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FUNDAÇÃO GETÚLIO VARGAS
ESCOLA DE ADMINISTRAÇÃO DE EMPRESAS DE SÃO PAULO
HENRIQUE GUILHERME CARLOS HEIDTMANN NETO
A SENSIBILIDADE TERRITORIAL DAS POLÍTICAS PÚBLICAS:
Um estudo em comunidades ribeirinhas na Amazônia Legal
SÃO PAULO
2008
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2
HENRIQUE GUILHERME CARLOS HEIDTMANN NETO
A SENSIBILIDADE TERRITORIAL DAS POLÍTICAS PÚBLICAS:
Um estudo em comunidades ribeirinhas na Amazônia Legal
Tese apresentada à Escola de Administração
de Empresas de São Paulo da Fundação
Getúlio Vargas, como requisito para
obtenção do título de Doutor em
Administração Pública e Governo
Linha de Pesquisa: Governo e Sociedade
Civil em Contexto Subnacional
Orientador: Prof. Dr. Peter Kevin Spink
SÃO PAULO
2008
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3
Heidtmann Neto, Henrique Guilherme Carlos.
A Sensibilidade Territorial das Políticas Públicas: um estudo em
comunidades ribeirinhas na Amazônia Legal / Henrique Guilherme Carlos
Heidtmann Neto. - 2008.
144 f.
Orientador: Peter Kevin Spink
Tese (doutorado) - Escola de Administração de Empresas de São Paulo.
1. Políticas públicas - Amazônia. 2. Amazônia – Política social. 3.
Territorialidade humana. 4. Políticas públicas – Disparidades regionais. 5.
Política social – Disparidades regionais. I. Spink, Peter Kevin. II. Tese
(doutorado) - Escola de Administração de Empresas de São Paulo. III. Título.
CDU 35(811)
4
HENRIQUE GUILHERME CARLOS HEIDTMANN NETO
A SENSIBILIDADE TERRITORIAL DAS POLÍTICAS PÚBLICAS:
Um estudo em comunidades ribeirinhas na Amazônia Legal
Tese apresentada à Escola de Administração
de Empresas de São Paulo da Fundação
Getúlio Vargas, como requisito para
obtenção do título de Doutor em
Administração Pública e Governo
Linha de Pesquisa: Governo e Sociedade
Civil em Contexto Subnacional
Data de aprovação:_____/______/__________
Banca examinadora:
______________________________________
Prof. Dr. Peter Kevin Spink (Orientador)
FGV-EAESP
______________________________________
Prof. Dr. Marco Antônio Carvalho Teixeira
FGV-EAESP
______________________________________
Prof. Dr. Ricardo Rocha Brito Bresler
FGV-EAESP
______________________________________
Prof. Dr. Armin Mathis
UFPA-NAEA
______________________________________
Prof. Dr. Milton Cordeiro Farias Filho
UNAMA
SÃO PAULO
2008
5
Para meus Pais,
com quem aprendo e aprendi o que o que não se ensina na academia
6
Agradecimentos
Em primeiro lugar a Deus em quem sempre acreditei e continuarei acredidanto
independente do lugar que eu esteja.
Ao meu orientador pela paciência que sempre esteve presente nos momentos em eu
sempre chegava com novas idéias e questionamentos para desenvolver a tese aqui presente e
aos membros da banca.
Ao corpo docente da FGV-EAESP e aos amigos do Programa Gestão Pública e
Cidadania. Aos companheiros Bedéis e o pessoal da segurança e da limpeza que sempre
foram muito pacientes comigo pelos incontáveis fins de semana que passei dentro da Escola.
Aos parceiros do Getulinho e do Galo Rei que sempre encontravam tempo pra conversar um
pouco.
Por conseguinte fiz muitos amigos nessa jornada aqui em São Paulo e seria injusto
citar alguém esquencendo o outro. Meus amigos, por mais distantes que estejam, muito
obrigado pela oportunidade em aprender com todos vocês.
7
Resumo
O trabalho tem como objetivo analisar falta de "sensibilidade territorial" das políticas
públicas em comunidades de populações tradicionais na Amazônia Legal, especificamente os
ribeirinhos, por meio de dois estudos de caso realizados com duas comunidades residentes às
margens dos rios Tapajós e Tocantins no Estado do Pará. Atarvés da Observação Simples e
Participante, utlizando instrumentos de pesquisa como entrevistas não-estruturadas, semi-
estruturadas e análise documental, procurou-se demontrar que para melhor acesso às políticas
públicas por parte das comunidades estudas existe a necessidade de que haja nos lugares
agentes capilares que facilitem o dialogo entre as populações locais e formuladores de
políticas.
A principal contribuição do trabalho é trazer para o debate a categoria territorialidade
considerando as especificidades de cada lugar para melhor aproveitamento das ações por parte
dos beneficiários: os habitantes destas localidades: os ribeirinhos. Outra contibuição do
trabalho é para a área da Administração Pública, pois busca mostrar que quanto mais agente
capilares no território mais sensível são as políticas públicas aos lugares, em função do
conhecimento da territorialidade e das especificadades do território. O trabalho direciona para
possibilidades de estudos mais pontuais sobre políticas públicas no território em uso e mostra
como a regionalidade se constitui, no caso estudado, num fator diferenciado para
planejamento, execução e avaliação de políticas públicas.
.
8
Abstract
9
1. Introdução
2. O Estado e as Políticas Públicas
- O Estado narrador
- A pesquisa do semi-árido: a situação da criança e do adolescente mostrando um
conceito de políticas públicas.
- Política Pública e Ação Pública
- Ação Pública: uma maneira de se fazer política territorializada
3. A categoria territorialidade como contribuição de análise às Políticas Públicas
- O espaço como ponto de partida
- Território, lugar e cotidiano: a ordem conceitual na desordem do pensamento
- O pensamento Complexo e a territorialidade
4. O método e os lugares
- A escolha do lugar da pesquisa
- Antes do terreno e a caminho do terreno
- No terreno da pesquisa
- Observação Participante como postura de pesquisa no terreno
- Coletando as informações no terreno
- O caminho da pesquisa
- A Amazônia em foco
5. Os dois casos em estudo
- A comunidade de Baixinha
- O dia-a-dia
- Os atores sociais em cena
- As políticas públicas na Comunidade de Baixinha
Comunicação
Educação
Energia Elétrica (Luz)
Organização Comunitária (“O pessoal aqui...”)
Saúde
Segurança Pública
Transferência de renda
- A comunidade de Suruacá
- O dia-a-dia
- Os atores sociais em cena
- As políticas públicas na Suruacá
Comunicação
Educação
Energia Elétrica (Luz)
Organização Comunitária (“O pessoal aqui...”)
Saúde
Segurança Pública
Transferência de renda
6. Painel de Imagens: o cotidiano dos ribeirinhos
10
7. Comparando os casos
- Análise da interfaces: um debate sobre os atores e a territorialidade como categoria de
análise
- As políticas e as Ações Públicas: um encontro possível?
8. Retomando as Políticas Públicas
9. Considerações Gerais
Referências
Anexos
11
Introdução
12
O século passado e início do atual foram marcados por várias mudanças nas
sociedades e nos estados nacionais, cujas origens são diversas e seus reflexos são distintos. As
áreas de atuação e intervenção do Estado
1
se ampliaram e a necessidade de interação com a
sociedade pode ser observada na economia, na política, na assistência social, na saúde, na
segurança pública, entre outras. Nessas macro áreas interagiram e interagem, constantemente,
instituições, grupos de interesse, intelectuais, entre outros, onde temáticas específicas como a
da pobreza, emergem como um fenômeno complexo de entendimento e um desafio a ser
superado pela sociedade contemporânea
2
.
Estudos apresentados pelo Relatório Nacional de Acompanhamento dos Objetivos
de Desenvolvimento do Milênio
3
(2007) mostram que 4,7 milhões de brasileiros não fazem
mais parte do temido conceito de condição de extrema pobreza. O período estudado foi de
1990 a 2005 e aponta a importância das políticas públicas na condução de um cenário “menos
trágico”. O advento do Plano Real, a queda das taxas de juros, o aumento real no salário
mínimo e a expansão das políticas de transferência de renda, especialmente o recente
programa Bolsa Família do Governo Federal, são os principais responsáveis pelo cenário
otimista apresentado no Relatório. Entretanto, apesar do aparente avanço, aproximadamente
7,5 milhões de brasileiros têm renda domiciliar per capita inferior a um dólar por dia e a
desigualdade nas áreas rurais é 4 vezes maior do que em áreas urbanas. A situação é pior nas
regiões Norte e Nordeste e, dentro delas, a área rural é a que apresenta os piores números
(PNUD, 2007).
Inúmeros estudos sobre pobreza nos mais variados campos do conhecimento, com
diferentes recortes teóricos e análises técnicas, são realizados por diversas instituições, como,
por exemplo, universidades e organizações multilaterais, apontando o fenômeno em questão
como algo que pode ser estudado, analisado e tratado de múltiplas formas, variados enfoques,
exigindo macro e micro análises complexas, sendo uma delas por meio das políticas públicas.
Sintetizar o conceito de pobreza apenas aos números pode significar uma
simplificação do debate, pois a percepção do conceito pode envolver, segundo SPINK (2003,
1
Colocar texto desta nota.
2
Não se pretende aqui estudar especificamente a pobreza como um fenômeno histórico e/ou contemporâneo,
mas entender que este trabalho se insere neste contexto mais geral.
3
No ano 2000, durante a Cúpula do Milênio das Nações Unidas, 189 países fixaram 8 objetivos a serem
alcançados até 2015, considerados como Objetivos do Milênio, quais sejam: erradicar a fome e a pobreza
extrema; atingir o ensino primário universal; promover a igualdade entre os sexos e a autonomia das mulheres;
reduzir a mortalidade da infância; melhorar a saúde materna; combater o HIV/Aids, a malária e outras doenças;
garantir a sustentabilidade ambiental e estabelecer uma parceria mundial para o desenvolvimento. (UNICEF,
2006)
13
p. 150), “necessariamente as dimensões políticas e de acesso aos benefícios sociais
coletivamente gerados e disponíveis”, pois, de acordo com sua posição, este fenômeno pode
ser interpretado de várias formas. Bitoun (2003) aponta que o aumento ou diminuição da
pobreza, em linhas genéricas, depende dos índices inflacionários; do crescimento econômico;
da eficiência das políticas redistributivas; do investimento em saúde e educação realizado pelo
Estado; e, por fim, do fortalecimento do capital social existente no território. Friedmann
(1992) aponta 8 bases para o processo de inclusão, quais sejam: a base familiar ou um ambiente
amigável, que nutre vida diária; tempo disponível para realização de atividades que não sejam
apenas a labuta; acesso a conhecimentos e habilidades; acesso a informações; um sistema de
organização comunitária; tecido social organizado em redes; possibilidades e recursos de trabalho;
e crédito disponível para a sociedade.
Observamos, assim, que as políticas públicas têm se constituído em objeto de grande
interesse de acadêmicos das mais variadas áreas da ciência, sendo elas uma das formas mais
adequadas para compreender melhor as ações em curso de combate à pobreza, contribuindo
para o desenvolvimento dos diversos lugares.
O mesmo pode ser observado também por meio de ações públicas que não
necessariamente são ações exclusivamente dos governos e/ou Estado, mas ações que
emergem das diversas sociedades nos mais variados territórios, como apontam Teixeira e
Spink (2007, p. 164 - 165):
Na América Latina, começou-se a utilizar a expressão ação pública
(Cabrero Mendonza, 2005) para descrever esse movimento duplo do
Estado para a sociedade civil e da sociedade civil para o Estado,
sempre com ênfase nas instituições públicas no âmbito local, em
especial os municípios e outras formas de governo local, onde as
mudanças têm sido mais significativas (Campbell, 2003). Ação
pública (uma fusão feliz de política pública e ação social) pode ser
entendida no sentido amplo para compreender as ações das diferentes
instituições públicas e também qualquer outra atividade que esteja
sendo articulada na esfera pública e em referência a um bem comum.
Inclui atividades vinculadas diretamente ao exercício do poder e
aquelas que resultam das atividades de cidadãos quando estão
demonstrando sua preocupação ativa com a vida coletiva (França
Filho et al., 2006).
Observamos algumas ações dessa natureza em bancos de dados elaborados por
algumas instituições no Brasil e no mundo que, de uma forma geral, guardadas as devidas
especificidades de cada uma delas, têm como finalidade coletar, analisar e disseminar
políticas, programas e projetos que mostram como as ações públicas podem contribuir para o
desenvolvimento de estados, municípios, comunidades, povos indígenas, etc, tendo como
protagonistas, em algumas circunstâncias, os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário ao
14
lado da sociedade civil organizada
4
. Desta forma, parece razoável perceber a importância dos
atores formuladores das políticas e ações públicas como parceiros fundamentais para
promover o desenvolvimento de um território que tenha suas relações sociais e econômicas
ativas.
Por mais que pareça simples entender o que são as políticas públicas, as diversas áreas
do conhecimento ainda não chegaram a um consenso sobre seu conceito, até mesmo em
função do recente debate na pesquisa acadêmica (SOUZA, 2003). Na América Latina,
principalmente no Brasil, mais precisamente após a Constituição de 1988, a discussão sobre o
tema parece ser constante (SOUZA, 2003; ARRETCHE, 2003; FARIA, 2003; REIS, 2003;
FUKS, 1998), pois as relações sociais, econômicas, políticas, jurídicas, entre outras, não
cessam e se processam constantemente no território (SANTOS, 1998). Uma (re)discussão de
fundo não pode ser esquecida nesse campo, envolvendo uma visão mais ortodoxa e outra mais
contemporânea ou colaborativa sobre o conceito.
Ao observarmos as práticas de planejamento presentes nos planos nacionais de
desenvolvimento e de metas no Brasil que predominaram nas décadas de 60 e 70
(HOLANDA, 1974), verificamos um contorno inicial na forma pela qual os governantes
formulavam os planos, ou seja, dentro de uma lógica top down (de cima pra baixo). As
grandes narrativas (GIDDENS, 1991) impunham as linhas gerais dos planos para as diversas
regiões brasileiras caracterizando a forma de como eles incidiam nos territórios.
Entretanto, a Constituição de 1988 favorece mudanças importantes que podem
promover uma lógica diferente de se planejar uma política. Um exemplo claro é a autonomia
relativa alcançada pelos municípios quando se tornam entes federativos. Essa autonomia
traduz-se pelo fato de que a maioria deles possui um poder residual de tributar com baixa
capacidade de financiamento, o que permite continuar sempre dependente dos repasses da
União e de governos estaduais (FARIAS FILHO, 2000).
Ainda assim, alguns pontos favoráveis à sociedade podem ser explicitados, como a
universalização do atendimento da saúde, mudanças consideráveis na criação de fundos para a
gestão local dos recursos da política de educação, como o Fundo de Manutenção e
Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação
4
Para conhecer um pouco mais sobre algumas iniciativas no Brasil pode-se consultar o Programa Gestão Pública
e Cidadania Programa Gestão Pública e cidadania (inovando.fgvsp.br), Instituto Polis (www.polis.org.br), etc e
fora do país o Observatório do poder local localizado em Portugal e pode ser acessado por meio do site
XXXXXXX
15
(FUNDEB)
5
, antigo Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de
Valorização do Magistério - FUNDEF, e as políticas de transferência de renda. Nesse último
ponto, podemos citar como exemplo o Programa Bolsa-Família, que parece transformar
(quase imperceptivelmente) as feições do federalismo brasileiro, pois tal transferência permite
um diálogo direto (na transferência de recursos) entre o Governo Federal, governo municipal
e cidadão, deixando ao largo os governos estaduais (ABRUCIO e COSTA, 1999).
Reconhecemos a importância de analisar as políticas públicas por meio das “grandes”
narrativas (GIDDENS, 1991); entretanto, observá-las e entendê-las através do cotidiano
(BERGER, 1973) e da conformação das territorialidades e dos territórios em uso (SANTOS,
1995) é o que propomos enquanto olhar metodológico o que, por sua vez, nos permitirá
entender relações e desafios mais complexos que se apresentam para o desenvolvimento dos
lugares onde habitam milhares de pessoas desassistidas das ações governamentais, ou seja,
onde as políticas públicas não chegam ou se apresentam precariamente, ou ainda onde o
acesso a elas é precário por inúmeras razões, sejam elas estruturais, culturais ou políticas.
Nesse contexto, a questão central é:
- Até que ponto as políticas públicas presentes no “território em uso” possuem em sua
conjuntura especificidades ligadas às territorialidades dos seus lugares?
Partindo da questão central um desdobramento, em duas questões se apresenta:
- Quais as políticas públicas que incidem e como são executadas nos lugares
estudados?
- Políticas públicas de promoção de desenvolvimento local realmente atendem às
demandas mais básicas das comunidades pobres? Elas emergem das necessidades locais ou
refletem as vontades dos governos?
As perguntas acima são, de fato, desafiadoras para estudos na área da Administração
Pública, pois observamos uma carência de estudos de políticas públicas e territorialidade de
desenvolvimento em comunidades consideradas pobres e/ou excluídas, a partir de
especificidades comunitárias, sob a ótica de intervenção estatal, cujas demandas comunitárias
sejam o ponto de partida para o delineamento de tais políticas, especialmente, em regiões
mais pobres. Contudo, para tratar dessa lacuna nos estudos sobre o tema, cruzar olhares entre
5
Por meio da Lei Nº 11.494/2007, sancionada em 20 de junho de 2007, foi regulamentado o Fundo de
Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação –
FUNDEB, que substituiu o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização
do Magistério - FUNDEF.
16
História, Economia, Ciência Política, Geografia, Sociologia e Psicologia torna-se necessário
para a construção do argumento de nossa tese.
Os críticos da modernidade apontam que, desde o divórcio entre ciência e filosofia,
houve um “esquartejamento” nos conceitos, insulando-os em recipientes científicos acolhidos
por disciplinas acadêmicas. Essa falta de interação entre as disciplinas pode ser entendida
como um fator que desfavorece a produção do conhecimento de mundo e sobre os próprios
homens que nele habitam, priorizando o pensamento reducionista e deixando à margem o
pensamento complexo (MORIN, 1987). Portanto, esse isolamento parece tolher a construção
de um campo interdisciplinar do conhecimento. Assim, optamos nesta tese, por entender os
espaços onde as políticas públicas se processam por meio dessa interdisciplinaridade
utilizando o pensamento complexo como um norteador do trabalho, pois o lugar onde elas
incidem se traduz em um território que está em constante uso, materializado em conflitos,
consensos, relações sociais (SANTOS, 2000) e ações comunicativas (HABERMAS,1998).
Portanto, dois importantes desafios metodológicos são colocados nesta tese: partir de
um pensamento complexo para o estudo das políticas e ações públicas por meio do cotidiano
de atores locais e o estudo interdisciplinar para a análise do trabalho aqui proposto.
Com base em um contexto metodológico de caráter interdisciplinar, sem perder de
vista o eixo central da Administração Pública, objetivamos com nosso trabalho discutir a
sensibilidade que as políticas e ações públicas possuem quando incidem nos territórios onde
habitam comunidades mais carentes econômica e socialmente.
Sendo assim, o desafio de trabalhar interdisciplinarmente se apresenta, ou seja, como
aponta Fazenda (1991), é necessário agrupar disciplinas com o intuito de unir os saberes,
reordenando-os e agrupando-os no campo do conhecimento que nos inserimos. Portanto,
sentimos necessidade de procurar em outras disciplinas, categorias, conceitos, variáveis
analíticas, métodos, técnicas e instrumental adequado ligados ao conjunto de conceitos
importantes para esta tese, tais como; território, territorialidade, territorialização,
desterritorialização, reterritorialização, espaço, lugar e local, assim como conhecer métodos
de pesquisa consagrados em outras disciplinas como a etnografia. Japiassu (1976) mostra que,
dentro desse contexto, a visão compartimentalizada de qualquer objeto é superada por meio
da construção de um conceito interdisciplinar, chamando atenção para a necessidade que o
pesquisador tem de, com isso, entender a linguagem de cada área explorada.
Como estratégia de pesquisa, optamos em uma análise de dois lugares por meio de
dois estudos de caso, quais sejam:
17
a) a comunidade
6
Suruacá, localizada às margens do Rio Tapajós, no
município de Santarém, no oeste do Estado do Pará;
b) comunidade de Baixinha, às margens do Rio Tocantins, no município de
Baião, no Norte do mesmo Estado.
As duas comunidades selecionadas localizam-se na Amazônia Legal, dentro do Estado
do Pará, mais especificamente nos municípios de Santarém e Baião, respectivamente. Além
da presença de algumas políticas públicas estatais, também incide sobre a primeira
comunidade ações públicas formuladas por uma Organização Não Governamental (ONG)
chamada “Projeto Saúde e Alegria” (PSA), que atua na área da saúde e educação para
comunidades ribeirinhas, que possui o reconhecimento das comunidades atendidas, conforme
identificamos em nossa pesquisa de campo.
Nossa senhora, se não fosse o pessoal do “Saúde e Alegria” nós taria
jogados aqui. Eles trazem pra nós os médicos, dentistas, nos ajudam
com nossos projetos, na melhoria da água. Vixe! Eles trabalham com
projetos e isso é bom pra gente. Às vezes quando acontece alguma
acidente com alguém da
comunidade eles mandam buscar e
encaminham pro hospital em Santarém. Ferrada de arraia, picada de
cobra, escorpião preto ou quando um dos meninos caem de um de
árvore desses daqui da
comunidade e quebra alguma coisa. Se agente
fosse esperar pela prefeitura...
Reconhecemos o quanto a comunidade de Suruacá tem respeito pela ONG em função
de inúmeros fatores, assim como observamos em campo o quanto a ONG procura atender a
comunidade na medida do possível, também em virtude de outros fatores que trataremos mais
adiante. Entretanto, uma questão preocupante, talvez de cunho normativo ou até mesmo
indutivo, emergiu durante nossa pesquisa: se a ONG finalizasse sua atuação na região, em que
situação ficariam as comunidades que são atualmente atendidas? A ONG na região tem
também um papel assistencialista? A ONG teria um papel de “despachante” de ações junto à
comunidade?
no outro caso, observa-se na área da saúde e educação apenas políticas públicas
estatais, o que não quer dizer necessariamente que a comunidade não participe do dia-a-dia
das mesmas, entretanto sem autonomia para mudar sua essência. A comunidade de Baixinha é
6
Uma das dúvidas que tínhamos nesse trabalho seria qual termo utilizaríamos para nos referirmos às famílias
que habitam os lugares estudados. Academicamente há diversos termos que poderiam ser utilizados, entretanto
optamos em utilizar a palavra comunidade, pois na maioria das entrevistas e conversas que realizamos com os
ribeirinhos os mesmos se reconheciam como “comunidade”.
18
composta por ribeirinhos
7
e ribeirinhos remanescentes de Quilombos
8
, possuindo, em alguns
casos, políticas especiais principalmente no que se refere à questão da terra (CASTRO, 1988).
Apesar de se encontrarem geograficamente distantes uma das outras
9
e divergentes
quanto ao atendimento da ONG na questão da Saúde e Educação, características em comum
podem ser apontadas. Ambas encontram-se dentro do mesmo estado, localizam-se à beira de
rios, do ponto de vista jurídico e antropológico são consideradas populações tradicionais
(LITTLE, 2002), possuem sistemas políticos calcados em troca de favores entre seus
representantes na câmara municipal e lideranças locais, assim como uma presença relativa
do sistema de escambo em ambas, pois a circulação de papel moeda, apesar de existir, ainda é
restrita.
Para entender melhor o campo em que nos encontrávamos, iniciamos o nosso trabalho
com um estudo preliminar exploratório e descritivo (observação feita pelo Peter: expl. descr
rets) (YIN, 2005; SHAVELSON e TOWNES, 2002), o qual versa acerca de fatos
contemporâneos sobre os assuntos abordados e sobre os casos, sem a pretensão de controlar
ou manipular qualquer tipo de variável (SHADISH
et al., 2002). Ressaltamos que essa
estratégia nos possibilitou a utilização de uma variedade de fontes, tais como: documentação,
registro em arquivos, entrevistas, observações diretas e observação participante, sem a
pretensão de nos tornamos especialistas em etnografia. Ademais, também tivemos a
oportunidade de manusear e criar um banco de dados para os estudos de caso, o que
possibilitou a manutenção do encadeamento das evidências coletadas (YIN, 2005). Assim, a
estratégia adotada facilitou a utilização de outros métodos e instrumentos de pesquisa.
Como mostra Ragin (1992), para os estudos de caso comparados, o princípio
repetitioné também um dos fatores que sugerem a escolha dos dois casos, pois o mesmo
estudo pode ser realizado em outros lugares, como por exemplo, em municípios ou
comunidades do semi-árido ou do sudeste brasileiro dentro da lógica proposta aqui, ou seja,
observar se as políticas públicas são sensíveis à territorialidade daqueles lugares. Assim,
propomo-nos em estudar dois casos de comunidades pobres, dentro do mesmo estado, às
margens de rios e comunidades habitadas por populações consideradas tradicionais que, se
7
Para que não cometamos qualquer tipo de discriminação referente ao gênero dos homens ribeirinhos ou das
mulheres ribeirinhas, adotamos aqui a fala mais comum que encontramos nas prórpias comunidades, ou seja,
tanto os homens quantos as mulheres se auto-deminavam de ribeirinhos.
8
Não é objetivo desta tese estudar comunidades remanescentes de Quilombos; entretanto, como em uma das
áreas ribeirinhas estudadas há a presença desses povos tradicionais, vemos a necessidade de mostrar sua
conformação histórica. Vale ressaltar que nosso centro nesse trabalho é política e ação pública em comunidades
ribeirinhas.
9
Ver mapa XX no capítulo XX na página XX.
19
comparadas com comunidades mais contemporâneas, até podem ser consideradas sociedades
mais fechadas na visão de Lévi-Strauss (1970).
Como postura metodológica em trabalho de campo, adotamos a observação
participante, que nos permitiu coletar informações e nos inserir na realidade local,
considerando ainda a importância da teoria para a construção do conhecimento. Dentro desse
contexto, visitamos e convivemos com as duas comunidades e tivemos a oportunidade de
ficar em cada um dos lugares estudados por 1 mês, indo e vindo das comunidades à sede dos
municípios, navegando nas bajáras
10
e entre uma comunidade e outra, conversando e
entrevistando ribeirinhos e observando seu cotidiano. Não podemos classificar nossa pesquisa
como etnográfica em seu sentido mais amplo, entretanto a convivência com os ribeirinhos nos
possibilitou capturar observações importantes para inferências em nossas análises.
Procuramos classificar as etapas de nossa pesquisa da seguinte forma: em um primeiro
momento utilizamos algumas técnicas de pesquisa que permitissem uma aproximação maior
com o tema, principalmente com os conceitos oriundos de disciplinas que não éramos
familiarizados, como aqueles que se inserem na Geografia. Além das políticas públicas,
policy cycle, desenvolvimento e suas múltiplas adjetivações, procuramos estudar os conceitos
de território, territorialidade, territorialização, bem como estudos antropológicos sobre saúde
e educação em comunidades ribeirinhas. Também realizamos uma pesquisa bibliográfica e
documental sobre material produzido acerca de Reservas Extrativistas (RESEX), Florestas
Nacionais (FLONA), programas e políticas públicas federais, estaduais e municipais, além de
ONGs atuantes na Amazônia, especialmente sobre o Projeto Saúde e Alegria, ONG
reconhecida como atuante pelos ribeirinhos do Rio Tapajós. Coletamos dados dos bancos de
dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE), Instituto Nacional de
Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), Departamento de Informática do
Sistema Único de Saúde (DATASUS), CEAPG / FGV-EAESP e Mapa do Terceiro Setor.
Em seguida, realizamos entrevistas com questionários não-estruturados e conversas
com líderes comunitários, ribeirinhos e secretários municipais de saúde e educação dos
municípios onde as comunidades se inserem. O processo de escolha dos entrevistados foi
aleatório, sem a preocupação prévia de selecioná-los, pois os identificamos no terreno de
pesquisa. Entretanto, chamamos atenção que em ambos os casos tivemos portas de entrada
importantes que facilitaram o contato com as pessoas. Na comunidade de Suruacá, a ONG foi
ator importante de aproximação com as pessoas das comunidades, enquanto que em Baixinha
10
Tipo de embarcação que possui um casco e um pequeno motor. Sua capacidade para passageiros varia de
acordo com o tamanho, podendo transportar de 4 até 15 pessoas.
20
tivemos o apoio de uma ex-Secretária de Saúde do município de Baião. Ressaltamos que
apesar da reconhecida ajuda, sempre deixamos claro que nossas análises mostrariam a
realidade e o dia-a-dia, independente das críticas que emergissem do campo em relação aos
atores que nos ajudaram.
Por fim, procuramos entender, identificar e analisar as relações e fenômenos, tanto
explícitos quanto implícitos, no cotidiano dos ribeirinhos que indicavam se suas
territorialidades estavam sendo consideradas nas políticas públicas presentes em suas
comunidades.
Para trabalhar o argumento de nossa tese, organizamo-la em 5 capítulos, além do
prefácio e desta introdução.
No capítulo 1, intitulado as “Políticas Públicas: das grandes narrativas às ações
públicas”, começamos com uma abordagem teórica sobre o objeto, procurando mostrar a
percepção mais ortodoxa para, em seguida, explicitar algumas tendências de estudos sobre
políticas públicas dentro de uma concepção mais cooperativa mostrando alguns casos
inovadores existentes no Banco de Dados do Programa Gestão Pública e Cidadania,
especificamente na Amazônia Legal, introduzindo o conceito de ação pública no debate.
No capítulo 2, discutiremos o conceito de políticas públicas e ações públicas à luz da
territorialidade, trazendo para o debate os conceitos de espaço, tempo, lugar, território e
desterritorialização, procurando mostrar seu caráter interdisciplinar e sua interação com a
Administração Pública.
No capítulo 3, faremos uma descrição do lugar onde realizamos nossos estudos de
caso, discutindo o método e o contexto em que se inserem as experiências vivenciadas,
mostrando o terreno geográfico de nossa pesquisa.
No capítulo 4, analisaremos a territorialidade das políticas e demais ações públicas
que incidem nas comunidades estudadas, mostrando por meio do cotidiano dos atores como as
políticas e ações públicas se manifestam em cada uma delas. Neste capítulo iniciamos ainda a
discussão entre autonomia e dependência existente entre as comunidades e os demais atores
coletivos e institucionais presentes no terreno, como Igreja, Estado, município, ONGs e outras
associações, que compõem esses processos capilares.
No quinto capítulo, será apresentado um painel de imagens a fim de caracterizar
melhor uma realidade que para muitos é desconhecida para que, no sexto capítulo possamos
oferecer a categoria “Fator Local” como forma agregada de aprendizagem para a formulação
de políticas territoriais. Ao concluir faremos uma reflexão sobre a importância de se
considerar as especificidades dos lugares na capilaridade das políticas públicas.
21
Como conclusão, nossa tese procura mostrar que para que as políticas e ações públicas
se capilarizem e sejam acessadas pelas pessoas que habitam os territórios ribeirinhos, é
necessário levar em consideração as especificidades de cada lugar. Em outras palavras,
considerar a territorialidade das comunidades estudadas permite que a capilaridade
11
das
políticas públicas seja mais efetiva havendo uma maior articulação entre Estado e sociedade
local com o objetivo de promoção do desenvolvimento do lugar.
11
Na física, Capilaridade é “Conjunto de fenômenos que se passam quando num capilar se forma uma interface
entre líquido-vapor”. (Aurélio, 2000, p. 393) (explicar depois)
22
Capitulo 1
O Estado e as Políticas públicas
23
Segundo Weber, o Estado é uma entidade monopolista por definição, pois detém o
monopólio genuíno da violência e tem o poder de definir as Leis de um país, estabelecer a
Justiça, manter a ordem a qualquer custo, policiar, defender o país, representá-lo junto as
nações estrangeiras, coletar impostos, regulamentar as atividade econômicas e fiscalizar o
cumprimento da Lei.
Aparentemente a formatação do Estado brasileiro parece dar os contornos das políticas
públicas nacionais. Considerando o Estado no período militar onde o sufrágio universal não
existia, os prefeitos e governadores dependiam do governo central para realizar qualquer
atividade que se relacionasse as questões fiscais, o poder de elaborar planos e projetos era
obra exclusiva de um estado com características centralizadoras. Esse tipo de Estado
consubstanciou o sistema de proteção social brasileiro criado e administrado pelo governo
central que determinava às outras esfreas de governos e agencias como geri-las no local que
elas incidiam (DRAIBE, 1987; FARAH, 2000)). A configuração desse Estado alinhava-se
com a forma de construir os planos e programas vigentes.
O PAEG(1964-1966), o PED(1968-1970), o Plano de Metas e Bases(1970-1972), os I (1972-
1974) e II PND(1975-1979)
12
, além dos planos de desenvolvimento da Amazônia, se
materializavam em ações que caracterizavam um Estado centralizador, onde a tecnicidade e a
centralidade se sobrepunham aos interesses coletivos da sociedade. Assim, construía-se no
Brasil um sistema moderno de elaboração de planos e políticas com um centro decisório
aparentemente repleto de certezas, entretanto, com impacto pífio na área de proteção social à
sociedade.
Vamos imaginar um homem com vestimenta militar seu status de mandatário e
conhecedor profundo de políticas sociais, sentado em uma cadeira na sede da capital do país
conversando com seus pares para elaborar um plano que teria impacto direto na vida das
pessoas que moram, por exemplo, em Jaboatão dos Guararapes (RE), Madicilândia (PA),
Caxias do Sul (RS), Nova Iorque (MA ou BA), Piraí (RJ), Nova Venécoa (ES), entre outros
municípios com os mais variados tamanhos, histórias, formação cultural, etc. Até que ponto
uma política construída com uma única narrativa poderia impactar positivamente nos mais
variados lugares e territórios? o que importava era tão somente os resultados para a própria
máquina estatal, sem considerar o que as pessoas que estariam vivendo o dia-a-dia estariam
pensando ou sentindo. Acreditamos que essa cena parece refletir bem as conjecturas da época.
