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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
Jean Soldi Esteves
A responsabilidade civil nos contratos bancários
MESTRADO EM DIREITO
SÃO PAULO
2008
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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
Jean Soldi Esteves
A responsabilidade civil nos contratos bancários
Dissertação de mestrado apresentada à
banca examinadora da Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo, como
exigência parcial para obtenção do título de
Mestre em Direito das Relações Sociais,
subárea direito civil comparado, sob
orientação da Professora Doutora Maria
Helena Diniz.
SÃO PAULO
2008
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Banca examinadora
_________________________________________
_________________________________________
_________________________________________
Dedicatória:
Dedico este trabalho a minha família. A
minha esposa Ariadne, por me tornar uma
pessoa melhor a cada dia de nossa eterna
convivência. A minha filha Júlia, por ser o
esteio de meu viver. Aos meus pais, Nelson e
Beatriz, pela lapidação de minha infância e
por me apoiarem em todos os momentos de
nossa jornada na terra. Aos meus sogros,
João e Stela, por terem me confiado uma de
suas jóias e pelo carinho que despendem a
mim e a minha filha.
Agradecimentos:
Meus sinceros agradecimentos à Profa. Dra.
Maria Helena Diniz, pela leitura acurada do
trabalho e pelo exemplo digno de pessoa e
jurista. Aos colaboradores de meu
escritório, pela compreensão nos momentos
em que não estive presente ao cotidiano
profissional. Ao Prof. Dr. Renan Lotufo por
me fazer aprofundar os estudos no direito
civil. À Universidade de Taubaté, pelo apoio
que me foi concedido ao longo desta etapa.
“Tudo o que persistimos em fazer torna-se cada vez mais fácil para nós; não porque mude
a natureza da coisa, mas porque nosso poder de fazê-la aumenta”.
Heber G. Grant. (Gospel Standards, p. 355 e Princípios do Evangelho, 220).
VI
Resumo:
Esta dissertação busca, por meio dos métodos da indução, da dedução e da tópica
argumentativa, e por meio da interpretação teleológica e sistemática, alcançar uma análise da
natureza jurídica e dos efeitos da responsabilidade civil no plano dos contratos bancários,
iniciando com uma abordagem filosófica e histórica, destacando os principais aspectos
jurídicos dos mesmos, especialmente, à luz da autonomia privada na Constituição da
República Federativa do Brasil, de outubro de 1988. Procura realizar uma sistematização da
atividade financeira e bancária, uma análise da estrutura do Sistema Financeiro Nacional e,
com base na legislação infraconstitucional, definir o que seja instituição financeira, bem como
atividade financeira e bancária. Parte também para a averiguação dos efeitos jurídicos dos
contratos bancários, identificando a sistematização de uma teoria geral, conceito, requisitos e
elementos caracterizadores, de forma a compreender a aplicação da responsabilidade civil
decorrente dos contratos no plano da atividade financeira e bancária. Servindo-se de uma
perspectiva civil-constitucional, discrimina os efeitos decorrentes do princípio da dignidade
da pessoa humana e da boa-fé, bem como investiga os contratos bancários no plano de
existência, validade e eficácia. Sob o prisma da responsabilidade civil aponta questões
relevantes no que diz respeito à responsabilidade pré e pós-contratual, por meio de uma
análise sistemática da legislação brasileira e, também, os efeitos no plano da responsabilidade
civil contratual, à luz dos diferentes tipos de instituições financeiras, registrando a experiência
estrangeira pertinente ao tema. Considerando a perspectiva civil-constitucional, esta
dissertação finaliza com uma identificação de propostas de implementação dos mecanismos
legislativos de controle e intervencionismo estatal quanto aos efeitos da responsabilidade civil
no plano dos contratos bancários, adequando o tema à autonomia privada, como meio de
efetivação dos princípios constitucionais, para alcançar a eficácia prática do fenômeno da
responsabilidade civil restrita a esse âmbito.
Palavras-chave: contratos bancários - responsabilidade civil – perdas e danos - bancos
VII
Abstract
This dissertation is aimed at, by means of the induction, and deduction methods, as well as by
means of the argumentative topic, and using the teleologic and systematic interpretation,
reaching an analysis of the legal nature and the civil liability effects of banking contracts,
starting with a philosophical and historical approach, highlighting the main legal aspects of
these contracts, especially in the light of the private autonomy granted by the Constitution of
the Federative Republic of Brazil, of October, 1988. It tries to carry out a systematization of
the financial and banking activity as well as of the National Financial System structure and,
based on the infraconstitutional legislation, to identify the definition of financial institution, as
well as of the financial and banking activity. It also tries to investigate the legal effects of
banking contracts, identifying the systematization of a general theory, concept, requirements
and characteristic elements to identify the application of the civil liability resulting from the
contracts in the field of the financial and banking activity. Based on a civil-constitutional
perspective, it identifies the effects resulting from the human being dignity and the good-faith
principles, and investigates banking contracts in the fields of its existence, validity and
effectiveness. Under the civil liability point of view, it highlights important subjects
concerning pre and post-contractual responsibility through a systematic analysis of the
Brazilian legislation, and also the effects of the civil liability in the contractual field, in the
light of different types of financial institutions, registering the foreign experience related to
the subject. Considering the civil-constitutional perspective, this paper finally identifies some
proposals for implementation of the legislative mechanisms of state control and
interventionism related to the civil liability in the banking contracts field, adjusting to the
private autonomy, as a means of accomplishment of the constitutional principles, to reach the
practical effectiveness of the phenomenon of the civil liability restrict to the scope of banking
contracts.
Key words: banking contracts - civil liability - damages - bank
VIII
SUMÁRIO
Prefácio
1. Contratos bancários e responsabilidade civil em âmbito filosófico, histórico e
jurídico ...................................................................................................................................... 12
1.1. Abordagem introdutória à luz da filosofia e da teoria geral do direito ........................ 12
1.2. Evolução histórica do direito contratual e da responsabilidade civil .......................... 21
1.3. Princípios fundamentais da responsabilidade civil nos contratos bancários ................ 26
2. Contratos bancários e seus efeitos jurídicos........................................................................... 38
2.1. Conceito de atividade financeira e bancária.............................................................. 38
2.1.1. O Sistema Financeiro Nacional....................................................................... 38
2.1.2. Definição de instituição financeira.................................................................. 40
2.1.3. A distinção entre atividade financeira e atividade bancária............................ 46
2.2. Teoria geral e natureza jurídica dos contratos bancários .......................................... 53
2.3. Conceito, requisitos e elementos caracterizadores.................................................... 59
2.4. Os momentos de formação e conclusão dos contratos bancários.............................. 76
2.5. Efeitos dos contratos bancários................................................................................. 87
2.5.1. A boa-fé objetiva e subjetiva nos contratos bancários .................................... 92
2.5.2. A dignidade da pessoa humana, a solidariedade, a justiça social, a
igualdade e a função social no âmbito dos contratos bancários................................ 99
3. A responsabilidade civil nos contratos bancários................................................................... 110
3.1. O problema da complexidade do tema...................................................................... 110
3.2. A questão da qualificação da responsabilidade contratual quanto à
legislação aplicável no plano internacional e nacional .................................................... 112
3.3. A responsabilidade pré-contratual e pós-contratual nos contratos bancários e
a extensão da mesma aos participantes da relação contratual.......................................... 123
3.4. Linhas gerais da responsabilidade civil nos contratos bancários.............................. 132
3.5. A cláusula de não indenizar, as excludentes de responsabilidade, cláusulas
abusivas e questões casuísticas ........................................................................................ 139
3.6. A responsabilidade civil objetiva e subjetiva no âmbito dos contratos
bancários.......................................................................................................................... 171
3.7. A aplicação do Código Civil e do Código de Defesa do Consumidor
concernente à responsabilidade civil nos contratos bancários......................................... 173
3.8. A incidência da legislação ambiental na responsabilidade civil no plano dos
contratos bancários........................................................................................................... 166
3.9. Os diferentes tipos de instituições financeiras e a responsabilidade civil das
mesmas na relação contratual .......................................................................................... 180
4. Perspectivas e propostas de modificação da legislação.......................................................... 184
4.1. Eficácia dos mecanismos de controle e intervencionismo estatal e a
autonomia privada............................................................................................................ 184
4.2. As possibilidades de alteração da legislação infraconstitucional.............................. 188
5. Conclusões ............................................................................................................................. 198
6. Bibliografia ............................................................................................................................ 203
IX
Prefácio
A realização de um trabalho monográfico no campo da ciência do direito deve
apresentar, ao menos, uma proposta e um resultado prático, delineando uma contribuição para
a evolução da ciência do direito, que, como uma ciência prática e efetiva, produz efeitos na
sociedade e também define os limites no plano normativo, para a vida harmoniosa das
pessoas.
A presente dissertação, por conseguinte, tenta alcançar esse escopo. A proposta
maior deste trabalho se delineia neste sentido e, embora não se tenha absoluta certeza de
haver alcançado o desiderato apontado, ao menos afasta a idéia e conforta o espírito do autor
de não haver tentado, pois, anote-se, a real contribuição certamente será identificada
efetivamente pelo leitor, após filtrar os dados relevantes que lhe interessar e, assim, ter-se-á
alcançado, ao menos, uma contribuição para o meio acadêmico, decorrente deste texto
dissertativo.
A idéia de realizar uma dissertação abordando um tema pouco explorado na
doutrina nacional e estrangeira, sobretudo, porque nos bancos acadêmicos do bacharelado não
se estuda senão mais que a própria teoria geral dos contratos e alguns tipos contratuais em
espécie nos quais, usualmente, não se incluem os contratos bancários - decorre da
observação, ainda que empírica, mas plenamente perceptível no plano fenomênico-social, da
importância dos contratos bancários no cotidiano das pessoas (naturais ou jurídicas), na
medida em que, pelo simples levantamento do cipoal de leis e regulamentos existentes sobre a
atividade financeira e bancária, a configuração de uma realidade ímpar que deve ser objeto
de descrição e regulação normativa, para harmonização dos pressupostos gerais e efeitos
decorrentes das atividades financeira e bancária e dos negócios jurídicos praticados no âmbito
das mesmas.
X
Os negócios jurídicos contratuais celebrados no plano das atividades
financeiras e bancárias, por influenciarem e serem influenciados pela política econômica do
Estado, ensejam uma premente necessidade de regulação e intervenção estatal atingindo um
universo difuso de pessoas.
É irrefutável a dinâmica dos negócios jurídicos bancários e a sua importância
na sociedade moderna, baseada no capitalismo e influenciada sobremaneira pelo fenômeno da
globalização e quebra de fronteiras. As atividades financeiras e bancárias se mostram como
eficientes instrumentos de realização de políticas econômicas e governamentais e, por conta
dessa vertente instrumental, os negócios jurídicos contratuais realizados pelas instituições
financeiras possuem uma importância político-social relevante, como mecanismos eficazes de
regulação e instrumentalização da vida em sociedade.
Justifica-se, portanto, o complexo de normas e regulamentos existentes e
comprova-se a importância de se sistematizar a análise do instituto jurídico da
responsabilidade civil no âmbito dos contratos bancários. Os pressupostos, requisitos e efeitos
que decorrem da responsabilidade civil determinam a sistematização da legislação em vigor
no ordenamento jurídico brasileiro, comparando-o, também, aos ordenamentos jurídicos
estrangeiros, mostrando-se absolutamente necessários para determinar a eficácia prática e os
resultados da investigação da responsabilidade civil nos contratos bancários, como uma
pequena contribuição doutrinária para o progresso da ciência do direito.
As operações e os serviços bancários realizados por meio de contratos
bancários evidenciam uma realidade fática inarredável no plano fenomênico-social. Portanto,
a temática se mostra relevante e atual pela inovação legislativa operada com a entrada em
vigor do Código Civil de 2002 e pela sua correlação com o Código de Defesa do Consumidor.
A investigação também enseja análise pela perspectiva civil-constitucional, sendo que a
metodologia que se buscou adotar foi da tópica argumentativa, não obstante o viés dedutivo e
XI
indutivo presente, por vezes, na exposição do assunto, especialmente, pela fundamentação
baseada na interpretação sistemática e teleológica da Constituição Federal, da legislação
infraconstitucional, da doutrina e da jurisprudência brasileira e estrangeira.
Pretende-se que a interpretação do fenômeno da responsabilidade civil no
plano dos contratos bancários seja feita objetivamente, permitindo uma identificação e
aproximação da teoria geral dos contratos com a teoria geral da responsabilidade civil
observando as especificidades dos negócios jurídicos bancários, trazendo à baila as principais
implicações e conseqüências jurídicas decorrentes dessa interação dos textos legislativos,
análise doutrinária e jurisprudencial.
Delimitado, portanto, o tema e as premissas metodológicas investigativas da
dissertação e feitas as considerações iniciais, passa-se, então, à estruturação das idéias e
principais concepções e conclusões acerca do instituto, sempre fundamentada em uma
perspectiva do chamado direito civil-constitucional.
São Paulo, 20 de fevereiro de 2008.
Jean Soldi Esteves .
CAPÍTULO I
Contratos bancários e responsabilidade civil em âmbito filosófico, histórico
e jurídico
1.1. Abordagem introdutória à luz da filosofia e da teoria geral do direito
A abordagem filosófica se justifica pela intenção de acentuar um pensamento crítico
circundando um problema jurídico que tem notório efeito prático sobre a vida em sociedade e
pelo fato de ser o contrato um instrumento eficaz para o ser humano alcançar bens de
qualquer gênero e espécie, sobretudo o contrato bancário que serve de instrumento de acesso
ao crédito, ou seja, ao dinheiro, bem móvel fungível e mola propulsora da sociedade moderna
capitalista e neoliberal, estruturada em um Estado Democrático de Direito.
O ser humano sempre empreende atos com a finalidade de alcançar determinados
bens, sejam materiais ou imateriais, e o contrato, por ser um negócio jurídico por excelência,
viabiliza essa aquisição e modificação de direitos concernentes aos bens, até mesmo pela sua
própria concepção e afirmação histórica, originada no direito francês.
A rigor, a filosofia do direito possibilita estabelecer premissas metodológicas eficazes
para estruturação e localização do tema no âmbito do direito contratual e as questões
concernentes à responsabilidade civil no plano dos contratos bancários, na medida em que a
visão filosófica permite identificar um juízo crítico e estabelecer uma relação entre a suposta
oposição existente entre o direito positivado e o direito ideal. Cientificamente não é permitido
afastar uma formulação crítica permanente do direito positivo vigente ante a realidade do
13
mundo, especialmente, para se permitirem avanços na avaliação do tema e estabelecer a
cientificidade do mesmo.
1
No plano dos contratos é válido observar a importância da autonomia privada para
determinação dos objetivos contidos neles e a legislação tem de assegurar a existência,
validade e eficácia da autonomia privada, para que os contratos alcancem sua finalidade, que
é viabilizar, instrumentalizar e permitir que pessoas tenham acesso a bens, dentro de limites
fixados pelo sistema normativo, harmonizando, por fim, os interesses aparentemente
contrapostos das pessoas envolvidas.
É possível afirmar que a autonomia privada decorre da plena liberdade de expressão,
manifestação e exteriorização que o ser humano tem de suas idéias e anseios, e isso gera
conseqüências relevantes para a vida em sociedade, que podem se materializar na aquisição e
cumprimento de obrigações por meio dos contratos. Quando isso não ocorre, depara-se com
uma patologia social que deve ser tratada por meio da regulação normativa, ante a ocorrência
da subsunção ou integração dos fatos às normas existentes. Não é demais salientar a
afirmação de Norberto Bobbio
2
ao identificar o direito como uma regra de conduta, sob o
ponto de vista normativo e dizer que: l´esperienza giuridica è un´esperienza normativa.
Salienta-se que o termo autonomia foi definido por Kant como a independência da
vontade, contraposta a qualquer desejo, ou mesmo livre, independente do objeto desse desejo,
e a capacidade que o ser humano tem de determinar-se conforme sua lei própria, decorrente
da reta razão.
3
Ou seja, o ser humano deve ter plena condição de se determinar segundo sua
própria razão em relação a um desejo ou um objeto, o que evidencia essa autonomia da
vontade, que é delimitada no plano normativo em função da necessidade de harmonização dos
interesses para a vida em sociedade. Daí chegar-se à idéia de autonomia privada, pois a
autonomia fica delimitada no campo normativo estabelecido para viabilizar a vida em
1
COMPARATTO, Fábio Konder. O que é a filosofia do direito? Barueri: Manole, 2004, p. 4.
2
BOBBIO, Norberto. Teoria generale del diritto. Torino: G. Giappichelli Editore, 1993, p. 03.
3
ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de filosofia. São Paulo: Martins Fontes, 2003, p. 97.
14
sociedade, segundo a influência dos princípios gerais, valores éticos e morais dessa sociedade,
que fomentam o direito e que organizam juridicamente o convívio entre os homens, não
obstante mostrar-se logicamente impossível conceber uma sociedade, sem a existência de um
sistema jurídico organizado.
Luigi Ferri
4
destaca a necessidade de apontar a substancial e ontológica distinção
entre a autonomia da vontade e a autonomia privada, pois os negócios jurídicos são a
manifestação desta última e todo o sistema normativo impõe limites a essa autonomia privada.
Basicamente, os limites da autonomia privada são reflexos das normas jurídicas, sem as quais
não se poderia nem ao menos conceber no plano da existência a referida autonomia privada, a
menos que se identifique essa autonomia com a liberdade natural ou moral do homem, o que
não contém carga de juridicidade adequada para conceituar cientificamente o fenômeno da
autonomia privada.
Respaldado por uma concepção ainda adstrita à autonomia da vontade sem fazer
expressa menção à autonomia privada, Eric Savaux
5
evidencia, no direito francês, a existência
de uma filosofia contratual inspiradora de uma moderna concepção da teoria geral dos
contratos, em que a vontade individual vem a ser o alfa e o ômega do ato jurídico, ou seja, o
negócio contratual tem como evidência maior a vontade individual; contudo, o referido autor
reconhece que essa autonomia da vontade é uma doutrina da filosofia jurídica que sofre
influência de considerações morais, econômicas e políticas, que irrigam essa vertente do
direito civil.
O objeto cognoscível deste estudo acerca do contrato tem de ser embasado pelas
premissas elementares na medida em que a autonomia privada e a vontade individual se
4
FERRI, Luigi. La autonomia privada. Granada: Comares, 2001, p. 5. Referido autor acentua a ausência de
estudos aprofundados na doutrina civil italiana acerca da autonomia privada e, na obra citada, discorre
profundamente sobre esse fenômeno que possui absoluta relevância para a análise e estudo dos negócios
jurídicos.
5
SAVAUX, Eric. La theorie générale du contrat, mythe ou réalité? Librairie nerale de droit et de
jurisprudence E.J.A. p. 70. O autor identifica, também, outras concepções da autonomia da vontade e sua
importância para caracterização da teoria geral dos contratos e conclui que essa teoria não está positivada, mas
sim decorre do estudo e sistematização da ciência do direito.
15
mostram como a essência do negócio jurídico contratual e, portanto, todo e qualquer estudo
crítico acerca do contrato, seja em que segmento contratual for, deve considerar a relevância
desse aspecto pertinente à autonomia privada. Maria Helena Diniz, com base nos
ensinamentos de Goffredo Telles Jr., observa a importância de ter uma exata noção do objeto
do conhecimento condicionado pelo sistema de referência, o que acaba por evidenciar a
relatividade do próprio conhecimento ante o objeto parametrizado no plano das normas e
regras de conduta.
6
Acrescente-se que no entendimento de Norberto Bobbio acerca da conduta do homem
em busca de alcançar determinadas finalidades projetadas para o futuro, à luz da filosofia
kantiana, esse fenômeno legislativo no universo humano também tem por base a autonomia, a
partir do momento em que assiste a um povo o direito de não ser impedido, por outras forças,
de dar a si mesmo uma constituição civil que julga boa, entendendo-se por constituição civil
aquela que esteja de acordo com os direitos naturais dos homens, que têm autorização para
reunirem-se e legislarem, hipótese em que Kant define a liberdade como autonomia, como
poder de legislar para si próprio, outorgado ao homem.
7
Maria Helena Diniz também doutrina que a relação contratual, ou seja,
especificamente o contrato, constitui uma espécie do negócio jurídico (do direito alemão -
Rechtsgeschaft) de conteúdo bilateral ou plurilateral na medida em que regulamenta interesses
privados e estabelece normas jurídicas entre as partes atuantes no contrato. Essa interpretação
do contrato estaria vinculada, portanto, ao encontro de vontade das partes conforme
6
DINIZ, Maria Helena. Compêndio de introdução à ciência do direito. 17 ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 16.
7
BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Tradução de Carlos Nelson Coutinho. Rio de Janeiro: Campus, 1992,
p. 51/52. Nesta obra, pode-se identificar claramente a perspectiva de Bobbio sob o prisma da filosofia e da
história em que os direitos humanos e fundamentais fazem a ocorrência de ondas ou eras de direitos, sendo a
primeira era como afirmação dos direitos e garantias fundamentais, a segunda era de alcance dos direitos sociais,
a terceira era de afirmação dos direitos relativos ao meio ambiente e a quarta era acerca da positivação dos
direitos das minorias. Essa noção, atrelada à afirmação histórica dos direitos humanos ou, no dizer de Hannah
Arendt, como direito a ter direitos deve embasar a perspectiva de estudo da autonomia privada, pois decorre
da própria essência da liberdade do ser humano idealizada por Kant.
16
especificado na teoria objetiva do direito, de Oscar Von Bullow, como sendo “autonomia
privada”.
8
O sistema normativo, com efeito, deve ser analisado de forma sistemática, extraindo-
se e elaborando-se juízos abstratos a partir das normas jurídicas, notadamente pela
interpretação e compreensão destas normas, o que Karl Engisch intitula de metodologia
jurídica, para no plano de um silogismo jurídico encontrar a premissa maior e mediante a
subsunção adequar a premissa menor, no âmbito da completude do sistema normativo.
9
Esse conceito de sistema na ciência do direito é absolutamente relevante para
determinar qualquer abordagem crítica e científica, notadamente, para alcançar o conteúdo
teleológico da norma jurídica. Claus-Wilhelm Canaris ressalta que, quando se ordena
sistematicamente um determinado fenômeno jurídico, em regra, aborda-se o conteúdo
teleológico desse fenômeno. Portanto, a interpretação sistemática enseja a teleológica em
qualquer fenômeno jurídico no plano da ciência do direito e constitui uma premissa
metodológica firme, em especial, por ser um cânone da interpretação.
10
A interpretação teleológica também é recomendada por Karl Engisch, sendo
absolutamente necessária no plano de interpretação das normas em geral, sobretudo e,
exemplificativamente, àquelas relativas aos contratos bancários e à definição de atividade
privativa de instituição financeira, como acentua Eduardo Salomão Neto, ao utilizar essa
metodologia de interpretação, quando analisa o artigo 17 da Lei 4.595/64 e conclui, por
exemplo, que a atividade privativa de instituição financeira e sua conseqüente regulamentação
tem por escopo alcançar a repressão à usura, a proteção da economia popular, a
8
DINIZ, Maria Helena. Tratado teórico e prático dos contratos. 6 ed. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 8.
9
ENGISCH, Karl. Introdução ao pensamento jurídico. 8 ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2001, p.
115-116 e 133. Obra de fundamental importância para a percepção da interpretação sistemática e teleológica
com a possibilidade de completude do sistema no pensamento jurídico moderno.
10
CANARIS, Claus-Wilhelm. Pensamento sistemático e conceito de sistema na ciência do direito. 3 ed.
Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2002, p. 154-157.
17
regulamentação e proteção ao crédito e seu efeito de multiplicador monetário e, por fim, de
instrumento de política econômica.
11
Para concluir essa abordagem filosófica e feita à luz da teoria geral do direito que
identifica a busca incessante do ser humano por bens materiais e imateriais até mesmo pela
própria subsistência e conservação originada na concepção de liberdade e igualdade jurídica,
bem como na constatação do fenômeno da autonomia privada como essência do negócio
jurídico, e que também identifica a necessidade de proceder a uma análise sistemática do
ordenamento jurídico, não se pode deixar de observar que a moderna visão do direito implica
uma visão de finalidade prática, por possuir a ciência do direito um viés pragmático. Além
disso, a dialética existente entre os fatos e as normas requesta essa abordagem, especialmente,
porque o fenômeno jurídico não está alheio à interdisciplinariedade do ordenamento.
Pietro Perlingieri
12
sustenta a existência dessa interdisciplinariedade, inclusive na
dicotomia entre o direito público e o direito privado e não só na correlação do direito com
outras ciências, o que é muito relevante para o tema em análise.
Carlos Ari Sundfeld
13
também destaca com propriedade o que vem a ser público e
privado, observando que esse contexto de interpretação é sobremaneira importante para o real
alcance da finalidade de qualquer norma jurídica e esse método é relevante, notadamente,
porque o tema em análise responsabilidade civil nos contratos bancários enfrenta aferição
11
NETO, Eduardo Salomão. Direito bancário. São Paulo: Atlas, 2005, p. 16-17. Pela utilidade conceitual,
transcreve-se: “É princípio tradicional de interpretação que, sendo possível a aceitação de mais de um sentido
para a mesma norma, não deverá ser privilegiado aquele que, reproduzindo literalmente seu conteúdo, leve a
resultado absurdo por incompatível almejado pela atividade legislativa. Deve ao invés disso ser preferida a
interpretação que privilegia o fim da norma. Esta forma de interpretação, chamada teleológica, é recomendada
por Karl Engisch: ‘Portanto, não o teor verbal e a colocação sistemática, como ainda as fontes históricas,
nos o conduzem a um resultado líquido. Nem a interpretação literal, nem a sistemática, nem a histórica
alcançam o seu objetivo. Poderemos nós porventura conseguir um resultado positivo por outra via?
Efectivamente, o jurista moderno, a todos os métodos até agora mencionados, prefere em certa medida o
chamado método teleológico de interpretação, o qual procura o fim, a ratio, o pensamento fundamental do
preceito legal, e a partir dele determina o seu sentido. Aqui, portanto, o sentido é o fim visado pela lei.’ (...)
Cumpre então aplicar o método teleológico de interpretação, pesquisando o objetivo do artigo 17 da Lei 4.595/64
para descobrir o intuito da norma sob estudo, em relação à qual, como visto, a interpretação literal apresenta
resultado absurdo.”
12
PERLINGIERI, Pietro. Il diritto civile nella legalità costituzionale. Napoli: Edizione Scientifiche Italiane,
2001, p. 5-6.
13
SUNDFELD, Carlos Ari. Fundamentos de direito público. 4 ed. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 138-142.
18
de normas de direito público e de direito privado como será demonstrado no decorrer da
dissertação.
Especificamente no plano dos contratos bancários é importante destacar que a ciência
econômica ganha relevo ante a estrutura de comunhão e relação que passa a ter com a ciência
do direito. Miguel Reale
14
enfatiza essa inserção entre as duas ciências com base no chamado
“materialismo histórico”, segundo o qual o direito se apresenta como uma superestrutura,
ideológica, que é condicionada pela infra-estrutura econômica, à luz da concepção marxista.
Reconhece-se que há uma interação dialética entre o econômico e o jurídico, e isso é absoluto
no contexto de análise sistemática do fenômeno jurídico negocial do contrato bancário, como
será visto adiante.
A responsabilidade civil decorre da prática do ato ilícito no âmbito do ordenamento
jurídico. Se o ato ilícito tem origem em um negócio jurídico, devem-se avaliar as
conseqüências dessa prática, pois isso decorre de um dever especial. O ato ilícito, como
resultado disso, não pode ser considerado algo fora do direito, mas sim inerente a ele, na
medida em que provoca efeitos dentro da ordem jurídica, ainda que não pretendidos por quem
o praticou ou se omitiu.
15
Como observa Renan Lotufo, é importante estabelecer na teoria geral do direito a
distinção entre ato ilícito e negócio ilícito: este último (negócio jurídico ilícito) será reprimido
pela ineficácia, ou seja, os efeitos pretendidos pelas partes não poderão ser considerados, pois
não estão em conformidade com a lei (Código Civil, artigo 104, inciso II). Já o ato ilícito,
autoriza para quem teve seu direito violado e sofreu dano, o direito de pretender o
ressarcimento deste dano, ainda que exclusivamente moral, por meio de uma reação de
14
REALE, Miguel. Lições preliminares de direito. 27 ed. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 20-22.
15
BEVILAQUA, Clovis. Teoria geral do direito civil. 2 ed. revista e atualizada por Caio Mario da Silva Pereira.
Rio de Janeiro: Editora Rio, 1980, p. 270-276.
19
direito. Haverá uma pretensão da reparação do dano, ou seja, a pretensão de apurar a
responsabilidade civil (Código Civil, artigos 189 e 927).
16
Por exemplo, se o ato ilícito decorre da celebração e execução de um contrato
bancário pelas partes, a responsabilidade civil deverá ser apurada com base no contrato e
demais pressupostos de caracterização do dever de reparar o dano, previstos no ordenamento
jurídico, por meio de uma interpretação sistemática e teleológica, considerando o contrato, o
ato ilícito e o sistema normativo no qual se inserem, bem como a regulação administrativa
incidente sobre esse tipo contratual.
Destaque-se, assim, que o dever de não causar dano é especial (decorrente do
contrato, ou seja, responsabilidade civil contratual), diferente daquele dever geral que todos
possuem de não causar dano a outrem (responsabilidade civil extracontratual).
Em contrapartida, se próprio contrato bancário tem uma característica de ilegalidade,
estar-se-á a tratar e apurar sua inexistência, invalidade e ineficácia, até mesmo por
caracterizar-se como um negócio jurídico ilícito.
No tocante a esse prisma do negócio jurídico no plano da teoria geral do direito, não
se pode desconsiderar e deixar de destacar que grande parte da doutrina aprecia o negócio
jurídico com uma perspectiva de licitude, em outras palavras, com uma aproximação do ato
lícito. Todavia, as lições de Antônio Junqueira de Azevedo são relevantes para se identificar
logicamente essa perspectiva de licitude e ilicitude atrelada ao negócio jurídico. Azevedo
defende que licitude e ilicitude consistem na qualificação que se a certos fatos jurídicos,
em razão de estarem ou não em conformidade com o ordenamento jurídico, e essa
qualificação de um fato não pode fazer parte de sua estrutura ontológica, pois a qualificação é
extrínseca a sua composição.
Pela precisão doutrinária, transcreve-se a opinião de Antônio Junqueira de Azevedo
17
:
16
LOTUFO, Renan. Código civil comentado. 2 ed. Vol. 1. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 496.
20
Pois bem, há casos de negócios ilícitos. Evidentemente, ao empregarmos essa
expressão, não queremos dizer os casos de negócios nulos, por terem objeto ilícito,
ou outro defeito semelhante, mas, sim, queremos mesmo dizer negócios ilícitos, isto
é, negócios que são também atos ilícitos, delitos, crimes. Muitos negócios são,
simultaneamente, casos de crime, por exemplo: compra e venda ou locação de
escrito, desenho, pintura, estampa ou objetos obscenos (art. 234 do CP), o segundo
casamento do bígamo (art. 235 do CP), o registro de nascimento inexistente (art. 241
do CP), a compra e venda ou empréstimo de entorpecente, e inúmeros outros. Tais
atos, que são crimes, são também negócios jurídicos (e não é naturalmente por serem
negócios nulos que eles perdem o caráter de negócio jurídico; pelo contrário, o fato
de serem nulos comprova que é de negócio jurídico que se trata, pois aos atos não
negociais não aplica idéia de válido ou nulo). Mas há até mesmo os casos de
negócios jurídicos válidos e, ainda assim (ou até por isso mesmo), ilícitos. Por
exemplo, a venda de imóvel próprio, mas que anteriormente fora prometido à venda,
mediante prestação, a terceiro (art. 171, par. 2º, II, do CP). Nesse caso,
normalmente, o segundo negócio será válido, e, se a promessa, anterior à venda, não
estiver inscrita ou averbada, o segundo adquirente deverá tornar-se proprietário.
Tudo isso demonstra a desnecessidade, e até o erro, de se colocar a licitude como
uma das características definidoras do negócio jurídico.
No plano dos contratos bancários, na condição de negócio jurídico, evidencia-se a
possibilidade de perpetrar-se por meio do mesmo uma figura delituosa, como por exemplo,
uma pessoa natural ou jurídica que incide em um dos tipos penais pertinentes aos crimes
contra a pública (Código Penal, artigos 289 a 311), notadamente, o uso de documento falso
(CP, art. 304) para celebração de contrato perante uma instituição financeira e as evidentes
conseqüências jurídicas que decorrem dessa situação fática, especificamente, quanto ao
aspecto da responsabilidade civil e os efeitos decorrentes do contrato bancário, que é um
negócio jurídico ilícito, pois pactuado de forma ilegal.
18
17
AZEVEDO, Antônio Junqueira. Negócio jurídico: existência, validade e eficácia. 4 ed. Atualizada. São
Paulo: Saraiva, 2002, p. 20.
18
Anote-se que o legislador prevê severa punição (reclusão de um a quatro anos) e multa para quem fizer operar,
sem a devida autorização, ou com autorização obtida mediante declaração falsa, instituição financeira, inclusive
aquelas voltadas para distribuição de valores mobiliários ou mbio, conforme disposição da Lei 7.492/86, no
artigo 16, denotando-se a possibilidade de concretização de um negócio jurídico ilícito no plano do direito
bancário.
21
1.2. Evolução histórica do direito contratual e da responsabilidade civil
A figura contratual não é recente na vida humana. Pelo contrário, há muito está
presente nas relações humanas. Relações comerciais da antiguidade foram precursoras do
contrato. Ainda que na modalidade de escambo, evidencia-se a figura contratual, em que a
troca de uma mercadoria por outra, ante a ausência de moeda de troca. Até mesmo nas
escrituras sagradas, pode-se evidenciar a existência do chamado convênio - “Convênio
Abraâmico, Novo e Eterno Convênio” -, ou seja, o Pacto entre o Pai Celestial e o homem,
embora as duas partes não se encontrem no mesmo vel, Deus estipula as condições do
convênio e o homem concorda em fazer o que Ele pede e, então, Deus promete certas bênçãos
pela obediência.
19
Os registros históricos a seguir têm como base doutrinária, em especial, as percepções
de Silvio de Salvo Venosa
20
. Referido autor explica que no direito romano a palavra
contractus tinha a acepção de unir, contrair, e não tinha exclusividade terminológica, na
medida em que os romanos utilizavam também conventio e pacto que, respectivamente,
significam cum venire¸ vir junto, e pacis si, ou seja, estar de acordo. O direito romano
conheceu e trabalhou as referidas expressões, muito embora, modernamente a concepção
técnica recaia sobre a palavra contrato; de toda forma essas palavras podem ser empregadas
como sinônimas, com os cuidados que a linguagem científica requer.
Primitivamente, os contratos e todos atos jurídicos tinham um conteúdo rigoroso e
sacramental, no qual as formas deveriam ser obedecidas ainda que não expressassem
efetivamente a vontade das partes. Na Lei das XII Tábuas, a intenção das partes estava
19
“Contigo estabelecerei o meu pacto”, Gênesis 6:18. “Estabelecerei o meu concerto entre mim e ti”, Gênesis
17:7. “Se guardardes o meu concerto, então sereis a minha propriedade peculiar”, Êxodo 19:5. “O Senhor fez um
novo convênio e o velho se acabou”, Hebreus 8:13. Essas escrituras apenas ilustram que a figura contratual,
embora no plano espiritual ou religioso, desde muito esteve presente na humanidade, abstraindo, nesse contexto,
qualquer consideração de ordem religiosa.
20
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil. Teoria geral das obrigações e teoria geral dos contratos. 5 ed. São
Paulo: Atlas, 2005, p. 394-400.
22
materializada nas palavras corretamente pronunciadas. Na época de Justiniano, a solenidade
estabelecia a força das convenções e exteriorizava a aceitação convencional e, por
conseqüência, existiam formas específicas de contratos no direito romano, mas não uma
categoria geral.
No plano dos contratos que atualmente se identificam como bancários, pode-se dizer
que no Direito Romano, além dos contratos formais, conheceram-se, também, os chamados
contratos reais, tais como o mútuo, o depósito, o penhor. Por outros tipos também atualmente
conhecidos, existiam os chamados contratos consensuais, como a venda, o arrendamento e a
sociedade. Ainda, com a evolução do direito romano, na época de Justiniano, conheceu-se a
intervenção do pretor para atribuir efetividade aos referidos contratos na hipótese de não
cumprimento da obrigação.
Terminado o domínio romano, ascende o direito germânico, bem menos avançado,
mas bem arraigado no simbolismo que decorria do contrato e isso se conserva até o término
da idade média. Nesse último período, a influência da Igreja e o renascimento de figuras do
próprio direito romano reafirmam o contrato por meio escrito (traditio cartae), amenizado
com os costumes mercantis que tornam mais simples as formas contratuais.
O instituto do contrato teve seu ápice com o direito francês por meio do Código Civil
de Napoleão, datado de 1804, originado da Revolução Francesa de 1789, que vem a ser o
esteio dessa codificação, sobretudo, pelo acesso da burguesia no plano ideológico, político e
econômico. O livro terceiro do Código de Napoleão estabelece como meio de aquisição da
propriedade o contrato. Ou seja, o contrato vem a ser o instrumento de acesso à propriedade.
Viabiliza-se a circulação de riquezas por meio do contrato no direito francês. Na realidade, as
noções de liberdade e de propriedade estão atreladas de forma contundente no direito francês.
Vale, nesse ponto, destacar, no plano do direito comparado, o artigo 1.134 do Código
Civil francês, que estabelece o vínculo contratual das partes, como regra equivalente à lei,
23
limitando-se os contratos ao plano do interesse blico e inserindo o contexto idealizado por
Rousseau no chamado Contrato Social.
A figura do negócio jurídico surge especificamente no Código Civil Alemão (BGB),
que foi editado quase um século após o Código Francês. No código alemão, o exame do
contrato passa pelo prisma do negócio jurídico. Vale destacar nesse conteúdo histórico
também as relevantes introduções ocorridas na Revolução Americana com a efervescência da
liberdade de expressão, liberdade religiosa, enfim, todo contexto que solidifica a liberdade, a
manifestação de vontade, a autonomia da vontade no bojo do direito privado.
21
Renan Lotufo
22
evidencia que a intenção de reforma do povo francês na revolução
almejava a idéia de justiça e por isso buscava-se uma lei única para todo o país, mediante a
realização de uma justiça legalista que tivesse pouca margem interpretativa operando, assim,
uma verdadeira sacralização da lei, com base até mesmo no artigo 6.º da Declaração de
Direitos, o que evidencia o primado da lei. Essa postura impregnou a cultura de outros povos
e, no Brasil, embora a influência maior tenha sido da BGB (Código Civil Alemão), não resta
dúvida da influência da cultura francesa, notadamente na região centro-sul do país,
especialmente no campo doutrinário, que resultou na escola da exegese e do Código Civil de
1916 como centro das relações privadas. Contudo, teve início uma visão mais ampla dos
direitos individuais originados na própria Constituição americana, embora com bases
filosóficas, culturais, religiosas e valores éticos distintos, que foram impulsionados após o
advento da Segunda Grande Guerra Mundial e a preponderância do direito internacional
privado e público no convívio entre os países. Surgiram, pois, normas constitucionais de
estruturação política do Estado com função programática, que inspiraram a própria
Constituição de 1988 no Brasil e que interferiram nas relações do direito privado,
especialmente, pela amplitude dessas relações, mediante os contratos de massa e relações
21
GAGLIANO, Pablo Stolze; FILHO, Rodolfo Pamplona. Novo curso de direito civil. 3 ed. Vol. IV. São Paulo:
Saraiva, 2007, p.1-8.
22
LOTUFO, Renan. Direito civil constitucional – Cadernos 1. São Paulo: Ed. Max Limonad, p. 7-12.
24
negociais massificadas, o que acaba prevalecendo atualmente, não existindo mais aquela
concepção do direito francês de contrato realizado por partes em igualdade de condições. Essa
massificação pode ser constatada no plano dos contratos bancários.
O novo Código Civil Brasileiro sofreu os reflexos dessas concepções e inseriu as
denominadas e relevantes cláusulas gerais na teoria geral dos contratos, como a função social
e a boa-fé, além de estabelecer a existência de contratos nominados e inominados. É nessa
perspectiva, portanto, que deve ser feita a análise dos chamados contratos bancários e o
fenômeno da responsabilidade civil, que também evoluiu no plano da ciência do direito.
Concernente à evolução histórica da responsabilidade civil, Silvio de Salvo Venosa
23
anota que atualmente ainda se emprega a terminologia romana nesse campo, contudo, a
concepção científica da responsabilidade civil atualmente identificada em nosso ordenamento
jurídico pelo artigo 186 do Código Civil de 2002, deve-se a uma longa evolução histórica que
remonta à Lei de Talião, que evidencia uma reação humana motivada pelo desejo de uma
indenização por um mal injustamente causado. O efetivo impacto da responsabilidade civil
está atrelado à Lex Aquilia de Justiniano, ou seja, à lei segundo a qual, por volta dos séculos
III a II a.c., o titular de bens tinha o direito de obter o pagamento de uma penalidade em
quantia de quem tivesse perpetrado ato para destruir ou deteriorar seus bens. A culpa já estava
presente para autorizar a punição, embora com o tempo também sofra uma notável evolução
até mesmo nos seus elementos possivelmente caracterizadores (imperícia, imprudência,
negligência) e até mesmo o dolo, sendo que essa concepção refletiu inclusive no ordenamento
jurídico brasileiro, quando se analisam os artigos 186, 927 e 944 do Código Civil de 2002.
Evidencia-se que a moderna concepção da responsabilidade de reparar danos foi
efetivamente ajustada e compreendida, ontologicamente, quando se percebeu que o equilíbrio
patrimonial deveria ser recomposto em razão do dano. Por conseqüência, não se reside mais
23
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil. Responsabilidade civil. 5 ed. São Paulo: Atlas, 2005, p. 27-28.
25
apenas e tão-somente o enfoque da responsabilidade civil na culpa, mas, também e
principalmente, na real noção de dano, ou seja, além da caracterização da culpa, de se
caracterizar plenamente a ocorrência do dano, como decorre da análise sistemática do
ordenamento jurídico.
24
Sustenta-se essa posição com base nas conclusões da doutrina quando identifica
funções para a responsabilidade civil e anota que a principal delas é compensar os danos que,
se forem meramente patrimoniais, terão sua recomposição por equivalência financeira, não
ensejando enriquecimento, ao passo que, se forem danos extrapatrimoniais, não haverá
equivalência financeira direta, mas haverá um enriquecimento financeiro pelo credor.
Destaca-se que, atualmente, a responsabilidade subjetiva possui uma função sancionatória do
sujeito infrator pelo ilícito cometido, evidenciando, também, que a responsabilidade civil
objetiva motiva a socialização de custos e que, por fim, a própria responsabilidade tem um
caráter preventivo e pedagógico.
25
Vale registrar que a evolução histórica da responsabilidade civil passou por uma
transmudação da responsabilidade aquiliana em contratual, sobretudo, porque a obrigação
pode ter origem não apenas no ato ilícito como, também, na vontade, ou seja, a
responsabilidade pode ter origem na violação de um dever legal ou, ainda, no
descumprimento de um dever assumido no contrato. Assim, a distinção atualmente admitida
pela doutrina entre responsabilidade contratual e extracontratual se refere à comprovação de
uma relação jurídica preexistente, o que, por conseqüência, exige a existência de um contrato
válido, que tenha sido descumprido, ensejando a comprovação da ocorrência do nexo causal
com o dano experimentado pela vítima.
26
24
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. Responsabilidade civil. 21 ed. São Paulo: Saraiva,
2007, p. 10-21. COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil. Vol. 02. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 252-286.
25
Ver, por todos, COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil. Vol. 02. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 272-275.
26
FILHO, Sérgio Cavalieri. Programa de responsabilidade civil. 7 ed. São Paulo: Atlas, 2007, p. 264-270.
26
que se destacar que no plano da responsabilidade civil das instituições financeiras
a doutrina vem conjugando a culpa e o risco da atividade, todavia, reputa-se que deverá haver
um equilíbrio harmonizador entre as duas, até mesmo para que não ocorra a exclusão de uma
pela outra, como será desenvolvido adiante.
1.3. Princípios fundamentais da responsabilidade civil nos contratos bancários
Seria impossível e inadequado discorrer com profundidade sobre a distinção entre
princípios e regras, mas uma observação sobre ela é sumamente importante, pois,
ontologicamente, tal como anota Humberto Ávila ao resgatar a doutrina do direito comparado,
existência de distinções fracas (Esser, Larenz, Canaris) e fortes (Dworkin, Alexy). Há,
segundo ele, basicamente, quatro critérios para identificá-las: o do caráter hipotético-
condicional, do modo final de aplicação, do relacionamento normativo e o do fundamento
axiológico. Humberto Ávila aponta críticas construtivas a cada um desses critérios, pois as
regras devem ser aplicadas de modo absoluto, ou seja, quando uma norma jurídica aponta
para uma antinomia com outra norma, uma prevalecerá em detrimento da outra (pela
aplicação dos critérios hierárquico, cronológico e da especialidade), ao passo que os
princípios jurídicos se amoldam na aplicação proporcional de cada um deles, ainda que ocorra
colisão entre os princípios, pela dinâmica da harmonização, até porque os princípios são
considerados fundamentos axiológicos para uma decisão a ser tomada.
27
Em razão dessa distinção é importante discriminar com pertinência científica quais
princípios jurídicos poderiam se aplicar à responsabilidade civil e aos contratos bancários. O
direito privado tem sua metodologia composta pela dialética existente entre a jurisprudência
27
ÁVILA, Humberto. Teoria dos Princípios. Da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 5 ed. São
Paulo: Malheiros, 2006, p. 38 e ss.
27
de interesses e a jurisprudência de valoração; de acordo com essa dialética, a questão dos
critérios de valoração, que são supralegais, e o conteúdo da norma jurídica têm sua estrutura
de realidade para buscar uma solução justa ao caso concreto. Por conta dessa realidade os
princípios são referências que o intérprete não pode deixar de lado, para alcançar a justiça
eqüitativa ou material, ou seja, a decisão justa, como um processo hermenêutico na busca da
interpretação e alcance da idéia de justiça a ser aplicada no caso concreto, com base no direito
positivado, como salienta Karl Larenz.
28
Joaquim Arce Flórez-Valdes
29
aponta de forma bem clara que existe uma concepção
científica dos princípios gerais de direito e também de valores superiores que possuem
formulação e inserção no plano normativo constitucional. A ocorrência dessa formulação e
inserção é muita clara na Constituição brasileira de outubro de 1988, que enuncia uma série
de valores e princípios fundamentais do Estado Democrático de Direito que, por sua vez, são
medidas de interpretação, análise e consideração do intérprete na aplicação da norma ao caso
concreto.
Pela clareza e precisão conceitual acerca dos princípios gerais de direito, transcreve-se
passagem em que Norberto Bobbio identifica a relevância dos princípios:
I principi generali non sono, a mio vedere, che norme fondamentali o
generalissime del sistema, le norme più generali. Il nome di principi non trae in
inganno, tanto che è vecchia questione tra i giuristi se i principi generali siano
norme. Per me non c´è dubbio: i principi generali sono norme como tutte altre. E
que ampiamente del problema, il Crisafulli. Per sostenere che i principi generali
sono norme gli argomenti sono due, ed entrambi validi: anzitutto se sono norme
quele da cui i principi generali sono estratti, attraverso um procedimento di
generalizzazione successiva, non si vede perché non debbano essere norme
anch´essi: se astraggo da specie animali ottengo sempre animali, e non Fiori o stelle.
In secondo luogo, la funzione per cui sono estratti e adoperati è quella stessa che è
adempiuta da tutte norme, cioè è la funzione di regolare um caso. A qual escopo
vengono estratti in caso di lacuna? Per regolare um comportamento non regolato, è
28
LARENZ, Karl. Metodologia da ciência do direito. Lisboa. Tradução portuguesa. 3 ed. Fundação Calouste
Gulbenkian, 1997, p. 163-259 e também as idéias contidas nas páginas 621-697.
29
FLOREZ-VALDES, Joaquim Arce. Los princípios generales del derecho y su formulación constitucional.
Madrid: Ed. Cuadernos Civitas, 1990, p. 93-163, como resumo das concepções do autor.
28
chiaro: ma allora servono allo stesso scopo cui servno norme espresse. E perché
non dovrebbero essere norme?
30
A percepção dos princípios para análise crítica de qualquer instituto, notadamente, dos
contratos bancários e do fenômeno da responsabilidade civil deve partir sempre do plano
constitucional, ou seja, a perspectiva de análiseo é só sistemática, mas também voltada aos
elementos normativos e principiológicos contidos na Constituição da República, para que toda
a estrutura normativa infraconstitucional seja corretamente interpretada, alcançando a
premissa da interpretação teleológica.
Essa perspectiva civil-constitucional dos princípios e a importância dos mesmos na
aplicação do direito, especialmente do direito civil, é muito bem retratada por Pietro
Perlingieri baseado na Constituição italiana e inicia tratando da pessoa, evocando o que
chama de princípios do personalismo e do solidarismo constitucional. Afirma que do artigo
2.º da Constituição italiana podem-se extrair referências aos conceitos de direitos invioláveis
do homem, de pessoa, de deveres inderrogáveis de solidariedade, de onde se tenta reconstruir
o conceito de pessoa ou de valor da pessoa.
31
30
BOBBIO, Norberto. Teoria generale del diritto. Torino: G. Giappichelli Editore, 1993, p. 271-272. Segue a
traduação em BOBBIO, Norberto. Teoria do ordenamento jurídico. tradução de Maria Celeste Cordeiro Leite
dos Santos. 10 ed. Brasília: UnB, 1999, p. 158-159: Os princípios gerais são apenas, ao meu ver, normas
fundamentais ou generalíssimas do sistema, as normas mais gerais. A palavra princípio leva a engano, tanto que
é velha questão entre os juristas se os princípios gerais são normas. Para mim não há dúvida: os princípios gerais
são normas como todas as outras. E esta é também a tese sustentada por Cisafulli. Para sustentar que os
princípios são normas, os argumentos são dois, e ambos válidos: antes de mais nada, se são normas aquelas das
quais os princípios gerais são extraídos, através de um procedimento de generalização sucessiva, não se por
que não devam ser normas também eles; se abstraio da espécie animal, obtenho sempre animais, e não flores ou
estrelas. Em segundo lugar, a função para a qual são extraídos e empregados é a mesma cumprida por todas as
normas, isto é, a função de regular um caso. E com que finalidade são extraídos para o caso de lacunas? Para
regular um comportamento não regulado: mas então não servem ao mesmo escopo a que servem as normas
expressas. E por que não deveriam ser normas?
31
PERLINGIERI, Pietro. Il diritto civile nella legalità costituzionale. Napoli: Edizione Scientifiche Italiane,
2001, p. 167-188. Registra-se, ainda, que Perlingieri sustenta que no contexto dogmático, por influência das
ideologias surgidas após a Segunda Guerra Mundial, infere-se uma pluralidade de acepções do solidarismo,
baseado, especialmente, no cristianismo, destacando a dignidade como forma de libertação do homem, na
medida em que os princípios da solidariedade e da igualdade são instrumentos e resultados da atuação da
dignidade social do cidadão. Fazendo referência à Corte Constitucional Italiana, Perlingieri afirma que a igual
dignidade social significa que deve ser reconhecida a todo cidadão igual dignidade, mesmo na variedade das
ocupações ou profissões. A rigor, o homem se realiza em todos os grupos sociais e comunitários em que atua
(família, escola, empresa, sindicato, partido, exército etc.) e isso destina a pessoa humana a um fim específico de
29
Em relação ao direito brasileiro, nota-se que essa mesma percepção também pode ser
construída a partir do artigo 1.º, inciso III, da Constituição da República de 1988, de onde se
evidencia o princípio da dignidade da pessoa humana que foi positivado inclusive para
orientar o Estado brasileiro na consecução de suas atividades.
Importa, ainda, frisar a relevância científica e operacional para efetiva utilização dos
princípios gerais de direito e, especificamente, os princípios cravejados na Constituição, na
interpretação e aplicação da norma jurídica, a concepção do princípio da proporcionalidade
como parâmetro supralegal de calibração e harmonização dos mesmos.
Pela precisão doutrinária, transcreve-se as lições de Suzana de Toledo Barros
32
:
o princípio da proporcionalidade tem dignidade constitucional na ordem jurídica
brasileira, pois deriva da força normativa dos direitos fundamentais, garantias
materiais objetivas do Estado de Direito. É haurido principalmente da conjugação
dos arts. 1.º, III; 3.º, I; 5.º, caput, II, XXXV, LIV e seus pars. 1.º e 2.º; 60, par. 4.º,
IV. Nesse sentido, complementa o princípio da reserva da lei, a ele incorporando-se,
de modo a converter-se no princípio da reserva legal proporcional. O legislador
brasileiro deve, portanto, observá-lo na regulação das medidas limitativas desses
direitos, de modo a unicamente restringi-los quando os meios utilizados sejam
idôneos, necessários e proporcionados em relação com a consecução de fins
constitucionalmente legítimos.
O conteúdo material do princípio da proporcionalidade não se aplica ao legislador,
mas, também, ao intérprete da norma. Daí decorre a relevância e pertinência da alusão a esses
princípios positivados no ordenamento jurídico para estabelecer a razoabilidade dos princípios
aplicáveis à responsabilidade civil nos contratos bancários, pois os princípios são
desenvolvimento político, cultural e geral. Ao analisar o princípio da igualdade e os institutos de direito civil,
Perlingieri diz com clareza que não é possível que a carga desse princípio seja realizada de modo integral nas
relações privadas. Essa disposição constitucional deve ser transplantada para o direito civil no contexto da
intervenção do Estado Legislador, assegurando a operacionalização dos institutos civilísticos fundamentais e
constitucionalmente garantidos. nítida incidência interpretativa da justiça social, no sentido e nos limites
traçados na Constituição, contribuindo em sede de interpretação, ou seja, para individuar o conteúdo específico
que, concretamente, devem assumir as cláusulas gerais das quais é cravejada a legislação civil. Por exemplo, a
equidade, a lealdade, boa-fé, do estado de necessidade à lesão, ou seja, assegurando a função social dos contratos
e da propriedade sustentando que o direito civil tem de se libertar de muitas das ambigüidades interpretativas que
o caracterizam, visto que uma justiça distributiva o pode atuar mediante técnicas tradicionalmente
privatísticas; estas, sendo conformes aos princípios fundamentais do ordenamento, devem estar prontas a sofrer
uso funcionalizado, mas sempre em harmonia com o sistema normativo, especialmente à luz da Constituição.
