar em que o-ca-
daver foi enterrado, e da docoinposiçSo mais.ou menos rapida que ahi se
opéra, existirem ainda vestigios, depois do espaço de annos referido peîo.
accusado. (Vide um exemplo notavel na Revistç de ffltxig, n. 82, p. 260.
(25) Exemplo : quando se trata de decidir, se os ferimentos erao mortaes
(26) Titius déclara ter feito em Um bosque muitos. ferimentos mortaes
cm Sempronius, com a intonçSode o matar, e que o deixou como morto ao
chSo. Nâo se acha mais o cadaver, mas as tegtemunhas afnrmao que oito
dias depois do assnssinato ainda o virào estendido no bosque.
55
tlo corpo de delicto, quando os caractères constitutivos des
devem ser tiecessarïamente submettidos ao exanie de pe-J
ritos ; neste ponto o accusado n&o pôde ser considerado
testemunha. No moment» do crime, o çstado do seu es-|
pirito n&o lhe permittia sem duvida observar exactamente
os factos (27) ; ou entao estes caractères, em virtude da sua
propria natureza, n&o podi&o ser apreciados (28) sen&o por
'um pevito. O mesmo acontece ainda, se é rtecessarîa tuna
vistoria para poder avaliar a influencia, as relaçoes entre
causa e effeitos de certas particularidades materiaesj
allegadas pelo accusado ; or a, desde que a vistoria n&o é
mais possivel, o corpo de delicto tambem n&o pôde" Veri-
ficar-se sufficientemente (29).
Em resumo : o corpo de delicto pôde - muito bera ser
provado pela confiss&o do indiciado, mas por uma coii-
(27) Exciuplo : uma mulher confessa ter morto seu fllho logo ao nascer ;
mas no momento do parto a mulher podia facilmento enganar-se. o acre-dltar
erradamente ter o fllho nascido vivo.
(28) Exemplo ; o accusado confessa uma tcntativa de envenonamento ;
prétende ter propinado ao seu inimigo arseaico, que lhe vendea uiu mer-rador
ambulante ; ora, o accusado sabc so foi arsonico, o nâo qualquer outra
substancia, que lhe fol vendida, e que elle administrou T II
(29) Exomplo: o accusado déclara ter descarregado muitos golpes sobre a
cabeça da sua victima) e que o sell cumplice, tendo chegado depois. tambem o
ferio no mesmo lugar.—Outro exemplo : Titius confessa ter torido
Sompronius em um incendio : o seu flm era faze-lo perder os sen-tidos, para
nâo ser denunciado por elle, pois quoria, aproveitando-se do incendio,
commetter um roubo. Mais tarde, acha'se o corpo de Sompronius, mas cm tal
estadO que nâo permittia um exame proveitoso dos peritos ; ora» neste caso, a
conussâb sa por si nâo serve de prova do corpo de delicto. Sompronius foi
feridoT Perdeu a vida cm consequencia dos feri-montos, ou surprendldo pclo
incendio T E' 0 quo nada demonstra.
50
fissao perfeita em relaçao as condîçoes de credibilidade
requeridas : é preciso principalmente que nâo se possa
duvidar do estado completamente sao do seu espirito ; que se
demonstre plenamehte que o crime, tal como foi con-
summado, nâo podia ter deixado vestigios ; que nao pareça
ser inconciliavel com o caracter ou posiçao do individuo ; é
mister que os peritos affirmera que podia ter sido con-
summado pelo modo porque este déclara, e deduzao a razao
de nao se acharem mais os vestigios ; ou, finalinente, é
mister que outras provas venhao corroborai- os facto»
relatados na confissao (30). E aqui é applicavel a regra gérai
estabelecida anteriormente : deve ha ver concordancia entre a
confissao e o resuit ado. das outras provas. Mas
y
comprehende-
se bem, para motivar a convicçao do juiz, nao é necessario
que esta concordancia se estenda a todas as circumstancias ;
sendo muitas délias verificadas por esta forma (31), basta que
as outras possao conciliar-se com aquellas provadas, 'e
que, por consequencia, nao pa-reçao inverosimeis (32).
(80) O art. 269 do Cod. bav. dispôc, que a confissao deve concordar com
todas as outras circumstancias, de tal sorte que nâo possa haver duvida
sobre a realidade dos fados.
fl
(31) Exempta: uma mulher confessa 1er moi'lo, ha olto an non, seu fllho
recemnaacido ; affirma que flcou gravida do h, a désigna os sous vizinlios
BeC, que forno testcmnnhas de que cessarào as sua» regras do Abril de
1831 a Setembro do raesmo anno; désigna tambem D o E como teatemunhas
de que estevo Ntaente em Setembro, o que depois reapparecerSo os suug
regras.
(82) Exempta: no caso preeltado (nota 31), o corpô de delicto o poderia
de modo ulgum ficar provado, se as tcstomunlias afflrmasscm que, conforme
todas as circumstancias délias conhecidas, nâo era possiyel que A aceusad»
çstivesse gravida na ôpoca a que se réfère.
s?
GAPITULO XXXVI.
Ï)A CONFlSSlO QUAl.IIfICA.DA. (OU LtMIl'ADA.)
A eonfiss&o qualificada (1) é aquella que nao comprehen
o crime em toda
%
a sua extensao, ou que nao assigna certos
caractères do facto imputado ; ou que encerra certes restrie-
çOes que obstao-os seus effeitos em reiaçâo â pena, ou tem
por fim torna-la menos rigorosa (2). A apr-eciaçâo desta con-
fissao é cousa particûlarmente delicada; sob esta denomi-
naçao commum, comprehende-se, rne-se uma multidâo de
casos ; tal é a confissao na quai o crime confessado é menos
grave do que o crime constante da accusaç&o (3) ; outras
vezes 0 aecusado, nao obstante reconhecer a existencia de
certos factos accessorios. nega outros cuja nfto existencia
destfôe a possibilidade do crime (4), ou atténua a sua natu-
reza (S) ; finalmente, outras vezes confessa os factos mate-
riaes, puramente objéctiros, mas, menos explicita sobre a
(1)" Borst, Areh. nooos do Dit: Crim., 1, p. 179.—Reyeher, de Confissions
ttmitata in cousis crim., Tubing., 1831.
(3) Vide as diversas considérasses do Kleinohrod, Da Conflssâo, 1. a, S 10
o 16.—Quistorp. g 6S3.—Stubel, Proe. crim., § 793.— Tittm'ann, da
ConflssBo e da RttractaçSo. S 16, o Manual. 111, p. 487.—Proe. crim. comp.,
t. 2» cap. 125.
(3) Exemplo : o aecusado confessa o rottbo. mas nega a violencia accès*
soria.
(4) Exemplo : uma mulher confessa ter dado a luz um filho adulterino« e te-
lo enterrado ; mas sustenta que elle nasceu morto.
(5) Exemplo : o aecusado confessa ter attentado com Violencia contra e
pudôr de uma moça, mas nega ter ronstktnmado ou qilerido consumniar o
força in>ntp>
r>8
questao da intençao» ou a nega (6), ou affirma que ellu traita
outro fim menos criminoso (7). Assim tambeiu a confîssao se
diz qualificada, quaudo, seudo o crime confessado, o indiciado
procura salvar-se com uma escusa mais ou menos valida, al-
legando, ou quenao podia ter consciencia dos seus actos (8),
ou que a sua justifiçaçao exclue toda e qualquer pena (9), ou
deve attenuar-lhe o rigor (10).
A doutrina antiga deu regras pouco satisfactofias em ma-
teria de apreciacao desta confîssao ; quiz-se forçosamente ap-
plicar-lhe como subsidiarids os principios do direito civil, dis-
cutio-se amplamente para saber, se a confîssao é divisivel ou
indivisivel (11). Antigamente, e mesmo hoje, commetteu-se
outrb grave erro, que ja assignalamos : quiz-se transportar
para o processo criminal o systema das exa-pçôes do processo
civil ; sustentou-se que as restricçoes contidas na confîssao
qualificada sao outras tantas excepçoes, cuja prova incumbe
ao accusado ; ora, uma vez admittido este principio, e sendo
(fi) Exeinplo : affirma ter involuntariamentc disparadpxa arma de foge.
(7) Exemplo : confessa ter tido intençào de ferir, mas nào de mater-
% • • i*
t
--
(S) Exemplo : allega embriaguez. .
(9) Exemplo : allega a necessidade de légitima defeza.
(10) Exemplo: affirma ter sido gravemente provocado pelo ma ad-rersario,
(11) Exemplo : Grafcu, de Confession* qualifie., g 4—16—Vide Angélus
Arttuua de Malificiis, § comepareut inquis, n. 1.—(Ediçào de Venez» de 1317), p.
223. Vide, entra, os moderaos, Carmignani, I*is da segura/tça social, vol. 4, p.
141, sobre a qnestào da divisîbilidade da conûssào.
KO
Aftsini considerada (12) a allegaçâo da légitima defeza, ou da
obedieneia passiva, é forçoso, para ser logiôo, admittir
tainbem que, quando a prova da èxcepçao nflo for compléta,
a confissao deve ser aceita contra o indiciado, sem se tomar
em oonsideraçâo as restricçoes que ella contém.
Nâo se podia deixar de recuar diante desta consequencia
rigorosissima ; recorreu-se entao a um meio-termo (13) ; pre-
tendeu-se ser bastante, para que a. confissao fosse admittida
em todo o seù teor, que as restricçoes parecessem simples-
mente verosimeis (14).
Quiz-se tambem confundir sob o mesmo nivel todos -os
casos possiveis, ainda que muito diverses ; mas estabelecer
uma regra unica para ser sempre applicada, é desconhecer
profundamente a verdadeira natureza da confissao' qualifi-
cada, e tirar-lhe os. meios de poder ser verificada. (15). E'
(12) O Col. bar., art. 272, i-ahio neste erro, servindo-se"(las expressôes,
tocepçào de falta de discernimento, de necessidade de légitima defeza, etc<
(13) Por exemple vide o Cod. pen. bav., art. 43.
(14) A Ord. crim. da Prtissia,. art. BW, assit!) se exprime : quando o ac-
cusado accrescenta algumas restricçTies à sua confisstto, e que estas des-
troem ou attenudo o crime, a confissïïo ntto de ser admittida, sentto qnando
se prova que estas restricçoes sdo verdadeiras ou verosimeis,—O novo
projecto revisto de Ord. do proc. crim. para o Wurtemberg (de 1830), art. 249,
dispSè qxW : Se a àonfiss&& contém restricçTies, que venJiâo des-mentir
uma parle au accusaçâo, deverà ser admittida com as restricçoes que délia
fazem parte intégrante, emquanto a sua falsidade ntto fur irre-eusavelmente
demonstrada. Mas, se, tendo sido o crime confessado na sua totaliddde, 6
accusado sô aUega uma circumstancia atténuante, ou exclu-siva da pena, a
exoepçdo (Ifntto Ihe aproveita, senâo quando fôr provado ser verdadeira ou
verosimil. Vide a lei de 1811, que subâtituio este projecto.
(15)
Gmélin, é* AdmitHsttaetto da Justlea crim., p, 159, demottstra per-
fei lamente, que as lei s modernas sào «mitas v**« viciosas ntste ponto.
ocf
esse uia erro fréquente, contra o quai nos opporeuios coin
todas as forças.
Nao sendo a confissâo qualificada mais do que uma decla-
raçao restricta, com o fim de desviar, em todo ou em parte, a
pena incorrida, o juiz deve extremar as explfcaçoes do
accusado, no que têm de essencial, e apreciar todas as suas
circumstancias, segundo a sua natureza (16) ; nao deve
preoccupar-se com o seguinte adagio, sem dûvida muito
inexacto, mesmo em direito civil (17) : a confiso é md/voisivei ;\
nada (18) impede que elle possa examinar, se ha intima re-
laçao, e de ordem natural, entre as diversas partes da confis-
sâo, e mesmo separar o que deve ser separado no desenvol-
mento que encerra. Passamos a expôr os principios de
apreciaçao melhor applicaveis.
1. A confissâo nao pôde provar plenamente o crime, senfto
quando se réfère a todas as circumstancias caracteristicas e
constitutivas do corpo de delicto, nos termos da lei. Donde se
segue que, se depois de ter confessado muitas, o accusado
nega outras nao menos essenciaes (19), o crime nao se con-
sidéra provado, e a confissâo é considerada cotno nao tendo
sido feita, Neste sentido, poder-rse-ia dizer talvez que a con-
fissâo nao é arbitrariamente divisivel ; nffio deve competir ao
(18) Beyscher, 1, e., not. 1, supra, p. 16.—Zum Bach, ConsidsrZss sobre
0 dir. crim., p. 356.—Vide o Proe. erim. comp-, t.Ji, cap. 165.—Àbegg, Tra-
tado do Proe. erim., p. 171.
(17) Vide sobre este assumpto uma dissertaçSo do autor nos Areh. du
Proe,. et».. 16
4
n. 3,
(18) Honhorst, Awnuarios do Tribunal Supremo badez, 5, p. 359.
(19) Exemplo : confessa que o ohjecto; que se du furtado, est* »m seu
poder, mas afllrma ao mes.mo tempo te-lo aefyado au reeebido par doaÇào.
• Ol
juiz o ai'bitrio de, a aeu bel prazer, destacac deUa certas cir-
cumstancias favoraveis ao accusado, por eile affirmadas ; e
obriga-lo a prova-las. Um individuo é accusado de ter fur-tado
um relogio ; confessa que o objecto esta em aeu poder'por ter-
lhe sido dado pelo do no; nâo ha duvida que o delicto nao foi
confessado, uem sequer em parte (20) ; compete à socie-dade,
parte accusadora, e que requer a applicacao da pena, provar
todos os factos caracteristicos e essenciaes, cuja exis-tencia
sômente torna possivel a pena. Se a confîssao compre-heude
certas circumstancias constitutivas de um delicto menor, e nega
outras, que aggravariao a uatureza do crime (21), ao deve ser
applicada a pena do delicto menor, salve-, se outras provas
demonstrarem a realidade das cir-oumstancias aggravantes.
2. O accusado, confessando os factos materiaes, de fazer
restricçOes sobre a questao da malicia ; a confîssao por si
nao deve motivar a condemnaçao, pois a intençfio de com-
metter o crime é tambem um dos elementos essenciaes da
culpabilidade. Surge aqui uma questao jà tratada. Em certes
paizes (22) o legislador, levado pela doutrina erronés professada
por grande nuro de autores, elevou o dôlo a eategoria de
presumpçao légal ; em outros sabiamente deixou
(20) Mesmo em materia civil, quando o autor propôe a aetiô deposiH, 80 o
réo confessa que possue o objecto reolamado (um annal, por exempta)* mas
affirma que lho foi dado pelo autor, deve-ae eoneluir que ha negaçSo sobre
todo o pediio da acç.So, e que entâo a prova ineumbe sômente ao autor. (E'
verdade que neste caso a posse constitue uma presumpçao do proprîedade) (N.
D. T. F.)
(21) Exempta : » accusado confessa a furto, mas nega a escalada.
(22) Vida, por .exempta, a Ood. biv , art. 43.
de o fasrer. No primeiro caso (23), concordaino», basta q«e os
facto8 materiaes sejao confessàdos, para que o accusado veja.
levantarsse contra si a dita presumpçûo fanesta de dôlo ; e,
apeàar das suas mais fbrmaes negativas, o juiz teria o di-reito
de condemna-lo, sem se importar corn as restricçoea da
eonfîssâo. Feliztnente, nao obstante consagrar o legislador tao
falsa doutrina, todavia, graças a um itistineto salutar, nao a
levou as ultimas consequencias ; e certamente, cons-taudo do
processo a simples verosimilhança de falta de ma-licia, o
magistràdo deve logo admitti4a. Dahi sulta que, negando o
accusado o dôlo, e juiz deve examinar escrupulo-somente as
circumstancias que pareç&o confirmar as suas negativas ; e,
como, no fim de contas, a duvîda aproVeita4he sempre, o
magistrado nunca deve considérai* provado o dôlo, emquanto
as explicaçôes do accusado derem lugar a nao se considérai
como provavel a realidade do acto criniinosol (culpa) ou do
accidente (casus), por elle allegado. Nos paizes allemaes que
se regem pelo direito couuuum, e em todos aquelles que
repellem a presumpçâo légal do dôlo, a posiç&o do juiz é
melhor. Nelles domina o principio : que para haver
condemnaçao possivel, é mister nao a materialidade dos
factos, mas tambem a sua intencionalidade ; que a prova de
cada facto câracteristico fica sempre a cargo daquelle que
pede a applicaçao da pena ; que o interesse publico, de que-é
o brguo, nao o dispensa de modo algum de provai) o dôlo
(24). Mas ha no dôlo um facto de consciencia exclusivo de
qualquer demonstraç&o material ; sô por inducç&o pôde-se
(23) Vide mais acima, cap. 17, o teitto a principalmento as notas 13 •.
seguintes,
(24) IntrodiicçHo d Arte da defeza. % 41.— Rossi, Trntado J)\r. Pen„
11, p. 228.
63
attingi-lo ; e quândo o accusado nao o eonfessar, o inquisidor em
caso algum deve olvidar-se de dirigir as suas mais severas
investigaçoes para as circumstancîas que podem servir de
ponto de partida a inducçoes certes .Mais tarde, o juiz do pie-
nario, cuja missao é decidir, se o acto rmputadq foi commet-
tido com malicia, compararà as circumstancîas affirmadus
pelo accusado em apoio das suas allegaçoes com as constantes
do processo, e, apreciando maduramente as relaçOes existentes
entre os factos confessados e os negados, déclarera pela sen-
tença até que ponto o lo de ser inferido das circumstancîas
da eausa. (25). O mesmo acontece no caso de allegar o
accusado este ou aquelle modo de perpetraçao exclusivo, se-
gundo a sua opiniao, de qualquer malicia, ou de qualquer
responsabilidade em relaçâo as consequencias do acto ; quândo
(26) affirma, por exemple, ter morto a sua victima por ordem e
com o consentimento desta. O juiz, an tes de tudo, deve indagar,
se esta allegaçao é verosimil, aflm de dar lugar ' a que exerça
na decisao toda a influencia que pôde ter em direito. 3. O
accusado confessa o facto e a intençâo, mas allega
(35) O mesmo se deve dizer qu.indo o accusado confesssa ter tido a iu->
tencâo de commetter uni crime menos grava* e nega formalmente o designia
de commetter oatro maior que foi a consequencia do piimeiro.—Vide, L'
h g 7 ; Si 7 D. ad leg. Corn, de Sicar (S).
(S) A primeira lei sugeita à pana o que tiver prepafado on vendido o Veueno
para m&tar alguem. A segunda manda avaliat o dôlo, segundo a acto, poisque'
nâo considéra dôlo a culpa lata, e para exemplo aponta a facto de precipitar-se
um individuo de um lugar alto e cahir sobre outro, e o de estar an individuo
cortando ar-vores e ser morto um oufefb que passava pela quéda de um ramo,
por nao ter o primeiro dado préviaments aviso. ; conclue que estes nâo estào
sugeitos à pena dos assassines.
(36) Vide o caso citado na Revista do DM*, crim. estrangeiro de Hitziç.
il. 8, p. 197.
t
&4
uni modo de perpetfaç&o que tira^âintençao a stia crirniusli-
dade ; affirma, por exemplo, ter-sé acliadô na necessidade de
légitima dfefeza (27) > aqui tambem sao àppli'câvèïs as regras
precedentemente estabelecidas paf a o caso de negao ' do
dôlo. A justificativa de légitima defeza nao pdde realmente
ser considerada como uma excepçao de direito .civil (28) ;
quando o féo apresenta esta justificativa o concède que a
accusaç&o seja verdadeira na sua totalidade, concess&o que
alias é sempre feita nas éxcepçoes civis ; pelo Contrario, af-
firmar a légitima defeza, é negar o dôlo ; e as declaraçoes -do
accusado, que repelle a accusaçao como nullamente fundada,
ou como o fundada, no sentido, ao menos, em que élla é
allegada, constituem um todo indivisivel, e tem por objecto,
no seu complexo, desviar totalmente, ou em parte, a appli-
caçao da pena (29). 0 juiz dirigirà a sua attençSo para cada
uma das circumstancias allegadas : se o accusado, para daf
mais peso a sua justificativa de légitima defeza, argument tar
com o mâo caracter do seu adversario, coffl as ameaÇas que
anteriormente lhe fez, etc., etc., deverà o juiz indagaty se estas
asserçOes sao verdadeiras ; ezaminar o procedfmento dos
dous adversarios, e saber, se for possivel, quai andava
armado, etc., etc.} concluido este exame, decidientao, se o
accusado merece credito na sua justificativa (30)>
(27) Art. 130, 145, 150, 156, G. C. C. Vide o commentario de Reyseher»
DUsertaçOo predta&a-, p. 28 —, Gmelin, Da Âdministraçâo da Juttiça
trim.i'p. 166.—Losshirt, Eotpotiçâo dot Princidtot et Dir. Pin., p. 220.
(28) Vide acima, cap. 17.
(29) Vide o Proc.erim. eotnp,, t. 2, eap, 165
(
-rAbegg, Tratado do Proc,
crim; p. 207.
(30) Vide, sobre a prova da necessidade de légitima defeza, o God. bav.»
art. 181 e 186 ; mas este God. vai longe demais, declarando que ha^per-
âumpçao contra o accusado de ter ultrapassado a necessidade da defeza,
pelo facto de nào ter feito logo a sua declaraçïo à aùtoridade.
65
Finalmente, estas mesmas razoes sao applicaVeis ao ftaso
de escusas pelo accusado allegadas, com o fim de fazer desap-
parecer toda a responsabilidade do crime, que, alias, confessa
na sua totalidade : por exemplo, a escusa de obediencia pas-
sives. (31). Quando o accusado, partindo da supposâo, que
fica plenamente justificado, provando que obedeceu a ordens
realmente dadas (32), apresenta esta defeza, nega uma parte
da imputaçao, e procura fazer desapparecer a criminalidade.
Esta circumstancia, ainda quando nao fosse senao verosimil,
bastaria para introduzir a duvida no espirito do juiz, e para
desviar à pena.
,4. O accusado pôde confessar o crime todo na sua mate-
r
rialidade e na sua moralidade, mas allegar ao mesmo tempo
circumstaucias que o attenuem (33) ; vê-se-o entûo ordinaria-
mente allegar alguns factos justificatives em apoio das suas
declaraçôes ; mas o juiz jamais deverâ exigir a prova
perfeita^ délies ; e se existir a menor duvida sobre a inteifa
rulpabilidade, deverâ applicar-lhe o minimo da pena.
(31) O projacto de lei Vrurtemberguez de 1831>§ 259, classificava a obedien-
cia passiva em catesoria diyersa da justiflealiva de légitima defeza. Mas
errava evidentetnente classificanio a primeira entre as escusas que noo tem
relaçGo directa com o crime.
(32) Esta questào origem a uma outra das mais graves : os agonies da
autoridade, os simples soldados, sSo obrigados a exécutai*, 93m excep-çào,
toias as ordens que recebsrem, mesmo aquillas que forem inconsti-tuctonaes î
Vide a este respeito. Rossi. Trata&o do Dii*. Pen., t. 2, p. 127.— Àbsgg,
HutstSes de Jurisprudence crirn., d. 96, (S.)
. (S) Entre nos decidem a quSstào o art. 14 § 5, e 142 do Col. Crim., m-
binaio com o art. 10, g 3 e 18. § 7 do nr-smo Coi., s7gunio as hypotbi-ses.—
Vide Conselheiro Pimenta Basno, Dir. Publ. Brasil. n. 57ô,
I ^
(33) Exemplo: factos de sedtt<"oïo, d> provocaçâo violenta, etc.
n. 0.
oo
CAλITULO XXXVII.
DA RBTBACTÂO DA CONFISSAO.
À revogaçfto ou retractaçâo da confissao tem lugar de
dirersos modos (1); ella comprehende a confissao na sua
totalidade, quaudo o accusado, arrependendo-se do que disse,
affirma a sua compléta innoCencia. Mas aqtti coh* vem fazer
as seguintes distincçOes :
1." Ou a retractaçâo, como aoontece muitas vezes, diz
respeito a uma confissao que satisfazia a todas as con-diçOes
de credibilidade exigidas, e na quai p juiz pode-ria
perfeitamente basear a condemnaçao.
2.° Ou entao a confissao, contendo certas lacunes, nao
poderia fazer por si plena fé.
A retractaçâo pôde tambem nao revogar a confissao,
«enao em uma ou muitas de suas partes.
A Carolina contém muitas prescripçces (2) sobre a ma-
teria (3) ; mas deve-se ter em lembrança, que nesta lei trata-
se de uma confissao arrancada por meio da tortura, e
retractada cessando esta ; e que uma confissao obtida por tal
meio faz suppôr ter o accusado fallado, nâo obstante estar
innocente,. para pôr um termo as suas insupportaveis
dores. Esta lei em mais de uma disposïçào
(1) Crosr. de Confessione rei et revàcatione confessionis. Amsteloâ, 1694.
Tittman, da Confissao e da Revogaçdo, Halle, 1810.—Kleinschrod nos -Afch,
noty. do Dir. Crim., J.V, p. 8.
(2) Arts. Ç4* 57, 69 e 91, C. C. C.
(8) Walchj de Eevocatione confessionis capUe damnati in die ail ejusf
supplicium destinato, Jeva, 1793.—Tittman, 1. c. (supra nofc. 1). § 26.
67
diz respeito (4) a retracçfto da confissao, que se prétende-ter
sido feita deste ou daquelle modo, quando se trata de provar ter
ella sido feita realmente nos termos constantes do processo
verbal. Demais, no fundo destas regras especialissimas da
Carolina, existe um principio de alcance mais gérai, e de util
applieaçao no processo moderno, e que decorre directamente da
propria natureza da confissao (5).
Mas voltemos as distincçOes acima estabelecidas.
1«° Se a retractaçao diz respeito a uma confissao plena-mente
regular (6), deve-se applicar-lhe a regra segundo a quai a
declaraçâo tardia e parcial do accusado, unicamente feita no
se*u interesse, nao pode destruir a prova plena primitivamente
feita (7). Ora, toda a retractaçao contém uma declaraçâo desta
natureza, e assim como, indepen-dentemente da retractaçao, a
declaraçâo do accusado nSo lue poderia aproveitar, pois* que
ninguem pôde ser crido fallando no interesse da propria causa,
assim tambem a declaraçâo, sob a nova forma que reveste, nao
pôde destruir a prova existente. Convém considerar com
escru-pulosa attençao as razOes nas quaes se apoia a
retractaçao.
(4) Arts. 91, 92. G. C. C. comparadoa com os arts. 94,107,123 da Bamb.—
Biener, Ensaios historicos sobre a processo inquisitoriai, p. 156.
(5) Entre as legislaçoes modernas vide o Cod. aust., §402.—Orden. crim. da
Pruss., g 273.—Lai da Saxonia sobre a retractaçao, promulgada em' 17 de
Abril de 1810.
(6) Notaveis casos de retractaçSo Ha Revista de Hittig precitada, ri. 37, p.
190.—Vide tambem Hitzig, Annaes do Dir. Crim. estrangeiro, n. 19, p. 88, e
23, p. 62.'
(7) Kleinschrod, da Confissao, $ 18 (Ant. Arcli.). Martin, Tratadù do
froc, crim., § 73.—Tittman, Manital, III, p. 492.—Vide o Proc. crim. comp., t.
3, cap. 169.
68
Sômente a veçpsimilhança e a gravidade destes motivos
podem dar-lhe peso é importancia.
Portante, o primeiro objecte da retractaçao é fazer ver que
u confissao actualmente revogada, por causa de um vicio ou
de uma lacuna qualquer no cumprimento das condiçOes
exigidas, nao merecia ; que erradamente se a considerava
perfeita,e que pelo contrario existem no processo circumstan-
cias materiaes, que, se fossem antes reconhecidas, teri&o
obstado a que fosse ella admittida como prova. a). Uma
destas circumstancias demonstra a impossibili-dade da
existencia do corpo de delicto [S), b). Outra de monstra a
inverosimiihança da accusaçao "e da confissao (9). c). Uma
terceira faz ver que o aecusado nao podia ter commettido o
crime anteriormente confessado (10). d). Outras vezes, estas
circumstancias tendem a demonstrar que, coagido
illegalmente (11), elle recorreu a confissao, por ser
(8) O magistrado conrenceu-se que A., victima de um assassinato com-
mettido por B., esta realmente morto; mas eis que B. retracta a sua con-
fissao e indica muitas testemunhas, que virào A. de perfeita saude muito
tempo dopois da época de pretendido assassinato.
(9) Exemplo : o aecusado confessa ter posto fogo a casa de seu vizinho ;
ratracta-se., e Invoca o testemunho de peritos, que declarSo nao ter elle
podido por o fogo do modo referido na confissao.
(10). Exemplo : o aecusado confessa ter posto fogo à cidade de A..., a 12
de Janeiro -de as 1882 ; retracta-se depois, e prova que nesse mesmo dia
elle estava em B...J a 80 léguas de distancia de A...
(11) Keferlmo-nos tambem as penas de desobediencia. qnando forào illé-
gal e exorbi tan temen te applicadas. Oonvém dizer que estas provas, nos
paizes em que vigorâo, por minimas que pareçâo (tomamos para exemplo
a de dez baatonadas) podem. certamente impressionàr tâo vivamento uma
pegsoa fraca e delicada sobre pontos de honra, que prefira confessai- a
goffrer um taLcastigo.
69
o uuico refugio que lhe foi offerecido ;—>e) que foi amea-çado,
caso nao confessasse ;—-f) que foi iuduzido em erro (12); e que
este erro podia levar um innocente a confessar-se culpado ;
g) que elle se enganou sobre as consequencias do acto
criminoso- confessado,e que se por isso fez figurai a si proprio
como tendo tomado nelle uma parte principal (13) ; h) ou
finalmente, que na occasiao da confissao achava-se em tal
disposiçfio de espirito, que era impellido irresis-tivelmente a um
falsa confissao de culpabilidade (14).
Alem disso, qualquer que seja o raotivo em que se apoia a
retractaçao, é necessario, de um lado demonstrar a sua verdade,
e de outro verificar bem quai ainfluencia que este motivo pdde
excercer sobre a fé que precedentemente obteve a confissao.
Quanto à primeira destas duas condiçoes, parece à pri-meira.
vista que é necessaria a demonstraçao compléta da procedencia
do motivo, para poder annullar a prova da culpabilidade
plenamente produzida pela confissao ; todavia, lembremo-nos
que a prova é o resultado da convicçao do juiz, quando deixao
de subsistir todos os motivos contra-
(13) Exemple : porsuadio-sa ao accusado que o facto nâo é sujeitp à pena,
ou que, confessando elle, atténua a culpabilidade de um amigo.
(13) Exemplo: un homem tenta commetter um acto criminoso,
de pois afasta-se precipitadamente; mais tarde tem noticia de um aconte-
cimento funesto (por exemple um incendio) e imagina que o acto
por elle - tentado foi a causa directa do incendio ; sô posteriormente à
sua confissao é que elle reconhece que a sua tentativa nào teve conse-
quencias, e que o crime, de que se suppunha autor, foi commettido por
ouïra pessoa, que. chegou dopois da tentativa.
(14) O accusado podia ter sido enganado por uma illusào, pelos sentidos,
por uma imaginaçâo morbida; o desgosto da vida podia te-lo levado
a confessar-se falsamento culpado.
•70
rios (15); que a verosimilhança deumsô destesbasta para
irapedir a formaçao da certeza, o que da mesma sorte é appli-
cavel em materia de revogacao da confissao ; que ainda que
seja verosimil o motivo desta revogacao, é isso bastante
para tirar à confissao o seu valor (16). E, com èffeito, assim
como a confissao nao teria sido admittida, se esta
circumstancia houvesse sido anteriormente conuecida, assim
tambem, sendo ella revelada antes do julgamento, nao pôde
deixar de reagir sobre a attribuida à confissao, que ella
offende muitas vezes na sua essencia. Titius tinha confessado
ter assassinado Sempronius ; depois retracta-se e faz
apparecer uma testemunha, uma v/mca, que vio Sempronius
de perfeita saude depois do dia do preten-dido assassinato ; ou
entao Titius, em apoio da sua re-tractaçao, demonstra, como
provavel, ter sido illégal mente ameaçado de ser espancado,
se nao confessasse : certamente, o jute devefô, tomar em
consideraçao tal retractaçao. Da mesma sorte (17), quando
entre as ciroumstancias contidas na confissao achao-se
algumas confirmadas por outras provas, séria de mais, exigir
do accusado, que se retracta, que seja obrigado a produzir
novas ciroumstancias tendantes a demonstrar, que a
concordancia é puramente apparente ; séria impor-lhe uma
tarefa muito difficil, que a
(15) Vidé adiante cap. 7,
(16) Jà se foi o tempo em que a simples probabilidade da retractaçao da
confissao raotivava a applicaçào de uma pena denominada esetraordinaria
(Carpzov, Prêtais rerum crim. qucst., 126 en- 68.) O Cod. Bav. g 273, con-
tentando-se tambem com a verosimilhança.dispôe que, se parecer veJiemen-
tetnente provavel nâo ter o accusado podido ou querido dizer a verdade na
occasMo da confissao, a retractaçBo deverd ser admittida.
(17) Tittmann, Manual, III, p. 491
*1
j ustiça reproVaria. Desde que se demonstrar a parte em que
deixa de merecer plena a confiss&o, esta perde intei-ramente
a sua força ; e as circumstancias accessorias, mesmo que n&o
tenh&o sido expressamente retractadas, n&o podem mais ser
invocadas no debate, salvo se fôrem provadas por outro modo.
Titius tinha confessado ter posto fogo, em 12 de Fevereiro, à
casa do Sempronius, contra quem, ha muito tempo, alimentava
violento odio ; depois, retrac-tando-se, demonstra que, se
confessou, foi porque se vio coagido a faze-lo : ora, se cahem
completamente as suas principaes declaraçoes, pouco importa
que a sua presença no lugar do incendio, e o seu odio contra
Sempronius sejao provados por outras provas ; neste caso
compete ao juiz appreciar os factos e délies tirar as
consequencias auto-risadas pela lei ; mas quanto à confiss&o,
délia nada mais resta»
Admittamos agora que' o motivo, no quai se apoia a
retractaçao, é cousa certa ou verosimil ; resta ainda a exa-minar,
como ha pouco dissemos, quai o seu effeito relati-vamente à
confiss&o por elle contrariada, e até que ponto pôde tirar-lhe a
anteriormente adquirida. Para verificar este effeito, basta
reconhecer que a circumstancia allegada pelo accusado, que se
retracta, descobre uma lacuna essen-cial nas condiçoes exigidas
para validade da confiss&o. Quanto maior fôr a importancia da
condiç&o que falta, tanto mais difHcil sera suppri-la por outros*
meios, tanto mais raz&o se terâ em julgar, que o accusado n&o
disse a verdade na primeira tez ; e com tanto maior força reage a
sua retractaç&o contra a confiss&o. Assim, demonstra, como
cousa perfeitamente verosimil, que em seguida à sua pris&o foi
dominado por tristeza e desanimo profundos; que tentou mesmo
suicidar-se : neste caso a sua confiss&o n&o
*3
pode merecer mais crédite (18). Se allega ameaças, cous*
trangimentos, soffrimentos rèaes, o juiz, tendo de decidir,
touiarà em consideraç&o o caracter individual do indiciado :
irai individuo robusto, experimentado, intelligente, nao se
deixarâ intimidar por ameaças, nem levar ao ponto de
confessar-se culpado sendo innocente ; o contrario acon*
tecerâ com
t
um homem timido e fraco.
2." Q u an do a confissao retrac tada nâo era compta :• quan-
do, por exemplo, délia nâo resultava plena e inteira-mente o
eorpo do delicto, on quando as circumstancias acceasorias,
que contera, nao estao em perfeita concordancia com o resuit
ado das outras provas, menos ainda se deve obrigar os
retractantes a demonstraç&o compléta dos niotivos: a confissao
primitiva, pelas lacunas que comtém, nâo pôde fazer prova
plena; e a retraètaçâo, que a vem revogar, ainda lhe tira
alguma força, que a sua primeira declaraçâo lhe teria dado, se
o indiciado persistisse nella (19).
3.' Finalmente a retractaçao pôde referir-se sômente a uma
ou muitas partes da confissao.
(18) Um a nossa hypothèse déverse entender que era mesmo no momento
da confissao que o accuaado estava sob a influencîa deste desarranjo
mental.
(19) E' occasiào de examinar as soguintas questSas : quai é o effeito da
retractaçao sobre a confissao feita pelo accusado uma $6 vez t Quai o seu
offeito sobre a confissao feita na instrucçâo preliminar, e mais tarde perti-
nazmcnto desmentida na instrucçâo ospecial ? E" regra invariavel, que
a confissao, para fazer ièt deve ser conflrmada muitas veses pelas decla-
raçôes persistentes do ace usado. Donde se segue que se a confissao foi uma
vez feita, a retractaçao nâo pôde deixar de ter valor. Quanto a segundà
questâo, para decidi-la, é mister recorror ao systema gérai da legislaçâo'
que rege a causa; e ver se ella considéra a .instrucçâo principal sô por si
como um prooesso propriamente dito; ou se, no seu espirito, a instrucçSù
gérai e a especiàl o s3o mais qup duas simples phases de um unico
processo e nâo sào cssencialmente separadas.
V
73
Ou ella versa sobre factos essencialinente constitutives
do crime, que nâo é possivel seiiâo quando é provada a
existencia délies (20). Este caso é identico àquelle em que
a confissao fôr
(
retractada ua sua totalidade.
Ou ella versa sobre factos aggravantes da criminali-dade
(21).
Neste caso tambem as regras jâ estabelecidas serao
applicaveis, salvo alguma modificaçâo muito natural. Para
que o juiz preste â retractaçao, bastarâ que o facto, tal
corao é actualmente referido pelo accusado, seja per-
feitameute concilia vel com as circumstancias constantes dos
autos, e que além disso pareça verosimil (22). Se os factos
retractados nâo o, nem constitutivos do crime, nem ag-
gravantes (23), a retractaçao, juridicamente fallando, tor-
na-se cousa indifférente, salvo se certas circumstancias da
confissao primitiva deixarem, por causa das modificaçoes
da retractaçao, de prestar-se à concordancia, até entao veri-
ficada, entre ellas e o resultado das outras provas (24).|
A retractaçao parcial pôde, finalmente, conter a decla-
(20) Esemplo : a accusada de infanticidio retracta-ae da sua confissao, c
affirmai que seu filho nasceu morto.
(21) Exempto : o accusado de homicidio affirma agora que nâo obrou coin
premeditaçtio.
(32) Esemplo : todas as circumstancias demonstrào que A. matou B. sem
intençRo.
l
' jJJ™
(23) Exempto : a retractaçao versa sobre a hora pretendida em que o
crime foi commeltido ; sobre a ovasào do accusado depois de consummado
o acto principal.
'(24) Exemplo : a época da perpetraçSo do crime, o numéro dos ferimen-
tos, podem ser causas indifférentes no pro-esso. e cntào a retratacçâo de
nada serve, quando a novaversSo do accusado sobre os factos fica'em
harmonia comas outras provas. Assim, o accusado, que confessa primeiro
ter consummado a assassinato a 18 de Janeiro, as 6 horas da tarde, déclara
depois que o coinmetteu a 13 de Janeiro de manhà. Certas testemunhas
tinhào fallado com o seu adversario no dia 12 de tarde : o seu depoimento
concilia-sc perfeitamentc com uni'i c outra versâo ; o a rctracçâo nao pôds
entào ter importancia.
