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SIMONE FLAESCHEN
A RELAÇÃO PROFESSOR-ALUNO EM UM CURSO DE
ITALIANO PARA FINS ACADÊMICOS
Dissertação de Mestrado em Letras Neolatinas,
na área de Língua Italiana, apresentada à
Coordenação de Pós-Graduação da Faculdade
de Letras da Universidade Federal do Rio de
Janeiro.
Orientadora: Professora Doutora Annita Gullo.
Rio de Janeiro
2006
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SIMONE FLAESCHEN
A RELAÇÃO PROFESSOR-ALUNO EM UM CURSO
DE ITALIANO PARA FINS ACADÊMICOS
Dissertação de Mestrado em Letras Neolatinas, na área de Língua Italiana, apresentada à
Coordenação de Pós-Graduação da Faculdade de Letras da Universidade Federal do Rio de
Janeiro. 148 páginas.
Rio de Janeiro, _____ de ________________ de 2006.
BANCA EXAMINADORA:
___________________________________________________
Profª. Dra. Annita Gullo (Orientadora) – UFRJ
___________________________________________________
Profª. Dra. Maria Lizete dos Santos – UFRJ
___________________________________________________
Profª. Dra. Opázia Chain Feres – UFF
____________________________________________________
Profª. Dra. Flora de Paoli Faria – UFRJ
____________________________________________________
Profª. Dra. Márcia de Almeida – UFJF
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AGRADECIMENTOS
À Professora Doutora Annita Gullo, por ter acreditado em mim, pela sabedoria, paciência e
dedicação com que orientou cada fase deste trabalho.
À Professora Doutora Maria Lizete dos Santos, que colaborou enormemente para a minha
formação acadêmica e que, com muito carinho e compreensão, sempre me apoiou.
À Professora Doutora Opázia Chain Feres, pelo carinho, apoio e estímulo e pela sua colaboração
para o enriquecimento de minha experiência profissional.
À Professora Doutora Maria José Pereira Monteiro, sobretudo porque foi freqüentando um dos
cursos que ministrou na Pós-Graduação que me interessei vivamente pelo ensino/aprendizagem
do italiano para fins acadêmicos.
Ao Professor Doutor Luiz Paulo da Moita Lopes, pela valiosa orientação na área de Lingüística
Aplicada.
À Direção e ao Setor Cultural da Faculdade de Letras da UFRJ, pela realização do Curso de
Extensão L’arte del costruire: curso de italiano técnico, que serviu de campo para esta pesquisa,
e pela disponibilidade de recursos humanos, físicos e materiais que viabilizaram o trabalho de
campo.
A Anderson Santos de Oliveira, do Laboratório de Línguas da Faculdade de Letras da UFRJ, pelo
apoio indispensável à realização do trabalho de campo desta pesquisa.
Às informantes-estagiárias Cristiane Maria de Franco e Sabrina Batista de Azevedo, que muito
contribuíram na coleta de dados para este trabalho.
Aos alunos do Curso de Extensão L’arte del costruire: curso de italiano técnico, pelo carinho e
pela valiosa colaboração neste estudo.
À Professora Marcela de Souza Santos, que gentilmente me auxiliou com a língua inglesa.
Ao amigo Luiz Roberto Conegundes Salvador, pelo incentivo constante, que me ajudou a
enfrentar o desafio de conciliar a continuação dos meus estudos, através do Curso de Mestrado, e
as longas jornadas de trabalho.
A Marcello Dias da Silva, pelo seu apoio e companheirismo.
À minha mãe, Marcélia Garavello Flaeschen, pelo seu amor e compreensão.
Ao meu pai, Geraldo Flaeschen, in memoriam, pelos sacrifícios que fez para me criar.
Aos meus irmãos, André Flaeschen e Luciana Flaeschen, pela compreensão e pelo incentivo.
A todos os que contribuíram para que este trabalho se realizasse.
RESUMO
FLAESCHEN, Simone. A relação professor-aluno em um curso de italiano para fins
acadêmicos. Rio de Janeiro: UFRJ, Faculdade de Letras, 2006. 148 páginas. Dissertação de
Mestrado em Língua Italiana.
Esta é uma dissertação de base etnográfica que parte da tradicional assimetria na relação
professor-aluno, para descrever e analisar essa relação em um contexto que consideramos ímpar,
o de um curso de italiano para fins acadêmicos, norteado pela abordagem para o
ensino/aprendizagem de línguas estrangeiras conhecida como Línguas para Fins Específicos
LSP (Languages for Specific Purposes). Procuramos ainda identificar as funções dos
participantes desse contexto pedagógico, algumas estratégias didáticas usadas pelo professor no
cumprimento da sua função, e alguns impactos que essa relação nesse contexto provocou no
processo ensino/aprendizagem.
ABSTRACT
FLAESCHEN, Simone. A relação professor-aluno em um curso de italiano para fins
acadêmicos. Rio de Janeiro: UFRJ, Faculdade de Letras, 2006. 148 páginas. Dissertação de
Mestrado em Língua Italiana.
In this ethnographic research, we depart from the traditional asymmetry in the teacher-
pupil relation in order to describe and analyze this relation in a context regarded as special, the
context of an Italian course for academic purposes, based on the approach for foreign languages
teaching/learning called Languages for Specific Purposes LSP. We identify the functions of
the participants in this pedagogic context, some didactic strategies used by the teacher in the
practice of your function, and some impacts that this relation do to the teaching/learning process.
RIASSUNTO
FLAESCHEN, Simone. A relação professor-aluno em um curso de italiano para fins
acadêmicos. Rio de Janeiro: UFRJ, Faculdade de Letras, 2006. 148 páginas. Dissertação de
Mestrado em Língua Italiana.
Questa è una richiesta di base etnografica che parte dalla tradizionale asimmetria nella
relazione professore-alunno per descrivere e analizzare questa relazione in un contesto che
consideriamo speciale, quello di un corso di italiano per scopi accademici, basato sull’approccio
per l’insegnamento/apprendimento delle lingue straniere conosciuto come Lingue per Scopi
Specifici LSP (Languages for Specific Purposes). Cerchiamo anche di identificare le funzioni
dei participanti di questo contesto pedagogico, alcune strategie didattiche usate dal professore
durante la pratica della sua funzione, e alcuni riflessi della riferita relazione nel processo
insegnamento/apprendimento.
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO ........................................................................................................................ 10
2. O ENSINO/APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ESTRANGEIRAS PARA FINS
ACADÊMICOS – LAP ............................................................................................................ 15
2.1. LAP E LSP: conceitos e particularidades .......................................................................... 15
2.2. Breve histórico da abordagem LSP ................................................................................... 21
2.3. O problema terminológico ligado à abordagem LSP ........................................................ 28
3. O ITALIANO PARA FINS ESPECÍFICOS NA HISTÓRIA DA DIDÁTICA DO
ITALIANO PARA ESTRANGEIROS .................................................................................... 36
4. A TRADICIONAL ASSIMETRIA EM EDUCAÇÃO ............................................................. 40
5. METODOLOGIA DE PESQUISA ............................................................................................ 44
5.1. Conceito, características e breve histórico da pesquisa etnográfica ................................... 44
5.2. O contexto de pesquisa: o curso de extensão L’arte del costruire: curso de
italiano técnico ........................................................................................................................... 50
5.3. O conteúdo programático, o material didático e a metodologia do curso de extensão ....... 56
5.4. A coleta de dados ............................................................................................................... 58
6. ANÁLISE DOS DADOS ........................................................................................................... 61
6.1. A relação professor-aluno no curso de extensão L’arte del costruire: curso de
italiano técnico ........................................................................................................................... 61
6.2. A função da professora e a dos alunos e o tipo de didática observados no curso
de extensão ................................................................................................................................. 72
6.3. Estratégias didáticas utilizadas pela professora no curso de extensão ................................ 77
7. IMPACTOS DA RELAÇÃO PROFESSOR-ALUNO SOBRE O PROCESSO
ENSINO/APRENDIZAGEM .................................................................................................... 81
8. CONSIDERAÇÕES FINAIS ..................................................................................................... 84
BIBLIOGRAFIA ............................................................................................................................ 88
ANEXOS .........................................................................................................................................94
1. INTRODUÇÃO
Ormai da diversi anni uno degli aspetti che caratterizza gli studi linguistici e
glottodidattici è l’interesse verso l’analisi e le modalità di insegnamento dei linguaggi
specialistici.
Paolo Balboni (Troncarelli; Vannini, 1995)
O desenvolvimento da abordagem LSP Languages for Specific Purposes / Línguas
para Fins Específicos para o ensino/aprendizagem de línguas estrangeiras, viabilizado
sobretudo por pesquisas em Lingüística Aplicada, além de proporcionar uma ampliação dos
horizontes no campo da didática dessas línguas, trouxe novos olhares sobre aspectos educacionais
freqüentemente investigados em outros contextos; um desses aspectos é a relação professor-
aluno.
A abordagem em questão tornou possível uma formação em língua estrangeira de nível
técnico, voltada principalmente para fins acadêmicos e profissionais. Neste sentido, os cursos
norteados por essa abordagem têm, como objeto de estudo, a área acadêmica ou profissional dos
alunos na língua estrangeira. Em cursos de línguas estrangeiras que focalizam a língua cotidiana,
comum a todos, podemos encontrar, por exemplo, alunos que pertençam a áreas profissionais ou
acadêmicas diferentes. Esse é um aspecto geralmente irrelevante para o desenvolvimento desses
cursos, porque a matéria a ser ensinada/aprendida é a língua cotidiana na língua estrangeira. Já os
chamados cursos de nguas para fins específicos, que seguem a abordagem LSP, devem ter
alunos que pertençam a uma única área acadêmica ou profissional, ou pelo menos a áreas afins;
eles estudarão a língua estrangeira de nível técnico, da área deles.
Segundo Paolo Balboni (Troncarelli; Vannini, 1995), a grande demanda, em diversos
países do mundo, por cursos dessa natureza gerada por fatores sobretudo sócio-econômicos,
como veremos na segunda parte deste trabalho intensificou as pesquisas lingüísticas e
glotodidáticas na área. Atualmente no mercado editorial, além dos tradicionais manuais didáticos
para o ensino/aprendizagem das línguas estrangeiras, também à disposição diversos manuais
didáticos voltados para cursos LSP, de áreas especializadas, tais como a Medicina, a Arquitetura,
o Direito, a Economia, a Administração. Paolo Balboni chama de “microlínguas científico-
profissionais” (microlingue scientifico-professionali) essas variações da ngua, conforme o setor
científico ou profissional (Balboni, 1999).
Segundo Giovanni Freddi (Balboni, 2000), o ensino/aprendizagem das línguas para fins
específicos implica significativas mudanças no modelo canônico aplicado para a língua comum.
No contexto deste modelo, a relação professor-aluno é tipicamente assimétrica: o professor é o
par mais competente, é aquele que tem o domínio didático e o domínio da língua estrangeira que
deverá ser aprendida pelo aluno. O professor controla o discurso, e portanto, detém o poder
(Moita Lopes, 1996). Na didática das nguas para fins específicos, porém, essa relação deverá
apresentar-se diferente, principalmente porque, apesar de o professor possuir o domínio da
língua-alvo comum e o domínio didático, ele o domina salvo raras exceções a área
especializada do aluno, que é justamente o objeto de estudo na língua estrangeira.
Um outro fato importante que contribui para descaracterizar a típica assimetria da relação
professor-aluno é que os cursos de línguas para fins específicos geralmente são direcionados a
alunos que já tenham concluído pelo menos um curso básico da língua estrangeira. São, portanto,
alunos que já têm um certo domínio da língua comum.
A reflexão sobre os princípios que sucintamente apresentamos, aplicados à didática da
língua italiana para estrangeiros, levou-nos às questões que orientaram este trabalho. São as
seguintes:
1. Como se caracterizará a relação professor-aluno em um curso de italiano para fins
acadêmicos?
2. Quais são as funções dos participantes nesse contexto pedagógico?
3. Quais estratégias didáticas serão usadas pelo professor para que ele cumpra sua função?
4. Quais são os impactos desse tipo de relação no processo ensino/aprendizagem?
Investigamos essas questões em um curso de italiano para fins acadêmicos, intitulado
L’arte del costruire: curso de italiano técnico, criado especialmente para o desenvolvimento
desta pesquisa, e oferecido à comunidade acadêmica da UFRJ pelo Setor Cultural da Faculdade
de Letras da mesma Universidade no segundo semestre de 2004. O curso foi dirigido a alunos de
Arquitetura, Engenharia Civil e Belas Artes, entendidas como áreas afins, mas participaram
também alunos da Faculdade de Letras. No capítulo 5, descrevemos mais detalhadamente a
estrutura deste curso-laboratório e a coleta de dados para a presente dissertação.
Assim, organizamos este trabalho em oito capítulos. Depois desta parte introdutória,
tratamos, no capítulo 2, dos conceitos e das particularidades do chamado LAP Languages for
Academic Purposes / Línguas para Fins Acadêmicos — e da abordagem LSP. Em seguida,
apresentamos um breve histórico dessa abordagem, desde a sua origem como ESP, com a língua
inglesa, até a sua expansão para o ensino/aprendizagem das outras línguas. Consideramos
importante apresentarmos um histórico dessa abordagem, porque ela está ligada ao contexto da
nossa pesquisa.
Ainda neste capítulo, tratamos o problema terminológico ligado à abordagem LSP,
focalizando sobretudo o contexto italiano.
No capítulo 3, focalizamos o italiano para fins específicos italiano per scopi specifici
na história da didática da língua italiana para estrangeiros. Ressaltamos os fatores que
impulsionaram o pido desenvolvimento da Glotodidática e da Língüística Aplicada na Itália a
partir da segunda metade do século XX.
No capítulo 4, tratamos a tradicional assimetria que se estabelece em contextos
educacionais. Iniciamos essa parte esclarecendo a nossa intenção ao nos propormos a descrever e
analisar a “relação” entre professor e alunos.
Dedicamos o capítulo 5 à metodologia utilizada nesta pesquisa, a etnografia, que
consideramos a mais coerente com o nosso tipo de investigação. Partimos do seu conceito, para
posteriormente expormos das suas características. Em seguida apresentamos um breve histórico
da pesquisa etnográfica. Na seqüência, contextualizamos o nosso estudo, descrevendo
detalhadamente o planejamento e a realização do curso de extensão L’arte del costruire: curso de
italiano técnico. Apresentamos o seu conteúdo programático, o material didático utilizado nele e
a metodologia adotada para o mesmo. Depois indicamos os instrumentos que serviram para a
coleta de dados e explicamos como foram utilizados.
No capítulo 6, através da análise dos dados coletados, buscamos responder a uma parte
das questões que orientam este trabalho: descrever a relação professor-aluno no curso-laboratório
L’arte del costruire: curso de italiano técnico; identificar as funções dos participantes do curso; e
verificar algumas estratégias utilizadas pela professora do curso para cumprir a sua função. No
tópico 6.2, sobre as funções dos participantes, tratamos ainda das discussões sobre a necessidade
de o professor dominar a área especializada do aluno, ou seja, de ser também um especialista.
No capítulo 7, apontamos alguns impactos que a relação professor-aluno estabelecida no
curso-laboratório provocou no processo ensino/aprendizagem.
No capítulo 8 e último, apresentamos as considerações finais deste trabalho.
Ressaltamos que o ensino/aprendizagem do italiano para fins específicos é ainda um
contexto novo para a didática da língua italiana para estrangeiros. No Brasil, por hora, tem se
mostrado escassa, em pesquisas acadêmicas, a atenção dedicada a essa modalidade de ensino.
Isso respalda a pertinência do nosso estudo.
Salientamos que foi-nos especialmente gratificante, no desenvolvimento desta pesquisa,
termos tido a oportunidade de prestar um serviço direto à comunidade através da realização do
curso L’arte del costruire: curso de italiano técnico.
Esperamos que este trabalho possa evidenciar o caráter ímpar do ensino/aprendizagem do
italiano para fins específicos, enquanto abordagem, no contexto da didática do italiano para
estrangeiros, e que possa contribuir para a excelência da sua prática.
2. O ENSINO/APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ESTRANGEIRAS PARA
FINS ACADÊMICOS - LAP
La scienza e le più diverse tecniche sono presenti in una misura larghissima nella vita
contemporanea: per questo i linguaggi settoriali delle diverse scienze hanno oggi un
posto importantissimo.
(Ignazio Baldelli, 1979)
2.1. LAP e LSP: conceitos e particularidades
LAP é a sigla da expressão inglesa Languages for Academic Purposes, que significa
Línguas para Fins Acadêmicos. Trata-se de um desdobramento da abordagem para o
ensino/aprendizagem de línguas estrangeiras conhecida como LSP Languages for Specific
Purposes / Línguas para Fins Específicos. Antes de verificarmos, com mais detalhes, qual é a
proposta desta abordagem e algumas particularidades a respeito dela, é necessário partirmos de
alguns conceitos fundamentais.
Em 1963, na tentativa de esclarecer a diferença entre uma filosofia de ensino de uma
língua em nível de teoria e princípios, e um conjunto de procedimentos para o ensino de uma
língua, o lingüista aplicado americano Edward Anthony propôs um esquema. Ele identificou três
níveis de conceituação e organização que ele chamou de abordagem, método e técnica (Richards;
Rogers, 1986).
Segundo o lingüista aplicado, “a organização desses níveis é hierárquica. A chave
organizacional é que técnicas executam um método que é coerente com uma abordagem”.
Vejamos o conceito que ele atribuiu a cada nível:
Uma abordagem é um conjunto de suposições correlativas relacionadas à natureza do
ensino/aprendizagem de uma língua. Uma abordagem é axiomática
1
. Descreve a
natureza do objeto a ser assimilado. (...) Método é um plano global para a
apresentação ordenada do material lingüístico; nenhuma parte dele pode contradizer
a abordagem selecionada (...). Uma abordagem é axiomática, um método é
processual. Para uma única abordagem pode haver muitos métodos.(...) Uma técnica
tem caráter de implementação é ela que, na realidade, toma lugar em uma sala de
aula. É um recurso particular, uma estratégia ou um artifício usado para executar um
objetivo imediato. Técnicas devem ser coerentes com um método e, por essa razão,
devem estar em total harmonia com uma abordagem
2
.
