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VIVIANE PRODOCIMO
A TRANSIÇÃO ENTRE HIPO- E HIPER-REGULAÇÃO OSMÓTICA DO PLASMA
EM PEIXES EURIHALINOS
Tese de doutorado apresentada ao Programa
de Pós-Graduação em Biologia Celular e
Molecular, Área de Concentração em
Fisiologia do Setor de Ciências Biológicas da
Universidade Federal do Paraná, como
requisito parcial para obtenção do grau de
Doutor em Biologia Celular e Molecular.
Orientadora: Prof
a
Dr ª Carolina Arruda de
Oliveira Freire.
Co-Orientador: Prof. Dr. Christopher M. Wood
(McMaster University)
CURITIBA
2006
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VIVIANE PRODOCIMO
A TRANSIÇÃO ENTRE HIPO- E HIPER-REGULAÇÃO OSMÓTICA DO PLASMA
EM PEIXES EURIHALINOS
Tese de doutorado apresentada ao Programa
de Pós Graduação em Biologia Celular e
Molecular, Área de Concentração em
Fisiologia do Setor de Ciências Biológicas da
Universidade Federal do Paraná, como
requisito parcial para obtenção do grau de
Doutor em Biologia Celular e Molecular.
Orientadora: Prof
a
Dr ª Carolina Arruda de
Oliveira Freire.
Co-Orientador: Prof. Dr. Christopher M. Wood
(McMaster University)
CURITIBA
2006
II
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AGRADECIMENTOS
À minha orientadora Prof
a
Carolina Arruda de Oliveira Freire pela
incomparável orientação e companheirismo durante todas as etapas da execução
do trabalho, pela confiança e amizade em mim depositadas.
Ao meu co-orientador Prof. Chris M. Wood por possibilitar meu estágio de
doutorado em seu laboratório na McMaster University, Hamilton, Canadá.
A CAPES pelas bolsas a mim concedida no Programa de Pós-graduação em
Biologia Celular e Molecular no Brasil e no Exterior (Estágio de Doutorado).
Ao Prof. Henry l. Spach do Centro de Estudos do Mar da UFPR, pelo auxílio
na execução das coletas dos baiacus utilizados nesta tese.
À Profa. Cloris D. Faraco do Departamento de Biologia Celular da UFPR,
pelo aprendizado da técnica de Imunofluorescênia.
Ao Prof. Silvio M. Zatana do Departamento de Patologia da UFPR, pela
colaboração na execução dos experimentos de Western Blot.
Ao Fernando Galvez da McMaster University pela colaboração durante o
meu estágio de doutorado no Canadá.
À Marlene Bonifácio de Camargo, secretária do Curso de Pós-Graduação
em Biologia Celular pela eficiência na execução de todos os pedidos a ela
solicitados.
À minha amiga Fabiana pela ajuda na realização da técnica de
imunofluorescência.
À minha amiga Anna Raquel pela amizade, apoio, incentivo e
companheirismo em todas as horas que precisei.
III
As minhas amigas canadenses Michele Nawata e Lara Alves pela amizade,
companheirismo e apoio durante minha estada no Canadá.
À Sunita Nadella secretária do Dr. C. Wood, McMaster University, por toda
ajuda na minha chegada ao Canadá.
Aos colegas do Laboratório de Fisiologia Comparativa pelos momentos
agradáveis de convivência.
Aos meus pais Acir e Marlene que sempre me apoiaram e possibilitaram que
eu atingisse meus objetivos.
Aos meus irmãos Marcio e Vinicius pela grande amizade e apoio.
Ao Jean R. S. Vitule, meu noivo, que foi meu companheiro, amigo e minha
maior fonte de apoio e inspiração.
IV
SUMÁRIO
AGRADECIMENTOS................................................................................................III
LISTA DE FIGURAS............................................................................................ .VII
RESUMO GERAL.....................................................................................................IX
INTRODUÇÃO GERAL........................................................................................ ..01
OBJETIVOS......................................................................................................... ..09
CAPÍTULO 1: O COTRANSPORTADOR Na
+
,K
+
,2Cl
-
DOS BAIACUS
ESTUARINOS (Sphoeroides testudineus e Sphoeroides greeleyi) NA HIPO- E
HIPER-REGULAÇÃO DA OSMOLALIDADE DO PLASMA..................................10
SUMÁRIO................................................................................................................11
RESUMO.............................................................................................................. ..12
ABSTRACT.......................................................................................................... ..13
1 INTRODUÇÃO.................................................................................................. ..14
2 MATERIAIS E MÉTODOS................................................................................ ..16
3 RESULTADOS .................................................................................................... 22
4 DISCUSSÃO E CONCLUSÕES ...................................................................... ..34
5 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ....................................................................41
CAPÍTULO 2: A Na
+
,K
+
-ATPase E ATP-ase TOTAL DOS BAIACUS
ESTUARINOS (Sphoeroides testudineus E Sphoeroides greeleyi) NA
TRANSIÇÃO ENTRE HIPO- E HIPER-REGULAÇÃO DA OSMOLALIDADE DO
PLASMA..................................................................................................................46
SUMÁRIO................................................................................................................47
RESUMO..................................................................................................................48
ABSTRACT.......................................................................................................... ..49
1 INTRODUÇÃO.................................................................................................. ..50
2 MATERIAIS E MÉTODOS................................................................................ ..53
3 RESULTADOS .................................................................................................. ..58
4 DISCUSSÃO E CONCLUSÕES ...................................................................... ..66
5 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ....................................................................71
V
CAPÍTULO 3: GLOMÉRULOS E TÚBULOS RENAIS SÃO RESTRITOS AO RIM
ANTERIOR NO ADULTO DO BAIACU ESTUARINO Sphoeroides
testudineus.............................................................................................................79
SUMÁRIO................................................................................................................80
RESUMO.................................................................................................................81
ABSTRACT.......................................................................................................... ..82
1 INTRODUÇÃO.................................................................................................. ..83
2 MATERIAIS E MÉTODOS................................................................................ ..83
3 RESULTADOS .................................................................................................... 86
4 DISCUSSÃO E CONCLUSÕES ...................................................................... ..91
5 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ....................................................................93
CAPÍTULO 4: AVALIAÇÃO DOS FLUXOS UNIDIRECIONAIS DE Na
+
E Ca
2+
EM
DUAS ESPÉCIES DE PEIXES TELEÓSTEOS EURIHALINOS, Fundulus
heteroclitus E Oncorhynchus mykiss SUBMETIDOS A ALTERAÇÕES
AGUDAS NA SALINIDADE................................................................................. ..96
SUMÁRIO................................................................................................................97
RESUMO.............................................................................................................. ..98
ABSTRACT.......................................................................................................... ..99
1 INTRODUÇÃO.................................................................................................. 100
2 MATERIAIS E MÉTODOS..................................................................................103
3 RESULTADOS ................................................................................................. .110
4 DISCUSSÃO E CONCLUSÕES ...................................................................... 119
5 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ..................................................................128
CONCLUSÕES GERAIS.......................................................................................135
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .....................................................................137
VI
LISTA DE FIGURAS E TABELAS
INTRODUÇÃO GERAL
Figura 1: Fotografia de Sphoeroides testudineus................................................. 07
Figura 2: Fotografia de Sphoeroides greeleyi ...................................................... 07
Figura 3: Fotografia de Fundulus heteroclitus ...................................................... 08
Figura 4: Fotografia de Oncorhynchus mykiss .................................................... 08
CAPÍTULO 1
Figura 1: Osmolalidade do plasma de S. testudineus e S. greeleyi injetados com
salina ou furosemida ........................................................................................... 23
Figura 2: Cloreto do plasma de S. testudineus e S. greeleyi injetados com salina ou
furosemida............................................................................................................ 25
Figura 3: Sódio do plasma de S. testudineus e S. greeleyi injetados com salina ou
furosemida............................................................................................................ 27
Figura 4: Hematócrito de S. testudineus e S. greeleyi injetados com salina ou
furosemida............................................................................................................ 29
Figura 5: Conteúdo de água no músculo de S. testudineus e S. greeleyi injetados
com salina ou furosemida..................................................................................... 31
Figura 6: Imunoflourescência do NKCC no epitélio branquial de S. testudineus e S.
greeleyi................................................................................................................. 33
CAPÍTULO 2
Figura 1: Imunoflourescência da Na
+
,K
+
-ATPase no epitélio branquial de S.
testudineus e S. greeleyil ..................................................................................... 59
Figura 2: Intensidade da fluorescência para Na
+
,K
+
-ATPase branquial de S.
testudineus e S. greeleyi...................................................................................... 60
Figura 3: Atividade ATPásica total das brânquias e rim de S. testudineus e S.
greeleyi.....................................................................................................................61
Figura 4: Triglicerídeos totais das brânquias e rim de S. testudineus e S.
greeleyi................................................................................................................. 63
VII
Tabela 1: Osmolalidade e cloreto plasmáticos, hematócrito, conteúdo de água no
músculo de S. testudineus e S. greeleyi..................................................................65
CAPÍTULO 3
Figura 1: Fotografia de S. testudineus mostrando a localização do rim da cabeça e
do rim caudal e micrografias de luz do rim da cabeça ........................................ 88
Figura 2: Micrografias eletrônica dos túbulos do rim da cabeça de S.
testudineus...............................................................................................................89
Figura 3: Micrografias de luz e eletrônica do duto mesonéfrico no rim caudal de S.
testudineus .......................................................................................................... 90
CAPÍTULO 4
Figura 1: Fluxos e concentração total de Na
+
em F. heteroclitus ......................... 113
Figura 2: Fluxos, concentração do plasma e total de Na
+
em O. mykiss.............. 114
Figura 3: Fluxos e concentração total de Ca
2+
em F. heteroclitus ........................ 117
Figura 4: Fluxos, concentração do plasma e total de Ca
2+
em O. mykiss ............ 118
Tabela 1: Concentração iônica das águas utilizadas nos experimentos de fluxo
iônico unidirecional de íons Na
+
e Ca
2+
..................................................................109
VIII
RESUMO GERAL
Os teleósteos são eurihalinos e possuem capacidade de tolerar amplas
variações de salinidade. Por estarem sujeitos a variação diária de salinidade, as
espécies estuarinas eurihalinas como os baiacus tropicais Sphoeroides testudineus
(mais tolerante a redução de salinidade) e Sphoeroides greeleyi e o killifish
temperado Fundulus heteroclitus são modelos interessantes para o estudo de
mecanismos de osmorregulação. Além de espécies estuarinas, a truta arco-íris
Oncorhynchus mykiss, espécie temperada dulcícola, também é um modelo muito
estudado. Com o objetivo de avaliar mecanismos que ocorrem durante a transição
entre hipo- (em salinidade 35‰) e hiper-regulação (em salinidade 5‰) osmótica do
plasma em peixes eurihalinos, avaliou-se a participação do NKCC, da Na
+
,K
+
-
ATPase, das reservas metabólicas (lipídicas) e da atividade ATPásica total nos
baiacus durante a hipo-regulação e hiper-regulação; descreveu-se a morfologia e a
ultraestrutura do rim de S. testudineus; e avaliaram-se os fluxos unidirecionais de
Na
+
e Ca
2+
em F. heteroclitus e O. mykiss durante a elevação gradual da salinidade
ao longo de 6 horas. Durante a hiper-regulação (5‰) e a hipo-regulação (35‰),
ambas as espécies de baiacus apresentaram mecanismos de regulação osmo-
iônica semelhantes, e mesmo padrão de resposta às salinidades. O NKCC dos
baiacus atuou na secreção de sal de em 35‰ das duas espécies de baiacus e na
regulação do conteúdo de água das células musculares e no hematócrito de S.
testudineus. Este transportador pode ser parcialmente responsável pela elevada
capacidade de S. testudineus de tolerar a diluição da água do mar durante a maré
baixa. Em geral foi demonstrada uma tendência a redução nas concentrações
plasmáticas osmóticas e iônicas em 5‰ e controle do conteúdo de água das
células, a despeito da ligeira diluição do plasma nos dois baiacus. A Na
+
,K
+
-
IX
ATPase branquial mostrou não ser um dos motivos para a maior tolerância de S.
testudineus à água do mar diluída, por não sofrer alterações no sinal
imunocitoquímico frente a hipo- e hiper-regulação. Contudo, diferenças no
conteúdo de triglicerídeos das brânquias e rins podem ser parte da explicação para
a tolerância diferencial.
S. testudineus revelou possuir um tipo raro de rim por apresentar rim anterior
com glomérulos e túbulos renais cercados por tecido hematopoiético e um grande
duto coletor convoluto denominado de duto mesonéfrico (única estrutura do rim
posterior). Apesar desta morfologia pouco comum quando comparada à morfologia
de outras espécies marinhas-estuarinas, o rim de S. testudineus atua ativamente
juntamente com as brânquias no controle da homeostase do líquido extracelular.
Frente à elevação gradual de salinidade simulando o ciclo de maré
enchente, F. heteroclitus manteve a homeostase dos íons Na
+
e Ca
2+
sem alterar
suas concentrações corporais, confirmando sua capacidade de tolerar a elevação
diária da salinidade com a subida da maré em seu ambiente natural. Em salinidade
elevada, O. mykiss perdeu a capacidade de manutenção das concentrações de
Na
+
e Ca
2+
plasmáticas devido ao aumento no influxo de ambos os íons. Este
resultado mostra que a espécie estuarina ativa mecanismos de osmorregulação
para manutenção da homeostase dos íons Na
+
e Ca
2+
durante a transição gradual
entre hiper- e hipo-regulação do plasma, o que não acontece com a espécie
dulcícola, por esta não ser submetida regularmente a elevação de salinidade em
seu ambiente natural. Com estes resultados esta tese contribuiu para o
conhecimento da fisiologia da osmorregulação em peixes estuarinos diante do
desafio da mudança rápida na salinidade do seu ambiente.
X
1
INTRODUÇÃO GERAL
Os peixes teleósteos mantêm sua concentração osmótica em torno de 1/4
a 1/3 da concentração da água do mar. Os teleósteos marinhos são hipo-
osmóticos em relação água do mar, apresentando concentração plasmática entre
370 e 480 mOsm/kgH
2
O, e as espécies dulcícolas são hiper-osmóticas em
relação ao seu ambiente e apresentam osmolalidade plasmática entre 230 e 330
mOsm/kgH
2
O (Evans, 1993; Jobling, 1995; Schmidt-Nielsen,1997).
Muitos teleósteos são eurihalinos, possuem capacidade de se
aclimatizar/aclimatar às alterações de salinidade, especialmente aqueles que
vivem em regiões estuarinas sujeitas às alterações diárias na salinidade da água
(Jobling, 1995). Quando teleósteos são submetidos a uma alteração na
salinidade, as modificações fisiológicas ocorrem em duas etapas. A primeira
etapa é adaptativa, na qual ocorrem alterações na concentração iônica e osmótica
do plasma após horas de exposição a alteração da salinidade. Quando um peixe
marinho é transferido para água doce ocorre redução da osmolalidade do plasma
pela perda de íons inorgânicos e ganho osmótico de água. A segunda etapa é
regulatória, na qual a osmolalidade e as concentrações iônicas do plasma
aumentam, retornando para seus níveis normais, sendo reguladas e mantidas
dentro de limites estreitos em homeostase (Schmidt-Nielsen,1997). A redução da
salinidade da água acarreta em geral uma redução do número de células de
cloreto das brânquias, e da atividade da Na
+
,K
+
-ATPase branquial, eventos
controlados pelo hormônio prolactina (Evans, 1993; Jobling, 1995; Zadunaisky,
1996).
2
Por outro lado, em teleósteos dulcícolas eurihalinos transferidos para água
do mar, na etapa adaptativa ocorre aumento da osmolalidade do plasma e da
concentração iônica devido à reversão do gradiente salino que favorece agora a
entrada difusiva de sal pelo epitélio branquial. Na etapa regulatória, após alguns
dias ou semanas de aclimatação à água do mar, em geral é observado um
aumento no número de células de cloreto e aumento da atividade da Na
+
,K
+
-
ATPase branquial, eventos controlados pelos hormônios cortisol e do crescimento
(Evans, 1993; Jobling, 1995; Zadunaisky, 1996).
Espécies de peixes marinhos e dulcícolas apresentam adaptações
fisiológicas para lidar com variações de salinidade. Estas estão em última
instância relacionadas com a absorção e secreção de uma determinada
quantidade de sais e com a manutenção da água nos tecidos corporais
(Zadunaisky, 1996; Wood & Pärt, 1997; Sakamoto et al., 2001). Em teleósteos
marinhos, que bebem água do mar, a absorção de sal acompanhada pela água
inicia-se no esôfago e estende-se até o estômago e intestino. Os rins e as
brânquias são os responsáveis pela secreção do excesso de sais ingeridos a fim
de manter a sua baixa concentração plasmática (hipo-regulação) (Evans, 1993;
Jobling, 1995). Os teleósteos dulcícolas, por serem hiper-osmóticos ao ambiente
onde vivem, realizam absorção de sal através do epitélio branquial e reabsorção
de sal e excreção do excesso de água através do epitélio renal (urina mais diluída
que o plasma) para a manutenção da osmolalidade extracelular (Evans, 1993;
Jobling, 1995).
A secreção e absorção de sal pelo organismo dos peixes podem ser
evidenciadas por alterações nos fluxos transepiteliais de íons e água. Evidências
experimentais demonstram alterações nos fluxos nos epitélios branquial, renal e
3
do tubo digestivo no processo de transição entre hipo- (em água do mar) e hiper-
regulação (em água mais diluída). Estas alterações estão associadas muitas
vezes a modificações estruturais nas brânquias; alterações na atividade de
enzimas; formação de proteínas de membrana responsáveis pelo transporte de
sal, muitas vezes com demonstração da ação moduladora de hormônios
glicocorticóides e esteróides sobre estes processos (Borski et al., 1994; Gaumet
et al., 1995; Jobling, 1995; Marshall, 2003).
Medidas dos fluxos iônicos unidirecionais no animal inteiro ou em células
isoladas de epitélios de transporte podem indicar de maneira precisa qual a
magnitude dos fluxos unitários de íons, e os fluxos que estão acarretando as
eventuais modificações resultantes no líquido extracelular (LEC) (e. g. Van Der
Heijden et al., 1999; Reid et al., 2003; Wood & Laurent, 2003). Quando o influxo
(absorção de íons pelos epitélios para o LEC) e o efluxo (secreção de íons pelos
epitélios do LEC para o meio externo) de íons são determinados durante
diferentes tempos de exposição a salinidades variadas, consegue-se estabelecer
como o animal está modulando seus fluxos unidirecionais em prol da homeostase
do seu LEC. Juntamente com as medidas dos fluxos transepiteliais, as
concentrações osmóticas do plasma indicam a capacidade de regular e manter
estável a osmolalidade do plasma (Evans, 1993; Jobling, 1995; Prodocimo &
Freire, 2001; 2004), eventualmente havendo ausência de fluxo resultante (estado
estacionário).
Além das medidas diretas de concentrações iônicas e osmóticas
plasmáticas, e dos fluxos iônicos unidirecionais, um forte indicador do estresse
osmótico imposto às células e tecidos de teleósteos eurihalinos marinhos ou
dulcícolas é o conteúdo de água nos tecidos musculares quando as espécies são
4
submetidas a ambientes hiper-osmóticos ou hipo-osmóticos. O conteúdo de água
apresenta-se inversamente relacionado com a osmolalidade dos líquidos
corporais, refletindo a resposta osmótica do plasma à variação de salinidade do
ambiente (Jensen et al., 1998; Kelly & Woo, 1999; Claireaux & Audet, 2000;
Sakamoto et al., 2001).
Em regiões litorâneas estuarinas onde a água do mar é misturada com a
água de rios, a salinidade é diminuída com o ciclo de maré formando água
salobra com salinidade entre 30‰ e 0,5‰ causando estresse osmótico diário aos
peixes que vivem nestas regiões (Evans, 1993; Schmidt-Nielsen,1997). O
ambiente estuarino (estuário) é semelhante a uma massa de água costeira que
possui ligação com o mar aberto, e é influenciada pelos movimentos das marés,
que posibilita mistura da água doce com a água do mar em proporções variadas
durante o dia, o que resulta em flutuação de salinidade (Odum, 1988;1994; Mann
& Lazier, 1991). O estuário poderia ser considerado apenas uma área de
transição entre o ambiente marinho e o de água doce, porém suas características
ecológicas o tornam um ecossistema diferenciado e exclusivo (Odum, 1988).
Variações sazonais no índice pluviométrico, ciclo das marés e ação eólica são os
fatores que determinam diretamente a salinidade da água do estuário. Este
fatores influenciam a distribuição de suas espécies por alterações significativas na
estratificação salina da coluna d’água (Odum, 1988; Mann & Lazier, 1991; Odum,
1994),
Espécies de Teleósteos Eurihalinos Estudadas
Sphoeroides testudineus Linnaeus, 1758 (baiacu-pintado) (Fig. 1), família
Tetraodontidae, habita baías e estuários, chegando a penetrar em água doce
5
(Figueiredo & Menezes, 2000). Distribui-se de Nova Jersey nos Estados Unidos
da América até o estado de Santa Catarina no Brasil. Na Baía de Paranaguá,
Paraná, está entre as espécies mais abundantes nos estuários, tanto nos canais
do manguezal, chamados de gamboas, quanto nas planícies de maré adjacentes.
Nesta região se distribuí em locais com salinidade variando de 34 ‰ a 0 ‰,
devido ao ciclo de maré (Figueiredo & Menezes, 2000; Vendel et al., 2002).
Sphoeroides greeleyi Gilbert, 1900 (baiacu-mirim) (Fig. 2) é também uma espécie
de baiacu comum no litoral brasileiro, habitando baías e estuários de águas pouco
profundas. Tem distribuição latitudinal menos ampla que S. testudineus, de
Honduras, pelo Caribe e litoral do Brasil até o estado do Paraná (Figueiredo &
Menezes, 2000). Na Baía de Paranaguá, S. greeleyi está limitado a uma área de
salinidade mais elevada que S. testudineus, sendo menos abundante em canais
de manguezal mais internos (gamboas), onde a salinidade tende a diminuir pelo
aporte de água doce dos rios que constituem o complexo estuarino (Vendel et al.,
2002). Ambas as espécies de baiacus são encontradas em áreas estuarinas da
Baía de Paranaguá em todos os períodos do ano nas formas adultas e juvenis,
utilizando o complexo estuarino como local de reprodução (Vendel et al., 2002).
Os baiacus Sphoeroides testudineus e Sphoeroides greeleyi são espécies
eurihalinas reguladoras das concentrações de NaCl e de íons magnésio no
plasma, tanto em água do mar (30‰) quanto em água do mar diluída (10‰). As
concentrações plasmáticas destes íons são muito próximas entre as duas
espécies. Contudo, estudos anteriores nos quais ambas as espécies foram
expostas às salinidades de 35‰ e 5‰ por períodos de 6 horas e 15 dias,
indicaram que S. testudineus, mais resistente a salinidades menores quando
comparado a S. greeleyi, sobreviveu 15 dias em 5‰ de forma totalmente
6
compatível com sua distribuição na natureza. S. greeleyi sobreviveu por 6 horas
e 5 dias a salinidade de 5‰ (Prodocimo & Freire, 2001; 2004).