32
BARROS, Suzana de Toledo. O princípios da proporcionalidade e o controle de constitucionalidade das leis
restritivas de direitos fundamentais. 3 ed. Brasília: Brasília Jurídica, 2003, p. 214-215.
30
indissociáveis e também inseridos nas normas e o intérprete não deve deixar de observá-los,
especialmente, para encontrar a ratio da norma jurídica, chegando, efetivamente, a uma
interpretação teleológica.
Traçadas essas premissas e o corte científico acerca dos princípios, destaca-se o que
Maria Helena Diniz
33
identificou como o que a doutrina e a jurisprudência têm construído a
título de regime especial de responsabilidade civil dos bancos, consagrando alguns princípios:
a) aplica-se aos bancos as normas relativas ao mandato, ao mútuo, ao depósito etc., ante a
ausência de normas específicas para apuração da responsabilidade dos bancos; b) distinção
entre a responsabilidade do banco e a responsabilidade dos administradores de instituição
financeira, sendo que, para a responsabilidade do banco, há forte tendência para se reconhecer
a responsabilidade objetiva, por conta da atividade ser de risco e por assemelhação do banco
ao concessionário de serviço público que exerce função delegada do Estado, ao passo que a
responsabilidade dos administradores é subjetiva; c) existência de dois fundamentos da
responsabilidade civil do banco: a culpa e o risco, um não excluindo o outro; d) incidência da
obrigação de vigilância nos contratos bancários com o intuito de garantir a segurança dos bens
e assegurar a proteção ao cliente, responsabilizando-se o banco, exceto nos casos de culpa
exclusiva ou concorrente da vítima ou força maior.
Concorda-se, parcialmente, com essas linhas gerais, como se discutirá na seqüência da
dissertação; todavia, ressalta-se que essas quatro linhas gerais de apuração de
responsabilidade civil dos bancos não se constituem propriamente princípios, tal como
apresentado neste tópico, e sim identificação de diretrizes gerais e idéias comuns que a
doutrina e a jurisprudência vêm destacando para se apurar a responsabilidade civil dos
bancos. Contudo a coerência metodológica requesta apontar que as referidas idéias consistem,
na verdade, em pura realização da interpretação da norma, pela mecânica da subsunção ou da
33
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. Responsabilidade civil. 21 ed. Vol. 7. São Paulo:
Saraiva, 2007, p. 351-356.
31
integração, e métodos de interpretação teleológico e sistemático, não se tratando propriamente
de princípios.
É de se registrar que a palavra princípio pode ser empregada não só no sentido
técnico, mas também no sentido lógico. Ou seja, a rigor, trata-se de construções lógicas de
interpretação por subsunção e integração do ordenamento jurídico, quando se analisa o fato
responsabilidade civil do banco e que guardam similitude de raciocínio interpretativo, como
uma elucidação dos princípios gerais positivados no ordenamento jurídico e aplicados na
interpretação da responsabilidade civil nos contratos bancários, seja pelo método da dedução,
da indução e até mesmo da tópica argumentativa
34
.
Para fundamentar essa posição, entende-se que a formulação de princípios gerais é
absolutamente necessária para melhor compreender as normas jurídicas, ou seja, as regras,
sistematicamente postas aos conjuntos de fatos que se pretende analisar, especialmente,
quando resta delimitada a questão da responsabilidade civil no plano dos contratos bancários.
Assim, à luz dos princípios gerais de direito e dos demais princípios e linhas gerais de
interpretação que se podem extrair caso a caso, surgem conclusões que possuem identidade
valorativa e ideológica, guardando similitude e proximidade entre as mesmas.
Carlos Ari Sundfeld doutrina que não caberia ao jurista criar os princípios, ou seja,
aqueles que gostaria de ver eleitos, mas sim destacar do ordenamento jurídico os princípios
implícitos, sacando-os dele e não os inserindo nele, observando, todavia, o cuidado no
emprego da palavra princípio”, pois pode ser utilizada em um sentido lógico e não técnico,
especificamente na ciência do direito.
O autor invoca as lições de Eros Grau
35
:
34
Para melhor compreensão do conceito de tópica utilizado por Aristóteles e Engisch, consultar, por todos, a
doutrina de VIEHWEG, Theodor. Tópica e jurisprudência. Tradução de Tércio Sampaio Ferraz Júnior. Brasília:
Departamento de Imprensa Nacional, 1979, especialmente págs. 33-44 e 75-85.
35
GRAU, Eros. A ordem econômica na Constituição de 1988 Interpretação e crítica. 5 ed. São Paulo:
Malheiros, 2000, páginas 101, 117-118.
32
Os princípios gerais do direito são, assim, efetivamente descobertos no
interior de determinado ordenamento. E o são justamente porque neste mesmo
ordenamento isto é, no interior dele já se encontravam, em estado de latência.
Não se trata, portanto, de princípios que o aplicador do direito ou o intérprete possa
resgatar fora do ordenamento, em uma ordem suprapositiva ou no Direito Natural.
Insista-se: eles não são descobertos em um ideal de ‘direito justo’ ou em uma ‘idéia
de direito’. (...) “Isso significa que, em cada caso, armam-se diversos ‘jogos de
princípios’, de sorte que diversas soluções e decisões, em diversos casos, podem ser
alcançadas, umas privilegiando a decisividade de certo princípio, outras a recusando.
Cada conjunção, ou jogo de princípios, será informada por determinações da mais
variada ordem: é necessário insistir, neste ponto, em que o fenômeno jurídico não é
uma questão científica, porém uma ‘questão política’ e, de outra parte, a aplicação
do direito é uma ‘prudência’ e não uma ‘ciência’.
36
Posto isso, com uma pequena variação das conclusões de Maria Helena Diniz, propõe-
se destacar da interpretação da responsabilidade civil no plano dos contratos bancários, à luz
dos princípios gerais do direito privado e baseado em uma perspectiva civil-constitucional,
alguns princípios gerais que podem nortear o intérprete, a saber:
a) aplicam-se aos bancos as normas do negócio jurídico, dos atos lícitos e ilícitos, as
normas relativas à teoria geral dos contratos e das várias espécies de contratos quando
pertinentes, por conta da inexistência de normas específicas para apuração da
responsabilidade dos bancos, especialmente, no plano dos contratos;
b) harmonização dos fundamentos da responsabilidade civil baseada na culpa e no
risco decorrente da atividade desenvolvida pela instituição financeira;
c) distinção entre a responsabilidade do banco e a responsabilidade dos
administradores de instituição financeira, todavia ambas baseadas na responsabilidade
subjetiva, sendo que nos bancos ela é harmonizada com o risco da atividade, especialmente,
atrelada ao dever de vigilância, segurança dos bens e dos clientes, responsabilizando-se o
banco, exceto nos casos de culpa exclusiva ou concorrente da vítima ou força maior.
36
SUNDFELD, Carlos Ari. Fundamentos de direito público. 4 ed. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 149-151.
33
Discorda-se, pois, da doutrina que aponta como princípio o reconhecimento da
responsabilidade civil objetiva dos bancos, baseada no risco da atividade e na suposição de ser
o banco um concessionário de serviço público que exerce função delegada do Estado
37
.
De fato, algumas atividades bancárias ensejam uma atividade de risco, tais como
guarda de bens, segurança dos clientes no interior das agências, determinados serviços
disponibilizados aos clientes, contudo, isso não pode envidar como princípio a extração de
responsabilidade objetiva, pois essa somente pode existir quando especificada em lei ou
quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza,
risco para os direitos de outrem, segundo determina o artigo 927, parágrafo único, do Código
Civil. Essa idéia está consagrada na Súmula 28 do Supremo Tribunal Federal.
38
A rigor, essas atividades de risco dos bancos têm como origem uma espécie de
contrato bancário. A análise, portanto, deve ser feita com base na responsabilidade contratual
e não extracontratual. Essas questões serão enfrentadas mais adiante, contudo, como linha de
interpretação, não se pode olvidar dos princípios incidentes e mencionados, pois são
relevantes para uma correta interpretação do objeto estudado.
Em contrapartida, sustenta-se que definir a atividade bancária como algo essencial do
Estado ou como um serviço público, não parece adequado, pois as funções essenciais do
Estado se baseiam na educação, saúde e segurança (basicamente). Os bancos não têm contato
direto com nenhuma delas. Na verdade, o Estado se ocupa de regular as relações e atividades
bancárias, criando o Sistema Financeiro Nacional para trazer uma estabilidade jurídica, por
meio das normas, como faz com qualquer outra atividade, por exemplo, na área do meio
37
Maria Helena Diniz identifica corrente doutrinária no direito comparado, propugnada por Roger Houin,
Christian Gavalda, Jean Stoufflet, Jack Vézian e Michel Vasseur, que consideram que os estabelecimentos
bancários exercem um serviço público à coletividade, intermediando os pagamentos na sociedade atual como
concessionário do Poder monetário exercido pelo Estado, e também identifica uma observação feita por Arnoldo
Wald, embora sem precisar o posicionamento do referido autor, pelo simples fato de a nossa legislação integrar
completamente os bancos no Sistema Financeiro Nacional. In DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil
brasileiro. Responsabilidade civil. 21 ed. Vol. 07. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 354.
38
Súmula 28 do STF: O estabelecimento bancário é responsável pelo pagamento de cheque falso, ressalvadas as
hipóteses de culpa exclusiva da vítima ou concorrente do correntista.
34
ambiente, de transportes, comunicação, desporto, ciência e tecnologia, enfim, atividades
exercidas no âmbito privado (por pessoas naturais ou jurídicas) que absolutamente não
ensejam responsabilidade objetiva por parte de seus agentes e que também não podem ser
consideradas atividades delegadas do Estado.
Não que se confundir atividade financeira com a bancária. Atividade financeira
está atrelada à atuação estatal em diversas funções de regulação econômica (como emissão de
moeda e controle do crédito), ao passo que a bancária desenvolve-se pela atuação das
instituições financeiras no mercado em suas mais diversas modalidades e espécies, o que se
demonstrado no próximo capítulo e autoriza de forma contundente o não reconhecimento da
defendida responsabilidade objetiva das instituições financeiras.
No direito comparado, tanto legislação, quanto jurisprudência e doutrina têm
rechaçado esta conclusão de que o banco exerceria um serviço público, idéia que foi
defendida inicialmente na França e na Itália, com base nas concepções de direito
administrativo. Contudo, reputa-se que no ordenamento jurídico brasileiro a teoria de que os
bancos desenvolvem atividade delegada do Estado não parece prosperar, ante os fundamentos
jurídicos desenvolvidos, mas, especialmente, pela evidente ausência de norma jurídica que
reconheça expressamente a delegação e, também, pela evidente distinção de atividade
financeira e bancária.
No plano do direito estrangeiro, destaca-se, ainda, a doutrina da autora portuguesa
Margarida Maria Matos Correia Azevedo de Almeida
39
em dissertação de mestrado defendida
na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, citando robusta doutrina e, também,
textos normativos, apresentando a seguinte conclusão, que pela relevância se transcreve:
Chegou-se a defender em França a actividade bancária como serviço público.
Esta concepção foi posta de parte enquanto tradução da idéia de que os bancos
39
ALMEIDA, Margarida Maria Matos Correia Azevedo de. A responsabilidade civil do banqueiro perante os
credores da empresa financiada. Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra. Coimbra:
Coimbra Editora, 2003, p. 23-25.
35
desenvolviam um serviço público em sentido administrativo. No nosso Direito, é
sublinhado que a nacionalização dos bancos ocorrida em 1975 não acarretou uma
modificação da natureza da actividade exercida pelos mesmos. Sendo empresas
públicas, estariam sujeitas ao princípio da gestão privada, nos termos do art. 3.º, DL
260/76. Este princípio da gestão privada tem inteira aplicação, como nota FREITAS
DO AMARAL, nas empresas de interesse econômico, como é o caso da banca que é,
na sua raiz, uma actividade privada. A privatização de vários bancos parece ter
vindo confirmar o afastamento da idéia de que a banca exerce um serviço público. A
concepção da banca como desenvolvendo um serviço público tem vindo a ser
ultrapassada, mesmo em França, país em que se manifestou, como acabamos de
referir, através de HOUIN. Em Portugal, várias vozes se têm levantado no sentido da
não aceitação dessa idéia, opondo-se, deste modo, à existência de um direito ao
crédito. Tem-se presente que a actividade bancária possui uma inegável projecção
social, pelo que se compreende facilmente a intervenção dos poderes públicos, como
se demonstra pela sujeição aos poderes de atribuídos essencialmente ao Banco de
Portugal (v. art. 93º/1 RGICSF). A supervisão das instituições tem, na verdade, em
vista ‘a prudência da actuação das instituições crédito e a confiança do público’. Isto
não impede que se considere que as instituições de crédito desenvolvam a sua
actividade em função da obtenção do lucro, ou seja, que desenvolvam uma autêntica
actividade empresarial, estando, desta forma, sujeitas às regras do Direito Privado. A
subordinação a estas normas implica, desde logo, que as decisões relacionadas com
a outorga ou não outorga de crédito se submetam ao princípio da liberdade
contratual. Todavia, como veremos, a importância e as características que revestem
a actividade bancária não poderão deixar de se tem em conta na apreciação da
questão da responsabilidade civil do banqueiro perante os credores do seu cliente.
Nota-se que, conforme identificado nas conclusões de Margarida Maria Matos Correia
Azevedo de Almeida, a regulação normativa no direito português pertinente ao setor
empresarial do Estado e de empresas públicas decorre atualmente do DL 558, de 17/12/99, e
na Itália, a Lei Bancária de 1936, que classificava a atividade bancária como de interesse
público, foi modificada pela disposição contida no artigo 10.º, parágrafo 1.º, do Texto Único
das Leis em Matéria Bancária e Creditícia que reconhece como empresa privada a atividade
dos bancos.
Assim, pela leitura da doutrina e normas jurídicas especialmente do direito português
e italiano, pode-se citar, com fundamento nas conclusões e citações da referida autora, que
doutrinadores como Diogo Freitas do Amaral, Diogo Leite de Campos e Antônio Menezes
Cordeiro, em Portugal, e Richard Routhier, na França, também reconhecem que os bancos não
desenvolvem serviço público.
que se destacar, também, a diferença entre responsabilidade legal e a
responsabilidade contratual. No caso dos bancos, a responsabilidade é contratual e em
36
algumas situações fáticas, decorrentes das atividades que desenvolvem, permeia a ocorrência
de atividade de risco, mas regulada no âmbito do direito privado em razão da autonomia
privada. Todavia a responsabilidade objetiva dos bancos por suposta realização de atividades
delegadas do Estado não procede, não se enquadrando no artigo 37, parágrafo 6.º, da
Constituição Federal e nem tampouco no artigo 927, parágrafo único, do Código Civil, pois
não está prevista por lei
40
.
Ademais, distinção entre atividade financeira, que é realizada pelo Estado, e a
bancária, que é desenvolvida pelas instituições financeiras, o que demonstra não se tratar da
mesma situação. Trata-se de uma distinção ontológica, como será justificado adiante. Em
contrapartida, se desenvolvessem os bancos atividade equiparada a serviço público, todos
teriam direito ao crédito, todavia, a concessão ou não de crédito está adstrita ao exercício da
autonomia privada das instituições financeiras, que inclusive podem recusar a concessão do
crédito a determinado cliente, na medida em que essa concessão está sujeita à prévia análise,
sobretudo, por estarem os bancos sujeitos às disposições normativas do Banco Central,
especialmente, àquelas vedações como realizar operações que não atendam aos princípios da
seletividade, da garantia, da liquidez e da diversificação do risco.
É importante acentuar que a Constituição da República de 1988, quando regulou a
ordem econômica e financeira (artigos 170 a 192, este último com a redação da Emenda
Constitucional n. 40, de 29/05/2005), baseou-se na valorização do trabalho humano e na livre
iniciativa, tendo em vista a consecução de uma vida digna, efetivando princípios como a
propriedade privada e sua função social, a livre concorrência, entre outros, registrando, ainda,
que o Sistema Financeiro Nacional deverá ser estruturado para proporcionar o
desenvolvimento equilibrado do País e servir aos interesses da coletividade, determinando sua
40
Enunciado 38 da Jornada I do STJ: A responsabilidade fundada no risco da atividade, como prevista na
segunda parte do parágrafo único do art. 927 do novo Código Civil, configura-se quando a atividade
normalmente desenvolvida pelo autor do dano causar a pessoa determinada um ônus maior do que aos demais
membros da coletividade.
37
regulação por meio de leis complementares. Nas referidas leis complementares não existem
normas prevendo a responsabilidade objetiva das instituições financeiras, como exige o
Código Civil, no artigo 927, parágrafo único
41
, que regula especificamente a responsabilidade
civil. Portanto, se admite a aferição do risco da atividade financeira em determinadas
hipóteses concretas, observando o tipo de atividade desenvolvida pelo banco, pois nem todas
são de risco, ficando afastada a idéia da responsabilidade objetiva dos bancos por conta de
suposta atividade delegada e essencial do Estado.
Evidencia-se, pois, como princípio geral de responsabilidade civil no plano dos
contratos bancários, a responsabilidade subjetiva, mitigada e harmonizada com a idéia do
risco da atividade bancária em determinadas hipóteses que serão expostas adiante. O corte que
se faz da análise da responsabilidade civil fica adstrito aos contratos bancários, portanto, as
premissas conceituais deste trabalho estão baseadas nos princípios identificados neste
capítulo.
de se registrar, ainda, que a responsabilidade civil contratual no plano dos
contratos bancários tem por origem a relação negocial estabelecida entre a instituição
financeira e o cliente, todavia, não é permitido confundir a referida responsabilidade civil com
inadimplemento contratual. Assim, como doutrina Fábio Ulhoa Coelho, deve-se perquirir se o
dever de indenizar é prestação ou consectário do contrato, ou seja, se for prestação, tratar-se-á
de responsabilidade civil contratual ou extracontratual e, diferentemente, se for consectário,
tratar-se-á de inadimplemento contratual.
42
41
digo Civil. Artigo 927: Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a
repará-lo.
Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em
lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os
direitos de outrem.
42
COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil. Vol. 02. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 253-255.
CAPÍTULO II
Contratos bancários e seus efeitos jurídicos
2.1. Conceito de atividade financeira e bancária
2.1.1. O Sistema Financeiro Nacional
O Sistema Financeiro Nacional no Brasil está estruturado em rigorosa regulação
estatal, o que o insere no âmbito do direito público; todavia, a atividade financeira e bancária
é desenvolvida, especialmente, pela iniciativa privada, o que a inclui no direito privado. Essa
dicotomia entre o direito público e o privado não autoriza uma exclusão um do outro, mas sim
a harmonização dos cânones que regulam essas duas áreas do direito, que na verdade é
composto pelo sistema normativo como um todo e que é uno, observando-se, também, que a
interpretação deve dar-se de forma sistemática e teleológica de todo o ordenamento jurídico.
Anote-se que a rigorosa regulação estatal não enseja o reconhecimento de uma
atividade delegada do Estado por parte das instituições financeiras, na medida em que a
referida regulação decorre especialmente do risco sistêmico no funcionamento do sistema
financeiro nacional. Deve-se salientar, também, a distinção entre atividade financeira e
atividade bancária.
A financeira enseja uma regulação rígida do Estado para atenuar o risco sistêmico que
decorre dessa atividade. A rigor, trata-se de uma atividade extremamente dinâmica e afetada
por fatores sociais, políticos, econômicos e jurídicos, bem como da movimentação do capital,
especialmente, o internacional e pelo afluxo do mesmo para o mercado interno. O Estado tem
de regular por razões de segurança jurídica (e também de ordem pública e social) a atividade
39
financeira e o faz por meio do controle exercido pelo Sistema Financeiro Nacional e pelos
órgãos de regulação, fiscalização e operacionalização da atividade em suas diversas vertentes,
como o Conselho Monetário Nacional e o Banco Central. Existe, pois, um dirigismo
contratual, no plano negocial das instituições financeiras.
O Sistema Financeiro Nacional está baseado e disciplinado a partir da Constituição da
República e tem uma estrutura normativa, de supervisão e de fiscalização, bem como uma
estrutura de operacionalização das atividades financeiras. Assim, a estrutura operativa tem
suas atividades voltadas para regular e fiscalizar as instituições bancárias (bancos comerciais,
múltiplos e outros) e não-bancárias (como sociedades de arrendamento mercantil, sociedades
de crédito imobiliário e outras), assim como regular o sistema de distribuição de títulos e
valores mobiliários e determinados agentes especiais.
O Sistema Financeiro Nacional desenvolve atividades por meio do Conselho
Monetário Nacional por três instituições autárquicas federais que gozam de autonomia: Banco
Central, Comissão de Valores Mobiliários e Superintendência de Seguros Privados. que se
destacar, também, a existência do Conselho de Recursos do Sistema Financeiro e do órgão de
inteligência que é o COAF (Conselho de Controle de Atividades Financeiras). Como órgãos
de cooperação internacional podem-se citar o Bank of International Settlemente (BIS), uma
espécie de Banco Central dos Bancos Centrais, e também o Comitê da Basiléia, no plano do
Direito Internacional (público e privado).
A composição do Sistema Financeiro Nacional, consoante disposição do artigo 1.º, da
Lei 4.595/64, é feita pelo Conselho Monetário Nacional, do Banco Central do Brasil, do
Banco do Brasil S/A, do Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e das demais
instituições financeiras públicas e privadas operantes no sistema.
Há de se destacarem as conseqüências decorrentes da Emenda Constitucional n. 40, de
19/05/2003, no tocante ao artigo 192 da Constituição Federal, pois conforme a doutrina de
40
Alexandre de Moraes a nova redação do artigo 192 indica quatro preceitos fundamentais
quanto à regulamentação do Sistema Financeiro Nacional: a) o Sistema Financeiro Nacional
deve ser estruturado a fim de promover o desenvolvimento equilibrado do país; b) a
regulamentação do sistema financeiro nacional deverá ter como meta servir aos interesses da
coletividade; c) a expressa previsão constitucional da integração das cooperativas de crédito
no sistema financeiro e d) a especificação da participação do capital estrangeiro nas
instituições bancárias pela regulamentação do sistema financeiro.
43
A revogação do parágrafo 3.º, do artigo 192 da Constituição Federal, por meio da
Emenda Constitucional n. 40/03, ensejou a permissão expressa da regulação do Sistema
Financeiro Nacional por meio de várias leis complementares e não mais uma única lei, até em
razão das diversas matérias que englobam o Sistema Financeiro Nacional. Todavia, a
jurisprudência do Supremo Tribunal Federal já vinha reconhecendo a não auto-aplicabilidade
do parágrafo 3.º, do artigo 192 da Constituição, e também a disciplina de recepção do pessoal
do Banco Central por meio da Lei 4.595/64, que foi recepcionada como norma ordinária, bem
como a atribuição ao Banco Central de executor da política econômica do governo federal,
por meio da lei ordinária referida.
44
2.1.2 Definição de instituição financeira
A Constituição Federal atribui como competência exclusiva à União a administração
das reservas cambiais do País e também a fiscalização das operações de natureza financeira,
especialmente as de crédito, câmbio e capitalização, bem como as de seguro e previdência
43
MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional. 6 ed. São Paulo:
Atlas, 2006, p. 2076.
44
MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional. 6 ed. São Paulo:
Atlas, 2006, p. 2077-2078: (STF, Pleno, ADIN n. 4-7/DF, decisão: 7-3-1991; STF, Súmula 648; STF, Pleno,
ADIN n. 449/DF; STF, Pleno, ADIN n. 2.238/DF).
41
privada, consoante dispõe o artigo 21, VIII, da CF. Percebe-se, portanto, que a Constituição
reconhece a existência de operações financeiras como gênero e traz como espécies um rol
exemplificativo no qual identifica as operações de crédito, câmbio e capitalização e outras
discriminadas no dispositivo constitucional.
Da referida competência constitucional decorrem normas jurídicas como a Lei 4.595,
de 31/12/64, que dispõe sobre a política e as instituições monetárias, bancárias e creditícias,
bem como cria o Conselho Monetário Nacional, exercitando a competência para regular a
administração das reservas cambiais e a fiscalização das operações de natureza financeira
como gênero. Na regulação das espécies de operações financeiras, por exemplo, segue a Lei
4.728, de 14/07/65, que disciplina o mercado de capitais e estabelece medidas para o seu
desenvolvimento, o Decreto-Lei n. 73, de 21/11/66, que dispõe sobre o sistema nacional de
seguros privados, regula as operações de seguros e resseguros, regulamentado pelo Decreto n.
60.459, de 13/03/67, e também a Lei Complementar n. 109, de 29/05/01, que dispõe sobre o
regime de previdência complementar, regulamentada pelo Decreto n. 4206, de 23/02/02.
A Lei Complementar n. 105/2001 destaca também diversas espécies de operações
financeiras, precisamente no artigo 5.º, parágrafo primeiro, que trata sobre o sigilo das
operações financeiras e lista um rol exemplificativo de operações que se sujeitam a sigilo.
45
Sustenta-se pelas disposições normativas no plano constitucional e infraconstitucional
que operação financeira refere-se a gênero do qual existem diversas espécies distintas de
operações, sendo que algumas têm regulação específica, tais como as de seguros, previdência
complementar, mercado de capitais, ao passo que outras operações não têm regulação
45
As operações financeiras delineadas pela Lei Complementar 105/2001 operacionalizam a proteção da
intimidade das pessoas (naturais ou jurídicas) em razão da disposição constitucional dos direitos e garantias
fundamentais do artigo 5.º, da Constituição da República e mereceram discussão acalentada, inclusive da
sociedade e da imprensa, sobre os poderes do Banco Central em determinar a quebra do sigilo bancário, em
decorrência da qual o STF reconheceu que tal procedimento deve ser precedido de autorização judicial,
conforme matéria veiculada recentemente no jornal O Estado de São Paulo, ano 128, n. 41569, de 10/08/07, p.
A3. Registra-se, ainda, que a não incidência da CPMF a partir de 31/12/07 fez acalentar ainda mais tal discussão
no meio jurídico, visto que a própria Receita Federal regulamentou a maneira pela qual as instituições
financeiras deverão proceder a informação das movimentações financeiras de seus clientes.
42
específica, mas incidência sistemática de todo ordenamento jurídico, ensejando uma
interpretação sistemática e teleológica com base em diversas normas jurídicas existentes.
A Constituição Federal também efetiva a atribuição de competência legislativa
exclusiva à União acerca do sistema monetário e de medidas, títulos e garantias dos metais,
política de crédito, câmbio, seguros e transferência de valores e dos sistemas de poupança,
captação e garantia da poupança popular, a teor do artigo 22, incisos VI, VII e XIX, da CF.
Decorrem dessa competência as normas jurídicas como a Lei 9.069, de 26/09/95, que dispõe
sobre o Plano Real, o sistema monetário nacional, estabelecendo as regras e condições de
emissão do Real e os critérios de conversão das obrigações para o Real, tendo sido
complementada pela Lei 10.192, de 14/02/01. Quanto à autorização do funcionamento de
associações de poupança e empréstimo e de regras para a indexação da economia, decorrem o
Decreto-Lei n. 70, de 21/11/66, e a Lei 8.177, de 01/03/91.
A competência exclusiva da União afasta os efeitos resultantes de normas emanadas
de processo legislativo dos Estados federados, visto tratar-se de competência restrita à União,
como já decidiu o Supremo Tribunal Federal.
46
Portanto, norma jurídica estadual ou
municipal não pode adentrar na esfera dessa competência como requesta a Constituição.
Destacam-se, ainda, as disposições constitucionais acerca das finanças blicas previstas nos
artigos 163, 164 e 192 da Constituição Federal e, também, a previsão contida no artigo 52 do
Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, com a redação dada pela Emenda
Constitucional n. 40/03, pertinente aos bancos estrangeiros com agências no País, normas
jurídicas que deflagram efeitos relevantes para a percepção dos efeitos na atividade
desenvolvida pelos bancos.
46
RE 183.907-4: decidiu-se que o Estado federado não pode fixar índices de correção monetária de créditos
fiscais em percentuais superiores aos fixados pela União. (STF, Min. Rel. Ilmar Galvão, DJ de 16/04/04).
43
O conceito e a definição de instituição financeira é fornecido pelo próprio legislador
infraconstitucional, no artigo 17 da Lei 4.595/64
47
. O legislador também prevê severa punição
(reclusão de um a quatro anos) e multa para quem fizer operar sem a devida autorização, ou
com autorização obtida mediante declaração falsa, instituição financeira, inclusive aquelas
voltadas para distribuição de valores mobiliários ou câmbio, conforme disposição da Lei
7.492/86, no artigo 16.
A opção legislativa foi no sentido de conceituar instituição financeira ao invés de
listar exemplares dela, com o escopo de evitar fraudes que se operassem por meio de
modificação do nome e não da atividade, no sentido de vincular o funcionamento da mesma
por meio de autorização prévia do Banco Central (artigo 18, da Lei 4.595/64) e, no caso das
instituições estrangeiras, por meio de autorização por decreto do Poder Executivo.
Assim, pode-se verificar pela estruturação normativa existente (artigos 22, 23, 24, 25
da Lei 4.595/64), sobretudo pelas Resoluções do Banco Central, que basicamente existem
dois tipos de instituições financeiras: as públicas e as privadas, subdivididas em razão de
atividades diferenciadas. Como exemplo de instituições financeiras públicas tem-se o Banco
do Brasil e também as Caixas Econômicas, mas que desenvolvem atividades que o
reguladas pelo direito privado.
No âmbito das instituições financeiras privadas, por meio de consulta direta aos
informes do Banco Central do Brasil
48
, considerando-se as diversas Resoluções, Circulares e
Portarias dessa autarquia federal, pode-se destacar a existência e regulação: os bancos
comerciais, os bancos de investimentos (Resolução 2624/99), os bancos cooperativos
(Resolução 2788/00), as conhecidas financeiras ou sociedades de crédito, financiamento e
47
Lei 4.595/64, art. 17. Consideram-se instituições financeiras, para os efeitos da legislação em vigor, as pessoas
jurídicas públicas ou privadas, que tenham como atividade principal ou acessória a coleta, intermediação ou
aplicação de recursos financeiros próprios ou de terceiros, em moeda nacional ou estrangeira, e a custódia de
valor de propriedade de terceiros. Parágrafo único. Para os efeitos desta Lei e da legislação em vigor, equiparam-
se às instituições financeiras as pessoas físicas que exerçam qualquer das atividades referidas neste artigo, de
forma permanente ou eventual.
48
Consultar diretamente o sítio do Banco Central do Brasil na Internet: <www.bacen.gov.br> acessado em
30/10/07.
44
investimento (Portaria 309/59), as cooperativas de crédito (Resolução 3321/05), as sociedades
de crédito imobiliário e as associações de poupança e empréstimo (Decreto-Lei 70/66), as
companhias hipotecárias (Resolução 2122/94), as agências de fomento (Resolução 2828/01),
as sociedades de crédito ao microempreendedor (Resolução 2874/01), as sociedades de
arrendamento mercantil (Resolução 2309/96), os bancos múltiplos (Resoluções 1524/88 e
1364/88), a recente figura do representante bancário (Circular 2978/00). Ressalta-se ainda a
existência de regulação sobre sociedades distribuidoras de títulos e valores mobiliários
(Resolução 1653/89), as sociedades corretoras de títulos e valores mobiliários (Resolução
1655/89) e as sociedades corretoras de câmbio (Resolução 1770/90).
No que diz respeito à recente figura do representante bancário, não se pode dizer
expressamente tratar-se de instituição financeira, uma vez que é, na verdade, um prestador de
serviços, conforme Circular 2978/00 do Banco Central. A hipótese de evidenciar como uma
instituição financeira será abordada adiante, quando se fizer alusão à responsabilidade civil
decorrente de serviço realizado por meio de representante bancário.
A jurisprudência também classifica como instituições financeiras empresas
administradoras de cartões de crédito e, por conseguinte, não faz incidirem as limitações da
Lei da Usura (Decreto 22.626/33) aos juros remuneratórios por elas cobrados.
49
Todavia,
quase que a totalidade das empresas administradoras de cartões de crédito foi transformada
em instituição financeira, em razão da vinculação dos cartões de crédito às operações
bancárias, o que ficou evidenciado pela multiplicidade de funções (crédito e débito).
Outro aspecto importante que a jurisprudência
50
tem reconhecido quanto à
classificação das instituições financeiras diz respeito ao fato de que os bancos comerciais não
estão sujeitos a registro nos conselhos regionais de economia, por vincularem-se única e
exclusivamente ao Banco Central do Brasil. Em vista disso, conseqüências jurídicas para a
49
Súmula 283 do STJ. As empresas administradoras de cartão de crédito são instituições financeiras e, por isso,
os juros remuneratórios por elas cobrados não sofrem as limitações da Lei de Usura.
50
Súmula 79 do STJ. Os bancos comerciais não estão sujeitos à registro nos conselhos regionais de economia.
45
União e para o próprio Banco Central, no que se refere ao enquadramento, classificação e
fiscalização das instituições financeiras e a jurisprudência observa essa questão, quando
reconhece que é da competência da União a fixação do horário bancário no País e que
legitimidade do Banco Central nas ações fundadas na Resolução 1.154, de 1986.
51
Com exceção das cooperativas de crédito (Resolução 3321/05), as instituições
financeiras por força de lei deverão constituir-se unicamente sob a forma de sociedade
anônima, conforme a redação dada pela Lei 5.710, de 07/10/71, ao artigo 25 da Lei 4.595/64.
Isso representa um tipo societário único de funcionamento das instituições financeiras no
Brasil e observa toda uma estruturação organizacional diferenciada e complexa, que implica
reflexos diretos nos contratos bancários e na própria responsabilidade civil, pois indica a
existência de uma pessoa jurídica, a princípio, extremamente estruturada de um lado, que
constrói e lança mão de relações jurídicas negociais massificadas no mercado, daí porque a
aplicação do Código de Defesa do Consumidor no âmbito das instituições financeiras,
conforme amplo entendimento doutrinário e jurisprudencial.
52
Impende reiterar que, após a análise normativa e regulatória exercida pelo Banco
Central, as operações financeiras listadas nas atividades de crédito, câmbio e capitalização
não possuem uma normatização própria, tal como ocorre com as operações financeiras de
seguro, previdência privada e de mercado de capitais. Por conta disso, sustenta-se que
operação financeira é gênero do qual existem diversas espécies.
Em outras palavras, os negócios jurídicos que têm por objeto operações financeiras de
crédito, câmbio e capitalização são regulados pelas normas jurídicas gerais existentes no País,
como o Código Civil de 2002 e o Código de Defesa do Consumidor (na medida em que
51
Súmula 23 do STJ. O Banco Central do Brasil é parte legítima nas ações fundadas na Resolução 1.154, de
1986. Súmula 19 do STJ. A fixação do horário bancário, para atendimento ao público, é da competência da
União.
52
Súmula 297 do STJ. O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras. Consultar,
também, decisão do STF na ADIN n. 2591 de 2005, pertinente a duplicidade de regime de revisão contratual
(Código Civil e Código de Defesa do Consumidor) que mais adiante também é analisada.
46
ambos forem aplicáveis), além dessas regras gerais de regulação, oriundas da estruturação do
Sistema Financeiro Nacional, do Conselho Monetário Nacional e especialmente do Banco
Central, no exercício do poder de fiscalização determinado pela Constituição Federal. Isso
enseja uma conseqüência jurídica na análise da responsabilidade civil no plano dos contratos
praticados pelos bancos, pois evidencia ausência de norma específica, especialmente para
regular a aferição e extensão da responsabilidade dos bancos no plano dos negócios jurídicos
que operacionalizam em suas atividades bancárias.
Nesse contexto, é importante reforçar a distinção entre atividade financeira e atividade
bancária, até porque as operações financeiras se operacionalizam no âmbito das duas
atividades; todavia, a fim de delimitar o campo de aferição da responsabilidade civil dos
contratos que tenham por objeto operações financeiras, é necessário demonstrar e justificar a
distinção da natureza jurídica dessas atividades.
2.1.3. A distinção entre atividade financeira e atividade bancária
Pela leitura da doutrina que segue adiante e baseado no ordenamento jurídico vigente,
uma distinção clara entre atividade financeira e atividade bancária, na medida em que a
primeira está atrelada às funções exercidas pela atuação estatal e a segunda desenvolve-se por
meio de instituições financeiras públicas ou privadas, e é concretizada nas diversas espécies
de operações financeiras negociais no mercado.
Sidnei Turczyn
53
evidencia a distinção e explica que a atividade financeira está
indissociavelmente ligada à atuação estatal, o que não ocorre com as demais atividades
econômicas, e observa que no regime capitalista a atividade econômica se apresenta como
53
TURCZYN, Sidnei. O Sistema Financeiro Nacional e a regulação bancária. São Paulo: RT, 2006, p. 33-47.
47
atividade-fim, ao passo que a atividade financeira se presta a atuar como atividade-meio,
facilitando o funcionamento das demais atividades econômicas. Salienta, ainda, que se opera a
atividade financeira por diversas modalidades, destacando-se a atividade financeira pública,
especialmente o poder estatal de emitir moeda, de controlar o crédito, de exercer política
pública de fixar taxas de juros, controle da oferta de moedas. Além disso, segundo o autor, o
Estado passa a exercer atividade financeira ao desenvolver o custeio do próprio
funcionamento, com a emissão de títulos representativos da dívida pública (tais como Letras
do Tesouro Nacional etc.). Por isso, a atividade financeira também pode ocorrer no âmbito
privado, quando procede à intermediação de capitais com o escopo de obter lucro, e essa
definição decorre da inteligência do artigo 17 da Lei 4.595/1964, no qual se nota como
atividade clássica a negociação do próprio dinheiro (como bem móvel fungível) e outra
atividade, que é a atuação no âmbito dos títulos e valores mobiliários e no mercado da bolsa
de valores, esse último regulado pela Lei 6.385/1976.
A atividade bancária se trava justamente na intermediação e capitação de dinheiro ou
de depósitos à vista, especialmente com recursos de terceiros, atuando com uma carteira
comercial e desenvolvendo as diversas atividades subdivididas nas classificações
estabelecidas pelo próprio Banco Central e já mencionadas adredemente. A identificação
dessa atividade bancária, no dizer de Nelson Abrão, é simples e direta, pois o referido autor
define e conceitua banco como a empresa que com fundos próprios, ou de terceiros, faz da
negociação de crédito sua atividade principal.
54
A atividade bancária, portanto, desenvolve-se pelas instituições financeiras,
notadamente pelos bancos, no plano da atividade financeira que se opera no âmbito privado, e
é operacionalizada por meio de negócio jurídico contratual, dito contrato bancário, em que se
desenvolvem as operações financeiras listadas, exemplificativamente, pelo ordenamento
54
ABRÃO, Nelson. Direito Bancário. 5 ed. São Paulo: Saraiva, 1999, p. 17.
48
jurídico
55
, a partir do que se analisa a responsabilidade civil com origem nos referidos
contratos bancários.
Eduardo Salomão Neto utiliza a expressão atividade privativa de instituição
financeira” para evidenciar a atividade bancária e identifica elementos que a caracterizam
pela interpretação teleológica que faz do artigo 17 da Lei 4.595/64, em função de suas
atividades privativas que exigem cumulativamente: a) a captação de recursos de terceiros em
nome próprio, b) seguida de repasse financeiro através de operação de mútuo, c) com o intuito
de auferir lucro derivado da maior remuneração dos recursos repassados em relação à dos
recursos coletados, d) desde que a captação seguida de repasse se realize em caráter
habitual.
56
Para alcançar o escopo efetivo e operacional do Sistema Financeiro Nacional, o Banco
Central do Brasil editou em 22/12/88 a Resolução n. 1.559, que foi alterada recentemente pela
Resolução n. 3.258, de 28/01/05, contemplando no item IX vedações gerais às quais as
instituições financeiras estão submetidas nas práticas de operações financeiras.
57
Assim, é vedado às instituições financeiras realizar operações que não atendam aos
princípios de seletividade, garantia, liquidez e diversificação do risco, o podendo conceder
crédito ou adiantamento sem constituição de adequado título de crédito
58
representativo da
dívida. Veda-se, ainda, a renovação de empréstimos com a incorporação de juros e encargos
de transação anterior, ressalvados os casos de composição de créditos de difícil ou duvidosa
55
Lei Complementar n. 105, de 10/01/01, artigos 1.º e 5.º, parágrafo 1.º, listando, exemplificativamente,
operações financeiras.
56
NETO, Eduardo Salomão. Direito bancário. São Paulo: Atlas, 2005, p. 27.
57
A nota técnica que justifica e esclarece a Resolução 3.258, de 28/01/05, destaca no item número 3: “Nesse
sentido, o Conselho Monetário Nacional e o Banco Central do Brasil têm implementado diversas medidas de
caráter prudencial de modo a reduzir o risco de crise sistêmica e das operações bancárias, instituindo com esse
intuito uma regulamentação coerente com as melhores práticas e recomendações internacionais, mais adequadas
ao alcance dos objetivos almejados quanto à solidez do SFN.”
58
A Resolução não esclarece qual título de crédito deva ser utilizado, mas apenas que o mesmo seja adequado
para representar a dívida. Atualmente, as instituições financeiras m lançado mão das Cédulas de Crédito
Bancário que foram inicialmente instituídas pela Medida Provisória 1925, de 14/10/99, alterada pela Medida
Provisória 2160, de 23/08/01, que permaneceu em vigor até 01/08/04, por força da Emenda Constitucional n.
32/01 e, finalmente, foi transformada e regulamentada pela Lei 10.931, de 02/08/04, capítulo IV, artigos 26 a 45.
49
liquidação; a admissão de saques além dos limites em contas de empréstimos ou a descoberto,
em contas de depósitos; a realização de operações com clientes que possuam restrições
cadastrais ou sem ficha cadastral atualizada e, por fim, a realização de operações com clientes
emitentes de cheques sem a necessária provisão de fundos.
Verifica-se que os aludidos princípios impõem restrições à forma de
operacionalização dos contratos bancários que instrumentalizam e têm por objeto operações
financeiras, ou seja, impõem exigências e vedações aos bancos para firmarem os negócios
jurídicos mencionados. Referidos princípios requestam que a instituição financeira deva
proceder à criteriosa seleção e avaliação na concessão do crédito, especialmente agregada à
tomada de garantias eficazes que viabilizem a retomada na hipótese de inadimplência do
crédito bancário e aferição da liquidez de suas reservas. Essa exigência se coloca no sentido
de diversificar, graduar e diluir a carteira de créditos das operações financeiras, registrando
que as mesmas podem ser ativas e passivas, e até mesmo negar a concessão de empréstimos.
Entende-se, portanto, que a autonomia privada das instituições financeiras não é
lesada, mas sim regulada ante suas especificidades apontadas, pois nítida harmonização
e efetivação das disposições normativas, principiológicas e programáticas da Constituição
Federal. Ora, o artigo 170 da CF dispõe que a ordem econômica funda-se na valorização do
trabalho e na livre iniciativa e deve obedecer ao princípio da propriedade privada, da função
social da propriedade (e também do contrato, que decorre dos artigos 421 e 2.035, parágrafo
único do Código Civil), da livre concorrência e da defesa do consumidor; todavia, sem deixar
de assegurar a todos, ou seja, sem acepção de pessoas, o livre exercício de qualquer atividade
econômica, ressalvando a autorização dos órgãos públicos nos casos expressamente previstos
em lei.
de se registrar que o rol indicado no artigo 170 da Constituição alberga não só os
fundamentos da ordem econômica, mas também suas finalidades, pois os objetivos que
50
deverão ser atingidos basicamente se restringem à procura de uma existência digna, nos
moldes dos ditames da justiça social, como doutrina André Ramos Tavares.
59
Anota-se, também, que a liberdade contratual é exercida em razão e nos limites da
função social dos contratos e nenhuma convenção poderá prevalecer, se vier a contrariar
preceitos de ordem pública, especialmente aqueles que visam assegurar a função social dos
contratos. Essas disposições decorrem do próprio Código Civil nos artigos 421 e 2.035,
parágrafo único, observando, ainda, que os contratos bancários, por operacionalizarem as
diversas modalidades de operações financeiras (sobretudo a concessão de crédito),
representam negócios jurídicos que têm função social evidente e relevante, sendo, portanto,
absolutamente legítima a limitação na liberdade contratual das partes, pois o contrato implica
conseqüências de destaque na vida econômica da sociedade.
Há, por isso, relevância na regulação das atividades desenvolvidas pelas instituições
financeiras, pois ela decorre de imposição da própria Constituição Federal como visto antes.
Contudo isso é harmonizado no texto constitucional e mostra-se absolutamente necessário sob
o aspecto social, político e jurídico, na medida em que o crédito é propósito de diversos
negócios jurídicos, caracterizando uma relação contratual que tem por objeto diversos tipos de
operações financeiras, sejam ativas, sejam passivas.
Cabe elucidar que a operação financeira ativa é aquela em que a instituição financeira
possui uma carteira de crédito em relação aos tomadores de empréstimos, enquanto operação
financeira passiva é aquela em que a instituição financeira figura no pólo passivo da relação
creditícia, pois nela o cliente investe seu capital e em troca recebe remuneração de acordo
com uma política de taxas de juros que variam conforme com o tipo e forma de investimento
59
TAVARES, André Ramos. Direito constitucional econômico. 2 ed. São Paulo: Método, 2006, p. 128-129.
51
e nos limites da regulação praticada pelo mercado e fiscalizada pelas autoridades
monetárias.
60
A título expositivo da regulação pela qual as instituições financeiras ficam
subordinadas, cabe destacar o aperfeiçoamento efetivado e implementado pelo Banco Central
do Brasil, no que diz respeito ao acompanhamento das carteiras de crédito das instituições
financeiras, em outras palavras, dos contratos existentes entre as instituições financeiras e
seus respectivos clientes. Como se depreende dos informes do próprio Banco Central em seu
sítio oficial na internet (www.bcb.gov.br), foi implantado o SCR – Sistema de Informações de
Crédito do Banco Central, pela Resolução 2724/00, e aperfeiçoado pela Circular 3310/06,
que visa a desempenhar função de destaque na garantia da estabilidade do Sistema Financeiro
Nacional, a fim de prevenir crises e alcançar transparência nos empréstimos (contratos de
mútuo, em última análise) firmados pelos bancos.
Referido mecanismo enseja que, por meio de monitoramento de dados específicos
sobre as operações contratadas por todos os bancos, o Banco Central tenha condições de
adotar medidas preventivas para proteger os recursos depositados nos bancos pelos cidadãos.
Com efeito, o Sistema de Informações de Crédito tem atualização mensal pelas instituições
financeiras, que informam os contratos de empréstimos e financiamentos celebrados,
referentes a todos os valores acima de cinco mil reais e operados por clientes em qualquer
instituição financeira. O acesso às referidas informações, segundo o Banco Central, está
restrito às instituições financeiras, aos clientes que tomam empréstimos e financiamentos no
Sistema Financeiro Nacional e também aos funcionários das áreas específicas do Banco
Central. Cabe destacar que, conforme a regulação do Banco Central, Resolução n. 2724/00 e
Circular 3310/06, as instituições financeiras necessitam de autorização por escrito dos clientes
para consultar seus dados no Sistema de Informações de Crédito e, caso a Instituição
60
SADDI, Jairo. A natureza econômica do contrato bancário. In Contratos bancários. Coordenação de Ivo
Waisberg e Marcos Rolim Fernandes Fontes. São Paulo: Quartier Latin, 2006, p. 22-31.
52
Financeira não observe a referida regra, sujeita-se à punição, observando-se que o Banco
Central desenvolveu diferentes níveis de acesso a tais informações; ou seja, se o cliente do
banco consultar o sistema visualizará mais informações sobre o contrato celebrado do que
eventual banco que vier realizar a mesma consulta sobre esse mesmo cidadão.
61
Percebe-se que o SCR implantado pelo Banco Central amolda-se às disposições da
Lei Complementar n. 105, de 10 de janeiro de 2001, que dispõe sobre o sigilo das operações
de instituições financeiras, notadamente, os artigos 1.º e 2.º, pois se trata de troca de
informações entre o Banco Central do Brasil, no desempenho de suas funções de fiscalização,
inclusive podendo o Banco Central firmar convênios com bancos centrais ou entidades
fiscalizadoras de outros países.
Sustenta-se, portanto, que as operações financeiras representadas em contratos
bancários sofrem implicações informativas relevantes, que motivam criterioso processo de
inserção de dados junto ao Banco Central, especificamente, na conceituação determinada pela
Lei Complementar n. 105/2001, que considera como espécies de operações financeiras:
depósitos à vista e a prazo, inclusive em conta de poupança; pagamentos efetuados em moeda
corrente ou em cheques; emissão de ordens de crédito ou documentos assemelhados; resgates
em contas de depósitos à vista ou a prazo, inclusive de poupança; contratos de mútuo;
descontos de duplicatas, notas promissórias e outros títulos de crédito; aquisições e vendas de
títulos de renda fixa ou variável; aplicações em fundos de investimentos; aquisições de moeda
estrangeira; conversões de moeda estrangeira em moeda nacional; transferências de moeda e
outros valores para o exterior; operações com ouro, ativo financeiro; operações com cartões
de crédito; operações de arrendamento mercantil e, segundo a lei, quaisquer outras operações
61
Fonte: <www.bcb.gov.br/scr> acessado em 30/10/07.
53
de natureza semelhante que venham a ser autorizadas pelo Banco Central do Brasil, Comissão
de Valores Mobiliários ou outro órgão competente.
62
Cabe ainda sustentar que as resoluções, portarias e circulares, emanadas dos referidos
órgãos governamentais, especificamente do Banco Central do Brasil, cuja natureza jurídica é
autarquia federal, constituem atos administrativos, baseados na legislação que os institui e,
sobretudo, na Constituição Federal.
Portanto, em se tratando de ato praticado pela administração pública, não exercício
da autonomia da vontade, nem tampouco de autonomia privada, pois a administração pública
está obrigada a cumprir a vontade da lei, afastando a idéia de negócio jurídico e reafirmando a
definição de ato administrativo como a declaração do Estado ou de quem o represente, que
produz efeitos jurídicos imediatos, com observância da lei, sob regime jurídico do direito
público e sujeita a controle pelo Poder Judiciário, como doutrina Maria Sylvia Zanella Di
Pietro.
63
Trata-se, assim, de atos administrativos que decorrem do poder normativo, regulatório
e de fiscalização, que é atribuído ao Banco Central, para atuar no âmbito do Sistema
Financeiro Nacional, especialmente junto às instituições financeiras e os contratos que
instrumentalizam operações financeiras praticadas pelos bancos.
2.2. Teoria geral e natureza jurídica dos contratos bancários
Os contratos bancários, por serem dotados de especificidades, estão limitados pelo
dirigismo contratual, o que enseja diminuição da autonomia de vontade das partes
62
Fonte: Lei Complementar 105/01, art. 5.º, parágrafo primeiro. O texto normativo relaciona todas como
espécies de operações financeiras.
63
Ver, por todos, DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 19 ed. o Paulo: Atlas, 2006, p.
206.
54
contratantes e submissão a controle contábil rigoroso. Caracterizam-se, também, por serem
em grande parte massificados, além de estarem sujeitos ao sigilo bancário, e atualmente vêm
apresentando uma nova feição atrelada sua constituição e celebração por meio eletrônico
(internet, caixas eletrônicos e telefone).
Além disso, por se tratar de contratos relacionais, bilaterais e comutativos,
caracterizam-se por serem usualmente de execução continuada e de trato sucessivo, o que
viabiliza a renegociação e a própria novação, especialmente, quando se operam as chamadas
confissões de dívidas. Aliás, essa temática foi enfrentada pela jurisprudência a ponto de o
Superior Tribunal de Justiça editar as Súmulas 286 e 300
64
, reconhecendo a possibilidade de
discussão sobre eventuais ilegalidades de contratos anteriormente novados (artigos 360 a 367,
do Código Civil) e a possibilidade de execução do instrumento de confissão de dívida, ainda
que originário de contrato de abertura de crédito.
Sustentou-se no item anterior que os contratos bancários têm por objeto operações
financeiras ativas e passivas desenvolvidas pelas instituições financeiras, que se realizam em
diversas modalidades, como descrito no mencionado artigo 5.º, parágrafo único da Lei
Complementar n. 105/2001, não havendo um rol taxativo e estanque de operações, mas um
conjunto de atividades e operações desenvolvidas pelos bancos, que possuem elementos
comuns.
Antes, todavia, é importante identificar que os contratos bancários são instrumentos
para viabilizar juridicamente operações financeiras realizadas pelas instituições bancárias. As
operações financeiras podem-se realizar por duas modalidades, no que diz respeito ao pólo da
relação contratual em que o banco se encontra, ou seja, ativo ou passivo como foi
demonstrado.
64
Súmula 286 do STJ: A renegociação de contrato bancário ou a confissão da dívida não impede a possibilidade
de discussão sobre eventuais ilegalidades dos contratos anteriores. Súmula 300 do STJ: O instrumento de
confissão de dívida, ainda que originário de contrato de abertura de crédito, constitui título executivo
extrajudicial.
55
Nesse sentido, vale a pena repetir que é assente, na doutrina, que, por um lado,
operações financeiras passivas são aquelas em que a instituição financeira é tomadora de
capital dos clientes, como ocorre no depósito, na conta corrente, nos fundos de investimentos,
em que o banco recebe uma determinada soma de dinheiro e remunera o cliente de acordo
com as taxas de mercado praticadas, que podem ser ajustadas entre as partes no exercício da
autonomia privada. Por outro lado, as operações financeiras ativas são aquelas em que o
banco fornece capital aos clientes, exemplificando, pelos empréstimos, abertura de crédito,
desconto de títulos de créditos, financiamentos cedulares (cédulas e notas de crédito
comercial, rural, industrial e a recente cédula de crédito bancário), repasses de recursos do
exterior, repasses de recursos governamentais, créditos documentários, empréstimos
sindicalizados, empréstimos com desconto em folhas de pagamento e empréstimos para
aposentados.
Algumas operações financeiras realizadas pelos bancos são tidas como especiais, pois
agregam operações que não são propriamente financeiras, tais como cartões de crédito,
factoring e securitização de recebíveis, contratos de câmbio e de derivativos (hedging, opções
e swap). E, ainda, operações que poderiam se referir a serviços, quando o banco oferece
cofre de segurança, custódia e cobrança de tulos de créditos, por meio de contrato firmado
com o cliente.
Um registro importante que deve ser observado em relação aos contratos bancários,
especialmente aqueles situados no plano de operações financeiras ativas, diz respeito à
outorga de garantias pelo cliente do banco que, basicamente, se operacionalizam pela figura
jurídica do aval e da alienação fiduciária, bem como da garantia real, notadamente a hipoteca
e o penhor.
