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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS
DEPARTAMENTO DE SERVIÇO SOCIAL
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM SERVIÇO SOCIAL
LILIANE DE SOUZA RIBEIRO CACHO
A VIOLÊNCIA SEXUAL CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES NA
CIDADE DO NATAL: DIREITOS GARANTIDOS OU NEGADOS?
NATAL
2006
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LILIANE DE SOUZA RIBEIRO CACHO
A VIOLÊNCIA SEXUAL CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES NA
CIDADE DO NATAL: DIREITOS GARANTIDOS OU NEGADOS?
Dissertação apresentada à Banca
Examinadora do Programa de Pós-
graduação em Serviço Social da
Universidade Federal do Rio Grande
do Norte, para fins de conclusão do
mestrado e obtenção do título de
Mestre em Serviço Social.
Orientadora:
Profª Drª Denise Câmara de
Carvalho.
NATAL
2006
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Em especial, ao meu filho, Adriano
Cláudio Filho e as minhas sobrinhas,
Ana Clara, Maria Beatriz e Enny
Camile , presentes de Deus,
sinônimos de alegria e esperança
que completam a minha vida e me
fortalecem na missão de contribuir
para a garantia de direitos de
crianças e adolescentes.
Aos meus pais, João Ribeiro e Maria
do Socorro e irmãos que me
proporcionaram uma infância e
adolescência repleta de amor,
carinho, respeito, condições dignas e
essenciais para o meu
desenvolvimento pleno.
Ao meu marido, Adriano Cacho que
ao entrar em minha vida trouxe
consigo carinho, alegria e amor que
resultou em um outro ser especial,
essenciais a minha felicidade.
AGRADECIMENTOS
Especialmente a Deus, por ter me presenteado com pessoas
maravilhosas: uma família linda, pais, irmãos e amigo(a)s para todos os
momentos, que nessa caminhada me ensinaram a amar , compreender ,
acreditar e respeitar.
À Professora Doutora Denise Câmara de Carvalho pelo
compromisso, disponibilidade, compreensão, carinho, motivação e referência
enquanto profissional.
A todos os profissionais e às mães das vítimas de violência sexual
que entenderam a importância e se disponibilizaram e contribuíram para a
realização deste estudo.
A Coordenação, aos professores e aos funcionários do Mestrado em
Serviço Social pela dedicação e carinho durante o meu convívio na academia.
A CAPES, pelo apoio financeiro a este trabalho.
A professora Zoraíde, pela correção ortográfica.
A equipe da Ong RESPOSTA-Responsabilidade Social Posta em
Prática pelas contribuições teóricas, pela relação de carinho e amizade.
A vocês, meus sinceros agradecimentos.
A criança é o princípio sem fim, o fim
da criança é o princípio do fim.
Quando uma sociedade deixa matar
as crianças é porque começou seu
suicídio como sociedade. Quando
não as ama é porque deixou de se
reconhecer como humanidade.
Afinal, a criança é o que fui em mim
e em meus filhos, enquanto eu e
humanidade. Ela como princípio é
promessa de tudo. É minha obra
livre de mim. Se não vejo na criança
uma criança, é porque alguém a
violentou antes, e o que vejo é o que
sobrou de tudo o que foi tirado. Mas
essa que vejo na rua sem pai, sem
mãe, sem casa, cama e comida;
essa que vive a solidão das noites
sem gente por perto, é um grito, é
um espanto. Diante dela o mundo
deveria parar para começar um novo
encontro, porque a criança é o
princípio sem fim e o seu fim é o fim
de todos nós. (Herbert de Sousa)
RESUMO
O estudo apresenta a problemática da violência sexual contra crianças e
adolescentes na cidade do Natal-RN, a partir de um olhar crítico sob o
atendimento na Delegacia Especializada em Defesa da Criança e Adolescente
– DCA, numa perspectiva de garantia de direitos. Constituiu-se em uma análise
sob um enfoque teórico-metodológico, quantitativo e qualitativo tendo como
pressuposto a violência sexual contra crianças e adolescentes nas suas
dimensões sociais, legais, histórico-culturais, econômicas, que norteiam o
tema. O percurso estabelecido entre conhecimento e método envolveu: análise
conceitual sobre a violência sexual, pesquisa em documentos oficiais do Poder
Público, aplicação de questionários com coordenadores de programas e
projetos sociais, realização de entrevistas com atores institucionais e mães de
crianças e adolescentes vitimizadas, além da análise de indicadores
quantitativos a partir dos dados disponibilizados pela DCA. A pesquisa realizou-
se junto à Delegacia Especializada em Defesa da Criança e do Adolescente,
tomou também como referência informação em Instituições que desenvolvem
ações direcionadas às crianças e aos adolescentes vítimas de violência sexual.
Apreendeu-se neste estudo as estratégias e as contradições existentes no
enfrentamento à violência sexual contra crianças e adolescentes
implementadas pelo Poder Público, identificou-se a necessidade de maior
articulação na perspectiva de garantia de direitos e permitiu-se ainda delinear
um panorama da violência sexual infanto-juvenil no período de 2001 a 2004 na
cidade do Natal-RN.
Palavra-chave: Violência Sexual. Criança. Adolescentes. Garantia de Direitos.
ABSTRACT
This study presents the issue of sexual violence against children and adolescents
in the city of Natal – RN from a critical approach over the work carried out at the
Delegacia Especializada em Defesa da Criança e Adolescente – DCA, with the
perspective towards guaranteeing their rights. It is constituted of an analysis
under a theoretical-methodological focus, both quantitative and qualitative, taking
as a premise the sexual violence against children and adolescents in its social,
legal, historical, cultural and economical dimensions that are behind this issue.
The established course between knowledge and methodology involved: a
conceptual analysis of the sexual violence, a research in the official records of the
Public Power, the application of questionnaires with the coordinators of social
projects and programmes, the accomplishment of interviews with key institutional
actors and mothers of victimized children and adolescents, besides the analysis of
quantitative indicators from the data made available by the DCA. The research
took place within the Delegacia Especializada em Defesa da Criança e
A
dolescente, and also took for reference the information from institutions that
develop actions directed towards children and adolescents victims of sexual
abuse. Through this study, the strategies and the contradictions existing in the
struggle against sexual violence towards children and adolescents implemented
by the Public Power were learnt, the need for a greater articulation was identified
to guarantee their rights and it also allowed for the tracing of a panorama of the
sexual violence against children and adolescents in the period from 2001 to 2004
in the city of Natal-RN.
Keywords: Sexual Violence. Children. Adolescents. Guarantee of Rights
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ABRAPIA _ Associação Brasileira Multiprofissional de Proteção à Infância e
Adolescência
BO _ Boletim de Ocorrências
CECRIA _ Centro de Referência de Estudos e Ações sobre a Criança e o
Adolescente
CF_Constituição Federal
CP _ Código Penal
CPI _ Comissão Parlamentar de Investigação
CPMI _ Comissão Parlamentar Mista de Inquérito
CLT – Consolidação das Leis Trabalhistas
CRESS – Conselho Regional de Serviço Social
DACA – Departamento de Atenção à criança e ao adolescente
DCA_ Delegacia Especializada em defesa da Criança e do Adolescente
DST_ Doenças Sexualmente Transmissíveis
ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente
FNAS – Fundo Nacional de Assistência Social
FUNDAC – Fundação da Criança e do Adolescente
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IML_ Instituto Médico Legal
ITEP _ Instituto Técnico Científico de Polícia
LOAS – Lei Orgânica da Assistência Social
MPAS _ Ministério da Previdência e Assistência Social
ONG _ Organização não-governamental
ONU _ Organização das Nações Unidas
RN – Rio Grande do Norte
SEAS – Secretaria de Estado de Assistência Social
SEMTAS – Secretaria Municipal de Trabalho e Assistência Social
TCO _ Termo Circunstancial de Ocorrência
UFRN _ Universidade Federal do Rio Grande do Norte
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1: NÚMERO PERCENTUAL DE DENÚNCIAS POR TIPO DE
EXPLORAÇÃO SEXUAL – BRASIL – PERÍODO FEV 1997- FEV. 2003..................99
Gráfico 2: TOTAL DE REGISTRO DE VIOLÊNCIA SEXUAL NA DCA NO
PERÍODO DE 2001 À 2004 NA CIDADE DO NATAL............................................100
Gráfico 3: REGISTRO DE BOLETINS DE OCORRÊNCIAS E DENÚNCIAS
CONFORME TIPIFICAÇÃO DA VIOLÊNCIA SEXUAL NA CIDADE DO NATAL –RN
DE 2001 À 2004.......................................................................................................102
Quadro 1: DEMONSTRATIVO DA VIOLENCIA SEXUAL NA CIDADE DO NATAL-
RN ...........................................................................................................................103
Quadro 2: PERFIL DA VÍTIMA E LOCAL DA OCORRÊNCIA- ANO 2004-
RN............................................................................................................................104
Quadro 3 : TIPO DE VIOLÊNCIA REGISTRADOS EM BOLETIM DE OCORRÊNCIA
SEGUNDO O PERFIL DO ACUSADO - Ano 2004-RN .........................................105
Gráfico 4 : NÚMEROS DE INQUÉRITOS REMETIDOS A JUSTIÇA NO PERÍODO
DE 2001 À 2004, NO RIO GRANDE DO NORTE....................................................106
LISTA DE TABELA
Tabela I : NÚMERO ACUMULADO DE DENÚNCIAS, POR RECEBIMENTO DA
DENÚNCIA SEGUNDO AS GRANDES REGIÕES DO
BRASIL.......................................................................................................................98
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO............................................................................................. 12
2 DIFICULDADES CONCEITUAIS E LEGISLAÇÃO: ENTRAVES PARA O
ENFRENTAMENTO À VIOLÊNCIA SEXUAL?...............................................
22
2.1 RE (DISCUTINDO) OS CONCEITOS DE VIOLÊNCIA SEXUAL
CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES.....................................................
22
2.1.1 Abuso sexual......................................................................................... 28
2.1.2 Exploração sexual e suas modalidades............................................. 34
2.2 A INSERÇÃO DA DISCUSSÃO SOBRE A VIOLÊNCIA SEXUAL NA
AGENDA POLÍTICA.........................................................................................
43
2.3 LEGISLAÇÃO REFERENTE AOS DIREITOS DE CRIANÇAS E
ADOLESCENTES – AVANÇOS OU RETROCESSOS?..................................
48
3 POLÍTICAS DE ENFRENTAMENTO A VIOLÊNCIA SEXUAL CONTRA
CRIANÇAS E ADOLESCENTES....................................................................
55
3.1 AS POLÍTICAS PÚBLICAS DE ENFRENTAMENTO A VIOLÊNCIA
SEXUAL ..........................................................................................................
55
3.2 REDE DE GARANTIA DE DIREITOS ÀS VÍTIMAS DE VIOLÊNCIA
SEXUAL NA CIDADE DO NATAL....................................................................
73
4 DELEGACIA ESPECIALIZADA EM DEFESA DA CRIANÇA E DO
ADOLESCENTE - DCA NO ENFRENTAMENTO A VIOLÊNCIA SEXUAL –
POTENCIALIDADES E OPORTUNIDADES DE MELHORIAS .....................
87
4.1 DCA- CONSTRUINDO SUA HISTÓRIA.................................................... 87
4.2 A VIOLÊNCIA SEXUAL COM BASE DA ANÁLISE DOS BOLETINS DE
OCORRÊNCIA E DENÚNCIAS.......................................................................
96
4.3 ATENDIMENTO AOS VITIMIZADOS PELA VIOLÊNCIA SEXUAL NA
PERSPECTIVA DE GARANTIA DE DIREITOS...............................................
107
5 APROXIMAÇÕES CONCLUSIVAS.............................................................. 122
REFÊRENCIAS ……………………...…………………………………………….. 126
APÊNDICE....................................................................................................... 133
ANEXO............................................................................................................. 147
13
1 INTRODUÇÃO
O problema fundamental em relação aos direitos do homem,
hoje, não é tanto o de justificá-los, mas o de protegê-los. Trata-
se de um problema não filosófico, mas político. (BOBBIO, 1992,
p.24)
A violência sexual contra crianças e adolescentes geralmente está
associada a outras violências e em face da gravidade e natureza deste crime
que traz conseqüências físicas, psicológicas e sociais demanda um sistema
articulado de proteção integral e especializada na perspectiva de garantia de
direitos.
Nessa perspectiva, o presente estudo pretende analisar se as ações
da Delegacia Especializada em Defesa da Criança e do Adolescente – DCA
vêm contribuindo para a garantia de direitos das crianças e dos adolescentes
vitimizados pela violência sexual na Cidade do Natal-RN.
Entende-se por garantia de direitos um sistema articulado de
espaços e mecanismos de promoção e defesa dos direitos e controle social. De
acordo com Paixão(2005, p.1):
O sistema de garantia de direitos se caracteriza por uma
interação de espaços, instrumentos e atores no interior de cada
um dos eixos e por uma interação complementar e
retroalimentação entre os três eixos.
A DCA surge através do Decreto nº 15.470 em 13/05/2001
1
,
enquanto Política Estadual de Segurança Pública e Defesa Social,
exclusivamente para atender os casos de maus-tratos e violência sexual contra
crianças e adolescentes em todo o Estado do Rio Grande do Norte.
Para entender a atuação da Delegacia Especializada em Defesa da
Criança e do Adolescente, enquanto Política de Segurança Pública, inserido no
1
EM ANEXO, cópia do Diário Oficial que institui o Decreto nº 15.470 em 13/05/2001 que cria a
Delegacia Especializada em Defesa da Criança e do Adolescente.
14
eixo de defesa e responsabilização do Plano Nacional de Enfrentamento a
Violência Sexual
2
far-se-á necessária uma discussão sobre as condições
objetivas e estruturais da DCA, em relação às especificidades do crime de
violência sexual, quanto à garantia de direitos que podem e devem ser
assegurados, bem como articulados às políticas governamentais e não
governamentais de saúde, educação e assistência social à criança e ao
adolescente na cidade do Natal-RN.
Verifica-se que em termos de legislação brasileira houve alguns
avanços significativos em relação à temática da criança e do adolescente, a
exemplo da Constituição Federal Brasileira de 1988(BRASIL,1988) e a
promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente-ECA lei
nº8069/90(BRASIL,2003). Ambos, norteados pelo paradigma dos Direitos
Humanos e pela Declaração dos Direitos da Criança (1959) passam a ser
importantes instrumentos de defesa e proteção dos direitos da população
infanto-juvenil. Direitos estes, que estabelecem prioridades absolutas à
população infanto-juvenil quanto ao atendimento , à implementação das
políticas sociais públicas e à destinação de recursos para a proteção dessa
população.
Avanços que não foram acompanhados pelo Código Penal de 1940,
no tocante às mudanças históricas, sociais e culturais conquistadas a partir dos
anos 70 pelo movimento feminista, a exemplo de termos utilizados para
qualificar crimes de natureza sexual que o Código (BRASIL, 1997) denomina
de crimes contra os costumes , sobre os quais voltar-se-á a se reportar neste
trabalho.
Na perspectiva de direitos das crianças e dos adolescentes vítimas
de violência sexual, destacam-se as garantias do direito à segurança, a uma
vida digna, ao desenvolvimento saudável de sua sexualidade, a um
atendimento multiprofissional de qualidade, às políticas públicas de inserção
sócio-econômicas e culturais.
2
O Plano Nacional de Enfrentamento à Violência Sexual é fruto de um encontro nacional
realizado na Cidade do Natal no período de 15 a 17 junho de 2000, contou com participantes
de organizações governamentais; não-governamentais; organismos internacionais e
representantes de jovens . O referido Plano é “um instrumento de garantia e defesa de direitos
de crianças e adolescentes que pretende criar, fortalecer e implementar um conjunto articulado
de ações e metas fundamentais para assegurar a proteção integral à criança e adolescente em
situação ou risco de violência sexual. (CONANDA, 2000:13)
15
Ao discutir o conceito de violência sexual nos deparamos com
concepções que se complementam na explicitação do mesmo, e ainda,
percebemos que há necessidade de se entender suas especificidades face ao
recorte temático que se destaca neste estudo.
Para Faleiros, E. (2000), a violência que se refere a uma categoria
conceitual e explicativa para a compreensão de todos os fenômenos em que
crianças e adolescentes são vitimizados sexualmente, deve ser analisada em
seu contexto histórico, econômico, cultural, social e ético.
Assim, a violência sexual contra crianças e adolescentes se
manifesta de diferentes formas, por isso, para melhor compreensão, prevenção
e enfrentamento faz-se necessário explicá-la conforme as suas
especificidades.
As leituras sobre a temática, nem sempre consensuais, dividem a
violência sexual em intrafamiliar e extrafamiliar. A direção seguida neste estudo
é concebida violência sexual em intrafamiliar quando existe uma relação de
parentesco com a vítima, também denominada de abuso sexual intrafamiliar ou
incesto; e a violência extrafamiliar é assim entendida quando não há a relação
de convivência familiar, denominada também de abuso sexual extrafamiliar e
exploração sexual quando caracterizar uma troca comercial.
Faleiros, E. (2000, p.15) destaca que o abuso sexual:
trata de uma situação de ultrapassagem de limites: de direitos
humanos, legais, de poder, de papéis, do nível de
desenvolvimento da vítima, do que esta sabe e compreende, do
que o abusado pode consentir fazer e viver, de regras sociais e
familiares e de tabus.
Azevedo e Guerra (1993) classificam o abuso sexual incestuoso
como uma forma de violência doméstica e ressaltam que as políticas sociais
direcionadas para supressão da violência foram sendo estruturadas a partir dos
anos 70 do séc. XX, em face às acusações do movimento feminista que tornou
público temas considerados tabus: estupro, espancamento de mulheres no lar
e abuso sexual de crianças. O marco de discussão da temática foi o Congresso
Mundial de Estocolmo em 1996, que denominou exploração sexual todo tipo de
atividade em que as redes, usuários e pessoas utilizam o corpo de crianças e
16
adolescentes para obter vantagem ou proveito de caráter sexual com base
numa relação de exploração comercial e poder.
Conforme nos mostra Faleiros, V.(1998, p. 46) “ a exploração sexual
comercial é uma violência sistemática que se apropria comercialmente do
corpo, como mercadoria para auferir lucro” sendo expressa através da
prostituição, pornografia, turismo e tráfico.
Ao articular esses conceitos com a legislação brasileira, é notória a
distância conceitual e terminológica do que os estudiosos compreendem sobre
a violência sexual e suas especificidades e a forma expressa no Código Penal
de 1940, principalmente no que se refere aos seus significados. Por isso a
existência de inúmeras propostas de alterações legislativas, que serão
enumeradas no primeiro capítulo deste trabalho, conforme propõe o Relatório
Final da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito-CPMI, instalada em 12 /06/
2003.
A partir de pressões sociais através de seminários e fóruns, a
discussão acerca do tema violência sexual passa a fazer parte da agenda
política nas três esferas de governo. Destaca-se a elaboração do Plano
Nacional de Enfrentamento à Violência Sexual, em 2000, que aponta entre
outras necessidades a atualização das legislações, o combate à impunidade,
capacitação de profissionais da área jurídico-policial e implantação das
Delegacias Especializadas em Defesa da Criança e do Adolescente e
consolidação de um sistema de atendimento integrado de Delegacias, Vara da
justiça, promotorias e defensorias especializadas e exclusivas para tratar dos
crimes sexuais contra crianças e adolescentes.
Parte-se do pressuposto que a temática da violência sexual, pela
complexidade exige que profissionais tais quais assistentes sociais, psicólogos,
agentes de polícia, investigadores, diretamente envolvidos no atendimento as
crianças e aos adolescentes tenham capacitações, oficinas específicas que
possam despertar uma atenção especial e uma sensibilidade, além de
proporcionar conhecimentos teóricos e práticos para uma abordagem
qualificada e articulada com os demais atores sociais na perspectiva de
garantia de direitos.
Enquanto condição fundamental para a garantia de um atendimento
na Delegacia que priorize a qualidade e agilidade na apuração dos fatos,
17
enfatizamos a melhoria das condições de trabalho, no tocante, ao aspecto
físico, vislumbramos um ambiente que seja receptivo à população infantil,
disponibilidade de viaturas necessárias para locomoção dos agentes,
equipamentos de informática, máquina fotográfica, filmadora para as
investigações , ampliação do número de agentes devidamente capacitados na
temática e ainda assistência psicossocial para as famílias.
Este estudo teve como um dos questionamentos centrais o de
apreender se as atividades desenvolvidas pela DCA contribuem para a garantia
dos direitos das crianças e dos adolescentes vitimizados pela violência sexual
na cidade do Natal.
Pretende-se expressar o questionamento supracitado nos seguintes
objetivos da pesquisa:
a) Analisar as ações desenvolvidas pela DCA no enfrentamento à violência
sexual infanto-juvenil;
b) Identificar a existência de articulação dos serviços de atendimento e
proteção à vítima;
c) Elucidar os limites e avanços no atendimento aos vitimizados e na
responsabilização dos acusados.
No percurso metodológico utilizou-se a abordagem quanti-
qualitativa:
Quantitativa, no que se reporta a identificação e caracterização dos
tipos de violência sexual, bem como das vítimas e acusados mais freqüentes,
intercruzar as ocorrências e os inquéritos instaurados, isto é, dados relevantes
que permitiram construir um panorama estatístico da violência sexual contra
crianças e adolescentes em Natal contribuindo sobremaneira para se pensar
estratégias de prevenção e atendimento específicos para as modalidades de
violência sexual mais freqüentes.
Qualitativa, na perspectiva de apreender por aproximação sucessivas
que o fenômeno da violência sexual contra crianças e adolescentes é
perpassado por múltiplas determinações e por considerar que o objetivo é
analisar a contribuição da Delegacia Especializada em Defesa da Criança e do
Adolescente –DCA na garantia de direitos dos vitimizados.
A pesquisa desenvolveu-se a partir de um levantamento bibliográfico
que permitiu a revisão da leitura sobre a temática e documental que consistiu
18
na análise dos dados dos Boletins de Ocorrências e denúncias. Na fase da
pesquisa de campo foram aplicadas entrevistas semi-estruturadas junto aos
atores institucionais e familiares das crianças e adolescentes ; aplicação de
questionários com os coordenadores dos programas e políticas públicas da
cidade do Natal , observação sistemática; e por fim o tratamento dos dados e
análise dos mesmos e sua apreensão face aos nossos questionamentos.
A abordagem teórico-metodológica contemplou autores, tais como:
Eva Faleiros, Vicente de Faleiros, Adriana Piscitelli, Maria Lúcia Pinto Leal com
concepções distintas, mas que se complementam na discussão e reflexão no
que diz respeito à violência sexual contra crianças e adolescentes e suas
especificidades. Desta forma, procurou-se abstrair o máximo de conhecimento
sobre a temática para que se pudesse definir qual das direções analíticas mais
se aproxima do entendimento desta problemática. Nesta perspectiva, foi uma
constante neste processo:
a) Aprofundar a discussão sobre a violência sexual de crianças e
adolescentes;
b) Analisar as legislações existentes sobre a temática da violência sexual
identificando os limites e avanços;
c) Identificar os atores sociais envolvidos no enfrentamento à violência
sexual de crianças e adolescentes na cidade do Natal;
d) Discutir a relação Estado, políticas públicas e garantia de direitos.
O recorte temporal da pesquisa documental compreendeu o período
de 2001 a 2004, refere-se ao tempo de existência da Delegacia Especializada
em Defesa da Criança e Adolescente no RN. Em virtude do caráter pioneiro da
pesquisa e sua relevância, faz-se de suma importância mapear a situação da
violência sexual em Natal. Neste sentido, propõe-se na análise dos dados
estatísticos:
a) Identificar todos os casos de violência sexual contra crianças e
adolescentes na cidade do Natal notificados na DCA no período acima
citado;
b) Caracterizar a vítima e acusado: faixa etária; grau de parentesco; sexo e
local da ocorrência;
c) Identificar a modalidade de violência mais freqüentes (abuso sexual,
tráfico, pornografia, prostituição e turismo sexual) em Natal-RN;
19
d) Verificar a responsabilização ou não a partir dos dados comparativos
entre o número de notificação de violência sexual através de Boletins de
Ocorrência e inquéritos instaurados;
Na pesquisa de campo, concomitante ao processo de observação,
foram realizadas entrevistas. Buscou-se apreender o conteúdo através da
utilização de um roteiro com questões semi-estruturadas com o auxílio de um
equipamento de gravação.
O universo da pesquisa foi definido a partir de uma amostra
intencional identificando enquanto sujeito deste estudo os atores institucionais
que atuam na Delegacia Especializada em Defesa da Criança e do
Adolescente e instituições parceiras que integram o sistema de garantia de
direitos. Assim sendo, participaram das entrevistas: a delegada, um chefe de
investigação, dois agentes da polícia civil e duas estagiárias dos cursos de
psicologia e serviço social. Das instituições parceiras que integram a rede de
garantia de direitos participaram: um promotor, representante do Ministério
Público do Estado do Rio Grande do Norte; uma assistente social do Instituto
Técnico Científico de Polícia – ITEP; um Conselheiro Tutelar; uma assistente
social do SOS Criança
3
; uma assistente social do Programa Sentinela
4
; uma
assistente social da Casa Renascer
5
. Totalizando doze entrevistas.
Em continuidade, entrevistamos também mães das vítimas de
violência sexual que notificaram à Delegacia Especializada em Defesa da
Criança e do Adolescente. As mães das vítimas foram identificadas por nomes
de flores.
Vale ressaltar, que por entender o quão são graves as
conseqüências emocionais que as crianças e os adolescentes sofrem com a
3
“A criação do SOS Criança é fruto de articulação entre a sociedade civil e amplos setores
governamentais, ocorrida em 1990, que ficou conhecida como Pacto pela Infância.”
(FELIZARDO, 2003: 95). O programa está vinculado à Secretaria do Estado de Trabalho e
Assistência Social(SETAS) , seu objetivo é receber denúncias, fazer procedimento ,
encaminhamento para visita domiciliar para ver a procedência da denúncia, fazer orientação
das famílias dos casos recebidos, realizar atendimento a violação de direitos contra crianças e
adolescentes. (Conforme entrevista com Assistente Social do SOS Criança)
4
O Programa Sentinela é uma política de apoio psicossocial as vítimas e familiares de violência
sexual operacionalizada pela Prefeitura Municipal de Natal. No capítulo 2 se aprofundará a
discussão sobre as Políticas Públicas de atendimento a crianças e adolescentes.
5
A Casa Renascer é uma organização não governamental pioneira no Estado do Rio Grande
do Norte no atendimento psicossocial a crianças e adolescentes do sexo feminino vitimizadas
pela violência sexual.
20
violência sexual e no intuito de preservá-las, foi que se optou em realizar as
entrevistas com as mães das vítimas.
Partimos das informações do Programa Sentinela para definirmos os
entrevistados, tendo-se por critérios o interesse e/ou motivação dos familiares
em participar do estudo e ter registrado ocorrência na DCA ,em 2004.
Registramos também, a dificuldade de localização das famílias em face de
informações desatualizadas e/ou incompletas nas fichas do Programa. Para
definir o número de entrevistados fez- se uso da amostra não-probabilística.
Assim, participaram da pesquisa quatro mães de crianças e
adolescentes vitimizados pela violência sexual. Nas entrevistas com as mães
ressaltamos junto às mesmas, questões que suscitassem o resgate de sua
história de vida , além de identificar os limites e avanços ocorridos no
atendimento e na garantia de direitos das crianças e dos adolescentes
vitimizados pela violência sexual.
Não foram considerados na análise dos dados os crimes de rapto
consensual por entender que não se caracteriza como violência sexual;
sedução por ter sido revogado; atentado ao pudor mediante fraude, posse
sexual mediante fraude, pornografia, tráfico e rapto violento pelo fato de não
terem sido registrados em BO nenhum caso no período de análise pela DCA.
Durante todo o processo de exposição da pesquisa buscou-se de um
lado apreender na realidade vivenciada pelos sujeitos participantes da
pesquisa - os atores institucionais, os profissionais e técnicos, qual a dimensão
do problema, qual a sua avaliação e como enfrentá-lo. De outro lado, na
cotidianidade dos demais sujeitos entrevistados, familiares das crianças e dos
adolescentes buscou-se a apreensão da dimensão da violência , seu
enfrentamento e a garantia de seus direitos na constituição e na construção do
ser social.
Refletir o fenômeno da Violência Sexual contra crianças e
adolescentes, suas especificidades, os avanços e limites legislativos, as
políticas e os atores envolvidos no atendimento e defesa dos direitos das
vítimas desta violência são condições fundantes para entender a importância
da Delegacia Especializada em Defesa da Criança e do Adolescente enquanto
agente articulador e estratégico na perspectiva de garantia de direitos de
crianças e adolescentes na cidade do Natal-RN.
21
Para a melhor apreensão das questões que norteiam o estudo
investigativo, propõe-se a seqüência de análise em três capítulos, a saber:
No primeiro capítulo, Dificuldades conceituais e legislação: entraves
para o enfrentamento a violência sexual? Buscou-se refletir se as dificuldades
e especificidades em torno do conceito da violência sexual, bem como o
aparato jurídico-legal podem ser considerados mais um fator de entrave para o
enfrentamento da problemática e ainda, se reforça a impunidade. Neste
sentido, recorremos à história no que se reporta a Violência Sexual contra
crianças e adolescentes, suas especificidades, levando em consideração as
modificações de ordem jurídica, a inserção da violência sexual na agenda de
discussões e reivindicações no cenário político internacional, nacional e local.
Além disso, às entrevistas com a equipe, delegada e representantes de
instituições parceiras da DCA nortearam a sistematização deste capítulo.
No segundo capítulo, procurou-se discutir sobre as Políticas de
enfrentamento a violência sexual contra crianças e adolescentes frente as
atuais transformações do Estado no provimento de Políticas Públicas. Neste
sentido, aprofundou-se as discussões acerca das Políticas Públicas
implementadas para o enfrentamento à violência sexual destacando suas
fragilidades, avanços e perspectivas em âmbito nacional e local , fez-se mister :
pesquisa pela internet nos sites oficiais, visita in locu e aplicação de
questionário com coordenadores e/ou prestadores de serviços de programas ,
projetos sociais e nas Secretarias Municipais de Saúde e Educação. Esta
pesquisa possibilitou ainda identificar os principais atores sociais em Natal que
estão desenvolvendo ações sob a temática em questão.
No terceiro capítulo, DCA no enfrentamento à Violência Sexual –
potencialidades e oportunidades de melhoria , verificou-se de que maneira a
Delegacia corrobora para a garantia de direitos de crianças e adolescentes que
foram violentadas sexualmente, considerando as condições objetivas de
funcionamento, atendimento, ações e encaminhamentos. Através das
entrevistas com a equipe da DCA, instituições parceiras, familiares dos
vitimizados identificou-se quais são os avanços, entraves e oportunidades de
melhoria da Delegacia numa perspectiva ampla de garantia de direitos. O
tratamento dos dados e a análise resultantes da pesquisa documental foram de
22
grande relevância para caracterizar a violência e apontar estratégias de
enfrentamento mais eficazes.
Numa perspectiva de síntese aproximativa do real buscou-se
responder aos questionamentos que nos colocamos ao longo do processo
investigativo, articulando as discussões sobre violência sexual, políticas
públicas, redes de atendimento numa perspectiva ampla de garantia de direitos
de crianças e adolescentes vitimizados sexualmente na Cidade do Natal.
23
2 DIFICULDADES CONCEITUAIS E LEGISLAÇÃO: ENTRAVES PARA O
ENFRENTAMENTO À VIOLÊNCIA SEXUAL?
2.1 RE (DISCUTINDO) OS CONCEITOS DE VIOLÊNCIA SEXUAL CONTRA
CRIANÇAS E ADOLESCENTES
A violência sexual contra crianças e adolescentes pode ser
considerada como um processo que é construído histórica e
socialmente, não só por aquele que vitimiza, mas também por
uma rede de relações vitimizadoras, não protetoras (VECINA,
2004, p. 52)
Historicamente, crianças e adolescentes são vítimas de violências
6
.
Violências físicas, psicológicas, sexuais, simbólicas e estruturais que assumem
formas contemporâneas.
Para Leal (1999, p.19):
A violência é um fenômeno antigo, produto das relações sociais
construídas de forma desigual e geralmente materializada contra
aquela pessoa que se encontra em alguma desvantagem física,
emocional e social.
A sociedade, especificamente, no Brasil Colônia sempre foi
perpassada por desigualdades sócio-econômicas, culturais e étnicas, que
asseguravam a existência da “prática de violências tanto entre classes sociais
quanto intra-classes sociais” (AZEVEDO; GUERRA,1993, p. 38) . E a
população infanto-juvenil, por muitos anos teve seus direitos suprimidos, uma
vez que eram vistos como objetos, e não como sujeitos portadores de direitos.
Neste período, crianças negras eram ainda mais marginalizadas,
tratadas como escravas e seres que serviriam como futuros explorados, e na
6
“A origem da palavra violência vem do latim violentia, ato de violentar, constrangimento físico
ou moral, ao qual se pode acrescentar a coação e coerção psicológica.” (LEVISKY, 1997, p.
