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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO RIO GRANDE DO SUL
FACULDADE DE LETRAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LETRAS
ALINE AVER VANIN
A RELEVÂNCIA EM COMUNICAÇÃO: A
CONSTRUÇÃO DE INFERÊNCIAS INTERNAS
E EXTERNAS A FILMES PUBLICITÁRIOS
Orientador: Dr. Jorge Campos da Costa
Porto Alegre
2007
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ALINE AVER VANIN
A RELEVÂNCIA EM COMUNICAÇÃO: A CONSTRUÇÃO DE INFERÊNCIAS
INTERNAS E EXTERNAS A FILMES PUBLICITÁRIOS
Dissertação apresentada como pré-requisito
para obtenção do grau de Mestre pelo
Programa de Pós-Graduação da Faculdade de
Letras da Pontifícia Universidade Católica do
Rio Grande do Sul.
Orientador: Professor Dr. Jorge Campos da Costa
Porto Alegre
2007
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ALINE AVER VANIN
A RELEVÂNCIA EM COMUNICAÇÃO: A CONSTRUÇÃO DE INFERÊNCIAS
INTERNAS E EXTERNAS A FILMES PUBLICITÁRIOS
3
Para meus pais, José Juarez e Cleonice.
4
AGRADECIMENTOS
Ao meu professor e orientador, Professor Dr. Jorge Campos da Costa, por ser um
estímulo relevante e uma presença essencial, guiando a reflexão durante a construção deste
trabalho e gerando muitos esforços de processamento, equilibrados por efeitos cognitivos
positivos.
Ao apoio da CAPES, que possibilitou a realização deste trabalho com dedicação
exclusiva.
À PUCRS, pela oportunidade de continuar meus estudos e projetos de vida.
Aos meus professores, pelo empenho e incentivo inspiradores: Dr. Jorge Campos da
Costa, Dr. Leci Barbisan, Dr. Ana Ibaños, Dr. Jane Rita Caetano da Silveira, Dr. Regina
trabalho a peles osge ostes valpoiuse.
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Esta manhã, antes do alvorecer, subi numa colina para
admirar o céu povoado. E disse à minha alma: quando
abarcarmos esses mundos e o conhecimento e o prazer
que encerram, estaremos finalmente fartos e
satisfeitos? E minha alma disse: não, uma vez
alcançados esses mundos prosseguiremos no caminho.
Walt Whitman
6
RESUMO
Este estudo tem por objetivo verificar a consistência da Teoria da Relevância, de Sperber &
Wilson (1986; 1995), um modelo de comunicação e cognição humanas que se propõe a
explicar de que forma os indivíduos processam mentalmente as informações nas trocas
comunicativas cotidianas através da formulação de inferências. Assim, abordam-se aspectos
como a comunicação ostensivo-inferencial, a manifestabilidade mútua, o ambiente cognitivo
de cada indivíduo, a formação do contexto e o raciocínio dedutivo subjacentes à condição
humana. A fim de exemplificar como o processo inferencial humano ocorre, cinco peças
publicitárias audiovisuais foram selecionadas pela interação entre os personagens representar
situações-tipo de interação comunicativa. Por isso, considerou-se analisar as inferências
internas ao comercial, ou seja, o levando em conta as características informativas e
persuasivas adotadas pela publicidade. Através desses filmes, foi possível corroborar a
arquitetura conceitual dessa teoria, em especial a questão do esforço de processamento e
efeitos cognitivos gerados no momento da conversação. Essa dicotomia representa, para
muitos autores, uma questão problemática, visto que Sperber & Wilson o descrevem de
modo claro como o falante acessa os esforços do ouvinte para que a informação seja
relevante. Por esse motivo, esse aspecto foi também avaliado no momento da análise das
inferências internas. Além disso, pensou-se ser importante demonstrar como a audiência
percebe a intenção comunicativa dos anunciantes, e por isso as inferências externas ao
comercial também foram analisadas. Essas inferências estão além da troca comunicativa dos
personagens, permitindo uma investigação sobre como os implícitos desses filmes são
compreendidos por seu público-alvo.
Palavras-chave: propaganda audiovisual, cognição, comunicação, inferências, Teoria da
Relevância.
7
ABSTRACT
The aim of this study is to verify the consistency of Relevance Theory by Sperber & Wilson
(1986; 1995), a model of human communication and cognition which aims to explain how
individuals process information in everyday communicative exchanges through elaboration of
inferences. Thus, some aspects of this theory were considered, such as ostensive-inferential
communication, mutual manifestness, the individual’s cognitive environment, the
construction of context and deductive reasoning underlying human condition. In order to
exemplify how human inferential process occurs, five audiovisual advertisements were
selected because they represent a situation-type of communicative interaction. Therefore,
internal inferences from the film were considered, but informative and persuasive features
adopted by publicity were not described in this first analysis. Through these movies, it was
possible to corroborate this theoretical framework, especially the processing effort and
cognitive effect aspects in a conversation. For several authors, this dichotomy represents a
problematic point, because is not clear how the speaker access the listener’s efforts to get
optimal relevance. For this reason, this aspect was also evaluated during the internal inference
analysis. It was shown how the audience gets the advertisers’ communicative intention and
that is why external inferences of the commercials were also analyzed. These external
inferences are beyond the characters’ communicative exchanges, which allow an investigation
about how the implicit information of these movies is understood by its public.
Key-words: audiovisual advertisement, cognition, communication, inferences, Relevance
Theory.
8
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ……………………………………………………………………………
2 ASPECTOS DA NATUREZA DA LINGUAGEM PUBLICITÁRIA …..……………
2.1 A COMUNICAÇÃO PUBLICITÁRIA …………………………………………………
2.2 A PUBLICIDADE E SUAS ESTRATÉGIAS ……………………………………………
3 FUNDAMENTOS DA TEORIA DA RELEVÂNCIA ...................................................
3.1 O SIGNIFICADO EM LINGUAGEM NATURAL:
A INTERFACE SEMÂNTICA / PRAGMÁTICA ………………………………………..
3.2 A DEFINIÇÃO DO SIGNIFICADO NA FILOSOFIA DA LINGUAGEM ……………
3.3 UM NOVO OLHAR: COMUNICAÇÃO COMO PROCESSO INFERENCIAL ………
3.4 A TEORIA DA RELEVÂNCIA DE SPERBER & WILSON ……………………………
3.4.1 Comunicação ostensivo-inferencial ……………………………………………………
3.4.2 Ambiente cognitivo tuo e a formação do contexto ………………………………
3.4.3 O mecanismo dedutivo: lógica e inferências na interpretação ……………………...
3.4.4 Esforço de processamento e efeitos cognitivos no processamento inferencial ...........
3.5 A RELAÇÃO CUSTO-BENEFÍCIO SOB AVALIAÇÃO ……………………….……
4 ANÁLISES DAS INFERÊNCIAS INTERNAS E EXTERNAS
AOS FILMES PUBLICITÁRIOS …………………………………………………………
4.1 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS ………………………………………………
4.2 DESCRIÇÃO E ANÁLISE DO CORPUS ………………………………………………
4.2.1 Filme publicitário 1: “Wassup”…………………………………………………………
4.2.1.1 Roteiro do filme publicitário .....…………………………………………......................
4.2.1.2 Análise das inferências internas ………………………………………………………
4.2.1.3 Análise das inferências externas ………………………………………………………
4.2.2 Filme publicitário 2: “Ex” ………………………………………………………………
4.2.2.1 Roteiro do filme publicitário …………………………………………………………
4.2.2.2 Análise das inferências internas ……………………………………………………
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4.2.2.3 Análise das inferências externas ………………………………………………………
4.2.3 Filme publicitário 3: “Modelo” …………………………………………………………
4.2.3.1 Roteiro do filme publicitário ……………………………………………………………
4.2.3.2 Análise das inferências internas ………………………………………………………
4.2.3.3 Análise das inferências externas ………………………………………………………
4.2.4 Filme publicitário 4: “Paulistas” ……………………………………………………...
4.2.4.1 Roteiro do filme publicitário …………………………………………………………
4.2.4.2 Análise das inferências internas ………………………………………………………
4.2.4.3 Análise das inferências externas ………………………………………………………
4.2.5 Filme publicitário 5: “The perfect Gentleman” ………………………………………
4.2.5.1 Roteiro do filme publicitário ……………………………………………………………
4.2.5.2 Análise das inferências internas ………………………………………………………
4.2.5.3 Análise das inferências externas ………………………………………………………
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ………………………………………………………………
REFERÊNCIAS ………………………………………………………………………………
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1 INTRODUÇÃO
As trocas comunicativas humanas são fontes inesgotáveis de mensagens implícitas,
as quais levam os interlocutores a despenderem esforços para alcançar, por si mesmos, o real
significado das palavras do outro. Assim, o que é comunicado de uma pessoa a outra depende
muito mais do que codificação e decodificação, como previa o Modelo de Códigos, por muito
tempo considerado uma explicação aceitável para a compreensão de enunciados. Grice (1975
[1957]; 1975), através dos seus estudos sobre a informação não expressa em palavras,
possibilitou um novo olhar para o fenômeno da comunicação. Para esse autor, uma lacuna
entre o dito e o que as palavras do falante significam, delineando dessa forma uma explicação
plausível a respeito da construção de inferências interpretativas. Ao chegar a tal compreensão,
esse estudioso abre portas para a estruturação da Teoria da Relevância, por Sperber & Wilson
(1986; 1995). Essa é uma alternativa para desenvolver em detalhes a afirmação central dos
estudos griceanos de que uma das características principais da comunicação humana é a
expressão e o reconhecimento de intenções.
O construto de Sperber & Wilson aproveita essas duas formas de comunicação
decodificada e inferencial na construção dessa teoria, pois, para esses autores, a mente
humana reage inatamente a uma mensagem codificada para então processá-la
inferencialmente a fim de determinar o seu significado. É justamente sobre o processamento
mental da informação a que este trabalho se dedica. Com o propósito de ilustrar de que
maneira esse fenômeno ocorre, determinou-se como objeto desta investigação uma aplicação
da arquitetura conceitual da Teoria da Relevância a situações-tipo (ou situações-exemplo) no
intuito de, com isso, avaliar a consistência do caráter descritivo e explanatório dessa teoria.
Nesse sentido, pretende-se explicar como um indivíduo produz inferências de forma
a chegar à interpretação mais provável e adequada em uma troca comunicativa. Para isso,
utiliza-se como exemplo um corpus constituído de cinco filmes publicitários, os quais imitam
eventos da vida cotidiana. A opção por comerciais se fundamenta porque a partir da história
contida em cada um deles é possível desenvolver uma análise aplicada na busca pela
compreensão dos processos inferenciais que ali ocorrem. Além disso, esses foram escolhidos
aleatoriamente, com o objetivo de utilizá-las para corroborar a proposta de Sperber & Wilson
(1995), sendo possível aplicar as noções essenciais dessa teoria.
11
Nessa perspectiva, ao se considerar peças publicitárias audiovisuais como base para
demonstrar de que forma ocorre a compreensão por trás das palavras, percebe-se a
importância de também discorrer sobre como um comercial
1
é construído, que estratégias são
utilizadas na sua criação e de que maneira a mensagem lançada para a audiência é capaz de
chamar a sua atenção a ponto de levar à interpretação pretendida pelo anunciante. As
discussões geradas a partir dessa reflexão servem de sustentáculo para este trabalho, o qual
consiste essencialmente numa reflexão sobre esse processo.
Pretende-se, então, avaliar como a comunicação ostensivo-inferencial ocorre na
interação humana, elucidando dessa forma o desenvolvimento do significado implícito. Parte-
se da hipótese de que, no momento da troca comunicativa, o falante comunica a sua
mensagem ostensivamente, e o ouvinte, através da elaboração de inferências, compreende o
que estaria implícito na mensagem de seu interlocutor. Isso aconteceria através do seu esforço
mental para a compreensão da informação e pela obtenção de efeitos cognitivos que
acrescentam, substituem ou modificam suposições já existentes na mente. Para melhor
explicitar essa relação é que as propagandas audiovisuais que contêm exemplos de situações
cotidianas foram selecionadas.
A partir disso, faz-se necessário esclarecer ao leitor como esse trabalho se
desenvolve. O capítulo dois tem o propósito de descrever aspectos da natureza da linguagem
publicitária. O discurso dessa área especialmente o relacionado à propaganda audiovisual
veiculada pela televisão, foco deste trabalho envolve imagem e código lingüístico,
geralmente fazendo uso de estratégias que deixam subentendido o real significado da
mensagem. Cabe à audiência a interpretação mais provável da informação transmitida pelo
anunciante, o qual utiliza tal artifício no intuito de atingir o seu objetivo principal: persuadir e
informar sobre determinado produto ou serviço a fim de vendê-lo. Pensando nesse processo,
levantam-se, ao final desse capítulo, algumas questões concernentes a essa construção de
significado do comercial de televisão, bem como aquele advindo do interlocutor na troca
comunicativa. Dentre elas, busca-se compreender como determinada peça publicitária chama
a atenção do seu público-alvo; que processos mentais são realizados na busca da melhor
interpretação possível; como a informação implícita inerente às cenas de um comercial vem à
tona para o espectador; de que forma a informação pretendida pelo anunciante é captada por
quem assiste à peça publicitária audiovisual; e de que forma as inferências geradas são
1
Mesmo tendo diferenças de sentido, os termos “comercial” e “filme publicitário” serão utilizados como
sinônimos neste trabalho.
12
construídas interna (pelos personagens do filme) e externamente (pela audiência) ao comercial
assistido.
Verifica-se que, apesar de lançar estímulos que muitas vezes demandam maior
esforço de compreensão por parte da audiência, na maioria das vezes a intenção do anunciante
é captada quase instantaneamente. Além disso, ao usar meios diversos para chamar a atenção
do público-alvo, o publicitário está intuitivamente utilizando um dos princípios básicos da
Teoria de Sperber & Wilson: os indivíduos prestam atenção somente àquilo que lhes parece
mais relevante. Por proporcionar explicações plausíveis para o funcionamento do processo
inferencial humano, destinou-se um capítulo à parte para esmiuçar o referencial teórico que dá
suporte a este trabalho.
O capítulo três, então, é considerado o mais importante, que subsidia todo o
restante do trabalho. É nele que se constroem as respostas às questões sobre como uma
informação é processada na mente para então ser compreendida. Além disso, esse capítulo é o
alicerce para as análises pretendidas neste trabalho. No entanto, pensou-se que para chegar
aos fundamentos dessa teoria, é necessário também conhecer os caminhos percorridos pela
filosofia da linguagem na busca pela definição do significado até a elaboração de tal
arquitetura conceitual.
Em primeiro plano se explica por que uma interface entre as disciplinas de
Semântica e de Pragmática são adotadas neste estudo. Acredita-se numa investigação do
significado em linguagem natural através de uma análise com base na ocorrência
concomitante de ambas, tendo em vista a flexibilidade com que se transita entre essas
disciplinas. Nesse sentido, um compartilhar de aspectos por ambas, o que significa dizer
que, além de visualizar o significado em sua forma proposicional papel da Semântica –,
admite-se a sua construção com o auxílio das informações provenientes do contexto
influenciado pela Pragmática. Na interface com a comunicação, essas disciplinas representam
o significado parcial para que a adequação descritiva e explanatória da Teoria da Relevância
seja alcançada.
Após esse esclarecimento, parte-se para um segundo nível na explicitação de como o
significado é processado, e é por esse motivo que se revisitam os caminhos pelos quais
filósofos da linguagem percorreram até chegar à concepção de construção de significado tal
como é percebida hoje. Essa trajetória é recuperada a partir de uma breve pincelada a respeito
das discussões de estudiosos como Frege, Russell e Wittgenstein. Perpassa-se pelas
contribuições relevantes sobre o assunto de Strawson, Levinson, Searle e, finalmente, Grice,
para o qual uma seção é exclusivamente dedicada.
13
O trabalho de Grice acerca daquilo que está além da superfície das palavras foi
precursor na elucidação da formação do significado por cada indivíduo. Em função da sua
percepção da comunicação como um processo inferencial, esse autor é capaz de demonstrar
que os seres humanos são equipados com regras internas que lhes permitem construir a
compreensão do significado da mensagem de um interlocutor em dado momento.
A partir da Teoria das Implicaturas de Grice e das noções de dito e de implicado é
que Sperber & Wilson propõem uma abordagem que integra aspectos da Filosofia da
Linguagem, da Lingüística e da Psicologia Cognitiva. Na investigação da constituição do
significado em comunicação, os autores concebem a Teoria da Relevância como um construto
lingüístico-psicológico, cuja motivação ocorre a partir da máxima griceana de Relevância.
Para os autores, a busca pela relevância norteia as relações humanas, fazendo com que os
indivíduos moldem as suas interações comunicativas através daquilo que é mais pertinente
para si. Nesse sentido, o modelo ostensivo-inferencial traz uma explicação sobre como os
seres humanos se comunicam e conseguem compreender uns aos outros no momento da
interação. Além disso, a seção dedicada a essa teoria tenta abraçar e especificar aspectos
como ambiente cognitivo, formação do contexto, funcionamento do mecanismo dedutivo e,
por fim, salienta a relação entre o esforço de processamento e os efeitos cognitivos, um dos
pontos mais importantes dessa teoria. Sobre esses, há uma última seção nesse terceiro capítulo
que trata das questões problemáticas da dicotomia custo-benefício em comunicação. É
importante ressaltar que, em princípio, pensava-se em analisar e avaliar as críticas à Teoria da
Relevância, uma vez que se verificam falhas explanatórias na elaboração da dicotomia esforço
de processamento e efeitos cognitivos. Essas avaliações teóricas sustentar-se-iam
essencialmente no número dez (10) da revista Behavioral and Brain Sciences (1987), com o
suporte de alguns outros textos sobre o assunto. Como se poderá verificar, essas questões têm
pertinência e coerência, mas acabaram tornando-se coadjuvantes desse texto. No decorrer da
redação e das análises aqui presentes, pensou-se que, apesar desse pequeno obstáculo para a
teoria de Sperber & Wilson, aspectos muito mais pertinentes a serem abordados. Assim,
por se admitir que o suporte dado por esses autores à explicação de como ocorre a
compreensão em comunicação é bastante consistente, lançou-se um olhar para o
processamento mental da informação através do modelo ostensivo-inferencial de
comunicação como um todo. Contudo, por ter sido o foco primeiro deste estudo, incluem-se
as principais discussões sobre o assunto nas análises do capítulo seguinte.
O capítulo quatro é dedicado à aplicação da teoria de Sperber & Wilson às peças
publicitárias selecionadas. Para melhor ilustrar o processamento da informação numa
14
interação comunicativa, primeiro é exposto o contexto inicial das situações vinculadas pelos
comerciais. Em seguida, o provável processo inferencial das personagens, aqui denominado
de inferências internas, é avaliado. Na mesma análise são consideradas as discussões sobre a
dicotomia esforço de processamento e efeitos cognitivos, as quais foram aplicadas à avaliação
das situações expostas em cada filme a fim de poder examinar a sua validade. Como o âmago
desse trabalho são as análises de situações-tipo nos comerciais numa exemplificação de
troca comunicativa entre indivíduos –, considerou-se necessário refletir também sobre como a
audiência de determinado comercial processa as informações advindas dele. Portanto, será
avaliado também o que se denomina, neste trabalho, de inferências externas, ou seja, aquelas
processadas pelo público-alvo da propaganda e que estão deslocadas da interação
demonstrada nela.
Acredita-se que a análise do processamento inferencial interno e externo às
propagandas é uma forma de demonstrar a como a construção do significado através de
mecanismos dedutivos ocorre. Com isso, a Teoria da Relevância é transportada para essa
investigação a fim de examinar seu potencial na depreensão dos implícitos em comunicação,
processo verificado nas simulações da vida real nos comerciais e, conseqüentemente, através
da interação entre o discurso publicitário e a audiência.
15
2 ASPECTOS DA NATUREZA DA LINGUAGEM PUBLICITÁRIA
A publicidade, em suas diversas formas, toma conta das ruas, da televisão, das
revistas, do rádio de maneira a penetrar na vida das pessoas silenciosa mas rapidamente, a
ponto de ser considerada parte natural dela. Estando inserida nesses meios, ainda assim ela
não é o foco de maior atenção, que o seu público está certamente voltado para outras
atividades cotidianas. Partindo-se do pressuposto de que comunicar é chamar a atenção para
si, percebe-se que, sendo um produto culturalmente construído, uma campanha publicitária
ousa ao criar meios no intuito de atrair determinada audiência para a mensagem pretendida.
Muitas vezes, para atingir o outro, a publicidade utiliza recursos que chamam a atenção,
lançando mão de imagens, sons, frases de efeito, humor, surpresa, dentre outros vários que
possam fazer com que o provável consumidor depreenda o significado de um anúncio.
Esse meio tem o desafio constante de inovar, o que pode ocorrer através da maneira
de apresentar o produto, por um fator-surpresa, pelo encantamento e até mesmo por trazer à
tona novas perspectivas culturais e sociais. Para tanto, estudiosos da área buscam investigar
esses fenômenos de comunicação e os seus efeitos sobre determinada sociedade de consumo.
Esse interesse se justifica porque muitos querem compreender como a comunicação de massa
atrai tantas pessoas em tão pouco tempo, além de descobrir as melhores formas de divulgar
um produto.
Atualmente, a publicidade audiovisual adquiriu um maior grau de importância por se
perceber que a união de estímulos perceptivos como imagens e sons com a linguagem
exerce influência e consegue alcançar um maior número de indivíduos. Sem dúvida a
linguagem é um instrumento que exerce e poder às pessoas e é dela que a publicidade se
utiliza para influenciar e persuadir. No entanto, a percepção humana ainda é um fator crucial
para a comunicação, e essa se não pela linguagem, mas através de estímulos visuais e
auditivos, por exemplo, os quais, juntos, levam os seres humanos a passar pela razão para
serem movidos pelos seus sentimentos (SAMPAIO, 1997).
Os interesses desse trabalho se voltam a esses fatores em comunicação publicitária:
linguagem, percepção e interpretação. Por isso, o objetivo primeiro deste capítulo é descrever
brevemente aspectos básicos da área da publicidade, como a retórica persuasiva, o ato de
influenciar, as linguagens verbal e não-verbal, recursos como metáforas e ambigüidades, entre
outros constantemente utilizados na criação de um comercial. Em seguida, levantam-se
16
questões acerca de como a compreensão daquilo que está por trás das palavras (ou seja,
daquilo que está implícito) vem à tona como a interpretação mais provável da mensagem que
o criador de tal campanha publicitária quis transmitir.
2.1 A COMUNICAÇÃO PUBLICITÁRIA
É evidente a influência da publicidade no contexto da comunicação atual ao se
verificar a sua abrangência em todos os veículos de comunicação. Ela está presente na vida de
uma pessoa como parte da sua existência. De fato, representa uma época, a cultura de um
povo e a sociedade onde está inserido. Essa área constitui uma forma de comunicação,
intermediando as práticas culturais e interagindo com os sistemas simbólicos pertencentes a
cada sociedade. Para Geertz (1978), cultura é um sistema que consiste em estruturas de
significados estabelecidas socialmente. Portanto, acredita-se que se trata de um conjunto de
práticas sociais organizadas em subsistemas que se inter-relacionam. Dentre esses subsistemas
está a área da comunicação social, onde a publicidade se situa. Ela produz mensagens e
símbolos e, pela sua interação entre anunciante e audiência, constrói representações da
sociedade em que se insere até o ponto de formar uma nova identidade. Por esse motivo, uma
propaganda pode gerar vários significados novos para palavras, para objetos e a mesmo
provocar mudanças de valores, dependendo da forma como ela é veiculada (GEERTZ, 1978).
Essa nova postura se dá porque os recursos utilizados pela publicidade podem
estimular os sentidos dos homens através da razão, por causa da persuasão, a qual utiliza uma
linguagem argumentativa que leva em conta aspectos da lógica, e através da emoção, como
conseqüência dos apelos aos sentimentos da audiência (SAMPAIO, 1997). Esse último fator é
um dos mais trabalhados na comunicação publicitária, visto que, ao provocar as emoções das
pessoas, impulsiona seus desejos e faz com que elas se sintam impelidas a se empenharem
para satisfazê-los. O que prevalece não é a questão do que é melhor, mais saudável, ou mais
útil, mas sim se o produto propiciará uma mudança de status social, de bem-viver ou um
sentimento de posse. A publicidade é criadora dos mercados que vão absorver seus produtos
se esses correspondem aos desejos e às necessidades dos consumidores, mesmo que essas
últimas sejam também construídas e estimuladas. Desse modo, muitas vezes o consumidor é
instigado a comprar um produto não porque terá uma utilidade, mas em função do poder de
persuasão da propaganda. Aliás, num mundo em que tantas diferenças sociais, a
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publicidade parece ignorar o fato de que os diversos problemas econômicos são uma
constante, sendo muitas vezes criticada por incitar o consumismo.
Alheia a esse fato, a publicidade tem por objetivo transmitir mensagens cuja intenção
é persuadir os consumidores a comprarem determinados produtos e serviços. Por isso, a
ideologia do consumo é a mais encorajada. Com essa intenção, há a utilização de uma retórica
persuasiva, que emprega padrões e opiniões pré-estabelecidos, idéias prontas, das quais o
público-alvo compartilha e aceita, além de apelar à emoção do consumidor. Geralmente, a
propaganda mostra e diz algo que deve ser tomado como universal ou aceito como tal,
difundindo uma imagem de prazer, renovação, sucesso, beleza e felicidade, conciliando-os
com a realidade, a qual nem sempre é condizente com aquela do consumidor.
Cabe à propaganda informar e despertar interesse de compra e uso de produtos e
serviços nos consumidores. De acordo com Sampaio (1997), a propaganda atua sobre as
pessoas, que são imprevisíveis, dentro de um ambiente complexo, no qual interagem diversas
forças e pressões. Nessa área, trabalha-se a partir de dados culturais, remodelando-os e até
mesmo alterando-os, e também sobre alguns dos instintos humanos: medos, necessidades,
segurança, desejos. Mesmo assim, Byrne (1992) afirma que o anunciante não tem certeza de
uma audiência atenta, mesmo que essa esteja fisicamente presente. Logo, precisa pesar as
implicações ao usar um estilo mais interessante para transmitir uma mensagem, mesmo que
isso envolva maior processamento mental.
Para criar mensagens que atinjam os outros, o ser humano utiliza a linguagem verbal
e escrita, bem como as linguagens artísticas a visual, a corporal e a musical de maneira a
servir-se dessas ferramentas como procedimentos para expressão de pensamento e sentimento.
Cada linguagem cria reações peculiares nos receptores das mensagens, assim como os
emissores utilizam os seus recursos para criá-las. Assim, a linguagem da propaganda, de
caráter persuasivo e muitas vezes autoritário, é peça-chave para convencer o consumidor de
que determinado produto ou serviço é necessário em sua vida, mesmo que na realidade não o
seja.
Sampaio (1997) afirma ainda que “a propaganda mistura apelos lógicos e
emocionais, informação e argumentação (...)”. Além de diferentes elementos que ela une e
combina para atingir seu propósito maior de gerar nos consumidores o desejo de compra, a
publicidade também lança mão de comportamentos que beneficiem o anunciante que a utiliza,
como as emoções que impulsionam os desejos em relação ao que está sendo anunciado. Para
Gomes (2003)
18
persuadir supõe convencer e, para tanto, é preciso motivar. Em publicidade
19
(b) é intencional, pois seu objetivo é colaborar nas vendas, e a informação é um dos
instrumentos que utiliza para estimular o consumo;
(c) é independente, porque a informação transmitida pela publicidade não é
controlada pelos meios nos quais é divulgada, visto que o espaço e o tempo são
comprados pelo emissor da campanha publicitária, o qual decide o que será
divulgado ali.
A publicidade também tem como estratégia dar valor aos produtos. Ela chama a
atenção e desperta o interesse por esses objetos e inspira os indivíduos a possuí-los ao revesti-
los de significados. Por isso, Carvalho (2000) acredita que a linguagem da publicidade cria
um mundo ideal. Ela induz a compartilhar uma visão, uma crença ou um valor, os quais estão
implicitamente colocados na propaganda, levando a convencer a audiência de que possuir tal
produto passa a ser sinônimo de felicidade. Com o intuito de vender, os produtos são
associados à vida do telespectador, recorrendo a aspectos culturais inerentes à sociedade em
que ele se insere. O discurso publicitário objetiva passar uma imagem de igualdade,
estabelecendo uma relação com a realidade particular e o desejo de cada consumidor,
levando-o a acreditar que, possuindo certo produto, esse preencherá uma lacuna na vida das
pessoas. Nesse sentido, a publicidade fez com que as distinções tradicionais entre cultura de
elite e cultura popular perdessem a nitidez e criou uma nova entidade: a cultura do anúncio.
Assim, pode-se dizer que a publicidade é um elo entre o particular e o universal: ela
homogeneíza os diversos aspectos culturais a ponto de eliminar as particularidades do sujeito,
que as necessidades experimentadas por ele são experimentadas por todos. Para Twitchell
(1996), a publicidade não é apenas um elemento importante de uma cultura, mas é aquilo que
as pessoas sabem, o que elas têm em comum e aquilo em que acreditam. Ela é, em última
instância, aquilo que as pessoas são. Por isso, essa área tem um papel fundamental na
definição da cultura, visto que o sistema simbólico gerado a partir dela faz com que os
indivíduos se reconheçam e se apropriem daquilo que é divulgado em um anúncio ou num
comercial, por exemplo. Esse fator atende às necessidades da propaganda de fazer o produto
integrar-se à vida das pessoas e, através de práticas persuasivas, consegue promover um
produto e sua marca.
20
2.2 A PUBLICIDADE E SUAS ESTRATÉGIAS
Para alcançar seus objetivos, profissionais da área da publicidade utilizam estratégias
conhecidas para captar o público-alvo, as quais ocultam, na maioria das vezes, a finalidade de
promover um produto e vendê-lo. Elas se diferenciam em terminologia, mas, segundo Roman,
Maas & Nisenholtz (2003, p. 14-16), têm basicamente os mesmos pontos:
(a) determinar o objetivo da propaganda;
(b) determinar o público-alvo da campanha;
(c) fazer com que a audiência compreenda a idéia central da propaganda;
(d) mostrar o que diferencia o produto anunciado dos demais;
(e) avaliar se a personalidade da marca precisa de reforço ou mudança;
(f) utilizar estratégias que conquistem a atenção do consumidor e mantenham a
marca em sua mente;
(g) trabalhar com aspectos de qualidade e de emoção.
Através desses aspectos, o publicitário tem em mente que é sua função passar uma
mensagem associada à vida do consumidor, reforçando a sua identidade cultural e fazendo
com que ele se sinta parte de um grupo social. Com o intuito de reforçar a existência do
produto e vendê-lo, a publicidade utiliza fórmulas prontas, como clichês e frases feitas, as
quais são aceitas por serem familiares para quem as recebe. Além disso, Carrascoza (2004)
descreve o emprego de esquemas no intuito de convencer os receptores da mensagem.
Segundo esse autor, o anúncio pode ser estereotipado e sem originalidade: por exemplo, o
conceito de dona-de-casa dedicada está ligado a sabão em pó, ou o homem de sucesso é
associado à aquisição do carro do ano. Por outro lado, a publicidade pode romper normas
estabelecidas, ser inovadora, mesmo que possua lugares-comuns, como um empresário que
recomenda um banco. Pode haver, também, a substituição, por eufemismos, de normas ou
mudanças de termos, num jogo de palavras que remete ao termo original. A criação de
adversários imaginários está entre os recursos mais utilizados nas campanhas de sprays
inseticidas, “inimigos dos insetos. Apela-se também à autoridade, fazendo com que, por
exemplo, um dentista fale sobre um creme dental fazendo afirmações a respeito do produto a
fim de transmitir certeza sobre ele. Por último, a repetição do que se diz garante a
possibilidade de aceitação pela consistência reiterativa.
21
Além desses esquemas utilizados para persuadir a audiência, Vestergaard & Schrøder
(1994) referem ao emprego simultâneo da comunicação verbal e não-verbal na publicidade: a
fala vem acompanhada de gestos e de posturas, de forma não-verbal, mediante os quais as
pessoas se comunicam. O texto verbal e sua unidade menor, a oração, têm começo e fim e só
podem ser lidos ou ouvidos nessa ordem. as imagens não têm essa dimensão temporal, e
cabe à audiência explorá-las para descobrir esses limites. Uma das técnicas mais usadas é a
presença de imagens na propaganda. Sua função é tornar o consumidor consciente da
necessidade, despertando seu desejo e salientando a capacidade que o objeto possui de
satisfazer o desejo” (RECKZIEGEL, 1996, p. 59). A imagem, na maioria das vezes, é
utilizada como um estímulo, no intuito de voltar a atenção do consumidor para a mensagem e,
por esse motivo, ela deve ser atraente o suficiente para atingir esse objetivo. De acordo com
Vanin & Fagherazzi (2007), pelo fato de os signos serem universais, chegam mais facilmente
à compreensão dos indivíduos por irem além da linguagem verbal e fazer com que os
indivíduos compreendam de imediato o que demandaria maior esforço caso estivesse em um
texto escrito. Muitos produtos utilizam figuras como símbolo de suas marcas, com a
finalidade de que o público as reconheçam logo que as vir e se recorde delas com facilidade.
Os anunciantes partem do pressuposto de que é possível lembrar melhor daquilo que está
presente de maneira concreta, valendo-se da máxima uma imagem vale mais do que mil
palavras.
A natureza audiovisual da televisão proporciona eficácia na divulgação do produto,
pois integra vários recursos em um só meio e possibilita grande flexibilidade de formas. Além
disso, não requer muito esforço para assisti-la, e sua grande penetração leva a informação para
um elevado número de pessoas. Apesar disso, o desafio primordial de um comercial é chamar
e manter a atenção de seu público-alvo, num espaço que geralmente tem pouca
visibilidade. Ao assistir a um programa, a audiência geralmente tem interesse no conteúdo
transmitido. Na hora do intervalo, a tendência é trocar de canal ou então sair da sala para fazer
outras coisas enquanto o programa não recomeça. O olhar da audiência tem tendência a se
desviar para outros focos de atenção; o corpo muitas vezes não tem porque se manter em
frente à televisão, e a mente é levada a pensar em outras coisas que não estão passando na
tela. O filme publicitário concorre também com os demais programas e canais de televisão
disponíveis, bem como com diversos outros meios, como Internet, DVD, ou rádio, por
exemplo, além do desafio da saturação cada vez maior. O risco de perder o telespectador é
bastante grande e os segundos disponíveis para veicular o produto ou serviço, caros.
22
O comercial de televisão é um segmento breve de conteúdo inserido na continuidade
da programação audiovisual, não estando relacionado a ela. Segundo Anderson (1985), a
audiência consiste em indivíduos que: (1) têm conhecimento de mundo, predisposição e
interesse no produto; (2) fazem uma atividade enquanto assistem à televisão; (3) têm estado
de atenção apenas no começo do comercial. Com poucas exceções, a audiência não tem
interesse prévio em assistir a um filme publicitário.
Para o mesmo autor, além das atividades feitas no momento do comercial, três
padrões de atenção devem ser levados em consideração na produção de um comercial: são os
princípios da atenção da compreensão guiada, da desatenção áudio-monitorada e da inércia de
atenção. O primeiro princípio demarca a importância do conteúdo. A consideração do
conhecimento de mundo do espectador e os processos inferenciais requeridos para a
compreensão devem ser combinados com a atenção aos seus interesses e necessidades. O
comercial deve dirigir um alvo de atenção para a audiência de modo a fazer com que ela se
ocupe, por alguns segundos, da informação transmitida. Conhecer a audiência é, por isso, de
importância primordial ao conceber a mensagem. Para muitos publicitários, esse ponto é
bastante óbvio, já que eles são capazes de transformar um produto comum em algo tão
interessante a ponto de fazer com que a audiência devote seu tempo para assistir ao comercial.
