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Fernanda Henriques Dias
"Aí dá pra entender como a gente não consegue trabalhar"
Projeções do self de uma professora de Língua Inglesa, questões do
ambiente escolar e o papel da pesquisa na formação do professor de
Língua Estrangeira
Dissertação de Mestrado
Dissertação apresentada como requisito parcial para
obtenção do título de Mestre pelo Programa de Pós-
Graduação em Letras da PUC-Rio.
Orientadora: Inés Kayon de Miller
Rio de Janeiro
Março de 2007
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0510550/CA
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Fernanda Henriques Dias
"Aí dá pra entender como a gente não consegue trabalhar"
Projeções do self de uma professora de Língua Inglesa, questões do
ambiente escolar e o papel da pesquisa na formação do professor de
Língua Estrangeira
Dissertação apresentada como requisito parcial para
obtenção do título de Mestre pelo Programa de Pós-
Graduação em Letras da PUC-Rio. Aprovada pela
Comissão Examinadora abaixo assinada.
Inés Kayon de Miller
Orientadora
PUC-Rio
Maria das Graças Dias Pereira
PUC-Rio
Myriam Brito Correia Nunes
UFRJ
Beatriz Barreto
PUC-Rio
Paulo Fernando Carneiro de Andrade
Coordenador Setorial do Centro de Teologia e Ciências Humanas -
PUC-Rio
Rio de Janeiro, 09 de março de 2007
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0510550/CA
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Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução total
ou parcial do trabalho sem autorização da universidade, da
autora e do orientador.
Fernanda Henriques Dias
Fernanda graduou-se em Letras (com habilitação em Língua
Inglesa e respectivas Literaturas e Língua Portuguesa e
respectivas Literaturas) no ano de 2005, pela Universidade
Federal de Juiz de Fora. Em 2006, ingressou no programa
de Mestrado em Estudos da Linguagem da PUC-Rio, onde
deu continuidade aos estudos relacionados às questões do
processo educacional em Língua Estrangeira, bem como à
formação de professores da área.
Ficha Catalográfica
Dias, Fernanda Henriques
“Aí dá pra entender como a gente não consegue
trabalhar”: projeções do self de uma professora de Língua
Inglesa, questões do ambiente escolar e o papel da
pesquisa na formação do professor de Língua Estrangeira /
Fernanda Henriques Dias ; orientadora: Inés Kayon de
Miller. – 2007.
160 f. ; 30 cm
Dissertação (Mestrado em Letras) Pontifícia
Universidade Católica do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro,
2007.
Inclui bibliografia
1. Letras – Teses. 2. Ensino de Língua Inglesa 3.
Lingüística aplicada. 4. Pesquisa etnográfica. 5. Escola
pública. 6. Pesquisa em sala de aula. 7. Formação de
professores. I. Miller, Inés Kayon. II. Pontifícia
Universidade Católica do Rio de Janeiro. Departamento de
Letras. III. Título.
CDD: 400
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Aos familiares e amigos.
Aos mestres da vida, Mário Roberto
Lobúglio Zágari e Ana Cláudia Peters
Salgado, pelo exemplo e incentivo
constantes.
Aos meus alunos, hoje amigos e
companheiros, por tudo que me ensinam.
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Agradecimentos
Agradeço aos meus pais, pelo incentivo e apoio sempre oferecidos. À minha mãe,
pela perseverança e exemplo.
Ao meu irmão, Bruno Dias, pela amizade e carinho; pelo ombro amigo nas horas
difíceis.
Ao Daniel Giotti, por compreender minhas ausências e incentivar minha sede de
conhecimentos; pela paciência e pelo companheirismo.
Ao Roberto Dias, pelas risadas e lágrimas.
Ao Roberto Dias e ao Bruno Dias, por me mostrarem o caminho da pesquisa.
Aos mestres, tanto àqueles que forjaram a base de meus conhecimentos na
graduação, quanto aos que me permitiram expandir horizontes no Mestrado.
À Inés Kayon de Miller, pela paciência e compreensão.
Aos meus alunos, por serem o motivo de meu contínuo desenvolvimento e por me
proporcionarem momentos inesquecíveis tanto dentro quanto fora da sala de aula.
À professora que me permitiu assistir às suas aulas e que se prontificou a
participar da pesquisa proposta, oferecendo-me, além de informações, uma
parcela de seu tempo e de seu conhecimento.
Aos alunos, por terem me acolhido e auxiliado.
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Resumo
Dias, Fernanda Henriques. "Aí dá pra entender como a gente não
consegue trabalhar": projeções do self de uma professora de Língua
Inglesa, questões do ambiente escolar e o papel da pesquisa na formação do
professor de Língua Estrangeira. Rio de Janeiro, 2007. 160p. Dissertação de
Mestrado - Departamento de Letras, Pontifícia Universidade Católica do Rio
de Janeiro.
Motivada por questionamentos presentes ainda durante a graduação, a
respeito do dia-a-dia do fazer pedagógico principalmente na escola pública, é que
me coloquei como pesquisadora em duas salas de aula de Língua Estrangeira em
uma escola pública de Juiz de Fora, Minas Gerais. Os dados foram construídos
seguindo princípios da etnografia. Eles são constituídos por notas expandidas
escritas a partir de notas de campo feitas em duas salas de aula durante as aulas de
Língua Inglesa e uma entrevista feita com uma professora de Língua Inglesa.
Analiso o discurso dessa professora, gerado na entrevista, e o relaciono com as
notas expandidas a fim de observar os aspectos que influenciam sua prática
pedagógica. Para a análise da entrevista, utilizo o conceito de footing empregado
por Goffman (2002) de forma a notar os movimentos discursivos da professora e
algumas facetas de seu self. Desta forma, pretendi buscar maiores entendimentos
para as questões sobre as práticas pedagógicas surgidas durante a graduação, ao
mesmo tempo em que refleti sobre questões concernentes à formação do professor
de Língua Estrangeira e o papel exercido pela pesquisa em sala de aula durante o
curso de graduação em Letras.
Palavras-chave
Ensino de Língua Inglesa; lingüística aplicada; pesquisa etnográfica; escola
pública; pesquisa em sala de aula; formação de professores.
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Abstract
Dias, Fernanda Henriques. "So people can understand why we can’t
work": an English teacher’s presentation of self, features of the school
environment and the role of research in foreign language teacher education.
Rio de Janeiro, 2007. 160p. Dissertação de Mestrado - Departamento de
Letras, Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro.
Impelled by questions still raised during the Graduation course regarding
the everydayness of pedagogical practices mainly in the public sector, I have
positioned myself as a researcher in two classrooms in which English is taught as
a Foreign Language in a public school in Juiz de Fora, Minas Gerais. The data
were built following principles of ethnography. They are constituted by expanded
notes written from field notes taken in two classrooms during the English classes
and an interview made with the teacher of English as a Foreign Language. I
analyse the interview with the English teacher and relate it to the expanded notes
in order to observe the aspects that influence her pedagogical practice. For the
analysis of the interview, I make use of the concept of footing applied by Goffman
(2002) so that I could notice the teacher’s discursive movements and some facets
of her self. In this way, I intended to look for more understandings regarding the
questions about pedagogical practices raised in the Graduation course. In addition,
I reflect upon questions concerned with Foreign Language teacher education and
the role played by classroom research throughout the “Letras” Graduation Course.
Keywords
English as a foreign Language; applied linguistics; ethnographic research;
public sector school; classroom research; teacher education.
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Sumário
1. Introdução
1.1. O Programa de Treinamento Profissional
1.2. Questões
2. Arcabouço teórico
2.1. A pesquisa em sala de aula: justificativa e relevância
2.2. O papel da pesquisa no processo de formação de professores
3. Decisões metodológicas
3.1. Abordagem da pesquisa
3.2. Contexto
3.3. Participantes
3.3.1. A professora de Língua Inglesa
3.3.2. Os alunos
3.3.3. A pesquisadora
3.3.4. Demais participantes
3.4. Construção dos dados
3.4.1. Notas expandidas
3.4.2. Entrevista
4. Metodologia e análise de dados
4.1. Metodologia de análise
4.2. Análise de dados
4.2.1. Motivo da escolha profissional
4.2.1.1. Motivo da escolha profissional: notas expandidas
4.2.2. Experiência profissional prévia à graduação
4.2.3. Escolha dos locais de trabalho
4.2.3.1.Escolha dos locais de trabalho: notas expandidas
4.2.4. O apoio dado ao ensino de Inglês
4.2.4.1.O apoio dado ao ensino de Inglês: notas expandidas
4.2.5. O papel dos alunos
4.2.5.1.O papel dos alunos: notas expandidas
4.2.6. O papel dos pais
4.2.6.1.O papel dos pais: notas expandidas
4.2.7. A reação dos alunos
4.2.7.1.A reação dos alunos: notas expandidas
4.2.8. O ensino da fala
4.2.8.1.O ensino da fala: notas expandidas
4.2.9. O número de alunos
4.2.9.1.O número de alunos: notas expandidas
4.2.10. Os materiais
4.2.10.1. Os materiais: notas expandidas
4.2.11. “Origem” dos alunos
4.2.11.1. “Origem” dos alunos: notas expandidas
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5. Conclusões
5.1. Considerações finais
6. Referências bibliográficas
Anexo 1 – Resolução Nº 19/1996
Anexo 2 – Notas expandidas
Anexo 3 – Transcrição 1
Anexo 4 – Transcrição 2
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Lista de quadros
Quadro 1 – Os “eus” da professora
Quadro 2 – Agentividade
Quadro 3 – Outros “eus”de Mariana
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O mais importante e bonito no mundo é isto:
que as pessoas não estão sempre iguais,
ainda não foram terminadas – mas que elas
vão sempre mudando.
João Guimarães Rosa. In: Grande
Sertão: Veredas, p. 39
E as pessoas nem sonham que quem acaba
uma coisa nunca é aquele que a começou,
mesmo que ambos tenham um nome igual,
que isso só é que se mantém constante,
nada mais.
José Saramago. In: O Ano da Morte
de Ricardo Reis, p. 51
Mestre não é quem sempre ensina, mas
quem de repente aprende.
João Guimarães Rosa. In: Grande
Sertão: Veredas, p. 326
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Convenções de transcrição
Adaptado de GAGO, Paulo Cortes. Questões de transcrição em Análise da
Conversa. In: Veredas – Revista de Estudos Lingüísticos. Universidade Federal
de Juiz de Fora. V. 6, n. 2, jul/dez 2002. Juiz de Fora: Editora UFJF, 2003. p. 89-
113
[colchetes] fala sobreposta.
(0.5) pausa em décimos de segundo.
(.) micropausa de menos de dois décimos de segundo.
= contigüidade entre a fala de um mesmo falante ou de dois
falantes distintos.
. descida de entonação.
? subida de entonação.
, entonação contínua.
: alongamento de som.
- auto-interrupção.
sublinhado acento ou ênfase de volume.
MAIÚSCULA ênfase acentuada.
o
fala mais baixa imediatamente após o sinal.
o
palavras
o
trecho falado mais baixo.
palavra
: descida entoacional inflexionada.
palavra: subida entoacional inflexionada.
subida acentuada na entonação, mais forte que os dois
pontos sublinhados.
descida acentuada na entonação, mais forte que os dois
pontos precedidos de sublinhado.
>palavras< fala comprimida ou acelerada.
(palavras) transcrição duvidosa.
( ) transcrição impossível.
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1
Introdução
Em agosto de 2004 começava o último período necessário para me graduar
em Letras. Aquele que, para mim, parecia ser um tempo de grandes expectativas,
na verdade, era, para meus colegas de classe, um período de dúvida e medo. A
incerteza em relação ao futuro era uma característica comum a todos, já que
mudanças viriam. Porém, nas aulas de Didática de Língua Estrangeira não era a
incerteza o tema mais discutido, mas sim o medo de assumir a sala de aula,
principalmente em uma escola pública.
Os comentários de meus colegas, as dúvidas de como agir perante uma
turma de trinta alunos e do que fazer caso eles não tivessem material, não podiam
ser plenamente resolvidas pela professora de Didática que, consciente das
diferentes realidades enfrentadas pelos professores, das diferenças entre os alunos
e entre as pessoas envolvidas no processo educacional, certamente não pôde se
limitar a passar velhas receitas de como dar uma boa aula. Afinal, as receitas de
nada serviriam, pois desconsiderariam todo o contexto envolvido no processo
educacional.
Nós estávamos no último período e já trazíamos conosco uma grande
bagagem teórica que nos poderia ser muito útil. Porém, ao ver aproximar o tempo
em que de fato “colocaríamos em prática” toda a teoria aprendida, as dúvidas em
relação ao que fazer perante a falta de material e de apoio em relação ao ensino da
Língua Inglesa e o medo de assumir uma turma de trinta ou mais alunos, em sua
maioria “desinteressados”, pareciam se tornar cada vez maiores.
Todo esse sentimento demonstrado inicialmente por meus colegas gerou
em mim certa inquietação. Se, durante os três anos e meio de graduação tudo
parecia ir bem, por que no último período meus colegas se demonstravam aflitos?
Afinal, a teoria subjacente já havia sido estudada. O que estava faltando?
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Na verdade, o fato era que pouco sabíamos das realidades enfrentadas nas
escolas. Tínhamos sim a teoria, mas ela já não podia satisfazer inteiramente as
dúvidas geradas durante a prática. Foi então que, impulsionada pelos comentários
e anseios de meus colegas e pelos relatos ouvidos, procurei uma maneira de
estudar a sala de aula de Língua Inglesa, na escola pública.
Assim, me envolvi com o programa de Treinamento Profissional da
Universidade Federal de Juiz de Fora, sobre o qual falarei na próxima seção.
1.1
O Programa de Treinamento Profissional
O Programa de Treinamento Profissional é um programa de bolsa de
graduação oferecido pela Universidade Federal de Juiz de Fora para o
desenvolvimento de projetos apresentados por docentes da mesma e é destinado
ao aprimoramento dos discentes do ensino médio profissionalizante e da
graduação em sua área de atuação.
Conforme vemos na Resolução Nº 19/1996 da UFJF (ANEXO 1), que fixa
as normas do programa e de suas respectivas bolsas,
Art.7º - O Programa de Treinamento Profissional, aberto a candidatos de 2º grau
profissionalizante e a graduandos da Universidade e a ser orientado por docente
da UFJF ou profissional da área, tem por objetivo permitir o aperfeiçoamento
profissional, em campo de treinamento profissional da Universidade, específico e
compatível com a habilitação cursada pelos bolsistas.
Em minha área de atuação estava aberto o edital para o projeto intitulado
“Professor de Língua Estrangeira: pesquisador e etnógrafo”
1
, apresentado pela
professora de Didática de Língua Estrangeira, para o qual me inscrevi.
Tal projeto visava aprimorar os estudos teóricos e práticos de questões
concernentes à etnografia da sala de aula, buscando uma maior compreensão das
realidades que circundam as aulas de Língua Inglesa nas escolas públicas da
cidade de Juiz de Fora. Dessa forma, desenvolvemos semanalmente estudos
teóricos sobre etnografia e ensino de Língua Estrangeira e, ao mesmo tempo,
1
O projeto foi orientado pela professora Ana Cláudia Peters Salgado e teve como bolsistas as
graduandas Alessandra da Silva Félix e eu, Fernanda Henriques Dias.
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acompanhamos duas salas de aula de Língua Inglesa na escola pública estadual.
Cada bolsista assistiu aulas em escolas diferentes para que pudéssemos comparar
e contrastar as realidades encontradas. Assim, uma bolsista acompanhou as aulas
em uma escola de um bairro mais afastado, enquanto eu assisti às aulas de uma
escola do centro da cidade. Nesta dissertação, serão usados apenas os dados
referentes à escola central.
O trabalho que me proponho a desenvolver no decorrer desta dissertação
tem por objetivo reunir as preocupações que surgiram no último período da
graduação, às questões posteriores, vistas tanto no papel de professora quanto no
de mestranda.
1.2
Questões
Além das questões acima mencionadas que me levaram a pesquisar, ainda
na graduação, o processo de ensino e aprendizagem de Língua Inglesa na escola
pública, outras questões foram surgindo, na pós-graduação. Já então posicionada
como professora, passei a me perguntar se as práticas pedagógicas encontradas
durante o programa de Treinamento Profissional correspondiam às oportunidades
vividas pela professora em sala de aula e também a refletir sobre como ela poderia
transformar suas práticas. Como mestranda, o que me motivava era a questão da
formação de professores e do papel exercido pela pesquisa em sala de aula durante
o curso de graduação.
Para buscar esses entendimentos, esta dissertação está dividida em cinco
capítulos. O Capítulo 2 refere-se ao arcabouço teórico que está em contato com os
temas da pesquisa. Inicialmente exponho conceitos relacionados às questões do
processo de ensino e aprendizagem em geral, passo por questões relacionadas à
formação de professores e, então, falo sobre o ensino de Língua Inglesa no Brasil.
Em seguida, discuto questões relacionadas aos conceitos de Linguagem com os
quais estou alinhada. Para concluir, explicito meu posicionamento em relação à
pesquisa em sala de aula, a importância da mesma para o processo de formação de
professores, bem como minhas escolhas de pesquisa.
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O Capítulo 3 fala sobre a metodologia de pesquisa adotada. O Capítulo é
dividido em quatro seções. Na primeira seção relato como foi feita a pesquisa a
partir de princípios da etnografia. A segunda seção é um resumo do contexto no
qual a pesquisa foi realizada. Nela, falo um pouco da escola e do ambiente de
trabalho e estudo encontrado. Na terceira seção, falo dos participantes e da relação
entre eles. Na quarta seção explico como os dados foram construídos. Os dados
são constituídos por notas expandidas relativas às aulas de Inglês e Português que
foram observadas e por uma entrevista feita com uma professora de Inglês, além
de fotografias da escola.
No Capítulo 4 apresento a metodologia de análise dos dados, levantando
questões teóricas apresentadas por Goffman (2002) em seu artigo Footing que
servirão como base para a análise. Em seguida, faço a análise dos footings
assumidos pela professora durante a entrevista. Para tal, dividi a entrevista em
onze seções, de acordo com os temas que foram surgindo com as perguntas feitas.
Para cada seção, criei uma subseção na qual relaciono a análise da entrevista com
trechos correspondentes das notas expandidas.
No Capítulo 5 apresento as conclusões concernentes às análises feitas no
capítulo anterior. Resumo, então, as realidades encontradas nas salas de aula
pesquisadas, bem como as questões que estão diretamente relacionadas às práticas
pedagógicas da professora participante da pesquisa. Após as conclusões da
análise, faço algumas considerações finais.
Para finalizar a introdução acho relevante explicitar algumas questões
sobre as referências textuais. É importante informar ao leitor que todas as
traduções das citações retiradas dos livros cuja bibliografia se encontra em Inglês,
são de minha autoria. Assumo, portanto, total responsabilidade sobre as mesmas.
Para as citações referentes ao artigo Footing de Goffman (1981) preferi fazer uso
da tradução publicada por Beatriz Fontana (In: Ribeiro & Garcez, 2002, p. 107-
148) já que esta é uma tradução academicamente conhecida. Para as minhas
traduções, em alguns momentos optei por manter certos termos em Inglês, apenas
colocando-os em itálico, levando em conta duas questões: os termos mantidos em
Inglês são de amplo conhecimento acadêmico e, ainda, a tradução dos mesmos
não traria a carga semântica que eles têm em Inglês.
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2
Arcabouço teórico
A construção do arcabouço teórico que fundamenta esta dissertação teve
início, conforme visto na introdução, durante o projeto de Treinamento
Profissional e foi aprimorada durante o Mestrado.
A questão inicial que permeia o projeto é o dualismo teoria e prática que
nos foi apresentado a partir dos medos dos graduandos de assumir uma sala de
aula. Os cursos de formação de professores deveriam trazer questões teóricas,
tanto lingüísticas quanto pedagógicas, que fossem capazes de construir uma base
sobre a qual fosse possível alicerçar a prática em sala de aula, de forma que
professores e alunos compartilhassem de interações produtivas não apenas em
relação à teoria, mas que também fossem relevantes para suas vidas cotidianas. As
teorias estudadas e discutidas no decorrer de uma faculdade são cruciais para a
reflexão sobre decisões metodológicas e até éticas que envolvem o processo
educacional. Segundo Paulo Freire (2002, p. 78),
toda prática educativa demanda a existência de sujeitos, um que, ensinando,
aprende, outro que, aprendendo, ensina, daí o seu cunho gnosiológico; a
existência de objetos, conteúdos a serem ensinados e aprendidos; envolve o uso
de métodos, de técnicas, de materiais; implica, em função de seu caráter diretivo,
objetivo, sonhos, utopias, ideais. Daí a sua politicidade, qualidade que tem a
prática educativa de ser política, de não poder ser neutra.
É certo que os estudos teóricos ajudam a fornecer argumentos e idéias para
um posicionamento pessoal. Todavia, apesar da grande importância do estudo
teórico, o mesmo se torna pouco produtivo e de certa forma utópico quando
desvinculado de sua prática. Na verdade, a angústia demonstrada pelos estudantes
deve-se justamente à falta de prática ou à pouca prática oferecida no período da
graduação. Para Paulo Freire (ibid, p. 43-44),
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18
na formação permanente de professores, o momento fundamental é o da reflexão
crítica sobre a prática. É pensando criticamente a prática de hoje ou de ontem que
se pode melhorar a próxima prática. O próprio discurso teórico, necessário à
reflexão crítica, tem de ser de tal modo concreto que quase se confunda com a
prática.
Porém, se não há prática, torna-se difícil usar o discurso teórico para uma
reflexão crítica que seja concreta.
A deficiência de se pensar diretamente sobre a prática no curso de
formação de professores acaba gerando um quadro de ensino no qual os alunos
são levados apenas a reproduzir o conhecimento (sobretudo gramatical, no caso
do ensino de Línguas) sem serem levados a refletir sobre o conhecimento e suas
conseqüências. De fato, como nos mostra Rubem Alves (2001, p. 29),
as crianças são ensinadas. Aprendem bem. Tão bem que se tornam incapazes de
pensar coisas diferentes. Tornam-se ecos das receitas ensinadas e aprendidas.
Tornam-se incapazes de dizer o diferente.
A questão não é diferente quando se trata do ensino de Língua Estrangeira.
De acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Médio (Maia,
2002, p. 150),
atualmente, a grande maioria das escolas baseia as aulas de Língua Estrangeira no
domínio do sistema formal da língua objeto, isto é, pretende-se levar o aluno a
entender, falar, ler e escrever, acreditando que, a partir disso, ele será capaz de
usar o novo idioma em situações reais de comunicação. Entretanto, o trabalho
com as habilidades lingüísticas citadas, por diferentes razões, acaba centrando-se
nos preceitos da gramática normativa, destacando-se a norma culta e a
modalidade escrita da língua.
Conforme também explicitado pelos próprios PCN (ibid, p. 147), o ensino
de Línguas Estrangeiras há muito não tem se dado de forma a possibilitar aos
alunos o uso da mesma em diferentes contextos, o que o torna irrelevante na vida
da maioria dos alunos.
Em lugar de capacitar o aluno a falar, ler e escrever em um novo idioma, as aulas
de Línguas Estrangeiras Modernas nas escolas de nível médio acabaram por
assumir uma feição monótona e repetitiva que, muitas vezes, chega a desmotivar
professores e alunos, ao mesmo tempo em que deixa de valorizar conteúdos
relevantes à formação educacional dos estudantes.
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19
Como tentativa de resolver a dificuldade de se ensinar as quatro
habilidades lingüísticas, alguns professores buscam adotar uma abordagem
instrumental do ensino da língua, voltando as aulas para uma habilidade
específica. Na maioria dos casos, a leitura e a escrita são as habilidades
privilegiadas. Todavia, é sabido também, que mesmo o ensino de Língua
Estrangeira voltado para a modalidade escrita não tem se dado de forma
satisfatória. É o que nos mostra a pesquisa realizada por Pinhel (In: Consolo &
Vieira-Abrahão, 2004, p. 62), que propõe
analisar as interações em sala de aula [no ensino médio de uma escola pública]
entre professor e alunos no momento da leitura, de maneira a identificar as
noções de linguagem, de leitura e de ensino/aprendizagem que têm fundamentado
a construção das interações pelos participantes do contexto pesquisado
e cuja conclusão é que
as orientações dos PCN com relação à leitura não têm caracterizado as práticas
desenvolvidas na escola pública, pois ainda prevalece a visão de texto como
somatório de palavras ou frases e como instrumento para análise lingüística, bem
como uma visão de leitura como reprodução oral da linguagem escrita. (p. 75)
Compreendendo, através dos dois textos acima citados, dentre outros, que
tanto o ensino das quatro habilidades quanto a abordagem instrumental voltada
para o ensino da leitura (em Língua Inglesa) nas escolas públicas não têm obtido,
em muitos casos, resultados desejáveis, torna-se necessário estudar a sala de aula,
analisando práticas que vêm sendo exercidas e buscando aprimorá-las e adaptá-las
aos diversos contextos de aprendizagem.
Segundo Maturana (2001, p. 76),
a história de um ser vivo é uma história de interações que desencadeiam nele
mudanças estruturais: se não há encontro, não há interação, e se há encontro,
sempre há um desencadear, uma mudança estrutural no sistema. A mudança pode
ser grande ou pequena, não importa, mas desencadeia-se nele uma mudança
estrutural. De modo que uma história de interações recorrentes é uma história de
desencadeamentos estruturais, de mudanças estruturais mútuas entre o meio e o
ser vivo, e o ser vivo e o meio.
E, para que haja encontro e, portanto, interação, é necessário que
utilizemos a mesma linguagem. É através da linguagem que interagimos, pois é
ela um fenômeno social da interação.
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Assim também, para a Etnografia da Comunicação (Schiffrin, 1994, p.
138),
a linguagem é o meio central pelo qual as pessoas se comunicam em suas vidas
diárias (...) [assim,] entender a comunicação é uma tarefa importante para os
lingüistas. A compreensão da comunicação também é importante para os
antropologistas: a maneira como nos comunicamos é parte de nosso repertório
cultural para fazer entender – e interagir com – o mundo.
Todavia, para compreendermos a comunicação, é importante lembrar que
toda interação se dá em um contexto, envolvendo todos os indivíduos
participantes daquele momento de interação. Para Goffman (In: Lemert &
Branaman, 1997, p. 23-24),
enquanto [uma] imagem é recebida em relação ao indivíduo, de forma que um
self é imputado a ele, este self não deriva do possuidor, mas de toda a cena de
ação, sendo gerado por aquele atributo de eventos locais que os torna
interpretáveis pela testemunha. Uma cena bem e corretamente atuada leva a
audiência a imputar um self a um personagem atuado, mas esta imputação – este
self – é um produto da cena e não a causa da mesma.
Dessa forma, os “animadores” (Goffman, 2002) estarão sempre envolvidos
em um jogo, no qual definirão suas imagens e se posicionarão como sujeito,
tentando imputar um self e, ao mesmo tempo, conferindo se o self construído pelo
outro corresponde ou pelo menos se aproxima do self que se deseja apresentar.
Para Gumperz (In: Duranti & Goodwin, 1992, p. 229),
os participantes de um evento comunicativo devem ser capazes de guiar um ao
outro em relação às interpretações do que está sendo dito através da
aparentemente vasta, se não infinita, variedade de dimensões e fatores
potencialmente relevantes.
Dessa forma, tanto o contexto quanto os participantes direta ou
indiretamente envolvidos em um evento comunicativo fornecerão bases
primordiais para a compreensão do que se passa no evento em questão.
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2.1
A pesquisa em sala de aula: justificativa e relevância
Conforme já dito em seções anteriores, a sala de aula é uma arena onde
pessoas diferentes, com objetivos diferentes se reúnem em torno do processo
educacional. Justamente devido às múltiplas diferenças encontradas em uma
escola, é que o processo educacional pode ser considerado uma teia na qual nem
sempre os sujeitos envolvidos compartilham dos mesmos princípios e ideais.
Conforme colocam Pimenta & Ghedin (2002, p. 37-38),
a educação é um fenômeno complexo, porque histórico. Ou seja, é produto do
trabalho de seres humanos e, como tal, responde aos desafios que diferentes
contextos políticos e sociais lhe colocam. A educação retrata e reproduz a
sociedade, mas também projeta a sociedade que se quer. Por isso, vincula-se
profundamente ao processo civilizatório e humano. Enquanto prática histórica
tem o desafio de responder às demandas que os contextos lhe colocam. (grifo
meu)
E, para compreender as complexidades de uma sala de aula, é que as
pesquisas de sala de aula se tornam um campo de grande relevância. Nas salas de
aula de Língua Estrangeira o panorama não é diferente da complexidade acima
exposta. Van Lier (1988, p.7) exemplifica melhor as complexidades das salas de
aula de Língua Estrangeira.
O desenvolvimento da linguagem, tanto em L1 quanto em L2, se dá por todo o
mundo em milhares de línguas diferentes, em vários ambientes diferentes, com
pessoas de todas as idades, em escolas, casas, indústrias, nas ruas e nos campos.
Mesmos se limitarmos o campo de pesquisa a apenas uma dessas facetas, i.e. ao
desenvolvimento do Inglês como segunda língua nas salas de aula, o potencial
para a variação é enorme.
Apesar de van Lier tratar do Inglês como segunda língua, o que não é o
caso no Brasil (pelo menos no que concerne às escolas públicas), na verdade o que
ele quer expor é que o ensino de Línguas em qualquer lugar é complexo e não
pode ser estudado sem se levar em conta o contexto no qual ocorre. O que quero
dizer com isso é que toda sala de aula é única, no sentido de que não é possível
reproduzir o mesmo contexto. Justifico, portanto, minha escolha de estudar apenas
dois casos, já que não busco aqui generalizações, mas sim especificidades de cada
caso estudado.
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22
Além da escolha de estudar casos, outra escolha precisa ser justificada: a
escolha de me posicionar como pesquisadora externa ao processo.
Atualmente, muitos autores que estudam a pesquisa em sala de aula (Van
Lier, 1996; Allwright & Bailey, 1994; Cavalcanti & Moita Lopes, 1991; Prabhu,
1990) defendem que os pesquisadores da sala de aula devem ser os próprios
professores, já que eles estão diretamente envolvidos com o processo educacional
daqueles alunos ali presentes e são eles também as pessoas mais capazes e
prováveis de implementar mudanças, caso achem necessário.
São indubitáveis e indiscutíveis as vantagens de se estudar a sua própria
sala de aula. Todavia, a questão que venho propor aqui, é um pouco diferente: o
que podem fazer, os estudantes de graduação, para tentarem conhecer um pouco
melhor as realidades dos contextos profissionais no qual irão atuar futuramente?
E, ainda, o que fazer para conhecer aspectos reais da sala de aula de Língua
Inglesa (já que aqui minha preocupação direta é com os graduandos do curso de
Letras), enquanto ainda não estão inseridos no mercado de trabalho?
E, justamente com base na preocupação de uma melhor formação
profissional do futuro professor, defendo, na seção a seguir, a importância da
pesquisa em sala de aula no período de graduação.
2.2
O papel da pesquisa no processo de formação de professores
Um dos problemas de grande repercussão acadêmica atualmente é a
questão da formação do professor. Sabe-se que, a maioria dos programas de
formação visa a “passar conteúdos teóricos” que capacitem o futuro professor a
agir em sala de aula, repassando conteúdos importantes a seus alunos.
Todavia, entende-se também que o foco dado a conteúdos teóricos, quando
desvencilhado da prática ou pelo menos de questões práticas que envolvem o dia a
dia em uma sala de aula, são pouco úteis para que o professor em formação saiba
como agir, ao tentar ensinar. Na verdade, esse modelo de formação ajuda a
perpetuar a idéia de que ensinar é “transmitir conhecimentos”. Em trabalho
apresentado por Celani (2002, p. 20), a autora mostra que
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23
a experiência de vários anos de trabalho na área de ensino-aprendizagem de
inglês e na formação do profissional para esse tipo de ensino, tanto em nível de
pré-serviço quanto de formação contínua, revela o professor de inglês,
particularmente aquele que trabalha na escola pública, como pouco equipado para
desempenhar sua tarefa educativa. Esse fato se deve a várias razões, entre elas,
tanto a qualidade deficiente da formação do docente em geral, como, até
recentemente, uma compreensão equivocada do que devesse ser a formação do
profissional de ensino de língua estrangeira.
De forma a equipar os futuros professores para uma atuação que esteja
voltada para a formação do ser humano, é necessário que, durante o processo de
formação, o ensino seja tal que o aluno/futuro professor perceba que a
aprendizagem deve ser um processo contínuo, entendendo assim a importância de
se buscar uma formação contínua. Segundo Celani (ibid, p. 27),
é necessário que programas em formação contínua criem espaços que
possibilitem a professores refletir sobre a heterogeneidade de sentidos que
compõem as representações, os valores, as intenções em agir e a própria ação. Em
outras palavras, em entender as necessidades dos alunos, os saberes que estão
enfocando, o currículo (oculto) que realmente está sendo enfatizado e o tipo de
profissionais que estão formando. O processo reflexivo não acontece sozinho. É,
na verdade, um trabalho ativo, consciente que pressupõe esforço, vontade e que
tem lugar quando condições são criadas para isso.
É nesse sentido que venho propor que a pesquisa feita na posição de
observador, durante o período de graduação, é uma forma de permitir que os
futuros professores participem de um ambiente que, embora diferente (devido a
todas as diferenças contextuais já mencionadas), apresenta também semelhanças
ao ambiente no qual atuará depois de formado.
Se o profissional terá, muito mais provavelmente, contato com situações
singulares, que dele demandarão soluções únicas, é necessário que o estudante
passe a vivenciar experiências de aula, em parceria com colegas e/ou professores,
o mais cedo possível, em seu curso de formação, tendo oportunidades para
discutir, avaliar e redimensionar as experiências vividas por si e pelos colegas,
desenvolvendo-se como profissionais reflexivos (Schön, 1987; Zeichner, 1993)”.
(Gonçalves & Gonçalves. In: Geraldi, 2001, p. 115)
Além disso, a pesquisa feita durante a graduação, na posição de
observador, é também uma maneira de inserir o estudante de Letras na pesquisa
de sala de aula, o que pouco acontece atualmente. Como colocam Gonçalves e
Gonçalves (ibid, p. 123),
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24
outra questão importante para a formação de professores seria a realização de
pesquisas em ensino de matemática, física, química, biologia etc., realizadas por
docentes dos departamentos específicos, em parceria ou não com as faculdades de
educação. Estas pesquisas devem contar com a participação dos alunos de
licenciatura, pois assim estarão sendo iniciados no processo de pesquisa,
recebendo, com isto, estímulo e competência para seus trabalhos futuros como
professores, podendo, então, investigar também suas próprias práticas, cujo
resultado os levará, provavelmente, a uma reflexão constante de suas atividades
como educadores.
Defendemos a necessidade do ensino como pesquisa e da pesquisa no ensino por
acreditarmos que ela pode ser a mola propulsora da formação e da transformação
do professor formador de professores, bem como do professor em formação.
A mesma questão é apresentada por Cavalcanti & Moita Lopes (ibid, p.