Ao compararmos esses conceitos elaborados por Edward Anthony na década de 60 do
século XX com os conceitos que Paolo Balboni apresenta para esses mesmos termos em seu
Dizionario di Glottodidattica, publicado em 1999, verificaremos que a proposta do lingüista
aplicado americano foi muito bem aceita entre os estudiosos da área e permaneceu praticamente
inalterada até os dias de hoje. Verifiquemos o que diz Balboni sobre o verbete “abordagem”, em
seu dicionário:
A abordagem constitui a filosofia de fundo de cada proposta glotodidática. A
abordagem avalia e seleciona dados e fundamentos epistemológicos das várias
teorias e ciências de referência e os reorganiza segundo os parâmetros próprios da
glotodidática, individuando as metas e os objetivos do ensino lingüístico. Uma
abordagem gera um ou mais métodos, através dos quais os seus princípios gerais são
aplicados ao ensino. Na história da glotodidática, algumas abordagens foram
definidas ‘métodos’ (Comunicativo, Formalístico, Método Direto, Método Natural,
Reading Method, Silent Way, Estruturalístico, (...) ).
No verbete “método”, Balboni acrescenta que um método não pode ser classificado como
1
Uma abordagem é “axiomática”, porque tem caráter de axioma; de acordo com o Dicionário Aurélio
(1986), um axioma é uma “premissa imediatamente evidente que se admite como universalmente
verdadeira sem exigência de demonstração”.
2
Todas as citações como esta apresentadas nesta Dissertação as quais são trechos de obras
escritas originalmente em inglês ou em italiano foram traduzidas por nós.
bom ou errado, velho ou moderno, mas sim “coerente ou incoerente com as premissas da
abordagem que ele pretende colocar em prática”.
Segundo Balboni, “uma técnica é uma atividade através da qual o material lingüístico é
apresentado aos estudantes e é, por eles, analisado, elaborado, (re)produzido”. O autor acrescenta
que também há técnicas para a reflexão a respeito da língua e para avaliação. Balboni, no verbete
“técnica”, apresenta uma importante observação:
Diferentemente da abordagem, que tem uma dimensão filosófica, e do método, que
tem que realizar, em termos de projeção curricular e organização didática, as
indicação da abordagem, as técnicas não admitem juízos de valor
(“verdadeiro/falso”, coerente/incoerente”), mas somente de eficácia / ineficácia ao
produzir o efeito desejado.
O esclarecimento acerca destes conceitos básicos é de extrema importância para a nossa
pesquisa, pois ela envolve uma abordagem a LSP e ela contou com a realização de um
curso que viabilizou a coleta de dados. Para as fases de planejamento, concretização, avaliação
deste curso, tivemos de fazer escolhas metodológicas e técnicas fundamentadas no conhecimento
prévio de conceitos básicos ligados à área, tais como os de abordagem, método e técnica. Essa era
uma das condição para o bom andamento do nosso projeto.
Vejamos agora qual é a proposta da abordagem LSP e algumas de suas particularidades.
Primeiramente é preciso sabermos que essa é uma abordagem baseada nas necessidades do aluno.
O princípio de todo curso LSP é a simples pergunta “Por que esse aluno precisa aprender uma
língua estrangeira?”. Essa indagação dará origem a um conjunto de indagações subsequentes;
algumas a respeito do próprio aluno, algumas sobre a natureza da língua que o aluno precisa
operar, algumas sobre o contexto da aprendizagem. Mas toda essa análise partirá da identificação
da razão pela qual o aluno precisa aprender a língua estrangeira. Todas as decisões sobre o curso
(escolha de conteúdo, de método etc.) estarão baseadas nesse princípio (Hutchinson; Waters,
1987). Há, portanto, uma centralização do processo ensino/aprendizagem no aluno. Em relação a
isso, Anna Ciliberti (1996) chama a atenção para o seguinte fato:
A teoria da competência comunicativa e as abordagens que a ela se
referem tinham descoberto o aprendiz enquanto pessoa. Com a nova
orientação centrada no discente, se reconhece a necessidade de uma
individualização dos objetivos da aprendizagem, e, conseqüentemente, de uma
individualização do ensino.
Ciliberti afirma ainda que a noção da centralização no discente pressupõe currículos
diferenciados para alunos diversos e pressupõe que se possa voltar atrás sobre cada decisão, pois
nada é rigidamente prefixado. E acrescenta:
As etapas curriculares da planificação, da atuação e da avaliação não
podem, então, seguir uma seqüência rígida como nos modelos tradicionais. Um
currículo centrado no discente se torna ‘um esforço de colaboração entre
professor e alunos, que estes últimos estão estreitamente envolvidos no
processo decisório em relação ao conteúdo do currículo e a como será ensinado’
(apud Nunan, 1988).
Vale notar que as pesquisas em Psicologia da Educação possibilitaram o reconhecimento
da importância central do aluno, contribuindo para o desenvolvimento de abordagens como a
comunicativa e a LSP.
Dissemos que a abordagem LSP está centrada nas necessidades do aluno, porém, segundo
Hutchinson e Waters (1987), todos os cursos, sejam os tradicionais de língua estrangeira ou os de
LSP, são baseados na observância de algum tipo de necessidade. Não é, portanto, a existência de
necessidades de aprendizagem que diferencia um curso de língua estrangeira geral de um curso
LSP, mas sim, a qualidade das necessidades.
A análise das necessidades do aluno envolve um processo complexo. Está ligada ao uso
da língua e à aprendizagem da língua.
No nome da abordagem, Línguas para Fins Específicos, devemos entender, por
“específicos”, o mesmo que “acadêmicos e ocupacionais/vocacionais/profissionais”.
Originalmente foram estabelecidos esses dois desdobramentos para a abordagem. A partir desse
esclarecimento, podemos dizer que a LSP direciona a formação em línguas estrangeiras para o
alcance de fins acadêmicos e ocupacionais/vocacionais/profissionais.
O LAP Languages for Academic Purposes / Línguas para Fins Acadêmicos tem
como foco do processo ensino/aprendizagem as linguagens dos diversos cursos acadêmicos:
Medicina, Arquitetura, Engenharia, Direito, Economia etc. . Seu objetivo principal é o de levar o
aluno a desenvolver, na língua estrangeira, as habilidades comunicativas necessárias a ele para
fins de estudo no contexto do curso universitário de que faz parte. Assim, um curso de LAP
Italiano para Fins Acadêmicos, Inglês para Fins Acadêmicos etc. terá, como alunos,
profissionais, estudantes ou pesquisadores de um mesmo curso acadêmico ou de cursos afins
(como por exemplo Engenharia e Arquitetura). Esse tipo de curso LSP tem a tendência a
desenvolver mais as habilidades de leitura e compreensão escrita e oral, porque, como
afirmamos, o estudo da língua estrangeira, nesse caso, é para fins de estudo no contexto do curso
acadêmico do aluno.
O outro desdobramento da abordagem LSP, conhecido como LOP Languages for
Ocupacional Purposes / Línguas para Fins Ocupacionais ou LVP Languages for
Vocacional Purposes / Línguas para Fins Vocacionais — é direcionado a profissionais que
precisem de uma formação em língua estrangeira para atuarem em suas respectivas áreas.
Um aspecto importante acerca da abordagem LSP é que ela costuma ser aplicada em
cursos avançados de línguas estrangeiras, ou seja, os cursos LSP, na sua maioria, são
direcionados a alunos que já tenham concluído pelo menos um curso básico da língua estrangeira.
São, portanto, alunos que têm um certo domínio da língua comum. A esse respeito,
verifiquemos o que afirma Paolo Balboni no prefácio do livro L’arte del costruire (Troncarelli;
Vannini, 1995), um manual didático para curso de Italiano para Fins Acadêmicos, dirigido a
alunos de Curso Superior de Arquitetura:
(...) esta obra diz respeito ao ensino do italiano para fins específicos. Já alguns
anos um dos aspectos que caracteriza os estudos lingüísticos e glotodidáticos é o
interesse pela análise e pelas modalidades de ensino das linguagens especializadas.
Tal interesse deriva também da crescente exigência por cursos de língua
direcionados, capazes de satisfazer as exigências de um público adulto que, após ter
concluído um ciclo de formação lingüística de base, pretende conseguir uma
competência específica para começar a tratar, em língua estrangeira, de conteúdos
relativos a um particular campo de estudos ou a uma determinada esfera profissional.
Uma justificativa para essa particularidade acerca dos cursos LSP está ligada ao que
afirmamos anteriormente neste tópico do trabalho: o objeto de estudo na ngua estrangeira não é
a língua comum, mas sim a linguagem de uma determinada área de conhecimento.
Não podemos dizer, porém, que ter uma formação básica em língua estrangeira seja uma
condição primordial para se freqüentar um curso LSP. Segundo Balboni (2000):
No âmbito da formação profissional conduzida nas empresas, o percurso considerado
mais produtivo é freqüentemente o inverso: parte-se da constatação de que o
destinatário do curso é um especialista com conhecimentos científicos-profissionais
específicos e justamente devido a esses conhecimentos ele se move para a
aprendizagem da linguagem especializada para depois conseguir dominar também a
língua de uso geral, aquela que serve para a vida cotidiana com estrangeiros.
Na citação anterior a esta, também é interessante notarmos o que diz Paolo Balboni acerca
do público-alvo: “público adulto”. Segundo o autor, o termo “adulto” deve ser entendido de
acordo com o aspecto social, referindo-se à pessoa que já tenha terminado um curso de estudos,
que tenha um trabalho, que já seja um sujeito autônomo para tomar decisões etc. (2000).
Em relação à questão metodológica, segundo Hutchinson e Waters (1987), não há
metodologia LSP, mas metodologias que têm sido aplicadas em aulas de LSP.
2.2. Breve histórico da abordagem LSP
O desenvolvimento da abordagem LSP está intrinsecamente ligado às origens de uma das
mais importantes ciências da linguagem da atualidade, a Lingüística Aplicada.
Até a década de 50 do século XX, as ciências da linguagem existentes, tais como a
Lingüística, a Sociolingüística e a Psicolingüística, isoladas, não conseguiam apresentar soluções
satisfatórias para diversificados problemas de uso e de ensino/aprendizagem das línguas
verificados na prática. A Lingüística Aplicada surgiu da necessidade de haver uma ciência da
linguagem voltada prioritariamente para fins práticos, com a função de mediadora entre o
conhecimento teórico advindo das várias disciplinas e os problemas a serem investigados e
solucionados. Signorini e Cavalcanti (1998), a esse respeito, afirmaram:
O estudo das questões aplicadas exige esquemas de investigação gerados e
sustentados no próprio contexto de aplicação e não desenvolvidos antes por um
grupo de elite e aplicados posteriormente àquele contexto por um segundo grupo
científico mais periférico. Os resultados da pesquisa não surgem, portanto,
somente ou principalmente da aplicação de conhecimentos já existentes.
Na verdade, o processo de consciência dessa necessidade tornou-se evidente durante a
Segunda Guerra Mundial, na América do Norte, com lingüistas como L. Bloomfield, C. Fries,
Robert Lado e Engels, que buscavam soluções para problemas ligados ao ensino/aprendizagem
de língua estrangeira e de segunda língua.
O ataque surpresa do Japão contra uma frota norte-americana ancorada em Pearl Harbour,
na madrugada de 7 de dezembro de 1941, levou os EUA a entrarem na Segunda Guerra Mundial
e provocou a tomada de consciência de que o conhecimento prático das línguas era uma
necessidade vital em questões bélicas. Percebeu-se que um exército eficiente deveria ter agentes
de contra-espionagem que conhecessem com perfeição diversas línguas estrangeiras. Em 1943, o
exército dos EUA implantou o Programa de Treinamento Especializado do Exército (Army
Specialized Training Program ASTP), que previa cursos de 24 línguas para, em princípio, 15
mil soldados, que seriam enviados às nações ocupadas pelos aliados na Segunda Guerra. Esses
cursos deveriam ser intensivos e basear-se sobretudo no estudo quase exclusivo da língua falada e
no redimensionamento do papel da gramática. O caráter “intensivo” significava ter “25 horas
semanais de contato’ com a língua em aprendizagem e pelo menos mais 10 horas dedicadas a
debates, conferências, filmes na língua etc.” (Freddi, 1994).
Professores formados em línguas foram recrutados para lecionarem nesses cursos, porém,
ao serem submetidos a um exame prévio de admissão, em que deveriam demonstrar
conhecimento prático das línguas, foram considerados inaptos para a tarefa de treinar os
soldados. Foi necessário, então, recorrer a especialistas extra-universitários, o que evidenciou a
falência dos sistemas de ensino das línguas estrangeiras nas universidades. Percebeu-se que era
preciso partir da prática para a teoria, e não mais da teoria para a prática, como tradicionalmente
vinha sendo feito no campo pedagógico.
Buscando-se soluções para problemas como o acima citado, em 1946 foi fundado o
Instituto de Língua Inglesa (English Language Institute), da Universidade de Michigan, em Ann
Abor, que passou a publicar, a partir de 1948, o periódico Language Learning Journal of
Applied Linguistics. A criação deste Instituto desencadeou, pelo mundo, a fundação de outras
instituições dedicadas à Lingüística Aplicada, tais como o Departamento de Lingüistica Aplicada
(Department of Applied Linguistics), da Universidade de Edimburgo, na Grã-Bretanha, fundado
no final da década de 50; a Associação Internacional de Lingüística Aplicada (Association
Internationale de Linguistique AppliquéeAILA), fundada na França em 1963; o Centro Italiano
de Lingüística Aplicada (Centro Italiano di Linguistica Applicata CILA), fundado em 1965; a
Associação de Lingüística Aplicada Alemã (Gesellschaft für Angewandte Linguistik GAL),
fundada em 1969. No Brasil, somente em 1990, fundou-se a Associação de Lingüística Aplicada
do Brasil (ALAB), na Universidade de Pernambuco.
A catástrofe militar ocorrida em 1941, em Pearl Harbour, e a posterior demonstração de
superioridade da União Soviética, através das conquistas espaciais, induziram o Congresso
Americano a aprovar, em 1958, o National Defence Education Act (NDEA), um documento que
reconhecia a importância das línguas estrangeiras para a segurança nacional. Foram aplicadas
somas altíssimas para a realização de pesquisas na área de didática das línguas.
A Lingüística Aplicada com Fries e Lado tornou-se matéria acadêmica. Posteriormente foi
reconhecida como uma ciência da linguagem, autônoma, que centra-se na identificação, análise e
resolução de problemas de uso da linguagem, tanto em contexto escolar, quanto em outros
contextos (institucionalizados ou não), tendo como foco os processos interacionais nos quais se
envolvem os usuários da linguagem. Por isso, é considerada uma ciência social, mediadora e
interdisciplinar, que colabora para o avanço do conhecimento teórico e que utiliza métodos de
investigação de natureza positivista e interpretativista (Moita Lopes, 1996).
A Lingüística Aplicada, portanto, tem três fundamentos básicos: a interdisciplinaridade; a
orientação para a solução de problemas; e a orientação em direção à prática (Spillner, apud
Ciliberti, 1996). Algumas das disciplinas-fonte que tratam assuntos que lhe são relevantes são:
Lingüística, Psicolingüística, Sociolingüística, Análise do Discurso, Análise Crítica do Discurso,
Análise da Conversação, Distúrbios da Comunicação, Filosofia, Psicologia do Desenvolvimento,
Psicologia Cognitiva, Tradução, História, Pedagogia, Ergonomia, Comunicação Institucional,
Etnografia da Fala e Etnografia da Escola (Signorini; Cavalcanti, 1998).
O surgimento da Lingüística Aplicada foi muito importante para os avanços na área de
ensino/aprendizagem de línguas estrangeiras. Spillner (19--) chegou a afirmar que “sem a
contribuição dessa ciência, o ensino de línguas estrangeiras seria impensável”.
Conforme já afirmamos, o desenvolvimento da abordagem LSP — inicialmente ESP
English for Specific Purposes / Inglês para Fins Específicos está intrinsecamente ligado às
origens da Lingüística Aplicada. A abordagem começou a ser desenvolvida nos EUA na década
de 60 do século XX, e as pesquisas em Lingüística Aplicada começaram a ser realizadas, no
mesmo país, na década de 50. Estas pesquisas viabilizaram descobertas que levaram ao
desenvolvimento da referida abordagem.
Depois da Segunda Guerra Mundial, a língua inglesa se impôs no mundo como língua
internacional, devido sobretudo ao poder econômico e político conquistado pelos EUA. O
mercado de trabalho no mundo inteiro passou a valorizar o domínio do inglês, gerando a
formação de uma massa de pessoas interessadas em aprender essa língua estrangeira. Além da
questão bélica a que nos referimos anteriormente, a limitação de tempo e de dinheiro das pessoas
para aprenderem esse idioma foi um outro fator que impulsionou as pesquisas nos EUA a
desenvolverem cursos mais rápidos e eficazes.
A partir de 1960, a constatação, através das pesquisas, da existência de variedades do
inglês, segundo as diversas áreas da atividade humana, possibilitou o desenvolvimento da
abordagem ESP, que viabilizava uma formação em inglês, orientada sobretudo para o exercício
profissional e acadêmico. Atribuíram-se a essa abordagem ramificações que corresponderiam às
diversas áreas para as quais ela estaria voltada.
Inicialmente, devido a interesses no crescente progresso tecnológico e econômico,
desenvolveu-se o chamado EST English for Science and Technology / Inglês para Ciência e
Tecnologia. Posteriormente foram consideradas outras áreas. Hutchinson e Waters (1987)
identificaram, como ramificações do ESP, além do EST, o EBE English for Business and
Economics / Inglês para Negócios e Economia — e o ESS — English for Social Sciences / Inglês
para Ciências Sociais.
