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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ
PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA
CENTRO DE CIÊNCIAS E TECNOLOGIA
MESTRADO ACADÊMICO EM GEOGRAFIA
LUCIANA MARTINS FREIRE
PAISAGENS DE EXCEÇÃO: PROBLEMAS
AMBIENTAIS NO MUNICÍPIO DE MULUNGU,
SERRA DE BATURITÉ - CEA
Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado
Acadêmico em Geografia, do Centro de
Ciências e Tecnologia da Universidade Estadual
do Ceará, como requisito parcial para obtenção
do título de mestre na área de concentração:
Análise Geoambiental Integrada e Ordenação
do Território nas Regiões Semi-Áridas e
Litorâneas.
Orientador: Prof. Dr. Marcos José Nogueira de
Souza
FORTALEZA/CE
2007
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1
F8
6
6p
Freire, Luciana Martins
Paisagens de exceção: problemas ambientais no
Município de Mulungu, serra de Baturité – Ceará/
Luciana Martins Freire. _____Fortaleza, 2007.
134p.:il.
Orientador: Prof. Dr. Marcos José Nogueira de Souza
Dissertação (Mestrado Acadêmico em Geografia) –
Universidade Estadual do Ceará, Centro de Ciências e
Tecnologia.
1. Proteção Ambiental 2. Problemas Ambientais 3.
Paisagens de Exceção 5. Mulungu - CE 4. Serra de
Baturité I – Título.
CDD 341.347
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2
Universidade Estadual do Ceará
Pró-Reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa
Centro de Ciências e Tecnologia
Mestrado Acadêmico em Geografia
Título da Dissertação
PAISAGENS DE EXCEÇÃO: PROBLEMAS AMBIENTAIS NO MUNICÍPIO DE
MULUNGU, SERRA DE BATURITÉ - CEARÁ
Autora: Luciana Martins Freire
Defesa em: 30/09/2007
BANCA EXAMINADORA:
____________________________________
Prof. Dr. Marcos José Nogueira de Souza
Universidade Estadual do Ceará – UECE
(Orientador)
____________________________________
Prof. Dr. Flávio Rodrigues do Nascimento
Universidade Estadual do Ceará – UECE
____________________________________
Profa. Dra. Marta Celina Linhares Sales
Universidade Federal do Ceará – UFC
A utilização de qualquer trecho desta dissertação é permitida, desde que
seja feita de acordo com as normas de ética científica.
3
Quem sabe perceber uma paisagem
consegue entender seu valor, perceber
a importância dela em sua vida, criar
vínculo afetivo com ela e,
conseqüentemente, defender sua
perpetuação.
(SCHIER, 2004)
4
AGRADECIMENTOS
Aos meus pais, Maria Aldísia Martins Freire e Francisco Valmir Freire, e
minha irmã, Suzana Martins Freire, que torceram juntamente comigo durante esses
anos de pesquisa.
À Joselito Santiago de Lima, que além do carinho, compreensão e
estímulo à pesquisa, foi meu braço direito durante os trabalhos de campo. Toda
minha gratidão e amor.
Ao meu avô, Ivanildo Martins, e à minha madrinha e tia, Gláucia Campos
Sales, pelas valiosas histórias contadas sobre seu Município.
Ao meu tio, Fábio Campos Martins, maior incentivador do meu
crescimento científico, pelas sugestões, pelos conselhos, pelos “puxões-de-orelha”,
além das ajudas indispensáveis durante minha formação acadêmica.
Ao meu orientador, professor Marcos José Nogueira de Souza, a quem
devoto sincera admiração, pelo apoio, pela determinação e, sobretudo, pelo
profissionalismo com que me orientou.
Aos professores Flávio Rodrigues do Nascimento e Marta Celina Linhares
Sales, componentes da Banca Examinadora, que se prontificaram, com muita boa
vontade, a avaliar este trabalho, além das valiosas contribuições com discussões,
sugestões e material bibliográfico. Ao Flávio, destaco sua efetiva participação desde
minha preparação para o Seminário do Mestrado, momento em que minha pesquisa
estava começando a desenvolver-se, trazendo colaborações fundamentais, incluindo
as conversas, as opiniões, a prestatividade e, principalmente, a amizade. À Marta,
pela atenção calorosa, oportunidade de aproximação, além da pesquisa que,
futuramente, seja consolidada através de novas parcerias.
Aos meus colegas do Mestrado Acadêmico em Geografia, particularmente
aos queridos amigos Nancy Gonçalves de Araujo, Niepson de Sousa Arruda e Paulo
Henrique Gomes, sempre dividindo comigo os difíceis caminhos percorridos durante
o curso. Enfatizo a participação de Paulo Henrique nas transcrições dos meus
abstrats. Também a Clarice Silvestre, pelo estímulo e contribuição com dicas
indispensáveis e fundamentais na realização do meu trabalho; e a Marcus Vinícius
Silva, pelas instruções na estrutura dos mapas temáticos.
Aos amigos Aridenio Quintiliano, o prestativo na edição dos mapas e
empréstimo de instrumento de campo; Lutiane Queiroz, pelas conversas, pelas
5
discussões, pela opinião e pela co-participação em campo; Ana Keyla Carmo Lopes,
tão atenciosa nas correções ortográficas; e Carlo Henrique de Paiva Grangeiro, pela
ajuda na impressão das cópias da dissertação.
Às minhas primas e amigas, Ana Clarisse Matos, Ana Cristina Matos, Elita
Freire e Denise Freire, pela torcida e pelo apoio.
Aos professores do Mestrado Acadêmico em Geografia, na UECE, com
quem tive convivência desde a minha graduação, nas salas de aula, nos laboratórios
e nas reuniões de colegiado do Mestrado. Especialmente, cito os(as)
professores(as).: Zenilde Baima Amora, tão atenciosa às minhas dúvidas e
“inquietações” geográficas; Luiz Cruz Lima, pelas cobranças e incentivo na
divulgação dos meus trabalhos; Denise Elias, pelas conversas durante a monitoria
na graduação e incentivo a procurar, como orientador, o professor Marcos Nogueira,
em busca de estudar o que eu realmente almejava; Fábio Perdigão e Eliana Guerra,
pela agradável convivência, durante a disciplina do Seminário.
Às experiências acadêmicas desenvolvidas em outras instituições de
ensino e pesquisa, especialmente durante a disciplina realizada no PRODEMA. À
professora Vládia Pinto Vidal, pela atenção dispensada e pela oportunidade de
conhecer novos colegas acadêmicos.
Às instituições que me atenderam tão prontamente durante as visitas em
busca de material bibliográfico, tais como SEMACE, IBGE, IPECE, SEPLAN e, em
especial, FUNCEME – Departamento de Recursos Ambientais (DERAM) pelo cordial
atendimento de Ana Maria Lebre e de Francisco de Assis Jorge de Oliveira e pela
aquisição de imagem de satélite SPOT e shapes, bases fundamentais para
confecções dos mapas da dissertação.
Ao povo mulunguense, em especial o Sr. Gerardo, pelas valiosas
informações colhidas em seu sítio. À Paróquia e Biblioteca de Mulungu,
mantenedoras de arquivos sobre o Município.
Ao CNPq, órgão que financiou meus estudos por dois anos, dando
condições para minha dedicação exclusiva a esta pesquisa.
Em suma, a todos que contribuíram, direta e indiretamente, para o
desenvolvimento desta pesquisa, assim como para o meu crescimento acadêmico e
profissional.
6
RESUMO
As paisagens de exceção representam configurações diferenciadas em
relação ao seu entorno. Resultam de uma dinâmica isolada, oriunda de fatores
naturais, sobretudo biogeográficos, ao longo do tempo geológico. Esta pesquisa
desenvolve-se baseada na analise do ambiente de uma das mais expressivas
paisagens de exceção do Nordeste brasileiro: os brejos de altitude, exemplificados
pela Serra de Baturité. Segundo Ab’Sáber (1990), a expressão ‘brejos’, aplicada a
ilhas de umidade no interior dos sertões secos, teve sua origem explicada através do
entendimento na própria serra cearense. A exuberância paisagística da Serra de
Baturité justifica-se pelo comportamento de um ambiente diferenciado, onde a
altitude do relevo possibilita a existência de condições climáticas que potencializam,
favoravelmente, a ocorrência de um enclave de mata úmida, no domínio semi-árido
das caatingas, com formação influenciada pelos ventos que sopram do Oceano
Atlântico. As potencialidades dos recursos naturais favoreceram, historicamente, a
criação de condições propícias ao desempenho das atividades agrícolas e de
fixação da segunda residência. O uso desordenado dos recursos naturais, em
desacordo com as prescrições legalmente estabelecidas, propiciou a criação de uma
Área de Proteção Ambiental (APA), no início da década de 1990. Mesmo com a
criação da Unidade de Conservação, a área enfrenta problemas ambientais no que
diz respeito às condições de uso e ocupação da terra. O Município de Mulungu é
estudado com base nessa questão, justificando-se sua escolha por ser o maior
município inserido na APA da Serra de Baturité. A pesquisa tem também o objetivo
de avaliar o estado atual de conservação dos recursos naturais, propondo-se
subsídios para o planejamento de uso e ocupação da terra em bases sustentáveis. A
presença de atividades agrícolas em vertentes muito íngremes verifica-se
rotineiramente, o que ocasiona a aceleração dos processos erosivos, o
ressecamento de fontes d’água naturais, a ablação dos solos, o assoreamento do
fundo dos vales, o empobrecimento da biodiversidade e a descaracterização da
paisagem serrana. Acrescenta-se a prática de técnicas agrícolas rudimentares, além
do uso incorreto de agrotóxicos, o que compromete a qualidade das águas
superficiais, dos solos e da saúde humana e ambiental. A infra-estrutura de
saneamento básico é deficiente, causando a poluição de recursos naturais. Outro
problema apontado é o da especulação imobiliária, consumado pela valorização da
terra na Serra de Baturité, consolidada como região de segunda residência e
propícia a atividades turísticas.
Palavras-chave: Paisagens de Exceção; Problemas Ambientais; Mulungu – CE,
Serra de Baturité.
7
ABSTRACT
The exception landscapes mean differential configurations in relation to
their vicinity. They result from an isolated dynamic, generated from natural factors,
above all the biogeographic, along the geologic tense. This research develops
analyzing one of the most expressive exception landscapes of the northeast of Brazil:
the “brejos de altitude”, exemplified here for Baturité Mountain. According to
Ab’Sáber (1990), the expression “brejo”, applied to humidity islands within drought
backwoods, has had its origin explained through the understanding of this mountain
in Ceará. The landscape exuberance of Baturité Mountain is justified by the behavior
of a differentiate environment, where the relief altitude makes possible the existence
of climate conditions that increase the occurrence of an enclave of humid forest,
within the semi-arid domain of the savanna, with formation influenced wind form the
Atlantic Ocean. The potentialities of natural resources favor, historically, the creation
of conditions likely the development of agricultural activities and the fixation of
second residences. The non-ordered use of natural resources, in disagree with the
legal laws previously established, has favored the creation of an “Áreas de Proteção
Ambiental (APA)” - Environmental Protection Area - in the 90’s. Even after the
creation of the Conservation unity, the area faces environmental problems that
concerns to the conditions of land use and occupation. The Mulungu municipality is
studied starting from this question, its choice is justified for being the largest
municipality inserted in the EPA of Baturité Mountain. The research has also the
objective to evaluate the current state of conservation of the natural resources,
providing subsidies to use and occupation planning of land in sustainable bases. The
presence of agricultural activities on very steep slopes has been verified usually,
causing the acceleration of erosive processes, the drying of natural waters sources,
soil ablation, the loss of depth of the bottom of valleys, the impoverish of biodiversity
and the changes of the mountain landscape. Adding the rudimentary agricultural
techniques, besides the wrong use of pesticides, has reducing the quality of the
surface waters, soils and the human and environmental health. The basic sanitation
infrastructure is deficient, causing the pollution of natural resources. Another problem
is the building speculation, consummated by the land valorization in Baturité
Mountain, consolidated as a region of second residence and likely to tour activities.
Key-words: Exception landscapes, Environmental problems, Mulungu – CE, Baturité
Mountain.
8
SUMÁRIO
LISTA DE FIGURAS 10
LISTA DE TABELAS 13
LISTA DE GRÁFICOS 14
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS 14
INTRODUÇÃO
16
1 GEOGRAFIA E ANÁLISE GEOSSISTÊMICA DA PAISAGEM: TEORIA,
MÉTODOS E TÉCNICAS
20
1.1 Paisagem: da Noção ao Conceito Geográfico 25
1.2 O Papel da Geografia nos Estudos Ambientais 29
1.3 Serras Úmidas: Referenciais Teórico-Metodológicos
31
1.4 Procedimentos Técnico-Operacionais
33
2 PAISAGENS DE EXCEÇÃO NO NORDESTE BRASILEIRO E O
CONTEXTO DA SERRA DE BATURITÉ - CE
38
2.1 Os Brejos de Altitude da Serra de Baturité 40
3 CARACTERIZAÇÃO FÍSICO-AMBIENTAL DO MUNICÍPIO DE MULUNGU
– CE
47
3.1 Características Geológico-Geomorfológicas
49
3.1.1 As Feições Geomorfológicas
52
3.1.2 Os Processos Morfodinâmicos
54
3.2 Condições Hidroclimáticas
58
3.2.1 Recursos Hídricos Superficiais
61
3.2.2 Recursos Hídricos Subterrâneos
62
3.3 Aspectos dos Solos e da Vegetação
64
3.4 Condições Ecodinâmicas da Paisagem
70
4 TIPOLOGIAS DE USOS E PROBLEMAS AMBIENTAIS DO MUNICÍPIO
DE MULUNGU – CE
73
4.1 Histórico da Ocupação e Aspetos Culturais
73
4.2 Condições de Organização e Produção Social: Aspectos
Demográficos, Infra-Estrutura Municipal e Atividades
Socioeconômicas
82
4.3 Impactos Sócio-ambientais
99
9
4.3.1 Devastação da Cobertura Vegetal
99
4.3.2 Erosão dos Solos
104
4.3.3 Degradação e Privatização dos Recursos Hídricos
107
4.3.4 Impactos das Atividades Agropecuárias
114
4.3.5 Especulação Imobiliária
119
4.3.6 Urbanização, Infra-Estrutura Deficiente de Saneamento
Básico e Disposição de Resíduos Sólidos.
121
5 CONCLUSÕES
125
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
128
10
LISTA DE FIGURAS
01 - Esboço de uma definição teórica de geossistema 22
02 - Constituição da Geografia, segundo C. A. de Figueiredo Monteiro, 2000 30
03 - Fluxograma Metodológico 37
04 - Comparativo da ocupação no passado e no presente da Mata Atlântica.
Acima, figura da área de distribuição original da mata. Abaixo, a sua
ocupação atual.
41
05 - Perfil esquemático dos brejos de altitude no Nordeste Brasileiro. 42
06 - Distribuição dos principais brejos de altitude do Estado do Ceará. 44
07 - Mosaico de imagem de satélite do Ceará, destacando algumas serras,
verdadeiras ilhas de umidade em meio aos sertões
45
08 - Mapa Básico do Município de Mulungu-CE 48
09 - Mapa Geológico-Geomórfológico do Município de Mulungu-CE 50
10 - Relevo fortemente dissecado em cristas (vertentes escarpadas) e colinas.
53
11 - Crista monoclinal ou hogback, ao fundo, e lombada, à frente. 53
12 - Vertente ocidental e seu relevo dissecado em colinas. 54
13 - Planície Alveolar com uso de atividades agrícolas no platô úmido. 54
14 - Sistema de Degradação do Meio Ambiente 57
15 - Riacho Nilo, na porção sul do Município. 61
16 - Qualidade das águas subterrâneas do município de Mulungu - CE, com
base na análise realizada em 29 amostras (poços tubulares).
63
17 - Mapa Pedológico do Município de Mulungu-CE 65
18 - Floresta Úmida Perenifólia, ao fundo, e área onde deveria estar a
Floresta Úmida Semiperenifólia, utilizada na cultura de bananeiras, à
frente.
68
19 - Floresta úmida semicaducifólia, vertente oriental úmida, com áreas
utilizadas no cultivo do milho.
68
20 - Floresta Caducifólia e mata seca, na vertente ocidental semi-árida.
Observam-se intensos processos de degradação.
68
21 - Área desmatada para fins de ocupação imobiliária, distrito de Lameirão. 68
11
22 - Serrapilheira cobrindo o solo, abaixo da floresta úmida perenifólia. 69
23 - Rua Coronel Justino Café, na sede municipal de Mulungu – CE 78
24 - Antigo prédio dos Correios, onde funciona atualmente a sede da
Prefeitura Municipal de Mulungu – CE
78
25 - Estátua do padroeiro, São Sebastião. 78
26 - Igreja matriz de Mulungu - CE. 78
27 - Preparação da procissão ao padroeiro São Sebastião, na sede municipal. 80
28 - Leilão na praça da igreja matriz em Mulungu - CE, durante as
celebrações da festa de São Sebastião.
80
29 - Vista da sede municipal de Mulungu – CE 85
30 - Rua Cel. Justino Café, na sede do município, e rua perpendicular, Tomaz
Carvalho.
85
31 - Casa localizada em zona rural, isolada no meio da mata. 84
32 - Poste de concreto, com fiação passando entre a vegetação. 86
33 - Presença de poste de madeira ao lado de casarão rural, nos arredores da
cidade.
86
34 - Recolhimento do lixo urbano em local pré-estabelecido, na sede
municipal de Mulungu - CE.
88
35 - Transporte de passageiros através do Pau-de-Arara de Mulungu - CE a
municípios vizinhos.
88
36 - Área comercial, na sede municipal de Mulungu – CE. 90
37 - Restaurante e pousada Hofbrauhaus, de propriedade do Sr. Wolfgang
Helmut, de cidadania alemã, localiza-se no distrito de Lameirão.
90
38 - Atividade agrícola aliada à atividade artesanal (plantio de cana-de-açúcar
e produção de rapadura).
91
39 - Piladeira de Café, sítio Brejo, distrito de Lameirão. 91
40 - Pecuária desenvolvida em Mulungu - CE, na localidade de Bom Jardim. 92
41 - Cultivo de tomate consorciado à Bananicultura, no sítio Brejo, distrito de
Lameirão.
93
42 - Plantação de hortaliças, em pequena propriedade, na localidade de Bom
Jardim.
93
12
43 - Cultivo de hortaliças, em grande propriedade, localidade de Cavaco. 93
44 - Bananicultura, próximo ao distrito de Catolé, em Mulungu – CE. 94
45 - Cultivo do café sombreado, no Sítio Brejo, distrito de Lameirão, em
Mulungu - CE.
94
46 - Brocagem para uso de lenha, na localidade Sítio Jardim, em Mulungu -
CE.
95
47 - Área na localidade de Boa Vista, Mulungu – CE, onde houve extração
vegetal para carvão.
95
48 - Área onde funcionava pedreira clandestina, na localidade Sítio Jardim. 96
49 - Mapa de Uso e Ocupação da Terra no Município de Mulungu – CE 98
50 - Plantação de cana-de-açúcar na localidade de Pindoba. Nota-se a
necessidade de área descampada para efetivação da produção.
102
51 - Ocorrência de atividades agrícolas ocupando indiscriminadamente em
vertentes íngremes.
103
52 - Riacho Nilo, na porção sul do Município, com margens degradadas. 103
53 - Sedimentos de empréstimos para abertura de estrada e ocupação
imobiliária. Nota-se que houve processo de erosão dos solos (indicado
pela seta).
106
54 - Área, na sede municipal, onde houve a retirada de terra para abertura e
terraplanagem.
106
55 - Fonte de água natural exposta, sem vegetação nativa ao redor,
localizada em sítio particular, distrito de Lameirão.
109
56 - Poço construído sobre nascente fluvial, para acúmulo de água. Sítio
particular, distrito de Lameirão.
109
57 - Barragem localizada próxima à nascente fluvial, no detalhe. Nota-se que
além do represamento da água há, ainda, a má conversação da nascente
fluvial, que se encontra desprotegida pela ausência da mata primitiva.
109
58 - Zona rural do Município, localidade de Bastiões, com presença de esgoto
a céu aberto.
110
59 - Canal de água poluída em barragem de sítio particular, no distrito de
Lameirão.
111
60 - Riacho contaminado por água provinda da barragem, em sítio particular.
Lameirão.
111
61 - Despejo de esgoto residencial a céu aberto e acúmulo de lixo, 112
13
ocasionando poluição dos solos e dos recursos hídricos.
62 - Chácara particular com utilização de barragem como elemento
paisagístico e criação de aves aquáticas ornamentais.
113
63 - Barragem com água contaminada por eutrofização, na localidade de Boa
Vista.
113
64 - Barragem localizada no distrito de Lameirão, ocasionando intensificação
de processos erosivos e alteração da paisagem.
114
65 - Ausência da cobertura vegetal para cultivo de pastagens para a atividade
pecuária, localidade de Jardim.
115
66 - Terreno em preparo para o plantio agrícola, no distrito de Catolé. 116
67 - Cultivo agrícola em vertentes com declividade acima de 45%, na
localidade de Camará.
117
68 - Exemplo de cultivo agrícola adequado em área de alvéolos e baixas
vertentes, localidade de Camará.
118
69 - Sítio particular à venda na localidade de Boa Vista. 120
70 - Degradação da cobertura vegetal, para fins imobiliários, no distrito de
Lameirão.
120
71 - Construção imobiliária em topo de colina no distrito de Lameirão. 120
72 - Lixo hospitalar em área de vertente. Localidade de Camará. 118
73 - Mapa de Impactos Sócio-Ambientais do Município de Mulungu – CE. 124
LISTA DE TABELAS
01 - Número e área florestal dos brejos de altitude ocorrentes na Floresta
Atlântica
43
02 - Situação dos Poços Tubulares Cadastrados 63
03 - Características Físico-Ambientais do Município de Mulungu - CE 71
04 - Condições Ecodinâmicas da Paisagem do Município de Mulungu - CE 72
05 - Primeiras Sesmarias Concedidas na Região de Baturité 73
06 - Cronologia de fatos históricos e culturais marcantes 81
07 - População Residente de Mulungu – CE 82
14
08 - Principais Indicadores de Saúde do Município de Mulungu – CE (2003) 87
09 - Frota do Município de Mulungu - CE (2004) 89
10 - Empresas de Mulungu - CE (2003) 89
11 - Pecuária de Mulungu - CE (2003) 92
12 - Lavoura Permanente de Mulungu - CE (2003) 94
13 - Lavoura Temporária de Mulungu - CE (2003) 95
14 - Extração Vegetal e Silvicultura de Mulungu - CE (2003) 96
15 - Quadro Comparativo do Café 101
16 - Tipos de uso indicados para os diversos intervalos de classe de declive 105
17 - Número de oferta de imóveis à venda nos principais Municípios
da Serra de Baturité – Julho / 2007
120
LISTA DE GRÁFICOS
1 - Média Histórica de Chuvas em Mulungu – CE 59
2 - População Residente de Mulungu – CE 82
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
AGRITEMPO – Sistema de Monitoramento Agrometeorológico
APA – Área de Proteção Ambiental
CEPEMA – Fundação Cultural Educacional Popular em Defesa do Meio Ambiente
CNPq – Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
CNUCED – Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento
CO2 – Dióxido de Carbono
COELCE – Companhia Energética do Ceará
CPRM – Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais
DSG – Diretoria do Serviço Geográfico
EMBRAPA – Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária
FUNCEME – Fundação Cearense de Meteorologia e Recursos Hídricos
FUNECE – Fundação Universidade Estadual do Ceará
15
GIS – Sistema de Informações Geográficas (Geographic Information System)
GPS – Sistema de Posicionamento Global (Global Positioning System)
IBAMA – Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IPCC – Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas
IPECE – Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica do Ceará
LANDSAT – Land Remote Sensing Satellite
NNE – Norte-Nordeste
ONG – Organização Não-Governamental
PAT – Plano de Ação Turística
PDDU – Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano
PDR – Plano de Desenvolvimento Regional
PRCC – Programa de Renovação e Revigoramento da Cafezais
PROURB-CE – Projeto de Desenvolvimento Urbano do Estado do Ceará
REFO – Residência Fortaleza
SDLR – Secretaria do Desenvolvimento Local e Regional do Estado do Ceará
SEAGRI – Secretaria de Agricultura e Pecuária do Estado do Ceará
SEINFRA – Secretaria de Infra-Estrutura do Estado do Ceará
SEMACE – Superintendência Estadual do Meio Ambiente do Ceará
SEPLAN – Secretaria de Planejamento do Estado do Ceará
SETUR – Secretaria do Turismo do Estado do Ceará
SRH – Secretaria dos Recursos Hídricos do Estado do Cea
SSW – Sul-Sudoeste
SUDENE – Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste
SUPREN – Superintendência de Recursos Naturais e Meio Ambiente
UECE – Universidade Estadual do Ceará
UFC – Universidade Federal do Ceará
UFPR – Universidade Federal do Paraná
USP – Universidade de São Paulo
UNFCCC – Convenção-Marco das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas
ZCIT – Zona de Convergência Intertropical
16
INTRODUÇÃO
A natureza preparou, ao longo de sua evolução, ambientes diversos
condicionados por variados fatores, formando, assim, potencialidades paisagísticas
complexas. No Brasil, muitos exemplos deste mostruário, de forma que foram
designados domínios paisagísticos e macroecológicos relativamente homogêneos,
do ponto de vista fisiográfico e ecológico.
Inseridos nesses grandes domínios paisagísticos, encontram-se
contrastes de paisagens e de ecologias, configurados como pequenos quadros de
exceção, representados pelos enclaves (AB’SABER, 2003). Denominam-se, assim,
como paisagens de exceção.
As paisagens de exceção representam configurações diferenciadas em
relação ao seu entorno. Resultam de uma dinâmica própria, oriunda de fatores
naturais, sobretudo biogeográficos, ao longo do tempo geológico. Suas formas
podem oferecer a resposta para os estudos sobre a formação de ambientes
existentes tanto no passado quanto no presente.
Na Região Nordeste do Brasil, mais especificamente no Estado do Ceará,
as paisagens de exceção, segundo Ab’Sáber (2003), verificam-se ao longo de seu
território, exemplificadas pelos: agrupamentos de inselbergs, sob a forma de
“montes ou ilhas” rochosas que pontilham domínios das caatingas; e maciços
elevados, voltados para os ventos úmidos vindos do Oceano Atlântico, resultando na
formação de florestas tropicais de cimeira, também denominados como “enclaves”,
“encraves ” ou “ilhas” úmidas, que se apresentam dispostos em pleno sertões secos.
Os maciços elevados cearenses, mas conhecidos por serras, têm
importância fundamental por comporem um sistema de dispersão de drenagem.
Dentre estes, a Serra de Baturité é o de maior expressividade, onde ainda é possível
identificar resquícios da Mata Atlântica.
O Bioma - ou Domínio da Mata Atlântica - é considerado o de maior
biodiversidade do Brasil, que apresenta, atualmente, uma cobertura florestal
reduzida a cerca de 7,6% da área original. Configurava, primitivamente, uma área de
aproximadamente 1.306.421 km
2
, que foi intensamente degradada, desde o início da
colonização do Brasil, começando com a exploração do pau-brasil (Caesalpinia
echinata), prosseguindo depois, com a retirada da cobertura vegetal para atender a
atividades monocultoras, como as da cana-de-açúcar (Saccharum officinarum) e do
17
café (Coffea arábica), aos dias atuais com a aceleração do crescimento urbano e
industrial (FUNDAÇÃO SOS MATA ATLÂNTICA, 2007).