135), que afirmam que “não há envolvimento em pesquisa por parte do professor
porque não existe tradição de pesquisa sobre ensino/aprendizagem de línguas nas
universidades”. Todavia, acredito que essa inserção possa abrir caminhos para
pesquisas futuras, incluindo-se a pesquisa da própria sala de aula. Como menciona
Cavalcanti (In: Almeida Filho, 1999, p. 181),
esse olhar reflexivo sobre a própria prática deveria começar na licenciatura (e até
antes da licenciatura) para que o profissional possa se engajar em sua formação
continuada. O desenvolvimento da proficiência e da competência pedagógica
deveria caminhar paralelamente ao desenvolvimento da competência reflexivo-
social.
Nesse processo de formação, voltada para o desenvolvimento integrado
das competências pedagógica e reflexivo-social, torna-se possível pensar em um
ciclo em que futuros professores serão formados com preocupações de formar
cidadãos que sejam, da mesma maneira, reflexivos. É esse o foco de Horikawa
(In: Magalhães, 2004, p. 121-122) que defende
a adoção de uma perspectiva pedagógica que enfoca a formação do homem como
um ser cultural, social e político, que compreende o tempo e o espaço em que
vive e atua para transformá-lo naquilo que o oprime. Nesses termos, insere-se a
importância da formação de um professor que, ao refletir permanentemente sobre
sua prática, encontra os liames que unem sua ação pedagógica à situação social
vivida pela comunidade em que atua e propõe alternativas para alcançar uma
educação emancipatória.
Ao defender a importância da pesquisa em sala de aula por alunos de
graduação, justifico minha posição de pesquisadora observante, já que, quando a
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25
pesquisa teve início, eu era ainda uma aluna da graduação, preocupada justamente
em entender a realidade de um possível campo de trabalho futuro.
Ao mesmo tempo, justifico minha análise atual, do ponto de vista de
professora e mestranda, preocupada também com a formação de futuros
professores. Unindo os papéis assumidos por mim nessas diferentes etapas, posso
dizer que a pesquisa na escola pública me mostrou a complexidade do processo
educacional, o qual ainda busco entender mais profundamente. Conjuntamente,
também foi possível verificar a importância da pesquisa de sala de aula enquanto
graduanda e enquanto futura formadora de professores.
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3
Decisões metodológicas
As decisões metodológicas que dão suporte a esta dissertação serão
apresentadas em quatro partes: abordagem da pesquisa, contexto, participantes,
construção de dados. Na abordagem da pesquisa falo sobre os princípios da
pesquisa qualitativa que norteiam o presente trabalho. Em seguida, explicito o
contexto no qual a pesquisa foi realizada, bem como os participantes envolvidos e
a relação entre eles. No tocante à construção de dados, falarei sobre o alinhamento
teórico-metodológico adotado para a construção dos mesmos. Para tal, falo sobre
as notas expandidas e a entrevista separadamente. A metodologia de análise será
apresentada no capítulo 4, precedendo à análise dos dados.
3.1
Abordagem da pesquisa
A construção de dados foi feita a partir de princípios da pesquisa
qualitativa. Segundo Guba & Lincoln (1994, p. 106), a pesquisa qualitativa pode
“prover informação contextual, (...) prover uma rica visão do comportamento
humano, (...) revelar visões êmicas”, não sendo ainda necessário (e nem sempre
possível) fazer generalizações.
Seguindo as definições dadas por Denzin & Lincoln (1994, p. 2),
a pesquisa qualitativa é multimetodológica em seu foco, envolvendo uma
aproximação interpretativa e natural ao assunto da pesquisa. Isso significa que os
pesquisadores qualitativos estudam as coisas em seus ambientes naturais,
tentando entender ou interpretar os fenômenos em termos dos significados que as
pessoas dão aos mesmos. A pesquisa qualitativa envolve a coleta e estudo de uma
variedade de materiais empíricos – estudo de caso, experiência pessoal,
introspecção, história de vida, entrevista, textos visuais, interacionais, históricos e
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27
observacionais – que descrevem rotina e momentos problemáticos e significados
na vida dos indivíduos.
Como pesquisa qualitativa, a pesquisa de cunho etnográfico me pareceu
ser, para o caso estudado, a mais apropriada, já que pressupõe “uma forte ênfase
em explorar a natureza de fenômenos sociais específicos (...); a investigação de
um pequeno número de casos (...); análise de dados que envolve interpretação
explícita dos significados e funções das ações humanas (...)” (Atkinson &
Hammersley, 1994, p. 248).
Os dados construídos constam de notas expandidas e de uma entrevista
sobre as quais discorrerei na seção 3.4. Registrei também o meu olhar em relação
ao ambiente de pesquisa através de fotografias, que foram úteis por mostrarem os
aspectos físicos do ambiente escolar. Antes de falar da construção dos dados,
discorrerei sobre o contexto da pesquisa, bem como sobre os participantes
envolvidos.
3.2
Contexto
A presente pesquisa foi feita em uma escola pública estadual situada na
região central de Juiz de Fora. Durante o período de observação, que se deu entre
os dias 17 de agosto e 20 de setembro de 2004, assisti às aulas de Inglês da sexta
série B e da sétima série A.
A escola em questão, apesar de ser uma escola pública, não tem uma sede
própria. Ela funciona no mesmo prédio onde estão situados um colégio técnico e
profissionalizante e uma rádio local. Tudo isso, devido a rachaduras e infiltrações
na antiga sede da escola, o que fez com que o colégio tivesse que se mudar para
esse outro lugar que estava disponível. Dessa forma, o prédio no qual a escola
funciona, não é apropriado para receber crianças, já que originalmente ele foi
projetado para atender apenas aos alunos do Ensino Médio. Além disso, a escola
estadual tem permissão para usar apenas algumas partes do prédio.
Quanto às aulas de Inglês assistidas, cabe mencionar que elas foram
lecionadas na Língua Portuguesa.
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28
Em relação ao contexto da entrevista, ela foi feita nos minutos finais de
uma aula da sétima série A, quando a professora deixou os alunos continuando um
exercício que ela havia pedido para fazer e ficou conversando comigo. Como a
entrevista foi feita na sala de aula mesmo, a conversa dos alunos interferiu na
gravação, tornando a transcrição menos clara em algumas partes. Assim, as
dúvidas de vocabulário demonstradas na transcrição se devem, principalmente,
aos ruídos ocasionados pela conversa dos alunos.
A turma da sexta série B tem 29 alunos e na sétima série A, embora eu não
tenha verificado o número de alunos, acredito que tenha, no máximo, 26 alunos, já
que havia na sala 27 carteiras (sendo uma delas o lugar onde eu me sentei).
3.3
Participantes
Durante o período de construção de dados, várias pessoas foram
envolvidas. Algumas contribuíram de forma direta e outras, de forma indireta.
Dentre as pessoas que participaram mais ativamente, cabe citar a professora de
Língua Inglesa, os alunos e eu, como pesquisadora. Dentre as que participaram de
forma menos direta, menciono as supervisoras e diretoras e os demais professores
da escola. Dessa forma, nas subseções seguintes, falarei um pouco sobre estas
pessoas.
3.3.1
A professora de Língua Inglesa
A professora de Inglês (aqui nomeada Mariana) é uma das participantes
principais. Além de ter contribuído significativamente com a pesquisa, permitindo
minha presença em suas aulas, ela me ofereceu informações de grande valor para
a construção de meus entendimentos. Foi com ela também que a entrevista foi
feita.
Mariana é formada em Letras por uma faculdade particular, e tem
habilitação nas Línguas Inglesa e Portuguesa. Ela trabalha atualmente em escolas
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29
públicas estaduais e municipais (nas quais ela é professora efetiva) e também em
escolas particulares, onde leciona ambas as Línguas. Isso quer dizer que ela tem
uma carga horária excessiva de trabalho, chegando a dar até quinze aulas em um
mesmo dia. Devido a sua carga horária, também sobra pouco tempo para que
possa resolver questões externas ao ambiente escolar (como exemplo, no período
de observação, ela estava montando sua casa nova, mas não tinha tempo para
escolher os móveis).
3.3.2
Os alunos
Os alunos são participantes chave da pesquisa. Afinal, não é possível haver
processo educacional onde não haja alunos.
Eles vêm de diferentes regiões da cidade, e têm diferentes backgrounds.
Eles têm entre doze e dezesseis anos, sendo que alguns deles já chegaram a repetir
até três vezes a mesma série.
Eles participam a todo o momento, direta ou indiretamente. Porém, apesar
de serem participantes diretos na sala de aula, durante a entrevista, eles assumem
papel de “circunstantes” (Goffman, 2002, p. 118). A fala se dá no âmbito visual
dos alunos, embora diretamente seja dirigida a mim. Segundo Goffman (ibid),
muita fala se processa no âmbito visual e auditivo de pessoas que não são
participantes ratificados e cujo acesso ao encontro, embora mínimo, é perceptível
aos participantes oficiais. Esses participantes eventuais são “circunstantes”. A sua
presença deve ser considerada regra e não a exceção.
Certamente, a presença dos alunos tem influência no discurso da
professora. Afinal, tudo aquilo que dizemos depende do contexto e dos
participantes envolvidos. O modo de falar e até mesmo o que falar pode ser
modificado, quando sabemos que estamos sendo observados ou ouvidos por
pessoas não ratificadas no momento da fala, como coloca Goffman (2002).
Porém, no caso acima, acredito que, ao oferecer para dar a entrevista
durante a aula, a professora confere, indiretamente, aos alunos, o papel de
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30
ouvintes ratificados. O que acredito que ocorra, na verdade, é um caso de
“insinuação” (ibid, p. 121).
Aliada ao conluio está a “insinuação”, através da qual o falante, ostensivamente
dirigindo palavras a um interlocutor endereçado, encobre suas observações com
um significado patente, mas passível de ser negado, significado que tem mais
alvo do que interlocutor propriamente, que em geral é desabonador e tem por
propósito ser captado pelo alvo, seja ele o interlocutor endereçado, um
interlocutor não-endereçado, ou mesmo um circunstante (Fisher, 1976).
Entendo que na entrevista Mariana não se dirige diretamente aos alunos,
mas faz com que eles sejam alvos de sua fala. Acredito que, ao se oferecer para
dar a entrevista naquele momento, Mariana tinha em mente a participação dos
alunos como ouvintes (ainda que não ratificados). Assim, a presença dos alunos é
um fator relevante para a análise da entrevista.
3.3.3
A pesquisadora
É importante ressaltar o papel ocupado pelo pesquisador durante a
pesquisa. Segundo Atkinson & Hammersley (1994, p. 249),
de certa forma, toda pesquisa social é uma forma de observação participante já
que não podemos estudar o universo social sem sermos parte dele (Hammersley
& Atkinson, 1983). A partir deste ponto de vista, a observação participante não é
uma técnica específica de pesquisa, mas um jeito de ser-no-mundo característico
de pesquisadores.
No meu entender, o pesquisador deve ser considerado um participante no
processo de pesquisa, na medida em que ele, de certa forma, interfere no meio
sobre o qual a pesquisa é realizada. Na verdade, neste caso, eu (como
pesquisadora) me inseri em um meio do qual não participava em minha vida
cotidiana. Assim, tanto para a professora, quanto para os alunos, a minha presença
evoca significados diversos.
No contexto da pesquisa, eu era vista pela professora como uma
pesquisadora, graduanda, que representava a faculdade de Letras da Universidade
Federal de Juiz de Fora. Assim, Mariana em alguns momentos me trata como
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31
pesquisadora, que pode ouvir questões que ela imagina que sejam relevantes para
uma pesquisa, em outras, ela me vê como alguém que está observando sua prática
e então justifica suas atitudes.
Para os alunos, meu papel não ficou claro. Ao me apresentar para a turma
da sétima série A, Mariana disse que eu ia assistir às aulas de Inglês e que eu
havia escolhido aquela turma porque era a melhor turma. Porém, na sexta série B,
ela me apresentou e, então, disse para os alunos que eu estava assistindo às aulas
para anotar se eles falavam muito. Os alunos então passaram a suspeitar de meu
papel, com certo receio de que minha presença pudesse representar alguma
punição.
3.3.4
Demais participantes
Além de Mariana e dos alunos, as diretoras e supervisoras também têm
grande participação, já que entram nas salas de aula com certa freqüência,
interrompendo o andamento das mesmas.
Os outros professores da escola participam nos momentos em que estamos
na sala de professores. Normalmente não parece haver acordo entre os
professores, o que sugere um clima de desarmonia.
3.4
Construção dos dados
No período de pesquisa, conforme já mencionado, os dados foram
construídos através de anotações feitas na escola. Também foi possível fazer uma
entrevista com Mariana. Além disso, obtive permissão para tirar fotografias da
escola. Aqui, utilizarei apenas as notas expandidas e a entrevista para a construção
de entendimentos.
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32
3.4.1
Notas expandidas
As notas expandidas foram construídas entre os dias 17 de agosto e 20 de
setembro de 2004. Esse período corresponde ao período de observação na escola,
quando assisti a seis aulas de Inglês em cada uma das turmas (sexta série B e
sétima série A). Também durante esse período, observei uma aula de Português
em cada uma das salas em pesquisa, para que fosse possível observar semelhanças
e diferenças entre os dados construídos durante as aulas de Língua Inglesa e
outros momentos no processo educacional. Os trechos das notas expandidas
referentes às aulas de Português serão utilizados apenas quando se mostrarem
relevantes para as análises em questão.
Parte das notas expandidas foi também tomada na sala de professores,
antes das aulas ou durante o intervalo. O mesmo ocorreu nos corredores do
colégio.
Para a construção de dados, Allwright & Bailey (1994, p. 3; dentre outros)
apresentam várias possibilidades, uma das quais foi a usada.
Fazer a pesquisa é essencialmente uma questão de coleta e análise de dados.
Tipicamente você precisa de algum tipo de registro do que aconteceu em uma
sala de aula específica ou em algumas salas de aula, de forma que você possa
analisar o registro (seus dados) e descrever os processos da sala de aula da
maneira que te interessar. [A maneira] mais óbvia é desenvolver uma base de
dados (o registro) através de observação direta. Você poderia observar os
processos da sala de aula assentando-se na sala e fazendo anotações...
Durante o período de observação tomei notas que constituíram minhas
notas de campo. Sempre após a observação, eu transformava as notas de campo
em notas expandidas. Nas notas expandidas, as notas de campo eram
transformadas em texto e minhas observações pessoais eram acrescentadas.
As referências às notas expandidas serão feitas de acordo com a
numeração das notas. Ou seja, NE001 refere-se às notas relativas ao primeiro dia
de pesquisa. As notas expandidas completas formam o ANEXO 2.
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33
3.4.2
Entrevista
A entrevista foi feita durante uma aula da sétima série A, com a professora
de Inglês cujas aulas eu estava observando. A entrevista tem a duração de
aproximadamente 8 minutos e 23 segundos.
Ela pode ser considerada semi-estruturada, já que eu, no papel de
entrevistadora, não tinha perguntas prontas a fazer, mas o tema da entrevista foi
delimitado por mim através de perguntas relevantes para o momento no qual
estava ocorrendo. Como vemos através de Fontana & Frey (In: Denzin & Lincoln,
2000, p. 653), esse tipo de entrevista “é ainda estruturada até certo ponto – ou
seja, há um contexto, há informantes identificados, e os respondentes são
claramente discerníveis. Em outros tipos de entrevistas, pode não haver um
contexto específico...”.
O nome da professora, bem como das demais pessoas citadas durante a
análise são fictícios. O único nome mantido é o da entrevistadora, que é a autora
desta dissertação. A escolha dos nomes fictícios não seguiu nenhuma norma
acadêmica. Apesar de compartilhar as noções apresentadas por Garcez (2001, p.
83-95), que defende a escolha de nomes fictícios que mantenham a entonação do
nome real, considerei que, por ter feito a pesquisa em uma cidade pequena, a
manutenção dos nomes comprometeria o anonimato dos participantes. Além do
mais, a escolha dos nomes não geram, aqui, nenhum problema em relação à
questão de entonação, já que nenhum nome é citado no decorrer da entrevista.
Dessa forma, optei por dar nomes de fato diferentes dos nomes reais.
A transcrição inicial (ANEXO 3) foi feita seguindo orientações de Gago
(2003). As convenções de transcrição encontram-se na página 12. A partir da
transcrição inicial fiz uma segunda transcrição na qual separei o texto em
unidades que fossem visualmente significativas para a análise (ANEXO 4).
Portanto, no decorrer do trabalho farei menção apenas à segunda transcrição. Para
destacar qualquer trecho da entrevista, fora dos traços previstos para a transcrição,
será usado negrito.
A metodologia de análise será apresentada no capítulo que se segue.
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4
Metodologia e análise de dados
Para abrir a seção da análise dos dados, apresento inicialmente a
metodologia utilizada para tal. O objetivo de apresentar a metodologia de análise
como abertura do capítulo da análise em si, está em manter uma leitura mais
agradável, de forma que o leitor não necessite retornar ao capítulo anterior para
verificar o embasamento metodológico de análise.
Logo após explicitar a metodologia, apresento neste mesmo capítulo a
análise pertinente.
4.1
Metodologia de análise
O que pretendo analisar nesta dissertação é a maneira como a professora
de Inglês se projeta em seu discurso, de forma a identificar fatores relevantes que
influenciam sua prática educacional. Desta forma, pretendo buscar compreender
alguns fatores que estão envolvidos no processo de ensino e aprendizagem em
uma escola pública de Juiz de Fora, principalmente nas aulas de Língua Inglesa.
Certamente, não busco com isso resumir as questões que circundam a escola
pública. Como já mencionado, este é apenas um caso, que envolve diferentes
realidades e que deve ser estudado com o olhar voltado para apenas uma
possibilidade. É sempre importante lembrar que as realidades são múltiplas e que
estudar casos separados é uma maneira de reafirmar a impossibilidade de
generalizações precipitadas acerca de estudos realizados. A escolha de se observar
justamente o posicionamento da professora em relação ao processo educacional é
reflexo da preocupação motivadora da pesquisa: entender alguns motivos que
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35
amedrontavam os graduandos. E, para isso, o melhor ponto de vista a se analisar é
o do professor, já que este seria o papel que ocuparíamos futuramente. Desta
forma, poderíamos observar a postura do professor perante as dificuldades
enfrentadas e refletir sobre as decisões tomadas, bem como poderíamos ver que,
mesmo o professor já inserido no mercado de trabalho também passa por
momentos de dúvidas nos quais ele precisa decidir quais atitudes tomar.
Os dados trabalhados, conforme já dito, fazem parte de uma entrevista. Na
entrevista, o esperado é que encontremos com freqüência o par adjacente
pergunta-resposta, já que eu assumi no momento da interação o papel de
entrevistadora e a professora assumiu o papel de entrevistada. Como apresenta
Oliveira (2002, p. 24-25),
Schiffrin (1988:270) coloca que perguntas são proposições incompletas que são
apresentadas para o outro completar com uma resposta. Portanto, este par
adjacente pode ser visto como um paradigma do esforço intencional a fim de
atingir coesão textual e significados conjuntos.
Acontece, todavia, que nem sempre o entrevistado irá responder às
perguntas de forma direta, utilizando, algumas vezes, formas de evasão. Todas as
formas de resposta, sejam elas diretas ou indiretas, levam a diferentes construções
do self. E, dentre as várias estratégias utilizadas para a construção do self e para
guiar o outro naquilo que está sendo dito encontra-se a mudança de “footing
(Goffman, 2002, p. 113-114).
Uma mudança de footing implica uma mudança no alinhamento que assumimos
para nós mesmos e para os outros presentes, expressa na maneira como
conduzimos a produção ou a recepção de uma elocução.
As mudanças de footing podem sinalizar respostas evasivas, mudanças de
assunto, posições presentes ou passadas, à medida que os participantes podem
usá-las, a fim de mostrar um posicionamento igual ou diferente daquele que se
busca na pergunta, inclusive utilizando mudança de tópico, ou apenas
exemplificando, ao invés de responder ao que foi perguntado. Conforme coloca
Goffman (ibid, p. 110), até mesmo a entrada e saída do assunto em si têm
implicações na capacidade social na qual os envolvidos pretendem atuar.
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36
Ainda, segundo Goffman (ibid, p. 114),
os participantes mudam constantemente seus footings enquanto vão falando,
sendo essas mudanças uma característica inerente à fala natural.
Isso significa dizer que as mudanças de footing estão presentes em todas as
interações comunicativas, interferindo na construção do self de todos os
participantes envolvidos. A definição de footing que estou empregando aqui foi
resumida por Goffman (ibid, p. 113), conforme vemos abaixo:
1. O alinhamento, ou porte, ou posicionamento, ou postura, ou projeção pessoal
do participante está de alguma forma em questão.
2. A projeção pode ser mantida através de um trecho de comportamento que
pode ser mais longo ou mais curto do que uma frase gramatical, de modo
que a gramática frasal não será de grande ajuda, embora pareça claro que
alguma forma de unidade cognitiva está minimamente presente, talvez uma
“oração fonêmica”. Estão implícitos segmentos prosódicos, não segmentos
sintáticos.
3. Deve ser considerado um continuum que vai das mais evidentes mudanças
de posicionamento às mais sutis alterações de tom que se possa perceber.
4. Quanto aos falantes, a alternância de código está comumente presente e, se
não está, estarão presentes ao menos os marcadores de som que os lingüistas
estudam: altura, volume, ritmo, acentuação e timbre.
5. É comum haver, em alguma medida, a delimitação de uma fase ou episódio
de nível “mais elevado” da interação, tendo o novo footing um papel liminar,
servindo de isolante entre dois episódios mais substancialmente sustentados.
Considerando os conceitos acima expostos, proponho fazer a análise de
mudanças de footing de uma professora de Inglês de uma escola pública de Juiz
de Fora, em suas respostas durante uma entrevista, de modo a observar e discutir
aspectos cruciais de seu discurso com relação a sua prática pedagógica observada
e comentada nas notas expandidas.
Para a análise, a entrevista será dividas em trechos, de acordo com os
temas tratados na pergunta feita e na resposta dada. Com a finalidade de alcançar
maiores entendimentos, estabeleço um diálogo entre a micro-análise da entrevista
e o discurso das notas expandidas.
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37
4.2
Análise de dados
O objetivo desta seção é analisar a entrevista feita com uma professora de
Inglês de uma escola estadual de Juiz de Fora, levando-se em consideração os
conceitos apresentados por Goffman (2002) em seu artigo Footing. Desta forma,
pretendo observar, através do discurso da professora, suas crenças, bem como
relatos que expliquem ou justifiquem sua prática pedagógica atual e também
identificar fatores presentes em sua realidade ao lecionar Inglês em uma escola
pública.
A análise será feita por trechos. A divisão dos trechos dar-se-á de acordo
com os temas tratados durante a entrevista. A transcrição foi feita a partir das
convenções de transcrição sugeridas por Gago (2003) que se encontram na página
12. Porém, de forma a facilitar a análise, separei as falas, tornando-as mais curtas.
A transcrição que será usada para a análise pode ser vista no ANEXO 4.
Acrescentei à transcrição elementos em negrito apenas para destacar pontos
importantes para a análise em questão.
Após a análise dos trechos acrescento partes das notas expandidas, como
forma de comparar as anotações feitas no período de construção de dados,
observando se elas correspondem ou entram em conflito com as análises ou com
os próprios trechos da entrevista. Sendo assim, apresento apenas os trechos das
notas expandidas que julgo compatíveis para comparação com os trechos
analisados. O corpo das notas expandidas pode ser lido no ANEXO 2. No decorrer
da análise, acrescento comentários em relação aos fatos observados, colocando-
me tanto no papel de graduanda pesquisadora, quanto no papel de mestranda, com
o olhar voltado para a pesquisa e a formação de professores.
4.2.1
Motivo da escolha profissional
Observemos o primeiro trecho de fala (que corresponde à primeira
pergunta feita durante a entrevista):
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38
01
02
Fernanda
é:: só queria saber porque você escolheu (.) fazer o
curso de le
tras.
03
04
Mariana
eu sempre gostei de:: das matérias, né? português,
inglês (.)
05
06
e:: eu pensei muito >no mercado de trabalho em juiz de
fora também
<.
07
quando eu entrei no curso de letras,
08
eu entrei:: pensando mais no mercado de trabalho,
09
do que (nas próprias) matérias,
10
mas eu me identifiquei.
11
ado:ro, gosto mesmo de dar aula.
12
mas eu pensei,
13
eu não queria sair de juiz de fora e::
14
a princípio eu tinha vontade de fazer: comunicação
15
16
(.) e eu achei que o mercado aqui é muito seria muito
>difícil< (.) pra comunicação.
17
então eu pensei alguma coisa nessa área
18
que (.) me desse um: mercado de trabalho razoável ( ).
Para responder à pergunta relacionada à escolha profissional da professora,
Mariana usa argumentos baseados em seu passado. Todavia, ela não se coloca
diretamente no discurso. O que quero dizer aqui é que Mariana faz uso de
“encaixamento”. Ao se reportar ao passado, Mariana não fala de si como ela é,
mas de si como foi. Assume então o papel de personagem do próprio discurso.
Para a análise de footing, Goffman (2002, p. 136-137) sugere que,
um começo pode ser estabelecido ao examinarmos a maneira como as afirmações
são construídas, especialmente quanto ao encaixamento, um assunto espinhoso,
que se agrava pela facilidade com que se pode confundi-lo com uma idéia
analiticamente um tanto diferente, a noção de papéis sociais múltiplos, já
considerada com relação ao “responsável”.
Além disso, podemos ver um segundo encaixamento: o uso constante de
verbos modais performativos, que têm o papel de atenuantes, afastando o
animador ainda mais do personagem do qual se está falando. Segundo Goffman
(ibid, p. 137-138),
em primeiro lugar, atenuantes e qualificadores apresentados na forma de verbos
modais performativos (eu “gostaria”, “acho”, “poderia”, “espero” etc.) tornam-se
assim possíveis, estabelecendo certa distância entre a figura e o seu aval. De fato,
constrói-se uma dupla distância, pois presumivelmente alguma parte de nós
permanece incondicionalmente por trás de nossa elocução condicional, caso
contrário teríamos de dizer algo semelhante a “eu acho que eu acho...”. Assim,
quando tropeçamos numa palavra e optamos por interromper o curso da fala pelo
uso de uma interjeição como afirmação remediadora, do tipo “Opa! Eu me
enganei”, ou “Eu quis dizer...”, estamos nos projetando na conversa como
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39
animadores. Mas se trata de uma figura, mesmo assim, e não do verdadeiro
animador; é meramente uma figura que, entre todas, é a que chega mais perto do
indivíduo que anima a apresentação.
Vejamos os verbos em negrito na transcrição abaixo:
03
04
Mariana
eu sempre gostei de:: das matérias, né? português,
inglês (.)
05
06
e:: eu pensei muito >no mercado de trabalho em juiz de
fora também
<.
08
Mariana
eu entrei:: pensando mais no mercado de trabalho,
12
Mariana
mas eu pensei,
13
eu não queria sair de juiz de fora e::
14
a princípio eu tinha vontade de fazer: comunicação
15
16
(.) e eu achei que o mercado aqui é muito seria muito
>difícil< (.) pra comunicação.
17
então eu pensei alguma coisa nessa área
Os verbos acima em negrito, empregados por Mariana, são usados como
forma de distanciamento do próprio discurso, de forma a se afastar um pouco mais
do papel de agente e se aproximar do papel de personagem. Todos eles se referem
ao passado e isentam a professora de se posicionar no presente. Isso é possível
porque, através das mudanças de footing podemos nos deslocar livremente no
tempo e no espaço. Para explicar esse aspecto, Goffman (ibid, p. 138) cita Hockett
(1963, p. 11).
(...) conforme recomenda Hockett (1963:11), torna-se possível o deslocamento
irrestrito no tempo e espaço, de tal modo que nossa referência pode ser ao que
fizemos, quisemos, pensamos etc., em algum ponto distante no tempo ou espaço,
quando também ocupávamos uma capacidade social da qual não podemos mais
desfrutar no presente e uma identidade que não mais sustentamos.
Para responder à pergunta feita, ela faz uma mini-narrativa, explicando sua
escolha profissional. Mariana então contrasta questões racionais da escolha a
questões sentimentais. Ela se projeta alternando entre um “eu emocional” e um
“eu racional”, de forma a mostrar que sua escolha não foi feita apenas de acordo
com seu gosto e sua vontade, mas também a partir de questões práticas
relacionadas a sua carreira futura.
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40
(Quadro 1 – Os “eus” da professora)
Footings da
professora
Exemplos
03
04
eu sempre gostei de:: das matérias, né? português,
inglês (.)
13
eu não queria sair de juiz de fora e::
“Eu
emocional”
14
a princípio eu tinha vontade de fazer: comunicação
05
06
e:: eu pensei muito >no mercado de trabalho em juiz de
fora também
<.
08
eu entrei
:: pensando mais no mercado de trabalho,
15
16
(.) e eu achei que o mercado aqui é muito seria muito
>difícil< (.) pra comunicação.
“Eu
racional”
17
então eu pensei alguma coisa nessa área
São as escolhas dos verbos performativos modais que constroem a
diferença do “eu emocional” e do “eu racional”. Se ao projetar o “eu emocional”
Mariana seleciona verbos ligados a questões sentimentais, ao projetar o “eu
racional” ela usa verbos ligados a idéias. As questões práticas que a levam a fazer
Letras, de acordo com o trecho acima, são o mercado de trabalho, a cidade e a
área de conhecimento, enquanto as questões emocionais envolvem a área de
conhecimento e a cidade.
Ao tomarmos o primeiro trecho da narrativa (das linhas 03 a 10), podemos
verificar que a professora o encerra com o seguinte comentário:
10
Mariana
mas eu me identifiquei.
A frase da professora é opositiva, demonstrando que se identificar com o
curso de Letras não era algo esperado nem por ela mesma. O que ocorre aqui é a
contraposição do “eu emocional” com o “eu racional”, já que o curso de Letras
inicialmente deveria ter seu lugar marcado apenas no racional e não no emocional.
Observando os dados, vemos que a narrativa de Mariana é interrompida na
linha 11 quando, após mostrar que ela se identificou com o curso, Mariana se
projeta de maneira diferente. Ela interrompe o footing de narrativa para fazer uma
exclamação sobre um “eu presente” ou “eu remetente” segundo nomenclatura de
Goffman (2002, p. 142) – já que até agora ela estava falando apenas de um “eu
passado”:
obviamente, quando, em vez de dizermos algo nós mesmos, optamos pelo relato
do que o outro disse, estamos mudando nosso footing. E o mesmo ocorre também
quando mudamos do relato de nossos sentimentos atuais, os sentimentos do “eu
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41
remetente”, para sentimentos que já tivemos, mas que não mais endossamos. (De
fato, uma troca de código às vezes funciona como uma marca dessa mudança.)
Como vemos, até agora, Mariana falava de um “eu passado”. Na linha
abaixo, Mariana fala do “eu remetente”.
11
Mariana
ado:ro, gosto mesmo de dar aula.
Mariana interrompe a narrativa para dizer que gosta do que faz, como
forma de justificar que sua escolha, apesar de não ter seguido seu “eu emocional”,
foi acertada. Ou seja, Letras hoje já faz parte do “eu emocional” da professora,
enquanto que no passado isso não era possível. O fato interessante, todavia, é que
logo após afirmar estar satisfeita com sua escolha Mariana retoma o footing da
narrativa, mas com uma conjunção adversativa que vai demonstrar justamente
uma oposição ao que ela acaba de afirmar.
12
Mariana
mas eu pensei,
13
eu não queria sair de juiz de fora e::
14
a princípio eu tinha vontade de fazer: comunicação
Desta forma, sua escolha de retomar a narrativa justamente contando que
inicialmente queria fazer comunicação, mas mudou de opinião devido ao mercado
de trabalho de Juiz de Fora, leva a uma idéia oposta ao que expressou no trecho
anterior. Tal oposição nos faz crer que, na verdade, Letras não faz parte do seu
“eu emocional”, como havia afirmado.
Observemos agora as linhas 15 e 16:
Nessa parte, Mariana começa a frase se projetando no passado (“eu achei”)
e embora ela não se coloque no presente, ela acaba trazendo a situação para o
presente (“é”) em oposição à situação passada (que ela rapidamente reformula –
“seria”). Trazer a situação para o presente, aqui, parece ser uma tentativa de se
projetar junto da situação, para uma explicação presente de continuar sendo uma
professora. É como se ela pensasse ainda na possibilidade de atuar na área de
15
16
Mariana
(.) e eu achei que o mercado aqui é muito seria muito
>difícil< (.) pra comunicação.
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42
Comunicação, mas como o mercado de trabalho em Comunicação era e ainda é,
segundo ela, difícil, ela prefere continuar confiando nos aspectos racionais, o que
a leva a continuar sendo professora (já que o curso de Letras oferece a ela um
mercado de trabalho razoável – conforme ela diz na linha 18).
18
Mariana
que (.) me desse um: mercado de trabalho razoável ( ).
Inicialmente, Mariana justifica sua escolha baseando-se primeiro nas
matérias das quais gostava e, depois, no mercado de trabalho em Juiz de Fora.
03
04
Mariana
eu sempre gostei de:: das matérias, né? português,
inglês (.)
05
06
e:: eu pensei muito >no mercado de trabalho em juiz de
fora também
<.
Todavia, Mariana inverte a ordem, passando a deixar o mercado de
trabalho como primeiro motivo de sua escolha e as matérias como um motivo
extra. Vejamos as linhas 08 e 09:
08
Mariana
eu entrei:: pensando mais no mercado de trabalho,
09
do que (nas próprias) matérias,
No trecho acima, podemos ver que a professora confronta a sua projeção
inicial feita em sua fala “eu sempre gostei de:: das matérias, né? português, inglês
(.)” (linhas 03 e 04) na qual ela insinua que a escolha do curso de Letras se deu
devido ao seu gosto por Português e Inglês, diminuindo a possibilidade do curso
de Letras fazer parte de sua vontade ou do seu “eu emocional” e aumentando o
valor dado ao mercado de trabalho. A partir deste trecho, Mariana não cita
novamente as matérias como motivo de sua escolha. Mas ela usa um termo mais
abrangente para se referir a elas:
17
Mariana
então eu pensei alguma coisa nessa área
Ela coloca as matérias como parte integrante de uma “área” e não de um
curso determinado fazendo com que Letras não seja uma escolha específica, isto
é, é uma escolha sem um motivo especial.
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43
Em contraposição, o mercado de trabalho é mencionado por mais duas
vezes (nas linhas 15 e 18):
15
16
Mariana
(.) e eu achei que o mercado aqui é muito seria muito
>difícil< (.) pra comunicação.
18
Mariana
que (.) me desse um: mercado de trabalho razoável ( ).
Tal fato mostra ter sido o mercado de trabalho o motivo de maior peso
para a escolha de Mariana. Na verdade, ao contrapor o mercado de trabalho com
as matérias, ela está de novo mostrando o conflito do “eu emocional” (as matérias
que ela gosta) com o “eu racional” (o mercado de trabalho).