Poucos decidindo por muitos com uma noção superficial dos acontecimentos cotidianos dos
12
Para saber mais sobre os Planos ver Bandeira (XXXX); Cano( XXX)
24
lugares que formam o território. Ademais, diante de tal situação, Marta Farah (2000) aponta
que as decisões tomadas pelo Estado dificultavam a maioria das pessoas a acessar políticas de
cunho social, como saúde, educação, etc.
Os processos em curso no mundo, como a neoliberalização da economia induzindo o
Estado a padrões mínimos de atuação, crise fiscal nos países em desenvolvimento, em
especial o Brasil, um grupo de pensadores que compunham a máquina estatal, novamente,
procuravam soluções de suas cadeiras para reformar o Estado. Entretanto, com o processo de
democratização dos anos de 1980 no Brasil, poderia ser uma possibilidade de repensar o
Estado sob a égide de uma maior participação da sociedade civil. Segundo Farah (2000), no
inicio dos anos 80 do século findo, as estruturas do Estado estavam arregimentadas sobre a
exclusão da sociedade civil nos processos decisórios, opacidade e impermeabilidade das
políticas e agências estatais, excluindo o cidadão e os usuários do processo de controle social
de avaliação dos serviços públicos.
Os Estados considerados do primeiro mundo também sofreram impactos negativos de
várias crises, como a do petróleo, abalando suas estruturas moldadas sob o modelo
desenvolvimentista keynesiano-fordista
13
. O Estado não controlava mais o déficit público e a
inflação. Então, pensadores liberais apostaram em uma nova configuração para o Estado
sendo adjetivada de neoliberalismo
14
, emergindo, primeiramente, na Inglaterra no governo da
primeira Ministra Margareth Thatcher e, em seguida, nos EUA com o então Presidente
Ronald Regan. O Estado passa agora se limitar ao papel preservador da ordem política e
econômica, tendo uma estrutura mínima, deixando o “mercado” agir livremente. (OSBORNE,
D. e GAEBLER, T, 1994)
Então o modelo neoliberal se coloca como única via diante do mundo. Palavras como
desregulamentação, liberalização e privatização ganham forma e força e passam a servir às
administrações públicas tornando-se as promessas mais viáveis para a promoção do
desenvolvimento econômico.
Na América Latina, Leite (2003) aponta três correntes que tem forte influência sobre
as ações do Estado, quais sejam: o background cepalino, exogenismo dependentista e
abordagem endogenista. Podemos afirmar que A Comissão Econômica para a América
Latina e o Caribe CEPAL, foi o grupo que que institucionalizou o debate acerca do de um
13
O modelo keynesiano funcionou até que o sistema fordista de produção e consumo tivesse
condições de crescimento sem ocasionar crises sistêmicas. Por isso é que alguns teóricos a chamam
de crise do fordismo-keynesianismo.
25
Estado mais eficiente. Criada em 1950 e reconhecida pela sua abordagem estruturalista do
sistema econômico mundial, a visão cepalina se opunha à teoria neoclássica das relações
internacionais e argumentava que dentro do sistema capitalista o subdesenvolvimento
marcadamente dividia o mundo em centro e periferia. (COLISTETE 2001; PREBISCH, 1949)
O background cepalino significou um avanço se comparado com a abordagem do
laissez-faire, reconhecendo que o papel do Estado nos países em desenvolvimento dependia
de:
(...) uma dupla modificação: de uma parte das estruturas internas dos
países, através, por exemplo, da reforma agrária e do impulso à
industrialização; e de outra, das estruturas externas, mediante o
incentivo ao desenvolvimento do comércio inter-regional e a adoção
de medidas protecionistas perante os países centrais.(LEITE, 2003,
p.4).
O exogismo dependentista segue a linha argumentativa da Teoria da Dependência, e
coloca os fatores externos como fundamentais à promoção do desenvolvimento dos países
latino-americanos. A força exógena do Estado renasce com força sob a égide da economia
neoclássica. A ênfase é dada na eficiência com o objetivo de melhor utilização dos recursos.
Recomenda-se abrir aos poucos o mercado, reduzindo as barreiras protecionistas e fazer uma
correção nas distorções de preços. (MACHADO, 1999; SANTOS, T. 1998; CARDOSO e
FALETO, 1970)
Na outra mão, a abordagem endogenista, construída nos anos 70, surge nas duas
décadas seguintes sob à luz de teorias que se contrapunham à idéia de desenvolvimento por
etapas, chamando atenção para os riscos em importar modelos de desenvolvimento prontos e
acabados.
Na arena social o Estado brasileiro absolveu em grande medida as diretrizes cepalinas,
tais como: a articulação entre as políticas públicas econômicas e sociais; integração entre as
políticas públicas universalizadas e os programas pontuais e o plano nacional de
desenvolvimento, por meio do estabelecimento de metas claras para cada área; criação de um
sistema de proteção social; articulação entre o Estado e a iniciativa privada com o objetivo de
conter gastos e aumentar a eficiência das ações do Estado. Nesse último caso o Estado
funcionaria como o responsável pela fiscalização e elaboração das políticas (FARAH, 2000;
ARRETCH, 1998).
14
O adjetivo neoliberal tem um campo muito abrangente de debate dentro das ciências econômicas e
sociais e possui inúmeras interpretações. Fiori (1995), por exemplo, debate a questão a partir da
redefinição do papel do poder público com base no
laissez- faire.
26
Marta Farah (2000) aponta que o que se apresenta como crise no Estado brasileiro se
aprofunda durante toda a década de 80, sendo o Estado incapaz de atender as demandas
sociais que se apresentavam. Vários são os fatores para o aumento de tal demanda, entretanto
chamamos atenção para a questão a questão do êxodo rural e do aumento populacional. Em
1940 80% da população brasileira vivia no campo com uma contingente populacional de XX
milhões de brasileiros, sendo XX milhões no campo e XX milhões da cidade. Atualmente
80% da população brasileira localiza-se nos grandes centros urbanos com uma população de
178 milhões de brasileiros, estando XX milhões do campo e XX milhões na cidade. O êxodo
e o aumento populacional têm seus reflexos em vários setores do Governo e a da sociedade,
por um lado o défict previdenciário, a falta de capacidade do Estado em atender as demandas
sociais em função em função do aumento das atribuições do aparato estatal. Por outro lado,
novos atores sociais, como por exemplo as ONGs, sindicatos, associações, (re)surgem com o
objetivo de atender a demanda reprimida de uma sociedade cheia de necessidades.
O processo de redemocratização que encontrava-se em curso no Brasil, a
universalização das políticas sociais e o processo de descentralização das políticas sociais foi
uma arena para configuração de uma certa aproximação entre o Estado e a sociedade civil,
materializada na Constituição de 1988 (FARAH, 2000; DRAIBE; 1991). Chamamos atenção
que o processo de descentralização Em 1990, pós-Constituição, um aparato de reformas foi
proposto pelo Estado e se desenvolviam sob os Planos Fiscal, Político e Administrativo
15
,
envolvendo tanto o aparelho governamental em níveis federal, estadual e municipal, quanto
para o cidadão que agora, pelo menos em tese, deveria ser visto como cliente. Segundo
Bresser (1998), o plano fiscal deveria revitalizar a poupança pública e reformar a previdência;
o plano político deveria promover a reforma política para dar mais governabilidade ao
governo e a reforma gerencial, que seria uma espécie de aperfeiçoamento administrativo do
aparato governamental a qual sucederia a Reforma burocrática de 1936 e a
desenvolvimentista de 1967.
Sônia Draibe (1999) aponta que essa nova configuração que se colocava na agenda do
Estado objetivava articular as ações entre o Estado e a sociedade procurando resguardar o
acesso do cidadão às políticas públicas. Entretanto, da composição desta agenda a
descentralização das ações do aparato estatal foi uma das recomendações adotadas pelo
15
Transformações nas agências estatais, sobretudo no que diz respeito ao planejamento econômico de políticas
públicas, na visão de Abrucio (1997), sofrem severas resistências dentro da administração pública estatal.
Primeiro, por parte dos burocratas que defendem interesses corporativos. Segundo, as resistências de
transformações provêm de fora do aparelho estatal, daqueles que temem perder o acesso privilegiado às decisões
nos recursos públicos de que se beneficiavam no período dos governos militares.
27
Estado que mais chamou atenção de acadêmicos, políticos, imprensa, entre outros. Criou-se
em torno desse processo grande expectativa esperando-se um ajuste nas contas municipais e
um acesso maior do cidadão às políticas de cunho social, como por exemplo a educação e a
saúde, por meio dos processos de municipalização o que, teoricamente, poderia vir a ser um
meio de se territorializar as ações do governo.
Mas o que temos aprendido com as lógicas das grandes narrativas no Brasil? Apesar
de reconhecermos os avanços nos processos descentralizadores construídos sob a égide do
Estado em meio as pressões sociais, eles trazem benefícios quanto ao acesso dos cidadãos às
políticas públicas? As Políticas Públicas existem realmente, ou seja, são estatais ou públicas?
São políticas para mostrar os resultados de uma eficiência da máquina estatal e manter grupo
políticos no poder ou para melhorar o acesso do cidadão?
As perguntas que colocamos, uma mistura de senso comum e curiosidade acadêmica,
podem ser respondidas de várias formas e de acordo como olhar e interesse do pesquisador.
Considerando nosso campo-tema e a forma que adotamos para redigir essa tese, ou seja,
sempre procurando alternar fatos teóricos, empíricos e históricos, vamos tratar das perguntas
supracitadas considerando que estamos tentando negociar o conceito de Políticas Públicas por
meio da construção de uma história que contamos dos processos de transformação do grande
Narrador, o Estado. Para tanto, trataremos a seguir das questões colocadas sob duas óticas,
quais sejam: o Estado como narrador das políticas públicas e, em seguida, as multiplas
narrativas do campo das ações públicas.
28
- O Estado narrador
Para Celina Souza (2003) estudar políticas públicas é estudar o governo em ação
(p.18). Partindo desse pressuposto automaticamente reconhecemos que o Governo, com
participe do Estado, narra as políticas de acordo com a sua vontade, mas não necessariamente
coloca na agenda o problema que leva à formulação de uma política pública. Segundo Bresser
Perreira (2005) atualmente a opinião pública influencia em grande medida as ações do estado,
tanto o Executivo, o Legislativo e o Judiciário, nos níveis federal, estadual ou municipal.
Portanto, relações intergovernamentais, entre os poderes e as pressões da opinião pública
sobre o Estado parecem colocar na agenda governamental os temas a serem tratados, que
podem ou não refletir a vontade dos grupos que se interessam pelo tema.
Marta Farah (2002) aponta que no campo das políticas sociais os movimentos sociais
foram os grandes responsáveis pela pressão sobre o Estado com o intuito de colocar em pauta
assuntos como a universalização do atendimento a saúde, programas de reforma agrária, entre
outros. Apesar de reconhecermos que o Estado não é o único ator responsável por colocar
temas na agenda política, entretanto parece ser ele o grande narrador das políticas públicas.
VOCÊ ENTRA DIRETO SEM AVISAR O LEITOR! É PRECISO DISCUTIR MAIS
ISSO, PARA QUE AS 4 PESSOAS (A BANCA) QUE LERÃO SUA TESE POSSAM
ENTENDER ESSA PASSAGEM. VOCÊ ENTRA DIRETO NO EXEMPLO
Realizou-se no site do Governo Federal um levantamento de todos os planos,
programas e projetos que compõem o quadro das políticas públicas. Identificamos um total
aproximado de 120 programas e projetos nas mais variadas áreas. As evidências mostram que
o Estado materializa, o que não significa que atende, as demandas sociais, econômicas,
fiscais, previdenciárias, burocráticas e militares. Nos diversos siter dos Ministérios
identificamos que o governo federal procura justificar a existência dos programas apontando
seus resultados por meio de gráficos, tabelas, descrições dos programas, entre outras formas,
por meio de técnicas que a maioria da sociedade desconhece e geralmente os resultados são
apresentados como positivos. A pergunta que colocamos é: positivos pra quem? Para a
máquina estatal como meio de justificar sua existência ou para o cidadão que tem o direito ao
acesso às políticas geridas pelo governo? NÃO É CLARO O QUE VOCÊ QUER DIZER
COM ISSO. OU FAZ PARTE DA TESE OU NÃO FAZ!
NOVAMENTE! É PRECISO UM ESTILO UM POUCO MAIS ACADÊMICO. SE
VOCÊ ESTIVESSE MINISTRANDO UMA AULA SERIA ÓTIMO, MAS
INFELIZMENTE ISSO NÃO É UMA AULA!
29
Ao analisar a maioria dos resultados que vimos no site essa pergunta imediatamente
remeteu nossos pensamentos aos últimos resultados do IDH
16
apontando o Brasil com 0.8 de
desenvolvimento, colocando-o na elite dos paises mais desenvolvidos, ou seja, conforme
aponta o Relatório as Políticas Públicas nacionais parecem ser as responsáveis pelas melhoras
apresentas, isto é, o Estado parece ser o único responsável pelo aparente sucesso. O que
significa obter um resultado 0.8? Para o Estado isso pode ser sinônimo de comemoração, pois
aponta para a comunidade internacional e para seus cidadãos que os resultados são
satisfatórios, ou como disse o atual Presidente da República:
Nunca na história desse país
tivemos políticas públicas tão eficientes” (Folha de São Paulo, Política, p.10, 2007)
ESTILO, ESTILO, ESTILO, CUIDADO COM O ESTILO
Entretanto, a tecnicidade apontada por Milton Santos parece mostrar apenas uma face
de uma realidade encoberta pelos números. A inquietação de Milton Santos nos inquietou nos
rementendo para outras perguntas, tais como: qual a diferença que este resultado tem para
20% da população mais carente possui apenas 2% da renda? Agora vamos mudar a pergunta,
mas deixá-la dentro do mesmo contexo: qual a diferença do IDH 0.8 para os 20% mais ricos
que detém 67,5% da renda?
Tais inquitações percorreram nossos pensamentos que nos remeteu logo às pesquisas
que realizamos dentro de nosso campo-tema entre os anos de 2005 e 2007. Uma em especial
poderia demonstrar a forma que a grande narrativa gerenciava o 0.8 de IDH e apontar esse
resultado representava a realidade de uma das regiões brasileiras consideradas mais pobres,
tanto do ponto de vista da renda quanto do acesso às políticas: o Semi-Árido
brasileiro.Confrontamos nossos cadernos de anotações de campo, fotos, relatórios,
lembranças entre outras formas de coletar coleções de informações sobre nosso campo-tema,
com o número publicado e adotado pelo governo como ponto importante no avanço da saúde,
educação e longevidade.
16
AEm 1990 o Índice de Desenvolvimento Humano – IDH é criado com o objetivo de mensurar uma percepção
diferente de desenvolvimento: o desenvolvimento humano. Para Sen (2000), o conceito de desenvolvimento
humano ultrapassa qualquer tentativa de mensuração da liberdade humana, para ele principal vertente do
verdadeiro desenvolvimento. Essa abordagem considera que o desenvolvimento está atrelado à liberdade
política, educação de qualidade, boas condições de habitação, nível de saúde satisfatório e um meio ambiente
saudável, sem desconsiderar a abordagem econômica. Em suma, para o autor o desenvolvimento não está
conectado somente às questões estruturais de Estado ou mercado, mas, também, a melhores condições de vida
individual e coletiva.
30
- A pesquisa do semi-árido
17
: a situação da criança e do adolescente nos ajudando
na negociação do conceito de políticas públicas.
Segundo o IBGE (2007) o Semi-árido Brasileiro possui aproximadamente 35 milhões
de brasileiros, o que representa 16% da população brasileira. Essas pessoas dividem-se em 11
Estados e 1.416 município. Os estados são: Alagoas, Bahia, Ceará, Norte do Espírito Santo,
parte do Maranhão, parte de Minas Gerais, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Norte
e Sergipe. A extensão territorial pode variar entre 23 km
2
a 12.630 km
2
e suas cidades variam
entre 1.129 e 2,5 milhões de habitantes em população. Para termos uma idéia somente o
Semi-árido equivale em extensão territorial à França e Alemanha, com problemas históricos
de se resolver com a questão da seca e da educação, sendo este último uma das vertentes de
construção do IDH.
A pesquisa que realizamos combinou métodos quantitativos e qualitativos. Quando
partimos para o terreno de pesquisa e por meio de observações em campo, conversas com
crianças, país ,mães, prefeitos, secretários, observamos que o quanto a realidade daqueles
pessoas se encontravam longe do IDH 0.8. Crianças desnutridas, educação descontextualizada
e saúde precária, caracterizam o IDH daquela região em meio aos sorrisos ingênuos das
crianças com um futuro duvidoso. Os principais resultados que obtivemos mostram, no que se
refere a situação da criança e do adolescente, o seguinte quadro:
a) A maioria dos indicadores sociais de base quantitativa mostra que a desigualdade
ainda é muito grande entre os municípios do Semi-árido e o restante do Brasil;
b) Os municípios do Semi-árido encontram-se entre os 25% de municípios brasileiros
com os piores níveis no Índice de Desenvolvimento Infantil (criado pelo UNICEF-
Brasil);
c) A situação é ainda pior no que se refere a renda, pois essa questão segue a tendência
da maioria dos territórios brasileiros, ou seja, com quase 80% da renda distribuída
entre os 20% mais ricos e menos 2% da renda da região distribuída entre os 20% mais
pobres;
d) Nessa região o que mais chama atenção é que internamente o Semi-Árido brasileiro é
tão desigual internamente quanto se comparado com o Brasil;
17
Pesquisa coordenada pelo Professor Peter Spink da FGV-EAESP e coordenador do CEAPG e por Ilka
Camarotti. A pesquisa foi realizada entre os meses de agosto de 2006 a março de 2007 encomendada pelo
UNCEF com o objetivo de se verificar a situação da criança e do adolescente no Semi-àrido Brasileiro.
31
e) Finalmente, um resultado que nos chama atenção é situação precária na área
educacional e mesmo com o processo de municipalização da educação o cenário é
precário.
Quando vamos ao terreno de pesquisa ou quando desagregamos os dados temos a
oportunidade de observar como a grande narrativa pode manipular o dado e generalizá-lo
colocando a tecnicidade ao seu serviço. Ao desagregarmos os números, observamos (VEJA
TODOS E COLOQUE NO IMPESSOAL. OK? UTILIZE O NÓS SOMENTE QUANDO
FOR ALGO NOVO QUE CAUSE REALMENTE O IMPACTO. CERTO?) como a
Educação no Semi-Árido brasileiro se encontra. A tabela abaixo mostra os indicadores
trabalhados:
Indicadores
Taxa de atendimento de crianças de 4 a 6 anos na educação infantil e/ou ensino
fundamental
Taxa de escolarização líquida no ensino fundamental
Taxa de distorção idade-série no ensino fundamental
Taxa de abandono no ensino fundamental
Percentual de professores de educação infantil habilitados em nível médio ou superior
Percentual de alunos do ensino fundamental matriculados em escolas municipais com
Conselhos Escolares
Percentual de alunos do ensino fundamental matriculados em escolas com quadra de
esporte
Percentual de alunos do ensino fundamental matriculados em escolas municipais com
grêmios escolares
% de crianças matriculadas em Pré-Escola
% de Escolas com acesso à Internet
Quadro XX
Fonte: Relatório Final FGV-UNICEF (2007: p. 4)
Todos os indicadores apresentam resultados que não refletem o IDH 0.8. Para reforçar
nosso argumento analisaremos dois indicadores dos apresentados acima, pois não é objetivo
deste tópico analisar a situação da criança e do adolescente no semi-árido, mas construir o
argumento de que é possível negociar o conceito de polítcas públicas mostrando que existe
um hiato entre as ações do Estado e o terreno em que habita a sociedade civil.
A taxa de abandono do Ensino Fundamental foi calculada utilizando o número de
crianças que abandonaram o Ensino Fundamental sobre o número de crianças matriculadas.
Para entendermos um pouco melhor consideramos que quanto menor a taxa de abandono,
melhor a situação de da unidade federativa. De acordo com os dados da Tabela XX, a taxa de
32
abandono no Ensino Fundamental vem caindo em todo o país, e o SAB vem acompanhando a
tendência nacional, porém em ritmo menor.
Anos 1.999 2.000 2.001 2.002 2.003 2.004
Brasil 11,3% 11,9% 9,5% 8,3% 8,3% 8,3%
Outros Estados 10,3% 10,7% 8,5% 7,1% 7,0% 7,1%
Semi-Árido Brasileiro 15,0% 16,6% 13,5% 12,9% 13,5% 12,9%
Tx. Var SAB *-* 11,1% -19,0% -4,3% 4,4% -4,2%
Tx. Var Brasil *-* 5,4% -19,7% -13,1% 0,5% -0,5%
Fonte: Tabela extraída do Relatório Final FGV-EAESP/UNICEF (2007: p. 12)
Quando comparamos o SAB com outros Estados ou com o Brasil, em qualquer ano que seja,
ainda temos uma situação extremamente grave. Em uma de minhas visitas ouvi o seguinte
depoimento de um morador: “Nós moramos aqui nesse barraco de lona. É quente. Os
meninos vão pra Escola (total de 12 filhos), mas eles não podem ficar muito tempo porque
tem que ajudar em casa e as vezes trabalhar pra ajudar(Depoimento de um pai de uma
aluno de Escola de Ensino Médio).
Um outro indicador interessante e recente é o percentual de escolas com acesso a Internet. De
acordo com os dados da tabela 06, de 1999 até 2005, esse percentual vem subindo em todo o
país, passando de 3,3% para 20,0%. No SAB isso também vem ocorrendo, mas num ritmo
mais lento, com um aumento de 0,4% para 5,0%.
Anos 1.999 2.000 2.001 2.002 2.003 2.004 2.005
Brasil 3,3% 6,7% 9,8% 14,8% 18,1% 14,8% 20,0%
Outros Estados 4,8% 9,8% 14,2% 20,3% 24,5% 20,3% 27,0%
Semi-Árido Brasileiro 0,4% 0,7% 1,2% 3,4% 4,6% 3,4% 5,0%
Tx. Var SAB *-* 62,2% 64,7% 194,7% 36,4% -26,7% 48,5%
Tx. Var Brasil *-* 103,9% 45,8% 51,0% 22,5% -18,4% 35,5%
Fonte: Tabela extraída do Relatório Final FGV-EAESP/UNICEF (2007: p. 28)
Entretanto, a leitura desse indicador deve não pode ser descontextualizada da realidade de
cada lugar.Ter um computador e internet na Escola não significa que o aluno esteja utilizando
os equipamentos de software e hardware. Um diretor de Escola Municipal chamou atenção
para o seguite: “Nem sempre podemos liberar as salas para a utilização por parte dos alunos
e professores. As vezes somem mouses, teclados e outros equipamentos. Outra coisa é a falta
de capacitação das pessoas para operar esses equipamentos”.
A literatura aponta a co-relação existente entre Educação e diversas outras áreas. Em
nossas análises observamos que não basta colocar o computador em sala de aula se o
ambiente não for seguro. Outro fato relevante é a falta de uma estratégia pedagógica para a
utilização dos equipamentos. Muitas vezes as salas ficam fechadas, também, por falta de
33
atividades nos mais diversos locais. Portanto, é preciso cuidado ao ler um indicador, pois ele
pode ser útil para fins que não sejam mostrar a realidade do cotidiano das pessoas.
Com isso, acreditamos que estamos prontos para dar nosso próximo passo na
negociação de nosso conceito, qual seja, observar se existem outras formas de se fazer política
pública mais próxima do cidadão. Mas antes, precisamos saber afinal o que são políticas
públicas? ESTOU SEGUINDO O ARGUMENTO, MAS NÃO É ASSIM QUE VOCÊ DEVE
ORQUESTRAR O TEXTO. DEVAGAR! ELABORE AS IDÉIAS COM CALMA
Como colocado na introdução de nosso trabalho e no começo deste capítulo Celina
Souza (2003) aponta que não existe um consenso sobre o que sejam políticas públicas, mas
contornos que podem ser percebidos dentro de um marco histórico conceitual que parece ter a
Constituição de 1988 como um marco que materializa algumas concepções de políticas
públicas pensadas ortoxamente dentro de uma visão reducionista onde o modelo Top Down
de formulação de Política ainda parece estar presente, mas, por outro lado apresenta inovações
jurico-legais que parecem refletir em certa medida o anseio de algumas demandas sociais,
como exemplicamos durante este trabalho ao falarmos da emancipação dos municípios, a
universalização do atendimento a saúde, entre outros.
Edgar Morin (1996) infere que na modernidade científica esse paradoxo não ocorre
pelo fato de existir um ponte de ligação entre uma dimensão e outra, simplificando e
homogeneizando a ciência tornado-a unidimensional afastando-a de outras possibilidades,
partindo para a racionalização extrema desconsiderando outras formas de construção do
conhecimento.
A ilusão iluminista que pregava um discurso de construir uma sociedade caracterizada
pela racionalidade e liberdade parece ter sido destruída, pois o homem moderno, que por meio
de técnicas científicas e processos tecnológicos procurou elevar o bem-estar sócio-econômico
do planeta, passou a se encontrar à beira de um abismo, pois as mesmas técnicas e processos
que construíram para seu próprio bem-estar, agora ameaçavam o homem moderno, que os
utilizou para construir armas nucleares, promover guerras, etc.
Fora das condições históricas, culturais, tecnológicas que foram as do
desenvolvimento ocidental, e, portanto, um modelo abstrato e
imposto, modelo tecno-burocrático que a máquina industrial e
nunca o homem, cuja prévia competência é necessária para as
máquinas e cuja altura prévia não pode adaptar-se ao universo tecno-
cronometrado. (MORIN, 1982)
Dentro desse contexto paradoxal identificado dentro de nosso campo-tema, ou seja, na
perspectiva da modernidade, as Políticas Públicas podem ser estigmatizadas e referenciadas
34
por constructos homogeneizando seu conceito, como a superioridade da técnica sobre os fatos
cotidianos. Milton Santos (XXXX) aponta que mundo da técnica e a certeza de encontrar a
certeza tornam o homem e a ciência refém da tecnicidade afastando-o da realidade, mostrando
somente aquilo que o interessado quer que oprimido (FREIRE, XXX) sinta e veja. Tal
argumentação está presente no cotidiano da Administração Pública quando observamos a
forma Top Down ou homogeneizada pela qual uma política pública é elaborada ou avaliada
(SPINK, Avaliação de Políticas Públicas). Esse tipo de postura exclui a possibilidade de
construção de políticas mais mais próximas do território (DEMO, XXX; DOWBOR, XXXX)
excluindo a possibilidade de participação dos atores sociais, desvalorizando o conhecimento
do senso comum para a construção do conhecimento.
Peter Spink (2001) apresenta uma forma alternativa a esse cenário apontado o seguinte::
Se avaliar é coisa séria, não há duvida que precisa ser feita
seriamente. Entretanto a seriedade é uma característica da
prática cotidiana da conversação, da ação comunicativa e da
democracia em constante construção e não de um grupo
profissional ou método específico; todos nós sabemos ser sérios
(p.15)
Portanto, avaliar uma política pública requer mais do a tecnicidade para mostrar sua
eficiência, mas é necessário, também, construir uma avaliação coletiva procurando observar a
conexão existente entre o lugar, as pessoas e a ação
18
, por meio da ação comunicativa
(HABERMANS, XXXX).
Independente que se esteja olhando a formulação, implementação ou avaliação de uma
política pública, sob a égide de uma modernidade a tecnicidade parece se sobrepor sobre o ser
que é impactado pela política . Milton Santos aponta que dentro do sistema no qual estamos
inseridos, o capitalismo, a situação ainda é pior, porque além de tornar os processos sociais
reféns da tecnicidade, o sistema produz a categoria pobreza e a desigualde.
Desafiar a objetivação e a tecnicidade moderna propondo alternativas para melhorar os
processos de políticas públicas, aproximando Estado e sociedade assim como a ciência do
senso comum, tornar possível se pensar a renegociação do conceito de políticas públicas, ou
seja, a renegociação do conceito tanto no cotidiano do Administrador Público, quanto do
pesquisador que se insere nesse campo-tema.
Nessa perspectiva de procurar caminhos para renegociar o conceito, parece fundamental
conectar o mundo da vida (HABERMANS, 2000) ao mundo das políticas públicas(Laswell,
35
H. Simon, C. Lindblom e D. Easton), que de certa forma parecem separados por aqueles
produtores das grandes narrativas, que se utilizam a tecnicidade e a burocratização como
ferramentas e das multiplas narrativas presentes no território, representadas pelo senso
comum e rede de saberes presentes em cada lugar do território.
Assim, podemos observar por meio dessa separação que o senso comum, o cotidiano
(BERGER, ) e o mundo da vida, parecem ser dispensáveis no processo de construção de
políticas públicas. Desta forma, se desconsiderarmos a existência de vários saberes o processo
de construção do conhecimento se reduz e simplifica-se, indo de encontro a uma perspectiva
complexa e holística.
Portanto, parece que é possível renegociar o conceito por meio de um pensamento complexo
onde o reducionismo científico não alcança, ainda mais de conectar o que se encontra
desconectado (MORAN, 1986), encontrar nas incertezas o nascimento de novos caminhos
para a investigação (MORAN, 1989) considerando a construção histórica do conceito e
apontando as tendências recentes de se pensar, analisar e se fazer políticas públicas a partir do
cotidiano dos atores que tornam o território vivo (SANTOS, 1989) para a produção da
realidade.
18
Segundo Giddens (1979).Ação é o “fluxo de intervenções causais atuais ou contempladas de pessoas no
processo contínuo de eventos no mundo”
36
Política Pública e Ação Pública
Além do Estado como narrador de políticas públicas observamos que parece se
configurar, também, uma outra dinâmica de gestão da rés públicas em função das diversas
transformações apontadas no início deste capítulo. O surgimento de formas alternativas de
se fazer política de caráter público e não meramente estatal pode combinar ações do Estado e
de atores da sociedade civil. Vamos relembrar a introdução de nosso trabalho quando Marco
Teixeira e Peter Spink (2007) apontam para uma fuzão entre política pública e ação social o
que resultaria em ação pública:
Na América Latina, começou-se a utilizar a expressão ação pública
(Cabrero Mendonza, 2005) para descrever esse movimento duplo do
Estado para a sociedade civil e da sociedade civil para o Estado,
sempre com ênfase nas instituições públicas no âmbito local, em
especial os municípios e outras formas de governo local, onde as
mudanças têm sido mais significativas (Campbell, 2003). Ação
pública (uma fusão feliz de política pública e ação social) pode ser
entendida no sentido amplo para compreender as ações das diferentes
instituições públicas e também qualquer outra atividade que esteja
sendo articulada na esfera pública e em referência a um bem comum.
Inclui atividades vinculadas diretamente ao exercício do poder e
aquelas que resultam das atividades de cidadãos quando estão
demonstrando sua preocupação ativa com a vida coletiva (França
Filho et al., 2006).
Modelos de gestão baseados em ações públicas são cada vez mais presentes no território
brasileiro. Podemos identificar inúmeras delas no banco de dados do Gestão Pública e
Cidadania
19
. Durante o período de exploração de nosso campo-tema, também fizemos uma
incursão no Banco de Dados do PGPC para analisarmos as principais características das ações
públicas existentes na Amazônia Legal, mas sem ter a pretensão de ir ao terreno de pesquisa,
mas observar como os experientes pesquisadores que visitavam os diversos lugares e
elaboravam relatórios sobre suas visitas caracterizavam as ações públicas que encontravam
nos diversos lugares.
19
Para conhecer experiência inovadoras de ações públicas consultar o site do Programa Gestão Pública e
Cidadania que é http://inovando.fgvsp.br
37
Ação Pública: uma maneira de se fazer política territorializada
Encontramos no Banco de Dados do PGPC a motivação necessária para fechar nossa
negociação , pois lá encontramos formas inovadoras em que poderes públicos estaduais,
municipais (sejam do executivo, legislativo ou do judiciário) e organizações próprias dos
povos indígenas, realizam ações públicas contextualizadas com suas realidades. O PGPC,
criado em 1996 pela FGV-EAESP, da Fundação Ford e do Banco Nacional de
Desenvolvimento - BNDES, objetiva identificar, disseminar e premiar projetos e programas
que se destacam pela inovação e eficiência em gestão pública no Brasil. Desde a sua criação o
programa possui em seu banco de dados 8.169 projetos inscritos e 200 projetos premiados.
(ELLER
et al., 2005)
Neste exemplo selecionamos a Amazônia Legal, que se constitui pelos estados do
Acre, Amapá, Amazonas, Pará, parte do Maranhão, Mato Grosso, Rondônia, Roraima, e
Tocantins, totalizando 805 municípios, o que representa 14,48% dos 5.561 existentes
atualmente no Brasil. O Estado que concentra o maior número de municípios dentro da
Amazônia Legal é o Maranhão, com 26,96% do total da região e 3,9% em relação ao Brasil.
O estado do Pará vem a seguir, c
oncentrando 17,76% dos municípios da Amazônia Legal e 2,57% no Brasil. Os
estados do Tocantins e Mato Grosso se igualam com o mesmo número de municípios, 139
cada, o que equivale a um percentual de 17,27% dos municípios da Amazônia e 2,5% cada no
total nacional. Lembramos que aqui não estivemos no terreno de pesquisa utilizando somente
o banco de dados do Programa.
Todos os anos são publicados vinte textos, organizados em um livro intitulado 20
Experiências de Gestão Pública e Cidadania
”, onde são descritos os projetos premiados, os
quais são selecionados por um comitê técnico que procura observar em que medida eles são
inovadores e qual a potencialidade das experiências para a manutenção e/ou construção de
políticas públicas nas regiões brasileiras. Os artigos finais que compõem o livro são escritos
por experientes pesquisadores de reconhecidas Instituições de Ensino Superior e renomados
Institutos de pesquisa do Brasil.
