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YUK WAH HSIA
A UTILIZAÇÃO DO LIVRO DIDÁTICO PELO ALUNO
AO ESTUDAR INTEGRAL
MESTRADO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA
PUC/SP
São Paulo
2006
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YUK WAH HSIA
A UTILIZAÇÃO DO LIVRO DIDÁTICO PELO ALUNO
AO ESTUDAR INTEGRAL
Dissertação apresentada à Banca Examinadora da
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo como
exigência parcial para obtenção do título de Mestre
em Educação Matemática, sob a orientação do
Professor Doutor Benedito Antonio da Silva.
PUC/SP
São Paulo
2006
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Banca Examinadora
____________________________________
____________________________________
____________________________________
Autorizo, exclusivamente para fins acadêmicos e científicos, a reprodução total
ou parcial desta Dissertação por processos de fotocopiadoras ou eletrônicos.
__________________________ __________________________
Assinatura Local e Data
Aos meus pais e meu tio,
In memorian
A
gradecimentos
Ao Professor Doutor Benedito Antonio da Silva,
que orientou este trabalho com dedicação,
empenho e competência.
Aos Professores, Doutora Cristina Cerri e Doutor
Saddo Ag Almouloud pela participação na Banca
Examinadora e pelas sugestões e comentários que
contribuíram para a evolução do trabalho.
Aos Professores do Programa de Ensino de Pós-
Graduação em Educação Matemática da PUC-SP,
por todo incentivo dado ao longo do curso.
Aos Professores Doutores Ana Chiummo, Norma
Sueli Gomes Allevato, Waldemar De Maio,
Walter Paulette e ao Professor Mestre Ayrton
Barboni, pelo incentivo e amizade.
À direção e aos estudantes do Curso de
Matemática da Universidade Paulista, que
contribuíram no experimento deste trabalho.
Aos colegas do Mestrado, pelo companheirismo.
Aos amigos, Alberto, Luciana, Maria Helena,
Maryneusa.
À minha família, pelo apoio, compreensão e
estímulo.
A Autora
R
esumo
Esta pesquisa procurou investigar como o aluno utiliza o livro didático, ao estudar
o objeto matemático “Integral”. Buscou-se mapear os indícios das estratégias que
o aluno lançava mão: para situar o tema proposto, no livro didático indicado, para
extrair as idéias principais e estratégias utilizadas pelo autor, resumindo-as num
esquema, para resolver exercícios propostos pelo livro. Buscou, ainda, identificar
como o estudante apresentava sua produção escrita, se apresentava idéias
encadeadas, por meio de mudanças de registros de representação semiótica, sob
a ótica de Duval, ao se referir aos aspectos cognitivos da aprendizagem. Para tal,
foi elaborado um roteiro de tarefas a serem desenvolvidas por alunos do Curso de
Licenciatura em Matemática, de uma instituição particular da Grande São Paulo.
Participaram do experimento, um grupo de alunos do 2º semestre, que ainda não
estudaram Integral e um grupo de 5º semestre, que já tiveram contato com o
conceito. Com isso, pretendia verificar se as estratégias utilizadas por um grupo
ou por outro grupo seriam diferentes. Os dados obtidos revelaram que não houve
diferenças perceptíveis entre as produções de um ou de outro grupo. Os dados
revelaram também que os estudantes desempenharam as tarefas com
entusiasmo e seriedade. A fundamentação teórica e o livro escolhido mostraram-
se ferramentas eficazes na análise dos protocolos. Ficou evidenciado que os
alunos na sua totalidade, localizava o tema consultando o índice, confeccionaram
um esquema pedido, destacando os tópicos que julgaram essenciais e ao
resolver o exercício proposto, buscaram subsídios nos exemplos e exercícios
resolvidos no texto, utilizando vários registros de representação. Embora, não
sendo escopo de nossa investigação, varias manifestações dos estudantes
apontaram para a pertinência da leitura do livro texto como uma atividade
preliminar no ensino aprendizagem de um conceito matemático.
Palavras-chave: livro texto; registro de representação semiótica; integral;
compreensão de texto; conversão de registros.
A
bstract
This paper investigated student’s use of the text book when learning the
mathematical object “Integral. Its aim was to map the indications of strategies used
by students in order to: 1. situate the proposed theme in the student book;
2.extract the main ideas and the strategies used by the author, summarizing them
in a scheme; 3. solve the exercises proposed in the book. It was also the focus of
this paper to identify how students delivered their written production - whether they
presented linked ideas, through changes in registers of semiotic representation,
according to Duval’s viewpoint, when referring to learning cognitive aspects.
Therefore, a task plan has been created, to be performed by the students of the
Undergraduate Mathematics Course of a private institution in Great São Paulo.
The participating groups were a second semester group, who have not learned
Integral yet, and a fifth semester group, who have already had contact with the
concept. A comparative study of the different strategies adopted by each group
has been developed. The achieved results revealed that there has been no
meaningful difference between the productions of the two groups. The data also
revealed that the students performed the tasks with enthusiasm and commitment.
The theoretical basis and the book chosen turned out to be efficient tools in the
analysis of the protocols. Results showed that the students as a whole could find
the theme in the index, performed the required schema, highlighting the topics
they judged essential and, while solving the proposed exercises, looked for
subsided in the examples and exercises solved in the text, making use of several
registers of representation. Although not included in the scope of this investigation,
several of the students’ manifestations suggested the pertinence of reading the
text book as a preliminary activity in the mathematical concept of learning.
Key-words: Textbook, registers of semiotic representation, integral, text
comprehension, registers conversion
S
umário
Apresentação
…………………………………………………………………… 11
Capitulo I
………………………………………………………………………….. 25
Fundamentação Teórica ……………………………………………………….. 25
Capitulo II
…………………………………………………………………………. 43
O Objeto Matemático – Integral ………………………………………………. 43
Capítulo III
………………………………………………………………………... 62
Procedimentos Metodológicos ………………………………………………… 62
Capítulo IV
………………………………………………………………………... 73
Resultados ………………………………………………………………………. 73
Capítulo V
………………………………………………………………………… 87
Conclusão e Considerações Finais ………………………………………… 87
Referências Bibliográficas
………………………………………………… 94
A
presentação
Segundo Duval (1999), educação matemática tem sido muito sensível às
necessidades de mudança nos últimos cinqüenta anos. Pesquisas em psicologia
de desenvolvimento, novas tecnologias, novas exigências em avaliação têm dado
suporte a essas mudanças. Mas seus impactos tornam-se mais efetivos no
currículo matemático e nas formas de ensino do que nas explicações dos
profundos processos de compreensão e aprendizagem da Matemática.
Dificuldades de tal pesquisa originam-se da necessidade de definir um
quadro teórico, no qual o confinamento epistemológico específico à atividade
matemática e às funções cognitivas do pensamento que o envolve não estão
separados. Isso requer ir além do estudo local do conceito adquirido em cada
nível do currículo e além da mera referência às várias teorias gerais de
aprendizagem e mesmo além da descrição global da atividade do aluno em sala.
(Duval, 1999)
Encontra-se em muitos manuais, a afirmação de que o Cálculo foi
inventado por dois homens, Newton e Leibniz. Courant (2000) considera isso
simplista. Segundo ele, o Cálculo é produto de uma longa evolução que não foi
iniciada nem concluída por Newton e Leibniz, porém, ambos desempenharam
papel decisivo em sua construção. Havia na Europa do século XVII, em sua maior
parte fora das escolas, um grupo de cientistas ativos que se empenhava em dar
continuidade aos trabalhos já realizados por Galileu e Kepler. Por meio de
correspondências e de viagens, esses homens mantinham entre si estreito
contato.
Apresentação Yuk Wah Hsia
Dois problemas chamavam atenção deles. Em primeiro lugar, o problema
das tangentes: determinar as retas tangentes a uma curva, que era problema
fundamental do Cálculo Diferencial. Em segundo lugar, o problema da quadratura:
determinar a área da região delimitada por uma curva, o problema fundamental do
Cálculo Integral. O grande mérito de Newton e Leibniz foi o fato de terem
identificado a estreita relação entre estes dois problemas. Nas mãos deles, cada
um utilizando métodos próprios, conseguiram tratar de maneira unificada esses
dois grandes problemas. (Courant, 2000)
Ao ingressarem na Universidade, tanto pública como particular, os alunos
da área de ciências exatas se defrontam com a disciplina Cálculo Diferencial e
Integral (CDI) como curso básico, pré-requisito para vários outros. Segundo
Candido, Barufi e Monteiro (2004), espera-se que essa disciplina, por meio de
vários tipos de problemas atuais e reais, propicie aos alunos uma visão mais
ampla de como o conhecimento matemático pode ser articulado.
Antes de chegar à Universidade, os alunos trabalharam alguns conceitos
matemáticos, muitas vezes de maneira isolada, e na melhor das hipóteses, um
enfoque significativo, e apesar de os professores de Cálculo esperarem haver
domínio de algumas técnicas operatórias e da linguagem lógico-formal, isso não
está satisfatoriamente estabelecido. A matemática com a qual os estudantes
trabalharam, muitas vezes permaneceu no âmbito da intuição, com algum aspecto
voltado, talvez, para o prazer da descoberta. Para a maioria dos alunos, a
matemática da Escola Média pouco ou nada tem a ver com o que lhe é
apresentado no Cálculo, e o caráter de análise com o qual passa se defrontar
parece constituir uma grande dificuldade. (Barufi, 2002)
E ainda segundo Barufi (2002), frente a essas dificuldades, muitas vezes,
os professores desenvolvem seus programas limitando-se ao “adestramento” dos
estudantes, pensando que a memorização de algoritmos seja suficiente, e que, no
futuro, eles descobrirão sozinhos os significados dos conceitos e da utilização
dessas técnicas, ao enfrentarem problemas cuja resolução os exige.
Nesse caso, alguns deles são apenas receptáculos de uma série de
resultados nos quais acreditam porque alguém, detentor do conhecimento,
12
Apresentação Yuk Wah Hsia
afirmou. O máximo que poderão fazer é repetir definições que guardaram na
memória episódica, procurando reproduzi-los da mesma maneira que lhes foram
transmitidos, ou resolver problemas semelhantes aos que viram resolvidos,
aplicando técnicas que, de tanto repetir, conseguiram razoavelmente memorizar.
Entretanto, para resolver problemas, antes de tudo, é necessário ter idéias
e, para isso, é preciso conhecer os significados das ferramentas disponíveis.
Somente depois é possível tomar decisões sobre quais ferramentas utilizar. E no
caso do Cálculo, além da coleção de idéias, extremamente férteis, existe um
conjunto de termos específicos e símbolos correspondentes, sendo que o todo se
constitui num mundo novo para os estudantes.
Malta (2003) em seu artigo “Linguagem, Leitura e Matemática”, afirma que
durante alguns anos, os professores estiveram imobilizados pela convicção de
que o grande número de reprovações na disciplina CDI era exclusivamente
causado pela deterioração do ensino pré-universitário, especificamente do ensino
médio, e portanto, sua solução só poderia advir de uma ação neste segmento de
ensino.
Ainda segundo a autora, esse quadro mudou e hoje, prepondera a
convicção de que não só a ineficiência do ensino fundamental e médio se insere
num amplo contexto social, político e cultural no qual a universidade tendo um
papel extremamente importante, mas também, de que as questões referentes às
dificuldades de aprendizado não se encerram no ensino pré-universitário. E
segundo Malta, nos últimos 15 anos muito se tem refletido, discutido e pesquisado
sobre a questão das dificuldades do aprendizado em Matemática nas disciplinas
básicas dos cursos universitários na área das ciências exatas.
As dificuldades de aprendizagem dos conceitos fundamentais, como
Derivada e Integral, têm impulsionado os educadores matemáticos a pesquisarem
em várias direções, tais como: o estudo de diferentes teorias cognitivas, novas
metodologias, uso das novas tecnologias, análise do material didático.
13
Apresentação Yuk Wah Hsia
A Integral traz no seu ensino problemas específicos como conceito,
técnicas, aplicações etc..., e foram encontradas várias pesquisas sobre o tema.
São elas:
1- The Improper Integral. An Exploratory Study with First-Year University
Students, cujos autores são Alejandro S. Gonzalez-Martín e Matías
Camacho.
Nesta pesquisa os autores, Matias Camacho e Ramón Depool Rivero
(Departamento de Analise Matemática – Universidade de La Laguna, Ilhas
Canárias, Espanha) analisaram as respostas de um grupo de universitários de 1º
ano para um questionário, com o objetivo de determinar as dificuldades que eles
tinham quando executavam tarefas não rotineiras, relativas a integrais impróprias
e identificar os obstáculos e dificuldades relativas a esse conteúdo, como também
em detectar certos erros e dificuldades, que são levantadas quando fazem
conversões entre os registros gráfico e algébrico, ou como eles manuseiam
elementos num mesmo registro.
A fim de descobrir o nível da compreensão dos alunos, segundo o ponto de
vista de Duval, os pesquisadores delinearam um questionário com nove questões,
compostas por tarefas de cálculo e determinação de convergência das integrais
impróprias, como também questões intuitivas e alguns resultados paradoxais (por
exemplo, uma figura como um comprimento infinito com um volume finito). Os
estudantes também foram solicitados a interpretar muitos dos resultados obtidos.
Os pesquisadores tentaram responder as seguintes perguntas: Como os
alunos reagem quando enfrentam exercícios do tipo não algoritmo, questões de
raciocínio e questões não rotineiras sobre o tópico em que estão estudando? Em
qual sistema de representação os alunos sentem-se mais confortáveis? Eles
percebem os resultados contraditórios a que chegaram? São eles capazes de
articular diferentes sistemas de representação nas questões relativas a integral
imprópria? Eles estabelecem alguma relação entre o conhecimento novo como o
anterior, particularmente com a integral definida, series e seqüências?
14
Apresentação Yuk Wah Hsia
O questionário, utilizando Computer Algebra System (CAS), foi respondido
por 31 alunos (13 rapazes e 18 moças), no final do segundo semestre do curso de
2000, durante uma aula de uma hora. As respostas dos alunos foram
categorizadas e seis alunos, 19,35% do total, foram entrevistados.
Depois de ler as respostas dos trinta e um questionários, os pesquisadores
concluíram que os alunos preferem trabalhar no registro algébrico e questões não
rotineiras como também questões, em que são solicitados a justificar suas
respostas, deixam-nos confusos.
Foi observado que os alunos não têm idéia clara do conceito de Integral,
concebem-na sempre como área, mas a principal dificuldade deles relaciona-se à
falta de conhecimento dos conceitos prévios, tais como convergência, seqüência
e integral definida.
Foi notado também que os alunos não estão habituados a combinar vários
registros para interpretar os resultados, ou falham ao usar o registro gráfico
quando são solicitados para isso e preferem utilizar o registro algébrico (ou se
limitam a este registro). Poucos se mostram capazes de coordenar dois registros.
Com relação a transferência dos conhecimentos prévios, observou-se que
poucos conseguem fazer isso e em muitos casos, este conhecimento prévio
revelou-se incompleto, impossibilitando a transferência.
2- Using Derive to Understand The Concept of Definite Integral, cujos
autores são Matías Camacho e Ramón Depool Rivero. Neste trabalho,
eles apresentam os resultados de um estudo piloto realizado numa
universidade em Venezuela, com o objetivo de determinar o conceito de
área e integral definida retido pelos alunos depois de eles terem sido
instruídos usando DERIVE CAS (Computer Algebra System).
É uma pesquisa que tem por objetivo analisar as potencialidades e
dificuldades encontradas, ao introduzir o software DERIVE no ensino e
aprendizagem de Cálculo durante o primeiro ano na Universidade Politécnica,
Venezuela.
15
Apresentação Yuk Wah Hsia
Cientes de que qualquer método de ensino e aprendizagem produz
resultados de curto prazo, médio prazo e longo prazo, os pesquisadores, Matias
Camacho Machín e Ramón Deepol Rivero tentaram determinar os efeitos de curto
prazo do programa de instrução combinando o método usual de ensino com
Práticas Laboratoriais delineadas com base em vários sistemas de representação.
Durante as Práticas Laboratoriais, o conceito de integral definida é
introduzido começando com o clássico problema da quadratura e mostrando
como a integral definida surge quando se tenta aproximar a área de uma certa
região do plano limitada por uma curva pelo eixo X.
Os pesquisadores visavam a que os alunos assimilassem não somente o
aspecto algébrico como também as perspectivas gráfica e numérica do conceito
de Integral Definida e vissem cálculos da Integral Definida de uma função
(contínua ou não) não exclusivamente como a diferença de uma primitiva
estimada ao fim de uma seqüência de integração.
O objetivo dessa pesquisa era analisar a influência do uso do DERIVE
Computer Algebra System, sobre a idéia da área limitada por uma curva com o
eixo X, quando este conceito é introduzido por meio de um programa de ensino
diferente dos métodos tradicionais.
O projeto foi delineado usando as idéias teóricas propostas por Duval,
referentes aos sistemas semióticos de representação. Os pesquisadores se
preocuparam principalmente com tarefas que tratavam do conhecimento,
tratamento e conversão das representações algébricas, gráficas e numéricas.
