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Virgínia — Disseste-me: — Amo-te. E o teu amor, mentido num olhar estudado,
encontrou uma porta escancarada onde deverá encontrar um baluarte inacessível:
amei-te. O resto, tremo de repeti-lo... Meu pai observou-nos e murmurou: — Aqui há
coisa... Chamou-me de parte...
O Doutor — E disse-te...
Virgínia — E disse-me: — Filha, os teus requebros e madeixas pelo Escorrega que,
ente parêntesis, é um farroupilha, podem passar despercebidos a outros olhos que
não sejam os de teu pai. Lembra-te de que já não tens mãe, e és o único penhor de
minha felicidade nesta vida. Esquece-te dele e casa com teu primo Bernardino, para
quem te destinei de pequena.
O Doutor — Estás a perder tempo; sei disso tão bem como tu .
Virgínia — Eu quisera que uma voz misteriosa te repetisse a todo momento essa
história de lágrimas. — Quando sai do quarto do meu pai...
O Doutor — Eu disse-te...
Virgínia — Disseste-me: — Espera-me no jardim. (Com exagerado lirismo.) E foi lá,
ao ciciar da brisa, ao brilho trêmulo da lua, que te repeti as palavras de meu pai...
O Doutor (À parte.) — Estou aqui, estou enforcado...
Virgínia — Nesse instante, parece que o demônio te inspirou estas palavras: —
Amo-te! Virgínia! Lutar contra a vontade de teu pai, será malhar em ferro frio!
Fujamos! Arranjarei um emprego qualquer! Casar-nos-emos! Uma dia voltaremos à
casa de teu e pedir-lhe-emos a sua benção!
O Doutor — Que noite aquela!
Virgínia — Fugimos!... Não conseguiste... não procuraste o emprego e eu achei
quem me desse roupa para lavar e engomar. Era daí que eu tirava a subsistência de
nós ambos. Todos os dias eu te falava no nosso casamento, e esta palavra —
Veremos — vinha morrer aos meus ouvidos como uma condenação. Um dia, poucos
meses antes da tua formatura, saíste de casa e não apareceste mais; mas, ó
desgraçado! o que não sabes é que me deixavas no seio o fruto da tua paixão
maldita!
O Doutor — O que ouço!... Essa criança... (Corre para a criança.)
Virgínia (Interpondo-se.) — É tua filha!...
O Doutor — Minha filha!... (Querendo tomar a criança.) A que sexo pertence? É
menina? Deixa-a ver!
Virgínia (Interpondo-se ainda.) — Ouve o resto: há um mês que veio ao mundo essa
pobre criança...
O Doutor — Oh! não calculas o interesse...
Virgínia — Mentes tu!
O Doutor — E onde estavas tu?
Virgínia — Em casa da Rosa... uma pobre mulher, que se compadeceu do meu
estado. — Dois dias depois do nascimento dessa pobre criaturinha, meu pai me
apareceu em companhia do meu primo Bernardino...
O Doutor — E disse-te...
Virgínia — E disse-me: — Minha filha, eu sei o que são as mulheres e sei o que são
os homens... O Escorrega seduziu-te, e tu, com a fraqueza própria do teu sexo e da
tua índole romanesca, escorregaste... Eu te perdôo... Aqui te trago o primo
Bernardino, que já de muito te perdoou também.
O Doutor — Bravo! Bravo! E o que te disse o primo Bernardino?
Virgínia — Disse-me: — Virgínia, o Escorrega, à vista desta criança, não hesitará
em dar-te a mão de esposo.
O Doutor — Hein?