A matéria-prima utilizada para pesquisa deste trabalho encontra-se nos livros
publicados a cada ciclo de premiação do PGPC. Para o estudo aqui proposto foram lidos
integralmente 35 textos finalistas publicados, que tratam de inovações na área da
Administração Pública nos Estados que compõem a Amazônia Legal, conforme mostra a
Tabela 1.
38
Tabela 1 – N° de municípios da Amazônia Legal finalistas no PGPC da FGV - EAESP
Inscritos
1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 Total
AC
2 1 1 0 0 0 0 0 2 0
6
AP
0 0 1 1 1 2 0 0 0 0
5
AM
0 0 1 2 1 1 0 0 0 1
6
MA
1 1 1 1 0 1 0 0 0 1
6
MT
1 0 0 0 0 0 0 1 1 0
3
PA
0 1 0 1 0 1 0 0 1 0
4
RO
0 0 0 0 0 0 0 0 0 1
1
RR
0 0 0 0 0 0 2 0 1 0
3
TO
0 0 1 0 0 0 0 0 0 0
1
Total
4 3 5 5 2 5 2 1 5 3 35
Fonte: http://inovando.fgvsp.br - consultado em 30./03 e 5,6,7,8,10,11,12, 13/4, 5 e 7/9/2006.
Para observamos a noção de ação pública na Amazônia, por meio de uma pesquisa
qualitativa e se empregamos a análise documental partindo dos 35 textos finalistas do PGPC
que compõem os livros 20 Experiências de Gestão Pública e Cidadania”. Decidimos, nesse
caso, por uma amostra intencionalmente selecionada em função dos interesses deste trabalho,
chamando atenção para a limitação estatística do trabalho, pois a amostra não é significativa
para uma tentativa de generalização, que não é o caso deste ensaio.
Por meio de análise de conteúdo aberto, ou seja, sem a preocupação inicial de fixar
categorias e parâmetros, o trabalho seguiu três etapas. Como ponto de partida para a
realização do trabalho, os seguintes passos foram seguidos: uma análise prévia do material
coletado por meio da leitura de todas as introduções e conclusões dos trabalhos, com o
objetivo de se familiarizar com o material impresso. Em seguida, o material foi lido
integralmente, ano a ano, sem o critério de identificar os estados e municípios de origem.
Nesta segunda etapa o intuito foi construir um quadro de referência geral, procurando sínteses
unívocas e quadros divergentes, nas palavras dos pesquisadores. Por fim, buscou-se fazer com
que o material interagisse um com o outro, não restringindo a análise apenas ao material lido,
pois levou-se em consideração outras fontes consultadas previamente. (VERGARA, 2005;
TRIVINOS, 1987) Ressaltamos que este trabalho não seguiu as três etapas rigidamente, pois,
por muitas vezes, foi necessário reconstruir algumas inferências retomando etapas anteriores
(STRAUSS e CORBIN, 1990)
39
Assim, por meio da análise de conteúdo aberto, um quadro foi elaborado com cada
dimensão e suas unidades de análise. Os agrupamentos e reagrupamentos das categorias
foram realizados identificando-se um vetor que transversalizou todos os textos e esteve
presente em todos os âmbitos, identificado sempre as palavras parceria e alianças, como será
demonstrado na parte final deste trabalho.
Muitos foram os caminhos indicados pela leitura realizada do material, englobando os
âmbitos econômico, social, político e cultural. No entanto, pelos resultados da pesquisa,
identificamos que as alianças e parcerias formam o eixo que perpassa todos os textos lidos,
pelo menos na visão dos pesquisadores do PGPC ao olhar o terreno de estudo. Vale aqui
descrever abaixo todos os 35 projetos e o nível de parceria identificado em cada um deles,
pois esse foi o produto que evidenciou fortemente que as redes de relações parecem ser
capazes de desenvolver projetos e programas inovadores, pelo menos na visão dos
pesquisadores do PGPC.
(Legenda: 1 Organizações públicas; 2 Organizações intermunicipais, interestaduais ou
entre países; 3- Organizações da Sociedade Civil, nacional e internacional; 4 Iniciativa de
um único ator; 5- outros
Projeto Tipo de parceria
1)Pólo Agroflorestal 1,3 e 5
2)Projeto Casa Rosa Mulher 1,3 e 5
3)Projeto Jaburu 1,3 e 5
4)Projeto Conviver em Duque Bacelar 1 e 5
5)Auto-Declaração Madijá:Uma Aula de Governo dos Povos Indígenas 1,3 e 5
6)Projeto Auto-Estima das Crianças Negras 1 e 3
7)Projeto de Interiorização da Fundação Carlos Gomes 1,2 e 3
8)Projeto Cidadão-Cidadania e Política Pública na Cidade de Rio Branco no
Estado do Acre
1,3 e 5
9)Parteiras Tradicionais do Amapá 1,3 e 5
10)Trienal de Medicina Tradicional do Povo Baniwa e Kuripako, da
Organização Indígena da Bacia do Içana (OIBI)
1,3 e 5
11)Programa de Desenvolvimento Auto-Sustentável na Pré-Amazônia
Maranhense
1,3 e 5
12)Os Krahós e a Reintrodução de Sementes Nativas 1 e 5
13)Programa Construindo uma Educação Escolar Indígena 1 e 3
14)Bolsa Familiar para a Educação - Bolsa Escola 1,3 e 5
15)Consórcio Intermunicipal de Abastecimento 1,2,3 e 5
16)Segurança Pública, Direitos Humanos e Cidadania 1,3 e 5
17)Projeto Rede Autônoma de Saúde Indígena (RASI) 1,3 e 5
18)Programa de Medidas Socioeducativas-Macapá 1,3 e 5
19)Projeto Educação Ticuna-Aldeias Indígenas do Alto Solimões 1,2,3 e 5
20)Programa Família Cidadã 1,2 e 5
21)Projeto Castanha-Do-Brasil 1,3 e 5
22)Projeto Arte Baniwa 1,2,3 e 5
23)Consórcio Intermunicipal de Produção e Abastecimento -CINPRA 1,2,3 e 5
40
24)Fundo Municipal de Geração de Emprego e Renda Ver-O-Sol 1 e 5
25)Projeto Anike 1,2,3 e 5
27)Formação de Professores do Parque Indígena do Xingú 1 e 5
28)Ação Comunitária em Arte e Ofício - Experiências Educativas em
Comunidades Rurais Negras no Pará
1,3 e 5
29)Desenvolvimento Florestal Sustentável Na Amazônia Brasileira - Floresta
Estadual do Antimary
1 e 5
30)Programa de Formação Intercultural Diferencial e Bilingüe de Professores
Indígenas
1,3 e 5
31)Programa Legislativo Interativo e Participativo 1,3 e 5
32)Projeto Crescer 1 e 5
33)Projeto Educação Indígena do Alto Rio Negro 1 e 5
34)Fruta Sã, Indústria, Comércio e Exportação ltda. 1 e 5
35)Unidades Produtivas Comunitárias para Criação de Peixes em Tanques-
Rede
1,2,3 e 5
Quadro 1 – Projeto e tipos de parcerias na Amazônia Legal no PGPC
Fonte: Programa Gestão Pública e Cidadania
Como se pode observar no Quadro 1, nenhum projeto finalista considerado inovador
pelos pesquisadores e técnicos do PGPC foram desenvolvidos somente por um ator
governamental. O que se observou na análise do material foi a construção de alianças e
parcerias consubstanciadas por questões objetivas, reunindo informações globais, idéias
gerais e recursos nacionais e internacionais. Os parceiros identificados são os mais variados
possíveis ligados a organizações públicas, estatais e governamentais, relacionados ao
governo, que é o responsável pela iniciativa. Os parceiros também podem ser intermunicipais
ou interestaduais, de organizações da sociedade civil dos mais variados setores.
Por meio das parceiras firmadas entre os atores envolvidos nas experiências descritas,
obsercamos que o Estado está presente em todos os projetos, mas neste caso não como o
narrador principal, mas como uma das múltiplas vozes que se apresentam, mesmo que o seu
peso decisório seja reconhecido. Outro fator que nos chamou atenção foram as parcerias
estabelecidas entre sociedades consideradas excluídas na Amazônia, como é o caso dos
negros, índios e populações ribeirinhas e, com ONGs com recursos internacionais e órgãos
estatais. Esse caso mostra um lugar como um espaço transnacional em que atores de vários
lugares dialogam em função de um projeto onde há a forte presença de ações públicas. Assim,
além do espaço transnacional, as alianças e parcerias construir a territorialidade (SANTOS,
1991).de uma política pública negociada.
Assim como no Semi-Árido brasileiro, a questão educacional mostrou-se como umas
das principais preocupações descritas pelos pesquisadores do PGPC. Quando olhado para essa
questão, tornou-se necessário um aprofundamento da leitura pelo fato dela não se apresentar
41
diretamente nos projetos, mas estar sempre se relacionando com pontos fundamentas para o
desenvolvimento local, como geração de emprego e renda, saúde, cultura, etc. Infelizmente,
não é possível analisar todas as vertentes existentes nesse rico banco de dados, mas com
apenas algumas modestas inferências alguns caminhos alternativos parecem surgir e mostrar
uma forma diferente, sinérgica, cooperativa, inclusiva de se fazer política pública.
Portanto, apresentamos neste capítulo o confronto de duas tendências que se negociadas
produzem um conceito de política pública mais próximo da realidade e do cotidiano dos fatos
sociais e das pessoas:
Em síntese, o que observamos é que os exemplos apresentados procuram superar o modelo
reducionista e, por meio do pensamento complexo e sinérgico avançar para um conceito de
políticas públicos onde realmente o público seja colocado como prioridade e o território seja
considerado. No próximo capítulo trataremos do conceito de territorialidade como uma forma
de contribuir para a construção do conhecimento na área da Administração Pública
considerando além do saber científico os saberes presentes nos mais variados territórios e
ligares.
Pensamento Reducionismo
Modelos Top-Down
Pensamento Complexo
(Sinérgico)
Modelos cooperativos - inclusivos
Conceito negociado de Políticas
Públicas:
Ação Pública
Saber Cintífico
Multiplos saberes
42
Capítulo 2
A territorialidade como categoria de análise nas políticas
públicas
43
A tese que aqui se apresenta defende parte da idéia de que se precisa considerar a
territorialidade dos lugares, em seu sentido mais amplo apontado por Milton Santos (1988),
na formulação e processamento das políticas públicas no território em uso. Apesar de não ser
um conceito oriundo do campo da Administração Pública a categoria territorialidade pode ser
utilizada em vários estratos (técnico, científico, político, cultural, social, etc) e, também, no
sistema de políticas públicas que se relaciona de forma intensa com as ações do governo,
sociedade e, principalmente, do cotidiano das pessoas, que formam culturalmente um lugar:
“(...) cultura e territorialidade são, de certo modo, sinônimos. A
cultura, forma de comunicação do indivíduo e do grupo com o
universo, é uma herança, mas também um reaprendizado das
relações profundas entre o homem e o seu meio, um resultado
obtido através do próprio processo de viver. Incluindo o
processo produtivo e as práticas sociais, a cultura é o que nos dá
a consciência de pertencer a um grupo. O território em que
vivemos é mais que um simples conjunto de objetos, mediante
os quais trabalhamos, moramos, mas também um dado
simbólico, sem o qual não se pode falar de territorialidade. Esta
não provêm do simples fato de viver num lugar, mas da
comunhão que com ele mantemos”. (SANTOS, 1988:83).
Entretanto, para construirmos a categoria territorialidade devemos considerar em sua acepção
outras categorias que em alguns momentos fazem parte dela e em outros ajudam-na a
construir outras categorias, quais sejam: espaço, território, lugar e cotidiano que, dentro um
pensamento complexo de ciência (MORIN, 1997) não podem ser reduzidos, simplificados ou
separados, pois estão unidos por um elo teórico complexo que considera o espaço e o tempo
como meio que os produzem através da leitura, abstração e observação das relações que se
processam nos territórios em uso (Santos, 1988). Em vários momentos duas ou mais
categorias dialogarão e estarão presentes nas análises conceituais.
44
- O espaço como ponto de partida
De acordo com Lefebre (1969) pode ser observado por meio de três feixes que estão
entrelaçados em alguns momentos e em outros se sobrepõe e, outras vezes se superpõe. São
eles: as práticas espaciais (
percebido – físico), representações do espaço (concebido -
mental) e espaços de representação (vivido - social), sendo eles os três feixes conceituais que
representam as práticas sociais de produção/reprodução. O esforço de separar esses três feixes
e, também, de juntá-los quando necessário, faz com que a noção de espaço faça sentido.
(LEFEBVRE , 1969)
Segundo o autor, o
percebido é categoricamente, dentre os três feixes, o que representa a
materialidade do espaço e remete a idéia de ações humanas, não podendo prescindir de
suporte físico. O c
oncebido representa formas concretas de parametrizar as ações dos
habitantes racionais do espaço do “local” territorialmente demarcado, como por exemplo, os
planos urbanos, os mapas, as leis, os códigos etc. O vivido são os espaços dominados por
expectativas, medos e proibições da representação do espaço. Porém, o vivido pode ganhar
proporções surpreendentes que mesmo sob a dominação pode transgredir o meio na tentativa
de realizar desejos ainda suspensos no imaginário
20
, não esquecendo, como dito
anteriormente, que este está entrelaçado com os demais feixes. (DUARTE, 2001) Na figura 1
procura-se ilustrar tal pensamento:
20
Segundo Duarte: Como exemplo de espaços de representação, Lefebvre aponta a apropriação
popular do espaço pelos moradores das favelas e guetos urbanos. (apud Shields, op. Cit) Nessas
áreas prevalecem formas de sociabilidade e códigos alternativos, a despeito das normas dominantes
e das regulamentações estatais vigentes
.” (Duarte, 2001: p 144)
45
FIGURA 1 – Os três feixes de Lefebvre
Analisando as convergências no pensamento de Lefebvre e Milton Santos, Duarte (2001)
mostra que “(...)
o conhecimento do espaço tem como ponto de partida a relação dialética
estabelecida entre sociedade e espaço, entendendo o espaço como meio de produção da
realidade.” (p.139). Nesse espaço os lugares se inserem reafirmando a forma espacial do
território e suas territorialidades.
Nesse sentido Milton Santos(2000) mostra que a forma espacial do território está em
constante uso, ou seja, o território em uso remete ao cotidiano da população, ao sentimento de
pertencimento, ao reconhecimento de uma identidade própria produzida pelas relações
sociais, nunca estáticas, consubstanciando-se pela construção da destruição e pela destruição
da construção das relações diárias, por meio da informação e do conhecimento gerados e
recebidos. Portanto, por meio de seus atores o território em uso é capaz de produzir e
reproduzir poder e sentimentos de identidades culturais e pertencer a um lugar, ou seja, ele
parece ser em certos momentos a própria territorialidade, onde as noções de poder e
dominação parecem estar presentes sempre.
Percebido
físico
Concebido
mental
Vivido
social
Remete a
idéia de
ações humanas.
(a materialidade
do espaço)
Demarcador das
Ações.
(Planos urbanos,
mapas e leis)
Dominado por
expectativas,
medos e
proibições.
46
A territorialidade, também apontada por Milton Santos (1988) como território em
uso, é uma categoria que (re)descobre
21
a importância das dimensões territorial, sociais e
culturais, emergindo das relações cotidianas existentes entre os diversos atores e grupos
sociais e refletindo o sentimento de pertencer a determinado lugar, sendo ele uma família, um
sindicato, um clube, uma comunidade, uma cidade, um grupo social, um país, etc.Assim, a
categoria territorialidade se materializa no lugar e parece refletir as dimensões culturais,
políticas, econômicas e sociais, organizando-se na desordem e na complexidade das relações
diversas como aponta Milton Santos (2004):
No lugar – um cotidiano compartido entre as mais diversas
pessoas, firmas e instituições - cooperação e conflito são a base
da vida em comum. Porque cada qual exerce uma ação própria,
a vida social se individualiza; e porque a contigüidade é
criadora de comunhão, a política se territorializa, com o
confronto entre organização e espontaneidade. O lugar é o
quadro de uma referência pragmática ao mundo (...), mas é
também o teatro insubstituível das paixões humanas,
responsáveis (...) pelas mais diversas manifestações da
espontaneidade e da criatividade (SANTOS, 2004:258).
Neste sentido, as categorias espaço e território são partes . O espaço pode ser observado por
meio de três feixes que estão entrelaçados em alguns momentos e em outros se sobrepõe e,
outras vezes se superpõe. São eles: as práticas espaciais (percebido – físico), representações
do espaço (concebido - mental) e espaços de representação (vivido - social), sendo eles os
três feixes conceituais que representam as práticas sociais de produção/reprodução. O esforço
de separar esses três feixes e, também, de juntá-los quando necessário, faz com que a noção
de espaço faça sentido. (LEFEBVRE, 1991)
21
Resolvemos colocar o prefixo (re) no verbo descobrir, pois o debate sobre territorialidade não é exclusivo
apenas da Geografia, muito pelo contrário, tem suas interfaces e origens principais com e em-na Filosofia,
Sociologia e Antropologia. Portanto, dependendo de onde se olha e analisa esse conceito o pesquisador pode
(caso queira) aceitá-lo como um novo conceito ou um conceito adormecido nos berços da disciplinas
consideradas clássicas das ciências sociais.
47
- Território, lugar e cotidiano: a ordem conceitual na desordem do pensamento
Territorium é uma palavra que se origina de territorialis, ambas do Latin e se
referem, até antes do século XVIII, à posse da terra. Na segunda década do século findo uma
atenção especial foi dada à palavra em especial pelas autoridades jurídicas. No mesmo
período a categoria territorialidade emergia no sistema etologico dando sentido de defesa às
espécies que defendiam seus territórios contra sua própria espécie. Entretanto, no decorrer das
décadas o conceito vem ganhando conotações e interpretações diferentes nos mais diversos
campos disciplinares, principalmente dentro das ciências sociais. Uma delas, que é o nosso
ponto de partida, é o debate da relação entre espaço e homem com um forte caráter subjetivo.
Esse debate é presente na geografia humana e se materializa por meio da categoria “lugar”
que, também, se relaciona com questões culturais e com o território. (CHARTIER, 1988)
Construir a relação entre um sistema cultural de determinado lugar com a categoria território
não é tarefa simples. Por exemplo, na produção acumulada no campo da Administração
Pública, principalmente no Brasil
22
, há poucas referências utilizando o termo.. Em seguida,
entender as relações culturais por meio dos códigos próprios de cada lugar exige do
pesquisador experiência e vivência em campo e, ainda mais, separar a cultura adquirida pelo
pesquisador àquela a qual o mesmo pretende investigar é tarefa árdua, pois requer tempo para
entender as dinâmicas sociais do terreno de pesquisa, pois, segundo Clifford Geertz (1978),
apenas a pessoa que sente e mora no lugar é capaz de interpretar sua própria cultura.
Mesmo antes de pisar no terreno de pesquisa, mas já dentro do campo, sentimos a necessidade
de interagir com outras com outras disciplinas das ciências sociais, como a filosofia,
antropologia, sociologia, geografia e história, que a mais tempo já tratavam das categorias
supracitadas
23
.
Durante algum tempo a noção da categoria território foi ligada ao poder legal que o Estado
tem de interferir na delimitação de fronteiras físicas (RATZEL, 1990). Assim, a questão do
poder do estado se mostra como dominador do território emergindo dessa concepção a
questão da dominação e do poder exercido por um único ator, tornado outros atores
22
Raros são os trabalhos desenvolvidos na Administração Pública que procuram mostrar essas relações.
Conforme apontaremos no capítulo 3, especificamente na área de Administração Pública, consultamos as
bibliotecas da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo e do Rio de Janeiro,
23 Nesse momento do trabalho é imprescindível comentar que entrar em contato com as disciplinas e conceitos
os quais não sejam aqueles os quais não estamos habituados durante nossa trajetória de pesquisa e acadêmica,
48
dependentes do primeiro. Entretanto, o poder estatal não é o único presente nas relações,
como aponta Claude Raffestin (1993) que mostra a importância do poder que os atores
presentes nos territórios possuem quando afirma que
O território, se forma a partir do
espaço, é uma ação conduzida por um ator sintagmático em qualquer nível ao se apropriar
de um espaço, concreta ou abstratamente, o ator territorializa o espaço
”, apontando ainda
que limites e delimitações são colocadas por esses atores em função de objetivos pré-
estabelecidos, pois se isso não ocorresse qualquer ação se perderia.
Rogério Haesbaert (1997), faz inferências mostrando que a dominação do espaço, tanto na
concepção política quanto simbólica, consubstancia uma identidade por meio da construção
das relações sociais presentes no território. O autor mostra que a dominação se por meio
dos controles simbólico e político-disciplinar disciplinando os indivíduos ordenando o espaço
onde as relações sociais se processam.
Werther Holzer (1997) mostra que o território também pode ser entendido como um rol de
lugares e que a delimitação física não necessariamente é aquela que melhor representa o
território e que a "territorialidade é a expressão dos comportamentos vividos, ou se
preferirmos, da constituição dos mundos pessoal e intersubjetivo, englobando a relação do
território com o desconhecido - espaço estrangeiro" , o autor possibilita o traçado da
diversidade das identidades culturais.
Partindo desse pressuposto, vários são os exemplos que emergem do dia-a-dia das
pessoas que se sentem parte dos mais diversos lugares. Seria improvável alguém com o
mínimo de conhecimento e em consciência nunca ter dito ou ter ouvido frases que reflitam
o sentimento de pertencer aos lugares. A mais comum delas parece ser “Eu dou daqui”, ou
“Eu pertenço a esse lugar”, ou ainda mais, “eu venho desse lugar que você acabou de falar”
ou para não se fechar apenas em escalas físicas, mas mais representativas e cognitivas,
podemos citar também outras frases como “o meu lugar é na igreja” ou ainda mais, “o meu
lugar é na nessa terra, foi aqui que eu nasci”
Para demonstrarmos o sentido de como as territorialidades se apresentam nos
lugares, vamos exemplificar por meio de alguns trabalhos acadêmicos desenvolvidos em áreas
rurais.
temos que ter muito cuidado ao se arriscar em comentários ou inferências, pois não somos especialistas, mesmo
que eles existam.
49
50
- O pensamento Complexo e a territorialidade
Assim, a complexidade do pensamento científico (MORIN, XXXX)
24
mostra-se
como um caminho adequado para entender a categoria, pois a incursão a esse conceito
ultrapassa o pensamento reducionista, em função das conectividades existentes com outras
categorias como território, lugar e cotidiano. Peter Spink (2001B) aponta que
um olhar que
encare a complexidade do lugar e se disponha a pensar o que é cotidiano, o que são limites,
conexões, e horizontes, partes e todos, formas de conhecimento local e senso comum, refletir
sobre ação, forma, produção de sentido e disputa por hegemonias (...) é no lugar que se
concretiza a sociedade civil
(SPINK, 2001B:11). Assim, parece razoável aceitar que a
territorialidade é o contorno que parece estar ausente na visão ortodoxa de se formular e
processar as políticas públicas, categoria esta que não se apresenta na visão moderna da
ciência da Administração Pública tradicional
25
.
. Um dos possíveis caminhos que se mostrou adequado para este trabalho é tentar
superar o pensamento reducionista pelo qual as Políticas Públicas vem sendo tratada por uma
boa parte da ciência da Administração e procurar considerar, como aponta Edgar Morin, um
pensamento mais complexo que procure considerar as Políticas Públicas em geral e as ações
públicas cotidianas em particular, incentivando uma forma homogênea de reflexão
considerando as diversas dimensões do cotidiano procurando articular o pertencer ao lugar ,
as diferenças, os consensos, os conflitos com a intenção de construir um saber que considere
as dimensões possíveis do conhecimento que este trabalho se propõe a estudar.
Talvez a certeza que perpassa o pensamento moderno dos clássicos que estudam
Políticas Públicas, como, por exemplo, um estudo que pode delimitar o objeto à policy cicle,
possa ser questionado ou complementado por um pensamento que procura explorar as
incertezas não presentes no pensamento reducionista. Isto é, questionar que não existe apenas
o que é certo ou que é errado, como se deve ou como não se deve fazer ou estudar algo, como
se fosse um pendulo fixo, ou seja, que não oscila, ficando fixo somente no lado esquerdo ou
no direito. Se considerarmos que não existe certo ou errado, ou ainda mais, se levarmos em
conta que para construção de um pensamento que supere esse reducionismo, devêssemos unir
conceitos de campos disciplinares diferentes, se considerarmos as histórias dos lugares,
questionarmos pressupostos já aceitos como verdades ouvindo as diferentes histórias do
cotidiano das pessoas, assim, uma ciência com traços diferenciados pode contribuir à
24
No primeiro tópico do capítulo 3 deste trabalho daremos atenção especial à importância do pensamento
complexo de Morin para esta tese.
25
Ver essa discussão no capítulo 1 desta tese. Ademais, olhar o quadro sobre políticas públicas e ação pública.
51
construção do conhecimento científico, sem necessariamente tornar o objeto um “ente” único
de apenas um campo, pois, deixando de ser pensado, meditado, refletido e discutido por
seres humanos, integrado na investigação individual de conhecimento e sabedoria, se destina
cada vez mais a ser acumulado em banco de dados, para ser depois computado por
instâncias manipuladoras, o Estado em primeiro lugar” (MORIN, 1996, p. 17)
Pensar ordenadamente as Políticas Públicas vistas somente com o olhar da
Administração Pública ou de qualquer outro campo do conhecimento, pode reduzir e
simplificar o estudo do objeto. Pensá-lo com incertezas dentro de uma ciência mais complexa
onde o conhecimento que se acumula é a soma do mundo vivido (Habermans, XXX), reflexo
do cotidiano (BERGER, XXX) onde a produção da realidade se por meio da reprodução
social (LEFVREV, XXX) no território em uso (SANTOS, XXX) em que a única certeza
teórica é de que a teoria se falsifica
Para Morin (1996) avançar para uma ciência complexa torna-se necessário resistir aos
métodos e técnicas aparentemente estruturadas e que se consideram donos do saber. Ainda
mais, o autor infere que a complexidade não deve ser um roteiro, mas uma forma de
humanizar as idéias considerando que o núcleo da complexidade não será alcançada jamais,
pois a cada novo preâmbulo de questionamentos e pensamentos, paradigmas mais complexos
surgirão e ressurgirão onde, em cada tempo, uma visão de mundo reaparecerá para
complementar ou mudar a anterior.
Portanto, para que haja uma evolução da ciência com maior complexidade torna-se
necessário: a) entender que no universo está presente a desordem (MORIN, 1996); b)
reconhecer como importantes o espaço e o tempo de cada lugar (Lefvre, XXX e SANTOS,
XXXX); c) reconhecer a simplificação e a universalização do saber, entretanto apontar seus
limites e neles avançar com o pensamento complexo (MORIN, 1996); d) entender que nas
relações de ordem a desordem está presente; e) entender que a unidade não se coloca sem a
totalidade e que a totalidade não existe sem as unidades, por exemplo, como o estudo de uma
determinada cultura que, para se construir, sofre influência de outras culturas formando uma
cultura só, para depois se reconstruir no espaço e no tempo; e) insular conceitos e demarcar a
ciência como um úncio território isola o objeto o tornando passivo às simplificações analíticas
(MORIN, 1996) Assim, podemos entender, então, que nos limites da simplificação a
complexidade se apresenta, ou seja, trazer a complexidade para o estudo é reconhecer que
fazer ciência com complexidade requer um esforço analítico que considere o empírico e a
lógica presente na desordem dando lugar a uma Scienza nueva. (Morin, 1991).
52
Podemos visualizar o pensamento complexo dessa “nova ciência” como um mosaico
de pensamentos construído de diversas cores, onde cada pequeno pedaço de cor se ordena na
desordem e na reordenação com outras cores, dando sentido ao todo. Assim, acreditamos que
a territorialidade enquanto categoria analítica pode contribuir para produção de um
pensamento complexo na Administração Pública, apontando novos caminhos onde os
gestures públicos reconheçam a importancia dos aspectos territoriais para a formulação de
Políticas. Entretanto, identificar esses aspectos é um desafio para nossa pesquisa, mas apenas
no que se refere as comuidades ribeirinhas estudadas aqui. No proximo capítulo apontaremos
a metodologia adotada para realizarmos o estudo sobre a territorialidade das Políticas públicas
em comunidades ribeirnhas.
53
Capítulo 3
O Método e os lugares
54
Este capítulo possui dois objetivos centrais: inicialmente, apontar o método de
pesquisa aqui abordado enfatizando de que forma estudar a territorialidade das políticas
públicas se torna relevante e coerente com o método em questão. Em seguida, descrever o
terreno geográfico dos estudos de casos fornecendo uma noção das dimensões territoriais,
culturais, políticas, econômicas e sociais por trás de uma realidade desconhecida para muitos.
Para atingir esses objetivos, inicialmente mostrafaremos aqui uma breve descrição
sobre a Amazônia Legal, o estado do Pará, os municípios de Santarém e Baião para, em
seguida, detalharmos o caso que nos propomos a estudar.
- A pesquisa do campo-tema
26
e a escolha do lugar da pesquisa
Para muitos, o título acima poderia ter uma conotação mais fiel à construção de um
texto tradicional se invertêssemos os termos, ou seja, “A escolha do lugar da pesquisa e a
pesquisa de campo-tema”. Entretanto, a noção de campo que adotamos em nosso trabalho se
difere da forma tradicional que considera campo apenas como o terreno físico da pesquisa.
Por tratar-se de um trabalho de caráter interdisciplinar, como colocado na
introdução, soma-se aqui o caminho de pesquisa pós-construtivista que trazemos da
Psicologia Social
27
, com o objetivo de entendermos por meio dos sentidos de nosso campo-
tema (SPINK, 2003) o que é a territorialidade das políticas públicas. (coloquei o “O” ali
porque sem ele a frase fica sem sentido, não fica muito clara, mas não sei se era isso mesmo
que você queria dizer)
Como orientador deste trabalho, um dos primeiros questionamentos que o Professor
Peter Spink trouxe para nossos encontros, e talvez o mais importante, foi: qual a relevância de
nosso trabalho para a academia e para o cotidiano das pessoas que se relacionam ou não com
nosso tema de pesquisa? A partir de então, procuramos nos preocupar, também, com a
utilidade prática do trabalho, o que nos fez procurar entender e pesquisar o que seria um
trabalho útil.
Assim, um novo caminho se apresentou para um método que se entrelaçou com nossas
preocupações iniciais de pesquisa, as quais ainda não estavam claras naquele momento.
Portanto, o conceito de “útil” foi o que mais nos preocupou inicialmente e nos instigou a
investigar, uma vez que para Spink (2003):
26
O Núcleo de Organizações e Ação Social – PUC-SP, coordenado pelo professor Peter Sink, fomentou o debate
sobre o que é pesquisa em Psicologia Social e o que é pesquisa de campo. Para saber mais ver SPINK (2003).
27
Cadê o texto desta nota de rodapé? Além disso, a referência dela está na página anterior e ela só aparece aqui.
55
Ser útil pode ser algo como o apoio ao debate ou, dado que nenhuma
teoria ou argumento viaja por conta própria (LATOUR, 1987), ajudar
os saberes e conhecimentos presentes a viajar para que outros possam
conectá-los com outras idéias e possibilidades dentro do processo de
coletivização. Pode ser também a contribuição de trazer outras vozes
para o debate, de mostrar outras posições e outros argumentos. A
contribuição que nós temos pra oferecer é provavelmente diferente em
casos diferentes e dificilmente os seus limites e alcances estarão claro
para nós. Mas é muito importante que não nos esqueçamos de
perguntar: “E daí? Por que isto é importante?”, “Por que estou aqui?”
(SPINK, 2003, p. 27)
Portanto, identificamos que nosso trabalho procura ser útil em quatro momentos:
a) o primeiro, quando reconhecemos que esta tese é uma construção coletiva, onde
colegas, professores e as pessoas que vivem nos lugares que pesquisamos são, de fato, os
construtores de nosso trabalho. Esse foi um dos motivos pelos quais escrevemos sempre na
primeira pessoa do plural, pois em todos os momentos, inclusive naqueles solitários, atores e
autores nunca se afastaram de nossas análises. O autor deste trabalho é apenas um
instrumento que procura materializar o que foi lido, visto, ouvido e sentido no campo-tema;
b) segundo, trabalhar no campo da Administração Pública com interdisciplinaridade,
inclusive no que diz respeito ao método, é uma resposta ao e daí?” daqueles que costumam
olhar apenas uma disciplina como a mais importante da ciência ou de seu campo, procurando-
a legitimar como a verdadeira dona do conhecimento. Para Spink (2003, p.26) Uma
disciplina é apenas uma disciplina; nem mais ou menos importante, superior ou inferior a
qualquer outra prática de análise e discussão instituída. É mais uma maneira de contribuir
para o dia-a-dia”.
c) além da interdisciplinaridade, procuramos por meio da multidisciplinaridade,
conectar os saberes do cotidiano dos ribeirinhos com os saberes das disciplinas acadêmicas
presentes aqui;
d) além de perceber a importância das políticas públicas como objeto de estudo
interdisciplinar e multidisciplinar, fazer parte desse campo-tema requer que nós,
pesquisadores, também, tenhamos o sentimento de pertencimento a ele, tornando-nos, em
alguns momentos, parte dele, e em outros, ficando a parte dele, com o objetivo de construir
uma análise próxima do cotidiano das relações sociais;
Além de procurar responder sobre a importância de nosso trabalho, entender o nosso
campo também é parte da metodologia aqui presente. Assim, campo também é o argumento e
o método que nosso trabalho se conecta e não somente o lugar ou os lugares que pesquisamos,
pois os lugares pesquisados são apenas uma das facetas da territorialidade do campo (SPINK,
56
2003). Nesses lugares, outros campos-temas também podem estar presentes, assim como
nosso campo-tema está, com certeza, presente em outros lugares. Isso pôde ser facilmente
vizualizado quando estávamos em nosso terreno de pesquisa, no “lugar” dos ribeirinhos, e
observamos um grupo de médico-pesquisadores estudando o comportamento dos
araquinídeos nas comunidades ribeirinhas do Tapajós, ou os arqueólogos, que por meio de
suas escavações investigavam as origens dos moradores daquelas comunidades. Por outro
lado, também podemos observar em outros “lugares” que passamos, como aldeias indígenas
ou populações urbanas, o estudo de políticas públicas nas mais diversas áreas, como na saúde,
educação, meio-ambiente, ou até mesmo estudando a territorialidade de grupos, como por
exemplo a territorialidade indígena na Amazônia Brasileira
28
, entre outros.