Ainda, como peculiaridades dos contratos bancários no âmbito da teoria geral e de sua
natureza jurídica, merecem destaque questões que dizem respeito à aplicação da correção
56
monetária, dos juros e da chamada comissão de permanência nos contratos realizados pelos
bancos, situações que por vezes levam os contratos bancários a pedido de revisão judicial,
fundamentando-se, basicamente na usura real, na lesão e na teoria da imprevisão, pautando-se
essencialmente nas disposições do Código Civil (artigos 317 e 478 a 480) e nas do Código de
Defesa do Consumidor (artigos 6.º, V, 51, IV, e 52), mesmo que o contrato esteja sendo
adimplido, consoante vem entendendo a jurisprudência e também a doutrina
65
.
Impende registrar, ainda, que a correção monetária nos contratos bancários, por
exemplo, é exigível por conta da própria disposição do artigo 315 do Código Civil, que visa
assegurar que dívida em dinheiro deve ser paga na data do vencimento em moeda corrente e
pelo valor nominal, vedando-se o pagamento em moeda estrangeira ou em ouro (art. 318 do
Código Civil). Na verdade, reconhece como válidos fatores de correção decorrentes de índices
gerais emanados e reconhecidos pelas autoridades governamentais como INPC, IGPM, a Taxa
Referencial (TR) e Taxa de Juros a Longo Prazo (TJLP), sendo vedada a indexação ao ouro
ou moeda estrangeira, à Taxa Básica Financeira (TBF), ao CDI e ao salário mínimo
(Constituição Federal, artigo 7.º, inciso IV).
66
Sem adentrar profundamente neste tópico em específico, destacando, contudo, sua
relevância conceitual, é necessário anotar quanto aos juros que, no âmbito dos contratos
bancários, terão natureza remuneratória (que remunera o capital emprestado) ou moratória
(atrelado à inadimplência), podendo ser calculado na forma simples ou composta, nos moldes
65
STJ, Turma, REsp 293778-RS, relator Min. Ruy Rosado de Aguiar, v.u., j. 29.05.2001, DJU 20.8.01.
Ementa: Contrato bancário. Adesão. Revisão. O fato de o obrigado cumprir com a sua prestação prevista em
contrato de adesão não o impede de vir a juízo discutir a legalidade da exigência feita e que ele, diante das
circunstâncias, julgou mais conveniente cumprir. Se proibida a sua iniciativa, estará sendo instituída, como
condição da ação no direito contratual, a de ser inadimplente, o que serviria de incentivo ao descumprimento
dos contratos. Além disso, submeteria o devedor à alternativa de pagar e perder qualquer possibilidade de
revisão, ou não pagar e se submeter às dificuldades que sabidamente decorrem da inadimplência. Quanto aos
motivos imprevisíveis, no contexto doutrinário, por todos: Jornada I do STJ, enunciado n. 17: “A interpretação
da expressão motivos imprevisíveis, constante do CC 317, deve abarcar tanto causas de desproporção não
previsíveis como também causas previsíveis, mas de resultados imprevisíveis.”
66
mula 176 do STJ: É nula a cláusula contratual que sujeita o devedor a taxa de juros divulgada pela
anbid/cetip. mula 287 do STJ: A taxa básica financeira (TBF) não pode ser utilizada como indexador de
correção monetária nos contratos bancários. Súmula 295 do STJ: A taxa referencial (TR) é indexador válido para
contratos posteriores à Lei 8.177/91, desde que pactuada.
57
da média praticada pelo mercado financeiro. Referente à comissão de permanência, a
jurisprudência reconhece a legalidade dela no âmbito da autonomia privada das partes,
devendo respeitar o contrato e as taxas de mercado, não se permitindo a cumulação com
correção monetária, juros remuneratórios ou moratórios e multa.
67
O objeto, portanto, do contrato bancário é bastante variável e está diretamente ligado à
espécie de operação financeira realizada entre as partes, sujeitando-o a diferentes tipos de
normas jurídicas, implicando inserção e análise sistemática e teleológica do ordenamento
jurídico, além da própria jurisprudência evidenciada pelo grande mero de súmulas
existentes sobre o assunto.
É importante registrar, também, que o corte investigativo a ser feito nos contratos
bancários se refere ao fato de ser possível que a responsabilidade civil decorra de danos
causados na ilegalidade ou exorbitância da cobrança de juros, correção monetária e multa,
observando o espectro de incidência desta responsabilidade por decorrer do contrato. Todavia
parece que o viés que toma a questão está atrelado mais à possibilidade de revisão do contrato
por onerosidade excessiva (Código Civil, artigos 478 a 480, e CDC, art. 6.º, V), lesão (Código
Civil, artigo 157) e usura real (Decreto-lei 22.626/33, embora não-aplicável às instituições
financeiras), do que propriamente pelo fato de vir a causar um dano a terceiro pela prática da
referida ilegalidade no âmbito do contrato bancário.
68
67
Súmula 30 do STJ: A comissão de permanência e a correção monetária são inacumuláveis. mula 294 do
STJ: o é potestativa a cláusula contratual que prevê a comissão de permanência, calculada pela taxa média de
mercado apurada pelo Banco Central do Brasil, limitada à taxa do contrato. Súmula 296 do STJ: Os juros
remuneratórios, não cumuláveis com a comissão de permanência, são devidos no período de inadimplência, à
taxa média do mercado estipulada pelo Banco Central do Brasil, limitada ao percentual contratado.
68
Jornada III de direito civil do STJ Enunciado 175: A menção à imprevisibilidade e à extraordinariedade,
insertas no CC 478, deve ser interpretada não somente em relação ao fato que gere o desequilíbrio, mas
também em relação às conseqüências que ele produz. Enunciado 176: Em atenção ao princípio da conservação
dos negócios jurídicos, o CC 478 deverá conduzir, sempre que possível, à revisão judicial dos contratos e não à
resolução contratual. O Superior Tribunal de Justiça já decidiu que: “A onerosidade excessiva pode dar ensejo à
revisão contratual. 1. Precedente da Corte assentou que o aumento do dólar americano no s de janeiro de
1999 representa fato superveniente capaz de ensejar a revisão contratual, nos termos do CDC 6º, V, que, de
modo induvidoso, onerou excessivamente a prestação contratual. 2. Recurso especial não conhecido. (STJ, 3ª T.,
REsp 327250-MG, rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, v.u., j. 8.4.2002, DJU 27.5.2002, p. 169). Ainda:
“O acórdão recorrido o cometeu qualquer ofensa à L. 4.595/64, pois reconheceu expressamente que as
disposições da LU o se aplicam às instituições financeiras (STJ, 3ª T., AgRgAg 429902-RS, rel. Min. Carlos
58
Esclarecendo: caso o cliente bancário consiga, efetivamente, comprovar que sofreu
danos materiais ou morais e qual a extensão dos referidos danos, bem como a relação de causa
e efeito com o contrato bancário, então, poder-se-ia, em tese, apurar a responsabilidade civil
decorrente do contrato em que ocorreu abuso na cobrança de juros, correção monetária e
multa.
A doutrina evidencia três tipos de caracterização da figura do contrato bancário, pelo
critério subjetivo, que torna clara a existência de uma operação financeira como objeto do
negócio jurídico contratual, o critério objetivo, que identifica que em um dos pólos haverá de
estar uma instituição financeira, e o critério sincrético, que adota um pouco das duas.
De fato, sustenta-se que o contrato bancário deve sempre possuir em um de seus pólos
uma instituição financeira e ter por objeto uma operação financeira, ativa ou passiva, pois
existem contratos em que em um dos pólos está uma instituição financeira e, de outro, uma
pessoa natural ou jurídica, contudo, o objeto do contrato não é uma operação financeira. Isso
ocorre nos contratos de prestação de serviços em geral, no contrato de trabalho, nos contratos
de locação, enfim, nos que se firma com um banco, mas que não se constituem, por óbvio,
contratos bancários regulando operações financeiras, hipótese em que não incidem as normas
jurídicas e administrativas regulatórias dessas operações.
Afirma-se, portanto, que contrato bancário pressupõe uma operação realizada por uma
instituição financeira autorizada a funcionar pelo Banco Central do Brasil, junto a uma pessoa
natural ou jurídica. Ora, a autonomia privada das partes é evidente, na medida em que o
banco, por exemplo, não está obrigado a conceder o crédito, nem tampouco o cliente obrigado
a pactuar o contrato. Em contrapartida, os normativos estabelecem vedações gerais que
Alberto Meneses Direito, v.u., j. 16.5.02, DJU 5.8.2002, p. 338). “Não se aplica, ao mútuo bancário, a limitação
em 12% ao ano, prevista na Lei da Usura (LU) (STF 596). Ocorre que, no caso, limitou-se os juros em face da
constatação de que houve abusividade na cláusula contratual. Esses fundamentos do acórdão não foram
impugnados no Especial, insistindo o recorrente apenas na aplicação de lei específica, a Lei 4595/64, que afasta
a limitação. Não atacado o principal fundamento do acórdão, mantém-se a limitação (STJ, T., AgRgAg
423203-RS, rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, v.u., j. 2.4.2002, DJU 27.5.2002, p. 172.)”
59
restringem o campo de negociação das partes, em prol do interesse público, harmonizado com
o interesse individual das partes participantes do negócio jurídico.
2.3. Conceito, requisitos e elementos caracterizadores
Não se pretende neste tópico aprofundar o estudo sobre cada tipo de contrato
bancário, pois estar-se-ia fugindo do tema responsabilidade civil, todavia a investigação do
conceito, dos requisitos e elementos caracterizadores se apresenta necessária em virtude da
própria caracterização do negócio jurídico como contrato bancário. Com isso pretende-se uma
análise das premissas gerais que norteiam essa modalidade de negócio jurídico contratual.
Para Renan Lotufo, o novo Código Civil abandonou a concepção unitária do ato
jurídico e passou a contemplar, expressamente, a figura do negócio jurídico, acolhendo as
idéias de grande parte da doutrina. Nesse ponto, é importante registrar a relevância da
perspectiva conceitual do negócio jurídico, valendo a transcrição dos ensinamentos de Lotufo,
baseado no conceito jurídico de Karl Larenz:
Foi na BGB que se teve o primeiro tratamento legal, portanto um regime
jurídico específico, do negócio jurídico, sob a denominação de Rechtsgeschafte.
Segundo Karl Larenz, a BGB permitiu que se extraísse o seguinte conceito: ‘negócio
jurídico é um ato, ou uma pluralidade de atos, entre si relacionados, quer sejam de
uma ou de várias pessoas, que tem por fim produzir efeitos jurídicos, modificações
nas relações jurídicas no âmbito do Direito Privado’, como se de sua obra Direito
Civil; parte geral, tradução espanhola, p. 421. ...O negócio jurídico, para nós, é o
meio para a realização da autonomia privada, ou seja, a atividade e potestade
criadoras, modificadoras ou extintoras de relações jurídicas entre particulares,
portanto o pressuposto e causa geradora de relações jurídicas, abstratamente e
genericamente admitidas pelas normas do ordenamento.
69
O negócio jurídico, no Código Civil, deve ser analisado à luz da Constituição Federal,
mas sem perder as noções do direito privado, do qual se concebe referido instituto. Anote-se a
69
LOTUFO, Renan. Código civil comentado. Parte Geral. 2 ed. Vol. 1. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 269-271.
60
importância de determinados caracteres essenciais para a identificação do negócio jurídico, de
acordo com a disposição normativa do artigo 104 do CC, que atribui validade ao negócio
jurídico pela presença de agente capaz, objeto lícito, possível, determinado ou determinável e
forma prescrita ou não defesa em lei.
No âmbito do direito comparado, por exemplo, os requisitos do artigo 104 do Código
Civil brasileiro deverão também existir como exige o artigo 1325 do Código Civil italiano
70
.
Para os contratos bancários, obviamente, os requisitos do artigo 104 do Código Civil também
deverão coexistir plenamente, anotando, contudo, que algumas vedações adicionais impõem-
se na autonomia privada das partes por força das normas que regulam e fiscalizam o Sistema
Financeiro Nacional, registrando, por exemplo, as vedações impostas pela Resolução 3.258,
de 28/01/05, tal como a de realizar operações que não atendam aos princípios da seletividade,
garantia, liquidez e diversificação dos riscos e outras elucidadas no capítulo 2, no item
2.1.3. da dissertação.
Não é prudente, sob o aspecto conceitual e científico, deixar de analisar e investigar os
planos de tripartição do negócio jurídico, que têm relevância para aferição da
responsabilidade civil, especialmente quando decorrentes de defeitos do negócio jurídico tal
como estabelecido no Código Civil brasileiro (erro ou ignorância, dolo, coação, estado de
perigo, lesão, fraude contra credores, invalidade do negócio jurídico, ou seja, disposições dos
artigos 138 a 184 do Código Civil). Também deve-se analisar o ato ilícito (art. 186 do Código
Civil) decorrente do contrato ou até mesmo o negócio jurídico ilícito, como destacado no
capítulo 1, item 1.2., da dissertação.
A clássica tripartição do negócio jurídico decorre da concepção inicial de Pontes de
Miranda é aventada até por Kelsen, na Teoria pura do direito; todavia, no Brasil, essa
70
digo Civil italiano, artigo 1325: Indicazione dei requisiti: I requisiti del contratto sono: l'accordo delle
parti (1326 e seguenti, 1427); la causa (1343 e seguenti); l'oggetto (1346 e seguenti); la forma, quando risulta
che è prescritta dalla legge sotto pena di nullità (1350 e seguenti). Tradução livre: Indicação dos requisitos: Os
requisitos do contrato são: 1. o acordo das partes (1326 e seguintes, 1427); 2. a causa; 3. o objeto (1346 e
seguintes); 4. a forma, desde que esteja sob pena de nulidade, estabelecida por lei (1350 e seguintes).
61
concepção desenvolveu-se de forma clara pela doutrina de Antônio Junqueira de Azevedo,
que identificou a tripartição do negócio jurídico nos planos de existência, validade e eficácia.
Embora a referida concepção fosse doutrinariamente aceita no direito brasileiro, o novo
Código Civil adotou a colocação bipartida, pois o relator da Parte Geral do Código, o Ministro
Moreira Alves, argumentou que o simples fato de se tratar de lei vigente identifica o plano
de validade, pressupondo o plano de existência do negócio jurídico. Por isso, ocupou-se de
analisar os planos de validade e eficácia do negócio jurídico, no que então se desenvolveu a
parte geral do Código Civil de 2002. Lotufo explica essa tripartição e, ainda, propõe uma
dinâmica de análise do negócio jurídico extremamente operacional no aspecto conceitual ao
escrever:
O plano de existência é o dos elementos, porque elemento é tudo o que entra
na composição de alguma coisa, é cada parte integrante da essência de um todo. O
plano de validade é o dos requisitos do negócio jurídico, porque estes são condição
necessária para a obtenção de certo objetivo, ou seja, para atingir certo fim. O plano
de eficácia é o das circunstâncias, entendidas estas como as situações, estado ou
condição das coisas, ou das pessoas, em um momento determinado. ...Para o estudo
do negócio jurídico uma proposta de se utilizar o método de exclusão, ou seja,
verificar progressivamente se o negócio é existente, depois, se é válido, e,
finalmente, se é eficaz. Porque se não for existente, não será nem válido nem eficaz.
se não for válido, não deveser eficaz, e se não for eficaz, não deverá merecer a
atenção do operador do direito.
71
Ainda que se trate de contrato bancário, terá por requisitos elementares as premissas
determinadas pelo artigo 104 do Código Civil, na medida em que as mesmas se impõem a
qualquer negócio jurídico, notadamente, nos contratos bancários que instrumentalizam
operações financeiras que têm dirigismo estatal marcante. A análise do contrato bancário pela
perspectiva proposta de tripartição possui alto grau de relevância para perscrutar a
responsabilidade civil decorrente e praticada no âmbito do contrato bancário. Daí o porquê de
se destacar a análise pelos planos de existência, validade e eficácia.
71
LOTUFO, Renan. Código civil comentado. Parte Geral. 2 ed. Vol. 1. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 279-278.
62
Hipótese a que se dá destaque é a celebração do contrato bancário com pessoas
plenamente capazes ou, se incapazes, que estejam representadas ou assistidas na forma dos
artigos 3.º e 4.º, do Código Civil, a fim de que não haja nulidade no contrato e que ele possa
ensejar eventual responsabilidade civil da instituição financeira. Ademais, uma modalidade de
contrato bancário absolutamente relevante, que é o mútuo, trabalha diretamente essa questão
da incapacidade, regulando-a pelas disposições do artigo 588 e 589 do Código Civil
72
.
Referidos dispositivos prevêem que o mútuo pactuado com pessoa menor, sem a
participação de quem tiver a guarda do mesmo, não pode ensejar a devolução do mutuário,
nem tampouco dos fiadores. As exceções decorrem de cinco situações previstas no artigo 589
do CC e que demonstram, contudo, circunstâncias baseadas na boa-fé objetiva e, como
doutrina Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery circunstâncias em que se
evidencia “vínculo social que o sistema jurídico considera como cláusula geral geradora de
obrigações para os que se encontram na situação jurídica contemplada na norma.”
73
Por sua vez, se uma instituição financeira celebrar um contrato bancário com uma
pessoa analfabeta e, em se tratando de um negócio jurídico complexo, que dispõe de várias
cláusulas e condições com uma variada gama de negócios decorrentes do mesmo, necessário
se faz que a pessoa seja assistida e tenha plena ciência das disposições do contrato, inclusive,
expressando sua condição de analfabeta e de que foi orientada e esclarecida acerca dos termos
e conseqüências ao firmar o contrato, para que isso não possa ensejar possível
responsabilidade civil da instituição financeira, em eventuais danos que o cliente possa sofrer
72
Art. 588 do Código Civil. O mútuo feito a pessoa menor, sem prévia autorização daquele sob cuja guarda
estiver, não pode ser reavido nem do mutuário, nem de seus fiadores.
Art. 589 do CC. Cessa a disposição do artigo antecedente: I - se a pessoa, de cuja autorização necessitava o
mutuário para contrair o empréstimo, o ratificar posteriormente; II se o menor, estando ausente essa pessoa, se
viu obrigado a contrair o empréstimo para os seus alimentos habituais; III se o menor tiver bens ganhos com o
seu trabalho. Mas, em tal caso, a execução do credor não lhes poderá ultrapassar a força; IV se o empréstimo
reverteu em benefício do menor; V – se o menor obteve o empréstimo maliciosamente.
73
NIOR, Nelson Nery; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código Civil Comentado. 4 ed. São Paulo: RT, 2006,
p. 490.
63
em razão de sua ignorância e desconhecimento das condições contratuais, desde que
devidamente comprovados.
A doutrina conceitua e lista requisitos e elementos caracterizadores dos contratos
bancários e estabelece alguns pontos de identificação que são relevantes. Orlando Gomes
74
,
por exemplo, acentua que com a expressão contratos bancários são designados os negócios
jurídicos que têm como uma das partes uma empresa autorizada a exercer atividades próprias
dos bancos, em que são realizadas operações bancárias específicas, passando a justificar a
necessidade de disciplina própria, por se tratar de um direito especial, sobretudo, pelas
operações financeiras que são realizadas através dos contratos bancários.
Já para Arnoldo Wald
75
o conceito de contratos bancários é a denominação que se dá a
um complexo de contratos em que uma das partes é um banco e pratica referidos contratos de
acordo com a lei e de forma habitual juntamente aos seus clientes.
A doutrina comumente exige a presença do banco para caracterização do contrato
bancário. Todavia, como se destacou no item anterior, no capítulo 2, desta dissertação, o
contrato bancário tem de ser realizado por um banco, mas deverá ter por objeto,
necessariamente, uma operação financeira. Assim, Sérgio Carlos Covello acentua que o
objeto do contrato bancário deverá ser um ato de intermediação de crédito, pois, por um lado,
nem todo contrato realizado pelo banco será tido como bancário e, por outro lado, nem todo
ato de intermediação de crédito enseja a ocorrência de um contrato bancário. O autor define,
com efeito, contrato bancário como “o acordo entre banco e cliente para criar, regular ou
extinguir uma relação que tenha por objeto a intermediação do crédito.”
76
Sérgio Carlos Covello
77
registra, ainda, como elementos caracterizadores dos
contratos bancários o sujeito, o objeto e a causa. Quanto ao sujeito, maiores dificuldades não
74
GOMES, Orlando. Contratos. 17 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1997, p. 323-337.
75
WALD, Arnoldo. Curso de direito civil brasileiro. Obrigações e contratos. 16 ed. São Paulo: Saraiva, 2004,
p. 653.
76
COVELLO Sérgio Carlos. Contratos bancários. 3 ed. São Paulo: LEUD, 1999, p. 47.
77
COVELLO Sérgio Carlos. Contratos bancários. 3 ed. São Paulo: LEUD, 1999, p. 47-53.
64
restam ao simplesmente afirmar que seriam o banco ou, no sentido lato sensu, instituições
financeiras e o cliente. Quanto ao objeto, o autor registra tratar-se do crédito e todas as suas
matizes conceituais e doutrinárias decorrentes da própria economia, como a confiança e o
risco implicados no crédito. Quanto à causa, o mesmo sustenta que é a mobilização do crédito
no comércio, indústria, produção, enfim, atividades econômicas desenvolvidas na sociedade.
Para Sérgio Covello, os contratos bancários “repercutem na economia nacional e
desempenham função de alto interesse público, razão por que estão sujeitos a normas
restritivas por parte do Estado.”
Quanto às características dos contratos bancários, a doutrina comumente anota que,
por conta de peculiaridades decorrentes de uma das partes que integram o referido negócio
jurídico (ou seja, as instituições financeiras), os contratos gozam de interdependência em
relação às causas que os designam, contam com rigoroso dirigismo contratual e exigentes
assentos contábeis, são, na maioria das vezes, caracterizados como contratos de adesão e de
massa (pois alguns elementos podem ser discutidos, como a taxa de juros a ser pactuada), por
vezes são caracterizados por serem eletrônicos ou realizados por meio eletrônico, e são
caracterizados, também, por serem contratos relacionais, ou seja, de trato sucessivo e
execução continuada, e estão submetidos a rigoroso sigilo em razão de disposição normativa
expressa (Lei Complementar 105/01).
Celso Marcelo de Oliveira também destaca algumas características do contrato
bancário, anotando o risco decorrente da concessão do crédito, ponderando que:
É contrato comutativo. Embora o risco seja imanente ao crédito, praticamente
inseparável deste, a ponto de afirmar-se que em princípio não existe crédito sem
risco, consistindo a atividade bancária fundamentalmente na intermediação do
crédito, o contrato bancário não é um contrato aleatório, ou de risco (para as
espécies de contratos aleatórios, ver arts. 1.118/1.121 do Código Civil de 1916; arts.
458/461 do Código Civil de 2002), mas comutativo, no sentido de que as partes, no
momento da celebração, m conhecimento da vantagem e do sacrifício que o
negócio comporta, diferentemente do contrato aleatório, no qual não se conhece a
quantidade da prestação e não se sabe do sacrifício que se terá ou não de sofrer na
dependência de acontecimento futuro. As cláusulas ou condições contratuais gerais
constituem parte essencial do Direito Bancário. Permitem a racionalização da
65
contratação em massa com milhares de pessoas, ganhando tempo e poupando
incomodidades aos clientes que desejam ser atendido pelas instituições financeiras.
O ponto crucial é que essas cláusulas pré-elaboradas ou utilizadas pelos bancos em
contratos singulares, sem influência do cliente no respectivo conteúdo, sejam justas,
eqüitativas e razoáveis.
78
O fato de se tratar de contrato de adesão ou, por vezes, contrato de massa não enseja
qualquer ilegalidade, na medida em que o artigo 54 do CDC autoriza legalmente sua prática e
no plano dos contratos bancários não haveria outra fórmula às instituições financeiras, a não
ser lançar mão de contratos padronizados, até porque o próprio Banco Central do Brasil
estabelece minutas e orientações padronizadas acerca dos contratos bancários. Os bancos têm
amplitude de funcionamento no âmbito geográfico nacional e, por razões administrativas e
jurídicas, devem-se valer de contratos padrões para a celebração das operações financeiras nas
diversas localidades em que atuam.
Aliás, a doutrina de Jorge Alberto Quadros de Carvalho Silva, valendo-se do conceito
de Nelson Nery Júnior, afirma que o contrato de adesão é aquele em que as cláusulas foram
previamente aprovadas pelo Poder Público ou idealizadas de forma unilateral por quem
fornece. Em outros termos, não vem se caracterizar como uma categoria contratual autônoma
ou uma modalidade contratual, mas apenas e tão-somente uma maneira pela qual o contrato se
forma e que pode ser utilizada em qualquer tipo de acordo, na medida em que necessidade
de busca de agilidade na sua conclusão por conta da amplitude da economia.
79
Nesse aspecto em específico, no plano do direito comparado, a doutrina portuguesa
baseada na compreensão contratualista das chamadas cláusulas contratuais gerais e também
na tutela do cliente bancário, advinda do direito alemão, utiliza a expressão “contrato-
quadro” para designar que os bancos lançam o no mercado, como jogadores (players), de
contratos para viabilizar relações jurídicas com clientes submetidas às cláusulas gerais
designadas pelo próprio órgão que regulamenta o setor. Essa percepção é deduzida por
78
OLIVEIRA, Celso Marcelo de. Manual de direito bancário. São Paulo: IOB Thonsom, 2006, p. 399.
79
CARVALHO E SILVA, Jorge Alberto Quadros de. Código de defesa do consumidor anotado. 3 ed. São
Paulo: Saraiva, 2003, p. 232-233.
66
Almeno de ao sustentar que, mesmo quando não ocorre essa padronização, é certo que
existirá uma intenção de dar início a uma relação cliente-banco duradoura, sempre submetida
ao manto regulatório do setor e das cláusulas e condições negociais gerais, ainda que tenham
por origem a própria instituição financeira. Para Almeno de Sá, é preciso vincular ambas as
partes a princípios gerais em comum e que ensejam cooperação, pois outras relações
negociais poderão advir da relação negocial inicial e maior.
80
Sustenta-se, pois, com base no que foi dito, que o contrato de abertura de conta
corrente entre cliente e banco se apresentasse como um contrato inicial e maior (ou, pode-se
dizer, como um contrato mãe) que permitisse em decorrência dele a elaboração de outros
contratos a ele vinculados, com especificidades, mas sempre atrelados às cláusulas gerais e à
padronização imposta pelo próprio mercado, pelos órgãos reguladores, não obstante serem
elaborados pela instituição bancária.
Antes de finalizar a investigação do conceito, requisitos e elementos caracterizadores
dos contratos bancários, é relevante observar que os contratos bancários se apresentam,
essencialmente, pelo depósito, pela conta corrente, pelo empréstimo e concessão de crédito
81
.
É importante fazer uma rápida digressão em relação aos contratos bancários em espécie, pelo
fato de que sobre os mesmos recai a análise da responsabilidade civil e, para tanto, é
necessário delimitar elementos caracterizadores relevantes e identificar as normas jurídicas
específicas que são aplicáveis aos aludidos contratos.
Basicamente, referidos contratos representam a figura do mútuo que, pela definição
legal, é o empréstimo de coisas fungíveis, no qual o mutuário é obrigado a restituir ao
mutuante o que dele recebeu em coisa do mesmo gênero, qualidade e quantidade (CC, art.
586). O contrato de tuo tem por objeto uma operação financeira que é o empréstimo
80
SÁ, Almeno de. Relação bancária, cláusulas contratuais gerais e o novo Código Civil Brasileiro. In Revista
Brasileira de Direito Comparado. Rio de Janeiro, n. 23, 2003, p. 185-186.
81
WALD, Arnoldo. Curso de direito civil brasileiro. Obrigações e contratos. 16ª ed., São Paulo: Saraiva, 2004,
p. 653-671.
67
bancário. Segundo Arnaldo Rizzardo, “o empréstimo bancário constitui um mútuo, com a
especialidade de ser concedido por uma entidade creditícia submetida à disciplina da Lei
4.595/64.”
82
O empréstimo bancário tem uma característica comercial e a entrega do dinheiro
torna-o concreto, sendo que as obrigações contratuais recaem sobre o mutuário, que tem de
devolver a quantia devidamente remunerada, o que caracteriza o contrato como oneroso e
típico. Vale observar que os principais objetos que poderiam ser identificados no mútuo
bancário é o dinheiro e, por vezes, títulos como caução e a fiança bancária, e podem ser
utilizados tanto no âmbito das pessoas naturais como no das jurídicas, nas quais se evidencia
um viés comercial.
A investigação científica dos chamados contratos bancários necessita um
aprofundamento e um corte dogmático para correta aferição e caracterização do denominado
contrato de mútuo que, no artigo 1257 do Código Civil de 1916 e, atualmente, no artigo 587
do Código Civil de 2002, assegurava a transferência do domínio da coisa emprestada ao
mutuário, passando este a arcar com todos os riscos desde a tradição.
A rigor, quando uma operação financeira é realizada por um banco, em especial
aquelas operações ativas em que a instituição financeira concede o chamado crédito bancário,
não implica, necessariamente, a imediata tradição, mas apenas e o-somente a mera
concessão de uma linha de crédito. Exemplo disso é a abertura de crédito em conta corrente
ou o conhecido “cheque especial”. Por vezes, o limite de crédito é concedido ao cliente
correntista, todavia ele não faz uso do referido crédito, que continua disponibilizado em sua
conta corrente.
A dificuldade, portanto, é saber identificar se o limite de crédito que atualmente é
instrumentalizado pela chamada “cédula de crédito bancário” poderia se caracterizar como
82
RIZZARDO, Arnaldo. Contratos de crédito bancário. 6ª ed. São Paulo: RT, 2006, p. 18.
68
um contrato de mútuo feneratício, à luz da leitura que se faz do quanto disposto no Código
Civil brasileiro, que assegura ou ao menos indica a existência da tradição do bem do mutuante
para o mutuário, que depois se responsabiliza pela devolução do mesmo ao mutuante.
Realmente, essa questão tópica indica que a concessão de uma linha de crédito se mostra
diferente de um financiamento bancário, pois este está atrelado à aplicação específica do
dinheiro em um determinado negócio jurídico, como ocorre no financiamento de um bem
imóvel, de um veículo, enfim, de qualquer bem juridicamente caracterizado. Assim, o banco
financia determinado negócio jurídico ao entregar, por vezes, a quantia diretamente ao
terceiro que entabula o negócio jurídico com o cliente do banco e este cliente, por sua vez, se
obriga pelo contrato bancário a devolver ao banco o dinheiro emprestado, objeto do
financiamento. Nesse caso, resta clara a caracterização do mútuo feneratício, pois houve a
tradição do bem móvel fungível (dinheiro) que será devolvido nas condições do
financiamento bancário ajustado entre o cliente e o banco.
83
Doutrina e jurisprudência ainda não observam essa qualificação do mútuo no direito
civil brasileiro, embora a doutrina estrangeira tenha se aprofundado com maior atenção a este
aspecto, notadamente na Itália e na França, como registra Maria Celina Bodin de Moraes. A
referida autora sustenta que uma dupla configuração do mútuo no ordenamento jurídico
brasileiro, sobretudo, após desenvolver percuciente investigação das causas do mútuo e
proceder à análise da figura da tradição, registrando uma coexistência de dois tipos diferentes
de mútuo: o consensual, que corresponderá à função creditícia, e o mútuo real, que servirá à
causa de tradição do bem.
84
83
DINAMARCO, Cândido Rangel. Contrato de abertura de crédito e a teoria do título executivo. In Revista
Síntese de direito civil e processual civil, n. 21, já-fev 2003, p. 34.
84
MORAES, Maria Celina Bodin de. O procedimento de qualificação dos contratos e a dupla configuração do
mútuo no direito civil brasileiro. In Revista Forense, vol. 309, março de 1990, p. 59-61. Registra a autora que a
inteligência da dupla caracterização do mútuo está atrelada ao fato de que, no mútuo feneratício com função
creditícia, a prestação dos juros equivalente ao correspectivo e vem a ser o índice determinante da correlação
econômica das partes, que obriga no ato de celebração do contrato, não obstante o início da execução do contrato
venha a ocorrer pela posterior entrega do bem móvel fungível que é o dinheiro. A figura da tradição, portanto,
69
Vale dizer, portanto, que o simples fato de o banco disponibilizar o crédito ao cliente
configura uma tradição, mais próxima da posse propriamente dita, pois o cliente pode a
qualquer momento fazer uso do seu crédito, visto estar em seu poder, ante a
disponibilização do valor creditício em sua conta corrente, por exemplo. Sustenta-se, pois,
tratar-se tal crédito bancário de mútuo feneratício da mesma forma. Vejam-se os efeitos da
inadimplência, especialmente da mora, em que o credor pode solicitar a devolução imediata
da coisa mutuada, ou seja, do dinheiro e a resolução contrato com perdas e danos,
caracterizada pela cobrança de juros moratórios, correção monetária, enfim, recomposição do
crédito concedido.
A jurisprudência brasileira, em especial do Superior Tribunal de Justiça, também é
uníssona no sentido de reconhecer a caracterização da abertura de crédito como contrato de
mútuo. Transcrevem-se alguns julgados:
Em mútuo oriundo de abertura de crédito, utilizável com o desconto de notas
promissórias, a falta de pagamento de qualquer dos títulos representativos das
quantias mutuadas importa no vencimento antecipado de toda a dívida. (JB 70/113).
O mútuo transfere o domínio da coisa emprestada, não se lhe aplicando,
assim, os princípios atinentes à posse indireta. (RT 495/222).
A jurisprudência do STJ a cujo teor os juros bancários, no contrato de
mútuo, não estão sujeitos ao limite, anual, de 12% (doze por cento) deve ser
seguida com cautela, a mode de que o devedor não fique preso a obrigações
conjunturais. Hipótese, emblemática, em que os juros foram contratados à base de
36% ao mês, nada justificando que o devedor fique assim vinculado, porque aquela
taxa, depois, se reduziu substancialmente. Em casos desse jaez, durante o prazo
contratual, os juros são exigíveis nos termos contratados, e, após, pela taxa média do
mercado, por espécie de operação, na forma apurada pelo BACEN, segundo o
procedimento previsto na Circular da Diretoria n. 2957, de 28 de dezembro de 1999,
que dispõe sobre a prestação de informações relativas a operações de crédito
praticadas no mercado financeiro. (STJ, T., REsp 137282-RS, rel. Min. Ari
Pargendler, v.u., j. 26.3.2001, DJU 4.6.2001).
Neste contexto, decorre o viés da responsabilidade civil no plano dos contratos
bancários quando visto pelo prisma da instituição financeira como credora perante o cliente
passa a ser uma figura neutra não para caracterizar o mútuo real, mas sim porque o que realmente vale é a
autonomia privada das partes e a função negocial do contrato.
70
inadimplente. Esta perspectiva implica uma rie de conseqüências jurídicas que a doutrina e,
especialmente, a jurisprudência vêm solucionando à luz do sistema normativo vigente,
considerando as características e elementos essenciais. Vale destaque, pois, para as Súmulas
54, 102 e 296
85
do Superior Tribunal de Justiça e 254 do Supremo Tribunal Federal, quanto à
incidência dos juros remuneratórios, dos moratórios, da comissão de permanência e da
correção monetária.
A título de caracterização do contrato bancário, vale a observação do artigo 591 do
Código Civil de 2002, que expressamente faz referência ao mútuo com fins econômicos,
observando que a natureza jurídica dos juros remuneratórios (ou compensatórios) destina-se à
remuneração pelo empréstimo do capital, ao passo que os juros moratórios têm natureza
jurídica de indenização e visualizam-se como pena imposta ao devedor pelo atraso no
cumprimento da obrigação.
86
Como os juros no âmbito dos contratos bancários têm origem contratual, qualquer
ilícito decorrente deles será tido como um ilícito contratual
87
, o que autoriza a incidência de
ambas as modalidades de juros (remuneratórios e moratórios) e a jurisprudência do STJ assim
já decidiu:
É permitida a cobrança cumulada de juros remuneratórios e moratórios de
contratos de abertura de crédito, mesmo após o vencimento do contrato, cumulação
essa que não configura anatocismo. Depois do vencimento do contrato, os juros
remuneratórios devem ser cobrados de acordo com a taxa média de mercado,
observado o contratado, e os moratórios devem obedecer o limite de um por cento ao
85
Súmula 54 do STJ: os juros moratórios fluem a partir do evento danoso, em caso de responsabilidade
extracontratual.
Súmula 102 do STJ: A incidência dos juros moratórios sobre os compensatórios, nas ações expropriatórias, não
constitui anatocismo vedado em lei.
Súmula 296 do STJ: Os juros remuneratórios, não cumuláveis com a comissão de permanência, são devidos no
período de inadimplência, à taxa média de mercado estipulada pelo BACEN, limitada ao percentual contratado.
Súmula 254 do STF: Incluem-se juros moratórios na liquidação, embora omisso o pedido inicial ou a
condenação.
86
JÚNIOR, Nelson Nery; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código civil comentado. 4 ed. São Paulo: RT, 2006,
p. 491.
87
Enunciado 163 da III Jornada de Direito Civil do STJ: A regra do art. 405 do novo Código Civil aplica-se
somente à responsabilidade contratual, e não aos juros moratórios na responsabilidade extracontratual, em face
do disposto no art. 398 do novo CC, não afastando, pois, o disposto na Súmula 54 do STJ.
71
mês, como definido no contrato em questão e permitido pela. (STJ, 2ª Seção, REsp
402483-RS, Rel. Min. Castro Filho, j. 26.3.2003, v.u.).
Segue como operacionalização do empréstimo bancário a existência de duas normas
que merecem destaque no plano dos contratos bancários, até por serem recentes no
ordenamento jurídico brasileiro.
A primeira é a Lei 10.820/03, que regula o chamado crédito em consignação em folha
de pagamento, dos empregados regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que
pode autorizar de forma irrevogável e irretratável que ocorra desconto dos valores referentes
ao pagamento de empréstimos concedidos por instituições financeiras, desde que exista
previsão contratual. Embora haja referência expressa apenas aos empregados celetistas, não se
encontra óbice legal que ocupantes de emprego público e cargos públicos também possam
autorizar e realizar o crédito em consignação em folha de pagamento.
A segunda é a Lei 10.953/04, que alterou a Lei 10.820/03, e no artigo 6.º, regulou o
chamado crédito em consignação para aposentados nos mesmos moldes junto a empréstimos
bancários concedidos por instituições financeiras, desde que o mutuário seja titular de
benefícios de aposentadoria e pensão do regime geral de previdência social junto ao Instituto
Nacional de Seguridade Social (INSS), exigindo, contudo, regulação complementar também
da autarquia federal previdenciária.
Referidas situações contratuais não autorizam a ocorrência de responsabilidade civil
das instituições financeiras, especialmente, pelo amparo contratual e pela aquiescência
outorgada expressamente pelo cliente mutuário, no exercício da autonomia privada e,
também, por expressa autorização legislativa.
Há julgados que fundamentam essa posição:
É possível se proceder ao desconto em folha de pagamento de funcionário
público, das prestações atinentes a contrato de empréstimo bancário pessoal, desde
que haja permissão do servidor e não se atinja cifra capaz de prejudicar a sua
72
subsistência. (TJPR, AGIN 317.794-4, Câmara, relator Juiz convocado Expedito
Reis do Amaral, j. 14.02.06, v.u., RT 849/373).
Dano material e moral. Desconto em folha de parte da remuneração.
Autorização fornecida pelo devedor. 1. autorizado desconto em folha pelo devedor,
não pode haver condenação por dano moral ou material em decorrência do
cumprimento da disposição contratual. 2. Recurso Especial não conhecido. (STJ,
REsp 730986, 3ª Turma, j. 20.10.05).
Civil. Contrato de auxílio financeiro. Desconto em folha de pagamento.
Cláusula inerente à espécie contratual. Inocorrência de abusividade. Penhora sobre
remuneração não configurada. Supressão unilateral pelo devedor. Impossibilidade. I.
É válida a cláusula que autoriza o desconto, na folha de pagamento do empregado ou
servidor, da prestação do empréstimo contratado, a qual o pode ser suprimida por
vontade unilateral do devedor, eis que da essência da avença celebrada em condições
de juros e prazo vantajosos para o mutuário. II. Recurso especial conhecido e
provido. (STJ, REsp 728563, 2ª Seção, 08.06.05).
Cabe identificar, após incursão sobre a dupla configuração do mútuo e como
modalidade de contrato bancário que também se amolda como mútuo - o chamado
financiamento bancário, que na doutrina de Antônio Carlos Efing “corresponde à operação
bancária que visa emprestar ao cliente certa soma, da qual o mesmo fará uso para efetivar um
determinado intuito negocial”.
88
O financiamento, portanto, representa uma modalidade de contrato bancário muito
utilizada no âmbito comercial, a ponto de Waldirio Bulgarelli, ao comentar os títulos de
créditos comerciais, acentuar que os mesmos “destinam-se a instrumentalizar operações de
empréstimos concedidos por instituições financeiras a pessoa física ou jurídica dedicada à
atividade comercial ou de prestação de serviços.”
89
Para caracterizar os financiamentos ou empréstimos bancários as instituições
financeiras lançam mão das chamadas cédulas de crédito e notas de crédito que se apresentam
no seguimento rural, comercial e industrial da sociedade. A distinção entre as cédulas e as
notas de crédito (sejam de emprego rural, comercial ou industrial) é que as cédulas possuem
garantia real, ao passo que as notas não possuem garantia real e sim fidejussória.
88
EFING, Antônio Carlos. Contratos e procedimentos bancários à luz do CDC . São Paulo: RT, 2006, p. 138.
89
BULGARELLI, Waldirio. Títulos de crédito. 11.ª ed. São Paulo: Atlas, 1995, p. 57.
73
A título de sistematização da legislação aplicável, sobretudo porque o corte
metodológico e dogmático implica a investigação do ordenamento jurídico como um todo
para aferição da responsabilidade civil nos contratos bancários e, especialmente, para verificar
se o contrato bancário espactuado à luz da legislação vigente, como requesta o artigo 104
do Código Civil, apresentam-se, ainda que apenas a título de sistematização, as normas
jurídicas que regulam e operacionalizam os financiamentos e empréstimos bancários,
notadamente, as cédulas e notas de crédito.
O Decreto-lei 167, de 14.02.1967, regula e institui os títulos de crédito rural
90
, que se
apresentam pela cédula de crédito rural pignoratícia, cédula rural hipotecária, cédula rural
pignoratícia e hipotecária e pela nota de crédito rural.
O Decreto-lei 413, de 09.01.1969, regula e institui os títulos de crédito industrial, que
são a cédula de crédito industrial e a nota de crédito industrial. Por fim, existem no
ordenamento jurídico brasileiro os títulos de crédito comercial, regulados pelas Leis 6.313, de
16.12.75, e 6.840, de 03.11.1980, representados pelas cédulas de crédito comercial e notas de
crédito comercial.
Outra modalidade de financiamento que é extremamente relevante e que representa
um típico contrato bancário com absoluta relevância social é o financiamento imobiliário em
razão do sistema financeiro da habitação, que decorre da Lei 4.380/64 e que conta com
recursos do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) e da poupança popular,
baseado, especificamente, em garantias reais e que tem forma de execução diferenciada,
regulada no âmbito judicial pela Lei 5.741/71 e no extrajudicial pelo Decreto-lei 70/66.
Na modalidade de financiamento imobiliário é necessário registrar a existência do
chamado sistema financeiro imobiliário, no âmbito das instituições financeiras privadas, que
tem regulação decorrente da Lei 9514/97, conta com recursos do mercado e tem lastro em
90
Citem-se, também, as Leis 6.754/79, 8.929/94 e 11.076/04.
74
garantias reais como a alienação fiduciária de bem imóvel. Por derradeiro, quanto à
modalidade de financiamento imobiliário, com o escopo de operacionalizar ainda mais o
funcionamento de referida atividade bancária, em específico com relação a este tipo de
operação financeira, foi efetivado pela Presidência da República o Decreto n. 5.892, de
12.09.2006 (publicado no DOE em 13.09.2006), que acrescentou o parágrafo 4º do Decreto n.
4.840/2003, regulamentando a Medida Provisória 130/2003, ao dispor sobre autorização para
desconto de prestação decorrente de financiamento imobiliário na folha de pagamento, o que
também é relevante para afastar a caracterização da responsabilidade civil da instituição
financeira, se a mesma estiver agindo nos exatos termos legais, como decorre da
sistematização apontada.
Recentemente as instituições financeiras vêm utilizando largamente a denominada
“cédula de crédito bancário” para instrumentalizar a abertura de crédito em conta corrente e
operacionalizar diversas modalidades de financiamento e empréstimo bancário. A cédula de
crédito bancário inicialmente foi concebida por força da Medida Provisória 1925, de
14/10/99, posteriormente, regulada pela Medida Provisória 2160-25, de 23/08/01, que esteve
em vigor até 01/08/04 em razão da Emenda Constitucional n. 32/01 e, por fim, foi
regulamentada plenamente no âmbito normativo pela Lei 10.931, de 02/08/04, nos artigos 26
a 45.
A cédula de crédito bancário trouxe consigo algo há muito tempo pleiteado pelas
instituições financeiras como a facilitação das relações dos bancos com seus clientes, trazendo
agilidade e garantias mais eficazes, com diminuição de custos, expressa permissão para
capitalizar juros e representar a concreção do chamado limite de crédito ou o conhecido
cheque especial, sobretudo para superar o óbice jurisprudencial da Súmula 233 do STJ.
91
91
Súmula 233 do STJ. O contrato de abertura de crédito, ainda que acompanhado de extratos da conta corrente,
não é título executivo. A referida Súmula afastou a antiga Súmula 11 do extinto TACSP que permitia a
execução do chamado cheque especial desde que acompanhado dos extratos e cálculo demonstrativo do débito.
75
A rigor, a referida cédula de crédito bancário é na verdade um título de crédito causal
que é emitido por uma pessoa (física ou jurídica) em favor da instituição financeira que
representa a promessa de pagamento em dinheiro, por força de uma operação de crédito e que
tem força executiva, desde que preenchidos os requisitos legais previstos na Lei 10.931/04,
nos artigos 26 a 45, em que se autoriza no bojo da referida operação bancária que sejam
pactuados juros capitalizados; forma da correção monetária; previsão de juros de mora; multa;
penas contratuais; garantias (fidejussórias, como fiança e solidariedade passiva, e reais, como
alienação fiduciária, hipoteca e penhor); hipóteses de vencimento antecipado; emissão de
extratos e planilhas, além dos chamados requisitos formais, uma vez que se trata de um título
de crédito.
Aliás, a evolução das operações financeiras é tão evidente que atualmente vem se
alargando a utilização da garantia implementada por meio da cessão fiduciária de recebíveis
pactuada na cédula de crédito bancário, em especial no que diz respeito ao mercado de
capitais, conforme dispõe o artigo 66-B da Lei 10.931/04, e também no que diz respeito à
utilização no futuro, no âmbito eletrônico, consoante disposição da Medida Provisória 2.200-
2, de 24/08/01, desde que se faça uso das chaves públicas de certificação e criptografia.
Na realidade, o corte investigativo no que se refere à cédula de crédito bancário se faz
necessário em razão da sua larga utilização no âmbito das operações bancárias, em que se
constata o emprego, na verdade, de um título de crédito recentemente concebido, que até
então não existia no direito bancário brasileiro, importando em sérias implicações na aferição
e constatação da responsabilidade civil no plano dos contratos bancários, especialmente
porquanto o contrato bancário pode ser viabilizado por meio de uma cédula de crédito
bancário e os seus requisitos legais de caracterização, portanto, tornam-se elementos
essenciais para aferição ou não da prática do ilícito com origem no negócio jurídico
contratual.
76
Ficam destacados, pois, o conceito, os requisitos e os principais elementos
caracterizadores dos contratos bancários e seus efeitos jurídicos que ensejam uma percuciente
análise do fenômeno da responsabilidade civil no plano dos contratos bancários, sobretudo,
pelo viés da inadimplência contratual que caracteriza um ilícito contratual e outras situações,
como a mora, enfim, todas veiculadas nas situações casuísticas adredemente anotadas.
2.4. Os momentos de formação e conclusão dos contratos bancários
O direito bancário tem ascensão sobre a estrutura do sistema financeiro nacional e
sobre o funcionamento das instituições financeiras, amoldando-se nas normas de direito
público. Entretanto, as relações jurídicas havidas entre as instituições financeiras, seus
clientes e o público em geral são reguladas pelas regras de direito privado. Isso justifica a
incidência das normas do Código Civil, do Código de Defesa do Consumidor e, também, das
resoluções e circulares do Banco Central do Brasil.
se sustentou que no direito brasileiro os contratos bancários sofrem um nítido
dirigismo contratual por parte do Estado, que tem por escopo padronizar procedimentos e
regular a operacionalização da atividade financeira e bancária para evitar colapso do sistema
financeiro nacional.
Em contrapartida, ainda que baseado em um dado empírico, mas notório, verifica-se
que o próprio o Estado (Governo Federal) vem fazendo uso das instituições financeiras para
viabilizar a cobrança de impostos que são ou foram até pouco tempo relevantes para a receita
pública, como a extinta CPMF (contribuição provisória sobre movimentações financeiras)
92
e
92
Com a extinção da CPFM em 31/12/07, a Secretaria da Receita Federal editou a Instrução Normativa n. 802,
de 2008, que criou a obrigatoriedade das instituições financeiras procederem à informação da movimentação
financeira de seus clientes, observando que a referida IN é objeto de contestações por meio de Ações Diretas de
77
o ainda cobrado IOF (imposto sobre operações financeiras), que, inclusive, se prestaram e
ainda se prestam, no caso do IOF, como parâmetro para a Secretaria da Receita Federal aferir
a movimentação financeira real das pessoas naturais e jurídicas correntistas de instituições
bancárias, mediante simples cálculo aritmético. Portanto, a estrutura organizacional, logística,
física e geográfica das instituições financeiras se presta a servir a interesses do próprio Estado
(União), o que registra a importância e relevância dessa atividade para o Estado e para a
sociedade em geral.
Pertinente à formação do contrato bancário, sustenta-se que segue regra geral do
Código Civil de 2002, harmonizado por disposições do Código de Defesa do Consumidor, no
tocante ao momento de formação, local da celebração, validade, autenticidade e identificação
das partes, e também no tocante à prova da sua implementação. No que diz respeito à
conclusão dos contratos bancários é de se registrar a questão da sua resolução por
cumprimento da obrigação ou sua resilição por inadimplemento da obrigação e, também,
quanto à antecipação de sua extinção, seja pela vontade das partes, seja pela inadimplência.
Todas as referidas situações têm relevância na apreciação da responsabilidade civil
nos contratos bancários, sobretudo, no que concerne à responsabilidade pré e pós-contratual,
sobre a qual se discorrerá no capítulo seguinte.
Todavia, seguindo a seqüência identificada, vale dizer que a formação dos contratos
está regulada no Código Civil de 2002 dos artigos 427 a 435. Sabe-se, assim, que a proposta
obrigará o proponente, se o contrário não resultar da própria proposta, da natureza do negócio
e das circunstâncias do caso. Os bancos, portanto, devem ter o cuidado específico de
assegurar total transparência nas propostas de relações contratuais para que todos os clientes
tenham prévio e integral conhecimento das cláusulas e condições dos contratos bancários, na
medida em que todas as propostas de concessão de crédito, de prestação de serviços bancários
Inconstitucionalidade perante o STF, propostas pelo Conselho Federal da OAB e pela Confederação Nacional
das Profissões Liberais ainda não apreciadas.
78
e, também, de operações de investimentos (em que a instituição financeira é tomadora de
capital, ou seja, operações passivas) ensejam obrigação do proponente, no caso as instituições
financeiras.
É claro que a ressalva a condicionar o deferimento da operação financeira, mediante
prévia análise cadastral e aprovação de crédito, faz incidir perfeitamente a disposição do
artigo 427 do Código Civil, pois a ressalva resulta dos próprios termos da proposta, da
natureza do negócio e das circunstâncias do caso, afastando qualquer prática de ato ilícito,
ainda que oriundo da negativa de concessão de crédito, desde que a instituição financeira
tenha tido o cuidado de ressalvar essas condições na proposta.
O Banco Central do Brasil com o intuito de regulamentar os procedimentos que
deverão ser observados pelas instituições financeiras e outras sob sua fiscalização instituiu
resolução para orientar a contratação de operações e a prestação de serviços aos clientes e ao
público em geral.
93
A Resolução n. 2.878, de 26/07/01, tem essa função, pois exige a
observância pelas instituições financeiras de certos cuidados que devem ter na contratação de
operações financeiras e realização de serviços bancários em geral.
A mencionada Resolução n. 2.878, de 26/07/01, no artigo 1.º, alterado pela Resolução
n. 2.892, de 27/09/01, estabelece que as instituições financeiras, na contratação de operações e
na prestação de serviços ao público em geral, não obstantes as normas legais em vigor e
aplicáveis ao sistema financeiro nacional, devem providenciar e adotar as seguintes medidas:
I – transparência nas relações contratuais, preservando os clientes e o público usuário
de práticas não eqüitativas, mediante prévio e integral conhecimento das cláusulas
contratuais, evidenciando, inclusive, os dispositivos que imputem responsabilidades
e penalidades;
II resposta tempestiva a consultas, as reclamações e aos pedidos de informações
formulados por clientes e público usuário, de modo a sanar, com brevidade e
eficiência, vidas relativas aos serviços prestados e/ou oferecidos, bem como as
operações contratadas, ou decorrentes de publicidade transmitida por meio de
quaisquer veículos institucionais de divulgação, envolvendo, em especial:
a) cláusulas e condições contratuais;
b) características operacionais;
93
Consulta da resolução no sítio do Banco Central do Brasil: <www.bcb.gov.br>
79
c) divergências na execução dos serviços;
III clareza e formato que permitam fácil leitura dos contratos celebrados com
clientes, contendo identificação de prazos, valores negociados, taxas de juros, de
mora e de administração, comissão de permanência, encargos moratórios, multas por
inadimplemento e demais condições;
IV fornecimento aos clientes de pia impressa, na dependência em que celebrada
a operação, ou em meio eletrônico, dos contratos, após formalização e adoção de
outras providências que se fizerem necessárias, bem como de recibos, comprovantes
de pagamentos e outros documentos pertinentes às operações realizadas;
V efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, causados a seus
clientes e usuários.
O que se denota é que um dever de informação por parte das instituições
financeiras, que, se for plenamente atendido, afasta a prática de ilícito contratual e, por
conseguinte, de responsabilização civil, ante o cumprimento das determinações legais
(Código Civil e Código de Defesa do Consumidor) e administrativas emanadas do Banco
Central, exemplificativamente, a Resolução 2878/01.
O próprio Código Civil, no artigo 429, regula a questão da oferta ao público, desde
que encerrados todos os requisitos essenciais ao contrato. Reputam-se requisitos essenciais do
contrato bancário aqueles exigidos pela Resolução 2878/01, porquanto emanados do Banco
Central e realmente necessários para elucidar o particular no ato da contratação com uma
instituição financeira.