O discurso analisado na entrevista ecoa uma dicotomia facilmente
encontrada na sociedade atual: a escolha profissional pautada por determinações
do mercado, em contraposição à escolha afetiva. Esta tendência na escolha
profissional poderia se associar à insatisfação pessoal no trabalho e a fatores que
dificultam o bom relacionamento no ambiente profissional.
4.2.1.1
Motivo da escolha profissional: notas expandidas
Ao verificar as notas expandidas, é possível encontrar alguns trechos nos
quais Mariana fala sobre seu gosto pelas matérias escolares.
O primeiro trecho refere-se a uma conversa na turma B da sexta série.
Um aluno fala: – A aula tá demorando acabar!
Outro aluno responde: – Aula chata é assim mesmo!
Karina: – Nossa, professora, é mesmo. Como é que cês foi gostar de Inglês?
Mariana: – Não sei como é que cês gostam de Matemática. Eu detesto
Matemática! (NE004)
Apesar de não afirmar que gosta de Inglês, Mariana vai contra o
comentário dos alunos, dizendo não gostar de Matemática.
No corredor, mais uma vez ela comenta comigo:
– Odeio Matemática! (NE004)
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44
Na semana seguinte, durante a aula da sétima série A, a professora
conversa comigo enquanto os alunos fazem o exercício. Novamente, ela cita sua
preferência em relação às matérias escolares.
A professora então fala comigo que adora História. Eu falo que também gosto
mas que não tive bons professores de História no Ensino Fundamental. Ela me
pergunta se eu dou aula e eu falo que dou aula de Inglês instrumental em um
projeto da universidade. (NE006)
Nos trechos acima, Mariana não menciona nenhuma matéria diretamente
relacionada ao curso de Letras (Inglês, Português ou Literatura). No entanto, ela
contrapõe Matemática e História como matérias que representam áreas de estudo
diferentes. É como se, ao mesmo tempo, ela demonstrasse gostar da área de
Ciências Humanas e descartasse a possibilidade de se envolver com a área de
Ciências Exatas.
Apesar de não afirmar diretamente, o que parece é que Mariana confirma o
que disse na entrevista, demonstrando que a área de estudo foi um fator
importante para sua escolha.
Quanto ao mercado de trabalho, Mariana também não o cita diretamente.
Todavia, temos a confirmação da amplitude do mercado de trabalho em Letras em
Juiz de Fora pela quantidade de trabalho que Mariana tem.
Conforme a professora menciona na entrevista, ela dá aula em três redes
de ensino: particular, municipal e estadual. Assim, ela leciona o dia inteiro, nos
três turnos (manhã, tarde e noite).
Mariana então me disse que nas segundas-feiras ela dá 15 aulas e nas terças 14
aulas, mostrando o tanto de aulas que ela dá, já desde o início da semana.
(NE003)
Mariana justifica que a quantidade exagerada de trabalho se deve à baixa
remuneração.
No corredor ela fala de novo que deviam ensinar Inglês instrumental nas aulas de
didática e comenta: “Se pelo menos a gente ganhasse melhor e pudesse trabalhar
um pouco menos, aí a gente podia fazer uns cursos”. (NE006)
Assim, a junção da baixa remuneração com a falta de tempo, gera um
cansaço que atrapalha a produtividade dos professores.
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45
Entrei na sala dos professores às 6:55 h, onde já se encontravam alguns
professores, inclusive a Mariana. Sentei e ela, cansada, comentou comigo:
“Nossa, tô sem coragem. Tô sem coragem para dar aula hoje.” E, depois de uma
longa pausa continuou: “Podia ter reunião comigo hoje! Tô sem coragem e ainda
tenho 15 aulas hoje.” (NE006).
Apesar da baixa remuneração e da excessiva carga horária, a professora de
fato dá aulas o dia inteiro, o que confirma que a área oferece um amplo mercado
de trabalho. Porém, há ainda outro fator, de acordo com Mariana, que interfere
quando se trata de gostar de dar aulas: o comportamento dos alunos.
Disse que gosta de trabalhar com adolescentes mas que na outra escola do estado
onde ela havia trabalhado ela não gostava. Justificou que na outra escola os
alunos ameaçavam e agrediam professores, e que às vezes ela saia de lá chorando,
com medo. (NE004)
O que vemos nos trechos acima é que apesar de Mariana dizer que gosta
do que faz, ela também apresenta fatores contra, como a baixa remuneração e a
falta de tempo tanto para preparar as aulas, quanto para se aprimorar.
A meu ver, a análise acima vem confirmar que a escolha de curso baseada
nas possibilidades de se conseguir um emprego não garante satisfação pessoal, na
medida em que certos empregos exigem uma dedicação de tempo excessiva, para
que o profissional atinja o nível de vida desejável ou, algumas vezes, necessário.
4.2.2
Experiência profissional prévia à graduação
Passemos agora à segunda pergunta feita:
19
20
Fernanda
e você já tinha tido alguma experiência com:: a sala de
au
la?
21
Mariana
não:.
22
antes de escolher o curso de letras não.
23
eu tenho (.) alguns parentes que são professores.
24
Fernanda
humhum
25
Mariana
entendeu?
26
então já tinha assim um contato.
27
já conhecia, é::
28
já tinha uma idéia de como seria – minha rotina
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46
Ao perguntar se Mariana já tinha tido alguma experiência com a sala de
aula, sua primeira resposta é negativa. “não:.” (linha 21). Ou seja, Mariana não
tinha tido nenhuma experiência como professora (o que significa dizer que a
escolha de curso não se deu pela experiência na área).
21
Mariana
não:.
22
antes de escolher o curso de letras não.
Na linha 22, ela insere um marcador temporal “antes” para confirmar que
ela não tinha tido experiência com a sala de aula apenas antes de iniciar o curso de
Letras (embora ela não afirme diretamente, o que ela parece fazer aqui é afirmar
que, durante o curso, ela teve alguma experiência na sala de aula). Novamente a
dêixis temporal está presente, demonstrando uma mudança de footing, através da
oposição entre passado e presente.
O “eu” imediato da pessoa que anima parece estar inevitavelmente envolvido de
alguma maneira – podendo ser chamado de “eu remetente”. Assim, a dêixis em
relação a tempo e lugar também está geralmente presente. (Goffman, 2002, p.
137)
Mariana então usa a experiência do outro como forma de mostrar que,
mesmo não tendo nenhuma experiência na área, sua escolha foi baseada em fatos,
em questões que ela conhece.
23
Mariana
eu tenho (.) alguns parentes que são professores.
Embora ela nunca tivesse dado uma aula, ela tem parentes que são
professores, o que fez com que ela soubesse, através deles, a realidade que viveria
como professora. E é assim que ela justifica seu “conhecimento” da área:
26
Mariana
então já tinha assim um contato.
27
já conhecia, é::
28
já tinha uma idéia de como seria – minha rotina
Na linha 26, ela transfere o contato de seus parentes para si. A repetição de
“já” nas linhas seguintes, bem como a substituição verbal são fatores interessantes
de serem notados. Na linha 26, quando ela diz que já tinha contato, ela responde à
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47
pergunta feita, todavia, substitui o verbo usado na pergunta “ter experiência” por
“ter contato”. Ou seja, embora ela não tivesse experiência, ela tinha contato, o que
significa que a profissão não era desconhecida para ela. Então, ela coloca o
contato dos parentes como sendo o conhecimento que ela possuía da área. Mas,
em seguida, ela refaz a frase e, substitui “conhecer” por “ter uma idéia”. Ou seja,
embora a experiência dos parentes tenha sido relevante para ela como parâmetro
para saber como seria sua carreira profissional, isso não foi suficiente para
determinar seu futuro profissional (serviu apenas para trazer uma idéia de como
seria futuramente).
As notas expandidas não oferecem nenhum comentário que possa ser
relacionado a esse trecho da entrevista.
Todavia, como mestranda, acredito que a experiência profissional prévia à
escolha do curso, ou pelo menos uma inserção no futuro ambiente de trabalho
antes do período de atuação é uma das maneiras que temos de observar o
ambiente para o qual estamos nos formando, de forma que a escolha do próprio
trabalho, bem como do local de trabalho possam levar em consideração fatores já
de nosso conhecimento (tanto os fatores positivos, quanto os negativos).
4.2.3
Escolha dos locais de trabalho
A pergunta seguinte está relacionada à escolha dos locais de trabalho:
29
30
Fernanda
humhum. e:: como você escolheu os lugares que você ia
trabalhar:::? como é que foi
?
31
Mariana
ah não.
32
isso: foi de acordo com o que foi: surgindo assim.
33
hoje eu já é,
34
já é uma escolha.
35
hoje o lugar que eu trabalho eu que escolhi mesmo.
36
mas a: a princípio não.
37
o que foi aparecendo a gente vai pegando - tudo.
38
39
e depois quando eu passei no concurso do estado e da
prefeitura,
40
aí você fica mais(.) é:: mais à vontade.
41
cê pode escolher, né?
42
aí eu escolhi. é::
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48
43
geralmente a gente escolhe por informações
44
“ah, já trabalhei em tal colégio,
45
é bom, é: os alunos são bons.”
46
é: o público, né,
47
o tipo de aluno trabalhado
48
bom, é tranqüilo.
Mariana começa se reportando ao passado:
32
Mariana
isso: foi de acordo com o que foi: surgindo assim.
Mas, suspende momentaneamente o footing e passa a falar da escolha das
escolas nas quais trabalha atualmente.
33
Mariana
hoje eu já é,
34
é uma escolha.
35
hoje o lugar que eu trabalho eu que escolhi mesmo.
Tal suspensão demonstra uma oposição não só temporal (passado versus
presente), mas também uma oposição de oportunidade de escolhas. Se, no
passado, Mariana tinha que trabalhar no local que “surgisse”, no presente, o local
de trabalho é, de fato, escolha própria. A repetição de “hoje” serve ainda para
reforçar a oposição entre passado e presente mencionada.
Para retomar o footing que ela havia suspendido, Mariana usa uma
sentença opositiva.
36
Mariana
mas a: a princípio não.
Tal sentença demonstra claramente um retorno ao passado, ou seja, à
escolha inicial de Mariana. O que podemos ver aqui é que, nesse “jogo” estão
presentes dois animadores do discurso. Para Goffman (2002, p. 139),
se acontecer de estarmos narrando uma história ou algo acontecido há muitos
anos, quando éramos um tipo de pessoa que não somos mais, então o “eu” em
“Eu disse, feche a janela” está ligado a nós – a pessoa presente – meramente
através da continuidade biográfica, algo sobre o que se pode compreender muito
ou pouco, e nada mais do que isso. Em tal caso, pode-se dizer que dois
animadores estão envolvidos: o que está fisicamente animando os sons que são
ouvidos e um animador encaixado, uma figura inserida em uma afirmação e cuja
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49
presença se dá somente no universo sobre o qual se está falando, não no universo
no qual a narração em curso acontece.
A partir de então, ela relata as “escolhas” do passado.
37
Mariana
o que foi aparecendo a gente vai pegando - tudo.
38
39
e depois quando eu passei no concurso do estado e da
prefeitura,
40
aí você fica mais(.) é:: mais à vontade.
41
cê pode escolher, né?
42
aí eu escolhi. é::
43
geralmente a gente escolhe por informações
Porém, o que é interessante notar no trecho acima é que, embora Mariana
esteja relatando um fato passado, há alternância entre passado e uma marcação
atemporal. O que é possível perceber é que todas as vezes que ela usa uma
marcação atemporal o sujeito é indefinido (“a gente” ou “você”), enquanto o
passado refere-se a um “eu” agentivo.
(Quadro 2 – Agentividade)
“quando eu passei no concurso” (linha 38)
“Eu” – agentivo
“aí eu escolhi. é::” (linha 42)
a gente vai pegando” (linha 37)
“aí você fica mais(.) é:: mais à vontade.”(linha 40)
cê pode escolher, né?” (linha 41)
“Você” / “a gente”
– indefinido
a gente escolhe por informações” (linha 43)
Após afirmar que as escolhas são feitas por informações, Mariana encaixa
a fala de um sujeito ausente e indeterminado. Segundo Goffman (ibid, p. 139),
ao usar a segunda ou terceira pessoa em lugar da primeira, podemos contar o que
uma outra pessoa disse, alguém presente ou ausente, humano ou mítico. Podemos
encaixar um falante completamente diferente no corpo da nossa elocução.
E é esse o recurso que Mariana emprega:
44
Mariana
“ah, já trabalhei em tal colégio,
45
é bom, é: os alunos são bons.”
O que ela faz aqui é acrescentar os comentários de um sujeito ausente e
indeterminado, como forma de justificar a maneira como escolhe seu local de
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50
trabalho. Como é possível observar, as informações dadas por outras pessoas é o
fator levado em consideração na hora da escolha. Mariana não menciona sua
experiência pessoal ou seu conhecimento como forma de auxiliar na sua decisão.
O que conta, portanto, é a opinião de terceiros, não sendo a escolha tão pessoal
quanto ela afirma. Em seguida, ela acrescenta os “elementos” que julga
importantes na hora de escolher o local de trabalho:
46
Mariana
é: o público, né,
47
o tipo de aluno trabalhado
48
bom, é tranqüilo.
O “público”, como ela coloca inicialmente, é o fator principal para sua
escolha. Ela reformula sua frase, explicando que o público são os alunos e que,
para uma escola ser boa para se trabalhar, os alunos têm que ser bons e tranqüilos.
Interessante notar que, como professora, Mariana preocupa-se apenas em
saber sobre os alunos que estudam no local onde irá trabalhar. No entanto,
importantes questões didáticas, que envolvem desde instalações apropriadas, até a
aquisição ou confecção de material didático, bem como a atuação da diretoria no
processo educacional não são levadas em consideração.
4.2.3.1
Escolha dos locais de trabalho: notas expandidas
Conforme vimos na análise da entrevista, Mariana faz uma oposição entre
passado e presente, sendo o passado o tempo no qual ela não podia optar por onde
trabalhar, enquanto o presente representa sua escolha do local de trabalho.
De fato, as notas expandidas confirmam que o local onde Mariana
trabalhava antigamente era menos agradável que o atual, como vemos em uma
conversa durante a aula da sétima série A (conforme já mencionado na seção
4.1.1).
[Mariana] Disse que gosta de trabalhar com adolescentes mas que na outra escola
do estado onde ela havia trabalhado ela não gostava. Justificou que na outra
escola os alunos ameaçavam e agrediam professores, e que às vezes ela saia de lá
chorando, com medo. (NE004)
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51
Embora possamos observar desvios de comportamento por parte dos
alunos na escola onde Mariana trabalha atualmente, eles não se comparam ao
relato anterior relacionados a ameaças e agressões a professores.
A maior parte dos problemas de comportamento se referem a conversas e
bagunças em sala de aula, como vemos abaixo.
A professora vai para a porta da sala e fica conversando com alguém que está do
lado de fora. Os alunos, enquanto isso, ficam conversando.
Os alunos começam a fazer muito barulho e alguns ficam andando pela sala. A
professora entra na sala e fala brava: “Gente, só um minutinho que eu tô
atendendo uma mãe aqui e já já eu explico”.
Sai da sala e continua conversando.
Karina vira para mim e fala: – Tadinha, a moça deve tá arrependida de ter entrado
nessa escola.
A bagunça continua e a supervisora entra na sala. Pede silêncio (...). (NE004)
Ainda assim, os problemas de comportamento são resolvidos com a ajuda
das diretoras ou das supervisoras, como veremos:
Então a Marcele entra na sala, lê o nome de seis alunos e pede que eles saiam da
sala, já com suas mochilas e materiais. Eles avisam que um dos alunos não está
na sala e os cinco ficam na porta da sala, esperando. Enquanto isso, os outros
alunos se mostram nervosos e os que estão em pé ficam tremendo.
A Marcele fala que a turma não tem tido um bom comportamento e explica que
os cinco estavam sendo chamados por causa do comportamento na aula do dia
anterior. Avisa que a turma vai ficar sem recreio por um bom tempo e sai da sala
acompanhada dos cinco alunos.
Um aluno reclama com a professora e diz que não é justo ele ficar sem recreio se
ele nem tinha ido à aula no dia anterior. A professora fala que a turma não tem
bom comportamento há muito tempo. Ele então diz que é injusto a Marisa e outra
aluna (cujo nome não me lembro) ficarem sem recreio, pois elas não conversam,
nem fazem bagunça.
Essa outra aluna então fala com a professora que a outra professora, que é mais
calma, não dá aula por causa da turma, fica o tempo todo de braços cruzados
esperando silêncio e, no fim da aula, passa exercícios e manda eles fazerem
sozinhos e pergunta para a professora (em um tom de indignação): “E o resto que
quer aprender?”
A professora então pergunta: – Mas cê acha que a gente tem que agüentar isso?
A aluna responde: – Mas então tem que punir! (NE004)
Com exceção dos casos de comportamento acima mencionados, o que
pareceu um pouco mais agressivo não ocorreu na aula de Inglês.
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52
Na sala dos professores, uma professora, indignada, mostra a prova de um aluno
toda escrita no verso. Os professores vêem a prova, ela explica que o que está
escrito em letras maiores é o apelido do aluno. Embaixo, vem escrito na prova:
“(enfia o pau no cú deles) dos professores”.
O professor de física comenta: “Ainda é burro! Não sabe nem que essa palavra
não tem acento” e depois de um tempo fala “O lugar de se consertar ele é na
CERESP
1
.” (NE007)
Apesar de o vocabulário ser tanto quanto agressivo, o aluno não oferece
nenhuma ameaça formal aos professores (pelo menos, isso não é relatado por
nenhum dos professores no momento em que eu estava presente).
Pelo que podemos notar, de fato, “o público” com o qual Mariana
trabalhava na época da pesquisa era melhor e mais tranqüilo que o relatado por ela
na escola em que trabalhava anteriormente.
Esta análise me permitiu associar os posicionamentos e a experiência de
Mariana ao clássico problema da disciplina escolar. Enquanto graduanda, este era
um dos problemas que gerava insegurança. Todavia, penso atualmente que, a falta
de disciplina normalmente advém da falta de interesse dos alunos pelos assuntos
tratados em aula. Uma formação universitária voltada para um ensino que leve em
consideração a realidade dos alunos pode facilitar o engajamento dos mesmos,
diminuindo o mau comportamento. Outra questão sobre a qual é necessário
refletir é o próprio conceito que permeia o termo “mau comportamento”. Isso
porque, o que às vezes é visto por um professor como desvio de comportamento,
pode ser visto por outras pessoas apenas como conseqüência de situações
cotidianas pelas quais os alunos passam. Desta forma, a reflexão sobre as
realidades dos alunos também pode modificar os conceitos pré-concebidos que
trazemos mesmo antes da graduação.
4.2.4
O apoio dado ao ensino de Inglês
Passemos agora para o próximo trecho, no qual confirmo as redes de
ensino nas quais Mariana dá aula e, em seguida, pergunto sobre o apoio dado ao
ensino de Inglês.
1
Centro de Remanejamento de Presos
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53
49
Fernanda
e você dá aula num colégio particular, é:: estadual e::
50
Mariana
tem o da prefei[tura.
51
52
Fernanda
[da prefeitura. é: e qual deles dá mais
apoio ao inglês (como) matéria?
53
(3.0)
54
Mariana
eu acho que o municipal.
55
pelo menos na escola que eu trabalho.
56
Fernanda
humhum
57
Mariana
eu acho que::[
58
59
Fernanda
[de todas elas, do: do municipal, dão
apoio, é?
60
Mariana
não, não, é. (.)
61
depende da escola, assim.
62
eu acho que não é a rede que define isso.
63
Fernanda
humhum
64
Mariana
entendeu?
65
eu acho que é a escola.
66
eu trabalho em três escolas da prefeitura.
67
uma me dá muito apoio
68
as outras, (.) indiferente.
69
70
mas aí eu acho também que todas as matérias são
indiferentes.
71
a escola não dá apoio para matéria nenhuma então, é.
72
eu acho, que eu sinto isso,
73
entendeu?
74
75
a escola que é boa que dá apoio mesmo quer dá apoio pra,
pra qualquer á
reas.
76
são: diferentes.
77
Fernanda
[humhum
78
Mariana
[eu acho que depende da escola, da direção.
Segundo Mariana, o colégio municipal, dentre os colégios nos quais ela
trabalha, é o que dá maior incentivo.
Todavia, ela não especificou se o apoio é dado pela rede municipal ou
apenas pela escola municipal onde ela trabalha. Para esclarecer, perguntei a ela.
58
59
Fernanda
[de todas elas, do: do municipal, dão
apoio, é?
60
Mariana
não, não, é. (.)
61
depende da escola, assim.
62
eu acho que não é a rede que define isso.
63
Fernanda
humhum
64
Mariana
entendeu?
65
eu acho que é a escola.
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54
Ela então explica que o apoio não é determinado pela rede de ensino, mas
por escolas específicas. Todavia, para dizer isso, Mariana não se posiciona
diretamente, ela faz, por duas vezes, uso do verbo modal performativo “acho”
(linhas 62 e 65). Eu sinalizo minha participação e ela confirma meu entendimento.
63
Fernanda
humhum
64
Mariana
entendeu?
É interessante notar que, a confirmação do entendimento não é uma
pergunta genuína já que Mariana prossegue sua fala, sem esperar por resposta.
Então, ela repete sua opinião sobre o apoio recebido e exemplifica, usando sua
estória para justificar sua opinião.
65
Mariana
eu acho que é a escola.
66
eu trabalho em três escolas da prefeitura.
67
uma me dá muito apoio
68
as outras, (.) indiferente.
Ao usar sua própria estória, Mariana se coloca como “personagem” do
próprio discurso. Ela ocupa a posição social de professora e conta sua estória
como forma de conceder autoridade a sua fala.
Observe que, quando tais elocuções são ouvidas, elas são ouvidas também como
vindas de um indivíduo que não apenas anima as palavras, mas ocupa ativamente
uma qualificação social determinada, sendo essa qualificação o que confere
autoridade às palavras.
Muitas das elocuções, se não a maioria, no entanto, não são construídas segundo
esse modelo. Ao contrário, como falante, representamos a nós mesmos pelo
emprego de um pronome pessoal, em geral “eu”, sendo assim uma figura – uma
figura numa afirmação – que serve como o agente, um protagonista numa cena
descrita, um “personagem” numa anedota, alguém, enfim, que pertence ao
universo sobre o qual se está falando, não ao universo no qual a fala ocorre. Uma
vez empregado esse formato, cria-se uma flexibilidade surpreendente. (Goffman,
2002, p. 137)
Inicialmente ela se distancia do discurso através do verbo modal
performativo “acho” e, logo em seguida, se aproxima novamente ao trazer sua
experiência como prova de sua opinião. Ela então explica que apenas uma das três
escolas municipais nas quais trabalha apóia o ensino de Língua Inglesa, enquanto
as outras, mesmo sendo municipais, não se importam.
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55
69
70
Mariana
mas aí eu acho também que todas as matérias são
indiferentes.
71
a escola não dá apoio para matéria nenhuma então, é.
72
eu acho, que eu sinto isso,
73
entendeu?
74
75
a escola que é boa que dá apoio mesmo quer dá apoio pra,
pra qualquer á
reas.
76
são: diferentes.
No trecho acima, ela continua explicando o apoio dado. O que me parece,
todavia, é que Mariana passa da falta de apoio ao ensino de Língua Inglesa, para a
falta de apoio ao ensino, em geral: “todas as matérias são indiferentes” (linha 69)
e “a escola não dá apoio para matéria nenhuma então” (linha 71).
Além do modalizador “acho” empregado na linha 69, ela usa mais dois
modalizadores na linha 72: “acho” e “sinto”.
Na linha 74, ela emite sua opinião, dizendo que as boas escolas são as que
apóiam todas as áreas de ensino.
E, para finalizar, ela faz um resumo da resposta.
78
Mariana
[eu acho que depende da escola, da direção.
Se observarmos o trecho todo do diálogo entre as linhas 49 e 78, podemos
notar que o apoio ao ensino (quer seja o de Inglês, quer seja de outras matérias)
não é atribuído às pessoas, mas sim às instituições. Inicialmente ela nega que o
apoio seja determinado pela “rede”, e o atribui à “escola”. No final, quando
resume sua resposta, ela o atribui à “direção”. Apesar de começar citando o grupo
mais abrangente e ir decrescendo, gradativamente (rede – escola – direção),
Mariana não cita nenhuma pessoa como responsável nem pelo apoio, nem pela
falta do mesmo. Desta forma, através de minha vivência como pesquisadora
participante e também como micro-analista do discurso de Mariana, entendo que
há uma indefinição reinante no sistema público de ensino. A partir da pesquisa
realizada, é possível observar que não há uma consistência em relação aos
procedimentos adotados pelos diversos coordenadores na escola pública
observada. Parece-me que a participação das coordenações no processo de ensino
e aprendizagem seja um campo de pesquisa necessário dentro da lingüística
aplicada.
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56
4.2.4.1
O apoio dado ao ensino de Inglês: notas expandidas
Nas notas expandidas, tal qual na entrevista, Mariana afirma que o melhor
lugar para se trabalhar é na escola municipal.
Ela pára perto de mim e fala sobre as diferenças entre trabalhar nas escolas do
estado e da prefeitura. Disse que na prefeitura é melhor, porque as turmas são
melhores e os professores têm direito de usar maior quantidade de xerox.
(NE004)
Segundo ela, além das turmas serem melhores, a quantidade de material é
maior.
Quanto ao apoio dado ao ensino de Inglês, nas notas expandidas, ele pode
ser dividido em vários segmentos. Podemos observá-lo a partir das atitudes da
coordenação da escola, dos outros professores ou dos pais.
O apoio dado pelos pais será tratado na seção 4.6. Aqui, nos deteremos aos
trechos das notas expandidas que mostram as atitudes da coordenação e dos outros
professores perante o ensino da Língua Inglesa.
Por parte da coordenação, há uma ligeira oposição de atitudes. Por um
lado, vemos as supervisoras e diretoras interferindo de forma positiva para ajudar
a professora a manter o controle da turma. Dessa forma, os próprios professores
usam a coordenação como ameaça para que os alunos mantenham um bom
comportamento.
A professora rebobina a fita e os alunos pedem para apagar a luz. A professora
deixa, mas avisa que se eles conversarem ela vai acender a luz. O filme começa e
ela faz chamada.
Os alunos ficam inquietos, conversam, olham para os lados, reclamam. A
professora fala que quem conversar vai para a diretoria. (NE010)
Por outro lado, observamos por várias vezes a presença da coordenação
interrompendo a aula para chamar a atenção dos alunos por problemas ocorridos
em outros momentos e, algumas vezes, ocupando grande parte do horário da aula.
A supervisora Marcele entra na sala e pergunta se pode conversar com os alunos.
Volta-se para os alunos e pergunta, de forma bruta: “Eu quero saber quem foi que
disse que eu disse”.
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57
Os alunos, assustados, ficam olhando para a supervisora, imóveis e demonstrando
não estarem entendendo o que está acontecendo.
Depois de alguns segundos de silêncio a supervisora continua: “Eu quero saber
quem foram as três meninas que disseram que eu disse. Eu fui bem clara. As três
meninas que disseram que eu disse e que o Nuno colocou no jornal.”
Os alunos então começam a se entreolhar, assustados, e ainda sem entenderem o
que estava acontecendo.
Marcele: – Hein gente? Quem são as três meninas que estavam na minha sala e
que disseram que eu disse?
Então, três meninas levantam o dedo e uma delas começa a explicar que ela
estava na sala da supervisora, mas que ela não sabia o que era que elas tinham
dito.
A Marcele então começa a falar de forma rígida com a turma, chama as três
meninas para a frente da sala. Só então explica o que aconteceu. Fala para a turma
que devido às fofoqueiras da sala (as três alunas) o Nuno, que também gosta de
um fuxico, havia escrito em seu jornal que a professora de Educação Física (Elba)
tinha sido expulsa do colégio, por ter mandado as três alunas para a supervisora,
já que elas estavam matando aula. Explica o que é um professor efetivo e diz que
a professora Elba só trabalhava na escola para completar carga horária e, como
ela havia conseguido mais aulas na outra escola, ela não precisaria mais dar aulas
no colégio. Avisa para os alunos terem cuidado com as três meninas e com o
Nuno porque os considera perigosos por serem fofoqueiros e mentirosos. Conta
que em outra escola já processou uma professora que falou mentira sobre ela e
pergunta a eles o que eles acham que pode acontecer com os pais deles, já que os
alunos são menores de idade (em forma de ameaça). Para terminar, avisa que pelo
menos por um mês a turma vai ficar sem recreio, conversando com ela, para
aprenderem a não fazer fofoca e que ela iria pensar se o jornal poderia continuar
ou não. Pede desculpas à professora por ter interrompido a aula e diz que depois
conversaria com os quatro fofoqueiros. (NE003)
A interrupção também é feita durante um teste, como vemos a seguir:
Uma mulher entra na sala. Pela conversa que ouvi na sala dos professores,
pressuponho que seja Cláudia, outra diretora. Ela chama a atenção da turma pela
quantidade de advertências que os alunos levaram. Fala com uma aluna que ela
está suspensa, avisa a Marcela que a mãe dela está no colégio e que quando ela
terminar o teste é para juntar o material para ir embora junto com a mãe. Pede à
turma para prestar atenção aos modos de agir, antes que o colégio tome outras
providências. Ela sai da sala e os alunos continuam o teste. (NE005)
Em oposição às interrupções feitas para chamar a atenção dos alunos, na
sala dos professores foi possível ouvir uma professora reclamar da falta de atitude
da coordenação perante um desvio de comportamento por parte de um dos alunos.
Cheguei à escola e fui direto para a sala dos professores, onde encontrei uma
professora de Português, conversando com uma secretária (pedagoga
aposentada). A professora estava exaltada, contando para a secretária que
nenhuma providência tinha sido tomada em relação a um problema com um aluno
da turma A. A conversa foi mais ou menos a seguinte:
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58
PP (Professora de Português): – Eu falei com a Norma que eu não ia dar aula com
aquele menino lá. Depois daquilo tudo não tomaram nenhuma providência e eu ia
ser obrigada a agüentar desaforo e ainda ficar desmoralizada.
S (Secretária): – Nossa! Eles que tinham que ter feito alguma coisa. E a mãe
dele? (NE004)
Por parte dos outros professores, não há consenso. Enquanto uns acreditam
no potencial dos alunos, outros não dão crédito ao ensino de Inglês na escola.
Professor: – Não deixa a Marcele pegar no seu pé não que ela é muito chata.
Além disso, essa professora de Inglês é uma droga, não sabe nada. É um nojo.
Acha que manda no pedaço.
Aproveitei a oportunidade da conversa para buscar dados:
Eu: – Mas ela não é a única efetiva aqui?
Professor: – Não é efetiva nada!
Eu: – Mas tem outros professores de Inglês, não tem?
Professor: – Ih! Cada um pior que o outro. É uma porcaria. Além disso acho
melhor você conversar com a Joana, que é a outra supervisora, porque a Marcele
é doida. (NE002)
Em oposição ao descrédito visto acima, temos um professor que sugere
que seja montada uma peça teatral em Inglês, para ser representada pelos alunos.
Um professor perguntou quem assistiu à peça de teatro feita por alunos de uma
outra escolha pública. A Mariana perguntou, com um tom duvidoso, se a peça
tinha sido boa, e completou que em escola estadual é impossível trabalhar com
teatro. O professor respondeu que a peça tinha sido ótima. Após a confirmação
por outra professora, ele ainda comentou que em outro lugar onde ele tinha
trabalhado (também escola estadual) ele tinha feito com os alunos uma peça em
grego e sugeriu à Mariana que montasse com eles uma peça em Inglês. Ela
respondeu que seria impossível, já que os alunos não se importam com nada.
(NE003)
Como vemos acima, após a sugestão da peça de teatro a própria professora
de Inglês demonstra descrédito em relação à capacidade dos alunos.
Apesar de na entrevista Mariana se restringir ao apoio, ou à falta do
mesmo dado institucionalmente, podemos ver nas notas expandidas que as
pessoas estão diretamente envolvidas interferindo positiva e negativamente no
fluxo das aulas de Língua Inglesa.
Outros entendimentos que alcanço aqui, relacionados também a minha
própria prática como professora é que o processo educacional não se restringe à
sala de aula. Em relação aos professores, a própria sala de professores exerce
influência sobre nossa prática, já que temos a oportunidade de refletir sobre os
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59
comentários e as atitudes de nossos colegas, aceitando ou refutando sugestões e
conselhos que podem transformar nossa atuação na sala de aula. As alianças que
se constroem ou que deixam de ser construídas nas salas de professores também
têm implicações pedagógicas na medida em que elas podem proporcionar um
trabalho conjunto e interdisciplinar.
4.2.5
O papel dos alunos
No trecho seguinte, pergunto sobre os alunos na intenção de saber a reação
deles perante o ensino de Inglês. Todavia, Mariana demonstra dúvida sobre o que
exatamente eu quero saber sobre os alunos, e me devolve o turno de fala, pedindo
esclarecimentos.
79
Fernanda
e em relação aos alunos?
80
Mariana
qual é o melhor?
81
Fernanda
não, como que eles reagem à matéria:?
82
Mariana
eu acho que inglês é uma,
83
é: mais ou menos assim. (.)
84
tem aluno que gosta muito
85
e tem aluno que não gosta muito também.
86
é difícil um aluno a tanto faz,
87
>tem aluno que gosta muito
88
e tem aluno que DETESTA mesmo<.
89
mas geralmente eu não tenho problema assim de (.)
90
“ah não vou fazer de jeito nenhum”,
91
“ah, num quero de jeito nenhum”.
92
Fernanda
humhum
93
Mariana
não tenho grandes problemas não.
94
( ) mais pro natural mesmo.
95
tem quem gosta,
96
tem quem não gosta,
97
como todas as matérias.
Após esclarecer a dúvida, ela inicia sua resposta, já modalizando-a.
82
Mariana
eu acho que inglês é uma,
83
é: mais ou menos assim. (.)
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60
Além do verbo modal “acho”, Mariana acrescenta outra expressão que irá
servir de modalizador, distanciando ainda mais o animador de sua fala: “mais ou
menos” (linha 83).
Nesse trecho, um dos recursos que Mariana utiliza é o paralelismo tanto
sintático, quanto semântico. Vejamos as linhas abaixo:
84
Mariana
tem aluno que gosta muito
85
e tem aluno que não gosta muito também.
87
Mariana
>tem aluno que gosta muito
88
e tem aluno que DETESTA mesmo<.
95
Mariana
tem quem gosta,
96
tem quem não gosta,
Nas quatro primeiras linhas acima mencionadas, Mariana utiliza a
estrutura “tem aluno que” e, nas duas últimas linhas, ela a substitui por “tem
quem”. As frases são as mesmas, sendo que o que varia é o verbo que,
semanticamente, demonstra afirmação ou negação: sempre a primeira sentença
demonstra um sentimento positivo, enquanto a segunda demonstra um sentimento
negativo. O que varia, neste caso, é a intensidade dos sentimentos. Nas linhas 84 e
85, “gosta muito” se opõe a “não gosta muito”, nas linhas 87 e 88, “gosta muito”
se opõe a “DETESTA mesmo” e nas linhas 95 e 96, “gosta” se opõe a “não
gosta”.