Assim, estar no campo-tema não é estar apenas no lugar ou no terreno da pesquisa,
mas inclui observar, antes mesmo de chegar nesses lugares, os debates teóricos, os conflitos e
consensos nos debates. Portanto, encontrar-se no terreno físico da pesquisa ou no “lugar” de
nossa observação não significa somente estar dentro do campo-tema, mas, também, ter uma
referência territorial densa donde possamos observar, anotar, ouvir, sentir, etc, os consensos,
conflitos, conexões e desconexões dos diversos atores pertencentes ao lugar (LONG, 2001;
SPINK, 2003), assim como tudo e todos que de alguma forma fazem parte do campo-tema.
Portanto, “campo é o campo do tema, o campo-tema (...) ” (SPINK, 2003, p. 36) e não
exatamente uma porta de entrada que defina nossa inserção no campo-tema das políticas
públicas, mas podem existir diversas portas e lugares onde o pesquisador possa entrar e estar
no campo, pois como mostra Spink (2003), não existe um palco único onde se possa olhar o
tema. Para ele, o campo-tema se mostra por meio da “causalidade intersubjetiva” em que sua
arena é conflituosa e permeada de “argumentos parciais, de artefatos e materialidades” (p.
36). Entretanto, vale ressaltar que essa complexidade de acontecimentos em um determinado
espaço e em algum tempo vai revelando, aos poucos, a territorialidade do campo-tema.
O campo-tema, como método e argumento, apontou maneiras de investigar a
territorialidade das políticas públicas em comunidades ribeirinhas na Amazônia, mesmo antes
de estarmos no terreno geográfico de pesquisa. Entretanto, qual o caminho percorrido para
mostrar a relevância do nosso campo-tema? Na verdade, no próximo tópico mostraremos os
instrumentos que nos foram úteis para continuar estudando nosso problema de pesquisa.
- Campo-tema: antes do terreno e a caminho do terreno
28
Ver os trabalhos de Paula (2003)
57
O leitor deste trabalho deve ter observado que nos inserimos no campo-tema a
algumas páginas atrás, que representam alguns anos, pois nosso método de investigação é
parte importante nesse processo. Aqui, então, imersos no campo-tema, mostraremos como
processamos nossa investigação antes e depois de tomar o avião e cruzar o Brasil até a
Amazônia Legal, ou seja, até pisar no terreno da pesquisa.
- Antes do terreno
De forma objetiva, os artefatos que utilizamos inicialmente não diferem muito de
outras pesquisas que estejam dentro de nosso campo. Lembramos, antes de partirmos ao
“antes” e “depois”, que mostraremos os tópicos em seqüência, mas os mesmos não
necessariamente aconteceram ordenadamente, pois muitos fatos se sobrepuseram, como, por
exemplo, a leitura de livros e a participação em projetos de pesquisa dentro do nosso campo-
tema.
Prosseguindo com o “antes do terreno”, em primeiro lugar procuramos revistar o que
havíamos estudado no curso de Mestrado realizado no Núcleo de Altos Estudos Amazônicos,
na Universidade Federal do Pará, no ano de 2000. Na oportunidade, estudamos os impactos
do processo de municipalização das políticas de saúde nos municípios de Baião e Cametá, do
Baixo Tocantins, no Estado do Pará, na Amazônia Legal. Procuramos, no trabalho, dentro de
uma visão insitutucionalista, verificar qual o nível de eficiência dos governos municipais
frente às recentes mudanças de municipalização da saúde no Brasil pós-Constituição de 1988.
Lembramos aqui que o objetivo não é relembrar nossa dissertação de Mestrado, mas como ela
está dentro do campo, apesar de não ser central (SPINK, 2003), facilitou-nos um repensar
sobre a forma como estávamos estudando nosso objeto.
Ademais, realizamos uma revisão bibliográfica sobre Políticas Públicas procurando
identificar o estado da arte sobre o assunto. Navegamos, também, em conceitos
desconhecidos até então para nós, tais como território, territorialidade, espaço, tempo e lugar,
procurando ter uma noção do tema nos campos da Geografia Política, Geografia Humana,
História, Filosofia, Sociologia e Economia.
Também nos aventuramos na literatura sobre estudos epistemológicos e
metodológicos. Descobrimos o trabalho do Professor Peter Spink, com o grupo de
pesquisadores da PUC-SP, sobre campo-tema.
O que nos levou a adotar tal método: primeiro foi a noção de campo que ele nos
mostrou, seguido da possibilidade de conjugar diversas maneiras e instrumentos de estudar o
problema de pesquisa dentro deste campo. Um exemplo disso é que de alguma forma
podemos conjugar o pensamento complexo de Morin (1996) ao método do campo-tema de
58
Spink (2003), com o objetivo de entendermos a construção da territorialidade das políticas
públicas sem um caráter reducionista, mas dentro de uma perspectiva pós-construtivista.
Além das inserções nas bibliotecas presenciais e virtuais, participamos de duas
pesquisas sobre nosso campo-tema, uma que objetivou estudar as políticas de
desenvolvimento local no Brasil, financiada pelo Banco Mundial junto ao CEPESP, e a outra
no CEAPG, que realizou um diagnóstico sobre a situação da criança e do adolescente no
semi-árido brasileiro, em parceria com o UNICEF.
Atualmente, estamos realizando uma terceira pesquisa, financiada pelo FINEP, que
tem como objetivo elaborar um sistema de monitoramento de políticas públicas no Brasil.
Estamos vinculados ao trabalho realizado na Amazônia legal Brasileira, realizando estudos
em municípios do Rio Tapajós que, por coincidência, também são um dos terrenos desta
pesquisa.
Ademais, um importante trabalho de orientação de iniciação científica foi realizado
por nós no primeiro semestre de 2007 sobre as políticas públicas em comunidades ribeirinhas
no Rio Tapajós. Portanto, novamente, o método adotado corroborava nossa inserção no
campo-tema que se mistura e conecta com o nosso cotidiano.
Ainda investigamos bases de dados, como a do DATASUS, IBGE Cid@des,
Microdados, sobre municípios brasileiros do IBGE, Atlas do Desenvolvimento Humano e
banco de dados do Programa Gestão Pública e Cidadania. Essa incursão nos foi útil para
tirarmos uma fotografia das políticas e ações públicas existentes no Brasil e começarmos a
construir nosso argumento sobre a negociação do conceito de políticas públicas colocadas no
capítulo 1. Entretanto, a carência de dados sobre Políticas Públicas na Amazônia,
principalmente de comunidades rurais, incentivou-nos a adotar uma postura qualitativa de
pesquisa no terreno.
Antes das visitas às localidades, procuramos identificar, como dito anteriormente, por
meio de pesquisas bibliográficas tanto presenciais quanto virtuais, atores que porventura se
relacionassem com as comunidades que pretendíamos visitar. No caso de Suruacá, no
município de Santarém, identificamos a ONG Projeto Saúde e Alegria, quando tivemos
contato com um relatório de pesquisa do Programa Gestão Pública e Cidadania da
pesquisadora Mônica Barroso (2004).
A ONG atende comunidades ribeirinhas do Rio Tapajós, nos municípios de Santarém,
Belterra e Aveiro, e trabalha com ações voltadas para a saúde curativa e preventiva, como
veremos no Capítilo 6 deste trabalho. Após a leitura cuidadosa do relatório, decidimos entrar
59
em contato com a coordenação do Projeto que, prontamente, nos auxiliou com informações e
documentos sobre as comunidades que habitam às margens daquele rio.
No terreno da pesquisa
No mês de julho de 2006 fomos, então, para Santarém sem uma comunidade ainda
definida. Partindo de São Paulo, levamos, em média, 6 horas viajando de avião para chegar
até lá. Chegando a Santarém, dirigimos-nos à sede do PSA, onde conversamos com o
coordenador da área da saúde, Ruy, que nos falou um pouco da região e da situação das
comunidades ribeirinhas que habitavam naquele território.
Encontramos na sede do Projeto, o ACS da comunidade de Suruacá, Sr. Djalma, que
estava realizando um treinamento. Aproveitamos a oportunidade e conversamos por cerca de
duas horas sobre as comunidades ribeirinhas e as dificuldades que a população destes lugares
tem para sobreviver.
Entretanto, percebemos na fala do Sr. Djalma a forma como sentia sua comunidade,
Suruacá, e seu sentimento de pertencimento ao povo ribeirinho: Eu sou ribeirinho, tenho
minhas dificuldades, mas eu dou os meus pulos, eu me viro. A nossa comunidade também!
Agente tem um posto de saúde que é mais ou menos, mas também agente tem um
telecentro, um sistema de abastecimento de água, treinamento, tudo isso que o PSA faz com
agente(Djalma, 2006, caderno de campo). Resolvemos, então, viajar até Suruacá com o
ACS.
Partimos do porto de Santarém em uma terça-feira no barco da própria comunidade.
Nossos custos de transporte entre Santarém-Suruacá-Santarém ficaram em torno de R$40,00.
Caso optássemos pelo barco de linha, pagaríamos o dobro.
No barco, observamos e conversamos com vários outros moradores e percebemos os
olhares estranhando nossa presença, que logo se transformaram em sorrisos e conversas. Na
comunidade, observamos a presença de projetos realizados pela ONG, em parceria com
Instituições Internacionais que poderíamos traduzir, incialmente, como ações públicas com a
anuência e participação da comunidade.
Durante nossa permanência nas comunidades nesse primeiro momento, preocupamos-
nos em deixar o canal de comunicação aberto para pesquisa, assim como identificar os atores
que pretendíamos entrevistar, uma vez que havíamos identificado em campo ações públicas
que aparentemente o Estado atuava timidamente. Isso também ficou claro por meio das falas e
conversas com os ribeirinhos.
Entretanto, em uma das noites na comunidade, ao organizar o caderno de campo,
observamos um forte relação entre aquela comunidade e a ONG e nos questionamos o quanto
60
aquelas ações se territorializavam naquele lugar e se a territorialidade daquelas ações não
tornariam a comunidade dependente e pouco autônoma frente à ONG.
Para pesquisar, então, essa questão, precisávamos olhar um outro lugar onde as ações
do Estado, materializadas em políticas públicas, incidissem sem o auxílio ou a presença de
uma ONG. Assim, ao retornar para Santarém resolvemos tomar o avião e ir para Belém, que
localiza-se a duas horas daquele município. Em Belém, começamos a buscar caminhos para
encontrar uma comunidade com características similares às de Suruacá, entretanto sem a
atuação de um ator tão presente no imaginário dos ribeirinhos. Retomamos, então, as
lembranças e anotações de nossa dissertação de mestrado que estudou o impacto das políticas
públicas de saúde nos municípios de Baião e Cametá
29
.
Relendo as anotações, encontramos a comunidade de Baixinha, às margens do Rio
Tapajós, habitada por ribeirinhos descendentes de quilombos e que não possuem relações tão
afins com uma Organização, como o PSA. Entretanto, as anotações eram sobre fatos
ocorridos no ano de 2000.
Partimos, então, em uma longa viagem para o município de Baião. Nesse caso, o
ônibus foi o nosso meio de transporte e o tempo de viagem foi cerca de 7 horas. Ao chegar ao
município, procuramos reativar nossos antigos contatos de pesquisa e, de imediato, alugamos
um pequeno barco para irmos até a comunidade de Baixinha. Sete anos depois, pouca coisa
havia mudado, principalmente a questão do acesso às políticas públicas e das ações setoriais
da Assossiação dos Remanescentes de Quilombos de Igarapé-Preto e Baixinha para a defesa
dos interesses dos remanescentes de Quilombos. Portanto, a primeira tarefa de selecionar as
comunidades em função dos interesses da pesquisa que emergiram em campo foram
cumpridas.
Observação Participante como postura de pesquisa no terreno
Utilizamos a noção de Observação Participante de William Whyte
30
(2005) como
postura de pesquisa em campo e como técnica de coleta de informações no terreno.O autor
aponta alguns contornos que contornos essências que caracterizam a observação participante a
qual adotamos, quais sejam:
a) negociação para entrar no terreno da pesquisa
29
ver em anexo cópia da parte do caderno que nos mostrou a outra comunidade
30
William Foote WHYTE. Sociedade de esquina: estrutura social de uma área urbana pobre degradada.
Tradução de Maria Lucia de Oliveira. Rio de Janeiro, Jorge Zahar, 2005. 390 páginas. Apesar dos estudos de
Whyte estarem direcionados para a área urbana, observamos que a postura da observação participante analisada
pelo autor se tornou útil no processo de construção de nosso trabalho, pois se conectou com o terreno de
pesquisa e com o campo-tema.
61
Nossa primeira aproximação com as comunidades, apesar de rápida, criou laços, o que
possibilitou nosso retorno mais vezes àqueles lugares. Entretanto, estar no terreno não
significaria que poderíamos retornar. No terreno, havíamos sido indentificados pelas
pessoas como “estranhos ao lugar”, pois para pertencer àquele lugar deveria existir um laço
mínimo de parentesco, como revelou dona Joana: Olha aqui seu Henrique, se o senhor
quiser morar aqui em Suruacá tem que casar com uma de nossas filhas. Então agente dá pra
vocês um pedaço de terra pra fazer a casa. Não pode entrar assim aqui não. O senhor só está
aqui porque é amigo do Djalma
” (Dona Joana, 2006 – ex-lider comunitária).
Em Baixinha, além do sentimento de pertencimento como ribeirinho, a fala das
pessoas revela que a terra é o simbolo do pertencer, pois, em vários momentos, ouvimos:
Tem que ser Quilombo ou descendente pra morar aqui. Mas a briga pela terra aqui também
é grande”.;
b) o desconhecimento do terreno
Não sabíamos o que nos esperava. Inicialmente tínhamos uma idéia do que seria estar
entre os ribeirinhos pois nossas pesquisas e contatos iniciais apontavam para um mundo
diferente do ponto de vista cultural;
c) Por que estar no terreno?
Nossa presença no terreno teria que ter uma justificativa para que fossemos aceitos
(WHYTE 2005, p. 301) pelas comunidades, entretanto não uma justificativa acadêmica, mas
uma razão que fizesse sentido aos interesses e sentidos das comunidades.
c) A verdade acima de tudo
Ser o mais franco possível com a comunidade mostrando os objetivos reais do que se
pretende no campo (p.304). Mostar claramente que existira uma relação de pesquisador
comunidade, sem ter a pretensão de ser a comunidade ou de fazer parte dela;
d) pessoa-chave no terreno
Ter uma pessoa-chave possibilita que o pesquisador ganhe tempo para buscar
informações e saber onde as conversas acontecem. Em nosso caso, no terreno de pesquisa, os
ACSs foram essas pessoas que conheciam os lugares das comunidades e sempre estavam
solícitos às nossas necessidades, inclusive nos hospedando em suas casas durante nossa estada
nas comunidades;
e) o pesquisador também é observado, mais ainda, monitorado;
Apesar de não se ter na comunidade meios de comunicações como telefones
residências e outros, o sistema de comunicação funciona muito bem via “pernas” onde as
pessoas sabem exatemante onde o estranho se encontra.
62
f) Willian Whyte (2005, pp 303-304) chama atenção que a observação participante
requer a habilidade do pesquisador em saber ouvir, olhar, sentir, ou seja, utilizar todos os
sentidos possíveis para captar cada gesto, entreolhares, palavras e sentimentos das pessoas
que encontram-se no terreno de pesquisa;
g) instrumentos de coletas de informações
A utlização e atualização do caderno de campo é fundamental para disciplinar e
desenvolver uma rotina de trabalho. Todas as noites, antes de dormir, revíamos e
atualizávamos nosso caderno, e anotávamos todas a s lembranças de mais um dia de coelta.
Muitas vezes no meio do dia, olhávamos algo, fotografávamos, mas mesmo assim
anotávamos tudo. Entrevistas formais podem ser dispensáveis nesse tipo de postura (WHYTE
p. 304), sendo que a coleta de informações podem ocorrer, também, por outras vias como
conversas em lugares de aglomeração de pessoas, imagens, participação em reuniões apenas
como observador, etc. Com os Secretários Municipais que entrevistamos na sede dos
municípios elaboramos um roteiro não estruturados com tópicos gerais (ANEXO XX) com o
objetivo de percerber qual a real importancia dada pelo poder governamental do muicípio aos
ribeirinhos.
i) Aprender com os erros
Olhar, anotar e descartar o que não deveria ser descartado. Aprender com isso faz
parte do processo da observação. Muitas vezes não anotávamos um determinado evento e, no
decorrer da pesquisa, nos esforçávamos muito para tentar lembrar, mas não reconstruíamos tal
como era. O aprendizado em anotar tudo e ficar atento aos fatos que nos rodeiam fazem a
diferença no momento da organização e análise das informações;
j) Seminário de devolução
Segundo Willian Whyte geralmente o pesquisador é cobrado pela pesquisa, ou seja,
qual o benefício que ela tratá à comunidade invistigada? Inúmeras vezes em conversas com
líderes comunitários ouvimos tal cobrança e, outras tantas éramos vistos como pessoas que
estavam na comunidade para levantar informaçãoes com o intuito de desenvolver e financiar
alguns projetos. Sempre deixamos claro que nossa função por sempre foi a de pesquisar,
mas nos compromentemos em ralizar um seminário de devolução em uma das comunidades,
ou seja, devolver às pessoas o conhecimento construído por meio da construção coletiva com
as mesmas
31
.
31
Nosso compromisso assumido foi somente com a comnunidade de Suruacá em função de restrições
financeiras.
63
- Coletando as informações no terreno
Não foi intensão em momento algum fazer parte de duas comunidades onde esse
sentimento de pertencimento tem certa variação. Procuramos adotar uma postura de
obervador em campo, utlizando nosso caderno de anotações como principal instrumento para
a coleta das falas.
Como mencionado anteriormente, em alguns setores das políticas públicas a
carência ou sobreposição de dados na Amazônia é crítica, principalmente quando procuramos
observar populações tradicionais da região. Nossas principais fontes de informação no terreno
de pesquisa foram os próprios ribeirinhos e suas lideranças locais. Para a escolha das fonts,
adotamos os seguintes critérios:
a) Identificação das lideranças formais
Lideranças comunitárias formais identificadas em campo, que em alguma medida
se relacionam com o poder governamental. Aqui consideramos os jovens que lideram grupos
da igreja, presidentes de associações, clube de mulheres, clube de idosos, etc.
b) Identificação de lideranças informais
Procuramos observar nas comunidades os locais onde homens, mulheres, jovens e
crianças se aglomeravam para, então, dirigirmo-nos até o local e, por meio da ajuda dos ACS,
conversar informalmente na tentativa de identificar os líderes informais.
Assim, percebemos que durante a manhã a maioria das famílias se dirigia para a
roça, retornava durante o almoço e, no fim da tarde, as crianças brincavam pelas comunidades
catando frutas e os homens e mulheres se reuniam para jogar futebol. No final da tarde,
dirigíamo-nos ao campo de futebol, parávamos debaixo das árvores em frente às casas ou
íamos à casa de alguém tomar um café e conversar. Procuramos, por meio das conversas,
verificar quem eram as lideranças informais.
c) Agentes Comunitários de Saúde
Esta escolha foi arbitrária. O motivo que nos levou a escolhê-los (se a escolha foi
arbitrária, fica estranho apresentar a explicação por escolhe-los. O que você quis dizer não foi
“o motivo que nos levou a inseri-los nesta pesquisa”?) tem duas explicações, quais sejam: a
primeiramente, por meio de nossa pesquisa bibliográfica (Outros atores e Lottar, 2006 –
dissertação de mestrado) identificamos a importância desses atores em comunidades carentes.
Em segundo, ao realizarmos uma pesquisa para o UNICEF
32
, os ACSs surgiram como um dos
32
Essa pesquisa foi realizada em 2006, pelo CEAPG da FGV/EAESP, onde participamos na condição de
pesquisador para verificar e analisar a situação da criança e do adolescente no semi-árido brasileiro. Para saber
mais sobre a pesquisa ver relatório em XXXXXX.
64
principais atores de conexão entre a comunidade e as políticas públicas, não somente as
políticas de saúde, mas também as de transferência de renda, em especial o Programa Bolsa
Família.
d) Pessoas nas ruas que se aproximavam espontaneamente para participar da
pesquisa.
Importante relatar que a curiosidade das pessoas em pequenas comunidades e a
vontade de serem ouvidas foi um dos fatores que facilitou o nosso processo de coleta de
informações. Antes mesmos de chagarmos às comunidades, seus moradores sabiam que
iríamos passar um período com eles. Isso aconteceu claramente em Suruacá, pois o ACS,
nossa porta de entrada na comunidade, antes de mais nada teve que pedir autorização para os
líderes comunitários para que pudéssemos conversar com as pessoas.
Para coleta de informações utilizamos duas estratégias: uma formal e estruturada e
outra informal. No primeiro caso, elaboramos um roteiro não estruturado, com tópicos gerais,
que nos permitisse abordar quatro questões de forma geral, não necessariamente na ordem
colocada a seguir, pois isso dependia muito do local que estávamos e com quem estávamos
conversando:
a) o ribeirinho falava de uma maneira geral do seu dia-a-dia, dos seus afazeres, da
família e relações com outros familiares e vizinhos;
b) abordava os principais problemas sociais e carências que ali estavam presentes;
c) informava como superavam as lacunas deixadas pelo mal atendimento do Estado
e a falta de acesso, na maioria dos casos, às políticas públicas. Não elegemos inicialmente
nenhuma política pública específica para tratar, mas deixamos as vozes do terreno de pesquisa
apontar quais possuem um acesso melhor e em quais o acesso é precário; e
d) identificava, em primeiro lugar: s ações públicas presentes no lugar dos
ribeirinhos, e; os atores sociais reconhecidos por eles como aqueles que tinham maior
importância em seus imaginários, ou seja, quando ligado ao acesso e ao atendimento das
necessidades sociais;
e) utilizamos aqui um quadro com o nome de alguns atores (EM ANEXO) para
observar com quais atores os ribeirinhos reconheciam como aqueles que mais os ligavam às
políticas públicas;
Em termos genéricos, em nossa incursão nos terrenos, os Agentes Comunitários de
Saúde, Presidentes das Associações mapeadas, lideres comunitários formais e informais,
alguns moradores, dentre esses incluindo crianças e adolescentes, foram ouvidos sobre as
condições de vida de cada comunidade, falando livremente sobre suas necessidades,
65
pretensões futuras e experiências do dia-a-dia. Discorreram sobre as dificuldades enfrentadas
no cotidiano, mas também as formas como as superavam ou, nas palavras dos próprios
ribeirinhos, a maneira como “
se viravam” para sobreviver.
66
A análise de interface como metodologia de análise
A metodologia de análise de interface de Norma Long (1999) se interconecta com
nosso campo-tema (SPINK, 2003) e com nossa postura de pesquisa antes e depois do terreno,
pois esta análise considera os diferentes saberes presentes no campo-tema não reduzindo ou
simplificando o conhecimento científico, ou seja, considera a complexidade (MORIN, xxxx)
existente na construção do conhecimento. A análise de interface se caracteriza por considerar
que os múltiplos atores em campo podem construir os sentido presentes dentro de um
determinado compo-tema.
67
- O caminho da pesquisa
Nosso estudo foi realizado na Amazônia, no estado do Pará
33
, em duas comunidades
ribeirinhas, sendo uma, Suruacá, localizada às margens do rio Tapajós, no município de
Santarém, e a outra, Baixinha, no rio Tocantins, dentro do município de Baião.
Optamos em concentrar nossas atividades no terreno de pesquisa na coleta de
informações por meio da fala dos ribeirinhos sobre o cotidiano e as demandas sociais dos
mesmos, observando, também, onde as políticas públicas estariam ou não presentes nos
lugares pesquisados.
Conseguimos captar, na medida do possível, por meio de cada conversa, formal ou
informal, entrevistas ou imagens do lugar, alguns aspectos desse cotidiano. Nesse sentido,
informações sobre a cultura local e as relações de poder presentes na territorialidade daqueles
lugares foram cuidadosamente observadas e consideradas.
- A Amazônia
Algumas são as concepções sobre a Amazônia que existem na literatura e no
imaginário das pessoas. A Amazônia é a maior floresta tropical do mundo, possuidora da mais
rica biodiversidade, que abriga 25% das espécies animais e vegetais do planeta, além da
riqueza cultural dos povos indígenas e das populações tradicionais, como por exemplo, os
ribeirinhos (LITTLE, 2002).
A Panamazônia ou Amazônia Continental, do ponto de vista da geografia física e do
ecossistema, possui 7.702.264 km² e dessa extensão 85% se encontra em terras brasileiras
(INPE, 2002). Dos países que a compõem, no Brasil a região amazônica corresponde a 61%
do território nacional, na Bolívia 51,63%, no Peru 58,79%, no Equador 28,35%, na Colômbia
33,36%, na Venezuela 42% e na República da Guiana, Suriname e Guiana Francesa essa
representatividade chega a 100% do território nacional.
Entretanto, para este relatório optou-se pela delimitação da Amazônia Legal, conforme
mostra a delimitação geográfica no mapa abaixo.
33
Gostaríamos de chamar a atenção que existe um movimento de determinados grupos de interesse em dividir o
Estado do Pará em dois, quais sejam: o Estado do Pará e o Estado do Tapajós. Caso isso ocorra, futuramente
uma das duas comunidades estudadas aqui, a comunidade de Suruacá, pertecente ao município de Santarém,
provável capital do Estado do Tapajós, não pertencerá geograficamente mais ao Estado do Pará. Mesmo que tal
fato ocorra, isso não inviabilizará os estudos aqui realizados, como veremos mais a frente, em função de que os
contornos da territorialidade das duas comunidades estudadas são muito parecidas do ponto de vista das
demandas e relações de poder como o Estado.
68
Fonte: ADA (2007)
Por meio da Lei 1.806, de 06.01.1953, a Amazônia Brasileira passou a ser chamada de
Amazônia Legal, fruto de um conceito político e não de um imperativo geográfico. Tal
definição foi elaborda pelo governo federal com o objetivo de planejar e promover o
desenvolvimento da região, partindo de uma lógica de definição top down.
Compõe a Amazônia Legal os estados do Acre, Amapá, Amazonas, Pará, parte do
Maranhão, Mato Grosso, Rondônia, Roraima, e Tocantins, totalizando 805 municípios, o que
representa 14,48% dos 5.561 existentes atualmente no Brasil. O Estado do Pará é o segundo
maior, concentrando 17,76% dos municípios da Amazônia Legal e 2,57% do Brasil.
(HEIDTMANN NETO, 2006) Para termos uma idéia dentro da amazônia poderíamos colocar
países como a Bolívia ou Argentina.
A Amazônia Legal pode ser caracterizada atualmente como um lugar urbano, com
elevada concentração das populações nas capitais (IBGE, 2007); entretanto, com uma forte
territorialidade rural representada por povos tradicionais, como os índios, seringueiros,
ribeirinhos e castanheiros que lutam pela ocupação de suas terras neste espaço e com sérios
problemas de pobreza rural.
O recente processo de ocupação da Amazônia, precisamente na virada do século XX,
mostra uma tentativa de imposição do governo federal em impor os ditames de um processo
de desenvolvimento baseado em uma estrutura capitalista, como aponta BECKER (1994, p.
10), mostrando que o Governo federal tem papel fundamental no planejamento e no volume
69
de investimentos em infra-estrutura”. Neste contexto de supervalorização do urbano sobre o
rural, inserem-se as comunidades ribeirinhas do Estado do Pará.
Nesse cenário, não se pode deixar de considerar que mesmo que alguns indicadores
demonstrem melhoras, como mostra a tabela 1, observa-se que a Amazônia Legal segue a
lógica nacional, ou seja, aumento da pobreza, aumento da renda e maior concentração da
renda, observada por meio do índice de GINI, que salta de 0,61, em 1991, para 0,64, em 2000.
Não se pode perder de vista, também, que a concentração de 91,68% dos municípios
da região possui até 50.000 habitantes e a maioria das pessoas que neles habitam depende da
lógica financeira em que os municípios estão inseridos atualmente, ou seja, depende de
repasses de programas federais e estaduais para se manter
34
pois, segundo SCHRER (2002),
as famílias que habitam locais com alta vulnerabilidade social dependem em parte dos
programas de transferência de renda.
Tabela 1 – Indicadores sócio-econômicos da Amazônia Legal (1991-2000)
Mort. inft(1) Analfbt(2) Renda(3) Gini (4) IDH (5)
Amazônia
Legal (UF)
1991 2000 1991 2000 1991 2000 1991 2000 1991 2000
Acre
41,9 30,4 38,9 29,6 144,7 180,7 0,62 0,65 0,624 0,697
Amapá
43,7 31,6 24,7 16,0 190,6 211,4 0,58 0,64 0,691 0,753
Amazonas
50,4 38,0 28,2 19,1 180,1 173,0 0,62 0,68 0,664 0,713
Maranhão
80,0 55,4 48,3 35,0 80,4 110,4 0,60 0,66 0,543 0,636
Mato Grosso
33,6 27,5 24,1 15,5 204,9 288,1 0,60 0,63 0,685 0,773
Pará
52,5 33,0 28,5 20,6 141,5 168,6 0,62 0,66 0,650 0,723
Rondônia
42,4 30,4 26,0 17,0 161,7 233,8 0,61 0,61 0,660 0,735
Roraima
49,3 33,8 26,3 17,5 252,2 232,5 0,65 0,62 0,692 0,746
Tocantins
63,6 44,2 38,0 24,0 125,9 172,6 0,63 0,66 0,611 0,710
Média
50,82 36,03 31,4 21,5 164,6 196,7 0,61 0,64 0,646 0,720
Fonte: Atlas do Desenvolvimento Humano
(1) Mortalidade até 1 ano de idade (por 1000 nascidos vivos)
(2) Nível Educacional da População Adulta (25 anos ou mais), 1991 e 2000
(3) Renda per capita Média (R$ de 2000)
(4) Mede a desigualdade
(5) Índice de Desenvolvimento Humano - IDH
34 Vale ressaltar também que desse universo de 805 municípios da Amazônia Legal, apenas 0,37%,
ou seja, um número absoluto de 3 municípios, possui mais de 500.000 habitantes e concentra a maior
parte da renda desta região (IBGE e Agência de Desenvolvimento da Amazônia – ADA. Consulta
realizada em 17 de maio de 2006).
70
Após a promulgação da Constituição de 1988, os municípios
35
brasileiros foram
considerados entes federativos autônomos e a todos eles foi dada autonomia de gestão, o que
na vida cotidiana da Administração Pública municipal significou graves problemas gerados
pelas crises internacionais
36
, a crise financeira da União e dos estados, alinhados com a falta
de capacidade técnica, administrativa e, principalmente, fiscal dos municípios. Assim, nota-se
que do ponto de vista financeiro, boa parte dos municípios brasileiros, principalmente os
menores, tornaram-se reféns das transferências de verbas federais e estaduais.
Na Amazônia, a situação se agrava, pois a maioria dos municípios, como
mencionado, depende de transferências de recursos públicos em virtude da baixa capacidade
de geração de receita própria que, em tese, seria oriunda da arrecadação de impostos como o
Imposto Sobre Serviços (ISS) e o Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU). Outro
problema grave na região é a questão da preparação de quadros técnicos para gerenciar os
recursos financeiros, humanos e ambientais.
Em suma, na Amazônia os governos encontram grandes dificuldades de gerir todo o
potencial existente na região, o que parece aprofundar ainda mais os problemas da pobreza na
região. As estratégias convencionais de desenvolvimento (...) não atendem às exigências do
desenvolvimento sustentável.”( GUTBERLET, 2002, p. 171), pois os problemas dos
municípios amazônicos precisam ter soluções localmente identificadas, sem deixar de levar
em consideração outras relações, como as intergovernamentais, internacionais, etc, que fazem
parte do cotidiano da gestão da
rés pública (GUTBERLET, 2002) e impactam diretamente no
cotidiano das comunidades mais pobres.
Vários são os estudos que têm a Amazônia como foco. No entanto, Becker (2004)
lembra que a maioria deles se concentra em questões ambientais, ecológicas, estudos sobre
biodiversidade, mineração, entre outros (BECKER, 2004). Parece haver poucos estudos sobre
a Amazônia na área da Administração Pública, no que se refere à territorialidade das políticas
públicas e sua relação com o desenvolvimento. Tais estudos não são inexistentes (SCHRER,
2004), porém as áreas de conhecimento em que esses estudos se concentram são, geralmente,
a Economia, o Serviço Social, a Sociologia, entre outros, passando ao largo da Administração
Pública. Isso não quer dizer que de alguma forma esses estudos realizados não se coadunem
35
Observando-se o número de municípios por habitantes, verifica-se uma grande concentração de
municípios com até 50.000 habitantes na Amazônia Legal, o que representa um total de 91,68%
desta região e 13,27% em relação ao Brasil. Mesmo que o número de municípios de grande porte
seja inexpressivo do ponto de vista absoluto, apenas 3, esse pequeno grupo concentra a maior parte
da renda per capita da região, seguindo a lógica nacional. (IBGE e Agência de Desenvolvimento da
Amazônia – ADA. Consulta realizada em 17 de maio de 2006)
36
Ver nota de rodapé número 10.
