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referimos a representação, não pelo entendimento ao objeto, para o conhecimento,
mas pela imaginação (talvez vinculada com o entendimento)
2
ao sujeito e ao seu
sentimento de prazer ou desprazer”.
3
Naturalmente neste trecho Kant expressa apenas
uma possibilidade de vinculação do entendimento com a imaginação, mas um pouco
antes, em uma nota do próprio título deste primeiro momento, é convicto quando
afirma que “os momentos, a que esse Juízo atende em sua reflexão, eu os procurei
tomando por guia as funções lógicas de julgar (pois no juízo-de-gosto está sempre
contida ainda uma referência ao entendimento)”. Quer dizer, na relação com o juízo
de gosto, a simples subjacência do entendimento justifica a recorrência de Kant à
forma lógica. O juízo de gosto é um juízo estético, de reflexão, e, sendo um juízo, a
tábua dos juízos lógicos, já que contém os momentos que organizam todos os modos
possíveis de unir as representações em uma consciência, pode servir de guia confiável
para os juízos estéticos como se fossem lógicos. Nesse sentido, parece estar correta a
inferência de Guillermit de que a “Analítica” poderia ter como título: “A Estética
Transcendental da Faculdade de Julgar”, pois o juízo de gosto se ampara no que já
existe e acrescenta o que falta. Na primeira Crítica, a Doutrina Transcendental dos
Elementos revelou, com efeito, que a subsunção daquela faculdade se exerce na relação do
entendimento com a imaginação, que deve produzir um esquema para tornar os conceitos
conhecimento voltado à ciência. Para julgar o belo é preciso escapar tanto do que fez o proeminente
analista Baumgarten, ou seja, colocar regras de subsunção à estética dando a ela um estatuto teórico,
quanto de uma significação psico-antropologizante, o que pode acontecer se não for preservado o
caráter transcendental do juízo estético, ou seja, numa estética transcendental da faculdade de julgar
(Kant não usa este termo no título da Analítica, mas sim na “Observação Geral sobre a Exposição dos
Juízos Reflexionantes Estéticos” – B 118), deve-se levar em conta unicamente os juízos estéticos
puros [cf. nota na CRP, A 21, B 35 e a última alínea da seção XI da Primeira Introdução à Crítica do
Juízo, onde Kant parece esclarecer o que estava meio obscuro da nota da CRP]. Parece-nos que é isso
que Guillermit salienta quando escreve: “Mas os dois pontos [lógico e estético] aparecem, de imediato,
estreitamente ligados na medida em que o método e o objeto só podem coincidir ao mesmo tempo em
que eles começam por se dar como distintos. O signo exterior mais imediatamente manifesto dessa
distinção se indica nos títulos: uma Analytique cujo objeto próprio é o Belo se organiza segundo os
momentos que comporta o juízo de gosto”. Embora a estética aqui deva ser entendida em sentido
transcendental, as fontes principais do gosto não são a priori, mas empíricas, logo, como Kant
especifica na nota mencionada, não podem servir para leis determinadas a priori. Esta é uma questão
pertinente à gênese da Crítica do Juízo, para a qual sugerimos, entre outros, o texto de De
Vleeschauwer, La Déduction Transcendantale
dans L’Ouvre de Kant, tomo troisième, pp. 338ss; e
também o de Dumouchel, Kant et la Genèse de la Subjetivité Esthétique, p. 147.
2
Grifo nosso.
3
Kant, I. – “Analítica do Belo”, p. 303 (B 3-4).