Muitas vezes propagandas têm efeitos especiais, sons inusitados ou situações
incomuns. No entanto, grande parte da população não estará prestando atenção à televisão no
momento do comercial. Isso torna o desenvolvimento de cada trecho da peça publicitária de
fundamental importância para o sucesso. De acordo com o segundo princípio de atenção
(ANDERSON, 1985), os espectadores que não estão atentos ao comercial devem ser levados
a percebê-lo de alguma forma, e é por isso que muitas vezes uma pesquisa de campo é
necessária. As características do público-alvo, seus interesses e necessidades são considerados
no momento da criação a fim de que dada propaganda seja pertinente para essas pessoas.
Além disso, o publicitário deve estar consciente de que a maioria dos espectadores poderá
prestar atenção nos primeiros segundos do comercial, mas a tendência é desviar-se para outros
fatos que ocorrem além da tela.
O último princípio mencionado por Anderson (1985), o da inércia de atenção, é um
fator propagado da cognição que pode estar a favor ou contra o publicitário. O contexto em
que um comercial se insere tem implicações essenciais se o início do segmento merece ser
assistido e se de fato deve ser visto por inteiro. Uma peça publicitária bastante envolvente
deverá cativar a audiência nos primeiros segundos. O oposto é também verdadeiro: algo
que exige pouca atenção produz certa resistência a assistir à televisão. duas posições
23
contrárias aqui: se por um lado uma peça publicitária tem conteúdo envolvente, por outro o
momento em que ela ocorre é um pretexto para que os espectadores façam outras atividades.
Pensando nisso, Roman, Maas & Nisenholtz (2003) afirmam que a chave para o
sucesso de uma peça publicitária é o envolvimento: a audiência deve querer parar para assistir
ao comercial. Para alcançar esse objetivo, os mesmos autores listam alguns caminhos:
primeiro, os anunciantes devem criar uma situação em que a audiência se identifique;
segundo, apresentar um problema e dar a solução para ele; terceiro, dar a informação que o
público quer e, por último, dar entretenimento que envolva as necessidades das pessoas, seus
interesses, valores ou estilos de vida. Nesse intento, um recurso muito utilizado em comerciais
de televisão é falar do produto por meio de uma história. Portanto, nada melhor para chamar a
atenção e prender o telespectador do que a ficção. Esse tipo de produção são recon8472(i)1.40381(a)7.829342101uç(a)-2.8102õques de
cenas ctiianas, cula nase está centrada m nido tico, ctocando aum ceda ta 8472(i)éparmede representuaaesmndo e
24
despertar o desejo de consumo. Além disso, muitas vezes a informação que se transmite é
indissociável da imagem, dado que na fala se faz referência ao que se vê, especialmente
quando se trata de comerciais de televisão.
A mensagem verbal ajuda a desambigüar a pictórica quando essa remete a várias
interpretações, mesmo que a ambigüidade seja uma estratégia para atingir o receptor. Na
maioria das vezes, mais de uma interpretação é ativada na mente do ouvinte, sendo que
uma ou algumas delas (ou até mesmo todas) estão sendo realmente comunicadas; a seleção de
uma dada interpretação fica ao encargo do ouvinte, o qual infere o que está subentendido a
partir da linguagem verbal. Para Vestergaard & Schrøder (1994), toda comunicação baseia-se
no princípio de que nada é dito se não razão para dizê-lo, e essa razão permite extrair
várias deduções daquilo que se ouve, observa ou lê. É preciso distinguir aquilo que
efetivamente se diz daquilo que se deduz do conteúdo do dito (ou do mero fato de ser
enunciado). Por esse motivo, a ambigüidade é um dos fatores importantes na publicidade,
apesar de se ter que dizer muito para ser compreendido em pouco tempo, além de se
despender esforços maiores para processar a informação. Além desse, uma série de outros
recursos são também constantemente utilizados a fim de ampliar a força impositiva dos
anúncios, os quais são mecanismos eficientes por envolver o receptor emocionalmente.
Dentre os mais empregados estão: hipérbole (ênfase ou exagero), trocadilho (jogo de palavras
com sons semelhantes, mas com significados diferentes), paralelismo (semelhanças entre as
estruturas dos enunciados), aliterações (repetição de fonemas idênticos ou parecidos),
metáfora (designação de um objeto ou qualidade por meio de uma palavra que designa outro
objeto ou qualidade que tem semelhança com o objeto referido, numa relação comparativa),
metonímia (substituição de um nome por outro em virtude de haver entre eles alguma
relação), sinédoque (tipo de metonímia que se baseia na relação quantitativa entre o
significado usual da palavra e o conteúdo ou referente pensado) e tropos relacionados
(emprego figurado de uma palavra)
3
.
Cabe ressaltar aqui que, além de ser uma linguagem essencialmente persuasiva, a
mensagem publicitária é também dotada de uma linguagem conotativa, a qual utiliza
principalmente conteúdos metafóricos e metonímicos, por serem recursos que captam
rapidamente a atenção das pessoas. A metáfora estabelece uma relação de similaridade entre
dois referentes, em que um objeto é descrito nos termos de um outro por esses terem algo em
comum (como em “João é um touro”, em que se quer dizer, na verdade, que ele é forte: o
3
Definições baseadas nas acepções do dicionário Houaiss da Língua Portuguesa (2006).
25
touro é um animal forte, característica que é atribuída a João). Ela se quando a audiência
pode ir além da mera exploração do contexto imediato e daquilo que está aparente, acessando
seu conhecimento de mundo e adicionando metáforas próprias como interpretações prováveis,
conseguindo empreender uma ampla variedade de possíveis significados, os quais poderão ser
utilizados no momento em que se ouve ou lê, ou então podendo ser resgatadas para futuras
interpretações. Assim sendo, uma única expressão utilizada de maneira solta determina uma
série abundante de possíveis interpretações. A metonímia, por sua vez, é uma figura estilística
que consiste no uso de uma palavra fora de seu contexto semântico usual por ter uma
significação com relação objetiva com o conteúdo (ou referente) ocasionalmente pensado (por
exemplo, se uma pessoa Gabriel García Márquez, ela está, na verdade, pensando na leitura
da obra desse autor).
De acordo com Carvalho (2000), o significado das palavras plenas (substantivos,
verbos e adjetivos) amplia-se em função do sentido conotativo. Na comunicação publicitária,
a denotação transmite a informação, e a conotação permite a expansão do significado em
várias possibilidades. Há, por isso, um esforço por parte do anunciante em enviar uma
mensagem, sempre com uma intenção implícita, a fim de convencer o público-alvo. Em
publicidade, conforme expõe Tanaka (1994), a comunicação implícita é empregada para dois
propósitos. Em primeiro lugar, uma tendência constante por parte do anunciante de tentar
fazer a audiência esquecer que se está tentando vender algo. Nesse tipo de comunicação
implícita, o anunciante pretende comunicar algo para a audiência, sem tornar sua identidade
manifesta ou, em outras palavras, não revelando sua real intenção de vender. Em segundo
lugar, o propósito da comunicação implícita em publicidade é evitar ter responsabilidade pelas
conseqüências sociais de certas implicações que advêm de uma propaganda. Assim, anúncios
que contenham interpretações de conotação sexual são casos típicos desse segundo aspecto da
comunicação implícita, visto que o uso de imagens as quais subliminarmente remontam a
questões sexuais geralmente nada tem a ver com o produto em si. A imagem de uma mulher
em poses sensuais numa propaganda de cerveja, por exemplo, serve para chamar a atenção
para o comercial, mas os anunciantes querem, na verdade, “segurar” o telespectador,
geralmente do sexo masculino, em frente à televisão, numa tentativa de mostrar o produto,
mesmo que o comercial se torne apelativo. Tanaka (1994) sugere ainda que a comunicação
implícita é uma estratégia útil para fazer com que o receptor se convença sobre a suposta
qualidade do produto, mesmo não acreditando no anunciante.
Não dúvida de que a estrutura de uma propaganda organiza-se de forma a deixar
mensagens implícitas, distanciando-se das mensagens mais objetivas, porque é através delas
26
que o consumidor recebe os valores, as crenças e os ideais transmitidos. Isso se pelo uso
variado dos recursos lingüísticos citados anteriormente, bem como através dos estímulo1279(s)6..21279(a)-2:3.4466( )-721279(a)-2c306829382.80892(b)10pt23449(i)1.40381(ng)1.6383(é)-2o.6166(t)1..31915( )-228.792.5532.80892(ons)-6383(é)-2m23449(i)1.218.081. tstdo st vtoétt as avamvt mm,v306.6 30 0 cm(a)-22001)1279(a)-25.9574( )-79.7792.5532.80762(v)1028.792.5532.80892(om)-9.2511(o)10prmsss
27
palavras para alcançar uma compreensão da mensagem. Através do auxílio que a imagem
provém, o observador verá que os rapazes estão em uma situação de perigo por quererem
parecer “radicais”. A foto do carro logo abaixo leva o leitor a inferir que o veículo é propício
para aventuras, mas ao mesmo tempo é seguro. Portanto, o leitor pode entender que, se ele
quiser segurança em suas aventuras radicais, é pensar com cuidado e perceber que o
veículo anunciado, Montana, é ideal para isso. Isso é reforçado pelo slogan
4
logo abaixo do
nome do carro: “Adrenalina para quem é inteligente”.
Essa breve exposição de uma possível interpretação do anúncio pelo leitor faz com
que se levantem questões sobre como se a compreensão da linguagem publicitária, visto
que nela geralmente são utilizadas informações subentendidas. É um fato curioso entender
como uma peça publicitária consegue chamar a atenção do seu público-alvo, além de se
questionar como a informação implícita de uma propaganda é trazida à tona e, por
conseqüência, quais são os processos mentais realizados na busca da interpretação correta.
Por fim, também se pode discutir como é compreendida a informação que o anunciante
pretende através da união da mensagem lingüística e a não-verbal, principalmente aquelas
veiculadas em filmes publicitários.
Percebe-se que o significado implícito em linguagem natural é flexível e variável por
definição, uma vez que depende de fatores como os conhecimentos de mundo dos indivíduos,
informações contextuais e a forma como a mensagem é transmitida. A importância da
linguagem por trás das palavras se situa nessa maleabilidade, visto que se pode moldar o
conteúdo a ser transmitido de diversas maneiras a fim de levar a audiência a uma
interpretação mais aproximada daquela mensagem pretendida.
O uso de implícitos pela publicidade é uma ferramenta poderosa para chamar a
28
anúncio-leitor). Além disso, levanta-se aqui a questão de como essas inferências são
construídas de forma interna ao comercial (em que se considera o contexto construído dentro
da propaganda, observando-se a maneira como os personagens da história ilustrada pelo
comercial se comunicam e se fazem entender uns pelos outros, a fim de elaborar uma
situação-tipo, ignorando-se aquilo que a audiência possa inferir) e também externamente (ou
seja, através da interação audiência-propaganda).
Levando-se em conta essas questões, percebe-se a necessidade de uma base teórica
consistente que explique como o processo de compreensão do discurso publicitário ocorre.
Por se acreditar que os conceitos e noções abordados no construto da Teoria da Relevância
explicam como a interpretação mais adequada é alcançada pelas pessoas que recebem a
mensagem, pretende-se expor, no capítulo seguinte, esse modelo conceitual de comunicação
humana baseado no processamento inferencial de informações. A Teoria da Relevância, de
Sperber & Wilson (1986; 1995), com base na Teoria das Implicaturas de Grice (1975), é,
então, o alicerce deste trabalho por se pensar que é, até o momento, a que melhor explica
como o receptor de uma mensagem entende aquilo que está além do dito. Por essa razão, as
questões levantadas nos parágrafos anteriores serão abordadas nos próximos capítulos sob a
perspectiva dessa teoria, numa tentativa de responder essas e outras perguntas que aparecerão
nesse texto.
29
3 FUNDAMENTOS DA TEORIA DA RELEVÂNCIA
Este capítulo propõe-se a desenvolver os aspectos teóricos que embasarão as futuras
análises do capítulo quatro. Levando-se em conta os questionamentos sobre a ocorrência de
implícitos na publicidade, pretende-se demonstrar de que forma um estímulo produzido pelo
desejo de comunicar algo é compreendido, mesmo que repleto de implícitos. Acredita-se que
30
significado não é exclusivo da realidade, e faz interfaces com diversas áreas. Pensando dessa
forma, assumem-se relações interdisciplinares entre as ciências formais, cognitivas e sociais.
O tipo de lingüística a ser feito dependeda concepção metodológica que melhor atende as
necessidades para explicar fenômenos desta disciplina. A Lingüística e suas intradisciplinas
Semântica, Lexicologia, Pragmática, Sintaxe, Fonologia, e Morfologia fazem interface com
essas ciências interdisciplinares.
Para as ciências sociais, a linguagem serve para a comunicação e, em conseqüência,
para a interação humana. Um dos principais representantes do estudo da linguagem como
fenômeno social é Saussure, que desenha uma faceta estrutural para os estudos lingüísticos.
Esse estudioso buscava estudar a significação como o objetivo principal da comunicação. Para
ele, ao dizer algo o indivíduo ao mesmo tempo comunica. Costa (1984) cita que, para o
paradigma estruturalista, a linguagem humana é vista como uma abstração social. Procura
descrever a estrutura de línguas específicas enquanto códigos sociais, compreendendo a
análise morfológica e fonológica delas. No entanto, não conta do estudo do significado e
nem descreve as relações sintáticas mais profundas.
Chomsky (1978) defende um estudo cognitivo da linguagem, vista como algo
inato aos seres humanos, os quais possuem regras internas para a comunicação. Afirma que o
significado é organizado e processado pela cognição. Dessa forma, o significado de algo é
construído a partir dos sentidos que ele possui. O objeto de estudo é a capacidade humana
para a linguagem, buscando propriedades universais das línguas. Assim, acredita na existência
de uma Gramática Universal que rege todas as línguas e, por esse motivo, procura explicar as
regras internas que um falante possui ao criar infinitos enunciados a partir da sintaxe. Assim
como a lingüística social de Saussure, essa teoria pouca atenção ao estudo do significado.
Para o paradigma chomskyano, aspectos do significado são determinados pela estrutura
superficial do enunciado, mas entende que o estudo semântico vai além desse modelo
gerativo-transformacional.
Sob o ponto de vista das ciências formais, a linguagem é analisada numa interface
com a lógica, a fim de formalizar aspectos do significado. De acordo com Montague (1974),
Sintaxe e Semântica compartilham aspectos na determinação do significado. Por isso, esse
depende da sintaxe e de suas propriedades formais para ser avaliado pela Semântica. O rigor
dessa teoria formal adota o estudo do significado a partir de suas condições-de-verdade, as
quais são provadas a partir da interface da Linguagem Natural com a Lógica. Nessa relação,
procura-se demonstrar que a primeira instância do significado é a forma lógica, visto que,
nessa interface, é possível representar o significado em sua forma sica. As áreas formais,
31
por não terem conteúdo e por poderem criar um domínio comum, aplicam-se a qualquer
campo de estudo a fim de formalizá-lo. Nesse sentido, não se espera que haja um trabalho
com as especificidades de cada enunciado, mas analisam-se as propriedades gerais do
raciocínio. Por esse motivo, a simbolização, derivada da lógica formal, tem o papel de
expressar a construção de uma representação do significado em termos gerais.
Considerar-se-á, então, a Lingüística e suas intradisciplinas sob o ponto de vista das
ciências formais, devido à precisão com que descrevem aspectos nelas inseridos. A Semântica
é base principal para se compreender como se dá o processo comunicativo dos seres humanos,
posto que quaisquer pensamentos inferenciais surgidos a partir da interação comunicativa
iniciam a partir da proposição. Assim, por ser livre de contexto e fazer interface com áreas
formais, a Semântica tem limitações. Por isso, o estudo do significado em linguagem natural
requer também a compreensão dos princípios pragmáticos inerentes ao processo
comunicativo.
A partir dessas questões, pretende-se abordar a forma pela qual a Semântica e a
Pragmática tratam fatos lingüísticos ligados a um contexto conversacional. Para tanto, será
exposto a seguir um breve percurso histórico acerca dos estudos do significado a partir de
conceitos da Semântica Formal até a necessidade dessa interação com a Pragmática como área
específica em relação ao significado de um enunciado ligado a contextos específicos. Isso se
faz necessário porque se percebe a existência de aspectos do significado difíceis de limitar: ao
estudar a linguagem natural, ultrapassa-se a barreira das condições-de-verdade da proposição
por conseqüência daquilo que está além do dito. A influência do contexto, as intenções do
falante e as inferências provocadas pelo enunciado desafiam a noção de significado prevista
pelos sematicistas, criando-se a necessidade da Pragmática como uma tentativa de resolver
tais questões. Por essa razão, a conexão entre as duas disciplinas garante uma explicação para
melhor definir a formação do significado.
inúmeras discussões sobre o que, exatamente, constitui o objeto de uma ou de
outra área, mas não uma clareza sobre se são mesmo objetos distintos. Muitos estudiosos
não incluem a Pragmática nos estudos do significado, abordando apenas as questões de
condições-de-verdade. também aqueles que vêem a necessidade dessa área por
considerarem a importância de fatores extralingüísticos na determinação do significado.
Como já referido, será considerada a interface entre as áreas, por se acreditar que a Semântica
e a Pragmática são disciplinas complementares. No entanto, é necessário ainda expor alguns
argumentos mais consistentes.
32
Pires de Oliveira e Basso (2007) afirmam que distinção de natureza do objeto
semântico e do pragmático. O objeto semântico é previsível, num lculo sempre válido,
enquanto o pragmático pode ser calculado a posteriori, isto é, pode-se explicar o cálculo
depois de pronto, e não como saber antes seu resultado por ele depender de uma
combinação de outros fatores, como o contexto e o uso decorrente desse. Stalnaker (1999)
aponta o contexto como fator determinante para separar a Pragmática e a Semântica: a
primeira mobiliza o contexto para determinar a significação dos enunciados, enquanto a
segunda não depende dele.
Tentou-se adequar o termo ‘pragmática’ à distinção de competência e desempenho,
propostos por Chomsky (1978): caberiam à pragmática as noções de desempenho da
linguagem em uso. Em seguida, acrescentou-se a noção de contexto, conceito esse que
deveria eliminar quaisquer ambigüidades das sentenças. No entanto, Levinson (1983) aponta
que não uma definição clara de contexto, justamente por haver um contexto-dependente,
relacionado com as produções de fala realizadas pelo falante a cada momento, e um contexto-
independente, que faria parte do sistema interno de cada indivíduo. Mesmo assim, é difícil
reunir esses dois conceitos para construir uma noção unificada de contexto com ambos.
Para Levinson (1983), a Pragmática deveria se ocupar com as questões de significado
que escapam à Semântica. De acordo com Yule (1996), Semântica é o estudo das relações
entre formas lingüísticas e entidades no mundo; ou seja, como as palavras literalmente se
conectam com as coisas. Sabe-se que essa área trata da interpretação expressa por condições-
de-verdade das proposições expressas em enunciados. Essas geralmente correspondem ao
significado básico literal de uma oração simples e que são convencionalmente representadas
por letras como P, Q e R, variáveis proposicionais. Dessa forma, P & Q, unidos pelo conector
lógico &, poderiam corresponder a uma série de enunciados diversos, tal como O gato pulou
da árvore e Pedro o observou, onde P refere-se a O gato pulou da árvore e Q, a Pedro o
observou. Se P é verdadeiro e Q é verdadeiro, então a forma P & Q é válida. Contudo, na
linguagem cotidiana, P & Q nem sempre servem para descrever fatos. Tem-se uma tendência
de interpretar a conjunção ‘e’ o como o conector lógico ‘&’, mas como a seqüência ‘e
então’. Assim, Pedro o observou e o gato pulou da árvore não segue a mesma seqüência
temporal no enunciado em questão. Esse é um exemplo de como muito mais pode ser
comunicado do que esdito. Outrossim, em algumas situações, o significado convencional
das palavras de um enunciado pode ser o mesmo daquele pretendido pelo falante. Por isso, a
semântica sozinha teria problemas em tratar dessas questões.
33
O sentido implícito dos enunciados não são tratáveis pela lógica, justamente por ser
maleável conforme o conteúdo e, na maioria das vezes, pelo contexto. A riqueza da
linguagem natural é altamente rentável devido a essa recursividade. O uso do conetivo ‘e’, por
exemplo, serve para diferentes enunciados, mostrando que o custo operacional é ótimo
6
:
(a) João procurou Maria e falou com ela (João procurou Maria e então falou com ela
– seqüência temporal).
(b) João pulou da janela e quebrou a perna (João quebrou a perna porque pulou da
janela – causa e efeito).
(c) Maria cozinhava e falava com sua filha (as ações parecem acontecer ao mesmo
tempo, dando idéia de simultaneidade).
Kempson (1977) afirma que uma teoria semântica deve proporcionar uma explicação
do significado das palavras e o significado das sentenças da linguagem. Contudo, como
referido, a semântica baseada na verdade se restringe a explicar a natureza dessas relações.
Conforme Wittgenstein (1984 [1953]), a linguagem, para fins de comunicação, não pode ser
analisada livre de contexto, e critica os limites da noção de verdade da lógica para a
comunicação. A semântica tem, então, compromisso com outras áreas, já que não pode
resolver sozinha a questão da significação em linguagem natural. Por esse motivo, ao se
observar o enunciado ‘Florianópolis é o lugar perfeito para passar as férias’, percebe-se que
uma relação pragmática que acarreta diferentes significados: uma expectativa de que se
considera Florianópolis um lugar excelente para passar as férias. Utiliza-se essa mesma
palavra ou expressão para diferentes situações. Portanto, ‘perfeito’ poderia ser substituído por
‘excelente’ ou ‘ótimo’, e pode-se afirmar que o contexto precisão aos enunciados em
linguagem natural, diminuindo a provável vaguidade deles, além de poder ser usado também
em situações irônicas: se esse mesmo enunciado tivesse sido pronunciado por alguém que
detesta Florianópolis, ele logo seria compreendido como uma afirmação contrária à que se
está afirmando. a linguagem gica é totalmente livre de contexto, buscando-o na
racionalidade. Por isso, mesmo que a forma lógica seja a base do significado, o contexto é
essencial por defini-lo dentro do escopo da linguagem natural.
Percebe-se então que a riqueza da linguagem faz com que o significado seja
relacionado de forma compatível com o que o falante quis dizer. A sua flexibilidade se
6
Observações feitas pelo Professor Dr. Jorge Campos da Costa, em suas aulas de Tópicos de Semântica na
PUCRS (2007).
34
explica por questões de economia, pois não é preciso explicitar todos os enunciados de forma
literal para que se tenha um entendimento completo, além de ter uma dependência de contexto
e ter como função básica a comunicação. Assim, o que está sendo comunicado não pode ser
compreendido somente através da interpretação semântica: essa área não se preocupa com
fatores extralingüísticos, como contexto e usuários da linguagem. Esses fatores são tratados
pela Pragmática, freqüentemente usada a fim de dar sentido ao que o indivíduo lê ou ouve.
A tarefa da Semântica é definida por determinar as condições-de-verdade de uma
sentença, posição essa defendida por Gazdar (1979), que define a Pragmática como o sentido
menos as condições-de-verdade, as quais fariam parte dos estudos semânticos. No entanto,
Pires de Oliveira e Basso (2007) entendem que o significado o as condições-de-verdade
mais as condições de admissibilidade, ou seja, a proposição carrega informações sobre os
contextos em que ela é aceitável.
A Semântica explicita as condições para se ter uma proposição e, uma vez que essa é
determinada, as relações com outras proposições. Uma mesma sentença pode expressar
diferentes proposições, e sentenças diferentes podem expressar uma mesma proposição. Além
disso, é possível haver equívocos que podem ou não ser desfeitos. Uma vez determinada, ela é
comparada com o mundo e avaliada como verdadeira ou falsa, entrando no campo da
Pragmática, visto que o ouvinte avalia a proposição no mundo. Aliás, uma das tarefas
principais dessa disciplina é explicar como os fatores do contexto entram na determinação da
proposição e como os atos lingüísticos são executados.
Para Stalnaker (1999) contexto é o conjunto de mundos aos quais pertencem as
proposições como verdadeiras; esses ajudam a determinar a proposição que, cotejada ao
mundo, recebe um valor de verdade e engendra um novo contexto. Segundo esse autor,
informações compartilhadas entre os interlocutores em um ato comunicativo representam um
conjunto de contextos. Quando uma nova sentença n é enunciada, ocorre uma mudança de
contexto, pois n elimina os contextos anteriormente aceitos que são incompatíveis com n. Por
isso, Moura (2000, p. 66) afirma que a fronteira entre Semântica e Pragmática é normalmente
traçada a partir da noção de contexto. A significação que independe de contexto é colocada no
campo da Semântica, e a significação contextualmente dependente é colocada no campo da
Pragmática. O autor aponta que não há uma definição precisa de contexto, e a divisão entre as
duas áreas é bastante fluída.
Bar-Hillel (1982) avalia o papel do contexto para a determinação da referência de
uma sentença, numa tentativa de definir o objeto da Pragmática. Através das sentenças:
(1) O gelo flutua sobre a água.
35
(2) Está chovendo.
(3) Estou com fome.
o autor aponta que (1) pode ser compreendida pelo interlocutor sem dificuldades, chamando-a
de asserção, enquanto (2) e (3), por conterem elementos indiciais que remetem a uma
dependência de contexto, possuem problemas quanto à determinação do estado-de-coisas a
que se referem e, portanto, problemas também na significação. Em (2), é preciso determinar
onde e quando a sentença foi dita, enquanto em (3) é necessário saber quando e quem disse.
Por esse motivo, a elas Bar-Hillel o nome de sentenças indiciais. Em (1), pode-se julgar a
sentença como verdadeira ou falsa, mas em (2) e (3) não, visto que o contexto aqui é
fundamental para a interpretação. Segundo Costa (1984), é por isso que a pragmática estaria
conectada à semântica das condições-de-verdade. Essa é uma questão que vem desde Frege,
quando elabora seu princípio do contexto, e continuada pelas Investigações filosóficas de
Wittgenstein (1984 [1953]), que examinou a importância do contexto para a significação. Em
outras palavras, percebeu-se a necessidade do estudo da significação em linguagem natural
dentro de um contexto de uso.
A Pragmática estuda as apostas de interpretação que desenham uma intenção do
falante que se coloca no e pelo próprio ato de fala (na comunicação). Focaliza também a
atribuição de intencionalidades (e as apostas do falante de que o intérprete vai fazer tal e qual
atribuição), e os raciocínios que o falante acredita que seu interlocutor é capaz de realizar.
Para Pires de Oliveira e Basso (2007), fenômenos pragmáticos podem ser
caracterizados por serem não-calculáveis (ou seja, não-previsíveis, posição defendida por Ilari
e Chomsky), pela maneira como o contexto se apresenta em dado momento (Stalnaker) e pela
cancelabilidade de raciocínio (Levinson). Os autores defendem ainda que o pragmático se
caracteriza pela combinação dessas características, sendo dependente de um julgamento do
intérprete no contexto que pode ou não ser equivocado. Já o semântico também depende desse
julgamento em contexto, já que a caracterização da proposição só é possível a partir dele, mas
se com independência, porque seu objeto de estudos é a proposição que se evidencia por
carregar o apenas as informações sobre as condições-de-verdade, mas também sobre as
condições de admissibilidade.
Há, no domínio da Pragmática, a presença do raciocínio não-lógico, em que nem a
dedução, nem a indução entram no cálculo, mas a abdução, ou seja, uma explicação da
subjetividade do falante, visto que, no jogo da comunicação, as cadeias de processos
inferenciais são todas baseadas em suposições. Ilari (2000 [1997]) acredita que à Semântica
36
cabe a análise dos fenômenos calculáveis, ao passo que fenômenos não-calculáveis ficam no
domínio da pragmática, onde estão os fatos imprevisíveis.
Contudo, essa separação enfática entre as áreas parece ser precipitada, visto que
ambas são complementares. Para Levinson (2000) a análise pragmática fundamenta-se na
semântica, que fornece o significado da sentença a partir do qual se o raciocínio
inferencial, gerado a partir do processamento dedutivo da informação. Há, então, uma relação
de dependência da Semântica, mas o mesmo autor não considera que essa é o input da
Pragmática, porque ela também depende dessa área. Não como determinar a proposição
expressa por uma sentença, tarefa da Semântica, sem a relação de referência que se estabelece
no uso, que é determinado pela Pragmática. Em outras palavras, a referência é Pragmática e
ela é pressuposta pela Semântica. Para o mesmo autor, a Pragmática é complementar e
constitutiva à Semântica; ela deve se aliar à Semântica como uma camada de significado
instável, dependente de contexto, sobre o significado fixo via cálculos lógicos. O escopo da
Pragmática deve incluir a ironia, a metáfora e o implícito, e não apenas o significado
convencional das sentenças. Assim como a semântica se estabelece no estudo das condições-
de-verdade, a pragmática seria definida em relação às condições de plausibilidade, ou
adequação, estudando a competência comunicativa, a habilidade dos falantes em usar
sentenças adequadas em um determinado contexto. No entanto, para Costa (1984) essa visão
apresenta problemas, pois não faz uma distinção clara entre Pragmática e Sociolingüística,
continua dependente de uma língua ideal, como preconizada por Chomsky, além de não ser
capaz de explicar os fenômenos pragmáticos em que a quebra de regras conversacionais é um
indício de que algo mais está sendo comunicado.
Montague (1974) afirma que a Pragmática deveria seguir os passos da Semântica,
trabalhando com conceitos de verdade e satisfação. A Pragmática é vista por ele como uma
disciplina formal que investiga as expressões indiciais, as quais os valores semânticos
dependem do contexto de uso. Percebe-se, então, que Pragmática e Semântica se assemelham
em metodologia, mas a primeira seria definida como uma disciplina que trabalha com fatores
do contexto para que uma sentença indicial possa ser interpretada semanticamente. A
semântica trata, portanto, do estudo das condições-de-verdade, e a Pragmática é definida pelas
condições de adequação.
Para Gazdar (1979), a Semântica deve considerar as condições-de-verdade e deixar
para a Pragmática a descrição e a explicação do excesso de significado. O mesmo autor
percebe que é difícil tratar da primeira separadamente, posto que o enunciado terá proposições
verdadeiras ou falsas de acordo com as informações do contexto. Muitas vezes é preciso
37
certas informações contextuais para identificar as condições-de-verdade das sentenças, como
numa inversão da ordem dos fatos, na qual o significado muda, sendo necessário que se
observem as informações advindas do contexto. Dessa forma, Semântica e Pragmática
trabalham juntas na construção do significado, porque as condições-de-verdade são
inseparáveis dos demais aspectos do enunciado. Costa (1984) também acredita que a
Semântica deve trabalhar de forma conjugada com a Pragmática, tendo em vista que os
aspectos significativos diversos na constituição de um enunciado não se separam no
estabelecimento das condições-de-verdade. “O conteúdo semântico parece ser a base sobre a
qual outras manifestações do sentido ocorrem”
7
(LEVINSON, 1983). Por isso, a Pragmática
não é autônoma, e tem uma forte base na semântica. Por esses motivos, pode-se dizer que a
Semântica como uma disciplina das condições-de-verdade e a Pragmática, das condições
comunicativas dos enunciados, são disciplinas dependentes, constitutivas uma da outra na
determinação do significado. A interação dessas intradisciplinas vem a ser, portanto, uma
solução para os problemas de significação em linguagem natural, sendo essa a abordagem
empregada neste trabalho.
Na próxima seção serão tratados alguns aspectos da definição do significado em
linguagem natural, considerando-se a interface entre Semântica e Pragmática como base. Essa
seção se faz necessária porque expõe parte do caminho percorrido pela Filosofia da
Linguagem na busca da construção do sentido nas relações comunicativas, essência deste
trabalho.
3.2 A DEFINIÇÃO DO SIGNIFICADO NA FILOSOFIA DA LINGUAGEM
Por um longo período nos estudos da Filosofia, houve interesse nos sistemas formais
de análise derivados, na maioria das vezes, da Lógica e da Matemática. A ênfase se dava na
descoberta dos princípios abstratos, potencialmente universais, no âmago da linguagem.
Interessava a descrição e o significado de enunciados, mas sem a preocupação com quem e
como esses eram pronunciados.
Frege (2002 [1892]) visa solucionar os problemas filosóficos através da Lógica. Até
então, pensava-se que o sentido seria nulo se não se estabelecesse uma relação do dito com a
7
As traduções feitas nesta dissertação são da própria autora do trabalho.
38
coisa referida. A tese fundamental desse filósofo é a de que as expressões que denotam um
objeto um indivíduo pressupõem a sua existência. Ao enunciar: O pintor de Girassóis
cortou uma orelha” e Van Gogh cortou uma orelha”, pressupõe-se que um indivíduo que
cortou uma orelha ou que um indivíduo chamado Van Gogh. Os dois enunciados
pressupõem que Van Gogh, o pintor que cortou uma orelha, existe. Para Frege, referir a algo
difere de falar significativamente. Assim, o autor a linguagem formal como uma correção
dos limites da linguagem natural.
Nesse sentido, é perfeitamente possível falar acerca de algo sem que se precise
necessariamente referir-se a ele, ou seja, sem que esse algo precise, de algum modo, existir. A
linguagem é um meio de comunicação e de conhecimento, já que possibilita a transmissão e a
compreensão do sentido sem precisar recorrer à referência. Todo objeto contém não aquilo
a que ele refere ou significa, mas também o sentido, que é o modo de designação, o modo
39
Russell (1905) acredita que o fato de a linguagem poder significar coisas diversas
para duas pessoas é o que garante a possibilidade de comunicação. Ele acreditava que da
estrutura lógica da linguagem se poderia resgatar a sua estrutura metafísica. O significado de
uma proposição seria analisado de forma abstrata, que na linguagem natural
flexibilidade, sendo difícil utilizá-la de maneira mais rigorosa. Por isso, as linguagens reais
não são logicamente perfeitas se devem servir aos propósitos da vida cotidiana.
Wittgenstein (1994 [1921]) propôs o resgate das propriedades do significado de
uma proposição através de suas propriedades semânticas, ou seja, com o uso da lógica e das
condições-de-verdade
8
. Em seu Tractatus lógico-philosophicus, discorre sobre a essência da
linguagem e do mundo, tentando estabelecer como um fato se relaciona com outro de modo a
ser símbolo deste. A partir disso, propõe que o significado de uma sentença provém do
significado das palavras que a compõem. Considera o enunciado como uma imagem da
realidade. Para o mesmo autor, compreender um enunciado significava saber se ele é
verdadeiro. Com esse pensamento, procura na forma lógica a essência da linguagem natural,
identificando significado e condições-de-verdade de um enunciado. Portanto, um enunciado
mostra seu sentido e é a expressão de suas condições-de-verdade – o sentido de um enunciado
é, por conseguinte, a condição sob a qual ele é verdadeiro.
O Tratactus tinha por objetivo isolar as regras que se supunha regerem a estrutura
lógica da linguagem. De acordo com Auroux (1998), essas regras agem no interior das línguas
e lhes conferem uma capacidade de expressão indefinida, sem que por isso as pessoas sejam
capazes de conhec sdo em -5.31915(n511(c)7.8)gu.21279(o)10.63gad511(c)7.8u72(ons)16.61(da)-2.8076T63eõgatciob e s egreor
40
sempre depende do contexto. Para ele, a linguagem está ligada a um contexto de ações, usos,
instituições.