A exuberância paisagística da Serra de Baturité justifica-se pelo
comportamento de um ambiente diferenciado, onde a altitude do relevo possibilita a
existência de condições climáticas que potencializam, favoravelmente, a ocorrência
de um enclave de mata úmida, no domínio semi-árido das caatingas, com formação
influenciada pelos ventos que sopram do Oceano Atlântico. As potencialidades dos
recursos naturais favorecem, historicamente, a criação de condições propícias ao
desempenho das atividades agrícolas e da fixação de populações. Assim, desde que
começou a ser ocupada, por volta do século XVIII, iniciaram-se processos de
exploração intensa, sob os quais a mata, ali existente, ia sendo continuamente
retirada para dar lugar a espaços urbanos e áreas agrícolas, sem qualquer limite.
Dessa forma, foi necessário instituir medidas para conter os efeitos
negativos causados pelo uso e pela ocupação da terra, na Serra, mediante
aplicação de instrumentos normativos com objetivos claros e práticos de uso
sustentável, buscando-se uma forma de concretizar uma relação harmoniosa entre a
sociedade e a natureza e, assim, procurar manter vivo o que ainda resta da
biodiversidade local. Dentre as possibilidades viáveis para deter o uso desordenado
dos recursos naturais, em desacordo com as prescrições legalmente estabelecidas,
criou-se uma Unidade de Conservação: a Área de Proteção Ambiental (APA) da
Serra de Baturité.
Criada no início da década de 1990, a APA abrange uma área de 32.690
ha (trinta e dois mil, seiscentos e noventa hectares), delimitada a partir da altitude
acima de 600 m (seiscentos metros). A legislação pertinente à da APA, todavia, não
é rigorosamente cumprida, haja vista a SEMACE (Superintendência Estadual do
Meio Ambiente) não contar com equipe de profissionais suficiente para fiscalizar
uma área de tamanho considerável e com topografia fortemente dissecada,
dificultando o acesso a determinados setores da APA.
A APA da Serra de Baturité abrange parte do território de oito municípios
cearenses, dentre os quais, Mulungu apresenta-se com extensa área inserida nessa
unidade, o que influenciou na sua escolha para análise, neste estudo. Sua
importância ambiental assume o fato de ser o município com maior área territorial
inserida nessa Unidade de Conservação. Dos 32.690 ha da APA, 10.752 ha fazem
parte do Município, o que equivale a 107,52 km² ou 33% do total. São quase 1/3 da
18
APA, portanto. Em relação à área total do Município, que é de 134,59 km², apenas
27 km² ficam de fora, porém a degradação existente ultrapassa, em muito, essa
marca, mostrando, dentre outros fatores, a falta de fiscalização por parte da gerência
da APA.
O Município de Mulungu está localizado no norte do Estado do Ceará, na
porção noroeste da região do Maciço de Baturité. A sede urbana está situada a
790m de altitude. Seu território localiza-se, na maior parte, no platô úmido da Serra.
Apresenta, como principais atividades econômicas, a prestação de serviços e o
comércio local, além de um desenvolvimento rural, baseado no aprimoramento de
culturas tradicionais. Este último é o principal responsável pela degradação
ambiental ocorrente no território municipal, aliado, agora, aos problemas urbanos
(como a falta de saneamento básico, a destinação de resíduos sólidos e os esgotos
à céu aberto) e ao crescente interesse de investidores imobiliários.
O crescimento dos interesses imobiliários, de serviços e comerciais por
áreas na Serra de Baturité consolidou a região como segunda residência e propícia
às atividades turísticas. Apesar de ainda não desenvolver investimentos nos
serviços voltados para a atividade turística, Mulungu destaca-se como um dos
municípios que mais comercializa terrenos e sítios, o que evidencia a prática da
especulação imobiliária, provocando assim diversas transformações no geossistema
daquele espaço.
Mesmo com a existência do Código Florestal (Lei 4.771, de 15 de
setembro de 1965) e a criação da APA na Serra, a área delimitada pelo Município
continua enfrentando problemas ambientais no que diz respeito às condições de uso
e ocupação da terra por meio das atividades ali desenvolvidas. Mulungu é estudado
com base nessa questão.
Esta pesquisa desenvolve-se fundamentada no estudo integrativo da
natureza, com base na concepção geossistêmica. Inicialmente, realizou-se a análise
e o estudo do referencial teórico sobre o assunto em foco, o levantamento histórico
da ocupação na Serra de Baturité (assim como, do Município de Mulungu), o exame
de material cartográfico, bibliográfico e documental produzido por instituições
oficiais. Na pesquisa de campo, fez-se a aplicação de entrevistas à população local,
umas visitas a órgãos e instituições públicos, o reconhecimento da verdade terrestre
e a análise das condições físicas do meio.
19
Esta pesquisa tem como objetivo precípuo avaliar o estado atual de
conservação dos recursos naturais, inseridos no Município de Mulungu. O estudo
requer o somente o conhecimento da área como um todo, mas também a análise
físico-ecológica das compatibilidades de uso e ocupação a longo prazo, buscando-
se, efetivamente, conhecer as condições atuais de ocupação in loco e analisar os
efeitos dessas transformações. Por fim, propõe-se subsídios para o planejamento
ordenado no sentido de contribuir para a sustentabilidade, isto é, a utilização dos
recursos como atividade econômica de forma socialmente justa sem que haja danos
à natureza, mantendo-a viva para legá-la às gerações futuras.
20
1 GEOGRAFIA E ANÁLISE GEOSSISTÊMICA DA PAISAGEM: TEORIA,
MÉTODOS E TÉCNICAS
O Município de Mulungu não conta, ainda, com um Plano Diretor de
Desenvolvimento Urbano (PDDU), apesar da urgente necessidade de adotar-se
medidas protecionistas devido à sua indispensabilidade diante do crescimento do
interesse turístico que a região apresenta, bem como em função do crescimento do
interesse de outras atividades produtivas. Apenas, participa de projetos regionais,
como o Plano de Desenvolvimento Regional (PDR) do Maciço de Baturité e a Área
de Proteção Ambiental (APA) da Serra de Baturité. Torna-se, enfim, de extrema
urgência propor um estudo mais aprofundado desse Município, de modo a contribuir
para um futuro plano de ação e metas para o desenvolvimento local.
A análise da paisagem tem o objetivo de demonstrar a configuração físico-
ambiental da região, incluindo as características dos recursos naturais nos aspectos
geológico-geomorfológicos, hidroclimáticos, pedológicos e sua biodiversidade.
Dessa forma, procura-se entender a constituição do ambiente de forma sistêmica,
por meio da inter-relação dos aspectos geoambientais e suas limitações,
proporcionando subsídios para o uso e para a ocupação corretos da terra.
A análise da paisagem é de natureza integrativa e tem como base o
estudo dos geossistemas (BERTRAND, 1969; SOTCHAVA, 1976; TRICART, 1977;
CHRISTOFOLETTI, 1979; MONTEIRO, 2000; SOUZA, 2000). O estudo sobre os
geossistemas é fundamentado com base na Teoria Geral dos Sistemas.
A teoria geral dos sistemas (General Systems Theory) foi inicialmente
desenvolvida nos Estados Unidos, devendo-se a R. Defay, em 1929, e a
Ludwig von Bertalanffy, a partir de 1936, as primeiras aplicações na
termodinâmica e na biologia. (...) Bertalanffy propôs perspectiva organística
ou teoria dos sistemas relacionada com a harmonia e coordenação de
processos entre uns e outros. (CHRISTOFOLETTI, 1979).
Uma das principais características a serem citadas a respeito da Teoria
Geral dos Sistemas é o desenvolvimento de uma teoria de caráter geral e
multidisciplinar. Um estudo sistêmico é realizado mediante análise e investigação
das partes componentes de um todo, isto é, conjunto de elementos que,
relacionados entre si e com certo grau de organização, atingiram determinado
objetivo ou finalidade. O todo sempre estará condicionado às relações e conexões
21
estabelecidas entre suas partes, de forma que, caso haja alguma alteração em uma
das partes, esta afetará a configuração final do todo; ou, mesmo quando as partes
são estudas de forma isolada, suas propriedades são individualizadas e a simples
soma de suas partes diferencia-se do todo (CHRISTOFOLETTI, 1979).
Na abordagem geográfica, a Teoria Geral dos Sistemas funcionou como
base para o surgimento de uma ferramenta indispensável, principalmente nos
estudos da natureza. Trata-se da estruturação dos Geossistemas, que constitui a
base atual dos estudos integrados da Geografia Física.
Os principais propagadores do Geossistema no mundo, Bertrand (1972) e
Sotchava (1977), foram difundidos, no Brasil, através dos periódicos do extinto
Instituto de Geografia da Universidade de São Paulo, os Cadernos de Ciências da
Terra.
Apesar de ter sido formulada pela escola russa, por meio de V. B.
Sotchava, que propõe o conceito e dele se utiliza de forma pioneira num
estudo publicado em 1960, a teoria foi difundida no mundo ocidental pela
escola francesa e por iniciativa de G. Bertrand, na mesma década, em
1968. (RODRIGUES, 2001, p.73).
Sotchava (1977) caracterizou-o como a expressão dos fenômenos naturais
resultantes da interação, na superfície da Terra, da litomassa com
biomassa, aeromassa e hidromassa. Para esse autor, as formações
naturais experimentam na atualidade o impacto de elementos sociais,
econômicos e técnicos, que lhes modificam a dinâmica natural peculiar;
nesse sentido, a concepção geossistêmica implica conceitualmente a
relação sociedade x natureza. (SALES, 2004, p.130).
Por meio da concepção geossistêmica, toma-se como categoria o estudo
da paisagem. Este estudo assume a função de estabelecer padrões espaciais,
adotando determinados graus de homogeneidade.
Bertrand (1972, p.2) destaca, na Geografia Física Global, o fato de não se
estabelecerem para o estudo, apenas, elementos da paisagem ‘natural’, mas
também a participação do ser humano como atuante na transformação do espaço
geográfico. Na análise da paisagem, o autor enumera métodos fundamentais em
seus estudos, tais como a noção de escala e a classificação dos elementos
específicos (clima, geologia, solos, relevo e vegetação, assim como uso e ocupação
da terra), chegando-se, pois, à síntese da paisagem, que é uma delimitação
geográfica, isto é, “um meio de aproximação em relação com a realidade
geográfica”.
22
Fig.01: Esboço de uma definição teórica de geossistema
Fonte: Bertrand (1971, p.13
)
POTENCIAL
ECOLÓGICO
EXPLORAÇÃO
BIOLÓGICA
GEOSSISTEMA
AÇÃO ANTRÓPICA
Como modo de facilitar o estudo da paisagem, Bertrand (1972)
estabelece um sistema hierárquico de classificação mediante unidades de paisagem
em seis níveis de grandeza espaço-temporais, conforme A. Cailleux e J. Tricart,
dividindo-as em unidades superiores e inferiores.
Às unidades superiores interessam as macroestruturas e a zonalidade
climática. A zona é a unidade de maior dimensão (1ª grandeza), ligada ao conceito
de zonalidade planetária, abrangendo os grandes climas e seus ‘biomas’ planetários;
seguida dos domínios morfoclimáticos (2ª grandeza), que podem ser delimitados por
condições morfoclimáticas; e a região natural (3ª e grandezas), definida por certa
individualização geológica ou geomorfológica.
Nas unidades inferiores, é possível incorporar os componentes criados
pelo ser humano como parte delas e sua conseqüente interação com o meio, de
forma dialética, sendo assim de maior interesse geográfico: geossistema, geofácie e
geótopo. “Na verdade, geo ‘sistema’ acentua o complexo geográfico e a dinâmica de
conjunto; geo ‘fácies’ insiste no aspecto fisionômico e geo ‘topo’ situa essa unidade
no último nível de escala espacial” (BERTRAND, 1972, p.5).
O geossistema é a primeira unidade inferior à região natural, enquadrada
entre e a grandezas, onde se constitui a organização do espaço, compatível
com a escala humana. O geossistema resulta de uma integração dinâmica dos seus
componentes, os quais são o potencial ecológico (fatores geomorfológicos,
climáticos e hidrológicos), a exploração biológica (atuação da vegetação, fauna e
solos) e a ação antrópica (fig.01).
23
Segundo Bertrand (1972), pela dinâmica de relações e também em razão
das potencialidades ecológicas e da ocupação biológica não serem estáveis, pois
estão sempre em variações no tempo e espaço, é expresso que o Geossistema não
se apresenta de forma totalmente homogêneo. É possível encontrar diversas formas
de paisagens, por sua vez ligadas umas às outras, podendo estas representar
diferentes estádios de evolução do geossistema. Cada uma dessas paisagens
distintas é classificada como geofácies.
Situada na ordem de grandeza, “o geofácies representa assim uma
malha na cadeia das paisagens que se sucedem no tempo e no espaço no interior
de um mesmo geossistema” (BERTRAND, 1972, p.7), configurando-se, pois, como
unidade fisionomicamente homogênea.
Por fim, os níveis componentes das unidades inferiores, tem-se o geótopo,
que constitui a menor unidade geográfica homogênea, configurada como um
resquício pontual. Essa está situada na 7ª grandeza de escala temporoespacial.
Entre os vários estudiosos que utilizam o método geossistêmico no Brasil,
merece destaque o geógrafo Aziz Ab´Saber. Foi ele quem primeiro classificou o
território brasileiro em domínios morfoclimáticos, utilizando, assim, o geossistema
como método. Ab’Saber tem evidência na pesquisa por ser o principal autor a tratar
do conceito de paisagens de exceção, que classifica as tipologias existentes por
região e características.
Outro geógrafo, merecedor de destaque, é o professor Carlos Augusto de
Figueiredo Monteiro, autor que trouxe o estudo dos Geossistemas para o Brasil e
produziu o trabalho Geossistemas: a história de uma procura (2000). Nesse livro, o
autor reuniu dados relativos ao seu percurso como geógrafo e docente em
universidades, salientando que o geossistema se enquadra como um dos melhores
métodos de pesquisa em Geografia, considerando-o como uma tentativa de
melhoria na investigação da Geografia Física junto à avaliação ambiental, pela
integração do natural com o humano, merecendo entrosamento multidisciplinar para
que haja uma interdisciplinaridade nos estudos. Dessa forma, o autor acentua que:
[...] o tratamento geossistêmico visa à integração das variáveis “naturais” e
“antrópicas” (etapa análise), fundindo “recursos”, “usos” e “problemas”
configurados (etapa integração) em “unidades homogêneas” assumindo um
papel primordial na estrutura espacial (etapa síntese) que conduz ao
esclarecimento do estado real da qualidade do ambiente na (etapa
aplicação) do “diagnóstico”. (p.81).
24
Em estudo sobre a ecodinâmica da paisagem na Serra de Maranguape-
CE, Arruda (2001) exprime a idéia de que, para uma análise geossistêmica aplicada
ao estudo das paisagens, faz-se necessário considerar,
[...] os elementos componentes do geossistema; a estrutura, o arranjo e a
distribuição de seus elementos; as características dimensionais; as
relações entre os elementos; os processos responsáveis por sua
organização; como se processam os fluxos de matéria e energia entre os
seus elementos e para o exterior; o nível de estabilização ou
transformação; o grau de utilização e sua importância socioeconômica; e o
grau de interferência antrópica, considerada como parte essencialmente
integrante do geossistema. (p.20).
Para uma melhor definição dos ambientes encontrados na área de estudo,
tem-se a contribuição de Tricart (1977) na análise ecodinâmica das unidades
geoambientais, facilitando assim a determinação de quais serão as formas de uso e
ocupação mais adequadas com base na identificação do grau estabilidade, pela
morfogênese e pedogênese.
A classificação ecodinâmica dos ambientes é baseada nos critérios de
Tricart (1977) os meios estáveis, os meios intergrades e os meios fortemente
instáveis adaptados por Souza (1998, p.28), seguindo as necessárias adequações
às características naturais do Ceará. Assim, os critérios de definição das categorias
de ambiente são:
· Ambientes estáveis: estabilidade morfogenética antiga em função da
fraca atividade de potencial erosivo; o balanço entre os processos
morfogenéticos e processos pedogenégicos é favorável à pedogênese; o
recobrimento vegetal é pouco alterado pelo antropismo ou fraca
recuperação da cobertura secundária que evolui para condições similares
ou próximas das originais; equilíbrio entre fatores do potencial e
fatores da exploração biológica.
· Ambientes de transição: a dinâmica atual do ambiente é marcada pela
preponderância de processos morfogenéticos ou de processos
pedogenéticos, podendo favorecer uma ou outra condição:
predominando a pedogênese passa-se aos meios estáveis; em caso
contrário, passa-se aos meios instáveis.
· Ambientes fortemente instáveis: intensa atividade do potencial
erosivo; balanço morfogênese x pedogênese é fracamente favorável à
morfogênese; podem ser freqüentes as rupturas do equilíbrio
ecodinâmico e a manutenção do solo é, freqüentemente, comprometida.
25
Ao se tratar do potencial atual dos recursos naturais, suas limitações de
uso e do estado de conservação, foram definidas as categorias de vulnerabilidade,
em que Souza (op. cit.) estabeleceu as seguintes:
· Vulnerabilidade baixa: áreas dotadas de boa capacidade produtiva dos
recursos naturais e com limitações que podem ser mitigadas com
aplicações de tecnologias simples e não onerosas;
· Vulnerabilidade moderada: áreas com razoáveis condições quanto à
capacidade produtiva dos recursos naturais, incluindo o potencial
hídrico, o estado de conservações dos solos e do seu potencial de
utilização;
· Vulnerabilidade alta: áreas em que a capacidade produtiva dos
recursos naturais é mínima e onde os efeitos da degradação ambiental
adquirem características praticamente irreversíveis em função da
devastação, da ablação dos solos e dos índices negativos elevados do
balanço hídrico. (Id. ibidem).
É importante salientar que Tricart trabalha essa concepção com base no
conceito ecológico de sistemas, isto é, o ecossistema, que buscou integrar na
Geografia sica. A “Ecologia tem por objetivo o estudo dos vários seres vivos em
suas relações mútuas e com o meio ambiente” (1977, p.17). Defende-se, pois, que o
autor não deixa de destacar o homem como ser vivo de desenvolvimento intelectual,
capaz de modificar os ecossistemas, os quais, por sua vez, reagem determinando
algumas adaptações ao homem. Consoante sua informação, o conceito de
ecossistema surgiu por intermédio de Tansley (1934), assinalando tratar-se de “um
conjunto de seres vivos mutuamente dependentes uns dos outros e do meio
ambiente no qual eles vivem”.
Acrescenta-se, ainda, que ecossistema e geossistema não se apresentam
como sinônimos. O ecossistema é biocêntrico, pois seu estudo objetiva conhecer as
propriedades dos próprios organismos. O geossistema é policêntrico, portanto as
investigações funcionais são mais amplas, ao abrager todas as relações no
complexo natural (RODRIGUEZ, 2004, p. 51).
1.1 Paisagem: da noção ao conceito geográfico
A paisagem, antes mesmo de ser estudada e conceituada, sempre esteve
presente por intermédio da observação do meio, expressa inicialmente pela sua
retratação, desde pinturas rupestres, como também pelas culturas ocidental e
26
oriental, evidenciada pelas construções de jardins e observação do céu, assim como
pelas artes e ciências. Na literatura, considera-se que a primeira referência à palavra
paisagem está no Livro dos Salmos, escrito por volta de 1000 a.C., no Antigo
Testamento, referindo-se à bela vista do conjunto arquitetônico de Jerusalém. a
sua representação ocorreu, primeiramente, nos registros pela pintura e relatos de
viagens pelo mundo ocidental (MAXIMINIANO, 2004).
Sua conceituação inicia-se através da contribuição dos interesses
fisionômicos da natureza realizados por Humboldt, na Alemanha do século XVIII,
juntamente com Friedrich Ratzel, em fins do século XIX, em sua linha de
pensamento sobre as relações causais existentes na natureza. “Na virada do século,
suas idéias foram assimiladas pela Landschaftskunde, uma ciência das paisagens,
considerada sob ótica territorial, ou seja, uma expressão espacial das estruturas da
natureza, organizadas por leis cientificamente observáveis.”(MAXIMINIANO, 2004,
p.86).
Após a introdução do conceito de paisagem feita pelos alemães, por volta
dos anos 1940, autores franceses, influenciados por Paul Vidal de la Blache e Jean
Rocherfort, caracterizaram paysage como a relação estabelecida entre o homem e
seu espaço físico, chegando a substituir o termo paisagem (landscape, nos Estados
Unidos) pelo vocábulo ‘região’, mais ligado à história do que aos elementos naturais.
Na mesma época, na Alemanha, a paisagem era caracterizada como conjunto de
processos ecológicos, de corrente naturalista (mesma tendência que desenvolveu o
geossistema na ex-URSS e Leste Europeu).
Fica evidente a dificuldade de aplicar conceitos de paisagem à pratica ou à
uma finalidade concreta, com tal amplitude de concepções. Por esta razão,
o Congresso da União Geográfica Internacional UGI, em Amsterdã, em
1938, reconheceu a necessidade de uma definição clara do que fosse
paisagem, para tratar do conflito de abordagens objetivas e subjetivas.
(ROUGERIE E BEROUCHATCHVILI, 1991 apud MAXIMINIANO, 2004,
p.86).
Com base nesse enfoque, destaca-se, então, a idéia de
Landschaftsökologie (ecologia da paisagem), proposta por Carl Troll, por meio da
combinação da dimensão espacial, horizontal (abordagem geográfica), com a
dimensão funcional, vertical (abordagem ecológica).
27
Diante da trajetória acerca da constituição para um conceito de paisagem,
Schier (2004) caracteriza-a como sendo de base filosófica, originalmente ligada ao
positivismo (na escola alemã), em que
[...] se focalizam os fatores geográficos agrupados em unidades espaciais
e, numa forma mais dinâmica, na geografia francesa. Ambas tratam a
paisagem como uma face material do mundo, onde se imprimam as
atividades humanas. A abordagem neopositivista direcionou para o termo
região tentando dar enfoque ao processo de abstração da realidade física,
conforme a sua metodologia quantitativa. A abordagem marxista
(materialista), pouco interessada na geograficidade da paisagem,
identificou-se com o termo região, o qual define como um produto territorial
da ação entre o capital e trabalho. As abordagens da ecologia humana,
entretanto, beneficiam-se da idéia de paisagem ao demonstrar suas
características sistêmicas. (p.80).
Sob vários aspectos, tenta-se estabelecer um conceito de paisagem, seja
como a estrutura de um ecossistema ou uma das palavras-chave dos estudos
geográficos ou arquitetônicos, ou tratada como base do meio físico para a Sociologia
ou a Economia, e trabalhada em diversas escalas de detalhe. Na atualidade, a
paisagem conceitua-se mais relacionada à questão ambiental e à estética.
Na Geografia, não há muitas controvérsias a respeito do conceito de
paisagem. Pode-se dizer que paisagem é o conjunto da relação entre elementos
físicos, biológicos e humanos, que resultam em determinada configuração visual,
sempre condicionada a transformações, sejam de origem local e/ou global.
Tradicionalmente, muitos geógrafos caracterizam-na como natural ou cultural. As
paisagens naturais, natureza, intocadas pelo homem, são formadas através das
interações estabelecidas entre os elementos físicos (geomorfologia, geologia, clima
e hidrografia) e os biológicos (vegetação, solos e fauna), enquanto as paisagens
culturais incluem as modificações estabelecidas pela humanidade na natureza,
resultando assim numa 2ª natureza.
Dentre os principais geógrafos que trataram de conceituar o termo
paisagem, destaca-se o geógrafo norte-americano Carl Sauer, o qual representa a
Geografia Clássica, trazendo a idéia de paisagem relacionada ao tempo e suas
relações vinculadas ao espaço, estando sempre em constante desenvolvimento.
Esse autor faz uma discussão aprofundada acerca da paisagem geográfica,
destacando sua generalização derivada da observação de cenas individuais e da
soma de características visuais. “Toda paisagem tem uma individualidade, bem
28
como uma relação com as outras paisagens e isso é verdadeiro com relação às
formas que compõem a paisagem” (SAUER, 2004, p.24).
Sauer (op. cit., p.29) discute um elemento importante no estudo da
paisagem: o valor. Para ele, o valor da paisagem é definido pelo interesse do
homem sob determinado espaço, pelas suas qualidades físicas (valor de habitat,
presente e potencial). Acrescente-se, ainda, o fato de Sauer ter sido um dos
primeiros geógrafos a tratar a Geografia de maneira integrada, inserindo a visão
fenomenológica no seu contexto, através de uma leitura crítica. O autor defende que
a Geografia está baseada na união dos elementos físicos e culturais da paisagem,
mas, para análise, apresenta uma distinção entre paisagem natural e cultural,
explicitada no momento em que assinala serem as formas em que o homem introduz
na paisagem outros conjuntos, configurados pela sucessão histórica (op. cit., 2004,
p.29).
Outro destaque a ser registrado é o geógrafo francês Georges Bertrand
(1972), que não faz distinção entre natural e cultural, trabalha a paisagem em sua
totalidade de modo homogêneo, conformando unidades, porquanto a sociedade e a
natureza estão relacionadas entre si, representadas em um mesmo espaço
geográfico.
A paisagem não é a simples adição de elementos geográficos
disparatados. É, em uma determinada porção do espaço, o resultado da
combinação dinâmica, portanto instável, de elementos físicos, biológicos e
antrópicos que, reagindo dialeticamente uns sobre os outros, fazem dessa
paisagem um conjunto único e indissociável em perpétua evolução.
(BERTRAND, 1972, p.2).
Juntamente com as contribuições de Bertrand (1972), outros autores
consagraram-se pelo fato de operacionalizarem a paisagem por intermédio do
desenvolvimento do conceito de geossistema. Para Sotchava (1977), a identificação
dos geossistemas ocorre mediante a homogeneidade e a diferenciação, por meio de
classes hierarquizadas do ambiente natural. “A perspectiva sistêmica permite a
identificação da diversidade de interação dos níveis internos de uma paisagem, sua
funcionalidade, seus estado e suas relações com o meio” (MAXIMIANO, 2004, p.88).
Há, no entanto, fatores comuns nas discussões a respeito da
conceituação de paisagem na Geografia: a participação do homem, o aspecto visual,
29
a possibilidade de ser cartografada, a questão da escala (do local ao global) e a
noção de taxonomia na identificação das unidades de paisagem.
1.2 Papel da Geografia nos Estudos Ambientais
No campo científico, os estudos ambientais são cada vez mais presentes,
haja vista seu caráter multidisciplinar, abrangendo amplo número de conhecimentos
envolvidos, sejam de bases naturalistas, humanísticas ou tecnológicas. A Geografia,
entretanto, destaca-se, por ser a única ciência que confere uma formação com
bases naturais e sociais (por meio da herança científica dos alemães Alexander von
Humboldt, que era naturalista, e Karl Ritter, filósofo e historiador, bem como por
contribuições posteriores, de outros estudiosos), o que a faz se propor a estudar as
relações entre o homem e o meio. Entende Mendonça (2001b, p.24) que,
[...] juntando os dois conhecimentos, lançaram a ciência geográfica, tendo
como objetivo a compreensão dos diferentes lugares através da relação
dos homens com a natureza, sendo que para isso era necessário o
conhecimento dos aspectos físico-naturais das paisagens, assim como dos
humano-sociais. Percebe-se assim que nascia uma ciência preocupada
diretamente com o que hoje se entende, de forma geral, por meio
ambiente.