A terceira espécie estuarina estudada neste trabalho foi o “killifish”
Fundulus heteroclitus (Fig. 3), pertencente à família Ciprinodontidae. É uma
espécie extremamente eurihalina que vive em planícies de maré e estuários ao
longo de toda costa norte americana, onde está sujeita a variações diárias de
salinidade. Esta espécie, bem como outras espécies pertencentes a este gênero,
toleram transferências abruptas entre a água doce e a água do mar, sobrevivendo
em salinidades entre 0 ‰ 120 ‰ (Feldmeth & Waggoner III, 1972; Griffith, 1974).
A espécie F. heteroclitus tem sido intensamente estudada para a determinação de
mecanismos básicos da osmorregulação de teleósteos eurihalinos (Jacob &
Taylor, 1983; Marshall et al., 1999; Marshall et al., 2000; Daborn et al., 2001;
Katoh et al., 2003; Marshall, 2003; Wood & Laurent, 2003).
Além da espécie estuarina F. heteroclitus, um outro modelo amplamente
estudado de peixe eurihalino é a truta arco-íris. A truta arco-íris (Oncorhynchus
mykiss) (Fig. 4) é uma espécie dulcícola que tolera até salinidades próximas a
24‰ em aclimatação gradual (Richards et al., 2003). Os salmonídeos em geral
são amplamente estudados quanto aos seus mecanismos de transporte de íons,
sendo excelentes modelos de teleósteos dulcícolas eurihalinos para estudos
sobre osmorregulação em diferentes salinidades (e.g. Perry & Flik, 1988; Perry &
Laurent, 1989; Perry et al., 1996; Galvez et al., 2002; Reid et al., 2003; Hawkings
et al., 2004).
7
Figura 1: Exemplar adulto de Sphoeroides testudineus.
Barra de escala: 2 cm.
Figura 2: Exemplar adulto de Sphoeroides greeleyi.
Barra de escala: 2 cm.
8
Figura 3: Exemplar adulto de Fundulus heteroclitus.
Barra de escala: 0,5 cm.
Figura 4: Exemplar adulto de Oncorhynchus mykiss.
Barra de escala: 5 cm
9
OBJETIVOS
Objetivo Geral
Descrever a ultraestrutura e a morfologia do rim e avaliar os mecanismos
fisiológicos de regulação osmo-iônica frente à diluição da água do mar em três
espécies eurihalinas estuarinas potencialmente sujeitas a redução da salinidade
no seu ambiente natural durante a descida de maré, e em uma espécie eurihalina
dulcícola não sujeita a variação de salinidade no ambiente natural.
Objetivos Específicos
1. Avaliar o papel do co-transportador Na
+
, K
+
, 2Cl
-
(NKCC) na tolerância
diferencial de S. testudineus e S. greeleyi à diluição da água do mar;
2. Avaliar o papel da Na
+
, K
+
-ATPase, da atividade ATPásica total e da
reserva metabólica de lipídeos na brânquia e no rim, na tolerância
diferencial de S. testudineus e S. greeleyi à diluição da água do mar;
3. Descrever a morfologia e a ultraestrutura do rim e dos túbulos renais de S.
testudineus;
4. Determinar os fluxos unidirecionais de Na
+
e Ca
2+
no peixe inteiro (F.
heteroclitus e O. mykiss) durante a elevação gradual da salinidade ao
longo de 6 horas simulando o ciclo de maré em ambiente estuarino.
10
CAPÍTULO 1: O COTRANSPORTADOR Na
+
,K
+
,2Cl
-
DOS BAIACUS
ESTUARINOS (Sphoeroides testudineus e Sphoeroides greeleyi) NA HIPO- E
HIPER-REGULAÇÃO DA OSMOLALIDADE DO PLASMA
1
1
Artigo publicado no Comparative Biochemistry Physiology C 142: 347-355, Prodocimo & Freire, 2006.
11
SUMÁRIO
RESUMO.............................................................................................................. ....12
ABSTRACT.......................................................................................................... ....13
1 INTRODUÇÃO.................................................................................................. ....14
2 MATERIAIS E MÉTODOS................................................................................ ....16
3 RESULTADOS ...................................................................................................... 22
4 DISCUSSÃO E CONCLUSÕES ...................................................................... ....34
5 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ......................................................................41
12
RESUMO
Os baiacus Sphoeroides testudineus e Sphoeroides greeleyi são espécies
estuarinas com eficiente capacidade osmorregulatória. Contudo, S. testudineus
tolera maior diluição da água do mar quando comparado a S. greeleyi. Este
estudo teve como objetivo testar a participação do NKCC na tolerância diferencial
à redução da salinidade, através da análise in vivo da injeção de furosemida
(inibidor do NKCC) durante a hipo-regulação (em salinidade 35‰) e hiper-
regulação (em salinidade 5‰). Após a exposição às salinidades esperimentais
por 6 horas ou 5 dias, amostras de sangue foram coletadas para determinação da
osmolalidade, concentração de cloreto e sódio plasmáticos e hematócrito, e
amostras de músculo para a determinação do conteúdo de água. Em ambas as
espécies, a injeção de furosemida levou ao aumento da osmolalidade e sódio
plasmáticos em 35‰ e diminuição da osmolalidade e cloreto plasmáticos em 5‰,
quando comparados ao controle injetados com salina; levou à redução dos
valores de hematócrito em ambas às salinidades e ao aumento do conteúdo de
água no músculo em 5‰ e diminuição em 35‰ em S. testudineus. Os resultados
obtidos são compatíveis com o envolvimento do NKCC branquial para a secreção
de sal (NaCl) em 35‰, em ambas as espécies, e seu papel fundamental na
regulação de volume celular nas células sangüíneas e nas células musculares de
S. testudineus, em ambas as salinidades, o que pode explicar parcialmente a
maior capacidade de S. testudineus de tolerar a diluição da água do mar durante
a maré baixa quando comparado a S. greeleyi.
13
ABSTRACT
The pufferfishes Sphoeroides testudineus and Sphoeroides greeleyi are
estuarine species that osmoregulate efficiently, but S. testudineus tolerates
seawater dilution to a much higher degree than S. greeleyi. This study aimed at
testing whether NKCC is involved with their differential tolerance of sea water
dilution, through the analysis of in vivo furosemide (NKCC inhibitor) injection both
on hypo-regulation (in 35‰ salinity) and hyper-regulation (in 5‰ salinity). After
exposure for 6 hours or 5 days to both salinities, blood samples were obtained for
determination of plasma osmolality, chloride, sodium and hematocrit, and muscle
samples for determination of water content. Furosemide injection led to increased
plasma osmolality and sodium in 35‰ and decreased osmolality and chloride in
5‰, when compared to saline-injected controls for both species. Furosemide
injection led to hematocrit reduction in both salinities, and muscle water content
increase in 5‰ and decrease in 35‰ in S. testudineus. The results are compatible
with NKCC working in branchial NaCl secretion in 35‰, in both species, and a
higher role in cell volume regulation in blood and muscle cells of S. testudineus, in
both salinities, which could partially explain the stronger capacity of S. testudineus
to tolerate seawater dilution during low tide.
14
1 INTRODUÇÃO
Teleósteos marinhos são hipo-osmóticos a água do mar e suas brânquias
são responsáveis pela manutenção da homeostase do plasma secretando o
excesso de sal ingerido (Evans, 1993; Jobling, 1995). As células ricas em
mitocôndrias (células de cloreto) do epitélio branquial são as principais
responsáveis pela secreção de cloreto na água do mar e são auxiliadas pelas
células acessórias adjacentes, separadas pela via paracelular permeável ao
sódio. As células de cloreto e as acessórias são ricas em mitocôndrias associadas
a um denso sistema tubular de membranas (continuação da membrana
basolateral), rico em proteínas transportadoras (Philpott, 1980; Jobling, 1995;
Perry, 1997).
O cotransportador Na
+
,K
+
,2Cl
-
(NKCC) está entre as mais relevantes
proteínas de transporte nas brânquias de peixes. Sua isoforma secretória NKCC1
está localizada no sistema basolateral de membranas nas células de cloreto no
epitélio branquial dos teleósteos (Lytle & Forbush, 1992a,b; Lytle et al., 1995;
Marshall et al., 2002a; Marshall, 2003; McCormick et al., 2003; Scott et al., 2004).
O NKCC é um transportador ativo secundário, encontrado em membranas
celulares de uma grande variedade de epitélios de transporte de sal, e também
em células animais não epiteliais, onde atua na homeostase do volume celular
(Russell, 2000). A isoforma absortiva NKCC2 está localizada nas membranas
apicais das células epiteliais. Ambas as isoformas podem ser inibidas pelos
“diuréticos de alça” bumetanida e furosemida (Forbush et al., 1992; Lytle &
Forbush, 1992a; Lytle et al., 1995; Mount et al., 1998; Russell, 2000). Em
telósteos em geral, a presença do NKCC tem sido demostrada nos epitélios
15
branquial e opercular (Pelis et al., 2001; Pelis & McComick, 2001; Cutler & Cramb,
2002; Marshall et al., 2002a; McCormick et al., 2003; Scott et al., 2004; Marshall
et al., 2005), bem como nos epitélios renal (Cutler & Cramb, 2002), e intestinal
(O’Grady et al., 1987; Marshall et al., 2002b).
Em teleósteos marinhos eurihalinos a expressão do NKCC1 foi reduzida
(down regulated) em água salobra onde não há necessidade de secretar sal
(McCormick et al., 2003; Scott et al., 2004), ou quando há necessidade de
absorver sal em água doce ou água do mar muito diluída (Pelis et al., 2001; Scott
et al., 2004). Associada à redução na expressão do NKCC, a regulação da
secreção de sal pelo epitélio branquial ou opercular em curto período de tempo
envolve a redistribuição deste transportador da membrana basolateral das células
de cloreto quando em água do mar para o interior das células em água doce
(Marshall et al., 2002a). Ocorre ainda defosforilação do NKCC por uma proteína
do tipo fosfatase (Marshall, 2003). O mesmo fenômeno regulatório se aplica às
células de cloreto, com redução na condutância apical pelos canais de cloreto
CFTR (
cystic fibrosis transmembrane conductance regulator, canais de cloreto
apicais responsáveis pelo transporte de cloreto para fora da célula) (Marshall,
2003; McCormick et al., 2003; Scott et al., 2004). Ambos os transportadores
(NKCC e CFTR) juntos são responsáveis pela secreção vetorial transcelular de
cloreto nas brânquias dos teleósteos marinhos (e.g., Marshall, 2003).
O baiacu Sphoeroides testudineus Linnaeus, 1758 é uma espécie
abundante em baías e estuários ao longo da costa do Brasil, e ocorre em água
com salinidade entre 0 e 34‰ (Nardi, 1999; Figueiredo & Menezes, 2000).
Sphoeroides greeleyi Gilbert, 1900 também é estuarina, mas restrita a áreas com
salinidade mais elevada que S. testudineus (~30‰), não permanecendo no
16
estuário durante a descida da maré (Figueiredo & Menezes, 2000; Vendel et al.,
2002). Ambos os baiacus são eurihalinos, apresentando capacidade similar de
regulação da osmolalidade e dos íons plasmáticos em água do mar (Prodocimo &
Freire, 2001; 2004). No entanto, em salinidades reduzidas, eles apresentam
comportamento diferenciado, com S. testudineus sendo mais tolerante quando
comparado a S. greeleyi (Prodocimo & Freire, 2001). Este padrão de tolerância é
compatível com sua distribuição na natureza (Figueiredo & Menezes, 2000;
Vendel et al., 2002).
O presente estudo foi conduzido para investigar se o NKCC apresenta
algum papel na tolerância diferencial de S. testudineus e S. greeleyi a diluição da
água do mar. O sinal da presença do NKCC em ambas as espécies foi aqui
avaliado usando duas técnicas experimentais: injeção de furosemida in vivo, e
imunocitoquímica da brânquia. O efeito da injeção do inibidor foi avaliado nas
brânquias, representado pela osmolalidade e concentração de cloreto e sódio
plasmáticos (ação do NKCC na osmorregulação), e nos tecidos, representado
pelo hematócrito e conteúdo de água no tecido muscular (ação do NKCC na
regulação do volume celular).
2 MATERIAIS E MÉTODOS
Animais
S. testudineus adultos (15±1 cm de comprimento, 40±1 g de peso) e S.
greeleyi (10±1 cm de comprimento, 20±1 g de peso) foram coletados na gamboa
do rio Baguaçu (25° 33’ 6,33’’S, 48°23’ 41,63’’W), na margem sul da Baía de
Paranaguá, Estado do Paraná, Brasil, entre Setembro de 2002 e Maio de 2004.
17
Os peixes foram coletados durante a maré enchente utilizando rede de espera
tipo fyke cruzando o canal da gamboa. A rede permaneceu instalada por 6 horas
até o pico de maré enchente, quando foi feita a coleta da rede. Os animais foram
animais transferidos para galões plásticos com água do local da coleta e aeração
constante. A salinidade da água foi verificada (refratômetro Shibuya S-28, Japão)
imediatamente após a coleta dos animais, e variou entre 29‰ e 30‰ nas datas
de coleta. Os peixes foram transferidos para o laboratório, onde foram
aclimatados por 7 dias em tanque estoque de 250 l com filtro biológico, salinidade
de 30‰, temperatura de 21±1°C e aeração constante. Durante o período de
aclimatação e o período experimental de 5 dias, os animais foram alimentados
diariamente ad libitum com camarões frescos e minhocas.
Experimentos
Espécimes de S. testudineus e S. greeleyi foram expostos por 6 horas ou 5
dias à água do mar com salinidade 35‰ e à água do mar diluída, com salinidade
5‰. A água do mar com salinidade 35‰ foi preparada misturando a água de
salinidade 30‰ com água do mar concentrada após congelamento. Os animais
experimentais submetidos à salinidade 35‰ foram diretamente transferidos do
tanque estoque de salinidade 30‰ para os aquários experimentais de salinidade
35‰. A água do mar 30‰ foi diluída para 5‰ adicionando-se água da torneira
sem cloro e filtrada (série de filtros de celulose e carvão ativado). A água do mar
foi diluída overnight de 30‰ para 10 - 12‰ ao longo de 4 horas (com fluxo de 0,7
ml/seg) para evitar choque osmótico nos peixes expostos a 5‰. Os peixes
permaneceram por 10 - 12 horas em 10 - 12‰, e foram transferidos para 5‰. Os
experimentos foram realizados em aquários de 30 l com aeração constante,
18
temperatura de 21±1 °C e número máximo de 3 peixes por aquário experimental,
com duplicatas independentes, até a obtenção de um número adequado de
animais para cada parâmetro. Após um período de 6 horas ou 5 dias nas
salinidades experimentais (5‰ e 35‰), os peixes foram anestesiados com
benzocaína dissolvida em etanol na água do aquário, com concentração final de
80 mg/l. Esta dose de benzocaína foi previamente testada para garantir a total
recuperação dos animais. Após a anestesia completa, os peixes foram injetados
com 1 ml de furosemida Aventis 10 mg/ml, ~30 mM em NaCl 300 mM. A dose de
furosemida estimada foi de: 0,75 µmol/g de peso corporal de S. testudineus e 1,5
µmol/g de peso corporal de S. greeleyi. Esta diferença na dose de furosemida
injetada impediu comparação direta entre os valores de ambas as espécies. Os
animais controles foram injetados com 1 ml de salina 300 mM NaCl, e todos os
peixes receberam injeção muscular dorsolateral. Esta dose de furosemida foi a
menor dose encontrada em testes preliminares capaz de induzir alterações
significativas na osmolalidade do plasma, sendo letal após 90-120 minutos da
injeção. Os peixes foram anestesiados antes da injeção para reduzir o estresse
causado pela contenção manual. Após a injeção, os animais experimentais e os
controles permaneceram em aquários individuais por 1 hora, quando foram
novamente anestesiados e abertos por incisão ventral.
Ensaios
Após a incisão ventral, amostras de sangue foram coletadas por punção
cadíaca utilizando-se seringas heparinizadas. As amostras foram centrifugadas
for 10 min (2,100 xg) e as amostras de plasma foram imediatamente congeladas a
–20°C até a realização dos ensaios para a determinação da osmolalidade, dos
19
íons cloreto e sódio. O sangue foi coletado também usando capilar de vidro para
determinação do hematócrito e finalmente um fragmento de músculo (~0,40 g) foi
dissecado para a determinação do conteúdo de água.
A osmolalidade do plasma foi determinada utilizando micro-osmômetro de
pressão de vapor Vapro 5520 (Wescor, USA); a concentração de cloreto foi
determinada por colorimetria utilizando kit comercial (Labtest, Brasil), lido por
absorbância em 470 nm; a concentração de sódio foi determinada através de
fotometria de chama em amostras diluídas 1:1000 (Fotômetro Micronal 462,
Brasil). O hematócrito foi determinado após centrifugação a 12000 rpm por 10 min
em centrífuga de hematócrito (Presvac, Argentina). Para a determinação do
conteúdo de água no músculo, amostras de músculo da região dorsal foram
pesadas em balança analítica e desidratadas a 100 °C por 24 horas. As amostras
foram pesadas novamente e o conteúdo total de água foi expresso em
percentagem de peso úmido.
Imunocitoquímica do NKCC
Para a detecção do NKCC por imunofluorescência, grupos de animais não
injetados foram do mesmo modo expostos por 6 horas ou 5 dias às salinidades
experimentais de 5‰ ou 35‰. Os peixes foram anestesiados como descrito
anteriormente, e o segundo arco branquial direito foi removido. Os filamentos
branquiais foram fixados em paraformaldeído 2% em PBS por 3 horas, em
seguida foram incubados em tampão fosfato (PBS) com sacarose 5% por 2 horas,
e incubados em PBS com sacarose 15% overnight a 4°C. Os filamentos foram
embebidos em OCT (crioprotetor Tissue – Tek), e imediatamente congelados em
nitrogênio líquido, sendo transferidos para freezer a -20°C. Os blocos foram
20
cortados em criostato CTD (IEC – International Equipment Company, EUA), e
cortes de 10-12 µm foram colocados em lâminas de vidro gelatinizadas para
adesão dos cortes. Os cortes foram lavados com PBS e PBS com glicina 0,1 M,
foram bloqueados em PBS com soro albumina bovina (BSA) 1%, e foram
incubados em câmara úmida a 4°C overnight, com anticorpo primário anti-NKCC
(T4, anti-cotransportador Na
+
,K
+
,2Cl
-
da cripta colônica humana, células T84),
obtido do Banco de Estudos de Desenvolvimento de Hibridoma, Departamento de
Ciências Biológicas, Universidade de Iowa, EUA. Este anticorpo foi produzido em
camundongo, e foi utilizado com diluição de 1:100 em PBS com BSA 0,1%. Após
a incubação, os cortes foram lavados com PBS, bloqueados por 15 min com BSA
1%, e então incubados por 1,5 horas, em câmara úmida no escuro a temperatura
ambiente, com anticorpo secundário anti-camundongo IgG produzido em cabra
conjugado com fluorocromo fluoresceína (FITC) (Pierce, EUA), diluído 1:100 em
PBS com BSA 0,1%. Os cortes foram lavados com PBS, rapidamente lavados
com água destilada e finalmente montados com fluormount e lamínula protegidos
da luz. As lâminas foram observadas e fotografadas em fotomicroscópio de
fluorescência Zeiss Axiophot.
Análise das Imagens
A intensidade da fluorescência nos filamentos branquiais de S. testudineus
foi qualitativamente avaliada através de fotomicrografias escaneadas obtidas com
a utilização de filme fotográfico colorido Asa 800. Para S. greeleyi as imagens dos
filamentos branquiais foram obtidas através de um sistema eletrônico de captura
de imagem (CCD monochromatic 1280 x 1024 pixels, 16 bits/pixel, Case Data
Manager, Applied Spectral Imaging) acoplado ao fotomicroscópio. As imagens
21
dos filamentos de ambas as espécies foram analisadas através do programa
Sigma Scan-Pro (Jandel Corporation). As imagens digitais foram convertidas em
escala de cinza, o contraste foi ajustado para melhorar o sinal e reduzir a
fluorescência de fundo. Para cada espécie e condição experimental
(salinidade/tempo), foram usados 5-7 animais independentes e 9-13 lamelas
secundárias dos cortes sagitais foram analisadas aleatoriamente.
Análise Estatística
A análise estatística dos dados foi realizada utilizando o programa
SigmaStat versão 2.03, com nível de significância de 0,05. ANOVA de duas vias,
foi realizada para osmolalidade, cloreto e sódio plasmáticos, hematócrito e
conteúdo de água no músculo. Duas ANOVAS foram realizadas separadamente
para cada espécie, uma para cada tempo de exposição (6 horas ou 5 dias). Os
dois fatores em cada ANOVA foram o fator “tratamento” (2 níveis: injetado com
furosemida ou injetado com salina), e “salinidade” (2 níveis: 5‰
e 35‰). O teste
post hoc utilizado foi o de Tukey para localizar as diferenças significativas. As
diferenças entre as salinidades 5‰ e 35‰, para os peixes injetados com
furosemida não foram indicadas por não terem significado. Teste t de Student não
pareado foi utilizado para determinar o efeito do tempo, comparando os dados de
6 horas e 5 dias, para cada espécie e tratamento.
22
3 RESULTADOS
Osmolalidade
A injeção de furosemida em S. testudineus exposto a 35‰ levou ao
aumento da osmolalidade do plasma após 6 horas (389±14,5 mOsm.kgH
2
O
-1
) e
após 5 dias (395±14,8 mOsm.kgH
2
O
-1
), quando comparados aos respectivos
controles injetados com salina (6 horas: 337±4,5 mOsm.kgH
2
O
-1
, 5 dias: 322±5,5
mOsm.kgH
2
O
-1
) (Fig. 1A). O único efeito do tempo (valor em 5 dias diferente do
valor em 6 horas) na osmolalidade do plasma de S. testudineus foi observado
para os peixes injetados com salina expostos a 35‰ por 5 dias, com valor inferior
ao dos peixes do grupo 6 horas (Fig. 1A). Basicamente o mesmo padrão foi
encontrado para a osmolalidade do plasma de S. greeleyi (Fig. 1B). A diferença
importante aqui foi que a injeção de furosemida afetou a osmolalidade do plasma
de S. greeleyi em 5‰, reduzindo seus valores (Fig. 1B), para ambos os tempos:
de 320±4,9 para 275±7,3 mOsm.kgH
2
O
-1
(6 horas), e de 329±14,4 para 289±3,5
mOsm.kgH
2
O
-1
(5 dias). A injeção de furosemida e elevou a osmolalidade
plasmática de S. greeleyi em 35‰ de 358±18,3 para 425±21,0 mOsm.kgH
2
O
-1
(6
horas), e de 361±10,5 para 414±10,4 mOsm.kgH
2
O
-1
(5 dias) (Fig. 1B).
23
0
50
100
150
200
250
300
350
400
450
6h 5d 6h 5d 6h 5d 6h 5d
S. greeleyi
§
§
§
§
SF
5‰
S
F
35‰
0
50
100
150
200
0
300
350
400
450
6h 5d 6h 5d 6h 5d 6h 5d
A
S. testudineus
#
§
§
Osmolaldade (mOsm.Kg.H
2
O )
25
-1
B
Figura 1. Osmolalidade do plasma (média ± erro padrão, mOsm.kg H
2
O
-
1
)
de S. testudineus (A, n: 6-8) e S. greeleyi (B, n: 6-8) expostos por 6 horas
(6h) ou 5 dias (5d) às salinidades 5‰ ou 35‰, e injetados com salina (S,
barras brancas) ou furosemida (F, barras pretas). § = efeito da injeção
(injeção de furosemida injeção de salina, mesma salinidade, mesma
espécie, mesmo tempo); # = efeito do tempo (5d 6h, mesma salinidade,
mesma injeção, mesma espécies) sempre com P<0,05.