Como desdobramentos do ESP foram definidos o EAP — English for Academic Purposes
/ Inglês para Fins Acadêmicos —, que está voltado para as carreiras universitárias; o EOP
English for Ocupacional Purposes / Inglês para Fins Ocupacionais; o EVP English for
Vocational Purposes / Inglês para Fins Vocacionais —; e o EPP English for Professional
Purposes / Inglês para Fins Profissionais — (Jordan, 1997).
Hutchinson e Waters, na obra English for Specific Purposes: a learning-centred approach
(1987), formularam um esquema em forma de árvore para demonstrar algumas das várias
possibilidades de ensino de uma língua e as relações estabelecidas entre elas. Eles tomaram como
exemplo o inglês e batizaram o esquema de “a árvore do Ensino da Língua Inglesa” (The tree of
ELT — English Language Teaching).
Sabemos que esquemas assim podem simplificar demais questões de natureza complexa
como a que estamos abordando, mas, a título de ilustração, consideramos válido aqui
reproduzirmos o esquema de Hutchinson e Waters, que é o seguinte:
inglês para
estudos inglês para inglês para inglês para inglês para inglês para
médicos técnicos economia secretários psicologia magistério
inglês para fins inglês para fins
acadêmicos ocupacionais
(EAP) (EOP) EAP EOP EAP EOP
inglês para ciência e inglês para negócios e inglês para ciências
tecnologia ((EST) economia (EBE) sociais (ESS)
inglês para fins
específicos (ESP) inglês geral (GE)
inglês como língua inglês como língua inglês como segunda
materna (EMT) estrangeira (EFL) língua (ESL)
ensino da língua inglesa (ELT)
ensino de uma língua
_________________________________
aprendizagem e comunicação
Desde o início do seu desenvolvimento, ocorrido, como dissemos, na década de 60 do
século XX, o ESP obteve um sucesso crescente em nível mundial. Isso foi constatado através da
verificação, com o passar dos anos, de vários fatores, tais como (Bloor, M.; Bloor, T., 1986):
Adaptação da abordagem ESP ao ensino/aprendizagem de outras línguas estrangeiras, passando
a ser representada pela sigla LSP — Languages for Specific Purposes;
aumento do número de cursos ESP/LSP realizados no mundo todo;
aumento do número de publicações sobre o ESP/LSP (The ESP Journal, de Washington);
aumento do número de materiais didáticos de ESP/LSP;
aumento do número de programas de treinamentos em ESP/LSP realizados no mundo todo.
Hutchinson e Waters (1987) esclarecem que o ESP não se expandiu pelo mundo
passando a ser representado pela sigla LSP como um fenômeno monolítico; desenvolveu-se
em ritmos diferentes em diversos países. A Itália foi um deles, e trataremos do seu caso no
próximo capítulo.
Apesar de essa abordagem ter sido “importada” de maneiras diferentes por vários países,
Hutchinsos e Waters (1987) identificaram e analisaram 5 fases de desenvolvimento da mesma.
A primeira dessas fases ocorreu de 1960 até o início da década de 70 e associou-se a Peter
Strevens, Jack Ewer e John Swales. Caracterizou-se pela identificação da existência de “registros
específicos” do inglês, segundo as diversas áreas da atividade humana, e pela análise desses
registros. Objetivava-se identificar as características gramaticais e lexicais desses registros, para
que programas e materiais de cursos pudesses ser produzidos.
A segunda fase, cujos principais teóricos foram Henry Widdowson (Grã-Bretanha), Larry
Selinker, Louis Trimble, John Lackstrom, Hutchinson, Waters e Mary Todd (EUA), ocorreu na
década de 70. Caracterizou-se pela análise do discurso ou retórica do inglês rhetorical or
discourse analysis. Abandonou-se o termo “registro” adotado na primeira fase e passou-se
a utilizar “variações de discurso”. Procuraram-se, nessa fase, identificar os padrões
organizacionais dos textos das diversas áreas especializadas e especificar os significados
lingüísticos pelos quais esses padrões são marcados. Os padrões deveriam, então, possibilitar a
elaboração de programas de cursos ESP.
A terceira fase foi marcada pela análise da situação alvo do inglês target situation
analysis ou análise das necessidades dos alunos. Objetivou-se estabelecer uma base mais
científica para a abordagem. Essa fase foi desenvolvida principalmente por John Munby, no final
da década de 70 e início da década de 80. Segundo Hutchinson e Waters (1987), essa fase não
acrescentou nada de novo a respeito do conhecimento sobre o ESP.
A quarta fase de desenvolvimento do ESP ocorreu na década de 80 e foi um esforço para
considerar não a língua em si mesma, mas sim os processos de pensamento que subordinam o uso
da língua. Segundo Hutchinson e Waters (1987), não houve uma figura dominante nesse período,
porém eles citam Françoise Grellet, Chistine Nuttal, Charles Alderson e Sandy Urquhart.
Segundo Hutchinson e Waters (1987), nessa fase, projetos ESP começaram a ser desenvolvidos
no Brasil e na Malásia.
A quinta fase de desenvolvimento está centrada na aprendizagem. Parte-se do princípio de
que a abordagem LSP só será válida se estiver baseada no entendimento dos processos de
aprendizagem da língua e não no uso da língua, como ocorreu nas outras fases.
O fator lingüístico tendeu a dominar o desenvolvimento da abordagem LSP, com ênfase
na análise da natureza das variedades específicas de uso da língua. Atualmente uma
necessidade de se ter uma visão mais ampla, que focalize sobretudo o que as muitas variações
têm em comum.
2.3. O problema terminológico ligado à abordagem LSP
Durante décadas — que abrangem o período anterior e posterior ao surgimento, na década
de 60 do século XX, da abordagem LSP vários termos foram usados para se fazer referência
aos objetos tratados pela abordagem, ou seja, as variações da língua. Verifiquemos o que diz
Paolo Balboni (2000) a esse respeito:
Nos anos 20 e 30, os estudiosos que faziam referência ao Círculo de Praga falavam
simplesmente de “estilo funcional”, enquanto no campo glotodidático Harold Palmer
falava de “vocabulário especializado” (Cambiaghi, 1988, p. 46), a ser acrescentado à
“língua fundamental”. Estes dois conceitos eram suficientemente claros, pelo menos
de maneira intuitiva, e foram, e em parte ainda são, usados sem discussões na
literatura em francês (Cambiaghi, 1983, pp. 187-189).
A partir dos anos 60 do século XX, com a internacionalizão da pesquisa, da produção e
do comércio, se inicia um reexame dos termos “estilo funcional” e “vocabulário especializado”.
Outros termos foram sendo usados, sem que houvesse um consenso. Alguns deles foram
“registro”, “tecnicismo” (tecnoletto), “subcódigo” (sottocodice), “linguagem setorial”, “língua
especial”, “língua para fins especiais”, “língua para fins específicos”, “microlíngua”,
“microlíngua de especialidade”, “microlíngua de especialização”, “microlíngua setorial”,
“microlíngua científico-profissional”, e até “línguas para especialistas de outras disciplinas”
(Langues pour Spécialistes d’Autres Disciplines / LANSAD).
Como pudemos verificar, a quantidade de expressões que já foram usadas para se referir a
um único objeto em estudo — considerando o conjunto das variações da língua — atesta a grande
dificuldade terminológica, neste setor de pesquisa, por parte de estudiosos de vários países. Não
foi diferente na Itália. Paolo Balboni (ibid.) afirma o seguinte sobre essa questão:
A denominação do nosso objeto de estudo esteve no centro de acesas discussões nos
últimos vinte anos e não foi uma discussão ociosa, que os nomes, no discurso
científico, são a chave para definir a realidade conceitual, que não existe se não for
denominada.
Praticamente cada teórico italiano que se ocupou do tema adotou a terminologia que
considerou mais adequada. Assim, por exemplo, S. L. Beccaria fala em “linguagens setoriais”, na
obra I linguaggi settoriali in Italia, publicada em 1973; Anna Ciliberti fala em “ensino lingüístico
‘para fins especiais’”, em obra homônima, publicada em 1981; M. Cortelazzo fala em “línguas
especiais”, em obra homônima publicada em 1990; Alberto Sobrero utiliza o termo “línguas
setoriais”, em um artigo que escreveu para uma coleção intitulada Italiano L2: corso a distanza
per insegnanti, publicada em 1992; depois Sobrero (1997) usa o termo “línguas especiais”; G.
Porcelli fala em “línguas de especializão”, na obra Le lingue di specializzazione e il loro
insegnamento, publicada em 1990, M. Gotti (1991) usa a expressão “linguagens especializadas”;
e Giovanni Freddi (1994) considera sinônimos os termos “microlíngua” e “línguas setoriais”.
Balboni (2000) cita o caso particular de uma obra publicada em 1994, sob organização de
E. Borello. Essa obra apresenta uma mistura das denominações: “linguagens setoriais” no tulo,
“linguagens especializadas” na introdução do próprio Borello, “microlíngua” e “linguagens
especializadas” como sinônimos na introdução de Leonardo Savoia, “inglês para fins específicos”
em Cacco, “microlíngua” em quase todos os ensaios. Nessa obra, Borello usa também a
expressão inglesa restricted languages.
O próprio Paolo Balboni, durante a sua pesquisa sobre o tema em questão, adotou termos
diferentes: na sua obra Didattica dell’italiano a stranieri (1994), Balboni fala em “microlínguas
setoriais”; no prefácio do manual didático L’arte del costruire (Troncarelli; Vannini, 1995),
Balboni usa os termos “italiano para fins específicos” e “linguagens especializadas”; por fim, em
uma outra obra, Balboni (2000) adota o termo “microlínguas científico-profissionais”.
Alberto Sobrero (1997) faz a seguinte observação sobre o problema:
(...) uma vez individualizado o fenômeno, a mesma terminologia que se usa para
designá-lo não é de modo algum unívoca. O que Berruto chama “línguas especiais”,
para outros são “linguagens especiais”, “linguagens especializadas”, “microlínguas”,
“linguagens setoriais”. Não é fácil decidir qual denominação adotar, porque cada
uma destas expressões tem alguma contra-indicão: “linguagens setoriais” é um
tanto vago; línguas/linguagens especializadas” se refere, de forma eletiva, ao uso
destas variações por parte de especialistas que se dirigem a outros especialistas
um lingüista que fala para outros lingüistas, um sico para outros físicos —, e então
exclui outras circunstâncias de uso — um professor de lingüística que fala para
estudantes universitários, um físico que tem uma conferência com a imprensa —;
“microlínguas” implica limitações ou simplificações em relação à língua comum, que
não se verificam na realidade; etc. .
Paolo Balboni (ibid.) acrescenta que “os volumes e os ensaios que assumem uma
abordagem declaradamente lingüística, típica dos anos 90, evitam o obstáculo terminológico e
usam “linguagem”, “discurso” ou mesmo “texto”, seguido da especificação “econômico”,
“científico”, “da crítica de arte” e assim por diante”.
Tendo em vista que estudiosos de renome, como os que citamos, não conseguiram e ainda
não conseguem entrar em acordo no que tange ao melhor termo para designar o objeto em
questão, seria pretensão de nossa parte desejarmos resolver esse problema. Por isso não
analisaremos a adequação ou inadequação de todas as designações propostas pelos estudiosos
citados. Por outro lado, consideramos necessário justificarmos as nossas escolhas terminológicas
neste trabalho, das quais não pudemos nos esquivar, uma vez que precisamos fazer referência ao
objeto em estudo.
Primeiramente é preciso estar claro que esta pesquisa está relacionada sobretudo à questão
didática (ou glotodidática, conforme a teoria italiana), e não lingüística.
De acordo com Paolo Balboni (ibid.), ao tratarmos, como objeto de estudo, o que o autor
chama de microlínguas científico-profissionais, podemos fazer isso considerando duas diferentes
perspectivas: uma lingüística e outra glotodidática. A perspectiva lingüística objetiva a descrição
formal dessas variações da língua, o estudo da natureza sociolingüística delas e a análise da
função pragmática que elas desenvolvem na comunicação. Esse enfoque serve de subsídio para o
estudo glotodidático, porque permite que se conheça o objeto a ser ensinado/aprendido.
Segundo o autor, a perspectiva glotodidática tem como fim “o estudo do problema
representado pela aquisição das microlínguas científico-profissionais e a descrição das possíveis
soluções para tal problema”. Busca estabelecer “a definição dos modelos relacionais docente-
aluno, de uma teoria curricular adequada, dos modelos operativos, do uso das gloto-tecnologias”.
Neste trabalho, portanto, ratificamos que a nossa perspectiva não é lingüística; não nos
propomos a tratar especificamente o objeto de atenção da abordagem LSP, mas sim um aspecto
educacional a relação professor-aluno em um curso de Italiano para Fins Acadêmicos,
norteado pela abordagem LSP. Quando usamos a expressão Línguas para Fins Específicos ou
Italiano para Fins Específicos / Acadêmicos queremos nos referir tão somente à abordagem,
conforme foi concebida por anglo-americanos.
Consideramos importante justificarmos as nossas escolhas terminológicas em relação ao
objeto de atenção da abordagem LSP, porque assim mostramos de forma clara qual é a nossa
posição a respeito das várias teorias surgidas.
Desta forma, adotamos a expressão “variações da língua”, porque ela foi usada por muitos
teóricos para definir o objeto em estudo. Verifiquemos isso com afirmações de alguns desses
teóricos:
Paolo Balboni (2000): As microlínguas científico-profissionais são uma variação de
língua;
Alberto Sobrero (1997): As variações diafásicas ou situacionais da língua
italiana compreendem por um lado os registros, por outro lado os subcódigos.
Giovanni Freddi (1994): A língua é um “sistema de sistemas” enquanto, no seu
interior, registra a presença de variações sociais (socioletti), de variações geográficas
(regioletti) e de variações especializadas (microlingue) que são as vozes das ciências,
das tecnologias ou de particulares setores de trabalho de grupo.
Entre as denominações propostas pelos estudiosos para essas variações da língua,
consideramos mais adequada a adotada recentemente por Paolo Balboni (2000): microlínguas
científico-profissionais.
Balboni (ibid.) afirma que o termo “microlíngua” nasceu da idéia da língua como
“polissistema” (polisistema) ou conforme diz Giovanni Freddi em todas as suas obras sobre o
tema a partir de 1970 “macrolíngua”. Segundo essa concepção, uma “macrolíngua” inclui
registros, variações geográficas e microlínguas científico-profissionais. De acordo com Balboni
(ibid.), o prefixo “micro-” deve ser considerado através do aspecto quantitativo, significando
“limitado (Firth usava restricted) na seleção dos elementos no interior de cada um dos planos que
compõem a ‘língua’ ”. Uma “microlíngua” é uma fração da “(macro)língua”. Essa definição,
porém, levava a se pensar erroneamente que também seriam microlínguas as gírias
3
. Assim, com
o intuito de demonstrar, de modo claro e preciso conforme o campo científico exige —, o que
o termo “microlíngua” significa, Balboni passou a usar o adjetivo composto “científico-
profissional”, acompanhando o referido termo. Assim, a expressão “microlínguas científico-
profissionais”, segundo o autor (ibid.), se refere às:
microlínguas (produzidas, isto é, a partir da seleção no interior de todos os
componentes da competência significativa em uma língua) usadas nos setores
científicos (pesquisa, universidade) e profissionais (do operário ao engenheiro, do
enfermeiro ao médico, do estudante do Ensino Médio ao crítico literário), com os
objetivos de comunicar na maneira o menos ambígua possível e de permitir que seus
usuários sejam reconhecidos como pertencentes a um setor científico ou profissional.
3
Balboni (2000) usa o termo italiano gerghi, que tanto pode ser traduzido, no português, como gírias”
quanto como “jargões”, este significando “gírias profissionais” (Ferreira, 1986); no texto consultado,
porém, Balboni faz referência somente a “gírias”, porque define o termo gerghi como sendo “variações
usadas por certos grupos, não necessariamente de baixa condição social, para se comunicarem entre
eles sem serem compreendidos por não-iniciados”.
De acordo com Balboni, essa variação da língua, em relação ao uso, pode ter um objetivo
epistemológico voltado para o conhecimento científico ou um objetivo relacional,
interpessoal ou instrumental voltado para a prática. Balboni esclarece que, no termo
microlíngua científico-profissional”, o adjetivo “científico” se refere a textos de caráter
epistemológico; já o adjetivo “profissional” se refere a textos de caráter relacional, operativo.
Com base no que acabamos de expor, consideramos a denominação “microlíngua
científico-profissional”, proposta por Balboni, a mais adequada para se referir às variações da
língua que são objetos de atenção da abordagem LSP, porque essa denominação é a que melhor
faz referência aos dois desdobramentos dessa abordagem, quais sejam conforme
informamos — o LAP — Languages for Academic Purposes / Línguas para Fins Acadêmicos —,
voltado para o campo acadêmico e científico, e o LPP — Languages for Professional Purposes —
voltado para o campo profissional.
É preciso esclarecer que essa associação entre a abordagem LSP e as variações
lingüísticas que ela trata fundamental a nosso ver —, é fruto de nossa reflexão. Paolo Balboni
não apresenta, em seus estudos, uma associação desse tipo. Na verdade, nenhum dos teóricos
italianos que se ocuparam do tema em questão deram uma atenção adequada à abordagem LSP.
Consideramos isso uma incoerência, tendo em vista que foi essa abordagem que, disseminada
pelo mundo, chamou a atenção para as variações lingüísticas a que nos referimos.
O próprio Paolo Balboni, em sua obra Dizionario di glottodidattica (1999), no verbete
LSP, considera essa sigla e naturalmente a expressão Languages for Specific Purposes, a que
ela se refere sinônimo do que o autor chama de microlínguas científico-profissionais. Nessa
mesma obra, no verbete “microlíngua (científico-profissional)”, Balboni faz a seguinte
afirmação:
(...) o termo “microlíngua” é considerado mais adequado, por alguns estudiosos, do
que expressões como “Língua para fins especiais” (do inglês Languages for
Specific/Special Purposes, freqüentemente abreviado LSP), que privilegia o aspecto
pragmático (...).