II. 10. .
T4
raçâo de circuinstancias aggravantes atë entao occultas ; neste
caso ella faz fé, porque o accusado falla contra os seus
proprios interesses; ma» é mister sempre que estas novas
circumstancias concordem perfeitaœentè corn os factos
constantes do processo (*).
(') As leis novas da Allcmnnha attestâo progrésso ccrto nas idéas cm
relacoo & doutriaa da confissào. Hojc é cou sa univérsalmente conhecidaj
que a confissào do accusado nfio faz ncccssariamente prova dirimente,
absolu.ta contra elle: mas que o juiz pôde basear a condcmnaçâo sobre a
confissào, se as circumstancias da causa o convenccrem da sua sihceri-
dade. Tal é o sentido exprcsso das disposicôes do novo codigo do processo
criminal para o Wnrterberg (art. 298\, 0 da nova Orden. de process. crim.
para o ducado do Baden (art. 252). Emqnanto existlrem duvidas, 0 juiz
tem direito de nâo se contentar sô coin a confissào ; e neste ponto a don-tri
na légal da prova na Allemanha concorda perfeitamente com a seguida na
Inglaterra e na America do Norte, onde os jurados buscào a sua
convicçio na confissào, quando a sinceridade dosta nâo pôde ser posta
0111 dnvida (Vide Grconleaf, Tratado das leis da prova, I. p.163). A soluçâo
0 fornecida polo exame profundo do juiz. Portanto este tem de examinar :
I." Se no momento om que os factos so consummârao o accusado teria
podido cxamina-los exactamento. E' preciso com effeito duvidar da ver-
dade da confissào, quando esta versa sobre pontos do dominio espe-cial
dos bornons da arte. Pouco importa que 0 accusado déclare que propi-nou
veneno a alguem: podia ter-se enganado e ter tomado por Teneno outra
droga fornecida por terceira pessoa; e em quanto o se fizer ûm exame
compétente, 0 facto do envenenamento nâo pôde considerar-se
deinonstrado ;
:'-..'
2.° So o accusado, no momento da confissào, estava em situacâo de
espirito tal, que as suas palavras mereçâo : com effeito é évidente que
nào merece crédite desde que se pôde desconfiar, com alguma verosimi-
îbaftça, ter elle obrado sob 0 imperio da alienacâo mental, ou desde que
paroce sujeito a fréquentes al'lucinaçôcs ; >, Â
3.» Se a intorvençSo do juiz da instrucçSo, dos policiaes, dos oAlciaes
de policia e dos carecroiros nâo inanifcstou-sc de modo funesto por
excitaçôes mentirosas, por ameas, ou por promessas fallazes : a simples
verosimilhança do emprego de tans meios tambem tira & confissào toda a
sua força ;
4.» Quando a confissào esta isolada, nâo pôde por si produzir plena
convieçâo Titius déclara ter assassinado ha nove annos um desconhecido,
e -ter depois lançado à agua o cadaver : uma condemnaçùo pôde ser
•75
baseada sobre esta simples declaraçào, que nada corrobora, nem a' dos*
coborta do cadaver, o nem alguma das outras cirounistancias que fazem
presumir ter siJo commettido um assassinato T
5.o Finalmonto, a confissào nào faz prova sufficionte, quando se conserva
cm terraos vagos e geraes. Quando o arcusado desce as particu-laridades do
todas as circumstancias do crime ;quando pôo diante dosolhos do juiz o quadro
vivo c complcto da sua pcrpetraçào ; o juiz logo se convencs; o magistrado
sente que todas as suas duvidas desappare-cem, quando claro nos motivos
que irapellirào a mào do assassino, e quaudo sabo como o assassinato foi
executado.
Digamos agora, que o caracter cxclusivamento inquisitorial do pro-cesso
allemûo, produz uma das mais funestas censequencias. O juiz da instruoçâo é
forçosamento levado a tomar a confissào por ponto de mira de todos os scus
eaforços. Dahi naseem muitas vozes enganos feitos ao accusado. ameaças,
pfomessas ; d'ahi as dctençôcs preventlvas, de proposito prolongadas na
esperança de obter uma confissào que so demora. As leis allemâcs, sob a
ilenominaçâo de pena de desobodioncia, autoris ào as sevicias. a pristto mais
ou menos rigorosa, contra todo e qualquer accusado que récusa responder, que
procède mal ou mente à justiça : sSo outros tanlos pretextos conuedidos ao juiz,
para impôr vnrda doiras torturas ao accusado que nào quizer confessai- ; o que
levado muitas vezes polo desesporo, réfère outras tan tas montiras sob a forma
de confissào. Os juizps de instruccçâo e principalmente os jovens o avidos de
accosso tomâo por timbre obter o maior numéro de confissôcs posai veUNSo se
<1 e ve admirar portante das retractaçôes poster iores as con lissées, e dasqueixas
todos os dias repetidas contra o emprego destes meios que a lei deve reprovar.
Opovo récusa a sua oonfiança aos julgamentos criminaes baseados sobre
confissôcs que parecem extorquidas. E todos osdiasajnstiça allemà vê diminuir
a considoraçào que' deveria sor o seu necessario apanagio. Nesta materia, como
em qualquer outra, o systema francez da publicidade e do debate oral deve
attrahir todos os suffragios. Se o accusado confessa na audiencia,"todos os
assistentes se convencem de que nada se fez para obriga-lo, e de que as suas
palavras nào emanào senào da sua livre vontade : os juizes, por seu turno,
pcrante os quacs comparées podem attentamonte examinar a sua attitude,
conceder-lhe, ou nogar-lhe credito, com conhecimento de causa. Se medidas
illegaes forào empregadas na instrtieçâo prelitninar, o accusado pode declara-
lo perante todos, affronta a que o magistrado instructor terà cuidado do nào se
expôr. Finalmente, quando a confissào foi ta na informaçàoé repetida no
plenario, ha uma dupla garantia da sua veracidude, e de SPU valor como meio de
prova.
{Nota manusc. do autor )
FIM DA QUARTA PARTE.
QUINTA PARTE
Da prova testemuiilial.
CAPITULO xxxvm.
DA PROVA TESTEMUNHAL RM GERAL.
Pela palavra testemunlia, designa-se o individuo chamado à
defpôr, segundo a sua experiencia pesaoal (1), a respeito da
existencia e da natureza de um facto. Propriamente fallando,
testemunlia é o personagem que se acha présente no momento
e n que aconteceu o facto (2) ; mas na pratica e em relaç&o à
prova, a testemunlia nBo tem importancia, e verdadeiramente
nao se a considéra como tal (3), senào qnando falla e conta o
. (1) A palavra latina testis, om relaçào do setttido e origem com as pala-,
vraa antesto, antisto, désigna o individuo que se colloca directamente em "
face do objecta, e que conserva a sua imagem (soguade Garmignani, IV, p.
150.)
(2) Por isso se dû o nome de testemunlia- ao individuo nâo "ïntôrrogàdo,
e que ainda o fallon; mas que se sabe estar no caso de ofazdr pelo
facto de ter estado présente no momento do àcontecimenfco.—Vide tambem
Bentbam, Tratado das Prov. judic., 1, p. 192.
(3) Sobre a doutrina da prova testemunhal om gérai, vide Kleinschfod
nos Arch. do JHr. crjim., VI, n. 8, c. Vil, n. 2.—Globig, Tlieoria da Vero-
similhança. lp. 97.—Globig, Censura rei Judic. 11, p. 48.—Rolin, de
Delict. probation. p. 43.—Constantin!, Do Exame da Prova testemunhal
no processo inquisitôHo, Veneza, 1827.—Bentham, Tratado das Provas, 1,
110.—Garmignani, IV, p. 100.
TV
que vio. Este depoimento, concebe-3e, pôde facilmente offender
a verdade objectiva ; a individualidade da testemunha sô por
si pôde influir muito no modo por que observa ; se chegou
ao lugar por acaso, se nada a convida a um ex aine serio,
apenas guardarâ os caractères mais salientes do facto : final -
mente, certes preconceitos, certa diaposiçao de espirito, fa-
zem-na emprestar aos objectes côres imaginariaa ; e muitas
vezes crê ter visto o que deseja ver. Frequentemente, e em
relaçao a certes objectes, as faculdades intellectuaes, os lia-
bitos praticos, a experiencia itdquirida, tem uma influencia
directa e sensivel sobre as observaçoes das testemunhas : sao
necessarias muitas vezes vistas mais exerritadas, intelligencia
perfeita da importancia dos diversos caractères da cotisa (4),
para apanhar com uma sô vista d'olhos todas as suas cir-
cumstancias essenciaes (5). O intervallo entre o aconteoimento
e o depoimento pôde modificar consideravelmente a natureza
desta (6). A imagînaçao transforma facilmente a recordacâo
dos factos confiados & memoria ; e entao pôde acontecer que
certas cireumstancias sejao postas em lugar inferior, que
outras tenlitio côres mais vivas, em virtude de uma operaçao
chimerica do espirito, que se apressa em preoncher as lacunas
da memoria ; torna-se diûicil entao distinguir o que é verda-*
deiro do qus sô é imaginario. Nâo obstante ter a melbor von-
tade, a testemunha, chamada a depôr muito depois do acon-
tecimento, nao pôde mais separar a bbaervsçao real, das
(4) Este cas>> aprcsnnta-so somprc que occorrcin di versos aconteclmentas
simultanoos ; o mister estar aenhor do si para dirigir a sua attonçâo sobre
todos os pontos ao mesmo tompo.
(b) Vide as condiçAos sob as qnaos sn dt dar plenu fé â testemunlip,
AntologUt do Fironzo, 1838* n. do Abril. p. 11G.
(0) Bontlmm, Tratado, y 52.
TS
ereaçGes phantasticas do espirito ; em uma palavra, quanto
mais viva for a sua imaginaçao, tanto maior risco haverâ de
cahir na inexactidfto (7). Deve antes de tudo reflectir se-
riamente, conhecer o que ha de grave em um depoimeuto,
procéder conscienciosameute, pesar corn cuidado cada palavra
que proferir, e, no caso de duvida, liraitar-se a exprimir sim-
plesmente a sua supposiçao, em lugar de affirmar o que nao" é
positivamente certo. Um tal procedimento sera para o juiz
garanti segura da sua veracidade. E, fazendo-se mesmo
abstraccfto de qualquer intençâo culpavel de occultar a ver-
dade, a individualidade da testemunlia reage sempre podero-
samente sobre o seu depoimento. Este se modifica, segundo a
disposiça» do seu espirito, no moment» em que falla, se-
guindo as inclinasses a que se entrega. Quando a paixao a
anima, quando o receio ou o medo a paralysa, deixa de fullar
de muitos factos, de que poderia dar conhecimento ; o seu
espirito, demasiadamente agitado, esquece-os momenta-
taneamente. Tem-se visto muitas vezes homens os mais leaes
lamentarem, porém muito tarde, nao terem podido lem-
brar-se, por ficarem intimidados pelo apparato severo da
justiça e nao conservarem a calma necessaria, de certas cir-
cumstancias importantes, que, depois lbes vierSo à memoria
pouco a pouco. Finalmente, a experieneja demonstra que os
homens se illudem a si proprïos, e acreditSo que nao mentem,
quando nao declarao tudo quanto sabem ; e a testemunlia, que
nao depôz conscienciosa e completamente, imagina desculpar
a infidelidade do seu testemunho, dizendo, que nao foi per-
guntada sobre todos os factos.
Eis quanto basta para demonstra r que é mister usar de
(7) ïom-se notado frequentomente que certas pessoas, por empres-
tarom muitas vezes a outres os mesmos factos inventados, acabSo
acreditando na sua 'realidade.
*9
limita prudeneia na apreciaçào da prova testemuuhal, e que
acontece frequentemente, nao obstanie a boa vontade da tes-
temunha, affîrmar esta peranteojuiz factos purameute ima-
ginarios em lUgar da verdade. Portanto, o legislador deve cercar
esta prova de todas as garantias possiveis (8) ; porque se estas
podem satisfazer a consciencia do juiz, e firmar a seguinte
presumpç&o necessaria : que a testemunha observou realmente
os factos, e quiz a respeito délies depôr com fldeli-dade e
completamente. As garantias do depoimento teste-munhal
classific&o-se em très categorias principaes :
Da economia da lei deve resultar para a testemunha os
mais poderosos motivos para reflectir séria e attentamente, e
para usar de uma linguagem inteiramente sincera e fiel.
O interrogatorio deve ser combinado de tâl sorte, que de
um lado a testemunha seja levada a declarar a verdade, e de
outro lado tornem-se impossiveis todas as escusas, todas as
escapatorias, e que aquella seja obrigada a depôr comple-
tamente.
Devem ser dados ao juiz os meios de apreciar exacta-
mente as qualidades individuaes da testemunha, e todas as
circumstancias que lhe permittiâo decidir, se a testemunha
observou realmente, e se quiz fallar de conformidade com as
suas observaçoes.
A primeira categoria comprehende :
A advertencia séria e solemne feita pelo juiz a testemunha
;
2° A prestaçao do juramento ;
3° As formalidades do interrogatorio judicial ;
4° A publicidade dos depoimentos.
Quando a testemunha mostra-se animada de intençoes firmes
e leaes, a advertencia do juiz nada vem accrescentar
(8) Bentham, Tratado, p. 112 e 143, t, 1.
r
so
à saa vontade de dizer a verdadsi; mas se hésita, cuino acon-
tece muitas vezes (9), se o receioou o intéresse influe
sobre o seu espirito, se manifeste leviandade prejudicial, o
juiz dà-lhe a força que lhe falta, ou lembra-lhe toda a gça-
vidade das declaraçOes que vai fazer; todavia, esta adver-
tencia tîlo util, nao deve, para fazer impressao sobre o seu
espirito, dégénérai* em uma formula maquinal e uni
forme (LO) ; deve ser convenientemente dirigida e adaptada
aos individuos. H
O jurameato constitue uma garantia mais importante ainda,
quer se o considère sob o ponto de vista da sancçao religiosa,
quer da sancçao moral ou légal (11). Sabe-se por experiencia
que, quando o home m nâo esta ligado pelo ju-ramento, muitas
vezes pOe de parte a verdade nas suas declaraçOes ; mas desde
que fica ligado pela fé do juramento, altéra a sua primeira
versao, e nao occulta mais.» verdade, que uni imperioso dever
so obriga a revelar. A santidade do juramento, se o individuo
nîto esta inteiramente depravado, actua sobre a sua aima e a
purifica ; impelle-o irresisiivel-mente pelo verdadeiro caminho
; e a testemunha r,ecua diante da torpeza de sellar uma mentira
corn um sêllo verdadeàra-mente sagrado, de cal car aos pés o
que os seus concidadaos considerâo como a arca santa da
verdade ; finalmente, na ausencia de sentimentos mais
generosos, a prudencia o leva a reflectir sobre as terriveis
consequencias do perjurio, e
(0) Constantini, do Exame dos Testemunhas. p. 515, Kitka, do Corpo de
Dclicto, p. 404:
(10) As formulas ordinariamente escriplas nos Codigos (Cod. bav., art. 307 ;
Ordtrn. crim. da Prussia, § 377), nâo sào mais do que indicaçôes, das quaes o juiz
pode usàr com intelligoncia.
(11) Bcntham, Tratado, liv
J
4, cap. 10 e seguintes.
Si
Sobre uma vida inteifa de inquietaçGes e angustias até o diâ
em que fôr çonbecido o seu crime. Tal é o poder do jura-
mento., que deve ser rodeado de solemnidades proprias, cuja
formula deve-se modelar pelas sacramentaes autorisadas pela
f eligiao da testemunba ; e que sobretud© deve ser concebido
Uos termos mais aptes para impressionar o seu espirito (12).
O juiz nao deve délie fazer uso. a cada passo : applicar sanc-
çao tào grave aos actos insignincantes, séria abolir nos ju-
risdiceioûados a idéa da sua santidade e da sua importan-
cia (13), Nao é indifrente fazer prest o jufamento antes ou
depois do depoimento da testemunba (14) : esta verificado que
esta o observarâ coin maior fidelidade, quando é simplesmente
cbamada a confirmai* oâ facto» por ella an^eriormente decla-
rados : o sett depoimento, que lbe è apresentado na sua ta*
talidade, mostra-lbe toda a extensâo do jurameuto que se lbe
pede ; pelo contrario, quando jura dizer a verdade, algumas
vezes sômente considéra o seu jurameuto como uma simples
promessa-
Nao se deve omittir formalidade alguma do intîogatorio
judicial (15). O magistrado deve com mais rao esperar um
depoimento vëridico, quando o apparato da justiea impres-
siona vivamente a testemunba, disperta toda a sua attençao,
le a leva a pesar cada uma das suas palavras, lembrando-lbe
as graves consequencias, que podem provir délias.
.
(13) Bentham, tr&t&âo, 1, p, 78, n. 11, co la.—Vide o Ptoc. cri»i, rnp.,
t. % cap. 139, %
i!3) Vide o artigo do autor nos Arch. do îtir. crim., 1> p. 418.
(14) Vide o Proc. efim. comp.. Il, cap, 133.
(15) Exemploo tribunal deve estar completo.
il. «•
rts
"Quaiito & publicidade dos depoimeutos (10), ella se fécom-*
menda por si mésmà : a testemunha sabe que falla perante os
seus concidadaos ; sabe que no auditorio pôde tairez haver
mais de uma pessoa, que conheça como elle o estado real das
cotisas, è que poderifto denunciar a sua mentira, se fosse ne»
cessario : um duplo motivo, pois, ordena-lhe conservar-se na
verdade.
As garantias da segunda categorîa, como dissemos, refe-
rem-se ao modo do ittterrogatorio ; mas nao é mener a sua
importancia (17). Em primeiro lugar devem-se evitar dous
erros graves : 'as perguntas muito genencas flS), e as perguntas
suggesHvas muito especiaes. A testemunha acredita ter suffi-
cientemente respondido as primeiras,quando expôz summaria-
mente os factos por ella conhecidos ; ora, desde que ella tem a
faculdade de distinguir entre o que julga necessario dizer,-e o
que julga poder calar, dominada pela paixao ou pelo interesse,
occulta aquillo que o seu interesse, ou o do accusado, lhe
aconselha nao revelar, e desculpa-se com a sua cons-ciencia,
dizendo que o juiz nao foi minucioso. Se, pelo contrario, as
perguntas sâo muito especiaes, se, â força de querer se indicar
a testemunha os factos sobre que tem de depôr, estes sao-ïhe
expostos precisamente, de sorte que ella tenta que
responder—sim ou nao (19), cahe-se no outro es-
(16) Bentham, Tratado, I.1, % cap. 10—Idem, Rationale, 1, p. 54.
(17) Bentham, Rationale, 1, p, 445.Constantini, 1, cap., p. 467.
(18) Exemplo : pergunta-se à testemunha o que sabe sobre o que se pas-
se u a 12 de Janeiro. Esta pergnnta feproduz-se frequentèmente no pro-
cesso proparatorio em França.
(19) Exemplo : pergunta-se : A. estava présente ï ou •• B. trazia uma ca-
saea verde ?
83
colho. A testemunba leviana e superficiel, sem se inv
rportar com as consequencias da sua declaraçao, apressa-se
ein dizer tim, aproveitando-se da occasiao, que se lhe
proporcionar para se tirar de embaraços. A testemunha mal
intencionada e perversa, nao obstante nada saber dos factos,
p<5de tambem aproveitar-se da occasiao, e res-poader
tambem — sûn; engana o juiz, que acredita que o seu
depôimento é consciencioso e baseado no conhe-cimento
pessoal da testemunha, que nunea o teve.
Finalmente, dissemos que, para dar à prova testemu-nbal
toda a força de que é susceptivel, é mister que o juiz possa
informar-se sobre a pessoa da testemunha, ao menos tanto
quanto é necessario para apreciar a sua veracidade.
Quando o magistrado dà credito à testemunha, suppoe que
esta vio e quiz dizer o que vio : donde se segue que lhe da
conhecimento de todos os factos, nos quaes se baséa esta
supposiçao (20). As garantias desta natureza sao derivadas
das faculdades intellectuaes, da postura da testemunha e da
ferma exterior do seu depôimento. Aigu mas vezes basta uma
vista d'olhos para reconhecer que a testemunha nao podia
ter observado de modo conveniente ; a paixao que trans-
(20) Por isso Adriano disse com razâo, 1.3,$, 8, D. de Testibus ; Tesli-bus
se non tettimoniit crediturum (S).
(S) O imperador Adriano dirigio um roscripto a Junias Kufinus, pro-consul
da Macedonia, declarando, que acredita nas testemunhas, c nSo nos
testemanhos. As palavras da epistola concernentes sào as seguin-tes : « Tendo
Alexandre accusado Apro perante mim por certos crimes, e nào os tendo
provado, e nein produzido testemunhas, queria fazer uso dos SPUS
testemunhos por escripto, o que eu nào adWtto, porque costumo intorrogar
pessoal mente as testemunhas : remctti-o, pois, ao présidente da provincia,
para que este se informasse da vida a tacs testemunhas ; devendo ser
exilailo no caso de nào provar a sua accusaçào.
S3L
iparece nas palavras, certa hesitaçao a respeito de certas cir-
cumstancias, um embaraço mal dissimulado em presença dol
juiz, e que mostra o desejo de nao dizer tudo ; certas tenta-
tivas para illudir uma pergunta, sao outros tantos aymptomas
que guiao a justiça na apreciaçao do depoimento téstemu-nhnl.
Ora, sob o regimen do proeesso no systema das peças
esfariptàs, -nnicas fontes donde o juiz definitivo pôde derivar
a sua decis&o, e que a instrueçao lhe transmitte mudas e
inanimadas, a quelle tem entre maos uma letra morta, que
nao lhe permit/te, nem ver, nem ouvir a testemunha, faltando-
lhe todos os meios de verificar estes symptomas da verdade
desta. Por mais consciencioso que seja o inquisidor, nao pôde
reproduzir todos os caractères fugitivos e indivi-duaes do
depoimento exterior ; e a falta de publicidade naol fica
supprida, obrigando-o a consignar em um proeesso verbal
especial as parti culavidades da attitude dar testemunha.
Quando a testemunha balbucia, e se perturba ; quando hésita e
retracta-se logo depois de ter ftillado, o juiz, se conhece o
coraçao "humano, logo conclue que nao se deve prestar ab-
isoluta ao seu depoimento. Has nao é tudo ; a publicidade
dos debates, e é este o seu principal benefîcio, facnlta-lhe
ainda fazer perguntas mais apropriadas, e esclarecer muitas
circumstancias, que ficariao obscuras, se o depoimento
existisse nos autos, e nao fosse feito perante elle. O inquisidor
nao julga definitiv ameute ; por isso nao liga bastante
importancia a uma multidao de pequenos fâctos que passao
desapercebidos ; mas o juiz definitivo, pelo contrario, vai
procurar os fundamentos da sentença nos elementos da ins-
trueçao ; e, portanto, melhor do que ninguem esta habilitado a
verificar, se a prova testemunhal é produzida como convéra
(S).
(S)'Entre nos as testemunhas devem ser juramentadns conforme a sua
»n
CAÇITULO XXXl$.
OUCIAÎÎISAÇÂO DA PUOVA TESTBMUNHAL, SKOCNDO A DtVERSIDAOE
DAS LKQISLAÇgKS.
Todas ta legislaçoes crimiuaes clasisinc&o o testemunliol
entre as provas ; mas as regras especiaes concementes fi,
admissao de certes testeraunhas, as formalidades do inter-
rogatorio judicial, etc., etc., différent segundo os priuci-
pios fundamentaes de cada uni* destas legislaçoes.
E' fora de du vida que a diversidade dos sy stem as accu~
satorio e inquiritorial produx différences profundas (1).
Na luta entre o accusado e o accusador, que constitue o
processo accusatorio, -se-oa face a face guerrearem-se com
o auxilio de todos os meios. O accusador esforça-se em con-
vencer ao juic da culpalnlidade de acu adversario e da ver»
dade das suas proprias allegaçoes, e o accusado, da hnproce-
dencia da aecusaçao ; este ataca todos os meios de que M ser-
roligiâo. (Cod. do Pr oc., art. 86), o a rllaa se dovem faz«r as perguntas re-
feridas ueaso artigo, para vérifie ar a sua identidude, o valor do sou depoi-
rnonlo, as rolaçôos quo as prcndaiu as partes. Deveni ser inquiridas do Titra
voz. cala um i dl par si, « soparadamente das outras, do borto que estas nao
ouçào o qwj dix a qua esté dapondo, i> nom mesmo o que dix o au-torou réo
(Cod. do Proc., art. 88). Os sous depoimontos devom ser escrip-tos polo
oscrivâu. e por ollas assignados, polo juix e partes (Cod. do Proc-, art*. 87 «
113), salvo perante o jury, ondi so dévora ser escriptos, se as partes o
roquerorem (Aviso de 'l de Novembre de 183.1). Séria ronvenlente, por causa
dos Mtursos. qno os dopoimentoa dados poranto o jury fassent escrip tos.
Devem ser inquiridas pelo juiz compétente, o «o reaidtremlôra, por precatoria
desto. E' uma importante garantia para os direitos du defeza a di sposiçab do
art. 40 do Cod. do Proc. Finalmonte, havendo diver-gencia entre us te-
itemunhas, podem ser c&readas, ou •k-oAcio. ou a reque-rimento das partes ou
juradus. para se conhecer quai lai ta a verdade. .(Cod. do Proc., art, 00.)
(1) Carmignani, Dette Isqyi, 3 te., p. 160.
86
vio o accusador, injerroga com este fini as testemunhas que
este produzio, fa-las cahir em contradicçao e esforça-se em
denionstrar queellas sao indignas de (2). Ora, nâo sendo as
testemunhas, que ambas as partes produsem, sen&o armas
cujo alcance cada uma trata de diminuir, d'ahi résulta para o
accusado um direito illimitado de interrir no seu interro-
gatorio ; résulta ainda o seguinte facto necessario : que o seu
intecrogatorio nao pôde ter lugar senao em presença de ambos
os adversarios. O principio da aceusaçao tem tambem por con-
sequencia necessaria crear numerosas restricçoes a admissibi-
lidade de testemunhas ligadas ao accusador por laços muito
intimps ; o legislador suppoz com razâo que as suas déclara-,
çôes seriao parciaes, e se limitariflo a reproduzir os articulados
do accusador : para exemplo, citemos os seus parentes proxi-
mos e os seus famulos. Sob esse regimen, expressao fiel das
idéas pppulareg, a lei deve evidentemente mostrar-se mais se-
vera em relaçao a certes individuos. cujo testemunrepelle, e
cujo interrogatorio prohibe. A publicidade da formaçao da
culpa, tal como é no processo accusatorio, lugar as
exclusoes. O povo, que esta présente, se apressaria em
condemnar a admissao de testemunhas dépendente3 do accu-
sado, ou seus proximos parentes : coïloca-las em face délie e
sob as vistas do auditorio, chama-las a depôr contra aquelle
aquem estao ligadas por tftntos laços, séria vîo-lentar a
natureza, e impôr-lhes ura doloroso constrangi-mento.
Bastariao sdmente estas razoes para- produsir nos espiritos a
idéa da sua total inadmissibilidadê'. Por tanto a primeira
divisao que deve ser feita é em testemunhas ca-pazes e
incapazes (ou absolutamente inadmissiveis).
No processo inquisitorio um principio contrario dâ ori-
, (2) A reinquiriçâo do debate inglez offereee um perfeito spécimen
destc processo.
8*
gem a outras consequencias. Conhecem-se os caractères
dominantes deste processo, que caminha lentamente, passo
a passo, colhendo, no interesse da manifestaç&o da ver-
dade, elementos diversos, dos quaes o juiz do plenario
terà de dedusir os motivos de uma justa decis&o sobre os
factos verdadeiros on falsos da accusaç&o. O inquisidor
deve seguir até o fim os mais pequenos vestigios, pois que
estes podem conduzir à verdade, ou ao descobrimento de
indicios novos e importantes ; e qualquer que seja a pessoa
chamada a depôr, em relaçâo ao accusado, ainda que pareça
pouco importante o depoimento que délia se espéra, é
mister sempre que seja interrogada, e que o mar gistrado
tente tirar lia informaçoes, como se diz na pratica. E' por
isso que o depoimento de um menor, de um parente, de um
cumplice, pôde ter no processo notavel im-portaneia ; e é sô
a afinal que o juiz, tendo sob as vistas todos os materiaes
fornecidos pela instrucç&o, os examina, compara uns com os
outros, e indaga quai o valor de 'cada um dos depoimentos
produzidos. Neste systema é maior o numéro das
testemunhas admissiveis, pois o legislador prudente nllo
deve augmentar demais o numéro das exclusses, porque
isso em resultado diminuir fontes preciosas da verdade. As
testemunhas, na frase de Ben-tham, sab os ouvidos e os olhos
da justiça (3). Séria impo-litico cerrar-lhe estes ouvidos e
estes olhos, e tirar-lhe assim os meios de certificar-se da
realidade da cusaçao. Do facto de ter sido um homem
condemnado à pena de prïsao por um delicto, n&o se deve
concluir, em regra gérai, ser inadmissivel o testemunho de
todo aquelle, que tiver sofirido a pena de pris&o : é verdade
que este indi-
t
(0) Bentham, Trâtàdo, II, p. 93.
HH
viduo pôde vir mentir à justiç ; mas é melhor deixar sempre
ao criterio do juiz a faculdade de apreciar o gr'âol de confiança,
que elle merece. Bahi résulta que no
<
processo inquisitorial ha
très classes de testeuiunhas : a das ad-misaiveis, cujo numéro é
maior que no processo accusa-torio, a das absolutamente
incapazes, e a das simples/ mente suspeitas ; estas, por ser
duvidosa a sua veracidade, sac pelo legislador
recommendadas à attençao do juiz, a quem tambem é dada a
faculdade de détermina? ate que ponto podem ser acreditadas-.
No processo accusatorjo, as testemunhas produzidas pelo
accusador depoe no sentido de quem as produz ; doude
derivao conseqUencias deci-sivas, como jà vimos ; mas uo
processo inquisitorial assim nao acoutece. O inquisidor convoca
ex-officio todos aqUeV les que o podem auxiliar no
descobrimento da verdade \ e a sua missao nao deve limitar-se
a fazer perguntas tendentes ao descobrimeuto do delicto : a sua
solicitude imparcial deve preoccupar-se ao raesmo tempo tanto
com a culpabilidade possivel do accusado, como com a sua
inno-
1
cencia. O processo inquisitoriai allemao, secreto em
todas as suas phases, dévia, com mais razao do que qualquer
outro, ser menos exclusivo em relaçao à admiss&o de teste-
munhas ao depoimento. Compcehende-se que o caracter
secreto do processo levé o magistrado instruetor a diri* gir-se
de preferencia as pessoas ligadas ao accusado por laços intimos
-, a testemuuba acha-se menos constrangida depondo n,a
ausencia deste, e longe do publico *, além disso os resultados
possiveis do iûterrogatorio se lhe apparecem em um futuro
longinquo ; eatretanto que, «e tivesse de comparecer em um
debate publico e depôr directamente contra o accusado,
supporia dar-lhe um golpe em cada uma das suas respostas.
Mas uma circumstancia sobre tudo contribue a dar um
89
caracter decisivo à organisaçao da prova testemunhal -, ê a
composiçao dos tribunaes, jque, ou sao justiças populares em
certes paizes, ou sao collegios de juizes jurisconsultes em outros.
No primeiro caso, convem antes de tudo estabelecer o priucipio :
que os jurados, sahidos do seio do povo, sEo mais aptos para
conhecer as testemunhas, a sua individualidade, a consideraçao
de que gozao entre os seus concidadaos, e por consequencia,
para dar a cada uma o grâo de coufiança que merece : por issu a
lei é ampla em relaçao a admissao "das testemunhas, e deixa aos
jura-dos o arbitrio de dëbidirem a respeito do valor dos de-
poimentos produzidos. Si se trata de juizes jurisconsultes, a lei
deve peux o seu arbitrio por normas précisas e rigo-sas : ella nao
quer que possao pi'estar nao merecida a certas testemunhas, e
para obviar a esta perigosa tenden-cia, estabelece classificaçoes :
testemunhas simplesmente suspeitas, e testemunhas
absolutamente incapazes ; e como a sua disposiçao é gérai, nao
podem absolutamente prestar as pàlavras daquëllas por ellus
declaradas indignas de crédite
Estas summarias consideraçoes e'xplicao as differenças que
se encontrao* no estudo comparado das legrèlaçGes nesta
materia. \
Entre os Romanos (4), o principio da accusaçao e apu-
blicidade do processo provocârao numerosas instrueçoes do
legislador a respeito das testemunhas que o accusador tinha
direi'to de produzir (5). Depois a jurisprudencia e a sabia
(4) Ayratit, A Oriem, formalidade, &, &.., p. 432. 0) Ç.
3, § 5.— L 18. 18, Dig. do Testibus (S) :
(9) A primoïra lei classfica em très classes as testemunhas inadmis»
siveis : 1», aquellas que devem respeito à pessoa contra quem vào dépôt I
II. **»
oo
duutriaa dus iurisconsultos trouxerao mais tarde flovas"
idéas (6). a respeito da no depoimento testemunhal ; o
debate publico tambem deu frequentemente occasiao de
apreciar racionalmente as qualidades individuaes das teste"
munbas produzidas nas causas j e cedo foi admittida a
regra, que o juiz, verdadeiro jurado sob o imperio da lei
romana, era o supremo arbitro da vida à testemunha,
depois de pesadas devidamente todas as circumstancias (7).
Nas suas constituiçoes (8) os impei'adores occuparflo-se de
t
2
a
,-as que tem fraquera de ospirito ; 3", as que tem a nota de infamia,
Exempliflca com os libsrtos, os comdemnados qu° nào obtivefSo res-
tituiçâo in integrum, os presos, os que locarào seus serviços para com-bater
com as feras, as meretrixes, os condettinados como testemunhas peitadas, e
mesmo aquelles que, ainda o comdemnados, tivessem roce-bido dinheiro
para depôr. A segunda contem um preceito de Papiniano» recommendando
ao juiz que preste attençào, para saber que credito deve dar â testemunha
que foi condemnada como calumniadora, e que nem a lei Romania, e
nem as leis .Tulias tinhào repellido do depoi- -niento. Na terceira ulo
conclue que, em gérai, as raulheres podem ser testemunhas, porque a lei sô
excluio as coiidemnadas por adulteri
(6) Principalinente o titulo todo do Digesto de Testibus (L. 22 tit. 5) é
a sua expressSo fiel.
(7) L. 21g 8, Dig, de Testibus {S). Esta lei, quando concorrem muitas
testemunhas, manda que o juiz dâ mais credito aquellas que entender
em |sua consciencia, e queo deve se regular pelo maior numéro
das testemunhas, mas pela sinceridade dos seus depoimentos.
(S) Por exemple: L. II, C/de Accusation; L. 9, "C. de Testibtis (S).
(S) Os impsradores Honorio e Theodosio prohibirào aos libertos de-
pôrem contra os seus patronos, por causa da ingratidào ; ainda que sejào
obrigados a comparecerom em juizo. E' o que contem a segunda lei. A
primeira dispôo que, nào obstante o accusado de homicidio ter
s
ido uma
vez processado e absolvido, pôde outra vez ser accusado pelo mesmo
crime por outro, e condemnado, se houvcr prova.
#
Ol
certas particularidades da prova testemunhal (9); algumas ve-
zes a declaràrao plena e sufficiente para .servir de base n
uma condemnaçao : outras vezea decidirao formalmente
x
que
o juiz nao podia condemnar pelo depoimento de uma tes-
temunha singular (10).
As formas inquisitoriaes e crétas do processo canonico,
produzindo uma organisaçao correspondente das regras da
prova, levârao os prazistas da média idade pouco a pouco
(9) L. 2. C. Quorum appell. um recip.— L. 8, G. ai Leg. Jul. ie vi.
L. 16. G. de Poznis.—L. 25, C. Probat. (S)
(S) A primeira. nao obstantn prohibir que se receba a appellaçâo do
condemnado pof crime capital provado, todaviu abre uma excepçào, fundada
na equidade : quando o accusado nào confessou o crime, ou quando a sua
confissâo foi arrancada polos tormcntos. A segunda Ici contera urm const. dos
imperadorea Valentiniano, Theodosio e Arcadio condemnando ao ultimo
suplicio os escravos convencidoa dp crime da violencia, ae o
eommetterào"ignorando os senhorrs ; o se eommetterào. por ordom c ameaças
dos sonhores, estes deviào ser -leclarados infâmes e privados dos priyilegios
inhérentes & sua patria ou origom, e aquelles aeviâo ser condemnados aos
trabalhos publicos ; o nestas mesmas p"nas erâo tambem condemnadas as
possoas de ma reputaçâo e infâmes, as reincidentes no mesmo crime, c até o
proprio juiz dévia ter a nota da infamia, ai se provasso ter elle retardado a
puniçâe do crime de violencia provado, ou ter repellido a accusaçito, ou ter
absolvido o accusado estando provado o crime, ou ter-lho applicado pena
menor do que a decretada na dita lei. A terceira ordena ao juiz que, antes de
pronunciar contra algum accusado a pena capital ou outra pena sevcra, attedda
a que este seja convencido de tal aorte pelas provas, que a sua confissâo seja
quasi inutil' para se formar conviceào compléta do seu crime. Sobre a ultima
Lei vide nota (S) pag. 29.
(10) L. 9, C. de Testions (S)..
(S) A3 leis nâo pertnittem a ninguem que possa depôr cm causa
propria, _\
Q2
a uma classificaçao systematica das testemunbas (11); fizerao
uso dos textos das leis romanas, que determinao quaes as
testemu,nhas, que o
x
accusado nao pôde produzir ; declarârao
absolutameute inadmisswei» todos os inaividuos nas condi-
çOes das referidas leis ; depois, fundados tambem em aigu-
mas decisOes do direito romano e do direito cauonico, nas
quaes certas testemunhas sao indicadas como pouco solidas,
incluirao-nas em uma classe denominada das suspeitas. Um
tratado especial de Farinacius contém a exposiçao fiel das
theorias da época (12).
Mas tarde Schioarbzemberg, fiel as idéas do seu tempo,
sancciona o principio da obrigaç5o de produzir * duas
mesmo très testemunhas capazes para poder haver p rova
plena testemurulial (13); mas,coin quanto elle na Bambergueza
(art. 79) (S) se applicasse em définir exactamente as quali-
dades de uma testemunha capaz, todavia a Carolina (art. 66)
satisfaz-se com algumas brèves indicaçoes,e no mais se réfère
ao systema geralmente praticado.
No seçulo 18 a sciencîa deu mais um passo ; os juris-
consultes determinârao as eondiçoes daprova testemunhal
perfeita ; e, além disso, esforçarao-se em incluir definitiva-
mente as testemunbas em très classes, comprehendendo todas
sob as denominaes de dassicas, suspeitas e incapazes. Quanto
as ultimas, a doutrina probibio ao juiz instructor dar-lhes a
menor fé, nao deyendo mesmo ser intèrrogadas ; quanto as
suspeitas, o. seu depoimento nSo pôde constituir mais
(11 As opiniôes dominantes esjiào fielment© reunidas por J. Clams,
Sentent., g fin, qucest.. 66, n. 3.