Mendonça (2004) acredita, no entanto, que a busca de se estudar a
problemática ambiental pela abordagem geográfica produz uma das principais
discussões entre os geógrafos: a presença da dicotomia, - ou dualidade -, entre
Geografia Física e Geografia Humana.
A Geografia, ciência de conflitos, estruturou-se da junção de vários
conhecimentos científicos, destacando-se os campos das ciências naturais (da terra
e biológicas), exatas e humanas.
Originalmente formada no encontro das ciências humanas, da terra e
biológicas, a Geografia apresentou desde a sua gênese científica uma forte
complexidade quanto à sua definição conceitual, bem como as aplicações
metodológicas; isto sem falar na sua problemática enquanto possuidora de
um objeto de estudo que reúne uma série de objetos de estudos de outras
ciências. (MENDONÇA, 2001a, p.15).
Dada a relação da Geografia com as demais ciências, como modo de um
melhor entendimento, o geógrafo brasileiro Carlos Augusto Figueiredo Monteiro
30
Fig.02: Constituição da Geografia, segundo C. A. de
Figueiredo Monteiro, 2000
(2000 apud MENDONÇA, 2001a) apresentou um esquema que retrata essa
realidade de forma clara. Evidencia-se como a Geografia é mais voltada para os
estudos das organizações humanas diante do espaço físico, caracterizando-se, pois,
como uma ciência social. O esquema, a seguir (fig. 02), admite que a Geografia é
constituída pelas ciências naturais (da terra e biológica, em um vértice,
caracterizado pelo ambientalismo) e pelas ciências humanas (destacando as
ciências econômicas e sociais), aparecendo em dois momentos, quando maior
evidência e participação nos estudos geográficos.
Baseado nessa discussão separatista, a Geografia enfrenta algumas
dificuldades no que diz respeito à sua metodologia de estudo. O fato de adotar-se
uma divisão em Geografia Física e Geografia Humana conflita a relação sociedade
versus natureza.
Os geógrafos físicos ou geomorfólogos se restringem às tentativas
incipientes de incluir o ser humano ou a população (quase nunca a
sociedade) nas suas interpretações. Os geógrafos humanos se limitam a
ver como substrato físico, que é passivamente transformado pela
sociedade. (COELHO, 2001, p.21).
Mendonça (2001a) tenta transmitir justamente essa preocupação,
enquadrando a Geografia como a única entre as ciências humanas a levar em
consideração os aspectos físicos do Planeta. O autor destaca a necessidade de
trabalhar a unicidade do pensamento geográfico sem haver a dicotomia ou
separação entre Geografia Física e Geografia Humana. A discussão da temática
ambiental recupera essa unidade existente na Geografia.
31
que ser frisado ainda que a geografia física é uma parte da ciência
denominada geografia e que, como tal, é uma subdivisão das ciências
humanas; quer seu enfoque seja aceito dentro da dicotomia geografia física
versus geografia humana, quer como aspecto importante de uma geografia
de caráter mais global. (MENDONÇA, 2001, p.68).
Originalmente, nos estudos ambientais, situava-se a humanidade como
externa ao meio, como não pertencente à natureza. O ser humano não deixa de ser
um agente de pertença da natureza, contudo nele a capacidade de organizar a
natureza à sua maneira, artificializando-a. Considerava-se natureza o que era
produzido mediante auto-organização, sem intencionalidade humana. O que se deve
notar é o fato de o ser humano ter o poder de transformar a natureza, modificá-la,
escapando da definição de natural. “Assim, uma natureza possuída pelo homem
transfigura-se, adquire uma outra dimensão” (SUERTEGARAY, 2004, p.116).
Significa dizer que o homem, por meio do desenvolvimento de técnicas, é capaz de
intensificar processos naturais ou produzir novos, transformando uma natureza em
outra figura, deixando de ser aquela antes existente.
Justifica-se a externalidade do homem à natureza no fato de a expressão
meio ambiente ter tido sua gênese em princípios naturalistas, tratando a dimensão
social como fator de desequilíbrio do meio, e não como componente deste, e,
também, pelo fato do homem se achar exterior e superior à natureza.
Um estudo em busca de solucionar problemas ambientais exige uma
elaboração complexa e unificada. Configura-se, portanto, uma pesquisa multi e
interdisciplinar, com relações dialéticas na interação da natureza com a sociedade,
na qual a Geografia vai servir como ciência fundamental na formulação de um
planejamento adequado.
1.3 Serra Úmidas: Referenciais Teórico-Metodológicos
Em se tratando de trabalhos e relatórios realizados sobre as serras úmidas
do Ceará, nota-se que, apesar de crescentes, ainda são incipientes, se comparados
aos estudos efetuados acerca de áreas litorâneas. Além de algumas monografias e
dissertações de mestrado, relatórios técnicos específicos elaborados por equipes
multidisciplinares, em geral no momento de implantação de unidades de
conservação ou planos de desenvolvimento regionais. A Serra de Baturité mostra-se
32
entre estes como beneficiada, porquanto, as pesquisas desenvolvidas são muitas e
bem diversificadas, sendo destacados os relatório técnicos seguintes:
· Zoneamento Ambiental da APA da Serra de Baturité: Diagnóstico e
Diretrizes, realizado pela Superintendência Estadual do Meio Ambiente
do Estado do Ceará – SEMACE (1992);
· Planejamento Biorregional do Maciço de Baturité, elaborado pelo
Ministério do Meio Ambiente e Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e
dos Recursos Naturais Renováveis – IBAMA (2002); e
· Plano de Desenvolvimento Regional do Maciço de Baturité, proposto
pela Secretaria de Infra-Estrutura SEINFRA, mediante Projeto de
Desenvolvimento Urbano do Estado do Ceará – PROURB-CE (2002).
Dentre os livros publicados, mecionam-se: Aspectos Histórico-
Econômicos, Geoambientais e Ecológicos do Maciço de Baturité, escrito por José
Arimatéia Campos (2000), com o apoio da Fundação CEPEMA; e A Serra de
Baturité, produzido por Arnóbio de Mendonça Barreto Cavalcante, também autor dos
textos Jardins Suspensos no Sertão (2005) e, mais recentemente, História da Área
de Proteção Ambiental da Serra de Baturité, juntamente com Joquebede Girão
(2006).
Ainda merecem destaque e servem como base para a presente pesquisa
relatórios estatísticos e informativos, tais como o Projeto RADAMBRASIL, por meio
do Levantamento de recursos naturais: Folhas Jaguaribe/Natal (BRASIL, 1981); os
Resultados do universo do Censo 2000 Ceará (IBGE, 2000), o Atlas dos Recursos
Hídricos Subterrâneos do Ceará (CPRM, 2000); o Perfil Básico Municipal (CEARÁ,
2004), o Anuário do Ceará (O POVO, 2005), além de informações coletadas em
banco de dados disponíveis na Internet de instituições oficiais, tais como FUNCEME,
Secretaria de Recursos Hídricos do Estado do Ceará SRH, Secretaria do
Desenvolvimento Local e Regional do Estado do Ceará – SDLR, EMBRAPA e
Sistema de Monitoramento Agrometeorológico – AGRITEMPO.
Acerca do Município estudado, como já citado, não há nem relatórios
técnicos nem trabalhos científicos, realizados especificamente sobre Mulungu. A
base municipal conhecida ocorre por intermédio do Perfil Básico Municipal: Mulungu,
realizado pelo IPECE (CEARÁ, 2004). Além desta, foram coletadas informações na
Biblioteca Municipal de Mulungu e em jornais cearenses.
33
1.4 Procedimentos Técnico-Operacionais
A pesquisa tem como objetivo central a análise das categorias de uso e
ocupação da terra na área compreendida pelo Município de Mulungu CE, bem
como suas influências e conseqüências ambientais, caracterizando as condições
ecodinâmicas e propondo formas de usos adequados. A investigação realizada
apresentou etapas fundamentais para a obtenção dos resultados alcançados.
Inicialmente, em gabinete, efetuou-se o estudo do referencial teórico sobre
o assunto focalizado, o levantamento histórico da serra de Baturité, assim como o do
Município de Mulungu, o exame e o diagnóstico de material bibliográfico e
cartográfico produzido por instituições oficiais. Paralelamente, também, houve a
coleta de dados e de informações específicas em pesquisas feitas na Internet nos
site de Organizações Não-Governaventais como o Greenpeace e o ‘SOS Mata
Atlântica’, e Instituições Oficiais de pesquisa, bem como do Instituto Brasileiro de
Geografia e Pesquisa IBGE. Juntamente com o material adquirido, foi realizada a
interpretação de imagens de sensoriamento remoto do LANDSAT (órbita-ponto 217-
63, b5, b4, b3, b8) em papel tamanho A3.
A pesquisa de campo foi indispensável para fins de reconhecimento da
verdade terrestre. Organizou-se todo o material adquirido em gabinete, visando à
caracterização e à avaliação do meio ambiente, abordando os seguintes aspectos:
as formas de uso e ocupação do solo; as condições de acesso; a qualidade
ambiental; a fragilidade ambiental; as causas dos problemas de fragilidade; as
intervenções corretivas; a vulnerabilidade ambiental; e as condições de moradia da
população local.
Há, como citado, entrevistas à população local, bem como umas visitas
a órgãos e a instituições públicos municipais Destaca-se a visita realizada à
Paróquia do Município, constituída de grande acervo histórico-cultural de Mulungu.
Com o acompanhamento da carta plani-altimétrica do Município de
Mulungu (DSG/SUDENE 1:100.000) e do Mapa Municipal Estatístico (IBGE), o
ambiente é analisado como um todo e documentado por fotografias. Foi realizada a
marcação de pontos por GPS (Global Positioning System) para indicar a localização
precisa das diversas formas de uso e ocupação, encontradas no Município,
delimitação da sede urbana municipal e de zonas urbanizadas (chamadas
localidades), entre outros destaques pertinentes ao estudo. Nesse sentido, foram
34
feitas, periodicamente, visitas de campo, levando-se em consideração o período
climático (estações seca e chuvosa) e período do ano em que o fluxo de pessoas no
Município é maior (caso de festas comemorativas, férias e feriados).
O método cartográfico constituiu-se por meio da utilização dos programas
Arcview GIS 3.2, utilizados na interpretação e construção dos mapas, e Corel Draw
12, para o layout.
Primeiramente, foi realizada a confecção do “Mapa Básico do Município de
Mulungu-CE”, onde permitiu-se que suas informações fossem utilizadas para a
construção dos mapas temáticos, tais como: limites, zonas urbanizadas, infra-
estrutura, topografia e recursos hídricos. O mapa resultou da junção de dados
contidos na carta plani-altimétrica do Município de Mulungu (DSG/SUDENE
1:100.000 – folhas de SB-24-V-B-III Canindé e SB-24-X-A-I Baturité), do Mapa
Municipal Estatístico (IBGE), de banco de dados cartográficos do IPECE (2000), da
base cartográfica da FUNCEME (2006), da análise da Imagem de Satélite SPOT 5
(resolução espacial 2,50m, datada de 4 de setembro de 2004) e de pontos
georreferenciados, durante o trabalho de campo.
Baseado nas informações do Mapa Básico, para a elaboração dos demais
mapas, buscou-se, então, informações de interesse geoambiental levantadas em
instituições públicas e órgãos governamentais e, ainda, enriquecidas através dos
trabalhos de campo, da análise da imagem de satélite e da revisão bibliográfica.
Na elaboração do “Mapa Geológico-Geomorfológico do Município de
Mulungu-CE”, tomou-se como base os mapas temáticos do Zoneamento Ambiental
da APA da Serra de Baturité (SOUZA, 1992), a carta plani-altimétrica
(DSG/SUDENE 1:100.000 folhas de SB-24-V-B-III Canindé e SB-24-X-A-I
Baturité), o banco de dados obtidos pela CPRM (2003), as informações coletadas
com base nas observações de campo e, principalmente, a análise fundamentada na
interpretação da carta-imagem SPOT 5 (2004) do Município.
No “Mapa Pedológico do Município de Mulungu-CE”, as informações de
base vieram dos dados contidos no Mapa Exploratório-Reconhecimento de Solos do
Estado do Ceará (EMBRAPA, 1973), porém, como estes dados estavam em escala
grande (1:600.000), o resultado final deu-se pela análise da imagem de satélite
SPOT 5 (2004), ao tomar-se como base os mapas temáticos do Zoneamento
Ambiental da APA da Serra de Baturité (SOUZA, 1992).
35
O “Mapa de Uso e Ocupação da Terra no Município de Mulungu” foi
confeccionado por meio da base cartográfica cedida pela FUNCEME (2006), em
formato de shapes (editados no Software ArcView 3.2), juntamente com a análise da
Imagem de Satélite SPOT 5 (2004), trazendo informações acerca do estado atual da
vegetação e das condições de organização e produção social.
O “Mapa de Impactos Sócio-Ambientais do Município de Mulungu”
demonstra os geofácies identificados, as informações básicas (tais como limites
municipais, áreas urbanizadas, estradas, espelhos d’água, cursos d’água e riachos)
e uma visualização fotográfica dos principais problemas cio-ambientais
constatados em campo, pontuados por meio de GPS.
O mapeamento básico e temático final foi realizado na escala de
interpretação da imagem de satélite SPOT 5 (2004), que é de 1:50.000.
Assim, a pesquisa é fundamentada na análise e avaliação do estado atual
de conservação dos recursos naturais, propondo-se subsídios para o planejamento
de uso e ocupação da terra em bases sustentáveis, mediante a indicação de opções
e recomendações, conforme a legislação ambiental em vigor e de acordo com as
avaliações técnicas apontadas.
Nesse sentido, os materiais foram indispensáveis para verificação de
dados e informação durante o desenvolvimento do trabalho. Em suma, os materiais
utilizados, tanto nas etapas de campo quanto nas de gabinete, foram:
1 Mapa Municipal de Mulungu (1:100.000 - IPECE).
2 Folhas plani-altimétricas do projeto RADAM BRASIL SB24 (1:250.000).
3 Folhas plani-altimétricas DSG/SUDENE, (1:100.000), folhas de SB-24-V-B-III
(Canindé) e SB-24-X-A-I (Baturité).
4 Fotografias aéreas – ORTOFOTOS 1:4.000.
5 Imagem de satélite SPOT 5, com resolução espacial 2,50m, de setembro de
2004 (cedida pela FUNCEME).
6 Imagens de satélite do LANDSAT, órbita-ponto 217-63, b5, b4, b3, b8, em papel
tamanho A3, com resolução de 15 metros.
7 Mapas temáticos produzidos para o Zoneamento Ambiental da APA da Serra de
Baturité.
8 Mapa Exploratório-Reconhecimento de solos do Município de Mulungu-CE
(EMBRAPA, 1973).
36
9 Atlas do Estado do Ceará (IPLANCE, 1997).
10 banco de dados de base cartográfica da SEAGRI (1988) e da CPRM (2003).
11 Mapa Municipal Estatístico (1:50.000 – IBGE).
Para abordagem metodológica, foram utilizados equipamentos para
desempenho de manipulação, armazenamento e processamento de dados e
utilitários, tais como:
1 Microcomputador Atlon XP 2.0 Ghz.
2 Softwares para análise, tratamento e manipulação de imagens e elaboração de
mapas temáticos: CAD Autocad Map 2000, Arcview GIS 3.2 e Corel Draw 12.
3 Softwares para elaboração de textos, tabelas e gráficos: Microsoft Word, Excel,
PowerPoint.
4 Softwares para visualização e edição de fotografias: Corel Photo-Paint 12 e
PhotoImpact SE 3.02.
5 Impressora jato-de-tinta HP-PSC 1315 all-in-line, para impressão de material
necessário.
6 Papel branco A4 (210x297mm), de 75g/m².
7 Scanner, para digitalização e armazenamento em banco de dados da
documentação fotográfica e documentos necessários à pesquisa.
8 Câmera fotográfica digital SONY DSC-W30, para uso no campo.
9 Gravador de voz digital MP3 Player SONY 1Gb.
10 Aparelho de orientação via satélite GPS Garmin Etrex 12.
11 Software para transferência de dados do aparelho de GPS para o micro-
computador, como o GPS TrackMaker.
O Fluxograma Metodológico (fig.3) mostra, de forma esquemática e
sintética, as etapas da pesquisa, iniciando pelo objetivo central, seguindo os
procedimentos dotados para sua realização e seus objetivos específicos, que iram
gerar os resultados da dissertação.
37
Fluxograma Metodológico
Fig. 3: Fluxograma Metodológico
Adaptado de SOUZA, 1992; 2000; ARRUDA, 2001.
OBJETIVO: análise das categorias de uso e ocupação da
terra na área compreendida pelo Município de
Mulungu/CE, bem como suas influências e conseqüências
ambientais, caracterizando as condições ecodinâmicas e
propondo formas de usos adequados.
Levantamento
biofísico e
Histórico
Potencialidades e
Limitação dos
Recursos Naturais
Ecodinâmica e
Vulnerabilidade
Ambiental
Mapeamento
Temático da
área de estudo
Condições de
Organização e Produção
Socioespacial
Características
Geológico-
Geomorfológicas
Condições
Hidroclimáticas
Aspectos dos Solos
e Vegetação
Tipologias de Uso e
Problemas Ambientais
Avaliação do Estado Atual de
Conservação dos Recursos Naturais
através de Análise Integrada das
Paisagens
Subsídios para o Planejamento de Uso e
Ocupação da Terra em Bases Sustentáveis e
Indicação de Alternativas e Recomendações
Problemas Ambientais Configurados pelo Uso e
Ocupação da Terra em Paisagens de
Exceção, exemplificado pelo Município de
Mulungu – Serra de Baturité – Ceará
Referencial
Teórico
Ambiente e
Geografia
Paisagens
de Exceção
Levantamento e Análise
de Material Bibliográfico
e Cartográfico
Fundamentação
Teórico-
Metodológica
Dados Estatísticos
e Trabalhos e
Campo
Geossistema
38
2 PAISAGENS DE EXCEÇÃO NO NORDESTE BRASILEIRO E O CONTEXTO DA
SERRA DE BATURITÉ - CE
A paisagem brasileira apresenta em toda sua extensão territorial um
grande e diversificado mostruário ecológico. Nota-se, assim como Ab’Sáber (2003,
p.12) afirma, que estas feições paisagísticas e ecológicas ocorrem em uma espécie
de área dimensional extensa e relativamente homogênea. Como modo de
classificação, foram designados domínios de natureza, indicados, principalmente,
pela constância da vegetação. Já foram reconhecidos, até então, seis grandes
domínios paisagísticos e macroecológicos em nosso país: Amazônia, Cerrado,
Mares de Morros, Caatingas, Planalto das Araucárias e Pradarias.
Porém, sabe-se que, no interior desses grandes domínios, se modelam
pequenos quadros de paisagens diferenciadas, de exceção. São contrastes de
paisagens e de ecologias, de natureza própria, representados pelos ‘encraves’ ou
‘enclaves’, complementa aquele autor.
As paisagens de exceção constituem cus de importância ambiental
ímpar, pois, se não houver a preocupação em mantê-las vivas, tenderão a
desaparecer rapidamente. Como a própria denominação sugere, são paisagens
inusitadas que, no aspecto visual e funcional, se diferenciam em relações ao seu
entorno ou aos cenários comuns encontrados. Constituem fontes de recursos
ambientais excepcionais. Resultam de uma dinâmica peculiar, oriunda de fatores
naturais, sobretudo biogeográficos, ao longo do tempo geológico. Em muitos casos,
são formadas de resquícios de paisagens, funcionando no presente como
importantes subsídios para o entendimento da formação de ambientes em diversos
níveis de escala de tempo e de espaço (AB’SÁBER, 2003).
Suas formas podem oferecer a resposta para estudos sobre a formação
de ambientes existentes tanto no passado quanto no presente, assim como explica a
teoria dos redutos e refúgios ecológicos (op. cit., 2003, p.146): “Na realidade, os
enclaves de sistemas ecológicos em espaços de médio porte refletem a dinâmica
das mudanças climáticas e paleoecológicas do período quaternário”. O autor define-
as como
[...] fatos isolados, de diferentes aspectos físicos e ecológicos inseridos no
corpo geral das paisagens habituais. Mais que isso, são referências para
os homens desde a pré-história. Servem, ainda, de referência para que os
que viverem muito depois de nós, caso sejam bem conservados e
39
protegidos. Tendo uma localização, quase sempre, muito distanciada entre
si, os sítios de paisagens bizarras em um país de tamanho gigante
raramente podem ser conhecidos ou estudados em sua totalidade.
Na indicação de paisagens de exceção, realizada por Ab’Sáber (2003),
não são apontados critérios para a delimitação desses ambientes. Porém, nota-se
uma exemplificação da metodologia geossistêmica, a qual define como Geossistema
os grandes domínios morfoclimáticos do Brasil e como geofácies e geótopos as
paisagens de exceção.
Dentre paisagens brasileiras caracterizadas como de exceção, Ab´Sáber
(2003) exemplifica:
· topografias ruiniformes, como as que ocorrem no Piauí (Parque Nacional
de Sete Cidades e a Serra da Capivara), em Goiás (Torres do Rio Bonito),
em diversas chapadas do Mato Grosso (Chapada dos Guimarães e
Planalto dos Alcantilados);
· pontões rochosos do tipo “pão-de-açúcar”, penedos ou “dedos de Deus”,
comuns na região Sudeste, que emergem acima ou à frente dos morros
do lado de maciços e escarpas granítico-gnáisicas;
· grupamentos de inselbergs em forma de “montes de ilhas” rochosas,
ocorrentes no Nordeste sob o domínio da caatinga;
· maciços elevados ou “brejos de altitude” (900-1000 m) em plenos sertões
secos, constituindo-se como verdadeiras ilhas de umidade, redutos de
florestas tropicais;
· os canyons brasileiros (mais conhecidos como gargantas, rasgões,
boqueirões, grotas longas, socavões, itaimbés e passos fundos,
desfiladeiros e estreitos);
· os altiplanos (Itatiaia e alta meseta do pico de Roraima) e nas planícies,
no caso, o Pantanal mato-grossense.
No Ceará, as principais paisagens de exceção configuram-se por meio dos
agrupamentos de inselbergs, como o caso do campo de inselbergs de Quixadá, e
em regiões de altitude pela formação de ‘ilhas úmidas’ ou ‘brejos de altitude’,
ocorrentes em meio ao semi-árido, dos quais exemplificam-se a Cuesta de Ibiapaba,
Chapada do Araripe e as serras de Baturité, Aratanha, Meruoca e Maranguape.
40
Segundo Ab’Sáber (1990, p.163), o termo ‘brejo’, aplicado a ilhas de
umidade no interior dos sertões secos, teve sua origem explicada através do
entendimento na própria serra cearense.
Quem subia dos sertões secos dominantes nas terras baixas onduladas
regionais, encontrava nos altos da serra úmida e florestada algumas
planícies de formato alveolar, logo reconhecidas pela velha expressão
portuguesa ‘brejo’.
2.1 Os Brejos de Altitude da Serra de Baturité
Na verdade, o termo ‘brejos de altitude’ era empregado pelo fato de serem
encontradas pequenas depressões florestadas no alto da Serra de Baturité, com
drenagens perenes, apresentando similaridade às planícies brejosas. Porém, a
palavra acabou por ser aplicada também a outras localidades com condições de
umidade que propiciam a formação e permanência original de florestas, em forte
contraste com os sertões secos. Caracteriza-se como um enclave de tropicalidade
no meio do semi-árido: “uma ilha de paisagens úmidas, quentes ou subquentes, com
solos de matas e sinais de antigas coberturas florestais, quebrando a continuidade
dos sertões revestidos de caatinga” (AB’SÁBER, 1999, p.17).
Ab’Sáber (1990, p.164) acrescenta, ainda, a contribuição do botânico
Dárdamo de Andrade-Lima (1982), segundo o qual alguns brejos são dotados de
florestas que comportam espécies da Mata Atlântica nordestina e das matas
periamazônicas, sugerindo um elo de continuidade quaternária ou tércio-quaternária
entre as duas matas.
A Mata Atlântica é uma formação florestal única, considerada o Bioma
mais rico em biodiversidade do planeta, cuja formação está associada aos ventos
úmidos que sopram do Oceano Atlântico. Segundo a Fundação SOS Mata Atlântica
(2007), sua área original perfazia mais de 1.300.000 km², distribuída em 17 Estados
brasileiros. Porém, mais de 93% de sua constituição original foi devastada,
resultado dos intensos processos de ocupação do homem no Brasil (fig.04).
41
Fig.04: Comparativo da ocupação no passado e no presente da Mata Atlântica. Acima, figura da
área de distribuição original da mata. Abaixo, a sua ocupação atual.
Fonte: SOS Mata Atlântica, 2007.
42
A devastação da Mata Atlântica iniciou-se mesmo antes dos anos de
colonização efetiva do Brasil, no século XVI, logo que o país foi “descoberto” pelos
portugueses, através da exploração do pau-brasil e de outras madeiras nobres. Já
no período colonial, entre os séculos XVII e XVIII, a Mata deu lugar aos cultivos da
cana-de-açúcar (na região Nordeste) e café (nas regiões Sul e Sudeste). Não
somente as atividades agrícolas foram responsáveis pela sua destruição, mas
também atividades de mineração e pecuária somada ao crescimento desordenado
das grandes cidades brasileiras. A Fundação SOS Mata Atlântica (2007) destaca
que é nesse Bioma que estão alocadas sete das nove maiores bacias hidrográficas
do Brasil, em contraste com cerca de 62% da população brasileira localizada nos
grandes centros urbanos do país.
No Nordeste brasileiro, parte da Floresta Atlântica está localizada nos
brejos de altitude. Andrade-Lima (1982 apud TABARELLI & SANTOS, 2004) acredita
que a origem dos brejos de altitude está associada às variações climáticas ocorridas
durante o Pleistoceno, as quais permitiram que a Floresta Atlântica penetrasse nos
domínios atuais da caatinga. Após esse período, então, as áreas florestadas
reduziram-se a pequenos espaços localizados em escarpas ou vertentes, voltadas
para os ventos úmidos, caracterizando-as como “refúgios atuais”, bem como
Ab’Sáber (2003, p.53) denomina como redutos ecológicos através da explicação da
“Teoria dos Refúgios”. A permanência dessas áreas úmidas florestadas está
associada à presença de planaltos, serras e chapadas (com altitudes entre 500
1.100 m), bem como exemplificado na figura 05, que ocasionam chuvas orográficas,
garantindo, assim, níveis de precipitações superiores a 1.200 mm/ano (1960 apud
TABARELLI & SANTOS, 2004, p.18).
Fig.05: Perfil esquemático dos brejos de altitude no Nordeste Brasileiro.
Fonte: TABARELLI & SANTOS, 2004, p.18.
43
Vasconcelos Sobrinho (1971) configura os brejos de altitude como um
acidente orográfico, pela umidade resultante da elevação relevo em contraste com
os brejos comuns, que são depressões com solos encharcados. Esse autor faz,
ainda, uma diferenciação entre brejos do sertão e brejos do agreste.
Porém, o autor insiste em citar que os brejos sertanejos são os
verdadeiros brejos de altitude, ou melhor seria vê-los como verdadeiras paisagens
de exceção.