O significado de uma palavra é, portanto, o seu uso em contexto dado. Nesse sentido,
um nome tem uma referência somente no contexto de um enunciado. A partir disso,
Wittgenstein (1984 [1953]) elabora o conceito de “jogo de linguagem”: “um contexto de
ações e palavras no qual uma expressão pode ter um significado”, ressaltando a importância
do fator extralingüístico. Nenhum jogo de linguagem representa a essência da linguagem. É,
na verdade, uma das várias práticas possíveis dela consideradas dentro de um contexto. O
sentido ou significado só pode acontecer considerando o jogo de linguagem no seu conjunto e
nas diferenças com outros jogos. Esse filósofo procura mostrar a multiplicidade dos usos das
palavras e dos enunciados. De acordo com Gedrat (1993), Wittgenstein mostra que o contexto
de uso de uma expressão determina seu significado em cada uma de suas ocorrências. Embora
semelhantes, as expressões lingüísticas têm funções múltiplas e diferentes entre si. Penco
(2006) aponta que o jogo de linguagem desempenha dois papéis: é um instrumento para o
estudo da linguagem e é um dado de onde se pode partir, ou seja, pode-se falar da linguagem
descrevendo as diferenças e semelhanças dos jogos de linguagem. Define-se, então, que o
significado de uma palavra é o seu uso no contexto de um enunciado e, por conseguinte, no
contexto de um jogo de linguagem. Assim, a expressão, a interpretação e a prática de uma
regra estão no nível do agir social: a interpretação sozinha não basta e compreender uma regra
não quer dizer necessariamente segui-la corretamente. A linguagem e o conjunto dos jogos de
linguagem são fenômenos governados por regras o há, por isso, uma linguagem privada,
individual. Se há linguagem, esta é um fenômeno público, constituída pelo acordo dos
falantes quanto ao uso das palavras.
Por causa de nomes como Strawson (1950), Grice (1957; 1975), Austin (1962),
Searle (1969) e Levinson (1983; 2000) desenvolveu-se a crítica às limitações da lógica a
partir da Teoria dos Atos de Fala e a Teoria das Implicaturas. Esses conceitos ligaram
significado e intencionalidade, o que reforçaria um estudo pragmático em detrimento do
tratamento puramente lógico dado às proposições. O foco passaria a ser o enunciado e sua
função comunicativa dentro do contexto, posição antagônica às proposições abstratas livres de
contexto. Para Strawson (1950), pode-se saber se a forma lógica de uma frase é verdadeira ou
falsa, dependendo da contextualização que se dá ao enunciado. Austin (1962) foi quem
primeiro desenvolveu essa concepção ao perceber que a linguagem não serve para
descrever o mundo, mas para fazer promessas, perguntar, declarar, entre outros atos
comunicativos.
41
A partir da proposta de Wittgenstein (1984 [1953]), Austin (1962) procurou
estabelecer relações entre a função de certos enunciados e a linguagem enquanto ato
comunicativo. Incomodava-o o caráter vago do apelo ao uso lingüístico que estava em vigor
por causa das Investigações de Wittgenstein. Austin queria classificar sistematicamente os
usos lingüísticos ao invés de declarar que existem usos infinitos da linguagem. Segundo ele,
uma dimensão social ou interpessoal da linguagem: ela não é usada apenas para descrever
o mundo, mas para perguntar, fazer promessas, pedir desculpas. Em outras palavras, uma
intenção, não apenas a descrição do mundo. Portanto, proferindo enunciados, executam-se
ações com conseqüências exatas, como se observa nos exemplos:
1. Aceitas como sua legítima esposa a senhorita Y?” pergunta feita pelo padre ao
noivo na cerimônia de casamento;
2. Você está demitido” – dito por um chefe a seu subordinado;
3. É proibido fumar” – escrito num cartaz em um ambiente fechado.
9
Atos executados através de enunciados são denominados por Austin (1962) de atos
de fala, os quais possuem comumente rótulos como desculpar-se, reclamar, cumprimentar
convidar, prometer ou pedir. O que é dito em um enunciado pertence a um ato de fala
particular. O fato de a linguagem não ser usada para descrever o mundo representou um ponto
decisivo nos estudos sobre a linguagem e o desenvolvimento da Teoria dos Atos de Fala.
Austin demonstrou que a linguagem suporta diferentes usos, executando ações ao invés de
dizer algo. Nesse sentido, não seria necessário falar sobre pensamentos e crenças transmitidos
por meio de enunciados, mas falar sobre atos que os falantes executam ou sobre a força
ilocucionária
10
dos enunciados.
Searle (1969) afirma que as pessoas comunicam para dizer o que elas dizem, e em
alguns momentos são compreendidas. Elas fazem perguntas, prometem algo, agradecem,
entre outros atos possíveis, e suas emissões são relatadas para o mundo. Em outras palavras,
Searle acredita que o falante pretende que o ouvinte o entenda pela decodificação de seu
enunciado.
Não se entrará aqui nas questões de explicitação da classificação dos atos de fala tal
como Austin e Searle os definiram, visto que isso escapa ao objetivo deste texto. Além disso,
segundo Penco (2006), Levinson sustentou que uma classificação pormenorizada dos atos
9
Austin define esses enunciados como “enunciações performativas” porque com elas se executa certa ação.
Estas se contrapõem às “enunciações constatativas”, que têm como função descrever um estado de coisas.
10
A força ilocucionária de um enunciado é a intenção por trás de um ato de fala.
42
lingüísticos é uma empreitada pouco útil do ponto de vista lingüístico, porque o tipo de força
ilocucionária é muito dependente do contexto, como o mostram os atos lingüísticos indiretos.
Por isso, ele acredita que se podem considerar somente três atos lingüísticos: asserção,
pergunta e ordem, deixando para o contexto a tarefa de clarificar o significado das
proposições.
Conforme exposto acima, os seres humanos usam a comunicação para propósitos
específicos. Dessa forma, a língua serviria como uma ferramenta para a interação
comunicativa. A partir desse momento, passou-se a valorizar o aspecto cognitivo da filosofia
da linguagem na interpretação do significado do enunciado. O código perde seu status dentro
da Pragmática e o raciocínio humano passa a ter preferência nos estudos da linguagem.
Note-se que Austin dedicou-se à convenção ao definir os atos lingüísticos através da
comunicação, mas deu espaço também à intenção. Esse assunto ganha espaço nos trabalhos de
Grice (1957, 1975), o qual percebe que o significado lingüístico vem da intenção do falante.
Segundo a Teoria das Implicaturas, desse autor, o significado se situa por trás do enunciado
expresso, pretendido pelo falante ao comunicar algo ao seu ouvinte. Esse percebe a intenção
de seu interlocutor, criando inferências e implicaturas a respeito do significado do falante a
partir de evidências que ele apresenta mediante sua fala. Na próxima seção explicitar-se-á a
Teoria das Implicaturas de Grice, base para a Teoria da Relevância de Sperber & Wilson
(1986; 1995), propósito teórico central deste trabalho.
3.3 UM NOVO OLHAR: COMUNICAÇÃO COMO PROCESSO INFERENCIAL
Conforme explicitado anteriormente, teóricos da filosofia da linguagem percebem
que a determinação do significado não se dá apenas por sua forma semântica, mas pela
situação em que dado enunciado ocorre, e por isso passou-se a trabalhar com a noção de
contexto, juntamente com o estudo do processamento cognitivo do enunciado. Nesse ínterim,
Grice (1975 [1957]) propõe o modelo inferencial de comunicação, o qual conta do dito
além do dito, ou seja, o que está implícito em uma dada mensagem. Trata-se de uma
alternativa para o Modelo de Código, traduzido por Ready (1979) pela “metáfora do canal”,
em que a codificação da mensagem seria o empacotar da mensagem e a decodificação, seu
desempacotar. No entanto, uma “habilidade interpretativa que envolve um raciocínio
inferencial, não contemplada por esse modelo, passa a ser requerida” (SILVEIRA & FELTES,
43
2002, p. 19), pois a abordagem desse modelo não leva em conta o papel do contexto no
processo interpretativo.
Ao observar o seguinte diálogo:
A: Você vai ao lançamento do novo livro de Scliar?
B: Os livros dele são sempre interessantes.
pode-se considerar a hipótese de que ‘B’ cogita em ir ao lançamento do livro de Scliar porque
provavelmente é leitor de seus livros, que emite uma opinião positiva a respeito deles (os
considera interessantes). Essa informação com certeza não deriva da decodificação
lingüística. Recorrendo ao contexto, exposto por ‘A’, de que haverá o lançamento de um livro
desse autor, é que se pode fazer uma interpretação adequada do enunciado de ‘B’.
Para Grice (1975), o comunicador tem que conseguir que o receptor reconheça a sua
intenção em transmitir certo pensamento. Esse reconhecimento inferencial
11
das intenções
ocorre com certo risco: às vezes o indivíduo infere uma interpretação que lhe parece a mais
plausível, mas que não é a única possível. A comunicação inferencial é bem sucedida quando
o falante pretende que seus ouvintes reconheçam a intenção para informá-los sobre sua
situação e os ouvintes, por sua vez, tentam reconhecer o que o falante pretende informar. A
comunicação, conseqüentemente, não se quando os ouvintes reconhecem o significado
lingüístico do enunciado, mas quando eles inferem o significado do falante através dele. Pode-
se dizer, então, que o significado
12
lingüístico é proveniente da intenção do falante e dos
processos mentais
13
.
As intenções dos falantes direcionam a escolha das expressões lingüísticas a serem
usadas com o intuito de exprimirem certo sentido e a escolha do tom que se quer dar a
entender conteúdos não proferidos, mas aqueles entendidos. Portanto, mostra-se que o ato
comunicativo é muito mais do que codificação e decodificação, surgindo assim a noção de
‘implicatura’. Para Grice (1975), existe um espaço entre o vel lingüístico, daquilo que é
pronunciado pelo falante, e aquilo que o ouvinte compreende. Trata-se de um sentido
11
Para Sperber & Wilson (1995, p. 68), inferência é um processo cognitivo conceitual pelo qual uma suposição é
aceita como verdadeira ou provavelmente verdadeira, baseada na força da verdade ou provável verdade de outras
suposições. Sobre a força das suposições, ver subseções 3.4.3 e 3.4.4.
12
Penco (2006) aponta que o verbo to mean literalmente pode ser traduzido como significar, dar a entender,
intencionar, pretender. Assim, meaning seria, ao mesmo tempo, significado, sentido, palavras que serão usadas,
neste trabalho, como sinônimas.
13
Esse ponto de vista parece opor-se ao de Frege (2002 [1892]), visto que ele afirma que o sentido é algo de
objetivo e não depende dos processos mentais com os quais os apreendemos”.
44
derivado atribuído a um enunciado após constatar que seu sentido literal é irrelevante para
determinado momento comunicativo. É, então, um significado adicional que o ouvinte assume
que o falante quer expressar para transmitir mais do que aquilo que é dito. Aliás, é importante
ressaltar que a expressão “dito” é utilizada para o significado literal, a proposição. A partir
dele são formadas as implicaturas ou algo é sugerido a respeito do que está subentendido,
e o que o está no vel do dito é usado como a base da informação transmitida. Essas o
informações que não precisam ser explicitadas no momento da fala por estarem subentendidas
ao enunciado, pois é o uso por parte do ouvinte do conhecimento adicional que sentido ao
que não está explícito em um enunciado. Considere-se o seguinte diálogo:
A: Qual a profissão do marido de Carolina?
B: Genro.
Nesse caso, pode-se implicar que o marido de Carolina provavelmente não tem
profissão alguma, e ‘A’ ainda poderia inferir muito mais da resposta de ‘B’: ‘A’ o precisa
dizer que o marido de Carolina vive à custa do pai dela. Tratam-se, portanto, de implicaturas
fortes, ou seja, necessariamente geradas e essenciais para a compreensão da mensagem do
falante. Quaisquer outras implicaturas concebidas, como, nesse caso, ‘Carolina e seu marido
vivem na casa do pai dela’, seriam fracas, que são apenas possíveis, mas não
indispensáveis. Assim como nas trocas comunicativas cotidianas a interpretação do que
está além das palavras, os implícitos do discurso publicitário também levam à geração de
implicaturas, a fim de sugerirem a mensagem que se quer divulgar. Esse é um recurso muito
utilizado por publicitários a fim de conquistar a atenção do público por meio do esforço de
compreensão do que é enunciado.
Grice (1975) pressupõe que existam regras internas no falante que possibilitam o
entendimento das intenções comunicativas. Busca, então, explicar o significado das palavras
dividindo-o em convencional e não-convencional, numa tentativa de mostrar o dito e além do
dito. Resgatando-se o exposto na primeira seção, salienta-se que a relação entre Semântica e
Pragmática é estreita e, ao trabalhar nessa interface, Grice (1975) acaba por perceber opiniões
controversas. O grupo dos formalistas estudava a linguagem através de mecanismos formais,
considerando uma linguagem ideal que deveria servir somente às necessidades da ciência.
os informalistas desejavam estudar a linguagem por ela servir para diversos fins, observando
também que as pessoas sabem perfeitamente o que uma expressão significa sem ter que
recorrer a sua análise. A partir disso, Grice passa a utilizar a Lógica para construir a sua teoria
de comunicação, ao mesmo tempo em que a critica, fazendo com que os limites entre Lógica
45
e a Linguagem Natural não sejam bem demarcados e a interface entre essas duas áreas de
estudos seja considerada como base dos seus estudos sobre a sua teoria inferencial.
Além disso, o teórico distingue o significado natural (n) de significado não-natural
(nn), demonstrando que o primeiro se no dito e o segundo, na intenção do dito. O primeiro
seria o significado semântico, dependente de convenções e consolidado socialmente, dada a
convergência dos significados dos falantes. É o significado padrão, das proposições,
reconhecido por uma comunidade lingüística. o segundo trata do significado ocasional do
falante, dependente das suas intenções.
Grice (1975 [1957]) analisou o que algo significa para um indivíduo em dado
enunciado em termos de intenções e o reconhecimento dessas e tentou também estender essa
análise a “significado do falante” e “significado da palavra”. Essa análise é o ponto de partida
para o modelo inferencial de comunicação, que trata da idéia de haver um hiato entre o
enunciado propriamente dito e a compreensão do mesmo pelo ouvinte. Essa lacuna seria
preenchida não mais por decodificação, mas por inferências.
Grice (1975 [1957]) propôs que o que um indivíduo F quer dizer através de um
enunciado x é equivalente a F pretende o enunciado x para produzir algum efeito em uma
audiência pelo reconhecimento de sua intenção’. Para Strawson (1971), três sub-intenções
envolvidas nessa questão. Para querer dizer algo por meio de um enunciado x, F deve
pretender:
- que o enunciado x de F produza certa resposta r em certa audiência a;
- que a reconheç-9.23449(uni)1.40381383( )250]TJ/R53.J/R53 11.28 aeealcade o ntee do Tf16.44 62( )250]TJ/R9 11.28depeeaa eicTf16.4419(e)-2.81021(a)-2.81204(pos)-4.617852aque idertmncudiêisa
46
falante e ouvinte têm consciência de um Princípio Cooperativo de comunicação. Atos de
comunicação direcionados para um propósito comum levando em conta o conhecimento
mútuo dos indivíduos nas trocas verbais são considerados, de alguma maneira, esforços
cooperativos. Assim, para que o dito além do dito seja compreendido, locutor e interlocutor
interagem de forma colaborativa, como se firmassem um contrato social, um acordo que é
inerente aos seres humanos. Segundo o Princípio Cooperativo, o falante deve seguir a
seguinte regra: “faça sua contribuição conversacional da forma como é requerida, no
momento em que ocorre, através do propósito ou direção aceita no intercâmbio de fala no
qual você está engajado” (GRICE, 1975, p. 307). Em conseqüência, Levinson (1983), ao citar
Grice, afirma que ao comunicar, as pessoas utilizam um conjunto de suposições
14
originadas
de considerações racionais básicas que guiam o desenvolvimento da conversação. Essas
suposições, ou ximas conversacionais
15
, são sub-princípios cooperativos, as quais
especificam o Princípio Cooperativo e indicam como as trocas comunicativas devem ocorrer:
(a) Máxima da Qualidade: não diga algo que você acredita ser falso e que não possa
fornecer evidência adequada;
(b) Máxima da Quantidade: torne sua contribuição tão informativa quanto é
requerida e não dê mais informação que o necessário;
(c) Máxima da Relação: seja relevante;
(d) Máxima de Modo: seja breve e ordenado, evitando obscuridade e ambigüidade.
A partir das máximas, Grice estabelece o modelo de implicaturas, classificando os
possíveis significados dos enunciados, além de mostrar a diferença entre o dito e o implicado.
O que está além do código está implícito, sofrendo interpretação pelo ouvinte, e é também
dependente da situação comunicativa. Ao não obedecer alguma das máximas, soma-se ao
enunciado um valor comunicativo extra. Através dessa violação, o falante a entender algo
mais do que está expresso, sendo então cooperativo em sua fala. Por exemplo, se alguém diz
“Que lindo dia!” no momento em que uma forte tempestade cai fora, o ouvinte admite que
o falante esteja violando a máxima de qualidade intencionalmente, gerando o que Grice
14
Suposições são os pensamentos (ou as representações conceituais) do indivíduo tratados como representações
do mundo real.
15
Ao elaborar essas máximas, Grice se reporta à Kant e sua afirmação a respeito da promessa: para ele, não é
possível assumir como máxima universal dizer uma mentira; se todas as pessoas mentissem e às vezes dissessem
a verdade, a conversação o seria possível. Isso quer dizer, então, que dizer a verdade é um pressuposto da
racionalidade e, ao mentir, o falante pode estar levando em conta motivos próprios. Por isso, os interlocutores
esperam que se diga sempre a verdade.
47
chama de implicatura conversacional. Essa traz o significado não-convencional e es
conectada ao discurso. É subdividida em:
a) Implicatura Conversacional Particularizada: um mesmo enunciado pode ser
diferentemente interpretado quando variam as situações comunicativas. Na seguinte situação:
A: Não tem farinha para o bolo.
B: O vizinho acabou de chegar.
implica-se que se pode conseguir a farinha para o bolo no vizinho, porque esse provavelmente
possui o ingrediente em sua casa.
b) Implicatura Conversacional Generalizada: dependente das pistas lingüísticas para
a compreensão. No enunciado “Algumas pessoas saíram do salão”, fica implicado que nem
todas as pessoas saíram daquele lugar.
De acordo com Silveira (2002), uma implicatura conversacional deve ser elaborada,
dado que é gerada no momento em que o falante viola intencionalmente uma xima em um
determinado contexto, um recurso conhecido tanto por locutor quanto por interlocutor. Para
deduzir que dada implicatura conversacional é concebida, o ouvinte deve observar: o
significado convencional das palavras usadas, junto com as identidades de quaisquer
referentes envolvidos, o Princípio Cooperativo e as máximas, o contexto (lingüístico e
extralingüístico) o conhecimento de mundo (ou background), e principalmente o fato de que
todos esses itens são acessíveis aos participantes do ato comunicativo, os quais supõem que
isso ocorra. Silveira (2002) afirma ainda que a dedução de uma implicatura funciona da
seguinte forma, seguindo um padrão geral:
- Ele disse que P;
- Não nenhuma razão para supor que ele não esteja observando as máximas ou o
Princípio Cooperativo;
- Ele não poderia estar fazendo/dizendo isso a não ser que ele pense que Q;
- Ele sabe (e eu sei que ele sabe) que posso ver que a suposição de que ele pensa que
Q é necessária;
- Ele não tentou impedir que eu pensasse Q;
- Ele tem a intenção de que eu pense, ou pelo menos quer deixar que eu pense que Q;
- Logo, ele implicou que Q.
Para compreender uma implicação conversacional, faz-se necessário examinar o que
se pressupõe na troca comunicativa, ou seja, qual é o objetivo da conversação, quais
48
informações estão envolvidas, o que é necessário para chegar à determinada interpretação.
Stalnaker (1999) afirma que, para uma interação conversacional ocorrer, é essencial que haja
aspectos em comum entre os interlocutores. Por isso, é indispensável um conjunto de
elementos que falante e ouvinte pressupõem ao conversarem.
Além da implicatura conversacional, pode ocorrer, no contexto das relações
comunicativas, a implicatura convencional, a qual se distingue da primeira quando o
significado padrão das palavras usadas determinará o que está implicado, além de ajudar a
determinar o que é dito. Portanto, esse tipo de implicatura é dependente somente e totalmente
do código, como no exemplo: “Marcos é colorado fanático, porém gosta mais de camisas
azuis.”, em que o conector ‘porém’ sugere que quem torce obstinadamente pelo Internacional,
ou seja, é colorado fanático, não gostaria de vestir nada azul, cor do time adversário. No
entanto, Marcos veste essa cor. Portanto, não enunciados que não gerem nenhum tipo de
implicatura, porque mesmo uma interpretação que dependa do código ou daquilo que é
dito, como é o caso das implicaturas convencionais, não quer dizer que o falante não tenha
indicado uma outra interpretação também válida. Exemplificando, quando se diz: “Esta
garrafa é verde”, está-se indicando não que ela é verde, mas que não é azul, vermelha ou
amarela. Da mesma forma, quando se diz que a garrafa não é verde, está-se excluindo a
possibilidade dessa cor. As implicaturas são, portanto, inferências pragmáticas que
complementam o dito.
As implicaturas conversacionais são canceláveis, não-determinadas, calculáveis ou
dedutíveis e não-convencionais. Assim, em linguagem natural pode-se cancelar uma
implicação explicitamente. Ao dizer: “João encontrou uma mulher”, o artigo indefinido gera a
implicatura de que João encontrou uma mulher que não era a sua. No entanto, pode-se
cancelar essa implicatura ao complementar: “Era a mulher dele”. Justamente por elas serem
canceláveis, são também indeterminadas. Elas estão ligadas ao conteúdo da proposição e são
implícitas ao dito, havendo indeterminação de sentido. Se o falante diz, ironicamente: “Maria
é mesmo uma ótima amiga”, pode, na verdade, estar querendo dizer: “Maria é uma traidora.
Fez-se de amiga para conseguir o que queria”. Além dessas duas características, diz-se
também que as implicaturas são calculáveis. Grice mostra que uma implicatura deve ser
reconhecida pelo seu cálculo lógico dedutível –, propriedade básica do raciocínio
inferencial. Observando-se o exemplo abaixo:
A: Tenho fome.
B: Há um restaurante no prédio ao lado.
49
Pode-se notar que ‘B’ está respeitando o Princípio Cooperativo, fazendo com que ‘A’
estabeleça um cálculo mental ao ouvir sua afirmação, implicando
16
:
P
1
– O restaurante fica perto daqui.
P
2
– Lá deve haver comida.
P
3
– Ao comer, vou matar minha fome.
P
4
– Devo ir ao restaurante.
C – Ir ao restaurante fará com que minha fome se extinga.
Grice (1975) considera, também, que a implicatura conversacional não é determinada
apenas por suas condições-de-verdade, mas também depende de particularidades existentes no
enunciado, advindas do contexto em está inserido. Por isso, essas implicaturas não são
convencionais e são determinadas pelo que está implícito no dito.
Já Levinson (2000), em seu livro Presumptive Meanings, expande a noção das
Implicaturas Conversacionais Generalizadas de Grice (1975), assumindo que existam
interpretações preferenciais, ou default. Para o autor, essas implicaturas o captadas pelo
ouvinte por causa da escolha, pelo falante, do enunciado e dos itens lexicais em sua fala.
Assim como Grice, Levinson acredita na capacidade humana em gerar inferências, mas
afirma que os indivíduos apresentam certos comportamentos devido às inferências default. As
Implicaturas Conversacionais Generalizadas são parte de um outro nível de análise que os
neo-griceanos consideram necessário em uma teoria do significado, estando entre o
significado semântico do enunciado (codificado e mais abstrato) e
50
enunciados ou metarepresentações dos processos mentais de outros. O propósito de tais
heurísticas é lidar com a questão da velocidade lenta na codificação do discurso em relação à
rapidez da mente humana em processar mensagens lingüísticas (LEVINSON, 2000). Por isso,
acredita-se que os humanos as desenvolvem para ampliar a carga informacional de qualquer
mensagem codificada, dessa forma conseguindo ultrapassar as dificuldades criadas pelas
limitações da transmissão lingüística. Levinson (2000) argumenta que explicar a recuperação
das intenções do falante com base no que é dito é uma incoerência. Os sistemas inferenciais
prevêem a reconstrução das intenções do falante trabalhando “de trás para frente”, ou seja, da
conclusão às premissas assim como vai ser assumido pela Teoria da Relevância, como se
verá na próxima seção que não um número de premissas definido que podem produzir
a mesma conclusão. Portanto, as heurísticas são um conjunto de limitações default para as
premissas implícitas e somente ajudam a resolver o problema lógico da recuperação de
intenções. Essas estão relacionadas às máximas griceanas da seguinte forma:
- 1ª Heurística (Q): o que não é dito o é o caso – relacionada à xima de
quantidade (faça sua contribuição tão informativa quanto requerido). De acordo
com essa heurística, o falante seleciona a alternativa mais informativa que é
consistente com os fatos. No exemplo “Algumas pessoas saíram”, implica (Q) que
nem todas as pessoas saíram.
- Heurística (I): o que é descrito de forma simples é exemplificado
estereotipicamente também relacionada à máxima de quantidade
(especificamente: não faça a sua contribuição mais informativa do que é
requerido). Essa heurística permite aos ouvintes disporem de uma interpretação
maximamente informativa, mais estereotípica, de uma descrição mínima e não
marcada. Assim, em “João abriu a porta e ligou a televisão”, uma implicação
(I) de que João abriu a porta de um jeito estereotipado (ou seja, com a chave) e
caminhou até a televisão e a ligou de uma maneira normal (ou seja, apertando
um botão).
- 3ª Heurística (M): o que é dito de uma forma anormal, não é normal – relacionada à
máxima de maneira (evite obscuridade de expressão e evite prolixidade). Ao dizer
“João empurrou a porta e se atirou no sofáam
51
Cada heurística amplia o conteúdo do que é dito, que o ouvinte exclui as
inferências que são também compatíveis com o sentido da mensagem codificada, mas que à
interpretação dela não estão ligadas. Diferentemente de quaisquer outras inferências
pragmáticas, elas determinam quais interpretações devem aparecer e em que condições. Por
isso, a teoria de Levinson sugere que um conjunto de princípios que conduzem à escolha
do enunciado mais adequado a fim de provocar a interpretação mais provável.
Pode-se dizer que o objetivo de Grice era sistematizar a maneira como falante e
ouvinte concretizam a significação entendida daquilo que não está dito. Através da percepção
da existência de um princípio cooperativo, das máximas e, principalmente, da noção de
implicaturas, esse autor causou impacto nos estudos lingüísticos, em especial no campo da
Pragmática. Ao estabelecer que as características principais do ato comunicativo são a
expressão e o reconhecimento de intenções, Grice demonstrou que os princípios pragmáticos
contribuem para a descrição dos implícitos, servindo de guia para a recuperação do
significado do falante. Em desacordo com Grice e seus seguidores, Levinson (2000) acredita
que o ouvinte não precisa ter processado toda a proposição antes de chegar a significados
presumidos. Além disso, enquanto para Grice as implicaturas conversacionais particularizadas
são formadas a partir dos significados pretendidos do falante, para Levinson os significados
prováveis parecem partir do ouvinte (obtidos por ele como resultado das suposições feitas no
processo da interpretação do enunciado).
Grice também não explica de onde vêm o Princípio Cooperativo e as máximas, nem
se eles são universais ou específicos de uma cultura ou, ainda, se são necessárias mais
máximas. Ademais, esses princípios o dão conta de como ocorre a escolha das suposições
no processo de interpretação ou da desambigüação, por exemplo
17
. Levinson (2000) tenta
sistematizar, na sua Teoria das Implicaturas Conversacionais Generalizadas, a seleção da
melhor interpretação possível através das inferências default, o que ocorre no nível de
significados-tipo.
Na próxima seção, verificar-se-á que a Teoria da Relevância tem o objetivo de
trabalhar com o significado do enunciado, ou do falante. Essa arquitetura conceitual
17
Estudos recentes em Psicologia Cognitiva sugerem que os processos inferenciais são em geral espontâneos,
inconscientes e automáticos segundo Fodor (1983), são “modulares”. Para Fodor (1983), a mente é modular
porque existem determinados domínios mentais inatos e específicos para certas operações cognitivas. As funções
mentais fazem a compartimentarão de diferentes sistemas do pensamento. A Pragmática de Grice não se
relaciona bem com essa abordagem, que não sugere qualquer processo prático por meio do qual o significado
do falante possa ser encontrado automática e inconscientemente. Para melhor entender esse aspecto, ver
subseção 3.4.3.
52
representa o processamento mental da informação e interpretação de enunciados, levando em
conta a união das informações contidas na mente do ouvinte com o input recebido pelas
informações contextuais para então compreender a provável intenção comunicativa do falante.
3.4 A TEORIA DA RELEVÂNCIA DE SPERBER & WILSON
3.4.1 Comunicação ostensivo-inferencial
Em Relevance: communication and cognition, Sperber & Wilson (1986; 1995)
delineiam uma nova abordagem para o estudo da comunicação e cognição humanas. Na obra,
exploram o tratamento do significado em comunicação, o que é compatível com o
desenvolvimento da Lingüística como uma ciência ao mesmo tempo cognitiva e formal. Em
outras palavras, os eixos dessa teoria trabalham com os sistemas representacionais e
computacionais da mente para a interpretação do enunciado e com a natureza dedutiva na
compreensão do significado.
A teoria pretende explicar como a informação é processada mentalmente por meio de
inferências durante interações comunicativas do cotidiano. Os autores partem do modelo
inferencial de Grice e as noções de dito, implicado e de intencionalidade, concentrando-se
principalmente na máxima conversacional de relação (“seja relevante”)
18
. A partir daí,
desenvolvem a Teoria da Relevância, um conceito teórico-cognitivo compreendido como uma
propriedade psicológica por tratar de processos mentais em comunicação. A esse conceito está
ligada uma característica básica da cognição humana: os indivíduos prestam atenção apenas
àquilo que é, para eles, relevante e/ou interessante. Os autores sugerem que comunicar é
chamar a atenção de alguém e, por isso, comunicar é também implicar que a informação
transmitida é relevante. Wilson e Sperber (2004) declaram que a comunicação é um processo
18
Costa (1984) havia sugerido que a xima de relação é, na verdade, uma megamáxima, visto que comanda
as demais máximas: ao seguir as máximas na troca comunicativa, o falante está sempre seguindo a máxima da
relevância. A partir dessa idéia, o ouvinte saberá que o falante o fará sua contribuição mais informativa que o
requerido (máxima de quantidade), não dirá algo que acredita ser falso (máxima de qualidade) e evitará
obscuridade ou ambigüidade (máxima de modo), considerando, assim, que o falante está sendo o mais relevante
possível em sua comunicação.
53
cognitivo em que um falante provém evidência da sua intenção para transmitir determinado
significado, que é inferido pelo seu ouvinte com base na evidência lançada.
Por essa razão, ao interagirem, os seres humanos manifestam de modo efetivo seu
desejo de comunicação, demonstrando ostensivamente a importância da mensagem
transmitida pelo falante para ser processada inferencialmente
54
por último, revelar essas intenções. percebendo esses propósitos é que alguém pode ter
acesso à informação que está sendo comunicada. Relembrando o que foi visto no capítulo
anterior, esse pressuposto é também utilizado pela publicidade, para a qual o emprego de
estímulos que sejam suficientemente relevantes para o público-alvo é essencial na conquista
da atenção. Dessa forma, a audiência é capaz de reconhecer a mensagem implícita nos inputs
lingüísticos e visuais de um comercial levando-a a uma interpretação adequada dela.
Sperber & Wilson (1995) argumentam que ao ouvinte cabe a recuperação da
informação codificada pelo falante e o processamento inferencial da mensagem. Isso ocorre
porque existe uma lacuna entre as representações semânticas lingüisticamente codificadas e os
pensamentos realmente comunicados pelo enunciado. O sistema lingüístico apenas indica
pistas sobre o conteúdo da mensagem, demonstrando que muito mais para ser preenchido.
Uma provável interpretação da mensagem pretendida pelo falante é resultado da atuação dos
processos inferenciais agindo sobre as expressões lingüísticas em dado contexto.
Cada ato ostensivo de comunicação carrega uma expectativa de relevância
20
. De
acordo com Yus Ramos (1998), isso pode ser explicado de duas formas: (a) o conjunto de
suposições {I} que o falante pretende tornar manifestas são suficientemente relevantes para
que a audiência processe o estímulo ostensivo; e (b) o estímulo ostensivo é o mais relevante
que o falante pode utilizar para comunicar {I}.
Do mesmo modo que a ostensão provém evidência da intenção do falante, a
compreensão inferencial, por parte do ouvinte, faz com que seja possível reconhecer as
intenções por trás da ostensão. De forma semelhante a Grice (1975), Sperber & Wilson (1995)
acreditam que é indispensável que o ouvinte reconheça a intenção do falante de informar sua
intenção comunicativa, definindo desse modo dois tipos de intenções: a intenção informativa,
de tornar manifesta ou mais manifesta para a audiência um certo conjunto de suposições, e a
intenção comunicativa, de tornar mutuamente manifesto para a audiência e para o
comunicador a intenção informativa desse comunicador (SPERBER & WILSON, 1987).
Assim, a comunicação diz respeito às inferências do ouvinte acerca das intenções
(comunicativa e informativa) do falante, ou seja, quando hipóteses interpretativas são feitas
acerca do propósito comunicativo subjacente ao enunciado.
Sperber & Wilson (1995) percebem que a intenção do falante não deve se manifestar
somente para o ouvinte, mas mutuamente para comunicador e interlocutor. Aqui, parte-se do
20
Segundo Sperber & Wilson (1995), os enunciados carregam expectativas de relevância não porque é esperado
que os falantes obedeçam a um princípio cooperativo, como dizia Grice, mas porque essa busca por relevância é
uma característica básica da cognição humana.
55
pressuposto de que as pessoas, em geral, compartilham informação. O processo cognitivo
início à troca de informações, o que é necessário para que a comunicação aconteça. Visto isso,
é essencial que se apresente como o ambiente cognitivo de um indivíduo se torna manifesto
para seu interlocutor e de que forma ele influencia na construção de um contexto
conversacional.
3.4.2 Ambiente cognitivo tuo e a formação do contexto
algum tempo, acreditava-se na existência do conhecimento mútuo, no qual o
contexto era visto como informação conhecida tanto por locutor quanto por interlocutor.