(12) Farinacius, Tractut. de Testibus, Lugduni, 1589,
(13) Art. G7, 69, C. C. C.
(S) Codlgo do Bamberg, intituladoCostumes '.do Bamberg—Dii Boys.
Histoire du Droit Criminel des Peuples Modernes.
h -
03
do que uma simples presumpçâo. Estes principios domin&o
nas' leis moderaas da Allemanha.
0 codigo austriaco limita-se a indicar cm termos geraes
as condiçOes da prova testemunhal (14) ; e, sem sujeitar as
testemunhas a uma classifieaçao rigorosa, deixa ao juiz a
livre apreciaeao dos seus depoimentos (15).
A ordenaç&o criminal da Prussia (16) entra em mais
minuciosidades. Aponta as testemunhas absolutamente in-|
capazes (17), désigna os individuos que, sem produzirem
prova gal plena pelo seu depoimento, podem ser cliamados
utilmente a titulo de informantes (18), Mas, entre todas estas
prescriOes, ha mais de uma que se poderia rasoavelmente cri"
ticar; tirar toda a força probatoria a tanta gente, por exemple
aos depoimentos do genro, do cunhado, é tornar impossivel
muitas vezes a manifestaçao da verdade (19). E depois
(14) God. crim. austr., art. 403.
(15) 0 art. 403 assim se exprime.... As relaçUes pcssoaes da tcitermt-nha, ou
o conteudo do seu depoimento, nSo devem dar lugar à duvida que diminua a
sua veraddade. segundo um juiso impartial.,.. Todavia ha um ponto sobre o
quai o Godigo austriaco mostrou-se mais expli-cito, é quando trata da diflicil
questào do saber, se as deelaraçSes do co-autor do crime podfm convencer
(Vide art. 410).
(16) Ord. crim. da Prussia, art. 866.
(17) Nos termos da Oruën. ha oito causas distyictas de iucapacidade.
(18) O art. 357 aponta dozo causas, pelas quaes nào se pôde attri-buir prova
pleua ao depoimento da testemuuha.
(10) O accusado matou sua mitlhcr em presonça do seu irmào e do irraào
délia, mas aega o crime ; ainda que estas duas tastemunhas afflrmem o facto
sob juramento. a. condemnaçfio nào é possivel. nos termos da lei prussiana.
04
(que inconsequencia !) considéra a credibilidade da teste-
munha diminuida por c.ausa da differença da sua reli-giao
(20) ! Finalmente (o que aiuda é maior incousequencia), este
mesuio individuo, cujo depoimento a lei repelle, é eha-mado a
depôr em certos casos excepcionaes, por exemple, em materia
de alta trahiçao, de trahiçao coutra o paiz etc. e o juiz pôde dar
féao que elle dix sob juramento (21). E' justainente quando se
trata de taes crimes, e de todos aquel-les em que a liberdade
dos cidadaos reclama maiores ga-rautias, que sao mais para
temer os excessos e os abusos do poder ;, foi neste caso que o
legislador se mostrou menas severo em * aquilatar o credito
*das testemunhas.
Disposiçoes da mesma natureza nao se encontrao no
systema da prova do codigo pénal bavaro (22) ; mas a obxa
do legislador tambem ahi foi defeituosa à força de querer
prévenir todos os casos possiveis, e formar um corpo com-
plète de regras ; militas destas regras pela sua gérai com-
prehençao pertencem mais ao dominio da doutrina ; e a
generalidade dos preceitos, ou nada de novo ensina ao juiz
(23),ou difficulta-lhe a sua applicaçao à causa(24). Pode-se
(30) O art. 357, n. 8, déclara que os judeus sao testemunhas sus-poitas,
desdc que o delicto lugar a uma pena superior a 50 tha-lers de multa,
ou à prisao por seis semanas.
(21) Art. 858.
(22) Vide este Codigo, 8« parte, cap. 4.
(28) Assim, diz o art. 237, « que o depoimento, para ter plana força,
nâo devc absohttamente dar lugar a que se disconfie ntto ter a teste-
munha podido, ou nSo ter querido dizer a verdade ». Certamente o juiz
nada adianta dopois de 1er este preceito,
(24) Exemplo: résulta do art. 277 comparado com o art. 267 que uma
das condiç-ôes da validade do depoimento testemunhal é que nab seja
obtido por uma pergunta insidiosa. Uma pergunta insidiosa é se m duvida
sempre um pernicioso abuso; mas o mesmo juizo o se deve fazer
sempre e nacessariamente de toda s qualquer pergunta capeiosa.
©s
coia razfto criticar o codigo bavaro por ter creado uma multidfto
de iacapacidades em relaçfto ao depoimento teste-munhal (25), e
por prender em estreito eirculo a livra apre-ciaçao do juiz em
relaçfto aos depoimentos das tcstemunhas suspeitas (26). Krra
tambem em admittir a velha e gastft doutrina da meia prova (27),
fazendo crer ao juiz que deve submetter a prova a uma especie
de calculo mat hem a-tico.
Muito diversa theorin rage a prova testémunhal nas legis-
laçfies que ndmittem a jurisdiçfto popular : nestas nflo ha
prencripçfto em relaçfto as condiçoes da validade desta prova ;
nfto ha limitaçfto no numéro das testemunhas, nom distincçfto
entre as capaxes e assiupeiUu: aos juradon compete decidir,
se a aceusaçfto é verdadeira ou falsa, nfto sendo obri-gados a
dar contas dos seus motivos.
Tal é o espirito gérai da lei franceza. Algumas indica-çfles
nella se encontrfto quanto As condOes da validade
(25) Aasim o art. 278 déclara incnpaz de depôr como testomnha « todo o
indieiduo proccssado por delieto de calwnnia. « que ntto foi plendmcnte
absolvido ou * aquelle que recebeu alguma cotisa paru depôr' Em uma
ospecio, tratava-sp do faner vir a Nuremberg uma toatemunhn résidente na
França : a parte tinha interesse capital no seu depoimento, pois que ella
podia dar certas informaçôes. Prometteu-lho poil 500 florins para a sua viagem
e seu comparecimenlo em juizo. Mas, conforme a letra do Codigo. o juiz foi
obrigado a pronunciar a incapa-cidade da teatomunha sô por este facto.
(26) O art. 282 diz que « O testemunho da parte lesada pelo crime ttm pleno
valor em relaçSo ao corpo dé delieto ; mai o mesmo Mo acontece em rèlaçâo d
pessoa do delinquente. » Assim formulada em regra gérai, esta disposicâo e
demasiadamente severa, como faremos ver mais adiante.
(27) O art. 286 diz que O depoimento de uma testemunha maior
de toda a escepfSo feu meia fxoca.
OG
desta pïova, masj além de serein summarias, nao se referem
sen&o ao processo preparatorio (28) ; e, sobre este ponto, o
legislador teria procedido com aeêrto dando mais amplas
instrucçoes ao magistrado preparador» prewenindo-o contra
os'numerosos abusos que tiio facilmente sedâono processo
preparatorio (29). Na occasiao do-debate publieo a lei satis-
faz-se em dar ao présidente a direcçûo, do interrogatorio, e
deixa à sua prudencia a escolha e ferma das pergun-tas (30).
Infelizmente, porém, nao se iguala a posiçap do accusador e
do aecusado : o ministerio publieo tem o direito de interpellar
directamente a testemuuha ; mas o aecusado, ou o seu
advogado, n&o pode inquiri-la. senao pelo orgao do
présidente, de sorte que dépende deste muitas vezes impedir,
ou permettir uma infcerpellaçâo summamente intéressante
para o rép. A lei nao décréta a incapacidade ab-soluta de
classe alguma em relaçao ao depoimento teste-munbal ; o que
faz é designar algUtnas que nao pôdem depôr perante o
tribunal (31) : tambem nao falla em teste-munbas suspeitas,
sômente deixa transpaïecer algumas du-Tidas a réspeito de
muitos individuos ; e manda interroga-las sobre estas ou
aquellas relaçoes, que, no ponto de vista da lei allemS, as
fariao suspeitas (32); finalmente, limita-se a
(28) Codigo de Instr. Crim. art. 71 e seguintes.
(29) E' corrente em França que o interrogatorio das testemunhaa
muitas vezes nao é mais do que tûna série de suggestôes. H
•<30) Godigo de Instr. Crim., art. 319.
(31) Art. 323. Como os mais proximos parentes do accussado» o eon-
juge., os denunciantes recompensados pela lei.
(32) Art. 817. Pcrgunta-se-lhes, se sâp parentes do aecusado e em
que grâo, se estào a, seu serviço etc.. eU#.
9"7
chamar a attençâo dos jurados sobre certas outras relaçôeâ,
eomo para dar a medida da confiança, que Ihes é dévida (33).
Tal é tambem o espirito dos processos escossez e inglez ;
mas o processo inglez, como é sabido, riva quasi iuteira-
mente da common lato, que contem um grande nuro de re-
gras sobre a prova testemunhal, regras, que bera poucos
ignorao (34), que os jurados conserv&o em memoria e que
applic&o tao religiosamente como se o legLdador as tivesse
escripto. Na Escossia o accusado, ou o seu advogado, tem
direito de contestar a admissào da» .testemunhas, e os
jurados, o de apreciar o valor dos seus depoimentos ; e
dizem os commentadores (35) que algumas vezes é permittido
interrogaros menores de 14 annos (36), nao onstante pro-
hibir a regra o seu depoimento nos casos ordinarios. O pro-
cesso approxima-se muito da forma inquisitorial ; ttm mi-
nisterio publico ahi é encarregado da perseguiç&o directa
do crime; a lei nao se préoccupa muito corn os laços de
parentesco entre a testemunha e a parte lesada, por-que
suppQe-se que esta nao obra no seu proprio intéresse ;
quando as testemunhas sao parentes proximos do réo, per-
gunta-se-lihes se querem depôr, e, no caso affirmativo, sao
ouvidas (38). Quanto ao conjuge, nâo é permittido cha-
(33) Oomo, nos termos do art. 323, o denunciante aSo recompensado pela
lei; o jury nca conhecendo a sua qualidade de denunciante.
(34) Vide o art. do autor nos Nav. Arch. âo Dir. erim. XIII, p. 291.
(35 Vide principalmente Hume, Oommentarios sobre a lei escosseza 4m
matériel criminal. Vol. II (odiçâo de 1819, p. 328 e seguintes).
(36) Hume. I. c„ p. 329.
(37) Hume. p. 339.
(38) Id, p. 335.
il.
ma-lo a depôr em vîrfcude dos laços e da affeao eonjtt-| gai
(39), ealvo o caso de necessidade absoluta (40). Outra par-
ticularidade notavel, mas que se explica pela influencia do
direito romano na lei escosseza, é que uma se testemnnha nâo
pode fazer plena prova, salvo se o seu depoimento fÔr
confirmado pelas circumstancias de causa (41).
Os praxistas ing-lezes (42j distinguera entre a inadmis-
sibilidade absoluta da testemunba (incompetency ofthevUnas.
e o crédite que lhe é devido (crtdibility). A questao da
admissibilidade é materia de direito : donde se segue, que é
mister recorrer à eommon Une e es regras por ëlla for-muladas
sobre a admissao do depoimento ; que se deve examinar logo
no principio do processo, se pôde ser ouxida a testemunba
apresentada pelo accusador; e finalmente que o juiz , no caso
de contestaçSo, décide, ou, no caso de duvida, sujeita o ponto
litigioso & decisSo dos quinze grandes juizes (ont'rora erao sô
doze) que decidem de direito. Este facto explica a existencia
de uma multid&o de deci-soes nesta materia nas collecçCes do
direito inglez (43). O numéro das testemunbas nâo ad aussi
veis vai diminuindo cons-tantemente, e todos os dias ganba
terreno a doutrina, que quer dar à prora todas as facilidades
possiveis e deixar aos jurados a livre apreciaçâo da sua
fidelidade : por isso
09) tt»J. 337. I
*>o
Vemos,que os proprios impubères nao s&o considerados pela leî
ingleza absolutamente inhabeis ao depoimento ; s&o submet-
tidos a uma especie de exame preliminar ; depojs de reco-
nhecer-se, que elles teui consciencia da gravidade dojura-
mento, idéas sas sobre Deus e sobre a immort alidade da aima,
o seu testemunho é admittido e defere-se-lhes juramento,
desde que a sua intelligencia se mostra sufficientemente des-
eu7olvida (44). Os individuos condemnados por certos crimes
(félonies) s&o declarados incapazes (45) ; mas esta incapa-
cidade nao se amplia âquelles, que comrnetterâo delictos
simples (misdemeanors) (46). O parentesco nâo é um motivo
absoluto de exclus&o (47) ; sô a mulher (e isto se explica pela
idéa ha longo tempo prédominante da sua sujeiç&o ao
poder marital) nao pôde depôr contra seu raarrdo (48),
salvo em certos casos especialissiinos (49). Competindo ao
juiz o illimitado direito de decidir sobre o credito devido ao
depoimento testemunbal, a loi ingleza deixou de esta-beleceç
regras a respeito ; nos tratados especiaes se en-contr&o,
em muito pequeno numéro, algumas especies, nas quaes os
jurados tiverao de decidir do valor das teste-munhas, que
alias deveri&o ser classifîcadas entre as sus-peitas ; e a este
respeito os autores ensinSo algumas regras
(44) Starkie, Da Prova.— II, p, 283.— RusseL I. c, p, 590.
(45) Philips. I, p. 27.
(46) Acto do Parlante uto de 27 de Junho de 1828.
(47) Philips, p. 46.
(48) Russel, II, p. 604.
(49) Quaado< por excinplo, soffreu algiitn damno pelo acto de *u
marido.
ÎOO
fun&adas uo uso, com as quaes os jui'adds se confornifto
(por esemplo, no. caso em que a testemunha, é co-autora
ou complice) (50); Finalmente, a apreciaçao, que elles tem
de fazer, Ibes é faeflitada pela inquiricâp (exammatiorkin
chÀef)
r
que a cada uma das testemunhas faz a parte, que
as produz, e pela reinquiriç&o (oross-examiruition^ feita pela
outra parte, contra quem depOeni. Este segundo interro-
gatorio tende ordinariamente a faze-las cahir em contra-
dioçâo e, por consequencia, a diminuir 6 valor dos seus
depoimentos (51). H
CAPITULO XL.
; DO CONSTRANGIMENïO AO DEPOIMENTO.
Todo o cidadao é obrigado a prestar o sëu concurso -a bem
do Estado ; ora, sendo a perseguiçao e repress&o dos crimes
necessarias à manutençao da segurança e da ordem pif-blica,
segue-se que o depoimento à requisiçao do Estado, em
materia criminal, constitue um dever civïco (1}/ Séria
asseguxar a impun-idade de todos-os crimes, re'cusar ao Estado
os meios de promover o depoimento testemunhaL, que mui-
tas vezes é o unico meio de constitua*-, a prova requerida.
Dabi decorre o direito de obrigar todo o individuo (2),
(50) Philips. I. c. p. 36.
(51) Vide o Proc. erim. comp„ t. 2. cap. 155.
(1) Vide o Proc. erim. camp., t. cap. 67.
(2) L. SI § S D.— L. 16, C. de Testibtts. Nov. 90.— Cap. 5 de Testibus
cogendis (S).
(S) A primeira loi nào tem confiança no depoimento de um gladiador. ou
pesssoa semelhaivte, o tanto que o majida metter em tormentos.
xoi
que récusa absolutamente compârecer, ou explitar-^se sobre
certas circumstancias', ou prestar juramento.
:j
M<riguVèni pôde
ser isento do. oamprimento èesté dever eivfco, quer sob o
pretexto de que o seu depoimento o poderia pre-judicar, quer sob
o de ter feito promessa de calar todè, ou parte da verdade, quer
sob o de, opinioes moraes e rèliV giosas prohibitivas do
juramento (3). Toda a convença'o ciOn-traria aos deveres sociaes
é nulla, e as opinioes individuaes jamais poderiao desligar os
cidadâos das suas obrigaçCes para com o paiz. Mas a sociedade
por sua vez, impoudo taes deveres, nao deve promulgar leis-
positivas contrarias àt lei natural, ou a outro dever social ; pois
que toda a collisao neste sentido dâ necessariamente causa a
funestas consequencias. Quando a lei natural esta em flagrante
contradicçao com a lei positiva, esta com certeza daixa de ser
observada : chamai os proximos parentes do accu-sado a
depôrem contra elle, e este facto torna-se-ha logo évidente. O
legislador faria mal em obriga-los a fallar, pois
A segunda «'egula o caso de sci-om outra vez ou vidas perante a.justièa as
testemunhas, que antes tinhào depostb perantc os juizes compro-missaHos. A
Nov. 90 contcm nos sens 9 capitulos as sogui n tes Te gr as : l
a
que as
tastemunhas deve m ter a reputacào iliesa ; 3* que os seus depoimentos devem
ser escriptos ; 3* que ao juiz compete o prudente arbitrio 4e lhes dar em sua
conscienoia a fé. que merecarem ; 4* que as testemunhas podem ser inquiridas
.no lugar onde residem, indol depois o seu depoimento para o lugar da causa ;
que os inimigos nâo podem jurar na causa dos seus inimigos ; que os
mediadores ou con-ciliadores entre as partes, antes de agitada a causa
judicialmente, podem depois jurar, se as partes concordào; 7* que as
testemunhas nâo devem depôr sënào em presenea da parte contra quetn
flepôem ; 8» que os autores, réos e advogados prestem juramento para evitar a
fraude. A ultima diz~si Miter- veritas neqUiveHt' cïïci, sunt per censurant
cccïesiasticain rompeltenâi.
(3) Bourguignon, Jurisprudencia, II. p. 21, 23.
iO»
que, collocados entre o seu dever e as suas aftmço'es na-turaes
mais poderosas, deixariao por causa destas de obedecer
âquelle e sacrincariao a verdade aos intéresses do accu-sado ;
alem disso, ainda que a testemunha fosse virtuosa, até ao
estoicismo, séria impor-lhe um supplicio real, obriga-la a
fallar neste caso ; e os seus concidadaos talvez a censuras-sem
pela infracefto dos deveres da natureza. Quaado o depoi.
mento fosse favoravél à defesa, séria pouco decisivo no pro-
cesso, pois que facilmente se poderia désconfiar terem sido as
suas palavras dictadas pela affeiç&o de familia.
Estabelecidos estes principios, vejamos quaes os systemas
mais frequentemente seguidos pelo legislador. Algumas vezes
-(4) este décréta a exclusao absoluta do parente proximo, quer
esteja disposto, quer nao, a depôr, dominado sempre por uma
idéa de ordem publica, que tomou por norma. invariavel.
Outras (5), o legislador preocçupa-se de perferencia com a
situaçao penosa da testemunha chamada a depôr ; évita usar
de constrangimento e deixa-lhe a opç&o do silencio ; se ella
quer depôr, nao pôde queixar-se de ninguem, pois que foi
livremente dado o seu depoimento e livremente se obrigou
pela juramento a. dizer plena e in-teiramente a verdade.
Todavia,s6 o mais proximo pareutesco é que deve isentar a
testemunha da obrigaçao de depôr (6);
(4) E' o systema da lei franceza, Ood. Instr. crin. art. .822.
(5) E' o systema das legisloes allemàes, Vide o God. austr. art. 377.—
Ord. da Pruss., g 311,— "Lei bavara, art. 211.
(6) L. i. 5. D. de Testib.— (S)— Gluck. Comment., II, p. 182— Tittmann,
Manuah, III Parte, p. 395.
(S) As leis citadas dizem que ninguem pôde ser obrigado a depôr contra
seu sogro ou genre padrasto, ou madrasta, primo-irmâo ou prima e primo
segundo e aquelles, que estào um grâo mais proximo ; o liberto do
accusado ou de seus filhos, pais, marido, mulher contra aquelle e vice
versa ; o noivo da fillm ou da mai é considerado genro ou padrasto.
103
os laços entre esta e o accussado devem eer tao in-timos, que
deein lugar a que a dita obrigaçao offenda realmente as affeiçoes
derivadas do laço natural. Nesta categoria devera ser classfieados
os descendentes, os innaos e irmaas e seus filhos (7), os nffins do
primeiro grao. Pelo mesmo motivo nella se deve tambem
classificar os espo-sos (8). A regra uma vez estabelecida deve ser
serapre invariavel ; e é erro grave permittir que ella seja dero-
gada no pretendido caso de impossibilidade de procurar-se
verdade por outra modo (9) : abre-se assim a porta ao arbitrio ; e
depois, mesmo neste caso exceptions!, como nos outros,
subsistem em toda a sua força as razOes, que se oppOem ao
depoimento dos parentes proxtmos.
As consequencias, que decorrem do conflicto de dous de-veres
contrarios, produzem-se com toda a energia nos indi-viduos, para
os quaes é um sagrado dever qalar os factos, sobre que sâo
chamados a depôr. Todavia, é mister que eôse sagrado dever seja
declarado e reconhecido pela lei positiva; um compromisso
voluntario de tal natureza, por exemplo, aquelle pelo quai
alguem se comprometteu com o malfeitor a* guardar segredo
sobre 6 seu crime, nao pôde isenta-lo de depôr em juizo ; da
mesina sorte, se a lei isentar do depoimento em materia civil, a
excepçao nao poderà ser ampliada alem dos seus termos ; assim
tambem, se o legislador impuser como um dever a algumas
pessoas o nao divulgarem a terceiros os segredos, que llie f orao
con-fiadôs em razao da sua profissao, d'abi nao se segue que
(7) L. 4.. D. de Teslib. Strecker, de Fratre contra Fratrem teste.
Erdord.. 1786.
(8) Vide o Pntc. crim. contp., h cap. 67.
(9) Vide C. g e uli., -«te TesHb.
104
oa raedicos *H(1O) tenhîio, de plang, o direito 'de negareni-se
ao depoimento, quand©-;sâo ci tados para o darem no processo
r.riminal; séria mister que a iseiiçîio fosse decretada por lei
expressa ; e ha no processo un intéresse da verdade e da
ordem :puHica, que préfère, a todas as consideraçoes
particulaves.^.Mas devera coin razao ser dispensados de depôr :
1* os advogados e defensores, em relaçm àquillo, que oa sens
clientes lb.es confiarSo a bem da suadefesa (11) ; '2°
ftmccionarios publicos (12), em relacao aos se'gredos do seu
cargo, nao os tendo autorisado a depôr «. admistra-çao
superior ; d'-finalmente os eccleaiastieos, em relaçao aosl
fncto» constados sob o sigillo da confissao (13). Para os
câtholieos, o silencio é inesmo M dever imposto pela lei
espirituàl (14) ; s&o sagrados os segredos do confessionario }
e se a lei civil obrigasse o confessoï a divulga-los, pro-
(10) Spangenberg na Revista
(
editada por Lindej 1IL p. 78.
'(lï) Vide a Lei bavara de 21 de Jan. 1819, no Annuario— de Ôœner,
1, Pi 97.
a
,(•18) Ood. da Prussia. $ SIS. Ood. bavaro, art. 204.
(13) Andréa, Arch. «o». ào Mr. TfHnJ.'.'S, n. 25,. II, n. 6.— Ifculler,
QuestZes de iWrH Ecoles., na sila appHcaçSo d lei de Weitnai
4
. Wermar,
1823, n. 2.— Droste Hulsbof, Questfies sobre n philosophia do Dir., Bonn,
1824, n. é.—T.Hehlein, de Sigillo cottfessionis, Heidëlberg, 1828.Breiger,
do Segredo da confiMstto e do 'Dir. do Soberano'. Hahover, 1827.— Vide
o Proo. çrliïn. comp.» cap. 67. •
(14) Can. 2„ dist. 6, Pasnit.C. 2.,
;
13* do Excessibus prœlator.—C,
2, do Offre, judic. ordinar., C. 12, nit. (S).
(S) As leis da Igreja sào unanimes em proclamarem a jnviolabili-do
segredo da confissao. O quarto concilio do LatrSo o declarori ïnyio-lavel
em todos os casos e sem excepçâo alguma.
io.%.
riiovcria a sua compléta violaçao ; obrigaria o sacerdote a
commetter um delicto eeclesiastico sugeito a uma pcna severa ; e
finalmente desfcruiria completamente a iustitui-çEo da confissao
(15) ; com effeito o que leva a maior parte das consciencias
culpadas a serem francas, é saberem que um roligioso silencio
éimposto ao sacerdote pov uma lei, que ninguem p6de força-lo a
infringir. Em relaçao, pois, a tal porsonagem o priucipio nao
soffre excepçâo àlguma (16) ; querer abrir alguma, é edificar em
terreno fôfo ; é dar ao juiz uma faculdade, que poderia degenerar
em arbitrjo e minar os fundamentos da confissâo. Supponhamos
que o legislador obriga o sacerdote a depôr nas causas que
iuteressao a salvaçûo do Estado : neste caso deverâ ser decidida
a questâo prejudicial de saber em que casos se-pôde considera-la
compromettida. Si se julga que o padre deve depôr, porque pôde
salvar uma innocente victima de uma grave accusaçao, o
inquisidor, todas as vezes que prender um individuo, julgar-se-
ha logo autorisado a exigir o depoimento daquelle, presumindo
que o accusado a elle
(13) As lois rao;lernas tambem isMitùo o confessor. Vida o Cod. il a
Prussia, § 313.— Cod. bav., art. 304.— Em relaçào à Fronça e a In-
glaterra vide o Froc. crim. comp., 67. (Em relaçào â França, vcja-sa
o art. 378, do Cod. Peu., o estudem-se as consoquencias, que délie de
1
dusirâo a doutrina e a jurisprudencia, consequancias militas vezes
amplissimas, e nem sempre uniformément?, admittidas.— Vide Ch.auveau
et Helie, Theoria do Cod. Pen, VI, cap. 58, p. 517.— Legraverend, t.
I. cap. 6, § 3). {X. d. T. F.)
(1G) Vide a dissertaçîîo do antor nos Arch. do DiV. Ci'im. VIII, p.
"t-î.— Vide ainda Falfc, Gtueta juridica d'Elvcr, 1829. n. 88.— Lippert,
Awnaes do Dir. ecclesiastico. liv„ p. 36.— (Sobre a questâo dos crimes
contia o Estado e o principe, vide os art 103, 10t> 105, 106, 107 do
Col. pen. francez de 1810, abrogados pela lei de 1832.— Vide tambem
Lp«raverend, t. I p. 239, rtip. fi, IIL g 2) '.V. d. T. F.)
H. !'•
H
106
se confessou ha pouco tempo ; verâ nisto om meio mais
simples e mais rapido de aaber, se o accusado é ou nao o
autor do facto. Quanto aos protestautea, uûo estau-do sugeitos
como os cathoiieos a confîss&o auricular, e aos regiméntos
ecclesiasticos, o silencio nao lhes é presw cripto por texto
algum positivo ; por isso, duvidou-se allumas vezes que
pudessem ser dispensados do depoimento; mas para concluir
que tambem o pastor protestante tem uma obrig-açJto natural
(18) poderosa de guardàr segredo, basta reflectir que o
peccador, quando vai procura? o ministro protestante, para
Ihe abrir a consciencia e pedir-lhe consolaçOes puramente
espirituaes, tem principal mente por mobil a segurança de
uma discripçao inviolavel e pro-fessional. O poder deve sem
duvida permittir que os fiéis possao com toda a segurança ir
procurai" ao lado do pastor o allivio moral, que a religiao lhes
offerece : ora obrigar o pastor a depôr sobre factos, que sô Ihe
forao revelados sob a fé de uma confissao religiosa, séria
destruir logo toda a conflança de que ha mister o seu caracter
(S).
CAPITULO XLI.
DA. FB QUE MERECEM AS TESTEMTJNHAP. DOS SfiUS DIVERS0S
GRAOS, E MAIS ESPEC1ALMENTE BAS TESTEMUNHAS DENOMI-
NADAS INCAPAZES.
A força probatoria do testemunho tem por origem a pre-
sumpçao de que, o que o dâ, exactamente observou e quiz
(17) Garpsow, Jurispmidcntia eccles.
K
Hvv 3, de (In, 25, n. 8.
(18) Gluck, Commentarios, XXII, p. 171,
(S) Entre nos as testemunhas sâ'o obrigaclas a comparecer emjulzo sem
que em contrario possào aliegar privilegio algum sob pena de serem
conduzidas debaixo de vai-a e de desobediéacia, tendo sido eifca-das, «
nâo havendo motivo iustifteado, Cod! Proc. art. 85 e 95.
ÎOT
dizer a verdade : esta presumpçao, ou apparece véhémente na
causa, ou fraca : para o juiz toda a questao consiste nisto. Para
resolver questao tao delicada, é-lhe mister examinai' corn
cuidado e inteiramente a individualidade da tes-temuuha,
comparar as suas qualidades physicas e moraes corn a sua
postura e suas palavras perante ajustiça, e afiiial decidir, se
merece e até que ponto. A lei tambem de perfeitamente
determinar o valor, que certas qualidades pes-soaes dao ao seu
testemunho ; en tao estatue para o juiz uma especie de theoria
légal da prova : outras vezes, fundado na experiencia quotidiana
da vida privada, o legislador desco-bre possibilidade de graves
perigos nas qualidades de outra ordem ; prohibe que uma
condemnaçâo possa basear-se no depoimento desta ou daquella
testemunha ; e, com receio de comproinetter a innoceucia,
déclara insufficiente para fazer prova plena o depoimento de
todos aquelles, nos quaes se manifestarem estas particularidades.
O seu depoimento jamais pôde autorisai- uma sentença
affirmativa ; e é sômente como informantes que o juiz os pôde
ouvir (1) ; militas vezes sâo uteis p orque daolugar a outra prova
mais perfeita, ou porque auxiliâo a fîrmar com precisao os
caractères do corpo de dolicto. Nâo se deve coufundir com estas
as testemunhas suspeitas (2), isto é, aqiiellas que receia-se nâo
poderem, ou nao quererem dizer a verdade : o seu depoimento,
ainda que insufficiente e recusavel em thèse, pôde entretanto
algumas vezes, em virtude das circumstancias que por ventura
lhe dêm mais fé, arrastar a decisao do juiz. A suspeiçao, em
(1) Pfister, Causas crim., p. 43.—Tittmann, Manuah III, p. 390.—
Cod. prus. § 357 e Cod. bav., art. 85,—Vide o Proe. crim. comp., 1,
cap, 95.
(2) Tittmann, I, e„ § 833.—Vide o Proe. crim. comp, II, cap. ICO le
170.
gérai, résulta de uma possibilidade in àbstmcto, que, em câèa
especie (in concreto), nao impede a intervençao de outras côn-
sideraçoes nao menos graves ; é mister pesa-las e comparà-las
entre si ; e é s<5 depois de maduro exame que o juiz décide, se
na causa a testemunha dà ou nao as necessarias garantias
de veracidade.
É muito conveuiente nao augmentai* de mais a lista das
incapazes : o legislador, que assim procède, commette, como
dissemos, um er.ro gravissimo ; priva-se de muitos meios
de manifestaçâo da yerdade : a maior parte dos individuos
incluidos nesta categoria sâo simplesmente suspeitas, isto é,
testemunhas 'das quaes se pôde receiar uma mentira,- ou um
erro possivel, mas cuja veracidade poderia na occasiao ser
corroborada pelas circumstancias. Lembraremos ainda que
nao se deve applicar ao direito moderno '(direito commum da
Allemanha ou outro qualquer) muitas disposiçOes da le'i ro-
mana, que rejeitavao o testemunho de certos individuos, que
nao podem lioje ser considerados incapazes no sentido em que
tomamos o vocabulo. Em primeiro lugar, séria perigoso
adaptai* ao processo inquisitorial as regras do processo ac-
cusatorio puro (vide acima, cap. 39). Além disso, alei ro-
mana nao distinguio entre as testemunhas incapazes e as
suspeitas; por isso, vê-se-a repellir absolutamente esta ou
aquella testemunha, que nos limitariamos a incluir na classe
das suspeitas : finalmente, nao se deve esquecer que em
Roma o processo nao eva regulamentado por um codigo
gérai, e que muitos dos textos em questao nao se
referiao senâo à lei (Ux) especial, que encarregava a uma
çommissao (quœslio) o julgamento de um crime ; portante,
erraria quem supposesse ver ahi as regras geraes appli-
caveis em todos os processus.
A incapacidade, segundo nos parece, nao pôde provir
sen5o de très causas principaes. Ella existe quand o :
ion
1.° Ha para o juiz certeza de que a testeinunba nao podia
ter observado os factos por carecer absolutamente das
faculdades necessarias a esta observaçâo ;
2.° Quando é muito provavel que .a testemunba nao
fallarà no interesse da verdade por causa da sua posi-
çao no negocio, represeutando, por assim dizer, um papel
de accusador ; H
Finalmente, quando a incapacidade é -decretada ex-
pressamente pela lei pénal.
Pertence à primeira categoria : .
a). A incapacidade das crianças (3). Por maior que seja o
valor que se de à sua candura, as suas ingenuas palavras,
que, sem calcular as consequencias, sô expri-mem o que
realmentè cabio sob os seus sentidos (4), o legislador
deverâ receiar da leviandade natural do seu espirito, da
falta dos" seus meios de observaeao, do seu habito de
verem as cousas superficialinente e de con-tentareni-se com a
primeira impress ; e finalmente, uma consideraçao das
mais fortes o farâ recuar, é a experiencia tao fréquente de
que a sua jovem imaginaçao mistura sempre imagens
erroneas com as observaçOes reaes (5). A incapacidade
das crianças, em relaçao à prova teste-munbal,, é principio
reconbecido ao menos no direito commuai
(3) Qaistorp. Principios. § 638.—Titfcmatm, 1. C, HT, p.( 516.
(4) Como sustcmla Sodcn, Espirito da Icgisl. crim.. Parte % g 602.
(5) L. 9, § 5.—L. 19, § 1, D. de Testib. (S) Gluck. Comment., XXII, p, 443..
(S) A. primeira lei dit, em gérai, que ha pessoas que nâo podem depôr por
causa da fraqueza do seu juizo. A sognnda isenta os pupillos.
110
e lias legislaçôes particular.es da Allemanlia (6) ; quanto
es legislaçoes que admitfem o jury, é exacto que ellas
previnem mais a variedade infir.ita das causas criminaes ;
além disso acontece frequeutemente que a prova do de-
licto nao pôde fazer-se seufto com o auxilio das crianças,
por exemple, quando ellas forao o objecto directo (7) ; e |
destes delictos precisamente querem assegurar a puniçao.
E' por isso que na Inglaterra (8) as crianças podem ser
ouvidas como testemunhas, competindo ao juis o direito
de apreciar o valor do testemunho. Na França, acontece a
mestna cousa com a distincçâo, pom, que os meninos
menores de 15 annos nao podem ser ouvidos, senao por
forma de declwaçâo e sera juramenio (9)..
Na Allemanlia tambem, onde conforme o direito commum
a criaa é incapaz, a restricçao nao podia durar tanto quanto
dura a menoridade Certamente a lei nao vai até ao ponto de
dizer, que os menores pubères deporâo sob juramento, poisque,
(0) Cod. bav, art. 278.
(7) Exempta : Houve attentado contra o pudor da'parto de uni preceptor
sobre os seus dicipulos.
(8) Vid
a
achiia cap. 39, nota 44
(9) Ood. Instr. Criui. franc, art. 73 (Ooino so vé, pois» nâo ha na
França, propriamente fallando, a distincçâo de testemunhas, eaj sus-peitas
e incapases. Toiavia podem ser, ou maiores de toda a exeep-çào, ou
defeituosas. Entre estas soinente algumas nâo podem depôr senào a titulo
de informantes, como os menores de 15 annos, os con-demriados a penas
afflictivas e infamantes, e algumas vezes a penas cor-reccionaos, arts. 28,
Si, 4, Ood. Pen., e alguns ra lis : as outras podem prestar juramento.
competindo ao juiz o direito de apreciar o valor do seu depoimento.
Incapaz absolutaraente talvez nâo seja senào a parte civil, o que se
conoel)3, porque accusa. Todavla. as divisôos e cateçroruvs traça las polo
autor sjo utois na pr.ilic». {Nota de T. F.)
111
as mais à as vexes, Biles nùo possuem a madureza de intelli-
gencia necessaria para apreeiar a gravidade de uni tal acto,
ou as consequencias de um depolmento falso: a regra deve fier,
que toda a testemunha, que nao tirer chegado à maioridade
para o j uramento, nao pôde depôr senao por forma de decla-
raç.ao, e pertenee à classe das suspeitas. Mas quai sera a
idade desta maioridade ? Neste ponto ha grande divergencia
lias leis. Nos termos do direito commum é a idade de 14
annos ; certas legislaçoes particulares a fixao em 16 ou a 18
amios (10). Final mente, o melhor séria nao considéra r esta
senao como uma queatâo de facto, cuja soluçao varia conforme
os individuos aos quaes se applica. Ha pubères de 14 annos,
nos quaes o espirito e o sentimento religioso se mostrao suffi-
cientemente desenvolvidos, e dos quaes se de esperar corn.
toda a confiança um depoimento completamente veridico.
Erra, pois, o legislador em fixar, por uma regra
absolut», a idade que deve servir de ponto de partida
para se julgar da aptidaj) da testemunha : esta idade nem
sempre é a mesma em todos os individuos. Ora, como o juiz,
que sô de passagem vê a testemunha, nao pôde verificar, se
ella tem a madureza de espirito sufficiente, séria talvez util,
sujeita-la, antes do interrogatorio a uma especie de exame
preliminar, ou que o tribunal ottvisse o sacerdote de quem
dépende na ordem espiritual, os seus parentes, o seu tutor,
e lhes perguntasse se haveria inconveniente em deferir-lhe
j uramento (11). No direito commum parece, à primeira
vista, que um menor de 20 annos nao pôde ser teste-
(10) Nos termos do Cod. austr., art. 031, e do Cod prus. g 357,
em 11 annos.
(11) A: nova Or<1. badeza do proc. civ» § 621, exige este exame pre-
liminar pira tolas as test^miinhas de 11 a 10 annos de idade.
112
muuha compléta: a Ici roinana dizia-o foYinalmente (L. 20 D.
de Testeb.) (S), e o art. G6 da Carolina..,(12) p?.-rece ter
adoptado o nxesuio systema ; nias, cooio dis-' semos, é
perigoso fazer inferencias dos textos de leis isoladas e
especiaes que se encontrao no Digesto. O di-reito canonico
diminuio a idade da maioridade para o juramento ;e, defeito,
ningueni pôde affirmar que se nao possadar, com menos de 23
annos, todas as garanties de um testemunho fundado na sa.
observaçao das cousas e per-teitainente veridico nos terinos.
Além disso, note-se, que a Carolina nâo reproluzio a
limitaç.âo da idade fixada pela Bambergueza, e por isso, com
razâo se pôde sus-tentar, que ella nâo quiz ligar o juiz, como
esta o havia feito. Se assim o fosse, de via concluir eutâo
que tambem as mulheres nâo podem depôr (13). Finalinente,
esta mesma lei décréta m fine, que os menores podem ser
chamados em certos casos (14).
Se a testemunha, na época do depoimento, é maior para o
juramento, mas os factos, sobre que depoe, sao anteriores à
sua maioridade, as no vas lois sao acordes (15)
S) A lei diz, qao o accusa lof nâo polori citar, para depôr, o mcnor de
20 annos.