Com relação à formação do contrato bancário, há que se destacar que os artigos 428, I,
e 434 do Código Civil consideram como presente a pessoa que contrata por telefone ou por
meio de comunicação semelhante. Essa circunstância é muito comum nos contratos bancários,
na medida em que o chamado “internet banking” vem se expandido, cada vez mais, no Brasil
e em outros países, até mesmo para viabilizar a melhoria das atividades bancárias e redução
de custos operacionais. A teoria da expedição da aceitação evidenciada no artigo 434 do
Código Civil assegura a concreção do contrato e, por isso, sua eficácia. Aliás, o uso do
sistema de internet banking” é fato notório e amplamente divulgado pelas instituições
financeiras em geral.
80
Nos planos de existência, validade e eficácia mencionados na dissertação, cabe
destacar que os contratos serão tidos por existentes, válidos e eficazes, ainda que formados
por meio eletrônico, pois, se estiverem asseguradas sua validade, autenticidade e integridade,
não que se atribuir qualquer nulidade a eles. Quanto ao local da celebração dos contratos
bancários, por exemplo, consoante o artigo 435 do Código Civil, reputam-se pactuados no
local onde foram propostos, assim como dispõe a Lei de Introdução ao digo Civil no artigo
9.º, parágrafo 2.º. No plano do direito comparado, há o chamado “place of business”,
evidenciado pelo artigo 15.4 da Lei Modelo da UNCITRAL (United Nations Commision on
International Trade Law), que implica a mesma disposição do ordenamento jurídico
brasileiro, bem como as disposições da UNCTAD (United Nations Conference on Trade and
Development), ambas entidades vinculadas à ONU (Organização das Nações Unidas).
Cabe destacar que as partes podem eleger outro foro para o contrato e que inclusive
pode ser o foro de domicílio do devedor ou da própria agência bancária da instituição
financeira, pela amplitude geográfica de diversas delas e, também, pela característica
continental do Brasil.
No que diz respeito aos contratos bancários celebrados por meio eletrônico, existem
alguns aspectos críticos que merecem atenção quanto à existência da assinatura digital, o uso
de códigos e senhas, a chamada certificação pelo e-cpf / e-cnpj (regulado pela Secretaria da
Receita Federal, por exemplo, através da Instrução Normativa 222 e da 462). São itens de
ampla utilização atualmente, até mesmo no próprio Poder Judiciário, em que se verifica o
chamado sistema e-doc de protocolização de petições e documentos por meio eletrônico (por
exemplo, a Instrução Normativa n. 28 do Tribunal Superior do Trabalho).
O que mais traz dificuldade na formulação do contrato bancário por meio eletrônico é
a aferição da autenticidade e da identidade do usuário, pois, atualmente, várias instituições
81
financeiras lançam mão de cartões bancários nas funções de crédito e de débito e alguns
possuem um dispositivo denominado “chip”, além das senhas pessoais.
Somado a esses tradicionais mecanismos, algumas instituições financeiras também
lançam mão dos chamados cartões alfa-numéricos com numerações seqüenciais que solicitam
a cada acesso uma senha diferenciada no referido cartão, quando a operação bancária é
realizada pela Internet e, mais recente ainda, lançam mão dos chamados “tokens”, que são
instrumentos que apresentam uma senha seqüencial diferente a cada minuto, que deverá ser
informada em cada acesso promovido pelo cliente. Há, ainda, o cartão bancário com um
“chip” que consegue, na hipótese de utilização junto a um terminal bancário (caixas
eletrônicos), comprovar a autenticidade do cartão e, junto com a senha pessoal do cliente,
comprovar a autenticidade do cliente.
94
Os meios de prova de formação do contrato bancário, inclusive os eletrônicos, estão
baseados na idéia de forma livre e geral de prova concebida pelo Código de Processo Civil,
artigo 332 e 383. Além desses, registram-se, ainda, os artigos 212 e 225 do Código Civil, nos
quais se poderia assegurar a comprovação da existência, validade e eficácia dos contratos
bancários por todos os meios legais e moralmente legítimos, sem deixar de anotar que todas
as reproduções mecânicas ou eletrônicas de fatos ou de coisas constituem prova plena, salvo
se a parte contra quem forem exibidas não lhes impugnar o conteúdo material e sua exatidão.
No direito comparado, as concepções dos artigos 225 do Código Civil e 383 do
Código de Processo Civil brasileiro também vêm muito sendo largamente justificadas no
direito positivado, bastando verificar o artigo 368 do Código Civil português e o artigo 2712
do Código italiano.
95
94
Instituições financeiras de grande porte como Itaú disponibilizam referido instrumento aos seus clientes, o que
mostra um mecanismo sofisticado e avançado de proteção de seus sistemas de acesso e formação de operações e
contratos bancários por meio eletrônico. Ver sítio na Internet: <www.itau.com.br/segurançaeprivacidade>
acessado em 10/08/2007, com todas as informações pertinentes sobre segurança e privacidade na Internet.
95
Código Civil italiano, artigo 2712: Riproduzioni meccaniche - Le riproduzioni (Cod. Proc. Civ. 261)
fotografiche o cinematografiche, le registrazioni fotografiche e, in genere, ogni altra rappresentazione
82
Ainda que baseado em um dado empírico, mas que decorre da experiência comum
agregada pela observação do que ordinariamente acontece (CPC, art. 335), é fato que a
formação dos contratos bancários por meio eletrônico vem se expandindo largamente e se
revelando um procedimento altamente seguro de realização de operações bancárias, bastando
verificar a insignificância do mero de queixas em relação ao volume de acessos e
correspondente utilização desses sistemas diuturnamente pelos clientes bancários.
Investigando-se um pouco mais acerca do momento de formação dos contratos
bancários, é necessário destacar a existência de uma presunção legal de existência ou de
veracidade (CPC, art. 334, IV), na esteira da regulamentação contida na Medida Provisória
2.200-2, que dispõe acerca da infra-estrutura de chaves públicas ICP” que outorgam
autenticidade, integralidade e validade a documentos que tenham a forma eletrônica, com
base na técnica de criptografia assimétrica (inclusive incentivada pelo CPC, art. 655-A, com a
redação da Lei 11.382/06), desde que haja a certificação por uma entidade autorizada pelo
Instituto Nacional de Tecnologia da Informação (ITI, que é uma autarquia federal vinculada à
Casa Civil da Presidência da República), ensejando os efeitos previstos no artigo 219 do
Código Civil, ante a presunção de validade do documento eletrônico.
96
O Banco Central do Brasil, por sua vez, editou a Carta-circular 3134, de 27/04/04,
regulando a assinatura digital em contrato de câmbio, e a própria Secretaria da Receita
Federal através da Instrução Normativa 222 e da 462 fez criar o chamado centro virtual de
atendimento ao contribuinte, o que evidencia uma tendência em tornar cada vez mais comum
e legal a operacionalização de negócios e atos jurídicos por meios eletrônicos.
meccanica di fatti e di cose formano piena prova dei fatti e delle cose rappresentate, se colui contro il quale
sono prodotte non ne disconosce la conformità ai fatti o alle cose medesime. Tradução livre: As reproduções
fotográticas ou cinematográficas, as gravações fonográficas e, em geral, qualquer outra reprodução mecânica de
fatos e de coisas constituem prova plena dos fatos e das coisas representadas, se aquele contra o qual forem
produzidas não desconhecer a conformidade delas com os fatos e as coisas mesmas.
96
FERREIRA, Ana Amélia Menna Barreto de Castro. A manifestação de vontade no contrato eletrônico. In
Revista do instituto dos advogados de Minas Gerais. N. 13, Belo Horizonte, 2007, p. 366.
83
Até mesmo no plano do direito projetado, existem diversos projetos de lei tramitando
no Congresso Nacional, que têm por escopo regulamentar com maior especificidade a
formação de documentos eletrônicos, dentre eles o projeto de lei da OAB de n. 1589/99 e o
672/99, dada a importância do meio eletrônico na vida da sociedade.
Valendo-se da interpretação sistemática e teleológica, é importante analisar
dispositivos do Código de Defesa do Consumidor no que diz respeito ao momento de
formação e conclusão dos contratos bancários, não obstante o Código Civil mostrar-se
plenamente eficaz para subsumir o fato juntamente com os demais dispositivos legais
delineados adredemente. uma tendência em invocar a inversão do ônus da prova (art. 6.º,
VIII, do CDC) na questão relativa a problemas ou danos decorrentes da inexata ou irregular
formação do contrato bancário por meio eletrônico, ou por meio de uso indevido do cartão e
senhas pessoais em caixas eletrônicos, chegando-se a invocar uma responsabilidade objetiva
da instituição financeira.
Nesse ponto vale menção às decisões já proferidas pelo Superior Tribunal de Justiça,
especialmente pela 4.ª Turma, a respeito do tema e que afastam tanto a responsabilidade
objetiva como vem a caracterizar com mais ênfase a culpa exclusiva da vítima no que diz
respeito à formação de uma operação bancária e de um contrato bancário:
Conforme precedentes desta Corte, em relação ao uso do serviço de conta-
corrente fornecido pelas instituições bancárias, cabe ao correntista cuidar
pessoalmente da guarda de seu cartão magnético e sigilo de sua senha pessoal no
momento em que deles faz uso. Não pode ceder o cartão quem quer que seja, muito
menos fornecer sua senha a terceiros. Ao agir dessa forma, passa a assumir os riscos
de sua conduta, que contribui, à toda evidência, para que seja vítima de fraudadores e
estelionatários. Fica excluída a responsabilidade da instituição financeira nos casos
em que o fornecedor de serviços comprovar que o defeito inexiste ou que, apesar de
existir, a culpa é exclusiva do consumidor ou de terceiro (art. 14, par. 3º, do CDC).
(STJ, 4ª Turma, REsp 601.805/SP, Rel. Min. Jorge Scartezzini, j. 20.10.05).
O uso do cartão magnético com sua respectiva senha é exclusivo do
correntista e, portanto, eventuais saques irregulares na conta somente geram
responsabilidade para o Banco se provado ter agido com negligência, imperícia ou
imprudência na entrega do numerário. (STJ, 4ª Turma, REsp 602.680/BA, Rel. Min.
Fernando Gonçalves, j. 21.10.04).
84
Extraída da conta corrente do cliente determinada importância por intermédio
de uso de cartão magnético e senha pessoal, basta ao estabelecimento bancário
provar tal fato, de modo a demonstrar que não agiu com culpa, incumbindo à autora,
em contrapartida, comprovar a negligência, imperícia ou imprudência do réu na
entrega do numerário. (STJ, Turma, REsp 417.835/AL, Rel. Min. Aldir
Passarinho Júnior, j. 11.06.02).
Com base no Código de Defesa do Consumidor, portanto, vale destaque apenas com
relação à oferta ao consumidor que vem regulada pelas disposições dos artigos 30 a 35 do
CDC e o chamado direito de recesso ou arrependimento pela regulação contida no artigo 49
do CDC.
Todavia, sustenta-se que o Código Civil, bem como as disposições da legislação
extravagante e, inclusive, o Código de Defesa do Consumidor, aliados às concepções do que a
doutrina chama de teoria geral dos contratos
97
, ensejam uma correta e segura interpretação
dos negócios jurídicos, sobretudo dos contratos bancários, e a responsabilidade civil
contratual que pode decorrer dos mesmos.
Em relação ao momento de conclusão do contrato bancário, afirma-se que pode
decorrer do adimplemento da obrigação ajustada ou pode decorrer da rescisão contratual por
inadimplência e também pode decorrer da resolução antecipada do contrato, em função da
vontade das partes. Nas referidas situações ocorrerá a aferição de responsabilidade civil
imputada ao banco ou ao cliente, por conta da prática de eventual ilícito contratual.
É de se notar que o momento de formação e conclusão dos contratos bancários pode
se dar em três modalidades distintas nas atividades bancárias. Sustenta-se que tais
modalidades sejam as seguintes:
a) na contratação de operações financeiras (ativas e passivas) com clientes;
b) na prestação de serviços bancários aos clientes;
97
Enunciado 167, da Jornada III do STJ: Com o advento do Código Civil de 2002, houve forte aproximação
principiológica entre esse Código e o Código de Defesa do Consumidor, no que respeita à regulação contratual,
uma vez que ambos são incorporadores de uma nova teoria geral dos contratos.
85
c) no atendimento ao blico em geral (clientes e não clientes), por ser uma forma de
contrato bancário, de execução instantânea, como ocorre, por exemplo, no pagamento de um
título em cobrança emitido por uma pessoa sica ou jurídica (que não seja instituição
financeira) em qualquer agência de rede bancária, ainda que a pessoa não seja cliente da
instituição financeira que recebe o pagamento. Ou seja, se uma pessoa natural utiliza algum
caixa bancário para pagar um determinado título em cobrança pela rede bancária, uma
relação negocial estabelecida entre o usuário e o banco, que enseja a obrigação bancária em
repassar a quantia recebida para o credor do usuário portador do título, este sim possuidor de
uma relação contratual com a instituição financeira, na medida em que colocou o título em
cobrança no banco.
Nesse ponto, o momento de formação e conclusão do contrato bancário é instantâneo
e plenamente caracterizado, quase que ocorrendo simultaneamente. Quanto às outras duas
modalidades, evidencia-se contrato bancário de execução continuada e de trato sucessivo, no
qual os momentos de formação e conclusão se distinguem no tempo.
No âmbito de formação e conclusão dos contratos bancários não se permite a sua
aceitação por meio do silêncio, ou seja, a concordância na formação e conclusão dos contratos
bancários deve ser expressa e não tácita, aos moldes do quanto dispõem os artigos 107 e 111
do Código Civil e o artigo 3.º, da Resolução n. 2.892, de 27/09/2001, do Banco Central que
assegura:
Ficam as instituições referidas no artigo anterior, obrigadas a garantir a seus
clientes o cancelamento da autorização de débitos automáticos em conta efetuados
por força de convênios celebrados com concessionária de serviço público ou
empresa privada ou por iniciativa da própria instituição, desde que, nesta hipótese,
não decorram de obrigações referentes a operações de crédito contratadas com a
própria instituição financeira.
86
Para finalizar a idéia de formação e conclusão dos contratos bancários, valendo-se das
concepções de extinção dos contratos arroladas por Orlando Gomes
98
e aferindo-se hipóteses
que podem autorizar, eventualmente, a ocorrência da responsabilidade civil, conclui-se que os
contratos podem ser extintos por resolução, resilição e rescisão.
Assim, há causas anteriores à formação do contrato (que ensejam anulação), há
causas posteriores à formação do contrato (que ensejam a dissolução) e causas que
ensejam a cessação do contrato, tal como a morte de uma das partes em alguns contratos,
dentre os quais pode-se citar qualquer modalidade de contrato bancário.
No plano da dissolução do contrato por causas posteriores à formação do mesmo,
cabe destacar a ocorrência da resolução pela inexecução do contrato (por conta de vícios
redibitórios, cláusula resolutória tácita e/ou expressa), bem como a ocorrência de resilição
pela vontade das partes (mediante distrato ou pela unilateralidade, no caso de ter vigência por
prazo indeterminado) e, por último, a rescisão do contrato por defeitos do negócio jurídico
(em que faz valerem também causas anteriores à formação do contrato autorizadoras da
anulação), caracterizando-se pelo erro ou ignorância, dolo, coação, estado de perigo, lesão e
fraude contra credores (arts. 138 a 165 do Código Civil).
Em qualquer dessas hipóteses de extinção do contrato, poderá haver a ocorrência da
responsabilidade civil no âmbito dos contratos bancários, se ficar caracterizada a prática de
um ilícito e houver prova inequívoca da ocorrência de danos, tendo por base e origem a
relação negocial, ou seja, contratual.
Eis, portanto, as principais características que dimensionam os momentos de formação
e conclusão dos contratos bancários, notadamente, quanto às conseqüências da aferição da
responsabilidade civil baseada em ilícito contratual.
98
GOMES, Orlando. Contratos. 17 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1997, p. 169-189.
87
2.5 Efeitos dos contratos bancários
Na perspectiva de análise do contrato bancário no plano de existência, validade e
eficácia e no intuito de que a responsabilidade civil não seja desvirtuada em termos de
metodologia prática, faz-se necessária investigação dos efeitos do negócio jurídico,
especialmente dos contratos bancários, que também estão sujeitos às chamadas modalidades
que afetam diretamente a produção de efeitos do contrato que são a condição, o termo e o
encargo, modalidades previstas nos artigos 121 a 137 do Código Civil.
A condição tem por origem exclusivamente a vontade das partes e faz com que o
efeito do negócio jurídico, ou seja, do contrato bancário, esteja sujeito a evento futuro e
incerto. Como exemplo disso, tem-se a liberação de determinado financiamento bancário, na
condição de a parte preencher certos requisitos atrelados a um evento futuro e incerto, desde
que seja lícita (art. 122 do CC). A legislação estrangeira também prevê essa hipótese, como
faz expressa referência o Código Civil francês, nos artigos 900, 1.172 e 1174, e o Código
Civil português, no artigo 271, pois se trata do que se denominou como elementos acidentais
do negócio jurídico.
Qualquer contrato bancário, por exemplo, será invalidado se estiver subordinado a
condição física ou juridicamente impossível, ilícita ou de obrigação de fazer algo ilícito.
Também será anulado se a condição for incompreensível, ininteligível ou contraditória (art.
123 do CC), o que igualmente é objeto de positivação no direito alienígena, citando, como
exemplo, o Código Civil italiano, no artigo 1.354, o Código Civil argentino, no artigo 530, e
os já referidos artigos 900 e 1.172 do Código Civil francês
99
.
99
Código Civil italiano, art. 1.354: É nulo o contrato ao qual foi aposta uma condição, suspensiva ou resolutiva,
contrária às normas imperativas, à ordem pública ou aos bons costumes. A condição impossível torna nulo o
contrato se for suspensiva; se for resolutiva considera-se como não imposta. Se a condição ilícita ou impossível
for aposta a um pacto singular do contrato, observar-se-ao, em relação à eficácia do pacto, as disposições das
alíneas anteriores, atendendo ao que está disposto no art. 1419.
88
O legislador brasileiro, tal como o estrangeiro (Código Civil francês, arts. 900 e 1172
e o Código Civil italiano, artigos 634 e 1354) adotaram a posição de reconhecer a inexistência
de cláusula contratual que venha estipular condição resolutiva impossível e, também, a de não
fazer coisa impossível, como dispõe o artigo 124 do Código Civil; isso traz grandes
conseqüências para os contratos bancários, pois estes serão considerados eficazes, exceto as
cláusulas que se enquadrarem nessas duas situações, que serão acatadas por inexistentes,
salvando o contrato como um todo e reconhecendo a inexistência, quanto mais a validade e
eficácia de referidas cláusulas que por ventura se enquadrarem na hipótese do art. 124 do
Código Civil.
Observe-se que a eficácia do contrato bancário pode estar subordinada a uma
condição suspensiva (artigo 125 do Código Civil) ou a uma condição resolutiva (artigos 127 e
128 do Código Civil), sendo que as duas hipóteses também são positivadas no direito
comparado (Código Civil italiano, artigos 1.358, 1359 e 1360; Código Civil francês, artigos
1181, 1182 e 1178; e Código Civil alemão, parágrafos 158 e 162) São hipóteses reguladas
comumente em contratos bancários, como, por exemplo, no caso de advir liquidação judicial
ou recuperação judicial de determinada pessoa jurídica que contratou financiamento bancário
com um banco e que tenha garantia real, a fim de retirar a garantia real da massa que vier a
compor a liquidação da pessoa jurídica.
No âmbito da responsabilidade civil pela regra geral do artigo 186 do Código Civil,
registra-se a incidência da mesma na hipótese de uso de ardil malicioso, com o propósito de
obstar a implementação de condição pactuada, como decorre da inteligência dos artigos 129 e
130 do Código Civil, ou seja, a verificação de ato praticado por terceiro não participante da
relação contratual ou por uma das partes que tenha por escopo obstar que a condição seja
Código Civil francês, art. 900: Em todas as disposições “inter vivos” ou testamentárias, as condições
impossíveis, as que forem contrárias à lei ou aos bons costumes, serão consideradas como não escritas. Artigo
1.172: Toda condição de uma coisa impossível, ou contrária aos bons costumes, ou proibida pela lei, é nula e
torna nula a convenção que depende dela.
89
implementada. Aliás, o próprio legitimado de direito eventual atrelado à ocorrência de
condição suspensiva e resolutiva pode praticar atos, inclusive judiciais, que visem assegurar e
preservar tal ocorrência. Essa hipótese também é regulada pela legislação estrangeira nas
disposições previstas no Código Civil alemão, parágrafo 162, no Código Civil francês, artigo
1.178 e 1180, e no Código Civil italiano, artigo 1.359.
Exemplifica-se: uma determinada pessoa natural ou jurídica efetua contrato de
financiamento com um banco estipulando uma condição suspensiva, que subordina a
liberação de parcelas do capital financiado à apresentação de determinadas notas fiscais de
importação de mercadorias e à apresentação dos documentos fiscais. Caso seja obstada
maliciosamente pela própria instituição financeira ou por um terceiro não participante da
relação contratual (como o fornecedor das mercadorias), estar-se-á, pois, diante das situações
previstas nos artigos 129 e 130 do Código Civil e que poderão, certamente, ensejar a
ocorrência de um ato ilícito com origem contratual e a apuração da responsabilidade civil,
caso fique demonstrada a ocorrência do dano.
Sustenta-se que a afetação de terceiros estranhos à relação negocial decorre da boa-fé
objetiva dos contratos e que produz efeitos inclusive a terceiros que não participam
diretamente da relação contratual, mas ficam impedidos de praticar atos que possam emperrar
ou prejudicar a execução de contrato em curso.
A figura jurídica do termo é largamente utilizada nos contratos bancários,
especialmente por conta da fixação de início e término de financiamentos e mútuos, tanto em
operações ativas quanto passivas realizadas pelos bancos. A redação de contratos bancários
que tenham por objeto operações financeiras e, também, serviços sempre toma por base um
termo inicial e um termo final, inclusive prevendo hipóteses de vencimento antecipado e
conclusão do contrato.
90
A regulação do elemento acidental termo está indicada, inicialmente, no artigo 131 do
Código Civil, guardando disposição semelhante no Código Civil francês, no art. 1185. Como
regras gerais para correta aferição do termo inicial e final, anotam-se aquelas que estão
previstas no artigo 132 do Código Civil e que guardam similitude com o Código Civil alemão,
nos parágrafos 186 a 193, e com o Código suíço, nos artigos 76 a 78.Todavia importante
previsão normativa no artigo 133 do Código Civil brasileiro, que traz incita uma regra
hermenêutica em favor do devedor no âmbito dos contratos, exceto disposição expressa em
contrário no próprio contrato, homenageando a autonomia privada das partes, o que também
tem guarida no direito comparado (Código Civil francês, art. 1187, e Código Civil italiano,
art. 1184). O Código Civil também estipula que se apliquem em relação ao termo, naquilo que
couber, as disposições concernentes à condição resolutiva e suspensiva, a teor do artigo 35 do
Código Civil e, no direito comparado, a mesma disposição se infere do parágrafo 163 do BGB
alemão.
Por final, quanto ao elemento acidental do negócio jurídico denominado encargo pelo
legislador brasileiro (ou modo na expressão doutrinária), vem regulado nos artigos 136 e 137
do Código Civil brasileiro. No âmbito do direito comparado, citam-se os parágrafos 525 e 527
do BGB alemão e o artigo 794 do Código Civil italiano
100
, destacando que a figura do encargo
ou modo tem relevância prática no plano dos contratos bancários, pois muitas operações
financeiras estabelecem ao devedor o ônus de destinar o uso da quantia mutuada em
determinado empreendimento ou produto especificado no contrato bancário, tal como ocorre
nos financiamentos realizados pelo Sistema Financeiro da Habitação e pelos créditos oriundos
do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDS).
A doutrina italiana faz uma distinção clara entre contrato de efeito real e contrato de
efeito obrigatório e dentre esses estabelece uma subclassificação quanto às formas de
100
Código Civil italiano, artigo 794: O encargo ilícito ou impossível se considera como o aposto, torna ele,
todavia, nula a doação, se constitui o único motivo determinante dela.
91
produção de efeitos dos contratos. Entretanto, para o que interessa no plano dos contratos
bancários, pode-se destacar que os mesmos produzem efeitos reais e obrigatórios, ante o
dirigismo estatal ao qual estão atrelados e a transferência de direito e objeto que os mesmos
ensejam.
Sustenta-se essa posição com base na doutrina de Francesco Messineo
101
, a qual se
transcreve:
Dalla figura del contrato ad effeto finale dipende logicamente la distinzione
fra contratto ade effetto reale e contratto ad effetto obbligatorio. Il contratto,
talvolta, è suscettibile di produrre immediati effetti reali; e si chiama, allora, ad
effetto rale. In cio risiede uma qualche innovazione, rispetto allá legislazione e allá
dottrina francese. Il contratto ad effettoreale si contrappone al contratto com effetto
obbligatorio (detto, anche, contratto personale) per la circostanza che esse
determina il trasferimento (o rispettivamente, la costituzione) e dall´altro lato
l´acquisto di um diritto, in forza Del solo consenso delle parti senza necessita di
esecuzione e indipendentemente da essa: cosiddetto passaggio consensuale Del
diritto (in specie, diritto reale): ossia passaggio contestuale al perfezionamento Del
contratto; non occore altra attività delle parti (in specie: dell´alienante). Infatti,
secondo l´art. 1376 c.c., il contratto che abbia per oggetto il trasferimento Del
diritto di proprietà su cosa determinata, produce, sotto taluni presupposti, il
trasferimento immediato di tale diritto, anche nei confronti della generalità dei terzi,
si che l´effetto obbligatorio Del contratto, o resta eliso, ovvero assume fuzione
secondaria.
Destaca-se, pois, a ocorrência de relevantes efeitos dos contratos bancários e,
notadamente, os aspectos de que tratam a responsabilidade pré-contratual e a pós-contratual,
que serão analisadas posteriormente.
101
MESSINEO, Francesco. Il contrato in genere. Vol 2. Milano: Editora Giuffrè, 1972, p. 62-63. Tradução
livre: A figura do contrato e seu efeito final depende logicamente da distinção que se faz de contrato de efeito
real e contrato de efeito obrigatório. O contrato, todavia, é suscetível de produzir imediato efeito real e se
chama, agora, de efeito real. Nele reside uma inovação, respeito à legislação e à doutrina francesa. O contrato
de efeito real se contrapõe ao contrato de efeito obrigatório (que se diz contrato pessoal) pela circunstância que
esse determina a transferência (ou, respectivamente, a constituição) e, de outro lado, a aquisição de um direito,
em razão do consenso das partes que sentem necessidade de execução, e que é independentemente dessa;
considera passagem consensual de direitos (na espécie, direito real); ou passagem contextual ao
aperfeiçoamento do contrato; não ocorre outra atividade da parte (na espécie, do alienante). De fato, segundo o
artigo 1376 CC., o contrato se apresenta pelo objeto e pela transferência do direito de propriedade de uma
coisa determinada, produzindo, sobre tal pressuposto, a transferência imediata de tal direito, no confronto da
generalidade de se ter o efeito obrigatório do contrato e o restante disso tudo assume uma função secundária.
92
2.5.1 A boa-fé objetiva e subjetiva nos contratos bancários
A boa-fé, ou como prefere a maioria da doutrina, o princípio da boa-fé, no âmbito dos
contratos bancários, tem relevância notória, refletindo no comportamento das partes e na
interpretação dos contratos e de seus efeitos em função das disposições dos artigos 112, 113 e
422 do Código Civil de 2002. No plano do Código de Defesa do Consumidor tal princípio
decorre da disposição contida no artigo 51, incisos I a XVI e par. 2.º. É também
absolutamente necessário para se apurar a caracterização ou não da responsabilidade civil que
tenha por origem um contrato bancário.
Referindo-se ao direito comparado, o princípio da boa-fé desenvolvido pela doutrina
alemã, contido nos dispositivos legais apontados no parágrafo anterior, também estão insertos
no ordenamento jurídico estrangeiro, como ocorre nos parágrafos 133 e 157 do Código Civil
alemão; no artigo 1156 do Código Civil francês; nos artigos 1362 a 1371 do Código Civil
italiano; nos artigos 236 a 239 do Código Civil português; e no artigo 18 do Código Civil
suíço
102
. Isso denota a relevância prática do princípio da boa-fé e sua importância para a
correta interpretação dos negócios jurídicos e da vontade das partes, privilegiando, em última
análise, a autonomia privada das partes, o que não poderia ser diferente no direito brasileiro,
sobretudo nos contratos bancários e na investigação da responsabilidade civil decorrente dos
mesmos.
Como exemplo de aplicação prática no plano dos contratos bancários do princípio da
boa-fé objetiva, destaca-se a expectativa que se cria nas partes contratantes. Além disso a
jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça planificou a eficácia prática do referido
princípio:
102
Código Civil francês, artigo 1156: Dever-se-á nas convenções procurar qual foi a comum intenção das partes
contratantes, e não se adstringir ao sentido literal dos termos.
93
O compromisso público assumido pelo Ministro da Fazenda, através de
Memorando de entendimento, para suspensão de execução judicial de dívida
bancária de devedor que se apresentasse para acerto de contas, gera no mutuário a
justa expectativa de que essa suspensão ocorrerá, preenchida a condição. Direito de
obter a suspensão fundado no princípio da boa-fé objetiva, que privilegia o respeito
à lealdade (STJ, 4ª T. RMS 6183, rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, v.u., j. 14.11.95).
A própria doutrina sustenta a relevância absoluta da concepção de boa-fé objetiva,
como uma exigência que se requesta no comportamento dos contratantes, sobretudo atrelada à
idéia de lealdade e à existência de um direito em favor do titular passivo da obrigação
negocial. Acrescente-se ainda a exigência de que o credor evite o agravamento do próprio
prejuízo e de que haja observância da boa-objetiva nas fases pré e pós-contratual. Aliás, a
aferição da boa-fé objetiva enseja a interpretação sistemática e teleológica do sistema de
teoria geral dos contratos decorrente do Código Civil com outros sistemas normativos do
ordenamento jurídico, tais como o Código de Defesa do Consumidor e, especialmente, a
própria Constituição Federal.
103
Na realidade, todas essas concepções originadas no princípio da boa-fé objetiva, no
plano dos contratos bancários, são absolutamente relevantes e pertinentes, pois vão assegurar
a correta e exata aferição da culpa das partes contratantes (banco e cliente e, também, do
próprio usuário do sistema bancário), e viabilizar a caracterização ou não da responsabilidade
civil decorrente de ilícito contratual.
Maria Helena Diniz explica que a boa-fé subjetiva diz respeito ao fato de a parte
desconhecer qualquer vício do negócio jurídico, ao passo que a boa-fé objetiva, prevista no
artigo 422 do Código Civil, diz respeito ao padrão de comportamento ético da parte, baseado
103
Citam-se, no campo doutrinário, os Enunciados das Jornadas de Direito Civil do STJ: Enunciado 24 - O art.
422 do CC não inviabiliza a aplicação pelo julgador do princípio da boa-fé nas fases pré-contratual e pós-
contratual; Enunciado 26 A cláusula geral contida no art. 422 do CC impõe ao juiz interpretar e, quando
necessário, suprir e corrigir o contrato segundo a boa-fé objetiva, entendida como a exigência de comportamento
leal dos contratantes; Enunciado 27 Na interpretação da cláusula geral da boa-fé, deve-se levar em conta o
sistema do Código Civil e as conexões sistemáticas com outros estatutos normativos e fatores metajurídicos;
Enunciado 168 O princípio da boa-fé objetiva importa no reconhecimento de um direito a cumprir em favor do
titular passivo da obrigação; Enunciado 169 O princípio da boa-fé objetiva o credor a evitar o agravamento do
próprio prejuízo; Enunciado 170 – A boa-fé objetiva deve ser observada pelas partes na fase negociações
preliminares e após a execução do contrato, quando tal exigência decorrer da natureza do contrato.
94
na probidade, na lealdade, que vem a tornar defeso o exercício abusivo de direito por parte de
um dos contratantes, não apenas em relação ao principal, mas também ao acessório previsto
na relação negocial, notadamente, ao dever de informar, de colaborar com a outra parte e ser
diligente e pró-ativo na relação, tanto é que a violação de deveres acessórios e anexos à
relação contratual principal também se caracteriza como uma forma de inadimplemento, não
obstante a caracterização ou não da culpa.
104
A rigor, em se tratando de contrato bancário que instrumentaliza uma operação
financeira, um serviço bancário e até mesmo a relação dos usuários em geral com os bancos, a
boa-fé objetiva está vinculada à idéia de comportamento probo e legal das partes envolvidas,
sendo que, para os bancos, o referencial de comportamento pode ser constatado no
cumprimento dos parâmetros estabelecidos nas resoluções do Banco Central, como aquela
que prevê operações e práticas vedadas às instituições financeiras (Resolução 3258/05, que
alterou a Resolução 1559/98) e, também, as duas resoluções que instituíram o que o Banco
Central veio a denominar de manual do cliente e usuário dos serviços financeiros (Resoluções
2.878/01 e 2.892/01).
105
Sustenta-se, pois, que na ausência de critérios legais específicos, os padrões
comportamentais para as instituições financeiras se referem às diretrizes estabelecidas pelo
Banco Central, que são objetivas, como também se referem ao atendimento de toda a estrutura
normativa em vigor no ordenamento jurídico brasileiro. Contudo, para os clientes e usuários
das instituições financeiras, a probidade está associada a ser leal e diligente na transparência
das informações transmitidas, que devem ser devidamente comprovadas, até para não
acarretar uma compreensão da verdadeira situação fática por parte da instituição
financeira.
104
DINIZ, Maria Helena. Código civil anotado. 12 ed. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 406.
105
Fonte de consulta: <www.bcb.gov.br> acesso em 30/10/07.
95
A boa-fé subjetiva está ligada à real e efetiva compreensão da natureza da relação
negocial, deduzindo que não existe qualquer nulidade ou vício no contrato bancário realizado.
Da referida situação pode decorrer a má-fé por uma das partes, especialmente pelo cliente ou
usuário da instituição financeira, ao omitir determinada informação relevante, apresentar
dados falsos, enfim, macular a boa-fé subjetiva das partes e ensejar uma postura contrária aos
bons costumes. A responsabilidade civil contratual, portanto, decorre da ilicitude praticada no
bojo do contrato bancário.
É importante realizar uma investigação de alguns aspectos da boa-fé objetiva para se
estabelecer parâmetros seguros e eficazes e se apurar a responsabilidade civil decorrente do
contrato bancário. Para tanto, considerando-se a evolução doutrinária, jurisprudencial e legal
no direito comparado, a começar pela incidência da boa-fé objetiva e a responsabilidade pré e
pós-contratual atrelada à inteligência do artigo 422 do Código Civil brasileiro, inspirado no
parágrafo 242 do BGB (Código Civil alemão), que está com a redação original desde 1896 e
que, apesar de não fazer menção aos momentos pré e pós-contratual, fez com que a doutrina e
a jurisprudência alemãs permitissem a inclusão das duas circunstâncias no âmbito de
aplicação do referido dispositivo, como acentua Nelson Nery Júnior e Rosa Maria Andrade
Nery ao comentarem-no:
106
Com isso os entabulantes ainda não contratantes podem responder por
fatos que tenham ocorrido antes da celebração e da formação do contrato
(responsabilidade pré-contratual) e os ex-contratantes – o contrato já se findou pela
sua execução também respondem por fatos que decorram do contrato findo (pós-
eficácia das obrigações contratuais).
Outro ponto que os autores destacam acerca da boa-fé objetiva é que está relacionada
à doutrina dos atos próprios (venire contra factum proprium), que faz com as partes se
comportem de forma coerente com as atitudes que vêm adotando antes, durante e após a
106
NIOR, Nelson Nery; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código civil comentado. 4 ed. São Paulo: RT, 2006,
p. 415.
96
execução contratual, estabelecendo o que a doutrina denomina de “dever de conduta”, para
que todas as expectativas originadas no comportamento de uma parte ensejem a prática da
legítima confiança da outra parte. Paralelamente, a responsabilidade civil contratual teve uma
evolução no direito comparado, especialmente na doutrina alemã, que autoriza a
implementação de efeitos relevantes na boa-fé objetiva e a aferição da chamada culpa in
contrahendo, que foi desenvolvida doutrinariamente por Jhering e Canaris e que fez surgir a
chamada “base do negócio jurídico” sustentada na evolução da doutrina alemã por Larenz e,
mais enfaticamente por Oertmann, que pode assim ser conceituada conforme a explicação de
Nelson Nery Júnior: “por base do negócio devem-se entender todas as circunstâncias fáticas
e jurídicas que os contratantes levaram em conta ao celebrar o contrato, que podem ser
vistas nos seus aspectos subjetivo e objetivo.”
107
Sustenta-se, pois, que a boa-fé objetiva e subjetiva, atrelada à doutrina dos atos
próprios, da culpa na contratação, compreendendo os momentos pré e pós-contratual e,
especialmente, a base do negócio jurídico, são elementos essenciais para se depurarem e
realmente identificarem as situações fáticas e jurídicas que ensejam a quebra do contrato
bancário, de forma a autorizar a aferição de responsabilidade civil contratual baseada na idéia
de culpa e extensão do dano, na medida em que haverá uma evidente dialética entre a teoria
geral dos contratos e a teoria geral da responsabilidade civil, delimitando o corte investigativo
nos contratos bancários.
Portanto, qualquer situação fática e jurídica que afete de forma direta ou indireta a
boa-fé contratual no plano de realização dos contratos bancários pode, em tese, autorizar uma
conseqüência de apuração da responsabilidade civil pelas partes contratantes, seja da
instituição financeira, seja do cliente, que pactua uma operação financeira, que contrata um
serviço bancário ou até mesmo para o usuário bancário.
107
NIOR, Nelson Nery; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código civil comentado. 4 ed. São Paulo: RT, 2006,
p. 416.
97
A base do negócio jurídico do contrato bancário deve manter-se indene desde sua
formação inicial até após sua conclusão, para que não haja quebra da fidúcia e as partes sejam
probas na execução do negócio jurídico, inclusive, os terceiros que tangenciem a relação
negocial. A doutrina brasileira e a doutrina francesa sustentam que os terceiros devem
respeitar a relação obrigacional, em curso, não praticando atos ilícitos que a fraudem ou a
emperrem, ou seja, os terceiros devem respeitar contrato em andamento e se abster de praticar
atos que possam prejudicar a regular execução dele.
108
Essa afetação dos terceiros é absolutamente relevante no plano dos contratos
bancários, na medida em que os mesmos acarretam efeitos que não se irradiam apenas entre o
banco e o cliente, mas em toda a sociedade que sofre conseqüências jurídicas resultantes da
inadimplência contratual, por exemplo, pois os chamados spreads bancários (diferença entre
o custo do empréstimo e o custo operacional do banco) levam em conta o índice de
inadimplência da instituição financeira, para apurar a taxa de juros que será praticada em
determinada modalidade de operação financeira.
Como base de sustentação das concepções extraídas no presente tópico, vale a
transcrição de algumas conclusões a que chegou Antônio Manuel da Rocha Menezes
Cordeiro
109
, em sua tese acerca da boa-fé no direito civil:
3. que praticar uma Ciência do Direito virada para a resolução de problemas
concretos, com atenção particular aos fenômenos do pré-entendimento, das unidades
previsão-estatuição e interpretação-aplicação e do ponderar das conseqüências da
decisão, numa linha de consenso.
38. O BGB consagrou a boa-fé subjectiva em termos éticos e a objetiva, no sector
contratual; dificuldades metodológicas impediram-no de dar voz à jurisprudência
que o antecedeu, mas que se manteria; a disparidade assim originada levou ao
repartir da doutrina por posições juspositivas e metajurídicas.
41. A boa conheceu uma expansão larga no Direito privado não civil e no Direito
público, apesar de carências doutrinárias.
108
NEGREIROS, Teresa. Teoria do contrato: novos paradigmas. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, p. 265;
ROSENVALD, Nelson. Dignidade humana e boa-fé no Código Civil. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 113-114;
ROMAIN, Jean-François. Théorie critique du príncipe general de bonne foi em droit prive. Bruxelles:
Bruylant, 2000, p. 557, 559 e 566; JÚNIOR, Nelson Nery; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código civil
comentado. 4 ed. São Paulo: RT, 2006, p. 417.
109
CORDEIRO, Antônio Manuel da Rocha Menezes. Da boa-fé no direito civil. Coimbra: Almedina, 2001, p.
1283-1299.
98
42. A boa fé assina quase todas as inovações ocorridas no Direito civil desde o início
do século; no entanto, não foi, nessa tarefa, conduzida por quaisquer orientações
juscientíficas que, tão pouco, explicam o fenômeno: é o irrealismo metodológico.
É necessário ponderar que a culpa na contratação também tem alcance na doutrina,
jurisprudência e no direito positivado europeu e, especificamente, nesse aspecto, o corte
metodológico que se ao tema está agregado à aferição da responsabilidade civil quando
decorrente do contrato bancário e, para tanto, transcreve-se a conclusão a que chegou Antônio
Menezes Cordeiro:
53. A ponderação jurisprudencial da culpa in contrahendo revela a sua concretização
em deveres de protecção, de informação e de lealdade que, ultrapassando os valores
em jogo na contratação, se fundam na boa-fé.
54. Esse alargar funcional levou ao aparecimento de concepções dogmáticas novas,
desde as relações contratuais de facto à doutrina da confiança; há que ir mais longe.
55. Fora do espaço alemão, a culpa in contrahendo teve alcance reduzido em França,
mas aparenta certa implantação em Itália e em Portugal; a análise da jurisprudência
portuguesa mostra não haver ainda um aproveitar total da figura, apesar de certos
sinais animadores.
113. A boa fé distingui-se dos bons costumes e da ordem pública.
114. A boa fé distingue-se da culpa e da diligência.
115. A boa fé distingue-se da chamada função social e econômica dos direitos.
120. A boa traduz, no caso concreto, a projecção dos dados materiais relevantes
do sistema, a cuja luz devem ser vistas a confiança e a materialidade da regulação
jurídica.
Por outro viés, a jurisprudência brasileira tem acolhido a concepção da base do
negócio jurídico como decorrência da boa-fé contratual e, sobretudo, nos contratos bancários,
atribuindo-lhe relevantes efeitos jurídicos:
Se tivesse que examinar o LICC 6º, de qualquer modo não o daria por
violado, pois o respeito ao pacta sunt servanda cede passo quando surgem fatos
supervenientes, suficientemente fortes para caracterizar a alteração da base em que o
negócio foi realizado, que tornem insuportável o cumprimento da obrigação para
uma das partes. Nessa hipótese, cabe a revisão judicial do contrato, ou mesmo sua
resolução (STJ, T., REsp 73370-AM, rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, v.u., j.
21.11.95, DJU 12.2.96).
Afastamento determinado, incluída somente a correção monetária do período
e demais encargos contratuais. Boa-fé objetiva. Comissão de permanência a
adicionar valor extorsivo ao principal, em percentual superior a 100% em cinco
meses, ferindo o princípio da lealdade contratual. Abusividade configurada.
Aplicação do CC 187 e 422 (extinto 2º TACSP, 10ª Câm.,Ag 796142-0/2, rel.
Soares Levada, v.u., j. 6.8.03).
99
O credor tem razão em afirmar que o fato superveniente da inflação
determinou a necessidade de modificação do contrato, celebrado quando presentes
outras circunstâncias, mas para isso deveria ter proposta a devida ação de revisão
judicial do contrato, a fim de que fossem reexaminadas as cláusulas e estipulados
novos critérios que garantissem o reequilíbrio da avença. Nas circunstâncias do
negócio, não poderia o banco surpreender o devedor, quando do vencimento,
recusando o pagamento ofertado, para exigi-lo em novas bases. (STJ, 4ª T., REsp
32488-2-GO, rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, v.u., j. 7.11.94, DJU 5.12.94).
Pela doutrina de Emílio Betti, a autonomia privada, quando chamada a interferir no
plano fenomênico social, depara-se com limites que obedecem às regras e exigências que
resultam da sua própria lógica, associada, inclusive, à percepção da boa-fé, seja no plano
objetivo, seja no subjetivo. Assim, limites e ônus que decorrem da autonomia privada,
antes e depois do seu reconhecimento jurídico.
110
O princípio da boa-fé, portanto, tanto no plano objetivo, quanto no plano subjetivo,
fornece um paradigma de interpretação do negócio jurídico que deve ser observado pelo
intérprete para se alcançar a interpretação teleológica e sistemática, no fato aplicado,
subsumido ou integrado à norma jurídica vigente.
2.5.2 A dignidade da pessoa humana, a solidariedade, a justiça social, a igualdade e a
função social no âmbito dos contratos bancários.
Como princípios informativos do direito privado é relevante destacar o princípio da
dignidade da pessoa humana previsto expressamente no artigo 1.º, inciso III, da Constituição
da República, que deve nortear todo o ordenamento jurídico brasileiro e que implica efeitos
sobre todos os tipos contratuais, inclusive os bancários.
No contexto da dignidade da pessoa humana identificam-se as concepções de Franco
Modugno, que trazem as principais idéias do autor acerca do referido instituto, à luz do direito
comparado, especialmente com um paralelo da Constituição italiana. Modugno inicialmente
110
BETTI, Emílio. Teoria geral do negócio jurídico. Tomo I. Tradução Ricardo Rodrigues Gama. Campinas:
LZN, 2003, p. 147/50.
100
trabalha com a idéia do objeto de reconhecimento de garantia dos direitos invioláveis, no
âmbito das normas constitucionais positivadas, e que se apresenta como direito fundamental
vinculado ao aspecto da liberdade positivada e sua autodeterminação, como autonomia
singular de todo indivíduo. Constitui-se, pois, como um direito fundamental garantido na
Constituição italiana, que deve ser auto-realizável, em todas as direções possíveis, civil, ético-
social, econômica e política.
111
Para o direito brasileiro, no âmbito dos contratos bancários, é interessante anotar que a
intimidade e a privacidade estão asseguradas por força da Lei Complementar 105/01, que faz
incidir o sigilo sobre as operações bancárias e que operacionaliza essa idéia de proteção da
intimidade e privacidade do correntista bancário.
Vale registrar que no plano do direito comparado, como demonstrado, as concepções
de Franco Modugno, quando ele se refere ao direito à integridade psicofísica da pessoa, com o
direito à vida, remetem à Quinta Emenda da Constituição norte-americana
112
, que afirma que
ninguém pode ser privado da vida, da liberdade e da propriedade, sem um processo regular;
paralelamente no âmbito do direito italiano, constitui-se o direito à vida como um direito
fundamental inviolável (direito à vida e à integridade psicofísica).
111
MODUGNO, Franco. I nuovi diritti nella giurisprudenza costituzionale. Torino: G. Giappicheli Editore,
1995, p. 9-19 e 87-108. Registra o autor que a liberdade humana se identifica sob o conteúdo axiomático com o
aspecto físico-psíquico. Essa concepção do indivíduo como uma pessoa humana originada em valores
antropológico-naturalistas onde se alcança, também, valores éticos e espirituais, culmina como valores jurídicos,
estabelecendo o significado de liberdade da pessoa humana como um valor jurídico-positivo, sendo um
patrimônio irretratável da pessoa humana e que reflete na autonomia privada. Assim, a classificação axiomática e
fundamental da personalidade humana é uma unidade psicofísica da identidade, da integridade, da intimidade, e
de pensamento ou de consciência.
112
A Declaração de Direitos (Bill of Rights) que se constitui das dez primeiras emendas da Constituição
americana, especialmente, a Quinta Emenda, entrou em vigor em 1791, registrando que a Constituição foi
promulgada em 1787. A redação da Quinta Emenda: “Nenhuma pessoa será obrigada a responder por um crime
capital ou infamante, salvo por denúncia ou pronúncia de um grande júri, exceto em se tratando de casos que,
em tempo de guerra ou de perigo público, ocorram nas forças terrestres ou navais, ou na milícia, quando em
serviço ativo; nenhuma pessoa será, pelo mesmo crime, submetida duas vezes a julgamento que possa causar-
lhe a perda da vida ou de algum membro; nem será obrigada a depor contra si própria em processo criminal ou
ser privada da vida, liberdade ou propriedade sem processo legal regular; a propriedade privada não será
desapropriada para uso público sem justa indenização.” In SÉROUSSI, Roland. Introdução ao direito inglês e
norte-americano. São Paulo: Landy, 2001, p. 195.
101
Destaca-se que essa concepção também existe no direito brasileiro e resultam
relevantes conseqüências aos contratos em geral, tais como a autonomia privada, a função
social dos contratos e a própria ordem pública que deverá ser sempre respeitada.
No plano normativo brasileiro e comparado, que é positivado pelo Estado, a
constituição material surge como possível base de estabelecimento de um direito inviolável e
fundamental, na medida em que se insere um princípio supremo inviolável no texto
constitucional. Portanto, pode-se concluir que a normatização constitucional de princípios
supremos faz surgirem os chamados direitos invioláveis. Daí se evidencia a figura que Franco
Modugno aponta como patrimônio irretratável da pessoa humana, fundamentando-se na
liberdade e dignidade em contraposição ao individualismo e liberdade da propriedade.
Essa liberdade atrelada à idéia de propriedade perpassa os contratos, pois eles são um
meio de aquisição da propriedade de bens móveis e imóveis. Além disso, por serem os
contratos bancários instrumentos de viabilização e operacionalização de créditos e meios que
têm por objeto operações bancárias, pode-se extrair a relevância desses princípios
constitucionais no ato interpretativo até mesmo da responsabilidade civil decorrente do
contrato bancário.
Todavia essa leitura do direito privado não é suficiente para se alcançar a tutela de
direitos humanos assegurados em princípios constitucionais e, por conta disso, que existir
essa dialética entre o direito público e o direito privado. Isso significa que no âmbito
específico do direito civil, a perspectiva de interpretação enseja a análise civil-constitucional
dos temas de direito privado à luz do direito público.
Gustavo Tepedino
113
, ao analisar os direitos humanos e as relações privadas, identifica
a insuficiência dogmática do direito privado, para tutelar os direitos humanos e saber qual
seria a nova abordagem do direito público e do direito privado, visto que historicamente os
113
TEPEDINO, Gustavo. Temas de direito civil. Rio de Janeiro: Renovar, 1998, p. 55-71.
102
direitos humanos vêm sendo abordados no âmbito do direito internacional, nos tratados e
convenções e no âmbito interno dos países, nas normas constitucionais, ou seja, voltado ao
direito público. Sustenta o autor que a supremacia do indivíduo no direito civil, ao privilegiar
a autonomia da vontade e afastar-se das garantias fundamentais do direito público, assegura o
afastamento da ingerência do Estado nas relações jurídicas privadas, o que traça as linhas
mestras de interpretação histórica. Todavia a distinção entre direito público e privado foi
abalada pelas crescentes necessidades do desenvolvimento da sociedade, do desenvolvimento
tecnológico, fazendo surgir o dirigismo contratual e o controle de participação social,
ocasionando relativização conceitual entre o direito público e o direito privado.
Essa perspectiva é evidente no âmbito dos contratos bancários, ante o notório
dirigismo contratual existente sobre os mesmos, em razão de regulações e vedações impostas
pelo Conselho Monetário Nacional, pela Comissão de Valores Mobiliários e pelo Banco
Central do Brasil.
Ressalta-se que a proteção dos direitos humanos previstos nos tratados e na norma
constitucional não terá efeito prático, se as políticas públicas e as atividades econômicas
privadas não estiverem sujeitas aos mecanismos de controle jurídico-normativo para afastar a
exclusão social e o desrespeito à dignidade da pessoa humana. Aliás, a própria norma
constitucional brasileira impõe a intervenção nos institutos de direito civil, como a
propriedade, a família, atividade empresarial e relações de consumo, além da dignidade da
pessoa humana. Destaque-se, outrossim, a questão da globalização da economia mundial, que
deve ser controlada com o escopo de assegurar a proteção dos direitos humanos com
aplicação do princípio da proporcionalidade entre os direitos externos e o direito interno, sem
que um venha a ferir o outro e, especialmente, sem que os valores internos deixem de ser
concernentes à estabilidade social e infrinjam a norma constitucional.
103
Para registro da importância da análise dos princípios apontados no presente tópico e
sua relevância e afirmação histórica, justifica-se uma pequena digressão das concepções de
Hannah Arendt, na visão de Celso Lafer, especialmente, no que o autor denomina de
afirmação político-jurídica dos direitos humanos de primeira, segunda e terceira geração.
Lafer
114
explica que são direitos humanos de primeira geração os direitos previstos na
Declaração de Virgínia e na Declaração Francesa de 1789, uma vez que se baseiam em uma
clara distinção entre Estado e Não-Estado, fundamentada no contratualismo de inspiração
individualista, ou seja, são direitos individuais divididos quanto ao modo de exercício e
quanto ao sujeito passivo do direito.
A segunda geração corresponde aos direitos do indivíduo para com a coletividade e
pressupõe como sujeito passivo o Estado, porque na interação de governantes com
governados foi a coletividade que assumiu a responsabilidade de atendê-los e, por tal motivo,
os direitos de segunda geração podem ser entendidos como direitos que tornam reais direitos
formais. Esses direitos, portanto, buscam assegurar as condições para o pleno exercício dos
primeiros.
Como suporte para as reivindicações dos desprivilegiados, apresentam-se os direitos
formulados pela ONU (Organização das Nações Unidas) como direitos de terceira ou quarta
geração. Tais direitos são os que têm, como titulares, não o indivíduo, mas algumas
coletividades, como a família, o povo, a nação, coletividades regionais ou étnicas, nas quais se
inclui a própria humanidade. A idéia que se destaca é a da convergência dos direitos de
primeira com os da segunda geração, que depende da viabilidade da democracia
contemporânea. Além disso, a dignidade da pessoa humana se firma partindo do pressuposto
de que deverão existir mais liberdades e menos privilégios, fato um tanto quanto difícil. A
passagem para os direitos de terceira ou quarta geração, em que o indivíduo deixa de ser o
114
LAFER, Celso. A reconstrução dos direitos humanos: um diálogo aberto com o pensamento de Hannah
Arendt. São Paulo: Cia. das Letras, 2001, p. 125-133.
104
titular incontestável dos direitos para assumir tal posto uma coletividade, implica a
dificuldade de saber quem são os titulares dos direitos. Ou seja, qual é a coletividade que pode
legitimamente afirmar seu direito à autodeterminação.
Sustenta-se, pois, à luz das idéias apresentadas, que a proteção e regulação normativa
que se opera no plano dos contratos bancários visa estabelecer uma tutela jurídica aos
cidadãos que firmam relacionamento (negócios jurídicos) com as instituições financeiras, seja
como correntistas, seja como investidores, seja como usuários do sistema bancário, e essas
pessoas constituem um grupo ou conjunto de indivíduos que estão submetidos a um
referencial criado pelo próprio ordenamento jurídico, brasileiro e mundial (no que se refere ao
direito comparado), pois a regulação da atividade financeira e atividade bancária é algo que
ocorre em diversos países no mundo.