Sabemos que essas variações da língua existiam muito antes do desenvolvimento da
abordagem LSP; o estudo sobre elas não precisa estar vinculado a essa abordagem. Já afirmamos
que podemos assumir tanto uma perspectiva glotodidática quanto uma perspectiva lingüística ao
tratá-las. Porém, se usarmos a sigla LSP ou a expressão a que ela se refere, Línguas para Fins
Específicos—, estaremos obrigatoriamente fazendo alusão à abordagem reconhecida por essa
sigla. Para atestarmos isso, basta recorrermos ao histórico da abordagem (tópico 2.2 deste
capítulo).
É importante observarmos que as microlínguas científico-profissionais podem ser
estudadas no contexto da língua materna ou no contexto de uma língua estrangeira. Já a
abordagem LSP foi concebida somente para o estudo dessas variações da língua no contexto de
uma língua estrangeira.
3. O ITALIANO PARA FINS ESPECÍFICOS NA HISTÓRIA DA DIDÁTICA
DO ITALIANO PARA ESTRANGEIROS
La glottodidattica italiana ha raggiunto livelli di estrema compattezza concettuale.
(Balboni, 1994)
A didática do italiano para estrangeiros alcançou um desenvolvimento considerável nos
últimos tempos. A criação do Centro Italiano de Lingüística Aplicada – C.I.L.A. – em 1965, e da
Sociedade Lingüística Italiana S.L.I. –, em 1966, e as atividades e pesquisas desenvolvidas
pelas Universidades para Estrangeiros de Siena e de Perúgia e pela Terceira Universidade de
Roma, por exemplo, colocam em evidência a preocupação com o ensino do italiano para
estrangeiros no mundo.
Essas Instituições italianas se esforçaram para suprir a carência quase exclusiva da
língua italiana em relação às outras línguas modernas de instrumentos didáticos adequados à
atualidade e para ajudar na formação e atualização de professores estrangeiros de italiano.
Massimo Vedovelli (Torchia, 1999) afirmou que a situação da difusão do italiano entre
estrangeiros e do seu ensino está mudando lentamente, mas decisivamente”. Esse processo de
mudança começou a ocorrer pelo menos a partir do início da década de 80 do século XX.
Vedovelli diz que os principais fatores que impulsionaram esse processo foram a unificação da
língua italiana e os novos motivos de interesse para a sociedade italiana, ligados sobretudo à
modernização nos diversos setores da vida humana.
Particularmente a unificação política italiana, realizada entre 1859 e 1870, trouxe grandes
mudanças em toda a Itália e favoreceu de modo determinante a consolidação da língua nacional.
Ignazio Baldelli e Nino Scivoletto (1979) afirmaram que os acontecimentos políticos e sociais do
século XX exerceram uma forte pressão para a difusão da língua nacional; entre os quais citamos
os deslocamentos da população, os novos meios de comunicação em massa, a instrução gratuita e
obrigatória até os 14 anos. A diminuição radical do analfabetismo na Itália foi um dos resultados
dessa campanha nacional voltada para a questão lingüística. Em 1860, 75% dos italianos eram
analfabetos; já em 1991, esse percentual era de apenas 2,4 (Serianni, 2002).
Isso se refletiu diretamente sobre a história da didática do italiano, e o desenvolvimento
de uma tradição científica italiana no campo lingüístico foi possível depois dessas
transformações por que a Itália passou.
Segundo Vedovelli (Torchia, 1999), antes da unificação lingüística, era muito difícil para
os estrangeiros ter um modelo de língua italiana efetivamente de uso. Então, em relação ao
ensino/aprendizagem do italiano para estrangeiros, podemos concluir que antes da unificação
política e lingüística, o problema era “qual italiano” ensinar/aprender, já que havia muitos
dialetos, sem que existisse uma língua nacional. Havia um problema lingüístico interno na Itália.
Depois da unificação lingüística, a questão passa a ser como ensinar o italiano standard de modo
eficiente
4
.
Essa e outras questões lingüísticas passaram a ser mais investigadas a partir dos anos 60
do século XX, quando a chamada glotodidática
5
(glottodidatica) começou a estabelecer-se na
Itália.
4
Ainda hoje, não podemos dizer, porém, que o problema lingüístico interno na Itália tenha sido totalmente
resolvido. Segundo Paolo Balboni (1996), “a luta contra os dialetos durou um século”— aproximadamente
de 1860 a 1960 —, mas, segundo Francesco Sabatini (1996), atualmente a língua italiana ainda varia de
região para região e os dialetos ainda são usados, mesmo que por grupos cada vez menores de
pessoas, que são geralmente idosos com pouca ou nenhuma escolaridade. Vale ressaltar que, a partir da
década de 70 do século XX, estabeleceu-se, nas escolas italianas de ensino fundamental e médio, o
estudo dos dialetos apenas como uma maneira de preservar a história lingüística italiana.
5
No Brasil, o termo “glotodidática” é um neologismo. Não existe uma “glotodidática brasileira”. Aqui
atualmente a área de ensino/aprendizagem de línguas, materna e estrangeiras, interessa sobretudo à
Lingüística Aplicada.
Nessa época, desenvolviam-se discussões sobre campos de pesquisa e formação
universitárias da pedagogia da linguagem e da filosofia da linguagem aplicada ao ensino
lingüístico. Essas discussões tratavam ainda quase que exclusivamente das áreas “italiano como
língua materna” e “línguas clássicas”.
O termo “glotodidática” foi introduzido na Itália por Renzo Titone nos anos 60 do século
XX (Titone, 1997) e significa “didática das línguas”. Foi adotado na Itália para definir a ciência
que se ocupa do ensino/aprendizagem das línguas de um modo geral, ou seja, ngua nacional,
segunda língua, línguas estrangeiras modernas e línguas clássicas. É, na concepção italiana, a
moderna didática das línguas. É uma ciência teórico-prática e interdisciplinar, porque utiliza as
contribuições de ciências da linguagem, da comunicação, da educação e de ciências psicológicas.
Dissemos que a Glotodidática é uma ciência da educação lingüística. Entende-se, por
educação lingüística, a parte da educação geral do homem que é assegurada pelas linguagens
verbais. É um processo unitário que se realiza através da língua materna, da segunda língua, das
línguas estrangeiras, das línguas clássicas, das línguas étnicas. A filosofia de fundo da integração
das várias línguas em um único conceito de educação lingüística consiste no deslocamento do
foco de interesse da língua como produto, para a língua como processo comunicativo, expressivo
e cognitivo. O desenvolvimento desses processos é o objetivo da educação lingüística, que se
concretiza nas três metas educativas gerais de cada processo formativo: aquisição de modelos
culturais (culturizzazione), socialização e autopromoção do sujeito (Balboni, 1999).
Tanto nos anos 60 quanto nos anos 70, a glotodidática italiana que então se
apresentava como uma disciplina foi marcada de forma relativamente forte pela importação
científica, principalmente de abordagens inglesas com tradição na Lingüística Aplicada os
assim chamados Linguistics Applied Approachesde origem estruturalista, como, por exemplo,
as abordagens de Sweet, Palmer, Jespersen e Firth. Isso conduziu, do ponto de vista conceitual, a
uma identificação da glotodidática italiana, no início do seu desenvolvimento, com a Lingüística
Aplicada. Posteriormente a Glotodidática alcançou o status de ciência da educação lingüística
através da atuação de estudiosos como Giovanni Freddi, Anna Ciliberti e Paolo Balboni.
O desenvolvimento dessa ciência favoreceu muito a difusão do italiano no mundo. Se hoje
temos à disposição diversos manuais para o ensino/aprendizagem dessa língua para estrangeiros,
publicados por editoras italianas, podemos dizer que isso é fruto principalmente do esforço dos
glotodidatas para acompanhar os avanços na área e adaptá-los ao seu contexto. Portanto, a
superação das dificuldades que a Glotodidática enfrentou para se afirmar como ciência na Itália é
muito significativa, considerando o árduo caminho que este país percorreu até tomar parte nas
discussões no campo lingüístico em âmbito internacional.
A abordagem LSP, conforme afirmamos, tem origem anglo-americana. A atenção, por
parte dos glotodidatas italianos, dedicada a ela e às questões ligadas à mesma, gerou
recentemente uma espécie de boom editorial na Itália. Várias editoras italianas de prestígio
publicaram manuais didáticos para o ensino/aprendizagem do italiano para fins específicos.
A Editora Guerra, de Perúgia, por exemplo, através de um projeto desenvolvido pelo
Centro Lingüístico de Ateneu, da Universidade dos Estudos de Parma, publicou uma coleção
didática dedicada ao italiano para fins específicos, voltada para três setores: Economia, Direito e
Medicina. Pela mesma editora também foram publicados manuais voltados para o Turismo, a
Arte, o Marketing e a Administração.
Um outro exemplo, é a Editora Bonacci, de Roma, que publicou manuais da área em
questão voltados para os negócios, para a Arquitetura, a Medicina, a Jurisprudência e as Ciências
Políticas.
4. A TRADICIONAL ASSIMETRIA EM EDUCAÇÃO
La natura di un rapporto è determinata dal defluire comunicativo tra i partner.
(Watzlawick, apud Ciliberti, 1997)
A questão da assimetria em sala de aula, considerando a relação professor-aluno, tem sido
tema central de diversas dissertações de Mestrado e teses de Doutorado, sobretudo na área de
Lingüística Aplicada. Neste trabalho, dedicamos este capítulo 4 a esse tema, procurando apontar
os fatores que determinam que a relação professor-aluno, em contextos institucionais, seja
tipicamente assimétrica. Abordamos esse tema na medida que consideramos suficiente para que
pudéssemos descrever e analisar a relação professor-aluno em um curso de italiano para fins
acadêmicos — este sim o objetivo central desta dissertação de Mestrado.
Quando nos propomos a descrever e analisar a relação professor-aluno em um curso de
italiano para fins acadêmicos, queremos nos referir, com o termo relação”, ao relacionamento, à
ligação entre estes dois sujeitos no contexto citado, considerando o poder em sala de aula e o
conhecimento cognitivo desses sujeitos.
Queremos deixar claro que “relação” não é o mesmo que interação”. Este último termo
significa a ação que se exerce mutuamente entre duas ou mais pessoas (Ferreira, 1986). Podemos
interagir com várias pessoas através da conversação e ter, com cada uma delas, uma relação
diferente. O tipo de interação que se estabelece entre os indivíduos pode ser determinado por
vários fatores, entre os quais a idade, a condição econômica e a relação social. Assim, por
exemplo, costumamos conversar de um modo com uma pessoa idosa e de outro com uma criança;
de um modo com o nosso chefe, e de outro com um amigo íntimo. Isso reflete a existência de
regras sociais de interação, que, se respeitadas e praticadas pelos indivíduos, proporciona-lhes uma
boa aceitação deles no meio social.
No contexto educacional, a interação tem sido considerada o foco central do processo
ensino/aprendizagem. A esse respeito, Luiz Paulo da Moita Lopes (2002) afirma o seguinte:
A visão de Vygotsky e Bruner coloca o foco na interação entre o aprendiz e o
professor na construção do conhecimento comum. Ou seja, esta é uma teoria
educacional que questiona a chamada aprendizagem centrada no aprendiz, posto que
interação implica ação conjunta para o desenvolvimento de conhecimento comum.
As relações de diálogo podem ser explicadas através do parâmetro distância social versus
poder do indivíduo. Dizemos que uma relação é simétrica quando não distância social e o
poder é equilibrado. É o caso, por exemplo, da interação entre dois diretores de empresas. Por
outro lado, a relação é assimétrica quando distância social e desequilíbrio de poder, como
ocorre, por exemplo, na interação entre chefe e empregado.
A sala de aula é um dentre os vários contextos institucionais do mundo social em que os
indivíduos, através da interação, se envolvem em relações de poder. Segundo Moita Lopes
(2002), “o poder atravessa a sociedade em diferentes direções, dependendo das relações sociais
nas quais as pessoas se envolvem por meio de diferentes práticas discursivas”. Essa trama
permite a construção de identidades sociais. No campo educacional, professores e alunos,
segundo Mercer (1995), “não deixam suas identidades sociais do lado de fora da classe, e a
linguagem de sala de aula é um meio de expressar e manter tais identidades, tanto como de
redefini-las”.
A relação entre poder e conhecimento pode contribuir para a simetria ou a assimetria em
sala de aula. Sobre esse aspecto, recorremos à teoria foucaultiana (Foucault, 1995):
Saber e poder se implicam mutuamente: não há relação de poder sem constituição de
um campo de saber, como também, reciprocamente, todo saber constitui novas
relações de poder. Todo ponto de exercício do poder é ao mesmo tempo um lugar de
formação de saber.
Assim, a relação professor-aluno é tipicamente assimétrica: o professor controla o
discurso e, portanto, detém o poder (Moita Lopes, 1996). Ele é, segundo Vigotsky (Rego, 1995),
o par mais competente, o elemento que possibilita a construção do conhecimento. O aluno é um
elemento que não tem o conhecimento e, por isso, não detém o poder. Moita Lopes (2002) afirma
o seguinte sobre a questão da relação assimétrica entre professor e aluno:
Na sala de aula (...) o desenvolvimento de conhecimento comum não é uma atividade
simples para alunos e professores. A dificuldade está, principalmente, calcada na
relação assimétrica entre o aluno e o professor, que atua como empecilho para o que
Bruner (1983) chama de handover, ou seja, o ponto em que o adulto, isto é, o
professor, passa a competência para o aluno. O ato de passar a competência para o
aluno implica, portanto, que o professor é o possuidor de um conhecimento que o
aluno não tem, e isto os envolve em uma relação de poder, que é extremamente
importante para a compreensão de como o conhecimento comum é criado na sala de
aula através da interação entre aluno e professor.
Alice Maria da Fonseca Freire (Cox; Assis-Peterson, 2003) reforça essa idéia com a
seguinte afirmação:
(...) o discurso da sala de aula é caracterizado pela seqüência Iniciação, Resposta,
Avaliação, cabendo ao professor o primeiro e o terceiro movimentos, e ao aluno,
apenas o segundo. Uma análise rápida da afirmação acima demonstra que a
distribuição do poder não é equilibrada nessa interação: o professor não só tem
direito a mais turnos, como também a ele cabe iniciar a seqüência e avaliá-la. Aos
alunos cabe apenas responder. Portanto, não se trata apenas de uma questão
quantitativa, mas também qualitativa: a questão não se esgota em uma análise de
quem fez mais uso da palavra, mas para que a palavra é usada. Essa análise se aplica
praticamente a todas as salas de aula, mas, no caso da sala de aula de língua
estrangeira, há um fator complicador, uma vez que o aluno é chamado a participar da
interação usando um código que ele está aprendendo, a própria língua estrangeira.
Esse fato tende a reforçar a centralização do poder na mão de uma pessoa o
professor.
O arranjo espacial em sala de aula também é um fator que determina o tipo de interação
estabelecida entre os indivíduos envolvidos no processo educacional. O arranjo tradicional de
sala de aula reafirma a posição de autoridade do professor e tem contribuído para a relação
assimétrica entre este e os alunos: o professor ocupa uma posição de destaque na parte dianteira
da sala de aula, e os alunos ocupam carteiras enfileiradas, de frente para o professor. Esse arranjo
dificulta o livre e igual acesso dos participantes à interação.
Portanto, a assimetria em diálogo, típica no contexto educacional, está relacionada
também a fatores como a quantidade de fala dos participantes e o domínio semântico, interacional
e estratégico deles. De acordo com Alice Maria da Fonseca Freire, na citação anterior, o
professor, por ser o par mais competente, é o elemento que tem mais direito a turnos de fala e,
por isso, domina o discurso.
No capítulo 6 deste trabalho, verificaremos que a assimetria típica da sala de aula de
língua estrangeira não se verifica em cursos LSP; verificaremos ainda por que isso acontece.
5. METODOLOGIA DE PESQUISA
We always have an obligation to attempt to answer practical questions in the light of
the best available knowledge.
(Corder, 1980)
5.1. Conceito, características e breve histórico da pesquisa etnográfica
Antes de tratarmos a etnografia enquanto abordagem de investigação científica
adotada na realização desta pesquisa —, é importante esclarecermos que entendemos que o
caráter científico do nosso trabalho independe do tipo de metodologia de pesquisa que adotamos.
Seguindo o pensamento de Giorgi, Moita Lopes (1994) afirma que, para que uma investigação
seja científica, é preciso que ela seja:
a) metódica (os procedimentos de investigação têm de estar claros); b) sistemática (o
conhecimento produzido deve ser inter-relacionado, ou seja, a investigação de uma
determinada questão não pode ignorar outras); c) criticada pelo próprio pesquisador e
oferecida à crítica dos pares na comunidade científica.
Considerando esses três critérios, podemos afirmar que o nosso trabalho é científico: é
metódico, porque nós seguimos procedimentos de investigação que incluem sobretudo uma linha
de pesquisa, a etnografia; é sistemático, porque acreditamos termos conseguido organizar e
apresentar as idéias de forma coerente e coesa, inter-relacionando-as; e finalmente, o
poderíamos deixar de cumprir o terceiro critério, porque, sendo uma Dissertação de Mestrado,
para que seja aprovada e publicada, deve ser submetida previamente à apreciação de uma banca
julgadora, geralmente composta por Professores Doutores da mesma área.
Assim, feito este esclarecimento prévio, passamos a tratar a metodologia de pesquisa que
adotamos, a etnografia, seu conceito, suas características e os traços que consideramos relevantes
sobre a sua história.