(12) Assim S3 décide interproiando-a polo art. G3 da Jlamberguesa,
fonte primitiva da Carolina. como se sibe. (Esta diz simplesmente : sîo
testeinnnlias sufflcientes as que nto tem nota ' cB infamia, ou aquellas
contra as quaes nâo se pôd-; teoantar unia rèprova légal. O art. 70 da
Bambergueza navra accréscenta-Io : Nâo podem ser tes? temunhas os que
tem nota ds infamia, os menores de 30 annos e as mulheres ; entretanto
em certos casos os menores e as mulheres podem ser. ouvidos, (N. T. F.)
(13 e 14) Vide o art. 76, nota précédente.
(15) Col. D-TV., art. 281.—Strecker, di Qualitate tislim. ad crimsn
•probanâ., % 8.—Tittnvmn, Manual, ITT, p, lin.
113
em dar completo valor ao seu testemunho, em reldçâo aa
poder do juramento e & probabilidade de conhecer elle a
importniicia das suas palavras e de ter quando dizer a
verdade ; mas resta resolver um ponto muito de-licado : o
juiz pôde receiar que, sendo ainda menor no momeuto em
que acontecerao os factos, nao os tivesse observado com a
necessaria attençao, ou que, no intervalle), as recordaçOes
da realidade fossem alteradas pelas illusOes da sua
imaginaçao.
b.) Sâo tambem incapazes : os insensatos, os idiotas, os
loucos furiosos, quando na occasiao 4
e
seu depoimento, ou
na época em que os factos acontecerao, estavao sob a
influencia da sua enfermidade mental. Quando ha lu-cidos
intervallos, quer na época dos acontecimentos, objecto do
debate, quer na occasiao do depoimento da testemunha, o
juiz deve mostrar-se muito circumspecto ; pôde ser il-
ludido por uma lucidez apparente, e a molestia, nao obs-
tanté nao se manifestar por accessos violentas, pôde con-
tinuar a infiuir iateriormente e a imprimir direcçâo comple-
tamente erronea aos orgaos do espirito ; ueste caso nao se
de ter na observaçao exacta dos factos e em um
depoimento correspondente (16.)
c) Deve ser declarado incapaz aquelle a quem falta o sen-
tido precisamente neceasario para a observaçao dos factos ;
'd.) Aquelle que "nâo pôde exprimir claramente as suas
idéas verbâlmehte, ou por escripto ; usando de signaes,
d^vem 'estes ser interpretados ; e a interpretaçao pôde ser
facilmente fallaz (17);
(16) À experiencia demonstra que nestes prétendidos instantes lu-
cidos as image ns creadas pela môiestia do espirito misturSo-se sempre
com os factos realmente observados.
(ÏJJ Doncle se sague que o depoimento de um surdo-mudo, que
nao sabe escrever, darâ sempre Iugar a diffîculdodes e a duvidas.
I . u. .
114
e) 0 que falla em propria causa (18) : mas, comp se verâ
mais adiante, nao sedeve incluir nesta categoria a victima do
delicto. Aléra disso, convém transportar in-teiramente para o
processo criminal o principio em vigor Tap direito civil, que
niuguem pôde ser testemuuba em causa propria: em materia
criminal a pena, que é de-cretada por causa do intéresse
publico, nao aproveita divectamente à parte ;
indirectamente pôde para ella resultar d'ahi yantagem, é
quando pede a satisfaçao do damno causado pelo delicto,
apoiando o seu pedido em uina condemnaças pénal anterior.
Portante, o testemunho da victima do delicto deve ser tomado
em consideraçao e pcsado conforme o seu yalor intrinseco, ou
conforme regras applicaveis as testemunhas simplesmente
sus-peitas ;
f) A doutrina classifica ordinariamente entre as inca-pazes
as testemunhas peitadas (19). Esta classificaçao nao é exacta,
sehdo tomada em um sentido demasiadamente absoluto. Do
facto de ter um individuo recebido dinheiro,
C18; L. 10, D.~ L. 10. Cod. de Testibus. L. \. g II. D. Quando appell.
(S) Layritz, de Test, in sua causa, 'Bar ut h, 1705.
(S) Na primeira lei Pompôtiîo firma a regi'a nullus idoneus in Tt\ sua
intelligîtw. Na segunda os imperadores Hooorio e Theodosio entre as
condjçôes para a admiasSo das testemunhas incluem a de nSo ser a
testemunha interessada np negocio si soeii et participes criminis non
dicantnr.- A ultima define o que é causa propria : eujus emolumentum, vel
damnum ad aliquem suonomine pertinet.
(19) L. 3, g 5, D. de Testib. C. C- C, art. 64.— O Codlgo pruss., j art.
856. n. 5, déclara incapaz toda a testemunha que tiver recebido dinheiro
ou quaesquer vantagens para depor, '
(SJ Vida noti (S) & nota 5 do cap. 39.
IIS
ou promessas (20), para depôr ou nso depôr, nao se segue
necessariamente que elle seja peitado. Se assira fosse,
deveria'ser repellida a testemuoha que, tendo de fazer uma
longa viagem, ou de vencer graves obstaculos para com-
parecer em juizo, tivesse recebido da parte do autor ou da
familia do accusado uma indemnisaç5o pecuniaria ;
deveria ser tambem repellido aquelle que nao tivesse brus-
cameute recusado as offertas, mesmo protestaudo nao mentir
à sua consciencia'(2L). Finalmente a corruoçao sô tira o
credito as testemunbas, quando as circumstancias vem
demonstrar que as promessas as determinarao ao falso
testemunbo ; mas neste caso a promessa deve ser feita sob
a condiçao de um depoimento, concebido neste ou
naquelle sentido, de uma falsa declaraçâo, etc. ; e a
testemunba deve comprometter-se a declarar o que lbe é
ordenado (22.)
g.) Sao ainda incapazes :
O morto civil (23) (S), que fica privado de todos os
direitos civis, e que certas legislaçoes considerao como
morto pbysicamente.
(20) O ood. bav., art. 278, u, 7,'assiin diapôe e nos mesuios termos
do nosso teKto.
(21) Gmeliu, da Justa criminal non pequenos Estados, p. 210,
(22) Globig, TheoHa das Prabalidades. U parte, p. 135.— Tittmam»
|8- part*. 532.
(23) Cod. bar., art. 278, n. 5.— Cod. da instr. criui. p., art. 28,84,42.
(S) Entre nos nao ha pena alguma que prive o eondemoado do todos
08 direitos civis. Felizmeate é hoje geralmente reconhecido (aalvo
alguma opiniào excentrica) que nâo temos morte civil, ou servidâû da
pena. No Ood. do Proc., i^rt. 89, nâo se falla nessa incapacidade. Vide
Conçoit das Leis, nota 3 ao art. 993 $ 5"
no
h.) Os que forao condemnados a uma pena infamante (o
que é* quasi geralmente admittido) (24) ; algumas vezes a
incapacidade se amplia a certos accusados ainda nao
absolvidos (25). Mas se é exacto, em thèse gérai, dizer que os
crimes destas testemunhas manifestao uma pro-funda
immoralidade e as tornao indignas de fé ; e que a
condemnaçSo baseada sômente no depoimento de uma
testemunha desta ordem ofifende vivamente a opiniao pu-
blica.; é tambem verdade, que séria ir longe de mais
considerar absolutamente incapaz de eer testemunha todo o
indiyiduo condemnado a qualquer pena infamante : n&o
esqueçamos que a quest&o se reduz a isto ; pdde-se, na
especie, esperar da testemunna a firme vontade de ser
verdadeira ? Ora, do facto de ter outr'ora commettido um
crime, e por mais severa que fosse a pena, segue-se ne-
cessariamente nao ter ella actualmente a vontade de dizer a
verdade? Certos delictos s6 constituem infracçOes â leis
puramente ci vis e arbitrarias (26) ; um intervallo quasi)
invisivel sépara o acto licito do acto prohibido (27) ; e da
condemnaçâo que o juiz tiver pronunciado, muitas vezes a
seu pesar, nao se pôde de modo algum concluir, que a
testemunha'nao esta disposta a dizer a verdade.
(24) Quigtorp. Prineipios, § 619.— Ord. cri m. pruss., art. 356, n. 7.—
God. bav. art. 278, n. 6; nos tormos des artigo sâo ineapazes do
depoimento aqwlles que fûrSo condemnados por delicto de calumnia,
falso testemunho on perjurio.
(25) Vide por exempta,» o God. bav. art. 278 n. 6.
(•}&) Por exeaaplo : as contravençSôs em materia de alfandegas. o facto
de nao ter denunciado este ou aquelle crime.
(37) Roferlmo-nos aqui a grande numéro de delictos politicos.
Ha outras crimes (28), cuja causa unica foi o accesso de
uma colera suinta, mas nos guaes nao houve depra-vaçao
do senso moral ; o juiz, ainda que os puua, nâo| de corn
fundamento acreditar nesta depravâo : o condemnado deve
querer, esforçando-se em emendar-se, re-couquistar a estima,
que os seus concidadaos nao ppdem recusar a uma vida
sem mancha; e deverà certamente fallar conforme a sua
consciencia no dia em que vir (30) todos os olhos fixos
sobre elle, podendo, além disso, sar| facilmente descoberto o
perjurio.
Sob um outro ponto de vista, deve-se considerar uma
medida prejudicial a todos os cidadaoa, mais do que ao
condemnado, deduzir a iucapacidade absoluta da pena
criminal ; é privar muitas vezes a parte interessada de uma
testemunha importante, com cujo depoimento con-tava.—
Portanto, o legislador erra estabelecendo, em regra gérai, a
incapacidade tao rigorosa résultante da condem-naçao a
uma pena infamante (31) ; s6 a
s
circumstancias da causa
podem fazer decidir dessa incapacidade, e s<5 ao juiz
compete pronunciar sobre a questao de saber, se uma
testemunha, nesta situao, deve ser repellida como incapaz,
ou admittida sob servas como suspeita, ou ad-mittida
como perfeitamente veridica. Podera-se apresentar
(^8) Por cxemplo- os fcriraentos sem intençSo de matar, mas pro-
daziado a morte; os feitos em uma rixa, ou tumulte.
(29) Um menor de 15 ami os foi condemnado, e por crime para o
quai tinha sido arrastado por um instigador: depois a sua conducta foi
exemplar.
(30) Bentham, Tratado dag provas, II, p. 147.
(81) Vide o art. do autor, Annuarios do prtte. erim. âo Zwrhein t. n.
% p. 20-1, on-lo esta doutrinn esta mais amplamonte dosenvolvida.
118
como objecçûes os delictoâ especiaes (32), como a car
lumnia, o perjurio, etc., nos quaes ordinariamente se ma-
nifesta a ausencia total de lealdade e de principios moraes e
religiosos : ao mehos aqui a regra poderiâ justificar-se à
Çrimeira vista (33) : mas, mesmi quanto a estes delicto»,
deve-se vêr em que circumstancias forao commettidos ; se ha
muito que" o forao ; se o culpado deu decisivas provas de
emenda ; se tornou a conquistar a confiança dos seus
concidad&os ; poisque entao realmente o juiznao deverà., em
thèse absoluta, declarar o seu depoiraento in-digno de crédite.
Entre os Roînanos, em cuja legislaç&o se vai frequen?
temente buscar argumentes a favor da theoria, que com-
batemos (34), a infamia [infamia)^ nao produzia a
incapacidade absoluta ; e além disso, nao se fasia dis-tincçao,
como entre nos actualmente, entre as testemu-nhas incapazes
e as simplesmente suspeitas. Quanto ao direito canonico (35),
nada se p6de concluir ; porque, se repellia, em principio, o
testemunho de individuos pre-cedentemente condemnados
por perjurio, ou par crime
(32) Hagomam, QuesKies pruticas, 6» parte; p. 271.— Tittuiam Ma-
nual, XX111, p. 512.
(33) A mesma cousa se deve dizar da deuuncia caluwniosa e da ban-
carrota fraudulenta,
(&l) Vide todavia Marczoll, da Honra civil.— Mas vide tambem o meu
artigo citado na nota31.— Vide L. 8, § 5. D. Testants.'— L. 13 D. eod.-tlt.
(S). (A. loi 13 é notavel : em alguuias linluis de admiravol boni sonso
Paplniano enuncia toda a theoria sognitïa polo autor) (N- T. F.J
(S) Vide as notas (è) à nota 19 deste cap. e a nota 5 do cap. 39.
(83)0. 54 X, âe Testib.
119
analogo, tambem autorisava ao juiz tomar em conside-
raçao as provas da sua emenda, fornecidas jlepois pela
testemuuha (36)
PITULO XLII.
BAS TESTEMCNHAS SUSPKITAS. '
Denominamos stemunha sp&Ua aquella, cujo depoi-
mento parece nao ser digno de inteira fé. ou que s6 de ser
crido sob certas condiçOes ; aquella, que graves motivos
fazem suppor nâo ter as faculdades sufiieientes para
observai" os factos e conserva-los fiel mente gravadosna
sua mémoria, ou nao ter a firme vontade de dizer toda a ver-
dade e s6 a verdade. Entre os motivos de suspe&o, uns sao
geraes,e se produzem em todag as causas (por exemplo, uma
vida desregrada) ; outros sao especiaes, e nâo se applicâo
senao ao processo actual (por exemplo, o parentesco corn
o accusado).
As razoes de duvidar da dévida as testemunhas sao .'
o vicio ou fraqueza dos orgaos necessarios para a ob-
servaçao exacta dos factos, por exemplo, a vista curta da
testemuuha no çaso era que esta estivesse distante da
scena ;
A fraqueza das faculdades intellectuaes: deve-se estar
inteiramente sao de espirito para poder-se observar fiel-
mente certos factos ; e uma testemunba meio idiota, ou
cuja intelligt ncia esta abaixo da ordinaria, o pôde pro-
duzir plena îé ;
O estada anormal em que se açhava a testemunha no
momanto to facto, por estar vivamente affectada a sua
(36) Vide o art' jb eitado em a nota 81. «
120
faculdade de o"bserveçâo (1) ; ou poirqué este estado faz
suppôr nao poder a sua uaemoria leinurar-se exactamente
dos factos (2) ; ''
bis. Mas a causa mais grave.de suspeiçao sulta do
interesse que pôde ter a testeïnunha na decisao do pro-cesso,
interesse capaz de leva-la a faltar a verdade. Assim sao
suspeitos : a) aquelles aos quaes p6de pessoal mente
aproveitar que a sentença seja dada neste ou naquelle sentido
(3) ; b) aquelles que tiveréra aceitado uma récompensa ou
promessa para dar um depoimento insinuadd pre-viamente; c)
finalmente a parte lesada, mas é difficil ,e importante
determinar até que ponto pôde ser crida eaté que ponto é
suspeita (4) No direito commum da Alïema-nlia se acha
uma disposiçao a respeito : a declaraçâo da parte lesada podia
dar lugar â tortura. E' certo, que, no momento em que o
delicto veio offende-lo, o quei'xbsb nao podia ter conservado
toda a sua calma, e que mais de uma circumstancia accessoria
podia ter-lhe escapado ; e tambem é certo, que a paixao ou o
interesse que se| pôde ter em fazer declarar o accusado
culpado, sao muitas
(1) Por exemple a testemutiha tinha bebid) de mais.
(2) Exemplo : a idade avançada da testemutiha. Cod. bar, art. 280,
n. 1.
(3) Por exemplo, no^caso de ser a testemunha obrigada â indemni-
saçào do danino. se o reo for condemnado.
(4) Art. 25, n.,6,-C- C. C—Sobre o testemunho da parte lesada,
vide tambem Quistorp, Prvndpîos, g 623.—Vornhnrr, Observ. forens,
p. 2. Obser. -438.—Harl. Arch. geraes da sciéicia polit ira, 1827» n. 2,
p. 84.—Vide o Proc. crim. comp. cap. 170.—O cod. bav. art. 382, da
plena força a este testemunho, mas soménte sobre o facto do delicto,
do quai foi victima o depoente e nSe em relaçào & pnssoa do agente,
/
121
Tdzea clante fortes para arrastar a mentira. Tambem ha
homens, que pretendem eer victimes de um delicto corn o
unico fini de obter uma vantagem, ou encobrir o sou
proprio crime (5) ; fînalmeute, pode-se de boa fé, em vir-'
tude de um erro, suppor-se lesado por um delicto ima-
ginario (6). De tudo isto résulta, que a declaraç&o da parte
lesada pôde ser inquinada de suspçao ;mas deve-se concluir
d'abi que em caso algum possa merecer credito ? Certamente
nao. Si se trata de ùm delicto contra a propria pessoa do
queixoso (7), pode-se dizer, como dissemos, que o depo-
ente, em relaçao as diversas circumstancias de facto, nao
merece pleno e inteiro credito, quer porque ha certas mi-
nuciosidades, que podiao facilmente e deviao ter-lhe esca-
pade (8), quer porque elle acredita ter reconhecido o cri-
minoso (9) somente por certas particularidades delicadas (10).
Si se tracta de um delicto contra a propriedade, as diffi-
culdades desapparecem, ou tornao-se menores em relaçao
(5) Exeffiplo: um depositario subtrahe o objecto que lhe foi conflado, e
deptis vem dizer que foi roubado.
(6) Acontece frequentementa esquecermo-nos de um objecto MB um lugar,
e acreditarmos depois flrmemeate ter elle desapparecido por uma subtraçâo
frauduleuta:
(7) Exemplo : ferimentos voluntarios. '
(8) Exemplo.' quai era a posiçâo do âge n te; que gestos ou démon s-
Ltraçôes fez?
(9) Convem tambem ver em que momento foi o crime commettido : se foi
durante o diaj o erro era mais dimeil. Se decorreo algum tempo para ser
coneummadd era mais facil ao depoente reconhecer o agente no intervallo.
(10) Sera sempre coi veniente veriflenr, se o individuo designado como o
autor do crime é \ sjsoalmente ooniieeido do depoente. se este podia ou nSo
ter-se facilmei le enganado, on se désigna pessoa dello pouco conhecida, e
que nerw ton distingua
-
.
100
à indicaçSo, nâo do agente, mas do corpo de delicto, sobre-
tudo quando a lealdade conhecida da pessoa lesada, ou as
circumstancias especiaes do facto (11) n&o permittem suppôr
ter elle aliegado falsamente um crime, corn vistas de auferir
vantagens, Iremos mais longe : mesmo em relaçao
H ao ageiite o déclarante -pôde ser crido, quando para este
» nâo ha vantagem em que seja condemuado precisamente
|'., o indiciado (12) ;
;: I 4.° O denunciante é testemunha suspeita (13). E' evi-
y dente que farâ todos os esforços para sustentar a* sua denun-cia
e demonstrar a sua sinceridade ; porque deve temer as penas
decretadas contra a calumnia. E demais, o facto de denunciar
um concidadâo é um acto insolite, e que disperta logo as
susceptibilldades do juiz; muitas vezes nâo é um jnotivo
nobre, uma razao de intéresse publico que o guia (14) ; e
sentimo-nos levados a vêr no seu pro-cedimento o resultado
somente do odio ou de um interesse privado sordido. Mas
tudo isso s6 prova que deve ser cuidadosamente pesado o depoimento do denunciante
(15) ;
(11) Exemplo : outras tcstemunhas virào a parte lesada collooar o
objecte
em um lugar ; e accrescentSo que pouco depois desapparecëra o dito ob
jecte no entanto que o proprietario ahi nâo voltâra. .
(12) Exemplo : a somma f urtada loi restituida por um desconliecido.
\m
(13) Quistorp, ObservaçSes juri&icas, 1, p. 226.— Kleinachrod, Tratado
do dirjito pénal, 1» Parte, n. 6.— Rauft, Da Prova g 85.
I (il) Para représentai* o papel de denunciante porante a opinion
publica, que se révolta contra os denunciantes, é prociso fazer esforço
violenta, e céder a motivos extraordinarios e muito fortes.
(15) Orden. crim. da Pruss., art. 357, n. 7.— Cod. Bav: art. 283—
Nos termos deste ultimo arligo « é testemunha pevfeita, quem, em
virtude do seu cargo» è obrigado a denunciar o crime, e quem ndo
pàde ter motivo algum de parcialidade ou de intereste pessoàl no
H exito do yrocesso.
1
M
m II
1133
quando a denuncia é dada por um magistrado em virtude das
suas funcçoes, o seu procedimeuto parece natural, e, longe de
ser attribuido a um motivo pouco louvavel, é considerado so-
mente como o cumprimento de um dever. Mas, quando a
denuncia é dada por um dennnciante, que tem em vi&tas uma
recompensa pecuniaria, surgem logo sérias duvidas contra a sua
veracidade, e desconfia-se que o seu testemu-nho nao é mais do
que o resultado da ambiç&o (16). Remo-vidas estas
difficuldades, convem examinar, se o depoimento s6 se réfère
ao facto do delicto sem designaçao do agente, ou se este é
nominalmente indicado. No primeiro caso po-de-se ter na
testemunha ; no segundo, é mister ainda ver quaes as relaçOes
existentes entre ella e o accusado, se erao inimigos, ou se, pelo
contrario, essas relaçOes erao de natureza a obstar a denuncia
(17).
5." O depoimento do cumplice apresenta tambem graves
diffîculdades. Aquelle que, segundo a sua propria confiss&o,
mancbou a sua vida por um crime, nao tem mais o di-reito de
ser acreditado no seu depoimento como um bo-raem, cuja vida
tivesse sido semprepura(18). Alem disso, é natural que o
cumplice queira fazer recahir sobre o
(16) Strecker, De Qualit. testium ad proband. crim., g 8.— Tittniam,
Mnnual III, p. 518.— (O art. 383 do Cod. inatr. crim. franc, classifica o
denuncicmte, cuja denuncia é reconupensada pecuniariamente pela lei,
entre aa pessoas que nao poflem depôr ; todavia, quando as partes nâo
se oppôem; a sua audiencia, esta uào constitue nullidade.) (JV. T. F.)
(17) A. denunci da parte de certas pessoas admira setnpre» por exemple,
da mulaer con a seu marido. Em tal caso 6 necessaiio, que o odio ou
outras pais es violentas tenhSb vencido os motivos» que, alias, deviSo
fazer coi que a testemunha nâo révélasse o crime.
(18) Art. 31 C O. G. rompnrado com a L. 16, D. de Quces., L. II,
Cod. de Accus;, 10 W X, de Prolmt,
1
co-autor do delioto uma parte da sua falta ; tem, pois, um
interesse directo em depôr contra a Terdade (19). Têm-se
visto criminosos, que, desesperados por conhecerem que nSo
podem escapar a pena, esforçâo-se em arrastar outros cida-
daos para o abysmo em que cahem.; outros denuncifto
cuinplices, alias innocentes, sô para affastar a suspeita dos
que realmente tomârao parte no delicto, ou para tornar o
processo mais complicado ou mais difficil (20) ; ou porque
ësperao obter um tratamento menos rigoroso (21), com-
promettendo pessoas collocadas em alta posiçao. Mas se o
legislador récusasse absolutamente qualquer valor ao de-
poimento do cumplice, privar-se-hia'gratuimente de um meio,
unico em mais de um caso, de convencer o ver-dadeiro
culpado obstinado em negar os factos ; é, pois, com razao que
o direito commum da Alicmauha admitte esta especie de
prova (22), quando as circumstancias da causa fazem
desapparecer os motivos de suspeiçao, que ordinariamente ha
contra ella. Tal é o caso em que o culpado confessa desde
logo plenamente o seu crime, e depoe contra o seu cumplice
sem reticencia alguma, que faça suppôr ter elle em vista
qualquer vantagem directa para
' (19) Vide, sobre o clepoimento do cumplice, Bivinus, De denominat.
complids a delittq., Lipse, 1720.— Creutzing, de Nominat. socii, Jéna
1785. Homtnel ad art. 81 G. G. C„ Lips» 1746.
(20) Em quanto dura o processo contra o cumplice innocente, o ver-
dadeiro cumpliee pôde procurai- os meios de fazer evadir o autor prin-
cipal.
(21) E' o que pôde acontecer em materia de alta traiçSe.
(22) As novas l'eia tambem admittem, mas sob certas réservai. Vide o
Ood. 'ausfcr. art. 410.— Ord. crim. da Prussia, g 398, n. 8.— Ood. bsv.,
art. 884, Vide o Proc. crim. comp., t. 2. cap., 170, nota 30.
125
si (23). Tal é ainda o caso era que o nome do cumplice é
claramente designado sem suggestao alguma da parte do
magistrado instructor : no caso contrario poder-se-hia
desconfiar ter o accusado denunciado falsamenté, appro-
veitando-se da occasiao, que se ofFerecia, de desviar as sus-
peitas da verdadeira direcçâo. Uma condiçâo essencial para
a validade do testemunho é a certeza de que nao ha ini-
mizade entre o depoente e o individuo a quera se réfère. E'
mister, finalmente, que aquelle acariado com este lue repita
e.m face os factos de que o accusa: ou que sustente a sua
declaracao depois de ter sciencia de ter sido condemnado,
porque entao nao tem mais interesse de ac-cusar a outra
pessoa (24). Quando todas estas condiçoes se achao
cumpridas, e quando, alem disso, estao satisfei-tas as
essenciaes para' a credibilidade do testemunho em rai, o
depoimento do cumplice deve.ter plenafé.
Uma condemnaçao pôle ser baseada no testemunho de
dous complices? No direito commum alleinao a questao
deve ser negativaraente resolvida (25). Alem de ser peri-
goso condemnar alguem pela declaracao de dous indivi-1
duos infamados pelo crime, a regra do direito commum
exige formalmente que a testemunha, para ter plena fé, seja
juramentada : ora o accusado, contra quem se instaura
(23) Quando o accusado, confessando o crime, acerescenta que fora
levado a. commette-lo e animado pela scducçào, provoca logo duvidas
quanto à verdacl' da sua declaracao; os criminosos acreditio militas vezes
que ficSo'le melhor pnrtido, fazendo crer aos outras que eeder&o à
Influencia da I educçào.
(34) Tittmam, \tanual, III, p. 522 e g 871.
(25) Quistorp, | ;G9i—Eivinus, 1. c, & nota 19, g 80.—Martin, Tra-tada.
XII, nota 1 .—Hohnhorst, Annttarios do Tribunal suprsmo As Bxi-m, VII
Parti \ p. 873.
13G
o processo por causa de um crime, nao pôde depôr sobj
juramento, e nada ha que autorise a favor dos cumplices! tao
grave excepçao a esta regra. Segundo esta as suas declaraçoes
nao podem ter valor, senao concordando com outros mèios de
convicçao ; e 6 entao o caso de appli-car-lhes os principios,
que exporemos mais tarde, quando tratarmos da prova
composta (26) ; mas, repitamos, uraa legislaçao nova (27)
procederia com acerto dando-lhes plena fô em certas
circumstancias, que o juiz apreciaria em sua prudencia. O
cumplice, s<5 por ser cumplice, nao é teste-munha incapaz, é
somente suspeita : ora a suspeiçao, que basea-se em uma
presumpçao desfavoravel, pôde, em certos casos, cahir, e dar
lugar ao firme credito no déclarante. Figureinos um exemplo:
um homem,cuja vida até alli era sem mancha, tomou parte em
um crime, cujaexecuçao, alias, nao dénota extrema
depravaçao ; confessa o crime, e manifesta o seu
arrependimento ; désigna como seu cumplice um outro
individuo, contra quem ja existiao fortes suspeitas ; persiste
obstinadamente na sua declaraçao, e nao se des-cobre indicio
algum de inimisade entre ambos ; o seu depoimento concorda
perfeitamente com o de outra teste-munha maior de toda a
excepçao ; sendo, alem disso, c OH borado por todas as
circumstancias e indicios da causa; havendo véhémente
presumpçao de que neste caso se disse-rao a verdade, devera
o legislador, sob o unico pretexto de queum délies nao esta
juramentado,.pear a convicçao
(26) Ranft, Da prova, g 72. Stubel, Do Corpo de délicto, 8 24"3,
Tittmam, I, c-, p. 5
-
22, sustentào que a declaraçao de muitos cumpliced
faz prova plena.
(27) Ood. aust., art. 410. dispôe, que quando muitos cumplices ol
unanimes nas suas dedaracdea fazem prova plena, .Tonull, Dir. crim. àa
Austria, IV, 111—llâ.|
137
do juiz, principalmentcse, depois de condemnado, reproduz a
sua declaraçâo nos mesmos teroios, e dâ â justiça nova garantia,
que .pode perfeitamente substituir o juramento previo (27 bis)^
Entretanto o juiz, emtal caso, devera ser o mais prudente
possivel.
Se para conseguir-se a declaraçâo do cumplice promet-teu-
se-lhe agraça, ouminoraçao da pena, ia nao se p*ôde fazer
cabedal das suas declaraçoes : séria perigoso dar a uma
testemunha, que foi provocada a fallar por proraessas ou por seu
interesse pessoal.
A suspeiçao, em materia de testemunho, tambem résulta das
relaçoes entre a testemunha e o accusado : 1° Em primeiro lugar
fallaremos do parentesco. A lei romana (28), quando estabelece
a incapacidade absolu ta de depôr como testemunha parece
designar os pais do accusado : mas convem lembrar aqui tudo
quanto dissemos a respeito dos effeitos do processo de
accusaçao ; sabe-se tambem que em Borna nao se fazia
distincçao entre as testemunhas suspei-tas e as incapazes.
No direito germanico, segundo o quai os parentes figu-
(27 Ws) ConVcm observai-, que. se no cttrso do processo o autor
principal denuncia um complice, devem ambos ser julgados pela
uiesma sèntença: a garantia de que falla o texto, ae fère ao
caso excepcional em qm o autor principal, depois de condemnado,
denuncia pela primeira véz o sou cumplice, que séria entào dir ec-
tamente processado. (# T. -F.)
(28) L. 9 eiL, 6, Dig. de Testibus (S) V. Gluck, Comment., XXII parte, p.
146.1
(S) A prirol 'fa déclara, que nem o pai pôde ser testemunha na causa do
ftlhï | nem este na do pai A segunda déclara, que nâo ae Àr
idonoas as testemunhas, qua estSo sob a autoridade
§produ4. O que dispôe a prlmeira é reproduzida pela festibus.
devem consul e
1
duquolle, que
L. 5, God. de
ISS
_
ravao nos debates como conjuradores a favor do aceiisado, o
parentesôo tainbem nao constituia incapacidade absolu ta ;
mas simplesmente suspeiçao. Coin effeito, é muito possivel
que a vôz da natureza, que na testemunha falla a favor do
accosado, abafe a vos do dever: mesmo involuntariamente as
preoccupaçoes da sua affeiçao podem faze-lo desviar da
verdade (29) ; mas, como se vê, em tudo isto nao ha mais do
que uma presumpçSo, que deve ser pesada com as presum-
pçoes contrarias. Tambem é certo haver homens, que poem o
dever e santidade do juramento acima de todas as consi-
deraçOes de affeiçao, e que julgar-se-hâo obrigados a con-
fessar tudo quanto sabem, ainda que a verdade seja preju-
dicial ao seu parente, ainda que soffra o seu coraçao. Nos
processos de certos paizes, principalmente no da Allema-nlia,
a testemunha citada tem a faculdade de recusar fallar contra os
seus parentes mais proximos ; basta-lhe manifester a sua
récusa, quando sabe que o seu depoimento poderia prejudicar
ao accusado, e quer evitar a penosa situaçao em que o
collocaria o seu comparecimento ; donde se segue que, em tai
caso, aquelle que nao usa desta faculdade, e déclara estar
prompto a fallar, considéra o interesse da verdade e da justiça
como um dever mais sagrado do que o bem estar do seu
parente accusado.
Em resumo, o testemunho dos parentes pôde ser suspeito
(30), e da mesma sorte o do conjuge : nSo obstante os estreitos
e intimos laços,que os unem, nao permi ttirem que faeilmente
(29) As ideas de honra. e de farailia exercem tambem grande influ-encia
sobre m ni tas testearonhns :- quantos nao ha que julgào dever mentir para
salvar o accusado, e evitar uma nodoa na familia deste T
(80) Cod. bav., art. 263, n. 4.— Ordem. crim. do Prussia, g 357,.—
rTittmann, Manuel, III, p. 517.
ISO
se aeredite poder o luarido depûr "montra sua foïùlher, nSo
obstantè a commnnhao de intéressés pecuriiariOs tornal-os di-
rectamente interessados no prôcesso ; todavia tudo isso nâo
'constitue mais do que uni tnotivo de suspeiçao, e nao uma iri-
capacidade absoluta ; e quando o conjugue, era ïugar de recu-sar
o seu testemunho, presta-se a fall'ar, é porque sem duvida
sacrifica as caras affeiçOes do seu coraçEo à lei do dever. Alem
disso, ha casos em que a verificaçâo da ver-dade séria
irapossivël, se o conjuge nâo fosse ouvido (31). Tem-se
sustentado, que estando a mulher collocada em uma condiçSo de
dependencia em rélaçâo ao marido, jamais ousa-ria depôr contra
elle ; e d'ahi concluio-se que ëra neste caso incapaz do
depoimento : mas as idéas modernas con-demnàrâo esta opiniâo
; as relaçoes mutuas entre os con-juges nao exige da parte da
mulher a abdicaçâo du sua dignidade pessoal.
Voltémos ao parentesco ordinario (32). No direito cora-mum,
para que haja suspeiçao, é mister que o parentesco nao excéda
do quarto grâo (33). Quanto mais estreito fôr elle,quanto maior
fôr a intimidade de familia entre a testemù-nha e o accusado
(por exemplo, se sao irmaos) ; quanto mais fortes forem os
laços de obediencia e respeito natural entre o accusado e a
testemunha (por exemplo, se esta é descendent© daquelle),
tanto menos se pôde esperar a verdade da parte desta.
(81) Exemplo : quando se trata do crime de bigamia.
ico, cap. 5 e ult., X de Testïbus, conslderava o
ntos como plenatnente valido, si Veritas aliter
systema, admittido na pràxe antiga, nâo pôde
Cod. instr. crim, franc.
17
(30) O direito canin
depôimemto dus pa
haberi nequsat : est]
hoje mais sustentar-sel
(33) Comp. art 2221
130
2.* A amizade entre a testemunha e o aceusado tambem
pôde tornar suspeito o seu depoimento (34). £' certo que a
amisade, tendo o seu principio na moral a mais pura, nao farà
por si desviar a teatemunna do caminho da ver-dade ; e,
conformando-se com a sua origem, jamais a levarâ a mentir,
ainda que a venlade prejudiqtie ao individu» amado ;. masiios
habitos da iutiraidade, na communhao da vida, por assim
dizer, fraternal, nesta associaç&o, cuja primeira regra parece
ser o préservai* de todo o mal aquelle que délia faz parte, ha
tambem um sentimento levado a exaltaçao, coin o quai o
interesse dos outros cida-dâos, mesmo o da sociedade, parece
nao poder entrar em luta : d'ahi nascem as razoes de duvida
uo caso de que se trata (35).
3.° A inimixade tambem éuma causa de suspeiçao (56) .1
Sqb o imperio da paixao, as primeiras impressoes da teste-
munha podem altërar-se diante de imagena infîeis, nascidas
de um espirito violentamente excitado, que pôde satifazer a
sua vingança em um depoimento desfavoravei ; mas para que
assim seja, é necessario haver odio inveterado, e que
(S'il L. 8) pr, D. de Têstib, Globig, Theoria du probabilidade, II
parte p, 170,
1
(95) Jonull, I. c. IV, p. 57,58.—Tittmann, IV. p. 518. ' 1
(36) L. S. pr. D., L. 13, Ood, de Testib. (S). — Streckor, de qualitate tes-
tium, § 6.
(8) A primeira lei content dîversos preceitos de Gallistrato sobre a
confiança,
d
qn.o/nerecem as testemunhas, e entre elles, um dix que se deve
oxaminar, se a testemunha é inimiga (laquelle contra quem depôe, ou
araiga daquelle a favor de quem depôe. A segnnda déclara que a inimi-
zade é mctivo de rejeiçaoda testemunha. 1/ • "
131
j a causa ainda subsista. Nao é bastante desunifto passageira
e por motivos pouco graves (37). Alem disso, s6 nos espi-
ritos seïn dignidade e sera nobreza é que a paixao do odio
préfère a vingança ao dever e â santidade do juramento ;
os outros limitao-se a evitar alguma relaçao corn o seu
inimigo, e nao procurao perde-lo injustamente, compromefr-
tendo a paz da sua propria consciencia. Portante, neste
caso, o caracter da testemunha servira ao juiz de regra
de apreciaçao. H
4.» As relaçoes domestkas e de dependencia constituem
nesta divis&o uma quarta categoria de testemunlias sus-
peitas (38). Mas séria ir longe de mais, sustentai que todo o
criado, que todo o homem livre obrigado por um contracte
à prestaçao de quaesquer serviços, deveni sempre inspirar
duvidas (39). Os laços, que prendem os cri ados a seus
amos, ordinariamente nao sâo taes, que façao desde logo
presumir, que os primeiros deporao falsamente no interesse
dos segundos ; e quanto â infiuencia, que estes exercera sobre
aquelles, nao é de natureza a alterar sempre a
imparcialidade do seu testemunho : se as circumstancias da
causa demonstrarem, que a testemunha, dizendo a ver- |
(37) Globig. I. c... IL p. 173.—Tittmarm, III, p. 51B.
(38) A loi romant, L, 24, D., L. U. Cod. de Testib. exclue 03 testes do-
mestkos. Gluck, ï'omment., XXIL p, 127, A citada loi classifica na
mesma categoria osl ndividuos quibus wyperari potest ut testes fiant. (S)
(S) Testes eos quosYtceusator de domo produxerit, interrogari non pla.
nUt.—Btiam jure ci\ ili domestici testimonii fides itnprobatur.
(S'J) Tiltmnauni II' b. 519.
133
dade, expor-se-ha a um grave prejuizo, entao deve appa-recer
logo a du vida (40).
5.° Ha tambem certas ralaçôes de diversa natureza, que
gerao a amizade ou o reconhecimento, e que,portanto, podenj
influir, no depoimento da testemunha : tacs sao as do pu-pillo
com o tutor, do adoptado com o adoptante (40 bù) ; mas em
todos estes casos, como, nos outros, compete ao juiz fazer a.
apreciaçao conforme as circumstancias.
6.° Podem existir entre a testemunha e a parte lesada certas
relaçOes, que convem tambem nfio desprezar. E' certo que a
condemnaçao do accusado a uma pena decretada no intéresse
social nao directamente vantagem material à pessoa
offendida : e, tratando-se exclusivamente deste interesse,
pode-se affirmar, que o offendido e as testemunhas, ainda
que bem dispostos a favor daquelle, olhao com vistas
indifférentes para a condemnaçao ou para a absolvicao : mas
concebe-se no offendido a existencia de um sentimento pro-
nunciado de ma vontade, podendo fazer participar as teste-
munhas, seus amigos, se forem homens de consciencia menos
firme, do desejo que tem de ver punir o seu aggressor, no
ponto de vista pessoal ; ora, pôde bem acontecer que este
desejo egoista levé as testemunhas a desviârem-se involun-
tariamente da stricta verdade. Ainda nao é tudo : a sen-
40) Globig, I, p. 133 —1. O art. 317 do CocL de instr. crim. fr. détermina
soments que se pergiuite à testemnnha.'se esta ao servi ço do accusado ;
no caso affirmativo ao juiz compote livremenlo apreciar o valor do de
poimento. (N. T. F.)
