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literatura sociológica, antropológica, intercultural e significativa sobre o alimento e o ato
de comer, conclui: “Compartilhar a comida é uma transação que envolve uma série de
obrigações mútuas e dá origem a um complexo interconectado de mutualidade e
reciprocidade (...)”.
5
Portanto, é com base nesses conceitos antropológicos que
desenvolveremos o tema da comensalidade, na dimensão eucarística, conforme João.
6
O Quarto Evangelho distingue-se dos evangelhos sinóticos. É tido como o
Evangelho da Vida (6,35; 8,12; 11,25), da grande revelação do amor de Deus.
7
Apresenta
preocupação menos cronológica do que teológica dos eventos ligados a Jesus. No Prólogo
desse evangelho (1,1-18) contém a chave da cristologia joanina (1,1. 14.18): “o Verbo era
Deus” (v.1). “E o Verbo se fez carne,
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e habitou entre nós; e nós vimos sua glória, glória
que ele tem junto do Pai como Filho único, cheio de graça e verdade” (v.14). Jesus é o
Filho de Deus que, visivelmente, manifesta as obras do Pai, pela sua vida e ação, gestos e
palavras (cf. DV 2).
Nesta análise, iremos deter-nos, especificamente, no cap. 6 do Evangelho de João,
no qual Jesus acolhe e alimenta todos os que dele se aproximam (cf.vv.5.12) e, ele mesmo,
distribui os pães de cevada (cf.vv. 9-11) aos convivas. Jesus manifesta-se pela
comensalidade do pão, e dá-se a conhecer como o Pão da vida (cf.vv.35.48.51). Quem
n’Ele crer e dele “comer” viverá para sempre (cf. 6,47-51). Assim indica João 3,16: Deus
amou tanto o mundo, que entregou o seu Filho único, para que todo o que nele crê não
pereça, mas tenha a vida eterna.
5
KLOSINSKI, L. E. The Meals in Mark – Ann Arbor, Ml. , p.56-58, Apud CROSSAN, J. D. Jesus, p. 83.
6
Ao dizer “João”, referimo-nos ao evangelho tal como chegou a nós, sendo ainda a autoria atribuída ao
apóstolo São João, filho de Zebedeu, identificado com o Discípulo Amado, o qual o QE assinala como seu
autor (21,24). Quando mencionamos “evangelista” referimos ao que reuniu os primeiros escritos do QE, de
acordo com a experiência de fé da comunidade; ao mencionar “redator” nos referimos aos autores finais do
mesmo. Tanto o evangelista como os redatores, possivelmente, não tenham pertencido ao círculo de Jesus
histórico, da Galiléia, mas que possuíam o testemunho ocular do Discípulo Amado (cf.19,35).
7
Cf. LÉON, Domingo M. Comentário Bíblico Latinoamericano, p. 595s.
8
O sentido da palavra “carne” em grego:
s
s
a
a
,
,
r
r
x
x [sarx] “está em oposição a pneuma, espírito, em 3,6, 6,63; em
paralelo com haima, sangue, em 1,13 e, de Jesus, em 6,53.54.55.56. Na linguagem joanina
s
s
a
a
,
,
r
r
x
x
[sarx]
significa que Jesus é o projeto de Deus feito realidade humana. “A descida do Espírito, que lhe dá capacidade
de amor igual à do Pai, transforma sua “carne” realizando nele o modelo de Homem ( “o Filho do homem”).
A carne de Jesus torna-se alimento para o ser humano (6,51), ou seja, a fonte de vida (6,53ss). Cf. MATEOS,
J. & BARRETO, J. Vocabulário Teológico do Evangelho de São João, p. 36. A “carne”, no sentido joanino,
designa a humanidade em sua condição de fraqueza e de imortalidade (Gn 6,3; Sl 56,5; Is 40,6-8; Jo
3,6;17,2). Dicionário Internacional de Teologia do Novo Testamento, p. 274.