As atividades financeiras e bancárias constituem típicas atividades complexas e
especiais que estão sujeitas a um risco sistêmico, no que diz respeito a influências externas e
internas no campo da economia, da política. Em vista disso, ensejam uma regulação para
proteção e parametrização de procedimentos por parte dos bancos e também dos contratantes
e usuários da rede bancária. É como se existisse um microssistema obrigacional que tem por
escopo tutelar os negócios jurídicos travados no plano das atividades financeiras e bancárias.
A responsabilidade civil, pois, no plano dos contratos bancários, por não ter uma
tutela específica regulando a mesma, segue as diretrizes gerais do direito privado estatuídas
no Código Civil e legislação extravagante do direito bancário no ordenamento brasileiro
(como o Código de Defesa do Consumidor, as circulares e resoluções do Banco Central), mas
que não pode deixar de considerar a incidência dos princípios constitucionais do direito
público, notadamente, da Constituição Federal, tal como sustentado.
A solidariedade e a justiça social estão agregadas à idéia da justiça comutativa e
distributiva incidentes no plano dos contratos bancários. Também se infere da leitura do
105
princípio da boa-fé já analisado. Assim, segundo a tradicional definição de Goffredo Telles
Júnior
115
, é operação de justiça comutativa a entrega da coisa comprada e o pagamento do
preço ajustado, ao passo que constituem operação de justiça distributiva os serviços realizados
pelo Poder Público, inclusive os realizados pelo Poder Judiciário, ao aplicar o direito em
casos concretos. Infere-se, também, o conteúdo normativo do artigo 170 da Constituição da
República de 1988.
Pode-se sustentar, portanto, que no plano dos contratos bancários haverá justiça
comutativa quando se operem completamente as obrigações contraídas pelas partes, seja
quando o objeto do contrato tiver uma operação financeira, seja quando tiver um investidor,
ou quando tiver apenas um usuário do sistema bancário, ao passo que a responsabilidade civil
decorrente de atos perpetrados no bojo do contrato bancário estará adstrita a sua formulação
no plano da justiça distributiva, a ser realizada pelo poder judiciário e, também, poderá se
falar em justiça distributiva quando houve regulamentação, fiscalização, normatização e
parametrização das atividades financeiras e bancárias pelas autoridades governamentais como
o Banco Central do Brasil, o Conselho Monetário Nacional e a Comissão de Valores
Mobiliários.
O princípio da igualdade ou da isonomia, na clássica definição aristotélica e de Rui
Barbosa, que consiste no tratamento igual para os iguais e desigual para os desiguais, na exata
medida de suas desigualdades. Para não fugir do contexto e do corte metodológico no plano
dos contratos bancários esse princípio passa a tomar proporção relevante quando se tem, de
um lado, um complexo estruturado e fiscalizado, que é a instituição financeira, e, de outro
lado, na maioria das vezes, pessoas naturais e pessoas jurídicas que podem também ter,
eventualmente, a mesma estrutura organizacional que o banco, todavia, fica evidente o
115
TELLES JR., Goffredo. Iniciação na ciência do direito. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 368-369.
106
tratamento diferenciado que deve ser atribuído no plano normativo, ante a importância das
instituições financeiras para a sociedade.
A isonomia, portanto, reflete na aferição da proporcionalidade e extensão da culpa na
responsabilidade civil decorrente de contrato bancário, na medida em que é requerida dos
bancos atenção redobrada ao realizar operações, na contratação com clientes e no atendimento
aos serviços bancários pelos usuários em geral. Entretanto, como foi explanado no capítulo
primeiro da dissertação, no item 1.3., não que se atribuir de forma absoluta a existência de
uma responsabilidade civil objetiva por parte das instituições financeiras, na medida em que a
aferição da culpabilidade e da extensão do dano deverá ser sempre investigada nas perdas e
danos decorrentes de atos praticados em contratos bancários.
Destaca-se que as concepções de igualdade também decorrem do Direito Internacional
Privado, quando o Estado brasileiro decidiu internalizar tratados internacionais como a
Declaração Universal dos Direitos Humanos, assinada pelo Brasil em 10/12/1948, o Pacto
Internacional dos Direitos Civis e Políticos, aprovado pelo Decreto Legislativo n. 226, de
12/12/91, e promulgado pelo Decreto n. 592, de 06/07/92, e também a Convenção Americana
sobre Direitos Humanos Pacto de São José da Costa Rica, aprovado pelo Decreto
Legislativo n. 27, de 26/05/92, e promulgado pelo Decreto n. 678, de 06/11/92.
O Código Civil de 2002, ao estabelecer no artigo 421 que a liberdade contratual
deverá ser exercida em razão e nos limites da função social do contrato, fez surgir o que a
doutrina comumente denominou de cláusulas gerais adstritas à autonomia privada, ao respeito
à ordem pública e à função social do contrato.
Como acentua Maria Helena Diniz
116
podem-se extrair do ordenamento jurídico
brasileiro princípios basilares e fundamentais do direito contratual, que seriam o princípio da
116
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria das obrigações contratuais e
extracontratuais. 23 ed. revista e atualizada. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 22-36.
107
autonomia da vontade e o da função social do contrato, do consensualismo, da
obrigatoriedade da convenção, da relatividade dos efeitos do contrato e da boa-fé objetiva.
Nelson Nery Júnior e Rosa Maria Andrade Nery destacam alguns aspectos relevantes
da concepção da função social do contrato que têm importância determinante para os
contratos bancários, a começar pela autonomia privada que assegura às partes a possibilidade
de realizar a contratação nos limites impostos pela ordem pública, vinculada ao princípio da
dignidade da pessoa humana (art. 1.º, III, da CF), destacando que essa autonomia privada é
ligada à idéia de poder e princípio próprio do direito privado. Aliás, os autores registram que a
maior função do contrato é econômica, pois viabiliza a circulação de riquezas e a
transferência de bens na sociedade, por isso qualquer espécie de contrato necessita se pautar
por uma função econômico-social para que ele realmente seja considerado existente, válido e
eficaz, chegando, inclusive, a sustentar que poderá ocorrer a autorização do dever de
indenizar se houver descumprimento da função econômico-social do contrato, obviamente,
que se comprovada a ocorrência de perdas e danos. Transcreve-se trecho da opinião dos
referidos autores
117
:
Função social do contrato e Constituição Federal. A cláusula geral da função
social do contrato é decorrência lógica do princípio constitucional dos valores da
solidariedade e da construção de uma sociedade mais justa (CF I). A doutrina a
vê, também, como decorrente ora da função social da propriedade (CF XXIII e
170 III) (Miguel Reale e Miguel Reale nior, Função social e boa-fé na valoração
dos contratos, in Reale-Reale jr., questões, n. 10, p. 125), ora do fundamento da
República do valor social da livre iniciativa (CF 1º IV) (Antônio Junqueira de
Azevedo, Princípios do novo direito contratual e desregulamentação do mercado,
RT 750/116). As várias vertentes constitucionais estão interligadas, de modo que não
se pode conceber o contrato apenas do ponto de vista econômico, olvidando-se de
sua função social. A cláusula geral da função social do contrato tem magnitude
constitucional e não apenas civilística. ...Função social. Conteúdo. O contrato estará
conformado à sua função social quando as partes se pautarem pelos valores da
solidariedade (CF 3.º I) e da justiça social (CF 170 caput), da livre iniciativa, for
respeitada a dignidade da pessoa humana (CF 1 III), não se ferirem valores
ambientais (CDC 51 XIV) etc. Haverá desatendimento da função social quando: a) a
prestação de uma das partes for exagerada ou desproporcional, extrapolando a álea
normal do contrato; b) quando houver vantagem exagerada para uma das partes; c)
quando quebrar-se a base objetiva, cláusula geral prevista no CC 422, decorre da
117
NIOR, Nelson Nery; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código civil comentado. 4 ed. São Paulo: RT, 2006,
p. 410-411.
108
função social do contrato, de modo que tudo o que se disser sobre a boa-fé objetiva
poderá ser considerado como integrante, também, da cláusula geral da função social
do contrato.
É certo, pois, que os contratos estão subordinados no plano de existência, validade e
eficácia ao princípio da função social que enseja uma cláusula geral ou um padrão a ser
seguido em todos os setores e, quanto aos contratos bancários, é fato que interessa a toda a
sociedade que os mesmos também venham a atender plenamente a função social, pois o
crédito bancário está diretamente ligado ao volume de operações inadimplidas, inclusive e
especialmente, relacionado às taxas de juros e à liberação do crédito contido no sistema
financeiro nacional.
A doutrina
118
desenvolveu diversas implicações decorrentes da função social dos
contratos, que se sustenta terem incidência na aferição da responsabilidade civil decorrente
dos contratos bancários, observando, contudo, a efetiva comprovação da existência de danos e
a perspectiva sempre defendida da responsabilidade subjetiva das instituições financeiras, no
âmbito dos contratos bancários.
É de se lembrar que os bancos por si exercem notória função social na atividade
bancária que desenvolvem como sustentado no capítulo primeiro da dissertação. Anote-se que
a Constituição Federal no artigo 173, parágrafo primeiro, inciso I, estatui a função social da
empresa pública e da sociedade de economia mista, contudo, a fiscalização das mesmas se
no plano estatal e da sociedade por força do referido dispositivo constitucional.
118
Jornada I do STJ Enunciado 23: A função social do contrato, prevista no CC 421, não elimina o princípio da
autonomia contratual, mas atenua ou reduz o alcance desse princípio quando presentes interesses
metaindividuais ou interesse individual relativo à dignidade da pessoa humana. Jornada I do STJ Enunciado 22:
A função social do contrato, prevista no CC 421, constitui cláusula geral, que reforça o princípio de conservação
do contrato, assegurando trocas úteis e justas. Jornada I do STJ Enunciado 21: A função social do contrato,
prevista no CC 421, constitui cláusula geral, a impor a revisão do princípio da relatividade dos efeitos do
contrato em relação a terceiros, implicando a tutela externa do crédito. Jornada III do STJ Enunciado 166: A
frustração do fim do contrato, como hipótese que não se confunde com a impossibilidade da prestação ou com a
excessiva onerosidade, tem guarida no direito brasileiro pela aplicação do CC 421.
109
A própria doutrina tem entendido haver uma função social das empresas: Jornada I do
STJ, Enunciado 53: Deve-se levar em consideração o princípio da função social na
interpretação das normas relativas à empresa, a despeito da falta de referência expressa.
Sendo as operações bancárias instrumentalizadas por meio dos contratos bancários, é
mais do que evidente a função social dos mesmos, ensejando pertinência e relevância na
investigação de suas conseqüências, inclusive, perante terceiros não participantes da relação
contratual, além do justo, do útil e equânime dimensionamento dos juros praticados no
mercado. Além disso, a frustração indevida do contrato, decorrente da prática de ato ilícito ou,
ainda, até mesmo de contrato ilícito, na celebração de uma operação financeira ou de um
atendimento a usuário bancário, pode ensejar a ocorrência de responsabilidade civil.
CAPÍTULO III
A responsabilidade civil nos contratos bancários
3.1. O problema da complexidade do tema
A aferição da complexidade do tema da responsabilidade civil nos contratos bancários
até então desenvolvida na presente dissertação esatrelada à idéia de que no ordenamento
jurídico brasileiro existem estruturas relacionadas às atividades financeiras que são
desenvolvidas pelo Estado, como se sustenta no Capítulo II, nos itens 2.1.1., 2.1.2, 2.1.3, bem
como relacionadas às atividades bancárias desenvolvidas pelas instituições financeiras
autorizadas a funcionar e integrantes do Sistema Financeiro Nacional.
Vale observar que as atividades financeiras se pautam pelas normas de direito público
e são desenvolvidas notadamente pela União, ao instituir e regular o Sistema Financeiro
Nacional como emissão de moedas, controle do câmbio e, principalmente, regular as
atividades que serão desenvolvidas pelos bancos, ou seja, pelas instituições financeiras em
suas várias modalidades.
As instituições financeiras, por sua vez, realizam operações financeiras que são
estruturadas em negócios jurídicos denominados contratos bancários com clientes em
operações ativas ou passivas e também com usuários dos bancos em geral, ainda que não
correntistas ou clientes. Todas essas atividades são pautadas pelas disposições normativas do
direito privado, baseado nas concepções da Constituição Federal, do Código Civil, do Código
de Defesa do Consumidor, da legislação de direito bancário em geral e, também, pelas
resoluções e circulares do Banco Central do Brasil.
111
Todavia, não obstante haver uma nítida distinção dogmática de incidência das normas
de direito público e de direito privado, como se tem sustentado, as duas vertentes não são
contrapostas e nem tampouco antagônicas, pois se completam na aferição da responsabilidade
civil nos contratos bancários, especialmente, por conta da perspectiva civil-constitucional que
se atribuiu ao estudo do tema discorrido.
Pode-se traçar o seguinte organograma para melhor visualizar a conclusão:
ESTADO – UNIÃO
Lei 4595/64
SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL
Conselho Monetário Nacional
BC CVM
SUSEP/OUTROS
INSTITUIÇÕES
FINANCEIRAS
(BANCOS)
CONSTITUIÇÃO FEDERAL
CC – CDC – Normas de direito
bancário – Resoluções do Bacen
CONTRATOS BANCÁRIOS
Operações financeiras ativas e
passivas com clientes
Prestação de serviços bancários
a clientes
Atendimento bancário aos
usuários não clientes
ATIVIDADES BANCÁRIAS ATIVIDADE FINANCEIRA
112
A complexidade, portanto, reside justamente em se adequar o ponto de equilíbrio
entre o direito público e o direito privado, pois a responsabilidade civil nos contratos
bancários deverá ser investigada pelas bases do direito privado, sem perder de vista as bases
do direito público, sobretudo a magnitude da Constituição Federal e, especialmente, as
matizes que se podem extrair tanto do direito público, quanto do direito privado, para se
alcançar uma interpretação sistemática e teleológica do tema.
3.2. A questão da qualificação da responsabilidade civil contratual quanto à legislação
aplicável no plano internacional e nacional
Como discorrido até então, o Brasil é signatário de tratados internacionais que no
âmbito do Direito Internacional Privado (DIP) são absolutamente relevantes para pautar a
postura das instituições financeiras na celebração de contratos bancários, especialmente, por
conta de alguns deles serem internalizados em nosso ordenamento jurídico.
Contudo sustenta-se, pela aferição empírica e por dados obtidos na Febraban
119
, que
alguns tratados internacionais, ainda que não internalizados pela União por meio do
apropriado processo legislativo designado pela Constituição Federal, não se afastam de
aplicação e incidência sobre determinadas instituições financeiras, sobretudo para aquelas
grandes instituições nacionais e internacionais que têm em sua estruturação e organização
interna padrões de gestão e de administração baseados em governança corporativa e de
transparência e que se valem, pela própria feição institucional, de sistemas normativos
internacionais, para regular suas atividades internas.
119
Consultar sítio da Federação Nacional dos Bancos no Brasil (Febraban): <www.febraban.org.br>
113
A doutrina brasileira tem elogiado a postura do Conselho Monetário Nacional, do
Banco Central e, também, das instituições financeiras, no que diz respeito à implementação de
mecanismos de governança corporativa e da composição mista do Conselho de Recursos do
Sistema Financeiro Nacional (CRSFN), e aponta sugestões de aperfeiçoamento partindo do
conceito de que governança corporativa é o sistema pelo qual as sociedades são dirigidas e
monitoradas, envolvendo os relacionamentos entre acionistas/cotistas, conselho de
administração, diretoria, auditoria independente e conselho fiscal”.
120
Cita-se, por exemplo, a Declaração Universal dos Direitos Humanos assinada pelo
Estado brasileiro, em 10/12/1948; o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos,
aprovado pelo Decreto Legislativo n. 226, de 12/12/91, e promulgado pelo Decreto n. 592, de
06/07/92; e, também, a Convenção Americana sobre Direitos Humanos Pacto de São José
da Costa Rica, aprovado pelo Decreto Legislativo n. 27, de 26/05/92, e promulgada pelo
Decreto n. 678, de 06/11/92.
No âmbito dos contratos bancários e voltando a investigação à responsabilidade civil,
destaca-se o Comitê da Basiléia I e II, que estrutura procedimentos a serem observados pelas
instituições financeiras em relação à transparência e fiscalização interna e externa de suas
atividades, inclusive no plano de auditoria e controladoria de governança corporativa, a partir
de 1995 em diante, divulgando princípios básicos a serem seguidos pelas instituições
financeiras em todo o mundo.
Em contrapartida, algumas instituições financeiras que têm operado ações na Bolsa de
Valores de Nova Iorque nos Estados Unidos da América também têm se submetido à famosa
Lei Americana denominada SARBANES-OXLEY (SOX),
121
aprovada em 2002, e que tornou
120
SANTOS, Flávio Maia Fernandes dos. Governança corporativa e o conselho de recursos do sistema
financeiro nacional. In Revista de direito bancário e do mercado de capitais. Coordenação Arnoldo Wald. Ano
10, n. 337. São Paulo: RT, 2007, p. 48/49.
121
An Act to protect investors by improving the accuracy and reliability of corporate disclosures made pursuant
to the securities laws, and for other purposes. Be it enacted by the Senate and House of Representatives of the
United States of America in Congress assembled. Tradução livre: uma lei para proteger investidores de
114
mais rigorosos os assentos contábeis e controles operacionais das empresas de capital aberto
(como as instituições financeiras), em forte reação aos escândalos corporativos de grande
monta em companhias norte-americanas.
Embora criticada nos EUA, é irrefutável que a mencionada Lei Sarbanes-Oxley
restaurou a credibilidade sistêmica e produziu, em razão de grandes investimentos em
tecnologia de informação (TI), importantes ganhos de produtividade e de eficiência. Em
outros termos, a luta contra as fraudes transformou-se em algo de absoluta importância e,
especialmente, em uma conquista de toda a sociedade, que ansiava pela busca de melhores
procedimentos de compras e de controle de estoques, de aferição e verificação de
procedimentos, auditoria e controladoria das operações desenvolvidas pelas empresas de
capital aberto, bem como de rigorosas demonstrações contábeis, além de progressos na gestão
de riscos e na real transparência para os acionistas, dimensionamento das contingências no
que os administradores chamam de governança corporativa pautada pela responsabilidade
social da companhia de capital aberto, tal como ocorre com as instituições financeiras.
Vale a observação que decorre da doutrina dos administradores de empresas de que os
sólidos conceitos de governança corporativa e de tecnologia da informação, atrelados aos
rígidos controles da Lei Sarbanes-Oxley trouxeram para o mundo empresarial, especialmente,
para as instituições financeiras, conduzindo a uma maturidade administrativa que, por
conseqüência, leva a um modelo estável e seguro, muito importante no âmbito dos contratos
bancários e, por via reflexa, na aferição da responsabilidade civil, situação esta que é
desconhecida da maioria dos operadores do direito, mas que refletem mecanismos muito
prováveis imprudências e insustentáveis gestões corporativas com propósito de constituir leis de segurança e
outros propósitos e que foi promulgada pelo Senado e Câmara dos Deputados dos Estados Unidos da América
em assembléia.
115
estáveis, rígidos e seguros de gestão de processos no âmbito bancário, que deveriam ser
levados em conta na investigação do fenômeno responsabilidade civil.
122
A Comunidade Européia, também vislumbrando uma proteção mais eficaz nas
relações com instituições financeiras e administradoras de cartões de crédito, no final da
década de oitenta emitiu diretivas com o propósito de criar um “Código de Boa Conduta”,
concebido nas recomendações 87/598/CEE e 88/590/CEE.
123
No que tange à responsabilidade civil no plano dos contratos bancários, ao se
estabelecer uma análise no direito comparado, tomando-se por base o ordenamento jurídico
brasileiro, destacam-se alguns conceitos semelhantes vinculados à obrigação de indenizar
decorrente da responsabilidade civil. Nesse sentido valem as referências de Celso Marcelo de
Oliveira
124
:
(...) Registra-se semelhante disposição no Código Federal das Obrigações da Suíça
(art. 54), no Código da Alemanha - BGB (art. 829), no Código Franco-Italiano das
obrigações (art. 76), no Código Civil do México (art. 1911), no Código Civil do Peru
(art. 1140), no Código Civil da Venezuela (art. 1187), no Código de Portugal (art.
2377), no Código da China (Código Civil de 1930, art. 187), no Código das
Obrigações da Polônia (art. 134), no Código do Líbano (art. 122), no Código da
Espanha (art. 32), no Código da Áustria (art. 310) e no Código Civil Italiano de 1942
(art. 2047).
Ainda no direito comparado, para que se estabeleça um paralelo com o direito
brasileiro, vale a observação, também, com base nos registros de Celso Marcelo de Oliveira,
acerca da responsabilidade civil na relação bancária em alguns países.
Na França, o Código Civil regula a questão da responsabilidade nos artigos 1382 e
seguintes e, tal como ocorre no Brasil, os tribunais têm analisado o tema da responsabilidade
civil com base na regra geral do próprio Código, ante a ausência de norma própria que venha
estabelecer a responsabilidade da instituição financeira, ensejando aferição também no plano
122
LEITE, Guilherme de Freitas. Os impactos dos requisitos e controles impostos pela Lei Sarbanes-Oxley na
governança de tecnologia da informação (TI). In Revista de direito bancário e do mercado de capitais.
Coordenação Arnoldo Wald. Ano 10, n. 37. São Paulo: RT, 2007, p. 349/360.
123
MARTINS, Maria Fernanda R. M. Tavares. A proteção do consumidor titular de cartões de crédito. In
Revista de direito privado. Coordenação Nelson Nery Júnior e Rosa Maria A. Nery. Ano 6, n. 24, São Paulo: RT,
2005, p. 185/186.
124
OLIVEIRA, Celso Marcelo de. Manual de direito bancário. São Paulo: IOB Thonsom, 2006, p. 294-300.
116
do direito privado. Todavia, a doutrina e a jurisprudência francesa têm admitido a
responsabilização do banco na concessão de crédito, por causar prejuízo a terceiros, que
são credores do inadimplente.
É bem verdade que, pela leitura do artigo 421 e 422 do Código Civil brasileiro e
considerando que os contratos ensejam efeitos reflexos sobre terceiros, a aferição da
responsabilidade civil do banco por conceder empréstimo à pessoa sem capacidade financeira,
para cumprir a obrigação, acaba sendo plausível. Isso ocorre até mesmo por conta das
vedações impostas pelo Banco Central do Brasil na realização de operações financeiras que
não atendam aos princípios de seletividade, garantia, liquidez e diversificação de riscos e,
especialmente, nas operações com clientes que possuam restrições cadastrais ou sem ficha
cadastral atualizada ou com clientes emitentes de cheques sem fundo, bem como vedação para
concessão de crédito sem a constituição de título de crédito adequado que represente a dívida
(Resolução 3.258, de 28/01/05).
na Alemanha a responsabilidade civil dos bancos está condicionada aos requisitos
da caracterização dos pressupostos da responsabilidade civil, o que também ocorre no direito
brasileiro, à luz do que preceituam os artigos 927 e 944 do Código Civil de 2002. O BGB
alemão, no parágrafo 826, traz a regra geral que norteia a aferição da responsabilidade civil
também no plano do direito privado, mas com menor desenvoltura no que diz respeito à
responsabilização civil do banco na concessão de crédito, pois ela não decorreria de ato
ilícito. que não estaria caracterizada a prática de ilícito contratual. Em outras palavras, no
sistema alemão a responsabilização está mais atrelada à concepção de ilícito do que
propriamente de aferição e extensão dos efeitos dos contratos perante terceiros.
Comparando-se com o direito brasileiro, essa situação não guarda correspondência
exata, na medida em que se sustenta a investigação da responsabilidade pelo plano subjetivo
mediante a caracterização da culpa e do dano. Em contrapartida, quando ocorrer concessão de
117
crédito de forma a infringir as disposições regulamentares apontadas (Resolução 3.258/05 do
Banco Central), haverão de existir os efeitos contratuais perante terceiros, pela leitura dos
artigos 186, 421, 422, 927 e 944, do Código Civil. Diferentemente, quando a instituição
financeira age nos estritos termos regulamentares, por exemplo, ao não conceder crédito ou
praticar operação financeira com pessoa natural ou jurídica que desatenda as disposições
normativas, não poderá ser imputada ao banco qualquer responsabilidade, pois agiu nos
exatos termos do artigo 188, I, do Código Civil de 2002, ou seja, no exercício regular de um
direito reconhecido.
Além dessas implicaçoes, estará a instituição financeira resguardando a função social
do contrato, pois não colocará em risco a ordem sistêmica das atividades financeiras e das
atividades bancárias, evitando prejuízos à sociedade como um todo.
Prosseguindo-se com a investigação da localização do tema no direito comparado,
identifica-se que a responsabilidade civil do banco na Argentina está calcada no artigo 1.109
do Código Civil, atrelada à idéia de que a instituição financeira deverá agir com prudência,
impondo-se o dever de se informar e investigar para a correta concessão de crédito, ou seja,
para a prática de operações financeiras.
Ao situar o tema da responsabilidade civil decorrente de contratos bancários no plano
do direito privado, estar-se-á a afastar qualquer conotação ideológica que esteja associada às
percepções do direito público, até porque a concessão do crédito, a prática de atividades
bancárias e serviços bancários de uso do público em geral passam eminentemente por relações
negociais entre entes privados e na forma do direito privado, não se valendo, pois, das matizes
do direito público, que tem outra gica jurídica de funcionamento. Isso não significa, no
entanto, perderem-se de vista as bases do direito público, para se encontrar o ponto de
interpretação sistemática e teleológica da questão.
118
em Portugal, a concepção tem estrutura muito próxima à do direito brasileiro (CC,
art. 186 e 927) e do direito francês (CC, art. 1.382 e 1.383), pois o Código Civil Português
assegura no art. 483: aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de
outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a
indenizar o lesado pelos danos resultantes da violação.
Veja-se que as normas regulamentares das instituições financeiras são estruturadas
nos aspectos administrativo, civil e até criminal, pois o ilícito ocorrido no bojo de operações
bancárias ensejará a aferição da culpa ou dolo e a responsabilização com base na fattispecie
identificada, seja penal, administrativa e civil.
No direito português, tanto a doutrina quanto a jurisprudência têm identificado
deveres que são impostos às instituições financeiras como discrição e prudência na realização
das operações dos clientes, que seria o dever de não se intrometer nas contas dos clientes sem
autorização expressa dos mesmos. Essas concepções estão baseadas nas idéias de Almeno de
e Meneses Cordeiro, como anota Celso Marcelo de Oliveira ao analisar a responsabilidade
civil do banqueiro em Portugal, o que merece transcrição:
Podemos considerar deveres especiais do banqueiro, geradores de
responsabilidade: o dever de discrição relativamente ao cliente; o dever de prudência
nas operações que leva a efeito e o dever de segredo profissional a que nos
referimos. No dever de discrição, inclui-se a obrigação de a instituição bancária não
se intrometer nos negócios do cliente, ou seja, de não interferir nas contas deste sem
ordens expressas. O dever de prudência implica a obrigação de atuar como um bom
gestor, com diligência e com conhecimentos apropriados; a obrigação de se informar
de todas as circunstâncias que possam condicionar a atividade; a obrigação de
informar os clientes dos fatos conhecidos que possam ocasionar-lhe prejuízos e bem
assim de todos os aspectos relevantes relacionados com as operações que pratique.
Muito interessante é a questão de saber se as instituições de crédito são
responsáveis por prejuízos sofridos pelos clientes, em virtude de recusa de crédito,
quando estes dele tivessem a expectativa. Com as cautelas que o assunto exige,
entendemos que pode haver lugar a responsabilidade, desde que a instituição tenha
frustrado justa e bem fundada expectativa do cliente, sobretudo tratando-se do único
banqueiro. A frustração da confiança do cliente por parte do banqueiro deverá, no
mínimo, ser tratada como culpa in contrahendo. O relacionamento continuado entre
o banco e o cliente constitui, de fato, uma permanente predisposição contratual em
que a boa-fé e o dever de lealdade e de transparência devem estar presentes.
125
125
OLIVEIRA, Celso Marcelo de. Manual de direito bancário. São Paulo: IOB Thonsom, 2006, p. 299.
119
O fato de o contrato bancário firmado com cliente se operar na maioria das vezes na
forma de execução continuada e de trato sucessivo, haverá de existir uma confiança mútua
que se cria entre o banco e o cliente, o que pode autorizar eventual responsabilização civil da
instituição financeira ao não deixar de forma transparente e de boa-fé a negativa do crédito em
curso, pois o cliente pode contar com aquele recurso para viabilizar atividades pessoais (no
âmbito comercial, inclusive) e o cuidado que se deve ter na aferição da responsabilidade civil
do banco está adstrita na prática do ilícito contratual, na caracterização do dano e busca do
nexo de causalidade entre o ato praticado e o dano reclamado.
Por outro contexto, não se pode olvidar que a autonomia privada estará caracterizada
pela circunstância afeta à contratação a ser realizada entre as partes no plano dos contratos
bancários e a extinção da relação obrigacional também estará relacionada à autonomia privada
e isso não pode ensejar, automaticamente, a aferição de ato ilícito, de forma a autorizar
responsabilidade civil.
Enfim, o que se percebe quanto ao direito comparado em relação ao direito brasileiro
é que toda a evolução da responsabilidade civil está calcada nas matizes de direito privado em
que a própria inserção da culpa e extensão do dano fica muito evidente, pois o dever de
indenizar acaba somando duas vertentes, uma atrelada à recomposição da perda sofrida e a
outra baseada no caráter punitivo-pedagógico da condenação imposta. Todavia, sustenta-se
que esse caráter punitivo-pedagógico não pode ter muita relevância, porque a própria
atividade desenvolvida pelas instituições financeiras impõe um risco natural, na medida em
que as operações são complexas e altamente dinâmicas, por vezes, fugindo ao controle fático
da própria instituição, que se protege por todos os meios possíveis para evitar danos a
terceiros.
O núcleo da questão apontada reside justamente na aferição da responsabilidade civil
da instituição financeira quando decorrente da eficácia externa da obrigação contratual, ou
120
seja, os efeitos dos contratos podem ensejar a ocorrência de danos e é justamente a aferição
dessa responsabilidade que estará adstrita à culpa ou ao dolo, pela prática do ilícito contratual.
A legislação aplicável ante a análise perpetrada consiste justamente no plano do
direito privado nos países mencionados em comparação ao direito positivado brasileiro.
que se registrar, também, que o sistema normativo brasileiro enseja a análise da
responsabilidade civil nos contratos bancários pela percepção das disposições do Código
Civil, do Código de Defesa do Consumidor, além das leis de direito bancário e, também, dos
normativos (resoluções e circulares) do Banco Central.
Não se pode inferir que todo comportamento da instituição financeira no âmbito dos
contratos bancários poderá ensejar responsabilidade civil, mas apenas aqueles
comportamentos muito graves, que estão distantes dos parâmetros legais, poderão ensejá-la,
desde que comprovada a existência do dano, a teor do que preceitua o artigo 944 do Código
Civil brasileiro de 2002.
Para fundamentar essa conclusão, vale destaque da doutrina portuguesa, quando
estuda a evolução da responsabilidade civil do banqueiro na concessão de crédito para
terceiros com bases no direito privado e no Código Civil português, fazendo a tipificação da
fattispecie no artigo 483, primeira parte, ou especialmente no artigo 334, ambos do Código
Civil português. Ao comparar o sistema evolutivo dessa concepção com a legislação brasileira
e, em específico, com a doutrina e jurisprudência brasileira, constata-se aproximação
dogmática, na medida em que, nos dois casos, a responsabilidade civil decorrente de contrato
bancário deverá ser aferida no plano do direito privado e baseada na aferição da culpa e sua
gravidade, associadas à extensão do dano.
Para sustentar a referida ilação se apresentam as percepções conclusivas de Margarida
Maria Matos Correia Azevedo de Almeida, ao investigar a questão no direito europeu,
destacando:
121
A questão que entendemos como central gira em torno do problema de
descobrir em que medida a conduta do banqueiro pode ser considerada uma conduta
ilícita. Daí a maior relevância que demos à ilicitude relativamente aos demais
pressupostos da responsabilidade civil. (...) Contudo, nem todos os prejuízos sofridos
pela pessoa atingida nos seus interesses serão susceptíveis de dar origem a uma
obrigação de indenizar a cargo de quem os tenha provado. É necessário que o lesante
tenha procedido ilicitamente. Partimos da constatação de que a concessão de crédito
não poderá em geral ser tida como um comportamento ilícito. Trata-se, desde logo,
de uma conduta que traduz o exercício da liberdade contratual do banqueiro (art. 405
CC). Ora, este exercício comporta uma ampla margem de discricionariedade.
126
É fato que no direito brasileiro ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer algo
senão em virtude de lei, a teor do artigo 5.º, II, da Constituição Federal, e que, o livre
exercício de qualquer atividade econômica independentemente de autorização governamental,
exceto nas hipóteses legais (art. 170, parágrafo único, da Constituição Federal), enseja que os
bancos poderão trabalhar segundo sua autonomia privada (potestade), limitada pelo
ordenamento jurídico, inclusive na negativa da concessão do crédito, ou optar pela não
continuidade da relação contratual, por exemplo.
Acrescente-se que a liberdade contratual decorre também do artigo 421 do Código
Civil e vale para todos os participantes das relações negociais, ante o princípio da isonomia
previsto no artigo 5.º, caput, inciso I, da Constituição Federal. Assim, salvo nas hipóteses de
ofertas com caráter obrigatório, ninguém poderá ser compelido a contratar ou continuar o
contrato, pois estar-se-ia lesando a autonomia privada das partes.
No direito comparado pode-se anotar a solução portuguesa e brasileira em relação à
solução alemã e francesa, ao se aferir a responsabilidade civil, sendo que as duas últimas se
valem, respectivamente, da idéia de “dolo de lesão” e faute”. As ilações de Margarida Maria
Matos Correia de Azevedo se pautam nesse sentido:
O recurso ao art. 334 que, segundo cremos, permite o ressarcimento não
dos danos causados com fundamento num comportamento doloso, mas também
numa conduta gravemente negligente, permitirá uma solução mais flexível do que o
126
ALMEIDA, Margarida Maria Matos Correia Azevedo de. A responsabilidade civil do banqueiro perante os
credores da empresa financiada. Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra. Coimbra:
Coimbra Editora, 2003, p. 183-184.
122
sistema alemão, ao não exigir dolo de lesão, e, ao mesmo tempo, evitará a
indefinição da faute do Direito francês, em que pode haver lugar, com base no art.
1.382 do Código de Napoleão, a responsabilidade do banqueiro por simples culpa
leve.
127
A rigor, portanto, comparando-se o direito brasileiro com as demais estruturas
normativas no plano mundial, fica claro que a responsabilidade civil decorrente do contrato
bancário possibilita a caracterização do dolo e, especialmente, da culpa, que poderá se dar
pela não observância dos parâmetros comportamentais estabelecidos no ordenamento jurídico
e pela caracterização do ilícito, associada à exata aferição do dano, sua extensão e nexo de
causalidade entre o ilícito contratual e o dano reclamado e devidamente comprovado.
A relação obrigacional decorrente do contrato bancário está complementada quando
se amolda à idéia de débito (schuld, do direito alemão) e à concepção de responsabilidade
(haftung, do direito alemão), que fazem surgir o contraponto a propiciar a aferição da própria
responsabilidade civil no bojo do contrato bancário.
Um corte investigativo que merece destaque reside no fato de que relações negociais
efetivadas no âmbito das instituições financeiras podem constituir prática de um negócio
jurídico ilícito, tal como ocorre com a lavagem de dinheiro, ou seja, a transformação de ativos
de origem ilícita em ativos lícitos, valendo-se de operações financeiras.
Diversos países têm procurado desenvolver mecanismos para evitar que pagamento
em espécie de bens e serviços sejam efetivados com o propósito de realizar a lavagem de
dinheiro. No Brasil, o Sistema Financeiro Nacional tem hoje rigorosas determinações no
sentido de evitar que operações incomuns ou suspeitas sejam realizadas por meio de
operações financeiras e por bancos.
127
ALMEIDA, Margarida Maria Matos Correia Azevedo de. A responsabilidade civil do banqueiro perante os
credores da empresa financiada. Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra. Coimbra:
Coimbra Editora, 2003, p. 185.
123
3.3. A responsabilidade pré-contratual e pós-contratual nos contratos bancários e a
extensão da mesma aos participantes da relação contratual
A responsabilidade pré-contratual no plano dos contratos bancários parece não
adentrar especificamente na responsabilidade contratual, mas sim na responsabilidade
extracontratual ou aquiliana, exatamente pela não existência do contrato bancário. Ora, não se
deve olvidar que a análise do contrato bancário se pauta pelos planos de existência, validade e
eficácia, contudo, se não houve celebração do contrato, afasta-se a idéia de existência do
mesmo, pressuposto essencial para desencadear a aferição de responsabilidade contratual.
É necessário registrar a opinião de Maria Helena Diniz, no contexto da
responsabilidade pré-contratual, para desencadear aferição correta pela responsabilidade
aquiliana e não o desdobramento pelo cumprimento do contrato. Pela precisão e concisão
doutrinária, transcreve-se:
Todavia, é preciso deixar bem claro que, apesar de faltar obrigatoriedade aos
entendimentos preliminares, pode surgir, excepcionalmente, a responsabilidade civil
para os que deles participam, não no campo da culpa contratual, mas no da aquiliana.
Portanto, apenas na hipótese de um dos participantes criar no outro a expectativa de
que o negócio será celebrado, levando-o a despesas, a não contratar com terceiro ou
a alterar os planos de sua atividade imediata, e depois desistir, injustificada e
arbitrariamente, causando-lhe sérios prejuízos, terá, por isso, a obrigação de ressarcir
todos os danos. Na verdade, uma responsabilidade pré-contratual, que certa
relevância jurídica aos acordos preparatórios, fundada não no princípio de que os
interessados na celebração de um contrato deverão comportar-se de boa fé, prestando
informações claras e adequadas sobre as condições do negócio e os possíveis vícios;
aconselhando; guardando com zelo bens ou documentos cedidos para análise; não
divulgando fatos sigilosos, que se tornaram conhecidos em razão das tratativas etc.,
mas também nos artigos 186 e 927 do digo Civil, que dispõem que todo aquele
que, por ação ou omissão, culposa ou dolosa, causar prejuízo a outrem fica obrigado
a reparar o dano (RT, 104:106; RTJRS, 152:605, 154:378). Aplicam-se, portanto, as
normas que regem a culpa extracontratual, desde que haja, convém repetir, dolo,
negligência ou imprudência por parte do desistente, que autorizam o direito de exigir
a reparação do dano sofrido, porém nunca o de exigir o cumprimento do futuro
contrato, pois, se houve motivo justo, seu comportamento é lícito, já que a recusa de
contratar constitui exercício regular de direito.
128
128
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil: teoria das obrigações contratuais e extracontratuais. 23 ed.
revista e ampliada. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 43.
124
Para a estruturação da responsabilidade pré-contratual registra-se que sua evolução no
direito comparado se deu inicialmente no direito alemão pela denominada culpa in
contrahendo e, como foi sustentado, pela idéia de boa-fé objetiva, que permite a postura
idônea e reta dos contratantes, o que também enseja aplicação aos contratos bancários no
direito brasileiro, contudo, ressaltando o viés aquiliano, que advirá pela não existência da
contratação, hipótese em que haverá aferição da responsabilidade extracontratual, mesmo no
plano dos contratos bancários.
Sustenta-se, contudo, que, se tratar de hipótese de contrato bancário em curso
(operações financeiras ativas ou passivas como mútuo, financiamento, e também prestação de
serviços), de eventual renovação do contrato ou de hipótese de subcontratação ou coligação
de contratos, será possível aferir a responsabilidade contratual, pela modalidade contratual
que vige e que autoriza a celebração de subcontratos ligados ao contrato inicial ou contrato-
mãe, o que permeia a investigação da responsabilidade civil pelo plano contratual e não
extracontratual, pois uma relação jurídica preestabelecida entre as partes, considerando a
gênese e os elementos constitutivos da causa do negócio jurídico, no dizer de Emílio Betti.
129
Como exemplo, pode-se trabalhar com a hipótese de o cliente possuir contrato de
abertura de crédito em conta-corrente, na qual se prevê a possibilidade de contratação de uma
série de créditos e serviços desde autorizados, mas pendentes de contratação posterior,
conforme a vontade das partes (banco e cliente), como um crédito pessoal, financiamento de
veículos ou prestação de serviços de cobrança etc., todavia, sujeitos à avaliação momentânea
do crédito no ato da formalização da contratação. Ora, esses subcontratos ou contratos
coligados terão origem no contrato inicial, o que autoriza deduzir que, no caso de
responsabilidade civil decorrente de eventual não contratação dos mesmos, a investigação da
existência de dolo ou culpa, nexo de causalidade e dano será realizada no âmbito contratual e
129
BETTI, Emílio. Teoria geral do negócio jurídico. Tomo I. Tradução de Ricardo Rodrigues Gama. Campinas:
LZN, 2003, p. 247/259.
125
não extracontratual, pois já existe uma relação negocial entre as partes, situada na perspectiva
geral das operações financeiras e, também, da contratação de serviços, que pode, enfim, se
realizar em diversas modalidades, a teor da legislação vigente.
Como foi explanado no capítulo II, item 2.4., da dissertação, a Resolução n. 2.878,
de 26/07/01, no artigo 1.º, alterado pela Resolução n. 2.892, de 27/09/01, bem como a
Resolução n. 3.258, de 28/01/05, trazem parâmetros comportamentais às instituições
financeiras, na contratação de operações e na prestação de serviços ao blico em geral, não
obstantes as normas legais em vigor e aplicáveis ao sistema financeiro nacional, que podem
delinear a apuração da responsabilidade civil pré-contratual, todavia pautadas pela ótica da
culpa extracontratual, na medida em que não houve contrato bancário celebrado, mas apenas
discussões preliminares nas quais poderá ocorrer ato ilícito a ensejar responsabilidade civil.
Rogério Ferraz Donnini em fundamentada doutrina e jurisprudência trabalha a questão
da responsabilidade pré-contratual com base na boa-fé oriunda, preliminarmente, do direito
alemão a qual produziu efeitos também no direito italiano, que regula especificamente a
questão no artigo 1337 do Código Civil, também estruturado na boa-fé. Já na França a
evolução da responsabilidade pré-contratual está baseada inicialmente na perda de uma
chance e foi regulada expressamente pelos artigos 1134, 1135 e 1383 do Código Civil
francês; o direito positivado português abarca a responsabilidade pré-contratual com base no
artigo 227 do Código Civil português, que se traduz nos deveres de proteção, informação e
lealdade, que, se quebrados, ensejarão o afastamento da confiança e da culpa in contrahendo;
por fim, na Argentina ilação possível da responsabilidade pré-contratual com base no
artigo 1198 do Código Civil. Enfim, doutrina e jurisprudência versam sobre a questão da
responsabilidade pré-contratual com base nos dispositivos legais destacados, cujo teor no
âmbito do direito positivado brasileiro se verifica nos artigos 421 e 422 do Código Civil de
2002 e, também, em disposições do Código de Defesa do Consumidor, aos moldes dos artigos
126
4.º, III, 6.º, III, 8.º, 9.º, 18, 19, 20, 23, 30 e 35, frise-se, todos construídos a partir da boa-fé,
inicialmente desenvolvida no direito alemão irradiando efeitos também no direito positivado
brasileiro.
130
A oferta de crédito, disponibilização de produtos e serviços bancários, enfim, poderão
autorizar, se caracterizados os pressupostos - ato ilícito contratual (decorrente de contrato em
curso) ou extracontratual, culpa ou dolo, nexo de causalidade e dano -, a investigação e
aferição da responsabilidade civil pré-contratual no âmbito dos contratos bancários.
Quanto à responsabilidade pós-contratual é interessante registrar a questão pertinente
à responsabilização do banco em financiamentos e concessões de créditos, na medida em que
o contrato bancário idealizado faz irradiarem efeitos na sociedade em geral e cria
conseqüências que podem atingir até mesmo terceiros. Mas essa responsabilização não
decorre automaticamente, pois deverá ser investigada a existência de dolo e especialmente de
culpa da instituição financeira nos efeitos que o contrato celebrado pela mesma produziu e,
também, em relação ao cliente tomador do empréstimo, na medida em que fica vinculado aos
termos contratuais, não podendo dar outra destinação ao capital a não ser aquela identificada
no contrato, sob pena de responsabilização.
Destaca-se o que atualmente vêm realizando as instituições financeiras para
padronizar seus contratos e, especialmente, o chamado Project Finance, ou financiamento de
projeto para alcançar um processo de disseminação de práticas em matéria contratual.
José Virgílio Lopes Enei
131
registra que instituições financeiras multilaterais têm
promovido a padronização de normas de grande relevância para o direito privado e os
cuidados que devem-se perquirir em financiamento de projetos. Por exemplo, o Banco
Mundial, por intermédio do BIRD, que se pauta pelo financiamento ao setor público, e o IFC,
130
DONNINI, Rogério Ferraz. Responsabilidade pós-contratual no novo Código Civil e no CDC. São Paulo:
Saraiva, 2004, p. 46-64
131
ENEI, JoVirgílio Lopes. Project Finance. Financiamento com foco em empreendimentos. São Paulo:
Saraiva, 2007, p. 141-143.
127
que se pauta pelo financiamento do setor privado, vem editando uma série de padrões
contratuais e normas que devem ser respeitados obrigatoriamente para que o crédito de
financiamento seja autorizado, especialmente, nos padrões de licitação no âmbito público e
nos padrões de respeito às normas relativas ao meio ambiente, reduzindo o impacto ambiental
e garantindo obediência estrita ao grau de emissão de poluentes nas indústrias.
O referido autor anota, ainda, que algumas instituições financeiras vêm adotando os
chamados Princípios do Equador (Equator Principles), que vêm a ser diretrizes e requisitos a
serem observados pelas instituições financeiras no que diz respeito a matérias sociais e
ambientais em empreendimentos a serem financiados pelas mesmas. Tais requisitos estão
baseados nos padrões estabelecidos pelo Banco Mundial e pelo IFC, sendo que, como registra
José Virgílio Lopes Enei, diversas instituições brasileiras têm adotado esses padrões em seus
contratos.
A rigor, as partes celebrantes de um contrato bancário, sejam elas de qualquer
modalidade, deverão observar sempre a função social e a boa-fé previstas nos artigos 421 e
422 do Código Civil de 2002, como cláusulas gerais, o que implica, por exemplo, a
solicitação de estudo de impacto ambiental e responsabilidade social para outorga de
financiamento de projetos, a fim de que o contrato bancário não possa ser precursor de danos
à sociedade, seja pela postura adotada pela instituição financeira, seja pelo cliente tomador do
capital.
Daí decorrem algumas técnicas de controle interno e externo que José Virgílio Lopes
Enei
132
identifica como a inserção no bojo dos contratos bancários de cláusulas de obrigações
de fazer e não fazer (conhecidas como covenants no sistema da common law), tais como
proibições contratuais de dar outro destino aos valores mutuados a não ser aqueles previstos
no contrato, redução do risco do empreendimento com obediência às normas legais,
132
ENEI, JoVirgilio Lopes. Project Finance. Financiamento com foco em empreendimentos. São Paulo:
Saraiva, 2007, p. 224-234.
128
excludentes de responsabilidade civil em hipóteses concretas ou em casos fortuitos e de força
maior, escrituração contábil adequada, controle de procedimentos e informação de fatos
relevantes ocorridos no curso do contrato. O autor menciona, também, a inserção de
obrigações relacionadas à fiscalização e monitoramento pela instituição financeira,
planejamento do uso do crédito, uso responsável e social do crédito, riscos de mercado, saúde
financeira do tomador, outorga de garantias e condições suspensivas e conclusivas do contrato
bancário.
No âmbito do direito positivado brasileiro, os padrões de conduta e comportamentos
das instituições financeiras são estabelecidos nas resoluções do Banco Central e, também, nas
disposições do Código Civil, artigos 421 e 422, e nas disposições gerais do Código de Defesa
do Consumidor, art. 6.º, VI, o que se aplica aos clientes contratantes na mesma medida.
É importante desenvolver, com base na doutrina de Rogério Ferraz Donnini, a
evolução da responsabilidade pós-contratual no direito comparado, em que se destaca,
inicialmente, o direito alemão como precursor da culpa post pactum finitum, com base no
parágrafo 242 do BGB. Em Portugal a concepção da responsabilidade pós-contratual está
baseada na pós-eficácia das obrigações, nos moldes da previsão do art. 239 do Código Civil
português. A Espanha pouco desenvolveu o tema, todavia, pode-se inferir pelas disposições
também atreladas à boa-fé, previstas nos artigos 7.º, par. 1.º, e 1258 do Código Civil espanhol.
na Holanda, previsão expressa no Código Civil holandês, no artigo 248, em que se
obrigam as partes a respeitar o resultado do contrato, da lei, dos usos e da razão e equidade.
No Canadá, o Código Civil regula o que se chama de deveres acessórios ou anexos aos
contratos, como dispõem os artigos 1375 e 1434. Já na Argentina, com base também na boa-
fé, tem-se a proteção dos efeitos do contrato, segundo o artigo 1198 e o artigo 37 do que vem
a corresponder ao Código de Defesa do Consumidor. Por fim, na Itália e na França, a
concepção de boa-fé é útil para se alcançarem idéias pertinentes à responsabilidade pós-
129
contratual, respectivamente, art. 1337 e 1175 do Código Civil italiano, e 1134 do Código
Civil francês, todos, frise-se, baseados na boa-fé.
133
Além das disposições normativas identificadas no item 3.2. deste capítulo,
desconhece-se legislação que tipifique e regule, especificamente, a responsabilidade civil pré-
contratual e pós-contratual no plano dos contratos bancários, até porque na maioria dos países,
tal como ocorre no Brasil, a investigação da culpa in contrahendo e a da culpa post pactum
finitum se devem, notadamente, às disposições atinentes à boa-fé, lealdade, dever de
informação, cláusulas gerais que, no direito positivado brasileiro, decorrem dos artigos 421 e
422 do Código Civil, e do artigo 6.º, VI, do CDC, além das regras gerais da responsabilidade
civil estatuídas nos artigos 186, 187, 188, 927 e 944 do Código Civil.
Há de se registrar, ainda, o que na doutrina estrangeira se desenvolveu como teoria da
base objetiva do negócio (Geschafsgrundlage), na medida em que, não obstante a análise do
pressuposto subjetivo, também deve ser observada a base objetiva do negócio jurídico para a
manutenção das condições gerais no decorrer do contrato, semelhantes às que ocorreram por
ocasião da conclusão do negócio, o que vem a ser o pressuposto objetivo da vontade
exteriorizada pelas partes, saibam elas ou não.
Por conseguinte, tomando-se por base a opinião de Luiz Gastão Paes de Barros Leães,
fundamentada na doutrina de Karl Larenz, defende-se que na celebração do contrato são
levadas em conta algumas condições básicas e de âmbito geral, como o poder aquisitivo da
moeda, as circunstâncias gerais de mercado e a ordem econômica do país. Se alguns eventos
fizerem desaparecer referidas condições básicas e impuserem ao devedor um esforço
excessivo, bem superior àquele previsto por ocasião da contratação, isso autorizaria a revisão
133
DONNINI, Rogério Ferraz. Responsabilidade pós-contratual no novo Código Civil e no CDC. São Paulo:
Saraiva, 2004, p. 130-140.
130
ou a resolução do negócio e isso poderia ocorrer na hipótese de destruição da relação de
equivalência ou frustração do objetivo do contrato.
134
que se distinguir, contudo, que na fase anterior à celebração do contrato bancário
(culpa in contrahendo) a responsabilidade será extracontratual, pelo fato de o contrato não
existir e, portanto, não haver validade e, especialmente, eficácia. Faz-se exceção a hipóteses
de contratos coligados que decorrem de um primeiro contrato ou de novação, pois nestes
casos haverá responsabilidade contratual.
No que diz respeito à fase posterior ao contrato bancário (culpa post pactum finitum),
a investigação da responsabilidade civil será contratual desde que comprovados o
descumprimento de deveres contratuais e a caracterização dos pressupostos gerais da
responsabilidade civil, que será sempre subjetiva, pois haverá de se perquirir a existência de
dolo ou culpa das partes, o nexo de causalidade e a extensão do dano.
A doutrina tem identificado também um parâmetro de aferição de responsabilidade
civil pelo plano contratual e subjetivo mediante investigação da culpa no que diz respeito aos
momentos de formação e extinção do contrato. Citam-se como exemplos doutrinários as
lições de Wanderley Fernandes e Ruy Rosado de Aguiar Júnior.
135
Há, ainda, na doutrina quem sustente a questão relativa ao adimplemento substancial
do contrato, especialmente baseado na boa-fé e tendo em vista, também, a noção de relação
jurídica obrigacional complexa, que pode ser invocada a todo e qualquer tipo de
inadimplemento, seja quando ocorrer sobre a prestação principal, seja quando incidir sobre
134
LEÃES, Luiz Gastão Paes de Barros. A onerosidade excessiva no Código Civil. In Revista de direito
bancário e do mercado de capitais. Coordenação Arnoldo Wald. Ano 09. n. 31. São Paulo: RT, jan-mar de 2006,
p. 15-16.
135
FERNANDES, Wanderley. O processo de formação do contrato. In: Fundamentos e princípios dos contratos
empresariais. Coordenação de Wanderley Fernandes. São Paulo: Saraiva, FGV, 2007, p. 257/259 e AGUIAR
JÚNIOR, Ruy Rosado de. Extinção dos contratos. In: Fundamentos e princípios dos contratos empresariais.
Coordenação de Wanderley Fernandes. São Paulo: Saraiva, FGV, 2007, p. 417/457.
131
deveres acessórios ou deveres laterais de conduta das partes. Essa é a opinião de Eduardo
Luiz Bussata.
136
Por final, investigam-se dois julgados que demonstram que a extensão da
responsabilidade civil, no que diz respeito aos terceiros não integrantes diretamente da relação
negocial, deve ser vista com precaução e não inferem, automaticamente, o reconhecimento de
responsabilidade civil por parte da instituição financeira no que concerne a terceiros, nem
tampouco ao correntista e, também, aos dados que podem ser fornecidos pela instituição
financeira sem caracterizar quebra do sigilo bancário. Vejam-se os julgados:
Ementa: Ação de indenização. Dano moral. Informações cadastrais para
financiamento. Cerceamento de defesa. 1. Não cerceamento de defesa quando o
fato a que se refere a inicial para justificar o pedido está incontroverso nos autos,
sequer merecendo do autor refutação, ou seja, a realidade das informações
cadastrais, ficando sua argumentação apenas em torno da vedação de que tais
informações sejam fornecidas sob pena de violação do sigilo bancário. Não
contestada a veracidade das informações, não há falar em cerceamento de defesa. A
prestação de informações cadastrais para efeito de financiamento não malfere
qualquer dispositivo de lei federal, cabível o pedido de dano moral se equivocadas.
