Download PDF
ads:
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO PARA
CENTRO DE CIÊNCIAS EXATAS E DE TECNOLOGIA - CCET
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GESTÃO URBANA
IURI FUKUDA HAYAKAWA
SITUAÇÕES DE RISCO AMBIENTAL COMO DEFINIDORAS DE
INFLEXÕES NO PLANEJAMENTO E NA GESTÃO URBANA
UM ESTUDO NA CIDADE DE CURITIBA-PARANÁ
CURITIBA
2008
ads:
Livros Grátis
http://www.livrosgratis.com.br
Milhares de livros grátis para download.
IURI FUKUDA HAYAKAWA
SITUAÇÕES DE RISCO AMBIENTAL COMO DEFINIDORAS DE
INFLEXÕES NO PLANEJAMENTO E NA GESTÃO URBANA
UM ESTUDO NA CIDADE DE CURITIBA-PARANÁ
Dissertação apresentada como requisito
parcial para obtenção do grau de Mestre
em Gestão Urbana, Linha de pesquisa:
Planejamento Urbano e Regional, ao
Programa de Pós-Graduação em Gestão
Urbana, da P-Reitoria de Pós-Graduão
e Pesquisa, da Pontifícia Universidade
Católica do Paraná.
Orientador: Prof. Dr. Clovis Ultramari
CURITIBA
2008
ads:
Dados da Catalogação na Publicação
Pontifícia Universidade Católica do Para
Sistema Integrado de Bibliotecas SIBI/PUCPR
Biblioteca Central
Hayakawa, Iuri Fukuda
H412s
Situações de risco ambiental como definidoras de inflexões no planejamento
2008
e na gestão urbana: um estudo na cidade de Curitiba - Paraná / Iuri Fukuda
Hayakawa ; orientador, Clóvis Ultramari. -- 2008
191 f. : il. ; 30 cm
Dissertação (mestrado) Pontifícia Universidade Católica do Paraná,
Curitiba, 2008
Bibliografia: f. 161-174
1. Planejamento urbano. 2. Desastres. I. Ultramari, Clóvis. II. Pontifícia
Universidade Católica do Paraná. Programa de Pós-Graduação em Gestão
Urbana. III. Título.
CDD 20. ed. 711.4
IURI FUKUDA HAYAKAWA
SITUAÇÕES DE RISCO AMBIENTAL COMO DEFINIDORAS DE
INFLEXÕES NO PLANEJAMENTO E NA GESTÃO URBANA
UM ESTUDO NA CIDADE DE CURITIBA-PARANÁ
Dissertação apresentada como requisito parcial
para obtenção do grau de Mestre em Gestão
Urbana, ao Programa de Pós-Graduação
em Gestão Urbana, da Pró-Reitoria de Pós-
Graduação e Pesquisa, da Ponticia Universidade
Católica do Paraná.
COMISSÃO EXAMINADORA
___________________________________
Prof. Dr. Clovis Ultramari
Orientador - PUCPR
___________________________________
Prof.
a
Dr.
a
Gislene de Fátima Pereira
Membro Externo - UFPR
___________________________________
Prof.
a
Dr.
a
Letícia Peret Antunes Hardt
Membro Interno - PUCPR
___________________________________
Prof. Dr. Harry Alberto Bollmann
Membro Interno - PUCPR
Curitiba, 28 de novembro de 2008.
Ao Prof. Nobuo Fukuda
AGRADECIMENTOS
Agradeço à Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR) e ao
Programa de Pós-Graduação em Gestão Urbana (PPGTU) que me oportunizou
fazer este curso de mestrado por meio da Bolsa de Estudos da Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES).
Ao Prof. Dr. Clovis Ultramari, por conduzir-me por este caminho fascinante
da pesquisa.
Ao Luiz, pelo apoio incondicional e incentivo em todos os momentos.
Ao Yoji, Kenji e Kenzo, pela compreeno nas horas em que estive ausente.
À Liria, pelo apoio e carinho.
À Deus, por me permitir vivenciar este momento.
RESUMO
O planejamento urbano tem limitações historicamente observadas. Neste percurso
histórico, não apenas limitões, mas também condicionantes têm sido agregados ou
valorizados. Aspectos naturais, por exemplo, a partir da evidência da chamada crise
ambiental, trouxeram ainda mais condicionantes a esse planejamento, reformatando-
o. A recente valorização das questões ambientais trazidas por mudanças climáticas
em nível global altera novamente suas prioridades. Todavia, a despeito da crescente
inclusão da questão ambiental nas práticas do planejamento, ainda é incipiente a
consideração da sua aplicação nos impactos de femenos adversos, consubstanciados
em calamidades públicas. Tal incipiência não permite a apropriação de eventuais
potencialidades que, paradoxalmente, essas calamidades possam ofertar. A discussão
da hipótese de como essas situações de risco aceleraram a tomada de decisões no
nível do planejamento urbano e da gestão, favorecendo a alocação de recursos para
as intervenções necessárias, estruturou o trabalho proposto e foi expressa por meio
de um estudo de caso do GPU Canal Extravasor, construído na Região Metropolitana de
Curitiba (RMC). O trabalho foi fundamentado em pesquisa documental e em pesquisa
de campo. A pesquisa de campo foi consubstanciada em questionários com pessoas
envolvidas no processo de decisão de aporte de recursos diante da situação
emergencial de calamidade pública. A área que constituiu o empírico da pesquisa foi
o assentamento irregular junto ao rio Iguaçu, denominado Bolsão Audi, no município
de Curitiba. Além da pesquisa documental e das entrevistas, serviu-se de dados
sobre o perfil socioeconômico da população da área em questão. Trabalhou-se
também com os conceitos relativos à fenomenologia dos acidentes naturais, riscos e
vulnerabilidade socioambiental. Busca-se neste trabalho facilitar à comunidade e aos
técnicos a compreensão do problema de riscos ambientais, os quais poderão servir
de ponto de partida para futuras ações de prevenções. Visa também contribuir na
formulação de políticas públicas para o enfrentamento de situações de emergências,
sobretudo na distinção de prioridades e distinção de situações criadas no território a
partir de diferentes riscos naturais e diferentes realidades sociodemográficas.
Palavras-chave: Urbanização. Planejamento. Gestão Urbana. GPU. Risco e
Vulnerabilidade Socioambiental.
ABSTRACT
Urban planning has historically observed limitations... Through this historical course,
not only limitations but also conditioning factors have been added or enhanced.
Natural aspects, for example, based on the evidence of the so called environmental
crisis, added even more conditioning factors to such planning, giving it a new shape.
The recent enhancement of environmental issues brought about by global climatic
change once again changes its priorities. However, even though environmental
matters have been increasingly included in planning practices, their application to the
impact caused by adverse phenomena resulting in public disasters, is still incipient.
For this reason, it is becomes impossible to take advantage of some potential that,
paradoxically, such disasters may offer. The discussion about how those risk
situations expedite decision making regarding urban planning and management, has
favored the distribution of resources for the necessary intervention, structured the
work to be done, and was expressed in a case study of the Large-scale Project Flow
Out Channel built at the Greater Curitiba. The study was based on both documental
and field research. The field work consisted of testimonials given by people involved
in the decision making process regarding the resources required to face an
emergency situation of public disaster. The area used in the empirical aspect of the
study was the irregular settlement on the margins of the Iguaçu River, called Bolsão
Audi, in Curitiba. In addition to documents and interviews, we have also resorted to
data on the socio-economic profile of the population in the chosen area. We have
also worked with concepts related to natural accident phenomenology, risk and
socio-environmental vulnerability. With this study we intend to provide both the
community and technicians a better understanding of environmental risk, to serve as
the starting point for future prevention action. Furthermore, we hope to contribute for
the creation of public policies to face emergency situations, especially in identifying
priorities and situations created in the territory by different natural risks and different
socio-demographic realities.
Key words: Urbanization. Planning. Urban Management. Large-scale Projects. Risk
and Socio-environmental Vulnerability.
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 - Orçamento Anual - Orçamento de Investimento em Habitação -
Despesa por Programas de Governo, conforme a categoria
econômica na Prefeitura Municipal de Curitiba ................................... 16
Tabela 2 - Tipologia de acidentes; número de ocorrências e número pessoas
afetadas, Brasil 2007-2008 .................................................................. 22
Tabela 3 - População brasileira: total, rural e urbana - 1990, 1996, 2000 ............ 37
Tabela 4 - Caracterização das famílias do Bolsão Audi (Jardim Alvorada II,
Audi, Jardim Icaraí, União Ferroviária, União Reno/Jardim União) -
Escolaridade da comunidade X Faixa etária ....................................... 149
Tabela 5 - Caracterização das famílias Jardim Alvorada II, Audi, Jardim
Icaraí, União Ferroviária, União Reno/Jardim União - Situação de
emprego dos maiores de 18 anos ....................................................... 150
Tabela 6 - Caracterização das famílias Jardim Alvorada II, Audi, Jardim
Icaraí, União Ferroviária, União Reno/Jardim União - Renda dos
titulares e cônjuges .............................................................................. 150
Tabela 7 - Caracterização das famílias Jardim Alvorada II, Audi, Jardim
Icaraí, União Ferroviária, União Reno/Jardim União- Tipo de
construção ........................................................................................... 152
Tabela 8 - Caracterizão das famílias Jardim Alvorada II, Audi, Jardim Icar,
União Ferroviária, União Reno/Jardim União - Número de pessoas
no domicílio X Número de cômodos utilizados como dormitório ......... 152
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 - Lista das maiores capitais brasileiras do censo de 1900 que
receberam projetos de renovação urbana ......................................... 56
Quadro 2 - Classificação dos hazards por processo físico .................................. 77
Quadro 3 - Região metropolitana de Curitiba: desastres naturais, 1980-2007 .... 121
Quadro 4 - Eventos negativos e eventos positivos .............................................. 156
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 - Mapa de ocorrência de alagamentos por bairros em Curitiba no
ano de 2007 .................................................................................... 19
Figura 2 - Canalização de córregos sem a devida análise de impactos .......... 40
Figura 3 - Cidade de São Paulo: conseqüências de retificação e
canalização de rios.......................................................................... 40
Figura 4 - Exemplo de área de risco de enchente e inundação ...................... 70
Figura 5 - Cenário de risco de enchente em ocupações ribeirinhas ................ 71
Figura 6 - Esquema de ocorrência de enchente .............................................. 75
Figura 7 - Imagem de uma área inundada ...................................................... 75
Figura 8 - Exemplo esquemático de destruição de enxurrada em fundo
de vale ............................................................................................. 76
Figura 9 - Localização da RMC no Estado do Para ..................................... 87
Figura 10 - Vista aérea da RMC: ao fundo situa-se a Serra do Mar e Litoral.
No centro visualiza-se o rio Iguacu e o município de Curitiba ......... 101
Figura 11 - Mapa do relevo de Curitiba onde se nota as depressões dos
fundos de vales ............................................................................... 103
Figura 12 - Mapa das áreas inundáveis de Curitiba .......................................... 104
Figura 13 - Plano Agache para Curitiba em 1943 Com destaque para a
preservação da mata ciliar ao longo dos rios, na porção leste e
oeste ............................................................................................... 107
Figura 14 - Incentivo para Programa de Habitação de Interesse Social ............ 112
Figura 15 - Transferência do potencial construtivo ............................................ 113
Figura 16 - Mapa das Bacias Hidrográficas de Curitiba .................................... 117
Figura 17 - Mapa dos bairros de Curitiba atingidos pela inundação no ano
de 1995 ........................................................................................... 124
Figura 18 - Fotografia aérea da ocupação do Bolsão Audi no ano de 1996 ...... 127
Figura 19 - Fotografia aérea da ocupação do Bolsão Audi no ano de 1999 ...... 127
Figura 20 - Fotografia aérea da ocupação do Bolsão Audi no ano de 2001 ...... 128
Figura 21 - Mapa da hidrografia da RMC e a localização do Canal
Extravasor ....................................................................................... 132
Figura 22 - Detalhe do traçado do Canal Extravasor ......................................... 133
Figura 23 - Esquema de funcionamento do Canal Extravasor da Bacia do
Alto Iguaçu ...................................................................................... 134
Figura 24 - Diretriz metropolitana com o novo traçado do Canal Extravasor
e anel viário metropolitano .............................................................. 136
Figura 25 - Mapa de Curitiba com a localização do Canal Extravasor e o
Bolsão Audi ..................................................................................... 146
Figura 26 - Fotografia da área definida como de utilidade pública pelo
Decreto n.
o
894/ 2007 ..................................................................... 155
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
APA - Área de proteção ambiental
COHAB - Companhia de Habitação de Curitiba.
COMEC - Coordenação da Região Metropolitana de Curitiba
GPU - Grandes Projetos Urbanos
IAP - Instituto Ambiental do Paraná
IDH - Índice de Desenvolvimento Humano
IDH-M - Índice de Desenvolvimento Humano do Município
INMET - Instituto Nacional de Meteorologia
IPARDES - Instituto Paranaense de Desenvolvimento
IPCC - Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática da ONU
IPPUC - Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba
IPT - Instituto de Pesquisas Tecnológicas
MMA - Ministério do Meio Ambiente
ONU - Organização das Nações Unidas
PROSAN - Programa de Saneamento Ambiental da Região Metropolitana de Curitiba
RMC - Região Metropolitana de Curitiba
SANEPAR - Companhia de Saneamento do Paraná
SIAFI - Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal
SIMEPAR - Instituto Tecnológico SIMEPAR da unidade complementar do Serviço
Social Autônomo Paraná Tecnologia
SMOP - Secretaria Municipal de Obras Públicas de Curitiba
SUDERHSA - Superintendência de Desenvolvimento de Recursos Hídricos e
Saneamento Ambiental
UNDRO - Office of United Nations Disaster Relief
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ............................................................................................... 13
1.1 TEMA DA DISSERTAÇÃO ......................................................................... 15
1.2 PROBLEMAS ............................................................................................. 16
1.3 OBJETIVOS ............................................................................................... 20
1.4 JUSTIFICATIVA ......................................................................................... 21
2 METODOLOGIA DA PESQUISA .................................................................. 26
3 REFERENCIAL TEÓRICO ............................................................................ 33
3.1 A URBANIZAÇÃO ...................................................................................... 33
3.2 INSTRUMENTOS DE PLANEJAMENTO DAS CIDADES .......................... 41
3.2.1 Constituicão Federal ............................................................................. 46
3.2.2 Estatuto da Cidade ................................................................................ 47
3.2.3 Plano Diretor .......................................................................................... 49
3.2.4 New Pubilc Management NPM e Planejamento Estratégico ........... 49
3.3 GRANDES PROJETOS URBANOS GPUs ............................................. 52
3.3.1 Outros conceitos de GPUs ................................................................... 60
3.4 VULNERABILIDADE, RISCOS E DESASTRES ........................................ 64
3.4.1 Vulnerabilidade ...................................................................................... 64
3.4.2 Riscos ..................................................................................................... 67
3.4.3 Desastres ............................................................................................... 71
4 ESTUDO DE CASO ....................................................................................... 86
4.1 CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO ............................................ 87
4.1.1 Região Metropolitana de Curitiba ......................................................... 87
4.2 CURITIBA: O GRANDE CENÁRIO ............................................................ 99
4.2.1 Aspectos naturais .................................................................................. 99
4.2.2 Medidas urbanísticas para controle de cheias em Curitiba ............... 106
4.2.3 Programas e ações do poder municipal para minimizar riscos
ambientais .............................................................................................. 114
4.3 QUADRO DE INUNDAÇÕES EM CURITIBA ............................................. 116
4.4 GPU CANAL EXTRAVASOR: INTERVENÇÃO, RISCO E LIMITES .......... 130
4.4.1 A importância do Canal Extravasor ..................................................... 130
4.4.2 A perspectiva da esfera decisória na obra do Canal Extravasor ...... 137
4.4.3 Limitações do planejamento - Bolsão Audi ........................................ 146
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................... 157
REFERÊNCIAS .................................................................................................... 161
APÊNDICES
APÊNDICE A - QUESTIONÁRIO 01 ................................................................... 176
APÊNDICE B - QUESTIONÁRIO 02 ................................................................... 178
APÊNDICE C - QUESTIONÁRIO 03 ................................................................... 182
APÊNDICE D - QUESTIONÁRIO 04 ................................................................... 183
APÊNDICE E - QUESTIONÁRIO 05 .................................................................... 185
APÊNDICE F - QUESTIONÁRIO 06 .................................................................... 187
APÊNDICE G - QUESTIONÁRIO 07 ................................................................... 188
13
1 INTRODUÇÃO
O processo de expansão nas grandes cidades potencializa desafios por solões
de planejamento e gestão de seu espaço. Quanto maiores e mais complexas forem
as cidades, maior também será sua dependência das áreas circunvizinhas e maior
sua vulnerabilidade em relação às mudanças ambientais, sociais e econômicas.
Vários fatores contribuem para a degradação ambiental e o mais evidente
está relacionado ao uso da terra. Os impactos observados nos indicadores de
saúde, devido à insalubridade, revelam também o agravamento do comprometimento
ambiental das cidades, na medida em que a consolidação física das moradias nas
favelas e nos loteamentos irregulares e até regulares se sem o provimento das
necessárias condições de infra-estrutura urbana. A poluição causada pela ocupação
urbana desordenada geralmente está associada à elevada vulnerabilidade, em função
do acelerado processo de urbanização sem o desejado (tecnicamente) ordenamento
territorial.
Geralmente esse processo de urbanização indesejado ocorre de forma lenta,
adiando inclusive a tomada de decisões devido à pouca “evidência” dos fenômenos
adversos. Essas mudanças podem levar tempo para se fazer perceber, parecendo
figurar-se timidamente em meio a pequenos acréscimos diários de fatos que não
permitem observar sua gravidade, constituindo-se, segundo Ultramari (2006, p.1),
num histórico de “crises cumulativas, dificultando o consórcio de esforços para lhe
fazer frente e permitindo eventualmente a instalação de situações irreversíveis”. Esta
situação também é alertada por Condon (2008, p.7) no contexto das cidades norte-
americanas: “Within the next ten years, North American cities will have to respond to
what Al Gore has called a „planetary emergency‟. [...] Without the tools necessary to
understand, predict, and enact policies, cities and their officials will fail”.
1
1
Tradução livre: “Nos próximos dez anos, as cidades norte-americanas terão que responder ao que
Al Gore chamou de „emergência planetária‟‟. [...] Sem as ferramentas necessárias para
compreender, prever e aprovar políticas, as cidades e seus administradores irão fracassar”.
14
Há ainda a perspectiva de ocorrências de extremos cliticos que se caracterizam
por pancadas de chuva violentas, alternadas com longas secas, ondas de calor e
furacões. O relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática/IPCC
de 2007, cita que 90% de probabilidade de que as atividades humanas são a
maior causa do aquecimento nas últimas décadas, pois é no meio urbano que se
consome a maior parte das matérias-primas e é neste perímetro que são geradas as
maiores descargas de poluentes atmosféricos e de resíduos que comprometem a
integridade de biomas e ecossistemas.
“No Brasil as principais ameaças naturais relacionam-se com a ocorrência de
inundações, secas e movimentos de massa, que se transformam em desastres naturais
decorrentes de conseqüências sociais e econômicas” (ANDRADE; SZLAFSZTEIN,
2007, p.2).
Embora ainda existam algumas incertezas científicas, evidências de que
se vive um processo de extremos climáticos global, com efeitos que ainda não se
conhecem claramente, mas com impactos certamente desestruturadores sobre o
espaço urbano. Qualquer mudança no balanço do ecossistema da terra tenderá a
alterar as temperaturas atmosféricas e oceânicas e os seus respectivos padrões de
circulação e tempo (MARENGO, 2006). Inicialmente, essas mudaas podeo afetar o
índice pluviométrico de diversas localidades, ou seja, ocasionar muita chuva em locais
onde pouco chovia, ou ainda diminuir a pluviosidade onde antes era abundante.
Podem também tornar mais intensos os fenômenos extremos, tais como furacões,
tufões, ciclones e tempestades tropicais (MARENGO, 2006). Portanto, há uma grande
combinação de riscos, cada um deles impulsionado em maior ou menor grau pelo
crescimento urbano e aumento da população, devendo constituir objeto de
preocupação não só dos gestores, mas também de toda a sociedade.
Mattedi (2007b) afirma que a preocupação com os desastres es relacionada ao
aumento e à concentração da população em áreas urbanas, o que eleva a vulnerabi-
lidade da maior parte dos seus moradores. Todavia, esta preocupação está muito
mais vinculada à busca do conhecimento científico para a identificação das causas
de sua ocorrência, bem como com a tentativa de atenuar os seus impactos, e menos
com as características sociais de vulnerabilidades. É preciso observar que nem todas
as pessoas o afetadas da mesma forma por desastres. A combinação de fatores
15
naturais e sociais é que definem o desastre, ou seja, se são as características físicas do
evento que determinam a probabilidade de ocorrência do fenômeno, o as condições
sociais de vulnerabilidade que determinam o grau do impacto. Os desastres são, pois,
parte do contexto e se modificam quando algum elemento natural ou antrópico
é alterado.
Catástrofes não são evidentemente precursoras ideais da implantação de uma
política urgente de atendimento às demandas básicas, porém, na prática, muitas
vezes é difícil perceber a capacidade de modificações indispensáveis a valores e
aspirações. Normalmente as situações de dificuldades levam à busca de soluções.
A hipótese aqui trabalhada é que, no convívio estóico ou mesmo de resignação diante
das situações de crises cumulativas podem, paradoxalmente, aportar a decisão de
mudanças que sempre foram necessárias, sobretudo as geradas a partir de vulne-
rabilidades socioeconômicas em áreas de fragilidade ambiental; acelerar decisões
transformadoras no nível do planejamento e da gestão e internalizar recursos.
1.1 TEMA DA DISSERTAÇÃO
O tema deste trabalho está relacionado com situações de risco ambiental em
áreas urbanas vulneráveis como definidoras de inflexões no planejamento e na gestão
urbana, assim como com a importância do planejamento urbano nas ações de
preveão e redão de ocorncias de situações de risco. O trabalho considera ainda
a intervenção dos Grandes Projetos Urbanos (GPUs)
2
como um dos elementos
estruturadores dos espaços atingidos por situações de vulnerabilidade. Dessa forma,
interessa aqui analisar grandes projetos de intervenção urbana implantados com o
fim de sanar impactos de eventos adversos, mas que, ao mesmo tempo, podem gerar
novas pressões de uso sobre áreas ambientalmente frágeis e eventualmente renovar
as mesmas situações de risco. Portanto, busca-se nesta pesquisa discutir o
2
O conceito de GPU é discutido no Referencial Teórico.
16
planejamento de forma dual: seja como potencializador ou mitigador de situações de
risco, ao permitir ou coibir ocupões em áreas de risco; seja como instrumento
influenciado por extremos climáticos, ao se atualizar a partir da evidência destrutiva
de desastres naturais.
1.2 PROBLEMAS
O crescimento das cidades brasileiras com seus cintues de pobreza, expostos
às conseqüências geradas pela falta de infra-estrutura, é um fenômeno que se
acentua a cada ano. Aliado à escassez de investimentos públicos, este fenômeno
caracterizado como focos de degradação, violência e risco vem comprometendo
progressivamente, e às vezes de maneira dramática, as condições de vida da
população periférica, com reflexos negativos não para a população ali assentada
como também para toda a região. Exemplo disso pode ser constatado na Tabela 1,
a seguir, sobre os orçamentos desembolsados para programas habitacionais de
2001 a 2007 na prefeitura de Curitiba. Verifica-se que, apesar de nos últimos anos o
desembolso destinado à habitação ser significativo (71,77% de investimento em
habitação em 2005; 72% em 2006 e 50,16% em 2007), foram recursos destinados
apenas a regularizar, urbanizar e promover o desenvolvimento social e econômico
de ocupações irregulares, não solucionando o atendimento ao déficit habitacional
dos inscritos na Companhia de Habitação de Curitiba/Cohab-CT.
Tabela 1 - Orçamento Anual - Orçamento de Investimento em Habitação - Despesa por Programas de Governo,
conforme a categoria econômica na Prefeitura Municipal de Curitiba
TOTAL DOS PROGRAMAS
POR CATEGORIA
ECONÔMICA
(R$)
CAPITAL INVESTIDO
PARA HABITAÇÃO
(R$)
% DE INVESTIMENTO
EM HABITAÇÃO
2001
27.950.000,00
550.000,00
7,97
2002
(1)
15.610.000,00
4.910.000,00
31,45
2003
(1)
14.000.000,00
1.780.000,00
12,71
2004
(1)
18.000.000,00
4.500.000,00
25,00
2005
(1)
12.400.000,00
8.900.000,00
71,77
2006
(1)
12.500.000,00
9.000.000,00
72,00
2007
(1)
18.600.000,00
9.330.000,00
50,16
Fonte: Secretaria Municipal de Finanças de Curitiba Orçamento anual/maio 2008
(1) Projetos de atuação em áreas de ocupações irregulares e áreas periféricas degradadas, bem como de
prevenção de novas invasões.
17
Esta situação também se agrava na Região Metropolitana de Curitiba/RMC,
cujo déficit habitacional (urbano e rural) passou de 38.867 (7,6% dos domicílios
permanentes) em 1991 para 74.721 (9,6% dos domicílios permanentes) em 2.000 e
114.618 (12% dos domicílios particulares permanentes) em 2005 apontando para
um déficit crescente (COHAB, 2007).
Deschamps (2004), generalizando essas diferenças em nível de municípios
no espaço metropolitano, afirma que a ocupação desses espaços obedece a uma
lógica seletiva, em que o município-pólo é privilegiado em proporções maiores com
imigrantes em situação econômica favorável. O contrário ocorre com as proporções
de imigrantes economicamente desfavoráveis, ou seja, quanto mais distantes os
municípios do pólo, maiores são as proporções de desfavorecidos em cada fluxo que
para eles se dirigem num processo em que se sobressai claramente a associação
entre a distância física e a distância social.
Do ponto de vista espacial e de organização do território, pode-se constatar
também, na década de 1990, por exemplo, o que ocorreu na RMC como centro de
referência no espaço regional e de Curitiba (município-pólo) como metrópole. A
expansão das atividades econômicas tem gerado relativo dinamismo em municípios
limítrofes ao de Curitiba. Segundo Deschamps (2004), a estruturação de um
mercado de trabalho cada vez menos local e mais metropolitano, cujas possibi-
lidades de oferta de trabalhadores passaram a depender da conformação da estrutura
viária e das condições de transporte coletivo de massa, constitui também uma face
desse processo. Os dados sobre o movimento pendular, extraídos do censo
demográfico de 2000, mostram que mais de 50% do movimento pendular no Paraná
é realizado entre os municípios da RMC. São quase 196 mil pessoas que se
deslocam de um município a outro para estudar ou trabalhar, das quais 85% se
dirigem a Curitiba, ou seja, 144 mil pessoas. Ainda, nesses mesmos municípios, à
exceção de São José dos Pinhais, mais de 40% da população com 15 ou mais anos
de idade que trabalha e (ou) estuda o faz fora do seu município, evidenciando a
precariedade ou a falta de postos de trabalho no local de residência. Essa situação
demonstra a necessidade da integração com os municípios da RMC nos diversos
setores, devendo ser fortalecido e considerado como uma única região onde um
18
município supre as necessidades de outro como numa troca simbiótica visando ao
crescimento de todos.
Somando-se a essas dificuldades, tem-se o custo elevado da moradia, o que
praticamente impede o acesso à terra pela população de mais baixa renda. Isso a
obriga a viver nas cidades em condições inaceitáveis de segurança e a instalar-se em
áreas sabidamente de risco. Em Curitiba, por exemplo, um lote com área de 125m
2
custa para o morador R$ 67,00 por mês (COHAB, 2007), para pagar em 15 anos,
sendo que 62% dos inscritos na COHAB/CT têm renda média de 1 a 3 salários
nimos. Sem considerar o custo da constrão da casa e implantação da infra-
estrutura básica (água, luz, esgoto, drenagem e revestimento primário).
Dessa maneira, o assentamento de forma espontânea a favela se afirmou
e se expandiu como opção de localização urbana para a população de mais baixa
renda, concentrando uma problemática decorrente da auncia de condições nimas
de habitabilidade, da falta de acesso aos serviços sociais básicos, de baixa integração
urbana e de condões econômicas insveis. Neste contexto, destaca-se principalmente
a ausência de tratamento de esgoto e de galerias de águas pluviais que, associados à
inadequada coleta e destinação final de reduos sólidos, contribuem para a degradão
da qualidade ambiental.
É desnecessário dizer que ocupações irregulares em áreas inadequadas,
sobretudo ambientalmente frágeis com densidades elevadas, constituem o cenário
ideal para a confirmação de situações de risco. Exemplo disso pode ser verificado na
Figura 1 em que se observam os locais das ações do Corpo de Bombeiros em
Curitiba no ano de 2007 em atendimento de ocorncias de alagamentos. Nota-se que
os atendimentos coincidem com as áreas demarcadas como de ocupações
irregulares e de risco a inundações.
19
Figura 1 - Mapa de ocorrência de alagamentos por bairros em Curitiba no ano de 2007
Fonte: IPPUC/SMSA/ARBV/ARCJ/ARMZ/ARSF, mar. 1998
A análise da trajetória histórica da urbanização oferece indicações que
não devem ser desprezadas, a respeito das conseqüências econômicas, sociais
e ambientais, resultantes do hábito de desconsiderar a dimensão ambiental nas
decisões macroeconômicas.
20
Diante de tal situação, constata-se uma fragilidade na capacidade de o Estado
atender às demandas sociais crescentes e, ao mesmo tempo, a ão de planejamento
ao qual foi formatado para a cidade formal. Os efeitos negativos desse processo
fazem-se notar pela segregação, pela deterioração ambiental, pelo incremento de
problemas sanitários e de saúde, pelo aumento da violência urbana, dentre outros.
Outro problema é com relação à internalização de recursos quando da
ocorrência de acidentes naturais. Ou seja, disponibilidade de muito recurso nas
ações pós-desastres, quando o correto deveria ser na prevenção. Tal observação
pôde ser verificada com as ocorrências das fortes chuvas provocadas na região
Nordeste do Brasil, em abril de 2008. “O Presidente determinou urgência no socorro
das vítimas e que se busque facilitar a burocracia para que os recursos cheguem
aos necessitados o mais rápido possível”, disse o ministro da Integração, Geddel
Vieira Lima em entrevista no Contas Abertas. Quatro dias após, o governo havia
liberado, por medida provisória, R$ 613,7 milhões para atender os desabrigados.
Desses, R$ 540 milhões foram destinados ao Ministério da Integração Nacional para
socorro às vítimas, ações de reabilitação de cenários de desastres, e outros R$ 73,7
miles para obras emergenciais em rodovias dos estados mais atingidos por meio do
Ministério dos Transportes.
Do exposto acima, a ocorrência de extremos climáticos em consequencia da
ão humana; o acelerado processo de urbanização; o uso e ocupação do solo
inadequados em áreas ambientalmente frágeis, acarretando na sua degradão
ambiental; as limitações do planejamento e a questão da vulnerabilidade sócio
demográfica nas áreas de risco, são alguns dos problemas que este trabalho irá
abordar.
1.3 OBJETIVOS
O objetivo geral deste trabalho é analisar como estudo de caso o GPU Canal
Extravasor, constrdo na Rego Metropolitana de Curitiba (RMC) em 1995, identificando
os fatores socioambientais que motivaram as decisões de planejamento e gestão,
para considerá-lo uma obra de caráter emergencial.
21
A questão que se coloca aqui pode estar elencada nos objetivos específicos
que detalham o objetivo geral:
a) identificar o papel do planejamento em situações emergenciais como
potencializador e (ou) mitigador e seus limites;
b) relacionar a importância do planejamento urbano x planejamento ambiental
nas ações de prevenções e naquelas após a ocorrência de riscos naturais,
em particular de áreas inundáveis;
c) qualificar os impactos do GPU implementado com o objetivo de mitigar os
impactos de um evento adverso;
d) analisar a questão da vulnerabilidade diante de riscos e desastres.
Busca-se neste trabalho facilitar a compreensão do problema de riscos
ambientais, os quais poderão servir de ponto de partida para futuras ações de
prevenção, não pelos técnicos como também pela comunidade em geral. Visa
também a distinção de prioridades em situações geradas a partir de diferentes riscos
naturais e de realidades sociodemográficas e contribuir na formulação de políticas
públicas para o enfrentamento de situações de emergência.
1.4 JUSTIFICATIVA
Mapear e conhecer as áreas sujeitas a riscos ambientais são questões que o
planejamento tenta enfrentar no sentido de minimizá-los principalmente aqueles
derivados dos extremos climáticos ou chuvas recorrentes.
Um dos riscos que mais afetam as áreas urbanas e, conseqüentemente, de
forma direta as populações, são as enchentes e inundações. Isso pode ser
verificado na Tabela 2, a seguir, na qual se demonstram os tipos de acidentes no
Brasil, o número de ocorrências e o número de pessoas atingidas.
22
Tabela 2 - Tipologia de acidentes; número de ocorrências e número pessoas afetadas, Brasil 2007-2008
TIPOLOGIA
OCORRÊNCIAS
PESSOAS
AFETADAS
Estiagens
208
972.645
Vendavais ou Tempestades
67
181.151
Enxurradas ou Inundações Bruscas
124
515.515
Enxurradas ou Inundações Gradativas
11
69.046
Granizos
55
72.014
Erosão Linear, Sulcos, Ravinas e Voçorocas
4
10.041
Secas
6
18.900
Enchentes ou Inundações Graduais
135
447.921
Outros Desastres relacionados com Produtos Perigosos
3
118
Alagamentos
20
603.373
Escorregamentos ou Deslizamentos
23
106.556
Erosão Fluvial - Desbarrancamentos de Rios e Terras Caídas
4
1.742
Erosão Marinha
1
8
Vendavais muito Intensos ou Ciclones Extratropicais
2
4.500
Inundações Litorâneas por Brusca Invasão do Mar
2
27
Incêndios Urbanos ou Rurais
4
475
Subsidência do Solo
3
25
Desastres e (ou) Acidentes de Trabalho durante a Construção
1
55
Meios de Transportes, Plantas e Distritos Industriais, Parques ou Desitos de Explosivos
2
118
Incêndios Florestais
1
0
Terremotos, Sismos
5
21.973
Malária
1
130
Dengue
5
27.122
Rompimento de Barragem
2
4.933
Fonte: Secretaria Nacional de Defesa Civil. Relatórios de ocorrências, 2007/2008
Nota: Tabulação da pesquisadora. Foram tabulados somente os acidentes que tinham índices diferentes de zero.
De fato, ao se observar a Tabela 2, verifica-se que de um total de 24 tipologias
de acidentes com ocorncia no Brasil, uma concentração em cinco delas: granizos
(55 ocorrências), vendavais (67 ocorrências), enxurrada (124 ocorrências), enchentes
(135 ocorrências) e estiagens (208 ocorrências). Nota-se outra tipologia em termos
de número de pessoas afetadas destacando-se uma concentração em seis tipologias:
granizos, afetando 72.014 pessoas; vendavais, afetando 181.151 pessoas; enchente,
afetando 447.921 pessoas; enxurradas, afetando 515.515 pessoas; alagamentos,
afetando 603.373 pessoas e estiagens, afetando 972.645 pessoas, totalizando
2 milhões e 800 mil pessoas afetadas, entre 2007 e 2008.
A dimensão da gravidade desses acidentes e a capacidade de se distinguirem
perante outros ou mesmo diante de diferentes situações de crise urbana podem
permitir, ou não, que aparentes limitações orçamentárias de governos locais cedam a
apoios político-financeiros com imediata liberação de recursos, podendo, pois, acelerar
a tomada de decisões tanto em nível da gestão como do planejamento. Todavia,
apesar de essa ação possibilitar uma rápida reação das autoridades em restaurar o
cotidiano das cidades, pode também causar eventos adversos à intenção inicial.
Nas situações de resposta à emergência, são tomadas decisões apressadas à
luz da situação e, por mais solidárias que sejam em seus princípios, podem provocar
23
externalidades passageiras ou definitivas, podendo comprometer todo um
compartimento urbano.
A pergunta que se deve fazer é até que ponto uma situação de emergência
pode justificar decisões apressadas e o quanto estas podem agravar demandas
futuras e dificultar soluções mais adequadas. Exemplos disso são o grande incêndio
em Chicago, no Illinois, em 1871, e o terremoto de São Francisco, na Califórnia, em
1906, consideradas como as duas maiores castrofes urbana na história dos Estados
Unidos, o devido às perdas humanas, mas, principalmente, devido à
surpreendente destruição de propriedades. Ultramari (2006), ao comentar a respeito
do grande incêndio de Chicago, afirma que a grande reconstrução tomou mais vidas
que o desastre propriamente dito, com doze trabalhadores mortos por dia em
decorrência da velocidade dos trabalhos e também da falta de segurança.
Uma outra questão a ser observada es relacionada à prevenção. Desnecessário
dizer que países que investem em prevenção poupam recursos financeiros e reduzem
os prejuízos, os danos e o número de óbitos.países que priorizam o atendimento
de resposta aos desastres são os mais atingidos economicamente.
No Brasil, segundo os dados levantados, foram destinados majoritariamente
recursos para atender aos danos causados pela falta de prevenção (BRASIL, 2008c).
Exemplo desta situação foram as enchentes de abril de 2008, causadas pelas cheias
dos rios da Região Nordeste que arrasaram casas, destruíram estradas e pontes e
afetaram a agricultura. Passou de 390 mil o número de pessoas afetadas pelas
chuvas que atingiram a região em pelo menos seis estados. Diante desse quadro,
constatou-se que o governo federal gastou mais nos três primeiros meses do ano,
remediando, ao invés de prevenir (BRASIL, 2008c). O programa de prevenção de
desastres aplicou R$ 14,9 milhões de recursos previstos em orçamento, enquanto o
de "resposta aos desastres" mais do que o dobro, R$ 38 milhões.
Em 2007 a diferença de gastos entre os dois programas federais (prevenção
e de respostas aos desastres) foi ainda maior. O Ministério da Integração Nacional
desembolsou R$ 53,5 milhões dos recursos destinados ao programa de "prevenção e
preparação para emergências e desastres", que inclui obras de contenção de encostas
e canalização de córregos. O valor representa apenas 20% da verba prevista em
orçamento para o programa. Entretanto, no mesmo período, o órgão destinou um
montante seis vezes maior para o programa "resposta aos desastres", que atua após
24
as calamidades terem sido consumadas, o que equivale a R$ 347,9 milhões
(BRASIL, 2008c).
Portanto, ao se tratar das áreas vulneráveis às enchentes e inundações devem
ser considerados vários aspectos. Primeiro, é necessário planejar de imediato as
ações tanto de prevenção quanto de recuperação, as quais devem ser eficazes,
rápidas e eficientes. Segundo, considerar a questão social, econômica e ambiental nos
trabalhos de prevenção e reconstrução. Terceiro, definir uma política de saneamento
e educação ambiental tendo em vista seu forte impacto sobre as condições de vida
das populões atingidas e a necessidade de implantão de sistemas de alertas mais
eficientes para o adequado monitoramento e prevenção. Esses o, pois, fatores
que devem ser considerados nos momentos que precedem o desastre ou quando de
sua imediata confirmação. Conceitualmente e mesmo na prática, esses fatores se
distinguem consideravelmente daqueles relacionados à recuperação dos laços
socioeconômicos da população atingida e à redução de suas vulnerabilidades em
acidentes futuros.
Na observação dos fatores pós-acidente, é fundamental reconhecer que os
impactos de caráter social e econômico atingem principalmente a população menos
favorecida, aumentando a desigualdade e criando diferenças estruturais nas periferias
das grandes e médias cidades, sobretudo nos países em desenvolvimento, onde as
administrações locais lidam com sérias limitações orçamentárias.
A experiência tem demonstrado também que, na ocorrência de desastres
naturais, as ações de recuperação levadas a efeito pelas autoridades responsáveis
tendem a ser, num primeiro momento, fragmentárias. Se medidas de caráter mais
estrutural não são tomadas, estas ações de recuperação, embora decididas para
fazer frente a uma situão de emergência, podem consolidar as formas de ocupação
que incrementam vulnerabilidades. Assim, na reconstrução de um compartimento
urbano ou de uma obra civil impactada por um desastre natural de grande porte, é
necessário considerar o apenas as providências imediatas de socorro às populações
flageladas fornecimento de alimentos, abrigos provisórios e assistência médica,
mas também os aspectos sociais, econômicos e ambientais da região e os efeitos
sobre ela, assegurando o melhor aproveitamento dos recursos financeiros, materiais
e humanos provenientes de diversas fontes.
25
Para fazer frente a situações emergenciais , a possibilidade de implantar
soluções estruturais, quase sempre concretizadas por grandes obras de construção
civil. Daí porque este trabalho discute a implantação dos Grandes Projetos Urbanos
(GPU), com o fim de refletir acerca de mudanças recentes nas formas de intervenção
sobre o território, bem como para analisar sua efetividade de implantação.
Ultramari (2006, p.2) define os grandes projetos urbanos (GPUs) como:
[...] agentes de transformão e recuperação de áreas degradas e a possibilidade
de integrar um projeto maior para a cidade multiplicando as possibilidades de
provocar maiores impactos positivos: ambientais e sociais. Algumas interveões
ganham mais valor se justificadas pela necessidade de se recuperar áreas
de subhabitação e pela necessidade de se valorizar símbolos importantes
para a imagem e competitividade da cidade.
Parece haver uma tendência de se lançar mão de grandes intervenções, aqui
representadas pelos Grandes Projetos Urbanos (GPUs), sobretudo na questão de
saneamento. O incremento de problemas ambientais e a implementação do plane-
jamento por meio deste conceito de GPU é que serão discutidos no estudo de caso
da construção do Canal Extravasor, o qual, acredita-se, permitirá debater a hipótese
deste trabalho.
Espera-se que os resultados deste estudo contribuam para uma melhor visão
sobre as novas práticas adotadas nas situações emergenciais, sobre o modo como os
modelos adotados nessas situões são interpretados no terririo nacional e sobre a
importância da gestão no que diz respeito tanto à participação e ao controle social
quanto à definição dos objetivos nos processos de decisão de questões de interesse
público.
26
2 METODOLOGIA DA PESQUISA
Pesquisar significa procurar respostas para indagações propostas. Minayo (1993,
p.23) considera a pesquisa como "uma atividade básica das ciências na sua
indagação e descoberta da realidade". É uma constante busca que define um processo
inacabado e permanente. É uma atividade de aproximação sucessiva da realidade
que nunca se esgota, fazendo uma combinação particular entre teoria e dados. Essa
assertiva foi confirmada ao se realizar esta dissertação quando da observação de
ocorrências de desastres naturais e as medidas emergenciais adotadas nestas
situações, gerando uma série de indagações e suposições.
Demo (1996, p.34) considera a pesquisa como atividade cotidiana, entendendo-a
como uma atitude, um "questionamento sistemático crítico e criativo, associada à
intervenção competente na realidade, ou o diálogo crítico permanente com a realidade
em sentido teórico e prático". Situação esta constatada no exercício diário das queses
relacionadas com os problemas da cidade, enfrentados por esta pesquisadora e que
influenciou na busca de respostas por meio desta dissertação.
Para Gil (1999, p.42), a pesquisa tem um caráter pragmático, é um "processo
formal e sistetico de desenvolvimento do todo científico. O objetivo fundamental
da pesquisa é descobrir respostas para problemas mediante o emprego de procedi-
mentos científicos".
No caso de um desastre natural, por exemplo, esta dissertação partiu da
necessidade de se buscar as potencialidades de um desastre, isto é, ir além de seus
impactos já tradicionalmente conhecidos e tratados por ações de emergência.
Apesar da sua reconhecida importância, obviamente, hoje mais do que nunca,
se percebe que a ciência não é um resultado de criação totalmente previsível.
Portanto, não há apenas uma maneira de raciocínio capaz de dar conta do complexo
mundo das investigações científicas. O ideal seria empregar métodos, e não um
método em particular, que ampliem as possibilidades de análise e obtenção de
respostas para o problema proposto na pesquisa. Isso facilitou a pesquisa para esta
dissertação uma vez que se trabalhou com fenômenos previsíveis do ponto de vista
de ocorrências de chuva, por exemplo, e imprevisíveis sob o ponto de vista temporal,
isto é, quando elas ocorreriam.
27
Do exposto pode-se dizer que o trabalho proposto foi expresso por meio de
um estudo de caso, a fim de torná-lo mais expcito e a construir as hipóteses. Segundo
Gil (1999), o conceito de estudo de caso é caracterizado pelo estudo de um ou de
poucos objetivos e pode ser utilizado tanto em pesquisas exploratórias quanto
descritivas e explicativas. Para Yin (1994), o estudo de caso é uma inquirição
empírica que investiga um femeno contemponeo dentro de um contexto da vida real,
quando a fronteira entre o fenômeno e o contexto não é claramente evidente e onde
múltiplas fontes de evidência são utilizadas. É importante ressaltar a diferença entre
estudo de caso e tema de estudo. Muitos confundem e transformam erroneamente
um estudo de caso na parte principal da pesquisa.
Foram também levantados documentos bibliográfico a partir de material
publicado, livros, artigos de periódicos e materiais disponibilizados na internet.
A pesquisa foi expost-facto, pois se analisaram dados já ocorridos. Envolveu
também a pesquisa documental, como matérias de jornais, análise de documentos e
relatórios. Na pesquisa experimental foram observados os efeitos que a variável
produziu no objeto de estudo; e levantamento de campo. A pesquisa de campo foi
consubstanciada em questionário com pessoas envolvidas no processo. Além da
pesquisa documental e do questionário, foram coletados dados fenomenológicos
para a caracterização da população da área em questão.
A pesquisa foi dividida em três fases:
- Fase 1: o método exploratório possibilitou maior domínio sobre o assunto
e a melhor definição da hipótese. Constou de uma pesquisa bibliográfico
teórico conceitual sobre os temas relacionados à: Urbanizão induzindo o
crescimento de cidades
3
, a partir do século XIX, por ser um recorte
temporal conhecido no processo contemporâneo de urbanizão, o qual se
vincula ao processo de industrialização, possibilitando até mesmo, a
criação mais formal, do urbanismo tal qual hoje se conhece. Outros temas
pesquisados foram Planejamento Urbano e sua importância na gestão das
3
Segundo Oliva e Giansanti (1995, p.106), a idéia de urbanização, que no passado sempre se
relacionou, corretamente, somente às cidades, atualmente é um fenômeno que ultrapassa esse
espaço geográfico, penetrando as zonas rurais.
28
cidades; Grandes Projetos Urbanos, por ser objeto do estudo de caso, e
Fenomenologia dos acidentes naturais, riscos, desastres e vulnerabilidade
socioambiental. Constou também de um questionário para o embasamento
da hipótese e que auxiliou na análise do estudo de caso;
- Fase 2: por meio do método descritivo caracterizou-se a população da
área de estudo, bem como se coletaram dados dos fenômenos naturais
com recorte nas inundações e estabeleceram-se relações entre as suas
variáveis. Para isso baseou-se em pesquisa documental, levantamento de
informações e bibliográfica da área;
- Fase 3: o método analítico ou explicativo permitiu identificar os fatores que
contribuíram para a ocorrência dos fenômenos naturais, bem como tabular
e analisar os dados coletados. Tabularam-se os dados referentes à
ocorrência de desastres naturais, em especial as inundações em Curitiba
entre os anos de 1980 a 2007, considerando os locais onde ocorreram os
eventos, a data de ocorrência desses eventos, a precipitão pluviotrica, a
tipologia dos eventos, assim como o número de pessoas atingidas por esse
evento. Também foram analisados os dados do questionário baseados nas
respostas dos entrevistados para a confirmação ou não da hipótese.
Para facilitar, preliminarmente, a organização da pesquisa foi utilizado um roteiro,
que teve como base a fundamentação teórica.