24
Cloreto
As concentrações de cloreto plasmáticas de S. testudineus injetados com
furosemida e mantidos em 5‰, após 6 horas (118±4,8 mM) e após 5 dias
(117±7,5 mM), foram menores que os respectivos valores dos controles injetados
com salina mantidos em 5‰ por 6 horas (148±8,0 mM) ou 5 dias (146±5,2 mM)
(Fig. 2A). Os valores obtidos para S. greeleyi injetados com salina em 5‰ foram
menores que os valores dos injetados com salina em 35‰, para ambos os
tempos de exposição: 156±11,1 mM em 5‰ e 192±9,8 mM em 35‰ (6 horas),
152±8,0 mM em 5‰ e 178±10,0 mM em 35‰ (5 dias) (Fig. 2B). Adicionalmente, a
injeção de furosemida levou a redução dos valores de cloreto plasmático em S.
greeleyi após ambos os tempos (6 horas: 126±5,8 mM e 5 dias: 130±6,8 mM) em
5‰, em relação aos grupos injetados com salina, como observado para S.
testudineus (Fig. 2B).
25
0
50
100
150
200
6h 5d 6h 5d 6h 5d 6h 5d
§
§
B
S. greeleyi
SF
5‰
S
F
35‰
*
*
0
50
100
150
200
6h 5d 6h 5d 6h 5d 6h 5d
§§
A
S. testudineus
Cloreto (mM)
Figura 2. Cloreto do plasma (média ± erro padrão, mM) de S. testudineu
s
(A, n: 6-8) e S. greeleyi (B, n: 6-9) expostos por 6 horas (6h) ou 5 dias (5d)
às salinidades de 5‰ ou 35‰, e injetados com salina S, barras brancas) ou
furosemida (F, barras pretas). § = efeito da injeção (injeção de furosemida
injeção de salina, mesma salinidade, mesma espécie, mesmo tempo); * =
efeito da salinidade (5‰ 35‰, mesma injeção, mesma espécie, mesmo
tem
p
o
)
sem
p
re com P<0
,
05.
26
Sódio
As concentrações plasmáticas de sódio de S. testudineus injetados com
furosemida e mantidos em 35‰, após 5 dias (191±14,1 mM), foram maiores que
seus respectivos controles injetados com salina e mantidos em 35‰ também por
5 dias (150±2,7 mM). O único efeito do tempo no sódio plasmático de S.
testudineus foi verificado para os peixes injetados com salina e mantidos em
35‰, com valores de sódio plasmático após 5 dias menores que os de 6 horas
(Fig. 3A). A injeção de furosemida levou ao aumento dos valores de sódio em S.
greeleyi após 5 dias em 35‰ (219±8,3 mM), em relação aos 179±21,5 mM dos
peixes injetados com salina, como também observado para S. testudineus (Fig.
3B).
27
0
50
100
150
200
250
6h 5d 6h 5d 6h 5d 6h 5d
§
B
S. greeleyi
SF
5‰
S
F
35‰
0
50
100
150
200
250
6h 5d 6h 5d 6h 5d 6h 5d
A
S. testudineus
§
#
Sódio (mM)
Figura 3. Sódio do plasma (média ± erro padrão, mM) de S. testudineus (A,
n: 5-6) S. greeleyi (B, n: 3-5) expostos por 6 horas (6h) ou 5 dias (5d) às
salinidades 5‰ ou 35‰, e injetados com salina (S, barras brancas) ou
furosemida (F, barras pretas). Os símbolos indicam diferença significativa
como na legenda da Figura 1.
28
Hematócrito
A injeção de furosemida levou à uma redução dos valores do hematócrito
(Hct) em S. testudineus após 5 dias em ambas as salinidades 5‰ (24,7±1,4%) e
35‰ (18,7±1,8%), quando comparados a seus respectivos controles injetados
com salina (5‰: 31,7±0,8%, 35‰: 31,0±0,8%) (Fig. 4A). Os valores do Hct em S.
testudineus expostos por 5 dias foram diferentes dos valores após 6 horas de
exposição em 35‰, em ambos os grupos: injetados com salina (6 horas:
25,2±2,0%, 5 dias: 31,0±0,8%) e injetados com furosemida (6 horas: 26,3±2,3%, 5
dias: 18,7±1,8%). Com um resultado distinto, o Hct de S. greeleyi não foi afetado
pela injeção de furosemida ou pela exposição à salinidade após 6 horas ou 5 dias
de exposição (Fig. 4B).
29
0
5
10
15
20
25
30
35
6h 5d 6h 5d 6h 5d 6h 5d
S. greeleyi
B
S
F
35‰
SF
5‰
0
5
10
15
20
25
30
35
6h 5d 6h 5d 6h 5d 6h 5d
S. testudineus
A
§
#
§
#
Hematócrito (%)
Figura 4. Hematócrito (média ± erro padrão, %) de S. testudineus (A, n: 6-7)
e S. greeleyi (B, n: 6-7) expostos por 6 horas (6h) ou 5 dias (5d) às
salinidades 5‰ ou 35‰, e injetados com salina (S, barras brancas) ou
furosemida (F, barras pretas). Os símbolos indicam diferença significativa
como na legenda da Figura 1.
30
Conteúdo de Água no Músculo
S. testudineus injetados com furosemida em 5‰ tiveram elevação no
conteúdo de água no músculo (CAM) após 6 horas (88,8±2,4%) e 5 dias
(80,6±1,0%) quando comparados a seus respectivos controles injetados com
salina, após 6 horas (80,5±2,1%) e 5 dias (70,9±1,0%) (Fig. 5A). Após 5 dias em
35‰, a injeção de furosemida levou a redução do CAM (56.6±4.5%) comparado
ao seu respectivo controle injetado com salina (72.7±0.9%) (Fig. 5A). Finalmente,
ocorreu efeito do tempo de exposição sobre o CAM de S. testudineus. Após 5
dias os valores sempre foram menores do que após 6 horas (Fig. 5A). A injeção
de furosemida em S. greeleyi reduziu o CAM após 5 dias, em 5‰, de 87,9±2,0%
nos animais injetados com salina para 80,5±2,6% nos injetados com furosemida,
e em 35‰, de 88,3±1,0% nos injetados com salina para 83,1±1,3% nos injetados
com furosemida (Fig. 5B). O único efeito do tempo de exposição foi verificado
para S. greeleyi injetado com salina em 5‰, onde o CAM após 5 dias (87,9±2,0%)
foi maior que o CAM após 6 horas (82,3±1,5%).
31
0
10
20
30
40
50
60
70
80
90
100
6h 5d 6h 5d 6h 5d 6h 5d
S. testudineus
A
#
#
#
§
#
§
§
0
10
20
30
40
50
60
70
80
90
100
6h 5d 6h 5d 6h 5d 6h 5d
S. greeleyi
B
SF
5‰
S
F
35‰
#
§
§
Conteúdo de água no músculo (%)
Figura 5. Conteúdo de água no músculo (média ± erro padrão, %) de S.
testudineus (A, n: 6-8 e S. greeleyi (B, n: 6-8) expostos por 6 horas (6h) ou 5
dias (5d) às salinidades 5‰ ou 35‰, e injetados com salina (S, barras
brancas) ou furosemida (F, barras pretas). Os símbolos indicam diferença
significativa como na legenda da Figura 1.
32
Imunocitoquímica do NKCC
Todos os filamentos branquiais de S. testudineus e S. greeleyi expostos
por 6 horas ou 5 dias a 35‰ e 5‰ e observados sob microscópio de
fluorescência apresentaram sinal do co-transportador Na,K,2Cl (NKCC) em sua
região interlamelar, onde localizam-se as células ricas em mitocôndrias, e onde foi
produzido um sinal positivo para o anticorpo α5 anti-Na,K-ATPase (Iowa DSHB)
(ver resultados do Capítulo 2) (Fig. 6). As brânquias dos peixes analisadas em
cada grupo experimental foram sistematicamente examinadas, e não houve
evidência de drástica alteração no sinal do NKCC (Fig. 6).
33
Figura 6. Imunoflourescência do NKCC no epitélio branquial de S.
testudineus: A 5‰, 6 horas (6h); B 35‰, 6h; C 5‰, 5 dias (5d); D 35‰, 5d,
e de S. greeleyi: E 5‰, 6h; F 35‰, 6h; G 5‰, 5d; H 35‰, 5d. As setas
brancas indicam o sinal do NKCC nas células de cloreto ao longo da região
interlamelar na lamela primária (PL), entre a lamela secundária (SL). Barra
-
H): 50
µ
m
34
4 DISCUSSÃO E CONCLUSÕES
Ambas as espécies confirmaram as observações prévias de elevada
capacidade de osmorregulação de seu fluido extracelular: osmolalidade e sódio
plasmáticos não foram reduzidos nos exemplares de ambas as espécies injetados
com salina após exposição à água do mar diluída (Figs. 1 e 3), sendo que o
cloreto plasmático foi significativamente reduzido apenas em S. greeleyi (Fig. 2).
Além disso, a injeção de salina não afetou os peixes, com os resultados aqui
obtidos repetindo observações prévias para ambas as espécies não injetados em
laboratório (Prodocimo & Freire, 2001) e no ambiente natural (Prodocimo & Freire,
2004).
O procedimento experimental da injeção de furosemida nos peixes in vivo
foi relatado pela primeira vez neste estudo. Os resultados obtidos foram
consistentes com a inibição do NKCC em água do mar. Em 35‰, a injeção de
furosemida levou ao aumento da osmolalidade do plasma, indicando a redução na
secreção de sal, através da ação inibidora da furosemida no NKCC (NKCC1)
basolateral nas células de cloreto branquiais (p. ex. Wilson et al, 2000; Pelis et al.,
2001; Marshall, 2003). Curiosamente, o cloreto plasmático não aumentou com a
injeção de furosemida em 35‰ (Fig. 2), não acompanhando os valores da
osmolalidade (Fig. 1), enquanto o sódio plasmático elevou-se (Fig. 3). Esta
discrepância entre os efeitos da furosemida sobre o sódio e o cloreto pode ser
explicado. Com o NKCC1 basolateral inibido pela furosemida, menos K
+
entraria
na célula de cloreto através do NKCC, assim existiria a redução no potencial
eletroquímico intracelular do K
+
, conseqüente redução na força motriz para saída
de K
+
através dos canais basolaterais de K
+
. Este decréscimo na saída do K
+
35
poderia resultar em uma diminuição da voltagem transepitelial (serosa positiva),
assim diminuindo a força eletro-motriz para a secreção de Na
+
através da via
paracelular, entre as células de cloreto e as células acessórias. Por outro lado, o
cloreto poderia ter sua secreção inalterada pela furosemida devido a um aumento
compensatório da entrada de cloreto nas células de cloreto através do trocador de
ânion basolateral (Marshall & Bryson, 1998), como um resultado direto de um
gradiente químico favorável (embora não elétrico) para cloreto através da
membrana basolateral das células de cloreto criado pela inibição do NKCC (Halm
et al., 1985). É importante adicionar que o Na
+
pode não entrar nas células de
cloreto com o NKCC inibido, mas continua sendo bombeado para fora através da
Na
+
,K
+
-ATPase. Este aumento pontual na concentração de Na
+
no lado seroso do
epitélio não poderia significar aumento significativo na força eletro-motriz para o
efluxo de Na
+
, porque o componente químico do gradiente eletroquímico com a
água do mar é ainda desfavorável para a saída de Na
+
. A diminuição do
componente elétrico discutido acima poderia ser responsável pela redução na
saída de Na
+
, resultando em elevação da osmolalidade do plasma. Outro ânion,
ou mais que um ânion, poderiam ter aumentando para preservar a eletro-
neutralidade do plasma, mas nós não sabemos sua identidade, podendo ser
bicarbonato, sulfato, fosfato, ou um ânion orgânico.
Quando a furosemida foi injetada nos peixes mantidos em água do mar
diluída (5‰), ambas as espécies apresentaram redução nos níveis de cloreto
plasmático, mas não nos níveis de sódio, e osmolalidade foi reduzida apenas em
S. greeleyi, quando comparada aos estáveis controles injetados com salina (Figs.
1, 2, e 3). A primeira hipótese para explicar este resultado seria que o NKCC
poderia estar envolvido na absorção de sal na água do mar diluída. No entanto,
36
não há suporte para esta inversão na direção do transporte de sal quando peixes
marinhos/estuarinos estão hipo-regulando em água do mar diluída (Marshall,
2003; McCormick et al., 2003; Wood & Laurent, 2003). As evidências levam a
uma redução na secreção de sal branquial, entre outras alterações (Marshall et
al., 2002a; Marshall, 2003; McCormick et al., 2003; Scott et al., 2004). A tendência
geral para a diluição do plasma após a injeção de furosemida em 5‰ pode
conduzir a uma questão: O que o NKCC faz para auxiliar o peixe a se livrar da
entrada de água osmótica em excesso ou para conservar sal em água do mar
diluída? Nós podemos tentar responder raciocinando sobre as alterações que
ocorrem seguindo-se à exposição de peixes marinhos à água do mar diluída.
Após choque hipotônico, os 3 órgãos (brânquias, intestino e rim) que expressam o
NKCC e são responsáveis pela osmorregulação dos peixes, sofrem alterações
significativas. Nas brânquias ocorre um influxo osmótico de água, e dramática
redução na secreção de sal. Esta resposta rápida para a redução na secreção de
sal é devido ao inchamento das células de cloreto, com o conseqüente reflexo de
norepinefrina e sua ação através de receptores α2-adrenérgicos, resultando em
defosforilação inibitória do NKCC (Marshall, 2003), e inibição do CFTR pela
fosforilação por tirosina quinase (Marshall et al., 2000). Aliado a estas ações
regulatórias intracelulares nos transportadores de cloreto, existe um notável
controle morfológico através do fechamento dos anéis de actina localizados nas
criptas apicais, levando as células de cloreto à perda do contato com o meio
externo (Daborn et al., 2001). Após um tempo maior (1-2 dias) em água do mar
diluída, existe uma provável redistribuição do NKCC e do CFTR de suas
localizações na membrana ideais para secreção de sal, para uma localização
mais difusiva no citoplasma. Pelo menos este fenômeno foi observado em peixes
37
estuarinos aclimatados a água doce (Marshall & Singer, 2002; Marshall et al.,
2002a; McCormick et al., 2003). Alterações extra-branquiais envolvem imediata
redução na ingestão de água durante exposição a água do mar diluída (Potts &
Evans, 1967; revisado em Wood & Laurent, 2003), com concomitante redução na
absorção de sal e água pelo epitélio intestinal, o qual também expressa NKCC
basolateralmente e apicalmente (O´Grady et al., 1987; Marshall et al., 2002b).
Finalmente, a exposição a água do mar diluída leva a um aumento na taxa de
filtração, acompanhado da elevação na excreção de água (Fleming & Stanley,
1965; revisado em Wood & Laurent, 2003). NKCC foi demonstrado em rim de
teleósteo (Cutler & Cramb, 2002), e foi localizado na membrana apical do rim de
elasmobrânquios (Biemesderfer et al., 1996), trabalhando na reabsorção de sal
(revisado em Dantzler, 2003).
De acordo com este cenário, nós podemos especular que a furosemida
causa redução na osmolalidade e cloreto do plasma nos baiacus expostos a água
do mar diluída através de sua ação no NKCC renal. Nós estamos conscientes de
que esta hipótese deve ser considerada cautelosamente, já que a osmolalidade
do plasma de S. testudineus não foi reduzida (Fig. 1). Novamente, a resposta
diferente apresentada pelo cloreto e sódio plasmático não é totalmente
inesperada, tendo em vista a discussão prévia do efeito da furosemida em água
do mar. Furosemida é uma molécula pequena. Ela é filtrada e chega ao lúmen
tubular onde pode inibir a absorção transepitelial de NaCl mediado pelo NKCC
apical (Cutler & Cramb, 2002). Esta inibição levaria ao aumento da perda renal de
sal na urina, causando diluição do fluido extracelular, e/ou depleção de volume.
Tentando especular adicionalmente, o NKCC presente nas células mesangiais no
glomérulo (Hickman & Trump, 1969; Youson & Butler, 1988; Hentschel & Elger,
38
1989) poderia ser necessário para aumentar o ritmo de filtração glomerular devido
à necessidade de elevar a excreção de água em água do mar diluída. NKCC foi
mostrado nas células mesangiais extraglomerulares e nas células da mácula
densa, desempenhando papel na retroalimentação tubuloglomerular em rim de
mamíferos (revisado em Mount et al., 1998). Furosemida, inibindo o NKCC das
células mesangiais, poderia interromper o aumento no ritmo de filtração
glomerular, levando a retenção de água e diluição do fluido extracelular nos
peixes injetados com furosemida, contribuindo assim para o efeito na reabsorção
tubular de sal. De qualquer forma, a elucidação do papel do NKCC renal na
osmorregulação dos peixes é um assunto interessante para estudos futuros. O
efeito significativo no NKCC intestinal seria tão esperado devido a provável
redução drástica na ingestão de água. Finalmente, o NKCC branquial estaria
inibido, como descrito acima, mas mesmo se o NKCC branquial ainda estivesse
disponível e funcional na membrana basolateral em 5‰, sua inibição não poderia
contribuir para a diluição do plasma.
O NKCC aparentemente atua na regulação de volume celular dos baiacus,
evidenciado pelo efeito da furosemida no hematócrito e no conteúdo de água no
músculo em 35‰, com maior intensidade em S. testudineus. O efeito da
furosemida pode ser indireto, levando a redução no conteúdo de água no músculo
e no hematócrito porque a osmolalidade do plasma aumentou em conseqüência
da ação da furosemida no NKCC branquial em água do mar. No entanto, parece
haver um efeito direto sobre o NKCC da membrana celular, o qual atua no
aumento regulatório de volume (regulatory volume increase - RVI) (Russell, 2000).
Se o NKCC não atuasse no RVI, as células musculares não perderiam água nos
peixes em 35‰ injetados com furosemida. A furosemida afeta o conteúdo de
39
água nas células musculares levando a perda de água das células em 35‰ e
ganho de água em 5‰ em S. testudineus. O ganho de água nas células em 5‰
após injeção de furosemida é um indicativo da ação do NKCC na redução
regulatória de volume (regulatory volume decrease - RVD), como observado em
neurônios de Aplysia brasiliana (Scemes & Cassola, 1995). Alternativamente, a
furosemida pode inibir o co-transporte K-Cl (KCC), que normalmente atua no RVD
necessário quando há diluição do plasma (Mount et al., 1998; Russell, 2000).
Furosemida, bem como bumetanida, são inibidores fracos do KCC (Mount
et al., 1998; Russell, 2000), indicando que o NKCC provavelmente tem papel
principal na regulação de volume celular nos baiacus (Russell, 2000), mais
evidente em S. testudineus que em S. greeleyi. Estudos adicionais de regulação
de volume celular devem ser realizados para confirmar tal especulação. É
importante observar que os exemplares de S. greeleyi são menores que os
exemplares de S. testudineus, conseqüentemente a dose efetiva de furosemida
injetada foi maior em S. greeleyi. Apesar disso, a injeção de furosemida causou
efeitos mais freqüentes e evidentes no hematócrito e na água do músculo em S.
testudineus, evidenciando a idéia de que há uma maior presença/expressão de
NKCC nos seus tecidos que em S. greeleyi. Ambas as espécies apresentaram
capacidade de regulação do volume de água celular, e a salinidade não
apresentou efeito visível no hematócrito (Fig. 4) e no conteúdo de água no
músculo (Fig. 5) dos animais injetados com salina. Os valores de hematócrito
obtidos para S. testudineus e S. greeleyi foram similares aos valores prévios
reportados para teleósteos: ~25-30 % (Plaut, 1998; Claireaux & Audet, 2000;
Brown et al., 2001; Martinez-Álvarez et al., 2002).
40
A imunofluorescência realizada utilizando o anticorpo T4 detectou NKCC
na região interlamelar das brânquias de ambas as espécies, em ambas as
salinidades e tempos. A distribuição e o sinal do NKCC no epitélio branquial de
ambas as espécies é coerente com os resultados da injeção de furosemida in vivo
em 35‰, elevando a osmolalidade e o sódio do plasma como efeito da inibição do
NKCC branquial. O anticorpo T4 reconheceu uma banda proteica que se
apresentou arrastada mas, compatível em peso molecular como reportado para o
NKCC do salmão Salmo salar (~285 kDa, Pelis & McCormick, 2001; Pelis et al.,
2001) (Western blots, dados não mostrados). As bandas de baixo peso molecular
reconhecidas pelo anticorpo T4 observadas a 120 kDa (salmão, Pelis &
McCormick, 2001; Pelis et al., 2001) e a 160-170 kDa (salmão, Pelis &
McCormick, 2001; Pelis et al., 2001, e killifish, Scott et al., 2004) não apareceram
nos Western blots das brânquias de S. testudineus e S. greeleyi (dados não
mostrados).
Apesar da complexidade da interpretação do ensaio com injeção in vivo,
ficou claro que o alvo principal da furosemida em 35‰ foi o NKCC branquial,
órgão principal envolvido na hipo-regulação do plasma em água do mar. A
ausência de alterações drásticas na presença do NKCC nas células de cloreto
branquiais em água do mar diluída está de acordo com a literatura (Marshall et al.,
2002a, Marshall, 2003; McCormick et al., 2003, Scott et al., 2004). A resposta
rápida (até ~12 horas) à redução de salinidade, é razoável supor, não envolveria
um efeito significativo na degradação de proteínas e turnover ou síntese de novo,
porque seria muito dispendioso para a célula. Alterações na expressão de
proteínas deve ocorrer após exposição de longo prazo (i.e., 1- 30 dias, Scott et
al., 2004) à alterações de salinidade. Adicionalmente à redução na expressão,
41
pode haver redistribuição do NKCC no compartimento sub-celular, mas as
análises das imagens realizadas neste trabalho não permitiram inferir tal
redistribuição. Em conclusão, a diferença na tolerância à diluição da água do mar
por ambas as espécies de baiacus pode parcialmente ser explicada pela forte
sugestão de participação do NKCC na regulação do conteúdo de água celular em
S. testudineus.
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46
CAPÍTULO 2: A Na
+
,K
+
-ATPase E ATPase TOTAL DOS BAIACUS
ESTUARINOS (Sphoeroides testudineus E Sphoeroides greeleyi) NA
TRANSIÇÃO ENTRE HIPO- E HIPER-REGULAÇÃO DA OSMOLALIDADE DO
PLASMA
47
SUMÁRIO
RESUMO.............................................................................................................. ....48
ABSTRACT.......................................................................................................... ....49
1 INTRODUÇÃO.................................................................................................. ....50
2 MATERIAIS E MÉTODOS................................................................................ ....51
3 RESULTADOS ...................................................................................................... 58
4 DISCUSSÃO E CONCLUSÕES ...................................................................... ....66
5 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ......................................................................71
48
RESUMO
Os baiacus Sphoeroides testudineus e Sphoeroides greeleyi são espécies
estuarinas com eficiente capacidade osmorregulatória. Contudo, S. testudineus
tolera maior diluição da água do mar quando comparado a S. greeleyi. Este
estudo teve como objetivo avaliar se a exposição à água do mar diluída e água
com salinidade 35‰ alteram o sinal imunocitoquímico da presença da Na
+
,K
+
-
ATPase nas brânquias destes baiacus, além das reservas metabólicas (lipídicas)
e a atividade ATPásica total nos órgãos osmorregulatórios (brânquias e rins).