Mariana começa a resposta explicando a posição que os alunos tomam em
relação ao ensino de Inglês. Porém, na linha 89, ela interrompe este footing.
89
Mariana
mas geralmente eu não tenho problema assim de (.)
90
“ah não vou fazer de jeito nenhum”,
91
“ah, num quero de jeito nenhum”.
Ela o interrompe para explicar que, apesar de ter alunos que não gostam da
matéria, isso geralmente não representa para ela um problema de comportamento.
E, para exemplificar os tipos de problemas que ela poderia ter, ela insere a voz de
um sujeito ausente (como já havia feito anteriormente).
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61
(...) podemos ver que, ao usar a segunda ou terceira pessoa em lugar da primeira,
podemos contar o que uma outra pessoa disse, alguém presente ou ausente,
humano ou mítico. Podemos encaixar um falante completamente diferente no
corpo da nossa elocução. (Goffman, 2002, p. 139)
Além de ausente, tanto o sujeito, quanto a fala do mesmo, são hipotéticos,
já que não se referem nem mesmo a algo que tenha ocorrido e que possa ser
relatado. Na suposta fala, Mariana usa novamente o paralelismo, substituindo
apenas “não vou fazer” (linha 90) por “num quero” (linha 91).
Logo após, ela reafirma que o fato de alguns alunos não gostarem de
Inglês não faz com que ela enfrente problemas de comportamento em sala de aula,
no sentido de que ela não precisa obrigar os alunos a fazerem as tarefas
solicitadas.
93
Mariana
não tenho grandes problemas não.
O que muda nessa segunda afirmação, em relação à primeira, é que na
primeira, ela diz que “geralmente” não enfrenta problemas (linha 89), enquanto na
segunda, ela diz que não tem “grandes” problemas (linha 93).
Mariana termina a resposta comparando Inglês com as demais matérias.
95
Mariana
tem quem gosta,
96
tem quem não gosta,
97
como todas as matérias.
Mariana aqui mostra que o Inglês não é diferente das outras matérias. Há
alunos que gostam e que não gostam em todas elas. Mariana coloca o gosto pelo
Inglês no mesmo patamar das demais matérias. Tal assunto, que será retomado no
próximo trecho da entrevista, é fundamental para o professor em formação e para
o professor graduado e em serviço, já que acredito que o gosto dos alunos tem
influência sobre o comportamento dos mesmos perante as matérias escolares. Ao
mesmo tempo, acho que também é papel do professor incentivar o aluno, trazendo
questões de relevância na vida dos mesmos. A falta de harmonia entre a vida e o
que se estuda na escola gera certo desconforto por parte dos alunos, de forma que
a matéria passa a ser algo chato que deve ser memorizado, em vez de ter utilidade
real para as crianças.
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62
4.2.5.1
O papel dos alunos: notas expandidas
Quanto ao gosto dos alunos, Mariana afirma que alguns gostam de Inglês e
outros não gostam, como em todas as matérias.
Ao perguntar para uma aluna qual a matéria que ela mais gosta e qual ela
menos gosta, a Língua Inglesa não é mencionada em nenhum dos extremos.
No caminho para o colégio, Marlene [uma aluna] me grita e começa a conversar
comigo. Fala que vai ter prova de História hoje, e que ela estudou: “decorei o
livro todo!”. Perguntei quais são as matérias que ela mais gosta e menos gosta.
Ela disse que a melhor matéria é Matemática e que ela tira notas boas em
Matemática e que a pior é Português porque ela não entende nada. (NE007)
Porém, durante a aula, uma aluna demonstra não gostar de Inglês, como já
visto antes (ver seção 4.1.1).
Um aluno fala: – A aula tá demorando acabar!
Outro aluno responde: – Aula chata é assim mesmo!
Karina: – Nossa, professora, é mesmo. Como é que cês foi gostar de Inglês?
Mariana: – Não sei como é que cês gostam de Matemática. Eu detesto
Matemática! (NE004)
Quanto à facilidade demonstrada pela professora para fazer com que os
alunos resolvam os exercícios passados, as notas expandidas parecem mostrar
uma posição diferente da afirmada, pelo menos em relação aos deveres de casa.
Na turma da sexta série B, a professora passa olhando os deveres de casa.
Pede aos alunos que abram os cadernos para olhar quem fez o dever de casa e
completa:
Mariana: – Quem não terminou, que eu vi que é a maioria, vai terminando. (...)
Uma das alunas (Fabiana) começa a procurar algum aluno que tenha o texto da
aula anterior:
Fabiana: – Você tem? Você tem? (espera resposta) Ninguém tem!
Outro aluno: – Eu vim na aula mas não copiei.
Um dos alunos pergunta à professora qual era o dever de casa e ela responde:
Mariana: – Pedi pra escrever todos os números de 1 a 100.
A professora continua olhando os cadernos e pára em um dos alunos.
Mariana: – Já olhei o seu?
Aluno: – Já.
Mariana: – Eu não olhei não. O “7” seu tá errado! Como é que eu posso ter
olhado? É com N.
Continua olhando os cadernos e então comenta com a turma.
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Mariana: – Gente, cês tão escrevendo tão errado! Muito errado mesmo!
Impressionante. (NE003)
Em outra aula, na mesma turma a professora passa um trabalho para ser
começado durante a aula e terminado em casa.
Karina: – Ela passou o abecedário duas vezes quase!
Fernando: – É que ela quer lembrar a infância, de escrever de A a Z. Professora,
quem não acabar pode levar pra casa?
Mariana: – Pode
Fernando: – Então não vou fazer aqui não. Se pode levar pra casa...
A professora fica brava e chama a atenção da turma e fala que os alunos são
muito preguiçosos.
Os alunos ficam quietos, copiando ou resolvendo o exercício e só às vezes um
conversa com outro. (NE006)
Na semana seguinte, quando vai recolher o trabalho, vemos que vários
alunos não o fizeram.
Vamos então para a 6B.
A professora passa recolhendo os trabalhos e comenta: “É impressionante como
vocês falam ‘Não fiz não’ na maior cara de pau!”.
Alguns alunos chegam atrasados e ela deixa-os entrarem. O Fernando comenta:
“É a primeira vez que eu chego atrasado e a professora deixa eu entrar”. (NE007)
Há momentos de exceção, nos quais os alunos de fato fazem as tarefas
pedidas, como no caso abaixo.
Os alunos ficam traduzindo em silêncio e, quando alguém conversa, a professora
chama a atenção. (NE007)
Como Mariana afirma na entrevista, a situação nas outras matérias não é
muito diferente. Na aula de Português, o mesmo acontece.
Manda os alunos abrirem o livro na página 169 e pede um aluno para ler o
exercício (que ela havia mandado fazer em casa). O aluno fala que não fez e ela
então pergunta quem fez. Como só três alunos haviam feito, a professora fica
nervosa e fala que, como castigo, além de terem que fazer o exercício, eles teriam
que copiar o enunciado e as perguntas todas. (NE010)
O que podemos ver através das notas expandidas é que, tanto na aula de
Português quanto na de Inglês, os alunos não participam como esperado. O que
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64
vai contra o que Mariana afirma, no entanto, é que tanto ela, quanto a professora
de Português não conseguem obrigar os alunos a fazerem as tarefas solicitadas.
Embora Mariana não tenha falado na entrevista sobre os deveres de casa,
considero que eles também fazem parte dos trabalhos que ela pede para fazer. No
caso, os alunos normalmente não o fazem, o que resulta em reclamações e
punições (normalmente os alunos são penalizados em suas notas por não fazerem
os deveres solicitados). Entendo que tanto a falta de estímulo em relação ao
próprio exercício, quanto a falta de estímulo dado pela professora (que usa apenas
a nota como forma de “incentivar” os alunos a fazerem os deveres), bem como a
falta de acompanhamento por parte dos pais contribuem para que os alunos
deixem de fazer as tarefas pedidas.
4.2.6
O papel dos pais
Passo então da reação dos alunos para a reação dos pais em relação ao
ensino de Língua Inglesa. A importância da participação dos pais no processo de
ensino e aprendizagem é um tema amplamente discutido, por isso foi interessante
buscar ouvir o que a professora diria.
98
Fernanda
e os pais? eles têm alguma influência? ou::
99
Mariana
eu acho que os pais (.)
100
dão pouco valor ao inglês,
101
dão pouco é:: apoio em casa.
102
às vezes eu precisaria de mais (.)
103
104
porque eles são mais >preocupados com< a matemática, com
português
:.
105
106
Fernanda
humhum. então você acha que eles dão apoio pras outras
matérias [e não dão pro inglês.
107
Mariana
[eu acho que sim.
108
eu acho que eles não se preocupam muito.
109
110
só quando a nota do aluno começa a cair que eles olham o
boletim.
111
“>uai<, inglês?
112
mas, inglês?
113
matéria tão boba, né?
114
perdendo nota?”
115
eles (.) vêm aqui (.)
116
como aconteceu hoje, né?
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65
117
o pai da garota da sétima série,
118
a mãe veio,
119
a menina tirou dois no segundo bimestre,
120
agora que ela tá vindo aqui (.)
121
pra vê porque tirou dois.
122
>quer dizer<
123
não acompanhou prova,
124
não acompanhou caderno,
125
não tem noção que a menina não tá fazendo nada=
126
Fernanda
=desde o início, né?
127
Mariana
pois é.
Mariana mais uma vez inicia a resposta com o verbo modal performativo
“acho” (linha 99). Ela dá sua opinião sobre a participação dos pais no processo de
ensino e aprendizagem da Língua Inglesa, usando um paralelismo sintático.
100
Mariana
dão pouco valor ao inglês,
101
dão pouco é:: apoio em casa.
Segundo Mariana, os pais não valorizam o Inglês, e não dão apoio
suficiente em casa. Se observarmos as linhas 101 e 115, contrastando-as, vemos
que Mariana usa o locativo “em casa”, em oposição a “aqui” (na escola):
101
Mariana
dão pouco é:: apoio em casa.
115
Mariana
eles (.) vêm aqui (.)
Ou seja, o lugar apropriado para os pais é em casa, enquanto a escola é o
lugar apropriado para a professora. A ida dos pais à escola, nesse caso, me parece
representar algum tipo de ameaça já que há a invasão do espaço da professora.
Ao prosseguir, Mariana então coloca o Inglês como sendo, para os pais,
menos prestigiado em relação às outras matérias. Se, no trecho anterior, Mariana
afirma que os alunos se comportam da mesma maneira perante todas as matérias,
em relação ao apoio dos pais, o mesmo não acontece. Por isso, Mariana acha que
a participação dos pais precisa ser maior.
102
Mariana
às vezes eu precisaria de mais (.)
103
104
porque eles são mais >preocupados com< a matemática, com
português
:.
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66
Então, confirmo a pouca ajuda oferecida pelos pais ao Inglês, em contraste
com as outras matérias.
105
106
Fernanda
humhum. então você acha que eles dão apoio pras outras
matérias [e não dão pro inglês.
107
Mariana
[eu acho que sim.
108
eu acho que eles não se preocupam muito.
Por mais duas vezes, Mariana utiliza “eu acho” para responder. Ela afirma
então que os pais não se preocupam muito. Porém, há uma exceção mencionada
por ela.
109
110
Mariana
só quando a nota do aluno começa a cair que eles olham o
boletim.
Ou seja, para Mariana, o boletim, quando apresenta notas baixas, é o único
fator que faz com que os pais se preocupem. Ela então usa o encaixamento,
apresentando a fala de uma terceira pessoa que, embora se refira aos pais, é
indeterminada.
111
Mariana
“>uai<, inglês?
112
mas, inglês?
113
matéria tão boba, né?
114
perdendo nota?”
Conforme afirma Goffman (2002, p. 142),
obviamente, quando, em vez de dizermos algo nós mesmos, optamos pelo relato
do que o outro disse, estamos mudando nosso footing.
Ao “representar” o discurso dos pais, na verdade, Mariana muda seu
footing e acaba representando sua idéia sobre o que os pais pensam. E, como ela
coloca no discurso dos pais, Inglês é para eles uma “matéria tão boba” e, portanto,
é inadmissível que os alunos obtenham notas baixas.
Para ela, a conseqüência da nota baixa é fazer com que os pais tenham que
ir até a escola.
115
Mariana
eles (.) vêm aqui (.)
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67
Para exemplificar, Mariana conta uma estória, que aconteceu no mesmo
dia da entrevista:
116
Mariana
como aconteceu hoje, né?
117
o pai da garota da sétima série,
118
a mãe veio,
119
a menina tirou dois no segundo bimestre,
120
agora que ela tá vindo aqui (.)
121
pra vê porque tirou dois.
Para indicar a mudança de footing, ou seja, para mostrar que agora ela vai
dar um exemplo, Mariana usa uma introdução: “como aconteceu hoje, né?” (linha
116). E então começa a contar que o pai de uma aluna da sétima série esteve no
colégio. Porém, antes de terminar a frase, ela corrige, substituindo o pai pela mãe.
As outras informações não são modificadas. Na sentença seguinte, ela substitui
“garota da sétima série” por “a menina”. “Agora” se refere ao dia da entrevista,
que foi feita no dia 26 de agosto, já no terceiro bimestre escolar. Mariana então
usa um marcador discursivo (“>quer dizer<” – linha 122) para demonstrar que vai
concluir a estória que está contando e, conseqüentemente, irá ou retomar o footing
que havia sido suspendido, ou assumir um novo footing. Na visão de Goffman
(ibid, p. 146),
freqüentemente, parece que, ao mudarmos de voz (...) não estamos exatamente
encerrando o alinhamento anterior, mas o suspendendo temporariamente, com o
entendimento de que ele será quase imediatamente restabelecido.
Nesse caso, Mariana indica o encerramento de um footing através da
conclusão da estória e, em seguida cede momentaneamente seu papel de
animadora à entrevistadora.
122
Mariana
>quer dizer<
123
não acompanhou prova,
124
não acompanhou caderno,
125
não tem noção que a menina não tá fazendo nada=
Sua conclusão mostra que os pais não acompanham a aprendizagem de
Inglês. Isso não quer dizer, necessariamente, que o procedimento seja diferente
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com as outras matérias, todavia, do ponto de vista de Mariana, as outras matérias
recebem mais apoio dos pais.
A pesquisa em relação ao papel exercido pelos pais me parece ser um
campo amplo. A influência exercida pelos pais, tanto negativa quanto
positivamente, é um fator relevante no que concerne às realidades vividas pelos
alunos. Alguns aspectos vivenciados na sala de aula não podem ser explicados por
fatores inerentes ao ambiente escolar. Muitas vezes, as explicações para os
mesmos são externas ao processo educacional que se dá na escola. Portanto, o
estudo das realidades que circundam a sala de aula pode enriquecer o
entendimento do que acontece na sala de aula e no ambiente escolar de uma forma
geral.
4.2.6.1
O papel dos pais: notas expandidas
Ao observarmos as notas expandidas, o primeiro fator que podemos
perceber é que não temos nenhum registro da participação ativa dos pais no
cotidiano escolar. O que vemos é que, para a coordenação, os pais são convidados
a ir à escola apenas nos casos de desvio de comportamento. É o que encontramos
nos dois trechos abaixo:
A bagunça continua e a supervisora entra na sala. Pede silêncio, vira-se para um
aluno (Fernando), que no momento não estava participando da bagunça e fala: “E
você, sua mãe já esteve aqui semana passada e vai vir aqui amanhã de novo.
Acho que ela não vai receber notícias boas não.” (NE004)
[Mariana] Falou com os alunos que ela precisaria sair para conversar com a mãe
de uma aluna e que eu ficaria tomando conta. Os alunos ficaram quietos, mas por
três vezes tive que pedir a alguns alunos que virassem para a frente ou que
parassem de conversar.
Uma mulher entra na sala. Pela conversa que ouvi na sala dos professores,
pressuponho que seja Cláudia, outra diretora. Ela chama a atenção da turma pela
quantidade de advertências que os alunos levaram. Fala com uma aluna que ela
está suspensa, avisa a Marcela que a mãe dela está no colégio e que quando ela
terminar o teste é para juntar o material para ir embora junto com a mãe. Pede à
turma para prestar atenção aos modos de agir, antes que o colégio tome outras
providências. Ela sai da sala e os alunos continuam o teste. (NE005)
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No mesmo trecho apresentado para mostrar a falta de apoio dada aos
professores (seção 4.4.1), podemos observar uma professora de Português
reclamando da atuação de uma mãe.
PP (Professora de Português): – Eu falei com a Norma que eu não ia dar aula com
aquele menino lá. Depois daquilo tudo não tomaram nenhuma providência e eu ia
ser obrigada a agüentar desaforo e ainda ficar desmoralizada.
S (Secretária): – Nossa! Eles que tinham que ter feito alguma coisa. E a mãe
dele?
PP: – A mãe dá apoio. Arruma mais confusão ainda. Aí a Norma foi lá e
conversou com a turma. Mas aí, sabe o que aconteceu? Tava a turma toda lá,
menos ele. Ele chegou atrasado e foi entrando. Aí eu falei: “Ele está entrando só
para ouvir o que você tem pra dizer, Norma!” Porque eu não ia deixar ele ficar na
minha aula. Faz as coisas e não acontece nada e eu ainda tenho que agüentar
marginal na sala. Mas ainda bem que ele chegou a tempo de ouvir o que ela tava
falando com a turma.
S: – E eles apóiam? Os outros alunos?
PP: – Às vezes. Eles não fazem, mas acham bonitinho. E se não acontecesse
nada, daqui a pouco ia ter um monte de marginal na sala.
S: – E aí, o que aconteceu com ele?
PP: – Aí a Norma falou com a turma e levou ele com ela e deixou ele fazendo
exercício. Mas a mãe apóia! (NE004)
Além disso, pode-se ver que, mesmo quando convidados a ir ao colégio
por causa do comportamento dos filhos, nenhum horário particular é agendado
com os mesmos. Dessa forma, os professores precisam sair da sala, durante a aula,
para conversar com os pais.
Os alunos começam a fazer muito barulho e alguns ficam andando pela sala. A
professora entra na sala e fala brava: “Gente, só um minutinho que eu tô
atendendo uma mãe aqui e já já eu explico”. (NE004)
A única exceção encontrada nas notas expandidas refere-se ao apoio dado
pelos pais de uma aluna que tem problemas auditivos.
A professora ficou no fundo da sala conversando comigo. Falou que podia ser um
dado importante para minha pesquisa o fato de ter uma aluna surda na sala, com a
qual ela não consegue se comunicar. Disse que tanto ela quanto os alunos têm boa
vontade com a aluna que é surda, mas que os alunos também não conseguem
comunicar com ela. Perguntei se a aluna sabe LIBRAS. A professora respondeu
que sim, mas que os professores não sabem. Perguntei se a professora havia
recebido algum treinamento ou orientação para trabalhar com deficientes
auditivos e ela disse que só ficou sabendo que tinha uma aluna surda quando
entrou na sala e tentou falar com a aluna. Disse que não sabe se ela consegue
acompanhar a aula, mas que ela tem o caderno completo e que faz todos os
deveres, mas acha que ela tem ajuda em casa. (NE005)
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Conforme podemos ver nas notas expandidas, os pais pouco participam no
processo de ensino e aprendizagem dos filhos, cabendo aos mesmos
comparecerem à escola apenas para ouvir as reclamações, seja por parte das
supervisoras ou dos professores.
A importância da participação dos pais no processo educacional vem
sendo negligenciada em muitas escolas. A política de participação da família, a
meu ver, parece representar uma ameaça aos profissionais responsáveis pelo
ensino na medida em que abre espaço para a colaboração, mas também para uma
maior cobrança por parte dos familiares.
4.2.7
A reação dos alunos
Volto então a perguntar sobre a reação dos alunos, e que “tipo de matéria”
eles mais gostam.
128
129
Fernanda
e:: como que os alunos reagem à matéria? que tipo de
matéria que eles gostam mais::?
130
Mariana
eles não,
131
132
o que eles gostam menos eu acho que é sem dúvida a
gramática. (.)
133
até texto eles gostam bem de tentar traduzir
134
e quando eles conseguem começar a entender um texto
135
eu vejo que eles gostam,
136
que acham que é interessante:.
137
eles gostam de algumas atividades assim
138
139
eu acho que de vez em quando eles preferem fazer umas
atividades mais lúdica também.
140
Fernanda
(como?)
141
Mariana
é com música para pegar um pouco de pronúncia
142
ou então pegar a gramática
143
e trabalhar dentro de uma música. é::
144
eu faço às vezes,
145
na quinta série por exemplo, é::
146
pra aprender vocabulário, então,
147
eu faço tipo um café da manhã,
148
eles trazem as comidas que é pra aprender vocabulário,
149
e isso sempre dá resultado assim,
150
pra eles estudarem o vocabulário em casa,
151
vim sabendo o que que tem na escola pública,
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71
152
isso eu acho interessante de vez em quando
153
e colocar isso pra dar um estímulo.
154
155
se ficar só por conta de gramática, gramática,
>gramática<,
156
essas crianças gostam (.)
157
sempre que fazem melhor.
158
a gramática é: mais (formal).
Em vez de responder o que eles gostam, Mariana responde que o que eles
gostam menos é a gramática. Inicialmente, ela formula a frase “eles não,” (linha
130) mas, em vez de afirmar que eles não gostam de gramática, ela reformula a
frase, e diz que gramática é o que eles gostam menos.
Os textos, como vemos através da resposta da professora, são usados para
tradução. E, quando eles conseguem entender o texto, eles “gostam” (linha 135),
ou melhor, “acham que é interessante” (linha 136).
Para responder a essa pergunta, há um certo tipo de gradação: Mariana
começa falando do que eles não gostam, mas reformula a frase, dizendo o que eles
gostam menos (gramática). Depois passa para o texto, que é algo que eles gostam.
Porém, esse gostar fica amenizado, quando se dá atenção ao início da frase: “até
texto” (linha 133). Este “até” mostra que o texto não está entre as atividades
favoritas, mas eles “até” gostam, desde que consigam entendê-lo.
Para chegar ao que eles gostam, Mariana usa uma frase que separa o que
eles preferem, das outras atividades.
137
Mariana
eles gostam de algumas atividades assim
E, só então, ela menciona as atividades preferidas, em um grupo mais
abrangente.
138
139
Mariana
eu acho que de vez em quando eles preferem fazer umas
atividades mais lúdica também.
Após dizer que os alunos preferem as atividades lúdicas, ela muda o
footing e passa então a exemplificar o que chamou de atividades lúdicas, devido a
minha interferência.
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141
Mariana
é com música para pegar um pouco de pronúncia
142
ou então pegar a gramática
143
e trabalhar dentro de uma música. é::
144
eu faço às vezes,
145
na quinta série por exemplo, é::
146
pra aprender vocabulário, então,
147
eu faço tipo um café da manhã,
148
eles trazem as comidas que é pra aprender vocabulário,
Interessante notar que, apesar de Mariana em um primeiro momento
dividir as atividades em gramática, texto e atividades lúdicas, num segundo
momento ela coloca o trabalho gramatical inserido na atividade lúdica. Quando
ela cita a música como atividade lúdica, ela explica como trabalha a música que,
no caso, pode ser usada para trabalhar pronúncia ou gramática, mesmo sendo a
gramática o que os alunos gostam menos.
Outra atividade lúdica é o café da manhã, feito nas turmas de quinta série e
que serve para “aprender vocabulário” (linha 146).
Ela fala, então, do resultado do café da manhã.
149
Mariana
e isso sempre dá resultado assim,
150
pra eles estudarem o vocabulário em casa,
151
vim sabendo o que que tem na escola pública,
152
isso eu acho interessante de vez em quando
153
e colocar isso pra dar um estímulo.
Segundo ela, o café da manhã faz com que os alunos estudem o
vocabulário em casa. O que é contraditório, todavia, é que Mariana não menciona
nenhum resultado em termos do que é ensinado ou aprendido em sala de aula,
durante a atividade, mas sim o que os alunos estudam sozinhos, em casa. É
interessante perceber que Mariana tenta colocar que uma maneira de estimular os
alunos é apresentar questões e atividades que envolvam o dia-a-dia dos mesmos.
Todavia, pelo que vemos na maioria das suas aulas, as matérias trazidas não têm
ligação com a vida cotidiana dos alunos.
Outra questão a ser levada em consideração, é o contraste de “sempre” e
“de vez em quando”. Embora ela ache que essas atividades sempre dão resultados,
ela apenas as faz de vez em quando.
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73
4.2.7.1
A reação dos alunos: notas expandidas
Na entrevista, Mariana coloca a gramática como sendo o que os alunos
menos gostam. Na verdade, durante o mês de aulas observadas nenhuma das aulas
dadas foi de gramática. Se tal procedimento tiver sido adotado em virtude do
gosto dos alunos, a professora então se mostrou coerente com o que diz nesse
trecho da entrevista.
Parou então ao meu lado e me explicou que está dando de 0 a 100 na sexta série
porque eles não aprenderam na quinta e que vai continuar até 1000 (que é a
matéria da sexta série). Disse que na sétima série, em algumas turmas ela
começou do 0 e que na sétima A, que é a melhor turma (porque nas outras
ninguém aprende nada) ela já ensinou até os bilhões. (NE003)
Contudo, em um dos trechos das notas expandidas a fala da professora
entra em conflito com a abordagem adotada pela mesma.
A Natália, outra professora de Inglês, começou a conversar com a Mariana sobre
o Simpósio de Professores. Disse ter assistido a um seminário muito bom sobre o
ensino de Inglês. Mariana perguntou o que foi dito no seminário e a Natália
respondeu que o que foi dito é o que eles já fazem mesmo. “Falou que tem que
ensinar a gramática no texto, que tem que ensinar a ler e que não precisa dar um
monte de nome para o conteúdo gramatical.” A Mariana discordou e disse que
tem que ensinar gramática mesmo, porque foi assim que ela aprendeu. Disse que
se os alunos não aprendem a gramática, então não vão aprender nada, sem a
gramática. A outra professora concordou e então elas começaram a falar sobre
casas. A Mariana então mostrou uma revista de artigos para casa, voltou-se para
mim e disse sorrindo: “Estou montando minha casa e, como não tenho tempo,
levo minhas revistas para todos os lugares. Aí, quando eu tenho um tempinho,
quando mando os meninos fazerem um exercício, eu aproveito para dar uma
olhada.” (NE003)
Apesar de Mariana advogar a favor do ensino de gramática, ela não o
adota em suas aulas (pelo menos durante o mês de observação). O texto, segundo
ela, é o que os alunos gostam, pelo menos quando o entendem. Porém, nenhum
trabalho é feito em aula com o texto, sendo que duas tarefas são solicitadas:
traduzir o texto ou responder perguntas em Português sobre o mesmo. A
professora raramente interfere no trabalho dos alunos sendo que, na maioria das
vezes, eles são requisitados a fazer os exercícios sozinhos.
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Entramos na sala da sétima série A e, ao perceber que eu estava procurando um
lugar para assentar, Marlene me ofereceu lugar ao lado dela.
Alguns alunos entregaram o trabalho de números para a professora.
Uma aluna pergunta: – Hoje você vai dar muita matéria?
A professora responde em tom irônico: “Não. Vou ficar a aula inteira à toa!” E
completa, agora sem ironia: “Hoje a gente vai largar um pouco a gramática e vai
pegar o livro.” (...)
A professora pega o livro e pede para abrir na página 22.
Mariana: – Eu vou fazer ao contrário. Vou deixar vocês fazerem sozinhos que, se
eu bem conheço essa turma, vocês vão conseguir. (NE004)
As únicas interferências feitas pela professora se dão quando os alunos
perguntam alguma coisa.
Um aluno pergunta o significado de uma palavra e o outro responde que é só
olhar no final do livro. A professora responde que é só descobrir o significado, de
acordo com o resto do texto. (NE004)
Também quando ela solicita que os alunos respondam perguntas sobre o
texto, ela evita interferir no trabalho dos mesmos.
Depois de cinco minutos a professora volta e manda quem ainda não terminou os
exercícios da aula anterior, terminar. Quem já acabou, ela manda “fazer três
conjuntos de palavras (retiradas do texto) com os seguintes segmentos: moradia,
trabalho e alimentação” e escrever o que entenderam do texto, quais informações
conseguiram tirar e avisa: “não é para traduzir não, héin!”. (NE006)
Além das traduções de texto, a professora ensinou também os números,
conforme ela havia me explicado.
Fomos para a sala da sexta série B. A aula começou às 7:20 h. A professora me
apresentou e comentou: “Ela vai anotar se vocês falam muito!” e então fez a
chamada. Durante a chamada, dois alunos ficaram perguntando se eu ia anotar se
eles falam muito e perguntaram o que eu estava fazendo e porque eu estava
anotando. Ao terminar a chamada, a professora falou:
Mariana: – Hoje nós vamos terminas os números.
Aluno: – E a tradução?
Mariana: – A tradução nós vamos terminar depois. Numbers.
Vira então para o quadro e escreve.
Numbers
200- two hundred
500- five hundred
345- three hundred and forty-five
786- seven hundred and eighty six
989- nine hundred and eighty nine. (NE004)
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Após passar o número no quadro, a professora avisa: – É só copiar que depois eu
vou explicar. (NE004)
A professora entra na sala, lê os números 100, 200 e 500 e pergunta: “Como
seriam os outros números? 300? 400? 600?”
A turma respondeu bem baixo.
Mariana: – Todo mundo consegue escrever isso aqui? (referindo-se aos números
300,400 e 600).
Aluno: – Escrever é fácil, só não dá pra falar!
Mariana leu os outros números do quadro e disse que o “and” é opcional.
Mariana: – Eu vou passar alguns para vocês fazerem para mim.
Passa alguns números no quadro e sai da sala. (NE004)
Quanto às atividades lúdicas mencionadas, o que podemos notar através
das notas expandidas é que elas não acontecem com muita freqüência.
Os alunos reclamam e a professora pede silêncio. Pergunta em que questão ela
parou (alunos: “24”) e pergunta o que ela pediu para fazer. Corrige oralmente o
exercício do livro. Uma aluna pede para ela passar a resposta no quadro e ela faz
cara de ironia.
Como o texto fala sobre vampiros, os alunos pedem para ela passar o filme
“Drácula”. Os alunos ficam conversando e sugerindo filmes. A professora decide
que vai passar “Entrevista com o Vampiro” e pergunta para as alunas se é nesse
filme que conta a vida inteira do drácula. A professora pede silêncio. Os alunos
continuam discutindo sobre o filme e a professora fala que porque eles falam
muito, ela já não tinha dado música para eles no semestre anterior e que se eles
continuassem ela também não ia passar filme. (NE007)
Na verdade, pelo que Mariana diz, a atividade lúdica do primeiro semestre
seria uma música, que não foi dada devido à conversa excessiva dos alunos. No
segundo semestre, a atividade lúdica foi um filme, conforme pedido pelos alunos.
Às 9:55 h, Mariana levou os alunos da 7A para a sala de vídeo. Antes de começar
o documentário (o mesmo da sexta série), ela muda uma aluna de lugar. Avisa
aos alunos que eles vão assistir a um documentário sobre o conde Drácula e que
depois vão fazer um trabalho sobre o documentário para o quarto bimestre. Fala
um pouco sobre o documentário.
A professora rebobina a fita e os alunos pedem para apagar a luz. A professora
deixa, mas avisa que se eles conversarem ela vai acender a luz. O filme começa e
ela faz chamada.
Os alunos ficam inquietos, conversam, olham para os lados, reclamam. A
professora fala que quem conversar vai para a diretoria. (NE010)
É interessante notar que Mariana atende ao pedido dos alunos, porém o
material não é apropriado para a aula de Inglês, já que é legendado em Português
e o som não é claro. Além disso, o filme é passado durante duas aulas
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consecutivas, sem que os alunos saibam o propósito do mesmo ou qual atividade
ou trabalho terão que fazer. A idéia de Mariana de passar o filme pedido pelos
alunos, relacionado ao texto lido em aula é de grande valor, já que através do
mesmo poderia ser possível trabalhar o vocabulário relacionado ao tema, bem
como histórias típicas da Língua Inglesa. Porém, nenhum trabalho é feito
inicialmente, tendo Mariana perdido a oportunidade de fazer um trabalho
embasado e voltado para a aula de Inglês. Outro fator a ser observado é que
Mariana decide passar o filme na turma da sexta série também, sem explicar o
motivo, e sem ter nenhuma razão aparente para tal.
A professora chega na turma 6B e avisa que eles vão para outra sala. Leva os
alunos para a sala de vídeo (uma sala com vídeo, TV, uma estante com várias
fitas de vídeo e, na parede, vários cartazes com pensamentos enfeitam a sala).
Eles ficam agitados e conversam muito.
A professora pede silêncio e avisa que eles vão assistir a um documentário sobre
o conde Drácula e começa o filme. O filme é legendado e o som é impossível de
ouvir, já que o filme é antigo. (NE010)
Como já apontei anteriormente, na sala dos professores, um professor
sugere que Mariana faça uma peça em Inglês com os alunos (o que poderia ser
feito como atividade lúdica). No entanto, ela descarta a possibilidade
imediatamente.
Um professor perguntou quem assistiu à peça de teatro feita por alunos de uma
outra escolha pública. A Mariana perguntou, com um tom duvidoso, se a peça
tinha sido boa, e completou que em escola estadual é impossível trabalhar com
teatro. O professor respondeu que a peça tinha sido ótima. Após a confirmação
por outra professora, ele ainda comentou que em outro lugar onde ele tinha
trabalhado (também escola estadual) ele tinha feito com os alunos uma peça em
grego e sugeriu à Mariana que montasse com eles uma peça em Inglês. Ela
respondeu que seria impossível, já que os alunos não se importam com nada.
(NE003)
Como graduanda, o que percebo nos trechos das notas expandidas acima
mencionados é uma desarticulação entre teoria e prática. Na verdade, a única
“matéria” ensinada pela professora são os números. Todas as outras atividades são
feitas pelos alunos sozinhos.
Como pesquisadora, penso que, durante a entrevista, Mariana tenta se
projetar como a professora que idealiza ser. No entanto, durante as aulas, seu
posicionamento prático e teórico demonstram posições opostas às que ela defende
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na entrevista. Embora ela mencione a importância de se trazer a realidade dos
alunos para as aulas, em nenhum momento da observação isso foi feito. Em
relação ao trabalho com o texto, embora ela em um momento afirme para um dos
alunos que o significado das palavras desconhecidas podem ser inferidos pelo
contexto, em nenhum momento da observação ela ensina ou explica como a
inferência pode ser feita. Além disso, nas demais aulas, ela demonstrou que sua
prática corresponde a uma visão estruturalista da linguagem, tratando-a como algo
estático e independente do contexto.
4.2.8
O ensino da fala
Pergunto então sobre a prática da fala durante as aulas:
159
160
Fernanda
aí quando você faz esse tipo de atividade eles costumam
praticar a fala também.
161
Mariana
é. a fala também.
162
a fala em colégio público do estado
163
164
ela é muito difícil por causa do número de alunos em
sala.