(STJ, REsp 689.581-AL 3.ª T. v.u., rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito,
DJU 14.05.07).
Ementa: Apelação cível. Ação de indenização. Responsabilidade civil de banco.
Invocação de lançamento a deito em conta corrente por terceiro, negando a
utilização do serviço via Internet, pretendendo tutela antecipada para imediata
restituição dos valores e indenização por danos morais. Improcedência do pedido.
Contrato de abertura de conta corrente. Lançamento a débito por operações
financeiras on line, via Internet, para pagamento de produtos e serviços. Fato de
terceiro. Fortuito interno que não afasta o dever de indenizar. Súmula 94 deste
Egrégio Tribunal. Mero Aborrecimento. Danos morais não caracterizados.
Sucumbência recíproca que impõe o rateio das custas e a compensação de
honorários advocatícios, suspensa a execução em relação à apelante, ex vi do
disposto no art. 12 da Lei 1.060/50. Provimento parcial do recurso para julgar
procedente em parte o pedido, condenando o réu a restituir a importância de R$
1.288,73, acrescida de correção monetária e juros legais de 1% ao mês a contar da
citação. (TJRJ, Ap. Cív. 54.883/06, 10.ª Câm., rel. Des. Gilberto Dutra Moreira, j.
27.10.06).
136
BUSSATA, Eduardo Luiz. Resolução dos contratos e teoria do adimplemento substancial. São Paulo:
Saraiva, 2007, p. 128/129.
132
3.4. Linhas gerais da responsabilidade civil nos contratos bancários
Quando a responsabilidade civil decorre do contrato bancário, a premissa
metodológica definida está atrelada à concepção de responsabilidade contratual que pode
decorrer do descumprimento de uma cláusula contratual ajustada, não na contratação de
operação ativa ou passiva entre a instituição financeira e o cliente, mas também na
contratação de serviços bancários com o cliente e, por último, na prestação de serviços
bancários ao público em geral, ou seja, o atendimento de não clientes.
A investigação realizada apontou para a ocorrência de responsabilidade subjetiva, pois
haverá de se perquirir a ocorrência de dolo ou culpa, nexo de causalidade entre o ato
originado no contrato e a comprovação da extensão dos danos materiais ou morais e a própria
caracterização do ilícito contratual ou do ato ilícito decorrente do contrato bancário.
Em outras linhas, o próprio negócio jurídico poderá ser tido por negócio ilícito a
ensejar a responsabilidade civil, todavia o contrato bancário também poderá ser lícito e o ato
originado dele caracterizar um ato ilícito. Exemplifica-se: por um lado, em um contrato
bancário fraudulento, firmado com documentos falsos, ter-se-á um negócio jurídico ilícito que
pode produzir efeitos danosos a possibilitar responsabilidade civil; por outro lado, em um
contrato bancário lícito, poderá ocorrer a inclusão do nome do correntista em órgãos de
proteção ao crédito indevidamente, em conseqüência do que se terá um ato ilícito originado
no contrato bancário e mesmo assim a responsabilidade será contratual.
Por vezes, a doutrina
137
confunde a responsabilidade objetiva quando originada em
contrato, com base no que dispõe o artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor, todavia
esse mesmo código trata de responsabilidade pelo risco do serviço prestado. Nesse sentido,
pergunta-se: no contrato bancário que tem por objeto uma operação financeira ativa ou
137
OLIVEIRA, Celso Marcelo de. Manual de direito bancário. São Paulo: IOB Thonsom, 2006, p. 314.
133
passiva, qual serviço é prestado? Nenhum, pois a entrega de dinheiro é contrato de mútuo, de
empréstimo, de financiamento, e não contrato de prestação de serviços, o que se mostra óbvio.
Aliás, nesse mesmo contexto, não haveria de se falar nem em vício ou defeito no serviço
prestado, pois além de não se tratar de prestação de serviços, o dinheiro foi entregue e
disponibilizado ao correntista, estando em sua esfera de vigilância.
Nos serviços bancários, tanto aos clientes quanto aos não clientes, a instituição
financeira responderá pelos eventuais prejuízos que advierem da sua atividade (art. 927,
parágrafo único, do CC, e art. 14 do CDC), mas a investigação da culpa ainda será necessária,
pois poderá haver culpa concorrente ou exclusiva do cliente ou do usuário do serviço
bancário
138
ou provar o banco estar agindo no exercício regular de um direito (art. 188, I, do
CC), novamente, ensejando a aplicação da regra dirigida ao Juiz quanto à distribuição do ônus
da prova (artigos 333 e 334 do CPC).
Nessas situações, por tratar-se de ônus da prova (artigos 333 e 334 do CPC), cabe
tanto ao cliente como ao usuário comprovar que houve descumprimento de disposição
contratual a ensejar a responsabilidade civil da instituição financeira, valendo o mesmo
raciocínio para a instituição financeira, sendo que a inversão do ônus da prova é uma
mecânica que poderá ser desenvolvida pelo magistrado ao perquirir a culpa no caso concreto.
Exemplifica-se referida situação quando ocorre uso indevido de cartão bancário por terceiro
que não seja o titular, na qual se destaca que não vício ou defeito do serviço prestado pela
instituição financeira, na medida em que o cartão é entregue ao correntista e passa a integrar
sua esfera de vigilância e nesse contexto que a regra do ônus da prova, dirigida ao juiz, deve
ser trabalhada no caso concreto.
Atualmente, as instituições financeiras têm desenvolvido mecanismos para promover
alta fiscalização interna das atividades bancárias, traduzida pela chamada “governança
138
Basta verificar o teor da Súmula 28 do Supremo Tribunal Federal: O estabelecimento bancário é responsável
pelo pagamento de cheque falso, ressalvadas as hipóteses de culpa exclusiva ou concorrente do correntista.
134
corporativa e instituído mecanismos de compliance” desenvolvidos no Brasil pela área
consultiva da FEBRABAN, devido às dificuldades para o entendimento das diferenças entre
as áreas de controle que atuam para a eficácia da governança corporativa, bem como devido à
falta de regulamentação no mercado financeiro nacional sobre o assunto. Quanto a esses
últimos mecanismos instituídos, em decorrência dessas dificuldades, entendeu-se por bem
criar a Comissão de Auditoria Interna e Compliance da FEBRABAN e o Comitê de
Compliance da ABBI (Associação Brasileira de Bancos de Investimento).
Se não bastassem as inúmeras regras às quais as instituições financeiras estão
submetidas, elas ainda conceberam outros instrumentos com conteúdo dispositivo ainda maior
que as disposições emanadas da Resolução 2554/98 do Conselho Monetário Nacional, que
adotou os princípios estatuídos no Comitê da Basiléia, que teve por escopo fazer implementar
nas instituições financeiras sistemas de controles internos, além de regras prudenciais na
realização de operações financeiras e prestação de serviços bancários, no plano das atividades
bancárias. A Resolução 3056/02 do Conselho Monetário Nacional, ao alterar a Resolução
2554/98, também do CMN, veio implementar sistemas de auditoria sobre os controles
internos, evidenciando, com isso, a preocupação das próprias instituições financeiras com a
transparência de suas atividades, especialmente, pelos escândalos ocorridos com a quebra de
companhias americanas por graves falhas contábeis, como a Worldcom e a Enron, em 2001.
Em 2003, portanto, as instituições financeiras que operavam no Brasil passaram a ter
novas disposições, considerando as atividades bancárias, e que são relevantes para se
determinar a culpabilidade e a responsabilidade civil nos contratos bancários.
Publicou-se, com efeito, a Resolução 3198/03 do Conselho Monetário Nacional, que
regula a atividade de auditoria independente e, também, a instituição de comitê de auditoria
interna nos bancos, com funções semelhantes àquelas previstas pela lei americana Sarbanes-
Oxley, mencionada. É de se destacar, também, a Carta-Circular 3098/03 do Banco Central,
135
que dispõe sobre a necessidade de registro e comunicação ao Banco Central do Brasil de
operações financeiras em espécie de depósito, provisionamento e saques a partir de cem mil
reais, afinando-se com o Comitê de Supervisão Bancária da Basiléia, que estatuiu práticas
recomendáveis para gestão e supervisão de riscos operacionais.
Toda essa estruturação, segundo informações do documento consultivo de função de
compliance da ABBI e da FEBRABAN na versão de 2004, disponível no próprio sítio da
entidade na Internet, constitui os pilares básicos da governança corporativa e gestão de
compliance, cuja expressão tem origem no verbo to comply”, ou seja, cumprir, fazer
cumprir, executar, e que são relevantes para determinar um padrão de conduta e
comportamento das instituições financeiras, registrando que a responsabilidade civil no
contrato bancário realmente passa a ter uma aferição voltada para a investigação da culpa, ou
seja, pelo plano subjetivo.
Vejam-se, pois, os principais aspectos desenvolvidos no Brasil para evitar
responsabilidade civil pelas instituições financeiras no sentido de compliance e governança
corporativa
139
:
. Leis – certificar-se da aderência e do cumprimento;
. Princípios Éticos e de Normas de Conduta - assegurar-se da existência e
observância;
. Regulamentos e Normas - assegurar-se da implementação, aderência e
atualização;
. Procedimentos e Controles Internos - assegurar-se da existência de
Procedimentos associados aos Processos;
. Sistema de Informações - assegurar-se da implementação e funcionalidade;
. Planos de Contingência - assegurar-se da implementação e efetividade por
meio de acompanhamento de testes periódicos;
. Segregação de Funções - assegurar-se da adequada implementação da
Segregação de Funções nas atividades da Instituição, a fim de evitar o conflito de
interesses;
. Prevenção à Lavagem de Dinheiro - fomentar a cultura de Prevenção à
Lavagem de Dinheiro, através de treinamentos específicos;
139
FEBRABAN e ABBI. Documento Consultivo. Função de Compliance do Grupo de Trabalho da ABBI,
versão 2004, p. 08-09, consultado em <www.febraban.org.br>, acessado em 29/06/07.
136
. Cultura de Controles - fomentar a cultura de Controles em conjunto com os
demais pilares do Sistema de Controles Internos na busca incessante da sua
conformidade;
. Relatório do Sistema de Controles Internos (Gestão de Compliance)
Avaliação dos Riscos e dos Controles Internos elaborar ou certificar-se da
elaboração do referido relatório com base nas informações obtidas junto às diversas
áreas da instituição, visando apresentar a situação qualitativa do Sistema de
Controles Internos em atendimento à Resolução n.º 2554/98;
. Participar ativamente do desenvolvimento de políticas internas, que
previnam problemas futuros de não conformidade e a regulamentação aplicável a
cada negócio.
. Relações com Órgãos Reguladores e Fiscalizadores Assegurar-se de que
todos os itens requeridos pelos reguladores sejam prontamente atendidos pelas várias
áreas da Instituição Financeira assertivamente e com representatividade e
fidedignidade;
. Relações com Auditores Externos e Internos:
. Assegurar-se que todos os itens de auditoria relacionados a não
conformidade com as leis, regulamentações e políticas da Instituição Financeira
sejam prontamente atendidos e corrigidos pelas várias áreas da Instituição
Financeira;
. Manter a sinergia entre as áreas de Auditoria Interna, Auditores
Externos e Compliance;
. Relações com Associações de Classe e importantes participantes do mercado
para promover a profissionalização da função e auxiliar na criação de mecanismos
renovados de revisão de regras de mercado, legislação e regulamentação pertinentes,
em linha com as necessidades dos negócios, visando a integridade e credibilidade do
sistema financeiro.
É sabido e consabido que a função social e a boa-fé no âmbito do contrato bancário
ensejam que tanto as instituições financeiras façam valer essas concepções de ordem
administrativa e operacional, mas que têm relevantes impactos na área da responsabilidade
civil, registrando um viés interdisciplinar na gestão do problema da responsabilidade civil
decorrente de contrato bancário.
Outro contexto relevante diz respeito à gestão contratual e negocial adequada das
relações travadas no âmbito dos negócios bancários para evitar a ocorrência de onerosidade
excessiva ou até mesmo a revisão judicial dos contratos bancários, seja pela leitura do Código
Civil, seja pelo Código de Defesa do Consumidor. Referida argumentação procede das
137
conclusões a que chegou Paulo Roque Khouri, baseado nos princípios da autonomia privada,
da obrigatoriedade, segurança jurídica, boa-fé e equilíbrio contratual.
140
A administração de contingenciamentos que possam surgir em razão de gestão e
problemas decorrentes de não conformidade com os procedimentos desenvolvidos pelos
bancos pode ensejar desdobramentos e reflexos nas operações financeiras ativas ou passivas
realizadas pelas instituições financeiras, bem como na prestação de serviços aos clientes e
usuários do sistema bancário em geral. Daí pode decorrer a responsabilidade civil.
Ainda no contexto da responsabilidade civil é interessante buscar no direito
comparado, sobretudo na doutrina, a evolução e as tendências pelas quais vem passando a
concepção de responsabilidade civil e seus princípios gerais. Na doutrina portuguesa, pode-se
destacar a opinião de Antônio Pinto Monteiro
141
, que concebe três idéias acerca da
responsabilidade, estabelecendo que ela pode ser “moral”, “política” ou “jurídica”, sendo que
esta última está atrelada à responsabilidade civil. Com a evolução da concepção de
responsabilidade civil veio a doutrina do laissez-faire, segundo a qual seria mais vantajoso
para uma economia de expansão afetar a segurança das pessoas, em prol dos interesses das
corporações que arcariam com os danos decorrentes de suas atividades e o desenvolvimento
industrial faz aumentar significativamente os eventos danosos, o que faz surgir efetivamente a
responsabilidade civil pelo risco da atividade.
Todavia a responsabilidade civil passou a atrelar-se de forma definitiva à concepção
de reparação de danos, pressupondo a existência de prejuízos, visando alcançar efetivo e real
ressarcimento, que pode ser in natura ou pelo equivalente em dinheiro, inclusive no caso de
danos morais. Assim, a doutrina portuguesa de Antônio Pinto Monteiro tem estabelecido a
necessidade de prova da existência de danos para que haja a obrigação de indenizar, além dos
140
KHOURI, Paulo R. Roque. A revisão judicial dos contratos no novo Código Civil, Código do Consumidor e
Lei 8.666/93. A onerosidade excessiva superveniente. São Paulo: Atlas, 2006, p. 135/147.
141
MONTEIRO, Antônio Pinto. Princípios gerais da responsabilidade civil. In Revista da Escola Nacional da
Magistratura da Associação dos Magistrados Brasileiros. Brasília: abril de 2007, Ano II, n. 3, p. 106-112.
138
demais pressupostos da responsabilidade civil, afastando das concepções de common law
relativas ao punitive damage. O direito positivado brasileiro não albergou essa concepção
unitária de punição, mas mesclou a idéia de ser “preventivo-sancionatória” e “ético-
jurídica”, observando que culpa e risco não são comportamentos contrapostos, mas
complementares. A idéia de responsabilidade contratual e extracontratual faz surgir um
concurso de responsabilidade por vezes, pois um fato pode ter desdobramento nas duas
modalidades. Contudo como acentua Antônio Pinto Monteiro, a posição dominante na
doutrina e jurisprudência portuguesa, assim como no direito comparado, é a de que a
responsabilidade contratual deverá prevalecer por conta da abrangência que advirá da
absorção do critério do neminem laedere pelo contrato existente entre as partes.
Do direito comparado podem-se citar exemplos bem-sucedidos de efetivação de
normas jurídicas que têm a finalidade de estabelecer maior segurança, transparência e
requisitos normativos rigorosos para efetiva realização de negócios jurídicos comerciais. Cita-
se como exemplo, embora relacionada ao campo do direito societário, mas com forte
implicação econômica e financeira, a modificação introduzida no Código Civil italiano, no
artigo 2.051-bis, alterado por força do Decreto-leg 6, de 17.01.2003, que mudou toda a seção
5, título 5, livro 5 do Código Civil italiano, que trata da chamada leverage buyout” ou
“aquisição alavancada”, que na opinião de Bárbara Makant fez introduzir mecanismos e
procedimentos para tornar operações de fusão e incorporação de empresas mais transparentes,
com rigorosos protocolos de fases para realização do negócio jurídico, comprovação da
origem e destinação dos recursos financeiros e justificativa da operação sob os aspectos
econômicos e financeiros.
142
142
MAKANT, rbara. Breves anotações sobre as operações de leveraged buyout no direito comparado. In
Revista de direito bancário e do mercado de capitais. Coordenação Arnoldo Wald. Ano 09. n. 31. São Paulo: RT,
jan-mar de 2006, p. 105-106. Segue transcrição do caput do artigo 2.051-bis do Código Civil italiano: 2.051-bis
(Fusione a seguito di acquisizione com indebitamento). – Nel caso di fusione tra societa`, uma dele quali abbia
contratto debiti per acquisire il controllo dell´altra, quando pe effetto della fusione il patrimônio di quest´ultima
viene a costituire garanzia genérica o fonte di rimborso di detti debiti, si applica la disciplina Del presente
139
São possibilidades normativas que visam alcançar maior segurança e transparência na
realização de negócios jurídicos comerciais para a sociedade e que ensejam até mesmo,
atração de investidores e maior crescimento econômico para o país, pois os referenciais de
boa-fé objetiva ficam padronizados e referenciados pelo próprio legislador, como regra de
conduta a delinear o comportamento das partes.
Na verdade, a doutrina vem sustentando a necessidade de um rigorismo maior na
aferição da responsabilidade civil perante as instituições financeiras. Citam-se as conclusões
de Jairo Saddi e Rodrigo Botani
143
:
7. Conclusão. Primeiro, é indispensável ao consumidor, antes de
movimentar a máquina judiciária, analisar as circunstâncias jurídicas e fáticas de
sua suposta violação moral; meros aborrecimentos o estão vinculados ao
invólucro do dano patrimonial. Em segundo lugar, o Poder Judiciário, e suas
instituições, no momento da análise do fato danoso, deverá ampará-lo conforme o
princípio da primazia da realidade, e não mais sob o texto frio da lei, já que a
sociedade atual ostenta valores invertidos; hoje, a antiga tristeza danosa se
transformou na felicidade de enriquecer. Em terceiro lugar, a hipossuficiência do
consumidor não significa que esteja dispensado de informar a instituição financeira
de supostos casos infortuitos, ao contrário, em toda relação de consumo, ambas as
partes obedecem ao princípio da boa-fé objetiva, principalmente nos casos de
fraude. Por fim, na hipótese de fraude ao sistema financeiro, a responsabilidade
objetiva das instituições financeiras, também vítimas, se completará, no caso de
ausência de culpa exclusiva ou concorrente do consumidor, pois o valor contratado
para as operações financeiras, na maioria dos casos, não abrange a análise pericial
profunda feita por profissionais gabaritados.
3.5. A cláusula de não indenizar, as excludentes de responsabilidade, cláusulas abusivas
e questões casuísticas
A responsabilidade civil também não fica alheia à autonomia privada das partes.
Podem as partes ajustar hipóteses que autorizam o afastamento da reparação do dano, ou seja,
articolo. Tradução livre: fusão seguida de aquisição alavancada. No caso de fusão com outra sociedade, na qual
uma delas adquire com contrato de débito para a aquisição por efeito da fusão, o patrimônio da última vem a
constituir a garantia genérica e fonte de reembolso do débito, é aplicada a disciplina do presente artigo.
143
SADDI, Jairo e BOTANI, Rodrigo. Dano moral e as instituições financeiras. In: Revista de direito bancário
e do mercado de capitais. Coordenação Arnoldo Wald. Ano 10, n. 38. São Paulo: RT, 2007, p. 343.
140
o que se afasta não é a responsabilidade ou o dever de indenizar, como doutrina Sérgio
Cavalieri Filho.
144
A doutrina é assente em identificar que a culpa exclusiva da vítima, a culpa
concorrente das partes, a culpa por fato de terceiro, o caso fortuito e a força maior são
hipóteses excludentes da responsabilidade civil, o que autoriza o não reconhecimento do
dever de indenizar. Essas situações podem ocorrer nos contratos celebrados entre o banco e o
cliente, que tenham por objeto operação financeira ativa ou passiva e, também, qualquer tipo
de serviço bancário, salvo nos casos de cofre bancário, pois o objeto do contrato ficaria
prejudicado.
a cláusula exoneratória da responsabilidade dos bancos também pode ser aferida
nas hipóteses de pagamento de cheques falsos e, especialmente, na contra-ordem ou oposições
(sustações) de cheques. Estabelecem-se restrições à cláusula exoneratória de responsabilidade
quando a mesma infringe a ordem pública e os bons costumes, afasta o dolo no plano dos
contratos bancários, a caracterização de culpa do banco em contratos de adesão, por pressupor
aceitação.
145
A caracterização de cláusulas abusivas no âmbito dos contratos bancários, as quais
podem autorizar a ocorrência de responsabilidade civil, sujeita-se àquelas disposições que
venham inicialmente ferir a ordem pública e os bons costumes. Entretanto, para estabelecer
parâmetros objetivos de cláusulas abusivas, podem-se identificar as disposições dos artigos
51, 52 e 53 da Lei 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor), que regula situações de
abusividade na prática de relações negociais, dentre elas os serviços bancários, e, no plano das
operações financeiras praticadas pelos bancos no pólo ativo ou passivo, podem-se invocar as
disposições das Resoluções 2.878/01 e 2.892/01, que regulam os procedimentos a serem
adotados pelos bancos na contratação de operações e na prestação de serviços aos clientes e
144
FILHO, Sérgio Cavalieri. Programa de responsabilidade civil. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2007, p. 497-499.
145
OLIVEIRA, Celso Marcelo de. Manual de direito bancário. São Paulo: IOB Thonsom, 2006, p. 310-311.
141
ao público em geral, bem como as vedações contidas na Resolução 3.258/05, todas
analisadas no capítulo II da dissertação.
Pode-se sustentar, também, que toda disposição contratual que venha a lesar a boa-fé,
a probidade, a lealdade, o dever de informar e a função social dos contratos bancários pode se
enquadrar em ilegalidade e, por sua vez, em abusividade, a teor dos artigos 421, 422 e 2.035,
parágrafo único, do Código Civil brasileiro.
Fundamentando-se essa conclusão, pode-se citar a doutrina de Maria Helena Diniz
146
:
O art. 2.035, parágrafo único (norma especial), retrata, expressamente, a
incidível vinculação da convenção de execução, feita pelos contratantes, a princípios
jurídico-constitucionais, fazendo interligação entre a antiga e a nova situação
jurídica. Os contratantes deverão sujeitar sua vontade às normas de ordem pública,
que fincam, para atender aos interesses da coletividade, as bases jurídicas
fundamentais que dão suporte à ordem econômica da sociedade, como a função
social da propriedade e do contrato. A ordem pública é um limite à manifestação da
vontade e às convenções particulares. (...)O princípio da função social da
propriedade está consagrado expressamente em norma constitucional, e o da função
social foi explicitamente positivado, pois muito tempo existe, implicitamente,
no ordenamento jurídico, p. ex., no art. 5º, da LICC, na proibição de cláusulas
abusivas pelo CDC, no princípio da equivalência contratual que, pela teoria da
imprevisão (ora recepcionada pelos arts. 317, 478 e 479 do novo CC), permite a
revisão judicial do contrato por onerosidade excessiva, provocada por fato
imprevisível ou extraordinário, na atividade equitativa do juiz, procurando a
equivalência contratual.
Por sua vez, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça no Brasil também
enfrentou questões atinentes à legalidade de cláusulas inseridas em contratos bancários,
reconhecendo a aplicação do Código de Defesa do Consumidor e a legalidade no desconto de
quantias diretamente na conta do correntista, por não ser potestativa e baseada no princípio da
autonomia privada:
"DIREITO DO CONSUMIDOR. APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO
CONSUMIDOR. PRECEDENTES. CLÁUSULA ABUSIVA. ART. 51, IV, CDC.
NÃO-CARACTERIZAÇÃO. RECURSO DESACOLHIDO.
I - Na linha da jurisprudência desta Corte, aplicam-se às instituições financeiras as
disposições do Código de Defesa do Consumidor.
146
DINIZ, Maria Helena. Código Civil anotado. 12 ed. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 1633.
142
II - Não é abusiva a cláusula inserida no contrato de empréstimo bancário que versa
autorização para o banco debitar da conta-corrente ou resgatar de aplicação em nome
do contratante ou coobrigado valor suficiente para quitar o saldo devedor, seja por
não ofender o princípio da autonomia da vontade, que norteia a liberdade de contratar,
seja por não atingir o equilíbrio contratual ou a boa-fé, uma vez que a cláusula se
traduz em mero expediente para facilitar a satisfação do crédito, seja, ainda, por não
revelar ônus para o consumidor.
III - Segundo o magistério de Caio Mário, "dizem-se [...] potestativas, quando a
eventualidade decorre da vontade humana, que tem a faculdade de orientar-se em um
ou outro sentido; a maior ou menor participação da vontade obriga distinguir a
condição simplesmente potestativa daquela outra que se diz potestativa pura, que põe
inteiramente ao arbítrio de uma das partes o próprio negócio jurídico". [....] "É preciso
não confundir: a ‘potestativa pura’ anula o ato, porque o deixa ao arbítrio exclusivo
de uma das partes. O mesmo não ocorre com a condição 'simplesmente potestativa’.
(STJ, Recurso Especial 258103, 4.ª Turma, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo
Teixeira, j. 23/03/2003, DJ 07/04/2003 pp. 289)"
Quanto aos aspectos casuísticos da responsabilidade civil nos contratos bancários,
doutrina e jurisprudência vêm enfrentando referido tema com maior ênfase nos últimos anos
em decorrência do sensível acréscimo das reclamações dirigidas ao Poder Judiciário.
Inicialmente destaca-se a questão de abertura de conta-corrente por meios
fraudulentos, em que estelionatário, valendo-se de documentos furtados, roubados ou
falsificados, engana a instituição financeira e realiza com ela negócio jurídico ilícito, abrindo
conta-corrente em nome de terceiro que não tem nenhum vínculo com a instituição, que
também ocupa a posição de vítima. Nessa hipótese, a instituição financeira toma todas as
precauções necessárias quando da contratação, não podendo ser punida ou responsabilizada
pela atitude de terceiros, sobretudo se eventual terceiro age de má-fé, ao contrário do banco,
que age em estrita boa-fé, conforme determina o artigo 422 do Código Civil.
Todavia a jurisprudência tem-se inclinado em reconhecer o risco da atividade com
base no artigo 927, parágrafo único, do Código Civil, pois o terceiro também se apresenta
como vítima de relação da qual não participou, ante o fato do contrato restar inadimplido,
embora eivado de ilegalidade, por conta da emissão de cheques sem fundos. Nesse sentido,
ocorrem medidas automáticas e cabíveis para a espécie, ou seja, inclusão do nome do
inadimplente nos órgãos de proteção ao crédito, o que constitui no exercício regular de um
143
direito, conforme previsto em lei e até mesmo no artigo 43 do Código de Defesa do
Consumidor.
O que se deve investigar é que, na abertura fraudulenta de conta-corrente, o contrato é
firmado com os documentos apresentados como se fossem do cliente e por pessoa que
geralmente passar por ser o próprio apresentante portador dos documentos. Contudo se feito
por terceiro de má-fé, isso ocorre pelo fato de este dispor de documentos de identificação
pessoal, além de outros que não causariam qualquer dúvida, além, é claro, de estar eivado de
evidente má-fé perante o Banco, que seria mais uma vítima do golpe. Ademais, vale lembrar
que o Banco não é obrigado por lei a manter em cada uma de suas agências um perito
grafotécnico, para averiguar a veracidade dos documentos e assinaturas de cada proponente de
uma operação financeira, pois isso não decorre de determinação legal e nem seria logicamente
razoável.
Também não haveria qualquer interesse da instituição financeira em realizar o
contrato, se os documentos se mostrassem inidôneos de forma flagrante, pois a referida
operação acarretaria prejuízo ao Banco, já que a instituição financeira sofreria tantos prejuízos
quanto a outra vítima (terceiro). Porém, pelo porte institucional e pelo risco da atividade e
pelo fato de se beneficiarem dos lucros, o banco acaba por ser obrigado a indenizar a outra
vítima, embora a investigação da culpa também deva ser levada a efeito, para apurar se a
terceira vítima não concorreu diretamente em deixar que o evento danoso lhe afetasse, agindo
de forma negligente ou imprudente na guarda de seus documentos pessoais.
Em contrapartida, o Banco age no exercício regular de um direito (artigo 188, I, do
Código Civil) ao atender as determinações das resoluções do Banco Central, que regulam a
matéria, o que afasta qualquer pretensão de se reconhecer eventual ilicitude do ato praticado
pelo Banco. Na verdade, a conta-corrente fraudulenta ou qualquer outro contrato bancário que
instrumentalize uma operação financeira e que tenha por base a má-fé do contratante serão
144
tidos por um negócio jurídico ilícito, assim, os efeitos decorrentes não poderão ensejar
diretamente a responsabilidade civil, pois esta só ocorre em razão do risco da atividade
desenvolvida pelo banco.
Encontram-se na jurisprudência vários julgados
147
nesse sentido, tendo como
exercício regular de um direito reconhecido a inclusão do nome de inadimplentes nos órgãos
de proteção ao crédito. Transcreve-se:
A responsabilidade civil dos estabelecimentos bancários é aquiliana no que se
refere a danos causados a terceiros, cabendo a prova a quem alega a sua ocorrência.
Não responde por indenização a título de dano moral a instituição financeira que
procede a abertura de conta e entrega talonário a pessoa que se apresenta com
documentos de identidade furtados de terceiro, visto não ter ficado comprovado se o
banco agiu com negligência no desempenho de suas funções ou mesmo o modus
agendi do estelionatário (Proc. 0237057-0/00 Apelação – 6
a
mara Cível do
Tribunal de Alçada de Minas Gerais – j. 26/06/97, v.u., Rel. Juiz Maciel Pereira).
Sustenta-se essa posição declinada no acórdão transcrito, contudo, reconhece-se que,
doutrina e jurisprudência tendem a reconhecer que o risco da atividade e o fato de obter lucros
com ela fazem com que a instituição financeira deva arcar com as perdas e danos do terceiro,
também vítima do negócio ilícito.
Outro fato casuístico interessante diz respeito ao atendimento prioritário nas agências
bancárias de pessoas portadoras de necessidades especiais (idosos, gestantes, deficientes etc.).
Se o banco não desobedecer a nenhuma disposição contida na Lei Federal 10.048/00
(prioridade de atendimento) e na 10.098/00 (acessibilidade), referentes aos portadores de
necessidades especiais, não haverá que se falar em responsabilidade civil que investigue
atendimento de usuários de serviços bancários em geral, clientes ou não clientes e, também,
mas com bem menos intensidade, de clientes que estejam celebrando contrato bancário que
tenha por objeto operação financeira ativa ou passiva, salvo aspectos discriminatórios que
decorram de atos praticados por prepostos (art. 932, III, do CC), em que se investigará a
147
RT 677/200, 704/98.
145
questão também pela responsabilidade subjetiva, para aferir realmente se houve ato ilícito
praticado pelo preposto do banco perante cliente ou usuário não cliente.
A objetividade do dever de indenizar do artigo 932, III, do CC está atrelada à idéia de
que o empregador responde pelo ato do empregado, mas a culpa do empregado deverá ser
investigada de qualquer forma e a questão será apurada com base na distribuição do ônus da
prova (art. 6.º, VI, do CDC e arts. 333 e 334 do CPC).
É relevante a questão pertinente à inclusão de clientes nos órgãos de proteção ao
crédito em decorrência de contrato bancário, notadamente quando se têm contratos
inadimplidos ou encerrados indevidamente. A rigor, deve-se fazer uma ressalva quando a
instituição financeira está procedendo à realização de um serviço de cobrança para o credor,
hipótese em que é mera mandatária do titular do crédito e recebe o mesmo a título de endosso
mandato, não sendo titular do crédito, pois essa hipótese somente ocorreria, se o banco
recebesse o crédito mediante endosso translativo.
Nessas situações, a inclusão do nome do devedor nos órgãos de proteção ao crédito
decorre apenas e tão-somente de uma instrução do titular do crédito, pois na condição de
endossatário mandatário o banco não assume responsabilidade pelo título, exceto se receber o
valor e não repassar ao titular do crédito por conta de falha no sistema bancário de
compensação, o que levará a ser objeto de investigação a culpa da instituição financeira.
As inserções de clientes inadimplentes nos órgãos de proteção ao crédito, tais como o
Serviço Central de Proteção ao Crédito (SCPC) e a SERASA, merecem um corte
metodológico para investigar a legitimidade e legalidade dos atos praticados pela instituição
financeira que terão origem em contratos bancários. As referidas inclusões decorrem de
convênios celebrados pelas instituições financeiras com os mencionados órgãos de proteção
ao crédito, nos quais o conveniado se compromete a estabelecer comunicação com eles,
sempre que algum cliente seu tornar-se inadimplente.
146
Existe previsão legal desses órgãos de proteção ao crédito, qual seja, o artigo 43 do
CDC. O banco passa então a agir no exercício regular de um direito e dentro dos limites legais
e contratuais firmados entre as partes. Nesse caso, somente caracterizaria ilegalidade
contratual a ensejar responsabilidade civil o fato de o cliente comprovar que a inserção é
indevida e que sofreu danos decorrentes da referida inclusão.
Ao aderir a essas centrais de restrições, o banco compromete-se a fornecer dados de
seus arquivos relativamente a clientes com restrições ao crédito, recebendo, em contrapartida,
as informações cedidas pelas outras instituições participantes, num verdadeiro intercâmbio de
informações. Inadimplidas as operações financeiras, caberá ao banco, até por razões éticas e
em respeito ao convênio a que aderiu, comunicar os nomes de seus devedores inadimplentes.
Na verdade, essa comunicação é essencial, sob pena de se inviabilizar a própria
existência das centrais de restrições”. É recomendável, por isso, que todos os bancos
conveniados informem as restrições existentes com relação a seus clientes, pois assim
estar-se-á preservando a utilidade dos mecanismos criados entre eles o SERASA e o SCPC
pelo comércio em geral para conceder crédito com margem maior de segurança, o que,
obviamente, é salutar para a sociedade e comprova a existência de uma função social e prática
da boa-fé no âmbito dos contratos bancários.
Outrotanto, na medida em que, hipoteticamente, se autoriza que um tomador de
empréstimo claramente inadimplente deixe de ter seu nome lançado no rol dos órgãos de
restrição ao crédito, ferir-se-ia o princípio da igualdade, garantido em sede constitucional (art.
5.°, caput, CR), estabelecendo-se o mesmo tratamento a situações diferentes, ou seja, não
havendo mais distinções entre o cidadão que honra seus compromissos e o inadimplente
contumaz. Em outro sentido, essas mesmas centrais de restrições têm adotado critérios de
147
registrar apontamentos positivos para formar um cadastro de pessoas que contraem obrigações
com instituições e as honram regularmente.
148
Não se deve esquecer de alegar, no entanto, que seria arbitrária a inserção do nome de
devedores nos registros dos órgãos citados. Aliás, o próprio Código de Defesa do Consumidor
diz, em seu artigo 43, § 5.°, que, “somente após consumada a prescrição relativa à cobrança
de débitos, não poderão os Sistemas de Proteção ao Crédito fornecer quaisquer informações
que possam impedir ou dificultar novo acesso ao crédito”.
Assim, se informações forem omitidas nos registros, os bancos de dados não mais
refletirão a verdadeira conduta de clientes bancários, tornando-se, dessa forma, imprestáveis,
uma vez restar negada sua própria existência, convertendo-se, assim, em letras mortas os
artigos do Código de Defesa do Consumidor (43 e 44) e da Constituição Federal (art. 5.°,
LXXII, “a”) que os criaram. Deve-se considerar que o próprio Poder Judiciário tem lançado
mão de convênios com as entidades de restrições creditícias para informar a propositura de
ações de execução, busca e apreensão e monitórias.
A inserção do nome de inadimplentes nos órgãos de proteção ao crédito em razão de
contratos bancários, se fundada em fatos verídicos, obviamente, será tida por perfeitamente
legal, pois não representa exposição ao ridículo, como vedado pelo artigo 42 da Lei 8.078/90,
nem tampouco materializa qualquer inverdade, sendo ilegal e injusta, isto sim, a não inserção,
na medida em que, se a pessoa se encontra inadimplente à época da inclusão, seu nome deverá
ser lançado nos órgãos restritivos, pois é extremamente salutar para a sociedade, até mesmo
para o controle da concessão do crédito bancário.
Aliás, se determinado banco, pessoa jurídica ou natural negar contrato de
financiamento ou qualquer outra operação comercial àquele que tem seu nome registrado nos
órgãos de proteção ao crédito, estará agindo no exercício livre de seu comércio, uma vez que,
148
Consultar sítio na Internet da SERASA: <www.serasa.com.br>
148
especificamente no caso dos bancos, os mesmos se constituem sob a estrutura de sociedade
anônima, submetidos à disciplina do Banco Central (artigos 4.°, 9.° e 10, da Lei 4.595, de
31.12.64); além disso, estará agindo no exercício de propriedade de seu capital (artigo 524 do
antigo Código Civil de 1916; artigo 5.°, XXII do Texto Magno); por fim, no caso de qualquer
outra pessoa, que não os bancos, estará agindo no âmbito de sua autonomia privada.
Nessas hipóteses, a inserção do nome de qualquer cliente bancário nos órgãos de
proteção ao crédito deverá ensejar a prova da ocorrência de lesões aos seus direitos da
personalidade, ou seja, aqueles decorrentes do artigo 5.º, incisos V e X, da CF, e artigos 11 a
21 do CC/02, no que diz respeito à imagem-atributo de pessoa jurídica ou de pessoa natural.
Não havendo prova da extensão dos danos alegados, como determina e requesta o artigo 944
do CC/02, não haverá que se falar em responsabilidade civil, como já foi sustentado.
Especificamente nesse aspecto, reporta-se à conclusão a que se chegou em recente
trabalho publicado para a comunidade jurídica, com relação à perspectiva civil-constitucional
da imagem da pessoa jurídica, ora transcrita:
À guisa de conclusão, procurou-se demonstrar que a perspectiva civil-
constitucional para uma eficaz tutela da imagem da pessoa jurídica exige uma
revisitação dos direitos da personalidade e sua incidência no plano das pessoas
jurídicas, salientando a distinção de conteúdo axiológico e da própria finalidade dos
mesmos, ante a constitucionalização dos referidos direitos galgados no princípio da
dignidade da pessoa humana e pela afirmação contida no artigo 52 do Código Civil,
que assegura a aplicação dos mesmos às pessoas jurídicas “no que couber” e é
exatamente nesse sentido que se tentou demonstrar em que medida essa aplicação é
feita, pois a dosimetria de aplicação, coube ao intérprete, ante o silêncio do
legislador.
O que ficou evidenciado é que embora haja uma transposição extensiva dos
direitos da personalidade, em especial do direito à imagem, da pessoa natural para a
pessoa jurídica, o conteúdo ontológico dessa transposição não é o mesmo em uma e
outra hipótese, ou seja, não se tutela a imagem de uma pessoa jurídica para proteger
a dignidade da pessoa humana, na medida em que está é e sempre será restrita às
pessoas naturais. Tutela-se a imagem da pessoa jurídica por ser um atributo
conquistado pela mesma, que tem inclusive reflexo econômico e patrimonial nas
relações negociais realizadas pela empresa, como foi demonstrado.
As possíveis conclusões antes demonstradas indicam que a natureza de
proteção e tutela do direito à imagem no plano das pessoas naturais difere em
conteúdo axiológico, ontológico e finalístico no plano das pessoas jurídicas, pois as
origens são distintas, sendo a primeira calcada na dignidade da pessoa humana
(baseada na moral, na honra objetiva, na psique do indivíduo), ao passo que a
segunda está calcada na aquisição de algo imaterial que tem reflexo econômico
149
patrimonial para a empresa e amesmo institucional (respeitabilidade profissional,
sigilo, experiência, conceito mercadológico, entre outros), sendo que a aferição da
extensão do eventual dano deve ser apurada no caso concreto pelos critérios
existentes na lei, doutrina e jurisprudência.
Fica, portanto, a provocação e a singela tentativa de contribuir no âmbito da
doutrina civil-constitucional e em homenagem ao princípio da autonomia privada e
de toda reconstrução histórica dos direitos humanos, bem com a perspectiva civil-
constitucional da imagem-atributo da pessoa jurídica.
149
A lesão a que se poderia referir no âmbito da responsabilidade civil nos contratos
bancários seria aquela adstrita à imagem-atributo, pois a imagem-retrato não poderia, ao
menos em tese, sofrer lesão em razão de contrato bancário, salvo na hipótese de uso indevido
da imagem em publicidade de instituição financeira de alguma operação financeira ou de um
serviço bancário.
Essa distinção tem por base o plano civil-constitucional que encontra guarida no
artigo 5.º, incisos V e X, da Constituição da República, e no artigo 20 do Código Civil em
vigor. Como doutrina Luiz Alberto David Araújo
150
, a imagem tutelada no artigo 5.º, inciso
X, da CF, é a imagem-retrato, aquela vinculada a atributos físicos da pessoa natural, ao passo
que a imagem protegida no artigo 5.º, inciso V, da CF, é a imagem-atributo, aquela atinente à
honra, à reputação, à moral, à respeitabilidade profissional, bem conhecida no plano
doutrinário e jurisprudencial.
Assim, que se distinguir com o devido cuidado a lesão da imagem-atributo quando
se tratar de pessoa jurídica e quando se tratar de pessoa natural que celebra contrato bancário
ou utiliza serviço bancário com instituição financeira. Se for pessoa jurídica, haverá de se
perquirir se realmente houve lesão à imagem-atributo e se essa acarretou conseqüências
patrimoniais à pessoa jurídica. É certo que em ambas as situações a prova do dano deverá
existir, como exige o artigo 944 do Código Civil, que é norma especial que prevalece sobre
149
ESTEVES, Jean Soldi. Uma perspectiva civil-constitucional da imagem da pessoa jurídica. In Questões
Controvertidas – parte geral do Código Civil. Vol. 6. São Paulo: Método, 2007, p. 205/206.
150
ARAÚJO, Luiz Alberto David. A proteção constitucional da própria imagem. Belo Horizonte: Del Rey,
1996 e também no artigo publicado na Revista do Advogado da AASP Ano XXIII N. 73 novembro 2003,
denominado “O Conteúdo do direito à própria imagem: um exercício de aplicação de critérios de efetivação
constitucional”, pp. 119-126.
150
toda e qualquer outra norma em vigor, pois específica para a caracterização da
responsabilidade civil.
Com relação à imagem-atributo da pessoa jurídica, cita-se julgado do STJ como
exemplo de aplicação da proteção da imagem-atributo da pessoa jurídica, o que acaba
contendo, também, seu sigilo e segredo profissional. O Acórdão proferido pelo Superior
Tribunal de Justiça em 03/09/98, relatado pelo Ministro César Asfor Rocha, no Mandado de
Segurança n. 9612-SP, publicado no DJ 09/11/98, p. 103, que pode ser consultado na RT
762/194, teve a seguinte ementa:
O sigilo profissional é exigência fundamental da vida social que deve ser
respeitado como princípio de ordem pública, por isso mesmo que o Poder Judiciário
não dispõe de força cogente para impor sua revelação, salvo na hipótese de existir
específica norma de lei formal autorizando a possibilidade de sua quebra, o que não
se verifica na espécie. O interesse público do sigilo profissional decorre do fato de
se constituir em um elemento essencial à existência e à dignidade de certas
categorias, e à necessidade de se tutelar a confiança nelas depositada, sem o que
seria inviável o desempenho de suas funções, bem como por se revelar em uma
exigência da vida e da paz social. Hipótese em que se exigiu da recorrente ela que
tem notória especialização em serviços contábeis e de auditoria e não é parte na
causa a revelação de segredos profissionais obtidos quando anteriormente prestou
serviços à ré da ação. Recurso provido, com a concessão da segurança.
Seguindo com aspectos casuísticos, vale menção, também, às hipóteses de saques
indevidos em caixas bancários ou uso indevido de cartões na função de crédito ou débito,
sobretudo, porque atualmente diversas instituições financeiras têm lançado mão de cartões
com os chamados chips, cuja estrutura é semelhante a de um computador, com CPU e
memórias próprias, onde são armazenados todos os dados do cliente, devidamente
criptografados, lembrando que o chip representa a autenticidade do cartão e a senha
representa a identidade do cliente, premissas a partir das quais deverá ocorrer a aferição da
responsabilidade civil.
A maioria das operações financeiras representadas nos contratos bancários é realizada,
atualmente, por meio de sistemas eletrônicos e, como foi sustentado na dissertação no
capítulo II, item 2.4., as transações eletrônicas são, por sua vez, reguladas por circulares do
151
Banco Central (3134) e instruções normativas da Secretaria da Receita Federal (222 e 462) e
pela infra-estrutura de chaves públicas, “ICP”, da Medida Provisória 2200-2, recebendo
guarida pelas disposições dos artigos 332 e 383 do CPC e 212 e 225 do CC.
Voltando-se ao denominado cartão com chip ou até ao cartão com tarja magnética,
ambos, na verdade, implicam dizer que os dados podem ser acessados pelo sistema
operacional do próprio chip contido no cartão ou impossibilitando assim sua leitura por
equipamentos externos. O referido chip é fabricado por algumas companhias no mundo, as
quais possuem rígidos controles de segurança. Para cada chip fabricado haverá um número de
série exclusivo, que vincula sua origem e só é vendido para instituições de grande porte.
Na prática, isso significa maior segurança, pois o cartão com chip somente poderá ser
utilizado em um equipamento que possa fazer a leitura do mesmo, e sua clonagem ou cópia é
praticamente impossível, o que demonstra ser o sistema altamente confiável, até pelo número
expressivo de utilização e o baixo índice de reclamações existentes, o que pode ser verificado
pelo senso comum, a teor do que dispõe o artigo 335 do Código de Processo Civil.
151
Para que um terceiro de má-fé possa realizar operações em contas dos clientes
bancários é absolutamente necessário que o mesmo tenha de estar de posse do cartão
magnético e ter conhecimento da senha pessoal do cliente, o que traduz uma culpa exclusiva
do cliente, pois não guardou com o cuidado necessário seus mecanismos de relacionamento
com o banco com que mantém operações financeiras. Assim, o acesso pode se dar apenas de
duas formas: por vontade do próprio cliente do banco ao operar o terminal ou ao entregar o
cartão e revelar a senha a terceiros que podem ser parentes, funcionários ou amigos - ou
pela desídia na guarda do cartão e da senha pessoal.
Todas essas situações caracterizam a excludência da responsabilidade do banco, pelo
ato culposo exclusivo do correntista bancário, pois o mesmo é obrigado a zelar pela guarda da
151
Fonte consultada: <www.itau.com.br/segurancaeprivacidade> Acesso em 30/10/07.
152
senha e do cartão de débito, o que inclui manter na guarda física e sempre junto aos
documentos pessoais, reservados na intimidade e privacidade do cliente ou em lugar seguro,
ao passo que a guarda da senha implica seu não fornecimento a terceiros ainda que de
proximidade familiar ou de vínculo afetivo com o cliente – bem como pela adoção de medidas
que tornem inviável o conhecimento involuntário, que pode acontecer pela anotação em
lugares de fácil visualização ou acessíveis às pessoas em geral, o que pode acontecer em
lugares virtuais e até mesmo físicos, como, por exemplo, anotações em papéis, palmtops,
junto ao cartão, enfim, lugares que evidenciem total negligência e imprudência do correntista.
Fato que independe de prova (CPC 334) e que é amplamente divulgado pelos meios
de comunicação é a grande quantidade de hackers existente em paralelo ao uso de
equipamentos como computadores próprios e de terceiros, ante a possibilidade de
conhecimento de dados pessoais por pessoas de má-fé, o que pode dar-se por vários recursos,
como e-mail, fotos e mensagens, em princípio inofensivos, mas que têm por escopo conseguir
dados pessoais dos clientes de instituições financeiras.
É importante registrar que todas essas fraudes, na maioria das vezes, se operam em
bens e informações de posse do cliente e não da instituição financeira, ou seja, mediante
utilização de cartão que está na posse do cliente, de computador do cliente, de uso de senha de
posse do cliente, sendo que nenhum desses bens e informações devem estar na posse do
banco. O dever de guarda e vigilância, portanto, à luz da boa-fé objetiva, a princípio, recai
sobre o cliente, visto que a instituição financeira fornece todos os meios para garantir a
segurança do sistema operacional, investindo quantias significantes em tecnologia da
informação.
Destaca-se importante acórdão do TJRS nesse sentido:
APELAÇÃO. DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO.
TELEFONIA. SERVIÇO NÃO PRESTADO. COBRANÇA. INSCRIÇÃO NO
SERASA. Internet. Conexão a provedor internacional. Vírus. A ligação telefônica
internacional para a Ilha Salomão, que ocasionou o alto valor cobrado na fatura
emitida pela ré, decorreu de discagem internacional provocada por vírus instalado na
153
máquina do autor. QUEM NAVEGA NA REDE INTERNACIONAL (WEB)
DEVE, NECESSARIAMENTE, UTILIZAR UM PROGRAMA ‘ANTI-VÍRUS’
PARA EVITAR TAIS ACONTECIMENTOS. Negligência do autor. Inexistência
de ato ilícito atribuível à Embratel. Ação improcedente. Apelação improvida.
152
Ademais, o uso da senha implica também a posse do cartão, ou seja, para se realizar
qualquer operação financeira no sistema do banco haverá de existir uso concomitante do
cartão e da senha, seja em terminais, seja na Internet. A culpa exclusiva do cliente se
evidencia pela desídia na guarda do cartão ou da senha pessoal, na medida em que teria
descumprido obrigação contratual de não revelar a senha a terceiros ou tomar todas as
precauções necessárias para que isso não ocorra.
Aplica-se, pois, à hipótese, o artigo 14, § 3.º, incisos I e II, do Código de Defesa do
Consumidor, que afasta a responsabilização do fornecedor, quando provada a ausência do
defeito e a culpa exclusiva do consumidor. Aliás, com relação à questão vale citar o
ensinamento de Carlos Roberto Gonçalves
153
:
Culpa Exclusiva da Vítima. Quando o evento danoso acontece por culpa
exclusiva da vítima, desaparece a responsabilidade do agente. Neste caso, deixa de
existir a relação de causa e efeito entre o seu ato e o prejuízo experimentado pela
vítima. Pode-se afirmar que no caso de culpa exclusiva da vítima, o causador do
dano, não passa de mero instrumento do acidente. Não liame de causalidade entre
o seu ato e o prejuízo da vítima.
Nesse sentido, não é demais citar ementa de recente julgado proferido pelo C.
Superior Tribunal de Justiça:
CIVIL. CONTA-CORRENTE. SAQUE INDEVIDO. CARTÃO MAGNÉTICO.
SENHA. INDENIZAÇÃO. IMPROCEDÊNCIA.
1 - O uso do cartão magnético com sua respectiva senha é exclusivo do correntista e,
portanto, eventuais saques irregulares na conta somente geram responsabilidade para
o Banco se provado ter agido com negligência, imperícia ou imprudência na entrega
do numerário.
2 - Recurso especial conhecido e provido para julgar improcedente o pedido inicial.
152
TJRS, 9.ª mara Cível, Ap. cível n.º 70011140902, Rel. Des. LUÍS AUGUSTO COELHO BRAGA, j.
26/10/2005 – grifou-se. Fonte: sítio do TJRS.
153
GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade Civil. 6 ed. São Paulo: Saraiva, 1995, p. 505.
154
(Resp 602.680 Ministro Relator Fernando Gonçalves, julgado em 21/10/2004, DJ
16/11/2004).
154
No julgado acima citado, extrai-se o seguinte trecho importante para o deslinde deste
feito:
“É que entregue o cartão ao cliente e fornecida a senha pessoal para a sua utilização,
a guarda a ele cabe, exclusivamente. Não pode nem deve, em princípio, cedê-lo a
quem quer que seja, ou quebrar o sigilo, fornecendo a senha a terceiros. Também
incumbe-lhe manusear adequadamente o cartão, evitando solicitar auxílio de
estranhos.
Desse modo, achando-se na posse e guarda do cartão e da senha, a presunção lógica
é a de que se houve o saque com o emprego de tal documento magnético, cabe à
autora prova que a tanto não deu causa. Não basta alegar que dele não fez uso. Tem
de demonstrá-lo.
Ao estabelecimento bancário basta, na hipótese em comento, comprovar que o saque
foi feito com o cartão do cliente, que tinha a sua guarda e não que foi o cliente,
pessoalmente, quem efetuou a retirada. Seu ônus não tem essa extensão, penso eu.
Não há, pois, a prova da culpa do banco, que ele teria agido com imprudência,
imperícia ou negligência. Ao estabelecimento bancário basta, na hipótese em
comento, comprovar que o saque foi feito com o cartão do cliente, que tinha a sua
guarda e não que foi o cliente, pessoalmente, quem efetuou a retirada”.
Ainda no contexto de fraude praticada por meios eletrônicos, identifica-se que
algumas instituições financeiras de grande porte desenvolvem esforços para tornar o sistema
absolutamente seguro a ponto de não poder ser manipulado por hackers ou crakers, na medida
em que todos os dados digitados deverão ser totalmente protegidos por tecnologia de
criptografia, com chave de segurança e transmissão dos dados através do protocolo SSL 3.0.
Essa tecnologia é reconhecida internacionalmente como a de maior segurança para
transmissão de dados via rede Internet e é amplamente utilizada por corporações em seus
respectivos sites de todo o mundo, o que indica ter sido atendido plenamente o artigo 15, § 2.º
da Resolução 2878 do Banco Central do Brasil, por parte da instituição financeira.