24)
24
maioria dos casos eram separadas de suas famílias
7
. O significado da palavra
infância não existia em termos práticos ou jurídicos. Tratava-se apenas de
negrinhos, escravos e serviçais, crianças que foram condenadas ao trabalho
escravo, a miséria e/ou abandono , como afirma Neder (1994, p. 41):
havia desprezo e descaso, sobretudo com relação às crianças,
uma vez que não se apostava com muita freqüência na
reprodução natural da massa escrava; havia uma clara
preferência pelo investimento no escravo adulto e era freqüente
o abandono de crianças.
Conforme Neder (1994, p. 30), em relação às famílias de origem
africana escravizada, vigorava “as concepções racistas mais arcaicas de não
reconhecimento de sua condição humana”, justificando assim “a própria
escravidão negra no pensamento católico ibérico”.
Em relação às crianças, filhas dos senhores, percebia-se a
desigualdade de gênero, pois estas eram vistas como bonecos de domínio e
poder, e quando do sexo feminino a situação era ainda mais grave, desde cedo
eram trocadas e prometidas ao casamento de acordo com os interesses de
seus pais e o valor dos dotes. A menina nesta realidade também era moeda de
troca, lhe restava o direito de ser subserviente ao seu pai e posteriormente ao
seu esposo, que na maioria das vezes era bem mais velho, e isto ocasionava
mais uma desigualdade, a de geração.
A educação era perpassada pelo “sadismo e os castigos físicos
praticados por pais e professores” , fundada na culpabilização de crianças e
adolescentes, no caráter repressivo e autoritário da estrutura familiar e
“reprodutora das normas de disciplinamento e controle social (e sexual) ditadas
pela Igreja”.(NEDER,1994, p. 30).
Segundo Leal (2001, p. 28), a violência contra mulheres, crianças e
adolescentes, negros e índios era exercida e permitida no contexto das
relações de mercado, “cujo o abuso e a exploração do sistema escravocrata
deram as bases para o mercado da exploração sexual e para o fortalecimento
das desigualdades sociais de gênero e raça.”
7
“Assim, o autoritarismo e a violência da Escravidão são responsáveis pela separação entre
casais, pais e filhos e outros parentes e amigos, provocando perda de vínculos e crises de
25
Violências que, decerto, nos dias atuais, em pleno séc. XXI
continuam presentes na formação das famílias brasileiras. Conforme dados da
Delegacia Especializada em Defesa da Criança e do Adolescente-DCA, no ano
de 2004, no Estado do Rio Grande do Norte registrou-se 497 casos (entre
boletins de ocorrências e denúncias) de violência contra crianças e
adolescentes, destes foram 193 casos de maus-tratos e 261 crimes de
natureza sexual
8
e 43 outros
9
. Os acusados são na maioria pais, mães e
padrastos, pessoas cuja responsabilidade é proteger e cuidar . Em relação às
vítimas nos casos de maus tratos são em sua maioria crianças na faixa etária
de 0 à 11 anos de idade, de ambos os sexos, que por sua condição física ,
psicológica não sabem como se defender das agressões. Já o crime de
natureza sexual, a exemplo do estupro e atentado violento ao pudor atinge
majoritariamente crianças e adolescentes do sexo feminino.
10
Historicamente, constata-se que a violência é por várias vezes
justificada pela fé
11
e pela guerra, não está se reportando apenas às grandes
guerras mundiais do século passado , fala-se também da atualidade , países
que em nome de interesses econômicos e por considerarem superiores a
Organizações Mundiais criadas para manter a paz, se sobrepõem a um
consenso Mundial utilizando e forjando falsos relatórios.
De acordo com Krynski (1997), a história da humanidade tem mais
anos de guerras do que de paz, mais de violência do que de amor. Violência
como forma de construir e destruir.
Percebe-se que a cultura da violência está enraizada na sociedade
brasileira, que, muitas vezes, justifica socialmente o uso da violência pelos pais
como forma de educar seus filhos.
identidades marcantes e irreversíveis” (NEDER, 1994, p. 39)
8
No capítulo 3 desta dissertação apresenta-se o perfil do acusado, e da vitima de acordo com o
tipo de violência cometida, conforme dados da Delegacia Especializada em Defesa da Criança
e do Adolescente.
9
A delegacia classifica em “outros” os crimes de trabalho infantil, seqüestro, troca de criança,
pedofilia, cárcere privado, abandono, drogas, lesão corporal, menor em boate, ameaça etc. O
que dificulta de certa maneira quantificar os casos de maus-tratos, uma vez que cárcere
privado e lesão corporal são considerados por estudiosos enquanto violência física e
considerados como uma forma de maus-tratos.
10
Ver quadro II na Capítulo 3 deste estudo.
11
Refere-se a passagem da bíblia em que o Faraó manda exterminar todas as crianças do
Egito e atualmente aos atentados, suicídios cometidos em nome de “Alá” .
26
Os dados estatísticos acima apresentados, confirmam que o
agressor é geralmente aquela pessoa que deveria estar protegendo. Isto é, o
responsável pela criança e adolescente que ao utilizar equivocadamente a
violência aliada a uma relação adultocêntrica de dominação e poder enquanto
argumento para educar, acabam por reforçar condutas agressivas e reproduzir
a cultura da violência. Neste sentido, Blay (1997, p. 33) argumenta que:
há uma cultura da violência entendida como forma de educação;
está arraigada a noção de que os filhos são propriedades dos
pais, os quais têm sobre eles o direito de vida e morte. Não é
incomum ver-se mãe e pai maltratar impunemente filhos em
público, com total inação da comunidade. É esta mentalidade
que precisa, antes de mais nada, ser modificada.
Assim, a sociedade compactua com relações sociais perpassadas
pelo autoritarismo, patriarcalismo, violências de gênero e etnia, além da
necessidade de reforçar a lógica do mercado.
Às vezes, representadas como anjos, bonecas de porcelana,
mulheres e homens em miniatura, as crianças são frequentemente abordadas
pela publicidade e pela pedagogia da mídia “que ensina através das imagens e
que tem seus signos produzidos socialmente pela cultura” (SABAT, 1999, p.
244), de forma a reforçar o imaginário social que tende a determinar papéis e
normas de condutas para meninos e meninas. Padronizam modos de se vestir,
determinam o que se ouvir, produzem consumidores e consumidoras, e
divulgam globalmente “modelos culturais, políticos e sociais, quase sempre
dominantes”.(SABAT, 1999, p.244). Reproduzem o modelo hegemônico,
identidades “normalizantes e fixas” tanto de gênero quanto sexuais que nega a
concepção de que “qualquer identidade sexual é negociada e construída em
meio a relações sociais” (BRITZMAN, 1996, p. 74). Ressaltamos que as
campanhas sociais
12
contra a violência física e sexual em crianças e
adolescentes costumam fazer uso de imagens, com cenas de violência são
ursos mal-tratados, bonecas quebradas e esta linguagem também precisa ser
revista, para que o tema seja visto com o enfoque mais humanizado.
12
EM ANEXO deste estudo, folder com o título Guia dos Direitos da Criança e do
Adolescente contra a violência lançada pela DCA que utiliza a imagem de um urso mal -
tratado.
27
Por outro lado, crianças e adolescentes inseridos numa sociedade
de consumo aparecem como potenciais poupadores, investidores e são
utilizados frequentemente como estratégia de marketing. Conforme constata
Leal (1999, p. 31), existe:
A cultura do consumo ou cultura de massa frente à indústria
cultural que impõe valores, padrões e estilos de
comportamentos massificados, produzindo sujeitos, grupos e
classes sociais, desejos de inclusão a partir do consumo.
Crianças e adolescentes enquanto sujeitos em processo de
desenvolvimento sentem a necessidade de estar inseridos em lugares de lazer,
de identificar-se com a realidade de consumo que está sendo imposta, dessa
forma tornam-se alvos de fácil cooptação pelas redes criminosas de tráfico de
drogas e exploração sexual.
Neste sentido, Violante (1997, p. 54) retrata bem a realidade
vivenciada por milhares de famílias brasileiras:
[...] contingente populacional que, longe de estar fora da
sociedade é parte integrante dela, produto histórico da lógica
perversa por meio da qual a sociedade produz e distribui
riquezas.
Assim, a necessidade de inclusão de crianças e adolescentes em
lugares e ao consumo de produtos, configura-se em categoria fundamental
para entender a inserção na prática da violência
13
e/ou vitimizados pela
exploração sexual, seja em busca do seu príncipe encantado, seja na
possibilidade de acesso à shoppings, restaurantes e produtos que em face da
sua atual situação sócio-econômica (excluídos ou incluídos marginalmente)
não seria possível.
Uma outra categoria importante refere-se às propagandas e bandas
musicais que incentivam a erotização infantil através de roupas e danças
sensuais. Segundo Leal (2001, p. 217):
28
O projeto hegemônico permite tanto a comercialização do sexo
de crianças e adolescentes como a banalização do mesmo,
através do erotismo exacerbado da imagem da criança e do
adolescente, como produto de consumo da “mass mídia” em
benefício do mercado.
No mundo globalizado, encontram-se formas atualizadas de violentar
crianças e adolescentes, são cada vez mais freqüentes denúncias de adultos
que usam a internet como estratégia de divulgar pornografia infanto-juvenil,
atraindo atenção de turistas e pedófilos, além do tráfico de adolescentes e
mulheres para fins sexuais.
Pressupõe-se que a violência sexual contra crianças e adolescentes
é mais freqüente do que anunciam os dados estatísticos, graças a um silêncio
das vítimas (justificada pelo medo e vergonha), de familiares, vizinhos, agentes
de saúde, educadores, e outros profissionais, neste caso considerados nos
termos de Vecina (2004, p. 54) enquanto ”atores passivos” que ao saberem e
não denunciarem, contribuem para o mascaramento desta realidade. De certa
forma “autorizam a violência perpetrada” tornando-se co-responsáveis pela
violência.
Neste sentido, os dados estatísticos da DCA que serão apresentados
no último capítulo desta dissertação constituem-se aproximações da realidade
da violência sexual contra crianças e adolescentes em Natal, uma vez que
muitas das denúncias e ocorrências nem chegam a ser registradas, contudo
são parâmetros para se refletir sobre o perfil da vítima, do agressor, a
necessidade de campanhas enfocando a importância da denúncia, bem como
repensar as Políticas Públicas e as formas de prevenção e enfrentamento mais
eficazes.
Entende-se neste estudo que a violência:
afeta diferentes dimensões da vida social, revelando sua
natureza contraditória, de conflitos insolúveis e formas variadas
de agressão de difícil detecção, porque ocupam também a
esfera do subjetivo e do simbólico e não necessariamente do ato
13
Conforme afirma Levisky (1997:26) “a falta de perspectiva que campeia a vida de muitos
adolescentes é outro ingrediente para o incremento da violência como reação a um estado
frustrante e contraditório insuportável”.
29
concreto, visível e mensurável pelas seqüelas
corpóreas.(KUYUMJIAM, 1998, p. 9).
Ressalta-se que o sistema de justiça e segurança do Brasil, ainda
privilegia as provas materiais, o que dificulta a investigação nos casos de
violência sexual o que se faz necessário uma maior valorização do
levantamento de provas que revelem a dimensão simbólica da violência.
Nos itens a seguir, nos deteremos nas especificidades da violência
sexual, isto é, abuso sexual e exploração sexual , para entender as
complexidades que norteiam esta temática. No entanto, no decorrer do
trabalho, utilizaremos o termo violência sexual contra crianças e adolescentes,
e em alguns casos, quando necessário, nos reportaremos aos termos
específicos.
2.1.1 - Abuso sexual
Faleiros, E.(2000), destaca em seu livro “Repensando os conceitos
de Violência, Abuso e Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes” que
estes conceitos muitas vezes são utilizados como sinônimos demonstrando
que existe uma imprecisão terminológica e epistemológica.
Neste sentido é importante esclarecer alguns conceitos. Observa-se
que conforme Filho
14
(2000) por abuso sexual entende-se uma situação em
que um adulto se utiliza de uma criança ou adolescente para seu prazer sexual,
podendo haver ou não contato físico, como já nos referimos neste trabalho,
podendo ser intrafamiliar quando o abusador for o pai, padrasto, tio , avô ou
alguém muito próximo à família, com acesso livre à vítima e que por isso usa o
afeto, a confiança depositada pela criança no adulto , a inocência e o amor da
criança para cometer esse crime, por muitos anos ou até que a mesma vire
adulta e consiga denunciar ou se livrar dessa relação doentia; e extrafamiliar,
14
Presidente da ABRAPIA- Associação Brasileira Multiprofissional de Proteção à Infância e Adolescência
30
quando cometido por uma pessoa que não convive com a criança, podendo ser
caracterizado por exploração sexual comercial quando houver a atuação de um
terceiro ator, o aliciador, que se apresenta como o contato entre a criança-
vítima e o autor do abuso. É necessário esclarecer que no caso de abuso
sexual cometido por um estranho, ou seja, extrafamiliar, não havendo a relação
comercial, este crime não poderá ser caracterizado como exploração sexual,
uma vez que não se configura em vantagem em termos econômicos para a
vítima.
Ferrari (2004) afirma que o fenômeno da violência no âmbito familiar
é uma construção social, resultante das relações entre os diversos atores em
que estão presentes: a falta de limites entre gerações, despotismo familiar ,
confusão de discurso, toxicidade. A relação familiar é perpassada pelo
autoritarismo dos pais que consideram seus filhos propriedades e a punição
corporal exercida como forma de disciplinar, isto é, os valores são deturpados,
ao invés de carinho, proteção e respeito a criança recebe sensualidade, abuso
e coação.
São inúmeras as conseqüências de ordem social, psicológica, física
e cultural em uma criança e adolescente vítima de abuso sexual.
Zürcher (2004) alerta que os efeitos podem variar de acordo com a
duração, a freqüência, o grau de gravidade, a idade e o grau de parentesco
entre a vítima e o abusador e os sintomas podem ser físicos e/ou psicológicos.
A autora cita alguns sintomas das vítimas após o trauma da violência sexual, a
saber:
- Lembranças repentinas do trauma que surgem como flashbacks;
- Torna-se insensível a sensações;
- Isolamento emocional;
- Abuso de drogas ;
- Distúrbios de concentração e atenção afetando o desempenho escolar;
- Dificuldades para dormir, medo acompanhado de ataque de pânico e
depressão;
Além destes sintomas, podem aparecer posteriormente reclamações
psicossomáticas: dores abdominais e de cabeça, dificuldades para se
alimentar, ataques de asfixia, sintomas de conversão, a exemplo de perda
repentina da fala.
31
Zürchen (2004) argumenta que podem surgir também distúrbios em
relação à sexualidade, tais como: frigidez; problemas com gravidez e a
maternidade; prostituição e promiscuidade(sem sentir prazer); fantasias
sexuais patológicas; distúrbios sexuais; relações confusa com o corpo.
Ainda sobre o abuso sexual intrafamiliar, Faleiros V.(1998) destaca
as dimensões que sintetizam este crime: segredo familiar; as pessoas
vitimizadas são traumatizadas pelo medo, pela vergonha, pelo terror, sofrendo
depressão, descontrole, anorexia, dificuldades nos estudos, problemas de
concentração, fobias, sensação de estar sujo, tentativas de suicídio;
reincidência; repetição da violência pelos vitimizados; presença da violência em
todas as classes sociais; pode acontecer em qualquer idade; impunidade; fuga
de casa; necessidade de terapia. Além das doenças sexualmente
transmissíveis –DST, como a AIDS, podem ainda apresentar sangramento
vaginal, gravidez ,corrimento vaginal, distúrbios gênito-urinários.
15
Para esclarecer melhor os tipos de abuso sofrido na infância Zürcher
(2004) diferencia em quatro, segundo o grau de intensidade das ações:
- sem contato corporal : exibicionismo, assistir pornografia, assédio
sexual verbalizado; observar tomando banho,etc.
- contato corporal sexualizado; caracteriza o toque nos seios e no
bum-bum, beijo sexualizado e tentativa de toque na parte genital.
- contato sexual: toques nas partes genitais; masturbação.
- contato corporal sexualizado com componentes de violência
explícita: sexo oral; penetração oral e vaginal, estupro vaginal, anal e oral.
Entende-se que nos dois primeiros tipos, sem contato corporal e
contato corporal sexualizado, devido o caráter implícito da violência, fica ainda
mais difícil a comprovação do crime, uma vez que não deixa marcas físicas.
Neste caso, faz-se necessário o acompanhamento psicoterapêutico para que a
criança possa revelar de maneira espontânea, evitando causar à mesma o
constrangimento e um novo trauma. Para descobrir a violência perpetrada
contra a criança, será necessário que a mãe, parentes ou professor observe as
possíveis mudanças de comportamento e assim com a ajuda de especialistas
tente identificar o motivo, mantendo uma relação de confiança com a vítima.
15
Informações retiradas da Cartilha “Violência sexual contra meninos e meninas” publicada em
2003 pela deputada Federal Maria do Rosário.
32
A legislação brasileira, não utiliza a terminologia abuso sexual, os
crimes são enquadrados penalmente como corrupção de menores(art. 218 do
CP), estupro (art. 213 do CP) e atentado violento ao pudor
16
(art. 214 do CP)
quando cometidos contra pessoa maior de 14(catorze) e menor de 18(dezoito)
anos . De acordo com o Capítulo IV do Código Penal - CP art 224, referente a
presunção da violência, a pena é acrescida da metade quando a vítima for
menor de 14(catorze) anos.
A Delegada da DCA -Adriana Shirley reforça neste relato as
dificuldades encontradas em relação aos crimes de abuso sexual, quando
caracterizado o atentado violento ao pudor:
[
...] nós sabemos que, na maioria das vezes, infelizmente é
praticada por aqueles que deveriam garantir a segurança. Às
vezes a família não tem prova ocular, então a gente encontra
dificuldade para poder encontrar essa materialidade, ... porque
é a palavra da menina ou do menino vitimizado contra a palavra
da família que não quer acreditar, tem uma resistência muito
grande. Às vezes a família vê que ali tem uma relação diferente,
mas não quer denunciar, muitas não registram também porque
acham que não houve estupro, então acham que é uma coisa
passageira que a criança vai ultrapassar.(Delegada da DCA)
Nesta perspectiva, alerta-se para a importância de capacitações
direcionadas aos profissionais de saúde e educação que visem a identificação
e a melhor forma de atendimento às crianças e aos adolescentes vítimas de
violência. Afinal são estes que, no exercício da sua profissão, imbuídos de
conhecimento, poderão ser agentes de denúncia, uma vez que o Estatuto da
Criança e do Adolescente assegura obrigatoriamente a comunicação ao
Conselho Tutelar e Vara da Infância. Esta lei tem causado alguns impasses
com o Código de Ética de profissionais, a exemplo do médico, que obriga o
sigilo e segredo profissional. Neste sentido a norma técnica do Ministério da
Saúde (BRASIL, 2005, p. 16) recomenda que deve-se priorizar a proteção à
vítima, isto é, “se a revelação dos fatos preservá-la está afastado o crime de
revelação de segredo profissional”, caso contrário , a decisão do profissional de
saúde deve estar justificada no prontuário da criança ou do adolescente. Estes
16
São considerados crimes de atentado violento ao pudor, ato libidinoso diverso de
conjunção carnal , que pode ser o voyerismo, contato físico em partes intimas até o estupro
33
profissionais devem estar indubitavelmente sensibilizados na temática da
violência, para que utilizem estratégias que garantam uma relação de confiança
e respeito com crianças e adolescentes que por sua condição estão
psicologicamente e fisicamente fragilizados.
Em relação ao incesto
17
, Cohen (1993) define como abuso sexual
intrafamiliar, podendo haver ou não violência explícita, a estimulação sexual
intencional por parte de algum dos membros do grupo que possui vínculo
parental que lhe é proibido o matrimônio.
Estudos mostram que o silêncio, frente ao incesto, pode ser
justificado pelo medo, relação de violência e poder, falta de confiança na
responsabilização do acusado, por isso os dados da delegacia não expressam
a dimensão real do crime , só retrata uma parte dos casos que foram
registrados.
Segundo Cohen (1993), o silêncio ocorre por vários motivos: pelo
temor na reação da família, para manter uma falsa aparência de “sagrada
família” , pelo silêncio dos outros membros que sabem e não denunciam, por
ser um assunto considerado culturalmente como um tabu.
Enfatizamos a importância de campanhas que sensibilizem e
incentivem a denúncia, além de trabalhos de orientação com a comunidade,
associações de mães, escolas, postos de saúde, etc. O tema deve ser caso de
polícia e, principalmente, de Políticas Públicas que desenvolvam
acompanhamentos psicossocial e terapêutico com vitimizados, família e o autor
da violência.
Vecina (2004, p. 52) apresenta com base na literatura e na sua
experiência clínica que as pessoas que comentem violência sexual “também
foram invadidas, foram objetos de desejo para outrem (físico, sexual ou
psicologicamente), no decorrer do seu processo de desenvolvimento”. Ou seja,
são pessoas que no passado foram vítimas, e pela falta de acompanhamento
especializado e oportunidades de vivenciar cuidados e proteção especial ,
reproduzem a violência com seus filhos por não conseguir desenvolver seu
papel de protetor.
“anal”.
17
Palavra derivada do latim “incestus” significa : impuro, manchado, não casto.
34
Vecina (2004) traz uma importante contribuição ao apresentar
características do comportamento abusivo entre os quais pode-se destacar:
x Possuir uma comunicação com a vítima com a intenção de esconder o
crime, amedrontar, confundir, manter o poder através de não-ditos,
silêncios, mentiras ...
x Ter dificuldades em reconhecer e obedecer a limites do outro, sem limites
claros para si e sendo por vezes invasivos e invadidos nas relações;
x Ter dificuldades em perceber o que é realidade, em estabelecer vínculos;
x Tender a culpabilizar, colocando-se sempre na defensiva de possíveis
acusações;
x Mostrar necessidade de adotar limites externos rígidos, dogmas, preceitos
religiosos, que lhes dêem identidade.
No entanto, não significa que essas características sejam exclusivas
de um abusador, deve-se ter cuidados, pois não se pode querer encaixar
todas as características como se fosse regra geral. A autora afirma que não
existe um perfil único de pessoas que vitimizam, “são pessoas comuns, que no
convívio social não suscitam quaisquer suspeitas” (VECINA, 2004, p. 53).
Salienta que são poucos os casos em que o autor apresenta agravos de
personalidade grave que mereçam intervenção psiquiátrica.
Na Cartilha Violência Sexual contra Meninos e Meninas (2003)
encontram-se algumas das possíveis causas para o abuso sexual, a saber:
famílias com forte desigualdade de poder entre pai e mãe; modelo feminino
desvalorizado; uso de drogas e álcool; relação de poder geracional(idade)
baseada na subordinação; e desequilíbrio ou transtornos psíquicos dos
abusadores. Em outras palavras, são relações perpassadas pelo autoritarismo,
machismo, patriarcalismo, adultocentrismo, supremacia de relações de poder,
violências de gênero e sexualidade em detrimento, de valores como igualdade,
respeito, confiança.
Faleiros V.(1998, p. 47) enfatiza que o combate à violência sexual
seja abuso sexual ou exploração sexual implica na ”responsabilização legal dos
envolvidos, a denúncia, a declaração formal, a instauração do devido processo
35
e julgamento”. Acrescentamos a essa afirmativa a necessidade urgente de
Políticas Públicas (amplas de caráter preventivo e de atendimento) e uma rede
de garantia de direitos articulada, com equipe multidisciplinar , capacitados e
sensibilizados com a temática.
2.1.2 Exploração sexual e suas modalidades
As desigualdades econômicas, sociais, de gênero, de etnia, e
geração tornam vulneráveis crianças e adolescentes à exploração sexual, isto
é, são submetidas a uma relação comercial por adultos (que utilizam muitas
vezes da força física, psicológica e cultural) para tirar proveito diante da falta de
alternativas em que elas se encontram.
No entanto, o mesmo não pode ser afirmado quando há o abuso
sexual, ou seja, este crime não pode ser relacionado a uma classe social
específica. Para Faleiros, V. (1998), a pobreza apesar de não ser determinante
nos casos de violência contra crianças e adolescentes se constitui em um
processo de vulnerabilização social. Segundo o Relatório Final (CENTRO DE
REFERÊNCIA DE ESTUDOS E AÇÕES SOBRE A CRIANÇA E O
ADOLESCENTE, 1999) , um outro fator a considerar na manifestação de certas
modalidades de exploração sexual, refere-se às desigualdades regionais, ou
seja, a região nordeste está mais propensa à exploração sexual no turismo e
pornografia enquanto que a região norte a exploração sexual acontece nos
garimpos, estradas e leilões de virgem.
A Exploração Sexual configura-se enquanto uma violência contra a
sexualidade de crianças e adolescentes. Em diferentes sociedades se verificou
a existência da violência sexual. É um fenômeno que sempre existiu, em maior
ou menor grau, contudo, podemos assegurar que sempre houve a prevalência
na história humana de uma interdição moral ao abuso e à exploração sexual de
crianças e adolescentes. Essa interdição é baseada no princípio de que, os
filhos e as crianças da comunidade da qual se faz parte devem ser respeitados
e protegidos.
36
Para refletir criticamente sobre a exploração sexual contra crianças e
adolescentes deve-se levar em consideração as “dimensões históricas,
culturais, estruturais, psicossociais, jurídica, ética e política.” (LEAL, 1999, p.
30)
Segundo Faleiros E. (2000), a exploração sexual infanto-juvenil
configura-se como uma relação de caráter comercial e em sua maioria o alvo
predileto dos exploradores (geralmente do sexo masculino) são crianças e
adolescentes do sexo feminino.
Os crimes referentes à exploração sexual comercial de crianças e
adolescentes são perpassados por uma relação de poder e de sexualidade
mercantilizada, que implica a prática sexual de adultos com crianças e
adolescentes através da comercialização de seus corpos, por meios coercitivos
ou persuasivos, que deve ser analisado dialeticamente considerando as
dimensões histórica, social, cultural, psicossocial, econômica e jurídica.
Conforme o Relatório Final- Brasil (CENTRO DE REFERÊNCIA DE
ESTUDOS E AÇÕES SOBRE A CRIANÇA E O ADOLESCENTE, 1999) a
exploração sexual pode ser compreendida em 04 modalidades: turismo sexual,
prostituição, pornografia e tráfico.
Por turismo sexual entende-se:
[...] exploração de meninos e meninas e adolescentes por
visitantes, em geral, procedentes de países desenvolvidos ou
mesmo turistas do próprio país, envolvendo a cumplicidade, por
ação direta ou omissão de agências de viagem e guias
turísticos, hotéis, bares, lanchonetes, restaurantes e barracas de
praia, garçons e porteiros, postos de gasolina, caminhoneiros e
taxistas, prostíbulos e casa de massagens, além da tradicional
cafetinagem. (CENTRO DE REFERÊNCIA DE ESTUDOS E
AÇÕES SOBRE A CRIANÇA E O ADOLESCENTE, 1999, p.27)
A expressão turismo sexual encontra-se em destaque por existirem
críticas pertinentes sobre a utilização deste termo, principalmente para
caracterizar o crime de explorar sexualmente crianças e adolescentes, por isso,
propomos utilizar a expressão exploração sexual de crianças e adolescentes
no turismo.
37
Em se tratando da política de crescimento do turismo no Nordeste
brasileiro, esta se desenvolveu, otimizando suas potencialidades naturais, o
que por sua vez, é justificada pela construção cultural da valorização do
modelo sol/praia, visto que o Nordeste dispõe de 3.300 Km de litoral, dos quais
400Km encontram-se no Estado do Rio Grande do Norte com uma população
de 2,68 milhões em uma área concentrada em 53.306 Km².
Conforme o anuário estatístico de 2005 fornecidos pela Empresa
Brasileira de Turismo - EMBRATUR, o Rio Grande do Norte recebeu no ano de
2004 a visita de 83.019 turistas estrangeiros via área, dos seguintes países:
66.055 turistas da América do Sul; 7.486 turistas da Europa e 7.776 da América
do Norte.(BRASIL,2004, p.90)
A exploração sexual no Brasil pode ser considerada um
desdobramento da prática turística no mundo. A sua causa não pode estar tão
somente ligada ao desenvolvimento do próprio turismo, mas sim à relação
entre determinantes econômicos (superação de instabilidade
financeira/desemprego e pobreza), culturais e simbólicos (consumo de fetiches
e símbolos/sociedade do consumo).
No Rio Grande do Norte o desenvolvimento da indústria do turismo
se firmou a partir da década de 80, com a construção da Via Costeira
18.
Embora
a atividade turística local desenvolva um importante papel de proporcionar o
desenvolvimento econômico do RN, são constatados hoje, alguns impactos
negativos da indústria do turismo como, degradação ambiental, aumento de
preços de produtos nos destinos para a comunidade local, aumento do
consumo de drogas, exploração sexual de crianças e adolescentes
19
,
vulnerabilidade ao tráfico internacional de crianças e adolescentes, aumento da
violência, dentre outros. A Cidade do Natal, por ser considerada uma região de
grande potencial turístico pelas suas belezas naturais e culturais, têm recebido
um contingente muito grande de visitantes nacionais e internacionais (com a
18
A Via Costeira é uma artéria viária que liga a região Costeira da cidade ao Parque das Dunas.
A sua construção significou o desenvolvimento da indústria do turismo em Natal.
19
No Brasil, no período de 1997 a 2003, o Sistema Nacional de Combate à Exploração Sexual
Infanto-Juvenil, operacionalizado pela Associação Brasileira Multiprofissional de Proteção à
Infância e Adolescência, registrou – ABRAPIA, contabilizou 3.328 casos de exploração sexual.
38
ampliação de vôos charters) o que despertou uma preocupação em diversos
setores com a exploração sexual de crianças e adolescentes no turismo. Na
DCA, nos anos de 2003 e 2004 foram registradas 04 denúncias de aliciamento
e 03 de prostituição envolvendo turistas. Neste sentido, surgiram algumas
medidas preventivas e de enfrentamento, em âmbito do governo e da
sociedade civil organizada que tiveram repercussão nacional e serão
destacadas no segundo capítulo deste estudo.
Felizardo (2004, p. 1) propõe refletir o fenômeno do turismo sexual a
partir de outras categorias estruturantes, tais como:
as trocas simbólicas profundamente significativas para as
adolescentes – a troca de sexo, carinho, e afeto por conforto,
estabilidade financeira, elevação da auto-estima, a necessidade
de vivenciar um grande amor e o desejo de ascensão
econômica, gerando mobilidade social, a possibilidade de um
casamento com estrangeiros, ou simplesmente viver um tempo
na Europa, surge como uma alternativa escapatória para a
impossibilidade e ausência de perspectivas de projeto de vida
dentro do país.
A autora alerta para a necessidade de considerar essas categorias,
bem como a dimensão “romantizada” que perpassa o imaginário de
adolescentes e turistas estrangeiros ao elaborar políticas sociais. Felizardo
(2004, p.2), afirma ser inadequado definir como violência sexual a experiência
de adolescentes, quando não existir a passividade, no “intercâmbio-econômico-
sexual-afetivo” com turistas estrangeiros. Neste sentido, a autora esclarece que
será considerada “exploração sexual” quando estiver envolvido em redes de
exploração sexual.
A partir da pesquisa realizada na cidade de Fortaleza com jovens
inseridas no contexto do Turismo Sexual, Piscitelli (2003, p.7) mostra que
existe uma preferência por europeus e, em menor grau, por homens do
Sudeste do Brasil que são definidos pelo “romantismo e delicadeza”. Essas
características são contrapostas a masculinidade local (Nordeste) perpassada
por aspectos “machistas”, o que justifica a rejeição por esses homens.
A prostituição caracteriza-se pela forma de exploração sexual
comercial de crianças e adolescentes através da relação sexual com adultos
em troca de dinheiro ou produtos. Este termo está em destaque por acreditar
39
que crianças e adolescentes em situação de exploração estão sendo
prostituídos (as), não são prostitutos(as). Segundo Relatório Final-Brasil
(CENTRO DE REFERÊNCIA DE ESTUDOS E AÇÕES SOBRE A CRIANÇA E
O ADOLESCENTE, 1999), o BICE- Buerau Internacional Catholique de
L´Enfant, 1996, destaca que quando se trata de crianças e adolescentes,
pessoas em processo de desenvolvimento, a prostituição não pode ser
entendida como trabalho, pois esta prática implica deteriorização física e
psicológica.
É importante entender estes conceitos para que não se confunda
exploração sexual com a vontade ou liberdade de adolescentes em exercer sua
sexualidade de forma consciente e responsável. Não se quer e não se deve
mascarar uma realidade, por concepções moralistas, puritanas e até
preconceituosas que insistem em rotular e estigmatizar adolescentes pobres.
Identificamos que geralmente, em depoimentos de jornais e seminários o
incômodo maior é ver adolescentes e mulheres negras, pobres, acompanhadas
de turistas em lugares antes só freqüentado pelas jovens ricas da cidade. Não
importa se estão passeando pelas praias e shopping, na visão discriminatória
de alguns, elas estão se prostituindo, e o espaço que estão ocupando chama
mais atenção das autoridades, do que crianças catando lixo, nas ruas,
expostas aos diversos riscos.