A pesquisa etnográfica é um tipo de investigação científica que se insere na tradição
qualitativa e interpretativista. Preocupa-se sobretudo com a descrição e a interpretão de
significados construídos pelos seres humanos em contextos sociais específicos, considerando a
perspectiva dos participantes. Uma pesquisa qualitativa, como a etnográfica, apresenta as
seguintes características (Ludke; André, 2003):
1. A sua fonte direta de dados vem do ambiente natural, ou seja, do ambiente em que os fatos
investigados ocorrem naturalmente, sem manipulação dos participantes. Por essa razão, todo
estudo qualitativo é considerado “naturalístico”;
2. O seu principal instrumento é o próprio pesquisador. Este deve realizar um trabalho intensivo
de campo, estabelecendo um contato direto e prolongado com o ambiente e a situação
investigada, porque eles são muito influenciados pelo contexto;
3. Envolve a obtenção de dados predominantemente descritivos; são feitas descrições sobretudo
de pessoas, situações e acontecimentos. A atenção, por parte do pesquisador, ao maior
número possível de elementos que compõem o contexto em que se insere a pesquisa é de
suma importância para o processo de compreensão do problema investigado;
4. A preocupação com o processo é maior do que com o produto. No estudo de um determinado
problema, o pesquisador se interessa pelo modo como esse problema se manifesta nas
atividades e interações cotidianas;
5. Existe a preocupação em retratar a perspectiva dos participantes (incluindo o pesquisador)
sobre o contexto e o todo do contexto social. “Ao considerar os diferentes pontos de vista dos
participantes, os estudos qualitativos permitem iluminar o dinamismo interno das situações,
geralmente inacessível ao observador externo” (André; Ludke, 2003);
6. Geralmente a análise dos dados segue um processo indutivo: chega-se às abstrações, às leis
gerais a partir de fatos particulares.
A abordagem interpretativista foi desenvolvida no campo da antropologia e da sociologia,
porque a abordagem positivista, de longa tradição nas ciências naturais — a botânica, a zoologia,
a mineralogia e a petrologia —, não dava conta de forma satisfatória das realidades sociais.
Verifiquemos o que diz Moita Lopes (1994) a esse respeito:
(...) aqueles que defendem a posição interpretativista como a maneira mais adequada
de produzir conhecimento nas Ciências Sociais argumentam que a natureza do objeto
de investigação das Ciências Sociais é tão diversa do das Ciências Naturais, que não
se justifica a utilização de meios e procedimentos das Ciências Naturais nas Ciências
Sociais. (...) O que é específico, no mundo social, é o fato de os significados que o
caracterizam serem construídos pelo homem, que interpreta e re-interpreta o mundo a
sua volta, fazendo, assim, com que não haja uma realidade única, mas várias
realidades.
Além disso, a inadequação dos procedimentos das ciências naturais nas ciências sociais
torna-se evidente ao considerarmos que, nas ciências sociais, a utilização da linguagem pelo
homem; nas ciências naturais isso não ocorre. “A linguagem possibilita a construção do mundo
social e é a condição para que ele exista” (Moita Lopes, 1994).
A etnografia, uma das formas que pode assumir uma pesquisa de tradição qualitativa e
interpretativista, surgiu no final do culo XIX como uma proposta de observação holística dos
modos de vida das pessoas. Suas primeiras manifestações são atribuídas a livros de viagem que
descreviam sociedades exóticas. Analisando a etimologia da palavra etnografia, temos: etno-, do
grego éthnos, que significa “raça”, “nação”, “povo”; e -grafia, vem do grego grápho, que
significa “descrever”, “escrever”, “descrição”, “escrita”. Podemos dizer, portanto que o termo
etnografia significa etimologicamente “a descrição de um povo”.
Por definição, a etnografia é a disciplina que estuda os povos para descrevê-los,
identificando língua, raça, religião, manifestações materiais etc. . É parte integrante da etnologia,
que estuda a cultura dos chamados povos naturais, isto é, povos que têm pouco desenvolvimento
técnico ou reduzidos meios para dominar a natureza. A etnologia é um ramo da antropologia,
cuja definição é a seguinte (Ferreira, 1986):
A ciência que reúne várias disciplinas cujas finalidades comuns são descrever o
homem e analisá-lo, com base nas características biológicas (antropologia física) e
culturais (antropologia cultural) dos grupos em que se distribui, dando ênfase, através
das épocas, às diferenças e variações entre esses grupos.
A etnografia também é conhecida como pesquisa social, observação participante,
pesquisa interpretativa, pesquisa analítica, pesquisa hermenêutica. Tradicionalmente realizada
por antropólogos e sociólogos, a pesquisa etnográfica é relativamente recente no campo
educacional, mas é considerada a mais adotada para as investigações em sala de aula. Foi no
início da década de 70 do século XX que pesquisadores da área de educação começaram a
utilizar as técnicas etnográficas em pesquisas.
O processo de adoção desse tipo de abordagem na área educacional fez com que ela
sofresse adaptações, afastando-se um pouco da sua proposta original advinda do campo da
antropologia. O uso da etnografia em educação pressupõe sobretudo uma preocupação em pensar
o ensino/aprendizagem dentro de um contexto cultural amplo (Ludke; André, 2003). Através da
etnografia, é possível revelar as relações e interações que ocorrem no interior da escola, “de
forma a abrir a ‘caixa preta’ do processo de escolarização” (Mattos, 2001).
Sendo de base qualitativa e interpretativista, a pesquisa etnográfica focaliza os aspectos
processuais do mundo social, e não um produto padronizado. Padronizações, análise estatística
dos dados e generalizações geralmente são considerados procedimentos que distorcem a
realidade social. Esta seria passível apenas de interpretação, tendo em vista a multiplicidade dos
significados que são construídos. Porém, Carmen Lúcia Guimarães de Mattos (2001) chama a
atenção para a seguinte questão:
Na abordagem dialética, temos interesse na totalidade do problema e não
simplesmente no tratamento isolado de uma parte do mesmo. Entretanto, isto não
significa que abandonemos a estatística como método de tratamento de dados; ao
contrário, a quantificação utilizada de maneira sensível será de grande valia para a
análise etnográfica.
A pesquisa etnográfica não visa à objetividade. Baseia-se sobretudo em uma
intersubjetividade, isto é, na interação entre dois ou mais sujeitos. Segundo Moita Lopes (1994),
“a intersubjetividade tenta dar conta dos significados possíveis sobre a sala de aula e é um
critério para estabelecer a validade da interpretação do pesquisador”. Essa interpretação se
realiza através da técnica de triangulação, que é o entrecruzar de vários pontos de vista.
Em uma pesquisa etnográfica, a coleta de dados é feita através de vários instrumentos,
tais como observação direta das atividades desenvolvidas pelo grupo estudado; elaboração de
diários por parte tanto do pesquisador-participante quanto dos outros participantes; gravação em
vídeo e/ou em áudio; realização de entrevistas e questionários; análise de documentos,
fotografias etc.; aplicação de testes psicológicos. O pesquisador se utiliza de quaisquer
instrumentos que possam apresentar descrições ou interpretações do contexto investigado.
Muitas vezes as técnicas têm de ser desenvolvidas para atenderem à realidade do trabalho de
campo. O modo como as técnicas e os procedimentos são utilizados o segue padrões rígidos
ou pré-determinados. Isso é determinado pelo senso que o pesquisador desenvolve a partir do
trabalho de campo no contexto social. Segundo Carmen Lúcia Guimarães de Matos, “a descrição
etnográfica depende das qualidades de observação, da sensibilidade ao outro, do conhecimento
sobre o contexto estudado, da inteligência e da imaginação do etnógrafo”. Geralmente o percurso
da investigação é norteado por três estágios. O primeiro é o de exploração, caracterizado pela
entrada no campo investigado e coleta de dados; o segundo estágio é o de decisão sobre os
fenômenos que serão focalizados; e o último estágio é o de interpretação desses fenômenos
(Ludke; André, 2003).
A pesquisa etnográfica pode apresentar-se como uma macroanálise ou como uma
microanálise. A macroanálise etnográfica está voltada para a descrição de uma sociedade,
considerando as relações sociais que ela manifesta, o seu papel como parte de uma nação e a sua
relação com outras sociedades.
A microanálise etnográfica objetiva descrever formas localizadas de organização em uma
sociedade, como por exemplo a organização de uma unidade social (uma vila, uma escola, um
hospital, etc.), a comunicação estabelecida em uma sala de aula, encontros face a face, etc. . Em
microanálise se enfatiza o significado das formas de envolvimento das pessoas como atores,
exigindo do pesquisador um detalhamento criterioso na descrição do comportamento desses
atores. Além disso, existe uma preocupação com o interesse desses atores sociais na escolha de
uma determinada forma de comportamento e com o significado desta escolha (Mattos, 2001). É
preciso considerar que, quando um grupo de pessoas se reúne para se socializar, uma ordem
social é estabelecida para esse grupo particular de indivíduos. Mattos acrescenta:
Isso acontece nas escolas, nas fábricas, nos hospitais, nos escritórios, onde quer que
as pessoas se encontrem regularmente para se socializar de alguma forma. Existe
uma ética de organização e um significado que é peculiar a este grupo
especificamente. A etnografia está interessada no significado local para estas pessoas
em particular. (...) O interesse no local e no particular está inerentemente conectado
com o interesse no geral e universal.
Destacamos que a microanálise etnográfica fornece elementos para a macroanálise
etnográfica: “só podemos aprender sobre a universalidade estudando os casos particulares”
(Mattos, 2001).
Nossa pesquisa explora o universo de uma sala de aula de italiano para fins acadêmicos.
Trata-se, portanto, de uma microanálise etnográfica, que visa à descrição e à interpretação da
relação professor-aluno nesse contexto específico. Para tanto, procuramos seguir os pressupostos
desta metodologia de pesquisa. Trataremos com mais detalhes, no próximo tópico, o contexto de
investigação e a forma como realizamos a coleta de dados.
5.2. O contexto da pesquisa: o curso de extensão L’arte del costruire: curso de italiano
técnico
O nosso trabalho é uma investigação de tipo etnográfica sobre a relação professor-aluno
em um curso de italiano para fins acadêmicos. Obviamente o trabalho de campo precisava se
realizar nesse contexto, isto é, em um curso de italiano desse tipo. Esses cursos, porém, não são
realizados com freqüência, em nível institucional, na cidade do Rio de Janeiro. Acreditamos que
isso se deva ao fato de não haver uma boa divulgação da abordagem LSP no Brasil como um
todo.
Considerando essa realidade, a solução que encontramos para podermos realizar o nosso
trabalho de campo foi solicitarmos à Diretoria Adjunta de Cultura e Extensão da Faculdade de
Letras da UFRJ, através da apresentação de um projeto, o oferecimento de um curso de extensão
que atendesse aos nossos interesses. O projeto foi aprovado e o curso se realizou no segundo
semestre de 2004. Para que possamos ter uma visão geral das etapas que foram seguidas e
quando elas aconteceram, verifiquemos o quadro abaixo:
Etapas Descrição das etapas Períodos
1 Planejamento do curso de extensão e
da coleta de dados
Março de 2004
2 Apresentação do projeto de curso de extensão e
aprovação do mesmo
Abril de 2004
3 Divulgação do curso De 01-08 a 01-09-2004
4 Período de inscrição no curso De 18-08 a 01-09-2004
5 Realização do curso e da coleta de dados De 01-09 a 31-10-2004
As aulas do curso de extensão foram ministradas pela autora desta pesquisa, a Professora
Simone Flaeschen. A Coordenadora do projeto foi a Professora Doutora Annita Gullo,
Orientadora desta pesquisa.
Vejamos agora com mais detalhes como foi o planejamento do curso de extensão e a sua
realização. Depois trataremos a coleta de dados.
Precisávamos oferecer à comunidade um curso de italiano para fins acadêmicos. A
primeira questão que enfrentamos foi decidir qual curso ou quais cursos acadêmicos
focalizaríamos. Optamos pelos cursos de Arquitetura, Engenharia Civil e Belas Artes da UFRJ
pelos seguintes motivos:
1º) Há, disponível no mercado brasileiro, um manual didático intitulado L’arte del costruire
(Troncarelli; Vannini, 1995), projetado para o ensino/aprendizagem do italiano da Arquitetura. O
manual é de nível elementar e intermediário e é constituído de um livro do estudante e de um
guia para o professor. A nossa intenção era a de nos basearmos neste manual didático para
selecionarmos o conteúdo programático do curso de extensão e elaborarmos uma apostila;
2º) Desejávamos atrair o maior número possível de alunos para a inscrição no curso de extensão.
A nosso ver, se o oferecêssemos somente aos alunos e profissionais de Arquitetura, correríamos
o risco de não termos muitos alunos inscritos. Decidimos, então, oferecer o curso também aos
alunos de Engenharia Civil e Belas Artes, porque essas três áreas são consideradas afins;
3º) O terceiro motivo, teve um caráter prático: o fato de a Faculdade de Letras da UFRJ local
onde se realizaria o curso de extensão ser muito próxima às Faculdades de Arquitetura, Belas
Artes e Engenharia Civil da UFRJ locais onde se encontraria o público-alvo. As Faculdades
de Arquitetura e de Belas Artes funcionam no prédio da Reitoria da UFRJ, em um terreno ao
lado da Faculdade de Letras; e a Faculdade de Engenharia Civil funciona no Centro de
Tecnologia da UFRJ, em um terreno em frente à Faculdade de Letras.
4º) O quarto motivo foi de havermos constatado que universitários de Arquitetura e Belas
Artes interessam-se pelo estudo da língua italiana. Muitos alunos dessas áreas freqüentam o curso
de italiano do CLAC Cursos de Línguas Abertos à Comunidade —, oferecido pelo Setor
Cultural da Faculdade de Letras da UFRJ.
Esses foram os quatro motivos que influenciaram a nossa escolha em relação aos cursos
acadêmicos. Mas é importante estar claro que poderíamos ter escolhido qualquer outro curso
universitário, tal como a Medicina ou o Direito. Essa escolha não é tão importante, porque o
contexto é sempre o mesmo: o de um curso de italiano para fins acadêmicos. Lembramos que o
foco da nossa pesquisa é a relação professor-aluno dentro desse contexto.
Após escolhermos os cursos acadêmicos para os quais o nosso curso-laboratório estaria
voltado, estipulamos a sua duração: 16 encontros de uma hora e meia cada, sendo dois encontros
por semana. A carga horária total seria de 24 horas. Os encontros aconteceriam nos meses de
setembro e outubro de 2004. Julgamos que o número de encontros e a carga horária que
estipulamos seriam suficientes tanto para que pudéssemos coletar dados para a nossa pesquisa,
quanto para satisfazer à comunidade em relação ao que lhe oferecíamos.
O curso de extensão recebeu o título L’arte del costruire: curso de italiano técnico.
Procuramos elaborar estrategicamente um título que atraísse o nosso público-alvo e que desse
conta da proposta do curso. Se o intitulássemos, por exemplo, de Curso de Italiano para Fins
Acadêmicos, as pessoas não entenderiam qual seria a sua proposta e nem para qual público
estaria voltado. O curso segue a abordagem LSP, mas isso não precisa ser evidenciado, no título,
para os interessados, porque eles não precisam entender de abordagens e de métodos de ensino
de línguas. Além disso, conforme já afirmamos, essa abordagem não é muito divulgada no
Brasil.
Assim, aproveitamos o nome do manual didático que utilizamos, L’arte del costruire
(Troncarelli; Vannini, 1995), no título do curso de extensão, por dois motivos: primeiro porque
essa expressão italiana, que significa em português “a arte de construir”, é facilmente entendida
por qualquer brasileiro, uma vez que o italiano e o português são duas línguas neolatinas; o outro
motivo é que essa expressão sugere as áreas para as quais o curso está voltado: Arquitetura,
Belas Artes e Engenharia Civil. Utilizamos o subtítulo Curso de italiano técnico, porque
sabemos que as pessoas de um modo geral entendem o termo “técnico” como se referindo ao
nível técnico da língua, exatamente o que queríamos que elas entendessem.
Vale ressaltar que um título, pelas suas características inerentes — expressão curta,
criativa, geralmente sem a presença de um verbo, etc. —, não precisa obrigatoriamente ser claro
e objetivo. Com o título L’arte del costruire: curso de italiano técnico, quisemos sobretudo
chamar a atenção do nosso público-alvo. Procuramos ser mais claros na ementa do curso, que foi
a seguinte: “curso de língua italiana, voltado para estudantes e profissionais de Arquitetura,
Engenharia Civil e Belas Artes”.
Em relação aos objetivos do curso de extensão, é preciso fazermos uma observação
importante. Conforme afirmamos anteriormente (capítulo 2, p. 15), os cursos LSP são baseados
nas necessidades do aluno. Os objetivos resultam, portanto, da análise prévia dessas
necessidades. É como se esses cursos fossem “encomendados” por grupos específicos de alunos.
No caso do nosso curso de extensão, não pudemos naturalmente seguir esse percurso, isto
é, as necessidades dos alunos determinando os objetivos do curso. Tivemos de seguir o percurso
inverso: estipulamos os objetivos do curso e buscamos um grupo de alunos que “aceitasse” esses
objetivos.
Desta forma, considerando o que acabamos de expor e também os fatores ligados ao
planejamento do curso duração, pré-requisito, etc. —, os principais objetivos que traçamos
para o mesmo foram os seguintes:
1) compreensão de textos em italiano ligados à Arquitetura, Belas Artes e Engenharia Civil;
2) Identificação das estruturas sintáticas italianas típicas dos textos ligados às referidas áreas
acadêmicas;
3) conhecimento e utilização de léxico ligado às referidas áreas;
4) aperfeiçoamento da capacidade de produção oral e escrita na língua italiana, no contexto das
referidas áreas;
5) reflexão crítica sobre o modo de conceber o conhecimento científico das referidas áreas nas
culturas brasileira e italiana.
A divulgação do curso foi feita através de vários exemplares de um cartaz elaborado para
esse fim. Esses exemplares do cartaz foram fixados na Reitoria onde ficam as faculdades de
Arquitetura e Belas Artes — e no Centro de Tecnologia, sobretudo no bloco onde se concentram
as disciplinas do curso de Engenharia Civil. O curso também foi divulgado da mesma forma na
Faculdade de Letras, onde foi ministrado.