Contudo, Sperber & Wilson (1986; 1995) vão além dessa noção ao demonstrarem que o
conceito de “conhecimento mútuo” é inadequado e que a noção de informação compartilhada
é vaga. Essa hipótese impõe certeza quanto à reciprocidade de conhecimentos, a qual não
pode ser garantida. É no curso da comunicação que uma suposição
21
se torna manifesta, ou
seja, aceita e inserida num contexto de suposições compartilhadas. Durante o ato
comunicativo, algumas suposições se tornam mais ou menos manifestas para falante e para
ouvinte. De acordo com Silveira & Feltes (2002), esse conjunto de suposições manifestas em
diferentes graus constituem o ambiente cognitivo do indivíduo. Esse consiste em uma lista
aberta de representações internas, como pensamentos, memória ou suposições, que podem ser
estocadas na mente, usadas como premissas no processo inferencial e reutilizadas em cálculos
mentais no processamento de diversos atos comunicativos. O ambiente cognitivo pode tornar-
se mútuo caso as suposições se tornem manifestas para os interlocutores envolvidos. Portanto,
a noção de conhecimento mútuo é substituída pela de ambiente cognitivo mútuo e
manifestabilidade mútua, a qual pode ser compreendida também como manifestação
potencial, perceptível ou inferível. Um ato de comunicação apenas torna manifestas as
suposições que o falante pretendeu tornar manifestas e que estão evidentes suficientemente no
ambiente; isso não faz a audiência, necessariamente, trazer à mente todas as suposições
comunicadas.
Mesmo vivenciando as mesmas situações e construindo representações mentais do
mundo em que convivem, duas pessoas não formulam as mesmas representações por causa da
21
Segundo Sperber & Wilson (1995, p. 85), suposições são “um conjunto estruturado de conceitos”.
56
maneira como percebem os ambientes físicos através de suas habilidades cognitivas. Ainda
que compartilhem o mesmo ambiente físico, o ambiente cognitivo de cada indivíduo
provavelmente será diferente. Nesse sentido, um fato é manifesto para um indivíduo num
tempo dado se e somente se ele é capaz de representá-lo mentalmente e aceitar essa
representação como verdadeira ou provavelmente verdadeira. Portanto, para ser manifesto,
um fato deve ser percebido e inferido por um indivíduo (SPERBER & WILSON, 1995).
Não como ter comprovação sobre o que é mutuamente manifesto para os
interlocutores, mas o ambiente cognitivo as informações necessárias para a comunicação.
Visto isso, ao lançar um estímulo ostensivo, o falante pretende modificar ou alterar o
ambiente cognitivo do seu ouvinte, assumindo certo grau de mutualidade
22
. Aplicando-se
esses aspectos à publicidade, pode-se mencionar que, ao arquitetar a criação de uma
propaganda, o profissional dessa área deve ter o cuidado de lançar estímulos ostensivos para
seu público-alvo de forma a provocar um processo inferencial que leve a uma interpretação
similar à pretendida, tornando as suposições sobre o produto mutuamente manifestas tanto
para anunciante como para público-alvo.
As noções de manifestabilidade mútua e de ambiente cognitivo mutuamente
manifesto são fatores que servem para elucidar a construção de suposições que se tornam
disponíveis durante o processo interpretativo. A partir dessa concepção, o contexto é definido
como o conjunto de premissas utilizado para interpretar enunciados. É, por conseguinte, um
construto psicológico, que carrega informações mentalmente representadas, constituído de
suposições do ouvinte sobre o mundo e que afeta a sua compreensão do enunciado. O
contexto, então, não é fixado a priori e sua formação é aberta a escolhas, constituindo uma
variável. Trata-se de uma tese contrária a de Grice (1975), para o qual o contexto é dado. Para
Sperber & Wilson (1995), o contexto vai se formando enquanto novas informações se unem
às velhas durante o ato comunicativo. Em outras palavras, uma informação nova é processada
naquilo que já se conhece, construindo-se um novo contexto. um conjunto de crenças
compartilhadas, mas não se pode explicar um ato comunicativo partindo-se do fato que
uma informação prévia, absoluta e certa a esse respeito para que esse ato seja entendido. Isso
explica como se dá a formação e extensão do contexto de suposições nessa teoria.
Tomando como ponto de partida o esforço mental de atenção, memória e raciocínio
para acessar o contexto, fatores determinantes para a relevância da informação a ser
22
Na subseção 3.4.3, tratar-se-á de descrever como o ambiente cognitivo de um indivíduo é alterado a partir da
demonstração de como se constrói a interpretação de dada informação por meio do mecanismo dedutivo.
57
processada, Sperber & Wilson (1995) afirmam que, ao final de cada processo dedutivo o
indivíduo tem disponível um conjunto particular de contextos acessíveis, parcialmente
ordenados. Cada contexto (exceto o inicial) contém um ou mais contextos menores que estão
contidos em um ou mais contextos maiores, e a ordem de inclusão corresponde à ordem de
acessibilidade: à medida que as informações se tornam disponíveis elas se tornam acessíveis.
Como o acesso se através das entradas lexicais ligadas a conceitos, um conceito presente
na memória do indivíduo pode dar acesso a outra informação que, por sua vez, seria formada
de outros conceitos que o acesso a informações adicionais. O contexto acaba contribuindo
diretamente para a relevância das informações, pois restringe a informação adequada. Se um
conjunto de suposições pode incluir outras suposições inferíveis daquelas que o indivíduo
possui, é possível que as conclusões derivadas sirvam de premissas para as novas conclusões.
Trata-se de um processo recursivo, em que se podem utilizar premissas iniciais na construção
de diversas outras premissas em diferentes contextos. Essa intrincada rede informações
estenderia as implicaturas e, conseqüentemente, o processo inferencial. Ao acessar e estender
o contexto, o ouvinte é guiado pela busca da relevância, um processo natural, inato e não-
observável.
A seguir, será exposto como se a formação de premissas no processo inferencial
para desencadear conclusões implicadas, compreendidas aqui como a seleção de uma hipótese
interpretativa. Isso é definido pela Teoria da Relevância como parte do mecanismo dedutivo
inerente aos seres humanos, o qual parte de um cálculo não-demonstrativo e não-trivial para
chegar à melhor interpretação possível.
3.4.3 O mecanismo dedutivo: lógica e inferências na interpretação
Observando-se o diálogo abaixo:
A: Vamos convidar ‘C’ para ir ao Ataliba?
B: Ela é vegetariana.
58
pode-se mostrar que, a partir do enunciado de ‘B’, surgem na mente deA’ suposições
originadas de sua memória enciclopédica
23
, que agrupam premissas que trazem informações
mentalmente representadas, as quais formam o contexto
24
:
P
1
– ‘Ataliba’ é um restaurante.
P
2
– ‘Ataliba’ é um restaurante que serve carnes.
P
3
– ‘Ataliba’ provavelmente é uma churrascaria.
P
4
– ‘C’ não come carne.
P
5
– ‘C’ não iria ao Ataliba.
As premissas no exemplo acima são recuperadas do conhecimento que ‘A’ tem de
mundo, fazendo parte de um cálculo dedutivo para alcançar uma conclusão implicada. Para
Escandell-Vidal (1996), a inferência é um processo que cria uma suposição a partir de outras
suposições, e por isso é de natureza dedutiva. A forma como ‘B’ respondeu a ‘A’
indiretamente permitiu que ele acessasse informações a respeito de ‘C’. Por isso, se ‘A’ tem
a intenção de convidar ‘C’ para jantar naquela churrascaria e obtém de ‘B’ que ‘C’ é
vegetariana, logo constrói em sua mente um conjunto de premissas, que são o seu contexto, e
conclui não ser uma boa idéia convidá-la para ir àquele restaurante, nem para qualquer outro
lugar que não sirva pratos vegetarianos.
O mecanismo interpretativo-dedutivo proposto por Sperber & Wilson toma como
input um conjunto de suposições e dele deduz todas as conclusões possíveis. Como é apenas
similar às regras da lógica padrão, esse mecanismo é capaz de derivar infinitas conclusões a
partir de determinado conjunto de premissas. Além disso, como as premissas não são pré-
fixadas, essas são construídas no decorrer do processamento mental.
Pode-se dizer que as operações realizadas pelo mecanismo dedutivo humano são
inferências lógicas por serem preservadoras da verdade, ou seja, representações armazenadas
na memória como suposições factuais, as quais operam com alguma organização interna de
cada uma das memórias enciclopédicas, baseadas em fatos. O conteúdo e o contexto fazem
parte do raciocínio interpretativo humano na compreensão de enunciados.
Por fazerem parte do equipamento mental humano, as regras dedutivas podem ser
espontaneamente trazidas à tona no processamento da informação. Essas m um tratamento
23
Por memória enciclopédica entende-se a representação do mundo de cada indivíduo.
24
Para Sperber & Wilson (1995), as implicaturas desdobram-se em premissas e conclusões implicadas,
diferentemente do proposto por Grice, para o qual as implicaturas partem do dito para o implicado, obedecendo
ou violando máximas conversacionais.
59
diferenciado ao se aplicarem às inferências cotidianas por escaparem da forma fixa da lógica.
No exemplo abaixo, das premissas P
1
e P
2
não se poderia extrair a conclusão C nos moldes da
lógica padrão:
P
1
– Se Pedro for ao supermercado, teremos legumes para o jantar.
P
2
– Pedro comprou brócolis e couve-flor.
C – Teremos legumes para o jantar.
Esse raciocínio não seria aceito pela lógica formal porque esse sistema utiliza
cálculos formais, em que todas as premissas devem estar explícitas, o que não ocorre no
exemplo acima. As suposições de que ‘brócolis’ e ‘couve-flor’ são legumes são construídas
pelo indivíduo porque essa informação está armazenada em sua memória enciclopédica.
Segundo Silveira & Feltes (2002), a construção do conteúdo do enunciado envolve
habilidades para identificar as palavras que o constitui, recuperar os conceitos a ele associados
e aplicar as regras dedutivas a suas entradas lógicas. Na interpretação de enunciados, o
mecanismo dedutivo constrói premissas a partir de conceitos que dão acesso a informações de
natureza lógica, enciclopédica e lexical. Essas estão estocadas na mente e são resgatadas da
memória de longo prazo e também da memória de trabalho
25
para compreender alguma
informação nova no momento em que recebe algum estímulo. As informações que chegam à
mente do ouvinte podem ter, então, três entradas possíveis (SPERBER & WILSON, 1995, p.
86):
(a) Entrada lógica consiste num conjunto finito de regras dedutivas, cada uma
descrevendo um conjunto de premissas e de conclusões.
(b) Entrada enciclopédica contém informações sobre a extensão e/ou denotação
dos conceitos, derivando representações semânticas da informação. Em outras
palavras, são os conhecimentos sobre diferentes assuntos.
(c) Entrada lexical possui informações sobre a contraparte em linguagem natural
do conceito. Nessa entrada existem informações sobre a palavra ou enunciado
que expressa o contexto.
25
Escandell-Vidal (2004) afirma que a memória de trabalho é a responsável por acessar suposições
internalizadas disponíveis em um dado momento, impondo ajustes às condições de input e de output do sistema
inferencial.
60
Pode-se dizer, então, que a construção do conteúdo de um enunciado envolve a
identificação de palavras ali existentes, a recuperação de conceitos e a aplicação de regras
dedutivas a suas entradas lógicas.
Para explicar como a informação é acessada na memória, Sperber & Wilson sugerem
que o quadro mais adequado da habilidade dedutiva seria dado através das regras de
eliminação ligadas a conceitos são as regras do tipo eliminação do (‘e’) e a de modus
ponens:
(a) Regra de eliminação do ‘’ (‘e’ na forma lógica):
Forma lógica: Linguagem Natural:
P Q João é professor de inglês e é professor de francês
P João é professor de inglês.
(b) Regra de Modus Ponens:
Forma lógica: Linguagem Natural:
P Q Se chover, vai esfriar.
P_____ Chove____________
Q Vai esfriar
Para os autores, o conteúdo das premissas é analisado e explicado num cálculo
dedutivo, que leva em consideração as regras de eliminação, indo além das propriedades
formais das suposições. As regras dedutivas fazem parte do equipamento mental humano,
podendo ser espontaneamente trazidas à tona no processamento da informação. A mente
humana jamais trabalha com a idéia de acréscimo de informações; se assim fosse, seria um
custo excessivo por estar sempre juntando mais e mais premissas. Por isso, as regras de
eliminação na mente levam a interpretar e a escolher a informação mais adequada para uma
dada interpretação, excluindo aquelas que são desnecessárias nesse processo. Um cálculo
dedutivo se baseado nas regras interpretativas, que as regras de inferência nesse
mecanismo humano não se combinam com as premissas como se na lógica formal, mas
operam sobre elas ao interpretá-las.
O processamento dedutivo traz vantagens para a formação, fortalecimento ou
eliminação de suposições. Em primeiro lugar, o sistema representa economia no
armazenamento de suposições, visto que o indivíduo pode juntá-las e processá-las para chegar
a uma nova suposição, não havendo a necessidade de guardar o raciocínio completo. Em
segundo lugar, o sistema dedutivo garantia de maior precisão, pois assegura a validade de
61
qualquer conclusão deduzida das premissas inicialmente estabelecidas. Por último, a mente
humana é uma ferramenta para trabalhar com inconsistências e imprecisões das suposições
em qualquer representação já existente.
Por esses motivos, as regras do mecanismo dedutivo humano vão além das
propriedades puramente formais das suposições. Diferentemente das regras da lógica formal,
os autores da Teoria da Relevância utilizam o conceito de inferência não-demonstrativa,
que o cálculo mental não pode ser evidenciado, mas apenas corroborado. Não modelo que
explique as operações mentais que asseguram inferências corretas e também não é possível
medir o sucesso dessas inferências. Por isso, nas inferências não-demonstrativas a verdade das
premissas torna a verdade das conclusões apenas prováveis. A noção de inferência é definida
como o processo pelo qual uma suposição é aceita como verdadeira ou provavelmente
verdadeira no fortalecimento da verdade ou provável verdade de outras suposições. Por isso, a
comunicação pode falhar: não provas de que ‘x’ significa ‘y’, mas apenas evidências.
Quanto maior a força de uma suposição, ou seja, quanto maior for a crença do indivíduo em
uma suposição, maior sua corroboração. Ao surgir uma suposição ainda mais forte, aquela
que é mais fraca pode ser eliminada. Além disso, o cálculo é também não-trivial, posto que no
raciocínio não existem premissas pré-fixadas; essas são construídas no decorrer do processo
comunicativo. Nesse sentido, ao se deparar com a propaganda abaixo que contém o desenho
provavelmente feito por uma criança sobre sua família (conceito existente no ambiente
cognitivo do leitor sobre como o desenho de uma criança é normalmente feito), talvez o
indivíduo possa não compreender imediatamente o objetivo desse anúncio.
(In: Revista Veja, N. 29, 25 de julho de 2007, p. 25)
62
É a partir da união do estímulo ostensivo visual com o input lingüístico verificado na
legenda (“As mulheres o precisam mais esperar seu roll-on secar. Rexona roll-on com
aplicação seca.”), juntamente com as informações existentes na mente, que o leitor pode
formar implicaturas sobre o significado da mensagem do anúncio: ‘a mãe esde braços para
o alto porque espera o desodorante secar’; ‘com esse desodorante, a mãe não precisará mais
ficar de braços para o alto, já que sua aplicação já é seca’, entre outras.
Qualquer informação que faça parte do contexto mental do indivíduo pode ser usada
como premissa no processo inferencial que sustentação à conclusão. Conforme Fodor
(1983), o processo de compreensão é ‘global’ em oposição a ‘local’. Isso se porque no
processo de compreensão local parte-se de premissas pré-fixadas, as quais são livres de
contexto como ocorre em lógica formal. No entanto, no processo de compreensão global, as
premissas do raciocínio vêm de quatro fontes, com livre acesso a toda a informação estocada
na memória: (a) percepção, (b) decodificação lingüística, (c) suposições ou esquemas de
suposições e (d) deduções. De modo implícito é extraída a concepção de que as inferências
não-demonstrativas são um processo central de pensamento entre sistemas de input
26
e
sistemas cognitivos centrais
27
. Os últimos envolvem os sistemas de input e as informações
contextuais disponíveis para que possa ocorrer a interpretação de um enunciado. Esse
processo ocorre em duas fases: a primeira fase é modular de decodificação, que fornece um
input para a segunda fase, que é a fase inferencial central, na qual uma forma lingüisticamente
codificada é contextualmente enriquecida e usada para construir uma hipótese sobre a
intenção informativa do comunicador.
É importante salientar que Fodor (1983) acredita que a mente, pelo menos em parte,
é composta por estruturas inatas ou “módulos” as quais definem os domínios
especializados no cérebro por meio dos quais o conhecimento é produzido. A idéia de que a
mente é modular sugere que os processos mentais são, de alguma forma, específicos e
encapsulados, isto é, para cada função cognitiva se considera um “módulo” do construto
mental, o qual funciona a partir de componentes cerebrais inatos. As funções mentais são,
dessa forma, realizadas devido a processos computacionais. Essa hipótese implica a divisão
de três sistemas para a obtenção do conhecimento: (1) sistemas transdutores, que recolhem a
informação sensorial pelos inputs perceptivos; (2) sistemas analisadores de entradas
26
Os sistemas de input processam as informações visuais, auditivas e lingüísticas.
27
Processos inferenciais não-especializados que integram a informação derivada dos sistemas modulares com a
informação estocada na memória e realizam tarefas inferenciais, levando o indivíduo a derivar conclusões sobre
o mundo.
63
sensoriais, especificando uma concepção computacional da mente; e (3) sistemas centrais, os
quais não são encapsulados, ou seja, constituem o mecanismo computacional cerebral de fato.
Fodor (1983) argumenta que somente sistemas de input (responsáveis pelo processamento da
percepção e da linguagem) e de output (responsáveis pela ação) são candidatos à
modularização. Os sistemas centrais não são modulares por serem responsáveis por processos
cognitivos ditos mais complexos, tais como raciocínio, resolução de problemas e fixação de
crenças. Refletindo sobre essa questão, para Sperber (1994) Fodor parece acreditar na
modularidade da periferia da mente e, por isso, na sua maior parte, a mente seria não-
modular. Dessa forma, Sperber (2002) defende a tese da modularidade massiva da mente, na
qual os módulos mentais estão interconectados. Nessa visão, psicólogos evolucionistas não
acreditam em módulos encapsulados, afirmando que eles são domínio-específicos (com a
função de processar somente inputs pertencentes a algum domínio específico empírico, ou
seja, os sistemas de input realizam tarefas especializadas), estruturas cognitivas inatas,
determinadas por fatores genéticos, e são características universais da mente humana (e, por
isso, espera-se que todas as pessoas possuam o mesmo conjunto de módulos específicos)
(SAMUELS, 1998). Portanto, cada um desses mecanismos possui uma organização de modo
a detectar algum aspecto no mundo. Para exemplificar, tomar-se-á o momento em que um
indivíduo assiste a um comercial de um automóvel na televisão. Os inputs perceptivos e
lingüísticos da cena que ele são processados através da variedade de módulos mentais
subjacentes à sua capacidade inferencial, levando-o à construção de hipóteses de interpretação
de que aquele é um comercial de carro e não de sapatos, por exemplo. Nesse sentido, a mente
humana é vista como um “canivete Suíço”, ou uma coleção de instintos adaptados para
resolver problemas evolucionários significantes, e não mais um computador com um
propósito geral (PINKER, 1994). Mesmo não conseguindo comprovar a existência de uma
modularidade massiva da mente, essa é a hipótese aceita hoje pelos autores da Teoria da
Relevância para explicar como hipóteses interpretativas são processadas inferencialmente na
mente humana.
Como mencionado anteriormente, a construção dessas hipóteses interpretativas
ocorre num processo inferencial o-demonstrativo. Ela se com a formulação e a
confirmação de hipóteses. Trata-se de um processo criativo, associado a idéias, deduções e à
concepção global de mundo. Portanto, pode-se dizer que a intenção do falante é inferida o-
demonstrativamente com livre acesso à informação contextual. Como mencionado, a
formação de hipóteses envolve o uso de regras dedutivas, mas não é totalmente governada por
elas. A confirmação é um fenômeno cognitivo não-lógico (pois se fosse lógico, seria
64
demonstrativo); é um subproduto do modo como as suposições são processadas
dedutivamente. Para Sperber & Wilson (1995), a dedução é o processo-chave para as
inferências não-demonstrativas.
Embora com a mesma formalidade da lógica padrão, no mecanismo dedutivo mental
as inferências aplicam-se a suposições factuais. Em lógica, como as premissas abstraem
contexto e conteúdo, nunca se poderia dizer que os fatos entram no raciocínio. As suposições
factuais, ao contrário, consideram esses aspectos, os quais são representados na memória. As
conclusões das suposições são mantidas como mais ou menos verdadeiras: a sua confirmação
pode vir de várias fontes e dependem do grau de confiança depositado nelas. Da mesma
forma, a força das suposições alcançadas depende da força das premissas das quais elas foram
derivadas.
A compreensão do que está subentendido depende da organização mental dos
participantes da interação comunicativa, os quais fazem um cálculo mental recheado por uma
série de inferências que eles têm acerca do assunto tratado naquele momento. Pode-se
demonstrar esse fato através do seguinte diálogo:
A – O que você pensa a respeito de Pedro?
B – Ele não fede, nem cheira.
Aqui, ‘A’, através das propriedades de seu mecanismo dedutivo, rapidamente
desenvolve um cálculo mental acerca das palavras de ‘B’, formando, dessa forma, o conjunto
de premissas (P
1
– P
4
), que levam à seguinte conclusão (C):
P
1
uma expressão popular que diz que se algo ou alguém não está em evidência
“não fede, nem cheira”.
P
2
– Se alguém não fede, nem cheira, é porque não se destaca.
P
3
– ‘B’ afirma que Pedro não fede, nem cheira.
P
4
– Pedro deve ter pouca visibilidade em seu meio social.
P
5
– Se alguém tem pouca evidência, tem pouca significância.
C – Para ‘B’, Pedro é insignificante.
O cálculo aqui demonstrado é uma das diversas possibilidades de representação,
que cada indivíduo pode ter diferentes representações mentais do sentido de um enunciado.
Trata-se, então, de uma perspectiva não-lógica e, de acordo com ela, quanto mais processada
uma suposição, mais ela se torna acessível. Isso é o que leva Sperber & Wilson (1995) a
afirmarem que a força de uma suposição é uma propriedade comparável à sua acessibilidade,
65
visto que quanto mais inteligível for uma informação para um indivíduo, mais relevante ela
será. Desse modo, as suposições são alcançadas e a compreensão efetivada por meio do
processo (já mencionado) de formação e confirmação de hipóteses com base em julgamentos
comparativos.
Portanto, a força de uma suposição é determinada por sua acessibilidade, e não por
seu valor lógico de confirmação (valor formal). A verdade das suposições – ou sua validade
depende de mecanismos cognitivos do indivíduo e do mundo que o circunda, o que evidencia
uma forte associação entre a força das suposições e a probabilidade que elas sejam
verdadeiras. Trata-se, então, de uma escala heurística de comparação, visto que não se pode
transformar comunicação em algo exato.
A formação de hipóteses sobre o que o falante quer dizer requer gasto de energia
mental no intuito de conseguir a melhor compreensão possível do enunciado. De acordo com
Sperber & Wilson (1995), isso envolve cálculos inferenciais que requerem um custo de
processamento mental que valha a pena para se obter um benefício máximo. Por ser um dos
temas centrais da Teoria da Relevância, dedicar-se-á uma subseção para explicar essa relação
de esforço e efeitos.
3.4.4 Esforço de processamento e efeitos cognitivos no processamento inferencial
Como especificado na subseção 3.4.1, ao lançar um estímulo ostensivo, o falante
demonstra seu desejo de comunicação. O enunciado é, nesse sentido, uma evidência direta da
sua intenção informativa. O papel do ouvinte é reconhecer o que está por trás do enunciado,
fazendo um lculo mental dedutivo, gerando inferências acerca da sua provável
interpretação. Isso demandará um esforço de processamento mental, em que se exige o
envolvimento de atenção, memória e raciocínio. A quantidade de esforço requerida dependerá
da acessibilidade do contexto: quanto mais acessível, ou seja, quanto melhor e mais
facilmente se a compreensão, menor será o esforço despendido. Assim sendo, se um
indivíduo consegue acessar suposições mais rapidamente, o gasto de energia será mínimo.
Se maior confiança sobre determinadas suposições, essas serão aquelas que de
fato são as que têm maior probabilidade de serem verdadeiras para o indivíduo. Uma
representação adequada é aquela na qual há uma boa ligação entre as suposições do indivíduo
que estão consolidadas e aquelas que, trazidas pelo ato comunicativo, podem ser
66
confirmadas. Aliás, “confirmação”, empregado nessa teoria com o mesmo sentido de
“corroboração”, é um termo emprestado da lógica e adaptado à Psicologia Cognitiva. Sperber
& Wilson adéquam esse vocábulo ao sistema de representações mentais humano, sendo que,
neste caso, ele assume uma posição subjetiva de provável valor.
A habilidade de julgar uma suposição como mais ou menos provável de ser
verdadeira é explicada em termos de força da suposição, a qual é determinada pela sua
corroboração. No exemplo: “O texto foi traduzido ipsis litteris a suposição sobre como
ocorreu a tradução do texto te uma força menor para o ouvinte que não compreender o
termo latino, visto que a sua acessibilidade é nula. Ao grau de acessibilidade do contexto está
ligada a idéia de força de suposições, e ambos dependem de diversos fatores provenientes do
contexto construído no momento do ato comunicativo, entre eles: decodificação lingüística,
percepção, memória enciclopédica e dedução.
Ao lançar um estímulo ostensivo, o falante espera que o ouvinte processe a
informação de forma a alterar o seu ambiente cognitivo. Essa mudança representa o que
Sperber & Wilson chamam de efeitos cognitivos
28
. Para Carston (2002), um efeito cognitivo é
o resultado de uma interação relevante entre um estímulo produzido por um agente e um
conjunto de suposições pré-existente na mente do ouvinte. Uma informação será relevante
para um indivíduo se ela se combina com as suposições que ele possui sobre o mundo para
resultar numa nova suposição.
Esses efeitos podem ocorrer de três formas:
(a) Por implicação contextual: quando se acrescenta uma informação nova ao
ambiente cognitivo do indivíduo. Nesse caso, são as suposições derivadas da
combinação de informações velhas e informações novas
29
. Por exemplo, João, ao
conversar com Ana, descobre que é o aniversário de Maria.
(b) Por fortalecimento ou enfraquecimento de suposições: a força das suposições
determinará a acessibilidade do contexto. o resulta em informações novas, mas
apenas fortalece ou enfraquece as informações que o indivíduo possui. Utilizando
28
Sperber & Wilson utilizam a expressão ‘efeitos cognitivos’ ao invés de ‘efeitos contextuais’ anteriormente
utilizada. Sperber (http://www.phon.ucl.ac.uk/home/robyn/relevance/relevance_archives_new/0054.html, acesso
em 14 de agosto de 2007) afirma que a noção de ‘efeito contextual’ deve ser definida e não tem um significado
claro para a maioria dos leitores. ‘Efeito cognitivo’, por outro lado, pode ser compreendido de forma
aproximada, mesmo que não se tenha uma idéia precisa do que isso realmente possa ser. O efeito cognitivo – ou
contextual – se dá pela união do input (informações novas) e das informações contextuais (conhecimento
enciclopédico) do indivíduo. A expressão atualmente utilizada pelos autores parece englobar esses dois
processos para formar um novo contexto.
29
A implicação contextual ocorre se e somente se houver a junção das informações existentes no ambiente
cognitivo do indivíduo com as provenientes do contexto.
67
a mesma situação do item anterior, João Pedro, namorado de Maria, chegar
com um presente e infere que é mesmo o aniversário dela, reforçando sua
suposição.
(c) Por contradição: quando uma nova informação faz com que o indivíduo elimine
as suposições que ele possuía. Ainda utilizando a mesma situação, Pedro afirma
que o aniversário de Maria será daqui a um mês e que Ana está enganada em
afirmar que a data é hoje. O presente é para um amigo, que passou em um teste
muito importante. Aqui, a suposição construída por João ao conversar com Ana é
contradita.
Um input é relevante para alguém quando esse se conecta ao conhecimento de
mundo que tem à disposição para produzir conclusões que lhe interessam. Além disso,
quando é processado em um contexto de suposições disponíveis, esse input deve gerar um
efeito cognitivo positivo, ou seja, tirando proveito do efeito conseguido e chegando a uma
conclusão verdadeira ou provavelmente verdadeira. Nesse caso, o input escolhido será sempre
o mais relevante que qualquer alternativa disponível.
Desse modo, a relevância de uma informação para um indivíduo senestes termos:
(a) quanto maiores os efeitos cognitivos alcançados pelo processamento do input, maior a
relevância para o indivíduo naquele momento; (b) quanto maior o esforço de processamento,
menor a relevância do input para o indivíduo naquele momento.
As noções de esforço e efeito têm papel decisivo na cognição, pois os humanos, de
acordo com Sperber & Wilson (1995), têm a tendência de maximizar a relevância. Como
resultado da seleção constante, os mecanismos perceptivos tendem a selecionar estímulos
relevantes, e os mecanismos de recuperação de memória tendem a ativar suposições
pertinentes. Os mecanismos inferenciais tendem a processá-los de modo mais produtivo e
econômico, e Sperber & Wilson sugerem que os custos do trabalho inferencial são
sustentáveis somente com a intenção de se obterem benefícios maiores do que o esforço.
Observando-se os exemplos (1º e 2º):
(1º) A: Estou com sono.
B: Tome um café.
68
(2º) A: Estou com sono.
B: O café é uma bebida escura e aromática, de propriedades tônicas por possuir
uma substância chamada cafeína que faz com que os indivíduos que o
ingerem sintam-se estimulados fisicamente. Esse líquido, proveniente do
fruto do cafeeiro, facom que seu sono seja disperso e assim o manterá
acordado para prestar atenção ao que estou dizendo.
percebe-se que no primeiro diálogo, ‘B’ tentou ser o mais relevante possível em sua
afirmativa, visto que o esforço que ‘A’ fará para compreender que o café é uma bebida
estimulante é pequeno: a força dessa suposição será acessada com maior facilidade porque
‘A’ provavelmente tem o conhecimento sobre as propriedades dessa bebida. no segundo
diálogo, ‘B’ corre o risco de seu ouvinte parar de prestar atenção ao que ele está dizendo
devido ao excesso de informações e à prolixidade de sua fala, o que exige um maior esforço
de processamento mental.
Pensando nisso, Sperber & Wilson formulam o Princípio Cognitivo da Relevância
30
,
para o qual a cognição humana tende a ser equipada para maximização da relevância. A
informação é processada da forma mais simples possível, porém tentando obter maior
conhecimento do que está sendo dito. Trata, em outras palavras, da relação custo-benefício
em comunicação.
A tendência universal de maximizar a relevância torna possível manipular e predizer
os estados mentais dos outros. Considerando-se essa tendência de selecionar os estímulos
mais relevantes, o indivíduo tenta produzir um estímulo que atraia a atenção dos outros e que
os encoraje a presumir que esse é relevante para ser processado. Isso é base para o Princípio
Comunicativo da Relevância: “cada estímulo ostensivo transmite uma presunção de sua
própria relevância ótima” (SPERBER & WILSON, 1995, p. 158). Em outras palavras, o
estímulo é o melhor que o comunicador poderia ter escolhido, permitindo que o destinatário
da mensagem suponha que, ao recuperar a informação pretendida, ele deve usar o esquema de
suposições sugerido pela forma lógica que está em sua mente e as entradas enciclopédicas que
se tornam acessíveis por seus conceitos constituintes. Nesse sentido, um estímulo ostensivo é
30
Inicialmente, Sperber & Wilson acreditavam que o Princípio da Relevância (“todo ato de comunicação
ostensiva comunica a presunção de sua Relevância ótima”) aplica-se de maneira geral na busca da pertinência da
comunicação. Mais tarde, os autores vêem a necessidade de desdobrar esse princípio em Princípio Cognitivo da
Relevância (“a cognição humana tende a ser guiada à maximização da relevância”, Sperber & Wilson, 1995, p.
260) e Princípio Comunicativo da Relevância (originalmente, Princípio da Relevância), apresentados de maneira
diferenciada nesta subseção.
69
otimamente relevante se: (a) é relevante o suficiente para ser válido para o esforço da
audiência; (b) é mais relevante o estímulo se compatível com as preferências e habilidades do
comunicador. À audiência é dado o direito de esperar que o estímulo ostensivo seja o mais
relevante para ser processado, além de ter expectativas a respeito desse estímulo.
O Princípio Comunicativo da Relevância e a definição de relevância ótima sugerem
um procedimento prático para realizar essas sub-tarefas e construir uma hipótese a respeito do
significado do falante. Essa deve satisfazer a presunção de relevância transmitida pela
expressão lingüística. No processo de compreensão, o ouvinte deve tomar o significado
lingüisticamente codificado da sentença e seguir um caminho de menor esforço; ele deve
enriquecê-lo no nível explícito e completá-lo no nível implícito, até que a interpretação
resultante encontre suas expectativas de relevância. Por isso, o ouvinte constrói hipóteses
sobre as suposições contextuais intencionais (que se tornarão premissas implicadas no
mecanismo dedutivo), testando-as em ordem de acessibilidade. Feito isso, ele pára quando
suas expectativas de relevância estiverem satisfeitas. Em outras palavras, produzirá uma
hipótese apropriada sobre as novas suposições geradas pela mensagem do ouvinte (conclusão
implicada), como se pode notar no exemplo abaixo:
A: Vamos ver o último filme do Homem-Aranha?
B: Detesto ficção científica.
Premissa implicada: (1) “Homem-Aranha” é um filme de ficção científica.
Conclusão implicada: (2) B não quer assistir o filme do Homem-Aranha.
Ao dar a resposta, ‘B’ deve ter esperado atingir alguns efeitos cognitivos adicionais
não inferíveis de C, o que neutralizaria o esforço adicional necessário para processar o
enunciado de ‘B’, fornecer a premissa implicada (1) e deduzir a conclusão implicada (2). O
esforço extra deve atingir a relevância por si mesmo, isto é, deve ser compensado por algum
aumento dos efeitos cognitivos desencadeados. Ademais, isso compensa o esforço de
processamento por ‘B’ optar por não responder somente “não”. ‘A’ tem uma suposição
adicional ao deduzir que, além de não querer assistir a esse filme, ‘B’ não vai querer assistir a
nenhum outro que se encaixe no gênero “ficção científica”.
Não há uma ordem seqüencial na formação das suposições: as hipóteses sobre
explicaturas, premissas implicadas e conclusões implicadas são desenvolvidas em paralelo
contra as hipóteses antecipatórias do ouvinte, que podem ser revisadas ou elaboradas
conforme os enunciados se revelam. O ouvinte pode trazer ao processo de compreensão não
só uma presunção de relevância geral, mas expectativas mais específicas sobre como a
70
expressão será relevante para ele, e isso contribui para a identificação de explicaturas e
premissas implicadas.
Constata-se, então, que o âmago da teoria de Sperber & Wilson é a questão da busca
pela relevância: processos de atenção e pensamento automaticamente se voltam a informações
que parecem relevantes, ou seja, são capazes de produzir efeitos cognitivos: quanto maiores e
mais econômicos eles forem, maior a relevância. Logo, o esforço de processamento tem que
valer a pena para que se chegue à interpretação adequada. Se o esforço de percepção,
inferência e memória forem muito grandes, o beneficio gerado pelo input será pequeno. A
relevância será maior quanto mais baixo o custo e mais alto o benefício. Contudo, se
houver um esforço de processamento excessivo, mas os efeitos cognitivos gerados por esse
esforço forem compensatórios, haverá uma relevância muito maior para a mensagem. Silveira
e Feltes (2002) apontam que o esforço despendido pelos ouvintes ao buscarem a relevância
ótima de um enunciado pode variar de forma considerável: enquanto uma pessoa precisa de
pouco tempo para processar uma informação, outra podeprecisar de mais elementos para
ter acesso ao significado pretendido pelo falante, visto que o ambiente cognitivo de cada
indivíduo é único.