Vale salientar, que, historicamente, a propaganda oficial do governo
e de empresários ao divulgar o destino turístico do Brasil, enfatizou a imagem
da mulher enquanto objeto sexual de desejo, muitas vezes retratadas semi-
nuas e associada à imagem do carnaval, o que culturalmente pode-se explicar
a vinda através dos vôos charters de homens solteiros de diversos países
europeus, em busca de prazer sexual. Segundo Soares do Bem (2004, p.
131), “a mulher brasileira incorporada como objeto de consumo é a
mulata/negra, representada como sendo picantes, mundanas, disponíveis,
pouco emancipadas, carinhosas”, e nas palavras do autor “o diferente constitui-
se também enquanto objeto de desejo”.
Ressalta-se que o envolvimento de turistas com homens, mulheres
ou adulto(a)s que exercem a prostituição ou não, não se configura em crime. O
que se questiona é a vinda de turistas em busca de prazer sexual com crianças
e adolescentes. Conforme demonstra o Relatório Final (CENTRO DE
40
REFERÊNCIA DE ESTUDOS E AÇÕES SOBRE A CRIANÇA E O
ADOLESCENTE, 1999, p. 39), a exploração sexual de crianças e adolescentes
no turismo acontece principalmente nas regiões litorâneas de intenso turismo,
como as capitais da, região do nordeste, com caráter comercial, organizada em
rede de aliciamento que inclui agências de turismo nacionais e estrangeiras,
hotéis, comércio de pornografia, taxistas e outros.
Uma terceira modalidade de exploração sexual, pode-se configurar
através da pornografia que tem se propagado com o advento da informática.
Um dos impactos da globalização para o mundo moderno, é o acesso ilimitado
a informação. A inclusão digital passa a ser critério para uma inserção e
interação social, principalmente entre os jovens.
Afinal, através da internet tem-se em segundos acesso às notícias,
fotos, encontros... navegar sem fronteiras pode ser fácil e rápido.
Internet, passa a ser sinônimo de diversão e um atrativo para
crianças e adolescentes que em apenas alguns segundos podem ter acesso às
informações e respostas às suas curiosidades. Neste sentido, alerta os
especialistas para as armadilhas da internet, e aos cuidados que pais e
profissionais devem ter ao permitir o acesso de crianças e adolescentes a
alguns sites
20
e salas de bate-papo
21
.
Landini (2004, p. 103) afirma que houve um aumento considerável de
troca de pornografia infantil via internet e alerta para dois riscos: a internet ao
tornar público o privado, faz com que as pessoas sintam e ajam como se
estivessem na esfera privada, isto é, as fotos e imagens pornográficas com
crianças antes trocadas apenas entre os clubes dos pedófilos
22
, agora pode ser
20
A maioria dos sites internacionais para obtenção de jogos infanto-juvenis gratuitos, possuem
links com imagem pornográficas que dão acesso direto a sites de conteúdo pornográfico e
anúncios com telefones para programas sexuais. O acesso a esses sites destinados a
população infanto-juvenil que possui como atrativos jogos, ao mesmo tempo, expõe a essas
crianças e adolescentes de forma involuntária ao conteúdo pornográfico e pode-se constituir
em isca para os exploradores sexuais, uma vez que para ter acesso aos jogos deve-se fazer
um cadastro. Um outro caminho frequentemente utilizado está para divulgar fotos e imagens de
crianças e adolescentes em situação de violência sexual tem sido blogs, flogs e Orkut.
21
As salas de bate papo é um termo utilizado para definir sites que permitem a conversação e
a troca de fotos entre vários internautas simultaneamente.
22
Pedofilia entendida como “doença psicológica e diz respeito a pessoas, geralmente homens
que têm desejos sexuais exclusivamente por crianças(não adolescentes) ”. (Tatiana Landini,
2004)
41
acessadas por todos; a pornografia infantil está inserida em outros tipos de
pornografia no qual pessoas têm acesso muitas vezes sem perceber que
cometem um crime. Landini(2004,p. 103) enfatiza que o combate passa pelo
incentivo à denúncia, medidas repressivas, e necessariamente pela educação
e o esclarecimento que a pornografia infantil é crime e que “por trás daquelas
fotos existe uma violência real”.
A pornografia infantil pode ser encontrada também através da
produção audiovisual: quadrinhos, revistas, posters, vídeos, filmes, peças
publicitárias etc. Serão legalmente considerados exploradores sexuais os
produtores, os intermediários (aliciadores e pessoas de apoio) , os
difusores(anunciantes, comerciantes, publicitários) e ou consumidores dos
produtos.
Neste estudo, corroboramos com a concepção de Pornografia do
Protocolo Facultativo à Convenção dos Direitos da Criança (CENTRO DE
REFERÊNCIA DE ESTUDOS E AÇÕES SOBRE A CRIANÇA E O
ADOLESCENTE, 1999, p. 25) :
Por utilização de crianças na pornografia se entende
comercialização/tráfico ou difusão, ou a produção ou posse(para
fins de tráfico/comercialização ou outro fim ilícito) de quaisquer
materiais que constituem uma representação de uma criança
realizando atos sexuais explícitos ou representando como
participante neles (ou utilizando) em uma atividade
sexual(explícita) ou qualquer representação (ilícita) do corpo ou
de parte de uma criança, cujo caráter dominante seja a exibição
com fins sexuais(entre outras coisas, incentivar a prostituição
infantil e a utilização de crianças na pornografia, inclusive no
contexto do turismo sexual que afeta crianças.
(CECRIA,
1999, p. 25)
O crime de pornografia infantil quando cometido via internet, devido a
sua especificidade, exige uma Polícia equipada tecnologicamente, composta
por um aparato pessoal, tecnológico, técnico-administrativo especializado e
levando-se em consideração as atuais situações em que se encontram a
Política de Segurança Pública torna-se ainda mais complicado a
responsabilização dos culpados.
42
Em relação à legislação brasileira sobre a pornografia infantil houve
importantes alterações do Estatuto da Criança e do Adolescente(BRASIL,
2003), destacando-se:
x No art. 240 foi incluso a “atividade fotográfica ou de qualquer meio
visual” e houve o aumento da pena que passou de 1(um) a 4 (quatro)
anos para 2(dois) à 6(seis) anos de reclusão existindo o agravante se o
agente comete o crime no exercício de cargo ou função e se obteve
vantagem patrimonial neste caso a pena poderá ser de 3 (três) a 8 (oito)
anos;
x No art. 241 acrescentou “apresentar, produzir, vender, fornecer, divulgar
ou publicar por qualquer meio de comunicação, inclusive rede mundial
de computadores ou internet”, fotografias ou imagens pornográficas de
crianças e adolescentes. Houve também o aumento da pena que passou
para 2(dois) a 6(seis) anos de reclusão.
x Acrescenta ao art. 244-A “submeter criança ou adolescente” à
prostituição ou à exploração sexual” e incorre a mesma pena , 4(quatro)
à 10(dez) anos, o proprietário, gerente ou responsável pelo local em que
se verifique a submissão de crianças e adolescentes e obrigatoriamente
havendo a condenação acarretará a “cassação da licença de
localização e de funcionamento do estabelecimento.”
Os artigos de 252 à 258 do Estatuto da Criança e do Adolescente
(BRASIL, 2003) refere-se a proibição do acesso de crianças e adolescentes à
pornografia ou material considerado impróprio à sua faixa etária.
Os avanços do ECA sobre os crimes de pornografia na internet não
foram contemplados de forma explícita pelo Código Penal(BRASIL, 1997), o
artigo 234 o que mais se aproxima com a criminalização da pornografia infanto-
juvenil reza: “fazer, importar, exportar, adquirir, ou ter sob sua guarda, para fim
de comércio ou distribuição ou de exposição pública, escrito, desenho, pintura,
estampa ou qualquer objeto obsceno.”
Além disso, mais um agravante diz respeito a falta de culpabilização
do sujeito “cliente” , tanto o ECA (BRASIL, 2003) quanto o Código Penal não
prevê de forma explícita pena para o cliente ou consumidor dos serviços e
publicações de pornografia infanto-juvenil. Para Vivarta (2003), além da
invisibilidade legal existe também na sociedade a cultura de proteger a pessoa
43
que está usufruindo do esquema da Exploração Sexual o que dificulta por
vezes a punição do cliente.
Sobre o crime de tráfico de crianças e adolescentes para fins de
exploração sexual destaca-se a concepção de Leal (2004) que busca entender
este fenômeno numa abordagem crítica, no contexto da globalização dos
direitos humanos e da globalização do crescimento e desenvolvimento para
todos. Leal (2004, p.42) aponta que este fenômeno está inserido no “mercado
transnacional, que potencializa a sexualidade na relação de troca comercial,
submetendo crianças e adolescentes à condição de mercadoria”.
Ressaltamos que no mundo colonial a prática do comércio de
pessoas através do tráfico internacional era justificada pela suposta
supremacia de uma etnia sob uma população negra, pobre, principalmente
composta de homens fortes para o trabalho nas lavouras e de mulheres cuja
função era fundamentalmente reprodutoras, “mucamas” e “objeto” de prazer
para os senhores feudais.
Nos últimos anos, a Pesquisa sobre Tráfico de Mulheres, Crianças e
Adolescentes-PESTRAF (2002) apontou que nesta relação mercadológica a
oferta é a mercadoria – são mulheres e adolescentes entre 15 e 25 anos, na
sua maioria afro-descendentes, alfabetizadas, de classes populares, que
moram em bairros periféricos e que já passaram por algum tipo de violência
sexual e/ou física.
Ainda de acordo com a Pesquisa, a demanda é o
“mercado/usuário/consumidor” composta por redes organizadas de criminosos.
Neste contexto, as vítimas são mulheres e adolescentes que saem dos seus
países de origem muitas vezes iludidas por falsas promessas de emprego ou
ainda em busca de condições melhores de sobrevivência, através da
prostituição. No entanto, ao chegar ao país de destino, são tratadas como
escravas, em condições subumanas , e o que seria um sonho de vida, passa a
ser um pesadelo.
O Código Penal (BRASIL, 1997) contempla no capítulo V arts. 231 e
231-A (recém alterados), respectivamente, o crime de tráfico internacional e
interno de pessoas para fins sexuais que prevê reclusão de 3 (três) a 8 (oito)
anos . Segundo dados da Delegacia Especializada em Defesa da Criança e do
Adolescente, no período de 2001 à 2004, não existem registros de boletins de
44
ocorrências e denúncias que se enquadram nos artigos referentes ao tráfico de
crianças e adolescentes no Estado do Rio Grande do Norte.
Faz-se uma ressalva que os crimes de pornografia infantil via internet
e tráfico de crianças e adolescentes para fins sexuais para o exterior devido
abrangência e repercussão transnacional passa a ser responsabilidade da
Divisão de Polícia Criminal Internacional do Departamento Polícia Federal.
2.2 A INSERÇÃO DA DISCUSSÃO SOBRE A VIOLÊNCIA SEXUAL NA
AGENDA POLÍTICA
A história do enfrentamento à agressão sexual contra a população
infanto-juvenil no Brasil surge atrelada à luta pelo fim da violência contra
mulher. Segundo Vivarta (2003), o debate sobre o tema se fortaleceu em
1986, na região Nordeste, liderado pelo movimentos em prol dos direitos da
mulher e com apoio de organizações não-governamentais que desenvolviam
projetos com adolescentes vítimas de Exploração Sexual.
A expressão política dessas discussões ganhou visibilidade em
1990, com a aprovação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e por
um processo intenso de articulação e mobilização da sociedade civil para “criar
meios de propiciar e estimular a comunicação da violência, com maior respaldo
da Justiça para punir os violadores dos direitos conquistados “ (VIVARTA,
2003, p. 87).
Enquanto resultado destas ações, o Legislativo Federal , realizou em
1993, na Câmara dos deputados a primeira Comissão Parlamentar de
Inquérito - CPI sobre o problema da Exploração Sexual. Apesar da impunidade
dos envolvidos nas denúncias, a CPI permitiu traçar um mapa da prostituição
infanto-juvenil no país, além de apontar propostas emergenciais no tocante ao
atendimento de crianças e adolescentes, nas delegacias, campanhas
educativas e implantação da educação sexual nas escolas. Um outro aspecto
relevante refere-se ao próprio conceito prostituição infanto-juvenil que passa a
ser entendida como exploração sexual infanto-juvenil. Nesta perspectiva, a
prostituição oculta a natureza do comportamento sexualmente abusado. De
45
fato, a CPI cumpriu um papel de denúncia e sensibilização para o tema, até
então, silenciado em termos de Políticas Públicas. Não existia Política Pública
de atendimento as crianças e aos adolescentes vítimas de violência sexual em
âmbito nacional. No entanto, as denúncias realizadas na CPI no Estado do Rio
Grande do Norte não saíram do papel, sequer foram devidamente investigadas.
Em nível internacional, como já mencionado na introdução deste
trabalho destaca-se o I Congresso Mundial contra Exploração Sexual
Comercial de Crianças, realizado em agosto de 1996, na Cidade de Estocolmo,
que contou com a representatividade de 126 países. Deste evento resultou um
Plano de Ação e uma agenda mundial para o enfrentamento do problema.
Entre os compromissos reiterados , ressaltam-se: cooperação entre os estados
e setores da sociedade com vistas a impedir a entrada de crianças no mercado
do sexo; responsabilização dos exploradores sexuais em seu país de origem
ou no exterior; revisão e promoção de leis e programas para coibir a
exploração.
O apelo ao setor de turismo realizado no Congresso de Estocolmo,
resultou em 1998, no Código de Conduta para a Proteção de Crianças e
Adolescentes contra a Exploração e Turismo Sexual, documento este
incorporado pelo Código Ético Mundial para o Turismo. Financiado pela
Comissão Européia , mobilizou operadoras de turismo de vários países, que se
comprometeram a introduzir seis critérios e ações em suas atividades, a saber:
formulação de política corporativa ética sobre Exploração Sexual, treinamento
de funcionários nos países de origem e de destino; informação a turistas sobre
o tema; a inserção de uma cláusula na qual repudiam a exploração sexual
infanto-juvenil nos contratos com fornecedores ; e a realização de encontros
anuais sobre as atividades desenvolvidas à implementação do Código.
23
O Governo Brasileiro assume publicamente o compromisso de
implantar Políticas Públicas que garantam os direitos das crianças e dos
adolescentes em situação de risco pessoal e social.
23
Informações obtidas no livro Grito dos Inocentes (2003). O livro publicado pela ANDI- Agência
de Notícia dos Direitos da Infância traz uma importante contribuição aos meios de comunicação
ao propiciar a discussão do tema da violência sexual contra crianças e adolescentes. A ANDI,
desde 1992, passou a desenvolver um conjunto de estratégias direcionadas à expansão da
presença de temáticas associadas à infância e à adolescência na pauta dos meios de
comunicação brasileiros. No capitulo a seguir apresentaremos a experiência do Código de
Conduta pioneiramente adaptado para a realidade do Rio Grande do Norte.
46
Entretanto , este compromisso assumido no I Congresso de
Estocolmo apenas se instrumentaliza quatro anos depois, em 2000, mediante a
articulação nacional entre as organizações públicas, privadas e sociais com a
elaboração do Plano Nacional de Enfrentamento a Violência Sexual Infanto-
Juvenil, na Cidade do Natal-RN. O referido Plano (BRASIL, 2002, p. 14), passa
a ser referência nas três esferas de governo objetivando “estabelecer um
conjunto de ações articuladas que permita a intervenção técnica-política e
financeira para o enfrentamento da violência sexual contra crianças e
adolescentes”. Apresenta-se dividido em 06 (seis) eixos estratégicos com
objetivos e metas próprias e articuladas: análise de situação; mobilização e
articulação; defesa e responsabilização; atendimento; prevenção e
protagonismo infanto-juvenil.
O Plano destaca-se por apontar de maneira concisa objetivos, ações
e metas em âmbito federal para o enfretamento da violência sexual contra
crianças e adolescentes no período de 2000 à 2003.
Neste estudo, em relação ao Plano Nacional buscamos desvelar
como se articula o eixo de defesa e responsabilização, por esse preconizar a
criação, implementação e consolidação das Delegacias especializadas de
crimes contra crianças e adolescentes. No decorrer da análise serão pontuadas
ações que foram contempladas pelos demais eixos e seus determinantes.
Ao longo de nossa pesquisa observamos que dos objetivos
apontados no eixo defesa e responsabilização tais como : atualizar a legislação
sobre crimes sexuais, combater a impunidade, disponibilizar serviços de
notificação e capacitar os profissionais da área jurídica-policial; implantar e
implementar os Conselhos Tutelares, o SIPIA- Sistema de Informação para a
Infância e a Adolescência e as Delegacias Especializadas de crimes contra
criança e adolescentes , alguns foram alcançados durante o período
compreendido de 2000-2004.
Contudo, apesar do Plano Nacional (BRASIL ,2002,p. 30)
estabelecer a necessidade de se “manter equipes multiprofissionais e
interdisciplinares especializadas para o atendimento de crianças e
adolescentes vitimados sexualmente junto às Delegacias, Instituto Médico
Legal - IML, Vara de Justiça, Promotorias e Defensorias” , o que se constatou
nos órgãos referidos é a carência ou a inexistência de um quadro
47
multiprofissional. O trabalho, a exemplo da DCA em Natal-RN, está sendo
desenvolvido por estudantes estagiárias dos Cursos de Serviço Social e
Psicologia. Na rede de atendimento encontramos conselheiro tutelar com
graduação em Contabilidade e ainda foram apontadas outras dificuldades no
exercício da função no programa SOS Criança, a saber:
A condição de trabalho não é satisfatória, porque a demanda é
tamanha que o cargo não suporta, mas dá pra gente trabalhar.
Agora a questão da infra-estrutura e manutenção do programa
não são satisfatórias. Um dos problemas maiores do SOS
criança é a questão da equipe multidisciplinar. Quando a gente
começou tínhamos 90% da equipe de profissionais com nível
superior e hoje há uma deficiência nesse quadro, pois a maioria
é de nível médio. A qualidade do trabalho caiu muito, nesse
sentido. Outra dificuldade é a questão da articulação rede de
atendimento, porque há casos que requer agilidade, e os órgãos
não garantem essa agilidade. A gente precisa de um
atendimento especial não tem, precisa de acompanhamento das
famílias não tem. As maiores dificuldades são a equipe e a rede
de atendimento, também a dificuldade de articulação.
Deficiência das políticas públicas.(Assistente Social do SOS
Criança)
No que se refere à legislação observa-se que o Código Penal
24
ainda é retrógrado e poucas alterações foram feitas. O plano previa que se
constituísse um grupo de trabalho para elaborar propostas de mudanças na
legislação que seriam entregues à Comissão de Reforma do Código Penal até
2001. Apontava mudança no art.225 do Código Penal, outorgando à criança e
ao adolescente, vítima de violência sexual, o direito de denúncia; criar-se
legislação extraterritorial contra os crimes sexuais e o tráfico de crianças e
adolescentes para fins sexuais; aprovar os projetos de lei contra crimes sexuais
contra crianças e adolescentes na internet e o que responsabiliza os
exploradores sexuais de crianças e adolescentes por produção, distribuição e
posse de material pornográfico.
No Estado do Rio Grande do Norte, destaca-se a elaboração do
Plano Estadual de Enfrentamento à Violência Sexual contra Crianças e
24
No próximo item, procuraremos situar sobre as propostas de alterações e alguns avanços do
Código Penal.
48
Adolescentes, que teve início em 2003 e foi concluído em 2005, desencadeada
pela Casa Renascer
25
, Organização não-governamental.
O referido plano é resultante das mobilizações e articulações de
instituições governamentais e não -governamentais que trabalham com a
temática da criança e do adolescente, possui o objetivo geral de:
estabelecer um conjunto de ações planejadas e articuladas
através da intervenção de organizações governamentais e não-
governamentais de caráter técnico, científico, político e
financeiro, que garantam o enfrentamento da violência sexual
contra crianças e adolescentes . (Plano Estadual, 2005: p.5)
Neste sentido, o Plano estadual segue os mesmos eixos de atuação
previstos no Plano Nacional e para cada objetivo foram traçadas ações e metas
a serem cumpridas no período de 2005 a 2007.
Na área de interesse desse estudo, observamos que no eixo defesa
e responsabilização distinguem-se metas: criação de delegacias especializadas
de defesa da criança e do adolescente, dotadas de equipe interdisciplinar, em
todo o Estado, por região geográfica; dotar de recursos materiais e humanos as
delegacias especializadas; criar Varas especializadas para processar e julgar
nas Comarcas de 3ª entrância os crimes contra crianças e adolescentes;
instrumentalizar a polícia técnico-científica, para o atendimento especializado,
com prioridade; dotar as delegacias especializadas de equipamentos de
informática e acesso à internet; realizar, nas regiões pólos, formação
continuada de policiais para intervir adequadamente nas diversas situações de
violência sexual contra crianças e adolescentes; inclusão do tema da violência
sexual na formação curricular das polícias.
É imprescindível que as metas previstas no Plano Estadual devam
receber uma atenção especial na previsão orçamentária e ultrapassar o
aspecto legal, normativo, tornando-se ações e Políticas Públicas eficientes,
eficazes e efetivas, para que crianças e adolescentes vítimas de violência
sexual tenham de fato seus direitos garantidos.
25
Deter-se-á no Capítulo II a discussão das organizações governamentais e não-
governamentais que trabalham a temática da violência sexual contra crianças e adolescentes,
dentre elas , a Casa Renascer e a RESPOSTA.
49
Nesta direção, cabe a sociedade cumprir o papel preponderante de
estimular, participar, pressionar e exigir respostas do poder público para que o
Plano Estadual constitua-se em um instrumento norteador de ações e políticas
para o enfrentamento à violência sexual no Estado do Rio Grande do Norte.
2.3 LEGISLAÇÃO REFERENTE AOS DIREITOS DE CRIANÇAS E
ADOLESCENTES – AVANÇOS OU RETROCESSOS?
Conforme Faleiros V. (1998), juridicamente, a infância era tida como
fase de incapacidade, da tutela, da menoridade, com as obrigações de
obediência e submissão.
Fazendo uma breve retrospectiva jurídica, observa-se que os
Códigos eram coercitivos:
- o Código Criminal Penal do Império 1830;
- o primeiro Código Penal Republicano 1890;
- o primeiro Código de Menores brasileiro surge em 1927 – trata-se
de uma legislação específica referente as crianças e aos adolescentes, o qual
se restringe a aplicar medidas aos menores de 18 anos relativa à prática de
atos considerados infrações penais, tinha como paradigma a defesa da higiene
e da ordem. De forma ínfima, introduziram-se normas de proteção a criança e
ao adolescente em situação irregular ao estabelecer medidas de assistência ao
chamado menor abandonado e coibir o trabalho do menor de doze anos e o
trabalho noturno.
Assim sendo, observa-se que em nada se vislumbra algo que
direcione a criança ou ao adolescente à sua formação como ser social.
Em 1979, publica-se um novo Código de Menores, a lei nº 6.697 que
rompe definitivamente com a Doutrina do Direito Penal do Menor e passa a
adotar a Doutrina Jurídica do Menor em Situação Irregular , isto é, seu objeto
principal foi o denominado menor carente, abandonado e infrator, sem no
entanto proporcionar-lhe proteção integral. Crianças e adolescentes
novamente tiveram sua identidade enquanto sujeito de direitos negligenciados.
50
Somente a partir da Constituição Federal de 1988 é que a criança e o
adolescente passam a ser considerados sujeitos de direitos, introduzindo ao
marco legal a Doutrina de Proteção Integral, garantindo prioridade absoluta e o
dever de proteção, artigo 227(BRASIL,1988) :
É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à
criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à
vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, á
profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à
liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-
los a salvo de toda a forma de negligência, discriminação,
exploração, violência, crueldade e opressão.
Referendado pelo Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA lei
nº 8069 13/07/1990,(BRASIL, 2003, p.16) que traz uma nova terminologia (em
relação ao Código de Menores) e clareia princípios e direitos já citados na
Constituição, como reza o artigo 5:
Nenhuma criança e adolescente será objeto de qualquer forma
de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e
opressão, punido na forma de lei qualquer atentado, por ação ou
omissão, aos seus direitos fundamentais.
O referido Estatuto, resultado de anos de lutas e reivindicações dos
movimentos populares em defesa da criança e do adolescente, trata-se do
divisor de águas da garantia de direitos negados historicamente. Reflexo de um
projeto democrático onde crianças e adolescentes passam a ser vistos
legalmente como sujeitos de direitos e deveres; a família e a sociedade civil
são chamadas a participar junto ao Estado, do compromisso de garantir com
prioridade às crianças e aos adolescentes, direitos fundamentais que
promovam o desenvolvimento físico, psíquico e social inerentes a sua condição
de pessoa humana em desenvolvimento. Institui ainda a figura dos Conselhos
(nas três esferas de poder) que contam com a participação popular paritária
(igual número de participação de entidades governamentais e não-
governamentais) como agentes propositores, controladores e fiscalizadores de
políticas de atendimento às crianças e aos adolescentes. Como afirma o artigo
86(BRASIL, 2003, p.38):
51
A política de atendimento dos direitos da criança e do
adolescente far-se-á através de um conjunto articulado de ações
governamentais e não-governamentais, da União, dos Estados,
do Distrito Federal e dos Municípios.
Nos anos 90 do séc. XX, em relação a leis referentes à temática da
violência sexual vislumbram-se :
A Lei dos crimes Hediondos nº 8.072 de 25/07/90 (BRASIL, 1990)
aumentou-se as penas em caso de estupro e atentado violento ao pudor, e se
a vítima tiver menos de 14 anos, as penas são acrescidas pela metade. São
classificados crimes hediondos sempre que se revestir de extrema gravidade,
evidenciar insensibilidade ao sofrimento físico ou moral da vítima ou a
condições especiais (crianças, deficientes, idosos). A esses crimes o acusado
não terá direito a fiança, indultos ou diminuição de pena.
26
A Lei da Tortura nº 9455/97(BRASIL, 1997, p. 1)., considera crime
de tortura, entre outros, “submeter alguém, sob sua guarda, poder ou
autoridade, com emprego de violência ou grave ameaça, a intenso sofrimento
físico ou mental, como forma de aplicar castigo pessoal ou medida de caráter
preventivo”, prevê aumento da pena se a vítima for criança ou adolescente.
A Lei nº 9.970/00 (BRASIL, 2000) que institui o dia 18 de maio, o Dia
Nacional de Combate ao Abuso e Exploração Sexual de Crianças e
Adolescentes
27
, neste data as organizações envolvidas com o Plano Nacional
de Enfrentamento a Violência Sexual Infanto-Juvenil promovem ações de
mobilizações da sociedade como estratégia de chamar a atenção sobre a
temática da violência sexual.
26
Segundo reportagem de Hugo Marques do JB on line de 10 de agosto de 2004, intitulada
“Penas mais brandas para crime hediondo”, o Ministério da Justiça propõe rever o artigo a Lei
dos crimes Hediondos que obriga o cumprimento em regime fechado, com a mudança, crimes
como estupro, seqüestro e homicídios na teriam mais as penas cumpridas integralmente em
regime fechado. As justificativas do atual ministro da justiça , Thomas Barros seria que a lei
não cumpriu seu objetivo de reduzir os crimes, além do alto custo para a manutenção das
penitenciária e desafogar sistema carcerário. O que consideramos um equívoco e um
retrocesso legislativo.
27
O dia 18 de maio representa o dia em que uma menina de nove anos chamada Araceli
Cabrera Crespo desapareceu e posteriormente foi encontrada morta com sinais de crueldade.
A menina foi drogada, estuprada, espancada e desfigurada . O crime aconteceu no Espírito
Santo e até hoje os acusados (filhos de famílias ricas do Estado) estão impune.
52
Segundo Nogueira Neto (2006, p.13), a eficácia jurídica de uma lei
está diretamente relacionada com a “comprovação da sua aplicabilidade a
casos concretos; da sua imperatividade, impositividade e coercitividade; da
imprescindibilidade e exigibilidade dos direitos que ela reconhece, constitui e
assegura.”
Neste sentido o Código Penal, reclama por modificações, no tocante
à violência sexual infanto-juvenil. Segundo o Relatório Final da Comissão
Parlamentar Mista de Inquérito - CPMI(2004, p. 167):
Sobre a legislação penal reinante pairam concepções
características da época do exercício autoritário de poder
__
a
primeira metade dos anos 40
__
e de padrão insuficiente para a
repressão aos crimes sexuais, seja por estigmas sociais, seja
pelos valores preconceituosos atribuídos ao objeto e às
finalidades da proteção pretendida. Trata-se de reivindicação
antiga dos grupos e entidades que lidam com a temática, sob o
argumento de que a norma penal, além de desatualizada quanto
a termos e enfoques, não atende a situações reais de violação
da liberdade sexual do indivíduo e do desenvolvimento de sua
sexualidade, em especial quando tais crimes são dirigidos
contra crianças e adolescentes.
Nesta perspectiva de reflexão, o relatório da CPMI (BRASIL, 2004,
p.167) condensa várias propostas de modificações ao Código Penal-CP
28
, a
saber:
A primeira alteração diz respeito à nomenclatura do capítulo do
Código Penal-CP , propõe-se substituir “ DOS CRIMES CONTRA OS
COSTUMES “ por “DOS CRIMES CONTRA A LIBERDADE E O
DESENVOLVIMENTO SEXUAL ” , desta forma entende-se que se distancia da
concepção moralista e aproxima-se da perspectiva de direitos humanos.
Existe ainda a proposta de unificar o crime de atentado violento ao
pudor art. 214 do Código Penal “constranger alguém, mediante violência ou
grave ameaça, a praticar ou permitir que com ele se pratique ato libidinoso
diverso da conjunção carnal” ao de estupro (art. 213 do Código Penal) que
atualmente restringe o crime praticado contra mulheres à conjunção carnal (ato
28
Para maiores detalhes das propostas de alterações no Código Penal e no Estatuto da
Criança e Adolescente consultar o Relatório da CPMI de 2003 publicado em 2004
53
sexual vaginal) . Neste caso o novo art. 213 do Código Penal passaria a dispor
da seguinte redação “constranger alguém, mediante violência ou grave
ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele/ela se
pratique outro ato libidinoso”. Acredita-se que desta forma se corrigiria o erro
da legislação atual que limita o crime à conjunção carnal e ao sexo feminino.
Uma outra proposta que merece destaque refere-se à retirada dos
termos “mulher honesta” e “mulher virgem” para caracterizar o crime de posse
sexual mediante fraude (art. 215 do CP), atentado ao pudor mediante fraude
(art. 216 do CP) , esses dois artigos seriam sintetizados em um novo art. 215 “
violência sexual mediante fraude” , em que seria considerado crime “a prática
com alguém de conjunção carnal ou ato libidinoso, mediante fraude”.
Nogueira Neto (2006, p. 12) afirma que a normativa jurídica precisa
ser “legítima socialmente, efetiva político-institucionalmente e eficaz
juridicamente” para a responsabilização jurídica-socialmente do Estado e
violadores e proteção de crianças e adolescentes vítimados pela violência
sexual.
Apesar das necessidades de mudanças e a morosidade do sistema
em promovê-las, observa-se que as mobilizações da sociedade civil , a
articulação com parlamentares com vistas a criação de projetos de lei
29
e
instalação das CPMI’s na temática da violência sexual infanto-juvenil trouxeram
alguns avanços ao velho Código Penal de 1940, são eles:
- A promulgação do projeto de lei nº 3187/97 que estabelece
presumidamente a violência absoluta, se a vítima for menor de 14 anos,
deficiente, se o agressor conhecer tais circunstâncias e ainda, presume
violência relativa , os casos em que a vítima por qualquer motivo, não puder
oferecer resistência. Nestes casos a pena é acrescida da metade.
- A promulgação da Lei nº 10.224/01 que, entre outros, inclui o
art.216-A que trata sobre o assédio sexual, “constranger alguém com o intuito
de obter vantagem ou favorecimento sexual prevalecendo-se o agente da sua
29
Salienta-se a importância da Constituição da Frente Parlamentar dos Direito da Criança e do
Adolescente. No Estado do Rio Grande do Norte a Frente Parlamentar foi constituída em 20 de
abril de 2004, resultado da articulação da Organização Não Governamental RESPOSTA com
alguns parlamentares.
54
condição de superior hierárquico ou ascedência inerentes ao exercício de
emprego, cargo ou função”
30
;
- A promulgação do projeto de lei nº 11.106 em 28 e março de 2005,
trouxe importantes modificações, que entre outras, acresce o artigo 231-A que
trata do tráfico interno de pessoas e modifica o Capítulo V que passa a vigorar
com o seguinte título ”DO LENOCÍNIO E DO TRÁFICO DE PESSOAS”, antes
restrito ao tráfico de mulheres; acrescenta ao art. 148 o agravante se a vítima
possui uma relação familiar com a vítima; revoga os arts. 217 , 219 e 220 que
trata, respectivamente, Sedução, Rapto violento e consensual ; e a retirada
dos termos “mulher honesta” e “mulher virgem” nos art. 215 sobre posse sexual
mediante fraude, art. 216 atentado ao pudor mediante fraude.
Internacionalmente, o primeiro passo para o compromisso com a
criança aconteceu com a proclamação da Declaração dos Direitos da Criança
31
publicado em 20 de novembro de 1959, pela Organização das Nações
Unidas-ONU. A referida declaração se apresenta em dez princípios que visam
nortear medidas legislativas e o cumprimento de direitos e liberdades que
devem ser garantidos pela família, sociedade e governos nacionais a todas as
crianças.