O experimento foi realizado com um grupo de onze estudantes
matriculados num curso regular de Cálculo I. O programa oficial foi ensinado, com
a diferença de que os alunos realizaram praticas laboratoriais em computadores,
segundo um modelo instrucional delineado para trabalhar com DERIVE. As
unidades temáticas foram: Funções, Limites, Derivadas e Integrais. Quando o
curso terminou, um questionário de 8 questões foi apresentado para checar a
aprendizagem.
16
Apresentação Yuk Wah Hsia
Para classificar as respostas, uma categorização foi feita para cada item
das respostas e para cada estudante. Isso permitiu aos pesquisadores a
sistematizar o caminho seguido por cada aluno quando resolvia cada problema.
Finalmente, dois dos alunos foram escolhidos para entrevista baseando-se no
desempenho deles e ao tipo de resposta dado. A entrevista era baseada no
questionário e foi levado a cabo um mês depois do mesmo ser completado.
Pelos resultados obtidos do questionário e das entrevistas, os
pesquisadores concluíram que os alunos conseguem reconhecer as
representações semióticas, gráfica e algébrica, conseguem realizar tratamentos
nessas representações, entretanto, eles têm problemas em conversão de
representações. Os alunos preferem trabalhar em representação algébrica em
vez de gráfica. Os pesquisadores também acreditam que o trabalho baseado em
praticas laboratoriais teve alguma influência na maneira em que os alunos
interpretaram as tarefas propostas.
3- Definitions and Images for the Definite Integral Concept. Os autores são
Shaker Rasslan e David Tall. O trabalho consistia em um questionário
delineado para explorar os esquemas cognitivos para o conceito da
integral definida evocado por 41 alunos do high school (Ensino Médio).
Os pesquisadores Shaker Rasslan (Center for Mathematics Education –
Oranim School of Education, Israel) e David Tall (Mathematics Education
Research Center – University of Warwick, UK) realizaram a pesquisa com 41 pré-
universitários, após terem freqüentado um programa de treinamento. O conceito
da Integral Definida, na Inglaterra, é ensinado nos dois últimos anos da escola
para alunos com idade entre 16 e 18 anos.
A pesquisa procurava responder as seguintes questões: Quais as
definições da Integral Definida são dadas pelos alunos do High School? Quais as
imagens da Integral Definida que os alunos usam em vários problemas? Quais
são as concepções errôneas relativas a Integral Definida que os alunos exibem?
Para responder essas questões, um questionário foi delineado com 6
questões sobre a integral definida. A amostra compreendia 41 alunos em quatro
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Apresentação Yuk Wah Hsia
classes do último ano e todos eles tiveram acesso a calculadoras gráficas e
encontraram todos os conceitos no teste. O questionário foi respondido pelos
alunos nas suas salas de aula, não precisavam se identificar e levaram cerca de
40 a 50 minutos para completar o questionário.
De acordo com os pesquisadores, uma das metas desse estudo foi expor
algumas imagens comuns da Integral Definida de uma função que os alunos do
ensino médio têm. Isso é muito importante para detectar o ponto de partida,
quando se quer ensinar esse conceito.
Concluíram os pesquisadores que a maioria dos alunos não escreveram
significativamente sobre a definição da Integral Definida e tiveram dificuldades em
interpretar problemas sobre cálculo de área e a integral em contextos maiores.
4- Conceito de Integral: Uma Proposta Computacional para seu Ensino e
Aprendizagem. A autoria é de José Manuel Ribeiro de Melo. Seu
trabalho tinha como objetivo, a elaboração e a aplicação de uma
seqüência de ensino, implantada num ambiente computacional.
Segundo Melo, o ensino e aprendizagem de Cálculo Diferencial e Integral
têm sido focado numa prática metodológica tradicional baseada em definições,
teoremas, propriedades, exemplos e exercícios, cujo resultado tem apresentado
um índice muito alto de reprovações. Para o autor, uma das possibilidades de
reverter este quadro é a utilização de novas tecnologias computacionais como
ferramentas didáticas no curso de Cálculo.
Para obter os dados para sua pesquisa, Melo elaborou e aplicou uma
seqüência didática aplicada a trinta alunos do segundo semestre do curso de
Matemática. Foram quatro sessões de três horas de duração, durante o horário
normal de aulas. A realização dos trabalhos foi observada pelo pesquisador,
professor de Cálculo e dois monitores.
Para atender este objetivo, o autor trabalhou com duplas de estudantes,
visando a uma produção de diálogos, troca de hipóteses e conclusões de forma
mais espontânea. As várias etapas foram elaboradas de modo que permitissem
18
Apresentação Yuk Wah Hsia
aos alunos construírem conceitos, para que tornar significativo o conceito de
Integral.
Os resultados da aplicação da seqüência evidenciaram que num ambiente
computacional, o ensino e aprendizagem passam a ser mais significativos,
contextualizados e motivantes, para os alunos e para os professores.
5- A Noção de Integral no Contexto das Concepções Operacional e
Estrutural. A autoria de Aguinaldo Herculino de Oliveira, que tinha como
meta analisar a abordagem da noção de Integral em dois livros
didáticos nos aspectos operacional e estrutural.
Esta pesquisa analisa a abordagem da noção de Integral em dois livros de
Cálculo. Fundamenta-se na teoria de Sfard, segundo a qual as noções
matemáticas são tratadas inicialmente como processos em que são evidenciadas
suas características (concepção operacional) e depois como objetos (concepção
estrutural). A passagem da primeira se dá através de três estágios
hierarquizados: interiorização, condensação e reificação.
Os livro escolhidos foram Calculus de M. Spivak e Cálculo de James
Stewart. O primeiro livro apresenta a Integral axiomaticamente, isto é, a partir de
uma construção refinada de definições e teoremas, Spivak primeiramente define a
Integral e depois trabalha suas propriedades. O segundo apresenta Integral
partindo de uma longa introdução sobre o cálculo de áreas, depois a definição e
em seguida, obtém suas propriedades. Seu ponto forte é a enorme quantidade de
exercícios que envolvem manipulações algorítmicas e aplicações.
A pesquisa evidenciou que o tratamento formalizado por Spivak vai em
direção oposta da teoria de Sfard, que postula que primeiro deve ocorrer a
concepção operacional e depois, a estrutural. Vários exercícios com
características estruturais propiciam a passagem da primeira para segunda
concepção. Em Stewart, o tratamento respeita o postulado, porém há poucos
exercícios com características estruturais e nos capítulos que tratam da noção de
Integral, apresenta projetos que propiciam a reificação da noção de Integral.
19
Apresentação Yuk Wah Hsia
6- A Noção de Integral em Livros Didáticos e os Registros de
Representação Semiótica. A autoria é de Carlos Antonio da Silva. O
autor analisa como o tema Integral é tratado em dois livros didáticos à
luz da teoria dos Registros de Representação Semiótica, propondo-se a
analisar o tema Integral à luz da teoria dos Registros de Representação
Semiótica de Duval.
Trata-se de uma analise qualitativa e os livros escolhidos foram de
Hamilton Guidorizzi, Um Curso de Cálculo, V.1 , e Cálculo de James Stewart, por
serem usados atualmente nas universidades e possuírem abordagens
diferenciadas e foram destinados a públicos diferentes.
Silva (2004) analisou como os diversos registros são empregados pelos
autores e concluiu que os registros são apresentados, os tratamentos e
conversões são explorados, de modo que o aluno pode se tornar um agente ativo
na sua aprendizagem e o professor pode assumir então o papel de facilitador
dessa aprendizagem.
Segundo Silva (2004), no processo de organização e comunicação de
saberes pela escola, é necessário considerar a natureza conflituosa entre a
construção do conhecimento e sua transmissão, sendo que a última apresenta
uma distância considerável entre a concepção teórica e organizacional dos
conteúdos a serem ensinados e sua viabilização pelo esquema escolar e
apresentação em sala de aula. Ou melhor, entre o que foi pensado para a
aprendizagem como proposta curricular, passando pelas diretrizes pedagógicas,
pelos livros didáticos, pelos programas, pela apresentação em sala de aula e pelo
que é cobrado nas avaliações e vai sofrendo adequações e determinações que
refletem, em cada um desses níveis, tensões próprias e contraditórias.
Ainda segundo o autor, na construção do conhecimento matemático, o
aluno se vê como um pesquisador na luta pelas novas descobertas e nessa
perspectiva, os livros tornam-se objetos importantes nesta maneira de se ensinar.
Os resultados da análise feita mostram que os livros quando bem
explorados, podem levar os alunos a um maior entendimento, por meio da
20
Apresentação Yuk Wah Hsia
utilização das conversões, com visualização gráfica dos conceitos em uma
situação contextualizada e motivadora.
Segundo Romanatto (2004), a situação de sala de aula brasileira permite
dizer que nem a palavra do professor e nem os modernos meios tecnológicos de
comunicação podem substituir o livro didático nas atividades escolares, pois este
acumula várias funções, como, por exemplo, a de ser instrumento de intercâmbio
e inter-relação social, permitindo a comunicação no tempo e no espaço, assim
como constitui várias fontes de informações. Portanto, considerando-se que ler é
interpretar os símbolos gráficos e compreender o significado, os objetivos da
habilidade de ler deverão principalmente levar o aluno utilizar a leitura como fonte
de informação e aperfeiçoamento cultural.
No seu artigo “O Ensino do Cálculo e da Análise”, Ávila faz um relato do
ensino do Cálculo no Brasil. Até aproximadamente 1960, o ensino dessa
disciplina seguia os moldes dos livros europeus, como o de autoria do francês
Édouard Goursat ou do italiano Francesco Severi. Os cursos eram estruturados
incorporando o que hoje costuma ser distribuído como Cálculo propriamente e a
Análise Matemática. Aprendia-se o Cálculo juntamente com a Análise. O modelo
seguido era “Cours d’Analyse” das escolas francesas, nos quais eram incluídas as
disciplinas de Cálculo de uma ou mais variáveis, funções de uma variável
complexa, geometria diferencial de curvas e superfícies e um pouco de análise de
Fourier e, à parte, ficava a Geometria Analítica como ainda é hoje.
O próprio autor, que cursou a faculdade de 1953 e 1956, teve um curso de
três anos de Análise Matemática, conforme descrito acima. Logo no primeiro ano,
começou com a teoria dos números reais, noções de topologia na reta, funções
contínuas em intervalos fechados, conjuntos compactos, etc... juntamente com
derivadas e aplicações, máximos e mínimos, comportamento das funções e não
havia menções a trigonometria, logaritmos e exponencial, tópicos que figuravam
no ensino médio.
Segundo Ávila (2002, p. 84), a partir de 1960, os livros americanos
tomaram o lugar dos livros europeus, surgindo assim o costume de ensinar o
Cálculo primeiro, ficando a Análise Matemática para depois, numa disciplina
21
Apresentação Yuk Wah Hsia
separada. Apesar dessa mudança, ainda resistiu a apresentação rigorosa do
Cálculo desde o primeiro ano por influência dos professores europeus, o que
pode ser notado em alguns livros de autores brasileiros e a marca mais visível
disso é a introdução, logo no início do curso, da definição de limite em termos de
e , e a conseqüente dedução das suas propriedades.
ε
δ
De acordo com o autor, um dos primeiros autores que mudou
significativamente o modo de apresentar Cálculo foi Serge Lang, cujo livro
apareceu pela primeira vez em meados dos anos sessenta, logo seguido pelo de
Bob Seeley. Esses autores reconheciam que não era realista ensinar a teoria
rigorosa do limite no inicio de um curso de Cálculo, e seus textos, principalmente
o primeiro, influenciaram muitos dos livros que têm sido escritos desde então.
Barufi (1999) realizou sua tese de doutorado buscando compreender as
dificuldades existentes no processo ensino-aprendizagem do CDI, a partir dos
livros adotados, um instrumento sempre presente no trabalho do professor em
sala de aula. Para a autora, bons livros sempre existiram e que a escolha do livro
pelo professor pode revelar suas crenças e as metodologias a serem adotadas
para a aquisição do conhecimento.
No outro artigo seu “O Provão e o Ensino da Matemática”, Ávila comenta
que um fator que pesa muito nas deficiências do aprendizado, principalmente da
Matemática, é o uso exagerado de preleções no ensino, tanto no superior como
no ensino fundamental e médio. O aluno é conduzido a uma atitude muito
passiva, esperando que lhe “ensinem”, quando devia ser induzido a “aprender”. É
cada vez mais generalizada a idéia de fazer o aluno ter mais iniciativa no
aprendizado, pois este já chega à universidade esperando que o professor lhe
“ensine” o que tem que aprender. Nas faculdades particulares, os alunos na
maioria trabalham, portanto, dispõem pouco tempo ou quase nenhum tempo para
estudo fora da sala de aula. Conseqüentemente, esperam aprender nas preleções
do professor durante a aula.
Sabe-se que ninguém aprende Matemática porque assiste às aulas, por
mais talentoso que seja o professor em suas exposições, afirma Ávila. É preciso
fazer os alunos trabalharem individualmente com muita disciplina e persistência.
22
Apresentação Yuk Wah Hsia
Entretanto, Malta (2003) aponta como indício do despreparo dos alunos ao
ingressar na universidade, a incapacidade de utilização da linguagem escrita,
visível na dificuldade de construir frases completas e consistentes e sem erros de
ortografia, demonstrado pelos alunos.
A autora enfoca a importância da linguagem no processo da aprendizagem
em matemática e ressalta a necessidade do aprender a ler e a se expressar de
forma organizada; ler no sentido mais amplo possível, no sentido de adquirir
conhecimentos a partir de fontes de registro, tais como livros, textos, hiper-textos
ou meios de registro de conhecimentos que venham a ser criado, sem a
interveniência direta de um explicador ao vivo, além de conduzir o aluno a
desenvolver suas capacidades de leitura em matemática e de expressão do
próprio raciocínio que os leve à compreensão e utilização de resultados
matemáticos.
A proposta do nosso trabalho é investigar como o aluno utiliza o livro
didático, quando ele estuda um tema como Integral de Riemann para funções
reais. Ele entende o que está estudando? Ele apresenta algum interesse pelo livro
didático? Ele consegue relacionar os conceitos apresentados com os registros
utilizados? Ele manifesta interesse em estudar usando um livro didático?
Tentar obter essas respostas é muito importante, porque segundo
Romanatto (2004), a leitura de um livro didático apresenta inúmeras vantagens
sobre outros meios de comunicação, sendo a reflexão a principal delas. A leitura
torna indispensável o esforço para compreender, o que é altamente disciplinador
e educativo. Outra vantagem: o desenvolvimento da criatividade. O leitor, muitas
vezes, enriquece o texto: vai além dos fatos narrados: “lê” nas entrelinhas, usa a
imaginação.
Na tentativa de obtenção das respostas, vamos solicitar aos alunos a
realização de tarefas como: leitura de texto do tópico do tema Integral em um livro
didático, que é o “Cálculo”, Volume 1, de James Stewart, colocar as idéias
principais do texto em um esquema e por fim, resolver um exercício do livro.
Além disso, vamos utilizar entrevistas para enriquecer os resultados.
23
Apresentação Yuk Wah Hsia
O nosso trabalho será organizado em cinco capítulos: no primeiro capítulo
desenvolvemos a fundamentação teórica de Raymond Duval, os registros de
representação semiótica, quanto a compreensão matemática e depois, a
compreensão de textos. No capitulo dois, apresentamos um breve relato sobre a
evolução do conceito de Integral. No capitulo três, tratamos das escolhas
metodológicas, dos procedimentos realizados e a realização do experimento. No
capitulo quatro, as análises das tarefas e entrevistas realizadas e no capítulo
cinco, as considerações finais.
A pesquisa fundamenta-se na teoria de Duval, cuja idéia da aquisição do
conhecimento matemático baseia-se na necessidade de distinguir o objeto
matemático de sua representação e para atingir essa meta, diferentes
representações semióticas de um objeto matemático precisam ser utilizadas.
Logo, o conhecimento matemático é adquirido quando o aluno consegue
converter dois registros de representação do mesmo objeto matemático.
24
C
apítulo I
Fundamentação Teórica
A Teoria “Registros de Representação Semiótica” de Raymond Duval dará
suporte teórico à nossa pesquisa, pois aborda os aspectos cognitivos relativos à
aquisição dos conhecimentos matemáticos e será baseado num texto seu,
Representation, vision e visualization: Cognitive functions in mathematical
thinking. Basic Issues for learning”.
Segundo Duval (1999), essa teoria procura primeiramente determinar o
funcionamento cognitivo subjacente à diversidade dos processos matemáticos, a
fim de entender as dificuldades de muitos estudantes com a aprendizagem
matemática e a natureza destas, visto que o objetivo do ensino da disciplina é
contribuir para o desenvolvimento das capacidades dos alunos em raciocinar,
analisar e visualizar, para enfrentar um ambiente tecnológico e computacional de
crescente complexidade.
Diferentemente de outros campos de conhecimento (como botânica,
geologia, astronomia, física...), em que as representações semióticas são
imagens ou descrições sobre algum fenômeno do mundo real, a única forma de
obter o acesso aos objetos matemáticos é a produção de alguma representação
semiótica, e ainda segundo o autor, não se pode confundir o objeto matemático
com sua representação.