Para entender o processo de urbanização foram importantes as leituras dos
seguintes autores: (I) Regina Maria Prosperi Meyer (2000), para entender como era
a vida das cidades no culo XIX e também porque a cidade estudada teve seu
desenvolvimento nesse peodo. (II) Richard Sennett (2001), onde as cidades de Paris
e Londres são citadas como exemplo de locais urbanos que influenciaram a forma
de vida de várias cidades e também onde o processo de industrialização foi pioneiro
em termos de população envolvida. (III) Lewis Munford (1998) em cuja obra coloca a
preocupão com a população marginalizada, reflexo da sociedade moderna. Destaca
o crescimento das cidades sem qualidade, comparando-as a uma necrópole urbana.
(IV) Manoel Castells (1983), que discorre sobre a fuão social das cidades e sua
preocupação com a construção do espaço urbano e a degradação ambiental. Clovis
Ultramari (2005) comenta sobre o crescimento das cidades, formando extensas
periferias que ignoram os limites político-administrativos, caracterizando regiões
29
metropolitanas. Cita também que a rede urbana atual cria estruturas para a qual as
cidades não estão preparadas e comenta também que a abertura da economia brasileira
criou novas relões entre as cidades, provocando impactos na urbanizão. A leitura
desse conjunto de obras contribuiu para enriquecer o conhecimento em relação à
urbanização.
Os seguintes autores auxiliaram na compreensão dos instrumentos do plane-
jamento das cidades: (I) Manuel Castells e Jordi Borja (1996), nesta obra os autores
destacam a cidade contemporânea como sendo um ator político. (II) Richard Rogers
(2001) destaca a cidade como sendo o ponto de equilíbrio entre o homem e o seu
meio ambiente e também analisa o dinamismo das cidades com seus sistemas em
permanente interão. (III) Isabel Cristina Eiras de Oliveira (2001) faz um breve hisrico
acerca da Constituição Federal de 1988, Plano Diretor e Estatuto da Cidade, e destaca
a importância de se garantir a implantação dos instrumentos do planejamento como
indutor de desenvolvimento. (IV) Roberto Braga (1995) destaca como deve ser um
Plano Diretor e sua importância ao direcionar o futuro das cidades: para onde elas
querem crescer e como querem crescer. (V) Flávio Vilaça (2001) faz uma crítica aos
Planos Diretores e chama ateão para que não corram o risco de ficarem engavetados.
(VI) Denis Rezende e Belmiro Castor (2005) destacam a nova gestão pública para
as cidades, ao considerar o cidadão como um cliente em foco. A leitura destes autores
evidenciou a importância de o planejamento ser um processo permanente, por se
tratar de instrumento aplicado em cidades, organismos dinâmicos por excelência.
Os seguintes autores foram muito importantes para embasar a hipótese desta
dissertação, sobre os GPUs: (I) José Geraldo Sies Junior (2007) descreve os primeiros
projetos de interveões urbanas e de melhoramentos nas principais capitais brasileiras,
destacando que desde o início do culo XIX havia uma preocupação com a
questão da saúde e do saneamento nas cidades. (II) Fernanda Sanchez, Glauco
Bienenstein, Pedro Novais e Fabrício Leal de Oliveira (2007) colocam os GPUs como
referência no urbanismo contemporâneo, destacando as cidades com vistas à sua
inserção no circuito mundial de valorizão. (III) Henry Lefebvre (1999) cita os GPUs
como elementos importantes nas formas de gestão e produção do espaço urbano,
subordinada a novos circuitos no capitalismo moderno. (IV) Fernanda Sanchez e
Carlos Vainer (2003) destacam que o planejamento por projeto estimula o
desenvolvimento e articulam o desenho da cidade. (V) Clovis Ultramari (2006) cita
30
algumas tipologias de intervenção dos GPUs mais observadas como projetos para
revitalizar e transformar o meio urbano. (VI) Regina Maria Meyer (2000) destaca os
GPUs como agentes estruturadores das cidades metropolitanas, capazes de
transformar o meio urbano, aumentando sua competitividade. (VII) Fernanda
Sanchez, Glauco Bienenstein, Bruna Guterman, Talitha Martins, Marcus Cesar Cruz,
Pedro Novais Lima Junior e Fabricio Leal de Oliveira (2007) comentam que o master
plan deu lugar ao master project, criando com isso novas práticas e instrumentos
para o planejamento urbano. (VIII) Manuel Castells e Jordi Borja (1997) falam a
respeito de uma cartilha para o novo planejamento urbano, gerando novos
empreendimentos urbanísticos, com novas refencias para ações de planejamento
urbano. (IX) Carlos Vainer e Ernia Maricato (2000) colocam uma perspectiva
diferente quanto ao papel da cidade e à formulação dos problemas urbanos e
destacam que os GPUs desencadeiam rupturas sobre os espaços físicos e sociais e
contribuem para mudanças na dinâmica socioespacial. (X) Manuel Castells e Jordi
Borja (1996) ao comentarem o plano estratégico da cidade, sinalizam que a cidade
passa a ser a dinamizadora econômica, social do bem-estar dos seus cidadãos.
Estes autores deram uma visão geral com relação aos GPUs e como podem ser
implantados no sentido de provocar uma mudança, uma inflexão urbana no seu
entorno.
Para a compreensão dos conceitos de vulnerabilidade, riscos e desastres e
suas relações intrínsecas, bem como as diferentes formas de afetar as comunidades
e suas prevenções e mitigações, foram pesquisados os seguintes autores: (I) Eduardo
Marandola Junior e Daniel Joseph Hogan (2006), em cuja obra conceituam a vulne-
rabilidade a partir de um perigo num contexto geográfico e social. (II) Caroline O. N.
Moser (1998) descreve a noção de vulnerabilidade como sendo exposição ao risco,
incapacidade de reão e dificuldade de adaptão frente a este risco. (III) Maria Paula
Ferreira, Nadia Pinheiro Dini e Sinésio Pires Ferreira (2006) citam ser a vulnerabilidade
multidimensional, afetando indivíduos, grupos e comunidades em diferentes formas e
intensidades. (IV) Marley Deschamps (2004, 2007) destaca a noção de vulnerabilidade
em vários campos e disciplinas: na economia, na geografia e conceitua a vulnerabilidade
como estar sem defesa, incapacidade de resposta, inabilidade de adaptar-se a um novo
cerio em função do risco. (V) Jorge Rodriguez (2000, 2001) analisa a vulnerabilidade
como sendo problema de condições sociais que afetam negativamente o desempenho
31
de uma comunidade. (VI) Comissión Economica para América Latina y el Caribe
CEPAL (2002) trata a vulnerabilidade por meio de estudos demográficos, na incapaci-
dade das pessoas de enfrentar riscos ou impossibilidade de proteger-se. (VII) Enrico L.
Quarantelli (1994) e Marco Antonio Mattedi, Ivani Cristina Butzke (2001) citam pesquisas
a partir de perigos e desastres ambientais e dimensionam a estrutura e a capacidade
de reação da sociedade diante de eventos extremos. (VIII) Diana Liverman (1994)
questiona: vulnerabilidade a que? Onde e quem esvulnerável? E identifica fatores
que promovem a diminuição da vulnerabilidade. (IX) Ulrich Beck (1996) descreve a
Sociedade do risco, a qual se preocupa com problemas que ela mesma provocou.
Com relação aos conceitos de risco, foram pesquisados os seguintes autores:
(I) Mary Douglas e Aaron Wildavski (1982) e Mary Douglas (1985) tratam do risco na
antropologia e a constrão social do risco no contexto cultural: estruturas e mecanismos
que aceitam ou não o risco. (II) Enrique Leff (2001) e Guillermo Foladori (2001) tratam
da problemática ambiental e afirmam serem os riscos e perigos ambientais conse-
qüências da dinâmica e estrutura social, da modernização ecológica e desigualdades
sociais. (III) Ian Burton, Robert Kates e Gilbert White (1978) analisam o Risk assessment
(avaliação do risco), ou seja, a possibilidade do risco ocorrer em determinado local.
(IV) Marcos Mattedi (2006) define alguns termos para compreender a avaliação de
riscos em que os danos são expressos em probabilidades estatísticas de ocorrência
e de intensidade, ou grandeza das possíveis conseqüências. (V) Paulo Procópio Burian
(2006) destaca a importância de avaliar o risco numa estratégia ambiental e identificar
o risco e suas medidas preventivas para minimizar a vulnerabilidade.
para a pesquisa em relação aos desastres, buscaram-se os seguintes
autores: (I) International Strategy for disaster reduction ISDR (2008) destaca a
preocupão com o impacto do desastre, o qual depende da combinação entre a
probabilidade de ocorrência de hazards e as condições de vulnerabilidade da
comunidade. (II) Antonio Luiz Coimbra de Castro (1998) descreve tipologias de
perigos e que os eventos são considerados perigos quando causam danos à
população. (III) Timothy O'Riordan e Peter Timmerman (2001) tratam da gestão dos
processos de produção do risco num futuro e da idéia de backcasting (cascata
abaixo). Relacionam os perigos a uma série de conseqüências que podem ou não
ser detonadas com o evento. (IV) Marcos Mattedi (1999 e 2007) e Graham A. Tobin
e Burrell E. Montz (1997) destacam que a intensidade dos desastres depende mais
32
do grau de vulnerabilidade dos cenários das comunidades afetadas do que da
magnitude dos eventos adversos. Falam também do processo de institucionalização
do risco e do ciclo de desastre: desastre-dano-reparação-desastre. Afirmam também
que as perdas por desastres são confrontadas por ações que favorecem a ocupação
em áreas de risco. (V) Debarati Guha-Sapir, David Hargitt e Philippe Hoyois (2004)
destacam os fatores que intensificam os impactos dos desastres: mudança de clima,
crescimento populacional, urbanização, incapacidade da população de escapar dos
efeitos do desenvolvimento econômico. (VI) N. Solomatine (1987) faz uma classificão
de desastres: naturais e antpicos. (VII) Kenneth Hewitt e Ian Burton (1971) classificam
os desastres de acordo com os processos físicos, originando uma classificação para
cada espécie de desastre. (VIII) Clovis Ultramari (2008b) relaciona desastres com
fenômenos inesperados e destaca três tipologias de classificação e desastres: os
imediatos, os ironicamente lentos e os repetitivos. (IX) Clovis Ultramari e Denis Alcides
Rezende (2007) destacam os desastres em áreas urbanas caracterizados pela repetição,
gerando com isso a indiferença da população sem garantir a sua recuperação e
oportunidades econômicas.
33
3 REFERENCIAL TEÓRICO
Com base nas leituras anteriormente descritas neste capítulo, destacam-se
conceitos que permitirão um melhor embasamento da análise aqui proposta para a
dinamização do estudo. Serão trabalhados os conceitos sobre Urbanização; Plane-
jamento Urbano e seus Instrumentos; Grandes Projetos Urbanos; Vulnerabilidade,
riscos e desastres.
O primeiro conceito aqui abordado refere-se à história da Urbanização com
crescimento de cidades, fazendo-se um recorte temporal a partir do século XIX, por
considerar que a cidade objeto deste trabalho teve seu desenvolvimento nesse peodo
da industrializão, por ser a época que provocou grandes inflexões urbanas.
3.1 A URBANIZAÇÃO
As cidades, do ponto de vista de sua organização interna, instalaram-se a
partir de sucessivos estágios em expansões, o povoado e depois a cidade, sempre
buscando uma forma de ser eficiente, de exercer suas funções de centralidade, de
forças econômicas, de relacionamentos culturais e sociais e de inovação técnica.
Mas que ao mesmo tempo impôs limites ao planejamento que é o que se quer
discutir aqui.
Meyer (2000,p1) destaca que a vida das cidades no culo XIX, a metpole
industrial abrigou as atividades da sociedade designadas modernas. A vida
metropolitana foi, portanto, moderna em todos os seus aspectos, desde sua origem.
Nela organizou-se a sociedade de classes, desenvolveu-se uma nova forma de
comunidade que assimilou outros costumes e nasceu um novo indivíduo. No âmbito do
espo físico, a metrópole ofereceu as condições territoriais indispensáveis para a
instalação da grande indústria, para a organização do mercado consumidor e para o
abrigo da classe trabalhadora.
A metpole assimilou e potencializou as inovões introduzidas pela Revolução
Industrial participando de forma intensa da "revolução ininterrupta da produção"
34
(MEYER, 2000, p.1). Um aspecto importante relacionado à vida política, foram as
relões sociais conflituosas que se estabeleceram entre o proletariado e a burguesia
urbano-industrial. No culo XIX, peodo de surgimento da metrópole industrial, também
ocorreram os deslocamentos rurais, em parte devido à fome, em parte, a uma nova
forma de capitalização da agricultura, mostrando que a vida nas cidades iria ter uma
expansão para além dos seus limites. A economia interna dessas cidades gerou uma
nova atividade econômica.
A migração, a segregação de classes, a zonificação são problemas que
iniciaram no século passado, mas que a hoje persistem nas cidades, e o
eventos que o planejamento deve levar em consideração, sendo uma das limitações
observadas no início desta pesquisa.
Sennett (2001), ao comentar essa industrialização, relaciona empiricamente a
cidade de Londres e Paris como exemplos de locais urbanos que influenciaram a
forma de vida de várias cidades e também onde o processo de industrialização foi
pioneiro em termos de população envolvida e massa construída para tal processo.
Explica que no século XIX o crescimento de Londres e Paris deve-se ao fato da
imigração. Apesar das vastas "places" (praças) abertas continuarem vazias no início
do século XIX, estavam rodeadas por distritos onde a população se acotovelava. No
século XIX, tanto em Paris como na grande Londres, não se formou uma economia
fabril da mesma intensidade da de Manchester e Birmingham (SENNETT, 2001). Em
Paris, isso se explica porque a terra era muito cara para ser usada como fábrica.
A rotina da vida diária fora do quartier estava se tornando uma experiência urbano-
burguesa, o senso de ser parte de uma comunidade que assimilou outros costumes e
de ser membro das classes burguesas passaram a ter certa afinidade. Em
contrapartida, o bairrismo e as classes mais baixas se fundiram. As únicas viagens
que os trabalhadores faziam para outros setores da cidade consistiam em ir a uma
das novas lojas de departamentos.
Esse cenário de segregação assemelha-se hoje à realidade da maioria das
cidades, onde cada vez mais a população de mais baixa renda não consegue
acessar aos bens da cidade formal
4
, como o alto custo da terra, por exemplo, que as
4
Cidade formal: dotada de ordenamento estatal do território.
35
obriga a ocupar terras mais baratas e normalmente em locais mais distantes,
inadequados e de riscos à saúde.
Para Munford (1998), as intervenções de caráter modernista não levavam em
consideração a continuidade cultural das cidades e representavam um desastre. Seu
estudo é uma reflexão sobre a grande força que a tecnologia exerce sobre as cidades.
Nos diversos textos em que abordou a questão urbana, Munford visou compreender
e enfrentar as questões que a nova escala urbana estava imprimindo a todos os
aspectos da vida material. Enfatizou, sobretudo as questões relativas à acomodação da
população operária no interior das metpoles cujo crescimento populacional tornou-se
exponencial; a permanente expansão do território urbanizado; a congestão, a
disponibilidade da água, de transporte e de terra urbana. Lewis Munford (1998)
traçou um funesto quadro final que ele mesmo denominou "uma visão do inferno"
definindo a metrópole moderna como "necrópole", a qual era, de acordo com sua
leitura, "a exacerbação e o desfecho gico dos formiveis aspectos negativos
detectados desde o início do processo, isto é, a metrópole como sendo reflexo do
desenvolvimento econômico da sociedade que a produz".
Munford, ao definir esse cenário de degradão da nova escala urbana, coloca
em evincia a preocupação com a população marginalizada, reflexo da prodão de
uma sociedade que não considerou as suas características culturais e econômicas.
as idéias do Barão Haussmann no século passado, baseavam-se numa
pretensa homogeneização de classes (SENNETT, 2001). Os novos distritos da cidade
deveriam ser de uma única classe e no centro antigo, ricos e pobres deveriam ser
isolados uns dos outros. É o chamado desenvolvimento urbano de "função única".
Exemplo disso é Brasília, Levittown, na Pensilvânia, e Euston Center, em Londres.
Construíram-se casas em uma quadra e os serviços em outro lugar: um centro
comunitário, um parque educativo, um shopping center, um campus hospitalar.
Essas idéias são muito questionadas pelos urbanistas, pois, se as necessidades
funcionais da área mudarem historicamente, o espaço não poderá corresponder a
elas; ele poderá ser utilizado para o seu propósito original, ou então ser
abandonado ou destruído e refeito.
A forma que Haussmann impôs para transformar Paris em grandes boulevards
influenciou muitos urbanistas. Tem-se como exemplo a urbanização de Curitiba.
registros de intervenções de caráter urbanístico e de saneamento anteriores às
36
ações de planejamento (BOLETIM CASA ROMÁRIO MARTINS, 2006, p.1), porém a
primeira experiência ocorreu com o Plano Agache, elaborado entre 1941 e 1943 pelo
urbanista francês Alfred Agache. Seu desenho radial tinha configuração semelhante
ao definido pelo Plano Haussmann de Paris. O Plano Agache para a cidade de
Curitiba englobava o plano das avenidas da cidade, os centros funcionais ou
especializados, o código de obras e zoneamento, os espaços livres e sua distribuição.
Muitas vezes o planejador define uma mancha de ocupação e idealiza um
espaço de convivência que nem sempre corresponde com a realidade. As cidades
contemporâneas demonstram que a mistura das funções é que humanizam e
dinamizam as cidades.
Segundo Sennett (2001, p.5.), a celebração do bairrismo e da vizinhança, que
hoje é feita por planejadores é um reforço de uma nova forma de dominação, um
despojamento da cidade que se impôs aos trabalhadores no século passado.
Para Ultramari (2007, p.1), “o chamado Urbanismo Modernista o se apresentou
apenas como um projeto de intervenção física em uma cidade específica, ao contrário,
se caracterizou como um manual de como proceder para se chegar à cidade ideal”.
Enfatiza ainda que com isso o Urbanismo, utopicamente, acreditava poder alterar a
cidade como espaço constrdo e também a sociedade que a consti e que a usa.
De fato, esse Urbanismo não apenas desenha a cidade que se quer, mas
também determina como ela deve ser obtida e usada, ou seja, acreditando na utopia
de poder formatar a sociedade que habita. Tais propostas permitiram gerar uma
diversidade de conhecimentos na busca de soluções para os então chamados
problemas urbanos.
Assim como as cidades foram crescendo, o fenômeno da urbanização foi
ficando cada vez mais evidente. Na definição de urbanização, dois autores merecem
ser citados por considerar que a junção de ambas as definições se encaixam para a
maioria das cidades contemporâneas.
Para Eldridge e Thomas (1964, p.338), “urbanização é um processo de concen-
tração da população em dois níveis: a proliferação de pontos de concentração e o
aumento do tamanho de cada um destes pontos”. Urbano designaria, então, uma
forma especial de ocupação do espaço por uma população, a saber, o aglomerado
resultante de uma forte concentração e de uma densidade relativamente alta, tendo
como correspondência uma diferenciação funcional e social maior.
37
para Castells (1983, p.16), numa preocupação mais social da construção
do espaço urbano, há uma nítida distinção entre dois sentidos do termo urbanização:
a concentrão espacial de uma populão, a partir de certos limites de dimensão e de
densidade, e a difuo do sistema de valores, atitudes e comportamentos denominado
"cultura urbana". As cidades, para Castells (1983, p.19), têm a função mais social:
As cidades são a forma residencial adotada pelos membros da sociedade cuja
presença direta nos locais de produção agrícola não era necessária. Estas
cidades só podem existir na base do excedente produzido pelo trabalho da
terra. Elas são o centro religioso, administrativo e políticos, expressão espacial
de uma complexidade social determinada pelo processo de apropriação e
de reinvestimento do produto do trabalho.
Ainda segundo Castells (1983), a problemática atual da urbanização gira em
torno de quatro fenômenos fundamentais e de uma questão extremamente delicada:
Fenômeno 1: aceleração do ritmo da urbanização no contexto mundial.
Exemplo desse fenômeno é o papel exercido pelo processo de urbanizão
das últimas décadas no Brasil, sobretudo a partir dos anos 1970, quando
importantes mudanças neste cenário, segundo Ultramari (2007),
começaram a ser observadas: ampliação das chamadas áreas
urbanizadas ou integradas à dinâmica nacional; crescimento das cidades
médias; formação de extensas periferias junto às grandes cidades; e
observação de grandes aglomerações urbanas que ignoram os limites
potico-adminstrativos dos municípios que os compõem, caracterizando
aglomerões ou mesmo regiões metropolitanas.
Tal situação pode ser resumida por meio das informações demográficas
das últimas décadas que demonstram uma rápida transformação de um
país rural em país urbano (Tabela 3);
Tabela 3 - População brasileira: total, rural e urbana - 1990, 1996, 2000
ANO
POR SITUAÇÃO DO DOMICÍLIO (%)
TOTAL
Rural
Urbana
1980
32,41
67,59
119.002.706
1990
24,41
75,59
146.825.475
1996
21,64
78,36
157.070.163
2000
18,75
81,25
169.799.170
Fonte: IBGE, Censos Demográficos. Disponível em: <www.ibge.gov.br>. Acesso em: mar. 2007
38
Fenômeno 2: concentração deste crescimento urbano nas regiões
subdesenvolvidas, sem corresponncia com o crescimento ecomico que
acompanhou a primeira urbanização nos países capitalistas industrializados.
Os municípios brasileiros periféricos às cidades-pólo, por exemplo, apesar
de também apresentarem quedas nas suas taxas de crescimento,
permanecem se constituindo como territórios de grandes acréscimos
demográficos metropolitanos. É desnecessário dizer que por trás desse
processo está o valor da terra diferenciado entre municípios periféricos e
los e uma urbanização aliada a uma generalização da pobreza. Sendo a
compreensão deste novo cenário fundamental para a integração entre as
cidades-pólo e suas regiões metropolitanas;
Fenômeno 3: aparecimento de novas formas urbanas e, em particular, de
grandes metrópoles.
Tem-se como exemplo a configuração atual da rede urbana brasileira.
Segundo Ultramari (2007), ela é definida a partir do tamanho de seus
centros urbanos que contam com dimensões variadas e relações de
diferentes níveis, estabelecidas a partir de continuidades espaciais e de
dependências funcionais na hierarquia nacional de cidades e da forma
como ocupam seus espaços, o que significa a identificação de fluxos de
pessoas, de mercadorias e de informações capazes de criar estruturas
territoriais para as quais muitas vezes as cidades não estão preparadas;
Fenômeno 4: relação do fenômeno urbano com novas formas de articulação
social provenientes do modo de produção capitalista.
O cenário de ocupação do território nacional, por exemplo, nos anos 1980
e 1990 em termos econômicos, com a abertura da economia brasileira
para o mercado internacional, de acordo com Ultramari (2007), criou novas
relões regionais e novas relações de alguns locais com economias
estrangeiras. De forma que todas essas mudanças provocaram impactos
na urbanização e a sua relação entre as cidades. Curitiba, pode-se dizer,
distingue-se pela funções de alta gestão e produção industrial no cenário
39
nacional, diversificando suas atividades e criando novas relações, incluindo
as internacionais, sendo um exemplo de aglomerão urbana metropolitana.
A esses problemas trazidos por Castells, hoje recorrentes, pode-se elencar
um quinto fenômeno a ser valorizado na gestão urbana: a questão da degradação
ambiental. Esta degradação tem várias causas; uma delas é a ausência de controle
e monitoramento da ocupação das áreas urbanas. Independentemente das causas,
tal degradação ocorre na maioria das cidades brasileiras: a ocupação nas encostas
dos morros causando deslizamentos como, por exemplo, na cidade do Rio de
Janeiro; a ocupação das bacias dos mananciais da represa de Guarapiranga,
em São Paulo, comprometendo a qualidade do abastecimento de água da cidade,
obrigando-a a trazer água de outro Estado, a 70 quilômetros de distância; a
ocupação desordenada ao longo do rio Tietê também em São Paulo; ocupações
próximas a áreas de mangue e restingas. Algumas dessas degradações ambientais
decorrem das ações antrópicas como nas construções de barragens, linhas de
transmissões elétricas, rodovias, aeroportos e retificações de rios, em função de
canalizações e planos de drenagens equivocados.
Essa visão de "controlar" a natureza, drenar pântanos, canalizar e retificar os
rios para o escoamento das águas da chuva com maior velocidade, com obras de
embelezamento e saneamento, prolongou-se até a década de 1980. Percebe-se que
com o crescimento da zona urbana, cada vez mais pressionando as bordas dos rios,
os problemas de drenagem e vazão ao longo dessas áreas começaram a ser
constantes, pois, além de o solo estar sendo impermeabilizado, o lixo estava sendo
jogado nos rios, diminuindo sua vazão na parte canalizada, dificultando o acesso
para a limpeza do córrego, acarretando estrangulamento da vazão do rio, problemas
de inundações e vulnerabilidade a doenças.
Hoje, a experiência vivenciada pelas sucessivas enchentes e inundações nas
cidades, mostra que não se deve canalizar ou retificar os rios sem um estudo de
análise de impacto. A Figura 2 demonstra um hidrograma de comparação do que
ocorre quando o rio corre no seu leito natural e quando há a retificação. Nota-se que
quando o rio corre no seu leito natural, ele vai amortecendo sua vazão lentamente
ao longo de seu percurso, quando ele sofre uma retificação praticamente
descarrega toda a vazão que recebeu a sua montante, na sua jusante e muito
40
rapidamente, não deixando que as águas possam ser amortecidas durante seu
percurso, acarretando inundações.
Figura 2 - Canalização de córregos sem a devida análise de impactos
Fonte: Rodrigo Martins Supervisão de Patrimônio Ambiental - Prefeitura Municipal
de São Paulo 2007
A Figura 3 a seguir mostra um exemplo da conseqüência quando se canaliza
um rio. O leito natural do rio desapareceu com a retificação e suas várzeas foram
ocupadas originando inundações e prejuízo à população.
Figura 3 - Cidade de São Paulo: conseqüências de retificação e canalização de rios
Fonte: Rodrigo Martins Supervisão de Patrimônio Ambiental - Prefeitura Municipal de São Paulo 2007
41
A gestão blica, segundo Castells (1983), no processo de urbanização exige
um estudo que integre a análise do espaço considerando as questões ambientais,
com as lutas sociais e os processos políticos.
Pode-se concluir que o processo de urbanização deve ser constantemente
avaliado, uma vez que a cidade é dinâmica e se modifica a todo momento em função
das adaptações que a modernidade exige dos seus habitantes. A história mostra
como algumas cidades influenciaram e influenciam até hoje na forma de ocupação
de muitas cidades, seja pelo seu desenho, seja pela sua vocação, seja pelo perfil de
de seus habitantes. Os problemas das cidades e as preocupões dos gestores em
resolvê-los são comuns à maioria delas. A cidade de Curitiba não foge à regra: a
questão do seu crescimento com infra-estrutura adequada, a preocupação com a
sua função social, com a constrão do espo urbano e a degradação ambiental,
formando periferias que extrapolam os limites político-administrativos, caracterizando
regiões metropolitanas. A falta de preparo das cidades em geral para a nova rede
urbana que está se criando, em função da abertura da economia brasileira, e das
novas relações entre as cidades, provocando impactos na urbanização como a
ocupão em áreas de risco, o acelerado ritmo de urbanizão, o fenômeno urbano
impondo novas relações com as cidades e a questão ambiental é um exemplo desse
processo de urbanização que este trabalho irá discutir.
A seguir, serão analisadas as limitações do planejamento urbano e sua impor-
tância na organizão e gestão das cidades, bem como a aplicação de seus instrumentos
urbanísticos como uma das medidas de abordagem para solucionar problemas.
3.2 INSTRUMENTOS DE PLANEJAMENTO DAS CIDADES
O planejamento das cidades surgiu para satisfazer as necessidades humanas
e sociais das comunidades. Porém, as cidades cresceram e se transformaram em
estruturas o complexas e diceis de administrar que o planejamento não consegue
mais ser visto sob este prisma. Constata-se que limitações no planejamento
urbano quando se procura atender as necessidades mais básicas da populacão. Se o
planejamento pode ser entendido, conforme Ultramari (2007, p.4), como "ato de
42
planejar, o qual explicita a cidade que se quer num plano, que define como deverá ser
seu futuro, quais os caminhos a seguir, as prioridades a adotar, os espaços a ocupar
e a não ocupar, as obras a serem feitas", isto tudo já não parece mais ser suficiente.
As cidades cresceram e passaram a exigir novas fórmulas de gestão urbana.
Como formular uma cidade ideal? Como identificar esse ideal, para quem ele
serve e em que momento ele poderia ser visualizado? Até que ponto a solução do
urbanista alcança o desejo concreto da sociedade sem que surjam eventos
adversos? Como agregar preocupações socioeconômicas às suas propostas? Tais
questionamentos podem contribuir, novamente segundo Ultramari (2007), para a
discussão sobre a oposição comumente observada entre "o homem poder fazer a
cidade" e a "cidade poder fazer o homem".
Segundo Ultramari (2007) na tentativa de se achar a Cidade Ideal tornaram-se
conhecidos os exemplos de: Fourier, com o Falanstério, edicios-cidades onde a
riqueza seria distribuída segundo a quantidade e a qualidade do trabalho produzido
pelo cidadão, aproximando o trabalho do lazer; Ebenezer Howard, com a Cidade-
jardim no final do século XIX, cujo objetivo era o de constituir uma comunidade
autônoma em termos de produção e consumo, cercada de área verde, constituindo a
mescla entre o campo e a cidade; Tony Garnier, com a Teoria da Cidade Industrial,
estabeleceu as zonas residencial, industrial, pública e de agricultura, sugeriu
inovões tecnológicas na construção com concreto e propôs a adoção de um modelo
socialista de sociedade. Tais propostas, apesar de não serem bem-sucedidas,
permitiram gerar uma diversidade de conhecimentos na busca de soluções para os
então chamados problemas urbanos.
No final do século XIX, a cidade ainda era vista como um objeto de interesse
pontual e marginal em outras ciências, chamando a atenção seus aspectos
quantitativos seu volume demográfico e o porquê de seu crescimento para a
sociologia, por exemplo. Do mesmo modo, percebe-se que desde essa época a
cidade era objeto de estudo por razões higienistas e sanitaristas, em resposta a
um problema de urbanização acelerada, pouco planejada e com índices de qualidade
de vida bastante baixos. A partir do final do século XIX, a cidade é claramente o lócus
central de relações econômicas, de fluxos, de interesses, de riqueza e de pobreza, de
enriquecer, de servir e de trabalhar. As bases do Urbanismo começavam a se
consolidar: não apenas aquelas que justificariam uma intervenção física segundo a
43
concepção do arquiteto ou do engenheiro, mas aquelas que traduziriam a complexa
síntese das diversas feições da sociedade, num tempo e num espaço determinados
(ULTRAMARI,2007).
Apesar das cticas de parte da academia em relão ao Urbanismo Modernista,
ainda hoje persiste a prática da busca de uma cidade funcional, do modelo ideal de
cidade, da intervenção física como fonte transformadora principal da cidade. Por que
essa busca? Talvez porque a cidade tenha se destacado com um papel importante
não só no que se refere à vida cotidiana dos cidadãos ao promover o seu bem-estar,
ao articular a sociedade civil, a iniciativa privada e o Estado, mas também no que diz
respeito às relações internacionais atraindo investimentos, participando ativamente
de fóruns internacionais. Segundo Castells e Borja (1996), a cidade vem assumindo
definitivamente centralidade na criação e dinamizão de bens simbólicos e no bem-
estar de sua população.
É também uma ironia dizer que as cidades, o bitat da humanidade, é o maior
agente destruidor do ecossistema e a maior ameaça para a sobrevivência da huma-
nidade no planeta, como muitos acreditam. Conforme Rogers (2001), três fatores
podem contribuir para que as cidades sejam o ponto de equilíbrio entre o homem e o
seu meio ambiente: o aumento da conscientização ecológica, da tecnologia das
comunicações e da produção automatizada. Segundo ele, todas contribuem para o
desenvolvimento de uma cultura urbana pós-industrial socialmente responsável e
ambientalmente consciente. O próprio conceito de desenvolvimento sustentável das
Nações Unidas é enfatizado como a espinha dorsal de uma política global: "atender
às nossas necessidades atuais sem comprometer as futuras gerações e dirigir
ativamente nosso desenvolvimento em favor da maioria do mundo os mais carentes".
Em nenhum outro lugar a implementação desse conceito pode ser mais poderoso
e benéfico do que nas cidades. Os benefícios oriundos dessa posição podem
transformar-se no princípio orientador do moderno desenho urbano.
Para Castells e Borja (1996), esse crescente protagonismo em relação às
cidades pode ser constatado em movimentos dos governos locais. Exemplos disso
verificam-se quando da recessão econômica dos anos 70, na Europa, quando surgiu o
movimento das Eurocidades, que definiu as cidades como motores do desenvolvimento
econômico, reunindo as cinqüenta cidades mais importantes da Europa em Barcelona,
em 1989.
44
Na Ásia, o protagonismo econômico das cidades fica mais evidente. A velocidade
de inovação das pequenas e médias empresas articuladas com as grandes em rede
com o exterior e com o poder político no interior assegura importantes funções de
informão e promoção, e garante o ordenamento e a prestão de serviços do sistema
cidade, onde o tecido urbano e o econômico se confundem.
Por outro lado, as cidades americanas reagiram nas suas transformações
políticas e econômicas colocando em prática ambiciosos projetos estratégicos, ao
combinar crescimento econômico e desenvolvimento urbano com os problemas
gerados pela degradação do meio ambiente, pelas desigualdades sociais e pela
insegurança pública.
No Leste Europeu, segundo Castells e Borja (1996), o protagonismo político
das cidades manifestou-se no desmoronamento dos sistemas comunistas por força
dos movimentos cívicos, pois as cidades foram palco o somente da reconstrução
da organização democrática como também da economia competitiva.
Castells e Borja (1996) afirmam que na América Latina o papel das cidades e
dos governos locais foram revalorizados por processos de democratização política e
de descentralização do Estado. A revitalização econômica estimulou o andamento
de projetos urbanos em grande escala, assim como dinamizou o setor da construção
civil. Por outro lado, multiplicaram-se as demandas sociais que acentuaram a
sensação de crise funcional nas grandes cidades. Porém, a reativação das
dinâmicas econômicas, as participações sociais e a democratização política criaram
condições para a geração de algumas respostas. Exemplos disso são as aprovões
de projetos de reforma política e financeira na Cidade do México, Bogotá e Buenos
Aires (CASTELLS; BORJA, 1996).
No Brasil, foi nos anos 1970 que as cidades mais se desenvolveram e tiveram
seu crescimento acelerado. Crescimento esse, segundo Ferreira, Dini e Ferreira (2006),
que não tem sido capaz de incorporar parcelas significativas de suas populações
aos benecios do desenvolvimento. Esse cenário é observado em maior ou menor
escala em todo o Brasil e na América Latina, sobretudo nos grandes centros urbanos.
O Estado, como agente transformador do espaço urbano, seja por meio de
investimentos em infra-estrutura, em habitação, seja pela implantão de equipamentos
públicos, tem o poder de torná-lo mais ou menos segregado. Desse modo, tanto as
políticas públicas emergenciais de combate à pobreza quanto aquelas que objetivam
45
a diminuição das desigualdades sociais devem considerar a dimensão territorial
como elemento decisivo na transformação do espaço urbano.
Dados do IBGE (2007) apontam que 81% da população brasileira mora nas
cidades, aproximadamente 137 milhões de brasileiros (de um total de 170 milhões).
O fenômeno de urbanização tornou mais evidente a marginalizão e a violência
urbana, motivo de grande apreeno não para os moradores e usuários, mas
também para os governos das cidades.
Muitas grandes cidades se expandiram para as suas regiões metropolitanas,
com periferias ocupadas pela população pobre expulsa das áreas centrais ou atrdas
de outros pontos do território brasileiro em busca de trabalho, acessos a bens,
servos e equipamentos urbanos. O que se encontra nas grandes cidades, observa-se
de forma semelhante também nas médias e menores. Nos espaços urbanos é que
emergem, de forma mais nítida e profunda, as contradições de um desenvolvimento
ecomico excludente e dos desafios da vida em sociedade. Nesse contexto, acentua-se
também a defasagem entre as necessidades e demandas de sua população e a
capacidade de o poder público oferecer os bens e serviços.
Esses problemas não são novos. Fazem parte do cotidiano das pessoas
e cada vez mais se percebe aumentar esse agravamento: periferias longínquas e
desprovidas de serviços e equipamentos urbanos; favelas, invasões, vilas e alagados
nascem e se expandem deixando a população em constante vulnerabilidade a todos os
tipos de riscos; especulação imobiliária; poluição de águas, do solo e do ar; dentre
outros aspectos. Tal cenário, como afirma Ultramari (2007, p.1), assemelha-se a:
cidades que sofreram grandes desastres naturais ou conflitos armados,
tamanha a degradação dessas áreas. Esse processo cumulativo sobrepõe
pois interesses, disputas, construções, deteriorização, abandono de áreas
urbanizadas, espraiamento irracional da área ocupada, e, dentre outros,
ocupação de espaços ambientalmente frágeis, de risco e baixas condições
de habitabilidade. Tais assentamentos humanos fazem parte de uma longa
lista de espaços submetidos a fenômenos que colocam em risco as suas
pprias existências e, igualmente, as forçam a um aprendizado de sobrevincia
constante, capacitando-as à recuperação, fazendo delas espaços de verdadeira
resiliência heróica.
46
Diante disso alguns instrumentos têm auxiliado na conducão de uma melhor
gestão das cidades, que serão vistos a seguir.
3.2.1 Constituicão Federal
Um dos mecanismos criados para tentar resolver as limitões do planejamento
urbano, e com o intuito de assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, o
bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma
sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, foi a aprovação da Constituição
Federal de 1988 (OLIVEIRA, 2001, p.3). Esse direito oportuniza a reorganizão social
da populão urbanizada, e a cidade passa a ser o principal ator potico do
desenvolvimento socioecomico, configurando o espaço privilegiado para a
articulação entre o governo e a sociedade na busca de novas formas de gestão dos
recursos existentes, acentuando a dimeno da cidadania local. A inclusão dos artigos
182 e 183, referentes ao capítulo da Política Urbana, possibilitou o direito à cidade, à
habitação, ao acesso aos melhores serviços públicos e a oportunidade de vida
urbana digna para todos.
Dentre os inúmeros avanços que a Constituição promoveu, destaca-se a
criação do Sistema Nacional de Defesa Civil (SINDEC), vinculado ao Ministério da
Integração Nacional, objetivando a redução dos desastres
5
tanto na prevenção, como na
preparão para emergências e desastres, na respostas aos desastres e na
reconstrução e recuperação. O trabalho deve ser realizado pela defesa civil nas
ações de socorro, assistenciais e recuperações destinadas a evitar ou minimizar os
desastres, preservação do moral da população e restabelecimento da normalidade
social muito importante para o resgate da cidadania, como preconiza a Constituição
Federal.
5
Desastres são situações anormais, causadas por evento(s) adverso(s) (naturais, humanos ou
mistos), trazendo danos (humanos, ambientais e materiais) em um cenário vulnerável (localidade
em situação de risco ou ameaça) e conseqüentes prejuízos econômicos e sociais (MINISTÉRIO
DA INTEGRACÃO NACIONAL, 2008).
47
3.2.2 Estatuto da Cidade
O Estatuto da Cidade reúne importantes instrumentos urbanísticos, tributários
e jurídicos que podem garantir efetividade ao Plano Diretor, responsável pelo
estabelecimento da potica urbana na esfera municipal e pelo pleno desenvolvimento
das funções sociais da cidade e da propriedade urbana, como preconiza o artigo 182
da Constituicão Federal de 1988 (OLIVEIRA, 2001, p.3)
O Estatuto da Cidade, dentre muitos outros princípios, também prevê a
proteção, a preservação e a recuperação do meio ambiente natural e construído, do
patrimônio cultural, hisrico, arstico, paisagístico e arqueogico, sendo uma medida
importante para a garantia da convincia entre o homem e o meio, bem como para a
manutenção da história urbana, local, regional ou nacional. Portanto, cabe também ao
município a conservação dos seus recursos naturais e a sua utilização adequada
pelas pessoas. Segundo Oliveira, 2001, p.10), as diretrizes gerais estabelecidas no
Estatuto da Cidade buscam orientar a ão de todos os agentes pelo desenvolvimento
na esfera local. Sinaliza que as cidades devem ser tratadas como um todo, rompendo
a visão parcial e setorial do planejamento urbano até agora praticado. Segundo
Bertolini (2007), exemplo dessa visão do todo, são os instrumentos de gestão,
estabelecidos a partir do Estatuto, aplicados, por exemplo, pelo município de
Curitiba, tais como:
a) as operações urbanas consorciadas, por meio das quais é permitida a
alterão dos índices urbasticos, bem como de usos e porte, não previstos
na Lei de Zoneamento e Uso do Solo, mediante contrapartida do setor
privado, nos casos de: execução de obras e serviços, preservação do
patrimônio histórico e cultural, alocão de recursos financeiros. construções
e concessões de terrenos para programas de habitação de interesse
social, de concessão de áreas à preservação do patrimônio natural e
ambiental. Estes dois últimos serão analisados como exemplo de medidas
urbanísticas no Estudo de Caso desta dissertação;
b) transferência do direito de construir, aplicado desde a cada de 1980 no
municípo de Curitiba, como incentivo à preservação do patrimônio cultural
e ambiental. Este instrumento contribui para a minimização de desastres
48
naturais, tendo em vista a garantia da preservação das áreas verdes e
fundos de vale para a adequada permeabilidade do solo quando da
ocorrência de chuvas torrenciais, por exemplo;
c) outorga onerosa do direito de construir, aplicado desde 1991 por meio de lei
de incentivo construtivo para a construção de habitação de interesse social.
Este mecanismo é muito importante para atender ao déficit habitacional
da faixa de mais baixa renda, reduzindo o risco e a vulnerabilidade à
invasão de áreas ambientalmente fragilizadas.
O Estatuto evidencia que o planejamento deve ser entendido como processo
construído a partir da participação permanente dos diferentes grupos sociais para
sustentar e se adequar às demandas locais e às ações públicas correspondentes.
O Estatuto da Cidade define também a função do Município na promoção do
adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do
parcelamento e da ocupação do solo, evidenciando a competência municipal para
adotar medidas que favoreçam o seu desenvolvimento territorial, com sustentabilidade
cultural, social, potica, econômica, ambiental e institucional. O Munipio é responvel,
portanto, em formular a política urbana e fazer cumprir, por meio do Plano Diretor, as
funções sociais da cidade.
Um exemplo importante na questão do ordenamento territorial para Curitiba e
sua rego foi o Programa de Saneamento Ambiental (PROSAN), da Região Metropolitana
de Curitiba, executado em meados dos anos 1990, financiado pelo Banco Mundial.
Ao reunir na mesma ação a proteção dos recursos naturais e os problemas gerados
pela ocupação urbana, estabeleceu um novo entendimento para a questão do
saneamento básico em áreas urbanas, pois permitiu o reassentamento de ocupação
das áreas de mananciais, ambiental e socialmente adequado com a implantão da
infra-estrutura urbana rede de água, esgoto, eletricidade, arruamento, transporte
público nos municípios de Piraquara, Campina Grande do Sul, Pinhais e São José
dos Pinhais.
Portanto o Estatuto da Cidade ao reunir importantes instrumentos
urbanísticos, tributários e jurídicos, garante a efetividade ao Plano Diretor.
49
3.2.3 Plano Diretor
O Plano Diretor procura orientar o desenvolvimento urbano para áreas que
oferam menores riscos naturais, adotar medidas para a realocação de populações
vulneráveis, assim como destinar as áreas em risco para usos mais adequados, tais
como: áreas verdes, áreas de lazer, canchas esportivas e outros. Uma das formas
encontradas para estimular a análise destas problemáticas, assim como a
implementação de estratégias e medidas de adaptão, tem sido a identificão dos
aspectos relacionados aos riscos ambientais como um dos temas prioritários na
elaboração dos Planos Diretores Municipais no Brasil (ROLNIK; MACEDO PINHEIRO,
2004).
Portanto, o poder público municipal assume a função de responsabilizar-se
pela formulação, implementação e avaliação permanentes de sua política urbana,
estabelecida no Plano Diretor, visando garantir a todos o direito à cidade e à justa
distribuição dos benefícios e ônus do processo de urbanização.
Segundo Braga (1995), o Plano Diretor ao estabelecer diretrizes, metas e
programas dirigidos à política urbana deve ser claro, objetivo e detalhado para que
o se torne apenas mais uma carta de boas intenções. O Plano Diretor, ao abranger
os tópicos uso e ordenação do solo urbano, habitação, saneamento básico e
transportes urbanos, está direcionando o futuro das cidades, ou seja, para onde elas
querem crescer e como desejam crescer.
Entretanto, muitos autores dizem que há uma mitificação em torno do Plano
Diretor, por ser ele um documento cnico, podendo muitas vezes excluir a participação
da sociedade civil, favorecendo determinadas camadas da sociedade em detrimento
de outra. Tradicionalmente, apesar de o Plano Diretor procurar orientar o
desenvolvimento urbano para áreas que ofereçam menores riscos naturais, assim como
destinar as áreas em risco para ocupações mais adequadas, um desconhecimento
mesmo de seus conceitos, priorizando em excesso o zoneamento, a tal ponto que ele se
confunde com o pprio Plan o(VILLAÇA, 2005) .
3.2.4 New Pubilc Management NPM e Planejamento Estratégico
50
Outro aspecto a ser considerado é o modelo tradicional de administração pública
com características burocráticas e centralizadoras, que tende a ser substituído por
modelos flexíveis e ágeis, acompanhando o ritmo das transformações no meio urbano
(REZENDE; CASTOR, 2005). O poder público, por um lado, tenta cumprir o seu papel
no aprimoramento de competências gerenciais para a abordagem integrada dos
problemas, de forma articulada e em parceria com a sociedade, no sentido de
recuperar a dimeno da cidadania local. De outro lado, está o papel dos demais
atores, lutando por espaços de participação efetiva e garantia dos direitos sociais
junto à esfera pública, construindo, assim, a cidadania ativa e responsável. Surge,
então, um novo conceito de geso, segundo Rezende e Castor (2005), na administrão
blica municipal relacionada à "new public management", tamm chamada de nova
gestão pública.
Esse novo conceito utiliza modelos de gestão da iniciativa privada e conceitos
de administração estratégica focados nos negócios empresariais, nas organizações
públicas. Esse modelo tem como características: contextualizar o cidadão como um
cliente em foco; dar sentido claro da miso da organização pública; delegar autoridades;
substituir normas por incentivos; elaborar orçamentos baseados em resultados; expor
operações do governo à concorrência; procurar soluções de mercado e não apenas
administrativas; e medir o sucesso do governo pelo cidadão. Essa nova gestão pública
tem também como prinpios: reestruturação, reengenharia, reinvenção, realinhamento
e reconceituação (JONES; THOMPSON, 2000). O new public management torna as
organizações públicas mais responsáveis para os cidaos como clientes participativos.
Diante desse novo conceito, também o planejamento estratégico surge como
mais uma ferramenta a ser considerada, sendo ele um processo dinâmico e interativo
para determinação dos objetivos, das estratégias e das ações do município.