* (40 bit) Na França, onde as relacocs entre o adoptado e o adoptante sâo
as mesmas que entre o flilio e o pat legitimo, tem plena applicaçào a
proliibiçà'o do art. 333 do Cod, de instr. crim.
N. T. F.
133
tença cri minai reage directamente sobre o proceaso çivU,
que a parte lesada tem direito de intentar contra o culpado
para satisfaçao do damao causado ; e esta consideraçao,
quando ha entre o offendido e as testemunhas certas re-
laçoes de affeiçao, pôde algumas vezes imprimir um carac-
ter hostil contra o accusado (41).
7** Final rneate, trataremos das relaçoes entre as testemu-
nhas. Devem, com razao, dar lugar as desconflanças do
juiz, quando uma délias représenta um papel importante no
processo, e quando parece ter exerçido grande influen-cia,
quer pela autoridade, quer pela persuasao, sobre o depoi-
mento da outra, seu parente proximo (42).
8.° O caracter da testemunha, seu modo de pensar e| de
obrar sâo causas poderosas de suspeiçao. se vio, que
nesta categoria déve-se classificar era primeiro lugar o que
foi anteriormente condemaado por um crime. A mesma
razao de suspeao subsiste, quando a testemunha, por acto3
(41) O mesmo se dovo dizer a respeito das relaçoes do pareil tesco. E é|
coin razao que Siegwart Mul 1er observa ao se a livro intilalado Dir. Tim.
dos canfôes'UrL Schwyte, S. Galcno, etc., etc. 1839. p. 123 «que nos pa
rentes, o mesmo sangue carre nos veias, bem depressa se inflamma e os
impelle a perseguir o offensor.» E' certo que séria perigoso, om certos
cantôes da Suissa. .acreditar fnciliuento ao testomunho dos parentes do
offendido.
i «
(42) Acouteceu o ciso seguinte : a testemunha A. tiuha declarado que
B. era o au toi' . lo crime. O fillio de A., que tambem tinha eatado pré
sente, déclara p ir sua parte nâo ter visto B.. Mais tarde, retratando-se,
affirma, como se', pai, que B. era o criminoso. Desconfiou-se entào, e com
r.'izào, que o pai, uaando dos meios âfa povsuasîio e do autoridade oatural
sobre o filho, l)i \ causou extremi perturbaçào, e o levou a pouto de nào
ousar por-so cm isonivadicçào com elle.
134
evidentemente immoraea (43), foi convencida de leviandade
nfto desculpavel, de indifferença culposa para os direitos de
outrem (44) ou para os da verdade (45). Mas deve o juiz
examinar com cuidado os factos em todas as suas circums-
taucias, pesar o acto imputa&o, e considerar attentamente o
caracter individual da testemunha em relaçao a este acto; este
methodo lue servira de guia seg-ura, e o preser-varà de
qualquer juizo temerario. Algumas vezes reflectem
desfavoravelmente sobre a sua pessoa os motivos,«.que o diri-
gir&o nos a,ctos da sua vida ; mas a primeira impressao
modifîca-se singularmente (46), si se deixa de fazer obra
pelas apparencias. Do facto de accusarem estes actos grande
leviandade, de se ter entregue a testemunha à devassidao
condemnavel aos olhos da moral, n8o se deve concluir que
ella queira calar a verdade, e macular-se por um péril urio.
Convem tambem considerar a natureza do testemunho. Se
o depoimento é em defesa, a experiencia diaria mostra que
em taes casos as testemunhas nEo primao por muito
(43) Tittmanu. III, p. 522.-L.3 g 5.-L 15» D. dé Test. (S).
(S) Sobre a primeira lei vide nota (S) n nota 34 do cap. 41. A segunda
prohibo que possa ser testemunna o qm foi condemnado por crime de
concussîïo.
(44) Exemplo: seiUizio uma donzella.
(45) Exemplo: é por todoa conliecido como menti roso o baso.
(16) Algumas vezes. a virtwde e o vicio tocoM de muito porto ; e fac.U-
niento so pôde ser injuste, julgando, os actos d«s ontros: Por «xamplo*
uma imperceptivcl bàrroira sepnru a eeonoiiiiii d.v avurezu.
133
exactas ; persuadein-se que, assira obrando, nio fazem mal
a ninguem, e prestao auxilio a um iufeliz accusado, cuja
conducta em fuirlo uao é por ellas vivamente re-provada
(47) : se o depoimento é coutra o accusado, as Imesoaas.
testemunhas julgariao, segundo a sua consciencia, dever
fallar coutra a verdade.
O depoimento do individuo conhecido pelas suas idéas
antireligiosas (48) uao pôde fazer absoluta ; é a saucçûo
religiosa que dé. à sociedade as mais poderosas garantias
de obedieucia ao juramento, garantias que poderiao ser sup-
pridas pela obrigaçao puramente moral de fallar conforme
a verdade (49).
Outras vezes a crença na veracidade da testemunha é
abalada por causa de certos defeitos particulares ceusu-
raveis ao seu caracter, como a tendencia para a cxage-
raçao, para a mentira, a quai a testemunha pôde ter
cedido no seu depoimento. Certos habitoà perniciosos
podem tambem fazer desconfiar nao ter tido a testemu
nna a calma e a liberdade de espirito necessarias para
a exacta observaçao dos factos, e para délies guardar
memoria fiel (50). I
[il) Alîudimos aos procosso9 em materla de drtello, de delielo politicô.
Frequentemente aa testemunhas julgâo, que pôdem mentir, ao porque
reprovâo o processo.
(48) Mas é 'mister moslrar-ae circumspecto na apreciaçào dos factos
de irreligiào. Nào bas tari», para tornar a {estentnnha suspeita, que um
padre déclara ise nào assistir ella aos offîcios divinos.
(49) A idèa ' noral do dever assenta com effeito sobre uma base bem
frapil na coni'ciencia do homem profundamente irreligioso.
(50) Por exenplo: o habilo da embriaguez.
X3©
A CarolioHMJclassLfica as pessouf desconhecida* enfrë
ad testemunhas àuspis : mas istb é uma consequencia das
antigas iaS populares, segundô as quaes, para que alguem
podesse depôr contra um cidadfto livre, eTa mister que
fosse concido e doraiciliado "(52). Todavia devia-se certa-
mente tomar em consideraçab a circumstancia de ser a teste-
munha produsi inteiramente desconhecida tanto do accu-
sado como dos' juizes (53).
CAPITULO XLIH.
DOS MEI0B DE APRECIAÇÂO DA Ffi DEVIDA AS TESTEMUNHAS.
o dissemos : séria um grave erro rejeitar inteira-
mente a declaraçfio de uma testemunlia, s6 pelo facto de
se dever considera-la suspeita por qualquer dos motrvos
enunciados no capitulo pdente. Nao Ihe reconhecendo
jamais força probatoria, o juiz faria applicaçao cômple-
tamente falsa dos principios que o devem dirigir no seu
exame. Erraria tambem, attribuindo pleiia e igual força
probatoria a todas as testemunhas, que a lei ou a dou-
trina incluirao na categoria das inoapazes e das sus-pei
tas ; e considerando haver prova compléta, desde que
tivessem deposto na causa duas das testemunhas cha-
madas clamcas. Finalmente, tambem haveria engano em
suppôr, que pôde ser matbematicamente avaliada a cre-
dibilidade das testemunbas ; em erigir a theoria que ad-
mitte uma especie de. nivel médio, subindo ou descendu
(61) C. C. G., art. 63,
(52) 0 Tribunal uao tem entâo a possibilidado de se esclarecer sobro
o caracter possoal da testemunlia e sobre todas as particularidades, que
podem depôr a faror da sua eredibilidade. H
£33) Tiltmann, ï. c, III. p. 535.
13T
segundo as circumstancias em cada causa, e para cada
testemunha (1).
Ha autor que toma por padivo ou medida de com-paraçâo um
cidadao tirado da classe média, dotado de intelligencia
ordinaria, de probidade sem nodoa, de-pondo como testemunha
do facto que observou : na sua opiuiao, este.typo tem nui valor
probatorio mêdio, que, ou augmenta, se na causa a testemunba
se distinguir pela sua alta moralidade e pelas suas faculdades
intel-lectuaes ; ou diminue, se carece destas qualidades. Este
systema nao se pôde susteutar (2).
A proposta escala de credibilldade basea-se em dis-ItincçOes
puramente arbitrarias, e nao é possivel deter-miuar préviamente
regras onde os casos divergem ao infinito, e se complicao com
innumeraveis incidentes. Am disso, por este meio chegar-se-
hia frequentemente a con-clusoes total meute falsas, por
exemplo, a capacidade in-tellectual da testeinunha nem sempre
vem corroborar a autoridade do testemunho ; poisque, tratando-
se de um facto simples, um individuo de espirito pouco
cûltivado, poréin com mais experiencia das cousas da vida, deve
depôr mais fielmente do que um distincte sabio. As
circumstancias, que vem augmentai
-
ou diminuir a credi-
bilidade, podem ém suas multiplas combinaçOes dar lugar a
deducçOes totalmente contrarias (3) ; como pois se pôde
(1) E' o qua Bsitham tentou erïgir ém âystema. Vide o Tratado de pvo-
oas, 1, cap. 14.1
(2) Vide as njt .s de Dumont na obra de Bentham precitada, h p. 99-
(8) Exemplo : I .estemunha é parente em igual grao tanto do accusado,
como da parte 1K ida ; soffreu jn uma cohdemnaçâo por delicto politieo ;
mas. por outro \ lo, é conhecida pela sua rigida veracidade.
13R
antecipadamente préciser o valor que à medida média se liade
augmentar de uma parte e tirar da outra? Em uma palavra,
querer constituer uma tabua fixa' de quanti-dades
mathematicas, é ir coutra a evidencia dos factos ; em um caso
dado, um unico motivo de avaliaçûo é mais forte do que très
ou quatro motivos em sentido contrario (4).
Quanto as testemunhas suspeitas, como jà dissemos, é
mister pesar inaduramente todas as circumstancias porque
este estado de suspeiçao basea-se sômente em presumpçoes,
que os factos podem destruir.
Mesmo quanto as proprias testemunhas classicas, assim
chamadas porque nao ha contra o seu testemunho ne-nhum
dos motivos legaes de suspeiçao, nEo se pode dizer que os
seus depoimentos tôm valor igual ; tambem,em re-laçâo a
ellas a fé do juiz apoia-se em uma ou muitas presumpçoes, e é
na occasiao do depoimento que pôde avaliar o grâo de
maior ou menor valor destas presumpçoes. A experiencia
demonstra victoriosamente, à despeito de todos os systemas
que se têm tentado erigir em leis, que o juiz décide neste
momento, como se fosse um jurado (5), e que a sua impressâo
final é o producto de uma multidao de circumstancias
accessorias. Para de-cidir com segurança estas difficeis
questoes, é mister ter conhecimento exacto do coraçao
humano, ' e experiencia da vida. Figueremos uma hypothèse :
uma accusaçao é in-tentada contra dous individuos, sendo um
irmao e o outro amante de uma mulher, que é a testemunha
principal,
(4) A lealdade do homem, o se a talento de observàçâo bem domonstrado
dariâo sempre grande influencia ao seu testemunlio.
(5) Exemplo : quando décide, que a testemunha devë ser acredttada, n2o
obstanto tar soffrido uma condemnaçâo pénal.
6
que esteve em posiçao de poder determinar positiva-
meute a parte que cada um toraou na perpetraçao do
delicto (6). Ella falla, e o seu depoimento é favoravel a aeu
amante, e muito desfavoravel a seu irmao : o que se deverâ
acredita'r"? Dever-se-ha concluir, que a voz do amôr é,
neste caso, mais forte do que a voz do sangue, Isacrificando
o iro ao amante ? Muitas duvidas se elevao, cuja soluçao
nunca poderia conseguir-se com o auxilio do systema das
provas legaes ; ainda ahi nada tem a fazer a Isciencia do
direito, e o juiz deverâ ir procurât os elementos da sua
convicçao no intimo do corao humano.
Regeitemos, pois, mais uma vez as formulas mathema-
ticas, sempre que se tratar da ayaliaçao de probabilidades
moraes (6). O juiz, em presença de um depoimento testemu-
nbal, procède como o historiador, que se basêa nas teste-
munuas dos factos passados para firmar a verdade da. sua
narraçao (8). Exigem a sua prudencia (9) diversas conside-
raçoes, cuja natureza vamos expor :
1.* Deve examinar attentamente as particularidades pliy-
sicas, das quaes dépende a capacidade de observao de qual-
quer testemunha. Esta merece tanto maior credito, quanto
(6) Figure-se a hypothèse de _ um assassinato commettido pelos dons
aceusados na noite de 10 de junho; a testemuuha velou toda a noite ; e im-
porta saber quai dos accusados chegou primeiro à casa em que réside.
(7) Sabe-se que FHangieri, Scieneia, etc., liv. III, p. 1, cas. 15, csforçou-
8e em reduzUlata formulas fixas.
H
(8) Garmignaifi, Délie Leggi, etc.. vol. IV, p. 155.
(9) Cremani, Mi mentajuris crim., liv. III, c.2ft p. 304—223. Globig,
Theoria das Pro\< Widades, 1 parte, p. 155, 2 parte, 137.—Stubel, § 877.
—Tiltmann, Mah il, Itl, § 855—Ord. crim. pruss., § 359.
140
mais exercitados (10) e pénétrantes fôrem os seus orgftos, tra-
tando-se precisamente de factos, que exigem da parte do ob-
servador habilidade prâtica (11). Melhor dotado, a este res-
peito, do que as outras testemunhas, as suas palavras devem
infallivelmente exercer raaior influencia.
2.° È tambem necessarîo examinar as faculdades psycho-
logicas da testemunha. Quem pela sua intelligencia mai»
cultivada comprehende quanto importa considerar exacta-
mente os factos, apanhar a physiomia, que Ihes dao as cir-
cumstancias no meio das quaes se aohao collocados, traduzir
comperfeita fidelidade o resultado das suas observaçOes, me-
rece certamente mais credito do que o homem grosseiro, que
atravessa a vida sem inteliigencia, que a superficie das
cousas, e que, sem calcular nem comprehender bem as
consequencias t&o graves do seu depoimeuto em juizo, falla
inconsideradamente, nao sabendo distinguir o que soube de
sciencia propria e certa do que soube por ouvir dizer.
Quanto mais o facto se complica corn elementos, muitas
(10) Exemple: uma testemunha, dotada de excellente vista, sustenta que
vio o accusado em certa posiçSo ; outra, de vista curta, depôe em sen-tido
contrario.—Frequentemente acontece nào confessarem as testemu-j nhas
a fraqueza dos seus orgàos, sendo algumas vezes necessario recor-rer â
inspecçào ocular, para adqnirir a certeza de que a testemunh a podia ter
viato a certa distancia o que se passou.
(11) Uma vez, em uma cansa crime, convinha verilcar de que modo o
accusado manejava a sua arma de fogo, e sobretudo se elle apontàra para
uma pessoa determinada. Entre as testemunhas havia um habil caça-dor,
que sustentava ter o accusado apontado em certa direcçito; outra
testemunha, ignorante em materia de caça, sustentava o contrario:
indepeudentomente das outras circumstancias, nao teria a primeira
testemunha mais direitos à confianca do juiz ?
141
vezes impalpaveis (12) ; quanto mais se carrega de côres e se
confonde com outros factos que importa conhecer, e,
finalmente, quanto mais necessidade tem o observador de o
apreeiar com exactidao, e tambem de examinar uma rnultidao
de circumstancias accessorias, pouco importantes na
apparencia, mas prendendo-se a outros factos princi-paes (13) ;
tanto mais o juiz se mostrarà severo, e exigirâ da testemunha
um desenvolvimento consideravel das suas faculdades
intellectuaes.- Mas ainda ha outros pontos, que devem chamar a
sua attenç&o.
3.° Em primeiro lugar examinarâ em que estado a testemunha
se achava, quando se deu o acontecimento sobre que depoe. Se
o seu espirito estava sobreexcitado pela pàixao ou por qualquer
outra cousa propria a perturbar a percepçao calma e imparcial
das suas faculdades ; nSo se pôde esperar da sua parte um
depoimento, que mereça plena fé. Se o acontecimento era
completamente indifférente à testemunha, e ao mesmo tempo
estava esta absorta pela contemplaç&o de um outro objecto, por
exemplo, pelo seu amor ; ou se estava escandecida pelo vinbo ;
ou inteiramente preocçupada com uma ma noticia ; ou,
finalmente, se o proprio acontecimento, de que se trata, abalara
violentamente todo o seu ser : em todas estas hypothèses, nîio
tendo a testemunha observado os acontecimentos, como o faria
um viandante desinteresado, a sua declaraçao nao poderâ
satisfazer tanto a consciencia do juiz.
4.° Este deverà tambem examinar a moralidade da teste-
(12) Exemplo :t rata-se de verificar na testemunha a esistenoia de
uma inimisade »< culta ou de uma molestia mental.
(18) Taes convi a posiçâo de certos objectes ao do cadaver da
victima ; a extens lo o o numéro das manohas de sangue ; mesmo a
existencia certa li tfas manchas por todo o lugar do crime.
munha, Quanto mais firme, veridico e surdo a todas as in-
fluencias exteriores se mostrou sempre um individuo ; quanto
mais puras forem as suas opinioes moraes e reïigiosas mani-
festadas pelas suas palavras e pelos actos da sua vida, nunca
desviada do caniinho do dever pelos intéresses materiaes ;
tanto mais credito merecerà o aea depoimento. Lembremo-nos
de que é grande o numéro daquelles, que traficao com a sua
consciencia ; daquelles que, sob o pretexto de que o fim sanc-
tifica os meios, julg&o-se autorisados, quando a accusaçao
répugna as suas idéas, ou quando acreditâo na innocencia] do
réo, a negar os factos de que forao espectadores, a occultar as
mais graves circumstancias accessorias, ou a dar-lhes um
caracter inteiramente phantasiado. Ora, isto é o que jamais
sera capaz de fazer o homem, cuja leal-dade tem por norma o-
principio moral: por isso o caracter da testemunlia fornece um
excellente meio de apreciar as suas palavras pelo seu justo
valor.
5.° Nao devem passar desapercebidas certas particula-
ridades na pessoa de cada testemunha. Em regra, o sexo nao
deveria ser razao de differença (14) ; a mulher é capaz de
observar os factos tao bem como o homem, e de tao fielmente
dar conta délies ; e se nas idéas dos nossos antepassados (15)
ella occupava posiç&o muito secundaria e nao inerecida ; se
entao parecia, que ella nao podia ser
(14; Vide, a este respoito, as nuraerosas discussÔes nos livras dos
antigos doutoros.— Clams, ltb. Y, g 20, n. 24.—Boehmer, ad Carpzov.
quœst. 114. obs> 5.
(15; 0, 10, de verb. sigif.. o. %c. XV. qu. 3. (S). Cramant, elementa,
III p. 180.
(S) Nam varium et mutabile teslimommn sempre femina producit.
143
admittidâ ao testemunho solemne, o tempo e a civilisa-oao
oondemnarao estas idéas erroneas, nao bavendo razao para
que o seu depoimento sêja me nos crivel (16). Ainda mais,
em certos casos, tratando-se de objectos, que entrao mais
naturalmente no circule das cousas, que a interés-sûo (17),
ella examinara melhor do que o bon*em ; porém se pelo
contrario se trata de objectos ordinariamente in-différentes
para ella, p6de acontecer (18) nao ter ella prestado a
attençao e seriedade necessarias ao aconteci-mento, de que
por acaso foi espectadora, e nao poder pesar maduramente
o alcance e a exactidao do seu de-poimentoi Em conclusao
diremos, que tudo pende das circumstancias, e que nâo é
directamente por causa do seu sexo que a sua palavra pôde
ser posta em duvida. Jâ nâo te m mais inyportancia a
religi&o a que pertence a testemunba. O espirito de
intolerancia espalhava outr'ora o prejuizo, de que o
depoimento de um judeu nao podia ter força contra um
christao (19). Suppunba-se entao que 0 judeu era
autorisado pela sua lei religiosa a perjurar em juvzo ;
acreditava-se tambem que o odio inveterado do povo de
Israël contra os ebristaos os levava a pre-judicar a estes por
todos os meios posaiveis. Mas o es-
(16) Geatcrdirig, Intestigiet,..., 1, p. S07
(17i Exemplo, tratando-se de uma gravldez, do unin ucio si dades do
vistuario, etc.
(18J Por exeinilo, cm materia de particularidades politicas.
(19) Vide L. 11 Cod. de Hereticis (S).—ûrd. crim. prusa., § 357. n. 8.
(S) Prohibe qtt' umjudeo ou heretico possa depôr contra um orto-
doxo; mas permute o depoimento délies nas causas dos sens corre-
ligionarios,-
144
tudo da lei judaica e a ohservaçao intelligente dos factos (20)
dernonstrarao a falsidade de tal theoria (21). Duas hypothèses
unicas podem apresentar-se, deixahdo duvidas ao juiz :
1." Quando a testemunha nao tiver prestado juramento
na forma da sua religi&o (22) ; I
2.' Quando a causa fornecer materia para asinimi-zades de
seita, sendo uma das partes interessadas corre-ligionaria da
testemunha ; mas ainda aqui convêm ob-servar, que a
lealdade bem conhecida da testemunha faria desapparecer as
objecçoes.
6." 0 conteûdo do depoimento contribue muito para fixar o
seu grâo de credibilidade. A testemunha, ou prova e seu
conhecimeuto dos factos por meio de razoes positivas,
demonstrando que esteve présente no lugar do acontecimento,
e que era impossivel que errasse; ou, pelo contrario, confessa
que estava afastada, que obstaculos intermediarios a impe-
dirao de ver tudo, e que a sua convicçao completou-se peloa
ditos de outra pessoa: é fora de duvida, que no primeiro caso
o seu depoimento tem muito maior autoridade. E, se pôde
indicar até as menores particularidades do acontecimento,
emquanto que outra testemunha, nada sabendo dizer, de-
monstra que observou de um modo incompleto e superfi-
cial, o seu depoimento deve ainda mais ser preferido.
7.° O juiz, finalmente, deve estudar a propria forma do
depoimento. A postura calma e firme da testemunha, a fran-
queza simples e tranquilla das suas respostas, a uni-
(20) Vide a obra do autor intitulada— Principios do Dir. priv. mît. g
117. not. 20.
(21) Tittmann, III. p. 425. « (22) Vide o Proe. crira. coinp., 2»
parte, cap. 133 in fin.
146
formidade dos seos ditos e a sua precisRo sâo outras tantas
provas da sua observaç&o attenta dos factos e da sua
inteira veracidâde ; sô por isso, as suas palavras adquirirào
autoridade poderosa. Quando, pelo contrario, a sua attitude
indien a violencia ou a paix&o, deve-se logo desconBar da
sua imparcialidade : se recita com sïngular vivacidade uma
declaraçao evideutemente insinuada, pa-rece seguir
cegainente as inspiraçôes de outrem : se hésita e se
embaraça nas suas respostas, o magistrado deve pensar, ou
que obiervou mal, ou que nao réfère fiel-mente o que sabe
(S).
CAPITULO XLIY.
DOS FCNDAMENTOS DO POUER DO TKST^MUSHO.
Allega-se uni facto, que pôde ter certa influeneia no pro-
cesso, quer contra, quer a favor do accusado : para que o
juiz o considère, como demonstrado pelas testemunhas, é
mister que exist&o certas garantie, e se preench&o diversas
condiçoes:
1." Ê necessario que o depoimento émane de testemunhas
teconhecidas dignas de fé;
2.* Que estas testemunhas teno prestado juramento se-
gunao as prescripçoes legaes, e na forma da sua religi&o;
3." Que os factos sobre que depoem tenhâo podido cahir di-
rectamente sob os seus sentidos. Muitas vezes, com effeito, o
testemunho, para ser positivo, deve emanar de um perito." sô
elle séria cantvz de observai- certas circumstancias pouco
(S) A nossa la islaçào, erigindo em piincipio a tolerancia religiosa, foi fiel e
conseqi nte na applicaçâo. Podem depùr no mesmo nivel as testemunhas oi
diversas religiôes, comtanto que prestem juramento segundo o seu ril Cod.
do Proc., Art. 86.1
14 O
apparentes, qua a.qualquer outro escapariao; outras vezes, foi
rai&ter oemprego de'instrumentas dasua arte (l)', ou ao me-nos
um minucioso exame, que sô poderia ser feito sufficiente-
meute por um homem experimentado (2) ; finalraente, outras
vezes, é necessaria* uma descripç&o pratica do objecto obser-
vado (3), para se poder dedusir justas conclusses. Quando as
declaraçoes das testemunhas nao se apoiao unicamente ua
experiencia ordinaria dos sentidos; quando exprimem somente
uma supposiçao, uma opiniao baseada em um en-cadêamento
de raciocinios por ellas feitos, o seu depoimento jâ nao
pôdepor si formai- a convicçao. Quando alguem déclara
que A. alimenta va cbntra-B. odio mortal ; que C. é um
homem perverso e perigoso, o seu testemunho nao se apoia em
um facto material, podendo cahir sob os sentidos ; o que faz,
é tirar dos actos ja conhecidos a conclus&o de que o, accusado
é depravado : mas se deixa de mencionar os factos, que sao a
manifestaçao necessaria desta depravaçSo, a sua declaraçao
nao merece credito. Qualquer que ella seja, nao pôde
directamente provar nada mais do que a existenciâ destes
factos productores sem tirar conclusses ; ao juiz, e a elle,
compete esta segunda missao.
4." O testemunho merece credito, quando se apoia na
observaçao pessoal daquelle que o dà (4). Segue»se dahi, que
elle deve ser interrogado sobre a raz&o de sciencia que
(1) Si se tratou, por'exemplo, de verifîcav a profundidade de um fe-
rimento.
(2) Por exemplo, quando se trata de descrever o estado das bordas do
ferimento. ?, j,v'
(3) Exemplo : a testomunha é interrogada sobre a côr que tinhSo os
pulmôes na occasiSa das experiencias, sobro a côr das chagas e con-
tusôesi etc., etc.
(4) Piccardt, de Fide testium, p. 729.—Cod. bavar... art. 277.
14 r
dos factos tem. Vê-se frequentemente, pessoas muito respeita-
\eis affirmarem o que ouvirao de terceiros, nao menos respei-
taveis, de modo a fazerem persuadir involuntariamente, que
ellas forao testemunbas originarias do facto; por isso, quando
o debate versa sobre acontecimentos, que tiverao lugar no
ineio de numeroso ajuntamento, deve-se ter cuidado em tirar
betn a limpo, quaes os factos de que a testcmunna foi
pessoalmento espectadora.
5.* O depoimento deve ser verosimU, isto é, o seu conteùdo
deve ser conforme corn as leis naturaes : as circumstancias
do facto taobem devem estar em correlaçao logica entre si.
A testemunha nao séria acreditada, se attribuisse ao accusado
um acto, que lbe fosse materralmente impossivel por causa
das suas faculdades pbysicas. Finalmente os ditos da
testemunba, para serem verosimeis, devem estar de acôrdo
com a situaçao que ella ocupava no momento do aconteci-
mento; dévia ser-lhe possivel, nas circumstancias especiaes
em que se acbava, observar os factos taes como déclara te-
los observado; d'abi nasce para o juiz o dever de esclarecer
as duvidas, que porventura surgirem, quer pelo seu exama
local (5), quer por meio de peritos (6).
6* Poréui a mais forte garautia da credibiiidade do tes-
temunho é o seu perfeito acôrdo com os resultados for-
necidos pelas outras provas (7). Se a testemunba é em um
ponto convencida de mentira, ou de erro, o juiz nao p6de
deixar de conceber desconfiança e duvidas, ou
(5) Exemplo: quando a testemunha protende ter «uvido certas pala-
vras, nâo obstante estar na distaneia de 300 passos.
(6)T.xpraplo : quando affirma ter rnconliecido o aamSado, de noite, e oo
clavào produzido pela detonaçào de uma pistola.
(7) Tittmann, HI, p. 520,—Ood. Bavar., ait. 279.
14 «
sobre a sua boa , ou sobre as suas faculdades de obser-
vaçan; pelo contrario, porem, cresce a sua convifto,
quando, confirmado e corroborado o testemunho por
todas as outras provas da causa. Entretanto nai se deve
exigir em sentido. absoluto esta garantia, Nao é
indispensavel que todas as circumstancias sejao sempre
corroboradas por outras provas; e mesruo quando estas
em um ou outra ponto desmentem as declaroes da teste-
raunha, u&o se segue que o testemunho deva logo ser
regeitado. Levar a applicaçao do principio até a conse-
quencias tao extremas, séria auniquilar a prova teste-
munhal em uma multidao de casos, mesmo naquelles em
que ella émanasse dos homens mais proprios para
fornece-la ; séria portante abrir porta larga i irapuuidade
dos criminosos. Nao séria mejjwr, neste systema, absolver
o accusado, serapre que nao houver contra as suasob-
tinadas deuegaçoes outra prova, alem do depoimento
singular de uma testemunha, eapectadora do crime ? Vê-se,
testemunhas de boa fé eng'anarem-se em relaçao a cer tas cir-
cumstancias, que podiao ter esca^ado à sua observao ou à
sua memoria; mas conservarem gravado no seu espirito o facto
principal (8). Digamos, pois, que a contradiao entre a de-
claraçao da testemunha e os factos demonstrados por outras
provas sô pôde diminuir a credibilidade, aliàs dévida, quando
necessari ameute versa sobre circumstancias, que ella nao
podia deixar de ver e conservar em memoria. Em outros
termos, se as provas da causa demonstrao, que é maliciosa-
mente inventada a circumstancia principal declarada pela.
(8) A testemunha, que via commetter o assassinato, lembra-se perfei-
tamente de quem o commettes» e, an nos dépôts, poderà designar o seu
autor ; mas si se llio porgunta que vastuario. trazla o criniinoso, qnantas
punhaladas deo, sera l'ucU o errô.
i
149
testèmunba, deixa esta logo deser crida (9). 0 mesmo se
deve dizer, quando se prova por outros meios a im-
possibilidade do facto tal como é enunciado, sendo, alein
disso, inexplicavel o erro de boa fé. A testemunb-a affirma,
por exemplo, que vio À. fepir JB. no coraçao na manhfio
do dia 16 de Junbo ; ora, outras duas vir&o B. de
perfeita ' saude na noite desse mesmo dia : como
dar credito à declaraçao da primeira teste-? munûa ?
"Orna confusâo involuntaria entre a manba e a noite nao é
cousa possivel. Mas se a parte da declaraçao
demonstrada erronea nao versa sobre facto essen-cial, o
erro explica-se facilmente por falta de memoria ou por
outra causa ; comprehende-se que a testèmunba mais
conscienciosa possa cabir nelle involuntariamente, e esta
contradieçao sem importancia nao abala a lé que lhe é
dévida. Se diz, por exemplo que o assassinato tove luger
as 7 boras da manba, quando se prova que as 7 boras e meia
a victima vivia ainda, comprebende se logo ser facil em tal
caso o erro, tendo por causa talvez o andar différente
de dous relogios (10), nao se podeu-do, se por essa razao,
duvidar da credibilidade da teste-munba, É mister, alem
disso, examinar sempre o modo pelo quai esta faz a sua
declaraçao relativa ao ponto sobre que versa a
contradieçao. Se em lugar de affinnar positivamente, a
testèmunba sô euuncia uma simples sup-posiçao, a
contradieçao nao vale a pena de ser, tomada em
consideraçao*; separando «laramente os factos sobre
. (0) Exemplo : a testemunha affirma que A. matou B. com uma facada,
e os peritoe, depois da autopsia, declarâo que o forimonto provoio de
uma arma de fogo.
(10) A. somma cb dinhoiro tlado, por exemplo, pôle perfeittimcpto
bsuupar à memoria do homeia o mais conscicncioso.
que devarifto ter produzido no sëu
-
ëlpïïitq uuu» im|ïr*fcj
indelevel, se a testciuunha tivcs.se sido realmente espèce tora
do acbntecîmeatô (13) ; ou quando teune no seu depoi-niento
circumstancias iu'conciliaveis entre si, e que o tornao
necessariamente erfoneo sobre um ou outro ponto (14); '
A convicçao do juiz nîio pôde -epoiar-se no depoimento,
senao quando este é prestado pela testemunlia em pessoa,
I peraute o tribunal compétente, e com interrogatorio regu-
1 lar, Urau declaraçao extrajudicial, por mais s
que. sejîio os ouvintes, é insufficiente (15} ; com efteito,
nada garante ter a testemunlia pesado maduramente a
gravidade do seu depoimento ; nenlium vinculo légal a obri-
gava a dizsr a verdade ; e podia tauito bem ter referido
uma versao falsa por estouvameuto, para diverti r-se a custa
de outrem, por jactancia, ou finslmente pelo desejo de
protéger ou prejudicar ao accusado. E' mister, pois, que
o interrogatorio seja feito perante o juiz compétente (16) :
P porque somente entao pode-se e deve-se suppûr terem sido
P satisfeitas todas il prescripçoes indispensaveis da lei e
de prudencia, cujo cumprimento garante ter a testemunlia
fallado somente conforme as suas convicjoes. Os offres)
Ejomplo : a t"stpmunhn éaelura ter visto A tarir B Com uma focnda ;
depois, no meswo interrogatorio affirma que A matou B rom um tiro do
pistola. K' osse um facto sobre a quai n3o devenu jamais oûiitradizcr-so.
B (14) Ëxomplo * déclara que A carteu com uma jiavalha a garganta
do B, o accrescenta quo B teve depois com A ma longo dialogo.
(15) Tittmann, III, § 858.— Hopp, Documentos Ingislativos para a liesse,
V. p. 188.
\\ (16) Kleiuscurod, AJ'C7I. do Dir. erim. VU. p. \&\ Quistorp. Princi-" '\
pios do ÎHr. crim. § 606.
153
ciaea da policia judiciaria e os tribunaos ciyis usao corn
demasiada facilidade de meios suggestives prejudiciaes â
manifestaçao da verdade. Concluamos: o comparecimento
pessoal da testemunha e o seu depoimento em juizo. s5o
elementos esseaciaes do testemunho. A sua declaraçao por
escripto, enviada ao magistrado, certamente nâo pôde bastar :
no processo verbal nada indica quaes forao as suggestoes
empregadas, e finalmenle a testemunha nao podia ter-se
compenetrado inteirainente da importancia da sua missae.
9.* O testemunho deve ser livre e espontaneo. Se a declaraçao
foi feita sob o imperio do constrangimento ou da ameaça ; si se
empregarao meios de coacçao, taes como a prisao, para obrigar
a testemunha a fallar contra o accusado, ella nûo de ser crida.
(17). Quando, pela sua obstinaçâo em desobedecer à lei e em
recusar-oe a depôr, a peua foi contra ella decretada, nao se pôde
induzir por isso uma reprôva contra o seu depoimento ; a
puniçao nfio tem por fim obriga-la a fallarem um sentido ex-
clusivo, mas simplesmente conforme a verdade; e a applicaçao
de taes medidas jamais poderia colloca-la em situaçao tao
critica, como aqnella em que, pelo temor da pena imminente,
um homem naturalmente verdadeiro preferisse dar um
depoimento falso. Mas ao magistrado instructor compete fazer
uao discrète e prudente do constrangimento ao depoimento ;
deverà evitar com cuidado tudo o que possa fazer suppôr à
testemunha, que délia se quer uma declaraçao preconcebida
(18) ; e lhe fara
(17) O mesmo SQ deve disser, quando eonsta do processo que o accu-do
ou, seuB ainigos usârào de ameaças para déterminai* a testemunha a
fallar favoravelmente.
(18) Go m», por cxemplo, dizar que A. é o autor do crime.
II. . ao
1Î54
seinpre comprehénder, que &6 se espéra a verdade pura.
Portante, s6 coino uieio cxtremo, quando forao infructi-feros
todos os esforçoa para o comparée imento da testemunha, é
que se deve usar de rigor (19) (20).
10. O testemunho nao merece crédite, quando a teste-
munha foi yictima de um embuste. Ora, este pôde ter por
effeito fazer èrer a testemunha que assistio real-mente à
execuçao de um facto puramente chimerico (21) ; ou teve
bastante força para faze-la depôr contra a Yer» dade,
suppondo nao haver nisso perigo para ninguem ; outras vezes
é levada ao erro sobre o proprio sentido das perguntas que lhe
sao feitas. No segundo destes casos, se, por exemplo, a
persuadem falsamënte, que o accusado nao tem que soffrer
pena alguma, que somente se trata de obter a confirmaçâo de
outros depoimentos importantes sob outro ponto de vista, lia
àhi evidentemente uma suggestao mentirosa das mais
perigosas. As pergun-tas subtis e capciosas merecem" igual
reprovaçao. A levi-andade natural em tantes homens, que
muitas vezes fal-lao sem pesar sufficientemente as
consequencias das suas pa-lavras ; a perturbaçao de espirito^
que nao pôde ser ven-•cida, em muitos daquelles que pela
primeira vez depoem
(19) Taes sao a coacrâo corpoxal e a mulla.
(20) Muitas TOZQS a récusa de fallar ou de prestar jurawento tem a sua
origem em prejuizos religiosos. O juiz, em. tal c.isô, pôde cliamar on
sacerdotc para esclarecer a consciencia da testemunha.
(21) Entretanto toda a suggestao mentirosa nâo destroe infallivel-mente
o valor da testemunha. U«na vez o magistrado inqnisidor fez crer a
testemunha que o pccusodo tinha confessado. e apresentando-lhe um
hilhete, em que a letra desto estava fulsificada, levon-a a dizer o que
sabia. A testemnhha fallou segundo a verdade: e se o juiz commette a um
acto condein navel, o depoimento conservon toda a sua forçi, pois qui
o resultaJo das suggestôes nSo foi a men-
I lira.
133
em juizo, sao bastantes para que a testemunba militas yezes
comprehenda mal a pergunta que lhe é feita, e responda contra a
verdade, querendo sinceramente rcspon-der ao que julga que lhe
foi perguatado. Importa muito, para julgar do valor do
testemunho, conueeer o texte e a substancia das perguntas (22),
e aqui devemos protestar contra a pratica tao seguida de se
fazerem perguntas, que em si contem muitas outras (23).
11° O depoiwento deve ser original, isto ê, deve ser a
expressâo espontanea da convicçao da testemunha. Se fosse
suggerido, perderia logo este caracter. Entretanto, do facto de se
dirigir uma pergunta suggeativa, nao se-segue. que o
testemunho fique logo viciado: sabe-se que um interrogatorio
nao pôde ter lugar sem que se faça algumas destas perguntas. Ha
homens que nunca respondem a um interrogatorio, sob a forma
gérai, e que evi-tao cuidadosamente dizer uma palavra com
relaçao ao ponto capital, com* receio de serem obrigados a
explicar-se de modo categorico (24). Àlem disso, a
snggéstao
(3*2) Gonvem pois eondemnar os procctfsos verbaes* que sô reprodu-
zom as rospostas da testemunha sob a forma de narraçâo contin ua.