De modo geral, o propósito desta seção foi descrever como a Teoria da Relevância
explica a compreensão da informação nas trocas comunicativas. A importância dada pelos
autores da Teoria da Relevância ao que é explícito e ao que é implicado, em diferentes graus
de manifestabilidade, acessibilidade e explicitude das suposições, permite demonstrar como
os interlocutores chegam à interpretação de enunciados, mas também verificar por que falhas
em comunicação são próprias da natureza humana: o modo como as suposições são acessadas
pode contribuir também para a vaguidade ou indeterminabilidade da mensagem.
Uma informação ostensivamente lançada a alguém cria uma presunção de relevância
se for econômica no seu esforço de processamento e contiver bastantes efeitos cognitivos. O
falante não deve impor ao ouvinte um esforço infundado para alcançar esses efeitos para
identificar a sua intenção. Sendo a primeira interpretação consistente com o princípio
comunicativo da relevância, essa será selecionada dentre as rias hipóteses possíveis, e um
falante que quer ser corretamente compreendido deve garantir ao seu ouvinte uma
interpretação consistente com esse princípio. A Relevância, sendo uma relação de esforço e
efeito, é também uma propriedade não-representacional de processos mentais (SPERBER &
WILSON, 1995, p. 132). Quando representada, isso é feito em termos de julgamentos
comparativos, numa escala heurística de relevância ‘irrelevante’, ‘fracamente relevante’,
‘muito relevante’ – mas não em termos de julgamentos quantitativos. Sendo a Relevância uma
71
propriedade psicológica, Sperber & Wilson preocupam-se em tratá-la como uma relação
comparativa de graus de relevância, mas não explicam de forma plausível como é medida. Por
isso, diversos autores questionam a dicotomia custo-benefício em comunicação, alguns dos
quais serão expostos na próxima seção.
3.5 A RELAÇÃO CUSTO-BENEFÍCIO SOB AVALIAÇÃO
Retomando o que foi referido na seção anterior, a Teoria da Relevância defende que
a comunicação e a cognição humanas são dirigidas pela relevância, em que o estímulo
ostensivo lançado pelo falante é a manifestação efetiva do seu desejo de comunicar. Ao
ouvinte, que recebe esse estímulo, cabe fazer o processamento inferencial da informação
comunicada. Nessa perspectiva, Sperber & Wilson trabalham com a relação de esforço de
processamento e efeitos cognitivos em comunicação, posto que os seres humanos buscam
maximizar a relevância nos atos comunicativos nos quais participam. Desse modo, com o
mínimo de esforço de processamento, pretende-se que se obtenha o máximo de efeitos
cognitivos, visto que cada ato de comunicação ostensiva vem carregado por uma noção de
relevância ótima.
O conceito de relevância afeta a cognição em termos de julgamentos brutos, sendo
fortemente ou fracamente relevante, dependendo da quantidade de esforço de atenção,
memória e raciocínio empregados. A partir disso, pode-se explicitar que nessa relação custo /
benefício fatores que afetam a relevância e a quantidade de esforço exigido. Dentre eles, a
falta de efeitos cognitivos leva também à falta de relevância da informação: se não há
benefício ou efeito cognitivo o indivíduo não encontrará relevância no enunciado
proferido por seu interlocutor. Pode-se dizer que, numa relação comparativa, quanto mais
fortes as suposições, maiores os efeitos cognitivos. Assim sendo, quanto mais freqüente ou
mais recente o uso de um enunciado, menor o esforço de processamento e, por isso, efeitos
maiores trazem maior relevância. Processar mais informações no mesmo contexto ou a
mesma informação num contexto mais ou menos acessível envolve maior esforço. Esses
fatores influenciam o ouvinte em sua decisão quanto ao uso de seus recursos de
processamento, bem como cabe ao falante decidir o que dizer e como dizê-lo.
Costa (2005b, p. 110) descreve os vários tipos de esforços mentais e de efeitos
cognitivos possíveis num ato comunicativo. Para ele, custo no processamento mental envolve:
72
(a) processamento mental e cognitivo; (b) processamento da linguagem verbal em nível
fonológico; (c) processamento sintático, semântico e pragmático; (c) grau de acessibilidade
dos contextos; (d) grau de acessibilidade de memória lexical; (e) calculabilidade de
inferências; (f) grau de percepção do ambiente cognitivo. O mesmo autor afirma ainda que
benefício na troca comunicativa envolve: (a) grau de importância do conteúdo; (b) grau de
adequação, de conexão, de interatividade; (c) compreensão de implicaturas; (d) implicação
contextual; (e) benefício retórico; (f) benefício cultural; (g) benefício moral e psicológico.
Essa noção de esforço de processamento na Teoria da Relevância tem sido criticada
por diversos estudiosos da área. Bach & Harnish (1987), Clark (1987), Levinson (1987),
Morgan & Green (1987) e Russell (1987) questionam como o esforço de processamento é
medido e como ele é balanceado com os efeitos cognitivos. Sperber & Wilson (1995) tratam a
questão do esforço cognitivo como se fizesse parte de uma relação mensurável. Para eles, a
noção de relevância é também uma noção de produtividade – envolvendo a questão da análise
de custo-benefício para algum grau; no entanto, não há menção de como o grau de
relevância é determinado.
Mais tarde, Bach (2006) escreve que “o problema mais óbvio é como quantificar e
medir os graus de efeitos cognitivos e esforço de processamento”. Uma suposição com algum
efeito contextual é relevante de alguma forma e com certo grau. Ao acessar a relevância, os
efeitos contextuais de uma suposição em um dado contexto não são os únicos fatores a serem
levados em consideração ao acessar seu grau de relevância. Os efeitos contextuais acontecem
por causa dos processos mentais e esses, como todos os processos biológicos, envolvem certo
esforço e gasto de energia. Este é um fator negativo: quanto maior o esforço de
processamento, menor será a relevância. Por ser um conceito classificatório e também
comparativo, a avaliação da relevância, segundo os autores da Teoria da Relevância, é uma
questão de balancear o output e o input. “Se os benefícios de se alcançar um efeito contextual
não forem nunca suficientes para superar o custo do esforço de processamento necessário para
implementá-lo, então um grau positivo de relevância nunca poderia ser alcançado”
(SPERBER & WILSON, 1995, p. 126). Trata-se de uma escala heurística de comparação, ou
seja, baseada na aproximação progressiva, e não de uma escala numérica. Por esse motivo os
autores afirmam que não se pode transformar a comunicação em algo exato.
Bach & Harnish (1987), observando que uma medida do esforço é requerida a fim de
determinar a relevância comparativa, consideram obscura a explicação sobre o modo como os
ouvintes seguem o Princípio da Relevância, como o esforço para determinar a relevância
comparativamente é medido, como o comunicador antecipa o esforço despendido pelo
73
ouvinte e de que forma o falante seria capaz de fornecer um estímulo que poupasse o ouvinte
de acessar primeiramente duas hipóteses consistentes com o Princípio da Relevância para
depois escolher apenas uma, quando esse estímulo está disponível. Sperber & Wilson (1987)
mencionam que o esforço de processamento é determinado pela complexidade lingüística de
estímulos, pela forma como o contexto ocorre e pela acessibilidade desse contexto. Segundo
esses autores, a mente acessa seus próprios esforços e efeitos, verificando essas mudanças
através do monitoramento de variações psicoquímicas. Se isso é possível, o ouvinte pode
acessar seu próprio esforço. No entanto, Bach & Harnish (1987) questionam como o falante
antecipa o esforço despendido pelo ouvinte. Para Sperber & Wilson (1987), o falante deverá
usar um estímulo que pouparia o ouvinte do esforço de primeiro acessar duas hipóteses
consistentes com o Princípio da Relevância e então ter escolhido entre elas. Contudo, a Teoria
da Relevância não explica como isso ocorre.
Sperber & Wilson (1987) mencionam que os participantes não seguem o Princípio da
Relevância, mas esse se aplica sem exceção: todo ato comunicativo ostensivo sempre
comunica uma presunção de relevância. No entanto, Bach & Harnish (1987) ainda discutem
que não é bem explicitado nessa teoria como o ouvinte consegue modificar, suplementar ou
substituir a primeira suposição que lhe vem à mente, mesmo que essa seja consistente com o
Princípio da Relevância. Sperber & Wilson (1987) respondem que o destinatário não pára
após fazer a primeira interpretação possível, mas na primeira consistente com o Princípio da
Relevância.
Para Charolles (1994), maneiras para medir esse esforço: (a) determinar o tempo
necessário durante o processo; (b) medir o número de passos inferenciais requisitados para
acessar a implicação; e (c) analisar variações nos estados neuro-químicos da mente. A
respeito disso, pensa-se que não como fazer essa medida pela questão de tempo gasto
porque cada indivíduo precisa de um tempo diferente no processamento da informação. Além
disso, conforme afirmaram Sperber & Wilson (1995), os passos inferenciais fazem parte de
uma relação não-demonstrativa, e isso significa dizer que não como medir a quantidade e
quais foram as suposições utilizadas no lculo dedutivo mental. A terceira alternativa parece
ser a mais plausível, uma vez que as variações cerebrais podem ser observadas, mas ainda não
há trabalhos consistentes nesse sentido.
Sperber (1996) afirma que as teorias que envolvem construtos psicológicos
envolvem uma noção de esforço de duas formas: (1) as performances mentais envolvem
algum esforço de processamento e, quanto maior o esforço requerido, menor a probabilidade
que ele seja processado com sucesso. Segundo o mesmo autor, não como medir esse
74
esforço, embora uma medida comparativa seja suficiente. Watson (1996) acredita que medir o
esforço de processamento é inviável, mas mesmo assim declara que o termo deve ser mantido.
Como já afirmado, certos passos que dependem logicamente uns dos outros de
forma que eles não poderiam ser processados paralelamente. Unger (1996) afirma que não é
necessário assumir uma abordagem serial de forma a criar uma suposição limitada de que o
tempo de processamento se relaciona com o esforço de processamento, embora a equação
“tempo de processamento = esforço de processamento”, segundo ele, seja inviável. Franks
(1996) afirma que a questão nessa relação é como diferenciar as tarefas cognitivas de maneira
a estabelecer as diferenças de esforço que podem ser estabelecidas.
De acordo com Adler (1987), a explicação de Sperber & Wilson sobre a relevância
em termos de extensão dos efeitos cognitivos parece ser uma simplificação das máximas
griceanas de qualidade, quantidade e relação. Nesse sentido, implicação contextual,
fortalecimento e contradição seriam efeitos cognitivos alcançados pelo fato de falante e
ouvinte respeitarem as máximas conversacionais relativas à quantidade, verdade e relevância
da informação, e não como um processamento cognitivamente eficiente de informação. Além
disso, essa relação de esforço e efeito incide sobre a categoria de modo das máximas
conversacionais (“seja breve e ordenado, evitando obscuridade e ambigüidade” GRICE,
1975, p. 308) e obedece ao Princípio Cooperativo, o que pressupõe conhecimento mútuo.
Adler acredita que o esforço de
75
às vezes R é uma medida comparativa entre esforço e efeito, a qual seleciona a melhor
interpretação; às vezes os custos de processamento têm um valor limiar (ou seja: de
intensidade mínima para que um estímulo produza uma resposta), em que os primeiros efeitos
cognitivos acessíveis num contexto são imediatamente selecionados. Todavia, Levinson
(1987) levanta a seguinte questão: se somente R é fixado, não uma solução determinada
para esse aspecto, já que o custo de processamento é também fixado; então, comparar
interpretações pode terminar com o custo de processamento sem produzir nenhuma solução.
O mesmo autor demonstra que se C = n e E = m para a interpretação 1, mas C = n + 1 e E = m
+ 1 para a interpretação 2, então o custo de cada um será o custo de compará-los, como 2n +
1, levando à conclusão que um deveria sempre escolher o efeito contextual máximo, deixando
de lado os custos de processamento. Por isso, se não se pretende medir os custos de
processamento, Levinson (1987) questiona como a relevância pode ser testada
empiricamente
31
.
Sadock (1986) também menciona a insuficiência explanatória da relação esforço /
efeito. Silveira (1995), citando Sadock (1986), demonstra que uma grande semelhança
entre os postulados da Relevância, efeito e esforço, e os princípios postulados por Horn
(1984) ao reduzir as máximas de Grice: quantidade (Q) de informação suficiente
considerando a relação de relevância (R) com a informação necessária. Embora acredite no
que ele chama de as duas metades de Relevância e nos princípios Q & R como sendo talvez
os mais fortes fatores na habilidade de um indivíduo de usar a linguagem, ainda sustenta que a
complexidade da interação entre efeitos cognitivos e esforço de processamento não é
suficientemente entendida para uma abordagem totalmente explanatória dos inúmeros
processos cognitivos inferenciais subjacentes aos fenômenos comunicacionais.
Russell (1987) também comenta sobre o papel do esforço de processamento na
Teoria da Relevância. Para ele, os dois princípios de relevância e a noção de menor esforço
precisam de uma implementação mais formal. Ele considera que a noção de esforço é avaliada
de maneira muito flexível para ser uma ferramenta pragmática adequada teoricamente.
Sem efeitos cognitivos não relevância, que esses o alterações de dado
contexto, resultado da associação de uma informação nova com as informações existentes no
ambiente cognitivo do indivíduo. Através do novo contexto, é possível chegar aos três tipos
31
Além dessas questões, Levinson (1987) ainda questiona se R é uma medida aplicada a estruturas de superfície,
representações semânticas ou formas lógicas explicadas, ou até mesmo das formas lógicas mais implicaturas, ou
então a tudo isso. Caso existam mais de um desses, então a afirmação de que o falante deva otimizar a relevância
não demonstra como ele deve distribuir significado entre o codificado e o implicado e assim explicar como o
ouvinte chega à melhor interpretação.
76
de efeitos cognitivos já citados na seção anterior: implicação contextual, fortalecimento ou
contradição de suposições. No entanto, Seuren (1987) aponta que, ao chegar a uma conclusão,
a força dessa depende do relativo fortalecimento das suposições advindas do input, mas nem
procedimentos nem formalização são demonstrados. Para esse autor, Sperber & Wilson o
mostram detalhes desse processo, por isso o texto acaba sendo impreciso e,
conseqüentemente, os autores falham ao definir efeitos cognitivos.
Uma das críticas mais recentes acerca da Teoria da Relevância discute os atos
comunicativos considerados irrelevantes em situações cotidianas. Para ter tal propriedade,
uma informação deve ter efeitos e esforços com valores aproximados. Isso quer dizer que, se
um input exige pouco esforço de processamento, mas o benefício também é quase nulo, o fato
será, conseqüentemente, irrelevante. O ensaio de Costa (2005a) expõe que muitas situações do
dia-a-dia não seguem os padrões definidos pela teoria, por serem consideradas de pouca
importância na questão comunicativa. No ambiente profissional ou acadêmico, por exemplo,
o foco é o maior benefício, já que se busca um aproveitamento ximo das informações
recebidas. Mesmo nesse tipo de ambiente há momentos em que o indivíduo passa por
situações de baixo custo e também de baixo benefício. No momento em que comenta com um
colega sobre o seu final de semana, sua atenção esvazia-se dos afazeres do trabalho e volta-se
para tratar de algo provavelmente prazeroso. Aqui, Costa (2005a) aponta que o foco é o
menor custo mental, mesmo com nenhum benefício: quando se despedem, a informação
trocada no bate-papo é tão pouco relevante informativamente que logo sesubstituída pelas
atividades mais importantes, correndo o risco de ser esquecida. De qualquer modo, certo
benefício, mas esse será de natureza o-informativa; para o momento do enunciado, mesmo
que este seja de pouca pertinência, o indivíduo tenta ser relevante e seu interlocutor procura
por essa relevância, mas no momento que a descontração acaba o que foi dito fica
armazenado na memória de curto prazo e a mente será preenchida por informações sobre o
trabalho a ser feito que, no caso, provavelmente são muito mais pertinentes. No caso de um
discurso amoroso, ou o ouvinte assume as irrelevâncias ali contidas ou assume os benefícios
de valor afetivo. Portanto, ao dizer “eu te amo” diversas vezes, o enunciado traria um
benefício afetivo ao ouvinte. Tendo observado esses fatos cotidianos, Costa (2005a) declara
que não se pode avaliar tecnicamente os vários tipos de custo e de benefícios gerados, tendo
em vista a grande quantidade de tipos possíveis.
O mesmo autor trata então dos discursos que são considerados, a princípio, de pouco
interesse no que diz respeito ao aspecto informativo. Para ele, a vida comum é feita de
irrelevâncias: uma caminhada com um amigo ou o encontro com o vizinho podem gerar
77
conversas com conteúdo de pouca pertinência. A menos que tenham um problema em
comum, qualquer tipo de interação que possam ter será sobre assuntos ditos “inúteis”. Pode-se
dizer, por isso, que em muitos momentos as pessoas procuram o mínimo de relevância. Elas
apenas tentam manter o mesmo benefício com o menor custo. Se há custo zero, qualquer coisa
é relevante. Considerando-se as irrelevâncias de diversas atividades e interações
comunicativas do dia-a-dia, constata-se que as pessoas estão inseridas em sociedades
preguiçosas, as quais buscam minimizar seu custo de processamento mental quando possível.
Ao assistir à televisão, as pessoas procuram programas que não requeiram uma demanda
muito grande de esforço, posto que se trata de uma fonte de lazer. Em ambientes acadêmicos
ou em momentos importantes no trabalho, o contrário geralmente ocorre: as pessoas
intuitivamente levam em conta a dicotomia custo / benefício na busca por relevância. Por
esses motivos, pode-se notar que a afirmação de que as pessoas o guiadas pela relevância,
como aponta a arquitetura conceitual de Sperber & Wilson (1995), no sentido de se observar
uma compensação dos esforços mentais pelos efeitos conseguidos, nem sempre é válida.
Note-se que, em princípio, a Teoria da Relevância propõe que os efeitos cognitivos
são de aspecto informativo. No entanto, se for aceito que diferentes valores de benefício,
como o afetivo, então benefício em todas as interações e, por isso, tudo seria relevante. A
discussão levantada por Costa (2005a) sobre as irrelevâncias da vida cotidiana traz à tona a
questão dos tipos possíveis de esforço e efeito no processamento mental, que se quaisquer
benefícios (emotivo ou informativo, por exemplo) forem considerados, essa noção torna-se
supérflua. Avaliar-se-á essa relação de esforço de processamento e de efeitos cognitivos e a
sustentabilidade das críticas acima expostas através de exemplos-tipo representados em cinco
filmes publicitários que levam em conta a interação entre as personagens em situações
cotidianas. A partir desses, serão abordados também os questionamentos feitos no capítulo
dois sobre os implícitos em publicidade, configurando-se, desta forma, três aspectos a serem
analisados. No primeiro, talvez o mais importante, será examinada a forma pela qual é
construída a compreensão de enunciados nas trocas comunicativas entre as personagens,
estabelecendo-se o que se denominará, neste trabalho, inferências internas. Isso se dará a
partir dos pressupostos da Teoria da Relevância, a fim de especificar os pontos-chave dessa
arquitetura conceitual. Um segundo ponto sea verificação da validade dos questionamentos
sobre a relação esforço de processamento e efeitos cognitivos em comunicação. Ao final,
serão consideradas as inferências externas à situação comunicativa exposta no comercial, em
que se dará atenção ao aspecto dos implícitos em comerciais de televisão para se chegar ao
objetivo de informar e persuadir. A partir desses fundamentos, espera-se explicitar os
78
conceitos desenvolvidos neste capítulo no intuito de elucidar como tais noções teóricas se
aplicam a determinado momento comunicativo, no caso, demonstradas nessas situações-tipo.
79
4 ANÁLISES DAS INFERÊNCIAS INTERNAS E EXTERNAS
AOS FILMES PUBLICITÁRIOS
A publicidade, instrumento central para este trabalho, cumpre uma função
importante na conquista do consumidor. É através dela que um produto tem visibilidade no
disputado mercado da compra e venda: o sucesso de uma marca depende muito da forma
como é apresentada ao público e como a informação sobre ela é transmitida de maneira
inteligível. Em palavras simples, sua missão é atrair e seduzir, utilizando recursos diversos na
busca pelo seu objetivo de divulgar e, geralmente, vender determinado produto.
Acredita-se que o discurso publicitário faz parte da cultura popular, possibilitando a
propagação dela nos veículos de divulgação de massa. Jornais, revistas, outdoors, televisão,
Internet, panfletos, entre outros, são apenas alguns exemplos da diversidade de meios pelos
quais há a tentativa de persuadir o público. Apesar de sua imensa fatia em todos esses
veículos, muitas propagandas correm o risco de passarem despercebidas. Por isso, o papel dos
criadores das peças publicitárias é elaborar uma forma de lançar estímulos para, em primeiro
lugar, prender a atenção do consumidor em potencial para então envolvê-lo e, por fim,
persuadi-lo. Como mencionado no capítulo três, para Sperber & Wilson (1995), o uso de um
estímulo ostensivo por um falante adiciona uma camada extra de reconhecimento de uma
intenção para uma camada básica de informação que a audiência deve ter captado durante o
ato comunicativo. O comportamento de um falante não evidência direta para a conclusão
intencionada, e é a presunção de relevância transmitida pelo estímulo ostensivo que encoraja a
audiência a devotar os recursos de processamento necessários para descobrir seu significado.
A ampla variedade de significados que podem ser transmitidos de forma verbal e não-verbal é
necessariamente limitada pela variedade de conceitos que o comunicador pode evocar na sua
audiência, chamando a atenção para características observáveis no ambiente.
Essa questão é muitas vezes percebida intuitivamente pelos publicitários ao
elaborarem uma propaganda, visto que eles precisam fazer uso de estímulos que sejam
perceptivos o suficiente para chamar a atenção do público-alvo. Os anúncios devem ser
criativos para serem notados e manterem a atenção por tempo suficiente para poderem
transmitir a mensagem. Se o comercial não for pertinente, o telespectador desviará a sua
atenção para outros interesses. Em outras palavras, levar em conta a busca pela relevância é
essencial para qualquer estratégia publicitária. Se não é percebido como sendo relevante o
suficiente para a audiência, o produto simplesmente o existe. Caso ocorra o contrário, a
80
comunicação entre anunciante e público se efetiva por haver um ponto de referência em
comum. Por isso, Byrne (1992) demonstra que uma peça publicitária pode ser pertinente para
o telespectador somente quando ele interage com a informação existente em seu ambiente
cognitivo para então produzir efeitos cognitivos suficientes. É a força das suposições que
determina qual alteração acontece no ambiente cognitivo do ouvinte através do processamento
da informação pelos seus mecanismos dedutivos. Desse modo, a publicidade caracteriza-se
pela utilização de instrumentos que alteram o ambiente cognitivo do indivíduo ao trazer à tona
algo que poderia acrescentar, ampliar ou mudar determinada opinião ou crença.
Leech (1966) mostra que a maior parte das propagandas possui uma linguagem rica
que objetiva a mudança de opinião de sua audiência. Assim, um aspecto a se considerar é que
não se deve levar em conta o que a propaganda quer transmitir, mas o que a audiência
interpreta. Aqui se pode corroborar a tese de Levinson (2000) que, diferentemente de Grice
(1975), acredita que o possível significado parte do ouvinte ou, nesse caso, da audiência, a
respeito das evidências lançadas pelo falante (ou anunciante). Ela é ajudada a recuperar as
suposições comunicadas implicitamente por estímulos adicionais diversos, como uma forma
de preencher a intenção informativa do comunicador. Muitas vezes, os enunciados proferidos
no comercial são parte do que se quer transmitir, mas a imagem é peça fundamental na
compreensão global dele. Esses estímulos, lançados juntos, formam um conjunto de
representações complementares que servem para a interpretação final da propaganda.
De acordo com Blakemore (1987), a interpretação pragmática não envolve apenas a
recuperação do conteúdo proposicional, visto que a audiência deve acessar o impacto da
proposição através da sua representação do mundo. A partir da proposição e de seu
significado semântico, serão formuladas hipóteses interpretativas variadas, conforme o
conhecimento de mundo que o indivíduo tiver e de acordo com as informações existentes em
seu ambiente cognitivo, o que resultará num contexto
32
. Desses elementos, o receptor terá
condições de corroborar as suas suposições, nesse caso, a respeito da mensagem publicitária.
Portanto, o significado de um anúncio não é algo que es dentro dele para ser revelado
através de uma compreensão “correta”, e o publicitário não deve esperar que a interpretação
pretendida seja a mesma que o público alcançará. O fato de haver uma escuta muitas vezes
ociosa enquanto se assiste à televisão pode levar a falhas na observação e na compreensão da
32
É por isso que mais uma vez se ressalta a necessidade da aplicação de uma interface entre as intradisciplinas
de Semântica e de Pragmática na análise do significado nos enunciados cotidianos.
81
mensagem, visto que os indivíduos realmente acessam as informações que julgam serem as
mais relevantes.
Pelos motivos expostos acima, assume-se que o escopo da Teoria da Relevância, de
Sperber & Wilson, dá subsídios suficientes para se entender a interação comunicativa humana
e, assim, responder aos questionamentos feitos no final do capítulo dois sobre a compreensão
dos implícitos em propagandas. Por isso, na construção de uma peça publicitária, esses
preceitos são considerados para a efetividade da comunicação da mensagem difundida para a
audiência.
A propaganda tem uma linguagem pré-formulada, descrita por Leech (1966) como
uma “linguagem script”; os anunciantes tendem a reduzir a linguagem do dia-a-dia do seu
público-alvo, utilizando também mecanismos poéticos. O ator, no comercial de televisão, não
é o falante original – que é, na verdade, o anunciante mas fala para uma audiência que pode
variar de centenas a milhões. Mesmo assim, trata-se de uma forma de interação comunicativa,
em que o anunciante, através de uma outra voz, transmite sua intenção de informar e persuadir
alguém, ainda que não revele a sua intenção informativa, que é a de vender seu produto.
Levando-se em conta essas questões, este capítulo tem três propósitos essenciais.
Utilizando peças publicitárias selecionadas a fim de servirem como ferramentas na aplicação
e avaliação da arquitetura conceitual da Teoria da Relevância, far-se-á um exame analítico-
descritivo desse corpus. Para tanto, pretende-se demonstrar, em primeiro lugar, de que forma
essa teoria se articula a fim de explicar a interação comunicativa entre as pessoas no
cotidiano. Sabe-se que se trata de um processo criativo que vai além do controle dos falantes e
de seus ouvintes, posto que seu comportamento verbal ou gestual denuncia seus propósitos.
Por isso, selecionaram-se filmes publicitários que contivessem interação comunicativa entre
os personagens no dia-a-dia. Em segundo lugar, considerando-se que os ouvintes despendem
esforço mental para alcançar a interpretação adequada do que o seu interlocutor quer
transmitir, estudar-se-á esse esforço e os efeitos surgidos a partir dele, trabalhando-se com as
questões problemáticas levantadas no final do capítulo três a respeito do tratamento dado a
essa dicotomia trazida pela Teoria da Relevância. Essas críticas ao modelo teórico proposto
por Sperber & Wilson serão avaliadas através desses mesmos filmes, justamente por se
tratarem de ilustrações da vida cotidiana. Assim, a utilização desse corpus se justifica por
conter situações que apresentam interações comunicativas no dia-a-dia, como em um encontro
de ex-namorados em um supermercado, um telefonema a um amigo, ou a mesmo uma
conversa em um bar, entre outros, os quais serão descritos no momento da análise. Até aqui,
esses dois primeiros aspectos serão incluídos na análise das inferências internas ao comercial,
82
em que serão considerados apenas os diálogos internos representando as prováveis inferências
produzidas pelos participantes da comunicação como situações-tipo.
Por fim, em terceiro lugar, será avaliado como os implícitos da linguagem
publicitária afetam o público-alvo, lançando um olhar atento para o que se denominará aqui
de inferências externas ao comercial, ou seja, aquelas que vão além da situação demonstrada
no filme para alcançar seu objetivo de persuadir o consumidor. Para isso, a análise se
debruçará sobre a situação contida no filme, que é o input lançado, e, a partir dele, sobre o
provável processamento inferencial do público-alvo. Sendo audiovisual, este tipo de
publicidade depende de contexto e de processamento cognitivo, o que torna a sua
compreensão mais abrangente para quem a assiste, possibilitando uma melhor interação entre
ambiente cognitivo e input.
A fim de alcançar esses três objetivos, a partir desse momento este capítulo se
organiza da seguinte forma: em 4.1, será descrita a metodologia utilizada, bem como a
listagem das peças publicitárias selecionadas para este trabalho. Na seção 4.2, serão feitas as
análises dos cinco filmes selecionados, organizadas em subseções, nas quais estarão
correlacionados: (a) a descrição dos comerciais selecionados; (b) a análise dos diálogos dos
personagens, traduzindo as inferências internas ao comercial com base na Teoria da
Relevância; (c) a avaliação das críticas a essa teoria, expostas no capítulo três, através das
situações-modelo dos filmes; (d) o exame das inferências externas do público-alvo de cada
peça publicitária, também considerando o modelo cognitivo-inferencial estabelecido por
Sperber & Wilson e sua aplicabilidade para a Publicidade de modo geral.
4.1 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Para o presente estudo, o universo de análise são propagandas televisivas, obtidas
através de seleção e posterior download do site de vídeos livres You Tube
33
, as quais foram
analisadas e submetidas a critérios de escolha, dentre os quais:
(a) O filme em questão representa uma situação cotidiana?
(b) Esse comercial contém interação entre os personagens?
33
Disponível: www.youtube.com. Último acesso: 12 de outubro de 2007.
83
(c) As situações trazidas no filme refletem uma realidade comum na vida das
pessoas?
(d) Essa situação pode ser considerada de custo e benefício baixos e, portanto,
irrelevante em uma situação cotidiana?
(e) É possível corroborar as questões problemáticas da Teoria da Relevância
(levantadas na seção 3.5) com uma demonstração através da análise de uma
situação-tipo cotidiana?
Foram escolhidos cinco (5) comerciais, reunidos em um DVD
34
(anexado na
contracapa deste trabalho), nos quais é possível perceber interação entre os personagens
(abaixo, listados na seguinte ordem: produto / título do filme):
1. Cerveja Budweiser: “Wassup”;
2. Xampu Sedal: “Ex”;
3. Sandálias Havaianas: “Modelo”;
4. Cerveja Polar: “Paulistas”;
5. Cerveja Heineken: “Gentileza masculina”.
É pertinente comentar aqui que a escolha desses filmes foi aleatória, sem a
determinação de uma nacionalidade, nem de um tipo de situação ou produto específicos,
que a preocupação principal, na busca pelos vídeos para as análises deste trabalho, era
encontrar propagandas que se adequassem à proposta de examinar atos comunicativos em
situações cotidianas. Por se acreditar que as cinco peças audiovisuais escolhidas contêm tais
características, essas foram consideradas ideais na ilustração da formação de inferências entre
indivíduos.
O exame das interações entre os personagens é necessário para demonstrar, de
acordo com a Teoria da Relevância, como ocorre o envio e o processamento mental da
mensagem. Para isso, os comerciais escolhidos são instrumentos nesse propósito de
evidenciar que essa teoria é capaz de explicar a compreensão nas trocas comunicativas.
Assim, denominar-se-ão inferências internas para aquelas presentes na interação dos
personagens, ilustrando uma circunstância que ocorre no dia-a-dia. A análise das inferências
internas também lugar ao exame da validade dos julgamentos e críticas sobre a relação
34
É necessário salientar que a resolução dos vídeos não tem boa qualidade por causa da sua origem. O site não
proporciona um meio de melhorar as imagens. No entanto, para fins de análise, a compreensão das interações
comunicativas é suficiente.
84
esforço de processamento e efeitos cognitivos prevista na teoria usada, visto que será aplicada
numa prática comunicativa que simula uma interação real. Além disso, conforme exposto,
serão demonstradas as inferências externas a cada comercial, isto é, a maneira como a
audiência processa mentalmente as informações recebidas. Portanto, a análise das
propagandas audiovisuais deverá levar em conta os seguintes aspectos: a generalização do
contexto, os tipos de inferências internas possíveis, as marcas lingüísticas nas falas dos
interlocutores, a formação de implicaturas pelos personagens, a relação esforço de
processamento e efeitos cognitivos, as críticas feitas a essa teoria pelos autores citados no
capítulo três e, por fim, as inferências externas à situação. Todo esse processo será embasado
no arcabouço da Teoria da Relevância.
Este capítulo reúne, para cada peça publicitária selecionada, três etapas construídas a
fim de culminar nas análises das prováveis inferências internas e externas. Assim, na primeira
etapa deste estudo, faz-se uma descrição dos filmes, relacionando imagem transcrita através
de proposições com as falas dos personagens, as quais estão em formato de roteiro, além de
descrever também o ambiente onde ocorre a interação. A segunda etapa traz uma análise das
inferências internas sob o ponto de vista do arcabouço teórico da Relevância. Para isso, a
primeira parte de cada comercial será considerada como o ponto de partida, ou seja, descrita
como o contexto cognitivo inicial, o qual embasa o restante da comunicação. Após a
descrição do dito, serão expostos o provável contexto criado pelo ambiente cognitivo do
falante(s) e do ouvinte(s) e as prováveis inferências decorrentes do diálogo. A partir disso,
será considerado o esforço de processamento do ouvinte para os efeitos cognitivos gerados
nessa interação. Com relação a esse último aspecto, a terceira etapa de análise será
fundamentada nas críticas acerca da dicotomia custo-benefício em comunicação prevista pela
Teoria da Relevância. É necessário salientar que não haverá demarcações limitando a segunda
da terceira etapa; como esta é uma extensão daquela, ambas serão trabalhadas
concomitantemente. Na última etapa serão analisadas as inferências externas à situação
comunicativa de cada filme, no intento de tornar evidente a eficácia da Teoria da Relevância
no que diz respeito à explicação de como ocorre a compreensão de implícitos dos filmes
publicitários por parte da audiência que os assiste.
85
4.2 DESCRIÇÃO E ANÁLISE DO CORPUS
4.2.1 Filme publicitário 1: “Wassup?”
35
“What’s up?” é uma expressão informal que significa, dependendo do contexto onde
está inserido, “O que você está fazendo?”, “Como você está?”, “Oi” e até mesmo “O que está
acontecendo?”. De acordo com o web site Wikipedia
36
, ela se tornou popular por causa de um
personagem de desenhos animados criado na década de 1940, Bugs Bunny (Pernalonga),
como parte de sua frase-clichê “What’s up, Doc?” (no Brasil, traduzida por “O que é que há,
velhinho?”), em que cada palavra era pronunciada de forma distinta. Essa expressão foi
alterada oralmente por “Wassup?”, popularizada numa campanha publicitária da cerveja
Budweiser no final dos anos 90 e início de 2000, baseado num filme escrito e dirigido por
Charles Stone III intitulado “True”. Esse filme retratava Stone e alguns amigos sentados,
falando ao telefone e dizendo “Wassup!” uns para os outros. August A. Busch IV, diretor
criativo da agência DDB, levou a idéia para o vice-presidente da empresa Anheuser-Busch
Budweiser para então fazer com que Stone dirigisse o comercial da marca, o qual ficou
mundialmente famoso.