Um plano estratégico, segundo Castells e Borja (1996), unifica diagnósticos,
concretiza ações públicas e privadas e estabelece um marco de mobilização e de
cooperação dos atores sociais urbanos. Oferece uma resposta onde os problemas
da sociedade são delineados e onde os agentes podem atuar conjuntamente. Permitem
reconstruir o sentido da cidade, do território desafiando a refazer os sistemas de
convivência. Um dos instrumentos valorizados no planejamento estratégico são os
Grandes Projetos Urbanos, que serão analisados como Estudo de Caso na seqüência
deste trabalho, tais intervenções são ícones, marcam uma gestão e por isso mesmo,
51
pode-se correr o risco de se usá-las mais como "espetáculo", tal como diz Novais
et al. (2007), do que com o objetivo de resolver problemas de ocupação, apenas.
Na opinião de Castells e Borja (1996), para que uma cidade seja competitiva
em relação ao mundo exterior e possa se inserir nos espaços econômicos globais
deve elaborar um planejamento estratégico considerando cinco objetivos: nova base
ecomica, infra-estrutura urbana, qualidade de vida, integração social e governabilidade.
Finalmente, a cidade deve ser entendida o somente como território que
concentra um grupo de pessoas e uma grande diversidade de atividades. Deve
também ser um espaço em que se integre o poder político e a sociedade civil, que
culturalmente dê identidade coletiva a seus habitantes e tenha um valor de marca e de
dinâmica em relação ao exterior, converta-se em respostas possíveis aos propósitos
econômicos, políticos e culturais (CASTELLS; BORJA 1996). Esta reação das
cidades tende a se concentrar na definição de um Plano Estratégico entre os
principais atores públicos e privados.
Segundo Rezende e Castor (2005), o êxito do planejamento estratégico se
quando a visão da cidade e suas estratégias mobilizam a todos, quando os objetivos
o exeqüíveis, consenso e trabalho coletivo compromissado, seus colaboradores
o capacitados, os demais planos da cidade eso integrados, a gestão local assume
e vivencia o planejamento estratégico com as políticas da cidade.
Se o planejamento urbano pode ser entendido como ato de planejar e que é
uma ciência mais ampla que se ocupa de atividades relacionadas à pesquisa, planos
setoriais diversos, regulação e controle do uso do solo, e atividades relacionadas
como a garantia do atendimento a serviços e infra-estruturas básicas (educação,
saúde e segurança pública para um e redes de água, esgoto, pavimentação,
transporte para outra); assim, confirma-se a idéia de que o planejamento urbano se
mostra como uma ciência de caráter eminentemente multidisciplinar, preocupada
com a forma como a sociedade se desenvolve no seu espaço de interesse, a cidade
(ULTRAMARI, 2007).
Talvez seja esse o motivo de o planejamento ter suas limitações, e seja tão
difícil de prever os fenômenos adversos que essas limitações possam proporcionar:
os problemas históricos relacionados à questão da pobreza, à falta de atendimento
das necessidades setoriais básicas da população, da degradação de espaços públicos,
de problemas financeiros dos governos. O que se quer colocar aqui em análise é o
52
fato de que não apenas limitações ao planejamento urbano, mas também
condicionantes devem ser agregadas ou valorizadas. Os aspectos naturais, a partir
da evidência da crise ambiental, acrescentaram mais condicionantes a esse
planejamento. As recentes questões ambientais trazidas por mudaas climáticas em
vel global alteram novamente as prioridades nas práticas do planejamento. Talvez
os benefícios oriundos do conceito sobre desenvolvimento sustentável
6
possam
transformar-se no princípio orientador do que seria hoje uma cidade ideal.
Na seqüência, discute-se o conceito de Grandes Projetos Urbanos que, como
dito anteriormente, fazem parte tradicionalmente do planejamento estratégico, por
ser objeto do Estudo de Caso e acredita-se poder debater a hipótese deste trabalho.
3.3 GRANDES PROJETOS URBANOS GPUs
Esta dissertação considera os Grandes Projetos Urbanos (GPUs) como um
dos elementos estruturadores dos espaços urbanos atingidos por situações de
vulnerabilidade. Dessa forma, interessa aqui analisar os GPUs implantados com o
fim de sanar impactos de eventos adversos, mas que, ao mesmo tempo, geram
novas pressões de uso sobre áreas sensíveis ambientalmente e eventualmente
renovam as mesmas situações de risco.
Tradicionalmente os GPUs são vistos de um modo diferente. Num primeiro
momento, pensa-se em espetacularização, ou melhor, grande parte da literatura os
assim. Mas um outro tipo, talvez mais relacionado com as intervenções características
do período desenvolvimentista e sanitarista do começo do século no Brasil, foi muito
marcante e evidenciou a atuação dos urbanistas brasileiros ao tratar dos problemas
relacionados à saúde e ao saneamento da época.
Assim, confirmando essa relação histórica dos GPUs com intervenções de
caráter sanitarista e higienista ou ainda de circulação, com construções de grandes
avenidas (esse um pouco posterior, a partir de 1892), tem-se que os primeiros
6
Desenvolvimento sustentável: desenvolvimento capaz de suprir as necessidades da geracão atual,
sem comprometer a capacidade de atender as necessidades das futuras geracões Comissão
53
exemplos das transformações dos projetos de intervenções urbanísticas, segundo
Simões Junior (2007), ocorridas nas capitais brasileiras ao longo da Primeira República,
tiveram sua influência do contexto urbanístico internacional, tal qual ocorre hoje em
relação aos GPUs. Estes projetos de intervenções urbanísticos, iniciados em fins do
século XIX, através dos congressos de urbanismo e disseminação de publicações
especializadas, mostra-se a relevância conceitual da experiência urbanística anglo-
saxônica.
A influência francesa a partir dos trabalhos de Haussmann em Paris, como
dito anteriormente, na década de 1850, é a que mais fortemente vai marcar a
atuação dos urbanistas brasileiros. Apesar de facilitar a implantação de um projeto
de modernidade urbana em curto prazo, possuía alcance limitado, constituindo-se
muito mais na produção de cenários modernizadores de embelezamento do que
propriamente de alterações estruturais nas cidades.
Ainda segundo Simões Junior (2007), o rápido crescimento das cidades ao
longo do século XIX, em especial daquelas situadas nos países onde o processo de
industrialização foi mais evidente Alemanha, Grã-Bretanha, França e Estados
Unidos , exigiu a elaboração de poticas de intervenção por parte das administrões
governamentais, destacando-se:
a) nas cidades euroias, a demolição dos muros defensivos das vilas e cidades
de fisionomia ainda medieval, para dar lugar a novas áreas de expano
urbana e bairros, muito deles destinados ao abrigo de conjuntos habitacionais;
b) a implantação de planos de remodelação para as áreas centrais e
históricas, demolindo estruturas fechadas de ruas estreitas e escuras e
criando espaços viários mais amplos e adequados para o enfrentamento
das novas necessidades de circulação e transporte;
c) o estabelecimento de um novo padrão de ocupação e de edificação,
objetivando o enfrentamento dos graves problemas sanitários e das
epidemias, decorrentes da forte concentração humana;
d) a implantação de redes de infra-estrutura sanitária, de iluminação e de
transporte público;
Mundial de Meio Ambiente e Desenvolvimento, criada pelas Nacões Unidas.
54
e) a realizão de projetos de embelezamento urbano, de criação de espos
de cunho cívico e monumental, assim como de áreas verdes e espaços
públicos de lazer.
Essas políticas de intervenções revelam uma tipologia de GPUs da época,
visando a uma geso mais organizada da cidade ao evidenciar práticas cientificistas,
como o sanitarismo e as tecnologias associadas às novas infra-estruturas.
No contexto brasileiro, o progresso científico na área das ciências da saúde
contribuiu, na segunda metade do século XIX, para a adoção dos princípios do
sanitarismo nas práticas urbanas e também inevitavelmente implantar GPUs, num
momento em que o enfrentamento das epidemias exigia que as áreas centrais fossem
remodeladas, de forma a implantar serviços de infra-estrutura de água e esgotos, a
sanear áreas pantanosas e inundáveis, a prover espaços blicos abertos para facilitar
a aeração e a insolação, a eliminar focos de concentração de moradias insalubres
(cortiços) e a estabelecer normativas para as construções.
Nesse sentido, destaca-se a contribuição no campo da engenharia, por meio
de planos integrados de saneamento envolvendo drenagem, canalização de cursos
d'água, tratamento de esgotos e abastecimento de água potável. O maior expoente
brasileiro foi Francisco Rodrigues Saturnino de Brito, que, com formação francesa,
realizou planos para quase todas as grandes cidades brasileiras, num momento em
que a ameaça de epidemias exigia intervenções sanitaristas imediatas. Saturnino
Brito se destaca como um grande urbanista sanitarista/higienista, cujos projetos
podem ser considerados como GPUs pela sua importância na saúde pública e visão
de respeito com a questão da natureza.
Dentre os trabalho de Saturnino de Brito, destaca-se o plano para o saneamento
de Santos em 1905, no qual, segundo Carriço (1991), apontava a necessidade de um
sistema de separação absoluta, entre águas servidas e pluviais, previa a descarga
dos esgotos em local afastado, para isso sendo construída a ponte Pênsil em São
Vicente, permitindo que estes fossem lançados na ponta do Itaipu, atualmente no
município de Praia Grande. Uma rede de canais foi desenhada e executada, sendo
ladeados por avenidas que estruturaram em definitivo o desenho urbano de Santos.
O plano de Brito foi, de fato, uma das mais completas contribuições ao planejamento
urbano nacional, até então realizadas. Tratava-se de um projeto extremamente
detalhado, ocupando-se desde a largura das vias, estabelecendo recuos e desenhando
55
os equipamentos sanitários internos aos imóveis. Brito estudou o volume e a periodi-
cidade das precipitações pluviométricas em Santos, o regime das águas das chuvas
e das marés, a topografia e as calhas naturais de drenagem da ilha de São Vicente.
Os canais de drenagem garantiram a extensão da cidade sobre uma área parti-
cularmente frágil, do ponto de vista ambiental, evidenciando o uso da tecnologia pelo
homem para adaptar o espo natural, e pela complexidade exigida pela crescente
interferência das esferas de governo nesse processo.
Outro relevante projeto de Saturnino Brito foi o elaborado para o governo da
Paraíba, em 1913, um plano de esgotos que lhe fora encomendado como parte de
um plano de expansão para a capital do Estado. O traçado que o engenheiro
projetou para tal área era destacado por sua originalidade e seu caráter inovador.
Assimétrico e muito irregular, ele diferia radicalmente dos trados feitos no Brasil nas
três décadas precedentes, distinguindo-se inclusive daqueles concebidos anteriormente
pelo próprio Saturnino dentre os quais o proposto para Santos, em São Paulo.
Além disso, ele mantinha-se original mesmo no contexto internacional, uma vez que
o se assemelhava a nenhuma das solões adotadas pelos planos urbanísticos mais
conhecidos produzidos, na época, na Europa e nos Estados Unidos. Isso porque
Saturnino considerava no trado urbano as condicionantes ambientais: curvas de nível
para drenagem e escoamento de esgoto. Esse tipo de GPU sanitarista/higienista é
importante do ponto de vista da saúde pública e para mitigar os impactos de acidentes
naturais, como erosões e quedas de barreiras naturais.
Segundo Sousa, Nogueira e Vidal (2006, p.3), percebe-se na abordagem
adotada por Brito, no plano para a capital paraibana, a preocupação não com a
questão do desenho das vias e quadras (deveria ser muito irregular e variado), mas
também com outras diretrizes:
a) as pras deveriam ser laadas depois de definidas as redes sanitárias
e as vias principais;
b) a segunda diretriz fundamental do traçado foi que as vias deveriam ser
dispostas de modo a facilitar a execução e o funcionamento das redes
sanitárias, isto implicando que a malha por elas formada deveria se
acomodar à topografia.
56
Brito (1914, p.7) justificou o arruamento que propôs com as seguintes palavras:
"procurei trar as ruas novas de modo a terem todas uma declividade favorável ao
escoamento pluvial e à execução dos esgotos [...]".
Percebe-se, portanto, que no começo do século as grandes obras eram de
saneamento, preparando as cidades para o básico, para a função de habitar em
densidades até então desconhecidas. O quadro 1 apresenta as maiores capitais
brasileiras identificadas pelo levantamento censitário de 1900. Essas cidades foram
objeto dos primeiros projetos de renovação urbana, com obras de saneamento,
implantação de parques, praças e avenidas, que, em maior ou menor escala, contri-
buíram para a adequação de suas estruturas físicas às necessidades econômicas do
país, em grande parte condicionadas pelo seu papel no contexto internacional.
Quadro 1 - Lista das maiores capitais brasileiras do censo de 1900 que receberam projetos de renovação urbana
CIDADES
POPULAÇÃO
(mil hab.)
PROJETO MAIS RELEVANTES
URBANISTA RESPONSÁVEL
Manaus
65
Av. Eduardo Ribeiro (1893-1902)
Gov. Eduardo Ribeiro
Santos
(1)
Plano para saneamento de Santos (1898-1905)
Eng. Francisco Rodrigues
Saturnino Brito
Rio de Janeiro
810
Abertura da Avenida Central (1902-06)
Eng. Pereira Passos
Belém
96
Boulevard da República (1905-11)
int. Antonio José de Lemos/Eng.
Francisco Bolonha
Recife
113
Avs.Marques de Olinda e Central (1909-13)
Eng. Alfredo Lisboa
Salvador
205
Rua Chile e imediações (1910-16)
Eng. Alencar Lima
São Paulo
239
Parque Anhangabaú (1911-16)
Eng. Victor Freire/Arq.Bouvard
João Pessoa
(1)
Plano de esgoto e Plano de expansão da cidade
Eng. Francisco Rodrigues
Saturnino Brito
Porto Alegre
73
Av. Júlio de Castilhos, Borges de Medeiros e
imediações
Eng. João Moreira Maciel
Curitiba
50
Rua 15 de Novembro (1920-24)
Pref. e eng.. João Moreira Garcez
Fortaleza
48
Passeio Público
Gov. Antonio Pinto Nogueira
Accioly
Teresina
45
Praças D. Pedro II e da Bandeira
Govs. Antonino Freire da Silva e
Miguel de Paiva Rosa.
Fonte: Simões Jr. (2007)
(1) Levantamento realizado pela pesquisadora.
Observa-se no quadro acima duas tipologias de GPUs: 1) projeto de moder-
nização de caráter emblemático, para descongestionamento das áreas centrais,
melhoria da insolação e aeração visando à salubridade, como a Avenida Central, no
Rio de Janeiro; a Av. Sete de Setembro em Salvador; as Avenidas Marques de Olinda e
57
Central no Recife, a Av. Borges de Medeiros em Porto Alegre, o Boulevard da
República em Belém; a Av. Eduardo Ribeiro em Manaus e a Rua XV de Novembro em
Curitiba; 2) projeto de intervenções mais abrangentes como o plano de saneamento
na cidades de Santos; o plano de esgoto e expansão urbana de João Pessoa e o
plano de expansão do centro de São Paulo (para fora de sua colina histórica, que,
aliada à necessidade de ampliação de áreas verdes blicas no centro, permitiu a
preservação de grande parte de sua área de valor histórico, renovando a área ao
redor da Sé, surgindo o projeto de urbanização da área do Anhangabaú).
Esses projetos das antigas ões de "melhoramentos urbanos" sem abandonar
alguns de seus objetivos iniciais, os de saneamento e circulação, pode-se dizer que
foram os pioneiros dos GPUs nas cidades brasileiras. Como dito anteriormente, os
GPUs atuais têm a preocupação da simples espetacularização, embora no passado
também houvesse o movimento da "haussmannização" ou "city beautiful". Pode-se
afirmar, então, que os GPUs atuais repetem interesses e objetivos observados
anteriormente na história do Brasil e de outras cidades do mundo.
Talvez o aspecto mais evidente relacionado com GPUs hoje seja o fato de
que são justificados, na maioria das vezes, pela necessidade de se recuperar áreas
de sub-habitação e pela necessidade de se valorizar símbolos importantes para a
imagem e competitividade da cidade. Segundo Ultramari (2006), ao priorizarem
áreas subutilizadas ou com padrão urbano abaixo do desejado, os GPUs tendem, na
maioria das vezes, a reforçar segregações a chamada gentrification mais uma
vez. Tais fatos têm levado a comparações com polêmicas semelhantes às ocorridas
nas intervenções de Haussmann em Paris ou na Ringstrassen de Viena, contrapondo
opiniões ideologicamente à esquerda e à direita. Lungo e Smolka (2005) citam a
possibilidade de haver uma reação por parte das elites urbanas em relação ao
planejamento democrático, normativo, participativo e, sobretudo, afirmam, moroso.
Conforme Ultramari (2008a) afirma, mais uma vez, opõe-se o pragmatismo à discussão
consorciada, o rápido ao demorado, o vivel ao invisível. Numa outra vio, encontra-se
a oposição entre aqueles que se desiludiram com os fracassos do planejamento
normativo e que agora buscam nos GPUs, guardando as proporções e os recursos
da cidade que o abriga e que o fabrica, o resultado necessário para atingir os objetivos.
58
no final dos anos 1980, conforme Ultramari (2008b), ao contrário da
cada que a havia antecedido, com as iniciativas da Renascença Urbana em cidades
da Europa e Estados Unidos, combinando um discurso de requalificação das áreas
centrais das cidades, se faz na implementação dos chamados Grandes Projetos
Urbanos, quase sempre ícones assinados por arquitetos de renome e pretensamente
habilitados para garantir competitividade à cidade que os contém, mas também na
função desses edifícios, abrigando e fomentando atividades artísticas, culturais e
de entretenimento.
Exemplo disso é a forma como as inúmeras cidades do Brasil, de médio e
grande porte, têm se lançado em projetos de revitalização de suas áreas centrais
como forma de transformar o meio urbano, quase sempre com intervenções que
podem ser identificadas como GPUs o necessariamente pelo tamanho, mas pelo
impacto no meio em que são implantados alguns com mais, outros com menos
sucesso. Ultramari (2006) destaca cinco tipologias de intervenção mais observadas:
1. Recuperação de grandes edifícios centrais para usos culturais, públicos
ou empresariais;
2. Implementação de obras urbanísticas como vias de pedestres e espaços
públicos abertos;
3. Recuperação de áreas ambientais degradadas como as margens de rios;
4. Mais recentemente, tentativas de se incrementar a oferta de habitação
nessas áreas;
5. Intervenção de GPUs
7
como elemento estruturador dos espaços atingidos
por desastres em função dos extremos climáticos.
Outro fator a ser considerado na implementação dos GPUs são as novas
práticas e os instrumentos desenvolvidos para o planejamento urbano que têm ganhado
espaço em virtude de fatores que o além de sua instrumentalidade: recebem o apoio
de instituições sobretudo as internacionais na forma de recursos financeiros ou
de legislações e estudos que funcionam como uma chancela para as novas práticas.
7
Essa última tipologia (item 5) de intervenção de um GPU como projeto de estruturação de um
espaço atingido por um desastre natural e a recuperação da área ambiental degradada (item 3) é
que serão analisadas nesse trabalho.
59
Um exemplo disso no Brasil são as operações urbanas consorciadas, legalmente
consolidadas no Estatuto da Cidade, já comentada no item anterior
Ainda segundo Ultramari (2006), em países como o Brasil, tais intervenções
na paisagem urbana concorrem com outros tipos de ação consideradas básicas à
vivência urbana, tendo, portanto, reduzidas suas influências no cenário das cidades
brasileiras e ainda despertam pouco interesse da parte dos urbanistas brasileiros. Ao
se analisar esses estudos, na maioria das vezes, limitam-se a um foco sobre os altos
custos da obra, no lucro apropriado pelo setor privado e na relão discutível com
outras ações governamentais.
Para Meyer (2000, p.6), a estruturação das cidades atualmente depende da
implantação do GPUs, sendo que o "valor estratégico" desses projetos está por sua
vez subordinado a sua capacidade de promover "transformações" do meio urbano
regional, aumentando sua atratividade e expandindo sua área de influência. Nesse
sentido, esses projetos diferem substancialmente das antigas ações de "melhoramentos
urbanos" que, muitas vezes, respondem apenas às demandas pontuais e específicas.
Conforme Novais et al. (2007), a intervenção nas cidades por meio de GPUs
passou a ganhar uma nova importância, podendo-se dizer que, nos anos 1990, o
Master Project
8
tomou boa parte do espaço reservado ao Master Plan
9
, que
prevalecera na década anterior. Essa passagem, quase sempre temida pelos
urbanistas, do plano para o projeto é justamente do que trata boa parte da literatura
contemporânea sobre o planejamento urbano. Tal distinção lembra também a errônea
separação do planejar e do agir, fazendo com que Planejamento e Urbanismo se
apresentem não apenas como distintos, mas igualmente como opostos. Sarah
Feldman (2005) ilustra essa "discórdia" com a oposição do professor Anhaia Mello
10
ao trabalho de Prestes Maia
11
na prefeitura da cidade de São Paulo, onde o primeiro
8
Master project similar ao Planejamento por Projeto.
9
Master Plan similar ao Plano Diretor.
10
Urbanista, opositor das idéias e intervenções de Prestes Maia, idealizador do Plano Regional de
o Paulo. Tal oposição, todavia,o diminui a concordância entre ambos de que o zoneamento é um
instrumento fundamental para o planejamento, ordenador mesmo do "caos" (FELDMAN, 2005).
11
Prefeito duas vezes da cidade de São Paulo, de 1938 a 1945 e de 1961 a 1965. Engenheiro,
caracterizou seus mandatos pelas obras implementadas no município. Dessas, vale citar o Plano
de Avenidas, com inspiração haussmaniana.
60
reivindicava o "aparelhamento do setor de urbanismo" para fazer planos, e não
apenas operações de ordenamento viário.
3.3.1 Outros conceitos de GPUs
Segundo Novais et al. (2007, p.2), “as cidades têm sido pensadas e produ-
zidas com vistas à ampliação de sua inserção no circuito mundial de valorização,
notadamente mediante a adequação de suas formas de gestão e produção de seus
espaços”. A competão pelos investimentos instaura uma verdadeira "batalha" entre os
lugares, e é nesse ambiente que emerge um conjunto de orientações que passam a
compor uma pauta a ser buscada e colocada em prática pelos diversos administradores
urbanos, independentemente de sua filiação político-partidária. A viabilização de tal
modelo está associada à efetivação das "parcerias público privadas", sendo um dos
instrumentos do Estatuto da Cidade, citado anteriormente, as operações urbanas
consorciadas, muitas vezes justificadas como necessárias, diante da dimica, lenta, do
setor público. As parcerias também buscam: 1) implementar meios de obter finan-
ciamento para as obras, em face da crise fiscal e da escassez de recursos públicos;
2) a desregulamentação e (ou) flexibilização do aparato legal da cidade e a redução
da escala de intervenção/ gestão urbana, por meio de projetos de grande impacto no
espaço construído das cidades; e 3) facilitar a confecção de novas formatações
jurídico-burocráticas, administrativas e financeiras para a execução dos projetos.
Todos estes fatores parecem se consubstanciar nos Grandes Projetos Urbanos: a
idéia de "progresso" e da construção de ícones que integrem os diversos grupos da
cidade ao redor de um projeto único, como num patriotismo urbano, um planejamento
de pensamento único, pretensamente capaz de aglutinar ricos e pobres, o velho e
o novo.
Tais enunciados têm se difundido em todo o mundo, configurando um padrão
a ser seguido pelas diversas localidades, porém não têm sido consideradas suas
respectivas identidades e (ou) singularidades sociogeográficas e culturais. Exemplo
disso pode ser observado por Gragg (2006, p.2) ao discutir o Tate Modern Collection
em Londres:
61
Connected to central London by arching spine of Lord Norman Foster's
Millennium Bridge and further magnetized by whirling mega-folly of the
London Eye Ferris wheel nearby, the Tate has catalized well over $ 200
million worth of other redevelopments to the area. Yet, even as it joins other
high-end arts institutions in the "Bilbao effect" of high art sparking higher-end
gentrification, the Tate is working hard to nurture an economically and
ethnically diverse live/work/ play urban neighborhood.
12
Essa abordagem faz surgir novas queses relativas aos processos socioespaciais
oriundos de tais projetos e novos desafios sobre as diferentes formas de reconstruir
e (ou) refazer as cidades. A adoção dos GPUs vem sendo apresentada, numa
perspectiva "estratégica", como a resposta para o enfrentamento da crise fiscal por que
passam as cidades, de um lado, e do progressivo incremento das desigualdades
socioespaciais nela presentes em função do atual pado de desenvolvimento (seletivo
e excludente), de outro. A análise aqui pretendida interpreta os GPUs como elementos
importantes da história recente das formas de gestão e produção do espaço urbano,
formas estas identificadas com a modernização socioespacial subordinada aos novos
circuitos do capitalismo globalizado, estreitamente vinculados à sociedade urbana
mundial (LEFEBVRE, 1999).
Incontáveis são os exemplos de GPUs que, orientados para a "revitalização
urbana", prometem promover o crescimento econômico, tanto mediante o incremento
do turismo quanto da atração de novos investimentos. Apresentado como alternativo ao
modelo normativo, diretivo e gido do zoneamento e do Plano Diretor, o "planejamento
por projeto" é considerado como estratégia apta a estimular o desenvolvimento e a
articular o tecido da cidade (NCHEZ; VAINER, 2003). Análises recentes de operões
urbanas realizadas mostram que o maior ônus acaba sendo do poder local, tanto
no que se refere a um importante investimento inicial quanto no longo prazo.
Os GPUs são apresentados como formas de ação adaptadas para garantir a
realização de empreendimentos num ambiente caracterizado pela complexidade e
incerteza. Apóiam-se na referência a uma variedade de instrumentos de escrutínio e
intervenção na realidade e supõem uma visão de cidade que vai além da abordagem
12
Tradução livre: "Ligada à área central de Londres pela espinha dorsal arqueada da Ponte Milênio
de Lorde Norman Foster e magnetizada pela mega-extravagância giratória que é a roda-gigante
London Eye ali perto, a Tate atraiu bem mais de $ 200 milhões em outras obras de restauração na
área. No entanto, ainda que se junte a outras instituições de arte sofisticadas no 'efeito Bilbao' de
elitizar uma área decadente por meio da arte requintada, a Tate está se esforçando arduamente
para nutrir uma vizinhança urbana de moradia/trabalho/lazer com diversidade econômica e étnica”.
62
formalista e da escala local. Os GPUs são formas complexas de articulação entre
atores privados e blicos referidas ao território, acionadas a fim de superar os
constrangimentos sobre a ação do Estado e garantir o envolvimento do setor
privado. São justificados com base em uma representação do mundo
contemporâneo que privilegia as articulações com a escala global em por estratégia
potencializar recursos para desencadear processos de desenvolvimento econômico e
promover efeitos de reestruturação no espaço urbano, apropriáveis pelos diversos
atores envolvidos. No processo de sua formulação e implantação, os GPUs
desencadeiam rupturas sobre os espaços físicos e sociais, em suas múltiplas
dimenes, e contribuem para a consolidão de mudaas na dinâmica socioespacial,
caracterizada por reconfigurações escalares e efeitos de desenvolvimento desigual
na escala local (SANCHEZ; VAINER, 2003, p.2).
Todavia, tais aspectos, sempre merecedores de críticas, são compensados
por outros. Ultramari (2006), por exemplo, acredita que os GPUs podem servir para
consubstanciar um debate maior sobre a cidade a partir de questões facilmente
compreendidas pela população sob impacto imediato de suas implementações.
Manuel Castells e Jordi Borja (1996) afirmam ser a cidade protagonista
ecomica e social, dinamizadora de bens simbólicos e do bem-estar de seus habitantes.
Para que isso verdadeiramente aconteça, esses autores propõem o chamado Plano
Estratégico de Cidade, que, sem descartar a participão dos diversos atores urbanos
(o que poderia ser uma posição de aparente interesse pela construção democrática
da cidade), valoriza também as parcerias do público com o privado, medidas de
rápida implementação, e construção de uma imagem da cidade; todos os fatores que
parecem se consubstanciar nos GPUs. Vale, para esse discurso, a idéia de "progresso"
e da construção de ícones que integrem os diversos grupos da cidade ao redor de
um projeto único, como num patriotismo urbano, um planejamento de pensamento
único, pretensamente capaz de aglutinar ricos e pobres, o velho e o novo. Como
afirmado por Carlos Vainer (in ARANTES; VAINER; MARICATO, 2000), a cidade torna-se,
então, uma pátria e portanto deve gerar um grande consenso e um forte sentimento
de se "pertencer", de "fazer parte", de não ser excluído.
Assim, o conceito de GPU é polêmico. Para uns, trata-se de mais uma
estratégia de dominão levada adiante no âmbito do planejamento e das intervenções
sobre o território. Para outros, uma forma para enfrentar a alienação que acompanha
63
os processos recentes da expano capitalista (BORJA; CASTELLS, 1997). Um terceiro
grupo, os chamados apologistas, defendem os GPUs como práticas adequadas ao
mundo contemporâneo.
Seja ela de louvor ou de censura, a produção literária sobre os GPUs
identifica-os como novas práticas de decisão e intervenção na cidade. De fato, o
embate entre os apologistas e seus críticos, se, por um lado, evidencia a falta de
consenso em torno de uma idéia e, assim, dos limites das formulações propostas,
por outro, ao expressar divergências em torno de pontos comuns, contribui para
evidenciar tendências no planejamento urbano contemporâneo.
Os resultados positivos que se espera de um GPU devem, pois, constantemente
fazer frente aos impactos urbanos ambientais e sociais. Se antes era louvável, até
certo ponto, aceitar declarações como a do prefeito de Nova York, Robert Moses de
que "you can not make an omelete without breaking the eggs" é substituído pelo "no
harm project"
13
, considerando que estudos prévios e medidas mitigadoras são
capazes de reduzir os impactos negativos da obra e mesmo de seu uso.
Mas o que importa é que um avanço, ainda que com o risco de interesses
não-democráticos, problemas diversos como a não-transparência de inversão dos
recursos e mesmo a simples espetacularização, é inegável dizer que um esforço
de recuperação e de valorizão dessas áreas degradadas. No caso espefico que
este trabalho irá abordar, ou seja, a implementação de um GPU quando construído
em áreas que sofreram um desastre natural, para fins de resolver situações de risco,
tal qual os de caráter sanitarista, conforme proposto por Saturnino Brito, contam com
menor grau de críticas, por explicitamente buscarem a segurança de
compartimentos da cidade.
A seguir, outro conceito a ser abordado diz respeito à fenomenologia dos
acidentes naturais, riscos e vulnerabilidade socioambiental. Discutem-se esses termos
por considerar que a área que constitui o empírico da pesquisa é o assentamento
irregular junto ao rio Iguaçu, denominado Bolsão Audi, no município de Curitiba, e
que está diretamente relacionado com esses conceitos.
13
Tradução livre:o se pode fazer uma omelete sem quebrar os ovos” [...] “projeto que não causa dano.
64
3.4 VULNERABILIDADE, RISCOS E DESASTRES
3.4.1 Vulnerabilidade
O termo vulnerabilidade, no entendimento de Marandola e Hogan (2005), não
pode ser analisado sem considerar simultaneamente o conceito de risco. Isto porque
a vulnerabilidade aparece no contexto dos estudos sobre risco em sua dimensão
ambiental, num primeiro momento, e mais tarde no contexto socioeconômico.
Outro conceito a ser discutido é com relação a desastres, pois a sua ocorrência e
intensidade dependem do grau de vulnerabilidade das comunidades afetadas e do
local onde ocorreram esses eventos.
Discutir os termos vulnerabilidade, riscos e desastres, aqui se justifica em
função de que os desastres naturais, quando ocorrem, normalmente exigem medidas
emergenciais, pois expõem a riscos as pessoas atingidas por esse fenômeno.
A vulnerabilidade, segundo Moser (1998), é definida como uma situação em
que estão presentes três elementos: exposição ao risco, incapacidade de reação e
dificuldade de adaptação diante da materialização do risco.
Deschamps (2007, p.1) também confirma a definição de Moser, ao colocar
que vulnerabilidade denota risco, fragilidade, estar sem defesas ou sofrer dano. Para
que se produza um dano, devem ocorrer: um evento potencialmente adverso, ou
seja, um risco; uma incapacidade de resposta a tal contingência seja ela de caráter
pessoal ou na forma de carência de fontes externas de apoio; e uma inabilidade
para adaptar-se ao novo cenário gerado pela materialização do risco.
Ainda segundo Deschamps (2004, p.18), na esfera científica, a noção de
vulnerabilidade vem sendo moldada e utilizada em vários campos disciplinares,
tornando-se muito útil para examinar diferentes aspectos da realidade. Na economia
se vincula ao desempenho macroeconômico diante de mudanças externas e, mais
recentemente, à integração econômica. Na geografia, o termo está relacionado às
probabilidades de ser afetado negativamente por um fenômeno geográfico e (ou)
climático. Assim, as zonas ou áreas e populações vulneráveis são aquelas que
podem ser atingidas por algum evento geográfico, como terremoto, enchente,
65
enxurrada e seca. Por sua estrutura geomorfológica ou por simples localização
geográfica, determinadas áreas o mais propensas a experimentar tais eventos, ou
seja, o áreas mais vulneráveis.
Para Ferreira, Dini e Ferreira (2006), vulnerabilidade é uma noção multidimen-
sional, uma vez que afeta indivíduos, grupos e comunidades, em planos distintos de
seu bem-estar, em diferentes formas e intensidades.
Nos últimos anos, elaborou-se um complexo discurso conceitual e analítico em
que se vincula à situação microssocial (os ativos de diversas naturezas das famílias,
que podem contribuir para a mobilidade social ou, ao menos, melhorar as condições
de vida) à macrossocial (a estrutura disponível para as famílias e seus membros).
A vulnerabilidade social consistiria no desajuste entre essas duas dimensões. A
noção de "desvantagens sociais", dada por Rodriguez (2000, 2001), possui papel
importante no estudo de vulnerabilidade, pois significa condições sociais que afetam
negativamente o desempenho de comunidades, lares e pessoas, o que corresponde a
menores acessos (conhecimento e (ou) disponibilidade) e capacidades de gestão dos
recursos e das oportunidades que a sociedade entrega para o desenvolvimento de
seus membros. Assim como Rodriguez (2000, 2001), Katzman (1999) adotam a noção
de vulnerabilidade vinculada à pobreza e como componente de crescente importância
dentro do complexo de desvantagens sociais e demográficas. Exemplo disso é a
maioria das ocupações irregulares localizadas nas áreas de riscos.
Outra fonte referencial são os estudos demográficos da Comisión Económica
para América Latina y el Caribe (Cepal), que m trabalhado também a vulnerabilidade
como incapacidade de enfrentar os riscos ou como impossibilidade de manejar ativos
para proteger-se (CEPAL, 2002; RODRIGUEZ, 2000, 2001). Diferente do que ocorreu
em outras ciências, nas quais a vulnerabilidade entra na tradição dos estudos sobre
riscos e perigos, estas preocupações, dentro das ciências sociais, não percorreram
o mesmo caminho. outra linha de trabalho que vem desenvolvendo pesquisas
a partir dos perigos e dos desastres ambientais, que adota fundamentalmente
a perspectiva de dimensionar a estrutura e a capacidade de reação da sociedade
diante de eventos extremos de alta conseqüência (QUARANTELLI, 1994; MATTEDI;
BUTZKE, 2001).
No entanto, é fundamental ter em mente a pergunta "vulnerabilidade a quê?"
quando se procede a uma investigação. A vulnerabilidade sempre será definida
66
a partir de um perigo ou um conjunto deles, em dado contexto geográfico e social.
Não se pode esquecer também de perguntar "onde e quem está/é vulnerável?"
(LIVERMAN, 1994).
A partir dessa delimitação, é possível identificar os fatores que podem promover
a diminuição da vulnerabilidade, bem como as situações ou os elementos que aumentam
o risco. Quando se adota a abordagem do lugar, entretanto, nem sempre é necesrio
definir a priori os perigos que serão analisados. Em muitos casos, problemáticas
específicas podem suscitar hipóteses de pesquisa que, ao serem investigadas,
revelarão os perigos e os elementos da estrutura causal da vulnerabilidade. Nesse
caso, manter uma postura aberta diante do objeto de pesquisa permite que, mesmo
que tenham sido definidos os perigos que serão investigados (e a vulnerabilidade a
eles), durante o seu desenvolvimento haverá oportunidade de descobrir outros
elementos que interferem no desenho da vulnerabilidade daquela populão,
sociedade ou lugar. Na maioria das vezes, maior clareza do dano que os perigos
causam, tendo dificuldade em definir o risco e a vulnerabilidade propriamente dita.
Para Marandola e Hogan (2005), o profundo conhecimento do perigo (o evento)
e dos processos envolvidos num contexto social e geogfico, colocados numa escala
adequada para a sua apreensão, é vital para que as estruturas que configuram a
vulnerabilidade possam ser elucidadas e compreendidas de forma contextual.
A dimensão temporal também é crucial na construção do conceito da vulne-
rabilidade, pois ela é extremamente dinâmica, além de poder apresentar variações
até em pequena escala temporal. Isto porque uma avaliação da vulnerabilidade
passa pela compreensão do perigo envolvido (eventos que causam dano), do contexto
geográfico e da produção social (as relações sociais, culturais, políticas, econômicas e
a situação das instituições), que revelarão os elementos constituintes da capacidade
de resposta, absorção e ajustamento que aquela sociedade ou lugar possuem para
enfrentar o perigo. Qualquer alteração em um dos termos envolvidos pode aumentar
ou diminuir a vulnerabilidade.
Outro exemplo desse raciocínio que pode ser aqui mencionado é a sazonalidade
anual do regime de chuvas, que pode ser fundamental no quadro da vulnerabilidade
de uma determinada área. Exemplo disso foi a grande enchente de 1983 que
ocorreu em Blumenau, alterando bruscamente a vida das pessoas dessa região,
67
aumentando drasticamente, da noite para o dia, a vulnerabilidade de um grupo de
moradores que perderam suas casas.
Assim, se a escala espacial é fundamental na compreensão das interações
espaciais e das complexas redes de relacionamento entre pessoas, lugares, regiões,
países etc., a escala temporal é igualmente imprescinvel e pode ser compreendida,
permitindo contextualizar os recursos disponíveis para responder aos perigos e à
capacidade de resiliência daquela sociedade/lugar de absorver e recuperar-se do
dano. A utilização de uma escala espaço-temporal não-alinhada pode mascarar
possibilidades de reação ou superestimar a agilidade em dar resposta ao perigo.
Outra inserção do tempo nos estudos sobre vulnerabilidade diz respeito à
postura prospectiva que eles demandam. Se, nos estudos sociológicos sobre os
desastres naturais ou nos estudos contemporâneos sobre os impactos ambientais,
prevalece um sentido paliativo ou corretivo de avaliação e de ações mitigadoras pós-
evento, pensar em termos de riscos e vulnerabilidades amplia a escala temporal.
Nessa perspectiva, a noção de risco torna-se fundamental para o desenvolvimento
do estudo da vulnerabilidade.
3.4.2 Riscos
Para Marandola e Hogan (2005), os primeiros estudos científicos envolvendo o
conceito de risco possuíam uma forte orientação objetivista, tendo como pressuposto
o entendimento da realidade como um dado, ou seja, passível de mensuração. Essa
noção de risco ainda possui grande eco em diferentes tradições de estudos.
Um marco no desenvolvimento dos estudos sobre risco é a discussão da
Sociedade de Risco, inaugurada pela sociologia em meados da década de 1980.
Essa discussão deslocou o debate de um local circunscrito no tempo e no espaço
para o âmbito das grandes transformações sociais. Contudo, permanece um hiato
entre essa análise contemporânea e os estudos anteriores, com algumas exceções
importantes e esforços preliminares de conjunção.
Os geógrafos foram os primeiros a trazer a vulnerabilidade para o debate
ambiental no contexto dos estudos sobre os riscos. O interesse dos geógrafos e dos
68
degrafos tem sido, principalmente, com preocupações mais recentes destes últimos
sobre as populações em situações de risco. Ambos passam a ocupar-se de estudos
sobre enchentes e deslizamentos, entre outras situações, em que o ambiente, aliado
a fatores socioeconômicos, expõe as populações a riscos, sobretudo nas cidades de
alta densidade.
É nesse contexto que Marandola e Hogan (2005) propõem uma aproximação
conceitual entre estes dois campos: geografia e demografia. A primeira é uma das
pioneiras em trabalhar os riscos e as vulnerabilidades em sua dimensão ambiental.
A segunda recentemente incorporou em uma parte de suas preocupações a
dimensão ambiental, mas, no entanto, tem contribuído com estudos empíricos e
preocupações comuns em um universo teórico distinto dos geógrafos. Mas ambas
alinham-se às abordagens com preocupões diretas sobre espos-tempos espeficos
e problemáticos relacionadas ao planejamento e à gestão.
Para Beck (1996), uma sociedade que concebe a si mesma como uma sociedade
do risco constitui uma sociedade que se encontra num processo de "modernização
reflexiva". A modernizão compreende, analiticamente, um estágio de desenvolvimento
no qual a sociedade passa a se ocupar com os problemas que o seu próprio desen-
volvimento acaba provocando. Este processo compreende duas fases. A primeira
refere-se a um estágio em que os efeitos e auto-ameaças são sistematicamente
produzidos, porém ainda não são questões públicas. A segunda fase diz respeito
à conversão desses problemas em questões políticas, ou seja, a dinâmica de
desenvolvimento da sociedade se torna publicamente um problema. Assim, a
modernização reflexiva constitui um efeito do aumento do conhecimento e da ciência
sobre os efeitos da própria modernização social.
Na Antropologia, o risco também representa uma tradição mais antiga de
estudos, ocupando-se principalmente da construção social do risco, de um lado, e
das estruturas e mecanismos que conferem aceitabilidade ou o ao risco no contexto
cultural, de outro (DOUGLAS; WILDAVSKY, 1982; DOUGLAS, 1985). Mas é na sociologia
ambiental e na área de população e ambiente que se pode identificar, no campo das
ciências sociais, esforços mais conscientes e sistemáticos para a abordagem da
dimeno social/cultural em conjunto com a dimeno ambiental. Nestes campos, tem
sido fundamental a compreensão de que a tensão ambiental vivida na sociedade
contemporânea não pode ser entendida apenas em sua dimeno técnica, ou seja, não
69
se pode, por exemplo, proibir as pessoas de ocuparem uma área de preservação
ambiental, sem que se lhes dê outras opções de áreas.
A problemática ambiental é reconhecida como uma das conseqüências da
dinâmica e da estrutura social, assim como outras tensões e questões relacionadas
à sociedade (LEFF, 2001; FOLADORI, 2001).
Os riscos e perigos ambientais passam a ser considerados como produtos do
sistema, intrincados na trama social e fruto da modernizão ecológica, da modernidade
tardia e de processos de segregação e desigualdade sociais. Os estudos desses
perigos sempre estiveram num contexto de planejamento, em que havia o objetivo
de não apenas entender a extensão e o dano que os perigos causariam àquelas
populações, mas também considerar perdas humanas, materiais e econômicas
iminentes. O prognóstico da probabilidade na ocorrência daqueles fenômenos era
fundamental naquele contexto.
Nesse sentido, os geógrafos desenvolveram largamente o que chamaram de
risk assessment (avaliação do risco) de ocorrer um perigo em determinado local. É
evidente que a avaliação do risco não era algo exclusivo dos geógrafos; no entanto,
eles desenvolveram metodologias específicas, abordando tanto as variáveis
ambientais quanto as respostas coletivas e individuais das populações em risco.
Nesse aspecto, destacam-se os trabalhos de Burton, Kates e White (1978). Estes
estudos são estruturados no contexto do Scientific Committee on Problems of the
Environment (Scope), importante organização científica que contribuiu muito nos
estudos sobre as relações do homem com seu ambiente, principalmente nos anos
70 e 80. Tais metodologias orientaram diversos trabalhos de análise do risco no
mundo todo, incluindo o Brasil.
Mattedi (2007a, p.7) define alguns termos para uma melhor compreensão da
avalião de riscos como sendo "a medida de danos e prejuízos potenciais, expressa
em termos de probabilidade estastica de ocorncia e de intensidade ou grandeza das
conseências posveis". Na vio de Mattedi (2007a), a perceão sobre a imporncia
e a gravidade de um risco pode ser determinada com base nos conhecimentos que
o indivíduo adquiriu durante seu desenvolvimento cultural e no juízo político e moral
do significado do nível de risco aceitável por um determinado grupo social. Por outro
lado, a percepção de risco é diretamente proporcional ao grau de desenvolvimento
70
social de um determinado grupo populacional, considerado em seus aspectos
psicológicos, éticos, culturais, econômicos, tecnológicos e políticos.
Em relão ao vel de risco aceivel, considera-se como sendo a quantidade
de risco que uma sociedade determinou como tolerável e razoável, após examinar
todas as conseqüências associadas a outros níveis alternativos. No que diz respeito
ao juízo crítico, Mattedi (2007a) afirma ser um relativo nível de risco, que exige um
elevado grau de responsabilidade política e deve levar em consideração as
conseqüências socioeconômicas de cada uma das linhas de ação alternativas, em
termos de equação custo/benefício.
Por outro lado, consideram-se como medidas iniciais de segurança aquelas
que produzem melhores resultados, a equação custo/benefício tende a aumentar, na
medida em que cresce o nível de qualidade de vida e, conseqüentemente, de exigência
das sociedades evoluídas.
Também é importante conhecer nos estudos de avalião de riscos o processo
que levou à configuração socioespacial atual. Dessa forma, compreendem-se os
perigos em potencial, os recursos e a capacidade que aquela sociedade tem para
responder, caso esses perigos se concretizem. Exemplo disso pode ser constatado
nas áreas de risco às enchentes e inundações que este trabalho irá analisar.
As pessoas que habitam essas áreas estão sujeitas a danos à integridade física,
perdas materiais e patrimoniais. Normalmente, essas áreas correspondem a núcleos
habitacionais de baixa renda (assentamentos precários), conforme mostra a Figura 4.
Figura 4 - Exemplo de área de risco de enchente e inundação
Fonte: Instituto de Pesquisas Tecnológicas IPT (2004)
71
Nesse cenário de risco de enchente atingindo a ocupão ribeirinha, conforme a
Figura 5, a seguir, há a possibilidade de ocorrência de óbitos, perdas materiais e
patrimoniais diversas como a destruão de moradias; poderão ocorrer, ainda, processos
de erosão e solapamento dos taludes marginais pelo impacto direto das águas
decorrentes da enchente; impacto destrutivo em função da energia de escoamento.
Figura 5 - Cenário de risco de enchente em ocupações ribeirinhas
Fonte: Instituto de Pesquisas Tecnológicas IPT (2004)
A tendência atual, de realizar a avaliação ambiental estratégica, reconhece a
importância de compreender os potenciais perigos e a forma como se deu a
ocupação nas áreas de risco (BURIAN, 2006). Desta relação, a vulnerabilidade pode
ser delineada, identificando-se o risco e as medidas preventivas que podem ser
tomadas para diminuí-lo ao máximo, minimizando a vulnerabilidade. Por outro lado,
é importante considerar as formas como a sociedade poderá e deverá reagir para
absorver e recuperar-se do impacto do perigo, caso este se realize.
3.4.3 Desastres
Diferenciando-se do conceito de risco, pode-se descrever desastre como sendo
a função do processo de risco resultante da combinação entre as probabilidades de
ocorrência de hazards e as condições de vulnerabilidade da comunidade. Portanto,
"o impacto o desastre vai depender das características, probabilidade e intensidade
72
do hazards, bem como da sustentabilidade dos elementos expostos, baseados
nas condições física, social, econômica e ambiental" (ISDR, 2005). Dessa forma, o
entendimento dos desastres envolve a dimensão natural e social, porém como estas
dimenes variam de contexto, os desastres convertem-se em fenômenos dinâmicos e
com alta variação do potencial de impacto. Não um consenso entre os especialistas
sobre a melhor maneira de caracterizar a combinação da forma de interação dos
fatores natural e social na ocorrência dos desastres, o que indica que a definição
dos desastres permanece uma questão aberta.