71
com a Administração Pública, muito pelo contrário, pois por meio da interdisciplinaridade
isso acontece, uma vez que a área de estudos da Administração Pública passa a considerar
questões que convencionalmente são tratadas por outros campos, como, por exemplo, a
questão da territorialidade, que tradicionalmente é tratada por áreas como a Filosofia e a
Geografia.
72
Conhecendo os Municípios dos lugares da pesquisa: Santarém e Baião, no Estado do
Pará
A seguir, serão caracterizados os 2 (dois) municípios foco desta investigação: Santarém e Baião. Esses
municípios, situados no Estado do Pará, estão localizados conforme o mapa abaixo:
73
-
O município de Baião
O município de Baião
74
Capítulo 4
Um estudo sobre a territorialidade das Políticas públicas em
Suruacá e Baixinha
75
Estrutura dos casos
76
Comunidade de Baixinha:
A Comunidade de Baixinha encontra-se territorialmente inserida dentro do Município de
Baião, que se localiza no nordeste paraense, mais especificamente na micro-região de Cametá,
a qual é composta também pelos municípios de Abaetetuba, Cametá, Iguarapé-Mirim,
Limoeiro do Ajurú, Mocajuba e Oeiras do Pará, conforme visualizamos no esquema abaixo.
Esquema demonstrative 1 – Município de Baião
Escala: XXXXXXX
O município de Baião tem área total de 3.758.273 km² com uma população de 21.119
habitantes (IBGE, 2000), dos quais 10.865 na área urbana e 10.254 na área rural (IBGE
2000). A sede encontra-se as margens direita do rio Tocantins a uma altitude de 30 metros
acima do nível do mar. Além de recentes melhorias nas estradas que ligam o município de
Mocajuba a sede do município de Baião, o rio Tocantins ainda é o principal meio de
transported a região, como aponta a ex-Secretária de Saúde do município:
As estradas estão melhorando, mas ainda é insificiente para
transporter mercadorias por aqui. Tem os ônibus, mas ná época
de chuva agente fica meio enrrascada porque quando chove
muito a Estrada alaga muito e não dá pra chegar aqui no
município. Mas foi pior. Como agente precisa muito das
coisas que vem de Belém e Cametá o rio ainda é um acesso
melhor. Agora para ir para o interior agente tem que ir de
rabeta mesmo (Depoimento da ex-secretária de Saúde do
município de Baião, 2006)
Micro Região de Cametá
77
Tanto de Barco quanto de ônibus para chegar na comunidade de Baixinha, saindo de Belém,
necessariamente passamos pela sede do município que. Segundo pesquisa que realizamos no
Google Maps (2007) a Capital do Estado está em linha retal distante cerca de 200km de sede
do município. Para termos uma idéia, em termos comaprativos, saindo do centro de São Paulo
para o município de XXXXX com uma velociadade media de 80km/h, sem transito e
considerando as paradas obrigatórias de pedágios, levamos em media três horas de viagem, ao
passo se opatarmos em sair de carro ou de ônibus, no verão, de Belém para Baião, a viagem
varia de quarto a seis horas, no verão, e de 8 a 12 horas, no inverno, em função das condições
da Estrada. Existe também dois barcos que fazem viagens semanais saindo de Belém até
Baião, numa viagem de aproximadamente 12 horas.
Em termos político-partidário o executivo municipal é administrado pela Prefeita Benedita do Pilar
Lobo Dias do Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB), que foi eleita pela Coligação
PT / PTB / PMDB / PL / PFL / PSB / PC do B. Conforma mostra o quadro abaixo o PMDB é o partido
com maior representação no município com dois vereadores eleitos na últim,a legislatura
QUADRO XX - Composição da Câmara Municipal - Resultados da eleição 2004:
Cargo Município Partido Candidato Votos Nominais Situação Coligação
Vereador BAIAO PSL AJAX DA PAIXÃO SANTOS 466 Eleito PP / PSL / PSDB
Vereador BAIAO PT ELPIDIO DA GLORIA TORRES 371 Eleito PT / PC do B
Vereador BAIAO PMDB GERSON LIRA BARROS 425 Eleito por Média
PTB / PMDB / PL
/ PFL / PSB
Vereador BAIAO PT do B HOMERO DE FARIAS RIBEIRO 263 Eleito PPS / PT do B
Vereador BAIAO PMDB VANDERLEI DA SILVA GOMES 438 Eleito
PTB / PMDB / PL
/ PFL / PSB
Vereador BAIAO PTB
JOSE FREDSON DOS REIS DE
OLIVEIRA 543 Eleito
PTB / PMDB / PL
/ PFL / PSB
Vereador BAIAO PSDB
JOSE HAROLDO LEITE DA SILVA
DE BRITO 386 Eleito PP / PSL / PSDB
Vereador BAIAO PDT RONILSON DOS SANTOS LOPES 624 Eleito (sem coligação)
Vereador BAIAO PSB JOÃO CORREA DE NAZARE 428 Eleito
PTB / PMDB / PL
/ PFL / PSB
Resultado da Eleição - 1° turno
UF (PARA) - Município (BAIAO) - Cargo (VEREADOR) - Situação (ELEITO,ELEITO POR
MÉDIA E 2º TURNO) - Partido (TODOS)
1~9 de 9 - Última atualização em: 03/04/2007 - Dados sujeitos a alteração
Fonte: Site do TSE http://www.tse.gov.br/internet/index.html consultado em dezembro de 2007.
Na área educacional, segundo dados do IBGE (2006) o município conta com 76 escolas de ensino
fundamental distribuídas em seu território, sendo 75 sob responsabilidade do município e apenas uma
privada. Na sede está localizada a única Escola Pública de ensino médio, porém não existindo
nenhuma do setor privado. Os números apresentados não representam qualidade no processo
78
educacional, pois a situação é mais grave do que se imagina no município, desde a questão da
descontextualização do ensino até as precárias condições da infra-estrutura das salas de aula, como
aponta o Sr. Carlos, comerciante e antigo morador do município a mais de 40 anos:
Acho que a única escola boa mesmo hoje aqui é a de segundo grau. Se
tu fores para o interior a situação ainda é bem pior. Eu recebo muita
gente aqui no meu comércio que vem comprar coisas aqui e vem com
os fiulhos que deveriam estar na Escola. Agente pergunta como vão as
coisas, porque o menino não ta estudando e a resposta é qu não tem
professor, o gerador ta quebrado, não tem merenda. A coisa é preta aqui
rapaz (Sr. Carlos – Comerciante da sede do município)
Na área da saúde o município não se difere muito da educação, pois é insuficiente o número de
profissionais para atender a demanda de todo o município. Segundo o Cadastro Nacional de
Estabelecimentos de Saúde – CNES, atualizado em 2 de dezembro de 2007, Baião conta com um
número total de 10 enfermeiros e 10 médicos, todos vinculados ao Programa Saúde da Família. O que
parece amenizar a situação dos moradores, principalmente no interio é a presence dos ACS, que
Segundo a Coordenadora local do Programa “ é a salvação da lavoura, porque se não fosse eles eu
nem saberia o que seria daquele povo.”.
Entretanto, os municípios que compõem a Amazônia Legal continuam sendo um verdadeiro
mistério, principalmente na área da saúde, pois além de reduzido número de bases de dados,
os dados gerados não são confiáveis. Hinton Silva (2006) mostra que
A amazônia continua a apresentar o Segundo mais altos indice
do país de mortes por “causas mal definidas”, isto é, não
identificadas pelo medico que assinou o atestado de
óbito(CFM, 2005; JATENE et al., 1993), perdendo apenas
para alguns casos dos estados do Nordeste. Isto indica que as
pessoas morrem antes de conseguir acesso a qualquer tipo de
assitência médica (SILVA, 2006, p. 80)
Apesar de nosso trabalho ser de caráter qualitativo, procuramos levantar alguns dados para
procurer entender onde a comundade em estudo está inserida para tirarmos uma fotografoia da
situação atual do município. Porém, essa fotografia parece distorcida pela falta de dados ou
pela dúvida na questão da confiabilidade nos mesmos. Com isso, unir o saber científico e o
saber dos lugares pesquisados é fundamental para analisar a territorialidade das políticas na
região, como se colocássemos uma lente de aumentos para melhor ver uma pequena parte
dessa fotografia. . No próximo tópico aprenstaremos essa parte chamada comunidade de
79
baixinha tomando como referência as representações sobre o cotidiano dos atores e moradores
que conversamos e entrevistamos.
80
A caminho da comunidade de Baixinha
Ao chegar em Baião, via rio, fretamos uma rabeta até à área da comunidade de Baixinha que
levou em média uma hora. Também poderíamos ir pela Estrada, pela Transcametá, entretanto
nessa situação, deveríamos partir do município de Cametá para a comnunidade que levaria em
media 8 horas de viagem no verão. A temperature média mensal varia, emq ualquer estação,
entre a mínima superior a 18°C, e maxima de 32°C, sendo que a amplitude térmica não
ultrapassa 5°C. Entender sobre o ciclo das chuvas na comunidade é de extrema importância
pois ela tem relação direta com o transporte e saúde dos ribeirinhos, conforme aponta o ACS
da comunidade:
“Quando chove por aqui o negócio piora um pouco. O água fica ruim, o rio
sobre e as crianças adoecem mais. A água não é potável e agente não tem um sistema de
tratamento”.
Os meses de de fevereiro a abril as chuvas ocorrem com muita frequencia, sendo
que este ultimo chega a registrar um índice pluviométrico de 44,1 mm. O mês de novembro é
o que registra o menor indíce, sendo de apenas 9 mm. Para nós, entender a lógica de vida de
um ribeirinho não simples, pois o tempo é sentido pela ída e vinda das chuvas e pelo estado
do rio.
O relevo é composto pela presença de terral relativamente altas se comparado com o nível do
rio com um terrace relativamente alto, sendo que para se chegar em terra firme na
comunidade é necessário subir uma escada com aprocimadamente 100 dégraus. Esse ponto
nos levou a curiosidade de entender o motivo pelo qual a comunidade se chama baixinha,
onde encontramos a seguinte explicação de Preto, presidente de uma associação local:
Agente não sabe ao certo, mas aqui tudo é o contrário. Não sei porque o nome é Baixinha se
para chegar a qui agente tem que subri um bom pedaço de escada (rindo)
A altura da
cominidade em relação ao rio é de aproximadamente uns 30 metros, alcançando em algumas
outras comunidades, Segundo Zé Preto, 35 metros. A terra firme, ou seja, o solo tem,
Segundo técnicos da EMBRAPA que estavam presentes no município na época da pesuqisa,
baixa reservas de nutrientes minerais, elavados teores de alumínio e e
está relacionado,
geologicamente, a sedimentos areno-argilosos do quaternário e terciário”, isto é, podemos
dizer que o solo é arenoso onde torna-se necessário cuidados especiais para a produção
agricola. A estrada desta cominidade, o rio Tocantins, é navegável por empbarcações de
pequno porte e sua água é utlizada pelos ribirinhos para o banho, para lavar roupas e diversão
da populaçõa local..
81
Além do Rio, a area onde localiza-se a comunidade é de floresta densa, com cobertura de
dicersos tipos de árvore com frutos variados e troncos, como maçaranduba, faveira, tachi,
cupiúba, angelins e castanheiras, todas essas caracterizadas pela comunidade comos seu lugar,
ou seja, a comunidade é o lugar do Rio e da mata (SHERER, XXXX).
Do ponto de vista adiminstrativo a comunidade de Baixinha está vinculada ao
município de Baião, como dito anteriormente, entretanto vale salientar que em conversa
com o presidente do sindicato rural local e com o ACS a impressão que se tem é que tal
vinculação está atrelada apenas do ponto de vista jurídico legal, pois no dia-a-dia
a
comunidade não tem o apoio necessário da prefeitura e eles aparecem aqui somente
noperíodo de eleição. Agente tem que se virar por aqui.”
Essa breve descrição mostra o
ambiente em que se inserem os ribeirinhos da comunidade de Baixinha em que se incerem e
formam a territorialidade das Políticas Públicas da Comuidade de Baixinha. De acordo com
nosso trabalho de campo, identificamos algumas areas de importância para os próprios
ribeirinhos e a partir do cotidiano dos mesmos circunscrevemos algumas areas para mostrar
por meio do cotidiano os contornos da territorialidade das políticas públicas presentes na
comunidade.
Considerando os depoimentos dos atores e moradores, mostramos a seguir as representações
sobre o cotidiano no que se refere ai dia-a-dia da comunidade o que nos levou a selecionar as
políticas públicas de maior importancia para eles.
82
Comunidade Quilombola Ribeirinha
O Pará é um dos estados que mais emitiu titulações de terras às comunidades o que, Segundo
CASTRO (XXXX), se deve pelo fato, em primeiro lugar, da maneira como as entidades se
organizaram para pressionar as organizações governamentais. Em função de tal pressão, os
loegisladores incluíram na Constituição Federal, por meio do art. 68 do ADCT da
Constituição Federal o direito consagrado a terra aos remanescentes de Quilômbos. Ademais,
a lesgislação Estadual serviu de base para a foprmulação do artigo constitucional em questão.
A comunidade de Baixinha é predominantemente composta por famílias remanescentes de
Quilombolas, somando um total de 64 famílias sendo que somente uma não pode ser
considerada remanescente, Segundo dados fornecidos pela Associação dos Remanescentes de
Quilombos de Iguarapé-Preto e Baixinha – ARQIB.
A comunidade de Baixinha faz parted a ARQUIB foi criada em 19 de outubro de 1999 como
forma de defender os interessas dos remanecentes de Quilombos Presentes na região. Sendo
uma mulher sua primeira presidenta, a Sra. Deodata Baia Machado Ramalho, uma das
principais lideranças de Igarapé Preto, comunidade que fica a curta distância de Baixinha.
Segundo o Estatuto da ARQUIB seu objetivo é adquirir e defender os direitos quilombos da
região no que se refere a questõa fundiária.
Segundo ZECA Preto, lider comunitário de Baixinha e remanescente, além da ARQUIB,
atores importantes como a Igreja Católica, Sindicatos Rurais, Insitutições de Ensino Sperior, e
pessoas ligadas á questão agrarian e Quilombos, também compuseram e compõem esse
quadro de lutes e constuistas em toda a região do baixo Tocantins: Eu lembro bem como foi
o processo de luta.O pessoal da Igreja que começou e nós mesmos sentimos que agentee
podia perder nossa terra aqui. vieram uns pesquisadores da Universidade que nos
ajudaram com alguns contatos em Belém. Mas o pessoal da medeira é F… e de qualquer jeito
eles queriam nos intimidar. Eles vinham por aqui e prometiam mundos e fundos pra gente e
queriam pra gente não se mobilisar. Ameaçaram agente de morte e até tentaram comprar o
pessoal do ITERPA .”.
[LITTE]
83
O dia-a-dia
-Das crianças
A escola e o trabalho fazem parte da dinâmica de vida das crianças na comunidade de
Baixinha. Em conversas com 4 crianças da comunidade procuramos saber como elas vivem e
o que fazem. Ana, Pedro, Thiago e João
37
falaram de uma meneira geral que suas rotinas o
marcadas pelas aulas, quando elas acontecem, assim como suas atividades na roça com os
Pais, como mostrou Ana: Agente acorda cedo, thiago, vamos pra Escola; depois vem pra
casa e vamos almoçar. Agente brinca na Escola e de tarde agente ajuda nossa mãe em casa.
De tarde agente brinca e vai pro Igarapé brinca, come de novo ajuda nossa mãe e depois
dormi. Thiago, de 12 anos, complementa, afirmando que também, as vezes, vai ajudar o Pai a
roça quando é preciso e quando tem energia gosta de ver programas de televisão. Geralmente
as meninas ajudam no cuidar da casa e arrumação, enquanto os meninos acompanham os pais
no roçado no trato da mandioca entre outros plantios.
- Das Mulheres
As mulheres vivem seu cotidiano em função dos afazeres domesticos e do dia-a-dia da escola
das crianças, quando, em alguns caso, não ajudam seus esposos na roça. Um dos depoimenos
nos mostra que: Minha vida é aqui nesse lugar (falando da sua casa) cozinhando e cuidando
dos meninos. Acordo cedo, prepare o café, arrumo os meninos pra aula, faço o almoço, cuido
da casa e quando meuesposo volta faço a janta.
Em uma outra fala: Eu fico muito sozinha a
maioria do tempo cozinhando. Acho bom quando vou com a comadre pro rio lavar rou
quando é preciso e as vezes vou pra roça pra ajudar na mandioca.
Nesses lugares o
conceito de tempo é diferente de outros lugares que não sejam dos ribeirinhos, pois é o
acordar da criança pr ir a escola, o almoço quando o marido chega a conversa Fiadano
final da tarde em baixo das arvores e que mostram um outro tempo e um outro espaço, como
mostra uma outra moradora: quando eu vou na cidade tem que ir cedo, porque depois o
sol cai e agente tem que voltar com o horário do barco. Se perder tem que esperar mais
ainda”.
- Dos Homens
A rotina dos homens parece mostrar explicitamente como os tempo do Ribeirinho é diferente
do tempo do morador da sede. Zeca Preto brinca com a situação apontando o seguinte: Todo
37
Muitas crianças entrevistadas têm seus nomes ralacionados a persoangens biblíblicos. Talvez uma das
explicações para isso é a inflência que a Igreja exerce nas comunidades da região.
84
mundo acha que agente é preguiçoso. Eu acordo com o sol, vou pra roça cuidar da pimento e
da mandioca, volto pra almoçar, deito um pouco, e as vezs eu volto. Mas depois quando o sol
caido egente vem pra
(Um casa no meio da comunidade como se fosse uma espécie de
maloca)
e agente fica com conversa fiada. (risos). De noite agente dorme cedo, porque tem
cedo com sol no outro dia.
A casa de farinha também faz parte do cotidiano dos homens. A farinha é um produto gerado
da mandioca, considerada um dos principais produtos da comunidade. As casas de farinha na
comunidade são rústicas, como aponta um morador:
Nós plantamos a mandioca, colhemos e trazemos pra cá. Aqui
agente
(Homem, mulher e as vezes criaças) descasca ela e moí
(Apontando para uma especial de triturador de mandioca
movido pelos próprios braços dos Homens). Depois de moida
agente coloca no tipití
38
e lava pro forno alí. Depois agente
mexe a massa até esfarelar e vira farinha (Olhando para a
farinha com orgulho). Ah, o clado que sai do tipití agente faz
tucupí e vende também. Mas agente também usa.
A casa de farinha se apresenta como um lugar dentro da comunidade onde algumas vezes o
homem, a mulher e as crianças, parecem se reunir para a produção da farinha. As casas de
farinha são rusticas sendo em sua maioria equipadas com um forno feito de barro com uma
chapa de ferro onde a massa da mandioca é jogada para o prepare da farinha.
O cotidiano dos homens parece ser um pouco diferente do das mulheres e crianças pela
sazonalidade das atividades, ou seja, não se ocupam somento com o roçado, desnvolvendo
outras atividades como a pesca. Carlos e Mário já não se consideram somente da roça, mas do
rio, ou seja, pescadoreso que de acordo com o tempo das chuvas eles desenvolvem suas
atividades. Agora o peixe tá difícil, porque a barragem de Tucuruí foi que prejudicou a pesca,
então agente tem que fazer outras coisas também. Mas agente tem que se errumar com o
novo costume dos peixes. Como tem pouco agente tem que saber onde eles estão.Antes agente
tava com fome era jogar a linha no rio que o peixe vinha, agora não mais assim.
Portanto, a mudança desse cotidiano parece que também foi influenciado pelos impactos da
construção da Barreira da Usina de Tucurí que alterou a salinidade da água e o tempo dela.
39
- Da comida no cotidiano
A variação da alimentação fica nítida desde as próprias proposições do cotidiano dos homens
como vimos no terreno de pesquisa, até a própria alimentação servida durante nossa estada na
comunidade. Comemos farinha, peixe e carne. A farinha é servida como acompanhamento do
38
Uma prensa para secar a massa que foi moída.
85
açai, do feijão e do arroz, estes últimos comprados em pequenas vendas na própria
comunidade ou trazidas da sede do município. A carne é trazida do da sede do município que
mantém um abatedouro as márgens do rio Tocantins, ponto de profunda profunda discussão
entre as comunidades, pois o sangue do abate desce diretamente para o Rio poluindo a água e
prejudicando a alimentação dos ribeirinhos, como aponta o Sr. Mário , pescador residente em
uma comnunidade chamada Vila Marariá, que visitamos em 20/7/2007: “O Matadouro de
baião também polui a água. Vem muito sangue de lá e polui os peixes.”.
No que se refere a alimentação observamos também o consume de produtos enlatados
trazidos da sede, como por exemplo a sardinha em lata, salsicha, entre outros produtos
industrialoizados. A Sr.a. Maria argumenta que
“quando agente quer um sabor diferente
agente como isso.”.
- O lazer no dia-adia
O futebol, a Igreja, a bebida e as festas religiosas são consideradas lazer para os ribeirinhos de
Baixinha. O campenato realizado entre as comunidades e a festa religiosa da comunidade é o
momento em que há um número maior de pessoas presentes na região. Para seu antônio “eu
me divirto muito quando tem as festas e a bola. Meus meninos jogam e eu tomo uma pinga.”
Pelo método da observação simples e despretenciosa, observamos o consume e demasiado de
cachaça e rum na região, sendo esta prática cosiderada um lazer. Armindo aponta que:
Agente trabalha muito e depois pra se diverti toma uma cachacinha (sorrindo) . E quando
agente vai pescar pra espantar os carapanães
40
também leva um tubo (garrafa) de cachaça.”
A comunidade também possui uma Igreja católica que é a considerada, além de uma religião,
um local de diversão das mulheres. As festas religiosas também são consideradas pela
comunidade como um tempo de diversão, onde várias outras pessoas das demais comunidades
também participam. Nesse período o consume de alcool parec aumentar. Seu João afirma que
: Quando agente coloca Rei
41
- Problemas do cotidiano
39
Para saber mais sobre os impactos da construção da Barragem da Hidrelétrica de Tucuruí ver XXXXXXX
40
Carapanã é uma espécie de pernilongo.
41
“Colocar Rei” é uma espécie de comemoração onde os Homens se reúnem e andam pela madrugada, de casa
em casa, cantando e pedindo dinheiro ou bebida. Quando não são atendidos começam a gritar e cantar totalmente
desafinados na frente da casa que não os acolheu. Tivemos a oportunidade de participar de uma “tirada de Rei” e
observar como a tradição é levada a sério pela comunidade. Poderíamos dizer que é uma espécie de Halowin
ribeirinho, porém para adultos.
86
Não existe um agrande problema, mas preocupações pontuais que ao serem somadas tornam-
se tão relevantes quanto um grande problema identificado. Os adolescents apontam a faltnão
tem muito o que fazer, agente as vezes ajuda na roça ou agente vamos jogar bola ou pra
outras comunidades com os amigos.Samuel, de 17 anos, com o Segundo grau imcompleto
fala que agente não tem nada pra fazer. Não tem um projeto que incentive agente. A
prefeitura nem aparece aqui.Eles vem aqui na época de eleição.”. Os pais demosntram a
preocupação apontando que os juvens não querem se envolver nas atividades da Igreja e
começam desde cedo a ingerir bebidas alcóilicas, como bem lembra a S.a Joana:
Os meninos
não tem muito o que fazer aqui. Vão jogar bola, se mete com bebida e logo cego arrumam um
menino. Eu tenho 5 filhos que já tá tudo encaminhado, mas que me deram muito trabalho.
As mães com as quais conversamos apontam que os problemas mais comuns envolvem seus
maridos e filhos, principalmente quando estes se envolvem com bebidas alcólicas. Ademais,
as brigas entre jovens, questões de saúde e financeiras, são as que são apontadas por elas
como as que lhes causam mais problemas.
Probelmas que foram apontados como a da ausência de peixe são complementados pelos
trabalhadores com os projetos que o Governo do Estado procura implementer nas
comnunidades sem que estes possuam uma cadeia de produção, como a produção de mel que
fica na própria comunidade pela falta de um sistema de distribuição. Zeca Preto coloca a
questão da seuinte maneira: O pessoal vem aqui, coloca pra comunidade a idéia, agente
cede, produz, mas agente não tem pra quem distribuir. A produção fica toda a e aentão não
adianta nada”.
O ACS da comunidade mostra que depender da sede do município para cuidar do Posto de
Saúde e da Escola , provoca um sentimento de incapacida em seu trabalho, pois sem o apoio
necessário dop poder público seu trabalho é pormenorizado e mal visto pela comujnidade:
Eu não tenho apoio da Prefeitura. Nosso posto de saúde esta e continua fazendo uma
brincadeira da relação da prefeitura, com a comunidade no que se refere a questão da saúde e
educação, “Aqui é uma fartura (ACS sorrindo), farta tudo, farta gente pra trabalhar no posto
de saúde, farta remédio, farta manutenção da escola (continua rindo muito) é uma fartura
só.”. Além desta questão, o ACS mostra a dificuldade que as pessoas da comunida tem para
receber os valores referents a aposentadoria e Bolsa-família, pois o sistema de transporte não
é eficiente e as vezes não se consegue receber os benefícios na sede do município, tendo que
muitas vezes ter que deslocar para o município de mocajuba.
- Morar na comunidade
87
Segundo Zeca Preto e Adilton Alves Afonso (ACS) a maioria das famílias moram na
comunidade a mais de 30 anos. Pertencer a Baixinha, ou seja, se identificar com a
comunidade, mostram alguns lados dos quais destacomos dois, conforme relata Zeca Preto:
Morar aqui é bom e num é. Aqui agente sossegado, não tem aqulea correira de Belém ou
Baião. Aqui nós temos o peixe e as frutas da mata, mas não tem o que fazer. Os meninos
ficam sem fazer nada, começam a beber cedo, emprenhar a meninas por (Zeca Preto
comaça a rir)
. Se tivesse uma atividade cultural, uma biblioteca, apoio mesmo dos politicos,
acho que seria diferente. Mas sabe o que é também, a comunidade não quer se mobilizar,
agente chama pra reunião pra decide as coisas e niunguém vem”
Adilton comeplementa a fala de Zeca Preto afirmando que “Morar aqui ficando ruim.
Antes era jogar o anzol e peixe vinha. Com a represa agora até a comida difícil. Agora
o Zeca tem razão, esse pessoal daqui é muito desmobilizado.”
Ao ouvir as mulheres, quarto moradoras jovens da comunida, Célia (15), Maria (14), Nadir
(16) e Nilda(12), mostram sua insatisfação em morar na comunidade. Célia argumenta que
Não tem nada pra se fazer aqui. Agente gosta de ire m Baião”, sendo complementada por
Nadir: “Me fala o que agente tem pra fazer aqui. Lá em Baião tem escola, mas quem não tem
parente por não tem como morar lá, fica aqui. Eu quero terminar a Escola e ir pra
Baião ou pra Cametá. QUero terminar o Segundo grau e fazer faculdade pra ajudar minha
família, porque aqui não tem nada pra fazer.
Por outro lado, ao conversarmos com pessoas que vivem ha mais de 20 anos no lugar é
perceptível o orgulho de pertencer: Eu gusto de morar aqui. aqui desde muito cedo e não
tenho vontade ir para outro lugar. Aqui é um sossêgo só. Tem as dificuldades, mas tem coisa
boa aqui. Agente as frutas, a mandioca pra fazer nossa farinha de cada dia e o Rio onde os
meninos se acabam brincando. Eu tenho dois sobrinhos pequenos que vem de Belém pra
passer ferias em Baião e sempre vem por aqui.
Não um consenso entre os moradores se morar em Baixinha é bom ou ruim, entretanto
torna-se evidente o sentimento de pertencer a comunidade, até mesmo quando ser referem as
dificuldades de acesso aos services públicos, pois no imaginário e na vontade das lideranças
locais o sentimento de melhora é presente, como aponta seu Firmino: Agente tem muita
88
dificuldade. Pensa num lugar que quando alguém é ferrado de arraia e não tem um
tranasporte pra lever pra Baião pode perder o pé! Pois então! Aqui é assim, o ACS não pode
cuidar disso, Fátima
(Falando com uma moradora), o Posto de saúde não tem gente e não
tem remédio. Então o único jeito é lever pra Baião e tentar ser atendido por lá. Mas agente
não desiste, porque morar aqui também é tranquilo.
Observamos em nossas conversas que para os moradores mais antigos morar na comunidade é
traz um sentimento positive de tranquilidade. Para os lideres comunitário o pertencer está na
luta diária por uma qualidade de vida melhor para as pessoas da comunidade por meio de uma
luta constante com os Polícos e contra os Polítcos e, finalmente, para as (os) jóvens faltam-lhe
esperança, principalmente no que se refere a um futuro melhor que pode ser constrído com
um sistema de ensino apropriado. Entretanto, duas coisas nos chama atenção e podem ser
caracterizadas como comuns no sentimento de pertencer da comunidade que são: a presence
do Rio e da Floresta em seus imaginários.
Como aponta Castro(XXXX) o Rio é a Estrada dos ribeirinhos e a floresta o quintal. Mais do
que Estrada o Rio tambpem é o local onde se lava a roupa, onde as crianças brincam, onde os
Homens pescam e por onde as pessoas trafegam em diração a oputras comunidades e outros
municípios. Tudo chega pelo Rio e tudo se vai pelo Rio, sendo ele o canal por onde chegam
as políticas públicas e por onde elas também não chegam. Mesmo as ações públicas locais,
como por exemplo a criação da ARQUIB, tem o Rio como o lugar por onde as pessoas
trafegam para se encontrar e decider coisas (XXXXXXX).
- A relação com a sede
Na relação com a sede do município O Executivo Municipal e os políticos locais, como
vereadores e deputados estaduais e federais, aparecem na consulta entretanto, pelas vozes dos
atores são vistos negativamente onde os prórpios interesses estão acima do bem-estar e
interesse da comunidade. Selecionamos, abaixo uma sequencia de vozes que retrata bem a
relação entre “Os políticos” e as pessoas da comunidade:
“Agente vota neles porque não tem outro. Só tem esses “politicos”
42
aí!”
“Tanto faz em quem agente vota, todos são farinha do mesmo saco”
89
“Eles quando vem aqui ajuda agente, um jogo de camisa pra comunidade, arruma alguém
pra ajeitar o poço dos vizinhos(…)”
“Nós fica aqui abandonado por eles. Mas agente tem que votar em alguém, não tem. Como
agente conhece eles e alguns ajudam agente nós vota neles”.
“Eles até ajuda agente de vez em quando., Eu voto em quem me ajuda. falando a
verdade, né moço. Agora o pessoal aqui fica falando mal deles e fim tudo eles acabam
votando nos mesmos safados. Eu escolhi um que eu voto tudo ano. Não tem quem faça eu
mudar. Ele ajudou muito meus pais e colocou meus irmão para trabalhar em Baião na
prefeitura. Meu irmão não trabalha mais porque mudou o pessoal da prefeitura e ele saiu e
entreram outras pessoas. Mas eu vu te falar uma coisa, se o pessoá dele vortar pra meu irmão
também vorta pro trabalho”.
“Hum, esse pessoá é um bando de safado. Eu num perco mais meu tempo pra sai de casa e
votar em nenhum deles. Eu justifico meu voto. Eles não fazem nada pra mim. pensam
neles. Mas tá que eu voto nesses pilantras!”.
“Eles só aparecem aqui em época de eleição”.
Essa frase está presente no depoimento da grande maioria das pessoas com as quais
conversamos, o que parece demonstrar uma relação de desconfiança entre a comunidade e os
politicos. Entretanto, nos arriscamos algumas vezes em perguntar o motivo pelo qual sempre
os mesmos politicos se elegiam e obtinhamos como resposta:
A relação das pessoas da comunidade com “os Políticos” parece ser de dependencia no que
diz respeito a favores pessoas, onde observamos pelas vozes dos atores em campo que o
clientelismo politico ainda presente na região. Para a comunidade “os Políticos” são os
grandes responsáveis pela situação da falta de services públicos com qualidade e de acesso as
políticas públicas
A maioria das pessoas considera como “os políticos”, os vereadores, deputados, Secretários
do Executivo municipal, e todos aqueles que de alguma forma, masmo não tendo mandato,
fazem algum tipo de articulação em prol de alguma ação pública. Por exemplo, como fala um
morador da coimunidade:
90
“Ih, esse pessoa aqui envolvido que dizem que defende nossos interesses é tudo politico. Nem
para mais aqui. Só veve na cidade”.
A palavra “Político” para o imaginário dos rinbeinhos soa como algo negativo que representa
o lado do auto-interesse, no sentido filosófico da palavra (SOCRATES, XXXX). Além disso,
quando algum ator de dentro da própria comunidade inicia algum processo de relação com
atores externos a ela e este ator necessita ficar fora por períodos longos de tempo, ele começa
a ser visto como “Político”, pois o estar no terreno físico da comunidade é um dos fatores que
parece dar o sentimento de pertencimento ao lugar. Portanto, essa relação com a sede se
por duas vias princiais, que são a política e a familiar.
Mesmo se identificando como Quilômbos, o lugar também pode ser considerado de
ribeirinhos, pois o cotidiano mostra a forte relação existente com Rio Tocantins e a Floresta
(SHERER, XXX). Os ribeirinhos da comunidade de Baixinha não fogem das características
gerais dos ribeirinhos de Suruacá, como veremos adiante, entretanto a predominância de
remanescentes de quilombolas
43
compõe uma das faces da territorialidade desse lugar.
Portanto, Políticas e Ações Públicas de proteção a comunidades remanescentes de quilombos
como por exemplo, a criação da ARQUIB, pode ser considerada como um diferencial nesse
território conjulgando, talvez, uma nova denominação às pessoas que possuem tais
características, qual seja, Ribeirinhos remanescentes de Quilombos.