Após o 1º Congresso Mundial contra a Exploração Sexual realizado
em Estocolmo, iniciou-se uma pressão internacional para introduzir a legislação
da Extraterritorialidade, no sentido de coibir a ação de estrangeiros envolvidos
com a prática de abuso e exploração sexual de crianças e adolescentes em
outros países. A referida legislação penaliza a pessoa que cometer crime de
abuso e exploração sexual envolvendo crianças e adolescentes fora de seu
país, mesmo que o crime perpetrado não seja considerado crime no país onde
ocorreu o delito. A lei prevê que o autor do crime seja processado em seu país
de origem , para que isso ocorra de forma eficaz, faz-se necessária a
assinatura do Tratado de Assistência Legal Mútua por ambos os países com o
intuito de facilitar a obtenção de provas.
30
Os casos de Assédio Sexual contra crianças e adolescentes podem ser identificados quando
estas estão inseridas ao mundo do trabalho, seja de forma legal através de programas de
inserção profissional para adolescentes ou de forma ilegal que é o caso do trabalho infantil e o
doméstico. Ver Vaz, Marlene. O trabalho doméstico. Brasília: UNICEF, 1998. (apud Leal,2001).
31
Na Declaração dos Direitos da Criança entende-se criança toda pessoa menor de 18 anos.
55
Em 2000, destaca-se a convenção 182 da Organização Internacional
do Trabalho que dispõe sobre as Piores formas de Trabalho Infantil e Ação
Imediata para sua Eliminação. Destaca-se a exploração sexual comercial uma
das piores formas de trabalho imposta a crianças (A OIT define criança toda
pessoa com menos de 18 anos).
O Brasil ratificou a referida convenção e institui que todas as
Delegacias Regionais do Trabalho, Ministério Público do Trabalho e o Fórum
de Erradicação do Trabalho Infantil, e outros, a desenvolverem nos estados
brasileiros atividades, campanhas em prol da eliminação de todas as formas de
trabalho infantil.
Leal (2001, p. 49) alerta que a Sociedade tem assumido um papel
fundamental de pressão e no sentido de que o discurso legal não se constitua
apenas na repressão , “mas em um conjunto de medidas preventivas e de
desmobilização da ação do agressor, nos locais onde se estabelece o conflito
(família, comunidade, escola, trabalho, rua e mercado) “, para o enfrentamento
à violência sexual.
Apesar dos avanços apontados em termos jurídicos, reivindicamos a
necessidade de se promover os direitos humanos a partir da concretização de
políticas públicas articuladas e universalistas.
56
3 POLÍTICAS DE ENFRENTAMENTO A VIOLÊNCIA SEXUAL CONTRA
CRIANÇAS E ADOLESCENTES
3.1 AS POLÍTICAS PÚBLICAS DE ENFRENTAMENTO A VIOLÊNCIA
SEXUAL
Toda violência é social, histórica e portanto capaz de ser
controlada e erradicada caso haja vontade política (GUERRA,
1993, p. 37)
Neste capítulo, buscamos situar o Estado enquanto provedor de
Políticas Públicas e de como está se posicionando, uma vez inserido numa
política reducionista de clara desresponsabilização de deveres constituídos
legalmente.
Stanislau Krynski (1997, p. 38) alerta que:
em um país como o Brasil a meta é a sobrevivência pura e
simples: ter dinheiro para comer, morar e vestir. E o único
instrumento legítimo é o trabalho. À medida em que esse
instrumento é subtraído, o homem busca o caminho da violência
e do crime.
A atual crise do Capitalismo, os mecanismos e estratégias
construídas pelos detentores do capital para sua superação, como o fenômeno
da Globalização ou Mundialização do Capital
32
e, em especial, a adesão do
32
Conforme Alba Pinho (1998), esse termo usado pelos franceses explica melhor a verdadeira
intenção desse processo excludente e seletivo, onde regiões - do chamado terceiro mundo -
57
governo federal brasileiro, nos mandatos de Fernando Henrique Cardoso, ao
projeto neoliberal de (des)organização societal reservou às Políticas Sociais
uma intervenção cada vez mais pontual e fragmentada.
Vive-se a era da minimização e enxugamento do Estado e do apelo à
solidariedade e ao voluntariado dos indivíduos na teia das soluções e respostas
à Questão Social. A concepção de Iamamoto (2001, p. 27), vem ampliar este
entendimento ao definir que “[...] questão social diz respeito ao conjunto das
expressões das desigualdades sociais engendradas na sociedade capitalista
madura, impensáveis sem a intermediação do Estado. “
Ou seja, a Questão Social nasce historicamente com a luta de
classes, indissociável da acumulação capitalista sendo expressa nas
contradições sociais, econômicas, políticas e culturais das classes sociais
inerentes a esse sistema. Constata-se assim, que hoje não se tem uma nova
Questão Social, e sim múltiplas e diferenciadas expressões, que demandam
um Estado intermediador para o reconhecimento e legalização de direitos e
deveres dos sujeitos, que devem estar consolidados também em serviços e
políticas sociais.
Na perspectiva neoliberal, não compete mais ao Estado o papel
central de promotor de bens e serviços sociais essenciais à vida. O
neoliberalismo constitui-se, portanto, em:
[...] um movimento ideológico, em escala verdadeiramente
mundial, como o capitalismo jamais havia produzido no
passado. Trata-se de um corpo de doutrina coerente, auto-
consciente, militante, lucidamente decidido a transformar todo o
mundo à sua imagem, em sua ambição estrutural e sua
extensão internacional (ANDERSON, 1995 Q.2 ).
Neste sentido, a realidade da violência hoje se complexifica e vem
marcada pelas novas determinações no mundo do trabalho . Em que “o mais
brutal dessas transformações é a expansão sem precedentes na era moderna,
do desemprego estrutural, que atinge o mundo em escala global” (ANTUNES,
1995, p. 41). Ou seja, traz conseqüências como o desemprego , a precarização
estão sendo descartadas dessa expansão do capital por não ser financeiramente, politicamente
ou estrategicamente interessante a essa lógica mercantil.
58
do trabalho, dos salários e dos direitos trabalhistas além de repercutir na
alimentação, educação, saúde, habitação, segurança, dignas e eficientes à
população.
Segundo Iamamoto (2001), as transformações no mundo do trabalho
vêm atreladas às mudanças na esfera do Estado, denominada de Reforma do
Estado, exigidas pelas Políticas de ajustes propostas no Consenso de
Washington. Neste sentido, Montano (2002,p. 37) esclarece:
[...] a implementação do programa de estabilização, ajuste e
reformas institucionais, apoiado e promovido pelos governos
nacionais e pelas agências financeiras internacionais: programa
de privatizações, reduções de tarifas alfandegárias para
importação, liberalização dos preços, política monetária
restritiva, redução de isenções e linhas de crédito, corte de
gastos públicos, liberalização financeira e renegociação da
dívida externa .
Os excluídos de forma cruel do mundo do trabalho formam um
grande exército sobrante, cidadãos que estão fora do mercado, independente
de cor, grau de escolaridade, idade e sexo. São milhões de brasileiros que se
perguntam: Quem precisa de mim? Para estes, o trabalho, representa
sobrevivência, realização pessoal, profissional e social e é, portanto, prioridade,
pois permite se sentirem úteis, necessário para si, sua família e a sociedade.
Segundo o relatório da Organização Internacional do Trabalho-OIT, o
número total de desempregados no mundo sofreu um aumento no ano de
2005, situou-se em 191,8 milhões de pessoas.
Jovens na procura incessante do primeiro emprego, homens e
mulheres que estão sendo colocados em situação de inutilidade, sobrantes ou,
na expressão de Castel (1998, p. 530) “os supranumerários não integrados e
não integráveis” ou ainda, os considerados “inúteis para o mundo”.
De acordo com Kurz (1999, p. 1):
Além disso, entre o emprego formal e o desemprego também
cresce um setor difuso, que já é velho conhecido dos países do
Terceiro Mundo e que nas sociedades marcadas pelo
“apartheid” social de uma minoria que toma parte do mercado
globalizado, ganhou o rótulo de “economia informal” dos
excluídos, os quais vegetam abaixo do nível de miséria. Os
camelôs nas calçadas, os garotos nos cruzamentos, a
59
prostituição infantil ou sistema semilegal de reaproveitamento de
sucata e lixo compõem essa categoria.
(KURZ, 1999, p. 1)
O relatório da OIT demonstra ainda que dos 2,8 bilhões de
trabalhadores no mundo, em 2005, cerca de 50% deste total não recebem o
suficiente para elevarem sua situação e de suas famílias para acima da linha
da pobreza de 2 (dois) dólares diários.
No Brasil, a adesão à Política de ajustes vem se efetivando com as
políticas de privatizações e a clara desresponsabilização do Estado na área
social. A ideologia difundida é que cabe a sociedade civil assumir o papel
relevante no combate à pobreza e as desigualdades sociais, em conjunto com
os órgãos governamentais e organizações não-governamentais.
Neste sentido, Leal (2001, p. 15) afirma que:
o modelo vigente reduz os direitos tradicionais dos
trabalhadores e acentua a pobreza, as desigualdades sociais e
a emergência de novas formas de exploração sexual comercial
de crianças e adolescentes (prostituição, tráfico, turismo sexual
e pornografia), no contexto da diminuição do Estado social onde
as políticas sociais têm sofrido contínuos cortes e a cidadania
ameaçada
Diante de uma realidade de exclusão do mercado de trabalho , a
bens e serviços de qualidade num contexto de omissão e redução do Estado
na garantia de direitos historicamente conquistados e no provimento de
políticas sociais públicas
33
, crianças e adolescentes estão fragilizados
expostos a todo tipo de violência e exclusão. E conforme definição de Garry
Rogers ( apud DUPAS ,1999, p.19),
exclusão social é em sua essência ‘multidimensional’, incluindo
uma idéia de falta de acesso não só a bens e a serviços, mas
também a segurança, à justiça e a cidadania. Ou seja, relaciona-
se às desigualdades econômicas, políticas, culturais e étnicas,
entre outras.
33
De acordo com Faleiros (2000, p.43) “As políticas sociais se referem, em uma primeira
aproximação ao processo de reprodução da força de trabalho através de serviços e benefícios
financiados por fundo a eles destinados.[...] é um mecanismo distributivo de renda ou riqueza
60
Violante(1997) também corrobora para a definição de exclusão ao
assegurar que consiste em um primeiro momento em condenar extensas
parcelas da população a sobreviver no nível da necessidade e do imediato,
desprovendo-as das condições materiais básicas de existência e,
consequentemente, apartando-o do acesso aos bens culturais... “a isso se
acresce o não reconhecimento da cidadania de milhares destas pessoas e a
rejeição social de que são alvos” (VIOLANTE, 1997, p. 54).
A apresentação deste cenário brasileiro inserido numa ordem
mundial que impõe transformações, é uma condição fundante para se entender
o processo de exclusão, ou no dizer de José de Souza Martins “inclusão
precarizada” com a presença da violência e desresponsabilização do Estado
frente às demandas sociais.
Nessa direção propomos com este estudo apreender as políticas
34
destinadas à população infanto-juvenil, que são a retaguarda para a promoção
de direitos de vítimas de violência sexual na cidade do Natal.
Partimos do pressuposto que a Política, como evidenciou Faleiros,
V.(1998) não se deve restringir ao binômio denúncia-repressão.
Assim, ao realizar esta pesquisa observamos que nos dados oficiais
do governo e de acordo com o relatório da Comissão Parlamentar Mista de
Inquérito de 2004, algumas ações federais de prevenção e enfrentamento à
violência sexual foram identificadas, ações promovidas pela Secretaria
Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República e pela Comissão
Interministerial para o Enfrentamento da Violência Sexual contra Crianças e
Adolescentes
35
.
Ressalta-se que o atual Presidente da República – Luís Inácio Lula
da Silva em seu pronunciamento de posse em 2002, declarou a toda
sociedade, inclusive aos vários órgãos do Governo Federal, que o combate ao
abuso e à exploração sexual estaria no centro da agenda política das ações do
socialmente produzida, sob forma de benefícios, proteção e serviços, sem que sejam afetadas,
entretanto, as relações de produção capitalistas.”
34
As informações apresentadas neste estudo sobre os projetos implementados no município
do Natal-RN foram obtidos através de aplicação de questionário com os/as coordenadores dos
referidos projetos.
35
Criada em 2003, a referida comissão integra órgãos do Ministério da Justiça, do Trabalho, do
Esporte, da Educação, da Cultura, do Desenvolvimento Social, das Cidades, da Saúde, do
Turismo e das Relações Exteriores além de secretarias especiais e departamentos de Polícia
Rodoviária e Federal . Conforme informações do Guia Escolar (2004)
61
Governo para a infância. Ao fazer o referido pronunciamento, o governo
assumiu um grande desafio de garantir na prática, isto é, através da alocação
de recursos orçamentários
36
, o que está previsto nas legislações e no Plano
Nacional de Enfrentamento da Violência Sexual Infanto-Juvenil.
A pesquisa nos possibilitou também a apreensão de algumas
iniciativas sobre o tema da violência sexual contra crianças e adolescentes
envolvendo Ministérios e a interlocução com a realidade do Município de Natal,
que inserido no processo de descentralização, assume enquanto gestor destas
políticas.
Na área de Educação, em 2004, o Ministério elaborou o Guia Escolar
intitulado Métodos para identificação de sinais de abuso e exploração sexual de
crianças e adolescentes. Documento importante para capacitação de
professores da Escola Pública, que no exercício da sua profissão, poderão
identificar casos de violência sexual, bem como denunciar aos órgãos
competentes para que se garantam os direitos das crianças e dos
adolescentes.
Segundo informações obtidas na Secretaria Municipal de Educação-
SME da Cidade do Natal, a partir de 1999, com a implantação do Programa de
Capacitação Continuada, os professores da rede pública participam de
palestras sobre saúde sexual e reprodutiva de jovens. As palestras e
capacitações são promovidas pelos técnicos da Secretaria, tendo como base
os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs). Além das capacitações, os
professores são orientados a trabalhar o tema em sala de aula, utilizando
recursos didáticos e audiovisuais (filmes). Ao identificar um caso de violência
sexual, o professor encaminha para o Conselho Tutelar mais próximo para que
sejam procedidos os encaminhamentos que se fizerem necessários. A SME
informou que existem casos de violência sexual identificados nas escolas,
36
No que tange o valor liquidado no Orçamento da União de 2005, segundo dados do INESC-
Instituto de Estudos Sócioeconômicos verificou-se que de um total de R$ 606,96 bilhões,
apenas cerca de R$ 3 bilhões foram investidos em Segurança Pública , R$ 15,80 bilhões em
Assistência Social, R$ 16,18 bilhões em Educação e R$ 36.68 bilhões em Saúde. A partir
desses dados constata-se que os valores investidos são considerados irrisórios se comparados
com o gasto de R$ 89,83 bilhões liquidado para o pagamento da dívida pública. Ou seja, se
investiu mais em pagamentos de juros a uma “pequena elite detentora dos títulos da dívida
pública” em detrimento a áreas que possibilitam um desenvolvimento social da maioria da
população brasileira.
62
porém não possue registros destes casos, apesar de reconhecer a
necessidade de realizar uma pesquisa.
Por ser um tema transversal, pode ocorrer que os professores
suprimam a questão da educação sexual nas discussões em sala de aula. Ou
ainda, possam limitar a discussão às mudanças ocorridas na puberdade,
negligenciando a abordagem sobre a violência sexual. Ao fazermos estas
suposições nos pautamos em Faleiros E.,(2003, p. 89) ressaltando o fato de
que:
Professores não são capacitados para associar sinais como
questões de disciplina, distúrbios de aprendizagem, problemas
psicológicos e evasão escolar ao Abuso Sexual ou a outras
formas de violência doméstica.
Faleiros E.(2003), observa ainda que no cenário da Saúde, a
situação ainda é mais delicada, uma vez que, em geral, os serviços disponíveis
na rede pública só estão preparados para o atendimento de casos graves de
violência contra mulheres adultas, sendo menos complexa que a situação
envolvendo crianças e adolescentes.
No estudo que desenvolvemos, com base na aplicação de um
questionário junto a Chefe do Núcleo de Prevenção à Violência e Promoção da
Saúde da Secretaria Municipal de Saúde – SMS da cidade do Natal,
constatamos que nos últimos cinco anos, houve algumas iniciativas, no tocante
a: curso de sensibilização em violência sexual com a participação de 187
profissionais de saúde; oficinas de sensibilização em violência intrafamiliar
contou com a participação de 67 agentes comunitários; participação de
profissionais de saúde em fóruns , oficinas, congressos e seminários sobre a
temática da violência sexual; participação de 15 profissionais no curso de
capacitação à distância de Enfrentamento da Violência Doméstica na Infância e
na Adolescência .
No entanto, essas iniciativas muitas vezes individuais de
profissionais em se capacitar, ainda não se traduz em um trabalho sistemático
de prevenção e enfrentamento à violência sexual infanto-juvenil desenvolvido
pela Secretária aos profissionais que atuam nas unidades de postos de saúde.
63
Apesar de apontar a realização de oficina com os profissionais da
área de educação, saúde e representantes da comunidade do Bairro de Ponta
Negra na cidade do Natal-RN e de iniciativa de profissionais em desenvolverem
em suas unidades grupos de educação sexual com adolescentes, os
profissionais de saúde não são “orientados de forma sistemática” a trabalhar o
tema da violência em reuniões com a comunidade. Apreendemos que
oficialmente não existem parcerias estabelecidas da SMS com outros órgãos
para a realização de capacitações. Contudo, segundo a Chefe do Núcleo,
foram realizadas oficinas no Bairro de Ponta Negra a partir do “ contato direto
com a coordenadora do Programa Sentinela”.
No que tange aos procedimentos adotados pelos postos de saúde no
caso de identificação de vítima de violência, a Chefe do Núcleo de Prevenção à
violência afirma:
Não existe um protocolo ou fluxo de atendimento definido ainda.
Os profissionais, provavelmente realizam o atendimento na área
de saúde e, aqueles que são mais sensibilizados,
provavelmente, dão um encaminhamento mais amplo para a
questão.
Com base nessa afirmação, pode-se inferir o quanto é grave a
situação dos postos de saúde no tocante ao atendimento às crianças e aos
adolescentes vitimizados pela violência sexual , fazendo-se importante
reforçarmos a necessidade iminente do reordenamento dos profissionais da
área de saúde na promoção dos direitos de vítimas de violência sexual ,
através de uma abordagem específica e encaminhamentos e esclarecimentos
necessários.
Vale registrar que existe um desconhecimento dos profissionais
sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) em seu art. 13 , que
prevê a responsabilidade dos profissionais de saúde, obrigatoriamente, em
caso de suspeita ou confirmação de maus-tratos contra a população infanto-
juvenil, em comunicar o Conselho Tutelar próximo à localidade, sem prejuízo
de outras providências que se fizerem necessárias. No capítulo referente às
infrações administrativas, art. 245 do ECA , amplia e estipula pena aos
profissionais da área de saúde e educação:
64
Deixar o médico, professor ou responsável por estabelecimento
de atenção à saúde, e de ensino fundamental, pré-escola ou
creche, de comunicar à autoridade competente os casos de que
tenha conhecimento, envolvendo suspeita ou confirmação de
maus-tratos contra crianças ou adolescente: Pena: multa de três
a vinte salários de referência, aplicando-se o dobro em caso de
reincidência (BRASIL, 2003, p.48)
Observa-se que, nos casos de violência sexual em que resulta a
gravidez, de acordo com o artigo 128, inciso II do Código Penal , o aborto é
uma alternativa permitida, havendo o consentimento da vítima ou de seu
representante legal(nos casos em que a vítima possuir idade inferior a 16
anos). A assistência pré-natal, entrega da criança para adoção e a interrupção
da gravidez , nesses casos, são alternativas que devem ser apresentadas a
vítima e ao seu representante legal. O profissional de saúde deve se distanciar
de seus tabus e preconceitos e exercer sua profissão de forma a garantir o
direito de escolha da vítima.
O Ministério da Saúde, para reforçar a determinação do ECA,
instituiu a portaria 1968/GM, que tornou, nos casos de violência sexual,
obrigatório para as instituições da rede pública o preenchimento de um Ficha
de Notificação Compulsória e seu encaminhamento aos órgãos competentes.
37
Apesar desta determinação do Ministério da Saúde e o lançamento
da Ficha de notificação em 2005, segundo a Chefe do Núcleo de Prevenção à
violência , a Secretaria Municipal de Saúde não possui nenhum registro com o
número de casos de violência identificados em postos de saúde e
encaminhamentos realizados para os órgãos competentes, não utiliza, ainda,
nenhum protocolo de notificação. Existe apenas a previsão para aplicação do
modelo de notificação no ano de 2006, em algumas unidades pilotos. A Chefe
do Núcleo de Prevenção à violência da Secretaria Municipal de Saúde da
cidade do Natal ao responder ao questionário afirmou que não há
conhecimento de profissionais da área de Serviço Social e de Psicologia
especializados na temática da violência sexual infanto-juvenil atuando nos
postos de saúde e não existe nenhum posto que ofereça um atendimento
37
O Ministério da Saúde lançou em 2005, “Norma técnica prevenção e tratamento dos agravos
resultantes da violência sexual contra mulheres e adolescentes”, EM ANEXO, deste trabalho
apresentamos a ficha de registro de atendimento das situações de violência sexual para os
serviços de saúde.
65
especializado para crianças e adolescentes vitimados pela violência sexual,
apesar de alguns profissionais terem participado de fóruns, seminários
realizados pela própria Secretaria.
Faz-se mister salientar, que da análise realizada com base nos
procedimentos adotados pelos profissionais da área de saúde, acreditamos
que esses como atores sociais devem estar imbuídos de conhecimentos e
sensibilizados para o atendimento à criança e ao adolescente vitimizados pela
violência sexual.
Neste sentido, ressaltamos a relevância do Programa Saúde da
Família
38
que está direcionado para a interação entre profissionais da área de
saúde com a comunidade, e que pode apresentar condições objetivas na
identificação de casos de violência sexual intrafamiliar, uma vez que os
profissionais que compõem a equipe: médico, enfermeiro, auxiliar de
enfermagem e agentes comunitários possuem o contato direto com as famílias.
Entretanto, percebemos ainda, que há a necessidade e urgência da
incorporação efetiva de profissionais da área de Psicologia e Serviço Social
nos Postos de Saúde e nos Programas Saúde da Família. Estes profissionais
deverão estar capacitados e sensibilizados na temática da violência sexual
para que se promova a identificação, acompanhamento e encaminhamentos
necessários à garantia de direitos de crianças e adolescentes.
Uma política que merece ênfase, quando buscamos desvendar o que
na realidade existe de palpável no que tange à promoção de direitos de
crianças e adolescentes refere-se aos programas desenvolvidos pelo Ministério
de Desenvolvimento Social e Combate à Fome que são operacionalizados pela
Secretaria Municipal de Trabalho e Assistência Social. Identificamos e
38
Segundo informações oficiais do Ministério da Saúde , o Programa de Agentes Comunitários
de Saúde e da estratégia de Saúde da Família, compõem parte do conjunto de prioridades
políticas apresentadas pelo Ministério e aprovadas pelo Conselho Nacional de Saúde.
Desenvolve-se por meio de práticas gerenciais e sanitárias, democráticas e participativas, sob
a forma de trabalho em equipes, dirigidas às populações de territórios delimitados, pelos quais
assumem responsabilidade. Os princípios fundamentais da atenção básica no Brasil são:
integralidade, qualidade, eqüidade e participação social. As equipes Saúde da Família
estabelecem vínculo com a população, possibilitando o compromisso e a co-responsabilidade
destes profissionais com os usuários e a comunidade. Neste sentido, seu desafio constitui em
ampliar suas fronteiras de atuação visando uma maior resolubilidade da atenção à Saúde da
Família.
66
analisamos
39
alguns destes programas, a saber: o Programa de Erradicação do
Trabalho Infanto-Juvenil – PETI , Programa Agente Jovem, Programa de
Atenção Integral à Família- PAIF e Programa Sentinela.
O Programa de Erradicação do Trabalho Infanto-Juvenil- PETI
destina uma bolsa no valor de R$ 40,00 para área urbana e de R$ 25,00 para
área rural a crianças e adolescentes de até 16 (dezesseis) anos que estão em
atividades laborais consideradas perigosas, penosas, insalubres e
degradantes, cujas famílias possuem renda per capita de até ½ salário mínimo.
As crianças e os adolescentes devem estar matriculados no ensino regular.
Segundo dados do Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome, o
PETI , em 2003, atingiu 810 mil crianças e adolescentes em 2.606 Municípios,
nas 27 Unidades de Federação. Ressalta-se que segundo as Convenções 138
e 182 da Organização Internacional do Trabalho-OIT a exploração sexual
infanto-juvenil se enquadra nas piores formas de trabalho infantil.
Na cidade do Natal, segundo a Coordenadora do PETI, existem 13
núcleos (sendo 04 implementados em instituições parceiras) que atenderam
em 2005, cerca de 2.878 crianças e adolescentes. Os encaminhamentos são
geralmente realizados pelos Conselhos Tutelares, principalmente em situação
de trabalho infantil, “nos casos de violência sexual as crianças são inicialmente
encaminhadas para o Programa Sentinela para os devidos procedimentos e
caso haja necessidade as crianças são encaminhadas para o PETI”. (Trecho
retirado do questionário aplicado com a Coordenadora do PETI)
As atividades sócio-educativas são realizadas de segunda à sexta,
durante todo o ano, com carga horária de 4hs em cada período. Sendo de 20%
a 30% desse tempo destinado à atividade de reforço escolar e o tempo
restante à atividades de oficinas culturais, esportivas e lúdicas. No período de
férias escolares, a jornada de atendimento poderá ter a carga horária reduzida
até o mínimo de 10 horas semanais contempladas com passeios culturais,
atividades lúdicas e de lazer.
A Coordenadora do PETI, em Natal , informou que as equipes são
formadas por Pedagogos, Assistente Social, Arte Educadores, instrutores de
esporte e outros. As atividades sócio-educativas contemplam temas
39
A análise foi pautada a partir de informações obtidas através da aplicação de questionário
com as coordenadoras dos referidos programas na Cidade do Natal-RN.
67
transversais, e existe um acompanhamento familiar e atividades (reuniões e
palestras) direcionadas à família.
No entanto, a assistência oferecida no programa atinge uma
pequena minoria, uma vez que, uns dos critérios estabelecidos limita-se à
participação da família com renda ”per capita” de até meio salário mínimo.
Reafirma-se assim, o caráter focalista e seletivo deste programa, tão
questionado por vários especialistas, como bem fundamenta Yasbeck (2003, p.
37):
O caráter regulador de intervenção estatal no âmbito das
relações sociais na sociedade brasileira vem dando o formato às
políticas sociais no país: são políticas casuísticas, inoperantes,
fragmentadas, superpostas, sem regras estáveis ou
reconhecimento de direitos. Nesse sentido, servem à
acomodação de interesses de classe e são compatíveis com o
caráter obsoleto dos aparelhos do Estado em face da questão.
Constituem ações que, no limite, reproduzem a desigualdade
social na sociedade brasileira.
O Programa Agente Jovem é destinado aos jovens entre 15 e 17
anos, visando ao desenvolvimento pessoal, social e comunitário. Proporciona
capacitação teórica e prática, por meio de atividades que não configuram
trabalho, mas que possibilitam a permanência do jovem no sistema de ensino,
preparando-o para futuras inserções no mercado. O MDS concede, também,
diretamente ao jovem, uma bolsa no valor de R$ 65,00 (sessenta e cinco reais)
durante os 12 meses em que ele estiver inserido no programa e atuando em
sua comunidade.
Segundo informações da Coordenadora , o Programa Agente Jovem
em Natal, está atendendo a um total de 700 jovens de 11 localidades. Os
jovens, além de receber capacitação em temas sobre sexualidade, drogas ,
meio ambiente, participam de oficina, canto coral, pintura e teatro. A equipe é
formada de coordenadora, 3 técnicos, 26 orientadores sociais(estudantes de
graduação), 3 instrutores e 7 arte-educadores. A coordenadora afirma receber
adolescentes vítimas de violência sexual encaminhados pelo Conselho Tutelar,
porém não soube informar a quantidade de vítimas inseridas no Programa. A
respeito dos critérios para inserir no programa afirmou que o adolescente deve
estar na faixa etária de 15 a 17 anos.
68
No entanto, sabemos que a realidade dos programas que destinam
um renda mensal aos usuários elegem critérios socioeconômicos para que os
adolescentes sejam incluídos, uma vez que estes programas não conseguem
atingir a demanda existente.
No campo da Proteção Social Básica do Sistema Único de
Assistência Social-SUAS, em Abril de 2004, o Governo Federal através do
Ministério de Desenvolvimento Social e Combate a Fome- MDS lança o
Programa de Atenção Integral à Família- PAIF. O PAIF, numa perspectiva de
fortalecimento de vínculos familiares e comunitários, desenvolve ações e
serviços básicos continuados para famílias em situação de vulnerabilidade
social na unidade do Centro de Referência da Assistência Social-CRAS.
Segundo informações da Coordenadora do PAIF, no município de
Natal-RN foi implementado em agosto de 2004, através da Secretaria
Municipal de Trabalho e Assistência Social privilegiando os bairros de
Guarapes, Felipe Camarão, Salinas, Pajuçara e Comunidade da África. Estes
bairros se apresentam com maior concentração de famílias em situação de
vulnerabilidade social. A Coordenadora afirma que o Programa através dos
Centros de Referência proporciona o acesso às Políticas Públicas assistenciais
nos próprios bairros, prestando serviços de apoio social e psicológico,
encaminhamentos à rede de proteção social local, além de um trabalho de
orientação e atividades sócio-educativas junto às famílias. As atividades sócio-
educativas contemplam “cursos de qualificação , que lhes garantam meios,
capacidade produtiva e de gestão para melhoria das condições de
subsistência, elevação do padrão de qualidade de vida, preservação do meio
ambiente e sua organização social, conforme disposto nos artigos 25 e 26 da
Lei Orgânica da Assistência Social. Cada CRAS dispõe de uma equipe
formada por 02(dois) Assistentes Sociais, 02(dois) psicólogos, 01 (um) auxiliar
administrativo. A equipe é contratada por um ano , seu pagamento e despesas
com as atividades são pagas através de recurso mensal no valor de R$
9.000,00 (nove mil reais) disponibilizados pelo MDS à SEMTAS para cada
CRAS. Conforme informações da Coordenadora as famílias cadastradas pelo
programa devem atender aos seguintes critérios: estarem na área de
abrangência de cada Centro de Referência, serem beneficiadas pelo Benefício
69
de Prestação Continuada-BPC e pela Bolsa Família e que vivam em situação
de vulnerabilidade social.
Ao ser questionada se o programa atende vítimas de violência
sexual, a Coordenadora afirma que: “Não. Existiram três casos que foram
encaminhados para o Programa de Enfrentamento ao Abuso e Exploração
Sexual de Crianças e Adolescentes(Sentinela).”
Percebemos nesta resposta uma contradição, pois conforme a
proposta do PAIF de ação continuada, o atendimento psicossocial deveria ser
assegurado à comunidade no CRAS, o que facilitaria e garantiria o
acompanhamento e a participação dos familiares, uma vez que a demanda do
Programa Sentinela é para todo o Município.
Um outro programa que merece ênfase é o Sentinela , uma ação do
Governo Federal em parceria com os estados e municípios que surge em 2000,
destinado a dar atenção direta à criança, ao adolescente e suas famílias
vitimados pela violência sexual, através de atendimento multiprofissional
especializado, apoio psicossocial e jurídico, apoio e abrigamento por 24 horas,
quando for o caso.
A atribuição do Assistente Social
40
no Programa é desenvolver
atividades de atendimento social às famílias vítimas de abuso sexual; visitas
domiciliares; realizar palestras em instituições com profissionais e pais e
elaborar parecer social. Segundo a Assistente Social do Programa Sentinela
em Natal, a maior dificuldade encontrada no exercício de sua função está nos
encaminhamentos , ao ser questionada sobre os limites percebidos na atuação
da DCA, expressa:
Faltam profissionais do serviço social e psicologia; Não fica claro
o papel do Serviço Social na DCA; Falta a presença de
profissionais graduados e com experiência para desenvolver as
atribuições dando a entender que outros realizam seu “papel” ;
Algumas vezes falta um atendimento mais humanizado;
Realização de cursos de aperfeiçoamento com os profissionais;
Agilidade nos processos; Relação mais intrínseca entre a DCA e
a rede de Atendimento; Realização de mais abordagens em vias
públicas; Realização de atividades de integração com os
funcionários.
40
As informações contidas neste estudo foram resultados da aplicação de questionário com a
Coordenadora e Assistente Social do Programa Sentinela em Natal .
70
A afirmação acima, vem reforçar a concepção aqui defendida da
necessidade de inserção de profissionais graduados na área de Serviço social
e Psicologia no atendimento direto à vítima de violência sexual e familiares
que procuram a Delegacia Especializada em Defesa da Criança e do
Adolescente para registrar a ocorrência.
