vontade histórica do Führer”. Da mesma maneira, Ernst Rudolf Huber, grande especialista
em teoria legal na Alemanha, reportou-se à lei como “nada além da expressão da ordem
comunitária em que o povo vive e que deriva do Führer”
22
. Assim, utilizando a terminologia
de Max Weber, podemos dizer que tais sentimentos equivaliam à subordinação da autoridade
legal-racional frente à autoridade carismática, de tal modo que a ‘vontade’, fundamentada nas
‘realizações destacadas’, acabou substituindo as determinações legais impessoais e abstratas
como premissa essencial da lei
23
.
22
Apud KERSHAW, Ian. op. cit. p. 82.
23
A análise weberiana sobre os três tipos puros de dominação legítima auxilia a compreender o papel de Hitler
no movimento nacional-socialista e como sua liderança foi fundamental para que seu poder se consolidasse na
Alemanha. Segundo Weber, portanto, dominação seria a probabilidade de encontrar obediência a uma
determinada ordem, fundamentando-se em diversos motivos de submissão. Nesse sentido, as bases de
legitimidade da dominação são as seguintes: dominação legal, dominação tradicional e a dominação carismática.
A dominação legal refere-se à legitimidade das ordens estatuídas e do direito de mando daqueles que são
nomeados para exercer essa dominação em virtude dessas ordens. Obedece-se, portanto, à ordem impessoal,
legalmente instituída e aos seus superiores por ela determinados. Logo, denomina-se como dominação legal em
virtude de seu estatuto, sendo seu tipo mais puro, a dominação burocrática. Do ponto de vista social, a
dominação legal com quadro administrativo burocrático significa a dominação da impessoalidade, isto é, sem
ódio ou paixão e, portanto, sem amor e entusiasmo. Não existem considerações pessoais, sendo assim, o conceito
de dever é o que rege a burocracia. Já a dominação tradicional é baseada na crença cotidiana, nas tradições
vigentes. O seu tipo mais puro seria a dominação patriarcal, na qual se obedece à pessoa em virtude de sua
dignidade santificada pela tradição. Em outras palavras, submete-se à pessoa do senhor, nomeada pela tradição e
em virtude de devoção aos hábitos costumeiros. A devoção afetiva do povo alemão à pessoa de Hitler pode ser
analisada, contudo, a partir do conceito weberiano de dominação carismática. O ponto de partida para sua
compreensão é a devoção afetiva à pessoa do senhor e a seu carisma. Este carisma poderia ser representado por
algo novo, fora do cotidiano, que provocasse um arrebatamento emotivo constituindo a devoção pessoal. O
carisma pode ser a transformação de um ponto de vista íntimo que, nascido da miséria ou do entusiasmo,
representa uma modificação das ações assumindo uma orientação totalmente nova diante do mundo. Segundo
Weber, portanto, é possível denominar o “Carisma” como uma qualidade pessoal considerada extra-cotidiana e
em virtude da qual atribuem ao portador do carisma qualidades fora do comum que o tornariam como uma
espécie de “enviado de Deus” e, por esta razão, um líder. Entretanto, a expressão carismática é empregada sem
“juízos de valor”, pois o que importa é se o líder carismático encontrou ou não reconhecimento, isto é, como ela
é avaliada pelos carismaticamente dominados. Destacamos ainda, os três tipos mais puros de dominação que são
do grande demagogo, do herói guerreiro e do profeta. Quanto ao primeiro, sua dominação pode ser explicada em
virtude da revelação de seu poder intelectual e de oratória, e do arrebatamento emotivo que o portador do
carisma é capaz de provocar nas massas. O demagogo, produto da cidade-estado Ocidental, seria o político
carismático que utiliza o dom da oratória e seu poder intelectual para conquistar as massas. Já o herói guerreiro
aclamava as massas através das revelações de seu heroísmo; tal figura reportava às caças e campanhas bélicas
que exigiram um líder pessoal dotado de qualidades excepcionais. O profeta, por sua vez, seria portador de um
carisma pessoal, que em virtude de sua missão anunciava uma espécie de doutrina religiosa. Assim, a magia
constituía o âmbito espiritual de sua dominação.
A associação de dominação seria uma relação comunitária de caráter emocional, o tipo que manda é o líder e o
que obedece o “apóstolo”, pois este obedece devido às qualidades excepcionais daquele. De acordo com Weber,
o líder carismático tem que “fazer-se acreditar”, pois seu domínio se faz por meio de milagres, êxitos e
prosperidade, ou seja, a validade do carisma é consolidada em virtude de provas e oriunda da confiança no líder.
Todavia, a fé e o reconhecimento são considerados um dever, cujo cumprimento que exige para si é passível de
castigo. Dessa forma, é importante destacar que a dominação carismática opõe-se tanto à dominação racional,
especialmente a burocrática, quanto à dominação tradicional, sobretudo a patriarcal, por ambas estarem
vinculadas às regras. Em contrapartida, a dominação carismática é especificamente irracional por não conhecer