Os natural hazards, ou perigos naturais, definidos por Marandola e Hogan
(2005) como perigo, acidente, azar ou acaso, m exigido grande esfoo e apreensão
por parte de pesquisadores envolvidos com ações de planejamento e gestão e com a
relação do homem com seu ambiente. Entre esses perigos estão enchentes, desli-
zamentos, tornados, erupções vulcânicas, furacões, vendavais, granizo, geadas,
nevascas, desertificação, terremotos e assim por diante. São considerados perigos
no momento em que causam dano às populações (BURTON; KATES; WHITE, 1978;
CASTRO, 1998).
Nos estudos dos natural hazards, a principal linha de investigação entre os
geógrafos que têm trabalhado os conceitos de risco e vulnerabilidade é tanto
circunstancial, em razão da dimensão, quanto metodológico, pois esta é a área de
principal contato entre geografia e demografia neste campo, bem como é a base
teórico-metodológica da qual muitos demógrafos têm se servido para ajudar a
orientar seus trabalhos (MATTEDI; BUTZKE, 2001, p.96).
A preocupação com as alternativas futuras, imaginadas a partir do conhecimento
das raízes do risco e do contexto político e social, é um método de buscar reduzir a
incerteza sobre a gestão dos processos de produção do risco numa perspectiva
futura. Este procedimento es centrado na idéia de backcasting (cascata-abaixo) que
relaciona os perigos a uma rie de conseqüências que podem ser ou o detonados
com o evento (O'RIORDAN; TIMERMAN, 2001). A magnitude do perigo é fundamental,
pois, muitas vezes, mesmo que haja grande capacidade de resposta e de ajustamento
"sempre em alerta", a magnitude pode ser excepcionalmente elevada, tornando
ineficientes até mesmo as mais bem preparadas sociedades.
É necessário observar que nem todas as pessoas o afetadas da mesma
forma, é preciso verificar também de que formas elas são influenciadas pelos desastres.
73
As populações menos capacitadas para enfrentar os desastres, em termos de
condições econômicas, políticas e cnicas são as mais afetadas. Este processo
desencadeia um ciclo de vulnerabilidade: as populações mais carentes sofrem mais
impactos porque estão mais expostas aos riscos de desastres, e porque sofrem mais
impactos têm menor capacidade de enfrentar os desastres.
Assim, a ocorrência e a intensidade dos desastres dependem muito mais do
grau de vulnerabilidade dos cenários de desastres e das comunidades afetadas do
que da magnitude dos eventos adversos (MATTEDI, 2007b). Por exemplo,
terremotos com magnitude de 6.5 graus na escala Richter provocaram as seguintes
perdas humanas: cinco óbitos na Califórnia; 20 mil óbitos no Cairo; 40 mil óbitos na
Armênia, importando dessa forma o lugar em que esses eventos ocorreram.
Nos casos de enchentes no Brasil, existem municípios que, em função da
ocupação desordenada do solo em áreas não-edificáveis, em total desrespeito às
leis ambientais, sofrem um aumento na vulnerabilidade às enchentes, enxurradas e
aos alagamentos. Dessa forma, uma mesma quantidade de chuva em municípios
diferentes pode ter danos humanos, ambientais e materiais completamente diferentes,
em função especificamente da vulnerabilidade. A vulnerabilidade ao desastre será
menor e a sua ocorrência irá resultar em danos e prejuízos menores se medidas
preventivas são tomadas para minimizar o desastre, tais como: barragem reguladora,
obra de controle de enchentes, interligação de bacias, projeto e planos de emergência
comunitária, zoneamento de uso e ocupação do solo, sistema de monitoramento,
alerta e alarme, entre outras ações.
A partir da constatação de que os desastres podem e devem ser minimizados,
cresce a importância da mudança cultural relacionada ao senso de percepção de
risco. A percepção de risco é diretamente proporcional ao grau de desenvolvimento
social de uma determinada comunidade ou grupo populacional, considerado em
seus aspectos psicológicos, éticos, culturais, econômicos, tecnológicos e políticos.
Os desastres não podem ser examinados isoladamente, deve-se considerar
também como as populações compreendem e reagem aos desastres. Este processo
pode gerar a institucionalização do risco: perdas provocadas por desastres são
confrontadas por ações parciais que favorecem a ocupação de áreas de risco
(MATTEDI, 1999), também descrito como ciclo de desastre: desastres-dano-reparação-
desastre (TOBIN; MONTZ, 1997, p.327).
74
Os indivíduos marginalizados são incapazes de efetuar mudanças em suas
condições de vida. A combinação dos fatores sociais e naturais (desigualdades na
distribuão dos recursos, marginalizão de grupos espeficos, aumento da populão,
crescente interdependência global) que definem a vulnerabilidade. Se as caracte-
sticas físicas do evento determinam a probabilidade de ocorrência do fenômeno, as
condições sociais são as que determinam o grau do impacto. Portanto, os desastres
são parte do contexto, e os desastres se modificam quando algum elemento natural
ou social se modifica.
Segundo dados do Centre for Research on the Epidemology of Disasters
(CRED) da Universidade Católica de Louvain, na Bélgica, cerca de 255 milhões de
pessoas são afetadas anualmente por desastres, provocando a morte de
aproximadamente 58.000 pessoas. Entre os fatores que explicam a intensificação
dos impactos dos desastres nas últimas décadas estão, principalmente, a mudança
do clima global, o crescimento da população, a urbanização e a incapacidade das
populações carentes de escapar dos efeitos do processo de desenvolvimento
econômico (GUHA-SAPIR; HARGITT; HOYOIS, 2004, p.13).
Esses fenômenos explicam a causa dos desastres terem ocupado uma atenção
crescente junto à mídia por meio de reportagens e imagens que retratam a fome, a
seca, a inundação, terremotos, tsunami, erupções vulcânicas, furacões etc. O que se
nota é que a sensação de insegurança não constitui um fato isolado e não está
associada somente à questão dos desastres. Na verdade, uma das características
mais marcantes da atualidade compreende justamente a instabilidade e a proliferação
da incerteza.
É recorrente na literatura a construção de que desastres de grandes proporções
ocorrem, freqüentemente, com um período de retorno da ordem de 100 em 100 anos
(SOLOMATINE, 1988). Por isso mesmo, a opinião pública tem uma forte tendência de
esquecer o que acontece sempre que ocorre um desastre de tal magnitude.
o diversas as formas de se classificar os desastres naturais. Para Solomatine
(1987), os desastres naturais possuem a seguinte classificação: a) avalanches;
b) deslizamentos de lama; c) ciclones, furacões e tufões; d) terremotos; e) enchentes;
f) vulcões; g) tsunami; h) epidemias; i) fome; j) secas. Os desastres provocados pela
atividade humana são: a) explosões e colapsos; b) incêndios; c) acidentes industriais
de grande porte; d) contaminação do ambiente; e) conflitos civis.
75
É importante destacar aqui alguns entendimentos relacionados à enchente,
inundação e enxurrada visto que este trabalho trata de estudos de inundações e
propostas de medidas de gestão, a partir da identificação e análise de cenários de
risco ocorrentes em Curitiba:
a) enchente é causada pela elevação temporária do nível d'água em um
canal de drenagem devido ao aumento da vazão ou descarga, conforme
mostra a figura a seguir;
Figura 6 - Esquema de ocorrência de enchente
Fonte: Instituto de Pesquisas Tecnológicas IPT (2004)
b) inundação é um fenômeno de extravasamento das águas do canal de
drenagem para as áreas marginais (planície de inundação, várzea ou leito
maior do rio) quando a enchente atinge cota acima do nível máximo da
calha principal do rio, conforme mostra a Figura 7;
Figura 7 - Imagem de uma área inundada
Fonte: Instituto de Pesquisas Tecnológicas IPT (2004)
76
c) enxurrada é decorrente de concentração de água de chuva em superfície,
conforme a Figura 8. Se a ocorrência é próxima de região de fundo de vale,
tem alto poder de destruição devido à velocidade das águas dos rios.
Figura 8 - Exemplo esquemático de destruição de enxurrada em fundo
de vale
Fonte: Instituto de Pesquisas Tecnológicas IPT (2004)
Para Mattedi (2007b), o agravamento dos impactos dos desastres não está
associado somente à crescente exposição ao risco, mas também à variação da
capacidade de resposta. Esta dificuldade de interpretação diz respeito tanto à
questão da adequação do indicador empregado para determinar a ocorrência dos
desastres quanto ao grau de importância teórica que se costuma atribuir na análise
aos fatores naturais e sociais na determinação da freqüência, intensidade e
magnitude dos desastres.
77
Considerando fatores anaticos podem-se diferenciar dois tipos de abordagens
dos desastres: os estudos que caracterizam os desastres enfatizando as dimensões
físicas do evento e os estudos que enfatizam as dimensões sociais relativas ao
impacto. Os hazards (ameaças) são caracterizados como evento de dimensões
naturais dos desastres e definidos como efeitos de processo geofísicos que cercam
o mundo humano, ou seja, elementos do ambiente físico prejudiciais ao homem e
causados por forças externas. Podem ser: terremotos, deslizamentos de terra, ciclones,
inundações, secas. Os desastres podem ser classificados e ordenados de acordo
com os processos desencadeadores: meteorológicos, hidrológicos, geológicos etc.
Hewit e Burton (1971) classificam os desastres de acordo com os processos
físicos: meteorológicos, hidrológicos, geológicos etc., conforme o Quadro 2.
Quadro 2 - Classificação dos hazards por processo físico
PROCESSO FÍSICO
TIPO DE EVENTO
Meteorológicos
Furacões, tornados, avalanches e nevoeiros
Geológicos
Terremotos, vulcões e deslizamentos
Hidrológicos
Inundações, secas e incêndios
Fonte: Hewit e Burton (1971)
Esse tipo de taxonomia originou uma classificação para cada espécie de
desastres, segundo os seguintes critérios:
a) mecanismos físicos (magnitude, durão, exteno espacial): considera-se a
determinação da força mobilizada por um evento, como a velocidade do vento
durante uma tempestade, o vel da água atingido numa inundão, a energia
liberada por um terremoto etc. Em alguns desastres, estes processos físicos
são medidos diretamente, por meio de procedimentos científicos padroni-
zados, como: índices de Temperatura-Umidade, Hidrógrafos de Inundação
etc.; em outros, a medição é feita indiretamente, mediante a consideração
da intensidade, estimando variáveis humanas, como índices de destruição
provocados pelo evento. Quando se considera a duração, enquanto alguns
possuem uma escala baseada em segundos (terremotos), em outros a
escala baseia-se em anos (secas); do ponto de vista espacial, quanto
mais alta a magnitude, menor a concentração espacial do evento;
b) distribuição temporal (freqüência, sazonalidade, parâmetros diurnos): diz
respeito à freqüência e ao período de retorno (intervalo de recorrência) de
78
um determinado evento. A abordagem tradicional tem sido analisar os
registros históricos, calculando o número de ocorrências num período de
tempo específico. Mas estas técnicas têm limitações, pois não permitem
extrapolação de um caso para outro, limitando-se ao local onde os dados
foram coletados. Além disso, não podem ser aplicadas a todos os eventos,
como ciclones tropicais, tornados, nevascas, secas etc. Certos eventos
ocorrem mais freentemente em determinados períodos de tempo do ano
do que em outros: tempestades de neve e ondas de frio o fenômenos de
inverno e ocorrem em latitudes temperadas, enquanto ciclones tropicais
são eventos de verão, o que permite estabelecer uma sazonalidade;
c) distribuição espacial (localização geográfica): o terceiro fator que permite
caracterizar geofisicamente os hazards é a sua espacialidade, que pode ser
definida pelo mapeamento estabelecido e seu risco conhecido mediante
sua determinação no espaço. Ao olhar a distribuição espacial é importante
considerar a escala espacial, pois escalas de vel global e regional possuem
padrões de emergência diferente. Muitos hazards podem ser identificados
com sua localização, pois eventos geofísicos extremos não ocorrem em
muitos lugares, como é o caso de furacões, vulcões;
d) dinâmica de eclosão (rapidez do início, tempo de preparação e rapidez de
término): examinando a dinâmica de desencadeamento de um evento
podemos identificar o seu risco de incidência. Acredita-se que, em geral,
quanto mais rápida for sua ocorrência, mais inesperado o evento, portanto,
menores são as condições para a adoção de ações. Por exemplo, enquanto
tornados e terremotos ocorrem muito rapidamente e oferecem um tempo
de preparação mínimo, secas e inundações, por outro lado, possuem um
tempo de desencadeamento bem mais extenso, permitindo a implementão
de estratégias de confrontação bem mais extensas (TOBIN; MONTZ, 1997,
48-131).
Assim, acredita-se que conhecendo melhor as diferentes magnitudes, freqüências
e durações dos hazards pode-se entender melhor o comportamento humano perante os
desastres e, dessa forma, estabelecer procedimentos de prevenção, protão e resposta.
A relação entre esses fatores pode ser descrita pela aplicação desta classificação
por meio de uma comparação entre as enchentes e os terremotos. As enchentes
79
costumam ter uma ocorrência mais freqüente, um tempo de duração maior, uma
área de impacto maior, um desencadeamento maior, uma dispersão espacial mais
ampla e uma distribuão temporal mais regular que os terremotos, portanto apresentam
uma relação impacto-resposta diferente.
Comunidades que convivem com alta freqüência de eventos geram respostas
mitigativas mais efetivas que outra. Tratadas deste ponto de vista, uma seca, uma
inundação ou uma queimada pode ser interpretada como um fenômeno que ocorre
de forma independente da estrutura social. Neste caso, a atenção recai sobre as
características do agente físico desencadeador do evento, e o enfoque metodológico
situa-se no período pré-impacto, cuja análise concentra-se sobre fatores como, por
exemplo, o tipo do agente físico, as conseqüências sicas do agente, o sentido em que
o agente físico tem sido avaliado (MATTEDI, 2007b, p.11).
Baseado nas características físicas dos agentes costuma-se diferenciar os
impactos em dois grupos principais, conforme Mattedi (2007b): segundo a escala
temporal, em impactos instantâneos ou progressivos, e, segundo a escala espacial,
em impactos localizados ou difusos. Assim, do ponto de vista da teoria os hazards
existem somente porque as atividades humanas se encontram expostas a forças
naturais. Portanto, um hazard é composto por uma dimensão natural e social.
De todos os desastres naturais, são as inundações as que mais perdas têm
trazido à humanidade (não em vidas humanas, mas sim em perdas socioeconômicas)
UNDRO, 2007 (United Nations of the Disaster Relief Office Escritório das Nações Unidas
para socorro em caso de desastres). Entre os fenômenos naturais, o exatamente
as inundações as que mais possuem possibilidades de previsão: senão "quando" o
fenômeno vai ocorrer (pois o existem ainda meios eficientes de muita antecipão),
com precisão quase absoluta pode-se indicar "onde" o fenômeno vai acontecer. São
comuns a todos os tipos de desastres naturais os seguintes efeitos:
a) um significativo número de vítimas, o que reduz efetivamente a limitada
capacidade ou oferta de recursos humanos treinados das áreas afetadas;
b) uma redução na disponibilidade de habitações e de equipamentos de saúde
e educão, aumentando os déficits já existentes e anteriores ao desastre;
c) redução temporária dos grupos sociais de baixa renda, com um correspondente
aumento de taxas de desemprego e de subemprego;
80
d) interrupção temporia no fornecimento de servos de água, saneamento,
eletricidade, comunicações e transportes;
e) escassez temporária de alimentos e insumos básicos para a produção
agrícola e industrial.
As perdas econômicas e sociais impostas pelos desastres naturais são grandes.
O efeito dessas perdas sobre a economia e sobre as condições de vida na rego muitas
vezes ameaça os esforços dos governos na direção do desenvolvimento econômico.
As conseqüências dos desastres podem ser reduzidas por meio de ações preventivas
inter-relacionadas com medidas de planejamento. Esse fato é particularmente
importante para o presente estudo por se entender que o planejamento pode também
ser considerado como instrumento de prevenção.
Ultramari (2007) afirma que desastres podem ser facilmente relacionados a
fenômenos inesperados e conseqüências indesejadas. De fato, esses dois aspectos
constituem as duas características principais num conceito de desastre, seja ele em
áreas urbanas, ou explicitamente urbano, ao relacionar-se com impacto sobre infra-
estruturas físicas e socioeconômicas de cater urbano, seja em áreas de caráter rural.
Uma terceira característica parece tradicionalmente acompanhar o conceito de
desastre: a velocidade com que os danos ocorrem e impactos se confirmam. A perda
de vidas, perda material e instalações de barreiras para a continuidade da vida social e
das atividades econômicas constituem as caractesticas nimas para a confirmação
de um desastre o fato de tais eventos ocorrerem em curto espaço de tempo parece,
pois, ser secundário.
Ainda segundo Ultramari (2006), há três tipologias de classificação de desastres:
1) os imediatos e facilmente observeis como o tsunami, em 2004, e o terremoto em
2003 na cidade do México e no Irã; 2) os ironicamente lentos, na maioria das vezes
não percebíveis e pouco convincentes de suas gravidades e quase impossibilita
precisar o exato momento da perda da resiliência urbana ou mesmo, no caso de
situações de risco ambiental, qual o momento em que as externalidades se
sobrepõem aos eventuais ganhos; 3) os que se podem observar em áreas urbanas e
que se caracterizam pela repetição, parecendo mais uma imposição da natureza
contra a qual pouco se pode fazer, ou seja, um fenômeno cujos efeitos devastadores
se pode tão-somente mitigar ou mesmo desenvolver cnicas de convivência. Tal
situação de desastre implica, pois, a criação de um hábito que parece incrementar a
81
indiferença da população, porém sem garantir uma resiliência urbana capaz de criar
novas oportunidades econômicas, conforme o texto abaixo:
Anual news in the media may certainly induce international community to get
used to this phenomenon [ Recurrent monsoon floods in Southeastern
Asian], which wrongly seems to be not only inevitable but also with no
mitigations. Recurrent disasters like those of the monsoons in Asia both
the very heavy as well as the failed ones tend in fact to gain only
complacent interest. Concentration of natural and human induced disasters
in Bangladesh may also offer us a good example of a huge recurrent
disaster that looks like having no solution and no emergency action despite
the catastrophic figures they present
14
(ULTRAMARI; REZENDE, 2007).
Diante disso, têm-se os tipos de desastres que podem ocorrer em áreas
urbanas, caracterizados, primeiro, quer pelo impacto imediato e percepvel, segundo,
quer pelo impacto negativo crescente que impõe às populações, imiscuindo-se em
meio a outras demandas cotidianas e de difícil determinação a partir de que momento a
repetição que o faz parecer inelutável. O que se observa é a combinação dessas
três tipologias, dificultando o entendimento se o acidente com seus danos resultam
de femenos naturais apicos e de dicil previo, ou do resultado de uma situação
critica que se avoluma ao longo do tempo a partir de uma ação antrópica ou de uma
simples repetição, esperada, e, portanto inelutável, de desastres sazonais, como o é
a maioria dos casos de desastres (seca, inundações) que ocorrem no Brasil.
Ao considerar a questão dos desastres à luz das transformações que marcaram
a sociedade nas últimas décadas, tem-se a sensação de que a insegurança não
constitui um fato isolado e não está associada somente à questão dos desastres,
uma vez que compreende justamente a instabilidade e a proliferação da incerteza.
Assim, tomando como refencia a não de uma comunidade melhor preparada,
um desastre também pode ser definido pelo grau de desestabilização da rede
14
Tradução livre: "As notícias anuais na mídia poderiam certamente induzir a comunidade internacional a
habituar-se a esse fenômeno [enchentes recorrentes no período das monções no sudeste da Ásia]
que, erroneamente, parece ser não apenas inevitável mas também não ter mitigação. Desastres
recorrentes como esses das monções na Ásia tanto os muito graves como os que falharam
tendem, na verdade, a atrair apenas um interesse complacente. A concentração de desastres
naturais e induzidos pelo homem em Bangladesh também pode nos servir como um bom exemplo
de um enorme desastre recorrente que parece não ter solução nem qualquer ação de emergência
apesar dos números catastróficos que apresentam."
82
sociotécnica de associação simbólica e material dos elementos do mundo social e
do natural. Nesse sentido, a segurança constitui o produto da percepção do grau de
consisncia da rede, ou seja, quanto menos densa a rede, mais problemático se
torna o processamento do desastre. Isso significa que quanto mais estável uma rede
menos ameaçada se torna uma comunidade, ou seja, quanto mais uma comunidade
se conhece, mais ela consegue gerir as ameaças.
A tarefa da psicologia para a construção de comunidades mais seguras
constitui o somente explicar e intervir nos efeitos que a desestabilização provoca no
comportamento individual ou na condição mental dos indivíduos, mas, sobretudo, revelar
os mecanismos por meio do quais os indivíduos aderem às redes sociotécnicas.
Segundo Mattedi (2007a), a contribuição da psicologia para a construção de
comunidades mais seguras consiste na realizão de pesquisas sobre o comportamento
individual nos períodos p, trans e pós-impactos, bem como na capacidade de aplicão
na preparação e na recuperação de comunidades impactadas.
Em situações de desastres, teme-se não pelas condições de vida das pessoas
conhecidas, mas também pelas casas, pela memória, pela perda de documentos,
fotos, registros familiares, e quando os desastres desestabilizam as condições de
subsistência da comunidade, teme-se pelas ligações sociais e culturais que se
integram ao grupo. Quando essas reações do choque imediato se dissipam, surgem
os efeitos de longo prazo, pois os desastres destroem a crença de que o mundo no
qual se vive é conhecido e controlável, tornando-se conscientes da vulnerabilidade
(MATTEDI, 2007b, p.1).
Nesse período, a experncia acumulada indica uma variedade muito similar de
distúrbios emocionais como, por exemplo, medo crônico, depressão, ansiedade,
sentimento de culpa, e outros, envolvendo não somente as "vítimas primárias", mas
também as "vítimas indiretas", o que pode dificultar a reconstrução de suas vidas.
Para Mattedi (2007a), a insegurança constitui uma das características mais
marcantes do mundo em que se vive. É por isso que noções como desastres, hazards,
catástrofes, riscos, vulnerabilidade tornaram-se centrais para entender os aconteci-
mentos dos dias atuais. O conjunto de informações produzidas e sistematizadas nos
estudos sobre desastres permite desenvolver dispositivos materiais e subjetivos
para confrontar desastres. Historicamente a forma como os desastres foram sendo
83
representados permite avaliar o significado do interesse público pelo tema da seguraa
na atualidade.
Nas sociedades pré-industriais, a insegurança era explicada sob a forma de
"perigos naturais" (tremores de terra, erupções vulcânica, inundações, secas etc.), e
sua ocorrência era atribuída a forças externas à sociedade. Na sociedade industrial,
as representações das origens, conseqüências e características dos desastres
mudaram, passando a depender de forças sociais.
Portanto, na sociedade moderna, as causas das ameaças podem ser identifi-
cadas e suas probabilidades calculadas em termos estasticos, o que torna a sociedade
responsável pelos impactos. As múltiplas dimensões do processo de construção do
risco, como, por exemplo, a deteriorização ambiental e o aumento da pobreza,
demonstram que o agravamento dos desastres está intimamente relacionado aos
processos de desenvolvimento socioeconômico. A dificuldade de atuar sobre os
desastres esnas formas de caracterização e interpretão do femeno, e também
na priorização nas agendas políticas, econômicas e sociais de cada comunidade.
Nos últimos anos, observa-se uma modificação nas formas de compreensão
do fenômeno dos desastres e das estratégias de prevenção, o que vem redefinindo
o papel do estado e a sociedade na confrontação dos desastres.
De acordo com Mattedi (2007b), é neste novo conceito anatico que os desastres
têm sido interpretados em termos de efeitos dos processos de desestabilização das
redes sociotécnicas que formam e mantêm comunidades. Sob este ponto de vista,
comunidades podem ser definidas como redes sociotécnicas que estabilizam as
associações simbólicas e materiais, mantendo unidos os elementos que compõem o
mundo natural. Esses dispositivos sociotécnicos podem ser muito valiosos leis,
equipamentos, sistemas de comunicão, energia ou alimentão, vias de transporte,
acervos artísticos etc. e também podem assumir vários significados, criando as
condições por meio dos quais os indivíduos representam e manipulam, ou constroem
e reconstroem o mundo em que vivem.
Contudo, as comunidades não podem ser consideradas como um simples
agrupamento das ações e percepções individuais, porque cada ator constitui, ao
mesmo tempo, um ator e uma rede que cria e recria sua própria estabilidade. Assim,
embora uma comunidade possa reconhecer o grau de vulnerabilidade de sua rede
de sustentação em termos dos fatores de risco e variações sociais e espaciais dos
84
eventuais impactos e identificar estratégias de proteção, nem sempre estas medidas
podem ser compreendidas e implementadas, porque dependem das condições por
meio das quais cada ator traduz o problema.
Para Mattedi (2007b) a combinação característica de cada rede gera
constrangimentos e oportunidades contínuos de resposta e ajustamento e, com isso,
cada modificação afeta ao mesmo tempo os atores e as redes que eles próprios
formam. Como cada comunidade é composta por entidades que atuam, simulta-
neamente, tanto atores quanto como redes, as identidades deles são veis. Para
coordenar suas ações, cada ator-rede põe em operação estratégias de simplificação
e justaposição de papéis.
Assim, do ponto de vista de uma comunidade, tem-se o exemplo do Corpo de
Bombeiros que compreende, ao mesmo tempo, um ator que se relaciona com outros
atores como os hospitais, a polícia militar, a defesa civil, a prefeitura, as indústrias,
os moradores de um bairro etc., mas também é uma rede que pode ser formada por
outros atores.
As comunidades que são formadas por redes diferentes não somente estabi-
lizam a associação entre o natural e o social de forma diferente, mas se autodefinem
de forma diferente. As comunidades se distinguem tanto pelo tipo de atores quanto
pelo padrão de relações que estabelecem entre si. Este padrão constitui o resultado
da forma como cada ator traduz e se converte em porta voz de outras entidades.
Quanto mais interesses são mobilizados em torno da atuação de um ator,
mais decisivo ele se converte na manutenção da rede, reduzindo a complexidade e
tornando-se um ponto de passagem obrigatório para os demais atores.
Assim, a insegurança pode ser considerada uma função do grau de confiança
na estabilidade da rede que mantém unidos os elementos sociais e naturais. Por
exemplo, a ocupação do leito secundário de um rio estabelece uma associação
entre o natural e social, porém a ocorrência de uma inundação redefine os termos
como os indivíduos e a comunidade traduzem as dimensões naturais e sociais na
rede sociotécnica. A forma como o natural foi associado ao social e o social foi
associado ao natural, por meio de uma leitura técnico-científica que estabiliza a vida
do indivíduo naquela região, passa a ser visto de uma outra forma.
Para Mattedi (2007a), o comportamento e o estado mental dos indivíduos em
situações de emergência variam segundo a consistência da rede. Isso significa que
85
a capacidade de reação e processamento vai depender da capacidade de avaliar a
consisncia da rede, o que envolve, entre outros fatores, a perceão dos pontos de
instabilidade da rede, nível de preparação, habilidade para conviver com a incerteza
e experiência prévia etc. Em outras palavras, o comportamento constitui o resultado de
como cada comunidade percebe e administra as ameas de desestabilizão da rede.
Portanto, quanto mais uma comunidade confia na estabilidade de sua própria
rede, menor o impacto gerado pelo seu poder e desarticulação da rede. Assim, as
comunidades diferenciam-se não pela capacidade de absorção dos impactos, mas
pelo grau de desconfiança que conseguem alimentar a respeito dos dispositivos que
mantêm unido o mundo social e o natural.
Assim, a percepção, preparação e preveão compreendem tornar os membros
constituintes da rede conscientes da instabilidade das associações que eles mesmos
produzem e reproduzem. Diante disso, pode-se dizer que a diferença entre atores
que conseguem absorver os impactos de dissolução da rede e atores para o qual a
não se aceita a dissolução da rede está associada ao grau de desconfiança que eles
nutrem a respeito da estabilidade da rede. Quanto mais um ator se mostra aderente à
rede sociotécnica, mais vulnerável ele se encontra para a desestabilização da rede.
Como conclusão, pode-se dizer que esses referenciais teóricos deram o
suporte técnico para compreender o processo de urbanização e a consideração de
se integrar a análise do espaço com as lutas sociais e os processos políticos.
Permitiu também entender os instrumentos do Planejamento Urbano e sua
importância na organização e gestão de uma cidade.
A abordagem dos conceitos sobre GPUs mais relacionados com as interveões
do peodo desenvolvimentista e sanitarista do começo do século no Brasil evidenciou a
atuação dos urbanistas brasileiros desde o início do século. Outro conceito abordado
com relação à fenomenologia dos acidentes naturais, riscos e vulnerabilidade
socioambiental mostrou a importância em considerar simultaneamente o conceito
de Risco em sua dimensão ambiental e no contexto socioeconômico, bem como
considerar a relação a desastres com a sua ocorrência e intensidade nas comuni-
dades afetadas.
Esses conceitos permitiram embasar a análise do Estudo de Caso que
constitui o próximo passo deste trabalho.
86
4 ESTUDO DE CASO
Para debater a hipótese deste trabalho, optou-se por fazer um estudo de caso
sobre o GPU do Canal Extravasor, cuja obra de infra-estrutura tem por finalidade a
contenção das cheias das bacias do Alto Iguaçu e do Belém, evitando enchentes a
jusante da BR-277. Nesta área, uma grande inundação ocorrida ao longo do rio
Iguaçu em 1995, acredita-se, acelerou a tomada de decisões para a internalização
de recursos e liberação ambiental da construção do referido Canal Extravasor; esta
é a hipótese com que se trabalha nesta dissertação. Do mesmo modo que a
situação de risco teria acelerado a implantação das obras do Canal, poderia também
ter permitido alguns eventos adversos ao projeto. Para analisar os eventos adversos
fez-se um recorte numa ocupação conhecida como Bolsão Audi em Curitiba por onde
passa o Canal. Com essas situações acredita-se na singularidade do fenômeno
selecionado e na sua capacidade de confirmar ou refutar a hipótese aqui lançada.
A implantação do Canal Extravasor será contextualizada na formação de
Região Metropolitana de Curitiba (RMC), uma vez que abrange o território de quatro
municípios e se justifica a partir de uma tipologia de ocupação periférica, excludente
e nas franjas de um município pólo.
A seguir, faz-se necessário apresentar algumas características que compõem
a Região Metropolitana de Curitiba (RMC), para melhor compreensão das relações
entre os meios natural e antrópico da área de estudo. A interdisciplinaridade no
entendimento destes temas é condição fundamental para que se possa relacionar a
ocorrência de fenômenos naturais com ações e procedimentos de gestão uma
vez que este trabalho contextualiza a construção do GPU Canal Extravasor, cuja
abrangência envolve municípios da RMC.
87
4.1 CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO
4.1.1 Região Metropolitana de Curitiba
Localizada no Primeiro Planalto Paranaense, a RMC é composta por 26
municípios, ocupando cerca de 15.000 km² e abrigando pouco mais de 3 milhões de
habitantes (IBGE, 2007).
Localizando-se na região leste do Estado do Paraná, a RMC inclui, ao norte,
as cabeceiras do rio Ribeira, pertencente à bacia do Alto Ribeira, a represa do rio
Capivari e a área da futura represa do rio Açungui, estendendo-se até a divisa com o
estado de São Paulo; ao sul, faz divisa com o estado de Santa Catarina; a leste,
bordeja as nascentes do rio Iguu junto à serra do Mar; e a oeste faz divisa com os
Munipios que pertencem ao segundo planalto paranaense, conforme Figura 9.
Figura 9 - Localização da RMC no Estado do Paraná
Fonte: COMEC, IPPUC
Elaboração: IPPUC - Banco de Dados - 2005
88
O relevo da RMC, segundo a COMEC (2002), define-se, ao norte, pelas altas
declividades e pelos terrenos dobrados, ao passo que o sul é constituído, em sua
maior extensão, por uma topografia ondulada, de colinas arredondadas. Nas vertentes
ocidentais da Serra do Mar, ao leste, observam-se as maiores altitudes da região,
entre 1.200 e 1.400m, e no sentido sudoeste destaca-se a escarpa Devoniana.
No âmbito de suas principais fisionomias vegetais, a RMC se caracteriza pela
presença da Floresta Atlântica, associada ao relevo montanhoso da Serra do Mar;
da Floresta de Pinheirais, típica dos planaltos meridionais e que também possui
componentes de origem atlântica; e das Várzeas do Iguaçu, cuja biota está relacionada
a eventos geológicos recentes. Atualmente, 15% da área da RMC é coberta por
remanescentes florestais e, dos ecossistemas originais, cerca de 2% é preservada
pelos 22 instrumentos de proteção da biota implantados na RMC (Parques, APAs
Áreas de Proteção Ambiental, APPs Áreas de Preservação Permanente, UTPs
Unidades Territoriais de Planejamento etc.).
As condicionantes físico-ambientais que conformam o espaço territorial da
RMC estão fortemente associadas às duas grandes linhas divisórias que separam os
usos antrópicos intensivos das demais áreas da RMC.
A primeira linha é no sentido N-SE, que bordeja o primeiro planalto e demarca
a Serra do Mar a leste e a segunda linha refere-se ao sentido NE-O, que marca a
transão da escarpa devoniana e das altas declividades a oeste e ao norte. Os lados
externos de ambas as linhas são consideradas áreas de grande vulnerabilidade e
fragilidade ambiental, não sendo aptas à ocupação. Porém é justamente na porção
leste da RMC que se concentram os problemas de ocupações irregulares.
O relevo da região NE-O, sendo bastante irregular (principalmente nos munipios
de Doutor Ulysses e Adrianópolis), conta, ainda, com extensões de remanescentes
florestais, áreas de mananciais e com as Áreas de Proteção Ambiental (APAs) do
Passaúna e do Verde, condições estas limitantes para a ocupação urbana.
Na região N-SE, da mesma forma, inserem-se várias APAs (APA do Iraí, do
Pequeno e do Piraquara) coincidentes com os mananciais de abastecimento público
e, ainda, com grandes remanescentes da Floresta Atlântica, notadamente a leste
dos municípios de São Jo dos Pinhais, Piraquara, Quatro Barras, Campina Grande
do Sul e Bocaiúva do Sul.
89
Os recursos hídricos também condicionam a evolução do uso e da ocupação
dos territórios da RMC, havendo forte relação da metrópole com as águas superficiais,
para a finalidade de abastecimento público, geração de energia e usos diversos.
Por situar-se na posição da linha divisória das águas superficiais da bacia do
Prata e da bacia do Atlântico, a RMC não apresenta rios caudalosos na sua área
mais urbanizada, exceção feita ao rio Iguaçu.
Na RMC, o processo de ocupão se consolidou nas áreas internas em relação
às linhas limítrofes. Não obstante, esta área abriga uma série de fragilidades naturais,
como a nascente do Rio Iguaçu que, juntamente com seus afluentes, está assentado
nas áreas planas da Formação Geológica Guabirotuba e Embasamento Cristalino,
compondo várzeas que, associadas à biota, atualmente se encontram comprometidas
com a urbanização.
Se as especificidades físico-ambientais, limitam o processo atual de ocupação
da RMC, no passado atraíram exploradores em função do potencial de exploração
mineral (região aurífera), sendo responsável pelo crescimento urbano e populacional
no final do século XVII.
A evolução histórica da RMC demonstra que a população cresceu mais de
200 vezes em pouco menos de 200 anos, saltando de 12.000 habitantes em 1802
época com a RMC composta de Curitiba, São Jodos Pinhais e Lapa) para os
atuais 3.166.273 de habitantes no ano 2007 (IPPUC, 2008).
Embora o aumento da taxa de urbanizão na RMC tenha sido mais expressivo
nas décadas de 1960 e 1970, esta nunca decresceu, chegando, no ano 2000, a
91,2%, da população residindo na área urbana metropolitana. Este fenômeno está
relacionado ao referido adensamento do município-lo e à conurbação metropolitana
principalmente a leste da RMC, destacando-se o município de São Jodos Pinhais,
em função de seu pólo automotivo.
A RMC justifica sua inserção entre os núcleos dinâmicos de produtividade,
basicamente, por meio de três grandes eixos de transformações estruturais: o
crescimento e transformações na estrutura da instria; expano do setor de serviços;
e o desenvolvimento da área de Ciência, Tecnologia e Inovação. Isso também
acontece no leste, ou seja, a pressão nessa área é grande em face da localização
do aeroporto e o porto de Paranaguá para escoamento da produção.
90
Entretanto, a evolução do crescimento populacional da RMC, aliada ao aumento
histórico das taxas de urbanização, não foi acompanhada no mesmo ritmo da
provio de emprego e de infra-estrutura para as áreas periféricas, tampouco do pleno
atendimento com servos blicos de qualidade, gerando problemas e espacializando
as desigualdades sociais, hoje generalizadas.
A RMC se configura como um espaço absolutamente heterogêneo, sob vários
aspectos inerentes à caracterização de uma região metropolitana, sendo o território
regional subdividido, com base em IPEA, IBGE e NESUR (1999), em três categorias
espaciais:
a) cleo urbano central, formado pelo conjunto da malha urbana de Curitiba,
áreas conurbadas e municípios com forte interão com o pólo metropolitano:
Almirante Tamandaré, Araucária, Campina Grande do Sul, Campo Largo,
Campo Magro, Colombo, Fazenda Rio Grande, Pinhais, Piraquara, Quatro
Barras e São José dos Pinhais;
b) primeiro anel metropolitano, composto pelo território dos municípios não-
limítrofes a Curitiba, mas fortemente polarizados por ela, caracterizando o
processo de inserção regional, são eles: Balsa Nova, Bocaiúva do Sul,
Contenda, Itaperuçu, Mandirituba, Rio Branco do Sul e Tunas do Paraná;
c) segundo anel metropolitano, estruturado por áreas recentemente incor-
poradas a RMC, com forte característica de atividade na área rural e com
incipiente configuração urbana, constando dos seguintes municípios:
Adrianópolis, Agudos do Sul, Cerro Azul, Doutor Ulysses, Lapa, Quitandinha
e Tijucas do Sul.
O processo de ocupação da RMC deu-se de forma desordenada. Como não
havia dispositivos legais que orientassem a elaborão dos projetos de parcelamento
do solo e que fornecessem diretrizes de regulamentação do uso e ocupação do
território, estas decisões ficavam invariavelmente atreladas à vontade políticas dos
governantes municipais (HARDT; HARDT; REZENDE, 2007, p.3).
A despeito da adão de mecanismos de proteção legal-institucionais, sobretudo
adotados a partir dos anos 70, as áreas ambientalmente frágeis estavam
comprometidas com uma ocupão inadequada e caracterizadas por graves problemas
de degradação ambiental e de carências sociourbanas. A partir dos anos 80, um
novo processo de ocupação se inicia na RMC, o das invasões, justificado seja pela
91
crescente migração de uma população sem recursos, seja pelo modelo excludente
de apropriação do solo urbano em áreas adequadas à habitação, seja pela liderança
de pessoas com interesses políticos. Assim, ainda que consciente da demanda não-
solvível de uma população que empobrecia, o planejamento regional igualmente
acreditava na necessidade inconteste de fiscalização, monitoração, informação e
conscientização relativamente à ocupação de áreas frágeis.
Segundo Ultramari (2005, p.43), a complexidade ao se tratar do fator urbano-
metropolitano pode ser resumida pelos seguintes fatos:
a) empobrecimento da população;
b) crescimento demográfico;
c) processo político que deixa de ser centralizado e passa a ser descen-
tralizado e participativo. Ocorre o em nível de decisão por parte da
comunidade ou mesmo iniciado por uma prática de abertura do governo
ao diálogo, mas sim em virtude de pressões de grupos organizados no
tocante a questões pontuais e de um aparato de legislação superior que
permite essa participação;
d) nova postura das agências de financiamento que incorporam positiva e
negativamente o processo de participação.
A dificuldade em controlar o processo de ocupação do território foi sendo
gradualmente solucionada com as aprovações dos planos municipais de estruturação
urbana e ações similares. A aprovação da Lei Federal n.
o
6.766, de 1972
15
(Lei
Lehmann), apesar de algumas falhas técnicas, possibilitou um melhor monitoramento
sobre o processo de parcelamento, ao exigir o estatuto da "anuência prévia" para
qualquer projeto de parcelamento do solo para fins urbanos. Com essa medida, havia
uma instância adicional às prefeituras que, mesmo não tendo o poder de "aprovar"
os projetos, deveria necessariamente se manifestar sobre eles, favoravelmente ou o.
Uma vez identificada qualquer irregularidade em relação à legislação pertinente,
inclusive de cunho municipal, a anuência era negada, interrompendo o processo,
sem o desgaste político direto do prefeito. Os mananciais hídricos foram os primeiros
15
Alterada pela Lei de responsabilidade territorial, Lei n.
o
3.057/00 e atualmente está sob a análise
da Comissão especial da Câmara dos Deputados.
92
espaços a serem protegidos, uma vez que, além de serem destinados ao abasteci-
mento público, eram insalubres e sujeitos a inundações periódicas.
O Decreto Estadual n.
o
2.964 de 1980, que versa sobre os mananciais, vinculava
os investimentos públicos nas áreas delimitadas como prioritárias ao abastecimento
blico à anncia do órgão metropolitano, porém não conseguiu impedir a ocupação
de toda a área.
As áreas de mananciais, em especial os territórios dos munipios de Piraquara e
Pinhais, a leste, foram ocupados a partir da década de 1990. Não apenas em suas
porções legalmente parceladas, mas também naquelas sujeitas ao processo
descontrolado de ocupação espontânea, inviabilizando qualquer ação pública no
sentido de ordenamento ou minimização e seus efeitos sobre a qualidade ambiental
e, principalmente, hídrica desses mananciais.
Outra lei importante para a RMC foi com relação ao "ICMS Ecológico", objeto
da Lei Complementar Estadual n.
o
59, de 1991 Lei dos Royalties Ecológicos ,
regulamentada pelos decretos n.
o
974/91 e n.
o
2.791/96, e que destina 5% dos 25%
da arrecadação do ICMS destinado ao Fundo de Participação dos Municípios (FPM),
que é redistribuído entre os municípios de acordo com índice calculado pelo Instituto
Ambiental do Paraná (IAP), que leva em conta parâmetros que consideram desde a
extensão das áreas legalmente protegidas até os resultados comparativos da qualidade
de água dos mananciais entre o ano anterior e o atual, ou seja, se houve melhoria
qualitativa ou não no período considerado.
Dessa forma, os municípios têm o instrumento legal para proteger as
unidades de conservação ambientais ou mananciais hídricos de abastecimento
público destinados a terceiros municípios. O Paraná foi pioneiro na adoção dessa
medida, que representou, para alguns municípios, importante elevação de receita,
mitigando, de certa forma, a redução da atividade produtiva em seu território. Na
RMC, sempre houve discussões sobre o ônus dos municípios que têm importantes
parcelas de seus territórios inseridos em bacias hidrográficas de mananciais
destinados ao consumo regional e que, por isso, possuem limitações no uso do solo.
Os municípios do Compartimento Leste Regional são os mais afetados por essa
medida legal. Piraquara foi o mais beneficiado tendo um acréscimo no seu repasse
de ICMS da ordem de 99% em média. Esta lei demonstra a importância de cooperação
interinstitucional em queses relacionadas ao uso e à ocupão, com forte conotão
93
de protão ambiental, pois sua elaboração foi resultado de estudo conjunto entre
vários órgãos estaduais e as prefeituras municipais envolvidas.
Excetuando-se parques municipais e Reservas Particulares do Patrimônio
Natural (RPPNs), cabe destacar outros instrumentos legais de proteção ambiental da
RMC, notadamente voltados à biota regional, tais como parques e florestas estaduais,
além de Áreas de Proteção Ambiental (APAs), com vários destes espaços protegidos
integrando o Compartimento Leste Regional. Destaca-se também a Lei Federal
n.
o
9.985 de 2000, que institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da
Natureza. Estabelece critérios e normas para a criação, implantação e gestão do
espaço territorial e seus recursos ambientais com características naturais relevantes
(unidades de conservação).
As Unidades Territoriais de Planejamento (UTPs) regulamentadas pelo Inciso II
do Artigo 2.
o
da Lei Estadual n.
o
12.248, de 1998, trata da criação do Sistema
Integrado de Gestão e Proteção dos Mananciais da RMC que é composto pelas sub-
bacias contribuintes de interesse da Região Metropolitana. O objetivo é assegurar
condições ambientais adequadas à preservação dos mananciais, mediante a
preservação e recuperação do ambiente natural e antrópico e efetivo controle de
processos de degradação e de poluição. Podem ser citadas as UTPs de Campo
Magro, Pinhais, Guarituba, Itaqui e Quatro Barras, todas, à exceção da primeira,
integrantes do Compartimento Leste Regional.
Há também as Áreas Especiais de Interesse Tustico (AEITs) definidas, segundo
Comec (2002), por trechos contínuos do território a serem preservados e valorizados no
sentido cultural e natural, sendo destinadas à realização de planos e projetos de
desenvolvimento turístico. Outra área protegida é a Serra do Mar, com a instituição
da AEIT do Marumbi por meio da Lei Estadual n.
o
7.919, de 1984, e regulamentada
pelo Decreto Estadual n.
o
5.308, de 1985. A maior parte das áreas de proteção da
biota na RMC está concentrada no Compartimento Leste Regional, tanto na região
da Serra do Mar, pela necessidade de proteção de importantes remanescentes da
Floresta Ombrófila Densa (Floresta Atlântica), quanto para proteção das áreas de
mananciais hídricos de abastecimento público metropolitano.
Nesse contexto metropolitano, vale ressaltar a importância do compartimento
cortado pelo aqui discutido Canal Extravasor na produção hídrica para atendimento
à população da RMC. Considerado, pois um importante manancial de captação, este
94
foi parcialmente abrangido pela criação de uma Área de Proteção Ambiental (APA)
do Iguaçu. O Decreto Municipal n.
o
174/2008 regulamenta o artigo 5.
o
inciso IX da
Lei n.
o
9.800/2000 no que diz respeito à APA do Iguaçu, Parque Municipal do Iguaçu.
Tem o objetivo de garantir a preservação, conservação, melhoria e recuperação da
qualidade ambiental da bacia do rio Iguaçu contida no município de Curitiba.
O uso adequado das várzeas do rio Iguaçu, o formador da principal bacia
hidrográfica do Estado, possui sua nascente na região Metropolitana de Curitiba,
constitui-se no principal manancial de abastecimento público de água potável,
garantindo não a qualidade de vida da população de Curitiba, como também a
qualidade dos recursos naturais. A região atravessada por esse rio concentra um
elevado número populacional e um conjunto de atividades econômicas de grande
expressão. Além de desempenhar um papel fundamental no abastecimento de água
para consumo agrícola, industrial e humano, o Iguaçu também é importante para o
saneamento das áreas urbanas, entre outras funções igualmente relevantes de
natureza ecológica e social.
O rio Iguaçu, principal curso fluvial do estado do Paraná, tem 910 km de
extensão. O seu percurso começa na Região Metropolitana de Curitiba e se estende
até Foz do Iguaçu, quando se encontra com o rio Paraná. Ao longo do seu percurso, o
rio Iguaçu recebe uma quantidade considerável de afluentes, sendo 61 rios na
margem direita e 42 rios na margem esquerda, cruzando importantes regiões do estado
do Paraná, portanto passando pelo Primeiro, Segundo e Terceiro Planaltos.
Segundo Maack (1981, p.355), "o rio Iguaçu abrange a maior bacia hidrogfica
do estado do Para, totalizando 79.799km
2
, sendo que cerca de 57.329 km
2
dentro do
estado do Paraná até o município de União da Viria e aproximadamente 13.470 km
2
no lado catarinense". A ocupação desordenada das várzeas tem propiciado não só a
degradação dos recursos hídricos, como também tem colocado a população que as
ocupa à merde enchentes que ocorrem nos períodos de muita chuvas, e de doeas
devido às condições desfavoráveis de higiene em que vive essa população.