Capítulo I Yuk Wah Hsia
Conforme o autor, no processo ensino-aprendizagem, os recursos
utilizados são a língua falada e a língua escrita. Aprendemos a falar imitando o
que ouvimos e aprendemos a escrever quando dominamos a fala, o que requer
atenção e conhecimento, e ao escrever, surge um registro.
A história mostra que o progresso da Matemática sempre esteve ligado ao
desenvolvimento de diversos sistemas semióticos baseados em dois diferentes
sistemas sensórios: linguagem e imagem. Exemplificando Duval: notações
simbólicas originaram-se da escrita, o que levou a escrita algébrica e, desde o
século XIX, a criação das linguagens formais. Existia a construção das figuras
planas com instrumentos, aí em perspectiva e depois em “gráficos”, a fim de
traduzir curvas em equações.
Cada novo sistema semiótico fornecia meio específico de representação e
processos para o pensamento matemático. Por essa razão, foram chamados de
registros de representação. São quatro tipos muito diferentes de registros, e isso
vincula uma complexa interação cognitiva apoiando qualquer atividade
matemática.(Duval, 2003)
Representação Discursiva Representação Não Discursiva
Registros
Multifuncionais: Os
tratamentos não são
algoritmizáveis.
1. Língua Natural.
2. Associações verbais
3. Formas de raciocinar:
- argumentação a partir de
observações, de crenças...
- dedução válida a partir de
definição ou de teoremas.
Figuras geométricas planas ou
perspectivas (configurações em
dimensão 0, 1, 2 ou 3).
- apreensão operatória e não
somente perceptiva.
- construção com instrumentos.
Registros
Monofuncionais:
Os tratamentos são
principalmente
algoritmos.
4. Sistemas de escritas:
- numéricas (binárias, decimal,
fracionária...);
- algébricas;
- simbólicas (línguas formais).
- Cálculo
Gráficos cartesianos.
- Mudanças de sistemas de
coordenadas.
- Interpolação, extrapolação.
Fig. I.1 – Classificação dos diferentes registros de representação
Fonte: Duval, 2003 p. 14
26
Capítulo I Yuk Wah Hsia
Para Duval, a aprendizagem matemática é um campo privilegiado para
estudar os registros de representação semiótica porque envolve um paradoxo
cognitivo, os objetos matemáticos, que não são objetos reais, necessitam de
representações para se tornarem acessíveis e perceptíveis, mas elas não podem
ser confundidas com os objetos matemáticos e essa distinção é muito importante
para a compreensão matemática, para que o conhecimento adquirido não se
torne inutilizado fora do contexto.
As representações são muito importantes para comunicação, como
também para atividade cognitiva do pensamento. Existem representações
mentais que dependem da interiorização das representações semióticas e essas
últimas são produções de conhecimento que permitem representações diferentes
do mesmo objeto e elas não são subordinadas às representações mentais.
Para que um sistema semiótico funcione como registro de representação,
segundo o autor, três atividades devem estar envolvidas: ser uma representação
identificável, permitir o tratamento (transformação interna ao registro), e por
último, permitir a conversão, que é a transformação de um registro em um outro.
1.1 – Operações Cognitivas: Tratamento e Conversão
Segundo Duval, os processos matemáticos são compostos de dois tipos de
transformações de representações. Existem transformações que são feitas no
mesmo registro de representação, como cálculo aritmético ou algébrico. Chama-
se de “tratamento” este tipo de transformação.
Existem, também, transformações que impõem uma mudança de registros,
isto é, a representação de um objeto é “traduzida” em uma representação
diferente do mesmo objeto em outro registro, por exemplo, quando se parte de
uma sentença em língua natural para uma expressão literal ou a transformação
de equações em gráficos cartesianos. Chama-se de conversão este tipo de
transformação.
27
Capítulo I Yuk Wah Hsia
Duval (1999) afirma que não se dá muita atenção à diferença entre esses
dois tipos de operações cognitivas que estão subjacentes aos processos
matemáticos, pois se muitos estudantes conseguem realizar alguns tratamentos,
poucos conseguem realmente converter representações.
A atividade matemática requer habilidade de mudança de registro, ou por
causa de outra apresentação de dados, que se encaixam melhor do que em um
modelo já conhecido, ou porque dois registros podem agir juntos, como figuras e
língua natural ou notações simbólicas em geometria.
Do ponto de vista didático, Duval (1999) afirma que somente alunos que
podem realizar mudança de registros não confundem o objeto matemático com
sua representação e eles podem transferir seu conhecimento para outros
contextos diferentes daqueles do ensino.
Dois fatos mostram a grande complexidade da operação de conversão:
- Qualquer conversão pode ser congruente ou não-congruente. Quando a
conversão é congruente, a representação de partida é transparente
para a representação do registro de chegada, isto é, a conversão pode
ser vista como uma fácil tradução unidade a unidade.
- Análises bastante exatas do caráter congruente ou não-congruente da
conversão de uma representação em outra podem ser dadas
sistematicamente e explicam muitos erros, fracassos, enganos ou
bloqueios mentais.
- A congruência ou a não congruência de qualquer conversão depende
de sua direção. A conversão pode ser congruente em uma direção e
não-congruente na direção oposta, levando a contrastes
surpreendentes no desempenho dos alunos.
Para o autor, é surpreendente ver como a maioria dos professores e
mesmos psicólogos dão muito pouca atenção às diferenças entre tratamento e
conversão. Essas duas operações cognitivas são agrupadas na unidade dos
processos matemáticos para resolver problemas, e quando uma mudança de
28
Capítulo I Yuk Wah Hsia
registro deve ser introduzida no ensino, geralmente se escolhe a direção em que
ela é congruente, evitando-se as situações que levam a dificuldades.
Para Duval, a coordenação entre os registros deve ser colocada em jogo,
ela não é conseqüência da compreensão matemática; ao contrario, ela é uma
condição essencial para isso.
1.2 – Visão e Visualização
Segundo Duval (1999), do ponto de vista psicológico, visão se refere à
percepção visual e, por extensão, a uma imagem visual. Como percepção, visão
envolve duas funções cognitivas essenciais:
- A primeira consiste em dar acesso direto a qualquer objeto físico. Essa
é a razão pela qual percepção visual é sempre tomada como um
modelo para noções epistemológicas da intuição. Nada é mais
convincente do que o que é visto. Nesse sentido, visão é o oposto da
representação, mesmo das imagens mentais, porque representação é
algo que fica no lugar de alguma coisa. Essa função é epistemológica.
- A segunda função é bem diferente. Visão consiste em apreender
simultaneamente vários objetos ou a um campo todo. Em outras
palavras, visão parece dar imediatamente uma completa apreensão de
qualquer objeto ou situação. Nesse sentido, visão é o oposto do
discurso, da dedução... que requer uma seqüência de atos, focalizando
uma cadeia de sentenças. Essa função é sinóptica.
Desse modo, percepção visual desempenha em uma maneira muito
imperfeita a função sinóptica. Primeiramente, porque nós estamos num mundo
tridimensional: somente um lado das coisas pode ser visto, e apreensão completa
requer movimento, tanto de quem está olhando como daquilo que está sendo
visto.
Em qualquer caso, conforme Duval, esse movimento é a transformação do
conteúdo percebido: há somente uma justaposição das vistas sucessivas que
29
Capítulo I Yuk Wah Hsia
pode ser de face cheia, de perfil, de cima, de baixo. Em segundo lugar, porque
percepção visual sempre focaliza numa parte particular do campo e pode saltar
de uma parte a outra. Não existe percepção visual sem um tal exploração.
Existe aí o ponto de ruptura entre percepção visual e visualização. Uma
representação semiótica não mostra as coisas como elas são em ambientes 3D
ou como elas podem ser fisicamente projetadas num pequeno suporte material
2D. Isso é problema da percepção visual.
Uma representação semiótica mostra relações, ou melhor, organização das
relações entre unidades representadas. Estas unidades representacionais podem
ser formas 1D ou 2D (figuras geométricas), coordenadas (gráficos cartesianos),
ou palavras (rede semântica)... E estas unidades devem ser bi-dimensionalmente
conectadas porque qualquer organização requer no mínimo duas dimensões para
se tornar obvia.
Deste modo, compreensão envolve apreender a estrutura global, não há
compreensão sem visualização. E é por esta razão que visualização não pode ser
reduzida a visão, pois visualização faz visível tudo aquilo que não acessível pela
visão. Aí está então a lacuna entre percepção visual e visualização.
Percepção visual precisa de exploração por meio de movimentos físicos,
porque ela nunca dá uma apreensão completa do objeto. Ao contrário,
visualização pode fornecer de imediato uma apreensão completa de qualquer
organização das relações, mas isso requer um longo treino, entretanto, o que a
visualização apreende pode ser o começo de uma série de transformações.
A forma de olhar não é a mesma em visão e visualização. Dois fenômenos
confundem este tema. Primeiramente, quando elas são graficamente produzidas,
as representações semióticas são objetos da apreensão visual perceptiva. Nesse
sentido, visualização é sempre mostrada dentro da percepção visual ou dentro da
sua extensão mental, de acordo com Duval.
Além disso, algumas representações semióticas, como desenhos, visam
ser representações icônicas: existe uma semelhança relativa entre o conteúdo e o
objeto representado, quando alguém o reconhece (uma árvore, um carro, uma
30
Capítulo I Yuk Wah Hsia
casa...) de imediato, sem nenhuma outra informação. Na matemática,
visualização não trabalha com tais representações icônicas: olhá-las não é
suficiente ver, isto é, perceber e compreender o que está realmente representado.
A diferença entre percepção visual e visualização gera duas conseqüências
para a aprendizagem matemática.
Visualização se refere a uma atividade cognitiva que é intrinsecamente
semiótica, que não é mental nem física. O uso da visualização requer um treino
especifico para cada registro. Figuras geométricas ou gráficos cartesianos não
são diretamente disponíveis como são as representações icônicas.
Assim, suas aprendizagens não podem ser reduzidas ao treino para
construí-las, e é devido a simples razão que construção requer atenção para
focalizar sucessivamente em algumas unidades e propriedades, enquanto
visualização consiste em apanhar diretamente a configuração inteira das relações
e discriminando o que é relevante nela. Freqüentemente, os estudantes vão não
mais longe que uma apreensão local e não vêem a organização global relevante,
mas uma representação icônica.
Segundo Duval, acredita-se que aprender como construir gráficos ou
figuras geométricas é suficiente para aprender visualização em matemática. Além
disso, neste tipo de tarefas os estudantes conseguem resultados satisfatórios.
Mas qualquer tarefa de construção requer somente uma sucessão de apreensões
locais: precisa-se de focalizar em unidades não na configuração final. Construir
um gráfico requer somente computar algumas coordenadas e desenhar uma
curva: alguns vão sempre da tabela de dados, ou equações para os eixos
graduados.
Visualização requer uma mudança oposta: deve-se ir do gráfico todo para
alguns valores visuais que apontam os traços característicos do fenômeno
representado ou aquilo que corresponde a um tipo de equação e aponta para
alguns valores característicos da equação. Portanto, visualização causa a
antecipação do tipo de equação a ser procurada.
31
Capítulo I Yuk Wah Hsia
Logo, para Duval (1999), aprender matemática implica a coordenação de
um registro fornecendo visualização e outro registro desempenhando uma das
quatro funções discursivas, e essa conexão entre registros compõe a arquitetura
cognitiva em que os alunos podem reconhecer o mesmo objeto através de
diferentes representações e podem fazer conexões objetivas entre matemática
empírica e dedutiva.
A seguir, é reproduzido o esquema utilizado por Duval (1999) para explicar
o funcionamento da sua arquitetura cognitiva.
INTENCIONAL AUTOMÁTICO
Fazendo agir um sistema semiótico Por meio da ativação dos sistemas
orgânicos.
(mentalmente ou materialmente)
A representação denota o objeto
representado em uma:
A representação é o resultado da
experiência do objeto
Forma não
analógica
Representações
Discursivas
sentenças
fórmulas...
Forma analógica
Representação
fornecendo uma
visualização
gráficos
figuras
geométricas
?
Reprodução de
gestalts
percebidos
imitação
simulação
Disponibilidade
interna do que foi
visto
Imagens mentais
Internalização
A aquisição dos sistemas semióticos e sua
coordenação requerem um longo treinamento.
1.3 - Compreensão de Textos
Como nossa pesquisa quer investigar o manuseio do livro didático pelos
alunos, além da aprendizagem matemática, recorremos também à teoria de Duval
que aborda a compreensão de textos, baseando-se nos textos “La compréhension
32
Capítulo I Yuk Wah Hsia
de Textes” e “La interaction des Niveaux de Representation Dans La
Compréhension des Textes”.
Para Duval (1991), a compreensão de texto é um fenômeno submetido a
importantes variações. Ela pode, sobre um mesmo tema e para um mesmo leitor,
apresentar diferenças consideráveis de custo ou de sucesso. Alguns dizem que
existem textos fáceis de ler, outro que são ao contrário e outros que não
conseguem ler, apesar do interesse que podem ter sobre o tema tratado.
Admite-se comumente que compreender um texto é compreender o que o
texto enuncia em relação às situações, os fenômenos, os acontecimentos ou os
problemas que ele trata. Segundo Duval (1991), uma tal compreensão só se torna
real para o leitor se ela corresponder a uma compreensão dessas situações ou
acontecimentos.
Conforme o autor, quando se analisam os modelos de compreensão
elaborados até o presente, pode-se destacar que todos são essencialmente
centrados sobre o leitor e não levam em conta as características próprias do texto
que podem modificar a situação de leitura e a natureza da tarefa de
compreensão, visto que os tratamentos que intervêm na compreensão de um
texto não são unicamente ligados ao grau de complexidade da forma lingüística
do texto, eles dependem também do conteúdo cognitivo que o texto lança mão.
Duval chama de conteúdo cognitivo de um assunto ou de um tema, o
conjunto das representações correspondentes que permitem a compreensão,
fazendo associações ou inferências, controlando a pertinência ou a legitimidade
do mesmo. Esta compreensão pode ser, em muitos casos, a compreensão que
um especialista pode ter do assunto tratado.
O autor chama de organização redacional de um texto só se tratando das
unidades de nível superior: as frases. A especificidade das frases em relação a
todas outras unidades de nível inferior, nas quais elas podem ser decompostas, é
que elas são unidades de discurso e não mais somente da língua. Isso quer dizer
passando da língua ao discurso, muda-se de universo: com a frase, passa-se na
33
Capítulo I Yuk Wah Hsia
intenção, naquilo que o locutor quer dizer. Isso indica em qual perspectiva as
frases vão ser consideradas.
Para o autor, de uma parte, cada frase marca uma relação que o texto
estabelece ou rejeita entre dois objetos do conteúdo cognitivo. De outra parte,
entre as diferentes frases, não existe somente elos externos marcados pelos
conectores, mais existem relações internas de sinônimo, antônimo ou de
superordenação referentes às expressões que mencionam ou que descrevem os
objetos do conteúdo cognitivo.
A organização redacional de um texto não pode então ser determinada a
partir das frases tomadas isoladamente, pois cada uma está então considerada
como uma seqüência de unidades elementares cuja combinação obedece
somente às regras sintáxicas e às exigências semânticas.
Então, para Duval (1991), compreender o que um texto descreve ou
explica, um leitor deve previamente dispor de um conjunto de dados e de
procedimentos. Isto recobre, para começar, aquilo que permite a compreensão da
linguagem falada ambiente e o acesso ao código escrito: é a parte invariante da
base do conhecimento, aquela que permite entender por meio da seqüência de
signos escritos, a expressão oral correspondente.
Existem, contudo, também os conhecimentos conceituais: é a parte que,
para um mesmo leitor, pode variar consideravelmente de um texto ao outro,
conforme os assuntos tratados. O processo de compreensão quando da leitura é
o mesmo quando a distância entre a base de conhecimentos do leitor e o
conteúdo cognitivo varia.
Esta questão permite encontrar a questão relativa a difícil diferenciação
entre compreensão quando da leitura e compreensão geral. Duval (1991) cita dois
casos.
O primeiro caso é aquele cuja distância é reduzida, isto é, o leitor já tem
uma compreensão do conteúdo cognitivo: os conhecimentos apresentados ou
utilizados no texto fazem parte de sua base de conhecimentos. Nesse caso, a
leitura se faz a partir das representações do nível cognitivo já adquirido, o que
34
Capítulo I Yuk Wah Hsia
permite fazer economia de certos tratamentos exigidos pelo nível da organização
redacional ou isso os facilita.
Para o autor, o leitor está então livre da imposição de seguir com atenção
todo desenrolar do texto para compreender aquilo que está escrito ou explicado.
Esses conhecimentos já adquiridos intervirão quando da leitura como esquemas,
permitindo integrar as determinações semânticas, sintáticas e pragmáticas do
texto. Certos desses esquemas foram descritos com roteiros, nos quais dizem
respeito às experiências das situações correntes, ou como episódios pelos
relatos.
O essencial do processo de compreensão consistiria então nesse
conhecimento dos esquemas, cujos textos seriam somente uma descrição
particular, mais ou menos completa, na sua aplicação sob forma de solicitação
das diferentes categorias em que está a organização. Em outros termos, a
compreensão quando da leitura se faz a partir de uma grade leitura.