As políticas públicas na Comunidade de Baixinha
O objetivo deste tópico é descrever e analisar a territorialidade das políticas públicas na
comunidade de Baixinha. Por meio das vozes dos atores, um mapeamento das principais
políticas públicas presentes na comunidade foi feito. Ao ouvir as pessoas da comunidade,
observar o cotidiano das mesmas, olhar a infra-estrutura local e mapear os atores que de
alguma forma são responsáveis ou se conectam com alguma política pública, selcionamos um
grupo de políticas públicas para obsevar sua territorialidade (SANTOS, XXXX; LEFEVRE,
XXXX; RAFESTIN, XXXX). A construção dessa matriz comporá um quadro análitico das
interfaces (LONG, XXXX) das politicas vistas pelos atores indentificados no terreno de
43
No Brasil, a Constituição Brasileira de 1988 reconheceu essas populações como sujeitos de direitos
economicos, sociais, culturais, civis e politicos como forma de resgate da cidadania dos afro-descendentes.
Segundo levantamento realizado pela Universidade de Brasilia em 1999, existem 848 comunidades
remanescentes de quilombos. Estas comunidades estão presentes em quase todos os estados brasileiros, com
91
pesquisa. A identificação dos atores e das políticas ocorreu por meio das seguintes técnicas e
instrumenos de pesquisa:
a) Observação Simples Estivamos em primeiro momento, julho de 2006, no terreno de
pesquisa com o obsejivo de olhar, sentir e converser livremente sem a preocupação de anotar
as observações imediatamente. Anotávamos no final do dia as coisas que vinham em nossas
lembranças: escrevíamos partes de conversas; gestos de pessoas; os nomes que mais se
repetiam; coisas incomuns do cotidiano da vida urbana; olhavamos a infra-estrutura das casas,
os retrétes, as escolas, o posto de saúde, o campo de futebol, os lugares que as pessoas mais se
reuniam;
b) Observação Participante
5.1 Atores presentes no cotidiano da comunidade
Neste item objtivamos mapear os principais atores que se relacionam de alguma forma com as
políticas públicas que incidem na comunidade. Em nossa primeira visita à comunidade, em
Janeiro de 2006, identificamos alguns atores por meio de nossas conversas com a população
local, presidentes de associações, sindicatos, igreja, ACSs entre outros. A partir dessas
conversas elaboaramos uma fica (ANEXO XX) com o nome desses atores identificados na
primeira visita e ainda incluímos outros que identificamos em nossas pesquisas bibliográficas
sobre a região do baixo Tocantins. Vale ressaltar que nessa etapa não realizamos nossa
consulta apenas na comunidade de Baixinha, mas em outras localidades vizinhas que se
interligam via rio com a comunidade, conforme aponta o Quadro abaixo:
QUADRO XX – Pesquisa de opinião com comunidades ribeirinhas do Rio tapajós
COMUNIDADE
N° TOTAL DE FAMÍLIAS MÉDIA DE PESSOAS CONSULTADAS
(Homens, Mulhers, Adolescentes e Crianças)
Bailique Beira 19 30 Formulários
BAIXINHA
65 161 formulário
Humarizal Dado não informa pelo ACS 45 formulários
Vila Marariá 10 10 formulários
TOTAL
93 246
FONTE: Pesquisa de campo (2007)
Devemos esclarecer nesse ponto que a consulta realizada foi cruzada com as anotações do
caderno de campo, ainda assim, cruzadas com os dados quantitativos do IBGE, DATASUS e
exceção de Roraima, Amazonas, Acre, Rondônia e Distrito Federal. Já algumas entidades ligadas ao setor,
calculam que há 1098 comunidades quilombolas.
92
INEP. Portanto, nossa pesquisa de opinião não tem a intensão de generalizar absolutamente
nada e, assim como não pode ser considerada como estatisticamente válida, uma vez que não
calculamos antecipadamente para coletad das informações. Nosso método de coleta foi
aleatório e utilizamos o seguinte critério para a escolha: o interesse das próprias pessoas em
olhar e contribuir com a pesquisa e, também, ao final de cada conversa ou entrevista formal,
perguntávamos se a pessoa poderia mostrar quais daqueles atores eram identificados na
comunidade.
Podemos classificar essa técnica como pesquisa de opinião induzida, onde mostramos o
quadro com o nome dos atores e as pessoas respondem de acordo com as opções presentes no
formulário (VERGARA, 2006). Procurando respeitar as especificidades do lugar e das
pessoas, perguntávamos se elas gostariam que lêssemos o quadro ou se gostariam de ver o
quadro e apontar quem reconheciam como importante ou não para a comunidade. A
comunidade do Humarial não tivemos a oportunidade de converser com o ACS e as pessoas
que por circulavam não souberam estimar a quantidade de famílias presentes. Entretanto,
resolvemos assim mesmo circular o formulário no final de nossas conversas, uma vez que
deixamos claro que essa pesquisa não tem a intensão de ter uma validade estatística, mas
apenas mostrar a noção dos atores presentes no imaginário dos cidadão que lá habitam.
[INSERIR O GRÁFICO]
Conforme mostra o gráfico acima A Igreja Católica, O Sindicato dos trabalhadores Rurais, e
o ACS são considerados os mais presentes e aqueles que parecem ser os mais engajados no
atendimento das demandas da comunidade no que se refere as questões fundiárias, da água,
saúde e educação. Analisando o cotidiano relatado até agora e conectando com os dados
coletados do munícipio, identificamos as area abaixo, que consubstancia as Políticas Públicas,
como primordias para se ter um padrão de vida mínimo do cidadão ribeirinho da comunidade
de Baixinha. No próximo tópico faremos a análise da interface (XXXX) das polítcas
identificadas em campo com os atores (gateXXXX) . Por esta análise procuraremos identificar
como as políticas públicas incidem na comunidade e quem são os GATES que, na concepção
dos moradores e atores identificados, (Kurt Lewin) Portanto, esses são atores presentes na
comunidade que comporão a análise das interfaces das políticas públicas.
93
4 A interface das políticas públicas
44
para os atores mapeados
As políticas públicas selecionadas são produtos de nosso processo de pesquisa no terreno, ou
seja, consideramos o que é de mais importanto para o cotidiano do ribeirinho. A água, a
Educação e Saúde, foram as polítcas que mais se mostraram presentes na preocupação dos
atores. Entretanto, falar de Saúde e Educação em comunidades afastadas, sem observer a
relação existente entre o sistema de comunicação e transporte parece não ser possível, pois
tudo se realciona, como aponta o ACS por meio de um exemplo:
Um dia desses nós tivemos um caso aqui de uma menina de 12 anos que foi ferrada de
Arraia. Não tinha nenhum barco aqui. Como é que faz pra lever pra Baião. Não tem
telephone e nem radio. Tem que esperar. Mas a dor da menina não pode esperar. Se agente
tivesse aqui o básico pra atender nem precisava de tudo isso. Agente vai dando o jeito,
colocando nossos remedies daqui da mata até aparecer alguém.
Assim, analisamos as interfaces das políticas públicas selecionadas por meio dos atores
presentes no terreno de pesquisa, ou seja, entrecruzamos o que é mostrado pela população
local, pelo Sindicato dos trabalahadores Rurais e pelo ACS, para construirmos a
territorialidade dessas políticas para os riobeinhos, como aponta a ilunstração abaixo:
[INSERIR ILUSTRAÇÃO]
Ademais, utilizando a noção de porteiro (GateXXXX), de Lewin (XXXX), procuramos
identificar, também, quem são os possíveis agentes que abrem e fecham as possibilidades de
se ter presente no terreno de pesquisa as políticas públicas. Dividimos nossa análise dentro
das seguintes áreas, quais sejam: Organização comunitária; abastecimento de água; saúde;
educação; energia eletrétrica (luz); segurança pública; transferência de renda e transporte.
Lembramos que as analises são feitas pela interface do olhar dos atores selecionados no
terreno de pesquisa, que são os próprios moradores, o Agente Comunitário de Saúde e o
44
Todas as políticas públicas citadas neste trabalho, enquando governo em ação, encontram-se no anexo XX
94
Sindicato dos trabalhadores rurais, representado pelo Presidente da Associação de mini e
pequeno proprietário Rural da comunidade.
4.4.1 - A água e o abastecimento na comunidade
O planeta que habitamos é composto por 71% de água, sendo que apenas 3% desse total pode
ser caracterizada como água doce o que não significa que essa porcentagem seja de água
potável, pois estudos apontam que dessa última porcentagem apenas 0,26% é apropriada para
o consume (PÉRES, 2004, p. 2). Além disso, o autor aponta que dependendo do lugar a água
tem suas diversas interpretações podendo ser caracterizada como um bem ecoômico ou como
um bem público (p.3).
Para o mundo das grandes empresas nacionais einternacionais
de água, ela é um bem econômico que permite criar novos
services, como de saneamento, eletricidade, transporte, etc.,
em troca de pagamentos. Para o mundo dos gestures públicos,
a água é uma questão de política pública, de discussão sobre
formas de regulamentação e controle. E, para as comunidades,
a água é vista como sendo ‘da gente”, algo que a natureza
fornece para as pessoas que por aí vivem (PÉREZ, 2004, p. 3)
Apesar do autor tartar da questão da dos conflitos da gestão da água no Vale do Químbor, na
Vezezuela, o debate sobre a questão parece ganhar uma territorialidade própria, independente
do lugar que esteja, principalmente no que se refere a questão da gestão e da água representar
para as comunidades algo que o sentimento de pertencimento ao lugar, aliada ao lugar em
que ela se acumula, em nosso caso, o Rio. Apesar da grandeza em termos geográficos do Rio
Tocantins, que possui uma extensão de XXM metros com uma concentração de XXXX metro
cúbicos, a água que nele presente não é propícia ao consumo, como aponta o ACS: O
pessoal toma banho no ri, mas a água não é boa pra beber. As crianças tomam essa água e
ficam com verminose e outras doenças. Não tem um tratamento certo pra água. É tanta água,
mas ela não é boa pra beber”.
As mulheres mães da comunidade apontam que a falta de água potável é um problema para os
filhos no que se refere a saúde e, também, ao dia-a-dia na escola. Dona Anônia fala que por
muitas vezes suas filhas não foram ou deixaram de ir para a aula em função de dores na
barriga, talvez provocadas pela água consumida:
95
Essas dais (apontando para as suas fuas filhas, uma com 12 e outra com 13anos)
voltaram do colégio com dor de narriga ou nem foram pra aula. Eu acho que a água do rio
fal mau pra elas. O Agente Comunitário, quando vem por aqui, fala pra gente colocar cloro
na água e não deixar as crianças beber água do rio. Mas não tem jeito, ees vão tomar benho
e acabam bebendo.
Alguns lideres comunitários, em especial do sindicato rural, aponta que os riscos que a água
oferece à saúde da comunidade são externas. Zeca Preto aponta que a populição dos barcos e
o matadouro existente na sede do município, que fica às margens do rio Tocantins, são fatores
que contaminam as agues do rio.
em Baião tem um amtadouro que fica bem na beirada do rio. O pessoal mata o boi e o
sangue escorre todo pra água e nninguém faz nada. Isso é antigo. Tem pra mais de 10
anos, né Luiz(Falando com o sr. Luiz, morador local). Aí é que eu falo pro senhor, os politicos
não fazem nada e as crianças ficam adoencendo. Pior é asituação de quem mora perto ou
vai pra praia que tem na frente. Aparece mancha na pele, diarreia, pelo menos é o que
eu sei. Mas deve de ter outras doenças. Quem pode te falar mais disso é o Adilton (ACS) que
trabalha com isso e anda o inerior todo daqui.
O Agente comunitário de Saúde aponta quem mora mais próximo da sede, como por exemplo
na Vila Marariá, os impactos sobre a saude dos ribeirinhos são piores do que na comunidade
de Baixinha. Constatamos esse fato em uma rápida parade que fizemos nesta Vila,
basicamente composta por pescadores, onde conversamos com os pescadores Carlos e Mário,
respectivamente com 22 e 34 anos. Mário aponta que “
A fossa de Baião vai direto pro Rio.
Ainda tem o matadouro e a água vai direto pro Tocantins. A fiscalização não funciona no
matadouro.”.
Além dos fatores externos que apontados pelos ribeirinhos, durante vários momentos
observações algumas cituações que parecem, também, contribuir para a poluição da água.
Abaixo faço um mapeamento de algumas delas:
- Viajando de barco da sede do município para a comunidade de Baixinha, podemos
observer que os degetos humanos depositados nos banheiros das embarcações são
jogadas diretamente no rio;
96
- O lixo produzido diarimente pelas famílias, não somente na comunidade de baixinha,
em muitos casos, são depositados em sacos plasticos e muitas vezes seu destino final é
o rio;
- Necessidades fisiológicas dos ribeirinhos muitas vezes são feitas diretamente no rio.
Vale chamar atenção que alguns técnicos da EMBRAPA presentes no local e observando e
ouvindo uma de nossas conversas com alguns moradores, interferiram e chamaram atenção
para o seguinte:
Não é isso torna a água poluída. Tem outras coisas também. Animais
mortos, salinidade da água, e muitas outras coisas também tornam a água impur, sem contra
o impacto da construção da barragem de Tucuruí.
Portanto, a impureza da água consumida
pelos ribeirinhos parece ser reflexo de fatores naturais, descaso da gestão pública do
município, da iniciativa privada que gerencia os barcos da região e ações dos próprios
moradores que em alguma medida acabam poluindo o rio. Holdgate (1991) chama atenção
que o planeta se sutenta ambientalmente se a homem tomar consciência de que a mudança
de postura é a única forma de torná-lo saudável e sustentável. Assim, a negligência com a
água do Rio Tocantins parece ter uma interface (XXXX) direta de ações, ou falta delas, do
homem com a natureza.
No que se refere ao abastecimento de água na comunidade este é inexistente na comunidade
de baixinha, sendo o consumo feito apenas por poços ixistentes nos quintais ou poços
coletivos. Mesmo com essas medidas os ACS ainda distribuem o hipoclorito e procuram
orientar as famílias na forma de utilizes. Agente repassa o hipoclorit, mas muits vezes eles
não usam. Não adianta, agente insiste, fala que se não usar o pessoal da casa pode adoecer.
Procuramos saber com os comunitários os motives pelos quais muitas vezes o hipoclorit não
era utilizado cpomo ferramenta para purificação da água. Dona Antonia nos fala que não
coloca o hipoclorito na água “porque o gusto fica diferente”. Uma das propriedades da água é
não ter gusto, portanto, a água do rio ou do poço ingerida pelos moradores possuiam um
gusto antes mesmo do tratamento
45
.
A falta de um sistema dessa natureza, além de impactar na área da saúde, também tem relação
com a agricultura, pois na época da estiagem as zonas de plantação longe dos cursos de água
ficam prejudicadas pela falta de um sistema de irrigação apropriado, como aponta Zeca Preto:
quando não tem chuva as plantação ficam todas secas e as vezes agente perde tudo até.
45
Resolvemos provar os três tipos de água e percebemos que, de fato, o gusto varia nas três situações, se
comparada com a água que consumimos em São Paulo.
97
Agente tem que rezar pra Deus mandar a chuva e lavar nossas plantações. A roça e até
mesmo o quintal fica ruim as vezes.
A água se relaciona com quase todas as outras políticas públicas dessas regiões. Além da
questão da saúde o sistema de cultivo também necessita dela para fazer com que políticas
públicas do sistema agrícola funcionem. Segundo Zeca Preto, o sistema de cultivo mais
importante das famílias de Baixinha é a roça, pois ela é quem mantém as famílias da
comunidade e a principal atividade fomentadora de renda.
O trabalho na roça começa em julho quando agente planta principalmente mandioca. Mas
quando é mata ou capoeirão agente começa em junho. Os homens fazem a roçagem e a
derruba e as mulher e os filhos ajuda na queima, no plantiu e na colheita. As vezes agente
chama um convidado pra nos ajudar nos trabalhos.
Visitamos um roçado já iniciado e um na época da colheita. Observamos que o roçado é feito
pelos homens com uma faca de grande porte, chamada na região de teçado que é útil para
cortar a vegetação baixa e o machado, ou em alguns casos a motoserra, para extrair árvores de
porte maior e , em seguida, a família parte para a queima da mata começando o processo
espalhando folhas secas em alguns lugares e tocando fogo. Essas atividades são realizadas nos
entre os meses de julho e novembro, período mais seco propício para a realização das
ativiades. Segundo o Sr. Sabá, agricultor local, o próximo passo é cortar tudo que ficou após a
queima apra em seguida agrupár tudo em um lugar e queimar novamente. Esse processo é
chamado de coivara e a quando se encerra a medira que praticamente virou uma espécie de
carvão é recolhida pelas famíliaa para serem utilizadas nos fornos das casas de farinha.
Zeca Preto esclarece que o plantiu começa a ser feito no mês de Janeiro e que os principais
produtos plantados são a mandioca, milho, arroz, cana, macaxeira, pimento-do-reino e
banana, sendo que o feijão é plantado somente quando as chuvas iniciam. Ele ainda afirma
que isso funciona como uma espécie de rodízio pra gente sempre ter alguma coisinha pra
comercializar e pra bóia da família também. Agente quando precisa convida outras famílias
pra ajudar e depois ajuda elas também. Agora, quando falta chuva agente tem dar os nossos
pulos por aqui, porque tem que ter água pra lavoura e não tem sistema de irrigação. A
mandioca é que é a salvação da lacoura, porque ela todo ano e a água que tem é
suficiente.
Observamos que em uma mesma roça existem culturas variadas de plantil e que a falta de
água, com tanta água em frente a comunidade, pode prejudicar alguns ciclos do plantiu e que
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a mandioca é o principal produto da comunidade, pois o além da facilidade com que ela se
reproduz dela deriva a farinha, principal produto da comunidade. Entretanto, para fabricar a
farinha é necessário uma casa de farinha, que não é privilégio de todas as famílias. Assim,
mais uma vez a solidariedade está presente, pois as famílias que possuem casa de farinha
colocam-na à disposição das famílias que não possuem para realizar a fabricação.
46
.
Segundo os técnicos da EMATER que presentes na comunidade o cultivo da pimento-do-
reino é uma experiência nova na região que vem sendo finaciada pelo Banco da Amazônia por
meio da linha de crédito FNO que é repassada via Associação de mini e pequeno proprietário
Rural de Baixinha. Zeca Preto aponta que existem inúmeros problemas no que se refere ao
cultivo dessa cultura na região:
Olha só, o senhor que é técnico, me explique o seguinte: por que que agente não tem
assistencia técnica de vocês? (Zeca Preto está toda hora falando e se dirigindo ao técnico da
EMATAR que estava conosco) Outra coisa, como é que vocês deixaram um monte de
agricultor plantar a pimento em area arenosa? Será que ninguém falou pro pessoal que
pegou o dinheiro que é preciso conhecer um pouco de outra coisa que nós nunca plantou
aqui? Veja, muitos de nós nem sabia que precisava de veneno pra pimento pegar. É lógico
que agente orienta, mas parece que os outros querem enfiar na gente o que eles querem! O
pessoal da EMATER vem aqui pra aprovar ou desaprovar as coisas e esquece que agente
também conhece nossa terra (Pela primeira vez Zeca preto ficou muito sério ao encerrar uma
frase).
Vários são os fatores apontados para que o plantiu da pimenta não esteja dando certo entre
eles podemos destacar a falta de apoio técnico e articulação dos órgãos competentes com os
atores presentes na comunidade que possuem o conhecimento da dinâmica local da
comunidade.
4.4.2 Comunicação
O sistema de comunicação da comunidade pode ser classificado por dois pontos: a
comunicação dentro da comunidade e a comunicação para fora da comunidade. Internamente
as comunidades se comunicam via rio onde os moradores trafegam de barco de uma
46
Para saber sobre o processo de fabricação da farinha ver no “dia-a-dia dos homens” no início deste capítulo.
99
comunidade para outra onde utilizam o barco para deslocamento ou de bicicleta onde utlizam
as estradas de terra que são abertas por trás das comunidades, como aponta um dos
moradores:
Quando agente vai pra encontrar alguém, dar algum recado ou procura agente
vai de bicicleta. QUando não tem bicicleta agenta empresta de alguém e vai lá. Muita gente
aqui também tem cellular, mas ele só pega em alguns lugares.
Entre os moradores a comunicação se a quando eles se deslocam de um casa para outra
pra falar sobre algum acontecimento ou comentar algum fato que aconteceu ao entorno da
comunidade.
Outro dia eu tava no roçado e meu Pai precisava manadar um recado pra
Baião. Como não tem cellular e eu tava sem bibicleta fui correndo beira pra falar o que
ele queria.
Somente uma comunidade visitada observamos a presence de um torre da empresa de
telefonia, a Telemar. Na comunidade em estudo essa torre não existe dificultando a
comunicação com a sede ou qualquer outro lugar. A comunicaçao por celular é possível
somente em alguns pontos da comunidade de Baixinha, tendo sinal , em alguns casos somente
na Beira do rio. Sistemas de radio não existem na comunidade pela falte de apoio da
Prefeitrua, como aponta um moradora do local: Em outras comunidade tem até radio, mas
aqui não tem. Se tivesse facilitaria muito nossa vida, porque qualquer caso de doença agente
falava pra Baião ou pra outra comunidade melhor e até recebia um apoio. Mas até pra isso é
dificultoso, porque agente precisaria de um barco.
4.4.3 Educação
A única escola que funciona na comunidade é miltisérie e atende de primeira a quarta série
em uma única sala de aula com professor do próprio lugar. Apenas as comunidade de Igarapé-
Preto e Araquembaua ppossue uma Escola qcom ensino fundamental. Na comunidade de
Baixinha, quando as crianças concluem a última série poucos têm a oportunidade de continar
os estudos em função das condições de transporte ou em função da ausência de condições de
encaminar os concluinte para a sede ou para outras comunidades onde o ensino fundamental
funciona, como lembra uma mãe:
Meus filhos terminaram aqui o mobral (maneira antiga de se referir ao termino da quarta
série) e nós não tem condições de mandar eles pra Baião. Não tem ninguém por lá pra eles
fica. Araquembaua é mais perto, mas não dá pra mandar todo dia os meninos pra lá. Então
100
eles ficam por aqui ajudando na plantação e ficam brincando aqui mesmo. Eu tenho até
medode mandar eles sozinhos pra Baião. Lá tem muita droga e muita briga. Hum, eu heim!
(O olhar de dona Raimunda é de conformação, alternando pequenos momentos de sorrisos
com seriedade)
A escola da comunidade possui um sitema de energia que funiciona com bateria e a merenda
escolar não é regular, pois a Prefeitura não encaminha com frequencia o material para o
prepare da comida. O preparo da merenda é feito pelas prórpias mães da comunidade, sem
remuneração, onde as mesmas se revezam no prepare do lanche que chega de barco da sede
do município. A solidariedade da comunidade, novamente, faz parte do cotidiano da vida das
pessoas que habitam a comunidade.
Durante nossa pesquisa analisamos os livros escolares que são disponibilizados na Escola e
observamos que as ilustrações e exmplos utilizados neles se referem em muitos casos a
situaçãos da vida urbana. Ilustraçoes como carros, prédios entre outros parecem
descontextualizar a educação do lugar. Como consequencia da educação a violência simbolica
parece fazer efeito no imaginário das crianças e adolescentes que frequentam a Escola.
(FREIRE, XXXX) Rafael, com apenas 10 anos de idade, demonstra sua curisodade para
descobir coisas como
eu quero andar nesse carro aqui (Apontando para um desenho em seu
livro). A violência simbólica (Boudie, XXXX) pode causar no imaginário das crianças o
desocntetamento com o lugar onde mora incentivando-as, desde cedo, a prática do êxodo pra
lugares apontados nos livros didáticos. (XXXXX – Ver trabalho do DURAM)
Em alguns casos onde a família têm condições de encaminhar seus filhos para dar
continuidade ao processo educacional formal o transporte é um dos fatores que fazem com
que muitos não continuem os estudos. As vezes o barco não vem para mandar eles pra Escola
lá Araquembaua. Eles até vão de canoa. Mas e quando chove?
Os Professores desenvolvem suas atividades com dificuldades no local apontando a falta de
material didático adequado e local inapropriado para o desenvolvimento das atividades.
Observamos a situação precária das instalações do prédio, da lousa e das carteiras. A infra-
estrutura e as más condições de trabalho transformam o cotidiano da professora da em um
desafio diário no processo de ensino-aprendizado dos alunos.
101
Os professores locais, não só da comunidade de Baixinha, demosntram a o prazer em lecionar
e participar do processe de formação das criançasdo lugar onde nasceram. O sentimento de
compartilhar, de ser útil (BOFF, 1999) de formar o mínimo possível torna prazeroso e útil o
trabalho desenvolvido pela professora, pois quando agente vê que encaminhamos pelo menos
uma criança e que elas não desistiram de estudar isso é uma felicidade única pra gente.
Observamos que as atividades desenvolvidas pela Professora não é apenas o a atividade
técnica, mas pela proximidade e convivência diária com seus alunos na comunidade, for a da
sala de aula, o aprendizado se torna rico, pois os exemplos que emergem do cotidiano
enriquecem o processo de aprendizagem superando as lacunas e a dexcontextualização
(FREIRE, XXXX) que se fazer presentes nos livros didáticos fornecidos pela grande narrative
que parece desconehcer as multiplas narratives presentes na comunidade
47
.
Entretanto, além das lacunas que envolvem o Estado a Professora também coloca como fator
preponderante na formação das crianças o apoio familiar, no acompanhar e participar da
formação educacional de seus filhos. Agente até entende que os pais não sabem ajudar os
filhos no dever de casa, mas poderiam pelo menos colocar os meninos pra estudar em casa.
Eles levam os meninos pra roça ou deixam brincandoo dia todo sem cobrar deles. Agora
alguns estão até cobrando mais, porque podem perder o Bolsa-Família.
Além das questões colocadas outros fatores são apontados pela, professora, pelas Associação
e pelo ACS, como: a inxistência de um sistema de capacitação para o aperfeiçoamento do
trabalho dos professores e a inserção no processo de formação das crianças de um sistema de
valorização da cultura Quilombola. Os livros didáticos fornecidos pelo poder governamental
não alcançam tais peculiaridades do lugar e a comunidade não é organizada o suficiente para
inserir nesse processo tais especificidades dessa territorialidade, como aponta Zeca Preto:
Na
escola eles não aprendem de onde os pais deles vieram, os costumes que agente tem e eles
47
Gostaríamos de compartilhar nesse momento nossos sentimentos, mesmo que normativos, ao ouvirmos a
Professora, que nospediu para não se identificada por razões próprias. Imaginamos como seria a formação
daquelas crianças com uma Escola adequada a realidade daquela comunidade, com uma infra-estrutura viável
para o processo de ensino-aprendizagem, com uma merenda escolar suficiente e regular, aliada a paixão
demonstrada pela Professora no processo de formação das crianças. Nos perguntamos naquele momento: uma
utopia, um sonho ou algo que um dia se concretizará? Nesse momento sentimo-nos felizes em observa o
sentimento de compaixão e paixão da Professora pelas crianças e pela comunidade e, ao mesmo tempo,
insatisfeitos com o apoio do poder das grandes narrativas para a comunbidade. Nesse momento lembramos em
que medida este trabalho pode ser útil para um dia colaborar com aquela comunidade. Percebemos que o
conceito de útil, apresentado nas orientações e textos de Peter Spink, nos faz pensar que a utilidade não é
somente para a academia, mas caminhar em direção a uma melhor gestão da
rés pública compartilhada com o
amor e dedicação das pessoas pelos seus afazeres utilizando o sentido de compartilhar de Lonardo Boff.
102
nem sabem o que é um quilombo. Se não fosse eu me interessar eu ía acreditar até hoje que
agente nasceu pra ser escravo. É só ler nos livros de história que chaga aqui. Só fala no
negro como escravo. EU acho que isso faz até mal, porque quem vai se orgulhar disso. Tem
fixar a nossa luta também!
4.4.4 Energia Elétrica (Luz)
A palavra utilizada pela maioria das pessoas presentes na comunidade quando se referem a
energia elétrica é “Luz”, ou seja,
Não tem luz; falta luz, sem luz é difícil fazer as coisas.
Apesar da comunidade estar localizada próxima as redes de transmissão elétrica do Linhão de
Tucuruí, não energia elétrica fornecida por ele. Existe na comunidade um sistema de
energia para a Escola que é alimentado por energia solar armazenada nas baterias para gerar
energia para esse fim específico. A comunidade possui também um pequeno motor que
funciona com oleo diesel e seu periodo de funcionamente vaira entre 2 e 4 horas por dia não
atendendo todas as residencias. A maioria das casas possuem televisores e seu funcionamento
é condicionado ao tempo de funcionamento do gerador.
Água potável gelada e local adequado e ilumindo para leitura durante a noite são praticamente
inexistentes, salvo nos momentos em que a comunidade se reune para colaborar na compra de
diesel para que o motor funcione por mais tempo. Para que o motor funcione cada família
colabora com uma quantia para a compra do combustível, sendo este pagamento realizado no
final de cada mês. Assim, as políticas de Educação e Energia se entrelaçam mostrando a
complexida existente no processo de construção de políticas públicas integradas.
4.4.5 Organização Comunitária (“O pessoal aqui...”)
4.4.6 Saúde
A política pública de saúde, enquanto ação do governo, é materializada na comunidade na
pessoa do ACS remunerado pelo Governo Federal e fiscalizado pela prefeitura. Na
cumunidade existe um prédio em condições precárias denominado Posto de Saúde onde não
existem equipamentos e nem condições mínimas de atuação de um auxiliar de enfremagem,
ou seja, existe apenas um prédio sem funicionamento. O ACS da Comunidade, Sr. Adilton,
reclama das péssimas condições de trabalho:
Eu faço o que eu por aqui. Visito as casas e tento orientar as famílias. Agora agenta faz oq ue
dá. O básico agente não tem. Não tem nem balança pra pesar as crianças. A bicicleta para
103
visitor as casas mais afastadas que eu uso é a minha e meu salário não dá pra fazer nem a
manutençâo. Tenho que dá meus pulos. Mesmo assim eu visito o pessoal pelo menos uma vez
por mês. Quando a coisa é séria agente encaminha pra Baião e as vezes o pessoal de Baião
encaminha pra Cametá.
febres, diarréia, ameba e verminoses que, em muitos casos, se relacionam diretamente com o
consume da água.
Segundo o ACS as doenças as enfermidades mais frequentes são a diarréia, verminose, ameba
e Infecção Respiratória Aguda (quase uma pneumonia). Com a falta de estrurura do poder
governamental as enfermidades são tratadas com medicamentos naturaiscomo o mel, jatobá,
cascas e ervas do proprio lugar, pois, Segundo dona Raimunda, moradora local aqui não
existe apoio necessário da prefeiturura.”. Caso mais graves também são identificados como
leshimaniose e hanseníase que necessitam de tratamento específico e isolamento.
Além das doenças supracitadas acidentes, na época da chuva, ferradas de arráia e picadas de
cobra, ocorrências essas que já causaram óbito por falta de atendimento no local, falta de
transporte em tempo hábil e a ausência de um sistema de comunicação com a sede do
município.
Acontece as vezes de alguém cair duma árvore, ser picado de cobra ou lavar uma ferrada de
arraia. Já aconteceu de morrer gente, porque não dá tempo de chegar no posto. Lá em
Araquebaua até tem como cuidar, mas o certo mesmo é lever pra Baião. Agora como agente
vai se comunicar com eles lá? Não tem barco toda hora aqui e agente tem que esperar.
Agente precisa de apoio, porque uns acidentes como esses agente se agente tivesse condições
aqui com certeza as coisas seria de outra forma.
O ACS é um dos principais atores que interligam a comunidade com a política de saúde. A
atuação destes agentes em comunidades rurais é o mínimo de acesso que as pessoas têm às
políticas de saúde. Entretanto, o atendimento dos ACS depende em grande medida da atuação
dele no lugar, pois a fiscalização do poder governamental e de baixa qualidade, como aponta a
coordenadora do PACS, Flavia Brasil, no município de Baião.
Olha Henrique, ser coordenadora do PACS é complicado aqui. Tu tens andado por e estás
vendo como as comunidades são longes. Eu não tenho condições de em cima toda hora.
Daqui pra Joana Perez de barco demora 4 horas. Imagina se eu tiver que fazer isso toda
104
semana pra ficar tomando conta de ACS, eu não faço meu trabalho por aqui. O
deslocamento é complicado e acaba compromentendo a fiscaçização. As vezes eu recebo
reclamação quando eu vou nas comunidade. Essa semana eu fui em Bailiquye Beira e faz
pra mais de 3 meses que a ACS não aparece por lá. Eu converse com eles e tento sensibilizar
mas as vezes não tem jeito, porque se eu dispensar a ACS pra arranjar outra é muito difícil.
Eu tô com duas áreas descobertas agora mesmo, porque as vezes não tem o perfil e o pessoal
fala que ser ACS é não ter sossego.
Na comunidade de Baixinha a atuação deste professional é copnsiderada pela população local
como razoável:
Olha, eu acho que ele faz o que pode, mas ele só vem aqui de vez em quando.
As vez agente que chama ele e ele não vem, manda dizer que ocupado e demora pra vim
aqui. As vez passa é mês sem aparecer. Quando vem eu até brinco e pergunto se ele se perdeu
no caminho (Rindo). Outro morador comenta: Um dia desses aí eu taca com mal da barriga e
com febre. Tomei meus remedies caseiros e não adiantou. Eu pensava que ía morrer. Como
fica longe da casa dele pedi pro meu menino chamar ele e ele nem apareceu. Faz é tempo
que ele não vem por aqui.
Um outro ponto que nos chamou atenção é a ausência de um auxiliar de emfermagem na
comunidade que tem como função realizar atendimentos de baixa complexidade, como por
exemplo, aplicar uma injeção. O ACS por sua vez realiza tal atividade quando necessário e
quando viável, pois não ha seruingas disponibilizadas pelo poder poder governamental.
4.4.7 Segurança Pública
Não existe na comunidade uma delegacia ou agente de segurança do Estado. As ocorrencias
são encaminhas para Araquembaua ou para a sede do município. Os problemas mais comuns
ocorrerem na époda de festas onde os moradores relatam que algumas pessoas aumentam o
consumo de bebida alcoolica perdendo os sentidos próprios provocando brigas e desavenças.
