PEDRINHO - Viva a adesão!
PANTALEÃO (Apontando para Pedrinho, Benjamim e Juca Sá.) - Aqui estão estes senhores: três
estudantes, isto é, três homens do futuro! Os moços que a pátria contempla com alguma esperança, que vivem
mais em contato do que nós com a literatura, que são da corte, que o digam: Meninos... mancebos! em algum
dos que aqui estão achais uma fisionomia que indique as longas noites de insônia passadas na companhia
amiga de um bom livro?
PEDRINHO (A Benjamim e Juca Sá.) - Vamos procurar! (Examinam, cada um de seu lado, as caras
dos circunstantes e voltam a seus lugares. O Alferes Andrade fica muito despeitado.) O senhor vigário é o que
tem a melhor cara
BENJAMIM - Nem uma olheira!
JUCA SÁ - Nada!
PANTALEÃO - E, caramba, isto é uma pouca vergonha!... (Com o caramba! de Pantaleão alguns se
assustam. Góis & Companhia, que estavam a cochilar, caem sentados. O alferes desembainha
instintivamente a espada. Restabelece-se o silêncio.) A fim de descobrir entre nós homens de talento foi que
instituímos este concurso. Todos, sem distinção alguma, serão igualmente admitidos. (Bebe outro gole
d’água.) São três as provas de hoje: decifrar uma charada, responder a uma pergunta enigmática e glosar um
mote. Quem glosar o mote, responder à pergunta e decifrar a charada, receberá das mãos da Senhora Dona
Helena, este livro... (Entrega a Helena um exemplar impresso da Filha de Maria Angu.)
PEDRINHO - E que livro é esse? Dá licença? (Toma o livro e lê o título.) A Filha de Maria Angu.
ALFERES ANDRADE - Ora via! Uma paródia! uma paródia!...
NICOLAU - E o que tem que seja uma paródia?
ALFERES ANDRADE - Vi-a representar... É a maior bagaceira... (Com energia, puxando pela
espada.) E não me digam que não é!...
NICOLAU - Quem foi que disse, Seu Alferes? Guarde a durindana, homem!
ALFERES ANDRADE - É assim que o Senhor Pantaleão de los Rios quer fazer literatos: dando-lhes
de presente A Filha de Maria Angu!
PEDRINHO - Não seja tolo, Seu Alferes!
ALFERES ANDRADE (Tirando a espada.) Isso é sério?
PEDRINHO - Muito sério!
ALFERES ANDRADE (Embainhando a espada.) - Eu logo vi! Comigo ninguém brinca...
NICOLAU - Ora ali está uma espada de que não se pode dizer: —Nunca saiu da bainha.
PANTALEÃO - Eu continuo! Meus senhores, ânimo! Puxai pela inteligência! Disputai
gloriosamente A filha de Maria Angu! (Aos músicos.) E vós, ilustres maccaroni, fazei vibrar as cordas de
vossas harpas e rabecas! (Bebe água.)
TODOS - Apoiado! A música! A música! (A música toca desafinadamente.)
NICOLAU - Excelente orquestra, compadre!
PANTALEÃO - Meia dúzia de maccaroni, que estão de passagem na freguesia... Tocam
regularmente... (Outro tom.) Vamos principiar a luta da inteligência. (Tirando do bolso um periódico.) Neste
número da Gazeta de Notícias acha-se a charada. (Tirando outro periódico.) Neste, a decifração. (Dando uma
das gazetas a Nicolau.) Leia compadre: é a que está marcada à margem.
NICOLAU (Lendo.) “Assuntos do dia... Houve grande rolo ontem na Rua de São Jorge... A feiticeira
vermelha...” Não é isso! “O nosso amigo...” Onde está? Ah! “Charadas”, cá está ela! (Lendo.) “Uma, três.
Tomo esta fazenda, sento-me nela; tem graça!”
PEDRINHO - Convém observar que a charada é da novíssima reforma; portanto “Tomo esta
fazenda...
ALFERES ANDRADE (Triunfante.) - Eu sei, eu sei!... Eu sei o que é!...
PANTALEÃO (Em tom de zombaria.) - Então você sabe o que é?
ALFERES ANDRADE - Sei! quem é que diz que não sei?... (Tirando meia espada.) “Tomo esta
fazenda... (Aponta com malícia para Helena.) Ora, quem há de ser a fazenda?
PANTALEÃO - Isto é de mau gosto, seu alferes. Está enganado! Vamos: “Toma esta fazenda,
uma...”
GÓIS - Uma... uma o quê?
PANTALEÃO - Uma sílaba! É boa!
GÓIS - O quê? a sílaba?
COMPANHIA - Não; ele disse — É boa —, assim como quem diz — É burro.
PANTALEÃO - Tomo esta fazenda, sento-me nela, três...