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Capítulo 2
1812-1830
imprensa, primeiro jornalista a sofrer “na carne” a repres-
são, o português Luís Augusto May teria sido, segundo a
historiadora Isabel Lustosa, um jornalista menos compro-
metido com a boa causa e mais interessado em promoções
e sinecuras. E suas “Malaguetas” tiveram muitas edições
extraordinárias, dependendo das disputas e dos pleitos desse
controvertido editor.
12 Dados compilados de LUSTOSA, Isabel. Insultos impres-
sos. São Paulo, Cia. das Letras, 2000, págs. 483-485. Há
também elementos retirados da pesquisa História da revista
no Brasil (1812-1999), da Emporium Brasilis, 1999: 1-14.
13 Personagem fascinante, Pedro I do Brasil e IV de Portugal
consegue a proeza de, em menos de uma década, passar
de herói e defensor perpétuo do Brasil a figura abominada.
Sobre isso é interessante ler a citação que faremos a seguir
(2.5.), do que publica sobre ele o Espelho das Brasileiras,
revista pernambucana, em sua edição 28, de 6 de maio de
1831. Mas sobretudo é de leitura altamente recomendável o
livro de Isabel Lustosa D. Pedro I, um herói sem nenhum
caráter.
14 Chama atenção a grafia de algumas palavras, nesses anos
inicais da imprensa brasileira. É o caso, visto no item ante-
rior, de Typografia e não Typographia. É o caso também de
Brasileiras, e não Brazileiras, como seria de se esperar.
15 Nascida em 12 de outubro de 1810, em Papari, Rio Gran-
de do Norte, filha do português Dionísio Gonçalves Pinto
com a brasileira Antônia Clara Freire, Dionísia Gonçalves
Pinto ficou conhecida pelo pseudônimo de Nísia Floresta
Brasileira Augusta – com que rendia homenagens: Flores-
ta, o nome do sítio onde nasceu; Brasileira, por seu ufa-
nismo, típico de quem viveu quase três décadas na Euro-
pa; Augusta, recordação do segundo marido, Manuel Au-
gusto de Faria Rocha, com quem se casou em 1828. Nísia
teve dois filhos, Lívia Augusta, nascida em 1830, e Au-
gusto Américo, nascido em 1833, mesmo ano em que
Nísia fica viúva. Sua atuação foi pioneira: a primeira jorna-
lista e militante feminista, não só por seus livros, que re-
tratavam de maneira corajosa e precisa a situação da
mulher na sociedade, mas também por sua vida e suas
idéias. Seu primeiro livro, lançado em 1832, Direitos das
Mulheres e Injustiça dos Homens, era uma livre tradução
de Vindications of the Rights of Woman, obra de Mary
Wollstonecraft, feminista inglesa, em que Nísia contextuali-
zou as teses da autora com os problemas brasileiros, prin-
cipalmente as posturas contra seu sexo. Com um texto
fluido, ela identifica as causas desse preconceito, ao mes-
mo tempo que desmistifica a idéia dominante da superio-
ridade masculina. Com o livro Nísia torna-se precursora,
porém não chegou a colher resultados. A consciência fe-
minina, ainda tão submissa, não assimilou suas teses –
sem esquecer que a mulher de seu tempo era ainda majo-
ritariamente analfabeta. Educadora, Nísia fundou no Rio
de Janeiro o Colégio Augusto, nome que homenageia seu
falecido companheiro. Também essa empreitada não ob-
teve sucesso: o viés progressista e revolucionário do co-
légio, inaugurado em 1838, não atraiu clientela e fechou
as portas em 1847. Nísia viveu em diversos estados bra-
sileiros, como Pernambuco (onde colaborou com O Espe-
lho das Brazileiras), Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul
(mudando-se devido ao clima tenso que a da Revolução
Farroupilha causou na capital gaúcha). Jornalista atuante,
colaborou com O Liberal, O Brasil Illustrado, e se desta-
cou na imprensa do Rio, escrevendo para o Correio Mer-
cantil, Jornal do Commercio e Diário do Rio de Janeiro.
Em 1849, após um acidente de cavalo ocorrido com sua
filha, resolve ir para a Europa com os dois filhos. Para
muitos o acidente fora apenas um pretexto para sua mu-
dança, uma vez que os jornais nacionais apenas difama-
vam suas obras. Outros livros de Nísia, defendendo o
mesmo ideário, questionando a situação social, econômi-
ca e política das mulheres, foram Conselhos à minha filha
(1842); Opúsculo Humanitário (1853); A Mulher (1859).