Os brejos do sertão são do tipo oásis: ilhas de umidade cercadas de vastas
extensões de vegetação xerófila. Os brejos do agreste são prolongamentos
da Floresta Atlântica implantados nas serranias, sem descontinuidade.
Muitas vezes essas serranias marcam os limites entre a Floresta Atlântica
e a caatinga, revestidas, em uma vertente e em suas cumiadas, de mata
úmida, e na outra, de elementos da caatinga. (VASCONCELOS
SOBRINHO , 1971, p. 81).
De acordo com os estudos de Vasconcelos Sobrinho (1971), o Ceará
apresenta uma superfície total de brejos de altitude compreendida por 6.596,50 km²,
representando então mais de 35% do total contabilizado no Nordeste Brasileiro
(tabela 1). Supõe-se, contudo, que esta não seja a área total atual, de modo que se
considera que os dados referentes ao ano de 1971 já estejam desatualizados.
TABELA 1: NÚMERO E ÁREA FLORESTAL DOS BREJOS DE ALTITUDE
OCORRENTES NA FLORESTA ATLÂNTICA
Estados Área florestal (km²) %
Ceará 6.596,50 35,48
Rio Grande do Norte 1.147,50 6,18
Paraíba 6.760,00 36,37
Pernambuco 4.850,00 21,97
Total 18.589,00 100,00
Fonte: Vasconcelos Sobrinho (1971)
No Estado do Ceará, os principais brejos de atitude são representados
pela chapada do Araripe, Cuesta da Ibiapaba e serras de Maranguape, da Aratanha,
de Baturité, de Uruburetama e da Meruoca (fig.06), que foram identificados através
de interpretação de imagem de satélite LANDSAT, do Estado do Ceará. Conforme
Andrade-Lima (1972, p.17), estas regiões apresentam relevo de altitude que
possibilitam, nas vertentes a barlavento, a ocorrência de maiores precipitações
(chuvas orográficas), o que possibilita a existência de uma vegetação exuberante.
44
A presença da umidade está condicionada a vários fatores, dentre os
quais, no caso da Serra de Baturité, o fato do relevo apresentar elevadas altitudes e
de estar próxima ao litoral. Desse modo, a região encontra-se influenciada pelos
ventos oriundos do Oceano Atlântico, o que condiciona a formação de um ambiente
úmido. Por sua vez, estabelece a fixação de uma mata úmida, nesse caso, a Mata
Atlântica.
A figura 07 mostra a notável presença das serras úmidas em meio ao
semi-árido cearense, através de imagem de satélite do LANDSAT.
Fig.06: Distribuição dos principais brejos de altitude do Estado do Ceará.
Elaboração e Edição: Luciana Freire (2007)
45
Fig. 07: Mosaico de imagem de satélite do Ceará
destacando algumas serras, verdadeiras ilhas de
umidade em meio aos sertões:
1. Uruburetama
2. Maranguape
3. Aratanha
4. Baturité
Elaboração e Edição: Luciana Freire (2007)
1
2
3
4
46
As serras úmidas concentram em si melhores condições de recursos
naturais, interferindo em mudanças locais de clima, com características mais
úmidas. O balanço hídrico é positivo e, durante a estação chuvosa, tem
precipitações mais regulares, comparando-se aos sertões. As temperaturas são
mais baixas e as taxas de evapotranspiração apresentam-se menores, contribuindo
para melhorar as condições dos recursos naturais. Por outro lado, os solos
(provenientes de rochas cristalinas, ricas em minerais) também são mais espessos,
têm melhor fertilidade, apresentando condições propícias para a ocorrência da mata
úmida, principalmente as áreas a barlavento, o que se faz como destaque, sendo
considerado como enclave úmido no meio dos sertões, criando um ambiente de
exceção às condições de semi-aridez, prevalecente na região.
Esses fatores interferem na melhoria das condições ambientais e de
recursos naturais. Desse modo, o ambiente apresenta-se muito mais atrativo para a
população, que, historicamente, se fixou naquele local, já que na região há melhores
condições de sobrevivência do que na depressão sertaneja, onde as condições
climáticas são mais severas. Assim, observa-se um contingente demográfico mais
denso do que nos sertões, implicando maior pressão sobre a base de recursos
naturais.
47
3 CARACTERIZAÇÃO FÍSICO-AMBIENTAL DO MUNICÍPIO DE MULUNGU – CE
Ante o diagnóstico sobre o comportamento do ambiente, em que são
efetivadas as interferências pela ocupação humana, a configuração da vegetação
funciona como a primeira resposta aos meios de utilização que foram ou não
empregados naquele local. O estudo geológico permite conhecer a base onde se
processa (seja por fatores internos ou externos) o modelado do relevo. o estudo
geomorfológico traz o resultado direto de influências de forças endógenas e
exógenas, registradas ao longo do tempo geológico, no local em que se constituíram
as formas de relevo e, por sua vez, a formação dos solos e da cobertura vegetal em
busca do equilíbrio ecológico. Fundamenta-se, então, a configuração da paisagem.
O Município de Mulungu localiza-se na porção noroeste do Maciço de
Baturité, apresentando grande expressividade, por encontrar-se dentro de região
serrana, definida como paisagem de exceção. A distância da Capital (em linha reta)
é de 85km (CEARÁ, 2004). O Município de Mulungu está situado “na Messoregião
02 (Norte Cearense), Microrregião Geográfica 013 (Baturité), desmembrado do
Município de Baturité pelo Decreto 29, de 23 de julho de 1890 e inaugurado em
11 de setembro de 1891. Extinto pela Lei nº 550 de 25 de agosto de 1899 e
restaurado pela Lei nº 602 de 06 de agosto de 1900.” (CAMPOS, 2000, p.19).
Ocupando uma área de 134,59 km², o Município de Mulungu tem sede
localizada nas coordenadas de 4º18’20” de latitude S e 38º59’47” de longitude W. A
altitude da sede municipal é de 790m, na maior parte, situada no platô úmido da
serra. o municípios limítrofes: Guaramiranga, ao norte; Baturité e Capistrano, a
leste; Caridade e Canindé, a oeste e Aratuba, ao sul, com dois distritos: Lameirão e
Catolé. O Mapa Básico do Município de Mulungu-CE (fig. 08) ilustra sua localização,
além de outras informações, como as principais rodovias, cursos d’água e curvas de
nível.
A maior parte do Município apresenta vegetação luxuriante durante o ano,
resultante da extensa e densa mata úmida, que faz, da região, enclave úmido no
meio dos sertões cearenses, apreciado pela beleza cênica. O Município de Mulungu
insere-se, então, a unidade geoambiental dos maciços residuais, denominada mais
comumente por serra. Assim, chamada Serra de Baturité, a região tem aspectos em
contraste com o entorno, caracterizada como paisagem de exceção.
48
49
As características geoambientais inter-relacionadas resultam numa
configuração excepcional. O revelo representativo da região estudada chega a
ultrapassar 800-900 metros de altitude, funcionando como barreira aos ventos
oriundos do Atlântico, estabelecendo-se, portanto, um clima diferenciado. A umidade
condiciona a formação de solos mais espessos e a predominância de uma
vegetação com padrões fisionômicos de floresta úmida. Eis, pois, a representação
dessa paisagem singular, em contraste com os sertões circundantes.
3.1 Características geológico-geomorfológicas
O Estado do Ceará é, na sua maior parte, constituído de rochas de
embasamento cristalino, bordejado pelas rochas sedimentares. Situada na região
norte do Ceará, de acordo com o RADAMBRASIL, a Serra de Baturité é formada por
rochas do Complexo Nordestino, no Pré-Cambriano Inferior e Médio (1981 apud
SOUZA, 1992), na Faixa de Dobramento Jaguaribana (BRITO NEVES, 1975 apud
IBAMA, 2002).
Sendo assim, o Município está inserido no Domínio dos Escudos e
Maciços Antigos, como rochas datadas do Pré-Cambriano. “Suas características
geomorfológicas estão subordinadas às influências litológicas e estruturais
pretéritas, aos mecanismos de flutuações climáticas Cenozóicas e aos processos
morfodinâmicos atuais.” (SOUZA, 1992, p.19). A paisagem da Serra de Baturité
modelou-se, principalmente, no Quaternário, período caracterizado pela acentuada
instabilidade climática, de notórias oscilações climáticas.
Embora a Geologia do Município de Mulungu tenha como unidade
litoestratigráfica quase totalmente compreendida em rochas do embasamento
cristalino, ocorrência de pequenas coberturas sedimentares quaternárias,
resultantes dos depósitos aluviais e coluviais, oriundas das vertentes íngremes,
concentradas no fundo de vales.
As falhas apresentam-se na direção Nordeste-Sudoeste (NE-SW),
conforme Mapa Geológico-Geomórfológico do Município de Mulungu-CE (fig. 09),
justificando, pois, as principais direções estruturais, pelas cristas, pelas lombadas,
pela rede fluvial e pelas zonas de cisalhamento. Além disso, a morfologia fortemente
dissecada é, ainda, acionada por eventuais dobramentos e fraturamentos.
50
51
Na compreensão de Souza (1992, p.18), as condições litológicas
apresentam grande variedade, vinculadas ao metamorfismo regional, com a
predominância de migmatitos, gnaisses, gnaisses migmatizados e granitóides
quartzíticos, calcários cristalinos e rochas calcossilicatadas.
Faz-se necessário enfatizar os estudos relacionados às propriedades
geomorfológicas das rochas que, pela estrutura geológica, vão condicionar
determinada ação erosiva e, assim, uma forma de relevo. A predominância de
rochas cristalinas faz com que apresentem propriedades geomorfológicas
específicas, as quais resultam no modelado dos maciços residuais. A
impermeabilidade das rochas permite a esculturação do relevo em formas
dissecadas, impedido a infiltração d’água proveniente da chuva e condicionando um
escoamento superficial (erosão linear), onde as rochas, menos coesas
(compactadas) e mais heterogêneas, vão sendo desagregadas. (PENTEADO, 1981,
p.25).
O relevo apresenta-se fortemente dissecado, resultado do entalhe da rede
de drenagem densa, de padrão dendrítico. O platô e a vertente oriental
correspondem à porção úmida do Município, a barlavento. Condicionada pela
altitude e pela umidade, nessa porção, desenvolve-se a mata úmida plúvio-nebular,
também denominada como Floresta Subperenifólia Tropical Plúvio-Nebular, cuja sua
formação está condicionada à condensação do vapor d’água na atmosfera,
representada pela nebulosidade.
O modelado do platô úmido é constituído pela superfície de cimeira
regional, com nível médio de 800m de altitude, com feições dissecadas em cristas e
colinas, separadas por vales em “V”. Em alguns pontos, o fundo dos vales são mais
alargados e planos, dominados por planícies alveolares.
Na vertente oriental úmida, são observados níveis dissecados em colinas
e lombas alongadas, separados por vales em “V”. As declividades, na porção úmida,
variam entre 15 e 45%, fazendo desse, relevo instável aos processos de ocupação.
A vertente ocidental semi-árida, do lado sotavento da Serra, corresponde
aos níveis suspensos de pedimentação, dissecados em colinas rasas e estreitas,
separadas por vales pedimentados. Resultada de um ambiente mais seco, que não
recebe boa parte da umidade provinda do Oceano Atlântico, a vegetação é
representada por matas secas e caatingas. A drenagem é menos densa, o que não
influi muito nos processos erosivos.
52
A compartimentação topográfica do maciço residual é configurada pela
ação seletiva da erosão diferencial, que se por processos ativos de intemperismo
físico e químico. Sua aparência resulta em relevo fortemente dissecado, de forma
que o constantes as feições de dissecação em cristas, colinas, lombadas, vales e
planícies alveolares, conforme expresso na figura 08 (Mapa Geológico-
Geomorfológico do Município de Mulungu-CE). O relevo tem altitudes médias que
variam de 600 a 800m (excepcionalmente, em alguns pontos, ultrapassando a cota
dos 1.000m).
Para classificar e setorizar as formas de relevo da área serrana, pela
metodologia geossistêmica, proposta por Bertrand (1972) (que faz subdivisões em
geofácies), no Planejamento Biorregional do Maciço de Baturité (op. cit.) são
designados os seguintes sistemas ambientais: platô úmido, vertente oriental,
vertente meridional, vertente ocidental e vertente setentrional. Como esse estudo
propõe-se a abranger apenas o Município de Mulungu, os dados concernentes à sua
posição geográfica referem-se apenas ao platô úmido, à vertente oriental úmida e
vertente ocidental semi-árida, incluindo-se, ainda, as planícies alveolares
1
.
A caracterização do relevo, além das contribuições de Souza (1998,
2000), neste trabalho, é também realizada pelas informações deste mesmo autor,
contidas no Zoneamento Ambiental da APA da Serra de Baturité: Diagnósticos e
Diretrizes (1992).
3.1.1 As feições geomorfológicas
As feições geomorfológicas em cristas o formas aguçadas, com
vertentes retilíneas e alongadas, com classe de declive superior a 45% (relevo
montanhoso), o que condiciona o aparecimento de escarpas e vertentes rochosas
expostas (fig. 10). Em Mulungu, a predominância está no platô úmido, porém
apresentando processos erosivos acelerados pela ocupação humana inadequada.
Observa-se, ainda, forma peculiar de crista monoclinal, também denominada de
hogback, que se caracteriza por ser uma estrutura de rocha cristalina inclinada
semelhante à de uma pseudo-cuesta (fig. 11).
1
A representação cartográfica das geofácies esta constante no “Mapa de Impactos Sócio-Ambientais do
Município de Mulungu”, Capítulo 4, figura 73, página 124.
53
As feições em colinas o configuradas por apresentarem vertentes mais
curtas e topos de formas convexas mais suaves do que as das cristas (fig.10 e 12).
Encontram-se na vertente oriental e platô úmido, com classes de declive que variam
entre 15% e 45% (relevo forte ondulado), e na vertente ocidental, a qual se
apresenta de forma mais suave e classifica-se entre 10% e 15% (relevo ondulado).
As lombadas são bem semelhantes às colinas, no entanto alongam-se no
sentido paralelo ao fundo dos vales, configurados pela capacidade de dissecação da
drenagem superficial, localizados entre as vertentes em forma de “V” (SOUZA,
1992).
As planícies alveolares são áreas planas (até 2% de declividade) que se
encontram ao fundo da junção de vertentes (planícies intermontanas), resultantes de
materiais provenientes da erosão, nas cristas e/ou colinas, originados por depósitos
colúvio-aluviais. São consideradas áreas propícias para a agricultura, por não
ocasionarem a aceleração da erosão, ao contrário do que ocorre em área de declive,
como nas vertentes (fig.13).
Fig. 10: Relevo fortemente dissecado em cristas
(vertentes escarpadas) e colinas.
Foto: Luciana Freire, 2005.
Fig. 11: Crista monoclinal ou hogback (ao
fundo) e lombada, à frente.
Foto: Joselito Lima, 2007.
54
Os processos erosivos que mais influenciam, na Serra, ocorrem pelo forte
entalhe executado pela drenagem superficial, por meio da erosão linear. Pela
configuração do relevo, a rede de drenagem é altamente ramificada, com padrão
dendrítico, bastante comum em terrenos de rochas cristalinas.
Resultantes de influências das condições paleoclimáticas, superfícies
mais aplainadas, correspondentes a níveis suspensos de pediplanação, originados
pela morfogênese mecânica, em períodos de climas secos. Nos períodos de climas
úmidos, predominantes no presente, a erosão acontece por meio de processos de
dissecação das formas do relevo por morfogênese química. (IBAMA, 2002, p.30).
3.1.2 Os processos morfodinâmicos
Os processos morfodinâmicos são oriundos da intensidade de energia
provinda de fatores naturais, resultando, assim, nas ações erosivas. São de
importância fundamental, haja vista o conhecimento para aproveitamento adequado
dos recursos naturais. Faz-se necessário lembrar que as atividades humanas
intensificam a morfodinâmica.
Fig. 12: Vertente ocidental e relevo dissecado
em colinas.
Foto: Luciana Freire, 2005.
Fig. 13: Planície Alveolar com uso de
atividades agrícolas no platô úmido.
Foto: Luciana Freire, 2005.
55
As serras são unidades geomorfológicas denominadas maciços residuais,
ocorrentes com freqüência em todo o Estado do Ceará como o caso de Baturité,
caracterizados pela sua continuidade territorial e parcial, sendo assim denominados
de resíduos de erosão. Não se encontram unidos a uma região determinada.
Compõem-se de uma série de características comuns, dentre as quais, a mais
importante é o fato de serem compostos, em sua maior parte, pelas rochas do
embasamento cristalino (rochas ígneas e metamórficas).
Os maciços residuais são ambientes que se configuram por haver
apresentado, anteriormente, uma dimensão muito maior do que a atual. Dessa
forma, certamente denota-se que a formação dos maciços residuais ocorreu por um
processo erosivo de recuo das vertentes. Na medida em que as vertentes foram
recuando, diminuiu a área de abrangência do maciço residual e foi ampliada a área
da depressão sertaneja (área rebaixada), o que vai compor a superfície pediplanada.
Isso é evidenciado pela presença marcante da erosão diferencial, isto é, de uma
série de inselbergs e afloramentos rochosos circunjacentes às serras. Explica-se,
portanto, por que a área rebaixada é geomorfológica, e ambientalmente, mais
recente do que a região elevada do maciço, embora geologicamente tenham a
mesma idade, datando do Pré-Cambriano.
De acordo com as condições paleoclimáticas, em períodos secos, pode
ser evidenciada a presença dos níveis suspensos de pedimentação, estabelecidos
então pelos processos de morfogênese mecânica. nos períodos de climas
úmidos, as superfícies são expostas a fortes dissoluções que provocam erosões, em
virtude da dissecação do relevo, influenciadas pela morfogênese química.
Inclui-se, também, a intensa ação da tectônica verificada no Pré-
Cambriano, o que gerou o aparecimento de setores dobrados e falhados (SOUZA,
2000). Porém, boa parte dessas feições foram reduzidas, rebaixadas e retalhadas
em relação à sua superfície original durante o Quaternário.
A representatividade do relevo da Serra de Baturité, em comparação com
as extensas áreas planas do sertão, e a proximidade do Oceano Atlântico, gera o
estabelecimento de clima úmido localizado (microclima), o qual condiciona
características pluviométricas diferenciadas, com maior concentração de
precipitações e assim fazendo brotar dali a floresta úmida e drenagem densa.
56
Souza (1992) descreve que, em função das condições climáticas úmidas,
associadas à cobertura vegetal do enclave de mata serrana, os processos erosivos
mais constantes dão-se por meio de intemperismos químico e bioquímico. A
lavagem dos solos pela lixiviação acarreta o empobrecimento de elementos
alcalinos, resultando em solo mais ácido, que vão, por sua vez, condicionar o
aparecimento de Argissolos Vermelho-Amarelo Distróficos. As áreas de ganhos
geoquímicos estão associadas a ocorrências de Argissolos Vermelho-Amarelo
Eutróficos.
Outro fator importante para o entendimento da morfodinâmica atuante, na
paisagem serrana em Mulungu, dá-se pela presença da densa floresta, que funciona
como protetora dos solos contra os efeitos da erosão, principalmente relacionados
ao transporte e à deposição de detritos. Dessa forma, a umidade dos solos é
mantida, o que vai facilitar a decomposição de materiais orgânicos. Facilita-se,
ainda, a infiltração, mantendo, vivas, as nascentes fluviais e aumentando a vazão
nos leitos fluviais.
Vale ressaltar que o escoamento superficial atua diretamente nas ações
erosivas referentes à dissecação do relevo. A ação fluvial intensa é responsável pela
capacidade de entalhe, conduzindo à elaboração do relevo acidentado. Nas áreas
de afloramentos rochosos, formam-se, então, belas quedas d’água e cachoeiras.
Na porção semi-árida do Município de Mulungu, as ações erosivas que
incidem por meio do intemperismo físico (ou mecânico) são justificadas pela
escassez hídrica e por maiores amplitudes térmicas.
O mais comum modo de intemperismo físico, em paisagens influenciadas
por climas semi-áridos, dá-se pela expansão e contração térmica ou diferencial. O
processo de desagregação mecânica afeta, principalmente, a película superficial das
rochas, o que provoca algo semelhante a uma esfoliação ou acebolamento e
fraturamentos. Penteado (1980) descreve que as variações de temperatura agem
também sobre os diferentes coeficientes de dilatação dos minerais, provocando o
destaque dos grãos da estrutura original, processo conhecido como desagregação
granular, muito comum em granitóides.
Pelo exposto, a respeito dos processos morfodinâmicos atuais,
especificamente em paisagens serranas (dotadas de natureza diferenciada em
relação ao seu entorno e por apresentarem formas de relevo acidentadas),
57
DEGRADAÇÃO DA
COBERTURA
VEGETAL
DIMINUIÇÃO DA
MATÉRIA
ORGÂNICA NO SOLO
MODIFICAÇÃO DAS
PROPRIEDADES FÍSICAS
DO SOLO E DESTRUIÇÃO
DOS AGREGADOS
< CAPACIDADE DE
RETENÇÃO DO SOLO
< CAPACIDADE DE
RESERVA DE ÁGUA
NO SOLO
< INFILTRAÇÃO
> ESCOAMENTO
< PEDOGÊNESE
< ALTERAÇÃO
DESTRUIÇÃO
DOS SOLOS
MODIFICAÇÃO DO
SISTEMA
MORFOGENÉTICO
< ESCOAMENTO
HIPOTÉRMICO
< ALIMENTAÇÃO
DOS AQÜÍFEROS
> REGIME
TORRECIAL
Fig.14: Sistema de Degradação do Meio Ambiente
Fonte: Tricart (1977), adaptado por Souza (1992)
preliminarmente, observa-se que a exploração do meio ambiente de modo
desordenado acarreta em desequilíbrio do sistema geoambiental.
Em face do esboço do sistema de degradação do meio ambiente (fig. 14),
proposto por Tricart (1977), adaptado por Souza (1992), pode-se obter melhor
compreensão de como se processam essas ações.
De acordo com o observado em campo, a degradação do meio intensifica-
se pela ação humana, mediante a utilização da terra para atividades agropecuárias,
extrativismo vegetal e mineral, expansão urbana e especulação imobiliária. A
degradação inicia-se com a retirada da cobertura vegetal e a conseqüente exposição
dos solos às ações hidroclimáticas, que, por sua vez, efetivam a diminuição da
matéria orgânica no solo e alteram as suas propriedades físicas. O solo, então, tem
menor capacidade de retenção e de reserva de água.
Há, assim, menor infiltração, que implica diminuição da alimentação do
lençol subterrâneo. A menor infiltração modifica as condições pedogenéticas, que
58
ficam com menor alteração. Se a água não infiltra, maior escoamento superficial
e maior aceleração de ações erosivas por parte do regime torrencial. Por fim, pode
haver a modificação da estrutura geral do sistema morfogenético e a destruição dos
solos, o que impossibilita o restabelecimento natural da cobertura vegetal.
Nota-se que a cobertura vegetal atua como principal elemento protetor dos
recursos naturais, haja vista que sua degradação provoca generalizado desequilíbrio
ecológico. Acrescenta-se que, em áreas de declives acentuados, como as do
Município de Mulungu, as ações erosivas vão se processar de modo mais acelerado,
o que pode resultar em conseqüências catastróficas (tais como movimentos de
massas e deslizamentos de terra).
3.2 Condições hidroclimáticas
O estudo das condições hidroclimáticas é fundamental para a
compreensão dos processos que atuam sobre a superfície terrestre. A erosão, na
maior parte, ocorre por influência direta das ações climáticas, agindo física e/ou
quimicamente na morfogênese e pedogênese, o que define e caracteriza a
paisagem. Os padrões de drenagem são primordiais para a configuração do relevo.
Os recursos hídricos são essenciais à vida. Nas serras, brotam os rios que
abastecem as grandes cidades. A biodiversidade e o ser humano dependem desse
recurso e sem manutenção e proteção poderá dar-se o seu comprometimento.
O Estado do Ceará está localizado na Zona Intertropical, em posição sub-
equatorial, configurando, assim, o clima semi-árido, com a ocorrência de
temperaturas elevadas, de irregularidade pluviométrica e de forte insolação. A Serra
de Baturité, todavia, é considerada uma das regiões mais chuvosas do Estado, com
totais pluviométricos superiores a 900mm. Esse é mais um aspecto hidroclimático
que comprova a excepcionalidade do ambiente, no âmbito do semi-árido, decorrente
da combinação entre as altitudes e a exposição do relevo, em face dos
deslocamentos dos ventos úmidos.
Para classificar as condições climáticas da área da Serra de Baturité, o
Planejamento Biorregional do Maciço de Baturité (IBAMA, 2002) estabelece um
esboço, indicando características de tipos de clima específicos e locais, entre as
quais, em Mulungu, registram-se:
59
· clima úmido abrange o plae a vertente oriental (na porção úmida,
a barlavento), com altos índices pluviométricos e maior concentração
de umidade na atmosfera e precipitações;
· clima semi-árido – abrange a vertente ocidental (na porção semi-
árida, a sotavento), com baixos índices pluviométricos, irregularidade
das precipitações e temperaturas mais elevadas.
O Município de Mulungu tem em registro, de acordo com o Perfil Básico
Municipal (CEARÁ, 2004), pluviosidade anual média de 1.119,5mm. Sabe-se,
contudo, que a informação é referente à porção úmida, onde está a sede do
Município. A sazonalidade das chuvas da região é ocasionada pela Zona de
Convergência Intertropical (ZCIT). Em geral, o período chuvoso inicia-se entre os
meses de janeiro e fevereiro, intensifica-se entre março e abril e finaliza-se em maio
e, eventualmente, em junho (gráfico 1). Assim, “constata-se a ocorrência nítida de
duas estações: uma chuvosa, correspondente ao período de verão-outono, e outra
seca, relacionada com o período de inverno-primavera.” (IBAMA, 2002, p.35).
Gráfico 1 – MÉDIA HISTÓRICA DE CHUVAS EM MULUNGU – CE
0
50
100
150
200
250
JAN FEV MAR ABR MAI JUN JUL AGO SET OUT NOV DEZ
Meses
Chuvas (mm)
Fonte: FUNCEME
Nota: Média histórica de mais de 30 anos
Nos períodos chuvosos, há intensa precipitação (pesados aguaceiros), em
espaço de tempo relativamente restrito. As chuvas são normalmente classificadas
em dois tipos: convectivas e orográficas ambas de grande intensidade. A densa
vegetação funciona, então, como aparador, evitando a remoção dos solos. Nesse
período, acumula-se maior quantidade de água nos rios, nos riachos e nas
barragens. Dessa forma, a garantia de água faz com que a região funcione como
60
dispersor de drenagem, alimentando importantes rios que abastecem a Região
Metropolitana de Fortaleza. Por outro lado, em áreas onde houve a retirada da mata,
os processos erosivos intensificam-se, acarretando desmoronamentos de terra e
solifluxão, que se configura pelo movimento de massa de solo decomposta,
embebida de água (GUERRA & GUERRA, 2001, p.582). Esse fenômeno ocorre em
áreas desprovidas de cobertura vegetal e que, ao receberem chuvas intensas,
podem acarretar o que comumente se chama deslizamento de terras.
Além da drenagem oferecida pela região, outra característica
representativa do clima úmido da Serra é sua influência que faz surgir floresta
úmida, pertencente ao Bioma da Mata Atlântica. Não somente no período chuvoso,
mas também nos períodos de estiagem, a concentração de umidade dos solos é
garantida pela presença de orvalhos e nevoeiro, muito fortemente influenciados pela
vegetação.