Conforme Duval, o segundo caso é aquele em que esta distância é
importante, ele se produz cada vez que a leitura tem por meta a aquisição de um
conhecimento novo, ou a modificação das representações da leitura sobre uma
situação, sobre um problema, sobre acontecimentos, etc...
A possibilidade de uma aprendizagem pela leitura (de manuais, de
publicações, ou de artigos de documentação) repousa sobre esta existência de
uma diferença entre o conteúdo cognitivo do texto e a base de conhecimentos do
leitor.
A compreensão do que está explicitamente apresentado no nível da
organização redacional se torna a passagem obrigatória para alcançar a
compreensão do conteúdo cognitivo. É relativamente a uma tal situação que a
distinção entre bons leitores e leitores fracos pode ter um sentido.
Para Duval, os primeiros se revelam melhor que os segundos, na medida
em que levam em conta e tratar corretamente uma categoria particular de
palavras funcionais, aquelas que se relacionam mais diretamente à organização
redacional do texto.
35
Capítulo I Yuk Wah Hsia
De fato, existem palavras funcionais (artigos, preposições) cujo tratamento
só exige, na maioria da suas ocorrências em um texto, considerar palavras
vizinhas, sem que seja necessário ter a frase inteira onde elas aparecem.
Sozinhos, os “bons leitores” podem restituir esta segunda categoria de
palavras funcionais, mesmo sobre textos para os quais eles não dispõem de uma
base de conhecimentos suficiente.
Esses tratamentos de natureza lingüística, todavia, não são sempre
suficientes para alcançar uma compreensão do conteúdo cognitivo, em caso de
distância grande, tratamentos paralelos são requisitados. Dessa forma, Duval
introduz a noção de situação de leitura.
Os dois fatores de variação que o autor vai descrever, se referem de um
lado a distância entre a base de conhecimentos do leitor e o conteúdo cognitivo e,
por outro lado, a distância entre a organização redacional do texto e do mesmo
conteúdo cognitivo. Então, levando em conta esses dois fatores, podemos
distinguir quatro situações de tipo de leitura. Em cada uma delas, o nível da
identificação das palavras, a natureza da tarefa de leitura e a natureza dos
tratamentos requeridos para compreensão mudam.
A seguir, estão as quatro situações citadas pelo autor.
Texto: Correspondência entre a organização redacional e o nível cognitivo.
Congruência Não-Congruência
Familiar
I. Situação trivial sem
riscos de erro.
II. Situação trivial com
riscos de erro.
Leitor: o conteúdo
cognitivo é, para
ele
Novo
III. Situação, normativa,
para uma aprendizagem,
exigindo tratamentos
paralelos.
IV. Situação, exigindo,
a mais, tratamentos
ortogonais.
Fonte: Duval (1991)
Nas duas primeiras situações I e II, a compreensão do texto pode ser
reconduzida a uma tarefa de reconhecimento. A não congruência introduz riscos
36
Capítulo I Yuk Wah Hsia
de interpretação errônea, seja por um falso reconhecimento induzido pela
organização redacional, seja por antecipações muito rápidas que conduzem a
negligenciar a organização redacional do texto. Um percurso único e rápido do
texto, sem retorno, pode ser suficiente para a compreensão no momento da
leitura nesses dois primeiros casos. Exceto o modo de identificação das palavras
e das frases, a compreensão releva os mesmos tratamentos daqueles que são
requisitados para a compreensão da linguagem falada em uma conversação.
Esta primeira situação de leitura não passa além de uma prática oral do
texto. Vê-se então o porquê a simples revisão pode ser considerada como um
critério suficiente de compreensão e porque, para o leitor, todo retorno ao texto
parece inútil. Duval (1991) observa, no entanto, que um percurso rápido e único
do texto, na situação II de leitura, aumenta os riscos de interpretação errônea no
leitor, erros muitos rapidamente explicados por uma falta de atenção.
As outras duas situações de leitura, III e IV, são diferentes. A compreensão
é uma produção de conhecimento novo para o leitor, pois existe uma defasagem
importante entre a base de conhecimento do leitor e o conteúdo cognitivo. Nessas
duas situações, um percurso único e rápido do texto, sem pausa, sem retorno, ou
mesmo, sem uma segunda leitura, não é suficiente.
O processo de compreensão não pode se limitar ao tempo de um percurso
visual, único e não interrompido. Exige-se uma atividade que prolongue este
percurso e que conduza um retorno sobre certas partes do texto, para responder
as questões, para efetuar comparações entre certas expressões, para verificar a
coerência de certas inferências, para determinar aquilo que passou sob silêncio.
Esta atividade que não é simultânea ao longo de uma leitura corrente, ela
exige outros tratamentos, como aqueles requisitados nas duas primeiras
situações sendo necessários: reformulações locais, questões, comparações entre
passagens diferentes do texto, retorno sobre os dados de sua própria base de
conhecimentos. Isso diz respeito a que Duval (1991) chama de “expansão
discursiva da leitura”.
37
Capítulo I Yuk Wah Hsia
Esses tratamentos podem depender de um outro registro: sublinhar,
marcas de retorno a outra passagem, transcrição em esquema... Duval fala nesse
caso de uma “prática escrita” do texto. Em caso de congruência entre os níveis de
representação, os tratamentos que permitem a compreensão do texto, isto é, a
apropriação do conteúdo cognitivo novo pelo leitor é favorecida pela organização
redacional do texto: eles podem ser facilmente efetuados paralelamente ao
desenrolar tematizado pelo texto. Em caso da não-congruência, tratamentos
suplementares devem também intervir.
Para Duval (1995), analisar de modo preciso o que recobre a compreensão
de um texto é importante, em primeiro lugar, dissociar os processos da
compreensão de um texto e a prática da leitura corrente. Por prática da leitura
corrente, o autor entende por um percurso visual único e regular do texto, sem
retornos e sem paradas longas. Um tal percurso pode ser suficiente, ou
considerado como tal para compreender um texto.
Isso porém, não é o caso para todos os leitores e para todos os textos,
paradas longas, retornos, vários percursos, até mesmo uma atividade de
informação ou de tratamento à margem desses percursos, se revelam muitas
vezes necessários. Isso depende das situações de leitura. Enquanto que a
compreensão de um texto seja simultânea a sua leitura corrente ou que não seja,
os processos de compreensão do texto repousam sempre sobre duas operações
fundamentais: a segmentação do texto em unidades e a recontextualização das
unidades segmentadas.
A importância da operação de segmentação surgiu com a constituição dos
primeiros modelos de compreensão. Eles evidenciaram a necessidade de compor
os textos em unidades que não sejam palavras nem frases, mas de unidades
textuais de informação. Três tipos desse procedimento podem ser colocados em
ação para distinguir as unidades no texto: a segmentação cognitiva, a
segmentação proposicional e a segmentação funcional. Para Duval (1995), são
sobretudo, as duas primeiras que foram consideradas nos modelos de
compreensão de texto.
38
Capítulo I Yuk Wah Hsia
A segmentação cognitiva se efetua a partir de uma lista de perguntas, a
resposta a cada pergunta delimitando uma unidade de informação textual que
deve ser encontrada no texto. Esta lista de questões originou-se das
representações completas de situação chamada de esquemas/roteiros. Esta
segmentação repousa inteiramente sobre representações que são independentes
da expressão lingüística e do grau de explicitação redacional. Ela conduz a
negligenciar unidades de informação explicitamente dadas no texto, mas que não
respondem a nenhuma das questões relativas aos esquemas conceituais de ação
ou de situação. A segmentação cognitiva é seletiva e extrínseca à organização
redacional do texto.
De acordo com Duval, a segmentação proposicional se efetua ao contrário
como uma codificação independentemente de toda referência a um conteúdo
cognitivo determinado. As unidades textuais de informação são definidas como
proposições, conforme a interpretação lógica do termo. As regras determinam a
priori uma correspondência entre a natureza das palavras de uma parte e um
outro dos dois termos característicos da proposição, o predicado e seu argumento
(ou seus argumentos).
A segmentação proposicional que só leva em conta critérios morfo-
sintáxicos é uma operação que não deixa nada escapar de todas as indicações
lingüísticas fornecidas pela redação do texto. Pode parecer mais próxima do texto
do que a segmentação cognitiva e também parecer congruente à segmentação
visual do texto. Determinar as proposições principais (as macro-proposições) e
encontrar a organização do texto a partir desta lista torna então uma tarefa difícil.
Não é suficiente discriminar todas as unidades de informação que são
explicitamente mobilizadas em um texto, é necessário também apreender as
conexões que as unem em um todo. Duval (1995) chama esta operação de
recontextualização.
Da mesma forma como existem diferentes formas de segmentação
conforme o procedimento utilizado, existem igualmente diferentes procedimentos
de recontextualização. Elas se distinguem essencialmente pelo aspecto da
totalidade integrante que é privilegiado para recontextualizar as unidades
39
Capítulo I Yuk Wah Hsia
resultantes da segmentação. Duval (1995) vai se deter somente em duas formas
de recontextualização: uma puramente cognitiva e a outra, redacional.
A recontextualização cognitiva mobiliza essencialmente os conhecimentos
relativos às situações, aos objetos ou às questões que o texto evoca, ou dos
quais ele trata, independentemente daquilo que a redação do texto explicita. O
conjunto dos conhecimentos mobilizados é independente da organização
redacional do texto.
É esta operação de recontextualização cognitiva que constitui a operação
central do processo de compreensão. Efetivamente, as perguntas que permitem a
segmentação cognitiva do texto são organizadas em uma rede, representando os
componentes e a estrutura de uma ação ou de uma situação. A leitura do texto
solicita uma ou várias dessas redes.
Cada rede determina relações que os segmentos do texto preenchem,
permitindo então a efetuação simultânea das operações de segmentação e
recontextualização. Cada vez que uma informação é encontrada em um texto, ela
é colocada em relação com outras informações.
As informações que faltam ou implícitas se encontram determinadas e
situadas da mesma maneira. A recontextualização cognitiva corresponde a
ativação de um esquema interpretativo mobilizável por todo um conjunto de textos
e em todas as situações de leitura onde a diferença entre o conteúdo cognitivo do
texto e a base de conhecimentos do leitor são pouco importantes.
A recontextualização redacional, segundo Duval (1995), é a operação que
explicita todas as relações que existem entre as unidades discriminadas pela
segmentação funcional. A recontextualização redacional é interna ao texto, e ela
só pode ser efetuada posteriormente a segmentação, isso quer dizer que a
recontextualização redacional é independente do conteúdo cognitivo do texto.
A compreensão de um texto repousa sempre sobre duas operações
fundamentais: sua segmentação em unidades e a recontextualização das
unidades obtidas pela segmentação.
40
Capítulo I Yuk Wah Hsia
Do ponto de vista de uma aprendizagem da compreensão de texto, para
Duval (1995), é essencial distinguir os níveis de organização que constituem um
texto como texto e mobilizar explicitamente as formas de segmentação e de
recontextualização que lhes são específicas: segmentação funcional e
recontextualização redacional, segmentação e recontextualização cognitivas.
Essas formas caracterizam dois processos de compreensão que parecem
ser inversos. Um conduz a desprender a organização redacional do texto,
enquanto ela dá acesso ao conteúdo cognitivo do texto. Outro parte de uma base
de conhecimentos correspondente ao conteúdo cognitivo do texto, e esta base
fornece esquema para desprender a organização redacional do texto, ou para
antecipar o desenvolvimento, ou para identificar rapidamente a participação dela.
Por analogia com outros modos de conhecimento, Duval (1995) chama
esses dois processos respectivamente de “processo indutivo” e “processo
dedutivo”.
As diferenças entre os dois processo são mostradas no quadro a seguir.
(Duval, 1995)
Processo Indutivo de Compreensão Processo Dedutivo de Compreensão
1- Segmentação Funcional:
As unidades são determinadas em
relação às funções discursivas (referenciais
e metalingüística).
O texto, na totalidade de suas
construções e de suas marcas sintáxicas, é
levado em conta.
Esta forma de segmentação, diferente
da segmentação visual da forma escrita do
texto, é sistemática e independe do
conteúdo cognitivo.
1- Segmentação Cognitiva:
As unidades são determinadas como
elementos de resposta a uma grade de
perguntas. Esta resposta pode ser
constituída por uma palavra ou uma frase.
A resposta pode também não se encontrar
no texto.
Não é necessário de entrar nos
detalhes da construção sintáxica de cada
frase. Procedimento visuais de
reconhecimento por combinação com as
perguntas ou por complementação
associativa podem ser suficientes.
Esta forma de segmentação é seletiva
e depende do conteúdo cognitivo.
41
Capítulo I Yuk Wah Hsia
2- Recontextualização Redacional
As diferentes relações que cada
unidade discriminada pode ter com as
outras discriminadas são explicitadas sobre
a base de relações semânticas entre as
expressões, e de ligações discursivas
marcadas por conectores argumentativos e
temporais.
Esta forma de recontextualização é
seletiva. Ela depende de um postulado de
conectividade textual conforme a qual cada
frase tem ao menos um elo interno ou
externo com ao menos uma outra frase do
texto.
2- Recontextualização Cognitiva
As unidades discriminadas são
integradas numa organização de
conhecimentos, que são relativos ao mundo
descrito ou evocado pelo texto.
Para que a recontextualização
cognitiva seja possível essa organização
deve já fazer parte da base de
conhecimentos do leitor.
Esta forma de recontextualização é
sistemática. Ela é independente da
organização redacional.
Fonte: Duval (1995)
Para Duval (1995), a compreensão de um texto depende de um desses
dois processos ou de sua interação. O processo indutivo está centrado sobre a
organização redacional e o processo dedutivo permanece num conjunto de
conhecimentos ultrapassando largamente aquilo que o texto mobiliza ou explicita.
Uma compreensão dependente desses dois processos é uma compreensão
evolutiva, aquela que permite uma aprendizagem pela leitura.
42
C
apítulo II
O objeto Matemático: Integral
Vamos, neste capítulo, apresentar um breve relato sobre o
desenvolvimento do conceito de Integral, foco de interesse da nossa pesquisa.
O notável progresso da ciência e da tecnologia, durante o século XX, só foi
possível graças em grande parte ao desenvolvimento da Matemática, cujo ramo
conhecido por Cálculo Diferencial e Integral, desempenhou o papel de um
poderoso instrumento para resolver uma variedade de problemas de Física,
Astronomia, Engenharia, Química, Geologia, Biologia, outros campos e
recentemente alguns das Ciências Sociais.
São inúmeras as aplicações de Cálculo, em questões como: a velocidade
com que um foguete deve ser lançado, para que não volte a tombar na Terra? Se
uma cultura de bactérias cresce proporcionalmente à quantidade que existe em
cada instante e se a população duplica ao fim de uma hora, quanto terá
aumentado ao fim de duas horas? Se uma força de dez quilos faz esticar uma
corda elástica, qual o trabalho necessário para esticar a corda de quatro metros?
Segundo Apostol (1997), sendo o Cálculo uma compilação de idéias
atraentes e excitantes, seu aspecto notável é o seu poder de síntese. Muitos dos
problemas acima estão relacionados com conceitos como velocidade, área,
volume, taxa de crescimento, continuidade, tangente a uma curva, que podem ser
formulados, reduzindo-se a dois outros problemas mais especializados, de
Capítulo II Yuk Wah Hsia
natureza puramente geométrica; o primeiro é determinar um número que dê a
medida da área de uma região plana sob uma curva e o segundo, é determinar
um número que dê o declive de uma reta tangente a uma curva, em um ponto.
Para o autor, fundamentalmente, o Cálculo ocupa-se da formulação exata e
da resolução desses dois problemas particulares, como mostra a fig. II.1.
Fig. II.1
Fonte: Apostol (1994) p. 2
A nossa pesquisa quer investigar como os alunos utilizam o livro didático
ao estudar Integral de Riemann, portanto, focalizaremos a evolução do conceito
de Integral.
O Cálculo Integral originou-se há mais de 2000 anos, quando os gregos
tentavam resolver o problema da determinação de áreas por um processo
designado “método de exaustão”, cujas idéias são elementares e podem ser
resumidas da seguinte forma: dada uma região cuja área se pretende determinar,
nela se inscreve uma região poligonal, cuja área é facilmente determinável, e que
se aproxima da primeira dada. A seguir, escolhe-se outra região poligonal que dê
uma melhor aproximação e o processo continua, tomando poligonais com número
cada vez maior de lados, de modo a “cobrir” toda a região dada. (Apostol, 1997, p.
3)
A figura seguinte ilustra o caso do cálculo da área de uma região
semicircular.
44
Capítulo II Yuk Wah Hsia
A
B
C
D
A
B
C
D
E
A
B
C
D
E
F
G
Fig. II.2. O método de exaustão aplicada a uma região semicircular.
Fonte: Apostol (1994) p. 3
Para o autor, o desenvolvimento do método de exaustão esperou quase 18
séculos para que o emprego de símbolos e técnicas algébricas se tornassem
parte usual da matemática, pois a álgebra elementar era completamente
desconhecida no tempo de Arquimedes, fato que tornava impossível estender o
método a qualquer classe de regiões, sem conhecer um modo adequado de
expressar os extensos cálculos, em uma forma compacta e simplificada.