Na França, participou do círculo de Augusto Comte, o filó-
sofo criador do positivismo, que admirou suas idéias e
com quem teve curta amizade. Nísia faleceu, em conse-
qüência de pneumonia, em Rouen, na França, aos 75 anos,
no dia 24 de abril de 1885. Em agosto de 1954, quase 70
anos depois, seus despojos foram transladados para o
Rio Grande do Norte e levados para sua cidade natal,
Papari, que em sua homenagem hoje se chama Nísia Flo-
resta.
16 Como já se falou anteriormente, é um tanto movediça a no-
menclatura entre revista e jornal antes de 1870 e da disse-
minação do uso do telégrafo. O autor prefere o designativo
periódico para as publicações desse período anterior ao te-
légrafo. Nessa primeira parte do século XIX, no entanto, vão
se criando alguns padrões: a) o pasquim ou o panfleto se
publica em 2 páginas (frente e verso); o jornal em 4 páginas
(uma lâmina frente e verso, dobrada); a revista semanal,
sobretudo a ilustrada, em 8 páginas, uma lâmina impressa
em tipografia de um lado e em litografia no outro, e dupla-
mente dobrada, formando a seqüência de página 1 ilustra-
da, páginas 2/3 com texto; páginas 4/5, centrais, ilustra-
das, páginas 6/7 com texto e finalmente a 8ª página com
ilustração. Será assim com os grandes clássicos, como A
Semana Illustrada, de Fleiuss, ou a Revista Illustrada, de
Angelo Agostini. As revistas doutrinárias, não ilustradas, em
formato brochura, chegarão a 80 ou 100 páginas, como foi
o caso de O Patriota.
17 Isabel Lustosa reproduz e deixa em aberto o tema de que
Leopoldina morreu como conseqüência do espancamento
de que foi vítima, por haver se recusado a entrar numa re-
cepção acompanhada da dama de honra, Domitila de Cas-
tro, a marquesa de Santos (LUSTOSA, 2006: 237-243).
18 É curioso notar que uma professora falasse do próprio
sexo como “vosso”, poder-se-ia suspeitar que as
quadrinhas fossem de autoria do próprio redator, que a
atribui a uma professora.
19 Escrito em 1853 pelo português Alfredo Hogan, a pedido
do editor Luiz Correia da Cunha, que queria explorar o su-
cesso da obra de Dumas, o folhetim A mão do finado se
revelou outro sucesso, aumentando as vendas do jornal.
Para estabelecer deliberadamente a ambigüidade, publicou-
se o folhetim sem nome do autor – o leitor deduziria que,
sendo o personagem o mesmo Edmond Dantes, o conde
de Monte Cristo, seria obra do mesmo autor. Rapidamente a
obra foi traduzida para o francês e publicada em 1854 sob o
título de La main du défunt, atribuída a um tal F. Leprince, e
muitos acreditaram que esse seria o pseudônimo de um
escritor francês. Na realidade, Leprince nunca existiu – o
autor da obra é mesmo Alfredo Hogan. O livro conheceu
numerosas traduções: a italiana La mano del defunto,
atribuída a A. Le Prince; a espanhola La mano del muerto.
A edição argentina em livro traz na capa o nome de
“Alejandro Dumas”. Houve ainda uma versão teatral, a
alemã Die totenhand. Dumas conheceu o livro e fez o
possível para refutar a idéia de que fosse ele o autor.
Desde finais de 1853 escreveu ao Jornal do Commercio
para explicar que “Je n’ai jamais fait et, bien qu’on me le
demande souvent, je ne ferai probablement jamais de suite
du Comte de Monte-Cristo”. Dumas exigia a retratação
por parte do jornal, desmentindo sua autoria do texto. Mas
seus apelos foram em vão. Sobre essa história há um rico
material no site
http://www.pastichesdumas.com/pages/
FichesMC/MaoFinado.html
20 Bas-bleus, segundo o Petit Larousse, é uma mulher pedan-
te, com pretensões literárias.
21 Segundo a professora Sandra Guardini, “Marlyse Meyer de-
nomina essa novela de ‘franco-brasileira’ e atribui a autoria
de Charles Auguste Taunay”. Ver “Uma Novela Franco-bra-
sileira de 1830” in As mil faces de um herói canalha e ou-
tros ensaios. Rio de Janeiro: Editora da UFRJ, 1998, págs.
333-347. Conferir Guardini T. Vasconcelos Sandra. Forma-
ção do Romance Brasileiro: 1808-1860 (Vertentes Ingle-
sas).
http://www.unicamp.br/iel/memoria/Ensaios/