Ao receber crianças e adolescentes vítimizados pela violência sexual
o Programa comunica ao Conselho Tutelar para aplicar as medidas previstas
no ECA; Promove o acesso das crianças e adolescentes às instituições
assistenciais para desenvolver atividades sócio-educativas e culturais;
Comunica a Delegacia Especializada em Defesa da Criança e do Adolescente
– DCA sobre as vítimas que estão sendo atendidas pelo Programa Sentinela
através de documento escrito. Ao encerrar o processo encaminha o parecer
social para DCA. Existe também o acompanhamento de pais ou responsáveis
pela denúncia para fazer o boletim de ocorrência na DCA e “quando a família
se nega a prestar queixa, o Programa Sentinela realiza o boletim de
ocorrência” (Trecho do Questionário aplicado com a Assistente Social do
Programa Sentinela)
No que diz respeito a parceria,
a Assistente Social do Programa
Sentinela
, enfatiza :
O programa Sentinela trabalha em conjunto com os outros
órgãos de proteção a criança e ao adolescente. Quando preciso
os profissionais realizam reuniões com a delegada para discutir
os casos. Realizamos a abordagem externa as crianças e
adolescentes exploradas sexualmente. A DCA sempre
encaminha casos para ser realizado o acompanhamento
psicossocial.
O referido programa foi mantido pelo atual Governo e de acordo com
dados do Ministério, em 2003 o programa estava implantado em 315
municípios dos 26 estados brasileiros.
Deve-se registrar que foram definidas pelo Programa as seguintes
áreas vulneráveis e prioritárias para implantação dos Centros e Serviços:
capitais, regiões metropolitanas, regiões portuárias e ribeirinhas, reservas
71
indígenas, entroncamentos rodoviários, zonas de garimpo, áreas com obras de
impacto em andamento e pólos turísticos.
É necessário salientar que os profissionais inseridos nos programas
e projetos desenvolvidos nos municípios são prestadores de serviços com
contrato por tempo determinado correspondente a um (1) ano.
Ao nos adentrarmos no processo analítico destes dois Programas
apreendemos a contradição existente no estabelecimento do contrato por um
período determinado que se coloca como entrave para o acompanhamento das
vítimas , mapeamento dos casos, encaminhamento das ações, manutenção da
articulação com os demais atores da rede de garantia. Logo, existe uma
rotatividade de profissionais nos projetos e programas anualmente, que
acarretará a falta de um acompanhamento dos casos , caracterizando uma
política pública descontínua, fragmentada e emergencial. O que pode ser
constatado nesta afirmação da Assistente Social do Programa Sentinela:
Sempre o Serviço Social, assim com a advogada acompanha os
casos para verificar os encaminhamentos que são dados. Agora,
alguns ,mais antigos não temos retorno.
A respeito das atividades que são desenvolvidas com as famílias , a
Assistente Social afirma que ainda não foram realizadas, porém “o Serviço
Social já elaborou um projeto para realizar oficinas com as famílias e vítimas.
O setor de psicologia também já elaborou um projeto de ação terapêutica para
a clientela.” No entanto, a previsão para a realização das oficinas e ação
terapêutica é para o ano de 2006. Devido o caráter de trabalho temporário
destes profissionais, a efetivação da proposta estará condicionada ao
compromisso e interesse da nova equipe.
De acordo com Azevedo (1993), crianças e adolescentes vítimas de
violência sexual tendem a possuir dificuldades de relacionamento interpessoal,
sexual e afetiva, além de baixa estima, sentimento de culpa e dificuldades de
ensino-aprendizagem.
Neste sentido, programas de incentivo à cultura, lazer e ao esporte
alinhado às políticas básicas apresentam-se como necessários à prevenção da
violência sexual e ao acompanhamento de vítimas, uma vez que, proporciona
72
o desenvolvimento de potencialidades, diminui a evasão escolar, incentiva a
criatividade, a interação em grupo dentre outros benefícios.
Na área de cultura, em âmbito federal identificamos alguns
programas, tais como: Incentivo à leitura ; Apoio às bandas municipais; Curso
de formação para restauração e preservação do Patrimônio Histórico; Oficinas
Escolas; Casa da Cultura e Artes sem Fronteiras.
Apesar da existência destes programas, percebe-se que são poucas
as iniciativas à cultura direcionada à parcela da população infanto-juvenil, em
situação de vulnerabilidade social.
Em âmbito municipal, identificamos iniciativas da sociedade civil em
parceria com empresas, emissoras de televisão e outras organizações , a
exemplo: programa Domingo na Praça evento cultural realizado no último
domingo de cada mês que integra música, literatura, folclore,artesanato, dança
que proporciona oportunidade a artistas locais e participação da população
através da apresentação de cantores regionais.
Uma outra iniciativa refere-se ao projeto Bibliotecas Comunitárias,
implementado pela Organização não Governamental Fundação Fé & Alegria
em bairros da periferia da cidade do Natal. O projeto propõe uma parceria com
a comunidade local para a manutenção e desenvolvimento das bibliotecas. Nas
Bibliotecas Comunitárias, além do acervo disponível, a organização não
governamental trabalha a qualificação dos Mediadores e gestores das
bibliotecas, oficinas temáticas e cursos; e desenvolve atividades sócio-culturais
no bairro onde se localiza e fora deles.
Entretanto, as iniciativas acima apresentadas atingem apenas uma
minoria. É necessário que o incentivo à cultura local esteja articulado com as
demais políticas para que se tenha uma maior abrangência e repercussão. O
acesso de crianças e adolescentes a peças teatrais, cinemas, apresentação
musical e de dança que valorizem a cultura local devem ser priorizados.
Alinhada à política de incentivo à cultura, deve-se ampliar os
programas de incentivo ao lazer e à prática de esporte. Em nível federal
destaca-se a criação do Programa Segundo Tempo voltado ao acesso de
alunos matriculados nas escolas públicas, principalmente em áreas de
vulnerabilidade social. Conforme informações do Ministério do Esporte, o
Programa objetiva a iniciação à prática esportiva, desenvolvimento de recursos
73
humanos profissionais envolvidos, contribuição para a diminuição da exposição
a situações de risco social, acompanhamento e avaliação do esporte
educacional no País.
Ao longo de nossa pesquisa, observamos que além de algumas
iniciativas na área de prevenção, existe apenas uma Política Pública de
atendimento às vítimas e familiares de violência sexual. A atuação ainda é
tímida e inconsistente. Na realidade o atendimento psicossocial é de caráter
emergencial.
Nas entrevistas realizadas com as mães das vítimas de violência que
serão detalhadas no próximo capítulo, apreendemos que as mesmas
vislumbram a continuidade do atendimento psicossocial, enquanto condição
para a retomada da qualidade de vida e recuperação da auto-estima das
crianças e dos adolescentes vitimados pela violência sexual. Este argumento é
reforçado por Ferrari (2004, p. 39) que afirma que nos casos de violência
contra crianças e adolescentes, diante de uma situação complexa, urge a
“intervenção interdisciplinar, envolvendo medidas protetivas”. Medidas que
devem garantir à “assistência psicológica, social , médica, jurídica, etc. .. pois
existe uma grande probabilidade de risco de vida e de conseqüências graves
para o desenvolvimento tanto da criança quanto do adolescente”(Ferrari,2004,
p. 39).
No tocante ao Ministério da Justiça , as ações de enfrentamento aos
crimes sexuais contra crianças e adolescentes está sob responsabilidade da
Secretaria Nacional de Justiça.
Segundo o relatório da CPMI de 2004, as principais atuações do
referido Ministério estão no campo da repressão policial (federal e rodoviária) à
exploração sexual de crianças e adolescentes envolvidas no tráfico com
destino a portos e aeroportos e na prostituição às margens das rodovias,
postos de combustíveis, além da intensificação da fiscalização do trânsito de
crianças e adolescentes às margens das rodovias, postos de gasolina, boléias
de caminhões etc.
Em âmbito estadual, destacaremos no próximo capítulo a atuação da
Delegacia Especializada em Defesa da Criança e do Adolescente no
atendimento as vítimas de violência sexual na perspectiva de garantia de
direitos.
74
No item a seguir trataremos das implicações da atuação da rede de
garantia de direitos e dos nexos que se estabelecem entre o Conselho Tutelar,
Ministério Público, Instituto Técnico Científico de Polícia –ITEP, SOS Criança,
Programa Sentinela e Casa Renascer em articulação com a DCA para a
garantia dos direitos de crianças e adolescentes vítimas da violência sexual na
cidade do Natal.
3.2 REDE DE GARANTIA DE DIREITOS ÀS VÍTIMAS DE VIOLÊNCIA
SEXUAL NA CIDADE DO NATAL
Inicialmente, apresentar-se-á o resultado do mapeamento de ações
que foram desenvolvidas nos anos de 2004 e 2005 pela rede de promoção à
criança e adolescente no enfrentamento à violência sexual infanto-juvenil na
Cidade do Natal:
x Elaboração de uma cartilha sobre Violência sexual contra crianças e
adolescentes: Você sabe como agir? que se inclui como uma das ações
do Plano Estadual de Enfrentamento à Violência Sexual contra Crianças
e Adolescentes em parceria com instituições governamentais e não
governamentais.
x Atuação das organizações não-governamentais na realização de
campanhas educativas
41
, seminários, capacitação e palestras na
temática: violência sexual, turismo sexual, turismo sustentável e infância;
x Operações de blitz para o enfrentamento a exploração sexual, realizada
pela Polícia Federal em parceria com o Ministério Público, Corpo de
Bombeiros, Polícia Civil e Militar, Vigilância Sanitária em hotéis,
restaurantes na Orla de Ponta Negra;
x Processo de conclusão do Plano Municipal de enfrentamento ao Abuso
e à Exploração Sexual, com previsão de lançamento para maio de 2006.
No tocante a atuação dos órgãos de defesa e responsabilização, que
participam das blitz, estas são realizadas com maior freqüência nos meses de
alta estação, principalmente na Orla de Praia de Ponta Negra. Um dos
41
EM ANEXO, folder da campanha desenvolvida pela Casa Renascer.
75
objetivos das blitzs é coibir a prática da exploração sexual infanto-juvenil e
situações irregulares de comerciantes e turistas estrangeiros.
No entanto, ao analisar o discurso dos profissionais envolvidos
através da imprensa escrita observamos que existe uma preocupação maior
com o chamado Sexo Turismo. Este fenômeno têm sido pauta na mídia
nacional e local resultando em várias reportagens e reinvidicações de
empresários e sociedade civil para o enfrentamento do “Sexo Turismo”. Vale
enfatizar que a presença de profissionais do sexo em ambientes antes
freqüentados predominante pela classe média, é fortemente questionado e alvo
de preconceitos da sociedade que através de um pseudo discurso de proteção
as crianças e aos adolescentes impõem sua posição moralista,
preconceituosa e higienista.
Durante o processo de elaboração desse estudo, acompanhamos
com freqüência a abordagem da mídia sobre o tema , participamos de
reuniões, seminários com organizações governamentais e não
governamentais para a discussão de estratégias de enfrentamento a
exploração sexual infanto-juvenil, o que de certa forma possibilitou uma
observação empírica da realidade e do discurso de atores sociais na cidade do
Natal.
É necessário explicitar que o termo Sexo Turismo ou Turismo Sexual
não deve ser associado a crime quando envolve a prostituição adulta e se não
existe a exploração de terceiros. Em outras palavras, os termos Sexo Turismo
ou Turismo Sexual são utilizados erroneamente pela mídia e por alguns atores
sociais enquanto sinônimo de crime, quando envolve adultos. Dessa maneira,
corroboramos com Soares Do Bem ao utilizar a terminologia Turismo com
motivação sexual. No entanto, enfatizamos que estes termos ao serem
utilizados isoladamente dissociado à criança e ao adolescente não é
caracterizado crime pela legislação brasileira. Por isso nos propomos utilizar
para caracterizar o crime de violência sexual a expressão : exploração sexual
de crianças e adolescentes no turismo.
Constata-se que as campanhas publicitárias recentes desenvolvidas
pela Secretaria Municipal de Comércio, Indústria e Turismo são equivocadas, a
exemplo da última campanha lançada em maio de 2006 que utiliza a imagem
de um homem com uma “camisinha” na cabeça associada à questão do sexo-
76
turismo enquanto sinônimo de abuso sexual. Isto é, além de passar a imagem
do uso do preservativo como uma atitude negativa que deve ser evitado pelos
turistas, transmitem erroneamente os conceitos de sexo-turismo, abuso sexua
e exploração sexual sem considerar as especificidades. Vale registrar, que
esse equívoco pode trazer conseqüências negativas, reforçando preconceitos
envolvendo turistas e mulheres que exercem a profissão de profissionais do
sexo. Outro aspecto a considerar, que conforme dados da DCA, o crime de
abuso sexual é na sua maioria cometido por pessoas conhecidas da criança e
do adolescente.
A prioridade de atenção à criança e ao adolescente, que durante o
dia e a noite fazem parte do cenário da Praia de Ponta Negra , catando lixo,
dormindo no chão, pedindo esmola e expostas a situações de exploração é na
maioria das vezes negadas pelo poder público, ou refém de medidas paliativas
e emergenciais. No entanto, áreas e ruas da periferia da cidade, que conforme
dados da Delegacia Especializada em Defesa da Criança e do Adolescente,
aparecem nas denúncias relativas à exploração sexual infanto – juvenil não se
constata a realização de blitz ou a atuação dos órgãos de defesa e proteção, o
que reforça a concepção do caráter, muitas vezes, higienistas das operações
em locais freqüentados por turistas, que contam com o apoio da população
norte-riograndense.
É válido salientar que as blitz devem acontecer , porém, o que se
questiona é a prioridade por locais que recebem grande visibilidade na mídia ,
é o caso da Praia de Ponta Negra em detrimento de locais onde já foi
constatado a existência da exploração sexual de crianças e de adolescentes
através da prostituição, ou em situação de risco pessoal e social.
Outra questão refere-se aos encaminhamentos nos casos em que
são encontradas crianças e adolescentes em situação de risco.
Nestes casos, as crianças e os adolescentes são retirados das ruas
através do Programa Canteiros Reconstituindo Vidas
42
desenvolvido pela atual
42
Segundo informações da Coordenadora o objetivo geral do Programa Canteiros é “Efetivar o
atendimento integral e integrado às crianças, adolescentes, jovens, idosos e pessoas com
deficiência e suas famílias, em situação de rua, visando a proteção, o acolhimento e a inclusão
na rede de serviços e a (re)inserção na família, na escola e no mercado de trabalho formal”. O
referido programa realiza abordagens de rua, diariamente de segunda a sexta e aos finais de
semana e feriados, em forma de plantão. “As pessoas abordadas são atendidas pelos
profissionais e orientadas quanto à situação vivenciada e quanto aos seus direitos e são
77
Secretaria Municipal de Trabalho e Assistência Social . O programa em
parceria com o Projeto de Intervenção Bosque das Mangueiras atende 50
adolescentes na faixa etária dos 12 aos 17 anos e 11 meses. São realizadas
atividades sócio-educativas, acompanhamento sócio-familiar, atividades de
lazer , esporte e pedagógicas. Neste projeto os adolescentes recebem um valor
de R$ 75,50 (setenta e cinco reais e cinqüenta centavos) por mês. A
Coordenadora destaca no questionário que o trabalho se estende também às
famílias:
[...]tendo em vista que é a instituição extremamente relevante
para a solução da problemática das pessoas em situação das
ruas, além de ser um dos principais objeto de intervenção do
Programa, visto que muitas das crianças e adolescentes
atendidos, enfrentam problemas e conflitos, em que se
apresentam com os vínculos familiares e afetivos praticamente
rompidos
Vale ressaltar que as crianças e os adolescentes em situação de
rua, podem obter um valor maior, seja trabalhando nos sinais, ou pedindo
esmolas, além de outros atrativos que a rua oferece. Por isso o desafio do
programa em proporcionar atividades atrativas além da renda oferecida.
No Programa Canteiros à abordagem às crianças e aos adolescentes
em situação de rua é realizada por um educador social. Nos casos em que as
crianças e os adolescentes não mencionam seus endereços, as mesmas são
encaminhadas para as Casas de Passagem de acordo com a faixa etária, os
casos são avaliados, e, dependendo da situação, são albergados (por um
tempo curto) ou abrigados (casos mais demorados), até que se resolva a
situação, ou que os familiares e o endereço sejam localizados. Entende-se que
nestes casos existe apenas uma transferência das ruas para as casas de
passagem, o que decerto não resolve a problemática.
43
Segundo a coordenadora das Casas Abrigos, existem na cidade do
Natal , três Casas de Passagem que atendem às crianças e aos adolescentes
encaminhadas às instituições diversas, para inserção em programas e projetos sociais, que lhe
propiciem a saída da situação de rua. “ (Trecho da resposta ao questionário aplicado com a
Coordenadora)
43
Questiona-se até que ponto o programa Canteiros promove o direito de crianças e de
adolescentes em situação de rua, uma vez que se retira da rua e os transfere para as Casas de
Passagem.
78
de ambos os sexos, de acordo com a idade 0 a 6 anos , 7 a 11 anos e de 12 a
17 anos, (quando trata-se de irmãos é preservado o vínculo independente da
idade).
A Coordenadora das Casas Abrigos em entrevista, explica que em
relação ao perfil das crianças e dos adolescentes que estão abrigados, estas
são vítimas de violência ou , em alguns casos, são adolescentes que
cometeram pequenos furtos. Acrescenta que por vezes são obrigados a
acolher adolescentes(com 18 anos) que deveriam ser encaminhados para
outras instituições de semiliberdade, mas devido a ordem judicial , atendem a
demanda , mas contestam na justiça a revisão da ordem. Consideramos que a
situação apresentada é um agravante para o trabalho nas Casas Abrigos ao
expor ao risco crianças e adolescentes que encontram-se abrigadas por terem
sido vítimas de violência.
As Casas Abrigos possuem uma equipe de Educadores Sociais,
Assistente Social, Terapeuta Ocupacional e Psicólogo. As crianças e os
adolescentes são encaminhados para a escola e no outro horário desenvolvem
atividades de reforço escolar, pintura, dobraduras e colagem. Existe uma
rotina, são acompanhados 24hs pelos educadores sociais, que na maioria são
contratados pelos abrigos e possuem no mínimo segundo grau completo.
Segundo a Coordenadora da Casa Abrigo, “as assistentes sociais e psicólogos
trabalham o tempo todo o retorno à família”, através também de um
acompanhamento com as mesmas. Levantamos as seguintes questões: como
se apresentam essas famílias, suas condições sócio-econômicas, culturais,
que tipo de relações são estabelecidas entre pais e filhos, como se caracteriza
suas moradias. Ou seja, o programa precisa reconhecer o fascínio que a rua
exerce sobre as crianças e os adolescentes e não insistirem apenas no
fracassado retorno familiar, que muitas vezes não acontece
.
A Coordenadora da Casa Abrigo aponta que o maior agravante é a
“questão da drogadição por não existir ainda um tratamento voltado para as
crianças e para os adolescentes”, acrescenta que “muitas vezes eles saem do
abrigo para utilizar as drogas”. Relata que as crianças cada vez mais cedo , na
faixa etária de 07 a 11 anos , que possuíram uma vivência de rua estão
envolvidas com drogas, dentre essas o crack. No caso de abuso sexual contra
crianças e adolescentes, a Casa Abrigo trabalha em parceria com o Programa
79
Sentinela. Sobre a rede de garantia de direitos, a coordenadora afirma que
melhorou, mas ainda existem falhas, atualmente tem se percebido uma maior
visibilidade da problemática. Percebe ainda, que existe uma necessidade de
melhoria das condições de infra-estrutura dos abrigos,”não funciona em
espaços ideais”, mas afirma que “a alimentação é de primeira” . Justifica que as
Casas são alugadas por isso não podem sofrer grandes reformas, ressalta que
“o ideal seria que fosse construído um espaço, para ser um abrigo, e entre o
real e o ideal , a gente trabalha com o possível”
Faz-se necessário registrar que se percebe na fala da coordenadora
o compromisso profissional na melhoria dos trabalhos desenvolvidos nas
Casas Abrigos. Aponta que são muitas as dificuldades, inclusive a questão de
preconceitos de vizinhos que possuem uma visão deturpada das crianças e
dos adolescentes atendidos, além de se atribuir a estes o possível aumento de
criminalidade no bairro.
Neste sentido, vale enfatizar que as crianças e os adolescentes que
se encontram em situação de abrigo são fortemente discriminalizados e
terminam sendo revitimizados pela sociedade.
Ressaltamos que a situação de abrigo é muitas vezes uma das
alternativas da Rede de promoção de direitos, em caso de violência sexual
e/ou maus-tratos cometida pelo responsável da criança, e na ausência de
parentes que possam assumir a tutela , a criança passa a ser penalizada uma
vez que é retirada do lar para garantir sua proteção e encaminhada para os
abrigos. Sobre os abrigos da cidade, podemos observar na fala da Assistente
Social do SOS Criança, o que segue:
Eu, particularmente, sou contra abrigo, definitivamente. Se eu
pudesse nenhum menino iria para o abrigo , mas tem caso tem
que ir. Para mim, não dá resposta, porque uma família por mais
desorganizada que ela seja , a criança tem um referencial de
apoio. Ás vezes o abrigo, viola muito mais. O que eu acho que
falta é um programa para a família. Acho que daria muito mais
resultado e evitaria a situação de abrigo. O abrigo não
corresponde.
Este depoimento corrobora que a situação de abrigo não deveria ser
uma alternativa nos casos de violência contra crianças e adolescentes, o
80
Estatuto da Criança e do Adolescente ainda estabelece no art. 130 (BRASIL,
2003,57) que:
Verificada a hipótese de maus-tratos, opressão ou abuso sexual
impostos pelos pais ou responsável, a autoridade judiciária
poderá determinar, como medida cautelar, o afastamento do
agressor da moradia comum.
Decerto, que em casos emergenciais em que a situação na
residência familiar coloca em risco a integridade física e psíquica da criança ou
do adolescente ,e, diante da falta de Políticas Públicas que possuam esse
atendimento preferencial a esse público vítima da violência, a alternativa para a
Rede de proteção tem sido o encaminhamento para os abrigos da cidade, o
que reputamos como um retrocesso nos encaminhamentos e alternativas em
relação à problemática estudada.
O ECA prevê no art. 94(BRASIL, 2003) uma série de obrigações e
condições para o funcionamento dos abrigos, dentre as quais, destacam-se:
instalações físicas em condições adequadas de habitabilidade, higiene,
salubridade e segurança; atendimento personalizado, propiciar escolarização e
profissionalização; propiciar atividades culturais, esportivas e de lazer. É mister
que estas obrigações sejam preservadas para que a criança e o adolescente
tenham condições dignas que proporcionem sua reinserção na família e na
comunidade , bem como promova a garantia de seus direitos. Nessa
perspectiva, o ECA prevê a fiscalização das Casas Abrigos pelo Conselho
Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente.
Nas entrevistas com os atores que compõem a rede de garantia de
direitos de crianças e adolescentes ao serem questionados sobre as limitações,
evidenciou-se nas falas: “falta de uma melhor articulação e estrutura no
atendimento, ausência de programa de proteção à vida das vítimas e
testemunhas delatoras”(Promotor do Ministério Público); “confusão de
atribuições dos órgãos”(Assistente Social da Casa Renascer); “qualificação
profissional”( Assistente Social do Programa Sentinela), “melhorar a estrutura
dos programas para que haja um trabalho continuado com as crianças e
adolescentes visando o resgate da auto-estima e o desenvolvimento saudável”(
81
Assistente Social do Programa Sentinela). Esta fala que se segue resume as
dificuldades apresentadas pela rede:
Há uma deficiência muito grande no quadro da rede de
atendimento, porque existem determinados casos que requerem
bastante agilidade e alguns órgãos não garantem essa
agilidade. A gente precisa de um atendimento especial não tem,
a gente precisa de um compromisso de acompanhamento com
as famílias não tem.
E ainda destacou-se enquanto condições que dificultam o
desempenho de suas funções nas suas respectivas áreas à necessidade de
“unificar a linguagem das intervenções para que o usuário compreenda o que
está acontecendo o porquê dos encaminhamentos” (Assistente Social da Casa
Renascer), “Falta de ordenação e integração da rede e ausência de políticas
públicas claras referentes à problemática” (Promotor do Ministério Público).
As dificuldades indicadas tornam-se entraves para o exercício da
função da maioria dos profissionais que precisam articular a rede para a
garantia de direitos. O trecho da entrevista com o representante do Conselho
Tutelar, vem reafirmar o caráter das Políticas Públicas e as dificuldades
encontradas ao desempenhar sua função :
As Políticas Públicas existem, mas têm que ser ampliadas.
Existem programas que nós temos que encaminhar porque o
conselheiro ele requisita as perguntas na área de saúde,
educação, etc., então nós temos uma criança numa situação de
risco quando ela deixa de estar na escola e passa o dia nas
ruas. Então para ocupar o tempo dessa criança nós temos o
programa Agente Jovem, só que, existem umas matrículas que
elas só são feitas em janeiro, então vamos encaminhar pra
ONG. A mesma coisa é com o Tributo,com o Aprendendo na
Praça e outros programas disponíveis para a criança e para o
adolescente. Como vamos trabalhar esse
adolescente?(Conselheira Tutelar)
Vale notar, que a entrevista acima indica mais um problema em
relação às Políticas Sociais, isto é, a limitação de matrículas a um período do
ano e o número de vagas, são entraves para a garantia de direitos de crianças
e de adolescentes que não estão sendo inseridos nestes projetos.
82
Em continuidade, expressa a premente necessidade de profissionais
de Serviço Social e Psicologia nos Conselhos Tutelares e nos Postos de
Saúde:
Precisamos, em cada conselho, ter um psicólogo e assistente
social ,porque um conselheiro não é um assistente social para
fazer um relatório de caso daquela família e ,também não é
psicólogo, para acompanhar a criança e o adolescente. O
conselheiro apenas requisita o serviço nas áreas. Temos
dificuldade quando solicitamos uma unidade de saúde para
aquele serviço, ou seja, psicólogo, assistente social e isso
demora, então se temos urgência de trabalhar a família, pra
resgatar aquela família, porque muitas vezes os adolescentes
são rebeldes e precisamos de apoio para ajudar aquela família e
encontramos obstáculos.Temos reuniões diariamente com o
Ministério Público, com a Guarda da Infância, delegacias, vários
órgãos. A gente conversa, mas continua tudo no mesmo, ai fica
difícil trabalhar e às vezes o conselheiro falha na sua função, a
partir do momento em que nós vemos uma família com
dificuldade financeira, dois, três dias sem se alimentar, solicita
das SEMTAS uma cesta básica que uma assistente social
atenda aquela família, que dê uma cesta básica pra suprir
aquela necessidade, não tem. Muitas vezes o conselheiro dá do
seu bolso. O conselheiro, muitas vezes, faz assistencialismo
sem querer. (Conselheira Tutelar)
O relato exposto, desvela as fragilidades e aponta as dificuldades
quanto à questão da articulação da rede de atendimento, a deficiência das
Políticas Públicas , falta de uma equipe multiprofissional, enquanto condições
fundantes para a qualidade do atendimento e o seu exercício profissional. O
trecho abaixo, aponta as questões que norteiam a problemática enquanto outra
dificuldade no exercício profissional:
As dificuldades existem, mas advém da própria temática que em
si agrega uma série de questões que passam pelas relações de
gênero, condições objetivas de vida dos usuários atendidos (as),
falta de articulação da rede de atendimento em determinados
momentos (Assistente Social da Casa Renascer).
Nessa direção, para o enfrentamento da violência sexual os
Promotor do Ministério Público ressalta que :
A violência sexual é um fenômeno complexo e multicausal. Há
que se considerar diversos fatores de vulnerabilidade. O
83
enfrentamento ocorre somente logrará êxito se for efetuado de
maneira articulada com os variados atores sociais. Fazer
cumprir os Planos Municipal e Estadual é uma forma racional de
viabilizar o enfrentamento.
O que teria prioridade, quais os caminhos a seguir para o
enfrentamento da violência sexual infanto-juvenil? Em resposta a essa questão
a Assistente Social do SOS Criança, acrescenta:
Os caminhos, primeiro teriam que começar com a questão
educativa. A educação é a base, família e educação é base,
seria um processo educativo da questão sexual, porque
enquanto a gente não estabelece uma forma educativa, formal,
com clareza[...] a televisão está jogando uma educação
degenerativa de fragmentar todo esse processo da questão de
pudor até refazer o código penal, o atentado não é ao pudor é a
pessoa. Então, seriam muitos os elementos que teríamos que
trabalhar para chegar ao combate ao sexo abusivo.
Para a Assistente Social do Programa Sentinela para o
enfrentamento da violência:
Os caminhos são a efetivação do ECA; utilizar os meios de
comunicação como televisão e rádio para desenvolver um
trabalho de prevenção da violência doméstica e a exploração
sexual da criança e do adolescente; a rede de atendimento a
criança e ao adolescente possa oferecer um serviço de maior
qualidade (recursos materiais e humanos); políticas públicas
sejam mais eficazes.
Na opinião da Conselheira Tutelar , deve-se enfrentar a problemática
a partir de uma maior “divulgação na televisão e no rádio.” ‘
As falas dos atores sociais que compõem a rede de garantia de
direitos, acima destacadas, são reveladoras da urgência de uma série de
medidas que devem ser consideradas para que a rede cumpra seu papel de
agente de garantia de direitos. A garantia de direitos, segundo o representante
do Ministério Público :“ é a certeza da observância dos direitos fundamentais
assegurados às crianças e adolescentes, de forma especial, com vistas à
superação da violência causada e responsabilização do(s) autor(es)” . Nesta
direção, o grande desafio que se coloca é o reconhecimento do papel de cada
84
ator social dentro dos respectivos eixos promoção, defesa e controle social
para que funcione de forma ordenada para efetivação do objetivo de garantia
de direitos. Segundo Paixão (2005, p. 3):
O Sistema nos traz a idéia de funcionamento articulado. O
atendimento nos fala de condições sócio-econômicas e políticas
novas, com capacidade de atendimento universal (Promoção).
As garantias nos remetem aos instrumentos para proteger,
assegurar e fazer cumprir os direitos (Defesa) e tudo dependerá
da capacidade da sociedade em organizar-se, fiscalizar,
monitorar, subsidiar (Controle Social).
As ONG`s- Organizações não-governamentais, por exemplo, têm um
papel sócio-político. São assim organismos que através de uma intervenção
propositiva se apresentam como grupos de pressão e monitoramento frente ao
Estado na busca da implementação e garantia de Políticas Sociais Públicas
que atendam as necessidades da população. Isto é, são importantes atores
sociais que devem atuar no eixo do controle social cujos os “instrumentos
deverão oferecer potencial de pressão, mobilização, produção de
conhecimentos em torno da problemática de crianças e adolescentes”
(PAIXÃO, 2005, p. 3).
Nessa direção, defendemos a atuação das ONGs numa perspectiva
de autonomia política , agente de pressão , mobilização e controle social ,
espaços de discussão e articulação que vise a transformação social.
Ao analisarmos historicamente a inserção da temática da violência
sexual na agenda pública , as discussões conceituais, o surgimento de
comissões parlamentares de inquéritos, audiências públicas, os seminários
promovidos, constatamos que a realidade apresentada em Natal reforça a
análise de Leal (2001), que identificou a mobilização das ONG’s, enquanto
estratégia que mais provocou impactos favoráveis ao enfrentamento do
fenômeno nos últimos dez anos, a exemplo do Plano Nacional de
Enfrentamento à Violência Sexual infanto-juvenil, já citado anteriormente.
Leal (2001) em sua tese de doutorado analisa o papel das ONGs a
partir de 1993 no enfrentamento à exploração sexual. A autora destaca a
atuação dos Centros de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente -
CEDECA e dos Conselhos de Direitos nos anos 90, enquanto espaços
85
estratégicos para que a sociedade civil pudesse acompanhar a política de
garantia de direitos da criança e do adolescente. Neste estudo corroboramos
com a concepção de Leal (2001) ao afirmar que a atuação das ONGs no
combate à exploração, abuso sexual e maus-tratos, têm construído nos últimos
anos, um espaço de mobilização social, permitindo a criação de uma
concepção sobre o fenômeno, dando visibilidade ao fenômeno, através de uma
articulação em âmbito nacional e internacional, para ampliar e fortalecer os
espaços de lutas para enfrentamento deste fenômeno. Além disso, as ONGs
estabeleceram um papel fundamental de interlocução com o legislativo
provocando mudanças e conquistando direitos.
Desse modo, faz-se relevante apresentar a experiência da Casa
Renascer, organização não-governamental fundada e idealizada pela psicóloga
e especialista Dilma Felizardo, na área de atendimento e mobilização da
temática da violência sexual em Natal-RN.
A referida ONG oferece desde 1992, atendimento a crianças e
adolescentes do sexo feminino que sofreram violência sexual ou encontram-se
em situação de risco pessoal e social
44
. Sendo pioneira no atendimento
especializado a crianças e adolescentes vítimas de violência sexual em Natal.
Atualmente com sede própria situada à rua Ana Néri nº 345, Petrópolis, atende
cerca de 50 crianças e adolescentes advindas das periferias da Cidade do
Natal.