Após exposição dos peixes às salinidades 35‰ e 5‰ por 6 horas e 5 dias,
avaliou-se a presença da Na
+
,K
+
-ATPase branquial, o conteúdo de triglicerídios e
atividade ATPásica das brânquias e rins, a osmolalidade (Osm) e cloreto (Cl
-
)
plasmáticos, o hematócrito (Hct) e o conteúdo de água no músculo (CAM). A
Na
+
,K
+
-ATPase foi localizada na região interlamelar do epitélio branquial de
ambas as espécies em ambas as salinidades, em intensidade constante. A
atividade ATPásica total apresentou redução na salinidade 5‰ comparada a 35‰
apenas para o rim de S. greeleyi, e foi maior na brânquia de S. greeleyi do que
em S. testudineus após 6 horas. A concentração de triglicerídeos totais foi maior
em S. greeleyi do que em S. testudineus em todas as condições experimentais,
nas brânquias e rins. A Osm foi reduzida em ambas as espécies e o Cl
-
em S.
greeleyi após 6 horas e 5 dias na salinidade 5‰, quando comparado a 35‰. O
Hct de S. greeleyi aumentou após 5 dias em 5‰, e o CAM não foi alterado em
ambas as espécies, sendo sempre de aproximadamente 80%, em todas as
condições. Apesar de apresentarem diferença na tolerância a redução da
salinidade, ambas as espécies apresentaram mecanismos de regulação osmo-
iônica semelhantes, e mesmo padrão de resposta às salinidades 5‰ (durante a
hiper-regulação) e 35‰ (durante a hipo-regulação). Os resultados mostraram
tendência de redução nas concentrações plasmáticas em 5‰, porém com
estabilidade no Hct e CAM, indicando controle do conteúdo de água das células, a
despeito da ligeira diluição do plasma. A maior tolerância de S. testudineus à
água do mar diluída não foi portanto explicada claramente pela Na
+
,K
+
-ATPase.
Contudo, pode ser parcialmente explicada por diferenças metabólicas dos órgãos
osmorregulatórios entre as duas espécies.
49
ABSTRACT
The pufferfishes Sphoeroides testudineus and Sphoeroides greeleyi are
estuarine species and efficient osmoregulators. However, S. testudineus tolerates
seawater dilution much better than S. greeleyi. This study aimed at evaluating
whether this differential tolerance can be explained by the Na
+
,K
+
-ATPase. It was
here tested whether exposure to dilute seawater modifies the
immunocytochemical signal of the branchial Na
+
,K
+
-ATPase, besides the
metabolic reserves of lipids, and the total ATPase activity in their osmoregulatory
organs (gills and kidneys). The fishes were exposed to seawater of salinity 35‰
and diluted seawater of salinity 5‰, for 6 hours and 5 days. The following
parameters have been evaluated: the presence of branchial Na
+
,K
+
-ATPase, the
triglyceryde content and total ATPase activity in gills and kidneys, plasma
osmolality (Osm) and chloride (Cl
-
), hematocrit (Hct), and water content in muscle
(WCM). The Na
+
,K
+
-ATPase has been positively localized to the interlamellar
region of the branchial epithelium in both species and in both salinities, under
unaltered intensity. Total ATPase activity was reduced in 5‰ when compared to
35‰ only for the kidney of S. greeleyi. The activity was higher in the gills of S.
greeleyi than in those of S. testudineus, after 6 hours in both salinities. Total
triglyceryde content was higher in S. greeleyi than in S. testudineus in all
experimental conditions, in both organs. Upon exposure to dilute seawater, Osm
was reduced in both species, and Cl
-
was reduced in S. greeleyi. The Hct of S.
greeleyi has increased after 5 days in 5‰, but the WCM was not modified in both
species, being always of approximately 80%. Both species thus displayed a similar
osmoregulatory pattern when exposed to dilute seawater. There was a trend of
reduction in plasma concentrations, but stability in Hct and CAM, indicating water
content control by the cells, despite a slight plasma dilution. The higher tolerance
of S. testudineus to dilute estuarine waters was thus not clearly explained by the
Na
+
,K
+
-ATPase. However, it can be at least partially explained by metabolic
differences in the osmoregulatory organs.
50
1 INTRODUÇÃO
Os teleósteos marinhos são hipo-osmóticos à água do mar, e órgãos
osmorregulatórios como o rim e as brânquias atuam na manutenção da
homeostase do plasma secretando o excesso de sais ingeridos e absorvidos pelo
trato digestivo (hipo-regulação) (Evans, 1993; Jobling, 1995). As células de cloreto
do epitélio branquial são as principais responsáveis pela secreção e absorção de
sal (NaCl). Estas células caracterizam-se por apresentar mitocôndrias envoltas
por um sistema tubular de membranas rico em proteínas transportadoras de íons
(Philpott, 1980; Jobling, 1995; Perry et al., 1996; Perry, 1997). O rim dos
teleósteos marinhos é responsável pela secreção íons multivalentes (Mg
+2
e SO
4
2-
) e substâncias orgânicas, muitas vezes através da exocitose de vesículas
(Beyenbach & Baustian, 1989; Beyenbach et al., 1993; Hentschel & Zierold, 1994;
Freire et al., 1996), e reabsorção do cloreto de sódio (Hentschel & Elger, 1989;
Hentschel et al., 1993; Beyenbach, 1995).
Dentre os transportadores que atuam na regulação osmo-iônica dos
teleósteos destacam-se as ATPases, grupo de enzimas que utilizam ATP como
substrato energético e são responsáveis pelo transporte de íons fundamentais
para o organismo dos animais (Stahl & Baskin, 1990). Por utilizarem ATP e com
isso gastarem energia, a determinação da atividade ATPásica total pode
representar parcialmente o estado metabólico dos animais quando estes são
submetidos a estresse osmótico. O teleósteo marinho eurihalino Dicentrarchus
labrax submetido à redução de salinidade até chegar a água doce em um período
total de 7 dias teve sua atividade ATPásica total nas brânquias e no rim reduzidas
(Venturini et al., 1992).
51
Dentro do grupo das ATPases destaca-se a enzima Na
+
,K
+
-ATPase,
localizada na membrana basolateral das células branquiais, e que atua na
regulação osmótica e iônica do plasma tanto na secreção de sal na hipo-
regulação em água do mar, quanto na absorção de sal na hiper-regulação em
água do mar muito diluída ou em água doce (Evans, 1993; Jobling, 1995).
Anticorpos monoclonais específicos contra a sub-unidade α da Na
+
,K
+
-ATPase
localizaram esta enzima na base da lamela secundária e em células localizadas
entre a lamela primária e secundária (células lamelares e pavimentosas) e nas
membranas basolaterais de células de cloreto associadas ao sistema tubular, em
diversos teleósteos: Chanos chanos, Fundulus heteroclitus, Oncorhynchus
mykiss, Oreochromis mossambicus, Stenogobius hawaiiensis e Tetraodon
nigroviridis (Witters et al., 1996; Goss et al., 1998; Marshall & Bryson; 1998;
Randall & Brauner, 1998; Choe et al., 1999; Wilson et al., 2000a,b; Pelis et al,
2001; Pelis & McCormick, 2001; Katoh et al., 2003; Lin et al., 2003; McCormick et
al., 2003; Lin et al., 2004).
O papel da Na
+
,K
+
-ATPase da membrana basolateral na secreção de sal
nas células branquiais de teleósteos é fundamental. Envolve a remoção de sódio
das células de cloreto produzindo e sustentando um gradiente entre o meio intra-
e extra-celular, favorecendo a entrada passiva de sódio na célula (Philpott, 1980;
Jobling, 1995; McCormick, 1995). Além da Na
+
,K
+
-ATPase, outras ATPases como
a H
+
-ATPase, Ca
+2
-ATPase e Mg
+2
-ATPase estão presentes nos epitélios de
transporte dos teleósteos e atuam em conjunto para a manutenção da
homeostase, sendo em grande parte responsáveis pelo metabolismo branquial e
dos órgãos osmorregulatórios (Doneen, 1993; Flik et al., 1993; Bijvelds et al.,
1995; Sullivan et al., 1995; Perry, 1997; Goss et al., 1998; Marshall & Bryson,
52
1998; Randall & Brauner, 1998; Van Der Heijden et al., 1999; Wilson et al., 2000b;
Marshall, 2002).
O baiacu Sphoeroides testudineus Linnaeus, 1758 habita baías e estuários
da costa brasileira em locais com salinidade variando de 0 ‰ a 34 ‰ (Figueiredo
& Menezes, 2000). Sphoeroides greeleyi Gilbert, 1900 é comum no litoral
brasileiro, também habita baías e estuários de águas pouco profundas, mas é
restrito a áreas de salinidade elevada (~30‰) (Figueiredo & Menezes, 2000;
Vendel et al., 2002). Ambas as espécies são eurihalinas, apresentando
capacidade semelhante de regular a osmolalidade e os íons plasmáticos em água
do mar (Prodocimo & Freire, 2001; 2004).
O objetivo deste trabalho foi o de avaliar o efeito da redução de salinidade
sobre a presença da Na
+
,K
+
,-ATPase no epitélio branquial de S. testudineus e S.
greeleyi. A hipótese testada neste estudo incluiu alterações na presença da
Na
+
,K
+
-ATPase da membrana basolateral do epitélio branquial dos baiacus diante
da necessidade de secretar e absorver quando os animais estuarinos são
submetidos à redução de salinidade durante o ciclo de maré. A concentração de
triglicerídeos na brânquia e no rim foi quantificada para avaliação da relação entre
as reservas metabólicas (lipídicas) e o metabolismo tecidual (atividade ATPásica
total) diante à redução e elevação de salinidade.
53
2 MATERIAIS E MÉTODOS
Animais
Exemplares adultos de S. testudineus (15±1 cm de comprimento, 40±1 g
de peso) e de S. greeleyi (10±1 cm, 20±1 g) foram coletados na Gamboa do Rio
Baguaçu (25° 33’ 6,33’’S, 48°23’ 41,63’’W), na margem sul da Baía de
Paranaguá, Paraná, Brasil. As coletas foram realizadas durante a maré enchente
com a instalação de uma rede de espera tipo fyke.
No momento da coleta a salinidade da água foi verificada com salinômetro
(refratômetro Shibuya S-28, Japão). Os animais foram colocados em galão
plástico, com aeração constante e transportados para o Laboratório de Fisiologia
Comparativa da Osmorregulação da Universidade Federal do Paraná em Curitiba,
Paraná. Os animais foram imediatamente colocados em aquário estoque com
capacidade de 250 litros abastecido com água do mar do local de coleta com
salinidade ajustada para 30‰, temperatura de 20±1°C, e constante aeração. Os
peixes foram alimentados diariamente com crustáceos e oligoquetas durante todo
o período de manutenção no laboratório e também durante os experimentos de
exposição por 5 dias.
Experimentos
Após 7 dias de aclimatação às condições laboratoriais, os espécimes de S.
testudineus e S. greeleyi foram expostos por 6 horas e por 5 dias às salinidades
de 5‰ e de 35‰ em aquários com capacidade de 30 litros, com aeração
constante e temperatura de aproximadamente 20°C, e um número máximo de 3
animais por aquário. A água do mar foi diluída com água filtrada overnight de 30‰
54
para ~10 - 12‰ ao longo de 4 horas (com fluxo de 0,7 ml/seg) para evitar choque
osmótico nos peixes expostos a 5‰. Os peixes permaneceram por 10 - 12 horas
em 10 - 12‰, e foram transferidos para 5‰.
Após o período de exposição de 6 horas e de 5 dias às salinidades
experimentais de 5‰ e de 35‰, os exemplares de S. testudineus e S. greeleyi
foram anestesiados com benzocaína 80 mg/L dissolvida em etanol na água do
aquário de aclimatação. Após 2 min, os peixes encontravam-se totalmente
anestesiados, não respondendo a estímulos de tato e permaneceram deitados
lateralmente no fundo do recipiente. Retirou-se assim o segundo arco branquial
do lado direito para imunofluorescência; os arcos branquiais restantes direito e
esquerdo e o rim anterior e posterior foram removidos para determinação da
atividade ATPásica total e dos triglicerídeos totais. Uma amostra de sangue foi
obtida por punção cardíaca para determinação da osmolalidade e cloreto
plasmáticos, e hematócrito. Finalmente uma amostra de músculo (0,40 g) foi
retirada para determinação do conteúdo de água.
As brânquias foram utilizadas para detecção da enzima Na
+
,K
+
-ATPase
por serem os principais órgãos responsáveis pela secreção/absorção de íons dos
teleósteos durante mecanismos de hipo- e hiper-regulação do plasma.
Ensaios
Imunofluorescência
Os filamentos branquiais foram fixados em paraformaldeído 2% em PBS
por 3 horas, em seguida foram encubados em tampão fosfato (PBS) com
sacarose 5% por 2 horas, e incubados em PBS com sacarose 15% overnight a
4°C. Os filamentos foram embebidos em crioprotetor OCT (Tissue – Tek), e
55
imediatamente congelados em nitrogênio líquido, sendo transferidos para freezer
a -20 °C. Os blocos foram cortados em criostato CTD (IEC – International
Equipment Company, USA), e cortes de 10-12 µm foram colocados em lâminas
de vidro gelatinizadas para adesão. Os cortes foram lavados com PBS e PBS
com glicina 0,1 M, bloqueados em PBS com BSA 1%, e foram incubados em
câmara úmida a 4 °C overnight, com anticorpo primário α5 (anti-Na
+
,K
+
-ATPase,
de frango, obtido do Banco de Estudos de Desenvolvimento de Hibridoma,
Departamento de Ciências Biológicas, Universidade de Iowa, EUA), produzido em
camundongo, diluído 1:100 em PBS + BSA 0,1%. Após a incubação, os cortes
foram lavados com PBS, bloqueados por 15 min com BSA 1%, e então incubados
com anticorpo secundário anti-mouse IgG produzido em cabra, conjugados com
fluorocromo fluoresceína (FITC) (Pierce, EUA) diluído 1:100 em PBS com BSA
0,1% por 1,5 horas, em câmara úmida no escuro, à temperatura ambiente. Os
cortes foram lavados com PBS, rapidamente lavados com água destilada e
finalmente montados com fluormount e lamínula, protegidos da luz. As lâminas
foram observadas e fotografadas em fotomicroscópio de fluorescência Zeiss
Axiophot.
Análise das Imagens
A intensidade da fluorescência nos filamentos branquiais de S. testudineus
e S. greeleyi foram obtidas através de um sistema eletrônico de captura de
imagem (CCD monochromatic 1280 x 1024 pixels, 16 bits/pixel, Case Data
Manager, Applied Spectral Imaging) acoplado ao fotomicroscópio. As imagens
dos filamentos de ambas as espécies foram analisadas através do programa
Sigma Scan-Pro (Jandel Corporation). As imagens digitais foram convertidas em
56
escala de cinza, o contraste foi ajustado para melhorar o sinal e reduzir a
fluorescência de fundo. Para cada espécie e condição experimental
(salinidade/tempo), foram usados 5-6 animais independentes e 9-13 lamelas
secundárias dos cortes sagitais foram analisadas aleatoriamente.
Atividade ATPásica total e Triglicerídeos Teciduais
As brânquias e rins foram homogeneizados em tampão imidazol 10 mM pH
7,5 em homogenizador Potter-S em gelo, seguida de centrifugação a 1000xg por
10 min. O sobrenadante foi incubado com detergente deoxicolato de sódio (0,1
mM por 20 min em gelo), para a quebra dos fragmentos de membrana que
viessem a formar vesículas, permitindo que o substrato Tris-ATP (3 mM) pudesse
se ligar a todos os sítios de ATP, também em eventuais vesículas formadas com
o lado citoplasmático para o interior (right-side-out). A atividade enzimática foi
detectada através do fosfato inorgânico liberado durante a reação da enzima com
o substrato, a 20°C, durante 30 minutos. O fosfato liberado foi revelado através de
reagente contendo ácido ascórbico 20%, molibdato de amônio 0,84% em H
2
SO
4
2
N, utilizando-se como padrão uma solução de fosfato de sódio dibásico
(NaH
2
PO
4
) 10 mM. A determinação da absorbância proporcional à concentração
de fosfato inorgânico foi realizada em espectrofotômetro (Ultrospec 2100 Pro,
Amersham Biosciences, EUA), com comprimento de onda de 830 nm (Fiske &
Subbarow, 1925). O valor da atividade ATPásica total foi dividido pela
concentração de proteínas totais da mesma amostra, obtendo-se o resultando em
µmol.mgProteína
-1
.h
-1
. A concentração de proteínas totais dos homogeneizados
foi determinada através do método do biureto utilizando Kit comercial (Labtest,
Brasil), com leitura em espectrofotômetro. Para a determinação dos triglicerídeos
57
totais dos homogenizados também foi utilizado Kit comercial (Labtest, Brasil), em
com leitura em espectrofotômetro.
Dosagens Plasmáticas, Hematócrito e Conteúdo de água
As amostras de sangue foram coletadas por punção cardíaca com seringa
heparinizada, foram centrifugadas por 10 min (2.100xg) para a retirada do plasma,
que foi imediatamente congelado a –20°C até o momento das dosagens. A
osmolalidade do plasma foi determinada utilizando o micro-osmômetro de pressão
de vapor Vapro 5520 (Wescor, EUA). A concentração de cloreto foi determinada
utilizando kit comercial (Labtest, Brasil), em espectrofotômetro (470 nm). O
hematócrito foi determinado após centrifugação a 12.000 rpm por 10 min, em
centrífuga de hematócrito (Presvac, Argentina). Para a determinação do conteúdo
de água no músculo, amostras foram pesadas em balança analítica e
desidratadas em estufa a 100°C por 24 horas. As amostras foram pesadas
novamente e o conteúdo total de água foi expresso em percentagem do peso
úmido.
Análise Estatística
A análise estatística dos dados foi realizada usando o programa estatístico
SigmaStat, com nível de significância de 0,05. Foi realizada ANOVA de duas vias
para identificar o efeito do tempo (2 níveis: 6 horas e 5 dias) ou da salinidade (2
níveis: 5‰ e 35‰) nas duas espécies separadamente para todos os dados:
intensidade da fluorescência, atividade ATPásica total; triglicerídeos totais,
osmolalidade e cloreto plasmáticos, hematócrito e conteúdo de água no músculo.
O teste post hoc de Tukey foi utilizado para localizar diferenças significativas entre
58
os grupos. Teste T de Student não pareado foi utilizado para comparar os grupos
de S. testudineus e S. greeleyi submetidos ao mesmo tratamento.
3 RESULTADOS
Imunofluorescência da Na
+
,K
+
-ATPase
As brânquias de S. testudineus e S. greeleyi expostos por 6 horas e 5 dias
às salinidades 5‰ e 35‰ observadas ao microscópio de fluorescência
apresentaram a enzima Na
+
,K
+
-ATPase localizada na região interlamelar dos
filamentos branquiais onde estão as células de cloreto responsáveis pelo
transporte de sal (Fig. 1). O único efeito detectado sobre a intensidade da
fluorescência foi sua redução em S. greeleyi (Fig. 2B) expostos por 5 dias a 35‰
(40,4±2,1) quando comparada aos baiacus da mesma espécie expostos por 6
horas a 35‰ (46,5±2,0) (P=0,036). Ambas as espécies apresentaram intensidade
da fluorescência para Na
+
,K
+
-ATPase muito próximas, não apresentando
diferença significativa entre si (Fig. 2A,B).
59
5‰ 35‰
S. greeleyi
6h
6h
5d
5d
S. testudineus
C
G
F
H
PL
SL
PL
SL
E
SL
PL
D
SL
B
SL
PL
A
SL
PL
5‰ 35‰
S. greeleyi
6h
6h
5d
5d
S. testudineus
C
G
F
H
PL
SL
PL
SL
E
SL
PL
D
SL
B
SL
PL
A
SL
PL
S. greeleyiS. greeleyi
6h
6h
5d
5d
S. testudineusS. testudineus
CC
GG
FF
H
PL
SL
H
PL
SL
PL
SL
E
PL
SL
E
SL
PL
D
SL
D
SL
B
SL
PL
B
SL
PL
A
SL
PL
Figura 1: Imunofluorescência da Na
+
,K
+
-ATPase do epitélio branquial de S.
testudineus, A: 5 ‰, 6 horas (6h); B: 35 ‰, 6h; C: 5 ‰, 5 dias (5d); D: 35 ‰, 5d; e
S. greeleyi, E: 5 ‰, 6h; F: 35 ‰, 6h; G: 5 ‰, 5d; H: 35 ‰, 5d. As setas indicam a
reação positiva para Na
+
,K
+
-ATPase nas células de cloreto na região inter-lamelar,
entre a lamela primária (PL) e as lamelas secundárias (SL). A barra de escala em
A
é válida para todas as figuras de A-H: 50 µm.
60
A
S. testudineus
0
20
40
60
5‰ 35‰ 5‰ 35‰
6h 5d
Atividade ATPásica Total
A atividade ATPásica total da brânquia de S. testudineus e S. greeleyi
(Fig. 3A,C) não foi alterada por nenhum dos tratamentos. O rim de S. testudineus
expostos a 35‰ por 5 dias (2,17±0,18 µmolPi.mgProteína.h
-1
) aumentou a
atividade ATPásica total quando comparado ao rim dos animais expostos a 35‰
por 6 horas (1,39±0,24 µmolPi.mgProteína.h
-1
) (P=0,009) (Fig. 3B). O rim de S.
greeleyi reduziu a atividade ATPásica total nos animais após 6 h em 5‰
(1,35±0,15 µmolPi.mgProteína.h
-1
) quando comparado aos animais em 35‰
(2,15±0,32 µmolPi.mgProteína.h
-1
) (P=0,013) (Fig. 3D); aumentou em 5‰, 5 dias
(1,98±0,20 µmolPi.mgProteína.h
-1
) quando comparada a 5‰, 6 horas (1,35±0,15
µmolPi.mgProteína.h
-1
) (P= 0,039); e reduziu em 35‰ 5 dias (1,13± 0,11
µmolPi.mgProteína.h
-1
) quando comparada a 35‰, 6 horas (2,15±0,32
Figura 2: Intensidade da fluorescência (unidade arbitrária) para Na
+
,K
+
-
ATPase branquial de S. testudineus (n=5) (A) e S. greeleyi (n=5) (B), após 6
horas (6h) e 5 dias (5d); # efeito do tempo (6 horas 5 dias na mesma
salinidade e mesma espécie). P<0,05.
B
S. greeleyi
0
20
40
60
5‰ 35‰ 5‰ 35‰
#
6h
5d
ciaescênen ad a or flue dsidInt
61
µmolPi.mgProteína.h
-1
) (P= 0,020). A atividade ATPásica total da brânquia foi
maior em S. greeleyi do que em S. testudineus após 6 horas em 5‰ (S. greeleyi,
1,71±0,17 µmolPi.mgProteína.h
-1
e S. testudineus, 1,17± 0,10
µmolPi.mgProteína.h
-1
) (P= 0,016), e após 6 horas em 35‰ (S. greeleyi 1,76±0,10
µmolPi.mgProteína/h-1 e S. testudineus 1,25±0,04 µmolPi.mgProteína.h
-1
)
(P=0,0005). O rim teve menor atividade ATPásica total em S. greeleyi (1,43±0,11
µmolPi.mgProt.h
-1
) comparado a S. testudineus (2,17±0,18 µmolPi.mgProteína.h
-
1
) em 35‰ após 5 dias (P=0,003).
