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3. O saudosismo pelo “antigo” afasta a Igreja da resilência exigida no presente
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Após os horrores da revolução francesa seguida pelas devastadoras guerras napoleônicas
houve um estremecimento da nova ordem surgindo um anseio pelos “velhos tempos” onde a
tentativa de se restaurar o mundo segundo os paradigmas da fé, como, por exemplo: “vontade de
Deus” encontrou ressonância junto aos Estados conservadores e culminou com o “acerto”
ocorrido no Congresso de Viena (1814-1815), capitaneados pela Áustria, conhecido na
historiografia como Santa Aliança. Fazia parte desta aliança, além da Áustria, a Rússia, a Prússia,
a França e a Inglaterra provocando no Estado pontifício a ilusão da restauração da velha ordem
absolutista, abençoada pela intervenção de Deus no mundo através de seu representante o Sumo
Pontífice aliado aos monarcas conservadores destes países citados acima.
Esta situação durou por um curto espaço de tempo e novas revoluções sacudiram a
Europa, desta “Santa Aliança” apenas a Rússia, no século XIX, parece ter ficado imune a
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cf. FISCHER-WOLPPERT, Rudolf. Os Papas: de Pedro a João Paulo II. 5 ed. Petrópolis: Vozes, 1999. Em
Bizâncio os imperadores, em grande parte, haviam assumido pessoalmente o domínio sobre a Igreja, [...] E
procuravam estender tal domínio sobre o papa, “o patriarca do ocidente”. [...] A liberdade e autonomia da Igreja do
Ocidente, nos séculos subseqüentes, vinha sendo ameaçada por muitos lados. Todas essas situações de dependência
levaram a Igreja a um paulatino fortalecimento da autoconsciência da Igreja romana. O papa Gelásio I [492-496]
[...], esclareceu pela primeira vez, durante as desinteligências com a Roma Oriental, a concepção eclesiástica das
relações Igreja-Estado. Numa carta ao imperador Anastácio formulou ele, em 494, a clássica doutrina-dos-dois-
poderes, que, a partir de então, por mais de 1000 anos, em todo transcurso da Idade Média, constituiria a base teórica
do pensamento político do Ocidente. Consoante o papa, os dois poderes governam o mundo: A autoridade dos bispos
e o poder imperial. O poder sacerdotal é entre estes o mais poderoso, porquanto é chamado a prestar contas a Deus
também acima dos reis. Embora o rei ultrapasse em dignidade todo gênero humano, também ele depende dos
ministros da Igreja no recebimento dos meios da sua salvação espiritual. Por isso não pode submeter a Igreja à sua
vontade. [...] Por isso, ninguém deverá jamais elevar-se acima da primazia daquele homem que foi por Cristo
estabelecido acima de todos os homens e cujo primado a própria Igreja reconhece. [...] em outro tratado, esclareceu
Gelásio que não se deve confundir o poder da Igreja com o poder estatal, nem tampouco separa-los um do outro. “...
porquanto Cristo [...] separou as esferas de competência de ambos os poderes em campos de atividades autônomos e
dignidade bem distinta. Assim sendo, devem os imperadores cristãos subordinar-se aos bispos em assuntos da
própria salvação eterna, devendo os bispos, por sua vez, conformar-se com as determinações imperiais no âmbito do
domínio terreno. O múnus espiritual deverá manter distância de todas as coisas mundanas e, em contrapartida, aquele
que se ocupa das coisas temporais deverá abster-se da pretensão de querer dispor sobre as divinas [...] nem uma nem
outra haverá de afirmar com orgulho ser dona de ambas as competências. O papa Leão Magno [440-461] preparou o
terreno teológico dessa doutrina, quando no quarto concilio ecumênico de Calcedônia [451], proclamou a doutrina
das duas naturezas de Cristo: Assim como em Cristo, também a Igreja deverá ficar assegurada, inobstante a natureza
diversa, a unidade substancial soa âmbitos religioso e político. O papa Bonifácio VIII preconizou, na bula “Unam
sanctam”, de 18 de março de 1302, a doutrina das duas espadas: Tanto a espiritual como a secular estariam
implicitamente em poder da Igreja. Ao poder espiritual compete estabelecer e, se necessário, julgar o poder secular.
p. 261-262.