Esse comercial da cerveja Budweiser é responsável pela propagação da expressão
“Wassup?”. Conforme mencionado no capítulo dois, a publicidade muitas vezes é
responsável pela divulgação de aspectos culturais que acabam tornando-se parte da cultura de
um povo, como se pode notar nesse caso, no qual houve a popularização de uma expressão
lingüística. Esse termo freqüentemente é encurtado, na linguagem oral, para sup”, podendo
ainda ocorrer mais variações, como se pode perceber no filme transcrito a seguir. Ele mostra
uma situação comum no dia-a-dia das pessoas: dois amigos conversando pelo telefone. Como
acontece muitas vezes, a interação comunicativa tem características irrelevantes, visto que não
acrescenta nenhuma informação nova para o outro, o que pode ser exemplificado pelo diálogo
entre os interlocutores nesse filme.
35
Disponível: http://www.youtube.com/watch?v=L38wthA4Ld0. Último acesso: 12 de outubro de 2007.
36
Whassup?. Reference.com. Wikipedia, the free encyclopedia. Disponível:
http://www.reference.com/browse/wiki/Whassup?. Acesso em 21 de agosto de 2007.
86
4.2.1.1 Roteiro do filme publicitário
Um jovem assiste à televisão quando o telefone toca. Do outro lado da linha, um
amigo.
(1) A – Hello?
B – Ehoo, sup?
A – None, B, just watching the game, having a Bud. So about you?
B – None. Watching the game, having a Bud.
A – True, true.
(2) [Nesse momento entra alguém.]
C – Wassup!
A – Wuuuaaap!
B – Yo, who’s at?
A - Yo, pick up the phone.
87
C – Hello.
B – Wassup!
C – Wizaaa!
A – Wazaaaap!
C – Yo, where’s Dookie?
B – Yo, Dookie!
[Dookie, que está em outra sala, pega o telefone.]
D – Yo.
C – Wassup! Wassaa!
A, B, C e D – Wassup!
[O interfone toca.]
C – Hold on.
[C atende.]
C – Hello?
88
E – Wassup!
A, B, C, D, E – Wassup!
[C, D, E desligam]
A – So wassup, B?
B- Watching the game, having a Bud.
A – True, true.
[A cena termina e aparece na tela a marca da cerveja Budweiser e, abaixo
dela, a palavra “true”.]
89
4.2.1.2 Análise das inferências internas
A partir desse diálogo, pode-se notar que os personagens estão provavelmente
assistindo a um jogo pela televisão, que se ouvem, ao fundo, sons de gritos de torcida. A
90
ato comunicativo. Segundo a Teoria da Relevância, um ato ostensivo leva a efeitos cognitivos
relevantes, os quais requerem o nimo de esforço de processamento. Esses são adquiridos a
partir de suposições usadas como premissas num cálculo não-trivial, derivando implicações
contextuais, fortalecimento ou eliminação de suposições, construídas a partir da união das
informações presentes no ambiente cognitivo do ouvinte com aquelas advindas do input
recebido. Assim é formado o contexto inicial no filme em questão. Ao ouvir a expressão
“wassup” (ou sup”) de ‘B’, ‘A’ imediatamente acessa as informações estocadas em sua
memória enciclopédica para então devolvê-la ao seu interlocutor também sob a forma de
cumprimento.
Descrito o ponto de partida dessa interação, verificar-se-ão, nesse momento, as
inferências internas do comercial; isto é, serão descritas a situação e as prováveis inferências
geradas no ambiente cognitivo de cada indivíduo envolvido na interação. Para facilitar a
análise, toda a comunicação dos interlocutores foi dividida em duas partes, indicada no roteiro
por (1) e (2). Da primeira, já descrita acima, o interlocutor ‘A’ pode construir em seu
ambiente cognitivo as seguintes suposições:
S
1
– ‘B’, que é meu amigo, me ligou.
S
2
– Está passando “o jogo”.
S
3
– Provavelmente ‘B’ esteja assistindo ao jogo também.
S
4
– Ele diz que está assistindo ao jogo.
Essas premissas permitem que ‘A’ chegue à seguinte conclusão implicada:
C – Eu e ‘B’ estamos assistindo ao mesmo jogo.
Ao dizer “True, true”, ‘A’ na verdade não quer dizer que algo está certo, mas apenas
dar indicações de atenção para a fala de ‘B’. Esse tipo de sinal, demonstrado por Yule (1996,
p. 75) como sendo um backchannel, provém uma resposta ao falante de que a mensagem está
sendo recebida. Constata-se, pela falta de movimento corporal, pelo olhar parado de ambos os
personagens e, principalmente, pelas falas de ‘A’ e ‘B’ poucos esforços de processamento da
informação. Os efeitos cognitivos de ‘B’ para ‘A’ são, também, mínimos: não se verifica
enfraquecimento de suposições, nem implicação contextual. Há, provavelmente, o
fortalecimento da suposição de que o amigo estaria assistindo ao mesmo jogo, já que, em suas
falas, utilizam o artigo definido (the), indicando o fato de um jogo específico estar passando
naquele momento ser manifesto mutuamente no ambiente cognitivo de ambos. Isso é
corroborado pela segunda fala de ‘B’, que praticamente repete o que foi dito pelo seu
91
interlocutor. Por isso, ao constatar a superficialidade das informações da primeira parte do
diálogo, ‘A’ pode formular a seguinte suposição:
S
5
– ‘B’ me ligou para ter contato com alguém.
Aqui, para os rapazes não interessa o que foi dito: o benefício afetivo é o único
alcançado nessa interação.
Pela evolução das falas, é possível perceber que o sentido da expressão “Wassup?”
toma diferentes formas, mas todas elas têm a função de saudar um amigo. Na primeira parte
do diálogo, ela tem o sentido de “Oi, o que está fazendo”, o que pode ser inferido pela
resposta de ambos. na segunda parte, a expressão é utilizada de maneira abusiva, indicando
redundância, o que leva à questão de economia do esforço do outro. Segundo a Teoria da
Relevância, o falante sempre lança um estímulo que ele acredita levar seu ouvinte a fazer
pouco esforço para que ele chegue à intenção comunicativa pretendida. Ao utilizar a mesma
expressão num contexto informal, no qual todos têm proximidade, pode-se defini-la como
uma forma de transmitir afetividade.
A partir da segunda parte, pode-se notar que o diálogo segue se desenvolvendo da
mesma forma, mas com mais interlocutores. O fato do item lexical “wassup?” ser repetido por
todos mesmo que com variações de sentido e de sonoridade demonstra que ele é usado e
compreendido pelos rapazes, sendo essa informação manifesta no ambiente cognitivo
mutuamente compartilhado. Isso indica também que o custo de processamento mental é
baixo, cada um obtendo apenas o benefício afetivo de interagir com alguém que conhece bem.
No entanto, não nenhum efeito cognitivo do tipo informativo nessa interação, pois não
acréscimo, alteração ou supressão de informações no ambiente cognitivo dos envolvidos na
comunicação. Ao final, quando apenas ‘A e ‘B’ continuam na linha, eles repetem suas falas
iniciais, denunciando sua busca por um custo de processamento mental baixo, mesmo que o
benefício desse diálogo seja quase nulo.
Refletindo sobre essa primeira situação-tipo e considerando-se as avaliações feitas
acerca da relação esforço e efeito em comunicação prevista pela Teoria da Relevância,
podem-se salientar alguns aspectos referentes às questões de esforço de processamento e de
efeitos cognitivos, conforme preconizados nessa teoria. Para Sperber & Wilson (1995), é
preciso uma medida comparativa entre esforço e efeitos cognitivos, mesmo que essa seja
apenas aproximada. No entanto, os autores não descrevem como isso ocorre. Como o esforço
de processamento pode ser determinado pela complexidade lingüística, cada participante da
interação acima descrita, partindo do pressuposto de que os outros conhecem a expressão
92
“Wassup?”, fornece um estímulo que leva os ouvintes a um esforço mínimo, mas ao mesmo
tempo com benefício quase zero também. Assim, nesse caso a relevância deve ser mínima, ou
nula. No entanto, ao comunicar-se com o outro, sua intenção é apenas a de entrar em contato
com alguém. Por esse motivo, mesmo que o custo de repetir a mesma frase tenha sido muito
pequeno, o benefício afetivo parece ter sido maior, e, por isso, a interação tornou-se relevante
no que diz respeito ao campo emotivo. Aqui, observa-se um ponto crucial para a Teoria da
Relevância: se o falante tem uma intenção comunicativa de tornar mutuamente manifesto para
sua audiência a sua intenção informativa, ele tem também o propósito de alterar o ambiente
cognitivo do ouvinte. O que ocorre no diálogo não é um acréscimo de informações, mas um
fortalecimento no grau de afetividade entre os interlocutores. Contudo, se afetividade pode ser
considerada benefício cognitivo, da mesma forma que uma informação nova ou um
conhecimento que chega ao ambiente cognitivo do ouvinte para alterá-lo, contradizê-lo ou
fortalecê-lo, então a noção de efeitos cognitivos é generalizada, o que desafia a noção de
relevância, tornando-a trivial. Assim, pensa-se que os seres humanos não buscam a
relevância em suas relações, mas procuram, em primeiro lugar, ter contato uns com os
outros
37
.
4.2.1.3 Análise das inferências externas
Neste ponto da análise, pretende-se salientar a formação das hipóteses interpretativas
por parte da audiência do comercial. Conforme demonstrado em 4.2.1, trata-se de um
comercial famoso por propagar uma expressão utilizada na linguagem oral. “Wassup” é um
estímulo altamente ostensivo, visto a sua consistência reiterativa. Ele aparece já nos primeiros
segundos do comercial, como uma forma de prender o telespectador para que ele não desvie a
sua atenção da mensagem que se pretende transmitir. De acordo com Silveira & Feltes (2002,
p. 89), a comunicação está sujeita a riscos e pode falhar. O publicitário, mesmo com a
possibilidade de não alcançar o seu objetivo, cria um anúncio menos trivial, provocador e, por
37
A respeito disso, Costa (2005b) propõe a Teoria da Conectividade Não-Trivial, uma alternativa para a
arquitetura conceitual da Teoria da Relevância. Segundo esse autor, os seres humanos têm uma tendência natural
para a conexão uns com os outros. Em suas próprias palavras, a interatividade “pode ser caracterizada como uma
conseqüência da sociabilidade natural mais a natureza do social, ou seja, da natureza da linguagem enquanto
propriedade genética para a expressão das línguas enquanto construções sociais” (COSTA, 2005b, p. 120).
93
isso mesmo, um estímulo ostensivo que incita o leitor a considerá-lo merecedor de atenção e
de processamento.
Essa ostensão é um pretexto para demonstrar que o produto faz parte de um
contexto em que os personagens centrais do comercial estão em um momento de lazer,
relaxados. Através da decodificação lingüística a partir da troca comunicativa transcrita na
primeira parte – e do estímulo visual, a audiência pode formular as primeiras suposições:
S
1
– Os sujeitos estão em posição de ócio.
S
2
– Ambos falam que não estão fazendo nada.
S
3
– O item lexical “Bud” refere-se à marca de cerveja “Budweiser”.
S
4
– Eles tomam uma “Bud” e assistem a um jogo.
S
5
– As atividades de tomar uma “Bud” e assistir a um jogo só são realizadas quando
as pessoas estão despreocupadas e sem nada para fazer.
S
6
Geralmente, assistir a um jogo prazer aos homens, assim como tomar uma
cerveja.
S
7
Nessa atividade de lazer, os indivíduos incluem beber uma Bud” porque lhes
dá prazer.
C
1
– A cerveja Budweiser faz parte dos momentos de lazer e prazer.
Percebe-se que ambos utilizam o vocábulo “Bud”, ao invés de nomear a bebida pelo
seu nome real, “Budweiser”. Ao dar um apelido à cerveja, estabelece-se uma ligação entre o
produto e uma atividade que é prazerosa a eles. Ademais, isso indica que a redução desse
nome é mutuamente manifesta no ambiente cognitivo de ‘A’ e ‘B’ e também, pressupõe-se,
da audiência do comercial. A metonímia aqui utilizada é uma das estratégias utilizadas pela
publicidade para atrair o consumidor, pois ao substituir o item lexical ‘cerveja’ por ‘Bud’,
está-se associando a marca a um momento de lazer. Segundo Song (1997), o uso da
metonímia, na maioria dos casos, requer que o ouvinte despenda um esforço extra de
processamento, muitas vezes compensado por efeitos cognitivos maiores. Isso ocorre nessa
situação, em que uma informação é acrescentada ao ambiente cognitivo através de implicação
contextual: há a informação, no ambiente cognitivo da audiência, de que o item lexical
‘Budweiser’ é uma marca de cerveja, mas a sua redução para ‘Bud’ é nova, o que gera um
efeito cognitivo positivo. Além disso, essa figura de linguagem demonstra a intenção do
anunciante de que os consumidores se sintam familiarizados com a marca, e, nesse sentido,
confortáveis em apelidá-la também. Dessa forma, poderão lembrar-se mais facilmente do
produto na hora da compra.
94
Por se tratar de uma situação de humor, esse é um estímulo bastante ostensivo para a
audiência, que é atraída por causa da repetição da mesma expressão. Durante o comercial,
pode-se perceber, como um segundo estímulo, que quase todos os personagens seguram uma
cerveja Budweiser. Apenas um, ‘D’ (Dookie), não está bebendo aquela cerveja, justamente
por estar trabalhando no computador. Por causa disso, o contexto inicial, indicado pelas
suposições S
1
a S
7
, é retomado a fim de fortalecer a suposição gerada pela conclusão
implicada (C
1
):
S
8
– Todos os que estão segurando a “Bud” estão descontraídos e relaxados.
S
9
– ‘D’ não parece estar em um momento de lazer.
C
2
– A cerveja Budweiser é uma bebida para os momentos de descontração.
Aliás, o fato de esses estímulos perceptivos serem ostensivos para a audiência e
levarem-na a formular os cálculos inferenciais acima demonstrados é um indício de que a
relevância é alcançada por fazer com que os telespectadores façam o mínimo de esforço e
alcancem efeitos cognitivos positivos. Por se acreditar que o objetivo do comercial é captar a
audiência através do humor e lançar a mensagem de que esse produto é próprio para
momentos de lazer, acredita-se que as hipóteses interpretativas são consistentes com o
princípio da relevância, para as quais cada estímulo ostensivo transmite uma presunção de sua
própria relevância ótima.
Ao final da propaganda, ‘A’ e ‘B’ repetem True, true”, como um backchannel, ou
seja, no intuito de não deixar de dizer algo. No entanto, por essa palavra aparecer ao final do
filme, abaixo da marca do produto e em letras maiúsculas, esse estímulo visual pode fazer
com que a audiência levante também as seguintes suposições:
S
10
Segundo o comercial, a cerveja Budweiser é um produto próprio para
momentos de lazer.
S
11
– Ao final do comercial aparece o vocábulo “TRUE” [verdade].
S
12
Esse item lexical sugere que as suposições geradas pelos estímulos lançados
pelo comercial são garantidas (verdadeiras).
C
3
– É verdade que a cerveja Budweiser é a bebida ideal para momentos de lazer.
Com base no processo inferencial gerado pelo filme, pode-se observar a intenção de
seus criadores de chamar a atenção através do estímulo ostensivo que o input lingüístico
“wassup?” produz. Mesmo que o produto seja um coadjuvante da troca comunicativa, ele
acaba ocupando uma posição de destaque no processamento mental da informação que os
95
anunciantes querem causar: a cerveja Budweiser é própria para momentos de lazer. Ao
produzir uma propaganda de humor, tem-se a intenção de levar a audiência a um
processamento inferencial otimamente relevante através de um esforço mental mínimo. Por
causa da percepção de que os estímulos do comercial geram humor, ele será mais facilmente
lembrado mais tarde porque faz com que a audiência tenha um momento de descontração.
A próxima análise se estrutura em torno de um diálogo aparentemente sem
pertinência, mas no qual se percebe que a interação entre os personagens justifica-se pelo
benefício emocional. Passa-se, a partir desse momento, à análise das inferências internas e
externas ao próximo filme.
4.2.2 Filme publicitário 2: “Ex”
38
O comercial do xampu Sedal (conhecido como Seda no Brasil) foi veiculado na
mídia Argentina no início dos anos 2000. Assim como nos demais comerciais ligados à
marca, ele traz uma situação em que mulheres, por darem um tratamento melhor aos seus
cabelos, têm maior visibilidade e assim conseguem algo almejado por elas. No filme, um
casal de ex-namorados se encontra num supermercado. O objetivo da mulher é o de ser vista
com outros olhos por seu ex, o que é conseguido por causa do uso do produto em questão.
4.2.2.1 Roteiro do filme publicitário
O seguinte diálogo ocorre entre Julián (J) e Laura (L), sua ex-namorada. Eles se
encontram no supermercado. Pode-se pressupor que é a primeira vez que se encontram após a
separação. Ao vê-lo, Laura sorri e solta os cabelos; Julián, por sua vez, fica impressionado ao
olhá-la.
38
Disponível: http://www.youtube.com/watch?v=WRwhbD70Dhc. Último acesso: 12 de outubro de 2007.
96
(1) J – Oh no, Laura.
¿Cómo se ha puesto tan linda…?
¿Estará sola?
¿Por qué ese no es un changuito de chica sola?
No, no, no, no. Existe algún alguien.
[Julián movimenta-se nervosamente]
97
(2) L - Julián!
J – Laura, ¿Cómo estás?
L – Bien, estoy bien.
J – ¿Te hiciste algo en el…?
[ Julián aponta para a cabeça]
L – Bueno, ahora tengo más tiempo para mí. [Julián baixa a cabeça e
sorri]
¿Y vos?
J – Yo bien, bien, espléndido, con un montón de proyectos y…
L – Aaaah… ¿Cuales?
J – Ãh?… [ele ri e desconversa]
L – Mira…
J – Sí…
L – Bueno, nos vemos. [Laura começa a andar]
98
J – Nos vemos… Lau… [ela se vira]
¿Te puedo llamar?
[pausa. Laura olha para baixo, como se estivesse pensando]
L – No. [Aparecem as legendas: “Mira me.” “Y mira me de nuevo.”.]
[Ela vai embora, sorrindo.]
99
(3) [Ao final do comercial, o produto aparece e o locutor diz: “Nuevo
Sedal Liso Perfecto. Tu liso como nunca lo tuviste”.]
4.2.2.2 Análise das inferências internas
Na primeira parte do filme, Laura está caminhando pelo supermercado quando
que Julián, seu ex-namorado, está a alguns metros dela. A partir dessa observação, ela pára e
solta seus cabelos, pretendendo, com isso, utilizar uma estratégia ostensiva não-verbal para
chamar a atenção do rapaz. Essa ação parece funcionar, visto que, ao vê-la, Julián surpreende-
se e a observa atentamente. Em seu ambiente cognitivo, explicitado no filme, surgem várias
perguntas: (a) Como ela pode estar tão linda? (b) Ela estará sozinha? (c) Por que não seria
esse um carrinho de uma mulher sozinha?. A partir disso, é possível resgatar as prováveis
inferências construídas por Julián, embutidas em suas próprias perguntas
39
:
(a) Como ela pode estar tão linda?
SJ
1
– Laura está linda (dito).
SJ
2
– Laura não pode estar tão linda depois de nos separarmos.
SJ
3
– Se está bonita, ela não deve estar sozinha.
Essas suposições representam implicaturas fracas, no sentido de não serem
necessárias, mas apenas possíveis. Dessas, Julián questiona-se se a ex-namorada está sozinha
39
A sigla SJ será utilizada para as prováveis suposições de Julián, e SL, para as de Laura.
100
(como pode ser visto pela pergunta b). A suposição SJ
3
é corroborada quando ele, ao observar
os itens no carrinho de compras de Laura, questiona-se (c), levando-o a mais suposições:
SJ
4
A quantidade e a variedade de itens selecionados no carrinho são para duas ou
mais pessoas.
SJ
5
– O carrinho não parece ser de alguém que está sozinho (dito).
No entanto, conforme Sperber & Wilson (1995) essas premissas podem apenas ser
corroboradas, e não provadas. Não como se ter certeza dessas suposições, exceto se Julián
perguntar a ela, o que ele não faz. Por isso, seus gestos inquietação, o ato de passar a mão
pelo cabelo – denunciam preocupação. As perguntas feitas mentalmente e as prováveis
premissas formuladas (SJ
1
a SJ
5
) levam à conclusão implicada:
CJ
1
– Existe alguém na vida de Laura.
Como demonstrado através das suposições de Julián, de uma premissa implicada
podem ser geradas outras, recursivamente. A mente humana permite esse jogo porque segue
um cálculo não-trivial e, portanto, as premissas o construídas a partir das informações
estocadas em sua memória enciclopédica (“se alguém está bonito, é porque tem alguém”; “se
alguém está sozinho geralmente compra pouca quantidade de produtos”, entre outras) com o
input recebido pelo ambiente e pelo falante, permitindo também a construção de outras
premissas implicadas e de diferentes conclusões. Para fins de análise, as suposições e a
conclusão implicada de Julián serão utilizadas como contexto inicial.
Na segunda parte, Laura caminha em direção ao seu ex, fingindo não tê-lo visto. Ela
demonstra surpresa por encontrá-lo, mesmo sabendo que ele estava ali antes. Ela pretende
chamar a atenção de Julián para si, ao mesmo tempo em que não quer demonstrar essa
intenção.
Após os cumprimentos, surgem as seguintes falas:
J – ¿Te hiciste algo en el…?
L – Bueno, ahora tengo más tiempo para mí.
Nesse momento, pode-se perceber que Laura interpreta o sentido da pergunta
inacabada de Julián, completando-a. Ela acredita que a palavra “cabello” (cabelo) seria a mais
apropriada para preencher a lacuna deixada por ele em função das informações que o gesto
dele provém quando aponta para a própria cabeça enquanto fala. Não praticamente
101
necessidade de um cálculo mental para chegar a essa explicatura, posto que o item lexical que
provém uma explicação é uma característica conceitual codificada e inferida
contextualmente” (SPERBER & WILSON, 1995, p. 182). Além disso, do ponto de vista
griceano, esse enunciado incompleto representa uma quebra na xima de modo, disparando
a inferência de que só essa palavra caberia nesse contexto.
A partir do contexto inicial, no qual Laura soltou seus cabelos ao ver Julián, pode-se
concluir que no ambiente cognitivo dela havia a intenção de mostrar, através do seu cabelo
tratado, que ela estava bonita e, com isso, chamar a atenção para si. Transpassando a barreira
do código e preenchendo inferencialmente a mensagem de Julián, Laura entende a pergunta
dele como um elogio, alcançando seu objetivo primeiro de impressioná-lo. A seguinte
suposição se torna, então, mutuamente manifesta:
SJL – Laura está bonita e, por isso, chama a atenção
40
.
Desse mesmo trecho, ainda cabe ressaltar que, se analisada em função do código, a
resposta de Laura não teria sentido, porque não responde à pergunta de Julián. No entanto,
com o objetivo de enviar a mensagem de que ela está muito bem sem o ex-namorado, Laura
pretende dizer isso indiretamente. A Teoria da Relevância prevê que o falante lance um
estímulo que ele julga ser relevante para seu ouvinte, ou seja, leve ao menor esforço possível
para alcançar a compreensão. Contudo, aqui se pode corroborar o questionamento de Bach &
Harnish (1987), explicitado no capítulo três, ao afirmarem que não se sabe como o falante
antecipa o esforço a ser feito pelo ouvinte para que a informação seja relevante. Essa teoria,
por esse motivo, falha em explicar essa questão, que preconiza que o falante deve antecipá-
lo. Por isso, ao lançar essa resposta, Laura implicará que provavelmente Julián recuperará a
interpretação pretendida através da construção das seguintes suposições implicadas:
SJ
6
– Se Laura tem mais tempo, ela pode cuidar de si.
SJ
7
– Antes ela não tinha tempo.
SJ
8
– Na época em que estávamos juntos Laura tinha menos tempo para cuidar de si.
SJ
9
– Sua falta de tempo era provocada por minha presença na sua vida.
SJ
10
– Alguém que tem mais tempo para si se sente melhor.
SJ
11
– Laura sente-se melhor em ter mais tempo para si mesma.
CJ
2
– Laura não sofre com a minha ausência.
40
SJL é utilizado aqui para demonstrar que as suposições tornaram-se mutuamente manifestas no ambiente
cognitivo das personagens.
102
Nesse caso, não como se ter certeza de que Julián acessou essas e não outras
hipóteses interpretativas. As crenças de Laura são de que Julián levará em conta as
informações contextuais e resgatará, em sua a memória de longo prazo, o envolvimento
amoroso deles no passado, visto que esse fato é mutuamente conhecido. Ela utiliza as
informações que provavelmente estão estocadas na mente de seu ex para produzir nele um
103
A última parte do diálogo é completada pela despedida deles. Julián pede se pode
ligar para ela. Ao fazer o gesto de olhar para baixo e responder negativamente, Laura faz com
que Julián preencha inferencialmente a informação pretendida através da representação
semântica da sentença, do enunciado no contexto por meio de suposições armazenadas na
memória enciclopédica e das propriedades perceptivas pelo gesto dela de baixar os olhos.
Isso leva à contradição da suposição de Julián de que ela provavelmente aceitaria conversar
com ele. Dessa forma, ele constrói as seguintes suposições:
SJ
12
– Laura está bem sem mim (informação recuperada a partir de CJ
2
)
SJ
13
– Laura não quer mais falar comigo.
SJ
14
– Laura não me quer de volta.
CJ
3
– Laura ainda deve estar magoada comigo.
Por causa da pergunta de Julián (“¿Te puedo llamar?”), Laura também constrói um
conjunto de suposições em seu ambiente cognitivo:
SL
2
– Se Julián quer ligar para mim, é porque tem algo a me dizer.
SL
3
Como namoramos, ele provavelmente vai querer falar sobre nosso
relacionamento.
SL
4
– Provavelmente ele vai querer reatar o namoro.
SL
5
– Julián está arrependido por ter terminado o namoro.
Essas suposições são base para o cálculo mental seguinte:
SL
6
– Julián percebe como eu estou bonita.
SL
7
– A idéia de cuidar de mim deu certo.
SL
8
Ao não dar uma chance a Julián e me mostrar superior, vou dar uma lição a
ele.
CL
2
– Quero mostrar a Julián o que ele perdeu.
Como se pôde ver, o encontro dos ex-namorados mostra uma situação totalmente
comum, com um diálogo de enunciados de teor irrelevante, onde o esforço é mínimo e, como
ocorreu com o diálogo da primeira análise, benefício ínfimo também. Mas pode-se notar que
aqui objetivos maiores por trás dessa conversa: da parte dele, a tentativa reaproximar-se da
ex-namorada; da parte dela, enviar uma mensagem ostensiva de que a partir de agora ela está
bem, mostrando ao ex que ele perdeu muito em não ficar com ela. Pode-se notar que,
informativamente, não houve nenhum progresso na comunicação de ambos. Quanto à questão
104
emocional, no entanto, percebe-se que houve maximização da relevância da parte de Laura,
visto que ela conseguiu obter o efeito cognitivo de captar a surpresa e o arrependimento de
Julián, sem com isso despender grandes esforços. Assim como ocorre com Laura, os efeitos
cognitivos de Julián também estão no nível emocional, a partir dos quais ele percebe que não
poderá reatar o namoro com Laura. Nesse caso, houve um baixo custo, e o efeito cognitivo foi
suficiente para essa compreensão.
Mais uma vez, ressalta-se a tendência de se obter um benefício emocional por parte
dos interlocutores, aqui representados por Laura e Julián. Como mencionado, o houve
uma relação de esforço e efeito informativos para ambos os personagens, visto essa ser de
caráter irrelevante. Para a arquitetura conceitual de Sperber & Wilson (1986; 1995), humanos
têm uma tendência a maximizar a relevância, mas o informa de que tipo será o esforço de
processamento ou os efeitos cognitivos obtidos. Cabe aqui salientar que não há precisão
quanto a esse aspecto, pois caso se considere quaisquer tipos de esforços e efeitos, não se sabe
exatamente como a relevância é determinada. Isso significa que, se os efeitos cognitivos
forem considerados não como informativos, mas como afetivos, ou de qualquer outra
modalidade, então é possível levar em conta quaisquer efeitos cognitivos que possam ser
obtidos na comunicação. Como se mostrou na seção 3.5, Costa (2005b) acredita que o
benefício leva em conta o grau de importância quanto ao conteúdo e o grau de interatividade.
Nesse caso, a importância do diálogo, no aspecto informativo, é quase nula, visto ser ele
superficial. Há, por trás das palavras, objetivos bem marcados, os quais podem ser observados
nesse diálogo. Os benefícios psicológicos o positivos, que os personagens utilizaram-se
de pouco esforço de percepção, memória e raciocínio para chegar aos efeitos cognitivos
demonstrados acima. No entanto, a conversa de pouco valor informativo, mas com grande
benefício afetivo, é redundante e aqui se questiona esse ponto da teoria de Sperber & Wilson:
não está claro, nas dez ginas dedicadas a essa questão em Relevance, como os autores
configurariam os vários tipos de esforços e de efeitos surgidos num diálogo como esse.
A seguir, utilizando aspectos dessa análise das inferências internas como base,
passa-se a olhar para o processamento da mensagem desse filme pelo público-alvo dele.
105
4.2.2.3 Análise das inferências externas
O comercial do xampu Sedal prende a atenção da audiência pela criatividade com
que expõe uma situação comum do cotidiano. Como em toda campanha publicitária dessa
marca, o filme mostra uma situação em que as mulheres, ao cuidarem de si, chamam a
atenção dos homens. Tomando como princípio a ostensão, base para a construção do processo
inferencial, o filme direciona-se para mulheres que querem que seus cabelos sejam mais lisos
e, supostamente, mais bonitos. A partir da identificação do input visual e lingüístico, da
recuperação de conceitos na memória enciclopédica e da aplicação de regras dedutivas ao
processo inferencial, a audiência pode extrair as primeiras suposições:
S
1
– A mulher que cuida de si atrai os olhares masculinos.
S
2
– Laura cuida de seus cabelos.
S
3
– Ela chama a atenção de seu ex-namorado.
C
1
– Laura consegue chamar a atenção do ex-namorado por cuidar de seus cabelos.
Pelo desenrolar do diálogo, percebe-se que a mulher consegue atingir seus objetivos
ao usar os cabelos como arma de sedução. A audiência entende, então, que os criadores do
comercial tiveram a intenção de mostrar que o produto tem a capacidade de tornar as
mulheres que fazem uso dele muito mais bonitas e interessantes. As suposições S
1
a S
3
são
recuperadas quando a legenda “Mira me. Y mira me de nuevo” (“Olha-me. E olha-me de
novo”) aparece, já no final do filme, gerando assim um novo cálculo mental:
S
4
– A mulher queria ser vista com atenção.
S
5
– Ao cuidar de seus cabelos, ela ficou mais bonita.
S
6
– Julián notou que Laura estava mais bonita.
S
7
– Por ter sido notada, a mulher alcançou seu objetivo.
C
2
A mulher queria ser vista e, ao usar o xampu Sedal, seu cabelo ficou mais liso
e, portanto, mais bonito, levando o ex-namorado a olhá-la com atenção.
As frases da legenda são estímulos ostensivos que levam a audiência à exploração
dos prováveis sentidos que os anunciantes querem provocar. Portanto, as inferências geradas a
partir delas poderiam ser as demonstradas abaixo:
S
8
Não basta apenas que o homem olhe para a mulher com atenção (“olha-me”),
mas que ele a observe atentamente (“olha-me de novo”).
106
S
9
– Ao usar o xampu Sedal Lisos Perfectos, a mulher ficará com cabelos bonitos.
C
3
– Ao conseguir cabelos bonitos, a mulher chamará a atenção do homem e
conseguirá que ele a contemple como ela deseja.
Além disso, o input lingüístico lançado pelo locutor (“Nuevo Sedal Liso Perfecto.
Tu liso como nunca lo tuviste”) pode também suscitar o seguinte cálculo mental:
S
10
– O xampu Sedal Lisos Perfectos dá o efeito de alisamento nos cabelos.
S
11
Ao usar esse produto as mulheres vão ter um cabelo liso como nunca tiveram
em suas vidas (“Tu liso como nunca lo tuviste”).
S
12
Mulheres que têm o cabelo liso por natureza podem contar com esse produto
para deixar o cabelo ainda mais liso.
C
4
– Ao usar o xampu Sedal, as mulheres terão um cabelo extremamente liso.
Essa conclusão implicada pode ser reaproveitada, visto que a mente utiliza-se de um
processo recursivo no uso de contextos estocados na memória, nos quais uma série de
suposições é utilizada para desenvolver um novo cálculo no processamento das informações.
Assim, a conclusão C
4
é compartilhada com as suposições S
1
a S
12
, gerando assim mais uma
conclusão implicada:
C
5
Ao usar o xampu Sedal, o cabelo vai ficar mais bonito e, conseqüentemente,
atrairá o olhar dos homens.
Como se pode ver, a riqueza dos efeitos contextuais fez com que o percurso
inferencial surgisse por causa da busca pela relevância ótima. Os criadores dessa peça
publicitária tiveram a intenção informativa de tornar mutuamente manifesto o conjunto de
suposições S
1
a S
12
, com suas respectivas conclusões implicadas, os quais fazem parte de um
contexto cognitivo que passa a ser compartilhado pelo público-alvo: mulheres de cabelo liso
desejam que seus cabelos fiquem ainda mais lisos e, conseqüentemente, mais bonitos,
segundo o conceito transmitido implicitamente pelo comercial. Por isso, o anunciante acredita
que as prováveis consumidoras que têm cabelos lisos provavelmente comprarão o produto no
intuito de chamar a atenção principalmente dos homens.
A terceira análise contempla um comercial brasileiro da marca de sandálias
Havaianas. Os criadores dessa propaganda usam criatividade na escolha de um dos estímulos
ostensivos presentes na propaganda, uma conversa informal visando uma conquista, na qual
107
um elemento-surpresa faz com que a contradição de suposições gere efeitos cognitivos
positivos.
4.2.3 Filme publicitário 3: “Modelo”
41
Havaianas é uma marca brasileira de chinelos de borracha produzida mais de 40
anos pela São Paulo Alpargatas
42
. Durante muito tempo, o público-alvo desse produto foi a
classe financeiramente desfavorecida, que o comprava em mercados de bairro por um preço
irrisório. Conhecidas popularmente como “chinelos de pobre”, a companhia que fabricava as
Havaianas tentou mudar essa visão com o lançamento, em 1994, da linha Havaianas Top.
Para dar impulso à campanha, foram veiculadas na mídia propagandas estreladas por
celebridades, além de as sandálias começarem a ser vendidas em locais mais estratégicos,
como butiques renomadas. De popular, as sandálias Havaianas (e não mais chinelos, uma
mudança de denominação que fez parte da estratégia da marca para conquistar consumidores
de classes mais altas) passaram a ser democráticas e informais. A hoje pessoas famosas
participam dos comerciais, os quais sempre mostram situações cômicas em que os artistas
usam ou procuram Havaianas nas lojas.
4.2.3.1 Roteiro do filme publicitário
Nesse filme vê-se Fernanda Lima, no papel dela mesma, escolhendo uma sandália
Havaiana em uma loja que fica próxima à praia. Utilizar-se-ão A para as falas do homem e B
para as falas dela.
41
Disponível: http://www.youtube.com/watch?v=toQXQL1h1w4. Último acesso: 12 de outubro de 2007.
42
As informações deste parágrafo foram pesquisadas na enciclopédia virtual Wikipedia disponível:
www.wikipedia.com. Acesso em 20 de setembro de 2007.
108
A – [som de assovio] Essas Havaianas vão ficar lindas em você.
B – ‘Brigada.
A – Você é modelo!
B – Sou.
A – [Ele parece surpreso] Como assim?
B – [Ela vira-se para ele] Ué, modelo. Sou Fernanda Lima, modelo.
