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do relógio
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. O tempo ritmado por mecanismos irá impor o ritmo do
capital, seguindo a lógica de que quanto mais rapidamente e em maior
quantidade se produzirem mercadorias, mais velozmente e em maior
quantidade se ampliará o lucro dos detentores dos bens e meios de
produção.
A sociedade burguesa também rompe os laços de proteção e
solidariedade social existentes nos grupos, paróquias e feudos, remetendo
suas funções aos Estados centralizados. Essa ruptura sedimenta e indica
um processo cada vez mais intenso de individualização
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, no qual cada
um se vê responsável por si mesmo na luta pela sobrevivência,
independente de grupos, e possuidor de liberdade de locomoção social e
espacial, e se pretendem constituir a cada ser humano como um ser uno e
indivisível: indivíduo. Será que, depois de Freud, podem-se ignorar os
múltiplos conflitos internos que nos assolam, resultantes dessa
individuação?!
Com o rompimento da convivência social não mediatizada pelo
Estado, evaporam-se as alianças entre as gerações humanas, antigas e
atuais, e gera-se o predomínio de um individualismo egocentrado e anti-
social
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. Na sociedade de massas o ser humano está isolado. Só, no meio
da multidão, a solidão do deserto lhe seria menos cruel!
As ligações virtuais propiciadas pela sociedade emergente criam
novas possibilidades de interligações e isolamentos sociais em todas as
esferas da vida: trabalho, lazer, educação, etc. Passeamos pelos parques
ouvindo As Quatro Estações de Vivaldi em nossos headphones, e
perdemos os sons do ambiente; com óculos escuros, protegemo-nos do
intenso brilho do Sol, mas distorcemos as cores da paisagem e ocultamos
nossas pupilas dos outros, evitando o diálogo pelo olhar.
São opções que apresentam perdas e ganhos, e as escolhemos
seguindo nossas oportunidades e valores. Não se trata, aqui, de
dicotomizar maniqueisticamente o complexo, mas de problematizá-lo.
Assim, buscamos compreender as atitudes de Unabomber como
sendo a reação de um indivíduo que vive no atual momento histórico,
contexto portador de variadas formas de representação, que perpassam o
nosso cotidiano, estraçalham os entrelaçamentos solidários das
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WOODCOCK, George. A ditadura do relógio. In: Os Grandes escritos anarquistas.
Porto Alegre: L&PM, 1981.
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Elias, Norbert. A sociedade dos indivíduos. Rio de Janeiro: Zahar, 1994, p. 102.
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Veja referências, por exemplo:
HOBSBAWM, Eric. Era dos extremos. São Paulo: Cia. das Letras, 1995.
LASCH, Christopher. O mínimo eu. São Paulo: Brasiliense, 1987.