No século XVI, o desenvolvimento matemático foi estimulado pelos
resultados alcançados pelos italianos Tartaglia, Cardano e Ferrari na
determinação das soluções algébricas para as equações cúbicas e do quarto
grau, encorajando a aceitação da nova linguagem algébrica. Com a introdução
dos símbolos algébricos, o antigo método de exaustão foi “ressuscitando”.
Nessa época, pioneiros como Cavalieri, Torricelli, Roberval, Fermat, Pascal
e Wallis foram responsáveis por muitas descobertas, que gradualmente, foram
transformando o método de exaustão evoluindo para o que é hoje chamado de
Cálculo Integral. Este ramo da Matemática recebeu o seu maior impulso no século
XVII, devido principalmente aos esforços de Isaac Newton (1642-1727) e Gottfried
Leibniz (1646-1716) e o seu desenvolvimento continuou até o século XIX, época
em que matemáticos como Augustin-Louis Cauchy (1789-1857) e Bernard
Riemann (1826-1866) lhe deram uma base matemática sólida.
II.1 - Arquimedes e a área do círculo.
Segundo Ávila (2005), Arquimedes, da escola de Alexandria, ocupou-se
intensamente com o cálculo de áreas e volumes de diversas figuras geométricas,
45
Capítulo II Yuk Wah Hsia
inclusive o círculo e a esfera, valendo-se muito de argumentos intuitivos e pouco
rigorosos, mas obtidos os resultados, demonstrava-os com impecável rigor.
De acordo com o autor, no seu artigo “Arquimedes, o rigor e o método”, os
escritos de Arquimedes são dotados de uma estrutura lógica que nem sempre
revelam os caminhos que o guiaram em suas descobertas. No entanto, no
prefácio do seu livro, “A Quadratura da Parábola”, Arquimedes fez uma referência
a um método mecânico de descoberta, comunicada por meio de uma carta
dirigida a Erastóstenes, em que dizia,
(...) julguei conveniente escrever-lhe para explicar as peculiaridades de
um certo método pelo qual é possível investigar alguns problemas de
Matemática por meios mecânicos. (...) Certas coisas primeiro se
tornaram claras para mim pelo método mecânico, embora depois
tivessem de ser demonstradas pela Geometria, já que sua investigação
pelo referido método não conduzisse a provas aceitáveis. Certamente é
mais fácil fazer as demonstrações quando temos previamente adquirido,
pelo método, alguns conhecimentos das questões do que sem esse
conhecimento. (...) Estou convencido de que ele será valioso para a
Matemática, pois pressinto que outros investigadores da atualidade ou
do futuro descobrirão, pelo método aqui descrito, outras proposições que
não me ocorreram.
Ávila afirma que usando um raciocínio apenas intuitivo, e baseando-se na
visualização geométrica, é possível ver que a área do círculo é igual à área de um
triângulo de base, cuja medida é igual à da circunferência do círculo e altura igual
ao raio r. O autor, para mostrar este fato, divide o círculo em n setores iguais por
meio da divisão da circunferência em n partes iguais (Fig. II.3). Esses setores são
cada vez mais parecidos com triângulos, quanto maior for n. E como eles têm a
mesma altura r, a soma de suas áreas é o produto da soma dos comprimentos
das bases pelos raios divido por dois. Como a soma dos comprimentos das bases
é exatamente o comprimento da circunferência, que é
2
, a área do círculo é a
área do referido triângulo, com base
2
e altura , isto é, a
r
π
r
π
r
2
2.rr
π
2
área do círculo r
π
==.
46
Capítulo II Yuk Wah Hsia
Fig. II.3
Fonte: Ávila (2005) p. 211
Esse raciocínio, embora utilize notação moderna (a notação data do
século XVIII), reflete essencialmente o método de exaustão, atribuído a Eudoxo e
aperfeiçoado por Arquimedes.
π
Ávila (2005) relata que Arquimedes na tentativa de calcular a área do
círculo, ia nele inscrevendo polígonos regulares no círculo, começando com
hexágono, e dobrando o número de lados a cada passo. Fazia o mesmo, com
polígonos circunscritos ao círculo. Desse modo, a área do círculo estava sempre
compreendida entre as áreas de um polígono inscrito e um polígono circunscrito
de n lados (Fig. II.4), e essas áreas vão se tornando cada vez mais próximas,
quanto maior for n.
Fig. II.4
Fonte: Ávila (2005) p. 212
II.2 - Arquimedes e a área do segmento de parábola.
Eves (2002) afirma que Arquimedes, usando o método da exaustão, foi
quem mais se aproximou da atual noção de Integral, e um dos exemplos de seus
47
Capítulo II Yuk Wah Hsia
trabalhos mais antigos foi a quadratura do um segmento parabólico. Por meio do
método mecânico, inspirado no ponto de equilíbrio da alavanca, Arquimedes
intuiu que a área do segmento da parábola era
4
3
da área de um triângulo cuja
base é a corda que liga os extremos do segmento e altura igual à da parábola.
Para provar que a área do segmento da parábola é
4
3
ABC Arquimedes
apelou para geometria e propriedades da parábola.
Segundo Eves, dada a corda AB, C é o ponto de tangência da reta paralela
a corda AB, L é o ponto médio de AB, N é o ponto médio do segmento BC e M é
o ponto médio do segmento AC (Fig. II.5). D e E são pontos pertencentes à
parábola, determinados pelas interceptação das retas paralelas ao segmento CL,
e que passam por M e N, respectivamente, formando assim os triângulos
e
. Usando a geometria da parábola, Arquimedes mostrou que
CEB
CDA
4
ACB
CEB
=CDA∆+ .
B
A
C
D
E
M
N
L
Fig. II.5
Fonte: Eves (2002) p. 421
Repetindo sucessivamente esse raciocínio concluiu que a área do
segmento parabólico é dada, nos moldes atuais, por:
23 23
11 1 4
1
44 4 444 3
ABC ABC ABC
ABC ABC ABC
∆∆∆
⎛⎞
++++=∆++++=
⎜⎟
⎝⎠
KK
48
Capítulo II Yuk Wah Hsia
Atualmente, esse cálculo se faz abreviadamente, utilizando-se a soma de
uma série geométrica. Arquimedes, contudo, procedia nos moldes do método de
exaustão, chegando a resultados equivalentes a muitas integrais definidas que
hoje figuram nos textos elementares de Cálculo. Foi ele que, pela primeira vez,
registrou e trabalhou com uma série infinita (EVES, 2002).
Eves (2002, p. 424) afirma que,
(...) no período que vai das realizações de Arquimedes até
praticamente o início da Idade Moderna, os trabalhos
embrionários quase não foram ativados. Por volta de 1450, os
trabalhos de Arquimedes começaram a chegar à Europa
Ocidental, por meio de uma tradução, encontrada em
Constantinopla, de uma cópia de seus manuscritos e só no início
do século XVII, suas idéias, até então conhecidas, passaram por
outros desdobramentos. A obra de Arquimedes, referente ao
método por ele utilizado, somente foi descoberta por volta de
1916.
Segundo o autor, foi Johann Kepler (1571-1630) um dos primeiros
europeus que desenvolveu idéias relativas a infinitésimos em trabalhos com a
integração, recorrendo a procedimentos similares aos de Arquimedes, para
calcular as áreas envolvidas em sua segunda lei do movimento planetário e os
volumes dos barris de vinho, ocupando-se em calcular suas capacidades.
As idéias do Cálculo surgiram aos poucos, nas obras de vários
matemáticos do século XVII e foram amadurecendo gradualmente,
adquirindo forma mais acabada nos trabalhos de Newton e Leibniz, cada
um trabalhando independentemente, formalizaram um cálculo
manipulável e proveitoso. (Eves, 2002)
II.3 – Newton e o cálculo fluxional
Isaac Newton nasceu na Inglaterra em 1642. Ele fez uma importante
descoberta matemática, o método dos fluxos, “Method of Fluxions”, que só foi
publicado em 1736.
O método, criado por Newton, resolveu o problema da determinação da
tangente a uma curva por uma equação . Para ele, uma curva era
(,) 0fxy
=
49
Capítulo II Yuk Wah Hsia
gerada pelo movimento contínuo de um ponto, isto é, e eram os fluentes,
quantidades que fluem com o tempo; à taxa de variação desses fluentes, ele
chamou de fluxo do fluente, representados por
e
, que na notação moderna
corresponderiam a
x y
x
&
y
&
dx
dt
e
dy
o
x y
x
&
y
&
x
xxo
+
&
y
yyo
+
&
2 2 3
3()3() ()- -2()-() () ) )- -3 ()-3()-() 0x x xo x xo xo ax ax xo a xo axy ay xo a xo yo ax y y yo y yo yo+++ +++ =
&&& && &&& & &&&
22
0
dt
, onde t representa o tempo (EVES 2002, p. 439).
Um outro conceito foi introduzido por Newton, chamado momento de um
fluente: tratava-se do incremento infinitamente pequeno sofrido por um fluente
como x, por exemplo, em um intervalo de tempo também infinitamente pequeno.
Desse modo, o momento do fluente x era dado por , que modernamente pode
ser representado por dx, e Newton salientou que se podia, em qualquer problema,
desprezar os termos que apareciam multiplicados por potências de iguais ou
maiores que 2 e obteria assim uma equação envolvendo as coordenadas e
do ponto gerador da curva e seus
e
.
xo
&
Como exemplo, considerou a curva cúbica
,
substituindo por e por , e era obtido
32 3
0xaxaxyy−+=
32 2 32 2 3
()( (yo+
e desprezava-se os termos em que figura com expoente igual ou maior que
dois, que para Newton eram infinitamente pequenos, dividia-se a sentença por o ,
obtendo
32 .
o
3x x axx ayx axy y y−++=
&&&&&
Donde,
2
2
32
3
y x ax ay
xyax
−+
=
&
&
, que em notação moderna é
x
y
f
dy
dx f
=− , que é o
teorema da função implícita, quando define implicitamente como
uma função diferenciável de com
.
(,) 0fxy=
y
x
f
0
y
Ao desprezar os termos em que aparece com expoente igual ou maior
que dois, Newton apresenta idéias embrionárias sobre limites, retomando os
infinitésimos (“infinitamente pequenos”) .
o
50
Capítulo II Yuk Wah Hsia
Entre as numerosas aplicações do método, encontravam-se a
determinação dos máximos e mínimos, tangentes a curvas, curvaturas de curvas,
pontos de inflexão e concavidade de curvas, como também a determinação de
muitas quadraturas e retificações de curvas. Segundo Palaro (2006, p. 94),
[...] Chamando de fluxões às velocidades dos movimentos ou dos
aumentos e de fluentes às quantidades geradas, esclareci aos poucos (nos
anos 1665 e 1666) o método das fluxões, que aproveito aqui na
Quadratura das curvas.
As fluxões são semelhantes aos aumentos dos fluentes, os quais são
gerados em intervalos de tempos iguais, mas são infinitamente pequenos;
e para ser mais exato, diria que estão na primeira razão dos aumentos
nascentes, mas podem ser representados por quaisquer linhas
proporcionais a elas. Se as áreas ABC, ABDG forem descritas pelas
ordenadas BC e BD, que se movem uniformemente ao longo da base AB,
então as fluxões dessas áreas estarão entre si como as ordenadas BC e
BD que as descrevem e poderão ser representadas por aquelas
ordenadas; isto é, tais ordenadas estão na mesma proporção que os
aumentos nascentes das áreas. [...]
c
E
K
H
T
C
b
B
d
D
V
A
G
Desse modo, Newton enunciou os problemas fundamentais do Cálculo,
sendo dada a relação das quantidades fluentes, encontra a relação de suas
fluxões e inversamente. Esse fato se traduz hoje, pelo conhecido Teorema
Fundamental do Cálculo, que em termos da geometria significa resolver o
problema do cálculo da área sob uma curva com o traçado da tangente a um
ponto da curva.
51
Capítulo II Yuk Wah Hsia
II.4 – Leibniz e seu cálculo formal
Gottfried Wilhelm Leibniz nasceu em Leipzig em 1646, e desde cedo
manifestou grande interesse pelo estudo.
Ávila relata que durante o período de 1672 a 1676, quando cumpria uma
missão diplomática em Paris, Leibniz entrou em contato com Christiaan Huygens,
que o aconselhou a ler uma publicação de Blaise Pascal sobre certos problemas
geométricos, já que desejava ser matemático.
Segundo Palaro (2006), Leibniz, ao ler a obra de Pascal, “Traité des sinus
du quart de cercle” (Tratado sobre os senos de um quadrante de um círculo”, uma
passagem chamou sua atenção, a qual foi descrita por Katz (Katz apud Palaro,
1998, p. 490):
[...] considerando o quadrante de um círculo de unitário e sendo D
um ponto para o qual seno é DI, Pascal traçou uma pequena tangente
EDE’ à curva ABC em D e os segmentos ER e E’R’ perpendiculares ao
raio AC, notando que os triângulos EKE’ e DIA são semelhantes,
encontrou que
ABC
EEEEDA
=
=
RRKEDI
e, portanto,
.
Considerando que, para um intervalo RR’ infinitamente pequeno, o
segmento EE’ é considerado igual ao arco de círculo, Pascal afirma que
o retângulo formado pelo seno DI e o arco infinitesimal (ou a tangente
EDE’), representado por EE’, é igual ao retângulo formado pelo raio DA
e a parte do eixo entre as extremidades do arco dada RR’, ou seja,
Pascal mostrou que a soma dos senos ou quadratura de qualquer arco de
um quadrante de um círculo é igual à porção da base entre os senos
extremos multiplicada pelo raio do círculo.
RRDAEEDI
=
B
E
D
E
A
K
R
I
R
C
De acordo com a autora, foi a leitura dessa publicação que inspirou Leibniz
para uma das suas idéias fundamentais na criação do Cálculo, a de “triângulo
52
Capítulo II Yuk Wah Hsia
característico”, pois percebeu que o “triângulo infinitesimal” inscrito em círculos
por Pascal, poderia ser generalizado e aplicado a curvas arbitrárias. A
exemplificação desta idéia, é de Baron descrita por Palaro (2006, p. 104).
[...] OcC é uma curva arbitrária; é uma tangente à curva em c;
é a normal à curva, também, em c; e é obtido pela
projeção ortogonal do ponto c sobre o eixo horizontal. Tomando um
ponto c’ pertencente à tangente, mas tão próximo de c que cc’ é
confundido com a própria curva, Leibniz obtém o triâgulo característico
cdc’ em c, que é semelhante aos triângulos cbe e gbc, chegando às
relações
(em notação atual,
cg
τ
=
nce
=
ycb=
:':' :: ::cddc cc yvn ty
τ
==
''cd
=
dc cc
yvn
=
e
''cd dc cc
ty
τ
==
), úteis em transformações de
quadraturas.
Em um artigo publicado em 1686, Leibniz enfatiza a relação inversa entre
diferenciação e integração, e conforme Palaro (2006, p. 107), ele considerou a
Integral como sendo a área sob uma curva, descrita por Baron da seguinte forma:
[...] A área é composta por muitas faixas retangulares verticais
infinitamente finas ydx e indica a soma das áreas de todas essas
faixas por
, que é a área sob a curva e
compreendida entre as retas
e ; considerando que a
diferencial da área de OCB é a área do retângulo ydx à direita, ou
seja,
, mostra a relação inversa entre d e e,
reciprocamente,
.
ydx
()yfx
=
0y = yx=
d ydx ydx
=
dy y
=
53
Capítulo II Yuk Wah Hsia
Y
C
ydx
y
dx
x
X B
O
Eves (2002) afirma que Leibniz usou pela primeira vez o símbolo de
integral, um
alongado, derivado da primeira letra da palavra latina summa
(soma) em 29 de outubro de 1675. O objetivo era indicar uma soma de
indivisíveis. Algumas semanas depois ele já escrevia diferenciais e derivadas
como se faz hoje, assim como escrevia
e para integrais. Segundo
Ávila, o cálculo de Leibniz, na sua origem, é mais complicado que o de Newton.
Seu formalismo, porém, é a sua grande virtude.
S
,dx dy dz etc
xdy
ydx
Ávila afirma que o raciocínio de Newton envolvia passagens em que ele
dividia os dois membros de uma equação pelo infinitésimo o (supondo-o diferente
de zero), depois desprezava termos com o fator o (supondo esse infinitésimo
igual a zero). Esse tipo de procedimento se apresentava também no Cálculo de
Leibniz, cujos “infinitésimos” eram denotados e que algumas vezes
eram cancelados como fatores diferentes de zero, outras vezes eram
desprezados como equivalentes a zero. O Cálculo foi dominado, por muito tempo,
por essas contradições, até que surgiram trabalhos que fundamentaram
logicamente a disciplina no começo do século XIX.
,, .
Entretanto, o grande mérito de Newton e Leibniz foi a identificação da
estreita relação entre a determinação das retas tangentes a uma curva, e a
determinação da área da região limitada por uma curva. Nas mãos deles, cada
um utilizando métodos próprios, conseguiram tratar esses problemas de maneira
unificada (Courant, 2000).
54
Capítulo II Yuk Wah Hsia
Os conceitos fundamentais do Cálculo em bases aceitáveis, rigorosamente
falando, seriam estruturados pelo grande analista francês Augustin-Louis Cauchy
(1789-1857) e seus sucessores do século XIX.