Algumas vezes as brigas são de caráter físico e acontecem por chutes, socos, facadas ou
“teçadadas”.
Uma vez um colega de outra comunidade veio pra uma festa aqui e acabou se desentendendo
com o pessal aqui. O pessoal baixou a ripa nele e deixou ele todo quebrado. Ficou jogado
até que apareceu uma alma boa e levou ele pra casa. Teve que esperar o barco pr air pra
105
Baião e como aqui não tem posto ele teve que esperar mesmo. O pessoal deu até teçadada
nele.
Pelo relato do morador observamos que, mesmo em uma situação inópita como essa,
observamos o difícil acesso às políticas públicas na comunidade. Por uma briga observamos
que as limitações de uma política de transporte público, de saúde e de segurança pública,
colocam em risco os próprios comunitários, como lembra o ACS: Agora se tivesse aqui um
barco ou uma delegacia isso seria resolvido rapidinho. Mas isso é assim mesmo, depois
todo mundo junto de novo.
4.4.8 Transferência de renda
O programa Bolsa-Família e de as aposentadorias são os programas mais presentes na
comunidade Baixinha.
Para areceber o benefício do Programa Bolsa-Família algumas condicionalidades foram
criadas pelo governo federal, como ter a brigatoriedade de pesar os filhos, ter aprovação na
Escola e possuir o cartão de vacinação em dia. Entretanto, essas são as condicionalidades
legais e regimentais. Na comunidade de Baixinha outras condicionalidades estão presentes,
mas no que se refere ao acesso ao programa.
1 – É necessário que alguém da família se desloque da comunidade para a sede do Município
de Baião, onde deveria haver um centro lotérico ou uma agência da Caixa Econômica Federal;
Para ir até a sede do município gasta-se em media de R$5 a R$10,00
2 – A permanência na sede
Durante a permanência na sede a pessoa geralmente faz um lanche que custa em torno de
R$3,00 a R$5,00
3- As compras na Sede
Geralmente o responsável faz as compras na sede do município levando consigo os
mantimentos e material
4 – O retorno à comuidade
106
O retorno custa em media R$5,00
Nesse percursso somente o custom com transporte e lanche na sede do município compromete
cerca de 70% da receita recebida. Com a compra dos produtos sendo realizados na sede
municipal a renda toda do recebimento do Programa gira na própria sede do município. Na
comunidade de Baixinha existem poucos postos de vendas de produtos alimentares,
conhecidas pelos moradores como “tabernas”.
Um alternativa foi criada pelos moradores para minimizar os gastos e aumentar a receita do
benefício: algumas famílias se reúnem e apenas uma pessoa vai a sede do município receber o
dinheiro. O responsável leva a lista de todos que se reuniram para trazer o que foi solicitado e
as despesas são rateadas
Entretanto, em nossa segunda visita a comunidade de Baixinha, julho de 2007, nos foi
informado que por motivos de segunrança o centro lotérico e a agência da Caixa Econômica
Federal havia sido fechada o que dicultaria ainda mais o recebimento do benefício. Nessa
situação os beneficiados se deslocavam até o município de Mocajuba, passando por Baião, o
que encarece ainda mais o translado, pois seria necessário ir do MotoTaxi ou de ônibus da
sede do município de Baião até a o centro de Mocajuba. Portanto, apenas ter o benefício não é
garantia de recebê-lo, pois para isso outras ações e políticas públicas precisam estar
conectadas, como uma engrenagem de um relógio, que para funcionar marcando a hora
corretamente tornam-se necessaries ajustes.
Conclusões preliminaries:
a) A população local sempre se refere a sede da comunidade como Baião. Isso pode
demontrar que eles não se reconhecem como moradores de Baião, mas como moradores do
interior e se identificam como moradores do interior;
b) Para que uma política pública tenha um impacto positive dentro do território ela precisa:
- acompanhar a dinâmica local;
- estar integrada uma a outra em função da especificidade local, no caso das aqui estudadas o
Rio é o eixo de integração e não de separação como perece ser no imaginário de várias
comunidades. RIO Ele é o canal das políticas para essas comunidade e seus porteiros são:
Identificar os porteiros comuns
Identificar os porteiros diferentes
107
Posso chamar esses porteiros de agentes capilares?
-
A seguir, partiremos para o oeste do Estado do Pará, para o município de Santarém, onde se
encontra Suruacá, outra comunidade ribeirinha que se caracteriza como mais uma pequena
parte de nosso terreno de pesquisa, distante da comunidade de Baixinha, sem linha reta,
aproximadamente XXXX Km, como mostra o mapa XX na próxima página:
108
Fonte: Mapa Político da Região Norte – IBGE – 29/08/2005
Escala: XXXXXX
P A R Á
Santarém
Belterra
Aveiro
Baião
AMAPÁ
OCEANO ATLÂNTICO
109
Para termos uma idéia trata-se da mesma distânica entre a capital de São Paulo até a Capital
do Rio de Janeiro (Confirmar). Entretanto, se partísemos da comunidade de Baixinha para a
comunidade de Suruacá o seguinte percurso seria feito:
1) Tomaríamos um barco na comunidade de Baixinha, via Rio Tocantins, com destino a
sede do município de Baião (aproximadamente 2 horas de viagem);
2) Pela Estrada, de ônibus, saíriamos para Belém (entre 4 e 6 horas de viagem);
3) Para chegarmos ao município de Santarém teríamos duas opções, de navio ou de
avião. Barco – aproximadamente 1 dia e de avião 1 hora e meia;
4) De Santarém para Suruacá partiríamos de barco o que leva em media de 3 a 4 horas de
viagem.
Se somarmos apenas as horas de tranlado, sem contra as horas de espera entre um meio de
transporte e outro, utilizando o navio entre Belém e Santarém, levamos em media 34 horas
entre uma comunidade e outra. Se optarmos fazer o percurso da capital do estado para a sede
do município de santarém, o tempo reduz para 15 horas de viagem em media. Uma viagem de
São Paulo para o Rio de Janeiro, de ônibus, leva em torno de 4 a 5 horas de viagem, com
transporte e de avião em media 45 minutos.
110
Comunidade de Suruacá
111
Capítulo 5
Painel de Imagens : o cotidiano dos ribeirinhos
112
A chegada em Santarém
O Rio Tapajós na chegada a Santarém
A saída para Suruacá
“Agente ata as redes no barco pra descançar um pouco até chegar lá. A viagem é
demorada”.
“Agente vê na TV aqueles riozinhos. Aqui o nosso Rio é grande”.
A chegada na comunidade
As ruas largas da comunidade
Sem energia elétrica, mas com parabólica
A moradia, achegada da alvenaria
O Banheiro das casas
Os clubes e o campo de futebol
O cotidiano: lugares para banhar e lavar a roupa
Pegando a roupa lavada
Os transportes do ribeirinho
Brincadeiras de criança
Os animais do lugar
A mandioca nossa de cada dia
113
Pegando e descascando a mandioca
Colocando no moedor
Moendo com a energia humana
Colocando no Tipiti
Para o forno: fazendo a farinha
Futebol: diversão feminina e masculina
As vendinha e as vendas
As parcerias: a rádio Japin , o telecentro e o sistema de abastecimento de água
Energia solar para o telecentro
“Telefone têm, mas não funciona”
“O nosso barco para aí o pessoal que mora por aqui vem deixar o isopor. Quando o
barco volta eles vem pegar o gelo, porque num tem luz, né?”
Amigos de viagem: Djalma
114
A saída para Baixinha
De baixinha não tem nada: curiosidade me muito alta
A moradia, a casa de madeira
O Banheiro das casas
As escola
O cotidiano: lugares para banhar e lavar a roupa
Pegando a roupa lavada
Os transportes do ribeirinho
Brincadeiras de criança
Os animais do lugar
A mandioca nossa de cada dia
Pegando e descascando a mandioca
Colocando no moedor
Moendo com a energia humana
Colocando no Tipiti
Para o forno: fazendo a farinha
Futebol: diversão feminina e masculina
Amigos de viagem:
Djalma e a família que nos acolheu
115
as crianças
Os líderes comunitários
116
Capítulo 6
117
Comunidade de Suruacá:
Como já falamos anteriormente Suruacá localiza-se Município de Santarém, onde estão presentes,
também, os municípios de Belterra e Aveiro. Dentro desses três municípios estão inseridas a
Reserva Extrativista do Tapajós (RESEX)e a Floresta Nacional (FLONA)do Tapajós que são
cortadas pelo Rio Tapajós. A comunidade de Suruacá faz parte do Município de Santarém e
encontra-se dentro da RESEX.
O município de Santarém está situado na mesorregião do Baixo Amazonas e na microrregião de
Santarém, na confluência dos rios Tapajós e Amazonas. A população estimada de em 2007 segundo
o IBGE é de 274.285, distribuindo em um área total de XXXXX Km2, com XX% presentes na
Zona Urbana e XX% na zona rural. O Rio Tapajós possui uma extensão de XX KM comum
volume de água aproximado de XXm2 e é a única canal de transporte com a sede do município
podendo ser considerado a estrada e a rua dos quase 30.000 ribeirinhos da região. Vários relatos
coletados no terreno da pesquisa apontam essa forte identidade entre o ribeirinho e o rio Tapajós,
entretanto o relato do ACS, Sr. Djalma, nos chamou atenção ao falar de maneira simples e sintética
o significado do Rio para ele: O Rio é a nossa estrada e a nossa rua, como fala aquele Carimbo
48
,
sabe qual é:’Esse rio é minha rua, minha e tua, mururé
49
, piso no peito da lua, deito no chão da
maré’ “(Ele termina a música com um largo sorriso no rosto).
O local está sob a administração da Prefeitura de Santarém que tem como Prefeita Maria do Carmo Martins
Lima, eleita pelo Partido dos Trabalhadores (PT) em coligação com o PDT. Em termos de composição a
Câmara Municipal possui um total de 14 vereadores sendo a maior representação partidária é de candidatos
do PT e PL, com 3 candidatos cada partido, dividindo-se o restante entre PFL (2), PPS (2), PMDB (1),
PSDB (1), PTB (1) e PPS (1).
No que se refere a questão da Educação o município de Santarém possui 137 escolas de educação infantil,
338 escolas de ensino fundamental e 31 escolas de ensino médio, entre instituições públicas e particulares,
totalizando 506 escolas (IBGE, 2006), possuindo ainda XX campus avançado da Universidade Federal do
Pará e XX instituições de Ensino Superior de caráter privado. Em 2007 o Governo Federal começou o
processo de criação da Universidade do Tapajós, com o apoio do Governo do Estado e da Prefeitura
municipal.
48
Carimbo é um estilo de dança tradicional que faz parte da cultura do Estado do Pará.
49
Espécie de árvore da floresta pluvial (DICIONÁRIO AURÉLIO, 2004, p.1377)
118
Na área da saúde, segundo informações da Secretaria Municipal de Saúde (2006) o município já possui
implementado o Programa Saúde da Família – PSF com 27 equipes distribuídas em 127 ACS, 27 Médicos e
27 Enfermeiros em Santarém-PA, atendendo 12 bairros da cidade e 07 comunidades da zona rural,
conseguindo dar assistência a 30% da população do município. Essas equipes desenvolvem ações básicas de
saúde através de visitas domiciliares, palestras e reuniões com a comunidade, consultas médicas,
odontológicas e de enfermagem, internações domiciliares, na tentativa de diminuir as internações
hospitalares. Entretanto, existe discordância no que se refere aos dados, pois segundo o Conselho Regional
de Medicina do Estado do Pará (dez/2007), há
144 médicos em Santarém, .enquanto que por meio do
DATASUS o Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES) aponta um total de 242 médicos e
137 enfermeiros.
Hilton Silva (2006)mostra que esforços técnicos e acadêmicos têm sido empreendidos na área da saúde para
se conhecer melhor a Amazônia, entretanto estes se concentram nos grandes centros urbanos, citando as
cidades mais populosas que são Belém, Santarém, Manaus, Boa Vista e Rio Branco. Mesmo com os
pequenos avanços, como a criação de base dados como o DATASUS e a presença de ONGs que se dedicam
em fazer levantamentos de dados na região
50
, ainda se sabe muito pouco sobre essas regiões e a situação se
agrava mais ainda quando trata-se de populações tradicionais, como populações rurais não indígenas,
ribeirinhos e caboclas, consideradas invisíveis aos olhos da ciência e do poder governamental, como aponta
o autor:
Esse segmento que o antropólogo britânico Stephen Nugent chama de
população “invisível” (NUGENT, 1993), permanece no limbo
científico (SILVA,2001). Como resultado, um percentual expressivo
da população da região é simplesmente ignorada pelas estatísticas
oficiais. Como ocorria a cem ou duzentos anos, milhares de pessoas
continuam a nascer e a morrer nos rincões amazônicos todos os anos
sem que o poder público tome conhecimento de sua existência.
(SILVA, 2006, p. 80)
50
Para exemplificar citamos o Imazon (www.imazon.org) e o PSA (www.saudeealegria.org)
119
Assim, procuraremos colocar uma lente de aumento em cima da mesma fotografia que nos referimos na
apresentação do tópico sobre a comunidade de Baixinha, para observar mais uma pequena parte do cotidiano
dessa população “invisível” que são os ribeirinhos da comunidade de Suruacá.
A caminho da comunidade de Suruacá
Partindo da sede do município para chegar a comunidade de Suruacá o rio é o único elo de ligação que há,
sendo o barco o único meio de transporte com uma duração média de viagem de aproximadamente quatro
horas e meia. A distância até a comunidade é de aproximadamente XX Km, a mesma entre São Paulo e
Jundiaí, entretanto com um tempo de viagem bem menor. Em Agosto de 2006 realizamos esse percurso em
uma barco da própria comunidade, cujo valor para deslocamento era de R$10,00. O barco pertencia a uma
espécie de cooperativa informal existente entre os moradores da comunidade que o mantinham. Porém,
existe na região um outro barco de propriedade privada que realiza o mesmo intinerário cobrando um valor
de R$15,00. A partida de barco para qualquer comunidade ocorre as terças-feiras do porto de Santarém,
pela parte da manhã, não havendo qualquer tipo de terminal ou guichê para compra de bilhetes, sendo a
transação feita dentro do próprio barco geralmente com os próprios proprietários, sendo que ás quartas-feiras
o porto recebe todos os barcos que retornam da comunidades com o objetivo específico de transporte de
passageiros e mercadorias.A população do município já se habituo aos horários sem a necessidade de um
local fico para a compra de bilhetes.
Conforme mostra o Mapa XX abaixo, no sentindo Santarém –Suruacá do lado esquerdo do Rio Tapajós
localiza-se a FLONA
51
e do outro lado a RESEX
52
consideradas áreas de intervenção federal, conhecidas
por áreas institucionais essenciais. No lado da FLONA
53
encontram-se outros dois município que são Aveiro
e Belterra, também margeados pelo Rio Tapajós. Entre a Floresta e a Reserva encontra-se o Rio Tapajós
com uma extensão de 1.992 km(CONFIRMAR ESSA INFORMAçÃO), nascendo nas divisas dos Estados
do Pará, Amazonas e Mato Grosso. Sua largura é bastante acentuada e em alguns trechos chega a 20 km.
51
A Floresta Nacional do Tapajós foi criada pelo pelo Decreto nº 73.684/1974
52
O Estado do Pará conta com diversas unidades de conservação, dentre as quais 14 florestas nacionais e 15
reservas extrativistas administradas pelo IBAMA
53
A Floresta Nacional do Tapajós, assim como todas as FLONAs, é gerida por “um Conselho Consultivo,
presidido pelo órgão responsável por sua administração e constituído por representantes dos órgãos públicos,
de organizações da sociedade civil e, quando for o caso, das populações tradicionais residentes”.
120
Fonte: IBAMA
A FLONA possui 6.000km² e foi criada pelo Estado, em 1974, sob a égide das
políticas desenvolvimentistas do Governo Militar. A lógica do Estado como planejador de
políticas públicas de uma região pouco conhecida pelos militares trouxe conseqüências para a
região, tanto positivas quanto negativas. A conservação da área pode ser concebida como um
aspecto positivo do ponto de vista ambiental e, por outro lado, a sobreposição de poderes
entre governo federal, estadual e municipal, o que atualmente reflete no cotidiano das pessoas
que habitam essas áreas apontam resultados adversos, como vem mostrando os primeiros
resultados de uma pesquisa que vem sendo desenvolvida pelo CEAPG, com financiamento do
121
FINEP, que tem como objetivo criar um sistema de monitoramente de políticas públicas de
desenvolvimento local.
O exemplo em questão tem o município de Aveiro como terreno de estudo. O
município de Aveiro fica localizado às margens do Rio Tapajós e tem sua extensão territorial
reconhecida como FLONA, possuindo um grande contingente de comunidades ribeirinhas.
No início da década de 1990, parte de seu território foi desmembrado para a criação do
município de Belterra, levando sua área territorial a ficar com 17.082.30 km² e uma população
estimada em 18.487 habitantes, segundo a última estimativa do IBGE (2007). O município
tem aproximadamente 80% de sua área territorial sob a jurisdição do Governo Federal. Tal
apropriação tem história e período distintos, mas que segue os ditamos sob intervenção
territorial nos estados-membros.
A sede do município foi toda incorporada à FLONA, o que dificulta, por exemplo, a
titulação de terras e que implica na impossibilidade de tributação como o IPTU. Segundo o
Secretario de Gestão do Município, projetos de saneamento básico apresentados pela
Prefeitura Municipal que objetivavam receber financiamentos da Caixa Econômica Federal
foram rejeitados pelo agente financiador, em função do município não possuir a titulação das
terras de sua sede administrativa onde os projetos seriam implantados.
Por tratar-se de uma área de proteção ambiental, a legislação da FLONA vetava o
direito de propriedade da população local dentro de seus limites territoriais, ou seja, a decisão
tomada em âmbito federal não considerou que a presença de famílias na região. Com a
pressão das comunidades locais diversos conflitos entre o IBDF (Instituto Brasileiro de
Desenvolvimento Florestal), mais tarde substituído pelo IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio
Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), e Prefeitura ocorreram na região sendo este
problema somente contornado após a promulgação do Decreto 1298, de 27 de outubro de
1994, quando foi conquistado o direito de permanência de populações tradicionais no local,
como por exemplo as comunidades ribeirinhas.
Em frente à FLONA do Tapajós, do outro lado do rio,
encontra-se a Reserva Extrativista Tapajós-Arapiuns, criada
em de 6 de novembro de 1998, abrangendo parte dos
municípios de Santarém e Aveiro, em de função da pressão
das comunidades ribeirinhas área de proteção.(IBAMA, 2006)
Diferente do que aconteceu na FLONA, segundo Miguel Lima, ex- Presidente da
Associação dos moradores de Suruacá (SEREIA) e um dos participantes mais ativos na
fundação da RESEX, esta ação foi uma conquista das comunidades e, por este motivo, suas
122
ações e decisões são provenientes da voz dos ribeirinhos”, ou seja, as múltiplas narrativas
unidas em torno de uma demanda conquistaram o direito de preservação de seus territórios,
algo que não ocorreu com a FLONA, que fora criada dentro de uma lógica de uma única
narrativa. Assim, no âmbito jurídico firmou-se contrato de uso da área sob proteção para as
populações residentes na RESEX, sendo o IBAMA órgão responsável por organizar,
fiscalizar e legislar sob o território ao lado do conselho da reserva. (Confirmar essa
informação).
A comunidade de Suruacá
Suruacá encontra-se dentro da Reserva Extrativista Tapajós-Arapiuns estando vinculada
administrativamente ao município de Santarém. Segundo informações fornecidas pelo ACS, Sr.
Djalma, a comunidade de Suruacá possui um total de 113 famílias com aproximadamente 500
pessoas, sendo que a maioria das pessoas tem ligações de parentescos umas com as outras, como
lembra Dona Martinha, uma das moradoras mais antigas:
Aqui todo mundo é praticamente parente um do outro. Agente
não aceita gente de fora. Se tu quiser morar aqui tem que
casar com gente daqui. agente te um pedaço de terra
pra construir tua casa. As pessoas de fora espalham uma
idéia diferente. não mais certo. agente tem cuidado
pra comunidade não se dividi.
A ex-freira Maria Manoela lembra que antes de alguém morar em Suruacá é convocado para a
Assembléia para todos conhecerem e para o indivíduo conhecer as regras da comunidade
, fato este
que tem como objetivo mostrar como a comunidade está organizada e apresentar as regras de
convivência existentes no local. Ainda segundo ela esse costume não foi imposto por qualquer
órgão governamental, mas foi construído historicamente desde a formação da comunidade auxiliada
pela Igreja Católica.
Dentro deste contexto de formação a população local se auto-denominar como reibeirinhos, porém
alguns moradores apontam que muitos dos que estão presentes na região são descendentes dos
índios que percorriam as margens dos rios e se negaram a ser catequisados pela Igreja, tornando-se
nômades do Tapajós. Segundo Dona Maria Manoela para se descobrir a origem do povo de Suruacá
é necessário um trabalho integrado entre de um historiador, um antropólogo e um arqueólogo,
sendo que o historiador vai identificar as raízes das histórias aqui da comunidade, o antropólogo
entender a nossa dinâmica e o arqueólogo estudar o que tem aqui por baixo do nosso chão.
Durante as visitas às colônias, lugar afastado da sede de Suruacá, e nas áreas de plantação de
mandioca observa-se a presença de alguns artefatos desconhecidos como, por exemplo, tigelas
123
antigas ou vasos, situados em uma espécie de sítio arqueológico coberto pelas plantações feitas
pelos agricultores da comunidade. Para os moradores da comunidade é comum encontrar esses
objetos, principalmente no momento do preparo da terra que faz parte, também, do dia-a-dia das
famílias Suruacaences.
O dia-a-dia
-Das crianças
A rotina das crianças se alterna-se entre a Escola e as brincadeiras nos quintais, nas largas ruas e no
Rio Tapajós. As crianças também ajudam nos afazeres domésticos e, em alguns casos, na roça. Para
um menino de 10 anos residente na comunidade o dia-a-dia se faz da seguinte maneira:
Eu acordo
bem cedo, tomo meu café e vou pra aula. na escola eu estudo e brinco e merendo. Venho pra
casa almoçar e depois vou pra rua brincar com meus colegas e as vez eu ajudo a minha mãe em
casa. A maioria das crianças encontravam-se com suas atividades escolares ativas, ou seja,
freqüentavam regularmente a Escola e se queixavam que eram cobrados em casa pelos pais, pois
prefeririam estar brincando na rua ou no rio.
Além da escola, os meninos e as meninas se misturam nas brincadeiras no rio, mas quando se trata
em ajudar os pais, geralmente os garotos seguem os pais para as colônias e as garotas ajudam as
mães com as tarefas domésticas.
O tempo das crianças de Suruacá se assemelham ao tempo das crianças da comunidade de
Baixinha, mas se diferem sobremaneira do tempo de uma criança da zona urbana que é restringido
pelo tempo da escola competitiva (AUTOR, XXXX). A criança em comunidades ribeirinhas tem
seu tempo e seu espaço consubstanciados por um cotidiano que se conecta com o tempo e o espaço
da natureza, do rio e da floresta (Castro, XXXX), ordenados pelo cotidiano das mães.
- Das Mulheres
As mulheres de Suruacá têm participação ativa e pró-ativa na gestão da comunidade e na família
como relata Dona Martinha: eu com 17 anos comecei a trabalhar na comunidade. com 70 anos
e cheia de pique. Dona Martinha foi uma das gestoras da Comunidade e fez parte de vários
grupos de jovens organizados pela comunidade com o apoio da Igreja Católica. Atualmente a filha
de Dona Martinha, Maura Bente, atua como coordenadora do conselho comunitário lembrando que
Com 15 anos eu coordenava um grupo de jovens em 1970. O moradores mais antigos procuram
envolver os jovens nas atividades comunitárias, mostrando assim que o espírito comunitário é
repassado de geração para geração sendo algo que faz parte do cotidiano e da territorialidade
(SANTOS, XXXX) da comunidade.
124
Além disso, as mulheres de Suruacá participam de campeonatos de futebol intracomunitários e se
divertem no campo jogando nos fins de tarde. As mulheres possuem um time organizado com
uniforme completo incluindo treinador que faz a preparação técnica do time para participar dos
campeonatos. Além disso, elas ainda trabalham no preparo da comida, na lavagem da roupa, no
quintal ou na beira do rio, e ainda se dedicam as atividades da Igreja e ajudam as crianças com as
lições de casa, como mostra a Sr.a. Margareth: O nosso time de futebol é bom de mais. Agente
ganha é quase tudo e olha que as vezes eu nem pra mim treinar, porque tem que fazer as coisas
aqui de casa.
Em várias ocasiões as mulheres acompanham os Homens para a colônia ou ajudam na preparação
da farinha. Tal como em Baixinha as atividades das mulheres concentram-se no lar, na colheita e na
casa de farinha, entretanto o lazer e a dedicação ao futebol é diferente, assim como a atuação na
vida da gestão comunitária.
-
Dos Homens
O homem Surucaense tem sua atividade relativamente parecida com os homens da comunidade de
Baixinha. A ocupação principal é o trabalho na colônia, no plantil da mandioca para a produção de
farinha e do tucupi e na precária coleta do látex. Ademais, os homens fazem o trabalho de
capinagem e assumem a responsabilidade em fazer as compras na sede do município. Geralmente
acordam junto com o Sol e partem para a lida diária, retornam para o almoço e deitam-se cedo
com o por-do-sol. O interesse pela vida comunitária é acentuado, como mostra o Sr. Milguel Lima:
Agente tem que cuidar da comunidade também. Nós
procuramos envolver todo mundo. Não é fácil, mas agente faz
o que pode e no final o pessoal acaba ajudando .O Puxirum é
um exemplo disso. Quando precisa arrumar a comunidade
todo mundo se junta, varre a rua, e faz o que precisa pra
deixar tudo certinho.
O Puxirum é uma atividade de mutirão que ocorre para manter a comunidade limpa onde grande
parte dos moradores se reúnem em um determinado dia para realizar tarefas de limpeza e
conservação. Na comunidade de Baixinha não uma atividade como essa, entretanto o convite
que uma família faz às outras para ajudar na roça. Holdgate (XXXX) mostra que o sentimento de
solidariedade do cuidar do cotidiano se interconecta com a conservação dos lugares em que as
pessoas habitam.
125
- Da comida no cotidiano
Dona Martinha lembra que A farinha é o prato principal. O resto é acompanhamento(Rindo). No
andamento da pesquisa, tanto em 2006 quanto em 2007, observou-se a importância desse alimento
do cotidiano dos ribeirinhos. A farinha é servida com o açaí, com o peixe, com a carne ou qualquer
outro tipo de alimento. A produção da farinha é feita pela própria comunidade nas casas de farinha.
No mês de julho de 2007 participou-se do processo completo da produção da farinha, desde a
colheita da mandioca até o preparo no forno, observando-se uma similaridade nesse processo com a
comunidade de Baixinha.
O Peixe é abundante na região sendo um dos alimentos consumidos em grande quantidade pelos
ribeirinhos. O processo de pesca se na comunidade de duas forma: pela linha e anzol ou pela
tarrafa, chamada também de rede. Durante a pesquisa participou-se de uma pescaria onde onde se
observou o processo de pesca com a tarrafa: jogava-se a rede para puxar o peixe que, mais tarde,
seria servido à mesa para o jantar. O Boto acompanhou toda a pescaria com o intuito de servir-se
dos peixes capturados pela rede, habito freqüente deste, como aponta o Sr. Djalma:
Sempre é assim,
esse safado prejuízo. Fica rondando por aqui, agente joga a rede e ele espera o peixe se
emboletar na rede pra comer, mas ele sempre fura nossa rede.
Observou-se ser necessária muita agilidade por parte do ribeirinho para puxar a rede no momento
em que sentir que o Boto está consumindo o peixe que será arrastado para dentro da Bajára
54
,
complementa o Sr. Djalma:
Se vacilar ele vai comer toda a nossa janta!
Outro alimento consumido é a carne que é comprada na sede do município e, em alguns casos, as
verduras e legumes também são compradas em Santarém, apesar do grande espaço disponível nos
quintais das casas para a construção de hortas. Igualmente a Baixinha, também são consumidos na
comunidade enlatados como sardinha e salsicha.
- O lazer no dia-a-dia
Para os ribeirinhos a principal atividade de lazer e talvez mais importante em Suruacá é o futebol.
Existem dois Clubes dentro da comunidade com campos de futebol e sede própria, que são o Santos
Futebol Clube e o Norte Brasil, ambos com times masculino e feminino. Cada clube treina no seu
54
Bajara é o nome que se dá a um barco de pequeno porte, com ou sem motor, que é utilizado na pesca e no
transporte diário do ribeirinho. Pode ser considerado o carro particular do ribeirinho, onde nem todas as famílias
têm a oportunidade de ter.
126
próprio campo de futebol, que possuem metragens oficiais, com jogos de camisas e bolas próprias
adquiridas por meios próprios, entretanto com gramados irregulares que podem causar lesões ou
torções nos jogadores. Os clubes se enfrentam regularmente e jogam,também, com clubes de outras
comunidades.
Além do futebol o Rio é o espaço utilizado para o lazer principalmente das crianças. As terças
feira quando o barco de transporte de passageiros aporta em frente a comunidade e quando parte, ás
quarta, as crianças aglomeram-se desde cedo em frente e dentro do rio para receber as pessoas e se
divertem durante a permanência do barco no local. As crianças também associam seu lazer a escola,
como mostra o pequeno Djalminha de apenas 11 anos:
(...)eu também gosto de ir para escola,
porque lá agente também brinca e merenda.
As ações da Igreja Católica junto aos jovens também pode ser considerado um lazer, não enquanto
ação, mas enquanto momento de congregação dos jovens: Além da gente se organizar agente
também se diverte nos clubes de jovens. Mas as vezes não tem o que fazer. Agente precisa de
projetos pra cá. Tem muito jovem aqui com muito talento, mas não tem apoio.(Rafael 14 anos). O
quadro apresentado retrata certa similaridade com as atividades de lazer existentes na comunidade
de Baixinha.
- Problemas do cotidiano
Tal como na outra comunidade estudada, em Suruacá os principais problemas da comunidade são
pontuais, entretanto a questão da Luz é a que está em pauta no momento na comunidade, em função
da expectativa que vem sendo gerada pelo governo municipal em torno do Programa Federal Luz
para Todos. Segundo Dona Martiha O pessoal da prefeitura quando vem aqui sempre ta falando
desse tal de Luz para Todos
55
, mas agente ta esperando e também agente ta cansado de esperar
(Abre uma risada bem alta)
A ausência de atividades complementares para os jovens também é lembrada na maioria das
conversas e entrevistas, principalmente com os adolescentes e pai de adolescentes, como mostra o
Sr. Mauro: A Igreja tem umas atividades muito boas, mas depois não tem o que fazer. Pra fazer
uma coisa diferente tem que ir pra Santarém ou pra Manaus. Eu tenho um filho que trabalha em
Manaus e ajuda agente por aqui no que pode. O êxodo entre os jovens varia de tempos em tempos,
de acordo com as possibilidades dos familiares para encaminhá-los aos centros urbanos.
Uma questão, que não chega ainda a ser um problema, vem sendo observada com reservas pela
comunidade de Suruacá é o êxodo entre as comunidades da FLONA e da RESEX, ou seja, o que se
55
O Programa Luz para Todos é um ação do Governo Federal que xxxxxxxx
127
chama nesse trabalho de êxodo intracomunitário. Dado que recentemente a comunidade de Suruacá
implementou uma Escola Pólo de ensino médio, vários jovens estão migrando para o local com o
objetivo de estudar. As lideranças locais identificam dois lados nesse processo:
É bom por um lado
porque agente tem um lugar pra colocar os meninos aqui da comunidade pra continuar os estudos,
mas agente se preocupa porque vem gente de outras comunidades que as vezes agente nem
conhece e tem outro jeito
(Maura Bentes - Coordenadora do Conselho Comunitário, 2007). Outros
problemas pontuais foram apontados pelos comunitários. O Sr. Djalma aborda que existe uma
preocupação dos pais com relação a chegada da Energia Elétrica para a comunidade, pois as
crianças ficaram mais tempo expostas aos programas de televisão. A Sr.a. Maria Manoela,
antiga
moradora da comunidade,
Vai ser bom por um lado se a luz chegar, mas por outro agente tem que
ter cuidado com o que os meninos vão ver. Agente ouve tanta história. Bem, vai de cada família
controlar o que o filho vai ver ou não, né?
Outros problemas do cotidiano são evidentes como as doenças causadas em função do clima e da
água ingerida. Tal como na comunidade de Baixinha a falta de tratamento de água provoca impacta
negativamente na saúde dos ribeirinhos causando-lhes febre, dores e verminoses. O ACS da
comunidade lembra o seguinte: Olha isso, na época do inverno a coisa fica pior, porque os
meninos vão tomar banho no rio e eles acabam ingerindo a água que tá muito suja isso faz mal pra
eles. eles ficam com febre, dores e tem muita verme também O pessoal do PSA que ajudou
agente aqui com uns potes e hipoclorito pra tratar a água. Além disso, as ferradas de arraia,
picadas de cobra e de escorpião preto, emergem como uma preocupação constante no cuidado que
as mães têm com seus filhos. Dona Maria relata que ensina desde criança seu filho a entrar na água:
Eu falo pra esse zinho aqui, tu te cuida quando entrar na água. Vai arrastando o pra espantar
elas da beirada.
Os problemas do cotidiano são geralmente acompanhados de soluções identificadas pela própria
comunidade. O cotidiano que as vozes do terreno de pesquisa mostram fazem parte do dia-a-dia dos
ribeirinhos, construído os lugares da comunidade e suas representações. A conformação desse dia-
a-dia não se pela representação somente dos bens materiais, mas por um cotidiano (BERGER,
XXXX) que entrecruza os diversos fatores internos ao homem a fatores externos, que compõem
uma cultura própria interagindo aspectos cognitivos, emotivos e corpóreos (BOFF, 1999) do
homem com a natureza, do homem com o homem e do homem com o que é considerado externo ao
seu lugar. Assim, observa-se a preocupação das lideranças da comunidade em manter seus padrões
culturais observando as mudanças que algumas políticas públicas podem provocar no cotidiano da
comunidade.