A
S. testudineus
(Brânquias)
0
1
2
3
B
S. testudineus
(Rim)
0
1
2
3
#
D
S. greeleyi
(Rim)
0
1
2
3
5‰ 35‰ 5‰ 35‰
6h
5d
&
#
#
*
C
S. greeleyi
(Brânquias)
0
1
2
3
5‰ 35‰ 5‰ 35‰
&&
5d
6h
Atividade ATPásica total
(umolPi.mgProteína/h-1)
Atividade ATPásica Total
(
µ
molPi.m
g
Proteína. h
-1
)
Figura 3: Atividade ATPásica total das brânquias (A) e rim (B) de S. testudineus (n:
6-8) e brânquia (C) e rim (D) de S. greeleyi (n: 6-12) em 6 horas (6h) ou 5 dias (5d)
em água de salinidade 5‰ ou 35‰. * efeito da salinidade (5‰ 35‰ no mesmo
tempo e mesma espécie); # efeito do tempo (6 horas 5 dias na mesma salinidade
e mesma espécie); & efeito da espécie (S. testudineus S. greeleyi na mesma
salinidade e mesmo tempo). P<0,05.
62
Triglicerídeos Totais
A concentração de triglicerídeos totais da brânquia de S. testudineus (Fig.
4A) foi aumentada em 5‰ após 5 dias (0,106±0.01 mg.Triglicerídeo/mg.Proteína)
quando comparada a concentração em 5‰ após 6 horas (0,082±0.004
mg.Triglicerídeo/mg.Proteína) (P=0,014). A concentração de triglicerídeos totais
dos rins de S. testudineus (Fig. 4B), da brânquia (Fig. 4C) e rins (Fig. 4D) de S.
greeleyi não sofreu alterações com os tratamentos. S. greeleyi teve maior
conteúdo de triglicerídeos totais nas brânquias e no rim em todas as condições
experimentais quando comparado a S. testudineus. Nas brânquias de S.
testudineus, a concentração de triglicerídeos variou de 0,081 a 0,106
mg.Triglicerídeo/mg.Proteína e de S. greeleyi de 0,147 a 0,174
mg.Triglicerídeo/mg.Proteína (P=0,003). No rim, os triglicerídeos totais variaram
de 0,065 a 0,081 mg.Triglicerídeo/mg.Proteína para S. testudineus e de 0,119 a
0,137 mg.Triglicerídeo/mg.Proteína para S. greeleyi.
63
C
S. greeleyi
(Brânquias)
0
0,05
0,1
0,15
0,2
5‰ 35‰ 5‰ 35‰
&
&
&
&
6h 5d
A
S. testudineus
(Brânquias)
0
0,05
0,1
0,15
0,2
#
B
S. testudineus
(Rim)
0
0,05
0,1
0,15
0,2
D
S. greeleyi
(Rim)
0
0,05
0,1
0,15
0,2
5‰ 35‰ 5‰ 35‰
&
&
5d6h
&
&
Triglicerídeos totais
(
m
g
.dL/dLProtna
)
Triglicerídeos Totais
(mg.Triglicerídeo/mg.Proteína)
Figura 4: Triglicerídeos totais das brânquias (A) e rim (B) de S. testudineu
s
(n=6) e brânquia (C) e rim (D) de S. greeleyi (n: 5-9), após 6 horas (6h) ou 5
dias (5d) em água de salinidade 5‰ ou 35‰; # efeito do tempo (6 horas 5
dias na mesma salinidade e mesma espécie); & efeito da espécie (S.
testudineus S. greeleyi na mesma salinidade e mesmo tempo), P<0,05.
Osmolalidade
A osmolalidade do plasma de S. testudineus exposto a 5‰ por 6 horas e 5
dias foi reduzida quando comparado aos animais expostos a 35‰ por 6 horas
(P<0,001) e 5 dias (P=0,012) (Tab. 1). S. greeleyi apresentou mesma resposta na
osmolalidade do plasma observada para S. testudinues, com redução dos valores
em 5‰ 6 horas e 5 dias quando comparados a 35‰ (P<0,001 para ambos os
tempos), porém a osmolalidade de S. greeleyi foi maior que a osmolalidade de S.
testudinues após 5 dias em 35‰ (P=0,006) (Tab. 1).
64
Cloreto
A concentração de cloreto plasmático de S. testudineus não sofreu
alteração frente a redução de salinidade nos tempos de exposição de 6 horas e 5
dias. A salinidade de 5‰ causou redução no cloreto plasmático de S. greeleyi em
6 horas e 5 dias quando comparado a salinidade de 35‰ (6 horas P=0,029; 5 dias
P<0,001) (Tab. 1).
Hematócrito
A salinidade e o tempo de exposição não afetaram o hematócrito de S.
testudineus (Tab. 1). A exposição à salinidade de 5‰ causou aumento no
hematócrito de S. greeleyi quando comparado ao seu hematócrito em 35‰, após
5 dias (P=0,046) (Tab. 1). O único efeito do tempo (valor em 5 dias diferente do
valor em 6 horas) no hematócrito de S. greeleyi foi observado para os peixes
expostos a 5‰ por 5 dias, apresentado valor maior que para os peixes em 6
horas (P=0,036) (Tab. 1). S. greeleyi apresentou valores de hematócrito
superiores aos de S. testudineus após 5 dias nas salinidades de 5‰ (P=0,0001) e
35‰ (P=0,032) (Tab. 1).
Conteúdo de Água no Músculo
O conteúdo de água no músculo de S. testudineus e S. greeleyi não foi
afetado por nenhum tratamento, sendo estável em aproximadamente 80% (Tab.
1).
65
Tabela 1: Osmolalidade e cloreto plasmáticos, hematócrito, conteúdo de água no
músculo de S. testudineus e S. greeleyi expostos por 6 horas e 5 dias às
salinidades de 5‰ e 35‰.
Salinidade/
Tempo
S. testudineus S. greeleyi
Osmolalidade
(mOsm.kgH
2
O
-1
)
5/6h
308.54±2.37 (n=11)* 304.55±7.13 (n=11)*
35/6h
343.00±9.43 (n=11) 341.73±3.96 (n=11)
5/5d
305.58±5.83 (n=12)* 299.0±9.03 (n=11)*
35/5d
327.08±4.15 (n=13) 347.50±5.49 (n=10)&
Cloreto (mM)
5/6h
144.31±2.53 (n=11) 148.94±5.12 (n=11)*
35/6h
155.23±2.90 (n=11) 161.59±2.36 (n=11)
5/5d
145.45±11.39 (n=8) 141.00±4.23 (n=11)*
35/5d
154.03±5.54 (n=13) 166.74±3.64 (n=10)
Hematócrito (%)
5/6h
27.89±1.09 (n=9) 30.55±1.19 (n=11)
35/6h
25.73±1.10 (n=11) 27.36±1.16 (n=11)
5/5d
25.54±0.77 (n=13) 34.64±2.02(n=11) * # &
35/5d
25.85±.0.80 (n=13) 30.11±1.92 (n=9)&
Conteúdo de água no
músculo (%)
5/6h
80.72±2.02 (n=6) 81.03±0.31 (n=11)
35/6h
82.72±0.89 (n=6) 81.28±0.76 (n=11)
5/5d
79.48±0.68 (n=6) 80.69±0.59 (n=10)
35/5d
80.10±0.35 (n=7) 79.85±0.85 (n=10)
* efeito da salinidade (5‰ 35‰ no mesmo tempo e mesma espécie), # efeito do
tempo (6 horas 5 dias na mesma salinidade e mesma espécie), & efeito da
espécie (S. testudineus S. greeleyi na mesma salinidade e mesmo tempo) com
P<0.05.
66
4 DISCUSSÃO E CONCLUSÕES
A presença da Na
+
,K
+
-ATPase verificada através da utilização do anticorpo α5
nas células de cloreto branquiais de S. testudineus e S. greeleyi está de acordo
com os resultados obtidos anteriormente para outros teleósteos (Witters et al.,
1996; Choe et al., 1999; Wilson et al., 2000a,b; Pelis et al., 2001; Pelis &
McCormick, 2001; Lin et al., 2003; McCormick et al., 2003; Lin et al., 2004). O
sinal da imunofluorescência não foi modificado com a redução da salinidade de
35‰ para 5‰ após 6 horas e 5 dias de exposição. Este resultado favorece a
interpretação de que esta enzima atua tanto nos processos de hipo-regulação em
água do mar (35‰), gerando gradiente eletroquímico para secreção de sal
através do co-transportador Na
+
,K
+
,2Cl
-
, quanto na hiper-regulação em água do
mar diluída (5‰), gerando gradiente eletroquímico para absorção de sal através
da enzima H
+
-ATPase (Evans, 1993; Jobling, 1995; McCormick, 1995; Marshall &
Bryson, 1998; Hirose et al., 2003; Kirschner, 2004). A redução na intensidade da
fluorescência de S. greeleyi em 35‰ após 5 dias pode indicar que após 5 dias de
exposição o organismo está totalmente adaptado a água do mar, levando a
redução da síntese e/ou degradação das moléculas da Na
+
,K
+
-ATPase das
células de cloreto, apesar deste ser um processo com alto custo energético para o
animal.
Por atuar tanto no sentido de secreção como no de absorção de sal nas
células de cloreto (Evans, 1993; Jobling, 1995), a Na
+
,K
+
-ATPase responde de
forma diferente à exposição a água do mar ou a água do mar diluída/água doce
em diferentes espécies de teleósteos eurihalinos estudados. Por exemplo,
Western blot da brânquia de juvenis da espécie marinha Chanos chanos mostrou
67
elevação da sub-unidade α da Na
+
,K
+
-ATPase em água doce quando comparada
à salinidade de 35‰ após 15 dias de exposição (Lin et al, 2003); o gobídeo
Stenogobius hawaiiensis, de forma semelhante, teve a intensidade da
fluorescência da Na
+
,K
+
-ATPase aumentada nas células de cloreto em água doce
após 10 dias (McCormick et al., 2003). Outras espécies apresentaram resultado
oposto, o baiacu dulcícola-estuarino Tetraodon nigroviridis e o salmão do atlântico
(anádromo) Salmo salar apresentaram elevação na abundância da sub-unidade α
da Na
+
,K
+
-ATPase branquial no epitélio branquial após 15 dias em água do mar
quando comparada a água doce ou água do mar diluída (Pelis et al., 2001; Lin et
al., 2004). As espécies de baiacus S. testudineus e S. greeleyi por sua vez não
apresentaram variação na Na
+
,K
+
-ATPase branquial frente à elevação e redução
da salinidade, mantendo constante a abundância da enzima para secretar e
absorver sal.
A elevação da atividade ATPásica renal de S. testudineus em 35‰ após 5
dias comparado à 6 horas ocorreu possivelmente pela necessidade de aumentar
a reabsorção de íons monovalentes (Na
+
, K
+
, Cl
-
) e secreção de íons divalentes
(Mg
2+
, SO
4
2-
) no rim durante a hipo-regulação a longo prazo e assim auxiliar na
manutenção da composição dos íons extra-celulares (Jobling, 1995; Dantzler,
2003). A redução da atividade ATPásica renal de S. greeleyi em 5‰ comparada
a 35‰ após 6 horas indica, além da necessidade de secretar e reabsorver íons
nas células renais na salinidade elevada como citado anteriormente,
possivelmente, maior metabolismo do tecido em água do mar apesar da
concentração de triglicerídeos totais ser mantida estável com a redução da
salinidade. Cabe observar que a espécie marinha eurihalina Dicentrarchus labrax
68
apresentou resposta contrária, elevou a atividade ATPásica renal com a diluição
da água do mar (Venturini et al., 1992).
A maior atividade ATPásica branquial encontrada em S. greeleyi
comparado a S. testudineus após 6 horas em 5‰ e 35‰, pode ser um indício de
que S. greeleyi aumenta o metabolismo do tecido branquial quando submetido a
estresse osmótico em curto prazo, aumentando a energia disponível para o
transporte ativo de íons. Esta resposta em S. greeleyi seria justificada pela sua
preferência por salinidades mais altas na natureza onde normalmente não é
submetido a estresse osmótico (Figueiredo & Menezes, 2000; Vendel et al.,
2002). No entanto esta explicação não se aplica ao tecido renal, pois a atividade
ATPásica do rim de S. testudineus submetido a 35‰ por 5 dias foi maior que em
S. greeleyi. Podemos sugerir com estes resultados que a atividade das ATPases
que atuam no tecido branquial durante os mecanismos de hipo- e hiper-regulação
do plasma é mantida estável, embora os animais sejam submetidos a extremos
de salinidade.
A dosagem de triglicerídeos totais dos homegenizados das brânquias e rins
de S. testudineus e S. greeleyi não apresentou variação significativa entre as
condições experimentais, indicando juntamente com a atividade ATPásica total a
manutenção estável do metabolismo do tecido branquial, pelo menos em termos
de reservas lipídicas. A menor concentração de triglicerídeos nas brânquias de S.
testudineus em 5‰ 6 horas comparado à 5 dias indica maior gasto de energia e
conseqüente depleção de lipídeos para hiper-regulação a curto prazo (6 horas),
necessária para produzir energia utilizada na manutenção das concentrações
osmóticas e iônicas em água do mar diluída (Woo & Fung, 1981; Woo & Chung,
69
1995; Jarvis & Ballantyne, 2003). Em todas as condições experimentais S.
greeleyi apresentou maior concentração de triglicerídeos do que S. testudineus,
indicando que esta espécie em geral utiliza menos suas reservas metabólicas
(lipídeos) durante os processos de hipo-regulação e hiper-regulação do plasma.
Os valores da osmolalidade e cloreto plasmáticos para as duas espécies
do gênero Sphoeroides assemelharam-se aos valores obtidos para estas
espécies em estudos anteriores (~300 mOsm.kgH
2
O
-1
e ~150 mM) (Prodocimo &
Freire, 2001; 2004) e aos valores de outras espécies de teleósteos marinho-
estuarinos (p. ex. Maren et al., 1992; Claiborne et al., 1994; Zadunaisky et al.,
1995; Zadunaisky, 1996; Jensen et al., 1998; Marshall et al., 1999). A
osmolalidade e o cloreto plasmáticos são parâmetros importantes para
demonstrar a capacidade de manutenção da homeostase do líquido extracelular
dos teleósteos e suas alterações indicam modificações nesta capacidade.
Ocorreu redução da osmolalidade em 5‰ em ambos os tempos em ambas as
espécies, como verificado anteriormente (Prodocimo & Freire, 2004). O valor da
osmolalidade de S. greeleyi após 5 dias em 35‰, sendo maior do que S.
testudineus, corroborou resultados obtidos anteriormente, e é explicado pela
distribuição de S. greeleyi em áreas com salinidade mais elevada (Prodocimo &
Freire, 2004).
O hematócrito e a concentração de água no tecido muscular são usados
como indicadores de estresse osmótico celular/tecidual para teleósteos (Plaut,
1998; Marshall et al., 1999; Claireaux & Audet, 2000; Brown et al., 2001; Martinez-
Álvarez et al., 2002). Os valores do hematócrito obtidos para S. testudineus e S.
greeleyi foram semelhantes aos de outros teleósteos 25-30 % (Plaut, 1998;
Claireaux & Audet, 2000; Brown et al., 2001; Martinez-Álvarez et al., 2002), porém
70
a elevação do hematócrito de S. greeleyi em 5‰ comparado a 35‰ após 5 dias
foi contrária às respostas observadas para outras espécies de teléosteos
submetidas a salinidade reduzida. Em geral salinidades elevadas levam a um
aumento do hematócrito após dias de aclimatação do animal, devido à perda de
água extra-celular para o ambiente hiper-salino e maior necessidade de O
2
(Plaut,
1998; Claireaux & Audet, 2000; Brown et al., 2001; Martinez-Álvarez et al., 2002).
Porém, o hematócrito de S. greeleyi foi elevado em 5‰ 5 dias quando comparado
à 6 horas.
Associado ao hematócrito, o conteúdo de água no tecido muscular reflete
resposta tecidual a variações osmóticas. S. testudineus e S. greeleyi não
sofreram alterações no conteúdo de água no tecido muscular com a redução da
salinidade. Os valores de ~80% foram semelhantes os valores do conteúdo de
água no músculo de outras espécies eurihalinas (Feldmeth & Waggoner, 1972;
Plaut, 1998; Kelly & Woo, 1999; Claireaux & Audet, 2000; Brown et al., 2001;
Martinez-Álvarez et al., 2002).
Apesar de apresentarem diferença na distribuição na natureza, ambas as
espécies apresentaram mecanismos de regulação osmo-iônica semelhantes, e
mesmo padrão de resposta às salinidades 5‰ (durante a hiper-regulação) e 35‰
(durante a hipo-regulação). Poucas ou inexistentes alterações na presença
imunocitoquímica da Na
+
,K
+
-ATPase branquial, na atividade ATPásica total e na
concentração de triglicerídeos na brânquia e no rim; redução da osmolalidade e
cloreto plasmáticos em 5‰ indicando possível perda de íons e entrada osmótica
de água em ambiente diluído; poucas ou inexistentes alterações no hematócrito e
no conteúdo de água do músculo. Todos estes resultados indicam que estas
espécies regulam o conteúdo de água das células. A maior concentração de
71
triglicerídeos na brânquia e rim de S. greeleyi indica menor utilização das reservas
metabólicas na forma de lipídeos durante os processos de hipo-regulação e hiper-
regulação do plasma, apesar de S. greeleyi apresentar uma maior atividade
ATPásica branquial quando comparada a de S. testudineus. A Na
+
,K
+
-ATPase
mostrou não ser um dos motivos para a maior tolerância de S. testudineus à água
do mar diluída (5‰), porém a elevação na atividade ATPásica total na reserva de
lipídeos em S. greeleyi indica que a diferença na utilização nas reservas
metabólicas entre as espécies pode estar influenciando a capacidade de tolerar a
diluição da salinidade no ambiente natural.
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79
CAPÍTULO 3: GLOMÉRULOS E TÚBULOS RENAIS SÃO RESTRITOS AO RIM
ANTERIOR NO ADULTO DO BAIACU ESTUARINO Sphoeroides testudineus
1
1
Artigo Publicado no Journal of Fish Biology 63: 1258-1265, Prodocimo & Freire, 2003
80
SUMÁRIO
RESUMO.............................................................................................................. ....81
ABSTRACT.......................................................................................................... ....82
1 INTRODUÇÃO.................................................................................................. ....83
2 MATERIAIS E MÉTODOS................................................................................ ....83
3 RESULTADOS ...................................................................................................... 86
4 DISCUSSÃO E CONCLUSÕES ...................................................................... ....91
5 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ......................................................................93
81
RESUMO
O baiacu Sphoeroides testudineus, uma espécie tropical eurihalina
estuarina abundante no oceano Atlântico ocidental encontrado no sul do Brasil
(em salinidades entre 0‰ e 34‰) possui rim anterior (porção cranial vermelha)
grande e espalhado lateralmente, e um rim posterior (porção caudal) bem fino e
pálido. Quando estudado sob microscopia de luz e microscopia eletrônica de
transmissão, o rim anterior apresentou glomérulos e túbulos renais cercados por
tecido hematopoiético. Estes túbulos parecem drenar para o interior de um grande
duto coletor convoluto com um lúmen largo e formado por um denso epitélio
pseudo-estratificado, denominado de duto mesonéfrico. Este duto coletor constitui
a única estrutura do rim posterior. Microvilos apicais foram observados nos
túbulos renais e no duto mesonéfrico, e mitocôndrias basais e dobramentos de
membrana foram observados nos túbulos renais. Mitocôndrias abundantes basais
e vesículas elétron-densas localizadas principalmente no citoplasma apical, foram
observadas ao longo de todo o comprimento do duto mesonéfrico. Apossomos
(blebs) foram freqüentemente observados no duto mesonéfrico na microscopia de
luz e na microscopia eletrônica. Este baiacu estuarino eurihalino revelou possuir
um tipo raro de rim.
82
ABSTRACT
The kidney of the pufferfish Sphoeroides testudineus, an abundant tropical
euryhaline estuarine species of the western Atlantic Ocean found in southern
Brazil (in salinities ranging from 0‰ to 34‰) has a large and laterally spread
cranial red portion, and a very thin and pale caudal portion. When studied under
light and transmission electron microscopy, the cranial kidney displayed glomeruli
and renal tubules surrounded by haematopoietic tissue. These tubules appeared
to drain into a single large convoluted collecting duct with a wide lumen and thick
pseudostratified epithelium, the mesonephric duct, which constituted the sole
structure of the caudal kidney. Apical microvillae were viewed in the renal tubules,
as well as in the mesonephric duct. Basal mitochondria and membrane infoldings
were observed in the renal tubules. Abundant more basally-located mitochondria
and electron-dense vesicles, mainly in the apical cytoplasm, were observed along
the entire length of the mesonephric duct. Aposomes (blebs) were frequently
observed in the mesonephric duct, both by light- and electron-microscopy. This
euryhaline estuarine pufferfish has thus been revealed to possess a rare type of
kidney.
83
1 INTRODUÇÃO
Nos peixes, o rim e as brânquias trabalham em conjunto realizando a
regulação osmótica e iônica do fluido extracelular. O rim da maioria dos teleósteos
marinhos apresenta néfrons simples e reduzido número de glomérulos quando
comparados às espécies dulcícolas. Sphoeroides testudineus (L.) é uma espécie
de baiacu marinho estuarino amplamente distribuído no Oceano Atlântico desde
os EUA até o estado de Santa Catarina, Brasil. No estado do Paraná, este baiacu
é encontrado em água com salinidade variando de 34‰ a 0‰ (Nardi, 1999).
Outras espécies de Tetraodontiformes foram previamente descritas como
aglomerulares (Diodon sp. and Tetrodon sp.) (Edwards, 1928; Hickman & Trump,
1969), embora não existam descrições morfológicas da estrutura fina de seus
néfrons. O objetivo do presente estudo foi preencher esta lacuna, descrevendo a
morfologia e a ultraestrutura do rim e dos túbulos renais de Sphoeroides
testudineus espécie eurihalina estuarina, a qual apresentou-se como eficiente
hipo- e hiper-regulador dos íons plasmáticos (Prodocimo & Freire, 2001).
2 MATERIAIS E MÉTODOS
Espécimes de S. testudineus foram coletados na gamboa do rio Baguaçu
(25°33’S; 48°23’W), na margem sul da Baía de Paranaguá, Paraná Brasil. A
salinidade no local da coleta variou amplamente com o ciclo de maré,
apresentando valores entre 0‰ e 32‰ (Nardi, 1999). Os animais foram obtidos
durante a subida da maré (salinidade ~30‰) utilizando rede de espera do tipo
fyke fixa nas bordas, cruzando o canal de maré. A rede permaneceu no canal de
84
maré por ~6 h até o pico da maré cheia, quando os animais foram retirados. Os
baiacus foram coletados durante sua tendência natural de migrar para o interior
do estuário com a subida da maré. Após chegar ao laboratório, os peixes foram
mantidos em tanque estoques de 250 L com água do local da coleta, salinidade
ajustada para 30‰ através da adição de água filtrada em água do mar 35‰,
temperatura entre 19°C e 22°C e aeração constante.