II.5 – Augustin-Louis Cauchy
Embora a derivada fosse um conceito moderno, que surgiu no século XVII,
a integral remontava ao tempo de Arquimedes, há mais de dois milênios. Ele já
calculava áreas e volumes de figuras geométricas por um procedimento
embrionário dos métodos modernos do Cálculo Integral. Contudo, naquela época,
a Matemática era geométrica e ainda não havia ferramenta desenvolvida, de tal
maneira que facilitasse o “desabrochar” de um Cálculo Integral sistematizado.
A situação, no século XVII, já era bem diferente. O uso de símbolos
algébricos já se desenvolvera no século anterior com François Viéte e depois,
com os trabalhos de René Descartes, Pierre de Fermat e outros seus
contemporâneos. A moderna notação da Geometria Analítica se difundira e
tornara possível a criação de métodos sistemáticos e unificados de tratamento do
cálculo de áreas e volumes. Por essa razão, o Cálculo Integral, como é conhecido
hoje, pôde evoluir.
Com o desenvolvimento das técnicas de Cálculo, ocorrido até o início do
século XIX, o cálculo de Integral, que tinha forte motivação geométrica, se
inverteu; agora, define-se a Integral, em termos numéricos, embora com alguns
apelos a inspiração geométrica, associando a Integral à área de superfícies sob
gráfico de funções positivas.
Em 1823, foi publicada uma obra de Cauchy, “Résumé des Leçons
données a l’École Royale Polytechnique, sur le Calcul Infinitesimal”, contendo
quarenta lições e as vinte últimas referiam-se ao Cálculo Integral. Na vigésima
primeira lição, Cauchy definiu Integral usando a idéia de soma, diferentemente da
idéia comumente usada no século XVIII, que abordava a integração como
operação inversa da diferenciação (Palaro, 2006).
55
Capítulo II Yuk Wah Hsia
Embora a integração fosse abordada como a inversa da diferenciação até o
século XVIII, Cauchy definiu a Integral como o limite da soma de um conjunto
infinitamente crescente de partes pequenas, tendendo a zero. Considerou somas
do tipo
, sendo f uma função contínua no intervalo
[
e ,
com i variando de 1 a n, são os pontos de partição desse intervalo.
()(
-1 -1
1
-
n
iii
i
fx xx
=
)
]
,ab
i
x
Por meio do registro da língua natural e o do algébrico e com o auxílio do
registro gráfico (Fig. II.6), apresentamos uma idéia geométrica de Integral de
Cauchy, relacionada com áreas de figuras planas.
y
x
f (x)
2
x
3
x
4
x
1
x
0
a=x
5
x=b
y
x
f (x)
1
x
2
x
3
x
4
x
5
x
6
x
7
x
8
x
9
x
0
a=x
10
x=b
Fig. II.6
São dadas, inicialmente, a função , contínua num intervalo
fechado
, e uma partição , e e
, do intervalo
[
, de modo que
()yfx
=
f
[]
{}
b
]
n
)
n
)
)
,ab
01
,,,
n
Pxx x= K
012 n
xxx x<<<<K
0
xa=
n
x= ,ab
10 21 1 1ii nn
xx xx xx xx x
−−
−=−== == =KK .
Em seguida, multiplica-se cada
pelo valor de , obtendo
i
x
(
1, 2, 3, ,i=
K
1
()
i
fx
()()()() (
10 0 21 1 1 1
()
nn n
Sxxfx xxfx xxfx
−−
=− + ++−K
,
a soma dos produtos obtidos, que poderá ser expressa por
.
()(
-1 -1
1
-
n
iii
i
fx xx
=
56
Capítulo II Yuk Wah Hsia
A quantidade S dependerá do número n, que indica a quantidade de sub-
intervalos
da partição P do intervalo . É importante destacar que se
os se tornarem muito pequenos quando n se torna muito grande, o valor de S
atingirá um certo limite que dependerá unicamente da forma da função
e do
intervalo de
[
. Este limite será chamado de Integral Definida por Cauchy.
[
1
,
ii
xx
] ]
]
]
)
] ]
1, 2, , n=
m M
]
]
() ()
[
,ab
x
()
fx
,ab
[]
K os estudos de Cauchy, nesse particular, foram muito incompletos. A
partir dessa época, intensificavam-se as investigações sobre os
fundamentos do Cálculo, levando ao desenvolvimento da Análise
Matemática e da Teoria das Funções.
[
Por volta de 1854, o eminente
matemático alemão Bernhard Riemann realizou um estudo aprofundado
da integral. (ÁVILA, 2005, p. 213)
K
III.6 - A Integral de Riemann
Foi Riemann quem ampliou a definição de Integral formulada por Cauchy,
estendendo a possibilidade de integrar funções não contínuas.
Para tanto, considerou uma função limitada,
e uma partição
arbitrária
do intervalo de
[
, sendo
[
os intervalos
dessa partição. Para cada i , denotou por
o ínfimo e , o supremo
dos valores de no intervalo
[
. A existência de e estão garantidas
pelo fato de ser limitada no intervalo
[
. A seguir, definiu a soma inferior
e a soma superior da função em relação à partição como:
[]
baf ,:
(
01
,, ,
n
Pxx x=
K
,ab
1
,
ii
xx
K
i i
f
1
,
ii
xx
i
m
i
M
f
,ab
,sfP ,SfP f P
(
)
(
(
)
(
)
11 0 1 1
1
,
n
nn n ii i
i
sfP mx x m x x mx x
−−
=
=−++ =
K
e
() ( ) ( ) (
11 0 1 1
1
,
n
nn n ii i
i
SfP Mx x M x x Mx x
−−
=
=−++ =
K
)
.
57
Capítulo II Yuk Wah Hsia
i
m
i
M
f(x)
0
a=x
1
x
2
x
3
x
4
x=b
Fig. II.7
No primeiro intervalo
[
, Fig. II.7, a função tem o menor valor e
o maior valor ; similarmente, no intervalo o menor valor da
é
e o maior valor da é .
]
1
M
simo
[]
1
,
ii
xx
f
i
m f
i
M
]
M
]
()()() ()
M
() ()
01
,xx
f
1
m
É importante observar que deve ser limitada em
[
, pois é essencial
para que todos
m e existam, como também é necessário considerá-los como
ínfimos e supremos, respectivamente, em vez de mínimos e máximos, uma vez
que a função considerada não é necessariamente contínua.
f
,ab
i i
Se é o ínfimo e M o supremo de em
[
, tem-se para toda partição
do intervalo
[]
, . Assim, para uma
mesma partição , tem-se
.
m f
,ab
P
,ab .,,.ba sfP SfP ba
−≤ m
P
,sfP ,SfP
Porém, esta relação se mantém para partições distintas? Para responder
essa pergunta, define-se refinamento de uma partição da seguinte maneira: Seja
58
Capítulo II Yuk Wah Hsia
Q uma partição de
[
, se , então a partição é mais fina que , ou
que
Q
é um refinamento de .
]
P
)
,
()()
,
]
()()
,
f
f
P
Q
_
f
,ab PQ Q
P
Riemann demonstra que sendo , tem-se e
, o que indica quando se refina uma partição, a soma inferior
aumenta e a soma superior diminui. Ainda mais, demonstrou que para quaisquer
partições e Q de
[
, tem-se sempre , isto é, no registro da
língua natural, toda soma inferior de é menor ou igual a qualquer soma
superior. Dessa forma, vê-se que o conjunto de todas as somas superiores de
em é limitada inferiormente por uma soma inferior em . Assim, esse conjunto
possui ínfimo.
PQ
()(
,sfP sfQ
,SfP SfQ
P ,ab ,sfP SfQ
Riemann definiu esse ínfimo como sendo a integral superior de e
denotou por
.
f
()
b
a
fxdx
Também o conjunto das somas inferiores de é limitado superiormente
por qualquer soma superior de . Logo, esse conjunto possui um supremo, que
Riemann definiu como sendo a integral inferior de e denotou por
f
f
()
a
fxdx
b
.
Quando esses dois números coincidem, isto é,
()
b
a
fxdx
= , a
função é dita integrável, segundo Riemann e a integral é denotada por
.
()
_
b
a
fxdx
()
a
fxdx
b
Após isto, Riemann provou que as funções contínuas são integráveis,
segundo essa definição. Mostrou também que existem funções não contínuas,
porém, limitadas que são também integráveis. Isso evidencia que o conjunto das
funções integráveis segundo Cauchy está contido no conjunto daquelas
integráveis segundo Riemann.
59
Capítulo II Yuk Wah Hsia
Depois, a questão colocada foi a de procurar quais são as funções
limitadas Riemann integráveis, chegando finalmente à demonstração do seguinte
resultado: toda função , limitada com um número finito de
descontinuidade é Riemann-integrável.
[]
baf ,:
Mais tarde, com a utilização da medida de Lebesgue, foi possível ampliar
esse resultado, mostrando-se que toda função de
[
em limitada, cujo
conjunto de pontos de descontinuidade tem medida nula, é Riemann-integrável.
]
]
,ab
Desse modo, ficam incluídas no conjunto das funções Riemann-integraveis,
por exemplo, aquelas que possuem um conjunto de pontos de descontinuidade
enumerável.
A integral de Riemann também pode ser expressa em termos de limites de
somas. Para isso, dada uma partição do intervalo
[
, denomina-se norma
de e indica-se por
P
,ab
P
P , o comprimento do maior subintervalo
[
da
partição. Em seguida, é escolhido arbitrariamente um ponto
c em cada um
desses subintervalos
[
, expressando a soma de Riemann por
.
]
]
n
1
,
ii
xx
i
1
,
ii
xx
() ()
[]
1
1
,
iii
i
SfP fc x x
=
=⋅
Mostra-se a seguir que sendo limitada, tem-se que o limite
[]
baf ,:
(
0
lim ,
P
ISfP
=
)
b
x
existe, se e somente se, é Riemann-integrável. E mais, no caso
afirmativo, tem-se que .
f
()
a
Ifxd=
Dessa forma, fica evidenciado que se é integrável, então f
()
[
0
1
1
lim
P
iii
i
aa a
ff f fcxx
=
===
∫∫
]
bb b
n
, para qualquer .
i
c
Nesta altura, colocaremos em destaque algumas constatações.
60
Capítulo II Yuk Wah Hsia
Em primeiro lugar, quanto à função integranda, a Integral de Cauchy
trata apenas das funções contínuas enquanto Riemann trabalha com funções
limitadas no intervalo
[
. Como toda função contínua no intervalo fechado é
limitada, vê-se que as funções integráveis, segundo Cauchy também são segundo
Riemann.
f
]
]
,ab
No livro didático utilizado neste trabalho, o autor trabalha com exemplos de
funções contínuas e positivas no decorrer do tópico 5.1.
Em segundo lugar, quanto à partição do intervalo
[
, Cauchy utiliza
sempre partições tais os subintervalos têm o mesmo comprimento enquanto na
Integral de Riemann, os subintervalos apresentam comprimentos arbitrários. No
livro de Stewart, todas as partições são com subintervalos de mesmo
comprimento.
,ab
Em terceiro lugar, na Integral de Cauchy, o ponto cujo valor da função é
tomado como altura dos retângulos é o extremo inferior de cada subintervalo da
partição, enquanto na Integral de Riemann, esses pontos são escolhidos
arbitrariamente em cada intervalo.
61
C
apítulo III
Procedimentos Metodológicos
Com o objetivo de investigar como o aluno manuseia o livro didático
quando ele estuda um tema como Integral, neste capítulo vamos apresentar os
procedimentos utilizados e o seu delineamento metodológico.
Nossa pesquisa tem uma abordagem qualitativa, e segundo Bogdan e
Biklen, como destacam Lüdke e André, a pesquisa qualitativa envolve a obtenção
de dados descritivos, obtidos no contato direto do pesquisador com a situação
estudada, enfatiza mais o processo do que o produto e se preocupa em retratar a
perspectiva dos participantes. (1986, p.13)
Ainda conforme Bogdan e Bilklen, uma pesquisa qualitativa apresenta
várias características, que foram apontadas pelas autoras:
- O material obtido nessas pesquisas é rico em descrições
de pessoas, situações, acontecimentos; inclui
transcrições de entrevistas e de depoimentos, fotografias,
desenhos e extratos de vários tipos de documentos.
Todos os dados da realidade são considerados
importantes. O pesquisador deve atentar para o maior
número possível de elementos presentes na situação
estudada, pois um aspecto supostamente trivial pode ser
Capítulo III Yuk Wah Hsia
essencial para a melhor compreensão do problema que
está sendo estudado. (1986, p. 12)
- Nesses estudos, há sempre uma tentativa de capturar a
“perspectiva dos participantes”, isto é, a maneira como os
informantes encaram as questões que estão sendo
focalizadas. Ao considerar os diferentes pontos de vista
dos participantes, os estudos qualitativos permitem
iluminar o dinamismo interno das situações, geralmente
inacessível ao observador externo. O pesquisador
precisa ter cuidado ao revelar os pontos de vista dos
participantes, deve encontrar meios para checá-las,
discutindo-as abertamente com os participantes para que
elas possam ser ou não confirmadas. (1986, p. 12)
- Os pesquisadores não se preocupam em buscar
evidências que comprovem hipóteses definidas antes do
inicio dos estudos. As abstrações se formam ou se
consolidam basicamente a partir da inspeção dos dados.
(1986, p. 13)
Lüdke e André (1986) afirmam que o fato de não existirem hipóteses ou
questões especificas formuladas a priori não implica a inexistência de um quadro
teórico que oriente a coleta e a análise de dados. O desenvolvimento do estudo
aproxima-se a um funil: no início há questões ou focos de interesse muito amplos,
que no final se tornam mais direitos e específicos. O pesquisador vai melhor
precisando esses focos à medida que o estudo se desenvolve.
Com a finalidade de responder as perguntas da pesquisa, optamos por
entrevistas baseadas em tarefas, baseando-se no texto “A Scientific Perspective
on Structured, Task-Based Interviews in Mathematics Education Research” de
Gerald A. Goldin.
Conforme o autor, entrevista baseada em tarefas para o estudo do
comportamento matemático envolve minimamente um sujeito (o solucionador do
63
Capítulo III Yuk Wah Hsia
problema) e um entrevistador (o clínico), interagindo em relação a uma ou mais
tarefas (questões, problemas ou atividades) introduzidas ao sujeito de uma forma
pré-planejada. O último componente justifica o termo “baseada em tarefas”, para
que as interações do sujeito não sejam meramente com os entrevistadores, mas
também com o ambiente das tarefas.
Normalmente, segundo o autor, providências como gravação de vídeo e/ou
áudio, notas de observadores e o trabalho do sujeito são tomadas para análises
posteriores do que aconteceu durante a entrevista. Pela análise do
comportamento ou interações verbal e não verbal, o pesquisador espera fazer
inferências sobre o raciocínio matemático, aprendizagem, e/ou solução de
problemas dos sujeitos. A partir dessas inferências, espera-se aprofundar a
compreensão dos vários aspectos da educação matemática.
Goldin (2000) afirma que o delineamento das entrevistas baseadas em
tarefa precisa levar em conta os propósitos da pesquisa, que podem incluir
investigação exploratória, refinamento de observação, descrições, inferências
e/ou questionar a aplicabilidade de um modelo de ensino, aprendizagem ou
solução de problemas.
Além disso, entrevistas baseadas em tarefas podem servir como
instrumento de pesquisa para fazer observações sistemáticas na psicologia da
aprendizagem matemática e solução de problemas matemáticos. Elas também
podem ser adaptadas como ferramentas de avaliação para descrever o
conhecimento do sujeito e/ou melhorar a prática da educação matemática e o seu
valor e para qualquer desses propósitos, repousa no fato de que elas fornecem
um ambiente matemático que pode ser controlado. Tarefas matemáticas podem
ser ajustadas, baseadas nos resultados de pesquisa anterior.
Contingências de entrevista podem ser decididas explicitamente e
modificadas quando apropriadas. Comparando com o convencional método papel
e lápis, entrevistas baseadas em tarefas tornam possível centrar a atenção da
pesquisa mais diretamente sobre os processos de solução das tarefas de
matemática do sujeito, do que somente sobre os padrões de respostas certo ou
errado nos resultados produzidos.
64
Capítulo III Yuk Wah Hsia
Portanto, para Goldin (2000), existe uma possibilidade de investigar em
uma variedade de tópicos importantes mais profundamente do que é possível por
outros meios experimentais – tópicos tais como cognição complexa associada à
aprendizagem matemática, mecanismos de exploração matemática e solução de
problemas, relações entre solução de problemas e aprendizagem, relações entre
afeto e cognição, e assim por diante.
Nossa pesquisa teve sua origem em uma pergunta feita pela Professora
Cristina Cerri, ao final da apresentação da dissertação “A Noção de Integral em
Livros Didáticos e os Registros de Representação Semiótica” de Carlos Antonio
da Silva, em 2004 – PUC, São Paulo. Nessa ocasião, a professora deixou em
aberto a seguinte questão: Como os alunos utilizam o livro didático e como eles
mobilizam os registros presentes na apresentação do tema?