A Casa conta com uma equipe multidisciplinar formada por
assistentes sociais, psicóloga, psicopedagoga, professores de dança, teatro,
música, arte, nutricionista, além de assessoria jurídica - responsáveis pela
defesa de direitos e proposições de leis para as três esferas de poder.
Para nortear suas atividades delimitou-se quatro eixos políticos de
referência: Educação - estimulo a aprendizagem básica e a reflexão sobre a
realidade social em que estão inseridas; Saúde e nutrição - são oferecidas três
refeições diárias, planejadas e monitoradas pela nutricionista.Todas as
solicitações de assistência médica: clínico geral, odontologia, pediatra e
44
Todas as informações sobre a Casa Renascer foram obtidas nos livros e relatórios
publicados pela organização e cedidos para a pesquisa exploratória. O termo grifado é
freqüentemente utilizado pela Casa Renascer, significa a situação de crianças e adolescentes
nas ruas, sujeitas a todo tipo de violência, as drogas, e, até cometendo alguns furtos para
garantir a sua sobrevivência.
86
ginecologista são encaminhadas pelo Serviço Social aos estabelecimentos
municipais e estaduais; Arte, cultura e esporte - são trabalhadas a criatividade
e o lúdico, através da terapia, oficinas de teatro, artes plásticas, dança, coral e
voleibol;Profissionalização - através da Fábrica Renascer adolescentes (faixa
etária de 16 a 18 anos) e suas famílias aprendem a confeccionar redes e
mantas para comercializar. Assim, têm acesso à profissionalização e a uma
alternativa de renda.
Vale registrar que a Casa Renascer mantém cinco Casas da
Comunidade localizadas em diferentes áreas da cidade do Natal e uma em
Parnamirim (Município do Rio Grande do Norte), que atendem crianças e
adolescentes que perderam o vínculo familiar ou foram vítimas de violência
doméstica. Ao completar 18 anos, a adolescente assina um termo de
responsabilidade que terá validade por dois anos, caso tenha tido cuidado com
a casa e não possua recursos financeiros para a aquisição de sua casa própria,
após este prazo, poderá assinar um contrato de locação se comprometendo
em trabalhar como contrapartida para o aluguel.
A Casa Renascer participou também da organização junto com
outras instituições em âmbito nacional da realização em 1995, da 1ª Campanha
Nacional pelo Fim da Violência, Exploração e Turismo Sexual contra crianças e
adolescentes. Novamente, o tema surge em pauta, exigindo a implantação de
políticas públicas, desenvolvimento de programas para enfrentar e atender os
vitimizados pela violência sexual e a implantação de uma rede de comunicação
de âmbito nacional e internacional.
Uma outra organização que vem se consolidando na discussão da
temática é a organização não-governamental RESPOSTA - Responsabilidade
Social Posta em Prática. Apesar de ter sido fundada em 2003, já é referência
nacional na área de enfrentamento à Exploração Sexual de crianças e
adolescentes. A referida organização coordena atualmente o projeto “Código
de Conduta do Turismo contra a Exploração Sexual Infanto-Juvenil” que visa
adesão de empresas e instituições do setor turístico no Estado do Rio Grande
do Norte, que assumem publicamente o compromisso de adotar em seus
estabelecimentos ou atividades um conjunto de princípios éticos contra a
87
exploração sexual de crianças e adolescentes. Seu foco de atuação são ações
preventivas, educativas e de mobilização que visam à construção de um
Turismo Sustentável alinhado com os direitos da Infância. A experiência
pioneira do “Código de Conduta do Turismo contra a Exploração Sexual
Infanto-Juvenil” do Rio Grande do Norte tem sido referência para outros
estados brasileiros.
As Políticas Públicas e as experiências aqui apresentadas apontam
na direção de significativos avanços no que diz respeito a inserção da temática
da violência sexual contra crianças e adolescentes no cenário político, e ainda
reforça a importância da consolidação da rede de garantia através do
reconhecimento de suas atribuições e Políticas Públicas que assegurem um
atendimento amplo, eficaz e eficiente na promoção, defesa dos direitos que
estão assegurados constitucionalmente.
A partir do pressuposto da garantia de direitos, nos propomos no
capítulo a seguir apreender as condições de funcionamento e as
especificidades que envolvem a Delegacia Especializada em Defesa da
Criança e do Adolescente, enquanto um ator importante na rede para
assegurar a defesa , responsabilizar o acusado, e principalmente promover a
garantia de direitos de crianças e adolescentes.
88
4 DELEGACIA ESPECIALIZADA EM DEFESA DA CRIANÇA E DO
ADOLESCENTE - DCA NO ENFRENTAMENTO À VIOLÊNCIA SEXUAL –
POTENCIALIDADES E OPORTUNIDADES DE MELHORIAS
4.1 DCA- CONSTRUINDO SUA HISTÓRIA
Neste contexto de cultura de direitos, de que forma a Delegacia
Especializada em Defesa da Criança e do Adolescente, está atuando para o
enfrentamento à violência sexual infanto-juvenil, crime este revestido por
múltiplos determinantes?
Importa identificar se as ações desenvolvidas pela Delegacia em
Defesa da Criança e do Adolescente, enquanto Política de Segurança Pública
para o enfrentamento da violência sexual contribui para garantia de direitos.
Resultante do Plano Nacional de Enfrentamento à Violência Sexual
Infanto – Juvenil(BRASIL,2002), conforme estabelece o Decreto nº 15.470
publicado no Diário Oficial do Estado do Rio Grande do Norte de 30 de maio de
2001, foi “considerando o crescente índice de violência sexual e maus-tratos
praticados contra crianças e adolescentes” e “a necessidade de criação de uma
unidade policial especializada para atendimento de ocorrências em que figure
como vítimas a criança ou o adolescente” foi instituída a implementação da
Delegacia Especializada em Defesa da Criança e do Adolescente- DCA.
A DCA
45
tem sede no Município do Natal, se constitui subordinada à
Coordenadoria de Policiamento da região da Grande Natal, que integra a
45
Atualmente, a DCA localiza-se numa casa alugada pela SETHAS- Secretaria Estadual de
Trabalho , Habitação e Ação Social , na rua: Ângelo Varela, 1465 Tirol, Natal-RN . A Delegacia
89
estrutura da Secretaria de Estado de Segurança Pública e Defesa Social. A
referida Delegacia tem jurisdição em todo o Estado do Rio Grande do Norte.
Segundo o Decreto nº 15.470 (DIARIO OFICIAL, 2001,p.1) são competências
da DCA:
prevenir, investigar e reprimir as infrações penais em que a
criança e adolescente figurem como sujeito passivo,
adotando todas as medidas de polícia judiciária e
administrativa com o objetivo de protegê-los contra a
exploração sexual e maus tratos; planejar e executar rondas
operações especiais com o fim específico de coibir a
exploração sexual e os maus-tratos; instaurar e presidir todos
os procedimentos de polícia judiciária e administrativa de sua
competência, especialmente quando solicitado pelo Poder
Judiciário ou pelo Ministério Público, como estrita observância
às normas legais e regulamentares; articular-se com as
demais Delegacias Especializadas distritos policiais e Polícia
Militar, para, em conjunto, desenvolverem atividades dentro de
sua área de competência, visando à melhoria do desempenho
de seus encargos e atribuições; exercer outras atividades
correlatas à função policial, quando determinadas pelas
autoridades superiores.
A Delegacia funciona em sistema de plantão , ou seja, 24 horas por
dia, em expediente ininterrupto de domingo a domingo. De segunda à sexta,
cada policial civil
46
, com exceção dos que trabalham no plantão, tem que dar
uma jornada de trabalho mínima de 6 horas.
funciona na estrutura de uma casa, possui no térreo uma recepção e uma sala para registro do
Boletim de Ocorrência e no primeiro andar, possui: uma ante-sala com um computador, na qual
o agente de polícia civil organiza as estatísticas e analisa os casos para definir prioridades;
possui um cartório no qual se arquiva os inquéritos da delegacia; o gabinete da delegada é
equipado com telefone e computador e dispõe de uma sala para coleta de depoimentos, no
entanto costuma ser utilizada, geralmente, pelas estagiárias de Serviço Social ou Psicologia no
atendimento à vítima.
46
Segundo informações do site da Secretaria Estadual de Segurança Pública e Defesa Social a
“Polícia Civil é uma instituição permanente, integrada ao Sistema Estadual de Segurança
Pública, essencial à Justiça Criminal, à preservação da ordem pública e a incolumidade das
pessoas e do patrimônio. É responsável pela investigação e apuração de infrações penais
(exceto as militares), indicando sua autoria. Suas conclusões em forma de inquérito policial são
enviadas à Justiça para que possa processar e levar a julgamento o possível autor do delito.”
90
No horário da manhã
47
, a equipe é formada pela delegada; uma
escrivã; três agentes de polícia, sendo destes um chefe de investigação; e à
tarde, trabalham dois agentes de polícia, uma estagiária de Serviço Social e
outra de Psicologia. Durante o período das entrevistas na Delegacia de junho à
setembro de 2005 encontramos ainda dois estudantes da Academia da Polícia
Civil que assumem as funções de agente e escrivão. O estágio possui a
duração de dois meses sendo disciplina obrigatória para todos os alunos que
passaram no último concurso da Polícia Civil, cujo objetivo é aprender sobre o
funcionamento de uma Delegacia.
O agente de plantão, em caso de denúncia de exploração sexual,
para assegurar a realização de um flagrante, deverá ligar para o telefone 190,
informar as circunstâncias daquela denúncia para que a central de polícia envie
uma viatura para o local. Ou seja, o flagrante não se constitui um serviço
especializado, uma vez que pode ser efetivado pelo 190.
Segundo depoimento da delegada, esse procedimento justifica-se
pelo fato de ser um “plantonista” por turno que não pode abandonar a
delegacia no período da noite e, além disso, a viatura no período da noite fica
sob a guarda do chefe de investigação, por isso a recomendação de
encaminhar o caso para a Central de Polícia , uma vez que, possui um
“contingente maior de policiais que são distribuídos” por diversas áreas em
Natal e “tem condições de chegar mais rapidamente ao local” do fato.
47
Manhã de 7h às 13h e tarde de 13h às 18h. Existem também quatro agentes plantonistas que
ficam responsáveis em garantir a segurança do prédio, atender as denúncias feitas por
telefone, realizar atendimento e registro do boletim de ocorrência ,de segunda à quinta-feira ,no
horário das 18h às 8h da manhã, com direito a 24 horas de folga, e de sexta a domingo ,
plantão de 24 horas com direito a 72 horas de folga.
91
Foto 1 – Fachada da DCA
Na recepção
48
, acontece o contato inicial com os usuários. Após a
primeira abordagem pelo agente da recepção, o denunciante é encaminhado
para a sala de registro de Boletim de ocorrência (dispõe de aparelho de
televisão, vídeo cassete e um computador), onde é realizado o registro da
ocorrência por um agente de polícia, e quando necessário, para maiores
esclarecimentos, o agente responsável pelo registro, solicita às estagiárias de
Serviço Social ou Psicologia, que converse com a vítima.
48
Na recepção existe um mural com cartazes de pessoas, principalmente crianças e
adolescentes desaparecidas e criminosos procurados, além de campanhas contra a exploração
sexual e contra os maus-tratos, incentivando a denúncia. A recepção possui um birô, sofá e
bebedouro.
92
Foto 2- Sala para o atendimento da vítima de violência sexual
Numa sala no 1º andar do prédio da DCA (minimamente adequada
com um birô , uma estante com brinquedos e uma cama), as estagiárias
iniciam uma aproximação com a vítima com objetivo de desvendar mais
detalhes, para que se possa caracterizar o crime. Após essa etapa, o agente
encaminha a vítima para a realização do corpo de delito ou para uma avaliação
sócio-psicológica no Instituto Técnico Científico de Polícia – ITEP. Mediante
depoimentos do denunciante e da vítima junto à escrivã, a delegada poderá
solicitar através de intimação a presença do acusado e se constatar indícios
poderá solicitar ao Juiz de Direito um mandado de prisão preventivo para o
acusado. Ao inquérito policial é anexado o resultado do laudo emitido pelo
ITEP , as provas testemunhais e materiais, que serão remetidos à Justiça.
Conforme afirma um dos agentes de polícia, geralmente no caso de
maus-tratos ou quando é configurado crime de menor ofensividade por se tratar
de uma pena leve de 1 até 3 anos, o agente de polícia nomeado para função
de escrivão “ad hoc” faz o Termo Circunstancial de Ocorrência- TCO’s e o
crime é julgado pelo Juizado Especial Criminal.
Segundo a Delegada, a DCA na efetivação de suas ações referentes
a crimes contra a liberdade sexual de crianças e adolescente, orienta-se pelo
Código Penal nos artigos que tratam sobre: estupro (art. 213); atentado violento
93
ao pudor (art. 214); posse sexual mediante fraude (art. 215); atentado ao pudor
mediante fraude (art. 216); corrupção de menores (art. 218); rapto violento ou
mediante fraude (art. 219); prostituição (art. 227-230); tráfico de mulheres (art.
231-234); e pelas disposições gerais: presunção da violência (art. 224); ação
penal (art. 225-226); Após os procedimentos criminais, a Delegacia
encaminha, em alguns casos, a vítima e familiares para o Programa Sentinela
ou para a Casa Renascer para a realização de um acompanhamento
psicossocial.
Durante o ano de 2005, segundo o depoimento da Delegada a DCA
desenvolveu as seguintes atividades educativas: entrega de cartazes contra a
exploração sexual infanto-juvenil em bares, boates e palestras em bairros
sobre o trabalho desenvolvido pela delegacia no enfrentamento aos crimes de
maus-tratos e violência sexual.
Foto 3 – Campanhas desenvolvidas pela DCA
A caracterização física, técnica-administrativa da DCA justifica-se
pela necessidade de vislumbrar as condições objetivas de funcionamento e
atendimento às crianças e adolescentes vitimizados pela violência sexual na
cidade do Natal, e possibilita ainda identificar suas limitações e perspectivas.
94
Em relação às condições objetivas de trabalho na Delegacia, que
podem dificultar as atividades, a equipe de agentes de polícia, destacou: a
necessidade de ampliar a quantidade de policiais; a abrangência de
competência em todo o estado do Rio Grande do Norte, a aquisição de viaturas
descaracterizadas, isto é, sem identificação da polícia civil, para equipes da
rua
49
e para as entregas de intimações. Há também falta de máquina
fotográfica, gravador, filmadora, máquina de XEROX, armamentos, munições e
computadores que seriam de grande relevância no trabalho de investigação.
Por muitas vezes, recai sobre a equipe a responsabilidade de garantir a
compra de materiais de expediente e de limpeza , conforme afirma o trecho
desta entrevista:
Faltam copos descartáveis que acabamos comprando, material
de limpeza, sempre falta alguma coisa, tem um sabão em pó , já
não tem água sanitária , detergente e isso tudo sai do nosso
bolso. Fazemos uma cota mensal, por exemplo, pra fazer a
faxina da delegacia, muita coisa somos nós que fazemos, era o
governo que deveria fazer. (Agente de Polícia)
Outra necessidade primária, muito enfatizada pela equipe de
profissionais da delegacia que prejudica o andamento das investigações é a
falta de uma linha telefônica para ligações externas o que implica na utilização
do telefone celular pessoal para ligações de trabalho. A linha instalada que os
agentes possuem acesso, só permite realizar ligações para outras delegacias,
apenas o gabinete da delegada, possui o telefone para uso externo. No
entanto, segundo os agentes de polícia, o telefone não pode ser usado com
freqüência por diversos motivos: sala fechada, em reunião ou registrando
depoimento de uma vítima.
Segundo depoimento da Delegada, além de Natal, o atendimento e a
apuração dos fatos pela DCA estende-se apenas á área metropolitana , por
exemplo: Goianinha, São José de Mipibu, Macaíba, Parnamirim e Extremoz.
Em relação às cidades mais distantes da capital, o procedimento da Delegacia
49
A DCA possui apenas uma viatura, utilizada para os procedimentos diários de intimação,
investigação e condução de presos em todo o estado do Rio Grande do Norte. Os agentes que
integram a equipe de investigação reclamam que a identificação da viatura prejudica
95
Especializada em Defesa da Criança e do Adolescente-DCA tem sido enviar
protocolo solicitando que o delegado da cidade realize as providências
necessárias.
Neste sentido, torna-se evidente que a extensão do atendimento da
DCA ao Estado do Rio Grande do Norte, conforme proposta no decreto lei de
criação da Delegacia, não está sendo efetivada diante das diversas
dificuldades materiais, de equipamentos e de pessoal, ora apresentada.
As entrevistas realizadas com a equipe da Delegacia tornaram
visíveis as dificuldades encontradas por estes profissionais no exercício de
suas funções, além disso, evidencia-se um descaso do Estado em investir em
melhorias estruturais e capacitação profissional. Quanto à formação da equipe,
a maioria dos agentes possue ou está concluindo curso superior,
principalmente na área de direito. Porém, constatou-se que nenhum dos
agentes de polícia que trabalham, na maioria, desde a fundação na Delegacia
em Defesa da Criança e do Adolescente , em 2001, participou de capacitação
na temática da violência sexual e maus-tratos. Conhecer a problemática, suas
causas e conseqüências são condições essenciais para a melhoria na
qualidade de atendimento nas delegacias, no entanto, não está sendo
prioridade pelas três esferas do Poder Público.
Com base em nossa pesquisa, apreendemos que desde a criação da
DCA-RN, não se configurou a garantia de recursos, ou um plano de ação de
capacitação dos profissionais na perspectiva de atender o objetivo proposto de
defesa das crianças e dos adolescentes vítimas de maus tratos e violência
sexual e responsabilização dos acusados. A delegada admite não conhecer o
valor do recurso destinado a DCA e afirma: “nunca vem um dinheiro pra mim
tudo que eu preciso de uma resma de papel ao combustível da viatura eu tenho
que pedir ao chefe da polícia civil.”
Faz-se necessário salientar, que desde a sua inauguração em 04 de
julho de 2001, a Delegacia não possui a presença de uma equipe
multiprofissional formada por Assistente Social e Psicólogo, profissionais
indispensáveis em uma Delegacia de Polícia que se propõe a prestar um
serviço especializado a crianças e adolescentes em situação de violência. Isto
consideravelmente o trabalho de investigação e na entrega de intimações. Muitas vezes o
acusado ao ver a viatura foge e a população nega informações.
96
evidencia a escassez de investimentos realizados pelo Poder Público. A
demanda por estes profissionais é identificada nas entrevistas com os agentes
de polícia, principalmente quando referem-se à melhoria no atendimento, como
segue:
A inexistência de pessoas formadas, assistente social pra dar
mais assistência para essas crianças. Muitas pessoas chegam
aqui vítimas, e se inibem muito, aqui temos estagiárias, mas não
são pessoas totalmente adequadas para o trabalho. Pra fazer
esse acompanhamento mandamos para o Programa Sentinela e
de lá mandam o processo, mas aí fica uma coisa muito distante,
mais fácil seria resolver tudo aqui. (Agente de Polícia)
As entrevistas com a equipe de profissionais da delegacia, muitas
vezes se constituiu em uma oportunidade de desabafo ao denunciar as
precárias condições de trabalho. Permitiu ainda, avaliar que apesar das
restrições, os profissionais são comprometidos com a causa da criança e do
adolescente e percebem que há necessidade de medidas urgentes para a
melhoria no atendimento.
O principal seria uma estrutura maior no atendimento, na minha
opinião, era melhor que tivesse o complexo, ao lado da
delegacia teria a parte de psicologia e assistente social, e tinha
que ter uma equipe médica aqui, uma equipe de rua, uma
equipe caracterizada, todos os equipamentos necessários
máquina fotográfica, filmadora... que a justiça desse mais apoio,
porque às vezes tem um caso e falam “ah, será que é mesmo,
será que foi assim?” O cara não viu nada, não recebeu as
vítimas e o juiz ta lá dentro de uma sala, diz que é Deus,
ninguém pode tocar nele e ele é quem faz as decisões, às
vezes, leva tanto tempo e a resposta dá negativa. (Agente de
Polícia)
Na entrevista acima, o agente de polícia sugere a criação de uma
estrutura anexa à Delegacia, com equipe multidisciplinar especializada para a
realização dos serviços médicos e psicossocial, evitando assim que a vítima se
exponha no ITEP onde são realizados os exames psicossocial e corpo delito.
Enfatiza também a necessidade de investimentos em equipamentos para a
investigação, na ampliação da equipe e por fim um maior compromisso da
Justiça para agilizar o processo e na decisão dos crimes.
97
Em relação ao ITEP, destacamos o depoimento da estagiária de
Serviço Social sobre a situação em que crianças e adolescentes estão sendo
expostas:
a criança chega aqui aí vai fazer um exame no ITEP, chega
gente machucado, sangrando, lotado. O ITEP parece a imagem
do inferno, é um calor, então é questão de investimento mesmo.
(Estagiária de Serviço Social)
A situação do ITEP reflete a falta de investimentos na estrutura física
e na capacitação dos profissionais, com o intuito de sensibilizá-los para como
proceder no atendimento e antes da realização do exame. No último item deste
capítulo, apresentamos os depoimentos das mães das vítimas sobre o
atendimento no ITEP.
As entrevistas realizadas na DCA, apresentaram uma série de
oportunidades de melhorias para os serviços prestados pela Delegacia,
iniciativas que podem contribuir para a recuperação da auto-estima, de valores
e atitudes positivas para o processo de desenvolvimento de crianças e
adolescentes que passaram pelo trauma de serem violentadas:
a) Investir na capacitação específica na temática da violência
sexual com os agentes policiais lotados na DCA;
b) Prestar acompanhamento psicossocial no ato da denúncia e
durante o trâmite do processo às vítimas e seus familiares com
vistas a proporcionar um serviço especializado;
c) Encaminhar as crianças e os adolescentes para projetos sociais
que garantam a continuação do acompanhamento psicossocial
por um período satisfatório;
d) Proporcionar o encaminhamento para a inserção das crianças e
adolescentes em programas de incentivo ao esporte, cultura,
lazer;
e) Encaminhar os adolescentes para atividades profissionalizantes;
No próximo item apresentaremos o perfil da violência sexual
contra crianças e adolescentes, em âmbito nacional, através das denúncias
registradas pelo Sistema Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração
Sexual Infanto-Juvenil e em âmbito estadual e municipal a partir dos dados
98
estatísticos coletados na Delegacia Especializada em Defesa da Criança e do
Adolescente-DCA .
4.2 A VIOLÊNCIA SEXUAL COM BASE NA ANÁLISE DOS BOLETINS DE
OCORRÊNCIA E DENÚNCIAS
A Violência Sexual contra crianças e adolescente é muitas vezes
perpassada pelo silêncio e a negligência. Silêncio das vítimas que se sentem
ameaçadas, coagidas e impotentes diante da violência sofrida, da situação em
que se encontra e do próprio agressor que na maioria dos casos são pessoas
conhecidas. Negligência dos pais, do Estado e da sociedade que prefere não
enxergar o problema a ter que enfrentá-lo.
Autores, a exemplo de Faleiros(1998) e Zürcher(2004) apontam que
a omissão, o silêncio e a conivência da mãe ou responsáveis que não denuncia
e/ou do Estado que não consegue provas, ou simplesmente, ignora o crime
levando a absolvição do acusado, diante de um caso de violência sexual
sofrida pela criança ou adolescente, faz com que as mesmas sintam-se
desprotegidas, inseguras e injustiçadas, sentimentos esses que levam ao
descrédito da Justiça, ao aumento da impunidade e da criminalidade, além de
outras conseqüências psíquicas para as vítimas.
De acordo com Faleiros, V.(1998), o enfrentamento à violência
intrafamiliar e a exploração sexual de crianças e adolescentes implica na
responsabilização legal dos envolvidos, na denúncia , na declaração formal, na
instauração do devido processo e julgamento.
É mister acrescentar que a morosidade da justiça e a forma que o
Estado encontra-se aparelhado é desestimulante para as famílias perseguirem
a responsabilização dos acusados. A exemplo da localização da DCA
50
que se
encontra em um bairro elitizado ,distante da parada de ônibus e de difícil
acesso para população dos bairros da periferia. Após a denúncia, a mãe e
vítima precisam se deslocar para o ITEP para a realização do exame, e para
50
Nas entrevistas realizadas com as mães das vítimas foi citado a dificuldade de localizar a
Delegacia.
99
receber o atendimento psicossocial deverão novamente procurar o Programa
Sentinela ou a Casa Renascer situados em outro bairro.
Um dos canais nacionais para denúncia de Violência sexual infanto-
juvenil nos últimos anos, tem sido através do serviço telefônico gratuito ou
disque-denúncia
51
administrado pela Associação Brasileira Multiprofissional de
Proteção à Infância e a Adolescência – ABRAPIA. A partir de 2003 passa a ser
responsabilidade da Secretaria Especial dos Direitos Humanos, passando a ser
uma Política Pública.
Resultado de seis anos de atuação (1997-2003) o Sistema Nacional
de denúncias, coordenado pela ABRAPIA trouxe as seguintes conquistas:
articulação e mobilização dos diversos atores sociais (Estado e sociedade
civil); centralização das denúncias relativas ao crime de violência sexual
infanto-juvenil; quantificação das denúncias registradas e encaminhamento
para os órgãos competentes; maior participação da imprensa realizando e
também estimulando a realização das denúncias; e articulação da Rede de
Enfrentamento à Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes.
52
Dados do Sistema Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração
Sexual Infanto-Juvenil demonstram que no período de fevereiro 1997 a
fevereiro 2003 no Brasil, houve um aumento significativo de denúncias,
totalizando 5.054 sendo 82% realizadas pelo telefone (0800-99-0500).
Conforme tabela abaixo, verifica-se que a região do Nordeste ocupa
a segunda colocação com 1.143 ou 22,6% das denúncias realizadas:
Tabela 1 - NÚMERO ACUMULADO DE DENÚNCIAS, POR RECEBIMENTO DA
DENÚNCIA SEGUNDO AS GRANDES REGIÕES DO BRASIL
Grandes
Regiões
Total 0800 Internet Outro
Telefone
Pessoalmente Outra
Entidade
Não
Informado
Total 5054 417
0
710 17 9 4 144
51
O número do disque denúncia 0800-99-0500, foi administrado pela ABRAPIA até 2003. Em
substituição , o governo lançou no dia 18 de maio de 2006, o disque 100, para denúncias de
abuso e exploração sexual em todo território brasileiro.
52
Conforme publicação da ABRAPIA- DO MARCO ZERO A UMA POLÍTICA PÚBLICA
DE PROTEÇÃO À CRIANÇA E AO ADOLESCENTE 0800-99-05000 Sistema Nacional de
Combate ao Abuso e à Exploração Sexual Infanto-Juvenil, ano 2004.
100
Norte 256 243 1 0 0 1 11
Nordeste 1143 112
1
1 1 1 1 18
Sudeste 2023 191
4
8 12 8 1 80
Sul 459 439 2 0 0 1 17
Centro-
Oeste
324 311 0 1 0 0 12
Ignorada 849 142 698 3 0 0 6
Fonte: ABRAPIA
Ainda conforme dados do Sistema Nacional , considerando-se as
5.054 denúncias, cerca de 3.434 ou 67,9% do total refere-se a exploração
sexual e 1.620 ou 32% ao crime de abuso sexual, observando-se que as
denúncias de abuso somente passaram a ser registradas a partir de 2000.
Outra informação relevante, refere-se à tipificação da Violência, isto é, dos
crimes considerados de exploração sexual, 86% são relacionados a
“prostituição”, 6% refere-se à pornografia com crianças na internet , 3,7%
turismo sexual, 2,3 % produção e venda de materiais pornográficos e (1,9 %),
tráfico de crianças e adolescentes com fins de exploração sexual .
Conforme gráfico abaixo:
86
6
3,7
2,3
1,9
0
10
20
30
40
50
60
70
80
90
"Prostituição" Pornografia
na Internet
Turismo
Sexual
Material
Pornogfico
Tráfico
Gráfico 1- NÚMERO PERCENTUAL DE DENÚNCIAS POR TIPO DE EXPLORAÇÃO
SEXUAL – BRASIL – PERÍODO FEV 1997- FEV. 2003.
Fonte: ABRAPIA
101
No que se refere às Políticas governamentais de enfrentamento em
âmbito nacional e estadual para coibir a pornografia, registra-se apenas a
atuação da Polícia Federal. Especificamente em relação à pornografia na
internet, existe a iniciativa de um projeto do Site Censura
(www.censura.com.br), uma organização não-governamental cuja missão é a
conscientização dos usuários da Internet, dos políticos, das famílias e da
sociedade sobre a situação preocupante, imposta pela ação criminosa através
da Internet e seus riscos que analisa e concede o Selo Site Amigo da Criança
a sites que possuam uma proposta alinhada à defesa e proteção de crianças e
adolescentes.
Em relação ao crime de Abuso Sexual, a estatística do Sistema
Nacional aponta a predominância da violência intrafamiliar, representando
60,3% das denúncias e extrafamiliar com 39,7%. Este dado corrobora com os
boletins de ocorrências registrados na Delegacia Especializada em Defesa da
Criança e do Adolescente do Rio Grande do Norte que apontam para o fato de
que os agressores são geralmente pessoas conhecidas da criança e do
adolescente, que de direito seriam responsáveis pela sua defesa e proteção.
Os dados nacionais apontam que dos lugares informados, 82,3% do crime de
abuso sexual é cometido na residência, seguido da escola com 2,2% dos casos
e 14,7% se referem a outros locais.
Dados da Delegacia Especializada em Defesa da Criança e do
Adolescente- DCA durante o período de análise, julho de 2001 a setembro de
2004, revela um número crescente de crimes de natureza sexual contra
crianças e adolescentes na cidade do Natal, onde foram registrados o total de
654, sendo 353 boletins de ocorrências e 301 denúncias.
102
62
42
127
61
132
64
103
63
0
20
40
60
80
100
120
140
2001 2002 2003 2004
ABUSO SEXUAL
EXPLORAÇÃO SEXUAL
Gráfico 2 - TOTAL DE REGISTRO DE VIOLÊNCIA SEXUAL NA DCA NO PERÍODO
DE 2001 À 2004 NA CIDADE DO NATAL.
Fonte: DCA- RN Tabulação dos dados por parte da pesquisadora
Dos 654 (Boletim de Ocorrência e Denúncia), registros acima, 424
são casos envolvendo abuso sexual (intra e extrafamiliar) e 230 são casos de
exploração sexual na modalidade de “prostituição” e “turismo”. Registramos
que os casos relativos à pornografia pela internet e tráfico de crianças e
adolescentes para outros estados geralmente envolvem a Polícia Federal.
No gráfico 3 apresentaremos os valores percentuais dos casos de abuso
sexual juridicamente caracterizado de Estupro (art. 213), Atentado Violento ao
Pudor (art. 214) , Assédio Sexual (art. 216) e Corrupção de ”Menores” (art.
218).
Atualmente, o Código Penal no art. 218 (BRASIL, 1997) expressa
que o crime de Corrupção de Menores “ corromper ou facilitar a corrupção de
pessoa maior de 14 (quatorze) anos e menor de 18 (dezoito) anos, com ela
praticando ato de libidinagem, ou induzindo-a a praticá-lo ou presenciá-lo”
prevê pena de reclusão, de 1(um) a 4 (quatro) anos.
Entretanto, a proposta de revisão do Código Penal apresentada pelo
Relatório da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI-2004) sugere a
alteração do termo corrupção de menores para Mediação para servir à lascívia
de outrem e o aumento da pena para 2 (dois) a 5 (cinco) anos de reclusão,
podendo ser caracterizado de exploração sexual quando for revestido pelo
103
caráter comercial, conforme expressa a proposta de parágrafo único – “Se o
crime é cometido com o fim de obter vantagem econômica, aplica-se também
multa.” (BRASIL, 2004, p.168 )
24%
30%
17%
19%
9%
1%
ESTUPRO
ATENTADO
ALICIAMENTO
PROSTITUÃO
CORRUPÇÃO
ASSÉDIO
Gráfico 3 - REGISTRO DE BOLETINS DE OCORRÊNCIAS E DENÚNCIAS
CONFORME TIPIFICAÇÃO DA VIOLÊNCIA SEXUAL NA CIDADE DO NATAL –RN
DE 2001 À 2004
Fonte: DCA- RN Tabulação dos dados por parte da pesquisadora
A Delegacia Especializada em Defesa da Criança e do Adolescente-
DCA, como já mencionado, foi inaugurada em julho de 2001, e já no primeiro
ano de existência foram registrados 104 ocorrências referentes a crimes de
natureza sexual sendo 61 boletins e 43 denúncias, na Cidade do Natal-RN que
gradualmente foram aumentando.
104
O quadro abaixo apresenta os tipos de violência sexual registrados
através de denúncias-DE e boletim de ocorrência-BO pela DCA, durante o
período de análise 2001 à 2004.
Quadro 1- DEMONSTRATIVO DA VIOLENCIA SEXUAL NA CIDADE DO NATAL RN
Fonte: DCA- RN Tabulação dos dados por parte da pesquisadora
Legenda: BO – Boletim de Ocorrência DE- Denúncia SUB – Subtotal
Ressalta-se que durante o período da análise as maiores incidências
na Cidade do Natal são os crimes de Atentado violento ao pudor (art. 214) com
166 BO(boletim de ocorrência) seguido de Estupro (art. 213) com 132 BO
(boletim de ocorrência) que correspondem cerca de 298 BO ou 84,41% dos
353 boletins de ocorrência.