128
- Morar na comunidade
A comunidade de Suruacá possui atualmente 113 famílias sendo que a maioria reside na
comunidade a bastante tempo, como é o caso de Dona Martinha que mora desde que nasceu, ou
seja, 70 anos. Como referência para este tópico, Dona Martinha fala que apesar das mudanças
ocorridas na comunidade nesse período, morar na comunidade pra ela representa paz:
Eu criei meus filhos aqui e todos com saúde e bem. Agente
não é rico de dinheiro, mas é rico de outras coisas. Aqui tem
peixe, tem a caça, tem fruta e tem a cervejinha também
(Rindo). Agente gela ela no gelo que vem de Santarém. Aqui
não tem violência. Não tem nem Policia. Nos mandamos ele
embora daqui porque quando ele tava aqui a coisa era
pior.Isso aqui é uma paz só.
Morar na comunidade também é sinônimo de segurança. Segundo a Sr.a. Maura Bente na década
de 1980 havia na comunidade um agente de segurança que fazia parte do quadro de funcionários
da Polícia Militar do Governo do Estado do Pará, que tinha como principal função manter a
ordem e dar segurança para os comunitários de Suruacá. Entretanto, Maura relata que a falta de
preparo do agente para se relacionar e tratar impactou negativamente no cotidiano das famílias
suruacaences, pois em casos de briga ou agressões mais violentas o agente seguia as normas que
o Estado determinava, ou seja, encaminhava o agressor para a sede do município para que as
providências legais fossem tomadas. Lembrar que o policial é preparado dentro dos padrões
colocados pelo Estado e não dentro dos padrões do cotidiano da comunidade (inserir isso na
análise – RETORNANDO ÀS POLÍTICAS PÚBLICAS).
No início da década de 1990 as lideranças locais se reuniram e decidiram solicitar o afastamento
do agente da comunidade, mas não somente daquele servidor público, mas qualquer outro que
tivesse relação com a polícia, pois, segundo Dona Martinha:
A polícia não dava conta. Acabamos com a Polícia e criamos o
conselho de lideranças. Não tem delegado nem agente de
segurança pública. Quando tem problema a própria
comunidade resolve. Não tem uma morte de morte matada a
muito tempo. A última vez que aconteceu foi um homem de
outra comunidade que matou um ancião daqui. Mas foi numa
festa. Nós criamos nossas próprias Leis. Vamos criando de
acordo com que as coisas vão acontecendo.
Ter segurança para a comunidade também é sinônimo de Paz. Observou-se em campo que
durante a noite algumas pessoas atam suas redes na rua, entre uma árvore e outra, e dormem do
129
lado de fora da casa, principalmente em noites onde a temperatura se eleva dentro das residências.
Para muitas mulheres o que chega a incomodar a segurança local é o excessivo consumo de
bebidas alcoólicas por parte dos homens jovens e adultos, que em alguns casos acabam se
desentendendo e brigando chegando, algumas vezes, a agressões físicas. Nos casos de agressões
físicas as lideranças comunitárias se reúnem e procuram identificar quem são os perturbadores da
ordem para conversar e aplicar as punições cabíveis segundo os costumes locais, como aponta
Dona Marta:
As vezes o pessoal exagera na bebida e acaba fazendo
besteira, brigando e se batendo. Na última festa que teve aqui
na comunidade dois rapazes brigaram no campo e ninguém
ficou sabendo. Eles esconderam de todo mundo que tinham
brigado. Agente descobriu porque no outro dia os dois
apareceram com a cara toda ferida. Eu chamei os dois aqui e
perguntei o que tinha acontecido e falei que se eles mentissem
seria pior. Mas eles confessaram a verdade.
Nesses casos a liderança local solicita que ambos apertem as mãos selando a paz. Caso os
infratores se recusem a fazer a reconciliação da amizade, a punição inicial aplicada é que as
principais ruas da cidade sejam varridas por eles. Em infrações mais graves a família toda é
convocada para uma reunião com o Conselho de Lideranças para que providências mais
severas sejam tomadas que, no limite, podem chegar até a expulsão do infrator da
comunidade.
Portanto, morar em Suruacá parece ser sinônimo de Paz e em função de várias aspectos tais
como ações da própria comunidade para manutenção da ordem pública, tranqüilidade no que
se refere a abundancia de alimento e a solidariedade das famílias uma com as outras em
ajudar no Puxirum ou em outras atividades coletivas.
- A relação com a sede
Essa relação se dá via rio ou via rádio. O rio é o meio que conecta os ribeirinhos com a cidade, com
as políticas públicas, com as outras pessoas das cidades como, por exemplo, Santarém, Belterra e
Aveiro. Um dos principais apoios identificados pelo ACS e reconhecidos pela comunidade, como
se verá no próximo tópico, é o Projeto Saúde e Alegia, um ONG que atua na comunidade desde a
década de 1980 na área de prevenção e saúde. O PSA é visto como um ponto de apoio da
130
comunidade na sede e o ACS da comunidade como um ator que estreita a relação com a cidade e
com a saúde. Sempre que eu vou em Santarém eu passo pelo PSA. Eles são como se fossem uma
base pra gente lá
(Relato do Sr. Djalma, 2007).
Além do PSA aqueles comunitários que possuem famílias em Santarém estreitam a relação com a
sede, pois tendem a viajar com maior freqüência. Para a maioria dos ribeirinhos de Suruacá viajar
para a sede do município é sempre um momento prazeroso que os coloca em contato com uma
realidade distinta da vivida diariamente, como lembra um adolescente de 17 anos:
Eu gosto muito
de ir pra casa da minha madrinha em Santarém. Sempre que eu posso eu vou por lá. tem
coisas diferentes daqui.
A relação inversa também existe, pois algumas crianças que mantém
parentesco com pessoas da comunidade encontravam-se brincado no Rio em um dos momentos de
observação. Em uma aproximação com elas o seguinte relato foi feito:
agente vem pra pra e
brinca o dia todo com os nossos primos. Agente toma banho de rio e brinca na rua. Aqui agente
pode correr a vontade porque não tem carro pra atrapalhar.(Relato de Evandro, 13 anos, 2007)
A relação com a sede também se por outros caminhos, como por exemplo pelos representantes
políticos
Assim, na relação com a sede o rio é o elo de ligação entre a comunidade e a cidade e os políticos, o
PSA e a família, parecem ser os pontos que conectam os dois espaços. Portanto, políticos, ONGS e
a família fazem parte de um sistema complexo que une dois lugares onde políticas públicas
incidem, indo e vindo pelo rio, sendo conectadas e desconectadas pelos por agentes que fazem parte
do cotidiano das pessoas que vivem na comunidade.
5 – As políticas públicas na Comunidade de Suruacá
5.1 Atores presentes no cotidiano da comunidade
A identificação dos atores na comunidade de Suruacá segue a mesma lógica do processo
realizado em Baixinha. A pesquisa de opinião foi induzida e o método de coleta foi aleatório,
procurando equilibrar o número de entrevistados com relação aos seguintes fatores: idade,
sexo, tipo de atividade desempenhada na comunidade. Das 113 famílias presentes na
comunidade coletou-se 200 questionários para a identificação dos atores, dentre adultos,
jovens e crianças de ambos os sexos. Ademais, no mês de julho de 2007, por meio do Projeto
131
de Iniciação Científica Conexão Local
56
, foram coletados cerca de 800 questionários entre
mais de 20 comunidades visitadas.
Reconhecimento dos atores
0%
20%
40%
60%
80%
100%
PSA (Programa
STR (Sindicato
ACS (Agente
Programa Bolsa
IBAMA
INCRA
Igrejas
RESEX
PC (Pastoral da
MOC
PSF (Programa
MST (Movimento
CPT (Comissão
CONASEMS
Prelazia
UNICEF
EMBRAPA
CESE
ABONG
GTZ -
Visão Mundial
DIACONIA
Atores
(%)
Nas comunidades do rio tapajós, na opinião dos ribeirinhos, os atores mais presentes em seu
imaginário são o PSA, o Sindicato dos trabalhadores Rurais e o Agente comunitário de Saúde. O
IBAMA, o INCRA e a Igreja também figuram entre os mais reconhecidos. Para análise da interface
com as políticas o PSA, o Sindicato dos Trabalhadores Rurais o ACS e a comunidade de Suruacá,
são referências para mostrar como as políticas públicas incidem na comunidade.
Os resultados encontrados aqui se diferem da comunidade de Baixinha principalmente no que diz
respeito da presença de uma ONG como ator importante para a comunidade na opinião dos
ribeirinhos, enquanto que em baixinha a comunidade mostrou que o Sindicado dos produtores
rurais são mais presentes no dia-a-dia da comunidade. Em Suruacá o sindicato também é um ator
que tem sua presença marcada no cotidiano dos ribeirinhos e parecer ser uma referencia na luta
pelos direitos nas duas comunidades. Outro ator relevante são os ACSs que, independente da
eficiência de sua atuação estão presentes na pesquisa de opinião nos dois lugares.
56
Nesse período participamos como Tutor do Projeto de Pesquisa Conexão Local que é uma iniciativa da
Fundação Getúlio Vargas de São Paulo, que tem como objetivo colocar alunos do curso de graduação de
Administração em contato com a pesquisa por meio da inserção do aluno em campo. Os alunos Alexandre Rolo
e Letícia Oi participaram do programa e vivenciaram a experiência de estudar políticas públicas em comunidades
ribeirinhas no Tapajós e o Projeto Saúde e Alegria (PSA). Os alunos permaneceram na região 23 dias onde 10
deles viajando no barco do PSA conhecendo comunidades da FLONA e da RESEX. Os alunos também
aplicaram a pesquisa de opinião nas comunidades visitadas seguindo o mesmo método deste trabalho. Os dados
levantados pelos alunos de iniciação científica foram agregados para a montagem do gráfico XX. Portanto, o
gráfico acima está sendo utilizado tanto neste trabalho quanto no relatório de iniciação científica da FGV-SP.
132
4 A interface das políticas públicas
57
para os atores mapeados
4.4.1 - A água e o abastecimento na comunidade
As distâncias parecem ser um dos diferenciais da região amazônica que diminui a
velocidade de locomoção de um lugar para o outro. Como já dito anteriormente possui grande
extensão territorial para uma das mais baixas densidades demográficas do país e sua
hidrografia permite a larga utilização de embarcações pela navegabilidade de seus rios. Assim
sendo, o principal meio de acesso e de transporte de bens, pessoas e informações na
localidade estudada são os rios, mais especificamente o rio Tapajós.
A importância do rio reflete na noção de tempo e ritmo de vida das comunidades
ribeirinhas determinada pelas cheias e vazantes do rio que determinam as melhores épocas
para a pesca e a navegação até certos trechos. Ele funciona como um canal de ligação entre as
comunidades e entre as comunidades e outras localidades trazendo e levando notícias,
informação e conhecimento. Entretanto, nas comunidades o que se viu foi o transporte escolar
por barco para alunos provido pela prefeitura para os que estudam em outras comunidades, no
entanto, em algumas épocas do ano precisam adicionar alguns quilômetros a mais de
caminhada, pois o percurso de barco fica reduzido com a seca do rio.
também barcos de linha que funcionam da mesma forma que um ônibus, são de
propriedade privada e fazem o itinerário de ida e volta até as cidades mais próximas
(Santarém, Aveiro, Belterra e Itaituba), o que pode levar horas de viagem e adiciona-se o fato
de que as passagens são relativamente caras para os ribeirinhos. Portanto, a ida para a cidade
só ocorre quando é realmente necessário, por exemplo, quando há necessidade de ir ao
médico ou de retirar o dinheiro do Bolsa-Família, entre outros, tendo em vista que parte do
dinheiro retirado vai para o pagamento da passagem.
Ademais, alguns ribeirinhos possuem barcos rústicos de fabricação própria, as
chamadas bajáras nas quais é acoplado o motor a gasolina, que têm utilização própria para
pesca e transporte e também podem ser emprestados para outros comunitários. O rio Tapajós
além de estar arraigado na cultura local como fonte de sustento, alimentação e lazer; como
meio de acesso, permite não o afluxo de bens, pessoas e informações, como também o
acesso à saúde.
4.4.2 Comunicação
57
Todas as políticas públicas citadas neste trabalho, enquando governo em ação, encontram-se no anexo XX
133
O conhecimento cumulativo é uma das maiores fontes de riqueza da sociedade e para isso o acesso
à informação precisa ser contínuo, caso contrário conhecimentos prévios e habilidades se tornam
inúteis ou ficam subutilizados. Assim sendo, a comunicação se traduz num processo de socialização
de informação essencial para troca de conhecimento e experiências.
Dentro das comunidades ribeirinhas do Tapajós, os meios mais comuns de se ter acesso à
informação relevante para tomada de decisões que fomentam iniciativas e inovações são o boca a
boca, a rádio, o jornal, a tv e a internet, em raros casos. No âmbito local, as conversas formais, tais
como palestras informativas, oficinas de capacitação, reuniões e assembléias da comunidade, e as
conversas informais do dia-a-dia como o boca a boca são o meio mais comum para difundir as
informações. Tais conversas são fundamentais para estabelecer uma relação de confiança com o
outro de modo a permitir a formação de um senso de coletividade que implica na organização social
para mobilização. Da mesma forma funcionam a rádio e o jornal que fornecem, além de notícias da
região, informações de utilidade prática e informes culturais sobre hábitos e costumes tradicionais.
Em entrevista com o primeiro presidente da associação de Suruacá, apelidada de Sereia pelos
moradores locais, a idéia de criar uma associação surgiu quando o mesmo ouviu pelo seu rádio,
movido a pilha, informações de como criar uma associação e suas vantagens para a comunidade.
Embora as comunidades visitadas tenham a energia elétrica limitada pelo número de litros de diesel
disponíveis para o gerador, muitas famílias possuem tvs em suas casas. De acordo com o presidente
da comunidade de Boim, em cada casa onde uma tv, existem pelo menos uma ou duas pessoas
aposentadas ou professor na família. Pelo que observamos é válido inferir, porém com muita
cautela, que parece haver aqui uma relação entre as pessoas que possuem uma renda fixa com
aquelas que possuem televisores em casa. Entretanto, as comunidades que possuem energia elétrica
são alimentadas por geradores movidos por combustível sendo o abastecimento de energia irregular
na maioria das comunidades, ou seja, em alguns lugares o “gerador só funciona” pela parte da noite
até as 22h e em outras aos fins de semana ou em festas comemorativas da padroeira do local. Nesse
cenário observamos que o fornecimento de energia depende basicamente da renda que cada
comunidade possuiu para alimentar seus geradores comprando combustível na sede do município,
ou seja, existe energia se houver recursos dentro da comunidade para a compra do combustível.
A maioria das comunidades possui energia elétrica por algumas horas semanais, mas com o Projeto
Luz para todos do governo federal, que está sendo colocado em prática em algumas
comunidades, esse número poderá aumentar, pelo menos essa foi a expectativa que identificamos
em nossas entrevistas com os moradores locais.
“Vai ser uma glória quando a luz chegar. Agente não vai mais precisar beber água fria e agente vai
poder ver a novela e os homens o futebol sem precisar fazer coleta sempre que passar um jogo. Pelo
134
que agente houve falar a luz vai chegar pelo governo pelo luz para todos. Tomara que não seja mais
uma promessa” (Moradora de 64 anos da comunidade de Suruacá)
Por outro lado, em alguns casos, isso está gerando certo receio para os comunitários com relação ao
conteúdo veiculado pela tv e como isso irá impactar na comunidade e na cultura local, pois a partir
do momento em que uma criança prefere deixar de nadar no rio para assistir tv isso é um indício de
que está se perdendo a referência local.
No que tange à comunicação entre as comunidades, algumas possuem telefones públicos e rádio-
amadores. Todavia, o número de telefones públicos nas comunidades ribeirinhas visitadas é muito
reduzido, visto somente em Suruacá e Boim sendo ainda um meio muito restrito para a maioria dos
habitantes da margem do Tapajós. Os rádio-amadores, por sua vez, estão presentes em algumas
comunidades oriundas de concessão do projeto Pro-Manejo do IBAMA no caso das comunidades
da Flona ou de doação da ONG Projeto Saúde e Alegria (PSA). Sua finalidade fica restrita para
casos de emergência que possam ocorrer na comunidade e requeiram ação imediata, por exemplo,
picadas de cobra e ferroadas de arraia ou para monitoramento e vigilância da área pelo IBAMA no
caso das comunidades da Flona. Assim como o uso de telefones públicos, o uso do rádio-amador é
também restrito tanto pelo número reduzido de aparelhos e pelo seu uso limitado de caráter
emergencial, quanto pelo fato de que os ribeirinhos encontram muitas dificuldades na manutenção
do aparelho. Antônio Pereira, cacique da comunidade de Escrivão que fica localizada no município
de Aveiro, relata que o rádio com o qual o IBAMA recebe os chamados da Flona era mantido na
Secretaria de Agricultura de Aveiro que, entretanto, funcionava somente pela parte da manhã e caso
ocorresse algum problema com o aparelho, os ribeirinhos pagam pela compra de peças e de nova
bateria, ou seja, novamente, os custos são arcados pelas comunidades.
4.4.3 Educação
A educação é a força por trás do desenvolvimento, potencializadora das possibilidades no longo
prazo, pois ela fornece as bases do conhecimento à medida que estimula a compreensão e análise da
realidade e das informações (DOWBOR, 2006). Por essa razão, constitui-se num meio fundamental
que viabiliza o desenvolvimento do indivíduo bem como do meio em que ele se insere, uma vez
que é a unidade básica componente de sua comunidade (FREIRE, 1996).
Nas comunidades visitadas, percebemos não existir educação infantil como prevê os artigos 29 e
30 da Lei de Diretrizes e Bases (LDB) da Educação, pois uma ausência de apoio, creches ou
equivalentes, por parte do serviço público. A educação parece se apresentar por meio das escolas,
do elevado número de crianças e jovens em idade escolar e do razoável número de famílias que se
135
recebem o dinheiro proveniente do Programa Bolsa Família, que possui como uma das
condicionalidades fazer com que as crianças permaneçam nas escolas . Em grande parte dessas
comunidades o ensino segue somente até o fundamental . As salas são multisériadas abarcam até a
quarta série, pois não é possível formar uma única turma de cada série, sendo que a maioria do
corpo docente que ministra aula para o ensino básico e o da própria comunidade. O Ensino médio é
realizado de forma modular e periódica sendo os professores provenientes da sede do município
alojando-se em casas construídas pela prefeitura para este fim.
Observamos em nossas conversas com os ribeirinhos que um dos maiores problemas dizem respeito
à continuidade das ações que lhes são propostas. Como dito anteriormente o sistema do ensino
médio é modular, ou seja, é lecionada intensivamente uma única disciplina por vez com todo o
conteúdo relativo aos três anos. De acordo com o líder do grupo de jovens da comunidade de
Suruacá, o problema do ensino modular é a vinda dos professores, pois são poucos os que têm
disponibilidade para ficar alguns meses nas comunidades ribeirinhas. Segundo a coordenadora do
Conselho Comunitário e funcionária de uma escola,para se ter uma idéia, em 2007 a última aula do
ensino médio havia sido em fevereiro e o outro módulo ainda não havia começado, o que parece ser
um vetor de desestimulo aos jovens nos estudos.
Além da falta de assiduidade dos professores do ensino médio, outra queixa dos comunitários
reside sobre o conteúdo do material didático. Nos livros utilizados em sala o conteúdo remete a
uma realidade desconhecida para muitos alunos. Durante nossa visita à comunidade de Capixauã
um respeitado professor da comunidade, lembrou de um caso ocorrido em uma de suas aulas em
que teve de explicar a um aluno o que era uma uva. Ora, esse fato não teria acontecido se fosse um
bacuri, cupuaçu ou açaí, isto é, o conteúdo descontextualizado (ARAÚJO, 2007) da realidade do
povo ribeirinho pode dificultar tanto o aprendizado quanto o ensino e, além disso, contribuir para
perda paulatina da sua identidade cultural, uma das grandes preocupações de Maria Manoela
Francisca de Souza, moradora da comunidade de Suruacá, que crê no papel da educação como meio
para a garantia das tradições e da existência da própria comunidade.
No que tange ao transporte escolar, as prefeituras de Aveiro e Santarém disponibilizam alguns
barcos para deslocamento dos professores do ensino médio. Apesar do apoio do governo municipal
um morador da comunidade de Vista Alegre do Capixauã, diz que “é muito dificultoso” e por isso
muitos jovens acabam optando por ficar em suas comunidades trabalhando no roçado. Em alguns
casos, quando chega a época da vazante e o rio seca, os barcos param muito longe das comunidades
adicionando uma caminhada de alguns quilômetros para os alunos.
As instituições de ensino superior da região estão localizadas em Santarém e, portanto, para a
continuidade dos estudos a opção mais próxima seria ir para Santarém. Contudo, as famílias não
136
possuem condições financeiras para sustentar seus filhos na cidade, nem para pagar uma faculdade;
por esse motivo, a maioria permanece na comunidade participando dos trabalhos comunitários e
alguns poucos vão para Santarém ou para Manaus, com os objetivos de trabalhar e continuar os
estudos, pois como dito anteriormente as comunidades não dispõe de todas as séries que o
sistema tradicional de ensino exige.
4.4.4 Energia Elétrica (Luz)
4.4.6 Saúde
Segundo as definições de FRIEDMANN (1992) para o conceito de necessidade, a
saúde para um indivíduo pode ser configurada como uma necessidade dentro de relação
funcional. Ou seja, a saúde pode ser encarada como um meio necessário para se obter algum
fim como o desenvolvimento, disposição e vigor físico essenciais para atividades domésticas
e comunitárias. Caso essa necessidade não seja satisfeita, o desempenho individual fica
comprometido, que não se goza plenamente de suas capacidades e a qualidade de vida se
deteriora, o que compromete seu auto-desenvolvimento e, por conseqüência, o
desenvolvimento local.
A prestação dos serviços de saneamento básico para a população é essencial para a
criação de um ambiente favorável à promoção da saúde do indivíduo. Dos serviços de
saneamento básico nas comunidades ribeirinhas, o abastecimento de água potável e o esgoto
sanitário estiveram mais presentes. Conforme a Lei 11.445, de 5 de janeiro de 2007 que
define as diretrizes nacionais para o saneamento básico e para a política federal de
saneamento básico, o abastecimento de água potável aparece como um dos serviços
compreendidos pela política. Contudo, durante o trabalho de campo, pôde-se perceber que o
fornecimento de água própria para consumo ainda é um problema para os povos das águas.
Na medida em que algumas comunidades ribeirinhas visitadas possuem água encanada
através de um sistema de bombeamento da água do rio ou de poços; outras, ainda retiram a
água diretamente do rio para consumo imediato.
Em Suruacá, financiados por capital norte-americano juntos da parceria com o PSA, o
sistema de água é um dos mais modernos da região e consiste numa bomba movida por
energia solar que bombeia a água de um poço de 60 metros fornecendo água potável para
todas as casas. Também parte do trabalho conjunto entre a Tapajoara, Associação Yané
Caeté
58
e por capital alemão, a comunidade de Pinhel no município de Aveiro conseguiu um
micro sistema de abastecimento de água. nas outras comunidades, o sistema funciona de
58
Associação Yané Caeté: associação inter-comunitária composta pelas comunidades de Escrivão, Camarão e
Pinhel do rio Tapajós do município de Aveiro que se consideram indígenas.
137
forma mais simples, pois a água é bombeada do rio através de um gerador, armazenada em
caixas d’água, ambos fornecidos pela prefeitura e depois distribuída pela comunidade.
Adiciona-se a isso o custo com o óleo diesel necessário para o funcionamento do gerador que,
por exemplo, em Cametá, custa 4 reais mensais para cada casa beneficiada.
Do outro lado, ou seja, a maioria das comunidades visitadas, o fornecimento de água
potável ocorre ainda de maneira muito rudimentar e, por vezes, precária. Em São Francisco de
Assis (Godinho) na FLONA, assim como em muitas outras comunidades, a água é retirada de
poços artesianos para consumo e, em outros casos, retirada diretamente do rio e colocada em
filtros de barro com adição de hipoclorito, fornecidos pelas prefeituras ou pelo PSA, ou
algumas gotas de limão que funcionam como bactericida. Trata-se de uma medida simples
que consegue evitar a contaminação pela água se colocada em prática. De forma mais
precária, na comunidade de Itapuama, também situada na FLONA, as famílias consumiam a
água diretamente do rio, pois presenciamos que o odor da água não era dos melhores
impossibilitando as pessoas de beber ou tomar banho com ela.
Com relação ao esgoto sanitário, não rede de esgoto nas comunidades, ao invés
disso, a maioria das famílias faz uso da pedra sanitária, piso de cimento para impermeabilizar
fossas sanitárias. As condições de saneamento básico relacionam-se diretamente com a saúde,
pois a falta de água potável ou o uso inadequado das fossas sanitárias nas casas das famílias
ribeirinhas pode desencadear uma série de complicações de saúde que comprometem não só o
desenvolvimento das crianças em fase de crescimento deixando-as mais suscetíveis a
contraírem doenças como também aos adultos. Logo, acabam por desestruturar a dinâmica
das famílias e, conseqüentemente, da comunidade.
De outra perspectiva, os impactos de más condições de saneamento básico nas
comunidades ribeirinhas, aliados à falta de água potável, podem refletir em um aumento dos
gastos do governo com saúde, uma vez que com a proliferação de doenças e contaminações os
problemas se ampliam e começam a adquirir uma complexidade maior. Para tanto, as
políticas públicas mais presentes na região visitada que possuem esse caráter preventivo
correspondem ao Programa Saúde da Família (PSF) e/ou ao Programa de Agentes
Comunitários de Saúde (PACS) que foi incorporado ao PSF onde a atenção básica é
ampliada.
O ACS é um dos mais importantes atores reconhecidos pelas comunidades, como
podemos observaremos na figura adiante, que faz parte dos programas supracitados. Este
ACS desempenha um papel essencial para o bom andamento de uma parte importante das
políticas de saúde que é a atenção básica. Por se tratar de alguém que vem da própria
138
comunidade, ele representa o elo entre o científico, atrelado aos procedimentos em situações
emergenciais (processos mais simples) como fraturas, picadas de cobra e de insetos e
ferroadas de arraia e aos conhecimentos sobre as doenças e casos mais freqüentes na
comunidade, e o saber local traduzido não nos remédios caseiros extraídos da natureza
cujos conhecimentos são passados de geração a geração, mas também na cultura local como
um todo.
Parte integrante da comunidade, o agente comunitário de saúde consegue se fazer
ouvir e se fazer entender de maneira mais efetiva do que qualquer outra pessoa de fora
conseguiria. Como a dinâmica de trabalho compreende visitas às casas das famílias, o
estabelecimento de uma relação de confiança é favorecido pelo fato do ACSs ser da
comunidade, o que faz com que sua atuação para o controle social na conscientização e na
prevenção de doenças, para a identificação e acompanhamento de diabéticos, hipertensos e
gestantes e para procedimentos de caráter emergencial pudessem ser observados de forma
significativa no trabalho de campo com os ribeirinhos do Tapajós.
Esse caráter territorializado que possui o ACS vai bem além da garantia da saúde
básica dos comunitários. Mais do que isso, “A territorialidade chama a nossa atenção para o
ambiente físico: a base de recursos da economia, o valor estético de paisagens tradicionais, e a
qualidade de vida no ambiente construído onde têm lugar todas as nossas ações e que afetam a
nossa vida, direta e indiretamente” (Friedmann apud Dowbor). Nas comunidades do rio
Tapajós, poucos foram os momentos que observamos esse conceito presente no cotidiano dos
gerentes das políticas e ações públicas locais, que não tenha sido o PSA.
Segundo o ex-Coordenador da área de saúde do PSA, o fator agravante na região
amazônica são as distâncias que implicam no meio de transporte e nos custos incorridos com
isso. Esses altos custos com tratamento fora de domicílio constituem juntamente com outras
variáveis o “fator amazônico”, ou seja, o que diferencia a atenção básica na Amazônia do que
preconiza a portaria da atenção básica. Atualmente, para casos de emergência o PSA dispõe
de uma ambulancha, lancha que cumpre a função de ambulância, e a prefeitura de Santarém,
duas. Essas ambulanchas são acionadas via rádio-amador providenciado na Flona pelo
IBAMA e na Resex pelo PSA e encaminham os pacientes para atendimento médico. De
acordo com Emanuel, secretário municipal de saúde de Santarém, são feitas de 60 a 80
chamadas mensais numa média de 2 a 3 chamadas diárias. Entretanto, nem todas as
comunidades ribeirinhas visitadas possuíam rádio-amador e, em algumas, a manutenção do
aparelho não era feita corretamente. Nesses casos, o paciente é auxiliado pelo ACS e fica na
incerteza de conseguir ou não transporte a tempo até a cidade.
139
Ainda segundo ele, um dos gargalos identificados é o encaminhamento dos casos mais
complexos para unidades de maior complexidade como hospitais municipais e regionais, seja
pelo número de leitos é bastante reduzido, pela burocracia de entrada ou, como foi dito pelo
secretário municipal de saúde Santarém, pela escassez de profissionais da área médica para
preencher até mesmo a demanda da zona urbana. Ademais, são raros os postos de saúde
presentes nas comunidades ribeirinhas e quando existem não enfermeiro presente e/ou
medicamentos disponíveis, o que dificulta o trabalho dos ACSs.
Os ACS entrevistados relataram que as condições de trabalho são muito precárias e em
muitos casos isso gera um sentimento de incapacidade diante dos problemas que encontram.
Por exemplo, quando um ACS é responsável por duas comunidades ou uma comunidade com
muitas famílias, para realizar todas as visitas de rotina necessárias, eles têm de percorrer
longas distâncias a pé, pois existem famílias que vivem nas colônias que ficam mais afastadas
do rio adentrando-se na floresta. Em certas épocas do ano para cumprir seu trabalho o ACS
tem de percorrer trechos alagadiços com perigo de serem picados por cobras. A importância
do ACS ficou evidente a durante a sua ausência na comunidade de Escrivão por problemas de
formalização contratual e na comunidade de Samaúma por problemas de saúde, pois pacientes
hipertensos, diabéticos e gestantes não estavam tendo o acompanhamento necessário.
Além das prefeituras, uma entidade que trabalha bem próxima do ACS e das
comunidades é o PSA. Em julho de 2007 acompanhamos o trabalho de atendimento médico e
odontológico e com a organização comunitária da ONG junto às comunidades ribeirinhas ao
longo do rio Tapajós, nesse período o que se observou foi a valorização do trabalho do PSA
pelos ribeirinhos e um grande esforço na construção de um consórcio entre as prefeituras de
Aveiro, Belterra e Santarém e o PSA para promover a saúde nessas comunidades.
Diante de declarações por parte dos comunitários sobre o significado da ONG tais
como “esperança de vida”, “uma benção de Deus”, “um sonho realizado”, “um parceiro que
gente pode contar” e “os únicos que voltam” se torna necessário o levantamento de questões
como: o que esse projeto faz no meio da Amazônia? Até que ponto a presença do PSA de
pela ausência do Estado ou pelo seu funcionamento irregular?
4.4.7 Segurança Pública
4.4.8 Transferência de renda
140
1. Quantidade de ONG’s
Segundo as Fundações Privadas e Associações sem Fins Lucrativos - FASFIL (2002), há 275.895 ONG´s
atuantes no Brasil, sendo que na Região Norte funcionam apenas 11.715 delas, ou seja, apenas
4,25%, fazendo com que essa região apresente o menor índice de instituições atuantes.
Focando o olhar na Região Norte, dentre os diversos Estados existentes na região, o Pará é o de
maior participação, conforme pode ser observado no quadro abaixo, que mostra a quantidade de
instituições em cada Estado e o número de pessoas atendidas...
Quadro X - Atuação de FASFIL nos Estados da Região Norte (IBGE - 2002)
Fonte: As Fundações Privadas e Associações sem Fins Lucrativos no Brasil 2002. 2ª edição. IBGE. Rio de Janeiro,
2004.
No portal Mapa do Terceiro Setor (http://www.mapadoterceirosetor.org.br/), encontram-se 2 instituições
cadastradas que estão localizadas em Santarém – PA. O Centro de Estudos Avançados em Promoção Social
e Ambiental – CEAPS, com sede em Santa Clara, e a Sociedade Beneficente São Camilo - Hospital e
Maternidade Sagrada Família, localizado em Prainha.
O conceito de saúde para as comundiades e para opoder público
Estado Quantidade Pessoal Ocupado Assalariado
Rondônia 2.162 4.821
Acre 711 1.882
Amazonas 1.797 11.856
Roraima 408 816
Pa 4.728 20.706
Amapá 314 1.907
Tocantins 1.595 4.496
Total 11.715 46.484
141
Conclusões
Contornos
Políticas Públicas a
partir das grandes
narrativas
Ações Públicas a partir
das múltiplas narrativas
Características gerais
Centralidade;
Top down;
Governança estatal
Generalização das
políticas para todos
os lugares;
Descentralidade;
A partir da
demanda/problema
territorial.
Uma governança
com interação de
atores locais da
sociedade civil e
governo;
Ações
territorializadas que
consideram as
especificidades locais
sem desconsiderar o
contexto econômico e
social mais amplo;
Foco
Prioridade (Foco)
nos resultados
quantitativos
Foco nos resultados
quantitativos e
qualitativos.
Atores mais
presentes
? (Adaptativo)
Estado e grandes
empresas
Estado; grandes,
médias e pequenas
empresas; Igreja;
Organizações Locais;
ACS (caso especial);
ONGs; Instituições
de Ensino Superior.
Resultados ? ?
142
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