Com a finalidade de responder essa pergunta, elaboramos um conjunto de
tarefas, baseando-se nas seguintes escolhas:
III.1 – Tema – Escolhemos o tema Integral –De acordo com o breve relato
histórico sobre a Integral apresentado no capítulo I, vimos que este objeto
matemático dispõe de vários registros de representação, para possibilitar o
acesso ao seu conceito.
Ao descrever o objeto Integral, além do discurso na forma da linguagem
escrita, tivemos que recorrer constantemente aos registros gráficos e algébricos
para tornar claras as explicações dadas, utilizando também a linguagem formal,
para tornar o discurso mais sintético. O recurso aos vários registros foi quase que
simultâneo, um remetendo ao outro sem cessar. A necessidade dos registros
puramente visuais foi imprescindível para que a compreensão do conceito
ocorresse. (Conversão dos registros).
III.2 - O livro didático – “Cálculo” de James Stewart (da editora Pioneira
Thompson Learning, 2002). Este livro é atual e aborda os temas partindo de uma
situação problema, dando ênfase às aplicações e agregando novas tecnologias
como o uso de calculadora gráfica.
65
Capítulo III Yuk Wah Hsia
De acordo com Silva (2004), que fez a análise deste livro quanto aos
registros de representação de Integral, diversos deles são utilizados, não só na
apresentação do conteúdo, como também, nos exemplos e nos enunciados dos
exercícios propostos, e em alguns casos propondo aos leitores a mudança de
registro. Para definição, o autor do livro explora vários registros, dando
preferência ao registro gráfico.
Além disso, Stewart afirma, no prefácio do seu livro, que a ênfase deste
está na compreensão dos conceitos, devendo ser a meta principal no ensino do
cálculo e que tentou implementá-la por meio de sua “Regra de Quatro”: “Tópicos
devem ser apresentados geométrica, numérica e algebricamente, além do ponto
de vista verbal ou descritivo”.
Embora não faça referência aos de registros de representação, quando o
autor do livro afirma que quer implementar sua “Regra de Quatro”, não pudemos
deixar de notar alguma semelhança com a teoria de Duval, referente à conversão
de registros de representação para apreensão do objeto matemático e Stewart
afirma que para a compreensão dos conceitos, os tópicos devem ser
apresentados geométrica, numérica e algebricamente.
Ainda no prefácio, o autor faz uma dedicatória aos estudantes, afirmando
que existe uma diferença entre ler um texto de cálculo e um jornal ou um
romance, ou até mesmo um livro de física. Para que ele não desanime se tiver
que ler uma passagem mais de uma vez para entendê-la, o aluno deve ter lápis,
papel e uma calculadora à mão para esboçar um diagrama ou fazer um cálculo.
Stewart sugere aos alunos que leiam e tentem compreender uma seção do
texto antes de começar os exercícios, em particular, deve examinar as definições
para entender o significado exato dos termos, pois parte da meta do curso de
Cálculo é induzi-lo a pensar logicamente, aprender a escrever a solução dos
exercícios de uma forma conexa, passo a passo e com sentenças explicativas – e
não uma fileira de equações desconexas ou fórmulas.
O método proposto por Stewart aos alunos sobre como estudar, em muitos
aspectos está de acordo com a teoria de Duval, segundo a qual compreender um
66
Capítulo III Yuk Wah Hsia
texto é elaborar uma representação da situação que é descrita. Isto é, ler um texto
não é somente descobrir os elementos desta situação, mas também suas
relações e sua organização global. Como o texto só pode dar esses elementos
um após o outro, a atividade de leitura comporta um movimento duplo de
descobrir as informações e de reorganizá-las. (Segmentação redacional e....).
Este trabalho permite ao leitor construir uma representação da situação. É
necessário também fazer os alunos sempre voltar ao texto para completar ou
corrigir a construção que eles estão elaborando.
O capitulo V do livro de Stewart refere-se a Integral. O autor apresenta um
tópico introdutório designado por “Áreas e Distâncias” (Tópico 5.1) ao longo de
onze paginas, utilizando fartamente registros de representação algébrica,
numérica, gráfica, tabelas e língua natural, terminado o mesmo com uma coleção
de 24 exercícios sob registros de língua natural, gráficos cartesianos, tabelas e
linguagem formal.
O autor inicia destacando as várias situações em que a Integral pode ser
utilizada. Para introduzir o desenvolvimento do assunto, começa com a tentativa
de determinar a área sob uma curva ou a distância percorrida e acaba se valendo
do mesmo tipo especial de limite. Passa a trabalhar com as duas questões até
chegar à definição de Integral.
Para a realização do experimento, nós levamos os livros, que foram
fornecidos aos alunos a fim de possibilitar a execução das tarefas.
III.3 – Observação – A presença da observadora foi muito importante, pois
as tarefas exigiam constantemente atentar nas posturas dos alunos frente às
mesmas, sem interferência nem da aplicadora nem da observadora.
III.4 - Os alunos Os participantes da pesquisa são alunos do segundo e
quinto semestres do curso de Matemática de uma universidade da cidade de São
Paulo, do período noturno. Por ocasião da aplicação das tarefas, os alunos do 2º
semestre ainda não conheciam o conceito de Integral e estavam estudando
Derivadas, e os alunos do 5º semestre já tiveram contato com o conceito.
67
Capítulo III Yuk Wah Hsia
III.5 - As tarefas – Elas foram planejadas para investigar se os alunos,
sem conhecer o tema Integral e sem o auxilio do professor, mobilizando os
registros contidos num texto, conseguem apreender as informações e se iniciar na
aprendizagem do tema, munidos apenas com os conhecimentos prévios de
geometria (cálculo de áreas), cálculo numérico (operações com números
racionais) e noção de função. O outro foco de nosso interesse era identificar quais
os registros são privilegiados por eles com esse fim.
As tarefas foram realizadas no período normal das aulas e a participação
foi espontânea. Os alunos resolveram as atividades individualmente, e foram lhes
oferecido papel e lápis para esse fim e não havia borracha, pois também
interessamos-nos em ver os registros que são abandonados durante a resolução
da tarefa. As sessões para realização das tarefas duraram aproximadamente 120
minutos, nas salas de aula.
Para esta pesquisa, um roteiro foi composto com cinco tarefas. Ele foi
inspirado, em parte, por um projeto do grupo “math-français” de I’Irem de
Strasbourg, que é composto por professores de francês e de matemática, sob
direção de R. Duval. Os professores de matemática franceses também se
depararam com uma nova dificuldade e que ultrapassava seu campo de
intervenção: nos problemas que eles propõem, o primeiro obstáculo que os
alunos encontram é o da leitura do texto do enunciado.
Em relação aos alunos brasileiros, Malta (2003) cita: “Dentre os indícios
mais apontados pelos professores do despreparo dos alunos que ingressavam na
universidade, está a incapacidade de se expressar, a incapacidade de utilização
da linguagem escrita, visível na dificuldade de construir frases completas e
consistentes (e sem erros de ortografia) que os alunos demonstravam”.
Conforme o relatório do projeto, “Un Travail Interdisciplinaire en Français et
en Mathématique” publicado em “Les revues pédagogiques de la Mission Laïque
Française” – Activités mathématiques et scientifiques, em abril de 1999, para os
professores deste projeto, tanto em matemática como em francês, a importância
de uma aprendizagem específica da leitura como também da escrita se impunha.
Esta dificuldade surgiu com intensidade quando os alunos tinham que abordar
68
Capítulo III Yuk Wah Hsia
textos que não eram narrativos: textos científicos (em biologia, em economia, em
geografia, em matemática), textos argumentativos (em francês, em filosofia,
especialmente). Entre outras dificuldades, encontravam-se também aquelas
ligadas à abstração crescente das noções ensinadas, e à produção de texto tanto
de demonstrativos como argumentativos.
Consciente da necessidade de enfrentar, juntos e de um modo comum, os
professores de francês e de matemática se encontraram sob direção de R. Duval
desde de 1990 e conduziram uma experiência alimentada por sensibilidades e os
diferentes pontos de vista dos docentes destas disciplinas.
As reflexões levaram os pesquisadores a conduzir a experiência segundo
dois eixos:
- um trabalho sobre a atividade de compreensão de textos, principalmente
sobre o tratamento das informações.
- um trabalho sobre o raciocínio, propriamente dito (com propósito da
demonstração em matemática e da argumentação em francês).
Para os pesquisadores franceses, os enunciados dos problemas não
devem conter somente informações simples e com frases curtas, ao contrário,
para eles, os alunos devem adquirir ferramentas, que os habilitem de modo
autônomo, a abordar textos complexos, relevar e organizar as informações que
se encontram, e hierarquizá-las e estabelecer as conexões lógicas que as unem.
Fazer matemática, para esses pesquisadores, é coordenar diversos registros
(figuras, língua natural, calculo...) e lhes interessavam descobrir em que uma
passagem por uma mudança de registros permite auxiliar estas aprendizagens.
Um espaço de uma hora semanal foi reservado para as atividades
referentes a esse projeto. Os dois professores, de francês e de matemática,
intervinham simultaneamente e a gestão da classe ficava a cargo de um ou de
outro, conforme a atividade proposta, cada um segundo sua competência. O
trabalho mais específico de cada uma das disciplinas prosseguia no curso, com a
reutilização e prolongamento daquilo que foi feito na aula comum. Este trabalho
podia ser igualmente conduzido de modo separado na aula de francês e de
69
Capítulo III Yuk Wah Hsia
matemática, mas necessitaria então de um ajuste indispensável entre os dois
professores, a fim de permitir uma análise dos resultados obtidos.
As atividades apresentadas, pelas pesquisas francesas, se encaixavam em
duas perspectivas:
- Escolha dos textos: Para a atividade de compreensão de texto, foram
escolhidos textos que não se supõe um conhecimento prévio para que
cada aluno pudesse, por uma leitura do texto, construir uma
representação descrita, ou textos que não têm relação imediata com os
conhecimentos próprios dos alunos, a fim de que estes não pudessem
substituir uma leitura atenta apelando aos outros saberes.
- Pela atividade proposta: Quando os alunos são solicitados para traduzir,
por um esquema, a organização das informações de um texto, a fim de
materializar a representação elaborada no momento da leitura, torna-se
possível observar onde se situam as dificuldades que eles encontram no
modo de organização própria à atividade de leitura.
Observando essas duas perspectivas, e para elaboração do nosso roteiro,
selecionamos o tópico 5.1 “Áreas e Distâncias” (Stewart, p. 367) com a finalidade
de estruturar as cinco tarefas.
Primeira tarefa - Localizar no livro o tema Integral.
A primeira tarefa tem por objetivo verificar como os alunos manuseiam o
livro. Se eles procuram o tema solicitado folheando o livro, sem consultar o índice.
Se eles apresentam curiosidades em conhecê-lo. Se eles apresentam interesse
de ler o prefácio. Enfim, se eles manifestam interesse pelo livro, além do que foi
pedido para fazer.
A fim de que observar os alunos durante a realização desta tarefa, eles
entraram na sala de dois em dois, e a dupla seguinte entrava na sala quando a
primeira terminava a primeira tarefa e prosseguia na realização de outras tarefas.
70
Capítulo III Yuk Wah Hsia
Segunda tarefa – Por um esquema, traduza as informações contidas no tópico 5.1.
A segunda tarefa é o cerne da nossa pesquisa e tem a preocupação de
verificar se os alunos sabem mobilizar vários registros para estudar, e qual o
registro privilegiado por eles para essa finalidade.
Ao serem solicitados a fazer um esquema, os alunos se enquadram numa
situação de leitura, em que existiria uma lacuna entre sua base de conhecimento
e o conteúdo cognitivo do texto. A compreensão do que está explicitamente
apresentado no nível da organização redacional torna-se passagem obrigatória
para alcançar a compreensão do conteúdo cognitivo, isto é, o leitor (aluno) terá de
fazer tratamento sobre as palavras (pronomes, conjunções), levando em conta as
frases.
Entretanto, nosso texto é um texto matemático, além de levar em conta as
palavras nas frases, o leitor (aluno de matemática) terá de considerar também os
registros de representação do objeto matemático em questão. Ele terá de fazer
apelo a outras formas de expressão: aos números, aos gráficos, às notações,... ,
etc, pois para aprender matemática é suposta interação entre esses vários tipos
de representações, além das discursivas.
De acordo com Duval, existem quatro situações de leitura. Queremos
investigar em qual situação cada um deles se enquadra.
Terceira tarefa – Como o autor começa o estudo do tema Integral?
A terceira tarefa da nossa pesquisa tem a finalidade de investigar se os
alunos, embora tivessem sido solicitados a localizar o tema Integral, realmente
iniciam as suas buscas no tópico cujo título não contempla a palavra “Integral”, já
que o mesmo se encontra no tópico 5.4.
71
Capítulo III Yuk Wah Hsia
QuartaTarefa – Suponha que você seja solicitado para resolver algum dos
exercícios da pagina 376, qual você escolheria? Justifique sua escolha.
Quinta Tarefa – Agora, você poderia resolver o exercício escolhido?
A quarta e a quinta atividade objetivam investigar a escolha de um
problema dentre de muitos propostos pelos alunos e as estratégias que eles
lançam mão para resolver um exercício quando solicitados e se mobilizam vários
registros simultaneamente.
III.5 - Entrevistas – As entrevistas foram realizadas com a finalidade de
complementar e esclarecer os dados coletados.
72
C
apítulo IV
Resultados
Analisamos, neste capítulo, os resultados obtidos com a realização das
tarefas. As produções foram obtidas com 14 alunos participantes do curso de
Matemática, de uma instituição particular, sendo oito deles do 2º semestre, que
estavam iniciando seus estudos em Cálculo Diferencial e Integral e do 5º
semestre, seis alunos que já conheciam o conceito de Integral. As tarefas foram
executadas individualmente.
Para a realização das tarefas, os livros, levados por nós, foram entregues
aos alunos assim que eles sentavam-se nas carteiras, e sobre estas estavam o
lápis e um caderno para as produções; a seqüência das tarefas era fornecida aos
alunos em folhas separadas, e estas eram diferentemente coloridas para que se
pudesse identificar a tarefa que o aluno estava executando.
Primeira tarefa: Localizar no livro didático o tema Integral.
Nesta tarefa, queremos conhecer como o aluno começa se relacionar com
o livro didático, quando se depara com ele. Esse nosso interesse é justificado,
pois conforme Malta (2003), [..] é muito comum ouvir de professores que “os
alunos não gostam de ler” e por parte dos alunos que “ler é muito difícil” [...].
Capítulo IV Yuk Wah Hsia
Descrição das ações dos alunos para localizar o tema Integral no livro,
observamos que:
- Apenas três alunos (dois do 5º semestre e um do 2º) ficaram esperando
que lhes fossem dado a ordem de começar a tarefa, comportando-se
como se estivessem em aula. Os outros começaram a manusear o livro,
tentado localizar no índice o tema que figura na tarefa.
- Dois alunos, um de cada semestre, começaram folheando o livro ao
acaso, sendo que um deles foi dos que só começaram a tarefa quando
“autorizado”; somente após algum tempo é que recorreram ao índice para
localizar o tema.
- Dois alunos leram o prefácio; outros foram direto ao capitulo de Integral.
Constatamos que, quanto à abordagem do livro didático, os alunos de
diferentes semestres não apresentam diferença na forma como iniciam o estudo .
O livro utilizado apresenta o capítulo 5 com a denominação “Integrais” e o
inicia com os itens 5.1 – “Áreas e distâncias”, seguindo com os tópicos 5.2 “A
Integral Definida”, 5.3 “O Teorema Fundamental do Cálculo”, 5.4 “Integrais
Indefinidas e o Teorema da Variação Total”, 5.5 “ A Regra da Substituição”, 5.6 “O
Logaritmo Definido como um Integral”.
Todos os alunos anotaram em seu caderno de produção: “página 366”, que
é exatamente o número que figura no índice, e abriram o livro nesta página.
2ª Tarefa – Por um esquema, traduzir as informações contidas no tópico 5.1
Nesta tarefa, estamos interessados nas produções dos alunos, após a
leitura do texto.
Malta (2003) observou que, [...] com raras exceções, os alunos que
ingressavam na universidade não compreendiam a linguagem matemática, [...] o
aprendizado se resumia em aprender a utilizar alguns algoritmos, sem relacioná-
los com os conceitos, e eles têm muita dificuldade em justificar suas respostas
74
Capítulo IV Yuk Wah Hsia
quando solicitados, demonstrando pobreza de linguagem como também
dificuldade de perceber e identificar o próprio raciocínio.
Para esta análise, vamos observar, primeiramente, as produções dos
alunos quanto à utilização dos registros de representação e depois, faremos uma
classificação quanto à situação de leitura em que eles se encaixam, com base na
teoria de Duval.
Segundo o autor, para compreender um texto, o leitor deve possuir uma
base de conhecimento que é aquela que vai permiti-lo compreender a língua
falada além do código escrito, isto é, a seqüência de código escrito e a expressão
oral correspondente. Os textos podem se diferenciar pelo conteúdo cognitivo, ser
familiar ou novo; mas, também podem se diferenciar pela organização redacional,
ser congruente ou não congruente. Desse modo, são verificadas quatro as
situações de leitura: a primeira, familiar e congruente (I), familiar e não congruente
(II), novo e congruente (III) e novo e não congruente (IV).