Em relação, especificamente, as 301 denúncias durante o período de
2001 a 2004 na cidade do Natal, a incidência maior são os crimes de
exploração sexual juridicamente caracterizado pela DCA por Prostituição com
ANO 2001 ANO 2002 ANO 2003 ANO 2004
Notificação
Violência
sexual
BO DE SUB BO D
E
SU
B
BO DE SUB BO DE SUB
Estupro
21 0
21
45 6
51
37 10
47
29 6
35
Atentado
31 9
40
46 10
56
46 7
53
43 10
53
Aliciamento
7 24
31
2 38
40
0 23
23
1 14
15
Prostituição
2 9
11
1 20
21
0 41
41
1 47
48
Corrupção
de Menores
0 0
0
14 4
18
13 16
29
11 3
14
Assédio
0 1
1
1 1
2
1 2
3
1 0
1
TOTAL
61 43
104
109 79
188
97 99
196
86 80
166
105
117 denúncias, Aliciamento com 99 denúncias , os dois crimes correspondem a
216 ou 71,7% das 301 denúncias registradas .
No decorrer dos anos (conforme o quadro acima), houve um
aumento considerável de registros de boletins de ocorrências e denúncias
referente ao crime de corrupção de menores com 61 denúncias e ocorrências
nos últimos três anos (no primeiro ano de existência da Delegacia não foi
registrado nenhuma ocorrência ou denúncia).
O fato de não ter sido registrado o crime de corrupção de menores
de crianças e de adolescentes no primeiro ano de funcionamento da DCA,
deve-se a falta de conhecimento da existência da Delegacia e a inexistência de
campanhas educativas que reforçassem a importância da denúncia e a
sensibilização para este crime. O crime de corrupção de menores como ainda é
denominado , atinge em sua maioria adolescentes, do sexo feminino em vários
bairros da cidade do Natal.(Quadro 2)
O Assédio Sexual só foi configurado como crime a partir da
promulgação da Lei nº 10.224/01, e ainda assim, existe muita resistência da
vítima em registrar ocorrência.
Das 47 denúncias-DE relativas à Prostituição, no ano de 2004, no
tocante ao local de ocorrência, 10 DE aconteceram no Bairro de Ponta Negra,
caracterizado por ser uma área freqüentada por turistas durante o dia na praia
e à noite na orla , seguido de 8 DE no Bairro do Alecrim, centro comercial com
grande movimento durante o dia e, geralmente deserto no período da noite.
Idade da vitima Sexo da
vitima
Local das
Ocorrências
Estado do RN
BO
0 à 6 7 à 11 12 à 17 F M N RM INT
Estupro
43 6 4 33 43 29 8
6
Atentado
Violento
52 13 23 16 48 4 43 7
2
Aliciamento
3 3 2 1 1 2
Prostituição
2 2 2 1 1
Corrupção
15 15 12 3 11 4
Assédio
1 1 1 1
TOTAL 116 19 27 70 108 8 86 22 8
106
Quadro 2 - PERFIL DA VÍTIMA E LOCAL DA OCORRÊNCIA- ANO 2004- RN
Fonte: DCA-RN Tabulação dos dados por parte da pesquisadora
Legenda: N- Natal RM- Região Metropolitana INT – Interior
O quadro 2 demonstra que no Estado do Rio Grande do Norte em
relação ao crime de Atentado violento ao pudor, registrou-se 52 boletins de
ocorrência, especificamente no ano de 2004. O número maior de vítimas está
na faixa etária de 0 à 11 anos, caracterizada pelo ECA fase da infância e são
cerca de 93% do sexo feminino. Dos 52 BOs de Atentado, 43 BOs foram
registrados na cidade do Natal . A maior incidência foi nos bairros de periferia:
Rocas, Pajuçara e Nossa Senhora da Apresentação e demais bairros da Zona
Norte. Não se pode afirmar que a violência sexual tem correlação direta com a
pobreza, mas conforme Faleiros (1998), pode se constituir em fator de
vulnerabilidade social.
Em seguida, está o crime de Estupro no Estado do Rio Grande do
Norte, no ano de 2004, atinge principalmente vítimas na faixa etária de 12 a 17
, fase definida pelo Estatuto da Criança e do Adolescente como fase da
adolescência, e em face à própria conceituação do crime de Estupro (art. 213),
isto é, “constranger mulher à conjunção carnal...”, a vítima será exclusivamente
do sexo feminino e o acusado do sexo masculino. Dos 43 BOs registrados , 29
foram vítimas na cidade do Natal e o maior número de ocorrências
aconteceram em bairros da Periferia: Felipe Camarão, Mãe Luiza, Passo da
Pátria e bairros da Zona Norte. Estes bairros da capital se caracterizam pela
pobreza, alto índice de violência e são geralmente discriminalizados.
FAIXA ETÁRIA SEXO RELAÇÃO
COM A
VITIMA
PARENTESCO
BOLETIM
DE
OCORRÊNCIA
TIPOS DE
VIOLÊNCIA
18 a
30
31 a
45
+ 46 NI F M C D P PA N V T M
Estupro
43 23 15 1 4 43 38 5 4 6 9 4
Atentado
Violento
52 15 27 10 1 51 49 3 6 7 9 6
Aliciamento
3 2 1 3 3
Prostituição
2 1 1 2 2
Corrupção
15 9 5 1 5 10 15 1 1 1
Assédio
1 1 1 1
107
TOTAL
116 50 50 12 4 11 105 108 8 10 13 10 14 6 1
Quadro 3 - TIPO DE VIOLÊNCIA REGISTRADOS EM BOLETIM DE OCORRÊNCIA
SEGUNDO O PERFIL DO INDICIADO - Ano 2004-RN
Legenda: NI– Não informado, F- Feminino, M- Masculino, C – Conhecido,
D-Desconhecido, P-Pai ,Pa- Padrasto, N – Namorado , V-Vizinho, T- Tio, M- Mãe
Fonte DCA -Tabulação dos dados por parte da pesquisadora
O quadro acima demonstra que no Estado do Rio Grande do Norte a
faixa etária do acusado varia de acordo com a tipificação da violência, porém a
freqüência maior esta na faixa etária de 18 a 45 anos, e ainda que
aproximadamente 90,51% dos crimes foram cometidos por homens, o que
demonstra e reforça a concepção que o crime de violência sexual perpassa
relações de poder e gênero .
No que se refere à relação do acusado com a vítima, os dados
fornecidos pela DCA , refletem a situação nacional, dos crimes de violência
sexual registrados , aproximadamente 93,9% são cometidos por pessoas
conhecidas das crianças e dos adolescentes, são vizinhos, padrastos, pais e
namorados.
Nos crimes relativos à exploração sexual os acusados também são
pessoas conhecidas. Apesar dos dados não fornecerem o grau de parentesco.
117
27
218
99
229
69
224
68
0
50
100
150
200
250
2001 2002 2003 2004
Re gistros de BO e DE
Inquéritos
Gráfico 4 - NÚMEROS DE INQUÉRITOS REMETIDOS A JUSTIÇA NO PERÍODO DE
2001 À 2004, NO RIO GRANDE DO NORTE
Fonte DCA-RN -Tabulação dos dados por parte da pesquisadora
No tocante à responsabilização dos acusados, pode-se verificar que
dos 788 casos, entre boletins de ocorrência, denúncias e flagrantes registrados
108
no Estado do Rio Grande do Norte relativos aos crimes de violência sexual,
apenas 263 casos ou 33,37% resultaram em inquéritos e foram remetidos à
Justiça. Segundo informação do agente de polícia, o percentual de
aproximadamente 66,63% pode ter sido arquivado por falta de dados do
acusado e da vítima ou por falta de provas que comprovem o crime, ou ainda
estão sob investigação. Esses dados retratam a preeminência da Secretaria de
Segurança Pública em ampliar o orçamento para garantir investimento no
campo técnico-administrativo e de infra-estrutura para a apuração dos fatos e
conclusão dos inquéritos com eficácia. Autores, a exemplo de Faleiros,
V.(1998, p. 47), reforçam a questão da impunidade enquanto fator para a não
realização da denúncia, incredibilidade da população, e continuidade dos
crimes:
Os aparelhos policial e judiciário precisam atuar, pois, na
construção de uma cultura cívica da punição legal em oposição
à cultura da impunidade, da chacota, e desmoralização das
denunciantes, do descrédito de crianças e adolescentes e das
pessoas pobres.
4.3 ATENDIMENTO AOS VITIMIZADOS PELA VIOLÊNCIA SEXUAL NA
PERSPECTIVA DE GARANTIA DE DIREITOS
Promover a garantia de direitos significa uma articulação entre os
sistemas de proteção, defesa e controle. Ou seja, são eixos de atuação em
espaços e mecanismos públicos que possuem como objetivo prioritário a
consecução de direitos humanos fundamentais. Conforme afirma Nery (2006):
Os direitos humanos fundamentais podem ser definidos como:
conjunto institucionalizado de direitos e garantias do ser
humano que tem por finalidade básica o respeito a sua
dignidade, por meio de sua proteção contra o arbítrio do poder
estatal e o estabelecimento de condições mínimas de vida e
desenvolvimento da personalidade humana. Esses direitos
apresentam diversas características, tais quais: historicidade
(são criados em um contexto histórico e, posteriormente,
quando colocados na Constituição, se tornam Direitos
Fundamentais); imprescritibilidade (não prescrevem, ou seja,
não se perdem com o passar do tempo); irrenunciabilidade
(não podem ser renunciados de forma alguma), universalidade
109
(são dirigidos ao ser Humano em geral, não podendo ficar
restrito a um grupo, categoria ou classe de pessoas);
efetividade e concorrência (podem ser exercidos vários Direitos
Fundamentais ao mesmo tempo).
Nery (2006) ressalta que os direitos humanos pré-existem a
qualquer ordenamento jurídico, constituindo-se, portanto, fruto das relações
históricas e culturais da sociedade que especificamente, no caso do Brasil, foi
consolidado com a Constituição Federal de 1988.
Retomando a reflexão e discussão sobre a temática, a violência
sexual contra a criança e o adolescente refere-se a um fenômeno de
transgressão dos direitos humanos de sujeitos que estão em fase de
desenvolvimento psíquico, físico, moral e social. Sua condição peculiar de
pessoas em desenvolvimento foi reafirmada com o Estatuto da Criança e do
Adolescente – ECA, que dispõe em seu primeiro artigo proteção integral à
criança e adolescente, além de estabelecer: a garantia de prioridade, o que
compreende:
primazia de receber proteção e socorro em quaisquer
circunstâncias; precedência do atendimento nos serviços
públicos ou da relevância pública; preferência na formulação e
execução das políticas sociais públicas; e destinação
privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a
proteção à infância e à juventude.(BRASIL, 2003, p.16)
A violência contra crianças e adolescentes, historicamente e
culturalmente, têm sido utilizadas e justificadas enquanto instrumento para
educar e impor poder apesar dos avanços em relação aos direitos e a atuação
de organizações não-governamentais, fóruns e conselhos. Vimos constatando
ao longo de nossa pesquisa é que as respostas a essa violência têm sido
tímidas, seja por parte da sociedade, seja por parte do Estado.
Alguns autores, a exemplo de Paixão (2005), ao definir sistema de
garantia de direitos pressupõe três eixos articulados de espaços públicos e ou
mecanismos a serem mobilizados, na consecução do atendimento , da
110
proteção e da fiscalização, ou respectivamente, promoção , defesa e controle
social.
No eixo de promoção de direitos estão articulados os espaços
públicos e institucionais que possuem enquanto objetivo a delimitação e a
formulação da política de atendimento, previsto no art.87 do Estatuto da
Criança e do Adolescente, a saber: políticas sociais básicas, de assistência
social, para aqueles que dela necessitem; serviços especiais de prevenção e
atendimento médico e psicossocial às vítimas de negligência, maus-tratos,
exploração, abuso, crueldade e opressão.
O eixo defesa de direitos refere-se ao direito de todo criança e
adolescente a ter “acesso à justiça” para a garantia de seus direitos e a
responsabilização dos acusados. Neste sentido prevê o Estatuto da Criança e
do Adolescente-ECA (BRASIL, 2003, p.61) no art. 141 parágrafo 1ª “a
assistência judiciária gratuita será prestada aos que dela necessitarem, através
de defensor público ou advogado nomeado”. Para assegurar os direitos das
crianças e adolescentes vitimizados pela violência sexual o Estatuto prevê :
medidas responsabilizadoras pertinentes aos pais ou responsáveis e medidas
especiais de proteção às criança e aos adolescentes sempre que os seus
direitos forem violados ou ameaçados . Integram este eixo as varas judiciais
especializadas na aplicação do ECA; as varas judiciais criminais especializadas
no julgamento de crimes contra esse público (presente em apenas quatro
capitais: Recife, Natal, Salvador e Fortaleza) , os conselhos tutelares , o
Ministério Público (União e Estado), os órgãos de Segurança Pública (Polícia
Federal, Polícia Rodoviária, Polícia Judiciária Civil e Polícia Militar), a
Defensoria Pública e outras entidades sociais de defesa.
Por fim, encontra-se o eixo de controle social que segundo Paixão
(2005) , refere-se ao monitoramento da realização dos direitos da criança e do
adolescente dentro do sistema geral de proteção, através de espaços públicos
e mecanismos de monitoramento, avaliação e correção. Integram este eixo a
sociedade civil organizada, via fóruns e comitês e os Conselhos de Direitos da
Criança e do Adolescente, constituídos nas três esferas de poder Municipal,
Estadual e Nacional.
Em relação à implementação de programas públicos de proteção
especial, identificam-se o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil –PETI
111
e o Programa Sentinela , conforme apresentado no capítulo anterior como a
única política de atendimento às crianças , aos adolescentes e aos familiares
vítimas de violência sexual.
Criado pelo Governo Federal, em parceria com os municípios, o
Programa Sentinela está presente em apenas algumas cidades. Possui um
atendimento emergencial e o trabalho é descontínuo, pois além de ser uma
assistência psicossocial por um período curto, não existe uma necessária
inclusão em outros projetos sociais e nem um encaminhamento para a
continuidade do tratamento psicológico na rede pública. O trecho abaixo retrata
esta realidade:
Pelo programa Sentinela foram feitas umas 4 sessões, só isso.
Depois do Programa não teve mais nenhuma assistência... a
psicóloga disse que ela tava bem , mas eu percebi que ela não
estava. Depois que aconteceu isso ela mudou muito, aí a
psicóloga daqui encaminhou para uma amiga dela que é
particular,mas faz dois meses que ela não vai, psicóloga
público. É muito difícil e pior ninguém sabe informar aonde tem.
No posto de saúde não tem”. (Margarida)
O relato acima afirma que só houve quatro sessões com a psicóloga
e que o encaminhamento foi para um outro psicólogo particular, mesmo sendo
esta família de baixa renda. Não foram consideradas as reais condições
econômicas desta família e a necessidade de continuidade do tratamento.
Identificamos, a partir de questionário aplicado na Secretaria
Municipal de Saúde que os postos de saúde municipais não possuem o
atendimento psicológico e social especializado no tratamento de crianças e
adolescentes vítimas de violência sexual. O que, decerto, é questão
estruturante para a retomada de direitos, é negligenciado mais uma vez pelo
poder público.
No período da realização das entrevistas de agosto a dezembro de
2005, houve uma grande dificuldade em localizar os familiares das vítimas que
prestaram ocorrência na delegacia no ano de 2004, uma vez que não se teve
acesso aos boletins de ocorrência.
A única opção foi buscar junto ao Conselho Tutelar e ao Programa
Sentinela o apoio para tentar localizar os familiares das vítimas, obedecendo o
112
critério de ter registrado ocorrência em 2004 na DCA. Apesar da
disponibilidade da Equipe do Programa Sentinela a dificuldade também
permaneceu, visto que não existe uma continuidade do atendimento, isto é, as
vítimas participam de quatro sessões e depois recebem “alta”, a maioria dos
dados não estão completos ou simplesmente os telefones e endereços
mudaram. Por serem prestadores de serviços por tempo determinado de um
ano, a equipe do Programa Sentinela é substituída anualmente. Assim, as
entrevistas foram realizadas com quatro mães frente às dificuldades de acesso
e disponibilidade de participação.
Entretanto, mesmo considerando as dificuldades apresentadas nas
entrevistas com as mães das vítimas, as mesmas forneceram elementos para a
análise e apreensão da realidade vivenciada pelas famílias. As entrevistas
permitiram que refletíssemos a respeito da qualidade de atendimento nos
serviços públicos, das deficiências das políticas públicas, da concepção de
direitos e deveres para a população, das condições e perspectiva de vida, do
papel e sugestões para a melhoria do atendimento na Delegacia.
Em virtude das particularidades inerentes ao processo de entrevista
com os familiares das crianças e adolescentes vitimizadas pela violência sexual
em dimensões ou tipos distintos, foi que optamos por analisar as percepções
dos sujeitos e as múltiplas determinações da violência sofrida pela criança ou
pelo adolescente.
Inicialmente apresentaremos o perfil das famílias que participaram
das entrevistas, destacando os dados sócio-econômicos, os depoimentos
sobre a ocorrência do crime e as conseqüências da violência para suas filhas e
famílias.
As quatro entrevistadas são mães moradoras de bairros de periferia
da cidade do Natal: Dix-Sept Rosado, Jardim Progresso, Redinha e Lagoa
Azul. Todas tiveram suas filhas violentadas sexualmente, crime caracterizado
juridicamente de atentado violento ao pudor (art. 214). Por questão de sigilo e
segurança estaremos apresentando o relato das mães utilizando nomes
fictícios.
Diante do fato de termos entrevistado quatro mães, buscamos trazer
à tona as singularidades de cada família, situando-as de “per si”.
113
A primeira família é composta por pai, mãe e três irmãos. O pai é o
único provedor da casa, ganha em torno de um a dois salários mínimos, moram
em casa própria de alvenaria. Antes da ocorrência do crime a diversão da
família era ir à praia.
O crime ocorreu no ano de 2004, quando a vítima possuía 9 (nove)
anos de idade e estava com o seu tio na praia. O acusado um desconhecido
tentou “ introduzir o dedo na vagina dela, não conseguiu, mas machucou, não
chegou ao sexo” (depoimento da mãe da vítima). O tio da vítima levou o
acusado para a Delegacia na Av. Ayrton Senna para efetuar o flagrante.
Segundo o depoimento da mãe , a violência aconteceu por volta das 14 horas.
Ao chegar à delegacia foram encaminhados para fazer o exame de corpo delito
no Instituto Técnico Científico –ITEP. Segundo a mãe da vítima no ITEP, “ foi
tudo bem, teve cuidado com ela ,não conversaram com ela, só fizeram o
exame e pronto não falou com a assistente social”. Depois do exame no ITEP,
retornaram para a delegacia e ficaram até às 23hs, “não gostei, porque como
ela tava muito abalada , ela ficou muito exposta, não teve um atendimento
especial e a agente não teve cuidado com ela, não foi bom pra ela, foi nessa
delegacia comum[...}”.
Após uma semana, a família foi encaminhada para prestar outro
depoimento na Delegacia Especializada em Defesa da Criança e do
Adolescente , sobre a qual expressa “ a delegada foi muito atenciosa com a
gente”. A mãe da vítima reclama da falta de informação sobre o andamento do
processo:
Eu fico indignada, não sei de nada do resultado, teve uma
audiência agora, mas não sei se ele foi condenado, não sei de
nada. No flagrante ele ficou preso, mas agora não sei, fez um
ano em setembro que aconteceu e eu não sei como anda o
processo. (Margarida)
Esta reclamação foi uma constante nas entrevistas, as famílias
carecem de informações de como proceder em relação à vítima, a quais
serviços devem procurar e de retorno sobre o andamento dos processos.
O trecho abaixo da segunda entrevista, relata o depoimento da mãe
que expressa a violência sexual sofrida por sua filha :
114
Vai fazer um ano, ela fez exame de conjunção carnal e
avaliação psicológica no ITEP. Demorou muito porque eu
recebi muitas ameaças da minha mãe que convivia com essa
situação e eu trabalhava em casa de família e ela vivia com
minha mãe, que lutava pra tomar a guarda da minha filha, eu
nunca dei. Então, ela pequenininha, minha mãe batia nela,
chegava o Conselho Tutelar e ela dizia que a menina era bem
cuidada, minha filha desmaiava, dava ataque epilético, minha
mãe a amarrava e eu não sabia. Segundo minha mãe, o vizinho
dela, que era meu amigo de infância, pegou minha filha colocou
o pênis na boca dela, jogou o “leite” no rosto dela, na boca dela.
Aí ela correu chegou na minha mãe toda suja ainda. Ela ficou
muito abalada e não queria nem me ver, corria de mim, recebia
ameaça da minha mãe. O primeiro laudo que foi em 8 de
setembro de 2004, atestou que ela tem epilepsia . O
neurologista falou que isso foi em razão da lesão que ela sofreu
e por causa da idade. (Rosa)
A criança sofreu a violência quando tinha apenas cinco (5) anos de
idade, e conforme o depoimento acima, vivia sob a responsabilidade da avó
materna a qual cometia o crime de maus-tratos. Pode-se caracterizar neste
caso também o crime de negligência, uma vez que a avó demorou para
comunicar o fato à mãe da criança e aos órgãos competentes. A denúncia foi
registrada na DCA, pela mãe da vítima no ano de 2004, após seis anos de
ocorrido o crime, o que acarretou à vítima várias conseqüências psicológicas e
de saúde. A partir de 2004, a criança passou a viver na residência com a mãe,
o padrasto e o irmão. A casa da família é própria, de alvenaria com apenas três
cômodos. Atualmente estão desempregados , sobrevivem de “bicos” e com o
recurso de R$ 35,00 (trinta e cinco reais ) proveniente do Programa Municipal
Tributo à Criança.
Este caso está em aberto, o acusado continua solto e ameaçando a
mãe da vítima. Na entrevista, a mãe da vítima, fez uma denúncia grave contra
o Conselheiro Tutelar a quem atribui o atraso do processo, conforme relato, ao
ser procurado pessoalmente pelo Programa Sentinela, o conselheiro “mentiu”
ao afirmar que não conhecia o novo endereço da vítima.
No que diz respeito ao atendimento na DCA, a mãe declara que foi
“ótimo” e sobre a importância da Delegacia expressa “Eu acho importante
115
porque foi onde eu pude dizer o que estava sentindo, foi onde minha filha pôde
falar abertamente.”
Ao ser questionada se havia sido encaminhada para algum programa
social informou que: “tive que pagar tudo particular, tinha que fazer exames de
três em três meses, fora o medicamento eles não fizeram nada” . Refere-se
novamente ao Conselheiro Tutelar que nas suas palavras: “não me deu esse
direito” . Informou que apenas, após procurar o Conselho Municipal dos
Direitos da Criança e do Adolescente “apareceu neuro, psicólogo, psiquiatra,
cardiologista, e encaminhou para a Casa Renascer, tudo isso é o meu direito”.
Percebemos aqui, a falha de alguns atores do sistema de garantia de direitos,
que durante o processo não disponibilizou a mãe e a vítima as informações e
encaminhamentos necessários para o acesso imediato à saúde gratuita.
A terceira entrevista, relata o depoimento da mãe que teve sua filha
violentada pelo seu marido, padrasto da vítima. A vítima tinha 13 anos quando
ocorreu o crime, a mãe informou que só ficou sabendo depois, porque a sua
filha mais nova a contou:
Eu fui falar com ela , eu fui amiga. Ela chorou muito disse que
tinha vergonha e medo de me falar. Quando ela me falou o que
aconteceu , ela disse que deixasse pra lá, que já passou, e eu
disse que não, que era uma coisa que não podia deixar para lá,
porque depois ela ia culpar a mim que não procurei os direitos
dela, foi quando fui à delegacia, prestei queixa.(Violeta)
Sobre o atendimento declarou que foi “muito bem atendida” na DCA
foram encaminhadas para o Programa Sentinela, cujo atendimento psicossocial
foi apenas durante o processo. E no ITEP, avalia que foi bem atendida, teve
acesso a assistente social, psicóloga e médica que explicou a sua filha como
seria o exame. Percebemos que esse atendimento no ITEP foi completo e
satisfatório, diferente dos demais casos. O acusado foi preso no mês de julho
do ano de 2005, exatamente após um ano da denúncia registrada na
Delegacia. Atualmente a família composta pela mãe, duas crianças e dois
116
adolescentes sobrevivem de uma renda proveniente do trabalho da mãe de
costureira e de um recurso do Programa Tributo à Criança
53
.
A quarta entrevista foi realizada com a mãe de uma criança que
também foi violentada pelo padrasto, pai do seu irmão mais novo. A criança
possuía 9 (nove) anos quando a mãe pegou o acusado alisando a menina : “
ele abusava dela em casa mesmo, quando bebia, mas não era desculpa, mas
não chegou a ter relação sexual com ela”, em outro trecho da entrevista a mãe
relata que a criança disse : “ele botava o dedo e doía”.
No trecho da entrevista abaixo a mãe relata detalhadamente como foi
o registro da ocorrência e os encaminhamentos:
Cheguei lá com o SOS, a minha filha foi comigo chegando lá
fomos atendidas por um agente, ele fez o BO minha filha não
falou, só eu que falei. De lá, eles encaminharam para o ITEP e
lá fizeram um exame e tinha que voltar pra fazer um exame
psicológico. Chegando lá, o médico não conversou com a
minha filha, fez o exame e só, mas eu não sei se a psicóloga
falou com ela , porque foi só elas duas e lá no ITEP fomos bem
atendidas. Ela não quis que eu entrasse, ela só quis fazer o
exame com uma médica e atendente. Depois do ITEP fomos
encaminhadas pra cá (Programa Sentinela).” (Jasmin)
53
Segundo informações da Coordenadora “O Programa Tributo à Criança tem com objetivo
geral “Prestar assistência financeira às famílias de baixa renda com filhos matriculados no
Ensino Fundamental da rede pública, associada a ações sócio-educativas que garantam o
acesso e a permanência da criança e do adolescente na escola. “ está vinculado a Secretaria
Municipal de Educação. Uma das linhas de ação desse Programa é a assistência financeira, no
valor de R$ 60,00 (sessenta reais) para famílias com um dependente e R$ 90,00 (noventa
reais) para famílias com mais dois dependentes e R$ 120,00 (cento e vinte reais) para famílias
com três ou mais dependentes. “O recebimento dessa assistência está vinculado à
permanência do(s) dependente(s) na escola, bem como à freqüência escolar igual ou superior
a 85% dos dias letivos de cada mês, para tanto se tem um acompanhamento contínuo da
situação escolar das crianças e dos adolescentes, observando a inserção e assiduidade dos
mesmos na escola. A outra linha de ação compreende o apoio educacional e psicossocial,
viabilizado por meio dos Núcleos Educacionais do Tributo à Criança, envolvendo em média
10% do universo de crianças e adolescentes assistidos pelo programa, o que corresponde a
aproximadamente 1.100 crianças e adolescentes, os quais precisam de uma atenção
diferenciada pela situação de vulnerabilidade social em que se encontram.Nos núcleos
educacionais as referidas crianças e adolescentes participam de oficinas de apoio pedagógico,
recreação, musicalidade, dança, teatro e de atividades esportivas, sendo assistidos de
segunda a quinta-feira, durante quatro horas diárias, em horário contrário ao da escola,
realizando atividades.” A coordenadora afirma receber encaminhamentos, principalmente dos
Conselhos Tutelares de crianças e adolescentes vítimas de violência sexual.
117
Após registro da denúncia, antes de ser chamado pelo juiz, o
padrasto acusado pela violência cometeu suicídio. Atualmente a única renda da
família é proveniente da pensão alimentícia dos filhos. A família é composta
pela mãe e três crianças, moram em uma casa alugada com apenas três
cômodos. Ao ser questionada sobre a opção de lazer da família, apenas
informou que não tinha.
O medo sentido pela vítima, pode ser explicado segundo Summit
(1983) pela inversão de valores: a criança, e não o adulto, passa a ter
“responsabilidade pelo destino da família”,ou seja, ao falar a verdade para sua
mãe, ela poderá causar o esfacelamento da família; “se ela não revela a
violência sofrida , a família pode continuar a existir”. Muitas vezes, a criança se
cala por muitos anos, diante da violência sofrida, sua única alternativa passa a
ser “adaptar-se” à situação para manter o “equilíbrio” da família. (SUMMIT
apud, FELIZARDO 2004, p. 98)
Enfatizamos assim, o papel da mãe em confiar, denunciar e apoiar à
sua filha, mesmo que conscientemente ou inconscientemente esta decisão
trará repercussões para sua vida. Romper com o silêncio significa romper com
os preconceitos, medos, dependências e conseqüências que essa atitude
possa acarretar para sua vida e da sua família. Afinal, a sua omissão além de
ser um crime, estará contribuindo para o desenvolvimento de sentimentos em
sua filha como raiva por não tê-la protegido, além das conseqüências
provenientes desse tipo de relação incestuosa
54
.
Todos os relatos apontaram que as vítimas continuam sofrendo as
conseqüências dessa violência:
Ela mudou muito, porque ela gostava de se divertir, ela anda
muito calada e eu nem falo isso pra todo mundo já pra ela não
ficar ainda mais envergonhada, pra não surgir comentários na
vizinhança. (Jasmin)
Ela está num estado que não quer que ninguém toque no
assunto, ela não gosta e se sente mal. Nós fazemos de tudo pra
ela se divertir, ir á praia. Agora ela tá com namoradinho, mesmo
54
Segundo Felizardo(2004), “entende-se por incesto, nesse caso, uma relação incestuosa
entre uma criança do sexo feminino ou uma adolescente e um adulto, que tenha sobre ela a
responsabilidade de pai.”
118
assim, ela não quer que fale nada, ela chora, ela sofre calada ,
ela ficou traumatizada. (Violeta)
Ao serem questionadas sobre direitos e deveres, todas tiveram
dificuldade de expressar o que seria direito, seu e de suas filhas, expressam na
verdade a ausência deste:
Meus direitos foram tão violados que eu não sei nem quais são
meus direitos. Os da minha filha eu levei ela pra psicólogo, pra
psiquiatra, pra neurologista, pra cardiologista pra tudo que foi
possível, mas eu sei que não vai trazer a inocência dela de
volta. Eu nunca tive direitos sempre tive deveres. (Rosa)
Um outro depoimento que chamou a atenção reivindica o seu
direito e o da sua filha à assistência social e psicológica contínua:
Eu queria ter esse direito, me explicar melhor o que iria
acontecer, como eu deveria agir. Como ela é uma criança
deveria ter um acompanhamento melhor, porque quando uma
coisa como essa acontece com uma criança muda totalmente a
cabeça dela. Com minha família foi assim: ela ficou muito
revoltada, como se ela não fosse igual às outras menina.
Gostaria que eles tivessem esse cuidado de ela ter um
acompanhamento mais prolongado e não só de 4 sessões. Eles
queriam saber como ela tava e não querem saber como ela tá
agora depois de um ano. Eu como mãe, não recebi nenhuma
assistência de como proceder nem aqui (Programa Sentinela)
nem na delegacia. Uma pessoa que me ajudou muito foi a
psicóloga só que particular, eu tava trabalhando na época.
(Margarida)
Em relação aos deveres, todas as mães entrevistadas percebem que
possuem o dever de proteger suas filhas:
Meu dever é procurar os direitos dela, porque se ela foi vítima
tem que procurar pra que ela não sofra mais ainda. (Violeta)
Meu dever de mãe é proteger, ter mais atenção e tentar fazer de
tudo pra tirar ela do risco. Mas a gente tem que ter uma ajuda
para saber como tratar com ela. Como eu sou leiga. Eu queria
que me explicar-se melhor. (Margarida)
119
O meu dever como mãe é dar força pra minha filha (Jasmin)
Em geral, todas declararam que foram “bem atendidas” na DCA e
percebem a importância de uma delegacia específica que atenda crianças e
adolescentes vítimas de violência sexual. Porém, expressam algumas
oportunidades de melhorias:
Pra falar a verdade quando eu cheguei lá foi tudo tão frio,
chegou uma mulher perguntou o que tinha acontecido e me
levou pra falar com a delegada. Porque quando a criança chega
lá , ela tá triste, era pra ser uma coisa mais alegre, um lugar
amigo, não tinha nada ,um lugar para recebe-la bem, não tinha
cor , um prédio normal. ( Margarida)
Todas expressam que tiveram dificuldade de localizar, reclamam da
distância e da falta de transporte coletivo (provenientes da Zona Norte) que
passasse mais próximo da delegacia e outras afirmam que desconheciam a
existência:
Eu imaginava, antes de eu conhecer, eu pensava que era
ambiente que as crianças permanecessem lá. Elas ficariam lá
por um tempo se recuperarem do trauma. Foi um pouco difícil
encontrar a delegacia, fui a outra delegacia primeiro e eles me
encaminharam pra lá, pois eu não sabia que existia uma
delegacia própria para isso. (
Violeta)
Mesmo expressando que possuíam dificuldade em definir o que
seria direitos, todas reconhecem que suas filhas e famílias precisam de uma
assistência psicossocial na delegacia e a continuidade do tratamento, de um
ambiente agradável e alegre, como retrata este depoimento:
Se tivesse uma assistente social que tivesse mais cuidado com
ela, uma psicóloga que conversasse com ela e que elas se
sentissem bem quando fossem lá. Pra falar a verdade quando
eu cheguei lá foi tudo tão frio, chegou uma mulher perguntou o
que tinha acontecido e me levou pra falar com a delegada.