C23) Exemplo : sabo, se A. proferio estas ou aquollas palavras, c se
entâo ameacou B. com a sua facaf A. gento do campo, aquellos cujal
educaçâo foi pouco cultivada» se lembrao de ordiriario, como e expo"
riencia frequintemente domonstra, do final das perguntas, que lhes sSo
feitas, e quando respondem por nm sim a ultima. parte destas modem
lerar o julz a suppôr, que respondem affirmativamente sobre todas.
(24) Exemplo : o juin quer sabev da testemunha, se o accus ado, no
dia 16 de Janeiro, pratioou estes "ou aquellos actos èm certa cstala-
gem. Intorroja prudentemente, e pergunta, se a testemunha estevo nesse
,dia na dlta estilagnm, que pessoas ahi se achavâo eom elle? A. teste-
munha rflspondp, mas snm mencionar o aecnsado; é necessario por*
tunlo, quo r> iiiqiiisidov acabn por parguntar-lhe aintln, se « tiocnsailo
tambem abi se achava"? se elle fez isto ou aquillo? -
muitas vezes s6 tevé por fim indicar à testemunha o que o juiz
tem necessidade de saber délia, e n5o ha embaraço em que
esta déclare toda a verdade. Por outro lado as sug-gesteses sao
perigosas, porque certas testemunhas respon-dem.
aflSjmativamente, umas por leviandade e para mais depressa
serem despedidas, outras por timidez e embaraço, suppondo
sempre que o inquisidor sabe pèrfeitamente tudo quarito se
passou, e que n&o poderia fazer-lhes pergun-tas tao précisas,
se o facto lhe fosse desconhecido (25). Outras vezes, tendo-se
esquecido a testemunha quasi total** mente de
circumstancias menos importantes, affirma, para sahir do
embaraço, a realidade de certas circumstancias, que o
magistrado lhe relata ; ou entao, tendo interesse em dissimular
a verdade, aproveita-se da occasiao, que lhe proporciona a
pergunta suggestivà do juiz, para pôr este em mâo caminho
(26). Todos estes motivos de desconfi-ança surgirao, pois,
contra o testemunho assim produzido, sem que todavia-së
possa exigir em regra a sua rejeiçao absoluta (27). O que deve
decidir em cada especie sao as circumstancias. Em
conclus&o, diremos que a dévida, ao testemunho sera
gravemente abalada :
a.) Quando as suggestoes forem numerosas, e versarem
sobre os principaes ponjos do depoimento ;
b.) Quando, nao podendo o corpo de delicto ser provado
(25) Gom effeito, é naturel que o tom de certeza com que sào
feitas as perguntas, imponha sîngularmente a certas pessoas.
,.
(26) ES* por isso que è sempre perigoso suggerir ao accusado o nome
de seu cumplice presumido.
(27) Kleinschrod, QuestZes do Dfo*. crim., 1» parie, n. 2, S 17 e 19.—
Bentbam, Tratado da$ Propos, 1. p. 122.— Parât, dos SuggestVes, p.' III,
15T
senao pela prova testemunhal, a testemunha tiver fallado
somente por causa das suggestoes ;
c) Quando se referirem à revelaç&o do nome de um
complice ;
d,) Quando, sobre uma circumstancia a respeito da quai
sedeve produzir nraitosdepoimentos concordes, as mesmas
perguntas suggestivas forem dirigidas a muitas testemu-
nhas;
e.) Finalmente, quando a testemunha inspirar por si
pouca connança, e quando a sua attitude trahir a falta de
independencia e de intelligencia : neste caso, em lugar de
relatar somente o que vio, poderia deixar-se levar pelas
idéas de outra pessoa, e fallar contra a verdade, querendo
dizer o que percebe desejarem que ella diga.
12 Finalmente, para que o facto em questao pareça
completamente demonstrado pela prova testemunhal, é
mister, pelo menos, o depoimento de duas testemunhas
contestes em todas as circunstancias essenciaes. A sua
unanimidade é uma forte garantia, e nao se pôde sup-pôr
no testemunho erro ou ma vontade, quando a segunda
testemunha faz uma declaraçao independeate, mas iden-
tica à précédente ; as suas palavras, pela comparaçao entre
ellas, adquirem mais força ; e, para haver mentira, séria
necessario suppôr da sua parte nada menos do que um
conluio criminoso. Alem disso, ellas o interrogadas
separadamente (28), e contanto que as suas respostas nao
(98) E' essentiel observar a regra que exige, que as testemunhas sejào-.
interrogadîs separadamente : a presença de ura tcrceiro pôde itnpôr ao
interrogado, e provocar da sua parte numerosaa reticen-cias: alem disso,
acontece muitas vezes, que aquelle que ouve» nSo peroebe logo as
calculadas. dissimulasses daquelle que falla, e com perfeiti bo.i fé ô
levado a Ullar como o primejro.
ISS
sejao éuggeridas quanto as circumstancias, é facil ao
magistrado, no caso de fraude, convence-las logo de im-
posture. A confiança vai
%
pois, crescendo à medida que maior
numéro de testemuuhas tiver a mesma linguagem, até nas
mesmas par ticularidades. Pelo contrario, a fajta de
concordancia prejudica ao testeinunho, mprmente se. este
versa sobre factos, que, se à elles tivessem assistid.Q as
testemunhas, deviao ter sido observados de modo neces-
sariamente uniforme,, nao os podeado ellas facilmente.
esquecer. A data do crime, o vestuario do seu autor, as
palavras que pronunciou sao cousas muito importantes, e o
juiz tem difficuldade em convencer-se, quando das duas
testemunhas que désigna© A., como o assassino de B. uma
affirma que A. trazia fato branco, e fèrio B. pela frente com
uma paulada sobre a cabeça, em quanto que a outra déclara
que A. trazia fato verde e ferio B. pelas costas com uma
punhalada. Entretanto a falta de concordancia pôde militas
vezes explicàr-se pela confusao em que ficarao os assis tentes
do crime : emquanto a teste-mnnlia dirige a sua attençao para
certas circumstancias, outras lhe escapao (29). Em tal caso, a
contradicçao das testemunhas nao tem importancia. O mesmo
acontece, quando se trata de circumstancias accessorias, cujos
caractères, em razao da sua propria natureza, sao susceptivôls
de apreciaçoes différentes por aquelles que os observ(33),
ou que podem facilmente, depois de certo tempo, ser esque-
cidos completamente (31).
(29) Por exempta, as palavras proferidas.
(30) Exempta :, os factos passarâo-së à hora de crepuscalo; Uma
testemunha déclara que A,> tînlià, uma casaca v«rdo escura : outra que
era azul.
31) Exemplo: séria as 7 lioraa on fis 7 e meiaï
15Ô
CAMTULO XLV.
DO El'FEITO DO TESTEMUNHO.
dissemos; por que razao a convicçao do juiz se
deve formar pela declaraçao identîca de duas testemu-nhas
pelo menos (1), cujos depoimentos se confirmEo um pelo
outro; dissemos que duas pessoas interrogadas se-
paradamente nao poderiao fornecer exactement** a mesma
relaçâo dos factos, se am^bas nao os couhecessem pela
evidencia naturai, e pela sua presenea no lugar do acon-
tecimenlo. Estes motivos, quasi sempre applicaveis, derao
origem a regra bem couhecida, que se acba em todos as
legislaçOes, que décrétarâo para o juiz prescrip-çoes fixas
em materia de prova /2). Nao obstante o direito roman o nao
ter creado a respeito umadoutrina compléta (3);
a
(1) Cremani, Elem. jur. crim., III, p. £07. — Klein, Da prova testemu-
rihal na sua Miscellanea, v. 8, p. 49.—Globig, Theoria das pvobabilidades,
I, p. 167. — Protobevera, Materiaes législatives, VII, p. 256. — Globig,
Censura rei judic., II, p. 195. — Oarroignani. Teoria dclla sicureza, IV»
p. 154. —Na França a maxima Testis unus, tes$s nullus, nâo tem mais
valor senâo eomo argumente de discussào, ou como regra de prudencia
para o juiz : a apreciaçâo dos testemuulios ahi é exelasivamente moral ;
e nesta materia, como em qualquer outra, o magistrado deve seguir a
sua convicçao intima e feflectida. Todavia este capitnlo contem excel-|
lentes conselhos para por em pratica. Alem disso todas as questôesl
que ahi sa distinguem tâoboni pertenciâo ao nosso direito anterior à re*
voluçfto. Vide -> Proc. arim. camp., cap, 173, para as particularidades
historicas; e qnanto à legislaçào franceza prine'ipalmente, vide o etcel-
lente livro de M. Bonnler ns. 199, 206, 317 e seguintes.. Çg. D. T. F.)
(2) Cod. austr.» g 409.—Orden. crim. prutfs., g 386 —CoJ. bav. §285.
' (3) L. 12, D. de Testib., L. 9, Cod. de Testib. (S).
(S) A primeira lei diz: Qvando nâo é determinado o numéro âas teste-
mxmhas, bast&o duas: quando se serve do termo testent unhas no plural é
sufflciente o numéro de duas.
A segunda diz : As leis nâo permutent que alguem possa depôr em causa
propriU. .
I
1GO
nao obstante o direito canonico ter-se limitado a transcrever
certas formulas extrahidas das leis bibli-cas. (4) ; e finalmente
a Carolina ter determinado que sômente duos ou très boas
lestemunhas podem satisfazèr & consciencia do juiz (5) ;
todavia no fundo de todos estes textos, a que alludimos,'
achamos o principio de que uma sô testemunha nao de
bastar para a condémnaç&o (6). M'as entender a regra no
sëntido (7) de dever ser 'cbnf sïderado provado todo o facto,
sobre o quai dUas teste-munbas depoem affirmativamente, é
cahir em um excesso deploravel ; dous malvados que se
combinassem para a
(4) G. 5,10,, 23, 25, 27, X. de Testib. (g).
(5) 6 Douter, c. 17 v. 6 proliibia que se eondêmnasse â morte polo
depoimento de uma testemuuha singular. O direito canonico estendeu
esta.regra a todaa as causas, Gap. 23, X. de Testib.; Balvo os casos espe-
eiaes previstos nas leis, como o do baplismo, para o quai se admitte 0
attestado singular do sacerdote ; o do casamento incestuoao, para o quai
basta o depoimento singular da mai, 1. 22 X. de TesHb,
(5) C. C. C., art. 87.
(6) Carpsow Praxis rer. crim. quoest., 114, v. 46. Quistorp § '«05.--
Tittmann, ManuaL. 14, g 657.
(7) £' esse o senttdo, qa* ao aystema allemâb da prova emprestSô os
escriptores francezes, que o impugnâo. e o desacreditào. Vide por esemplq
Mi»yer, Espirito dos iiislituiçôes judiciarias, voL 2, p. 363, das notas.—
Observaremos, que, mesmo em France, a doutrina e a jurlaprudencia
antigas attribuiào força inveacivel a dous depoimentos contestes. Em
1786, por oecasiâo da fumosa memoria de Dûpaty em defesa dos très ho-
mens condemnados ao supplicio da roda, cuja supprèssào sustentera, o
advogado gérai Seguier exclama va : O depoimento de duas testemunhas
contestes deve passar por uma prova complota, segundo as leis divi/nas e
humanas,,. o nagistrado, o mais ingra, pôde ser surprendido, mas naâa
perde da sua dignida.de, quando se conformou com a vontàde da IM.
(N. T. F.)
161
condemnaçao de um innocente, conseguiriâo seguramente o seu
fim dando dous depoimentos conformes. A maxima Unus tesbis,
testis nullus nâo tem esse alcance, e se o juiz nao pôde basear a
condemnaçao senâo sobre o depoi-mento conteste pelo menos de
duas testemunhas, nao se segue .que seja forçado a condemnar
pelo seu testera u-nho ; deve aqui, como sempre, examiuar, se
reunem todas as condiçGes de «redibilidade requeridas ; em uma
pala-vra, deve convencer-se da sua verdade. Aprecia livre-mente
6 segundo a sua consciencia, se cada uma das testemunhas
offerece pessoalmente garantias legaes, se as suas declaraçOes
sao verosimeis, se concordao com as cir-cumstancias
demonstradas pelas outras provas, e ainda que as testemunhas
sejao em maior numéro, Mo ficando elle convencido da
culpabilidade, deve regular-se somente pela sua convicçao.
A maxima da exclusâo da testemunha singular é garantia
concedida â innocencia, e torna impossivel uma sentença dictada
por temeraria confiança no depoimento produ-. zido. Quando
duas testemunhas declàrao em juizo terem visto Pedro matar
Paulo, ha sete annos, e depois lançar o cadaver à agua; sera
isso bastante para que Pedro possa ser condemnado *? E
ainda quando fosse verdade ter Paulo desapparecido, ha muitos
annos, o corpo de de-licto fica sempre por provar ; alem disso,
sera necessario examinar, se Pedro teve qualquer interesse em
commetter o crime ; se na referida época foi visto perto do lugar
indi-cado pelas testemunhas; e finalmente se tal crime p<5de
ser-lhe imputado em razao dos seus antécédentes. O juiz
examinarà depois, se outras provas vêm demonstrar a realidade
dos factos relatados pelas duas testemunhas ; se os seus
depoimentos sao contestes até nas menores circum-stancias. Se
lhe restar a menor duvida sobre a verdade
1«3
dos depoiméntôs, pôde; déclarai- logo que o orfme nfto esta
sufficientèmente provado, nao obstante as presumpçoes
existantes.
Tein-se indagado niuitas vêzes : qùaes os factos sobre que
deve verSar a d'eelaraçâo de. diïas testemunhas ?
questfio, em cuja soluç&o, por querer-se sëguir a todo
custô o rigor do principio, cahio-se em uma doutrina er-ronea.
Pedro é accusado de ter matado Pauîo em um con-fticto
popular : duas testemunhas Virâo o primeiro lançar-se sobre a
sua victima com a>.faca levantada, exclamando : « E' précise
que eu o mate ; » ouvir&o Paulo designa-lo como o seu
assassino ; mas n&O o 'virao descarregar o golpe ;
aflîrmâo sômente que o sangue corria em jorros do seu péit'o
(8). P'6de-se duvidar de que a prova teste-mùnhal seja aqui
compléta? Nao admitti-la, séria errar por espirito de systema.
As testemunhas provao clara« mente a existencia de factos
successivos, ligando-se entre Si de tal sorte, que a existencia
do crime é a sua conse-quencia necessaria, e que os factos
intermediarios, nao percebidos por ellas, devem ser
considerados verdadeiros na ordeiu natural das cousas, desde
que pelos seus depoiméntôs se achao devidamente provados
os antécédentes e os conséquentes. Certamente nada mais é
preciso.
Uma testemunlia vê Titius arrombar Um armario no quai es
ta va um relogio ; immediatamente depois o mesmo
relogio nas maos de um terceiro ; a sua doclara-çao nao
pïovarâ o rôubo, nao obstante nao ter visto com-metter a
subtracdao?
Duas testemunhas contestes bastao para a demonstraç&o
dos crimes de qualquer natureza. Em relaçao à prova do
(8) Vide uma especie notàvel nas Causas crim. de Feuerîmch, II, p.
6WJ|
163
juramento falso (9), sustentou-se que o juramento faz por si
prova plena dos factos contidos no depoimento ; que afîirmando
as duas testemunnas o contrario, simplesmente contrabalançao a
primeira prova por uma outra ; por con-sequenci» nao a
annullao. Dahi coneluio-se que nesta ma-teria especial très
testemunlias sao necessarias : mas tudo isso nao é senao argucia
; o perjurio nao ficara* demons-trado, desde que os factoa
affirmados pelo accusado forem provados falsos em si f
Titras affirma, que nao recebeu no dia 24 de Julho de 1830
100 francos de Sempronius a titulo de emprestimo: duas
testemunhas affirmao tê-los visto entregar por emprestimo ; a
prova do perjurio esta feita, e o juramento do accusado nao
constitue mais do que uma simples affirmaçao pessoal, que
podia valer como prova, em-quanto a prova contraria nao fosse
produzida (10).
As duas testemunhas classicas sfto suffieientes para de-
monstrarem o corpo de delicto (11)'? Aqui convem dis-j tinguir ;
ou se se trata de certos factos que se prendem ao corpo de
delicto, ou de todo o corpo de delicto. No primeiro caso, nao lia
difnculdade alguma ; duas testemunhas podem perfeitamente
affirmar e provar, por exem-plo, o estado de gravidez de uma
mulher accusada de abôrto, ou o uso de titulos falsos. Mas no
segundo caso, a resposta é mais difficil ; mesmo em outro
tempo era
(9) Schneider, Tratado da promu, p. 53t. — Sfcubôl, Procssso crim.,
S 910.
(10) Vida o artigo do autor nos Sotos arch. de dir. crim., Il, p. 1U.
Protobovera, I. e.„ V, p. 224. — Hitzig, Revista, n. 85, p. 172.
(11) Brunemann, Proc. induisit., cap. Vit, n. 20. — Klcinschord, an-
i ttgts Arch. de dir. -rim. VI, p. 10. — Stubal. Proc. crim., g 007.
164
essa uma das difllculdades da doutrina, que queria, que |a
inspecçao ocular fosse o unico meio de verificaçao do corpo
de delicto. monstràmos (12) que a confiss&o pôde
perfeitamente fornecer essa prova (13); oatro tanto dire-mos
do testemunho pelos mesmos motivos: e se é ver-dade que as
testemunhas podem dar a certeza de ter sido Pedro o assassino
de Paulo, é taobem verdade que o seu depoimento tem a
mesraa força probatoria em relaç&o a factos de outra uatureza,
ao crime de corrupçao de um funccionario, a um delicto de
rebelliao ou de adulterio, etc. Mas os praxistas allemaes
oppunhao ainda outra objecçao. Se as mesmas testemunhas
depoem sobre o facto do crime e sobre a pessoa do seu autbr,
torna-se im-possivel verificar o depoimento, em relaçao a este,
pela prova do corpo de delicto ; sem duvida, quando alem das
testemunhas, que affirmao ter Pedro matado Paulo, a autopsia
do cadaver da victima vem, até nas menores par-ticularidades,
confirmai a exactidao das suas declaraçoes, (por exemplo,
sobre o numéro e direcçâo dos ferimentos) nasce dahi para- o
juiz uma forte garant ia ; o erro parece impossivel ; pois para
fornecerem particularidades tao précisas, parece que deviao
necessariamente ter assistido ao acontecimento. Mas o que se
pôde concluir dahi?
Na falta das facilidades que traz o corpo de delicto
precedentemente verificado, nao pôderà o juiz descobrir
outros meios de verificaçao? Deve examinar e saber côm
certeza por que razâo o crime commettido nao deixou ves-
(lg) Yid*> acima cap. ¥>,.
(18) Vide 0 Prou crim, comp. cap. 167. /«-*
163
tigios (14) ; quaes as probabilidades que existem da sua
perpetraçio real ; deve indagar, se as declaraçOes s5o contestes
até nas menores circumstaucias, e se lia lugar a desconfiar-se de
algum conluio crimiuoso ou de sugges-toes inconsideradas ; se
aiuda restao duvidas, que nao per-mittem considérer
verdadeiros os factos relatados nos seus depoimentos (15) ; se
todos os factos constitutivos do corpo de delicto forao
articulados (16). Se o crime exigia, sob certas relaçOes, o
exame especial de peritos (17), nao da plena ao
testemunlio, senâo quando as lacunas résultantes da falta de
vistoria (18) forem preenchidas, quer pelos factos articulados,
quer pelas outras provas do pro-cesso. O testemunlio faz prova
plena, por exemplo, quando os peritos affirmao, que a
substancia administrada ao accusado em* presença das
testemunbas, que relatao o facto,
(14) Duas testomuukas declarâo ter visto Pedro matav Paulo em uma
fiorcsta, depois enterrai- o cadaver. pxcava-so o -lugar in-licado, e, nao se
acha nem ossos, e nom vestigios. O corpo do delicto nâo pôde ser con-
siderado como demonstrado Poderia nao s*r assioi, SU os peritos achas-som
na natureza do terrono,proprio para activai- a dccoinposiçào do corpo. uma
explicacSo satisfactoria da ausencia de vestigios.
(13) Exemplo : as duas testemanhas virao Pedro e Paulo entrar na Ho- '
resta, e satùr-Pedro sô : o facto do assassinato Ûca duvidoso.
(1G) E mesmo certa circumstancia moral, por exemplo, a falta de înoti-vos
conhecidos, que pudessom levar o accusado ao crime, bas ta muitas vezes
para exclair a possibilidade de uma condemnaçâo.
(17) Assim as tegteinunhas viras Pedro ferir Paulo na cabeoa com très
punhaladas; depois fugirâo quando a victima cahia; os seus depoimentos, na
falta dn pevttos, nSo bnstao para provar que Pedro matou realuiente Panlo.
(18) As testemunhas affirmao que foi propinado arsenico; a sua douta vur-
So provarâ. M ne a substancia eraooin efieito ossa ?
ïiario publico-, o oiRci al j udi ciariû o deixao de ser i ;
como taes nao escapao à, fallibilidade da natureza humana ; a
imaginaç&o tambem perverte muitas vezes a sua me-nioria, e
o seu testerimnlio pddc involuntariamente ser influenciado
pela paixao (27).' Mas, diz se, o funccionario é juramentado.
O effeito deste jurameuto, que lhe em-peuha todo o futuro,
nao p6de enfraquecer no seu espîrito, depois de algum tempo
% O acaso fa-lo testemunha de um acontecimento, que lhe
produz . profunda emoçao (28) ; deixa de ter o sangue frio
necessario para bem obser-var os factos ; neste caso, nao
obstante o privilegio, que a lei confère as suas palavras, a
razao recusa-lhe o direito de fazer plena (29). Por isso, é
mister accrescentar, mesmo nos paizes onde se admïtte esta
exCepçào, o seo testemunho fica singularmente abalado,
desde que elle é pessoalmente lesado pelo delicto, ou que os
factos provao, que elle nao podia ter visto tudo e com exac-
tidao,
CAPITULO XLVI.
nO EFFEITO DO DEPOIMENTO DADO POR MUITAS TESTEMUNHA.S
BOSPBITAS.
A seguinte quest&o dividio por muito tempo a escola (1).
(27) O que piova, niera digso, que os sectarios do systema que coin-
bateroos recu&o âiante das consequencias, é que nào o applicào senîio cm
materia de a Impies delictos.—Vide Tilfcnann, Matinal, 8, p. 521,
(28) Exemple : acka-se expôsto a xima violencia., ou a um acto do
rebelli So.
(29) Vide ainda C. 22, X. do Elect.G. 19, X. de Appellat.Linde, Re-
tista de Dir. civil, 8, p, 181.— Vide, sobretudo, Hefftor, Tratado do Dir.
crim., p. 624.
(1) Eisenhard nos Ant. Arch. do Dir. crim. tom. 3, n. 1, p. 101. Rauft,
Da Prora, g 124.
109
Os depoimentos> de pessoas suspeitas, mas nutnerosos,
podem pelo seu grande numéro compensar o que falta a cada um
délies em credibilidade 1 em outres termos, quatro. testemunhas
suspeitas, por exemple, mas contestes, pro-vio a certeza de um
facto ¥ Estabelecida assim a ques-tao, deve ser resolvida peia
negativa (2) ; trata-se da apre-ciâo de factos moraes, onde nada
têm aqui a fazer as leis do calculo mathematico : o depoimento
da primeira teste-munha suspeita, por ser reproduzido pela
segunda, nao adquire nova força, pois que esta, por causa do seu
vicio pessoal, nao tbrnece um meio regular de verifl cacao. Para
sermos melhor comprehendidos, daremos um exemple A pri-
meira testemunha foi muitas vezes presa por causa de
condemuaçOes judiciarias, e a sua vida inteira attesta a sua falta
de probidade ; a segunda parece ter sido pei-tada para depôr ; a
terceira é inimiga mortal do accu-sado, e a quarta, parente
proximo da parte lesada ; pode-rao depôr as quatro contes te
mente, mas a uniformidade dos seus depoimentos nao
convencerâ ninguem directamente. A affirmaçao de um
mentiroso nao faz acreditar na mentira de um outro. O
depoimento de cada uma das teste-) munbas pôde aqui
comparar-se corn outros tantos indi-cios, e njio é somando-os
que se chega a dizer que os indicios formSo a certeza. Donde se
segue que a maxima, frequentemente invocada, que quatro
testemunhas suspeitas fazem prova plena, é falsa no seu sentido
abso-luto (3).
(3) QuUtorp, S V06,— Struben, Ensaios de Jurispi-., 2o"vol., n. 4.
!
(3) Nos ternios da Ord. crim. pruss., § 387, as testamunlias sus-
peitas jamais podem fazer prova plena.
ii. ' 22.
XTO
Mas, tratando-se simplesmente de eaber, se em certos
casos, sob certas condiçoes, o testemunho de homens
suspeitos pôdc formai" a certeza (4), responderemos sim
aem, hesitar (5). O que torna a testemunha suspeita, é uma
presumpçao de falta de sinceridade, cujos effeitos nao sâo
sempre os mesmos, e se modificao segundo os casos. Com-pete
entao ao juiz considerar maduramente todas as cir-
cumstancias. Quando perante elle se apresenta como teste-
munha um individuo que jâ foi condemnado, a sua des-
confiança é despertada ; receia que este homem nao tenlia
senso moral, e que, estando os resultados da sua obser-vaçao
viciados pela sua propria immoralidade, Yenba dar um
depoimento falso. Mas si "Se demon&trasse, que este
individuo, coudemuado ha mais de 20 annos, fora sedusido e
arrastado pela leviaudade; que depois a sua vida fora exemplar
; se, alem disso, os seus concidadaos attestarem a sua emeuda,
que motivo serio impedirà o juiz de deixar de attender à
condemnaçao outr'ora soffrida, e de ter con-fiauça na
testemunha ? Kepitamos, as circumstancias deci-dir&o
sempre, si se deve, ou nao, tomar em consideraçao a
presumpçao desfavoravel ligada à pessoa da testemuuha (6) ; o
que quer dizer que o juiz deverâ examinai' : 1* se na causa o
vicio do depoimento esta sanado no todo ou em parte ; 2° se a
conformidade das testemunhas vem dar
(4) E' pois coin razâo que o Cod. bav., art 289, diz que quatro tes
temun lins contestes podem neste caso fornecer prova pleila.
(5) Ha s Car aiiguani vai longe de mais IV, p. 163.
(G) Stubol, Proe. crim., g 915,— Tittmann, 1. c. 3, p. 532. Frie-
drech nos Dosumentos pahlicados por Zurhein, t, 'i, p. 4t.
1*1
garautia de certeza. Quanto ao primeiro ponto, convira
distinguir. 0 motivo de suspeiçfto pôde provir do carac-ter
pessoal da testemunha, que nao permitte que se acre-dite
no seu amor da verdade (7) ; pôde ainda derivar de
relaçOes, que nao Ihe deixao a liberdade de depôr na causa
contra tal pessoa (8), ou que portera incita-la a confirmai*
por um depoimento falso esta ou aquella allegaçao de
factos (9). Na primeira hypothèse, sa usando da maior
circunspecçao é que o juiz poderà acreditar na sinceri-dade
da testemunha, sinceridade que nao era de presumir a
principio *, servi-ïhe-ha de garantia a sua conducta
excellente, indicio raanifesto da sua eraenda moral (10) ou
do amor da verdade, que nao foi destruido pela li-cença da
vida anterior. Na segunda hypothèse, as duvi-das podem
tambem desapparecer, quer porque o depoimento
demonstre pelo seu conteudo que a testemunha fallou
contra o seu interesse, por ser a verdade mais forte (il) ;
quer porque as circumstancias da causa mos-trem, que os
motivos de parcialidade, que se Ihe attribui&o
(!) Exempta : a testemunha jâ foi condeninaJa, procède uotoriamenle
mal.
(8) Exempta : a testemunha é parente proximo do accusado.
(?) Exempta : a testemunha tem intéresse na condemnaçta do acen-
sado.
(10) Convem entâo ouvir outra» tastemunhas para pvovar a sua
amenda«
(U) Exempta: é um parente proximo do accusado quo dep5a cou tra
elle.
172
nio poderao faze-la dèsviar do verdadeiro caminho (12) ; quer
finalmente porque o caracter irreprehensivel da la vida nfto
de lugar a que se supponha nao ter ella tudo sacrificado ao seu
dever, nesse caao, corao no mais, eter cedido as suggestoee de
outro interesse.
Em relaçao à conformidade dos depoimentos, diremos que
ella péde ser decisiva aos olhos do _juiz :
â.) Quando diz respeito a factos cuja exposiçâo exige
necessariamente a presença simultanea de todos os depo-entes
;
6.) Quando estes factos, sâo confirmados por outras pro-
vas;
c.) Quando se deprehende do processo nao ter-se sug-
gerido resposta alguma as testemunhas ;
d). Finalmente quando nao é possivel admittir o con-luio
entre estas para conservarem uma linguagem unanime (13).
CAPITULO XLVII.
DA CONTRADÎCÇXo NOS DEPOIMENTOS.
Quando os depoimentos parecem estar em contradicçao, o
juiz, para sabir do embaraço, nâo deve sommar o numéro de
cada lado, dando fé à opiniâo representada pela
(13) Exemplo : desde muitos annos a testemunha vivia na intiini-
dade do accusado ; de sorte que a3 suas affeiçôes sSo igua.es entre este e
sea parente.
(13) As quatro te3temunhas sâo amigos intimos, o an tes do poi-
mento, tiveo entre si longas conferancias:* a sua uuanintidado te o
minimo valor?
173
tuaioriâ ; é falso semelhante calculo (1) ; os teste munhos nfto
3&o quantidades que se apreciem pelos meios mathe-maticos ;
a convicçio sçS é produzida pelas circumstan-cias da causa, e,
em tal caso, o espirito adquire a cer-teza pesando com cuidado
todos os elementos de cre-Idibilidade que ellas contera.
Mas muitas distincçôes devem primeiro ser feitas.
1* Acontece muitas vezes que, nao obstante a diversi-dade
do seu conteudo, os depoimentos podem subsistir uns a par dos
outros ; que podem mesmo concilîar-se (2), sem que seja
preciso rejeitar algum délies, como inquinado de erro ou
mentira (3). Convera aqui examinar, em que situaçâo, sob que
ponto de vista, ou relaçoes, em que momèntos diversos as
testemunhas, que differem, observarao as cousas. Dous factos
différentes attestados por duas testemunhas podem ser reaes,
sem que haja, propriamente fallando, contradicçEo entre ellas.
2* Tambem nao ha collisao de depoimentos, quand o cada
um délies refere-se a factos diversos que se succèdent
(l) Exemplo: très testemunhas affirmâo ter ouvido tal palavra :
outras dans affirmSo o contrario: aeria absurde procéder por via de
subtraçào, e admittir como meia prou a declaraçào daquella que forma
a maioria- ;
•2) £' o caso chamado pclos antigos doutores singularitas testium
diversicatioa. Vide sobretudo Farinacius. Testib.} quest. 64.— Georgi, de
Teste HngulaH. Argentor. 1722.— Leyser Sjtec. 287. Oremani,
Elementa, III, p. 210.— Banft, Da Prova. S tfil— Tittmann, I. c. III,
p. 534.
(3) Exemplo : em um processo por fetimentos graves feitos em um
tiimulto, cortas testemunhas dizem ter visto A., ferir B. : outras afllr-
que C. fevira o mesmo individuo.
1T4
e que se completao um pelo outro (4). 0 juiz toma todos em
consideraçao, e attende à sua intima lîgaçâo, afim de basear a
sua cptivicçao, segundo as re^ras da prova artiricial. •
Mas ha real contradicçao, quando nao é possivel que
todas tenhâo dito a yerdade no mesmo tempo (5) ; e quando,
por conseguinte, uma délias deve neeessariamente ter-se
enganado ou mentido (6).
Aqui começa a duvida : a certeza de um facto exclue com-
pletamente a possibilidade do facto* contrario, ora a contra-
dicçao das testeraurhas precisamente em résulta do a affir-
maçao desta contrariedade. Entâo o juiz nao tem outro meio
de decidir a questao, senao examinar a fundo as garantias de
confiança que cada uma das testemunhas tem em si (7).,
Sentimo-uos mais propensos a acreditar em uma testemunha
classiez do que em uma incapas ou suspeita. Quando as duas
testemunhas que affirmâo sao homens irreprehensiveis e I
diguos de fé, e as duas que negao sao réos {de policia ou ho-
mens de ma vida, a sua opposiçao nao pôde subsistir um sd
momento. Dà mesma sorte, entre pessoas- maiores
{4) Exemple : A. ourio B. dizer a seu camarada que queria-matar G.
para se vingar délie: D. YIO B.r carregir a pistola : E. vio-o esprei- | tando a
sua victima : F. vio-o disparar o tiro etc., etc. E" o que os autores çhamào
a singularisas testiwn adminiculatina ou cumulativa.
(5) E' a singularitas obstativa dos autores.
(6) Duas testemunhas affirmâo ter visto as 6 horas Pedro apnnha- I
lar Paulo : outras duas sustentào que José é o autor do assassinato,
e que â hora indicada Pedro esfiava assentndo ao pfl deltas.
(7) A L. 21, g 3, de Testib. detorminava que nao se via de
ordinario préoccupai- corn o .numéro das testemunhas.—"Vide tambem G.
32, X de Testib.—Guk, Commentarias, XXII, p. 212.
175
de toda a excepçao para deporem como testemunhas. con~ vem
examinai- quaes as que merecem mais fé, e o iz deeide-se
segundo as regras que jâ iudicânios (vide cap. 43J. Prestarâ
antes ao depoimento de um homem conhecido pela sua
experiencia calma e prudente, pelas suas palavras claras e
lucidas,«do que ao dito de uma testemunha que hésita, ou que é
conhecida pela sua levi-| andade. A fé que é dévida ao primeiro
vem diminuir a que a segunda poderia ter obtidô ; e quando em
face do accusado apresentâo-se rauitas contestes na sua îingua-
gem, e negando os factos da accusaçâo, a duvida augmenta
mesmo na razao da sua credibilidade (8). Fiualmente,
independentexnente da pessoa da testemunha, o conteudo do
depoimento tambem exige um serio exame : quanto mais
verosiveis parecerem os factos, quanto mais em har-monia
estiverem com o resultado fornecido pelas outras provas e
oircumstancias da causa, tanto mais razao terà o juiz de lhe
prestar fé. Ve-se, pois, que o juiz nao esta sujeito em todos os
casos a regras fixas, e que décide como um jurado (9).
Refutemos, de passagem, um erro que frequentemente se tem
produzido. Tem-se sustentado que as testemunhas aftirmativas
devem sempre sçr prefe-ridas as que negao ; que estas, por mais
numerosas qne sejao, nao podem jamais illidir a prova
produzida pelas
(8) Stubel, Proc. erim., g 933-.îittmnnn. 1
c
. îtl» p. 530.
(9) As leis modérons da Allemnn tambem nâo contetn sonào dis-|
posiçôos geraes* sem utilidade directs: por exempta, a Ord. crim Pruss..
ait. 860 dix quo o juiz decidira quai a testemunha qucmerece ser
acreditada. O mesmo Ja» o Col. bav:, art. 294 295.
Il
1TG
primeiras. A causa deste erro é a confusao nos termes (10). Aa
testemunhas que negao (neganlea) de modo algum se podem
confundir eom as que nada sabem tyteteientes). Quando estas
em grande numéro vierem dizer que nio tem conhe_ cimento
de um facto, quer porque nSo estavaq présentes quer porque
nfto o observârao, o seu depoimento, com-prehende-se, em
nada diminue a força do testemunho das que affirm&o. Mas
se apparecem outras susten-tando que o facto nSo teve lugar, e
relatao certas circums-tancias (11) em opposiçao formai com
o testemunho affir-mativo (12) ; se, em apoio de suas
denegaçoes, provao que se o facto fosse real, deveri&o
neçessariamente ter conhe-cimento délie (13) ;' se q, facto
negado tem alguma rela-çfto com ellas, sem que entretanto se
possa desconfiar terem ellas interesse em occulta-lo (14) : em
todos estes casos, a contradieçao entre as testemunhas
eyidentemente nfto pôde ser resolvida a priori a favor das
affirmatiras.
(10) Vide a este respeito, Globlg, Theoria das Probàbilidades I" parte,
p. 187.—
x
StubeL g 930, ïiUmann, III, p. 536.
(11) Kleinschi'O'L nos Nov. Arch. do Dir. crim., III, p. 630:
(12) Exemplo : as testemunhas declarào que no dia 14 de Julho, jis 6
horas, Pedro commetteu tal crime: outras dnas afflrmSo que nesse mesmo
dia, desle ,6 ats as 8 horas, Pedro nSo as deixou.
(13) Em nma briga em que Pedro é acensado de ter sido o agg're-sor>
outras testemunhas declarào que elle nSo as deixou nem sequer um
momeqto, e que conservou-se constat) te mente tranquillo.
14) Exemplo: o accusado affirma que Pedro den-Ihe tal objecto : Pedro
nega o facto.
ITT
Nao podendo o juiz aahir duvida, deverâ, no fim de
contas, recorrer ao meio ordinario, e admittir <como
verdadeira a vers&o mais favoravel ao accusado (15) (*)
(15) E' o que prescrevem o Cod. bav., art. 295, e a Orden crkn.
pruss. art. 39C.
(*) Quanto à prova testemunhal, a seiencia e a legislaçâo fizerào-
lullimamente notaveis progresses na Allemantaa. Todo o mundo reoo-
nhpce cada vez mais que as testemunhas sâo os ouvidos e os olhos da
justiça, e que é privar-se sem razào de um poderoso meio de
Imanifestaçâo da verdade, pronunciar-se contra ellas exclusôea muito
namerosas. Ha 20 an nos apenas, a lei regeitava sempre, como émanai!
do de pessoas incapazes de depor, a doclaraçâo de individuos que, em
razào de certas circumstanci§s particular»s, tinhào contra ai uma
presumpçâo gérai de falta de sinceridade, por exemplo, os parentes
'p'roximos e os condemnados, A lei tambem tinha decretado pres-|
criôes coin o flm determinai' precisamente a foa probatoria do
depoimento de certas testemunhas, dos cumplices, da parte lesada, ect
Eats systema produzia graves inconveniontes. Os juizes, ads-trictos â-
observancia de regras geraes e muitas vezes injustas pela sua propria
generalidade, viào-se obrigados a nào considerar sulfici-ente o
testemunho, nào obstante todas as circumstancias da causa
convencerem-no de que a testemunha disse a verdade. As récentes leis,
a Ord. crim. de "Wurtemberg (g 305), e a do ducado de Badem ( g 255),
ta nào f.izem distinccào entre as testemunhas inhabeis e as classicaa.
Os parentes proximos e os condemnados sâo ouvidos. Compete ao juiz
decidir, se merocem on nào crédite, ficando sem applicaçâo as regras
da antiga lei.