A temperatura média, em Mulungu (sede - porção úmida), está entre 22º e
24º C (CEARÁ, 2004, p.5), o que torna o Município atraente, pelo ambiente
agradável, ensejando a fixação de segundas residências e o estabelecimento de
equipamentos de hospedagem para repouso e turismo. Porém, estima-se que, na
porção semi-árida, a temperatura é superior a 2ºC em relação à média registrada na
sede.
As informações acerca dos índices de umidade relativa do ar e da pressão
atmosférica são baseadas nas coletas realizadas no município vizinho de Aratuba,
com sede municipal distante 18 km da sede de Mulungu, já que é a única Plataforma
de Coleta de Dados PCD da FUCEME, implantada na Serra de Baturité, e cujas
características ambientais são bastante semelhantes às de Mulungu.
Os índices de umidade relativa do ar estão diretamente ligados aos
períodos climáticos, à hora do registro e à localidade. Na época chuvosa, a umidade
relativa constantemente ultrapassa 90%. Na estiagem, o percentual diminui para
menos 70%, principalmente, à tarde, depois do meio-dia. A umidade também está
condicionada à mata úmida e altitude do Município. Em relação à localidade, não se
deve esquecer, na porção úmida do Município, que essa umidade é mais elevada do
que na porção semi-árida. A pressão atmosférica tem média registrada de 920 hPa.
Em geral, a evaporação, na porção úmida, é baixa, principalmente
condicionada pela mata densa. Nos períodos de índices pluviométricos menores,
nos meses de setembro, outubro e novembro, quando a incidência da insolação se
61
de forma mais intensa, a evaporação é maior. Para o segundo caso,
acrescentam-se, ainda, as áreas desmatadas e a porção semi-árida do Município.
3.2.1 Recursos hídricos superficiais
Os rios e riachos da Serra, principalmente no platô e na vertente oriental,
apresentam características de escoamento de semiperenidade a perenidade. Na
vertente ocidental, predominância de cursos d’água por escoamento torrencial,
devido à maior irregularidade das chuvas (SOUZA, 1992, p.28). Importante destacar
que nesse ambiente se encontra grande quantidade de riachos, caracterizando a
Serra de Baturité como dispersor de drenagem. O mais importante rio da Serra é o
Pacoti, que faz parte da grande bacia Metropolitana, e abastece a Região
Metropolitana de Fortaleza. Não registros de que o rio atravesse o Município de
Mulungu.
No Município, uma variedade de riachos que seguem fendas onde os
cursos d’água adaptam-se às estruturas da tectônica ruptural e formas de relevo. O
Riacho Nilo é o principal (fig.15), drenando, ao sul do território municipal, integrante
da sub-bacia do Rio Aracoiaba, contribuinte à Bacia do Rio Choró.
Fig.15: Riacho Nilo, na porção sul do Município.
Foto: Luciana Freire, 2006.
62
Além do Nilo, há outros riachos que integram a Bacia do Rio Choró, como
o Canabrava, o Pindoba, do Cedro e da Santa Clara. Além da Bacia do Choro,
Mulungu ainda participa com drenagem em mais duas Bacias do Ceará: a Bacia do
Pacoti, pela presença de pequenos riachos ao norte do Município, e a Bacia do
Curu, com os riachos Camará e da Embira, pela vertente ocidental.
Os padrões de drenagem têm predominância de modelados dendríticos,
justificados, sobretudo, pelas formas de relevo fortemente dissecadas,
apresentando, ainda, raros padrões subparalelos e angulares, influenciados pela
orientação das falhas e fraturas.
O Município não conta com açudes, porém algumas barragens
particulares em sítios e chácaras, por meio do aproveitamento das águas que
escoam, sobretudo nos períodos chuvosos.
3.2.2 Recursos hídricos subterrâneos
A constituição geológica do Município de Mulungu tem predominância de
rochas cristalinas, as quais representam o que tecnicamente é chamado de aqüífero
fissural.
Como basicamente não existe uma porosidade primária nesse tipo de
rocha, a ocorrência da água subterrânea é condicionada por uma
porosidade secundária representada por fraturas e fendas, o que se traduz
por reservatórios aleatórios, descontínuos e de pequena extensão. (CPRM,
2000, p.8).
Assim sendo, parte das águas subterrâneas são classificadas como
salobras, resultado da concentração de sais minerais da rocha cristalina. A
regularidade pluviométrica, porém, tem diminuído esse qualitativo, havendo assim
maior circulação de água subterrânea, tendo, como conseqüência, águas doces, que
acabam por constituírem-se como principal fonte de abastecimento do Município
(fig.16).
Em áreas de depósitos sedimentares, a alta permeabilidade dos terrenos
arenosos compensa as pequenas espessuras, produzindo vazões mais
significativas.
63
De acordo com o Atlas dos Recursos Hídricos Subterrâneos do Ceará:
Programa Recenseamento de Fontes de Abastecimento por Água Subterrânea no
Estado do Ceará, realizado pelo CPRM (2000), o Município de Mulungu conta com
41 poços, todos do tipo tubular profundo, sendo 14 poços públicos e 27 privados. A
tabela 2 demonstra a situação dos poços cadastrados até o ano de 2000. Observa-
se que, em relação aos poços tubulares privados, 70% (19 poços) estão em
funcionamento, enquanto que 26% (7 poços) estão paralisados (desativados 4;
não instalados - 3). Entre os poços públicos, 14% (2 poços) não estão em
funcionamento (desativado 1; não instalado - 1), e 57% (8 poços) estão sendo
usados.
Tabela 2 – Situação dos Poços Tubulares Cadastrados
Natureza do Poço Abandonado Desativado Em Uso Não Instalado
PÚBLICO 4 1 8 1
PRIVADO 1 4 19 3
Fonte: CPRM, 2000
Acredita-se, contudo, que a quantidade de poços perfurados seja bem
maior do que a registrada até o ano de 2000. Isso se deve, principalmente, à
expansão urbana e maior quantidade de sítios e chácaras em instalação, depois
desse ano.
0
10
20
E m Uso
12 8 3
Desativados
2 2
Não Instalados
1 1
DOCE S ALO BR S ALINA
Fig.16: Qualidade das águas subterrâneas do município de Mulungu – Ceará, a partir
da análise realizada em 29 amostras (poços tubulares).
Fonte: CPRM, 2000.
64
3.3 Aspectos dos solos e vegetação
Aliados às condições hidroclimáticas do ambiente e formas do relevo, os
solos do Município de Mulungu, assim como na maior parte da Serra de Baturité,
são de natureza colúvio-aluviais, com predominância de Argissolos Vermelho-
Amarelos, caracterizados pela profundidade, o que “possibilitou a prática de uma
agricultura diversificada nas pequenas propriedades, que constituem a marca
proeminente da estrutura fundiária local” (SOUZA, 1992, p.16). Dessa forma, são
expressas algumas das importâncias dos estudos de solos, que mediante o
conhecimento de suas propriedades, indicam os tipos de atividades agrícolas que
podem ser implementadas na área e como melhor utilizá-las sem haver maiores
impactos ambientais.
As classes de solos que predominam no Município de Mulungu o
baseadas na identificação proposta no Planejamento Biorregional do Maciço de
Baturité (IBAMA, 2002), pela tipologia, pelas características e pelas limitações dos
solos, elaborado por Souza (1992, 2000), apresentados no Mapa Pedológico do
Município de Mulungu-CE (fig. 17).
No platô úmido, estão os Argissolos Vermelho-Amarelo Distróficos,
caracterizados como solos profundos, moderadamente drenados, de textura areno-
argilosa e fertilidade natural média à baixa. Encontram-se cobertos pela mata úmida,
exceto em áreas utilizadas para atividades agrícolas, como a bananicultura, o cultivo
do café, a cultura da cana-de-açúcar e o cultivo de hortaliças. Entre as principais
limitações, têm-se a deficiência da fertilidade e a susceptibilidade à erosão, pela
ocorrência de relevos fortemente dissecados.
Com maior presença na vertente oriental do que na vertente semi-árida, os
Argissolos Vermelho-Amarelos Eutróficos são solos profundos a medianamente
profundos, com textura média argilosa, moderadamente drenados, apresentando
fertilidade natural média à alta. o também cobertos por mata úmida e utilizados
para as atividades agrícolas, principalmente por se tratarem de solos férteis, porém,
susceptíveis à erosão das vertentes. Entre os principais produtos agrícolas, citam-se
a banana, o café e o milho.
65
66
Os Neossolos Litólicos são encontrados, também, na vertente oriental
úmida, contudo dissecados em cristas e colinas, associadas aos afloramentos
rochosos. Sua maior incidência está na vertente semi-árida, caracterizados por
serem solos rasos, de textura média, pedregosos, com fertilidade natural média. As
condições de uso propiciam o desenvolvimento da pecuária. Por não contarem com
cobertura vegetal densa e pela própria localização, são solos com deficiência
hídrica.
Nas planícies alveolares encontram-se os Neossolos Flúvicos, de origem
colúvio-aluvial, apresentando maior profundidade e fertilidade natural alta. Ocorrem
em áreas de superfície plana, com drenagem de à moderada. Nos períodos
chuvosos, são solos com excesso de água. Por serem ricos em fertilidade e
localizarem-se em áreas planas, são bastante utilizados para o desenvolvimento de
atividades agrícolas, na maioria, com cultivo de hortaliças e leguminosas, não
acarretando maiores limitações ao uso, desde que não sejam empregadas técnicas
rudimentares de preparo do solo.
A biodiversidade é representada pela variedade de formas de vida que
indicam o equilíbrio dos ecossistemas.
A flora recobre o solo e auxilia na sua evolução e manutenção, além de
equilibrar o microclima e fornecer alimentos a todos dos seres vivos. A
fauna mantém uma relação de sobrevivência com a flora, dela retirando a
alimentação e ao mesmo tempo auxiliando no seu desenvolvimento e
manutenção. (ARRUDA, 2001, p.79).
A Serra de Baturité apresenta algumas alterações na biodiversidade após
sua história de degradação. É perceptível o avanço da caatinga em áreas antes
ocupadas por formações florestais. A diminuição dos recursos hídricos
(subterrâneos ou superficiais) e, ainda, o aumento da temperatura média têm sido
percebidos, mesmo pela própria comunidade local.
Apesar de bem descaracterizada, a cobertura vegetal é bastante variada,
apresentando “desde formações florestais plúvio-nebulares às formações arbustivas
semi-caducifólias, campos de altitude e vegetação de rochedos semi-desnudos e
com vertentes expostas.” (SOUZA, 1992, p.16). As matas plúvio-nebulares são
formadas pelas chuvas orográficas aliadas à condensação de vapor d’água na
atmosfera local, representado pelo orvalho oriundo do nevoeiro, que são os
condicionantes principais da ocorrência desse tipo de vegetação.
67
Como modo de estabelecer a tipologia da vegetação encontrada na área
do Município de Mulungu, considera-se a classificação realizada pelo Zoneamento
Ambiental da APA da Serra de Baturité: Diagnóstico e Diretrizes (CEARÁ, 1992).
Um dos principais motivos de denominar a Serra como paisagem de
exceção -se pela floresta úmida perenifólia, que está situada no platô úmido, em
altitudes superiores a 800m. Constitui um dos resquícios da Mata Atlântica, com
vegetação associada às características climáticas e dos solos. Entre as formações
do Município, configura-se como a mais preservada, apesar de serem perceptíveis a
cultura indiscriminada de banana e de café no local.
A floresta úmida semiperenifólia também faz parte da Mata Atlântica,
situando-se nas altitudes entre 600m e 800m, em áreas do platô úmido e em alguns
pontos da vertente oriental, tendo como conseqüência menor umidade e pequeno
índice de deciduidade. maior intensificação de atividade agrícola, bastante
alterada, excetuando-se os pontos mais elevados e de declividade excessiva. Boa
parte da floresta é substituída por culturas de banana, café e milho (fig. 18).
Situada a barlavento da Serra, na vertente oriental, a floresta úmida
semicaducifólia também é integrante da Mata Atlântica, condicionada às chuvas
orográficas e aos ventos do Oceano Atlântico. A altitude varia de 200m até 600m.
Nessa zona, a vegetação apresenta-se menos densa e, em período de estiagem,
ocorrem espécies caducifólias, em razão da deficiência de umidade. Encontra-se
bastante alterada, substituída, principalmente, por culturas de banana e milho
(fig.19).
Na vertente ocidental semi-árida, a sotavento, localiza-se a floresta
caducifólia e mata seca (fig. 20), que atinge cotas altimétricas de 600m. Sua
formação é caracterizada pelas altas temperaturas e pela baixa umidade. Apresenta-
se bastante alterada, com desenvolvimento de culturas de feijão, milho e, nas áreas
mais elevadas, de banana.
Presentemente, além das visíveis áreas desmatadas, para fins agrícolas, é
crescente a retirada da mata para a ocupação imobiliária, principalmente nas áreas
dotadas de vistas panorâmicas (fig. 21). Assim, os solos ficam expostos às ações
erosivas, o que pode ocasionar movimentos de terra.
68
Fig.18: Floresta úmida perenifólia ao
fundo, e área onde deveria estar a
floresta úmida semiperenifólia,
utilizada pela bananicultura, à frente.
Foto: Luciana Freire, 2007.
Fig.19: Floresta úmida semicaducifólia, vertente
oriental úmida, com áreas utilizadas no cultivo do
milho.
Foto: Luciana Freire, 2006.
Fig.20: Floresta caducifólia e mata seca, na
vertente ocidental semi-árida. Observam-se
intensos processos de degradação.
Foto: Luciana Freire, 2007.
Fig.21: Área desmatada para fins de
ocupação imobiliária, distrito de Lameirão.
Foto: Luciana Freire, 2007.
69
Fig.22: Serrapilheira cobrindo o solo, na
floresta úmida perenifólia.
Foto: Luciana Freire, 2007.
A vegetação tem papel fundamental na regulação da umidade do ar e dos
solos, na proteção dos solos, na infiltração de água e na perenização dos rios.
Cavalcante (2005) demonstra um dos exemplos práticos desse fato, que é o
desempenho da copa das árvores, funcionando como aparadora dos impactos das
águas das chuvas, fazendo-as deslizar lentamente até o solo, que, por sua vez,
ainda encontram mais obstáculo, quase imperceptível: a serrapilheira, que são
folhagens e restos de plantas ainda não decompostos sobre o solo (fig. 22),
funcionando como tapete sobre o solo e tem papel de esponja d’água.
Após o desempenho natural de proteção da vegetação, a água segue
rumos distintos: infiltração no solo para reabastecimento das reservas subterrâneas
e escoamento na superfície dos solos, em forma de pequenos veios, seguindo para
córregos; depois, riachos e, por fim, deságuam nos rios.
Os tipos de vegetação existentes em Mulungu estão demonstrados,
espacialmente, no Mapa de Uso e Ocupação da Terra no Município de Mulungu
CE
2
.
2
Capítulo 3, figura 49, página 98.
70
3.4 Condições Ecodinâmicas da Paisagem
Assim como especificado na metodologia da pesquisa
3
, o estudo da
paisagem determinou áreas com certo grau de homogeneidade, resultantes da
integração de seus componentes, formando assim os geofácies do geossistema
estudado.
No Município de Mulungu, é possível identificar quatro geofácies: platô
úmido, vertente oriental, vertente ocidental e planícies alveolares.
De modo sintético e claro, é apresentada uma tabela com as
características físico-ambientais da área de estudo (tabela 03). A partir dela, então,
permite-se a construção do contexto geoecológico para a definição das condições
ecodinâmicas da paisagem (tabela 04).
3
Capítulo 1
71
Tabela 03 – Características Físico-Ambientais do Município de Mulungu – CE
Geofácies Feições Geomorfológicas
Condições
Hidroclimáticas
Solos Cobertura Vegetal Tipologias de Uso
Platô Úmido
Nível de cimeira úmido, com
cristas e colinas.
Densa fluvial rede de
padrão dendrítico,
pluviosidade alta
(> 1000mm).
Argissolos Vermelho-
Amarelo Distróficos e
Neossolos Litólicos
Floresta Úmida
Perenifólia e
Subcaducifólia.
Culturas de bananeira,
café, milho, lavouras
de subsistência e
pastagens.
Vertente Oriental
Vertente úmida (a
barlavento), com colinas
rasas e vales pedimentados.
Densa rede fluvial de
padrão dendrítico,
pluviosidade alta
(> 1000mm).
Argissolos Vermelho-
Amarelo Eutróficos e
Neossolos Litólicos
Floresta Úmida
Subcaducifólia e
Semicaducifólia.
Culturas de bananeira,
milho, Lavouras de
subsistência,
pastagens.
Vertente Ocidental
Semi-Árida
Vertente seca (a sotavento),
com níveis suspensos de
pedimentação, dissecada em
colinas e lombadas.
Drenagem fraca de padrão
dendrítico, pluviosidade
moderada a baixa
(< 900mm)
Neossolos Litólicos
Floresta Caducifólia
e mata seca.
Culturas de bananeira,
feijão, milho,
extrativismo vegetal e
pastagens.
Planícies
Alveolares
Áreas planas, fundo de vales
(planícies intermontanas)
com depósitos sedimentares
do quaternário.
Densa rede fluvial de
padrão dedrítico,
pluviosidade alta
(> 1000mm).
Neossolos Flúvicos
Formações florestais
plúvio-nebulares.
Hortifruticultura
Fonte: Adaptado de SOUZA, 1992. IBAMA, 2002. ARRUDA, 2001. Trabalhos de Campo
72
Tabela 04 – Condições Ecodinâmicas da Paisagem do Município de Mulungu – CE
Geofácies Potencialidade Limitações Riscos de Ocupação Condições Ecodinâmicas
Platô Úmido
- Floresta nativa conservada;
- Pluviometria com chuvas mais
regulares;
- Recursos hídricos superficiais;
- Solos profundos;
- Atividades de pesquisa
científica e educação ambiental;
- Patrimônio Paisagístico;
- Atrativos turísticos;
- Áreas protegidas pela legislação
ambiental;
- Declividade forte das vertentes;
- Dificuldades de acesso;
- Impróprio para grandes edificações;
- Sujeitos a movimentos de massa
nas áreas desmatadas;
Vertente
Oriental
- Floresta nativa moderadamente
conservada;
- Solos profundos a
medianamente profundos;
- Fertilidade natural dos solos
média a alta;
- Patrimônio Paisagístico;
- Atrativos turísticos;
- Áreas protegidas pela legislação
ambiental;
- Declividade forte das vertentes;
- Impróprio para grandes edificações;
- Carreamento de material dos solos
nas áreas desmatadas;
- Ambientes estáveis nas
vertentes com vegetação
nativa conservada;
- Ambientes de transição com
tendência à instabilidade nas
áreas desmatadas;
Vertente
Ocidental
Semi-Árida
- Fertilidade natural dos solos
média;
- Extrativismo vegetal;
- Solos rasos e pedregosos;
- Susceptibilidade à erosão dos
solos;
- Declividade forte das vertentes;
- Baixo potencial de recursos hídricos
superficiais;
- Baixa umidade, principalmente nos
períodos secos;
- Carreamento de material dos solos;
- Erosão acelerada das
vertentes em função dos
desmatamentos
indiscriminados e do uso de
técnicas agrícolas
rudimentares;
- Empobrecimento da
biodiversidade;
- Assoreamento dos fundos
de vales;
- mudanças nos percursos
dos cursos d’água pela
construção de barragens;
- contaminação dos cursos
d’água e dos solos por
agrotóxicos e falta de
tratamento de esgoto;
- Comprometimento das
Nascentes Fluviais
- Condições sanitárias
deficientes;
- Descaracterização da
paisagem;
- Ambientes instáveis em
função da excessiva
degradação da cobertura
vegetal e erosão dos solos;
Planícies
Alveolares
- relevo plano e suavemente
ondulado;
- Águas sub-superficiais;
- Solos férteis e bem drenados,
propícios à agricultura
diversificada;
- Áreas alagadas durante os períodos
chuvosos.
- Desmatamentos
indiscriminados conduzem ao
comprometimento da
biodiversidade, aumento da
lixiviação e empobrecimento
dos solos;
- Riscos de contaminação
dos solos e dos recursos
hídricos por agrotóxicos;
- Ambiente estável em função
da fraca atividade de
potencial erosivo;
Fonte: Adaptado de SOUZA, 1992; 1998; 2000; 2005. ARRUDA, 2001.
73
4 TIPOLOGIAS DE USO E PROBLEMAS AMBIENTAIS
4.1 Histórico da ocupação e aspetos culturais
A colonização, no Ceará, ocorreu tardiamente. Somente a partir do século
XVII, mais de cem anos depois do “descobrimento” do Brasil, o Ceará desperta
maior atenção por parte da coroa portuguesa, devido às invasões dos holandeses.
Sob ameaça de perda do território, os portugueses organizaram
expedições com objetivo de defesa territorial. Diferente de outras regiões do Brasil,
onde o litoral dispunha de terras férteis e recursos hídricos abundantes para o
modelo agrícola, no Ceará o foco principal da economia era no sertão, orientado
para a pecuária extensiva, que abastecia de couro e charque os mercados regionais
que, assim, abriam caminhos para o desenvolvimento de cidades e vilas sertanejas,
hoje importantes núcleos urbanos.
Segundo Leal (1981 apud CAMPOS, 2000), a partir de 13 de outubro de
1680, deu-se início a ocupação da Serra de Baturité, atribuída a Estevão Velho de
Moura, juntamente com outros seis potiguares, em terras próximas ao Rio Choró, em
direção à Serra, obtidas pelo Capitão-Mor Sebastião de Sá.
A apropriação e organização territorial da atual região do Município de
Mulungu, na Serra de Baturité, e demais municípios ali configurados, deram-se de
forma similar, pela concessão de sesmarias, nos vales do Rio Choe na Serra de
Baturité, entre os anos de 1718 e 1736, como visto na tabela 5.
As sesmarias concedidas no Estado, inicialmente ocorrem no litoral e
mostraram-se desfavoráveis. Optou-se então, pelas terras úmidas situadas
às margens dos rios, da foz para as cabeceiras, o que imprimiu aspecto
tipicamente potâmico ao povoamento do interior do Ceará. Seguindo a
TABELA 5
PRIMEIRAS SESMARIAS CONCEDIDAS NA REGIÃO DE BATURITÉ
DATA CONCESSIONÁRIO LOCALIZAÇÃO
ÁREA (LÉGUA)
(5.280m)
23/02/1718 Pe. Felipe Pais Barreto
Riacho Comari (Rio Choró) na
Serra Cariancó (Baturité)
4 x 0,5
28/11/1727
Tomé Calado Galvão e mais
seis companheiros
Ilharges do Rio Choró ao Norte
da Serra de Uiuterete (Baturité)
14 x 1
04/02/1735 Manuel Rodrigues das Neves Serra de Iboyutitê (Baturité) 3 x 1
02/06/1735 Pedro da Rocha Maciel
Riacho que nasce na Serra de
Baturité
3 x 1
17/11/1736 Teodósio de Pina e Silva
Brejo Coité que nasce da Serra
de Baturité
3 x 1
Fonte: SEMACE, Zoneamento Ambiental da APA da Serra de Baturité, 1992
74
norma e através dos rios Choró e Pacoti, lentamente, se procedeu a
ocupação até a Serra de Baturité. (SOUZA, 1992:63).
As formas de uso e ocupação eram direcionadas, principalmente pela
atividade econômica, com base na agricultura, a qual fixa o homem no local. Apesar
da diversidade natural da região, as atividades agrícolas tinham características de
monocultura, com destaque, nas áreas serranas, com o plantio de café.
É interessante destacar o fato de que a ocupação da Serra de Baturité,
bem como de outras regiões serranas do Estado (Maranguape, Aratanha,
Uruburetama, Ibiapaba, dentre outras) ocorreu de forma singular, em virtude das
características topográficas, que dificultavam o acesso pela declividade das
vertentes, e das características geoambientais (bem como condições climáticas
favoráveis, recursos hídricos, fertilidade e profundidade dos solos) que, atrativas,
propiciavam o desenvolvimento de outras atividades.
Antes mesmo de os portugueses chegarem às terras cearenses, essas
eram habitadas por grupos indígenas, entre os quais, na região central do Estado,
os índios Tarairiús. Para “amansá-los”, havia missões jesuíticas, que promoveram
aldeamentos indígenas, organizando-os espacialmente de modo semelhante às
atuais divisões municipais da região (excetuando-se Palmácia, desmembrada de
Maranguape).
Ainda relatos da ocupação territorial pela rota do gado, nas imediações
dos rios, no interior do Estado. Os grupos indígenas foram expulsos, o que resultou
na sua ída para áreas de exceção (as quais não faziam parte dos caminhos do
gado). Daí o fato de haver a catequização e aldeamento como primeira forma de
apropriação do maciço de Baturité.
Fazendo contraponto com a guerra de extermínio que as fazendas de gado
promoveram contra os povos indígenas, as missões jesuítas imprimiram
outro tipo de dominação. O aculturamento dos indígenas se deu sob o
comando dos jesuítas que promoveram deslocamentos populacionais das
aldeias para os aldeamentos artificiais. (...) O aldeamento formava a tríade
do poder colonial juntamente com o engenho de açúcar no litoral e a
fazenda de gado nos sertões. (IBAMA, 2002:74).
Outro fato de destaque da ocupação da região serrana são as secas
periódicas (1777-1778, 1790-1793, 1804, 1809, 1816-1817, 1824-1825),
ocasionando fluxo migratório sertão-serra.
75
Entre os sesmeiros registrados na ocasião, citam-se Manuel da Costa
Ribeiro, que detinha parte das terras localizadas no alto da serra em 1812; e o
cunhado Manuel de Queiroz Lima. Depois, veio Antonio Pereira de Queiroz, quem
primeiro trouxe as sementes de café do Cariri, plantadas em sistema de pleno sol no
sítio Munguaípe, em Guaramiranga, em 1824. Na mesma época, Manuel Felipe
Castelo Branco também planta sementes de café provenientes do Pará, no sítio
Bagaço, que futuramente tornar-se-ia parte do município de Mulungu (GIRÃO, 1947
apud CAMPOS, 2000).
No século XVIII, é introduzido, nas regiões de altitude do Maciço de
Baturité, o cultivo do café, resultado de intensa imigração, primeiramente no lado
oriental da Serra, com a fixação de famílias, a partir de 1824. Na época, o cultivo do
café não era sombreado, provavelmente o principal indício da devastação da floresta
nativa da Serra. Não era a época do apogeu da cultura cafeeira, de forma que os
primeiros habitantes da Serra viviam de culturas de subsistência e criação de alguns
animais. Houve, ainda, o ciclo da cana-de-açúcar, que se destacava pela produção
de rapadura e aguardente, iniciada antes de 1858 (CAMPOS, 2000).
O cultivo do café, em função da adaptabilidade da cultura, trouxe muita
riqueza aos proprietários de terras da Serra de Baturité, resultando em grandes
sítios e casarões, alguns, preservados até hoje. Registra-se que, em 1850, o Estado
do Ceará foi responsável por mais de 2% das exportações brasileiras de café, sendo
este considerado internacionalmente de excelente qualidade (CEARÁ, 2005, p.1). O
apogeu da economia cafeeira na Serra é registrado na segunda metade do século
XIX, consolidando a construção da estrada de ferro que ligava Fortaleza a Baturité,
em 1882.