A – Pô, sacanagem!
B – Que foi?
A – Essa era minha melhor cantada. Você estragou tudo!
109
[Ele vai embora]
B – Desculpe. Eu, hein…
[Ao final, a cena é cortada e aparecem várias sandálias
110
escolhendo um par de Havaianas. O rapaz tenta novamente lançar um elogio, perguntando se
ela é modelo. Para isso, em seu ambiente cognitivo estão estocadas as seguintes suposições
43
:
SH
1
– Modelos são mulheres lindas.
SH
2
Ao perguntar para uma mulher se ela é modelo, ela irá gostar por compará-la
a um tipo de mulher que é, por hipótese, linda.
Essas suposições são resgatadas da memória enciclopédica dele para que lance esse
elogio, gerando assim a seguinte suposição:
SH
3
– A mulher que está à minha frente vai gostar de ser chamada de modelo.
No entanto, para sua surpresa, a mulher responde que realmente é modelo (“Sou”).
Como a intenção era apenas elogiá-la, as suposições dele de que ela provavelmente não era
modelo são contraditas. Esse efeito cognitivo é notado, também, por sua expressão de
surpresa e pela pergunta “Como assim?” num tom hesitante. Quando a mulher volta-se para
ele, revelando a sua identidade, as suposições, antes contraditas e substituídas pela informação
de que a mulher é modelo, são agora fortalecidas pelo input lingüístico e visual da modelo
“Fernanda Lima, modelo”. O homem a reconhece, porque possui, em sua memória
enciclopédica, a informação de que essa pessoa é uma modelo brasileira famosa.
Por haver uma alteração do ambiente cognitivo do rapaz, ele fica confuso. Em
seguida, demonstra a sua insatisfação em saber disso, o que gera surpresa por parte de
Fernanda. Ao explicar que ela “estragou tudo”, esse input lingüístico provoca, na mulher, um
processamento inferencial, compreendido como um mecanismo cognitivo no qual o ouvinte,
ao receber a mensagem do falante, estabelece relações acerca do que foi dito. Dessa forma, a
mulher constrói uma série de suposições a respeito do homem:
SM
1
– O homem provavelmente costuma “cantar” as mulheres.
SM
2
– Ele tinha várias “cantadas”.
SM
3
– Perguntar para uma mulher se ela é modelo era a sua melhor cantada.
SM
4
– Esse homem não tinha uma cantada melhor.
SM
5
– O homem não estava preparado para dizer qualquer outra coisa.
43
As siglas SH e SM são utilizadas aqui para destacar as suposições formuladas pelo homem e pela mulher,
respectivamente, em seus prováveis ambientes cognitivos.
111
Por ele dizer essa era minha melhor cantada”, a suposição SM
1
se confirma, mas o
fato de ele ir embora logo em seguida faz com que a inferência gerada por informações
estocadas na memória enciclopédica dela, de que o rapaz provavelmente continuaria a
conversa, seja enfraquecida.
Mais uma vez, pode-se observar que essa situação possui um diálogo bastante
irrelevante, do ponto de vista do grau de informatividade transmitido por ele. Para o homem,
existem altos e baixos na formação de hipóteses interpretativas, visto que os efeitos cognitivos
atingidos variam entre extremos de contradição e de fortalecimento de suposições. Já o fato de
a mulher responder diretamente, sem deixar informações implícitas em sua fala, mostra que
aquela conversa não tem pertinência para ela, a qual responde somente para ser simpática com
o homem. O elemento-surpresa da situação é o fato de ele não tentar prolongar a conversa e ir
embora. A mulher pode supor que ele, na verdade, se assustou com essa informação
inesperada por não estar preparado para ela.
Nesse caso, observa-se que o diálogo desenrola-se informalmente e que, assim, o
há exigência de grandes esforços de processamento mental. Esperar-se-ia que os efeitos
cognitivos fossem positivos, gerando relevância ótima. Isso ocorre no homem, para o qual os
efeitos cognitivos alcançados são maiores do que os esforços despendidos para atingi-los.
Além disso, por ele nem tentar continuar conversando com a mulher após a surpresa da
contradição de informações, significa que ele não pretende despender muitos esforços de
processamento para criar novas formas de conquistá-la.
Conforme observado, para a mulher esse diálogo tem um tom irrelevante, já que
ela faz esforços mínimos para alcançar o significado dos enunciados, mas os efeitos
cognitivos também parecem ter valor semelhante. Tendo uma relação custo-benefício com tal
medida, acredita-se que, para ela, não um grau de relevância válido. Pode-se ressaltar, no
início do diálogo, que os efeitos emocionais causados pelo elogio do rapaz no ambiente
cognitivo dela são importantes naquele momento. Mais uma vez a questão do tipo de
benefício cognitivo alcançado, algo ainda obscuro na teoria de Sperber & Wilson. Somente ao
final, quando Fernanda questiona sobre a reação do rapaz (“Que foi?”) é que se tem um efeito
cognitivo de ordem informativa. Salienta-se, por isso, que ainda falta uma melhor explanação
a respeito desse ponto. Por ora, considerar-se-ão todas as vantagens trazidas por essa teoria na
explicação da compreensão inferencial humana. Tendo trabalhado as inferências internas,
parte-se a seguir para aquelas construídas pela audiência dessa propaganda.
112
4.2.3.3 Análise das inferências externas
Nesse comercial, as sandálias Havaianas aparecem como coadjuvantes da interação
entre os personagens. O foco situa-se na usuária do produto, uma modelo famosa. Trazendo à
memória o slogan da campanha – Havaianas: todo o mundo usa –, o fato de ela estar
escolhendo uma sandália dessa marca serve como um estímulo ostensivo para a audiência,
que pode construir um cálculo inferencial através da união das informações previamente
estocadas na memória enciclopédica com aquelas proporcionadas através da percepção, da
decodificação lingüística e pelas suposições formuladas. Esse processo pode ser assim
demonstrado:
S
1
As Havaianas, anos atrás, eram consideradas um produto popular, de baixo
custo, usadas por pessoas de poucas posses.
S
2
– No filme, Fernanda Lima está escolhendo um par de Havaianas.
S
3
– Fernanda Lima é famosa.
S
4
– Geralmente, pessoas famosas também têm status e poder.
S
5
– Pessoas famosas como essa modelo usam Havaianas.
S
6
– As Havaianas são usadas também por pessoas de status e poder.
S
7
Assim como pessoas que ganham pouco usam essas sandálias, também o fazem
as pessoas de posses.
C
1
– Logo, todas as pessoas usam Havaianas.
Essas suposições e conclusão implicadas formam o contexto inicial, que se
utilizado no decorrer do filme como base para a compreensão da interação comunicativa. Esse
pode gerar novas inferências e, portanto, novos contextos mentais. Trata-se de um processo
que pode se repetir um número infinito de vezes, até que o uso delas se esgote para o
entendimento global do comercial.
A conclusão implicada C
1
é corroborada pelo slogan da marca, enunciado pelo
locutor ao final do comercial: “Havaianas, todo o mundo usa”. Quando o rapaz afirma “Essas
Havaianas vão ficar lindas em você”, além de apontar que a modelo está escolhendo um par
dessas sandálias, ainda faz referência à marca, como uma forma de chamar a atenção do
consumidor. Conforme demonstrado na análise das inferências internas, a referência ao
produto é a forma encontrada pelo rapaz de chamar a atenção da mulher. para a audiência,
é um estímulo ostensivo para mostrar que o uso das Havaianas é bastante democrático, posto
113
que até mesmo uma modelo famosa procura por um par. A escolha do item lexical
“Havaianas” uma metonímia para designar essas sandálias serve para valorizar o produto,
e ao mesmo tempo é uma tentativa de incutir nos usuários dessas sandálias o costume de
denominá-las pelo nome próprio. Essa estratégia, utilizada também nos outros comerciais
dessa marca, tem tido resultado positivo, pois se percebe que geralmente as pessoas têm a
tendência de chamar o produto pelo nome da marca, e não pelo nome “chinelo” que, de
acordo com os criadores da campanha, possui uma conotação depreciativa.
Ao relegar as sandálias a um segundo plano, envolvendo-as em uma cena onde um
elemento-surpresa gera humor, os anunciantes fazem com que a audiência obtenha efeitos
cognitivos positivos. Esses estímulos ostensivos carregam consigo uma expectativa de
relevância, que é alcançada pelo público-alvo ao despender esforços mínimos para a
compreensão desse filme. Mesmo não tendo destaque, a intenção dos criadores da cena é
explícita: mostrar que as Havaianas revestem os pés de “todo o mundo”: de pessoas mais
simples até uma modelo famosa como a que se apresenta no filme.
4.2.4 Filme publicitário 4: “Paulistas”
44
O comercial da cerveja Polar, da empresa AmBev, foi criado por Tales Bahu e Giba
Lages. O filme foi veiculado na televisão gaúcha, onde nesse meio poderia ser divulgado,
uma vez que existem marcas lingüísticas próprias do lugar, como sotaque e expressões
típicos, além de transmitir certa visão pré-concebida que o povo gaúcho tem a respeito da
cidade de São Paulo. Mostra, também, o orgulho por aquilo que é feito no Rio Grande do Sul,
sendo um desses produtos a marca de cerveja “Polar”, produzida no Estado. O filme se passa
em um bar, no qual dois rapazes se aproximam de duas mulheres para conversarem. No
entanto, ao descobrirem que elas são paulistas, logo desistem da idéia.
44
Disponível: http://www.youtube.com/watch?v=pRAMHY364Is. Último acesso: 12 de outubro de 2007.
114
4.2.4.1 Roteiro do filme publicitário
A cena se passa em um bar, provavelmente no Rio Grande do Sul. Duas jovens estão
sentadas à mesa quando dois rapazes se aproximam.
(1) [O filme inicia mostrando o produto]
115
A – Ô, meu, cê traz mais dois copos aqui pra gente, por favor.
[Os rapazes se aproximam]
B – E aí, beleza?
C – Bah, vocês não são daqui, né?
A– Não, São Paulo.
B e C – [eles se olham] São Paulo…
D – Então, cês querem sentar com a gente?
(2) [Nesse momento, o filme mostra a imaginação dos rapazes
deslocando-se para São Paulo. Eles estão se casando com as
mulheres que recém encontraram.]
116
B – Ah, São Paulo…
[Um caminhão parte, deixando para trás muita fumaça, o que os faz
tossir.]
[Em um elevador, todos estão apertados. Ouve-se a voz da
ascensorista com o sotaque paulista típico: “descendo”.]
[No trânsito, os quatro estão em um engarrafamento. De repente, um
motoqueiro passa e quebra um dos espelhos retrovisores do carro.]
[B e C vão para um bar, ainda em São Paulo]
117
B – Tchê, dá uma Polar aí.
Garçom – Polar? O que é isso, meu?
[Nesse momento, os dois voltam à realidade]
D – Então? [aponta, com um gesto de cabeça, a cadeira.]
[B e C se olham e gritam]
B e C – Bem capaz!
(3) Locutor do comercial: Polar. A melhor é daqui. Beba com
moderação. [Mostra a bebida e uma mão que arranca do rótulo a
parte onde está escrito: “tipo export”].
118
(4) [Os rapazes vão para outra mesa, onde estão duas outras mulheres]
C – Tá, mas vocês são daqui, né?
E e F – ã-ham…
B e C – Mas ah!
4.2.4.2 Análise das inferências internas
O filme inicia com uma das mulheres sentadas à mesa fazendo um pedido para o
garçom. Os itens lexicais “ô, meu”, “cê” e o input auditivo revelando um sotaque diferente
chamam a atenção dos rapazes, que, ao ouvirem o primeiro enunciado, logo constroem o
seguinte cálculo dedutivo
45
:
SH
1
– Uma das mulheres tem um sotaque diferente.
SH
2
– Ela utiliza expressões que não são típicas do lugar onde nos encontramos.
SH
3
Por estar junto com outra mulher, essa provavelmente tem também a mesma
forma de falar.
CH
1
– Essas mulheres devem ser de algum outro lugar do Brasil.
Por causa disso, essa é uma deixa para que eles se aproximem delas e questionem
sobre as suas origens. Suas hipóteses são corroboradas quando elas respondem à pergunta. O
45
As letras ‘H’ e ‘M’ serão utilizadas junto às letras S e C para distinguir as suposições e conclusões formuladas,
respectivamente, pelos homens e pelas mulheres.
119
fato de eles chegarem perto delas com essa pergunta aciona o mecanismo dedutivo delas para
formular as hipóteses:
SM
1
– Estamos em um bar.
SM
2
– Bares são ambientes propícios para conversas informais.
SM
3
– Se eles se aproximaram, é porque querem sentar e conversar conosco.
Por causa dessas suposições, elas convidam os dois rapazes para sentar. Nesse
instante, o filme mostra o provável ambiente cognitivo dos rapazes, os quais apelam para a
própria memória enciclopédica sobre a cidade de São Paulo (parte 2 do comercial). As
suposições levantadas por eles (poluição de carros, pessoas engravatadas, elevadores
apertados, motoqueiros que arrancam o espelho retrovisor do carro) fazem parte da percepção
coletiva das pessoas que não pertencem à cidade de São Paulo. Por parecer que os dois m
essa visão desse lugar, as suposições fazem parte do ambiente cognitivo mútuo,
compartilhado pelas pessoas que conhecem essa cidade a partir de uma visão transmitida pela
televisão.
De acordo com a Teoria da Relevância, o processo inferencial é compreendido como
um mecanismo dedutivo no qual o ouvinte, ao receber a mensagem do falante, estabelece
relações sobre o que foi dito. Para Sperber & Wilson (1995) as inferências são dedutivas,
espontâneas e inconscientes, formuladas no decorrer do processo comunicativo. O
processamento da informação ocorre da maneira mais eficiente possível, em que a informação
nova interage com aquilo que o indivíduo já conhece. Por essa razão, o cálculo para essas
suposições seria o seguinte:
SH
4
– Em São Paulo, há muita poluição.
SH
4
– Nessa cidade as pessoas estão sempre engravatadas e formais.
SH
6
– Há sempre muita gente aonde se vai, inclusive em elevadores.
SH
7
– Os motoqueiros, por estarem sempre com pressa, acabam estragando os carros
pelos quais passam.
CH
2
– São Paulo não é uma boa cidade para se viver.
Depois de imaginarem todos esses fatos considerados “horríveis” sobre a vida em
São Paulo, os rapazes ainda imaginam-se entrando num bar e pedindo a cerveja preferida
deles. Constatam, nesse momento, a falta da bebida naquela cidade, suposição formada pelo
não-conhecimento do garçom sobre o item lexical “Polar”. Esse fato une-se às suposições SH
4
a SH
7
e à conclusão implicada CH
2
para que voltem ao momento atual, em que eles estavam
120
abordando as paulistas no bar. Por causa dessas suposições compartilhadas, os sujeitos
rejeitam o convite das mulheres, visto que o filme ainda mostra que, no ambiente cognitivo
dos sujeitos, eles procuravam essas mulheres para, talvez, terem relacionamento sério. Caso
eles se sentassem com elas, esse poderia evoluir para um namoro e, conseqüentemente, eles
poderiam se casar e teriam que viver em São Paulo. O cálculo feito por eles seria mais ou
menos o que se segue:
SH
8
– As mulheres à nossa frente são paulistas.
SH
9
– Caso nos sentemos com elas, poderíamos sair com elas.
SH
10
– Ao sair com elas, poderíamos ter um relacionamento sério, a ponto de
possivelmente nos casarmos.
SH
11
Se nos casássemos com elas, poderíamos nos mudar para São Paulo, que
elas são desse lugar.
SH
12
– São Paulo não é uma boa cidade para se viver (suposição advinda da
conclusão CH
2
).
SH
13
– Não devemos nos envolver com essas mulheres.
CH
3
– Não devemos nos sentar com elas.
A expressão “bem capaz”, no sul do Brasil, é compreendida como “nem pensar”, e
provavelmente é entendida dessa forma pelas paulistas porque o input visual revelado pelo
gesto e pela expressão facial deles reforça esse significado. No entanto, o ato de rejeitarem o
convite contradiz as suposições iniciais das mulheres (em SM
3
), que provavelmente
esperavam que eles se sentassem com elas.
A seguir, já na parte 4, os rapazes procuram outras mulheres e, por causa da
experiência anterior, armazenada em sua memória enciclopédica, eles iniciam o enunciado
com o item lexical “mas”. Esse leva a uma implicatura convencional, disparando uma
inferência de que é importante, para eles, saber de antemão a origem delas, que é possível
inferir o desejo deles de não querem ficar longe da sua terra. Ao ouvirem a resposta, com
expressão e sotaque típicos do sul, os rapazes ficam satisfeitos e sentam-se com elas.
Desse diálogo podem-se extrair alguns elementos que demonstram como os seres
humanos buscam a relevância em suas relações. Lembrando que, segundo os autores da
Teoria da Relevância, todo ato comunicativo ostensivo sempre comunica uma presunção de
relevância (grifo da autora), pode-se perceber, nessa interação, que mesmo estando em um
ambiente informal, onde o lazer predomina, as pessoas prestam atenção somente ao que é
imediatamente relevante. Por isso, a primeira pergunta dos rapazes já é um estímulo ostensivo
121
para que as mulheres formulem um processo inferencial em que reconhecem o interesse deles
e os convidam para sentarem-se com elas. O fato de elas não responderem apenas “não” à
pergunta inicial deles poupa seus ouvintes do esforço de perguntarem de onde elas são, por
exemplo. Ademais, percebe-se que o restante do diálogo, mesmo sem grande conteúdo, é
pautado pela relevância, posto que os personagens disparam inferências a partir das poucas
informações dadas pelos seus interlocutores. Concorda-se com o construto teórico de Sperber
& Wilson (1995) nesse ponto, mas levanta-se a seguinte pergunta: o termo relevância” o
poderia ser substituído por “vínculo”? As pessoas procuram pela relevância em suas relações,
mas fundamentalmente, pode-se assumir que um dos princípios básicos da interação humana é
a tendência a se aproximarem e interagirem com outras pessoas. Essa idéia é melhor
explanada em Costa (2005b, p. 120), na formulação de sua Teoria da Conectividade Não-
Trivial, que segue basicamente o Princípio da Interatividade Comunicativa. Segundo esse
autor, uma direção cognitiva do cérebro/mente para a conexão comunicativa. Por isso,
admite-se que o fato de os seres humanos terem conversas informais, como era a intenção dos
rapazes no filme, é uma predisposição natural de compartilharem linguagem. Isso significa
dizer que, ao terem uma comunicação redundante, com poucos esforços de processamento
mental e baixos efeitos cognitivos, as pessoas desejam, em princípio, interagir umas com as
outras, sem a preocupação de obterem muitos benefícios. Nesse comercial, destaca-se a
preocupação dos rapazes na busca por uma troca comunicativa que provavelmente seria
redundante, se não fosse a informação, para eles relevante, de que elas são de um outro lugar.
A busca por benefício afetivo é evidente ao se notar que os rapazes logo repetem a mesma
ação com outras duas mulheres.
O que se pode salientar sobre a questão da tendência à aproximação que os seres
humanos naturalmente têm é que o tipo de benefício obtido, nesse exemplo de interação, não
é o da informação, embora as mulheres tenham comunicado as suas origens. Aqui, os rapazes
procuravam por uma espécie de vínculo, conseguindo, ao final, o benefício interativo. Nesse
caso, assim como nos filmes anteriormente analisados, mais de um tipo de benefício
procurado: além do informativo, há também o interativo e o afetivo. Pode-se concluir, a partir
dessas constatações, que é preciso uma reformulação mais exata da noção “comparativa” de
relevância, e dos tipos possíveis de benefício, que, se não limitações teóricas acerca
desse aspecto. Então, a noção de efeitos cognitivos acaba sendo muito ampla e vaga para a
arquitetura conceitual de uma só teoria.
Além dessas questões, concorda-se com Bach & Harnish (1987), ao afirmarem que
não como o falante medir os esforços de processamento do ouvinte, porque a relevância
122
pode ter graus bem diferentes para duas pessoas. O fato de as mulheres (‘A’ e ‘D’) serem de
São Paulo é relevante para os rapazes, os quais levantam uma série de suposições acerca da
cidade, imaginando-se vivendo no futuro. No entanto, quanto relevante a informação é para
cada pessoa é muito relativo. Por esse motivo, as mulheres não têm como ter certeza se o fato
de elas serem de outro lugar foi o que os fez se afastarem, muito embora possam acreditar
nisso por causa das reações que eles têm. Sperber & Wilson (1995) afirmam que relevância é
uma questão de grau, mas eles nada dizem sobre como esses graus são determinados. Os
autores apenas dizem que relevância leva em conta julgamentos comparativos, ou seja, algo
pode ser “irrelevante”, “fracamente relevante”, “relevante” ou “muito relevante” (p. 132).
Como efeitos e esforços mentais são propriedades o-representacionais, assim também é a
relevância, visto que ela é uma função de efeito e esforço. Por isso, pode-se especular que a
relevância possa ter um valor ‘X’ para cada indivíduo, mas o acesso a ele pelo seu interlocutor
não é possível. É fato, portanto, que ainda não como comprovar que as inferências são
utilizadas por cada pessoa, mas ainda assim a Teoria da Relevância pede por explicações mais
fundamentadas sobre essas questões.
Após essas divagações sobre a troca comunicativa entre os personagens numa
simulação da vida real, passa-se à investigação do provável processo inferencial por parte da
audiência.
4.2.4.3 Análise das inferências externas
O filme inicia com uma cerveja sendo servida em um copo com a marca “Polar”.
Esse input lingüístico, o som de abrir a garrafa e o líquido sendo jorrado no copo são os
primeiros estímulos ostensivos lançados pelo anunciante. De certa forma, o objetivo é criar no
público a vontade de beber a cerveja, posto que apela para os inputs perceptivos auditivos,
visuais e, também, para a memória gustativa do consumidor, provocando, já no início, uma
implicação contextual de que a propaganda é de uma marca de cerveja e que essa
provavelmente é saborosa. Como mencionado, a função de um comercial publicitário é
tornar atraente o produto para a compra e, para isso, apelos visuais e auditivos m papel
essencial por constituírem estímulos altamente ostensivos, resultando em novos conceitos que
a audiência constrói mentalmente.
123
O comercial ainda lança estímulos ostensivos através de outros inputs auditivos, já
que o sotaque dos personagens e as e
124
C
2
– “Polar”, que é considerada a melhor cerveja, é produzida nesse Estado.
Essa expressão identifica, portanto, a relação que o povo do Rio Grande do Sul tem
com este produto – por simbolizar tudo aquilo que também é feito nessa terra – e reúne toda a
tradição em uma cerveja feita por gaúchos para gaúchos.
Mais um estímulo ostensivo se pelo input visual quando o filme mostra o produto
e uma mão que arranca do rótulo a parte onde está escrito: “export”, disparando, por isso, um
novo cálculo inferencial:
S
5
– O item lexical “export” significa que um produto é destinado à exportação.
S
6
– A cerveja Polar é tipo “export”
S
7
– A cerveja Polar é produzida no Rio Grande do Sul para ser também exportada.
S
8
– O vocábulo “export” é arrancado do rótulo da cerveja Polar por uma mão.
S
9
– A mão é uma metonímia que simboliza o povo gaúcho.
S
10
Esse gesto provavelmente significa que os gaúchos o querem dividir esse
produto com outras pessoas que não pertençam ao Estado.
C
3
Apesar de ser uma cerveja tipo exportação, é um patrimônio do Rio Grande do
Sul que os gaúchos não deixam sair de lá.
Essa conclusão, mais as suposições levantadas no decorrer do comercial, ativam a
memória enciclopédica da audiência, que conhece o ufanismo do povo gaúcho por suas
origens e por aquilo que é feito na sua terra. Ao utilizar essa informação como apelo, o
anunciante provavelmente conseguirá atingir seu público-alvo porque aguça os sentimentos
patrióticos do consumidor, além de recorrer para a criatividade. Ademais, ao fazer uma
comparação entre duas culturas, sugerindo que a vida no Rio Grande do Sul é muito melhor
do que em São Paulo, o anunciante conquista esse consumidor que, como afirmado, em
geral tem orgulho do lugar onde nasceu. Essas inferências podem ser deduzidas a partir das
suposições SH
3
e SH
6
, mais a conclusão implicada C
1
para, dessa forma, gerar as suposições
que servem de argumento na conquista do consumidor:
S
11
– O comercial afirma que o Rio Grande do Sul não tem os mesmos problemas de
São Paulo: excesso de poluição, pessoas apressadas e ocupadas, estresse no
trânsito.
S
12
– A qualidade de vida no Rio Grande do Sul é superior.
S
13
Por ter qualidade de vida superior, o Estado também produz os melhores
produtos, visto que alguns deles são exportados para outros lugares.
125
S
14
– A cerveja Polar está entre esses produtos.
C
4
– O Rio Grande do Sul é, por esses motivos, o melhor lugar para viver.
A partir das prováveis conclusões implicadas geradas no ambiente cognitivo da
audiência, pode-se ressaltar que o objetivo do comercial de chamar a atenção para o produto é
alcançado, por fazer com que o público se reconheça através dos personagens principais. O
bairrismo bem-humorado é o mote da campanha publicitária desse produto, dado que os
anunciantes apelam para o que de mais relevante na memória coletiva do povo gaúcho: o
sentimento de amor por aquilo que é da própria terra. Ao deixar implícito que o Rio Grande
do Sul é um lugar melhor para viver, o anunciante apela para as emoções da audiência e o seu
orgulho pelo lugar em que vive. Esse pode ser comprovado não somente nessa propaganda,
mas pelas evidências que se podem extrair ao se observar, no cotidiano, o cultivo pelas
tradições, pela identidade cultural que as pessoas m e também pelo orgulho com que as
pessoas falam de suas origens. Por invocar esse sentimento e mostrar que o produto é
produzido somente para os gaúchos, os anunciantes ganham a simpatia do seu público-alvo, o
que é um ponto positivo na arte de persuadir.
4.2.5 Filme publicitário 5: “The perfect Gentleman”
47
O comercial da cerveja Heineken, lançado em 2003, é parte de uma série de
anúncios dessa marca que usam o slogan “It’s all about the beer”. Criado pela agência
publicitária Lowe, o filme se destaca por retratar uma cena aparentemente pouco retocada,
com produção mínima, de modo a parecer o mais real possível para que a audiência possa se
interessar e se reconhecer nela. Assim como os demais filmes analisados, esse foi escolhido
por também representar uma situação cotidiana comum, apesar do fato de a comunicação oral
ser inexistente: é a interação por meio de gestos que leva o público a uma compreensão
completa. Na história apresentada, um homem e uma mulher estão em uma festa informal e
disputam uma única cerveja Heineken restante na geladeira.
47
Disponível: http://www.youtube.com/watch?v=Dao_fHjuyzs. Último acesso: 12 de outubro de 2007.
126
4.2.5.1 Roteiro do filme publicitário
Essa propaganda da cerveja Heineken não tem diálogos. Mesmo assim, pode-se
considerar a interação entre os personagens como uma comunicação não-verbal, visto que eles
se relacionam pela linguagem corporal. O filme simula a ocorrência de uma festa informal.
Um homem e uma mulher chegam quase ao mesmo tempo à geladeira e tentam pegar a única
cerveja restante.
O homem consegue pegar a bebida primeiro.
127
A mulher lança olhares insinuantes, como se estivesse flertando com ele. Ela olha para a
cerveja e depois para ele.
O homem olha para a cerveja, para a mulher, expressa dúvida em seu rosto, o que leva a
mulher a mudar seu semblante.
Nesse momento, o homem vislumbra outro rapaz chegando com duas caixas de cerveja
Heineken.
128
Isso faz com que ele tome a decisão de entregar a cerveja à mulher, que parecia furiosa. Ele
sorri e, nesse momento, aparece a legenda: “The perfect gentleman”
48
.
A mulher sorri para ele e pega a cerveja. Por trás dela passa o rapaz com as caixas de cerveja.
A tela fica preta e aparece a inscrição: “It’s all about the beer”
49
. Ao final, foco no nome do
produto.
48
“O perfeito cavalheiro”.
49
“É tudo pela cerveja”.
129
4.2.5.2 Análise das inferências internas
Neste filme, apesar de haver uma interação não-verbalizada entre os personagens, é
possível compreender todos os sentidos que homem e mulher querem compartilhar. Eles
chegam quase no mesmo momento para pegar uma cerveja na geladeira, mas é o homem que
consegue alcançá-la primeiro. Como não conseguiu o que queria, a mulher lança olhares
insinuantes para ele, os quais o uma forma de estímulo ostensivo que levam o homem a
formular uma série de suposições através do seu mecanismo dedutivo, como
50
:
SH
1
– Peguei primeiro a cerveja.
SH
2
– A mulher também queria a cerveja.
SH
3
– A mulher está flertando comigo.
SH
4
– O motivo de ela estar lançando esses olhares só pode ser porque também quer
a cerveja.
CH
1
– A mulher quer que eu ceda a cerveja a ela.
A mulher, no mesmo instante, também elabora inferências acerca do ocorrido:
SM
1
– O homem pegou a cerveja primeiro.
SM
2
– Homens são cavalheiros.
SM
3
– Esse homem deve ser cavalheiro.
CM
1
– Esse homem cederá a cerveja para mim.
Além disso, é mutuamente manifesto no ambiente cognitivo desses personagens que
é culturalmente reprovável que um homem não preferência à mulher. Por isso, a mulher
espera que o homem a bebida a ela e ele, por sua vez, se sente obrigado a fazer isso,
mesmo que não queira.
No entanto, mesmo lançando estímulos ostensivos, as inferências da mulher (SM
1
a
SM
3
e a conclusão implicada CM
1
) não são corroboradas, e se contradizem quando ela
percebe a expressão de dúvida do homem, gerando assim novas inferências a respeito dele:
SM
4
– Há apenas uma cerveja restante.
50
As siglas SH e CH demonstram as prováveis inferências formuladas pelo homem; do mesmo modo, SM e CM
são utilizadas para as suposições e conclusões implicadas femininas.
130
SM
5
– Lancei olhares significativos com minha intenção de ter a cerveja.
SM
6
– O homem deve ter entendido a minha vontade.
SM
7
– Esse homem parece estar em dúvida quanto a me dar a cerveja ou ficar com
ela.
CM
2
– Esse homem não é nada cavalheiro.
Ao chegar a essa conclusão, a mulher se enfurece, o que se pode notar pela sua
expressão facial e o ato de cruzar os braços, ostensivamente indicando seus sentimentos de
contrariedade. A mudança de semblante é um indício de que, além de surpresa, a mulher fica
brava pela atitude do homem. Nesse mesmo instante, a partir das suposições SH
1
e SH
2
, além
da conclusão implicada CH
1
, o homem provavelmente questiona-se a respeito do assunto:
SH
5
– Há apenas uma cerveja restante na geladeira.
SH
6
– Se eu der essa cerveja para ela, ficarei sem.
Essa busca por suposições anteriores para complementar o processamento de
informações é explicada por Sperber & Wilson (1995) através do que eles chamam de
formação e extensão do contexto. Segundo os autores, a mente humana é capaz de elaborar
diversas suposições no decorrer da interação comunicativa, as quais fazem parte de seu
contexto mental, formado a partir da interação de informações já existentes na memória do
receptor da mensagem e daquelas advindas do ambiente externo. Isso constitui um processo
recursivo, em que suposições estocadas na memória são buscadas e utilizadas a partir de
processos inferenciais anteriores, podendo ser reaproveitadas infinitamente, o que é
demonstrado nessa interação.
Enquanto pondera entre dar a cerveja para mulher ou ficar com ela, o homem vê um
rapaz chegando com duas caixas dessa bebida. A suposição de que restava uma cerveja na
festa é enfraquecida, fazendo com que a suposição SH
6
seja suprimida pela decisão de dar a
cerveja para a mulher, que ele não ficamais sem a bebida. Assim, o homem estende a
cerveja para ela, que muda seu semblante e sorri para ele. Nesse instante, a conclusão
implicada anterior (CM
2
) é contradita, criando no ambiente cognitivo da mulher um novo
conjunto de suposições e, conseqüentemente, uma nova conclusão implicada. Isso leva a uma
mudança de opinião a respeito dele:
SM
8
– O homem parecia não ser cavalheiro (suposição recuperada de CM
2
).
SM
9
– Ele me estende a única cerveja restante.
SM
10
O homem parece seguir as regras sociais nas as quais as mulheres têm a
preferência.
131
CM
3
– Esse homem é, na verdade, um cavalheiro.
Nesse momento, a suposição de que o homem o cederia a cerveja havia sido
acessada por ela. No entanto, ocorre uma contradição de suposições. Quando pega a bebida, a
mulher surpreende-se pelo gesto de generosidade do homem e, encantada, devolve um sorriso
sedutor para ele. O homem, não querendo perder a bebida, mas ao mesmo tempo não
desejando também desperdiçar uma possível chance com a mulher, consegue seus dois
objetivos naquele momento, sem que a mulher perceba que ele não perde nada ao fazer uma
concessão a ela. Por esse motivo, ele se faz passar por cavalheiro, ganhando pontos no jogo da
sedução, dado que a informação de que mais cerveja acaba de chegar à festa o é
mutuamente manifesta.
É bastante claro que, nesse filme, os indivíduos são guiados por seus desejos
pessoais, ou seja, de obter determinada bebida. Tal propósito representa um exemplo de uma
das propriedades mais básicas da natureza humana: a busca por aquilo que é mais relevante
em dado momento. Nesse sentido, conforme aponta a teoria Sperber & Wilson (1995), lançam
estímulos ostensivos que são facilmente compreendidos pelo outro através de sinais corporais
e olhares significativos, os quais são claramente uma forma de interação comunicativa. Pode-
se dizer, por isso, que a comunicação expressa pelos trejeitos dos personagens constitui as
representações internas das suas intenções. Pode-se corroborar, por isso, a noção custo-
benefício em comunicação descrita pela Teoria da Relevância: os interlocutores lançam o
estímulo mais relevante possível para que o outro seja capaz de compreendê-lo sem despender
esforços injustificáveis. Assim, mesmo sem falas, homem e mulher não fazem grandes
esforços para entender aquilo que o outro transmite; os efeitos cognitivos, nessa relação, são
positivos: ambos conseguem obtê-los com muita facilidade, alcançando assim a relevância
ótima.
Cabe, neste momento, retomar alguns dos questionamentos feitos a respeito desse
ponto na Teoria da Relevância. Bach & Harnish (1987) apontam que Sperber & Wilson
tratam a questão do esforço de processamento mental como se a relevância fosse uma relação
mensurável. No entanto, os autores não mostram como isso ocorre, além de não haver
possibilidade de medir o grau de relevância, uma noção abstrata. Por esse motivo, não é
possível provar, ainda, como se dá esse processo. De acordo com Sperber & Wilson, o
Princípio de Relevância se aplica a todo ato de comunicação ostensiva, mas a definição de
relevância deveria possibilitar comparações. Questiona-se, por isso, como o esforço de
processamento necessário às comparações é medido. Além disso, a antecipação dos custos de
132
processamento do ouvinte pelo falante não é ainda clara. Não se pode dizer como se prevêem
os custos mínimos de processamento do ouvinte pelo falante, e essa questão é ainda ignorada
pelos autores de Relevance.
Nesse filme, é possível perceber que, intuitivamente, homem e mulher lançam
estímulos de forma a se fazerem entender da maneira menos custosa possível para o outro,
mesmo não podendo comprovar que seu interlocutor está mesmo tendo um efeito cognitivo
positivo. A mulher lança estímulos visuais para o homem, mas ela não tem como ter certeza
se ele compreendeu suas intenções. Ela espera que ele possua em seu ambiente cognitivo a
noção cultural de cavalheirismo e, por isso, lança um input visual de maneira que ele receba a
mensagem com facilidade.