154
NO MESMO SENTIDO: “RECURSO ESPECIAL - RESPONSABILIDADE CIVIL - AÇÃO DE
INDENIZAÇÃO -DANOS MATERIAIS - SAQUES INDEVIDOS EM CONTA-CORRENTE CULPA
EXCLUSIVA DA VÍTIMA - ART. 14, § DO CDC - IMPROCEDÊNCIA. 1 - Conforme precedentes desta
Corte, em relação ao uso do serviço de conta-corrente fornecido pelas instituições bancárias, cabe ao correntista
cuidar pessoalmente da guarda de seu cartão magnético e sigilo de sua senha pessoal no momento em que deles
faz uso. Não pode ceder o cartão a quem quer que seja, muito menos fornecer sua senha a terceiros. Ao agir
dessa forma, passa a assumir os riscos de sua conduta, que contribui, à toda evidência, para que seja vítima de
fraudadores e estelionatários. (RESP 602680/BA, Rel. Min. FERNANDO GONÇALVES, DJU de 16.11.2004;
RESP 417835/AL, Rel. Min. ALDIR PASSARINHO JÚNIOR, DJU de 19.08.2002). 2 - Fica excluída a
responsabilidade da instituição financeira nos casos em que o fornecedor de serviços comprovar que o defeito
inexiste ou que, apesar de existir, a culpa é exclusiva do consumidor ou de terceiro (art. 14, § do CDC). 3 -
Recurso conhecido e provido para restabelecer a r. sentença.” STJ, 4ª Turma, REsp 601805 / SP, Rel. Min. Jorge
Scartezzini, pub. DJ 14/11/05, p. 328.
155
Outras instituições financeiras para alcançar a prova da segurança do sistema buscam
valer-se de certificações tal como o sistema GoodPriv@cy, emitido pela Fundação Carlos
Alberto Vanzolini (FCAV) aos bancos, o que enseja rigoroso processo de auditoria na gestão
da privacidade de dados que transitam na WEB, fornecidos por clientes e não clientes. Isto
significa que toda e qualquer informação disponibilizada pelos usuários deverá ser coletada e
processada de acordo com os mais rígidos padrões de segurança e confiabilidade que o
próprio Banco Central impõe, valendo-se inclusive de credenciamento pelo INMETRO, órgão
governamental e de total imparcialidade. Ainda existe a tecnologia de fornecimento por
algumas instituições financeiras do mencionado token, um equipamento que altera o código
a cada sessenta segundos, sendo que o acesso eletrônico deverá informar o código existente
naquele exato momento do acesso, ou seja, o nível de segurança passa a ser maior ainda e a
possibilidade de invasão reduzida a praticamente zero, pois todos os equipamentos e medidas
são fornecidos para viabilizar a segurança do sistema.
155
É preciso compreender que a dinâmica das relações comerciais e negociais, no
contexto da globalização, se intensificou, tornando suas relações mais complexas e
necessariamente mais rápidas, portanto, é um fenômeno irreversível e natural o aumento do
uso de meios eletrônicos para processar negócios jurídicos, tanto é que a urna eletrônica no
Brasil é algo absorvido na cultura brasileira, juntamente com o processamento da
declaração de imposto de renda pela Internet, acerca dos quais se desconhecem quaisquer
reclamações.
É preciso desmistificar certas idéias e concepções estabelecidas acerca das instituições
financeiras, sem que isso signifique fazer apologia às mesmas, mas tão-somente investigar e
destacar situações concretas que evidenciam faticamente um comportamento negocial
relevante e que traduz diversos efeitos na sociedade, ante a diuturna realização de contratos e
155
Fonte consultada: <www.itau.com.br/segurancaeprivacidade> Acesso em 30/10/07.
156
serviços bancários a clientes e não clientes. Portanto, pela experiência comum a que remete o
artigo 335, do CPC, o sistema operacional das instituições financeiras é seguro, até por conta
das inúmeras normas e procedimentos existentes e demonstrados na evolução do tema da
dissertação.
A questão dos cartões de débito e crédito intimamente relacionada com os contratos
bancários, mereceu acurado estudo desenvolvido por Carlos Henrique Abrão, que demonstra a
presunção de certeza do usuário frente ao mecanismo da senha, na medida em que ela
identifica, pessoalmente, o usuário do cartão que detém a posse do mesmo.
156
Algumas situações fáticas têm ensejado responsabilidade civil no plano dos contratos
bancários e a jurisprudência tem enfrentado referidas situações apresentando divergências
metodológicas e interpretativas, valendo, portanto, a investigação dos julgados que seguem,
coletados por Nelson Nery Júnior e Rosa Maria Andrade Nery
157
.
O comunicado de encerramento de conta-corrente é algo que deve se dar da mesma
forma que o contrato, ou seja, por escrito. Como sustentado, é forma de extinção contratual
e evitar-se-á a ocorrência de responsabilidade civil, se os comunicados forem realizados
efetivamente. A contrário senso, se houver a comunicação e o cliente fizer uso indevido do
talonário, não haverá responsabilidade civil. A jurisprudência entoa:
Se a instituição financeira não comunicou ao correntista o cancelamento de
contrato de abertura de crédito em conta-corrente, deve arcar com o dano moral
advindo da devolução de cheques por insuficiência de fundos se demonstrado que o
cliente, na data da apresentação das cártulas, contava com saldo credor em conta
corrente e o pagamento dos títulos não extrapolaria o limite de crédito fornecido pelo
banco. (RT 795/220).
Como demonstrado, na hipótese de cheque falsificado, a responsabilidade civil da
instituição financeira existirá, nos moldes da Súmula 28 do STF: “O estabelecimento bancário
156
ABRÃO, Carlos Henrique. Cartões de crédito e débito. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2005, p. 130/155.
157
JÚNIOR, Nelson Nery; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código Civil comentado. 4 ed. São Paulo: RT, 2006,
p. 614-615.
157
é responsável pelo pagamento de cheque falso, ressalvadas as hipóteses de culpa exclusiva ou
concorrente do correntista.”
A devolução de cheque por insuficiência de fundos, na hipótese de haver saldo
suficiente, pode autorizar a responsabilização civil por força da boa-fé e quebra de dever
contratual. Vejam-se os seguintes julgados:
Responde o banco pela falha do serviço, ocasionadora de devolução de cheques por
insuficiência de fundos, de cliente que tinha saldo na conta corrente comum, além de
investimentos de resgate automático, transferido para a do cheque especial, sem
autorização expressa do mesmo. (RT 779/351).
Devolvido cheque por insuficiência de fundo quando havia saldo, o banco deve
indenizar por dano moral, caracterizado pelos transtornos, incômodo e vexame social
ao emitente (STJ, 3ª T., REsp 258411-MG, rel. Min. Waldemar Zveiter, j. 19.2.01.)
Todas as referidas situações descritas nos julgados em comento ensejam a efetiva
caracterização da responsabilidade civil correspondente à comprovação: a) da ação ou
omissão do agente; b) do dolo ou da culpa; c) do dano; d) do nexo de causalidade.
Acrescente-se, ainda, que a culpa exclusiva e concorrente do cliente ou do usuário enseja o
afastamento ou, no mínimo, a mitigação da responsabilidade civil da instituição financeira.
A idéia da culpa concorrente e exclusiva da vítima tem sustentação no artigo 945 do
Código Civil que evidencia a percepção e leitura da questão da responsabilidade civil nos
contratos bancários pela ótica da responsabilidade subjetiva. A rigor, duas situações ocorrem
na leitura do artigo 945 do CC: a) a vítima concorreu para o fato que causou o dano, o que
autoriza o pedido indenizatório, todavia, com o abatimento da quantia levando-se em conta a
atitude da vítima; e, b) a vítima deu causa única e exclusivamente ao evento que lhe causou o
dano, o que afasta por completo o nexo causal e, por conseguinte, o dever de responsabilizar.
Aferir a quantificação da participação da vítima denomina-se teoria da causalidade
adequada. A I Jornada de Direito Civil do STJ proclamou o Enunciado 47: O CC 945, que
158
não encontra correspondente no CC/1916, não exclui a aplicação da teoria da causalidade
adequada.”
Os seguintes julgados sustentam essa posição:
Reconhecida a culpa concorrente do autor em grau menor que a da ré, a indenização
a que ele tem direito, para a reparação do dano que sofreu, deve ser
proporcionalmente reduzida (STJ, T., REsp 94277-SP, rel. Min. Ruy Rosado de
Aguiar, v.u., j. 27.08.96, DJU 16.9.96, p. 33748)
Se a vítima não age com a cautela necessária para atravessar a rua em local
apropriado, vindo a ser atropelada, justificável a redução proporcional do valor
indenizatório, em razão da culpa concorrente (RT 609/112).
A responsabilidade pelos danos decorrentes de acidente de trânsito, em caso de culpa
concorrente, deve ser proporcional ao grau de culpa de cada um dos agentes
causadores do sinistro (RT 773/364).
No caso dos contratos bancários, a aferição da responsabilidade civil também deve
levar em conta a teoria da causalidade adequada, especialmente nos casos a seguir ilustrados.
Sustentam-se referidas conclusões com base nos seguintes julgados:
A abertura de conta-corrente através de ato fraudulento, consistente na utilização de
carteira de identidade, que havia sido perdida pelo titular do documento, sem o seu
conhecimento ou participação, que acabou por culminar no protesto de cheques,
impõe ao banco o dever de indenizar os danos morais e materiais suportados em
decorrência da fraude, pois a falsificação foi montada contra a instituição financeira,
decorrendo sua responsabilidade em virtude do risco profissional (RT799/216).
O titular da conta-corrente deve ser notificado das alterações do respectivo limite de
crédito (cheque especial), e a devolução indevida do cheque do correntista como sem
fundos acarreta a responsabilidade de indenizá-lo por dano moral. Precedente citado:
REsp 251713-BA, DJU 11.3.02 (STJ, T. REsp 486249-RS, rel. Min. Ari
Pargendler, j. 25.3.03).
Age com culpa o cliente que, sem tomar as devidas cautelas, fornece sua senha, por
telefone, a pessoa que se apresenta como funcionário do estabelecimento bancário,
ao pretexto de que esta delineara alguns de seus dados pessoais, tais quais: mero
de CPF, mero de conta e código da agência. Por outro lado, o fato de haver
transferido para a conta do fraudado, via Internet, quantia superior ao limite diário
estabelecido, evidencia a responsabilidade do banco, a quem cabe a supervisão das
operações disponibilizadas aos clientes, por meio eletrônico, sendo tal prática
incluída entre aquelas cujo risco profissional envolve a atividade bancária. A culpa
nesse caso é recíproca, embora não o seja em partes iguais. culpa recíproca
proporcional (TJDF, RTDCiv 2/179).
É de responsabilidade do usuário o uso do cartão magnético e o sigilo de sua senha;
porém, se é vítima de golpe de troca de cartão no interior das dependências da
instituição bancária, vindo a sofrer vários desfalques em seu crédito em conta
159
corrente, responde o banco pelos prejuízos causados em razão de ter oferecido um
serviço defeituoso, sem a segurança necessária à realização de operações financeiras
em caixa eletrônico, consoante disposto no CDC 14 (RT 781/395)
.
O uso disseminado de cartões na função de débito (quando o valor é debitado,
automaticamente, da conta-corrente do correntista) e na função crédito (tradicional sistema de
pagamento por meio de faturas mensais de acordo com um limite de crédito preestabelecido),
enseja, também, um cuidado redobrado pelos clientes bancários, na medida em que as
instituições financeiras estarão atreladas ao cumprimento dos deveres contratuais e na
preservação da segurança do sistema e os julgados que seguem, todos baseados na aferição da
culpa e da comprovação do dano, demonstram, por vezes, a exclusão da responsabilidade civil
da instituição bancária e, noutras, a caracterização dessa responsabilidade:
A instituição financeira tem o dever de indenizar o dano moral experimentado por
seu cliente que, após o cancelamento de cartão de crédito, com a comprovada
quitação prévia de todos e quaisquer débitos, teve seu nome incluído como
inadimplente junto ao SERASA, pelo valor correspondente à anuidade do referido
cartão cancelado, ali permanecendo negativado por longo período (RT 781/247).
O registro do nome de cliente inadimplente com a utilização de movimentação de
cartão de crédito em cadastros restritivos do SPC não pode ser considerado como
uma atitude ilegal ou arbitrária da instituição financeira, tampouco em
desconformidade à lei ou ato ilícito gerador de reparação a título de dano moral, pois
possibilidade de os estabelecimentos bancários utilizarem-se deste sistema como
meio de proteção ao seu próprio funcionamento (RT 780/375).
Cabe, também, destacar que a doutrina e jurisprudência têm entendido que não
responsabilidade civil nas hipóteses decorrentes de ausência de comunicação prévia à
inscrição em órgão de proteção ao crédito, nas hipóteses da informação ser de domínio
público. Os bancos, por vezes, ao protestarem um título de crédito vencido de um cliente,
automaticamente fazem com que o nome do cliente inadimplente seja comunicado aos órgãos
de proteção ao crédito, mas não por ato próprio seu, mas sim decorrente de informações
obtidas em órgãos oficiais como cartório de distribuição de processos, diário oficial etc.
160
Contudo, Luciano Timm e Eduardo Jobim
158
, ao comentarem julgado do STJ com base no
artigo 43 do CDC, concluem que:
Em conclusão, à luz da decisão em comento, podemos afirmar que:
a) A inserção indevida gera, em regra, dano moral indenizável ao consumidor (quer
tenha havido informação prévia ou não);
b) A divulgação de informações públicas por órgãos de restrição ao crédito não
gera dever de indenizar pela simples ausência de comunicação prévia ao
consumidor;
c) A divulgação de informações de caráter privado (ou seja, que não caíram ainda
no domínio público), sem prévia comunicação ao consumidor, pode gerar o dever
de ressarcimento.
O julgado do STJ que ampara referida conclusão foi assim ementado:
Ementa: Responsabilidade civil. Indenização por dano moral. Ausência de
comunicação (art. 43, par. 2º, do CDC). Dado colhido em cartório distribuidor.
Natureza pública. Inexistência de dano. Tratando-se de atividade lícita por parte da
entidade cadastral, que se colheu dados já dotados de ampla publicidade, a ausência
da comunicação do registro ao consumidor não lhe causa dano moral algum. (STJ,
REsp 684.489-RS, 4ª T., v.u., Rel. Min. Barros Monteiro, j. 16.08.05).
Em contrapartida, também ocorrem situações de discussão contratual baseada na
revisão do contrato, por onerosidade ou lesão e, nesses casos, apenas na hipótese de existir
liminar judicial suspendendo os efeitos da inadimplência, poderá desautorizar a instituição
financeira de fazer uso regular de direito seu de executar o contrato e inscrever o nome do
devedor nos órgãos de proteção ao crédito, até por conta de expressa disposição legal (art. 43
do CDC) e do artigo 585, par. 1.º, do CPC, que assegura que a propositura de qualquer ação
relativa ao débito constante de título executivo não inibirá o credor de promover-lhe a
execução.
A jurisprudência do STJ apreciou questão semelhante que, todavia, não assegura
estar a seguinte decisão suspendendo a exigibilidade do crédito bancário:
É devida indenização por dano moral pelo fato de o banco, pendente ação em que se
discute a validade do contrato, ajuizar execução e incluir o nome do mutuário no
158
TIMM. Eduardo. JOBIM. Eduardo. As conseqüências da ausência de informação prévia ao consumidor nos
casos de inscrição em órgãos de restrição ao crédito. In Revista de direito bancário e do mercado de capitais.
Coordenação Arnoldo Wald. Ano 9, n. 31. São Paulo: RT, 2006, p. 211.
161
SERASA. O descumpridor do contrato era o banco, que exigia o indevido e ainda
levou o nome da compradora ao cadastro de inadimplentes (STJ, T., REsp
219184-RJ, rel. Min. Ruy Rosado Aguiar, m. v., j. 26.10.99).
Quanto aos terceiros participantes de contratos bancários, até por força de condição
contratual de interveniente garantidor solidário, ou seja, de fiador, ensejará em relação aos
mesmos o conhecimento da inadimplência para que possa tomar as devidas providências.
Veja-se o seguinte julgado:
O mero garante da dívida deve ser notificado da inadimplência por parte do devedor
principal, antes de ter seu nome negativado junto ao SERASA ou qualquer outro
órgão de proteção ao crédito. A ausência de prova de tal notificação. Abalo de
crédito provado e tipo por indevido. Ação indenizatória por danos morais julgada
procedente (2º TACSP, 10ª C. Ap 620898-0/8, rel. Juiz Soares Levada, v.u., j.
12.12.01).
A responsabilidade civil dos administradores de instituições financeiras é regulada
pela Lei 6024/74, contudo, é relevante considerar que a responsabilidade será sempre
perquirida pelo plano subjetivo, eis que se trata de pessoas naturais no exercício de função de
destaque, lembrando, também, as disposições gerais do artigo 50 do CC quanto à
desconsideração da personalidade jurídica para atingir bens dos administradores, embora a
questão seja totalmente regulada pela lei especial mencionada.
Não é possível deixar de registrar pesquisa desenvolvida por Maria Helena Diniz, com
base em robusta doutrina
159
ao identificar diversas situações que podem caracterizar a
responsabilidade civil decorrente de contratos bancários. Por exemplo, haverá necessidade de
se garantir obrigação de vigilância, segurança e proteção de bens dos clientes por força do
contrato bancário, exceto se houver culpa exclusiva ou concorrente do cliente (Súmula 28 do
STF e artigo 945 do Código Civil), ou seja, o banco deve proceder à devolução do valor ou de
159
DINIZ, Maria Helena. Tratado teórico e prático dos contratos. 6 ed. Vol. IV. Revista, ampliada e atualizada.
São Paulo: Saraiva, 2006, p. 731-736. Ver, também, WALD, Arnoldo. A responsabilidade contratual do
banqueiro. In Digesto econômico, 1982, p. 95, n. 299;
Do regime legal da responsabilidade das instituições
financeiras pelo extravio de títulos de crédito que lhes foram entregues para cobrança através de endosso-
mandato, RT 718:63; e BITTAR, Carlos Alberto. Responsabilidade civil dos bancos na prestação de serviços.
RT 614:33.
162
bens, contudo, na hipótese de perecimento do bem, por conta da força maior, cessará o dever
do banco.
Há de se destacar a figura contratual do depósito (Código Civil, artigos 627 a 652) e a
do mandato (Código Civil, artigos 653 a 692), que são caracterizados em várias operações
financeiras e serviços realizados pelos bancos junto aos seus clientes.
Nesse contexto, a responsabilidade civil contratual também terá por base as premissas
dessas duas figuras contratuais. Registram-se, pois, situações identificadas pela doutrina, em
que são passíveis de se apurar a responsabilidade civil no plano dos contratos bancários, desde
que comprovados os pressupostos dos artigos 186, 927, 944 e 945 do Código Civil, sempre, é
claro, pela aferição da teoria da causalidade adequada:
160
1) assim, pode-se registrar possibilidade de aferição da responsabilidade civil no
âmbito dos contratos bancários, quando a instituição financeira recebe em nome do cliente
quantia inferior ao que era devido; deixa de executar ordens recebidas do cliente ou
aconselha-o de forma incauta, de modo a lhe causar sérios prejuízos em operações
financeiras; enseja a ocorrência de danos ao cliente por prorrogar sem a devida autorização
título colocado em cobrança;
2) nos termos da Súmula 28 do STF desconta cheque falso ou com assinatura
falsificada, exceto quando faz prova de que houve culpa exclusiva ou concorrente do cliente
na guarda do talão de cheque, do cartão e senha, e que tenha permitido saques indevidos da
conta-corrente, até porquanto determinado pelo artigo 945 do CC e artigo 14, par. 3.º, do
CDC; todavia, quando a falsidade é detectável a olho nu (RT 274:692), o banco acaba arcando
com o dever de indenizar por força do risco do negócio (CC, art. 932, par. único), sobretudo
160
DINIZ, Maria Helena. Tratado teórico e prático dos contratos. 6 ed. vol. IV. Revista, ampliada e atualizada.
São Paulo: Saraiva, 2006, p. 731-736. FILHO, Sérgio Cavalieri. Programa de responsabilidade civil. 7 ed.
Revista e ampliada. São Paulo: Atlas, 2007, p. 384-396. GAGLIANO, Pablo Stolze; FILHO, Rodolfo
Pamplona. Novo curso de direito civil. 5 ed. Revista e atualizada. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 323-335; ALVES,
Vilson Rodrigues. Responsabilidade civil dos estabelecimentos bancários. Campinas: Bookseller, 1997, p. 119-
286.
163
porque a diligência comum e ordinária ensejaria a averiguação de um a um dos cheques
depositados, o que acaba por atribuir um dever pelo risco assumido pelo banco; no caso de
falsificação de assinatura em cheque não ser perceptível a olho nu, mas apenas por perito
grafotécnico, a jurisprudência têm acolhido a responsabilidade do banco sob o argumento de
que aceitou o depósito e com isso o risco pelo mesmo (RT 563:109, 569:185);
3) proceder de forma incauta e sem diligência para prestar informações ao cliente,
como no caso de cancelamento de cartões de crédito (RT 554:146), bem como na não
realização da remessa de fundos de forma ágil, e incluir indevidamente o nome do correntista
em órgãos de proteção ao crédito;
4) fazer a inserção do nome de cliente junto aos órgãos de proteção ao crédito por
equívoco na aferição da suficiência ou não de fundos em cheques, pois nítido
descumprimento do contrato; realizar protesto de título e inserção do nome de pessoa em
função de abertura de conta-corrente ou contrato de financiamento, como arrendamento
mercantil ou alienação fiduciária, mediante uso de documentos falsificados ou perdidos pelo
titular (RT, 779:219);
5) desenvolver atividades de gestão em fundos de investimento em não conformidade
com as determinações da Comissão de Valores Mobiliários;
6) responder pelos danos oriundos de ocorrências havidas em cofres-fortes e cofres de
aluguéis, exceto se decorrentes de caso fortuito e força maior, como tem entendido a
jurisprudência (STJ, 3.ª Turma, REsp 151.060/RS, Rel. Min. Eduardo Ribeiro, j. 10.4.00, RT
676:151);
7) debitar valores indevidamente da conta-corrente do cliente, ensejando negativação
da conta-corrente e a inserção do nome do devedor nos órgãos de proteção ao crédito (STJ, 3.ª
T. REsp 219.619, j. 3-9-1999), e reduzir limite de cheque especial sem comunicação prévia e
164
que enseja devolução de cheques sem provisão de fundos por extrapolar o limite previamente
contratado (STJ, REsp 486.249-RS, rel. Ari Pargendler);
8) responsabilizar-se por danos causados na entrega irregular de talonário de cheques
ou cartões no endereço do correntista, como já decidiu o STJ nos REsp 251.713 e 332.106);
9) responsabilizar-se pela irregularidade na hipótese da quebra de sigilo bancário em
fornecer informações sem os cuidados devidos às autoridades fiscais e do Poder Judiciário
(informações da conta-corrente de cliente em processos judiciais), sem atentar para os
parâmetros referenciais previstos na Lei Complementar 105/2001, artigo 6.º, e Decreto n.
3.724/2001, seja fornecendo documentos sigilosos sem pleitear a concessão do segredo
judicial em processos para preservar o sigilo bancário dos clientes;
10) ainda, deixar de efetuar lançamento de contribuição paga pelo cliente ou
equivocar-se no lançamento de dados na conta-corrente do cliente (RT, 501:195); deixar
extraviar título de crédito ou documentos do cliente que foram entregues para cobrança,
avaliação de crédito ou perda de malote (RT, 573:138, 516:108, 571:100); deixar que
funcionário se aproprie de numerário entregue para depósito ou aplicação ou mesmo por conta
de roubo na agência (RT 547:190, 539:88, 481:130 e 502:84); transferir indevidamente
valores para conta de terceiros (RT 505:209); devolver cheque por insuficiência de fundos de
correntista que tinha valores na conta-corrente comum e saldo de aplicação financeira de
resgate automático (RT 779:351) e, por fim, causar por defeito em caixa eletrônico a retenção
de cartão magnético, o que veio a acarretar posterior saque em dinheiro na conta-corrente do
cliente, sem a autorização deste (RT, 789:266).
Podem-se extrair da doutrina de Rodrigo Bernardes Braga algumas perspectivas de
aferição de responsabilidade civil das instituições financeiras, especialmente nas situações
fáticas que envolvam o pagamento de cheque falso, cofres de aluguel, protesto indevido de
títulos, extravio de títulos entregues ao banco para cobrança, devolução indevida de cheques,
165
envio irregular do nome do cliente aos órgãos de proteção ao crédito, realização de débito
automático na conta-corrente do correntista, desaparecimento de importância depositada
através de envelope em caixa-rápido.
161
Outro aspecto que merece investigação diz respeito ao contrato de arrendamento mercantil,
que não é uma forma de financiamento comum, como crédito direto ao consumidor, mas uma espécie
de contrato bancário com características próprias. A Lei 6.099, de 12/09/74, alterada pela Lei
7.132, de 26/10/83, define o arrendamento mercantil:
“Considera-se arrendamento mercantil, para os efeitos desta Lei, o negócio jurídico
realizado entre pessoa jurídica, na qualidade de arrendadora, e pessoa física ou jurídica, na
qualidade de arrendatária, e que tenha por objeto o arrendamento de bens adquiridos pela
arrendadora, segundo especificações da arrendatária e para uso desta”.
Com fundamento no texto normativo, arrendamento mercantil é, então, a cessão do uso de um
bem, por um determinado prazo, mediante contrato e demais condições pactuadas, sendo uma
operação em que o possuidor (Arrendador) de um bem móvel ou imóvel cede a terceiro
(Arrendatário) o uso desse bem por prazo determinado, recebendo em troca uma contraprestação
pecuniária.
O arrendatário tem de zelar pelo bem, que o domínio e a posse indireta da coisa pertence à
arrendadora, a qual tem interesse imediato pela conservação dele, todavia, não dispõe do uso e gozo
direto, mas apenas indireto do bem. Na verdade, controversas existem com relação a veículos
arrendados que se envolvem em acidentes de trânsito, dado que se discute a responsabilidade civil e
imputa-se à companhia arrendadora um suposto dever de indenizar a vítima de acidente em que se
envolveu a arrendatária e o veículo objeto do arrendamento.
Na Apelação vel 71.427, TAC-RJ, 7.ª Câmara, em 10.09.92, ADCOAS 87980/82, se
sedimentava o entendimento que “se o dono arrendador não usa a coisa, é difícil dizer-se que deva
ser responsabilizado, pois não tem a chamada guarda jurídica.”
161
BRAGA, Rodrigo Bernardes. Responsabilidade civil das instituições financeiras. 2 ed. Rio de Janeiro:
Lúmen Júris, 2004, p. 77-198.
166
A jurisprudência tem-se posicionado em desonerar de qualquer responsabilidade as
companhias de “leasing”:
“Arrendamento mercantil (leasing) - Danos causados por preposto de arrendatária -
Inocorrência de responsabilidade objetiva - Recurso conhecido e provido.
A arrendante, no contrato de leasing, não responde objetivamente pelos danos causados pela
arrendatária, diretamente ou por seu preposto.”
(Rec. esp. 4.187 - Rel. Min. lvio de Figueiredo - Bradesco Leasing x Diniz Vital - DJ de
19.11.90).
Confiram-se as RTs 574/216 e 602/227, bem como os dois julgados abaixo transcritos,
elucidativos quanto ao claro entendimento dos tribunais sobre a matéria:
PROCESSUAL CIVIL – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO DECORRENTE DE ACIDENTE DE
TRÂNSITO CAMINHÃO SUPOSTAMENTE CAUSADOR DO SINISTRO QUE É OBJETO
DE ARRENDAMENTO MERCANTIL DEMANDA AJUIZADA CONTRA A INSTITUIÇÃO
ARRENDANTE IMPOSSIBILIDADE ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM
MANIFESTA EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO
ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA CONCEDIDA À PARTE PELO MAGISTRADO SINGULAR
LEI 1.060/50 PRETENDIDA FIXAÇÃO DE VERBA EM URH'S IMPOSSIBILIDADE
ADVOGADO CONSTITUÍDO PELA PRÓPRIA PARTE INTELIGÊNCIA DOS ARTS. 7º E
17, II, DA LC 155/97 RECURSO DESPROVIDO 1. "A responsabilidade civil por ato
ilícito decorrente da utilização de veículo objeto de leasing é do arrendatário, até porque
não pode o arrendante interferir nas condições de uso da coisa. Inexiste, pois, vínculo de
atributividade em relação ao lessor de maneira a justificar sua posição no pólo passivo da
demanda. Ademais, nada obstante a idéia genérica de arrendamento, o contrato de leasing
tem características que o distinguem da locação propriamente dita, não se lhe aplicando a
Súmula 492 do STF" (Maria Helena Diniz). 2. "A remuneração pelo estado ao defensor
dativo e assistente judiciário somente será devida quando a nomeação decorrer de pedido
formulado pela parte interessada, por petição escrita, dirigida ao juiz da vara, verificada a
insuficiência de recursos pelo magistrado ou autoridade judiciária competente para
conhecer e julgar a pretensão civil ou criminal" (art. da LC 155/97). 3. "Não será
devida a remuneração ao advogado assistente e judiciário ou defensor dativo quando o
beneficiário da assistência judiciária, qualquer que seja sua situação econômico-financeira,
apresentar-se com advogado constituído" (art. 17, II, da LC 155/97). (TJSC – AC
2002.017879-4 – Biguaçu – 3ª CDCiv. – Rel. Des. Marcus Tulio Sartorato – J. 10.02.2006)
8000112 PROCESSUAL CIVIL APELAÇÕES CÍVEIS ACIDENTE DE TRÂNSITO
FALECIMENTO DE VÍTIMA MENOR DE IDADE DANOS MORAIS E MATERIAIS
SENTENÇA ANULADA INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA DO JUÍZO EM RAZÃO DA
MATÉRIA CONVALIDAÇÃO DOS ATOS PROCESSUAIS ANTERIORES
JULGAMENTO DE MÉRITO PELO TRIBUNAL PRINCÍPIO DA CAUSA MADURA
EMPRESA DE ARRENDAMENTO MERCANTIL (LEASING) –RESPONSABILIDADE NÃO
INCIDENTE EXCLUSÃO DA LIDE RECURSO PROVIDO CULPA CONCORRENTE
DOS PAIS RECONHECIDA INDENIZAÇÃO DEVIDA REFORMATIO IN PEJUS
AFASTADA PARTE BENEFICIÁRIA DA JUSTÍÇA GRATUITA CUSTAS
PROCESSUAIS PELA RECORRENTE SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA NOS DANOS
MORAIS INOCORRÊNCIA CONDENAÇÃO NOS DANOS MATERIAIS
HONORÁRIOS COMPENSADOS ART. 21, CAPUT, CPC PROVIMENTO PARCIAL I
Preliminares: Nulidade da sentença por incompetência absoluta do juízo em razão da
matéria. Acolhida. Sentença anulada. Nulidade do processo. o apreciação dos embargos
167
declaratórios. Prejudicada. II – Mesmo verificada a nulidade absoluta da sentença, plausível
o deslinde de mérito pelo Tribunal, pois em plenas condições de julgamento, com vistas a
minimizar as conseqüências formais do processo ao fim colimado da prestação jurisdicional
efetiva. Deve-se conferir maior eficácia à principiologia do direito, sob pena de se perder a
utilidade da prestação jurisdicional. Aplicação do Princípio da Causa Madura. Art. 515, §
3º, CPC. III No leasing a empresa arrendadora é uma intermediária na conclusão do
negócio jurídico não interferindo na utilização da coisa, o que afasta a aplicação da Súmula
492 do STF e impõe a sua exclusão do dever de indenizar. IV Reconhecida a culpa in
vigilando dos pais, vez que negligenciaram a atitude inesperada da filha menor de 8 anos,
aplica-se a concorrência de culpas, devendo o quantum indenizatório ser arbitrado de forma
moderada e proporcional. V – Não que se cogitar em reformatio in pejus, uma vez
procedido, nesta esfera, novo e independente julgamento de mérito. VI Sendo o recorrido
beneficiário da justiça gratuita, custas processuais às expensas da recorrente. VII Sem
sucumbência recíproca nos danos morais, fixa-se os honorários em 10% (dez por cento)
sobre o valor da indenização. VIII Na condenação dos danos materiais, não sendo o valor
pleiteado meramente estimativo, os honorários devem ser compensados, conforme o art. 21,
caput, CPC. Recurso conhecido e parcialmente provido. Unanimidade. (TJPA AC Ac.
54.538 C.Cív.Isol. Relª Desª Luzia Nadja Guimarães Nascimento J. 12.08.2004)
JCPC.21 JCPC.515 JCPC.515.3)
Em contrapartida, as principais excludentes da responsabilidade civil, que envolvem a negação
do liame de causalidade, são: o estado de necessidade, a legítima defesa, a culpa exclusiva da vítima,
o fato de terceiro, a cláusula de não indenizar e o caso fortuito ou força maior. Sustenta-se, pois, não
haver responsabilização civil da instituição financeira que efetua contrato de arrendamento mercantil
com pessoas naturais ou jurídicas que acabam por envolver o objeto do arrendamento em atos ilícitos
mediante o uso do bem, justamente pela ausência da chamada guarda jurídica desse e pela ausência de
relação direta com o terceiro causador do dano, que envolve fato de terceiro.
A jurisprudência é pacífica nesse sentido:
“Responsabilidade civil Fato de terceiro Causador direto do dano que foi
mero instrumento da ação de terceiro Fato equiparado ao caso fortuito – Teoria
do risco afastada – Terceiro que é causador único do evento.” (RT 651/99).
“Responsabilidade civil Ônibus abalroado por caminhão e arremessado contra
outro veículo Exclusão de culpa do motorista do ônibus Ação de indenização
improcedente. Quando a primeira culpa, causadora da segunda, é de tal força e de
tal intensidade que exclui a liberdade de ação do segundo culpado, este terá
excluída a sua culpa.” (RT 404/134).
Todavia, sustenta-se que, não obstantes as situações casuísticas identificadas no
âmbito da doutrina e, também, enfrentadas pelos tribunais, de onde se extraem os julgados
168
colacionados, é preciso definir que a responsabilidade civil no plano dos contratos bancários
segue a regra geral do Código Civil, alinhada com parâmetros específicos do Código de
Defesa do Consumidor, na hipótese de contratação de serviço bancário.
Assim, baseando-se na doutrina de Silvio de Salvo Venosa
162
, sustenta-se que os três
requisitos de caracterização da responsabilidade civil - culpa, dano e nexo de causalidade -
devem caracterizar-se para identificação do fenômeno no plano dos contratos bancários.
Nestes termos:
a) pode-se dizer que a culpa vem a ser o centro da responsabilidade civil subjetiva,
planificada no Código Civil e carreada como um ato ou uma conduta eivada de negligência,
imperícia ou imprudência, observando que a culpa vem moldada pela escolha (in
eligendo), pela fiscalização do patrão (in vigilando), pela abstenção indevida (in
omittendo) e, na forma, como ato positivo (in comitendo), além da possibilidade de sua
identificação pela culpa concreta, ou seja, aquela em que se avalia uma conduta específica, e
também pela culpa abstrata, em que se baseia no comportamento padrão do homem médio;
há, ainda, a culpa contra a legalidade, que vem de ser praticada pelo descumprimento de
normas jurídicas como, por exemplo, não fumar, não utilizar celulares, não utilizar aparelhos
de segurança e, no caso dos contratos bancários, não observar determinações emanadas do
Banco Central. Por fim, existe a ocorrência da culpa concorrente, que está delineada no artigo
945 do CC, que traz à baila a teoria da aplicação da causalidade adequada (Enunciado 47 da I
Jornada de Direito Civil do STJ);
b) o dano, por sua vez, pode ser identificado como individual, coletivo, material ou
moral. Assim, pela leitura dos artigos 402, 403, 404 e 946 do CC, existe a figura dos danos
emergentes e dos lucros cessantes, pois o dano material ou patrimonial é aquele suscetível de
avaliação pecuniária objetiva, podendo ser reparado por reposição em dinheiro, sendo que o
162
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil. Responsabilidade civil. 5 ed. São Paulo: Atlas, 2005, p. 28-105.
169
dano emergente, por sua vez, é aquele em que se apura o que efetivamente se perdeu, ao passo
que o lucro cessante é aquilo que efetivamente deixou de se ganhar; o dano reflexo ou por
ricochete está delineado sobre os dependentes diretos ou indiretos (filhos, esposa, por
exemplo, em razão de danos causados ao pai). Por fim, como positivação no direito brasileiro,
pode-se citar a Lei 7347/85, que regula a questão dos danos causados ao meio ambiente, ao
consumidor, a bens e direitos de valor artístico, histórico, rústico, paisagístico e, por último, o
dano moral que decorre, essencialmente, por lesão aos direitos da personalidade,
especialmente, pela lesão à imagem-atributo (artigo 5.º, X, da CF) e pela imagem-retrato
(artigos 5.º, V, da CF, e 21 do CC), baseados nos direitos da personalidade (artigos 11 a 21 do
Código Civil);
c) por derradeiro, o nexo causal pode ser delineado pela inteligência do artigo 13 do
Código Penal segundo a qual: “O resultado, de que depende a existência do crime, somente é
imputável a quem lhe deu causa. Considera-se causa a ação ou omissão sem a qual o
resultado não teria ocorrido.” Vale dizer, ainda, que a causa e a concausa podem advir da
estrutura delineada pelo artigo 403 do CC, sem perder de vista a aplicação da teoria da
causalidade adequada, que decorre da leitura do artigo 945 do Código Civil, como já
argumentado.
De outro turno, vale a observação trazida pela doutrina de Américo Luiz Martins da
Silva
163
, no que diz respeito à forma de reparação civil do dano moral (extrapatrimonial)
quando efetivamente demonstrado:
A reparação civil de danos decorrentes de atos ilícitos pode ser fixada de três
maneiras diferentes: a) por acordo entre o ofensor e ofendido, ou por quem tem a
obrigação de indenizar o ofendido (reparação convencional reparação cujo
quantum é fixado pela vontade dos interessados); b) em alguns casos, pela
determinação da lei (reparação legal – reparação cujo quantum é fixado pela lei); c)
por arbitramento admitido em sentença judicial (reparação judicial – reparação cujo
quantum é fixado por sentença judicial).
163
SILVA, Américo Luís Martins da. O dano moral e a sua reparação civil. 3ª ed., São Paulo, RT, 2005, p. 371.
170
Filiamo-nos à corrente que admite a aferição da responsabilidade civil pelo plano
convencional e judicial, na medida em que pode haver transação (artigo 840 do Código Civil
brasileiro) para prevenir ou findar litígio decorrente de responsabilidade civil nos contratos
bancários e, ainda, pelo plano judicial, na medida em que a questão da responsabilidade civil
nos contratos bancários poderá ser sempre submetida à apreciação do Poder Judiciário. Não
que se falar em responsabilidade legal, segundo a doutrina acima, pois não norma
jurídica que determine valores ou dever de indenizar objetivamente e que vincule
especificamente à questão da responsabilidade civil nos contratos realizados pelas instituições
financeiras.
Em qualquer fattispecie em que se discuta a ocorrência ou não da responsabilidade
civil no plano dos contratos bancários, sustenta-se, pois, que os três pressupostos adredemente
delineados deverão ser objeto de investigação pelo viés da responsabilidade civil subjetiva,
com a perquirição e identificação da culpa e do dano.
Sustenta-se que deve haver uma hermenêutica construtiva da questão da
responsabilidade civil nos contratos bancários, pelo fato de existir um número grande de
regulamentos que interferem sensivelmente na formulação do contrato bancário e, ainda, uma
fiscalização rígida das atividades desenvolvidas pelas instituições financeiras, seja pelo Banco
Central, seja pela própria instituição financeira em seu seguimento de compliance, o que
evidencia uma atividade altamente regulada, daí também o motivo da aferição da
responsabilidade civil pelo plano subjetivo, com perquirição da culpa, como se defende no
item seguinte.
171
3.6 A responsabilidade civil objetiva e subjetiva no âmbito dos contratos bancários
Foi desenvolvida conclusão no capítulo I, item 1.3., da idéia de que a responsabilidade
civil nos contratos bancários terá feição pautada pelo plano subjetivo ante a disposição do
artigo 927, parágrafo único, do Código Civil, que exige expressa previsão em lei, embora o
risco da atividade bancária traga dever de reparar dano, salvo nos casos de culpa exclusiva ou
concorrente do cliente bancário (artigo 945 do Código Civil).
Contudo, apenas uma situação que parece estatuir uma responsabilidade objetiva
da instituição financeira por previsão legal agregada ao risco integral da atividade
profissional, que decorre da Lei 7102/83, que criou aos bancos um dever de segurança ao
público em geral, especialmente, aos usuários e clientes da instituição financeira.
Investigam-se os seguintes julgados:
A responsabilidade pelo pagamento dos danos morais e patrimoniais causados a
cliente do banco por assalto é do próprio banco, por força do disposto na L 7102/83,
independentemente de existir empresa contratada para fazer a segurança do local.
Em caso de assalto a banco não pode ser alegado motivo de força maior, pois o
roubo é fato previsível na atividade bancária (STJ, T., REsp 182284-SP, rel. Min.
Pádua Ribeiro, j. 2.12.2003, v.u., DJU 19.12.03).
Esta corte tem entendimento firme no sentido da responsabilidade do banco por
roubo ocorrido no interior da agência bancária, por ser a instituição financeira
obrigada por lei (L 7102/83) a tomar todas as cautelas necessárias a assegurar a
incolumidade dos cidadãos, não podendo alegar força maior, por ser o roubo fato
previsível na atividade bancária. (STJ, T., REsp 227364-AL, rel. Min. Sálvio de
Figueiredo Teixeira, RT 794/226).
Em face dos riscos inerentes à atividade bancária, a Lei 7102/83 criou para as
instituições financeiras um dever de segurança em relação ao público em geral, razão
pela qual, ocorrendo assalto dentro de agência bancária e vindo a ser um dos clientes
atingido por projétil de arma de fogo, o banco tem a obrigação de indenizar o dano
experimentado, mesmo em casos de culpa exclusiva da vítima, fato de terceiro, caso
fortuito ou força maior, pois a responsabilidade do banco se funda na teoria do risco
integral (RT 781/366).
Anota-se, contudo, que, no caso de assalto a agência bancária, a jurisprudência vem
admitindo a responsabilidade civil pelo risco integral da instituição financeira, desde que o
172
evento danoso ocorra no interior da agência bancária, para os clientes e usuários em geral, na
medida em que eventual dano ocorrido fora da agência bancária e que cause dano a terceiro já
não está mais na esfera do dever de vigilância do banco, cabendo ao Estado a segurança a ser
prestada e não ao banco, ainda que eventos danosos ocorram defronte a ele ou em suas
redondezas, ou terceiros que locam espaços contíguos ao banco, como estacionamentos etc.
quem sustente existir responsabilidade civil objetiva por parte das instituições
financeiras em razão da concessão abusiva de crédito, com base no próprio artigo 927,
parágrafo único, do CC, em razão da responsabilidade que se atribui às instituições
financeiras ao conceder crédito de forma indiscriminada, de modo que isso possa resultar
efeitos perante terceiros contratantes do tomador do crédito bancário.
164
Acredita-se ser mais adequado filiar-se à corrente que reconhece apenas
comportamentos muito graves, investigados no plano da responsabilidade subjetiva, tal como
demonstra a construção do direito português
165
acerca dessa situação de responsabilização do
banco pela concessão abusiva do crédito. A culpa deverá ser investigada, sobretudo
considerando o cipoal de normas incidentes sobre as operações financeiras, conforme
demonstrado na dissertação. Aliás, a jurisprudência também reconhece a investigação da
culpa e o aspecto contratual no plano do direito bancário para perquirir a ocorrência ou não de
responsabilidade civil. Veja-se o seguinte julgado do TJRJ:
Ementa: Apelação civil. Indenização. Ação de indenização por danos morais e
materiais proposta sob o argumento de que o banco debitou automaticamente em
conta corrente, sem aviso prévio, valores de cartão de crédito, desequilibrando suas
contas. Pelo contrato firmado entre as partes, em especial na cláusula XXIII, item
13.4, é permitido o débito direto da conta do autor em hipótese como a dos autos.
Além disso, o próprio fato de ser o autor devedor confesso perante o banco réu,
permitiria que este procedesse à inclusão de seu nome, de forma regular, nos
cadastros de negativação. Desprovimento do primeiro recurso, provido o recurso do
réu, ora segundo apelante. (TJRJ, ApCiv, 7676/05, 1Câm., v.u., Rel. Des. Binato
de Castro, j. 05.07.05).
164
BENACCHIO, Marcelo. Responsabilidade civil do banco por concessão abusiva de crédito. In Contratos
Bancários. Coord. Ivo Waisberg e Marcos Rolim Fernandes Fontes. São Paulo: Quartier Latin, 2006, p. 430-437.
165
ALMEIDA, Margarida Maria Matos Correia Azevedo de. A responsabilidade civil do banqueiro perante os
credores da empresa financiada. Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra. Coimbra:
Coimbra Editora, 2003, p. 183-186.
173
Por outro viés, José de Aguiar Dias, invocando fundamentos diversos, mas todos
baseados na investigação da culpa no plano da responsabilidade subjetiva e harmonizando-a
com a perspectiva da responsabilidade contratual, sob a feição do contrato de depósito e pela
leitura da máxima do direito romano res perit domino”, observa que a responsabilidade dos
estabelecimentos bancários deve ser investigada pelo plano subjetivo, mediante aferição da
culpa e, naquele tempo, pela extensão do dano sofrido pela vítima civil. Ademais, segundo
Aguiar Dias, o risco profissional não pode ser projetado de forma a amparar eventual
responsabilidade objetiva dos estabelecimentos bancários, pois haverá casos em que nem
mesmo esse argumento será suficiente para aceitar referida conclusão.
166
Com base nessas assertivas, portanto, conclui-se pela investigação no plano da
responsabilidade subjetiva das instituições financeiras, harmonizada, caso a caso, com a
origem contratual e, também, com o risco decorrente da atividade desenvolvida.
3.7. A aplicação do Código Civil e do Código de Defesa do Consumidor concernente à
responsabilidade civil nos contratos bancários
O presente tópico enseja, preliminarmente, a transcrição da recente decisão tomada
pelo pleno do Supremo Tribunal Federal na ADIn 2.591/DF, julgado em 14/12/06, e após
publicados os Embargos de Declaração interpostos pela Procuradoria Geral da República, no
Diário da Justiça de 13/04/07, página 00083, volume 002271-01, reduziu-se a Ementa do
acórdão, que passou a ser:
EMENTA: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. LEGITIMIDADE RECURSAL
LIMITADA ÀS PARTES. NÃO CABIMENTO DE RECURSO INTERPOSTO
POR AMICI CURIAE. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO OPOSTOS PELO
166
DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil. Tomo I. 5ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1973, p. 376/386.
174
PROCURADOR GERAL DA REPÚBLICA CONHECIDOS. ALEGAÇÃO DE
CONTRADIÇÃO. ALTERAÇÃO DA EMENTA DO JULGADO. RESTRIÇÃO.
EMBARGOS PROVIDOS. 1. Embargos de declaração opostos pelo Procurador
Geral da República, pelo Instituto Brasileiro de Política e Direito do Consumidor -
BRASILCON e pelo Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor - IDEC. As duas
últimas são instituições que ingressaram no feito na qualidade de amici curiae. 2.
Entidades que participam na qualidade de amicus curiae dos processos objetivos de
controle de constitucionalidade, não possuem legitimidade para recorrer, ainda que
aportem aos autos informações relevantes ou dados técnicos. Decisões monocráticas
no mesmo sentido. 3. o conhecimento dos embargos de declaração interpostos
pelo BRASILCON e pelo IDEC. 4. Embargos opostos pelo Procurador Geral da
República. Contradição entre a parte dispositiva da ementa e os votos proferidos, o
voto condutor e os demais que compõem o acórdão. 5. Embargos de declaração
providos para reduzir o teor da ementa referente ao julgamento da Ação Direta de
Inconstitucionalidade n. 2.591, que passa a ter o seguinte conteúdo, dela excluídos
enunciados em relação aos quais não consenso: ART. 3º, § 2º, DO CDC.
CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. ART. 5o, XXXII, DA CB/88. ART.
170, V, DA CB/88. INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS. SUJEIÇÃO DELAS AO
CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. AÇÃO DIRETA DE
INCONSTITUCIONALIDADE JULGADA IMPROCEDENTE. 1. As instituições
financeiras estão, todas elas, alcançadas pela incidência das normas veiculadas pelo
Código de Defesa do Consumidor. 2. "Consumidor", para os efeitos do Código de
Defesa do Consumidor, é toda pessoa física ou jurídica que utiliza, como destinatário
final, atividade bancária, financeira e de crédito. 3. Ação direta julgada
improcedente.
O recente acórdão do STF foi analisado por Arnoldo Wald
167
, que concluiu:
35. De qualquer modo, não dúvida que por ampla maioria, nove votos contra dois,
somando-se as manifestações dos Ministros que davam provimento parcial com os
que negavam procedência à ação, mas ressalvavam a não incidência do CDC sobre a
política monetária, o STF reconheceu paralelismo e a ausência de conflito entre, de
um lado, as medidas que protegem o consumidor e de outro, a definição de juros e
correção monetária pelos órgãos competentes do governo, constituindo política
monetária. 36. (...) Duas teses parecem fundamentais: a primeira se refere à
necessidade de fazer prevalecer as políticas públicas sobre os eventuais direitos do
consumidor. A segunda importa em reconhecer a peculiaridade da moeda, tendo em
vista que a legislação monetária não é norma de simples conteúdo contratual e que a
moeda não é um bem como qualquer outro, mas uma unidade de conta definida pelo
Poder Público e uma medida de valor que se impõe à sociedade. 37. No tocante às
políticas públicas, uma tendência no direito constitucional mais recente de
reconhecer que elas podem revelar mutações constitucionais implícitas e que se
destacam dos princípios constitucionais, embora atendendo às finalidades destes.
Assim, para a melhor doutrina, a diretriz política, policy ou política pública, é
conceituada como um conjunto de normas que propõe um objetivo econômico,
político ou social, que se considera necessário. 40. O segundo aspecto importante da
decisão consiste no reconhecimento implícito, mas incontestável, da natureza
peculiar da moeda, cuja estabilidade é condição do desenvolvimento econômico e da
justiça social, razão pela qual a análise da moeda e do crédito ultrapassam o campo
da economia. 44. (...) É este que evidentemente deve prevalecer, especialmente,
porque a Suprema Corte reconheceu que o CDC não trata nem do custo nem da
remuneração do dinheiro nas operações bancárias.
167
WALD, Arnoldo. O CDC e os bancos. In Revista de direito bancário e do mercado de capitais. São Paulo:
RT, ano 10, n. 35, jan-mar de 2007, p. 285-287.
175
Parece que aquela distinção entre atividade financeira e atividade bancária é relevante
para se interpretar corretamente essa decisão do STF, especialmente porque a incidência do
CDC não poderá recair sobre políticas públicas monetárias, nem tampouco sobre a
composição do custo e da remuneração em dinheiro em operações financeiras realizadas por
instituições financeiras, mas sim sobre produtos e serviços disponibilizados pelos bancos em
razão dos contratos bancários, inclusive, para aqueles que tenham por objeto operações
financeiras ativas ou passivas, em conjunto com as normas do Código Civil.
O Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, ao decidir questão pertinente à
aplicação do CDC aos contratos bancários e referente às conseqüências de responsabilidade
civil, firmou entendimento de que a instituição financeira está adstrita a cumprir as
determinações do Conselho Monetário Nacional, executadas pelo Banco Central do Brasil.
Transcreve-se a ementa:
Ementa: Ação civil pública movida em face ao Banco do Brasil. R. Sentença que
julgou o pedido improcedente. Alegada insuficiência nas informações acerca das
tarifas bancárias. Sustentação que não restou comprovada na hipótese dos autos.
Banco apelado que observa as regulamentações estabelecidas pelo Banco Central,
além de manter vários meios de informação à disposição de seus correntistas, seja
por tabelas expostas nas agências, Internet, terminais de auto-atendimento, folders,
extratos bancários, telefone e o mais conexo. Meios utilizados que superam as
determinações do Bacen. Alegada violação aos artigos 6º, III, e 31 da Lei do
Consumidor que não prosperam, já que os referidos textos de lei não aludem à
forma de informar aos consumidores, mas tão-somente à necessidade de
informações claras, o que restou evidenciado nos autos. Negado provimento. (TJRJ,
Ap. Cív. 51232/05, m. Cív., Rel. Des. Reinaldo Pinto Alberto Filho, j.
24.01.06).
Quanto à responsabilidade civil nos contratos bancários, o diálogo que deverá haver
entre as duas fontes normativas CDC e CC associado às normas de direito bancário e
resoluções do Banco Central, autorizará a investigação da fattispecie da responsabilidade civil
no bojo dos contratos bancários.
Não se pode deixar de observar que a responsabilidade civil no ordenamento jurídico
brasileiro vem regulada pelo Código Civil (artigos 186, 927 e 944), tratando-se, pois, de
norma especial, na medida em que o Código de Defesa do Consumidor e outras normas
176
jurídicas não tratam do assunto responsabilidade civil de forma específica, tal como faz o
Código Civil. Portanto, a aferição da responsabilidade civil nos contratos bancários deve
pautar-se, inicialmente, pelas disposições do digo Civil e, eventualmente, tratando-se de
serviços bancários prestados a cliente e não clientes, poderá invocar o Código de Defesa do
Consumidor para constatar eventual defeito no serviço e ocupações pertinentes ao ônus da
prova, pois, nessa hipótese, será norma especial em relação ao Código Civil, que silencia
quanto a esse aspecto específico.
Sustenta-se, ainda, não se tratar de lacuna normativa, mas sim de integração e
subsunção de fato à norma jurídica. Para tanto, justifica-se que distinção no plano da
teoria geral do direito entre analogia e interpretação extensiva. Eliseu Amaral Camargo,
citando robusta doutrina (Larenz, Bobbio, Trabucchi, Ferrara, Reale e Limongi França),
considera a distinção entre analogia, interpretação extensiva e indução, resumindo:
Não se confundem o método da analogia e o emprego da indução e da
interpretação extensiva no Direito. Com efeito, a indução consiste em generalizar
para todos os casos da mesma natureza aquilo que é válido para um deles, ao
passo que a analogia limita-se a estender o que é válido para certo caso a um outro
que lhe seja similar. a interpretação extensiva nada mais faz que reconstruir a
vontade legislativa existente para a relação jurídica, que somente por uma inexata
compreensão parece, à primeira vista, dela excluída; ao passo que, ao contrário, a
analogia depara com uma lacuna, com um caso não previsto, procurando superá-la
por meio de casos afins.
168
Norberto Bobbio
169
também doutrina que o processo de auto-integração do direito se
realiza por meio de dois procedimentos: a analogia e o uso dos princípios gerais, o que está
em consonância com nosso ordenamento jurídico, pela leitura que deve ser feita da Lei de
Introdução ao Código Civil, especificamente, artigo 4.º Maria Helena Diniz
170
apresenta
vários pontos de distinção não apenas teóricos, mas práticos, e esclarece:
168
CAMARGO, Eliseu Amaral. A analogia como método de solução de lacunas do ordenamento jurídico A
visão do STF. LOTUFO, Renan. Coordenador. Lacunas do ordenamento jurídico. Barueri: Manole, 2005, págs.
160/162.