Aqui ainda se reproduzem os perniciosos effeitos do vicio capital da
lei Allemâ, o segredo e o processo escripto. As testemunhas sâo
ouvidas â parte pelo juiz de instrucçâo, e ninguem sabe a que sugges-
tôes, a que perguntas insidiosas, promessas ou ameaças ficâo ellas
expostas. E* pois do admîrar que o povo deixe de ter confianca na
justiça do paizî E' sempre cousa difficil reprodnzir fielmento o pro-
cesso verbal da declaraçâo das testemunhas ; ùma palavra de mais
ou de menos pôde alterar-lho o sentido: e no entanto é somento nesta
pei.a que os juizes devem apoiar a sua confîançr. e a Rpr'»ni": nào
podem, nem ver, nero ouvir, nom interrogar as testemunha para
•Bclarecer as suas duvidas. Alem disso, nom todos os juizes da causa
Itomâo conhecimento por si mesmo dos autos do processo, allumas
17»
vezfis mnito volumoso9; é nm juiz relator que lhes da conhecimento
délie*, e a expos lçào que lhes faz constitue o unico fundamento da
cortoza. Nâo conhcccm nom a pessoa das testoniunlias, nom a forma
do seu dopoimento, nom a sua attitude em juizo; fulta-llies, pois,
uma dus mais fortes garantias da sua fé nos dcpoipientos produzidos.
Sâo outros tantos motivos para o povo al le niâo recusar a sua oon-
nança nos julgamentos l'undados na prova testemunhal, e roclaraar
abortamente o debatc oral e publiée Kelizmente esta innovaçào foi
finalmente introduzida pela nova lei badeza, (e tambem na Prnssia);
dpve-so porem latisinar ter-se empregado somente meias ntedidas, como
de ordinario acontece na Allemanha, por causa de excessiva timidez;
e ter aido violado o principio da prova testemunhal oral pela dis-|
posiçâo que autorisa- a leitura, nos debates. dos depoimentoi produ
zidos na instrucçâo preliminar, e emanados de testemunhas mortas
depois ou impedidas por qualquer motivo. (Nota manusc. do autor.J
(Rm Franco, o présidente, em^virtude do seu poder discripçiçpiario,
'pàde tambem ordenur esta leitura a titulo de informâmes ; cotnpete
porem aos jurados prestar-lhe fi ou nâo.) (N. T. F,
\
FIM DA QUINT A PARTE.
SEXTA PARTE
Da prova por titulos e peças de convicçào
CÀPITULO XLVIII
EM QUE COKSlfcïE A PROVA POR TITCLOS B PEÇAS DE
CONVIÂO
Ha certes factos cuja prova no processo criminal se
prcdùz perfeitamente por meio de titulos e documentes
materiaes. Por estas palavras (1), designamos ao mesmo
tempo todos os objectes inanimados (2) , que por acaso
vierem attestar a realidade de um aconteclmento (3), e
tâobem todos aquelles expressamente creados para prova-
los (em ultimo caso, a palavra titulo é toraada era uma
accepçao restricta). Entre estes meios de prova distinguem-
se, os monumentos [monwnenta) que sao desti-
(1) Vide u invesligaçôes da scisncia moderna em materia de processo civil
principalmento ; e sobretudo Gesterding, InvestigaçVes e Soluçôes, I* parte,
p. 245, — Vide tombent Gunther. de Documenti notions recte constituti,
Lipsi, 1830. I—III Specimem.
(2) Por opposiçào as testemanbas vivas e intelligentes»
(3) Exemplo : no lugar, em que tinhâo sido postas m/vterias combus-tivcis,
achSo-se alguns pedaços de pàe eonsumidos em parte, apagados llfa pouco
tempo; provSo que nesse lugar fez-se fogo.
180
nados a perpetuarem a memoria de um facto (4) ou a tra-
duzirem e proclamarem, sob uma forma symbolica (5), um
direito existente, e (no sentido mais restricto) os titulos
propriamente ditos (documenta) cujo fim é verificar a
realidade do facto (6) : destes, alguns torao prevîamente
instituidos para servirem de prova para o futuro (7) ;
outros vem dar certas explicaçCes ou attestar certos
acontecimentos importantes (8), pelo effeito do acaso, e
sem que este fim especial tenha sido previsto. A prova
por titulos, ou o uso que délies se deve fazer para a
administraçao de prova,de variar muito no processo
criminal. Ora o crime résulta do proprio titulo, de sorte
que pela existencia de um se demonstra a existencia do
outro (9); ora por uma confissao formai o accusado alli
confessa ter commettido este ou . aquelle crime (10) ; ora
é um escripto, donde se pôde inferir uma confissao tact"
ta (11); outras vezes cou te m o tastemunho de um terceiro
* (4) Os tumulos.
(5) Os marcos, as armas (brazôes)
(6) Sobre a dilTcronç'a entre os monumentos é os titulos propriamente
ditos vide Stagemann, Dlssertaçtfes praticas, 2* parte, p. 125, Gunther, L.
cit. Spec.,, p. II.
(7) Exemplo: as obrigaçdes assignadas.
(8) Exemplo: uma carta amorosa, uma folha de album podem conter
importantes indicaçôcs, e sem que a pessoa de quem procedem tenha tido
a intençào de fazer um documente para o futuro.
(9) Em materia de usura, de diffamaç&o.
(10) Exemplo: confessa a um amigo o facto i m put ado.
(11) Oonfessa-lhe que tem bastantei remorsos, na occasi&o do processo
contra elle intentado.
181
sobre um crime de que foi espectador (12) ; ou finalmente
trata-se alli de um facto que pôde fazerconcluir a exis-
tencia do proprio crime (13), ou fomecer a certeza da
culpabilidade do accusado (14). Quando 8e quer peuetrar
tua ecotiomia desta prova, ve-se que ella résulta do pode-
ïoso coucurso de diverses elementes de convicçao. Um
titulo é decisivo, por si mesmo, como objecte exterior, e»
por sua propria natureza, como titulp ; a circumstaucia que
faz com que a sua indicaçao tenha sido consignada de
proposito e para o fim do conservar a prova, é por si so
grave motivo para o juiz acreditar (14 a) naverdade do que
enuncia : é racional suppor ter o seu autor usado de
prudencia* e circumspecçao, quando nao se tratava de
palavras sem alcance e lançadas ao vente. Em compensa-
çao, a experiencia tem demonstrado que a prova literal
pôde ser coutrafeita e tornar-se uma cilada perigoza ; que a
imitaçâo da letra de outrem é uma arte facil, e que muitas
vezes usou-se de um escripto habilmento falsificado e que se
attribuia a uma pessoa que nao era o seu autor. Em relaçâo
à sua forma, as condiçces extrinsecasdo titulo, devenons
fazer duas observaçOes principaes (15) :
(12) Titius escrevc a um dos seus amigos que foi testemunlta do crime.
(13) Por excmplo uma correspondencia de natureza suspeita com um
amigo.
(14) Borraduras, palavras raspadas nos livros de commercio.
(14 a) Bentham, Tratado da Prova judiciaria discute sabtamente o
valor da prova littoral e os motivos que fan m dar-se-lhe crédita, 1, p.
329.
(15) Vide, sobrs a prova por titulos em materia cviminal, Reinhard.
De eo quod justum est circa probat. per documenta. Erford. 1782.—
Bochmero, ad Carpzow, quant. 114— Kleinschrod, nos Ant. Arch. de
Dir. crim., V, p. artigo.Rolin, de Delictor. probat, p. 94.-»- Car-
mignani, Dell i leggi délia sicureia, IV, p. 167.—Proc crim, comp.
cap. 98, 99, 184, 176.
1.* Para conquistar a confiait ça deve ser produzido tia sua
integridade sem o menor vestigio de alteraçao ou de muti-
laçao: sfe contem numerosas riscaduras, se linhas inteiras forao
apagadas, se a inetade do titulo foi dilaeerada, este tortia-se
logo impotente ;
2.° Para muitos titulos (\Q) ha uma forma obrigatoria
essencial sob peua de nullidade. Quando se me apresenta uma
carta de sentença, um mstrumento public©, nao estando a
peça revestida do compétente sello, e nfto tendo a aesig-satura
do officiai publico, considero-a sem valor.
Quanto ao titulo em si, adquirimos a convicçao collo-
candc-o sob as nossas viatas ; e, assim como na inspçcçâo
ocular o juiz confia nos seus sentidos e considéra verdadeiros
os objectos por elles mostrados, assim taobem, quando
examinâmes o titulo, a nos nossos sentidos nos convenue
que estas ou aquellas indicaçoes, de que elle faz mençao,
estao effectivamente nelle contidas ; e de outro lado, feita a
verificaçao de. sens caractères exteriores em relaçâo as
condiçOes indicadas na lei, a reflexao nos leva a deci-dir, que
o titulo tem por si mesmo direito âhossa confiance.
Mas a forma do titulo nao é tudo ; taobem é importante o
seu contendo . Ora deve conter em si mesmo o crime, ora
relata factos que servem para provar como e por quem foi elle
comraettido ; outras vezes, BO se pôde lie concluir a
existencia do mesmo crime. No pri-meiro caso, basta le-lo
para conbecer-se o que contêm ; ou para que a delicto logo se
révèle, basta virifica-lo por meio de outros factos
anteriormente provados (17), e que
(10) Vide tambem, sobrn o mosmo assumpto, I>ntham, Tratado das
Procas liv. 1, cap. VI, liv. IV cap. 1 c S'ig,|
(17) Em mntarla 'le frtlsiflcaçâo.
18.3
se tornlo p/ratos de comparaçâo. A convicçâo do juiz pro-
cède entâo tanto dos sentidos, como da reflexâo. No sen-
gundo caso, a pro va por titulo regula-se como a das tes-
temunhas. Considéra verdadeiro o seu conteudo, quando
tenho motivos para acreditar na pessoa, de quem elle
einana. No titulo publico fio-me na imparcialidade do-
oflicial juramentado que o lavrou ; imagino que elle nâo
podia ter attestado senfto a verdade. Ainda uma vez, o
testemunho literal tira a sua força da probidade e do
caracter doseu autor : quando este é digno de fé, refiro-me
à sua declaraçâo, e quando tenho présente um titulo que con-
tem uma confissâo, considero-o verdadeiro; se a pessoa que
confessa deve tambem ser acreditada se fizesse uma con-
fiso oral, a sua declarâo é considerada com um testemunbo
dado sobre si mesmo. Masconsideremos a questâo sob um ponto
de vista mais restricto; até que ponto, no crime, os titulos sô
por si pôdem ter força probatoria, e motivar a condemna-|
çâo (18) ? Quanto aô processo eswipto da Allemanha, força é
reoonbecer que, em um sentido, os titulos s&o o principal
meio de prova: o juiz definitivo jamais procède à inspecçao
neste caso ; nunca interroga as testemunhas e o accusado :
as pa-s sâo-lhe transmittidas simplesmenta, depois de ter o
tribunal da informaçâo encerrado o pro-cesso, e décide de
conformidade com ellas (19) . A sua convicçâo apoia-se,
pjis, sobre titulos publicos ; condemna
(18) Esta questào toi outrora tiramente controvertida. Vide, entra ôa
advcrsarios du prova piooonstîtuida, Farinacius, lier. crhn
u
quœst, 81.—
Mascarlus, de Probat., qnœst. V n 14.— Clams. Sent. liv. V, g lin. quœst.
SI.— Entre os da opiniào contraria vide Mathœi, de Crim.. lib. 48. n. 15 cap.
5.— Cremani, Elem. jur. erim.. lib. 3. cap. 28, g 3. Joim<s. Tratado da
justiça crim. 1. p. 710—40.
(19) E' o qu« Hpffjter. Tratado, g 24. faz muito fonni ver
184
por tima confissao, pelo depoimento testèmùnh'al eon-
signado nos autos ; e a confissao e o depoimento àao por
elle " considerados verdadeiros, por que os termos do pro-
cesso atteatao, que elles forao judicialïnente s.
Entretanto, indo-se ao fundo das cotisas, ve-se que o titulo nao
é mais do que uma prova de prova, que, constituida
regularmente, pôde, aos olbos da lei, ser toma-da eomo base
da condemnaçao. O juiz condemna, nao porque os autos
déclarera ter o accusado feito uma confissao ; mas porque a
confissao tem em si certos caractères de natureza convincenje.
Propondo-se a questâo nos seguintes termos : um titulo pôde
cbnvencer da mesma forma que a confissao ou o testemunho
*? O juiz pôde condemnar o accusado em face do titulo,
independente da confissao directa ou do depoimento
testemunbal t A resposta certamente sera negativa. (20) ; em
todos os casos sem excepçao, desde que um titulo é produzido
como prora de um facto, a pretendida prova por titulo resolve-
se Lem uma outra que a seu turno deve ser produzida e
julgada conforme os principios que lue sao espèciaes.
1/ Se o crime réside no proprio titulo, é por meio da
inspecçâo pura e simples que o juiz, lendo-o, se convence
logo de sua existencia (21) ; ou entào, nao satisfeito com as
observaçoes que* os seus sentidos lhe transmittera, applica o
raciooinio e a reflexao ao exame comparado da peça e dos
outros factos da causa (22).
(20) Garmlgnani, 1. e. IV, p. 171.— Tiltmatin, Manunl. III, 507.--
Reinhart, Dits, cit., 9.— Kletnschroi, g 7.'— Kitka, Do eorpo de
delicto, p. 354.—Hoffeter, Tratado p. 625.~-Abegg, Curso do Prâcesso
"crim. Kœnisbei-g, 1833, p. 221!
(21) Exempta : aclia a diffamaç&p no proprio libelle
(22) Exemple). quando procura a prova da fulsidade.
185
2.° Quand o se trata de verifîcar ter sido o accusado o
autor .do crime, se o titulo contem uma confissâo, sendo
esta necessariamente extrajudicial, ignorandô o juia que
circumst&ncias a produzirao, e nao podendo apreciar o que
pôde ter de serio,é mister concluir que nao' esta compléta a
prova ; que é necessaria uma nova e catégorie» declarao
do accusado para dar ao titulo todo o effeito probatorio. Se
este se limita a attestar um crime com-mettido por um
terceiro, tal testemunbo nâo é sufficiente. A testemunha
para fazer deve «Lepôr emjuizo e sob juramento ; deve-
se sujeita-la a um interrogatorio regu-lar sem suggestoes, e
alem disso, a convieçâo do juiz nao pôde formatf-se, se nao
ha pelo menos duas testemu-nhas. Um testemunho
extrajudicial e escripto nao dà garantia alguma : nada prova
que a testemunha tivesse fallado dêpois de ter
maduramente .pesado as consequen-cias das suas palavras ;
que estivesse livre de todo o cons-trangimento, de todas as
insûmaçoes estranhas. Se o titulo menciona simplesmente
factos, que podem fornecer materia a estas ou âquellas
inducçOes do juiz, a estas ou âquellas presumpçoes de
facto contra o accusado (23), ou que concorrem para
descobrir as suas intençOes no momento, em que praticou
o acte (24), as regras appli-caveis entûo sao as da prova
artificial ; a primeira cousa a fazer é verificar, se os factos,
de que falla o titulo, devemj
(33) Ëxamplo: uma earta fol achada, pela quai o acensado supplica à parte
lesida; que nâo dé queisa contra elle, promettendo-lhe reparar o damno.
(24) Exemplo: algumak horas antes do ussassinato p accusado escie-
veti a um amigo, que elle tiuha Arme designio de se vingar.
II. **
186
ser considerados provados (25) ; depois examïna-se quaes as
conclusoés, que podeni ser razoavelmente délies dedu-zidas.
Coino se vô, a prova preconstituida nao é mais ao que a
prova pela confissao, pela testemunho, pelo inspecç&o do
puiz, mas modificada ; modificaçBo entretanto importante na
maior parte dos processos, e da quai as diversas le-igislaçces
fizerao mençâo especial. Alguns textos das leis Romanas (26)
projfao claramente que em Eoma algumas vezes a
condemnaç&o era proferida à vista dos titulos. A Carolina
nada diz a este respeito. Os doutores da antiga escola nao
julgarao esta prova digna das suas elucubraçoes especiaes
(27), e entré as antigas leis criminaes, a da Baviera (28),
tratou délia particularmenre. Os codigos mo-dernos sao os qne
contam disposiçoes regulamentares a respeito ; entretanto o da
Austria esta longe de formular
(26) No exaraplo aciuia convem exatninar, se a carta contem umâ
ameaça reai.
' (26) L. ult. C. de Probat.—h. 2, C. iiuor. appeUat. non recipvtmtur —L.
22, C. ad legem Cornet, de falsis.'-L. 15, 0. de flde InstruA men. (S)
(S) Sobre a primeira lei, vide a nota (S) à no la 19 do Cap. 2, A "
segtihda diz oxpressamente que a eondemnaçâo mesmo nos crimes oapitaes
de sor baseada em titulos—instrumentis probatis— A terceira refere-se
especialmente ao crime de falsidade, e diz que pôde ser pro-| vado pela
comparaçâo dos escriptos A quarta diz terminantemente que em juiso os
instrumentes tem lanta força como o iepoimento das testemunhas.
(27) Vide-os au tores citados na nota 18.
(28) Or.lon. crim. de 1616, tito IV, art. 3
1S7
uma theoria compléta (29) ; o lesgislador seni duvida nâo
julgou que os titalos fossem uma prova directe e in-
dépendante (30). quando tratou' da força probatoria dos
tUtilos publiços (31), é que julgou dever eatabelecer algumas
prescripçoes (32). A Orden. Crim. da Pruss. refe» re-se pura
e simplesmente aos termos da Orden. da jus-tiça civil ;
todavia, estabelece de passagein algumas regras
particulares em materia de reconhecimento da assig natura e
de comparaçao das letras (33). O Codigo Bavaro
regulamenfca primeiro o processo, isto é, organisa os
meios de poder o juia procurar os titulos, de reconbecer e
verificar a sua sinceridade (34) ; depois détermina quai o
seu effeito quanto a prova, mas satisfazendo-se em
enunciar algums preceitos applicaveis aos casos mais
fréquentes (35) . A lei franceza taobem nâo estabelece
n&p ium pequeno numéro de regras abreviadas, indicando
aojuiz da instrucçao a pesquisa que deve fa-zer dos papeis,
effeitos e peças de convicçao (36) ; or-denao a sua
apresentaçao ao accusado em audiencia
(39) Kittka, Da Veriflcaçâo do Corpo de Delicto, p. 956— Von l-
Zeiller, Annuarios de Jurisprùdencia, II, p. 44.— Jenull, Dir. crim. nu.it., IV.
p. 99.
(80) Cod. austr., 1. parte, ait. 282, leUa E.
(31) Cod. austr. 1. parte, 406.
(33) Jenull, Dir. amt., IV g 97. Kittka, 1. c, p. 254. 987.
• (33) Orden. crim. pruss., g 882, 884.
(34) Cod. bav., art. 246, 250.
(35) Ood. bav., art. 298 306*
(86) Cod. do inrtr. en m., art. 87, 90.
188
bublica (37), e estabelecem algumas regras para serem
observadas no processo de falsidade (38). E' nos escrip- 1 tores
inglezes que se acha mais amplo desenvolvimento sobre a
prova judiciaria {Evidence) ; em vâo se procnraria nos
escriptores allemaes e francezes os desenvolvimentos uteis,
feitos pelos inglezes em relaçao à força probato-ria dos
diversos titulos publicos (39), taes como os actos emanados do
Estado, as sentenças dos tribunaes ; em relaçao à* força
probatoria das diversas especies de titulos particulares, titulos
antigos, etc, etc ; em relaçao finalmente à sua sinceridade e
principalmente a comparaçao de letras (40). 0 Cod. da prova
do ameri-cano Livingston (44) quanto ao assumpto é
concebido no mesmo espirito, e reproduz nas suas disposiçoes
todas as idéas dos praxistas inglezes.
CAPITULO XLIX,
DAS DIVEBSAS ESPECIES DE TITULOS.
No civel distinguem-se os titulos em publicos e paHicukh
res; esta distincçâo tambem é applicavel em materia criminal.
Entre os titulos publicos, classificâo-se todos aquelles que,
revestidos de caracter authentico, forao
(37) Cod. do instr. crim., art. 329.
(38) Cod. do iastr. crtm., art. 448 e seg;
(39) Vide sobrôtado Philips, Tratado da Prova, 1, p. 316 577.
(40) As investigaçôes de Bentham tambem tem al ta impor tancia, |
Tratado da Prova Judic., II, p. 435»
(41) Vide, sobra esta Ici, os Arch. novos do Dir. crim., XII, p. 516,
eseg.
i»o
lavrados por officiaes compétentes segundo as regras
determinadas, e nos limites de suas attribuiçoes. Podem ser
divididos :
1." Escriptos emanados do Estado (1) ou das assemblons
politicas reconhecidas pelo Estado, (2) ou, final-mente, de
magistraturas publicas (3). Estes titulos tem ordi-
nariamente por fim a declaraçao das vontades, as pres-
cripçoes do poder reinante.
2.° Escriptos tambem emanados das autoridades rela-
tando as medidas que tomâr&o, o procedimento que tiverao,
as declaraçoes que julgao uteis (4), ou entao referindo
declaraçoes sobre os acontecimentos de que os officiaes
publicos tiverao conhechnento no exercicio de suas func-
çoes (5). A' esta classe de titulos pertencem igualmonte os
actos judiciaes, e muitas vezes tambem os registros
ecclesiasticos, quando as leis do paiz conferem ao clero os
poderes de officiai do Estado civil, e quando os fac-tos
relatados nesses registres nao sahem circulo das suas
attribuiçoes especiaes (6).
Antes de decidir da força probatoria de um titulo pu-
blico, ha uma distineçao importante a fazer entre os fac-tos
que o redactor do titulo pôde nelle attestar pela
(1) Exemplo : as leis, as circulares ministeriaos.
"(9) Exemplo: as resoluçôes votadas pelas assemblées do Estado, on
pelas assembléas constitucionaes.
(8) Exemplo : as sentonças dos tribunaes.
(4) Exemplo : um processo verbal sobre um acontoeimento e as con-
quentes medidas que so tomarâo.
(o) Exemplo: as testemuiïhas referem-se a condneta de um individu >,
on a sua presença em nm certo lugar.
(8) Exemplo s o titulo relata que A,, casou-so «m tal dia.
ÎOO
* I
sua experiencia pessoal (7)., e aquellesque elle sd por
declaraçao de terceiro pôde consignar no escripto pu-blico
(8). Se o facto que se tem de provar entra na primeira
categoria, o titulo faz prova plena, isto é, o juiz é obrigado a
considerar conio judiciariamente verdadeiro o aconte-cimento
que o officiai déclara ter-se passado sob suas vistas (9).
Alem disso, os titulos publicos podem fornecer a prova,
quer do corpo de delicto (10), quer de um dos indicios do
corpo de delicto (11) e quer de uma circumstancia aggravante
da pena (12) : ou contem so mente a prova de um facto, no
quai pôde-se vêr um indicio contra uma pessoa (13/.
"Provado que seja este facto, pôde tambem vir a ser favoravel
ao accusado (14). .
Todos os outros titulos, quer os emanados de pes-soas
particulares, quer os lavrados por pessoas publicas, mas
(7) Exemple : o ccelesiaslico pôilc coi'tilicar que baptisau A- em 35 de
Junlio de 1800.
(6) Exemplo : recebe a declaraçao feita pela mai de ser A... o pai da cria
n ça.
(9) Exemplo : o titulo prova que A. fez tal declaraçao em juizo.
(10) O accusado oommetton o crime de diffamaçâo em plena auiiaucia;
disso se fez mençào na sentença.
(11) Exemplo: os autos provâo que A. fez sob juramento esta ou aquella
declaraçao em juizo.
(12) Exemplo: o titulo prova qup. o accusado foi con'demnado por
outro crime semelhante, e que por consequencia esta em estado de rein-
cidencia.
(13) Exemplo: o accusado, afim de transviar a justiça, deu informaçoes
falsa,s dn proposito.
(14) Exemplo : um homem é accusado de ter commettido um crime em
B'rliin a 24 de Junlio de 1833, e prova que nesse mesmo dia em Vicnna foi
iuter roxado ein juizo.
191
fora das suas attribuiooes legaes ; todos os titnlos publi-|
cos, emfim, carecendo das formas substanciaes, consti-
tuem escriptos puramcnte particulares, e cuja apreciaçâo
cahe na regra gérai, nâo podendo provar a favor do seu
autor mais (15) do que o faria a declaracâo verbal da
testemunha fallahdo em causa propria. Em compensa-
ç&o os titulos particulares fazem prova contra o seu
autor (16) (S). I
CAPITJLO L.
OONMCÇORS EXTRISECA.S I)A PRODUCÇÂO DOS TITUÏ 03- M
Quando se vai procurar em um titulo qualqner a prova
de certas indicaçoes que contem, cumpre, antes de tuclo,
considerar em que estado é apresentado.
1." Deve ser apresentado em original (1) ; por uma
simples copia nâo se pôdejulgar do seu verdadeiro estado;
pôdem nella baver erros muitos prejudiciaes ao accusado, e
alem disso, como chamar o autor do titulo original al dar
explicaçSes sobre a sinceridade da copia que nso é
(15) Exemplo : o accusado para provar que ostava em diverso lugar, produz
uma nota foi ta no seu livra particular- Esta nota nâo tem impor-tancia
alguma.
(16) Exemplo : um iudividuo c accusado de ter subtrahido sommas que lhe
forào conûadas em deposito; e apresenla-se-fho o seu recibo para pvo-Var que
o deposito fol ellectuado.
(3) 0 nosso Col. do Processo. quanto aoa documentes, Rmita-se as
prescripçoes dos ai'ts. 92 e 97, deixando larga marge m para a doutrina e
consciencia do juiz. Alem destas, ainda ha a prescripçào do segredo invio-
lavel das cartos, emquanto estîio confiadas aos correios, Const. art. 179 S 5°.
n8o podendo portanto servirem de prova emquanto alii estivereni. Sobre est3
pontoxhoj? a jurisprudencia é uniforme.
(1) Kl3ins;hrod, I. c , § 10.—Tittmann, III, p. 511.
• * -
103
escripta pelo seu punho (2)? Séria pois um erro julgar ser
applicavèl ao processo cri minai a tegra do direito civil, que
pOe na classe dos origmaes as Copias authenticas (3) ; pois
que em materia criminal é a verdade material abso-luta que se
deve attingir ; deve-se remonta? até as fontes, ir mais longe
do que a copia (4) : se assim nao fosse, o juiz, em lugar de
cliegar a certeza, deveria contentarj 5e com a presumpçao, de
que o officiai publico, encar-regado de concertar o titulo,
cumprio a sua missao com todo o cuidado que ella exige.
Sabe-se que as copias sao de ordinario tiradas ao correr da
penna, e quando nâo se pôde prever a importancia do papel
que mais tarde têm de representar, e por «sso, é facil nellas
commetterem-se erros : tambam acontece algumas vezes estar
o crime no proprio original, o que nao pôde ser conhecido
pelo officiai que extrahe a copia : finalmente, a copia authenl
tica nâo représenta verdadeiramente o estado material do|
original. E' mister, fois, coricluir que taes copias nao|
constituem mais do que uma probalidade, e que o titulo
original produz a certeza.
2.» o titulo deve ser apresentado na sua totalidade. Quando
lhe faltâo algumas partes (5) ; quando ha neces-saria
correlaçao entre elle e um outro titulo, de sorte que o seu
verdadeiro sentido nao se mostre senao pela compa-raçao,
nao faz prova plena por si so ; do contrario, o juid correria o
risco de tomar por base da sentença uma inter-pretaçâo
completamente erronea.
(2) Benthaci, Tratado dos Provas, liv. IV. cap. 8.
® Heffter, no seu Curso deDir. crim.,g 625, parece ;r longe de mais.
(4, Vide excellentes observaçôes en» Kittka, Do Ponto de faclo,j p. 274,
etc.
(5) Tittmann, Manual, III, p. 511. not. 5.
193
3.* 0 titulo deve ser isento de defeitos ou de signaes de
defeitos ; as raspaduras, as interpolaçoes, as emendas e
accrescimos fariâo acreditar que elle foi desfigurado (6).
12' mister que o juiz uâo possa encontrar nelle qualquer
vicio, cujo effeito directe ria uma presumpçâo de falsi-
dade ; quando as explicaçôes do accusado ou indicios de
outra natureza dfio lugar a tal desconfiança, o primeiro
dever do inquisidor é de attender para este ponto, escla-
recer todas as duvidas, e verificar, se o titulo merece ou nao
ser crido corn segurança. Finalmente, convem aqui
distinguir entre os titulos publiées e privados : quauto aos
primeiros, o processo allemao diffère muito do francez. Na
Allemarïha, quaudo um titulo publico é afguido de falso
inteira ou parcialmente (Fœlschung, Verfœlschung) é
necessario ouvir primeiro o officiai a quem é attribuido ;
pois este, melhor do que ninguem, pôde informar ao juiz,
se elle é realmente o redactor da peça, e provar a sua
veracidade ou falsidade ; mas devemos censurar a pratica
frequentemente seguida, de se exigirem por escripto estes es-
clarecimentos : quando o déclarante transmitte o seu depoi-
mento ao correr da penna, é possivel nao se explicar suffl-
cientemente sobre certos pontos importantes, que o juiz nâo
lbe pode indicar por nao estar présente ; as suas recor-daçoes
podem nâo ser complétas; pelo contrario, se o juiz devesse
interrogar sempre verbalmente todos os que estao no caso de
fornecerem informaçôes uteis sobre o conteudo originario do
titulo, a verdade manifestar-se-hia com mais segurança (7).
No direito francez (8), quando se trata de
(6) Vide o Proc. erim. comp., tit. 2, cap. 174.
(7) Vide as excellentes observaç.ôes de Kiittka, I. c, p. 250.
(8) Cod. de instr. crim., art. 18-161.
falsidade, o processo reveste-se de formas numerosas e
especiaes (9). Quanto aos titulos particulares, devem ser
ouvidos todos aquelles, dos quaes procède a peça, aquelles
que, polos, proprios termes do titulo, parecem ter coope-rado
na sua redacçao (por exemplo as testeinunlias). ; finàl-
mente,'todos aquelles que deviao te-lo visto,. se fosse ver-
dadeiro, ou que, conliecendo o verdadeiro titulo, estûo uo
caso de indicarem em que diverge do que é apresentado (10),
E" quasi sempre necessario uiu exame ; os peritos veri-fieao,
se o titulo cotitem ou nao os caractères da verdade (11) ;
comparâo a peça em questao com outras reconlie-cidas
verdadeiras (12), e. declarâo, se a falsificaçâo é pro-vavel ou
certa.
CAPITULO LI
VERlFlCAÇÂO DA VERACIDADE DOS TITULOS.
Para fazer plena fé, o titulo deve satisfazer a uma con-
diçfto essencial, "quai a veracidade, isto é, que esteja tao
exacto e fiel como quaudo sahio das maos de seu autor.
Quanto ao titulo puolico, a veracidade résulta do facto
(0) Legravereud, Tratado, 1 voL, p. 559. — Carnot, Instrc. rrim II,
p. 577 .'
(10) Klttka.I, c. p. 201.
(11) Por cxemplo, so ha raspaduras, se os sellos estâo alterndos.
(12) Por exemple, qnando se trata de livras de commeveio falsiKoaflos.
195
se achai* revestido de todas as formalidades* legaes(l),
independentemente de mais indagaçoes ; o cumprimerito idestas
formalidades constitue uma presumpç&o juridica ; salvo se o
titulo emanar de officiaes pablicos estrangei-ros, pois que entao
cumpre examinât previaïnente, si 8e acha revestido de todas as
formas exigidas pela lei do paiz em que foi redigido (2), para
poder ser considerado titulo publico ; e se sao authenticas e
verdadeiras- as assignaturas dos officiaes que nelle apparecem
(3).
Quanto aos titulos particulares, a veracidade é da mesma
aorte exigida,* quando délies se faz uso. Ella se prova ;
1." Pelo reconhecirmnto do seu autor. Este reconheci-mento
équivale a confissao (4), mas, como tal, nâo faz plena fé, senao
quando é feito em juizo e perante autho-ridade compétente :
soraente esta formalldade pôde dar a certeza de ter a parte
pezado seriamente as cousequen-cias da sua declaraçao, e de
nao ter sido, alem disso, a confissao extorquida por meios
illicitos. O reconheci-mento extrajudicial nao pôde produzir
mais effeito do que a confissao nas mesmas circutnstancias. A.
confissao tacita, que produz pleno effeito em direito civil,
porque
(1) Tap.s Como o sello. as firmes de cerfcas pessoas.
(2) Esta informaçâo é importante; em cada paiz variâo as formalidades;
por exemple» sobre o numéro dos officiaes on fnnwionarios que assign
o titulo, quando este deve ser assignado por muitos.
(3) Àqui a anthonticaçao e indispensavel: o juiz nâo conliece a assigna»
tura do funecionario estrangeiro.
) Cremani, Elem. juris. crim., II. p. \1%.— Kleinschrod, § 8— Stubel,
Difi crim.,% 1,0-JLOr-len- crim. pruss,, § 383.—Cod. bav., art. SIX).
196
o processo civil adinitte a desistencia e a sentença profe-rida
sobre simples presumpçoes, nao pôde ser applicada em
materia crirainal (5), como dissemos em outro lugar.
D'onde dimanao os. seguintes consequencias :
a.) Nâo pôde baver tambem reconhecimento tacito do titulo
(9) ; e ao juiz nao é licito assignar ao accusado uma dilaçao
para dizer sobre o titulo, sob pena de ser este havido como
reconhecido â sua revelia (7).
(
Que ahi haja um indicio, uma
causa procedente de suspeita con-cedemos; mas
reconhecimento tacito é cousa completa-mente impossivel ;
em materia criminal, nao se assig-nao termos peremptorios à
manifestaçâo da verdade ; nâo é sufficiente a verdade
artificial e meramente pre-sumida; alem disso, sd porque
persévéra o réo no seu silencio, é forçoso concluir que o seu
designio nao podia ser outro senao reconhecer o titulo que lhe
é apre-sentado ?
b.) Em materia civil é de regra (ao menos tera-se
sustentado muitas vezes) que, reconbecendo alguem a
assignatura de um titulo, taobem reconbece o conteùdo ; o
principio nao é applicavel ao processo criminal (8) ; o
reconhecimento, quando muito, poderia forma? umapre-
sumpç&o ;mas esta nao suppre a prova ; e no caso de que se
trata, quantos motivos albeios à intençâo de
(5) Martin, Curso de proc. cran., § 80, not. 14. Compare-se-o coin Titt-I
inann, Manual, IIL P- 509-
(6) Vide o Proe. crim. com/p., t. 2, cap. 175.
(7) O constrangimento é aqui inadmissivel. Vide -Hochboch, fArch.
novos do dir. crim., XII, p. 525.
(8) Consideraraos por isso defeituosas as prescripçôos do art. 983 do
Cod. pruss. e 302 do Cod. bav. >
197
approvar o que esta escripto nHo podem determinar o signatario
a assignar ? Podia acontecer ter elle assignado somente para
marcar o objecto com o seu nome (9), ou ter dado a sua
assignatura em branco, com um fim especial (10), da quai
abusou depois um terceiro, encbendo o papel em branco com
clausulas falsas e contrarias â intençâo do signatario.
Pinalmente, a assig-gnatura podia ter sido surprendida,
introduzindo o titulo entre outros muitos que o signatario tinba
de asignar, e com os quaes elle o confundio na precipitaçao com
que assignou- Portanto, reconbecendo o accusado a assignatura,
mas negando o conteùdo do titulo, nSo se pode dizer que o seu
reconbecimento comprebenda este (11); e o inquisidor deve an
tes de tudo investigar os moti-vos allegados e os signaes que
provem ter realmente bavido abuso da assignatura em branco.
2.° A veracidade do titulo tâobem se prova por teste»)
munhas (12) ; e entre estas distinguem-se ; H
a.) As que presenciarfto a confecçSo do titulo, e o re-vestirao
de suas assignatura s :
b.) As que assistirfto aos preliminares do acto, ainda) que
nao o assignassent ;
(9) Por oxomplo, muitos costamào assignar o seu nome om branco8
paginas do livros, contondo titulos que llies pertoncem.
(10) Acontece muitas vozes assignar um individuo o nome em branco
n'um papel para n^lle so passar ùma procuraçào, cuji formula ignora.
' (11) Vide as boas observacôcs de Stubel. g 1,051.—Volkmann, Cnrso do
Mr. crim. saxon,. II, p. 125—Hoffter. Curso, etc., g 625 not. 2.
(12) IvloimscliroL g 5..—Stnbel. g 1032—-1056.—Crotnani, El'tn. Juris,
cfim. III, p. 175.-God. prnsa-, 8,881 Ood. bav., g 299.
&y As que podem dizer, se é ou nao verdadeira a
assignatura, por conhecerem a da pessoa a quern é attri-buida
;
d.) Finalmente, as que depoem ter-lhes o autôv do titulo
confessado ter siçlo elle o "proprio que o escreveu.
Nos dous primeiros casos, o titulo deve ser tido por
verdadeiro, depondo as testemunhas era juizo e sob jura-
raento, e nao havendo razao para suppor um erro ou
infldelidade premeditada nas suas declaraçOes. Ko ter-ce iro
caso, os depoimentos s6 produsera lima levé pre-sumpçao ; é
muito facil o engano em inateria de escrip-tos, e os proprios
peritos, como se sabe, nao podem affirmar senao
probabilidades, quando dao o seu parecer a vista das peças
que comparào. No quarto caso, final-mante, ha compléta
analogia.com a confissao extrajudi-cial, e por isso nao pôde
haver prova.
3*° Na falta destes diversos nieios, resta sempre o exame
por peritos nas peças que compar&o (13) . Mas o emprego
deste pracesso requer a maior circumspec-çao (14).
a.) Quanto ans escriptos, que tem de servir de ter-mos de
comparaçâo e que devein ser entreg'.ues aos peritos, couve m
que o inquisidor procure os realmente verdadeiros, ou por
que o accusado os reconheoeo, ou por que sao titulos
publicos, e por isso nao dépendent do seu reconhecimeufco. 0
inquisidor deverâ lembrar-se que a mao muda ordinariamente
por causa da idade, que no fi m de dez ann )S o talho daletra
nao seassemelha a maior
(18) Cremani. I. c , p. 173—Quistorp, Prindyios, g 708— KlAiiMchw-1,
g 11—11—Tiltmann, Manual, g 848
(II) pluli[iâ,'.n i sua obraDn Prom ~ii\i os«oltent:ô3 oxpliisaçôas.
I
ÎOO
parte das vezes ao que se tinha antes ; para n&o tomar, pois,
termos de comparaçSo talvez falsos, deverâ procurar
escriptos da mesma época da peça erâ questao (15). Se,
n&o obstante todas as investigaçoes, n5o se acharem
escriptos que incontestavelmente sejao de seu punho, con-
vem fazer o accusado escrever, dictando o juïz (16). Mas
aqui apparece um inconveniente : o accusado, preve-
nido do designio do juiz, altéra muitas vezes o seu modo
ordinario de escrever, e esforça-se em occultar a verda-de ;
eutûo o juiz procédera com acerto, fazendo-0 escrever,
antes que elle possa desconfiar do_ fim para que
(17). E' taobem muito util que o escripto conte-nlia as
principaes palavras que se lôm na peça, objecto da
verificaçâo (18) ; Mas é preciso nïio esquecer que o
escripto actual do accusado pôde ressentir-se da per-
turbaçâo que o agita nessa occasiâo, e que a forma da
penna com que n&o esta acostumado, os objectos que
Ihe sao entregués, alterao frequentemente a sua
mao
(19).
(13) Geatèrding. Invetligaftlh é soluçtiei II. p. 414.