165
então pra falar eu (.)
166
quando a gente vai trabalhar a fala
167
eu perco muitas aulas.
168 porque o aluno não pode falar uma vez só,
169 não adianta nada.
170 então às vezes eu perco muitas aulas.
171
então a fala,
172
173
principalmente no estado, que as salas são muito
grandes
174
é muito difícil de trabalhar.
Mariana, já de início, marca o local.
162
Mariana
a fala em colégio público do estado
Depois de marcar o local sobre o qual ela vai falar, ela então confere à fala
o papel de sujeito da oração.
163
164
Mariana
ela é muito difícil por causa do número de alunos em
sala.
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78
Ou seja, a fala é muito difícil. Mas, ela justifica tal dificuldade como sendo
gerada pelo número de alunos em sala.
Ela muda então o footing, passando a ser, ela mesma, o sujeito.
165
Mariana
então pra falar eu (.)
Todavia, ela resolve reformular a frase, mudando novamente o sujeito.
166
Mariana
quando a gente vai trabalhar a fala
Mariana, aqui, fala de um tempo não especificado (“quando”) e também de
pessoas indeterminadas (“a gente”, que, inicialmente, pode referir-se a ela e aos
alunos, ou a ela e aos outros professores, ou até mesmo a um “a gente” que
indique apenas a indeterminação do sujeito).
Ela diz então que quando a fala é praticada, muitas aulas são perdidas.
Todavia, quando ela diz que as aulas são perdidas, o sujeito volta a ser
determinado, voltando a ser ela mesma o sujeito da ação.
166
Mariana
quando a gente vai trabalhar a fala
167
eu perco muitas aulas.
Ela muda o footing para emitir uma opinião pedagógica sobre o trabalho
com a fala em sala de aula.
168
Mariana
porque o aluno não pode falar uma vez só,
169 não adianta nada.
Acima, vemos Mariana se posicionar novamente através de “eus”
distintos. Ela usa a própria voz para falar por si mesma, mas ao mesmo tempo fala
pelos alunos, e fala também por todos juntos.
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79
(Quadro 3 – Outros “eus” de Mariana)
“Eu pessoal”
eu perco muitas aulas.
“Eu representante dos alunos”
porque o aluno não pode falar uma vez só,
“Eu representante da coletividade”
quando a gente vai trabalhar a fala
Mariana então repete a frase que já tinha dito, para demonstrar que irá
retomar o footing que havia suspendido. Porém, ela dá um tom mais ameno à
frase, ao acrescentar que “às vezes” ela perde muitas aulas:
170
Mariana
então às vezes eu perco muitas
aulas.
Ela então resume a resposta, reforçando a dificuldade de se trabalhar a
fala, nos colégios estaduais, principalmente.
171
Mariana
então a fala,
172
173
principalmente no estado, que as salas são muito
grandes
174
é muito difícil de trabalhar.
E, ao resumir, volta a afirmar que o fator que dificulta o trabalho da fala
nas escolas estaduais é o número de alunos (que é retomado na frase “as salas são
muito grandes” – linhas 172 e 173).
4.2.8.1
O ensino da fala: notas expandidas
Nas notas expandidas, não foi possível encontrar nenhum relato do
trabalho feito com a fala em sala de aula. Durante o mês de observação em
nenhuma das aulas Mariana se dedicou à habilidade oral da língua. A única
referência feita à fala vem do comentário de um aluno (mencionado na seção
4.7.1).
Mariana: – Todo mundo consegue escrever isso aqui? (referindo-se aos números
300,400 e 600).
Aluno: – Escrever é fácil, só não dá pra falar!
Mariana leu os outros números do quadro e disse que o “and” é opcional.
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0510550/CA
80
Mariana: – Eu vou passar alguns para vocês fazerem para mim. (NE004)
Pelo que foi observado, a professora não se preocupa em relação à
capacidade dos alunos falarem o que está sendo ensinado. Sua prática pedagógica
está orientada para a escrita.
Mais uma vez, retomo aqui os Parâmetros Curriculares Nacionais (Maia,
2002), que traz para o ensino de Língua Estrangeira, duas sugestões: ou o trabalho
das quatro habilidades, quando possível, ou a abordagem instrumental do ensino
da Língua, voltada para a realidade dos alunos. Mariana, nas notas expandidas,
não se mostrou familiarizada com a abordagem instrumental da Língua Inglesa:
A professora volta, fala comigo o nome de dois professores do FPL (faculdade
onde estudou) e me pergunta se eu os conheço. Eu falo que não e ela então,
voltando ao assunto anterior, fala que eles deviam ensinar Inglês instrumental na
aula de didática, porque ela não sabe nem o que é isso. (NE006)
E o ensino das quatro habilidades também não é priorizado. Como ela
argumenta, não é possível “perder” aulas para trabalhar a parte oral, já que não
adianta os alunos repetirem uma vez só.
Mariana trabalha apenas a leitura e a escrita, mesmo assim, uma
desarticulada da outra. Os alunos lêem os textos dos livros e, normalmente,
respondem em Português. A parte escrita se restringe a copiar do quadro o
vocabulário dado ou reescrevê-los.
O que podemos notar, como fator relevante de pesquisa, é a falta de uma
teoria pedagógica que dê embasamento à prática adotada. Não trabalhar a
habilidade oral não é uma escolha consciente: é apenas algo imposto pelas
dificuldades de trabalho, de acordo com a professora. Essa análise apóia a
necessidade de se articular teoria e prática em um processo crítico-reflexivo de
formação de professores, na busca de uma atuação pedagógica mais coerente.
4.2.9
O número de alunos
Já que Mariana menciona o número de alunos em sala, aproveito a
oportunidade para fazer uma pergunta mais específica.
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81
175
Fernanda
qual é o número de alunos (geralmente)?
176
Mariana
trinta e cinco, tem turma de quarenta,
177
178
>tem turma até de quarenta e cinco< (.) nessas escolas.
(.)
179
na, no particular,
180
eu já tive turma de setenta e oito alunos. (.)
181
(.) o rendimento é::, é absurdo,
182
>assim< quase nenhum.
183
184
com setenta e oito alunos, cê tem aluno de todos os
níveis
, (.)
185
é muito difícil você conseguir muito (.)
186
(os interesses) de todos assim. na maioria ( ).
187
e a fala fica prejudicada.
188
189
eu acho que a: a gramática é que funciona mais com um
número grande né?
190
que a gramática não tem problema (.)
191
e o, o texto também eu acho que funciona.
192
eu trabalho com um grupo de texto um ajuda o outro
193
e vejo que o vocabulário vai melhorando.
194
no início eles pegam um texto de inglês,
195
no início do ano,
196
e quase não sai nada.
197
198
no meio do ano e no final do ano (eles não precisam de
ajuda em nada) do vocabulário.
199
eles já vão passando a entender pelo contexto,
200
já vão, (.) assim, (.) pelo menos é::,
201
é ter uma idéia do que que o texto fala sozinho,
202
sem ter:
o
tanta influência minha
o
.
Mariana inicialmente afirma que o número de alunos varia entre trinta e
cinco a quarenta alunos, sendo que algumas vezes chega a quarenta e cinco.
176
Mariana
trinta e cinco, tem turma de quarenta,
177
178
>tem turma até de quarenta e cinco< (.) nessas escolas.
(.)
O termo “nessas escolas”, empregado por ela na linha 177, contrapõe-se
com a linha 179:
177
178
Mariana
>tem turma até de quarenta e cinco< (.) nessas escolas.
(.)
179
na, no particular,
Isso quer dizer que a expressão “nessas escolas” exclui as escolas
particulares, sobre a qual Mariana vai começar a falar.
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82
180
Mariana
eu já tive turma de setenta e oito alunos. (.)
Além do contraste de espaços, há também um contraste temporal.
Enquanto que ao falar das escolas públicas Mariana cita o que ocorre
normalmente, ao falar da escola particular ela cita uma experiência pela qual
passou.
Após falar sobre o número de alunos em sala, Mariana emite sua opinião,
indo além da pergunta feita. Ela fala sobre o rendimento das turmas grandes.
181
Mariana
(.) o rendimento é::, é absurdo,
182
>assim< quase nenhum.
Então ela retoma o assunto anterior para explicar o porquê de o
rendimento ser baixo. Segundo Goffman (2002, p. 110),
a entrada e a saída do assunto em si envolvem uma mudança de tom e uma
alteração da capacidade social na qual os envolvidos pretendem atuar.
Ela havia mudado o tema, mas rapidamente ela volta a falar sobre o
número de alunos em sala.
183
184
Mariana
com setenta e oito alunos, tem aluno de todos os
níveis
, (.)
185
é muito difícil você conseguir muito (.)
186
(os interesses) de todos assim. na maioria ( ).
Quando Mariana diz que o nível dos alunos é diferente, o que faz com que
seja difícil conseguir o interesse de todos eles, é interessante notar que o sujeito
usado por Mariana corresponde a um sujeito indeterminado. “Você” ou “cê”, aqui,
quer dizer qualquer professor, não necessariamente ela.
Logo após, ela retoma o footing que havia sido suspendido na pergunta
anterior, voltando a falar do trabalho feito com a fala em sala de aula.
187
Mariana
e a fala fica prejudicada.
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0510550/CA
83
Nesse trecho, ela justifica novamente o motivo de não conseguir trabalhar
a fala. Todavia, o que muda é que, ao comentar sobre o excessivo número de
alunos em sala, ela enfoca principalmente a escola particular. Ao comentar sobre a
dificuldade de trabalhar a fala, ela enfoca principalmente a escola pública. Porém,
ao concluir neste trecho que a fala fica prejudicada, ela mistura os dois itens,
justificando que a fala fica prejudicada devido ao excessivo número de alunos.
Ela continua sua resposta:
188
189
Mariana
eu acho que a: a gramática é que funciona mais com um
número grande né?
190
que a gramática não tem problema (.)
191
e o, o texto também eu acho que funciona.
Como podemos ver, Mariana retoma o footing que havia sido suspendido
na linha 158, quando falávamos dos “tipos” de matéria preferidos pelos alunos.
158
Mariana
a gramática é: mais (formal).
Ela afirma que, quando o número de alunos é grande, o mais fácil é
ensinar gramática. Contudo, essa afirmativa vai justamente se opor à opinião da
professora sobre o gosto dos alunos, nas linhas 131 e 132.
131
132
Mariana
o que eles gostam menos eu acho que é sem dúvida a
gramática. (.)
A questão do trabalho com o texto continua coerente, já que ela acredita
que os alunos gostam de trabalhar com o texto (pelo menos quando conseguem
entendê-lo).
O que vejo aqui, como pesquisadora observadora, é a complexidade do
processo educacional. Nem sempre o que os alunos gostam é o que é o mais fácil
para a professora. Nem sempre o que funciona para a professora, funciona para os
alunos, já que eles podem não gostar, ou nem mesmo aprender.
Ela passa a explicar então o trabalho que ela geralmente faz com o texto:
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84
192
Mariana
eu trabalho com um grupo de texto um ajuda o outro
193
e vejo que o vocabulário vai melhorando.
194
no início eles pegam um texto de inglês,
195
no início do ano,
196
e quase não sai nada.
197
198
no meio do ano e no final do ano (eles não precisam de
ajuda em nada) do vocabulário.
199
eles já vão passando a entender pelo contexto,
200
já vão, (.) assim, (.) pelo menos é::,
201
é ter uma idéia do que que o texto fala sozinho,
202
sem ter:
o
tanta influência minha
o
.
Mariana assume a primeira pessoa como sujeito, quando ela explicita o
que faz. Todavia, sua explicação não fica muito clara, a meu ver.
192
Mariana
eu trabalho com um grupo de texto um ajuda o outro
193
e vejo que o vocabulário vai melhorando.
Entendo que, uma das possibilidades é que Mariana trabalha com um
conjunto de textos e um texto facilita a compreensão do outro. Porém, também é
possível entender que “grupo” refere-se a alunos. Assim, os alunos trabalham em
grupo e, para compreender o texto, um aluno ajuda o outro. Esse trabalho parece
levar à melhora no vocabulário dos alunos.
A segunda interpretação parece mais plausível, de acordo com o que foi
observado. Durante o período de observação, o que pude entender é que o trabalho
em grupo propicia um desenvolvimento mútuo. Um aluno ajuda o outro e, juntos,
fica mais fácil encontrar soluções para os exercícios propostos. Assim, a
participação da professora se torna menor, enquanto a participação dos alunos
aumenta, o que pode ajudar a impulsionar a motivação dos alunos.
Ela explica então que, no início do ano, os alunos têm dificuldade para
compreender o texto.
194
Mariana
no início eles pegam um texto de inglês,
195
no início do ano,
196
e quase não sai nada.
Isso contrasta com o que ocorre no meio e no fim do ano:
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85
197
198
Mariana
no meio do ano e no final do ano (eles não precisam de
ajuda em nada) do vocabulário.
199
eles já vão passando a entender pelo contexto,
200
já vão, (.) assim, (.) pelo menos é::,
201
é ter uma idéia do que que o texto fala sozinho,
202
sem ter:
o
tanta influência minha
o
.
No meio e no fim do ano, os alunos já entendem o vocabulário e
conseguem inferir significados através do contexto, sem precisar da ajuda
constante da professora.
4.2.9.1
O número de alunos: notas expandidas
Na seção acima, Mariana responde à pergunta feita em relação ao número
de alunos. Ela inicia falando do número de alunos das escolas públicas e depois
fala da escola particular.
Nas notas expandidas podemos ver a descrição do prédio, na qual a
capacidade de alunos por sala é mencionada.
A sala da sexta série B tem carteiras para 31 alunos. Parte da parede é feita de
tijolos abertos, de modo que é possível ver o que está acontecendo fora e dentro
da sala de aula. A porta tem uma janela de vidro.
A sala da sétima série A é igual à da sexta série B, porém não há vidro na porta e
a capacidade é de 27 alunos. (NE003)
Ou seja, nas turmas assistidas, o máximo é de 31 alunos. Assim, podemos
acreditar que a dificuldade de trabalho com a fala se torna maior, de acordo com a
fala de Mariana, nas escolas particulares, onde o número de alunos por sala é
maior.
Mais uma vez, na entrevista, ela se coloca a favor do ensino de gramática,
enquanto nas notas expandidas vemos que ela se coloca mais a favor do ensino do
“texto”. A gramática, segundo as notas expandidas, normalmente não é aprendida
pelo aluno.
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86
Falou que ela já percebeu que os alunos sabem mais texto do que gramática.
Disse que em outra escola, onde ela dá aula para todas as séries, ela percebeu que
os alunos não lembram a gramática e, por isso, não sabem gramática; todavia,
eles sabem texto.
Disse também que gosta de dar avaliações diversificadas: individuais, em duplas,
em grupos; e explicou que esta avaliação não tinha sido preparada por ela, mas
por outra professora com a qual ela troca materiais. Às 8:00 h ela recolheu o teste
e foi para outra sala de aula. (NE005)
Apesar de se colocar a favor do ensino de gramática, Mariana não a
leciona em nenhuma aula observada. Além disso, nenhum dos testes aplicados
tem questões relacionadas a itens gramaticais.
Vejamos abaixo as notas expandidas relacionadas ao trabalho dado como
forma de avaliação para a turma da sétima série A.
O intervalo acabou e então fomos para a sala da sétima série A. A aula começou
às 09:55 h, quando a professora cancelou a prova e disse que daria um trabalho,
por causa das notas baixas das outras turmas de sétima série. Explicou que o
trabalho seria com consulta, podendo também tirar dúvidas com ela. (...)
O trabalho que a professora passou no quadro vem a seguir. O título não foi
passado no quadro, mas a professora deu a seguinte explicação oral: “Cês têm
que escrever esses números em Inglês”.
a) 987.654.321.123
b) 123.456.789.876
c) 444.555.332.222
d) 943.866.545.323
e) 364.747.325.126
f) 149.236.344.498
g) 700.600.500.400
h) 918.815.711.612
i) 636.727.848.959
j) 222.111.100.600
k) 740.630.240.950
l) 843.754.963.632
m) 240.420.150.510
n) 854.733.621.510
o) 978.645.231.321
p) 189.158.117.162
q) 643.772.884.995
r) 407.306.402.509
s) 348.457.369.236
t) 458.337.126.105
u) 800.200.300.100
v) 463.774.523.621
w) 941.632.443.894
x) 104.205.306.407
y) 900.888.700.666
z) 610.711.812.913
aa) 631.543.973.640
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87
bb) 870.444.312.200
cc) 209.306.401.504
dd) 100.200.300.400
Após passar no quadro, a professora falou: – Data de entrega: até segunda-feira.
Aluno: – Vai valer quanto?
Mariana: – Deve ser de 10 a 15. (NE003)
Na sexta série B, o trabalho não foi diferente, em relação ao conteúdo.
A professora passa o trabalho no quadro, e os alunos copiam em silêncio,
parando, de vez em quando, para reclamar da quantidade de números.
Nuno: – São quantos abecedários?
Mariana: – É para fazer com atenção, que se aí for errando, vai perdendo ponto.
a) 987
b) 321
c) 123
d) 444
e) 555
f) 332
g) 222
h) 876
i) 654
j) 943
k) 866
l) 545
m) 323
n) 364
o) 149
p) 236
q) 344
r) 498
s) 700
t) 600
u) 918
v) 948
w) 815
x) 711
y) 612
z) 636
aa) 727
bb) 848
cc) 959
dd) 222
ee) 111
ff) 740
gg) 630
hh) 240
ii) 950
jj) 843
kk) 754
ll) 963
mm) 632
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88
nn) 854
oo) 733
pp) 621
qq) 510
rr) 189
ss) 158
tt) 117
uu) 162
vv) 643
ww) 458
A professora fez chamada e os alunos continuaram reclamando da quantidade de
exercícios. (NE006)
O outro teste aplicado foi um texto. Os alunos deveriam ler o texto e, em
duplas, responder às perguntas feitas. Os comentários das notas expandidas, em
relação ao teste da sexta série B seguem abaixo.
Entramos na sala de aula já eram 7:15 h. Ela fez a chamada e lembrou que a
prova seria na próxima quinta-feira. A Karina me perguntou se eu ia ajudar na
prova.
A professora avisou que a aula seria um teste de texto, em dupla. Dois alunos
perguntaram para mim:
– Você vai fazer comigo?
A professora organizou a sala e às 7:20 h distribuiu o teste. Me deu um teste e
disse para mim que acha esse teste muito fácil para eles, mas que se for mais
difícil eles não conseguem fazer.
Pediu aos alunos para deixarem os cadernos abertos e então passou de mesa em
mesa olhando os cadernos e apontando os erros.
O teste é um diálogo, que não considero difícil. Todavia, algumas das perguntas
não têm resposta direta que possa ser extraída do texto, devendo ser levada em
conta a opinião do aluno. Além disso, a pergunta “f” contém um erro biográfico,
que invalida a pergunta “e”. (NE005)
O teste da sétima série A também foi um texto cujas questões deveriam ser
respondidas em duplas.
A professora falou comigo que todas as turmas fariam teste hoje. Falou que o
teste da 7A seria diferente das outras (mais difícil) porque as outras turmas não
conseguem resolver o teste da 7A. (...)
Às 9:55 h entramos na sala da 7A. A professora pediu que os alunos se sentassem
em dupla e avisou que eles fariam um teste. Distribuiu os testes e explicou que as
respostas tinham que ser dadas em Português. O texto falava sobre Koalas.
(NE005)
Quanto ao trabalho com textos, acredito que ao falar de “grupo” de texto,
Mariana está mencionando um grupo de alunos, visto que, com exceção de uma
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89
aula, todas as demais aulas nas quais ela usou textos, os alunos trabalhavam em
duplas, inclusive nos testes, como podemos ver nas notas acima citadas.
Quanto à capacidade de compreensão do texto, os alunos demonstraram
ainda não serem capazes de inferir significados pelo contexto, mesmo estando já
no terceiro bimestre. Durante um dos testes, Mariana pediu que eu tomasse conta
da turma e, pude verificar que os alunos ainda encontravam um pouco de
dificuldade para responder às questões feitas.
Alguns alunos me chamaram e perguntaram os significados de algumas palavras,
demonstrando que as técnicas de leitura empregadas não foram satisfatórias.
Todavia, acho que os alunos conseguiram entender a idéia central do texto.
(NE005)
A meu ver, embora na abordagem Instrumental do ensino de Inglês
voltada para a leitura seja reforçada a necessidade de se entender a idéia central do
texto, é também importante que os alunos saibam usar técnicas de leitura para
responder a perguntas específicas do texto. Durante a observação, Mariana não
ensinou como fazer a inferência a partir do contexto, e também não ensinou
técnicas de leitura que possibilitassem aos alunos responder questões específicas.
Todavia, como avaliação, ela solicita aos alunos que trabalhem em grupo a fim de
responderem perguntas concernentes a um texto em Inglês. O trabalho em grupo e
colaborativo exerce um papel de integração e estimula o ato de compartilhar dos
alunos. Porém, se as técnicas não são ensinadas, os alunos passam a ter pouca
coisa a compartilhar nesse contexto específico. A interação do grupo
possivelmente trará maior integração entre os participantes, contudo isso não
garantirá a troca de experiências relacionadas ao conhecimento ou à aprendizagem
da Língua Estrangeira em questão.
Outro fator notável é a falta de uma reflexão pré-profissional e profissional
– por parte de futuros professores na graduação quanto por professores em serviço
– sobre o papel didático e institucional das provas. É necessário que haja, antes
que uma prova seja elaborada, uma reflexão crítica sobre sua função, bem como
dos resultados desejados. A prova precisa ser coerente com a abordagem adotada.
Quando a escolha da abordagem não é embasada, dificilmente a prova será um
processo de avaliação pertinente e condizente com as vivências na sala de aula.
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90
4.2.10
Os materiais
Certamente eu não poderia deixar de perguntar sobre o material utilizado,
já que durante as aulas percebi que muitos alunos não possuíam livro de Inglês, e
que em algumas aulas Mariana usava apenas o quadro e giz.
203
204
Fernanda
humhum. e::, em relação ao listening, você trabalha
com a música mesmo?
205
Mariana
é. mais só música (.).
206
a gente não tem muito material né.
207
Fernanda
humhum.
208
Mariana
o que peca aí é o material.
209
Fernanda
é porque, o li:vro é emprestado, né?
210
Mariana
é.
211
212
Fernanda
e no caso de fita você que tem que conseguir, ou a
[escola tem alguma?
213
Mariana
[é. só se eu conseguir. não. [a escola não tem nada.=
214
Fernanda
[não tem:
215
216
Mariana
=é:. eu acredito que: esses livros são muitos antigos,
né?
217
pode ser até que eles (.) tivessem fita,
218
mas só não existe mais.
219
se perde,
220
não tem muito mais,
221
não tem o material na escola.
222
a escola não tem material.
223
aí eu peguei e comprei o material com os alunos.
224
turmas diferentes,
225
níveis diferentes,
226
muitos alunos, (.)
227
228
então esse material para eu fornecer todo o material é
uma coisa difícil
229
se a escola não tiver como.
230
231
aí dá pra entender como a gente não consegue trabalhar.
(.)
232
não tem cd:
Como já havíamos mencionado a leitura e a fala, perguntei então sobre o
ensino de listening. Tal assunto já havia sido mencionado quando perguntei a
Mariana sobre o que os alunos gostavam de fazer nas aulas (linhas 141, 142 e
143).
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141
Mariana
é com música para pegar um pouco de pronúncia
142
ou então pegar a gramática
143
e trabalhar dentro de uma música. é::
Quando perguntei se o listening é trabalhado através da música também,
ela responde que sim: “é. mais só música (.)” (linha 205).
Ou seja, a parte de escuta é feita apenas através de músicas. Mas Mariana
justifica o motivo de usar apenas músicas como material de listening: “o que peca
aí é o material” (linha 208).
E, como ela volta o foco para a falta de material, confirmo que o livro é
emprestado e pergunto se a escola tem fitas para trabalhar listening.
209
Fernanda
é porque, o li:vro é emprestado, né?
210
Mariana
é.
211
212
Fernanda
e no caso de fita você que tem que conseguir, ou a
[escola tem alguma?
213
Mariana
[é. só se eu conseguir. não. [a escola não tem nada.=
214
Fernanda
[não tem:
Mariana confirma que a escola também não tem fitas e, se ela quiser
trabalhar o listening ela mesma tem que providenciar o material.
Ela muda o footing e então explica porque a escola não tem o material.
215
216
Mariana
=é:. eu acredito que: esses livros são muitos antigos,
né?
217
pode ser até que eles (.) tivessem fita,
218
mas só não existe mais.
219
se perde,
220
não tem muito mais,
221
não tem o material na escola.
222
a escola não tem material.
Mariana inicia a frase (linha 215) com um verbo modal performativo,
distanciando-se um pouco do discurso. Diz que os livros são antigos e que, se
tinham fita, as mesmas já foram perdidas. Note-se que “se perde” (linha 219) tem
sujeito indeterminado. Logo em seguida, Mariana refaz “se perde”, com a frase
“não tem muito mais” (linha 220). Ou seja, por perderem o material, hoje já não
tem muitos. Porém, ela ainda refaz a frase, acrescentando o lugar “não tem o
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material na escola” (linha 221) que, finalmente é refeita, colocando a escola como
sujeito da oração.
222
Mariana
a escola não tem material.
Ao mudar o footing e assumir uma postura explicativa, acredito que
Mariana esteja falando com a pesquisadora, com uma função social de mostrar as
dificuldades enfrentadas na escola pública. Ela coloca sua voz em uma posição em
que possa ser ouvida em algum lugar além da sala de aula.
Parece que Mariana muda então da falta de fita, para a falta de material,
em geral. Ela mais uma vez muda o footing para falar da aquisição do mesmo.
223
Mariana
eu peguei e comprei o material com os alunos.
224
turmas diferentes,
225
níveis diferentes,
226
muitos alunos, (.)
227
228
então esse material para eu fornecer todo o material é
uma coisa difícil
229
se a escola não tiver como.
Mariana então faz um contraste entre os sujeitos “eu” e “a escola”, sendo
que o primeiro sujeito indica uma ação, enquanto o segundo indica a falta de ação.
Porém, nas linhas 224 a 226, Mariana apresenta empecilhos para sua ação.
224
Mariana
turmas diferentes,
225
níveis diferentes,
226
muitos alunos, (.)
Ela usa um paralelismo sintático para mostrar que suas turmas são
diferentes, os níveis são diferentes. Além das diferenças, o grande número de
alunos também impede que ela adquira o material todo sozinha. Mariana então
agrupa os problemas acima mencionados e os utiliza como explicação para as
dificuldades normalmente enfrentadas.
230
231
Mariana
aí dá pra entender como a gente não consegue trabalhar.
(.)
232
não tem cd:
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93
Novamente nos deparamos com o sujeito “a gente” (linha 230), no qual
Mariana assume o papel de “eu representante da coletividade”. Além de proteger-
se, percebo que Mariana protege toda a classe de professores contra qualquer
acusação em relação a um possível trabalho mal feito.
Como resumo, ela volta a falar da escola como sujeito do discurso e diz
que a escola não tem cd, o que é uma maneira de exemplificar e retomar a falta de
material.
4.2.10.1
Os materiais: notas expandidas
A primeira pergunta do trecho acima mencionado refere-se ao trabalho
feito com listening em sala de aula. Mariana inicialmente justifica a falta do
mesmo citando a falta de material como principal problema. Como já vimos
anteriormente, não foi feita nenhuma atividade de listening no período observado.
Todavia, foi possível notar que a escola possui uma sala preparada para
aulas com vídeo, que pode ser usada pelos professores, bastando agendar na
secretaria.
A professora chega na turma 6B e avisa que eles vão para outra sala. Leva os
alunos para a sala de vídeo (uma sala com vídeo, TV, uma estante com várias
fitas de vídeo e, na parede, vários cartazes com pensamentos enfeitam a sala).
Eles ficam agitados e conversam muito. (NE010)
Na verdade, a única aula na qual houve a possibilidade de se trabalhar o
listening foi a aula em que Mariana passou um filme. Porém, como podemos notar
abaixo, a qualidade do som não possibilita tal atividade, além do filme ser
legendado em Português.
A professora pede silêncio e avisa que eles vão assistir a um documentário sobre
o conde Drácula e começa o filme. O filme é legendado e o som é impossível de
ouvir, já que o filme é antigo. (NE010)
O problema do filme não está apenas no som, mas também na imagem.
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Uma aluna reclama da imagem tremendo (e que agora estava bem pior do que na
aula da sexta série). (NE010)
Quanto aos livros, o que notei é que os alunos não os têm, sendo
necessário pegar emprestados os da biblioteca da escola. Nos dias em que a
professora usa os livros, ela precisa pedir que um dos alunos vá até a biblioteca
buscá-los.
Vamos para a 7A. A professora pede a um dos alunos para buscar os livros na
biblioteca e distribuir para os alunos. O aluno começa a distribuir os livros e os
outros reclamam que não é aquele livro. A professora pede dois alunos que não
tinham feito a prova para sentarem juntos para fazerem a prova. Pede a outra
aluna para ir à biblioteca trocar os livros e avisa que enquanto isso ela vai na 7C
passar atividades. Os alunos ficam conversando. (NE007)
Os livros da biblioteca são antigos e sempre geram reclamações por parte
dos alunos.
Faz a chamada e distribui os livros (já que os alunos não têm livro, pelo menos a
maioria deles).
Um aluno fala: –Ah professora. Esse livro é empoeirado, fedido.
A professora finge não ter escutado e fala com a turma: – Esses livros perderam o
mofo, cês lembram?
Dois alunos respondem.
Aluno 1: – Mais ou menos.
Aluno 2: – É mesmo.
Outra aluna comenta: – Ah esse livrinho é tão chatinho!
Mariana: – Vamos abrir na página 22. (NE004)
Além de serem velhos, quantidade de livros também não é suficiente para
todos os alunos.
Ela pede aos alunos para sentarem em duplas para trabalhar com os livros, porque
não tem livro o suficiente para todos os alunos. (NE007)
Outro fator a se levar em consideração é que, por serem emprestados, os
alunos nem sempre têm cuidado com o material.
Um aluno avisa que está faltando páginas no livro. A professora reclama e fala
que acabou de arrumar os livros: “Vocês rasgam esses livros, vocês é que saem
prejudicados.” E vai à biblioteca procurar as páginas do livro. Enquanto isso os
alunos ficam conversando baixo.
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A bibliotecária entra na sala e chama a atenção dos alunos. Avisa que eles vão
acabar ficando sem livros. Fala que vai passar nas outras salas, chamando a
atenção dos outros alunos também. (NE007)
Nenhuma menção é feita, nas notas expandidas, sobre a aquisição de
material. Mariana apenas afirma, na nota acima, que ela arrumou os livros da
biblioteca.
A questão da adoção de livros didáticos nas escolas é um assunto discutido
durante a graduação e que também deve ser pensado seriamente durante a prática
pedagógica. Os livros didáticos já trazem em si teorias educacionais que refletem
crenças de seus autores. Portanto, a escolha do material didático é de extrema
importância, já que terá uma interferência direta na prática pedagógica. É certo
que é possível adaptar as atividades dos livros por atividades que estejam de
acordo com nossas próprias crenças e expectativas, porém, quando falamos dos
livros da biblioteca da escola, os problemas são maiores. Os livros mencionados
na pesquisa são livros antigos, já desatualizados. Eles não tratam de assuntos
atuais e, ainda, não foram escolhidos pela professora. Ela usa o material
disponível, sem levar em consideração as questões teóricas que estão entrelaçadas
nas questões propostas pelos autores. Uma solução possível para esse problema é
a confecção do próprio material. No entanto, para isso, é necessário que o
professor esteja preparado e tenha uma teoria articulada para que possa colocá-la
em prática na sala de aula. Algumas pessoas podem argumentar que a confecção
do próprio material tem um custo elevado. Porém, é importante levar em
consideração que não é necessário criar materiais sofisticados para atender às
necessidades dos alunos. Mesmo o quadro e o giz podem se mostrar boas
“ferramentas” de ensino, se usados de forma criativa, para propor questões que
estejam relacionadas à vida dos alunos.
A pesquisa sobre a utilização dos materiais escolares me parece ser um
vasto campo, já que, em cada contexto, diferentes materiais podem ser criados
para atender às necessidades dos alunos.
Outro argumento que se pode utilizar contra a criação do próprio material
é o tempo que se gasta para tal. Porém, se as atividades previstas forem bem
planejadas, é possível e até interessante (falando agora do ponto de vista de
professora atuante) que os próprios alunos estejam envolvidos na confecção do
material a ser usado. Durante a confecção, muitas oportunidades de interação
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96
surgem, nas quais é possível trabalhar a Língua Estrangeira, estendendo o ensino
para além do planejado.
4.2.11
“Origem” dos alunos
Para concluir a entrevista, perguntei se Mariana sabia onde os alunos da
escola moram (em quais bairros).
233
Fernanda
você sabe de onde os alunos vêm? de quais bairros?
234
235
Mariana
aqui (.) nesse colégio tem alunos que moram por aqui, no
centro mesmo, perto,
236
237
e aqui, por ser escola central tem, nós temos vários
bairros da cidade. (.)
238
entendeu?
239
Fernanda
não tem uma área definida então [não?
240
Mariana
[não.
241
Fernanda
tem escolas estaduais que têm bairros definidos.
242
Mariana
é. mas no bairro geralmente é exclu é:
243
o aluno é do bairro, né?
244
mas numa escola central teria vários bairros.
245
Fernanda
tá bom. (.) obrigada. (.) só isso.
Ela começa a resposta, indicando o local sobre o qual ela vai falar.
234
235
Mariana
aqui (.) nesse colégio tem alunos que moram por aqui, no
centro mesmo, perto,
Ela diz que alguns alunos são do centro da cidade mesmo, usando um
paralelismo semântico (“moram por aqui”, “no centro mesmo” e “perto”).
236
237
Mariana
e aqui, por ser escola central tem, nós temos vários
bairros da cidade. (.)
E explica que, por ser uma escola central, a escola atende também a outros
bairros da cidade. Confirmo, então, se a escola não atende a alguma área mais
específica e Mariana afirma que não (linha 240).
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97
Afirmo que algumas escolas atendem a bairros específicos e, ela explica
que isso é o que normalmente ocorre nos bairros, sendo as escolas centrais
exceções.
4.2.11.1
“Origem” dos alunos: Notas Expandidas
Nas notas expandidas encontramos apenas uma menção à origem dos
alunos.
Na sala dos professores, encontrei duas alunas conversando com a diretora
(Norma). A Norma perguntou porque elas estavam atrasadas e elas disseram que
moram longe e que tinham chegado atrasadas porque não tinham dinheiro para o
ônibus e então tiveram que ir a pé para a escola e justificaram que era a primeira
vez que estavam chegando atrasadas. (NE004)
Não é possível saber exatamente onde as alunas moram, porém, devido à
distância alegada por elas, provavelmente elas não moram no centro da cidade, o
que confirma a informação dada por Mariana.