A realização do curso de extensão contou com o seguinte cronograma:
Ordem
cronograma datas
Cumprimento do conteúdo programático De 01-09 a 25-10-2004
Avaliações com os alunos 27-10-2004
Resultado da prova escrita e encerramento do curso 31-10-2004
Foram disponibilizadas 30 vagas para o curso. Estipulamos como pré-requisito para
acompanhá-lo o conhecimento básico da língua italiana, mas não exigimos, no ato da inscrição,
nenhuma comprovação de conclusão de curso básico de italiano. O nível de conhecimento da
língua italiana por parte dos inscritos foi verificado nas primeiras aulas, através dos seguintes
instrumentos: desenvolvimento de uma dinâmica de interação entre a professora e o grupo de
alunos; elaboração de uma redação escrita pelos alunos; e aplicação de um material composto de
3 folhas, intitulado Revisione di elementi della morfologia della lingua italiana.
Inscreveram-se 28 pessoas no curso, vindas das faculdades de Arquitetura e Urbanismo
(FAU), Letras, Engenharia Civil e da Escola de Belas Artes (EBA). Desses, 20 freqüentaram o
curso, entre os quais 11 tiveram 75% de freqüência e, por isso, estes receberam o certificado
(anexo 1).
A prova escrita (anexos 4 - 6) realizada com os alunos no dia 27 de outubro de 2004 teve
um caráter informal; serviu para que tanto os alunos quanto nós pudéssemos ter uma idéia do
aproveitamento que eles tiveram do curso. A obtenção do certificado, como já afirmamos,
dependia apenas de se ter um mínimo de 75% de freqüência.
5.3. O conteúdo programático, o material didático e a metodologia do curso de extensão
Selecionamos o conteúdo programático com base sobretudo na duração do curso. Não
poderíamos utilizar todo o manual didático L’arte del costruire (Troncarelli; Vannini, 1995),
porque seria necessário bem mais do que 16 encontros para isso. Decidimos, então, selecionar
alguns conteúdos desse manual e elaborar, do nosso modo, uma apostila com eles. Essa apostila
foi o principal material didático utilizado pelos alunos em sala de aula (nos anexos 7 e 8 vêem-se
a capa da apostila, com o seu sumário, e a bibliografia consultada para elaborá-la).
O manual didático L’arte del costruire apresenta-se dividido em 3 módulos, sendo o
primeiro constituído de 8 unidades; o segundo, de 4; e o terceiro, de 9 “fichas de trabalho”. Já a
nossa apostila teve apenas 2 módulos; o primeiro com 6 unidades — contendo 6 temas e 9 fichas
de trabalho —; e o segundo com 2 unidades.
afirmamos que métodos diferentes têm sido aplicados em cursos que seguem a
abordagem LSP (tópico 2.1). Para o nosso curso de extensão, resolvemos seguir a metodologia
proposta pelo manual didático L’arte del costruire. Essa metodologia não foi nomeada pelas
autoras como sendo audio-oral, comunicativa, etc. —; foi apenas explicada no Guia do
professor. De acordo com as auroras, as unidades didáticas se desenvolvem da seguinte forma:
Segundo uma estrutura que compreende uma fase de percepção global do evento
comunicativo no qual se insere o texto, uma fase de análise e aprofundamento dos
usos lingüísticos que o caracterizam, e uma fase conclusiva de reutilização dos
aspectos examinados na produção.
Essas fases o foram evidenciadas na apostila que elaboramos, isto é, não utilizamos
nenhuma indicação que pudesse levar os alunos a identificá-las, porque essa identificação não
era relevante para nós. As fases, porém, se apresentam na seqüência descrita pelas autoras na
citação acima.
Tanto o manual que serviu de base para a apostila, quanto a própria apostila que
utilizamos apresentam basicamente, em cada unidade, um texto, seguido de exercícios sobre o
léxico especializado e o léxico da língua comum e sobre as estruturas da língua italiana mais
usadas na Arquitetura, Belas Artes e Engenharia Civil.
Outros materiais foram utilizados no decorrer do curso. Geralmente serviam para
complementar o assunto estudado, com informações que não havia na apostila, ou exercícios.
5.4. A coleta de dados
A coleta de dados foi realizada através dos seguintes instrumentos: diário da professora-
pesquisadora, Simone Flaeschen; diário de duas informantes, as estagiárias Cristiane Maria de
Franco e Sabrina Batista de Azevedo; gravações em áudio e em vídeo; e dois questionários.
Os diários foram escritos a cada encontro do Curso de Extensão pela professora-
pesquisadora e pelas duas informantes. Nos diários foram feitas anotações sobretudo sobre a
dinâmica das aulas e sobre o tipo de relação que se estabelecia entre a professora e os alunos.
A gravação em áudio foi feita apenas nos dois primeiros encontros do curso, enquanto o
equipamento que seria usado para filmar as aulas ainda não estava disponível. Foram produzidas
duas fitas de áudio. A maioria dos encontros foi filmada.
No primeiro dia de aula dia 01 de setembro de 2004 —, a professora-pesquisadora
esclareceu aos alunos que o curso fazia parte de uma pesquisa de Mestrado e que, por isso, as
aulas seriam filmadas. Ninguém se opôs a isso. Em seguida, a professora fez uma dinâmica para
que o grupo todo começasse a se conhecer. Ela falou um pouco de si para os alunos, sobretudo a
respeito da sua formação acadêmica e da sua experiência profissional. Em seguida pediu que
cada aluno se apresentasse e falasse um pouco de si e das expectativas em relação ao curso.
Depois da participação de todos nessa atividade, a professora entregou, a cada um, um material
composto de duas ginas, contendo dois textos em italiano (anexos 9 e 10): o primeiro
intitulado Che cosa vogliamo dire per corso di italiano tecnico?, e o segundo com o título Un
piccolo testo di italiano tecnico, legato sopratutto all’Architettura, alle Arti Plastiche e
all’Ingegneria Civile. A nossa intenção em relação ao primeiro texto foi a de expormos
informalmente aos alunos os objetivos principais do curso. Com o segundo texto quisemos dar
aos alunos uma pequena amostra de um texto ligado às suas áreas acadêmicas de estudo e
atuação.
Com ambos os textos foi feita leitura em voz alta, seguida de tradução e análise dos texto.
A última atividade dessa primeira aula foi com o material intitulado “Conhecendo cada aluno”,
constituído de duas páginas. Este material serviu para coletar dados pessoais sobre os alunos;
para conhecer os motivos que os levaram a se inscrever no curso e as expectativas deles em
relação ao mesmo; e para avaliar superficialmente o seu nível de domínio da língua italiana. Ao
todo, 19 alunos participaram dessa atividade, sendo 17 na primeira aula, um na aula do dia 08 e
um na aula do dia 13 de setembro de 2004 (anexos 11 - 31).
Um funcionário do Laboratório de Línguas da Faculdade de Letras da UFRJ, Anderson
Santos de Oliveira, foi o responsável pela filmagem das aulas. Foram produzidas 6 fitas VHS
6
. A
distribuição das aulas filmadas nas fitas foi a seguinte:
FITA 1: aula do dia 13 de setembro de 2004;
FITA 2: aulas dos dias 15 e 20 de setembro de 2004;
FITA 3: continuação da aula do dia 20; aula do dia 22 de setembro de 2004;
FITA 4: aula do dia 29 de setembro de 2004;
FITA 5: aulas dos dias 04 e 06 de outubro de 2004;
FITA 6: continuação da aula do dia 06; aulas dos dias 20 e 25 de outubro de 2004.
Serviu como um importante instrumento para coleta de dados um questionário composto
de duas páginas, intitulado “Avaliação individual do curso feita pelos alunos”. Essa avaliação foi
6
Foi produzida uma compilação com os momentos que consideramos mais interessantes da filmagem de
cada aula. Essa compilação é o conteúdo do DVD que se encontra anexado a este trabalho (anexo 55).
escrita e realizada no dia 27 de outubro de 2004. Pedimos aos alunos que não se identificassem
ao responder a esse questionário. Com isso, quisemos que eles escrevessem com espontaneidade
e sinceridade. Nessa avaliação, os alunos analisaram vários aspectos ligados ao curso; além
disso, puderam também declarar o que acharam do desempenho deles e da professora.
Participaram dessa atividade os 11 alunos que concluíram o curso (anexos 31 - 52).
Esse material foi um instrumento importante na coleta de dados, porque conforme
afirmamos no capítulo 5 deste trabalho na pesquisa etnográfica, existe a preocupação em se
retratar a perspectiva dos participantes sobre o contexto investigado. A consideração dos
diferentes pontos de vista dos participantes contribui para o trabalho de interpretação que leva às
respostas das questões propostas acerca do objeto investigado.
É importante esclarecermos que as perguntas que formulamos para os dois questionários
foram as que consideramos mais interessantes como instrumentos de coleta de dados que nos
levariam a descrever e analisar a relação professor-aluno no curso de extensão. Somente durante
o trabalho de análise dos dados coletados é que pudemos verificar quais eram as perguntas mais
pertinentes com o nosso objetivo principal. Queremos dizer, portanto, que nem todas as
perguntas dos dois questionários — e conseqüentemente as respostas dos alunos — foram
aproveitadas na análise dos dados. Isso ocorreu também com dados coletados através dos outros
instrumentos.
Além do que, consideramos pretensão a idéia de se exaurir todas as possibilidades de
exploração de dados coletados para uma pesquisa — sejam por meio de questionários, de diários,
de filmagens, etc. . Procuramos, assim, nos ater à busca de respostas satisfatórias para as
indagações deste trabalho. Essas respostas serão apresentadas nos próximos capítulos.
6. ANÁLISE DOS DADOS
6.1. A relação professor-aluno no curso de extensão L’arte del costruire: curso de italiano
técnico
Conforme afirmamos no capítulo 5, em uma pesquisa etnográfica, é o entrecruzar de
vários pontos de vista que viabiliza uma interpretação do fenômeno investigado. São utilizados
diferentes instrumentos para a coleta de dados essencialmente descritivos, os quais levam à
captação desses vários pontos de vista.
No presente capítulo, portanto, pretendemos analisar os dados coletados que
consideramos pertinentes e realizar a triangulação, para, assim, respondermos às questões
levantadas neste trabalho. Lembramos que o nosso objetivo principal é descrevermos e
analisarmos a relação professor-aluno no curso de extensão, no que tange ao poder em sala de
aula.
Recapitulemos sucintamente quais foram os instrumentos utilizados para a coleta dos
dados. Foram os seguintes:
1) diários de classe escritos pela professora-pesquisadora e pelas duas informantes;
2) gravação em áudio das primeiras aulas (2 fitas cassetes);
3) gravação em vídeo da maioria das aulas (6 fitas VHS);
4) um questionário individual, intitulado “Conhecendo cada aluno”, respondido pelos alunos no
primeiro encontro do curso de extensão (2 páginas originais; anexos 11 - 30);
5) um questionário individual de avaliação do curso de extensão, respondido pelos 11 alunos de
forma anônima, no penúltimo encontro do curso (2 páginas originais; anexos 31 - 52).
É importante expormos que verificamos a seguinte situação: os dados coletados através
dos 3 diários de classe, das gravações em áudio e em vídeo, e do questionário individual de
avaliação do curso-laboratório viabilizaram a obtenção de respostas para as questões desta
pesquisa, sobretudo porque captaram a dinâmica estabelecida em sala de aula. o questionário
individual intitulado “Conhecendo cada aluno”, não contribuiu muito para esse fim; porém, foi
de suma importância para a pesquisa, porque serviu principalmente para que conhecêssemos o
grupo de alunos participantes e a expectativa deles em relação ao curso de extensão. Foi através
deste instrumento de coleta de dados que pudemos, por exemplo, identificar as áreas acadêmicas
dos alunos.
Quanto aos participantes do contexto investigado, convém aqui fazermos um
esclarecimento. Como sabemos, esse contexto foi o curso de extensão L’arte del costruire:
curso de italiano técnico. Nele inscreveram-se 28 pessoas. Dessas, 11 o concluíram; 9 desistiram
ou tiveram freqüência inferior a 75%; e 8 nunca o freqüentaram (anexos 1 - 3).
Tendo em vista essa realidade, consideramos participantes do contexto investigado
apenas os 11 alunos que freqüentaram assiduamente e concluíram o curso de extensão, além
naturalmente da professora-pesquisadora e das duas informantes. Obviamente desconsideramos
os 8 alunos que nunca freqüentaram o curso. Também foram desconsiderados os 9 alunos que
tiveram freqüência insuficiente menos de 75% —, porque o nosso objetivo é descrever e
analisar a relação professor-aluno estabelecida através de um convívio dentro do contexto
educacional selecionado, o de um curso LAP. Esses 9 alunos não tomaram parte no grupo
inserido nesse contexto, não chegaram a “conviver” com os outros participantes. Além disso, em
uma pesquisa etnográfica, uma preocupação em se retratar a perspectiva dos sujeitos sobre o
contexto estudado, e essa perspectiva é formada e percebida através de um processo. Para que
isso se dê, professora e alunos precisam conviver durante um certo período de tempo; somente os
11 alunos que concluíram o curso atenderam a essa condição.
Assim, ressaltamos para que fique claro: coletamos dados que envolviam os 11 alunos
assíduos no curso e os 9 alunos que pouco o freqüentaram, mas analisamos apenas os dados
ligados aos referidos 11 alunos. Feito este esclarecimento, passemos à descrição do grupo
discente participante do contexto de investigação.
O questionário Conhecendo cada aluno” foi respondido no primeiro encontro do curso
de extensão dia 01-9-2004 por 10 dos 11 alunos participantes. Esse questionário
apresentava-se dividido em duas partes; na primeira, os alunos prestaram as seguintes
informações: nome; idade; vínculo com a UFRJ; área acadêmica ou profissional a qual estava
ligado; nível de domínio da língua italiana e de outras línguas estrangeiras; estada na Itália;
contato anterior com o italiano técnico; motivo pelo qual se inscreveu no curso de extensão; e
expectativa sobre esse curso. Na segunda parte deste questionário, o aluno deveria elaborar, em
italiano, uma redação de 10 a 15 linhas sobre ele próprio e a sua vida. Esta segunda parte serviu
para que pudéssemos ter uma idéia da correspondência entre o domínio que o aluno declarou ter
da língua italiana e aquele que ele apresentava. Lembramos que cursos LSP, como o que
oferecemos, são voltados para alunos que já possuem um certo domínio da língua estrangeira.
Com base na primeira parte deste questionário e também em uma dinâmica de interação
realizada nos primeiros encontros do curso, pudemos identificar quais eram os alunos ligados às
áreas especializadas e quais não eram dessas áreas. Assim, dividimos os 11 alunos participantes
em dois grupos; os estudantes das áreas especializadas formam o grupo 1; os outros formam o
grupo 2. Verifiquemos a seguir quem são esses alunos, suas idades e quais são as suas áreas:
GRUPO 1 – alunos das áreas especializadas:
NOME E IDADE: ÁREA ACADÊMICA:
1. Edson Santiago – 23 anos Aluno do período do Curso de Graduação
em Arquitetura e Urbanismo da UFRJ
2. Rafael Malheiro da Silva de Amaral Ferreira
– 23 anos
Aluno do 10º período do Curso de Graduação
em Engenharia Civil da UFRJ
3. Sara Jane Araújo Lopes – 21 anos
Aluna do período do Curso de Graduação
em Composição de Interiores da Escola de
Belas Artes da UFRJ
4. Juliana Baptista Lanhas –20 anos Aluna do período do Curso de Graduação
em Pintura da Escola de Belas Artes da UFRJ
5. Istefânia Marcarini Rubino – 18 anos Aluna do período do Curso de Graduação
em Pintura da Escola de Belas Artes da UFRJ
6. Égle Justino Vaz – não informou idade
Fez Ensino Médio Técnico na Itália, voltado
para uma área ligada à Arquitetura; ele não
informou qual área
GRUPO 2 – alunos de outras áreas:
NOME E IDADE: ÁREA ACADÊMICA:
1. Fábio de Almeida Aquino – 19 anos Aluno do período do Curso de Graduação
em Letras, Português-Italiano, da UFRJ
2. Paulo Henrique F Guimarães – 21 anos Aluno do período do Curso de Graduação
em Letras, Português-Italiano, da UFRJ
3. Roberta Matias dos Santos – 22 anos Bacharel em Letras, Português-Italiano, pela
UFRJ
4. Renata Moraes do Nascimento – 19 anos
Aluna do período do Curso de Graduação
em Letras, Português-Literaturas, da UFRJ
5. Monique Medeiros Fagundes – 25 anos
Bacharel em Letras, Português-Italiano, pela
UFRJ; aluna do Curso de Graduação em
Licenciatura em Letras da UFRJ
No que tange à expectativa do corpo discente em relação ao curso de italiano técnico,
observamos que a maioria dos 10 alunos que responderam ao questionário “Conhecendo cada
aluno” esperava adquirir vocabulário técnico e/ou aprender mais sobre arquitetura e engenharia.
Verifiquemos as respostas de 3 alunos para a pergunta “O que você espera desse curso?”
(pergunta 12):
“Acredito que neste curso poderei conhecer mais a língua italiana, manter um
contato com esta e aprender mais sobre arquitetura.” (Aluno Rafael Malheiro da
Silva do Amaral Ferreira)
“Espero que com esse curso eu amplie o meu vocabulário e tenha mais contato com
assuntos de engenharia e arquitetura.” (Aluna Juliana Baptista Lanhas)
“Espero aprimorar meu vocabulário (...).” (Aluno Fábio de Almeida Aquino)
É interessante notar que esses dados apresentados pelos alunos, relativos à
expectativa deles sobre o curso de extensão, foram ao encontro dos objetivos que traçamos para
o mesmo, expostos no capítulo 5 (tópico 5.2). E, de acordo com o questionário individual de
avaliação do curso de extensão vale lembrar, respondido anonimamente pelos 11 alunos no
penúltimo encontro —, os alunos demonstraram ter compreendido, a nosso ver satisfatoriamente,
esses objetivos. Na pergunta “Qual foi, no seu entender, o objetivo principal do curso?”
(pergunta 1), obtivemos respostas como:
“O objetivo do curso foi desenvolver instrumentos para o ensino/aprendizado de um,
dentre vários setores específicos de uma língua estrangeira.”