(16) Cod. de inst. rrlm. art. 461.—Klcimsclirod, g 85.—Cod. bav.j art.
a48.—Vide tambem as judiciosaa ohservar.ôos de. Kittka, I c, p. 265.|
(17) Por exemplo. podia-so ordonar-lhe que escrovesso a-suaresçosta |no
proeesso verbal em lngar do escrivao. (Em França os documentes que]
sevvom de termos de comparaçâo estâo sempre separados do procosso verbal
de informaçôes em auto especial.
(18) O bom inquisidor deverâ formulât 09 seus quesitos dp modo qu? htja
neccssnriamente repctieào das palawas que considéra importantes;] d->pois
pedlri ao acousido a sua resposta por escripto.
(10) Pratobevera, Dommmlos, IV, p. 140.
tfftôlka'RDS peritos. é. côïïsâ t&obem muitok<gra-
ve. Vé-se muitas vezes o inquisidor chaînai
-
sem razao os
professores de calligraphia do lugar : estes, se bem que muito
aptos para decidirem da belleza do traço e da firmeza da mao,
. nao o sao sempre para decidirem da semelhança de dous
escriptos. Os individuos, que por virtude de suas funcçoes
lêm diariamente escriptos de todas as especies e têm
frequentemente t>ccasiao de examina-! os profundamente,
estao por certo mais no caso de esclarecerem a religiao do
juiz (20).
c.) Depois de nomeados os peritos, e deprestarem jura-
mento, entrega-se-lhes a peça em questao e os documen-tos
que servent de termos de comparaçûo e sao reconhe-cidos
como verdadeiros ; em seguida, os peritos dao o seu parecer
motivado e explicado, o quai é iiiserido no pro-cesso verbal.
\£.- d.) No caso mais favoravel, isto é, declarando os peritos '
que a peça em questao é do mesmo punho que as outras, o seu
laudo nao constitue certeza, mas somente uma pro-babilidade
a favor da veracidade do titulo (21). Com effeito, a arte da
verificaçao dos escriptos nao se apoia em regras segmras (22).
O perito mais attento pôde eoganar-se ; os escriptos de
différentes pessoas podem por acaso assemelhar-se muito ;
(30) Os euiprogados do registre os archivistas, os guarda-livxos.
(21) Esto principio nào é eon tes tact o mesmo no civcl. Martin, Curso, etc.
S 211.—Lin te, Curso, efc,#289?
(22) Filangieri, Sienza délia Législations, lib, III, § 5.—Benthara,
Tratado das Protêts. Uy. IV cap. IL—Idem, Ratiônale, etc. 111. p. 598.—
Carmignanii IV, p
v
175.
301
a habilidade do falsificador pode, ' alem disao, ser tal, que
consiga illudir completamente o melhor conhecedor. O parecer
dos petos nada mais é do que a expressao de uma opiuiao
pessoal (23); pdde constituir um indicio, mas o prova directa
(24/.
4.° No civel, o réo [no direito allemào) pode repellir o titulo
pelo juramento negatorio (Diffmionseid) \ sendo logo, é sem
outra forma de processo, considerada a peça nao verdadeira ;
mas no crime nâo pode ser assim (25) ; nâo ha ahi somente duas
partes em presenca uma da outra ; e erraria quem dissesse que
o juramento, tacita-mento deferido como no processo civil,
pdde tâobem ser negativameute prestado, e produzir por
consequencia pleno effeito ; séria facilitai' o perjurio : o
accusado, para sabir de uma prosiçâo difficil, negaria em todos
os casos, e annullaria ao mesmo tempo as provas e o
processo começado. Em resumo, o juramento negatorio é
inadmis-siv'el pelos mesmos motivos que o juramento purgatorio
(26,; contraria a marcha do processo da formaçao da culpa, e
(23) Kiltka, Ic.,gv67.
(24) Stubel, Dir. cran» g 1033.—Tiltmann, g SIS. - Heflter. g 635 e not. —
Cod. pruss., g 38*.—CoU. bav., g 300,
(25)
Globig. Theorla dos $robabilidades, 22, p. 230, Stubel, Dir. frim.,
gg 1032 e 2728.—Martiu. Curso, etc., g 80. not. 12. Heffter, Curso, g G-
»5, not. 2.
(Em França, mesmo no ci vcl, esta principio nâo pode ser admittido sein
rastrieçoes ; alem disso nào pode ser applicado senào aos escriptos au-tban
ticos.)
(N. T. F.)
(20) Nu Àllemanha, na praticu, vô-se algamas vezes o juiz, deferir por
sentenca o juramento purgitorio ao accusado, com o fim de por elle repellir
esta ou aquella peça corroborativa das presumpçSes contra elle.— Tittmann,
Mnnual, g 500.
». 20.
impede-o de conseguir o seu fîm, que éa verdade absolu ta.
Se a lei o autorisasse, militas vezes o inquisidor, no momento
de verificar a vcracidodo do titulo por meio da prova
testemunlial, e da comparaçao de escrip-tos, séria obrigado o
suspender tuào e a fi car momen-taneamente com os bracos
atados, por ter o accusado fejto uma declaraçao falsa, nao
obstante sec solemne.
CAPITCJLO LU
DO EPFBITO DO TITULO QUANTO AO SEU CONTEUDQ
Provando-se ser verdadeiro o titulo, convem exauiinar-
llie o conteudo. O texto deve ser preciso, e claro o seu
sentido; porque, assim como uma confissao ou um depoi-
menfeo testemunhal em juizo fica sem effeito si se contra-diz,
assim taobem um titulo é uullo se é confuso o seu sentido, e
contein numerosas contradicçoes. Quando a obscu-ridade dos
termos é o resultado de intençao expressa (1); quando o
escripto é cifrado, adquire logo maior importancia aos
olhosdo inquisidor: a sua propria obscuridade ou os caractères
enigmaticos fasem presumir que o seu autor se eaforçou em
occultar particularidades que nao queria sugeitar as
inyestigaçoes da justiça; convem entao fazer-lhe perguntas
prudentemente meditadas (2), e obriga-lo a explicar-se sobre
o sentido real dos termos, ou interrogar
(1) Assim, é posai vol que o autor da pèça nao tenha querido que pes*
soas estranhas ao seu segredo soubessem o que sô via ser sabido
pelos' sous confidentes. Kleinschrod, I. t., p. 82.
(2) Por isso nâo se deve àpresentar logo de utna vez a ps'ça inteira
ao accusado.
303
as testemunhas que estejâo mais ao facto das relaçôes entre o
accusado e a pessoa a quem é dirigido o escrip-[to; estas
podem fornecer uteis informaçces e muitas vezes dar a chave
doa ditos caractères (3). Sendo a peça escripta ffl em idioma
estrangeiro, o seu conteudo deve s'gr verlido ',-. para o do paiz
em que se faz o pvocesso de informao, e inse-rido nos autos.
Este trabalho de versao requerj homens fi escolbidos e
peritos: os de meia sciencia poderiao indusir.-^M o iuiz em
erro. Devevao sempre prestar juramento; e a sua traducçâo
deverâ ser mostrada ao autor do titulo original, para
reconhecer se é ou nao verdadeiro o sentidû que Ihe derâo (é).
Quando fica demonstrado ser verdadeiro o titulo na
sua forma e preciso no seu texto, é do conteudo que dé-
pende o seu effeito no prôcesso.
1. Elle pôde concorrer para a verificaçao do corpo de
«ielicto, quer o delicto consista na propria peça (5), quer -
^enha sido nella effectuado (6), quer consista, final mente, no
seu contexto (Ty, entretanto, ainda que o jura adquira a
oonvicçao- da existencia do titulo pela inspecçao, é mister
todavia que outra prova venha completar a manifes- taçao do
corpo de delicto; testemunhas ou outros titulo
s
devetn ser
apreaentados para provarem, na primeira hypothèse a
falçidade total, e na segunda a partial da peça ^
(3) Tittmumv, itanual, 11L p.. 512.
(4) V ido sobretudo Kitlka, 1. c, p. 26!). H
(5) Por oxamplo, quaudo se trata de passaporte f.ilso.
(6) Exempta : o titulo è verdadeiro, mas as somnias forào falsificadas. . (7)
Por exçmplo : no caso de libello diffamntorio.
ein questfto. No tereeiro caso, para que se demonstre o
delicto, é preci30, de ordinario, produzir taobem a prova de
algunia eircumstancia constitutiva e essencial, estranha
completaraente â propria confecçfio do titulo. Tomenios para
exempta o libello diffamatorio. Em um moraento de desespero
ou de fervor poetico, o autoi* de um libello lançou sobre o
pape! pensamentos que nelle transbordavao, mas sem a
intençSo de os divulgar, e sem mostrar o escripto a pes-soa
alg-uma. Aqui, sob o ponto de fdsta juridico, o simples facto
do escripto nfto basta para constituir o delicto de diffa-maçSo.'
da mesma sorte quando um individu©, babil em imitar a letra
dos outros, se diverte em falsificar uma nota do banco, que
deixa no fundo da sua secretaria» sem manifestar desejo de
fazer uso délia, ainda nâo ha crime (8); &6 a emissao reunida
aos primeiros factos pro-vocarâ contra elle os rigores da lei.
2. 0 titulo taobem é efficaz para demonstrar quem é o autor
do delicto; mas, como jâ. dissemos mais acima, eonsti* tue
entâo uma prova de prova, e a regra que décide da prova
orig'inaria devè sô ella tambem decidir do seu valor-a). Se
contem uma confîssao, tendo sido esta extrajudicial, ainda.
que o titulo tenba sido reconhecido, nao de autorisât a
condemnaçâo. Se o autor da peça reconbece que ella
(8) 0 God. bav. ostabelece perfeitamente esta distinccào, art. SC5. (Em
França, em materia de diffamùo, a emissào é tambem necessaria; mas
quando se trata de falsidade om escripturas, da fabricaçào de moeda
falsa, etc., etc. o facto sô, independento da intençâo, pôde alguma s
A'ezes bastar para constituir um delicto. Ood. peu., liv. III, tit. 1 cap.
III, secç. I, II, III. IV, V. VI, e as lêis ospeciaes sobre a imprensa
cspecialmonte a do 17 de Maio de 1819.
\ * (N. T. F.)
V (9) Exomplo : A. confessa o crime em uma" car ta escripta a um amigo.
SOS
é verdadeira, mas ao mesmo tempo nega o crime perante o
juiz, o titulo ntto é mais do que um indicio contra elle.
Quando, pelo contrario, elle confessa emjuizo â-vista do
titulo, ha entao confissao expressa e judïcial, e a condem-
naçao é a consequencia, baseando-se na confissao e o no
titulo que, quando muito, traça os limites dent'ro dos quaes
podem ser admittidos'os factos confessados. h). Se o titulo
contem o testemunlio de uma pessoa que o reconhece
erdadeiro, sera comtudo reper em juizo o seu depoiment
nfto lia mais do que um testemunlio extrajudicial, sera jura-
mento emanado de uma testemunha singular. que nâo pode
fazer prova plena. Se, pelo contrario, o autor reproduz em
juizo os factos por elle enunciados na peça, entao é o novo
depoimento que faz fé, achando-se revestido das solemnidades
legaes. c). Mencionando o titulo factos dos quaes se possa
inferir a culpabilidade do accusado (10), sao elles que podem
dar origem as presumpçOes, pela sua natureza, e por virtude
da prova artificial. Se o titulo o é authentico, os raesmos
factos nao podem ser considerados provados; convem entao
ver se a peça contem uma con- I fissao ou um testemunlio, e
decidir segundo as regras an- ! teriormente citadas.» Muitas
vezes a simples posse do titulo faz com que pairem suspeitas
sobre o possuidor (11); neste
(10) Em um processo do informaçOo por onvenenamenlo achou-so em cas»
âo um pharmacoutico um bi.'helo no quai se pedla nrsenico. O pharmaceutico
afflrmou que A. 3 ho tinha envlado ,estè bilhete, e que a ello tinta mandado a
substancia venenosa. A. uegou ter oscripto o bilhete.
(11) A. possue cartas eseviptas pelo autor de uma conspïraçào de alta
traioSo: todos os piano» sâo-lhe descoberlos, e de todas as cartas sulta que
ha muito tempo existera volaçSes entre o que as eacreveo 'i o que as
rppobfi-)-
caso o juiz indaga, se elle sabiaqueotinhaemseupoder, e coni
que intençao elle julgou dever guarda-lo; intençao que muitas
vezes nflo é condemnavel. d). Se o titulo é produzido como
prova de defesa, deve-se decidir segundo o principio gérai,
que, sendo o seu autor quem o produz, as explica oOes -que
contem nao podem fazer prova a seu favor ; to-davia, si se
provar que quaudo elle o escreveo nao tinha em vista tirar
délie vantagem futura (12), ou desfazer pre-viameute certas
suspeitas (13), o titulo nao poderé. deixar de ter muita
influencia no processo.
(12) Por exemple corn o 11m de provar a sua estad* osa outro lugar-
(18) Vi'le priacipalmonli o Cod. bav., art. 802 a 306.
FIM DA SEXTA PARTE
SETIMA PARTE
Da pi'ova pelo coneurso de cireum-stancias.
CAPITULO LUI
CARiCTER DA. PROVA CIUCGMSTAKCUL
Na maior parte dos casos, falhâo os meios que nas idéas
communs dao origem ao que se chaîna prova natural; por outroa
termos, nfto ha a inspeeçSo do juiz, a confissao, e testera umaas
do facto. Maso espirito inrestigador do ma-gistrado,deve saber
achar uma mina fecunda para o des~ cobrimento da verdade no
raciocinio apoiado na experiencia, nos processus que applica ao
exame dos factos e circums-tancias, que se encadeiao e servem
de sequito ao delicto. Estas circumstancias sao outras t-autas
testemunhas mudas (l), que a providencia paréce ter collocado
em torno do crime, para fazer surgir a luz da sombra na quai o
agent» esforçou-se em sepultar o facto, principal; sao como que
um pharol esclarecendo o espirito do jui/ e dirigindo-o para
vestigios cerfcos, que basta seguir para chegar à ver dade. A
existencia destas testemunhas mudas é de ordinario
(1) Boatham. Tratado dos Provae, 1, UT.
aos
Mffl
ignorada pelo culpado, ou elle as considéra sem irapor-tanciaj
aleni disso nao as pode desviar : os pregos da sola dos seus
sapatos tralfem a sua passag'em; um botâo per-dido uo lugàr
do crime foroece um indicio véhémente: uma nodoa de
sangue no seu fato attesta a sua participaçâo no acto de
violencia. Todas estas circumstancias servem de ponto de
partidaa o juiz: a marcha ordinaria dos acontecimen-tos
humanos lhe fornece analogias, e por inferencia conclue dos
factos conhecidos para os que necessariamente consti-tuem a
criminalidade. Como se vê, a prova chamada artificiel (2) ou
pelo concurso dos circumstancias (3) é absolutamen-te
indispensa vel em materia criminal, e maior parece ser a sua
importancia (4) desde que se chega a comprehender
exactamente a natureza da prova em gérai (5). E' erro sup-pôr
que a inspecç&o do juiz, a confissao, o depoimento teste-
niunhal, que todos os meios a que a opiniao dâ a quaiifica-çao
de prova natural, baseâo-se na experiencia directa e pes-soal)
e convencem melhor, por isso que o nosso espiritose décide
entao sômente pela dos sentidos. Como jà dis'semos em
outro lugar, a convicçâo, em todos os casos, apoia-se em
presurapçoes. Prestamos fé a confissao, porque nao po-demos
suppor que um innocente se confesse culpado; o modo porque
o réo confessa faz-nos concluir que real-iuënte commetteo o
crime, se alem disso os factos prin-
(2) Vide mais acima cap. 16, in fine
(3) Esta expressào é usarla prinnipàlmente pelos ant<w>s inglezes—
Bantharra, Tratado 1» liv. V. M., nationale III, p. 1. Philips, Da
prova, I, p. 135
(-1) Hainrotli, na Revista de Hitiig, a. 42, p, 257
(ô) Vida mais acima, cap. 11
30©
cipaos sao verosimeis e concordâo perfeitamentc corn os
factos accessorios; fiuâlmente, sô depois de ternios por
muito tempo comparado as circumstancias da con-fissSo
com as jà conhecidas é que decidimos com toda a segurança
ter o confitente commettido o crime. Quando duas
testemunhas deposer&o, aceitamos o sëu depoimento, porque
consideramos veridico o de ambas, ou antès, por-que
presumimos que podérâo ver e quiserâo dizer a ver-dade, e
.porque, fiuâlmente, as suas declaraçoes estâo de acôrdo
com os factos yerificados. Propriamente fal-lando é
semprc a prova circumstaacial que motiva nos-sas
decisOes : etn cada causa na semprè circumstancias que
nâo procedem da observaçao pessoal, mas sim do seaso
intimo, e que o espirito n5o pôde attingir senîlo
raciocinando do conhecido para o desconhecido (6).
A' prova artificial (7) derâo-se duas différentes defini-
çOes. Em uma quiz-se comprehender todos os meios imperfei-
tos que contituissem a prova directa, satisfazendo elles a
todas as condiçoes legaes; na outra nSo ha mais do que a
prova por via de conclusao de um facto certo para outro
incerto. O primcito systema tem por base a Caro-
(0) Por exomplo, quanto â «loraonstraçao da intençâo criminosa.
Vide tâobem Bayl, Ensaio sobre o Dlr. «•£»?., 1, p. 211.
(7) Vide, sobre este assumpto, entre os antigos doutores, Blanchi,
dos Indicios Vonot. 131"».—Bruni Guido de Suzaria. do Indicio Lugd.
lôlô.-MenocMus de Prœmmpt.. Colon. 1028- entre os modernos vide
Nani.d* Indiciiseùrunq. usu. Tic. ri- 1781—Pagano. Logica de proba-
lili applicata a giudizi crim.. Milan. 1806,- Zurhen, Ensatos de Ugu-
laçSo, IL p. 41 Cirmignani» délie Leggi: IV, p- «6.
es) o. c. c, art. an, ai, sa.
mim-
SIO
linâ, que consagrava, segundo se diz, a opiniflo (9) da-
quelles que classifieâù entre os indicios o depoimento de uma
testeinuuha singular, ou a confiss&o extrajudicial. Mas os
teiinos de que se serve a Carolina nâo tem aqu. importancia
âlguma; o seu autor quiz simplesmente indi. car ao juiz
f
nos
textos citados, as fontes mais ordinarias da probalidade, e
estabelecer uni limite alem do quai podesse ter applicaç&o a
tortura: ora, tendo an tes decla-rado que esta n&o podia ser
applicada senao no caso de presumpç&o légitima, foi
conséquente declarando t&obem que o depoimento de uma
unica testemunha e a confis, s&o extrajudicial constituera a
presumpç&o légitima pela quai o juiz pôde decretal-a. Pore
m, tratando-se de définir precisamente as provas natural e
artificial, torna-se illogico, na linguagem scientifica, incluir
na ultima especies que differem totalmeote dos indicios
propriamen-te ditos; e coin effeito, se um outro depoimento
vem se ajuntar ao da testemunha singular, ent&o jâ n&o ha
mais indicio, ha prova compléta, sem que a natureza do meio
tenha niudado. Em materia de prova artificial, a quest&o a
resolver é sempre a seguinte: a certeza sera produzida pelo
concurso das circumstancias, ou pelas in-duçoes «que délias
deriv&o ? Mas o depoimento da testemunha singular, e a
confiss&o despida de todas as for-» malidades que fazem a
força da confiss&o judicial, n&o s&o circumstancias
accessorias do facto principal; n&o podem ser
denominados indieios, e o seu effeito se avalia segundo as
regras da prova composta ( Vide cap. 92).
(9) Ranfl, Da Prova, p; 148. — Heffler, 'Curso do, g 628, classifBcào as
provas juridicamente inauflleientca em uma catogoria que dcnominào
Indicios improyiamsnte ditot
311
Assini restricta e fixada a prova artificial, de que
varaos tratar mais especialmente, applica-se a todos os
os casos em que, por falta da onfissao do réo, ou do
depoimento de testemunbas sobre o facto principal,*» nao
resta ao juiz, para firmar a sua convicçao, outro recurso
senao examinai' em suas mutuas relaçOes as circumstan»
cias accessorias, e tirar délias as inducçGes, que contem
emgermen. Em materia civil ella admitte duas grande divi-
isoes : ^j
1.° Muitas vezes a propria lei éleva certas presum-l
pçoes & categoria de prova, e .obriga o juiz a considérai
verificados os factos principaes, desde que certos outros
estiverem provados.
2.° Outras vezes ella deixaao juiz o arbitrio de decidir
em sua sabedoria, e de seguir as conclusses da sua razao
para firmar as suas convicçoes.
D'ahi derivâo duas especies de presumpçOes: as cha-
madas legaes, premmpUones juris: as deixadas à apreciaraqj do
inagistrado presumpclones hominis.
JSm materia criminal nao pode haver presumpçao lé-
gal (10); querendo a lei a manifestaç&o da verdade absoluta,
nao podia obrigar o juiz a tomar por base certos factos,
muitas vezes equivocos ; alem de que séria ar-bitrario, por
causa da multiplicidade infinita dos incidentes tao
complexos da vida -humana, applicar-lhes uma medida
sempre fixa; querer que estes factos pre-estabelecidos
provera necessariamente a existencia do facto principal, é
erigir em certeza probalidades muitas vezes enganadoras.
Concebe-se qtie no civel sejao nô gordio assim cortodo, pois
em uma situaçâo delicada é talvez melbor
(10) Vi-lo aobreeaU questùo Cremaiii, Elamjur. crim. III, p. 140.
£13
tomar por gtrias analOgias e a experiencia quotidîana da vida ;
mas o mesmo nao se pode dar no processo criminal. E nem se
diga que, concedendo-se ao accusado o direito de produzir a
sua prova contra a da accusaçSo, tâobem se lhe todaa as
garantias contra as pre'sump-çOes legaes; corn que direito se
lhe impOe o onus da prova da defeza ? Alem disso, esse onus
é perigoso, por-que se nao quer ou nao pode dar prova plena, a
presumpçao légal se levanta contra elle com todo o seu rigor.
No direito commuai allemûo é desconhecida esta presumpçao;
nem mesmo a constitue o que ordinariamente se deve entender
por prei/nvptiïo doli (11).— Nao" obstante, certos codigos
modernos (12) a admittirao algumas vezes, principalraente
quanto à criminalidade e ao al eau ce da ntençao, e em materia
de légitima defesa^ mas o legis-lador, guiado por um
sentimento mais justo, ampliou quanto era possivel o campo
da contra prova, e decla-rou nulla a presumpçao, quando
existera- probabilidades contrarias; alem disso, como o
inquisidor tem por dever investigar ex officio as
circumstancias favoraveis ao réo, nao poderà, na maior parte
dos casos, a presumpçao légal, assim limîtada, exercer funesta
inflnencia contra os interesses do mesmo réo.
CAPITULO LIV.
SYSTEMAS DAS DIVERSA.S LEÛISLOES EM MATERIA DE PROVA
ARTIFICIAL.
E' natural que a prova baseada no concurso "das cir-
cumstancias représente papel muito mais importante em
(11) Vide mais aciraa, cap. 16, e not. 17.
(12) Vide God. bnv., art. 41, 48, 44, 136.
&13
toia a legislaçao que adopta o systema da accusaçao e das
justiças populares, do que naqnellas cm que vigora o systema
inquisitorial, e em que a sentença deve ser proferida por juizes
regulares e letrados. No processo accusatorio as duas partes que
luctao perante o magis-trado, esforçao-se, cada uma, em
conseguir que as convic-çao deste lhe sej&o favoraveis :
coraprehende-se que lan-ç&o mao de todos os meios para fazer
pender a balança do seu lado, e impressionar profundamenmente
aquelle de quem défende a sua sorte. A. prova que se deduz do
argumente da impossibilidade do contrario, a pintura viva e
dramatica dos incidentes que possao produzir a probabi-lidade
das allegaçoes faites, tudo tem ahi importancia capital; e como
juiz nao tem por missâo directs, neste systema, provocat a
confissao, e faltem frequentemente testemunhas sobre" o proprio
crime, segue-se que, ordinariameute, é a prova pelas circutnstan
cias que décide de todo o processo. Alem disso nao se deve
esquecer que aqui o povo é juiz ; o accusado nao se dirige a fria
razabdos magis-|rado? regulares, mas si m aos sentimentos e a
imagina-çao dos jurados ; e quando trata de obter os seus votos
pela prova artificial, diminue sensilvelmente a barreira que
sépara a certeza da verosimilbança (1)
K O contrario aconteco no processo inquisitorial.-O carac-ter deste
processo é a incessante actividade do magistrado que yimos
immovel no systema da accusaçao ; e esta actividade tem por
fim a manifestaç&o da verdade absoluta; cada um dos
movimentos do iuquisidor e do juiz definitivo é regu-lado pela
fria e sa razao. Nos autos nao se encontrao pinturas vivas e que
arrastem o eapirito ; é um corpo de documentes
I (1) Cav'vignani, I. c. IV, p. 177:
214
que c mister estudar maduramente, e apreciar pelas segras do
bon» senso e da experiencia em materia de investi ga-çfto da
verdade ; do quai, finalmeute, devo einanar a cer-| teza eaj
relacâo à iuiputaçao. Quem analysar a' uatureza da prova
artificial, reconhecerâ logo que ella pdde facil-mente dar lugar
a duvida ; que é imperceptivel o limite entre as simples
suspeitas e a certeza baseada nos in-dicios, e que o juiz tem
inteira liberdade de faze-lo avan-çar ou recuar a seu bel prazer
; por isso, nao é de admi-mirar ver as legislaçoes, em que
domina o systeraa inqui-sitorial, concederem menos força a
esta prova. Demais, neste systema, o fim principal é obter a
eonfissao ; e sendo pclos interrogatoiïos que o juiz o consegue
a maior parte das vezes, segue-se que os indicios, menos indis-
pensaveis entao, sao postos em segundo lugar. Finalmeute, por
isso mesmo que o legislador institue juïzes regulares, e forma
para elles uma tbeoria obrigatoria da prova, preoccupa-se mais
com os perigos que a innocencia pode correr par causa da
prova artificial; e parecendo-lhe que a prova natural pôde
merecer toda a confiança rejeita inteiramente qualquer outra,
ou nao a admitte senao com numerosas réservas.
Estas ligeiras observaçGes servem para ezplicar os
seguintes factos bistoricos :
Em Borna, os indicios tinbâo grande força (2) ; estudan-do-
se nos autores classicos as particularidades que refe-rem (3;,
ve-se-os applicar os processos mais conformes
(2) Mais tarde iniagaremos se, sob 0 imperio da lel romane n
julgameuto polia ser pronunciado por simples indicios,
0) PriBcipalwente Cicero «/(juiuliliauo.
2iS
com os Habites quotidianos da vida â investigaçao c as|
couclusGes a tirar desta prova; e grande numéro de textos
(4t) demonstrao perfeitamento quai a importancia que os
jurisconsultes davao aos argumenta (5), indicia e aos signa
(G) (7), O direito canonico poucos documentos fornece (8) ;
em compeusaçao os praxislas da idade média dao aoa,
indicios lugar mais importante, e estndûo principal mente a
sua força probatoria. Construem catégories, sendo a
principal a dos indicia indubilata (que nao
(1) L. 25, Cod. do PioOat—L. 3, Cod. Quorum appellat. non reci-\ piant.—
h. 22, Cod. ad Leg. Corn, de falsis (S).
(S) Sobre a primoira Ici vide 4 nota (S) à nota 12, do cap. 2, A segundu diz,
que o accasado de aer convencido argumentis. A ter. Cîira, tratundo
especialmcuie do crime de fuisidade, tambem estatuo que pôde ser provado
argumentis.
(5) Sobre o sentido du palavra argumentum vide Inttit. orat. V,
cap. 10.—Vossius, Continent. Rhêt. lib. 1, cap. 2, n. 2.
(6) Por exemplo, a L< 25, 0. de Probat. (S). (S)
Vide a- nota (S) 4 nota 12, do cap. 9.
(7) Cod. Theodoa. Const., 3, IX, 37.
(8) C. 10, X, de rerbor. sign.; C. 2. 14, X, de Prcesumpt. (S).
(S) A primeira de H ne o que é prova e o que é argumento, e os [distingue,
accrescentando que p?lo argumento se chega 4 verdade por meio da
investigaçao. A sigunda d4 como csemplo da presumpçao véhémente o caso do
rei SalomSo, com as duas mulhercs que allegavâo ambaa serem màes do uma
criança. As provas no direito canonico foriio reunidas resumidamento por
Lancelot. Inst. Jur. Can. h. 3, IT-. Il da forma scgûinte : utputa confessione
partium. depositione testium, instrumenta,-um exhibilione. jurisjurandi
religione, inspection» judicis, notorietadi: rei. tuspicione tehamenti, foma atque
aliis ad miniculls
210
,stio seaâo- um complexo, uma reuniao de muitos iudicios | mais
véhémentes) e acredit&o chegar por este modo facil- * .mente a
soluçâo do problema. Finalmente,. estabelecem j divisoes de
outro genero segundo as novas phases (9) em fi q»e os indicios
parecetn, por sua natureza, fazer entrar \ 01 processus. As
prescripçoes sobre a materia honr&o a .:•] Carolina : nellas se
révéla o genio do Schwartzenberg, '-• des té espirito.
methodico, e formado na escola dos antigos ? logicos.
Occupon-se (10) em dar aos j.uizos instrucçoes J complétas,
em mostrar-lhes como devem procurar os indicios, e que partido se
délie tirar délies. Ainda que véhémentes e numerosos sejâo, nao
podem sô por si autorisa r a condemnaçao (11); mas podem
autorisar a applicaçao Ida tortura (12). Demais, era rasoavel
declarar ao juiz que-para a applicaçao da tortura nao dévia guiar-se
por quai-quer presumpçao, mas por um indicio legitimo (13? e
dev.i-dameute verificado (14). Depois o legislador, para mostrar o
caminho que deve seguir, enumera, sob a forma de
1
(0) Vide a este respeito Angelu3 AtTetinus, de Màteficiis, § Quod fama
vublica, ns. 10 o 29.; Gandinus, de Maleflciis, tit. de Prcesumpti Clams,
qucxst. 20. ns. 1—8; Milloeua. tract, -de Probat. D. 08, 71.
(10) Tàbor, G. C. C Analyste, art. 18 e 24, nos seus Tratat. juris.
ï.ips. 1718, vol. II, p. 468; Tiltmnn, Historia do proc.. crim. ail.
p. 275. Il
(H) C. C. C, art. 22. (12) G. O.
C., art. 20. (18) C. C. C. art.
20, 23.
(U) G. 0. C. art. 23. |,
isvr
\
ëx^npïosï aTgutïs Indicios prineipaea, uns gërâës (15)7]
outros especiaes a certos crimes (16).
Os preceitos da Carolina tornârâo-se regras de decidîr
para os doutores, e o escriptores que se seguirEo esfor-
çarao-se em tirar délies todas as conseqaencias. Estes pre-
ceitos forâo suflîcientes, em quanta Yigorou a tortura ; mas
à proporçâo que esta foi sendo abolidn, foi-se conhecendo
que a prova por indicios era tolhida por obstaculos podc-'
rosos; é entao procurarâo libcrtnr-sc délies a todo custo
(por exemplo, por meio da pena extraordinaria).
As leis modernas da Allemanlia abolirSo défini tivamete
a tortura : os seus autores, esperando tirar todo o partido
possivel das récentes investigaçoes da sciencia nesta ma-
teria, derâo ao juiz instrucçoes complétas. Mas a idéa
dominante era entao que se a prova natural pode com toda
a segurança motivar a condeinnaç&o ; que a prova por
indicios nao pode estar no niesmo nivel ; todavia, como
houvesse perigo para a ordem publica, si se pro-hibisse em
todos os casos pôder ella autoriser -a condem-naçâo, o
legislador, para sabir do embaraço, voltou ao syâtema da
pena extraordinaria, e declarou ser esta a unica applicavel
no caso de existirem indicios, e esforçou-se em determinar
rigorosamente sob que condicçôes estes poderiao dar lugar a
essa condemnaçao. Tal é o systema seguido pelo codigo
austriaco (17), que, alem disso,
(15) C. 0. C. art. 85, 37.
(18) C. C. 0. art.. 83, 84.
(17) Cod. pen da Austria, art. 412.— A lei muilo importante de C de
Julho do 1833 (da quai fallaremos depois), meluorou conaidera-
velrnetito este artigo.
n. "*__
I
318
enumera sob a ferma de exemplos, para guiar û juiz,
diversos indicios que déclara sufficieutes.— A ord. crim.
da Prussia tambem procède por via de exemplos (18), enu
mera os indicios di rectos ou proximos (19), e alem disso
décréta a pena extraordinaria, por mais véhémentes e
numerosos que elles sejâo (20). Mas o Cod. bav., repro-
duzindo com fidelidade todas as noçoes até entao admit ti-
das pela sciencia, formulou o mais complète systema da
prova por indicios, definindo-a (21) ; ddvide-a em di versas
categorias ; enumera muitos exemplos (22jl ; instrne-
çoes aos juizes para a apreciaçao dos indicios proximos e
remotos (23/, e fînalmente, exige o cumprimento de uma
multidâo de condiçoes muito severas, mediante as quaes
o tribunal tem a faculdade, no caso de concurso de indi
cios, de decretar todas as penas ordinarias, excepte a de
morte (24;. ,^
Tal é tambem o -espirito dos projectos de lei do Ha-nover
.(25), e do- Wurtemberg (26/, que derivâo do Cod. bavaro.,
.*.
(18) Ord. crim., art. 401.
{19) M , art. 398, 404.
(20) Id. art. 405. g 6.,
(21) Cod. bav., art. 308.
(22) ld., art. 310, 319.
(23) ld., art. 326, 327.
(84) ld., art. 328, 330.
(25)''Projecto wurtemberguoz, de 1830, art. 276,289.
(26) Projecto hanoveriaoo de 1830, art. 236, 249.
219
Na França, onde domina o principio das justiças popu-lares,
comprehende-se que o Codigo da iustrucçao crimi-nal nao
contenba nada de especial em relaçâo aos indi-cios (27) ; mas na
Inglaterra, onde talvez melhor 6e com-prohendeo a verdadeira-
economia do jury, tentou-se, e com successo, conciliai" as uteis
prescripçoes de uma lei sobre a prova com a omnipotencia do
jury. ,Nao se eu-contrao, é verdade, na lei ingleza eates preceitos
formaes, a enumeraçao dos indicios que devem guiar o juiz, a
determinaçao do seu numéro e de suas condiçoes para fazerem
prova, todas estas particularidades enfim que acabamos de
apontar nas leis. da Àllemanba ; nao lia necessidade de
disposiçOes tao restrictas e absolutas ; mas na jurisprudencia e
na pratica dos tribunaes existem regras eertas (28) em materia de
prova e de prova artificial (29) : comtudo, estas nao provoc&o a
attençao do juiz seo sob a forma de avisos ou de indicaçoes,
as vezes muito précisas. Em resumo, na Inglaterra reconbece-se
que a prova circumstancial exige a maior circumspecçao e pru-'
dencia, mas ao mesmo tempo se reconbece tambem que ella -
pôde muito bem autorisar a condemnaçao (30).
(27) Vide a nota manuscripta do autor, cap. 61, tn fine. Vide u.
kOrd. crim. da Hollauda, que dériva do codigo ancez, excepto quaulo ao
jury, que nao adinitte. Résulta dos art. 310» 342 que os indicios sàb
meios de prova, mas que o juiz deve usar délies com extrema cir-
evmspecçOo.
(28) Philips, Leis da prova, I, p. 155; Russel, on Crimes. II, p. 605;
(29) Bentham, Tratado da Prova. III, p. 1. laz excellentes obser-
r
vaçôoa sobre a prova circumstancial.—Vide tambem um artigo do Law
Magasine, 14, p. 348.
ftîû) Ilnme, Co/nmentarlo sobre a M escosseia, II. p. 873.
220
CAPITULO LV.
DOS INDICIOS B PBESUMPÇOES. DAS DIVBBSAS ESPECIES DE
, ,*
INDICIOS.
Forma-se a prova artificial pelas consequencias succes-
sivamente dedusidas d'os factos; os indicios e presump-IÇOes
(1) sao os meios da sua acçfto. O indicio 6 um facto em
relaçao tao précisa com outro facto, que de um o juiz chega ao
outro por uma conclusao natural ^2). E' preciso, entao, que
haja ua causa dous factos, um veri-ficado, e outro nao
provado, mas que se trata de provar raciocinando do
conhecido para o desconhecido (3) : appli-cado ao processo
criminal, o indicio é o facto, circums-tancia accessoria que se
preude ao crime principal, e que por isso concorre para se
chegar à conclusao, ou de ter sido commettido o crime, ou de
ter nelle tomado parte um individuo determinado, ou de ter
sido o crime con-summado deste ou daquelle modo. Em uma
palavra, os indicios versao, ou sobre o facto, ou sobre o
agente, ou sobre o modo do facto. Pela sua natureza, e como o
nome o' exprime (îtwtec), o indicio é, por assim dizer, o dedô
que désigna um objecto (4); conm em si um facto
indifférente,
(I) Estas expressôes cm fundo sâo synonimas ; os praxistas a o lo-
gislador as emprogiïo indi ffercn temen In.
(g) Vide diversas definiç-ôes em Globig, Theoria dos Probalidades, II,
p. 809; Tittmann, III, p. 547, Stnbel, Do Corpo de Deiïcto. g 248 ; Abegg.
Curso do Prqc. crlm, § 132.
(3) Exemplo : achu-so uo lugar do crime um fragmenta da roupa de A :
concluo-so quo A. por ahi passou.
(4) GmellOi Du Administ. du just. ûrim. nos paquems Estados, f. 86.
» r «31
8e esta isolado (b), mas que adquive logo grande iinpor-
tancia, quando o juiz o ligar-se a outro facto (6). Este,
por seu turno (7), sendo assim descoberto, provoca, uo
curso do processo da informaçao, a attençao da justiça sobre
certo individuo que, sem elle, continuaria a ficar occulto ;
ou entao, e pesado na balança da razao, na occasiao da
sentença définitîva, e contribue para firniar fortemente, as
probalidadea da imputaçao. Neste iuomento, o juiz tem por
guias as leis da natureza nianifestadaa e garantidas pela
experiencia e pelo bom senso.
O indicio é tanto mais grave quanto mais certa parece a
lei, a relaçûo necessaria Antre o facto primitive- e o facto
conséquente desconbecido. Se esta relaçao se acba plena-|
inente justificada pela experiencia ; se nfto se pôde ad-
Imittir de modo algum outra conclusâo ou oatra interpre-
*açao, a consciencia do juiz declara-se satisfeita, e o racio-
cinio forma a conviççao (8). Infelizmente as nossas conclu-
sOes apoiao-se quasi sempre em simples possibilidade : a
relaçao que queremos ver entre os dous factos de nao ser|
necessaria, e dabi nascem as duvidas : pôde tambem acou-
tecer que sejao -completamente nullas estas relaçoes que
(0) Exempta : ura individuo tem sanguo nu roupa; lai ta nui botito i\
casaca de A.
G) Mag esta botûo é achado no saugae empoçado ao pé do cadaver
de B. Nj;.---
(7) Nnstfl sontido, os indicioa forïo denomlnadoa fontes de vérifie*-
çGa indirecte/, Stub«L Dir. Crim. g 93G; vide, no aentido contrario,
Abegg, Curso, etc., 3 182.
3) Exempta : a gravides prova evideatemeut* a cohiibiUçào.
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