Neste estudo foram utilizados um total de 16 peixes adultos com
comprimento total médio de 15 cm (CT). Os peixes foram anestesiados utilizando
MS-222 0,04% na água do aquário. Após 1–2 min, os peixes não apresentaram
mais atividade locomotora e foram imediatamente abertos através de incisão
ventral. Os órgãos internos foram removidos, expondo o rim anterior (cranial)
hematopoiético, bilobado, volumoso e vermelho e o rim posterior (caudal)
(comprimento entre 20–25mm) delicado, fino, branco e cilíndrico (Fig. 1a). Rins de
10 animais foram processados para microscopia eletrônica de transmissão, sendo
divididos em pequenas porções de ~3mm de comprimento. Desta maneira o rim
anterior foi examinado ao longo de todo o seu comprimento, através de 68
lâminas com pelo menos 10 cortes semi-finos em cada lâmina. As porções de
tecido renal foram fixadas por imersão em fixador (glutaraldeído 2,5% e
paraformaldeído 200mM em tampão cacodilato de sódio 100 mM, NaCl 100 mM,
KCl 3 mM, MgCl
2
2 mM, CaCl
2
3 mM, pH 7,5) em gelo por 2 h. As concentrações
dos eletrólitos foram próximas dos valores plasmáticos desta espécie e de outros
teleósteos marinhos (Evans, 1993; Prodocimo & Freire, 2001). Os fragmentos
renais foram lavados em tampão cacodilato de mesma concentração dos
componentes do fixador, porém sem conter os aldeídos (pH 7,5). Em seguida
foram pós-fixados em tetróxido de ósmio 1% em tampão cacodilato (pH 7,5),
85
contendo novamente os mesmos sais, por 1,5 h em gelo. As amostras foram
desidratadas em série alcoólica, transferidas para óxido de propileno e embebidas
em resina Araldite 502 (Polysciences). Cortes semi-finos (500 nm) e finos (50 nm)
foram obtidos utilizando ultramicrótomo Leica Ultracut UCT; os cortes semi-finos
foram corados com azul de toluidina 1% (em borax 1%) e fotografados. Os cortes
finos foram contrastados com acetado de uranila 5% e citrato de chumbo
(Reynolds, 1963) e examinados em microscópio eletrônico de transmissão (JEOL
JEM 1200 EXII).
Seis outros animais foram processados para microscopia de luz. Cortes
seriais do rim anterior hematopoiético foram realizados para análise do diâmetro
do glomérulo (Sigma Scan-Pro) ao longo de todo seu comprimento. Um total de
34 lâminas foram preparadas a partir do rim anterior de 4 animais, com 8 lâminas
para cada rim, permitindo a análise de todo o rim anterior. Cada lâmina tinha 9
cortes consecutivos. Dos 9 cortes em cada lâmina, 3 foram analisados, o primeiro,
o último e um intermediário. Todos os 306 cortes foram cuidadosamente
examinados, mas apenas 24 cortes tiveram seus glomérulos contados e
mensurados, totalizando 111 glomérulos uniformemente distribuídos entre os 4
rins utilizados. Este procedimento assegurou que o mesmo glomérulo não fosse
mensurado duas vezes. Outros 2 peixes tiveram seus rins posteriores
examinados sob microscopia de luz para investigar a estratificação do epitélio do
duto mesonéfrico, que não pode ser visualizado facilmente nos cortes semi-finos
corados com azul de toluidina. Os fragmentos foram fixados por imersão na
solução fixadora Alfac (8,5 ml de etanol 80%, 1 ml de formaldeído 40% e 0,5 ml
de ácido acético glacial) por 16 h. Após desidratação em álcool (80–100%), o
material foi submerso brevemente em xilol (três vezes de 1 min) e transferido para
86
resina Histosec (Merck). Os cortes (6 µm) foram obtidos utilizando micrótomo
Leica RM 2145, foram corados com hematoxilina-eosina e fotografados. Exceto
os glomérulos, os quais foram diretamente mensurados utilizando imagens
digitalizadas através do microscópio, a dimensão das estruturas foi calculada a
partir da ampliação final das micrografias eletrônicas e de luz.
3 RESULTADOS
Um exame morfológico do rim revelou a presença de glomérulos e túbulos
renais no rim anterior, envolto por tecido hematopoiético abundante (Fig. 1).
Cortes seriados ao longo de todo o comprimento do rim anterior revelaram a
presença de glomérulos com tamanho regular (Figs. 1c–h). A média de diâmetro
dos glomérulos medidos em microscopia de luz para todos os animais analisados
(111 glomérulos) foi de 35,21±0,50 µm (média ± erro padrão). Foi observado no
rim da cabeça o começo de um único e largo duto mesonéfrico convoluto (Figs.
1b, 1c). Não foi encontrada bexiga urinária em S. testudineus.
Os túbulos do rim anterior apresentaram microvilos apicais, porém sem
borda em escova (Fig. 2a), e mitocôndrias basais envolvidas por dobramentos de
membrana (Fig. 2b). O duto mesonéfrico apresentou diâmetro de 0.3-1 mm
extendendo-se para a porção caudal do corpo, transformando-se na única
estrutura da porção posterior do rim, rodeada por tecido conjuntivo e tecido
muscular liso (Figs. 3a–3c). O epitélio do duto mesonéfrico apresentou-se
homogêneo em todo o seu comprimento: espesso e pseudo-estratificado
(espessura de 225 µm), com núcleos concentrados na região basal das células
(Fig. 3d). Mitocôndrias pequenas localizadas mais basalmente foram observadas
87
ao longo de todo o comprimento do duto. A membrana luminal-apical apresentou
alguns microvilos e numerosos complexos juncionais intercelulares sub-apicais
com desmossomos (Fig. 3e).
Em todos os animais investigados e ao longo de todo o comprimento do
duto mesonéfrico foram observadas vesículas elétron-densas, principalmente
próximas à membrana luminal. O conteúdo destas vesículas era normalmente
escuro, elétron-denso, mas ocasionalmente mais granular (Fig. 3f). Sob
microscopia de luz e eletrônica de transmissão foram observados apossomas
(blebs) na membrana luminal do duto mesonéfrico (Fig. 1b) de 70% dos rins
examinados (Fig. 3g), com células liberando quantidade significativa de material
citoplasmático no lúmen tubular.
88
(
h
)
(
d
)
(
e
)
(
f
)
(g)
(b)
(
c
)
(a)
FIGURA 1. (a) Fotografia de S. testudineus mostrando a localização do rim anterio
r
(Ì) e do rim posterior (), barra de escala: 1 cm; (b) micrografia de luz do rim da
cabeça com túbulos abundantes (), e duto mesonéfrico () apresentando
apossomas luminais (
), barra de escala: 50 µm; (c)–(h): micrografias de luz de
cortes seriados do rim anterior com túbulos (), tecido hematopoiético (),
glomérulos (Ð), e duto mesonéfrico (), barra de escala 50 µm .
89
(b)
(a)
FIGURA 2. Micrografia eletrônica dos túbulos do rim anterior de S. testudineus.
(a) Túbulo com microvilos () na membrana apical. Barra de escala: 2 µm; (b)
Região basal do túbulo com mitocôndria () e dobramentos de membrana ()
sustentados por uma espessa membrana basal (). Barra de escala: 1 µm.
90
Figura 3: Micrografias de luz e eletrônica do duto mesonéfrico no rim posterior de S.
testudineus. (a–c) Micrografias de luz de cortes seriados do rim caudal mostrando o duto
mesonéfrico (]) rodeado por tecido conjuntivo e tecido muscular liso (), barra de
escala 50 µm (a–c); (d) micrografia de luz mostrando epitélio pseudo-estratificado com
núcleos basais, barra de escala: 25 µm; (e) micrografia eletrônica mostrando lúmen (L),
membrana apical com microvilos (Ì), e região de contato intercelular rica em
desmossomos (d), barra de escala: 1 µm; (f) micrografia eletrônica da membrana luminal
mostrando dois tipos de vesículas (
F;), barra de escala: 500 nm; (g) micrografia
eletrônica da membrana luminal mostrando apossomas apicais (). Barra de escala: 2
µm.
91
4 DISCUSSÃO E CONCLUSÕES
O rim do baiacu estuarino S. testudineus sob microscopia de luz
apresentou-se incomum, quando comparado ao rim da maioria dos teleósteos
com ou sem glomérulos (Audigé , 1910; Edwards, 1928; Hickman & Trump, 1969;
Safer et al., 1982; Hentschel & Elger, 1989). A peculiaridade do rim de S.
testudineus consiste na presença de glomérulos e túbulos funcionais rodeados
por abundante tecido hematopoiético apenas no rim anterior, e total ausência
destas estruturas no rim posterior. A presença de túbulos funcionais no rim
anterior é raro entre peixes adultos (Gérard, 1958), mas foi reportado para
Fundulus heteroclitus L., Callionymus lyra L., Liparis vulgaris Fleming e Cottus
bubalis Euphrasen (Gérard, 1958), e para o “mudskipper” eurihalino
Periophthalmus koelreuteri L. (Gérard, 1958; Safer et al., 1982). Os túbulos
proximais de S. testudineus não apresentaram a densa borda em escova usual,
mas abundantes microvilos como ocorre em alguns peixes (Hickman & Trump,
1969; Hentschel & Elger, 1989). O rim posterior de S. testudineus é composto por
apenas um duto mesonéfrico, que pode alcançar nos animais maiores 1 mm de
diâmetro e coletar o fluido produzido pelos túbulos anteriores. O duto mesonéfrico
apresentou-se rodeado por camadas de tecido conjuntivo e de músculo liso, típico
de segmentos distais do rim de peixes (Bulger & Trump, 1968; Anderson &
Loewen, 1975).
Entre os tipos de rim classificados por Audigé (1910), o rim de S.
testudineus parece ser do tipo I. Este tipo apresenta um rim anterior funcional,
mas o rim posterior é ausente ou raramente detectável (Audigé, 1910; Möllendorf,
1930). Este grupo inclui os gobídeos, que possuem túbulos renais pronéfricos
92
funcionais (Audigé, 1910; Möllendorf, 1930; Safer et al., 1982). Glomérulos
pronéfricos são grandes (Tytler, 1988); no gobídeo Lepadogaster gouanii Risso
mediu 200–300 µm (Möllendorf, 1930), quase 10 vezes o tamanho do glomérulo
de S. testudineus, o que sugere que os néfrons do rim anterior destes baiacus
não são pronéfricos, mas opistonéfricos. O rim de S. testudineus também se
encaixa na classificação apresentada por Hentschel & Elger (1989) como tipo ‘‘i’’
(rim opistonéfrico e com órgão linfóide no rim anterior) na Fig. 1 deste estudo,
como o rim de ciprinodontídeos.
Os apossomos ou blebs freqüentemente detectados no duto mesonéfrico
(Figs. 1b e 3g), poderiam ser conseqüência de atividade secretória apócrina (Chia
& Koss, 1994; Aumueller et al., 1999). Estas estruturas não são artefatos de
fixação, uma vez que os animais foram anestesiados, imediatamente sacrificados
e as porções do rim foram removidas para fixação como descrito no Material e
Métodos. Além disso, é possível observar que material rodeando os apossomas é
claramente bem preservado (Figs. 1b e 3g). Apossomas até onde se sabe, nunca
foram reportados para o rim de peixes. Eles são um fenômeno fisiológico
reportado para diversos tecidos como em células T2 na gastroderme do estômago
de asteróidea (Chia & Koss, 1994), ou no epitélio relacionado com a reprodução,
como no epidídimo e na próstata, nas glândulas mamárias, e glândulas
sudoríparas apócrinas (Aumuller et al., 1999). A função dos apossomas ou blebs
(secreção apócrina) é a secreção de material protéico (Aumueller et al., 1999). Se
este tipo de secreção é sempre de natureza peptídica, não pode ser aferida
nenhuma função para esta atividade secretória no rim de S. testudineus até o
presente momento.
93
As vesículas elétron-densas (Fig. 3f) observadas ao longo de todo o
comprimento do duto mesonéfrico em todos os animais examinados podem
conter muco. Vesículas escuras de muco foram descritas para “bowfin” Amia
calva L. por Youson & Butler (1988) no segmento coletor. De fato, a secreção de
muco pelas células do duto é comum para teleósteos (Hickman & Trump, 1969;
Hentschel & Elger, 1989). A maioria das micrografias mostra células secretoras de
muco no rim de peixes, no entanto, apresentam vesículas esbranquiçadas, como
em Parophrys vetulus Girard (Bulger & Trump, 1968; Hickman & Trump, 1969). A
densidade de vesículas no citoplasma é relativamente baixa no rim deste baiacu,
quando comparada à densidade elevada normalmente encontrada nas células
secretoras de muco (Youson & Butler, 1988). Como a composição do material
dentro das vesículas e sua direção de tráfico no citoplasma não podem ser
confirmadas até a presente data, a natureza das vesículas do duto mesonéfrico é
apenas especulativa.
O presente estudo contribuiu para o conhecimento do rim de peixes, o qual
pode ser muito diverso em sua morfologia e estrutura. Um rim muito simplificado
foi encontrado em S. testudineus, apesar do fato desta espécie habitar um
ambiente estuarino com estresse osmótico diário.
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96
CAPÍTULO 4: AVALIAÇÃO DOS FLUXOS UNIDIRECIONAIS DE Na
+
E Ca
2+
EM
DUAS ESPÉCIES DE PEIXES TELEÓSTEOS EURIHALINOS, Fundulus
heteroclitus E Oncorhynchus mykiss SUBMETIDOS A ALTERAÇÕES
AGUDAS NA SALINIDADE
1
1
Artigo em preparação para ser submetido ao Journal of Comparative Physiology B, Prodocimo et al., 2006.
97
SUMÁRIO
RESUMO.............................................................................................................. ...98
ABSTRACT.......................................................................................................... ...99
1 INTRODUÇÃO.....................................................................................................100
2 MATERIAIS E MÉTODOS................................................................................ .103
3 RESULTADOS ................................................................................................... 110
4 DISCUSSÃO E CONCLUSÕES ...................................................................... .119
5 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...................................................................128
98
RESUMO
Os teleósteos eurihalinos são modelos adequados para estudar alterações
nos fluxos iônicos unidirecionais. Possuem capacidade de tolerar amplas
variações de salinidade, possivelmente modificando fluxos unidirecionais e até
revertendo fluxos resultantes de íons através dos epitélios de interface. Não se
sabe ao certo o que ocorre com peixes estuarinos sujeitos a variação de
salinidade com o ciclo de maré de ~6 horas. Este estudo teve como objetivo
determinar os fluxos unidirecionais de Na
+
e Ca
2+
em F. heteroclitus e O. mykiss
durante a elevação gradual da salinidade ao longo de 6 horas, simulando a maré
enchente. Os resultados indicaram que a espécie eurihalina estuarina (F.
heteroclitus) e a espécie eurihalina dulcícola (O. mykiss) apresentam diferentes
padrões na modulação do fluxo iônico frente ao estresse da rápida elevação da
salinidade. F. heteroclitus aumenta as taxas de influxo e efluxo de Na
+
com a
elevação da salinidade ao longo de 6 horas, mantendo a homeostase deste íon
sem alterar suas concentrações corporais. Este resultado confirma a capacidade
que esta espécie possui de tolerar a elevação diária da salinidade com subida da
maré em seu ambiente natural. Os fluxos de Ca
2+
indicam que F. heteroclitus
tende a perder Ca
2+
para o ambiente mesmo com ambiente rico em Ca
2+
. Em O.
mykiss a elevação gradual da salinidade levou à perda da capacidade de
manutenção das concentrações de Na
+
e Ca
2+
plasmáticas devido ao aumento no
influxo de ambos os íons. Como esta espécie não é submetida regularmente a
elevação de salinidade em seu ambiente natural, não consegue ativar de forma
eficaz mecanismos que mantenham a homeostase dos íons Na
+
e Ca
2+
em água
do mar em curto período de tempo.
99
ABSTRACT
Euryhaline teleosts are adequate models for the investigation of changes in
unidirectional ion fluxes in different salinities. These fish are able to tolerate to
widely variable salinities, possibly shutting off unidirectional fluxes and even
reverting the direction of net fluxes across their interface epithelia. It is not yet
known what happens to estuarine fish subject to steep salinity variations along a
~6 hour tidal cycle. This study aimed at determining the unidirectional fluxes of Na
+
and Ca
2+
in F. heteroclitus and O. mykiss during gradual salinity increase along 6
hours, simulating the flow tide. The results have indicated that the estuarine
euryhaline killifish (F. heteroclitus) and the euryhaline freshwater rainbow trout (O.
mykiss) display distinct patterns of modulation of their ionic fluxes when faced with
the stress of fast increase in salinity. F. heteroclitus raises its influx and efflux of
Na
+
, maintaining the homeostasis of this ion in the plasma and whole body. This
result is in accordance with the widely reported capacity of this species to tolerate
salinity fluctuations in its natural habitat. Ca
2+
fluxes have indicated that F.
heteroclitus tends to eliminate Ca
2+
(secretory net flux) to the environment at all
salinities above 10% seawater. In O. mykiss, gradual increase in salinity led to the
loss of precise homeostasis of both Na
+
and Ca
2+
, with increased plasma values,
explained by absorptive net fluxes. As the rainbow trout is not regularly submitted
to increased salinity in its natural environment, it is not able to rapidly (within
hours) activate changes in unidirectional fluxes in order to ensure ionic
homeostasis in saline water.
100
1 INTRODUÇÃO
Os teleósteos marinhos são hipo-osmóticos a água do mar e as espécies
dulcícolas são hiper-osmóticas ao seu ambiente. Para serem hipo-osmóticas, as
espécies marinhas secretam sal e para serem hiper-osmóticas as espécies
dulcícolas absorvem sal do ambiente (revisado em Evans, 1993; Jobling, 1995).
Muitos teleósteos marinhos e dulcícolas são eurihalinos, possuindo grande
capacidade de tolerar amplas variações de salinidade, possivelmente
interrompendo e até revertendo os fluxos unidirecionais de íons através dos
epitélios de interface entre animal e ambiente (Gordon, 1963; Potts & Evans,
1967; Bath & Eddy, 1979; Perry & Flik, 1988; Wood & Marshall, 1994; Goss et al.,
1998; Marshall, 2003; Wood & Laurent, 2003).
Medidas dos fluxos iônicos unidirecionais no animal inteiro ou em células
isoladas de epitélios de transporte podem indicar de maneira precisa qual a
magnitude dos fluxos unitários de íons, e os fluxos que estão acarretando as
eventuais modificações resultantes no líquido extra-celular (p. ex. Van Der
Heijden et al., 1999; Reid et al., 2003; Wood & Laurent, 2003).
Os principais mecanismos moleculares responsáveis pelos fluxos iônicos
no epitélio branquial de teleósteos são diferentes em animais marinhos e
dulcícolas. Para a secreção de sal nas brânquias de teleósteos marinhos o Na
+
,
K
+
e Cl
-
são transportados através da isoforma secretora do co-transportador
NKCC localizado na membrana basolateral das células de cloreto juntamente com
a Na
+
,K
+
-ATPase. Estas células possuem condutância elevada ao Cl
-
na região
apical (canais de cloreto - CFTR) ao mesmo tempo em que o Na
+
passa do
sangue para a água pela via paracelular entre as células de cloreto e células
101
acessórias (Evans, 1993; Jobling, 1995; Marshall & Bryson, 1998; Evans et al.,
1999; Russel, 2000; Marshall, 2002; Marshall et al., 2002).
Para a absorção de sal nas brânquias de teleósteos dulcícolas o Na
+
é
absorvido através de canais na membrana apical, acoplado energeticamente à
secreção de H
+
pela H
+
-ATPase e através do trocador Na
+
/H
+
. Na membrana
basolateral o Na
+
é movido para o sangue através da Na
+
,K
+
-ATPase. O Cl
-
entra
na célula acoplado com o HCO
3
-
(trocador de ânions) e vai para o sangue por
canais de Cl
-
(CFTR) na membrana basolateral (Evans, 1993; Jobling, 1995,
Perry, 1997; Wilson et al., 2000; Marshall, 2002). O Ca
2+
é absorvido por canais
apicais e na membrana basolateral é retirado ativamente da célula em direção ao
sangue através de Ca
2+
-ATPase e através de um trocador Ca
2+
/Na
+
impulsionado
pelo gradiente eletroquímico do Na
+
gerado pela Na
+
,K
+
-ATPase nos teleósteos
dulcícolas e marinhos (Flik et al., 1993; Perry, 1997; Marshall & Bryson, 1998; Van
Der Heijden et al., 1999; Marshall, 2002).
Não se sabe ao certo o que ocorre com peixes estuarinos sujeitos à
variação de salinidade com o ciclo de maré de aproximadamente 6 horas. O
teleósteo estuarino Fundulus heteroclitus sobrevive a água do mar e a água doce
por longo período de tempo (12 horas, 7 dias, 14 dias), modulando o influxo e o
efluxo de Na
+
e Cl
-
e alterando a presença e expressão de transportadores nas
células de cloreto branquais (Marshall et al., 2002; Katoh et al., 2003; Richards et
al., 2003; Wood & Laurent, 2003). Estudos realizados utilizando F. heteroclitus
exposto à água doce por 1 hora mostraram a redução na secreção de NaCl e nos
fluxos passivos de íons (Marshall, 2003). No entanto, não há resultados indicando
possíveis modulações nos transportadores e nos fluxos iônicos com aumento
gradual de salinidade ao longo de 6 horas, simulando a maré enchente.
102
Peixes eurihalinos são modelos adequados para estudar alterações nos
fluxos iônicos unidirecionais. O “killifish”, Fundulus heteroclitus, família
Cripinodontidae é uma espécie extremamente eurihalina que vive em planícies de
maré e estuários ao longo da costa norte americana, onde está sujeita a
variações diárias de salinidade. Esta espécie, bem como outras espécies do
gênero Fundulus, tolera alterações abruptas na salinidade da água sobrevivendo
em salinidades entre 0 ‰ e 120 ‰ (Feldmeth & Waggoner III, 1972; Griffith,
1974). F. heteroclitus tem sido muito estudado para determinação de mecanismos
básicos da osmorregulação de telósteos eurihalinos (Jacob & Taylor, 1983;
Marshall et al., 1999; Marshall et al., 2000; Daborn et al., 2001; Katoh et al., 2003;
Marshall, 2003; Wood & Laurent, 2003).
Além da espécie estuarina F. heteroclitus, um outro modelo amplamente
estudado de peixe eurihalino é a truta arco-íris. A truta arco-íris (Oncorhynchus
mykiss) é uma espécie dulcícola, eurihalina que tolera salinidades próximas a 24
‰ em aclimatação gradual (Richards et al., 2003). Os salmonídeos em geral são
amplamente estudados quanto aos seus mecanismos de transporte de íons
branquiais, sendo excelentes modelos de teleósteos dulcícolas para estudos da
transição entre absorção em água doce e secreção na água salgada (Gordon,
1963; Perry & Flik, 1988; Perry & Laurent, 1989; Perry et al., 1996; Galvez et al.,
2002; Reid et al., 2003; Hawkings et al., 2004).
O objetivo deste estudo foi preencher a lacuna na literatura, determinando
fluxos unidirecionais de Na
+
e Ca
2+
no peixe inteiro (F. heteroclitus e O. mykiss)
durante a elevação gradual da salinidade ao longo de 6 horas simulando o ciclo
de maré em ambiente estuarino. Os resultados foram analisados
comparativamente entre as espécies, sob a hipótese de que a espécie eurihalina
103
dulcícola O. mykiss e a espécie eurihalina estuarina residente F. heteroclitus
poderiam apresentar diferentes padrões na modulação do fluxo iônico frente ao
estresse da rápida elevação da salinidade.