“O objetivo principal foi a compreensão dos textos de linguagem setorial.”
“Aprender, ter conhecimento das palavras e termos técnicos de arquitetura em
italiano.”
No capítulo 4 deste trabalho, vimos que a relação entre poder e conhecimento pode
contribuir para a simetria ou a assimetria em sala de aula. Assim, na análise dos dados para a
descrição da relação professor-aluno estabelecida no curso de extensão, tivemos de considerar o
domínio de dois tipos de saberes: o da língua estrangeira comum; e o das áreas especializadas.
Temos consciência de que o uso de determinados termos, em estudos como este, nos
obriga a declarar o sentido que lhes conferimos. Por isso, faz-se necessário aqui esclarecermos o
que queremos dizer com o termo “domínio”, considerando os dois tipos de saberes supra citados.
Por “domínio da língua estrangeira comum”, entendemos o conhecimento da norma culta dessa
língua e a sua utilização adequada, através das habilidades lingüísticas e comunicativas —
compreender (ler e ouvir), falar e escrever. Por “domínio das áreas especializadas”, queremos
dizer a posse de conhecimentos ligados a essas áreas.
Captamos, sobretudo através do questionário “Conhecendo cada aluno”, o ponto de vista
dos alunos participantes a respeito do nível de domínio que eles tinham do italiano língua
comum (pergunta 5). Havia 4 opções de resposta: fraco, regular, bom e ótimo. O resultado foi o
seguinte:
1 aluno declarou ter um domínio ótimo da língua italiana;
1 aluno declarou ter um domínio bom;
6 alunos declararam ter um domínio regular;
2 alunos declararam ter um domínio fraco.
Através da análise da redação que eles elaboraram nesse mesmo questionário e com base
ainda no desempenho deles durante as aulas, pudemos conferir se a auto-avaliação deles foi
correta. O resultado foi o seguinte: os 2 alunos que declararam possuir um ótimo e um bom
domínio da língua italiana, na verdade cometiam freqüentemente erros gramaticais, que nos
levaram a classificar o domínio deles da língua como sendo de regular a fraco; os 6 alunos que
declararam ter um domínio regular e os 2 que declararam ter um domínio fraco da língua, de
fato, demonstraram uma auto-avaliação correta.
Assim, no que diz respeito ao domínio da língua comum por parte dos alunos,
verificamos que praticamente não houve distinção entre grupo 1 e grupo 2, isto é, os dois grupos
juntos apresentaram um domínio de regular a fraco do italiano língua comum.
Foi importante conhecermos o ponto de vista dos alunos sobre o nível de domínio que
eles têm da língua, porque esse aspecto interfere na interação que se estabelece em sala de aula
entre os sujeitos. Teoricamente os alunos que acreditam ter um domínio bom ou ótimo da língua
estrangeira tendem a participar mais ativamente das aulas, e o contrário costuma acontecer com
aqueles que acreditam ter um desempenho regular ou fraco.
Quando levamos em conta o domínio das áreas especializadas, tivemos de considerar
separadamente os dois grupos discentes, porque, conforme já afirmamos, os alunos do grupo 1 o
possuem, os do grupo 2 não o possuem. Assim, verifiquemos, através do quadro que segue, a
situação da professora e dos alunos de ambos os grupos em relação ao domínio da língua comum
e das áreas especializadas:
DOMÍNIO ... PROFESSORA ALUNOS DO GRUPO 1 ALUNOS DO GRUPO 2
da língua comum possui não possuem não possuem
das áreas especializadas
não possui possuem não possuem
Com base nessa realidade e nos princípios que apresentamos anteriormente,
identificamos, na verdade, mais de um tipo de relação professor-aluno no curso de extensão, os
quais passaremos agora a descrever.
O tipo de assimetria de conhecimento que se estabeleceu ao se considerar o italiano
língua comum, gerou uma assimetria na relação de poder em sala de aula entre a professora e os
alunos dos grupos 1 e 2. De um lado figurava a professora, com o domínio da língua comum, e
de outro, todos os alunos, sem esse domínio. À professora coube o poder obtido através do
domínio desse saber. Nesse caso, portanto, a relação foi assimétrica, exatamente como nos
cursos tradicionais.
Verificaremos, no tópico 6.3 deste trabalho, que esse resultado foi utilizado pela
professora como uma estratégia que a auxiliou no exercício da sua função no curso.
Quando levamos em conta o conhecimento das áreas especializadas, verificamos o
estabelecimento de dois tipos distintos de relação professor-aluno: a relação professora-alunos do
grupo 1; e a relação professora-alunos do grupo 2.
O tipo de assimetria de conhecimento verificado entre a professora e o grupo 1 gerou uma
simetria de poder; tanto a professora quanto os alunos eram “especialistas”, cada qual com o
domínio de um tipo de saber: a professora com o domínio do italiano língua comum; e os alunos,
com o das áreas especializadas. Esses dois saberes articulados possibilitaram a construção do
conhecimento em sala de aula.
É interessante observar que, quando as etapas de iniciação, resposta e avaliação que,
como vimos no capítulo 4, são tradicionalmente seguidas em cursos de língua comum foram
aplicadas nas aulas do curso de extensão, verificamos que a iniciação e a resposta foram como
nas aulas tradicionais, isto é, a iniciação era feita pela professora, e a resposta cabia aos alunos,
mas a etapa de avaliação foi diferente, porque a professora, no que tange ao conhecimento
técnico, não era capaz de avaliar. Essa etapa era realizada pelos alunos do grupo 1. Isso lhes
conferiu poder.
Entre a professora e o grupo 2, ainda considerando as áreas especializadas, observamos
também uma assimetria de conhecimento que, por sua vez, gerou uma assimetria de poder. A
professora não possuía o domínio das áreas especializadas, mas o conhecimento mínimo que ela
obteve das mesmas principalmente através da pesquisa e do estudo que realizou para planejar
o curso e cada aula representou uma vantagem da professora em relação ao grupo 2, que não
possuía nenhum conhecimento das referidas áreas. Por isso a relação entre a professora e esse
grupo de alunos sob o aspecto do poder em sala de aula seguiu a tendência tradicional, ou
seja, assimétrica.
O questionário individual de avaliação do curso de extensão contribuiu muito para a
obtenção desses resultados. É interessante notar a resposta de um aluno para a pergunta a
respeito do objetivo principal do curso — pergunta 1, a qual já fizemos referência anteriormente:
“Enriquecimento vocabular e cultural de alunos e professora.”
Consideramos essa resposta um dado interessantíssimo. Para esse estudante, tanto os
alunos quanto a professora aprenderam durante o curso; essa visão deixa a entender que a relação
entre a professora e os alunos do grupo 1 foi simétrica. Não prevaleceu uma situação de
transmissão de conhecimento da professora para os alunos, mas sim uma espécie de
cumplicidade entre esses sujeitos na obtenção do conhecimento desejado, ou seja, o
conhecimento técnico.
Isso ficou evidenciado também pelo tipo de aula que a maioria dos alunos declarou — no
mesmo questionário — ter se estabelecido no curso (questão 4). Os 11 alunos tiveram as
seguintes três opções de resposta sobre esse aspecto:
“aulas expositivas (o professor apresentava o conteúdo e direcionava todas as
etapas das aulas, com pouca participação dos alunos);
interativas (o professor e os alunos interagiam todo o tempo);
outra resposta: _________________________________________________.”
O resultado que obtivemos foi o seguinte:
1 aluno considerou as aulas expositivas;
8 alunos consideraram as aulas interativas;
2 alunos optaram por “outra resposta”, e afirmaram o seguinte:
“A aula na verdade foi uma fusão entre as opções anteriores (expositivas e
interativas), pois o andamento da aula dependia do assunto”.
“Interativa, mas o professor não possuía uma base em arquitetura e tinha dúvidas
nas respostas da apostila”.
O fato de a maioria dos alunos ter considerado as aulas interativas reforça a idéia de que
houve uma simetria na relação entre a professora e alguns alunos, no que tange ao poder em sala
de aula. Os alunos das áreas especializadas detinham um conhecimento específico que lhes
conferiu “poder”. Na afirmação apresentada pelo aluno que optou por “outras respostas”, fica
claro que a professora dependia da participação desses alunos para a construção do
conhecimento. Esse fato ficou mais evidente ainda nas respostas que os alunos apresentaram
para a pergunta 8 do questionário individual de avaliação. A pergunta e as opções de resposta
foram as seguintes:
“Em relação à participação, nas aulas, dos alunos das áreas especializadas, você
diria que:
( ) a professora dependia deles para que os conteúdos das aulas fossem dados de
modo satisfatório.
( ) em nenhum momento a professora dependeu da participação deles para
trabalhar os conteúdos das aulas de modo satisfatório.
( ) outra resposta: _________________________________________________”
O resultado foi o seguinte: 4 alunos marcaram a primeira opção; 1 aluno marcou a
segunda opção; e 6 alunos marcaram a opção “outra resposta”; neste último caso, a maioria
defendeu a idéia de que às vezes a professora dependia dos alunos das áreas especializadas.
Sendo assim, podemos dizer que praticamente 10 alunos admitiram ter existido esse tipo de
dependência.
6.2. A função da professora e a dos alunos e o tipo de didática observados no curso de
extensão
Decidimos tratar, em um mesmo tópico, a função da professora e a dos alunos e o tipo de
didática observados no curso de extensão, porque consideramos esses dois aspectos
indissociáveis; eles serão abordados juntos, de modo que um justifique o outro.
Conforme verificamos no capítulo 4 deste trabalho, nos cursos de línguas estrangeiras
cujo objeto principal é o ensino/aprendizagem da língua comum, professor e alunos exercem
papéis diferentes muito bem definidos. Geralmente o professor é o detentor absoluto do
conhecimento almejado pelos alunos, e cabe a ele ensiná-lo com segurança. No que diz respeito
à interação em sala de aula, é sua tarefa iniciá-la, monitorá-la, avaliá-la e encerrá-la. Aos alunos
cabe o trabalho de compreender e assimilar a matéria ensinada, bem como seguir os
procedimentos estipulados pelo mestre.
De acordo com Paolo Balboni (2000), “o modelo ‘o-professor-ensina-coisas-que-sabe-a-
um-aluno-que-não-sabe’ se adapta à cotidianidade da turma da escola auto-referencial, mas não
pode ser aplicado ao ensino das microlínguas científico-profissionais”. Balboni apresenta as
seguintes razões para esse fato:
1) “o ensino microlingüístico é por natureza hetero-referencial”, isto é, o seu planejamento e a
sua realização dependem do mundo externo, do lugar onde a microlíngua é utilizada;
2) o professor não conhece a microlíngua com profundidade e segurança, porque ele não
pertence à área científico-profissional do aluno;
3) “o ensino da microlíngua é dirigido a um estudante especialista”; ele geralmente não domina
as variações cotidianas da língua estrangeira, mas domina o conteúdo tratado na microlíngua.
Considerando essa realidade, pudemos observar que no curso de extensão foi posta em
prática um tipo de didática que Balboni (ibid.) denomina de didática colaborativa ou cooperativa.
Sobre esse paradigma, o autor afirma o seguinte:
No ensino microlingüístico, o ato didático os dois sujeitos estudante e docente
em posição de igual dignidade, de igual responsabilidade, com deveres e
competências complementares: o termo “microlíngua” é dividido nos seus dois
componentes, e o estudante traz a sua competência relativa ao “micro”, ao signifié,
enquanto o professor contribui seja com o signifiant, com a própria competência na
“língua”, seja sobretudo com o seu domínio das técnicas de análise lingüística e o seu
conhecimento dos processos de aprendizagem.
Os dois principais sujeitos da prática dessa didática colaborativa no curso de extensão
foram, sem dúvida, a professora e os alunos do grupo 1 os das áreas especializadas. Esses
dois sujeitos exerceram a função de colaboradores mútuos, facilitadores da aprendizagem, uma
vez que, na construção do conhecimento comum, eles contribuíram com as suas respectivas
competências. Por isso a relação de poder entre eles foi simétrica e houve a prevalência de aulas
interativas, em detrimento de aulas expositivas.
A função desempenhada pelos alunos do grupo 2 os das outras áreas foi a mesma
exercida por alunos de cursos de língua comum. Eles se encontravam desprovidos de poder,
porque nem dominavam a língua estrangeira comum, nem possuíam nenhum conhecimento das
áreas especializadas. A participação desses alunos nas aulas foi menor, e por isso as aulas para
esses alunos foram mais expositivas: de um lado, estavam a professora e os alunos do grupo 1, e
de outro lado, os alunos do grupo 2.
A organização principal do discurso em sala de aula foi a tradicional, ou seja, a de
iniciação, resposta e avaliação. No que tange à língua comum, era função da professora iniciar e
avaliar; aos alunos dos grupos 1 e 2 cabia a função de responder. No que tange às áreas
especializadas, a função da professora se restringia a de iniciar a interação; os alunos do grupo 1
acumulavam as funções de responder e de avaliar; e aos alunos do grupo 2 cabia apenas
responder.
É interessante notar que, segundo Balboni (ibid.), o professor de cursos LSP tem um papel
mais delicado do que o professor de língua comum. Um dos fatores que contribui para isso é o
fato de que geralmente um professor de LSP precisa desenvolver o material didático a ser
utilizado nas aulas. Mesmo que, hoje em dia, haja materiais didáticos para cursos LSP ligados a
diversas áreas, freqüentemente esses materiais precisam ser adaptados para que atendam às
necessidades dos alunos, ao período de duração do curso, etc. .
De fato, no curso de extensão, tivemos de elaborar e adaptar materiais didáticos, sobretudo
porque consideramos três áreas afins: Arquitetura, Engenharia Civil e Belas Artes.
Uma função que se costuma atribuir a professores de cursos LSP e que, para muitos
estudiosos, não lhes cabe é a de ensinar a matéria das áreas especializadas. No início do
desenvolvimento da abordagem LSP, muito se discutiu sobre a necessidade de o professor
dominar a área especializada do aluno, ou seja, de ser um especialista como o aluno. O teórico
Timothy Bell foi um dos que defendeu essa idéia (1999). Entre os estudiosos italianos, Giovanni
Freddi (1994) também defendia esse princípio. Segundo esse autor, “o professor ideal de
microlíngua é um operador que tem a necessária competência tanto na ciência ou setor
especializado, quanto na correspondente microlíngua”. Freddi admite, porém, ser difícil
encontrar profissionais com essa formação:
Mesmo que seja difícil encontrá-lo, nós sabemos que tal professor será: um formado
em línguas com conhecimentos específicos em um particular setor; ou mesmo um
especialista — cientista, técnico com conhecimentos lingüísticos e didáticos
específicos.
Na obra As microlínguas científico-profissionais (2000), Paolo Balboni dedica um
capítulo à formação do professor de microlíngua. O autor afirma que a idéia da necessidade de se
criar um “superdocente de LSP” (Super LSP Teacher) foi, durante muito tempo, preponderante.
Porém, o autor afirma que atualmente “falta uma visão unitária e específica para a formação
desses professores”. Balboni apresenta a seguinte proposta de modelo de formação desses
docentes que, segundo o autor, é adequada para desenvolver a análise semiótica e lingüística
(...) e glotodidática”:
O ensino de microlíngua é antes de tudo o ensino de língua, mas o que faz do
docente da microlíngua um especialista peculiar (...) não é a cota aditiva, isto é,
quanto se acrescenta à formação glotodidática de base (...), mas sobretudo a
autonomia que o professor deve alcançar nas seguintes direções: seguir a vorticosa
mudança do mundo científico-profissional, sob o plano epistemológico e cultural;
estudar o discurso científico segundo modelos de análises (...); colher a rapidíssima
variação nos estilos microlingüísticos provocada pela globalização dos meios de
comunicação e portanto pela adesão cada vez mais marcada por módulos retóricos e
construtivos do discurso de origem americana (...); analisar particularmente a
inovação lingüística e estilística (...); aprofundar a natureza dos textos (...); conduzir
análises confiáveis e produtivas das necessidades (...); desenvolver uma
glotodidática específica para estudantes adultos (...); utilizar o suporte das novas
tecnologias (...).
Hutchinson e Waters, na obra English for Specific Purposes (1987), também dedicam um
capítulo ao papel do professor de ESP
7
, em que os autores indagam: “Que tipo de conhecimento
é exigido do professor de ESP?”. Eles respondem:
Os professores de ESP não precisam aprender um conhecimento de uma área
especializada. Eles precisam ter somente três coisas:
i) uma atitude positiva frente ao conteúdo ESP;
7
Os autores usam a sigla ESP, de English for Specific Purposes / Inglês para Fins Específicos, porque,
conforme já afirmamos no capítulo 2, tópico 2.2, deste trabalho, a abordagem LSP originou-se com o inglês.
ii) um conhecimento dos princípios fundamentais da área especializada;
iii) uma consciência de quantos (princípios) eles (os professores) provavelmente já
conhecem.
(...) o professor de ESP não tem que se tornar um professor da matéria especializada,
mas sim um estudante interessado da matéria especializada.
A LSP é uma entre as várias abordagens didáticas existentes para o ensino/aprendizagem
de línguas estrangeiras. O professor formado para dar aulas de uma língua estrangeira tem a sua
disposição essas abordagens e opta por uma ou outra —ou ainda combinações possíveis delas
de acordo com o tipo de trabalho que ele realizará. Esse professor pode trabalhar com a
abordagem LSP voltada para qualquer área acadêmica ou profissional, porque essa abordagem
implica a adoção de uma didática colaborativa, em que conforme afirmamos o aluno
deve contribuir na construção do conhecimento com o compartilhamento do conhecimento que
ele tem da sua área especializada.
Procuramos, no início do curso de extensão, expor todos esses princípios para os alunos.