O período de riqueza nos cafezais, todavia, não foi longo, haja vista a
degradação ambiental causada pelos desmatamentos e pelas queimadas, levando à
queda da produtividade. A expansão da cultura, além de ter causado a derrubada da
mata nativa, também apresentava impactos negativos nas propriedades naturais dos
solos. Os solos estavam empobrecendo, de modo que não produziam mais húmus
nem retinham umidade.
Como uma forma de tentar minimizar esse problema, registra-se que, em
1868, houve uma tentativa de consórcios bem sucedido com leguminosas, fruteiras
e árvores de sombra, como a camunzé (Senna multijuga) e a ingazeira (Inga edulis).
“Além de proteger os cafezais do sol, estas árvores, especialmente os ingás,
76
produzem húmus com a queda de suas folhas e têm a vantagem de enriquecer o
solo com azoto e abrigar inimigos naturais de pragas.” (SAES; SOUZA; OTANI,
2001, p.28). De acordo com os mesmos autores, citando Lima (1946), no ano de
1904, era possível perceber uma presença marcante da ação regeneradora que
as ingazeiras causavam, assim “replantadas as falhas”.
Entretanto, em 1962, houve uma intensa redução da produção cafeeira
ocasionada pelo Programa de Erradicação de Cafezais, que buscava eliminar os
cafezais considerados inaptos (com produtividade abaixo de 6 sacas
beneficiadas/1.000 pés), implantado pelo Governo Federal através do Grupo
Executivo de Racionalização da Cafeicultura , GERCA (COOABRIEL, 2005). Dessa
maneira, eram incentivados outros cultivos agrícolas, entre os quais, o principal foi a
bananicultura, que perdura até hoje.
A cultura cafeeira, juntamente com o cultivo de cana-de-açúcar, nas áreas
de planície alveolares, definiu boa parte do processo de ocupação econômica, na
região serrana. Mesmo com as desvantagens topográficas, o solo e o clima foram
essenciais para a produção se efetivar, não havendo maior expansão, em
decorrência das dificuldades de transporte.
Em conseqüência do desenvolvimento econômico da região, a Vila erigida
(1763), formada e denominada Vila Real Monte Mor-o-Novo da América,
transformava-se em Cidade, com o nome de Baturité, pela Lei Provincial 844, de
09 de agosto de 1858. O nome, então, denominou toda a região.
O topônimo indígena Baturité, que empresta denominação ao Maciço,
passou a uso oficial apenas no século XIX. Revelando a valorização tardia
da língua do antigo habitante, essa apropriação simbólica do lugar pelo
colonizador foi difundida através do instinto de nacionalidade que moveu a
independência política no primeiro quartel daquele século. Esse impulso
político reforçou a utilização dos topônimos indígenas, revelando uma
paradoxal produção de sentido do ‘nativo sem nativo’. (...) A versão
etimológica de Gil Amora afirma que o nome original do lugar não era
Baturité e sim Batieté. Em apoio a essa versão, é resgatada a fala popular
de velhos habitantes do lugar, caboclos de origem indígena, que
pronunciavam (Batieté). Em tupi, esse topônimo vem a ser: bu (sair,
rebentar, sair da fonte), ty (água) e eté (boa), que exprime butieté (sair
água boa), em provável alusão às inúmeras fontes de água de qualidade
na área serrana do maciço. (IBAMA, 2002:73).
Enfim, vilas desmembram-se de Baturité, constituindo-se em municípios
pertencentes à região, a exemplo de Mulungu.
77
O topônimo ‘mulungu’ é proveniente da denominação de árvore
pertencente à família das leguminosas. “O termo é de origem africana, segundo
Barbosa Rodrigues, que o supõe adulteração de mulungu. Mas, para Gonçalves
Dias, é tupi, simples corruptela de murungu” (SETUR, 2005, p.37). Pelas entrevistas
concedidas por pessoas naturais do Município e documentos coletados na biblioteca
municipal e arquivos da Paróquia, o nome originou-se do fato de haver, na região
serrana, pequeno comércio localizado próximo a um mulungu (Erythrina speciosa).
As pessoas de outras localidades diziam que iam no ‘mulungu’ comercializar seus
produtos. Dessa forma, então, adotou-se o nome.
A criação do Município de Mulungu é datada de 23 de julho de 1890, pelo
Decreto nº 29, inaugurado em 11 de setembro do mesmo ano.
Em 7 de setembro de 1895, era instituída a freguesia de São Sebastião do
Mulungu, mas em 25 de agosto de 1899, a Lei nº 550 suprimia o município,
que foi restaurado em 6 de agosto de 1900, pela Lei 602. Novamente
extinto em 15 de outubro de 1921, pela Lei 1.887, é restaurado em
virtude da Lei 2.715 de 24 de março de 1929. Em 1931, nova extinção é
determinada pelo decreto 193 de 20 de março, quando passou a ser
simplesmente distrito de Pacoti. A Lei 3.566 de 14 de março de 1957
promoveu-o definitivamente a comarca autônoma. (SETUR, 2005, p.37).
Porém, mesmo antes de criado o Município, naquela região registrava a
chegada da imagem de São Sebastião em 1864. Segundo arquivos documentais da
paróquia, o Município teve como primeiros habitantes os fogueteiros Sr. Francisco
Cobra e Inácio Cobra. O primeiro comerciante chamava-se José Balbino Filho,
proprietário de uma loja de tecidos. O primeiro boteco e depois primeira farmácia era
de propriedade do Sr. Antônio Romero Jucá. Onde atualmente situa-se a Secretaria
de Cultura e Turismo do Município, funcionava a primeira padaria, de propriedade do
Sr. Antonio Passos. Logo em frente à antiga padaria, surgia o primeiro sobrado
construído pelo Sr. Caetano Alves, de propriedade do Sr. Joaquim Café.
As primeiras construções do Município de Mulungu apresentavam estilos
antigos do século XIX. Atualmente, a arquitetura histórica popular apresenta-se
bastante descaracterizada, com alguns exemplares isolados, entre prédios e
casarões antigos. Entretanto não são tombados pelo Patrimônio Histórico (fig.23 e
24).
Segundo o Plano de Desenvolvimento Regional do Maciço de Baturité
(2000), o principal fator de descaracterização dos imóveis urbanos dá-se pela
78
atividade comercial que, em algumas edificações, substitui pelo uso residencial. Na
sede municipal, existem dois pontos de referência popular: na entrada da cidade, é
destacado o visual da estátua de São Sebastião (fig.25); outro destaque é a Igreja
Matriz de São Sebastião (fig.26), com visualização de vários pontos da cidade.
Fig.23: Rua Coronel Justino Café, na sede municipal de
Mulungu-CE.
Foto: Luciana Freire, 2006.
Fig. 24: Antigo prédio dos Correios,
onde funciona atualmente a sede da
Prefeitura Municipal de Mulungu-CE.
Foto: Luciana Freire, 2006.
Fig.25: Estátua do padroeiro,
São Sebastião.
Foto: Luciana Freire, 2006.
Fig. 26: Igreja Matriz de Mulungu – CE.
Foto: Luciana Freire, 2006.
79
Quando a Igreja Matriz de São Sebastião foi fundada ainda não havia sido
criado o Município. Na época, existia apenas uma pequena comunidade que vivia da
plantação da cana-de-açúcar. A fundação da igreja deveu-se ao Frei José de Maria.
Os registros dão 1895 como ano de fundação da Paróquia, tendo como primeiro
vigário o Pe. Benedito de Araújo (1895-1901). Em 1906, chegava ao Município a
iluminação à base de carbureto, que foi instalada na igreja. O vigário Maximiano
Pinto da Rocha, que ali permaneceu entre 1917 e 1921, foi o primeiro a celebrar
missa na Matriz.
Somente em 1958, por meio da administração Paroquial do Pe. Antonio
Suzenito Soares Pinto, a antiga Igreja Matriz, em estilo barroco, foi reformada quase
por completa, sendo reformada para receber mais fiéis. Nesse ano, também foi
realizada a primeira eleição para prefeitos e vereadores de Mulungu, mesmo
constando da formação de sua primeira Câmara Municipal, em meados de 1939.
a atual estátua do padroeiro São Sebastião foi construída a partir de
uma promessa de campanha política do Sr. José Wanderley Vieira. Na verdade, sua
promessa foi de erigir uma estátua do Cristo. Assim eleito, a comunidade começou a
discutir se seria melhor a construção de uma estátua do padroeiro do Município. O
então vigário, Pe. Elpídio de Souza Sampaio, solicitou, em plena missa a opinião do
povo que se decidiu pelo padroeiro.
Em 1967, a bandeira do Município de Mulungu foi desenhada, por
Leonardo Carvalho. Em seu desenho, o artista quis retratar símbolos vivos
existentes no Município, dentre os quais se tem um escudo com palmeiras imperiais
(Roystonea oleraceal), presentes na subida à Igreja Matriz, rodeado por dois ícones
da atividade agrícola da região: ramos de café e de cana-de-açúcar.
A construção da estátua de São Sebastião foi iniciada em 1978, pelo
mestre escultor Deoclécio Soares Diniz, conhecido como Bibi, finalizada com
aproximadamente 14 metros de altura, classificando-se como a (quarta) maior do
país (1ª – São Francisco / Canindé; 2ª – Cristo Redentor / Rio de Janeiro; 3ª – Padre
Cícero / Juazeiro do Norte). Está localizada em morro a 817 metros de altitude, ao
lado do cemitério São Gerardo, a qual se tem acesso por meio de degraus que
formam os passos da Via Sacra de Jesus Cristo.
A cultura do Município é muito ligada aos festejos religiosos. A população
mulunguense procura manter a tradição religiosa através da celebração de festas de
seus padroeiros como: a Festa do Padroeiro, São Sebastião (20/01); de Nossa
80
Senhora das Dores (07/09); de Nossa Senhora de Fátima, no distrito de Cato
(14/03); e de Santa Luzia, no distrito de Lameirão (13/12). Somam-se, a estas, ainda
a celebração do Dia do Município (14/03), as festas juninas e o carnaval.
A Festa de São Sebastião é considerada a mais importante, reunindo
pessoas vindas de várias regiões da Serra de Baturité e do Estado. Inicia-se no dia
10 de janeiro, findando no dia 20, dia do Santo festejado, com a procissão, em que
os devotos pagam promessas feitas ao padroeiro (fig.27). Durante as celebrações,
são realizados leilões com oferendas de moradores do Município, e o dinheiro
arrecadado é destinado à paróquia (fig.28).
A tabela 6 expressa, cronologicamente, uma síntese dos acontecimentos
históricos e culturais marcantes no Município de Mulungu, bem como na Serra de
Baturité e no Ceará.
Fig.27: Preparação da procissão do padroeiro São
Sebastião, na sede municipal.
Foto: Suzana Freire, 2007.
Fig.28: Leilão na praça da Igreja Matriz em
Mulungu, durante as celebrações da festa de
São Sebastião.
Foto: Valmir Freire, 2007.
81
Tabela 6 – Cronologia de fatos históricos e culturais marcantes
Século Ano Cronologia de fatos
1603 Primeira expedição colonizadora do Ceará, comandada por Pero Coelho
de Souza.
XVII
1680 Início da apropriação da Serra de Baturité, atribuída a Estevão Velho de
Moura, juntamente com outros seis potiguares, conseguidos pelo Capitão-
Mor Sebastião de Sá.
1718-1736 Concessão de sesmarias na região da Serra de Baturité.
1763 Formação da Vila Real Monte Mor-o-Novo da América
XVIII
1777-1778
1790-1793
1804,1809,
1816-1817
1824-1825
Secas periódicas, que ocasionaram fluxo migratório sertão-serra.
1812 Registro dos sesmeiros Manuel da Costa Ribeiro e Manuel Queiroz Lima.
1824
- Entrada das primeiras sementes de café, trazidas do Cariri pelo
sesmeiro Antonio Pereira de Queiroz, plantadas no sítio Munguaípe, em
Guaramiranga.
- Manuel Felipe Castelo Branco planta sementes de café provenientes do
Pará, no sítio Bagaço, que futuramente tornar-se-ia parte do município de
Mulungu.
1858 - Início da cultura de cana-de-açúcar na Serra de Baturité.
- A Vila Real Monte Mor-o-Novo da América transformava-se no Município
de Baturité.
1864 A imagem de São Sebastião (não a estátua localizada no cemitério)
chega a Mulungu.
1882 Construção da estrada de ferro que ligava a capital cearense, Fortaleza,
ao Município de Baturité.
1890 - Criação do Município de Mulungu, pelo Decreto nº 29.
1895 - Foi instituída a freguesia de São Sebastião do Mulungu.
- Fundação da paróquia de São Sebastião
XIX
1899 A Lei nº 550 suprimia o Município de Mulungu.
1900 Foi restaurado o Município de Mulungu através da Lei nº 602.
1906 Instalação da luz de carbureto na Igreja de Mulungu
1914 Primeiro automóvel a chegar a Mulungu, guiado por José Messias
1921 Extinção do Município de Mulungu, pela Lei nº 1887.
1929 Restauração do Município de Mulungu, pela Lei nº 2715
1931 Extinção do Município de Mulungu, pelo Decreto 193, passando a ser
distrito de Pacoti.
1939 É formada a primeira Câmara Municipal do Município de Mulungu
1957 Promoção definitiva à comarca autônoma do Município de Mulungu.
1958 - Início da construção da Igreja de São Sebastião (Matriz)
- Primeira eleição para prefeito e vereadores de Mulungu
1967 A bandeira de Mulungu foi desenhada por Leonardo Carvalho
1972 Construção da Estátua de São Sebastião.
1975 Conforme a Lei nº 9999, o Município de Mulungu passa a ser Comarca
XX
XX
1990 Criação da Área de Proteção Ambiental da Serra de Baturité
Fonte: SOUZA, 1992; CAMPOS, 2000; IBAMA, 2002; CEARÁ, 2005; material coletado junto à Paróquia do
Município de Mulungu (Anexo); e entrevistas a antigos moradores.
82
4.2 Condições de organização e produção social: aspectos demográficos,
infra-estrutura e atividades socioeconômicas
De acordo com os dados publicados pelo Censo Demográfico do IBGE
(2000), o Município apresenta população de 8.964 habitantes, dos quais 3.795 estão
concentrados na área urbana (42,34%) e 5.169 na área rural (57,66%). Os dados
revelam que Mulungu apresenta composição predominantemente rural (tabela 7 e
gráfico 2), bem como toda a região da Serra de Baturité. Com base na análise
populacional do IBGE, conclui-se que a taxa média de crescimento anual é de
1,43% (IBGE, 1991/2000). Na última contagem populacional realizada pelo IBGE
(2007), o Município contabilizou 10.975 habitantes, confirmando, então, um aumento
da população mulunguense
4
.
Tabela 7 – População Residente em Mulungu – CE
Variável / Ano
População residente (Pessoas)
População residente (Percentual)
Situação do domicílio
1970 1980 1991 2000 1970 1980 1991 2000
Total
8.382
7.429
7.842
8.964
100,00
100,00
100,00
100,00
Urbana
1.338
1.323
3.023
3.795
15,96
17,81
38,55
42,34
Rural
7.044
6.106
4.819
5.169
84,04
82,19
61,45
57,66
Nota: 1 - Dados da Amostra
Fonte: IBGE - Censo Demográfico
Gráfico 2 – População Residente em Mulungu – CE
Nota: 1 - Dados da Amostra
Fonte: IBGE - Censo Demográfico
4
Até o fechamento da dissertação, o IBGE ainda não havia publicado dados específicos referentes à situação de
domicílio da população.
83
Ao tratar do crescimento urbano e rural, o Planejamento Biorregional do
Maciço de Baturité (IBAMA, 2002) indica que o Município de Mulungu está
enquadrado no grupo dos municípios com crescimento urbano positivo, apesar da
ligeira diminuição da população urbana ocorrente entre os anos de 1970 e 1980.
na zona rural o crescimento é negativo, com exceção do período entre os anos 1991
e 2000.
Nesse sentido, o crescimento negativo de população rural e a expansão da
população urbana passam a ser características demográficas
predominantes na região, tendo como exceção os municípios de
Guaramiranga e Aracoiaba, que mantêm taxas positivas de crescimento
rural. (IBAMA, 2002, p.80).
De acordo com a evolução urbana, não somente Mulungu como também
os demais municípios serranos têm características semelhantes. Até 1980, as zonas
urbanas são consideradas como verdadeiros aglomerados rurais. A inexpressividade
da população das sedes, os incipientes equipamentos urbanos e a predominância
da atividade agrícola até então lhe conferem essa característica (IBAMA, 2002). O
caso de Mulungu é claro, pela tabela 4 e gráfico 2, comparativo com a população
residente (habitantes) e sua situação (urbana e rural) decorrente, entre os anos de
1970 e 1980. A partir de 1991, pode-se observar acentuado crescimento das áreas
urbanizadas.
Pode-se deduzir que parte dos habitantes, antes moradores em áreas
rurais, migrou para áreas urbanas, ou ainda o crescimento dos antigos aglomerados
rurais. Outro fato, mais ligado ao decréscimo da população total (principalmente
entre 1970 e 1991) decorre da provável migração da população mulunguense para a
Capital e Região Metropolitana de Fortaleza, em busca de melhores condições de
vida, o que ainda é comum nos dias atuais, com relação à maioria das cidades
interioranas.
A maioria dos núcleos urbanos do Município instala-se na área do platô
úmido, porém é possível ainda localizar outros nas vertentes oriental úmida e
ocidental semi-árida. A fixação dos cleos está quase sempre condicionada às
melhores condições de atividades agrícolas.
As áreas urbanas, assim como todo o território do Município, têm terreno
com relevo acidentado, todavia, em alguns pontos, como a sede municipal, têm
84
formas mais aplainadas, o que possibilitou uma fixação sem maiores riscos
topográficos (fig. 29).
Com base nas informações apresentadas pelo IBGE (2000), a população
predominante no Município de Mulungu é rural (57,66%). O maior número de
comunidades rurais encontra-se muito bem distribuída ao sul da sede municipal,
principalmente no platô úmido e vertente oriental. As principais zonas urbanizadas
(sede e distrito) alocam-se no platô. Acredita-se que a não ocupação humana nas
outras áreas se dá em virtude: da vertente ocidental apresentar menores índices de
umidade e topografia mais acidentada; e da área ao norte da sede, por oferecer
menos vias de acesso.
Acerca da forma de ocupação das edificações, nas zonas urbanas, é
possível observar um arranjo espacial organizado em sistema de ruas curtas
paralelas, perpendiculares ao longo de uma rua maior principal asfaltada, a Rua
Coronel Justino Café (fig. 30), com exceção das áreas onde a topografia não
permite. As edificações são, em geral, bem estruturadas, em construção de
alvenaria e com a presença de praças. Já, nas zonas rurais, as edificações alocam-
se desalinhadas, sem ordem e, por vezes, sem ruas, e muitas outras construídas
isoladas no meio da mata, entre as quais, é comum deparar-se com casebres
desprovidos de qualquer infra-estrutura (fig. 31).
Fig.29: Vista da sede municipal de Mulungu – CE.
Foto: Luciana Freire, 2006
85
A infra-estrutura de Mulungu tem característica bem típica de cidades
interioranas e pequenas. O desenvolvimento urbano não é muito representativo ao
longo dos últimos anos. Mesmo com o crescimento do turismo e do veraneio na
região da Serra de Baturité, até os dias atuais, o poder público do Município não
investe nesse setor e nem em melhores condições de infra-estrutura, como o
melhoramento das escolas públicas e dos postos de saúde, reforma de praças, ruas
e prédios antigos e ampliação da rede de saneamento básico.
O serviço de tratamento de esgoto beneficia parte da população
urbana, apenas 16,55% em todo o Município. Dessa forma, são comuns os esgotos
a céu aberto, facilitando a contaminação dos solos e da água. O serviço de água
urbano é quase total, com 98,40%. o serviço nas áreas rurais abrange apenas
12,50% (O POVO, 2007, p.150). Segundo informações coletadas em entrevistas
locais, a água provém de reservas subterrâneas e é tratada e distribuída pela
Companhia de Água e Esgoto do Ceará – CAGECE, que mantém estação de
tratamento no Município.
O Anuário do Ceará (op cit, 2007, p.150), registra-se um número de 689
linhas telefônicas em 2006. A telefonia móvel conta com serviços das três
operadoras presentes no Estado cearense: TIM, OI e Claro.
O fornecimento de energia elétrica abrange 88,72% da população total,
pela Companhia Energética do Ceará COELCE. O número de domicílios
Fig.30: Rua Cel. Justino Café, na sede do
município, e rua perpendicular, Tomaz
Carvalho.
Foto: Luciana Freire, 2007.
Fig.31: Casa localizada em zona rural, isolada
no meio da mata.
Foto: Luciana Freire, 2007.
86
beneficiados até 2006 era de 2.486 (op cit, 2007, p.150). A instalação dá-se por
meio de postes de concreto com fiação (fig.32). Em algumas localidades, porém, é
observada rede elétrica ligada por fiação em postes de madeira, de forma
rudimentar, não muito recomendados, por não serem resistentes às condições
climáticas da área (fig.33).
A presença da vegetação densa tem causado constantes faltas de energia
no Município. houve, inclusive, problemas graves com acidentes elétricos. Em
agosto de 2000, foi registrada a queda de palmeiras sobre fios de alta-tensão, que
caíram sobre residência, em curto-circuito, causando vítima fatal. Acredita-se que
falta de manutenção e prevenção de acidentes elétricos, que não têm sido
realizadas podas periódicas das árvores próximas à fiação.
Entre os serviços públicos, a Saúde é prestada pelo próprio poder
municipal, ligada ao Sistema Único de Saúde SUS. Entre as unidades de saúde,
segundo levantamento do Perfil Básico Municipal de Mulungu (IPECE, 2005, p.7), o
Município conta apenas com um hospital (22 leitos), três unidades de saúde da
família, uma unidade de vigilância sanitária, um ambulatório e um centro de saúde. A
tabela 8 mostra os principais indicadores de saúde registrados em 2003:
Fig.32:
Poste de concreto com fiação
passando entre a vegetação.
Foto: Luciana Freire, 2007.
Fig. 33: Presença de poste de madeira ao lado de
casarão rural, nos arredores da cidade.
Foto: Luciana Freire, 2006.
87
TABELA 8 – PRINCIPAIS INDICADORES DE SAÚDE DO MUNICÍPIO DE MULUNGU – CE (2003)
INDICADORES MUNICÍPIO ESTADO
Médicos / 100 hab. 0,17 0,14
Dentistas / 100 hab. 0,02 0,03
Leitos / 100 hab. 2,45 2,11
Unidades de Saúde / 1.000 hab. 0,08 0,05
Nascidos vivos 150 98.374
Óbitos 9 2.194
Taxa de Mortalidade Infantil / 1.000 hab. Nascidos vivos 60,00 22,30
Fonte: Secretaria da Saúde do Estado do Ceará, adaptado pelo Perfil Básico Municipal de Mulungu
Na Educação, as escolas de ensino fundamental somam 16 e as de
ensino médio apenas uma. Incluem-se, ainda, três escolas com educação para
jovens e adultos. A taxa de alfabetização, em 2000, registrava 67,5%. Em 2005, a
escolarização, no ensino médio, contabilizou 85,5%; e a escolarização, no ensino
médio, 27,5% (O POVO, 2007).
Em Mulungu, não instituições públicas de ensino cnico e superior.
Entretanto, há um núcleo da Universidade Estadual Vale do Acaraú – UVA, no
Instituto Dom José de Educação e Cultura IDJ, com cursos particulares de
formações especiais de licenciatura em Biologia, História e Letras, ministrados na
Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio Prof. Milton Façanha Abreu.
O IDJ surgiu com o intuito de qualificar os professores que já integravam a
rede de ensino pública estadual, sem diploma de ensino superior, que a Lei de
Diretrizes e Bases da Educação LDB, de 1996, exige esse documento. Porém,
depois de alguns anos, viabilizaram-se vagas para o público em geral, tornando-se
ensino superior privatizado de qualidade questionável, mesmo oriunda da UVA, que
é uma universidade pública estadual.
O Município não tem equipamentos de promoção da cultura, como
museus e/ou teatros. Tem apenas uma biblioteca pública, com um acervo bastante
limitado. Além da programação cultural das próprias escolas, a Paróquia de Mulungu
tem participação destacada na mobilização cultural, com oficinas de canto e ensaios
teatrais para apresentações pontuais, bem como para os festejos da Paixão de
Cristo, além de um arquivo documental sobre o município bastante rico com acesso
ao público.
O Município conta com uma banda de sica formada desde 1975,
atuante nos festejos religiosos, juninos e carnavalescos.
A segurança pública é realizada pela polícia militar, representada por um
destacamento policial, sediada no Município, subordinado à Companhia (Baturité)
88
do Batalhão da Pocia Militar, localizada no Município de Canindé. Contudo, os
equipamentos militares, atualmente, encontram-se em situação bastante precária.
Segundo a comunidade, o Governo Estadual não tem investido na manutenção do
prédio, nem da única viatura existente, de modo que a própria população é quem
tem contribuído para sua manutenção.
A comarca do Município foi estabelecida conforme a Lei 9999 de 05 de
dezembro de 1975, tendo como seu primeiro Juiz de Direito, Dr. Azis Manuel Farias
Jereissati. Conta com o Fórum Des. Raimundo Bastos de Oliveira, de primeira
entrância, onde também funciona a Justiça Eleitoral.
No que se refere aos resíduos sólidos, a coleta de lixo é realizada pelo
próprio Município, duas vezes por semana, em caminhão (fig.34). Anteriormente, os
resíduos lidos eram despejados em lixão, na localidade de Camará. Entretanto,
pelas inadequações do relevo acidentado, foi desativado em 2004. Atualmente, o
lixo é direcionado a um novo lixão, no Município de Baturité, no sopé da Serra.
Os serviços de transporte de passageiros para Mulungu contam com
linhas fixas de empresas credenciadas, como também com transportes alternativos
(“topics” e “paus-de-arara” – fig.35). Acrescenta-se que, no Município, bem como em
boa parte do interior do Ceará, cresce bastante a frota de motocicletas, em razão do
baixo custo dos veículos, economia de combustível e aumento de serviços de
transporte pelos mototáxis (tabela 9). Em contrapartida, crescem também os índices
de acidentes de trânsito e a poluição sonora.
Fig.35: Transporte de passageiros, através do pau-
de-arara, de Mulungu – CE a municípios vizinhos.
Foto: Joselito Lima, 2006.
Fig. 34: Recolhimento do lixo urbano em local pré-
estabelecido, na sede municipal de Mulungu – CE.
Foto: Joselito Lima, 2006.
89
TABELA 9 - FROTA DO MUNICÍPIO DE MULUNGU – CE (2004)
Automóvel 71
Caminhão 32
Caminhonete 9
Microônibus 7
Motocicleta 239
Motoneta 1
Ônibus 1
Fonte: Ministério da Justiça, DENATRAN – 2004
De acordo com a evolução histórica, a economia da região serrana de
Baturité mais decisiva é constituída por atividades agrícolas.
Em Mulungu, essa realidade tem mudado, pois 57,7% da economia é
basicamente constituída pelas atividades de serviços/comércio local, ultrapassando
as atividades agropecuárias, que chegam a 26,4%. Há, ainda, uma tímida atividade
industrial de transformação (15,8%), não sendo característica própria da região (O
POVO, 2007, p.150).