A legislação existente, de âmbito Municipal, Estadual e Federal, às vezes é falha,
ou na maioria das vezes não é cumprida e nem fiscalizada, principalmente na área que
se refere à preservação das faixas ao longo das margens dos rios, não fugindo à
regra o rio Iguaçu. Outro problema a ser enfocado vem ser a vocação de uma
grande parte do rio Iguaçu para a exploração de areia, destinada para a construção
95
civil. Hoje essas reservas de areia já estão bastante prejudicadas, o que vem
comprometendo a paisagem e principalmente degradando a qualidade ambiental do
rio Iguaçu.
A exemplo do que ocorre no Brasil, em geral, o processo de ocupação e uso
das margens do rio Iguaçu vem sendo feito sem os necesrios cuidados ambientais.
As matas ciliares foram extensamente desmatadas. A constrão de infra-estrutura
viária e outras obras urbanas que envolvem a terraplenagem e o manejo de
grandes volumes de terra, o uso de biocidas e fertilizantes químicos, o lançamento
de esgotos e reduos sem o devido tratamento, todas essas atividades vêm causando
o assoreamento, a poluição e a degradãosica, biológica e paisagística do rio Iguaçu.
Está sendo proposta uma lei no Congresso Nacional que cria a Área de
Proteção Ambiental do rio Iguaçu (APA do Iguaçu), com o propósito de assegurar o
controle do processo de uso e ocupação das margens do rio Iguaçu, benefícios para
qualidade de vida da população da região, aliando a conservação da biodiversidade
e dos recursos hídricos à proteção contra enchentes e à oferta de áreas de lazer,
além de valorizar a paisagem urbana. Com esta APA, espera-se que sejam evitados os
mencionados problemas que costumam acometer os fundos de vales, quando o
crescimento urbano acontece sem as devidas salvaguardas ambientais. Além de
proteger importantes remanescentes florestais e outras formas de vegetação nativa
típicos da região e que tem grande importância no contexto nacional, a APA do rio
Iguaçu também denominada "Corredor da Vida" vai funcionar como um corredor
ecológico. Além de integrar os ecossistemas da Serra do Mar até as florestas do
Parque Nacional do Iguaçu e outras áreas protegidas nos países vizinhos da
Argentina e do Paraguai, facilitará o fluxo gênico e aumentará as possibilidades de
sobrevivência de muitas espécies hoje ameaçadas ou já extintas regionalmente.
No nível municipal, em abril de 2000 foi criado pelo Decreto Municipal
n.
o
192/2000 a Área de Proteção Ambiental do Iguaçu (APA) com o objetivo de
garantir a preservação, conservação, melhoria e recuperação da qualidade ambiental
da bacia do rio Iguaçu contida no Município de Curitiba. A APA do Iguaçu situa-se a
leste e sul do Município de Curitiba, à margem direita do rio Iguaçu e Atuba. A APA
do Iguaçu é definida pelas seguintes áreas e setores:
a) área de preservação permanente (APP) consiste em áreas a preservar
ou recuperar, de forma a propiciar a regeneração natural da cobertura
96
vegetal, possibilitar o estabelecimento natural e o deslocamento da fauna
local, assim como de proteger os cursos d'água, e compreende as faixas
marginais mínimas de 100m (cem metros) ao longo do rio Iguaçu e 50m
(cinqüenta metros) de seus meandros, as faixas marginais de 30m (trinta
metros) ao longo do rio Atuba e dos demais cursos d'água e as manchas
de cobertura vegetal que extrapolem as larguras estabelecidas para as
faixas marginais quando da existência de áreas cadastradas no Setor
Especial de Áreas Verdes, as quais terão ocupação segundo a Lei
n.
o
9.806/00 e o uso somente residencial unifamiliar;
b) setor de alta restrição de uso consiste em áreas com pequena interferência
humana, contendo ecossistemas únicos, espécies de flora e fauna de
relevante interesse ecogico, seus hábitats, bem como os entornos próximos,
onde as normas de uso e ocupação do solo são definidas pelo decreto;
c) setor de média restrição de uso compreende áreas tradicionalmente
utilizadas com agricultura, pecuária e extração mineral, onde as normas
de uso e ocupação do solo são as definidas pelo decreto;
d) setor de transição consiste em áreas com loteamentos residenciais
aprovados anteriormente à implantação da APA e áreas ocupadas irregu-
larmente, passíveis de regularização fundiária, com os parâmetros de uso
e ocupação do solo estabelecidos no decreto;
e) setor de uso esportivo consiste em área destinada a fins recreacionais,
culturais e esportivos com os parâmetros de uso e ocupação do solo
estabelecido no decreto;
f) parque municipal do Iguaçu compreende as propriedades municipais
hoje utilizados para fins de preservão, educação ambiental, recreão,
cultura e esporte, bem como as propriedades particulares situadas dentro
dos limites indicados no decreto;
g) setor de serviços compreende os terrenos com testada para a BR-116
entre as ruas Ângela Gabardo Parolin e Jo lio Tortato, limitados a uma
profundidade de 100m (cem metros), contados a partir do alinhamento
predial da BR-116, onde as normas de uso e ocupação do solo são
constantes no decreto.
97
Apesar dos mecanismos de proteção legal-institucional, essas áreas continuam
tendo problemas de depredação e degradação ambiental, quer pela falta de informação
das pessoas, quer pela falta de recursos financeiros para morar em locais com
urbanização adequadas, quer pela atuação de convencimento de grupos movidos por
idealismos políticos, muitas vezes acabam invadindo e ocupando essas áreas sem
noção do verdadeiro motivo. Ações como fiscalização, monitoração, informação e
conscientização devem ser incorporadas às medidas de proteção dessas áreas
frágeis.
Ao mesmo tempo em que se procura entender os motivos da migração das
populões, com destaque para a modernizão do campo com a mecanizão agcola,
se observa que o problema não é somente da quantidade de pessoas, mas também
onde elas se instalam e os motivos daqueles que não voltam, transformando-se em
algo irreversível.
Segundo Guattari (2002, p.47), o que está em questão a maneira de viver
daqui em diante neste planeta, sob a ótica de um suporte natural que se deteriora e
se esgota". Para Ultramari (2005), atualmente, grandes áreas são disputadas não
mais entre o especulador imobiliário e a população, a disputa ocorre entre essa
população e a defesa necessária de proteção (no caso, mananciais de produção hídrica
ou de cobertura florestal), visando a sua conservação.
As mudanças na ptica da gestão urbana sugerem, portanto, que se discutam a
preocupação com a sustentabilidade ambiental e a sustentabilidade social, surgindo
dessa forma o conceito de "sustentabilidade ampliada". Conforme Novaes (2000),
esse conceito promove o encontro político entre a agenda ambiental e a social, isto
é, não se pode dissociar a necessidade de enfrentar a degradação do meio
ambiente do problema da pobreza mundial.
Ultramari (2005) considera que os espaços naturais que existem nas cidades
são artificializados, a defesa de sua conservação ou preservação deve fundamentar-
se no atendimento aos padrões mínimos de habitabilidade. As ocupações de fundo
de vale teriam, por exemplo, sua conservação e preservação justificadas antes pelos
riscos ambientais aos moradores que se instalam, e pela redução do volume e da
qualidade da água para uso público decorrente de sua poluição e de incrementos na
taxa de impermeabilização do que pela preocupação moral de manter ambientes
naturais. Do ponto de vista ambiental, a cidade é, ou potencialmente pode vir a ser,
98
o espaço de assentamento humano com as maiores chances de contribuir para a
sustentabilidade ambiental. Perlman (1991, p.61) é uma das autoras que acreditam
nessa potencialidade das cidades:
Não só mais oportunidades na cidade, como quanto maior o tamanho
desta, maior a oportunidade. Evidência empírica tem indicado que as cidades
produzem mais e que nos países menos desenvolvidos as cidades de maior
porte tendem a ser relativamente mais produtivas.
Agregam-se nessas duas posições conceituais uma visão otimista e uma
preocupão prioriria com o atendimento das demandas urbanas, sempre acreditando
que as cidades agregam solões. Segundo Ultramari (2007, p.3), a ciência do
Urbanismo se configura a partir de um problema: pessimismo, utopia e otimismo se
substituem, sendo a cidade ora passível de solução, ora constituindo o próprio
problema da sociedade mundial, ora se constituindo como o mais adequado espaço
para o desenvolvimento da história. Portanto, é com essa busca de posturas
conceituais que se contextualiza este trabalho.
É recorrente na literatura, e mesmo nos princípios que norteiam muitos dos
trabalhos técnicos de intervenção no espaço urbano, a defesa do direito à terra e à
moradia neste espaço, como direitos sicos de um cidadão. Tal defesa é expressa de
forma bastante clara, sendo mesmo seu princípio norteador, no Estatuto da Cidade.
Tal legislação preconiza esse direito de cidadania. também que se considerar
aspectos naturais, por exemplo, a partir da evidência da chamada crise ambiental,
os quais exigem prioridades de tratamento ao lidar com o urbano trazendo novos
condicionantes ao planejamento.
A recente valorização das queses ambientais trazidas por mudaas climáticas
em nível global altera novamente suas prioridades. Todavia, a despeito da crescente
inclusão da queso ambiental nas práticas do planejamento, ainda é incipiente a consi-
deração da sua aplicação nos impactos de fenômenos adversos, consubstanciados
em calamidades públicas. Tal incipiência não permite a apropriação de eventuais
potencialidades que, paradoxalmente, essas calamidades possam ofertar. É neste
cenário que se debate a hipótese deste trabalho: uma grande inundação ocorrida ao
longo do rio Iguaçu em 1995, acredita-se, acelerou a tomada de decisões para a
internalização de recursos e liberação ambiental da construção de um Canal
Extravasor, que será descrito a seguir.
99
4.2 CURITIBA: O GRANDE CENÁRIO
4.2.1 Aspectos naturais
Antes de iniciar esta análise faz-se necessário caracterizar o cenário de
estudo selecionado onde, se acredita, ocorreram eventos adversos ao planejamento
como ocupações em áreas de risco definidas como área de proteção ambiental.
Para compreender a ocorrência das inundações em uma cidade, é importante
entender o comportamento climático e mais especificamente o pluviométrico da
região onde ela se encontra inserida. Os eventos pluviométricos intensos e de curta
duração, característicos de regiões tropicais, ao interagir com os demais elementos
da paisagem, modificados pelo uso urbano, contribuem para agravar a ocorrência
das inundações nas cidades. Portanto, considerações sobre as condições climáticas
da região serão abordadas a seguir visando a um melhor entendimento da dinâmica
do clima na área.
Em Curitiba, vários fatores interferem na sua característica climática: sua
localização em relação ao Trópico de Capricórnio; a topografia do primeiro planalto;
a altitude média do município de 905,00m acima do nível do mar, como também a
barreira geográfica natural da Serra do Mar. O ponto mais elevado está ao Norte do
munipio correspondendo a cota de 1.021,00m no bairro Lamenha Pequena, dando-lhe
uma feição topográfica relativamente acidentada composta por declividades mais
acentuadas, devido à proximidade com a Região Serrana do Açungui.
Ao Sul do Município de Curitiba encontra-se a situação de mais baixo terraço,
com cota de 864,90m localizada no bairro do Caximba, na cabeceira do rio Iguaçu.
Tomando-se por referência a classificação de Koeppen (MAACK, 1981), a
cidade de Curitiba localiza-se em região climática do tipo Cfb, com clima temperado
(ou subtropical) úmido, mesormico, sem estação seca, com verões frescos e invernos
com geadas freqüentes e ocasionais precipitação de neve (última ocorrência em
17/07/1975).
Segundo dados da Estação Meteorológica de Curitiba do SIMEPAR, dada a
sua posição geográfica (Sul do Trópico de Capricórnio), área onde os sistemas
100
atmosféricos intertropicais e polares travam constantes confrontos, além de situar-se
em altitudes relativamente elevadas (aproximadamente 905m), e de suas caractesticas
topográficas, a cidade de Curitiba caracteriza-se por apresentar temperaturas
relativamente inferiores às demais capitais brasileiras. Todavia, os índices térmicos
anuais apresentam-se mais elevados nos meses de dezembro, janeiro e fevereiro
(23.7 a 32.5
o
C), quando a energia solar disponível é maior e predomina a atuação
de sistemas atmosféricos intertropicais. As temperaturas mais baixas são registradas
nos meses de junho, julho e agosto (-1.3 a 15.9
o
C), sendo que a média é de
17.488
o
C, quando a energia solar disponível é reduzida e predomina a atuação dos
sistemas atmosféricos polares.
Com relão à precipitação pluviométrica, segundo dados do Instituto Tecnológico
SIMEPAR Sistema Meteorológico do Paraná (2008), sua dia mensal é de
130,94mm e a precipitão dia anual es entre 1.385,00mm no ano de 2000 com
144 dias chuvosos e 1.625,20mm em 2001 com 170 dias chuvosos. Quanto à época
das chuvas, esta ocorre sempre na estação de verão, sendo que a maior incidência
mensal foi em janeiro de 1999, com 27 dias de precipitação.
Quanto às características geomorfológicas de Curitiba vale notar que ela se
localiza no Primeiro Planalto, o qual foi descrito por Reinhard Maack (1981) como
"uma zona de reversão entre a Serra do Mar e a Escarpa Devoniana", mostrando um
plano de erosão recente sobre um antigo tronco de dobras.
O Primeiro Planalto divide-se em três regiões: Planalto de Curitiba; Região
Serrana do Açungui e o Planalto de Maracanã. Dessas três regiões, o Planalto
de Curitiba ocupa a parte sul, onde a cidade desenvolveu-se sobre os terrenos
sedimentares do Planalto de Curitiba, formado por colinas, que corresponde à porção
centro-meridional do Primeiro Planalto Paranaense (AB'SABER, 1966), conforme
demonstrado na Figura 10.
101
Figura 10 - Vista aérea da RMC: ao fundo situa-se a Serra do Mar e Litoral. No centro visualiza-se o rio Iguacu e
o município de Curitiba
Fonte: COMEC, 2002
Os setores norte, oeste e sul do Município estão representados por um relevo
em colinas alongadas, de baixa altura, em cotas altimétricas que variam entre 900 e
950m acima do nível do mar. Os interflúvios apresentam-se amplos e os vales
mostram-se abertos e com fundo chato, constituídos por terraços fluviais que foram
ocupados a partir da parte central do terraço fluvial do rio Belém (IPPUC, 1985, p.87).
As declividades variam de 0 a 12%, fato que facilitou a expansão urbana da cidade
de Curitiba (OKA-FIORI; CANALI; inédito). O fato de as declividades serem pouco
acentuadas ameniza eventuais outros problemas como deslizamentos, tal como
acontece em outras cidades brasileiras como Recife e Salvador, por exemplo.
Ao longo das reges planas e baixas (planícies aluviais), ocorrem depósitos o
consolidados, como os compostos de argilas e areias. Essas planícies de inundação
devem-se ao fenômeno da formação dos meandros no rio Iguaçu, no seu curso
superior, devido à sua baixa energia, em fuão da suave inclinação da base cristalina
do planalto na direção oeste.
Os solos, interferem sobremaneira nos processos relacionados ao escoamento
e à infiltração das águas das chuvas. Solos mais permeáveis, arenosos, permitem
uma infiltração mais efetiva da água no solo, diminuindo o escoamento superficial
102
das águas pluviais. Ao contrário, solos hidromórficos, orgânicos, localizados em áreas
de baixios, geralmente são saturados de água, não permitindo que haja uma drenagem
eficiente, aumentando assim o escoamento em superfície, o que contribui para
encharcamentos e uma entrada mais pida de água no canal fluvial, ocasionando
muitas situações de risco.
A área de estudo encontra-se inserida na classe Gleissolos/Organossolos que
aparece em todo o munipio, nas várzeas dos rios, sendo, portanto, mal drenados.
Esses solos apresentam vários problemas para a urbanização, que sofrem
encharcamentos temporários ou permanentes, tendo em vista sua localização em
posições do relevo sujeitas a inundações. Por não responderem bem à drenagem,
quando drenados sofrem profundas transformações morfológicas (Figura 11).
No que se refere à rede de drenagem de Curitiba, é possível identificar alguns
aspectos que se relacionam diretamente ao tema, na maior ou menor gravidade de
situações extremas climáticas. Na porção norte e sul do Município, predominam
rochas do Grupo Açungui (menos permeáveis), rochas migmatíticas e gnáissicas do
Embasamento Cristalino, relevo mais movimentado e solos mais rasos; observa-se
uma maior densidade de rios, justificada pela menor infiltração da água das chuvas e
escoamento superficial mais intenso naquelas condições ambientais (Figura 12).
Por sua vez, sobre a Bacia Sedimentar de Curitiba, onde se dispõem as
rochas da Formação Guabirotuba, pode-se notar uma densidade de rios menor,
que as condições ambientais desta porção (maior permeabilidade, relevo suave,
solos mais profundos) facilitam a infiltração da água, diminuindo o escoamento
superficial. Assim, o número de canais nesta porção da área é bem inferior.
Nessa área forma-se uma das mais importantes bacias hidrográficas do Paraná:
a bacia do rio Iguaçu, por cruzar áreas urbanas de alta densidade como a RMC. As
principais bacias de afluentes do Iguaçu que drenam no município de Curitiba e que
deságuam pela sua margem direita são: bacia do rio Atuba e Bacacheri, bacia do rio
Belém, bacia do Ribeirão dos Padilhas, bacia do rio Barigui, bacia do rio Passaúna,
além de outros menos representativos.
103
Figura 11 - Mapa do relevo de Curitiba onde se nota as depressões dos fundos de vales
Fonte: IPPUC
104
Figura 12 - Mapa das áreas inundáveis de Curitiba
Fonte: IPPUC-SMS, ago. 1997
Nota: A localização dos rios indicam ser justamente os solos mais suscetíveis às enchentes conforme pode ser
observado nas áreas manchadas.
105
A área objeto desta pesquisa localiza-se na planície de inundação do rio
Iguaçu e, portanto, tem convivido com o problema das inundações, principalmente a
partir do início da década de 1990, quando começa a ser efetivamente ocupada,
pois até então, apesar de haver ocorrências de grande quantidade de chuva, não
constituía em área de risco devido à sua não-ocupação.
Com relação à vegetação, remanescentes da Floresta Ombrófila Mista Aluvial
(florestas de galeria) têm sido suprimidos e fragmentados nos afluentes do rio Iguaçu
para os fins mais diversos, como a urbanização ou a construção de barragens para
abastecimento público. Apesar de ser um tipo florestal de pouca expressão
econômica, possui extrema importância ambiental, pois conforme Silva et al. (1992),
a Floresta Aluvial desempenha fuões muito importantes na manutenção da qualidade
da água, estabilidade do solo de áreas marginais e regularização de regimes hídricos
por meio de suas influências nos leóis freáticos, além de atuar no sustento da fauna
aquática e silvestre ribeirinha. Deve-se destacar que essa floresta é importante para
a diminuição das inundações.
A escassez de vegetação provoca uma diminuição da infiltração da água da
chuva no solo e um aumento do escoamento superficial, o que aumenta os problemas
de inundações em todo o município. Na área objeto desta dissertação, a cobertura
vegetal é praticamente inexistente. Observam-se pequenas porções de cobertura
secundária, em pequenos trechos junto às margens do rio Iguaçu, quantidade esta
inexpressiva para influenciar a dinâmica atual das inundações. A maior parte da
área, inclusive junto às margens do referido rio, encontra-se desprovida de vegetação e
a atividade de extração de areia nestes locais e no interior do canal fluvial contribui
também para essa ausência.
Do exposto, pode-se concluir que a fragilidade ambiental, principalmente na
poão leste de Curitiba, impõe várias restrições para sua ocupão. Para isso, medidas
urbanísticas foram e estão sendo praticadas, como pode ser acompanhado a seguir.
106
4.2.2 Medidas urbanísticas para controle de cheias em Curitiba
A história da urbanização de Curitiba, que é objeto de análise deste trabalho,
coincide com a maioria das cidades em crescimento no século XIX. Curitiba
prosperou por servir de abrigo a tropas de gado que vinham do Sul com destino aos
garimpos de Minas Gerais e com a extração da erva-mate e da madeira (IPPUC,
2004, p.14). O tipo de vegetação e o clima predominante na região do planalto
curitibano contribuíram de modo decisivo para a ocupação da área. O que antes se
configurava como campos ermos, pantanosos e desnivelados começou a se modificar
no final do século XIX e início do XX. Pretendia-se dar à cidade uma aparência
de progresso e civilidade, priorizando os espaços amplos, arejados e arborizados
(BOLETIM DA CASA ROMÁRIO MARTINS, 2006, p.1). A área central é o cenário para
grandes transformações urbanas e arquitetônicas, culminando por estabelecer os
primeiros referenciais da nova paisagem construída, tanto no seu aspecto simbólico
quanto na definição de usos e similaridades. Surgem então novos espaços, iniciando
com o primeiro parque público da cidade, em 1886, o Passeio blico, com o objetivo
de sanear e embelezar a cidade. A partir d as administrões queriam fazer mudanças
estruturais a exemplo do que ocorriam nas principais capitais brasileiras. Destacam-se
nesse plano as obras executadas na formação de diversas praças de Curitiba, com
projetos sobre áreas pantanosas, campos cortados por rios, ou banhados, que
exigiram obras de canalização de rios e aterros, tais como as praças General Osório
(1879), Carlos Gomes (1884), 19 de Dezembro (1879) e a Zacarias (1864), que abastecia
de água a população, dentre outras. Ações essas que acarretaram em muitos
problemas de enchentes e inundações principalmente na área central, até que
medidas urbanísticas e estruturais fossem implantadas.
Nas décadas seguintes, o processo de urbanização de Curitiba, associado ao
desenvolvimento do Estado, fez com que se acentuasse ainda mais o crescimento
da Capital. Eno o engenheiro francês Alfred Agache desenvolveu para Curitiba, entre
1941 a 1943, o primeiro plano urbanístico de Curitiba, o Plano Agache ou Plano das
Avenidas,Figura 13, que, segundo IPPUC (2004, p.21), trazia a preocupação com
a questão ambiental da cidade:
107
[...] de concepção radiocêntrica, estabelece um sistema viário hierarquizado,
mediante avenidas radiais e perimetrais, define um zoneamento com
setores funcionalmente especializados e implementa uma série de medidas
de saneamento, que vão da criação de novos parques com a finalidade de
represamento de rios até cuidados com a infra-estrutura, drenagem e
normatização de aspectos construtivos. Estabeleceu parâmetros construtivos
para edificações e orientações de ordem sanitária, como a drenagem por
meio do recuo frontal [...].
Figura 13 - Plano Agache para Curitiba em 1943 Com destaque
para a preservação da mata ciliar ao longo dos rios, na
porcão leste e oeste
Fonte: IPPUC (2004)
Nos anos 1960, a falta de uma política urbana mais definida implicou um
crescimento desordenado, problema percebido não somente na cidade de Curitiba,
com também em várias capitais brasileiras. Em 1965, Curitiba ganhou um novo
Plano, com um desenho de expansão urbana linearizado por meio dos chamados
Setores Estruturais. As ações de planejamento a partir dessa época teriam como
suporte o chamado tripé: Zoneamento, Sistema Viário, Transporte Público e sua
interação com as dimensões socioeconômicas e ambientais. Para que esse Plano
tivesse sucesso e fosse implantado, bem como tivesse acompanhamento, foi criada
a Assessoria de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba, que mais tarde se
transformou numa autarquia municipal, surgindo então em 1965 o Instituto de
Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba (IPPUC), ahoje o órgão responsável
pelo planejamento da cidade, para detalhar e acompanhar a implantação do Plano
108
Diretor de 1966. Este plano foi sendo adaptado por decretos em função da dinâmica
da cidade e em 2000 foi aprovado um novo plano. Em 2004 foi feita uma
readequação do Plano Diretor de Curitiba ao Estatuto da Cidade, sendo o que vigora
atualmente.
A cidade de Curitiba ao considerar seus aspectos naturais tem-se caracterizado
por propor soluções para superar suas limitações por meio de medidas de
planejamento urbano: no seu sistema viário, nos transportes coletivos, na preservação
do meio ambiente, na área de saúde, educação e criança, dentre outras, aliando o
planejamento urbano à preservação cultural e sustentabilidade ambiental.
Desde eno a perspectiva de conservar o meio ambiente vem se concretizando
na cidade por meio de ações de prevenção de enchentes, preservação de fundos de
vale e áreas verdes.
Em Curitiba, o Zoneamento e o Uso do Solo definem regras para construir e
implantar atividades socioeconômicas que o intensamente utilizadas como mecanismo
para efetivar o planejamento urbano e para dar contorno às demais poticas blicas
(IPPUC, 2004, p.28). É um instrumento que se associa à legislação ambiental ou de
conservação, em que se caracterizam Zonas Urbanas específicas, com uma ou duas
funções predominantes, para as quais se estabelecem parâmetros de ocupação.
São normas que orientam e controlam, assim, os investimentos da comunidade.
Disciplinam atividades privadas de modo a adequá-las aos objetivos pactuados no
Plano Diretor.
Segundo Hayakawa (2004, p.1), a legislação da cidade, bem como a lei de
zonea-mento e uso do solo, reformulada em 2000, também contém dispositivos que
visam preservar as condições de escoamento das águas, mesmo com a expansão
do processo de urbanização. Um exemplo de medida preventiva prevista na
legislação é a criação do Anel de Conservação Sanitário Ambiental. Trata-se de uma
área de proteção que foi criada ao longo das principais bacias hidrográficas, com a
instituição de parâmetros construtivos diferenciados e a concessão de medidas
compensatórias (como a transferência de potencial construtivo) para estimular a
preservação da faixa de drenagem dos rios e córregos. O Anel de Conservação foi
criado dentro da mesma filosofia que norteou a implantação dos parques na década
de 1970 e visa resguardar a sustentabilidade da cidade para o futuro.
109
Ainda com relação à questão ambiental, a preocupação em diminuir os efeitos
das chuvas nas redes de águas pluviais também está prevista nos parâmetros de
uso e ocupação do solo, como observam Hawken, Lovins e Lovins (2005, p.296):
At the same time, the city introduced a five-yard setback requirement (intend
as a space for gardens) for all new buildings outside the core. It limited
residential construction to 50 percent of a site's area, and banned impervious
paving of open space. It provided permanent protection for vegetation in the
low-density one-third of the city, and tax relief for woods and gardens.
16
Essas medidas podem ser observadas nas várias zonas residenciais onde os
recuoso ajardinados garantindo a permeabilidade do solo necessária à drenagem da
área. Outra exigência do poder público, desde 1990, são os canteiros ajardinados em
postos de abastecimentos de combusveis e a proibão de estacionamentos frontais
em áreas de recuos nos comércios auxiliando na redução de áreas impermeáveis e
minimizando os efeitos da alta contribuão das águas pluviais nas cheias e enchentes.
Para construções na área central, onde a taxa de ocupação dos lotes pode
chegar a 100%, ou nos grandes empreendimentos (como hipermercados e shoppings
centers), a exigência adotada pela Prefeitura para garantir a permeabilidade do solo
é a implantação, pelos próprios empreendedores, de reservatórios de contenção
17
.
Os reservatórios são áreas criadas para "guardar" a água das chuvas, que são
eliminadas aos poucos para a rede de drenagem, evitando a formação de pontos de
alagamentos em terrenos que são impermeabilizados por asfalto ou cimento para a
implantação dos estacionamentos.
16
Tradução livre: "Ao mesmo tempo, a prefeitura introduziu uma exigência de recuo de 4,5 m (como
espaço para jardins) para todos os novos edifícios fora do centro. Limitou a construção residencial
a 50% da área do terreno, e proibiu pavimentação à prova d‟água em espaços abertos. Forneceu
proteção permanente à vegetação no terço de baixa densidade da cidade, e incentivo fiscal para
bosques e jardins".
17
Segundo Fendrich (2004), exemplos de obras que prevêem o cuidado ambiental do controle das
enchentes urbanas são os supermercados Carrefour do bairro Parolim, Wall Mart do bairro Jardim
das Américas e o Barigüi Park Shopping Center do bairro Campo Comprido (que fazem a
detenção) e dos postos de combustíveis Rick, no bairro Cristo Rei, e Criança, no bairro Mercês,
que implantaram o sistema para usar a água na lavagem de veículos. (Decreto n.
o
791/2003 que
dispõe sobre os critérios para implantação dos mecanismos de contenção de cheias).
110
Outra medida urbanística para corrigir e (ou) mitigar os impactos das cheias é a
que se refere à questão da ocupão em áreas de risco, principalmente as ribeirinhas.
Nesse sentido, os instrumentos de legislação urbanística dentro do município
de Curitiba, embora tenham a intenção de normatizar e estabelecer diretrizes para a
melhor ocupação do terririo, produziram impactos positivos e negativos, na questão
habitacional. O estabelecimento de parâmetros adequados para a aprovação de
loteamentos e edificões garantiu melhores condões sanitárias e de habitabilidade
das construções e também preservação de um meio ambiente urbano com mais
qualidade, no entanto não se mostrou suficiente para conter as ocupações irregulares
nas áreas mais periféricas, como é o caso do Bolo Audi, em análise neste trabalho.
A partir do princípio de que a ocupação e os usos na cidade podem ser
induzidos, e o adensamento deve ser compavel com a infra-estrutura urbana disponível,
áreas foram destinadas à habitação de baixa, média e alta densidade, além
daquelas destinadas à habitação de interesse social foram definidas áreas com
predominância residencial, eixos estruturantes, eixos de adensamento, áreas de
ocupação mista, tolerando a ocupação nas APAS dentro dos parâmetros
estabelecidos no Zoneamento Ecológico-econômico.
No que se refere à habitação de interesse social, embora o município de
Curitiba ainda não tivesse implantado as Zonas Especiais de Interesse Social (ZEIS),
conforme diretrizes do Estatuto da Cidade, a Lei Municipal n.
o
9.800/00 criou os
Setores Especiais de Habitação de Interesse Social (SEHIS), com finalidade similar
(COHAB, 2007).
Os SEHIS compreendem áreas onde interesse público em ordenar a
ocupão por meio de urbanização e regularização fundiária, em implantar ou comple-
mentar programas habitacionais de interesse social, e que se sujeitam a critérios
especiais de parcelamento, uso e ocupação do solo, como é o caso do Bolsão Audi,
analisado adiante.
Além dos SEHIS criados pelo zoneamento em 2000, o Decreto n.
o
901/80
declarava como áreas de interesse social aquelas destinadas à implantação, pela
COHAB-CURITIBA, de novos núcleos habitacionais, constituídos por lotes, habitações
unifamiliares e coletivas, ou mais de uma dessas modalidades. Este Decreto foi
substituído pelo Decreto n.
o
250/00.
111
No âmbito municipal, as SEHIS possibilitaram parâmetros diferenciados para a
regularização de ocupações irregulares e viabilizaram a produção de lotes de
interesse social. Este mecanismo permitiu que muitas áreas irregulares pudessem
ser enquadradas no novo parâmetro de ocupação e pudessem ser regularizadas.
Como visto anteriormente, a política urbana no município de Curitiba, no
que diz respeito às questões ambientais são amparadas por diversas leis e decretos
que estabelecem critérios e parâmetros de uso e ocupação do solo em áreas
ambientalmente relevantes.
Visando à preservação, manutenção e recuperação ambiental, a legislação
vigente acaba sendo, na maioria dos casos, muito restritiva. Por esse motivo, a
ocupação formal dos imóveis atingidos por algum fator ambiental tende a ser
limitada ou mesmo inibida. Porém, para compensar esse limitação, a política urbana
do município prevê incentivos tributários e fiscais, flexibiliza os parâmetros
construtivos e possibilita a transferência de potencial construtivo destes imóveis para
novos empreendimentos.
Os fatores ambientais de que trata a legislação podem ser resumidos em cinco
tipos principais: bosques (áreas verdes), Áreas de Proteção Ambiental (APAs), Áreas
de Preservação Permanente (APPs), faixas de drenagem e áreas inundáveis.
O bosque
18
é talvez o fator ambiental que possui o maior amparo de incentivos
fiscais e construtivos da legislão municipal. Em troca da preservação, o previstos
parâmetros especiais de ocupação
19
. Isto é, podem consistir no aumento do número
de pavimentos, permissão de usos além dos estabelecidos na lei de zoneamento e a
transfencia de potencial construtivo, dependendo da área do terreno, da abrangência
da cobertura do bosque, da zona em que se localiza o imóvel e se existe previsão,
por parte do município, de criação de Unidade de Conservação naquele local.
Como visto, as APAs possuem uma regulamentação bem definida na
legislação. O município dispõe de duas áreas de APAs: a de manancial do rio Iguaçu e
a de manancial do rio Passaúna, regulamentada por legislação municipal e estadual.
A necessidade de preservar, melhorar e recuperar culminou na regulamentação
18
Definido na Lei n.
o
9.806/00, que institui o Código Florestal do município.
19
Definidos no Decreto n.
o
194/00, que estabelece as condições especiais do Setor Especial de
Áreas Verdes.
112
destas áreas, criando-se um zoneamento próprio, de acordo com as características
ambientais e de ocupação existente.
Atualmente as APAs sofrem pressão para a ocupação. Isso ocorre devido a
menor possibilidade de ocupação, quer por fragilidade do solo, quer por restrições
de uso impostas pela legislação ambiental, que influem na redução do custo da
terra. Assim acabam sendo alvo de ocupações irregulares, como é o caso do Bolsão
Audi, analisado neste trabalho.
Para as ocupações irregulares existentes, tanto na APA do Iguaçu quanto na
APA do Passaúna está prevista a possibilidade de regularização fundiária, desde
que atendidos os parâmetros que garantam a qualidade ambiental da ocupação e o
não-prejuízo ao meio ambiente.
Com o objetivo de transferir imóveis urbanos ou recursos financeiros ao Fundo
Municipal de Habitação (FMH), foi instituído o Incentivo Construtivo (Solo Criado) pela
Lei Municipal n.
o
7.420/90, substituída pela Lei Municipal n.
o
9.802/00, que possibilita
o acréscimo de potencial construtivo e (ou) de número de pavimentos e em edifícios
habitacionais em diversas zonas residenciais, conforme a Figura 14.
Figura 14 - Incentivo para Programa de Habitação de Interesse Social
Fonte: IPPUC (2000)
113
A transfencia de imóveis urbanos ou o pagamento em dinheiro são efetuados
ao Fundo Municipal de Habitação (FMH) que é administrado pela COHAB-CURITIBA, é
utilizado para a implantão de programas habitacionais de interesse social destinados
a famílias de baixa renda.
Com a finalidade de preservação do patrimônio histórico, cultural e ambiental,
desde a década de 1980, é possível o aumento do potencial construtivo de edificações
de uso habitacional, comércio e serviço, mediante a transferência do potencial
construtivo de áreas verdes e de unidades de interesse de preservação conforme
mostra a Figura 15.
Por meio da Lei Municipal n.
o
9.803/00 tem-se a possibilidade da utilização
desse instrumento tamm para a regularizão fundiária e habitação de interesse social.
Com esses instrumentos urbanísticos, o Município procura atender às
demandas de habitações de interesse social como a urbanização dessas ocupações
e pela implantação de parques, equipamentos sociais e comunitários no seu entorno
de forma a propiciar a integração dos seus moradores e também pela realocação
das áreas de risco. Exemplo dessa urbanização é o Bolsão Audi, cuja ocupação é
analisada nesta dissertação como exemplo de fenômeno adverso ao planejamento.
Figura 15 - Transferência do potencial construtivo
Fonte: IPPUC (2000)
114
Além dessas medidas urbanísticas para controle e preservação ambiental, a
municipalidade também possui programas e ações que contribuem para minimizar
riscos ambientais conforme será descrito a seguir.
4.2.3 Programas e ações do poder municipal para minimizar riscos ambientais
Segundo Hayakawa (2004, p.1), o início do processo de minimizar os riscos
ambientais vem da década de 1970, quando foram criados os primeiros parques de
Curitiba: o Barigui (1972), o São Lourenço (1972), o Barreirinha (1972) e o Iguaçu
(1978). A política de implantação dos parques em Curitiba não se limita a
proporcionar uma alternativa de lazer para a população, tem também uma função
que muitas vezes passa despercebida; esses parques são muito importantes, foram
criados junto às bacias hidrográficas e, com suas lagoas de contenção paralelos aos
rios, ajudam a represar as águas e evitam a formação de áreas de inundação. De
acordo com Hawken, Lovins e Lovins (2005, p.296) "this design with nature strategy
stopped the flooding, and cost far less than tradicional flood-control methods".
20
A implantação de áreas de lazer e parques ao longo do rio Iguaçu, dentro da
área de criação da APA, teve início com a criação do Parque Iguaçu. Exemplos de
implantação dessas áreas são os pomares públicos plantados junto ao Rio Iguaçu
em meados de 1978, próximo ao ribeio dos Padilhas; o novo zoológico que ampliou o
espaço natural para os animais e ssaros; o Parque Náutico; Parque Peladeiros;
Parque Linear do Cajurú; a sede da Pocia Florestal e, mais recentemente, a proposta
do Parque do Centenário da Imigração Japonesa e o Museu de História Natural.
Os parques associados aos usos urbanos como as atividades esportivas, culturais,
educacionais, tusticas e até mesmo em áreas da defesa social e saúde complementam
essa dupla função.
20
Tradução livre: “esse projeto com estratégia voltada à natureza acabou com as enchentes e
custou muito menos que os métodos tradicionais de controle de enchentes”.
115
A criação de vários programas relacionados com a questão ambiental também
auxilia na adequada aplicação da política da preservação ambiental. Um desses
programas implantados foi a política específica de resíduos sólidos criada em 1989. A
cidade sinalizava sérios problemas com a destinação do lixo produzido nas residências,
com a população lançando-os em locais inadequados. O problema se agravava mais
quando da ocorrência de chuvas intensas, pois esse material era carregado pelas
águas, obstruindo a rede de drenagem, poluindo os rios e provocando inundações.
Inicialmente, com a perspectiva de efetuar uma coleta seletiva, a Municipalidade
criou o programa "Lixo que Não é Lixo", estruturado por toda a cidade e em vigor até
hoje, uma forma para que a população também tivesse sua co-responsabilidade com
as questões ambientais essenciais: educação ambiental, separação do lixo orgânico
do inorgânico e destino final a um aterro sanirio tecnicamente adequado.
Conectado a esse projeto foi criado tamm o Câmbio Verde, ação de integrão
pela qual a população coleta o lixo reciclável nos locais onde o caminhão de lixo não
consegue entrar, normalmente porque são áreas onde as ruas são estreitas e de
difícil acesso, e troca por hortifrutigranjeiros provenientes do excedente de produção
de pequenos produtores do cinturão verde da região metropolitana. Após a seleção,
o lixo reciclável é vendido e a arrecadação é destinada aos programas sociais da
prefeitura, garantindo assim a sustentabilidade do programa.
A Secretaria Municipal do Meio Ambiente de Curitiba também tem feito um
trabalho de educação ambiental com todas as escolas (municipais e particulares) de
primeiro grau chamado Programa Olho D'água, para que as crianças sejam os
multiplicadores da importância de se respeitar e conservar o meio ambiente. Neste
programa as crianças fazem, juntamente com os técnicos, a coleta das águas dos
rios próximo às suas escolas, analisam a qualidade desta água e percorrem as
casas do entorno orientando e ensinando os moradores a olhar o rio de forma a
reconhecê-lo como um patrimônio natural, a estabelecer um vínculo de pertinência
determinante para a sua conservação.
Esse conjunto de programas e ações para minimizar riscos ambientais devem
estar vinculado a uma ação maior. Deve considerar a abrangência metropolitana e
interagir com os municípios vizinhos de forma que todos eles assumam suas co-
responsabilidades, conciliar interesses ambientais, o custo socioambiental de
116
moradia, abastecimento de água
21
e insumos, entre outros aspectos. Esse pensar
global se justifica em função da interdependência das cidades na dinâmica
metropolitana. Assim, o núcleo urbano pode ser potencializado a partir de uma
estrutura racional por meio da qual, além da troca de serviços, as cidades possam
compor forças num projeto urbano único ao invés de contribuir à periferização das
cidades externas ao pólo central.
A gestão metropolitana também deve voltar-se à concretização e continuidade
deões baseadas em políticasblicas que respeitem a sustentabilidade, não apenas
ambiental, mas de maior âmbito, o que depende, invariavelmente, da conscientização
coletiva e respectiva responsabilidade social.
4.3 QUADRO DE INUNDAÇÕES EM CURITIBA
Apesar de toda a política de gestão ambiental, medidas urbanísticas e das
iniciativas adotadas pelo poder público, a cidade de Curitiba ainda padece com os
fenômenos naturais consubstanciados em eventos de chuvas mais intensos. Em
parte, isso ocorre porque Curitiba é dotada de uma densa rede hidrográfica,
conforme a Figura 16, o que a faz sofrer os impactos das chuvas concentradas de
grande intensidade e de curta duração que ocorrem em pequenas áreas, mas
também porque ela segue o padrão de ocupação dominante no país.
21
Exemplo disso é a represa do Iraí que tem a função de abastecimento de água para a Região
Metropolitana de Curitiba e, ao mesmo tempo, em época de chuvas excessivas, a contenção
de cheias.
117
Figura 16 - Mapa das Bacias Hidrográficas de Curitiba
Fonte: IPPUC
118
Zanella (2006), baseado no levantamento de episódios chuvosos com registros
em jornais de precipitações que causaram impactos, ao finalizar sua tese de
doutorado, chegou à conclusão de que, quando o volume das chuvas ultrapassou
60mm, os impactos observados foram alagamentos e inundações próximas de rios e
córregos, desmoronamentos, danos causados na pavimentão, entre outros. Portanto,
a considerão desse dado é um dos indicadores de um processo de risco resultante da
combinão entre as probabilidades de ocorrência de hazards e as condições de
vulnerabilidade da comunidade.
Dessa forma, "o impacto o desastre vai depender das características,
probabilidade e intensidade do hazards, bem como da sustentabilidade dos elementos
expostos, baseados nas condões sica, social, ecomica e ambiental" (ISDR, 2005).
Como visto anteriormente, o entendimento dos desastres envolve a dimensão natural
e social, porém, como tais dimensões variam de contexto, os desastres convertem-se
em fenômenos dinâmicos e com alta variação do potencial de impacto. Não
consenso entre os especialistas sobre a melhor forma de caracterizar a combinação
da forma de interação dos fatores natural e social na ocorrência dos desastres, o
que indica que a definição dos desastres permanece como uma questão aberta.
Existem muitos estudos sobre os impactos das precipitações nas cidades;
segundo Zanella (2006), embora não exista uma correlação direta entre urbanização
e precipitação, são visíveis as influências dos efeitos de uma tempestade nos
eventos mais intensos e de curta duração em uma área urbanizada. As ilhas de calor
geradas, o índice de poluição, a rugosidade da superfície urbana são fatores que
poderão contribuir para o aumento que se vem observando na precipitação anual e
nos dias de chuva de até 16%, nas cidades em geral.
Para Zanella (2006), o impacto das precipitações também constitui um grande
problema para Curitiba, dadas as conseqüências geradas por eventos de maior
magnitude relacionados às inundações na cidade.
Para se analisar situações de risco em Curitiba, foi pesquisada a ocorrência
de desastres naturais, em especial as inundações entre os anos de 1980 a 2007, e
construído um quadro baseado na classificação de Hewit e Burton (1971), visto
anteriormente, de acordo com os seguintes critérios:
a) distribuição espacial, ou seja, na primeira coluna foram levantados os locais
onde ocorreram os desastres (localização geográfica), pois o fator que
119
permite caracterizar geofisicamente os Hazards é a sua espacialidade. No
caso de inundões os locais levantados envolveram os município da RMC,
baseados nas ocorrências da Defesa Civil, reportagens de jornais
22
,
pesquisas documentais do IPPUC, da COMEC, SUDERHSA e Secretaria
Municipal de Comunicação Social. A avaliação do risco de ser conhecida
mediante sua determinação no espaço. Para Hewit e Burton (1971), ao
olhar a distribuição espacial é importante considerar a escala espacial,
pois escalas de nível global e regional possuem padrões de emergência
diferente. Muitos Hazards podem ser identificados com sua localização,
pois eventos geofísicos extremos não ocorrem em muitos lugares, como é
o caso de furacões e vulcões.
b) distribuição temporal (freqüência, sazonalidade, parâmetros diurnos): diz
respeito à freqüência e ao período de retorno (intervalo de recorrência) de
um determinado evento. Dessa forma foram pesquisados na segunda coluna
os registros históricos de desastres (inundações, enchentes, alagamentos)
num período de 27anos, de 1980 a 2007.
Essa forma de abordagem, segundo Hewit e Burton (1971), permite calcular o
número de ocorrências num período de tempo espefico limitando-se ao local
onde os dados foram coletados permitindo estabelecer uma sazonalidade,
como as ondas de frio no inverno e os ciclones tropicais no verão. Neste
item foram observados também os anos de ocorrências do fenômeno
El Niño
23
. Na terceira coluna tem-se a tipologia do risco;
c) mecanismos físicos (magnitude, duração, extensão espacial): considera-se a
determinação da força mobilizada por um evento, como o nível da água
atingido numa inundação. No caso específico deste trabalho (inundações,
enchentes, alagamentos), foram colocados na quarta coluna a quantidade
máxima de precipitação pluviométrica em 24 horas, conforme dados do
SIMEPAR, INMET e Defesa Civil, por meio de hidrógrafos de inundação.
22
Foram pesquisadas notícias em manchetes de jornais que envolviam inundações e enchentes que
causaram algum tipo de dano à população.
23
El Niño, se caracterizou por alterações climáticas tais como: aquecimento anormal das águas
superficiais no Oceano Pacífico Tropical alterando o clima regional e global: chuvas na costa oeste
da América do Sul e seca na Indonésia e Austrália, mudando os padrões de ventos em nível
mundial, e afetando assim os regimes de chuvas em regiões tropicais e de latitudes médias.
120
Neste estudo, é importante o conhecimento pluviométrico diário, pois,
a partir dele, pode-se observar os eventos extremos que acontecem na
pluviometria. São esses eventos que interessam na análise das inundações.
Foram considerados os picos máximos de precipitação do ponto de vista
espacial, pois, segundo Hewit e Burton (1971), quanto mais alta a magnitude,
menor a concentração espacial do evento. É importante, entretanto, consi-
derar que, embora bastante significativa na caracterização da intensidade,
a precipitação máxima em 24 horas representa aspectos variados da
pluviosidade, tendo em vista que as chuvas, em sua descontinuidade
espefica, podem ser fortes ou fracas, contínuas ou esparsas e ocorrem em
espaços de tempo e duração variável durante o dia (GONÇALVES, 1992).
Outra medão feita indiretamente, mediante a considerão da intensidade,
foi em relação à estimação de variáveis humanas atingidas pelo evento,
indicadas na quarta coluna, e os índices de destruição provocados pelo
evento elencados na quinta coluna, baseando-se nas informações da
Defesa Civil, jornais, pesquisas documentais;
d) dinâmica de eclosão (rapidez do início, tempo de preparação e rapidez de
término): examinando a dinâmica de desencadeamento de um evento
pode-se identificar o seu risco de incidência (TOBIN; MONTZ, 1997). No
caso das inundões, possuem um tempo de desencadeamento extenso,
permitindo a implemen-tão de estratégias de confrontação mais extensas.