2 MATERIAIS E MÉTODOS
Animais
Exemplares adultos de Fundulus heteroclitus (2,7±0,08 cm de
comprimento) foram coletados nos estuários de Antigonish, Nova Scotia, Canadá
e Hampton, New Hampshire, EUA e foram levados para McMaster University,
Hamilton, Ontário, Canadá onde foram mantidos em tanques de 500 L
abastecidos com água de salinidade 10% da água do mar (~ 3,5‰), temperatura
ambiente, e constante aeração. Os peixes foram alimentados diariamente com
ração comercial floculada (Wardley Total Tropical Gourmet Flake Blend, Hartz
Mountain Corp., EUA) e camarões salgados e congelados (San Francisco Bay
Bre, EUA).
Exemplares de Oncorhynchus mykiss (169,6±10,6 cm de comprimento)
foram obtidos de fornecedores comerciais (Humber Springs Trout Hatchery,
Orangeville, Ontário, Canadá) e foram em seguida levados para McMaster
University, onde foram mantidos em tanque estoque de 500 L com água doce,
aeração constante e temperatura de 15 °C. Os peixes foram alimentados
diariamente com ração comercial (Martin Mills Inc., Canadá).
Experimentos de Fluxo Unidirecional de Na
+
e Ca
2+
104
Após aclimatação às condições laboratoriais foi realizada a determinação
dos fluxos unidirecionais de Na
+
e Ca
2+
no corporal de F. heteroclitus e O. mykiss
utilizando os radioisótopos
22
Na
+
,
24
Na
+
e
45
Ca
2+
.
Influxo
Os animais foram submetidos à elevação gradual de salinidade para
simular a subida da maré no ambiente natural. Trinta e seis exemplares de F.
heteroclitus foram transferidos do tanque estoque para tanques de 2 L com água
de salinidade 10% da água do mar (AM) (~3,5‰), e 36 exemplares de O. mykiss
para tanques com 4 L de água doce. Após 1 hora em AM 10%, 6 exemplares de
F. heteroclitus foram sacrificados para verificação do influxo nesta salinidade e 30
exemplares foram transferidos para salinidade AM 20% (~7‰). Ao final de 1 hora,
6 exemplares foram sacrificados e os 24 restantes foram transferidos para AM
40% (~14‰). Ao completar 1 hora em AM 40% o mesmo procedimento foi
aplicado e 18 animais foram transferidos para AM 60% (~21‰), onde
permaneceram por 1 hora. Em seguida 12 animais foram transferidos para AM
80% (~28‰) e após 1 hora 6 animais foram sacrificados como descrito
anteriormente. Finalmente, os 6 animais restantes foram transferidos para 100%
(~35‰) da água do mar, sendo sacrificados após exposição de 1 hora. A
absorção do radioisótopo (influxo) do meio foi determinada pela sua detecção no
corpo do animal. Os influxos dos íons Na
+
e Ca
2+
foram determinados em um
mesmo experimento, para cada espécie. As medidas do influxo de Ca
2+
foram
realizadas após 7 dias da realização do experimento após o total
desaparecimento da radioatividade emitida pelo
24
Na
+
.
105
Para a determinação dos fluxos de Na
+
em F. heteroclitus, foram
adicionados 24 µCi de
24
Na
+
(Departamento de Física, McMaster University) em 2
L de água de salinidade 10%, 20%, 40% ou 60%, 32 µCi em água 80% e 40 µCi
em 100%. Para a determinação do fluxo de Ca
2+
foram adicionados 30 µCi de
45
Ca
2+
(Perkin Elmer, EUA) em 2 L de água com salinidade 10%, 20%, 40% e
60%, 40 µCi em água 80% e 50 µCi em 100%. Para a determinação dos fluxos de
Na
+
em O. mykiss foram adicionados 24 µCi de
24
Na
+
em 4 L de água doce, 20%,
40% e 60%, 32 µCi em água de salinidade 80% e 40 µCi em 100% da água do
mar. Para o fluxo de Ca
2+
foram adicionados 30 µCi de
45
Ca
2+
em 4 L de água
doce, 20%, 40% e 60%, 40 µCi em água de salinidade 80% e 50 µCi em 100% da
água do mar. A elevação na concentração dos radioisótopos foi devido à elevação
na concentração dos íons/sal nas salinidades crescentes, a fim de manter a
atividade específica calculada para cada condição. A atividade específica foi
calculada usando a concentração do íon radioativo mensurado na água divido
pela concentração de íon frio (Tab. 1).
Os isótopos foram adicionados e misturados rapidamente à água na qual
os animais eram expostos. Amostras de água de 5 mL foram coletadas no início
(tempo 0 min) e no final do período de determinação dos fluxos de 30 min para
24
Na
+
e 60 min para
45
Ca
2+
, para cada salinidade. Imediatamente após a coleta
das amostras de água, os animais foram banhados em meio não radioativo por 5
minutos e em seguida anestesiados, pesados e amostras de sangue das O.
mykiss foram coletadas. Os animais foram processados para medida da
radioatividade total do corpo e da concentração de íons Na
+
e Ca
2+
no corpo e no
plasma dos animais.
106
Para determinação do
24
Na
+
na água, as amostras de 5 mL foram lidas
imediatamente após o experimento em contador gama e para a determinação do
45
Ca
2+
foram adicionados 10 mL de ACS (“Aqueous Counting Scintillant”)
(Amersham Biosciences, EUA), um fluoróforo de cintilação específico para
contagem de
45
Ca
2+
em água.
Para determinação do total de radioatividade (
24
Na
+
) em todo o corpo de F.
heteroclitus, os animais inteiros foram medidos diretamente no contador gama
Minaxi Autogamma 5000 counter (Packard Instruments, EUA). Para determinar a
radioatividade do
45
Ca
2+
e a concentração corporal dos íons em F. heteroclitus, as
carcaças foram digeridas em 4 volumes de 1 N HNO
3
e aquecidas a 60 C por 24
h. Para determinar o
24
Na
+
e o
45
Ca
2+
e a concentração dos íons corporais em O.
mykiss, as carcaças foram homogeneizadas em liquidificador com adição do
mesmo volume de água e em seguida sub-amostras do homogeneizado foram
digeridas como descrito anteriormente para F. heteroclitus. Após o período de
digestão as amostras de ambas as espécies foram centrifugadas a 600 xg por 10
min em centrífuga Sigma 4K15 (Sigma, Alemanha). Cinco mL do sobrenadante
foram adicionados a 10 mL do UltimaGold AB (Perkin Elmer, EUA), um fluoróforo
de cintilação específico para contagem de
45
Ca
2+
em digestão ácida, e foram
medidos em contador beta Liquid Scintilation Analyser, Tri-Carb 2900TR (Perkin
Elmer, EUA). O sobrenadante restante e as amostras de plasma de O. mykiss
foram utilizados para determinar as concentrações totais dos íons Na
+
e Ca
2+
em
Fotômetro de Absorção Atômica, SpectrAA, 220FS (Varian, Canadá). A
determinação do
45
Ca
2+
na água e no corpo/plasma dos animais ocorreu após 7
dias, período necessário para que não houvesse emissão de radioatividade pelo
24
Na
+
.
107
As taxas de influxo em µmol/kg/h foram calculadas utilizando o valor total
de radioatividade por peixe em CPM (counts por minuto) para
24
Na
+
e DPM
(desintegração por mL) para
45
Ca
2+
dividido pela atividade específica calculada
em cada salinidade, sendo o resultado dividido pelo peso (g) de cada peixe e
multiplicado por 1000 para converter o peso em kg.
Efluxo
A perda de radioisótopos do corpo do animal para o meio foi diretamente
medida pela taxa unidirecional de efluxo. Os radioisótopos
22
Na
+
e
45
Ca
2+
foram
diluídos em salina de Cortland e injetados intraperitonealmente (1 µL/g de peixe)
com seringa Hamilton de 50 µL (F. heteroclitus) e 100 µL (O. mykiss) em peixes
retirados dos tanques estoque. Após a injeção de 0.05 µCi/g de
22
Na
+
(n=6), e de
1,0 µCi/g de
45
Ca
2+
(n=6), para ambos os radioisótopos, os exemplares de F.
heteroclitus foram colocados em câmaras individuais com 250 mL de água com
salinidade 10% da água do mar (mesma salinidade do estoque). Os exemplares
de O. mykiss foram injetados com 0,05 µCi/g de
22
Na
+
(n=6), e 0,2 µCi/g
45
Ca
2+
(n=6) e em seguida foram colocados em câmaras individuais com 3 L de água
doce. Após um período de equilíbrio do radioisótopo no organismo dos animais,
de 1 hora para F. heteroclitus e 4 horas para O. mykiss, iniciou-se a transferência
dos animais individualmente para salinidades mais elevadas como já descrito
anteriormente para o experimento de influxo. Para determinar o efluxo dos íons
em F. heteroclitus e O. mykiss durante os experimentos foram coletadas amostras
de água em cada salinidade no tempo zero, 15 min, 30 min, 45 min e 60 min. Ao
final do experimento, os animais foram sacrificados e a radioatividade (
22
Na
+
e
108
45
Ca
2+
) e a concentração dos íons Na
+
e Ca
2+
no corpo e no plasma dos animais
foram determinadas utilizando protocolo descrito anteriormente.
As taxas de efluxo em µmol/kg/h foram calculadas baseadas no valor de
radioatividade medido na amostra de água e na atividade específica no animal
após as exposições. A atividade específica plasmática para o Na
+
na truta e para
o Ca
2+
no “killifish” e na truta foi calculada baseada no valor total de CPM por mL
de LEC utilizando volume permutável dos íons Na
+
estimado em 37% (Eddy e
Bath, 1979); e volume permutável de Ca
2+
estimado neste trabalho em ~4,5%
para “killifish” e ~39% para truta. A atividade específica de Na
+
no “killifish” foi
calculada com base na concentração de Na
+
do corpo todo do animal. O cálculo
da atividade específica foi realizado dividindo o valor em CPM pela concentração
dos íons plasmáticos ou no corpo todo. A perda de íons Na
+
e Ca
2+
do animal
para a água foi calculada dividindo o valor total de CPM/DPM perdido na água de
cada salinidade ao longo de 60 min pela atividade específica dos íons no animal.
O valor final do efluxo foi calculado em cada salinidade ao longo dos 60 min de
exposição, multiplicando o valor dos íons perdidos para a água em cada
salinidade pelo tempo de exposição à salinidade (60 min), em seguida dividindo o
valor obtido pelo peso de cada animal em gramas, multiplicando ainda o valor
final por 1000 para converter o peso em kg. O fluxo resultante dos íons foi
calculado pela diferença entre o influxo e o efluxo.
Análise Estatística
Os resultados foram expressos em média ± erro padrão da média.
Comparações entre o mesmo parâmetro (influxo, efluxo, concentração de Na
+
e
Ca
2+
plasmáticos e no corporal do animal) após exposição às diferentes
109
salinidades (água doce ou 10%, 20%, 40%, 60%, 80% e 100% da água do mar)
foram avaliados através de ANOVA de uma via, seguido de teste post hoc de
Tukey com p<0,05.
Tabela 1: Concentração iônica das águas utilizadas nos experimentos de fluxo
iônico unidirecional de íons Na
+
e Ca
2+
, em água doce (AD) e nas diversas
concentrações da água do mar (AM).
Na
+
(mmol/l) Cl
-
(mmol/l) Ca
2+
(mmol/l)
AD
0,7±0,1 (n=6) 1,1±0,1 (n=7)
1,4±0,1 (n=4)
10%AM
73,3±4,8 (n=5) 104,3±14,0 (n=5)
3,8±0,1 (n=4)
20%AM
109,9±8,3 (n=9)
133,4±8,5 (n=7) 5,6±,0,3 (n=4)
40%AM
203,1±12,1 (n=10)
212,0±11,1 (n=7)
8,0±0,5 (n=4)
60%AM
270,1±11,5 (n=9)
303,2±5,9 (n=7)
9,9±0,5 (n=4)
80%AM
354,8±13,1 (n=9)
412,6±7,9 (n=7)
12,9±0,7 (n=4)
100%AM
439,1±12,9 (n=10)
534,6±7,2 (n=7)
15,9±0,8 (n=4)
110
3 RESULTADOS
Após os experimentos de determinação dos fluxos unidirecionais dos íons
Na
+
e Ca
2+
durante elevação gradual da salinidade da água simulando a subida
de maré no ambiente natural, pode-se observar diferenças no padrão de
regulação dos fluxos em F. heteroclitus, espécie eurihalina estuarina e O. mykiss,
espécie eurihalina dulcícola.
Fluxos Unidirecionais de Na
+
F. heteroclitus apresentou aumento dos fluxos tanto de entrada quanto de
saída do íon Na
+
(Fig. 1A) com aumento da salinidade ao longo das 6 horas de
experimento. O influxo de Na
+
aumentou na salinidade de 60% da água do mar
(11550±1076 µmol/kg/h) e manteve-se estabilizado em 80% da água do mar
(9261±1344 µmol/kg/h) e água do mar 100% (AM) (9963±1344 µmol/kg/h). O
efluxo aumentou a partir de 80% (9163±1289 µmol/kg/h), mantendo valor elevado
em AM (13243±1677 µmol/kg/h) quando comparado a 10%, 20% e 40% da água
do mar. O fluxo resultante em AM e 10% da água do mar foi negativo,
prevalecendo o efluxo de Na
+
(secreção de íons pelos epitélios, do LEC para o
meio externo). Nas salinidades de 20%, 40% e 60% da água do mar, o fluxo
resultante de Na
+
foi positivo indicando uma maior absorção resultante de íons
pelos epitélios, para o LEC (influxo). Na salinidade de 80% da água do mar, o
efluxo e o influxo apresentaram-se em equilíbrio, praticamente sem fluxo
resultante. Os resultados indicam que F. heteroclitus aumenta gradualmente os
fluxos unidirecionais (influxo e efluxo) de íons Na
+
com aumento da salinidade. O
111
fluxo resultante em 10% e 100% da água do mar indicou secreção e em 20%,
40% e 60% indicou absorção de Na
+
.
A concentração de íons Na
+
corporall (Fig. 1B) não apresentou alterações
significativas frente à elevação da salinidade, indicando elevada capacidade de
homeostase do Na
+
extracelular mesmo com alterações em seus fluxos
unidirecionais.
O. mykiss submetida à água doce (AD) (615±101 µmol/kg/h) apresentou
influxo de Na
+
reduzido quando comparado as salinidades de 20% (2262±224
µmol/kg/h) e 40% da água do mar (3234±215 µmol/kg/h). (Fig. 2A). Nas
salinidades de 60% (33610±3646 µmol/kg/h), 80% (24866±2346 µmol/kg/h) da
água do mar e AM (27953±1014 µmol/kg/h), observou-se um aumento drástico do
influxo de Na
+
comparado aos valores em AD, 20% e 40% da água do mar
(valores entre 615-3240 µmol/kg/h), indicando entrada do íon para o corpo do
animal. O efluxo de Na
+
foi aumentado em AM (5396±1014 µmol/kg/h) e em 80%
(3581±571 µmol/kg/h) quando comparado a AD (1883±335 µmol/kg/h) e 20% da
água do mar (2359±480 µmol/kg/h). O fluxo resultante em AD foi negativo,
prevalecendo o efluxo de Na
+
. Nas salinidades de 20% e 40%, observou-se
equilíbrio entre influxo e efluxo, com fluxo resultante praticamente inexistente, e
em 60%, 80% e AM o fluxo resultante de Na
+
foi positivo indicando influxo
resultante (absorção) para o LEC. Os resultados indicam que a partir da
salinidade de 60% da água do mar O. mykiss apresentou perda da capacidade de
manutenção do equilíbrio entre efluxo e influxo, absorvendo uma grande
quantidade de Na
+
do ambiente hiper-salino, perdendo a capacidade de regulação
do Na
+
após exposição por 1 hora em salinidade de 60% da água do mar.
112
A concentração de Na
+
no plasma e corporal de O. mykiss apresentou
aumento com a elevação de salinidade. A concentração plasmática de Na
+
(Fig.
2B) em AM (187,5±1,7 mmol/l) foi elevada comparada aos valores em AD
(148,7±4,5 mmol/l), 20% (153,5±2,3 mmol/l), 40% (152,8±3,3 mmol,l
-1
), 60%
(154,9±3,4 mmol/l) e 80% (164,8±3,3 mmol/l) da água do mar. Em 80% da água
do mar os valores de Na
+
foram maiores do que em AD. A concentração de Na
+
corporal do animal (Fig. 2C) elevou-se em AM (63,0±3,0 mmol/kg) comparando-se
a AD (37,5±2,7 mmol/kg), 20% (37,1±2,3 mmol/kg), 40% (40,3±0,8 mmol/kg), 60%
(43,2±1,3 mmol/kg) e 80% (45,8±1,5 mmol/kg) da água do mar. Observou-se
aumento significativo das concentrações de Na
+
plasmáticas e corporal de O.
mykiss principalmente em AM indicando a perda de capacidade de manter a
homeostase deste íon em curto período de tempo em salinidade elevada.
113
-20000
-15000
-10000
-5000
0
5000
10000
15000
20000
a
ab
ab
bc
b
b
ab
a
ab
abc
bc
c
A Sódio,
F. heteroclitus
Fluxo de Na+ (umol/kg/h)
0
10
20
30
40
50
60
70
10% 20% 40% 60% 80% Sw
Salinidade
Conc
inteiro
a
a
a
a
a
a
B
entração de Na+ no corpo
(mmol/kg)
Figura 1: Fluxos e concentração corporal de Na
+
em F. heteroclitus submetido à
elevação da salinidade da água. A) Influxo de Na
+
(valores positivos) (n=6) e efluxo
de Na
+
(valores negativos) (n: 5-10) (média ± erro padrão, µmol/kg/h). Barras
preenchidas representam a diferença aritmética (fluxo resultante) entre a média das
taxas de influxo (positivo) e efluxo (negativo). B) Concentração de Na
+
corporal (n:
6-25) (média ± erro padrão, mmol/kg). AM, água do mar. Letras diferentes indicam
diferença significativa (p<0.05) entre as salinidades de exposição.
Concentração de Na+ corporal
(mmol/kg)
AM
114
0
50
100
150
200
ab ab ab
b
c
a
B
Concentração de Na+ no plasma
(mmol/l)
-40000
-30000
-20000
-10000
0
10000
20000
30000
40000
Fluxo de Na+ (umol/kg/h)
a
ab
ac
ac
bc
c
b
a
c
c
c
b
A Sódio,
O. mykiss
0
20
40
60
80
AD 20% 40% 60% 80% AM
Salinidade
o
a
a
b
a
a
a
C
Concentração de Na+ no corp
inteiro (mmol/kg)
Figura 2: Fluxos, concentração do plasma e corporal de Na
+
em O. mykis
s
submetido à elevação da salinidade da água. A) Influxo de Na
+
(valores positivos)
(n=6) e efluxo de Na
+
(valores negativos) (n: 5-10) (média ± erro padrão,
µmol/kg/h). Barras preenchidas representam a diferença aritmética (fluxo
resultante) entre a média das taxas de influxo (positivo) e efluxo (negativo). B)
Concentração de Na
+
no plasma (n: 6-18) (média ± erro padrão, mmol/l) C)
Concentração de Na
+
corporal (n: 6-12) (média ± erro padrão, mmol/kg). AD, água
doce; AM, água do mar. Letras diferentes indicam diferença significativa (p<0.05)
entre as salinidades de exposição.
Concentração de Na+ corporal
(mmol/kg)
115
Fluxos Unidirecionais de Ca
2+
F. heteroclitus apresentou aumento do influxo do íon Ca
2+
(Fig. 3A) em AM
(318±77,9
µmol/kg/h) comparado ao influxo em 10% (90,8±17,1 µmol/kg/h) e na
salinidade de 80% da água do mar (358±53,6
µmol/kg/h) comparado às
salinidades reduzidas de 10%, 20% (158±19,1
µmol/kg/h), 40% (171±31,1
µmol/kg/h) e 60% da água do mar (158±26,6 µmol/kg/h). O efluxo teve resultado
contrário ao influxo, com valor elevado na salinidade de 10% (1154±61,1
µmol/kg/h), reduzindo-se gradativamente com o aumento da salinidade (20%:
736,5±59,7; 40%: 517,1±131,7; 60%: 462±100; 80%: 451±103; AM: 383±121
µmol/kg/h). O fluxo resultante em todas as salinidades foi negativo e levou ao
efluxo de íons Ca
2+
, prevalecendo à secreção de íons pelos epitélios do LEC para
o meio externo (Figura 3A). Os resultados indicam que
F. heteroclitus tem maior
perda de Ca
2+
em salinidades reduzidas e possui tendência ao equilíbrio entre
secreção e absorção em salinidades elevadas ao longo de 6 horas de
experimento.
A concentração corporal de íons Ca
2+
(Fig. 3B) apresentou valores
menores em AM (571±35,3 mmol/kg) e 80% da água do mar (534±15,1 mmol/kg)
quando comparados aos valores em 10% (691±22,2
µmol/kg), 40% (787±12,5
mmol/kg) e 60% da água do mar (777±32,6
µmol/kg). A concentração em 40% e
60% foi aumentada quando comparada à concentração em 10% e 20% da água
do mar (605±42,1 mmol/kg). Devido ao pequeno volume de sangue coletado, a
concentração de Ca
2+
plasmático foi verificada apenas nos animais utilizados para
o experimento de efluxo, apresentando em água do mar ao final do experimento
de 6 horas, valor de 7,2±0,8 mmol/l (n=5).
116
O. mykiss apresentou aumento gradual do influxo de Ca
2+
acompanhando
o aumento da salinidade (Fig. 4A). Em AM, o influxo foi aumentado para 263±70,7
µmol/kg/h quando comparado ao influxo em AD (35,7±5,8 µmol/kg/h), 20%
(66,2±13,4
µmol/kg/h), 40% (85,5±10,4 µmol/kg/h) e 60% (91,1±13,9 µmol/kg/h)
da água do mar. Em 80% (108±10,6
µmol/kg/h), 60% e 40% da água do mar,
ocorreu aumento significativo no influxo de Ca
2+
comparado ao influxo em AD. O
efluxo de Ca
2+
não variou com a elevação da salinidade, mantendo seus valores
ao longo de todo experimento próximos a 8,0
µmol/kg/h (Fig. 4A). O fluxo
resultante de Ca
2+
em todas as salinidades foi positivo, sempre a favor da
absorção dos íons da água para o interior do corpo do animal (influxo).
A concentração de Ca
2+
no plasma de O. mykiss (Fig. 4B) apresentou
elevação significativa em AM (4,7±0,1 mmol/l) quando comparada a AD (3,6±0,1
mmol/l) e às salinidades reduzidas de 20% (3,0±0,2 mmol/l), 40% (3,3±0,2
mmol/l), 60% (3,2±0,1 mmol/l) e 80% (3,7±0,3 mmol/l) da água do mar. A
concentração corporal de Ca
2+
de O. mykiss (Fig. 4C) não apresentou diferenças
significativas entre as salinidades de exposição, mantendo seus valores próximos
a 250 mmol/kg. A elevação nas concentrações plasmáticas acompanhou a
elevação do influxo de Ca
2+
nos animais expostos a salinidades mais elevadas.