Porque quando a criança chega lá , ela tá triste, era pra ser uma
coisa mais alegre, um lugar amigo, não tinha nada ,um lugar
120
para recebê-la bem, não tinha cor , um prédio normal.
(Margarida)
Os relatos acima apresentados expressam o papel desempenhado
por essas mulheres, mães que mesmo diante das dificuldades, desemprego,
ameaças, medo, preconceitos romperam o silêncio e denunciaram o crime em
busca dos direitos de suas filhas.
A Rede de Garantia de Direitos à Criança e ao Adolescente é um
importante instrumento que segundo Faleiros, V.(1998, p. 50) tem como “o
paradigma de redes conseqüência a construção da integração estratégica de
atores na implementação da garantia de direitos”. No entanto, em entrevista
com um dos atores da rede, o mesmo reconhece as limitações da rede e a
necessidade de uma maior articulação e clareza de seus papéis:
A questão de competência de papéis , tem caso que engloba
não só o Conselho Tutelar e precisa de procedimento na rede
que são imediatos, a gente precisa da Dca, do Abrigo, da
agilidade do Conselho Tutelar , do Ministério Público,precisa do
judiciário, tem casos que envolve no mínimo 05 atores e
dificulta pela questão da morosidade, do encaminhamento, da
resposta. Tem que ser imediato. Você manda e diz não é minha
competência. Fica uma dificuldade da compreensão das
competências. A gente fica como um pingue-pongue.
(Assistente Social do SOS Criança)
A partir deste relato podemos identificar as deficiências da rede no
que tange a agilidade dos processos, falta de políticas que promovam um
acompanhamento às famílias, desconhecimento de alguns atores sobre a
competência de suas funções o que corrobora para uma negação de direitos
estabelecidos pelo ECA.
Retomando a fala do entrevistado, o mesmo acrescenta que:
A criança que é a vítima da história que deveria ser ,conforme o
Estatuto, a prioridade absoluta, termina sendo a prioridade
última. A prioridade se dá até na fragilidade da rede e na
questão da compreensão. Há, às vezes, o embate desses
órgãos a criança fica a mercê da compreensão de quem vai
decidir. A compreensão e do Conselho Tutelar de suas
121
atribuições deixa a desejar, não há um norte para ação do
Conselho e sobra com certeza para a criança. Aplicar a medida
de proteção, em conversa com conselheiro, a criança está
trancada, está no risco imediato, não tem o que pensar, a gente
vai lá e termina fazendo,correndo risco, se a competência não é,
como o Conselho Tutelar a gente é apenas um programa, mas
na hora do encaminhamento preciso do aval órgão competente ,
o Conselho Tutelar, então a criança fica
à mercê num embate
da instituição, na questão da proteção. Para mim, a violação é
dobrada, em vez de proteger eu violo duas vezes, quando o
abrigo não recebe e, às vezes, precisa de internação da justiça
para se conseguir abrigar. Eu pergunto: Qual a compreensão
dessa rede sobre o Estatuto? E em que condição se coloca
como proteção? Às vezes, não aplica a prioridade absoluta pela
ausência da rede de atendimento. (Assistente Social do SOS
Criança)
Entende-se que a garantia de direitos às crianças e aos adolescentes
vítimas de violência sexual, pressupõe necessariamente: atendimento de
qualidade através de quadro de funcionários capacitados e sensíveis a esta
temática; um ambiente agradável e favorável para uma abordagem com os
vitimizados; acompanhamento psicossocial para o vitimizado e sua família;
encaminhamento para os serviços de saúde, políticas públicas de atendimento
e inclusão social; responsabilização dos acusados; trabalho preventivo junto as
escolas, clubes de mães e igrejas; reforçar e otimizar a rede de proteção e
atendimento a crianças e adolescentes existente na cidade.
Na concepção de Faleiros, V.(1998, p. 45) , o desmonte da violência
e a construção de uma cultura amorosa da criança e de garantia de seus
direitos implica à sociedade “denunciar permanentemente a quebra do respeito
, da proteção e da construção das relações de trocas afetivas e de
aprendizagem” além de “coibir os abusos , enfrentar as ameaças e os
segredos” e em consonância com os outros atores, Estado e família, proteger
as vítimas e testemunhas.
As Políticas Públicas aqui apresentadas não estão em consonância
com o que promulga o acordo assinado pelos Estados partes da Convenção
das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança 1989 (2002, p.4), que ressalta
a importância do trabalho com as famílias enquanto elemento essencial para o
crescimento das crianças que deverão receber do Estado “proteção e
assistência necessárias para assumir plenamente suas responsabilidades “
além de reconhecer que “ a criança para pleno e harmonioso desenvolvimento
122
de sua personalidade, deve crescer no seio da família, em um ambiente de
felicidade, amor e compreensão”.
Os órgãos de defesa e responsabilização, a exemplo da delegacia,
estão distantes das discussões sobre o tema, suas condições de trabalho não
permitem uma intervenção eficiente e eficaz, trata-se de uma intervenção
emergencial, restrita e punitiva. A assistência psicossocial à vítima no ato do
registro da denúncia da Delegacia não está sendo priorizada pelo Estado
enquanto um dos instrumentos para a promoção da garantia de direitos de
crianças e adolescentes.
Com base em nossa análise, podemos afirmar que as Políticas
Públicas de enfrentamento à violência sexual infanto-juvenil são
comprovadamente focalistas, desarticuladas e ineficazes no sentido de
erradicação do problema da violência sexual, mesmo que se considere seus
avanços.
Ainda em relação à atuação da DCA, deixamos em aberto para uma
nova reflexão muitos questionamentos sobre a garantia de direitos, enfim, do
que precisa ser revisto e analisado.
É premente a formulação de Políticas Públicas que promovam a
garantia de direitos de crianças e adolescentes com base em uma atenção
especial às famílias através de Programas de Geração de Emprego e Renda;
Rede de Serviços Comunitários de Apoio Psicossocial às Vítimas de Violência,
acesso à Cultura, Programas de Socialização e Lazer, uma Rede de Proteção,
Defesa e Controle eficiente, aliado a um acesso às Políticas Sociais básicas de
qualidade.
123
5 APROXIMAÇÕES CONCLUSIVAS
A questão da violência sexual contra crianças e adolescentes exigiu
neste estudo um olhar multifacetado. Em nossa pesquisa vislumbramos as
dimensões sócio-econômicas, culturais, legislativas e históricas que perpassam
a problemática, o que possibilitou apreendermos as dificuldades de
conceituação, os avanços e os limites no que tange a legislação, o atendimento
e o provimento de Políticas Públicas.
Apreendemos que o crime de violência sexual contra crianças e
adolescentes está permeado por uma série de outras violências e negação de
direitos, assim, enfatizamos que o enfrentamento deve ser repensado a partir
das múltiplas dimensões que norteiam a problemática.
Faz-se mister reforçar que a violência sexual contra crianças e
adolescentes (abuso sexual e exploração sexual) deve ser entendida enquanto
um problema público, que a mudança deve ultrapassar às quatro paredes
privadas. Ou seja, não pode ser encarada como uma questão pessoal e
particular das famílias, mas sim, uma problemática de violação de direitos
humanos e portanto um crime que deve ser tratado na polícia e principalmente
por políticas que visem a qualidade de vida e dignidade das famílias e de suas
crianças e adolescentes.
A realização da pesquisa na Delegacia Especializada em Defesa da
Criança e do Adolescente-DCA foi ponto de partida para se entender a
problemática da Violência Sexual sob a perspectiva quantitativa, no que diz
respeito ao número de casos registrados, perfil da vítima e do acusado, o que
permitiu mapear e caracterizar o crime e suas especificidades no período de
2001 a 2004. Qualitativamente foi possível vislumbrar e desvendar sobre a
especificidade desse fenômeno em seus diversos aspectos na cidade do Natal,
a análise sobre o atendimento na DCA, os entraves e limites da Rede de
garantia de direitos, os caminhos percorridos pelas vítimas, as dificuldades e
conseqüências deste crime para as famílias e a urgência de Políticas Públicas
eficazes.
A leitura da questão da violência sexual de crianças e adolescentes
na cidade do Natal, possibilitou a articulação da discussão de conceitos ,
124
legislação e Políticas Públicas e a realidade vivenciada pelos familiares, atores
institucionais da Delegacia e da Rede de Garantia de Direitos.
É importante reafirmar que a riqueza das entrevistas junto aos
diversos atores institucionais da DCA e da Rede de Garantia proporcionaram
com suas informações e contribuições à apreensão e análise da problemática
no âmbito nacional e local.
Os atores sociais apontaram criticamente as dificuldades
encontradas no seu dia a dia profissional, demonstraram o seu compromisso
com o usuário e ainda identificaram oportunidades de melhorias para o
atendimento de crianças e adolescentes, entendendo que o objetivo principal é
a garantia de direitos a esta população.
As mães das vítimas que participaram das entrevistas acrescentaram
sobremaneira à reflexão dos direitos e deveres de suas filhas, das
conseqüências da violência sexual para suas famílias e reforçaram a
importância das Políticas Sociais para as famílias empobrecidas que passam
por mais essa violência.
Percebemos que o Estado Brasileiro inserido no processo de
globalização e seguindo as recomendações do Consenso de Washington, vem
minimizando sua atuação no provimento de Políticas Sociais Públicas
configurando-se meramente focalistas, de caráter seletivo e ineficazes. São
medidas de ajuste neoliberal que acirraram as conseqüências sociais nos
países em desenvolvimento: crescente desigualdade, desemprego estrutural,
miséria, violência ... Programas e projetos são criados e renomeados numa
perspectiva assistencialista e muitas vezes sem objetivos na prática que
promovam de fato o bem-estar social dos cidadãos.
Portanto, enfatizamos a urgência por um Estado propositivo de
Políticas Públicas planejadas em conjunto com a sociedade para atender as
demandas que lhes são postas, e não reforçar a relação de dependência
existente nas políticas meramente emergenciais.
No atual governo brasileiro, idealizado por um partido de esquerda,
representativo das classes dos trabalhadores, percebemos que não se pode
ainda ignorar a força dos organismos internacionais que pressionam e
ameaçam de forma explícita as políticas econômicas e sociais. A população
urge por transformações estruturais que devem fazer parte de um processo
125
que garanta à sua inclusão econômica e social. No entanto, apesar de
identificarmos avanços e compromissos assumidos com a população infanto-
juvenil, nos últimos anos, a pesquisa constatou que as Políticas Sociais
continuam mantendo um caráter seletivo e pontual.
É premente políticas para prevenir, denunciar, defender e proteger
crianças e adolescentes e responsabilizar os culpados , que devem ser
garantidas por lei, nos orçamentos, nos planos de ação das
secretarias(municipais e estaduais) e dos ministérios da educação, saúde,
assistência social, justiça, turismo , cultura, esporte e lazer estrategicamente
articulados.
A sociedade civil, a imprensa, as organizações não-governamentais,
fóruns ,conselhos e demais atores que formam a rede de promoção de direitos
apesar dos avanços ressaltados neste estudo, precisam reafirmar sua função
de agentes de mobilização, articulação, controle e monitoramento, na
perspectiva de garantia dos direitos de crianças e adolescentes.
O problema da violência, deve ter prioridade na agenda política,
referindo-se também à falta de Políticas Sociais Básicas que garantam uma
vida digna às crianças e aos adolescentes.
Enquanto avanços, identificamos a visibilidade da problemática nos
canais de imprensa, nas instituições de ensino, nas organizações
governamentais e não governamentais; maior clareza do tema da violência
sexual e suas especificidades repercutindo em alterações na legislação; a
percepção dos atores institucionais de necessidade de melhorias no
atendimento e no provimento de Políticas Públicas.
Esses avanços precisam ser acompanhados pela superação de
desafios que se apresentam no cotidiano profissional dos atores sociais.
Entendemos que a Política de Segurança Pública deve ultrapassar a
sua concepção punitiva e repressiva e vislumbrar uma nova perspectiva para o
atendimento às crianças e aos adolescentes vítimas de violência, entre outras,
enfatizamos: articulação dos diversos atores sociais, capacitação dos
profissionais na temática, atendimento especializado, registro dos casos em
formulários específicos, prioridade no atendimento, campanhas educativas,
equipamentos eletrônicos para investigação, inserção de uma equipe
multiprofissional na delegacia, humanização no atendimento nos órgãos de
126
defesa e promoção de direitos, melhores condições de trabalho, ambiente
agradável, acolhedor que transmita confiança e segurança para as crianças e
os adolescentes que procuram a delegacia para realizar denúncia.
O estudo apontou ainda para a necessidade de maior articulação da
rede de atendimento, capacitação continuada com os diversos atores
institucionais nas áreas de segurança, saúde, educação e assistência social na
temática da violência sexual infanto-juvenil além de políticas sociais universais
e emancipadoras.
O objetivo de uma delegacia que atende crianças e adolescentes
vítimas de violência não deve ser apenas apurar os fatos, mas
necessariamente privilegiar a qualidade no atendimento e a proteção dos
direitos. Talvez seja esse o grande desafio da Política de Segurança, a
substituição do binômio denúncia-repressão por uma política de defesa,
proteção e promoção de direitos, o que impõem entre outras, uma mudança de
cultura, maiores investimentos e comprometimento ético-profissional.
Enfim, acreditamos que as considerações acima elencadas, são
condições fundantes para que os direitos de crianças e adolescentes
historicamente conquistados, culturalmente aceitos e garantidos por lei possam
ser efetivados.
127
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134
APÊNDICES
135
ROTEIRO DE ENTREVISTA APLICADO COM A DELEGADA DA DCA
Função: Instituição:
Grau de instrução: Sexo: ( )F ( ) M
CONHECENDO A DELEGACIA
1. Quais os dias e horários de funcionamento da DCA ?
2. A Delegacia funciona em sede própria ou alugada?
3. Como se efetiva a destinação orçamentária da Delegacia? Você acompanha a
definição desses valores e su
4. a implementação?
5. Como avalia as condições de trabalho na Delegacia?
6. A Delegacia conta como uma equipe psicossocial no seu quadro de funcionários?
RELAÇÃO ENTRE FUNCIONÁRIO E INSTITUIÇÃO
7. Há quanto tempo exerce a função na instituição?
8. Quais são as suas atribuições?
9. Encontra alguma dificuldade para desempenhar sua função? Qual?
10. Qual a infra-estrutura disponível para o deslocamento ao interior?
A DCA NO ENFRENTAMENTO A VIOLÊNCIA SEXUAL
11. A Delegacia conta com algum sistema informatizado de recebimento de denúncia e
acompanhamento dos casos?
12. Como é feito o registro de denúncias?
13. Como as denúncias do interior chegam a Delegacia?
14. Como é realizado o atendimento e acompanhamento dos casos de Violência Sexual
registrados no interior ?
136
15. Após uma denúncia, qual o procedimento da DCA?
16. Quais as maiores dificuldades encontradas no trabalho de elucidação dos casos
de violência sexual ?
17. Quais atividades que são desenvolvidas pela DCA no enfrentamento à Violência
Sexual?
18. A DCA conta com a parceira de alguma instituição na realização de suas
atividades? Como se efetiva essas parcerias?
19. Existe capacitação específica na temática da Violência Sexual para a equipe da
Delegacia?
20. Quais as instituições que oferecem a capacitação? Nenhuma
21. Qual o profissional responsável pela realização do atendimento ao vitimizado?
Como e onde ocorre o atendimento?
22. Quais as instituições parceiras que compõem a rede de atendimento aos vitimizados
pela violência?
23. Existem instrumentais específicos para o registro e o atendimento nos casos de
Violência Sexual?Quais?
DISCUTINDO A VIOLÊNCIA SEXUAL
24. Na sua opinião, quais as causas da Violência Sexual? E quais os caminhos para o
enfrentamento?
25. Qual sua opinião a respeito da legislação referente à Violência Sexual?
26. Na sua opinião, como se apresenta a rede pública de atendimento aos vitimizados
pela Violência Sexual?
27. O que você entende por garantia de direitos de crianças e adolescentes
vitimizados pela violência sexual?
28. Você conhece o Plano Nacional de Enfrentamento a Violência Sexual e as ações
previstas para o eixo de defesa e responsabilização?
137
29. O que você poderia apresentar como sugestão sobre o atendimento as crianças e
os adolescentes vitimizados pela violência sexual?
ROTEIRO DE ENTREVISTA APLICADO COM OS ATORES INSTITUCIONAIS DA DCA
Função: Instituição:
Grau de instrução: Sexo: ( )F ( ) M
RELAÇÃO ENTRE FUNCIONÁRIO E INSTITUIÇÃO
1.Há quanto tempo exerce a função na instituição?
2. Quais são as suas atribuições?
3. Encontra alguma dificuldade para desempenhar sua função? Qual?
4. Qual a sua participação no atendimento e acompanhamento dos casos de Violência Sexual
registrados no interior? e na capital?
A EQUIPE DA DCA NO ATENDIMENTO AOS
VITIMIZADOS PELA VIOLENCIA SEXUAL
5.Quais instrumentos de registros de casos são utilizados no atendimento ao vitimizado
pela Violência Sexual ?
6. Quais os encaminhamentos nos casos de Violência Sexual?
7. Há o acompanhamento dos casos? Como são feitos esses acompanhamentos?
8. É desenvolvida alguma atividade com as famílias dos vitimizados? Qual o objetivo?
9. Quais as instituições parceiras que compõem a rede de atendimento aos vitimizados pela
violência?
10. Qual o objetivo da DCA no atendimento ao vitimizados pela Violência Sexual?
DISCUTINDO A VIOLÊNCIA SEXUAL
138
11. Na sua opinião, quais as causas da Violência Sexual? E quais os caminhos para o
enfrentamento?
12.Qual sua opinião a respeito da legislação referente à Violência Sexual?
13. O que você entende por garantia de direitos de crianças e adolescentes vitimizados
pela violência sexual?
14. Você conhece o Plano Nacional de Enfrentamento a Violência Sexual e as ações
previstas para o eixo de defesa e responsabilização?
15.O que você poderia apresentar como sugestão sobre o atendimento às crianças e aos
adolescentes vitimizados pela violência sexual?
139
ROTEIRO DE ENTREVISTA APLICADO COM AS INSTITUIÇÕES PARCEIRAS
Função: Instituição:
Grau de escolaridade: Sexo: ( ) F ( ) M
RELAÇÃO ENTRE FUNCIONÁRIO E INSTITUIÇÃO
1.Há quanto tempo exerce a função na instituição?
2.Quais são as suas atribuições?
3.Encontra alguma dificuldade ao desempenhar sua função? Qual?
INSTITUIÇÕES PARCEIRAS E DCA
4. Qual o objetivo da sua instituição no atendimento ao vitimizados pela Violência Sexual?
5. Quais os encaminhamentos realizados por sua instituição nos casos de Violência
Sexual?
6. Sua instituição participa no atendimento e acompanhamento dos casos de Violência Sexual
registrados pela DCA?
7. Como se efetiva a parceria com a DCA?
8. É desenvolvida alguma atividade com as famílias dos vitimizados? Quais?
9. Quais as demais instituições que compõem a rede de atendimento aos vitimizados pela
violência?
10. Em sua opinião, existem limites da rede de atendimento aos vitimizados pela
violência? Quais?
11. Como você avalia a atuação da DCA no enfrentamento a Violência Sexual?
12. Na sua opinião, quais os limites do trabalho desenvolvido pela DCA no enfrentamento
a Violência Sexual?
13. Na sua opinião, quais as perspectivas do trabalho desenvolvido pela DCA no
enfrentamento a Violência Sexual?
140
DISCUTINDO A VIOLÊNCIA SEXUAL
14. Na sua opinião, quais as causas da Violência Sexual? E quais os caminhos para o
enfrentamento?
15. Qual sua opinião a respeito da legislação referente à Violência Sexual?
16. O que você entende por garantia de direitos de crianças e adolescentes vitimizados
pela violência sexual?
ROTEIRO DE ENTREVISTA APLICADO COM MÃE DA VÍTIMA
IDENTIFICAÇÃO DA VÍTIMA
1. Idade:
2. Sexo: ( )Feminino ( ) Masculino
3. Etnia:
4. Grau de escolaridade:
( ) ensino fundamental incompleto ( ) ensino médio incompleto
( ) ensino fundamental completo ( ) ensino médio completo
( ) superior incompleto ( ) superior completo
5. Bairro/localidade em que mora:
PERFIL SÓCIO-CULTURAL E ECONÔMICO DA FAMÍLIA
7. Número de pessoas na família:
( )Crianças de 0 a 6 anos ( )de 7 a 12 anos: ( ) 13 a 17 anos: ___ ( ) mais de 18 __
8. Situação da casa:
( ) própria ( ) alugada ( ) cedida ( ) ocupação ( ) outro __________
9. Número de Cômodos da casa: 5cômodos Tipo de moradia: ( ) alvenaria ( ) madeira (
) sape
10. Ocupação dos membros:
( ) trabalham. Qual a ocupação?
( ) estudam
11. Grau de escolaridade dos membros da família
( ) ensino fundamental incompleto:filhos e mãe ( ) ensino médio incompleto
( ) ensino fundamental completo ( ) ensino médio completo :
141
( ) superior incompleto _____ ( ) superior completo _____
12. Renda familiar mensal
( ) menos de 1 salário mínimo ( ) de 1 a 2 salários mínimos ( ) de 2 a 3 salários
mínimos
( ) mais de 3 salários mínimos
13.
Inscrito em Programas Sociais e de Renda Mínima do Governo Federal, Estadual e/ou
Municipal? Se sim, quais?
( ) Programa PETI ( ) Programa Sentinela ( ) Tributo à criança ( ) Bolsa
Família
( ) Bolsa Escola ( ) outros __________________
14. Quais as atividades de lazer e diversão que costuma fazer nos finais de semana?
( ) ir a praia ( ) festas em clubes ( ) ir ao cinema ( ) áreas de lazer ( )
teatro
( ) assistir televisão ( ) outros
ATENDIMENTO NA DCA
15.
Como foi o atendimento na DCA?
16.Toda pessoa possui direitos e deveres. O que é dever para você?
17. O que é direito?Quais são seus direitos?
18. Você e sua família foi encaminhada para algum Programa Social?Qual?
19. Na sua
opinião qual o papel da DCA?
20. Você considera importante o atendimento oferecido pela DCA? Justifique sua
resposta.
21. O que você considera de positivo no atendimento oferecido pela DCA?
22. O que você esperava encontrar numa delegacia especializada em defesa da criança e
do adolescente?
23. O que você mudaria para melhorar o atendimento?
142
QUESTIONÁRIO APLICADO COM A COORDENADORA DA CASA ABRIGO
Função: Instituição:
Grau de escolaridade: Sexo: ( ) F ( ) M
1. Qual o objetivo da Casa Abrigo? Quantos núcleos existem na cidade do Natal? E a faixa
etária dos atendidos?
2. A Casa Abrigo recebe crianças e adolescentes vítimas de violência sexual?Se, sim,
Quantos atualmente?
3. Existe uma Casa Abrigo destinada exclusivamente para vítimas de violência sexual
infanto-juvenil?Qual?
4. Quais as atividades desenvolvidas com as crianças e adolescentes?
5. Qual a estrutura física das Casas Abrigos?
6. Como é formada a equipe de profissionais?
7. Qual o perfil dos atendidos nas Casas abrigos?
8. Quais os casos em que são recomendados a internação na Casa Abrigo? Quantas
crianças e adolescentes vítimas de violência sexual estão sendo atendidas pelos
Abrigos, na cidade do Natal?
9. Quais os órgãos que encaminham a vítima de violência sexual para a Casa Abrigo?
10. Qual o período do acompanhamento da vítima na Casa Abrigo? Após completar a
maioridade a vítima de violência sexual é encaminhada para alguma instituição ou outro
programa?
143
11. A Casa Abrigo realiza algum trabalho sócio-educativo? Quais?
12. As crianças e adolescentes encontradas em situação de risco social e pessoal , nas
ruas ou em sua residência , são encaminhadas para Casa Abrigo?
13. Qual o valor do recurso destinado para a realização das atividades nas Casas Abrigos?
14. Na sua opinião as Casa Abrigos estão preparadas para receber vítimas de violência
sexual?
DISCUTINDO A VIOLÊNCIA SEXUAL
15. Na sua opinião, quais as causas da Violência Sexual? E quais os caminhos para o
enfrentamento?
16. Qual sua opinião a respeito da legislação referente à Violência Sexual?
17. O que você entende por garantia de direitos de crianças e adolescentes vitimizados pela
violência sexual?
QUESTIONÁRIO – PETI , AGENTE JOVEM ,TRIBUTO A CRIANÇA, PAIF
Função: Instituição:
Grau de escolaridade: Sexo: ( ) F ( ) M
1. Qual o objetivo do programa/projeto? Quantos núcleos existem na cidade do Natal?
2. Quais as atividades desenvolvidas?
3. Como é formada a equipe de profissionais?
4. Qual o valor da bolsa destinado aos atendidos pelo programa/projeto? (quando for o
caso)
5. Quais os critérios para ser inserido no programa/projeto? Existem crianças e
adolescentes vítimas de violência sexual? Quantas?
6. Recebem encaminhamentos do Conselho Tutelar ou outro órgão para a inserção da
vítima de violência sexual no projeto? Quais?
7. Qual o período do programa/projeto? Após o término do programa/projeto é
encaminhado para alguma instituição ou outro programa?
8. Quantas crianças e/ou adolescentes foram atendidos em 2005 na cidade do Natal?
144
9. Existe algum trabalho educativo com crianças , adolescentes e familiares sobre a
violência sexual?Qual?
10. Qual o orçamento destinado para a realização do projeto na Cidade do Natal?
DISCUTINDO A VIOLÊNCIA SEXUAL
11. Na sua opinião, quais as causas da Violência Sexual? E quais os caminhos para o
enfrentamento?
12. Qual sua opinião a respeito da legislação referente à Violência Sexual?
13. O que você entende por garantia de direitos de crianças e adolescentes vitimizados
pela violência sexual?
QUESTIONÁRIO APLICADO COM A COORDENADORA DO PROJETO CANTEIROS.
Função: Instituição:
Grau de escolaridade: Sexo: ( ) F ( ) M
1. Qual o objetivo do programa/projeto? Quantos núcleos existem na cidade do
Natal?
2. Quais as atividades desenvolvidas?
3. Como é formada a equipe de profissionais?
4. Qual o valor da bolsa destinado aos atendidos pelo programa/projeto? (quando for
o caso)
5. Como é feita a abordagem das crianças , adolescentes e familiares que
encontram-se nas ruas? Quem faz?
6. As crianças e adolescentes encontradas em situação de risco social e pessoal nas
ruas (e informam que não possuem residência), são encaminhadas para alguma
instituição? Qual? E por quanto tempo?
7. Quantas crianças e/ou adolescentes foram atendidos em 2005 na cidade do Natal?
145
8. Existe algum trabalho educativo com crianças , adolescentes e familiares sobre a
violência sexual?
9. Qual o valor do recurso destinado para a realização do Programa?
DISCUTINDO A VIOLÊNCIA SEXUAL
10. Na sua opinião, quais as causas da Violência Sexual? E quais os caminhos para o
enfrentamento?
11. Qual sua opinião a respeito da legislação referente à Violência Sexual?
12. O que você entende por garantia de direitos de crianças e adolescentes
vitimizados pela violência sexual?
QUESTIONÁRIO APLICADO COM A COORDENADORA DO PROGRAMA SENTINELA
Função: Instituição:
Grau de escolaridade: Sexo: ( ) F ( ) M
1. Qual o objetivo do programa/projeto? Quantos núcleos existem na cidade do Natal?
2. Quais as atividades desenvolvidas com as vítimas?
3. Como é formada a equipe de profissionais?
4. Quais os critérios para ser inserido no programa/projeto? Quantas crianças e
adolescentes vítimas de violência sexual foram atendidas no ano de 2004, na cidade
do Natal?
5. Quais os órgãos que encaminham a vítima de violência sexual para o
programa/projeto?
6. Qual o período do acompanhamento no programa/projeto? Após o término do
programa/projeto é encaminhado para alguma instituição ou outro programa?
Quais?
7. O Programa realiza algum trabalho preventivo? Qual?
8. O Programa participa de blitz em parceria com a Delegacia e outros órgãos de
defesa?
146
9. O Programa serve de abrigo por 24 horas?
10. Em caso de denúncia para o 0800 do programa , quais os encaminhamentos
realizados? Possui estatísticas?
11. As crianças e adolescentes encontradas em situação de risco social e pessoal em
sua residência , são encaminhadas para alguma instituição?
12. Qual o valor do orçamento destinado para a realização do Programa?
DISCUTINDO A VIOLÊNCIA SEXUAL
13. Na sua opinião, quais as causas da Violência Sexual? E quais os caminhos para o
enfrentamento?
14. Qual sua opinião a respeito da legislação referente à Violência Sexual?
15. O que você entende por garantia de direitos de crianças e adolescentes vitimizados
pela violência sexual?
QUESTIONÁRIO APLICADO NA SECRETARIA MUNICIPAL DE SAÚDE
Função: Instituição:
Grau de escolaridade: Sexo: ( ) F ( ) M
1. A Secretaria desenvolve algum trabalho de prevenção e enfrentamento à Violência Sexual
de crianças e adolescentes nos postos de saúde? Qual?
2. Os profissionais de saúde receberam alguma capacitação na temática da Violência
Sexual contra crianças e adolescentes? Quem realizou?
3. A Secretaria orienta os profissionais da área de saúde abordarem o tema da Violência
Sexual contra Crianças e Adolescentes em reunião com a comunidade? Se, sim, qual o
material utilizado?
4. Existe parceria com alguma organização governamental ou não governamental para o
desenvolvimento da temática da violência sexual contra crianças e adolescentes? Como
é efetivada a parceria?
5. Qual o procedimento adotado pelos postos de saúde no caso de identificação de vitima de
violência sexual? É desenvolvida alguma atividade ou encaminhamento com as famílias dos
vitimizados? Quais?
6. A Secretaria possui algum registro do número de casos de violência identificados nos
postos de saúde e encaminhados para os órgãos competentes?
147
7. Os postos de saúde contam com profissionais na área de Serviço Social e Psicologia
especializados e/ou capacitados na temática da violência sexual contra crianças e
adolescentes para realizarem a identificação, encaminhamento e acompanhamento das
vítimas na perspectiva de garantia de direitos?
8. Quantos postos de saúde em Natal possuem atendimento especializado para crianças e
adolescentes vítimas de violência sexual?
9. Na sua opinião, existem limites da rede de atendimento aos vitimizados pela violência?
Quais?
DISCUTINDO A VIOLÊNCIA SEXUAL
10. Na sua opinião, quais as causas da Violência Sexual? E quais os caminhos para o
enfrentamento?
11. Qual sua opinião a respeito da legislação referente à Violência Sexual?
12. O que você entende por garantia de direitos de crianças e adolescentes vitimizados pela
violência sexual?
QUESTIONÁRIO APLICADO NA SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO
Função: Instituição:
Grau de escolaridade: Sexo: ( ) F ( ) M
1. A Secretaria desenvolve algum trabalho de prevenção a Violência Sexual de
crianças e adolescentes nas escolas? Qual?
2. Os professores receberam alguma capacitação na temática da Violência Sexual
contra crianças e adolescentes? Quem realizou?
3. A Secretaria orienta os professores a abordarem o tema da Violência Sexual
contra Crianças e Adolescentes em sala de aula? Se, sim, qual o material
utilizado?
4. Existe parceria com alguma organização governamental ou não governamental
para o desenvolvimento da temática da violência sexual? Como é efetivada a
parceria?
5. Qual o procedimento adotado pelas escolas no caso de identificação de vítima de
violência sexual? É desenvolvida alguma atividade ou encaminhamento com a vítima
e as famílias dos vitimizados? Quais?
148
6. A Secretaria possui algum registro do número de casos de violência sexual
identificados nas escolas?
7. Na sua opinião, existem limites da rede de atendimento aos vitimizados pela
violência? Quais?
DISCUTINDO A VIOLÊNCIA SEXUAL
8. Na sua opinião, quais as causas da Violência Sexual? E quais os caminhos para o
enfrentamento?
9. Qual sua opinião a respeito da legislação referente à Violência Sexual?
10. O que você entende por garantia de direitos de crianças e adolescentes
vitimizados pela violência sexual?
149
ANEXO
ANEXO I – DIÁRIO OFICIAL
150
151
ANEXO II – FOLDER DA CAMPANHA DA DCA
152
ANEXO III- FICHA DE PROCEDIMENTOS
153
154
155
ANEXO IV- FOLDER DA CAMPANHA DA CASA RENASCER
156
ANEXO V – FOTOS DA DELEGACIA ESPECIALIZADA EM DEFESA DA
CRIANÇA E DO ADOLESCENTE
157
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