Mais uma vez notamos aqui a influência de fatores externos ao ambiente
escolar no processo educacional. Fatores que fogem ao controle dos alunos (tais
quais a falta de dinheiro para pagar o ônibus, ou morar longe da escola) têm
extrema importância quando pensamos nas dificuldades e diferenças de vida dos
alunos. Quando conhecidas e levadas em consideração, estas informações sobre a
vida fora da sala de aula podem ajudar o professor em sua prática pedagógica.
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5
Conclusões
A partir da análise das mudanças de footing da professora Mariana, foi
possível observar como ela se projeta em seu discurso, de forma que pudemos ver
alguns fatores pessoais e outros inerentes ao próprio ambiente educacional que
justificam ou pelo menos exemplificam motivos que geram a insegurança de
alunos à beira de se graduarem, ou recém graduados.
Certamente nem todos os professores da escola pública enfrentam as
mesmas realidades vividas por Mariana, mas através da pesquisa feita é possível
ao menos conhecer e entender um pouco das possíveis realidades vividas no
processo de ensino e aprendizagem neste contexto.
Como fator pessoal, através das mudanças de footing de Mariana, a
primeira questão que pudemos observar é que Mariana não escolheu fazer o curso
de Letras motivada por sua vontade. Ela norteia seu discurso por dois eixos,
alternando entre aspectos racionais e emocionais que contribuíram para que ela
decidisse fazer Letras. Como vemos, ela decidiu continuar em Juiz de Fora, e a
partir desta decisão escolheu um curso que estivesse ligado à área das Ciências
Humanas e que oferecesse oportunidades de trabalho futuramente. Assim,
Mariana abriu mão do curso de Comunicação Social (que correspondia à vontade
dela) devido às poucas oportunidades de trabalho oferecidas na área. O curso de
Letras não foi escolhido por motivos especiais. Além disso, antes de entrar para o
curso, ela também não tinha nenhuma experiência na área de ensino. Ela então
toma a experiência do outro como parâmetro, de forma que suas expectativas em
relação a sua rotina de trabalho vinham do contato com alguns parentes que
também são professores. Já aqui vemos duas possíveis fontes de frustração
profissional: a falta de conhecimento sobre a futura área de atuação e a escolha de
um curso incompatível com o que se deseja fazer.
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99
Ao concluir o curso, Mariana passou a exercer a profissão em escolas
públicas estaduais e municipais. Para falar de como “escolheu” os locais onde
trabalhar, Mariana alterna entre passado e momentos atemporais, posicionando-se
ora em um footing temporalmente mais afastado, ora em um tempo
indeterminado. Ao mesmo tempo, Mariana nos apresenta um “eu agentivo”, que
tem a possibilidade e liberdade de escolher os locais de trabalho (ligado ao “eu
presente”) em oposição a um sujeito indefinido (“você” ou “a gente”),
impossibilitado de fazer escolhas. Assim, ela relata que seus primeiros locais de
trabalho não foram escolhidos por ela e, já nas primeiras escolas, Mariana teve os
primeiros problemas. Os alunos da escola, segundo ela, ameaçavam e agrediam
professores.
Esse problema foi resolvido ao fazer o concurso para se tornar professora
efetiva. Após o concurso, Mariana passou a ter a possibilidade de escolher as
escolas onde trabalhar. Porém, sem conhecer as escolas, a escolha se torna
dificultada. Então, Mariana precisou levar em consideração a opinião de terceiros
(Mariana então insere em seu discurso a fala do outro, como forma de demonstrar
os fatores que a levaram a escolher as escolas onde trabalha). A sua escolha,
conforme ela relata, se deu devido aos comentários feitos por terceiros sobre o
comportamento dos alunos (afinal, o principal problema que ela havia enfrentado
era justamente em relação ao mau comportamento).
Segundo ela, atualmente ela não tem grandes problemas. No entanto, o que
vemos é o desinteresse por parte dos alunos em relação ao que está sendo
ensinado. Não me cabe aqui, julgar o comportamento dos alunos, mas podemos
ver que o conteúdo lecionado durante as aulas observadas não demonstra
nenhuma relevância na vida dos alunos.
A própria coordenação, como visto no relato de Mariana e nas notas
expandidas, tem um posicionamento pouco acadêmico em relação às aulas de
Inglês, interrompendo as aulas e “ameaçando” os alunos. Isso é demonstrado
quando Mariana usa-se de uma gradação para mostrar que o ensino, de forma
geral, não recebe o apoio devido. Ela menciona inicialmente que não é a rede de
ensino que determina o apoio dado ao ensino de Língua Inglesa, mas sim a escola
ou, ainda, a direção.
Mariana não consegue articular seu posicionamento teórico com a prática
adotada. Ela transita entre os footings do que ela acha que sempre dá certo e do
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100
que ela faz de vez em quando. No entanto, ela demonstra que raramente faz as
atividades que considera que sempre dão certo. Sua prática, na maioria das vezes,
não condiz também com o gosto dos alunos (e, nem mesmo com uma possível
necessidade).
Em relação às habilidades trabalhadas por Mariana, o que podemos notar é
que ela tenta fazer um trabalho voltado para a leitura (que corresponde ao que é
adotado no livro texto da biblioteca da escola). Fora isso, as demais aulas focaram
apenas em aquisição de vocabulário (números). A fala, o listening e a escrita não
foram trabalhados em nenhum momento. Mariana justifica, assumindo três
posições diferentes (a de “eu pessoal”, “eu representante dos alunos” e “eu
representante da coletividade”) que não é possível trabalhar outras habilidades
devido ao número de alunos em sala.
Os pais também não são incentivados a participar ativamente do processo
de ensino e aprendizagem. Eles são convidados a ir à escola apenas para tomarem
ciência do mau comportamento apresentado pelos filhos ou das notas baixas. Da
mesma maneira, acredita-se que em casa o apoio também não é oferecido.
Mariana relata a participação dos pais inserindo supostas falas dos mesmos e
mostrando que, para eles, a nota é que determina o sucesso ou fracasso dos filhos.
Em relação ao material didático, Mariana às vezes usa o da biblioteca da
escola, que não é suficiente para a turma toda. Os alunos não possuem material.
Mariana também tem uma quota de fotocópias insuficiente. Dessa forma, ela
acaba se restringindo ao uso de quadro e giz, enquanto os alunos usam caderno e
lápis. Nas aulas em que o livro da escola não é usado, os alunos passam a maior
parte do tempo copiando informações do quadro. Mariana aqui se posiciona como
agente, quando fala da aquisição dos materiais, por ela, junto dos alunos. No
entanto, quando se refere à falta de material, a escola passa a ser o sujeito. Então,
ela usa o pronome “a gente”, de forma bem abrangente, a fim de defender a classe
dos professores, acusada de não fazer um bom trabalho (“aí dá pra entender como
a gente não consegue trabalhar. (.)” – linhas 230 e 231).
Os alunos, como consta da entrevista, vêm de diferentes regiões da cidade,
aumentando ainda as multiplicidades de realidades presentes na sala de aula.
Desta forma, vemos que são vários os fatores que interferem para que o
processo de ensino e aprendizagem de Língua Inglesa, neste caso, não seja
satisfatório. Além de questões pessoais, o próprio ambiente de trabalho e a falta de
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0510550/CA
101
articulação entre os membros da instituição também geram resultados negativos
para o processo educacional.
Como graduanda, me foi possível perceber a grande complexidade que
envolve o ambiente escolar a partir de reflexões sobre observações feitas dentro
do próprio ambiente. Hoje, acredito que a participação em um projeto de pesquisa
no curso de graduação, bem como a observação direta de fatores que ocorrem no
ambiente escolar e a reflexão sobre os mesmos, tenham sido de grande
importância para minha formação, me ajudando a entender um pouco mais a rede
interacional da escola pública. Como mestranda e professora, acredito que
a pesquisa como princípio educativo produz o saber e a consciência crítica e
desenvolve a capacidade de intervenção, ao passo que, enquanto princípio
científico, produz ciência em seu sentido mais acadêmico e deve, portanto, ser
mais sistemática e consistente. (Mateus, p. 7. In: Gimenez, 2002)
Assim, afirmo mais uma vez a importância da realização da pesquisa em
sala de aula, desde a graduação, de forma que o futuro professor possa refletir
sobre práticas “reais”, sem desconsiderar a teoria, mas articulando teoria e prática
e desenvolvendo pensamento crítico em relação a ambas. Além disso, a pesquisa
em sala de aula no decorrer da graduação é útil no sentido de que pode ajudar o
professor em formação a refletir sobre problemas vivenciados por alunos e
professores observados ou que serão vivenciados, em vez de apenas acreditar que
ele nunca enfrentará os mesmos problemas ou que ele poderá corrigir um
problema já existente.
5.1
Considerações finais
Esta dissertação teve origem a partir de duas preocupações principais:
entender os motivos que levavam à insegurança dos graduandos do curso de
Letras ao se aproximarem do período em que de fato deveriam assumir suas
próprias salas de aula e compreender um pouco mais das realidades vividas em
um dos mais complexos ambientes de atuação profissional dos professores de
Língua Inglesa (a escola pública). Sua continuidade se deve à preocupação
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0510550/CA
102
voltada para a necessidade da inserção mais consistente da pesquisa de sala de
aula nos cursos de graduação.
Para tal, analisei o discurso de uma professora de Inglês que leciona em
uma escola pública na região central da cidade de Juiz de Fora – MG.
A partir das notas expandidas e da entrevista construídas durante o período
de observação, foi possível analisar as mudanças de projeção da professora, de
forma a buscar entender suas atitudes perante o processo de ensino e
aprendizagem de Língua Inglesa.
Considerando todos os problemas apresentados por Mariana, ou seja, a
decisão desmotivada de fazer Letras, os problemas enfrentados com os alunos, a
baixa remuneração e a conseqüente excessiva carga horária, as dificuldades de
articulação entre teoria e prática e entre o conteúdo programático e a vida real dos
alunos, a falta de harmonia entre os profissionais da escola e a pouca participação
dos pais, pudemos observar e refletir sobre as complexas realidades que
circundam o processo de ensino e aprendizagem.
A observação destes problemas pode ser um dos fatores que geram a
insegurança dos graduandos, nas vésperas de suas formaturas. Porém, acredito que
tal insegurança possa ser diminuída se, em vez de apenas ouvirem os relatos, os
alunos da graduação participarem como pesquisadores em futuros ambientes de
trabalho, refletindo sobre as realidades encontradas e sobre a atuação das pessoas
envolvidas no processo educacional (professores, alunos, pais, coordenadores,
entre outros).
Dessa forma, pelo menos alguns aspectos da sala de aula já teriam sido
vivenciados e discutidos durante o curso de graduação, o que fortaleceria o “eu”
do futuro profissional. É inegável o fato de que nossas experiências de vida
contribuem para posicionamentos e decisões que precisam ser tomadas frente a
situações problemáticas que enfrentamos. Conforme colocam Pimenta & Ghedin
(2002, p. 20),
frente a situações novas que extrapolam a rotina, os profissionais criam,
constroem novas soluções, novos caminhos, o que se dá por um processo de
reflexão na ação. A partir daí, constroem um repertório de experiências que
mobilizam em situações similares (repetição) configurando um conhecimento
prático.
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0510550/CA
103
Através da observação da sala de aula, os acadêmicos poderiam refletir
sobre a experiência do outro e identificar necessidades de atitudes semelhantes ou
diferentes das atitudes tomadas, transformando a própria prática.
Além disso, a pesquisa durante a graduação pode servir como mola
propulsora para pesquisas futuras, que então poderão ser realizadas até mesmo em
suas próprias salas de aula, ao longo da vida docente, além de reforçar a
necessidade de uma formação contínua.
Nas palavras de Van Lier (1994, p. 8) “uma borboleta movendo-se no ar,
hoje, em Pequim, pode transformar os sistemas de tempestade no próximo mês em
Nova York (Gleick, 1987:8)”. Assim também, a reflexão sobre a prática de outros
professores pode influenciar e transformar nossas práticas futuras, gerando
transformações múltiplas.
Considero que seja necessário que os cursos de graduação possam
fortalecer as bases teóricas oferecidas através de uma reflexão crítica sobre a
prática. Contudo, para que isso seja possível é necessário que a prática seja, de
fato, observada.
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6
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107
ANEXO 1
Resolução Nº 19/1996
RESOLUÇÃO Nº 19/1996
Fixa normas sobre o Programa de Treinamento
Profissional e dispõe sobre a respectiva bolsa.
O Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão - CEPE, da Universidade Federal de Juiz de Fora, no uso
de suas atribuições e tendo em vista o que consta do Processo 23071.004937/91-17 e que foi deliberado, por unanimidade,
em sua reunião do dia 02 de julho de 1996,
R E S O L V E:
CAPÍTULO I
DAS DISPOSIÇÕES PRELIMINARES
Art.1º - A presente Resolução fixa as diretrizes do Programa
de Treinamento Profissional da Universidade Federal de Juiz de Fora.
Art.2º - O Programa de Treinamento Profissional, vinculado
à Pró-Reitoria de Ensino visa proporcionar aos alunos a participação em
projeto acadêmico de ensino.
Parágrafo único – A Pró-Reitoria de Ensino expedirá
instruções para a elaboração do projeto.
Art.3º - O Programa de Treinamento Profissional será
gerenciado pela Pró-Reitoria de Ensino.
Art.4º - A participação no Programa de Treinamento
Profissional será admitida após a prestação de Termo de Compromisso,
que definirá as responsabilidades do aluno e do órgão proponente.
Parágrafo único O Termo de compromisso será firmado
entre o aluno e a Universidade, representada pela Pró-Reitoria de Ensino.
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108
Art.5º - O Programa será mantido com recursos
orçamentários da Universidade.
Art.6º - A Bolsa de Treinamento Profissional terá seu valor
proposto pela Pró-Reitoria de Planejamento e fixado pelo Conselho
Universitário, sendo paga mensalmente, à vista de folha de freqüência do
bolsista.
CAPÍTULO II
DA NATUREZA DO PROGRAMA DE TREINAMENTO PROFISISONAL
Art.7º - O Programa de Treinamento Profissional, aberto a candidatos de 2º grau profissionalizante e
a graduandos da Universidade e a ser orientado por docente da UFJF ou profissional da área, tem por objetivo permitir o
aperfeiçoamento profissional, em campo de treinamento profissional da Universidade, específico e compatível com a
habilitação cursada pelos bolsistas.
Parágrafo único – é expressamente proibido que a
participação no programa seja revertido em estágio curricular.
CAPÍTULO III
DO REGIME DE PARTICIPAÇÃO
Art.8º - O regime de participação é de 12 horas semanais de atividades.
Parágrafo único – O horário das atividades do bolsista não
poderá , em hipótese alguma , prejudicar o cumprimento de suas
obrigações discentes.
Art. 9º - A Bolsa de Treinamento Profissional não poderá ser
acumulada com outra, ainda que de espécie diferente.
Art. 10 – O bolsista não terá nenhum vínculo empregatício
com a Universidade.
Art.11 – A participação no Programa de Treinamento
Profissional terá a duração máxima de dois períodos letivos, vedada a
prorrogação.
CAPÍTULO IV
DA SELEÇÃO
Art. 12 – Na seleção dos bolsistas do Programa de Treinamento Profissional serão levados em
consideração os seguintes critérios.
I – Projeto formulado pelo órgão proponente e aprovado pela
Pró-Reitoria de Ensino;
II – Histórico Escolar do candidato, garantida a correlação
das disciplinas cursadas com o trabalho prático do treinamento
profissional;
III – disponibilidade horária do candidato;
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109
Parágrafo primeiro A seleção será realizada pelo órgão a
que se vincula o Projeto, por meio de Comissão especialmente
designada.
Parágrafo segundo – A seleção será supervisionada,
coordenada e, afinal homologada pela Pró-Reitoria de Ensino.
CAPÍTULO V
DOS DIREITOS E DEVERES
Art. 13 – São direitos do bolsista:
I – receber carteira de identificação;
II – obter remanejamento de horário de treinamento
profissional, em virtude de provas e de apresentação de trabalho;
II – receber Certificado de Exercício de Treinamento
Profissional.
Parágrafo único: O Certificado de Exercício de Treinamento
Profissional será expedido pela PROEN, à vista de “ Conceito Favorável”
do Orientador, àquele que tiver exercido suas atividades, pelo menos por
um período letivo.
Art. 14 – São deveres do bolsista:
I – cumprir as normas do Programa , bem como o plano de
atividades a ele atribuído no projeto;
II – apresentar à PROEN relatório semestral das atividades
desenvolvidas, bem como sugestões para a avaliação do Programa;
III – participar da reunião semestral, para a avaliação do
Programa.
Art.15 – São deveres do proponente do projeto:
I – elaborar projeto acadêmico de ensino a ser executado
pelo bolsista, submentendo-o à PROEN;
II – estruturar e encaminhar o desenvolvimento das
atividades, em comum acordo com o bolsista;
III – aprovar o relatório semestral do bolsista, submetendo-o
à PROEN;
IV – apresentar uma avaliação do desempenho do bolsista à
PROEN;
V – participar de reunião semestral de avaliação do
Programa;
VI – cumprir e fazer cumprir as normas do Programa;
VII – apresentar folha de freqüência do bolsista à PROEN,
até o último dia de cada mês.
CAPÍTULO VI
DA EXCLUSÃO DO BOLSISTA
Art.16 – O bolsista será excluído do Programa por:
I – modificação das condições regulamentares que
determinaram a participação;
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II – abandono do Curso ou trancamento de todas as
disciplinas do período;
III – solicitação do bolsista, apresentada com antecedência
de 15 (quinze) dias , ao órgão proponente, para encaminhamento à
PROEN;
IV – descumprimento ou cumprimento insatisfatório de suas
atribuições.
Parágrafo único A exclusão de que trata o item IV será
determinada pela PROEN, de ofício ou por provocação do órgão
proponente, dela cabendo recurso ao Conselho de Ensino, Pesquisa e
Extensão – CEPE.
CAPÍTULO VII
DISPOSIÇÕES TRANSITÓRIAS
Art. 17 – No prazo de um ano, a contar da data de entrada em vigor desta Resolução, a PROEN
deverá encaminhar à aprovação do Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão – CEPE, os critérios de seleção do Programa
de Treinamento Profissional.
Art. 18 – Esta Resolução entra em vigor na data de sua
assinatura.
Juiz de Fora, 02 de julho de 1996
Joaquim Pinto Domith
Secretaria dos Órgãos Colegiados
Renê Gonçalves de Matos
Reitor
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111
ANEXO 2
Notas expandidas
PROJETO DE TREINAMENTO PROFISSIONAL
NOTAS EXPANDIDAS
PESQUISADORA: Fernanda Henriques Dias NE001
DATA: 17 de agosto de 2004 (Terça-feira)
HORA INÍCIO: 14:40 h HORA TÉRMINO: 15:20 h
LOCAL: Escola Estadual João de Freitas
FENÔMENO: Pedido de autorização para a pesquisa
Ao entrar na escola me dirigi à secretaria, onde tive que esperar por um
longo tempo até ser atendida. Ao mencionar que estava precisando fazer um
estágio, a secretária me encaminhou para a diretora (Norma). Após conversar com
a mesma ela me pediu que aguardasse, enquanto ela chamaria a supervisora. A
diretora me ofereceu uma cadeira na sala dos professores, onde fiquei esperando.
Enquanto isso, observei que na sala dos professores os alunos entram e saem
quando querem.
Através dos armários dos professores pude ver que a escola possui muitos
professores e, no horário, li o nome de pelo menos três professores de Inglês.
Ainda enquanto esperava, entrou na sala dos professores a mãe de um dos
alunos do colégio. Perguntei a ela desde quando o colégio está instalado neste
local e ela disse que eles mudaram para lá mais ou menos em abril. Disse também
que o prédio antigo estava cheio de rachaduras e infiltrações e que estava muito
arriscado continuar lá. Disse que havia propostas de mudar de local novamente em
agosto, mas as conversas cessaram e ela acredita que a escola não mudará, pelo
menos até o fim deste ano. Durante todo o tempo de espera, em algum lugar da
escola estava tocando a música “Poeira” (repetidas vezes) com o volume alto o
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bastante para ser ouvida em todo o colégio. Considerei o som desapropriado, já
que era horário de aula.
Finalmente a diretora me levou à sala da supervisora (Marcele). Expliquei
à mesma do que se tratava meu “estágio” e ela disse que só havia uma professora
efetiva de Inglês e que, por ela ser nova na escola, eu também precisaria da
permissão da professora.
Como a professora não estava na escola, combinamos que eu voltaria em
outro dia, na parte da manhã. Voltei à sala dos professores e verifiquei o horário
da professora com o propósito de voltar ao colégio em um dia em que a mesma
estivesse presente.
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PESQUISADORA: Fernanda Henriques Dias NE002
DATA: 19 de agosto de 2004 (Quinta-feira)
HORA INÍCIO: 06:55 h HORA TÉRMINO: +-08:00 h
LOCAL: Escola Estadual João de Freitas
FENÔMENO: Pedido de autorização para a pesquisa
Cheguei à escola às 6:55 h, já que a professora de Inglês tinha uma aula às
7:00 h e a Marcele chegaria também neste horário.
As secretárias me encaminharam novamente para a sala dos professores
onde estavam vários professores.
Um professor me ofereceu uma cadeira e eu fiquei sentada. Alguns
professores perguntaram o que eu estava fazendo, outros me ofereceram café. Ao
dizer que estava esperando a supervisora e a professora de Inglês, os professores
me disseram que a outra supervisora (Joana) estava no colégio e que eu poderia
resolver a questão do estágio com ela e que seria até mais fácil.
Um professor me chamou para fora da sala dos professores e disse:
Professor: – Não deixa a Marcele pegar no seu pé não que ela é muito
chata. Além disso, essa professora de Inglês é uma droga, não sabe nada. É um
nojo. Acha que manda no pedaço.”
Aproveitei a oportunidade da conversa para buscar dados:
Eu: – Mas ela não é a única efetiva aqui?
Professor: – Não é efetiva nada!
Eu: – Mas tem outros professores de Inglês, não tem?
Professor: – Ih! Cada um pior que o outro. É uma porcaria. Além disso
acho melhor você conversar com a Joana, que é a outra supervisora, porque a
Marcele é doida.
O professor me mostrou a professora de Inglês (Mariana) e me levou até a
Joana. Ele me apresentou a ela. Joana me atendeu prontamente, eu expliquei que
precisaria fazer um estágio de Inglês para um projeto e que eu já tinha conversado
com a Marcele. Fomos juntas procurar a Mariana, e enquanto procurávamos, ela
me falou que apenas uma parte do colégio estava emprestada para ser usada pela
E.E.J.F. Percebi que as instalações não são apropriadas para crianças, já que há
um vão do primeiro ao último andar do prédio, cujo muro é mais baixo que minha
cintura, sendo que uma criança facilmente o ultrapassaria.
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Ao encontrarmos a professora, Joana a chamou. Ela parou a aula para nos
atender. Joana pediu permissão à Mariana e eu disse que, devido aos meus
horários, só poderia assistir às aulas das turmas 6B e 7A. Mariana rapidamente me
sugeriu a turma 7A na qual “os alunos são melhores”. Disse também que eu não
poderia começar já o estágio porque ela estava dando aula em duas turmas ao
mesmo tempo devido a um curso do estado (que eu associei ao Simpósio da
Semana do Professor) que os outros professores estavam fazendo e então os
horários tiveram que ser reduzidos e modificados. Eu disse a ela que começaria na
semana seguinte e que escolheria a turma mais apropriada de acordo com o meu
horário. Joana me levou à sala dos professores, onde me passou o horário das
turmas 6B e 7A.
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PESQUISADORA: Fernanda Henriques Dias NE003
DATA: 23 de agosto de 2004 (Segunda-feira)
HORA INÍCIO: 06:50 h HORA TÉRMINO: 10:35 h
LOCAL: Escola Estadual João de Freitas
FENÔMENO: Aulas de Inglês das turmas 6B e 7A
Cheguei na escola às 6:50 h e fui convidada a sentar na sala dos
professores. Os mesmos ficaram conversando sobre o fim de semana. Às 7:05 h a
Mariana chegou e eu pedi permissão para assistir às aulas tanto da 6B quanto da
7A e ela autorizou. Às 7:10 h a professora foi para a sala e às 7:15 h fez a
chamada da turma 6B. Alguns alunos colocaram o caderno e o livro (Password)
sobre a mesa. De acordo com a chamada, havia 22 alunos presentes e 7 ausentes,
dando um total de 29 alunos. Duas alunas entram na sala atrasadas e uma delas
reclama que tem gente no seu lugar. Enquanto ela discute, outro aluno chega. A
professora vai até a porta e pergunta onde ele estava e chama a atenção do mesmo.
As meninas trocam de lugar. A professora pede, então, para quem não copiou o
texto da aula anterior para copiá-lo para a próxima aula e avisa que ainda não é
preciso traduzi-lo porque ela ainda não terminou a matéria de números.
Pede aos alunos que abram os cadernos para olhar quem fez o dever de
casa e completa:
Mariana: – Quem não terminou, que eu vi que é a maioria, vai terminando.
É importante notar que todo o tempo a professora usa o registro informal
da Língua Portuguesa ao se dirigir aos alunos.
Uma das alunas (Fabiana) começa a procurar algum aluno que tenha o
texto da aula anterior:
Fabiana: – Você tem? Você tem? (espera resposta) Ninguém tem!
Outro aluno: – Eu vim na aula mas não copiei.
Um dos alunos pergunta à professora qual era o dever de casa e ela
responde:
Mariana: – Pedi pra escrever todos os números de 1 a 100.
A professora continua olhando os cadernos e pára em um dos alunos.
Mariana: –Já olhei o seu?
Aluno: – Já.
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116
Mariana: – Eu não olhei não. O “7” seu tá errado! Como é que eu posso ter
olhado? É com N.
Continua olhando os cadernos e então comenta com a turma.
Mariana: – Gente, cês tão escrevendo tão errado! Muito errado mesmo!
Impressionante.
Após um tempo olhando os cadernos, o telefone celular da professora toca
e ela vai desligá-lo. Um dos alunos fala: “Direitos iguais!”
Mariana: – Direitos iguais não senhor. Professor, professor. Vocês são
alunos.
Continua olhando os cadernos e repete:
Mariana: – Gente, mas cês tão escrevendo errado demais.
Enquanto a professora olha os cadernos, alguns alunos fazem o exercício,
outros conversam, mas o silêncio se mantem relativamente.
A professora pergunta: “Gente, aí na frente tá falando é por que já
terminou?” Dois alunos respondem que já terminaram e continuam conversando.
A professora continua olhando os cadernos, pára em um aluno e comenta: “Tá
tudo escrito errado!” Volta-se para a turma e fala: “Oh gente! Cês copia errado,
escreve errado no caderno, depois faz errado na prova.”
Parou então ao meu lado e me explicou que está dando de 0 a 100 na sexta
série porque eles não aprenderam na quinta e que vai continuar até 1000 (que é a
matéria da sexta série). Disse que na sétima série, em algumas turmas ela
começou do 0 e que na sétima A, que é a melhor turma (porque nas outras
ninguém aprende nada) ela já ensinou até os bilhões.
Às 7:30 h a professora começa a olhar os cadernos de novo. Chama a
atenção de um aluno que estava conversando e que ainda nem tinha começado.
Continua olhando os cadernos e resolve mudar um aluno de lugar.
A professora comenta de novo: “Oh gente, se isso fosse uma prova vocês
estão copiando e iam tirar nota péssima (pausa). Nossa! Estão todos errados. Não
tem nenhum certo. Você não copiou isso não? Você tirou da sua cabeça?”
A supervisora Marcele entra na sala e pergunta se pode conversar com os
alunos. Volta-se para os alunos e pergunta, de forma bruta: “Eu quero saber quem
foi que disse que eu disse.”
Os alunos, assustados, ficam olhando para a supervisora, imóveis e
demonstrando não estarem entendendo o que está acontecendo.
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117
Depois de alguns segundos de silêncio a supervisora continua: “Eu quero
saber quem foram as três meninas que disseram que eu disse. Eu fui bem clara. As
três meninas que disseram que eu disse e que o Nuno colocou no jornal.”
Os alunos então começam a se entreolhar, assustados, e ainda sem
entenderem o que estava acontecendo.
Marcele: – Hein gente? Quem são as três meninas que estavam na minha
sala e que disseram que eu disse?
Então, três meninas levantam o dedo e uma delas começa a explicar que
ela estava na sala da supervisora, mas que ela não sabia o que era que elas tinham
dito.
A Marcele então começa a falar de forma rígida com a turma, chama as
três meninas para a frente da sala. Só então explica o que aconteceu. Fala para a
turma que devido às fofoqueiras da sala (as três alunas) o Nuno, que também
gosta de um fuxico, havia escrito em seu jornal que a professora de Educação
Física (Elba) tinha sido expulsa do colégio, por ter mandado as três alunas para a
supervisora, já que elas estavam matando aula. Explica o que é um professor
efetivo e diz que a professora Elba só trabalhava na escola para completar carga
horária e, como ela havia conseguido mais aulas na outra escola, ela não precisaria
mais dar aulas no colégio. Avisa para os alunos terem cuidado com as três
meninas e com o Nuno porque os considera perigosos por serem fofoqueiros e
mentirosos. Conta que em outra escola já processou uma professora que falou
mentira sobre ela e pergunta a eles o que eles acham que pode acontecer com os
pais deles, já que os alunos são menores de idade (em forma de ameaça). Para
terminar, avisa que pelo menos por um mês a turma vai ficar sem recreio,
conversando com ela, para aprenderem a não fazer fofoca e que ela iria pensar se
o jornal poderia continuar ou não. Pede desculpas à professora por ter
interrompido a aula e diz que depois conversaria com os quatro fofoqueiros.
Dá 8:00 h, e a professora continua chamando a atenção da turma por causa
do jornal e diz ao Nuno que ele deveria saber melhor o que publicar. Às 8:05 h sai
da sala e vai para a outra turma (onde a aula deveria ter começado às 7:50 h).
Após a aula da 6B fui até a Joana para pedir permissão para tirar fotos da
escola. Ela me levou até à diretora (Norma), que me pediu para explicar o motivo
das fotos. Quando falei que estava fazendo uma pesquisa com base etnográfica, a
supervisora começou a explicar o que era etnografia e então a diretora, Norma,
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118
deu permissão para fotografar tanto a parte interna quanto a parte externa, desde
que a professora e os alunos permitissem (caso eles aparecessem nas fotos). Então
resolvi andar pelo colégio anotando as informações para a descrição física da
escola.
A escola fica localizada bem no centro da cidade, num local de fácil acesso
(próximo às principais ruas da cidade). O prédio é alugado ou emprestado e
pertence ao Colégio Santo Antônio, um colégio particular que oferece cursos
técnicos e profissionalizantes correspondentes às séries de Ensino Médio. Isso
significa dizer que a estrutura física não é apropriada para receber crianças. A
frente do prédio fica voltada para uma rua por onde os alunos entram na escola e
os fundos dão para outra rua. O prédio possui cinco andares, todavia, por estar
situado em um morro, sua entrada corresponde ao quarto andar do prédio.
Começarei falando do primeiro andar. O primeiro andar é utilizado pela
“Rádio & Som” e, por isso, as passagens que dão acesso ao primeiro andar ficam
fechadas. Todavia, enquanto observava a estrutura, uma faxineira (usando o
mesmo uniforme dos faxineiros da escola) aparece e deixa um saco de lixo no
primeiro andar, próximo a outro saco de lixo. Percebo então que o local é sujo e
que há no chão riscos de giz. Em um dos cantos está escrito GOL, como se o local
tivesse sido usado por alunos. A entrada para o primeiro andar se dá pelos fundos
do prédio, porém os alunos não têm permissão para usar esta entrada. Não é
possível ver a parte da frente do primeiro andar.
No segundo andar, a parte dos fundos à esquerda é destinada à “Rádio &
Som” e, portanto, os alunos não têm acesso à mesma. Nos fundos, à direita há
uma sala de aula em uso, uma sala de aula trancada e um banheiro masculino e um
feminino. Na parte da frente há um refeitório (que parece ser gratuito), uma
cantina (paga), dois bebedouros, um banheiro masculino e um feminino e ainda
um local (armário) onde ficam materiais de limpeza.
Na parte da frente do terceiro andar encontram-se um banheiro masculino
e um feminino. Na esquerda, à frente, ficam um laboratório, uma cantina (paga) e
algumas salas (que não estavam sendo usadas no momento da observação). À
direita há algumas salas em uso pelo Colégio Santo Antônio. Nos fundos, à
esquerda, há algumas salas que também não estavam sendo usadas; há também
um banheiro masculino e um feminino (todavia os banheiros não têm pia); há dois
bebedouros e, ao lado dos mesmos, duas pias. Na parte dos fundos, à direita,
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119
ficam três salas (sendo duas salas de aula e uma biblioteca) e um banheiro
masculino e um feminino.
O quarto andar, como já dito, corresponde à entrada utilizada pelos alunos.
Na parte da frente, à esquerda, fica a secretaria do Colégio Santo Antônio e, logo
após, a secretaria da E. E. J. F. e a sala dos professores do E. E. J. F. e, ainda, uma
sala de enfermagem e um laboratório de informática, ambos fora de uso. A sala
dos professores possui armários encostados na parede esquerda, uma mesa grande
com várias cadeiras ao centro. Na mesa, ficam um arranjo de flores e os três livros
nos quais os professores assinam o ponto. Na parede direita ficam dois murais
com avisos e horários e, encostada na parede, uma mesa com café e xícaras. Ao
lado dos armários há um vidro com água e copos descartáveis. Descendo, então,
dois ou três degraus encontra-se um espaço separado por uma mureta. Nesse
espaço fica uma mesa com um mimeógrafo e uma máquina de escrever. Através
desse espaço fica a porta que dá acesso à sala da diretora. Porém, não foi possível
ver como é tal sala. É por esse espaço também que se tem acesso ao banheiro
usado pelos professores que, embora pequeno, é limpo e possui todos os recursos
necessários em um banheiro. Ainda na parte da frente, à esquerda há uma
secretaria do Colégio Santo Antônio, um banheiro feminino e um masculino, duas
pias e dois bebedouros e algumas salas em uso (onde são ministradas aulas do
Colégio Santo Antônio). De frente para a entrada do colégio há um mural sobre as
olimpíadas, feito por alunos e professores da E. E. J. F. No quarto andar, na parte
dos fundos, à direita, ficam algumas salas (em uso pelo Colégio Santo Antônio) e
ainda dois banheiros (masculino e feminino), duas pias e dois bebedouros. À
direita, fica a sala das supervisoras da E. E. J. F., três salas de aula e um banheiro
masculino e um feminino.
No quinto andar, na frente, há algumas salas em uso pelo Colégio Santo
Antônio (tanto à direita quanto à esquerda). À esquerda há também uma quadra,
onde duas alunas estavam jogando bola. Todavia não consegui entrar na quadra
para descrevê-la. À direita, há um tanque onde algumas alunas da E. E. J. F.
estavam trabalhando com argila. Na parte dos fundos, à esquerda, há algumas
salas fechadas, bem como dois bebedouros, dois banheiros e duas pias. À direita,
também nos fundos, há três salas de aula e dois banheiros.