Uma parte do texto intitulado Che cosa vogliamo dire per corso di italiano tecnico? (anexos 9 e
10), trabalhado com eles no primeiro encontro do curso, dizia o seguinte:
É importante observar que, em cursos de microlínguas, não é uma microlíngua toda
pronta, definitivamente codificada que o docente deve ensinar ao estudante, mas sim
técnicas e habilidades de auto-aprendizagem que consentem a qualquer um de
integrar e aperfeiçoar continuamente a própria microlíngua, paralelamente ao evoluir
da ciência e da tecnologia de que se ocupa o estudante. (Giovanni Freddi)
No final do curso de extensão, retomamos propositalmente essa particularidade, através
de uma das perguntas do questionário individual de avaliação do curso (anexos 31-52). A
pergunta foi a seguinte (nº 9): “Na sua opinião, que tipo de professor deve dar aula de uma
língua estrangeira em nível técnico?”. Algumas das respostas foram:
1) “Um professor que conheça profundamente a língua e um pouco da área
especializada.”
2) “Qualquer professor desde que esteja preparado para tal.”
3) “Um professor especializado.”
4) “Professores que tenham pesquisas direcionadas para este campo, para que
possam ter o máximo a oferecer.”
Analisando as respostas dos 11 alunos, verificamos que 4 alunos demonstraram ter
entendido que não é função do professor dominar as áreas especializadas, mas sim a língua
estrangeira; a resposta 1 demonstra isso; 4 alunos não responderam de forma clara; foi o caso,
por exemplo, da resposta 2; e 3 alunos acreditavam que o professor deve dominar as áreas
especializadas, conforme demonstram as respostas 3 e 4.
6.3. Estratégias didáticas utilizadas pela professora no curso de extensão
No curso de extensão, a professora utilizou determinadas estratégias no trabalho com a
didática colaborativa, que refletiram, de um modo geral, o seu esforço por facilitar a construção
do conhecimento e por conservar o seu status enquanto profissional. Algumas dessas estratégias
foram as seguintes:
1) Logo no primeiro encontro do curso, a professora expôs aos alunos a necessidade da adoção
de uma didática colaborativa, explicando em que esta consistia. Através do texto Che cosa
vogliamo dire per corso di italiano tecnico? (anexos 9 e 10), a professora procurou mostrar aos
alunos qual seria a sua função e a função deles no curso.
Consideramos esse procedimento uma estratégia da professora, porque, assim, ela
procurou deixar claro para os alunos o tipo de comportamento que esperava deles durante o
curso. Eles deveriam primeiramente aceitar o fato de ela não ser uma especialista nas áreas deles
e aceitar também a necessidade de eles contribuírem com o conhecimento das áreas
especializadas.
2) Apoio no domínio da língua comum. A professora, no decorrer do curso, procurava, através
do seu domínio da língua comum, superar a falta de domínio das áreas especializadas.
Freqüentemente a professora chamava a atenção dos alunos para aspectos gramaticais presentes
nos textos que tratavam temas das áreas especializadas.
3) Apoio na distância social. Apesar de termos verificado a ocorrência de uma maior simetria, no
que tange ao poder em sala de aula, entre a professora e os alunos do grupo 1, a professora
procurou manteve a sua autoridade, o seu “status”, considerando a hierarquia institucional. Era
ela quem tomava as decisões, por exemplo, sobre o direcionamento das aulas. Isso foi reforçado
sobretudo quando o arranjo espacial na sala de aula apresentava a professora em posição de
destaque na parte dianteira da sala e os alunos sentados em carteiras enfileiradas, de frente para a
professora. Porém, o arranjo espacial predominante no curso foi o dos alunos sentados lado a
lado, formando uma meia lua.
4) Apoio no domínio didático. Esse aspecto pôde ser percebido em determinadas situações
ocorridas em sala de aula. Um exemplo disso é que, quando tanto a professora quanto os alunos
do grupo 1 não entendiam algum termo técnico ou apresentavam dúvida sobre a utilização de um
termo técnico, geralmente a professora resolvia a situação pedindo a esses que pesquisassem o
assunto e apresentassem na aula seguinte. Assim, superava esse tipo de obstáculo e dava
continuidade à aula.
5) A aceitação por parte da professora do “poder” dos alunos das áreas especializadas também
foi, a nosso ver, uma estratégia que ela utilizou. O poder desses alunos era um fato irrefutável;
assim, a professora demonstrou esforço para dividir a responsabilidade de apresentar
conhecimentos, sem se sentir ameaçada por isso. Esse esforço foi percebido pelos alunos, o que
se verifica nas respostas que eles apresentaram para a pergunta 7 do questionário de avaliação
individual do curso de extensão (anexos 31 - 52). A pergunta foi a seguinte: “Qual foi, na sua
opinião, o desempenho da professora, tendo em vista que ela não pertence a nenhuma das áreas
especializadas às quais o curso foi direcionado (Arquitetura, Engenharia Civil e Belas Artes)?
Justifique”. Algumas das respostas foram as seguintes:
1) “O desempenho da professora foi muito bom, visto que ela se preocupava todo o
tempo em passar o melhor significado das palavras/assuntos dados em aula,
inclusive contando com a participação dos alunos.”
2) Às vezes se demonstrou insegura, mas conseguiu seu objetivo de passar
informações novas.”
3) “Foi bom. A professora se esforçou bastante e conseguiu ministrar bem as
aulas.”
4) “Teve um desempenho com riqueza de vocabulário e demonstrando total interesse
nas informações dadas pelos alunos.”
5) Desempenho muito bom. O mais importante é que ela demonstrou dedicação e
vontade de aprender com os alunos.”
As respostas 4 e 5 são particularmente interessantes, porque indicam claramente uma
quebra no modelo tradicional em que o professor é o elemento que “transmite” conhecimentos
ao aluno. Segundo esses alunos, a professora demonstrou “total interesse nas informações dadas
pelos alunos” e demonstrou também dedicação e vontade de aprender com os alunos”. Essas
indicações reforçam o caráter simétrico da relação de poder entre a professora e os alunos do
grupo 1.
7. IMPACTOS DA RELAÇÃO PROFESSOR-ALUNO SOBRE O
PROCESSO ENSINO/APRENDIZAGEM
As relações entre quem ensina e quem aprende repercutem sempre na aprendizagem.
(Bruner, em Uma nova teoria da aprendizagem, p.50)
Conforme vimos no tópico 6.1 deste trabalho, no que tange ao poder em sala de aula,
estabeleceram-se dois tipos de relação professor–aluno no curso de extensão: uma simétrica,
entre a professora e os alunos do grupo 1 os das áreas especializadas; e outra assimétrica,
entre a professora e os alunos do grupo 2 os das outras áreas. Esses dois tipos de relação
provocaram impactos positivos e negativos no processo ensino/aprendizagem. Por positivos
queremos nos referir aos impactos que facilitaram a construção do conhecimento; e por
negativos, aqueles que, de certa forma, atrapalharam essa construção. Neste capítulo,
apresentamos sucintamente os impactos que consideramos mais importantes.
O primeiro impacto positivo que observamos foi a predominância de aulas interativas,
devido sobretudo ao tipo de didática que se estabeleceu no curso, a colaborativa ou cooperativa.
Havia a necessidade da participação dos alunos do grupo 1 nas aulas, compartilhando seus
conhecimentos das áreas especializadas. Isso, porém, evidenciou um problema: a interação só era
freqüente entre a professora e os alunos do grupo 1. A participação dos alunos do grupo 2 foi
mínima, representando isso um impacto negativo.
No capítulo anterior, no tópico 6.1, demonstramos que os alunos do grupo 2 estavam
desprovidos de poder, porque eles não apresentavam nem o domínio da língua estrangeira
comum nem conhecimentos das áreas especializadas. Considerando esses dois saberes, durante a
dinâmica de iniciação, resposta e avaliação, cabia-lhes somente a função de responder.
A didática colaborativa que se desenvolveu no curso levou a um equilíbrio do poder em
sala de aula entre a professora e os alunos do grupo 1. Estes não apresentaram o domínio da
língua comum nem o domínio didático. Estes se concentraram na figura da professora. Porém,
tendo em vista que os alunos do grupo 1 sabiam que eram eles e não a professora os
especialistas nas áreas, isso proporcionou uma maior segurança a esses alunos e serviu para
aumentar a motivação deles no processo ensino/aprendizagem do italiano técnico e a
participação deles nas aulas.
Pudemos perceber, porém, uma certa resistência por parte dos alunos em aceitar o
“poder” que era conferido aos das áreas especializadas. Isso ficou evidenciado na pergunta 9 do
questionário de avaliação, que foi a seguinte: “Na sua opinião, que tipo de professor deve dar
aula de uma língua estrangeira de nível técnico?”. Um dos alunos respondeu: “Um professor
especializado”. Houve outros alunos que, nas suas respostas, seguiram essa mesma idéia.
Consideramos esse fator uma resistência por parte dos alunos do grupo 1 em assumir a
responsabilidade de compartilhar conhecimentos em sala de aula, e uma resistência por parte dos
alunos do grupo 2 em aceitar que outros alunos tivessem mais poder do que eles.
Atribuímos a essa reação de resistência por parte dos alunos uma explicação de ordem
cultural e histórica, baseada no princípio que Foucault (1995) chama de “regime de verdades”,
isto é, o conjunto de discursos valorizados por uma determinada sociedade que “ela acolhe e faz
funcionar como verdadeiros”, em detrimento de outros que são considerados falsos, sem
prestígio social.
Ao longo dos anos de escolaridade, os alunos aprendem que o professor é a autoridade,
cabendo-lhe ensinar determinados saberes, dirigir o raciocínio, avaliar, controlar o discurso etc.;
aos alunos cabe sobretudo responder e obedecer, seguir as orientações dadas pelo professor.
Habituados a aulas predominantemente expositivas, que seguem, segundo Paolo Balboni, o
modelo “o-professor-ensina-coisas-que-sabe-a-um-aluno-que-não-sabe”, em nível imaginário,
eles estariam infringindo uma “lei social”, ao assumirem funções que cabem ao professor e não a
eles. Eles estariam “destruindo” o status da figura do professor, legitimado por eles próprios.
Sabedores de que infringir leis sociais que regem os comportamentos humanos na maioria das
vezes implicam punições para os infratores, os alunos como um todo manifestaram
inconscientemente, no curso de extensão, uma resistência à atribuição de autoridade a um grupo
deles, no caso o grupo 1, mesmo que com o “consentimento” da professora.
7. CONSIDERAÇÕES FINAIS
No presente trabalho, buscamos descrever e analisar a relação professor-aluno, no que
tange ao poder em sala de aula, em um curso de italiano para fins acadêmicos. Realizamos uma
microanálise etnográfica, e tivemos como campo de investigação um curso de extensão
intitulado L’arte del costruire: curso de italiano técnico, oferecido pela Faculdade de Letras da
UFRJ no segundo semestre de 2004 a alunos e profissionais dos cursos de Engenharia Civil,
Arquitetura e Belas Artes, mas participaram também alunos do curso de Letras.
Através da análise dos dados coletados, verificamos a existência de dois grupos
diferenciados de alunos: o grupo 1, do qual faziam parte os alunos das áreas especializadas; e o
grupo 2, com os alunos de Letras. A partir dessa realidade, estabeleceram-se dois tipos de
relação professor-aluno em sal de aula.
A relação professora-alunos do grupo 1 mostrou-se simétrica, tendo em vista que houve
um equilíbrio do poder entre esses dois sujeitos, por possuírem, tanto a professora quanto esses
alunos, saberes complementares: a professora possuía o domínio do italiano língua comum e o
domínio didático, e os alunos possuíam o domínio, na língua materna (português) das áreas
especializadas.
A relação professora-alunos do grupo 2 mostrou-se como nos cursos tradicionais de
línguas estrangeiras, isto é, assimétrica, caracterizando-se por um desequilíbrio de poder em sala
de aula, uma vez que somente a professora possuía o domínio da língua estrangeira comum, o
domínio didático e um conhecimento mínimo das áreas especializadas.
Especialmente o resultado obtido sobre a relação professora-alunos do grupo 1 coloca a
abordagem LSP em posição de destaque frente às outras abordagens para o ensino/aprendizagem
de línguas estrangeiras, uma vez que estas, adotadas em cursos que enfocam a língua comum,
têm feito a relação professor-aluno ser tradicionalmente assimétrica.
O caráter complementar dos saberes da professora e dos alunos do grupo 1 gerou a
prática de uma didática colaborativa ou cooperativa, atribuindo à professora e aos alunos das
áreas especializadas a função de facilitadores do processo de construção de conhecimento
durante o curso de extensão.
Algumas estratégias didáticas utilizadas pela professora refletiram a sua preocupação em
conservar o seu status enquanto profissional e ser respeitada pelos alunos. Para tanto, a
professora apoiou-se sobretudo no seu domínio da língua comum e da didática e na sua própria
posição privilegiada na hierarquia institucional.
No que tange aos impactos dos tipos de relação professor-aluno estabelecidos no curso-
laboratório sobre a construção do conhecimento em sala de aula, concluímos que os impactos
verificados foram mais positivos do que os que se verificam nos cursos tradicionais de línguas
estrangeiras, sobretudo porque os alunos do grupo 1 tiveram muita participação nas aulas.
Apesar de termos percebido uma certa resistência por parte dos alunos de um modo geral em
aceitar a necessidade desses que pertenciam às áreas especializadas de contribuírem na
construção do conhecimento, a didática colaborativa se desenvolveu naturalmente.
O foco central da nossa pesquisa foi descrevermos e analisarmos a relação professor-
aluno, e, por isso, procuramos nos ater à consideração desses dois sujeitos, mas percebemos, ao
longo do trabalho, que a relação entre alunos do grupo 1 e alunos do grupo 2 foi
predominantemente assimétrica, considerando também o poder em sala de aula. Cabe aqui
esclarecermos que esse tipo de assimetria, porém, não é comum em cursos de LSP, porque
conforme afirmamos na introdução deste trabalho esses cursos são direcionados a alunos que
pertençam a uma mesma área acadêmica ou profissional ou a áreas afins, gerando um equilíbrio
de conhecimento e conseqüentemente de poder entre estudantes.
Acreditamos que, de todas as abordagens de ensino/aprendizagem de línguas
estrangeiras, a LSP é a que melhor proporciona a prática de uma didática colaborativa, sobretudo
porque o tipo de assimetria de conhecimento que se estabelece gera um equilíbrio do poder entre
professor e alunos em sala de aula. Esse quadro pedagógico se contrapõe àquele apresentado por
Moita Lopes (2002), em citação que apresentamos no capítulo 4 e que consideramos valer a pena
retomarmos aqui:
Na sala de aula (...) o desenvolvimento de conhecimento comum não é uma atividade
simples para alunos e professores. A dificuldade está, principalmente, calcada na
relação assimétrica entre o aluno e o professor, que atua como empecilho para o que
Bruner (1983) chama de handover, ou seja, o ponto em que o adulto, isto é, o
professor, passa a competência para o aluno. O ato de passar a competência para o
aluno implica, portanto, que o professor é o possuidor de um conhecimento que o
aluno não tem, e isto os envolve em uma relação de poder, que é extremamente
importante para a compreensão de como o conhecimento comum é criado na sala de
aula através da interação entre aluno e professor.
No que diz respeito ao tipo de relação professor-aluno, verificamos neste trabalho que a
abordagem LSP foge à regra apresentada por Moita Lopes na citação acima. Porém, mesmo que
em cursos LSP a referida relação seja simétrica, surpreendentemente o desenvolvimento de
conhecimento comum a que se refere Moita Lopes continua a não ser tarefa simples para
alunos e professores. A dificuldade, neste caso, está na resistência que esses sujeitos apresentam
frente a necessidade de assumirem novas funções no cenário pedagógico. A tradição de relação
assimétrica entre eles, caracterizada pelo modelo “o-professor-ensina-coisas-que-sabe-a-um-
aluno-que-não-sabe" (Balboni, 2000), é muito forte; trata-se de um padrão educacional
historicamente constituído, que atribui apenas à figura do professor o detentor do conhecimento
e do poder. Isso, de certa forma, dificulta o processo ensino/aprendizagem. No curso de
extensão, mostrou-se uma situação difícil tanto para professora quanto para alunos aceitar o
equilíbrio do poder entre eles.
Queremos, enfim, destacar que a abordagem LSP representa uma abertura de horizontes
para a prática docente com a língua italiana bem como com outras línguas. Tradicionalmente
é dada atenção apenas ao ensino/aprendizagem da língua comum, vinculado ao estudo da cultura
do país ou dos países onde se fala a língua estrangeira; mas não podemos perder de vista que as
microlínguas científico-profissionais, que têm um caráter universal, também o importantes. A
busca por cursos voltados para essas microlínguas — cursos LSP — sempre existiu e cresce cada
vez mais, refletindo o aspecto objetivo do mundo globalizado.
Esperamos que este trabalho possa ter evidenciado a condição ímpar da abordagem LSP,
no âmbito das diversas abordagens educacionais existentes, e a necessidade da realização de
mais pesquisas sobre a mesma, para a sua ampla divulgação e prática.
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ANEXOS
NÚMEROS:
ESPECIFICAÇÃO:
1 Folha de controle de freqüência dos alunos inscritos no curso de extensão
2 e 3 Situação dos 28 alunos inscritos no curso de extensão ao término deste
4 – 6 Prova escrita aplicada com os alunos no final do curso de extensão
7 Capa da apostila do curso de extensão
8 Bibliografia consultada na elaboração da apostila do curso de extensão
9 e 10
Dois textos trabalhados com os alunos no primeiro encontro do curso de extensão,
com os seguintes títulos:Che cosa vogliamo dire per corso di italiano tecnico?; Un
piccolo testo di italiano tecnico legato sopratutto all’architettura, alle arti
plastiche e all’ingegneria civile
11 - 30
Questionário respondido pelos alunos no primeiro encontro do curso de extensão;
o mesmo foi intitulado “Conhecendo cada aluno” (2 páginas originais)
31 - 52
Avaliação individual do curso feita anonimamente pelos alunos (2 páginas
originais)
53 Uma foto da professora-pesquisadora e das duas informantes-estagiárias
54 Uma foto de grupo no curso de extensão
55
DVD com a compilação dos momentos considerados mais importantes de cada
aula filmada
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