Sendo uma relação comparativa de esforço e efeito, segundo os próprios autores da
teoria, supor-se-ia que os indivíduos poderiam acessar essa relação no outro, o que é
impossível. Por isso a mulher apenas pode acreditar estar sendo cooperativa com o outro
quando lança olhares e faz alguns gestos no intuito de que o homem consiga captar as suas
intenções. Mesmo a escala comparativa heurística prevista por Sperber & Wilson (1995, p.
132) – com os graus ‘irrelevante’ a ‘muito relevante’– é obscura, no sentido de o falante poder
acreditar que algo é muito relevante para alguém quando, na verdade, não é. Portanto, essa
escala é bastante relativa: não há como se precisar os valores exatos de tal interação. Pensa-se
que os interlocutores de um ato comunicativo apenas podem fazer pré-julgamentos sobre as
informações que eles acreditam serem importantes para o outro, podendo (ou não) corroborar
essas suposições após o lançamento do estímulo ostensivo.
De acordo com Sperber & Wilson (1995), essa teoria envolve a noção de esforço de
duas formas: (1) performances mentais envolvem algum esforço; e (2) quanto maior for o
esforço requerido, menor sea probabilidade de que sejam levadas a termo com sucesso. No
entanto, os mesmos autores afirmam que não existe uma forma de medir o esforço de
processamento, embora acreditem que formas comparativas sejam suficientes.
Retomando as observações feitas por Levinson (1987), que também questiona como
a relevância pode ser testada empiricamente, esse autor também mostra que ainda não
como determinar uma medida para a relevância. Para ele, se há uma medida fixa para
relevância são necessários contextos para que tal valor seja alcançado. Além disso, se a
Relevância é uma medida comparativa, em que os custos de processamento devem ter um
valor mínimo, então qualquer medida ínfima alcançada nos efeitos cognitivos será aceita para
que determinada informação seja relevante.
133
Corrobora-se a idéia de insuficiência explanatória por se acreditar que ainda o se
pode comprovar empiricamente a dicotomia custo-benefício em comunicação. Mesmo
necessitando de estudos mais abrangentes que consigam provar a existência de tal relação,
essa é a mais plausível aceita hoje. Portanto, não descartando a hipótese de se examinar
futuramente esse ponto da teoria, ainda assim esses conceitos são aceitos aqui para fins de
análise e como uma tentativa de explicar por que as pessoas prestam atenção às informações
mais relevantes e como são os esforços para chegar aos efeitos cognitivos requeridos no
intuito de se chegar a ela.
4.2.5.3 Análise das inferências externas
Nesse comercial o produto tem um papel central, posto que o evento se desenrola
por causa dele. Pode-se perceber que o foco no produto como essencialmente relevante na
vida dessas pessoas é uma forma de chamar a atenção para o comercial. Assim, numa situação
informal como a que se apresenta, percebe-se que a disputa silenciosa pela cerveja Heineken
134
uma vez que o leitor, em seu processo interpretativo, é quem deve completar as lacunas
criadas, permitindo que sejam negados significados subentendidos que eventualmente se
tornem inconvenientes. Nesse caso, uma das idéias implícitas que pode ser resgatada no filme
é a de que os homens sempre devem ser gentis com as mulheres, dando a prioridade a elas e,
portanto, há uma consciência não manifestamente declarada de que se vive em uma sociedade
machista. Essa noção vem da representação largamente propagada de que as mulheres, em
geral, são consideradas o sexo frágil e, por isso, devem ter a preferência em tudo. Por isso, no
jogo da conquista, os homens atentam para esse fator e normalmente agem no sentido de dar a
preferência à mulher a fim de atraí-la.
No entanto, no filme isso o ocorre conforme o esperado, como se pode perceber
pela expressão da mulher. Ela parecia pensar que, naturalmente, o homem cederia a bebida,
assim como a audiência também prevê esse gesto. A expressão de dúvida do rapaz é um
estímulo ostensivo para a audiência, assim como o é para a mulher no filme, visto que ele
mais valor à cerveja do que a um provável flerte com a jovem a sua frente. Essa suposição se
torna fortemente manifesta quando, ao ver mais caixas de cerveja chegando à festa, ele
prontamente decide dar a bebida à mulher, que não sabe desse fato. Nesse momento, a
legenda “the perfect gentleman” aparece como uma ironia para o ato do homem, já que ele
entrega a cerveja porque reconhece que conseguirá mais. Conforme Wilson & Sperber (1992)
ironia é essencialmente uma figura de linguagem que comunica o oposto do que foi dito
literalmente. Assim, não se trata de uma conduta amável, como pensa a mulher, mas da idéia
de que, não perdendo nada, ele pode abrir mão daquela bebida.
Mais uma vez cabe ressaltar o papel significativo da cerveja Heineken como
personagem principal, que ela faz com que homem e mulher atuem a fim de obtê-la. Ao
final do comercial, o enunciado “It’s all about the beer” reforça essa idéia, e a noção
transmitida é de que tudo o que se faz, pelo menos nesse momento, é por essa bebida. Esse
estímulo visual faz com que a audiência compreenda que não importa, portanto, o que a
mulher pensa do homem, ou o quanto as relações sociais entre eles corram riscos por causa da
indecisão do homem. Ao demonstrar uma situação como essa, o anunciante quer tornar o
valor da cerveja Heineken superior para o consumidor. Além disso, esse é ampliado ainda
mais se uma audiência mais atenta perceber que a trilha sonora do comercial é combinada
com a situação. Apesar de ter sido escrita para outros fins, a letra de “Give it to me”, de J.
Geils Band, é muito bem encaixada nesse comercial, que, em conjunto com a cena, auxilia
a retratar as intenções dos personagens: “You've got to give it to me / You're so slick now,
know every trick now / You know I want it, I want it so bad / You know I need it, I can't
135
believe it / So come on baby, please relieve it / You've got to give it to me”
51
. Como se pode
perceber, a letra da música é mais um estímulo ostensivo a favor da compreensão das
intenções do anunciante: por expressar uma necessidade urgente de ter a bebida, retoma-se a
idéia de que a cerveja Heineken é protagonista do comercial. Portanto, a ação dos
personagens e a inserção da música reforçam a noção de que eles têm um interesse comum e
se esforçam para consegui-lo. A partir desses aspectos, a audiência pode reforçar as
suposições de que o comercial se constrói em torno do produto, o qual é por isso
supervalorizado. Nesse sentido, é l édave m 4( )250]TJ-()-2.807c2( )]TJ309(i)1.40381(z)-2.80762(nt)-9.23do9(e)-2.80762(s)-4.61789(s)-4.617-()-2.807d.44 0 T56 Tdrs p(e)-2.80762( )-47.87ç(a)-2.80762( )-47.8723()-2.807publ( )-37.23i( )-37.2321(om)-9.23i( )-37.23t( )-37.23á1(r)3.21019( )-367.0i(a)-2.8102(- )250]TJ-290.64 - T56 Tdd[(s)-4.6172(- )25066(6(e)-2.808i(e)-2.8083(c)-13.4449(a)-2.80892( )-398.9m( )-69.1489( )-367.0(e)-2.80892(g)10.638u( )-47.8723( )-186.1ob(c)-13.4449(a)-2.80892(t)1.40381(r)3.212749(do)10.633(o )-260.638( )-186.1p9(i)1.40381(z)-2.8081(e)-13.4472(i)1.40381(( )-367.0)-47.8723((,)-5.31915 )-186.17(é))-367.04472 e onsa nt ên mo ar bii
136
modelo ostensivo-inferencial na explicação de como ocorre o processamento mental da
informação. No entanto, por se utilizarem comerciais de televisão com o intento de expor os
aspectos principais dessa teoria, assumiu-se que também seria necessário demonstrar a forma
como os implícitos da linguagem publicitária são capazes de afetar o público-alvo a ponto de
persuadi-lo. Propôs-se, por isso, uma demarcação entre inferências internas e externas, em
que as primeiras tratam da interação entre os personagens e as segundas, da compreensão do
significado da mensagem de um comercial por parte da sua audiência.
Ao se definir um duplo olhar no exame da construção de inferências, traçou-se uma
linha imaginária entre os dois processos. Contudo, eles estão interligados, visto que a
compreensão daquilo que os indivíduos do filme entendem torna possível captar as intenções
implícitas do criador de uma propaganda. Por isso, a análise das inferências internas acaba
contribuindo para entender a formulação das inferências externas.
Além disso, nas seções em que se examinaram as inferências internas ao comercial,
pensou-se ser oportuno inserir alguns questionamentos relacionados à relação esforço de
processamento e efeitos cognitivos em comunicação, por esse ser um ponto crucial para a
teoria de Sperber & Wilson (1986; 1995). Nesse caso, pretendeu-se, através das análises das
prováveis inferências formuladas pelos personagens, ilustrar um pouco das críticas através
daquelas situações comunicativas no intuito de chamar a atenção para esse “ponto fraco”
teórico. Cabe ressaltar que o havia a intenção de apresentar uma solução para tais
problemas, mas mostrar que ainda muito a ser trabalhado nessa teoria, mesmo que para
isso ela conte com contribuições de outros estudiosos, como Costa (2005b) e a sua Teoria da
Conectividade Não-Trivial.
Por fim, tendo-se abarcado e aplicado os conceitos da Teoria da Relevância nas
análises a fim de elucidar a sua consistência e plausibilidade, acredita-se ter alcançado os
objetivos propostos para este capítulo. Demonstrando-se os processos inferenciais internos e
externos a um comercial, foi possível salientar a existência de dois sub-processos
concomitantes. Se por um lado pretendia-se esclarecer os processos interpretativos na
comunicação cotidiana, por outro se tentava utilizar essas mesmas noções ao exemplificar
uma das características mais marcantes da linguagem publicitária: a existência dos implícitos.
Portanto, entender o que está além das palavras é um ato inerente à capacidade de raciocínio
humana, que, na busca pela informação mais relevante, tenta reconstituir as peças do
significado do seu interlocutor através dos vestígios deixados por ele no decorrer da
comunicação, num processo rico, criativo e recursivo.
137
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente trabalho teve como objetivo principal analisar a construção de inferências
em linguagem natural através de cinco peças publicitárias audiovisuais. Como mencionado, o
corpus foi selecionado devido às suas características de representação de interação
comunicativa na vida real, sem que se levasse em conta aspectos como nacionalidade, tipo de
produto ou até mesmo o tipo de interação. Para alcançar o propósito planejado, foi necessário,
antes de tudo, elaborar um suporte teórico que constituísse as bases para o exame dos filmes
escolhidos.
Reuniram-se, no capítulo dois, alguns fundamentos da teoria publicitária,
considerando-se as características da linguagem utilizada por essa área, a fim de demonstrar
de que forma uma propaganda é construída com o intuito de conseguir persuadir seu público-
alvo. Apesar de conceitos básicos da comunicação publicitária terem sido abordados para
expor as estratégias utilizadas pelos criadores de anúncios na arte de seduzir o público, um
recorte foi feito para destacar apenas aquilo que concerne à propaganda televisiva, foco deste
estudo. Assim, no intento primeiro de utilizar o corpus como exemplos-tipo de situações
cotidianas para verificar de que forma a comunicação ocorre, percebeu-se que seria possível
também aplicá-lo aos pressupostos da publicidade a fim de evidenciar a maneira como a
audiência consegue interpretar os implícitos de um comercial. Por isso, essas questões foram
abordadas no decorrer do terceiro e aplicadas no quarto capítulo, nos quais também se
discorreu sobre o fenômeno da comunicação em linguagem natural. Como mencionado, para
trabalhar com essas noções, seria necessária uma base teórica consistente e detalhada sobre a
natureza da interação humana.
No terceiro capítulo houve a preocupação de destacar alguns pressupostos da
filosofia da linguagem para discorrer sobre a interface semântica / pragmática, visto essas
áreas tratarem de aspectos do dito e do implicado e, conseqüentemente, da construção inata de
inferências pelos indivíduos. Como a primeira intradisciplina trata do significado no seu
aspecto mais sico e formal, coube considerar a segunda como uma alternativa para os
significados mais maleáveis em comunicação, somente explicados se observados fatores
como contexto, variações culturais de significado, significado do falante, significado do
ouvinte, entre outros. Tendo um caráter ao mesmo tempo formal e social, atentou-se para o
fato de que ambas as intradisciplinas são mutuamente necessárias para se entender a
construção do significado e, com isso, explorar a formação de inferências. A partir disso,
138
acrescentaram-se informações a respeito do caminho percorrido pelos estudiosos para
entenderem como ocorre o significado em linguagem natural. Isso se fez necessário para que
o leitor pudesse perceber por que essa questão tem tantas discussões e é compreendido, neste
trabalho, tal como o desenvolvido por Grice e seus sucessores.
A Teoria das Implicaturas de Grice (1975) inaugurou um período de novas reflexões
sobre os estudos a respeito do significado em comunicação. Para esse autor, uma lacuna
entre aquilo que é proferido em palavras e o que é realmente enunciado pelo falante. Tal
espaço seria preenchido por inferências através da derivação dedutiva, em que os
interlocutores levariam em conta o Princípio de Cooperação e as máximas conversacionais.
Esse estudo explica por que os indivíduos não interpretam os enunciados literalmente, sendo
possível compreender os implícitos além da mensagem.
Ainda nesse capítulo, demonstrou-se de que forma Sperber & Wilson (1986; 1995),
com base na solução oferecida por Grice para entender o processamento mental de
informações por inferências, desenvolvem a Teoria da Relevância. Esse construto surge como
uma proposta inovadora para a descrição e explanação das possibilidades em comunicação.
Utilizando a máxima griceana de relevância como um dos pontos de partida para elaborar os
fundamentos dessa teoria, os autores reelaboram esse preceito de maneira a evidenciar que a
relevância comanda as operações da mente durante o ato comunicativo, conferindo-lhe um
valor central e necessário. Desse ponto, esse conceito é visto como um processo ostensivo-
inferencial, no qual os interlocutores lançam os estímulos mais instigantes possíveis a fim de
provocar em seu ouvinte um processamento inferencial mental sobre a sua mensagem.
Resumidamente, pode-se dizer que a Teoria da Relevância busca explicar como ocorre a
compreensão na comunicação cotidiana e de que forma os processos inferenciais nela
envolvidos se constituem. Os conceitos abordados por essa teoria, entre eles o de contexto
cognitivo, ambiente cognitivo (mútuo), esforço de processamento, efeito cognitivo,
mecanismo dedutivo e manifestabilidade mútua, são capazes de prover um esclarecimento
sobre a constituição dos implícitos presentes nas trocas comunicativas humanas. Por esse
motivo, acredita-se este ser um modelo consistente e coerente de explicitação da ocorrência
de significados em comunicação cotidiana. Ao proporem uma nova abordagem para explicar a
compreensão em comunicação, Sperber & Wilson estabelecem que o significado é construído
através de mecanismos dedutivos subjacentes à natureza humana, demonstrando que esse
processo pode ou não ter sucesso no momento da interação.
Ao final desse mesmo capítulo, salientaram-se algumas questões problemáticas
levantadas sobre a relação esforço de processamento e efeitos cognitivos, prevista pela Teoria
139
da Relevância. De acordo com os pressupostos dessa teoria, com o mínimo de esforço de
processamento, pretende-se que se obtenha o máximo de efeitos cognitivos para que uma
informação seja relevante. Apesar de existirem críticas sobre outros aspectos conceituais, a
importância dada pelos autores a essa dicotomia fez com que a atenção neste ponto do
trabalho se concentrasse exclusivamente nela. A pouca sustentabilidade na descrição desse
aspecto fez com que muitos teóricos apontassem falhas explanatórias. A maioria dos autores
revisitados questiona de que maneira o esforço de processamento pelo ouvinte é medido pelo
falante com o propósito de enviar-lhe um estímulo que custe pouco processamento mental.
Esse ato é previsto pela teoria de Sperber & Wilson, mas é um aspecto teórico que eles ainda
não conseguem explicar, comentando somente que todo ato de comunicação ostensiva sempre
carrega uma noção de relevância ótima. Nesse sentido, o falante lançaria a ostensão prevendo
que sua mensagem teria um custo mínimo para seu ouvinte. Por ser um processo abstrato, não
se pode medir essa ocorrência, elevando-se essa noção a um nível hipotético. Os autores que
criticam esse fator na teoria concordam que é necessária uma descrição mais formal. No
entanto, até o momento, essa conjectura é a mais aceita nos estudos do processamento mental
em comunicação, não se podendo comprová-la nem refutá-la. O falante não tem como
antecipar o esforço de compreensão de seu interlocutor, mas apenas imaginar estar
contribuindo para seu entendimento. Por isso, Sperber & Wilson apostam numa medida
comparativa, em que se utilizaria uma escala heurística: algo pode ser ‘irrelevante’ ou ‘muito
relevante’, mas sem nenhum valor específico estipulado.
É válido salientar que cada indivíduo contribui com as informações estocadas em seu
ambiente cognitivo no momento da comunicação no intuito de acrescentar, contradizer ou
modificar as suas suposições e a do outro, a fim de formar contextos novos. Pensando nisso,
pode-se dizer que o falante não tem como ter certeza da compreensão do seu ouvinte, mas
uma estimativa aproximada dela. A comunicação é, então, um processo em movimento, em
que a cooperação dos interlocutores determina a interpretação mais adequada para dada
mensagem. Por esse motivo, a insuficiência explanatória da relação custo-benefício em
comunicação não traz um problema drástico para essa teoria, posto que ela tenta dar a melhor
explicação possível sobre uma especulação a respeito da atividade da mente no momento da
interação. Sendo uma questão ainda abstrata e sem comprovação científica, uma alternativa de
pesquisa seria a análise empírica do funcionamento das funções cerebrais no momento da
conversação. Por não ser esse o intento desse trabalho, procurou-se apenas expor essas críticas
a fim de provocar uma reflexão sobre o assunto, buscando-se demonstrá-las através das
análises realizadas no capítulo quatro.
140
Dessa seção em que se citam as questões ditas problemáticas da Teoria da
Relevância, ainda os apontamentos de Costa (2005b), mostrando que muitas situações
cotidianas fogem às normas da relação custo-benefício conforme estipuladas por Sperber &
Wilson, já que existem alguns momentos nos quais os indivíduos não são guiados pela
relevância, mas por aquilo que custará o menor esforço possível, gerando também um efeito
cognitivo mínimo. Por esse motivo, as informações advindas desse contexto se tornariam
irrelevantes, visto que, ao balancear um esforço muito pequeno com um efeito cognitivo de
valor equivalente, determinado fato não terá pertinência. Essa noção adversa aos fundamentos
da relação custo-benefício ainda deveria ser melhor explorada, merecendo atenção em futuras
pesquisas. Contudo, a função deste trabalho foi apenas a de apontar tais lacunas descritivo-
explanatórias, ilustrando-as nas análises dos filmes publicitários.
No último capítulo procurou-se abarcar o referencial teórico exposto até então. Para
tanto, os questionamentos levantados ao final do primeiro capítulo foram resgatados para
enfim poderem ser respondidos através de um suporte mais rico. Assim, retomaram-se
aspectos da linguagem publicitária, relacionando-a, nesse momento, à arquitetura conceitual
da Relevância. Os implícitos em publicidade passaram a ser novamente o foco do trabalho, a
fim de explicar como ocorre a construção da significação de uma propaganda pela audiência.
Pelo fato de as propagandas audiovisuais selecionadas conterem simulações de
interações comunicativas, acredita-se que seriam um corpus ideal para a confirmação de tais
aspectos. Na escolha desses filmes, atentou-se se esses continham uma história completa,
independente dos aspectos persuasivos relativos à área da publicidade. Assim, antes de se
aplicar os fundamentos da Teoria da Relevância à comunicação publicitária, pensou-se em
utilizar as cinco propagandas selecionadas na demonstração de como o mecanismo dedutivo
humano é capaz de derivar diferentes conclusões através dos implícitos na interação humana.
Por se propor, então, uma análise da construção de inferências na comunicação
cotidiana e também dos implícitos da linguagem publicitária, estipulou-se uma forma de
delimitar os dois casos, desdobrando-se as inferências surgidas nesse processo. Essa divisão
se fez necessária porque se considerou que, apesar de serem processos semelhantes, em que se
parte dos mesmos princípios básicos, a formação de inferências em uma situação
comunicativa, como falante-ouvinte, e a interpretação de comerciais, como audiência, são
processadas distintamente. Portanto, passou-se a denominar inferências internas aquelas que
fazem parte da situação apresentada no comercial, como uma representação do que ocorre no
dia-a-dia. para a relação comercial-audiência, as prováveis interpretações dos implícitos de
cada filme publicitário foram consideradas. A partir disso, passou-se ao exame das inferências
141
externas ao comercial, ou seja, aquelas que englobam a interação comunicativa e também os
fatores persuasivos do filme, como reação dos personagens, legendas, slogan, entre outros.
Como se pôde evidenciar em alguns filmes, nos quais o acontecimento pode ser
considerado de pouca pertinência, os valores do esforço e do efeito são mínimos, resultando
muitas vezes em irrelevância de informações. Em alguns momentos, como ocorreu no
primeiro filme (“Wassup”), por exemplo, o tipo de benefício gerado não era de caráter
informativo, mas afetivo, por exemplo. Nessa direção, abordou-se brevemente a Teoria da
Conectividade Não-Trivial (Costa, 2005b), cujas bases se posicionam na tendência natural dos
seres humanos de se relacionarem. Isso quer dizer, em termos mais simples, que, muito antes
de procurar pela relevância, como preconizam Sperber & Wilson, os indivíduos buscam uma
ligação com seus semelhantes.
Atentando para essa noção, percebeu-se, durante as análises, que o primeiro filme
registrava o ato de conversar ao telefone enquanto se assiste à televisão e repetir as mesmas
expressões apenas pela questão afetiva. Nesse caso, pôde-se perceber que os indivíduos não
estavam sendo guiados pela busca da relevância, mas apenas procuravam por afetividade. Do
mesmo modo, o comercial do xampu Sedal também ilustrava uma situação em que se
explorava a tendência à ligação que os seres humanos possuem: dois ex-namorados se
aproximavam e teriam uma conversa sem muito conteúdo, com o propósito único de
beneficiarem-se de alguma forma da presença do outro. Estava em jogo, naquele momento, o
quanto prazeroso era para a mulher demonstrar para o rapaz que ela estava muito bem sem
ele, enquanto o rapaz queria apenas reaproximar-se dela. O terceiro filme, das sandálias
Havaianas, possui também um diálogo de pouco valor informativo, salientando apenas o
benefício afetivo da aproximação entre aqueles personagens. Com isso, além de se explorar os
fundamentos da Teoria da Relevância, foi possível também expor uma maneira de se
solucionar a explicação das irrelevâncias do cotidiano. Mesmo assim, para não perder o
enfoque, apenas julgou-se importante mencionar essa questão devido à sua natureza
explicativa das interações humanas. Ademais, por propor uma nova perspectiva para ilustrar o
fenômeno da comunicação, assume-se que uma discussão detalhada dessa teoria e suas
implicações para o estudo da comunicação humana é inevitável; no entanto, isso requereria
um trabalho muito mais amplo.
Com o propósito de avaliar a consistência teórica da Teoria da Relevância e
examinar se a descrição e explanação propostas são adequadas para tornarem claros os
processos de interpretação, sobretudo a formação de inferências, este trabalho contribui ao
propor uma nova forma de avaliar a questão dos implícitos em linguagem natural. Por serem
142
processos de significação distintos, mas que partem basicamente dos mesmos princípios,
apresentou-se uma análise em que os tipos de inferências geradas foram separadas. Mesmo
assim, foi inevitável o auxílio da análise das inferências internas na explicitação do
significado que o anunciante queria lançar no momento da avaliação das inferências externas.
Por isso, assim como se verificou no filme 4, da cerveja Polar, foi necessário investigar as
inferências internas dos personagens para se compreender como seria a provável interpretação
do público-alvo desse comercial. no último filme, um elemento relevante para quem o
assiste é a sua ausência de diálogos: a linguagem não-verbal é um estímulo ostensivo tanto no
jogo da sedução entre os personagens daquele filme como para a audiência, a qual consegue
ter consciência dos implícitos de ambos os personagens para então poder interpretar as
intenções comunicativas do próprio anunciante.
Ao final deste texto, pode-se afirmar que se colaborou para as investigações sobre o
escopo da Teoria da Relevância ao se investigar uma distinção na análise do processo
inferencial, além de propor uma aplicação para essa arquitetura conceitual. Considerando a
importância desse tipo de pesquisa, espera-se ainda continuar explorando as noções da Teoria
da Relevância em trabalhos futuros, bem como aprofundar os estudos a respeito dos
questionamentos e críticas à relação esforço de processamento e efeitos cognitivos gerados
numa interação comunicativa. Neste trabalho, um dos objetivos foi salientar essas críticas e
análises dentro de uma interação simulada, a fim de permitir reflexões sobre a relação custo-
benefício em comunicação. Além disso, a Teoria da Conectividade Não-Trivial, somente
mencionada em poucas palavras, merece uma atenção maior do que a que foi dada neste texto.
Ela é uma alternativa para alguns problemas apresentados pela Teoria da Relevância e, por
isso, pensa-se em desenvolver análises e aplicações sobre esse assunto futuramente.
Por fim, mesmo não aprofundando as críticas a essa teoria, acredita-se que este
estudo, além de colaborar para uma avaliação mais específica das inferências geradas tanto no
meio publicitário quanto nas trocas comunicativas cotidianas, contribui para elucidar os
pressupostos da Teoria da Relevância. Nesse sentido, foi possível expor a validade desse
construto através das análises das inferências internas e externas via discurso publicitário,
propondo uma possível explicação para a compreensão dos implícitos em linguagem natural.
143
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150
Aline Aver Vanin
Curriculum Vitae
Abril/2008
151
Aline Aver Vanin
Curriculum Vitae
_________________________________________________________________________________
Dados Pessoais
Nome Aline Aver Vanin
Filiação José Juarez Vanin e Cleonice Aver Vanin
Nascimento 15/04/1982 - Planalto/RS - Brasil
_________________________________________________________________________________
Formação Acadêmica/Titulação
2008 Doutorado em Lingüística e Letras.
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, PUC RS, Porto Alegre,
Brasil
Título: Palavras de emoção: o papel da relevância na definição do significado
lexical
Orientador: Jorge Campos da Costa
Palavras-chave: Cognição, Comunicação, Inferências, Linguagem, Linguagem Natural, Pragmática
2006 - 2008 Mestrado em Lingüística e Letras.
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, PUC RS, Porto Alegre,
Brasil
Título: A relevância em comunicação: a construção de inferências internas e
externas a filmes publicitários, Ano de obtenção: 2008
Orientador: Jorge Campos da Costa
Bolsista do(a): Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior
Palavras-chave: Cognição, Pragmática, Semântica, Comunicação, Inferências, Publicidade
Áreas do conhecimento : Lingüística,Letras
2005 - 2006 Especialização em Estudos Avançados da Língua Inglesa.
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, PUC RS, Porto Alegre,
Brasil
Título: Developing Pragmatic Awareness in EFL: greetings in opening and closing
conversations
Orientador: Dr. Cristina Becker Lopes Perna
2000 - 2004 Graduação em Licenciatura Plena em Letras.
Universidade de Caxias do Sul, UCS, Caxias Do Sul, Brasil
_________________________________________________________________________________
Formação complementar
2001 - 2001 Curso de curta duração em Gramática Normativa versus Português Brasileiro.
Universidade de Caxias do Sul, UCS, Caxias Do Sul, Brasil
Palavras-chave: Normatividade, Língua em uso, Semântica, Gramática
2002 - 2002 Extensão universitária em Passeios pela Literatura Italiana.
Universidade de Caxias do Sul, UCS, Caxias Do Sul, Brasil
Palavras-chave: Língua Italiana, Cultura, Literatura Italiana
2003 - 2003 Curso de curta duração em Curso de Atualização para Professores de Inglês.
Speakeasy Escola de idiomas, SPEAKEASY, Brasil
Palavras-chave: Learning, Interaction, Estratégias, Teaching
2003 - 2003 Extensão universitária em English Pronunciation.
Universidade de Caxias do Sul, UCS, Caxias Do Sul, Brasil
-7.9576(E)-12.3.455508(c)-88923(88v)-8.122.3.4555(o)-7.957
152
2006 - 2006 Curso de curta duração em Português Histórico.
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, PUC RS, Porto Alegre,
Brasil
2006 - 2006 Curso de curta duração em Curso de Introdução ao Programa Minimalista.
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, PUC RS, Porto Alegre,
Brasil
2006 - 2006 Curso de curta duração em Fonética Articulatória.
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, PUC RS, Porto Alegre,
Brasil
_________________________________________________________________________________
Atuação profissional
1. Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul - PUC RS
_______________________________________________________________________
Vínculo institucional
2006 - 2008 Vínculo: Pesquisa e desenvolvimento , Enquadramento funcional:
Bolsista , Carga horária: 20, Regime: Dedicação Exclusiva
_______________________________________________________________________
Atividades
03/2006 - Atual Projetos de pesquisa, Conselho Universitário, Programa de Pós-
Graduação em Letras
Participação em projetos:
LINCOG
03/2006 - Atual Pesquisa e Desenvolvimento, Conselho Universitário, Programa de
Pós-Graduação em Letras
Linhas de Pesquisa:
Lógica e Linguagem Natural
2. Speakeasy Escola de idiomas - SPEAKEASY
_______________________________________________________________________
Vínculo institucional
2002 - 2006 Vínculo: Colaborador , Enquadramento funcional: Professor titular ,
Carga horária: 20, Regime: Parcial
_______________________________________________________________________
Atividades
08/2002 - 02/2006 Aperfeiçoamento
Especificação:
Inglês I,II, III e IV
3. Colégio Mutirão Objetivo Assemarcos
_______________________________________________________________________
Vínculo institucional
2002 - 2006 Vínculo: Colaborador , Enquadramento funcional: Professor titular ,
Carga horária: 11, Regime: Parcial
153
_______________________________________________________________________
Atividades
04/2002 - 02/2006 Ensino fundamental
Especificação:
Língua Inglesa , Língua Portuguesa
03/2005 - 02/2006 Ensino médio
Especificação:
Língua Inglesa
3. IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
_______________________________________________________________________
Vínculo institucional
2000 - 2000 Vínculo: Colaborador , Enquadramento funcional: Colaboradora as
pesquisas do Censo 2000 , Carga horária: 20, Regime: Parcial
_______________________________________________________________________
Atividades
Pesquisa e Desenvolvimento, IBGE
Linhas de Pesquisa:
Pesquisa e desenvolvimento
Outras informações relevantes
1 Avaliadora das Redações do Concurso Vestibular 2008 da Universidade Federal do Rio Grande do
Sul;
2 Revisora de monografias, dissertações e textos acadêmicos em geral.
3 Professora particular de Língua Portuguesa e Inglesa.
_________________________________________________________________________________
Linhas de pesquisa
1. Lógica e Linguagem Natural
Objetivos:Descrição: Lógica e linguagem natural: linguagens formais e linguagens
naturais, forma lógica e forma gramatical, conetivos, quantificadores - contrapartes
lógicos, simbolização. Lógica proposicional: sintaxe da linguagem L, dedução
natural. Lógica de predicados.
Palavras-chave: Semântica, Linguagem Natural, Lógica
Áreas do conhecimento : Lingüística,Filosofia da Linguagem,Lingüística Aplicada
_________________________________________________________________________________
Projetos
2006 - Atual LINCOG
Descrição: Este projeto de pesquisa tem por objetivo analisar filmes de natureza diversa com
enfoque na Teoria das Implicaturas (Grice, 1975) e na Teoria da Relevância (Sperber & Wilson,
1995). Dado seu caráter multidisciplinar, também pretende ampliar o universo cultural, informativo e
comunicativo, potencializando uma maior abrangência como recurso para o contexto acadêmico.
Situação: Em Andamento Natureza: Pesquisa
Alunos envolvidos: Graduação (1); Mestrado acadêmico (2);
Integrantes: Aline Aver VaninAna Maria Tramunt Ibaños (Responsável); Carlos Gerbase; Gilberto
Keller Andrade; Jane Rita Caetano da Silveira; Daiane Fagherazzi
Financiador(es): Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico-CNPq
_________________________________________________________________________________
154
Áreas de atuação
1. Lingüística
2. Letras
3. Ensino-Aprendizagem
4. Educação
_________________________________________________________________________________
Idiomas
Inglês Compreende Bem , Fala Bem, Escreve Bem, Lê Bem
Espanhol Compreende Razoavelmente , Fala Pouco, Escreve Razoavelmente, Lê Bem
Francês Compreende Razoavelmente , Fala Razoavelmente, Escreve Pouco, Lê Bem
Produção em C, T & A
_________________________________________________________________________________
Produção bibliográfica
Artigos completos publicados em periódicos
1. VANIN, A. A., FAGHERAZZI, D.
Uma análise pela relevância do filme "O nome da Rosa". Revista Virtual de Estudos da Linguagem. ,
v.5, p.18 - , 2006.
Palavras-chave: Pragmática, Cognição, Semântica, Teoria da Relevância
Áreas do conhecimento : Lingüística,Artes
Demais produções bibliográficas
1. VANIN, A. A.
Developing Pragmatic Awareness in EFL: greeting in opening and closing conversations, 2007.
(Comunicação,Apresentação de Trabalho)
Palavras-chave: Pragmática, Cognição, Comunicação, Linguagem, Interação, Speech Acts
Áreas do conhecimento : Lingüística
Referências adicionais : Brasil/Inglês. Meio de div
155
4. VANIN, A. A., RÖRIG, Cristina
Como facilitar a construção do resumo em sala de aula, 2007. (Seminário,Apresentação de
Trabalho)
Palavras-chave: Escrita, Estratégias, Texto, Resumo
Áreas do conhecimento : Lingüística Aplicada,Língua Portuguesa,Educação
Referências adicionais : Brasil/Português. Meio de
156
UCS - Cidadão do Século XXI.
Áreas do conhecimento : Línguas Estrangeiras Modernas
Setores de atividade : Educação pré-escolar e fundamental, Educação média de formação geral
15. XVIII Semana de Letras e I encontro Nacional de Literatura, Leitura e Cultura da
Universidade de Caxias do Sul, 2004. (Congresso)
.
16. Reading between the lines - Oxford University Press, 2004. (Encontro)
.
17. The Bright Side of EFL Teaching - Convenção da Associação dos Professores de Inglês do
RS, 2003. (Congresso)
.
18. XVI Semana de Letras - Universidade de Caxias do Sul, 2002. (Congresso)
.
19. XV Semana de Letras - Encontro Nacional de Ensino de Línguas - Universidade de
Caxias do Sul, 2001. (Congresso)
.
20. XIV Semana de Letras - Universidade de Caxias do Sul, 2000. (Congresso)
.
Totais de produção
Produção bibliográfica
Artigos completos publicado em periódico........................................... 1
Apresentações de Trabalhos (Comunicação)........................................... 2
Apresentações de Trabalhos (Conferência ou palestra)............................... 1
Apresentações de Trabalhos (Seminário)............................................. 1
Eventos
Participações em eventos (congresso)............................................... 10
Participações em eventos (seminário)............................................... 4
Participações em eventos (oficina)................................................. 2
Participações em eventos (encontro)................................................ 3
Participações em eventos (outra)................................................... 1
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