117
0
100
200
300
400
5
6
00
00
700
800
900
10% 20% 40% 60% 80% AM
Salinidade
Concentração de Ca2+ no corpo
a
a
a
c
bc
c
B
inteiro (mmol/kg)
-1200
-800
-400
0
400
800
1200
Fluxo de Ca2+ (umol/kg/h)
a
ab
ab
ab
bcc
ab
a
aa
a
b
A Cálcio,
F. heteroclitus
Concentração de Ca2+ corporal
( l/k )
Figura 3: Fluxos e concentração corporal de Ca
2+
em F. heteroclitus submetido à
elevação da salinidade da água; A) Influxo de Ca
2+
(valores positivos) (n=6) e efluxo
de Ca
2+
(valores negativos) (n=6) (média ± erro padrão, µmol/kg/h). Barras
preenchidas representam a diferença aritmética (fluxo resultante) entre a média das
taxas de influxo (positivo) e efluxo (negativo). B) Concentração de Ca
2+
corporal (n:
6-13) (média ± erro padrão, mmol/kg). AM, água do mar. Letras diferentes indicam
diferença significativa (p<0.05) entre as salinidades de exposição.
118
0
50
100
150
200
250
300
350
AD 20% 40% 60% 80% AM
Salinidade
C
a
a
a
a
a
a
Concentração de Ca2+ no corpo
in l/kg)teiro (mmo
0
1
2
3
4
5
6
b
a
a
a
a
a
B
Concentração de Ca2+ no plasma
(mmol/l)
-300
-200
-100
0
100
200
300
400
a
ab
b
b
c
b
A Cálcio,
O. mykiss
a
a
a
a
a
a
Fluxo de Ca2+ (umol/kg/h)
Concentração de Ca2+ corporal
(
mmol/k
g)
Figura 4: Fluxos, concentração do plasma e corporal de Ca
2+
de O. mykis
s
submetido à elevação da salinidade da água; A) Influxo de Ca
2+
(valores positivos)
(n=6) e efluxo de Ca
2+
(valores negativos) (n=6) (média ± erro padrão, µmol/kg/h).
Barras preenchidas representam a diferença aritmética (fluxo resultante) entre a
média das taxas de influxo (positivo) e efluxo (negativo). B) Concentração de Ca
2+
no plasma (n=6) (média ± erro padrão, mmol/l) C) Concentração de Ca
2+
corporal
(n: 6-12) (média ± erro padrão, mmol/kg). AD, água doce; AM, água do mar. Letras
diferentes indicam diferença significativa (p<0.05) entre as salinidades de
exposição.
119
4 DISCUSSÃO E CONCLUSÕES
Os fluxos unidirecionais (influxo e efluxo) de Na
+
aumentaram
gradualmente com a elevação da salinidade para
F. heteroclitus. Para O. mykiss,
o influxo aumentou abruptamente nas salinidades de 60%, 80% e água do mar e
o efluxo apresentou pequena elevação ao final de 6 horas de experimento em
água do mar. Os fluxos iônicos unidirecionais em
F. heteroclitus podem ser
aumentados por estresse durante a manipulação e anestesia dos animais (Wood
& Marshall, 1994; Wood & Laurent, 2003). Para minimizar este efeito os animais
foram colocados
overnight nos tanques onde seriam depois realizados os
experimentos, para prévia aclimatação ao novo ambiente. Os peixes não foram
anestesiados para a injeção dos radioisótopos.
Espécies eurihalinas como
F. heteroclitus e O. mykiss geralmente
conseguem manter a osmolalidade e a concentração dos íons frente a gradientes
osmóticos alterando os fluxos iônicos, a permeabilidade para água e íons através
dos principais órgãos responsáveis pela osmorregulação (Gordon, 1959; 1963).
Os menores fluxos de entrada e saída de Na
+
verificados em água doce e nas
salinidades reduzidas (ambiente hipo-osmótico) em ambas as espécies é
ocasionado principalmente por alterações branquiais e renais. As brânquias
reduzem a permeabilidade aos íons (Potts & Evans, 1967; Evans, 1993; Wood &
Marshall, 1994; Jobling, 1995), aumentam a secreção de muco (Wood &
Marshall, 1994; Perry, 1997), reduzem condutância celular e paracelular ao Na
+
devido a alterações nas junções
tight entre as células branquiais, reduzem os
mecanismos de secreção e aumentam os mecanismos de absorção de Na
+
(Potts
120
& Evans, 1967; Wood & Marshall, 1994; Marshall et al. 1995; Marshall & Bryson,
1998; Marshall et al., 2000) O rim, por sua vez, realiza conservação de Na
+
para
evitar perda para o ambiente e auxilia na manutenção de suas concentrações
(Evans, 1993; Wood & Marshall, 1994; Jobling, 1995). O intestino atua na
absorção e secreção de água (Potts & Evans, 1967; Evans, 1993; Jobling, 1995).
Os valores do influxo e efluxo de Na
+
para F. heteroclitus em salinidade
10% da água do mar apresentou valores semelhantes aos obtidos anteriormente
para esta espécie (Wood & Laurent, 2003). Em água do mar (ao final das 6 horas)
os valores do influxo (~9900
µmol/kg/h) e efluxo (~13300µmol/kg/h) de Na
+
foram
inferiores aos valores verificados em
F. heteroclitus anteriormente por outros
autores (valores entre ~20000-40000
µmol/kg/h) (Motais et al., 1966; Potts &
Evans, 1967; Pic, 1978; Wood & Marshall, 1994; Wood & Laurent, 2003),
possivelmente devido ao menor tempo de exposição (dias ou horas) à água do
mar realizado neste estudo quando comparado aos estudos anteriores.
Em
F. heteroclitus, o fluxo resultante para secreção de Na
+
em 10% da
água do mar foi semelhante à resposta obtida para esta espécie exposta à água
doce (Wood & Marshall, 1994; Patrick & Wood, 1999). Animais expostos a água
doce por períodos mais longos (entre 8 horas e 14 dias) apresentaram resultados
contrários, com influxo aumentado (Scott et al., 2004a). Os mecanismos que
atuam em água doce e em água diluída (10%) ocasionam redução da taxa de
ingestão de água (Wood & Marshall, 1994) e redução da permeabilidade aos íons
Na
+
(Potts & Evans, 1967), e são responsáveis pelos menores fluxos em 10% da
água do mar quando comparados às salinidades mais elevadas de 60%, 80% e
água do mar.
121
A elevação da salinidade ao longo de 6 horas levou ambas as espécies ao
aumento dos fluxos unidirecionais de Na
+
acompanhado de uma possível
elevação na ingestão de sal vindo da água (dados não avaliados), o que explica o
fluxo resultante no sentido de absorção verificado nas salinidades mais elevadas
(Bath & Eddy, 1979; Eddy & Bath, 1979; Evans, 1993; Jobling, 1995; Wood &
Marshall, 1994). A absorção de Na
+
verificada em O. mykiss nas salinidades entre
40% da água do mar e água do mar 100% pode estar sendo influenciada
principalmente pela entrada passiva de NaCl vindo do ambiente. Em
F.
heteroclitus
, espécie marinha-estuarina, a absorção de Na
+
pode estar sendo
influenciada principalmente pela expansão da região apical das células de cloreto
branquiais em água do mar diluída devido a ausência ou presença reduzida da
H
+
-ATPase apical nesta espécie (Wood & Marshall, 1994; Marshall et al., 1997;
Kirschner, 2004).
O fluxo resultante para secreção de NaCl em
F. heteroclitus em água do
mar pode ser explicado pela possível ativação de sistemas de secreção dos íons
Na
+
principalmente nas brânquias para secretar o excesso de sal ingerido com
elevação da permeabilidade ao Na
+
e elevação da taxa de ingestão de água do
mar característico de peixes marinhos (Potts & Evans, 1967; Evans, 1993, Jobling
1995; Zadunaisky et al., 1995; Marshall et al., 1999; Daborn et al., 2001). Além de
alterações na permeabilidade e na taxa de ingestão de água, mecanismos
moleculares e hormonais são ativados para realizar secreção de sal em água do
mar em curto período de tempo. A Na
+
,K
+
-ATPase aumenta sua atividade (Vonck
et al., 1998; Marshall et al., 1999; Scott et al., 2004b); o cortisol responde
rapidamente à salinidade elevada aumentando a expressão do kCFTR (Marshall
et al., 1999).
122
Os fluxos unidirecionais de Na
+
para O. mykiss em água doce, 20% e 40%
da água do mar indicaram secreção de Na
+
para o ambiente hipo-osmótico em
água doce e 20% e absorção em 40%. Em 60%, 80% e 100% da água do mar
ocorreu perda da capacidade de regular o Na
+
, com influxo aumentando
drasticamente indicando a total perda da capacidade de manutenção da
homeostase do Na
+
. Como está espécie é dulcícola e não está sujeita
periodicamente a elevação de salinidade como
F. heteroclitus, a mesma
demonstrou não possuir mecanismos de ativação da regulação do Na
+
em curto
período de tempo. Outra espécie dulcícola eurihalina, a tilápia
Oreochromis
mossambicus,
quando exposta a água doce, 25%, 50%, 75% e 100% da água do
mar por período de 4 horas apresentou resultados semelhante aos verificados
para
O. mykiss, com influxo aumentado nas salinidades elevadas e fluxo
resultante para absorção de Na
+
da água (Vonck et al., 1998). Experimentos
anteriores realizados com
O. mykiss apresentaram valores semelhantes nos
fluxos de Na+, mostraram equilíbrio entre o influxo e efluxo de Na
+
em salinidades
elevadas, porém os animais foram aclimatados gradualmente a elevação de
salinidade ao longo de horas ou dias (Bath & Eddy, 1979; Eddy & Bath, 1979;
Perry & Laurent, 1989; Postlethwaite & McDonald, 1995).
A elevação drástica do influxo de Na
+
observada para O. mykiss em altas
salinidades é esperada pela enorme disponibilidade de sal externo, uma vez que
o animal dispõe de mecanismos ativos de absorção de sal nas suas brânquias.
Em salinidades mais elevadas (60%, 80% e água do mar), ocorre maior entrada
passiva de íons, aumento na taxa de ingestão de água, perda osmótica de água e
a redução na taxa de produção de urina. Em conseqüencia, ocorre aumento nas
123
concentrações dos íons plasmáticos e corporais, como verificado na Figura 2
(Gordon, 1959; Bath & Eddy, 1979; Eddy & Bath, 1979; Vonck et al., 1998).
Em
F. heteroclitus não observou-se variação significativa nas
concentrações de Na
+
corporal indicando que está espécie eurihalina estuarina
tem maior capacidade de manter a homeostase deste íon frente a elevação
gradual de salinidade comparada a
O. mykiss, uma espécie eurihalina dulcícola.
As concentrações de Na
+
plasmático e corporal da truta O. mykiss indicam
um aumento gradual da concentração de Na
+
com elevação da salinidade
acompanhando o aumento no influxo, atingindo seus maiores valores ao final das
6 horas, quando os animais encontravam-se expostos à 100% da água do mar.
Resultados semelhantes de aumento gradual foram observados nas
concentrações de Na
+
em O. mykiss expostas a 2/3 água do mar por 8 horas e
em
Oreochromis mossambicus expostas a água do mar, 25%, 50%, 75% e água
do mar (Bath & Eddy, 1979; Vonck et al., 1998).
Os fluxos unidirecionais (influxo e efluxo) de Ca
2+
responderam de forma
bastante distinta à elevação gradual da salinidade em
F. heteroclitus e O. mykiss.
Em
F. heteroclitus, o influxo foi elevado com aumento da salinidade e o efluxo
reduzido, com fluxo resultante em todas as salinidades no sentido de secreção de
Ca
2+
. O. mykiss apresentou elevação do influxo de Ca
2+
com aumento da
salinidade, apresentando valor mais alto em água do mar. O efluxo não
apresentou variações significativas com a elevação da salinidade, e fluxo
resultante indicou forte absorção de Ca
2+
em todas as salinidades.
Os fluxos unidirecionais de Ca
2+
para F. heteroclitus em água doce foram
medidos anteriormente, com influxo deste íon sendo reduzido (valores entre 32,5
e 10,5 µmol/kg/h) quando comparado ao influxo verificado neste trabalho (valores
124
entre 90 e 358 µmol/kg/h) (Mayer-Gostan et al., 1983). Este trabalho é o primeiro
a relatar os fluxos de Ca
2+
em água do mar diluída (10%-40% da água do mar) no
killifish. O influxo em 10% da água do mar é mais elevado do que o verificado em
água doce, possivelmente pela maior concentração de Ca
2+
na água.
Experimentos utilizando o epitélio opercular e as brânquias de
F. heteroclitus
expostos a água doce mostraram absorção de Ca
2+
prevalecendo seu influxo,
resultado contrário ao aqui verificado em água do mar diluída (salinidade de 10%
da água do mar) para o animal inteiro (McCormick et al., 1992; Marshall et al.,
1992; Wood & Marshall, 1994).
O efluxo elevado para
F. heteroclitus nas salinidades reduzidas de 10% e
20% pode ser resultado de uma perda excessiva do radioisótopo
45
Ca
2+
durante
as primeiras 2 horas de experimento, indicando a necessidade de um período de
equilíbrio no corpo do animal maior do que o aplicado que foi de 1 hora. Após a
transferência para salinidade de 40% da água do mar (~ 4 horas após a injeção
do radioisótopo) o efluxo foi estabilizado, indicando um maior equilíbrio. O fluxo
resultante de secreção de Ca
2+
observado em todas as salinidades seria resultado
da tendência a entrada de Ca
2+
vindo do ambiente rico neste íon principalmente
através do sistema digestivo, e sua provável secreção através do rim (Jobling,
1995). O transporte de Ca
2+
brânquial é bem conhecido em teleósteos dulcícolas
(Jobling, 1995, Perry, 1997; Flik et al., 1993; Marshall & Bryson, 1998; Vonck et
al., 1998; Marshall, 2002), porém poucos autores relatam o transporte de Ca
2+
branquial em espécies marinhas-estuarinas (Marshall & Bryson, 1998; Marshall,
2002), havendo a necessidade de estudos mais detalhados para explicar estes
mecanismos.
125
A concentração corporal de Ca
2+
de F. heteroclitus apresentou valores
muito elevados (entre 534 e 788 mmol/kg), indicando grande participação do Ca
2+
presente no esqueleto do animal sobre a concentração corporal medida. Sendo
assim, os valores corporais de Ca
+2
obtidos não são representativos das
alterações dos fluxos unidirecionais e não auxiliam na interpretação dos
resultados do influxo e efluxo. O Ca
+2
plasmático seria mais representativo neste
experimento, porém devido ao pequeno volume de sangue obtido, não foi
possível a verificação das concentrações plasmáticas em todas as condições
experimentais, obtendo-se valor apenas nos animais em água do mar ao final do
experimento de efluxo. Este valor final (7,2 mmol/l) foi maior que o verificado para
espécies marinhas e dulcícolas eurihalinas (Evans, 1993; Flik et al., 1986),
indicando que apesar do fluxo resultante para secreção de Ca
2+
em água do mar,
ocorre elevação da sua concentração plasmática provavelmente pelo grande
aporte vindo do ambiente rico neste íon como já mencionado anteriormente.
A absorção de Ca
+2
foi observada em O. mykiss em todas as salinidades.
Normalmente ocorre absorção de Ca
2+
em teleósteos dulcícolas, com o influxo
maior que o efluxo (Perry & Flik, 1988; Flick et al., 1993; Jobing, 1995; Marshall &
Bryson, 1998). Trutas em água doce apresentaram absorção Ca
2+
, corroborando
os resultados aqui obtidos, porém com valores menores para os fluxos devido ao
tempo maior de monitoramento de ~16-18 horas contra apenas 6 horas neste
experimento e a quantidade de radioatividade utilizada (Perry & Flik, 1988).
A tilápia
Oreochromis mossambicus, quando submetida a água doce,
apresentou fluxos unidirecionais de Ca
2+
semelhantes aos aqui verificados para
O. mykiss com absorção de Ca
2+
(Flik et al., 1985;1993; Vonck et al., 1998).
Quando
Oreochromis mossambicus foi submetida por período de 4 horas a água
126
doce, 25%, 50%, 75% e 100% da água do mar, apresentou maior influxo e fluxo
resultante para absorção em todas as salinidades, corroborando os resultados
obtidos para
O. mykiss.
A absorção de Ca
2+
observada em O. mykiss em água doce pode ser
explicada pelo controle do Ca
2+
extracelular realizado principalmente pelo
hormônio prolactina. Este hormônio ativa a absorção de Ca
2+
em ambientes com
pouco Ca
2+
(em água doce, ou água do mar muito diluída), levando a manutenção
das concentrações plasmáticas (Flik et al., 1989; Flik et al., 1993; Vonck et al.,
1998). Sendo assim, em água com salinidade mais elevada (20%, 40%, 60%,
80% e 100% da água do mar), a absorção de Ca
2+
e o aumento na concentração
plasmática não podem ser atribuídos à prolactina, mas sim pelo aumento do
influxo de Ca
2+
como verificado nos resultados obtidos neste estudo e em estudos
anteriores com tilápia, e pela maior disponibilidade de Ca
2+
no meio externo (Tab.
1) (Flik et al., 1986; Vonck et al., 1998). As alterações no influxo podem ocorrer
devido a maior disponibilidade de Ca
2+
no ambiente, o que gera um elevado
gradiente entre o meio externo e a célula, ocasionando entrada passiva de Ca
2+
(Mayer-Gostan et al., 1983; Marshall & Bryson, 1998; Marshall, 2002).
A elevação do influxo de Ca
2+
nos animais expostos a salinidades mais
elevadas foi acompanhada pela elevação nas concentrações plasmáticas de Ca
2+
de
O. mykiss principalmente em água do mar, indicando a perda de capacidade
de regulação dos íons Ca
2+
quando os expostos a salinidades elevadas. Resposta
semelhante à elevação de salinidade foi encontrada para
Oreochromis
mossambicus
que também elevou o Ca
2+
plasmático com a elevação da
salinidade (Flik et al., 1986, Vonck et al., 1998). A concentração de Ca
2+
corporal
não variou com a elevação da salinidade e o mesmo foi observado para
127
Oreochromis mossambicus (Vonck et al., 1998), indicando que a variação
plasmática não afetou o Ca
2+
total do animal provavelmente pela grande
quantidade de Ca
2+
presente no esqueleto.
O transporte branquial (células de cloreto) dos íons Na
+
e Ca
2+
é acoplado
e similar nas espécies dulcícolas e marinhas (Marshall & Bryson, 1998; Marshall,
2002). As trocas entre Na
+
e Ca
2+
contribuem para a absorção de Ca
2+
associado
em alguns casos ao aumento no número das células de cloreto e na atividade das
enzimas Na
+
,K
+
-ATPase e Ca
2+
-ATPase (Marshall, 2002). O transporte de Ca
2+
e
Na
+
ocorre via transcelular e paracelular. Na via transcelular, o Ca
2+
é absorvido
pelas brânquias da água para o sangue passivamente, devido ao gradiente
eletroquímico por canais apicais e ativamente da célula para o sangue através do
trocador Na
+
/Ca
2+
e da Ca
2+
-ATPase. O Na
+
é absorvido por canais apicais e é
transportado para o sangue pela Na
+
,K
+
-ATPase (Flik et al., 1984; Flik et al.,
1986; 1993; Verbost et al., 1994; Jobling, 1995; Perry, 1997; Marshall & Bryson,
1998; Marshall, 2002). Em água do mar ocorre aumento do influxo de Na
+
e Ca
2+
e aumento da atividade da Na
+
,K
+
-ATPase gerando, o gradiente eletroquímico
ativador do trocador Na
+
/Ca
2+
e da Ca
2+
-ATPase basolaterais, aumentando a
absorção de Ca
2+
(Flik et al., 1997; Marshall & Bryson, 1998; Vonck et al., 1998;
Marshall, 2002). O aumento do trocador Na
+
/Ca
2+
em trutas O. mykiss submetidas
a 70% da água do mar levou ao aumento do transporte transepitelial de Ca
2+
(Verbost et al., 1994).
Em conclusão, observamos que
F. heteroclitus, espécie eurihalina
estuarina, mantém as taxas de influxo e efluxo de Na
+
aumentados com a
elevação da salinidade ao longo de 6 horas, assegurando a homeostasia deste
íon, com manutenção de suas concentrações corporais. Este resultado confirma a
128
capacidade que esta espécie possui de tolerar a elevação da salinidade diária
com a maré enchente em seu ambiente natural. Os fluxos de Ca
2+
indicam que F.
heteroclitus tende a secretar Ca
2+
para o ambiente mesmo com ambiente rico em
Ca
2+
(salinidades mais elevadas) compensando sua entrada passiva. Para O.
mykiss uma espécie eurihalina, porém dulcícola, 6 horas de elevação gradual da
salinidade levaram a perda da capacidade de manutenção das concentrações de
Na
+
e Ca
2+
plasmáticas devido ao aumento no influxo de ambos os íons. Como
esta espécie não é submetida regularmente a elevação de salinidade em seu
ambiente natural, não consegue ativar de forma eficaz mecanismos que
mantenham a homeostase dos íons Na
+
e Ca
2+
em água do mar em curto período
de tempo.
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135
CONCLUSÕES GERAIS
Durante a transição entre hiper-regulação (em salinidade 5‰) e a hipo-
regulação (em salinidade 35‰) as duas espécies de baiacus apresentaram
mecanismos de regulação osmo-iônica semelhantes. Demonstraram o mesmo
padrão de resposta às salinidades, com tendência a redução nas concentrações
plasmáticas osmóticas e iônicas em 5‰ e controle do conteúdo de água das
células, a despeito da ligeira diluição do plasma.
Quanto à participação de transportadores específicos na osmorregulação
destes peixes estuarinos, o NKCC atuou na secreção de sal em 35‰ e na
regulação do conteúdo de água das células musculares e no hematócrito de
S.
testudineus
. A Na
+
,K
+
-ATPase branquial dos baiacus mostrou desempenhar seu
papel tanto na hiper- quanto na hipo-regulação por não sofrer alterações no sinal
imunocitoquímico. Esta enzima mostrou não ser um dos motivos para a maior
tolerância de
S. testudineus à água do mar diluída. De forma geral, as diferenças
no conteúdo de triglicerídeos e atividade ATPásica total das brânquias e rins, e a
atuação do NKCC no conteúdo de água do músculo e do hematócrito podem
explicar parcialmente a maior capacidade de
S. testudineus de tolerar a diluição
da água do mar durante a maré baixa quando comparado a
S. greeleyi.
Mostrou-se que
S. testudineus possui notável capacidade de tolerar
flutuações de salinidades no seu ambiente dispondo de um tipo raro de rim. Seu
rim anterior possui glomérulos e túbulos renais cercados por tecido
hematopoiético. O rim posterior é constituído apenas de um grande duto coletor
convoluto denominado de duto mesonéfrico. Com estes resultados esta tese
136
contribuiu também com dados morfológicos de um órgão crucial para a
osmorregulação dos peixes, e mesmo assim muito pouco estudado.
Frente à elevação gradual de salinidade simulando o ciclo de maré
enchente,
F. heteroclitus confirmou sua capacidade de tolerar a elevação diária
da salinidade com subida da maré em seu ambiente natural e
O. mykiss perdeu a
capacidade de manutenção das concentrações plasmáticas de Na
+
e Ca
2+
. Este
resultado mostra que a espécie estuarina ativa mecanismos de osmorregulação
para manutenção da homeostase dos íons Na
+
e Ca
2+
durante a transição gradual
entre hiper- e hipo-regulação do plasma, o que não acontece com a espécie
dulcícola, por esta não ser submetida regularmente a elevação de salinidade em
seu ambiente natural. Em conclusão, este trabalho preencheu lacunas do
conhecimento sobre a morfologia e fisiologia da osmorregulação em peixes
estuarinos, abrangendo um grande número de metodologias.
137
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