Assim, acredita-se que, conhecendo melhor as diferentes magnitudes, freqüências
e durações dos hazards, pode-se entender melhor o comportamento humano perante
os desastres e, dessa forma, estabelecer procedimentos de prevenção, proteção e
resposta. As enchentes costumam ter uma ocorrência mais freqüente, um tempo de
durão maior, uma área de impacto maior, um desencadeamento maior, uma dispersão
espacial mais ampla e uma distribuição temporal mais regular que os terremotos, por
exemplo e portanto apresentam uma relação impacto-resposta diferente. Dessa
forma, na sétima coluna foram colocadas as medidas de resposta aos desastres.
A seguir visualiza-se a montagem do Quadro 3, construído conforme os critérios
acima descritos.
Quadro 3 - Região metropolitana de Curitiba: desastres naturais, 1980-2007
continua
CIDADE OU MUNICÍPIO
DATA
TIPO DESASTRE
QUANTIDADE DE
PRECIPITAÇÃO
PLUVIOMÉTRICA
NÚMERO PESSOAS
NÚMERO
CASAS
MEDIDAS ADOTADAS
1. Curitiba: Tarumã,Boqueirão,
Uberaba, V. Sofia e RMC: Edi,Lorena
São Paulo
1980
Inundação
86,4mm
1 morte S.J. Pinhais
60 desabrigados Curitiba
50 desabrigados Colombo
60 desabrigados Piraquara
Casas alagadas
Desobstrução córregos e valetas
2. Curitiba:Vila Sofia, Autódromo
Barigui, Uberaba, Boqueirão,
Sta. Quitéria,V. Oficinas,
Sta.Felicidade, Sta.Cândida,
Pinto e Lorena
1982
Inundação:
100,6mm
2 mortos
600 desabrigados
Casas alagadas, Queda
de postes
Queda de árvores,
Falta de energia,
Congestionamento no
centro
Retirada das pessoas atingidas
3. Curitiba: Boqueirão, Uberaba,
Cajurú, Tarumã, Bairro Alto,
Santa Cândida, Barreirinha,
Pilarzinho, São João, cavas Iguaçu
(Bolsão Audi),
Vista Alegre, Cascatinha
Jul. 1983
Enchente
(1)
97,9mm
8.240 pessoas atingidas
2.065 invadidas pelas
águas
11 perda total
154 estado precário
4.235 indiretamente
afetadas
Perdas eletrodoméstico,
Ruas alagadas
299 relocações
233 elevação moradia,
Retificação e dragagem rios,
Tratamento taludes,
rev. leitos rios em canal aberto,
limpeza, desobstrução valetas e
tubulações
4. Guaraituba, S.J.Tadeu,Capanema,
Alto da Glória, Ahú de Baixo,
Cabral, C.Siqueira, Bonfim,
Fazendinha, Pinheirinho, Jd.
Primavera, S.Domingos,
Vargem Grande, S.Amélia,
S.Helena, Bigorrilho,
Tarumã, CIC,V.Sofia,
Vilas Oficinas
Mai. 1988
Alagamento
82,9mm
300 casas alagadas
Ruas alagadas
Retiradas e alojadas
40 famílias
5.Curitiba: Boa Vista
Pinhais
Jan. 1989
Inundação
72,9mm
2 casas desabaram
30 casas inundadas
30 famílias removidas
6.Curitiba:Santa Cândida
Fazendinha
Jul. 1990
Nov. 1990
Alagamento
Inundação
68,7mm
163 casas alagadas
30 famílias removidas p/ igrejas
140 famílias alojadas em barracas
7.Curitiba: Uberaba, Rio Belém
Mai. 1992
Alagamento
68,5mm
Cerca de 2.000 pessoas
Desalojadas
350 casas
Margem rios: Iguaçu,
Belém, Barigui
Famílias alojadas em escolas,
Igrejas e casas de parentes
Quadro 3 - Região metropolitana de Curitiba: desastres naturais, 1980-2007
continua
CIDADE OU MUNICÍPIO
DATA
TIPO DESASTRE
QUANTIDADE DE
PRECIPITAÇÃO
PLUVIOMÉTRICA
NÚMERO PESSOAS
NÚMERO
CASAS
MEDIDAS ADOTADAS
8.Curitiba: Boqueirão, Alto Boqueirão,
CIC, Hauer, Sítio Cercado,
S. Quitéria, Bacacheri, Centro,
Tarumã, Uberaba, Abranches,
V.Sofia, Pinheirinho, B.Alto
Acrópole, S.Cândida, Barigui,
Atuba e RMC
1993
Enchente
103,3mm
7.160 indiretamente
atingidas
Ruas alagadas,
Quedas de árvores,
Destruição carros,
Trânsito interrompido,
Lojas inundadas,
Desabamento casas
Revestimento de canal, dragagem,
limpeza, drenagem, construções de
pontes, galerias, recuperação de
pavimentação
9.Curitiba:V.Verde, V.Sofia,Uberaba,
Boqueirão,V.Oficinas, B.Alto
Jan. 1995
Alagamentos,
(1)
Enchente
121,0mm
615
Decretado Estado de Calamidade
Pública pelo prefeito Rafael Greca
O Governo do Estado decretou
Estado de emergência na RMC.
Reassentamento, regularização
fundiária, relocação, urbanização,
construção do Canal Extravasor
Piraquara
Jan. 1995
Enchente
(1)
658
200
186 casas relocadas
14 reassentadas
Pinhais
Jan. 1995
Enchente
(1)
6.302
1.556
719 casas relocadas
839 reassentadas
São José dos Pinhais
Jan. 1995
Enchente
(1)
9.084
2.243
2150 relocadas 93 reassentadas
Sub-total:
16.655 desabrigados
3.999 casas inundadas,
Turbidez na água,
Congestionamento
carros,
3.053 casas relocadas
946 casas reassentadas
10.Curitiba- Cajuru, Bacacheri, Bairro
Alto,
Tarumã, Rebouças, Atuba, Centro
1997
Enchente
114,8mm
1 morte no Belém
88 desabrigados
230 casas alagadas.
Faltou água, energia
elétrica,queda de
árvores, ruas destruídas
Emergenciais: cestas básicas,
doações de móveis
11.Curitiba: 42 bairros
J.Botânico, Alto Boqueirão, São Braz,
Cachoeira, Pilarzinho, Bom Retiro,
Rebouças, C.Siqueira,
Boqueirão, CIC, Fazendinha,
Santa Cândida.
Pinhais e São José dos Pinhais
Ago 1998
Inundação
100,6mm
54
casas,árvores
caídas,energia e
Telefonia interrompidas
PMC atendimento a desalojados
Defesa Civil atendeu 207 pedidos
Referentes à inundação
Quadro 3 - Região metropolitana de Curitiba: desastres naturais, 1980-2007
conclusão
CIDADE OU MUNICÍPIO
DATA
TIPO DESASTRE
QUANTIDADE DE
PRECIPITAÇÃO
PLUVIOMÉTRICA
NÚMERO PESSOAS
NÚMERO
CASAS
MEDIDAS ADOTADAS
12.Curitiba: Mercês, S.Felicidade,
Pilarzinho, B.Retiro,
Rebouças,Campina do Siqueira,
Boqueirão, CIC
1999
Inundação
146,2mm
174 desabrigados
01 casa arrastada e 100
atingidas
600 relocações
Alargamento seção Rio Atuba,
Parque Linear Cajurú,canalização de
córregos
13.Curitiba- Cajuru, Umbará,
S. Cercado (V.Osternack),
Boqueirão, B. Vista,Atuba,
Jardim Social, Cristo Rei,
Bairro Novo,
Bolsão Audi:Vila Audi,
São Judas Tadeu,Vila Yasmin e Ilha
do Mel
2001
Enchente
71,8mm
1.748 desabrigados
95 na RMC
701 casas alagadas
Transbordamento
Ribeirão Ponta Grossa e
Padilhas.
Alagamento ruas,
Desabamento de muro,
árvores
caídas, Transbordamento
do rio Iguaçu e Barigui
Emergenciais: cestas básicas,
doações de móveis
64 desabrigados para casas de
Parentes e Escolas da região
SMS registra contaminação
por leptospirose no Bolsão Audi
Canalizado o rio Cajuzinho
14.Curitiba: Xaxim, A. Boqueirão,
Sítio Cercado, Fazendinha, CIC,
Tingui,
Santa Cândida, Bacacheri,
2002
Enchente
79,7mm
807 casas alagadas
sendo 300
Na V. Osternack
(S. Cercado)
Transbordamento do
Ribeirão Padilhas e rio
Barigui
Emergenciais: cestas básicas,
doações de móveis
De acordo com a Prefeitura R$ 6
Milhões em 22 obras de saneamento
e drenagemnos últimos 2
anos amenizaram os danos
15.Curitiba- Cajuru
2003
Enchente
220mm
51 casas alagadas
Emergenciais: cestas básicas,
doações de móveis
16.São José dos Pinhais
2007
Enchente
210mm
1.000
desabrigados
250 casas alagadas
Retirada de 470 toneladas de entulho
do Rio Ressaca, cesta e kit limpeza
Fontes: SIMEPAR; SUDERHSA; Defesa Civil; IPPUC; COMEC; Rasmusson e Carpenter (1983); Ropelewski e Halpert (1987, 1989); Climate Prediction Center (CPC)/NCEP/NOAA Estados Unidos
Nota: Quadro elaborado pela pesquisadora.
(1) Neste ano ocorreu o fenômeno El Niño de intensidade forte.
124
Figura 17 - Mapa dos bairros de Curitiba atingidos pela inundação no ano de 1995
Fonte: IPPUC
125
Observando-se a quarta coluna sobre os dados pluviométricos da série histórica
de Curitiba, nota-se no Quadro 3, no item 3, que em 1983 a precipitação pluviomé-
trica foi de 97,9mm, deixando 8.240 pessoas desabrigadas e 2.065 casas inundadas,
atingindo os bairros de Curitiba: Boqueio, Uberaba, Cajuru, Tarumã, Bairro Alto,
Santa Cândida, Barreirinha, Pilarzinho, São João, Vista Alegre, Cascatinha e cavas
do rio Iguaçu (Bolsão Audi). Segundo o Sistema Meteorológico do Paraná (SIMEPAR),
nesse ano ocorreu o fenômeno El Niño, que são alterações climáticas, afetando os
regimes de chuvas em regiões tropicais.
Nesse período, a experiência acumulada indica uma variedade muito similar de
distúrbios emocionais como, por exemplo, medo crônico, depressão, ansiedade,
sentimento de culpa, e outros, envolvendo não somente as "vítimas primárias", mas
também as "vítimas indiretas", o que pode dificultar a reconstrução de suas vidas.
Coforme visto, a insegurança e a destruição de crenças constituem
características marcantes do mundo em que se vive (MATTEDI, 2007a).
A dificuldade de atuar sobre os desastres está nas formas de caracterização e
interpretão do femeno, e tamm na priorizão nas agendas políticas, econômicas
e sociais de cada comunidade.
As medidas urbanísticas adotadas na enchente de 1983 basearam-se apenas
nas emergenciais, ou seja, relocações de algumas moradias, elevação de casas,
retificação e dragagem de rios, tratamento de taludes, limpeza e desobstrução de
valetas e tubulações. Porém, essas medidas não eliminaram de vez a probabilidade
de o fenômeno acontecer novamente. Conforme Marandola e Hogan (2005), na
reconstrução de um desastre deve-se levar em conta as variáveis ambientais, plane-
jamento, gestão e o homem. Neste caso não foram consideradas as medidas estruturais
de planejamento e gestão para evitar novas ocorrências deste tipo de desastre.
De fato, analisando-se novamente o Quadro 3, item 9, nota-se que em 1995 o
fenômeno do El Niño se fez presente novamente, conforme o mapa da Figura 17.
A precipitação pluviométrica foi de 121mm, atingindo 16.655 pessoas e inundando
3.999 casas. Diante da dimensão do impacto, na época foi decretado Estado de
Calamidade Pública pelo Prefeito de Curitiba e o Governo do Estado decretou Estado
de Emergência na Região Metropolitana de Curitiba. Além das medidas emergenciais
de socorro às vitimas, tomou-se como medida urbanística estrutural a construção de
um Canal Extravasor ao longo do rio Iguaçu (será objeto de análise a seguir). No
126
caso da enchente ocorrida em 1995 em Curitiba, acredita-se houve uma melhor
avalião na capacidade de resposta, considerando que se fossem adotadas apenas
as medidas paliativas haveria novamente outro desastre, gerando o processo do ciclo
de desastre: desastres-dano-reparação-desastre (TOBIN; MONTZ, 1997). Acredita-se
que foram consideradas tamm as conseqüências socioeconômicas em termos de
custo/benefício.
Observando-se o Quadro 3, item 10, no ano de 1997, verifica-se que a
precipitação pluviométrica foi de 114,8mm, causando uma morte no rio Belém com
88 desabrigados, sendo atingidas pelas águas 230 casas. Houve enchentes nos
bairros: Cajuru, Bacacheri, Bairro Alto, Tarumã, Rebouças, Atuba e Centro.
Sabe-se, segundo Zanella (2006), que quando o volume de chuvas ultrapassa
os 60mm em Curitiba significa alagamentos e inundações próxima aos rios e rregos.
Comparado-se com a precipitação pluviométrica de 1995, que foi de 121mm, cujo
número de timas foi de 16.655 e diversos bairros atingidos, fica visível que o
impacto gerado no ano de 1997 é bem inferior ao do evento de 1995. Esse impacto
de menor porte pode ser justificado pela construcão em 1995 do Canal Extravasor, o
que provavelmente reduziu a vulnerabilidade da área a enchentes na região afetada
antes da construção do Canal.
Assim, constata-se também que a vulnerabilidade pode ser alterada pela ação
do planejamento e interferência externa, mesmo considerando-se uma quantidade
de chuva similar em uma região.
Analisando-se novamente o Quadro 3, item 13, no ano de 2001, houve uma
precipitação pluviométrica de 71,8mm, com 1.748 desabrigados e 701 casas foram
inundadas, atingindo os bairros: Cajuru, Umbará, Sitio Cercado, Boqueirão, Boa Vista,
Atuba, Jardim Social, Cristo Rei, Bairro Novo, Bolsão Audi (Vila Audi, Vila Yasmin,
Ilha do Mel e São Judas Tadeu); além de ter sido registrado a contaminação por
leptospirose no Bolsão Audi. A pergunta que se faz é o que causou tamanho impacto
nessa região, apesar de ter chovido apenas 71,8mm.
Comparando-se a seqüência de fotos históricas de ocupação do Bolsão Audi
observa-se que:
a) na figura 18 pode ser visualizada a fotografia aérea tirada em 1996 (um ano
as a constrão do Canal Extravasor), observam-se alguns remanescentes
127
de cavas de areia, resultado da exploração de areia para a construção
civil e ainda uma ocupação incipiente na porção leste da área;
Figura 18 - Fotografia aérea da ocupação do Bolsão Audi no ano de 1996
Fonte: Acervo IPPUC/COHAB
b) já na figura 19, na fotografia aérea datada de 1999, percebe-se uma grande
ocupação muito próxima às cavas de areia;
Figura 19 - Fotografia aérea da ocupação do Bolsão Audi no ano de 1999
Fonte: Acervo IPPUC/COHAB
c) na figura 20 observa-se na fotografia datada do ano de 2001, o avanço da
mancha de ocupação não nos limites das cavas, mas também nos
remanescentes da vegetação próximo ao rio Iguaçu, ocupando todos os
espaços disponíveis.
128
Figura 20 - Fotografia aérea da ocupação do Bolsão Audi no ano de 2001
Fonte: Acervo IPPUC/COHAB
Portanto, pode-se afirmar que uma das razões da magnitude desse desastre
foi o aumento considerável de ocupões irregulares numa APA, com topografia plana,
sujeita a inundações periódicas, com baixa condição de drenagem. Além disso, o
sistema viário subdimensionado e em más condições de conservação e a precariedade
do sistema de drenagem, aliada às condições geológicas locais, têm reflexo negativo
direto sobre as condições de circulação na área e a prestação de serviços públicos
como a coleta de lixo, seguraa e transporte coletivo, afetando a saúde das pessoas.
Situação essa agravada com os casos de ocorncia de leptospirose, caracterizando-se
como um quadro de grande vulnerabilidade ao risco, como é o caso da área do
Bolão Audi.
Apesar da existência dos instrumentos e medidas urbanísticas adotadas pelo
município com relão à o-ocupão em áreas fragilizadas, o planejamento não
conseguiu impedir esta ocupação. Pode-se dizer que esta situação constitui uma das
adversidades do planejamento urbano, contextualizada neste trabalho a seguir.
Outro fator determinante para tal ocupação nesta área foi a questão social.
Segundo Marandola e Hogan (2006, p.2), os riscos e perigos ambientais passam a
ser considerados como "produtos do sistema, intrincados na trama social e fruto da
modernização ecológica, da modernidade tardia e de processos de segregação e
desigualdade sociais". Portanto, outro fator que pode ter conduzido esta população a
se localizar nesta área podem ter sido menores acessos à terra, ao emprego, ao
conhecimento e menor capacidade de reação diante de fenômenos adversos.
129
Logo, neste caso específico do Bolsão Audi, vários fatores contribuíram
para o aumento da vulnerabilidade: a sua localização, a questão social, citada
anteriormente, e a pouca capacidade dessa população de enfrentar o perigo.
Com base nisso, pode-se dizer que a percepção de risco para a comunidade
que ocupou a área chamada Bolsão Audi expressou-se como sendo nível de risco
aceitável com a construção do Canal Extravasor. Outra questão a considerar é a
repetição das chuvas, parecendo mais uma imposição da natureza contra a qual
pouco se pode fazer, cujos efeitos devastadores se pode tão-somente mitigar ou
mesmo desenvolver cnicas de convivência. Esta situação pode mascarar a
vulnerabilidade ao risco, diminuindo a sua percepção.
Analisando-se o Quadro 3 com destaque para o item 15, ano 2003 a precipi-
tação pluviométrica foi de 220mm, 51 casas ficaram alagadas e bairro Cajuru
foi atingido.
Ao se comparar as precipitações dos anos anteriores, percebe-se que a chuva
foi muito intensa nesse ano, porém o dano foi pequeno: a área atingida foi mínima e
o número de casas em situação de vulnerabilidade foi pequena. Ao observar o
Quadro 3, item 14, ano 2002, nota-se que na coluna de medidas urbanísticas houve
um investimento pelo poder público de 6 miles de reais em 22 obras correspondentes
a drenagens, construções de galerias, pontes e saneamento (limpeza de rios e
rregos) nas regiões afetadas. Em vista disso, conclui-se que uma das raes de ter
diminuído o risco no ano de 2003 pode ter sido a adoção de medidas urbanísticas no
ano de 2002.
Como já visto anteriormente, entre os fenômenos naturais, são exatamente as
inundações as que mais possuem possibilidades de previsão: senão "quando" o
fenômeno vai ocorrer, pode-se dizer "onde" o fenômeno vai acontecer.
No caso das enchentes em Curitiba, baseado no Quadro 3, na primeira
coluna, visualizam-se os bairros onde houve mais ocorrências no período de 1980 a
2007: Boqueirão (8); Santa Cândida e Uberaba (6); seguido por Tarumã, CIC e Vila
Sofia (5). A construção do Canal Extravasor abrange justamente alguns destes
bairros de Curitiba (Boqueirão, Alto Boqueirão, Uberaba, Cajurú e Ganchinho), o que
diminui a possibilidade de o fenômeno ocorrer novamente nestes locais.
130
Porém, sabe-se que a carência de uma política de gestão de águas mais
abrangente, contemplando áreas de bacias hidrográficas é de vital importância para que
medidas futuras de atendimento a populações em situação de risco sejam reduzidas.
Pode-se concluir que quando o planejamento e a gestão adotam medidas
estruturais considerando os aspectos naturais, sociais, econômicos e culturais para
mitigar os impactos decorrentes das inundações, os resultados demonstram que é
possível reverter uma situação de risco e diminuir a vulnerabilidade da área. Apesar
dos fenômenos naturais continuarem ocorrendo, o planejamento e a gestão podem
potencializar positivamente os impactos de um acidente, como a construção do GPU
Canal Extravasor, cuja obra emergencial sanitária procurou minimizar as inundações
nesta porção da cidade, como será analisado a seguir.
4.4 GPU CANAL EXTRAVASOR: INTERVENÇÃO, RISCO E LIMITES
A hipótese levantada nesta dissertação de que a ocorrência de uma situação
de risco pode ter acelerado a tomada de decisões no nível do planejamento e da
gestão, favorecendo a alocação de recursos para as intervenções necessárias será
agora analisada.
Para debater a hipótese deste trabalho, optou-se por fazer um estudo de caso
sobre o GPU do Canal Extravasor, cuja obra sanitária de infra-estrutura tem por
finalidade a contenção das cheias das bacias do Alto Iguaçu evitando enchentes a
jusante da BR-277.
4.4.1 A importância do Canal Extravasor
Como visto no Quadro 3 de enchentes do item anterior, quando da
ocorrência da grande inundação ocorrida ao longo do rio Iguaçu em 1995, foi
decretado Estado de Calamidade Pública pelo município de Curitiba e também o
governo do Estado decretou Estado de Emergência na RMC. Mais de 16.000
131
pessoas ficaram desabri-gadas e quase 4.000 casas ficaram inundadas pelas águas
da chuva, evidenciando uma grande situação de risco. Uma das medidas
urbanísticas adotadas foi a construção do GPU Canal Extravasor. Acredita-se que
esta situação emergencial acelerou a tomada de decisões para a internalização de
recursos e liberação ambiental da construção do referido GPU Canal Extravasor;
esta é a hipótese que se trabalha nesta dissertação.
Confirmando a relação histórica dos GPUs com intervenções de caráter
sanitarista e higienista é que a leitura da construção do Canal Extravasor pode ser
considerada um GPU, não pelas suas múltiplas funções, mas também pela sua
abrangência metropolitana. Não necessariamente pelo tamanho, mas pelo impacto
no meio em que está implantado, adequando-se também numa das tipologias de
Ultramari (2006) de intervenção mais observadas, ou seja, intervenção de GPUs
como elemento estruturador dos espaços atingidos por desastres em função dos
extremos climáticos.
Um dos fortes argumentos para a realizão da obra foram os repetidos gastos,
tanto pelo poder público quanto pela população afetada, nas sucessivas inundações
decorrentes de chuvas, que estavam se tornando freqüentes e com danos cada vez
maiores à população. Ou seja, mais recursos seriam necessários para atender a
população atingida, caso não se adotassem medidas concretas e efetivas para
prevenir as cheias e enchentes decorrentes das fortes chuvas, pois as medidas
adotadas até então eram paliativas. Nesses termos, a concepção principal da obra
do Canal Extravasor
24
é o de evitar enchentes e assegurar a maior área possível de
armazenagem e amortecimento de águas pluviais.
Com aproximadamente 20km de extensão, sua largura varia de 25 a 40
metros de largura e de 3 a 4 metros de profundidade. Conforme Suderhsa (2007)
está localizado na Área de Proteção Ambiental (APA) do Iguaçu, abrangendo uma
área de 3.968,45ha, na Região Metropolitana de Curitiba. A construção do Canal
Extravasor abrange quatro municípios: Curitiba, Pinhais, Piraquara e São Jose dos
24
Segundo a Superintendência de Desenvolvimento de Recursos Hídricos e Saneamento Ambiental
SUDHERSA (2007) a construção do Canal Extravasor seja talvez a mais importante obra de infra-
estrutura realizada nas últimas décadas para o controle das cheias na bacia do Alto Iguaçu.
132
Pinhais, conforme Figura 21, sendo que no município de Curitiba abrange os bairros:
Cajuru, Uberaba, Boqueirão e Ganchinho. A obra do Canal Extravasor foi executada
em tempo recorde, isto é, durou seis meses, em função de ter sido decretado Estado
de Calamidade Pública e ser emergencial.
Figura 21 - Mapa da hidrografia da RMC e a localização do Canal Extravasor
Fonte: Mapa Base IPPUC, montagem elaborada pela pesquisadora (2007)
Seu afastamento do leito principal do rio Iguaçu varia de 80 a 800 metros.
O GPU Canal Extravasor foi construído com os objetivos de aumentar a calha de
escoamento do rio e também constituir-se em uma barreira física à ocupação dessa
área entre o rio e o canal, caracterizada como de maior risco a inundações. Desta
forma possibilitaria a implantação de áreas de preservação e (ou) do Parque Linear
Metropolitano do rio Iguaçu, conforme Figura 22. O Canal mede 19.896m e se
desenvolve desde a PR415 Estrada do Encanamento até a foz do rio Miringuava,
com volume total escavado de 2.207.000m
3
; está dividido em três trechos:
133
Figura 22 - Detalhe do traçado do Canal Extravasor
Fonte: Imagem de satélite Google Earth (ago. 2007) - Adaptação pela pesquisadora
a) trecho 1 - inicia na PR415 Estrada do Encanamento - e se desenvolve
para jusante até a BR277, numa distância de 6.492m, com largura e
profundidades médias de 25,50m e 3,20m, respectivamente, e volume
escavado de 415.000m
3
;
b) trecho 2 da BR 277 para jusante até o Zoológico no Contorno Sul, com
uma distância de 10.049m, largura e profundidades médias de 33,00m e
3,40m respectivamente, e volume escavado de 1.510.000m
3
;
134
c) trecho 3 do Zoológico aa foz do rio Miringuava, numa distância de
3.355m, com largura e profundidade dias de 28m e 4,0m, respectivamente,
e volume escavado de 282.000m
3
.
No trecho a jusante da foz do rio Miringuava até a BR116, foi executada a
retificão e ampliação da calha do rio Iguaçu, numa distância de 9.060m, com largura
e profundidade médias de 38,50m e 4m, respectivamente, e volume escavado de
946.000m
3
.
Para a obra que aqui se discute, mais de quatro milhões de metros quadrados
foram desapropriados pelo Governo do Estado para a constrão do Canal Extravasor
paralelo ao rio Iguaçu. A Figura 23 demonstra esquematicamente o funcionamento
do Canal.
Figura 23 - Esquema de funcionamento do Canal Extravasor da Bacia do Alto Iguaçu
Fonte: Monteiro, Cristo, Aisse e Zapelon (2006)
A construção do Canal Extravasor possui os seguintes objetivos:
a) controlar o fluxo do rio Irai e Iguu, evitando enchentes a jusante da BR-277;
b) direcionar as águas diretamente in natura para as estações de tratamento
de água (ETA) do Iguaçu, otimizando a quantidade de águas evitando a
sua perda para o preenchimento da várzea do rio Irai;
135
c) manter a qualidade das águas na região do Altíssimo Iguaçu
25
, pois as
águas do represamento do Rio Irai até chegarem na ETA do Iguaçu
passariam naturalmente por um sistema de canais associados a uma
série de várzeas, desde a barragem a montante da rodovia PR 415 aa
rodovia BR-277;
d) deslocar as águas in natura, após a conclusão do Canal, para as
Estações de Tratamento de Águas ETAs do Iguaçu e do Irai, pois sofrem
menor influência do meio externo;
e) ajudar na contenção das cheias das bacias do Alto Iguaçu e do Belém,
pois as áreas desapropriadas também o úteis como lagoas de
amortecimento de águas pluviais;
f) possibilitar o escoamento das águas quando o nível das chuvas ultrapassar
o volume normal. O Canal beneficiou a região da cidade onde as caracte-
rísticas de topografia e hidrografia eram mais sujeita a inundações, numa
faixa entre os bairros do Cajuru, no Leste, e o Boqueirão, no Sul.
O traçado do canal foi discutido com os órgãos envolvidos bem como a
INFRAERO (Empresa Brasileira de Infra-estrutura Aeroportuária), que na ocasião
iniciava as obras de terraplenagem e ampliação do Aeroporto Afonso Pena. Em face
de uma contribuição maior de águas pluviais decorrentes da Bacia do Rio Iguaçu,
onde se localiza o Aeroporto Afonso Pena, considerando a previsão de uma terceira
pista, a proposta do traçado do Canal Extravasor foi modificada e se distanciou mais
do rio Iguaçu, para ampliar as dimensões das áreas de armazenagem e contenção
de cheias, conforme a Figura 24. Os antigos meandros do rio Iguaçu formaram
vasos comunicantes entre o Canal e o próprio rio Iguaçu. Dessa maneira, o
planejamento e a gestão dos órgãos como a SUDHERSA, SANEPAR, COMEC, COPEL
e as Prefeituras Municipais tinham o Canal Extravasor como uma diretriz e limite a
serem seguidos em seus planos de expansão. Até mesmo a diretriz metropolitana do
anel viário definido pela COMEC teve que proceder a sua alteração, para evitar os
mesmos conflitos que se verificam na cidade de São Paulo, por exemplo, com relação
às margens do rio Tietê e às vias marginais de circulação. Estas, freqüentemente
25
Classificação um pouco aleatória, em nível de Estado, Altíssimo é toda a RMC, em nível de RMC,
Altíssimo é o início.
136
inundadas e confinando as águas do rio, causam congestionamento e danos ambientais
de difícil solução na conservação ambiental das margens do rio. Assim, uma via
local ao longo do Canal pode ser mais adequada para usos de menor densidade
habitacional, mais desejável para a região, devido ao cone de aproximação de
aeronaves ao Aeroporto Afonso Pena.
Figura 24 - Diretriz metropolitana com o novo traçado do Canal Extravasor e
anel viário metropolitano
Fonte: IPPUC
Nota: Montagem pela pesquisadora.
É importante observar que do ponto de vista do planejamento de toda a
Região foram consideradas não apenas as restrições físicas do terreno, da calha do
rio, da topografia. O planejamento como indutor de desenvolvimento considerou as
variáveis (densidade, de circulação, de infra-estrutura e ambientais) e redefiniu as
137
diretrizes de ocupação para toda a Região. Esta redefinição pode ser considerada
como uma externalidade do projeto. Não era intenção do projeto a ampliação da
área do Parque, mas resultou numa potencialidade. Ao mesmo tempo, pode ser um
risco para novas invasões, pois é de conhecimento que terreno blico sem uso é uma
oferta a invaes. É este o evento adverso ao planejamento tratado nesta dissertação.
Dessa forma, com áreas extensas entre o novo trado do Canal e o rio Iguu
desapropriada, obteve-se a real perspectiva e amplitude do Parque Metropolitano
do Iguaçu. De fato permite a ligação do Zoológico Municipal de Curitiba, junto ao
Contorno Sul até as nascentes do Irai, Palmital, Atuba e outras, formam a maior rede
de biodiversidade da Bacia do Alto Iguaçu. Seu uso abrange desde os espaços para
a prática esportiva como o remo, canoagem, localizado no pólo do Parque Náutico,
baseball e futebol de pelada no pólo do Parque Peladeiros, bem como as atividades
culturais e educativa, de lazer e meio ambiente no Zoológico mais ao sul.
O reconhecimento da importância das obras e ações realizadas em 1995 será
maior, na medida em que se consolida o uso do Parque Metropolitano pela
população. As obras complementares de equipamentos ao parque impõem um uso
que dificilmente permitirá a ocupão de novas áreas irregulares. Pom, é importante
que os órgãos responsáveis pelo planejamento e gestão da Bacia do Alto Iguaçu
tenham sempre a visão global e integrada da região. Assim, o controle de cheias e
enchentes na região reduz os seus efeitos catastróficos na infra-estrutura e com
danos sociais bem menores em relação às ocorrências de inundações.
4.4.2 A perspectiva da esfera decisória na obra do Canal Extravasor
Neste item, discute-se a forma como ocorreu e em que situação se favoreceu
a alocação de recursos para as intervenções necessárias.
Como já visto, quando da ocorrência da grande inundação em 1995, foi
decretado Estado de Calamidade Pública no município de Curitiba e o governo do
Estado do Paraná decretou Estado de Emergência na RMC. Dessa forma, a hipótese
de que em situações de risco as tomadas de decisões poderiam ter sido aceleradas
no nível do planejamento e da gestão podem ser aqui constatadas ou não.
138
Para a comprovão quanto à possível agilização na geso e no planejamento
em função da situação de risco foram realizadas entrevistas semi-estruturada,
composta de cinco queses, cujo foco consistiu na tomada de decisão, numa situação
emergencial, com pessoas envolvidas no processo do Canal Extravasor.
As perguntas basearam-se na averiguação quanto ao projeto ter seguido os
trâmites normais administrativos de aprovação como tradicionalmente é uma aprovação
de EIA/RIMA por ser uma situação emergencial. Outra questão levantada foi quanto
ao poder de decisão de cada um dos técnicos envolvidos em função dos cargos que
ocupavam na época e o momento em que se tomou a decisão para a aprovação e
liberação das obras do Canal Extravasor. Outra queso é se houve uma agilizão em
comparão com outras situões de emergência e o que alterou no tempo com outras
decisões. Esta questão é considerada a mais importante para constatar a hipótese
quanto à agilização em relação às tomadas de decisões no nível do planejamento e
da gestão. Com relação a haver outros projetos de situações similares ao do Canal
também foi questionado, para verificar se foi também dado o mesmo tratamento de
agilização nos seus trâmites administrativos. Outra questão levantada foi com
relação à gestão e integração entre os diversos técnicos; se o planejamento havia
previsto a construção do Canal ou foi um projeto emergencial e se os recursos
estavam previstos ou foram liberados em função da situação emergencial. As respostas
dessas entrevistas encontram-se nos apêndices desta dissertação.
Dessa forma, como referência foram entrevistados sete técnicos em posição
de decisão durante o início e a avaliação da obra do Canal:
a) o governador do Estado do Paraná na época, arquiteto Jaime Lerner, por
ter decretado Estado de Emerncia na RMC e centralizado a coordenação
das obras do Canal;
b) o diretor-presidente da Coordenação da Região Metropolitana de Curitiba
(COMEC), arquiteto Luiz Masaru Hayakawa, por ter sido o órgão responsável
para executar as ões delegadas diretamente pelo governador do Estado
do Paraná para o planejamento, projeto e obras do Canal.;
c) o Secretário Municipal de Saneamento e Obras do Município de Curitiba,
engenheiro civil Nicolau Kluppel, por ser o órgão que executou a obra
emergencial em Curitiba;
139
d) a chefe do Departamento de Avaliação de Impacto Ambiental (DAIA),
vinculado à Diretoria de Licenciamento Ambiental do Instituto Ambiental do
Para (IAP), a engenheira florestal Themis Piazzetta, por ser o óro que,
na época, deu a licença ambiental para a construção do Canal Extravasor;
e) o diretor de Engenharia da Superintendência de Recursos Hídricos e
Saneamento do Paraná (SUDERHSA), o engenheiro civil José Scroccaro
por ser o órgão responsável pelo desenvolvimento e detalhamento do
projeto do Canal;
f) o diretor de Saneamento Ambiental também da Superintendência de
Recursos Hídricos e Saneamento do Paraná (SUDERHSA), o engenheiro
civil Carlos Alberto Galerani por desenvolver a parte técnica do projeto;
g) a cnica integrante da equipe do Departamento de Avaliação de Impacto
Ambiental do Instituto Ambiental do Paraná (IAP), a socióloga Schirle
Margaret Dos Reis Branco, por ser o órgão que licenciou a construção do
Canal Extravasor.
Como já visto anteriormente, as pessoas que habitam áreas de risco às
enchentes e inundações estão sujeitas a danos à integridade física, perdas materiais
e patrimoniais. Normalmente, essas áreas correspondem a núcleos habitacionais de
baixa renda (assentamentos precários). Neste cerio de risco de enchente atingindo a
ocupação ribeirinha, a possibilidade de ocorrência de óbitos; perdas materiais e
patrimoniais diversas como a destruição de moradias; poderão ocorrer processos de
erosão e solapamento dos taludes marginais pelo impacto direto das águas decorrentes
da enchente; impacto destrutivo em função da energia de escoamento.
Portanto, baseado na caracterização acima, pode-se dizer que a grande
inundação de 1995 se enquadra como uma situação de risco, pois, segundo dados
da Comec, a inundação afetou mais a população da porção leste da RMC, ou seja,
próxima ao rio Iguaçu, na qual 16.655 pessoas ficaram desabrigadas e 3.999 casas
ficaram inundadas.
O depoimento do Secretário Municipal de Obras e Saneamento, Nicolau Kluppel,
que sobrevoou com o governador Jaime Lerner a área atingida pela inundação, confirma
a importância e a percepção da gravidade do risco com base no conhecimento
adquirido:
140
Como Secrerio de Obras e Saneamento de Curitiba, fizemos, o Jaime
e eu, um sobrevôo na área atingida e após observar a situação das
pessoas afetadas e as casas inundadas foi feita uma reunião com as
várias instituições envolvidas e decidiu-se pela construção imediata
do Canal Extravasor e a redragagem do rio Iguaçu a partir da Br-277
à montante do rio, para melhorar a sua vazão.
A entrevista do então presidente da Comec, Luiz Hayakawa, confirma essa
percepção de risco e juízo político e moral do risco:
A determinação do Governador do Estado em buscar a solução e
resolver o problema das cheias e não apenas atuar nos efeitos das
ocorrências que se repetiam em chuvas torrenciais cada vez mais
em intervalos menores, foi importante para sentir as mudanças nas
áreas atingidas.
O engenheiro da Suderhsa, José Scroccaro, também evidencia a percepção
de novas ocorrências de riscos na área ao citar a elaboração do projeto do Canal:
"Em função da primeira enchente ocorrida em 1983, foi elaborado um projeto de
intervenção mais estruturante de construção de um Canal Extravasor."
A considerão das questões ambientais nos impactos de fenômenos adversos
consubstanciados em calamidades públicas ainda é incipiente e não permite a
apropriação de eventuais potencialidades que essas calamidades possam ofertar.
Todavia, a discussão dessa hipótese de como essas situações de risco ambiental
concretizados em inundações podem ter acelerado a tomada de decisões no nível
do planejamento urbano e da gestão, favorecendo a alocação de recursos para as
intervenções necessárias, pôde ser constatada com a análise das respostas
coletadas.
Analisando-se as respostas conclui-se que houve uma agilização entre os
órgãos na gestão e no planejamento. Esta afirmativa constata-se no depoimento da
técnica do Departamento de Avaliação de Impacto Ambiental do Instituto Ambiental
do Paraná (IAP), Schirle Branco:
Em função da emergência para a construção do canal, o trâmite de
liberação do licenciamento foi agilizado, porém com as previsões
das medidas mitigadoras e compensatórias pertinentes as etapas do
licenciamento.
Existia uma equipe formada para responder sobre EIA-RIMA (Estudo
de Impacto Ambiental Relatório de Impacto sobre o Meio Ambiente)
e essa equipe emitiu um parecer técnico para a liberação da licença
141
prévia sobre as obras do PROSAN (Programa de Saneamento
Ambiental da Região Metropolitana de Curitiba) na qual fazia parte a
construção do Canal Extravasor.
Observa-se nessa entrevista que apesar da situação emergencial, os trâmites
administrativos ocorreram, apenas houve maior agilização nos pareceres dos técnicos.
A Chefe do Departamento de Avaliação de Impacto Ambiental (DAIA), vinculado
à Diretoria de Licenciamento ambiental do Instituto Ambiental do Paraná (IAP),
Themis Piazzetta também confirma essa mesma constatação:
A SANEPAR (Companhia de Saneamento do Paraná) como proponente
do Projeto PROSAN solicitou ao IAP a Licença Prévia, para os 4
empreendimentos que faziam parte desse Projeto: Canal Extravasor,
Barragem do Irai, para o manancial de abastecimento de água para
Curitiba e região metropolitana, Estação de Tratamento de Esgoto do
Atuba e Aterro Sanitário de Almirante Tamandaré.
A decisão foi embasada em todos os pareceres dos técnicos que
faziam parte da equipe multidisciplinar (diversas áreas técnicas
pertinentes ao assunto) e interinstitucional (diversas instituições, tais
como: COMEC, IBAMA, Prefeituras, SUDERHSA - Superintendência
de Desenvolvimento de Recursos Hídricos e Saneamento Ambiental
e Promotoria de Meio Ambiente), montada para a análise desses 4
empreendimentos, bem como, do resultado das Audiências Públicas
(prevista em Resolução do CONAMA) realizadas para cada um dos
empreendimentos.
Dada a urgência para a solução dos impactos ambientais causados
pela falta de implantação desses empreendimentos, foi formada uma
equipe técnica ciente do prazo restrito, que trabalhou na análise e no
licenciamento ambiental desses quatro empreendimentos, de forma
ágil, colocando-os como prioridade.
Percebe-se na resposta acima que o projeto estava seguindo seu processo
regular de licenciamento. Mas, em face da urgência da situação, a integração dos
técnicos das diversas instituições priorizaram os esforços para liberação do licen-
ciamento ambiental.
Da mesma forma,o diretor-presidente da COMEC, Luiz Hayakawa, reforça
essa medida da agilização entre os órgãos:
Em 1995, o efeito da enchente na região metropolitana se agravou,
pelo maior mero de desabrigados, exatamente pelo aumento da
população que se instalou nessas áreas de risco ambiental. Daí, uma
mudança de postura na gestão e no planejamento da região. Os óros
envolvidos, como a PGE, SUDHERSA, IAP, SANEPAR, COPEL,
COMEC e as Prefeituras Municipais numa gestão compartilhada e
142
integrada realizaram as medidas necessárias. Como Diretor Presidente
da COMEC, tive o poder de decio para executar as ações delegadas
diretamente pelo Governador do Estado do Paraná. A responsabilidade
pelo planejamento, pelos projetos, das medidas adotadas e as obras
a serem realizadas foram coordenadas pela COMEC.
Atras da Comec, órgão responsável pelo planejamento metropolitano,
foi desenvolvido o PROSAN, Programa de Saneamento Ambiental da
Bacia do Alto Iguaçu. Nos estudos foram realizados os EIA RIMA,
correspondentes aos componentes do Programa, aprovados pelo
Banco Mundial. Um dos componentes do Programa era a execução
de um Canal paralelo ao rio Iguaçu, que auxiliaria a vazão do rio e, ao
mesmo tempo poderia ser utilizado na captação e aproveitamento de
águas pluviais para o abastecimento da região.
O projetoo estava na prioridade dentro do cronograma do Programa,
até a ocorrência das chuvas torrenciais em janeiro de 1995 e da
previsão metereológica continua do fenômeno "El Niño".
Com as chuvas excepcionais de janeiro, mais de cinco mil moradias
foram atingidas pela cheia, causando um dos maiores danos sociais
e ambientais na região metropolitana de Curitiba. Com o estudo
ambiental prévio realizado e aprovado, o Canal extravasor teve o
projeto executivo acelerado e adaptado às condições extremas
observadas durante as enchentes de janeiro e das possíveis cheias
durante o período das chuvas decorrentes do "El Niño".
Percebe-se mais uma vez no depoimento acima a confirmação de que houve
uma agilização em todo o processo e que o projeto do Canal não era prioritário no
cronograma do PROSAN, pois estava seguindo o processo regular de aprovação, até
que a situação de emergência o colocou como prioridade, agilizando o processo.
A resposta do engenheiro civil Carlos Galerani enfatiza essa agilização em
função da pressão da sociedade neste evento:
Após as cheias de 1983, onde milhares de famílias foram atingidas,
começou-se a discutir alternativas cnicas para melhorar a capacidade
de escoamento do rio Iguaçu. Com a cheia de 1995, o Governo do
Estado decidiu iniciar as obras no trecho entre a BR 277 e o
Zoológico. Isto mostra claramente que os governos, para obras desta
natureza, tem iniciativa após pressão da sociedade.
A hipótese de que uma situação de risco ambiental pode favorecer a internali-
zação de recursos foi comprovada também nos depoimentos dos técnicos envolvidos.
Apesar dos recursos para a execução do Canal estarem elencados dentro
do Programa de Saneamento (PROSAN) e aguardando recursos do Estado, houve
agilização na sua liberação em função da situação de emergência.
143
A resposta do Secretário Municipal Nicolau Kluppel confirma a agilização na
alocação de recursos:
Na enchente de 1995, como era uma situação de emergência, com o
repasse do recurso do governo Federal ao Estado foram feitos os
primeiros 9 km do Canal Extravasor e ao Município de Curitiba fez-se
a redragagem de 14 km do rio Iguaçu, a qual não estava prevista
no orçamento.
O diretor-presidente da COMEC, Luiz Hayakawa, igualmente confirma esta
afirmação:
Num período de seis meses, foram feitos levantamentos cadastrais
dos terrenos, contatos com os proprietários e desapropriões de suas
áreas. Foi discutido e apresentado o projeto executivo na Assembléia
Legislativa. Destinaram-se recursos para as desapropriações e obras
de Arte como pontes foram feitas.
Os recursos do Governo Federal foram discutidos para aplicar em
obras que reduziriam os problemas sociais ocasionados pelas enchentes.
Assim, a obra do Canal Extravasor, com a concepção de assegurar a
maior área possível de armazenagem e amortecimento de águas
pluviais se tornou fundamental. Uns dos fortes argumentos para a
realizão da obra foram os repetidos gastos nas sucessivas inundações
decorrentes de chuvas, que estavam se tornando freqüentes e com
danos cada vez maiores à população. Ou seja, mais recursos seriam
necessários para atender a população atingida, caso não se
adotasse medidas concretas e efetivas para prevenir as cheias e
enchentes decorrentes das fortes chuvas.
O engenheiro José Scroccaro, da Suderhsa, tamm enfatiza que a alocação de
recursos vem em função de uma emergência: "Infelizmente pouco se planeja e o se
faz manutenção das obras executadas. Trabalhamos mais em ações de emergência
e pouco em planejamento, e os recursos vêm sempre em função da emergência."
Da resposta acima se evidencia claramente a alocação de recursos em face
da situação de risco.
Com relão a haver outros projetos de situações similares ao do Canal também
foi questionado, para verificar se foi dado o mesmo tratamento de agilização nos
seus trâmites administrativos. Serviu também para constatar que o estudo de caso
do GPU Canal Extravasor se diferencia de outros, isto é, depara-se com um caso único
e singular perante o fenômeno selecionado. A engenheira florestal Themis Piazzeta,
quando perguntada a respeito de outros projetos que não seguiram os trâmites
144
administrativos, lembra que quando da reativação da dragagem do canal do litoral
paranaense, houve a dispensa do EIA/RIMA, porém a situação era diferente da
encontrada no Canal Extravasor, como confirma no seu depoimento:
Quando da solicitação da licença prévia para o canal do litoral, houve
um parecer baseado na Resolução do CONAMA (Conselho Nacional
de Meio Ambiente) n.
o
01, de 23 de janeiro de 1986, em que define
que a exigência de Estudo de Impacto Ambiental e seu respectivo
Relatório de Impacto Ambiental (EIA/RIMA), deve acontecer para
empreendimentos novos. Como as obras para a abertura desse
canal iniciaram-se na década de 60, não seria mais o caso de análise
ambiental por meio desses documentos. Portanto, para o estudo das
implicações ambientais da reativação das atividades dessa obra foi
exigido apenas um Plano de Controle Ambiental (PCA).
Esse mesmo exemplo foi lembrado pelo engenheiro civil Nicolau Kluppel,
porém relatando que após ter iniciado a redragagem houve interdição pelo Ministério
Público alegando que esse projeto deveria ser submetido ao EIA/RIMA.
O Plano de Desenvolvimento do Litoral previa a redragagem do Canal
do Litoral que além de aumentar a sua capacidade de vazão serviria
tamm para ser navevel. Na época foi executado um trecho pequeno,
próximo de Matinhos e depois foi embargado pelo Ministério Público
por entenderem que deveria ter um Eia/Rima.
Esse caso diferencia-se da situação do Canal Extravasor justamente por não
ser emergencial. Sabe-se que mais tarde o próprio Ministério Público solicitou a
continuação da obra porque houve uma chuva muito forte e provocou inundação
exatamente onde as obras paralisaram.
Outro exemplo citado pela socióloga Schirle Branco foi o derramamento de
óleo da Refinaria de Araucária da Petrobras nos rios Barigui e Iguaçu ocasionando
um grande risco ambiental à ictiofauna, à fauna e à flora.