Na tabela 10, tem-se a noção das atividades econômicas estabelecidas
até o ano de 2003. Não representa, porém, a totalidade de mão-de-obra empregada,
mas a quantidade de empresas cadastradas pelo IBGE. Nota-se um maior número
de empresas alocadas na área de serviços e comércio, fato decorrente,
provavelmente, do crescimento urbano do Município e do aumento de demandas
locais. As atividades primárias estão representadas por apenas três unidades
cadastradas, supondo-se que exista um maior número, praticadas em pequenos
sítios, em diversas localidades do Município.
TABELA 10 – EMPRESAS DE MULUNGU – CE (2003)
Número de unidades locais da Empresa Unidades
Agricultura, pecuária, silvicultura e exploração florestal 3
Indústrias de transformação 3
Comércio; reparação de veículos automotores, objetos pessoais e domésticos
66
Alojamento e alimentação 7
Transporte, armazenagem e comunicações 1
Intermediação financeira 1
Atividades imobiliárias, aluguéis e serviços prestados às empresas 1
Educação 3
Outros serviços coletivos, sociais e pessoais 32
Fonte: IBGE,Cadastro Central de Empresas 2003.
90
Entre as atividades do setor terciário, destaca-se a acentuada quantidade
de pequenos comércios (fig.36), representados, na maioria, pelas mercearias, pelas
lojas de confecção, pelos bares e pelas lanchonetes.
A atividade terciária destaca-se, sobretudo, nos setores da Educação e da
Saúde. O Município, também, conta com uma agência de Correios e Telégrafos,
uma agência do Banco do Brasil, um escritório da Superintendência Estadual do
Meio Ambiente SEMACE, um sindicato dos trabalhadores rurais, um sindicato dos
servidores públicos municipais e 24 associações comunitárias que se congregam à
Federação das Entidades Comunitárias do Município de Mulungu - FECOMU.
Com o advento do turismo na região, na Serra de Baturité, o Município de
Mulungu conta hoje, a partir da iniciativa privada, com quatro estabelecimentos de
hospedagem (três pousadas e um hotel-restaurante fig.37), o que tem também
direcionado à capitação de serviços hoteleiros prestados pela comunidade.
Outro ponto relevante, em relação ao setor terciário, -se pela crescente
expansão imobiliária, impulsionada também pelo turismo da região serrana, que vem
ocasionado abertura de lojas de material de construção e empregado parte da
população na construção civil.
A especulação imobiliária estabelece-se principalmente nas áreas mais
protegidas do platô úmido, dotadas de valor paisagístico. Aproveitou-se o
Fig. 37: Restaurante e pousada Hofbrauhaus, de
propriedade do Sr. Wolfgang Helmut, de cidadania
alemã, localiza-se no distrito de Lameirão.
Foto: Luciana Freire, 2007.
Fig. 36: Área comercial, na sede municipal
de Mulungu – CE.
Foto: Luciana Freire, 2005.
91
desconhecimento da população local acerca do valor da terra, que vende seus
terrenos a preços muito abaixo dos de mercado. Foram surgindo, então, sítios e
chácaras luxuosas em contraponto com as pequeninas moradias locais. Sem a terra
para plantar, antigos agricultores migraram para serviços domésticos.
O setor secundário tem pequena representatividade (15,8%), em relação
aos demais setores da economia, mormente em padarias, feitura de mobiliários e
construção de engenhos para o beneficiamento de cana-de-açúcar, na produção de
rapadura, mel e cachaça (fig.38). Registram-se, ainda, algumas fábricas de pilação
de café (fig.39) e casas de farinha em sítios de propriedade particular.
Entre as atividades primárias, a principal é a agricultura. Porém, é possível
perceber uma pecuária desenvolvida, predominantemente na localidade de Boa
Jardim. Outras mais, isoladas, sobrevivem com características ainda bastante
rudimentares.
A prática da atividade pecuária é prejudicial ao ambiente serrano, pela
necessidade de campos abertos para pastagem, o que induz à desmatamentos
florestais. Segundo o IBGE (2003), predominância de bovinos (fig.40), suínos,
granjas (galináceos e produção de ovos) e muares, todos desenvolvidos em
criatórios de pequenas propriedades particulares. Como visto na tabela 11, uma
grande expressividade da produção de granjas. A produção de leite de vaca e ovos
Fig.38: Atividade agrícola aliada à atividade artesanal (plantio
de cana-de-açúcar e produção de rapadura).
Foto: Luciana Freire, 2006.
Fig.39: Piladeira de Café, sítio Brejo,
distrito de Lameirão.
Foto: Luciana Freire, 2007.
92
de galinha também é bastante representativa, consumida, em sua maior parte, na
própria região.
TABELA 11 - PECUÁRIA DE MULUNGU – CE (2003)
Produção Quantidade Especif.
Bovinos - efetivo dos rebanhos 907 cabeça
Suínos - efetivo dos rebanhos 245 cabeça
Eqüinos - efetivo dos rebanhos 50 cabeça
Asininos - efetivo dos rebanhos 96 cabeça
Muares - efetivo dos rebanhos 386 cabeça
Ovinos - efetivo dos rebanhos 25 cabeça
Galinhas - efetivo dos rebanhos 2.815 cabeça
Galos, frangas, frangos e pintos - efetivo dos rebanhos 5.426 cabeça
Caprinos - efetivo dos rebanhos 79 cabeça
Vacas ordenhadas 146 cabeça
Leite de vaca - produção 149 mil litros
Ovos de galinha - produção 15 mil dúzias
Fonte: IBGE, Produção da Pecuária Municipal 2003.
Em relação à produção agrícola, Mulungu tem como principal atividade o
cultivo de hortifruticulturas, prevalecendo a praticada em pequenas propriedades,
com alto percentual de miniprodutores em agricultura de subsistência com baixos
rendimentos (fig. 41 e 42). Há, também, a presença de alguns grandes produtores
que captam mão-de-obra para a produção (fig. 43). Essa atividade está distribuída
em toda a extensão do município, porém apresenta maior expressividade na
vertente oriental.
Fig. 40: Pecuária desenvolvida em Mulungu, na localidade de
Bom Jardim.
Foto: Luciana Freire, 2007.
93
As principais culturas agrícolas são: banana, laranja, café, cana-de-
açúcar, alface, cenoura, tomate, beterraba, chuchu e repolho. De acordo com a
pesquisa de campo, a maior parte da produção é comercializada diretamente na
Companhia de Abastecimento do Ceará CEASA, em Fortaleza, além do consumo
local.
Fig. 41: Cultivo de tomate consorciado à
Bananicultura, no sítio Brejo, distrito de
Lameirão.
Foto: Luciana Freire, 2007.
Fig. 42: Plantação de hortaliças, em pequena
propriedade, na localidade de Bom Jardim.
Foto: Luciana Freire, 2007.
Fig. 43: Cultivo de hortaliças, em grande propriedade,
localidade de Cavaco.
Foto: Luciana Freire, 2007.
94
O IBGE (2003) subdivide a produção agrícola em lavouras permanentes e
temporárias. Nas lavouras permanentes, destacam-se a bananicultura (fig.44), com
produção de mais de 9 mil toneladas, e a produção de café em grãos (fig.45), com
547 toneladas, que pode ser encontrada em quase toda a área do Município.
A fruticultura complementa o quadro das lavouras permanentes, conforme
dados da tabela 12, representadas, principalmente, pelo coco-da-baía, laranja,
manga, mamão e maracujá, produzidas em algumas pequenas propriedade mais
isoladamente. A castanha de caju tem pouca representatividade, haja vista que as
regiões serranas não são propícias ao seu cultivo.
TABELA 12 - LAVOURA PERMANENTE DE MULUNGU – CE (2003)
Produção Quantidade Produzida (tonelada)
Banana 9.610
Café (em grão) 547
Castanha de caju 7
Coco-da-baía 194
Laranja 141
Mamão 35
Manga 121
Maracujá 18
Fonte: IBGE, Produção Agrícola Municipal, 2003.
Fig. 44: Bananicultura, próximo ao distrito de Catolé.
Fotos: Luciana Freire, 2007.
Fig.45: Cultivo do café sombreado, no
sitio Brejo, distrito de Lameirão.
Fotos: Luciana Freire, 2007.
95
Nas lavouras temporárias, como registrado na tabela 13, observa-se a
predominância de grãos e leguminosas, dentre os quais, destaca-se a produção de
milho (1.171 toneladas) e de tomate (801 toneladas).
TABELA 13 - LAVOURA TEMPORÁRIA DE MULUNGU – CE (2003)
Produção Quantidade Produzida (tonelada)
Alho 10
Cana-de-açúcar 880
Feijão (em grão) 304
Mandioca 19
Milho (em grão) 1.171
Tomate 801
Fonte: IBGE, Produção Agrícola Municipal, 2003.
A cultura de cana-de-açúcar, importante produto econômico do Município
ao longo de sua história, também merece destaque com produção média de 800
toneladas anuais, localizada em planícies alveolares. a produção de feijão, milho
e mandioca ocorre, principalmente, nas vertentes oriental e ocidental.
A atividade econômica da extração vegetal não é muito representativa,
provavelmente pela atuação da fiscalização da SEMACE na Área de Proteção
Ambiental APA, da Serra de Baturité, que restringe a derrubada de árvores. Ainda
assim, são encontradas áreas desmatadas na vertente ocidental, com dimensões
territoriais representativas, utilizadas pela retirada de madeira para produção de
lenha e carvão (fig.46 e 47).
Fig. 47: Área na localidade de Boa Vista,
Mulungu – CE, onde houve extração vegetal
para carvão.
Foto: Luciana Freire, 2007.
Fig. 46: Brocagem para uso do solo, na
localidade Sítio Jardim, Mulungu – CE.
Foto: Joselito Lima, 2007.
96
A tabela 14 mostra que a extração de grãos oleaginosos está relacionada
à produção de óleos, proveniente da amêndoa de babaçu. a retirada de madeira
está destinada, principalmente, à produção de carvão vegetal. Acrescente-se, ainda,
a utilização dessa madeira como lenha e na construção de cercas.
TABELA 14 - EXTRAÇÃO VEGETAL E SILVICULTURA DE MULUNGU – CE (2003)
Produção Quantidade produzida (tonelada)
Madeiras - carvão vegetal 3
Oleaginosos - babaçu (amêndoa) 6
Fonte: IBGE, Produção da Extração Vegetal e Silvicultura 2003.
Foram notificadas, também, as atividades de mineração, com a retirada
de rochas graníticas para produção de brita para construção civil. É bom lembrar
que o Estado do Ceará é um dos principais pólos de extração dessas rochas, uma
vez que mais da metade de sua superfície é constituída de granito (ARRUDA, 2001).
De conhecimento da comunidade local, havia uma pedreira clandestina
(fig.48) desativada logo após a ocorrência de um acidente, de repercussão estadual,
em fevereiro de 2006. A vítima do acidente ficou presa pelas penas entre duas
rochas pelo deslocamento de uma delas, durante cerca de seis horas a ser
resgatada. Infelizmente, a vítima faleceu poucos meses depois em decorrência dos
graves ferimentos. Essa mesma atividade, segundo os meios de comunicação,
havia feito, anteriormente, duas vítimas fatais.
Fig. 48: Área onde funcionava a pedreira clandestina, na
localidade Sítio Jardim.
Foto: Luciana Freire, 2007.
97
O Mapa de Uso e Ocupação da Terra no Município de Mulungu CE (fig.
49) demonstra, espacialmente, as condições atuais de organização e produção do
espaço em tipologias de uso e ocupação, além de conter os tipos de vegetação e
suas atuais condições de conservação e degradação.
98
99
4.3 Impactos sócio-ambientais
Apesar de tratar-se de Município com extensa parte do território inserida
na Área de Proteção Ambiental APA, da Serra de Baturité, Mulungu tem
demonstrado, por meio dos diferentes processos de uso e ocupação da terra,
problemas ambientais graves, de modo que, se não controlados em tempo, tornar-
se-ão irreversíveis.
A partir das atividades socioeconômicas desenvolvidas ao longo da sua
história de ocupação, conclui-se que o principal problema está relacionado à
degradação da cobertura vegetal, causando a quebra do equilíbrio natural e
desencadeando a intensificação de processos erosivos, entre outros diversos
impactos negativos, bem como expresso no Mapa de Impactos Sócio-Ambientias do
Município de Mulungu – CE
5
.
A maioria dos impactos sócio-ambientais inicia-se pela ação da própria
comunidade. A falta de informação e educação ambiental por parte dos próprios
habitantes, ocasiona um uso inadequado da terra para as atividades agropecuárias.
Inclui-se, ainda, a falta de opção de terras propícias para essas atividades, que
boa parte do território é comercializado a favor da especulação imobiliária.
Incluem-se, como fatores determinantes dos impactos, a ausência de
políticas públicas voltadas para a produção rural e o planejamento urbano e rural,
sendo imprescindíveis a prática de políticas públicas de ordenamento territorial.
Dentre os principais impactos sócio-ambientais registrados, incluem-se os
que estão analisados a seguir.
4.3.1 Devastação da cobertura vegetal
O problema da devastação da cobertura vegetal está relacionado ao
histórico de ocupação ainda nas primeiras instalações colonizadoras, ocorridas no
início do culo XVIII, tendo como principais as atividades agropecuárias, o
extrativismo vegetal, o processo de urbanização e, mais recentemente, os efeitos da
especulação imobiliária.
5
Figura 73, página 124.
100
As serras úmidas cristalinas têm a topografia acidentada como principal
fator limitante para o uso da terra. Não diferentemente do que ocorre em toda a
região serrana, no Município de Mulungu, a retirada de vegetação nativa de
vertentes muito íngremes promovem a exposição dos solos às ações erosivas que
podem comprometer a qualidade ambiental, conforme demonstrado no sistema de
degradação do meio ambiente
6
.
A floresta atua como reguladora do ecossistema e, sem ela, torna-se
impossível a conservação da natureza. À medida que a vegetação nativa vai sendo
substituída por outras formas de uso, o desequilíbrio ecológico, resultando na
redução da diversidade de espécies da flora e da fauna.
Entre as principais atividades agrícolas responsáveis pelo início da
devastação da cobertura vegetal, citam-se a cafeicultura, a bananicultura, a cana-
de-açúcar e o cultivo tradicional de grãos e hortaliças.
A cultura cafeeira, iniciada na região em meados do século XIX, foi uma
das maiores responsáveis pelo desmatamento da Serra de Baturité. Houve um
período, durante o século XX (até a década de 1970), em que foi praticado o cultivo
do café a pleno sol, o que levou à derrubada de matas inclusive próximas às
margens e nascentes dos cursos d’água e em declives acentuados e à exaustão
dos solos, na medida em que a produção aumentava.
Considerando-se que a Serra é um importante foco onde são encontrados
resquícios da Mata Atlântica, começaram, então, os movimentos a favor da
conservação da floresta úmida. Deste modo, foi implantada uma Unidade de
Conservação, a Área de Proteção Ambiental APA da Serra de Baturité (1990),
como medida para atenuar os impactos ambientais negativos que estavam
ocorrendo na Serra.
A produção cafeeira na região foi diminuindo, tanto pelo fato da
implantação da APA quanto pelos cafezais não estarem mais resistindo às altas
radiações solares do Ceará. Os produtores precisavam de alternativas. Assim, foi
incentivada a prática do cultivo do café sombreado que, comparado ao café a pleno
sol, é considerado como café ecológico (tabela 15).
6
Capítulo 3, figura 14, página 57.
101
Tabela 15 – Quadro Comparativo do Café
Café Sombreado (espécie arábica) Ao sol (espécie robusta)
Objetivos Gerais Além de satisfazer a interesses
econômicos, atende a necessidades
ecológicos e sociais.
Atende a interesses econômicos a
curto prazo.
Cultura Sistema Diversificado Consorciado com
árvores de sombra (Ingazeiras), fruteiras
(bananeiras), agricultura de
subsistência (milho, mandioca, chuchu).
Monocultura
Qualidade Alta, com baixo teor de acidez Baixa
Estrutura Fundiária Pequena propriedade Grande propriedade
Controle de Pragas Nutrição equilibrada e adequada;
Diversificação e consorciação;
Controles alternativos
Agrotóxicos
Fertilização Natural, proveniente do húmus
decorrente das folhas caídas no chão que
fertilizam o solo com nitrogênio.
Química
Vantagens Habitat de pássaros migratórios;
Conservação da biodiversidade
Alta produtividade
Desvantagens Alto preço Baixo preço
Produtividade 5 sacas por hectare (podendo chegar a
15 sacas)
30 sacas por hectare (podendo
chegar a 50 sacas)
Valor do produto
final/saca
R$ 350,00
R$ 120,00
Custos Mão-de-obra Mão-de-obra, insumos, fertilizantes,
adubos, mudas
Renda Adicional Proveniente das fruteiras Nenhuma
Fonte: Secretaria de Desenvolvimento Local e Regional do Ceará (CEARA, 2005, p.10).
Ele [café de sombra] melhora a biodiversidade, tanto quanto do número de
espécies vegetais e animais nas suas áreas. Além disso, o sistema de
sombreamento não usa fertilizantes ou pesticidas. O húmus é decorrente
da decomposição de resíduos vegetais e controla também possíveis
doenças ou pragas. Quando certificado esse café também pode ser
considerado orgânico. (CEARÁ, 2005, p.10).
Não sendo necessária a retirada da vegetação existente e, ainda, havendo
o replantio de árvores de sombra como o camunzé e a ingazeira, o café sombreado
é, portanto, uma atividade econômica ambientalmente viável, além de necessitar de
uma estrutura fundiária em pequena propriedade. Acrescenta-se, ainda, a
possibilidade de aproveitamento da área plantada consorciada a outros produtos
agrícolas (policultura), por meio de árvores frutíferas.
No período em que a cultura cafeeira entrava em decadência foram
indicadas novas alternativas de atividades agrícolas, entre as quais, destaca-se a
bananicultura.
O cultivo da banana (Musa balbisiana) é, atualmente, a atividade agrícola
que mais causa devastação da cobertura vegetal. A fruta tem produção bastante
102
intensificada, sendo presentemente a principal atividade agrícola e comum a todas
as regiões do Município. É altamente prejudicial, não sendo recomendável,
principalmente em áreas serranas. Além de haver a retirada total da mata nativa
para dar lugar à produção, os bananais não protegem adequadamente o solo contra
as ações naturais do clima, condicionando a ablação dos horizontes superficiais, do
solo, aliada ao seu empobrecimento pela perda dos nutrientes naturais.
Soma-se ainda, historicamente, a cultura da cana-de-açúcar, iniciada na
Serra, na segunda metade do século XIX. Apesar de não apresentar produção em
grande escala, como ocorreu em outras regiões do Nordeste brasileiro, a exemplo
da Serra de Uruburetama, no Ceará, a atividade também necessita de campos
abertos, sem qualquer vegetação para seu cultivo (fig.50). É possível identificar
várias áreas utilizadas para seu plantio, em diversas localidades do Município. É
importante enfatizar um ponto positivo: esta produção que, em sua maioria, está
alocada nas planícies alveolares, por serem áreas mais planas, resulta em menores
impactos gerados pela devastação vegetal.
No Município, são comuns, também, os sistemas agrícolas tradicionais
voltados ao cultivo de hortaliças, grãos e leguminosas. Em geral, têm caráter de
produção de subsistência, sem utilização de insumos modernos, como fertilizantes
para os solos, além da retirada indiscriminada da cobertura vegetal, por meio de
técnicas rudimentares, em locais impróprios, principalmente em áreas de
declividades acentuadas (fig.51). Inclui-se a brocagem e destocamento, que se
pela retirada de lenha e produção de carvão vegetal.
Fig.50: Plantação de cana-de-açúcar na localidade de Pindoba. Nota-
se a necessidade de área descampada para efetivação da produção.
Foto
: Luciana Freire, 200
7
.
103
Entre as áreas com maiores problemas gerados pelo desmatamento das
matas nativas, além das vertentes íngremes, somam-se as margens dos riachos e
nascentes fluviais. A região é um importante dispersor de drenagem, de tal maneira
que, se forem afetados os recursos hídricos, pode acarretar impactos não só locais.
Em relação aos riachos, com a ausência da mata ciliar, o aumento da
evapotranspiração, remoção dos solos e assoreamento do fundo dos vales (Fig.52).
A falta de vegetação no entorno das nascentes pode ocasionar o seu
ressecamento.
Fig.52: Riacho Nilo, na porção sul do Município, com margens
degradadas.
Foto: Luciana Freire, 2007.
Fig.51: Ocorrência de atividades agrícolas ocupando indiscriminadamente
vertentes íngremes.
Foto: Luciana Freire, 2006.
104
Por fim, entre os impactos gerados pela devastação da cobertura vegetal
mais perceptível, cita-se a mudança e descaracterização da paisagem natural. É
inegável que uma paisagem, para ser bela, o ideal é que esteja conservada, seja
ela natural ou cultural.
Do mesmo modo que, nos centros urbanos, prédios com valor histórico-
culturais são mantidos bem como eram no passado, respeitando suas belezas
arquitetônicas de civilizações passadas, é necessário também manter conservadas
as áreas ainda inabitadas pelo homem. Essa atitude não visa unicamente à
apreciação estética de um belo cenário, mas também manter vivas as
características essenciais que a natureza oferece à sobrevivência na Terra.
4.3.2 Erosão dos solos
A erosão dos solos é caracterizada pelo movimento brusco de
sedimentos. As causas estão relacionadas à própria dinâmica da natureza
distribuição e intensidade das chuvas, à declividade, às propriedades químicas e
físicas dos solos, à estrutura geológica e ao tipo de cobertura vegetal) e, sobretudo,
pelas condições de uso e ocupação da terra pelo homem, condicionando a
aceleração dos processos erosivos.
Em áreas dotadas de alta declividade, a erosão dos solos torna-se maior
na medida em que são registrados desequilíbrios, como a retirada da cobertura
vegetal, o uso indiscriminado dos solos em atividades agropecuárias e a ocupação
desordenada pela construção civil. O conhecimento da topografia e suas formas de
uso adequado são primordiais. Bigarella (1979 apud CUNHA & GUERRA, 2000)
destaca a importância do uso condicionado a determinadas classes de declive,
propondo uma tabela que indica as forma possíveis de usos (tabela 16).
As chuvas representam o principal elemento climático relacionado aos
movimentos de massa nas vertentes e encostas. No período chuvoso, o volume das
precipitações é maior, os solos expostos ficam encharcados e são comuns as ações
erosivas, configurando-se pela formação de sulcos, ravinas e movimentos de massa.
Além do movimento de massa, “a ação da água das chuvas pode romper os
agregados, provocando o processo de selagem (sealign), na superfície do solo,
formando crostas (crusts), que vão dificultar ou mesmo impedir a infiltração da água
da chuva” (GUERRA & MENDONÇA, 2004, p.229).
105
TABELA 16 – TIPOS DE USO INDICADOS PARA OS DIVERSOS INTERVALOS
DE CLASSE DE DECLIVE
Intervalos de classe de declive
Em percentual Em graus
Tipo de uso do solo indicado;
< 1 <1
· Agricultura sem restrições;
1 a 6 1 a 3
· Agricultura intensiva;
· Medidas de convervação ligeiras;
6 a 12 3 a 7
· agricultura com práticas moderadas
conservacionistas;
12 a 20 7 a 12
· Agricultura com rotação;
· Limite à agricultura mecanizada;
· Conservação intensiva;
20 a 45 12 a 24
· Culturas permanentes com restrições;
>45 >24
· Área de preservação obrigatória por lei.
Fonte: Bigarella (1979 apud CUNHA & GUERRA, 2000, p.357)
Os movimentos de massa podem ser classificados como quedas,
escorregamentos, corridas, tombamentos e espraiamentos. Na Serra de Baturité,
são mais comuns os escorregamentos, também conhecidos como desabamentos,
derretidos e deslizamentos.
Os escorregamentos caracterizam-se como movimentos rápidos de
terra, de curta duração, com plano de ruptura bem definido, o que distingue o
material deslizado do não movimentado (FERNANDES & AMARAL, 2000, p.135).
Incluem-se, ainda, os processos de erosão linear (sulcos, ravinas e
voçorocas) que, de acordo com Guerra (2003), combinados, podem causar o
rebaixamento da superfície do terreno, provocando a redução do teor de matéria
orgânica e de elementos minerais, tornando os solos degradados e dificultando a
agricultura nessas áreas.
Com a devastação da cobertura vegetal, os solos ficam sujeitos aos
mais diversos tipos de erosão. É comum a remoção da mata para limpeza de
terrenos para fins agrícolas, pecuária, abertura de estradas e para construção
imobiliária (fig. 53). Nas serras, entretanto, essa devastação confirma-se pela maior
remoção dos solos, ocasionando o desmoronamento de terras ou movimentos de
massas. Essa erosão é mais evidente nas vertentes íngremes, onde é maior a força
gravitacional.
106
Com a crescente procura por terrenos para instalação de segunda
residência no Município de Mulungu, são freqüentes as áreas onde remoção de
areia para a construção civil, aliada à abertura e terraplanagem (fig.54). Essas ações
são extremamente perigosas, quando não aplicação de cnicas adequadas, em
locais de solo frouxo, podendo acarretar deslizamentos de terra.
Fig.53:
Sedimentos de empréstimos para abertura de estrada e
ocupação imobiliária. Nota-se q
ue houve processo de erosão dos
solos (indicado pela seta).
Foto: Luciana Freire, 2007.
Fig.54: Área, na sede municipal, onde houve a retirada de terra para
abertura e terraplanagem.
Foto: Luciana Freire, 2007.
107
Diante da erosão dos solos caracterizados pelos movimentos de massa,
há, como conseqüência, o assoreamento de áreas mais deprimidas, como os vales,
lagos, rios e riachos. Há, ainda, implicações relacionadas às mudanças das
propriedades dos solos, como a diminuição da fertilidade e redução da capacidade
de retenção de água, dificultando o desenvolvimento natural da vegetação. Os
problemas ocorrem, principalmente, em terrenos descobertos, como na prática da
atividade pecuária, em que os solos estão expostos às ações climáticas e ao
pisoteio do gado.
Inclui-se, ainda, a possibilidade de a erosão de solos causar o
aparecimento de afloramentos rochosos, impossibilitando, principalmente em áreas
com declividade acentuada, a pedogênege, a fixação de vegetação e a infiltração de
água. Outro impacto dá-se pela mudança e degradação visual da paisagem natural.
Para que haja a conservação dos solos e evitar a aceleração dos
processos erosivos, são necessárias práticas de conservação, como cultura em
curvas de nível e terraceamento, técnicas de pousio, dentre outras.
4.3.3 Degradação e privatização dos recursos hídricos
Os recursos hídricos são elementos da natureza essenciais à
sobrevivência da biodiversidade e do próprio homem. A devastação da cobertura
vegetal, os processos de expansão da urbanização e a atividade industrial e
tecnológica aliados ao alto consumo de água doce têm ocasionado a escassez do
líquido que se torna, a cada dia, mais precioso.
As serras úmidas são importantes setores de dispersão de drenagem. São
fontes de água natural, que pela sua própria topografia são distribuídas através dos
sistemas de bacias.
Incluiu-se, entre alguns exemplos dos impactos negativos referentes aos
recursos hídricos no Município de Mulungu, além da devastação da cobertura
vegetal, a contaminação dos recursos hídricos em face da falta de tratamento de
esgoto, o acúmulo de resíduos sólidos, o uso inadequado de agrotóxicos, os
criatórios de animais sem cuidados com a higiene. Estes, e outros exemplos de
impactos, estão expostos nos tópicos a seguir.