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A E. E. J. F. tem permissão para usar a parte direita dos fundos apenas. A
altura dos muros internos corresponde mais ou menos à altura da minha cintura, o
que pode ser considerado baixo para um local que trabalha com crianças.
A sala da sexta série B tem carteiras para 31 alunos. Parte da parede é feita
de tijolos abertos, de modo que é possível ver o que está acontecendo fora e
dentro da sala de aula. A porta tem uma janela de vidro.
A sala da sétima série A é igual à da sexta série B, porém não há vidro na
porta e a capacidade é de 27 alunos.
Às 9:10 h a campainha da escola tocou, indicando o intervalo dos alunos
do Colégio Santo Antônio. Os corredores então ficaram cheios de alunos e, por
todo o colégio, ouvia-se muito barulho.
Fui para a sala dos professores. A partir de 9:25 h os professores
começaram a chegar na sala para o intervalo (que deveria começar às 9:30 h).
Duas serventes levaram a merenda (no caso, macarrão) e os professores ficaram
comendo. A Natália, outra professora de Inglês, começou a conversar com a
Mariana sobre o Simpósio de Professores. Disse ter assistido a um seminário
muito bom sobre o ensino de Inglês. Mariana perguntou o que foi dito no
seminário e a Natália respondeu que o que foi dito é o que eles já fazem mesmo.
“Falou que tem que ensinar a gramática no texto, que tem que ensinar a ler e que
não precisa dar um monte de nome para o conteúdo gramatical.” A Mariana
discordou e disse que tem que ensinar gramática mesmo, porque foi assim que ela
aprendeu. Disse que se os alunos não aprendem a gramática, então não vão
aprender nada, sem a gramática. A outra professora concordou e então elas
começaram a falar sobre casas. A Mariana então mostrou uma revista de artigos
para casa, voltou-se para mim e disse sorrindo: “Estou montando minha casa e,
como não tenho tempo, levo minhas revistas para todos os lugares. Aí, quando eu
tenho um tempinho, quando mando os meninos fazerem um exercício, eu
aproveito para dar uma olhada.”
Mariana então me disse que nas segundas-feiras ela dá 15 aulas e nas
terças 14 aulas, mostrando o tanto de aulas que ela dá, já desde o início da
semana.
Um professor perguntou quem assistiu à peça de teatro feita por alunos de
uma outra escolha pública. A Mariana perguntou, com um tom duvidoso, se a
peça tinha sido boa, e completou que em escola estadual é impossível trabalhar
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com teatro. O professor respondeu que a peça tinha sido ótima. Após a
confirmação por outra professora, ele ainda comentou que em outro lugar onde ele
tinha trabalhado (também escola estadual) ele tinha feito com os alunos uma peça
em grego e sugeriu à Mariana que montasse com eles uma peça em Inglês. Ela
respondeu que seria impossível, já que os alunos não se importam com nada.
O intervalo acabou e então fomos para a sala da sétima série A. A aula
começou às 09:55 h, quando a professora cancelou a prova e disse que daria um
trabalho, por causa das notas baixas das outras turmas de sétima série. Explicou
que o trabalho seria com consulta, podendo também tirar dúvidas com ela.
Pediu aos alunos que tirassem uma folha do caderno e escrevessem nome e
número e então ela saiu da sala para buscar giz.
Enquanto a professora estava fora da sala, os alunos ficaram conversando
e um deles, indignado, comentou: “Ah! Cê estuda pra não ter prova!”. A
professora voltou e passou o trabalho no quadro. Ela ficou de costas para a turma
o tempo todo, exceto quando estava pedindo silêncio.
Os alunos perguntaram se tinha que colocar nome, número e série e ela
respondeu de costas mesmo.
De costas, escrevendo no quadro, também conversou com os alunos:
Mariana: – Gente, eu quero perguntar uma coisa: cês acham que algum dia
cês vão esquecer esses números?
Aluno: – Nunca mais.
Outra aluna pergunta: – Professora, por que esse exagero?
Mariana: – Ué. Pra vocês fazerem o trabalho.
Aluna: – Não é melhor você dá prova?
Mariana: – Nossa, que preguiçosa!
Outro aluno: – Vai até a letra Z?
Mariana: – Gente, relaxa que vai ter um monte. Vocês vão ter sábado à
tarde ou à noite para terminar.
Enquanto a professora passava no quadro, os alunos ficaram conversando
e reclamando. Uma aluna levantou e ficou dançando no meio da sala e a
professora, virada para o quadro, nem mesmo percebeu.
Outro aluno reclamou: – Nossa professora, tá bom!
E a professora, irritada, respondeu: – Gente, já cansei. Acho que precisa
disso que vai ser útil, então tem que fazer! Pode ser chato, mas tem que fazer.
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O trabalho que a professora passou no quadro vem a seguir. O título não
foi passado no quadro, mas a professora deu a seguinte explicação oral: “Cês têm
que escrever esses números em Inglês”.
a) 987.654.321.123
b) 123.456.789.876
c) 444.555.332.222
d) 943.866.545.323
e) 364.747.325.126
f) 149.236.344.498
g) 700.600.500.400
h) 918.815.711.612
i) 636.727.848.959
j) 222.111.100.600
k) 740.630.240.950
l) 843.754.963.632
m) 240.420.150.510
n) 854.733.621.510
o) 978.645.231.321
p) 189.158.117.162
q) 643.772.884.995
r) 407.306.402.509
s) 348.457.369.236
t) 458.337.126.105
u) 800.200.300.100
v) 463.774.523.621
w) 941.632.443.894
x) 104.205.306.407
y) 900.888.700.666
z) 610.711.812.913
aa) 631.543.973.640
bb) 870.444.312.200
cc) 209.306.401.504
dd) 100.200.300.400
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123
Após passar no quadro, a professora falou: – Data de entrega: até segunda-
feira.
Aluno: – Vai valer quanto?
Mariana: – Deve ser de 10 a 15.
Outro aluno: – Professora, então não vou fazer mais nada essa semana. Só
isso daqui.
Outra aluna: – Para acabar isso aqui hoje, eu não posso fazer mais nada, aí
eu tenho que matar aula de Inglês.
Mariana: – Você vai faltar aula de Inglês para fazer exercício de Inglês?
Aluna: – Claro que não. Ainda mais aquelas coisas complicadas.
Mariana: – Ah bom!
Depois de um tempo, a conversa com a professora recomeça.
Aluno: – Eu vou fechar esse trabalho, professora.
Mariana: – Espero que todos fechem, porque vocês já fizeram um monte
de exercício.
Aluno: – Quem não fechar, você pode passar mais uns.
Mariana: – Ótima idéia. Quem errar mais de sete eu passo outra bateria.
Aluno: – Ou, minha prova de Inglês lá do curso podia ser assim, né?
Outro Aluno: – Ah! Lá é fácil!
Aluno: – Pra você, né!
Enquanto os alunos copiam, a professora fica sentada à sua mesa,
cantando. Depois, começa a conversar com os alunos sobre o Miss Gay e os
alunos falam sobre “ficar” e namorar e contam casos uns dos outros.
Os alunos falam muito e levantam. Então a professora levanta e vai
passando de mesa em mesa e mandando eles terminarem de copiar.
Um aluno fala: – A gente vai ralar, mas a professora vai ralar muito mais.
Bem feito, professora!
Mariana: – Isso mesmo! Façam como se estivessem me maltratando!
Aluno: – Professora, você parece a Letícia da Malhação.
Mariana: – Quem é a Letícia da Malhação?
Outro Aluno: – Aquela chata!
Outro aluno, então, pergunta: – Professora, é para te maltratar?
Mariana: – É.
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124
Aluno: – A gente te ama, professora. Então a gente não vai fazer não.
Depois de mais algum tempo, a professora lembrou de me apresentar para
a turma. Os alunos me cumprimentam e batem palmas quando a professora disse
que eu tinha escolhido aquela turma porque era a melhor. Eles então ficaram
felizes, mas logo arranjaram um assunto.
Aluna: – Ela escolheu essa turma, porque ainda não me conhece!
Outra Aluna: – Coitada. Tô com pena dela!
A professora então pegou seu material, disse “bye-bye” e saiu da sala,
determinando o fim da aula.
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PESQUISADORA: Fernanda Henriques Dias NE004
DATA: 26 de agosto de 2004 (Quinta-feira)
HORA INÍCIO: 06:50 h HORA TÉRMINO: 08:40 h
LOCAL: Escola Estadual João de Freitas
FENÔMENO: Aulas de Inglês das turmas 6B e 7A
Cheguei à escola e fui direto para a sala dos professores, onde encontrei
uma professora de Português, conversando com uma secretária (pedagoga
aposentada). A professora estava exaltada, contando para a secretária que
nenhuma providência tinha sido tomada em relação a um problema com um aluno
da turma A. A conversa foi mais ou menos a seguinte:
PP (Professora de Português): – Eu falei com a Norma que eu não ia dar
aula com aquele menino lá. Depois daquilo tudo não tomaram nenhuma
providência e eu ia ser obrigada a agüentar desaforo e ainda ficar desmoralizada.
S (Secretária): – Nossa! Eles que tinham que ter feito alguma coisa. E a
mãe dele?
PP: – A mãe dá apoio. Arruma mais confusão ainda. Aí a Norma foi lá e
conversou com a turma. Mas aí, sabe o que aconteceu? Tava a turma toda lá,
menos ele. Ele chegou atrasado e foi entrando. Aí eu falei: “Ele está entrando só
para ouvir o que você tem pra dizer, Norma!” Porque eu não ia deixar ele ficar na
minha aula. Faz as coisas e não acontece nada e eu ainda tenho que agüentar
marginal na sala. Mas ainda bem que ele chegou a tempo de ouvir o que ela tava
falando com a turma.
S: – E eles apóiam? Os outros alunos?
PP: – Às vezes. Eles não fazem, mas acham bonitinho. E se não
acontecesse nada, daqui a pouco ia ter um monte de marginal na sala.
S: – E aí, o que aconteceu com ele?
PP: – Aí a Norma falou com a turma e levou ele com ela e deixou ele
fazendo exercício. Mas a mãe apóia!
S: – É! Tem que tomar providência. Um pessoal assim não pode ficar não.
Como os outros professores estavam começando a chegar, o assunto
acabou. Um dos professores chegou e disse que estava cansado. Comparou seu
cansaço com uma bateria: na segunda-feira está cheia, aí a carga vai diminuindo e
na quinta-feira de manhã sobra menos de 10%.
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126
Os professores ficaram batendo papo e a diretora começou a conversar
com a Mariana. Como eu estava longe, não pude saber do que estavam falando.
Deu o horário da aula e os professores foram saindo até que ficamos na
sala dos professores eu, a Mariana, a Norma e a Joana. Então, foi possível ouvir a
conversa. A Norma estava chamando a atenção da Mariana, porque um professor
tinha dito que ela havia liberado os alunos mais cedo na segunda-feira. A Mariana
disse que era mentira e que outros professores tinham liberado os alunos mais
cedo do que ela. A Marcele chegou e então eu levantei e saí da sala. A professora,
a supervisora e a diretora também levantaram e continuaram a conversa por mais
um tempo. A Mariana então saiu da sala e fomos andando pelo corredor. A
Mariana falou comigo:
Mariana: – Agora cê vê! Foram falar com a Norma que eu não dei a última
aula na segunda-feira. Agora é assim? O professor pode escolher se vai dar aula
ou não? (pausa) É impressionante! Tem gente que gosta de inventar. Mas tinha
que ser justo comigo? Tinham que me pegar pra Cristo?
Encontramos com a Marcele no corredor e a Mariana parou para perguntar
o que ela devia fazer. Disse que ia procurar saber quem foi que falou e que ia
reclamar com a pessoa. A Marcele sugeriu que ela deixasse para lá e que não se
importasse com o que tinha acontecido. Disse que a pessoa tinha reclamado de
vários professores, mas o único nome que havia citado era o da Mariana.
Fomos para a sala da sexta série B. A aula começou às 7:20 h. A
professora me apresentou e comentou: “Ela vai anotar se vocês falam muito!” e
então fez a chamada. Durante a chamada, dois alunos ficaram perguntando se eu
ia anotar se eles falam muito e perguntaram o que eu estava fazendo e porque eu
estava anotando. Ao terminar a chamada, a professora falou:
Mariana: – Hoje nós vamos terminas os números.
Aluno: – E a tradução?
Mariana: – A tradução nós vamos terminar depois. Numbers.
Vira então para o quadro e escreve.
Numbers
200- two hundred
500- five hundred
345- three hundred and
forty-five
786- seven hundred and eighty six
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127
989- nine hundred and eighty nine.
Enquanto ela escreve no quadro, os alunos ficam conversando agitados.
Falam que é a aniversário da Fabiana (uma das alunas) e ficam falando dos ovos
que trouxeram para jogar nela ao fim da aula.
Um aluno fala com a professora: – Professora, escreve o 100 de novo que
eu esqueci de copiar.
O outro aluno responde: – “One randredi!”
E a professora, sem responder, escreve: “100 – one hundred” no quadro.
Após passar o número no quadro, a professora avisa: – É só copiar que
depois eu vou explicar.
Fernando comenta: – Olha como escreve 345. Se pedir pra eu escrever 345
em Português eu acho que eu não sei!
A professora vai para a porta da sala e fica conversando com alguém que
está do lado de fora. Os alunos, enquanto isso, ficam conversando.
Os alunos começam a fazer muito barulho e alguns ficam andando pela
sala. A professora entra na sala e fala brava: “Gente, só um minutinho que eu tô
atendendo uma mãe aqui e já já eu explico”.
Sai da sala e continua conversando.
Karina vira para mim e fala: – Tadinha, a moça deve tá arrependida de ter
entrado nessa escola.
A bagunça continua e a supervisora entra na sala. Pede silêncio, vira-se
para um aluno (Fernando), que no momento não estava participando da bagunça e
fala: “E você, sua mãe já esteve aqui semana passada e vai vir aqui amanhã de
novo. Acho que ela não vai receber notícias boas não.”
A turma fica em silêncio e ela sai da sala.
A professora entra na sala, lê os números 100, 200 e 500 e pergunta:
“Como seriam os outros números? 300? 400? 600?”
A turma respondeu bem baixo.
Mariana: – Todo mundo consegue escrever isso aqui? (referindo-se aos
números 300,400 e 600).
Aluno: – Escrever é fácil, só não dá pra falar!.
Mariana leu os outros números do quadro e disse que o “and” é opcional.
Mariana: – Eu vou passar alguns para vocês fazerem para mim.
Passa alguns números no quadro e sai da sala.
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128
Karina pergunta para mim: – Você tá anotando se a gente tá conversando
muito?
E eu respondi que não.
Um aluno fala alguma coisa sobre os Estados Unidos. E o Nuno responde:
“Você não sabe nem pegar o ônibus que vai para o aeroporto!”
Eles continuam falando sobre os Estados Unidos. A professora entra na
sala e os alunos começam a fazer o exercício (escrever os números do quadro por
extenso).
Um aluno fala com a professora: “É mais fácil escrever do que falar.”
Karina fala para si mesma, batendo na testa: “Ai menina burra!”
Um aluno pergunta alguma coisa (incompreensível do lugar onde eu
estava) e ela responde: – Tá querido, mas falta quatro minutos pra terminar a
aula.
Outro aluno comenta: – E ela passou só quatro minutos de aula.
Alguns alunos riem com o comentário.
Um aluno chama a professora: – Professora, já acabei tudo. Fiz tudo de
cabeça.
Mariana: – Você tá fera, então!
Um aluno fala: – A aula tá demorando acabar!
Outro aluno responde: – Aula chata é assim mesmo!
Karina: – Nossa, professora, é mesmo. Como é que cês foi gostar de
Inglês?
Mariana: – Não sei como é que cês gostam de Matemática. Eu detesto
Matemática!
A professora vai passando nas carteiras e olha o caderno de duas alunas: –
Tá tudo errado! Você tá fazendo outra coisa e você fica conversando.
Depois de olhar os cadernos, a professora marca uma prova para quinta-
feira.
A Karina pergunta para mim: “Você vai estar aqui?”. Em um tom
malicioso, querendo saber se eu ajudaria durante a prova:
Eu: – Vou.
Karina: – Brincadeira.
Fabiana: – Você vai fazer prova com a gente?
Eu: – Se for em grupo e a Mariana deixar ...
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A professora então pergunta: – Teve alguém que eu não passei olhando o
caderno? Quero ver quem fez errado.
Como ninguém respondeu e, como já estava na hora da aula acabar, a
professora juntou o material, disse “bye-bye” e foi embora.
No corredor, a professora falou comigo: – Odeio Matemática!
Eu respondi que gosto de Matemática e que na escola minhas melhores
notas eram em Matemática.
Entramos na sala da sétima série A e, ao perceber que eu estava
procurando um lugar para assentar, Marlene me ofereceu lugar ao lado dela.
Alguns alunos entregaram o trabalho de números para a professora.
Uma aluna pergunta: – Hoje você vai dar muita matéria?
A professora responde em tom irônico: “Não. Vou ficar a aula inteira à
toa!” E completa, agora sem ironia: “Hoje a gente vai largar um pouco a
gramática e vai pegar o livro.”
Faz a chamada e distribui os livros (já que os alunos não têm livro, pelo
menos a maioria deles).
Um aluno fala: –Ah professora. Esse livro é empoeirado, fedido.
A professora finge não ter escutado e fala com a turma: – Esses livros
perderam o mofo, cês lembram?
Dois alunos respondem.
Aluno 1: – Mais ou menos.
Aluno 2: – É mesmo.
Outra aluna comenta: – Ah esse livrinho é tão chatinho!
Mariana: – Vamos abrir na página 22.
Então a Marcele entra na sala, lê o nome de seis alunos e pede que eles
saiam da sala, já com suas mochilas e materiais. Eles avisam que um dos alunos
não está na sala e os cinco ficam na porta da sala, esperando. Enquanto isso, os
outros alunos se mostram nervosos e os que estão em pé ficam tremendo.
A Marcele fala que a turma não tem tido um bom comportamento e
explica que os cinco estavam sendo chamados por causa do comportamento na
aula do dia anterior. Avisa que a turma vai ficar sem recreio por um bom tempo e
sai da sala acompanhada dos cinco alunos.
Um aluno reclama com a professora e diz que não é justo ele ficar sem
recreio se ele nem tinha ido à aula no dia anterior. A professora fala que a turma
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130
não tem bom comportamento há muito tempo. Ele então diz que é injusto a Marisa
e outra aluna (cujo nome não me lembro) ficarem sem recreio, pois elas não
conversam, nem fazem bagunça.
Essa outra aluna então fala com a professora que a outra professora, que é
mais calma, não dá aula por causa da turma, fica o tempo todo de braços cruzados
esperando silêncio e, no fim da aula, passa exercícios e manda eles fazerem
sozinhos e pergunta para a professora (em um tom de indignação): “E o resto que
quer aprender?”
A professora então pergunta: – Mas cê acha que a gente tem que agüentar
isso?
A aluna responde: – Mas então tem que punir!
A professora pega o livro e pede para abrir na página 22.
Mariana: – Eu vou fazer ao contrário. Vou deixar vocês fazerem sozinhos
que, se eu bem conheço essa turma, vocês vão conseguir.
Eu então perguntei à professora onde ficava o banheiro.
Mariana: – Fica aqui do lado, mas esse banheiro é de aluno. É melhor não
usar aqui não. Vai no da sala dos professores.
Na sala dos professores, encontrei duas alunas conversando com a diretora
(Norma). A Norma perguntou porque elas estavam atrasadas e elas disseram que
moram longe e que tinham chegado atrasadas porque não tinham dinheiro para o
ônibus e então tiveram que ir a pé para a escola e justificaram que era a primeira
vez que estavam chegando atrasadas.
Quando eu estava voltando para a sala, vi a professora em um dos
corredores, também voltando para a sala, porém não pude saber por quanto tempo
ela havia deixado os alunos sozinhos.
Os alunos ficaram conversando com a professora e contaram o que havia
acontecido na aula do dia anterior. Depois de um tempo eles ficaram quietos
fazendo o exercício. Um aluno começa a conversar com o outro e a professora
fala: “Vou falar com a Marcele que acho que faltaram algumas [pessoas]” Os
alunos pedem para ela não fazer isso.
Um aluno pergunta o significado de uma palavra e o outro responde que é
só olhar no final do livro. A professora responde que é só descobrir o significado,
de acordo com o resto do texto.
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Ela pára perto de mim e fala sobre as diferenças entre trabalhar nas escolas
do estado e da prefeitura. Disse que na prefeitura é melhor, porque as turmas são
melhores e os professores têm direito de usar maior quantidade de xerox. Disse
que gosta de trabalhar com adolescentes mas que na outra escola do estado onde
ela havia trabalhado ela não gostava. Justificou que na outra escola os alunos
ameaçavam e agrediam professores, e que às vezes ela saía de lá chorando, com
medo. Lembrou, então, que eu havia pedido para fazer a entrevista com ela e
perguntou: “Pode ser agora?” E então ela deu a entrevista na sala de aula mesmo,
não se importando com a presença dos alunos.
Depois da entrevista ela conversou um pouco com os alunos, até a aula
acabar.
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PESQUISADORA: Fernanda Henriques Dias NE005
DATA: 30 de agosto de 2004 (Segunda-feira)
HORA INÍCIO: 06:55 h HORA TÉRMINO: 10:35 h
LOCAL: Escola Estadual João de Freitas
FENÔMENO: Aulas de Inglês das turmas 6B e 7A
Cheguei na escola às 6:55 h, junto com a Mariana. Ela falou comigo:
“Fernanda, mas eu tenho um gênio ruim. Enquanto eu não souber quem falou que
eu não dei aula segunda eu não vou ficar bem. E o pior que a primeira pessoa que
eu tô vendo é quem eu acho que falou. Não sei, mas acho que vou resolver isso de
uma vez.” E entrou na sala dos professores. Eu fiquei do lado de fora, mas como
ela estava falando alto e gesticulando muito, vi que ela estava tirando satisfação
com uma professora e os outros professores todos prestando atenção na conversa.
Depois de um tempo, ela saiu da sala com o material na mão e falou comigo:
Mariana: – Ainda bem que eu falei, senão eu ia ficar entalada. E você
acredita que todos os professores acharam um absurdo ela ter dito aquilo?! Ela
falou que não foi ela não, ela só falou que reclamou de forma geral que alguns
professores estão liberando os alunos muito cedo, mas que não falou meu nome.
Você acha? Ela ia reclamar dos outros e não ia falar meu nome? Mas eu só não
entendo porque que falou só o meu nome! Deve ter me achado bonitinha.
Entramos na sala de aula já eram 7:15 h. Ela fez a chamada e lembrou que
a prova seria na próxima quinta-feira. A Karina me perguntou se eu ia ajudar na
prova.
A professora avisou que a aula seria um teste de texto, em dupla. Dois
alunos perguntaram para mim:
– Você vai fazer comigo?
A professora organizou a sala e às 7:20 h distribuiu o teste. Me deu um
teste e disse para mim que acha esse teste muito fácil para eles, mas que se for
mais difícil eles não conseguem fazer.
Pediu aos alunos para deixarem os cadernos abertos e então passou de
mesa em mesa olhando os cadernos e apontando os erros.
O teste é um diálogo, que não considero difícil. Todavia, algumas das
perguntas não têm resposta direta que possa ser extraída do texto, devendo ser
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levada em conta a opinião do aluno. Além disso, a pergunta “f” contém um erro
biográfico, que invalida a pergunta “e”.
A professora ficou no fundo da sala conversando comigo. Falou que podia
ser um dado importante para minha pesquisa o fato de ter uma aluna surda na sala,
com a qual ela não consegue se comunicar. Disse que tanto ela quanto os alunos
têm boa vontade com a aluna que é surda, mas que os alunos também não
conseguem comunicar com ela. Perguntei se a aluna sabe LIBRAS. A professora
respondeu que sim, mas que os professores não sabem. Perguntei se a professora
havia recebido algum treinamento ou orientação para trabalhar com deficientes
auditivos e ela disse que só ficou sabendo que tinha uma aluna surda quando
entrou na sala e tentou falar com a aluna. Disse que não sabe se ela consegue
acompanhar a aula, mas que ela tem o caderno completo e que faz todos os
deveres, mas acha que ela tem ajuda em casa.
Fiquei observando a aluna surda e o aluno que estava fazendo o teste com
ela. Eles estavam “conversando” por escrito ou fazendo sim ou não com a cabeça.
O aluno pareceu ter boa vontade com ela, mas ainda assim eles estavam
demonstrando grande dificuldade de comunicação.
A professora falou comigo que todas as turmas fariam teste hoje. Falou
que o teste da 7A seria diferente das outras (mais difícil) porque as outras turmas
não conseguem resolver o teste da 7A.
Contou que no Colégio Santo Antônio, onde dá aulas de Português, ela
teve problemas com a Associação dos Surdos, pois deu um trabalho diferenciado
para as três alunas surdas da sala.
Falou para a turma que eles teriam cinco minutos além do horário para
terminarem o teste e então falou comigo que pediria dez minutos da aula seguinte
para os alunos terminarem o teste (pois a aula seguinte seria da professora que
falou que ela havia liberado os alunos cedo) e completou: “já que ela está
boazinha comigo hoje”.
Falou que ela já percebeu que os alunos sabem mais texto do que
gramática. Disse que em outra escola, onde ela dá aula para todas as séries, ela
percebeu que os alunos não lembram a gramática e, por isso, não sabem
gramática; todavia, eles sabem texto.
Disse também que gosta de dar avaliações diversificadas: individuais, em
duplas, em grupos; e explicou que esta avaliação não tinha sido preparada por ela,
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mas por outra professora com a qual ela troca materiais. Às 8:00 h ela recolheu o
teste e foi para outra sala de aula.
Na hora do intervalo fui para a sala dos professores, onde os mesmos
estavam comendo macarrão e biscoito. Mariana me disse que já havia olhado os
testes da 6B e que eles tinham se saído bem. Perguntei se a aluna surda tinha feito
um bom teste e ela disse que não, que essa tinha sido a dupla com menor nota.
Às 9:55 h entramos na sala da 7A. A professora pediu que os alunos se
sentassem em dupla e avisou que eles fariam um teste. Distribuiu os testes e
explicou que as respostas tinham que ser dadas em Português. O texto falava
sobre Koalas.
Um aluno perguntou o que é Koala e, em um tom irônico, ela falou:
“Vocês não sabem o que é Koala?” E explicou que é um “bichinho”.
Falou com os alunos que ela precisaria sair para conversar com a mãe de
uma aluna e que eu ficaria tomando conta. Os alunos ficaram quietos, mas por três
vezes tive que pedir a alguns alunos que virassem para a frente ou que parassem
de conversar.
Uma mulher entra na sala. Pela conversa que ouvi na sala dos professores,
pressuponho que seja Cláudia, outra diretora. Ela chama a atenção da turma pela
quantidade de advertências que os alunos levaram. Fala com uma aluna que ela
está suspensa, avisa a Marcela que a mãe dela está no colégio e que quando ela
terminar o teste é para juntar o material para ir embora junto com a mãe. Pede à
turma para prestar atenção aos modos de agir, antes que o colégio tome outras
providências. Ela sai da sala e os alunos continuam o teste.
Alguns alunos me chamaram e perguntaram os significados de algumas
palavras, demonstrando que as técnicas de leitura empregadas não foram
satisfatórias. Todavia, acho que os alunos conseguiram entender a idéia central do
texto.
Às 10:20 h a professora volta para a sala. Alguns alunos entregam o teste e
ficam andando pela sala, enquanto outros terminam.
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PESQUISADORA: Fernanda Henriques Dias NE006
DATA: 02 de setembro de 2004 (Quinta-feira)
HORA INÍCIO: 06:55 h HORA TÉRMINO: 08:40 h
LOCAL: Escola Estadual João de Freitas
FENÔMENO: Aulas de Inglês das turmas 6B e 7A
Entrei na sala dos professores às 6:55 h, onde já se encontravam alguns
professores, inclusive a Mariana. Sentei e ela, cansada, comentou comigo: “Nossa,
tô sem coragem. Tô sem coragem para dar aula hoje.” E, depois de uma longa
pausa continuou: “Podia ter reunião comigo hoje! Tô sem coragem e ainda tenho
15 aulas hoje.”
Esperei um tempo e então pedi permissão para tirar fotos nas aulas e ela
disse que não tinha problema.
Fomos então para a sala. No corredor, a professora perguntou de onde eu
era e se eu estava morando em Juiz de Fora.
Às 7:10 h entramos na sala. A Mariana ficou em pé na frente da sala,
esperando silêncio, até 7:15 h. Duas alunas chegam atrasadas e ficam esperando
na porta da sala, até que a professora permite a entrada das mesmas.
A professora então explica que, no lugar da prova, os alunos terão que
fazer um trabalho. Avisa que a aula toda será usada para o trabalho mas que se
eles não terminarem, poderão entregar na quinta-feira seguinte.
Karina me perguntou se eu havia visto o trabalho e se estava difícil. Eu
respondi que não vi o trabalho. Ela perguntou meu nome e afirmou que eu vi o
trabalho mas que eu não queria falar.
Fabiana fala que está sem seu estojo e pede, aluno por aluno, um lápis ou
lapiseira emprestado (pede inclusive para mim).
A professora passa o trabalho no quadro, e os alunos copiam em silêncio,
parando, de vez em quando, para reclamar da quantidade de números.
Nuno: – São quantos abecedários?
Mariana: – É para fazer com atenção, que se aí for errando, vai perdendo
ponto.
a) 987
b) 321
c) 123
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136
d) 444
e) 555
f) 332
g) 222
h) 876
i) 654
j) 943
k) 866
l) 545
m) 323
n) 364
o) 149
p) 236
q) 344
r) 498
s) 700
t) 600
u) 918
v) 948
w) 815
x) 711
y) 612
z) 636
aa) 727
bb) 848
cc) 959
dd) 222
ee) 111
ff) 740
gg) 630
hh) 240
ii) 950
jj) 843
kk) 754
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137
ll) 963
mm) 632
nn) 854
oo) 733
pp) 621
qq) 510
rr) 189
ss) 158
tt) 117
uu) 162
vv) 643
ww) 458
A professora fez chamada e os alunos continuaram reclamando da
quantidade de exercícios.
Karina: – Ela passou o abecedário duas vezes quase!
Fernando: – É que ela quer lembrar a infância, de escrever de A a Z.
Professora, quem não acabar pode levar pra casa?
Mariana: – Pode
Fernando: – Então não vou fazer aqui não. Se pode levar pra casa...
A professora fica brava e chama a atenção da turma e fala que os alunos
são muito preguiçosos.
Os alunos ficam quietos, copiando ou resolvendo o exercício e só às vezes
um conversa com outro.
Observei então que a aluna surda também estava escrevendo.
A professora fala com os alunos: “Agora vocês vão servir de modelo” e
me avisa que eu posso tirar as fotos.
Os alunos continuam escrevendo e, depois das fotos, a professora comenta:
“Que falsidade, héin gente! O Nuno ficou até olhando para o caderno, coisa que
ele menos faz.”
Os alunos concordam e voltam a escrever. Às vezes, alguns alunos
conversam um pouco ou passam bilhetes uns para os outros.
A professora, então, chama a atenção de um aluno que está conversando e
pergunta se ele já acabou.
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Duas alunas que estão sentadas perto de mim nunca acabam de copiar os
números: cada vez que erram, arrancam a folha do caderno e começam a copiar de
novo, mesmo faltando apenas dez minutos para acabar a aula.
A professora mexe em seu celular e sai da sala.
Os alunos conversam um pouco e então Fernando pergunta pela
professora. Eles conversam alto e a professora, do lado de fora da sala, grita: “Eu
estou aqui, tá!”. Os alunos fazem silêncio e continuam escrevendo.
A professora volta para a sala e vai passando de mesa em mesa, olhando os
cadernos.
De início, ela pula a mesa da aluna surda, mas depois resolve olhar o
caderno dela e me avisa que a aluna surda está fazendo tudo “e certo”.
A professora pergunta para Fernando de onde ele é e qual a idade dele. Ele
diz que é de Maceió, que morou lá até os doze anos e que agora tem quinze anos.
A professora fala sobre Maceió. A aula acaba, ela junta o material e sai da
sala.
Ao chegar na sala da sétima série A, tivemos que esperar o outro professor
sair da sala. Entramos, então, às 7:55 h. A professora pede a um dos alunos para ir
buscar os livros de Inglês na biblioteca (que é uma das salas do segundo andar) e
distribuí-los entre os alunos. Ela sai da sala e avisa que vai passar exercícios na
sétima série C e que já volta.
Enquanto isso os alunos ficam conversando, andando pela sala e
lanchando. Só duas alunas ficam escrevendo, mas não dá para saber se tem
relação com a matéria. Depois de cinco minutos a professora volta e manda quem
ainda não terminou os exercícios da aula anterior, terminar. Quem já acabou, ela
manda “fazer três conjuntos de palavras (retiradas do texto) com os seguintes
segmentos: moradia, trabalho e alimentação” e escrever o que entenderam do
texto, quais informações conseguiram tirar e avisa: “não é para traduzir não,
héin!”.
Sai da sala novamente e vai para a sétima C. Os alunos ficam quietos,
fazendo os exercícios.
A professora volta e avisa que eu vou tirar fotos. Os alunos fazem pose e
depois fazem algumas piadinhas. Duas alunas de outra sala batem à porta e pedem
uma régua emprestada (e avisam que foi a professora de arte quem mandou). Os
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139
alunos reclamam que toda aula elas pedem alguma coisa emprestado e dizem que
é pretexto delas para verem o Mariano (um dos alunos da sala).
Uma aluna diz que está com preguiça e a professora manda ela deixar de
ser preguiçosa.
Os alunos ficam quietos fazendo os exercícios e, às vezes, um ou outro
conversa um pouco.
A professora então fala comigo que adora História. Eu falo que também
gosto mas que não tive bons professores de História no Ensino Fundamental. Ela
me pergunta se eu dou aula e eu falo que dou aula de Inglês instrumental em um
projeto da universidade.
Alguns alunos perguntam se o texto que eles têm que escrever é em Inglês.
Ela responde: “Não! Se você souber!”. Pergunta a uma aluna se ela já acabou e sai
da sala (vai na turma 7C). Alguns alunos conversam um pouco. A professora
volta, fala comigo o nome de dois professores do FPL (faculdade onde estudou) e
me pergunta se eu os conheço. Eu falo que não e ela então, voltando ao assunto
anterior, fala que eles deviam ensinar Inglês instrumental na aula de Didática,
porque ela não sabe nem o que é isso.
Uma aluna mostra para a professora fotos de atores, e a professora
comenta quais ela acha bonito. Uma das alunas fala que um ator é gostoso e a
professora fala que ela é muito nova para ficar usando este vocabulário. A turma
toda fica agitada, comentando sobre os atores. A professora pede silêncio, mas
não adianta.
Alguns alunos acabam e entregam os livros. A professora então fica
conversando com eles sobre signos (e diz que não acredita nisso), até a aula
acabar.