169
NORBERTO, Bobbio. Teoria generale del diritto. Torino: G. Giappichelli Editore. 1993, págs. 265-273.
170
DINIZ, Maria Helena. As lacunas no direito. 7 ed. São Paulo: Saraiva, 2002, págs. 180-181.
177
A analogia é um mecanismo auto-integrativo do direito e não interpretativo,
no sentido de que não parte de uma lei aplicável ao fato, porque esta não existe, mas
procura norma que regule caso similar ao não contemplado, sem contudo criar
direito novo. É pressuposto da aplicação analógica que o fato sub judice se trate de
um caso que o legislador não previu, porque se o tivesse previsto, ainda que não
claramente compreendido na letra da lei, teria lugar a interpretação extensiva. Do
exposto se infere que um ponto de contato entre elas. Ambas são extensivas no
sentido de autorizar a aplicação do significado das palavras constantes do texto a
casos que não estão incluídos na significação, mas não se confundem, como vimos,
e lícito não é equipará-las.
Conclui-se, pois, que toda a leitura do fato responsabilidade civil nos contratos
bancários ocorrerá por meio de uma interpretação planificada pela responsabilidade subjetiva,
valendo-se da subsunção e, por vezes, da integração por meio da analogia e extensão, como
identificado. É certo, também, que a hermenêutica construtiva do fenômeno é válida para
amplificar os efeitos das disposições do Código Civil e do Código de Defesa do Consumidor,
especialmente se for considerado que o próprio Banco Central e o Conselho Monetário
Nacional também instituíram, como foi demonstrado, o denominado “Código de Proteção
do Cliente Bancário”, Resolução 2.878/01, do Banco Central do Brasil, que mereceria maior
divulgação junto ao público em geral.
Não se pode deixar de anotar as percucientes explicações trazidas à baila pela doutrina
pátria, especialmente pela área de consultoria jurídica da FEBRABAN em relação a questões
que são próprias do sistema financeiro e que não podem ser colocadas em uma situação
comum contratual, ante as especificidades do contrato bancário e as questões de
responsabilidade civil que dele decorrem, como doutrinam Johan Albino Ribeiro e William
Salasar.
171
É fato comprovado que determinadas disposições do Código Civil fazem ampliar
conceitos estabelecidos no Código de Defesa do Consumidor, o que possibilita uma
interpretação que efetive uma sistematização e alcance o objetivo das duas normas jurídicas,
171
RIBEIRO, Johan Albino e SALASAR, William. O sistema protetivo dos clientes bancários: da o
aplicação do CDC às atividades bancárias. In Revista de direito bancário e do mercado de capitais. São Paulo:
RT, ano 09, n. 32, abr-jun de 2006, p. 111/126.
178
tal como identificado pela doutrina, observando, pois, que as disposições do Código de
Defesa do Consumidor não podem ser aplicadas, em síntese, ao custo do dinheiro no que diz
respeito aos contratos bancários.
172
Entretanto, é oportuno mencionar no que diz respeito à responsabilidade civil no
plano dos contratos bancários, a prevalência do Código Civil por conter regras específicas em
relação ao Código de Defesa do Consumidor, tais como questões pertinentes à prescrição, à
apuração da extensão dos danos e a teoria da causalidade adequada. Assim, sustenta-se que
exemplos práticos de incidência do Código de Defesa do Consumidor aos contratos bancários
dizem respeito ao dever de informação, ao conhecimento prévio e clareza dos contratos, ao
controle de cláusulas abusivas e ao controle de práticas abusivas, pois contidas nas
disposições do CDC e não no Código Civil.
173
3.8. A incidência da legislação ambiental na responsabilidade civil no plano dos
contratos bancários
A doutrina vem propugnando interpretação extensiva ao art. 12 da lei 6938/81 (que
trata do agente poluidor) e também pelo artigo 2.º da Lei 8.974/95 (posteriormente substituída
pela Lei 11.105/05 – Lei de biossegurança), e também pela Lei 9.605/9 (Lei dos crimes
ambientais).
Sustenta a doutrina que, se houver participação de instituição financeira na concessão
abusiva de crédito para projetos e financiamentos empresariais que venham causar dano
172
Enunciado 42, da I Jornada de Direito Civil do CJF/STJ: “O artigo 931 amplia o conceito de fato do produto
existente no artigo 12 do CDC, imputando responsabilidade civil à empresa e aos empresários individuais
vinculados à circulação dos produtos.” Enunciado 167 da III Jornada de Direito Civil do CJF/STJ: “Com o
advento do CC/02, houve forte aproximação principiológica entre esse Código e o CDC no que respeita à
regulação contratual, uma vez que ambos são incorporadores de uma nova teoria geral dos contratos.”
173
PFEIFFER, Roberto Augusto Castellanos. Aplicação do código de defesa do consumidor aos serviços
bancários. In: Revista de direito privado e do mercado de capitais. Coordenação Arnoldo Wald. Ano 10, n. 38.
São Paulo: RT, 2007, p. 90/98.
179
ambiental, haverá responsabilidade objetiva calcada nas normas mencionadas no parágrafo
anterior e com base no artigo 927, parágrafo único do CC.
174
que se tomar o devido cuidado em distinguir essas conseqüências jurídicas nos
efeitos dos contratos bancários, pois a responsabilidade objetiva pode ensejar um
desvirtuamento da idéia do risco da atividade, pois não previsão expressa em lei. Parece
mais prudente adequar a via da responsabilidade subjetiva para verificar se a instituição
financeira agiu com culpa na concessão do crédito a cliente que causou dano ambiental, até
porque se trata de fato praticado por terceiro, que deve seguir norma especial, regulada no
artigo 932 do Código Civil, hipótese em que não se delineia referida situação e de rol
taxativo.
A própria doutrina nacional que defende a total aplicação do Código de Defesa do
Consumidor aos contratos e procedimentos bancários divide e visualiza as questões baseadas
no aspecto contratual e na prestação de serviços, mas evidencia o dever do Banco Central na
aplicação das sanções administrativas, como decorrente de um dever legal. Essa é a conclusão
de Antônio Carlos Efing.
175
Veja-se o seguinte julgado proferido pelo Superior Tribunal de Justiça no que diz
respeito a um sistema de serviços bancários, associado às disposições tanto do Código de
Defesa do Consumidor quanto do próprio Código Civil, a evidenciar um diálogo das duas
fontes normativas, com base no plano da responsabilidade subjetiva e investigação da
ocorrência de culpa.
Ementa: Civil. Conta-corrente. Saque indevido. Cartão magnético. Senha.
Indenização. Improcedência. 1. O uso do cartão magnético com sua respectiva é
exclusivo do correntista e, portanto, eventuais saques irregulares na conta somente
geram responsabilidade para o Banco se provado ter agido com negligência,
imperícia ou imprudência na entrega do numerário. 2. Recurso Especial conhecido
174
ENEI, JoVirgilio Lopes. Project Finance. Financiamento com foco em empreendimentos. São Paulo:
Saraiva, 2007, p. 264-277.
175
EFING, Antônio Carlos. Contratos e procedimentos bancários à luz do CDC. São Paulo: RT, 1999, p.
71/259.
180
e provido para julgar improcedente o pedido inicial. (STJ, 4ª T., REsp 602.680-BA,
Rel. Min. Fernando Gonçalves, DJU 16.11.04).
Mostra-se arrojado por demais atribuir responsabilidade objetiva a uma instituição
financeira pelos danos causados ao meio ambiente por fato praticado por cliente tomador de
empréstimo, pois o nexo de causalidade por si ficará frágil para se chegar a tal conclusão,
além da necessidade de se invocar a teoria da causalidade adequada que não se apresenta
razoável no tema destacado.
3.9 Os diferentes tipos de instituições financeiras e a responsabilidade civil das mesmas
na relação contratual
A Lei Complementar n. 105 de 10/01/01, que trata do sigilo nas operações financeiras
estabelece quais são as pessoas jurídicas consideradas instituições financeiras, no artigo 1.º,
parágrafo primeiro. Referida definição foi enfrentada no capítulo II, item 2.1.2, da
dissertação.
Todas se enquadram na condição de instituição financeira e, portanto, ficam sujeitas
ao regime geral de responsabilidade civil em contratos bancários desenvolvidos na presente
dissertação.
No que diz respeito à recente figura do Representante Bancário”, não se pode dizer
expressamente tratar-se de instituição financeira, eis que é, na verdade, um prestador de
serviços, conforme Circular 2978/00 do Banco Central, nem ao menos se equiparando à
instituição financeira, hipótese que afasta a responsabilidade civil do representante bancário
como tal e o apenas como uma pessoa jurídica que oferece um serviço bancário por
representação direta da instituição financeira.
Portanto, se houver prática de ato ilícito pelo representante bancário, isso poderá
ensejar responsabilidade civil da instituição financeira pela culpa in eligendo e in vigilando, a
181
teor do artigo 932, IV, do CC, se decorrente do serviço bancário oferecido. Em contrapartida,
a falha na realização de serviço efetivado por representante bancário poderá ser enquadrada
no artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor, contudo, poderá ser afastada pela prova de
que o defeito não existiu ou que houve culpa exclusiva do consumidor, consoante autoriza o
artigo 14, parágrafo 3.º, incisos I e II, do CDC.
Conforme declinado no item 2.1.2 da dissertação, pela estruturação normativa
existente (artigos 22, 23, 24, 25 da Lei 4.595/64), sobretudo pelas resoluções do Banco
Central, evidencia-se que basicamente existem dois tipos de instituições financeiras: as
públicas e as privadas, subdivididas em razão de atividades diferenciadas. Como exemplo de
instituições financeiras públicas têm-se o Banco do Brasil e também as Caixas Econômicas,
que desenvolvem, no entanto, atividades reguladas pelo direito privado.
No âmbito das instituições financeiras privadas, por meio de consulta direta aos
informes do Banco Central do Brasil
176
, considerando-se as diversas resoluções, circulares e
portarias do mesmo, pode-se destacar a existência e regulação: os bancos comerciais, os
bancos de investimentos (Resolução 2624/99), os bancos cooperativos (Resolução 2788/00),
as conhecidas financeiras ou sociedades de crédito, financiamento e investimento (Portaria
309/59), as cooperativas de crédito (Resolução 3321/05), as sociedades de crédito imobiliário
e as associações de poupança e empréstimo (Decreto-Lei 70/66), as companhias hipotecárias
(Resolução 2122/94), as agências de fomento (Resolução 2828/01), as sociedades de crédito
ao microempreendedor (Resolução 2874/01), as sociedades de arrendamento mercantil
(Resolução 2309/96), os bancos múltiplos (Resoluções 1524/88 e 1364/88), a recente figura
do representante bancário (Circular 2978/00). Ainda, há que se destacar a existência de
regulação sobre sociedades distribuidoras de títulos e valores mobiliários (Resolução
176
Consultar diretamente o sítio do Banco Central do Brasil na Internet: <www.bacen.gov.br>
182
1653/89), as sociedades corretoras de títulos e valores mobiliários (Resolução 1655/89) e as
sociedades corretoras de câmbio (Resolução 1770/90).
Frise-se, novamente, que a jurisprudência também classifica como instituições
financeiras empresas administradoras de cartões de crédito e, por conseguinte, não faz
incidirem as limitações da Lei da Usura (Decreto 22.626/33) aos juros remuneratórios por elas
cobrados.
177
Todavia, quase a totalidade das empresas administradoras de cartões de crédito
foi transformada em instituição financeira, em razão da vinculação dos cartões de crédito nas
operações bancárias, no que ficou evidenciado pela multiplicidade de funções (crédito e
débito).
Outro aspecto importante que a jurisprudência
178
tem reconhecido, quanto à
classificação das instituições financeiras, diz respeito ao fato de que os bancos comerciais não
estão sujeitos a registro nos conselhos regionais de economia, por vincularem-se única e
exclusivamente ao Banco Central do Brasil. Em contrapartida, conseqüências jurídicas
decorrem para a União e para o próprio Banco Central na questão de enquadramento,
classificação e fiscalização das instituições financeiras, e a jurisprudência observa essa
questão, quando reconhece que é da competência da União a fixação do horário bancário no
país e também na legitimidade do Banco Central nas ações fundadas na Resolução 1154, de
1986.
179
Com exceção das cooperativas de crédito (Resolução 3321/05), as instituições
financeiras por força de lei deverão constituir-se unicamente sob a forma de sociedade
anônima, conforme a redação dada pela Lei 5.710, de 07/10/71, ao artigo 25 da Lei 4.595/64,
o que representa um tipo societário único de funcionamento das instituições financeiras no
177
Súmula 283 do STJ. As empresas administradoras de cartão de crédito são instituições financeiras e, por isso,
os juros remuneratórios por elas cobrados não sofrem as limitações da Lei de Usura.
178
Súmula 79 do STJ. Os bancos comerciais não estão sujeitos à registro nos conselhos regionais de economia.
179
Súmula 23 do STJ: O Banco Central do Brasil é parte legítima nas ações fundadas na Resolução 1.154, de
1986. Súmula 19 do STJ: A fixação do horário bancário, para atendimento ao público, é da competência da
União.
183
Brasil e observa toda uma estruturação organizacional diferenciada e complexa que implica
reflexos diretos nos contratos bancários e a própria responsabilidade civil, pois indica a
existência de uma pessoa jurídica, em princípio, extremamente estruturada, e que constrói e
lança mão de relações jurídicas negociais massificadas no mercado, daí porque a aplicação do
Código de Defesa do Consumidor no âmbito das instituições financeiras, conforme amplo
entendimento doutrinário e jurisprudencial.
180
Carlos Roberto Gonçalves também identifica a responsabilidade civil no plano das
instituições financeiras mediante uma análise sistemática do Código Civil e do Código de
Defesa do Consumidor, baseando suas conclusões na teoria do risco da atividade, muito
embora exija a perquirição da culpa e a investigação da participação da tima no evento
danoso, pela aplicação do artigo 945 do Código Civil, também vinculada à idéia da teoria
contratualista.
181
Enfim, pela fundamentação jurídica ora identificada, percebe-se que a estrutura
normativa existente no ordenamento jurídico brasileiro é a mesma para os diversos tipos de
instituições financeiras operantes no Brasil, contudo a responsabilidade civil no plano dos
contratos bancários segue a regra geral da investigação pelas disposições contidas no Código
de Defesa do Consumidor e do Código Civil, ante a inexistência de norma específica que
regule a questão dos contratos bancários e da responsabilidade civil.
180
Súmula 297 do STJ: O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras.
181
GONÇALVES. Carlos Roberto. Direito civil brasileiro. Responsabilidade civil. vol IV. São Paulo: Saraiva,
2007, p. 226/238.
CAPÍTULO IV
Perspectivas e propostas de modificação da legislação
4.1. Efetividade dos mecanismos de controle e intervencionismo estatal e a autonomia
privada
O artigo 4.º, inciso VIII, da Lei 4.595/64
182
, atribui ao Banco Central do Brasil,
conforme o artigo 9.º, da mesma norma, a competência para fazer cumprir as atribuições que
lhe são determinadas pela legislação em vigor e, também, as normas expedidas pelo Conselho
Monetário Nacional junto às instituições financeiras no exercício de suas atividades bancárias,
especialmente na realização de operações financeiras.
A rigor, essa fiscalização do Banco Central não deve ser apenas efetiva, mas sim
eficiente, ou seja, deve ter o poder de produzir um efeito real, que torne eficaz a norma
jurídica. Denota-se que as atividades desenvolvidas pelos bancos sofrem um grau de
intervencionismo estatal significante, até mesmo porque há nítido interesse público no regular
desenvolvimento das referidas atividades.
De outro lado, todavia, há a autonomia privada das instituições financeiras no regular
desenvolvimento de suas atividades, como assegura, inclusive, a própria Constituição da
República, nos artigos 170 e 192, e toda a estrutura do ordenamento jurídico brasileiro.
Na verdade, a autonomia privada no direito brasileiro vem modelada pela leitura que
se faz da função social do contrato, orientada pelo artigo 421 do Código Civil que instaura,
182
Lei 4595/64, art. 4.º, VIII: Compete ao Conselho Monetário Nacional, segundo as diretrizes estabelecidas
pelo Presidente da República:
(...)
VIII Regular a constituição, funcionamento e fiscalização dos que exercerem atividades subordinadas a esta
lei, bem como a aplicação das penalidades previstas;
185
por um lado, uma forma de vigilância sobre o contrato e, por outro, um ajuste dos resultados
do contrato perante terceiros. Nesse ponto, destaca-se, também, o princípio da boa-fé, que
deve ser objeto de concreção caso a caso, e que, segundo o artigo 113 do Código Civil, passa
a ser “critério hermenêutico central” do negócio jurídico. Surge, com isso, o que se
denominou, também, de princípio da “legitimidade da intervenção controladora” nos
contratos de massa, de adesão e que são impregnados de cláusulas gerais, visando estabelecer
um “princípio geral de controle” de cláusulas iníquas e abusivas ou, ainda, um princípio
geral de sindicância de todas as cláusulas elaboradas prévia e unilateralmente por uma das
partes, protegendo, na verdade, a autonomia privada e não uma ou outra parte, mas sim
todas.
183
Almeno de Sá, ao comparar a norma brasileira e portuguesa, acentua que a positivação
da função social do contrato visa estabelecer uma “justeza do contrato” e que a autonomia
privada possui uma função ordenadora atrelada ao momento de autodeterminação das partes.
Assim, a conformação jurídica da relação banco-cliente não encontra respaldo em uma única
norma jurídica, mas sim em espectro grande e extenso de normas de direito privado (Código
Civil e Código de Defesa do Consumidor e legislação bancária) e normas de direito público
que regulam o sistema financeiro.
184
Destaca-se que, quando um cliente entra em um banco,
ele não apenas ajusta um único negócio jurídico, mas também estabelece uma gama
diversificada de relações negociais, ou seja, entre ambas as partes banco e cliente - passa a
ocorrer uma relação negocial de trato sucessivo e de execução continuada. Em resumo: tanto
o banco, quanto o cliente pretendem adequar a relação de negócios sobre uma base contratual
183
SÁ, Almeno de. Relação bancária, cláusulas contratuais gerais e o novo Código Civil brasileiro. In Revista
Brasileira de Direito Comparado. N. 23. Rio de Janeiro: 2003, p. 167/177. Publicação semestral do Instituto de
Direito Comparado Luso-Brasileiro.
184
A doutrina estrangeira, especialmente Almeno de Sá, Professor da Universidade de Coimbra, encontra três
modos de se configurar uma relação cliente-banco: a primeira, considerando os diversos negócios bancários que
se travam em pura relação de fato; a segunda, baseada na responsabilidade pela confiança advinda da própria lei
e não apenas do contrato; a terceira, que identifica uma construção da relação contratual bancária.
186
que possa ser hábil para definir direitos e deveres para ambas as partes.
185
O que fica evidente
é que haverá sempre uma relação contratual entre o cliente e o banco, passível de solucionar
problemas existentes entre as partes. Esse contrato-quadro envida um dever entre as partes e
uma obrigação de prestar serviços por parte da instituição financeira, por meio da estrutura
organizacional do banco que o possibilita possuir uma cautela maior ao cuidar dos interesses
do cliente, pela sua notória especialização, o que decorre não do contrato, mas também da
lei.
186
Um problema que se identifica pelo fato de não haver uma positivação unificada de
normas de direito bancário é que a primeira regra a ser destacada na hipótese de distúrbio na
relação negocial passa a ser o próprio contrato bancário. Ou seja, ele assume um caráter de
norma entre as partes, o que é absolutamente normal, especialmente pela economia
estandardizada que ocorre praticamente em todos os países do planeta. Ante a complexidade
das normas jurídicas bancárias existentes, constata-se uma grande lacuna no ordenamento
jurídico brasileiro no que se refere ao direito bancário, na medida em que as questões se
resolverão pela hermenêutica de integração, sistematização e extensão para solucionar os
problemas ocorridos no âmbito dos contratos bancários. Daí a relevância dos contratos
bancários, pois eles serão a primeira regra a ser consultada para solucionar os problemas
ocorridos.
Quando se depara com transferência de responsabilidades e riscos do banco para o
cliente, na verdade, o veículo adequado para aferição desses problemas é o contrato bancário,
185
Nesse ponto, vale destacar que a base contratual é estabelecida em padrões (que constituem o contrato-
quadro) concebidos pelos agentes reguladores, que no Brasil são representados pelo Conselho Monetário
Nacional e pelo Banco Central. Do contrato-quadro podem surgir diversos outros negócios bancários específicos
que serão regulados pelas partes caso a caso. Exemplifica-se pela hipótese de uma simples abertura de conta-
corrente que posteriormente faz desencadear outros tipos de relações negociais, como aplicações financeiras,
cobranças de títulos, empréstimos pessoais, cartões de crédito e de débito etc. É óbvio, todavia, que o banco não
está obrigado a manter o cliente ou contratar outros tipos de operações, sobretudo pelas vedações a que es
submetido, tais como as operações e práticas vedadas às instituições financeiras previstas no Brasil pela
Resolução 3.258/05 do Banco Central.
186
SÁ, Almeno de. Relação bancária, cláusulas contratuais gerais e o novo Código Civil brasileiro. In Revista
Brasileira de Direito Comparado. N. 23. Rio de Janeiro: 2003, p. 177/217. Publicação semestral do Instituto de
Direito Comparado Luso-Brasileiro
187
contudo, baseado nas linhas gerais do direito contratual e, por vezes, em resoluções e portarias
do Banco Central do Brasil, como a Resolução 2878/01 (chamado inadvertidamente de código
de proteção do cliente bancário), contudo, desconhecido de boa parte da sociedade.
A rigor, o que se pretende alcançar atualmente no ordenamento jurídico brasileiro,
ainda que sem nenhuma sistematização ou unificação, no que diz respeito ao direito bancário,
é que exista um adequado equilíbrio de interesses entre as relações banco-cliente, seja de
qualquer modalidade, ensejando, inclusive, o próprio resgate de contratos, ainda que tenham
cláusulas não adequadas ou em não conformidade com o direito positivado. As disposições do
Código Civil e do Código de Defesa do Consumidor, aparentemente, até então têm sido
suficientes para fazer valer a ocorrência desse adequado equilíbrio de interesses.
Percebe-se, contudo, que a busca desse equilíbrio não ocorre por meio de decisões
administrativas ou dos órgãos fiscalizadores e operadores do Sistema Financeiro Nacional, ou
seja, o Conselho Monetário Nacional e o Banco Central do Brasil, pois quanto a questões
fáticas e concretas, eles nada fazem e todas as patologias que ocorrem no âmbito das relações
negociais bancárias, quaisquer que sejam, acabam desaguando no Poder Judiciário, o que
torna a questão ainda mais ampla, pela ausência de uniformização das decisões.
Questões atinentes à responsabilidade civil no plano dos contratos bancários, por
exemplo, praticamente são todas desaguadas no Poder Judiciário, pois não existe órgão
regulador e fiscalizador capaz de dirimir referidas controvérsias. É claro que nenhuma lesão
ou ameaça de lesão a direitos pode ser afastada de conhecimento do Poder Judiciário (CF, art.
5.º, XXXV), todavia muitas questões poderiam ser dirimidas na esfera administrativa ou nas
próprias instituições financeiras se existisse um órgão eficiente que tivesse capacidade de
processar agilmente referidas questões, tais como uma ouvidoria com regulação própria.
Como proposta para desafogar o Poder Judiciário e imprimir celeridade e
uniformidade às decisões de questões relativas ao direito bancário, especialmente a
188
responsabilidade civil no plano dos contratos bancários, seria a regulamentação, por parte do
próprio Conselho Monetário Nacional e do Banco Central do Brasil, da forma de
processamento e encaminhamento de reclamações junto às instituições financeiras ou órgãos
reguladores anexos que tivessem condições de pacificar os conflitos havidos, assegurando alto
grau de competência e especialização nas questões de direito bancário, muitas vezes tão
distantes do homem médio comum.
O Supremo Tribunal Federal no ano de 2005 decidiu diversas e relevantes questões
em direito bancário e que se caracterizaram, segundo a doutrina, como um marco no direito
bancário, sobretudo por reconhecerem a validade das determinações do Conselho Monetário
Nacional e por esclarecerem para a sociedade a linha divisória entre as competências do Poder
Monetário, que são exercidas pelo Poder Executivo, e as do Poder Judiciário para realizar a
função de controle da constitucionalidade e legalidade das normas instituídas pelas
autoridades monetárias, evidenciando uma maior segurança aos negócios bancários e
viabilizando o desenvolvimento econômico do país.
187
4.2 As possibilidades de alteração da legislação infraconstitucional
Como proposta e contribuição científica destaca-se, como evidenciado no item 4.1.,
a criação de mecanismos para processamento e recebimento de conflitos originados em
contratos bancários, que por vezes ganham alto grau de complexidade a ponto de se distanciar
por demais das questões normalmente levadas ao Poder Judiciário.
Assim, com base no artigo 840 do Código Civil, aplicando o instituto da transação,
para prevenir ou encerrar conflitos, muito interessante seria a criação, regulamentação e
187
WALD, Arnoldo. A recente evolução da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal em direito bancário.
In Revista de direito bancário e do mercado de capitais. São Paulo: RT, ano 09, n. 31, jan-mar de 2006, p. 7-11.
189
implementação na esfera administrativa e até mesmo privada no âmbito das instituições
financeiras, de órgãos capazes de dirimir conflitos e pacificar questões contratuais originadas
em relações bancárias. Isso seria absolutamente prático e possível, pois trata-se de direitos
patrimoniais disponíveis e passíveis de solução mais célere, segura e que imprimiria uma
uniformização ainda maior às questões bancárias, inclusive no âmbito da responsabilidade
civil.
O chamado PROCON timidamente tenta realizar referido papel, todavia, a instituição
e regulação pelo Conselho Monetário Nacional e pelo Banco Central do Brasil junto às
instituições financeiras e seus órgãos representativos (FEBRABAN e Confederação Nacional
do Sistema Financeiro) teriam condições materiais e organizacionais, bem como competência
para viabilizar a constituição de um órgão que tenha por escopo promover a conciliação, a
mediação e a arbitragem de questões suscitadas no plano dos contratos bancários, dentre elas
a responsabilização civil.
Nota-se que referida solução tem amparo normativo em nosso ordenamento jurídico, a
começar pela própria Constituição Federal, que visa alcançar a pacificação social como
princípio decorrente do artigo 3.º, inciso I, da CF, e a celeridade processual estatuída no artigo
5.º, inciso LXXVIII, da CF. No Código Civil, citam-se os artigos 104, 121 a 124 e,
especialmente, o instituto da transação designado no artigo 840 do Código Civil. O Código de
Processo Civil incentiva a conciliação por meio dos artigos 125, IV, 269, III, 277, 331, 448,
449, 584 e 475-N, incisos III e V. O Código de Defesa do Consumidor incentiva a conciliação
e mediação, nos artigos 5.º, IV, 6.º, VII e 107; e a Lei 9099/95 dos Juizados Especiais tem
como princípio jurídico a conciliação estatuída no artigo 2º.
Há, ainda, o quanto disposto na Lei 9.307/96 (Mediação e Arbitragem), como
prevêem seus artigos 21, par. 4.º, e 28. A própria Consolidação das Leis do Trabalho, não
obstante tratar-se de direitos patrimoniais indisponíveis, estatui a negociação, nos artigos 625-
190
A a H, artigos 856 a 875, 444, 8.º e 9.º, da CLT, nos quais se destacam as chamadas
Comissões de Conciliação Prévia.
188
A doutrina e a jurisprudência vêm incentivando a implementação da cultura de
conciliação, mediação e arbitragem no âmbito do direito brasileiro
189
e a proposta ora
idealizada seria instituir, no âmbito do Conselho Monetário Nacional, do Banco Central do
Brasil e dos órgãos representativos das Instituições Financeiras, mecanismos de viabilização
de solução de conflitos individuais surgidos no âmbito de contratos bancários, inclusive, de
responsabilização civil, como forma de uniformizar as decisões, imprimir celeridade à solução
dos referidos conflitos, implementar segurança aos clientes bancários e aos bancos pela
padronização e ensejar maior acuidade e estandardização de procedimentos bancários.
A questão de meios alternativos de solução de conflitos consubstancia-se na
conciliação, mediação e arbitragem que tem total implicação na autonomia da vontade,
autonomia privada e na teoria geral dos contratos, com inserção das chamadas cláusulas
compromissórias e compromissos arbitrais que poderiam ser inseridos nos contratos
bancários, todavia a regulação no âmbito dos contratos bancários deve, como sustentado,
ser regulada e autorizada por meio de normas emanadas do Conselho Monetário Nacional e
implementadas pelo Banco Central do Brasil, pois várias situações fáticas e jurídicas deverão
ser objeto de regulação prévia, como ocorrem em quaisquer questões submetidas à
188
Aliás, o tema da autocomposição de conflitos trabalhistas foi adotado como meio de minimizar e solucionar
eficazmente conflitos trabalhistas por Instituições Financeiras, como se denota do trabalho idealizado pelo Dr.
Ismal Gonzalez, no âmbito do Banco Itaú, ao conceber a Comissão extrajudicial de solução de conflitos
individuais, In Autocomposição de conflitos traballhistas. LTR, 1997.
189
DAMIANO, Henrique. O dever de negociar: uma visão Brasil/Espanha. Revista do TRT-15ª Região, n. 29,
Campinas, 2006, p. 93/97. GOMMA, Azevedo, André; CARVALHO E SILVA, Cyntia C. Autocomposição,
processos construtivos e a advocacia: breves comentários sobre a atuação de advogados em processos
autocompositivos. In Revista do Advogado, da AASP. Ano XXVI, n. 87, São Paulo: setembro de 2006, p. 115-
124. GAJARDONI, Fernando da Fonseca. A arbitragem nos tribunais estatais: 10 anos de jurisprudência. In
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de Justiça do Estado de São Paulo. In Revista do Advogado da AASP. Ano XXVI, n. 87, São Paulo: setembro
de 2006, p. 138-144.
191
arbitragem comum, a fim de regular dúvidas muito freqüentes, tal com acentua a doutrina de
Luiz Fernando do Vale de Almeida Guilherme.
190
Pertinente à responsabilidade civil no plano dos contratos bancários sustenta-se que as
normas jurídicas que atualmente vigoram no ordenamento jurídico brasileiro e que
estabelecem uma teoria geral dos contratos e uma teoria geral da responsabilidade civil,
baseada em uma visão sistemática e teleológica da Constituição Federal, do Código Civil, do
Código de Defesa do Consumidor e da legislação de direito bancário vigente, são suficientes
para solucionar questões fáticas colocadas em apreciação perante o sistema normativo, pela
hermenêutica da subsunção, integração e extensão, considerando-se que o sistema normativo
atual comporta efetividade para solucionar a responsabilização civil no plano dos contratos
bancários, como se demonstrou ao longo da dissertação.
Aliás, doutrina e jurisprudência têm-se utilizado da legislação vigente para solucionar
questões de responsabilização civil nos contratos bancários e não quem sustente haver a
necessidade de um diploma específico para regular referidas situações, até porque
desconhece-se que outros países também tratem referido assunto em um único diploma
normativo. Posto isso, a teoria geral dos contratos e da responsabilidade civil é
suficientemente capaz de enfrentar e dirimir questões relativas ao direito bancário.
No plano do direito comparado, por exemplo, considera-se a evolução da questão no
âmbito do direito francês regulando a responsabilidade do banqueiro por não respeitar a
legislação do mercado de capitais e similares, onde se anota a doutrina de Thierry Bonneau
191
,
ao comentar recente jurisprudência das cortes francesas, que não diferem em muitos aspectos
das conclusões a que chegaram os tribunais pátrios.
190
GUILHERME, Luiz Fernando do Vale de Almeida. Dúvidas freqüentes na eleição da arbitragem como
meio de solução de conflitos uma análise da autonomia da vontade e da teoria geral dos contratos. In
Revista de direito privado. Ano 6, julho-setembro de 2006, n. 23. São Paulo: 2006, p. 259-270.
191
BONNEAU, Thierry. La responsabilité du banquier encourue pour non respect de la législation relative au
blanchiment dês capitaux: panorame de jurisprudence recente. In Revista de direito privado. Ano 9, abril-
junho de 2006, n. 32. São Paulo: 2006, p. 127/141.
192
Ora, a responsabilidade civil no direito brasileiro, consoante doutrina Álvaro Villaça
Azevedo, citando Maria Helena Diniz, vem a se caracterizar como “a situação de indenizar o
dano moral ou patrimonial, decorrente de inadimplemento culposo, de obrigação legal ou
contratual, ou imposta por lei, ou, ainda, decorrente de risco para os direitos de outrem.”
192
A proposta ora idealizada, de criação de mecanismos alternativos de solução de
conflitos bancários, especialmente, de responsabilidade civil, pressupõe, por razões de
segurança jurídica e legitimação, a regulamentação pelas autoridades competentes – Conselho
Monetário Nacional e Banco Central em homenagem, também, ao princípio da legalidade,
pois lícito não é apenas o que a lei permite, mas tudo quanto ela não veda expressamente,
consoante dispõe o artigo 5.º, inciso II, da Constituição Federal. As edições de atos
infralegais, ou seja, que não tenham conteúdo formal de norma jurídica, aos moldes do
processo legislativo previsto na Constituição, também não retira sua eficácia, ante o fato de as
resoluções e normativos do Conselho Monetário Nacional e do Banco Central terem suporte
na própria Constituição e na legislação de direito bancário que confere autoridade às referidas
instituições.
José Gomes Canotilho acentua que
“quanto a certas matérias, a Constituição preferiu a lei como meio de actuação das
disposições constitucionais, mas não proibiu a intervenção de outros actos
legislativos, desde que a lei formal isso mesmo autorize, previamente, os princípios
e objecto de regulamentação das matérias (reserva relativa)”.
193
Destaca-se que a Lei 4.595/64 atribui competência ao Conselho Monetário Nacional e
ao Banco Central do Brasil. Aliás, como exemplo de regulação e proteção do cliente bancário
em relações negociais especificadas com instituições financeiras, existe o Fundo Garantidor
de Créditos FGC, instituído por força dos artigos 3.º, inciso VI, e 4.º, inciso VIII, da Lei
192
AZEVEDO, Álvaro Villaça. Teoria geral das obrigações. Responsabilidade civil. 10 ed. São Paulo: Atlas,
2004, p. 277.
193
CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. 2 ed. Coimbra: Almedina, 1998,
p. 635.
193
4595/64, bem como artigo 69 da Lei 7.357/85, e artigo do Decreto-lei 2.291/86 e que foi
implementado pela Resolução 3.251/2004 do Conselho Monetário Nacional e publicada pelo
Banco Central do Brasil.
Referido Fundo Garantidor de Crédito é uma associação civil sem fins lucrativos, com
personalidade jurídica de direito privado, e não exerce qualquer função pública nem por
delegação. Por fim, tal órgão tem por objetivo prestar garantia de créditos contra as
instituições associadas, nas hipóteses de decretação de intervenção, liquidação extrajudicial
ou falência de instituição associada, bem como reconhecimento de insolvência de instituições
financeiras ou situações especiais, podendo o FGC efetuar o pagamento dos créditos e se sub-
rogar no direito creditório. Permite-se a associação de instituições financeiras como bancos
múltiplos, comerciais, de investimentos, de desenvolvimento, caixas econômicas, sociedades
de crédito, enfim, instituições que recebam depósitos à vista, em contas-correntes de depósito
para investimento, em contas de poupança ou a prazo, que emitam letras de câmbio, captem
recursos em geral por meio de letras imobiliárias, hipotecárias e de crédito.
194
A regulamentação por meio do Conselho Monetário Nacional e a fiscalização do
Banco Central do Brasil perante as instituições financeiras tornam possível a implementação
de meios eficazes para se investigarem situações conflituosas que possam ocorrer entre as
instituições e seus clientes nas relações negociais travadas entre eles, até mesmo para dirimir
questões relativas à responsabilização civil com base na legislação vigente.
Em outro sentido, uma séria e eficiente aferição dos problemas ocorridos no âmbito
dos negócios jurídicos bancários ensejará que instituições que não sejam eficientes possam ser
compelidas a modificar o modus operandi e evitar que problemas de responsabilização civil
ocorram. No âmbito do direito comparado, a doutrina vem sustentando que a legislação de
194
Fonte: Anexo I à Resolução 3.251/04, artigos 1.º a 4.º – Estatuto do Fundo Garantidor de Crédito – FGC.
194
direito bancário influencia o cálculo do risco do crédito e isso possui uma função social
notória.
O Professor Alan Schwartz, da Universidade de Yale, nos Estados Unidos, ao fazer
uma abordagem econômica das conseqüências da legislação falimentar no cálculo do risco de
crédito, demonstra os benefícios da criação de um sistema normativo orientado no sentido da
remoção de empresas ineficientes do mercado, para viabilizar uma economia de alto
desempenho e competitividade. Ora, se houver melhoria nas condições de operacionalização
dos contratos bancários, evitando questões de responsabilidade civil, podeocorrer aumento
da competitividade e melhoria no desempenho da economia como um todo, pois as
instituições financeiras estão diretamente relacionadas com a economia de um país.
195
Assim, pela leitura conceitual e doutrinária, o direito positivado brasileiro possui
suficientes dispositivos para solucionar questões atinentes à responsabilidade civil no plano
dos contratos bancários e que podem ser ampliados para se tentar a composição de eventuais
conflitos no campo extrajudicial, através de uma regulação eficaz e prudente do Conselho
Monetário Nacional, aplicada pelo Banco Central do Brasil, tal como ocorre com a
Resolução 2878/2001 e a 2892/01, que instituíram o que ficou conhecido como Código de
Defesa do Cliente Bancário.
César Peluso, Ministro do Supremo Tribunal Federal, defende que o Banco Central do
Brasil, assim como o Supremo Tribunal Federal, devam ser dotados, na prática, de autonomia,
imparcialidade, transparência e comprometimento com a defesa dos princípios do Estado
Democrático de Direito.
196
Por outro viés, a instituição de organismos especializados em dirimir conflitos em
determinada área do direito, no caso, conflitos originados em contratos bancários, com
195
SCHWARTZ, Alan. The law and economics approach to corporate bankruptcy. In Revista de direito
bancário e do mercado de capitais. Ano 10, n. 36, abril-junho de 2007, Coordenação: Arnoldo Wald. São Paulo:
RT, 2007, p. 55-79.
196
PELUSO, César. O Supremo Tribunal Federal e o Banco Central. In Revista de direito bancário e do
mercado de capitais. Coordenação Arnoldo Wald. Ano 10, n. 35. São Paulo: RT, 2007, p. 175-181.
195
celeridade e alto grau de especialização, faz com que haja segurança jurídica para a sociedade.
João Otávio de Noronha, Ministro do Superior Tribunal de Justiça, ao comentar a existência
de varas especializadas em direito bancário no Estado de Santa Catarina, destaca esses
benefícios de aferição multidisciplinar, especialmente, por conta do grande reflexo econômico
que uma decisão judicial possui quando enfrenta uma discussão travada no âmbito do contrato
bancário, seja de responsabilidade civil, seja de revisão contratual, pois as decisões judiciais
podem afetar, por exemplo, a composição do spread (juro) bancário.
197
Todavia, a questão ora proposta de implementação de mecanismos de solução de
conflitos atrelados à regulamentação do Conselho Monetário Nacional e do Banco Central do
Brasil, junto às instituições representativas das instituições financeiras, pode ensejar, também,
uma reformulação e disposição política por parte de todos os envolvidos em se alcançar uma
autonomia do Banco Central, no aspecto formal e legal que permita a ocorrência de
distanciamento das atividades institucionais do BACEN, em relação ao Poder Executivo da
União. Essas ponderações são lançadas pela doutrina tanto no aspecto jurídico, quanto
econômico, evidenciando as percepções de Gustavo Loyola e Jairo Saddi a respeito da
relevância do tema para que seja atribuída realmente uma independência efetiva à
autarquia.
198
Anota-se que a segurança jurídica que deve haver nas operações financeiras viabiliza
um melhor funcionamento das instituições econômicas e das relações negociais praticadas
pelos bancos. Vale dizer que, quanto menos houver responsabilização civil no plano dos
contratos bancários, maior será o desempenho da economia, ante a caracterização da
necessária segurança jurídica. Outro não é o entendimento de Ives Gandra da Silva Martins:
197
NORONHA, João Otávio. A natureza da Lei 4.595/64. In Revista de direito bancário e do mercado de
capitais. Coordenação Arnoldo Wald. Ano 10, n. 35. São Paulo: RT, 2007, p. 212-215.
198
LOYOLA, Gustavo. Autonomia formal e material do Banco Central. In Revista de direito bancário e do
mercado de capitais. Coordenação Arnoldo Wald. Ano 10, n. 35. São Paulo: RT, 2007, p. 234-243 e SADDI,
Jairo. Autonomia do Banco Central. In Revista de direito bancário e do mercado de capitais. Coordenação
Arnoldo Wald. Ano 10, n. 35. São Paulo: RT, 2007, p. 244-246.
196
As regras jurídicas estáveis, por outro lado, atraem o investimento e este gera
desenvolvimento. Não sem razão Ronald Coase, prêmio Nobel de Economia em
1989, formulou sua teoria econômica de mercado à luz dos institutos jurídicos. E a
segurança jurídica, segundo ele, que gera o progresso econômico, e a economia
existe pelo prisma do direito. Contrato e propriedade são os dois alicerces da ordem
econômica. Cabe ao direito garanti-los. Se um investidor não se sente seguro no
investimento a fazer, não o faz ou cria tais cláusulas de proteção, para evitar a
insegurança jurídica que o custo desses mecanismos termina por retirar a
competitividade internacional dos produtos a serem negociados ou dos serviços a
serem prestados.
199
A rigor, o que se busca efetivamente com um estudo aprofundado da
responsabilidade civil no plano dos contratos bancários é propiciar meios mais claros e
seguros que se baseiam na legislação, jurisprudência e doutrina, para que se leve a efeito o
princípio da segurança jurídica, na medida em que o investimento e a eficiência econômica, a
melhoria e o bem-estar social. Os economistas invocam com veemência o princípio da
segurança jurídica como um dos pilares do Estado de Direito.
O economista Armando Castelar Pinheiro
200
, ao comentar o princípio da
segurança jurídica, assim conclui:
O princípio da segurança jurídica busca facilitar a coordenação das interações
humanas, inclusive econômicas, reduzindo a incerteza que as cerca. Ele se inspira
na confiança que deve ter o indivíduo de que os seus atos, quando alicerçados na
norma vigente, produzirão os efeitos jurídicos nela previstos. A segurança jurídica
se traduz, portanto, como uma norma jurídica que seja estável, certa, previsível e
calculável, tanto nas relações jurídicas entre particulares quanto, principalmente,
naquelas que envolvam o Estado. Esse preceito geral deve aplicar-se não apenas ao
ordenamento jurídico positivo como também à sua interpretação e aplicação pelo
Judiciário. Na economia, a segurança jurídica leva a “regra do jogo” claras e
estáveis. Isso reduz custo de transação, ex ante, simplificando a contratação pois
permite que os contratos sejam mais incompletos, sem que para isso precisem ser
mais arriscados; e, ex post, desencorajando as partes de levarem seus conflitos ao
Judiciário. Além disso, estimula os agentes privados a investir mais e em ativos de
mais longo prazo, ilíquidos e especializados, que são os mais produtivos; e, por fim,
fomenta a especialização, o investimento em P&D e a difusão de tecnologia. Dessa
forma, por meio do incremento do investimento e da produtividade, a segurança
jurídica promove o crescimento econômico.
199
MARTINS. Ives Gandra da Silva. Independência do Banco Central. In Revista de direito bancário e do
mercado de capitais. Coordenação Arnoldo Wald. Ano 10, n. 35. São Paulo: RT, 2007, p. 268.
200
PINHEIRO, Armando Castelar. Segurança jurídica, crescimento e exportações. In Revista de direito
bancário e do mercado de capitais. Coordenação Arnoldo Wald. Ano 9, n. 31. São Paulo: RT, 2006, p. 343.
197
Essa mesma percepção de segurança jurídica decorre de uma leitura da
doutrina do direito alemão, baseado nas concepções de Karl Larenz, e que Cláudia Lima
Marques
201
bem evidencia ao observar que a confiança é o segundo pilar do direito privado
alemão, sendo o primeiro a autonomia privada, que decorre da moral social e que tem por
fundamento o princípio da segurança jurídica ao qual se adicionam à confiança o respeito aos
direitos de defesa e de confidencialidade e o direito ao silêncio, que são muito importantes
quando se trata de uma relação jurídica que se trava no âmbito dos contratos bancários e, por
conseqüência, na análise da responsabilidade civil.
O saudoso Clóvis Beviláqua
202
, na teoria geral do direito civil, doutrinava
que as palavras são simplesmente os sinais que revelam a resolução tomada, residindo
justamente na possibilidade de equívoco ou utilização das mesmas que autoriza buscar no
ato volitivo a realidade, que pode estar por detrás da imperfeição dos símbolos, o que se
reproduz no artigo 112 do atual Código Civil. A estrutura normativa brasileira, assim como no
plano do direito comparado, atualmente privilegia a autonomia privada, a boa-fé e a função
social no plano dos contratos, o que não pode deixar de ser perquirido na análise do tema da
responsabilidade civil.
Essas lições eram preconizadas por Miguel Reale
203
, quando analisava
questões de direito privado antes mesmo do advento do vigente Código Civil. Cláudio Luiz
Bueno de Godoy
204
sustentou, com detalhes, o conteúdo e efeitos do princípio atinente à
função social do contrato. Todas essas perspectivas devem pautar a aferição do fenômeno
responsabilidade civil sob a ótica referencial dos contratos realizados pelas instituições
financeiras.
201
MARQUES, Cláudia Lima. Confiança no comércio eletrônico e a proteção do consumidor: um estudo dos
negócios jurídicos de consumo no comércio eletrônico. 4ª ed. São Paulo: RT, 2004, p. 123/125.
202
BEVILAQUA, Clóvis. Teoria geral do direito civil. ed. revista e atualizada por Caio Mario da Silva
Pereira. Rio de Janeiro: Editora Rio, 1980, p. 215.
203
REALE, Miguel. Questões de direito privado. São Paulo: Saraiva, 1997, p. 1/57.
204
GODOY, Cláudio Luiz Bueno de. Função social do contrato. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 1/123.
CAPÍTULO VI
CONCLUSÕES
À guisa de ponderações finais, não obstante diversos pontos terem sido
sustentados e conclusões apresentadas ao longo da dissertação, propõe-se identificar as
conclusões mais relevantes a que se chegou e para tanto destaca-se o seguinte.
1. A relação negocial existente no plano das instituições financeiras é baseada
no princípio da autonomia privada e a análise que deve ser efetivada pelo intérprete passa pela
perspectiva sistemática que enseja uma abordagem do conteúdo teleológico do fenômeno da
responsabilidade civil no âmbito dos contratos bancários.
2. Deve ser traçada uma investigação do negócio jurídico contratual, ainda que
perquirindo a responsabilidade civil, pelos planos de existência, validade e eficácia, bem
como buscando uma aferição interdisciplinar correlacionando o tema com outros ramos da
ciência do direito e, também, com ciências afins, como a economia.
3. A história constata uma evolução do fenômeno negocial nas instituições
financeiras que atualmente traz uma perspectiva da questão da responsabilidade civil,
observando-se um conteúdo preventivo e pedagógico perpassando pela ótica da
responsabilidade subjetiva e contratual.
4. Sustentou-se que os princípios constitucionais irradiam efeitos na análise da
responsabilidade civil nos contratos bancários e que a mesma deve considerar os seguintes
parâmetros de interpretação: a) aplicam-se aos bancos as normas do negócio jurídico, dos atos
lícitos e ilícitos, as normas relativas à teoria geral dos contratos e das várias espécies de
contratos quando pertinentes, por conta da inexistência de normas específicas para apuração
da responsabilidade dos bancos, especialmente, no plano dos contratos; b) harmonização dos
fundamentos da responsabilidade civil baseada na culpa e no risco decorrente da atividade
199
desenvolvida pela instituição financeira; c) distinção entre a responsabilidade do banco e a
responsabilidade dos administradores de instituição financeira, todavia, ambas baseadas na
responsabilidade subjetiva, que nos bancos, por se harmonizar com o risco da atividade, fica
especialmente vinculada ao dever de vigilância, segurança dos bens e dos clientes, e recai
sobre o banco, exceto nos casos de culpa exclusiva ou concorrente da vítima, caso fortuito ou
força maior.
5. uma distinção entre atividade financeira e atividade bancária, sendo a
primeira desenvolvida no âmbito público e a segunda no âmbito privado.
6. A atividade regulatória exercida pelo Banco Central, realizada no âmbito
público, evidencia a existência de operações financeiras listadas como atividades de crédito,
câmbio e capitalização, as quais não possuem uma normatização própria, tal como ocorre com
as operações financeiras de seguro, previdência privada e de mercado de capitais. Sustenta-se,
portanto, que operação financeira é gênero do qual existem diversas espécies.
7. A legislação vigente estabelece um extenso rol exemplificativo de operações
financeiras que são rigidamente controladas pelo Banco Central, com o propósito de
minimizar o risco sistêmico e estabelecer uma segurança jurídica e também a estabilidade do
Sistema Financeiro Nacional.
8. O fenômeno da responsabilidade civil no plano dos contratos bancários pode
ocorrer nas fases pré e pós-contratual, bem como ao longo da execução do contrato,
especialmente se for o mesmo de trato sucessivo e execução continuada.
9. O meio eletrônico é hábil e eficaz para autorizar a formação de um contrato
bancário e pode motivar a ocorrência de responsabilização civil. Ademais, esse meio pode ser
utilizado em três fases distintas, considerando o momento de formação e conclusão dos
contratos bancários: a) na contratação de operações financeiras (ativas e passivas) com
200
clientes; b) na prestação de serviços bancários aos clientes; c) no atendimento ao público em
geral (clientes e não clientes).
10. São bases informativas de interpretação o princípio da autonomia privada
e, atrelado a ele, o princípio da boa-fé. Ambos se apresentam como paradigmas em conjunto
com os princípios da dignidade da pessoa humana, da solidariedade, da justiça social, da
igualdade e da função social no âmbito dos contratos bancários, e devem ser considerados na
investigação da responsabilidade civil.
11. Pela estrutura concebida na Constituição Federal de 1988, a atividade
financeira é desenvolvida no âmbito do direito público pela União, à luz da Lei 4.595/64, que
concebe o Sistema Financeiro Nacional, estruturado pelo Conselho Monetário Nacional, que é
constituído pelo Banco Central, Comissão de Valores Mobiliários, Superintendência de
Seguros Privados e, também, pelas instituições financeiras. Por sua vez, a atividade bancária é
desenvolvida no âmbito do direito privado, à luz do Código Civil, do Código de Defesa do
Consumidor, normas de direito bancário e normativos do Banco Central, âmbito no qual se
afiguram os contratos bancários que instrumentalizam operações financeiras ativas, passivas
com clientes, realizam prestação de serviços bancários a clientes e, também, atendimento aos
usuários não clientes.
12. Não existem normas específicas regulando os contratos bancários nem
tampouco o fenômeno da responsabilidade civil no plano dos contratos celebrados pelas
instituições financeiras, mas gido controle das atividades e operações realizadas pelas
instituições financeiras, que por regras de boa conduta criam seus próprios sistemas de
compliance e governança corporativa extremamente eficazes para monitorar suas atividades e
operações. Referidas perspectivas também ocorrem no âmbito do direito comparado.
13. O fenômeno da responsabilidade civil nos contratos bancários trava-se pelo
plano subjetivo e pela aferição da culpa, evidenciando a investigação da extensão do dano
201
(artigo 944 do Código Civil) e participação da vítima no evento danoso (artigo 945 do Código
Civil).
14. Portanto, a investigação da responsabilidade civil nos contratos bancários
deve investigar: a) a culpa como centro da responsabilidade civil subjetiva, planificada no
Código Civil e carreada como um ato ou uma conduta eivada de negligência, imperícia ou
imprudência, observando que a culpa vem moldada pela escolha (in eligendo), pela
fiscalização do patrão (in vigilando), pela abstenção indevida (in omittendo) e, na forma,
como ato positivo (in comitendo), além da possibilidade de sua identificação pela culpa
concreta, ou seja, aquela em que se avalia uma conduta específica e, também, pela culpa
abstrata, em que se baseia no comportamento padrão do homem médio; há, ainda, a culpa
contra a legalidade, que vem de ser praticada pelo descumprimento de normas jurídicas como,
no caso dos contratos bancários, não observar determinações emanadas do Banco Central; b)
o dano, que por sua vez pode ser identificado como individual, coletivo, material ou moral.
Assim, pela leitura dos artigos 402, 403, 404 e 946 do CC, existe a figura dos danos
emergentes e dos lucros cessantes, pois o dano material ou patrimonial é aquele suscetível de
avaliação pecuniária objetiva, podendo ser reparado por reposição em dinheiro, sendo que o
dano emergente é aquele em que se apura o que efetivamente se perdeu, ao passo que o lucro
cessante é aquilo que efetivamente deixou de se ganhar; o dano reflexo ou por ricochete
está delineado sobre os dependentes diretos ou indiretos e, por fim, o dano moral que decorre,
essencialmente, por lesão aos direitos da personalidade, especialmente pela lesão à imagem-
atributo (artigo 5.º, X, da CF) e pela imagem-retrato (artigo 5º, V, da CF, e artigo 21 do CC),
ambas com base nos direitos da personalidade (artigos 11 a 21 do Código Civil); c) por
derradeiro, o nexo causal pode ser delineado pela inteligência do artigo 13 do Código Penal,
que diz: “O resultado, de que depende a existência do crime, somente é imputável a quem lhe
deu causa. Considera-se causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria
202
ocorrido.” Vale dizer, ainda, que a causa e a concausa podem advir da estrutura delineada
pelo artigo 403 do CC, sem perder de vista a aplicação da teoria da causalidade adequada, que
decorre da leitura do artigo 945 do Código Civil.
15. Existem contratos padronizados pelo Banco Central e, também, práticas
vedadas às instituições financeiras pela referida autarquia federal (Resolução 3258/05) e que,
atreladas à perspectiva da análise sistemática e teleológica, autorizam a investigação da
responsabilidade civil, valendo-se do diálogo de duas fontes normativas, a saber: o Código
Civil e o Código de Defesa do Consumidor, na proporcionalidade e especificidade de
incidência de cada qual, respeitando a regra da especialidade.
16. A concepção de mecanismos mais ágeis, seguros, especializados e eficazes,
inclusive com o emprego da conciliação, mediação e arbitragem regulada e instituída pelos
próprios órgãos de representação e fiscalização das instituições financeiras, ensejaria uma
maior segurança jurídica e estabilidade econômico-social da questão atinente à
responsabilidade civil nos contratos bancários, respeitando-se os paradigmas instituídos pela
Constituição Federal e pela legislação infraconstitucional.
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