108
Comprometimento das nascentes fluviais
As nascentes fluviais são de importância fundamental. Delas vêm as
águas que alimentam os rios e riachos da Serra e abastecimento dos açudes que ,
inclusive, fornecem o precioso líquido para a Região Metropolitana de Fortaleza. As
nascentes são áreas que devem ser prioritariamente preservadas e/ou conservadas,
sendo necessária uma rígida aplicação da legislação que proíba toda e qualquer
forma de uso na sua área de abrangência.
De acordo com a Instrução Normativa 01/91 do Decreto Lei 20.956,
que estabelece as normas da implantação da APA da Serra de Baturité (SOUZA,
1990, p.95), o Artigo 9º declara que:
[...] as nascentes fluviais permanentes ou sazonais em qualquer situação
topográfica, terão a cobertura mantida numa faixa mínima de 50
(cinqüenta) metros a partir de suas margens, de modo a proteger, em cada
caso, a bacia de drenagem.
Mesmo sob proteção da lei, as nascentes, nas áreas do Município,
contempladas na APA, o apresentam sequer proteção especial. o identificadas
algumas fontes de água natural, mesmo ocorrentes em período de estação seca,
principalmente alocadas no platô úmido do Município.
As nascentes fluviais, observadas em campo, localizam-se em áreas de
propriedades particulares e não se apresentam conservadas. A vegetação primitiva
que deveria estar recobrindo seu entorno, já não mais existe (fig.55). Algumas,
inclusive, são aproveitadas para escavamento de poços (fig.56).
Além da conservação do entorno das nascentes, flagrou-se, ainda, um
caso que, em um mesmo sítio de propriedade particular, uma barragem, com
represamento de água, comprometendo o sistema de drenagem e privatizando,
indevidamente, os recursos hídricos (fig.57).
Os impactos ambientais, decorrentes da ausência de mata no entorno da
nascente, poderão ocasionar o ressecamento da fonte de água natural. Desse
modo, as implicações decorrentes seriam o seu assoreamento e a degradação
irreversível. Haveria, então, o desencadeamento de maiores problemas relacionados
à diminuição dos cursos d’água, comprometendo a recarga dos açudes da região.
109
Também são comuns as atividades agrícolas bem próximas das
nascentes fluviais, aliadas à utilização indiscriminada de agrotóxicos,
comprometendo a qualidade da água.
Fig.55: Fonte de água natural exposta, sem
vegetação nativa ao redor, localizada em
sítio particular, distrito de Lameirão.
Foto: Luciana Freire, 2007.
Fig.56: Poço construído sobre nascente fluvial,
para acúmulo de água. Sítio particular, distrito
de Lameirão.
Foto: Luciana Freire, 2007.
Fig.57: Barragem localizada
próxima à nascente fluvial, no detalhe. Notar que além do
represamento da água há, ainda, a conversação da nascente fluvial, que se encontra
desprotegida pela ausência da mata primitiva.
Fotos: Joselito Lima, 2007.
110
Contaminação das Águas
Além dos problemas ambientais dos recursos hídricos relacionados com o
desmatamento das matas ciliares, Mulungu apresenta, também, implicações ligadas
aos sistemas de esgoto e à contaminação das águas. De acordo com o
levantamento do Anuário do Ceará 2007-2008 (O POVO, 2007), o Município conta
com 16,55% do serviço de tratamento de esgoto, abrangendo apenas as áreas
urbanas.
Nas áreas não beneficiadas pelo tratamento de esgoto, os domicílios
possuem fossas artesanais ou, como a maioria, lançam os esgotos na rua, em
forma de canais a céu aberto (fig. 58), fazendo com que escoem diretamente para
rios e riachos mais próximos. Desse modo, o comprometimento da qualidade
das águas, com sérios danos aos ecossistemas aquáticos e ao próprio homem.
As águas, provenientes dos esgotos, podem apresentar grande
quantidade de matéria orgânica e inorgânica, incluindo microorganismos
patogênicos e substâncias tóxicas. O tratamento adequado e abrangente da água é
essencial para a saúde humana e ambiental, com o fim de evitar a transmissão de
doenças e maiores impactos ambientais.
Os esgotos a céu aberto são fontes de poluição direta dos recursos
hídricos superficiais, além da contaminação do solo. Importante lembrar que
Fig. 58: Zona rural do Município, localidade de Bastiões, com
presença de esgoto a céu aberto.
Foto: Luciana Freire, 2006.
111
naquela região nasce boa parte das águas que vão abastecer a bacia dos rios
Pacoti, Choró e Curu, haja vista a necessidade de um controle de qualidade pelo
amplo espaço territorial beneficiado.
Os impactos oriundos das fossas artesanais implicam na contaminação
dos recursos subterrâneos. O Município é abastecido por reservas hidrogeológicas,
o que motiva uma maior preocupação com o tratamento dessa água, que beneficia
a população local tanto no uso doméstico como para fins agrícolas.
Em pesquisa de campo, verificou-se a contaminação de riachos em sítios
particulares (segunda residência), com barragem e criação de patos. Segundo
moradores, época em que a água represada sai da barragem com odor fétido
muito forte, proveniente das fezes das aves (fig.59 e 60). A comunidade vizinha,
antes beneficiada pela água, não confia mais em sua qualidade, diante da barragem
particular e seu manejo, obrigando-se a buscar o líquido em outras localidades.
Não somente a falta de tratamento de esgoto causa contaminação dos
recursos hídricos. Além disso, incluem-se casos de acúmulo de lixo (fig. 61), de
matadouros artesanais e do uso indiscriminado de agrotóxicos nas atividades
agrícolas.
Fig.59: Canal de água poluída em barragem de
sítio particular, no distrito de Lameirão.
Foto: Luciana Freire, 2007.
Fig.60: Riacho contaminado por água provinda da
barragem em sítio particular. Lameirão.
Foto: Luciana Freire, 2007.
112
Barramentos indevidos
Na Serra de Baturité, é grande o número de barragens em áreas
particulares. São estruturas artificiais construídas com o intuito de represar água de
determinado curso d’água, para abastecimento próprio e/ou irrigação.
Em Mulungu, não há barragens públicas para abastecimento da
população, que a fonte principal é de origem hidrogeológica. São registrados
sítios e chácaras com barragens para utilização da água para irrigação da produção
agrícola.
Com o aumento do uso da terra em segundas residências, são comuns
ainda lagos artificiais instalados como elemento paisagístico, principalmente na
criação de aves aquáticas ornamentais (fig.62). Alguns, ainda, utilizam as barragens
para a pesca e atividades de lazer.
O barramento de rios e riachos condiciona alterações diversas,
principalmente pela mudança do ecossistema terrestre para aquático. O ambiente,
antes terrestre, tem a vegetação original destruída e o espaço para a fauna terrestre
é reduzido, provocando deslocamentos dessas espécies.
Fig.61: Despejo de esgoto residencial a céu aberto e acúmulo de lixo,
ocasionando poluição dos solos e dos recursos hídricos.
Foto
: Luciana Freire, 2005.
113
Outro fato dá-se pela transformação do ecossistema lótico (águas
correntes) em ecossistema lêntico (águas paradas). Dessa forma, animais aquáticos
que antes migravam pelas águas correntes são retidos em água parada,
modificando todo o ecosistema (BANCO DO NORDESTE, 1999).
Com a transformação do meio hídrico, no ecossistema lêntico, a
proliferação de plantas macrófitas aquáticas e a eutrofização das águas, que as
tornam com alto grau de nutrientes, causando a deficiência de oxigênio pelo
apodrecimento, tornando a água tóxica para os organismos vivos (fig.63). Nesse
caso, a contaminação dos corpos hídricos é inevitável.
Fig.62: Chácara particular com utilização de barragem como
elemento paisagístico e criação de aves aquáticas
ornamentais.
Fig.63: Barragem com água contaminada por eutrofização na
localidade de Boa Vista.
Foto: Luciana Freire, 2007.
114
A água parada, no período chuvoso, transborda os limites da barragem e
flui diretamente para os rios e riachos naturais, acarretando no comprometimento da
qualidade dos corpos hídricos serranos.
Outros impactos são constatados em relação ao barramento de rios, como
a mudança de percurso de antigos rios e riachos, a intensificação de processos
erosivos, o assoreamento dos riachos, além da mudança da paisagem natural
(fig.64).
4.3.4 Impactos das atividades agropecuárias
Com base na apresentação acerca das principais atividades desse setor
desenvolvidas em Mulungu
7
, é possível detectar os impactos negativos por elas
gerados.
Primeiramente, iniciam-se através da retirada da cobertura vegetal, dando
lugar ao cultivo agrícola e pastagens (fig.65). A agropecuária está diretamente
relacionada às práticas incorretas de manejo dos solos, ocasionando intensificação
dos processos erosivos, compactação e redução da fertilidade dos solos,
dificultando ainda mais a produtividade.
7
Conforme visto no item 4.2
Fig.64: Barragem localizada no distrito de Lameirão, ocasionando
intensificação de processos erosivos e alteração da paisagem.
Foto: Luciana Freire, 2007.
115
No caso em tela, pelo maior índice pluviométrico, os solos tendem a ser
carreados, principalmente nas vertentes íngremes, aumentando o escoamento
superficial e, conseqüentemente, dificultando a infiltração de água. . A compactação
dos solos dá-se, sobretudo, por meio do pisoteio dos animais da atividade pecuária,
com a diminuição da capacidade de infiltração da água. Some-se a isso a lixiviação,
em relevos planos, que retira boa parte dos nutrientes dos solos, comprometendo
sua fertilidade.
Entre as atividades agrícolas negativamente impactantes, cabe destaque
à bananicultura. Inicialmente, pela retirada da mata nativa, bem como as demais
culturas, com exceção do café sombreado ou café ecológico que não exige o
desflorestamento. Os problemas motivados pelo cultivo da banana agravam-se
ainda mais ao serem analisadas as características estruturais da planta.
As bananeiras possuem raízes curtas e finas, o que diminui a capacidade
de retenção do solo. Plantadas em áreas de declive, o que é bastante perceptível
em Mulungu, podem ocasionar deslizamentos de terra, mais conhecidos como
‘derretidos’. Somando-se a esse problema, suas folhas encontram-se dispostas em
forma de calhas receptoras de grande quantidade de água durante as chuvas,
atingindo o solo, tornando-o mais vulnerável à erosão, intensificando a ação erosiva
direta da chuva (ARRUDA, 2001).
o cultivo da cana-de-açúcar, presente em menores proporções ao
longo do território municipal, é praticado principalmente nas planícies alveolares.
Fig.65: Ausência da cobertura vegetal para dar espaço ao cultivo
de pastagens, localidade de Jardim.
Foto: Joselito Lima, 2007.
116
Entre os principais impactos gerados, além da remoção da mata primitiva, cita-se a
queima da palha da cana-de-açúcar, desencadeando implicações como esterilidade
e erosão dos solos, diminuição da biodiversidade e problemas gerados pela fumaça
relacionados à saúde ambiental e humana.
No Município, assim como em toda a região serrana, são comuns as áreas
aproveitadas para cultivo agrícola mediante a utilização de técnicas rudimentares ou
tradicionais. Conforme a compreensão de Souza (2000, p. 35),
[...] a utilização da terra assume proporções preocupantes pela adoção de
técnicas rotineiras e inadequadas para áreas dotadas de fortes declives
nas encostas. O desmatamento processado de maneira indiscriminada tem
contribuído para uma degradação generalizada dos recursos naturais
renováveis.
O inadequado preparo da terra é evidenciado, principalmente, pelos
constantes focos de queimadas (Fig. 66). A prática de queimadas dos solos tende a
torná-los inférteis, com a eliminação de boa parte dos nutrientes naturais, além da
poluição do ar gerada pela fumaça.
Há, ao mesmo tempo, como referido, a prática das atividades agrícolas
em áreas extremamente íngremes, em vertentes com declividades que chegam a
ultrapassar 45% (Fig. 67). Além de não corresponder a áreas propícias para cultivos
Fig.66: Terreno em preparo para o plantio agrícola, no distrito de
Catolé.
Foto: Luciana Freire, 2005.
117
agrícolas, na maioria dos casos, não o utilizadas quaisquer técnicas de
adequação ao ambiente, a exemplo das técnicas em curvas de nível.
A ocupação das áreas impróprias dá-se, muitas vezes, não pelo
desconhecimento dos problemas ambientais que podem ocasionar, mas
simplesmente pela falta de alternativa de produção por parte de agricultores
alocados em pequenas propriedades de terra, que se limitam à produção em
pequena escala.
As respostas às inadequações na utilização da terra exibem-se,
sobretudo, nos casos de erosão dos solos, que no estágio mais avançado podem
acarretar afloramentos do substrato rochoso.
Há, por conseqüência, necessidade de implementação de programas
políticos direcionados à adequação da agricultura, privilegiando o pequeno produtor,
por meio dos quais se possa manter boa parte dos recursos naturais, evitando a
degradação generalizada dos recursos naturais renováveis. Importante constatar
também que a prática incorreta das atividades agrícolas causam a exaustão dos
Fig.67: Cultivo agrícola em vertentes com
declividade acima de 45%, na localidade de
Camará.
Foto: Luciana Freire, 2005.
118
Fig. 68: Exemplo de cultivo agrícola adequado em
área de alvéolos e baixas vertentes, localidade de
Camará.
Foto: Luciana Freire, 2005.
solos e, por conseqüência, a improdutividade da terra, gerando problemas sociais,
tais como o desemprego.
Apesar dos problemas apontados, pôde-se constatar, em alguns setores
da região, a utilização de técnicas agrícolas adequadas em área de alvéolos (fig.68)
e vertentes íngremes, com técnicas em curvas de nível. Além disso, nessas áreas, é
comum o sistema de rotação de culturas com a técnica de pousio das terras.
Somando-se aos problemas da agricultura, tem-se ainda a utilização
incorreta de agrotóxicos, levando a sérios riscos, entre os quais, o Manual de
Impactos Ambientais (BANCO DO NORDESTE, 1999, p.9) aponta: “a toxidade
aguda e crônica, a contaminação de material e produtos de colheita, dos solos, da
água, do ar, além da fauna e do homem”.
O uso indiscriminado de agrotóxicos está ligado à facilidade de compra,
sem receituário agronômico, além da rápida eficiência no extermínio das pragas nas
hortas. Agricultores mal informados empregam dosagem errada, sem equipamentos
de proteção adequados (vestuário, luvas e máscaras).
Acrescenta-se, ainda, que os riscos causados pelos agrotóxicos não estão
somente nas lavouras. Residem, também, no local de armazenamento, no
transporte e no descarte das embalagens.
119
Durante as pesquisas de campo, verificou-se que contradições a
respeito da utilização de agrotóxicos no Município, uma vez que a representante da
APA da Serra de Baturité, na sede da SEMACE, revela que está alheia ao uso
desses produtos, alegando o haver registros de uso nas atividades agrícolas da
região. Em entrevistas com os agricultores, porém, confirma-se sua utilização,
mesmo que mínima, principalmente no cultivo de hortaliças e leguminosas.
Boa parte da agricultura praticada em Mulungu é familiar, em pequenas
propriedades de terra. o agricultores sem capacitação, que têm, nessa atividade,
o único sustento. Conclui-se, portanto, que uma provável utilização incorreta de
agrotóxicos.
Alguns produtores agrícolas afirmam que o uso de agrotóxicos é muito
restrito, dependendo da safra e do produto plantado. É citado o tomate como o
principal fruto que carece de sua utilização, que é extremamente vulnerável às
pragas. Os produtores alegam que a quantidade de agrotóxico diluído em água é
bastante pequena, alegando assim não causar maiores problemas ao ser humano.
No caso das grandes propriedades, em um caso específico, lavradores
negam haver a utilização de agrotóxicos. Nota-se, nesse caso, o receio de
responderem positivamente, que se trata de entrevista realizada a trabalhadores
de um grande produtor agrícola.
4.3.5 Especulação imobiliária
A especulação imobiliária é consumada pela valorização da terra, na
Serra de Baturité, consolidada como região de segunda residência e propícia às
atividades turísticas. O fato de o município não contar com um Plano Diretor de
Desenvolvimento Urbano (PDDU) torna fácil a comercialização de terrenos e a
construção de habitações, sem que haja interferências maiores da administração
Municipal.
Em pesquisa realizada no site de vendas da imobiliária mais atuante na
Serra de Baturité, a Imobiliária Magno Muniz, constata-se que, depois de
Guaramiranga, Mulungu é o Município que mais comercializa terrenos e sítios
(tabela 17). São cada vez mais comuns placas de empresas imobiliárias e de
proprietários particulares de vendas desses imóveis (fig.69).
120
Tabela 17 - Número de oferta de imóveis à venda nos principais Municípios
da Serra de Baturité – Julho / 2007
Guaramiranga Mulungu Pacoti Baturité Aratuba
75 37 23 10 7
Fonte: http://www.magnomuniz.com.br
São evidentes as ocupações em áreas de declives acentuados, com
riscos de desabamentos. muitos terrenos submetidos a desmatamentos
desordenados (fig. 70.) e irregulares, como em topos ou cumes de colinas,
lombadas e/ou cristas (fig.71).
Fig.69: Sítio particular à venda na localidade de Boa Vista.
Foto: Luciana Freire, 2007.
Fig.70: Degradação da cobertura vegetal, para fins
imobiliários, no distrito de Lameirão.
Foto: Luciana Freire, 2007.
Fig.71: Construção imobiliária em topo de
colina no distrito de Lameirão.
Foto: Luciana Freire, 2007.
121
No Município, a área de intensa especulação imobiliária está inserida no
distrito de Lameirão, ainda no platô úmido, com vista panorâmica para a vertente
ocidental da Serra de Baturité e Sertão de Canindé.
Além da devastação da cobertura vegetal, entre os impactos ambientais
negativos oriundos da especulação imobiliária, citam-se: a degradação da paisagem
natural e da fauna; os aumentos na geração de resíduos sólidos, na demanda de
energia elétrica, no tráfego de veículos (comprometimento da qualidade do ar e
aumento de ruídos); e a implantação de obras de infra-estrutura.
Aliados aos fatores ambientais, um dos principais motivos que
intensificaram a especulação imobiliária, naquela região, é a falta de conhecimento
por parte da população local sobre a valorização da sua própria terra. As terras eram
compradas pelas agências imobiliárias a preços irrisórios, sendo comercializadas,
hoje, por cerca de 7.000 e 25.000 reais cada hectare.
Destacam-se, ainda, alterações no estilo de vida das populações nativas,
principalmente, com novas modalidades de atividades econômicas. Parte dos
antigos agricultores não possuem terras para cultivo, passando agora a trabalhar
sob novas condições. São serviços na construção civil e nas propriedades
particulares, como caseiros, vigias e empregados domésticos, muitos deles
temporários.
4.3.6 Urbanização, infra-estrutura deficiente de saneamento básico e disposição de
resíduos sólidos
O espaço serrano, ao longo do seu processo de ocupação, passou por
modificações, dentre as quais, a mais evidente é a urbanização. Com a implantação
das cidades, houve o recobrimento dos solos por estruturas artificiais, tais como
edificações, asfalto, calçamento, praças e calçadas. A maior implicação dá-se pela
alteração do ciclo hidrológico, diminuindo gradativamente a infiltração, modificando o
processo de escoamento superficial, aumento da evapotranspiração e até variações
na temperatura local.
A substituição de espaços naturais por urbanos tem ocasionado
desequilíbrios ecológicos que acentuam a proliferação de insetos nocivos ao ser
humano. As enfermidades mais comuns em regiões serranas transmitidas por
picadas de mosquitos são a dengue, o calazar e a leishimaniose.
122
Devido ao desmatamento, houve a extinção de espécies que conviviam
hamoniosamente com estes insetos, que tinham, nas áreas florestadas, seu
alimento e habitat natural. Com o aumento das áreas urbanizadas, o mosquito tende
a atacar outros seres vivos de sangue quente, dentres os quais, o homem e os
animais domésticos.
Em decorrência dos processos de instalação de edificações, seja no
espaço urbano quanto no rural, ocorrem problemas relacionados à poluição dos
recursos ambientais, principalmente quando o município não oferece infra-estrutura
adequada.
O sistema de esgoto é essencial para a boa qualidade de saúde humana
e do ambiente. Conjuntamente com o sistema de esgoto sanitário, deve haver rede
de resíduos, transporte e tratamento de esgoto, sem quaisquer riscos.
O Município de Mulungu não conta com um serviço de esgoto em todo o
território, abrangendo somente alguns setores urbanos (16,55%). Desse modo, é
flagrante o despejo de esgotos a céu aberto (contaminando os corpos hídricos
superficiais, alterando os ecossistemas aquáticos pela diminuição do teor de
oxigênio da água) e em fossas artesanais (contaminando as águas subterrâneas).
O esgotamento sanitário, não estando sujeito a tratamento, torna-se um
risco potencial à saúde humana, provocando problemas como: infecções
parasitárias (contato direto com a matéria fecal), hepatite e contaminação da água e
de alimentos, provocando doenças gastrointestinais (coléra e febre tifóide) (BANCO
DO NORDESTE, 1999, p.225). Os riscos ambientais são evidentes pela
contaminação das águas, dos solos, da flora e da fauna por substâncias tóxicas,
além do odor fétido gerado pelos esgotos.
O manejo inadequado dos resíduos sólidos é, do mesmo modo, um dos
problemas mais graves dos municípios serranos. Não se recomenda o acúmulo de
lixo, devido à topografia acidentada e maiores índices pluviométricos, implicando no
alastramente de resíduos. Dentre as implicações, tem-se a poluição dos solos e dos
recursos hídricos, unida aos problemas de saúde ambiental, afetando as sociedades
humanas.
Em Mulungu, havia um lixão localizado na vertente ocidental, na
localidade de Camará (cerca de 24km da sede), onde os resíduos eram depositados
ao longo da estrada que o liga ao Município de Caridade. Era uma área que
abrangia cerca de 400m de extensão e com forte declividade. Atualmente, encontra-
123
Fig. 72: Lixo hospitalar em área de vertente.
Localidade de Camará.
Foto: Luciana Freire, 2005.
se oficialmente desativado. Mesmo assim, ainda é comum observar-se lixo
acumulado no local, configurando-se como problema de suma gravidade.
Observou-se, em visita de campo, a exposição de lixo hospitalar,
revelando o desconhecimento e/ou negligência com a saúde pública da população
em continuar aproveitando o espaço dessa maneira (Fig.72). O local especificado
apresenta como impactos diretos, a poluição das terras agricultáveis e das águas
superficiais que escoam para Bacia do Curu.
Atualmente, os resíduos sólidos são destinados a um novo “lixão”, no
Município de Baturité, no sopé da Serra. projetos consorciados, entre alguns
municípios da Serra, para a construção de um aterro sanitário que atenda a região.
124
125
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A serra de Baturité apresenta-se como um enclave de mata úmida, no
domínio do semi-árido. O contraste com o entorno a fez uma região atraente para a
fixação de populações e para a prática de atividades agrícolas. Progressivamente, a
região foi sendo ocupada de modo cada vez mais intenso, cujos resultados já
demonstram áreas degradadas, levando, então, à preocupação em manter as
condições originais de tão singular paisagem. O primeiro passo deu-se pela criação
da Área de Proteção Ambiental (APA) da Serra de Baturité.
O Município de Mulungu, tido como área de estudo, tem parcela
significativa de seu território contemplado na APA (cerca de 1/3) e não dispõe ainda
do Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano (PDDU). Com base nas observações
da pesquisa, foram apontados problemas ambientais configurados desde os
primórdios da constituição do Município a hoje. Assim, conhecidos o potencial
natural da área e suas limitações, são apresentados os principais problemas
ambientais e indicadas alternativas e recomendações, conforme a legislação em
vigor, para subsidiar o planejamento de uso e ocupação da terra em bases
sustentáveis.
Entre as principais potencialidades da área, destacam-se:
· as condições hidroclimáticas, que são propícias à dispersão da
mata úmida e favorece a ocorrência de uma rede de drenagem
semi-perene;
· a fertilidade natural dos solos, que é de média a alta, influenciando
nas possibilidades de atividades agrícolas;
· a beleza nica das paisagens serranas, como fonte de atração
turística; e
· a presença de águas subsuperficiais nos alvéolos e em áreas
fortemente fraturadas.
As limitações, principalmente pela alta declividade das vertentes, fazem do
Município, na maior parte, ambiente instável, com vulnerabilidade de moderada a
alta, haja vista a elevada susceptibilidade à erosão. A região tem elevado grau de
126
acidentamento do relevo pela dissecação causada, pela drenagem dendrítica. O uso
e a ocupação encontram-se limitados pela legislação ambiental da APA da serra de
Baturité.
Dentre os impactos ambientais, assinala-se, como principal responsável, a
devastação da cobertura vegetal, praticada indiscriminadamente em vertentes e
nascentes fluviais, com a aceleração dos processos erosivos, o ressecamento de
fontes d’água naturais, a ablação dos solos, o assoreamento do fundo dos vales, o
empobrecimento da biodiversidade e a descaracterização da paisagem serrana.
Acrescentam-se, ainda, as técnicas agrícolas rudimentares, além do uso incorreto
de agrotóxicos, o que vem comprometendo a qualidade das águas superficiais, dos
solos e da saúde humana e ambiental. A infra-estrutura de saneamento básico é
deficiente, causando a poluição de recursos naturais. Tem-se também o aumento da
especulação imobiliária, resultante da elevação do valor da terra em Mulungu, pelos
incentivos à segunda residência e ao turismo na região serrana, fator de degradação
da cobertura vegetal, entre outros impactos negativos.
A criação da Unidade de Conservação na área tem constribuido para
atenuar os efeitos de parte dos impactos ambientais. Dessa forma, buscando-se o
uso e ocupação da terra fundamentados na sustentabilidade dos recursos naturais,
indicam-se como alternativas básicas as seguintes:
· divulgar junto à comunidade acerca da questão ambiental, da
existência da APA e de seus reais objetivos, e fazer com que a
população participe, protegendo o ambiente e denunciando ações
indiscriminadas de degradação. A fiscalização é primordial;
· recomendar, em relação às atividades agrícolas, a oferta de cursos
de capacitação, para que os agricultores do Município tenham o
conhecimento técnico e específico do ambiente, assim como
técnicas adequadas de manejo do solo e culturas apropriadas, em
meio ao financiamento e ao subsídio dos produtores rurais;
· implantação do PDDU, do Município de Mulungu, com maior rigor
em relação à organização dos aglomerados urbanos e à crescente
construção de empreendimentos imobiliários na Serra;
127
· ampliação dos serviços de esgotoamento sanitário, que abrange
apenas 16,55%, beneficiando a sede municipal, buscando-se a
melhoria da qualidade de vida da população; e
· desenvolvimento do ecoturismo (ou turismo de natureza), isto é,
atividade turística organizada com aproveitamento dos recursos
ambientais como cachoeiras, vistas panorâmicas e trilhas
ecológicas. Em Mulungu, essa atividade ainda se mostra tímida,
porém é praticada com sucesso em outros municípios da Serra,
a exemplo de Guaramiranga e Pacoti. Trata-se de uma proposta de
atividade econômica alternativa, a ser mediada por um
planejamento adequado, compatível com a conservação da
natureza.
128
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