Nas duas primeiras situações, um percurso único e rápido do texto, sem
retorno, pode ser suficiente para a compreensão no momento da leitura, pois não
passa de uma prática oral do texto; porém na situação II, Duval observa que um
único percurso rápido aumenta os riscos de má interpretação do leitor, o que
pode ser explicado por uma falta de atenção por parte do mesmo.
Na situação III e IV, a compreensão do texto é uma produção de
conhecimento novo para o leitor, existindo uma defasagem entre sua base de
conhecimento e o conteúdo cognitivo. O processo de compreensão exige um
percurso prolongado e com retorno sobre certas partes do texto, para responder
as questões, para efetuar comparações entre certas expressões, para verificar a
coerência de certas inferências, para determinar aquilo que passou
desapercebido.
Nesta tarefa, três alunos (dois do segundo semestre e outro do quinto
semestre) utilizaram somente o registro da língua natural para fazer o esquema
solicitado, nota-se claramente nas duas produções, que eles segmentaram o texto
para realizar a tarefa solicitada. Ilustramos abaixo uma produção desta natureza.
75
Capítulo IV Yuk Wah Hsia
Observamos que sete alunos (cinco do segundo semestre e dois do quinto
semestre) utilizaram os registros da língua natural e gráfico para dar conta do
esquema solicitado, incluindo também muitas vezes o registro algébrico.
Apresentamos a seguir uma produção desse tipo.
76
Capítulo IV Yuk Wah Hsia
Três alunos (um do segundo semestre e dois do quinto semestre)
enfatizaram o registro gráfico incluindo em menor proporção o registro algébrico
para tentar fazer o esquema solicitado. Em suas produções revelam claramente
que não entenderam o texto lido, e um deles inclusive efetuando erros como
colocar as variáveis no gráfico da função . Em entrevista posterior,
perguntamos ao aluno por que ele fez isso, ele respondeu que não gostava de
fazer esse tipo de tarefa, pois não tinha o hábito de ler textos matemáticos,
apenas os exemplos e exercícios resolvidos, e que também não percebera que
tinha errado. Apresentamos abaixo a produção deste ultimo aluno.
i
x
f
A última produção, de um aluno do 5º semestre, expressou um diálogo com
ele mesmo, utilizando o registro gráfico e o dangua natural para realizar a tarefa.
Esta produção está num formato diferente dos demais. Todo seu esquema foi
dialogado, o aluno conversando com o texto, para formar suas próprias imagens
mentais e organizar seu raciocínio. Isto está de acordo com Romanatto (2003),
que afirma: [...] a leitura torna indispensável um esforço para compreender, o que
é altamente disciplinador e educativo, [...] leva também ao desenvolvimento da
criatividade.
77
Capítulo IV Yuk Wah Hsia
Constatamos, então, que ler um texto matemático é uma situação à qual os
alunos não estão habituados, e fazer um esquema da leitura feita é uma situação
que é nova e gera muitas estratégias distintas para que a tarefa fosse cumprida.
Terceira tarefa: Como o autor começa o estudo do tema Integral?
Nesta tarefa, queremos observar se o aluno, embora tenha sido solicitado
localizar o tema Integral, percebeu que o capítulo não começa exatamente com
Integral e se ele conhece a razão.
Nove alunos perceberam que o capitulo de Integral começa com a noção
de medidas, e eles usaram o registro da língua natural expressar tal fato.
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Capítulo IV Yuk Wah Hsia
Quarta tarefa: Suponha que você seja solicitado para resolver algum dos
exercícios da página 376, qual você escolheria? Justifique
Nesta tarefa, queremos investigar como o aluno aborda os exercícios, se
ele começa resolvendo os mais fáceis, se escolhe os que são similares aos
exercícios resolvidos ou exemplos dados.
Todos os alunos escolheram o exercício nº 1, cujo enunciado reproduzimos
a seguir.
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Capítulo IV Yuk Wah Hsia
Seis deles (três do segundo semestre e três do quinto semestre)
consideraram o exercício nº 1, o mais fácil. Por exemplo,
Sete dos alunos (cinco são do segundo semestre e um do quinto semestre)
justifcaram porque tem semelhança com o exemplo do tópico estudado.
Outro aluno deste grupo justificou a escolha da seguinte maneira como se
vê abaixo.
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Capítulo IV Yuk Wah Hsia
Apenas um aluno (do 5º semestre) justificou porque é a questão cujo
enunciado que melhor entendeu.
Um aluno do 5º semestre explicita enfaticamente a influência da leitura do
texto apresentado na escolha do exercício escolhido pra resolver.
A maneira dos alunos, uns com mais, outros com menos destaque,
ressaltaram nas suas justificativas, o trabalho que haviam realizado na utilização
do texto do livro. Uns referiram-se a tópicos no registro da língua natural, outro no
registro gráfico.
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Capítulo IV Yuk Wah Hsia
Quinta tarefa: Agora, você poderia resolver o exercício escolhido?
Nesta tarefa, estamos interessados em conhecer as estratégias que os
alunos utilizam para resolver os exercícios.
Para resolver o exercício escolhido, o aluno precisa saber determinar as
áreas de cinco retângulos, cujas bases justapostas completam o intervalo [a, b] e
cuja altura (y) é o valor da função (cujo gráfico é fornecido), calculado ora no
extremo inferior, ora no extremos superior da base.
Nesta tarefa, doze alunos tentaram resolver o exercício escolhido (seis do
segundo semestre e seis do quinto semestre) e dois entregaram em branco,
desistiram de resolver. Numa entrevista feita posteriormente, um desses alunos
declarou que entendeu o enunciado do exercício, porém não conseguiu construir
os retângulos solicitados, o cálculo do valor de suas alturas foi a grande fonte de
dificuldades para a resolução exercício.
Dez deles (cinco do 2º semestre e cinco do quinto semestre) utilizaram o
registro gráfico, numérico, sendo que dois deles também utilizaram o registro da
língua natural.
Embora a maioria dos alunos conseguiu construir os retângulos, alguns
construíram apenas retângulos superiores, apresentando apenas a estimativa
superior solicitada, como o protocolo a seguir.
Esse aluno, em sua resolução, utilizou os registros gráfico, numérico,
língua natural, além de ilustração de figuras geométricas.
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Capítulo IV Yuk Wah Hsia
Outro aluno construiu apenas retângulos inferiores, não em numero de
cinco, porém 10. A seguir, apresentamos a reprodução deste protocolo.
Alguns estudantes construíram figuras que não são retângulos, como o
protocolo abaixo.
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Capítulo IV Yuk Wah Hsia
A produção abaixo indica que o estudante percebeu perfeitamente o que o
exercício pedia, apresentando uma resolução correta no registro gráfico tanto
para o item a quanto para o item b do enunciado, porém no calculo numérico, não
atentou para o fato que se pedia era uma estimativa e passou a fazer cálculos de
limites. Isto talvez seja decorrência da idéia de que todo problema de matemática
deve ter uma única e exata solução numérica.
84
Capítulo IV Yuk Wah Hsia
Entretanto, dois alunos conseguiram resolver completamente o exercício,
demonstrando ter entendido como é determinada a altura do retângulo.
Reproduzimos abaixo o protocolo.
85
Capítulo IV Yuk Wah Hsia
Observamos que os alunos estavam impedidos de apagar qualquer
tentativa de solução, porque não havia borracha para isso. Assim sendo, este
aluno anulou os cálculos, que julgou errados, refazendo-os em seguida.
Pudemos constatar que com apenas uma leitura do texto, pode fornecer
aos alunos os primeiros subsídios para a compreensão das idéias envolvidas no
conceito de Integral. Claro está, que para alguns alunos ainda seria necessário
um aprofundamento, que ficou evidenciado em dificuldades apresentadas na
resolução do exercício.
Ao final de uma sessão, quando um aluno nos acompanhou até o carro
para levar o material utilizado, ele comentou: “Depois desta experiência, acho que
os professores de Matemática deveriam ensinar utilizando livros didático, seria
mais completo e mais estimulante aprender desse modo”.
86
C
apítulo V
Conclusão e Considerações Finais
Esta pesquisa tem por meta investigar como os alunos utilizam o livro
didático e como eles mobilizam os registros de representação contidas em um
texto sobre a noção de Integral. Partimos dos resultados do trabalho de Silva
(2004), sobre as representações semióticas nos livros didáticos, e outras
pesquisas em Educação Matemática que tratam das dificuldades dos alunos
relacionadas com a disciplina de Cálculo.
O trabalho foi evoluindo, primeiramente, quanto à fundamentação teórica
que embasasse nossa investigação. Julgamos adequada para nossa
investigação, a teoria “Registros de Representação Semiótica”, de Duval, que
Silva já utilizara no seu trabalho. Esta teoria forneceu, então, uma base em que
nós pudemos nos apoiar para a próxima etapa, a elaboração do experimento
propriamente dito.
O aporte necessário para o desenvolvimento desta etapa, está apoiado
num trabalho do Grupo Math-Français de I’IREM de Strasbourg, sob direção de
Duval, sobre as dificuldades de abordagem de textos não narrativos, dificuldades
estas ligadas à abstração das noções envolvidas e a produção de textos
argumentativos ou demonstrativos. Compusemos, então, o roteiro de tarefas.
Capítulo V Yuk Wah Hsia
Percebemos, durante a realização das tarefas, que os alunos ficaram
entusiasmados com a possibilidade de aprender Matemática, utilizando o livro
didático, diferentemente da forma que tem sido ensinado-lhes. Isto nos
surpreendeu, pois, a nossa perspectiva era que os alunos não gostassem de
estudar utilizando livro, mas, sim recorrendo às anotações de aula, que muitos
verbalizaram ser a maneira mais fácil. Além disso, o entusiasmo de muitos deles
foi relevante, para mais uma vez, sinalizar que esta pesquisa tem razão de ser.
A sugestão dos professores, componentes da banca examinadora, sobre a
oportunidade de a pesquisa conter um estudo sobre o objeto matemático, deu
origem ao capítulo sobre a evolução do conceito de Integral. Esta contribuição
dos professores foi de grande importância, pois já estudáramos o conceito no
curso de graduação e retomamos discussões sobre ele no grupo de mestrado,
porém as idéias estavam dispersas. Assim sendo, quando esboçamos um relato
sobre a evolução do conceito, isso nos possibilitou perceber que nesta tarefa,
utilizamos variados registros de representação e a conversão de registros foi
fundamental par a elaboração desse esboço.
Quanto à pergunta da investigação, destacamos que a maioria dos alunos
se mostra interessada diante de uma nova possibilidade de iniciar o estudo de um
conceito, diferentemente da aula expositiva introdutória de um assunto. Dentre as
manifestações dos alunos nesse sentido, destacamos a frase de um estudante:
Gostei de saber que os conceitos que eu estudo tem aplicação na vida prática”.
Quanto à compreensão de texto, percebemos, pela forma que o esquema
solicitado foi apresentado, os alunos fazem uma segmentação do mesmo,
destacando e pontuando tópicos. Em cada um dos tópicos pontuados, a maioria
dos estudantes expressou a sua compreensão sobre o conceito estudado,
recorrendo a marcantemente pelos menos dois registros, um visual (gráfico) e
outro discursivo. Grande parte deles utilizou também outros registros como
numérico, algébrico, além de símbolos matemáticos que figuravam no texto.
Segue um exemplo de um esquema.
88
Capítulo V Yuk Wah Hsia
Em entrevista com os estudantes do 2º semestre, realizada no final desta
tarefa, eles verbalizaram que foi a primeira vez que se depararam com uma
tarefa, que propunha a leitura de texto de matemática, cujo conteúdo
desconheciam, elaborando posteriormente, um esquema sobre o conteúdo
envolvido na leitura.
Percebemos que as estratégias para a elaboração de tal esquema foram
variadas, sendo que alguns alunos privilegiaram o registro na língua natural, outro
o gráfico e sendo que muitos deles utilizaram simultaneamente três ou quatro
registros. Isto se deve ao fato de o autor do livro também utilizar vários registros
de representação no texto trabalhado.
A escolha dos registros de representação semiótica de Duval mostrou-se
apropriada como ferramenta de análise das produções dos alunos, mesmo
89
Capítulo V Yuk Wah Hsia
porque no livro escolhido, a variação de registros de representação é fartamente
utilizada.
A escolha do livro também propiciou a motivação dos alunos no
engajamento da atividade como aponta a produção abaixo.
Destacamos também que para a resolução de exercício, os alunos
recorreram a algum exemplo ou exercício resolvidos e, além disso, utilizaram
vários registros disponíveis para tal finalidade.
Detectamos uma dificuldade apresentada por aproximadamente metade
dos alunos, referente ao significado de função, revelado no momento da
construção de retângulo cuja altura era dada pelo valor da função em um ponto.
Tal dificuldade se revelou logo na segunda tarefa, em que alguns desses alunos
apresentaram construção de figuras que não são retângulos, pois a “base
superior” é curvilínea.
90
Capítulo V Yuk Wah Hsia
Na resolução do exercício nº 1 escolhido por eles, em que deveriam
determinar as áreas de cinco retângulos, cujas bases justapostas completam o
intervalo [a, b] e cuja altura (y) é o valor da função cujo gráfico é fornecido,
calculado ora no extremo inferior, ora no extremo superior da base, muitos
desistiram da tarefa e outros deixaram a resolução incompleta. Eles não
conseguiram perceber que cada retângulo deveria tocar o gráfico dado, visto que
sua altura é dada pelo valor da função num ponto determinado.
A nosso ver, isto é conseqüência do não entendimento, por parte dos
estudantes, de que o gráfico de uma função é o conjunto dos pontos (x, f(x)), cuja
simbologia muitas é até expressa, porém, sem nenhuma vinculação coma
representação dos pontos componentes do gráfico, no plano cartesiano.
Os esquemas elaborados pelos alunos, assim como as produções
referentes a resolução de exercícios fornecem indicações que a maioria deles
perceberam pelos menos os rudimentos do conceito que está sendo tratado no
91
Capítulo V Yuk Wah Hsia
livro. Evidentemente, com uma só leitura nem sempre é possível para um aluno
adquirir totalmente o conhecimento relativo ao objeto matemático, porém, este
inicio mostrou-se um eficaz ponto de partida para o aprofundamento da noção.
Principalmente, na resolução do exercício, ficou evidenciado que os alunos
voltavam para os exemplos tratados e/ou exercícios resolvidos no texto, para
buscar subsídios para a execução da tarefa. Nessa busca, também pode se
constatar que os estudantes procuram relacionar os conceitos trabalhados com os
variados registros utilizados.
Com a questão “Os alunos apresentam algum interesse pelo livro didático”,
pretendíamos observar como seria o primeiro contato deles com o livro. Isto é,
queríamos saber se os alunos se restringiam sua atenção apenas ao tópico
indicado, se procuravam diretamente o tema, folheando o livro, se iriam no início
do capitulo 5, cujo cabeçalho “Integrais”; se iniciariam pelo capítulo introdutório
denominado “Áreas e distâncias”; se tentavam iniciar já pelo 2º tópico
denominado “A Integral Definida”. Pretendíamos ainda investigar se algum aluno
mostrava interesse em conhecer o livro em sua totalidade, além do tópico
mencionado na tarefa. Observamos dois alunos tentaram localizar o tópico
indicado ao acaso, folheando o livro, mas em seguida recorreram ao índice.
Todos os demais localizaram o capítulo referente à Integral, imediatamente ao
abrir o livro, leram seu prefácio, viram a pagina em que estão elencados os
capítulos e em seguida, localizaram o tema no sumário.
Na fundamentação teórica, foi destacado que um fator importante na
interpretação de textos é a distancia entre a base de conhecimento do leitor e o
conteúdo cognitivo. Pretendíamos investigar que diferenças apresentam na
resolução das questões das tarefas, um aluno do 2º semestre, que nunca estudou
Integral e um aluno do 5º semestre, que já teve contato com o conceito. A análise
dos protocolos revelou que não houve diferenças perceptíveis entre as produções
de um e de outro grupo.
Embora uma única leitura não seja suficiente para que os estudantes
apreendam todos os conceitos periféricos que envolvem o tema central tratado,
pudemos constatar que o objetivo proposto foi alcançado, uma vez que, a
92
Capítulo V Yuk Wah Hsia
totalidade dos alunos se direcionou exatamente para o conteúdo indicado,
trabalharam com seriedade e afinco, no desenrolar das tarefas e ao se proporem
a resolver um exercício, efetuaram um movimento de ida e volta ao texto,
utilizando variados registros de representação, o que mostra que tanto a
fundamentação teórica, quanto o livro escolhido mostraram-se eficazes para a
investigação.
Vários dos estudantes, que trabalharam nesta investigação, manifestaram-
se afirmando que seria interessante uma prática, que partisse da leitura preliminar
do livro texto, com a possibilidade de consultas ao professor sobre dificuldades
apresentadas na leitura e posteriores discussões sobre os conteúdos
propriamente tratados. Com base no trabalho realizado e nas produções dos
estudantes, deixamos como possibilidade de continuação de pesquisa, a
indagação: Como a leitura do livro texto pode contribuir para o desenvolvimento
cognitivo do aluno de um curso de Cálculo Diferencial e Integral?
93
R
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