O acidente de derramamento de óleo nos rios Barigui e Iguaçu. Foi
criada uma portaria definindo um grupo de trabalho emergencial onde
participaram: Petrobrás, IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente),
IAP. Apesar da PETROBRÁS (Companhia Brasileira de Petróleo) ter
a licença ambiental, foi elaborado um documento complementar ao
parecer estratégico do Ministério do Meio Ambiente justificando o
licenciamento. Pelo dano ambiental causado a PETROBS foi multada
como medida compensatória.
145
Nesse caso houve uma situação de risco, exigiu-se uma solução emergencial
pelos técnicos, na ocasião sabe-se que foram feitos desvios do rio para dentro das
cavas de areia e com isso conseguiu-se controlar a poluição das águas. Quanto aos
recursos para reparar os danos, segundo o jornal Gazeta do Povo (2007), houve
mais tarde repasse de 40 milhões de reais ao IAP como medida compensatória e até
hoje há uma briga na justiça contrariando o valor. Mais uma vez esta situação não se
assemelha ao do Canal Extravasor, pois não se destinaram recursos para sanar
uma situação emergencial, mas sim após o desastre como medida compensatória.
Do exposto acima, pode-se concluir que o Estudo de Caso do Canal Extravasor
configura-se como um caso único perante o fenômeno selecionado.
Analisando-se as respostas dos cnicos envolvidos, pode-se afirmar que houve
agilização no nível do planejamento e da gestão urbana nas liberações de recursos,
em função de que ocorreu uma situação de emergência, confirmando-se, portanto, a
hipótese inicial.
Ressalta-se nessas entrevistas a imporncia devida à capacidade dos cnicos,
nas diversas áreas, quanto à melhor solução para sanar os problemas a eles apresen-
tados, bem como a forma da gestão praticada nesta questão. Porém, do mesmo
modo que a situação de risco acelerou a implantação das obras do Canal, acredita-
se também ter permitido alguns eventos adversos ao projeto, como dito na inicial
desta dissertação.
O que se procura colocar aqui em análise é o fato de que muitas vezes o
planejador idealiza um espaço de convivência que nem sempre corresponde com a
realidade. Constata-se que limitações no planejamento urbano quando se procura
atender suas necessidades mais básicas. Se o planejamento pode ser entendido,
segundo Ultramari (2007), como ato de planejar a cidade que se deseja, que define
como deverá ser seu futuro, quais os caminhos a seguir, as prioridades a adotar, os
espaços a ocupar e a não ocupar, as obras a serem feitas, isto tudo não parece
mais ser suficiente. São essas as limitações do planejamento urbano analisadas a
seguir e seus eventos adversos. Para tanto, selecionou-se como exemplo uma área
de ocupação irregular próxima ao rio Iguaçu denominada Bolsão Audi.
146
4.4.3 Limitações do planejamento - Bolsão Audi
A intervenção realizada pelo poder público da construção do GPU Canal
Extravasor para minimizar o risco de inundações ao longo do Rio Iguaçu como
medida estruturante para toda a região, pode ter produzido eventos adversos ao
planejamento. Observou-se que uma área por onde passou o Canal, ao longo do rio
Iguaçu estava desocupada até 1996, conforme visto anteriormente na Figura 18.
Infelizmente, após a construção do Canal, esta área sofreu uma invasão, fato este já
observado anteriormente nas Figuras 19 e 20. Acredita-se que esta situação pode
ser caracterizada como um fenômeno adverso ao planejamento, ou seja, não se
esperava que esta área fosse ser invadida, tendo em vista ser uma APA, portanto de
usos bem restritivos. Esta área ficou designada como Bolsão Audi e pode ser
visualizada na Figura 25.
Figura 25 - Mapa de Curitiba com a localização do Canal Extravasor e o
Bolsão Audi
Fonte: IPPUC/COHAB-CT/1999/2000
147
Pode-se dizer que a construção do Canal Extravasor provocou uma perceão de
risco devel aceivel para a comunidade permitindo, dessa forma, a ocupação da área.
O Bolsão Audi tem sete anos de existência e encontra-se inserido na bacia
hidrográfica do rio Iguaçu, dentro de sua área de proteção ambiental (APA) Municipal
do Iguaçu, no bairro Uberaba.
O Bolsão Audi é formado por um conjunto de sete vilas: Audi, União Reno/
Jardim União, União Ferroviária, Jardim Icaraí, Alvorada II, Lorena e Savana. Essas
ocupações irregulares estão localizadas ao longo do Rio Iguaçu, compartimentadas
pela rodovia federal BR-277, pelo ramal ferroviário e pela Avenida Comendador
Franco que faz a principal ligação até o aeroporto. Essas ocupações totalizam 2.554
domicílios, segundo o Cadastro Único do Governo Federal (Cadúnico) aplicado pela
Companhia de Habitação Popular de Curitiba (COHAB-CT) no primeiro semestre de
2007, e que subsidiou a caracterização das famílias apresentadas a seguir.
Considerando a realidade diferenciada de cada área, a caracterização e perfil
socioeconômico das famílias foram organizados da seguinte forma pela COHAB-CT:
a) Perfil Bolsão Audi: áreas Jardim Alvorada II, Audi, Jardim Icaraí, União
Ferroviária,União Reno/Jardim União;
b) Perfil Vila Savana e Lorena.
Neste trabalho será enfocado o perfil do Bolsão Audi.
Verifica-se que 64,14% das pessoas estão na faixa etária entre 0 e 30 anos
de idade, portanto uma população jovem na qual, dentre as faixas etárias de maior
prevalência, destacam-se as faixas entre 07 a 13 anos, representando 19,37% e de
18 a 30 anos, 21,47% da população total.
Esses dados indicam grande presença de jovens em idade economicamente
ativa, principalmente no período de inserção no mercado de trabalho, o que aponta
para a necessidade deões do poder blico conjuntamente com Instituições Privadas
e ONGs, para criação de alternativas de trabalho e geração de renda, mediante a
oferta de cursos profissionalizantes, estímulo à conclusão das etapas de ensino,
parcerias com o setor privado para abertura dos postos de trabalho, entre outras.
As crianças e os adolescentes representam 32,7% do total da população.
Para este segmento populacional, deve ser priorizado o processo de formação na
sua totalidade escolar, nutricional, educacional, cultural, emocional, o qual demanda
148
extensa e eficaz rede de serviços e proteção social, a ser ofertada pelo poder público
competente (direitos da criança e adolescente ECA). No caso dos adolescentes,
paralelamente ao ensino regular, faz-se necessária inserção em programas de
educão complementar ou ainda inserção protegida, no mercado de trabalho.
O Bolsão Audi conta com percentual de 4,1% de pessoas idosas na comunidade.
Mesmo não sendo uma parcela predominante da população é uma demanda que
requer atenção nas ações do poder público no que se refere aos serviços de apoio
e atenção ao idoso, principalmente na humanização dos atendimentos públicos.
É importante considerar também o grupo de pessoas entre 55 e 59 anos que podem ser
incluídas em ões de prevenção e assessoramento no preparo para as necessidades
do envelhecimento.
A relação de nero está expressa de forma semelhante na comunidade: 48,9%
das pessoas são do sexo masculino e 51% do sexo feminino. entre os titulares
26
,
grande diferença: em 71,8% das famílias as titulares o mulheres, enquanto em
28,14% os titulares são homens. Estes dados apontam para a consolidação do
princípio de garantir à mulher a titularidade do domicílio buscando salvaguardar o
direito dos filhos em caso de dissolução da união do casal de pais.
Identifica-se que das 6.181 pessoas cadastradas, 2.024 encontram-se estudando,
o que representa 32,7% da população total. Estes dados correspondem princi-
palmente à faixa entre 7 e 15 anos, idade escolar com ensino garantido pelo poder
público municipal.
Do total de pessoas que acessam o Ensino Fundamental (1627 pessoas),
76% são crianças até 15 anos, 24% são pessoas acima de 18 anos que retomaram
os estudos na fase adulta. Em relação ao Ensino Médio, das 221 pessoas, 41,1%
são adolescentes em idade escolar. Verifica-se ainda que 20 pessoas na faixa etária
entre 18 a 40 anos estão cursando o nível superior, conforme mostra a Tabela 4.
26
Titulares são as pessoas responsáveis pela família e que têm o título de propriedade da casa.
149
Analisar a taxa de alfabetização é um indicador importante que expressa a
situação educacional da população e a necessidade de investimentos da política
educacional, visando à redução das desigualdades sociais e econômicas.
Tabela 4 - Caracterização das famílias do Bolsão Audi (Jardim Alvorada II, Audi, Jardim Icaraí, União Ferroviária, União
Reno/Jardim União) - Escolaridade da comunidade X Faixa etária
FAIXA ETÁRIA
SÉRIE CONCLUÍDA DA POPULAÇÃO QUE ESTUDA
Nunca estudou
Educação
Infantil/Creche
1.
a
a 4.
a
Ensino
Fundamental
5.
a
a 8.
a
Ensino
Fundamental
1.
a
a 3.
a
Ensino Médio
Ensino
Superior
TOTAL
N.
o
%
N.
o
%
N.
o
%
N.
o
%
N.
o
%
N.
o
%
N.
o
%
0 a 06 anos
670
56,88
156
100,00
0
0,00
0
0,00
0
0,00
0
0,00
156
7,71
07 a 13 anos
142
12,05
0
0,00
699
82,24
291
37,45
0
0,00
0
0,00
990
48,91
14 a 15 anos
11
0,93
0
0,00
48
5,65
199
25,61
0
0,00
0
0,00
247
12,20
16 a 17 anos
11
0,93
0
0,00
32
3,76
141
18,15
91
41,48
0
0,00
264
13,04
18 a 30 anos
59
5,01
0
0,00
22
2,59
100
12,87
111
50,23
16
80,00
249
12,30
31 a 40 anos
61
5,18
0
0,00
16
1,89
30
3,86
12
5,43
3
15,00
61
3,01
41 a 50 anos
56
4,75
0
0,00
14
1,65
9
1,16
4
1,81
0
0,00
27
1,33
51 a 55 anos
23
1,95
0
0,00
8
0,94
4
0,51
1
0,45
1
5,00
14
0,69
56 a 60 anos
39
3,31
0
0,00
2
0,24
3
0,39
0
0,00
0
0,00
5
0,25
61 a 64 anos
25
2,12
0
0,00
2
0,24
0
0,00
0
0,00
0
0,00
2
0,10
65 anos ou mais
81
6,88
0
0,00
7
0,82
0
0,00
2
0,90
0
0,00
9
0,44
TOTAL
1.178
156
7,71
850
42,00
777
38,39
221
10,92
20
0,99
2.024
Fonte: COHAB-CT (2007)
Em relação à escolaridade dos titulares, observa-se que os índices de analfabe-
tismo (nunca estudou) e analfabetismo, 38,7% destes acessaram educação até
4.
a
série do ensino fundamental, o que cria para os moradores e conseqüentemente
para suas famílias toda uma situação de grande vulnerabilidade: exclusão do mercado
formal, maior dificuldade de agregar renda e desproteção social do trabalho. Isso
gera um quadro que demanda, além da intervenção específica na política de
educação, atenção especial com relação ao alcance das ações para esta população,
para não agravar uma possível dificuldade de gerir as questões relativas à moradia,
enfrentamento de situações de desastres ambientais como as inundações, as
questões relacionadas à saúde, entre outras.
No entanto, observa-se que a escolaridade dos cônjuges aponta indicadores
diferenciados, a grande maioria apresenta o Ensino Médio, 94,6%. Vale ressaltar,
que do total de cônjuges 83,7% são do sexo masculino.
150
Tabela 5 - Caracterização das famílias Jardim Alvorada II, Audi, Jardim Icaraí, União Ferroviária, União Reno/Jardim União -
Situação de emprego dos maiores de 18 anos
SITUAÇÃO EMPREGO
TITULAR
CÔNJUGE
COMUNIDADE
Qtde.
%
Qtde.
%
Qtde.
%
Empregador
1
0,06
0
0,00
4
0,06
Autônomo com previdência
30
1,72
8
1,59
56
0,91
Autônomo sem previdência
435
24,89
217
43,23
881
14,25
Empregado com vínculo
140
8,01
47
9,36
279
4,51
Empregado sem vínculo
161
9,21
35
6,97
363
5,87
Desempregado
708
40,50
151
30,08
1.507
24,38
Aposentado/pensionista
114
6,52
10
1,99
180
2,91
Do lar
Estudante
1.733
28,04
Incapaz
Eventual
Outros
151
8,64
34
6,77
826
13,36
Não informado
8
0,46
0
0,00
352
5,69
TOTAL
1.748
28,28
502
8,12
6.181
Fonte: COHAB-CT (2007)
A Tabela 5 acima mostra que a baixa escolaridade interfere na forma de inserção
no mercado de trabalho, na situação de emprego e na renda das famílias, e apresenta
a situação de emprego dos maiores de 18 anos. Considerando os dados referentes
aos titulares e cônjuges, observa-se que 38,2% informam que não trabalham
(desempregados), 28,9% são autônomos sem previdência e 8,7% assalariados sem
vínculo empregatício. Estes representam um número significativo de responsáveis
pelo domicílio que não estão inseridos no sistema de proteção social trabalhista.
Num desastre, deve-se levar em conta a forma como as populações
compreendem e reagem aos desastres. Esta situação além de estar diretamente
relacionada com a questão econômica do indivíduo, também está diretamente
relacionada com o seu grau de instrução. Esta situação pode ser verificada na
ocupação do Bolsão Audi.
Tabela 6 - Caracterização das famílias Jardim Alvorada II, Audi, Jardim Icaraí, União Ferroviária,
União Reno/Jardim União - Renda dos titulares e cônjuges
FAIXA DE RENDA
TITULAR
CÔNJUGE
Qtde.
%
Qtde.
%
Sem renda
580
33,18
135
26,68
Até R$ 199,00
267
15,27
87
17,19
De R$ 200,00 até R$ 300,00
248
14,19
139
27,47
De R$ 301,00 a R$ 400,00
290
16,59
71
14,03
De R$ 401,00 a R$ 500,00
161
9,21
42
8,30
De R$ 501,00 a R$ 600,00
76
4,35
17
3,36
De R$ 601,00 a R$ 700,00
39
2,23
7
7,39
De R$ 701,00 a R$ 800,00
38
2,17
3
0,59
De R$ 801,00 a R$ 900,00
15
0,86
2
0,40
De R$ 901,00 a R$ 1.050,00
14
0,80
1
0,20
Acima de R$ 1.050,00
20
1,14
2
0,40
TOTAL
1.748
506
Fonte: COHAB Curitiba (2007)
151
Conforme a Tabela 6, 33,18% dos titulares dos domicílios declaram-se sem
renda e 46,15% informam renda até um salário mínimo. Vale ressaltar que cerca de
72% dos titulares são do sexo feminino. Estes dados apontam para a realidade
vivenciada no mercado de trabalho que desfavorece a mulher tanto na situação de
emprego quanto na remuneração. Em geral, para estas mulheres, os postos de
trabalho mais encontrados o relativos às funções domésticas, que o consideradas
de menor valor, desqualificadas para remuneração, precárias e com poucas possibi-
lidades de asceno profissional. Mesmo quando inseridas no mercado formal, muitas
dessas mulheres não conseguem nem a renda de um salário mínimo, tendo em vista
a carga horária reduzida possível de ser conciliada com o cuidado dos filhos.
Outro dado relevante refere-se às mulheres únicas responveis pelos domilios.
Na pesquisa, verificou-se que 528 mulheres assumem a responsabilidade da manu-
tenção da casa e cuidado com os filhos com precariedade, pois a renda apresentada
em geral não ultrapassa a dois salários mínimos. A situação mais agravada é a
daquelas titulares que não possuem renda ou, quando a têm, permanecem na faixa
de até um salário mínimo.
Para o poder público, esta demanda aponta a necessidade de priorização
em ações de qualificação profissional e geração de trabalho e renda, tendo em vista
que as famílias contam basicamente com a força de trabalho e provimento dessas
mulheres. Além disso, o poder público precisa garantir e monitorar a inserção dos
filhos dessas mulheres no ensino regular e atividades de contra-turno, a fim de
permitir condições de qualificação e trabalho para o sustento das famílias e evitar
que as crianças e os adolescentes fiquem sem um responsável pelo seu cuidado
enquanto as mães trabalham.
Um percentual significativo dessas famílias o consegue suprir suas necessi-
dades sicas, sobrevivendo em condão de grande vulnerabilidade. Dessa maneira,
com orçamento mínimo, os moradores voltam-se para as necessidades básicas,
especialmente alimentão. As demais, ainda que primordiais, são relegadas ao segundo
plano, e neste enquadram-se as relativas à saúde, ao vestuário, à educação, a
atividades de lazer das crianças e adolescentes, bem como as relativas às moradias, ao
acesso permanente a serviços de infra-estrutura, o que será apresentado adiante.
A precariedade de renda, aliada aos baixos índices de escolaridade, contribui para a
manutenção dos níveis de pobreza, concorrendo para pouca expectativa de melhoria
nas condições de trabalho, emprego e renda, e em última análise de qualidade de
152
vida. De acordo com o que Kaztman (1999); Rodriguez (2000, 2001); Pizarro (2001) e
Bustamante (2000) abordam, a questão da vulnerabilidade está vinculada à pobreza
e como componente de crescente imporncia dentro do complexo de desvantagens
sociais e demográficas. Este é o contexto com que vivem estas famílias, sem
condições de suprir as necessidades básicas de sobrevivência.
Do exposto acima, também a condição socioeconômica interfere na situação
de moradia. Em geral, a renda das famílias não permite a construção nos padrões
mínimos exigidos pelas normas construtivas de habitação, colocando em risco seus
moradores em face da precariedade de suas moradias. Com relação à moradia,
97,9% dos domicílios são casas térreas. O tipo de material utilizado na construção
em 47,4% dos domicílios é a alvenaria e em 46,4% a madeira, conforme Tabela 7.
Tabela 7 - Caracterização das famílias Jardim Alvorada II, Audi, Jardim Icaraí,
União Ferroviária, União Reno/Jardim União- Tipo de construção
MODALIDADE
TOTAL
%
1. Alvenaria
829
47,43
2. Adobe
6
0,34
3. Taipa revestida
0
0,00
4. Taipa não revestida
2
0,11
5. Madeira
811
46,40
6. Material aproveitado
18
1,03
7. Outro
82
4,69
TOTAL
1.748
Fonte: COHAB-CT (2007)
Os domicílios apresentam sérios problemas ocasionados pela falta de janelas
abertas para áreas livres que permitam a ventilação e a entrada de iluminação
natural, fator esse que, associado ao número inadequado de cômodos, ao mero
de pessoas da família e organização do espaço, potencializa o risco de doenças
infecto contagiosas, conforme se verifica na Tabela 8.
Tabela 8 - Caracterização das famílias Jardim Alvorada II, Audi, Jardim Icaraí, União Ferroviária, União Reno/Jardim União -
Número de pessoas no domicílio X Número de cômodos utilizados como dormitório
NÚMERO DE
PESSOAS
NÚMERO DE CÔMODOS
1 cômodo
2 cômodos
3 cômodos
Mais de 3
cômodos
TOTAL
N.
o
%
N.
o
%
N.
o
%
N.
o
%
N.
o
%
Sozinha
12
21,43
29
18,13
49
13,76
104
8,84
194
11,10
2 pessoas
16
28,57
30
18,75
61
17,13
194
15,50
301
17,22
3 pessoas
5
10,71
43
26,88
98
27,53
257
21,85
404
23,11
4 pessoas
15
26,79
34
21,25
77
21,63
245
20,88
371
21,22
5 pessoas
5
8,93
11
6,88
33
9,27
208
17,69
257
14,70
6 pessoas
2
3,57
7
4,38
28
7,87
94
7,99
131
7,49
7 pessoas
0
0,00
5
3,13
4
1,12
51
4,34
60
3,43
Mais de 7 pessoas
0
0,00
1
0,63
6
1,69
23
1,96
30
1,72
TOTAL
56
3,20
160
9,15
356
20,37
1.176
87,28
1.748
Fonte: COHAB Curitiba (2007)
153
Portanto, nos casos das ocupações do Bolsão Audi o tipo das moradias e o
local onde foram construídas aumentou o evento de risco na região.
Em relação à composição familiar, 44,3% das famílias apresentam densidade
habitacional de 3 a 4 pessoas no domicílio. Os números destacados representam um
maior grau de vulnerabilidade em relação ao número de pessoas e cômodos
utilizados como dormitório, sendo 9% das famílias. Quanto maior o número de
pessoas na moradia, maiores serão os problemas enfrentados na organização da
dinâmica familiar, principalmente em relação às múltiplas tarefas desenvolvidas por
seus membros que acabam por exigir espaços diferenciados para cada tipo de
atividade doméstica praticada. Nestes casos, evidenciam-se as condições precárias
de habitabilidade, pois o mínimo espaço não permite condições adequadas.
Cabe ainda ressaltar que, para boa parte dos domilios, o destino dos dejetos
domiciliares é completamente inadequado e insalubre, sendo que 69,4% das falias
não possuem atendimento com rede de esgoto. Este quadro exige atenção do poder
blico no sentido de tanto em viabilizar na nova área de moradia condições adequadas
de destinação e coleta dos dejetos quanto de sensibilizar as famílias para deste serviço.
Em relão ao abastecimento de água, apesar de utilizarem a rede pública, as
falias em geral o mantêm o medidor individualizado, utilizando ligões irregulares.
Em relão ao fornecimento de energia, cerca de 72% das falias encontram-se
com fornecimento de energia individualizado, o que remete, além da ausência de
infra-estrutura básica comum às áreas de ocupação irregular que as expõe a riscos
e privação eventual, à falta de condições de manutenção dos custos do serviço.
A grande maioria das famílias, 87%, informa a coleta pública como destino do
lixo. No entanto, isso não representa a separação adequada do lixo orgânico e lixo
reciclável, demandando ações que sensibilize a comunidade para novas práticas em
relação ao lixo produzido.
A população de áreas de ocupação irregular, pelo alto grau de vulnerabilidade
social, já está inserida em programas e serviços públicos de saúde, educação,
assistência, entre outros. Em relação aos programas sociais federais, o Bolsa
Família e o PETI são os programas com maior número de inserção.
Acompanhando a afirmativa de Ultramari (2008b, p.1) de que desastres
relacionam-se com fenômenos inesperados e conseqüências indesejadas, esse
desastre ocorrido, ou seja, a invasão, a degradação ambiental, a pobreza, mais a
154
ocorrência de chuvas na região, acarretou na exposição dessa população a uma
grande vulnerabilidade de risco, o que se traduziu o pela contaminação das
pessoas por leptospirose, mas pelas perdas econômicas e sociais, e o efeito dessas
perdas sobre a economia e sobre as condições de vida na região, colocando também
em risco os esforços dos governos na direção do desenvolvimento econômico.
Sabe-se que quando o choque de um desastre se dissipa, as pessoas ficam
mais conscientes da vulnerabilidade, podendo dificultar a reconstrução de suas vidas.
Este sentimento de impotência diante das dificuldades da vida pode acarretar outros
problemas como a revolta principalmente por parte dos jovens, levando-os à
criminalidade e às drogas.
Esse desastre poderia ser evitado ou minimizado. Faltou por parte das autori-
dades o chamado "juízo crítico", como Mattedi (2007a) caracterizou. O poder público
foi em parte conivente com esta situação, principalmente por parte do Ministério
Público, que na ocasião foi solicitado a intervir, uma vez que se tratava de áreas
particulares que estavam sendo usadas à revelia da lei, pois se tratava de uma APA,
e disse nada poder fazer tendo em vista a questão social dessa população. As
organizações não-governamentais (ONGs), que têm como objetivo a preservação do
meio ambiente, também foram omissas ausentando-se em se pronunciar a respeito
desta situação. Também faltou por parte da populão que ocupou essa área a
percepção do risco. Tem-se conhecimento de que a perceão do risco é diretamente
proporcional ao grau de desenvolvimento social de um determinado grupo populacional.
Provavelmente essa comunidade aquilatou o vel de risco como aceitável, ou seja,
determinou como tolerável e razoável instalar-se na área após considerar as
possíveis conseqüências desta ocupação. Apenas instalou-se não levando em conta
as possíveis variáveis físicas e ambientais.
Diante disso, a dificuldade dos gestores em lidar com as questões sociais, em
entender os comportamentos e as necessidades da comunidade é um desafio
constante e, segundo Lerner (2007), tem de haver vontade política, visão estratégica e
visão de solidariedade e por fim montar-se uma equação de co-responsabilidade.
Evento adversos como este podem e devem ser revertidos pelo poder público.
Do exposto acima algumas medidas positivas de gestão e planejamento
foram tomadas por parte do poder público com relação à ocupação do Bolsão Audi
ao lidar com as adversidades por meio das ferramentas do planejamento urbano.
155
A Prefeitura de Curitiba, por meio da COHAB-CT está investindo recursos para
a reurbanização da área em parceria com o governo Federal: relocação, drenagem,
pavimentação, construção de galerias e canal de drenagem; como medida
institucional, foi decretado pelo Prefeito de Curitiba área de área de utilidade pública
(Decreto n.
o
894/2007) e área de criação de parque pelo Decreto n.
o
520/2008 ao
longo de rio Iguaçu com a função de amortecimento das águas pluviais, contenção
de cheias, controle da degradação do solo, evitar a ocupação desordenada na área
de risco e promover o turismo ambiental e cultural com a implantação do GPU
Parque do Centenário, conforme a Figura 26 a seguir.
Figura 26 - Fotografia da área definida como de utilidade pública pelo Decreto n.
o
894/ 2007
Fonte: COHAB-CT
Nota: Montagem da pesquisadora.
Dessa forma, partindo de necessidade de mitigar áreas degradadas e
ocupadas com moradias e atividades irregulares, o projeto de reurbanização e de
implantação do novo parque procura aliar o respeito à cultura de um povo, à
conscientização da população em relação ao meio ambiente, educação, trabalho e
até mesmo proteção e segurança contra desastres naturais. Como conseqüência da
urbanização e regularização dos assentamentos promovidos pelo poder público,
156
o plano de drenagem recomenda a implantação de lagoas de amortecimento na
prevenção e controle de cheias, promovendo a recuperação e melhoria da qualidade
hídrica da região.
As medidas urbanísticas ao serem aplicadas possibilitam que os aspectos
negativos sejam minimizados potencializando os ganhos positivos, como observado
no Quadro 4, no qual tenta-se resumir o que foi apreendido. Toda síntese conta com
o risco de simplificações, para tanto, adotou-se uma terceira coluna, em que se
observa eventuais reparações a essas mesmas generalizações.
Quadro 4 - Eventos negativos e eventos positivos
EVENTO NEGATIVO
(OCORRÊNCIA)
EVENTO POSITIVO
(MEDIDAS URBANÍSTICAS)
OBSERVAÇÕES
Enchente de 1983
Precipitação pluviométrica de 97,9 mm
8240 pessoas atingidas
4.234 casas afetadas
Relocações, retificação e dragagens de
rios, tratamento de taludes, limpeza e
desobstrução de valetas e tubulações
As medidas emergenciais adotadas
pelo poder público foram paliativas e
não resolveram os problema das
inundações.
Enchente de 1995
Precipitação pluviométrica de 121 mm
16.655 desabrigados
3.999 casas inundadas
Construção do Canal Extravasor
A construção do Canal deveria ser
implantado conjuntamente com a
construção de um parque. Desta forma
evitaria a invasão que ocorreu em 1998.
Sabe-se que a limitação orçamentária
não permitiu na ocasião a implantação
do parque
Enchente de 2001
Precipitação pluviométrica de 71,8 mm
1748 desabrigados
701 casas atingidas
Contaminação por leptospirose
Emergenciais básicas
As pessoas atingidas foram justamente
as que invadiram a área de preservação
destinada a parque. A Legislação em si
não foi suficiente para conter essa
situação. Falhou o poder público em
deixar que a ocupação se consolidasse
Enchente de 2002
Precipitação pluviométrica de 79,9 mm
807 casas alagadas
A Prefeitura investiu R$ 6 milhões em
22 obrasÇ drenagens e limpeza de rios,
constrição de pontes e canais
Apesar da prevenção a novas
enchentes com obras mais estruturais a
cidade ainda sofreu com as inundações
Enchente de 2003
Precipitação pluviométrica de 220 mm
51 casas alagadas
Construção de um canal de
macrodrenagem ao longo da Vila
Yasmin
A terra retirada da escavação para as
obras do canal de drenagem foi
utilizada para elevar a cota de nível na
área de reassentamento da Vila Yasmin
Enchente de 2007
Precipitação pluviométrica de 210 mm
7.000 desabrigados
Decreto n.
o
520/ 2008 Criação do
Parque Centenário, reurbanização do
Bolsão Audi
Essa medida institucional permitiu a
solução de uma área cujos proprietários
há muito não estavam cumprindo com
as obrigações de cidadania em função
da invasão e que estava se
deteriorando dia-a-dia. As obras
iniciaram em agosto de 2008.
Nota: Elaborado pela pesquisadora.
157
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao finalizar esta dissertação, pode-se concluir pela confirmação da hipótese,
a partir do Estudo de Caso e dos estudos teóricos, de que situações de risco, como
no caso analisado das inundações, aceleraram a tomada de decisões no nível do
planejamento urbano, em face do caráter emergencial do evento, ou seja, de calami-
dade pública, e podem permitir a internalização de recursos para as intervenções
necessárias, sendo comprovada com o estudo de caso do GPU Canal Extravasor.
O papel do planejamento urbano nas decies das ações de preveão e redução
de ocorrências de situações de risco pode ser um grande aliado na estruturação dos
espaços atingidos por uma situação de vulnerabilidade. Os instrumentos do plane-
jamento podem ser ferramentas importantes para a gestão dos problemas das cidades,
pom,o há confirmação de impactos a respeito dos tratamentos adequados, mesmo
porque foram trabalhados nesta pesquisa com parâmetros usualmente conhecidos
do planejamento.
A implementação de um GPU quando construído em áreas que sofreram um
desastre natural, para fins de resolver situações de risco, tal qual os de caráter sani-
tarista, contam com menor grau de críticas, por explicitamente buscarem a segurança
de compartimentos da cidade.
Conclui-se que o planejamento e a gestão podem reverter ou minimizar
impactos dos fenômenos naturais considerados de grande risco.
Embora não seja possível controlar totalmente as enchentes catastróficas,
existe a possibilidade de estabelecer medidas estruturais para promover a minimizão
dos seus efeitos. Exemplos dessas medidas são a implantação de parques lineares
com áreas de retenção das águas pluviais, de lazer e matas ciliares, permitindo que
os rios possam extravasar dos seus leitos sem afetar as áreas das moradias; utilizar as
áreas de fragilidade ambiental com equipamentos de complementação aos parques:
campos de futebol, canchas de areia, playgrounds e dessa forma evitar ocupações
inadequadas.Também os esfoos quando integrados, como no caso do Canal entre os
três níveis governamentais: Municipal, Estadual e Federal, mostraram-se eficientes,
focando um objetivo, o de reduzir o risco. Portanto, medidas que podem promover
a minimização dos inúmeros impactos que ocorrem com as inundações, princi-
158
palmente, buscando diminuir prejuízos materiais das pessoas atingidas, e, sobretudo,
procurando evitar o elevado número de vítimas fatais que sempre ocorrem com as
enchentes urbanas.
A própria legislação quando cumprida é uma medida natural de proteção.
Os prejuízos gerados pelas enchentes também podem ser minimizados, se a popu-
lação for mais bem preparada para enfrentar este tipo de situação, conforme visto no
referencial teórico quanto à questão da vulnerabilidade das pessoas cujo processo
desencadeia um ciclo de vulnerabilidade: as populações mais carentes sofrem mais
impactos porque estão mais expostas aos riscos de desastres, e porque sofrem mais
impactos têm menor capacidade de enfrentar os desastres. Evidenciou-se também
que a maior ocorrência e o maior número de pessoas afetadas por acidentes com
origem natural o agravados e potencializados por conta de densidades ocupacionais
e do nível de vulnerabilidade das populações submetidas a eles. Sendo este cenário
exemplificado pela ocupação do Bolsão Audi.
Dada à complexidade de se entenderem todas as questões que envolvem
as comunidades e o ambiente das áreas de risco, é possível também compreender
a dificuldade das tomadas de decisão dos gestores junto a essa população e a
esses ambientes.
Os referenciais teóricos pesquisados, favoreceram a definição de contornos
mais precisos para compreender o processo de formação das cidades e a
consideração de se integrar a análise do espaço com as questões sociais e os
processos políticos. Permitiram também entender os instrumentos do Planejamento
Urbano e sua importância na organização e gestão da cidade.
No que se refere à abordagem dos conceitos sobre GPUs mais relacionado
com as intervenções do período desenvolvimentista e sanitarista do começo do
século no Brasil mostrou que é possível abordá-los com outro enfoque que não o de
espetacularização. A escolha de se trabalhar com o estudo de caso do GPU Canal
Extravasor é um exemplo desta tipologia, além de configurar-se como um caso único
diante do fenômeno selecionado.
Em relação aos depoimentos dos técnicos envolvidos no processo, pode-se
pensar que talvez a ampliação da amostragem, inserindo representantes da comu-
nidade diretamente envolvida também poderia enriquecer as conclusões, aportando
mais garantia na forma de analisar as hipóteses levantadas.
159
O conceito abordado com relação à fenomenologia dos acidentes naturais,
riscos e vulnerabilidade socioambiental permitiu na caracterização do Bolsão Audi a
importância em considerar simultaneamente o conceito de risco em sua dimensão
ambiental e no contexto socioecomico, bem como considerar a relão a desastres
com a sua ocorrência e intensidade nas comunidades afetadas. É necessário salientar
que talvez outras referências teriam trazido uma perspectiva diferente uma vez que a
vulnerabilidade é um conceito social que pode permitir outro tipo de abordagens que
o essas. Esses conceitos também alertaram para o fato de que esse fenômeno não
pode ser analisado do ponto de vista tão-somente do fenômeno natural e sim da sua
relão com os aspectos sociais, ecomicos e mesmo das estruturas governamentais
e da sociedade.
A fragilidade ambiental principalmente na poão leste de Curitiba evidenciou a
imposição a rias restrições para sua ocupação. As medidas urbanísticas, ao serem
aplicadas, possibilitam que os aspectos negativos sejam minimizados potencializando
os ganhos positivos.
É importante observar que do ponto de vista do planejamento de toda a região
de abrangência do Canal Extravasor, foram observadas não apenas as restrições
físicas do terreno, da calha do rio, da topografia. O planejamento como indutor de
desenvolvimento considerou as variáveis (densidade, de circulão, de infra-estrutura e
ambientais) e redefiniu as diretrizes de ocupação para toda essa área. Esta redefinão
foi entendida como uma externalidade do projeto. Não era intenção do projeto essa
ampliação da área do Parque, mas resultou numa potencialidade.
A conclusão da hipótese de que situações de risco aceleram a tomada de
decisões no nível do planejamento urbano, diante do caráter emergencial do evento,
permitindo a internalização de recursos para as intervenções necessárias, sendo
comprovada com o estudo de caso do GPU Canal Extravasor, é no entanto passível
de ser complementada ou mesmo revista a partir de novos estudos similares,
ampliando a amostra aqui trabalhada. A inclusão de estudos de caso em outras
realidades urbanas, sociais e econômicas que não a da cidade de Curitiba poderá
também aportar novos parâmetros para se tomar essa conclusão válida para um
universo mais amplo.
Cabe aos gestores, no enfrentamento do desafio de planejar a cidade, valorizar o
pragmatismo e incorporar instrumentos diversos na busca por soluções, ou seja,
160
considerar a necessidade de competir por recursos com instrumentos diversos,
demonstrando a eventuais agentes financeiros da importância de uma determinada
intervenção. Por mais paradoxal que isso possa parecer, a explicitação de carências
e de situações emergenciais pode servir como um desses instrumentos. Se essa
assertiva está correta, resta apreender a oportunidade. Tal pensamento incorpora o
fato de que as cidades são dinâmicas e que ao serem estimuladas e construídas em
conjunto trazem avanços e efeitos impactantes às pessoas e ao meio em que vivem.
161
REFERÊNCIAS
AB'SABER, A. N. Notas a respeito do sítio urbano de Curitiba. In: Geomorfologia.
São Paulo: Instituto de Geografia USP, 1966. v.3.
ALBUQUERQUE, L. A. A.; MOTA, T. L. T.C. S. Diagnóstico das ações de
combate e controle de enchentes e inundações em Curitiba. 2006. Monografia
do Curso de Pós-Graduação em Emergências Ambientais do Departamento de
Engenharia Ambiental -PUCPR, Curitiba, 2006.
ALTSHULER, A.; LUBEROFF, D. Megaprojects. The changing politics of urban
public investments. Washington: Brookins Institution Press, Lincoln Institute of
Land Policy, 2003.
ANDRADE, M. M. N. A.; SZLAFSZTEIN,C. F. Estudo de vulnerabilidade a
inundações como subsidio ao planejamento urbano no município de Novo
Repartimento, Estado do Pará. In: ENCONTRO DA ASSOCIÃO NACIONAL DE
PÓS-GRADUÃO E PESQUISA EM PLANEJAMENTO URBANO E REGIONAL, 12.,
2007, Belém. Anais... Belém (PA), 2007.
ARANTES, O.; VAINER, C.; MARICATO, E. A cidade do pensamento único:
desmanchando consensos. Petrópolis: Vozes, 2000.
BECK, U. Risk society: towards a new modernity. Trad. Mark Ritter. London: Sage,
1996. 260p.
BERTOLINI, A. D. Instrumentos urbanísticos de desenvolvimento urbano.
In: MONTANDON, D. T.; SOUZA, F. F. Land readjustment e operações urbanas
consorciadas. São Paulo: Romano Guerra, 2007.
BOLETIM CASA ROMÁRIO MARTINS. Praças de Curitiba: espaços verdes na
paisagem urbana. Curitiba: Fundação Cultural de Curitiba, v.30, n.131, set. 2006.
BRAGA, R. Plano Diretor Municipal: tres questões para discussão. Caderno do
Departamento de Planejamento da Faculdade de Cncia e Tecnologia UNESP,
Presidente Prudente, v.1, n.1, p.15-20, ago. 1995.
BRASIL. Fundação IBGE. Pesquisa Industrial Anual (PIA) 2000.
162
BRASIL. Ministério das Cidades. Retomando o debate sobre a questão
metropolitana. S.l., 2003. Relatório resumido/questões centrais e propostas da
Reunião Técnica de julho de 2003.(Não publicado).
BRASIL. Lei n.
o
9.985, de 18 de julho de 2000. Institui o Sistema Nacional de
Unidades de Conservação da Natureza SNUC. Disponível em:
<www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L9985.htm >. Acesso em: 15 jul. 2008a.
BRASIL.Ministério das Cidades. Projeto de Lei 3.057/00. Disponível em:
<http://www.cidades.gov.br/secretarias-nacionais/programas-urbanos/biblioteca/
regularizacao-fundiaria/anais-de-eventos/seminario-projeto-de-lei-no-3-057-
00/PL3057.pdf/view>. Acesso em: fev. 2008b.
BRASIL. Sistema Integrado de Administração Financeira. Ministério da Fazenda.
Disponível em: <www.tesouro.fazenda.gov.br/siafi/index.asp>. Acesso em: 28 abr.
2008c.
BRITO, S. Saneamento da Parahyba do Norte: Projecto dos esgotos. Parahyba do
Norte: Imprensa Oficial, 1914.
BURIAN, P. P. Do estudo do impacto ambiental à avalião ambiental estratégica:
ambivalências do processo de licenciamento ambiental do setor elétrico. 2006. Tese
(Doutorado em Ciências sociais) Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da
Unicamp, Campinas, 2006.
BURTON, I.; KATES, R. W.; WHITE, G. F. The environment as hazard. New York:
Oxford University, 1978. 240p.
CARDOSO, A. C. D.; LIMA, J. J. F. Conflicts between national and local approaches
to water usage, hydroeletriciy generation and local communmities living conditions
in Tocantins River, Brazil. Disponível em: <http:// www.mpl.ird.fr/UR044/projets/Textes>.
Acesso em: 18 jul. 2008.
CARRIÇO, J. M. O plano de Saturnino de Brito para Santos: urbanismo e
planejamento urbano entre o discurso e a prática. Espaço e Debates, São Paulo,
n.34, p.55-63, 1991.
CASTELLS, M. A questão urbana. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1983.
CASTELLS, M.; BORJA, J. As cidades como atores políticos. Novos Estudos do
Cebrap, n.45, p.152-166, jul. 1996.
163
CASTELLS, M.; BORJA, J. Planes Estratégicos y Proyetos Metropolitanos. Cadernos
IPPUR/UFRJ, v.11, n.1 e 2, jan./dez. 1997.
CASTRO, A. L. C. Glossário de defesa civil: estudos de riscos e medicina de
desastres. 2.ed. rev. e ampl. Brasília: Mistério do Planejamento e Orçamento -
Secretaria Especial de Políticas Regionais - Departamento de Defesa Civil, 1998.
Disponível em: <www.defesacivil.gov.br>. Acesso em: 09 out. 2008.
CEPAL COMISIÓN ECONOMICA PARA AMÉRICA LATINA Y EL CARIBE. Socio-
demographic vulnerability: old and new risks for communities, householders and
individuals. Summary and conclusions. Brasilia: UNA, 2002. 34p.
COHAB Companhia de Habitação de Curitiba. Plano Municipal de Habitação e
Habitação de Interesse Social. 2007. Disponível em: <www.ippuc.org.br>. Acesso
em: jun. 2008.
COMEC - Coordenação da região metropolitana de Curitiba da SEPL - Secretaria de
Estado do Planejamento e Coordenação Geral do Governo do Estado do Paraná.
Plano de desenvolvimento integrado da Região Metropolitana de Curitiba -
PDI/RMC. Curitiba, 2002. Consórcio Cobrape/Sogreah.
CONDON, P. Planning for Climate Change. Land Lines (Lincoln Institute of Land
policy), Boston, v.1, n.1, Jan. 2008.
CURITIBA. Leis municipais. Disponível em: <http://www.curitiba.pr.gov.br/>.
Acesso em: jul. 2008.
DEFESA CIVIL. Recomendões e informações sobre inundões. 2005. Dispovel
em: <http://www.defesacivil.gov.br/desastres/recomendacoes/inundacao.asp>.
Acesso em: jul. 2008.
DEMO, P. Pesquisa e construção do conhecimento. Rio de Janeiro: Tempo
Brasileiro, 1996.
DESCHAMPS, M. V. Vulnerabilidade sócio ambiental na região metropolitana
de Curitiba. 2004. Tese (Doutorado em Meio Ambiente e Desenvolvimento)
UFPR, Curitiba, 2004.
DESCHAMPS, M. V. Vulnerabilidade cio ambiental: o caso da região metropolitana
de Curitiba. Seminário Inflexões urbanos PPGTU PUCPR, 2007.
164
DOUGLAS, M. Risk, acceptability according to the social sciences. New York:
Russel Sage Foundation, 1985. 115p.
DOUGLAS, M.; WILDAVSKY, A. Risk and culture: an essay on the selection of
technological and environmental dangers. Berkeley: University of California, 1982. 221p.
EIRD. Mission and Objectives. International Strategy for Disaster Reduction Latin
America and the Caribbean. 2006. Disponível em: http://www.eird.org. Acesso em:
fev. 2008.
ELDRIDGE, H. T.; THOMAS, D. S. Population and Economic Growth: United
States, 1870-1950. Philadelphia: The American Philosophical Society, 1964. v.3.
FELDMAN, S. Planejamento e zoneamento. São Paulo: 1947-1972. São Paulo:
EDUSP/FAPESP, 2005.
FENDRICH, R. Economia de água potável pelo uso de sistema de coleta,
armazenamento, utilização e infiltração das águas pluviais. Engenharia &
Arquitetura, v.7, n.91, p.67-72, 2004.
FERREIRA, M. P.; DINI, N. P.; FERREIRA, S. P. Espaços e dimensões da pobreza
nos municípios do Estado de São Paulo: índice paulista de vulnerabilidade social
IPVS. São Paulo em Perspectiva, São Paulo, v.20, n.1, p.5-17, jan./mar. 2006.
FOLADORI, G. Limites do desenvolvimento sustentável. Trad. Marise Manoel.
Campinas: Unicamp, 2001. 221p.
GASTAL, Alfredo. Efeitos sociais e econômicos dos recentes grandes desastres
naturais na américa latina e a necessidade de preveni-los. In: SEMINÁRIO
INTERNACIONAL DE ESTRATÉGIAS E AÇÕES FRENTE A DESASTRES
NATURAIS, 1., Salvador. Anais... Salvador: PNUD/MHU, 1987. p. 11-17
GELLERT, P. K.; LYNCH, B. D. Mega-projects as displacements. International Social
Science Journal, v.55, n.175, p.15-25, 2003.
GIL, A. C. Métodos e técnicas de pesquisa social. São Paulo: Atlas, 1999. 206p.
GONÇALVES, M. F.; BRANDÃO, C. A. (Org.). Regiões e cidades, cidades nas
regiões: o desafio urbano-regional. São Paulo: Unesp, 2003.
165
GONÇALVES, N. M. S. Impactos pluviais e desorganização do espaço urbano
em Salvador-BA. 1992. Tese (Doutorado em Geografia Física) Universidade de
São Paulo, São Paulo, 1992.
GRAGG, R. London's Large-scale Regeneration Projects Offer Community Benefits.
Land Lines (Lincoln Institute of Policy), v.18, n.4, Oct. 2006.
GUATTARI, F. As três ecologias. Trad. Maria Cristina F. Bittencourt. 7.ed. Campinas:
Papirus, 2002.
GUHA-SAPIR, D.; HARGITT, D.; HOYOIS, P. Thirty years of natural disasters
1974-2003: the numbers. Louvain: UCL Presses Universitaires De Louvain, 2004.
HARDT, C.; HARDT, L. P. A.; REZENDE, D. A. Brasil: alise da gênese institucional
do processo de gestão da região metropolitana de Curitiba. In: In: ENCONTRO DA
ASSOCIÃO NACIONAL DE S-GRADUAÇÃO E PESQUISA EM PLANEJAMENTO
URBANO E REGIONAL, 12., 2007, Belém. Anais... Belém (PA), 2007.
HAWKEN, P.; LOVINS, A.; LOVINS, L. H. Natural Capitalism. 2.ed. São Paulo:
Cultrix, 2005.
HAYAKAWA, L. Canal extravasor. Entrevista Ambiente Brasil. 2004. Disponível em:
<www.pescacommosca.com.br/noticia/lernoticia.php?IdtNoticia=869>. Acesso em:
06 jul. 2007.
HEWITT, K.; BURTON, I. The harzardousness of a place: a regional ecology of
damaging events. Toronto: University of Toronto Press, 1971. 154p.
HOGAN, D. J. Populão, pobreza e poluição em Cubao, São Paulo. In: MARTINE, G.
(Org.). População, meio ambiente e desenvolvimento: verdades e contradições.
Campinas: Unicamp, 1993. p.101-132.
IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censos demográficos.
Disponível em: <www.ibge.gov.br>. Acesso em: mar. 2007.
IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Contagem da população,
2007. Disponível em: <www.ibge.gov.br/english/dafault.php>. Acesso em: out. 2008.
166
INSTITUTO DE PESQUISA E PLANEJAMNETO URBANO DE CURITIBA - IPPUC.
Aspectossicos-territoriais. In: Alise, diagnóstico e diretrizes do Plano Municipal
de Desenvolvimento Urbano PMDU. Curitiba, nov. 1985. v.1.
INSTITUTO DE PESQUISA E PLANEJAMENTO URBANO DE CURITIBA - IPPUC.
Plano Diretor 2004: o planejamento urbano de Curitiba. Curitiba: IPPUC, 2004.
INSTITUTO DE PESQUISA E PLANEJAMENTO URBANO DE CURITIBA - IPPUC.