No corredor ela fala de novo que deviam ensinar Inglês instrumental nas
aulas de Didática e comenta: “Se pelo menos a gente ganhasse melhor e pudesse
trabalhar um pouco menos, aí a gente podia fazer uns cursos”.
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140
PESQUISADORA: Fernanda Henriques Dias NE007
DATA: 09 de setembro de 2004 (Quinta-feira)
HORA INÍCIO: 06:55 h HORA TÉRMINO: 10:30 h
LOCAL: Escola Estadual João de Freitas
FENÔMENO: Aulas de Inglês das turmas 6B e 7A
No caminho para o colégio, Marlene me grita e começa a conversar
comigo. Fala que vai ter prova de História hoje, e que ela estudou: “decorei o livro
todo!”. Perguntei quais são as matérias que ela mais gosta e menos gosta. Ela
disse que a melhor matéria é Matemática e que ela tira notas boas em Matemática
e que a pior é Português porque ela não entende nada.
Na sala dos professores, uma professora, indignada, mostra a prova de um
aluno toda escrita no verso. Os professores vêem a prova, ela explica que o que
está escrito em letras maiores é o apelido do aluno. Embaixo, vem escrito na
prova: “(enfia o pau no cú deles) dos professores”.
O professor de física comenta: “Ainda é burro! Não sabe nem que essa
palavra não tem acento” e depois de um tempo fala “O lugar de se consertar ele é
na CERESP
1
.”
Os professores lêem um aviso para uma reunião no sábado e então
reclamam.
A Mariana me mostra alguns textos em Inglês e me pergunta qual que ela
já deu nas sexta e sétima séries.
Vamos então para a 6B.
A professora passa recolhendo os trabalhos e comenta: “É impressionante
como vocês falam ‘Não fiz não’ na maior cara de pau!”.
Alguns alunos chegam atrasados e ela deixa-os entrarem. O Fernando
comenta: “É a primeira vez que eu chego atrasado e a professora deixa eu entrar”.
A professora faz a chamada e mais um aluno chega atrasado.
Ela pede aos alunos para sentarem em duplas para trabalhar com os livros,
porque não tem livro o suficiente para todos os alunos.
A aluna surda vai até a mesa da professora e “conversa” alguma coisa com
ela, que não dá para saber o que é.
1
Centro de Remanejamento de Presos
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141
Karina fala “oi” comigo. A professora pede aos alunos para abrirem o livro
na página 86 e pergunta, mostrando o texto da página: “Eu pedi para passar esse
texto para o caderno, não pedi?” Os alunos respondem que sim e um deles afirma:
“Era para traduzir também professora.”
Mariana: – Abram o texto no caderno também.
Fernando: – Eu não terminei. Vou ter que copiar.
A professora imita o sotaque do Fernando e passa olhando quem copiou.
Fabiana me pergunta que dia é hoje.
Nuno: – É para traduzir também?
Mariana: – Yes. Vou dar um tempinho para terminar.
Um aluno avisa que está faltando páginas no livro. A professora reclama e
fala que acabou de arrumar os livros: “Vocês rasgam esses livros, vocês é que
saem prejudicados.” E vai à biblioteca procurar as páginas do livro. Enquanto isso
os alunos ficam conversando baixo.
A bibliotecária entra na sala e chama a atenção dos alunos. Avisa que eles
vão acabar ficando sem livros. Fala que vai passar nas outras salas, chamando a
atenção dos outros alunos também.
A professora pergunta se alguém não fez o teste. Um aluno fala que não
fez e ela avisa que vai pedir à próxima professora (de Ciências) para deixá-lo
fazer a prova no horário da aula dela.
Chama a atenção de quatro alunas que estão conversando e olha se elas já
acabaram. Manda elas traduzirem e passa na mesa da aluna surda e tenta explicar
que é para ela traduzir o texto.
Os alunos ficam traduzindo em silêncio e, quando alguém conversa, a
professora chama a atenção.
A aula acaba e a professora manda quem não terminou terminar em casa.
Vamos para a 7A. A professora pede a um dos alunos para buscar os livros
na biblioteca e distribuir para os alunos. O aluno começa a distribuir os livros e os
outros reclamam que não é aquele livro. A professora pede dois alunos que não
tinham feito a prova para sentarem juntos para fazerem a prova. Pede a outra
aluna para ir à biblioteca trocar os livros e avisa que enquanto isso ela vai na 7C
passar atividades. Os alunos ficam conversando.
Marlene distribui os livros e me oferece um. Os alunos continuam
conversando e andando pela sala. Os dois alunos que estão fazendo prova
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142
perguntam para a turma a resposta de algumas questões. A Karina pergunta se eu
não vou fazer nada e porque que eu não tinha deixado a turma colar e estava
deixando eles colarem. Eu expliquei que naquele dia a professora tinha pedido
para eu ficar olhando a turma para ela e que hoje ela não tinha falado nada.
Às 8:05 h a professora volta. Pede aos alunos para sentarem e fazerem
silêncio.
Aluno: – Você já corrigiu a prova?
Mariana: Não.
Aluno: – E o trabalho de números?
Mariana: Não.
Os alunos reclamam e a professora pede silêncio. Pergunta em que questão
ela parou (alunos: “24”) e pergunta o que ela pediu para fazer. Corrige oralmente
o exercício do livro. Uma aluna pede para ela passar a resposta no quadro e ela faz
cara de ironia.
Como o texto fala sobre vampiros, os alunos pedem para ela passar o filme
“Drácula”. Os alunos ficam conversando e sugerindo filmes. A professora decide
que vai passar “Entrevista com o Vampiro” e pergunta para as alunas se é nesse
filme que conta a vida inteira do drácula. A professora pede silêncio. Os alunos
continuam discutindo sobre o filme e a professora fala que porque eles falam
muito, ela já não tinha dado música para eles no semestre anterior e que se eles
continuassem ela também não ia passar filme.
A professora vai para a 7C e deixa os alunos à toa. Manda eles não
conversarem e deixa um aluno anotando. A aula acaba, a professora volta, recolhe
o material e sai da sala.
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143
PESQUISADORA: Fernanda Henriques Dias NE008
DATA: 13 de setembro de 2004 (Segunda-feira)
HORA INÍCIO: 07:00 h HORA TÉRMINO: 08:30 h
LOCAL: Escola Estadual João de Freitas
FENÔMENO: ?
Fui ao colégio para assistir à aula posterior à de Inglês. Entrei na sala dos
professores e logo depois de mim entrou a Marcele. Ela avisou que uma
professora de Matemática não ia dar aula e que a professora de Inglês também não
porque estava doente. Os professores rearrumaram os horários e decidiram quem
ia dar aula no lugar de quem. Fiquei esperando a Joana chegar, então pedi
permissão para assistir às aulas de Ciências e de História na quinta feira.
Procuramos os professores, mas como não os encontramos, Joana disse que ela
conversaria com eles e que eu podia voltar na quinta que eles já estariam sabendo.
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144
PESQUISADORA: Fernanda Henriques Dias NE009
DATA: 16 de setembro de 2004 (Quinta-feira)
HORA INÍCIO: 07:00 h HORA TÉRMINO: 07:15 h
LOCAL: Escola Estadual João de Freitas
FENÔMENO: ?
Fui ao colégio assistir às aulas combinadas com a Joana. Procurei os
professores de Ciências e História e eles disseram que eu não poderia assistir às
aulas, porque a Joana não havia conversado com eles.
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145
PESQUISADORA: Fernanda Henriques Dias NE010
DATA: 20 de setembro de 2004 (Segunda-feira)
HORA INÍCIO: 06:55 h HORA TÉRMINO: 11:25 h
LOCAL: Escola Estadual João de Freitas
FENÔMENO: Aulas de Inglês e Português das turmas 6B e 7A
A professora chega na turma 6B e avisa que eles vão para outra sala. Leva
os alunos para a sala de vídeo (uma sala com vídeo, TV, uma estante com várias
fitas de vídeo e, na parede, vários cartazes com pensamentos enfeitam a sala). Eles
ficam agitados e conversam muito.
A professora pede silêncio e avisa que eles vão assistir a um documentário
sobre o conde Drácula e começa o filme. O filme é legendado e o som é
impossível de ouvir, já que o filme é antigo.
A maioria dos alunos presta atenção, mas alguns conversam. A professora
faz a chamada durante o filme.
Em uma parte do filme, a professora assusta e grita. Os alunos riem dela.
Depois, a professora troca uma aluna que está conversando de lugar.
O horário da aula acaba, e a professora avisa que vai terminar de passar o
documentário na próxima aula.
Os alunos voltam para a sala. Como a aula posterior seria a de Português,
procurei a Joana e ela pediu permissão à professora para eu assistir à aula da 6B e
também conversou com a professora de Português da 7A (já que são professoras
diferentes).
A professora da 6B fala que eu posso assistir à aula dela, mas que da
próxima vez, se a Joana for levar algum estagiário para ela, ela só vai aceitar se o
estagiário for dar aula para ela e fala que já cansou de receber estagiário para ficar
só olhando.
A professora entra na sala e pergunta se alguém tinha faltado aula no dia
da prova. Como ninguém respondeu, ela repete a pergunta. Da terceira vez que ela
pergunta, um aluno fala que não fez prova e ela então começa a brigar com a
turma, que eles são muito distraídos e relaxados e que ele havia perdido prova e
nem havia procurado por ela. O aluno explica que teve problemas em casa, e ela
continua chamando a atenção. O aluno diz que depois a mãe dele conversaria com
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146
a professora e pediria para ela dar outra prova para ele. A professora então separa
o aluno e dá uma prova para ele ir fazendo durante a aula.
Fala que as notas não foram boas e que eles precisam estudar mais. Chama
atenção do Nuno, que está conversando e fala que conversa muito e que se ele
desse um pio durante a aula ela o mandaria para fora de sala.
Manda os alunos abrirem o livro na página 169 e pede um aluno para ler o
exercício (que ela havia mandado fazer em casa). O aluno fala que não fez e ela
então pergunta quem fez. Como só três alunos haviam feito, a professora fica
nervosa e fala que, como castigo, além de terem que fazer o exercício, eles teriam
que copiar o enunciado e as perguntas todas.
Os alunos ficam quietos, em silêncio. A professora faz a chamada e fala
que é para eles irem copiando soltando linhas, para depois responderem. A
professora sai da sala e os alunos ficam em silêncio copiando. A professora volta e
uma aluna de outra sala entrega uma prova para ela. Ela corrige a prova.
Um aluno vai até à mesa da professora. Alguns alunos conversam. Um
aluno pergunta a data. Um aluno sai da sala e volta logo depois. O Nuno conversa
com os alunos do lado dele e com a professora, e ela não faz nada. Ela pede um
corretivo emprestado e fica escrevendo (parece que corrigindo provas da outra
turma).
A professora passa de mesa em mesa olhando os cadernos. Um aluno a
chama e ela explica o exercício para ele.
A professora fala com ironia que a sala é quieta “Qualquer coisa a gente
tira meia dúzia daqui que melhora mais ainda.” Os alunos continuam copiando.
Alguns conversam. A professora sai da sala. Os alunos ficam conversando, até a
professora voltar.
Um aluno pede para ir ao banheiro e a professora deixa. Ela avisa que vai
pedir um trabalho sobre provérbios e ditados populares. A professora sai da sala e
depois de um tempo volta. Fala que vai corrigir os exercícios e os alunos pedem
mais tempo, e ficam quietos, copiando.
A professora dita as notas da prova e diz que eles vão receber as provas
depois. Fala que as turmas 6A e 6C estão adiantadas, principalmente a 6C. Os
alunos reclamam que tudo é a 6C e perguntam sobre as notas das outras salas. Os
alunos falam que a turma deles é a melhor porque foi a única que teve alguém que
fechou a prova. A professora pede silêncio, mas eles continuam conversando.
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147
O aluno que fechou a prova fala que chutou bem.
A professora avisa que o dever de casa vai ser copiar um texto, em castigo
aos que não fizeram os exercícios. Pede a eles para abrirem o livro e mostra o
texto de duas páginas que será o dever. Chama atenção dos alunos que estão
conversando e eles ficam quietos.
Fala que o aluno que fechou a prova é muito bom, mas que a letra dele é
horrível. Fala que a prova foi tirada de um livro de quinta série e que muita gente
tinha que ter fechado.
Os alunos conversam e reclamam do texto que terão que copiar. A
professora dita mais exercícios, até dar 9:25 h, quando as outras turmas foram
sendo liberadas e não foi possível continuar ditando, por causa do barulho.
Às 9:55 h, Mariana levou os alunos da 7A para a sala de vídeo. Antes de
começar o documentário (o mesmo da sexta série), ela muda uma aluna de lugar.
Avisa aos alunos que eles vão assistir a um documentário sobre o conde Drácula e
que depois vão fazer um trabalho sobre o documentário para o quarto bimestre.
Fala um pouco sobre o documentário.
A professora rebobina a fita e os alunos pedem para apagar a luz. A
professora deixa, mas avisa que se eles conversarem ela vai acender a luz. O filme
começa e ela faz chamada.
Os alunos ficam inquietos, conversam, olham para os lados, reclamam. A
professora fala que quem conversar vai para a diretoria.
Uma aluna reclama da imagem tremendo (e que agora estava bem pior do
que na aula da sexta série).
Outra turma desce para a sala de vídeo e fica conversando/gritando do lado
de fora. Os alunos prestam atenção ao que está acontecendo do lado de fora. Os
outros alunos voltam para a sala de aula, gritando. É impossível ouvir o vídeo. Os
alunos ficam quietos.
Passa uma turma gritando do lado de fora e os alunos prestam atenção na
turma. A professora passa o vídeo até acabar a aula e avisa que vai continuar na
próxima aula.
A professora de Português chega às 10:40 h na sala e só tem quatro alunos
na sala. Todos os outros estão no corredor tomando sol. A professora chama os
alunos para a sala e eles entram gritando e dois alunos brigando. A professora fala
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148
que vai reclamar com a Marcele e muda alguns alunos de lugar. Manda eles
assentarem para fazerem a prova e eles falam que a prova é amanhã.
A professora pára na porta da sala e fala: “Daqui a pouco vai alguém para
fora!” Avisa que hoje será a prova de interpretação e que a parte de gramática fica
para a próxima aula. Os alunos continuam reclamando que a prova não é hoje.
A professora vai para a frente da sala e fica esperando. Uma aluna chama a
atenção dos outros: “Oh moçada vão calar a boca aí!”.
Às 10:50 h a professora distribui as provas e avisa que é para fazer até a
letra f, de caneta.
Um dos alunos comenta: “Nossa, não tô entendendo nada desse poema
complicado”.
E o outro, num tom irônico completa: “Nossa, lindo o poema”.
Finalmente os alunos fazem silêncio, mas sempre alguém faz um
comentário ou uma pergunta sobre a prova.
Às 11:00 h um aluno avisa que acabou. Vários alunos acabam e ficam à
toa na sala, conversando. A professora inicialmente chama a atenção, mas depois
começa a conversar com alguns alunos e aí a sala toda conversa. Os alunos
guardam o material e ficam prontos para ir embora. Eles pedem à professora para
recolher a prova. Ela olha os trabalhos de alguns alunos, enquanto eles andam pela
sala e conversam.
Às 11:20 h ela recolhe as provas e libera os alunos.
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ANEXO 3
Transcrição 1
01
02
Fernanda é:: só queria saber porque você escolheu (.) fazer o
curso de le
tras.
03
04
05
06
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08
09
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Mariana eu sempre gostei de:: das matérias, né? português,
inglês (.) e:: eu pensei muito >no mercado de trabalho
em juiz de fora também
<. quando eu entrei no curso de
letras, eu entrei
:: pensando mais no mercado de
trabalho, do que (nas próprias) matérias, mas eu me
identifiquei. ado
:ro, gosto mesmo de dar aula. mas eu
pensei, eu não queria sair de juiz de fora e:: a
princípio eu tinha vontade de fazer: comunicação (.) e
eu achei que o mercado aqui é muito seria muito
>difícil< (.) pra comunicação. então eu pensei alguma
coisa nessa área
que (.) me desse um: mercado de
trabalho razoável ( ).
15
16
Fernanda e você já tinha tido alguma experiência com:: a sala
de au
la?
17
18
Mariana não:. antes de escolher o curso de letras não. eu tenho
(.) alguns parentes que são professores.
19 Fernanda humhum
20
21
22
Mariana entendeu? então já tinha assim um contato
.
conhecia, é:: já tinha uma idéia de como seria - minha
rotina
23
24
Fernanda humhum. e:: como você escolheu os lugares que você ia
trabalhar:::? como é que foi
?
25
26
27
28
29
30
31
32
33
34
35
Mariana ah não. isso: foi de acordo com o que foi: surgindo
assim. hoje eu já é, já é uma escolha. hoje o lugar
que eu trabalho eu que escolhi mes
mo. mas a: a
princípio não
. o que foi aparecendo a gente vai pegando
- tudo. e depois
quando eu passei no concurso do estado
e da prefeitura, aí você fica mais(.) é
:: mais à
vontade. cê pode escolher, né? aí eu escolhi. é::
geralmente a gente escolhe por informações “ah, já
trabalhei em tal colégio, é bom, é: os alunos são
bons.” é: o público, né, o tipo de aluno trabalhado
bom, é tranqüilo.
36 Fernanda e você dá aula num colégio particular, é:: estadual e::
37 Mariana tem o da prefei[tura.
38
39
Fernanda [da prefeitura. é: e qual deles dá mais
apoio ao inglês (como) matéria?
40 (3.0)
41
42
Mariana eu acho que o municipal. pelo menos na escola que eu
trabalho.
43 Fernanda humhum
44 Mariana eu acho que::[
45
46
Fernanda [de todas elas, do: do municipal, dão
apoio, é?
47
48
Mariana não, não, é. (.) depende da escola, assim. eu acho que
não é a rede
que define isso.
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49 Fernanda humhum
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56
57
Mariana entendeu? eu acho que é a
escola. eu trabalho em três
escolas da prefeitura. uma me dá muito apoio. as
outras, (.) indiferente. mas aí eu acho também que
todas as matérias são indiferentes. a escola não dá
apoio para matéria nenhuma então, é. eu acho, que eu
sinto isso, entendeu? a escola que é boa que dá apoio
mes
mo quer dá apoio pra, pra qualquer áreas. são:
diferentes.
58 Fernanda [humhum
59 Mariana [eu acho que depende da escola, da direção.
60 Fernanda e em relação aos alunos?
61 Mariana qual é o melhor?
62 Fernanda não, como que eles reagem à matéria:?
63
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65
66
67
68
69
Mariana eu acho que inglês é uma, é: mais ou menos assim. (.)
tem aluno que gosta muito e tem aluno que não gosta
muito
também. é difícil um aluno a tanto faz, >tem
aluno que gosta muito e tem aluno que DETES
TA mesmo<.
mas geralmente eu não tenho problema assim de (.) “ah
não vou fazer de jeito nenhum”, “ah, num quero de jeito
nenhum”.
70 Fernanda humhum
71
72
73
Mariana não tenho grandes problemas não. ( ) mais pro natural
mesmo. tem quem gosta, tem quem não gosta, como todas
as matérias.
74 Fernanda e os pais? eles têm alguma influência? ou::
75
76
77
78
Mariana eu acho que os pais (.) dão pouco
valor ao inglês, dão
pouco é:: apoio em casa. às vezes eu precisaria de mais
(.) porque eles são mais >preocupados com< a
matemá
tica, com português:.
79
80
Fernanda humhum. então você acha que eles dão apoio pras outras
matérias [e não dão pro inglês.
81
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85
86
87
88
89
90
Mariana [eu acho que sim. eu acho que eles não se
preocupam muito
. só quando a nota do aluno começa a
cair que eles olham o boletim. “>uai<, inglês
? mas,
inglês
? matéria tão boba, né? perdendo nota?” aí eles
(.) vêm aqui (.) como aconteceu hoje, né? o pai da
garota da sétima série, a mãe veio, a menina tirou dois
no segundo bimestre, ago
ra que ela tá vindo aqui (.)
pra vê porque tirou dois. >quer dizer< não acompanhou
prova
, não acompanhou caderno, não tem noção que a
menina não tá fazendo nada=
91 Fernanda =desde o início, né?
92 Mariana pois é.
93
94
Fernanda e:: como que os alunos reagem à matéria? que tipo de
matéria que eles gostam mais::?
95
96
97
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99
100
101
Mariana eles não, o que eles gostam menos eu acho que é sem
dúvida a gramática. (.) até texto eles gos
tam bem de
tentar traduzir e quando eles conseguem começar a
entender um texto
eu vejo que eles gostam, que acham
que é interessante:. eles gostam de algumas atividades
assim eu acho que de vez em quando eles preferem fazer
umas atividades mais lúdica também.
102 Fernanda (como?)
103
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106
107
Mariana é com mú
sica para pegar um pouco de pronúncia ou então
pegar a gramática e trabalhar dentro de uma mú
sica. é::
eu faço às vezes, na quinta série por exemplo, é:: pra
aprender vocabulário, então, eu faço tipo um café da
manhã, eles trazem as comidas que é pra aprender
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vocabulário
, e isso sempre dá resultado assim, pra eles
estudarem
o vocabulário em casa, vim sabendo o que que
tem na escola pública, isso eu acho interessante de vez
em quando e colocar isso pra dar um estímulo. se ficar
só por conta de gramática, gramática, >gramática<,
essas crianças gostam (.) sempre que fazem melhor. a
gramática é: mais (formal).
115
116
Fernanda aí quando você faz esse tipo de atividade eles costumam
praticar a fala também.
117
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124
Mariana é. a fala também. a fala
em colégio público do estado
ela é muito
difícil por causa do número de alunos em
sala. então pra falar eu (.) quando a gente vai
trabalhar a fala eu perco muitas
aulas. porque o aluno
não pode falar uma vez só, (.) não adianta nada. então
às vezes eu perco muitas
aulas. então a fala,
principalmente no estado
, que as salas são muito
grandes é muito
difícil de trabalhar.
125 Fernanda qual é o número de alunos (geralmente)?
126
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Mariana trinta e cinco
, tem turma de quarenta, >tem turma até
de quarenta e cinco< (.) nessas escolas. (.) na, no
particular
, eu já tive turma de setenta e oito alunos.
(.) o rendimento é::, é absurdo, >assim< quase nenhum.
com setenta e oito alunos, cê tem aluno de todos os
níveis
, (.) é muito difícil você conseguir muito (.)
(os interesses) de todos
assim. na maioria ( ). e a
fala fica prejudicada. eu acho que a: a gramática é que
funciona mais com um número grande né? que a gramática
não tem problema (.) e o, o texto também eu acho que
funciona. eu trabalho com um grupo
de texto um ajuda o
outro e vejo que o vocabulário vai
melhorando. no
início eles pegam um texto de inglês, no início do ano,
e quase
não sai nada. no meio do ano e no final do ano
(eles não precisam de ajuda em nada) do vocabulário.
eles já vão passando a entender pelo contexto
, já vão,
(.) assim, (.) pelo menos é::, é ter uma idéia do que
que o texto fala sozinho, sem ter:
o
tanta influência
minha
o
.
145
146
Fernanda humhum. e::, em relação ao listening, você trabalha
com a música mesmo?
147
148
Mariana é. mais só música (.). a gente não tem muito material
né.
149 Fernanda humhum.
150 Mariana o que peca aí é o material.
151 Fernanda é porque, o li:vro é emprestado, né?
152 Mariana é.
153
154
Fernanda e no caso de fita você que tem que conseguir, ou a
[escola tem alguma?
155 Mariana [é. só se eu conseguir. não. [a escola não tem nada.=
156 Fernanda [não tem:
157
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166
Mariana =é:. eu acredito que: esses livros são muitos antigos,
né? pode ser até que eles (.) tivessem
fita, mas só não
existe
mais. se perde, não tem muito mais, não tem o
material na escola. a escola não tem
material. aí eu
peguei e comprei o material com
os alunos. turmas
diferentes, níveis
diferentes, muitos alunos, (.) então
esse material para eu fornecer
todo o material é uma
coisa difícil
se a escola não tiver como. aí dá pra
entender como a gente não consegue trabalhar. (.) não
tem cd:
167 Fernanda você sabe de onde os alunos vêm? de quais bairros?
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Mariana aqui (.) nesse colégio tem alunos que moram por aqui,
no centro mesmo, perto, e aqui
, por ser escola central
tem, nós temos vários
bairros da cidade. (.) entendeu?
171 Fernanda não tem uma área definida então [não?
172 Mariana [não.
173 Fernanda tem escolas estaduais que têm bairros definidos.
174
175
176
Mariana é. mas no bairro geralmente é exclu é: o aluno é do
bairro, né? mas numa escola central teria vários
bairros.
177 Fernanda tá bom. (.) obrigada. (.) só isso.
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153
ANEXO 4
Transcrição 2
Transcrição separada em trechos de forma a facilitar, visualmente, a análise.
01
02
Fernanda
é:: só queria saber porque você escolheu (.) fazer o
curso de le
tras.
03
04
Mariana
eu sempre gostei de:: das matérias, né? português,
inglês (.)
05
06
e:: eu pensei muito >no mercado de trabalho em juiz de
fora também
<.
07
quando eu entrei no curso de letras,
08
eu entrei:: pensando mais no mercado de trabalho,
09
do que (nas próprias) matérias,
10
mas eu me identifiquei.
11
ado:ro, gosto mesmo de dar aula.
12
mas eu pensei,
13
eu não queria sair de juiz de fora e::
14
a princípio eu tinha vontade de fazer: comunicação
15
16
(.) e eu achei que o mercado aqui é muito seria muito
>difícil< (.) pra comunicação.
17
então eu pensei alguma coisa nessa área
18
que (.) me desse um: mercado de trabalho razoável ( ).
19
20
Fernanda
e você já tinha tido alguma experiência com:: a sala de
au
la?
21
Mariana
não:.
22
antes de escolher o curso de letras não.
23
eu tenho (.) alguns parentes que são professores.
24
Fernanda
humhum
25
Mariana
entendeu?
26
então já tinha assim um contato.
27
já conhecia, é::
28
já tinha uma idéia de como seria - minha rotina
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29
30
Fernanda
humhum. e:: como você escolheu os lugares que você ia
trabalhar:::? como é que foi
?
31
Mariana
ah não.
32
isso: foi de acordo com o que foi: surgindo assim.
33
hoje eu já é,
34
já é uma escolha.
35
hoje o lugar que eu trabalho eu que escolhi mesmo.
36
mas a: a princípio não.
37
o que foi aparecendo a gente vai pegando - tudo.
38
39
e depois quando eu passei no concurso do estado e da
prefeitura,
40
aí você fica mais(.) é:: mais à vontade.
41
cê pode escolher, né?
42
aí eu escolhi. é::
43
geralmente a gente escolhe por informações
44
“ah, já trabalhei em tal colégio,
45
é bom, é: os alunos são bons.”
46
é: o público, né,
47
o tipo de aluno trabalhado
48
bom, é tranqüilo.
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49
Fernanda
e você dá aula num colégio particular, é:: estadual e::
50
Mariana
tem o da prefei[tura.
51
52
Fernanda
[da prefeitura. é: e qual deles dá mais
apoio ao inglês (como) matéria?
53
(3.0)
54
Mariana
eu acho que o municipal.
55
pelo menos na escola que eu trabalho.
56
Fernanda
humhum
57
Mariana
eu acho que::[
58
59
Fernanda
[de todas elas, do: do municipal, dão
apoio, é?
60
Mariana
não, não, é. (.)
61
depende da escola, assim.
62
eu acho que não é a rede que define isso.
63
Fernanda
humhum
64
Mariana
entendeu?
65
eu acho que é a escola.
66
eu trabalho em três escolas da prefeitura.
67
uma me dá muito apoio
68
as outras, (.) indiferente.
69
70
mas aí eu acho também que todas as matérias são
indiferentes.
71
a escola não dá apoio para matéria nenhuma então, é.
72
eu acho, que eu sinto isso,
73
entendeu?
74
75
a escola que é boa que dá apoio mesmo quer dá apoio pra,
pra qualquer á
reas.
76
são: diferentes.
77
Fernanda
[humhum
78
Mariana
[eu acho que depende da escola, da direção.
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79
Fernanda
e em relação aos alunos?
80
Mariana
qual é o melhor?
81
Fernanda
não, como que eles reagem à matéria:?
82
Mariana
eu acho que inglês é uma,
83
é: mais ou menos assim. (.)
84
tem aluno que gosta muito
85
e tem aluno que não gosta muito também.
86
é difícil um aluno a tanto faz,
87
>tem aluno que gosta muito
88
e tem aluno que DETESTA mesmo<.
89
mas geralmente eu não tenho problema assim de (.)
90
“ah não vou fazer de jeito nenhum”,
91
“ah, num quero de jeito nenhum”.
92
Fernanda
humhum
93
Mariana
não tenho grandes problemas não.
94
( ) mais pro natural mesmo.
95
tem quem gosta,
96
tem quem não gosta,
97
como todas as matérias.
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98
Fernanda
e os pais? eles têm alguma influência? ou::
99
Mariana
eu acho que os pais (.)
100
dão pouco valor ao inglês,
101
dão pouco é:: apoio em casa.
102
às vezes eu precisaria de mais (.)
103
104
porque eles são mais >preocupados com< a matemática, com
português
:.
105
106
Fernanda
humhum. então você acha que eles dão apoio pras outras
matérias [e não dão pro inglês.
107
Mariana
[eu acho que sim.
108
eu acho que eles não se preocupam muito.
109
110
só quando a nota do aluno começa a cair que eles olham o
boletim.
111
“>uai<, inglês?
112
mas, inglês?
113
matéria tão boba, né?
114
perdendo nota?”
115
eles (.) vêm aqui (.)
116
como aconteceu hoje, né?
117
o pai da garota da sétima série,
118
a mãe veio,
119
a menina tirou dois no segundo bimestre,
120
agora que ela tá vindo aqui (.)
121
pra vê porque tirou dois.
122
>quer dizer<
123
não acompanhou prova,
124
não acompanhou caderno,
125
não tem noção que a menina não tá fazendo nada=
126
Fernanda
=desde o início, né?
127
Mariana
pois é.
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128
129
Fernanda
e:: como que os alunos reagem à matéria? que tipo de
matéria que eles gostam mais::?
130
Mariana
eles não,
131
132
o que eles gostam menos eu acho que é sem dúvida a
gramática. (.)
133
até texto eles gostam bem de tentar traduzir
134
e quando eles conseguem começar a entender um texto
135
eu vejo que eles gostam,
136
que acham que é interessante:.
137
eles gostam de algumas atividades assim
138
139
eu acho que de vez em quando eles preferem fazer umas
atividades mais lúdica também.
140
Fernanda
(como?)
141
Mariana
é com música para pegar um pouco de pronúncia
142
ou então pegar a gramática
143
e trabalhar dentro de uma música. é::
144
eu faço às vezes,
145
na quinta série por exemplo, é::
146
pra aprender vocabulário, então,
147
eu faço tipo um café da manhã,
148
eles trazem as comidas que é pra aprender vocabulário,
149
e isso sempre dá resultado assim,
150
pra eles estudarem o vocabulário em casa,
151
vim sabendo o que que tem na escola pública,
152
isso eu acho interessante de vez em quando
153
e colocar isso pra dar um estímulo.
154
155
se ficar só por conta de gramática, gramática,
>gramática<,
156
essas crianças gostam (.)
157
sempre que fazem melhor.
158
a gramática é: mais (formal).
159
160
Fernanda
aí quando você faz esse tipo de atividade eles costumam
praticar a fala também.
161
Mariana
é. a fala também.
162
a fala em colégio público do estado
163
164
ela é muito difícil por causa do número de alunos em
sala.
165
então pra falar eu (.)
166
quando a gente vai trabalhar a fala
167
eu perco muitas aulas.
168
porque o aluno não pode falar uma vez só,
169
não adianta nada.
170
então às vezes eu perco muitas aulas.
171
então a fala,
172
173
principalmente no estado, que as salas são muito
grandes
174
é muito difícil de trabalhar.
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159
175
Fernanda
qual é o número de alunos (geralmente)?
176
Mariana
trinta e cinco, tem turma de quarenta,
177
178
>tem turma até de quarenta e cinco< (.) nessas escolas.
(.)
179
na, no particular,
180
eu já tive turma de setenta e oito alunos. (.)
181
(.) o rendimento é::, é absurdo,
182
>assim< quase nenhum.
183
184
com setenta e oito alunos, cê tem aluno de todos os
níveis
, (.)
185
é muito difícil você conseguir muito (.)
186
(os interesses) de todos assim. na maioria ( ).
187
e a fala fica prejudicada.
188
189
eu acho que a: a gramática é que funciona mais com um
número grande né?
190
que a gramática não tem problema (.)
191
e o, o texto também eu acho que funciona.
192
eu trabalho com um grupo de texto um ajuda o outro
193
e vejo que o vocabulário vai melhorando.
194
no início eles pegam um texto de inglês,
195
no início do ano,
196
e quase não sai nada.
197
198
no meio do ano e no final do ano (eles não precisam de
ajuda em nada) do vocabulário.
199
eles já vão passando a entender pelo contexto,
200
já vão, (.) assim, (.) pelo menos é::,
201
é ter uma idéia do que que o texto fala sozinho,
202
sem ter:
o
tanta influência minha
o
.
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203
204
Fernanda
humhum. e::, em relação ao listening, você trabalha
com a música mesmo?
205
Mariana
é. mais só música (.).
206
a gente não tem muito material né.
207
Fernanda
humhum.
208
Mariana
o que peca aí é o material.
209
Fernanda
é porque, o li:vro é emprestado, né?
210
Mariana
é.
211
212
Fernanda
e no caso de fita você que tem que conseguir, ou a
[escola tem alguma?
213
Mariana
[é. só se eu conseguir. não. [a escola não tem nada.=
214
Fernanda
[não tem:
215
216
Mariana
=é:. eu acredito que: esses livros são muitos antigos,
né?
217
pode ser até que eles (.) tivessem fita,
218
mas só não existe mais.
219
se perde,
220
não tem muito mais,
221
não tem o material na escola.
222
a escola não tem material.
223
aí eu peguei e comprei o material com os alunos.
224
turmas diferentes,
225
níveis diferentes,
226
muitos alunos, (.)
227
228
então esse material para eu fornecer todo o material é
uma coisa difícil
229
se a escola não tiver como.
230
231
aí dá pra entender como a gente não consegue trabalhar.
(.)
232
não tem cd:
233
Fernanda
você sabe de onde os alunos vêm? de quais bairros?
234
235
Mariana
aqui (.) nesse colégio tem alunos que moram por aqui, no
centro mesmo, perto,
236
237
e aqui, por ser escola central tem, nós temos vários
bairros da cidade. (.)
238
entendeu?
239
Fernanda
não tem uma área definida então [não?
240
Mariana
[não.
241
Fernanda
tem escolas estaduais que têm bairros definidos.
242
Mariana
é. mas no bairro geralmente é exclu é:
243
o aluno é do bairro, né?
244
mas numa escola central teria vários bairros.
245
Fernanda
tá bom. (.) obrigada. (.) só isso.
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