Curitiba em dados. Disponível em: <http://ippucnet.ippuc.org.br/Bancodedados/
Curitibaemdados/Curitiba_em_dados_Pesquisa.asp>. Acesso em: jul. 2008.
INTERNATIONAL STRATEGY FOR DISASTER REDUCTION ISDR. Living with
risk: a global review of disasters reduction iniciatives. Genebre, 2005. Disponível em:
<www.unisdr.org>.Acesso em: out. 2008.
IPEA - Instituto de Planejamento Econômico e Social; IBGE - Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística; NESUR - Núcleo de Economia Social, Urbana e Regional.
Caracterização e tendências da rede urbana no Brasil. Rio de Janeiro, 1999.
IPPUC. Plano Diretor em Curitiba - adequação ao estatuto da cidade. Revista do
Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba Espaço Urbano,
Curitiba, n.6, 2004.
JONES, L. R.; THOMPSON, F. Um modelo para a nova gerencia pública. Revista
do Serviço Público, v.51,n.1, p.41-79, jan./mar. 2000. (New Public Management)
KATES, R. W. Risk assessment of environmental hazards. London: John Wiley &
Sons, 1978. 112p. (SCOPE Report 8).
KAZTMAN, R. (Coord.). Activos y estructuras de oportunidades. Estudios sobre
lãs raíces de la vulnerabilidad social em El Uruguay. Montevideo: Oficina Del
Programa de lãs Naciones Unidas para El Desarollo (PNUD) y Oficina de La CEPAL,
em Montevideo, 1999. (LC/MVD/R, 180).
LAMAS, J. M. R. G. Morfologia urbana e desenho da cidade. 3.ed. Lisboa:
Fundação Calouste Gulbenkian, 2004.
LARA, L. F. A arquitetura se torna mais visível quando falha.Trabalho apresentado
em Louisiana State University, mar. 2007.
167
LEFÊBVRE, H. A revolução urbana. Trad. Sérgio Martins e revisão técnica de
Margarida Maria de Andrade. Belo Horizonte: Ed. Universidade Federal de Minas
Gerais, 1999.
LEFF, E. Epistemologia ambiental. Trad. Sandra Valenzuela. São Paulo: Cortez,
2001. 240p.
LERNER, J. Acupuntura urbana. Rio de Janeiro: Record, 2003.
LERNER, J. A cidade na prancheta. Revista Arquitetura & Construção, set. 2007.
LIMA JUNIOR, P. N.; SANCHEZ, F.; OLIVEIRA, F.; BIENENSTEIN, G. Grandes
projetos urbanos: panorama da experiência brasileira. In: ENCONTRO DA
ASSOCIÃO NACIONAL DE S-GRADUAÇÃO E PESQUISA EM PLANEJAMENTO
URBANO E REGIONAL, 12., 2007, Belém. Anais... Belém (PA), 2007.
LIVERMAN, D. M. Vulnerability to global environmental change. In: CUTTER, S. L.
Environmental risks and hazards. London: Prentice-Hall, 1994. p.326-342.
LUNGO, M. (Org.). Grandes Proyectos Urbanos. El Salvador: UCA Editores y Lincoln
Institute of Land Policy, 2004.
LUNGO, M.; SMOLKA, M. O. Land value and large urban projects: the Latin American
experience. Land Lines (Lincoln Institute of Land policy), Boston, v.17, n.1, Jan. 2005.
LYNCH, K. A imagem da cidade. São Paulo: Martins Fontes, 1997.
MAACK, R. Geografia física do estado do Paraná. São Paulo: Livraria José
Olimpio, 1981.
MARANDOLA JR., E.; HOGAN, D. J. Vulnerabilidades e riscos: entre geografia e
demografia. Revista Brasileira de Estudos de População, São Paulo, v.22, n.1,
p.29-53, jan./jun. 2005.
MARANDOLA JR., E.; HOGAN, D. J. As dimensões da vulnerabilidade. São Paulo
em Perspectiva, São Paulo, v.20, n.1, p.33-43, jan./mar. 2006. Disponível em:
<http://www.seade.gov.br>; <http://www.scielo.br>. Acesso em: jun. 2008.
168
MARENGO, J. A. Mudanças climáticas globais e seus efeitos sobre a
biodiversidade: caracterização do clima atual e definição das alterações climáticas
para o território brasileiro ao longo do século XXI. Brasilia: MMA, 2006.
MARENGO, J. A. Entrevista a Fabio de Castro. Boletim Agência FAPESP, 05 fev.
2007. Disponível em: <http://www.agencia.fapsp.br/materia6689/especiais/futuro-
radical.htm>. Acesso em: ago. 2008.
MATTEDI, M. A. As enchentes como tragédias anunciadas: impactos da
problemática ambiental nas situações de emergência em Santa Catarina. 1999. Tese
(Doutorado em Ciências Sociais) UNICAMP, Campinas, 1999.
MATTEDI, M. As interpretações sociológicas das dinâmicas sociais de construção do
risco na sociedade moderna. Revista Grifos, n.13, nov. 2002.
MATTEDI, M. A questão da seguraa na sociedade do risco. In: Reuno Internacional
por uma Formação Especializada em Psicologia da Emergência e dos
Desastres. Brasília, ago. 2006.
MATTEDI, M. A construção política do problema das enchentes em Blumenau-SC:
novas respostas para velhas questões. 2007. Dissertação (Mestrado em Desenvolvimento
Regional) Universidade Regional de Blumenau, Blumenau-SC, 2007a.
MATTEDI, M. A. Reconceituando os desastres como uma construção social: novas
respostas a velhas questões. In: XIV Encontro Nacional da ABRAPSO UFRJ
Diálogos em Psicologia Social: Epistemológicos, Metodológicos, Éticos, Políticos,
Estéticos, Políticas públicas 2007b.
MATTEDI, M. A.; BUTZKE, I. C. A relação entre o social e o natural nas abordagens
de hazards e de desastres. Ambiente e Sociedade, Campinas, ano IV, n.9, p.93-
114, 2 sem. 2001.
MELLO, T. C.; MACHADO, P. H. B. Do desenvolvimento urbano à sustentabilidade.
Curitiba: IPPUC, 1999.
MEYER, R. M. P. Atributos da metrópole moderna. São Paulo Perspectiva, São
Paulo, v.4, n.4, p.3-9, Oct./Dec. 2000.
MINAYO, M. C. S. O desafio do conhecimento. São Paulo. Hucitec, 1993.
169
MINISTÉRIO DA INTEGRACÃO NACIONAL. Secretaria Nacional de Defesa Civil.
Sistema Nacional de Defesa Civil. Disponível em:
<http://www.integracao.gov.br/sindec/index.htm>. Acesso em: out. 2008.
MOSER, C. The asset vulnerability framework: reassessing urban poverty reduction
strategies. World Development, New York, v.26, n.1, 1998.
MOURA, R. A situão socioeconômica das Reges Metropolitanas: desigualdade
e diversidade regional. Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e
Social IPARDES. maio 2005. Disponível em: <www.abm.org.br/doc/desafio_da_
gestao_urbana_BRASIL_2007.pdf>. Acesso em: 11 jun. 2008.
MOURA, R.; LIBARDI, D.; BARION, M. I. Institucionalização de regiões metropolitanas:
qual sentido? Revista Paranaense de Desenvolvimento, Curitiba, n.111, p.129-143,
jul./dez. 2006.
MUNFORD, L. A cidade na história. São Paulo: Martins Fontes, 1998.
NOVAES, W. Agenda 21 brasileira: bases para discussão. Bralia: MMA/Pnud, 2000.
NOVAIS, P.; OLIVEIRA, F. L.; BIENENSTEIN, G.; SANCHEZ, F. Grandes projetos
urbanos: panorama da experiência brasileira. In: ENCONTRO DA ASSOCIÃO
NACIONAL DE S-GRADUAÇÃO E PESQUISA EM PLANEJAMENTO URBANO E
REGIONAL, 12., 2007, Belém. Anais... Belém (PA), 2007.
OBSERVATÓRIO DAS METRÓPOLES; IPPUR Instituto de Pesquisa e Planejamento
Urbano e Regional; FASE Federação de Órgãos para Assistência Social e
Educacional. Projeto Análise das Regiões Metropolitanas Brasileiras relatório
da atividade 4: como andam as metrópoles brasileiras: relatório final. dez. 2005.
Disponível em: <http://www.observatoriodasmetropoles.ufrj.br/como_anda/como_
anda_ brasil.pdf >. Acesso em: 19 dez. 2006.
OKA-FIORI, C.; CANALI, N. Geomorfologia de Curitiba. Curitiba, Departamento
deGeografia UFPR. (inédito).
OLIVA, J.; GIANSANTI, R. Espaço e modernidade: temas da geografia mundial.
São Paulo: Atual, 1995.
OLIVEIRA, I. C. E. Estatuto da cidade para compreender. Rio de Janeiro:
IBAM/DUMA, 2001. 64p.
170
ONU. Relatório do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas IPCC,
2001.
O'RIORDAN, T.; TIMMERMAN, P. Risk and imagining alternative futures. In:
KASPERSON, R. E. (Ed.). Global environmental risk. Tokyo: United Nations
University Press, 2001.
PERLMAN, J. Uma estratégia de mão dupla para a mudança social delineada
nas cidades. In: SEMINÁRIO CIDADES ANOS 90, CATÁSTROFE OU
OPORTUNIDADE. 1991. Rio de Janeiro. Anais... Rio de Janeiro: Câmara de
Comércio Brasil-Canadá/Iban, 1991.
PINHEIRO, Adilson. Mapeamento da área inunvel de Blumenau-SC. In: Seminário
Internacional de estratégias e ações frente a desastres naturais. 1987, Salvador,
Ministério da Habitação, Urbanismo e Meio Ambiente, 1987. p.17-27.
QUARANTELLI, E. L. Disaster studies: an analysis of the social historical factors
affecting the development of research in the area. In: CUTTER, S. L. (Ed.).
Environmental risks and hazards. London: Prentice-Hall, 1994.
RAMOS, L. C. S.; REZENDE, D. A.; GUAGLIARDI, J. A.; WZOREK, L.. As relações
existentes entre o pensamento estratégico municipal, a gestão por projetos e o
mercado imobiliário urbano. In: SEMINÁRIO INTERNACIONAL DA LARES (Latin
American Real Estate Society), 4., 2004, São Paulo. Anais... São Paulo: LARES, 2004.
RASMUSSON, F. M.; CARPENTER, T. H. Variations in tropical sea surface temperature
and surfacewind fields associated with the Southern Oscillation/El Niño. Monthly
Weather Review, v.110, n.5, p.354-384, 1982.
REZENDE, D. A.; CASTOR, B. J. Planejamento estratégico municipal:
empreendedorismo participativo nas cidades, prefeituras e organizações públicas.
Rio de Janeiro: Brasport, 2005. Disponível em: <www.netpar.com.br/engsoft>.
Acesso em: maio 2007.
RIBEIRO, M. A. Ecologizar: pensando o ambiente humano. 3.ed. Brasília: Universa,
2005.
ROCHEFORT, M. Redes e sistemas: ensinando sobre o urbano e a região. São
Paulo: Hucitec, 1998.
171
RODRIGUEZ, J. Vulnerabilidad demográfica: una faceta de s desventajas sociales.
Santiago Del Chile: Cepal, 2000 e 2001. 79p. (Serie Población y Desarollo n. 5.).
ROGERS, R. Cities for a small planet. Barcelona: Gustavo Gili, 2001.
ROLNIK, R.; MACEDO PINHEIRO, O. Plano diretor participativo: guia para a
elaboração pelos municípios e cidadãos. Brasília: Ministério das Cidades, 2004.
ROPELEWSKI, C. F; HALPERT, M. Quantifying Southern Oscillation precipitation
relationships. Journal of Climate, v.9, p.1043-1059, 1996.
ROPELEWSKI, C. F.; HALPERT, M. Global and regional scale precipitation patterns
associated with the El Niño/Southern Oscillation. Montlhy Weather Review, v.115,
p.1606-1626, 1997.
NCHEZ, F.; BIENENSTEIN, G.; LIMA JR, P.; OLIVEIRA, F.; GUTERMAN, B.;
MARTINS, T. Jogos Pan-Americanos Rio 2007: uma análise transdimensional do
projeto urbano. In: ENCONTRO DA ASSOCIÃO NACIONAL DE S-
GRADUAÇÃO E PESQUISA EM PLANEJAMENTO URBANO E REGIONAL, 12.,
2007, Belém. Anais... Belém (PA), 2007.
SANCHEZ, F.; VAINER, C. Belém, arena política, arena urbanísticas: o espaço
em disputa na retomada das águas. Rio de Janeiro: IPPUR, 2003. (Relatório de
Pesquisa. UFRJ/IPPUR, UFF/EAU, Prefeitura Municipal de Belém, Lincoln Institute
of Land Policy).
SCHORSKE, K. E. Fin-de-Siècle Vienna: politics and culture. Nova York: Vintage;
Alfred Knopf, 1981.
SENNETT, R. O declínio do homem público: as tiranias da intimidade. Trad. Lygia
Araújo Watanabe. São Paulo: Companhia das Letras, 2001.
SILVA, S. M. et al.Composão florística do componente arreo das florestas ciliares
da bacia do rio Tibagi, Paraná. In: CONGRESSO NACIONAL SOBRE ESSÊNCIAS
NATIVAS, 2., 1992, São Paulo. Anais... São Paulo: IF, 1992.
SIMEPAR. Sistema Meteorológico do Paraná, atual Instituto Tecnológico SIMEPAR.
Disponível em: <http:// www.simepar.br/tempo/clima/previsao_clima_pr.jsp>. Acesso
em: abr. 2008.
172
SIMÕES JR., J. G. Cenários de modernidade: os projetos urbanos das capitais
brasileiras no início da república. In: ENCONTRO DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE
PÓS-GRADUÃO E PESQUISA EM PLANEJAMENTO URBANO E REGIONAL, 12.,
2007, Belém. Anais... Belém (PA), 2007.
SOLOMATINE, N. As atividades da UNDRO (Office of United Nations Disaster Relief)
em emerncias de enchentes - prevenção e capacitão. In: Seminário Internacional:
Estratégias e Ações Frente a Desastres Naturais. Brasília: PNUD, 1987. p.133-147.
SOUSA, A.; NOGUEIRA, H. C.; VIDAL, W. Inovação no urbanismo brasileiro da
Primeira República: o traçado de Saturnino de Brito para a expansão da capital
paraibana. Portal Vitruvius. marc 2006.
SOUZA, C. M. de. Metropolização brasileira: uma análise dos anos setenta. 1985.
Dissertação (Mestrado em Administrão blica) Escola Brasileira de Administrão
Pública, Fundação Getúlio Vargas, Rio de Janeiro, 1985.
SUDERHSA - Superintendência de Desenvolvimento dos Recursos Hídricos e
Saneamento Ambiental. Programa de saneamento ambiental da Região
Metropolitana de Curitiba PROSAN, SIG - para gestão de recursos hídricos
do Alto Iguaçu. Curitiba, 2000
SUDERHSA - Superintendência de Desenvolvimento dos Recursos Hídricos e
Saneamento Ambiental. Plano da Bacia do Alto Iguaçu e afluentes do Alto Ribeira.
Relatório de diagnóstico A expansão urbana e a evolução dos sistemas de recursos
hídricos. 2007. Disponível em: <www.recursoshidricos.pr.gov.br/arquivos/File/
COALIAR/Publicacoes/plano_de_bacias/cap05_expansao_urbana.pdf>. Acesso em:
jul. 2008.
THEIS, I. M.; MATTEDI, M.; TOMIO, F. R. L. Novos olhares sobre Blumenau:
contribuições criticas sobre seu desenvolvimento recente. Blumenau: EDIFURB,
2000. 400p.
TOBIN, G. A.; MONTZ, B. E. Natural hazards: explanation and integration. New
York: The Guilford Press, 1997.
TRÊS DESASTRES, sete anos e apenas uma multa paga. Gazeta do Povo, Curitiba,
16 de set 2007, Caderno de Meio Ambiente: valores de indenização ainda são
discutidos na justiça, p.3.
173
TREVISAN, E. O meio físico e a ocupação urbana de Curitiba, PR: estudos de
caso. 2001. Tese (Doutorado em Meio Ambiente e Desenvolvimento) UFPR,
Curitiba, 2001.
ULTRAMARI, C. O fim das utopias urbanas. São Paulo: Studio Nobel, 2005.
ULTRAMARI, C. Guerras, desastres, pobreza, mas também resiliências urbanas.
CEBRAP Novos Estudos, ago. 2006.
ULTRAMARI, C. Relações entre urbanismo e planejamento urbano: uma sugestão de
debate. In: Seminário de história da arquitetura e urbanismo. Recife, set. 2007.
ULTRAMARI, C. Grandes projetos urbanos no Brasil: conceitos, contextualização
e discussão de três casos. Disponível em: <http://www.ifch.unicamp.br/ciec/revista/
artigo3.pdf -2006a>. Acesso em: out. 2008a.
ULTRAMARI, C. Sobre o conceito de vulnerabilidade, risco e emergência em
áreas urbanas. 2008b. (mimeo)
ULTRAMARI, C.; DUARTE, F. 6 fenomenologias urbanas. Evento Araucária sobre
Inflexões Urbanas PUC/PR, 2007.
ULTRAMARI, C.; REZENDE D.; FIRMINO, R. Dos conceitos de acidentes e suas
correlações sociodemográficas: o caso do Estado do Paraná. In: ENCONTRO
NACIONAL DE ESTUDOS POPULACIONAIS, 16., 2008, Caxambu. Anais...
Caxambu (MG), 2008.
ULTRAMARI, C.; REZENDE, D. Urban resilience and slow motion disasters. Revista
City & Time, v.2, n.3, 2007.
UNEP. Relatório Mudanças Climáticas UNEP, SBCI. 2007. Disponível em:
<http://www.unep.fr ou www.unep.org>. Acesso em: 06 jul. 2007.
VAINER, C. B.; SÁNCHEZ, F. Estudo comparativo de duas intervenções
urbanísticas em Belém: 'Ver o Rio' e 'Estação das Docas'. Rio de Janeiro:
IPPUR/UFRJ, Prefeitura Municipal de Belém, Lincoln Institute of Land Policy, 2001.
VILLAÇA, F. Uma contribuição para a história do planejamento urbano no Brasil. In:
DEÁK, C.; SCHIFFER, S. R. (Orgs.). O processo de urbanização no Brasil. São
Paulo: EDUSP-FUPAM, 1999.
174
VILLAÇA, F. As ilusões do plano diretor. São Paulo, edição do autor, ago. 2005.
Disponibilizado em: www.vitruvius.com.br/resenhas/texto/resenha/32.asp>. Acesso
em: jul. 2008.
VOITCH, G. Três desastres, sete anos e apenas uma multa paga. Gazeta do Povo,
Curitiba, 16 set. 2007. Caderno Meio Ambiente, p.3.
WHITE, A. V.; BURTON, I. Environmental risk assessment. London: John Wiley &
Sons, 1980. 157p.
YIN, R. K. Case study research. London: Sage Pub., 1994.
ZANELLA. M. E. Inundações urbanas em Curitiba Pr: impactos, riscos e
vulnerabilidade socioambiental no bairro Cajuru. 2006. Tese (Doutorado) Meio
Ambiente e Desenvolvimento Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2006.
175
APÊNDICES
176
APÊNDICE A
QUESTIONÁRIO 01
Conversa com o então governador do Estado do Paraná em 1995,arquiteto Jaime
Lerner e Secretário de Obras e Saneamento de Curitiba, engenheiro civil Nicolau Kluppel
sobre o Canal Extravasor:
O primeiro canal executado foi o canal intercavas, o qual foi construído para minimizar
o problema de inundação na região do Boqueirão. Haviam as cavas remanescentes da
exploração de areias ao longo do rio Iguaçu e a Secretaria de Obras e Saneamento de
Curitiba executou a interligação das cavas dando origem a um grande lago, que além da
função de lazer: prática de remo e canoagem (Parque Náutico) também auxilia na drenagem
de toda a área de planície do bairro Boqueirão. Este canal intercavas é navegável e foi
concebido para ser uma hidrovia, ligando o Parque Náutico até o Zoológico.
Na enchente de 1995 com o repasse do recurso do governo Federal ao Estado foram
feitos os primeiros 9 km do Canal Extravasor e ao Município de Curitiba fez-se a redragagem
de 14 km do rio Iguaçu, a qual não estava prevista no orçamento.
O IAP aprovou o EIA-Rima.
Na enchente de 1983, o rio Ressaca localizado em São Jo dos Pinhais transbordou,
porque no local onde se situava a Boneca do Iguaçu (restaurante dançante) foi feito um
desvio do rio, pelo proprietário, forçando o curso do rio para a sua montante, ou seja,
forçando o rio a subir.
Em 1995 o engenheiro Nicolau Kluppel era Secretário de Obras e Saneamento de
Curitiba. A atuação da Secretaria era sobre: lixo, drenagem, água e esgoto.
O Plano de Desenvolvimento do Litoral previa a redragagem do Canal do Litoral que
além de aumentar a sua capacidade de vazão serviria também para ser navegável. Na
época foi executado um trecho pequeno, próximo de Matinhos e depois foi embargado pelo
Ministério Público por entenderem que deveria ter um Eia-Rima.
Uma nova visão de meio ambiente em Curitiba surgiu com a questão do lixo. Houve
programas e campanhas educativas para a separação do lixo e a conseqüente prorrogação
da vida útil do aterro sanitário.
177
Segundo Lerner quando aparece uma "ferida" abre-se uma oportunidade. Exemplo
disso são os vários parque criados pela Prefeitura. O que antes era considerado uma
situação de risco é transformada em oportunidade para se fazer uma intervenção e mudar
positivamente a situação. Essa é a função do planejamento. O Parque Barigui, onde hoje
está implantado o lago, era uma área toda ocupada com moradias irregulares. O Parque
Náutico, antes era uma área cheia de cavas de areia, degradada e hoje é um parque de
esportes náuticos. O Parque das Pedreiras era uma área degradada pela exploração de
jazidas de pedras e hoje serve de palco para grandes espetáculos ao ar livre. O bosque
onde hoje se situa a Universidade Livre do Meio Ambiente, antes era uma área de ponto de
drogados. É importante destacar que os dirigentes devem ter vontade política para executar
os projetos e muita criatividade.
178
APÊNDICE B
QUESTIONÁRIO 02
Entrevista com o Diretor Presidente da Coordenação da Região Metropolitana de
Curitiba (COMEC), arquiteto Luiz Masaru Hayakawa.
1) Como se deu a licença ambiental?
Resposta: Em 1989, iniciou-se os estudos na bacia do rio Belém, visando a recuperação
e recomposição de suas margens e matas ciliares. Em busca de recursos do Banco
Mundial, os estudos tomaram uma maior dimensão e se estenderam para a Bacia do
Alto Iguaçu, na região metropolitana de Curitiba. Através da COMEC, órgão responsável
pelo planejamento metropolitano, foi desenvolvido o PROSAN, Programa de Saneamento
Ambiental da Bacia do Alto Iguaçu. Nos estudos foram realizados os EIA-RIMA,
correspondentes aos componentes do Programa, aprovados pelo Banco Mundial. Um
dos componentes do Programa era a execução de um canal paralelo ao rio Iguaçu, que
auxiliaria a vazão do rio e, ao mesmo tempo poderia ser utilizado na captação e
aproveitamento de águas pluviais para o abastecimento da região.
O projeto não estava na prioridade dentro do cronograma do Programa, até a ocorrência
das chuvas torrenciais em janeiro de 1995 e da previsão metereológica continua do
fenômeno "El Nino".
Com as chuvas excepcionais de janeiro, mais de cinco mil moradias foram atingidas
pela cheia, causando um dos maiores danos sociais e ambientais na região
metropolitana de Curitiba. Com o estudo ambiental prévio realizado e aprovado, o Canal
Extravasor teve o projeto executivo acelerado e adaptado às condições extremas
observadas durante as enchentes de janeiro e das possíveis cheias durante o período
das chuvas decorrentes do "El Nino".
O que antes se previa apenas um canal auxiliar de vazão de águas pluviais, procurou-
se estender ao máximo possível, a distância entre o canal e o rio, formando uma área
de proteção mais abrangente, sujeita a cheias, mas com a função de se tornar um
grande Parque como barreira pra impedir as ocupações irregulares. Assim, o Canal
Extravasor também se tornou importante para os estudos de ordenamento físico
territorial dos municípios envolvidos. Onde a lei de uso do solo define como limite para a
ocupação urbana.
179
2) Qual foi o seu poder de decisão, em função do cargo que ocupava na época?
Resposta: Como Diretor Presidente da COMEC, tive o poder de decisão para executar
as ões delegadas diretamente pelo Governador do Estado do Paraná. A responsabilidade
pelo planejamento, pelos projetos, das medidas adotadas e as obras a serem realizadas
foram coordenadas pela COMEC.
3) Em comparação com outras situações de emergência o que alterou no tempo com
outras decisões, houve uma agilização?
Resposta: A reação imediata ao evento catastrófico e as medidas emergenciais para
evitar a ocorrência de mais enchentes durante a ocorrência do "El Niño" previsto para o
semestre, foram os diferenciais com relação às ocorrências de anos anteriores. As
medidas tomadas para desapropriar os terrenos necessários para a execução do canal
e as áreas de amortecimento e acumulação de cheias entre o canal e o rio Iguaçu foram
fundamentais para a execução das obras emergenciais e a continuidade do projeto.
A determinação do Governador do Estado em buscar a solução e resolver o problema
das cheias e não apenas atuar nos efeitos das ocorrências que se repetiam em chuvas
torrenciais cada vez mais em intervalos menores, foi importante para sentir as
mudanças nas áreas atingidas.
As ações realizadas em 1983 foram de recuperação e de reparação nas valetas, em
função das obstruções e assoreamentos dos rios e canais. O maior trabalho foi de
minimizar os danos causados pela enchente e com algumas obras pontuais, assegurar
o melhor escoamento das águas pluviais. Infelizmente, não houve a preocupação em
alterar o zoneamento nos locais mais atingidos e não se adotou as medidas de
desapropriação de áreas para manter possíveis locais preventivos de armazenamento e
amortecimento de águas como reservatórios no futuro. O que explica o número maior
de moradias atingidas pela enchente em 1995, em relação a 1983.
Em 1995, com as desapropriações de áreas e as relocações de moradias em áreas de
risco somadas às obras do Canal Extravasor, houve uma definição mais clara das áreas
de proteção ambiental e com restrições quanto ao adensamento na ocupação urbana.
O que reduziu sensivelmente os danos causados pelas chuvas nos anos subseqüentes.
4) Quais outros projetos semelhantes ao do Canal que não precisaram seguir os
tramites normais?
Resposta: Em casos de catástrofes ambientais ou naturais onde a população e a infra-
estrutura são diretamente atingidas e as obras necessárias para normalizar a situação
se tornam emergenciais, o EIA/ RIMA pode ser relegado em face da eminência de uma
calamidade pública. Nesse caso, o Poder Executivo pode decretar o estado de emerncia
e de calamidade pública para restaurar a ordem e recuperar e recompor a infra-estrutura
180
perdida. O prazo máximo para realizar as medidas emergenciais não pode ultrapassar
seis meses.
5) Você consegue observar mudanças no nível da gestão, houve uma integração
multidisciplinar, no planejamento e no repasse de verbas quando das enchentes
ocorridas em 1983 e 1995?
Resposta: Em 1983, a visão da enchente, apesar de afetar a região metropolitana, foi
de que a cidadelo de Curitiba seria a maior atingida pelos danos das chuvas e enchente.
Na ocasião, a nível metropolitano não se observou a integração entre os órgãos que
poderiam adotar ou definir um planejamento e uma gestão eficaz contra ocorrências do
mesmo nível. As medidas ficaram restritas em aumentar as seções de valetas e realizar
mais dragagens dos rios assoreados pela falta de conservão e manutenção. Em Pinhais,
na Vila Maria Antonieta e no Jardim Weissópolis, ficaram inundadas pela enchente de
1983. Posteriormente, essas áreas continuariam a sofrer pela falta de escoamento de
águas pluviais e mesmo assim,o se adotou nenhuma medida restritiva em sua ocupação.
Os recursos pleiteados se destinavam mais à Defesa Social, no sentido de minimizar a
aflição da população atingida e diminuir a tensão social.
em 1995, o efeito da enchente na região metropolitana se agravou, pelo maior
número de desabrigados, exatamente pelo aumento da população que se instalou nessas
áreas de risco ambiental. Daí, uma mudança de postura na gestão e no planejamento
da região. Os órgãos envolvidos, como a PGE, SUDHERSA, IAP, SANEPAR, COPEL
(Companhia Elétrica do Estado do Paraná), COMEC e as Prefeituras Municipais numa
gestão compartilhada e integrada realizaram as medidas necessárias. Num período de
seis meses, foram feitos levantamentos cadastrais dos terrenos, contatos com os
proprietários e desapropriações de suas áreas. Foi discutido e apresentado o projeto
executivo na Assembléia Legislativa. Destinaram-se recursos para as desapropriações
e obras de Arte como pontes foram feitas.
Os recursos do Governo Federal foram discutidos para aplicar em obras que reduziriam
os problemas sociais ocasionados pelas enchentes. Assim, a obra do Canal Extravasor,
com a concepção de assegurar a maior área possível de armazenagem e
amortecimento de águas pluviais se tornou fundamental. Uns dos fortes argumentos
para a realização da obra foram os repetidos gastos nas sucessivas inundações
decorrentes de chuvas, que estavam se tornando freqüentes e com danos cada vez
maiores à população. Ou seja, mais recursos seriam necessários para atender a
população atingida, caso não se adotasse medidas concretas e efetivas para prevenir
as cheias e enchentes decorrentes das fortes chuvas.
O traçado do canal foi discutido com os órgãos envolvidos e ouvido a INFRAERO
(Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária), que na ocasião iniciava as obras
181
de terraplenagem e ampliação do Aeroporto Afonso Pena. Em face de uma contribuição
maior de águas pluviais decorrentes da Bacia onde se localiza o Aeroporto, com a
previsão de uma terceira pista, a proposta do Canal Extravasor se distanciou mais do rio
Iguaçu, para ampliar as dimensões das áreas de armazenagem e contenção de cheias.
E os antigos meandros do rio Iguaçu formaram vasos comunicantes entre o Canal e o
próprio rio Iguaçu. Dessa maneira, o planejamento e a gestão dos órgãos como a
SUDHERSA, SANEPAR, COMEC, COPEL e as Prefeituras Municipais tinham o canal
extravasor como uma diretriz e limite a ser seguida em seus planos de expansão. Até
mesmo a diretriz metropolitana do anel viário definido pela COMEC teve que proceder a
sua alteração, para evitar os mesmos conflitos que causam na cidade de São Paulo,
com relação às margens do rio Tietê e as vias marginais de circulação. Freqüentemente
inundadas e confinando as águas do rio, causam congestionamento e danos ambientais
de difícil solução na conservação ambiental das margens do rio. Assim, uma via local ao
longo do canal, pode ser mais adequado para usos de menor densidade habitacional,
mais desejável para a região, devido ao cone de aproximação de aeronaves ao
Aeroporto Afonso Pena.
Dessa forma, com áreas extensas entre o canal e o rio Iguaçu já desapropriada, obteve-
se a real perspectiva e amplitude do Parque Metropolitano do Iguaçu. De fato, permite a
ligação do Zoológico Municipal de Curitiba, junto ao Contorno Sul até as nascentes do
Irai, Palmital, Atuba e outras, formando a maior rede de biodiversidade da Bacia do Alto
Iguaçu. Seu uso abrange desde os espaços para a prática esportiva como o Remo,
canoagem, baseball, peladeiros bem como para as atividades culturais e educativa, de
lazer e meio ambiente. O reconhecimento das obras e ações realizadas em 1995 será
maior, na medida em que se consolida o uso do Parque Metropolitano pela população.
Porém é importante que os órgãos responsáveis pelo planejamento e gestão da Bacia
do Alto Iguaçu tenham a visão global e integrada da Região. Assim, o controle de
cheias e enchentes na região reduz os seus efeitos catastróficos na infra-estrutura e
com danos sociais bem menores em relação às ocorrências de 1983 e 1995.
182
APÊNDICE C
QUESTIONÁRIO 03
Entrevista com o Secretário de Obras e Saneamento de Curitiba na época, engenheiro
civil Nicolau Kluppel.
1) Como se deu a licença ambiental do Canal Extravasor?
O IAP aprovou o EIA/RIMA.
2) Qual foi o seu poder de decisão, em função do cargo que ocupava na época?
Como Secretário de Obras e Saneamento de Curitiba, fizemos, o Jaime e eu, um
sobrevôo na área atingida e após observar a situação das pessoas afetadas e as casas
inundadas foi feita uma reunião com as várias instituições envolvidas e decidiu-se pela
construção imediata do Canal Extravasor e a redragagem do rio Iguaçu a partir da Br-
277 à montante do rio, para melhorar a sua vazão.
3) Em comparação com outras situações de emergência o que alterou no tempo com
outras decisões, houve uma agilização?
Na enchente de 1995, como era uma situação de emergência, com o repasse do recurso
do governo Federal ao Estado foram feitos os primeiros 9 km do Canal Extravasor e ao
Município de Curitiba fez-se a redragagem de 14 km do rio Iguaçu, a qual não estava
prevista no orçamento.
4) Quais outros projetos semelhantes ao do Canal que não precisaram seguir os
tramites normais?
O Plano de Desenvolvimento do Litoral previa a redragagem do Canal do Litoral que
além de aumentar a sua capacidade de vazão serviria também para ser navegável. Na
época foi executado um trecho pequeno, próximo de Matinhos e depois foi embargado
pelo Ministério Público por entenderem que deveria ter um Eia-Rima.
5) Você consegue observar mudanças no nível da gestão, houve uma integração
multidisciplinar, no planejamento e no repasse de verbas quando das enchentes
ocorridas em 1983 e 1995?
O Estado e o Município de Curitiba se integraram para resolver um problema que era
comum. Essa visão demonstrava como a questão ambiental é um problema que
envolve a todos. De nada adianta cuidar da qualidade das águas de um rio à montante
se na sua jusante não há esse cuidado, comprometendo o seu uso pelo próximo vizinho
e assim por diante.
183
APÊNDICE D
QUESTIONÁRIO 04
Entrevista com a Chefe do Departamento de Avaliação de Impacto Ambiental (DAIA),
vinculado à Diretoria de Licenciamento Ambiental do Instituto Ambiental do Paraná (IAP),
engenheira florestal Themis Piazzetta Marques.
1) Como se deu a licença ambiental?
Resposta: A SANEPAR (Companhia de Saneamento do Paraná) como proponente do
Projeto PROSAN solicitou ao IAP a Licença Prévia, para os 4 empreendimentos que
faziam parte desse Projeto: Canal Extravasor, Barragem do Irai, para o manancial de
abastecimento de água para Curitiba e região metropolitana, Estação de Tratamento de
Esgoto do Atuba e Aterro Sanitário de Almirante Tamandaré.
2) Qual foi o seu poder de decisão, em função do cargo que ocupava na época?
Resposta: A decio foi embasada em todos os pareceres dos cnicos que faziam parte
da equipe multidisciplinar (diversas áreas técnicas pertinentes ao assunto) e interinstitucional
(diversas instituições, tais como: COMEC, IBAMA, Prefeituras, SUDERHSA - Superinten-
dência de Desenvolvimento de Recursos dricos e Saneamento Ambiental e Promotoria
de Meio Ambiente), montada para a análise desses 4 empreendimentos, bem como, do
resultado das Audiências Públicas (prevista em Resolução do Conama) realizadas para
cada um dos empreendimentos.
3) Em comparação com outras situações de emergência o que alterou no tempo com
outras decisões, houve uma agilização?
Resposta: Dada a urgência para a solução dos impactos ambientais causados pela
falta de implantação desses empreendimentos, foi formada uma equipe técnica ciente
do prazo restrito, que trabalhou na análise e no licenciamento ambiental desses 4
empreendimentos, de forma ágil, colocando-os como prioridade.
4) Quais outros projetos semelhantes ao do Canal que não precisaram seguir os
trâmites normais?
Resposta: O canal do litoral. Quando da solicitação da licença prévia para esse
empreendimento, houve um parecer baseado na Resolução do CONAMA (Conselho
Nacional de Meio Ambiente) n.
o
01, de 23 de janeiro de 1986, em que define que a
exigência de Estudo de Impacto Ambiental e seu respectivo Relatório de Impacto
184
Ambiental (EIA/RIMA), deve acontecer para empreendimentos novos. Como as
obras para a abertura desse canal iniciaram-se na década de 60, não seria mais o caso
de análise ambiental por meio desses documentos. Portanto, para o estudo das
implicações ambientais da reativação das atividades dessa obra foi exigido apenas um
Plano de Controle Ambiental (PCA).
5) Você consegue observar mudanças no nível da gestão, houve uma integração
multidisciplinar, no planejamento e no repasse de verbas quando das enchentes
ocorridas em 1983 e 1995?
Resposta: Essa resposta eu não vou ter condição de dar, mas posso orientar que se
tente um contato com José Luiz Scrocaro e Everton Luiz da Costa Souza, ambos da
SUDERHSA, pois talvez eles tenham condição de responder ou indicar quem poderia.
185
APÊNDICE E
QUESTIONÁRIO 05
Entrevista com o Diretor de Engenharia da Superintendência de Recursos Hídricos e
Saneamento do Paraná (SUDERHSA), engenheiro civil José Scroccaro.
1) Como se deu a licença ambiental do Canal Extravasor?
Resposta: Em função da primeira enchente ocorrida em 1983, foi elaborado um projeto
de intervenção mais estruturante de construção de um Canal Extravasor. Este projeto
fazia parte do Prosan (Programa de Saneamento Ambiental da Região Metropolitana de
Curitiba) no qual também constavam mais três grandes projetos: a barragem do Iraí, a
estação de tratamento de esgoto do Atuba e o aterro sanitário de Almirante Tamandaré.
Foi elaborado EIA/RIMA destes projetos no qual foram exigidos algumas compensações
ambientais:
a) um plano de macrodrenagem (executado);
b) replantio de mata ciliar;
c) relocação de dois loteamentos da área de risco, acompanhados pelos técnicos do
Banco Mundial, cuja preocupação era com relação a questão social dessas famílias;
d) acompanhamento da ONG AMAR, principalmente nos trabalhos da draga que
estava abrindo o Canal, cuja preocupação eram relacionados aos peixes que por
acaso poderiam ser dragados e material excedente, ou seja, areia (70%). Estas
questões foram resolvidas de forma muito simples: os peixes coletados foram
vendidos ou consumidos pela população do entorno e a areia foi explorada no
mercado pelos proprietário das áreas por onde passou o Canal. Com isso diminuiu o
custo de destinação adequada do material retirado (bota-fora);
e) uma equipe de fiscalização para acompanhar todas as fases da obra do Canal tendo
o cuidado com a questão ambiental.
Tem que se louvar estas exigências do Banco Mundial, pois os danos ambientais foram
mínimos, bem como todas as relocacões foram efetuadas amigavelmente.
A grande enchente de 1995 ajudou a agilizar o processo para a execução do Canal
Extravasor.
2. Qual foi o seu poder de decisão, em função do cargo que ocupava na época?
Resposta: Tive liberdade de ação, logicamente dentro do cumprimento das Normas,
para adequar, paralisar quando necessário, mudar o sistema, etc.
186
3. Em comparação com outras situações de emergência o que alterou no tempo com
outras decisões, houve uma agilização?
Resposta: Na mesma época foi feita a limpeza dos canais do litoral, apesar de não ser
emergencial, pois estavam assoreados e provocando problemas de enchentes e
alagamentos. Estes canais foram executados em 1948 com o objetivo de saneamento e
permitir a atividade de agricultura da rego. Até 1989 a manutenção destes canais era de
responsabilidade do DNOS. A partir de 1989 a Suderhsa ficou encarregada da manuteão.
Foi elaborado um Plano Básico Ambiental como ação planejada de impacto, incluindo
basicamente a limpeza ao longo de seus 150 km de exteno, passando pelos municípios
de Pontal do Paraná, Matinhos e Guaratuba.
4. Quais outros projetos semelhantes ao do Canal que não precisaram seguir os
tramites normais?
Resposta: Todos os outros projetos seguiram os trâmites normais, incluindo o projeto
do Canal. A única diferença foi a agilização na aprovação por ser emergencial e (ou)
quando abrande área social e de criação de parques.
5. Você consegue observar mudanças no vel da gestão, houve uma integração
multidisciplinar, no planejamento e no repasse de verbas quando das enchentes
ocorridas em 1983 e 1995?
Resposta: A somatória de ações dos órgãos executivos, ambientais (IAP, Suderhsa) e
de planejamento (Comec, SEPLAN), bem como a equipe técnica e administrativa foram
muito importantes para resolver o problema das enchentes e inundações na região do
Iguaçu. O resultado disso é bem visível, não houve mais enchentes na proporção da
ocorrida no ano de 1995, apesar do aumento da população nos munipios de Piraquara,
Pinhais e São José dos Pinhais, e de áreas impermeabilizadas. Isso demonstra que o
projeto executado foi calculado com vazão adequada e também que a área deixada
entre o Canal Extravasor e o rio Iguaçu absorve perfeitamente as cheias do rio.
Infelizmente pouco se planeja e não se faz manutenção das obras executadas.
Trabalhamos mais em ações de emergência e pouco em planejamento, e os recursos
vêm sempre em função da emergência. Estamos brincando com a sorte, pois, se os
serviços de manutenção do Canal não forem executados, ele perderá parcialmente sua
capacidade hidráulica e fatalmente ocorrerão novas inundações.
187
APÊNDICE F
QUESTIONÁRIO 06
Entrevista com o Diretor... da Superintendencia de Recursos Hídricos e Saneamento
do Paraná (SUDERHSA), engenheiro civil José Galerani.
1) Como se deu a licença ambiental do Canal Extravasor?
Resposta: O Estudo de Impacto Ambiental e o Relatório de Impacto Ambiental foram
desenvolvidos pelo Governo do Estado, através do IAP Instituto Ambiental do Paraná.
2) Qual foi o seu poder de decisão, em função do cargo que ocupava na época?
Resposta: Na época, eu não tinha o poder de decidir, pois ocupava a Diretoria de uma
área que não estava afeta às obras de macro drenagem, porém acredito que o Dr.
Nicolau aconselhou o Governador Lerner da importância de se construir o canal para
minimizar os efeitos das cheias. O que foi feito em 1995, ou seja, a contratação em
regime emergencial, do primeiro trecho do canal. (Entre a BR 277 e o Zoológico).
3) Em comparação com outras situações de emergência o que alterou no tempo com
outras decisões, houve uma agilização?
Resposta: As as cheias de 1983, onde milhares de famílias foram atingidas, começou-se
a discutir alternativas cnicas para melhorar a capacidade de escoamento do Rio Iguaçu.
Com a cheia de 1995, o Governo do Estado decidiu iniciar as obras no trecho entre a
BR 277 e o Zoológico. Isto mostra claramente que os governos, para obras desta
natureza, tem iniciativa após pressão da sociedade.
4) Quais outros projetos semelhantes ao do Canal que não precisaram seguir os
tramites normais?
Resposta: "Todos os outros projetos de controle de cheias, afetos ao PROSAM, seguiram
os trâmites normais, ou seja, não foram contratados em regime emergencial.
5) Você consegue observar mudanças no nível da gestão, houve uma integração
multidisciplinar, no planejamento e no repasse de verbas quando das enchentes
ocorridas em 1983 e 1995?
Resposta: Os cnicos da COMEC, SUDERHSA, IAP e Prefeituras, eso conscientizados
da necessidade de se combater permanentemente as cheias, quer por ações estruturais
ou não estruturais, porem, institucionalmente existe muita dificuldade de atuar de forma
integrada, por razões políticas ou outras que devem ser avaliadas.
Isto dificulta o repasse de verbas para ações concretas.
188
APÊNDICE G
QUESTIONÁRIO 07
Entrevista com a técnica integrante da equipe do Departamento de Avaliação de
Impacto Ambiental do Instituto Ambiental do Paraná (IAP), a socióloga Schirle Margaret Dos
Reis Branco.
1) Como se deu a licença ambiental?
Resposta: Em função da emergência para a construção do canal, o tramite de liberação
do licenciamento foi agilizado, porém com as previsões das medidas mitigadoras e
compensatórias pertinentes as etapas do licenciamento.
2) Qual foi o seu poder de decisão, em função do cargo que ocupava na época?
Resposta: Existia uma equipe formada para responder sobre EIA-RIMA (Estudo de
Impacto Ambiental Relatório de Impacto sobre o Meio Ambiente) e essa equipe emitiu
um parecer técnico para a liberação da licença previa sobre as obras do PROSAN
(Programa de Saneamento Ambiental da Região Metropolitana de Curitiba) na qual
fazia parte a construção do Canal Extravasor.
3) Em comparação com outras situações de emergência o que alterou no tempo com
outras decisões, houve uma agilização?
Resposta: Houve uma agilização na sua liberação em função da situação de
emergência, visto que a região foi tomada pelas enchentes. Outro exemplos ocorreram,
por conta da emergência, porém sempre foi respeitado nos pareceres técnicos as fases
das licenças, com respectivas exigências legais.
4) Quais outros projetos semelhantes ao do Canal que não precisaram seguir os
tramites normais?
Resposta: O acidente de derramamento de óleo nos rios Barigui e Iguaçu. Foi criada
uma portaria definindo um grupo de trabalho emergencial onde participaram: Petrobrás,
IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente), IAP. Apesar da PETROBRÁS
(Companhia Brasileira de Petróleo) ter a licença ambiental, foi elaborado um documento
complementar ao parecer estratégico do Ministério do Meio Ambiente justificando o
licenciamento. Pelo dano ambiental causado a PETROBRÁS foi multada como medida
compensatória.
189
5) Você consegue observar mudanças no nível da gestão, houve uma integração
multidisciplinar, no planejamento e no repasse de verbas quando das enchentes
ocorridas em 1983 e 1995?
Resposta: A solução da construção do Canal Extravasor foi uma alternativa tecnológica
necessária e que deu certo. Não houve mais enchente daquela proporção na região.
Conquanto ao repasse de verbas, a equipe técnica do EIA-RIMA, não se envolve com
este assunto.
Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download:
Baixar livros de Administração
Baixar livros de Agronomia
Baixar livros de Arquitetura
Baixar livros de Artes
Baixar livros de Astronomia
Baixar livros de Biologia Geral
Baixar livros de Ciência da Computação
Baixar livros de Ciência da Informação
Baixar livros de Ciência Política
Baixar livros de Ciências da Saúde
Baixar livros de Comunicação
Baixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNE
Baixar livros de Defesa civil
Baixar livros de Direito
Baixar livros de Direitos humanos
Baixar livros de Economia
Baixar livros de Economia Doméstica
Baixar livros de Educação
Baixar livros de Educação - Trânsito
Baixar livros de Educação Física
Baixar livros de Engenharia Aeroespacial
Baixar livros de Farmácia
Baixar livros de Filosofia
Baixar livros de Física
Baixar livros de Geociências
Baixar livros de Geografia
Baixar livros de História
Baixar livros de Línguas
Baixar livros de Literatura
Baixar livros de Literatura de Cordel
Baixar livros de Literatura Infantil
Baixar livros de Matemática
Baixar livros de Medicina
Baixar livros de Medicina Veterinária
Baixar livros de Meio Ambiente
Baixar livros de Meteorologia
Baixar Monografias e TCC
Baixar livros Multidisciplinar
Baixar livros de Música
Baixar livros de Psicologia
Baixar livros de Química
Baixar livros de Saúde Coletiva
Baixar livros de Serviço Social
Baixar livros de Sociologia
Baixar livros de Teologia
Baixar livros de Trabalho
Baixar livros de Turismo